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Sumário
DIREITO PROCESSUAL PENAL: AÇÃO PENAL ........................................................................................................... 4
1. PRETENSÃO PUNITIVA ........................................................................................................................................ 5
2. AÇÃO PENAL ....................................................................................................................................................... 7
2.1 Direito De Ação............................................................................................................................................. 7
2.2 Condições Da Ação ....................................................................................................................................... 8
2.2.1 Conceito ................................................................................................................................................ 8
2.2.2 Condições Genéricas............................................................................................................................ 10
2.2.3 Condições Específicas da Ação ............................................................................................................ 18
3. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL ............................................................................................................................ 23
3.1 Princípios Comuns Da Ação Penal Pública E Privada .................................................................................. 23
3.2 Princípios Da Ação Penal Pública ................................................................................................................ 23
3.3 Princípios Da Ação Penal Privada................................................................................................................ 28
4. AÇÃO PENAL PÚBLICA ...................................................................................................................................... 32
4.1 Ação Penal Pública Incondicionada ............................................................................................................ 32
4.2 Ação Penal Pública Condicionada ............................................................................................................... 32
4.2.1 Ação Penal Pública Condicionada à Representação do Ofendido ........................................................ 33
4.2.2 Ação Penal Pública Condicionada à Requisição do Ministro da Justiça ............................................... 36
4.2.3 Ação Penal Pública Subsidiária da Pública ........................................................................................... 37
5. AÇÃO PENAL DE INICIATIVA PRIVADA .............................................................................................................. 37
5.1 Ação Penal Privada Personalíssima............................................................................................................. 38
5.2 Ação Penal Privada Exclusiva Ou Propriamente Dita .................................................................................. 39
5.3 Ação Penal Privada Subsidiária Da Pública Ou Acidentalmente Privada Ou Supletiva ............................... 39
6. OUTRAS CLASSIFICAÇÕES DA AÇÃO PENAL ...................................................................................................... 43
6.1 Ação Penal Adesiva ..................................................................................................................................... 43
6.2 Ação Penal Popular ..................................................................................................................................... 44
6.3 Ação Penal Secundária ............................................................................................................................... 44
6.4 Ação De Prevenção Penal ........................................................................................................................... 45
7. DENÚNCIA E QUEIXA CRIME ............................................................................................................................. 45
8. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (Lei 13.964/19) ................................................................................... 52
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8.1 Conceito ..................................................................................................................................................... 52
8.2 Requisitos, Condições e Vedações .............................................................................................................. 55
8.3 Procedimento Do Acordo De Não Persecução Penal .................................................................................. 60
9. AÇÃO CIVIL EX DELICTO .................................................................................................................................... 64
9.1 Execução Civil Ex Delicto (Art. 63, CPP) X Ação Civil Ex Delicto (Art. 64, CPP) ............................................. 65
9.2 Legitimados Ativos Para Propor A Ação Civil .............................................................................................. 66
9.3 Indenização Na Sentença Condenatória ..................................................................................................... 66
9.4 Efeitos Civis Da Sentença Absolutória ........................................................................................................ 67
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TODOS OS ARTIGOS RELACIONADOS AO TEMA
CF/88
⦁ Art. 129, I
⦁ Art. 5º, LIX
CPP
⦁ Art. 3º-B, IV
⦁ Art. 5º, §4º
⦁ Art. 24 a 68
⦁ Art. 384 e 385
⦁ Art. 395
Outros Diplomas Legais
⦁ Art. 76 e 88 a 91, Lei 9099/95
⦁ Art. 2º, § 1º, Lei n. 9.613/98
⦁ Art. 83, § 2º, Lei n. 9.430/96
ARTIGOS MAIS IMPORTANTES – NÃO DEIXE DE LER!
CPP:
⦁ Art. 3º-B, IV
⦁ Art. 24 e 25
⦁ Art. 28
⦁ Art. 28-A (importantíssimo!!!)
⦁ Art. 29
⦁ Art. 38, 41, 42, 46, 48, 49 e 51
⦁ Art. 60 (alto índice de cobrança em prova objetiva!)
⦁ Art. 65, 66 e 67 (alto índice de cobrança em prova objetiva!)
⦁ Art. 396
SÚMULAS RELACIONADAS AO TEMA
Súmula 542-STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a
mulher é pública incondicionada.
Súmula 714-STF: É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público,
condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público
em razão do exercício de suas funções.
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Súmula 234-STJ: A participação de membro do Ministério Público na fase investigatória criminal não
acarreta o seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.
Súmula 594-STF: Os direitos de queixa e de representação podem ser exercidos, independentemente, pelo
ofendido ou por seu representante legal.
Súmula 670-STJ: Nos crimes sexuais cometidos contra a vítima em situação de vulnerabilidade temporária,
em que ela recupera suas capacidades físicas e mentais e o pleno discernimento para decidir acerca da
persecução penal de seu ofensor, a ação penal é pública condicionada à representação se o fato houver sido
praticado na vigência da redação conferida ao art. 225 do Código Penal pela Lei n. 12.015, de 2009.
Súmula 667-STJ: Eventual aceitação de proposta de suspensão condicional do processo não prejudica a
análise do pedido de trancamento de ação penal.
O estudo dadeliberada pelo querelante. STJ. 5ª Turma. RHC 55142-MG, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em
12/5/2015 (Info 562).
OBS.1: Cabe ao MP fiscalizar o princípio da indivisibilidade na ação penal privada. Contudo, o MP NÃO
pode aditar a queixa para incluir coautores, pois NÃO tem legitimidade ativa. Deve, portanto, pedir a intimação
do querelante para que adite a queixa, sob a pena de a renúncia concedida a um dos coautores ser estendida
aos demais (quando a omissão for involuntária).
OBS.2: Há doutrina em sentido contrário, segundo a qual à luz do dever do MP de zelar pela
indivisibilidade da ação penal privada, caberia ao representante do órgão acusatório aditar a queixa-crime.
Distingue-se a questão na jurisprudência:
https://buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/23d2e1578544b172cca332ff74bddf5f?categoria=12&subcategoria=126
https://buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/23d2e1578544b172cca332ff74bddf5f?categoria=12&subcategoria=126
https://buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/23d2e1578544b172cca332ff74bddf5f?categoria=12&subcategoria=126
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Não configurada coautoria ou participação nos crimes contra honra, mas delitos
autônomos em contextos distintos, a ausência de oferecimento de queixa-crime
contra todos os que proferiram ofensas contra a vítima não afronta o princípio da
indivisibilidade da ação penal privada. STJ. Processo em segredo de justiça, Rel.
Ministro Messod Azulay Neto, Rel. para acórdão Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta
Turma, por maioria, julgado em 27/8/2024, DJe 3/9/2024. (Info 826)
4. AÇÃO PENAL PÚBLICA
A ação penal pública pode ser:
1) Ação penal pública incondicionada;
2) Ação penal pública condicionada à representação;
3) Ação penal pública subsidiária da pública.
4.1 Ação Penal Pública Incondicionada
É a regra, de modo que, no silêncio da lei, o crime será de ação penal pública incondicionada.
a) Titular: Ministério Público, cuja atribuição é privativa, conforme a CF (art. 129, I, CF).
b) Peça inicial: A denúncia é a peça privativa do Ministério Público que dá início à ação penal pública.
c) Prazos para oferecimento da denúncia:
REGRA DO CPP ● Réu preso: 05 dias.
● Réu solto: 15 dias.
CRIMES ELEITORAL 10 dias.
TRÁFICO DE DROGAS 10 dias.
CRIMES CONTRA A ECONOMIA
POPULAR
2 dias.
LEI DE FALÊNCIAS ● Réu preso: 05 dias.
● Réu solto: 15 dias.
4.2 Ação Penal Pública Condicionada
A ação penal pública condicionada é aquela que depende da manifestação de vontade do legítimo
interessado para que a persecução penal possa se iniciar.
A ação penal pública pode ser condicionada à:
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a) Representação do ofendido;
b) Requisição do Ministro da Justiça.
Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério
Público, mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou
de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.
4.2.1 Ação Penal Pública Condicionada à Representação do Ofendido
A representação do ofendido é o pedido e a autorização que condiciona o início da persecução penal.
Sem ela inexiste processo, IP e até mesmo lavratura de flagrante.
Art. 5ª, § 4o, CPP O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender de
representação, não poderá sem ela ser iniciado.
● Natureza jurídica: É uma condição de procedibilidade.
Lembrando que pode ser condição de prosseguibilidade (como vimos anteriormente), a exemplo da Lei
9.099/95 quando passou a exigir representação para as lesões corporais leves e culposas.
● Prazo decadencial: 6 meses, contados do conhecimento da autoria (art. 38, CPP)
OBS.: Na sucessão processual, o prazo não é renovado, mas contínuo, de modo que são possíveis duas
situações:
1) Se o sucessor toma conhecimento da autoria no mesmo momento que a vítima, tem direito ao prazo
restante;
2) Se o sucessor não tinha conhecimento da autoria, o prazo restante será contado no momento em que
atingir esse conhecimento.
O prazo é uno para os sucessores, de modo que basta que um deles tenha conhecimento da autoria,
para que tenha início o prazo decadencial para todos.
Pergunta-se: A decadência do direito do representante legal atinge a do menor? R.: Há divergência na
doutrina.
1ª Corrente (Renato Brasileiro): O prazo é único, razão pela qual a decadência para o representante legal
acarreta desde logo a extinção da punibilidade, ainda que o menor não tenha completado 18 anos.
2ª Corrente (Nucci e Mirabete): O direito não pode ser exercido pelo menor, de modo que, cuidando-se
de incapaz, NÃO se pode falar em decadência.
OBS.: O mesmo entendimento se aplica ao exercício do direito de queixa (ação penal privada).
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● Legitimidade para receber a representação:
a) Delegado;
b) MP;
c) Juiz.
● Legitimidade para oferecer a representação:
1) Vítima ou seu representante legal: A representação pode ser feita pessoalmente pelo ofendido
com 18 anos completos ou mais OU por procurador, desde que possua poderes especiais.
