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GRANDES
CIENTISTAS SOCIAIS
Textos básicos de 
Ciências Sociais, selecionados 
com a supervisão geral do 
Prof. Florestan Fernandes. 
Abrangendo seis disciplinas 
fundamentais da ciência social 
Sociologia, História, 
Economia, Psicologia, 
Política e Antropologia - 
a coleção apresenta os autores 
modernos e contemporâneos 
de maior destaque mundial, 
focalizados através de 
introdução crítica e 
biobibliográfica, assinada 
por especialistas 
da universidade brasileira. 
A essa introdução crítica 
segue-se uma coletânea dos 
textos mais representativos 
de cada autor.
Desde que Karl Marx (1818-1883) 
Mlllf X desenvolveu a sua explicação do 
IlIFlIl/l modo de produção capitalista, o 
capitalismo não pode mais ser pensado, defen­
dido ou questionado sem que se leve em conta 
essa explicação. Mais do que isso, a obra de 
Marx passou a fazer parte do universo capita­
lista, como sua expressão histórica e teórica. 
Operários e burgueses, intelectuais e burocra­
tas, civis e militares, leigos e religiosos, homens 
e mulheres, na cidade e no campo, todos, em 
todas as sociedades, nos vários continentes, 
passaram a ter o seu pensamento e a sua prá­
tica — direta ou indiretamente, em maior ou 
em menor grau — questionados, reafirmados ou 
negados pela explicação dialética do capitalis­
mo. Ao abordar as categorias e leis que consti­
tuem os movimentos e os antagonismos da 
formação social capitalista, Marx revelou a 
historicidade inscrita nas relações, nos proces­
sos e nas estruturas sociais — fundamental­
mente econômicos e políticos — que engendram 
os movimentos e os antagonismos dessa forma­
ção social. A revolução científica realizada por 
Marx põe em questão tanto a explicação como 
a existência do capitalismo.
Marx
Organizador: Octavio lanni
Coordenador: Florestan Fernandes
SOCIOLOGIA
GRANDES
CIENTISTAS SOCIAIS
Textos básicos de 
Ciências Sociais, selecionados 
com a supervisão geral do 
Prof. Florestan Fernandes. 
Abrangendo seis disciplinas 
fundamentais da ciência social 
Sociologia, História, 
Economia, Psicologia, 
Política e Antropologia - 
a coleção apresenta os autores 
modernos e contemporâneos 
de maior destaque mundial, 
focalizados através de 
introdução crítica e 
biobibliográfica, assinada 
por especialistas 
da universidade brasileira. 
A essa introdução crítica 
segue-se uma coletânea dos 
textos mais representativos 
de cada autor.
Desde que Karl Marx (1818-1883) 
Mlllf X desenvolveu a sua explicação do 
IlIFlIl/l modo de produção capitalista, o 
capitalismo não pode mais ser pensado, defen­
dido ou questionado sem que se leve em conta 
essa explicação. Mais do que isso, a obra de 
Marx passou a fazer parte do universo capita­
lista, como sua expressão histórica e teórica. 
Operários e burgueses, intelectuais e burocra­
tas, civis e militares, leigos e religiosos, homens 
e mulheres, na cidade e no campo, todos, em 
todas as sociedades, nos vários continentes, 
passaram a ter o seu pensamento e a sua prá­
tica — direta ou indiretamente, em maior ou 
em menor grau — questionados, reafirmados ou 
negados pela explicação dialética do capitalis­
mo. Ao abordar as categorias e leis que consti­
tuem os movimentos e os antagonismos da 
formação social capitalista, Marx revelou a 
historicidade inscrita nas relações, nos proces­
sos e nas estruturas sociais — fundamental­
mente econômicos e políticos — que engendram 
os movimentos e os antagonismos dessa forma­
ção social. A revolução científica realizada por 
Marx põe em questão tanto a explicação como 
a existência do capitalismo.
Marx
Organizador: Octavio lanni
Coordenador: Florestan Fernandes
SOCIOLOGIA
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ClP-Brasil. Catalogação-na-Fonle 
Câmara Brasileira do Livro, SP
M355k
Marx, KarI, 1818-1883.
KarI Marx : sociologia / organizador [da coletâ­
nea] Oclavio Ianni ; [tradução de Maria Elisa Mas- 
carenhas, Ione de Andrade e Fausto N. Pellegrini]. 
— São Paulo : Ática, 1979.
CGrandes cientistas sociais ; 10)
Inclui introdução sobre Marx por Octavio Ianni.
1. Classes sociais 2. Comunismo 3. Comunismo e 
sociedade 4. Marx, KarI, 1818-1883 5. Sociologia 
I. Ianni, Otávio, 1926- II. Título.
79-0342
CDD—335.438301 
—301 
—301.44 
—320.532 
—323.3
índices para catálogo sistemático:
1. Classes sociais : Aspectos políticos 323.3
2. ^ Classes sociais : Sociologia 301.44
3. Classes sociais e Estado : Ciência política 323.3
4. Estado e classes sociais : Ciência política 323.3
5. Marxismo : Ciência política 320.532
6. Marxismo e sociologia 335.438301
7. Sociologia 301
8. Sociologia marxista 335.438301
- ----------------------------------------------------
EDIÇÃO Tradução: Maria Elisa Mascarenhas, Ione de Andrade e 
Fausto N. Pellegrini
Copidesque: Mitsue Morissawa e M. Carolina de A. Boschi 
Coordenação Editorial: t Paulo S. M. Machado 
Consultoria Geral: Prof. Florestan Fernandes
ARTE Capa: Elifas Andreato
Projeto Gráfico'. Virgínia Fujiwara
Produção Gráfica: Elaine Regina de Oliveira
Edição de Arte: Ademir Carlos Schneider
Foto de capa: João Bittar
\________________ í_____________ ___ _____________________________ /
. .... ................... ....... 1979 ~
Todos os direitos reservados pela Editora Âticà S.A. 
R. Barão de Iguape, 110 — Tel.: PBX 278-9322 (50 Ramais) 
C. Postal 8656 •— End. Telegráfico “Bomlivro” — S. Paulo
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
(por Octavio Ianni), 7
1. A PRODUÇÃO DA SOCIEDADE
1. Fundamentos da História, 45
2. Condições históricas da reprodução
social, 62
3. Características essenciais do
sistema capitalista, 74
4. Infra-estrutura e superestrutura, 82
II. CLASSES SOCIAIS E
CONTRADIÇÕES DE CLASSES
5. As classes sociais, 99
6. A estrutura de classes na Alemanha, 102
7. Classes sociais e bonapartismo, 110
8. O exército industrial de reserva, 125
9. Questionário sobre a situação
operária na França, 133
III. EXISTÊNCIA E CONSCIÊNCIA
10. A produção da consciência, 145
11. Fetichismo e reificação, 159
ClP-Brasil. Catalogação-na-Fonle 
Câmara Brasileira do Livro, SP
M355k
Marx, KarI, 1818-1883.
KarI Marx : sociologia / organizador [da coletâ­
nea] Oclavio Ianni ; [tradução de Maria Elisa Mas- 
carenhas, Ione de Andrade e Fausto N. Pellegrini]. 
— São Paulo : Ática, 1979.
CGrandes cientistas sociais ; 10)
Inclui introdução sobre Marx por Octavio Ianni.
1. Classes sociais 2. Comunismo 3. Comunismo e 
sociedade 4. Marx, KarI, 1818-1883 5. Sociologia 
I. Ianni, Otávio, 1926- II. Título.
79-0342
CDD—335.438301 
—301 
—301.44 
—320.532 
—323.3
índices para catálogo sistemático:
1. Classes sociais : Aspectos políticos 323.3
2. ^ Classes sociais : Sociologia 301.44
3. Classes sociais e Estado : Ciência política 323.3
4. Estado e classes sociais : Ciência política 323.3
5. Marxismo : Ciência política 320.532
6. Marxismo e sociologia 335.438301
7. Sociologia 301
8. Sociologia marxista 335.438301
- ----------------------------------------------------
EDIÇÃO Tradução: Maria Elisa Mascarenhas, Ione de Andrade e 
Fausto N. Pellegrini
Copidesque: Mitsue Morissawa e M. Carolina de A. Boschi 
Coordenação Editorial: t Paulo S. M. Machado 
Consultoria Geral: Prof. Florestan Fernandes
ARTE Capa: Elifas Andreato
Projeto Gráfico'. Virgínia Fujiwara
Produção Gráfica: Elaine Regina de Oliveira
Edição de Arte: Ademir Carlos Schneider
Foto de capa: João Bittar
\________________ í_____________ ___ _____________________________ /
. .... ................... ....... 1979 ~
Todos os direitos reservados pela Editora Âticà S.A. 
R. Barão de Iguape, 110valor 
trabalho, trabalho social (concreto, abstrato, individual, coletivo), 
trabalho necessário, trabalho excedente, mais-valia absoluta, mais- 
-valia relativa e outros. O núcleo desse processo explicativo é a 
categoria mais-valia, que revela uma relação determinada de 
alienação e antagonismo, na qual se encadeiam e opõem o operá­
rio e o capitalista.
laura
.
alice alcantara
.
laura
.
laura
.
laura
.
20
“Não é o operário quem emprega os meios de produção; são os 
meios de produção que empregam o operário. Não é o trabalho 
vivo que se realiza no trabalho materializado, como em seu órgão 
objètivo; é o trabalho materializado que se conserva e aumenta 
pela sucção do trabalho vivo, graças ao qual converte-se em um 
valor que se valoriza, em capital, e funciona como tal. Os meios 
de produção aparecem, pois, unicamente como sugadores de 
quantidades crescentes de trabalho vivo. (...)
Em realidade, a dominação dos capitalistas sobre os operários e 
somente o domínio das condições de trabalho sobre estes (entre 
as quais contam-se, também, além das condições objetivas do 
processo de produção — isto é, os meios de produção —, as 
condições objetivas de manutenção e de eficiência da força de 
trabalho, ou seja, dos meios de subsistência'), condições de traba­
lho que se tornaram autônomas, e precisamente frente ao ope­
rário. (...)
A dominação do capitalista sobre o operário é, por conseguinte, 
a da coisa sobre o homem, do trabalho morto sobre o trabalho 
vivo, do produto sobre o produtor, pois que, na realidade, as mer­
cadorias, que se convertem em meios de dominação sobre os 
operários (mas somente como meios da dominação do capital 
propriamente), não são nada mais que meros resultados do pro­
cesso de produção, os produtos do mesmo. Na produção mate­
rial, no verdadeiro processo da vida social — pois este é o pro­
cesso da produção ■—• dá-se exatamente a mesma relação que, no 
terreno ideológico, apresenta-se na religião: a conversão do sujeito 
no objeto e vice-versa.” 15 *
Por intermédio desse movimento analítico, quando as cate­
gorias vão exprimindo relações necessárias, que se impõem com 
férrea necessidade, surge progressivamente a verdadeira condição 
da. classe operária, ao mesmo tempo que surge a condição ver­
dadeira da classe capitalista, desde o processo produtivo, em 
sentido estrito, até às suas relações políticas de antagonismo e 
negação.
Entretanto,, a condição crítica da classe operária não é in- 
dependente da sua perspectiva crítica. A mesma condição alienada 
da sua existência, como classe, constitui a base da sua posição 
crítica. Pouco a pouco a classe operária se dá conta da sua.
15 Marx, K. El capital. Buenos Aires, Ediciones Signos, 1971. liv. I,
cap. VI (inédito), p. 17, 18 e 19.
21
posição 'histórica privilegiada, quanto às suas condições de luta 
política contra a burguesia. Desde"os primeiros escritos, iMaix 
ik esteve interessado no processo • político por meio do qual se dá a 
metamorfose da classe operária de classe em si a classe para si. 
Esse é um movimento crucial no processo de desenvolvimento 
da contradição de classes no capitalismo;
“A grande indústria concentra, em um mesmo lugar, uma massa 
de pessoas que não se conhecem entre si. A concorrência divide 
os seus interesses. Mas a defesa do salário, esse interesse comum 
a todas elas perante seu patrão, une-as em uma idéia comum de 
resistência: a coalizão. Portanto, a coalizão persegue, sem­
pre, uma dupla finalidade: acabar com a concorrência entre os 
operários para poder fazer uma concorrência geral aos capita­
listas. Se o primeiro fim da resistência se reduzia à defesa do 
salário, depois, à medida que, por sua vez, os capitalistas se as­
sociam, movidos pela idéia da repressão, as coalizões, inicial­
mente isoladas, formam grupos, e a defesa pelos operários de 
suas associações, diante do capital sempre unido, acaba sendo 
para eles mais necessária que a defesa do salário.
(...) Nessa luta — verdadeira guerra civil — vão-se unindo e 
desenvolvendo todos os elementos para a batalha futura. Ao 
chegar a esse ponto, a coalizão toma caráter político. As con­
dições econômicas transformaram primeiro a massa da população 
do país em trabalhadores. O domínio do capital criou para essa 
massa uma situação comum, interesses comuns. Assim, pois, essa 
massa já é uma classe relativamente ao capital, mas ainda não é 
uma classe para si. Na luta, da qual não assinalamos mais que 
algumas fases, essa massa se une, constituindo-se numa classe para 
si mesma.” 10
Vimos, pois, que a teoria marxista da luta de classes é o 
resultado combinado de dois movimentos do pensamento de 
Marx. Por um lado, ele elabora a sua compreensão das classes 
Nociais, seus antagonismos e lutas à medida que se desenvolvem 
UH suas reflexões, desde a crítica das filosofias hegelian. e 
neo-hegeliana até a crítica do socialismo utópico francês e da 
economia política clássica inglesa. Note-se que todas essas re­
flexões foram enriquecidas e desenvolvidas inclusive pela sua 
participação política direta em lutas operárias do tempo. Em todo
1,1 Marx, K. Misère de la philosophie. p. 134; Miséria da Filosofia, p. 163-64.
20
“Não é o operário quem emprega os meios de produção; são os 
meios de produção que empregam o operário. Não é o trabalho 
vivo que se realiza no trabalho materializado, como em seu órgão 
objètivo; é o trabalho materializado que se conserva e aumenta 
pela sucção do trabalho vivo, graças ao qual converte-se em um 
valor que se valoriza, em capital, e funciona como tal. Os meios 
de produção aparecem, pois, unicamente como sugadores de 
quantidades crescentes de trabalho vivo. (...)
Em realidade, a dominação dos capitalistas sobre os operários e 
somente o domínio das condições de trabalho sobre estes (entre 
as quais contam-se, também, além das condições objetivas do 
processo de produção — isto é, os meios de produção —, as 
condições objetivas de manutenção e de eficiência da força de 
trabalho, ou seja, dos meios de subsistência'), condições de traba­
lho que se tornaram autônomas, e precisamente frente ao ope­
rário. (...)
A dominação do capitalista sobre o operário é, por conseguinte, 
a da coisa sobre o homem, do trabalho morto sobre o trabalho 
vivo, do produto sobre o produtor, pois que, na realidade, as mer­
cadorias, que se convertem em meios de dominação sobre os 
operários (mas somente como meios da dominação do capital 
propriamente), não são nada mais que meros resultados do pro­
cesso de produção, os produtos do mesmo. Na produção mate­
rial, no verdadeiro processo da vida social — pois este é o pro­
cesso da produção ■—• dá-se exatamente a mesma relação que, no 
terreno ideológico, apresenta-se na religião: a conversão do sujeito 
no objeto e vice-versa.” 15 *
Por intermédio desse movimento analítico, quando as cate­
gorias vão exprimindo relações necessárias, que se impõem com 
férrea necessidade, surge progressivamente a verdadeira condição 
da. classe operária, ao mesmo tempo que surge a condição ver­
dadeira da classe capitalista, desde o processo produtivo, em 
sentido estrito, até às suas relações políticas de antagonismo e 
negação.
Entretanto,, a condição crítica da classe operária não é in- 
dependente da sua perspectiva crítica. A mesma condição alienada 
da sua existência, como classe, constitui a base da sua posição 
crítica. Pouco a pouco a classe operária se dá conta da sua.
15 Marx, K. El capital. Buenos Aires, Ediciones Signos, 1971. liv. I,
cap. VI (inédito), p. 17, 18 e 19.
21
posição 'histórica privilegiada, quanto às suas condições de luta 
política contra a burguesia. Desde"os primeiros escritos, iMaix 
ik esteve interessado no processo • político por meio do qual se dá a 
metamorfose da classe operária de classe em si a classe para si. 
Esse é um movimento crucial no processo de desenvolvimento 
da contradição de classes no capitalismo;
“A grande indústria concentra, em um mesmo lugar, uma massa 
de pessoas que não se conhecem entre si. A concorrênciadivide 
os seus interesses. Mas a defesa do salário, esse interesse comum 
a todas elas perante seu patrão, une-as em uma idéia comum de 
resistência: a coalizão. Portanto, a coalizão persegue, sem­
pre, uma dupla finalidade: acabar com a concorrência entre os 
operários para poder fazer uma concorrência geral aos capita­
listas. Se o primeiro fim da resistência se reduzia à defesa do 
salário, depois, à medida que, por sua vez, os capitalistas se as­
sociam, movidos pela idéia da repressão, as coalizões, inicial­
mente isoladas, formam grupos, e a defesa pelos operários de 
suas associações, diante do capital sempre unido, acaba sendo 
para eles mais necessária que a defesa do salário.
(...) Nessa luta — verdadeira guerra civil — vão-se unindo e 
desenvolvendo todos os elementos para a batalha futura. Ao 
chegar a esse ponto, a coalizão toma caráter político. As con­
dições econômicas transformaram primeiro a massa da população 
do país em trabalhadores. O domínio do capital criou para essa 
massa uma situação comum, interesses comuns. Assim, pois, essa 
massa já é uma classe relativamente ao capital, mas ainda não é 
uma classe para si. Na luta, da qual não assinalamos mais que 
algumas fases, essa massa se une, constituindo-se numa classe para 
si mesma.” 10
Vimos, pois, que a teoria marxista da luta de classes é o 
resultado combinado de dois movimentos do pensamento de 
Marx. Por um lado, ele elabora a sua compreensão das classes 
Nociais, seus antagonismos e lutas à medida que se desenvolvem 
UH suas reflexões, desde a crítica das filosofias hegelian. e 
neo-hegeliana até a crítica do socialismo utópico francês e da 
economia política clássica inglesa. Note-se que todas essas re­
flexões foram enriquecidas e desenvolvidas inclusive pela sua 
participação política direta em lutas operárias do tempo. Em todo
1,1 Marx, K. Misère de la philosophie. p. 134; Miséria da Filosofia, p. 163-64.
laura
.
22
esse trabalho ele vai deparando os mais diferentes aspectos das 
relações capitalistas, desde o caráter alienante da divisão social 
do trabalho na fábrica e na sociedade até o problema da superação 
do regime capitalista por uma sociedade sem classes. Por outro 
lado — mas ao mesmo tempo ■—- Marx mergulha e demora 
na análise das relações de produção específicas do capitalismo. 
Ao realizar esse trabalho, reencontra as classes sociais em suas 
relações necessárias e antagônicas., Um e outro movimento 
encadeiam-se no curso da'produção da interpretação crítica do 
capitalismo.
3. Existência e consciência
Para Marx, a consciência social exprime e constitui, ao 
mesmo tempo, as relações sociais. Por isso, a análise dialética das 
relações capitalistas exige que a interpretação apanhe sempre a 
maneira pela qual os homens pensam-se a si mesmos e uns aos 
outros. A autoconsciência somente é possível no espelho do outro. 
A condição de operário e de capitalista somente se revela nas 
relações que um e outro estabelecem entre si. Mas essas relações 
não se realizam, a não ser que um e outro se pensem no processo 
de compra e venda de força de trabalho, de produção de merca­
doria, de intercâmbio entre trabalho necessário (pago) e exce­
dente (não pago). Não se completa a compreensão da existência 
do operário e do capitalista, a não ser quando a análise passa pela 
forma pela qual um e outro se compreendem a si próprios e 
reciprocamente. Para reconhecer-se como operário* é indispen­
sável que o operário reconheça o capitalista como tal e vice-versa. 
Esse reconhecimento é, ao mesmo tempo, uma condição funda­
mentar da existência e negação recíprocas. Para afirmar-se como 
capitalista, o capitalista precisa não só apropriar-se do produto 
do trabalho excedente (não pago), mas também reconhecer o 
produtor de valor excedente, a mais-valia, que aparece na sua 
consciência como lucro. Reciprocamente, para afirmar-se como 
tal, o operário precisa não só afirmar-se como produtor de merca­
doria ou vendedor de força de trabalho, mas também reconhecer 
o proprietário dos meios de produção que se apropria do produto 
do trabalho não pago. Essas são as relações básicas de depen­
dência, alienação e antagonismo, que fundam a existência e a 
consciência do operário e do capitalista.
23
Como vemos, é essencial que a análise dialética compreenda 
a maneira pela qual se relacionam, encadeiam e determinam, 
reciprocamente, as condições de existência social e as distintas 
modalidades de consciência. Não se trata de conferir autonomia 
a uma ou outra dimensão da realidade social. É evidente que 
as modalidades de consciência fazem parte das condições de 
existência social. Por isso é que Marx examina, sempre, os 
diversos momentos e èxpressões das relações capitalistas. Ele reco­
nhece que “a anatomia da sociedade deve ser procurada na econo­
mia política”, isto é, na análise das relações de produção. Mas 
entende que, para conhecer as relações de produção, é preciso 
examinar desde o grau de desenvolvimento das forças produtivas 
e das relações de produção até às relações e estruturas jurídico- 
-políticas, jamais perdendo de vista as suas especificidades e os 
seus encadeamentos recíprocos. Inclusive as interpretações prece­
dentes e contemporâneas são examinadas criticamente, como di­
mensões ou expressões ideológicas e teóricas desse modo de pro­
dução. Todo esse trabalho intelectual está orientado pela convic­
ção de que não se pode compreender a sociedade se não se exami­
nam os encadeamentos, desdobramentos e determinações recíprocos 
das forças produtivas, relações de produção, estruturas políticas 
e modalidades de consciência.
“Na produção social da própria existência, os homens entram em 
relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; 
estas relações de produção correspondem a tim grau determinado 
de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. O con­
junto dessas relações de produção constitui a estrutura econômica 
da sociedade, a base real sobre a qual se eleva uma superestrutura 
jurídica e política e à qual correspondem formas sociais determi­
nadas de consciência. O modo de produção da vida material 
condiciona o processo de„vid.a. sociaji^p.oiítíca.^e..intelectual. Não 
é a consciência dqs homens que determina a realídade; ao^com 
Trário, é a realidade social que determina sua consciência.” 17 \
Ocorre, no entanto, que as modalidades da consciência e as 
condições de existência social não se exprimem nem se relacionam 
de modo harmônico. Tanto as pessoas como os grupos e as 
classes sociais apreendem as suas relações sociais reais de maneira
17 Marx, K. Contribuição à Crítica da Economia Política, p. 30-31.
22
esse trabalho ele vai deparando os mais diferentes aspectos das 
relações capitalistas, desde o caráter alienante da divisão social 
do trabalho na fábrica e na sociedade até o problema da superação 
do regime capitalista por uma sociedade sem classes. Por outro 
lado — mas ao mesmo tempo ■—- Marx mergulha e demora 
na análise das relações de produção específicas do capitalismo. 
Ao realizar esse trabalho, reencontra as classes sociais em suas 
relações necessárias e antagônicas., Um e outro movimento 
encadeiam-se no curso da'produção da interpretação crítica do 
capitalismo.
3. Existência e consciência
Para Marx, a consciência social exprime e constitui, ao 
mesmo tempo, as relações sociais. Por isso, a análise dialética das 
relações capitalistas exige que a interpretação apanhe sempre a 
maneira pela qual os homens pensam-se a si mesmos e uns aos 
outros. A autoconsciência somente é possível no espelho do outro. 
A condição de operário e de capitalista somente se revela nas 
relações que um e outro estabelecem entre si. Mas essas relações 
não se realizam, a não ser que um e outro se pensem no processo 
de compra e venda de força de trabalho, de produção de merca­
doria, de intercâmbio entre trabalho necessário (pago) e exce­
dente (não pago). Não se completa a compreensão da existência 
do operário e do capitalista, a não ser quando a análisepassa pela 
forma pela qual um e outro se compreendem a si próprios e 
reciprocamente. Para reconhecer-se como operário* é indispen­
sável que o operário reconheça o capitalista como tal e vice-versa. 
Esse reconhecimento é, ao mesmo tempo, uma condição funda­
mentar da existência e negação recíprocas. Para afirmar-se como 
capitalista, o capitalista precisa não só apropriar-se do produto 
do trabalho excedente (não pago), mas também reconhecer o 
produtor de valor excedente, a mais-valia, que aparece na sua 
consciência como lucro. Reciprocamente, para afirmar-se como 
tal, o operário precisa não só afirmar-se como produtor de merca­
doria ou vendedor de força de trabalho, mas também reconhecer 
o proprietário dos meios de produção que se apropria do produto 
do trabalho não pago. Essas são as relações básicas de depen­
dência, alienação e antagonismo, que fundam a existência e a 
consciência do operário e do capitalista.
23
Como vemos, é essencial que a análise dialética compreenda 
a maneira pela qual se relacionam, encadeiam e determinam, 
reciprocamente, as condições de existência social e as distintas 
modalidades de consciência. Não se trata de conferir autonomia 
a uma ou outra dimensão da realidade social. É evidente que 
as modalidades de consciência fazem parte das condições de 
existência social. Por isso é que Marx examina, sempre, os 
diversos momentos e èxpressões das relações capitalistas. Ele reco­
nhece que “a anatomia da sociedade deve ser procurada na econo­
mia política”, isto é, na análise das relações de produção. Mas 
entende que, para conhecer as relações de produção, é preciso 
examinar desde o grau de desenvolvimento das forças produtivas 
e das relações de produção até às relações e estruturas jurídico- 
-políticas, jamais perdendo de vista as suas especificidades e os 
seus encadeamentos recíprocos. Inclusive as interpretações prece­
dentes e contemporâneas são examinadas criticamente, como di­
mensões ou expressões ideológicas e teóricas desse modo de pro­
dução. Todo esse trabalho intelectual está orientado pela convic­
ção de que não se pode compreender a sociedade se não se exami­
nam os encadeamentos, desdobramentos e determinações recíprocos 
das forças produtivas, relações de produção, estruturas políticas 
e modalidades de consciência.
“Na produção social da própria existência, os homens entram em 
relações determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; 
estas relações de produção correspondem a tim grau determinado 
de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. O con­
junto dessas relações de produção constitui a estrutura econômica 
da sociedade, a base real sobre a qual se eleva uma superestrutura 
jurídica e política e à qual correspondem formas sociais determi­
nadas de consciência. O modo de produção da vida material 
condiciona o processo de„vid.a. sociaji^p.oiítíca.^e..intelectual. Não 
é a consciência dqs homens que determina a realídade; ao^com 
Trário, é a realidade social que determina sua consciência.” 17 \
Ocorre, no entanto, que as modalidades da consciência e as 
condições de existência social não se exprimem nem se relacionam 
de modo harmônico. Tanto as pessoas como os grupos e as 
classes sociais apreendem as suas relações sociais reais de maneira
17 Marx, K. Contribuição à Crítica da Economia Política, p. 30-31.
alice alcantara
.
24
diversa e antagônica, quando não de forma incompleta, parcial, 
invertida ou fetichizada. Na sociedade capitalista, as relações __de^ 
produção tendem a configurar-se em idéias, conceitos, doutrinas 
ou teorias, que evadem os seus fundamentos reais. Mas não 
evadem por deliberação. Ao contrário, evadem, em geral, as 
condições reais de vida sem que essa seja a sua finalidade ou 
intenção. A finalidade precípua das idéias, conceitos, doutrinas 
ou teorias é exprimir e constituir as relações sociais. Ocorre que 
as várias modalidades de consciência (ou ciência), mais ou menos 
límpidas ou obscurecidas, invertidas ou fetichizadas, constituem-se, 
segundo as posições relativas das pessoas, grupos e classes sociais, 
nas relações de dependência, alienação e antagonismo em que se 
acham inseridas.
“E assim como na vida privada se diferencia o que um Homem 
pensa e diz de si mesmo do que ele realmente é e faz, nas lutas 
históricas, deve-se distinguir, mais ainda, as frases e as fantasias 
dos partidos de sua formação real e de seus interesses reais, o 
conceito que fazem de si, do que são, na realidade”.18
Aqui, novamente, Marx nos coloca o problema dos descom- 
passos e divórcios entre as aparências e as essências das coisas. 
O que toma necessária a análise dialética é que as coisas não são 
transparentes; e muito menos quando elas são as relações capita­
listas de produção. No capitalismo, as relações de dependência, 
alienação e antagonismo estão no centro das relações entre o 
operário e o capitalista. Mas essas relações não surgem claras, 
ordenadas e transparentes nas ações e na consciência das pessoas. 
As idéias, conceitos, doutrinas ou teorias exprimem as relações 
sociais de modo incompleto ou, mesmo, invertido. Elas não 
podem elidir as posições das pessoas, grupos ou classes nas 
relações de produção, mas não as refletem, a não ser de maneira 
incompleta ou evasiva. É sabido que a revolução burguesa 
proclamou a liberdade de consciência, inclusive a religiosa. Esse 
princípio, no entanto, não faz senão instaurar mais um compo­
nente do processo de mercantilização universal das relações, 
pessoas e ^óisas.T^s"própriãs práticas religiosas, inclusive cerimô­
nias e imagens, são mercantilizadas/t
18 Marx, K. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. p. 49.
25
“As idéias de liberdade religiosa e de liberdade de consciência 
não fizeram mais que proclamar o reino da livre concorrência no 
domínio do conhecimento”.10
Na consciência burguesa, a maior parte dos problemas 
tende a ser equacionada a partir do 'princípio da mercantilização 
universal das relações, pessoas e coisas. Por isso, a liberdade 
religiosa surge de par com a constituição do mercado de trabalho, 
que supõe o direito de livre circulação das pessoas e mercadorias. 
A liberdade religiosa é tomada como uma condição moral 
necessária à livre circulação do trabalhador no mercado nacional 
e internacional de força de trabalho. Marx nqtou que o protes­
tantismo havia transformado a maior parte das festas tradicionais 
em dias de trabalho. Ao mesmo tempo, o protestantismo transfe­
riu para as pessoas a responsabilidade pelo cumprimento dos 
princípios da fé.
"Lutero venceu efetivamente a servidão pela devoção, porque a 
substituiu pela servidão da convicção,- Acabou com a fé na 
autoridade, porque restaurou a autoridade da fé. Converteu 
sacerdotes em leígòs, porque tinha convertido leigos em sacer­
dotes. Libertou o Homem da religiosidade externa, porque 
instituiu a religiosidade no interior do Homem. Emancipou o 
corpo das cadeias porque carregou de cadeias o coração”. 20
Esse fenômeno ocorreu principalmente na época de formação 
do capitalismo, quando se verificava a acumulação primitiva na 
Inglaterra e outros países europeus. Fez parte do processo social 
mais amplo de metamorfose do produtor autônomo (camponês, 
artesão ou outro) em trabalhador livre assalariado. Esse fenô­
meno, repetimos, foi uma das primeiras manifestações da cons­
ciência burguesa em formação. E acompanhou a ruptura das 
relações e estruturas feudais, nas quais as pessoas pertenciam 
fisicamente ao feudo e espiritualmente à Igreja Católica de Roma.
n) Marx, K. e Engels, F. Manifeste du parti communiste. p. 33; Manifesto 
do Partido Comunista, p. 43-44.
2(1 Marx, K. “En torno a la crítica de la filosofia dei derecho de Hegel.” In: 
Marx, K. e Engels, F. La sagrada familia. México, Ed. Grijalbo, 1959. 
p. 1-15, citação da p. 10; Marxj K. “Introdução à Crítica da Filosofia do 
Direito de Hegel.” In: A Questão Judaica. RÍo de Janeiro; Ed. Laemmert, 
1969. p. 103-27, citação da p. 118. Trad. por Wladimir Gomide. Consultar 
também: Marx, K. El capital,t. I, p. 305; O Capital, liv.' 1, p. 313; Marx, 
K. e Engels, F. On Religion. Moscou, Progress Publishers, 1966.
24
diversa e antagônica, quando não de forma incompleta, parcial, 
invertida ou fetichizada. Na sociedade capitalista, as relações __de^ 
produção tendem a configurar-se em idéias, conceitos, doutrinas 
ou teorias, que evadem os seus fundamentos reais. Mas não 
evadem por deliberação. Ao contrário, evadem, em geral, as 
condições reais de vida sem que essa seja a sua finalidade ou 
intenção. A finalidade precípua das idéias, conceitos, doutrinas 
ou teorias é exprimir e constituir as relações sociais. Ocorre que 
as várias modalidades de consciência (ou ciência), mais ou menos 
límpidas ou obscurecidas, invertidas ou fetichizadas, constituem-se, 
segundo as posições relativas das pessoas, grupos e classes sociais, 
nas relações de dependência, alienação e antagonismo em que se 
acham inseridas.
“E assim como na vida privada se diferencia o que um Homem 
pensa e diz de si mesmo do que ele realmente é e faz, nas lutas 
históricas, deve-se distinguir, mais ainda, as frases e as fantasias 
dos partidos de sua formação real e de seus interesses reais, o 
conceito que fazem de si, do que são, na realidade”.18
Aqui, novamente, Marx nos coloca o problema dos descom- 
passos e divórcios entre as aparências e as essências das coisas. 
O que toma necessária a análise dialética é que as coisas não são 
transparentes; e muito menos quando elas são as relações capita­
listas de produção. No capitalismo, as relações de dependência, 
alienação e antagonismo estão no centro das relações entre o 
operário e o capitalista. Mas essas relações não surgem claras, 
ordenadas e transparentes nas ações e na consciência das pessoas. 
As idéias, conceitos, doutrinas ou teorias exprimem as relações 
sociais de modo incompleto ou, mesmo, invertido. Elas não 
podem elidir as posições das pessoas, grupos ou classes nas 
relações de produção, mas não as refletem, a não ser de maneira 
incompleta ou evasiva. É sabido que a revolução burguesa 
proclamou a liberdade de consciência, inclusive a religiosa. Esse 
princípio, no entanto, não faz senão instaurar mais um compo­
nente do processo de mercantilização universal das relações, 
pessoas e ^óisas.T^s"própriãs práticas religiosas, inclusive cerimô­
nias e imagens, são mercantilizadas/t
18 Marx, K. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. p. 49.
25
“As idéias de liberdade religiosa e de liberdade de consciência 
não fizeram mais que proclamar o reino da livre concorrência no 
domínio do conhecimento”.10
Na consciência burguesa, a maior parte dos problemas 
tende a ser equacionada a partir do 'princípio da mercantilização 
universal das relações, pessoas e coisas. Por isso, a liberdade 
religiosa surge de par com a constituição do mercado de trabalho, 
que supõe o direito de livre circulação das pessoas e mercadorias. 
A liberdade religiosa é tomada como uma condição moral 
necessária à livre circulação do trabalhador no mercado nacional 
e internacional de força de trabalho. Marx nqtou que o protes­
tantismo havia transformado a maior parte das festas tradicionais 
em dias de trabalho. Ao mesmo tempo, o protestantismo transfe­
riu para as pessoas a responsabilidade pelo cumprimento dos 
princípios da fé.
"Lutero venceu efetivamente a servidão pela devoção, porque a 
substituiu pela servidão da convicção,- Acabou com a fé na 
autoridade, porque restaurou a autoridade da fé. Converteu 
sacerdotes em leígòs, porque tinha convertido leigos em sacer­
dotes. Libertou o Homem da religiosidade externa, porque 
instituiu a religiosidade no interior do Homem. Emancipou o 
corpo das cadeias porque carregou de cadeias o coração”. 20
Esse fenômeno ocorreu principalmente na época de formação 
do capitalismo, quando se verificava a acumulação primitiva na 
Inglaterra e outros países europeus. Fez parte do processo social 
mais amplo de metamorfose do produtor autônomo (camponês, 
artesão ou outro) em trabalhador livre assalariado. Esse fenô­
meno, repetimos, foi uma das primeiras manifestações da cons­
ciência burguesa em formação. E acompanhou a ruptura das 
relações e estruturas feudais, nas quais as pessoas pertenciam 
fisicamente ao feudo e espiritualmente à Igreja Católica de Roma.
n) Marx, K. e Engels, F. Manifeste du parti communiste. p. 33; Manifesto 
do Partido Comunista, p. 43-44.
2(1 Marx, K. “En torno a la crítica de la filosofia dei derecho de Hegel.” In: 
Marx, K. e Engels, F. La sagrada familia. México, Ed. Grijalbo, 1959. 
p. 1-15, citação da p. 10; Marxj K. “Introdução à Crítica da Filosofia do 
Direito de Hegel.” In: A Questão Judaica. RÍo de Janeiro; Ed. Laemmert, 
1969. p. 103-27, citação da p. 118. Trad. por Wladimir Gomide. Consultar 
também: Marx, K. El capital, t. I, p. 305; O Capital, liv.' 1, p. 313; Marx, 
K. e Engels, F. On Religion. Moscou, Progress Publishers, 1966.
26
A perspectiva de classe não é a única, mas é a determinante, 
na produção da consciência das pessoas e grupos sociais. O 
operário não pode elidir a alienação do produto do seu trabalho 
excedente (não pago), da mesma forma que o capitalista não 
pode elidir essa alienação. Sob as mais diversas formas, um luta 
para modificar essa situação, enquanto que o outro luta para 
mantê-la.
[! E claro que as idéias da classe dominante não exprimem 
sempre e diretamente os seus interesses de classe. Elas aparecem 
sob os mais variados lineamentos ou cores, conforme se trate de 
questões econômicas ou políticas, filosóficas ou artísticas. Em 
geral, no entanto, elas tendem a ser as idéias predominantes na 
época. Isto significa que são generalizadas às outras classes, 
inclusive o proletariado, transformando-se, às vezes, em idéias 
“naturais” ou “definitivas”.]1
I “As idéias da classe dominante são as idéias dominantes em cada 
época; ou, dito em outros termos, a classe que exerce o poder 
material dominante na sociedade é, ao mesmo tempo, seu poder 
espiritual dominante.^ A classe que tem à sua disposição os meios 
para a produção material dispõe, com isso, ao mesmo tempo, 
dos meios para a produção espiritual, o que faz com que se lhe 
submetam, no devido tempo, a médio prazo, as idéias daqueles 
que carecem dos meios necessários para produzir espiritual­
mente”. 21
Parece, no entanto, que a consciência burguesa tende a 
organizar-se, principalmente, segundo os problemas e as interpre­
tações da Economia política. A Ciência e a consciência, nesse 
caso, tendem a rebater mais ou menos diretamente uma na outra. 
O liberalismo inglês, na época de Marx, estava profundamente 
impregnado dos ensinamentos e das fabulações da Economia 
política inglesa, clássica e vulgar. Como doutrina social, política 
e econômica — mas impregnada principalmente pelas categorias 
da Economia política — o liberalismo generalizou-se tanto na 
sociedade inglesa como entre as classes dominantes nos países 
coloniais e dependentes do imperialismo inglês. Vejamos, um 
pouco melhor, como Marx situa a Economia política, quanto às 
relações capitalistas de produção.
21 Marx, K. e Engejls, F. La ideologia alemana. p. 48-49.
27
Marx salienta que a Economia política clássica (A. Smith, 
D. Ricardo e alguns outros) estava interessada em pesquisar os 
nexos causais internos do regime capitalista de produção. Ela 
descobre, por exemplo, que o trabalho cria valor, mas não extrai 
dessa descoberta as suas consequências econômicas e políticas, ao 
passo que a Economia política vulgar (Malthus, J. Mill, Sismondi 
e muitos outros) contentava-se em sistematizar, tornar pedantes 
e proclamar, como se fossem verdades eternas, as idéias banais 
que formulavam sobre o capitalismo. Esta se aferrava muito mais 
às aparências, em lugar de procurar compreender as leis que 
regem os fenômenos. Aquela elaborava algumas leis, ainda que 
não pudesse levá-las às suas conseqüências lógicas. No conjunto, 
no entanto, as economias clássica e vulgar elidiam o essencial.
“A Economia política esconde a alienação contida na própria 
essência dotrabalho, pelo fato de que não considera a relação 
direta entre o operário (o trabalho) e a produção”. 22
É possível afirmar-se que a passagem da Economia política 
clássica à vulgar corresponde, até certo grau, a dois movimentos 
combinados no desenvolvimento do capitalismo. (Primeiro; A 
economia clássica constituiu-se como a ciência do capitalismo em 
formação. Por isso, estava mais diretamente voltada para a 
compreensão das relações, processos e estruturas que distinguiam 
o capitalismo de qualquer outro sistema. Ao mesmo tempo, 
devido ao fato de que se inseria na própria revolução burguesa 
que acompanhava a formação da sociedade industrial, essa eco­
nomia era globalizante e, muitas vezes, parecia uma teoria da 
sociedade capitalista. A economia vulgar surge diretamente na 
perspectiva da burguesia como forma de pensamento da burguesia 
no poder. Daí a razão 'por “que ela é muito mais ideológica. 
Apanha a realidade de maneira fragmentária e tende para a 
apologia do mundo burguês. Mas esse é apenas um dos movi­
mentos envolvidos na metamorfose da ciência econômica em 
ideologia. Segundo: Pode-se afirmar, também e principalmente, 
que a passagem da Economia política clássica à vulgar corresponde 
a um passo decisivo no desenvolvimento das contradições de 
classes, no seio do sistema capitalista inglês. Na medida em que 
se desenvolvia esse sistema, desenv'olviam-se as suas relações de
22 Marx, K. Manuscrits de 1844. Paris, Éditions Sociales, 1969. p. 59.
26
A perspectiva de classe não é a única, mas é a determinante, 
na produção da consciência das pessoas e grupos sociais. O 
operário não pode elidir a alienação do produto do seu trabalho 
excedente (não pago), da mesma forma que o capitalista não 
pode elidir essa alienação. Sob as mais diversas formas, um luta 
para modificar essa situação, enquanto que o outro luta para 
mantê-la.
[! E claro que as idéias da classe dominante não exprimem 
sempre e diretamente os seus interesses de classe. Elas aparecem 
sob os mais variados lineamentos ou cores, conforme se trate de 
questões econômicas ou políticas, filosóficas ou artísticas. Em 
geral, no entanto, elas tendem a ser as idéias predominantes na 
época. Isto significa que são generalizadas às outras classes, 
inclusive o proletariado, transformando-se, às vezes, em idéias 
“naturais” ou “definitivas”.]1
I “As idéias da classe dominante são as idéias dominantes em cada 
época; ou, dito em outros termos, a classe que exerce o poder 
material dominante na sociedade é, ao mesmo tempo, seu poder 
espiritual dominante.^ A classe que tem à sua disposição os meios 
para a produção material dispõe, com isso, ao mesmo tempo, 
dos meios para a produção espiritual, o que faz com que se lhe 
submetam, no devido tempo, a médio prazo, as idéias daqueles 
que carecem dos meios necessários para produzir espiritual­
mente”. 21
Parece, no entanto, que a consciência burguesa tende a 
organizar-se, principalmente, segundo os problemas e as interpre­
tações da Economia política. A Ciência e a consciência, nesse 
caso, tendem a rebater mais ou menos diretamente uma na outra. 
O liberalismo inglês, na época de Marx, estava profundamente 
impregnado dos ensinamentos e das fabulações da Economia 
política inglesa, clássica e vulgar. Como doutrina social, política 
e econômica — mas impregnada principalmente pelas categorias 
da Economia política — o liberalismo generalizou-se tanto na 
sociedade inglesa como entre as classes dominantes nos países 
coloniais e dependentes do imperialismo inglês. Vejamos, um 
pouco melhor, como Marx situa a Economia política, quanto às 
relações capitalistas de produção.
21 Marx, K. e Engejls, F. La ideologia alemana. p. 48-49.
27
Marx salienta que a Economia política clássica (A. Smith, 
D. Ricardo e alguns outros) estava interessada em pesquisar os 
nexos causais internos do regime capitalista de produção. Ela 
descobre, por exemplo, que o trabalho cria valor, mas não extrai 
dessa descoberta as suas consequências econômicas e políticas, ao 
passo que a Economia política vulgar (Malthus, J. Mill, Sismondi 
e muitos outros) contentava-se em sistematizar, tornar pedantes 
e proclamar, como se fossem verdades eternas, as idéias banais 
que formulavam sobre o capitalismo. Esta se aferrava muito mais 
às aparências, em lugar de procurar compreender as leis que 
regem os fenômenos. Aquela elaborava algumas leis, ainda que 
não pudesse levá-las às suas conseqüências lógicas. No conjunto, 
no entanto, as economias clássica e vulgar elidiam o essencial.
“A Economia política esconde a alienação contida na própria 
essência do trabalho, pelo fato de que não considera a relação 
direta entre o operário (o trabalho) e a produção”. 22
É possível afirmar-se que a passagem da Economia política 
clássica à vulgar corresponde, até certo grau, a dois movimentos 
combinados no desenvolvimento do capitalismo. (Primeiro; A 
economia clássica constituiu-se como a ciência do capitalismo em 
formação. Por isso, estava mais diretamente voltada para a 
compreensão das relações, processos e estruturas que distinguiam 
o capitalismo de qualquer outro sistema. Ao mesmo tempo, 
devido ao fato de que se inseria na própria revolução burguesa 
que acompanhava a formação da sociedade industrial, essa eco­
nomia era globalizante e, muitas vezes, parecia uma teoria da 
sociedade capitalista. A economia vulgar surge diretamente na 
perspectiva da burguesia como forma de pensamento da burguesia 
no poder. Daí a razão 'por “que ela é muito mais ideológica. 
Apanha a realidade de maneira fragmentária e tende para a 
apologia do mundo burguês. Mas esse é apenas um dos movi­
mentos envolvidos na metamorfose da ciência econômica em 
ideologia. Segundo: Pode-se afirmar, também e principalmente, 
que a passagem da Economia política clássica à vulgar corresponde 
a um passo decisivo no desenvolvimento das contradições de 
classes, no seio do sistema capitalista inglês. Na medida em que 
se desenvolvia esse sistema, desenv'olviam-se as suas relações de
22 Marx, K. Manuscrits de 1844. Paris, Éditions Sociales, 1969. p. 59.
28
alienação e antagonismo. Quanto mais se desenvolvem e apro­
fundam as contradições de classes — expressas nas agitações, 
greves, formação de associações, sindicatos e surgimento de 
correntes políticas operárias — mais intenso é o movimento da 
consciência burguesa no sentido de adotar fórmulas ilusórias ou 
simplesmente apologéticas. Os dois movimentos combinados pa­
recem ter provocado o florescimento da Economia política vulgar.
