Prévia do material em texto
Currículos e Programas Sandra da Costa Lacerda Revisada por Roseli Helena de Souza Salgado APRESENTAÇÃO É com satisfação que a Unisa Digital oferece a você, aluno(a), esta apostila de Currículos e Progra- mas, parte integrante de um conjunto de materiais de pesquisa voltado ao aprendizado dinâmico e autô- nomo que a educação a distância exige. O principal objetivo desta apostila é propiciar aos(às) alunos(as) uma apresentação do conteúdo básico da disciplina. A Unisa Digital oferece outras formas de solidificar seu aprendizado, por meio de recursos multidis- ciplinares, como chats, fóruns, aulas web, material de apoio e e-mail. Para enriquecer o seu aprendizado, você ainda pode contar com a Biblioteca Virtual: www.unisa.br, a Biblioteca Central da Unisa, juntamente às bibliotecas setoriais, que fornecem acervo digital e impresso, bem como acesso a redes de informação e documentação. Nesse contexto, os recursos disponíveis e necessários para apoiá-lo(a) no seu estudo são o suple- mento que a Unisa Digital oferece, tornando seu aprendizado eficiente e prazeroso, concorrendo para uma formação completa, na qual o conteúdo aprendido influencia sua vida profissional e pessoal. A Unisa Digital é assim para você: Universidade a qualquer hora e em qualquer lugar! Unisa Digital SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................... 5 1 OS FUNDAMENTOS DO CURRÍCULO....................................................................................... 7 1.1 Desenvolvimento, Cultura, Educação e Escolarização ......................................................................................8 1.2 Definindo Currículo .....................................................................................................................................................10 1.3 As Fontes do Currículo ................................................................................................................................................12 1.4 Psicologia e Currículo ..................................................................................................................................................13 1.5 Resumo do Capítulo ....................................................................................................................................................17 1.6 Atividades Propostas ...................................................................................................................................................17 2 CONSTRUINDO UMA MATRIZ DE CURRÍCULO ............................................................... 19 2.1 A Metáfora e o Modo Narrativo ...............................................................................................................................22 2.2 Objetivos, Planos, Propósitos ...................................................................................................................................23 2.3 Os Quatro Rs - uma Alternativa para os Princípios Lógicos de Tyler .........................................................24 2.4 Resumo do Capítulo ....................................................................................................................................................29 2.5 Atividades Propostas ...................................................................................................................................................29 3 A ORGANIZAÇÃO DO CURRÍCULO POR PROJETOS DE TRABALHO OU A TENTATIVA DE APLICAÇÃO DE UMA MATRIZ CURRICULAR PÓS- MODERNA ................................................................................................................................................31 3.1 Origem e Sentido dos Projetos na Escola - um Relato de Caso ..................................................................31 3.2 Os Projetos de Trabalho: outro Nome para os Centos de Interesse? ........................................................33 3.3 Aspectos a serem levados em conta no Desenvolvimento de um Projeto de Trabalho ...................34 3.4 Resumo do Capítulo ....................................................................................................................................................41 3.5 Atividades Propostas ...................................................................................................................................................41 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................................... 45 RESPOSTAS COMENTADAS DAS ATIVIDADES PROPOSTAS ..................................... 47 REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................. 49 Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 5 INTRODUÇÃO Prezado(a) aluno(a), nesta disciplina, discutiremos a concepção de currículo. Certamente, você já ouviu falar inúmeras vezes em currículo. Aqui, vamos situar o currículo no contexto da escolarização. Para isso, é necessário precisar o que se entende por currículo, determinar suas funções e identificar seus elementos principais, pois o significado e a extensão do termo variam muito conforme os autores e orientações teóricas. Esse é o nosso objetivo. Perceba que serão consideradas as fontes do currículo, isto é, o tipo de informação que se deve considerar na sua elaboração. Em grande parte, essas informações são específicas para cada currículo, pois variam em função do lugar e do momento (as informações originadas na Sociologia da Educação, por exemplo) ou do nível educacional e da idade dos alunos (como as informações originadas na nature- za e estrutura do conteúdo da aprendizagem). Existe, ainda, um conjunto de informações, provenientes da análise psicológica dos processos de desenvolvimento e aprendizagem, que são relativamente gerais e, nesse sentido, merecem um tratamento específico, em uma proposta de modelo curricular que abran- ja todo o ensino obrigatório; por isso, analisaremos, também, as contribuições da Psicologia ao currículo. Para tanto, cumpre discutirmos os fundamentos que iluminam a concepção de currículo. A seguir, procuraremos entender a construção de uma matriz de currículo. Finalizando, discutiremos a organização do currículo por projetos de trabalho. Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 7 OS FUNDAMENTOS DO CURRÍCULO1 O campo do currículo está moribundo. Ele está incapaz, por sua presente me- todologia e princípios, de continuar seu trabalho e contribuir significativamente para os avanços da educação. Ele exige novos princípios [...] uma nova visão [...] de seus problemas [...] [e] novos métodos apropriados aos[...] problemas. (SCHWAB, 1978, p. 64). Você sabe qual a função primordial da edu- cação? Provavelmente não haverá divergências entre os profissionais da educação se afirmarmos que sua finalidade primordial é promover o cres- cimento dos seres humanos. Mas, com certeza, elas surgirão no momento de definir e explicar em que consiste o crescimento educativo e, so- bretudo, de decidir as ações pedagógicas mais adequadas para promovê-lo. A disjuntiva básica ocorre entre aqueles que o fundamentam como o resultado de um processo de desenvolvimen- to, em grande parte interno à pessoa, e os que o concebem mais como o resultado de um proces- so de aprendizagem, em grande parte externo à pessoa. AtençãoAtenção As atividades educativas escolares correspon- dem à ideia de que existem certos aspectos do crescimento pessoal, considerados importantes no âmbito da cultura do grupo, que não poderão ser realizados satisfatoriamente ou que não ocor- rerão de forma alguma, a menos que seja forneci- da uma ajuda específica, que sejam exercidasati- vidades de ensino especialmente pensadas para esse fim. São atividades que correspondem a uma finalidade e são executadas de acordo com um plano de ação determinado e estão a serviço de um projeto educacional. Na verdade, é importante que você com- preenda que o crescimento pessoal e social, in- trínseco à ideia de educação, pode vincular-se alternadamente, tanto ao processo de desen- volvimento como ao de aprendizagem. Por um lado, uma pessoa educada é uma pessoa que se desenvolveu, que evoluiu, no sentido forte do ter- mo, desde níveis inferiores de adaptabilidade ao meio físico e social até níveis superiores. Por ou- tro, uma pessoa educada é a que assimilou, que interiorizou, em suma, que aprendeu, o conjunto de conceitos, explicações, habilidades, práticas e valores que caracterizam uma cultura determina- da, sendo capaz de interagir de forma adaptada ao ambiente físico e social no seu seio. A opção por uma das duas interpretações do crescimento educacional é importante, porque propõe ações pedagógicas diferentes que se plasmam no cur- rículo. Saiba que, embora antiga, a controvérsia foi incentivada nas décadas de 1960 e 1970 pelo auge do enfoque cognitivo-evolutivo, inspirado na teoria genética de Jean Piaget e por suas apli- cações. Saiba maisSaiba mais Jean Piaget, em sua teoria denominada Epistemolo- gia Genética ou Teoria Psicogenética, explica como o indivíduo, desde o seu nascimento, constrói o co- nhecimento. Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 8 DicionárioDicionário Epistemologia: s.f. Estudo das ciências, no que cada uma, e o seu conjunto, tem por objeto apreciar seu valor para o espírito humano; teoria do conheci- mento; gnoseologia. Fonte: Dicionário Aurélio. 1.1 Desenvolvimento, Cultura, Educação e Escolarização Caro(a) aluno(a), observe que, em face do anteriormente exposto, a controvérsia na inter- pretação do crescimento educativo é colocada nos seguintes termos: enquanto o enfoque cog- nitivo-evolutivo considera que a meta primordial da educação deve ser promover, facilitar ou, no máximo, acelerar os processos naturais e univer- sais do desenvolvimento, o enfoque alternativo considera que a educação deve ser orientada mais à promoção e à facilitação das mudanças que dependem da exposição a situações específi- cas de aprendizagem. Em nossa opinião, ambas as posturas con- têm parte de verdade, porém traduzem igual- mente uma maneira incorreta de entender as relações entre aprendizagem e desenvolvimento, que deve ser superada. Nos dois casos, os proces- sos de desenvolvimento e de aprendizagem são considerados quase independentes; atribuem-se quase exclusivamente os primeiros a uma dinâmi- ca interna da pessoa, e os segundos, a uma pres- são externa. A diferença reside na ênfase dada, mas nas duas posturas pressupõe-se que a única relação entre elas é de tipo hierárquico: a apren- dizagem subordina-se ao desenvolvimento, ou o desenvolvimento subordina-se à aprendizagem. Saiba que a ideia de que existem proces- sos evolutivos e processos de aprendizagem in- dependentes entre si deve ser rejeitada, porque contradiz algumas contribuições recentes da pes- quisa psicológica. As pesquisas antropológicas e transculturais têm manifestado a indivisibilidade das capacidades cognitivas básicas (a capacidade de generalizar, recordar, formar conceitos, racio- cinar etc.) em todos os grupos culturais estuda- dos. As mesmas pesquisas, entretanto, ressaltam diferenças na maneira de utilizar capacidades em situações concretas de resolução de proble- mas; e, o que é mais interessante, mostram que essas diferenças estão relacionadas aos tipos de experiências educacionais. Tudo parece sugerir que existem alguns universais cognitivos, porém o fato de serem, efetivamente, postos em prática, depende da natureza dos aprendizados específi- cos propiciados pelas experiências educativas. A partir dessa constatação, inspirando-se fortemente, por um lado, nos trabalhos pioneiros de Vygotsky, Luria e Leontiev e, por outro, na pes- quisa antropológica, surgiu uma nova proposta que supera a controvérsia descrita e reconcilia em um esquema explicativo integrador os processos de desenvolvimento individual e o aprendizado da experiência humana culturalmente organiza- da (o que denominamos de aprendizagens espe- cíficas). O conceito de educação subjacente ao modelo de currículo que defendemos é tributário dessa proposição, cuja ideia básica consiste na re- jeição da tradicional separação entre o indivíduo e a sociedade, que costuma ser introduzida pela análise psicológica. Observe que, nessa óptica, todos os proces- sos psicológicos que configuram o crescimento de uma pessoa – tanto os habitualmente consi- derados evolutivos quanto os atribuídos, tam- Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 9 bém habitualmente, a aprendizagens específicas – são fruto da interação constante que mantém com um meio ambiente culturalmente organi- zado. A interação do ser humano com seu meio está intermediada pela cultura desde o momento do nascimento, sendo os pais, os educadores, os adultos e, em geral, os outros seres humanos, os principais agentes mediadores. Graças às suas múltiplas oportunidades de estabelecer relações interpessoais com os agen- tes mediadores, o ser humano pode desenvolver os processos psicológicos superiores – sua com- petência cognitiva –, porém tais processos sem- pre aparecem em primeiro lugar na vida de uma pessoa no plano da relação interpessoal e, con- sequentemente, sofrem a mediação dos padrões culturais dominantes. O crescimento pessoal é o processo pelo qual o ser humano torna sua a cultura do grupo social ao qual pertence, de tal forma que, nesse processo, o desenvolvimento da competência cognitiva está fortemente vincu- lado ao tipo de aprendizagens específicas e, em geral, ao tipo de práticas sociais dominantes. Para evitar mal-entendidos, vamos precisar rapidamente que o conceito de Cultura é utiliza- do aqui em um sentido muito amplo, próximo ao da antropologia cultural. A Cultura engloba múlti- plos aspectos: conceitos, explicações, raciocínios, linguagem, ideologia, costumes, valores, crenças, sentimentos, interesses, atitudes, pautas de com- portamento, tipos de organização familiar, pro- fissional, econômica, social, tecnológica, tipos de habitat etc. No decorrer da sua história, os grupos sociais encontraram numerosas dificuldades e geraram respostas coletivas para poder superá- -las; a experiência assim acumulada configura sua Cultura. Chegamos, assim, ao conceito de Educação, que desempenha um papel central no esquema explicativo, porque permite compreender como se articulam em um todo unitário a Cultura e o desenvolvimento individual. Os grupos sociais ajudam seus membros a assimilar a experiência culturalmente organizada e a converter-se, por sua vez, em membros ativos e em agentes de cria- ção cultural, ou, o que é a mesma coisa, favorecem seu desenvolvimento pessoal no seio da Cultura do grupo, fazendo-os participar de um conjunto de atividades que, consideradas globalmente, constituem o que chamamos de Educação. Assim, a Educação designa o conjunto de atividades mediante as quais um grupo assegu- ra que seus membros adquiram a experiência social historicamente acumulada e culturalmen- te organizada. Recordemos que os instrumentos cognitivos de natureza simbólica e seus usos, os processos psicológicos superiores, fazem parte dessa experiência. As atividades educativas ado- tam diferentes modos de organização social con- forme o volume e também o conteúdo concreto do conhecimento cultural. No caso das sociedades primitivas, por exemplo, com um escasso nível de desenvolvi- mento científico etecnológico, como algumas tribos de caçadores ou de pescadores estudadas pelos antropólogos, as atividades educativas não costumam diferenciar-se das atividades habituais dos adultos. A aquisição das pautas culturais pela criança – conhecimentos, conceitos, habilidades, valores, costumes etc. – é feita com sua partici- pação, na medida do possível, nas atividades dos adultos, ou simplesmente por observação e imi- tação. No outro extremo, encontramos as ativida- des educativas típicas das sociedades com maior nível de desenvolvimento científico e tecnológi- co, que apresentam uma organização social mui- to mais complexa: são atividades nitidamente di- ferenciadas das atividades habituais dos adultos, correspondem a intenções próprias e geralmente são efetuadas em instituições especificamente habilitadas para esse fim (as escolas e outros cen- tros educacionais). O conceito de escolarização (Schooling) designa essa subcategoria de ativida- des educativas em cujo contexto, por outro lado, a questão do