2) Diante de menor, mentalmente enfermo ou retardo mental, que NÃO tenha representante legal,
ou cujos interesses colidirem com os do representante, será nomeado curador especial (art. 33,
CPP).
3) Diante da morte ou da declaração judicial de ausência da vítima teremos como sucessores o
cônjuge/companheiros, ascendentes, descendentes e irmãos (CADI) (art. 24, §2º, CPP).
OBS.1: Trata-se de rol preferencial e taxativo.
OBS.2: Deve-se respeitar a ordem preferencial (CADI) quando houver morte, declaração judicial de
ausência ou incapacidade civil superveniente. Por outro lado, em caso de abandono ou desistência da ação, o
art. 36 preconiza que qualquer dessas pessoas do CADI poderá prosseguir com a ação, independentemente de
obedecer à ordem preferencial.
Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério
Público, mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou
de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.
§ 1o No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão
judicial, o direito de representação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou
irmão.
Art. 36. Se comparecer mais de uma pessoa com direito de queixa, terá preferência o
cônjuge, e, em seguida, o parente mais próximo na ordem de enumeração constante
do art. 31, podendo, entretanto, qualquer delas prosseguir na ação, caso o
querelante desista da instância ou a abandone.
O STJ (Info 654), ainda, estendeu o direito à representação ao companheiro:
A companheira, em união estável homoafetiva reconhecida, goza do mesmo status
de cônjuge para o processo penal, possuindo legitimidade para ajuizar a ação penal
privada. No caso, trata-se de crime de calúnia contra pessoa morta, o que aponta que
os querelantes – mãe, pai, irmã e companheira em união estável da vítima falecida –
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm#art31
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são partes legítimas para ajuizar a ação penal privada, nos termos do art. 24, § 1º, do
CPP. Cumpre anotar que a companheira, em união estável reconhecida, goza do
mesmo status de cônjuge para o processo penal, podendo figurar como legítima
representante da falecida. Vale ressaltar que a interpretação extensiva da norma
processual penal tem autorização expressa do art. 3º do CPP ("a lei processual penal
admitirá interpretação extensiva e aplicação analógica, bem como o suplemento dos
princípios gerais de direito"). Ademais, o STF, ao apreciar o tema 498 da repercussão
geral, reconheceua "inexistência de hierarquia ou diferença de qualidade jurídica
entre as duas formas de constituição de um novo e autonomizado núcleo doméstico,
aplicando-se à união estável entre pessoas do mesmo sexo as mesmas regras e
mesmas consequências da união estável heteroafetiva" (RE 646.721, Rel. Min. Marco
Aurélio, Rel. Acd. Min. Roberto Barroso, Tribunal Pleno, julgado em 10/05/2017, DJe
11/09/2017).
Apesar do entendimento do STJ, parte da doutrina, por outros Renato Brasileiro critica a extensão por
ferir a legalidade devido à utilização de analogia prejudicial ao réu.
ATENÇÃO: Pessoas jurídicas vítimas de infrações penais, podem oferecer representação por quem os
respectivos contratos ou estatutos designarem ou, no silêncio destes, pelos seus diretores ou sócios-gerentes.
● Forma da representação: De acordo com o STJ/STF, ela tem forma livre, podendo ser oral ou por escrito.
Ou seja: NÃO precisa ser através de peça formal.
● Prazo para a representação: 6 (seis) meses contados do conhecimento da autoria. NÃO interessa a data
do fato.
OBS.: O prazo para oferecimento da representação tem natureza decadencial, não se admite
suspensão, prorrogação ou interrupção.
● Retratação da Representação
Regra: a retratação da representação é possível até antes do oferecimento da denúncia.
Art. 25. A representação será irretratável, depois de oferecida a denúncia.
Exceção: Na Lei Maria da Penha, a retratação é possível até o recebimento da denúncia, em audiência
perante o juiz designada especialmente para esse fim.
Lei 11.340/06. Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da
ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o
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juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento
da denúncia e ouvido o Ministério Público.
ATENÇÃO: Há divergência doutrinária acerca da possibilidade de retratação da retratação. Para parte
da doutrina, a vítima poderá se arrepender da retratação e renovar a representação, desde que esteja dentro
do prazo decadencial.
Porém, mesmo para os que admitem a retratação da retratação, há DUAS EXCEÇÕES, dois
microssistemas que fatalmente a retratação da representação por lei extingue a punibilidade:
i. Juizado da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher;
ii. Juizado Especial Criminal.
● Eficácia objetiva da representação: A representação é feita para cada crime e abrange todos os
possíveis coautores e participes.
Por eficácia objetiva da representação, entende-se o seguinte: se oferecida a representação contra um
dos partícipes ou coautores do crime, o MP deve oferecer a denúncia contra todos aqueles que praticaram o
delito. Porém a representação só é válida para aquele delito.
Assim, se a vítima representou apenas pelo delito de injúria, NÃO é possível o MP amplie a
representação para abranger os crimes de calúnia e difamação, em face da eficácia objetiva da representação.
Não abrange outros crimes, envolvendo apenas todos os coautores.
4.2.2 Ação Penal Pública Condicionada à Requisição do Ministro da Justiça
É ato de conveniência política, autorizando a persecução penal em alguns crimes.
● Prazo: A lei é omissa. Logo, pode ocorrer a qualquer tempo, enquanto não for extinta a punibilidade.
Ao contrário da representação, que deve ser oferecida no prazo decadencial de 6 meses, contados do
conhecimento da autoria, a lei silenciou acerca de eventual prazo para o oferecimento da requisição. Entende-
se, portanto, que a requisição NÃO está sujeita ao prazo decadencial, podendo ser oferecida a qualquer
tempo, desde que não tenha havido a extinção da punibilidade pelo advento da prescrição.
● Destinatário: MP (PGJ).
☞ Há discricionariedade do Ministro da Justiça
☞ A requisição NÃO vincula o MP. Ou seja: o MP não está obrigado a oferecer denúncia.
● Hipóteses:
a) Crimes cometidos por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil;
b) Crimes contra a honra praticados contra o Presidente ou Chefe de Governo Estrangeiro.
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4.2.3 Ação Penal Pública Subsidiária da Pública
Para alguns doutrinadores, essa subespécie de ação penal pode ser vislumbrada quando ocorre a
atuação de um órgão do MP diante da inércia de outro órgão do MP.
Alguns exemplos dessa espécie “sui generis” de ação penal pública subsidiária da pública podem ser
apresentados:
a) Nos Crimes de Responsabilidade de Prefeitos, em caso de inércia do PGJ (lembrando que os Prefeitos
têm prerrogativa de função e são julgados pelos Tribunais de Justiça), a ação poderá este ser proposta
pelo PGR (art. 2º., § 2º, do Decreto-Lei 201/67)
b) Nos casos de deslocamento de competência como aqueles que ocorrem quando há “grave violação
dos direitos humanos” e inércia dos órgãos estaduais, podendo então o caso, mediante representação
do PGR perante o STJ, ser deslocado para a Justiça Federal, isso com o fim de “assegurar o cumprimento
de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte”
(art. 109, § 5º., CF). Também é mencionável a possibilidade de deslocamento de competência para o
Tribunal Penal Internacional (TPI), no caso de inércia dos órgãos internos brasileiros envolvendo crimes
contra a humanidade (artigo 5º., § 4º., CF).
5. AÇÃO PENAL DE INICIATIVA PRIVADA
Possível questão: O princípio da obrigatoriedade se aplica à ação penal privada?
Resposta correta: Não. O princípio da obrigatoriedade é exclusivo da ação penal pública,
impondo ao Ministério Público o dever de promover a denúncia sempre que presentes os requisitos
legais.
Ocorre quando o Estado legitima o ofendido ou seu representante legal a ingressar com ação penal,
pleiteando a condenação do agressor, em hipóteses excepcionais.
O particular, portanto, passa a ter o direito de ação, a legitimidade para o oferecimento da ação penal
privada, embora a titularidade da ação penal permaneça com o Estado. Trata-se, como já visto, de hipótese de
legitimação extraordinária.
● Titularidade: Ofendido ou representante legal.
A queixa pode ser proposta por procurador, desde que seja mediante procuração com poderes
especiais. Deve constar da procuração com poderes especiais o nome do querelante e a menção ao fato
criminoso. No entanto, os Tribunais Superiores divergem quanto ao significado de “menção ao fato criminoso”:
Para o STF: na procuração, deverá ser individualizado o evento delituoso, não bastando apenas a
menção do nomen iuris do crime.
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Para o STJ: basta mencionar o tipo penal ou nomen iuris, sendo desnecessário pormenorizar a
descrição da conduta.
Art. 44. A queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo
constar do instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do fato
criminoso, salvo quando tais esclarecimentos dependerem de diligências que devem
ser previamente requeridas no juízo criminal.
● Peça inicial: Queixa-crime.
° Vítima é chamada de querelante.
° Réu é chamado de querelado.
● Prazo para interpor a queixa crime: 6 meses, contados a partir do conhecimento da autoria.
Lembre-se que se trata de prazo decadencial!
Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal,
decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo
de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no
caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia.
● Espécies:
1) Ação penal privada personalíssima;
2) Ação penal privada propriamente dita ou exclusiva;
3) Ação penal privada subsidiária da pública.
5.1 Ação Penal Privada PersonalíssimaSomente o ofendido pode ingressar em juízo, ou seja, o direito NÃO é transmitido ao representante
legal e nem haverá sucessão processual.
Aqui, a morte da vítima extingue a punibilidade do autor do delito.
Na atual legislação brasileira, há apenas um exemplo de crime dessa espécie. Vejamos:
Art. 236, CP - Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou
ocultando-lhe impedimento que não seja casamento anterior
Pena - detenção, de seis meses a dois anos.
Parágrafo único - A ação penal depende de queixa do contraente enganado e não
pode ser intentada senão depois de transitar em julgado a sentença que, por motivo
de erro ou impedimento, anule o casamento.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm#art29
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5.2 Ação Penal Privada Exclusiva Ou Propriamente Dita
É aquela que pode ser proposta pelo ofendido ou seu representante legal. Na hipótese de ser proposta
pelo representante legal, há substituição processual.
