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1. QUANDO A POSSE APARECE NO MUNDO DA VIDA; NATUREZA JURÍDICA DA POSSE; TEORIAS EXPLICATIVAS DA POSSE(ENVOLVENDO POSSE E DETENÇÃO). Conforme magistério de Roberto de Ruggiero, não há matéria que se ache mais cheia de dificuldades do que esta, no que se refere à sua origem histórica, ao fundamento racional da sua proteçãp, à sua terminologia, à sua estrutura teórica, aos elementos que a integram, ao seu objeto, aos seus efeitos, aos modos de adquiri-la e de perdê-la. (Ruggiero, 2008?, p. 179). Outros civilistas eminentes tais como Lafaille, Oliveira Ascenção, Manuel Rodrigues e José Carlos Moreira Alves elencam outros problemas concernentes a definição precisa da posse e institutos acessórios. Não obstante, a doutrina nacional segue caminho relativamente coerente no que tange às questões relativas à posse: o momento de seu aparecimento, natureza jurídica e teorias explicativas. A proteção da situação de fato que surge da posse sempre teve como propósito preservar a ordem e a paz sociais. Quando tal situação é violada, buscava-se o restabelecimento do estado anterior por meio de ação coercitiva (manu militari), conforme assevera Carlos Roberto Gonçalves (2017, p.13). Embora se reconheça que a posse tenha se desenvolvido em Roma, sua origem na vida social é tema amplamente debatido. Uma corrente entende que a posse surgiu antes dos interditos que protegiam situações de uso e ocupação; outra sustenta que sua origem está vinculada ao processo reivindicativo dessas situações. A primeira, defendida por Niebuhr e Savigny, explica que Roma destinava parte das terras conquistadas aos cidadãos e outra parte ao Estado. Posteriormente, a cidade passou a distribuir também essas terras estatais, chamadas possessiones, a título precário. Por não poderem ser protegidas pela reinvindicatio, foi criado um procedimento especial de defesa, o interdito possessório, distinto da proteção conferida à propriedade quiritária. Os adeptos da segunda linha, como Ihering, entendem que os interditos possessórios derivaram do processo de reinvindicação. Inicialmente, o pretor decidia quem possuía direito sobre o bem com base nas provas. Com o tempo, esse procedimento ganhou autonomia e se separou da ação petitória. A natureza jurídica da posse também é objeto de controvérsia. Para compreendê-la, é essencial observar que o termo é usado de forma ambígua, tanto pela doutrina quanto pelo ordenamento jurídico, que lhe confere diferentes significados. Maria Helena Diniz observa que "posse" pode designar a propriedade, condição para aquisição do domínio, poder sobre pessoa, entre outros (DINIZ, 2022, n.p). No campo dos direitos reais, PAMPLONA FILHO e GAGLIANO (2022, p.56) afirmam que a posse pode ser identificada, em linhas gerais, como o domínio de fato da pessoa sobre a coisa. Savigny defende que a posse possui natureza bivalente: é, ao mesmo tempo, fato (quanto à sua existência) e direito (pelos efeitos que produz). Ihering, por sua vez, entende a posse exclusivamente como direito. Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho consideram a posse como uma situação fática protegida pelo Direito, mas não um direito real, visto que os direitos reais se caracterizam pela legalidade e tipicidade, e a posse não está listada entre eles. Quanto às teorias sobre a posse, destacam-se duas principais: a subjetiva (Savigny) e a objetiva (Ihering). Também existem teorias mistas (Ferrini, Riccobono, Barassi) e as teorias sociológicas (Perozzi, Saleilles, Hernandez Gil). A teoria subjetiva define a posse como a conjunção do corpus (posse material) e do animus (intenção de possuir como dono). Se faltar qualquer um dos dois, não há posse, apenas detêinção. Essa abordagem, no entanto, é criticada por não reconhecer a posse em contratos como comodato e locação. Ihering, embora inicialmente admirador de Savigny, questionou essa teoria ao apontar a incongruência de se proteger juridicamente um ladrão (que tem animus) e não proteger um locatário (que não tem animus domini). Savigny respondeu com a ideia de posse derivada, admitida em casos como o do credor pignoratício e o depositário. Savigny ainda reformulou os conceitos: o corpus passou a incluir a possibilidade de exercer o domínio físico, e