“A Economia política, quando é burguesa, isto é, quando vê no 
regime capitalista não uma fase historicamente transitória de 
desenvolvimento, mas a forma absoluta e definitiva da produção 
social, somente pode manter a sua categoria de Ciência enquanto 
a luta de classes permanece latente ou aparece apenas em mani­
festações isoladas”. 23
A verdade é que, desde que começou a formar-se, o prole­
tariado teve de lutar contra a expropriação inerente às relações 
capitalistas de produção. No princípio, ele se viu na obrigação 
de lutar, principalmente, por sua sobrevivência física. Encontrava- 
-se totalmente dominado pelo capital e sem qualquer experiência 
de organização e luta. As suas condições de trabalho e vida ainda 
não lhe permitiam socializar ou coletivizar a experiência comum, 
organizando associações, coalizões, sindicatos ou partidos, para 
lutar por seus interesses econômicos e políticos. Essa é a época 
em que surgem, difundem-se e predominam seitas e doutrinas 
socialistas, mais ou menos utópicas. 24|O proletariado se encontra 
sob a influência de políticos e ideólogos de filiação reformista e 
humanitária, incapazes de se libertarem das categorias da econo­
mia política burguesa ou dos quadros ideológicos burgueses. | 
Acresce que, nessa época, a própria burguesia ainda está lutando 
para impor-se como classe hegemônica; inclusive apela para alian­
ças com o proletariado. Por isso, ela própria colabora no processo 
de politização do proletariado,dando-lhe a contragosto elementos 
para tornar-se uma classe política.
“Em geral, os choques que se produzem na velha sociedade 
favorecem de diversos modos o desenvolvimento do proletariado. 
A burguesia vive num. estado de guerra perpétua: primeiro,
23 Marx, K. El capital, t. 1, p. 2; O Capital, liv. 1, p. 10. Em termos mais 
gerais, a mesma idéia havia sido apresentada em: Marx, K. e Engels, F. 
La ideologia alemana. p. 323.
24 Marx, K. e Engels, F. Manifeste du parti communiste. p. 36-46; Mani­
festo do Partido Comunista, p. 47-59.
29
contra a aristocracia; depois, contra as camadas da própria 
burguesia cujos interesses se encontram em conflito com os pro­
gressos da indústria; e3 sempre, finalmente, contra a burguesia 
dos países estrangeiros. Em todas essas lutas, vê-se forçada a 
apelar para o proletariado, usar seu concurso e arrastá-lo no 
movimento político, de modo que a burguesia fornece aos prole­
tários os elementos de sua própria educação política, isto é, 
armas contra ela própria”. 25
À medida que socializam as suas experiências comuns, no 
contexto das suas relações de trabalho e das suas experiências de 
vida cotidianas, os operários compreendem de modo cada vez 
mais claro o caráter alienado e antagônico da sua condição. 
Pouco a pouco, tendem a organizar as suas atividades políticas em 
função dessa compreensão. (No curso da formação de sua cons­
ciência política, o proletariado pode confundir a máquina com o 
seu inimigo ou aceitar a aliança com a burguesia nascente, para 
lutar contra os inimigos do seu inimigoA E também pode ser 
levado a aceitar seitas e doutrinas do socialismo utópico. Paulati­
namente, no entanto, a classe operária vai elaborando a sua 
consciência política. Essa é a ocasião em que começa a com­
preender a burguesia como a sua classe antagônica. É óbvio que 
esse processo de tomada de consciência da classe operária desen­
volve-se ao longo das suas próprias lutas, como classe. Isto é, a 
classe operária não se constitui apenas porque o regime capitalista 
se desenvolve; ela se forma na medida em que luta contra as 
relações de alienação em que se acha inserida. É no curso dessa 
luta que ela acaba por identificar toda a hierarquia dos seus 
inimigos, até compreender o Estado burguês como o núcleo do 
regime em que se funda a sua alienação.
“Assim, além dos distintos movimentos econômicos dos operários, 
surgem em todos os lugares movimentos políticos, isto é, movi­
mentos de classe, com o objetivo de impor os seus -interesses de 
forma geral, de uma forma que possui força coercitiva social 
geral. Se bem que estes movimentos pressupõem certo grau de 
organização prévia, em compensação eles igualmente significam 
meios de desenvolver essa organização”. 20
™Id. p. 23-24; Id. p. 31.
23 Marx, K. “Marx to F. Boite in New York.” (Carta datada de 23 de 
novembro de 1871.) In: Marx, K. e Engels, F. Selected Correspondence. 
Moscou, Progress Publishers, 1965. p. 269-71, citação da p. 271.
28
alienação e antagonismo. Quanto mais se desenvolvem e apro­
fundam as contradições de classes — expressas nas agitações, 
greves, formação de associações, sindicatos e surgimento de 
correntes políticas operárias — mais intenso é o movimento da 
consciência burguesa no sentido de adotar fórmulas ilusórias ou 
simplesmente apologéticas. Os dois movimentos combinados pa­
recem ter provocado o florescimento da Economia política vulgar.
“A Economia política, quando é burguesa, isto é, quando vê no 
regime capitalista não uma fase historicamente transitória de 
desenvolvimento, mas a forma absoluta e definitiva da produção 
social, somente pode manter a sua categoria de Ciência enquanto 
a luta de classes permanece latente ou aparece apenas em mani­
festações isoladas”. 23
A verdade é que, desde que começou a formar-se, o prole­
tariado teve de lutar contra a expropriação inerente às relações 
capitalistas de produção. No princípio, ele se viu na obrigação 
de lutar, principalmente, por sua sobrevivência física. Encontrava- 
-se totalmente dominado pelo capital e sem qualquer experiência 
de organização e luta. As suas condições de trabalho e vida ainda 
não lhe permitiam socializar ou coletivizar a experiência comum, 
organizando associações, coalizões, sindicatos ou partidos, para 
lutar por seus interesses econômicos e políticos. Essa é a época 
em que surgem, difundem-se e predominam seitas e doutrinas 
socialistas, mais ou menos utópicas. 24|O proletariado se encontra 
sob a influência de políticos e ideólogos de filiação reformista e 
humanitária, incapazes de se libertarem das categorias da econo­
mia política burguesa ou dos quadros ideológicos burgueses. | 
Acresce que, nessa época, a própria burguesia ainda está lutando 
para impor-se como classe hegemônica; inclusive apela para alian­
ças com o proletariado. Por isso, ela própria colabora no processo 
de politização do proletariado, dando-lhe a contragosto elementos 
para tornar-se uma classe política.
“Em geral, os choques que se produzem na velha sociedade 
favorecem de diversos modos o desenvolvimento do proletariado. 
A burguesia vive num. estado de guerra perpétua: primeiro,
23 Marx, K. El capital, t. 1, p. 2; O Capital, liv. 1, p. 10. Em termos mais 
gerais, a mesma idéia havia sido apresentada em: Marx, K. e Engels, F. 
La ideologia alemana. p. 323.
24 Marx, K. e Engels, F. Manifeste du parti communiste. p. 36-46; Mani­
festo do Partido Comunista, p. 47-59.
29
contra a aristocracia; depois, contra as camadas da própria 
burguesia cujos interesses se encontram em conflito com os pro­
gressos da indústria; e3 sempre, finalmente, contra a burguesia 
dos países estrangeiros. Em todas essas lutas, vê-se forçada a 
apelar para o proletariado, usar seu concurso e arrastá-lo no 
movimento político, de modo que a burguesia fornece aos prole­
tários os elementos de sua própria educação política, isto é, 
armas contra ela própria”. 25
À medida que socializam as suas experiências comuns, no 
contexto das suas relações de trabalho e das suas experiências de 
vida cotidianas, os operários compreendem de modo cada vez 
mais claro o caráter alienado e antagônico da sua condição. 
Pouco a pouco, tendem a organizar as suas atividades políticas em 
função dessa compreensão. (No curso da formação de sua cons­
ciência política, o proletariado pode confundir a máquina com o 
seu inimigo ou aceitar a aliança com a burguesia nascente, para 
lutar contra os inimigos do seu inimigoA E também pode ser 
levado a aceitar seitas e doutrinas do socialismo utópico. Paulati­
namente, no entanto, a classe operária vai elaborando a sua 
consciência política. Essa é a ocasião em que começa a com­
preender a burguesia como a sua classe antagônica. É óbvio que 
esse processo de tomada de consciência da classe operária desen­
volve-se ao longo das suas próprias lutas, como classe. Isto é, a 
classe operária não se constitui apenas porque o regime capitalista 
se desenvolve; ela se forma na medida em que luta contra as 
relações de alienação em que se acha inserida. É no curso dessa 
luta que ela acaba por identificar toda a hierarquia dos seus 
inimigos, até compreender o Estado burguês como o núcleo do 
regime em que se funda a sua alienação.
“Assim, além dos distintos movimentos econômicos dos operários, 
surgem em todos os lugares movimentos políticos, isto é, movi­
mentos de classe, com o objetivo de impor os seus -interesses de 
forma geral, de uma forma que possui força coercitiva social 
geral. Se bem que estes movimentos pressupõem certo grau de 
organização prévia, em compensação eles igualmente significam 
meios de desenvolver essa organização”. 20
™Id. p. 23-24; Id. p. 31.
23 Marx, K. “Marx to F. Boite in New York.” (Carta datada de 23 de 
novembro de 1871.) In: Marx, K. e Engels, F. Selected Correspondence. 
Moscou, Progress Publishers, 1965. p. 269-71, citação da p. 271.
30
4. Estado e sociedade
Seria equívoco pensar que Márx não elaborou uma interpre­
tação do Estado capitalista, simplesmente porque não a vemossistematizada em algumas páginas, num ensaio ou livro. A inter­
pretação do Estado capitalista aparece bastante bem delineada 
nos vários passos da sua análise do regime capitalista de produção. 
Naturalmente a sua concepção de Estado vai se explicitando ou 
desenvolvendo à medida que estuda as imbricações ou os desdo­
bramentos sociais, políticos e econômicos das forças produtivas 
e das relações de produção, em seus desenvolvimentos especifica­
mente capitalistas. O conjunto do processo de produção de 
mais-valia, de reprodução ampliada do capital ou de mercantili- 
zação universal das relações, pessoas e coisas, somente pode ser 
compreendido se a análise apreende também o Estado, como uma 
dimensão essencial do capitalismo. A teoria da luta de classes 
seria uma simples abstração, se as relações e os antagonismos 
de classes não implicassem no Estado capitalista como expressão 
e condição dessas mesmas relações e antagonismos. Quando se 
refere às estruturas jurídicas e políticas, que expressam as relações 
de produção, está se referindo à 4‘superestrutura” da sociedade, 
ao poder estatal. Todas as contradições fundamentais do capita­
lismo envolvem o Estado, como expressão nuclear da sociedade 
civil. Em síntese, a análise marxista do capitalismo seria inin­
teligível, se Marx não tivesse elaborado, também e necessaria­
mente, uma compreensão dialética do Estado.
sua atividade® a) a crítica da dialética hegeliana, 
utópico e dcTTconomia política clássica; a
Em seus primeiros escritos, Marx discute e procura superar 
as concepções hegeliana e liberal do Estado. 27 Para ele, o Estado 
nem paira sobre a “sociedade civil” nem exprime a “vontade 
geral”. Entende o Estado inserido no jogo das relações entre as 
pessoas, os grupos e as classes sociais. Com isto não queremos 
dizer que Marx teve, já no princípio, uma compreensão nova e 
acabada do Estado. Nada disso. A sua compreensão nova ele 
a elaborou à medida que desenvolvia os três núcleos principais e 
combinados da
do socialismo 
27 Consultar, em especial: Marx, K. Crítica da Filosofia do Direito de 
Hegel. Lisboa, Editorial Presença [s. d.]; Marx, K. e Engels, F. La ideo­
logia alemana, esp. p. 212-23.
31
análise do capitalismo; c) a participação prático-crítica nas lutas 
políticas do proletariado. Note-se que, aqui, falamos da forma 
pela qual a interpretação de Marx surge em suas obras. Outra 
questão é saber qual foi ou quais foram as ocasiões exatas em que 
ele realizou a sua compreensão dialética do Estado. Este é um 
problema da sua biografia intelectual, da qual não estamos 
tratando. Aqui falamos principalmente da exposição e desenvol­
vimento do seu pensamento. É importante reconhecer, sob qual­
quer das suas perspectivas, que, desde os seus primeiros escritos, 
Marx está preocupado com as relações e determinações recípro­
cas entre o Estado e a sociedade, numa ótic^ diferente daquelas 
propostas anteriormente, não apenas por Hegel. Nesse processo 
crítico, formula a chave da sua concepção, quando diz que o 
Estado ^precisa ser compreendido, simultaneamente, como uma 
“colossal superestrutura” do regime capitalista e como o “poder 
organizado de uma classe” social em sua relação com as outras. 28
No início, a discussão realizada por Marx sobre as relações 
do Estado com a sociedade civil ou com os indivíduos, os grupos 
e as classes sociais apreende, principalmente, as dimensões polí­
ticas dessas relações. Afirma que o Estado e a sociedade não são 
politicamente distintos; que “o Estado é a estrutura da sociedade”; 
mas o Estado não é a expressão harmônica e abstrata da socie­
dade. Ao contrário, já se constitui como um produto de contra­
dições políticas. Esta é a primeira e mais geral contradição na 
qual se funda o poder estatal: “O Estado se funda na contradição 
entre o público e a vida privada, entre o interesse geral .e o 
particular”. 29
Para realizar-se, no entanto, o Estado não pode aparecer aos 
cidadãos e às associações (ou grupos, classes, exército, igreja etc.) 
dessa forma, simplesmente como um produto de antagonismos, ou 
como um feixe de contradições. Isto seria muito transparente e, 
28 Marx, K. Contribuição à Crítica da Economia Política. Sao Paulo, Ed. 
Flama, 1946. p. 31. Trad. por Florestan Fernandes. Ver, também: Marx, 
K. e Engels, F. Manifeste du parti communiste. p. 17 e 35; Manifesto do 
Partido Comunista, p. 21 e 45.
29 Marx, K. “Observações Críticas à Margem do Artigo: CO Rei da Prússia 
e a Reforma Social’. ” In: Vorwãrts. 7 de agosto de 1844. Texto transcrito 
parcialmente em Bottomore, T. B. e Rubel, M. Karl Marx. Selected 
Writings in Sociology and Social Philosophy. Londres, Penguim Books, 
1963. p. 221-23 e citações da p. 222.
30
4. Estado e sociedade
Seria equívoco pensar que Márx não elaborou uma interpre­
tação do Estado capitalista, simplesmente porque não a vemos 
sistematizada em algumas páginas, num ensaio ou livro. A inter­
pretação do Estado capitalista aparece bastante bem delineada 
nos vários passos da sua análise do regime capitalista de produção. 
Naturalmente a sua concepção de Estado vai se explicitando ou 
desenvolvendo à medida que estuda as imbricações ou os desdo­
bramentos sociais, políticos e econômicos das forças produtivas 
e das relações de produção, em seus desenvolvimentos especifica­
mente capitalistas. O conjunto do processo de produção de 
mais-valia, de reprodução ampliada do capital ou de mercantili- 
zação universal das relações, pessoas e coisas, somente pode ser 
compreendido se a análise apreende também o Estado, como uma 
dimensão essencial do capitalismo. A teoria da luta de classes 
seria uma simples abstração, se as relações e os antagonismos 
de classes não implicassem no Estado capitalista como expressão 
e condição dessas mesmas relações e antagonismos. Quando se 
refere às estruturas jurídicas e políticas, que expressam as relações 
de produção, está se referindo à 4‘superestrutura” da sociedade, 
ao poder estatal. Todas as contradições fundamentais do capita­
lismo envolvem o Estado, como expressão nuclear da sociedade 
civil. Em síntese, a análise marxista do capitalismo seria inin­
teligível, se Marx não tivesse elaborado, também e necessaria­
mente, uma compreensão dialética do Estado.
sua atividade® a) a crítica da dialética hegeliana, 
utópico e dcTTconomia política clássica; a
Em seus primeiros escritos, Marx discute e procura superar 
as concepções hegeliana e liberal do Estado. 27 Para ele, o Estado 
nem paira sobre a “sociedade civil” nem exprime a “vontade 
geral”. Entende o Estado inserido no jogo das relações entre as 
pessoas, os grupos e as classes sociais. Com isto não queremos 
dizer que Marx teve, já no princípio, uma compreensão nova e 
acabada do Estado. Nada disso. A sua compreensão nova ele 
a elaborou à medida que desenvolvia os três núcleos principais e 
combinados da
do socialismo 
27 Consultar, em especial: Marx, K. Crítica da Filosofia do Direito de 
Hegel. Lisboa, Editorial Presença [s. d.]; Marx, K. e Engels, F. La ideo­
logia alemana, esp. p. 212-23.
31
análise do capitalismo; c) a participação prático-crítica nas lutas 
políticas do proletariado. Note-se que, aqui, falamos da forma 
pela qual a interpretação de Marx surge em suas obras. Outra 
questão é saber qual foi ou quais foram as ocasiões exatas em que 
ele realizou a sua compreensão dialética do Estado. Este é um 
problema da sua biografia intelectual, da qual não estamos 
tratando. Aqui falamos principalmente da exposição e desenvol­
vimento do seu pensamento. É importante reconhecer, sob qual­
quer das suas perspectivas, que, desde os seus primeiros escritos, 
Marx está preocupado com as relações e determinações recípro­
cas entre o Estado e a sociedade, numa ótic^ diferente daquelas 
propostas anteriormente, não apenas por Hegel. Nesse processo 
crítico, formula a chave da sua concepção, quando diz que o 
Estado ^precisa ser compreendido, simultaneamente, como uma 
“colossal superestrutura” do regime capitalista e como o “poder 
organizado deuma classe” social em sua relação com as outras. 28
No início, a discussão realizada por Marx sobre as relações 
do Estado com a sociedade civil ou com os indivíduos, os grupos 
e as classes sociais apreende, principalmente, as dimensões polí­
ticas dessas relações. Afirma que o Estado e a sociedade não são 
politicamente distintos; que “o Estado é a estrutura da sociedade”; 
mas o Estado não é a expressão harmônica e abstrata da socie­
dade. Ao contrário, já se constitui como um produto de contra­
dições políticas. Esta é a primeira e mais geral contradição na 
qual se funda o poder estatal: “O Estado se funda na contradição 
entre o público e a vida privada, entre o interesse geral .e o 
particular”. 29
Para realizar-se, no entanto, o Estado não pode aparecer aos 
cidadãos e às associações (ou grupos, classes, exército, igreja etc.) 
dessa forma, simplesmente como um produto de antagonismos, ou 
como um feixe de contradições. Isto seria muito transparente e, 
28 Marx, K. Contribuição à Crítica da Economia Política. Sao Paulo, Ed. 
Flama, 1946. p. 31. Trad. por Florestan Fernandes. Ver, também: Marx, 
K. e Engels, F. Manifeste du parti communiste. p. 17 e 35; Manifesto do 
Partido Comunista, p. 21 e 45.
29 Marx, K. “Observações Críticas à Margem do Artigo: CO Rei da Prússia 
e a Reforma Social’. ” In: Vorwãrts. 7 de agosto de 1844. Texto transcrito 
parcialmente em Bottomore, T. B. e Rubel, M. Karl Marx. Selected 
Writings in Sociology and Social Philosophy. Londres, Penguim Books, 
1963. p. 221-23 e citações da p. 222.
32
assim, insuportável para os cidadãos e as associações. Implicaria 
uma guerra aberta e ininterrupta entre uns e outros. Ocorre, no 
entanto, que, no mesmo processo de sua realização, o Estado já 
se constitui fetichizado. Na consciência e na prática das pessoas, 
tende a aparecer sob uma forma abstrata, como um ato de vontade 
coletiva ou como a forma externa da sociedade civil.
“O Estado anula, a seu modo, as diferenças de nascimento, de 
estado social, de cultura e de ocupação, ao declarar o nasci­
mento, o estado social, a cultura e a ocupação do homem como 
diferenças não políticas', ao proclamar todo membro do povo, 
sem atender a estas diferenças, participante da soberania popular 
em base de igualdade', ao abordar todos os elementos da vida real 
do povo do ponto de vista do Estado. Contudo, o Estado deixa 
que a propriedade privada, a cultura e a ocupação atuem a seu 
modo, isto é, como propriedade privada, como cultura e como 
ocupação, e façam valer a sua natureza especial.” 30
“Como o Estado é a forma sob a qual os indivíduos de uma 
classe dominante fazem valer os seus interesses comuns, na qual 
se condensa toda a sociedade civil de uma época, segue-se disso 
que todas as instituições comuns têm como mediador o Estado e 
adquirem, através dele, uma forma política. Daí a ilusão de que 
a lei se baseia na vontade e, além disso, na vontade separada de 
sua base real, na vontade livre. E, da mesma maneira, por sua 
vez, se reduz o direito à lei.” 31
Em seguida, Marx apanha as dimensões políticas e econô­
micas do Estado, ao compreender o Estado burguês como uma 
expressão essencial das relações de produção específicas do capi­
talismo. Ao aprofundar a análise do regime capitalista, mostra 
como o Estado é, em última instância, um órgão da classe domi­
nante. O monopólio do aparelho estatal, diretamente ou por meio 
de grupos interpostos, é a condição básica do exercício da domi­
nação. “O governo moderno não é senão um comitê adminis­
trativo dos negócios da classe burguesa”, o que significa, em 
30 Marx, K. “Sobre la cuestión judia.” In: La sagrada família. México, 
Editorial Grijalbo, 1959. p. 16-44, citação da p. 23. Ver, também: Marx, 
K. A Questão Judaica. Rio de Janeiro, Ed. Laemmert, 1969. p. 25. Trad; 
por Wladimir Gomide.
31 Marx, K. e Engels, F. La ideologia alemana. p. 69.
33
outros termos, que “o poder político, na verdade, é o poder 
organizado de uma classe para a opressão de outras”.32 *
Ao estudar o golpe de Estado de 1852, na França, Marx se 
viu obrigado a aprofundar a análise do Estado burguês nesse 
país. Examinou as relações e estruturas jurídico-políticas e buro­
cráticas do poder estatal. Inclusive dedicou-sé a uma. análise 
interna rigorosa da constituição vigente na época, para apanhar 
a estrutura de poder por ela definida, além das congruências e 
contradições ‘entre essa estrutura formal e as forças sociais reais 
na sociedade francesa. Na pesquisa, ele recupera a história do 
poder estatal burguês, conforme se constitui e aperfeiçoa ao longo 
das décadas posteriores à Revolução de 1789. As lutas sociais 
entre grupos e classes sociais, nos anos 1789-1852, são também 
momentos importantes na formação do Estado, como uma con­
dição e um produto das relações de dependência, alienação e 
antagonismo das classes sociais e suas facções. Uma parte dessa 
análise pode ser sintetizada aqui, nas palavras de Marx.
“Esse poder executivo, com sua imensa organização burocrática 
e militar, com sua engenhosa máquina de Estado, abrangendo 
amplas camadas com um exército de funcionários totalizando 
meio milhão, além de mais de meio milhão de tropas regulares, 
esse tremendo corpo de parasitos, que envolve como uma teia 
o corpo da sociedade francesa e sufoca todos os seus poros, sur­
giu ao tempo da monarquia absoluta, com o declínio do sistema 
feudal, que contribuiu para apressar. Os privilégios senhoriais 
dos proprietários de terras e das cidades transformaram-se em 
outros tantos atributos do poder do Estado, os dignitários feu­
dais em funcionários pagos e o variegado mapa dos poderes 
absolutos medievais em conflito entre si, no plano regular de um 
poder estatal cuja tarefa está dividida e centralizada como em 
uma fábrica. A primeira revolução francesa, em sua tarefa de 
quebrar todos os poderes independentes locais, territoriais, 
urbanos e provinciais — a fim de estabelecer a unificação civil 
da nação, tinha forçosamente que desenvolver o que a monarquia 
absoluta começara: a centralização, mas, ao mesmo tempo, am­
pliou o âmbito, os atributos e os agentes do poder governa­
mental. Napoleão aperfeiçoara essa máquina estatal. A monarquia 
legitimista e a monarquia de Julho nada mais fizeram do que
32 Marx, K. e Engels, F. Manifeste du parti communiste. p. 17 e 35;
Manifesto do Partido Comunista, p. 21 e 46. •
32
assim, insuportável para os cidadãos e as associações. Implicaria 
uma guerra aberta e ininterrupta entre uns e outros. Ocorre, no 
entanto, que, no mesmo processo de sua realização, o Estado já 
se constitui fetichizado. Na consciência e na prática das pessoas, 
tende a aparecer sob uma forma abstrata, como um ato de vontade 
coletiva ou como a forma externa da sociedade civil.
“O Estado anula, a seu modo, as diferenças de nascimento, de 
estado social, de cultura e de ocupação, ao declarar o nasci­
mento, o estado social, a cultura e a ocupação do homem como 
diferenças não políticas', ao proclamar todo membro do povo, 
sem atender a estas diferenças, participante da soberania popular 
em base de igualdade', ao abordar todos os elementos da vida real 
do povo do ponto de vista do Estado. Contudo, o Estado deixa 
que a propriedade privada, a cultura e a ocupação atuem a seu 
modo, isto é, como propriedade privada, como cultura e como 
ocupação, e façam valer a sua natureza especial.” 30
“Como o Estado é a forma sob a qual os indivíduos de uma 
classe dominante fazem valer os seus interesses comuns, na qual 
se condensa toda a sociedade civil de uma época, segue-se disso 
que todas as instituições comuns têm como mediador o Estado e 
adquirem, através dele, uma forma política. Daí a ilusão de que 
a lei se baseia na vontade e, além disso, na vontade separada de 
sua base real, na vontade livre. E, da mesma maneira, por sua 
vez, se reduz o direito à lei.” 31
Em seguida, Marx apanha as dimensões políticas e econô­
micas do Estado, ao compreender o Estado burguês como uma 
expressão essencial das relações de produçãoespecíficas do capi­
talismo. Ao aprofundar a análise do regime capitalista, mostra 
como o Estado é, em última instância, um órgão da classe domi­
nante. O monopólio do aparelho estatal, diretamente ou por meio 
de grupos interpostos, é a condição básica do exercício da domi­
nação. “O governo moderno não é senão um comitê adminis­
trativo dos negócios da classe burguesa”, o que significa, em 
30 Marx, K. “Sobre la cuestión judia.” In: La sagrada família. México, 
Editorial Grijalbo, 1959. p. 16-44, citação da p. 23. Ver, também: Marx, 
K. A Questão Judaica. Rio de Janeiro, Ed. Laemmert, 1969. p. 25. Trad; 
por Wladimir Gomide.
31 Marx, K. e Engels, F. La ideologia alemana. p. 69.
33
outros termos, que “o poder político, na verdade, é o poder 
organizado de uma classe para a opressão de outras”.32 *
Ao estudar o golpe de Estado de 1852, na França, Marx se 
viu obrigado a aprofundar a análise do Estado burguês nesse 
país. Examinou as relações e estruturas jurídico-políticas e buro­
cráticas do poder estatal. Inclusive dedicou-sé a uma. análise 
interna rigorosa da constituição vigente na época, para apanhar 
a estrutura de poder por ela definida, além das congruências e 
contradições ‘entre essa estrutura formal e as forças sociais reais 
na sociedade francesa. Na pesquisa, ele recupera a história do 
poder estatal burguês, conforme se constitui e aperfeiçoa ao longo 
das décadas posteriores à Revolução de 1789. As lutas sociais 
entre grupos e classes sociais, nos anos 1789-1852, são também 
momentos importantes na formação do Estado, como uma con­
dição e um produto das relações de dependência, alienação e 
antagonismo das classes sociais e suas facções. Uma parte dessa 
análise pode ser sintetizada aqui, nas palavras de Marx.
“Esse poder executivo, com sua imensa organização burocrática 
e militar, com sua engenhosa máquina de Estado, abrangendo 
amplas camadas com um exército de funcionários totalizando 
meio milhão, além de mais de meio milhão de tropas regulares, 
esse tremendo corpo de parasitos, que envolve como uma teia 
o corpo da sociedade francesa e sufoca todos os seus poros, sur­
giu ao tempo da monarquia absoluta, com o declínio do sistema 
feudal, que contribuiu para apressar. Os privilégios senhoriais 
dos proprietários de terras e das cidades transformaram-se em 
outros tantos atributos do poder do Estado, os dignitários feu­
dais em funcionários pagos e o variegado mapa dos poderes 
absolutos medievais em conflito entre si, no plano regular de um 
poder estatal cuja tarefa está dividida e centralizada como em 
uma fábrica. A primeira revolução francesa, em sua tarefa de 
quebrar todos os poderes independentes locais, territoriais, 
urbanos e provinciais — a fim de estabelecer a unificação civil 
da nação, tinha forçosamente que desenvolver o que a monarquia 
absoluta começara: a centralização, mas, ao mesmo tempo, am­
pliou o âmbito, os atributos e os agentes do poder governa­
mental. Napoleão aperfeiçoara essa máquina estatal. A monarquia 
legitimista e a monarquia de Julho nada mais fizeram do que
32 Marx, K. e Engels, F. Manifeste du parti communiste. p. 17 e 35;
Manifesto do Partido Comunista, p. 21 e 46. •
34
acrescentar maior divisão do trabalho, que crescia na mesma 
proporção em que a divisão do trabalho dentro da sociedade 
burguesa criava novos grupos de interesses e, por conseguinte, 
novo material para a administração do Estado. Todo interesse 
comum era imediatamente cortado da sociedade, contraposto a 
ela como um interesse superior, geral, retirado da atividade dos 
próprios membros da sociedade e transformado em objeto da 
atividade do governo, desde a ponte, o edifício da escola e pro­
priedade comunal de uma aldeia, até as estradas de ferro, a 
riqueza nacional e as universidades da França. Finalmente, em 
sua luta contra a revolução, a República parlamentar viu-se for­
çada a consolidar, juntamente com as medidas repressivas, os 
recursos e a centralização do poder governamental. Todas as 
revoluções aperfeiçoaram essa máquina, ao invés de destroçá-la. 
Os partidos que disputavam o poder encaravam a posse dessa 
imensa estrutura do Estado como o principal espólio do ven­
cedor.” 33
“Unicamente sob o segundo Bonaparte o Estado parece tornar- 
-se completamente autônomo. A máquina do Estado consolidou 
a tal ponto a sua posição em face da sociedade civil que lhe 
basta ter à frente o chefe da Sociedade de 10 de Dezembro, um 
aventureiro surgido de fora (. . .).” 34
“E, não obstante, o poder estatal não está suspenso no ar.” 35 
“Bonaparte gostaria de aparecer como benfeitor patriarcal de 
todas as classes. Mas não pode dar a uma classe sem tirar de 
outra”. 36
A partir de certo momento, o aparelho estatal está de tal 
forma constituído em sua composição, estrutura e concepção, que 
o chefe do governo pode ser um aventureiro, preposto ou membro 
de outra classe. A forma pela qual o poder estatal burguês se 
constitui o. toma intrínseca e necessariamente um órgão da bur­
guesia. Tanto assim que, nas ocasiões de crise de hegemonia, 
quando a própria burguesia ou alguma das suas facções não está 
em condições de exercer o poder, mesmo nessas ocasiões o Estado 
não deixa de exprimir-se em conformidade com as determinações
33 Marx, K. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. São Paulo, Ed. Escriba, 
1968. p. 130-31.
^Ibid. p. 131.
35 Ibid. p. 132.
™Ibid. p. 143.
35
básicas do regime. A crise de hegemonia está na base do golpe 
de Estado de 1852, por meio do qual se instaura o bonapartismo, 
como governo que aparentemente paira sobre todas as classes 
sociais.
“A burguesia conservava a França resfolegando de pavor ante 
os futuros terrores da anarquia vermelha. (...) A burguesia 
fez a apoteose da espada; a espada a domina. Destruiu a im­
prensa revolucionária; sua imprensa foi destruída. Colocou as 
reuniões populares sob a vigilância da polícia; seus.-salões estão 
sob a vigilância da polícia. (...) Reprimiu todos os movimentos 
da sociedade mediante o poder do Estado; tqdos os movimentos 
de sua sociedade são reprimidos pelo poder do Estado.” 87
Note-se que não se trata apenas de crise de hegemonia, mas 
também do receio de que o poder burguês viesse a ser destroçado 
pelos trabalhadores. A burguesia francesa se achava atemorizada 
diante do aparecimento do proletariado como força política. Esse 
temor era tanto mais forte e real porquanto ela tinha a experiência 
recentíssima das lutas havidas nos anos 1848-50.37 38 Nem por isso, 
entretanto, o capitalismo francês deixou de desenvolver-se. Ao 
contrário, sob o Império de Luís Bonaparte, nos anos 1852-70, 
cresceu intensamente.
“Em realidade, era a única forma de governo possível, em um 
momento em que a burguesia havia perdido a faculdade de 
governar o país e a classe operária ainda não a havia adquirido. 
O Império foi aclamado no mundo inteiro como o salvador da 
sociedade. Sob a sua égide, a sociedade burguesa, livre de preo­
cupações políticas, conseguiu um desenvolvimento que nem ela 
mesma esperava. Sua indústria e seu comércio alcançaram 
proporções gigantescas; a especulação financeira realizou orgias 
cosmopolitas; a miséria das massas destacava-se sobre a osten­
tação desaforada de um luxo suntuoso, falso e abjeto. O 
poder do Estado, que aparentemente flutuava por sobre a socie­
dade, era na realidade o maior escândalo, autêntico viveiro de 
corrupção.” 39
37 Marx, K. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. p. 127.
33 Marx, K. As Lutas de Classes na França (1848 a 1850). Rio de Janeiro, 
Editorial Vitória, 1956; Les luttes de classes en France (1848-1850). Paris, 
Êditions Sociales, 1946.
39 Marx, K. La guerre civile en France. Paris, Êditions Sociales, 1953. 
p. 40-41.
34
acrescentar maior divisão do trabalho, que crescia na mesma 
proporção em que a divisão do trabalho dentro da sociedade 
burguesa criava novos grupos de interesses e, por conseguinte, 
novo material para a administração do Estado. Todo interesse 
comum era imediatamente cortado da sociedade, contraposto a 
ela como um interessesuperior, geral, retirado da atividade dos 
próprios membros da sociedade e transformado em objeto da 
atividade do governo, desde a ponte, o edifício da escola e pro­
priedade comunal de uma aldeia, até as estradas de ferro, a 
riqueza nacional e as universidades da França. Finalmente, em 
sua luta contra a revolução, a República parlamentar viu-se for­
çada a consolidar, juntamente com as medidas repressivas, os 
recursos e a centralização do poder governamental. Todas as 
revoluções aperfeiçoaram essa máquina, ao invés de destroçá-la. 
Os partidos que disputavam o poder encaravam a posse dessa 
imensa estrutura do Estado como o principal espólio do ven­
cedor.” 33
“Unicamente sob o segundo Bonaparte o Estado parece tornar- 
-se completamente autônomo. A máquina do Estado consolidou 
a tal ponto a sua posição em face da sociedade civil que lhe 
basta ter à frente o chefe da Sociedade de 10 de Dezembro, um 
aventureiro surgido de fora (. . .).” 34
“E, não obstante, o poder estatal não está suspenso no ar.” 35 
“Bonaparte gostaria de aparecer como benfeitor patriarcal de 
todas as classes. Mas não pode dar a uma classe sem tirar de 
outra”. 36
A partir de certo momento, o aparelho estatal está de tal 
forma constituído em sua composição, estrutura e concepção, que 
o chefe do governo pode ser um aventureiro, preposto ou membro 
de outra classe. A forma pela qual o poder estatal burguês se 
constitui o. toma intrínseca e necessariamente um órgão da bur­
guesia. Tanto assim que, nas ocasiões de crise de hegemonia, 
quando a própria burguesia ou alguma das suas facções não está 
em condições de exercer o poder, mesmo nessas ocasiões o Estado 
não deixa de exprimir-se em conformidade com as determinações
33 Marx, K. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. São Paulo, Ed. Escriba, 
1968. p. 130-31.
^Ibid. p. 131.
35 Ibid. p. 132.
™Ibid. p. 143.
35
básicas do regime. A crise de hegemonia está na base do golpe 
de Estado de 1852, por meio do qual se instaura o bonapartismo, 
como governo que aparentemente paira sobre todas as classes 
sociais.
“A burguesia conservava a França resfolegando de pavor ante 
os futuros terrores da anarquia vermelha. (...) A burguesia 
fez a apoteose da espada; a espada a domina. Destruiu a im­
prensa revolucionária; sua imprensa foi destruída. Colocou as 
reuniões populares sob a vigilância da polícia; seus.-salões estão 
sob a vigilância da polícia. (...) Reprimiu todos os movimentos 
da sociedade mediante o poder do Estado; tqdos os movimentos 
de sua sociedade são reprimidos pelo poder do Estado.” 87
Note-se que não se trata apenas de crise de hegemonia, mas 
também do receio de que o poder burguês viesse a ser destroçado 
pelos trabalhadores. A burguesia francesa se achava atemorizada 
diante do aparecimento do proletariado como força política. Esse 
temor era tanto mais forte e real porquanto ela tinha a experiência 
recentíssima das lutas havidas nos anos 1848-50.37 38 Nem por isso, 
entretanto, o capitalismo francês deixou de desenvolver-se. Ao 
contrário, sob o Império de Luís Bonaparte, nos anos 1852-70, 
cresceu intensamente.
“Em realidade, era a única forma de governo possível, em um 
momento em que a burguesia havia perdido a faculdade de 
governar o país e a classe operária ainda não a havia adquirido. 
O Império foi aclamado no mundo inteiro como o salvador da 
sociedade. Sob a sua égide, a sociedade burguesa, livre de preo­
cupações políticas, conseguiu um desenvolvimento que nem ela 
mesma esperava. Sua indústria e seu comércio alcançaram 
proporções gigantescas; a especulação financeira realizou orgias 
cosmopolitas; a miséria das massas destacava-se sobre a osten­
tação desaforada de um luxo suntuoso, falso e abjeto. O 
poder do Estado, que aparentemente flutuava por sobre a socie­
dade, era na realidade o maior escândalo, autêntico viveiro de 
corrupção.” 39
37 Marx, K. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. p. 127.
33 Marx, K. As Lutas de Classes na França (1848 a 1850). Rio de Janeiro, 
Editorial Vitória, 1956; Les luttes de classes en France (1848-1850). Paris, 
Êditions Sociales, 1946.
39 Marx, K. La guerre civile en France. Paris, Êditions Sociales, 1953. 
p. 40-41.
36
Como vemos, para Marx, o Estado é, ao mesmo tempo, 
constituído e constituinte nas relações de dependência, alienação 
e antagonismo, que estão na essência das relações capitalistas de 
produção. Por isso, Marx não reduziria o poder estatal a apenas 
uma das suas expressões, ainda que fundamental. A condição de 
órgão de classe é uma determinação básica, conferindo-lhe as 
condições essenciais de desenvolvimento e crise; mas não é a única 
nem aparece com exclusividade. O Estado é a “colossal superes­
trutura” da sociedade capitalista, ao mesmo tempo que o “poder 
organizado de uma classe” social, a burguesia, sobre as outras.
Na medida em que as relações de produção são, simulta­
neamente, relações de dependência, alienação e antagonismo, não 
podem ser preservadas, a não ser que uma das classes sociais seja 
hegemônica ou disponha de elementos para definir as estruturas e 
as atividades do aparelho estatal. Isto não impede, entretanto, 
que o Estado exprima, simultaneamente, os interesses da burguesia 
e alguns interesses de outras classes sociais. O que se verifica, em 
situações concretas, é que as classes são representadas diferencial­
mente no Estado burguês. Como se forma e aperfeiçoa à medida 
que se desenvolvem as forças produtivas e as relações de 
produção, o Estado burguês está constitutivamente organizado e 
orientado pelas exigências da acumulação capitalista. Não se pode 
dar a uma classe sem tirar de outra, da mesma forma que não 
se pode tirar tudo de uma classe, sob pena de extingui-la. É 
preciso ter em conta que o poder estatal varia conforme a conju­
gação das forças econômicas e políticas. Há ocasiões em que a 
burguesia monopoliza totalmente o aparelho estatal, como na 
ditadura; há ocasiões nas quais esse monopólio não pode exercer- 
-se de modo exclusivo, como na democracia burguesa. Às vezes 
a burguesia é obrigada a transigir, fazendo concessões à classe 
média ou, mesmo, ao proletariado. Além do mais, o movimento 
interno da sociedade capitalista gera, freqüentemente, descom- 
passos entre as forças políticas do proletariado, da classe média e 
da burguesia, na cidade e no campo, em suas relações internas e 
externas.
Já nos primeiros momentos do capitalismo, a burguesia 
ascendente tende a usar todo o poder do Estado para acelerar a 
reprodução do capital e, ao mesmo tempo, destruir ou incorporar 
os remanescentes do feudalismo. Desde a época da acumulação 
originária, o poder estatal surge vinculado à burguesia. Essa 
37
supremacia é facilitada pelo fato de que, na época, os trabalha­
dores estão sendo surpreendidos pelas transformações sociais que 
acompanham a expansão da mercantilização geral das relações, 
pessoas e coisas. Nessa época, está em curso a revolução burguesa.
“No transcurso da produção capitalista, desenvolve-se uma classe 
trabalhadora que, por educação, tradição e costume, aceita as 
exigências desse modo de produção como leis naturais evi­
dentes. A organização do processo de produção capitalista, em 
seu pleno desenvolvimento, quebra toda resistência;' a produção 
contínua de uma superpopulação relativa mantém a lei da oferta 
e da procura de trabalho e, portanto, o salárib’ em harmonia com 
as necessidades de expansão do capital; e a coação surda das 
relações econômicas consolida o domínio do capitalista sobre o 
trabalhador. Ainda se empregará a violência direta, à margem 
das leis econômicas, mas doravante apenas em caráter excepcio­
nal. Para a marcha natural das coisas, basta deixar o trabalhador 
‘ entregue às 'leis naturais da produção’, isto é, à sua dependência 
do capital, a qual decorre das próprias condições de produção, 
e é assegurada e perpetuada por essas condições. Mas, as coisas 
corriam de modo diverso durante a gênese histórica da produção 
capitalista. A burguesia nascente precisava e empregava a força 
do Estado,— Tel.: PBX 278-9322 (50 Ramais) 
C. Postal 8656 •— End. Telegráfico “Bomlivro” — S. Paulo
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
(por Octavio Ianni), 7
1. A PRODUÇÃO DA SOCIEDADE
1. Fundamentos da História, 45
2. Condições históricas da reprodução
social, 62
3. Características essenciais do
sistema capitalista, 74
4. Infra-estrutura e superestrutura, 82
II. CLASSES SOCIAIS E
CONTRADIÇÕES DE CLASSES
5. As classes sociais, 99
6. A estrutura de classes na Alemanha, 102
7. Classes sociais e bonapartismo, 110
8. O exército industrial de reserva, 125
9. Questionário sobre a situação
operária na França, 133
III. EXISTÊNCIA E CONSCIÊNCIA
10. A produção da consciência, 145
11. Fetichismo e reificação, 159
12. Ideologia e ciência. 173
13. Realidade social e pensamento, 177
IV. ESTADO E SOCIEDADE
14. Estado, sociedade civil e religião, 183
15. 0 cidadão, 195
16. A constituição, 199
17. 0 poder estatal, 203
ÍNDICE ANALÍTICO E ONOMÁSTICO, 211
© Textos para esta edição extraídos de:
Marx, K. Contribuição à Critica da Economia Política» São Paulo, Ed. Flama, 
1946.
Marx, K. El capital. México, Fondo de Cultura Económica, 1946-47.
Marx, K. La sagrada familia. México, Editorial Grijalbo, ,1959.
Marx, K. Miséria da Filosofia. Rio de Janeiro, Ed. Leitura, 1965.
Marx, K. O Capital. Trad. por Reginaldo SanfAnna. Rio de Janeiro, Ed. 
Civilização Brasileira, 1968.
Marx, K. O 18 Brumário e Cartas a Kugelmann. Rio de Janeiro, Ed. Paz e 
Terra, 1969.
Marx, K. Revolution and Cpunter-Revolution (of Germany in 1848). Londres, 
George Allen and Unrçv.ín, 1952.
Marx, K. Trabalho Assalariado e Capital. 2.a ed. Rio de Janeiro, Editorial 
Vitória, 1963.
Marx, K. e Engels, F. Escritos Econômicos Vários. México, Editorial Gri­
jalbo, 1962.
Marx, K. e Engels, F. Éidéologie allemande. Paris, Éditions Sociales, 1953. 
Marx, K. e Engels, F. Qbras escogidas* Moscou, Ediciones en Lenguas Ex- 
tranjeras, 1952.
Capa: Greve dos Metalúrgicos em Sao Paulo (1978).
INTRODUÇÃO
c
Octaviolanni
Professor de Sociologia no Curso de Pós-Graduação 
em Ciências Sociais (puc)
Membro do cebrap
12. Ideologia e ciência. 173
13. Realidade social e pensamento, 177
IV. ESTADO E SOCIEDADE
14. Estado, sociedade civil e religião, 183
15. 0 cidadão, 195
16. A constituição, 199
17. 0 poder estatal, 203
ÍNDICE ANALÍTICO E ONOMÁSTICO, 211
© Textos para esta edição extraídos de:
Marx, K. Contribuição à Critica da Economia Política» São Paulo, Ed. Flama, 
1946.
Marx, K. El capital. México, Fondo de Cultura Económica, 1946-47.
Marx, K. La sagrada familia. México, Editorial Grijalbo, ,1959.
Marx, K. Miséria da Filosofia. Rio de Janeiro, Ed. Leitura, 1965.