currículo do ensino obrigatório ad- quire plena significação. De acordo com a intencionalidade desta disciplina, vamos nos referir exclusivamente à escolarização, mas não devemos esquecer que as atividades educativas dessa natureza não são, de forma alguma, as únicas presentes em nossa sociedade. Com elas, encontramos outras ativida- Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 10 des educativas igualmente importantes (na edu- cação familiar, na educação extraescolar, na edu- cação impulsionada pelos meios de comunicação social etc.), que também deveriam ser considera- das na análise holística do fenômeno educativo (COLL, 1998). Você sabe que papel desempenha o cur- rículo nas atividades educativas escolares? Que elementos inclui? Em definitivo, que é o currícu- lo? Essas perguntas são realmente difíceis de res- ponder, pois, na prática, cada especialista tem sua própria definição com nuanças diferenciais. Evitaremos o debate sobre o que é o currícu- lo, limitando-nos a precisar o que se entende por currículo na proposta e aceitando que existem outras concepções diferentes da que aqui se con- templa, porém sem polemizar. O caminho que leva à formulação de uma proposta curricular é mais o fruto de uma série de decisões sucessivas do que o resultado da aplicação de alguns princípios firmemente esta- belecidos e unanimemente aceitos. Consequen- temente, o que importa é justificar e argumentar sobre a solidez das decisões que vamos tomando e, sobretudo, velar pela coerência do conjunto. O caminho mais direto para precisar o que entende- mos por currículo consiste em interrogarmo-nos sobre as funções que ele deve desempenhar, e, para identificá-las, convém recordar e ampliar o que dissemos anteriormente a propósito da na- tureza das atividades educativas escolares. Essa modalidade de educação surge quando a simples participação nas atividades habituais dos adultos, bem como sua observação e imitação, não são su- ficientes para assegurar aos novos membros do grupo um crescimento pessoal adequado. As atividades educativas escolares corres- pondem à ideia de que existem certos aspectos do crescimento pessoal, considerados importan- tes no âmbito da cultura do grupo, que não po- derão ser realizados satisfatoriamente ou que não ocorrerão de forma alguma, a menos que seja for- necida uma ajuda específica, que sejam exercidas 1.2 Definindo Currículo atividades de ensino especialmente pensadas para esse fim. São atividades que correspondem a uma finalidade e são executadas de acordo com um plano de ação determinado e estão a serviço de um projeto educacional. A primeira função do currículo, sua razão de ser, é a de explicitar o pro- jeto – as intenções e o plano de ação – que presi- de as atividades educativas escolares. Delimitando-se como projeto, o currículo é um guia para os encarregados de seu desen- volvimento, um instrumento útil para orientar a prática pedagógica, uma ajuda para o professor. Por essa função, não pode se limitar a enunciar uma série de intenções, princípios e orientações gerais que, por excessivamente distantes da rea- lidade das salas de aula, sejam de escassa ou nula ajuda para os professores. O currículo deve levar em conta as condições reais nas quais o projeto vai ser realizado, situando-se justamente entre as intenções, os princípios e as orientações gerais e a prática pedagógica. É função do currículo evitar o hiato entre os dois extremos; disso depende, em grande parte, sua utilidade e eficácia como instru- mento para orientar a ação dos professores. O currículo, entretanto, não deve suplantar a iniciativa e a responsabilidade dos professo- res, convertendo-os em meros instrumentos de execução de um plano prévia e minuciosamente estabelecido. Por ser um projeto, o currículo não pode contemplar os múltiplos fatores presentes em cada uma das situações particulares no qual será executado. Os componentes do currículo, os elementos que ele contempla para cumprir com êxito suas funções, podem ser divididos em quatro grupos: Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 11 1. Proporciona Informações Sobre o que Ensinar Este grupo inclui dois temas: conteúdos (termo que designa aqui, em sua acepção mais ampla, o que chamamos de “a experiência social culturalmente aceita”: conceitos, sistemas expli- cativos, habilidades, normas, valores etc.) e obje- tivos (os processos de crescimento pessoal que se deseja provocar, favorecer ou facilitar mediante o ensino). 2. Proporciona Informações Sobre Quando Ensinar Traz informações sobre a maneira de ordenar e dar sequência aos conteúdos e aos objetivos. A educação formal abrange, com efei- to, conteúdos complexos e inter-relacionados e pretende incidir sobre diversos aspectos do cres- cimento pessoal do aluno, sendo necessário, por- tanto, optar por uma determinada sequência de ação. 3. Proporciona Informações Sobre como Ensinar Traz, ainda, informações sobre a manei- ra de estruturar as atividades de ensino/aprendi- zagem das quais participarão os alunos, a fim de atingir os objetivos propostos em relação com os conteúdos selecionados. 4. Proporciona Informações Sobre O Que, Como e Quando Avaliar Na medida em que o projeto correspon- de a certas intenções, a avaliação é um elemento indispensável que assegura se a ação pedagógica responde adequadamente a essas intenções e in- troduz as correções oportunas em caso contrário. Os quatro grupos estão relacionados entre si e condicionam-se mutuamente, pois tratam de diferentes aspectos de um mesmo projeto: en- quanto o primeiro (o que ensinar?) explicita as in- tenções, os três restantes (quando ensinar?, como ensinar?, o que, como e quando avaliar?) referem- -se mais ao plano de ação a ser seguido de acordo com elas. Um dos problemas intrínsecos na ela- boração do currículo reside em decidir como concretizar esses diferentes elemen- tos e em assegurar a coerência de todos eles. Em resumo, entendemos o currículo como o pro- jeto que preside as atividades educativas escola- res, define suas intenções e proporciona guias de ação adequadas e úteis para os professores, que são diretamente responsáveis pela sua execução. Para isso, o currículo proporciona informações concretas sobre o que ensinar, quando ensinar, como ensinar e o que, como e quando avaliar. Em princípio, essa colocação está próxima da defendida por autores como Stenhouse (1984, p. 29), para quem “um currículo é uma tentativa de comunicar os princípios e características es- senciais de um propósito educativo, de tal forma que permaneça aberto à discussão crítica e possa ser efetivamente transladado à prática.” Antes de continuar, no entanto, convém esclareceruma nuança com relação à extensão do currículo. Para alguns autores, entre os quais Stenhouse, o currículo inclui tanto a descrição do projeto educativo quanto a análise empírica do que realmente sucede nas salas de aula, quando o projeto é concretizado; isso explica, por exem- plo, que, para Stenhouse, o currículo deva abran- ger, além dos componentes mencionados, uma série de princípios para o estudo empírico da sua aplicação. É óbvio que existem dois aspectos relacionados ao currículo, o Projeto ou Desenho Curricular e sua aplicação, e que ambos estão in- timamente ligados. Mas, a nosso ver, o problema reside no fato de que, definido dessa maneira am- pla, o currículo termina abrangendo a totalidade de elementos da educação formal, perdendo, as- sim, seu caráter específico e também sua opera- cionalidade. Contudo, resulta difícil admitir que a análise empírica daquilo que realmente acontece nas salas de aula possa ser reduzida ao desen- volvimento ou à aplicação do currículo, a menos que nele sejam incluídos absolutamente todos os fatores que, de uma forma ou de outra, incidam sobre a realidade escolar. Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 12 A seguir, e para frisar o caráter de projeto do currículo, manteremos a diferença entre Pro- jeto ou Desenho Curricular e Desenvolvimento ou Aplicação do Currículo como duas fases da ação educativa que se alimentam mutuamente, porém não se confundem. Uma última precisão terminológica sobre os conceitos de instrução e de currículo para ter- minar esse item de considerações gerais: o termo “instrução” é habitualmente utilizado, em sentido amplo, como sinônimo de “educação formal” e de “escolarização” e, em sentido estrito, para referir- -se aos componentes de metodologia do ensino, tanto em sua vertente de projeto como de execu- ção efetiva. O termo “currículo” às vezes também é utilizado em sentido muito mais limitado, para referir-se apenas aos objetivos e aos conteúdos da educação formal. Pesquise as matrizes de referência para a avalia- ção do rendimento escolar no site: http://portalsme.prefeitura.sp.gov.br/Projetos/ BibliPed/Documentos/publicacoes/MatrizesRe- ferencia.pdf. MultimídiaMultimídia Assim, nossa maneira de entender o Pro- jeto Curricular inclui tanto aspectos curriculares em sentido estrito (objetivos e conteúdos) como também aspectos de instrução (relativos a como ensinar). O primeiro elo da complexa cadeia de ine- vitáveis problemas a enfrentar e resolver no pro- cesso de elaboração de um Projeto Curricular refere-se às suas fontes. Você sabe onde buscar a informação necessária para definir as intenções – objetivos e conteúdos – e o plano de ação a se- guir na educação escolar? Tradicionalmente, as respostas consistiram em dar prioridade a uma das possíveis fontes de informação em relação a todas as outras, seguindo modas mais ou menos passageiras ou adotando pontos de vista redu- cionistas, sem perceber que a complexidade e heterogeneidade de fatores que desembocam no Projeto Curricular obrigam necessariamente a levar em conta ao mesmo tempo informações de origem e natureza diferentes. Como afirma Coll (1998, p. 47), já em 1949, em obra clássica sobre o tema, R. Tyler ressalta, no tocante aos pontos suscetíveis de proporcionar in- formação para selecionar ‘sabiamente’ os objetivos – a afirmação que se pode 1.3 As Fontes do Currículo estender a todo o currículo –, que exis- te forte discrepância entre três posturas defendidas respectivamente pelos ‘pro- gressistas’, pelos ‘essencialistas’ e pelos ‘sociólogos’. Os primeiros destacam a importância de estudar a criança a fim de descobrir seus interesses, seus proble- mas, seus propósitos e suas necessida- des, sendo esta a informação básica para selecionar os objetivos. Os ‘essencialistas’, por seu lado, consideram que os objeti- vos devem ser extraídos de uma análise da estrutura interna dos conteúdos do ensino, das áreas de conhecimento. Por último, os ‘sociólogos’ tendem a situar a fonte de informação principal para sele- cionar os objetivos na análise da socie- dade, dos seus problemas, necessidades e características. Não é difícil vislumbrar por trás dessas posturas outras tantas al- ternativas ainda atuais que dão primazia respectivamente à análise psicológica, à análise da estrutura interna das discipli- nas e à análise sociológica, como fontes do currículo. Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 13 A essas três fontes do currículo devemos acrescentar uma quarta: a própria experiência pedagógica. Um Projeto Curricular não surge do nada – e muito menos no caso do ensino obriga- tório –, mas parte de uma prática pedagógica que aspira a transformar e melhorar. Para isso, oferece novos pontos de vista e alternativas, mas tam- bém integra as experiências bem-sucedidas. En- tretanto, como projeto educativo que é, o Projeto Curricular contrasta com a prática pedagógica e tem de estar permanentemente aberto às modi- ficações e correções derivadas desse contraste. O desenvolvimento do currículo, retomando a dis- tinção anterior, é uma das fontes – talvez a princi- pal do processo de elaboração, revisão e contínuo enriquecimento do Projeto Curricular. É importante que você compreenda que, no momento atual, a Psicologia da Educação ain- da não dispõe de um marco teórico unificado e coerente que permita dar conta dos múltiplos e complexos aspectos implicados nos processos de crescimento pessoal e da influência exercida sobre eles pelas atividades educativas escolares. Ainda não dispomos de uma teoria compreensiva da instrução com base empírica e teórica suficien- te para ser utilizada como fonte única de informa- ção. Temos, porém, múltiplos dados e teorias que proporcionam informações parciais pertinentes. O problema reside em que, frequentemente, es- ses aportes não são fáceis de integrar, pois cor- respondem a concepções diferentes do funciona- mento psicológico. Ante esse estado de coisas, a alternativa consiste em fugir tanto do ecletismo fácil, no qual podem ser justificadas práticas pedagógicas con- traditórias, quanto do excessivo purismo, que, ao centrar-se em uma única teoria psicológica, ig- nore contribuições substantivas e pertinentes da pesquisa psicoeducativa contemporânea. De acordo com Coll (1998, p. 50-51), nosso marco de referência concreto é um conjunto de teorias e explicações que, embora discrepantes em numero- sos pontos de importância, consagram uma série de princípios comuns ou, pelo menos, não-contraditórios. Estes princí- pios são os que devem ser mantidos no Projeto Curricular. Grosso modo, o mar- co de referência está delimitado pelo 1.4 Psicologia e Currículo que podemos denominar de enfoques cognitivos em sentido amplo. Entre eles parecem-nos particularmente importan- tes a teoria genética de J. Piaget e de seus colaboradores da Escola de Genebra, tan- to no tocante à concepção dos proces- sos de mudança como nas formulações estruturais clássicas do desenvolvimento operatório e as recentes elaborações em torno das estratégias cognitivas e pro- cedimentos de resolução de problemas; a teoria da atividade nas formulações de Vygotsky, Luria e Leontiev e em seus desenvolvimentos posteriores (Wertsch, Forman, Cazden etc.), particularmente no que se refere à maneira de entender as relações entre aprendizagem e de- senvolvimento e a importância atribuída aos processos de relação interpessoal; a prolongação dessas teses nas propostas da psicologia cultural, enunciada nos trabalhos de M. Cole e colaboradores do Laboratory of Comparative Human Cog- nition da Universidade da Califórnia, que integra os conceitos de desenvolvimen- to, aprendizagem, cultura e educação em um esquema explicativounificador; a teoria da aprendizagem verbal significati- va de D. P. Ausubel e seu prolongamento na teoria da assimilação de R. E. Mayer, especialmente orientadas para explicar o aprendizado de blocos de conheci- mento altamente estruturados; as teo- rias dos esquemas (Anderson, Norman, Rumelhart, Minsky etc.) que, inspiradas nos princípios do enfoque de processa- mento humano da informação, postulam que o conhecimento prévio, organizado em unidades significativas e funcionais, é um fator decisivo na realização de novos Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 14 aprendizados; e a teoria da elaboração de M. D. Merrill e C. M. Reigeluth, interessan- te tentativa de construir uma teoria glo- bal da instrução, ainda inacabada, porém muito sugestiva e útil para os aspectos centrais do Projeto Curricular, como sele- ção e organização de conteúdos. Nesses termos, os princípios básicos parti- lhados ou não contraditórios entre si desses enfo- ques não são prescrições educativas em sentido estrito, mas princípios gerais, ideias-força, que im- pregnam todo o Projeto Curricular e encontram um reflexo na maneira de entender a concretiza- ção de seus elementos, nas decisões relativas à sua estrutura formal e nas sugestões relativas ao seu desenvolvimento e aplicação. Coll (1998) apresenta-nos treze ideias-força, oriundas da Psicologia, a serem consideradas na construção do Projeto Curricular: a) A repercussão das experiências edu- cativas formais sobre o crescimento pessoal do aluno está fortemente condicionada, entre outros fatores, ao seu nível de desenvolvimento operatório. A psicologia genética estuda esse de- senvolvimento e ressalta a existência de etapas que, com pequenas flutuações nas margens de idade, são relativamente universais em sua or- dem de aparecimento. A cada um dos grandes estágios de desenvolvimento corresponde uma forma de organização, uma estrutura intelectual, que se traduz em algumas determinadas possibi- lidades de raciocínio e de aprendizagem a partir da experiência. O Projeto Curricular deve levar em conta essas possibilidades, não só no tocan- te à seleção dos objetivos e dos conteúdos, mas também na maneira de planejar as atividades de aprendizagem a fim de ajustá-las às peculiarida- des de funcionamento da organização mental do aluno. b) A repercussão das experiências edu- cativas formais sobre o crescimento pessoal do aluno também está condi- cionada aos conhecimentos prévios pertinentes com os quais inicia sua participação nessas experiências. Por sua vez, esses conhecimentos po- dem ser resultado de experiências educacionais anteriores – escolares ou não – ou de aprendiza- gens espontâneas; também podem estar mais ou menos ajustados às exigências das novas situa- ções de aprendizagem e ser mais ou menos corre- tos. É preciso considerar de forma muito especial esse princípio no estabelecimento de sequências de aprendizagem, porém ele também apresenta implicações para a metodologia do ensino e para a avaliação. c) Levar em consideração o nível do alu- no na elaboração e aplicação do Pro- jeto Curricular exige levar em con- sideração simultaneamente os dois aspectos mencionados. Aquilo que um aluno é capaz de fazer e aprender em um determinado momento – ex- poente do seu nível de crescimento pessoal – de- pende tanto do estágio de desenvolvimento ope- ratório em que se encontra quanto do conjunto de conhecimento que construiu em suas expe- riências prévias de aprendizagem. As atividades educativas escolares têm como finalidade última promover o crescimento pessoal do aluno nessa dupla vertente mediante a assimilação e a apren- dizagem da experiência social culturalmente or- ganizada: conhecimentos, habilidades, valores, normas etc. d) Deve-se estabelecer uma diferença entre o que o aluno é capaz de fazer e de aprender sozinho – fruto dos fatores apontados – e o que é capaz de fazer e aprender com a ajuda e a participação de outras pessoas, ob- servando-as, imitando-as, seguindo suas instruções ou colaborando com elas. Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 15 A distância entre esses dois pontos, que Vygotsky chama de Zona de Desenvolvimento Pro- ximal, porque está situada entre o nível de desen- volvimento efetivo e o nível de desenvolvimento potencial, delimita a margem de incidência da ação educativa. Assim, o ensino eficaz é o que parte do nível de desenvolvimento do aluno, não para se acomodar a ele, mas para fazê-lo progre- dir por sua zona de desenvolvimento proximal, para ampliá-la e gerar, eventualmente, novas zo- nas de desenvolvimento proximal. e) A questão primordial não reside em se a aprendizagem escolar deve dar prioridade aos conteúdos ou aos pro- cessos, ao contrário do que sugere a polêmica sobre o uso, mas em asse- gurar-se de que ela seja significativa. A distinção entre aprendizagem signifi- cativa e aprendizagem repetitiva evidenciada no marco de uma tentativa de construir uma teoria da aprendizagem escolar refere-se ao vínculo en- tre o novo material de aprendizagem e os conhe- cimentos prévios do aluno: se o novo material de aprendizagem se relacionar de forma substantiva e não arbitrária com o que o aluno já sabe, isto é, se for assimilado à sua estrutura cognoscitiva, estaremos diante de uma aprendizagem signi- ficativa; se, ao contrário, o aluno se limitar a me- morizá-lo sem estabelecer relações com seus co- nhecimentos prévios, estaremos diante de uma aprendizagem repetitiva, memorística ou mecâ- nica. Ao realizar aprendizagens significativas, o aluno constrói a realidade, atribuindo-lhe signi- ficados. A repercussão da aprendizagem escolar sobre o crescimento pessoal do aluno é maior quanto mais significativa ela for, quanto mais sig- nificados permitir-lhe construir. Assim, o realmen- te importante é que a aprendizagem escolar – de conceitos, processos, valores – seja significativa. f) Para a aprendizagem ser significati- va, duas condições devem ser cum- pridas: Em primeiro lugar, o conteúdo deve ser potencialmente significativo, tanto do ponto de vista da sua estrutura interna (significatividade ló- gica: não deve ser arbitrário nem confuso) como do ponto de vista da sua possível assimilação (sig- nificatividade psicológica: na estrutura cognosci- tiva do aluno deve haver elementos pertinentes e relacionáveis). Em segundo lugar, deve-se ter uma atitude favorável para aprender significativa- mente, ou seja, o aluno deve estar motivado para relacionar o que aprende com o que já sabe. Esse segundo requisito é um chamado de atenção so- bre o papel decisivo dos aspectos motivacionais. g) A significatividade da aprendizagem está vinculada muito diretamente à sua funcionalidade. A educação escolar deve sempre se ocupar de que os conhecimentos adquiridos – conceitos, habilidades, valores, normas etc. – se- jam funcionais, isto é, possam ser efetivamente utilizados quando as circunstâncias nas quais o aluno se encontrar assim o exigirem. h) O processo mediante o qual a apren- dizagem significativa ocorre requer uma intensa atividade do aluno. O aluno deve estabelecer relações entre o novo conteúdo e os elementos já disponíveis em sua estrutura cognoscitiva; julgar e decidir sua maior pertinência; matizá-los, reformulá-los, ampliá-los ou diferenciá-los em função das novas informações etc. É evidente que a natureza des- sa atividade é fundamentalmente interna e não deve ser identificada com a simples manipulação ou exploração de objetos e de situações; este úl- timo tipo de atividade é um meio que pode ser utilizado na educação escolar – e um meio privi- legiado em determinadas situações e em deter- minados momentos evolutivos – para estimular a atividade cognitivainterna diretamente implica- da na aprendizagem significativa. Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 16 i) O papel habitualmente atribuído à memória na aprendizagem escolar deve ser reconsiderado. É preciso distinguir a memorização mecânica e repetitiva, que tem escasso ou nulo interesse para a aprendizagem significativa, da memorização compreensiva, que, ao contrário, é um ingrediente fundamental. A memória não é apenas a recordação do que foi aprendido, mas a base a partir da qual novas aprendizagens são abordadas. Quanto mais rica for a estrutura cognoscitiva do aluno em elementos e relações, maior será a probabilidade de que ele possa construir novos significados, isto é, maior será sua capacidade de aprendizagem significativa. Me- morização compreensiva, funcionalidade do co- nhecimento e aprendizagem significativa são os três vértices de um mesmo triângulo. j) Aprender a aprender. Sem dúvida, o objetivo mais ambicioso e ao mesmo tempo irrenunciável da educação escolar equivale a ser capaz de realizar aprendi- zagens significativas sozinho em ampla gama de situações e circunstâncias. Esse objetivo recorda a importância da aquisição de estratégias cogni- tivas de exploração e descoberta, bem como de planejamento e regulação da própria atividade na aprendizagem escolar. Essas estratégias, po- rém, após sua aquisição, integram-se à estrutura cognoscitiva do aluno, e sua significatividade e funcionalidade estão em função da riqueza desta, dos elementos que a configuram e da rede de re- lações que as liga. k) A estrutura cognoscitiva do aluno pode ser concebida como um conjun- to de esquemas de conhecimento. Os diferentes esquemas de conheci- mento que formam a estrutura cognoscitiva po- dem manter relações de extensão e complexida- de diversas entre si. Todas as funções atribuídas à estrutura cognoscitiva do aluno na realização de aprendizagens implicam diretamente os es- quemas de conhecimento; a nova informação ad- quirida é armazenada na memória mediante sua incorporação e assimilação a um ou mais esque- mas; a lembrança das aprendizagens anteriores é modificada pela construção de novos esquemas; assim, a memória é construtiva; os esquemas podem distorcer a nova informação, forçando-a a acomodar-se às suas exigências; os esquemas permitem fazer inferências em situações novas; os esquemas integram conhecimentos puramen- te conceituais com habilidades, valores, atitudes etc.; aprender a avaliar e a modificar os próprios esquemas de conhecimento é um dos compo- nentes essenciais do aprender a aprender. l) A modificação dos esquemas de co- nhecimento do aluno. Revisão, enriquecimento, diferencia- ção, construção e coordenação progressiva do conhecimento são o objetivo da educação esco- lar. m) A atividade mental construtiva do aluno está na base dos processos de crescimento pessoal que a educação escolar tenta promover. Uma interpretação construtivista da aprendizagem escolar, sem dúvida incompatível com uma concepção do ensino entendido como pura transmissão de conhecimentos, exige uma interpretação igualmente construtivista da inter- venção pedagógica, cuja ideia diretriz consiste em criar as condições adequadas para que os esque- mas de conhecimento inevitavelmente construí- dos pelo aluno no decorrer das suas experiências sejam os mais corretos e ricos possíveis. Entretan- to, uma concepção construtivista da intervenção pedagógica não renuncia a formular prescrições concretas para o ensino nem a planejar cuidado- samente as atividades de ensino/aprendizagem. Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 17 Você deve ter percebido que a definição de Currículo tem considerável complexidade, especial- mente quando pensamos no Currículo a ser definido pela escola. É importante conhecer características do desenvolvimento, nas diferentes faixas etárias, para, então, propor atividades desafiadoras que pro- movam aprendizagens com vistas ao crescimento humano, em todas as suas dimensões. Nesse aspecto, a psicologia contribui muito com seus estudos. Além disso, as interações a serem promovidas devem ser pensadas para garantir boas aprendiza- gens, e, por isso, precisamos contar com boa organização do espaço e dos materiais disponíveis. Mas, lembre-se: isso só será possível se definirmos o que, quando e como ensinar acompanhado da explicita- ção do modo como iremos acompanhar as aprendizagens, ou seja, a avaliação dos processos e conteú- dos estudados. 1.5 Resumo do Capítulo 1.6 Atividades Propostas 1. O que podemos entender por “promover o crescimento dos seres humanos”? Como o currícu- lo pode contribuir para isso? 2. Qual a relação entre aprendizagem e desenvolvimento? 3. O que você entende por currículo? Pode pesquisar em outras fontes. 4. Quais as funções do currículo? 5. Quais os componentes do currículo? Comente cada um deles. O Pequeno Nicolau O filme, por meio de um enredo divertido, mostra, de forma sutil, a escola e sua cultura em determinado tempo his- tórico. MultimídiaMultimídia Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 19 CONSTRUINDO UMA MATRIZ DE CURRÍCULO2 O pluralismo é o ‘ismo’ da nossa época [...] [Nós precisamos] escolher e combinar as tradições seletivamente [...]. Eleger aque- les aspectos do passado e do presente que parecem mais relevantes para a tare- fa em questão. (Jencks) Prezado(a) aluno(a), é nossa intenção apresentar alguns conceitos de Currículo funda- mentados nas novas visões, nos princípios, nos problemas e nos métodos apresentados pelo pós- -modernismo. Esperamos que esses conceitos se- jam suficientemente amplos e provocativos para proporcionar um início às pessoas interessadas nessa tarefa, especialmente você. Em termos prá- ticos, uma das coisas mais necessárias para esse desenvolvimento é os novos princípios lógicos para substituir os que Ralph Tyler1 propôs há mais de meio século. É bem possível que os quatro Rs, de riqueza, recursão, relações e rigor, ajudem-nos a avançar nessa direção. AtençãoAtenção O currículo pós-moderno é marcado por sua na- tureza construtiva e não linear... O diálogo é a condição sine qua non de todo o processo. Sem diálogo não existe transformação. Decidimos chamar este capítulo de Cons- truindo uma Matriz de Currículo para enfatizar a natureza construtiva e não linear de um currí- culo pós-moderno. De Piaget, Prigogine, Dewey e Bruner vêm as ideias de construção – com to- dos eles, fora Piaget, e ele em parte, favoráveis a uma construção de final aberto, não determinista. Portanto, um currículo construtivo é aquele que emerge pela ação e interação dos participantes; ele não é estabelecido antecipadamente (a não ser em termos amplos e gerais). Uma matriz, evidentemente, não tem nem início nem fim; ela tem fronteiras e pontos de interseção ou focos. Assim, um currículo modelado em uma matriz também é não linear e não sequencial, mas limi- tado e cheio de focos que se interseccionam em uma rede relacionada de significados. Quanto mais rico o currículo, mais haverá pontos de in- tersecção, conexões construídas, e mais profundo será o seu significado. Considerar o currículo em termos da cons- trução de uma matriz está de acordo com a ideia de Dewey da mente como um verbo e da ideia de Bruner (1986, p. 97) da mente como um ins- trumento de construção – um instrumento que usamos para criar significado. Seguindo Dewey e precedendo Schön e Rorty, Schwab (1978, p. 287) afirma que “as construções teóricas são, em geral, 1 Os princípios lógicos de Tyler: 1. Que propósitos educacionais as escolas devem tentar atingir? 2. Que experiências educacionais podem ser proporcionadas para tornar mais provável que esses propósitos sejam atingidos? 3.Como essas experiências educacionais podem ser efetivamente organizadas? 4. Como podemos determinar se esses propósitos estão sendo atingidos? Tyler enunciou esses princípios lógicos para a elaboração do Currículo em sua obra Basic Principles of Curriculum and Instruction, de 1950. Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 20 inadequadas e impróprias para os problemas de ensino e aprendizagem”. Os problemas de ensino e aprendizagem precisam ser tratados de uma perspectiva prática e não teórica; isto é, eles preci- sam ser vistos não como parte de teorias concor- rentes, mas em termos de seu “estado de coisas” local. Eles precisam ser tratados de uma maneira “concreta e particular [...] ilimitadamente suscetí- vel às circunstâncias e, portanto, extremamente sujeita à mudança inesperada.” (SCHWAB, 1978, p. 289). Eles precisam seguir os modelos não linea- res que a Física Quântica e a Matemática do Caos estabeleceram, não os modelos universais, abran- gentes, grandiosos, tão prevalentes no modernis- mo. Essa mudança de ênfase na relação entre a teoria e a prática, na qual a teoria não mais pre- cede a prática e em que a prática não está mais a serviço da teoria, não pretende negar a teoria ou criar uma lacuna inseparável entre as duas. Também não pretende “praticalizar” a teoria. Na verdade, ela pretende fundar a teoria na prática e desenvolvê-la a partir da prática. Se, como Katherine Hayles (1990) e Stephen Toulmin (1990) dizem, o século XX foi um século de turbulência, ele também foi o século que nos trouxe a consciência da auto-organização, pois a ordem que emerge (sob certas condições) da turbulência é uma ordem auto-organizadora. Os biólogos reconhecem isso há muito tempo, e isso é central na visão de mundo de Piaget e em seu trabalho com a criança, e é por essa razão que ele nunca conseguiu compreender o desejo “norte- -americano” de apressar a transição de um está- gio para o próximo. Quanto mais a transição for acelerada, menor a chance de a auto-organização operar. Entretanto, a auto-organização só come- çou a adquirir importância como conceito com a Matemática do Caos e o trabalho de Prigogine com reações químicas oscilantes (e, portanto, au- tocatalíticas e instáveis). Se pensarmos em uma pedagogia pós- -moderna, ela deverá centrar-se no conceito de auto-organização. Como e quando, então, opera a auto-organização? Uma exigência é a pertur- bação. Um sistema só se auto-organiza quando existe uma perturbação, um problema ou uma alteração – quando o sistema está perturbado e precisa se reajustar para continuar funcionando. Como diz Piaget, essa perturbação (desequilíbrio) fornece a força propulsora do redesenvolvimen- to. Entretanto, como bem sabemos, a partir da experiência vivida, nem toda perturbação leva ao redesenvolvimento; é bem possível que uma situação desequilibrada leve ao tipo de caos que nos conduz não a um nível de ordem novo e mais complexo, e sim ao abismo da destruição. A his- tória do século XX nos mostrou o potencial real dessa possibilidade. Em que condições, então, você acha que a perturbação se torna um fator positivo no pro- cesso auto-organizador? Façamos uma analo- gia a partir da Teoria da Evolução das Espécies: as bactérias são organismos celulares surpreenden- temente eficientes; não existe desperdício ou “sobra” em seu funcionamento com o meio am- biente e dentro do meio ambiente. Todavia, elas não evoluíram, além de sua forma original, há mais de 3,5 bilhões de anos e provavelmente con- tinuarão como são “até o sol explodir”. Entretanto, o design ineficiente de alguns peixes proporcio- nou suficiente “sobra” e “redundância” para pode- rem emergir da mesma substância múltiplos usos quando os peixes precisaram de guelras tanto para respirar quanto de ossos maxilares desenvol- ventes. Assim, igualmente, os répteis precisavam de substância extra nos ossos maxilares, para que elas pudessem servir aos múltiplos usos de comer e desenvolver tímpanos. Bem, ninguém defende- ria um currículo que tivesse sobras e redundân- cia, nem estas devem ser as qualidades principais de um aluno. Mas o aluno, no curso do currículo, precisa conhecer o material estudado suficiente- mente bem e ter uma confiança pessoal suficien- te para ser capaz tanto de resolver, interpretar, desempenhar e analisar o material apresentado, quanto de brincar com esse material de maneira imaginativa e sutil. A analogia com os múltiplos usos da evolução são, acreditamos, as múltiplas perspectivas do currículo. Isso exige um currículo rico em diversidade, problemática e heurística, assim como uma atmosfera de sala de aula que estimule a exploração – um passo além da des- coberta. Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 21 A perturbação só vai desencadear a auto- -organização quando o meio ambiente for su- ficientemente rico e aberto para que múltiplos usos, interpretações e perspectivas entrem em cena. Se falamos de um currículo aberto, como fica a questão da autoridade docente na diretivi- dade do processo ensino-aprendizagem? Em ge- ral, a nossa sociedade adota uma visão particular em relação ao controle, uma visão que supõe que o controle deve ser definido em termos de im- posição externa. O controle, em termos de auto- controle ou controle interno, sempre deve ter as palavras auto ou interno como modificadores; de outra forma, supõe-se que controle significa inter- venção externa – trazer um deus ex-machina para a situação. Outra visão do controle, bem oposta, é aquela encontrada na auto-organização, na Matemática do Caos, no naturalismo de Dewey, na Cosmologia de processo de Whitehead, na narrativa de Bruner, na fenocópia de Piaget e na Hermenêutica de Gadamer. Todos eles supõem que a autoridade está dentro (não fora) de parâ- metros situacionais. Além disso, todos supõem que o controle é o autocontrole que emerge das interações dentro desses parâmetros situacionais. Esse tipo de controle não foi estudado de forma muito profunda, portanto, muitas vezes, os pro- fessores (involuntariamente e não criticamente) achavam que o controle deveria ser do tipo deus ex-machina em vez de do tipo prima interpares. É este último, “primeiro entre iguais”, que, acredita- mos, define o papel do professor em um currículo transformativo, pós-moderno. Como o primeiro entre iguais, o papel do professor não é anulado, e sim reestruturado e (re)situado: de um papel externo à situação do aluno, torna-se um só com aquela situação. Questões de procedimento, me- todologia e valores não são decididas no abstrato, longe das praticabilidades da vida, mas são sem- pre decisões locais envolvendo os alunos, profes- sores, costumes e tradições locais. Obviamente, o papel do professor é crucial aqui, mais do que na estrutura deus ex-machina, em que o professor é um reforçador – no melhor dos casos, um intér- prete – dos valores dos outros. Em uma estrutura situacional, o professor é um líder de dentro, não um ditador (por mais benevolente que seja) de fora. Desenvolver esse novo papel é um desafio que os professores e os programas de educação dos professores precisam enfrentar. Um ingrediente-chave nessa estrutura si- tuacional é o estabelecimento da comunidade – tornar praticável aquele reino fascinante, ima- ginativo, em que ninguém é dono da verdade e to- dos têm o direito de ser compreendidos. Aqui está a base para o diálogo, e é por meio do diálogo dentro de uma comunidade interessada e crítica que os métodos, procedimentos e valores são desenvolvidos a partir das experiências de vida – que “usos” são transformados em “deveres”. Falar nesses termos – desenvolver autoridade e contro- le em vez de impô-los – soa estranho aos nossos ouvidos modernistas. Entretanto, defendemosque o controle e a autoridade são desenvolvidos internamente, não impostos externamente. Esse desenvolvimento comunal da autoridade e do controle é imperativo para que o ecletismo e o foco multivariado predominantes no pós-moder- nismo sejam utilizados criativamente. Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 22 Caro(a) aluno(a), enquanto a teoria do co- nhecimento do espectador dominar – a teoria de que a realidade é determinada à parte de nós para ser descoberta por meio de certos métodos –, a lógica e o modo analítico governarão a nossa epistemologia e a nossa pedagogia. Nessa estru- tura, são necessárias as explicações claras. Assim, os princípios lógicos de Tyler e suas ramificações enfatizam a precisão na afirmação dos objetivos e das experiências e no esquema por meio do qual esses objetivos e experiências são avaliados. Em- bora o controle e a autoridade sejam importantes nesse paradigma, em um nível mais profundo, metafísico, o conceito básico é o de que a preci- são na observação e no pensamento é a entrada naquele reino que está além das nossas experiên- cias pessoais, aquele reino que contém o “verda- deiro conhecimento”. Laplace sonhava em obter precisamen- te todos os dados sobre os movimentos celes- tiais dos planetas e depois traçar suas órbitas para a eternidade, sonhava em descobrir, por meio da Ciência e da Matemática, a verdadeira ordem da natureza planejada por Deus. Taylor2 utilizou a precisão do cronômetro ao programar os passos que um operário deveria dar e o tem- po que ele gastaria em cada tarefa. Atualmente, os professores encorajam a precisão, exortando os alunos a “prestar atenção”, a “ouvir cuidadosa- mente”, a “fazer observações perspicazes”. Subja- centes a essas exortações está a suposição de um relacionamento de espectador (não construtivis- ta) entre o aluno e o conhecimento. Considera- -se que o conhecimento está “lá fora”, e o aluno, como uma pessoa semelhante a um operário, de “primeira classe”, deve se preparar para receber esse conhecimento conforme ele é transmitido. Quão bem o aluno recebeu esse conhecimento está espelhado na nota recebida. 2.1 A Metáfora e o Modo Narrativo No entanto, ultimamente, essa visão tem sido muito criticada; tanto Rorty quanto Toulmin atacaram drasticamente a tradição do espectador analítico na Filosofia, o comportamentalismo pa- rece uma questão morta na Psicologia, e o currí- culo está, pelo menos, flertando com conceitos de construção e reflexão. Conforme Bruner (1986) salienta, existe outro modo de pensamento complementar ao lógico, analítico, científico – o modo metafórico, narrativo, hermenêutico. A diferença-chave entre esses dois modos de pensamento é que o analí- tico é explanatório, enquanto o narrativo é inter- pretativo. No primeiro, o professor deseja obter a precisão na apresentação; no último, ele quer “manter o diálogo em andamento”. Neste último, a suposição é a de que os significados são criados (construídos) pelo diálogo. O diálogo é a condi- ção sine qua non de todo o processo. Sem diálogo não existe transformação. As metáforas são mais úteis do que a lógica para gerar esse diálogo. Elas são criativas e nos ajudam a ver o que não vemos. As metáforas são abertas, heurísticas, geradoras de diálogo. A lógica é definicional; ela nos aju- da a ver mais claramente aquilo que já vemos e tem por objetivo o fechamento, a exclusão. Nós precisamos, é claro, tanto da imaginação criativa quanto da definição lógica. Precisamos de cria- ção e fechamento. A vida é nascimento e morte; a realidade, diz Whitehead, também o é. É por meio da interação da metáfora e da lógica que a vida é vivida, experienciada, desenvolvida. Como professores, precisamos trazer essa interação para as nossas construções de currículo. O modo narrativo requer interpretação. Uma boa história, uma grande história, encoraja e desafia o leitor a interpretar, a iniciar um diálogo com o texto. Em uma boa história existe exatamente a quantidade suficiente de indeterminância para incitar o leitor ao diálogo. É o elemento da indeter- 2 Referimo-nos à obra tradicional de Taylor (Frederick Winslow Taylor, 1856-1915) acerca da racionalização do trabalho por meio do estudo de tempos e movimentos do trabalhador na execução da tarefa. Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 23 minância que faz com que o texto “se comunique” com o leitor e, por sua vez, o induz a “participar” da história. Como professores, precisamos apresen- tar as nossas lições de uma forma suficientemen- 2.2 Objetivos, Planos, Propósitos te narrativa para encorajar os nossos alunos a ex- plorarem conosco as possibilidades que podem ser geradas a partir de um diálogo com o texto. Você já deve ter percebido em sua vida que não há nada mais importante para o ser hu- mano do que estabelecer, experienciar e avaliar objetivos, planos e propósitos. Nisso Tyler estava certo; essa atividade intencional é o que separa a espécie humana das outras em grau, se não em espécie – e é essa atividade que permite à nos- sa espécie a escolha de criar ou destruir intencio- nalmente. A capacidade de planejar traz consigo uma responsabilidade impressionante – em rela- ção a nós mesmos, aos outros, ao meio ambiente em que vivemos. Subjacente ao conceito de inteligência crí- tica de Dewey está, evidentemente, essa ideia do ser humano como competente no planejamento intencional. A transformação que Dewey deseja- va ver acontecendo era a transformação da com- petência nascente ou potencial em capacidade e desempenhos maduros. Dewey percebeu corre- tamente que um currículo que respeitasse a ca- pacidade do indivíduo de criar, planejar, executar e avaliar seria aquele currículo que respeitaria as atividades de planejamento do indivíduo – isto é, sua ação concreta de planejar. Esse currículo tinha de basear-se em uma pedagogia e epistemologia interativas, não de espectador. Infelizmente, o currículo escolar da época de Dewey (e da nos- sa época) estava tão atolado no modernismo que compreendeu erroneamente o estabelecimento de objetivos, a criação do significado e o planeja- mento intencional. Dois entendimentos errôneos destacam-se como cruciais. Um deles é que nós supomos que o indivíduo desenvolve melhor as suas habilidades de planejamento sendo um re- cebedor ou copiador passivo dos planos de outra pessoa, em vez de sendo um participante ativo do processo de planejamento – isto é, um recebedor ou descobridor do conhecimento, não um criador de significado. O segundo grande equívoco foi que nós aceitamos (tacitamente) uma cosmolo- gia baseada em um universo estável em ordem. A Física Quântica e a Filosofia de Whitehead, assim como a Química termodinâmica das estruturas dissipativas e o pensamento filosófico de John Dewey e Richard Rorty, ajudaram-nos a perceber a inadequação dessa visão simplista de um uni- verso estável. A complexidade é a natureza da Natureza, e somente nas últimas décadas é que começamos a estudar seriamente a complexidade. Qualquer pessoa que a tenha estudado percebe que ela supõe conceitos não reconhecidos pelo moder- nismo: a auto-organização e a transformação são dois desses conceitos. Em uma estrutura que re- conhece a auto-organização e a transformação, os objetivos, planos e propósitos não surgem apenas antes, mas também a partir da ação. Essa é uma questão essencial, de acordo com Dewey: os planos surgem da ação e são modificados pela ação. Os dois são interativos, cada um levando ao outro e dependendo do outro. Curricularmente, isso significa que os planos de curso ou aula devem ser escritos, de maneira geral, livres, um tanto indeterminados. À medida que o curso ou a aula progride, a especificidade torna-se mais apropriadae é trabalhada conjuntamente – entre professor, alunos, texto. Esse planejamento con- junto não só permite a flexibilidade – utilizar o inesperado –, como também permite que os pla- nejadores se compreendam e compreendam seu assunto com um grau de profundidade de outra forma não obtido. Existem padrões no nosso planejamento, como Piaget, Vygotsky e Bruner ajudaram-nos a perceber; e o material do assunto (o texto) que usamos no nosso planejamento tem a sua pró- pria estrutura, história e parâmetros. Investigar a estrutura e a história de um assunto fornece-nos insights além daqueles encontrados nos livros di- Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 24 Assista ao filme “Vocacional – uma aventura hu- mana”. Ele aborda uma experiência curricular vivencia- da na década de 60, dentro de uma visão pro- gressista de currículo. Vale a pena conhecer! Visite o site www.gvive.org. MultimídiaMultimídia 2.3 Os Quatro Rs - uma Alternativa para os Princípios Lógicos de Tyler dáticos. Na frase de Donald Oliver (1990, p. 64), estamos adquirindo “conhecimento fundamenta- do”, não apenas “conhecimento técnico”. O plane- jamento conjunto, desenvolvimental, aproveita o inesperado, leva a um conhecimento funda- mentado e ajuda o aluno a adquirir “um repertó- rio crescente de descrições alternativas” (RORTY, 1989, p. 39). Todos esses são importantes atribu- tos nas nossas tentativas de desenvolver a com- petência no manejo do mundo em que vivemos. Os três Rs, de Readin, Ritin, e Rithmetic3, fo- ram criações do final do século XIX e início do XX, visando às necessidades de uma sociedade in- dustrial em desenvolvimento. A leitura era a leitu- ra funcional de notas de venda e conhecimentos de embarque (carga), combinada com histórias inspiradoras. A escrita era literalmente caligrafia, introduzindo um estilo de livro-razão na primeira série. Esse treinamento cursivo tinha de começar cedo, pois por volta da quinta série a metade da- queles que haviam entrado na escola tinha par- tido. A Aritmética, não a Matemática, era essen- cialmente adição e subtração de colunas, com multiplicação e divisão algorítmica, começando nos últimos anos elementares. Novamente, a ên- fase estava no funcionalismo de um empregado de comércio, capaz de manter as notas de venda e os livros-razão com precisão e ordem. A reso- lução de problemas era introduzida na segunda série, mas estava pesadamente, se não exclusiva- mente, associada a compras em uma loja urbana. Os alunos nascidos no início do século XX ti- veram o seu treinamento inicial na escola elemen- tar nesses três Rs. As listas de palavras para leitura e ortografia preparavam para a sociedade urba- na, industrial, que existia. O método de caligrafia começava na primeira série. Com os professores que ensinavam as turmas de primeira, segunda e terceira séries, aprendia-se a manter os dígitos da coluna das dezenas fora da coluna das centenas e da coluna das unidades, e sempre começando com a coluna certa para “transferir” um dígito único e para “transportar” para a próxima coluna quaisquer dígitos restantes. Na quarta série, uma pequena modificação nesse método “consoante” – a saber, que no caso de decimais eram as vír- gulas dos decimais que precisavam formar uma falange vertical, uniforme. Zeros eram acrescen- tados à direita da vírgula decimal para manter a coluna certa, as centenas (muitas vezes conside- radas como centavos), alinhadas. Na vida fora da escola, o marceneiro da es- quina e demais profissionais do comércio não eram tão bons quanto os professores na manu- tenção de colunas ordenadas. Além disso, muitos começavam a sua adição na coluna da esquerda, não da direita. Quando questionados, afirmavam que não queriam cometer erros com o dinheiro e que esse método lhes garantia maior exatidão com essas colunas importantes. Pior ainda, mui- tos agrupavam os dígitos ou na sua cabeça, ou em pequenas anotações, em combinações iguais a dez. Esses métodos, por mais intrigantes que fossem e a despeito de funcionarem muito bem na vida real, eram descartados na escola como heresia, o que deixava alguns alunos atônitos. 