Art. 31. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão
judicial, o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge,
ascendente, descendente ou irmão.
É a regra nos crimes contra a honra.
Art. 145, CP - Nos crimes previstos neste Capítulo (DOS CRIMES CONTRA HONRA)
somente se procede mediante queixa, salvo quando, no caso do art. 140, § 2º, da
violência resulta lesão corporal.
Atenção: A diferença entre a ação penal exclusivamente privada e a ação privada personalíssima é que, na
ação penal exclusivamente privada, admite-se a sucessão processual, ao passo que na ação penal privada
personalíssima, somente o próprio ofendido pode ajuizar queixa crime.
5.3 Ação Penal Privada Subsidiária Da Pública Ou Acidentalmente Privada Ou Supletiva
A banca frequentemente aborda os prazos de decadência para a representação nos crimes de ação
penal pública condicionada.
Possível questão: Qual é o prazo para a vítima oferecer representação nos crimes de ação
penal pública condicionada?
Resposta correta: Seis meses, contados do dia em que a vítima tomou conhecimento da autoria do crime,
conforme art. 38 do CPP.
● Conceito:
A ação penal privada subsidiária da pública também é chamada de ação penal acidentalmente
privada/supletiva e será admitida quando estiver caracterizada a inércia do MP.
Assim, em havendo inércia do órgão ministerial, a ação penal privada subsidiária da pública será
exercida pela vítima ou por seu representante na condição de substituição processual, já que ela atua em
nome próprio pleiteando a punição que será exercida pelo estado.
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● Fundamento legal e constitucional:
CF Art. 5º, LIX - será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for
intentada no prazo legal;
CPP - Art. 29. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for
intentada no prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e
oferecer denúncia substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer
elementos de prova, interpor recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do
querelante, retomar a ação como parte principal.
Trata-se de forma de controle da obrigatoriedade da ação penal pública, bem como da inafastabilidade da
jurisdição.
● Pressupostos:
Há dois requisitos:
i. Só é cabível em face da inércia do MP;
Ex.: Se o promotor recebe o inquérito e em 15 dias (acusado solto) não faz nada, a partir do 16º dia
cabe ação penal privada. Se pedir arquivamento ou diligência não se trata de inércia, logo, não cabe ação
subsidiária.
OBS: no HC n. 74.276, o STF, considerou procrastinatórias diligências solicitadas pelo MP.
Consequentemente, o Tribunal entendeu ser possível o ajuizamento de uma ação penal privada subsidiária da
pública.
Veja o julgado:
Ementa: Recurso extraordinário com agravo. Repercussão geral. Constitucional. Penal
e processual penal. 2. Habeas corpus. Intervenção de terceiros. Os querelantes têm
legitimidade e interesse para intervir em ação de habeas corpus buscando o
trancamento da ação penal privada e recorrer da decisão que concede a ordem. 3. A
promoção do arquivamento do inquérito, posterior à propositura da ação penal
privada, não afeta o andamento desta. 4. Os fatos, tal como admitidos na instância
recorrida, são suficientes para análise da questão constitucional. Provimento do
agravo de instrumento, para análise do recurso extraordinário. 5. Direito a mover
ação penal privada subsidiária da pública. Art. 5º, LIX, da Constituição Federal. Direito
da vítima e sua família à aplicação da lei penal, inclusive tomando as rédeas da ação
criminal, se o Ministério Público não agir em tempo. Relevância jurídica.
Repercussão geral reconhecida. 6. Inquérito policial relatado remetido ao Ministério
Público. Ausência de movimentação externa ao Parquet por prazo superior ao legal
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(art. 46 do Código de Processo Penal). Surgimento do direito potestativo a propor
ação penal privada. 7. Questão constitucional resolvida no sentido de que: (i) o
ajuizamento da ação penal privada pode ocorrer após o decurso do prazo legal, sem
que seja oferecida denúncia, ou promovido o arquivamento, ou requisitadas
diligências externas ao Ministério Público. Diligências internas à instituição são
irrelevantes; (ii) a conduta do Ministério Público posterior ao surgimento do direito
de queixa não prejudica sua propositura. Assim, o oferecimento de denúncia, a
promoção do arquivamento ou a requisição de diligências externas ao Ministério
Público, posterior ao decurso do prazo legal para a propositura da ação penal, não
afastam o direito de queixa. Nem mesmo a ciência da vítima ou da família quanto a
tais diligências afasta esse direito, por não representar concordância com a falta de
iniciativa da ação penal pública (STF, RG no REXT com Ag no RG ARE 859251 DF, Dje
21/05/2015).
ii. O crime deve possuir um ofendido individualizado.
Ex.: Em crimes de perigo (incolumidade pública posta em risco) não cabe essa ação subsidiária. Assim,
tráfico de drogas, quem ofereceria a ação? Não existe.
Exceção: Há 2 hipóteses em que, mesmo que a coletividade seja o sujeito passivo, será possível
interpor ação penal privada subsidiária da pública:
1) Crimes contra as relações de consumo (art. 80 e 82, CDC): nessa hipótese, os legitimados para
propor a queixa substitutiva serão as associações de defesa do consumidor e os Procon’s.
2) Crimes falimentares (art. 184, Lei 11.101/05): nessa hipótese, os legitimados para propor a queixa
substitutiva serão o administrador judicial ou qualquer credor habilitado.
Fique atento à jurisprudência sobre o tema:
Conselho indigenista não pode ajuizar queixa-crime subsidiária por delito contra
índios
Determinado indivíduo teria proferido discurso racista contra um grupo de índios que
teria invadido uma fazenda em certa região. O Ministério Público não ofereceu
denúncia nem instaurou qualquer procedimento. Em virtude disso, o Conselho dos
Povos Indígenas (organização não-governamental indígena) ajuizou uma queixa-crime
subsidiária (art. 5º, LIX, da CF/88) contra o indivíduo, imputando-lhe a prática dos
crimes de racismo (art. 20 da Lei 9.459/97) e incitação à violência e ódio contra os
povos indígenas (arts. 286 e 287 do CP). Essa queixa-crime deverá ser rejeitada,
porque os conselhos indigenistas não possuem legitimidade ativa em matéria penal.
Na ação penal privada (mesmo sendo a subsidiária da pública), a queixa-crime
somente pode ser promovida pelo ofendido ou por quem tenha qualidade para
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DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
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representá-lo (art. 100, § 2º do CP e art. 30 do CPP). A suposta vítima dos crimes
não foi o conselho indigenista, mas sim os próprios índios que participaram da
invasão. STF. 1ª Turma. Inq 3862 ED/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em
18/11/2014 (Info 768).
● Prazo: 6 meses, contados a partir da inércia do MP.
Pergunta-se: Esgotado o prazo opera-se a decadência e, consequentemente, a extinção da
punibilidade? R.: NÃO. Trata-se da denominada decadência imprópria, visto que embora não seja mais
possível a queixa subsidiária, uma vez transcorrido o prazo decadencial, permanece a possibilidade de o MP
oferecer denúncia, enquanto o crime não estiver prescrito.
● Poderes do Ministério Público:
Conforme lição de Fernando da Costa Tourinho Filho, o Ministério Público, em face da queixa
substitutiva, assume a posição de um litisconsorte, porém de natureza sui generis, na medida em que não há
cumulação de ações contra o mesmo réu. A doutrina fala que o MP atua como uma espécie de “assistente
litisconsorcial”
Pode-se, ainda, “falar em ‘interveniente adesivo obrigatório’, porquanto, oferecida a queixa, o
Ministério Público é obrigado a intervir em todos os termos do processo”. Nessa linha, é a lição de Nestor
Távora, para quem o Ministério Público, “na ação privada subsidiária, figura como interveniente adesivo
obrigatório, atuando em todos os termos do processo, sob pena de nulidade (art. 564, III, d, CPP), tendo
amplos poderes”.
Assim, o MP pode:
(1) Repudiar a queixa, oferecendo denúncia substitutiva
Esclarece o Nestor Távora que quando a vítima “ingressa com a ação penal privada subsidiária, a
petição inicial é a queixa-crime SUBSIDIÁRIA da denúncia que não foi apresentada. Por sua vez, quando o MP
repudia a queixa, por entender que não houve omissão, a denúncia é SUBSTITUTIVA” da queixa repudiada.
(2) Aditar a queixa, tanto em seus aspectos formais, como materiais
Prazo para o MP aditar a queixa: 3 dias.
Art. 46, § 2o O prazo para o aditamento da queixa será de 3 dias, contado da data em
que o órgão do Ministério Público receber os autos, e, se este não se pronunciar
dentro do tríduo, entender-se-á que não tem o que aditar, prosseguindo-se nos
demais termos do processo.
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
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OBS.: Na ação exclusivamente privada, NÃO pode o MP incluir coautor ou fato que o ofendido não
incluiu, sob pena de violação ao princípio da oportunidade. Contudo, em atenção ao princípio da
indivisibilidade, verificada omissão involuntária, o MP poderá oficiar o querelante para que promova o
aditamento.
(3) Intervir em todo os termos do processo
O MP pode, a qualquer momento:
● Fornecer elementos de prova;
● Interpor recurso;
● Opinar pela rejeição da queixa.
Art. 45. A queixa, ainda quando a ação penal for privativa do ofendido, poderá ser
aditada pelo Ministério Público, a quem caberá intervir em todos os termos
subsequentes do processo.
OBS.: o MP NÃO pode recorrer da decisão absolutória proferida em ação penal
privada!
(4) Se o querelante for negligente, o MP reassume o polo ativo da ação penal
É a chamada ação penal indireta.
6. OUTRAS CLASSIFICAÇÕES DA AÇÃO PENAL
6.1 Ação Penal Adesiva
Para o professor Nestor Távora, seria o litisconsórcio ativo entre o MP (no crime de ação penal
pública) e o querelante (nas hipóteses de ação penal privada).
Ex.: Estupro antes de 2009 (ação penal privada) conexo com tentativa de homicídio (ação penal pública
incondicionada), de modo que o MP oferece denúncia e vítima queixa e as ações correriam juntas pela
conexão.