Marx, K. O Capital. Trad. por Reginaldo SanfAnna. Rio de Janeiro, Ed. 
Civilização Brasileira, 1968.
Marx, K. O 18 Brumário e Cartas a Kugelmann. Rio de Janeiro, Ed. Paz e 
Terra, 1969.
Marx, K. Revolution and Cpunter-Revolution (of Germany in 1848). Londres, 
George Allen and Unrçv.ín, 1952.
Marx, K. Trabalho Assalariado e Capital. 2.a ed. Rio de Janeiro, Editorial 
Vitória, 1963.
Marx, K. e Engels, F. Escritos Econômicos Vários. México, Editorial Gri­
jalbo, 1962.
Marx, K. e Engels, F. Éidéologie allemande. Paris, Éditions Sociales, 1953. 
Marx, K. e Engels, F. Qbras escogidas* Moscou, Ediciones en Lenguas Ex- 
tranjeras, 1952.
Capa: Greve dos Metalúrgicos em Sao Paulo (1978).
INTRODUÇÃO
c
Octaviolanni
Professor de Sociologia no Curso de Pós-Graduação 
em Ciências Sociais (puc)
Membro do cebrap
I
I
i ;
1# A produção da sociedade capitalista
C-
A análise do regime capitalista 
de produção não se restringe às 
relações econômicas, se bem que 
pareça iniciar-se nesse ponto. Ao 
analisar o capitalismo, Marx apa­
nha os fenômenos como fenômenos 
sociais totais, nos quais sobres­
saem o econômico e o político, 
como duas manifestações combi- 
nadas e mais importantes das re- 
lações entre pessoas, grupos e clas­
ses sociais. Por isso é que a sua. 
análise apanha sempre as estrutu­
ras de apropriação econômica e 
dominação política, em que ten­
dem a cristalizar-se aquelas rela­
ções e os antagonismos que com
elas se engendram. Desde a crítica da dialética hegeliana à análise 
da dominação inglesa na índia, todos os trabalhos de Marx são, 
fundamentalmente, de interpretação de como o modo capitalista 
de produção mercantiliza as relações, as pessoas e as coisas, em 
âmbito nacional e mundial, ao mesmo tempo que desenvolve as 
suas contradições.
Ao integrar criticamente as contribuições da Filosofia clás­
sica alemã, do socialismo utópico francês e da economia política 
clássica inglesa, Marx elaborou, simultaneamente, o método de
I
I
i ;
1# A produção da sociedade capitalista
C-
A análise do regime capitalista 
de produção não se restringe às 
relações econômicas, se bem que 
pareça iniciar-se nesse ponto. Ao 
analisar o capitalismo, Marx apa­
nha os fenômenos como fenômenos 
sociais totais, nos quais sobres­
saem o econômico e o político, 
como duas manifestações combi- 
nadas e mais importantes das re- 
lações entre pessoas, grupos e clas­
ses sociais. Por isso é que a sua. 
análise apanha sempre as estrutu­
ras de apropriação econômica e 
dominação política, em que ten­
dem a cristalizar-se aquelas rela­
ções e os antagonismos que com
elas se engendram. Desde a crítica da dialética hegeliana à análise 
da dominação inglesa na índia, todos os trabalhos de Marx são, 
fundamentalmente, de interpretação de como o modo capitalista 
de produção mercantiliza as relações, as pessoas e as coisas, em 
âmbito nacional e mundial, ao mesmo tempo que desenvolve as 
suas contradições.
Ao integrar criticamente as contribuições da Filosofia clás­
sica alemã, do socialismo utópico francês e da economia política 
clássica inglesa, Marx elaborou, simultaneamente, o método de
alice alcantara
.
8
análise e a interpretação do capitalismo.1 Este é um aspecto 
essencial do pensamento de Marx: o materialismo dialético e o 
niaterialismo histórico são os dois elementos principais e conju­
gados do mesmo processo teórico-prático de reflexão sobre o 
capitalismo. Na obra de Marx, o capitalismo é levado a pensar-se 
a si mesmo, de maneira global e como um modo fundamental­
mente antagônico de desenvolvimento histórico. Da mesma forma 
que o modo capitalista de produção, a dialética marxista funda-se 
nas relações de antagonismo. O princípio da contradição governa 
o modo de pensar e o modo de ser. Mesmo porque, ambos são 
manifestações da mesma época histórica. As relações de antago­
nismo ocorrem em todas as épocas históricas, aparecem em todos 
os modos de produção. Em cada época, no entanto, adquirem 
configurações particulares. Em cada época, as determinações 
econômicas, políticas, religiosas ou outras organizam-se e deter­
minam-se reciprocamente de modo diverso. No capitalismo, os 
antagonismos fundados nas relações econômicas adquirem preemi­
nência sobre todos os outros, enquanto determinação estrutural.
Em essência, o capitalismo é um sistema de mercantilização 
universal e de produção de mais-váliaT ^Ele^mércantilizá~ás 
relações, as pessoas ê as coisas. Ao mesmo tempo,^ol^ mercah- 
tiliza a força de trabalho, a energia humana que produz valor. 
Por isso mesmo, transforma as próprias pessoas em mercadorias, 
tornando-as adjetivas de sua força de trabalho. Vejamos o que 
diz Marx, num dós últimos capítulos de O Capital, ao chamar a 
atenção para duas categorias básicas do regime. Como categorias 
dialéticas, elas exprimem determinações essenciais do regime.
“Desde o primeiro instante, são duas as características que dis­
tinguem o modo capitalista de produção.
Primeira. Ele produz os seus produtos como mercadorias. O 
fato de que produz mercadorias não o distingue de outros modos 
de produção; o que o distingue é a circunstância de que o ser 
mercadoria constitui o caráter dominante e determinante dos seus 
produtos. Isto implica, antes de tudo, o fato de que o próprio 
operário somente aparece como vendedor de mercadorias, ou 
seja, como trabalhador livre assalariado, de tal maneira quepara 'regular’ ocertas atividades produtivas 
sejam desempenhadas por crianças ou mulheres. Tomara-se ine­
vitável que o poder estatal formulasse e pusesse em prática uma 
legislação fabril, para a “proteção física e espiritual da classe 
operária”. 42
“A legislação fabril, essa primeira reação consciente e sistemática 
da sociedade contra a marcha espontânea do processo de pro-
Marx, K. El capital, t. I, p. 472; O Capital, liv. 1, p. 490-91. 
e econômica, na qual 
a classe dominante ou uma das suas facções mais ativas perde o 
controle do aparelho estatal e é obrigada a comparti-lo formal­
mente com outras classes. Ou, então, essa aparente independência 
se manifesta, quando uma facção da classe dominante já não tem 
força suficiente para manter o poder, mas não surge outra capaz 
de substituí-la.
Na época de formação do capitalismo industrial, na transição 
da sociedade feudal à capitalista, também surgem situações que 
conferem ao poder estatal em formação essa aparência de auto­
nomia. Isso ocorria na Alemanha contemporânea da Revolução 
Francesa e da Revolução Industrial inglesa. Nessa época, os 
burgueses alemães não estavam ainda em condições de se oporem 
à supremacia dos holandeses, para defenderem os seus interesses 
econômicos. Faltavam-lhes as condições econômicas para reali­
zarem a organização política indispensável à defesa e à expansão 
dos seus interesses de classe. Esse foi o contexto em que o Estado 
adquiriu a aparência de autonomia.
“Como poderia surgir a convergência política num país em que 
faltavam todas as condições econômicas para isso? A impotência 
de cada um dos setores da vida (não se pode ainda falar de 
estamentos nem classes, mas no máximo de estamentos pretéritos 
e de classes futuras) não permitia a nenhum deles conquistar a 
hegemonia exclusiva. Disso decorria a conseqüência necessária de 
que — durante a época da monarquia absoluta, que aqui adquiria 
a forma mais raquítica, uma forma semipatriarcal — aquele.setor 
especial, que, na divisão do trabalho, coube à administração dos 
interesses públicos, adquirisse uma anormal independência, que 
se tornou ainda maior com a burocracia moderna. O Estado se
41
constituiu, assim, como um poder em aparência independente, 
posição esta que, em outros países, foi apenas transitória, uma 
fase de transição.” 44
Enquanto categoria dialética, pois, o Estado adquire os con­
tornos, a estrutura e os movimentos que se lhe produzem nas 
relações com as classes constituídas ou em constituição. Ocorre 
que o poder estatal , é o núcleo de convergência das relações de 
interdependência, alienação e antagonismo que caracterizam a 
produção capitalista. Por isso ele se configura .segundo, as 
determinações das relações capitalistas concretas, isto é, conforme 
a situação específica deste ou daquele país,civil, em conjunto, como com cada uma 
das classes sociais. No percurso dessa análise, surgem as relações, 
os processos e as estruturas, de par em par com as pessoas, os 
grupos e as classes sociais, uns e outros encadeados no conjunto 
do regime capitalista de produção, em vigor em dado país e época. 
A análise dialética do Estado capitalista, portanto, deve revelar, 
sob uma luz especial, a forma pela qual se organizam as forças 
produtivas, as relações de produção, ou seja, as classes sociais, 
em seus movimentos e antagonismos.
A verdade é que a mercantilização universal das relações, 
pessoas e coisas implica, também, na generalização de estruturas 
burguesas de poder aos vários países. Algumas' dessas estruturas 
são a expressão indispensável das relações de alienação e antago­
nismo que caracterizam o processo de produção de mais-valia. Ao 
comparar uns e outros países, tendo em conta os diversos graus
44 Marx, K. e Engels, F. La ideologia alemana. p. 213-14.
42
de desenvolvimento das suas forças produtivas e relações de 
produção, evidencia-se que o poder estatal burguês guarda algumas 
significações essenciais comuns, além das peculiaridades de cada 
país.
“A despeito da matizada diversidade de suas formas, os distintos 
Estados dos distintos países civilizados têm em comum o' fato de 
que todos se apoiam nas bases da sociedade burguesa moderna, 
ainda que, em alguns lugares, ela se ache mais desenvolvida do 
que em outros, no sentido capitalista. Têm, portanto, certos ca­
racterísticos essenciais comuns.” 40
Mas a análise marxista do Estado capitalista não se completa 
a não ser quando se delineiam as condições do seu declínio ou 
crise final. Vimos que o Estado é a expressão mais acabada daS 
relações que caracterizam o capitalismo. É na esfera do Estado 
que as relações de alienação e antagonismo das classes sociais 
adquirem plena concretividade e se resolvem. A crise do Estado 
burguês é a conseqüência necessária do agravamento das contra­
dições de classes, contradições essas nas quais o proletariado e a 
burguesia são as duas classes substantivas. Na luta contra a 
burguesia, o proletariado lutará para conquistar e destruir o poder 
estatal, já que este se constitui no núcleo essencial das relações 
e estruturas de apropriação e dominação do regime. A Comuna 
de Paris foi a primeira, manifestação do que poderia ser o Estado 
proletário, em contraposição ao. Estado burguês. Para concretizar- 
-se, o poder operário começou por suprimir relações e estruturas 
jurídico-políticas e burocráticas que exprimiam prática e simbo­
licamente o poder burguês. Para instaurar a “ditadura do prole­
tariado”, que é a condição básica para a transição à “sociedade 
sem classes”, torna-se indispensável suprimir as relações e as 
estruturas preexistentes. Isto significa suprimir a “colossal super­
estrutura” do edifício do Estado capitalista. 45 46
45 Marx, K. “Gloses marginales au programme du parti ouvrier allemand.” 
In: Marx, K. e Engels, F. Critique des programmes de Gotha et d*Erfurt. 
Paris, Éditions Sociales, 1950. p. 33-34. Ainda, sobre a concepção do Estado 
capitalista, consultar: Marx, K. “La sociedad burguesa y la Revolución 
Comunista.” In: Marx, K. e Engels, F. La ideologia ale mana. p. 632.
46 Marx, K. “Marx to J. Weydemeyer in New York”; La guerre civile en 
Francey “Gloses marginales au programme du parti ouvrier allemand”.
LA PRODUÇÃO 
DA SOCIEDÂDE
42
de desenvolvimento das suas forças produtivas e relações de 
produção, evidencia-se que o poder estatal burguês guarda algumas 
significações essenciais comuns, além das peculiaridades de cada 
país.
“A despeito da matizada diversidade de suas formas, os distintos 
Estados dos distintos países civilizados têm em comum o' fato de 
que todos se apoiam nas bases da sociedade burguesa moderna, 
ainda que, em alguns lugares, ela se ache mais desenvolvida do 
que em outros, no sentido capitalista. Têm, portanto, certos ca­
racterísticos essenciais comuns.” 40
Mas a análise marxista do Estado capitalista não se completa 
a não ser quando se delineiam as condições do seu declínio ou 
crise final. Vimos que o Estado é a expressão mais acabada daS 
relações que caracterizam o capitalismo. É na esfera do Estado 
que as relações de alienação e antagonismo das classes sociais 
adquirem plena concretividade e se resolvem. A crise do Estado 
burguês é a conseqüência necessária do agravamento das contra­
dições de classes, contradições essas nas quais o proletariado e a 
burguesia são as duas classes substantivas. Na luta contra a 
burguesia, o proletariado lutará para conquistar e destruir o poder 
estatal, já que este se constitui no núcleo essencial das relações 
e estruturas de apropriação e dominação do regime. A Comuna 
de Paris foi a primeira, manifestação do que poderia ser o Estado 
proletário, em contraposição ao. Estado burguês. Para concretizar- 
-se, o poder operário começou por suprimir relações e estruturas 
jurídico-políticas e burocráticas que exprimiam prática e simbo­
licamente o poder burguês. Para instaurar a “ditadura do prole­
tariado”, que é a condição básica para a transição à “sociedade 
sem classes”, torna-se indispensável suprimir as relações e as 
estruturas preexistentes. Isto significa suprimir a “colossal super­
estrutura” do edifício do Estado capitalista. 45 46
45 Marx, K. “Gloses marginales au programme du parti ouvrier allemand.” 
In: Marx, K. e Engels, F. Critique des programmes de Gotha et d*Erfurt. 
Paris, Éditions Sociales, 1950. p. 33-34. Ainda, sobre a concepção do Estado 
capitalista, consultar: Marx, K. “La sociedad burguesa y la Revolución 
Comunista.” In: Marx, K. e Engels, F. La ideologia ale mana. p. 632.
46 Marx, K. “Marx to J. Weydemeyer in New York”; La guerre civile en 
Francey “Gloses marginales au programme du parti ouvrier allemand”.
LA PRODUÇÃO 
DA SOCIEDÂDE
1. FUNDAMENTOS DA HISTÓRIA *
i
c
As condições prévias das quais partimos não são bases arbitrárias 
ou dogmas; são bases reais, que só podemos abstrair em imaginação. 
São os indivíduos reais, sua ação e suas condições materiais de existên­
cia, as que encontraram já prontas, como também aquelas que nasceram 
de sua própria ação. Essas bases são, portanto, verificáveis através de 
um meio puramente empírico.
A condição primeira de toda história humana é, naturalmente, a 
existência de seres humanos vivos. O primeiro estado real a constatar 
é3 portanto, o patrimônio corporal desses indivíduos e as relações que 
esse patrimônio desenvolve com o resto da Natureza. Não podemos, 
naturalmente, fazer aqui um estudo aprofundado da própria constituição 
física do Homem, nem das condições naturais que os homens encon­
traram já prontas: condições geológicas, orográficas, hidrográficas, 
climáticas e outras. Toda história deve partir dessas bases naturais e 
de sua modificação, através da ação dos homens, no curso da História.
Pode-se distinguir os homens dos animais, pela consciência, pela 
religião e por tudo o mais que se queira. Eles mesmos começam a se 
distinguir dos animais desde que principiam a produzir os seus meios 
de existência, um passo adiante e consequência de sua organização 
corporal. Ao produzir os seus meios de existência, os homens produzem 
indiretamente a sua própria vida material.
A maneira pela qual os homens produzem os seus meios de exis­
tência depende, primeiramente, da natureza dos meios de existência
* Reproduzido de Marx, K. e Engels, F. “Feuerbach.” In: L‘idéologie allemande. 
Paris, Éditions Sociales, 1953. p. 11-28. Àpiid Ianni, O. Teorias de Estratifi­
cação Social. Trad. por Wilma Kovesí. São Paulo, Cia. Ed. Nacional, 1972, 
p. 67-83.
1. FUNDAMENTOS DA HISTÓRIA *
i
c
As condições prévias das quais partimos não são bases arbitrárias 
ou dogmas; são bases reais, que só podemos abstrair em imaginação. 
São os indivíduos reais, sua ação e suas condições materiais de existên­
cia, as que encontraram já prontas, como também aquelas que nasceram 
de sua própria ação. Essas bases são, portanto,verificáveis através de 
um meio puramente empírico.
A condição primeira de toda história humana é, naturalmente, a 
existência de seres humanos vivos. O primeiro estado real a constatar 
é3 portanto, o patrimônio corporal desses indivíduos e as relações que 
esse patrimônio desenvolve com o resto da Natureza. Não podemos, 
naturalmente, fazer aqui um estudo aprofundado da própria constituição 
física do Homem, nem das condições naturais que os homens encon­
traram já prontas: condições geológicas, orográficas, hidrográficas, 
climáticas e outras. Toda história deve partir dessas bases naturais e 
de sua modificação, através da ação dos homens, no curso da História.
Pode-se distinguir os homens dos animais, pela consciência, pela 
religião e por tudo o mais que se queira. Eles mesmos começam a se 
distinguir dos animais desde que principiam a produzir os seus meios 
de existência, um passo adiante e consequência de sua organização 
corporal. Ao produzir os seus meios de existência, os homens produzem 
indiretamente a sua própria vida material.
A maneira pela qual os homens produzem os seus meios de exis­
tência depende, primeiramente, da natureza dos meios de existência
* Reproduzido de Marx, K. e Engels, F. “Feuerbach.” In: L‘idéologie allemande. 
Paris, Éditions Sociales, 1953. p. 11-28. Àpiid Ianni, O. Teorias de Estratifi­
cação Social. Trad. por Wilma Kovesí. São Paulo, Cia. Ed. Nacional, 1972, 
p. 67-83.
46
já dados e que precisam ser reproduzidos. Não_se_deve considerar essa 
modalidade de produção sob esse único ponto de vista, apenas como 
a reprodução da existência física dos indivíduos. Em verdade já 
representa um modo determinado da atividade desses indivíduos, ou 
maneira determinada de manifestar a sua vida, um modo de vida deter­
minado. 5 A maneira pela qual os indivíduos manifestam a sua vida 
reflete muito exatamente o que são. O que eles são coincide, portanto, 
com a sua produção, tanto com o que produzem quanto com a maneira 
pela qual o produzem. O que os indivíduos são depende, portanto, das 
condições materiais de sua produção.^
Esta produção só aparece com o crescimento da população. Ela 
mesma pressupõe de sua parte relações dos indivíduos entre si. A 
forma dessas relações é, por sua vez, condicionada pela produção.
As relações entre as diferentes nações dependem do estágio do 
desenvolvimento em que cada uma delas se encontra, no que se refere 
às forças produtivas, à divisão do trabalho e às relações internas. Esse 
princípio é universalmente reconhecido. No entanto, não somente as 
relações de uma nação com as outras nações, mas também toda a estru­
tura interna dessa própria nação, dependem do nível de desenvolvimento 
de sua produção e de suas relações internas e externas. Podemos reco­
nhecer, de modo bastante claro, o grau de desenvolvimento atingido 
pelas forças produtivas de uma nação pelo nível de desenvolvimento 
atingido pelas suas forças produtivas, pelo nível de desenvolvimento 
atingido pela divisão do trabalho. Na medida em que esta não é uma 
simples extensão quantitativa das forças produtivas conhecidas (cultivo 
de terras virgens, por exemplo), toda nova força de produção provoca, 
em consequência, um novo aperfeiçoamento da divisão do trabalho.
A divisão do trabalho no interior de uma'nação,. acarreta, primei- 
ramente, a separação do trabalho industrial e comercial, por um lado, 
e do trabalho agrícola, por outro. Ássim sendo, provoca á separação 
entre a cidade e o campo, e a oposição dos seus interesses. O seu 
desenvolvimento ulterior acentua a separação do trabalho comercial e 
do trabalho industrial. Ao mesmo tempo, devido à divisão do trabalho 
no interior dos diferentes setores, desenvolvem-se, por sua vez, dife­
rentes subdivisões, dentre os indivíduos que cooperam em trabalhos 
determinados. A posição dessas subdivisões particulares, umas em 
relação às outras, é condicionada pela modalidade de exploração do 
trabalho agrícola, industrial e comercial (patriarcado, escravatura, 
ordens e classes). As mesmas analogias aparecem quando os inter­
câmbios são mais desenvolvidos, nas relações entre as diversas nações.
47
Os diversos estágios do desenvolvimento da divisão do trabalho 
representam igual número de diferentes formas de propriedade. Em 
outros termos, -cada novo estágio da divisão do trabalho determina, ao 
mesmo tempo, relações dos indivíduos entre si, no tocante às coisas, 
instrumentos e produtos do trabalho.
A primeira forma da propriedade é a propriedade da tribo. Ela 
corresponde a esse estágio rudimentar da produção, quando um povo 
se alimenta da caça e da pesca, da criação de gado ou, a rigor,, da agrP 
cultura. Neste caso, supõe-se uma grande quantidade de terras incultas. 
Nesse estágio, a divisão do trabalho é ainda muito pouco desenvolvida" 
e se limita a maior extensão da divisão natural do trafealho que a ofere­
cida pela família. A estrutura social se limita, portanto, a uma extensão 
da família: chefes da tribo patriarcal, tendo abaixo de si os membros 
da tribo e, finalmente, os escravos. A escravatura latente na família 
somente se desenvolve aos poucos com o aumento da população e das 
necessidades e, também, com a ampliação das relações externas, tanto 
pela guerra como pela troca.
A segunda forma da propriedade é a propriedade antiga,.proprie­
dade comunal e propriedade do Estado, resultante sobretudo da reunião 
de várias tribos numa só cidade, por contrato ou conquista, onde 
subsiste a escravatura. Ao lado da propriedade comunal, a propriedade 
privada, de bens móveis e mais tarde imóveis, já se desenvolve, mas sob 
uma forma anormal, e subordinada à propriedade comunal. Os cidadãos 
não têm plenos poderes sobre os seus escravos, que trabalham em sua 
comunidade, o que já os liga à forma da propriedade comunal. É a 
propriedade privada e em comum dos cidadãos ativos, os quais, face 
aos escravos, são obrigados a permanecer nessa forma natural de 
associação. É por essa razão que toda a estrutura social baseada nessa 
forma e, juntamente com ela, o poder dó povo, se desagregam à medida 
que se desenvolve a propriedade privada imobiliária. A divisão do tra­
balho já está mais adiantada. Já se encontra a oposição entre a cidade 
e o campo e, mais tarde, a oposição entre os Estados representantes do 
interesse das cidades e aqueles representantes do interesse do campo. 
E no interior das próprias cidades, encontra-se a oposição entre o 
comércio marítimo e a indústria. As relações de classe entre cidadãos 
e escravos atingem o seu completo desenvolvimento.
O fato da conquista parece estar em contradição a toda esta 
concepção de história. Até o presente, encarou-se a violência, a guerra, 
a pilhagem, o banditismo, etc., como a força motriz da história. É 
necessário que nos limitemos aqui aos pontos capitais, razão pela qual 
46
já dados e que precisam ser reproduzidos. Não_se_deve considerar essa 
modalidade de produção sob esse único ponto de vista, apenas como 
a reprodução da existência física dos indivíduos. Em verdade já 
representa um modo determinado da atividade desses indivíduos, ou 
maneira determinada de manifestar a sua vida, um modo de vida deter­
minado. 5 A maneira pela qual os indivíduos manifestam a sua vida 
reflete muito exatamente o que são. O que eles são coincide, portanto, 
com a sua produção, tanto com o que produzem quanto com a maneira 
pela qual o produzem. O que os indivíduos são depende, portanto, das 
condições materiais de sua produção.^
Esta produção só aparece com o crescimento da população. Ela 
mesma pressupõe de sua parte relações dos indivíduos entre si. A 
forma dessas relações é, por sua vez, condicionada pela produção.
As relações entre as diferentes nações dependem do estágio do 
desenvolvimento em que cada uma delas se encontra, no que se refere 
às forças produtivas, à divisão do trabalho e às relações internas. Esse 
princípio é universalmente reconhecido. No entanto, não somente as 
relações de uma nação com as outras nações, mas também toda aestru­
tura interna dessa própria nação, dependem do nível de desenvolvimento 
de sua produção e de suas relações internas e externas. Podemos reco­
nhecer, de modo bastante claro, o grau de desenvolvimento atingido 
pelas forças produtivas de uma nação pelo nível de desenvolvimento 
atingido pelas suas forças produtivas, pelo nível de desenvolvimento 
atingido pela divisão do trabalho. Na medida em que esta não é uma 
simples extensão quantitativa das forças produtivas conhecidas (cultivo 
de terras virgens, por exemplo), toda nova força de produção provoca, 
em consequência, um novo aperfeiçoamento da divisão do trabalho.
A divisão do trabalho no interior de uma'nação,. acarreta, primei- 
ramente, a separação do trabalho industrial e comercial, por um lado, 
e do trabalho agrícola, por outro. Ássim sendo, provoca á separação 
entre a cidade e o campo, e a oposição dos seus interesses. O seu 
desenvolvimento ulterior acentua a separação do trabalho comercial e 
do trabalho industrial. Ao mesmo tempo, devido à divisão do trabalho 
no interior dos diferentes setores, desenvolvem-se, por sua vez, dife­
rentes subdivisões, dentre os indivíduos que cooperam em trabalhos 
determinados. A posição dessas subdivisões particulares, umas em 
relação às outras, é condicionada pela modalidade de exploração do 
trabalho agrícola, industrial e comercial (patriarcado, escravatura, 
ordens e classes). As mesmas analogias aparecem quando os inter­
câmbios são mais desenvolvidos, nas relações entre as diversas nações.
47
Os diversos estágios do desenvolvimento da divisão do trabalho 
representam igual número de diferentes formas de propriedade. Em 
outros termos, -cada novo estágio da divisão do trabalho determina, ao 
mesmo tempo, relações dos indivíduos entre si, no tocante às coisas, 
instrumentos e produtos do trabalho.
A primeira forma da propriedade é a propriedade da tribo. Ela 
corresponde a esse estágio rudimentar da produção, quando um povo 
se alimenta da caça e da pesca, da criação de gado ou, a rigor,, da agrP 
cultura. Neste caso, supõe-se uma grande quantidade de terras incultas. 
Nesse estágio, a divisão do trabalho é ainda muito pouco desenvolvida" 
e se limita a maior extensão da divisão natural do trafealho que a ofere­
cida pela família. A estrutura social se limita, portanto, a uma extensão 
da família: chefes da tribo patriarcal, tendo abaixo de si os membros 
da tribo e, finalmente, os escravos. A escravatura latente na família 
somente se desenvolve aos poucos com o aumento da população e das 
necessidades e, também, com a ampliação das relações externas, tanto 
pela guerra como pela troca.
A segunda forma da propriedade é a propriedade antiga,.proprie­
dade comunal e propriedade do Estado, resultante sobretudo da reunião 
de várias tribos numa só cidade, por contrato ou conquista, onde 
subsiste a escravatura. Ao lado da propriedade comunal, a propriedade 
privada, de bens móveis e mais tarde imóveis, já se desenvolve, mas sob 
uma forma anormal, e subordinada à propriedade comunal. Os cidadãos 
não têm plenos poderes sobre os seus escravos, que trabalham em sua 
comunidade, o que já os liga à forma da propriedade comunal. É a 
propriedade privada e em comum dos cidadãos ativos, os quais, face 
aos escravos, são obrigados a permanecer nessa forma natural de 
associação. É por essa razão que toda a estrutura social baseada nessa 
forma e, juntamente com ela, o poder dó povo, se desagregam à medida 
que se desenvolve a propriedade privada imobiliária. A divisão do tra­
balho já está mais adiantada. Já se encontra a oposição entre a cidade 
e o campo e, mais tarde, a oposição entre os Estados representantes do 
interesse das cidades e aqueles representantes do interesse do campo. 
E no interior das próprias cidades, encontra-se a oposição entre o 
comércio marítimo e a indústria. As relações de classe entre cidadãos 
e escravos atingem o seu completo desenvolvimento.
O fato da conquista parece estar em contradição a toda esta 
concepção de história. Até o presente, encarou-se a violência, a guerra, 
a pilhagem, o banditismo, etc., como a força motriz da história. É 
necessário que nos limitemos aqui aos pontos capitais, razão pela qual 
tomamos um único exemplo marcante, que é o da destruição de uma 
antiga civilização por um povo bárbaro e a formação de uma nova 
estrutura social que a ela se reúne e principia da estaca zero. (Roma 
e os bárbaros, o feudalismo e a Gália, o Império Bizantino e os turcos.) 
Entre os conquistadores bárbaros, a própria guerra já é, como indicamos 
acima, uma forma normal de relações, explorada com tanto mais zelo 
porque o crescimento da população cria, de maneira mais imperiosa, 
a necessidade de novos meios de produção, considerando-se a modali­
dade de produção tradicional e rudimentar que é para eles a única 
possível. Por outro lado, na Itália, assiste-se à concentração da pro­
priedade rural, cuja causa, além do endividamento, foi a herança; pois 
a extrema dissolução dos costumes e a raridade dos casamentos provo­
caram a extinção progressiva das antigas famílias, tendo os seus bens 
caído em mãos de uns poucos. Outrossim, essa propriedade rural foi 
transformada em. pastagens, transformação provocada (fora das causas 
econômicas comuns válidas ainda em nossos dias) pela importação de 
cereais pilhados ou obtidos a título de tributo e, também, pela conse­
quente carência de consumidores de trigo italiano. Como resultado 
dessas circunstâncias, a população livre tinha desaparecido quase por 
completo. E os próprios escravos, em vias de se extinguirem, precisa­
vam ser constantemente substituídos. A escravatura permaneceu 
a base de toda a produção. Os plebeus, situados entre os homens livres 
e os escravos, jamais conseguiram elevar-se acimlFTa condição do 
Lumpenproletariat. Outrossim, Roma jamais ultrapassou o estágio da 
cidade e estava ligada às províncias através de laços. quase que unica­
mente políticos, os quais, como fenômenos, podiam, naturalmente, ser 
rompidos por sua vez.
Com o desenvolvimento da propriedade privada, surgem", pela 
.primeira vez, as relações que reencontraremos na propriedade privada 
moderna, embora numa escala mais vasta. Por um lado, a concentração 
da propriedade privada, iniciada muito cedo em Roma, como o prova 
a lei agrária de Licínio, progrediu rapidamente depois das guerras civis, 
sobretudo sob o Império. Por outro lado, ligando-se a tudo isso, a 
transformação dos pequenos camponeses plebeus num proletariado cuja 
situação intermediária, entre os cidadãos proprietários e os escravos, 
impediu para sempre um desenvolvimento independente.
A terceira forma é a propriedade feudal ou por ordens. Enquanto 
a Antigüidade partia da cidade e. do seu pequeno território, a Idade 
Média partia do campo. A população existente, espalhada e dispersa’ 
sobre uma vasta superfície, parada qual os conquistadores não foram 
49
uma contribuição digna de nota, condicionou* essa mudança do ponto 
de partida. Em oposição à Grécia e Roma, o desenvolvimento feudal 
principia, portanto, sobre um campo bem mais extenso, preparado pelas 
conquistas romanas e pela extensão da agricultura, que delas dependeu 
no início. Os últimos séculos do Império Romano em decadência e 
a conquista dos próprios bárbaros anularam a massa de forças produ­
tivas: a agricultura havia declinado; a indústria, caído em decadência, 
por falta de escoamento; o comércio, estagnado, ou interrompido pela 
violência; a população, tanto a rural como a urbana, tinha diminuído. 
Esse estado de coisas e a modalidade de organização da conquista que 
disso decorreu, desenvolveram a propriedade feudal, sob a influência da 
constituição do exército germânico. Como a propriedade da tribo e a, 
da comuna, a propriedade feudal repousa, por sua vez, sobre uma 
comunidade na qual não são mais os escravos, como no sistema antigo, 
mas os pequenos camponeses avassalados que se erguem como classe 
diretamente produtora. Paralelamente ao desenvolvimento completo do 
feudalismoapareceu, por outro lado, a oposição às cidades. A estrutura 
hierárquica da propriedade imobiliária e as escoltas armadas, surgidas de 
par com ela, conferiram à nobreza a onipotência sobre os servos. Essa 
estrutura feudal, exatamente como a antiga propriedade comunal, era 
uma associação contra a classe produtora dominada. Entretanto, a 
forma de associação e as relações" com os produtores eram diferentes, 
porque as condições de produção eram, diferentes.
A essa estrutura feudal da propriedade imobiliária correspondia, 
nas cidades, a propriedade corporativa, organização feudal da profissão. 
Aqui, a propriedade consistia principalmente no trabalho de cada 
indivíduo. Mas a necessidade da associação contra a nobreza espolia- 
tiva, a necessidade de mercados cobertos comuns numa época em que 
o industrial fazia as vezes de comerciante, a crescente concorrência dos 
servos que se evadiam em massa em direção às cidades prósperas, a 
estrutura feudal em cada região fizeram nascer as corporações. Assim, 
os pequenos capitais economizados aos poucos por artesãos isolados, e 
o invariável número destes numa população incessantemente aumentada, 
desenvolveram as condições de artesão e de aprendiz, fazendo com que 
nascesse nas cidades uma hierarquia semelhante à do campo.
A propriedade principal consistia, portanto, durante a época feu­
dal, por um lado, na propriedade imobiliária, à qual está ligado o 
trabalho dos servos, e por outro, no trabalho pessoal com pequeno 
capital regendo o trabalho dos artesãos. A estrutura de uma e outra 
forma era condicionada pelos limitados lucros de produção, pela cultura 
tomamos um único exemplo marcante, que é o da destruição de uma 
antiga civilização por um povo bárbaro e a formação de uma nova 
estrutura social que a ela se reúne e principia da estaca zero. (Roma 
e os bárbaros, o feudalismo e a Gália, o Império Bizantino e os turcos.) 
Entre os conquistadores bárbaros, a própria guerra já é, como indicamos 
acima, uma forma normal de relações, explorada com tanto mais zelo 
porque o crescimento da população cria, de maneira mais imperiosa, 
a necessidade de novos meios de produção, considerando-se a modali­
dade de produção tradicional e rudimentar que é para eles a única 
possível. Por outro lado, na Itália, assiste-se à concentração da pro­
priedade rural, cuja causa, além do endividamento, foi a herança; pois 
a extrema dissolução dos costumes e a raridade dos casamentos provo­
caram a extinção progressiva das antigas famílias, tendo os seus bens 
caído em mãos de uns poucos. Outrossim, essa propriedade rural foi 
transformada em. pastagens, transformação provocada (fora das causas 
econômicas comuns válidas ainda em nossos dias) pela importação de 
cereais pilhados ou obtidos a título de tributo e, também, pela conse­
quente carência de consumidores de trigo italiano. Como resultado 
dessas circunstâncias, a população livre tinha desaparecido quase por 
completo. E os próprios escravos, em vias de se extinguirem, precisa­
vam ser constantemente substituídos. A escravatura permaneceu 
a base de toda a produção. Os plebeus, situados entre os homens livres 
e os escravos, jamais conseguiram elevar-se acimlFTa condição do 
Lumpenproletariat. Outrossim, Roma jamais ultrapassou o estágio da 
cidade e estava ligada às províncias através de laços. quase que unica­
mente políticos, os quais, como fenômenos, podiam, naturalmente, ser 
rompidos por sua vez.
Com o desenvolvimento da propriedade privada, surgem", pela 
.primeira vez, as relações que reencontraremos na propriedade privada 
moderna, embora numa escala mais vasta. Por um lado, a concentração 
da propriedade privada, iniciada muito cedo em Roma, como o prova 
a lei agrária de Licínio, progrediu rapidamente depois das guerras civis, 
sobretudo sob o Império. Por outro lado, ligando-se a tudo isso, a 
transformação dos pequenos camponeses plebeus num proletariado cuja 
situação intermediária, entre os cidadãos proprietários e os escravos, 
impediu para sempre um desenvolvimento independente.
A terceira forma é a propriedade feudal ou por ordens. Enquanto 
a Antigüidade partia da cidade e. do seu pequeno território, a Idade 
Média partia do campo. A população existente, espalhada e dispersa’ 
sobre uma vasta superfície, parada qual os conquistadores não foram 
49
uma contribuição digna de nota, condicionou* essa mudança do ponto 
de partida. Em oposição à Grécia e Roma, o desenvolvimento feudal 
principia, portanto, sobre um campo bem mais extenso, preparado pelas 
conquistas romanas e pela extensão da agricultura, que delas dependeu 
no início. Os últimos séculos do Império Romano em decadência e 
a conquista dos próprios bárbaros anularam a massa de forças produ­
tivas: a agricultura havia declinado; a indústria, caído em decadência, 
por falta de escoamento; o comércio, estagnado, ou interrompido pela 
violência; a população, tanto a rural como a urbana, tinha diminuído. 
Esse estado de coisas e a modalidade de organização da conquista que 
disso decorreu, desenvolveram a propriedade feudal, sob a influência da 
constituição do exército germânico. Como a propriedade da tribo e a, 
da comuna, a propriedade feudal repousa, por sua vez, sobre uma 
comunidade na qual não são mais os escravos, como no sistema antigo, 
mas os pequenos camponeses avassalados que se erguem como classe 
diretamente produtora. Paralelamente ao desenvolvimento completo do 
feudalismo apareceu, por outro lado, a oposição às cidades. A estrutura 
hierárquica da propriedade imobiliária e as escoltas armadas, surgidas de 
par com ela, conferiram à nobreza a onipotência sobre os servos. Essa 
estrutura feudal, exatamente como a antiga propriedade comunal, era 
uma associação contra a classe produtora dominada. Entretanto, a 
forma de associação e as relações" com os produtores eram diferentes, 
porque as condições de produção eram, diferentes.
A essa estrutura feudal da propriedade imobiliária correspondia, 
nas cidades, a propriedade corporativa, organização feudal da profissão. 
Aqui, a propriedade consistia principalmente no trabalho de cada 
indivíduo. Mas a necessidade da associação contra a nobreza espolia- 
tiva, a necessidade de mercados cobertos comuns numa época em que 
o industrial fazia as vezes de comerciante, a crescente concorrência dos 
servos que se evadiam em massa em direção às cidades prósperas, a 
estrutura feudal em cada região fizeram nascer as corporações. Assim, 
os pequenos capitais economizados aos poucos por artesãos isolados, e 
o invariável número destes numa população incessantemente aumentada, 
desenvolveram as condições de artesão e de aprendiz, fazendo com que 
nascesse nas cidades uma hierarquia semelhante à do campo.
A propriedade principal consistia, portanto, durante a época feu­
dal, por um lado, na propriedade imobiliária, à qual está ligado o 
trabalho dos servos, e por outro, no trabalho pessoal com pequeno 
capital regendo o trabalho dos artesãos. A estrutura de uma e outra 
forma era condicionada pelos limitados lucros de produção, pela cultura 
50
rudimentar e restrita do solo e pela indústria artesanal. No apogeu do 
feudalismo, a divisão do trabalho era muito limitada. Cada região ou 
conjunto de feudos tinha a sua própria oposição entre cidade e campo. 
A divisão em ordens era na realidade fortemente marcada; mas, além 
da separação em príncipes reinantes, nobreza, clero e camponeses (no 
campo) e a separação em mestres, operários e aprendizes e logo 
também em plebe dos diaristas (nas cidades), não houve importante 
divisão do trabalho. Na agricultura, esta tornou-se mais difícil pela 
exploração em pequenas propriedades, ao lado da qual se desenvolveu 
a indústria doméstica dos próprios camponeses. Na indústria, o trabalho 
também não era dividido dentro de cada profissão e muito pouco entre 
as diferentes profissões. A divisão entre o comércio e a indústria já 
existia nas antigas cidades, mas só se desenvolveu nas novas cidades, 
quando estas travaram relações umas comas outras.
A reunião de feudos de uma determinada extensão em reinos 
feudais era pa necessidade, tanto para a nobreza latifundiária como 
para as cidades. Por isso, a organização da classe dominante, isto é, 
da nobreza, teve por toda a parte um monarca à sua frente.
Portanto, o fato é o seguinte: indivíduos determinados, que têm 
uma atividade produtiva, segundo um método determinado, entram em 
relações sociais e políticas determinadas. Em cada caso isolado, a 
observação empírica deve mostrar, empiricamente e sem nenhuma 
especulação ou mistificação, o elo entre a estrutura social e política 
e a produção. A estrutura social e o Estado resultam, constantemente, 
do processo vital de indivíduos determinados; mas desses indivíduos, 
não mais tal como podem aparentar em sua própria representação ou 
na de outrem, mas tal como são em realidade, isto é, tal como trabalham 
e produzem materialmente. Portanto, como se agissem sobre bases e 
em condições e limites materiais determinados e independentes de sua 
vontade.
A produção das idéias, das representações e da consciência está, 
antes de mais nada, direta e intimamente ligada à atividade material e 
ao comércio material dos homens; é a linguagem da vida real. As 
representações, o pensamento, o comércio intelectual dos homens apare­
cem aqui, ainda, como a emanação direta do seu comportamento 
material. O mesmo ocorre com a produção intelectual, tal como se 
apresenta na linguagem da política, das Jeis, da moral, da religião, da 
metafísica etc., de um povo. Os homens são os produtores de suas 
representações, de suas idéias etc., mas os homens reais, atuantes, 
condicionados que são por desenvolvimento determinado de suas forças 
51
produtivas e das relações a elas correspondentes, incluindo-se as mais 
amplas formas que estas possam tomar. A consciência jamais pode ser 
outra coisa que o Ser consciente e o Ser dos homens é o seu processo 
real de vida. E se, em toda a ideologia, os homens e as suas relações 
nos parecem colocados de cabeça para baixo, como numa câmara 
escura, esse fenômeno decorre do seu processo de vida histórico, da 
mesma forma que a inversão dos objetos sobre a retina decorre do seu 
processo de vida diretamente físico.
Ao contrário da filosofia alemã que desce do céu sobre a terra, 
é da terra ao céu que subimos aqui. Em outras palavras, aqui não 
partimos daquilo que qs homens dizem, imaginam/-creem, nem muito 
menos do que são nas palavras, pensamento, imaginação e representação 
de outrem, para atingir finalmente os homens em carne e osso. Não, 
aqui partimos dos homens tomados em sua atividade real, segundo o 
seu processo real de vida, representando também o desenvolvimento dos 
reflexos e dos ecos ideológicos desse processo vital. E mesmo as fantas­
magorias no cérebro humano são sublimações, necessariamente resul­
tantes do seu processo material de vida, as quais se podem constatar 
empiricamente e que repousam sobre bases materiais. Por isso, a moral, 
a religião, a metafísica e todo o resto da ideologia, como também as 
formas de consciência que lhes são correspondentes, perdem logo toda 
aparência de autonomia. Elas não têm história, não têm desenvolvi­
mento; sao, ao contrário, os homens que, ao desenvolverem a sua 
produção material e suas relações materiais, transformam, com esta 
realidade que lhes é própria, o seu pensamento e os produtos do seu 
pensamento. Não é a consciência que determina a vida, mas a vida que 
determina a consciência. Na primeira maneira de se considerar as 
coisas, perte-se da Consciência como sendo o Indivíduo vivo; na se­
gunda, maneira, que corresponde à vida real, parte-se dos próprios 
indivíduos reais e vivos e considera-se a Consciência unicamente como- 
a sua consciência.
Esta maneira de considerar as coisas não é desprovida de bases. 
Parte de premissas prévias reais e não as abandona um único instante. 
Suas bases são os homens, não isolados e imobilizados (de alguma 
maneira, pela imaginação), mas tomados em seu processo de desenvol­
vimento real, em. condições determinadas, desenvolvimento esse empi­
ricamente visível. A partir do momento em que se representa esse 
processo de atividade vital, a história deixa de ser uma coleção de fatos 
sem vida, como ocorre com os empiristas, eles mesmos ainda abstratos;
50
rudimentar e restrita do solo e pela indústria artesanal. No apogeu do 
feudalismo, a divisão do trabalho era muito limitada. Cada região ou 
conjunto de feudos tinha a sua própria oposição entre cidade e campo. 
A divisão em ordens era na realidade fortemente marcada; mas, além 
da separação em príncipes reinantes, nobreza, clero e camponeses (no 
campo) e a separação em mestres, operários e aprendizes e logo 
também em plebe dos diaristas (nas cidades), não houve importante 
divisão do trabalho. Na agricultura, esta tornou-se mais difícil pela 
exploração em pequenas propriedades, ao lado da qual se desenvolveu 
a indústria doméstica dos próprios camponeses. Na indústria, o trabalho 
também não era dividido dentro de cada profissão e muito pouco entre 
as diferentes profissões. A divisão entre o comércio e a indústria já 
existia nas antigas cidades, mas só se desenvolveu nas novas cidades, 
quando estas travaram relações umas com as outras.
A reunião de feudos de uma determinada extensão em reinos 
feudais era pa necessidade, tanto para a nobreza latifundiária como 
para as cidades. Por isso, a organização da classe dominante, isto é, 
da nobreza, teve por toda a parte um monarca à sua frente.
Portanto, o fato é o seguinte: indivíduos determinados, que têm 
uma atividade produtiva, segundo um método determinado, entram em 
relações sociais e políticas determinadas. Em cada caso isolado, a 
observação empírica deve mostrar, empiricamente e sem nenhuma 
especulação ou mistificação, o elo entre a estrutura social e política 
e a produção. A estrutura social e o Estado resultam, constantemente, 
do processo vital de indivíduos determinados; mas desses indivíduos, 
não mais tal como podem aparentar em sua própria representação ou 
na de outrem, mas tal como são em realidade, isto é, tal como trabalham 
e produzem materialmente. Portanto, como se agissem sobre bases e 
em condições e limites materiais determinados e independentes de sua 
vontade.