o animus, a abranger outros direitos reais. Já Ihering descartou a necessidade do animus separado: para ele, o corpus (comportamento visível de domínio) já engloba a intenção. Assim, quem age como dono possui a posse. Exemplo: o lavrador continua possuidor da lavoura, mesmo ausente. Em contrapartida, quem abandona um bem móvel em local inapropriado perde a posse, por não agir como dono. A teoria objetiva valoriza a visibilidade da posse. Alguém pode adquirir a posse sem tocar o bem, desde que haja destinação econômica. Assim, aquele que encomenda um produto é considerado possuidor mesmo antes de recebê-lo fisicamente. Ihering diferencia relações possessórias normais (reconhecidas socialmente) e anormais (que não indicam posse). Ex: lenhadores que lançam madeira no rio mantêm a posse; objetos levados por força de enchentes, são perdidos. A posse, para ele, pode existir sem domínio físico, bastando haver uma relação econômica visível. Por isso, a detecção ocorre apenas em casos de impedimento legal. Savigny entende que detentor é aquele que tem corpus e affectio tenendi (vontade de manter a coisa), mas sem animus domini. Para Ihering, essa mesma configuração é posse, salvo proibição legal. Ihering justifica a proteção possessória como meio de facilitar a defesa da propriedade: é mais simples provar a posse do que a propriedade. Por isso, o possuidor é tido como proprietário presumido. Essa proteção, embora possa beneficiar invasores, é fundamental para garantir segurança jurídica. A teoria de Ihering influenciou legislações em diversos países, inclusive o Brasil. As teorias sociológicas, por sua vez, surgiram da observação das transformações sociais. Para Perozzi, a posse é resultado da abstenção de terceiros em intervir sobre quem detém a coisa. Saleilles defende a posse como independência econômica avaliada pela consciência social. Hernandez, influenciado pela sociologia, vincula a posse à função social do Direito, relacionando-a ao trabalho e à necessidade. No Brasil, a função social da posse é consagrada pela Constituição de 1988 e pelo Código Civil de 2002. Miguel Reale destaca a ideia de "posse-trabalho", que legitima a manutenção da posse em favor de quem dá à coisa uma destinação produtiva e socialmente relevante (REALE, 2005, n.p). 2. CLASSIFICAÇÃO DA POSSE Conforme a muito oportuna lição de Orlando Gomes, a posse: “existe como um todo unitário e incindível. Não obstante, a presença, ou ausência, de certos elementos, objetivo ou subjetivos, determina a especialização de qualidades, que a diversificam em várias espécies.” (GOMES, 2007?, n.p). O Código Civil promulgado em 2002, em seu capítulo I do Livro III da parte especial trata da posse e realiza sua classificação em posse direta e indireta; posse justa e injusta; posse de boa-fé e posse de má-fé. Todavia, a doutrina apresenta uma classificação mais ampla da posse, distinguindo as posses exclusiva; composse; posses paralelas; posse velha e posse nova; posse natural e posse jurídica; posse pro diviso e posse pro diviso; e posse ad interdicta e posse ad usucapionem, que serão definidas a seguir com base no magistério de Carlos Roberto Gonçalves. A partir do critério de exercício e gozo, a posse pode ser direta ou indireta. A direta é aquela exercida de forma imediata sobre o bem, como no caso do locatário. A indireta, por sua vez, é exercida à distância, como pelo locador. Ambas podem coexistir, conforme o art. 1.197 do CC, formando o chamado desdobramento ou paralelismo da posse. Nesses casos, tanto o possuidor direto quanto o indireto podem exercer medidas de defesa possessória. Com base na existência de vício, a posse se divide em justa e injusta. Conforme o art. 1.200 do CC, a posse justa é aquela livre de violência, clandestinidade ou precariedade. A posse injusta, por exclusão, é a quedecorre desses elementos. Em casos de aquisição mediante violência ou clandestinidade, a posse só se consolida com o fim dessas condutas (art. 1.208 do CC). A posse precária, um subtipo da injusta, surge da recusa de restituir a coisa por quem a recebeu a título precário, como no comodato. O vício reside na quebra da boa-fé. Quando o possuidor direto passa a agir com animus domini em relação ao indireto, ocorre a interversão possessória. Sob esse