Para o professor Luiz Flávio Gomes, só existe na Alemanha, onde é possível que MP ingresse com a
ação penal pública e, em seguida, a vítima ingresse de maneira adesiva, porém com objetivos indenizatórios.
Nesse contexto, há uma espécie de intervenção adesiva facultativa, relacionada à satisfação do dano
decorrente do crime.
Para Tourinho Filho/Denilson Feitoza, o instituto verificado na Alemanha, também é possível nos
crimes de ação penal privada, quando o MP promove a ação penal, mediante constatação de um interesse
público. Nesse caso, faculta-se ao ofendido ou seu representante legal intervir no processo como assistente.
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OBS: NÃO confundir com a atuação obrigatória adesiva do MP (“interveniente adesivo obrigatório”) na
ação penal privada subsidiária da pública.
6.2 Ação Penal Popular
A doutrina que defende a possibilidade cita dois exemplos:
1) Habeas Corpus
2) Faculdade de qualquer cidadão oferecer “denúncia” (notitia criminis) por crime de responsabilidade
praticado por agentes políticos (art. 14, Lei 1.079/50).
Críticas:
● Habeas corpus NÃO se trata de uma ação penal por excelência (ação penal propriamente dita),
mas sim de uma ação libertária, um meio de impugnação autônomo.
● A “denúncia” mencionada no art. 41, Lei 1.079/50, em verdade, compreende com incorreção
técnica do legislador, que confunde o termo “denúncia” com “notícia crime”. Além disso, os
ilícitos da Lei 1.079/50 não são crimes propriamente ditos, uma vez que sequer prevê sanções
penais em razão da prática das condutas ali previstas, mas sanções político-administrativas.
CONCLUSÃO: Em razão das críticas apresentadas, a doutrina majoritária entende NÃO existir no Brasil ação
penal popular (Noberto Avena). Contudo, há doutrina em sentido contrário (Tourinho Filho).
6.3 Ação Penal Secundária
Ocorre quando as circunstâncias do caso concreto modificam a modalidade de ação penal a ser
ajuizada.
Ex.1: Crimes contra o patrimônio, no contexto do art. 182 do CP (escusas absolutórias relativas),
quando cometidos sem violência ou grave ameaça podem depender de representação (ação penal pública
condicionada), sendo que a regra geral é a ação penal pública incondicionada.
Ex.2: Crimes contra a honra, em regra, são de ação penal privada, contudo, há algumas exceções.
Vejamos:
1. Injúria real mediante vias de fato
· Injúria real mediante lesão corporal GRAVE ou GRAVÍSSIMA: ação penal pública incondicionada.
· Injúria real mediante lesão corporal LEVE: ação penal pública condicionada à representação (art.
140, §2º, CP c/c 9.099/95).
· Injúria qualificada (art. 140, §3º, CP): ação penal pública condicionada à representação (art. 145,
§ único).
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2. Crime contra a honra do presidente da república: ação penal pública condicionada à requisição do
Ministro da Justiça.
3. Crime contra a honra de servidor público em razão de suas funções: duas possibilidades → ação
penal pública condicionada à representação OU ação penal privada, sendo hipótese de legitimidade
concorrente ALTERNATIVA (oferece denúncia ou queixa-crime).
Súmula 714, STF - É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do
Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por
crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções.
No entendimento de Renato Brasileiro, a palavra "concorrente" foi uma imprecisão técnica. Na
verdade, o termo correto seria legitimidade "alternativa", uma vez que ao ser oferecida representação pelo
ofendido, autorizando o MP a agir, não seria mais possível o oferecimento da queixa-crime. Portanto, cabe ao
ofendido escolher a via eleita, ou representação ou queixa-crime.
6.4 Ação De Prevenção Penal
Ação a ser proposta contra o inimputável do art. 26, caput, pois é uma denúncia que NÃO visa a
condenação, mas a aplicação de medida de segurança, através da chamada absolvição imprópria.
Art. 26, CP- É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento
mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse
entendimento.
7. DENÚNCIA E QUEIXA CRIME
● Denúncia: É a peça privativa do Ministério Público que dá início à ação penal pública.
● Queixa-crime: É a peça privativa do ofendido, de seu representante legal, seu sucessor ou ainda seu
curador que dá início à ação penal privada.
OBS.: É possível o litisconsórcio ativo entre o MP e o querelante, na hipótese de conexão entre crime
de ação penal pública e outro de ação penal privada. Nesse contexto, uma única ação penal contará com uma
denúncia e uma queixa.
As duas peças de início da ação penal serão analisadas em conjunto com as necessárias distinções
quando necessário.
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a) Requisitos formais da denúncia ou queixa crime:
Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as
suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se
possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das
testemunhas.
OBS.: Em regra, devem ser feitas por escrito, salvo na hipótese de infração de menor potencial
ofensivo que, nos termos da Lei 9.099/95, admite o oferecimento de denúncia ou queixa oral, desde que
posteriormente seja reduzida a termo.
I. Exposição do fato criminoso e suas circunstâncias
Consiste na narrativa do fato delituoso, com todas as suas circunstâncias, de maneira clara, precisa,
simples e objetiva, sob a pena de inviabilizar o direito de defesa, pois, no processo penal, o acusado se defende
dos fatos que lhe são imputados.
Salienta-se que a narrativa deve responder questionamentos básicos: Como? Quando? Quem? O que?
Por quê? Contra quem?
Segundo Renato Brasileiro, imputação “é a atribuição a alguém da prática de determinada infração
penal, funcionando como o ato processual por meio do qual se formula a pretensão penal”.
Cuidado! Quando se tratar de crime culposo, é imprescindível que o titular da ação penal (MP ou
querelante) descreva em que consistiu a imprudência, negligência ou imperícia.
A inobservância deste requisito acarreta a inépcia da peça acusatória, pois viola o princípio da ampla
defesa (inépcia formal), razão pela qual a peça deve ser rejeitada pelo juiz.
CPP Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:
I - for manifestamente inepta;
Para o reconhecimento ou não da inépcia da inicial, a doutrina diferencia elementos necessários e
secundários. Vejamos:
● Elementos NECESSÁRIOS (essenciais): São aqueles necessários para identificar o fato típico. A ausência
destes elementos causa evidente prejuízo à defesa e, portanto, nulidade absoluta. Não se pode
imaginar uma denúncia sem esses elementos essenciais, uma denúncia que não os têm, não narra um
fato criminoso.
● Elementos SECUNDÁRIOS (acidentais): São aqueles ligados às circunstâncias de tempo ou de espaço
cuja ausência nem sempre prejudica a ampla defesa, portanto, eventual vício pode produzir, no
máximo, uma nulidade relativa, devendo ser comprovado o prejuízo.
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● CRIPTOIMPUTAÇÃO
Termo doutrinário que se refere a imputação contaminada por grave deficiência na narrativa do fato
delituoso. Ou seja, é uma espécie de denúncia criptografada, em códigos. Em outras palavras, quando NÃO
contém os elementos mínimos de sua identificação como crime, sendo “gravemente inepta”.
(...) Expressão de Scarance, trata-se de uma imputação confusa, incompreensível,
que dificulta o exercício da defesa. O neologismo criptoimputação deriva de
criptografia, técnica de comunicação confidencial, com linguagem inacessível, que
bem representa a qualificação de inépcia que recebe a petição inicial. (TÁVORA,
Nestor e Rosmar Rodrigues. Direito processual penal, p. 285).
Para complementar jurisprudência pertinente ao tema;
4. O Código de Processo Penal, no artigo 41, prescreve que a denúncia deverá conter
a exposição do fato criminoso, com todas as circunstâncias, a qualificação do acusado
ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime
(indicação de rol de testemunhas, se houver), exigências que encontram fundamento
na necessidade de o representante do Ministério Público precisar os limites da
imputação, possibilitando ao acusado, prima facie, o conhecimento da alegação de
infringência à norma incriminadora e o exercício da ampla defesa.
5. O artigo 41 do Código de Processo Penal é de necessária observância, posto que a
inépcia da denúncia baseada em descrição do fato delituoso, viola as garantias
constitucionais do devido processo legal e do contraditório, integrantes do núcleo
essencial do due process of Law. (STF, HC 110015, Rei. Min. Luiz Fux, Primeira Turma,
julgado em 19/03/2013, DJe 11/04/2013)
Por conseguinte, com o escopo de evitar a criptoimputação, o Ministério Público deve fazer constar da
denúncia, de forma precisa e minuciosa, a descrição dos elementos estruturais que integram o tipo penal,
prestigiando o princípio da presunção de inocência e o exercício da ampla defesa.
● DENÚNCIA GENÉRICA
É a denúncia que não individualiza a conduta do agente, imputa fato a agente sem descrever a conduta
ou diversos fatos a agentes indistintamente.
A discussão ganha relevo quando se trata de crimes societários (crimes de gabinete), nos quais uma PJ
é utilizada como “manto protetivo”. A denúncia genérica, aqui, é aquela que inclui o diretor, o gerente, o
preposto da pessoa jurídica na ação apenas por ele ostentar essa qualidade, sem, contudo, descrever qual foi a
conduta criminosa dessa pessoa. Não estabelece o mínimo de vínculo entre o comportamento dessa pessoa e
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o crime. Por isso, a denúncia genérica é inepta, devendo ser rejeitada por impedir o exercício do contraditório
e da ampla defesa.
Nesse sentido, vejamos a jurisprudência:
Inexistindo a demonstração do mínimo vínculo entre o acusado e o delito a ele
imputado, impossibilitado está o exercício do contraditório e da ampla defesa. STJ. 6ª
Turma. RHC 154162-DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 22/03/2022 (Info
730).
A doutrina diferencia a acusação GERAL e acusação GENÉRICA (Pacelli):
⋅ Acusação GERAL: Ocorre quando o órgão da acusação imputa a todos os acusados, o mesmo fato
delituoso, independentemente das funções exercidas por eles na empresa. Como se trata de UM SÓ
FATO, não há inépcia, não viola o princípio da ampla defesa, o indivíduo como integrante da sociedade
sabe de qual fato típico tem de se defender.
⋅ Acusação GENÉRICA: ocorre quando a acusação imputa vários fatos típicos, imputando-os
genericamente a todos os integrantes da sociedade. Como envolve VÁRIOS fatos típicos, há inépcia.