A produção das idéias, das representações e da consciência está, 
antes de mais nada, direta e intimamente ligada à atividade material e 
ao comércio material dos homens; é a linguagem da vida real. As 
representações, o pensamento, o comércio intelectual dos homens apare­
cem aqui, ainda, como a emanação direta do seu comportamento 
material. O mesmo ocorre com a produção intelectual, tal como se 
apresenta na linguagem da política, das Jeis, da moral, da religião, da 
metafísica etc., de um povo. Os homens são os produtores de suas 
representações, de suas idéias etc., mas os homens reais, atuantes, 
condicionados que são por desenvolvimento determinado de suas forças 
51
produtivas e das relações a elas correspondentes, incluindo-se as mais 
amplas formas que estas possam tomar. A consciência jamais pode ser 
outra coisa que o Ser consciente e o Ser dos homens é o seu processo 
real de vida. E se, em toda a ideologia, os homens e as suas relações 
nos parecem colocados de cabeça para baixo, como numa câmara 
escura, esse fenômeno decorre do seu processo de vida histórico, da 
mesma forma que a inversão dos objetos sobre a retina decorre do seu 
processo de vida diretamente físico.
Ao contrário da filosofia alemã que desce do céu sobre a terra, 
é da terra ao céu que subimos aqui. Em outras palavras, aqui não 
partimos daquilo que qs homens dizem, imaginam/-creem, nem muito 
menos do que são nas palavras, pensamento, imaginação e representação 
de outrem, para atingir finalmente os homens em carne e osso. Não, 
aqui partimos dos homens tomados em sua atividade real, segundo o 
seu processo real de vida, representando também o desenvolvimento dos 
reflexos e dos ecos ideológicos desse processo vital. E mesmoas fantas­
magorias no cérebro humano são sublimações, necessariamente resul­
tantes do seu processo material de vida, as quais se podem constatar 
empiricamente e que repousam sobre bases materiais. Por isso, a moral, 
a religião, a metafísica e todo o resto da ideologia, como também as 
formas de consciência que lhes são correspondentes, perdem logo toda 
aparência de autonomia. Elas não têm história, não têm desenvolvi­
mento; sao, ao contrário, os homens que, ao desenvolverem a sua 
produção material e suas relações materiais, transformam, com esta 
realidade que lhes é própria, o seu pensamento e os produtos do seu 
pensamento. Não é a consciência que determina a vida, mas a vida que 
determina a consciência. Na primeira maneira de se considerar as 
coisas, perte-se da Consciência como sendo o Indivíduo vivo; na se­
gunda, maneira, que corresponde à vida real, parte-se dos próprios 
indivíduos reais e vivos e considera-se a Consciência unicamente como- 
a sua consciência.
Esta maneira de considerar as coisas não é desprovida de bases. 
Parte de premissas prévias reais e não as abandona um único instante. 
Suas bases são os homens, não isolados e imobilizados (de alguma 
maneira, pela imaginação), mas tomados em seu processo de desenvol­
vimento real, em. condições determinadas, desenvolvimento esse empi­
ricamente visível. A partir do momento em que se representa esse 
processo de atividade vital, a história deixa de ser uma coleção de fatos 
sem vida, como ocorre com os empiristas, eles mesmos ainda abstratos;
52
ou uma ação imaginária, de assuntos imaginários, como ocorre com os 
idealistas.
É aí que cessa a especulação. É, portanto, na vida real que começa 
a ciência real, positiva, a representação da atividade prática, do processo 
de desenvolvimento prático dos homens. Cessam as frases vazias sobre 
a consciência, devendo uma sabedoria verdadeira substituí-las. A filo? 
sofia independente perde o seu meio de existência, como representação 
da realidade. Em seu lugar, poder-se-á, no máximo, colocar uma síntese 
dos resultados mais gerais, os quais é possível abstrair do estudo de 
desenvolvimento histórico dos homens. Essas abstrações, tomadas em 
si, separadas da história real, não têm o menor valor. Podem, no 
máximo, servir para classificar com maior facilidade o material histórico, 
para indicar a sucessão de suas estratificações peculiares. Mas não 
proporcionam, de maneira alguma, como a filosofia, uma receita, um 
esquema segundo o qual se podem acomodar as épocas históricas. A 
dificuldade começa, ao contrário, somente quando nos pomos a estudar 
e classificar esse material, seja em se tratando de uma época passada 
ou do tempo presente, e a interpretá-lo realmente. A eliminação dessas 
dificuldades depende dos dados prévios, impossíveis de serem aqui 
desenvolvidos, pois resultam do estudo do processo real de vida e da 
ação dos indivíduos de cada época. Tomaremos aqui algumas dessas 
abstrações, que empregamos a' propósito da ideologia, explicando-as 
através de exemplos históricos.
2
Como os alemães, desprovidos de qualquer dado prévio, é forçoso 
que iniciemos pela constatação do primeiro dado prévio de toda exis­
tência humana, e comecemos pela história; pois os homens devem poder 
viver para poder “fazer a história”. Mas, para viver, é preciso antes 
de tudo, beber, comer, morar, vestir-se, além de outras coisas, i O 
primeiro fato histórico é, portanto, a produção dos meios que permitam 
a satisfação dessas necessidades, a produção da própria vida material, 
o que já constituí um fato histórico, uma condição fundamental de toda 
história; necessidades essas que se_devemr ainda hoje como há. milhares 
de anos atrás, satisfazer dia a dia, hora a hora, simplesmente para manter 
os homens com vida. Mesmo quando a materialidade está reduzida a 
1À altura dessa frase, Marx anotou na coluna da direita: Hegel. Condições 
geológicas, hidrográficas etc. Os corpos humanos. Necessidade, trabalho.
53
um bastão, o estrito mínimo, como ocorreu com São Bruno,2 esta 
pressupõe a atividade que produz esse bastão. A primeira coisa, em 
toda concepção histórica, é, portanto, a observação desse fato funda­
mental, em toda a sua importância e toda a sua extensão; e fazer-lhe 
justiça. Todos sabem que os alemães jamais o fizeram; nunca tiveram, 
portanto, base terrestre para a história e, conseqüentemente, jamais 
tiveram um único historiador. Embora só tenham percebido a ligação 
desse fato com o que se denomina história sob o ângulo mais limitado, 
sobretudo enquanto permaneceram encerrados na ideologia política, os 
franceses e os ingleses fizeram, não obstante, as primeiras tentativas 
para dar à história uma base materialista, ao escrgver primeiranjente 
as histórias da sociedade burguesa, do comércio e da indústria.
O segundo ponto é que, uma vez satisfeita a primeira necessidade 
em si, a ação de satisfazê-la e o instrumento dessa satisfação impelem 
a novas necessidades, e essa produção de novas necessidades é o pri­
meiro fato histórico. É através desse fato que logo se reconhece qpal 
o espírito que a grande sabedoria histórica dos alemães tem por pai. 
Onde .há carência de material positivo e onde não se debatem asneiras 
teológicas nem estupidez nossos alemães vêem, não mais a história, mas 
os “tempos pré-históricos”. Da mesma forma, não. nos explicam como 
se passa desse absurdo da “pré-história” à história propriamente dita. 
Assim, a sua especulação histórica se lança, de maneira toda especial, 
sobre esta “pré-história”, porque ela se considera ao abrigo das invasões 
do “fato brutal” e, também, porque pode aí dar vazão ao seu instinto 
especulativo e engendrar e derrubar hipóteses a.os milhares.
O terceiro ponto, que intervém repentinamente no desenvolvi­
mento histórico, é que os'homens, que renovam a cada dia a sua própria 
vida, se põem a criar outros homens, a se reproduzirem: é a ligação 
entre homem e mulher, pais e filhos, é a família. Esta família, que é 
no início a única relação social, torna-se, em seguida, uma relação 
subalterna (exceto na Alemanha), quando as necessidades acrescidas 
geram novas relações sociais e o aumento da população gera novas 
necessidades. Conseqüentemente, deve-se tratar e desenvolver esse tema 
da família segundo os fatos empíricos existentes e não segundo o “con­
ceito de família”, como é hábito fazer na Alemanha.3 Outrossim, não 
2 Alusão a uma teoria de Bruno Bauer.
3 Construção de casas. Entre os selvagens, é natural que cada família tenha a 
sua gruta ou cabana própria, como também é normal que os nômades tenham 
uma tenda particular para cada família. Esta economia doméstica separada tor-
52
ou uma ação imaginária, de assuntos imaginários, como ocorre com os 
idealistas.
É aí que cessa a especulação. É, portanto, na vida real que começa 
a ciência real, positiva, a representação da atividade prática, do processo 
de desenvolvimento prático dos homens. Cessam as frases vazias sobre 
a consciência, devendo uma sabedoria verdadeira substituí-las. A filo? 
sofia independente perde o seu meio de existência, como representação 
da realidade. Em seu lugar, poder-se-á, no máximo, colocar uma síntese 
dos resultados mais gerais, os quais é possível abstrair do estudo de 
desenvolvimento histórico dos homens. Essas abstrações, tomadas em 
si, separadas da história real, não têm o menor valor. Podem, no 
máximo, servir para classificar com maior facilidade o material histórico, 
para indicar a sucessão de suas estratificações peculiares. Mas não 
proporcionam, de maneira alguma, como a filosofia, uma receita, um 
esquema segundo o qual se podem acomodar as épocas históricas. A 
dificuldade começa, ao contrário, somente quando nos pomos a estudar 
e classificar esse material, seja em se tratando de uma época passada 
ou do tempo presente, e a interpretá-lo realmente. A eliminação dessas 
dificuldades depende dos dados prévios, impossíveis de serem aqui 
desenvolvidos, pois resultam do estudo do processo real de vida e da 
açãodos indivíduos de cada época. Tomaremos aqui algumas dessas 
abstrações, que empregamos a' propósito da ideologia, explicando-as 
através de exemplos históricos.
2
Como os alemães, desprovidos de qualquer dado prévio, é forçoso 
que iniciemos pela constatação do primeiro dado prévio de toda exis­
tência humana, e comecemos pela história; pois os homens devem poder 
viver para poder “fazer a história”. Mas, para viver, é preciso antes 
de tudo, beber, comer, morar, vestir-se, além de outras coisas, i O 
primeiro fato histórico é, portanto, a produção dos meios que permitam 
a satisfação dessas necessidades, a produção da própria vida material, 
o que já constituí um fato histórico, uma condição fundamental de toda 
história; necessidades essas que se_devemr ainda hoje como há. milhares 
de anos atrás, satisfazer dia a dia, hora a hora, simplesmente para manter 
os homens com vida. Mesmo quando a materialidade está reduzida a 
1À altura dessa frase, Marx anotou na coluna da direita: Hegel. Condições 
geológicas, hidrográficas etc. Os corpos humanos. Necessidade, trabalho.
53
um bastão, o estrito mínimo, como ocorreu com São Bruno,2 esta 
pressupõe a atividade que produz esse bastão. A primeira coisa, em 
toda concepção histórica, é, portanto, a observação desse fato funda­
mental, em toda a sua importância e toda a sua extensão; e fazer-lhe 
justiça. Todos sabem que os alemães jamais o fizeram; nunca tiveram, 
portanto, base terrestre para a história e, conseqüentemente, jamais 
tiveram um único historiador. Embora só tenham percebido a ligação 
desse fato com o que se denomina história sob o ângulo mais limitado, 
sobretudo enquanto permaneceram encerrados na ideologia política, os 
franceses e os ingleses fizeram, não obstante, as primeiras tentativas 
para dar à história uma base materialista, ao escrgver primeiranjente 
as histórias da sociedade burguesa, do comércio e da indústria.
O segundo ponto é que, uma vez satisfeita a primeira necessidade 
em si, a ação de satisfazê-la e o instrumento dessa satisfação impelem 
a novas necessidades, e essa produção de novas necessidades é o pri­
meiro fato histórico. É através desse fato que logo se reconhece qpal 
o espírito que a grande sabedoria histórica dos alemães tem por pai. 
Onde .há carência de material positivo e onde não se debatem asneiras 
teológicas nem estupidez nossos alemães vêem, não mais a história, mas 
os “tempos pré-históricos”. Da mesma forma, não. nos explicam como 
se passa desse absurdo da “pré-história” à história propriamente dita. 
Assim, a sua especulação histórica se lança, de maneira toda especial, 
sobre esta “pré-história”, porque ela se considera ao abrigo das invasões 
do “fato brutal” e, também, porque pode aí dar vazão ao seu instinto 
especulativo e engendrar e derrubar hipóteses a.os milhares.
O terceiro ponto, que intervém repentinamente no desenvolvi­
mento histórico, é que os'homens, que renovam a cada dia a sua própria 
vida, se põem a criar outros homens, a se reproduzirem: é a ligação 
entre homem e mulher, pais e filhos, é a família. Esta família, que é 
no início a única relação social, torna-se, em seguida, uma relação 
subalterna (exceto na Alemanha), quando as necessidades acrescidas 
geram novas relações sociais e o aumento da população gera novas 
necessidades. Conseqüentemente, deve-se tratar e desenvolver esse tema 
da família segundo os fatos empíricos existentes e não segundo o “con­
ceito de família”, como é hábito fazer na Alemanha.3 Outrossim, não 
2 Alusão a uma teoria de Bruno Bauer.
3 Construção de casas. Entre os selvagens, é natural que cada família tenha a 
sua gruta ou cabana própria, como também é normal que os nômades tenham 
uma tenda particular para cada família. Esta economia doméstica separada tor-
54
se devem compreender esses três aspectos da atividade social como três 
estágios- diferentes, mas precisamente como três aspectos, simplesmente; 
ou, para empregar uma linguagem clara para os alemães, três “mo­
mentos”, que coexistiram desde o início da história e desde os primeiros 
homens, e que se afirmam ainda hoje na história. Produzir a vida, tanto 
a sua própria, através 9o trabalho, como a vida de outrem, pela pro­
criação, nos parece, portanto, desde já, uma relação dupla: de um 
lado, uma relação natural e, do outro, uma relação social — social no 
sentido que se entende pela ação conjugada de vários indivíduos, pouco 
importando em que condições, de que maneira e com que finalidade. 
Conseqüentemente, uma modalidade de produção ou um estágio indus­
trial são constantemente ligados a uma modalidade de cooperação ou 
a um estágio social determinado; e essa modalidade de cooperação é por 
si uma “força produtiva”. Segue-se, igualmente, que a massa das forças 
produtivas acessíveis aos homens determina o estado social, devendo-se, 
como consequência, estudar e elaborar incessantemente a “história dos 
homens”, em conexão com a história da indústria e da troca. Mas é 
tão claro quanto impossível escrever semelhante história na Alemanha, 
pois falta aos alemães, para fazê-la, não somente a faculdade de conce­
bê-la e os materiais, mas também a “certeza sensível”, não se podendo 
fazer experiências nesse campo do outro lado do Reno, pois lá não 
acontece mais história. Portanto, repentinamente, manifesta-se um elo 
materialista entre os homens, que é condicionado pelas necessidades e 
modalidade de produção e que é tão velho quanto os próprios homens 
— elo que toma incessantemente novas formas, apresentando, portanto,
na-se ainda mais indispensável quando ocorre o desenvolvimento da propriedade 
privada. Entre os povos agricultores, a economia doméstica comum é tão impos­
sível quanto a cultura comum do solo. A construção das cidades foi um grande 
progresso. No entanto, èm todos os períodos anteriores, supressão da economia 
separada, inseparável da supressão da propriedade privada, era impossível pela 
carência das condições materiais. O estabelecimento de uma economia domés­
tica comum tem por condições prévias o desenvolvimento do maquinismo, com 
a utilização de forças naturais e de numerosas outras forças produtivas — por 
exemplo, canalização de água, iluminação a gás, aquecimento a vapor, etc., a 
supressão da cidade e do campo. Sem essas condições, a economia comum não 
constituiria em si, por sua vez, uma força produtiva, pois esta careceria de toda 
base material, repousando somente sobre uma base teórica, sendo, em outras 
-palavras, um simples capricho, conduzindo apenas à economia monacal. O que 
era possível, verificou-se com o agrupamento das pessoas em cidades e com as 
construções de edifícios comuns, para finalidades singulares determinadas (prisões, 
casernas, etc.). A supressão da economia separada é inseparável da abolição da 
família, é evidente.
55
uma “história” mesmo quando não existe um não-senso político ou 
religioso qualquer que reúna ainda mais os homens.
E é somente agora, após já ter examinado quatro momentos, qua­
tro aspectos das relações históricas originais, que achamos que o homem 
também tem “consciência”. 4 Mas não se trata de uma consciência que 
seja, de início, consciência “pura”. Desde o início, uma maldição pesa 
sobre o “espírito”, a de ser “maculado” pela matéria que se apresenta 
sob a forma de camadas agitadas de sons; em suma, pela linguagem. 
A linguagem é tão velha quanto a consciência. A linguagem é a cons­
ciência real, prática, existindo também para outros homens, existindo, 
portanto, igualmente para mim mesmo pela primeira vez e, exatamente 
como a consciência, a linguagem só aparece com a carência, a necessi­
dade de comércio com outros homens. Onde existir uma relação,, esta 
existe para mim. O animal “não está em relação” a nada, não conhece, 
no final das contas, relação alguma. Para o animal, as suas relações 
com os outros não existem como relações. A consciência é, portanto, 
de início, um produto social, assim permanecendo tanto tempo, quanto 
existirem os homens em geral. Evidentemente, a consciênciao 
trabalho aparece, em geral, como trabalho assalariado. (...) Os
1 Lenine, V. “Karl Marx.” In: Oeuvres choisies. Moscou, Éditions du Pro- 
grès, 1971. v. 1, p. 19-49; “Les trois parties constitutives du marxisme.” 
Op. cit. p. 58-62.
9
principais agentes deste modo de produção, o capitalista e o 
operário assalariado, não são, como tais, senão encarnações do 
capital e do trabalho assalariado, determinados característicos 
sociais que o processo social de produção imprime nas pessoas, 
produtos destas relações determinadas de produção. (...)
O segundo característico do modo capitalista de produção é a 
produção de mais-valia, como a finalidade direta e o móvel de­
terminante da produção. O capital produz essencialmente capital 
e isto somente na medida em que ele produz mais-valia.” 2
A mais-valia e a mercadoria são a condição e o produto 
das relações de dependência, alienação e antagonismo do operário 
e do capitalista, um em face do outro. A forma mercadoria 
cristaliza tanto o produto do trabalho necessário à reprodução 
do produtor (trabalho pago), como o produto do .trabalho exce­
dente (não pago) e apropriado pelo capitalista, no processo de 
compra e venda de força de trabalho. A mais-valia e a mer­
cadoria, pois, não podem ser compreendidas em si, mas como 
produtos das relações de produção que produzem o capitalismo. 
Na análise dialética, elas surgem como realmente são, isto é, 
como sistemas de relações antagônicas. Nisto se funda o caráter 
essencial do regime: os seus componentes mais característicos, 
seja a mais-valia e a mercadoria, seja o operário e o capitalista, 
^produzem-se, desde o princípio, antagonicamente.
A descoberta desse antagonismo, pois, não é alheia à cons­
tituição interna do capitalismo. As relações antagônicas não 
podem resolver-se a não ser que o próprio capitalismo seja 
também pensado. Ê necessário que o capitalismo se transforme 
em concreto pensado, pleno de suas determinações, para resolver- 
-se. Ele precisa transformar-se em componente da consciência 
de classeTío proletariado, que e o póío^^^fivo dqT^goni^o, 
"para que o "próprio antagonismo se desenvolva e resolva. O 
processo de troca, sem o qual a mercantilização universal não 
se realiza, é, simultaneamente, o processo por intermédio do qual 
as pessoas, os grupos e as classes sociais realizam-se e pensam-se 
como categorias sociais reciprocamente referidas e antagônicas. 
Não é por acaso que todo processo de reflexão de Marx, sobre 
as relações, os processos e as estruturas capitalistas, é, também,
2 Marx, K. “Relaciones de distribución y relaciones de producción.” In: 
El capital. México,'Fondo de Cultura Económica, 1946-47. t. III, cap. LI, 
p. 1015-17.
alice alcantara
.
laura
.
laura
.
8
análise e a interpretação do capitalismo.1 Este é um aspecto 
essencial do pensamento de Marx: o materialismo dialético e o 
niaterialismo histórico são os dois elementos principais e conju­
gados do mesmo processo teórico-prático de reflexão sobre o 
capitalismo. Na obra de Marx, o capitalismo é levado a pensar-se 
a si mesmo, de maneira global e como um modo fundamental­
mente antagônico de desenvolvimento histórico. Da mesma forma 
que o modo capitalista de produção, a dialética marxista funda-se 
nas relações de antagonismo. O princípio da contradição governa 
o modo de pensar e o modo de ser. Mesmo porque, ambos são 
manifestações da mesma época histórica. As relações de antago­
nismo ocorrem em todas as épocas históricas, aparecem em todos 
os modos de produção. Em cada época, no entanto, adquirem 
configurações particulares. Em cada época, as determinações 
econômicas, políticas, religiosas ou outras organizam-se e deter­
minam-se reciprocamente de modo diverso. No capitalismo, os 
antagonismos fundados nas relações econômicas adquirem preemi­
nência sobre todos os outros, enquanto determinação estrutural.
Em essência, o capitalismo é um sistema de mercantilização 
universal e de produção de mais-váliaT ^Ele^mércantilizá~ás 
relações, as pessoas ê as coisas. Ao mesmo tempo,^ol^ mercah- 
tiliza a força de trabalho, a energia humana que produz valor. 
Por isso mesmo, transforma as próprias pessoas em mercadorias, 
tornando-as adjetivas de sua força de trabalho. Vejamos o que 
diz Marx, num dós últimos capítulos de O Capital, ao chamar a 
atenção para duas categorias básicas do regime. Como categorias 
dialéticas, elas exprimem determinações essenciais do regime.
“Desde o primeiro instante, são duas as características que dis­
tinguem o modo capitalista de produção.
Primeira. Ele produz os seus produtos como mercadorias. O 
fato de que produz mercadorias não o distingue de outros modos 
de produção; o que o distingue é a circunstância de que o ser 
mercadoria constitui o caráter dominante e determinante dos seus 
produtos. Isto implica, antes de tudo, o fato de que o próprio 
operário somente aparece como vendedor de mercadorias, ou 
seja, como trabalhador livre assalariado, de tal maneira que o 
trabalho aparece, em geral, como trabalho assalariado. (...) Os
1 Lenine, V. “Karl Marx.” In: Oeuvres choisies. Moscou, Éditions du Pro- 
grès, 1971. v. 1, p. 19-49; “Les trois parties constitutives du marxisme.” 
Op. cit. p. 58-62.
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principais agentes deste modo de produção, o capitalista e o 
operário assalariado, não são, como tais, senão encarnações do 
capital e do trabalho assalariado, determinados característicos 
sociais que o processo social de produção imprime nas pessoas, 
produtos destas relações determinadas de produção. (...)
O segundo característico do modo capitalista de produção é a 
produção de mais-valia, como a finalidade direta e o móvel de­
terminante da produção. O capital produz essencialmente capital 
e isto somente na medida em que ele produz mais-valia.” 2
A mais-valia e a mercadoria são a condição e o produto 
das relações de dependência, alienação e antagonismo do operário 
e do capitalista, um em face do outro. A forma mercadoria 
cristaliza tanto o produto do trabalho necessário à reprodução 
do produtor (trabalho pago), como o produto do .trabalho exce­
dente (não pago) e apropriado pelo capitalista, no processo de 
compra e venda de força de trabalho. A mais-valia e a mer­
cadoria, pois, não podem ser compreendidas em si, mas como 
produtos das relações de produção que produzem o capitalismo. 
Na análise dialética, elas surgem como realmente são, isto é, 
como sistemas de relações antagônicas. Nisto se funda o caráter 
essencial do regime: os seus componentes mais característicos, 
seja a mais-valia e a mercadoria, seja o operário e o capitalista, 
^produzem-se, desde o princípio, antagonicamente.
A descoberta desse antagonismo, pois, não é alheia à cons­
tituição interna do capitalismo. As relações antagônicas não 
podem resolver-se a não ser que o próprio capitalismo seja 
também pensado. Ê necessário que o capitalismo se transforme 
em concreto pensado, pleno de suas determinações, para resolver- 
-se. Ele precisa transformar-se em componente da consciência 
de classeTío proletariado, que e o póío^^^fivo dqT^goni^o, 
"para que o "próprio antagonismo se desenvolva e resolva. O 
processo de troca, sem o qual a mercantilização universal não 
se realiza, é, simultaneamente, o processo por intermédio do qual 
as pessoas, os grupos e as classes sociais realizam-se e pensam-se 
como categorias sociais reciprocamente referidas e antagônicas. 
Não é por acaso que todo processo de reflexão de Marx, sobre 
as relações, os processos e as estruturas capitalistas, é, também,
2 Marx, K. “Relaciones de distribución y relaciones de producción.” In: 
El capital. México,'Fondo de Cultura Económica, 1946-47. t. III, cap. LI, 
p. 1015-17.
alice alcantara
.
alice alcantara
.
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uma sistemática, profunda e contundente crítica de todas as 
interpretações, doutrinas, idéias ou conceitos preexistentes sobre 
os mesmos fenômenos. É que as representações sobre o real são 
parte necessária do real; são “sombras”, “reflexos”, “formas 
invertidas” das relações, processos enada mais 
é em primeiro lugar, que a consciência do meio sensível mais próximo 
e aquela do elo limitado com outras pessoas e outras coisas situadas 
fora do indivíduo que toma consciência. Ao mesmo tempo, é a cons­
ciência da natureza que se ergue em primeiro lugar face aos homens, 
como uma potência essencialmente estranha, todo-poderosa e inatacável, 
frente à qual os homens se comportam de uma maneira puramente 
animal e que se lhes impõe tanto quanto ao gado; conseqüentemente, 
uma consciência da natureza puramente animal (religião da natureza).
Vê-se imediatamente que esta religião da natureza ou essas relações 
determinadas face à natureza são condicionadas pela forma da sociedade 
e vice-versa. Aqui, como em todos os outros lugares, a identidade do 
homem e da natureza apareceu também sob essa forma. O comporta­
mento determinado dos homens, em face da natureza, condiciona o 
comportamento entre eles, e o comportamento determinado entre eles 
condiciona, por sua vez, as suas relações determinadas com a natureza, 
precisamente porque a natureza está muito pouco modificada pela 
história. Por outro lado, a consciência da necessidade de entrar em 
4 A essa altura, Marx escreveu na coluna da direita: “Os homens têm uma 
história, porque devem produzir sua vida, devendo fazê-lo realmente, de uma 
maneira determinada', sendo esse dever dado por sua organização física; da 
mesma maneira que a sua consciência”.
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se devem compreender esses três aspectos da atividade social como três 
estágios- diferentes, mas precisamente como três aspectos, simplesmente; 
ou, para empregar uma linguagem clara para os alemães, três “mo­
mentos”, que coexistiram desde o início da história e desde os primeiros 
homens, e que se afirmam ainda hoje na história. Produzir a vida, tanto 
a sua própria, através 9o trabalho, como a vida de outrem, pela pro­
criação, nos parece, portanto, desde já, uma relação dupla: de um 
lado, uma relação natural e, do outro, uma relação social — social no 
sentido que se entende pela ação conjugada de vários indivíduos, pouco 
importando em que condições, de que maneira e com que finalidade. 
Conseqüentemente, uma modalidade de produção ou um estágio indus­
trial são constantemente ligados a uma modalidade de cooperação ou 
a um estágio social determinado; e essa modalidade de cooperação é por 
si uma “força produtiva”. Segue-se, igualmente, que a massa das forças 
produtivas acessíveis aos homens determina o estado social, devendo-se, 
como consequência, estudar e elaborar incessantemente a “história dos 
homens”, em conexão com a história da indústria e da troca. Mas é 
tão claro quanto impossível escrever semelhante história na Alemanha, 
pois falta aos alemães, para fazê-la, não somente a faculdade de conce­
bê-la e os materiais, mas também a “certeza sensível”, não se podendo 
fazer experiências nesse campo do outro lado do Reno, pois lá não 
acontece mais história. Portanto, repentinamente, manifesta-se um elo 
materialista entre os homens, que é condicionado pelas necessidades e 
modalidade de produção e que é tão velho quanto os próprios homens 
— elo que toma incessantemente novas formas, apresentando, portanto,
na-se ainda mais indispensável quando ocorre o desenvolvimento da propriedade 
privada. Entre os povos agricultores, a economia doméstica comum é tão impos­
sível quanto a cultura comum do solo. A construção das cidades foi um grande 
progresso. No entanto, èm todos os períodos anteriores, supressão da economia 
separada, inseparável da supressão da propriedade privada, era impossível pela 
carência das condições materiais. O estabelecimento de uma economia domés­
tica comum tem por condições prévias o desenvolvimento do maquinismo, com 
a utilização de forças naturais e de numerosas outras forças produtivas — por 
exemplo, canalização de água, iluminação a gás, aquecimento a vapor, etc., a 
supressão da cidade e do campo. Sem essas condições, a economia comum não 
constituiria em si, por sua vez, uma força produtiva, pois esta careceria de toda 
base material, repousando somente sobre uma base teórica, sendo, em outras 
-palavras, um simples capricho, conduzindo apenas à economia monacal. O que 
era possível, verificou-se com o agrupamento das pessoas em cidades e com as 
construções de edifícios comuns, para finalidades singulares determinadas (prisões, 
casernas, etc.). A supressão da economia separada é inseparável da abolição da 
família, é evidente.
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uma “história” mesmo quando não existe um não-senso político ou 
religioso qualquer que reúna ainda mais os homens.
E é somente agora, após já ter examinado quatro momentos, qua­
tro aspectos das relações históricas originais, que achamos que o homem 
também tem “consciência”. 4 Mas não se trata de uma consciência que 
seja, de início, consciência “pura”. Desde o início, uma maldição pesa 
sobre o “espírito”, a de ser “maculado” pela matéria que se apresenta 
sob a forma de camadas agitadas de sons; em suma, pela linguagem. 
A linguagem é tão velha quanto a consciência. A linguagem é a cons­
ciência real, prática, existindo também para outros homens, existindo, 
portanto, igualmente para mim mesmo pela primeira vez e, exatamente 
como a consciência, a linguagem só aparece com a carência, a necessi­
dade de comércio com outros homens. Onde existir uma relação,, esta 
existe para mim. O animal “não está em relação” a nada, não conhece, 
no final das contas, relação alguma. Para o animal, as suas relações 
com os outros não existem como relações. A consciência é, portanto, 
de início, um produto social, assim permanecendo tanto tempo, quanto 
existirem os homens em geral. Evidentemente, a consciência nada mais 
é em primeiro lugar, que a consciência do meio sensível mais próximo 
e aquela do elo limitado com outras pessoas e outras coisas situadas 
fora do indivíduo que toma consciência. Ao mesmo tempo, é a cons­
ciência da natureza que se ergue em primeiro lugar face aos homens, 
como uma potência essencialmente estranha, todo-poderosa e inatacável, 
frente à qual os homens se comportam de uma maneira puramente 
animal e que se lhes impõe tanto quanto ao gado; conseqüentemente, 
uma consciência da natureza puramente animal (religião da natureza).
Vê-se imediatamente que esta religião da natureza ou essas relações 
determinadas face à natureza são condicionadas pela forma da sociedade 
e vice-versa. Aqui, como em todos os outros lugares, a identidade do 
homem e da natureza apareceu também sob essa forma. O comporta­
mento determinado dos homens, em face da natureza, condiciona o 
comportamento entre eles, e o comportamento determinado entre eles 
condiciona, por sua vez, as suas relações determinadas com a natureza, 
precisamente porque a natureza está muito pouco modificada pela 
história. Por outro lado, a consciência da necessidade de entrar em 
4 A essa altura, Marx escreveu na coluna da direita: “Os homens têm uma 
história, porque devem produzir sua vida, devendo fazê-lo realmente, de uma 
maneira determinada', sendo esse dever dado por sua organização física; da 
mesma maneira que a sua consciência”.
56
relação com os indivíduos que o cercam marca, para o homem, o início 
da consciência do fato de que, apesar de tudo, ele vive em sociedade.
Esse início é tão animal quanto a própria vida social desse estágio; 
ele é uma simples consciência gregária e o homem se distingue aqui do 
carneiro através do fato único de que a sua consciência pode tomar nele 
o lugar do instinto ou de o seu instinto ser um instinto consciente. Esta 
consciência de carneiro, tribal, recebe seu desenvolvimento e seu 
aperfeiçoamento ulteriores com o aumento da produtividade, o aumento 
das necessidades e o aumento da população que está na base dos 
dois precedentes. Assim se desenvolve a divisão do trabalho, que, 
primitivamente, nada mais era que a divisão do trabalho no ato sexual, 
tornando-se, em seguida, a divisão dcT trãBSho que ~se faz por si ou 
1 ^aturalmente^" em virtüde~~dãs~ disposições naturais (vigor corporal^ 
por exemploJ, das necessidades, do acaso etc. A divisão do trabalho 
so"_seTórnaTeJetivamente divisão do trabalho a partir do momento em 
que se opera uma divisão>~de Irabalho material e intelectual.5 A partir 
desse momento, a consciência pode realmente crer que seja algo dife­
rente da consciência da prática existente^ que representa realmente 
qualquer coisa sem representar algo de real. A partir desse momento, 
a consciência está em condições de se emancipar do mundo, passando à 
formação da teoria “pura”, teologia, filosofia, moral etc. Mas mesmo 
quando esta teoria, esta teologia, esta filosofia, esta moral etc. entram 
em contradição com as relações existentes, isso só pode ocorrer pelo 
fato de terem as relações sociais existentes entrado em contradição com 
a força produtiva existente. Assim, num determinado círculo nacional 
de relações, isso pode ocorrer também porque a contradição se produz, 
não no interior dessa esfera nacional, mas entre esta consciência nacio­
nal e a prática das outras nações, isto é, entre a consciência nacional 
de uma nação e sua consciência universal. Outrossim, pouco importa o 
que a consciência empreende isoladamente; toda essa podridão só nos 
dá o seguinte resultado: que estes três momentos, a força produtiva, 
o estado social e a consciência, podem e devem entrar em conflito entre 
si, pois, através da divisão do trabalho, torna-se possível, ou melhor, 
torna-se efetivo que as atividades intelectual e material, que o gozo e 
o trabalho, a produção e a consumação caibam em partilha a indivíduos 
diferentes. Então a possibilidade desses momentos não entrarem em 
conflito reside unicamente no fato de se ter novamente abolido a divisão 
5 A essa altura, Marx anotou na coluna da direita: “Coincide a primeira forma 
dos ideólogos, padres'1.
57
do trabalho. Também, é por si explicativo que “fantasmas”, “ralé”, 
“essência superior”, “conceito”, “dúvidas”, nada mais são que a expres­
são mental idealista, a representação aparentemente do indivíduo 
isolado, a representação de cadeias e de limites muito empíricos, no 
interior dos quais se movimentam a modalidade de produção da vida 
e a forma de relações que está a ela ligada.
Esta divisão de trabalho, que implica em todas essas contradições 
e repousa, por sua vez, sobre a divisão natural do trabalho na família, 
e sobre a separação da sociedade em famílias isoladas e opostas umas 
às outras, — esta divisão do trabalho implica, ao. mesmo tempo, na 
repartição do trabalho e de seus produtos, na distribuição desigual tanto 
em. quantidade como em qualidade. Implica, portanto, na propriedade, 
cuja forma primeira, o germe, reside na família, onde a mulher e as 
crianças são os escravos do homem. A escravatura, naturalmente muito 
rudimentar e latente na família, é a primeira propriedade, que, aliás, já 
corresponde perfeitamente à definição dos economistas modernos, se­
gundo a qual ela é a livre disposição da força de trabalho de outrem. 
Igualmente, divisão do trabalho e propriedade privada são expressões 
idênticas: enuncia-se, na primeira, em relação à atividade, aquilo que 
se enuncia e, na segunda, em relação ao produto da atividade.
Além disso, a divisão do trabaího implica, ao mesmo tempo, na 
contradição entre o interesse do indivíduo singular, ou. da família sin­
gular, e o interesse coletivo de todos os indivíduos que mantêm relações 
entre si. E, o que é mais, esse interesse coletivo não existe somente, 
digamos, na representação, na qualidade de “universal”, mas antes como 
dependência recíproca dos indivíduos entre os quais o trabalho é divi­
dido. Finalmente, a divisão do trabalho nos oferece imediatamente o 
primeiro exemplo do seguinte fato: enquanto os homens se encontra­
rem na sociedade natural, portanto, enquanto existir cisão entre o 
interesse particular e o interesse comum, enquanto a atividade não for 
voluntária mas naturalmente dividida, o próprio ato do homem se trans­
forma em potência estrangeira que a ele se opõe e o avassala, ao invés 
de ser por ele dominado. Realmente, desde o instante em que o trabalho 
começa a ser repartido, cada um tem uma esfera de atividade exclusiva 
e determinada, que lhe é imposta e da qual não pode sair. Seja ele 
caçador, pescador ou pastor ou crítico fazendo crítica, deverá perma­
necer como tal, se não desejar perder os seus meios de existência; 
enquanto na sociedade comunista, onde o indivíduo não tem uma esfera 
de atividade exclusiva, podendo se aperfeiçoar no ramo de sua prefe­
rência, a sociedade regulamenta a produção- geral, possibilitando assim 
56
relação com os indivíduos que o cercam marca, para o homem, o início 
da consciência do fato de que, apesar de tudo, ele vive em sociedade.
Esse início é tão animal quanto a própria vida social desse estágio; 
ele é uma simples consciência gregária e o homem se distingue aqui do 
carneiro através do fato único de que a sua consciência pode tomar nele 
o lugar do instinto ou de o seu instinto ser um instinto consciente. Esta 
consciência de carneiro, tribal, recebe seu desenvolvimento e seu 
aperfeiçoamento ulteriores com o aumento da produtividade, o aumento 
das necessidades e o aumento da população que está na base dos 
dois precedentes. Assim se desenvolve a divisão do trabalho, que, 
primitivamente, nada mais era que a divisão do trabalho no ato sexual, 
tornando-se, em seguida, a divisão dcT trãBSho que ~se faz por si ou 
1 ^aturalmente^" em virtüde~~dãs~ disposições naturais (vigor corpor al^ 
por exemploJ, das necessidades, do acaso etc. A divisão do trabalho 
so"_seTórnaTeJetivamente divisão do trabalho a partir do momento em 
que se opera uma divisão>~de Irabalho material e intelectual.5 A partir 
desse momento, a consciência pode realmente crer que seja algo dife­
rente da consciência da prática existente^ que representa realmente 
qualquer coisa sem representar algo de real. A partir desse momento, 
a consciência está em condições de se emancipar do mundo, passando à 
formação da teoria “pura”, teologia, filosofia, moral etc. Mas mesmo 
quando esta teoria, esta teologia, esta filosofia, esta moral etc. entram 
em contradição com as relações existentes, isso só pode ocorrer pelo 
fato de terem as relações sociais existentes entrado em contradição com 
a força produtiva existente. Assim, num determinado círculo nacional 
de relações, isso pode ocorrer também porque a contradição se produz, 
não no interior dessa esfera nacional, mas entre esta consciência nacio­
nal e a prática das outras nações, isto é, entre a consciência nacional 
de uma nação e sua consciência universal. Outrossim, pouco importa o 
que a consciência empreende isoladamente; toda essa podridão só nos 
dá o seguinte resultado: que estes três momentos, a força produtiva, 
o estado social e a consciência, podem e devem entrar em conflito entre 
si, pois, através da divisão do trabalho, torna-se possível, ou melhor, 
torna-se efetivo que as atividades intelectual e material, que o gozo e 
o trabalho, a produção e a consumação caibam em partilha a indivíduos 
diferentes. Então a possibilidade desses momentos não entrarem em 
conflito reside unicamente no fato de se ter novamente abolido a divisão 
5 A essa altura, Marx anotou na coluna da direita: “Coincide a primeira forma 
dos ideólogos, padres'1.
57
do trabalho. Também, é por si explicativo que “fantasmas”, “ralé”, 
“essência superior”, “conceito”, “dúvidas”, nada mais são que a expres­
são mental idealista, a representação aparentemente do indivíduo 
isolado, a representação de cadeias e de limites muito empíricos, no 
interior dos quais se movimentam a modalidade de produção da vida 
e a forma de relações que está a ela ligada.
Esta divisão de trabalho, que implica em todas essas contradições 
e repousa, por sua vez, sobre a divisão natural do trabalho na família, 
e sobre a separação da sociedade em famílias isoladas e opostas umas 
às outras, — esta divisão do trabalho implica, ao. mesmo tempo, na 
repartição do trabalho e de seus produtos, na distribuiçãodesigual tanto 
em. quantidade como em qualidade. Implica, portanto, na propriedade, 
cuja forma primeira, o germe, reside na família, onde a mulher e as 
crianças são os escravos do homem. A escravatura, naturalmente muito 
rudimentar e latente na família, é a primeira propriedade, que, aliás, já 
corresponde perfeitamente à definição dos economistas modernos, se­
gundo a qual ela é a livre disposição da força de trabalho de outrem. 
Igualmente, divisão do trabalho e propriedade privada são expressões 
idênticas: enuncia-se, na primeira, em relação à atividade, aquilo que 
se enuncia e, na segunda, em relação ao produto da atividade.
Além disso, a divisão do trabaího implica, ao mesmo tempo, na 
contradição entre o interesse do indivíduo singular, ou. da família sin­
gular, e o interesse coletivo de todos os indivíduos que mantêm relações 
entre si. E, o que é mais, esse interesse coletivo não existe somente, 
digamos, na representação, na qualidade de “universal”, mas antes como 
dependência recíproca dos indivíduos entre os quais o trabalho é divi­
dido. Finalmente, a divisão do trabalho nos oferece imediatamente o 
primeiro exemplo do seguinte fato: enquanto os homens se encontra­
rem na sociedade natural, portanto, enquanto existir cisão entre o 
interesse particular e o interesse comum, enquanto a atividade não for 
voluntária mas naturalmente dividida, o próprio ato do homem se trans­
forma em potência estrangeira que a ele se opõe e o avassala, ao invés 
de ser por ele dominado. Realmente, desde o instante em que o trabalho 
começa a ser repartido, cada um tem uma esfera de atividade exclusiva 
e determinada, que lhe é imposta e da qual não pode sair. Seja ele 
caçador, pescador ou pastor ou crítico fazendo crítica, deverá perma­
necer como tal, se não desejar perder os seus meios de existência; 
enquanto na sociedade comunista, onde o indivíduo não tem uma esfera 
de atividade exclusiva, podendo se aperfeiçoar no ramo de sua prefe­
rência, a sociedade regulamenta a produção- geral, possibilitando assim 
58
ao indivíduo que faça algo de diferente a cada dia, caçando pela manhã, 
pescando à tarde, criando gado à noite e fazendo crítica após as refei­
ções, segundo a sua própria vontade sem nunca se tornar caçador, 
pescador ou crítico.
Esta fixação da atividade social, esta consolidação de nosso próprio 
produto numa potência objetiva que nos domina, fugindo ao. nosso 
controle, contrariando nossas expectativas, reduzindo a zero os nossos 
cálculos, é um dos momentos capitais no desenvolvimento histórico, até 
os nossos dias. É justamente esta contradição entre o interesse particular 
e o coletivo que conduz o interesse coletivo a tomar, na condição de 
Estado, uma forma independente, separada dos interesses reais do indi­
víduo e do conjunto e a fazer, ao mesmo tempo, figura de comunidade 
ilusória, embora sempre sobre a base concreta dos elos existentes em 
cada conglomerado de família e de tribo, como os laços de sangue, 
linguagem, divisão do trabalho em vasta escala e outros interesses. E 
dentre esses interesses encontramos, em particular, como desenvolvere­
mos mais tarde, os interesses de classes já determinadas pela divisão do 
trabalho, as quais se diferenciam em todo agrupamento desse gênero e 
das quais uma domina as outras. Conseqüentemente, todas as lutas no 
interior do Estado, a luta entre a democracia, a aristocracia e a monar­
quia, a luta pelo direito de voto etc., etc., nada mais são do que formas 
ilusórias, sob as quais são conduzidas as lutas efetivas das diferentes 
classes entre si (do que os teóricos alemães nem suspeitam, embora 
nesse sentido se lhes tenha amplamente mostrado o caminho nos Anais 
Franco-alemães e ri A Sagrada Família'). Por isso, ocorre, também, que 
toda classe que aspire ao domínio (ainda que esse domínio determine 
a abolição de toda a antiga forma social e domínio em geral, como no 
caso do proletariado), deve, portanto, esta classe conquistar antes o 
poder político, para representar, por sua vez, o seu próprio interesse 
como sendo o Universal, ao qual ela está restrita nos primeiros tempos. 
Precisamente porque os indivíduos só procuram o seu interesse parti­
cular (que para eles não coincide com o intéresse coletivo, não sendo 
o Universal, senão uma forma ilusória da coletividade), esse interesse 
é representado como um interesse que lhes é “estranho”, que é “inde­
pendente” deles, sendo ele próprio, por sua vez, um interesse “geral”, 
especial e particular ou, então, devem se defrontar eles mesmos nesse 
desacordo, como na democracia. Por outro lado, o combate prático 
desses interesses particulares, que constantemente se chocam realmente, 
em relação aos interesses coletivos e ilusoriamente coletivos, torna 
necessária a intervenção prática e o refreamento pelo interesse “geral” 
ilusório sob forma de Estado.
59
O poderio social, isto é, a força produtiva décupla, nascida da 
cooperação dos diversos, indivíduos, condicionada pela divisão do tra­
balho, não aparece a esses indivíduos como a sua própria força na 
união, porque essa própria cooperação não é voluntária, mas natural. 