prisma, distingue-se a posse de boa-fé da de má-fé. A boa-fé subjetiva refere-se à convicção pessoal do possuidor quanto à legitimidade de sua posse, enquanto a objetiva refere-se ao comportamento esperado socialmente (honestidade, lealdade etc.). Nos termos do art. 1.201 do CC, há boa-fé quando o possuidor ignora o vício que invalida sua posse. Caso contrário, a posse é de má-fé. Do ponto de vista temporal, a posse é classificada como nova ou velha. A posse nova é aquela com menos de um ano e um dia; a velha, com mais. Essa distinção tem implicações processuais relevantes, conforme os arts. 558 e 562 do CPC/2015. O decurso do tempo no caso da classificação da posse em velha ou nova tem o poder de afastar consolidar a situação de fato em que se encontra a posse e livra-la dos defeitos que possam estar presentes nela, sem embargo da possibilidade de que tais defeitos sejam eliminados antes do aludido prazo. Reza a história que esse prazo teria surgido a partir da medição do tempo relacionado ao plantio e à colheita, que normalmente dura cerca de um ano. Outra versão afirma que o prazo de um ano surgiu no Direito germânico, cujos juristas formularam o entendimento de que para a consolidação da posse seria necessário um tempo mínimo de um ano para que somente então se pudesse proceder à presunção de propriedade. Conforme sua proteção, distingue-se entre posse ad interdicta (protegida por interditos possessórios, mas sem aptidão para usucapião) e posse ad usucapionem (aptá para gerar aquisição da propriedade). Tal classificação relaciona-se com a intenção do agente, conforme visto na teoria subjetiva da posse. Para ser protegido pelos interditos e ser considerada posse ad interdicta, basta que a posse seja justa, não contendo, portanto, os defeitos ou vícios da violência, da clandestinidade ou ou da precariedade. A posse ad usucapionem é aquela que se protrai por tempo definido em lei, permitindo que o titular adquira o domínio, gerando o direito de propriedade. Caso presentes o ânimo de dono, o exercício contínuo e de forma mansa e pacífica da posse, o justo título e a boa-fé, passados dez anos resta caracterizada a usucapião ordinária. Caso ausentes a boa-fé e o justo título, o prazo prolonga-se para quinze anos, ao fim dos quais resta caracterizada a usucapião extraordinária. A posse exclusiva é aquela exercida por uma única pessoa, seja direta ou indiretamente. Ela pode ser plena ou não, dependendo se abrange todos os poderes inerentes à propriedade, agindo como se a coisa fosse sua. A composse ocorre quando mais de uma pessoa exerce poderes possessórios sobre o mesmo bem, como em casos de comunhão ou condomínio. Prevista no art. 1.199 do CC, admite que cada compossuidor defenda judicialmente sua posse. A doutrina distingue entre composse simples (cada compossuidor exerce a posse independentemente) e em mão comum (só se exerce conjuntamente). Em ambas, é cabível a ação possessória contra terceiros ou entre compossuidores, especialmente se houver abuso no exercício da posse. Quando os poderes são divididos de fato, caracteriza-se a composse pro diviso; quando exercidos em conjunto, temos a composse pro indiviso. Havendo compossessão pro diviso por mais de um ano e dia, o compossuidor pode ajuizar interdito possessório contra outro que perturbe sua parte. As posses paralelas ocorrem quando mais de uma pessoa possui a mesma coisa sob títulos distintos, ou seja, é a situação que envolve o exercício da posse sobre um mesmo bem por duas ou mais pessoas, advindo tal direito de diferentes relações jurídicas. Essa classificação da posse está intimamente ligada com os conceitos de composse e posses direta e indireta, embora tais conceitos não se confundam. Um exemplo é a coexistência de posse direta e indireta em uma relação de inquilino e locatário, ou a relação existente entre os moradores de um mesmo condomínio. Posse natural e posse jurídica ou civil são duas formas de posse que se dinstinguem pelo meio de aquisição e transmissão. A posse natural é baseada no exercício efetivo de poder físico sobre o bem, o possuidor exerce o domínio de fato sobre a coisa. Já a posse jurídica é reconhecida por meio de ato legal, como escritura pública, não se exigindo para a constituição da posse o exercício do domínio