“De qual deles irei me defender?” Verifica-se uma clara violação da ampla defesa, gerando nulidade
absoluta.
Pergunta-se: AGRAVANTES devem constar da denúncia?
R.: Para a jurisprudência, agravantes NÃO precisam constar da peça acusatória, uma vez que podem ser
reconhecidas de ofício pelo juiz, mesmo que não tenham constado na denúncia (art. 385 CPP). Entretanto, para
parte da doutrina, isso viola a ampla defesa e o contraditório.
Art. 385. Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória,
ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer
agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.
Norberto Avena afirma que ao contrário do que ocorre com as qualificadoras, a inclusão de agravantes
na denúncia é uma faculdade do MP. Esta conclusão, inclusive depreende-se dos próprios termos do art. 385
doCPP, quando reza que o juiz pode reconhecer agravantes na sentença, “embora nenhuma tenha sido
alegada”.
Pergunta-se: MAJORANTES devem constar da denúncia?
R.: Tratando-se de majorantes previstas na PARTE ESPECIAL do Código Penal exigem a explicitação na
denúncia ou queixa, para o fim de serem reconhecidas.
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Todavia, se forem as majorantes da PARTE GERAL do Código Penal, não é imprescindível que tenham
sido expressamente mencionadas na peça acusatória. Ex.: concurso formal próprio e crime continuado,
podendo ser reconhecidos pelo juiz na sentença caso exsurjam do contexto imputado ao réu.
II. Qualificação do acusado e demais esclarecimentos de identificação
Caso não se tenha a qualificação do acusado e não seja possível a identificação criminal, a denúncia ou
queixa deve indicar esclarecimentos pelos quais se possa identificar o acusado (art. 259, CPP).
III. Classificação da infração:
É o enquadramento típico. NÃO é requisito obrigatório. No processo penal, o acusado não se defende
da classificação e sim dos fatos que lhe são imputados. Isto porque o juiz, na hora da sentença, pode realizar a
mutatio libelli ou emendatio libelli. Veja:
● Emendatio libelli: NÃO há alteração em relação ao fato delituoso, limitando-se o juiz a modificar a
CLASSIFICAÇÃO formulada na peça acusatória, ainda que tenha que aplicar pena mais grave. Ex.: MP
oferece denúncia descrevendo um furto, mas classifica de maneira errada, como estelionato, razão
pela qual na hora da sentença, o juiz a corrige.
● Mutatio libelli: Ocorre quando o FATO que se comprovou pela instrução é diverso daquele narrado na
peça acusatória. Isso porque, decorre do surgimento, no curso da instrução, de prova de ELEMENTAR
ou CIRCUNSTÂNCIA não contida na peça acusatória. O MP deve aditar a denúncia e, em seguida, abre-
se prazo para a defesa se manifestar.
Art. 384. Encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica
do fato, em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância
da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a
denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido
instaurado o processo em crime de ação pública, reduzindo-se a termo o aditamento,
quando feito oralmente.
Segundo entendimento dos Tribunais Superiores, o momento adequado para a emendatio libelli é a
sentença. Contudo, admite-se a correção da capitulação já no recebimento da inicial quando ocorrer em
benefício do réu, permitindo a incidência de instituto despenalizador; quando acarretar a modificação do juízo
competente; quando necessária para determinação do procedimento aplicável; quando repercutir em matérias
de ordem pública, como a prescrição.
IV. Rol de testemunhas e demais diligências
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● O número de testemunhas é por fato delituoso imputado.
● O rol de informantes e vítimas NÃO entra nessa contagem.
(...) O limite máximo de 8 (oito) testemunhas descrito no art. 401, do Código de
Processo Penal, deve ser interpretado em consonância com a norma constitucional
que garante a ampla defesa no processo penal (art. 5º, LV, da CF/88). Para cada fato
delituoso imputado ao acusado, não só a defesa, mas também a acusação, poderá
arrolar até 8 (oito) testemunhas, levando-se em conta o princípio da razoabilidade e
proporcionalidade. (STJ, 5ª Turma, HC 55.702/ES, Rel. Min. Honildo Amaral de Mello
Castro, j. 05/10/2010).
NÃO é obrigatória a apresentação de rol de testemunhas. A consequência do não oferecimento de rol
de testemunhas é a preclusão.
O STJ possui julgado (NÃO é entendimento pacífico) permitindo a intimação do MP para a emenda da
inicial e inclusão do rol de testemunhas, desde que ocorra antes da formação da relação processual, ou seja,
antes da citação do réu (Info 577).
PROCEDIMENTO ORDINÁRIO 8 testemunhas
PROCEDIMENTO SUMÁRIO 5 testemunhas
PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO 3 testemunhas
1ª FASE DO JÚRI 8 testemunhas
2ª FASE DO JÚRI 5 testemunhas
LEI DE DROGAS 5 testemunhas
V. Nome e assinatura da parte acusadora
Sob pena de que a peça seja tida como inexistente.
b) Requisitos da Queixa-Crime
O art. 44, CPP prevê como requisito específico da queixa procuração com poderes especiais.
Art. 44. A queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo
constar do instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do fato
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criminoso, salvo quando tais esclarecimentos dependerem de diligências que devem
ser previamente requeridas no juízo criminal.
O vício na procuração pode ser sanado, sendo que há duas correntes sobre o momento em que pode
ocorrer.
1ª Corrente: prazo decadencial, ou seja, 6 meses do conhecimento da autoria.
2ª Corrente (majoritária): antes da sentença, em observância ao art. 569, CPP, mesmo que escoado o
prazo decadencial.
c) Não preenchimento dos requisitos formais
Se não preenchidos os requisitos formais da denúncia ou da queixa e isso implicar prejuízo à ampla
defesa (vício insanável), deverá ocorrer a rejeição da inicial acusatória (art. 395, I, CPP), bem como se faltar
alguma condição da ação ou pressuposto processual ou se faltar justa causa à ação penal.
Contra a decisão de rejeição da denúncia ou queixa cabe recurso em sentido estrito (prazo de 05 dias).
d) Prazos para oferecer a denúncia
Trata-se de prazo impróprio, ou seja, caso não seja observado, não enseja a perda do direito de
oferecer a denúncia!
REGRA DO CPP ● Réu preso: 05 dias;
● Réu solto: 15 dias.
CRIMES ELEITORAL 10 dias
TRÁFICO DE DROGAS 10 dias
CRIMES CONTRA A ECONOMIA POPULAR 2 dias
LEI DE FALÊNCIAS ● Réu preso: 05 dias;
● Réu solto: 15 dias.
Se queixa crime: Prazo de 6 (seis) meses, contados a partir do conhecimento da autoria (art. 38, CPP).
e) Imputação cumulativa e alternativa
A denúncia pode ter cumulação de imputações. Pode tanto trazer mais de um fato, hipótese em que
temos cumulação objetiva, quanto mais de um sujeito, situação que incorre em cumulação subjetiva.
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NÃO é possível, contudo, a imputação alternativa, ou seja, diante da ausência de elementos suficientes
de prova da materialidade, trazer mais de um fato (como na imputação cumulativa), deixando explícito que
apenas um deles ocorreu.
f) Aditamento da denúncia
Ocorre quando, no curso da instrução, são descobertos novos fatos, pessoas ou elementos de prova,
de modo que o MP deverá complementar a peça acusatória, diante das novas informações.
O aditamento se justifica no princípio da correlação entre denúncia e sentença, pois, se o juiz só pode
condenar quem foi denunciado e em relação aos fatos que foram narrados na denúncia, caso surjam novos
elementos no curso da ação, o aditamento será necessário.
Poderá ser feito até o momento imediatamente anterior à sentença.
A doutrina classifica em:
● Aditamento próprio: Acréscimo de fatos (REAL) ou sujeitos (PESSOAL).
● Aditamento impróprio: Correção de alguma falha na denúncia (ex.: data de nascimento do réu, hora e
data do fato).
● Aditamento espontâneo: O próprio MP constata a necessidade do aditamento.
● Aditamento provocado: O juiz provoca a atuação do MP, zelando pelo princípio da obrigatoriedade da
ação penal.
Pergunta-se: O aditamento interrompe a prescrição (uma vez que o recebimento da denúncia ou
queixa é causa interruptiva)?
R.: DEPENDE. O aditamento impróprio, bem como o aditamento próprio pessoal NÃO interrompem a
prescrição, contudo, o aditamento próprio real interrompe a prescrição quanto ao novo fato.
Pergunta-se: É possível o aditamento da queixa?
R.: O aditamentoimpróprio é possível. Há divergência acerca do aditamento próprio. Parte da doutrina
sustenta a inviabilidade, pois a não imputação implica na renúncia ao direito de queixa. Lado outro há quem
sustente posterior aditamento, quando no momento do oferecimento da queixa, não se tinha ciência de certo
fato e/ou pessoa.
8. ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (Lei 13.964/19)
8.1 Conceito
Inicialmente, vale destacar uma crítica à nomenclatura, visto que o mais adequado seria acordo de não
deflagração da ação penal, pois, em verdade, já temos inquérito instaurado, ou seja, já há persecução penal em
andamento.
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
53
Trata-se de instituto de natureza mista (penal e processual) que possibilita uma solução negociada no
processo penal ao acusado que confessar a prática do crime e que, a partir disso, sofrerá as sanções propostas
pelo Ministério Público (instrumento de justiça negociada). Ao final, caso cumprido o acordo, há a extinção da
punibilidade.
Segundo Renato Brasileiro:
“O acordo de não persecução penal é um negócio jurídico de natureza extrajudicial,
necessariamente homologado pelo juiz competente, celebrado pelo MP e o autor do
delito, necessariamente assistido por um defensor, que confessa formal e
circunstanciadamente a prática de um delito, sujeitando-se ao cumprimento de certas
condições não privativas de liberdade, em troca do compromisso do Parquet de não
oferecer denúncia, declarando-se ao final a extinção da punibilidade, se o acordo for
cumprido”.