Ela lhes parece, ao contrário, como uma força estranha, situada fora 
deles,- da qual não sabem nem de onde vem nem para onde vai, a qual, 
portanto, não podem mais dominar e que, inversamente, percorre agora 
uma sequência particular de fases e de estágios de desenvolvimento tão 
independente da vontade e da marcha da humanidade que na verdade 
dirige esta vontade e esta marcha da humanidade. Para que esta “alie­
nação” seja inteligível aos filósofos, ela precis^ naturalmente, ser 
abolida sob duas condições práticas, Para que se torne uma força 
“insuportável”, isto é, uma força contra a qual se faz a revolução, é 
necessário que tenha feito da massa da humanidade uma massa total­
mente “privada de propriedade”, que se acha simultaneamente em 
contradição a um mundo existente da riqueza e da cultura, coisas que 
supõem um grande aumento da força produtiva, isto é, um estágio 
elevado do seu desenvolvimento. Por outro lado, esse desenvolvimento 
das forças produtivas (que já implica em que a existência empírica atual 
dos homens se desenrole sobre o platio da história mundial, ao invés de 
se desenrolar sobre aquele da vida local), esse desenvolvimento das for­
ças produtivas é uma condição prática prévia absolutamente indispensá­
vel, pois sem ele haveria a penúria geral, a carência, e a luta pelo neces­
sário que recomeçaria, recaindo-se fatalmente na mesma velha imundície. 
É igualmente uma condição prática sine qua non, porque as relações 
universais do gênero humano podem ser estabelecidas unicamente atra­
vés desse desenvolvimento universal das forças produtivas e porque este 
gera o fenômeno da massa “privada de propriedade”, simultaneamente 
em todos os países (concorrência universal) tornando cada um deles 
dependente dos transtornos dos outros e colocando, finalmente, homens 
empiricamente universais, históricos, no lugar dos indivíduos vivendo num 
plano local. Sem isso: l.°) o comunismo só poderia existir como fenôme­
no local; 2.°) as forças das próprias relações humanas não teriam podido 
se desenvolver como forças universais e, portanto, inexoráveis, e teriam 
permanecido como “circunstâncias” decorrentes das superstições locais; 
e 3.°) qualquer extensão das relações humanas aboliria o comunismo 
local. O comunismo só é empiricamente possível como o ato “repenti­
no” e simultâneo dos povos dominantes, o que supõe, por sua vez, o 
desenvolvimento universal da força produtiva e as relações universais 
estreitamente ligadas ao comunismo. De outra forma, por exemplo, de 
que maneira .poderia a propriedade, no final das contas, .ter uma história, 
58
ao indivíduo que faça algo de diferente a cada dia, caçando pela manhã, 
pescando à tarde, criando gado à noite e fazendo crítica após as refei­
ções, segundo a sua própria vontade sem nunca se tornar caçador, 
pescador ou crítico.
Esta fixação da atividade social, esta consolidação denosso próprio 
produto numa potência objetiva que nos domina, fugindo ao. nosso 
controle, contrariando nossas expectativas, reduzindo a zero os nossos 
cálculos, é um dos momentos capitais no desenvolvimento histórico, até 
os nossos dias. É justamente esta contradição entre o interesse particular 
e o coletivo que conduz o interesse coletivo a tomar, na condição de 
Estado, uma forma independente, separada dos interesses reais do indi­
víduo e do conjunto e a fazer, ao mesmo tempo, figura de comunidade 
ilusória, embora sempre sobre a base concreta dos elos existentes em 
cada conglomerado de família e de tribo, como os laços de sangue, 
linguagem, divisão do trabalho em vasta escala e outros interesses. E 
dentre esses interesses encontramos, em particular, como desenvolvere­
mos mais tarde, os interesses de classes já determinadas pela divisão do 
trabalho, as quais se diferenciam em todo agrupamento desse gênero e 
das quais uma domina as outras. Conseqüentemente, todas as lutas no 
interior do Estado, a luta entre a democracia, a aristocracia e a monar­
quia, a luta pelo direito de voto etc., etc., nada mais são do que formas 
ilusórias, sob as quais são conduzidas as lutas efetivas das diferentes 
classes entre si (do que os teóricos alemães nem suspeitam, embora 
nesse sentido se lhes tenha amplamente mostrado o caminho nos Anais 
Franco-alemães e ri A Sagrada Família'). Por isso, ocorre, também, que 
toda classe que aspire ao domínio (ainda que esse domínio determine 
a abolição de toda a antiga forma social e domínio em geral, como no 
caso do proletariado), deve, portanto, esta classe conquistar antes o 
poder político, para representar, por sua vez, o seu próprio interesse 
como sendo o Universal, ao qual ela está restrita nos primeiros tempos. 
Precisamente porque os indivíduos só procuram o seu interesse parti­
cular (que para eles não coincide com o intéresse coletivo, não sendo 
o Universal, senão uma forma ilusória da coletividade), esse interesse 
é representado como um interesse que lhes é “estranho”, que é “inde­
pendente” deles, sendo ele próprio, por sua vez, um interesse “geral”, 
especial e particular ou, então, devem se defrontar eles mesmos nesse 
desacordo, como na democracia. Por outro lado, o combate prático 
desses interesses particulares, que constantemente se chocam realmente, 
em relação aos interesses coletivos e ilusoriamente coletivos, torna 
necessária a intervenção prática e o refreamento pelo interesse “geral” 
ilusório sob forma de Estado.
59
O poderio social, isto é, a força produtiva décupla, nascida da 
cooperação dos diversos, indivíduos, condicionada pela divisão do tra­
balho, não aparece a esses indivíduos como a sua própria força na 
união, porque essa própria cooperação não é voluntária, mas natural. 
Ela lhes parece, ao contrário, como uma força estranha, situada fora 
deles,- da qual não sabem nem de onde vem nem para onde vai, a qual, 
portanto, não podem mais dominar e que, inversamente, percorre agora 
uma sequência particular de fases e de estágios de desenvolvimento tão 
independente da vontade e da marcha da humanidade que na verdade 
dirige esta vontade e esta marcha da humanidade. Para que esta “alie­
nação” seja inteligível aos filósofos, ela precis^ naturalmente, ser 
abolida sob duas condições práticas, Para que se torne uma força 
“insuportável”, isto é, uma força contra a qual se faz a revolução, é 
necessário que tenha feito da massa da humanidade uma massa total­
mente “privada de propriedade”, que se acha simultaneamente em 
contradição a um mundo existente da riqueza e da cultura, coisas que 
supõem um grande aumento da força produtiva, isto é, um estágio 
elevado do seu desenvolvimento. Por outro lado, esse desenvolvimento 
das forças produtivas (que já implica em que a existência empírica atual 
dos homens se desenrole sobre o platio da história mundial, ao invés de 
se desenrolar sobre aquele da vida local), esse desenvolvimento das for­
ças produtivas é uma condição prática prévia absolutamente indispensá­
vel, pois sem ele haveria a penúria geral, a carência, e a luta pelo neces­
sário que recomeçaria, recaindo-se fatalmente na mesma velha imundície. 
É igualmente uma condição prática sine qua non, porque as relações 
universais do gênero humano podem ser estabelecidas unicamente atra­
vés desse desenvolvimento universal das forças produtivas e porque este 
gera o fenômeno da massa “privada de propriedade”, simultaneamente 
em todos os países (concorrência universal) tornando cada um deles 
dependente dos transtornos dos outros e colocando, finalmente, homens 
empiricamente universais, históricos, no lugar dos indivíduos vivendo num 
plano local. Sem isso: l.°) o comunismo só poderia existir como fenôme­
no local; 2.°) as forças das próprias relações humanas não teriam podido 
se desenvolver como forças universais e, portanto, inexoráveis, e teriam 
permanecido como “circunstâncias” decorrentes das superstições locais; 
e 3.°) qualquer extensão das relações humanas aboliria o comunismo 
local. O comunismo só é empiricamente possível como o ato “repenti­
no” e simultâneo dos povos dominantes, o que supõe, por sua vez, o 
desenvolvimento universal da força produtiva e as relações universais 
estreitamente ligadas ao comunismo. De outra forma, por exemplo, de 
que maneira .poderia a propriedade, no final das contas, .ter uma história, 
60
tomar diferentes formas? Como, digamos, teria a propriedade rural 
podido, nas condições adversas que se apresentaram, passar na França, 
do desmembramento à centralização, nas mãos de uns poucos; e, na 
Inglaterra, da centralização nas mãos de uns poucos ao desmembra­
mento, como é hoje efetivamente o caso? Ou então, como se explica 
o fato de o comércio, que no entanto representa a troca dos produtos 
dos indivíduos e de nações diferentes e nada além disso, dominar o 
mundo inteiro através da relação da oferta e procura (relação que, 
segundo um economista inglês, paira sobre a terra como a antiga 
fatalidade e distribui através de mão invisível a felicidade e a infelicidade 
entre os homens, funda impérios, destrói impérios, faz povos nascerem 
e desaparecerem). Uma vez abolida a base, a propriedade privada, e 
instaurada a regulamentação comunista da produção, que abole no 
homem o sentimento de estar diante do seu próprio produto como 
diante de uma coisa estranha, a força da relação da oferta e da procura 
é reduzida a zero e os homens retomam o seu poder, o intercâmbio, a 
produção, a sua modalidade de comportamento uns face aos outros.
O comunismo não é para nós um estado que deve ser criado, um 
ideal segundo o qual a realidade deve se regular. Nós chamamos 
comunismo o movimento real que abole o estado atual. As condições 
desse movimento resultam de bases atualmente existentes. Outrossim, 
a massa de simples trabalhadores (força de trabalho separada em massa 
do capital ou de toda espécie de satisfação limitada) e também a perda 
de trabalho, através da concorrência, e não mais a título temporário, 
tem como base prévia o mercado mundial, O proletariado só pode, 
portanto, existir na escala da história universal, da mesma forma que 
o comunismo, que é a ação, não pode absolutamente existir de outra 
forma que a de “existência histórica universal”. Existência histórica 
universal dos indivíduos, em outras palavras, existência diretamente 
ligada à história universal.
A forma das relações humanas, condicionada pelas forças de pro­
dução existentes em todos os estágios históricos que precedem o nosso, 
e condicionando-os por sua vez, é a sociedade burguesa que, como ele, 
já resulta daquilo que o precede, tem como condição prévia e base 
fundamental a família simples e a família composta, o que se denomina 
tribo, cujas definições mais precisas já foram dadas acima. Já é, 
portanto, evidente que esta sociedade burguesa é o verdadeiro lar, 
verdadeiro teatro de toda história e vê-se a que ponto a concepção 
passada da história era um não-senso,'negligenciando as relações reaise limitando-se aos grandes e estrondosos acontecimentos históricos 'e 
61
políticos. A sociedade burguesa reúne o conjunto das relações materiais 
dos indivíduos, em um estágio de desenvolvimento determinado das 
forças produtivas.. Ela abrange o conjunto da vida comercial e industrial 
de um estágio e ultrapassa por esse mesmo meio o Estado e a nação, 
embora deva, por outro lado, afirmar-se exteriormente como nacionali­
dade e organizar-se internamente como Estado. O termo sociedade 
burguesa apareceu no século XVIII, a partir do momento em que as 
relações de propriedade foram desligadas da comunidade antiga e 
medieval. A sociedade burguesa como tal só se desenvolve com a 
burguesia. Todavia, a organização social nascida diretamente da pro­
dução e do comércio, e que forma em todos os temços a base do Estado 
e do resto da superestrutura idealista, continua a ser designada sob o 
mesmo nome.
60
tomar diferentes formas? Como, digamos, teria a propriedade rural 
podido, nas condições adversas que se apresentaram, passar na França, 
do desmembramento à centralização, nas mãos de uns poucos; e, na 
Inglaterra, da centralização nas mãos de uns poucos ao desmembra­
mento, como é hoje efetivamente o caso? Ou então, como se explica 
o fato de o comércio, que no entanto representa a troca dos produtos 
dos indivíduos e de nações diferentes e nada além disso, dominar o 
mundo inteiro através da relação da oferta e procura (relação que, 
segundo um economista inglês, paira sobre a terra como a antiga 
fatalidade e distribui através de mão invisível a felicidade e a infelicidade 
entre os homens, funda impérios, destrói impérios, faz povos nascerem 
e desaparecerem). Uma vez abolida a base, a propriedade privada, e 
instaurada a regulamentação comunista da produção, que abole no 
homem o sentimento de estar diante do seu próprio produto como 
diante de uma coisa estranha, a força da relação da oferta e da procura 
é reduzida a zero e os homens retomam o seu poder, o intercâmbio, a 
produção, a sua modalidade de comportamento uns face aos outros.
O comunismo não é para nós um estado que deve ser criado, um 
ideal segundo o qual a realidade deve se regular. Nós chamamos 
comunismo o movimento real que abole o estado atual. As condições 
desse movimento resultam de bases atualmente existentes. Outrossim, 
a massa de simples trabalhadores (força de trabalho separada em massa 
do capital ou de toda espécie de satisfação limitada) e também a perda 
de trabalho, através da concorrência, e não mais a título temporário, 
tem como base prévia o mercado mundial, O proletariado só pode, 
portanto, existir na escala da história universal, da mesma forma que 
o comunismo, que é a ação, não pode absolutamente existir de outra 
forma que a de “existência histórica universal”. Existência histórica 
universal dos indivíduos, em outras palavras, existência diretamente 
ligada à história universal.
A forma das relações humanas, condicionada pelas forças de pro­
dução existentes em todos os estágios históricos que precedem o nosso, 
e condicionando-os por sua vez, é a sociedade burguesa que, como ele, 
já resulta daquilo que o precede, tem como condição prévia e base 
fundamental a família simples e a família composta, o que se denomina 
tribo, cujas definições mais precisas já foram dadas acima. Já é, 
portanto, evidente que esta sociedade burguesa é o verdadeiro lar, 
verdadeiro teatro de toda história e vê-se a que ponto a concepção 
passada da história era um não-senso,'negligenciando as relações reais 
e limitando-se aos grandes e estrondosos acontecimentos históricos 'e 
61
políticos. A sociedade burguesa reúne o conjunto das relações materiais 
dos indivíduos, em um estágio de desenvolvimento determinado das 
forças produtivas.. Ela abrange o conjunto da vida comercial e industrial 
de um estágio e ultrapassa por esse mesmo meio o Estado e a nação, 
embora deva, por outro lado, afirmar-se exteriormente como nacionali­
dade e organizar-se internamente como Estado. O termo sociedade 
burguesa apareceu no século XVIII, a partir do momento em que as 
relações de propriedade foram desligadas da comunidade antiga e 
medieval. A sociedade burguesa como tal só se desenvolve com a 
burguesia. Todavia, a organização social nascida diretamente da pro­
dução e do comércio, e que forma em todos os temços a base do Estado 
e do resto da superestrutura idealista, continua a ser designada sob o 
mesmo nome.
2. CONDIÇÕES HISTÓRICAS DA 
REPRODUÇÃO SOCIAL *
Quando estudamos um país determinado, do ponto de vista da 
economia política, começamos por sua população, a divisão desta em 
classes, seu estabelecimento nas cidades, nos campos, na orla marítima; 
os diferentes ramos da produção, a exportação e a importação, a pro­
dução e o consumo anuais, os preços das mercadorias etc. Parece mais 
correto começar pelo que há de concreto e real nos dados; assim, pois, 
na economia, pela população, que é a base e sujeito de todo o ato social 
da produção. Todavia, bem analisado, este método seria falso. A 
população é uma abstração se deixo de lado as classes que a compõem. 
Estas classes são, por sua vez, uma palavra sem sentido se ignoro os 
elementos sobre os quais repousam, por exemplo: o trabalho assalaria­
do, o capital etc. Estes supõem a troca, a divisão do trabalho, os preços 
etc. O capital, por exemplo, não é nada sem trabalho assalariado, sem 
valor, dinheiro, preços etc. Se começasse, portanto, pela população, 
elaboraria uma representação caótica do todo e, por meio de uma 
determinação mais estrita, chegaria analiticamente, cada vez mais, a 
conceitos mais simples; do concreto representado chegaria a abstrações 
cada vez mais tênues, até alcançar as determinações mais simples. Che­
gado a este ponto, teria que voltar a fazer a viagem de modo inverso, 
até dar de novo com a população, mas desta vez não com uma re­
presentação caótica de um todo, porém com uma rica totalidade de 
determinações e relações diversas. O primeiro constitui o caminho que 
foi historicamente seguido pela nascente economia política. Os econo­
mistas do século XVII, por exemplo, começam sempre pelo todo vivo: 
a população, a nação, o Estado, vários Estados etc., mas terminam 
sempre por descobrir, por meio da análise, certo número de relações 
* Reproduzido de Marx,. K. “Posfácio.” In: Contribuição à Crítica da Economia 
Política. Trad. por Florestan Fernandes, São Pavio, Ed. Flama, 1946. p. 219-31.
63
gerais abstratas que são determinantes, tais como a divisão do trabalho, 
o dinheiro, o valor etc. Estes elementos isolados, uma vez que são mais 
ou menos fixados e abstraídos, dão origem aos sistemas econômicos, 
que se elevam do simples, tal como Trabalho, Divisão do Trabalho, 
Necessidade, Valor de Troca, até o Estado, a Troca entre as Nações e 
o Mercado Universal. O último método é manifestamente o método 
cientificamente exato. O concreto é concreto, porque é a síntese de 
muitas determinações, isto é, unidade do diverso. Por isso, o concreto 
aparece no pensamento como o processo da síntese, como resultado, 
não como ponto de partida, embora seja o verdadeiro ponto de partida 
e, portanto, o ponto de partida também da percepção e da representação. 
No primeiro método, a representação plena volatiliza-se na determina­
ção abstrata; no segundo, as determinações abstratas conduzem à repro­
dução do concreto por meio do pensamento. Assim, é que Hegel chegou 
à ilusão de conceber o real como resultado do pensamento que se 
absorve em sl, procede de si, move-se por si; enquanto o método que 
consiste em elevar-se do abstrato' aó~ concreto 'não e' senão "a maneira de 
proceder do pensamento para se apropriar do concreto, para reproduzi-lo 
mentalmente como coisa concreta. Porém isto não é, de nenhum modo, 
o processo da gênese do próprio concreto. A mais simples categoria 
econômica, suponhamos, por exemplo, o valor de troca, pressupõe a 
população, uma população que produz em determinadas condições e 
também certo tipo de famílias, de comunidadesou Estados. Tal valor 
nunca poderia existir de outro modo senão como relação unilateral- 
-abstrata de um todo concreto e vivo já determinado.
Como categoria, ao contrário, o valor de troca leva consigo uma 
existência antediluviana. Para a consciência — e a consciência filosó­
fica é determinada de tal modo que, para ela, o pensamento que concebe 
é o homem real, e o mundo concebido é, como tal, o único mundo real 
— para a consciência, pois, o movimento das categorias aparece como 
o verdadeiro ato de produção — que apenas recebe um impulso do 
exterior -—■ cujo resultado é o mundo, e isto é exato porque (aqui temos 
de novo uma tautologia) a totalidade concreta, como totalidade de 
pensamento, como uma concreção de pensamento, é, na realidade, um 
produto do pensar, do conceber; não é de nenhum modo o produto 
do conceito que se engendra a si mesmo e que concebe separadamente 
e acima da percepção e da representação, mas é elaboração da percep­
ção e da representação em conceitos. O todo, tal como aparece no 
cérebro, como um todo mental, é um produto do cérebro pensante, que 
se apropria do mundo da única maneira em que o pode fazer, maneira 
que difere do modo artístico, religioso e prático de se apropriar dele. O 
2. CONDIÇÕES HISTÓRICAS DA 
REPRODUÇÃO SOCIAL *
Quando estudamos um país determinado, do ponto de vista da 
economia política, começamos por sua população, a divisão desta em 
classes, seu estabelecimento nas cidades, nos campos, na orla marítima; 
os diferentes ramos da produção, a exportação e a importação, a pro­
dução e o consumo anuais, os preços das mercadorias etc. Parece mais 
correto começar pelo que há de concreto e real nos dados; assim, pois, 
na economia, pela população, que é a base e sujeito de todo o ato social 
da produção. Todavia, bem analisado, este método seria falso. A 
população é uma abstração se deixo de lado as classes que a compõem. 
Estas classes são, por sua vez, uma palavra sem sentido se ignoro os 
elementos sobre os quais repousam, por exemplo: o trabalho assalaria­
do, o capital etc. Estes supõem a troca, a divisão do trabalho, os preços 
etc. O capital, por exemplo, não é nada sem trabalho assalariado, sem 
valor, dinheiro, preços etc. Se começasse, portanto, pela população, 
elaboraria uma representação caótica do todo e, por meio de uma 
determinação mais estrita, chegaria analiticamente, cada vez mais, a 
conceitos mais simples; do concreto representado chegaria a abstrações 
cada vez mais tênues, até alcançar as determinações mais simples. Che­
gado a este ponto, teria que voltar a fazer a viagem de modo inverso, 
até dar de novo com a população, mas desta vez não com uma re­
presentação caótica de um todo, porém com uma rica totalidade de 
determinações e relações diversas. O primeiro constitui o caminho que 
foi historicamente seguido pela nascente economia política. Os econo­
mistas do século XVII, por exemplo, começam sempre pelo todo vivo: 
a população, a nação, o Estado, vários Estados etc., mas terminam 
sempre por descobrir, por meio da análise, certo número de relações 
* Reproduzido de Marx,. K. “Posfácio.” In: Contribuição à Crítica da Economia 
Política. Trad. por Florestan Fernandes, São Pavio, Ed. Flama, 1946. p. 219-31.
63
gerais abstratas que são determinantes, tais como a divisão do trabalho, 
o dinheiro, o valor etc. Estes elementos isolados, uma vez que são mais 
ou menos fixados e abstraídos, dão origem aos sistemas econômicos, 
que se elevam do simples, tal como Trabalho, Divisão do Trabalho, 
Necessidade, Valor de Troca, até o Estado, a Troca entre as Nações e 
o Mercado Universal. O último método é manifestamente o método 
cientificamente exato. O concreto é concreto, porque é a síntese de 
muitas determinações, isto é, unidade do diverso. Por isso, o concreto 
aparece no pensamento como o processo da síntese, como resultado, 
não como ponto de partida, embora seja o verdadeiro ponto de partida 
e, portanto, o ponto de partida também da percepção e da representação. 
No primeiro método, a representação plena volatiliza-se na determina­
ção abstrata; no segundo, as determinações abstratas conduzem à repro­
dução do concreto por meio do pensamento. Assim, é que Hegel chegou 
à ilusão de conceber o real como resultado do pensamento que se 
absorve em sl, procede de si, move-se por si; enquanto o método que 
consiste em elevar-se do abstrato' aó~ concreto 'não e' senão "a maneira de 
proceder do pensamento para se apropriar do concreto, para reproduzi-lo 
mentalmente como coisa concreta. Porém isto não é, de nenhum modo, 
o processo da gênese do próprio concreto. A mais simples categoria 
econômica, suponhamos, por exemplo, o valor de troca, pressupõe a 
população, uma população que produz em determinadas condições e 
também certo tipo de famílias, de comunidades ou Estados. Tal valor 
nunca poderia existir de outro modo senão como relação unilateral- 
-abstrata de um todo concreto e vivo já determinado.
Como categoria, ao contrário, o valor de troca leva consigo uma 
existência antediluviana. Para a consciência — e a consciência filosó­
fica é determinada de tal modo que, para ela, o pensamento que concebe 
é o homem real, e o mundo concebido é, como tal, o único mundo real 
— para a consciência, pois, o movimento das categorias aparece como 
o verdadeiro ato de produção — que apenas recebe um impulso do 
exterior -—■ cujo resultado é o mundo, e isto é exato porque (aqui temos 
de novo uma tautologia) a totalidade concreta, como totalidade de 
pensamento, como uma concreção de pensamento, é, na realidade, um 
produto do pensar, do conceber; não é de nenhum modo o produto 
do conceito que se engendra a si mesmo e que concebe separadamente 
e acima da percepção e da representação, mas é elaboração da percep­
ção e da representação em conceitos. O todo, tal como aparece no 
cérebro, como um todo mental, é um produto do cérebro pensante, que 
se apropria do mundo da única maneira em que o pode fazer, maneira 
que difere do modo artístico, religioso e prático de se apropriar dele. O 
64
objeto concreto permanece em pé antes e depois, em sua independência 
e fora do cérebro ao mesmo tempo, isto é, o cérebro não se comporta 
senão especulativamente, teoricamente. No método também teórico [da 
economia política], o objeto — a sociedade — deve, pois, achar-se 
sempre presente ao espírito, como pressuposição.
Porém, estas categorias simples não têm também uma existência 
independente, histórica ou natural, anterior às categorias mais concre­
tas? Ça depend. 1 Hegel, por exemplo, começa corretamente sua 
Rechtsphilosophie pela posse, como a mais simples relação jurídica do 
sujeito. Todavia, não existe posse anterior à família e às relações entre 
senhores e escravos, que são relações muito mais concretas ainda. 
Como compensação, seria justo dizer que existem famílias, tribos, que 
se limitam a possuir, mas não têm propriedade. A categoria mais sim­
ples aparece, pois, como relação de comunidades de famílias ou de 
tribos com a propriedade. Na sociedade primitiva aparece como a 
relação mais simples de um organismo desenvolvido, mas subentende-se 
sempre o substrato mais concreto, cuja relação é a posse. Pode-se 
imaginar um selvagem isolado que possua coisas. Mas neste caso a 
posse não é uma relação jurídica.
Não é exato que‘ a posse evolua historicamente até a família. A 
posse sempre pressupõe esta “categoria jurídica mais concreta”. Entre­
tanto, restaria sempre o seguinte: as categorias simples são a expressão 
de relações nas quais o concreto menos desenvolvido tem podido se 
realizar sem haver estabelecido ainda a relação mais complexa, que se 
acha expressa mentalmente na categoria concreta, enquanto o concreto 
mais desenvolvido conserva a mesma categoria • como uma relação 
subordinada.
O dinheiro pode existir, e existiu historicamente, antes que exis­
tisse o capital, antes que existissem os Bancos, antes que existisse o 
trabalho assalariado. Deste ponto de vista pode-se dizer que a categoria 
simplespode exprimir relações dominantes de um todo pouco desenvol­
vido ainda, relações que já existiam antes que o todo tivesse se 
desenvolvido na direção que é expressa em uma categoria mais completa. 
Neste sentido, as leis do pensamento abstrato que se eleva do mais 
simples ao complexo, correspondem ao processo histórico real.
De outro lado, pode-se dizer que há formas de sociedade muito 
desenvolvidas, embora historicamente não tenham atingido ainda sua 
1 Em francês, no original.
65
maturidade, nas quais se encontram as formas mais elevadas da econo­
mia, tais como a cooperação, uma divisão do trabalho desenvolvida, 
sem que exista nelas o dinheiro; o Peru, por exemplo.
Também nas comunidades eslavas o dinheiro e a troca que o 
condiciona desempenham um papel insignificante ou nulo, mas apare­
cem em suas fronteiras, nas suas relações com as outras comunidades. 
Além disso, é um erro situar a troca no interior das comunidades como 
elemento que as constitui originariamente. A princípio surge antes nas 
relações recíprocas entre as distintas comunidades do que nas relações 
entre os membros de uma mesma e única comunidade.
Além disso, embora o dinheiro tenha desempenhado oportunamen­
te, e por toda parte, desde os antigos, um papel como elemento domi­
nante, não aparece na Antiguidade senão em nações desenvolvidas 
unilateralmente em determinado sentido, e ainda na Antiguidade mais 
culta, entre os gregos e os romanos, não atinge seu completo desenvol­
vimento, supondo completo o da moderna sociedade burguesa, senão 
no período de dissolução. Esta simplíssima categoria alcança historica­
mente, portanto, seu ponto culminante somente nas condições mais 
desenvolvidas da sociedade. E o dinheiro não entrava (?)> de nenhum 
modo, em todas as relações econômicas; assim, no Império Romano, 
na época de seu perfeito desenvolvimento, permaneceram como funda­
mentais o imposto e o empréstimo em frutos naturais. O sistema do 
dinheiro, propriamente falando, encontrava-se ali completamente desen­
volvido unicamente no exército, e não tinha participação na totalidade 
do trabalho.
De modo que, embora a categoria mais simples tenha podido 
existir historicamente antes que a mais concreta, não pode precisamente 
pertencer em seu. pleno desenvolvimento, interno e externo, senão a 
formações sociais compostas (?), enquanto que a categoria mais con­
creta se achava plenamente desenvolvida em. uma forma de sociedade 
menos avançada.
O trabalho é uma categoria inteiramente simples. E também, a 
concepção do trabalho neste sentido geral — como trabalho em geral 
__ é muito antiga. Entretanto, concebido economicamente sob esta 
simplicidade, o trabalho é uma categoria tão moderna como o são as 
condições que engendram, esta abstração. Por exemplo, o sistema mo­
netário coloc.a a riqueza sem exceção objetivamente ainda no 
- Há duas palavras indecifráveis.
64
objeto concreto permanece em pé antes e depois, em sua independência 
e fora do cérebro ao mesmo tempo, isto é, o cérebro não se comporta 
senão especulativamente, teoricamente. No método também teórico [da 
economia política], o objeto — a sociedade — deve, pois, achar-se 
sempre presente ao espírito, como pressuposição.
Porém, estas categorias simples não têm também uma existência 
independente, histórica ou natural, anterior às categorias mais concre­
tas? Ça depend. 1 Hegel, por exemplo, começa corretamente sua 
Rechtsphilosophie pela posse, como a mais simples relação jurídica do 
sujeito. Todavia, não existe posse anterior à família e às relações entre 
senhores e escravos, que são relações muito mais concretas ainda. 
Como compensação, seria justo dizer que existem famílias, tribos, que 
se limitam a possuir, mas não têm propriedade. A categoria mais sim­
ples aparece, pois, como relação de comunidades de famílias ou de 
tribos com a propriedade. Na sociedade primitiva aparece como a 
relação mais simples de um organismo desenvolvido, mas subentende-se 
sempre o substrato mais concreto, cuja relação é a posse. Pode-se 
imaginar um selvagem isolado que possua coisas. Mas neste caso a 
posse não é uma relação jurídica.
Não é exato que‘ a posse evolua historicamente até a família. A 
posse sempre pressupõe esta “categoria jurídica mais concreta”. Entre­
tanto, restaria sempre o seguinte: as categorias simples são a expressão 
de relações nas quais o concreto menos desenvolvido tem podido se 
realizar sem haver estabelecido ainda a relação mais complexa, que se 
acha expressa mentalmente na categoria concreta, enquanto o concreto 
mais desenvolvido conserva a mesma categoria • como uma relação 
subordinada.
O dinheiro pode existir, e existiu historicamente, antes que exis­
tisse o capital, antes que existissem os Bancos, antes que existisse o 
trabalho assalariado. Deste ponto de vista pode-se dizer que a categoria 
simples pode exprimir relações dominantes de um todo pouco desenvol­
vido ainda, relações que já existiam antes que o todo tivesse se 
desenvolvido na direção que é expressa em uma categoria mais completa. 
Neste sentido, as leis do pensamento abstrato que se eleva do mais 
simples ao complexo, correspondem ao processo histórico real.
De outro lado, pode-se dizer que há formas de sociedade muito 
desenvolvidas, embora historicamente não tenham atingido ainda sua 
1 Em francês, no original.
65
maturidade, nas quais se encontram as formas mais elevadas da econo­
mia, tais como a cooperação, uma divisão do trabalho desenvolvida, 
sem que exista nelas o dinheiro; o Peru, por exemplo.
Também nas comunidades eslavas o dinheiro e a troca que o 
condiciona desempenham um papel insignificante ou nulo, mas apare­
cem em suas fronteiras, nas suas relações com as outras comunidades. 
Além disso, é um erro situar a troca no interior das comunidades como 
elemento que as constitui originariamente. A princípio surge antes nas 
relações recíprocas entre as distintas comunidades do que nas relações 
entre os membros de uma mesma e única comunidade.
Além disso, embora o dinheiro tenha desempenhado oportunamen­
te, e por toda parte, desde os antigos, um papel como elemento domi­
nante, não aparece na Antiguidade senão em nações desenvolvidas 
unilateralmente em determinado sentido, e ainda na Antiguidade mais 
culta, entre os gregos e os romanos, não atinge seu completo desenvol­
vimento, supondo completo o da moderna sociedade burguesa, senão 
no período de dissolução. Esta simplíssima categoria alcança historica­
mente, portanto, seu ponto culminante somente nas condições mais 
desenvolvidas da sociedade. E o dinheiro não entrava (?)> de nenhum 
modo, em todas as relações econômicas; assim, no Império Romano, 
na época de seu perfeito desenvolvimento, permaneceram como funda­
mentais o imposto e o empréstimo em frutos naturais. O sistema do 
dinheiro, propriamente falando, encontrava-se ali completamente desen­
volvido unicamente no exército, e não tinha participação na totalidade 
do trabalho.
De modo que, embora a categoria mais simples tenha podido 
existir historicamente antes que a mais concreta, não pode precisamente 
pertencer em seu. pleno desenvolvimento, interno e externo, senão a 
formações sociais compostas (?), enquanto que a categoria mais con­
creta se achava plenamente desenvolvida em. uma forma de sociedade 
menos avançada.
O trabalho é uma categoria inteiramente simples. E também, a 
concepção do trabalho neste sentido geral — como trabalho em geral 
__ é muito antiga. Entretanto, concebido economicamente sob esta 
simplicidade, o trabalho é uma categoria tão moderna como o são as 
condições que engendram, esta abstração. Por exemplo, o sistema mo­
netário coloc.a a riqueza sem exceção objetivamente ainda no 
- Há duas palavras indecifráveis.
66
dinheiro. Deste ponto de vista, houve um grande progresso quando o 
sistema manufatureiro ou comercial colocou, o manancial da riqueza 
não no objeto, mas na atividade subjetiva ■— o trabalho comercial e 
manufatureiro. Contudo, concebia-a ainda no sentido restrito de uma 
atividadeprodutora de dinheiro. Em relação com este sistema, o dos 
fisiocratas (um novo progresso) é assim: estabelece uma forma determi­
nada de trabalho — a agricultura —- como criadora de riqueza, e o 
próprio objeto não aparece já sob o disfarce do dinheiro, mas como 
produto em geral, como resultado geral do trabalho. Mas este produto, 
de conformidade com. as limitações da atividade, é sempre um produto 
natural. A agricultura produz a terra, produz par excellence. 8 Pro­
grediu-se imensamente quando Adam Smith repeliu todo caráter deter­
minado da atividade-que^cqa a riqueza, quando [estabeleceu] o trabalho 
simplesmente;' não o trabalho manufatureiro, não o comercial, não o 
agrícola, mas tanto uns quanto os outros. Com a generalidade abstrata 
da atividade qúe cria a riqueza, temos agora a generalidade do objeto 
determinado como riqueza, o produto em geral ou, uma vez mais, o 
trabalho em geral, mas como trabalho passado realizado. A dificuldade 
e importância desta transição prova-o o fato de que o próprio Adam 
Smith torna a cair, de quando em quando, no sistema fisiocrático. 
Poderia parecer agora que, deste modo, se teria encontrado unicamente 
a expressão abstrata da relação mais simples e mais antiga em que 
entram os homens — em qualquer forma de sociedade — enquanto 
são produtores. Isto é certo em um sentido. Mas não em outro.
A indiferença em relação a um gênero determinado de trabalho 
pressupõe uma totalidade muito desenvolvida de gêneros de trabalhos 
reais, nenhum, dos quais domina os demais. Tampouco se produzem 
as abstrações mais gerais senão onde existe o desenvolvimento concreto 
mais rico, onde uma coisa aparece como comum a muitos indivíduos, 
comum a todos. Então já não pode ser imaginada somente sob uma 
forma particular. De outro lado, esta abstração do trabalho em geral 
não é mais que o resultado de uma totalidade concreta de trabalhos. 
A indiferença em relação ao trabalho determinado corresponde a uma 
forma de sociedade na qual os indivíduos podem passar com facilidade 
de um trabalho a outro e na qual o gênero determinado de trabalho é 
fortuito, e, portanto, é-lhes indiferente. Neste caso o trabalho se tem 
convertido, não só categoricamente, mas realmente em um meio de 
produzir riqueza em geral, deixando de se confundir com o indivíduo 
« Em francês, no original.
67
como um objetivo especial. Este estado de coisas é o mais desenvolvido 
na forma de existência mais moderna da sociedade burguesa — nos 
Estados Unidos. Assim, pois, neste caso, a abstração da categoria 
“trabalho”, “trabalho em geral”, trabalho sans phrase, •' ponto de par­
tida da economia moderna, torna-se, pela primeira vez, praticamente 
certa. De modo que a abstração mais simples, que coloca em primeiro 
lugar a economia moderna e que expressa uma relação antiga e válida 
para todas as formas de sociedade, não aparece, entretanto, como prati­
camente certa nesta abstração senão como categoria da mais moderna 
sociedade. Poder-se-ia dizer que tudo o que surge nos Estados Unidos 
como um produto histórico ocorre entre os russos, por exemplo — 
trata-se desta indiferença em relação ao trabalho determinado — 
como uma disposição natural. Em primeiro lugar, há uma diferença 
enorme entre os bárbaros aptos para serem empregados em qualquer 
coisa e civilizados que se dedicam eles próprios a tudo. E, além disso, 
praticamente, a esta indiferença em relação ao trabalho determinado 
corresponde, nos russos, o fato de que se encontram submetidos tradi­
cionalmente a um trabalho bem determinado, do qual só as influências 
exteriores podem arrancá-los.
Este exemplo mostra, de uma maneira clara, como até as categorias 
mais abstratas, apesar de sua validade — precisamente por causa de 
sua natureza abstrata — para todas as épocas, são, contudo, no que 
há de determinado nesta abstração, do mesmo modo, o produto de 
condições históricas, e não possuem plena validez senão para estas 
condições e dentro dos limites destas mesmas condições.
A sociedade burguesa é a organização histórica da produção mais 
desenvolvida, mais diferenciada. As categorias que exprimem suas 
condições, a compreensão de sua própria organização, a tornam apta 
para abarcar a organização e as relações de produção de todas as 
formas de sociedade desaparecidas, sobre cujas ruínas e elementos se 
acha edificada, e cujos vestígios, não ultrapassados ainda, leva arras­
tando, enquanto que tudo o que fora antes apenas indicado se desen­
volveu, tomando toda sua significação etc. A anatomia do homem é 
a chave da anatomia do mono. O que nas espécies animais inferiores 
indica uma forma superior, não pode, ao contrário, ser compreendida 
senão quando se conhece a forma superior. A economia burguesa 
fornece a chave da economia antiga etc. Porém, não conforme o 
método dos economistas, que fazem- desaparecer todas as diferenças
4 Em francês, no original.
66
dinheiro. Deste ponto de vista, houve um grande progresso quando o 
sistema manufatureiro ou comercial colocou, o manancial da riqueza 
não no objeto, mas na atividade subjetiva ■— o trabalho comercial e 
manufatureiro. Contudo, concebia-a ainda no sentido restrito de uma 
atividade produtora de dinheiro. Em relação com este sistema, o dos 
fisiocratas (um novo progresso) é assim: estabelece uma forma determi­
nada de trabalho — a agricultura —- como criadora de riqueza, e o 
próprio objeto não aparece já sob o disfarce do dinheiro, mas como 
produto em geral, como resultado geral do trabalho. Mas este produto, 
de conformidade com. as limitações da atividade, é sempre um produto 
natural. A agricultura produz a terra, produz par excellence. 8 Pro­
grediu-se imensamente quando Adam Smith repeliu todo caráter deter­
minado da atividade-que^cqa a riqueza, quando [estabeleceu] o trabalho 
simplesmente;' não o trabalho manufatureiro, não o comercial, não o 
agrícola, mas tanto uns quanto os outros. Com a generalidade abstrata 
da atividade qúe cria a riqueza, temos agora a generalidade do objeto 
determinado como riqueza, o produto em geral ou, uma vez mais, o 
trabalho em geral, mas como trabalho passado realizado. A dificuldade 
e importância desta transição prova-o o fato de que o próprio Adam 
Smith torna a cair, de quando em quando, no sistema fisiocrático. 
Poderia parecer agora que, deste modo, se teria encontrado unicamente 
a expressão abstrata da relação mais simples e mais antiga em que 
entram os homens — em qualquer forma de sociedade — enquanto 
são produtores. Isto é certo em um sentido. Mas não em outro.
A indiferença em relação a um gênero determinado de trabalho 
pressupõe uma totalidade muito desenvolvida de gêneros de trabalhos 
reais, nenhum, dos quais domina os demais. Tampouco se produzem 
as abstrações mais gerais senão onde existe o desenvolvimento concreto 
mais rico, onde uma coisa aparece como comum a muitos indivíduos, 
comum a todos. Então já não pode ser imaginada somente sob uma 
forma particular. De outro lado, esta abstração do trabalho em geral 
não é mais que o resultado de uma totalidade concreta de trabalhos. 
A indiferença em relação ao trabalho determinado corresponde a uma 
forma de sociedade na qual os indivíduos podem passar com facilidade 
de um trabalho a outro e na qual o gênero determinado de trabalho é 
fortuito, e, portanto, é-lhes indiferente. Neste caso o trabalho se tem 
convertido, não só categoricamente, mas realmente em um meio de 
produzir riqueza em geral, deixando de se confundir com o indivíduo 
« Em francês, no original.
67
como um objetivo especial. Este estado de coisas é o mais desenvolvido 
na forma de existência mais moderna da sociedade burguesa — nos 
Estados Unidos. Assim, pois, neste caso, a abstração da categoria 
“trabalho”, “trabalho em geral”, trabalho sans phrase, •' ponto de par­
tida da economia moderna, torna-se, pela primeira vez, praticamente 
certa. De modo que a abstração mais simples, que coloca em primeiro 
lugar a economia moderna e que expressa uma relação antiga e válida 
para todas as formas desociedade, não aparece, entretanto, como prati­
camente certa nesta abstração senão como categoria da mais moderna 
sociedade. Poder-se-ia dizer que tudo o que surge nos Estados Unidos 
como um produto histórico ocorre entre os russos, por exemplo — 
trata-se desta indiferença em relação ao trabalho determinado — 
como uma disposição natural. Em primeiro lugar, há uma diferença 
enorme entre os bárbaros aptos para serem empregados em qualquer 
coisa e civilizados que se dedicam eles próprios a tudo. E, além disso, 
praticamente, a esta indiferença em relação ao trabalho determinado 
corresponde, nos russos, o fato de que se encontram submetidos tradi­
cionalmente a um trabalho bem determinado, do qual só as influências 
exteriores podem arrancá-los.
Este exemplo mostra, de uma maneira clara, como até as categorias 
mais abstratas, apesar de sua validade — precisamente por causa de 
sua natureza abstrata — para todas as épocas, são, contudo, no que 
há de determinado nesta abstração, do mesmo modo, o produto de 
condições históricas, e não possuem plena validez senão para estas 
condições e dentro dos limites destas mesmas condições.
A sociedade burguesa é a organização histórica da produção mais 
desenvolvida, mais diferenciada. As categorias que exprimem suas 
condições, a compreensão de sua própria organização, a tornam apta 
para abarcar a organização e as relações de produção de todas as 
formas de sociedade desaparecidas, sobre cujas ruínas e elementos se 
acha edificada, e cujos vestígios, não ultrapassados ainda, leva arras­
tando, enquanto que tudo o que fora antes apenas indicado se desen­
volveu, tomando toda sua significação etc. A anatomia do homem é 
a chave da anatomia do mono. O que nas espécies animais inferiores 
indica uma forma superior, não pode, ao contrário, ser compreendida 
senão quando se conhece a forma superior. A economia burguesa 
fornece a chave da economia antiga etc. Porém, não conforme o 
método dos economistas, que fazem- desaparecer todas as diferenças
4 Em francês, no original.
68
históricas e vêem a forma burguesa em todas as formas de sociedade. 
Pode-se compreender o tributo, o dízimo, quando se compreende a 
renda territorial. Mas, não se deve identificá-los.
Como, além disso, a sociedade burguesa não é, em si, mais do 
que uma forma antagônica do desenvolvimento, certas relações perten­
centes a formas anteriores nela só poderão ser novamente encontradas 
completamente esmaecidas ou mesmo disfarçadas; por exemplo, a pro­
priedade comunal. Se é certo, portanto, que as categorias da economia 
burguesa ocorrem em todas as demais formas de sociedade não se deve 
tomar isto senão cum grano salis. Podem ser contidas, desenvolvidas, 
esmaecidas, caricaturadas, mas sempre essencialmente distintas. A 
chamada evolução histórica descansa em geral no fato de que a última 
forma considera as formas ultrapassadas como graus que conduzem a 
ela, sendo capaz de criticar-se a si mesma alguma vez, e somente em 
condições muito determinadas ■— aqui não se trata, é óbvio, desses 
períodos históricos que se descobrem a si próprios — inclusive como 
tempos de decadência. A religião cristã não pôde ajudar a tomar 
compreensível, de uma maneira objetiva, as mitologias anteriores senão 
quando sua crítica de si mesma esteve, até certo ponto, dynameii isto é, 
acabada. Deste modo, a economia burguesa só chegou a compreender 
a sociedade feudal, antiga, oriental, quando a sociedade burguesa come­
çou a criticar-se a si mesma. Precisamente porque a economia burguesa 
não prestou atenção à mitologia e não se identificou simplesmente com 
o passado, sua crítica da [sociedade] anterior, especialmente da feudal, 
com a qual ainda tinha que lutar diretamente, se assemelhou à crítica 
que o cristianismo fez do paganismo ou o protestantismo do catolicismo.
Quando se estuda a marcha das categorias econômicas e, em geral, 
qualquer ciência social histórica, sempre convém recordar que o sujeito 
— a sociedade burguesa moderna, neste caso — se encontra determinado 
na mentalidade tanto quanto na realidade, e que as categorias, portanto, 
exprimem « formas de vida, determinações de existência, e amiúde so­
mente aspectos isolados desta sociedade determinada, deste sujeito, e 
que, por isso, a [economia política] não aparece também como ciência 
senão unicamente a partir do momento em que trata dela como tal. 
Deve-se recordar este fato, porque - dá imediatamente uma direção 
decisiva para a divisão que se precisa fazer.
Parece muito natural, por exemplo, que se comece pela renda 
territorial, a propriedade rural, porque se encontra ligada à terra, fonte 
de toda produção e vida, e à agricultura, primeira forma de produção 
em todas as sociedades, por pouco solidificadas que se achem. E, 
69
contudo, nada mais falso do que isto. Em todas as formas de sociedade 
se encontra uma produção determinada, superior a todas as demais, e 
cuja situação aponta sua posição e sua influência sobre as outras. É 
uma iluminação universal em que atuam todas as cores, e às quais 
modifica em sua particularidade. É um éter especial, que determina o 
peso específico de todas as coisas às quais põe em relevo.