sobre a coisa. Exemplo: Marcos compra um imóvel de João, mas ainda não se mudou. Mesmo sem exercer a posse natural, Marcos já detém a posse jurídica. Ocorrem as posses pro diviso e pro indiviso quando duas ou mais pessoas possuem direito à posse de um mesmo bem. Na posse pro indiviso, os compossuidores possuem frações ideais do bem, sem divisão física. Já a posse pro diviso ocorre quando há necessidade de divisão material das partes. Vale observa que, conforme Washington de Barros Monteiro, a compossessão ainda existe de direito, mas não tem existência de fato quando se trata de posse pro diviso; na posse pro indiviso a compossessão existe de fato e de direito(Monteiro, 2005, n.p) 3. AÇÕES POSSESSÓRIAS Para melhor inteligibilidade das ações possessórias é salutar realizar previamente alguns apontamentos acerca dos efeitos da posse. Existem duas principais correntes que apresentam suas próprias teorias a respeito dos efeitos da posse: a) a teoria da pluralidade dos efeitos da posse, que sustenta que a posse engloba vários efeitos em seu bojo; b) E a teoria da unicidade dos efeitos da posse, segundo a qual a posse produz somente um efeito, a saber, a presunção da propriedade, da qual surgem de fato outros efeitos relacionados à posse. Dentro da mesma vertente, existem aqueles que vêem na capacidade de invocar interditos possessórios o único efeito da posse. Segundo entendimento predominante no meio acadêmico, a posse produz vários efeitos, entendimento coadunado por personalidades como Marin Wolf, Planiol, Ripert, Savigny - que admitia como efeitos da posse somente a usucapião e a capacidade de invocar interditos possessórios - e Astholpho Rezende. O Código Civil de 2002 enumera cinco principais efeitos em seus arts. 1.210 ao 1.222 e 1.238, que são: A) A proteção possessória; B) A percepção dos frutos; C) A responsabilidade pela perda ou deterioração da coisa; D) A indenização das benfeitorias e direito de retenção; E) A Usucapião. A proteção possessória pode proceder pela legítima defesa ou pelo desforço imediato e pelas ações possessórias, sendo essas últimas o objeto em comento, proceder-se-à a seguir ao estudo de cada uma das figuras que integram a listagem das ações possessórias em sentido estrito, expressas pela ação de reintegração de posse, a ação de manutenção da posse e a ação de interdito proibitório. Urge diferenciar ainda as ações possessórias de ações petitórias; as ações possessórias, como já dito, tem por objetivo proteger a posse, direta ou indireta, ao passo que as ações petitórias tratam da propriedade. Ação de reintegração de posse, como indica o nome, tem por objetivo e função reestabelecer ao possuidor a posse perdida. É a ação adequada quando o possuidor do bem sofre o chamado esbulho, previsto também no Código Penal e caracterizado quando o possuidor é privado da posse por meios violentos, cladestinos ou em que há abuso de confiança. O esbulho é disciplinado pelo arts. 560 a 566 do Código de Processo Civil e no art. 1.210 do Código Civil de 2002. Ação de manutenção de posse visa reestabelecer ao possuidor a posse parcialmente perdida. É a ação adequado quando o o possuidor sofre a turbação, caracterizada pela perda parcial da posse que impede que o possuidor exercite plenamente seu direito de fato sobreou plantações. D) a última hipótese obriga que se realize uma análise mais longa e detida a respeito das benfeitorias e das consequências que se pode observar. Conceitua-se benfeitorias como obras ou despesas realizadas em uma coisa com o objetivo de conservá-la, melhorá-la ou embelezá-la. Não se confudem as benfeitorias com as acessões, estas criam coisas novas, ao passo que as benfeitorias tem caráter acessório, pois somente melhoram coisas já existentes. Remonta ao Direito romano a divisão das benfeitorias que podem ser realizadas nas coisas, são elas: benfeitorias necessárias(impensae necesariae); benfeitorias úteis(impensae utiles); e benfeitorias voluptuárias(impensae voluptuariae). Necessárias são as benfeitorias que visam à conservação ou garantia de normal exploração do bem; Úteis são as aquelas que tem por objetivo facilitar ou aumentar o uso do bem, aumentando também seu valor; e Voluptuárias são as servem para tornar mais agradável ou deleitoso o bem potencialmente