3 Reading (Leitura), Writing (Escrita), Arithmetic (Aritmética). Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 25 Como nos relata Doll (1997, p. 191): Em retrospecto, acho que o Sr. Bartlett [o marceneiro] era mais industrialmente orientado do que a Srta. Thatcher [a pro- fessora], e talvez inclusive um melhor pe- dagogo. Ao lidar com as minhas próprias classes elementares, eu descobri grande parte da adição de colunas – pelo menos do tipo prático dá uma ‘impressão’ me- lhor quando é feita da esquerda para a direita, permitindo assim que a intuição e a estimativa entrem em cena. Além disso, trabalhar com colunas agrupando alga- rismos em combinações de dez não só produz respostas mais exatas como tam- bém encoraja o pensamento estrutural e situacional – por exemplo, fazer 101-49 como 102-50, ou talvez como 100-50+2. Este ‘ordenamento caótico’ é a marca re- gistrada do modus operandi dos meus alunos há muitos anos – antes de eu ler Whitehead ou ouvir falar sobre o pós- -modernismo; isso geralmente era muito útil para. À primeira vista, não vemos uma conexão entre os princípios lógicos de Tyler e os três Rs. Entretanto, um funcionalismo preestabelecido está subjacente em ambos. Embora a estrutura de Tyler expanda e amplie o funcionalismo industrial além das notas de venda e dos livros-razão, ainda existe a suposição de objetivos preestabelecidos. Nessa estrutura, os objetivos não emergem no “brincar” com as experiências; pelo contrário, os objetivos são predeterminados, assim como as experiências e os métodos para desenvolver essas experiências. Todos estão firmemente no lugar antes de ocorrer qualquer interação com os alu- nos. As avaliações são planejadas para correla- cionar as experiências somente com os objetivos preestabelecidos, não para explorar aquilo que os alunos geraram pessoalmente depois de refletir sobre as experiências. De fato, como foi salientado anteriormente neste capítulo, enquadrar a evolução em termos de geração, reflexão e transformação é virtual- mente contraditório a partir de uma perspectiva modernista. Então, o que serviria como critérios para um currículo destinado a promover uma visão pós-moderna? Que critérios poderíamos usar para avaliar a qualidade de um currículo pós- -moderno – um currículo gerado, não pré-defini- do, indeterminado, mas limitado, explorando o “fascinante reino imaginativo da risada de Deus” e constituído por uma rede sempre crescente de “universalidades locais”? Doll (1997) sugere que os quatro Rs, de Riqueza, Recursão, Relações, e Ri- gor, poderiam servir para esse propósito. Riqueza Esse termo se refere à profundidade do currículo, às suas camadas de significado, às suas múltiplas possibilidades ou interpretações. Para que os alunos e professores transformem e sejam transformados, um currículo precisa ter a “quan- tidade certa” de indeterminância, anomalia, inefi- ciência, caos, desequilíbrio, dissipação, experiência vivida – para usar palavras e expressões já descri- tas. Não podemos definir antecipadamente qual será exatamente a “quantidade certa” para que o currículo seja provocativamente gerador, sem perder sua forma ou configuração. Essa é uma questão que deve ser continuamente negociada entre alunos, professores e textos (os últimos con- tendo histórias antigas e suposições básicas que não podem ser negligenciadas). Mas a questão de o currículo precisar de qualidades perturba- doras não deve ser negociada; essas qualidades formam as problemáticas da vida e são a essência de um currículo rico e transformador. Outra ma- neira de dizer isso é afirmarque as problemáticas, perturbações e possibilidades inerentes a um cur- rículo são o que lhe dá riqueza e também o seu senso de ser. As principais disciplinas acadêmicas ensina- das nas escolas têm seus próprios contextos his- tóricos, conceitos fundamentais e vocabulários finais. Portanto, cada uma interpretará a riqueza à sua própria maneira. A linguagem – incluindo a leitura, escrita, literatura e comunicação oral – de- senvolve a sua riqueza ao centrar-se intensamen- te (mas não exclusivamente) na interpretação de metáforas, mitos, narrativas. Dizer isso coloca a linguagem dentro de uma estrutura hermenêuti- ca; é ver a linguagem como integrada à cultura, Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 26 assim como um dos determinantes da cultura. A Matemática – um assunto em que a Aritméti- ca Computacional desempenha apenas um pe- queno papel – adquire sua forma de riqueza ao “brincar com padrões”. Obviamente, isso pode ser feito com os computadores – instrumentos que qualquer currículo matematicamente rico deve- ria possuir –, mas eles não são uma condição sine qua non. Podemos ver padrões, desenvolvê-los e brincar com eles em simples combinações numé- ricas ou na geometria. Em todos os níveis, da Edu- cação Infantil à Universidade, a Matemática pode ser tratada significativamente como “brincar com padrões”. A Ciência – incluindo a biológica e a fí- sica – pode ser vista como hipóteses intuitivas, desenvolventes, indagadoras, “comprovadoras” referentes ao mundo em que vivemos. Isso leva a Ciência além da coleção de “fatos” – com a su- posição de que esses fatos são fragmentos objeti- vos da realidade – até a esfera do manipular, criar, trabalhar com fatos ou informações de uma ma- neira imaginativa e (termo)dinâmica. As Ciências Sociais – aquelas múltiplas disciplinas da Antro- pologia, Economia, História, Psicologia e Sociolo- gia – retiram seu conceito de riqueza do diálogo a respeito de ou da negociação de passagens entre várias interpretações (muitas vezes concorrentes) das questões sociais. Aqui, provavelmente mais do que em qualquer outra disciplina, as suposi- ções são questionadas. São esses dados aceitos que constituem as fundações dos costumes, das normas e dos padrões da sociedade; e em uma sociedade democrática, é imperativo que esses dados estejam abertos ao diálogo. Obviamente, essas disciplinas, suas lingua- gens e histórias não são mutuamente exclusivas. O conceito de desenvolver riqueza por meio do diálogo, de interpretações, geração e comprova- ção de hipóteses e do brincar com padrões po- de-se aplicar a tudo o que fazemos no currículo. Novamente, essas ideias soam estranhas para aqueles imbuídos de uma perspectiva moder- nista, o que ajuda a explicar por que precisamos transcender essa perspectiva e chegar a uma pós- -modernista. Recursão Derivada de recorrer, ocorrer novamente, a recursão é normalmente associada à operação matemática da iteração. Na iteração, uma fórmu- la é “aplicada” repetidamente, com o resultado de uma equação sendo o input para a próxima. Em y = 3x+1, um y de 4 (se o x = 1) torna-se o próximo x, e o novo y de 13 torna-se o próximo x, e assim por diante. Nessas iterações, existe tanto estabilidade como mudança; a fórmula permanece a mesma, as variáveis mudam (de maneira ordenada, mas muitas vezes imprevisível). Entretanto, quando Bruner (1986, p. 97) afirma que “qualquer teoria formal da mente é impotente sem a recursão” – e destaca a importância da recursão para a Episte- mologia e a Pedagogia –, ele se refere menos à Matemática e mais à capacidade humana de fazer com que os pensamentos se conectem em circui- tos. Essa conexão de pensamentos com pensa- mentos distingue a consciência humana; é assim que criamos significado. Conforme Bruner (1986, p. 127), “grande parte do processo de educação consiste em ser capaz de distanciar-se de alguma maneira daquilo que se sabe, ao conseguir refletir sobre o próprio conhecimento.” É assim também que criamos um senso de self, por meio da interação reflexiva com o meio ambiente, com os outros, com uma cultura. Essa “reflexão recursiva” é essencial em um currículo transformativo; em um currículo que respeita, va- loriza e usa a recursão, não existe nenhum início ou final fixo. Conforme Dewey salientou, cada fi- nal é um novo início, cada início emerge de um final anterior. Os segmentos, partes e sequências de um currículo são porções arbitrárias que, em vez de serem vistas como unidades isoladas, são vistas como oportunidades para a reflexão. Em uma estrutura dessas, cada teste, trabalho ou entrada em um diário pode ser visto não apenas como a conclusão de um projeto, mas também como o início de outro – para explorar, discutir, in- vestigar, tanto dentro de nós, como criadores de significado, quanto dentro do texto em questão. Esse currículo, é claro, será aberto, não fechado; como o próprio pós-modernismo, ele é bifronte, eclético, interpretativo. Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 27 A recursão e a repetição diferem no sentido de que nenhuma delas, de nenhuma maneira, re- flete a outra. A repetição, um forte elemento no modo modernista, destina-se a melhorar o de- sempenho estabelecido. Sua estrutura é fechada. A recursão visa a desenvolver a competência de organizar, combinar, inquirir, utilizar as coisas heu- risticamente. Sua estrutura é aberta. A diferença funcional entre a repetição e a recursão está no papel que a reflexão desempenha em cada uma. Na repetição, a reflexão desempenha um papel negativo; ela interrompe o processo. Existe certa automaticidade na repetição que mantém o mes- mo processo em andamento – de novo e de novo e de novo, como nos exercícios de Aritmética com a apresentação de cartões ou nos exercícios de tênis com uma máquina que arremessa bolas. Na recursão, a reflexão desempenha um papel posi- tivo; para que os pensamentos se conectem com eles mesmos, como na experiência secundária de Dewey, refletindo sobre a experiência primária, ou na inteligência reflexiva de Piaget, refletindo sobre a inteligência prática, é necessário, como disse Bruner, que recuemos naquilo que estamos fazendo, que “nos distanciemos de alguma ma- neira” dos nossos próprios pensamentos. Portan- to, na recursão, é necessário que outras pessoas – colegas, professores – observem, critiquem, res- pondam àquilo que fizemos. O diálogo torna-se a condição sine qua non da recursão: sem a reflexão – gerada pelo diálogo – a recursão torna-se vazia, não transformativa; ela não é uma recursão refle- xiva, é apenas repetição. Relações O conceito de relações é importante em um currículo moderno, transformativo, de duas maneiras: uma pedagógica, e outra cultural. As primeiras poderiam, naturalmente, ser chamadas de relações pedagógicas, referindo-se às relações dentro do currículo – a matriz ou rede que o torna rico. As últimas poderiam, também naturalmen- te, ser chamadas de relações culturais, referindo- -se àquelas relações culturais ou cosmológicas que estão fora do currículo, mas constituem uma grande matriz dentro da qual o currículo está in- serido. Ambas as relações são importantes; uma complementa a outra. Ao focar as relações pedagógicas, focamos as conexões dentro de uma estrutura curricular que lhe dá profundidade, a profundidade desen- volvida pela recursão. Aqui, os processos duplos de fazer e refletir sobre o fazer são importantes, e por meio destes o currículo se torna mais rico com o passar do tempo. O aluno deve usar o tempo necessário para dominar o material apresentado, até certo nível, predeterminado, de proficiência repetitiva. Em um universo em processo, o tempo assume uma dimensão diferente, qualitativa; ele adquire um aspecto transformático,uma vez que sempre está ocorrendo algum tipo de desenvol- vimento. As condições, situações e relações estão sempre mudando; o presente não recria o pas- sado (embora certamente seja influenciado por ele), e o presente também não determina o futuro (embora seja um influenciador). Assim, também, a estrutura curricular operando no início do curso é inevitavelmente diferente da estrutura curricu- lar operando no final do curso. A questão não é a diferença, mas o grau ou qualidade da diferença – se a diferença é uma diferença que faz uma dife- rença. Doll (1997), em um relato pessoal, aponta- -nos a importância de se pensar as relações peda- gógicas na construção do currículo: Reconhecendo a contingência das re- lações, e esperando que essas relações sejam desenvolvidas positivamente e comunalmente durante o curso de um semestre, organizo meus cursos univer- sitários de subgraduação e graduação para intensificar este desenvolvimento. Entre os instrumentos que utilizo, um deles é oferecer um curso que lista leitu- ras comuns apenas para 2/3 do curso; no último terço os vários grupos escolhem suas leituras de uma lista selecionada. O tempo de aula não é dedicado ao resumo dessas leituras, mas a interconectá-las com as leituras comuns e entre si. A qua- lidade da discussão melhora conforme o semestre se desenvolve; assim, também, os trabalhos escritos no início do semes- tre melhoram extraordinariamente quan- do reescritos e reestruturados depois da utilização dos insights obtidos. Às vezes Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 28 a mudança é transformativa. Nas aulas de segundo grau, em que muitas vezes utilizo um texto estabelecido, construo relações orientadas pelo tempo, pedindo aos alunos que reestruturem o material apresentado, que escolham ou reenqua- drem as perguntas do capítulo, e lidem com o material textual numa base ‘o-que- -aconteceria-se’ (imaginária) e numa base ‘relacione-isso-a-você-mesmo’ (real). Nas séries de primeiro grau, sigo os mesmos procedimentos gerais, mas uso materiais bem mais manipulativos, como contar histórias, projetos e apresentações dra- máticas. O livro didático, durante tudo isso, é visto como algo a ser revisado, não como algo a ser seguido. Ele é a base a partir da qual ocorre a transformação. Numa estrutura pós-moderna, o currícu- lo precisa ser criado (auto-organizado) pela comunidade da sala de aula, não pe- los autores dos livros didáticos. Deve es- tar claro em todas essas histórias pessoais que, ao construir uma matriz de currículo com um rico conjunto de relacionamen- tos, eu fui fortemente influenciado pela máxima de Whitehead de ‘não ensinar assuntos demais’, mas ‘ensinar cuidado- samente’ aquilo que realmente ensino, e deixar que as idéias principais ‘sejam lançadas em todas as combinações pos- síveis’. (p. 196). O conceito de relações culturais origina-se de uma cosmologia hermenêutica – uma cosmo- logia que enfatiza a narração e o diálogo como veículos essenciais na interpretação. A narração faz aflorar os conceitos de história (por meio da história), linguagem (por meio do relato oral) e lugar (por meio da localidade de uma história). O diálogo inter-relaciona esses três aspectos para nos proporcionar um senso de cultura que é local em sua origem, mas global nas interconexões. As- sim, todas as nossas interpretações se relacionam à cultura local e se interconectam com outras cul- turas e suas interpretações por meio de uma ma- triz global. O discurso (narração e diálogo) opera, então, dentro de uma estrutura cultural de duas camadas; ele opera assim muito mais do que na estrutura funcionalista, abstrata e privilegiada postulada pelo modernismo. O discurso passa a ser “contextualista”, sempre limitado pelo cará- ter local de nós mesmos, de nossas histórias, de nossa linguagem, de nosso lugar, mas também se ampliando em uma rede global e ecológica cada vez maior. É essa natureza de duas camadas ou dois focos que torna as relações culturais tão complexas. Reconhecer a natureza contextualista do discurso ajuda-nos a perceber que os constru- tos daqueles que estão participando estruturam todas as conversações, todos os atos de ensino. Como professores, não podemos e não devemos transmitir diretamente a informação; em vez dis- so, desempenhamos o ato de ensinar quando aju- damos os outros a negociarem passagens entre seus construtos e os nossos, entre os nossos e os dos outros. É por isso que Dewey diz que ensinar é um processo interativo, com a aprendizagem sendo um subproduto dessa interação. Rigor De certa maneira, como o mais importante desses quatro critérios, o rigor evita que um cur- rículo transformativo caia ou em um “relativismo extravagante”, ou em um “solipsismo sentimen- tal”. Ao apresentar a transformação como uma alternativa para a nossa atual estrutura de men- suração, fica fácil ver a transformação como nada além de antimensuração ou não mensuração. Aqui, a transformação deixa de ser uma verdadei- ra alternativa e