Consideremos, por exemplo, os povos pastores (os simples povos 
caçadores ou pescadores não chegaram ao ponto em que começa o 
verdadeiro desenvolvimento). Neles existe certa forma esporádica de 
agricultura. A propriedade rural encontra-se determinada por ela. Esta 
propriedade é comum, e conserva mais ou menos festa forma, conforme 
aqueles povos se aferrem mais ou menos às suas tradições; por exemplo, 
a propriedade rural entre os eslavos. Onde predomina a agricultura, 
praticada por povos estabelecidos — e este estabelecimento já constitui 
um grande progress'o — como na sociedade antiga e feudal, a indústria,, 
com sua organização e as formas da propriedade que lhe correspondem, 
mantém também maiores ou menores traços característicos da proprie­
dade rural; [a sociedade] ou bem depende inteiramente da agricultura, 
como entre os antigos romanos, ou imita, como na Idade Média, a 
organização do campo nas relações da cidade. O próprio capital — 
enquanto não seja simples capital dinheiro •—- possui, na Idade Média, 
como utensílio (?) tradicional, este caráter de propriedade rural.
Na sociedade burguesa acontece o contrário. A agricultura trans- 
forma-se mais e mais em simples ramo da indústria e é dominada 
completamente pelo capital. A mesma coisa ocorre com a renda 
territorial. Em todas as formas em que domina a propriedade rural, a 
relação com a natureza é preponderante. Naquelas em que reina o 
capital, o que prevalece é o elemento social produzido historicamente. 
Não se compreende a renda territorial sem o capital; entretanto, com­
preende-se o capital sem a renda rural. O capital é a potência econô­
mica da sociedade burguesa, que domina tudo. Deve constituir o ponto 
inicial e o ponto final e ser desenvolvido antes da propriedade rural. 
Depois de ter considerado separadamente um e outro, deve-se estudar 
sua relação recíproca. Seria, pois, impraticável e errôneo colocar as 
categorias econômicas na ordem segundo a qual tiveram historicamente 
uma ação determinante. A ordem em que se sucedem se acha determi­
nada, ao contrário, pela relação que têm umas com as outras na 
sociedade burguesa moderna, e que é precisamente o inverso do que 
parece ser uma relação natural ou do que corresponde à série da evo­
lução histórica. Não se trata do lugar que as relações econômicas 
68
históricas e vêem a forma burguesa em todas as formas de sociedade. 
Pode-se compreender o tributo, o dízimo, quando se compreende a 
renda territorial. Mas, não se deve identificá-los.
Como, além disso, a sociedade burguesa não é, em si, mais do 
que uma forma antagônica do desenvolvimento, certas relações perten­
centes a formas anteriores nela só poderão ser novamente encontradas 
completamente esmaecidas ou mesmo disfarçadas; por exemplo, a pro­
priedade comunal. Se é certo, portanto, que as categoriasda economia 
burguesa ocorrem em todas as demais formas de sociedade não se deve 
tomar isto senão cum grano salis. Podem ser contidas, desenvolvidas, 
esmaecidas, caricaturadas, mas sempre essencialmente distintas. A 
chamada evolução histórica descansa em geral no fato de que a última 
forma considera as formas ultrapassadas como graus que conduzem a 
ela, sendo capaz de criticar-se a si mesma alguma vez, e somente em 
condições muito determinadas ■— aqui não se trata, é óbvio, desses 
períodos históricos que se descobrem a si próprios — inclusive como 
tempos de decadência. A religião cristã não pôde ajudar a tomar 
compreensível, de uma maneira objetiva, as mitologias anteriores senão 
quando sua crítica de si mesma esteve, até certo ponto, dynameii isto é, 
acabada. Deste modo, a economia burguesa só chegou a compreender 
a sociedade feudal, antiga, oriental, quando a sociedade burguesa come­
çou a criticar-se a si mesma. Precisamente porque a economia burguesa 
não prestou atenção à mitologia e não se identificou simplesmente com 
o passado, sua crítica da [sociedade] anterior, especialmente da feudal, 
com a qual ainda tinha que lutar diretamente, se assemelhou à crítica 
que o cristianismo fez do paganismo ou o protestantismo do catolicismo.
Quando se estuda a marcha das categorias econômicas e, em geral, 
qualquer ciência social histórica, sempre convém recordar que o sujeito 
— a sociedade burguesa moderna, neste caso — se encontra determinado 
na mentalidade tanto quanto na realidade, e que as categorias, portanto, 
exprimem « formas de vida, determinações de existência, e amiúde so­
mente aspectos isolados desta sociedade determinada, deste sujeito, e 
que, por isso, a [economia política] não aparece também como ciência 
senão unicamente a partir do momento em que trata dela como tal. 
Deve-se recordar este fato, porque - dá imediatamente uma direção 
decisiva para a divisão que se precisa fazer.
Parece muito natural, por exemplo, que se comece pela renda 
territorial, a propriedade rural, porque se encontra ligada à terra, fonte 
de toda produção e vida, e à agricultura, primeira forma de produção 
em todas as sociedades, por pouco solidificadas que se achem. E, 
69
contudo, nada mais falso do que isto. Em todas as formas de sociedade 
se encontra uma produção determinada, superior a todas as demais, e 
cuja situação aponta sua posição e sua influência sobre as outras. É 
uma iluminação universal em que atuam todas as cores, e às quais 
modifica em sua particularidade. É um éter especial, que determina o 
peso específico de todas as coisas às quais põe em relevo.
Consideremos, por exemplo, os povos pastores (os simples povos 
caçadores ou pescadores não chegaram ao ponto em que começa o 
verdadeiro desenvolvimento). Neles existe certa forma esporádica de 
agricultura. A propriedade rural encontra-se determinada por ela. Esta 
propriedade é comum, e conserva mais ou menos festa forma, conforme 
aqueles povos se aferrem mais ou menos às suas tradições; por exemplo, 
a propriedade rural entre os eslavos. Onde predomina a agricultura, 
praticada por povos estabelecidos — e este estabelecimento já constitui 
um grande progress'o — como na sociedade antiga e feudal, a indústria,, 
com sua organização e as formas da propriedade que lhe correspondem, 
mantém também maiores ou menores traços característicos da proprie­
dade rural; [a sociedade] ou bem depende inteiramente da agricultura, 
como entre os antigos romanos, ou imita, como na Idade Média, a 
organização do campo nas relações da cidade. O próprio capital — 
enquanto não seja simples capital dinheiro •—- possui, na Idade Média, 
como utensílio (?) tradicional, este caráter de propriedade rural.
Na sociedade burguesa acontece o contrário. A agricultura trans- 
forma-se mais e mais em simples ramo da indústria e é dominada 
completamente pelo capital. A mesma coisa ocorre com a renda 
territorial. Em todas as formas em que domina a propriedade rural, a 
relação com a natureza é preponderante. Naquelas em que reina o 
capital, o que prevalece é o elemento social produzido historicamente. 
Não se compreende a renda territorial sem o capital; entretanto, com­
preende-se o capital sem a renda rural. O capital é a potência econô­
mica da sociedade burguesa, que domina tudo. Deve constituir o ponto 
inicial e o ponto final e ser desenvolvido antes da propriedade rural. 
Depois de ter considerado separadamente um e outro, deve-se estudar 
sua relação recíproca. Seria, pois, impraticável e errôneo colocar as 
categorias econômicas na ordem segundo a qual tiveram historicamente 
uma ação determinante. A ordem em que se sucedem se acha determi­
nada, ao contrário, pela relação que têm umas com as outras na 
sociedade burguesa moderna, e que é precisamente o inverso do que 
parece ser uma relação natural ou do que corresponde à série da evo­
lução histórica. Não se trata do lugar que as relações econômicas 
70
ocupem, historicamente, na sucessão das diferentes formas da sociedade, 
Menos ainda de sua série “na idéia” (Proudhon), que não passa de 
uma representação falaz (?) do movimento histórico. Trata-se de sua 
conexão orgânica no interior da sociedade burguesa moderna.
A nitidez (caráter determinado abstrato) com que os povos comer­
ciantes — fenícios, cartagineses — apareceram no mundo antigo, pro­
vém, precisamente, da própria supremacia dos povos agricultores. O 
capital, como capital comercial ou capital dinheiro, aparece nesta 
abstração justamente onde o capital não é ainda um elemento prepon­
derante das sociedades. Os lombardos, os judeus, ocupam a mesma 
posição em. relação às sociedades medievais que praticam a agricultura.
Ainda pode servir de exemplo do papel distinto que as mesmas 
categorias desempenham em diferentes graus da sociedade, o seguinte: 
as sociedades por ações, uma das últimas formas da sociedade burguesa, 
aparecem também, em seus começos, nas grandes companhias comer­
ciais privilegiadas, desfrutadoras dos monopólios.
O conceito da riqueza nacional em si insinua-se no espírito dos 
economistas do século XVII sob a forma — e esta representação 
persiste em parte nos do século XVIII — de que a riqueza não se cria 
senão para o Estado, e que a potência do Estado é proporcional a esta 
riqueza. Também esta era uma forma inconscientemente hipócrita sob 
a qual a riqueza e a produção da mesma se expressavam como finalidade 
dos Estados modernos, e não se lhes considerava senão como meios 
para chegar a este fim.
A divisão deve, do começo, ser feita de maneira que [se de­
senvolvam], em primeiro lugar, as determinações gerais abstratas, que 
pertencem mais ou menos a todas as formas de sociedade, mas no 
sentido exposto anteriormente. Em. segundo lugar, as categorias que 
constituem a organização interior da sociedade burguesa, sobre as quais 
repousam as classes fundamentais. Capital. Trabalho assalariado. Pro­
priedade rural. Suas relações recíprocas. Cidade e campo. As três 
grandes classes sociais. A troca entre estas. Circulação. Crédito 
(privado). Em. terceiro lugar, a sociedade burguesa compreendida sob 
a forma de Estado. O Estado em si. As classes “improdutivas”. Im­
postos. Dívidas do Estado. O crédito público. A população. As colônias. 
Emigração. Em quarto lugar, relações internacionais da produção. 
Divisão internacional do trabalho. Troca internacional. Exportação e 
importação. Curso do câmbio. Em quinto lugar, o mercado mundial e 
as crises.
71
Produção. — Meios de produção e relações de produção. — 
Relações de produção e de distribuição. — Formas do Estado e da 
propriedade em sua relação com a produção e a distribuição. — 
Relações jurídicas. -—• Relações familiares.
Nota Bene — relação dos pontos que precisam ser mencionados 
aqui e que não devem ser esquecidos:
1) A guerra é desenvolvida antes que a paz. [Deveria expor] 
como pela guerra e nos exércitos etc., certos fenômenos econômicos, tais 
como o trabalho assalariado, o maquinismo etc., são desenvolvidos 
antes que no interiorestruturas do capitalismo. 
Marx estava consciente da relação de necessidade entre o mate­
rialismo dialético e o materialismo histórico, na interpretação do 
capitalismo. .
“O descobrimento tardio de que os produtos do trabalho, consi­
derados como valores, não são mais que expressões materiais do 
trabalho humano investido na sua produção, é um descobrimento 
que marca época na história do progresso humano 8
Seria enganoso pensar que a crítica da dialética hegeliana, 
do materialismo feuerbachiano, do socialismo utópico francês e 
da economia. política inglesa foi realizada segundo uma separação 
entre questões de método e problemas específicos do capitalismo 
ou ao acaso das oportunidades. Com isto não queremos sugerir 
que Marx prefigurou e programou todo o seu trabalho. É 
evidente que foi desenvolvendo, passo a passo, uma compreensão 
cada vez mais clara de problemas que tinha pela frente. Houve, 
inclusive, desenvolvimentos ou saltos revolucionários no interior 
da revolução científica realizada por Marx. Toda a sua obra é um 
documento vivo sobre a maneira pela qual foi percebendo, deli­
mitando, eliminando, enfrentando e resolvendo as questões. Nesse 
processo, a atividade política de Marx desempenhou, às vezes, 
um papel decisivo. O que interessa aqui, no entanto, é que, ao 
longo da sua obra, produz, simultaneamente, o método e a inter­
pretação do capitalismo. Não é por mero acaso que, em todas as 
suas análises, aborda, sempre e conjuntamente, os problemas do 
capitalismo e os do método de análise. Para mencionar três 
exemplos, no “Prefácio” e “Posfácio” da Contribuição à Crítica 
da Economia Política 3 4 — posfácio esse publicado depois como 
introdução de Elementos Fundamentais para a Crítica da Econo­
mia Política (Grundrisse) — e no posfácio da segunda edição do 
primeiro tomo de O Capital, Marx preocupou-se em explicitar 
alguns aspectos da dialética materialista. Compreendia que o 
3 Marx, K. El capitai t. I, p. 82-83; O Capital. Rio de Janeiro, Ed. Civi­
lização Brasileira, 1968. liv. 1, p. 83. Trad. por Reginaldo SanfAnna.
4 Marx, K. Contribuição à Crítica da Economia Política. São. Paulo, Ed. 
Flama, 1946. p. 30-31. Trad. por Florestan Fernandes.
11
objeto e o método de seu trabalho eram elementos necessários 
e encadeados do mesmo processo de conhecimento. Enquanto 
que, para Hegel, o processo do pensamento é o “demiurgo do 
real”, para Marx “o ideal não é senão o material traduzido e 
transposto na mente do homem”. 5 Marx havia descoberto os 
encadeamentos e as determinações recíprocas entre as condições 
de existência social e as idéias que expressam essafc condições na 
mente do Homem. Isso era crucial para o entendimento e a 
transformação do regime capitalista, já que este possui, desenvol­
vido em grau excepcional, a faculdade de divorciar as dimensões 
e as figurações que compõem os movimentos do real. Essa é a 
razão por que a análise marxista da mercadoria passa pela análise 
do seu fetichismo.
“Toda ciência seria supérflua, se a aparência exterior e a essência 
das coisas coincidissem diretamente.” 6
Nessas condições, a análise dialética torna transparentes as 
relações, os processos e as estruturas capitalistas. Opera como 
uma técnica de desmascaramento, pois que exige a crítica das 
idéias, conceitos ou representações, sob os quais as pessoas, as 
classes sociais e as coisas aparecem na consciência e na Ciência. 
Não seria possível explicar a mercadoria, como um sistema de 
relações (dos homens com a natureza e entre si, na produção e 
reprodução de si mesmos) sem desvendar o seu “caráter místico”. 
Depois de mostrar como o valor-de-uso esconde o valor-de-troca 
e ambos escondem o valor-trabalho, de mostrar, portanto, que a 
mercadoria é trabalho social cristalizado e alienado, Marx se 
dedica a examinar o seu fetichismo. Isto é, depois de ver a 
mercadoria na perspectiva do seu produtor, o operário, ele se 
dedica a examinar como a mercadoria é vista e apresentada pelo 
capitalista, ou a sua Ciência, a Economia política. Na consciência 
e na ciência da burguesia, a mercadoria aparece como ela não é; 
apresenta-se coisificada, como se tivesse propriedades exclusivas, 
independentes do produtor e das relações de produção. A classe 
dominante tende a projetar e impor essa maneira de ver a todas 
as outras classes, inclusive e principalmente ao proletariado.
“O caráter misterioso da mercadoria assenta, pura e simples­
mente, em que proteja ante os homens o caráter social dos seus
5 Marx, K. El capital, t. I, p. 17; O Capital, liv. 1, p. 16.
6 Marx, K. El capital, t. III, p. 948.
10
uma sistemática, profunda e contundente crítica de todas as 
interpretações, doutrinas, idéias ou conceitos preexistentes sobre 
os mesmos fenômenos. É que as representações sobre o real são 
parte necessária do real; são “sombras”, “reflexos”, “formas 
invertidas” das relações, processos e estruturas do capitalismo. 
Marx estava consciente da relação de necessidade entre o mate­
rialismo dialético e o materialismo histórico, na interpretação do 
capitalismo. .
“O descobrimento tardio de que os produtos do trabalho, consi­
derados como valores, não são mais que expressões materiais do 
trabalho humano investido na sua produção, é um descobrimento 
que marca época na história do progresso humano 8
Seria enganoso pensar que a crítica da dialética hegeliana, 
do materialismo feuerbachiano, do socialismo utópico francês e 
da economia. política inglesa foi realizada segundo uma separação 
entre questões de método e problemas específicos do capitalismo 
ou ao acaso das oportunidades. Com isto não queremos sugerir 
que Marx prefigurou e programou todo o seu trabalho. É 
evidente que foi desenvolvendo, passo a passo, uma compreensão 
cada vez mais clara de problemas que tinha pela frente. Houve, 
inclusive, desenvolvimentos ou saltos revolucionários no interior 
da revolução científica realizada por Marx. Toda a sua obra é um 
documento vivo sobre a maneira pela qual foi percebendo, deli­
mitando, eliminando, enfrentando e resolvendo as questões. Nesse 
processo, a atividade política de Marx desempenhou, às vezes, 
um papel decisivo. O que interessa aqui, no entanto, é que, ao 
longo da sua obra, produz, simultaneamente, o método e a inter­
pretação do capitalismo. Não é por mero acaso que, em todas as 
suas análises, aborda, sempre e conjuntamente, os problemas do 
capitalismo e os do método de análise. Para mencionar três 
exemplos, no “Prefácio” e “Posfácio” da Contribuição à Crítica 
da Economia Política 3 4 — posfácio esse publicado depois como 
introdução de Elementos Fundamentais para a Crítica da Econo­
mia Política (Grundrisse) — e no posfácio da segunda edição do 
primeiro tomo de O Capital, Marx preocupou-se em explicitar 
alguns aspectos da dialética materialista. Compreendia que o 
3 Marx, K. El capitai t. I, p. 82-83; O Capital. Rio de Janeiro, Ed. Civi­
lização Brasileira, 1968. liv. 1, p. 83. Trad. por Reginaldo SanfAnna.
4 Marx, K. Contribuição à Crítica da Economia Política. São. Paulo, Ed. 
Flama, 1946. p. 30-31. Trad. por Florestan Fernandes.
11
objeto e o método de seu trabalho eram elementos necessários 
e encadeados do mesmo processo de conhecimento. Enquanto 
que, para Hegel, o processo do pensamento é o “demiurgo do 
real”, para Marx “o ideal não é senão o material traduzido e 
transposto na mente do homem”. 5 Marx havia descoberto os 
encadeamentos e as determinações recíprocas entre as condições 
de existência social e as idéias que expressam essafc condições na 
mente do Homem. Isso era crucial para o entendimento e a 
transformação do regime capitalista, já que este possui, desenvol­
vido em grau excepcional, a faculdade de divorciar as dimensões 
e as figurações que compõem os movimentos do real. Essa é a 
razão por que a análise marxista da mercadoria passa pela análise 
do seu fetichismo.
“Toda ciência seria supérflua, se a aparência exterior e a essência 
das coisas coincidissem diretamente.” 6
Nessas condições, a análise dialética torna transparentesda sociedade burguesa. Nó* exército é especial­
mente visível a relação da força produtiva e dos meios de comunicação.
2) Relação do método idealista de escrever a História tal como 
se tem feito até agora e o método realista. Particularmente a chamada 
História da Civilização, que é a História da religião e dos Estados.
A esta altura, poder-se-á dizer alguma coisa sobre as diferentes 
maneiras de se escrever a história até agora. O modo chamado objetivo. 
O subjetivo (moral e outros). O modo filosófico.
■ 3) Fatos secundários e terciários. Em geral, relações de produção, 
derivadas, transmitidas, não originais. Aqui entram em jogo as relações 
internacionais.
4) Sobre o materialismo desta concepção. Relação com 'o mate­
rialismo naturalista.
5) Dialética dos conceitos, força produtiva (meios de produção) e 
relações de produção, dialética; cujos limites se deve determinar e que 
não elimina a diferença real.
6) A relação desigual entre o desenvolvimento da produção ma­
terial e a produção antiga, por exemplo. Em geral, o progresso não 
deve ser concebido da maneira abstrata habitual. Em relação à arte, 
esta desproporção não é ainda tão importante nem tão difícil de apreen­
der como nas relações prático-sociais; por exemplo, a relação da cultura 
dos Estados Unidos com a da Europa. O ponto realmente difícil que 
precisa ser discutido é o de saber como evoluirão de uma maneira de­
sigual (?) as relações de produção e as relações jurídicas que delas 
derivam. Assim, por exemplo, a relação entre o direito privado romano 
(quanto ao direito criminal e público não parece tão certo) e a 
produção moderna.
70
ocupem, historicamente, na sucessão das diferentes formas da sociedade, 
Menos ainda de sua série “na idéia” (Proudhon), que não passa de 
uma representação falaz (?) do movimento histórico. Trata-se de sua 
conexão orgânica no interior da sociedade burguesa moderna.
A nitidez (caráter determinado abstrato) com que os povos comer­
ciantes — fenícios, cartagineses — apareceram no mundo antigo, pro­
vém, precisamente, da própria supremacia dos povos agricultores. O 
capital, como capital comercial ou capital dinheiro, aparece nesta 
abstração justamente onde o capital não é ainda um elemento prepon­
derante das sociedades. Os lombardos, os judeus, ocupam a mesma 
posição em. relação às sociedades medievais que praticam a agricultura.
Ainda pode servir de exemplo do papel distinto que as mesmas 
categorias desempenham em diferentes graus da sociedade, o seguinte: 
as sociedades por ações, uma das últimas formas da sociedade burguesa, 
aparecem também, em seus começos, nas grandes companhias comer­
ciais privilegiadas, desfrutadoras dos monopólios.
O conceito da riqueza nacional em si insinua-se no espírito dos 
economistas do século XVII sob a forma — e esta representação 
persiste em parte nos do século XVIII — de que a riqueza não se cria 
senão para o Estado, e que a potência do Estado é proporcional a esta 
riqueza. Também esta era uma forma inconscientemente hipócrita sob 
a qual a riqueza e a produção da mesma se expressavam como finalidade 
dos Estados modernos, e não se lhes considerava senão como meios 
para chegar a este fim.
A divisão deve, do começo, ser feita de maneira que [se de­
senvolvam], em primeiro lugar, as determinações gerais abstratas, que 
pertencem mais ou menos a todas as formas de sociedade, mas no 
sentido exposto anteriormente. Em. segundo lugar, as categorias que 
constituem a organização interior da sociedade burguesa, sobre as quais 
repousam as classes fundamentais. Capital. Trabalho assalariado. Pro­
priedade rural. Suas relações recíprocas. Cidade e campo. As três 
grandes classes sociais. A troca entre estas. Circulação. Crédito 
(privado). Em. terceiro lugar, a sociedade burguesa compreendida sob 
a forma de Estado. O Estado em si. As classes “improdutivas”. Im­
postos. Dívidas do Estado. O crédito público. A população. As colônias. 
Emigração. Em quarto lugar, relações internacionais da produção. 
Divisão internacional do trabalho. Troca internacional. Exportação e 
importação. Curso do câmbio. Em quinto lugar, o mercado mundial e 
as crises.
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Produção. — Meios de produção e relações de produção. — 
Relações de produção e de distribuição. — Formas do Estado e da 
propriedade em sua relação com a produção e a distribuição. — 
Relações jurídicas. -—• Relações familiares.
Nota Bene — relação dos pontos que precisam ser mencionados 
aqui e que não devem ser esquecidos:
1) A guerra é desenvolvida antes que a paz. [Deveria expor] 
como pela guerra e nos exércitos etc., certos fenômenos econômicos, tais 
como o trabalho assalariado, o maquinismo etc., são desenvolvidos 
antes que no interior da sociedade burguesa. Nó* exército é especial­
mente visível a relação da força produtiva e dos meios de comunicação.
2) Relação do método idealista de escrever a História tal como 
se tem feito até agora e o método realista. Particularmente a chamada 
História da Civilização, que é a História da religião e dos Estados.
A esta altura, poder-se-á dizer alguma coisa sobre as diferentes 
maneiras de se escrever a história até agora. O modo chamado objetivo. 
O subjetivo (moral e outros). O modo filosófico.
■ 3) Fatos secundários e terciários. Em geral, relações de produção, 
derivadas, transmitidas, não originais. Aqui entram em jogo as relações 
internacionais.
4) Sobre o materialismo desta concepção. Relação com 'o mate­
rialismo naturalista.
5) Dialética dos conceitos, força produtiva (meios de produção) e 
relações de produção, dialética; cujos limites se deve determinar e que 
não elimina a diferença real.
6) A relação desigual entre o desenvolvimento da produção ma­
terial e a produção antiga, por exemplo. Em geral, o progresso não 
deve ser concebido da maneira abstrata habitual. Em relação à arte, 
esta desproporção não é ainda tão importante nem tão difícil de apreen­
der como nas relações prático-sociais; por exemplo, a relação da cultura 
dos Estados Unidos com a da Europa. O ponto realmente difícil que 
precisa ser discutido é o de saber como evoluirão de uma maneira de­
sigual (?) as relações de produção e as relações jurídicas que delas 
derivam. Assim, por exemplo, a relação entre o direito privado romano 
(quanto ao direito criminal e público não parece tão certo) e a 
produção moderna.
72
7) Esta concepção aparece como a de uma evolução necessária. 
Mas justificação do acaso. Varia5 (A liberdade, e também outras 
coisas). (Influência dos meios de comunicação). Falando com pro­
priedade, a História Universal nem sempre aparece na História como 
resultado da História Universal.
8) As determinações naturais subjetivas e objetivas, tribos, raças 
etc., devem constituir, como é justo, o ponto de partida.
Quanto à arte, já se sabe que os períodos de florescimento deter­
minados não estão, absolutamente, em relação com. o desenvolvimento 
geral da sociedade nem, portanto, com a base material, o esqueleto, de 
certo modo, de sua organização. Por exemplo, os gregos, comparados 
com os modernos, ou, ainda, Shakespeare. Em relação a certos gêneros 
de arte, a epopéia, por exemplo, admite-se que jamais podem produzir-se 
em sua forma clássica, fazendo época no mundo, desde o momento em 
que a produção artística aparece como tal; isto é, no interior do domínio 
da própria arte, algumas manifestações importantes não são possíveis 
senão em um grau inferior da evolução da arte. Se isto é certo, 
referindo-se à relação dos diferentes gêneros de arte no interior do 
domínio da própria arte, não se pode estranhar que também o seja a 
respeito da relação do domínio todo da arte com o desenvolvimento geral 
da sociedade. A dificuldade consiste somente na formulação geral destas 
contradições. Assim que se especificam, explicam-se. Consideremos, 
por exemplo, a relação da arte grega e depois a de Shakespeare com os 
tempos atuais. A mitologia grega, como se sabe, não somente era o 
arsenal da arte grega, mas sua terra alimentadora também. A concepção 
danatureza e das relações sociais, que se acham no fundo da imaginação 
grega e, portanto, da arte grega, é por acaso compatível com as má­
quinas automáticas, as estradas de ferro, as locomotivas e o telégrafo 
elétrico? Que representa Vulcano ao lado de Roberts & C.1”, Júpiter 
dos pára-raios e Hermes do crédito mobiliário? Toda a mitologia 
submete e domina e modela as forças da natureza, na imaginação e 
para a imaginação, e desaparece, portanto, quando se chega a dominá-las 
realmente. Que representa a Fama em relação à Printing House Square.d 
A arte grega pressupõe a mitologia grega, isto é, a natureza e a própria 
sociedade modelada já de uma maneira inconscientemente artística pela 
fantasia popular. Esses são. seus materiais. Não uma mitologia qualquer, 
não qualquer transformação inconscientemente artística da natureza 
5 Assim está escrito no original. 
Tipografia do jornal Times.
73
(compreendendo esta última tudo que é objeto, logo, também, a socie­
dade) . A mitologia egípcia jamais pôde ceder o solo ou o seio materno 
para criar a arte grega. Mas, em todo caso, era necessária uma mitolo­
gia. A arte grega não podia surgir, em nenhum caso, em uma sociedade 
que exclui toda relação mitológica com a natureza, que exige do artista 
uma imaginação que não se apoie na mitologia.
De outro ponto de vista, é possível a existência de Aquiles ao 
aparecer a pólvora e o chumbo? A ilíada inteira é compatível com a 
máquina impressora? Não desaparecem, necessariamente, os cantos, as 
lendas, e a Musa diante da regreta do tipógrafo? Não se desvanecem 
as condições necessárias da poesia épica? C
O difícil não é compreender que a arte grega e a epopéia se achem 
ligadas a certas formas do desenvolvimento social, mas que ainda 
possam proporcionar gozos estéticos e sejam consideradas, em certos 
casos, como norma e modelo inacessíveis.
Um homem não pode voltar a ser criança sem retornar à infância. 
Mas não se satisfaz com a ingenuidade da criança e não deve aspirar 
a. reproduzir, em um nível mais elevado, a sinceridade da criança? Não 
revive, na natureza infantil, o caráter próprio de cada época em sua 
verdade natural? Por que a infância social da humanidade, no mais 
belo de seu florescimento, não deveria exercer uma eterna atração, 
como uma fase desaparecida para sempre? Há meninos mal-educados 
e meninos envelhecidos. Muitas nações antigas pertencem a esta cate­
goria. Os gregos eram meninos normais. O encanto que encontramos 
em sua arte não está em contradição com o caráter primitivo da socie­
dade em que essa arte se desenvolveu. É, ao contrário, sua produção; 
poder-se-ia dizer melhor que se acha indissoluvelmente ligada ao fato 
de que as condições sociais imperfeitas em que nasceu, e nas quais 
forçosamente tinha que nascer, não poderiam retornar nunca mais.
72
7) Esta concepção aparece como a de uma evolução necessária. 
Mas justificação do acaso. Varia5 (A liberdade, e também outras 
coisas). (Influência dos meios de comunicação). Falando com pro­
priedade, a História Universal nem sempre aparece na História como 
resultado da História Universal.
8) As determinações naturais subjetivas e objetivas, tribos, raças 
etc., devem constituir, como é justo, o ponto de partida.
Quanto à arte, já se sabe que os períodos de florescimento deter­
minados não estão, absolutamente, em relação com. o desenvolvimento 
geral da sociedade nem, portanto, com a base material, o esqueleto, de 
certo modo, de sua organização. Por exemplo, os gregos, comparados 
com os modernos, ou, ainda, Shakespeare. Em relação a certos gêneros 
de arte, a epopéia, por exemplo, admite-se que jamais podem produzir-se 
em sua forma clássica, fazendo época no mundo, desde o momento em 
que a produção artística aparece como tal; isto é, no interior do domínio 
da própria arte, algumas manifestações importantes não são possíveis 
senão em um grau inferior da evolução da arte. Se isto é certo, 
referindo-se à relação dos diferentes gêneros de arte no interior do 
domínio da própria arte, não se pode estranhar que também o seja a 
respeito da relação do domínio todo da arte com o desenvolvimento geral 
da sociedade. A dificuldade consiste somente na formulação geral destas 
contradições. Assim que se especificam, explicam-se. Consideremos, 
por exemplo, a relação da arte grega e depois a de Shakespeare com os 
tempos atuais. A mitologia grega, como se sabe, não somente era o 
arsenal da arte grega, mas sua terra alimentadora também. A concepção 
da natureza e das relações sociais, que se acham no fundo da imaginação 
grega e, portanto, da arte grega, é por acaso compatível com as má­
quinas automáticas, as estradas de ferro, as locomotivas e o telégrafo 
elétrico? Que representa Vulcano ao lado de Roberts & C.1”, Júpiter 
dos pára-raios e Hermes do crédito mobiliário? Toda a mitologia 
submete e domina e modela as forças da natureza, na imaginação e 
para a imaginação, e desaparece, portanto, quando se chega a dominá-las 
realmente. Que representa a Fama em relação à Printing House Square.d 
A arte grega pressupõe a mitologia grega, isto é, a natureza e a própria 
sociedade modelada já de uma maneira inconscientemente artística pela 
fantasia popular. Esses são. seus materiais. Não uma mitologia qualquer, 
não qualquer transformação inconscientemente artística da natureza 
5 Assim está escrito no original. 
Tipografia do jornal Times.
73
(compreendendo esta última tudo que é objeto, logo, também, a socie­
dade) . A mitologia egípcia jamais pôde ceder o solo ou o seio materno 
para criar a arte grega. Mas, em todo caso, era necessária uma mitolo­
gia. A arte grega não podia surgir, em nenhum caso, em uma sociedade 
que exclui toda relação mitológica com a natureza, que exige do artista 
uma imaginação que não se apoie na mitologia.
De outro ponto de vista, é possível a existência de Aquiles ao 
aparecer a pólvora e o chumbo? A ilíada inteira é compatível com a 
máquina impressora? Não desaparecem, necessariamente, os cantos, as 
lendas, e a Musa diante da regreta do tipógrafo? Não se desvanecem 
as condições necessárias da poesia épica? C
O difícil não é compreender que a arte grega e a epopéia se achem 
ligadas a certas formas do desenvolvimento social, mas que ainda 
possam proporcionar gozos estéticos e sejam consideradas, em certos 
casos, como norma e modelo inacessíveis.
Um homem não pode voltar a ser criança sem retornar à infância. 
Mas não se satisfaz com a ingenuidade da criança e não deve aspirar 
a. reproduzir, em um nível mais elevado, a sinceridade da criança? Não 
revive, na natureza infantil, o caráter próprio de cada época em sua 
verdade natural? Por que a infância social da humanidade, no mais 
belo de seu florescimento, não deveria exercer uma eterna atração, 
como uma fase desaparecida para sempre? Há meninos mal-educados 
e meninos envelhecidos. Muitas nações antigas pertencem a esta cate­
goria. Os gregos eram meninos normais. O encanto que encontramos 
em sua arte não está em contradição com o caráter primitivo da socie­
dade em que essa arte se desenvolveu. É, ao contrário, sua produção; 
poder-se-ia dizer melhor que se acha indissoluvelmente ligada ao fato 
de que as condições sociais imperfeitas em que nasceu, e nas quais 
forçosamente tinha que nascer, não poderiam retornar nunca mais.
3. CARACTERÍSTICAS ESSENCIAIS
DO SISTEMA CAPITALISTA *
O valor novo acrescentado pelo trabalho novo que se incorpora 
durante o ano — e também, portanto, a parte dó produto anual em 
que se traduz esse valor, e que pode ser separado do rendimento total 
— divide-se, pois, em três partes, que revestem três formas diferentes 
de rendas, formas que expressam uma parte desse valor como perten­
cente ao possuidor da força de trabalho, outra parte como pertencente 
ao possuidor do capital e outra ao proprietário da terra. Trata-se, 
portanto, de relações em que o valor total novamente criado se distribui 
entre os possuidores dos diversos agentes da produção.
A concepção corrente considera essas relaçõesde distribuição 
como relações naturais, como relações que respondem, simplesmente, 
à natureza de qualquer produção social, às leis da produção humana 
pura e simples. Ainda que não se possa negar que as sociedades pré- 
-capitalistas apresentavam outros tipos de distribuição, estes se apresen­
tam como formas primitivas, rudimentares e disfarçadas, não reduzidas 
à sua expressão mais pura e à sua modalidade mais alta, como formas 
matizadas de modo distinto das relações naturais de distribuição.
A única coisa exata nessa concepção é o seguinte: partindo de 
uma produção social, de qualquer caráter que seja (por exemplo, a das 
comunidades índias mais rudimentares ou a do comunismo dos peruanos, 
já mais desenvolvido e artificial), podemos distinguir, sempre, entre a 
parte do trabalho, cujo produto é consumido diretamente pelos produ­
tores e suas famílias, com caráter individual, e — prescindindo da parte 
destinada aò consumo produtivo ■— outra parte do trabalho, que é sem­
pre trabalho excedente, cujo produto se destina sempre à satisfação das 
* Reproduzido de Marx, K. “Características esenciales dei sistema capitalista” In: 
El capital. México, Fondo de Cultura Económica, 1946-47. t. III, cap. II, p. 
1013-20. Trad. por Maria Elisa Mascarenhas.
75
necessidades gerais da sociedade, qualquer que seja o modo pelo qual 
se distribua esse produto excedente, e seja quem for aquele que atue 
como representante dessas necessidades sociais. A identidade entre os 
diversos tipos de distribuição se reduz, portanto, ao fato de que são 
idênticos, se deixarmos de lado suas distinções e formas específicas, 
para nos fixarmos somente no que há de comum em todos eles, omitindo 
o que os separa e diferencia.
A medida em que a consciência do Homem vai se desenvolvendo 
e se fazendo mais crítica, leva em conta, entretanto, o caráter historica­
mente mais desenvolvido das relações de distribuição,1 embora se 
aferrando mais fortemente ainda ao caráter permanente das relações de 
produção, que se considera como obra da natureza humana e indepen­
dentes, portanto, de qualquer evolução histórica.
A análise científica do regime capitalista de produção demonstra, 
pelo contrário, que este regime constitui um regime de produção de 
tipo especial, e que corresponde a uma condicionalidade histórica 
específica; que, como qualquer outro regime de produção concreto, 
pressupõe, como condição histórica, uma determinada fase das forças 
sociais produtivas e de suas formas de desenvolvimento, condição que 
é, por sua vez, resultado e produto histórico de um processo anterior, 
e do qual parte o novo tipo de produção como de sua base dada; que 
as relações de produção que correspondem a este regime de produção 
específico, • historicamente determinado •—• relações que os homens 
contraem em seu processo social de vida, na criação de sua vida so­
cial —, apresentam um caráter específico, histórico e transitório; e, 
finalmente, que as relações de distribuição são essencialmente idênticas 
a estas relações de produção, o seu reverso, pois ambas apresentam o 
mesmo caráter histórico transitório.
Quando se examipam as relações de distribuição, parte-se, antes 
de mais nada, do pretenso fato de que o produto anual se distribui como 
salário, lucro e renda do solo. Mas o fato, assim exposto, é falso. O 
produto se distribui, de uma parte, em capital, e, de outra parte, em 
rendas. Uma dessas rendas, o salário, reveste sempre a forma de renda, 
renda do trabalhador depois de já haver enfrentado o operário em 
forma de capital. O fato de que as condições de trabalho produzidas e 
os produtos do trabalho se enfrentem como capital para o produtor 
direto, já implica, de antemão, um determinado caráter social das con- 
1 Stuart Mill, J. Some Unsetled Questions of Political Economy. Londres, 1844.
3. CARACTERÍSTICAS ESSENCIAIS
DO SISTEMA CAPITALISTA *
O valor novo acrescentado pelo trabalho novo que se incorpora 
durante o ano — e também, portanto, a parte dó produto anual em 
que se traduz esse valor, e que pode ser separado do rendimento total 
— divide-se, pois, em três partes, que revestem três formas diferentes 
de rendas, formas que expressam uma parte desse valor como perten­
cente ao possuidor da força de trabalho, outra parte como pertencente 
ao possuidor do capital e outra ao proprietário da terra. Trata-se, 
portanto, de relações em que o valor total novamente criado se distribui 
entre os possuidores dos diversos agentes da produção.
A concepção corrente considera essas relações de distribuição 
como relações naturais, como relações que respondem, simplesmente, 
à natureza de qualquer produção social, às leis da produção humana 
pura e simples. Ainda que não se possa negar que as sociedades pré- 
-capitalistas apresentavam outros tipos de distribuição, estes se apresen­
tam como formas primitivas, rudimentares e disfarçadas, não reduzidas 
à sua expressão mais pura e à sua modalidade mais alta, como formas 
matizadas de modo distinto das relações naturais de distribuição.
A única coisa exata nessa concepção é o seguinte: partindo de 
uma produção social, de qualquer caráter que seja (por exemplo, a das 
comunidades índias mais rudimentares ou a do comunismo dos peruanos, 
já mais desenvolvido e artificial), podemos distinguir, sempre, entre a 
parte do trabalho, cujo produto é consumido diretamente pelos produ­
tores e suas famílias, com caráter individual, e — prescindindo da parte 
destinada aò consumo produtivo ■— outra parte do trabalho, que é sem­
pre trabalho excedente, cujo produto se destina sempre à satisfação das 
* Reproduzido de Marx, K. “Características esenciales dei sistema capitalista” In: 
El capital. México, Fondo de Cultura Económica, 1946-47. t. III, cap. II, p. 
1013-20. Trad. por Maria Elisa Mascarenhas.
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necessidades gerais da sociedade, qualquer que seja o modo pelo qual 
se distribua esse produto excedente, e seja quem for aquele que atue 
como representante dessas necessidades sociais. A identidade entre os 
diversos tipos de distribuição se reduz, portanto, ao fato de que são 
idênticos, se deixarmos de lado suas distinções e formas específicas, 
para nos fixarmos somente no que há de comum em todos eles, omitindo 
o que os separa e diferencia.
A medida em que a consciência do Homem vai se desenvolvendo 
e se fazendo mais crítica, leva em conta, entretanto, o caráter historica­
mente mais desenvolvido das relações de distribuição,1 embora se 
aferrando mais fortemente ainda ao caráter permanente das relações de 
produção, que se considera como obra da natureza humana e indepen­
dentes, portanto, de qualquer evolução histórica.
A análise científica do regime capitalista de produção demonstra, 
pelo contrário, que este regime constitui um regime de produção de 
tipo especial, e que corresponde a uma condicionalidade histórica 
específica; que, como qualquer outro regime de produção concreto, 
pressupõe, como condição histórica, uma determinada fase das forças 
sociais produtivas e de suas formas de desenvolvimento, condição que 
é, por sua vez, resultado e produto histórico de um processo anterior, 
e do qual parte o novo tipo de produção como de sua base dada; que 
as relações de produção que correspondem a este regime de produção 
específico, • historicamente determinado •—• relações que os homens 
contraem em seu processo social de vida, na criação de sua vida so­
cial —, apresentam um caráter específico, histórico e transitório; e, 
finalmente, que as relações de distribuição são essencialmente idênticas 
a estas relações de produção, o seu reverso, pois ambas apresentam o 
mesmo caráter histórico transitório.
Quando se examipam as relações de distribuição, parte-se, antes 
de mais nada, do pretenso fato de que o produto anual se distribui como 
salário, lucro e renda do solo. Mas o fato, assim exposto, é falso. O 
produto se distribui, de uma parte, em capital, e, de outra parte, em 
rendas. Uma dessas rendas, o salário, reveste sempre a forma de renda, 
renda do trabalhadordepois de já haver enfrentado o operário em 
forma de capital. O fato de que as condições de trabalho produzidas e 
os produtos do trabalho se enfrentem como capital para o produtor 
direto, já implica, de antemão, um determinado caráter social das con- 
1 Stuart Mill, J. Some Unsetled Questions of Political Economy. Londres, 1844.
76
dições materiais do trabalho diante dos operários; e, portanto, numa 
determinada relação, em que estes se acham, dentro da própria produ­
ção, como possuidores das condições de trabalho, e vice-versa. A 
transformação dessas condições de trabalho em capital implica, por sua 
vez, a expropriação do solo dos produtores diretos, e, portanto, numa 
determinada forma de propriedade territorial.
Se uma parte do produto não se convertesse em capital, não 
revestiria a outra as formas de salário, lucro e renda do solo.
Por outro lado, se o regime capitalista de produção pressupõe esta 
forma social determinada das condições de produção, também a repro­
duz constantemente. Não produz apenas os produtos materiais, mas 
reproduz, também, continuamente, as relações de produção nas quais 
aqueles são produzidos, e, com elas, as correspondentes relações de 
distribuição.
Podemos dizer, certamente, que o capital (e a propriedade territo­
rial, que o engloba como sua antítese), já pressupõe por si uma distri­
buição; a expropriação dos operários das condições de trabalho, a 
concentração dessas condições de trabalho em mãos de uma minoria 
de indivíduos, a propriedade exclusiva sobre o solo em favor de outros 
indivíduos, em suma, todas aquelas relações que foram estudadas no 
capítulo sobre a acumulação primitiva (liv. I, cap. XXIV). Mas essa 
distribuição difere totalmente do que se entende por relações de dis­
tribuição, quando se reivindica para estas um caráter histórico, por 
oposição às relações de produção. Por relações de distribuição se enten­
de aqui os diversos títulos que autorizam a receber a parte do produto 
destinada ao consumo individual. Aquelas outras relações de distribui­
ção são, por sua vez, as bases das especiais funções sociais que, dentro 
do próprio regime de produção, correspondem a determinados agentes 
do mesmo, por oposição ao produtor direto. Dão às mesmas condições 
de produção e a seus representantes uma qualidade social específica. 
Determinam todo o caráter e todo o movimento da produção.
Duas são as características que distinguem, desde o primeiro ins­
tante, o regime capitalista de produção.
Primeira. Esse regime cria seus produtos com o caráter de merca­
dorias. Mas o fato de produzir mercadorias não o distingue de outros 
sistemas de produção; o que o distingue é a circunstância de que, nele, 
o fato de seus produtos serem mercadorias constitui seu caráter predo­
minante e determinante. Implica, logo de início o fato de que, nele, o 
próprio trabalhador aparece como vendedor de mercadorias e, portanto, 
77
como trabalhador livre assalariado e, por conseguinte, o trabalho 
aparece como trabalho assalariado com caráter geral. Devemos voltar 
a expor novamente, depois de todo o desenvolvimento anterior desta 
obra, como a relação entre o capital e o trabalho assalariado informa 
todo o caráter deste regime de produção. Os agentes principais deste 
sistema de produção, o capitalista e o trabalhador assalariado, não são, 
como tais, mais que encarnações, personificações do capital e do tra­
balho assalariado, aspectos sociais determinados que o processo social 
de produção imprime aos indivíduos, produtos dessas determinadas 
relações sociais de produção.