aumentem seu valor, sem que com isso seu uso habitual aumente. Conforme o art. 1.219 do Código Civil, possuidor de boa-fé possui direito à indenização das benfeitorias necessáras e úteis que realizar em algum imóvel. Também prevê o direito de reaver as benfeitorias voluptuárias quando puder fazê-lo sem prejuízo da coisa, além do que poderá exercer o direito de retençao pelo valor das benfeitorias úteis e necessárias. O possuidor de boa-fé tem direito a indenização das benfeitorias úteis e necessárias que fizer, podendo mesmo exercer o direito de retenção pelo valor delas. Relativamente às benfeitorias voluptuárias, o possuidor de boa-fé poderá retirá-las se com isso não acarretar danos à coisa e se o reinvindicante não manifestar o desejo de ficar com elas, indenizando seu valor ao possuidor. Quanto ao possuidor de má-fé, dispõe o art. 1.220 do mesmo código que o possuidor de má-fé terá direito de ressarcimento somente relativamente às benfeitorias necessárias, não podendo se valer do direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis e não lhe assiste o direito de levantar as benfeitorias voluptuárias, mesmo quecom isso não suceda prejuízo à coisa. Seguindo a tradição romana, não de modo uniforme, o Brasil garante ao possuidor de má-fé o direito à indenização das benfeitorias necessárias, mas não admite o mesmo em se tratando das úteis ou voluptuárias. Na opinião de Tito Fulgêncio, isso se deve porque considera-se essa recusa de indenizar como uma compensação ao dono pelo tempo em que esteve privado do uso do bem pelo possuidor de má-fé. A propósito da compensação, prescreve o art. 1.221 do Código Civil que as benfeitorias são compensadas com os danos e somente assiste ao evicto o direito de ressarcimento se quando da evicção ainda existirem as benfeitorias realizadas. A compensação leva em consideração os arts. 1.217 e 1.219, já vistos anteriormente, para evitar assim demandas inúteis ao avaliar duas obrigações recíprocas em confronto e calcular a diferença que deverá ser paga ao devedor da maior obrigação dentre as duas. Outra imposição negativa ao possuidor de boa-fé está insculpida no art.1.222 do Código Civil, que dispõe que o reinvindicante obrigado a pagar indenização em virtude das benfeitorias feitas por possuidor de má-fé terá o direito de escolher se quererá pagar o valor atual ou o valor de custo das benfeitorias; caso esteja obrigado a pagar indenização a possuidor de boa-fé, terá de suportar a indenização pagando o valor atual. Essa faculdade quanto ao possuidor de má-fé se faz sentir principalmente em tempos de grande inflação. Baseado no ius retentionis do direito romano, o direito de retenção é um meio de defesa do credor que consiste no direito de continuar mantendo a coisa em seu poder até que ser indenizado pelo crédito das benfeitorias ou acessões feitas por ele. Conforme entendimento jurisprudêncial, retenção é o pode jurídico direto e imediato de uma pessoa sobre uma coisa, com todas as características de um direito real. Á guisa de exemplo, uma oficina mecânica pode reter um veículo até que o pagamento pelos serviços e materiais usados seja feito. Exige-se os seguinte requisitos para o uso da retenção: a) detenção legítima da coisa que se deve restituir; b) crédito do retentor que seja exigível; c) conexão; d) ausência de impedimento legal ou convencional da retenção. O fundamento para a existência desse direito são os princípios da equidade e igualdade e o combate ao enriquecimento sem causa, visando garantir a satisfação do crédito do credor, que estaria ameaçado caso este devolvesse a coisa sem ter recebido a indenização que lhe cabe. Para Carlos Roberto Gonçalves, no entanto, trata-se mais de um meio coercitivo de cumprimento da indenização do que uma preocupação com o enriquecimento sem causa que ensejaria a entrega da coisa sem a satisfação do crédito. Cita o autor o art. 476 do Código Civil, que elenca meios coercitivos de pagamento e coloca a retenção como uma modalidade das figuras previstas no referido artigo. Sobre a natureza do direito, alguns pensam ser um direito pessoal, outros um direito real, ou ainda de natureza intermediária. O direito de retenção é alegado na contestação, conforme o parágrafo 2º do art. 538 do Código de Processo Civil de 