A Natureza Mista do Acordo de Não Persecução Penal
Em 10.11.2020, a 1T do STF (AR no HC 191.464/SC), reconheceu a natureza mista (penal e processual) do
acordo de não persecução penal, tendo em vista que o seu cumprimento acarreta a extinção da punibilidade e,
por isso, admitindo sua aplicação retroativa. Nesse sentido, fixou a seguinte tese: “o acordo de não persecução
penal aplica-se a fatos ocorridos ANTES da Lei 13.964/2019, desde que NÃO RECEBIDA A DENÚNCIA”.
A Corte estabeleceu o marco temporal do recebimento da denúncia pois o acordo de não persecução penal é
um negócio jurídico PRÉ-PROCESSUAL que busca evitar a deflagração da ação penal. Nesse sentido, caso a
denúncia já tenha sido admitida judicialmente, o instituto perde sua razão de ser.
Ressalta-se que a tese fixada pelo STF modifica a decisão proferida anteriormente pelo STJ (HC 575.395/RN).
Segundo a doutrina2, o instituto materializa a adoção, pelo sistema brasileiro, do chamado “plea
bargaining” Norte-Americano:
“No plea bargaining norte-americano, o imputado manifesta perante o Ministério
Público sua decisão de declarar-se culpado, aceitando as imputações acordadas,
assim como a pena pactuada, ao mesmo tempo em que renuncia a certas garantias
processuais. Como explica Luiz Flávio Gomes, "uma vez que se dá conhecimento da
acusação - qualquer que seja o crime - para o imputado, pede-se o pleading, isto é,
para se pronunciar sobre a culpabilidade; se se declara culpado (pleads guilty) - se
2 (Lima, 2017, p. 260)
DIREITO PROCESSUAL PENAL
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54
confessa - opera-se o plea, é dizer, a resposta da defesa e então pode o juiz, uma vez
comprovada a voluntariedade da declaração, fixar a data da sentença (sentencing),
ocasião em que se aplicará a pena (geralmente 'reduzida' - ou porque menos grave ou
porque abrangerá menos crimes -, em razão do acordo entre as partes), sem
necessidade de processo ou veredito (trial ou veredict); em caso contrário, abre-se ou
continua o processo e entra em ação o jurado".
A importação do instituto norte-americano não é imune às críticas. Segundo Jacinto Nelson de Miranda
Coutinho3, a importação de institutos de outros sistemas é prejudicial diante da realidade brasileira:
“Na prática, o plea bargainig visa lutar contra o acúmulo de trabalho (e isso, pelo
menos, desde o Século XIX, nos E.U.A.), mas sem deixar de lado os direitos e garantias
individuais, dos quais eles não abririam mão, ainda que muita gente reclame e afirme
que é justo isso que estão fazendo.
Eis, então, que, fundados em um modelo de pensamento (Francis Bacon como
principal corifeu) utilitarista (Jeremy Bentham e John Stuart Mill), empiricamente não
se incomodam, em tantas passagens, de operar com uma ética na qual os fins
justifiquem os meios, desde que se almeje o bem-estar de todos.
De certa forma, isso justifica, para eles, a negociação de um acordo sobre o crime e a
pena; o próprio acordo ainda na esfera material ou mesmo naquela processual em
face dos lugares ocupados pelos atores; e o lugar do juiz como aquele de – quase que
– tão só controlar o que se fez, para não permitir que se vilipendiem direitos e
garantias individuais.
[...]
Tudo leva a crer, enfim, que um plea bargaining metido em um processo do sistema
inquisitório como o brasileiro seja um desastre, retirando ainda mais o pouco de
democracia processual que restou depois da americanização à brasileira promovida
nos últimos anos, tudo sem o devido controle por quem de direito, seja lá por qual
motivo for.
Ter plea bargaining é inevitável se o processo penal brasileiro vier a ser acusatório.
Mas para isso é preciso, antes, importar o sistema todo, com ônus e bônus. Do jeito
que se está tentando impor, os ônus ficarão para os cidadãos investigados/acusados;
e os bônus – tudo indica – ficarão para o Estado e seus órgãos. Em tempos
neoliberais, tudo é contra o cidadão, quem sabe em nome daquela ética utilitarista
precitada, embora se saiba que ela é só discurso fácil para iludir os incautos. Os de
sempre serão os beneficiados, como sempre foi. É como se existissem cidadãos e...
3 (Coutinho, 2019)
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
55
cidadãos. O problema em uma sociedade assim é que tudo se faz em nome do bem
comum e da democracia, nem que seja contra a Constituição. Um dia – ahimé, como
dizem os italianos – a vida revida.”
Aplicação Retroativa do ANPP
O instituto passou a constar com previsão expressa no CPP a partir da Lei 13.964/19 e a sua
aplicação retroativa a processos já em curso com o advento da legislação, foi estabelecida pela STF, em
julgamento concluído em setembro de 2024, nos seguintes termos:
1. Compete ao membro do Ministério Público oficiante, motivadamente e no exercício do seu poder-
dever, avaliar o preenchimento dos requisitos para negociação e celebração do ANPP, sem prejuízo do
regular exercício dos controles jurisdicional e interno;
2. É cabível a celebração de Acordo de Não Persecução Penal em casos de processos em
andamento quando da entrada em vigência da Lei nº 13.964, de 2019, mesmo se ausente confissão do réu
até aquele momento, desde que o pedido tenha sido feito antes do trânsito em julgado;
3. Nos processos penais em andamento na data da proclamação do resultado deste julgamento, nos
quais, em tese, seja cabível a negociação de ANPP, se este ainda não foi oferecido ou não houve motivação
para o seu não oferecimento, o Ministério Público, agindo de ofício, a pedido da defesa ou mediante
provocação do magistrado da causa, deverá, na primeira oportunidade em que falar nos autos, após a
publicação da ata deste julgamento, manifestar-se motivadamente acerca do cabimento ou não do acordo;
4. Nas investigações ou ações penais iniciadas a partir da proclamação do resultado deste
julgamento, a proposição de ANPP pelo Ministério Público, ou a motivação para o seu não oferecimento,
devem ser apresentadas antes do recebimento da denúncia, ressalvada a possibilidade de propositura,
pelo órgão ministerial, no curso da ação penal, se for o caso.
STF. HC 185.913/DF, relator Ministro Gilmar Mendes, julgamento finalizado em 18.09.2024. (Info 1051)
8.2 Requisitos, Condições e Vedações
A banca cobra os requisitos e implicações doacordo de não persecução penal, introduzido pelo
Pacote Anticrime.
Possível questão: Quais são os requisitos para a celebração do ANPP?
Resposta correta: O investigado deve confessar formalmente a prática do crime e este deve ter
pena mínima inferior a 4 anos, sem violência ou grave ameaça, conforme art. 28-A do CPP.
https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5917032
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
56
Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal
e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e
com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor
acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e
prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e
alternativamente:
I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;
II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público
como instrumentos, produto ou proveito do crime;
III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período
correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em
local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº
2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);
IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei
nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de
interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente,
como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente
lesados pelo delito; ou
V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público,
desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.
§ 1º Para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o caput deste
artigo, serão consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso
concreto.
§ 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes hipóteses:
I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos
termos da lei;
II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem
conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as
infrações penais pretéritas;
III - ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da
infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão
condicional do processo; e
IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados
contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor.
Conforme a previsão legal, poderá o Ministério Público propor ao investigado o acordo de não
persecução penal obedecidos os seguintes REQUISITOS:
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
57
a) Confissão formal e circunstancial do investigado;
b) Infração penal sem violência ou grave ameaça;
c) Infração penal com a pena mínima inferior a 4 anos;
d) Acordo necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime.
Pergunta-se: O acordo de persecução penal é um direito subjetivo do investigado OU uma faculdade
para o Ministério Público?
1ª Corrente: Direito subjetivo do investigado, pois a expressão “poderá” deve ser interpretada como
um “poder-dever”, de modo que, preenchidos os requisitos objetivos estabelecidos em lei, o investigado passa
a ter o direito subjetivo ao acordo. Da mesma forma, o art. 76 da Lei 9099/95 prevê que o Ministério Público
“poderá” propor a transação penal, e o dispositivo é interpretado pela doutrina como direito subjetivo do
acusado, sendo assim, onde há a mesma razão, deverá ser aplicado o mesmo direito (ubi eadem ratio ibi idem
jus).
2ª Corrente: Faculdade do Ministério Público, com base em interpretação literal do art. 28-A, uma vez
que, ainda que preenchidos os requisitos legais, o promotor pode, fundamentadamente, deixar de oferecer o
acordo.
Esse é o entendimento que vem sendo adotado pelo STJ (RHC 161.251, 2021) e STF (HC 191124 AgR,
2022).
Segundo o STJ "O acordo de não persecução penal - ANPP não constitui direito
subjetivo do investigado, assim pode ser proposto pelo Ministério Público conforme
as peculiaridades do caso concreto, quando considerado necessário e suficiente para
reprovar e prevenir infrações penais." (Agravo Regimental no Recurso Especial nº
1.948.350/RS, STJ, 5ª Turma, unânime, rel. min. Jesuíno Rissato, julgado em
9/11/2021, publicado no Dj em 17/11/2021)
Conforme a doutrina, Renato Brasileiro de Lima:
Se não se trata de direito subjetivo do acusado, o ideal, então, é concluir que estamos
diante de uma discricionariedade ou oportunidade regrada, porquanto somente é
lícito ao Ministério Público celebrar a avença se acaso preenchidos todos os requisitos
listados pelo art. 28-A, caput e parágrafos do CPP, com redação dada pela Lei n.
13.964/19. Não existe, pois, absoluta liberdade discricionária, posto que tais
requisitos deverão ser necessariamente observados, sob pena inclusive de recusa
judicial à homologação do acordo (CPP, art. 28-A, §7º). Sobre o assunto, eis o teor do
Enunciado n. 19 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos Ministérios
Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de Coordenadores de
Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM): “O acordo de não persecução penal é faculdade
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
58
do Ministério Público, que avaliará, inclusive em última análise (§14), se o
instrumento é necessário e suficiente para a reprovação e prevenção do crime no
caso concreto”.