A característica 1 do produto como mercadoria e a característica 
2 da mercadoria como produto do capital acarretam, já, todas as 
relações de circulação, isto é, um determinado processo social que os 
produtos devem percorrer, e no qual assumem determinadas caracterís­
ticas sociais; e acarreta, também, certas relações entre os agentes da 
produção, que determinam a valorização de seu produto e sua reversão, 
seja em forma de meios de vida ou de meios de produção. Mas, ainda 
que se prescinda disso, das duas características anteriores do produto 
como mercadoria ou da mercadoria como mercadoria produzida capita- 
listicamente, já se deduz toda a determinação valorativa e a regulação 
da produção total pelo valor. Nesta forma totalmente específica do 
valor, o trabalho rege, de um lado, como trabalho social; de outro lado, 
a distribuição desse trabalho social e a mútua complementação, o 
intercâmbio de matérias de seus produtos, a sujeição e a dependência 
dentro da trama social, ficam entregues à ação fortuita dos diversos 
produtores capitalistas, ação na qual as tendências de uns destroem as 
de outros e vice-versa. Como esses produtores só se enfrentam enquanto 
possuidores de mercadorias, e cada um deles procura vender sua mer­
cadoria pelo mais alto preço possível (e, além disso, aparentemente, só 
é governado por seu arbítrio na regulação da própria produção), daí 
resulta que a lei interna só se impõe por meio de sua concorrência, da 
pressão mútua exercida por uns sobre os outros, o que faz com que as 
divergências sejam reciprocamente compensadas. A lei do valor só atua 
aqui como lei interna, que os agentes individuais consideram como uma 
cega lei natural; e é esta lei, deste modo, que impõe o equilíbrio social 
da produção em meio às suas flutuações fortuitas.
Na mercadoria, e principalmente na mercadoria como produto do 
capital, já vai implícita, ademais, a materialização das determinações 
sociais da produção e a personificação de seus fundamentos materiais, 
que caracterizam todo o regime de produção capitalista.
76
dições materiais do trabalho diante dos operários; e, portanto, numa 
determinada relação, em que estes se acham, dentro da própria produ­
ção, como possuidores das condições de trabalho, e vice-versa. A 
transformação dessas condições de trabalho em capital implica, por sua 
vez, a expropriação do solo dos produtores diretos, e, portanto, numa 
determinada forma de propriedade territorial.
Se uma parte do produto não se convertesse em capital, não 
revestiria a outra as formas de salário, lucro e renda do solo.
Por outro lado, se o regime capitalista de produção pressupõe esta 
forma social determinada das condições de produção, também a repro­
duz constantemente. Não produz apenas os produtos materiais, mas 
reproduz, também, continuamente, as relações de produção nas quais 
aqueles são produzidos, e, com elas, as correspondentes relações de 
distribuição.
Podemos dizer, certamente, que o capital (e a propriedade territo­
rial, que o engloba como sua antítese), já pressupõe por si uma distri­
buição; a expropriação dos operários das condições de trabalho, a 
concentração dessas condições de trabalho em mãos de uma minoria 
de indivíduos, a propriedade exclusiva sobre o solo em favor de outros 
indivíduos, em suma, todas aquelas relações que foram estudadas no 
capítulo sobre a acumulação primitiva (liv. I, cap. XXIV). Mas essa 
distribuição difere totalmente do que se entende por relações de dis­
tribuição, quando se reivindica para estas um caráter histórico, por 
oposição às relações de produção. Por relações de distribuição se enten­
de aqui os diversos títulos que autorizam a receber a parte do produto 
destinada ao consumo individual. Aquelas outras relações de distribui­
ção são, por sua vez, as bases das especiais funções sociais que, dentro 
do próprio regime de produção, correspondem a determinados agentes 
do mesmo, por oposição ao produtor direto. Dão às mesmas condições 
de produção e a seus representantes uma qualidade social específica. 
Determinam todo o caráter e todo o movimento da produção.
Duas são as características que distinguem, desde o primeiro ins­
tante, o regime capitalista de produção.
Primeira. Esse regime cria seus produtos com o caráter de merca­
dorias. Mas o fato de produzir mercadorias não o distingue de outros 
sistemas de produção; o que o distingue é a circunstância de que, nele, 
o fato de seus produtosserem mercadorias constitui seu caráter predo­
minante e determinante. Implica, logo de início o fato de que, nele, o 
próprio trabalhador aparece como vendedor de mercadorias e, portanto, 
77
como trabalhador livre assalariado e, por conseguinte, o trabalho 
aparece como trabalho assalariado com caráter geral. Devemos voltar 
a expor novamente, depois de todo o desenvolvimento anterior desta 
obra, como a relação entre o capital e o trabalho assalariado informa 
todo o caráter deste regime de produção. Os agentes principais deste 
sistema de produção, o capitalista e o trabalhador assalariado, não são, 
como tais, mais que encarnações, personificações do capital e do tra­
balho assalariado, aspectos sociais determinados que o processo social 
de produção imprime aos indivíduos, produtos dessas determinadas 
relações sociais de produção.
A característica 1 do produto como mercadoria e a característica 
2 da mercadoria como produto do capital acarretam, já, todas as 
relações de circulação, isto é, um determinado processo social que os 
produtos devem percorrer, e no qual assumem determinadas caracterís­
ticas sociais; e acarreta, também, certas relações entre os agentes da 
produção, que determinam a valorização de seu produto e sua reversão, 
seja em forma de meios de vida ou de meios de produção. Mas, ainda 
que se prescinda disso, das duas características anteriores do produto 
como mercadoria ou da mercadoria como mercadoria produzida capita- 
listicamente, já se deduz toda a determinação valorativa e a regulação 
da produção total pelo valor. Nesta forma totalmente específica do 
valor, o trabalho rege, de um lado, como trabalho social; de outro lado, 
a distribuição desse trabalho social e a mútua complementação, o 
intercâmbio de matérias de seus produtos, a sujeição e a dependência 
dentro da trama social, ficam entregues à ação fortuita dos diversos 
produtores capitalistas, ação na qual as tendências de uns destroem as 
de outros e vice-versa. Como esses produtores só se enfrentam enquanto 
possuidores de mercadorias, e cada um deles procura vender sua mer­
cadoria pelo mais alto preço possível (e, além disso, aparentemente, só 
é governado por seu arbítrio na regulação da própria produção), daí 
resulta que a lei interna só se impõe por meio de sua concorrência, da 
pressão mútua exercida por uns sobre os outros, o que faz com que as 
divergências sejam reciprocamente compensadas. A lei do valor só atua 
aqui como lei interna, que os agentes individuais consideram como uma 
cega lei natural; e é esta lei, deste modo, que impõe o equilíbrio social 
da produção em meio às suas flutuações fortuitas.
Na mercadoria, e principalmente na mercadoria como produto do 
capital, já vai implícita, ademais, a materialização das determinações 
sociais da produção e a personificação de seus fundamentos materiais, 
que caracterizam todo o regime de produção capitalista.
78
A segunda característica específica do regime capitalista de pro­
dução é a produção da mais-valia como finalidade direta e móvel deter­
minante da produção. O capital produz essencialmente capital, e, para 
poder fazê-lo, não tem outro caminho a não ser produzir mais-valia. 
Ao examinar a mais-valia relativa e, mais tarde, ao estudar a transfor­
mação da mais-valia em lucro, vimos que este é um dos fundamentos 
sobre os quais repousa o regime de produção característico da época 
capitalista, esta forma específica de desenvolvimento das forças produti­
vas sociais do trabalho, consideradas como forças do capital substan­
tivadas frente ao trabalhador, e, portanto, em contraposição direta com 
o próprio desenvolvimento deste. A produção decorrente do valor e 
da mais-valia tem implícita, como já observamos no decorrer da 
exposição, a tendência constante a reduzir o tempo de trabalho neces­
sário para a produção de uma mercadoria, isto é, seu valor, a um limite 
inferior à média social vigente em cada momento. A tendência a reduzir 
o preço de custo a seu mínimo se converte na mais poderosa alavanca 
para a intensificação da força produtiva social do trabalho, que, sob esse 
regime, só aparece como intensificação constante da força produtiva do 
capital,
A autoridade que o capitalista assume, no processo direto da 
produção, como personificação do capital, a função social de que se 
reveste, como dirigente e governante da produção, difere essencial­
mente da autoridade daqueles que dirigiam a produção baseada em 
escravos, servos etc.
Enquanto no regime capitalista de produção a massa dos produto­
res diretos percebem o caráter social de sua produção, sob a forma de 
uma autoridade estritamente reguladora e de um mecanismo do processo 
de trabalho organizado como uma hierarquia completa — autoridade 
que, entretanto, só compete a quem a ostenta, como personificação das 
condições de trabalho frente a este, e não, como em formas anteriores 
de produção, enquanto titulares do poder político ou teocrático — 
entre os representantes desta autoridade, ou seja, entre os próprios 
capitalistas, que se defrontam, simplesmente, como possuidores de 
mercadorias, reina a anarquia mais completa, dentro da qual a coesão 
social da produção só se impõe à arbitrariedade individual como uma 
lei natural onipotente.
Somente considerando o trabalho, sob a forma de trabalho assala­
riado, e os meios de produção, sob a forma de capital assalariado, e os 
meios de produção, sob a forma de capital — isto é, só partindo da 
existência da forma social específica desses dois agentes essenciais da 
79
produção — aparece uma parte do valor (produto) como mais-valia, 
e esta mais-valia como lucro (renda do solo), como lucro do capitalista, 
como riqueza adicional disponível, pertencente a ele. E só porque 
assim se apresenta — como seu lucro —aparecem os meios adicionais 
de produção destinados a ampliar a reprodução, e que formam parte 
do lucro, como novo capital adicional, e a ampliação do processo de 
reprodução como um processo de acumulação capitalista.
Ainda que a forma do trabalho, enquanto trabalho assalariado, 
seja decisiva para a forma de todo o processo e para a modalidade 
específica da própria produção, o trabalho assalariado não é o que 
determina o valor. Na determinação do valor, tratã-se do tempo social 
de trabalho, em geral, da quantidade de trabalho de que, em geral, 
pode dispor a sociedade, e cuja absorção relativa pelos diversos pro­
dutos determina, de certo modo, seu respectivo peso social. A forma 
concreta em que o tempo de trabalho social se impõe, como fator 
determinante, no valor das mercadorias mantém, indubitavelmente, 
relação com a forma do trabalho, enquanto trabalho assalariado, e 
com a forma correspondente dos meios de produção, como capital, no 
sentido de que, só sobre esta base, se converte a produção de merca­
dorias na forma geral da produção.
Fixemo-nos, por outro lado, nas chamadas relações de distribuição. 
O salário pressupõe o trabalho assalariado, o lucro, o capital. Estas 
formas concretas de distribuição pressupõem, portanto, determinados 
caracteres sociais, qu‘anto às condições de produção, e determinadas 
relações sociais dos agentes de produção.. As relações concretas de 
produção são, pois, simplesmente, a expressão das relações de produção 
historicamente determinadas.
Tomemos, por exemplo, o lucro. Esta forma concreta da mais- 
-valia constitui a premissa para o reagrupamento dos meios de produção, 
sob a forma da produção capitalista; é, portanto, uma relação que 
impera sobre a reprodução, ainda que o capitalista individual pense 
que poderia, realmente, consumir todo o lucro como renda. Fazendo 
isso, tropeçaria com uma série de impedimentos que se interpõem diante 
dele sob a forma de fundos de seguros e de reserva, lei da concorrência 
etc., e que lhe demonstram, praticamente, que o lucro não é, de modo 
algum, uma simples categoria de distribuição do produto entregue ao 
consumo individual. Além disso, todo o processo de produção capita­
lista está regulado pelos preços dos produtos.E os preços reguladores 
da produção estão regulados, por sua vez, pelo nivelamento da quota 
de lucro e pela correspondente distribuição do capital entre os diversos
78
A segunda característica específica do regime capitalista de pro­
dução é a produção da mais-valia como finalidade direta e móvel deter­
minante da produção. O capital produz essencialmente capital, e, para 
poder fazê-lo, não tem outro caminho a não ser produzir mais-valia. 
Ao examinar a mais-valia relativa e, mais tarde, ao estudar a transfor­
mação da mais-valia em lucro, vimos que este é um dos fundamentos 
sobre os quais repousa o regime de produção característico da época 
capitalista, esta forma específica de desenvolvimento das forças produti­
vas sociais do trabalho, consideradas como forças do capital substan­
tivadas frente ao trabalhador, e, portanto, em contraposição direta com 
o próprio desenvolvimento deste. A produção decorrente do valor e 
da mais-valia tem implícita, como já observamos no decorrer da 
exposição, a tendência constante a reduzir o tempo de trabalho neces­
sário para a produção de uma mercadoria, isto é, seu valor, a um limite 
inferior à média social vigente em cada momento. A tendência a reduzir 
o preço de custo a seu mínimo se converte na mais poderosa alavanca 
para a intensificação da força produtiva social do trabalho, que, sob esse 
regime, só aparece como intensificação constante da força produtiva do 
capital,
A autoridade que o capitalista assume, no processo direto da 
produção, como personificação do capital, a função social de que se 
reveste, como dirigente e governante da produção, difere essencial­
mente da autoridade daqueles que dirigiam a produção baseada em 
escravos, servos etc.
Enquanto no regime capitalista de produção a massa dos produto­
res diretos percebem o caráter social de sua produção, sob a forma de 
uma autoridade estritamente reguladora e de um mecanismo do processo 
de trabalho organizado como uma hierarquia completa — autoridade 
que, entretanto, só compete a quem a ostenta, como personificação das 
condições de trabalho frente a este, e não, como em formas anteriores 
de produção, enquanto titulares do poder político ou teocrático — 
entre os representantes desta autoridade, ou seja, entre os próprios 
capitalistas, que se defrontam, simplesmente, como possuidores de 
mercadorias, reina a anarquia mais completa, dentro da qual a coesão 
social da produção só se impõe à arbitrariedade individual como uma 
lei natural onipotente.
Somente considerando o trabalho, sob a forma de trabalho assala­
riado, e os meios de produção, sob a forma de capital assalariado, e os 
meios de produção, sob a forma de capital — isto é, só partindo da 
existência da forma social específica desses dois agentes essenciais da 
79
produção — aparece uma parte do valor (produto) como mais-valia, 
e esta mais-valia como lucro (renda do solo), como lucro do capitalista, 
como riqueza adicional disponível, pertencente a ele. E só porque 
assim se apresenta — como seu lucro —aparecem os meios adicionais 
de produção destinados a ampliar a reprodução, e que formam parte 
do lucro, como novo capital adicional, e a ampliação do processo de 
reprodução como um processo de acumulação capitalista.
Ainda que a forma do trabalho, enquanto trabalho assalariado, 
seja decisiva para a forma de todo o processo e para a modalidade 
específica da própria produção, o trabalho assalariado não é o que 
determina o valor. Na determinação do valor, tratã-se do tempo social 
de trabalho, em geral, da quantidade de trabalho de que, em geral, 
pode dispor a sociedade, e cuja absorção relativa pelos diversos pro­
dutos determina, de certo modo, seu respectivo peso social. A forma 
concreta em que o tempo de trabalho social se impõe, como fator 
determinante, no valor das mercadorias mantém, indubitavelmente, 
relação com a forma do trabalho, enquanto trabalho assalariado, e 
com a forma correspondente dos meios de produção, como capital, no 
sentido de que, só sobre esta base, se converte a produção de merca­
dorias na forma geral da produção.
Fixemo-nos, por outro lado, nas chamadas relações de distribuição. 
O salário pressupõe o trabalho assalariado, o lucro, o capital. Estas 
formas concretas de distribuição pressupõem, portanto, determinados 
caracteres sociais, qu‘anto às condições de produção, e determinadas 
relações sociais dos agentes de produção.. As relações concretas de 
produção são, pois, simplesmente, a expressão das relações de produção 
historicamente determinadas.
Tomemos, por exemplo, o lucro. Esta forma concreta da mais- 
-valia constitui a premissa para o reagrupamento dos meios de produção, 
sob a forma da produção capitalista; é, portanto, uma relação que 
impera sobre a reprodução, ainda que o capitalista individual pense 
que poderia, realmente, consumir todo o lucro como renda. Fazendo 
isso, tropeçaria com uma série de impedimentos que se interpõem diante 
dele sob a forma de fundos de seguros e de reserva, lei da concorrência 
etc., e que lhe demonstram, praticamente, que o lucro não é, de modo 
algum, uma simples categoria de distribuição do produto entregue ao 
consumo individual. Além disso, todo o processo de produção capita­
lista está regulado pelos preços dos produtos. E os preços reguladores 
da produção estão regulados, por sua vez, pelo nivelamento da quota 
de lucro e pela correspondente distribuição do capital entre os diversos
80
ramos sociais de produção. Por conseguinte, o lucro aparece, aqui, 
como fator fundamental, já não da distribuição dos produtos, mas sim 
de sua própria produção, como parte da distribuição dos capitais e do 
próprio trabalho entre diversos ramos de produção. O desdobramento 
do lucro em benefício do empresário e do juro aparece como distribui­
ção da própria renda. Mas, na verdade, surge do desenvolvimento do 
capital como valor que valoriza a si mesmo, que engendra mais-valia; 
surge desta forma social concreta do proceâso de produção imperante. 
Aí nascem o crédito e as instituições de crédito e, com isso, a forma da 
produção. No juro etc., as supostas formas de distribuição entram no 
preço como fatores determinantes da produção.
Quanto à renda do solo, poder-se-ia pensar que é uma simples 
forma de distribuição, porque a propriedade imobiliária como tal não 
exerce nenhuma função ou, pelo menos, não exerce nenhuma função 
normal, no próprio processo da produção. Mas o fato de que: l.°) 
a renda do solo se limite ao remanescente sobre o lucro médio, e 2.°) o 
proprietário se veja rebaixado pelo dirigente e governante do processo 
de produção e de todo o processo da vida social ao papel de simples 
arrendatário da terra, de usurário desta e de mero perceptor de rendas, 
constitui um resultado histórico específico da produção capitalista. Uma 
premissa histórica deste regime de produção é o fato de que a terra 
tenha adotado a forma de propriedade imobiliária. O fato de que a 
propriedade territorial se apresente sob formas que permitam o regime 
capitalista de exploração da agricultura constitui um produto do caráter 
específico desse tipo de produção. Pode ocorrer que o que o proprietá­
rio receba, em outros tipos de sociedade, se chame também renda. Mas 
difere substancialmente da renda característica desse sistema de pro­
dução.
As chamadas relações de distribuição correspondem, pois, a formas 
historicamente determinadas e especificamente sociais do processo de 
produção, das quais surgem, e às relações que os homens contraem 
entre si no processo de reprodução de sua vida humana. O caráter 
histórico dessas relações de distribuição é o caráter histórico das relações 
de produção, das quais aquelas só expressam um aspecto. A distribui­
ção capitalista difere das formas de distribuição que correspondem a 
outros tipos de produção, e cada forma de distribuição desaparece ao 
desaparecer a forma determinada de produção da qual nasce e à qual 
corresponde.
O ponto de vista que só considera como históricas as relações dedistribuição, mas não as de produção, é, de um lado, o ponto de vista
81
da crítica já iniciada, mas ainda rudimentar, da economia burguesa. 
De outro lado, tem a sua base na confusão e identificação do processo 
social da produção com o processo simples de trabalho, tal como 
poderia ser executado por um indivíduo anormalmente isolado, sem 
qualquer ajuda da sociedade. Quando o processo de trabalho não é 
mais que um simples processo entre o Homem e a Natureza, seus 
elementos simples são comuns a todas as formas sociais de desenvol­
vimento do mesmo. Mas cada forma histórica concreta desse processo 
continua desenvolvendo suas bases materiais e suas formas históricas. 
Ao alcançar uma certa forma de amadurecimento, a forma histórica 
concreta é abandonada e deixa o posto para outra mais alta. A chegada 
do momento da crise se anuncia ao se apresentar e ganhar extensão e 
profundidade a contradição e o antagonismo entre as relações de distri­
buição e, portanto, a forma histórica concreta das relações de produção 
correspondentes a elas, por um lado, e, por outro lado, as forças 
produtivas, a capacidade de produção e o desenvolvimento de seus 
agentes. Surge, então, um conflito entre o desenvolvimento material 
da produção e sua forma social. 2
2 Veja-se a obra sobre Competition and Co-operation (1832?).
80
ramos sociais de produção. Por conseguinte, o lucro aparece, aqui, 
como fator fundamental, já não da distribuição dos produtos, mas sim 
de sua própria produção, como parte da distribuição dos capitais e do 
próprio trabalho entre diversos ramos de produção. O desdobramento 
do lucro em benefício do empresário e do juro aparece como distribui­
ção da própria renda. Mas, na verdade, surge do desenvolvimento do 
capital como valor que valoriza a si mesmo, que engendra mais-valia; 
surge desta forma social concreta do proceâso de produção imperante. 
Aí nascem o crédito e as instituições de crédito e, com isso, a forma da 
produção. No juro etc., as supostas formas de distribuição entram no 
preço como fatores determinantes da produção.
Quanto à renda do solo, poder-se-ia pensar que é uma simples 
forma de distribuição, porque a propriedade imobiliária como tal não 
exerce nenhuma função ou, pelo menos, não exerce nenhuma função 
normal, no próprio processo da produção. Mas o fato de que: l.°) 
a renda do solo se limite ao remanescente sobre o lucro médio, e 2.°) o 
proprietário se veja rebaixado pelo dirigente e governante do processo 
de produção e de todo o processo da vida social ao papel de simples 
arrendatário da terra, de usurário desta e de mero perceptor de rendas, 
constitui um resultado histórico específico da produção capitalista. Uma 
premissa histórica deste regime de produção é o fato de que a terra 
tenha adotado a forma de propriedade imobiliária. O fato de que a 
propriedade territorial se apresente sob formas que permitam o regime 
capitalista de exploração da agricultura constitui um produto do caráter 
específico desse tipo de produção. Pode ocorrer que o que o proprietá­
rio receba, em outros tipos de sociedade, se chame também renda. Mas 
difere substancialmente da renda característica desse sistema de pro­
dução.
As chamadas relações de distribuição correspondem, pois, a formas 
historicamente determinadas e especificamente sociais do processo de 
produção, das quais surgem, e às relações que os homens contraem 
entre si no processo de reprodução de sua vida humana. O caráter 
histórico dessas relações de distribuição é o caráter histórico das relações 
de produção, das quais aquelas só expressam um aspecto. A distribui­
ção capitalista difere das formas de distribuição que correspondem a 
outros tipos de produção, e cada forma de distribuição desaparece ao 
desaparecer a forma determinada de produção da qual nasce e à qual 
corresponde.
O ponto de vista que só considera como históricas as relações de 
distribuição, mas não as de produção, é, de um lado, o ponto de vista
81
da crítica já iniciada, mas ainda rudimentar, da economia burguesa. 
De outro lado, tem a sua base na confusão e identificação do processo 
social da produção com o processo simples de trabalho, tal como 
poderia ser executado por um indivíduo anormalmente isolado, sem 
qualquer ajuda da sociedade. Quando o processo de trabalho não é 
mais que um simples processo entre o Homem e a Natureza, seus 
elementos simples são comuns a todas as formas sociais de desenvol­
vimento do mesmo. Mas cada forma histórica concreta desse processo 
continua desenvolvendo suas bases materiais e suas formas históricas. 
Ao alcançar uma certa forma de amadurecimento, a forma histórica 
concreta é abandonada e deixa o posto para outra mais alta. A chegada 
do momento da crise se anuncia ao se apresentar e ganhar extensão e 
profundidade a contradição e o antagonismo entre as relações de distri­
buição e, portanto, a forma histórica concreta das relações de produção 
correspondentes a elas, por um lado, e, por outro lado, as forças 
produtivas, a capacidade de produção e o desenvolvimento de seus 
agentes. Surge, então, um conflito entre o desenvolvimento material 
da produção e sua forma social. 2
2 Veja-se a obra sobre Competition and Co-operation (1832?).
4. INFRA-ESTRUTURA E SUPERESTRUTURA
4.1. O “prefácio” da Contribuição à Crítica da Economia
Política *
O primeiro trabalho que empreendi, para resolver as dúvidas que 
me assaltavam, foi uma revisão crítica da Filosofia do Direito, de Hegel, 
trabalho cuja introdução apareceu nos Anais Franco-alemães, publica­
dos em Paris, em 1844. Minhas investigações me conduziram ao 
seguinte resultado: as relações jurídicas, bem como as formas do Estado, 
não podem ser explicadas por si mesmas, nem pela chamada evolução 
geral do espírito humano; estas relações têm, ao contrário, suas raízes 
nas condições materiais de existência, em seu conjunto, condições estas 
que Hegel, a exemplo dos ingleses e dos franceses do século XVIII, 
compreendia sob o nome de “sociedade civil”. Cheguei, também, à 
conclusão de que a anatomia da sociedade deve ser procurada na 
Economia política. Eu havia começado o estudo desta última em Paris 
e o continuara em Bruxelas, bnde eu me havia estabelecido, em conse­
quência de uma sentença dé expulsão ditada pelo Sr. Guizot contra 
mim. O resultado geral a qpe cheguei e que, uma vez obtido, serviu 
de guia para meus estudos, jpode formular-se, (resumidamente, assim: 
na produção social da própria existência, os homens entram em relações 
determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; estas relações 
de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento 
de suas forças produtivas materiais. O conjunto dessas relações de 
produção constitui a; estrutura econômica da sociedade, a base real sobre 
a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual corres­
pondem formas; sociais determinadas de consciência. O modo de 
* Reproduzido de Marx, K. “Prefácio.” In: Contribuição à Crítica da Economia 
Política. Trad. por Florestan Fernandes. São Paulo, Ed. .Flama, 1946. p. 30-32.
83
produção da vida material condiciona o processo de vida social, política 
e intelectual. Não é a consciência dos homens que determina a 
realidade; ao contrário, é a realidade social que determina sua cons­
ciência. Em certa fase de seu desenvolvimento, as forças produtivas da 
sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes 
ou, o que não é mais que sua expressão jurídica, com as relações de 
propriedade, no seio das quais elas se haviam desenvolvido até então. 
De formas evolutivas das forças produtivas, que eram, essas relações 
convertem-se em seus entraves. Abre-se, então, uma era de revolução 
social. A transformação que se produziu na base econômica transtorna 
mais ou menos lenta ou rapidamente toda a colossal superestrutura. 
Quando se consideram tais transformações, convém^ distinguir, sempre, 
a transformação material das condições econômicas de produção — 
que podem ser verificadas, fielmente, coma ajuda das ciências físicas 
e naturais — e as formas jurídicas, políticas, religiosas, artísticas ou 
filosóficas, em resumo, as formas ideológicas, sob as quais os homens 
adquirem consciência desse conflito e o levam até ao fim. Do mesmo 
modo que não se julga o indivíduo pela idéia que de si mesmo faz, 
tampouco se pode julgar uma tal época de abalos pela consciência que 
ela tem de si mesma. É preciso, ao contrário, explicar esta consciência 
pelas contradições da vida material, pelo conflito que existe entre as 
forças produtivas sociais e as relações de produção. Uma sociedade 
jamais desaparece antes que estejam desenvolvidas todas as forças 
produtivas que possa conter, e as relações de produção novas e supe­
riores não tomam jamais seu lugar antes que as condições materiais de 
existência dessas relações tenham sido incubadas no próprio seio da 
velha sociedade. Eis por que a humanidade não se propõe nunca senão 
os problemas que ela pode resolver, pois, aprofundando a análise, 
ver-se-á, sempre, que o próprio problema só se apresenta quando as 
condições materiais para resolvê-lo existem ou estão em vias de existir. 
Esboçados, em largos traços, os modos de produção asiáticos, antigos, 
feudais e burgueses modernos, podem ser designados como outras tantas 
épocas progressivas da formação social econômica. As relações de 
produção burguesas são a última forma antagônica do processo de 
produção social, antagônica não no sentido de um antagonismo indivi­
dual, mas de um antagonismo que nasce das condições de existência 
sociais dos indivíduos; as forças produtivas que se desenvolvem no seio 
da sociedade burguesa criam, ao mesmo tempo, as condições materiais 
para resolver este antagonismo. Com esta formação social termina, 
pois, a pré-história da sociedade humana.
4. INFRA-ESTRUTURA E SUPERESTRUTURA
4.1. O “prefácio” da Contribuição à Crítica da Economia
Política *
O primeiro trabalho que empreendi, para resolver as dúvidas que 
me assaltavam, foi uma revisão crítica da Filosofia do Direito, de Hegel, 
trabalho cuja introdução apareceu nos Anais Franco-alemães, publica­
dos em Paris, em 1844. Minhas investigações me conduziram ao 
seguinte resultado: as relações jurídicas, bem como as formas do Estado, 
não podem ser explicadas por si mesmas, nem pela chamada evolução 
geral do espírito humano; estas relações têm, ao contrário, suas raízes 
nas condições materiais de existência, em seu conjunto, condições estas 
que Hegel, a exemplo dos ingleses e dos franceses do século XVIII, 
compreendia sob o nome de “sociedade civil”. Cheguei, também, à 
conclusão de que a anatomia da sociedade deve ser procurada na 
Economia política. Eu havia começado o estudo desta última em Paris 
e o continuara em Bruxelas, bnde eu me havia estabelecido, em conse­
quência de uma sentença dé expulsão ditada pelo Sr. Guizot contra 
mim. O resultado geral a qpe cheguei e que, uma vez obtido, serviu 
de guia para meus estudos, jpode formular-se, (resumidamente, assim: 
na produção social da própria existência, os homens entram em relações 
determinadas, necessárias, independentes de sua vontade; estas relações 
de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento 
de suas forças produtivas materiais. O conjunto dessas relações de 
produção constitui a; estrutura econômica da sociedade, a base real sobre 
a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual corres­
pondem formas; sociais determinadas de consciência. O modo de 
* Reproduzido de Marx, K. “Prefácio.” In: Contribuição à Crítica da Economia 
Política. Trad. por Florestan Fernandes. São Paulo, Ed. .Flama, 1946. p. 30-32.
83
produção da vida material condiciona o processo de vida social, política 
e intelectual. Não é a consciência dos homens que determina a 
realidade; ao contrário, é a realidade social que determina sua cons­
ciência. Em certa fase de seu desenvolvimento, as forças produtivas da 
sociedade entram em contradição com as relações de produção existentes 
ou, o que não é mais que sua expressão jurídica, com as relações de 
propriedade, no seio das quais elas se haviam desenvolvido até então. 
De formas evolutivas das forças produtivas, que eram, essas relações 
convertem-se em seus entraves. Abre-se, então, uma era de revolução 
social. A transformação que se produziu na base econômica transtorna 
mais ou menos lenta ou rapidamente toda a colossal superestrutura. 
Quando se consideram tais transformações, convém^ distinguir, sempre, 
a transformação material das condições econômicas de produção — 
que podem ser verificadas, fielmente, com a ajuda das ciências físicas 
e naturais — e as formas jurídicas, políticas, religiosas, artísticas ou 
filosóficas, em resumo, as formas ideológicas, sob as quais os homens 
adquirem consciência desse conflito e o levam até ao fim. Do mesmo 
modo que não se julga o indivíduo pela idéia que de si mesmo faz, 
tampouco se pode julgar uma tal época de abalos pela consciência que 
ela tem de si mesma. É preciso, ao contrário, explicar esta consciência 
pelas contradições da vida material, pelo conflito que existe entre as 
forças produtivas sociais e as relações de produção. Uma sociedade 
jamais desaparece antes que estejam desenvolvidas todas as forças 
produtivas que possa conter, e as relações de produção novas e supe­
riores não tomam jamais seu lugar antes que as condições materiais de 
existência dessas relações tenham sido incubadas no próprio seio da 
velha sociedade. Eis por que a humanidade não se propõe nunca senão 
os problemas que ela pode resolver, pois, aprofundando a análise, 
ver-se-á, sempre, que o próprio problema só se apresenta quando as 
condições materiais para resolvê-lo existem ou estão em vias de existir. 
Esboçados, em largos traços, os modos de produção asiáticos, antigos, 
feudais e burgueses modernos, podem ser designados como outras tantas 
épocas progressivas da formação social econômica. As relações de 
produção burguesas são a última forma antagônica do processo de 
produção social, antagônica não no sentido de um antagonismo indivi­
dual, mas de um antagonismo que nasce das condições de existência 
sociais dos indivíduos; as forças produtivas que se desenvolvem no seio 
da sociedade burguesa criam, ao mesmo tempo, as condições materiais 
para resolver este antagonismo. Com esta formação social termina, 
pois, a pré-história da sociedade humana.
84
4.2. Carta de Marx a P. V. Aiuienkov *
[Bruxelas], 28 de dezembro [de 1846].
O senhor teria recebido minha resposta à sua carta de l.° de '
novembro, já há muito tempo, se meu livreiro não me tivesse mandado 
somente na semana passada a obra do senhor Proudhon A Filosofia 
da Miséria. Li-a rapidamente, em dois dias apenas, a fim de trans­
mitir-lhe, sem perda de tempo, minha opinião. Por tê-la lido apressa-à verdade? Por que o senhor Proudhon 
recorre, em suas especulações, a um hegelianismo superficial para pare­
cer um esprit fortl
Ê o mesmo senhor Proudhon quem nos dá a chave do enigma. 
Para ele, a História é uma série determinada de desenvolvimentos sociais. 
Vê na História a realização do progresso. Julga, finalmente, que os 
homens, tomados como indivíduos, não sabiam o que faziam e imagi­
navam de modo errôneo seu próprio movimento, isto é, que seu desen- \
volvimento social parece, à primeira vista, algo diferente, separado, j
independente de seu desenvolvimento individual. O senhor Proudhon 
* Reproduzido de Marx, K. e Engels, F. Obras escogidas. Moscou, Ediciones 
en Lenguas Extranjeras, 1952. t. II, p. 414-24. Trad. por Maria Elisa Mascarenhas.
85
não pode explicar esses fatos e recorre, então, à sua hipótese — 
verdadeiro achado — da razão universal que se revela a si mesma. 
Nada mais fácil que inventar causas místicas, isto é, frases, quando se 
carece de bom-senso.
Mas, uma vez que o senhor Proudhon reconhece que não com­
preende, de modo algum, o desenvolvimento histórico da humanidade 
— como faz ao apelar para palavras sonoras: razão universal, Deus 
etc. — não estaria ele, por acaso, reconhecendo, também, implicita­
mente, que é incapaz de compreender o desenvolvimento econômico!
Que é a sociedade, qualquer que seja a sua forma? O produto 
da ação recíproca dos homens. Podem os homens eleger livremente 
esta ou aquela forma social? Nada disso. A um determinado nível do 
desenvolvimento das forças produtivas dos homens corresponde uma 
determinada forma de comércio e de consumo. A determinadas fases 
de desenvolvimento da produção, do comércio, do consumo correspon­
dem determinadas formas de organização social, uma determinada 
organização da família, das camadas sociais ou das classes; em síntese: 
uma determinada sociedade civil. A uma determinada sociedade civil 
corresponde um determinado Estado político, que não é mais que a 
expressão oficial daquela. Isto é o que o senhor Proudhon jamais 
chegará a compreender, pois acredita que concebe grandiosidade, quando 
fala da sociedade civil como decorrência do Estado, isto é, da síntese 
oficial da sociedade como fruto da sociedade oficial.
Falta acrescentar que os homens não arbitram livremente sobre 
suas forças produtivas — base de toda a sua História, pois toda força 
produtiva é uma força já adquirida, produto de uma atividade anterior. 
Portanto, as forças produtivas são o resultado da energia posta em prática 
pelos homens; mas essa energia é determinada, ela mesma, pelas con­
dições em que os homens se encontram, pelas forças produtivas já 
adquiridas, pela forma social que lhes é anterior, que eles não criaram 
e que é produto da geração prévia. O simples fato de que toda geração 
nova se defronta com forças produtivas adquiridas pela geração prece­
dente e que servem de matéria-prima para a nova produção, dá à 
História um encadeamento, forjando uma História da Humanidade, que 
é tanto mais a História da Humanidade quanto maior for o desenvol­
vimento de suas forças produtivas e, por conseguinte, de suas relações 
sociais. Conseqüência obrigatória: a história social dos homens nada 
mais é que a história de seu desenvolvimento individual, tenham, ou não 
eles próprios consciência disso. Suas relações materiais formam a base 
de todas as demais relações. Essas relações materiais não são mais que
84
4.2. Carta de Marx a P. V. Aiuienkov *
[Bruxelas], 28 de dezembro [de 1846].
O senhor teria recebido minha resposta à sua carta de l.° de '
novembro, já há muito tempo, se meu livreiro não me tivesse mandado 
somente na semana passada a obra do senhor Proudhon A Filosofia 
da Miséria. Li-a rapidamente, em dois dias apenas, a fim de trans­
mitir-lhe, sem perda de tempo, minha opinião. Por tê-la lido apressa-forjando uma História da Humanidade, que 
é tanto mais a História da Humanidade quanto maior for o desenvol­
vimento de suas forças produtivas e, por conseguinte, de suas relações 
sociais. Conseqüência obrigatória: a história social dos homens nada 
mais é que a história de seu desenvolvimento individual, tenham, ou não 
eles próprios consciência disso. Suas relações materiais formam a base 
de todas as demais relações. Essas relações materiais não são mais que
86
as formas necessárias sob as quais se realiza sua atividade material e 
individual.
O senhor Proudhon confunde as idéias com as coisas. Os homens 
nunca renunciam ao que já conquistaram; mas isso não quer dizer que 
nunca renunciem às formas sociais sob as quais adquiriram determina­
das forças produtivas. Muito pelo contrário: para não se verem privados 
dos resultados adquiridos, para não perderem os frutos da civilização, 
os homens se vêem constrangidos, a partir do momento em que a forma 
de seu comércio já não corresponde às forças produtivas alcançadas, a 
modificar todas as suas formas sociais tradicionais. Emprego, aqui, a 
palavra “comércio”, em seu sentido mais amplo, para designar o que 
em alemão denominamos FerA:e/zr. Assim3 por exemplo, os privilégios, 
a instituição de grêmios e corporações, as numerosas relações estabe­
lecidas entre os homens, na Idade Média, eram relações sociais que 
correspondiam tão-somente às forças produtivas adquiridas e ao estado 
social anterior, do qual essas instituições haviam brotado. Sob a tutela 
do regime das corporações e das ordenanças, foram acumulados capitais, 
desenvolveu-se um comércio marítimo, foram fundadas colônias; e os 
homens teriam perdido esses frutos de sua atividade, se tivessem se 
empenhado em conservar as formas à sombra das quais estes haviam 
amadurecido. Em razão disso, duas revoluções ocorreram: a de 1640 
e a de 1688. Na Inglaterra, foram abolidas todas as antigas formas 
econômicas, as relações sociais a elas correspondentes e a situação 
política, que era a expressão oficial da velha sociedade civil. Assim, as 
formas econômicas, sob as quais os homens produzem, consomem e 
permutam, são transitórias e históricas. Ao adquirir novas forças pro­
dutivas, os homens mudam seu modo de produção e, com este, também, 
todas as relações econômicas, que nada mais eram que as relações 
necessárias àquele modo concreto de produção.
• Isto é o que o senhor Proudhon não soube compreender, e, menos 
ainda, demonstrar. Incapaz de seguir o movimento real da História, 
ele nos oferece divagações supostamente dialéticas. Não sente a neces­
sidade de abordar os séculos XVII, XVIII e XIX, porque sua história 
se passa nos nebulosos ambientes da imaginação, e paira, muito alto, 
acima do tempo e do espaço. Em resumo, isso não é a História; todas 
essas idéias são velhas tolices hegelianas; não é uma história profana, 
mas sim uma história sagrada ■—■ a história das idéias. Em seu modo 
de ver, o homem é apenas um instrumento do qual se vale a idéia ou 
a razão eterna, para se desenvolver. ' As evoluções de que nos fala o 
senhor Proudhon são concebidas como evoluções que se efetivam no 
87
seio místico da idéia absoluta. Se alguém arranca o véu dessa linguagem 
mística, o que se revela é a ordem em que as categorias econômicas 
estão alinhadas na cabeça do senhor Proudhon. Não me esforçarei 
muito para lhe provar que esta é a ordem de um cérebro muito desor­
denado.
O senhor Proudhon inicia o seu livro com uma dissertação sobre 
o valor, que é seu tema predileto. Não entrarei, aqui, na análise dessa 
dissertação.
A série de evoluções econômicas da razão eterna começa com a 
divisão do trabalho. Para o senhor Proudhon, a divisão do trabalho é 
uma coisa bem simples. Mas não foi o regime das castas uma determi­
nada divisão do trabalho? Não foi o regime das corporações outra 
divisão do trabalho? E a divisão do trabalho do regime da manufatura, 
que começou em meados do século XVII e terminou em fins do século 
XVIII, na Inglaterra, não foi, por sua vez, totalmente diferente daquela 
da grande indústria, da indústria moderna?
O senhor Proudhon está tão longe da verdade, que omite, inclusive, 
o que os economistas profanos já tomam em consideração. Quando 
fala da divisão do trabalho, esquiva-se, por achar desnecessário, de 
falar do mercado mundial. Então, acaso a divisão do trabalho nos 
séculos XIV e XV, quando ainda não havia colônias, quando a América 
não existia ainda para a Europa, e só se podia chegar à Ásia Oriental 
através de Constantinopla, não era diferente, em essência, da que se 
verificou no século XVII, quando as colônias já se encontravam desen­
volvidas? Mas isso não é tudo. Toda organização interna dos povos, 
todas as suas relações internacionais são, porventura, outra coisa além 
da expressão de certa divisão do trabalho? Não devem, pois, alterar-se 
com as modificações da divisão do trabalho?
O senhor Proudhon compreendeu tão pouco o problema da divisão 
do trabalho, que nem sequer fala da separação entre cidade e campo, 
que na Alemanha, por exemplo, se operou entre os séculos IX e XII. 
Assim, portanto, essa separação deve ser uma lei eterna para o senhor 
Proudhon, já que ele não conhece nem sua origem nem seu desenvol­
vimento. Em. todo o seu livro ele fala como se essa criação de um modo 
de produção determinado devesse existir até ao fim do mundo. Tudo 
o que o senhor Proudhon diz sobre a divisão do trabalho é apenas um 
resumo, certamente muito superficial e incompleto, do que foi dito 
anteriormente por Adam Smith e milhares de outros autores.
86
as formas necessárias sob as quais se realiza sua atividade material e 
individual.
O senhor Proudhon confunde as idéias com as coisas. Os homens 
nunca renunciam ao que já conquistaram; mas isso não quer dizer que 
nunca renunciem às formas sociais sob as quais adquiriram determina­
das forças produtivas. Muito pelo contrário: para não se verem privados 
dos resultados adquiridos, para não perderem os frutos da civilização, 
os homens se vêem constrangidos, a partir do momento em que a forma 
de seu comércio já não corresponde às forças produtivas alcançadas, a 
modificar todas as suas formas sociais tradicionais. Emprego, aqui, a 
palavra “comércio”, em seu sentido mais amplo, para designar o que 
em alemão denominamos FerA:e/zr. Assim3 por exemplo, os privilégios, 
a instituição de grêmios e corporações, as numerosas relações estabe­
lecidas entre os homens, na Idade Média, eram relações sociais que 
correspondiam tão-somente às forças produtivas adquiridas e ao estado 
social anterior, do qual essas instituições haviam brotado. Sob a tutela 
do regime das corporações e das ordenanças, foram acumulados capitais, 
desenvolveu-se um comércio marítimo, foram fundadas colônias; e os 
homens teriam perdido esses frutos de sua atividade, se tivessem se 
empenhado em conservar as formas à sombra das quais estes haviam 
amadurecido. Em razão disso, duas revoluções ocorreram: a de 1640 
e a de 1688. Na Inglaterra, foram abolidas todas as antigas formas 
econômicas, as relações sociais a elas correspondentes e a situação 
política, que era a expressão oficial da velha sociedade civil. Assim, as 
formas econômicas, sob as quais os homens produzem, consomem e 
permutam, são transitórias e históricas. Ao adquirir novas forças pro­
dutivas, os homens mudam seu modo de produção e, com este, também, 
todas as relações econômicas, que nada mais eram que as relações 
necessárias àquele modo concreto de produção.
• Isto é o que o senhor Proudhon não soube compreender, e, menos 
ainda, demonstrar. Incapaz de seguir o movimento real da História, 
ele nos oferece divagações supostamente dialéticas. Não sente a neces­
sidade de abordar os séculos XVII, XVIII e XIX, porque sua história 
se passa nos nebulosos ambientes da imaginação, e paira, muito alto, 
acima do tempo e do espaço. Em resumo, isso não é a História; todas 
essas idéias são velhas tolices hegelianas; não é uma história profana, 
mas sim uma históriaas 
relações, os processos e as estruturas capitalistas. Opera como 
uma técnica de desmascaramento, pois que exige a crítica das 
idéias, conceitos ou representações, sob os quais as pessoas, as 
classes sociais e as coisas aparecem na consciência e na Ciência. 
Não seria possível explicar a mercadoria, como um sistema de 
relações (dos homens com a natureza e entre si, na produção e 
reprodução de si mesmos) sem desvendar o seu “caráter místico”. 
Depois de mostrar como o valor-de-uso esconde o valor-de-troca 
e ambos escondem o valor-trabalho, de mostrar, portanto, que a 
mercadoria é trabalho social cristalizado e alienado, Marx se 
dedica a examinar o seu fetichismo. Isto é, depois de ver a 
mercadoria na perspectiva do seu produtor, o operário, ele se 
dedica a examinar como a mercadoria é vista e apresentada pelo 
capitalista, ou a sua Ciência, a Economia política. Na consciência 
e na ciência da burguesia, a mercadoria aparece como ela não é; 
apresenta-se coisificada, como se tivesse propriedades exclusivas, 
independentes do produtor e das relações de produção. A classe 
dominante tende a projetar e impor essa maneira de ver a todas 
as outras classes, inclusive e principalmente ao proletariado.
“O caráter misterioso da mercadoria assenta, pura e simples­
mente, em que proteja ante os homens o caráter social dos seus
5 Marx, K. El capital, t. I, p. 17; O Capital, liv. 1, p. 16.
6 Marx, K. El capital, t. III, p. 948.
laura
.
alice alcantara
.