2015, que prescreve que diante do descumprimento de obrigação de entregar coisa em prazo estabelecido por sentença será expedido mandade de busca e apreesão ou de imissão na posse em favor do credor, variando o instituto jurídico usado a depender da natureza da coisa, se for móvel ou imóvel. O parágrafo segundo, a seu turno, versa que o direito de retenção por benfeitorias realizadas deve ser exercido na constestação, durante a fase de conhecimento do processo.. Entretanto, pode o executado deduzir os embargos de retenção por benfeitorias na execução para entrega de coisa certa de título executivo extrajudicial, conforme o inciso IV do art. 917 do Código de Processo Civil de 2015. Porém, nas nas execuções de título executivo judicial isso não poderá ser feito, devendo ser respeitado o disposto no art. 538 do mesmo diploma. 5. DESAPROPRIAÇÃO JURISDICIONAL INDIRETA PRIVADA, TENDO EM VISTA O ARTIGO 1228, PARÁGRAFOS 3º E 5º DO CÓDIGO CIVIL DE 2002 Rezam os parágrafos 3º e 5º do artigo 1228 do Código Civil de 2002, respectivamente, que o proprietário pode se ver privado de algum de seus bens nos casos de desapropriação caso se trate de necessidade ou utilidade pública ou esteja envolvido algum interesse público, ou em caso de requisição, em situações que envolvam perigo público iminente. Além disso, prevê o pagamento de indenização ao proprietário que, quando paga, funcionará a sentença como sucedâneo ao título para fins do registro do imóvel no nome dos possuidores. Esta previsão faz referência ao disposto no parágrafo 4º do mesmo dispositivo, que disciplina uma das hipóteses em que o proprietário pode se ver privado de seu imóvel, pontuando que o imóvel de extensa área for ocupado ininterruptamente e de boa-fé durante ao menos cinco anos, tendo as pessoas que dele possuem a posse realizado algum serviço que o juiz considere de relevante interesse social e econômico, poderá o proprietário sofrer a perda do imóvel. A esse respeito, cabe também citar o o inciso XXIV do artigo 5º da Constituição Federal de 1988, que estabelece que os processos de desapropriação são ensejados quando há presentes necessidade ou utilidade pública, bem como interesse social para que se proceda à desapropriação, que se dará mediante indenização do proprietário, ressalvadas outras hipóteses com previsão constitucional. Além das previsões genéricas, a Constituição Federal de 1988 traz hipóteses específicas de desapropriação em seus arts. 182, 184 e 185. Assim, a desapropriação é um instituto de direito público que encontra fundamento constitucional e é disciplinado pelo direito administrativo e civil. A desapropriação é um modo involuntário e unilateral de perda da propriedade de domínio particular ou de domínio de outra entidadepública inferior para a administração pública justificado pela ideia da prevalência do interesse público sobre o particular e, conforme o art. 1228 do Código Civil, prevê a perda da propriedade do imóvel condicionada ao pagamento de justa indenização, pois a adição do imóvel ao patrimônio público inviabiliza a ação reinvindicatória. E conforme magistério de José Cretella Júnior, a desapropriação é: O procedimento complexo de direito público, pelo qual a Administração, fundamentada na necessidade pública, na utilidade pública ou no interesse social, obriga o titular de bem, móvel ou imóvel, a desfazer-se desse bem, mediante justa indenização para o proprietário do bem. ( GONÇALVES, 2017, n.p). Em virtude da exposição presente acima das caractéristica essencias que distinguem a desapropriação, não se pode confundida-la nem com o confisco, instituto usado quando há o uso inadequado de um bem que então é retomado pelo Estado sem a necessidade de pagamento de indenização; nem com a servidão administrativa, que impõe limites ao uso da propriedade por parte do proprietário, que a conserva; muito menos com a compra e venda, contrato consensual condicionado à vontade das partes. Além disso, pode-se considerar que a desapropriação constitui um modo originário de aquisição da propriedade, pois a vontade do titular da propriedade perdida é irrelevante e dispensa o registro do título anterior. Caso exista o registro, a desapropriação será registrada para sinalizar a perda da propriedade do titular primevo que ali