Importante destacar, que segundo o §1º, para fins de aferição da pena mínima, serão consideradas as
causas de aumento e diminuição de pena.
Cumpridos os requisitos, o acordo será oferecido mediante as seguintes CONDIÇÕES (requisitos
positivos), que poderão ser ajustadas cumulativamente ou alternativamente:
a) Reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;
b) Renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos,
produto ou proveito do crime;
c) Prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima
cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução,
na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);
d) Pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo
juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou
semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou
e) Cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que
proporcional e compatível com a infração penal imputada.
Destaca-se entendimento da jurisprudência sobre o tema:
Enquanto sanção premial atípica, a imediata privação da liberdade, nos termos do
acordo de colaboração premiada, condicionada à homologação judicial, não ofende
a Constituição ou a lei de regência. STJ. Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro
Raul Araújo, Corte Especial, por maioria, julgado em 23/11/2023. (Info 798)
Por fim, há VEDAÇÃO (requisitos negativos) à celebração do acordo:
a) Se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei;
(Cuidado! Não confundir com suspensão condicional do processo)
b) Se o investigado for reincidente (genérico ou não) ou se houver elementos probatórios que
indiquem conduta criminal habitual,reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações
penais pretéritas;
c) Ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo
de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; (Cuidado! Não
confundir com suspensão condicional da pena) e
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
59
d) Nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher
por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor. (Cuidado! Na violência doméstica
ou familiar contra homens também se aplica essa vedação).
Ainda, destaca-se a vedação conferida pela jurisprudência:
Não cabe acordo de não persecução penal nos crimes raciais, o que inclui as
condutas resultantes de atos homofóbicos. STJ. AREsp 2.607.962-GO, Rel. Ministro
Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 13/8/2024.
(Info 821)
Vale destacar que o STJ decidiu que, ainda que o advogado seja investigado, é inadmissível o acordo de
colaboração premiada firmado com violação do sigilo profissional.
No caso, o colaborador foi investigado, preso e denunciado, antes de fazer a escolha
pelo acordo com o Parquet estadual. Mesmo assim, a obrigação de sigilo se impõe.
Esse é ônus do advogado que não pode ser superado mesmo quando investigado sob
pena de se colocar em fragilidade o amplo direito de defesa.
Quebrar o sigilo profissional para atenuar pena em ação penal em que figura, com o
cliente, como investigado, não está autorizado pelo Código de Ética da Advocacia. O
art. 25 é claro que o sigilo só pode ser rompido salvo grave ameaça ao direito à vida, à
honra, ou quando o advogado se veja afrontado pelo próprio cliente e, em defesa
própria, tenha que revelar segredo, porém sempre restrito ao interesse da causa.
Destaque-se que o sigilo profissional do advogado "é premissa fundamental para
exercício efetivo do direito de defesa e para a relação de confiança entre defensor
técnico e cliente" (STF, Rcl 37.235/RO, Ministro Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe
27/5/2020). A partir do momento que entendermos possível que o sigilo entre
advogado e cliente possa ser quebrado no momento em que o advogado passa a ser
investigado, essa premissa deixa de existir e a defesa passa a correr risco em razão de
uma ruptura, ou melhor dizendo, de um receio de ruptura na relação de confiança
entre defensor técnico e cliente, fragilizando o seu direito à ampla defesa.
Por fim, registre-se que, em alteração legislativa posterior aos fatos em análise (Lei n.
14.365/2022), no §6º-I do art. 6º do Estatuto da Advocacia passou a constar proibição
expressa da delação por parte do advogado contra seu cliente. STJ. RHC 179.805-PR,
Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, por maioria, julgado em 21/5/2024.
(Info 813)
Lado outro, a jurisprudência reconhece a possibilidade de celebração do acordo:
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
60
A continuidade delitiva não impede a celebração de acordo de não persecução
penal.
A inclusão da continuidade delitiva como óbice à celebração do acordo de não
persecução penal constitui uma interpretação que extrapola os limites impostos pela
norma, inserindo um requisito que o legislador, de forma deliberada, optou por não
contemplar. Não se pode olvidar que a norma processual penal tem seus parâmetros
definidos de maneira a equilibrar o poder punitivo do Estado com as garantias
constitucionais do acusado, sendo inadmissível a criação de obstáculos não previstos
expressamente em lei, sob pena de violação ao princípio da estrita legalidade. STJ.
AREsp 2.406.856-SP, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade,
julgado em 8/10/2024. (Info 829)
Sobre o tema, confira a dica do Prof. Matheus de Palma:
https://youtu.be/e2SmEkSybnA
8.3 Procedimento Do Acordo De Não Persecução Penal
Art. 28-A.
(...)
§ 3º O acordo de não persecução penal será formalizado por escrito e será firmado
pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e por seu defensor.
§ 4º Para a homologação do acordo de não persecução penal, será realizada
audiência na qual o juiz deverá verificar a sua voluntariedade, por meio da oitiva do
investigado na presença do seu defensor, e sua legalidade.
§ 5º Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições
dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá os autos ao Ministério
Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com concordância do
investigado e seu defensor.
https://youtu.be/e2SmEkSybnA
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
61
§ 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá
os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução perante o juízo de
execução penal.
§ 7º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos
legais ou quando não for realizada a adequação a que se refere o § 5º deste artigo.
§ 8º Recusada a homologação, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para a
análise da necessidade de complementação das investigações ou o oferecimento da
denúncia.
§ 9º A vítima será intimada da homologação do acordo de não persecução penal e
de seu descumprimento.
§ 10. Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não
persecução penal, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua
rescisão e posterior oferecimento de denúncia.
§ 11. O descumprimento do acordo de não persecução penal pelo investigado
também poderá ser utilizado pelo Ministério Público como justificativa para o
eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo.
§ 12. A celebração e o cumprimento do acordo de não persecução penal não
constarão de certidão de antecedentes criminais, exceto para os fins previstos no
inciso III do § 2º deste artigo.
§ 13. Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente
decretará a extinção de punibilidade.
§ 14. No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não
persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão
superior, na forma do art. 28 deste Código.
Cumpridos os requisitos legais, o Membro do Ministério Público proporá o acordo com as condições
previstas em lei (de forma isolada ou cumulativa), na forma escrita e na presença do defensor (§3º).
Recebido o acordo, será realizada audiência para verificar sua legalidade e a voluntariedade.
Após, o juiz poderá homologar ou não o acordo de não persecução penal. Nas duas hipóteses os autos
retornam ao Ministério Público.
Caso homologue o acordo (§6º), os autos retornarão para que o Ministério Público inicie sua execução
perante o juízo da execução. Cabe ao Ministério Público fiscalizar o cumprimento das condições (penas
antecipadas) e, caso sejam cumpridas, informará ao juiz para que seja declarada extinta a punibilidade.
No caso de quebra do acordo, o Ministério Público comunicará ao juiz que o rescindirá, podendo o
Ministério Público determinar o prosseguimento das investigações ou denunciar o investigado.
Caso o acordo não seja homologado pelo juiz, os autos igualmente retornam ao Ministério Público,
para complementação das investigações ou oferecimento da denúncia.
Em ambas as soluções, a vítima será intimada (§9º).
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
62
"Uma vez oferecida denúncia pelo Membro do Ministério Público, com a respectiva
recusa em propor o acordo de não persecução penal, a defesa poderá requerer ao
Juiz a remessa dos autos ao órgão superior de revisão do Ministério Público, para
analisar a negativa do Promotor ou Procurador de 1º Grau. Veja-se que apesar da
vagueza do § 14, do art. 28-A, CPP esse pedido de remessa deverá ser formuladoao
Juiz, pois caso tenha ocorrido a negativa do ANPP, haverá, obviamente, oferecimento
de denúncia (e essa recusa, como já dito, deve ser feita na quota que acompanha a
acusação), estando, portanto, os autos, sob a responsabilidade do magistrado, para
apreciação. (...) Mas, então, surge a seguinte pergunta: quando deve ser formulado
esse pedido de remessa dos autos ao órgão revisional do MP? Existe prazo para ele
ser formulado? (...) Desse modo, nos parece que a melhor solução seria entender que
o pedido ao juiz de remessa dos autos ao órgão de revisão do Ministério Público
deverá ser feito por ocasião e no prazo da resposta à acusação, prevista nos artigos
396 e 396-A do Código de Processo Penal" (CABRAL, Rodrigo Leite Ferreira, Manual
do acordo de não persecução penal. Salvador, ed. Juspodivm, 2020, p. 167-173).
Além disso, no caso de desclassificação do crime no curso da ação penal, será possível oferecer o
acordo de não persecução penal. Isso porque, embora a finalidade processual do acordo de não persecução
penal já esteja preclusa – tendo em vista que a ação penal foi deflagrada – a sua finalidade material, qual seja,
a finalidade de preservar o estado de inocência do indivíduo ainda permanece.
Ex.: O indivíduo foi denunciado por um crime de maior gravidade que, a princípio, não caberia acordo
de não persecução penal, caso haja a desclassificação do crime para um crime de menor gravidade, será
possível oferecer o acordo de não persecução penal (da mesma forma que é possível o oferecimento da
transação penal e suspensão condicional do processo).
Nos casos em que houver a modificação do quadro fático-jurídico, e, ainda, em
situações em que houver a desclassificação do delito - seja por “emendatio” ou
“mutatio libelli” -, uma vez preenchidos os requisitos legais exigidos para o Acordo
de Não Persecução Penal, torna-se cabível o instituto negocial. STJ. AgRg no REsp
2.016.905-SP, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por unanimidade,
julgado em 7/3/2023, DJe 14/4/2023. (Info 772)
Destaque: Ocorreu a I Jornada de Direito Penal e Processo Penal CJF/STJ (10 a 14 de agosto de 2020). Veja os
enunciados atinentes sobre tema em estudo:
https://buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/8b1ecf6d8049bb062a356f1cc812e69e?categoria=12&subcategoria=126&ano=2020
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
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Enunciado 10 - Recomenda-se a realização de práticas restaurativas nos acordos de
não persecução penal, observada a principiologia das Resoluções n. 225 do CNJ e
118/2014 do CNMP.