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trabalhos como se fosse um cárater’material dos próprios pro­
dutos do trabalho, um dom social natural desses objetos; e como 
se, portanto, a relação social, que media os produtores e o tra­
balho coletivo da sociedade, fosse uma relação social estabelecida 
entre os próprios objetos, à margem dos seus produtores. Este 
quid pro quo é que converte os produtos de trabalho em mer­
cadoria, em objetos fisicamente metafísicos ou em objetos so­
ciais. (...) Ocorre que a forma mercadoria e a relação de valor 
dos produtos do trabalho, em que essa forma toma corpo, não têm 
absolutamente nada que ver com seu caráter físico, nem com as 
relações materiais que derivam desse caráter. O que aqui toma, 
aos olhos dos homens, a forma fantasmagórica de uma relação 
entre objetos materiais não é mais do que uma relação social 
concreta estabelecida entre os próprios homens. Assim, se que­
remos encontrar uma analogia com esse fenômeno, precisamos 
elevar-nos às regiões nebulosas do mundo da religião, onde os 
produtos da mente humana assemelham-se a seres dotados de 
vida própria, de existência independente, mantendo tanto relações 
entre si como com os homens. Isto é o que ocorre no mundo 
das mercadorias, com os produtos da mão do Homem. E isto 
é o que eu chamo o fetichismo que adere aos produtos do tra­
balho, tão logo são criados sob a forma de mercadorias, e que 
é inseparável, por conseguinte, deste sistema de produção.” 7
É óbvio que os fetichismos de todo o tipo são indispensáveis 
à existência e à persistência das relações alienadas que as pessoas, 
os grupos e as classes sociais desenvolvem entre si e com os 
produtos das suas atividades. Entretanto, na ocasião em que se 
realiza a descoberta científica do verdadeiro caráter dessas rela­
ções, quando se desvendam e desmascaram as suas significações, 
nessa ocasião os fetichismos começam a perder eficácia. A nova 
interpretação adere às relações sociais como algo que também lhe 
é intrínseco, e tende a desvendar os reflexos, as formas invertidas, 
os fetichismos que encobrem ou sombreiam as determinações 
essenciais, particularmente as contradições, que governam essas 
relações. É na análise de Marx que todo capitalismo se toma 
transparente, desde as figurações da mercadoria até às figurações 
das relações entre as pessoas, desde os encadeamentos entre a 
sociedade e o Estado até às contradições de classes.
“Ao Homem, de certa forma, ocorre o mesmo que às mercado­
rias. Como não vem ao mundo provido de um espelho, nem pro-
7 Marx, K. El capital, t. I, p. 80-81; O Capital, liv. 1, p. 81.
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clamando filosoficamente, como Fichte, “eu sou eu”, o Homem 
se vê e reconhece primeiramente em seu semelhante. Para 
referir-se a si mesmo como Homem, o homem Pedro tem que 
começar por referir-se ao homem Paulo como seu igual. Assim 
fazendo, o tal Paulo é, para ele, com os seus cabelos e sinais, e 
toda sua corporeidade paulina, a forma ou a manifestação sob 
a qual se reveste o gênero homem.” 8
“Quando se examina mais de perto a situação e os partidos, desa­
parece essa aparência superficial que dissimula a lufa de classes 
e a fisionomia peculiar da época.” 9
A análise dialética ao mesmo tempo constitui e transforma 
o objeto. Adere destrutivamente ao objeto, na medida em que 
desvenda e desmascara os seus fetichismos, as suas contradições 
e os seus movimentos. Desde o instante em que se formula, a 
interpretação marxista do capitalismo torna-se imprescindível à 
existência histórica deste. Ao tomar transparente o encadeamento 
dos homens e dos produtos da sua atividade, entre si e recipro­
camente, a análise desvenda o caráter e as tendências dos antago­
nismos que governam o andamento revolucionário e histórico do 
capitalismo. Na essência do capitalismo estão, ao mesmo tempo, 
a mais-valia, que funda a acumulação de capital, e o proletariado, 
que produz a mais-valia. Desde o momento em que descobre 
que é ele quem produz o capital, ao produzir mais-valia, o 
proletariado começa a libertar-se da dominação burguesa. Esse é 
o primeiro momento no processo de realização da sua hegemonia.
2. Classes sociais e contradições de classes
Marx realizou várias descobertas revolucionárias, envolvendo 
a História, a Economia política, a Lógica, bem como outros 
campos das Ciências Sociais e da Filosofia. O que singulariza 
essas descobertas, no entanto, é o fato de que todas são relaciona­
das entre si, todas estão reciprocamente_en.cadeadas. Aind-a—que 
se po§sa_disaitir^|^juventud?^)e a (maturidade^) ou av‘ruptura> 
e a ycontinuidadejXa obra de Marx, as suas descobertas exigem, 
onde quer que as tomemos, que as vejamos sempre em seus des­
dobramentos e detenpinações mútuos. E isso nos parece evidente, 
8 Marx, K. El capital, t. I, p. 59; O Capital. Üv. 1, p. 60.
9 Marx, K. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. São Paulo, Ed. Escriba, 
1968. p. 48.
alice alcantara
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trabalhos como se fosse um cárater’material dos próprios pro­
dutos do trabalho, um dom social natural desses objetos; e como 
se, portanto, a relação social, que media os produtores e o tra­
balho coletivo da sociedade, fosse uma relação social estabelecida 
entre os próprios objetos, à margem dos seus produtores. Este 
quid pro quo é que converte os produtos de trabalho em mer­
cadoria, em objetos fisicamente metafísicos ou em objetos so­
ciais. (...) Ocorre que a forma mercadoria e a relação de valor 
dos produtos do trabalho, em que essa forma toma corpo, não têm 
absolutamente nada que ver com seu caráter físico, nem com as 
relações materiais que derivam desse caráter. O que aqui toma, 
aos olhos dos homens, a forma fantasmagórica de uma relação 
entre objetos materiais não é mais do que uma relação social 
concreta estabelecida entre os próprios homens. Assim, se que­
remos encontrar uma analogia com esse fenômeno, precisamos 
elevar-nos às regiões nebulosas do mundo da religião, onde os 
produtos da mente humana assemelham-se a seres dotados de 
vida própria, de existência independente, mantendo tanto relações 
entre si como com os homens. Isto é o que ocorre no mundo 
das mercadorias, com os produtos da mão do Homem. E isto 
é o que eu chamo o fetichismo que adere aos produtos do tra­
balho, tão logo são criados sob a forma de mercadorias, e que 
é inseparável, por conseguinte, deste sistema de produção.” 7
É óbvio que os fetichismos de todo o tipo são indispensáveis 
à existência e à persistência das relações alienadas que as pessoas, 
os grupos e as classes sociais desenvolvem entre si e com os 
produtos das suas atividades.sagrada ■—■ a história das idéias. Em seu modo 
de ver, o homem é apenas um instrumento do qual se vale a idéia ou 
a razão eterna, para se desenvolver. ' As evoluções de que nos fala o 
senhor Proudhon são concebidas como evoluções que se efetivam no 
87
seio místico da idéia absoluta. Se alguém arranca o véu dessa linguagem 
mística, o que se revela é a ordem em que as categorias econômicas 
estão alinhadas na cabeça do senhor Proudhon. Não me esforçarei 
muito para lhe provar que esta é a ordem de um cérebro muito desor­
denado.
O senhor Proudhon inicia o seu livro com uma dissertação sobre 
o valor, que é seu tema predileto. Não entrarei, aqui, na análise dessa 
dissertação.
A série de evoluções econômicas da razão eterna começa com a 
divisão do trabalho. Para o senhor Proudhon, a divisão do trabalho é 
uma coisa bem simples. Mas não foi o regime das castas uma determi­
nada divisão do trabalho? Não foi o regime das corporações outra 
divisão do trabalho? E a divisão do trabalho do regime da manufatura, 
que começou em meados do século XVII e terminou em fins do século 
XVIII, na Inglaterra, não foi, por sua vez, totalmente diferente daquela 
da grande indústria, da indústria moderna?
O senhor Proudhon está tão longe da verdade, que omite, inclusive, 
o que os economistas profanos já tomam em consideração. Quando 
fala da divisão do trabalho, esquiva-se, por achar desnecessário, de 
falar do mercado mundial. Então, acaso a divisão do trabalho nos 
séculos XIV e XV, quando ainda não havia colônias, quando a América 
não existia ainda para a Europa, e só se podia chegar à Ásia Oriental 
através de Constantinopla, não era diferente, em essência, da que se 
verificou no século XVII, quando as colônias já se encontravam desen­
volvidas? Mas isso não é tudo. Toda organização interna dos povos, 
todas as suas relações internacionais são, porventura, outra coisa além 
da expressão de certa divisão do trabalho? Não devem, pois, alterar-se 
com as modificações da divisão do trabalho?
O senhor Proudhon compreendeu tão pouco o problema da divisão 
do trabalho, que nem sequer fala da separação entre cidade e campo, 
que na Alemanha, por exemplo, se operou entre os séculos IX e XII. 
Assim, portanto, essa separação deve ser uma lei eterna para o senhor 
Proudhon, já que ele não conhece nem sua origem nem seu desenvol­
vimento. Em. todo o seu livro ele fala como se essa criação de um modo 
de produção determinado devesse existir até ao fim do mundo. Tudo 
o que o senhor Proudhon diz sobre a divisão do trabalho é apenas um 
resumo, certamente muito superficial e incompleto, do que foi dito 
anteriormente por Adam Smith e milhares de outros autores.
88
A segunda evolução refere-se às máquinas. Para o senhor 
Proudhon, a conexão existente entre a divisão do trabalho e as má­
quinas é inteiramente mística. Cada uma das formas de divisão do 
trabalho tem seus instrumentos de produção específicos. Desde o 
meado do século XVII até o do XVIII, por exemplo, os homens já não 
faziam tudo apenas manualmente. Possuíam instrumentos, e instru­
mentos bastante complexos, como teares, navios, alavancas etc., etc.
Assim, portanto, nada mais ridículo que derivar as máquinas da 
divisão do trabalho em geral.
Assinalo, também, rapidamente, que se o senhor Proudhon não 
logrou compreender a origem histórica das máquinas, menos ainda 
compreendeu o seu desenvolvimento. Podemos dizer que, até 1825, 
data da primeira crise mundial, as necessidades do consumo cresciam, 
em geral, mais rapidamente que a produção, e o desenvolvimento das 
máquinas foi, desse modo, conseqüência forçada das necessidades do 
mercado. A partir de 1825, a invenção e a aplicação de novas 
máquinas foram apenas um resultado da guerra entre operários e 
patrões. Mas isto só é válido quando dito em relação à Inglaterra. 
Quanto às nações da Europa continental, estas se viram obrigadas a 
empregar as máquinas por causa da concorrência' que lhes faziam os 
ingleses, tanto em seus próprios mercados quanto no mercado mundial. 
Finalmente, na América do Norte, a introdução da maquinaria foi 
devida tanto à concorrência com outros países como à escassez de 
mão-de-obra, isto é, à desproporção entre a povoação do país e as 
suas necessidades industriais. Por tais fatos pode o senhor ver a saga­
cidade apresentada pelo senhor Proudhon, quando conjura o fan­
tasma da concorrência como a terceira evolução, como a antítese das 
máquinas!
Finalmente, é, em geral, um verdadeiro absurdo fazer das máquinas 
uma categoria econômica, ao lado da divisão do trabalho, da concor­
rência, do crédito etc.
A máquina tem tanto de categoria econômica quanto o boi que 
puxa o arado. A utilização atual das máquinas é uma das relações de 
nosso regime econômico presente; mas uma coisa são as máquinas e 
outra coisa é o modo de utilizá-las. A pólvora continua sendo pólvora, 
indiferentemente, quer seja utilizada para ferir quer para curar.
O senhor Proudhon supera a si mesmo, quando permite que a 
concorrência, o monopólio, os impostos ou a polícia, a balança 
comercial, o crédito e a propriedade se desenvolvam, no interior de 
89
seu cérebro, precisamente na ordem em que aqui indico. Quase todas 
as instituições de crédito já se haviam desenvolvido, na Inglaterra, no 
começo do século XVIII, antes da invenção das máquinas. O crédito 
público não era mais que uma nova maneira de se elevar os impostos 
e de se satisfazer as novas demandas originadas pela chegada da bur­
guesia ao Poder. Finalmente, a propriedade constitui a última categoria 
no sistema do senhor Proudhon. No mundo real, pelo contrário, a 
divisão do trabalho e todas as demais categorias do senhor Proudhon 
são relações sociais, cujo conjunto forma o que atualmente se denomina 
propriedade} fora dessas relações, a propriedade burguesa é apenas uma 
ilusão metafísica ou jurídica. A propriedade de çutra época, a proprie­
dade feudal, se desenvolve em uma série de relações sociais completa­
mente distintas. Quando estabelece a propriedade como uma relação 
independente, o senhor Proudhon comete algo mais que um mero erro 
de método: prova, claramente, que não compreendeu o vínculo que liga 
todas as formas da produção burguesa} que não compreendeu o caráter 
histórico e transitório das formas da produção, numa época determinada. 
O senhor Proudhon só pode fazer uma crítica dogmática às nossas 
instituições, pois não as considera como produtos históricos, e não com­
preende nem sua origem nem sua evolução.
Assim, o senhor Proudhon se vê constragido a recorrer a uma 
ficção para explicar o desenvolvimento. Pensa que a divisão do tra­
balho, o crédito, as máquinas etc. foram inventadas para servirem à 
sua idéia fixa, à idéia da igualdade. Sua explicação é de uma ingenui­
dade sublime. Essas coisas foram inventadas para a igualdade, mas, 
infelizmente, voltaram-se contra ela. Este é todo o seu argumento. Em 
outras palavras, faz uma suposição gratuita, e, como o desenvolvimento 
real e sua ficção se contradizem, a cada passo, conclui, inevitavelmente, 
que há uma contradição. Oculta o fato de que a contradição existe 
unicamente entre suas obsessões e o movimento real.
Assim, portanto, o senhor Proudhon, devido, principalmente, à sua 
falta de conhecimentos históricos, não viu que os homens, ao desenvol­
verem suas forças produtivas, isto é, ao viverem, desenvolvem entre si 
certas relações, e que o caráter dessas relações se altera, necessariamente, 
com a modificação e o desenvolvimento dessas forças produtivas. Não 
viu que as categorias econômicas não são mais que abstrações dessas 
relações reais, e que somente são verdades enquanto estas últimas 
subsistem. Por conseguinte, incorre no erro dos economistas burgueses, 
que vêem, nessas categorias econômicas, leis eternas e não leis histó­
ricas, válidas apenas para certo desenvolvimento histórico, para um 
88
A segunda evolução refere-se às máquinas. Para o senhor 
Proudhon, a conexão existente entre a divisão do trabalho e as má­
quinas é inteiramenteEntretanto, na ocasião em que se 
realiza a descoberta científica do verdadeiro caráter dessas rela­
ções, quando se desvendam e desmascaram as suas significações, 
nessa ocasião os fetichismos começam a perder eficácia. A nova 
interpretação adere às relações sociais como algo que também lhe 
é intrínseco, e tende a desvendar os reflexos, as formas invertidas, 
os fetichismos que encobrem ou sombreiam as determinações 
essenciais, particularmente as contradições, que governam essas 
relações. É na análise de Marx que todo capitalismo se toma 
transparente, desde as figurações da mercadoria até às figurações 
das relações entre as pessoas, desde os encadeamentos entre a 
sociedade e o Estado até às contradições de classes.
“Ao Homem, de certa forma, ocorre o mesmo que às mercado­
rias. Como não vem ao mundo provido de um espelho, nem pro-
7 Marx, K. El capital, t. I, p. 80-81; O Capital, liv. 1, p. 81.
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clamando filosoficamente, como Fichte, “eu sou eu”, o Homem 
se vê e reconhece primeiramente em seu semelhante. Para 
referir-se a si mesmo como Homem, o homem Pedro tem que 
começar por referir-se ao homem Paulo como seu igual. Assim 
fazendo, o tal Paulo é, para ele, com os seus cabelos e sinais, e 
toda sua corporeidade paulina, a forma ou a manifestação sob 
a qual se reveste o gênero homem.” 8
“Quando se examina mais de perto a situação e os partidos, desa­
parece essa aparência superficial que dissimula a lufa de classes 
e a fisionomia peculiar da época.” 9
A análise dialética ao mesmo tempo constitui e transforma 
o objeto. Adere destrutivamente ao objeto, na medida em que 
desvenda e desmascara os seus fetichismos, as suas contradições 
e os seus movimentos. Desde o instante em que se formula, a 
interpretação marxista do capitalismo torna-se imprescindível à 
existência histórica deste. Ao tomar transparente o encadeamento 
dos homens e dos produtos da sua atividade, entre si e recipro­
camente, a análise desvenda o caráter e as tendências dos antago­
nismos que governam o andamento revolucionário e histórico do 
capitalismo. Na essência do capitalismo estão, ao mesmo tempo, 
a mais-valia, que funda a acumulação de capital, e o proletariado, 
que produz a mais-valia. Desde o momento em que descobre 
que é ele quem produz o capital, ao produzir mais-valia, o 
proletariado começa a libertar-se da dominação burguesa. Esse é 
o primeiro momento no processo de realização da sua hegemonia.
2. Classes sociais e contradições de classes
Marx realizou várias descobertas revolucionárias, envolvendo 
a História, a Economia política, a Lógica, bem como outros 
campos das Ciências Sociais e da Filosofia. O que singulariza 
essas descobertas, no entanto, é o fato de que todas são relaciona­
das entre si, todas estão reciprocamente_en.cadeadas. Aind-a—que 
se po§sa_disaitir^|^juventud?^)e a (maturidade^) ou av‘ruptura> 
e a ycontinuidadejXa obra de Marx, as suas descobertas exigem, 
onde quer que as tomemos, que as vejamos sempre em seus des­
dobramentos e detenpinações mútuos. E isso nos parece evidente, 
8 Marx, K. El capital, t. I, p. 59; O Capital. Üv. 1, p. 60.
9 Marx, K. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. São Paulo, Ed. Escriba, 
1968. p. 48.
laura
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14
seja quando examinamos a sua obra ao longo do processo da sua 
produção, seja quando a tomamos em termos do seu encadea­
mento lógico interno. Para concretizar um pouco a discussão das 
duas perspectivas sugeridas, vejamos como se revelam na formu­
lação da teoria da luta de classes.
Em quase todas as obras de Marx há uma preocupação 
persistente e preponderante com. o caráter das classes sociais, 
isto é, as condições e conseqüências dos seus antagonismos è lutas 
na sociedade capitalista. Para Marx, em última instância, a 
historicidade, ou seja, a transitoriedade do capitalismo, depende 
do desenvolvimento desses antagonismos e lutas. Fundamental­
mente, o confronto por meio do qual o capitalismo entra em 
colapso final é o confronto entre o proletariado e a burguesia, 
pois que, para ele, essas são as duas classes substantivas do 
regime. Uma, a burguesia, é a classe revolucionária que constrói 
o capitalismo, depois de ter surgido com o desenvolvimento e a 
desagregação das relações de produção do feudalismo. A outra, 
o proletariado, é a classe revolucionária que nega o capitalismo 
e luta para criar a sociedade sem classes, no socialismo. A preo­
cupação com essa problemática surge e ressurge em muitas 
ocasiões e sob os seus diferentes aspectos. Ê inegável, no entanto, 
que a teoria da luta de classes formulada por Marx é uma contri­
buição Revolucionária, tanto no contexto da sua obra como 
relativamente a tudo o que se estava pensando na sua época ou 
se havia dito anteriormente. Ele próprio situa essa contribuição 
com clareza.
“No que me diz respeito, nenhum crédito me cabe pela desco­
berta da existência de classes na sociedade moderna ou da luta 
entre elas. Muito antes de mim, historiadores burgueses haviam 
descrito o desenvolvimento histórico da luta de classes, e econo- 
■ mistas burgueses, a anatomia econômica das classes. O que fiz 
de novo foi provar: 1) que a existência de classes somente tem 
lugar em determinadas fases históricas do desenvolvimento da 
produção', 2) que a luta de classes necessariamente conduz à 
ditadura do proletariado, 3) que esta mesma ditadura não consti­
tui senão a transição no sentido da abolição de todas as classes 
e da sociedade sem classes.” 10
10 Marx, K. “Marx to I. Weydemeyer in New York.” (Carta datada de 5 
de março de 1852.) In: Marx, K. e Engels, F. Selected Correspondence. 
Moscou, Progress Publishers, 1955. p. 69.
15
Aqui devemos recolocar o problema inicial: em que medida 
a teoria da luta de classes de Marx vai se produzindo ao longo 
da sua obra e em que medida ela responde ao desenvolvimento 
lógico da sua interpretação do capitalismo., Vejamos, agora, o 
primeiro movimento da reflexão de Marx sobre o tema.
Já nos seus primeiros escritos, Marx revela uma preocupação 
constante e preponderante com as questões sociais geradas com a 
formação e a expansão do capitalismo. Desde o início, ele aborda' 
a alienação das gentes na óptica da divisão sociaí do trabalho. 
Encara esse processo social como uma coqdição da alienação 
que marca a existência social no regime capitalista. Em A Ideologia 
Alemã, onde os problemas são postos frequentemente em termos 
de primeiros princípios, encontramos uma reflexão como esta:
“A partir do momento em que começa a dividir-se o trabalho, 
cada um se move num círculo determinado e exclusivo de ativi­
dades, que lhe é imposto e do qual não pode sair; o homem é 
caçador, pescador, pastor, ou crítico crítico, e não há remédio 
senão continuar a sê-lo, se não quiser ver-se privado dos meios 
de vida”. 11
Nessa época, conforme ele próprio o indica, ao referir-se
ironicamente ao “crítico crítico”, Marx está polemizando com os 
neo-hegelianos de direita. Sob certo aspecto, ele está levando a 
crítica do pensamento hegeliano, na medida em que reaparece na 
linguagem e nos temas dos seus discípulos, às últimas conse­
qüências. Ao mesmo tempo, no entanto, Marx já está retirando 
as conseqüências sociais da concepção otimista da economia 
política clássica inglesa sobre a divisão social do trabalho. En­
quanto Adam Smith via na divisão social do trabalho o processo 
por meio do qual as forças produtivas podiam desenvolver-se e 
generalizar os benefícios do capitalismo, inclusive em âmbito 
Á?rRci°£aÁMa£A JÁ 0 ÁÇaÃLzava com° uma^_ das_ f
quais se concretizam as relações de alienação ~e antagonismo que 
estão na base do capitalismo. Tanto assim que retoma as impli­
cações econômicas e sociais da divisão social do trabalho em
O Capital, na mesma busca das relações 
alienação do produtor no sistema capitalista.
que fundamentam a
Para Marx, a força
11 Marx, K. e Engels, F. La ideologia alemana. Montevidéu, Ediciones 
Pueblos Unidos, 1958. p. 33.
alice alcantara
.
laura
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seja quando examinamos a sua obra ao longo do processo da sua 
produção,seja quando a tomamos em termos do seu encadea­
mento lógico interno. Para concretizar um pouco a discussão das 
duas perspectivas sugeridas, vejamos como se revelam na formu­
lação da teoria da luta de classes.
Em quase todas as obras de Marx há uma preocupação 
persistente e preponderante com. o caráter das classes sociais, 
isto é, as condições e conseqüências dos seus antagonismos è lutas 
na sociedade capitalista. Para Marx, em última instância, a 
historicidade, ou seja, a transitoriedade do capitalismo, depende 
do desenvolvimento desses antagonismos e lutas. Fundamental­
mente, o confronto por meio do qual o capitalismo entra em 
colapso final é o confronto entre o proletariado e a burguesia, 
pois que, para ele, essas são as duas classes substantivas do 
regime. Uma, a burguesia, é a classe revolucionária que constrói 
o capitalismo, depois de ter surgido com o desenvolvimento e a 
desagregação das relações de produção do feudalismo. A outra, 
o proletariado, é a classe revolucionária que nega o capitalismo 
e luta para criar a sociedade sem classes, no socialismo. A preo­
cupação com essa problemática surge e ressurge em muitas 
ocasiões e sob os seus diferentes aspectos. Ê inegável, no entanto, 
que a teoria da luta de classes formulada por Marx é uma contri­
buição Revolucionária, tanto no contexto da sua obra como 
relativamente a tudo o que se estava pensando na sua época ou 
se havia dito anteriormente. Ele próprio situa essa contribuição 
com clareza.
“No que me diz respeito, nenhum crédito me cabe pela desco­
berta da existência de classes na sociedade moderna ou da luta 
entre elas. Muito antes de mim, historiadores burgueses haviam 
descrito o desenvolvimento histórico da luta de classes, e econo- 
■ mistas burgueses, a anatomia econômica das classes. O que fiz 
de novo foi provar: 1) que a existência de classes somente tem 
lugar em determinadas fases históricas do desenvolvimento da 
produção', 2) que a luta de classes necessariamente conduz à 
ditadura do proletariado, 3) que esta mesma ditadura não consti­
tui senão a transição no sentido da abolição de todas as classes 
e da sociedade sem classes.” 10
10 Marx, K. “Marx to I. Weydemeyer in New York.” (Carta datada de 5 
de março de 1852.) In: Marx, K. e Engels, F. Selected Correspondence. 
Moscou, Progress Publishers, 1955. p. 69.
15
Aqui devemos recolocar o problema inicial: em que medida 
a teoria da luta de classes de Marx vai se produzindo ao longo 
da sua obra e em que medida ela responde ao desenvolvimento 
lógico da sua interpretação do capitalismo., Vejamos, agora, o 
primeiro movimento da reflexão de Marx sobre o tema.
Já nos seus primeiros escritos, Marx revela uma preocupação 
constante e preponderante com as questões sociais geradas com a 
formação e a expansão do capitalismo. Desde o início, ele aborda' 
a alienação das gentes na óptica da divisão sociaí do trabalho. 
Encara esse processo social como uma coqdição da alienação 
que marca a existência social no regime capitalista. Em A Ideologia 
Alemã, onde os problemas são postos frequentemente em termos 
de primeiros princípios, encontramos uma reflexão como esta:
“A partir do momento em que começa a dividir-se o trabalho, 
cada um se move num círculo determinado e exclusivo de ativi­
dades, que lhe é imposto e do qual não pode sair; o homem é 
caçador, pescador, pastor, ou crítico crítico, e não há remédio 
senão continuar a sê-lo, se não quiser ver-se privado dos meios 
de vida”. 11
Nessa época, conforme ele próprio o indica, ao referir-se
ironicamente ao “crítico crítico”, Marx está polemizando com os 
neo-hegelianos de direita. Sob certo aspecto, ele está levando a 
crítica do pensamento hegeliano, na medida em que reaparece na 
linguagem e nos temas dos seus discípulos, às últimas conse­
qüências. Ao mesmo tempo, no entanto, Marx já está retirando 
as conseqüências sociais da concepção otimista da economia 
política clássica inglesa sobre a divisão social do trabalho. En­
quanto Adam Smith via na divisão social do trabalho o processo 
por meio do qual as forças produtivas podiam desenvolver-se e 
generalizar os benefícios do capitalismo, inclusive em âmbito 
Á?rRci°£aÁMa£A JÁ 0 ÁÇaÃLzava com° uma^_ das_ f
quais se concretizam as relações de alienação ~e antagonismo que 
estão na base do capitalismo. Tanto assim que retoma as impli­
cações econômicas e sociais da divisão social do trabalho em
O Capital, na mesma busca das relações 
alienação do produtor no sistema capitalista.
que fundamentam a
Para Marx, a força
11 Marx, K. e Engels, F. La ideologia alemana. Montevidéu, Ediciones 
Pueblos Unidos, 1958. p. 33.
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individual de trabalho permanece inativa, estéril, se não se vende 
ao capital. Ela somente pode funcionar, criar valor, quando se 
articula, depois de vendida, às outras forças produtivas, nos 
quadros da divisão social do trabalho, organizada também como 
força produtiva, segundo as exigências da produção de mais-valia. 
Isto é, a força individual de trabalho somente pode funcionar em 
benefício do trabalhador se funcionar também, em benefício do 
capitalista. Na divisão social do trabalho, que impera na indústriaA 
o processo de dissociação entre o produtor e a propriedade dos 
meios de pródução alcança os seus maiores desenvolvimentos. 
Esse é o contexto em que o operário se transforma em operário 
parcial, em peça adjetiva da máquina. Devido à fragmentação' 
do processo produtivo, no desenvolvimento da divisão social do 
trabalho, o operário é levado a utilizar apenas uma parte das suas 
faculdades criativas. Toda a sua energia tende a esgotar-se na 
sucção de trabalho vivo pelo trabalho morto, isto é, na cristaliza­
ção de trabalho vivo segundo as determinações do capital. Muitas 
vezes, pois, a divisão social do trabalho traz consigo distorções 
no desenvolvimento e na expressividadg_física e espiritual dq 
operário. Nesses sentidos ê que a_ máquina aparece metafórica^ 
mente digerindo o operário. Esse grau de alienação, que passa 
pela divisão social do trabalho na fábrica" em cada setor eco­
nômico e na sociedade, é uma determinação da produção de 
mais-valia relativa.
“Decompondo o ofício manual, especializando as ferramentas, 
formando os trabalhadores parciais, grupando-os e combinando-os 
num mecanismo único, a divisão manufatureira do trabalho cria 
a subdivisão qualitativa e a proporcionalidade quantitativa dos 
processos sociais de produção; cria, assim, determinada organiza­
ção do trabalho social e, com isso, desenvolve ao mesmo tempo 
nova força produtiva social do trabalho. A divisão manufatureira 
do trabalho, nas bases históricas dadas, só poderia surgir sob 
forma especificamente capitalista. Como forma capitalista do 
processo social de produção, é apenas um método especial de 
produzir mais-valia relativa, ou de expandir os ganhos de capital, 
o que se chaipa de riqueza social, “Wealth of Nations” etc., as 
custas do trabalhador. Ela desenvolve a força produtiva do tra­
balho coletivo para o capitalista e não para o trabalhador e, além 
disso,,deforma o trabalhador individual. Produz novas condições 
de domínio do capital sobre o trabalho. Revela-se, de um lado,
l 17
progresso histórico e fator necessário do desenvolvimento econô­
mico da sociedade, e, de outro, meio civilizado e refinado de 
exploração.” 12
/ Pouco a pouco, Marx delineia a sua visão do capitalismo 
como uma sociedade na qual a burguesia e o proletariado são 
classes sociais revolucionárias e antagônicas^ Revolucionárias é 
antagônicas porque enquanto uma instaura o capitalismo, a outra 
começa a lutar pela destruição do regime no próprio, instante em 
que aparece. Porque aparece alienado no produto do seu trabalho, 
ao produzir mais-valia, o proletariado lutará para suplantar essa 
situação; Porque aparece, desde o princípiér, como a classe que 
se apropria da mais-valia, a burguesia começa a deixar de ser 
revolucionária na ocasião em que se constitui. Nesse instante, 
passa a preocupar-se principalmente com a preservaçãoe o aper­
feiçoamento do (stalus Por dentro da revolução burguesa 
começa a formar-se a revolução proletária.
“Há algumas décadas, a história da indústria e do comércio não 
é mais que a história da revolta das forças produtivas modernas 
contra as relações de produção e de propriedade, que condicio­
nam a existência da burguesia e sua dominação. (...) As forças 
produtivas de que dispõe (a sociedade) não favorecem mais o 
desenvolvimento das condições da propriedade burguesa; pelo 
contrário, tornaram-se poderosas demais para essas condições, 
que se transformam em entraves; e todas as vezes que as forças 
produtivas sociais se libertam desses entraves, precipitam na 
desordem a sociedade inteira e ameaçam a existência da proprie­
dade burguesa. (...)
As armas de que a burguesia se serviu para abater o feudalismo 
voltam-se hoje contra a própria burguesia.
Mas a burguesia não forjou somente as armas que lhe darão a 
morte; criou também os homens que manejarão essas armas — 
os operários modernos, os 'proletários'. (...)
Ora, a indústria, desenvolvendo-se, não somente engrossa o 
número dos proletários, mas concentra-os em massas cada vez 
mais consideráveis; os proletários aumentam em força e adqui­
rem mais clara consciência de sua força. (...) Os choques in­
dividuais entre ó operário e o burguês tomam cada vez mais o 
caráter de choques entre duas classes. Os operários começam
12 Marx, K. El capital, t. I, p. 404; O Capital. Jiv. 1, p. 417-18.
alice alcantara
.
alice alcantara
.
laura
.
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individual de trabalho permanece inativa, estéril, se não se vende 
ao capital. Ela somente pode funcionar, criar valor, quando se 
articula, depois de vendida, às outras forças produtivas, nos 
quadros da divisão social do trabalho, organizada também como 
força produtiva, segundo as exigências da produção de mais-valia. 
Isto é, a força individual de trabalho somente pode funcionar em 
benefício do trabalhador se funcionar também, em benefício do 
capitalista. Na divisão social do trabalho, que impera na indústriaA 
o processo de dissociação entre o produtor e a propriedade dos 
meios de pródução alcança os seus maiores desenvolvimentos. 
Esse é o contexto em que o operário se transforma em operário 
parcial, em peça adjetiva da máquina. Devido à fragmentação' 
do processo produtivo, no desenvolvimento da divisão social do 
trabalho, o operário é levado a utilizar apenas uma parte das suas 
faculdades criativas. Toda a sua energia tende a esgotar-se na 
sucção de trabalho vivo pelo trabalho morto, isto é, na cristaliza­
ção de trabalho vivo segundo as determinações do capital. Muitas 
vezes, pois, a divisão social do trabalho traz consigo distorções 
no desenvolvimento e na expressividadg_física e espiritual dq 
operário. Nesses sentidos ê que a_ máquina aparece metafórica^ 
mente digerindo o operário. Esse grau de alienação, que passa 
pela divisão social do trabalho na fábrica" em cada setor eco­
nômico e na sociedade, é uma determinação da produção de 
mais-valia relativa.
“Decompondo o ofício manual, especializando as ferramentas, 
formando os trabalhadores parciais, grupando-os e combinando-os 
num mecanismo único, a divisão manufatureira do trabalho cria 
a subdivisão qualitativa e a proporcionalidade quantitativa dos 
processos sociais de produção; cria, assim, determinada organiza­
ção do trabalho social e, com isso, desenvolve ao mesmo tempo 
nova força produtiva social do trabalho. A divisão manufatureira 
do trabalho, nas bases históricas dadas, só poderia surgir sob 
forma especificamente capitalista. Como forma capitalista do 
processo social de produção, é apenas um método especial de 
produzir mais-valia relativa, ou de expandir os ganhos de capital, 
o que se chaipa de riqueza social, “Wealth of Nations” etc., as 
custas do trabalhador. Ela desenvolve a força produtiva do tra­
balho coletivo para o capitalista e não para o trabalhador e, além 
disso,,deforma o trabalhador individual. Produz novas condições 
de domínio do capital sobre o trabalho. Revela-se, de um lado,
l 17
progresso histórico e fator necessário do desenvolvimento econô­
mico da sociedade, e, de outro, meio civilizado e refinado de 
exploração.” 12
/ Pouco a pouco, Marx delineia a sua visão do capitalismo 
como uma sociedade na qual a burguesia e o proletariado são 
classes sociais revolucionárias e antagônicas^ Revolucionárias é 
antagônicas porque enquanto uma instaura o capitalismo, a outra 
começa a lutar pela destruição do regime no próprio, instante em 
que aparece. Porque aparece alienado no produto do seu trabalho, 
ao produzir mais-valia, o proletariado lutará para suplantar essa 
situação; Porque aparece, desde o princípiér, como a classe que 
se apropria da mais-valia, a burguesia começa a deixar de ser 
revolucionária na ocasião em que se constitui. Nesse instante, 
passa a preocupar-se principalmente com a preservação e o aper­
feiçoamento do (stalus Por dentro da revolução burguesa 
começa a formar-se a revolução proletária.
“Há algumas décadas, a história da indústria e do comércio não 
é mais que a história da revolta das forças produtivas modernas 
contra as relações de produção e de propriedade, que condicio­
nam a existência da burguesia e sua dominação. (...) As forças 
produtivas de que dispõe (a sociedade) não favorecem mais o 
desenvolvimento das condições da propriedade burguesa; pelo 
contrário, tornaram-se poderosas demais para essas condições, 
que se transformam em entraves; e todas as vezes que as forças 
produtivas sociais se libertam desses entraves, precipitam na 
desordem a sociedade inteira e ameaçam a existência da proprie­
dade burguesa. (...)
As armas de que a burguesia se serviu para abater o feudalismo 
voltam-se hoje contra a própria burguesia.
Mas a burguesia não forjou somente as armas que lhe darão a 
morte; criou também os homens que manejarão essas armas — 
os operários modernos, os 'proletários'. (...)
Ora, a indústria, desenvolvendo-se, não somente engrossa o 
número dos proletários, mas concentra-os em massas cada vez 
mais consideráveis; os proletários aumentam em força e adqui­
rem mais clara consciência de sua força. (...) Os choques in­
dividuais entre ó operário e o burguês tomam cada vez mais o 
caráter de choques entre duas classes. Os operários começam
12 Marx, K. El capital, t. I, p. 404; O Capital. Jiv. 1, p. 417-18.
laura
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por unir-se contra os burgueses para manter seus salários. Vão 
até formar associações permanentes, na previsão de lutas even­
tuais. Por vezes a resistência transforma-se em revolta.” 13
Ao mesmo tempo que se desenvolve o capitalismo industrial, 
os trabalhadores assalariados da indústria vão se organizando em 
associações, coalizões, sindicatos e, por fim, em partido político. 
Pouco a pouco eles compreendem as suas condições semelhantes 
de vida, as suas relações sociais imediatas de trabalho, as suas 
relações entre si, com as outras classes sociais e, em especial, com 
a burguesia. Nesse processo, os trabalhadores individuais trans­
formam-se no proletariado; a classe econômica na classe política 
ou a classe em si numa classe para si. Essa é a ocasião em que o 
proletariado se transforma numa classe social hegemônica (para 
si ou política), passando a lutar politicamente pela destruição do 
Estado burguês e instauração da “ditadura revolucionária do 
proletariado”, como fase de transição para a sociedade sem classes. 
Há uma determinação recíproca entre alienação, antagonismo e 
revolução. Dentre todas as forças produtivas, a maior é a pró­
pria classe operária; portanto, a única que pode transformar o 
sistema.14
Vejamos, agora, o segundo movimento do pensamento de 
Marx, isto é, como a sua teoria da luta de classes corresponde a 
uma decorrência lógica da sua análise do capitalismo. Note-se, 
aliás, que alguns aspectos dessa congruência lógica interna já 
aparecém, implícitos, na análise do movimento anterior. Agora 
vamos explicitá-la melhor.
^Sabemos que Marx elaborou a interpretação do capitalismo 
realizandouma integração crítica e desenvolvida das contribuições 
da filosofia hegeliana, do socialismo utópico e da economia 
política clássica.^] Note-se, entretanto, que ele se aproveitou desse 
trabalho crítico" tanto para desenvolver e integrar o seu pen­
samento como para apreender, isolar e aprofundar a análise 
de questões que aquelas correntes de pensamento não foram 
capazes de resolver ou resolveram em direções que ele considerou
13 Marx, K. e Engels, F- Manifeste du parti communiste. Paris, Éditions 
Sociales, 1960. p. 20-23; Manifesto do Partido Comunista. Rio de Janeiro, 
Editorial Vitória, 1948. p. 28-30.
34 Marx, K. Misère de la philosophie. Paris, Éditions Sociales, 1947. p. 135; 
Miséria da Filosofia. Rio de Janeiro, Ed. Leitura, 1965. p. 164-65.
19
incompletas ou falaciosas. Nesse processo, essencialmente prático- 
-crítico, Marx produz a sua interpretação do capitalismo; interpre­
tação essa que parece corresponder ao momento mais desenvolvido 
da existência do regime e, ao mesmo tempo, à condição da sua 
superação por outro regime produtivo.
No curso desse trabalho intelectual, Marx descobre que a 
mercadoria se singulariza por exprimir, em última instância, umã 
relação determmãda~de~alienação entre o operário e,q capitalista. 
Inicialmente, a mercadoria aparece como valor de-uso. Mas essa 
é a expressão, por assim dizer, subjetiva da mercadoria, enquanto 
uma relação entre o produtor e o produto çdo seu trabalho. À 
medida que a análise progride, no entanto, fica evidente que por 
sob o valor de uso está o valor de troca, e de que por sob este 
está o valor trabalho, isto é, o trabalho social nela cristalizado. 
Assim, a troca de mercadorias esconde a troca de trabalhos sociais 
nelas cristalizados. Na medida em que somente a força de tra­
balho cria valor, pois que o valor é energia humana socialmente 
cristalizada em objeto social, a acumulação de capital pelo capi­
talista só é possível pela expropriação. Ou seja, o capitalista 
compra certa quantidade de força de trabalho do operário, mas 
faz com que ele produza maior quantidade de valor do que o 
que lhe é restituído sob a forma de salário. O segredo da acumu­
lação capitalista, pois, é a diferença entre o trabalho necessário à 
reprodução da vida do operário (o que é pago) e o trabalho 
excedente, que o trabalhador é obrigado a realizar (não pago). 
É o trabalho excedente que produz mais-valia; quando resulta da 
extensão da jornada de trabalho, produz a mais-valia absoluta, 
ao passo que produz mais-valia relativa quando resulta da poten­
ciação da produtividade da força de trabalho, pela tecnologia, 
divisão social do trabalho ou outras forças produtivas combinadas. 
O operário não pode viver a não ser pela venda da sua força 
produtiva ao proprietário dos outros meios de produção, tais como 
capital^ tecnologiá7~õrgãnizãçãõ~emprêsãriai etc. No curso dessa 
análise, à medida que ela se toma cada vez mais concreta, Marx 
vai elaborando os conceitos de valor de uso, valor de troca, valor 
trabalho, trabalho social (concreto, abstrato, individual, coletivo), 
trabalho necessário, trabalho excedente, mais-valia absoluta, mais- 
-valia relativa e outros. O núcleo desse processo explicativo é a 
categoria mais-valia, que revela uma relação determinada de 
alienação e antagonismo, na qual se encadeiam e opõem o operá­
rio e o capitalista.
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por unir-se contra os burgueses para manter seus salários. Vão 
até formar associações permanentes, na previsão de lutas even­
tuais. Por vezes a resistência transforma-se em revolta.” 13
Ao mesmo tempo que se desenvolve o capitalismo industrial, 
os trabalhadores assalariados da indústria vão se organizando em 
associações, coalizões, sindicatos e, por fim, em partido político. 
Pouco a pouco eles compreendem as suas condições semelhantes 
de vida, as suas relações sociais imediatas de trabalho, as suas 
relações entre si, com as outras classes sociais e, em especial, com 
a burguesia. Nesse processo, os trabalhadores individuais trans­
formam-se no proletariado; a classe econômica na classe política 
ou a classe em si numa classe para si. Essa é a ocasião em que o 
proletariado se transforma numa classe social hegemônica (para 
si ou política), passando a lutar politicamente pela destruição do 
Estado burguês e instauração da “ditadura revolucionária do 
proletariado”, como fase de transição para a sociedade sem classes. 
Há uma determinação recíproca entre alienação, antagonismo e 
revolução. Dentre todas as forças produtivas, a maior é a pró­
pria classe operária; portanto, a única que pode transformar o 
sistema.14
Vejamos, agora, o segundo movimento do pensamento de 
Marx, isto é, como a sua teoria da luta de classes corresponde a 
uma decorrência lógica da sua análise do capitalismo. Note-se, 
aliás, que alguns aspectos dessa congruência lógica interna já 
aparecém, implícitos, na análise do movimento anterior. Agora 
vamos explicitá-la melhor.
^Sabemos que Marx elaborou a interpretação do capitalismo 
realizando uma integração crítica e desenvolvida das contribuições 
da filosofia hegeliana, do socialismo utópico e da economia 
política clássica.^] Note-se, entretanto, que ele se aproveitou desse 
trabalho crítico" tanto para desenvolver e integrar o seu pen­
samento como para apreender, isolar e aprofundar a análise 
de questões que aquelas correntes de pensamento não foram 
capazes de resolver ou resolveram em direções que ele considerou
13 Marx, K. e Engels, F- Manifeste du parti communiste. Paris, Éditions 
Sociales, 1960. p. 20-23; Manifesto do Partido Comunista. Rio de Janeiro, 
Editorial Vitória, 1948. p. 28-30.
34 Marx, K. Misère de la philosophie. Paris, Éditions Sociales, 1947. p. 135; 
Miséria da Filosofia. Rio de Janeiro, Ed. Leitura, 1965. p. 164-65.
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incompletas ou falaciosas. Nesse processo, essencialmente prático- 
-crítico, Marx produz a sua interpretação do capitalismo; interpre­
tação essa que parece corresponder ao momento mais desenvolvido 
da existência do regime e, ao mesmo tempo, à condição da sua 
superação por outro regime produtivo.
No curso desse trabalho intelectual, Marx descobre que a 
mercadoria se singulariza por exprimir, em última instância, umã 
relação determmãda~de~alienação entre o operário e,q capitalista. 
Inicialmente, a mercadoria aparece como valor de-uso. Mas essa 
é a expressão, por assim dizer, subjetiva da mercadoria, enquanto 
uma relação entre o produtor e o produto çdo seu trabalho. À 
medida que a análise progride, no entanto, fica evidente que por 
sob o valor de uso está o valor de troca, e de que por sob este 
está o valor trabalho, isto é, o trabalho social nela cristalizado. 
Assim, a troca de mercadorias esconde a troca de trabalhos sociais 
nelas cristalizados. Na medida em que somente a força de tra­
balho cria valor, pois que o valor é energia humana socialmente 
cristalizada em objeto social, a acumulação de capital pelo capi­
talista só é possível pela expropriação. Ou seja, o capitalista 
compra certa quantidade de força de trabalho do operário, mas 
faz com que ele produza maior quantidade de valor do que o 
que lhe é restituído sob a forma de salário. O segredo da acumu­
lação capitalista, pois, é a diferença entre o trabalho necessário à 
reprodução da vida do operário (o que é pago) e o trabalho 
excedente, que o trabalhador é obrigado a realizar (não pago). 
É o trabalho excedente que produz mais-valia; quando resulta da 
extensão da jornada de trabalho, produz a mais-valia absoluta, 
ao passo que produz mais-valia relativa quando resulta da poten­
ciação da produtividade da força de trabalho, pela tecnologia, 
divisão social do trabalho ou outras forças produtivas combinadas. 
O operário não pode viver a não ser pela venda da sua força 
produtiva ao proprietário dos outros meios de produção, tais como 
capital^ tecnologiá7~õrgãnizãçãõ~emprêsãriai etc. No curso dessa 
análise, à medida que ela se toma cada vez mais concreta, Marx 
vai elaborando os conceitos de valor de uso, valor de troca,

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