passa a ser apenas uma variação daquilo que ela tenta substituir. Isso certamente aconteceu nos movimentos de educação pro- gressista e aberta. Dewey lutou com o problema do movimento da educação progressista e escre- veu Need for a Philosophy of Education para expli- car por que a Educação progressista precisava ser mais do que antitradicional, por que a Educação progressista tinha de ter seus próprios fundamen- tos e estrutura. Ao comparar sua visão da Educa- ção progressista – desenvolvimental e transfor- mativa – com a visão progressista recebida (que ele considerava romântica demais) ou com a visão tradicional estabelecida (que ele considerava rígi- da demais), ele disse: “esta alternativa não é ape- nas um curso intermediário ou um compromisso entre os dois procedimentos. É algo radicalmente diferente dos dois. Gostos e poderes existentes Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 29 têm de ser tratados como possibilidades.” (DEWEY apud DOLL, 1997, p. 198). Para tratar a interpreta- ção rigorosamente, precisamos estar conscientes de que todas as avaliações dependem de suposi- ções (muitas vezes ocultas). Assim como as estru- turas diferem, os problemas, os procedimentos e os resultados valorizados também diferem. Rigor, aqui, significa a tentativa consciente de esclarecer essas suposições, que nós ou outras pessoas apre- ciamos tanto, assim como negociar passagens entre essas suposições, para que o diálogo seja significativo e transformativo. O diálogo entre o leitor e o texto é um processo de duas vias, ambos têm uma voz, e nesse diálogo existe uma combi- nação de determinância e indeterminância. A in- determinância, aqui, não significa arbitrariedade; pelo contrário, ela leva em conta um espectro de realização, melhor ainda, ela leva em conta uma gama de possibilidades a partir das quais surgem as realizações. A realização que surge no desenvolvimento depende do próprio processo Saiba maisSaiba mais Pesquise nas Leis nºs 4.024/61 e 5.692/71 as indica- ções de currículo propostas. de interação, da mistura de indeterminância com determinância. Assim, o rigor também pode ser definido em termos de mistura da indeterminância com a interpretação. A qualidade da interpretação, sua riqueza, depende de quão inteiramente e quão bem nós desenvolvemos as várias alternativas apresentadas pela indeterminância. Nessa nova estrutura para o rigor – combinar a complexi- dade da indeterminância com hermenêutica da interpretação –, parece necessário estabelecer uma comunidade, uma comunidade crítica, mas apoiadora. Tal comunidade é o que uma escola deveria ser. Caro(a) aluno(a), uma Matriz Curricular, após a definição de qual ser humano se quer formar, deve preocupar-seem manter a coerência entre os meios e fins, ou seja, o conteúdo definido deve ir ao encon- tro dos objetivos. Construir uma Matriz de Currículo é considerar o modo como as relações de tempo, espaço e ma- teriais se estabelecem. Elas revelam o quanto o currículo favorece ou não a participação e criatividade de seus atores. Nesse sentido, o modo narrativo e as metáforas podem contribuir muito nessa abordagem. 2.4 Resumo do Capítulo 2.5 Atividades Propostas 1. Quais são as características de um currículo elaborado a partir de uma matriz? 2. O que são os 4 Rs? Comente cada um deles. Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 31 A ORGANIZAÇÃO DO CURRÍCULO POR PROJETOS DE TRABALHO OU A TENTATIVA DE APLICAÇÃO DE UMA MATRIZ CURRICULAR PÓS-MODERNA 3 A proposta que inspira os Projetos de Traba- lho está vinculada à perspectiva do conhecimen- to globalizado e relacional.4 Essa modalidade de articulação dos conhecimentos escolares é uma forma de organizar a atividade de ensino e apren- dizagem, que implica considerar que tais conhe- cimentos não se ordenam para sua compreensão de uma forma rígida, nem em função de algumas referências disciplinares preestabelecidas ou de uma homogeneização dos alunos. A função do projeto é favorecer a criação de estratégias de organização dos conhecimentos escolares em relação ao tratamento da informação e a relação entre os diferentes conteúdos em torno de pro- blemas ou hipóteses que facilitem aos alunos a AtençãoAtenção A organização dos Projetos de Trabalho baseia-se, fundamentalmente, em uma concepção da glo- balização, entendida como um processo muito mais interno do que externo, no qual as relações entre conteúdos e áreas de conhecimento têm lugar em função da necessidade de resolver uma série de problemas que subjaz a aprendizagem. construção de seus conhecimentos, a transfor- mação da informação procedente dos diferentes saberes disciplinares em conhecimento próprio. Um projeto pode organizar-se seguindo um determinado eixo: a definição de um conceito, um problema geral ou particular, um conjunto de perguntas inter-relacionadas, uma temática que valha a pena ser tratada por si mesma etc. Nor- malmente, superam-se os limites de uma matéria. Para abordar esse eixo em sala de aula, procede- -se dando ênfase na articulação da informação necessária para tratar o problema objeto de estu- do e nos procedimentos requeridos pelos alunos para desenvolvê-lo, ordená-lo, compreendê-lo e assimilá-lo. Quando os professores pretendem tratar em sala de aula do tema “a pesca”, além das motivações particulares do contexto em que tra- balha e no qual as crianças tomam consciência de um setor produtivo, se estabelece qual pode ser a estrutura, o fio condutor que, presente nes- se tema, possa ser transferido a outros. Estudar “a relação entre uma profissão e uma forma de vida” pode ser o nexo, adaptado a cada caso, também presente em temas de Biologia, História, Antropo- logia etc. 3.1 Origem e Sentido dos Projetos na Escola - um Relato de Caso Hernández e Ventura (1998) relatam como o professorado de uma escola se propôs a refletir sobre se estavam realizando um ensino baseado 4 Entendemos por conhecimento globalizado e relacional aquele que se constrói inter e transdisciplinarmente, superando a fragmentação de disciplinas estanques. na globalização. Ao iniciar a pesquisa, os autores constataram que, naquele estágio, a relação entre ensino e aprendizagem concretizava-se como: Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 32 uma organização dos conteúdos curri- culares baseada nos Centros de Interes- se; uma intervenção psicopedagógica pre- ocupada em como favorecer a apren- dizagem a partir da diversidade, e não a partir das características e deficit dos alunos; um trabalho de equipe de vários anos que reclamava e possibilitava a neces- sidade de questionar e inovar a prática docente. Dos diferentes sentidos de globalização, o que se pretende desenvolver com os Projetos é buscar a estrutura cogniscitiva, o problema eixo, que vincula as diferentes informações, as quais confluem em um tema para facilitar seu estudo e compreensão por parte dos alunos. Para levar adiante a organização curricular a partir de Projetos de Trabalho, foram explicitadas na escola as bases teóricas que os fundamentam; entre elas, vale ressaltar as seguintes: um sentido da aprendizagem que quer ser significativo, ou seja, que pretende conectar com o que os estudantes já sabem, com seus esquemas de conhe- cimento precedentes, de suas hipóte- ses (verdadeiras, falsas ou incompletas) ante a temática que se há de abordar; assume como princípio básico para sua articulação a atitude favorável para o co- nhecimento por parte dos estudantes, sempre e quando o professorado seja capaz de se conectar com seus interes- ses e de favorecer a aprendizagem; configura-se a partir da previsão, por parte dos docentes, de uma estrutura lógica e sequencial dos conteúdos, em uma ordem que facilite sua compre- ensão, mas sempre levando em conta que essa previsão constitui um ponto de partida, não uma finalidade, já que pode ficar modificada na interação da classe; realiza-se com um evidente sentido de funcionalidade do que se deve apren- der. Para isso, torna-se fundamental a relação com os procedimentos, com as diferentes alternativas organizativas aos problemas abordados; valoriza-se a memorização compreen- siva de aspectos da informação, com a perspectiva de que esses aspectos constituem uma base para estabelecer novas aprendizagens ou relações; por último, a avaliação trata, sobretudo, de analisar o processo seguido ao lon- go de toda a sequência e das inter-rela- ções criadas na aprendizagem. Parte de situações nas quais é necessário ante- cipar decisões, estabelecer relações ou inferir novos problemas. Os Projetos de Trabalho são uma resposta – nem per- feita, nem definitiva, nem única – para a evolução que o professorado acompa- nhou e que lhe permitiu refletir sobre sua própria prática e melhorá-la. Definitivamente, a organização dos Projetos de Trabalho baseia-se, fundamentalmente, em uma concepção da globalização entendida como um processo muito mais interno do que externo, no qual as relações entre conteúdos e áreas de co- nhecimento têm lugar em função da necessidade de resolver uma série de problemas que subjaz a aprendizagem. Essa seria a ideia fundamental dos Projetos. A aprendizagem, nos Projetos de Traba- lho, baseia-se em sua significatividade, à diferen- ça dos Centros de Interesses, que se baseiam nas descobertas espontâneas dos alunos. Globalização e significatividade são, pois, dois aspectos essenciais que se plasmam nos Projetos. É necessário destacar o fato de que as diferentes fases e atividades que se devem desen- volver em um Projeto ajudam os alunos a serem conscientes de seu processo de aprendizagem e exigem do professorado responder aos desafios que estabelecem em uma estruturação muito mais aberta e flexível dos conteúdos escolares. É importante constatar que a informação necessária para construir os Projetos não está Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 33 determinada de antemão, nem depende do educador ou do livro-texto, está, sim, em função do que cada aluno já sabe sobre um tema e da in- formação com a qual se possa relacionar dentro e fora da escola. Isso evita o perigo da estandardiza- ção e homogeneização das fontes de informação, e, por sua vez, o intercâmbio entre as informações que são aportadas pelos membros do grupo con- tribui para a comunicação. Perceba que, na escola estudada, o profes- sorado tinha ampla experiência didática que se refletia emum desenvolvimento curricular por matérias (sobretudo de Matemática, Língua e Ciências Sociais). No Ensino Fundamental, eram realizadas sessões de trabalho a partir de uma or- ganização da classe por cantos ou oficinas, tudo isso além das aulas de Música, Educação Física e Informática. Entretanto, o núcleo principal de ho- mogeneização de toda a escola, em sua forma de organizar os conhecimentos, era a realização de Centros de Interesse. A argumentação da concepção didática do Centro de Interesse apoia-se, em linhas gerais, em um duplo ponto de partida psicopedagógico. Por um lado, destaca o princípio da aprendizagem por descoberta, que estabelece que a atitude para a aprendizagem por parte dos alunos é mais positiva quando parte daquilo que lhes interessa e aprendem da experiência do que descobrem por si mesmos. E, por outro lado, um princípio da Escola Ativa, que se refere ao exercício da educa- ção como prática democrática, que outorga às as- sembleias de classe a decisão sobre o que se deve aprender. As diferenças entre as duas maneiras de organizar o conhecimento escolar, por Centros de Interesse e por Projetos de Trabalho, encontram- -se esquematizadas no quadro a seguir. 3.2 Os Projetos de Trabalho: outro Nome para os Centos de Interesse? ELEMENTOS CENTROS DE INTERESSE PROJETOS Modelo de Aprendizagem Por descoberta Significativa Temas Trabalhados As Ciências Naturais e Sociais Qualquer tema Decisão sobre que Temas Por votação majoritária Por argumentação Função do Professorado Especialista Estudante, intérprete Sentido da Globalização Somatória de matérias Relacional Modelo Curricular Disciplinas Temas Papel dos Alunos Executor Copartícipe Tratamento da Informação Apresentada pelo professo-rado Investigada pelos alunos em conjunto com os professores Técnicas de Trabalho Resumo, destaque, questio-nário, conferências Índice, síntese, conferências Procedimentos Recompilação de diversas fontes Relação entre fontes Avaliação Centrada nos conteúdos Centrada nas relações e nos procedimentos A Revista Nova Escola - Janeiro/Fevereiro 2012 - traz interessantes experiências para trabalhar o currículo por meio de projetos. MultimídiaMultimídia Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 34 Na escola foco deste estudo, nos Centros de Interesse, eram abordados, sobretudo, temas das áreas das Ciências Naturais e Sociais; as propos- tas concretas eram apresentadas pelos alunos, e a decisão sobre o que se ia estudar era tomada por votação na sala de aula. Nessa votação, o papel do professorado era fundamental, pois costuma- va procurar que o tema escolhido fizesse parte da programação, tivesse um reflexo nos livros-textos e não saísse da pauta que estabelece que, em cada nível de escolaridade, devem ser estudados determinados temas. No fundo, não havia lugar para o novo: os professores ensinavam aquilo que sabiam e que acreditavam que o aluno devesse aprender. O Centro de Interesse deveria figurar no programa do curso ou os conteúdos eram trans- formados para se aproximarem dele. Uma vez escolhido o tema, os professores costumavam apresentar o material para seu estudo e decidir a sequência e as relações entre as diferentes fontes de informação que o aluno pudesse estabelecer. Essa descrição pode parecer simplificação interessada, no entanto, corresponde a observa- ções efetuadas em classe pelos pesquisadores, ao diálogo com educadores sobre sua experiência com Centros de Interesse e à análise de materiais globalizados. Não se pode perder de vista, além disso, que o início do processo de inovação na escola começou com a insatisfação que produzia no grupo de professores o trabalho por Centros de Interesse, dado o caráter rotineiro que havia adquirido. 3.3 Aspectos a serem levados em conta no Desenvolvimento de um Projeto de Trabalho A perspectiva de globalização que se adota na escola e que se reflete nos Projetos de Traba- lho trata de ensinar o aluno a aprender, a encon- trar o nexo, a estrutura, o problema que vincula a informação e que permite aprender, finalidade esta que se pode fazer coincidir com os objetivos finais de cada nível educativo. Por isso, na escola, foram formuladas referências cognoscitivas como articuladoras e orientadoras dos conhecimentos que a organização dos Projetos deveria ajudar a veicular nos alunos. Essas referências, que a se- guir apresentaremos, não são as únicas possíveis; são colocadas aqui apenas a título de exemplo: Escola Infantil - 4 anos: aprender a construir definições de objetos e fatos, a partir de seus atributos e funções. Escola Infantil - 5 anos: definir a fun- cionalidade de objetos e fatos. 1ª Série do Ensino Fundamental: ex- plicar os processos de transformação que agem nos objetos, fatos e proble- mas. 2ª Série do Ensino Fundamental: es- tabelecer relações causais ou funcio- nais sobre os fatos ou as informações estudadas. 3ª, 4ª, 5ª, 6ª Séries do Ensino Funda- mental: abordar a informação apresen- tada em sala de aula de maneira que os alunos cheguem a ordená-la, valorizá-la e inferir dela novos sentidos, significa- dos ou referências. 7ª e 8ª Séries do Ensino Fundamental: realizar gradualmente um processo de mudança que conduza os alunos da descrição da informação à sua explica- ção relacional. A partir dessas e de outras referências que aparecem em cada projeto, o docente planeja o esquema de sua intervenção e tenta organizar o desenvolvimento do Projeto de Trabalho. Os as- pectos mais relevantes dessa organização serão apresentados a seguir. Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 35 A Escolha do Tema O ponto de partida para a definição de um Projeto de Trabalho é a escolha do tema. Em cada nível e etapa da escolaridade, essa escolha ado- ta características diferentes. Os alunos partem de suas experiências anteriores, da informação que têm sobre os Projetos já realizados ou em proces- so de elaboração por outras classes. Essa infor- mação se torna pública em um painel situado na entrada da escola (com isso, as famílias também estão cientes). Dessa forma, o tema pode perten- cer ao currículo oficial, proceder de uma experiên- cia comum (como os acampamentos), originar-se de um fato da atualidade, surgir de um problema proposto pelos professores ou emergir de uma questão que ficou pendente em outro Projeto. O professorado e os alunos devem perguntar-se so- bre a necessidade, relevância, interesse ou opor- tunidade de trabalhar um ou outro determinado tema. Todos eles analisam, de diferentes pers- pectivas, o processo de aprendizagem que será necessário levar adiante para construir conjunta- mente o Projeto. Como explicava uma professora de 5ª e 6ª séries do Ensino Fundamental, [...] é a turma em seu conjunto que define o Projeto; não só escolhe um tema, mas também o escolhe em função dos outros Projetos que já foram trabalhados, em função de uma série de conceitos que temos claro que será trabalhado nesse período, em função da história do grupo, e, além disso, o tema não se define por si mesmo, e sim segundo um roteiro de trabalho. (HERNÁNDEZ; VENTURA, 1998, p. 67). AtençãoAtenção O critério de escolha de um tema pela turma não se baseia em um “porque gostamos”, e sim em sua relação com os trabalhos precedentes, porque permite estabelecer novas formas de conexão com a informação e a elaboração de hipóteses de trabalho que guiem a organização da ação. Em qualquer caso, trata-se de defini-lo em relação às demandas que os alunos propõem. Nesse sentido, leva-se em conta uma organização curricular baseada nos interesses dos estudantes. Com essa opção curricular, a diferença apoia-se no fato de que o educador sabe que os alunos,sobretudo os dos primeiros níveis educativos, vão querer estudar aquilo que já sabem ou partir de esquemas que já conheçam e dominem. Por isso, o docente propõe que as propostas sobre possíveis temas sejam argumentadas pela pró- pria criança, com critérios de relevância e com as contribuições que julgue necessárias: convidar um conferencista, preparar um vídeo, realizar um dossiê de apresentação, apresentar informação inicial. O critério de escolha de um tema pela tur- ma não se baseia em um “porque gostamos”, e sim em sua relação com os trabalhos preceden- tes, porque permite estabelecer novas formas de conexão com a informação e a elaboração de hi- póteses de trabalho que guiem a organização da ação. Na etapa inicial, uma função primordial do docente é mostrar ao grupo ou fazê-lo descobrir as possibilidades do Projeto proposto (o que se pode conhecer), para superar o sentido de querer conhecer o que já sabem. Não existem temas que não possam ser abordados por meio de Projetos. Frequentemen- te, o sentido de novidade, de adentrar-se nas in- formações e problemas que normalmente não se encontram nos programas escolares, mas que o aluno conhece por meio dos meios de comu- nicação, conduz a uma busca em comum da in- formação, abrindo múltiplas possibilidades de aprendizagem, tanto para os alunos como para o professorado. Tudo isso não impede que os do- centes também possam, e devam, propor aque- les temas que considerem necessários, sempre e quando mantiverem uma atitude explicativa si- milar à que se exige dos alunos. Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 36 A Atividade do Docente após a Escolha do Projeto Uma vez escolhido o Projeto e estabelecida uma série de hipóteses em termos do que se quer saber, as perguntas que se deve responder etc., o que aconteceu para que valha a pena sua escolha, o professorado pode realizar as seguintes ativida- des: especificar qual será o motor de co- nhecimento, o fio condutor, o esquema cognoscitivo que permitirá que o pro- jeto vá além dos aspectos informativos ou instrumentais imediatos e possa ser aplicado em outros temas ou proble- mas. Esse fio condutor está em relação com o Projeto Curricular Institucional. Na escola analisada, durante o período de 1987 e 1988, realizou-se a concreti- zação dos objetivos finais de cada nível, em que se destacam alguns dos pro- blemas fundamentais que devem ser desenvolvidos ao longo de cada etapa e servem como referência curricular da- quilo que se vai ensinar por meio dos Projetos; realizar uma primeira previsão dos con- teúdos (conceituais e procedimentais) e das atividades e tratar de encontrar algumas fontes de informação que per- mitam iniciar e desenvolver o Projeto. Não obstante, a pergunta que o docen- te tenta responder é: o que os diferentes componentes do grupo aprendem com o Projeto? estudar e atualizar as informações em torno do tema ou problema do qual se ocupa o Projeto, com o critério de que aquelas apresentem novidades, propo- nham perguntas, sugiram paradoxos, de forma que permita ao aluno ir crian- do novos conhecimentos. Essa seleção de informação deve ser contrastada com outras fontes que os estudantes já possuam ou possam apresentar e tam- bém com as conexões que possam sur- gir de outras situações e espaços edu- cativos, os quais tenham lugar dentro do horário e do planejamento da esco- la. No caso analisado, os “Cantos”, as ofi- cinas interclasses, o trabalho individual; criar um clima de envolvimento e de interesse no grupo e em cada pessoa sobre o que se está trabalhando na sala de aula. Ou seja, reforçar a consciência de aprender em grupo; fazer uma previsão dos recursos que permitam transmitir ao grupo a atuali- dade e funcionalidade do Projeto; planejar o desenvolvimento do Projeto sobre a base de uma sequência de ava- liação: a) inicial: o que os alunos sabem sobre o tema, quais são suas hipóteses e referências de aprendizagem; b) formativa: o que estão aprendendo, como estão acompanhando o senti- do do Projeto; c) final: o que aprenderam em relação às propostas iniciais? São capazes de estabelecer novas relações? Essa pauta deve servir como pauta de reflexão e acompanhamento do Projeto e como preparação de outros futuros, tudo o que irá guiando seu processo de tomada de decisões; recapitular o processo que se realizou ao longo do Projeto, em forma de pro- gramação a posteriori, que possa ser uti- lizada como memória de cada docente, para intercâmbio com outros professo- res, compatibilizando com os objetivos finais da escola e com os do currículo oficial, e como ponto de partida para um novo Projeto. No entanto, essa forma de intervenção não é homogênea entre o professorado. Produzem- -se variações e diferenças. Isso foi constatado na avaliação externa sobre a inovação na escola Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 37 pesquisada. Segundo essa fonte, se estabelecês- semos de maneira paralela e extrema as formas mais relevantes da atuação dos docentes, em di- ferentes situações de ensino e aprendizagem que foram observadas em sala de aula durante a rea- lização dos Projetos, poderíamos encontrar uma série de diferenças. Estas são reflexo de como o professorado, apesar de incorporar critérios alter- nativos como organizadores de sua prática, tem dificuldades para adaptá-los a situações reais, outorgando aos Projetos interpretações distintas. As razões dessas diferenças, em uma coletividade que, em boa parte, compartilhou a mesma infor- mação e passou por um processo de formação similar, podem ser múltiplas. No caso concreto da escola pesquisada, poderiam ser destacadas as seguintes: a consciência de ser especialista em uma área ou matéria, que leva a seguir uma ordem única na apresentação do Projeto, sem levar em conta a diversi- dade de desenvolvimentos que pode adotar; a necessidade de preparar o aluno para as exigências do Ensino Médio, que leva alguns professores a antecipar o tipo de docência que, supostamente, será en- contrada mais tarde; a dificuldade que implica refletir criti- camente sobre os fundamentos da pró- pria prática quando se está satisfeito com o modo de como se está realizan- do. Essas posições encontradas não devem ser contempladas de maneira radical, mas são orien- tativas das diferentes posturas existentes; trata-se simplesmente de reconhecer que uma determi- nada concepção do ensino implica um tipo de atitude profissional. Portanto, podem-se encontrar na escola turmas que utilizavam os Projetos para tentar fa- vorecer uma construção dos conhecimentos de maneira significativa e favorecedora da autono- mia na aprendizagem, mas também se podem encontrar turmas nas quais os Projetos eram sim- plesmente uma nova organização externa, um nome novo com o qual se denominava uma ati- tude profissional rotineira diante das relações de ensino e aprendizagem. Partindo da perspectiva geral de toda a es- cola, os Projetos geraram um alto grau de auto- consciência e de significatividade nos alunos com respeito à sua própria aprendizagem, ainda que, em um determinado período ou série, possam estar desenvolvendo Projetos de forma menos in- tensa. Essa variedade, como dissemos, é um ele- mento de contraste e dinamizou a discussão psi- copedagógica na escola, ainda que, em algumas ocasiões, também servisse de freio ou de forma de pressão de alguns docentes sobre outros. A Atividade dos Alunos Após a Escolha do Projeto De forma paralela a esse conjunto de ações e tomada de decisões do docente, a turma e cada pessoa vão realizando também outras atividades. A interação entre ambas articula o sentido da or- ganização Projeto e explicaoutra dimensão de sua orientação globalizadora. As tarefas que se destacam a seguir não são as únicas que os alu- nos realizaram, nem são realizadas sempre da mesma maneira. Em caso contrário, o efeito ino- vador sobre a aprendizagem dos Projetos ficaria limitado, já que não levaria em conta que a forma de abordar cada tema deve apresentar variações que proponham aos alunos problemas novos e lhes ensinem procedimentos diferentes. Depois da escolha do tema, cada estu- dante realiza um índice no qual espe- cifica os aspectos que vai trabalhar no Projeto (com os menores, realiza-se co- letivamente). Isso lhe permite antecipar qual possa ser o desenvolvimento do Projeto, ajuda a planejar o tempo e as atividades e a assumir o sentido de glo- balidade do Projeto. O índice tem, além disso, o valor de ser um instrumento Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 38 de avaliação e de motivação iniciais, já que estabelece as previsões sobre os di- ferentes aspectos do Projeto e prevê o envolvimento dos membros do grupo. Dessa forma, constitui um procedimen- to de trabalho que permite, em sua ge- neralização, aplicar-se a outros temas e informações. A colocação em comum dos diferentes aspectos de cada índice configura o ro- teiro inicial da classe, o ponto de parti- da que irá organizar o planejamento e a aproximação à informação de cada estudante e dos diferentes grupos da classe. De forma paralela, os alunos realizam uma tarefa de busca de informação que complementa e amplia a apresentada na proposta e argumentação inicial do Projeto. Essa busca deve ser diversifica- da e pode consistir-se em: nova infor- mação escrita, conferências de convi- dados (companheiros de outros cursos, especialistas de fora da escola, familia- res dos alunos), visitas a museus, expo- sições e instituições, apresentação de vídeos, programas de computador etc. Realizar o tratamento dessa informação é uma das funções básicas dos Projetos. Esse processo se realiza tanto individu- almente como em um diálogo conjunto com toda a classe. Nessa fase, a ênfase é dada aos seguintes aspectos e princí- pios: a informação oferece visões da realida- de. É necessário distinguir as diferentes formas de apresentá-las, assim como tornar compreensível a ideia de que os seres humanos interpretam a realida- de utilizando diferentes linguagens e enfoques. A distinção entre hipóteses, teorias, opiniões, pontos de vista, que adota quem oferece uma dessas visões é um dos aspectos que se deve levar em conta. A confrontação de opiniões con- trapostas ou não coincidentes e as con- clusões que disso pode extrair o aluno incidem também nesse aspecto; a) a informação pode ser diferente, se- gundo como se ordene e se apresen- te. Deve-se insistir na maneira de or- dená-la em relação com a finalidade do Projeto, dos capítulos do índice e das variações que surgem em conta- to com a própria informação; b) a aprendizagem de procedimentos (classificação, representação, síntese, visualização) permite realizar defini- ções, propor perguntas, estabelecer prioridades e hierarquias em relação aos conteúdos da informação; c) estabelecer relações causais e novas perguntas que expliquem as diferen- tes questões derivadas do processo de tratamento da informação. Desenvolve os capítulos assinalados no índice, mediante atividades de aula in- dividuais ou em pequeno grupo. Realiza um dossiê de síntese dos aspec- tos tratados e dos que ficam abertos para futuras aproximações por parte de toda turma e de cada estudante. Na apresentação dessa recompilação, reelabora-se o índice inicial, ordenam- -se as fontes de informação utilizadas e os trabalhos de análise e observação realizados, planeja-se a “imagem” que conterá essa síntese final e reescreve-se o que se aprendeu. A seguir, realiza a avaliação de todo o processo seguido no Projeto, a partir de dois momentos: a) um de ordem interna: o que realiza cada criança e no qual se recapitu- la sobre o que foi feito e o que foi aprendido; b) outro, de ordem externa, mediante o qual e a partir da apresentação do professor, deve ser aplicada em situ- ações diferentes a informação traba- lhada, para realizar outras relações Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 39 e comparações, abrir novas possibi- lidades para o tema e destacar, de forma relacional, o que se tratou par- cialmente. As simulações costumam ser a via efetiva para realizar esse processo final. Finalmente, abrem-se novas perspec- tivas de continuidade para o projeto seguinte, procedendo do anterior, de forma a gerar um ciclo contínuo de significações dentro do processo de aprendizagem. A Busca das Fontes de Informação Na organização dos conhecimentos escola- res por meio dos Centros de Interesse, costuma ser o docente quem se responsabiliza e decide so- bre qual informação os alunos irão trabalhar em aula. Nos Projetos de Trabalho, essa função não se exclui, mas se complementa com as iniciativas e colaborações dos alunos. Esse envolvimento dos estudantes na busca da informação tem uma série de efeitos que se re- lacionam com a intenção educativa dos Projetos. Em primeiro lugar, faz com que assumam o tema como deles próprios e que aprendam a situar-se diante da informação a partir de suas próprias possibilidades e recursos, mas também lhes leva a envolver outras pessoas na busca de informação, o que significa considerar que não se aprende só na escola e que o aprender é um ato comunicati- vo, já que necessitam da informação que os outros trazem. Sobretudo, descobrem que eles também têm uma responsabilidade na sua própria apren- dizagem, que não podem esperar passivamente que o professor tenha todas as respostas e lhes ofereça todas as soluções, especialmente porque, como já foi dito, o educador é um facilitador e, com frequência, um estudante a mais. No processo, foi colocado aos pesquisado- res que nem todos os alunos têm facilidades para um acesso extraescolar a fontes de informação. Foi sugerido que essa orientação é válida para os de classe média, a quem as famílias podem ofe- recer recursos e em cujas casas encontram infor- mação e interesse para responder às demandas sobre um tema, mas que não ocorre assim com outros estudantes de diferente contexto social e cultural. Se bem que essa crítica possa ser, em par- te, acertada, deveria ser levado em conta o que se considera como fonte de informação útil para a escola. Indubitavelmente, nem tudo passa pe- los livros. Há temas em que as referências trazidas por um informante têm mais valor do que as de qualquer fonte escrita ou visual. Informantes váli- dos podem ser encontrados em todos os tipos de contextos. Além disso, nesses contextos com me- nos recursos, a própria escola pode impulsionar aqueles de que já dispõe em função da forma de trabalho que desenvolve com os alunos. Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 40 Os Projetos: um Modelo Didático para Traba- lhar as “Ciências”? Os Projetos de Trabalho são uma inovação que pode ser aplicada em todas as áreas de co- nhecimento, mas basicamente foram colocados em prática nas áreas de Ciências Naturais e Ci- ências Sociais, já que estas favorecem, em maior grau, a busca e o tratamento da informação. A realização de Projetos em outras áreas continua sendo ocasional, ainda que se tenham planejado pequenos Projetos em Matemática ou em Língua. Para alguns docentes, a alternativa a essa limita- ção passa por conectar os conteúdos e as ativida- des dos Projetos com conteúdos e Projetos de ou- tras situações educativas que os alunos realizem ao longo de sua tarefa escolar, o que permitiriaa introdução da noção interdisciplinar da relativi- dade. Síntese da Atuação do Professorado e dos Alunos no Projeto POR PARTE DO PROFESSORADO POR PARTE DOS ALUNOS 1. Estabelece os objetivos educativos e de aprendizagem. 2. Estabelecem a possibilidade do tema. 3. Seleciona os conceitos, procedi- mentos que prevê que possam ser tratados no projeto. 4. Realizam a avaliação inicial: o que sabemos ou queremos saber sobre o tema? 5. Pré-sequencializa os possíveis con- teúdos a trabalhar, em função da in- terpretação das respostas dos alunos. 6. Realizam propostas de sequenciação e ordenação de conteúdos. 7. Buscam fontes de informação, elaboram um índice. 8. Compartilham propostas. Buscam um consenso organizativo. 9. Preestabelece atividade. 10. Planejam o trabalho (individual, em pequeno grupo, turma). 11. Apresenta atividades. 12. Realizam o tratamento da informação a partir das atividades. 13. Facilita meios de reflexão, recursos, materiais, informação pontual. Papel de facilitador. 14. Trabalho individual: ordenação, reflexão sobre a informação. 16. Autoavaliação.15. Favorece, recolhe e interpreta as contribuições dos alunos. Avaliação. 17. Contraste entre a avaliação e a autoavaliação. 18. Análise do processo individual de cada aluno: O que aprendeu? Como trabalhou? 19. Conhecem o próprio processo e em relação ao grupo. 20. Estabelecer uma nova sequência. Saiba maisSaiba mais Você pode aprofundar os estudos acerca da interdisciplinaridade promovida em muitos projetos no endereço a seguir: http://www.crmariocovas.sp.gov.br/itd_l.php?t=001 Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 41 O Projeto Didático é um valioso recurso para se trabalhar o Currículo. Isso vale em qualquer nível ou modalidade de ensino. Você deve ter percebido que, embora seja um tema atual, sementes dessa ideia emergiram há al- gum tempo. Convém destacar que o Projeto favorece o trabalho interdisciplinar e, nos casos mais avançados, transdisciplinar. Isso se constitui um ganho para o aluno que pode melhor compreender os conteúdos acadêmicos, muitas vezes tratados de forma estanque e descolada da realidade. Isso promove grande motivação e aprendizagens mais significativas. Veja alguns sites interessantes acerca de Projeto interdisciplinar: http ://www.educared.org/educa/ index. cfm?pg=oassuntoe.interna&id_tema=12&id_ subtema=1&cd_area_atv=2 revistaescola.abril.com.br/ portal.mec.gov.br MultimídiaMultimídia 3.4 Resumo do Capítulo 3.5 Atividades Propostas 1. Por que trabalharmos o currículo por Projetos de Trabalho? 2. Quais as etapas para o desenvolvimento de um projeto? 3. Como deve ser a participação do aluno no trabalho com Projetos? E, agora, teste seus conhecimentos: 1. (ENADE 2008) Considere as descrições que se seguem. Escola X: O currículo é desenvolvido em projetos de trabalho, com integração entre disciplinas, e os laboratórios de informática estão a serviço da pesquisa empreendida pelos alunos. Escola Y: Há uma delimitação clara entre as disciplinas, com horários e espaços bem definidos para as atividades, e os recursos tecnológicos dão suporte à transmissão de conhecimentos. Escola Z: Laboratórios de informática, telas digitalizadas e estúdios de produção audiovisual Sandra da Costa Lacerda Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 42 estão disponíveis aos professores, que são conduzidos a desenvolver um currículo em que os novos conhecimentos científicos sejam imediatamente incorporados. Qual das análises faz uma relação coerente entre concepções de currículo e uso da tecnologia, segundo as correntes teóricas a que se referem? (A) As escolas X e Y adotam uma concepção de currículo calcada no multiculturalismo, pois o tratamento dado ao uso de recursos tecnológicos está associado à diversidade. (B) Na escola X o currículo possui uma abordagem interdisciplinar, o que favorece o caráter investigativo do uso de recursos tecnológicos no contexto da metodologia de projetos. (C) Na escola Y a delimitação entre as disciplinas demonstra que o currículo é reflexo da plura- lidade cultural contemporânea, ao passo que o modo como a tecnologia é adotada remete a um modelo tecnicista. (D) Na escola Z os diversos recursos tecnológicos usados indicam uma visão de currículo calca- da na teoria pós-crítica, pois os professores acompanham as inovações tecnológicas. (E) As escolas Y e Z trabalham segundo uma perspectiva curricular crítica, em que os recursos tecnológicos são utilizados para a formação continuada de alunos e professores. 2. (ENADE 2008) A partir dos anos 1990 foram realizadas várias reformas curriculares no âmbito das instituições educativas, dentre elas, as propostas de reorganização dos anos de escola- ridade em ciclos, que trouxeram mudanças significativas para a estruturação curricular e a avaliação, com a implantação da progressão continuada. Tais experiências fizeram constatar que a implementação de novas propostas nas escolas necessita que as(os) (A) particularidades da implementação em cada escola sejam programadas pelos níveis cen- trais. (B) equipes diretoras aceitem a proposta e a desenvolvam com o apoio do coordenador peda- gógico. (C) ações pedagógicas e administrativas sejam modificadas de forma coletiva e participativa. (D) projetos oficiais prescrevam com clareza as ações a serem executadas. (E) programas de formação continuada aconteçam depois do processo de implementação. 3. (ENADE 2008) A professora Inês, interessada em integrar matemática e artes plásticas, propôs aos seus alunos uma pesquisa da obra do artista plástico Piet Mondrian (1872-1944), que con- sistiu na observação dos quadros reproduzidos abaixo. Fonte: http://www.artcyclopedia.com/artists/mondrian_piet.html Composição com Vermelho, Azul e Amarelo - 1930, Azul e Amarelo – 1930 Composição com Amarelo, Azul e Vermelho - 1939, Azul e Amarelo – 1930 Currículos e Programas Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 43 A qual objetivo da educação matemática para o ensino fundamental, presente nos PCN, aten- de a proposta da professora, de observação dos quadros de Mondrian? (A) Identificar formas geométricas e reproduzi-las segundo categorias artísticas miméticas, a fim de apurar o gosto estético. (B) Estabelecer conexões entre temas matemáticos de diferentes campos e entre esses temas e conhecimentos de outras áreas curriculares. (C) Descrever resultados com precisão e argumentar sobre suas conjecturas, estabelecendo relações entre matemática e linguagem oral. (D) Resolver situações-problema para validar estratégias e resultados, identificando os ângulos obtuso, agudo e reto entre as formas geométricas. (E) Apurar a percepção da forma e estimular a sua criação, por meio da cooperação, tendo em vista a solução de problemas numéricos propostos. 4. (ENADE 2005) Leia trechos da carta-resposta de um cacique indígena à sugestão, feita pelo Governo do Estado da Virgínia (EUA), de que uma tribo de índios enviasse alguns jovens para estudar nas escolas dos brancos. “[...] Nós estamos convencidos, portanto, de que os senhores desejam o nosso bem e agradecemos de todo o coração. Mas aqueles que são sábios reconhecem que diferentes nações têm concepções diferentes das coisas, e, sendo assim, os senhores não ficarão ofendidos ao saber que a vossa idéia de educa- ção não é a mesma que a nossa. [...] Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte e aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando eles voltaram para nós, eram maus corredores, ignorantes da vida da floresta e incapazes de suportar o frio e a fome. Não sabiam caçar o veado, matar o inimigo ou construir uma cabana efalavam nossa língua muito mal. Eles eram, portanto, inúteis. [...] Ficamos extremamente agradecidos pela vossa oferta e, embora não possamos aceitá-la, para mostrar a nossa gratidão concordamos que os nobres senhores de Virgínia nos enviem alguns de seus jovens, que lhes ensinaremos tudo que sabemos e faremos deles ho- mens.” (BRANDÃO, 1984). A relação entre os dois principais temas do texto da carta e a forma de abordagem da educação privilegiada pelo cacique está representada por: (A) sabedoria e política / educação difusa. (B) identidade e história / educação formal. (C) ideologia e filosofia / educação superior. (D) ciência e escolaridade / educação técnica. (E) educação e cultura / educação assistemática. 5. (ENADE 2005) A implementação do projeto político-pedagógico é uma das condições para que se afirme a identidade da escola como espaço necessário à construção do conhecimento e da cidadania. Sabe-se que o currículo é parte integrante desse processo e deve contemplar a formação de identidade cultural. Nessa perspectiva, o currículo deverá ter como diretriz: (A) promover narrativas sobre o outro numa ótica universalista. (B) valorizar o enfoque prescritivo e auto-referenciado do conhecimento. (C) organizar conteúdos, disciplinas, métodos, experiências e objetivos. (D) estabelecer pautas de conduta visando à classificação de identidades. (E) privilegiar os processos de subjetivação coletiva e o saber sistematizado. Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 45 CONSIDERAÇÕES FINAIS4 Prezado(a) aluno(a), finalizando esta disciplina, o último comentário que gostaríamos de fazer re- fere-se ao papel da mudança curricular nos processos de reforma educacional. Melhorar a qualidade da educação implica melhorar os processos de ensino e aprendizagem que ocorrem nas salas de aula, im- plica introduzir mudanças naquilo que é ensinado e aprendido nas escolas e, sobretudo, na forma como se ensina e como se aprende. Assim, a mudança curricular é uma condição necessária para realizar uma reforma educacional que aspire a melhorar a qualidade da educação. No entanto, seria uma ingenuidade pensar que isso pode ser conseguido simplesmente com a modificação do currículo estabelecido. Esse é apenas o primeiro passo, necessário e importante, mas nada mais do que o primeiro passo, de uma dinâmica de mudança que implica todo um conjunto de atuações coerentes e inter-relações em várias frentes: formação dos professores, materiais didáticos e curriculares, equipamento e instalações, condi- ções de trabalho, organização e funcionamento das escolas, avaliação, serviços de apoio etc. Em outras palavras, além de estabelecer um currículo atualizado, ajustado às necessidades do sistema educacional e da sociedade, faz falta uma política clara e decidida de desenvolvimento curricular nestes e em outros âmbitos, que possibilite que a transformação proposta chegue à realidade das escolas e das salas de aula, ao que fazem cada dia professores e alunos quando enfrentam a apaixonante, porém complexa, tarefa de ensinar e aprender. Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 47 CAPíTULO 1 1. Leia neste capítulo todas as considerações acerca dos diversos pensamentos que abordam o tema aprendizagem e desenvolvimento. Após a leitura, você deverá expor o que entendeu. 2. Para responder a segunda parte da pergunta, você precisa considerar a definição de currículo e tudo o que ele envolve, para responder como ele pode contribuir na promoção do desen- volvimento humano. 3. Procure definir de modo que você exponha o que realmente entendeu acerca da concepção de currículo; pode citar autores diferentes, mas ao final tire sua própria conclusão. É muito importante que o conceito de currículo tenha sido compreendido. 4. Ler na apostila o tópico que trata desse assunto e responder objetivamente. 5. Nesta questão também basta uma leitura compreensiva do tópico que trata do assunto. Quais os componentes do currículo? Comente cada um deles. CAPíTULO 2 1. Primeiramente você precisa compreender o que é uma Matriz, para saber o motivo pelo qual muitos estudiosos do currículo defendem a elaboração do currículo a partir de uma matriz, quais as vantagens e pontos de destaque. 2. Para responder esta pergunta, basta ler cuidadosamente o item do texto e expor com suas palavras o que você compreendeu acerca dos 4Rs. CAPíTULO 3 1. Se você já compreendeu o que é currículo, precisa agora saber o que é Projeto de Trabalho. Adquirindo esse conhecimento você tem condições de responder a pergunta, considerando que, nas práticas escolares, muitas Unidades Educacionais e mesmo Redes Educativas têm optado pelo trabalho curricular por meio dos projetos. 2. Um projeto começa sempre por um problema para o qual se quer encontrar uma resposta, so- lução ou entendimento. Ele termina em uma situação de Comunicação ou produção de algo. Mas entre o início e o fim, há diversas etapas; relacione-as. Se considerar necessário, consulte outras fontes. 3. Nesta questão, o quadro que está neste capítulo pode ajudar, mas lembre-se de que a partici- pação do aluno no trabalho pedagógico por projetos deve, acima de tudo, ser ativa. Verifique outros aspectos dessa participação. Questões ENADE: 1. B 2. C 3. B 4. E 5. E RESPOSTAS COMENTADAS DAS ATIVIDADES PROPOSTAS Unisa | Educação a Distância | www.unisa.br 49 BRANDÃO, C. R. O que é educação. São Paulo: Brasiliense, 1984. BRUNER, J. Actual minds, possible words. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1986. CARBONELL, J. A aventura de inovar, a mudança na escola. Porto Alegre: ArtMed, 2002. COLL, C. Psicologia e currículo. São Paulo: Ática, 1997. ______. Os conteúdos da reforma: ensino e aprendizagem de conceitos, procedimentos e atitudes. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. DOLL JR., W. E. Currículo: uma perspectiva pós-moderna. Porto Alegre: ArtMed,1997. GOODSON, I. F. Currículo: teoria e história. Petrópolis: Vozes, 1995. HAYLES, N. K. Chaos bound. Ithaca: Cornell University Press, 1990. HERNÁNDEZ, F.; VENTURA, M. A organização do currículo por projetos de trabalho: o conhecimento é um caleidoscópio. Porto Alegre: ArtMed, 1998. IMBERNÓN, F. A educação no século XXI: os desafios do futuro imediato. Porto Alegre: ArtMed, 2000. MACHADO, N. J. Epistemologia e didática: as concepções de conhecimento e inteligência e a prática docente. São Paulo: Cortez, 1995. MEIRIEU, P. Aprender... sim, mas como? Porto Alegre: ArtMed, 1998. ______. A pedagogia entre o dizer e o fazer. Porto Alegre: ArtMed, 2002. MOREIRA, A. F. B.; PACHECO, J. A.; GARCIA, R. L. Currículo: pensar, sentir e diferir. Rio de Janeiro: DP&A Editora, 2004. OLIVER, D. Grounded knowing: a postmodern perspective of teaching and learning. Educacional Leardership (Magazine), n. 48, Sep. 1990. PERRENOUD, P. Pedagogia diferenciada, das intenções à ação. Porto Alegre: Artes Médicas, 2000. RORTY, R. Contingency, irony, and solidarity. Cambridge: Cambridge University Press, 1989. SCHWAB, J. The practical: a language for curriculum. In: WESTBURY, I.; WILKOF, N. J. (Eds.). Science, curriculum, and liberal education: select essays. Chicago: University of Chicago Press, 1978. STENHOUSE, L. Investigación y desarrollo del curriculum. Madrid: Morata, 1984. TOULMIN, S. Cosmópolis. New York: Free Press, 1990. ZABALA, A. Enfoque globalizador e pensamento complexo: uma proposta para o currículo escolar. Porto Alegre: ArtMed, 2002. REFERÊNCIAS OLE_LINK3 INTRODUÇÃO 1 OS FUNDAMENTOS DO CURRÍCULO 1.1 Desenvolvimento, Cultura, Educação e Escolarização 1.2 Definindo Currículo 1.3 As Fontes do Currículo 1.4 Psicologia e Currículo 1.5 Resumo do Capítulo 1.6 Atividades Propostas 2 CONSTRUINDO UMA MATRIZ DE CURRÍCULO 2.1 A Metáfora e o Modo Narrativo 2.2 Objetivos, Planos, Propósitos 2.3 Os Quatro Rs- Uma Alternativa para os Princípios Lógicos de Tyler 2.4 Resumo do Capítulo 2.5 Atividades Propostas 3 A ORGANIZAÇÃO DO CURRÍCULO POR PROJETOS DE TRABALHO OU A TENTATIVA DE APLICAÇÃO DE UMA MATRIZ CURRICULAR PÓS-MODERNA 3.2 Os Projetos de Trabalho: outro Nome para os Centos de Interesse? 3.3 Aspectos a serem levados em conta no Desenvolvimento de um Projeto de Trabalho 3.4 Resumo do Capítulo 3.5 Atividades Propostas 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS RESPOSTAS COMENTADAS DAS ATIVIDADES PROPOSTAS REFERÊNCIAS