consta. Portanto, conforme entendimento predominante na doutrina pátria, a transferência de domínio ocorre não pela transcrição de título aquisitivo, que não possui caráter obrigatório, embora seja útil, mas tão somente pela vontade do poder público e o pagamento do valor indenizatório ao antigo proprietário do bem desapropriado. Há, todavia, dissenso entre importantes civilistas como Pontes de Miranda e José Cretela Júnior, que apontam como requisito para a tranferência de domínio a transcrição no registro de imóveis, no caso da desapropriação, são registradas a sentença ou o acordo. Feito o delineamento básico da desapropriação clássica, cumpre agora partir ao estudo da desapropriação indireta à luz dos parágras 3º e 5º do art. 1.228 do Código Civil de 2002. A desapropriação indireta, também chamada de apossamento administrativo, remonta ao direito francês, que prevê casos legais de desapropriação indireta e hipotéses não previstas em lei caracterizadas pelo domínio ilegítimo do Estado sobre propriedade particular sem o devido processo. A desapropriação indireta não está legalmente prevista no ordenamento jurídio brasileiro, trata-se de uma criação doutrinária e jurisprudencial que guarda grande semelhança com o instituto francês equivalente, motivo pelo qual apresentase agora a sua conceituação segundo o pensamento de alguns autores franceses. Em suma, autores como George Vedel, Berthélemy e Marcel Waline vêem a desapropriação indireta como o domínio ilegítimo de uma propriedade particular pelo Estado em que pese a falta de interesse público, o erro no planejamento de obra pública que resulte na anexação de propriedade privada sem que haja ânimo fraudulento, ou a inobservância do devido processo de desapropriação por parte do poder público, deixando também de proceder à indenização que cabe ao proprietário lesado em razão da impossibilidade de ação reinvindicatória. É uma figura que pode ser comparada ao esbulho possessório, mas realizado pelo poder poder público face um particular. Ademais, a desapropriação indireta possui ação judicial de natureza jurídica de direito real, portanto, o particular lesado que figura como réu em hipótese de desapropriação regular, no caso em questão atua como autor. A indenização no processo de desapropriação indireta é regulada pelas mesmas normas que regem a desapropriação clássica, nos mesmos termos dos parágrafos 3º e 5º do art. 1.228 do Código Civil de 2002. Em havendo procedência dos pedidos da ação judicial de desapropriação indireta, o poder pública ficará obrigado a cumprir a sentença que se realizará, na fase de cumprimento, por meio do regime de precatórios, fato que é alvo de questionamentos por contrariar normas constitucionais e dificultar o recebimento da indenização por quem sofreu a despropriação. REFERÊNCIAS 1 RUGGIERO, Roberto. De Instituciones De Derecho Civil. Trad. espanhola da 4. ed. italiana. Madrid, 1929. 2 STOLZE GAGLIANO, Pablo; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, Direitos Reais. 5º ed. São Paulo: Saraiva, 2023. 3 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Direito das Coisas. 12º ed. São Paulo: Saraiva, 2017. 4 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS//2002/L10406compilada.htm>.Acesso: 25 de abril de 2025. 5 BRASIL. Lei n° 7.844, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso: 25 de abril de 2025. 6 BRASIL. Lei nº 13. 105, de 16 de março de 2015. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso: 25 de abril de 2025.pública inferior para a administração pública justificado pela ideia da prevalência do interesse público sobre o particular e, conforme o art. 1228 do Código Civil, prevê a perda da propriedade do imóvel condicionada ao pagamento de justa indenização, pois a adição do imóvel ao patrimônio público inviabiliza a ação reinvindicatória. E conforme magistério de José Cretella Júnior, a desapropriação é: O procedimento complexo de direito público, pelo qual a Administração, fundamentada na necessidade pública, na utilidade pública ou no interesse social, obriga o titular de bem, móvel ou imóvel, a desfazer-se desse bem, mediante justa indenização para o proprietário do bem. ( GONÇALVES, 2017, n.p). Em virtude da exposição presente acima das caractéristica essencias que distinguem a desapropriação, não se pode confundida-la nem com o confisco, instituto usado quando há o uso inadequado de um bem que então é retomado pelo Estado sem a necessidade de pagamento de indenização; nem com a servidão administrativa, que impõe limites ao uso da propriedade por parte do proprietário, que a conserva; muito menos com a compra e venda, contrato consensual condicionado à vontade das partes. Além disso, pode-se considerar que a desapropriação constitui um modo originário de aquisição da propriedade, pois a vontade do titular da propriedade perdida é irrelevante e dispensa o registro do título anterior. Caso exista o registro, a desapropriação será registrada para sinalizar a perda da propriedade do titular primevo que ali consta. Portanto, conforme entendimento predominante na doutrina pátria, a transferência de domínio ocorre não pela transcrição de título aquisitivo, que não possui caráter obrigatório, embora seja útil, mas tão somente pela vontade do poder público e o pagamento do valor indenizatório ao antigo proprietário do bem desapropriado. Há, todavia, dissenso entre importantes civilistas como Pontes de Miranda e José Cretela Júnior, que apontam como requisito para a tranferência de domínio a transcrição no registro de imóveis, no caso da desapropriação, são registradas a sentença ou o acordo. Feito o delineamento básico da desapropriação clássica, cumpre agora partir ao estudo da desapropriação indireta à luz dos parágras 3º e 5º do art. 1.228 do Código Civil de 2002. A desapropriação indireta, também chamada de apossamento administrativo, remonta ao direito francês, que prevê casos legais de desapropriação indireta e hipotéses não previstas em lei caracterizadas pelo domínio ilegítimo do Estado sobre propriedade particular sem o devido processo. A desapropriação indireta não está legalmente prevista no ordenamento jurídio brasileiro, trata-se de uma criação doutrinária e jurisprudencial que guarda grande semelhança com o instituto francês equivalente, motivo pelo qual apresentase agora a sua conceituação segundo o pensamento de alguns autores franceses. Em suma, autores como George Vedel, Berthélemy e Marcel Waline vêem a desapropriação indireta como o domínio ilegítimo de uma propriedade particular pelo Estado em que pese a falta de interesse público, o erro no planejamento de obra pública que resulte na anexação de propriedade privada sem que haja ânimo fraudulento, ou a inobservância do devido processo de desapropriação por parte do poder público, deixando também de proceder à indenização que cabe ao proprietário lesado em razão da impossibilidade de ação reinvindicatória. É uma figura que pode ser comparada ao esbulho possessório, mas realizado pelo poder poder público face um particular. Ademais, a desapropriação indireta possui ação judicial de natureza jurídica de direito real, portanto, o particular lesado que figura como réu em hipótese de desapropriação regular, no caso em questão atua como autor. A indenização no processo de desapropriação indireta é regulada pelas mesmas normas que regem a desapropriação clássica, nos mesmos termos dos parágrafos 3º e 5º do art. 1.228 do Código Civil de 2002. Em havendo procedência dos pedidos da ação judicial de desapropriação indireta, o poder pública ficará obrigado a cumprir a sentença que se realizará, na fase de cumprimento, por meio do regime de precatórios, fato que é alvo de questionamentos por contrariar normas constitucionais e dificultar o recebimento da indenização por quem sofreu a despropriação. REFERÊNCIAS 1 RUGGIERO, Roberto. De Instituciones De Derecho Civil. Trad. espanhola da 4. ed. italiana. Madrid, 1929. 2 STOLZE GAGLIANO, Pablo; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil, Direitos Reais. 5º ed. São Paulo: Saraiva, 2023. 3 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro, Direito das Coisas. 12º ed. São Paulo: Saraiva, 2017. 4 BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS//2002/L10406compilada.htm>.Acesso: 25 de abril de 2025. 5 BRASIL. Lei n° 7.844, de 05 de outubro de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso: 25 de abril de 2025. 6 BRASIL. Lei nº 13. 105, de 16 de março de 2015. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm>. Acesso: 25 de abril de 2025.