Enunciado 12 - A proposta de acordo de não persecução penal representa um poder-
dever do Ministério Público, com exclusividade, desde que cumpridos os requisitos do
art. 28-A do CPP, cuja recusa deve ser fundamentada, para propiciar o controle
previsto no § 14 do mesmo artigo.
Enunciado 13 - A inexistência de confissão do investigado antes da formação da
opinio delicti do Ministério Público não pode ser interpretada como desinteresse em
entabular eventual acordo de não persecução penal.
Enunciado 17 - É possível aditar a denúncia para requerer a perda de bens cujo
conhecimento se der após iniciada a ação penal, caso em que, recebido o aditamento,
deverão ser ouvidos os interessados e propiciada a dilação probatória.
Jurisprudências pertinentes:
Não é obrigatório notificar o investigado acerca do não oferecimento de proposta
do acordo de não persecução penal, sendo que a ciência da recusa do Ministério
Público deve ocorrer por ocasião da citação, podendo o acusado, na primeira
oportunidade de se manifestar nos autos, requerer a remessa dos autos ao órgão de
revisão ministerial. AgRg no REsp 2.039.021-TO, Rel. Ministro Messod Azulay Neto,
Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 8/8/2023, DJe 16/8/2023.
A revogação do acordo de não persecução penal não exige que o investigado seja
intimado para justificar o descumprimento das condições impostas na avença. STJ.
AgRg no HC 809.639-GO, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do
TJDFT), Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 17/10/2023, DJe 20/10/2023.
(Info 795)
Por ausência de previsão legal, o Ministério Público não é obrigado a notificar o
investigado acerca da proposta do Acordo de Não Persecução Penal. REsp
2.024.381-TO, Rel. Ministro Jesuíno Rissato (Desembargador convocado do TJDFT),
Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 7/3/2023.
https://buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/1387a00f03b4b423e63127b08c261bdc?categoria=12&subcategoria=126&ano=2020
https://buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/8b1ecf6d8049bb062a356f1cc812e69e?categoria=12&subcategoria=126&ano=2020
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AÇÃO PENAL
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O Poder Judiciário não pode impor ao Ministério Público a obrigação de ofertar
acordo de não persecução penal (ANPP). Não cabe ao Poder Judiciário, que não
detém atribuição para participar de negociações na seara investigatória, impor ao
MP a celebração de acordos.STF. 2ª Turma. HC 194677/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes,
julgado em 11/5/2021 (Info 1017).
A Lei n. 13.964/2019, ao incluir o § 14 no art. 28-A do Código de Processo Penal,
garantiu a possibilidade de o investigado requerer a remessa dos autos ao Órgão
Superior do Ministério Público nas hipóteses em que a acusação tenha se recusado a
oferecer a proposta de acordo de não persecução penal na origem. Nada obstante, tal
requerimento, por si só, não impõe ao Juízo de primeiro grau a remessa automática
do processo ao órgão máximo do Ministério Público, considerando-se que o controle
do Poder Judiciário quanto à remessa dos autos ao órgão superior do Ministério
Público deve se limitar a questões relacionadas aos requisitos objetivos, não sendo
legítimo o exame do mérito a fim de impedir a remessa dos autos ao órgão superior
do Ministério Público (HC 668.520/SP, de minha relatoria, Quinta Turma, julgado em
10/8/2021, DJe de 16/8/2021).
É vedada a substituição da figura do Ministério Público pela do juiz na celebração do
acordo de não persecução penal, instrumento jurídico extrajudicial concretizador da
política criminal exercida pelo titular da ação penal pública cuja homologação
judicial tem natureza meramente declaratória. (AgRg no HC 685.200/RJ, Rel.
Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUINTA TURMA, julgado em 24/08/2021, DJe
30/08/2021).
9. AÇÃO CIVIL EX DELICTO
O Ordenamento Jurídico Brasileiro adota o sistema da independência acerca da relação entre ação
penal e a ação civil decorrente de uma infração penal.
Por esse sistema, ambas as ações podem ser propostas de maneira independente, pois versam sofre
direitos diferentes (direito privado de cunho patrimonial e direito do Estado de punir).
Renato Brasileiro assevera que há um certo grau de mitigação no Sistema da Independência, haja vista
que o próprio juiz pode fixar, na sentença condenatória, um quantum a título de reparação pelos danos
causados (indenização mínima), à luz do art. 387, IV, CPP.
Art. 387. O juiz, ao proferir sentença condenatória:
IV - fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração,
considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido;
DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
65
São 2 as formas de obter a indenização civil por danos decorrentes da infração penal:
1) Execução civil ex delicto (art. 63, CPP)
2) Ação civil ex delicto (art. 64, CPP)
Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a
execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu
representante legal ou seus herdeiros.
Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá
ser efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso iv do caput do art. 387 deste
Código sem prejuízoação penal para o concurso de Delegado da Polícia Federal, conforme a banca
CESPE/CEBRASPE, deve ser direcionado para os tipos de ação penal, os princípios aplicáveis, os
prazos e as peculiaridades processuais, incluindo institutos como transação penal, suspensão
condicional do processo e acordo de não persecução penal (ANPP).
A CESPE frequentemente explora a classificação da ação penal, diferenciando ação penal pública
incondicionada, ação penal pública condicionada à representação e ação penal privada. Além disso, a banca
exige o domínio dos princípios da ação penal, como obrigatoriedade, oficialidade, indisponibilidade e
indivisibilidade, destacando que o princípio da obrigatoriedade não se aplica à ação penal privada.
Outro ponto recorrente é a ação penal privada subsidiária da pública, permitida quando o Ministério
Público não oferecer a denúncia no prazo legal, conforme art. 29 do CPP. A CESPE também explora o prazo
decadencial para representação, que é de seis meses a contar do conhecimento da autoria do crime (art. 38
do CPP), e os efeitos da perempção, que ocorre quando o querelante abandona injustificadamente a ação
penal privada, resultando na extinção da punibilidade do réu (art. 60 do CPP).
Além disso, a banca aborda conhecimento sobre o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP),
introduzido pelo Pacote Anticrime, explorando os requisitos (art. 28-A do CPP).
Para um bom desempenho, o candidato deve dominar os artigos 24 a 62 do CPP, bem como a
jurisprudência do STF e STJ sobre decadência, perempção e os limites da atuação do Ministério Público na
ação penal. A CESPE valoriza a aplicação prática dos conceitos processuais, exigindo interpretação de casos
concretos e correta utilização dos princípios da ação penal.
1. PRETENSÃO PUNITIVA
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DIREITO PROCESSUAL PENAL
AÇÃO PENAL
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A pretensão punitiva possui o jus puniendi como seu elemento intersubjetivo, e é composta pelo
próprio direito de punir (poder/dever de punir), situado dentro da relação jurídico-penal que se forma após a
prática do crime.
A legislação, a exemplo do Código Penal, prevê a conduta de matar alguém, com pena de 6 a 20 anos
(art. 121, CP). O tipo penal incriminador até então encontra-se no plano abstrato. Porém, no momento em que
o sujeito pratica a conduta, in casu, o delito, o direito de punir, que estava no plano abstrato, passa para o
plano concreto, ocasião em que, surge o ius puniendi do Estado.
Assim, a partir do momento em que alguém pratica a conduta delituosa prevista no tipo penal, este
direito de punir desce do plano abstrato e se transforma no ius puniendi in concreto.
PLANO ABSTRATO REALIZAÇÃO DA CONDUTA PRETENSÃO PUNITIVA
A norma penal no plano
abstrato prevê a conduta e
comina sanção.
Quando o sujeito pratica a
conduta, inobstante esteja
prevista como fato típico,
nasce para o Estado a
possibilidade de exercício do
seu jus puniendi.
A pretensão punitiva foi
materializada/surgiu, sob a
perspectiva do mundo
concreto.
Pretensão punitiva x Ação penal:
● Pretensão punitiva: Verifica-se quando se imputa ao réu, mediante a ação penal, a prática de crime,
para que ele seja sujeito às sanções previstas na legislação penal.A pretensão punitiva, pode ser
compreendida como o poder do Estado de exigir de quem comete um delito a submissão à sanção
penal.
● Ação penal: É o instrumento utilizado pelo Estado para obter o exercício da pretensão punitiva, uma
vez que, a partir da ação penal o Estado-acusação (ou o ofendido) ingressam em juízo para solicitar a
aplicação das normas de direito penal ao caso concreto, exercendo a pretensão punitiva.
Nesse sentido, preleciona Renato Brasileiro:
O Estado, por intermédio do Poder Legislativo, elabora as leis penais, cominando
sanções àqueles que vierem a praticar a conduta delituosa, surge para ele o direito de
punir os infratores num plano abstrato e, para o particular, o dever de se abster de
praticar a infração penal. No entanto, a partir do momento em que alguém pratica a
conduta delituosa prevista no tipo penal, este direito de punir desce do plano
abstrato e se transforma no jus puniendi in concreto. O Estado, que até então tinha
um poder abstrato, genérico e impessoal, passa a ter uma pretensão concreta de
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punir o suposto autor do fato delituoso (Manual de Processo Penal, Renato Brasileiro,
2017, p. 37).
2. AÇÃO PENAL
2.1 Direito De Ação
a) Conceito
O Estado trouxe para si o exercício da função jurisdicional, de modo que ele deverá fornecer ao cidadão
a tutela jurisdicional. Esse instrumento encontra-se solidificado no direito de ação.
O direito de ação é o direito público subjetivo consagrado na CF/88, de se exigir do Estado-Juiz a
aplicação do direito objetivo ao caso concreto, para a solução da demanda penal.
A partir dela a parte acusadora – Ministério Público ou ofendido (querelante) – tem a possibilidade de,
mediante o devido processo legal, provocar o Estado-Juiz a dizer o direito objetivo no caso concreto. (Renato
Brasileiro).
b) Fundamento Constitucional
O direito de ação é extraído da própria Constituição Federal, art. 5º, XXXV: “a lei não excluirá da
apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
O dispositivo constitucional consagra o chamado princípio da inafastabilidade de jurisdição. Assim, se
não exclui a apreciação, significa dizer que há o dever de prestá-la.
NÃO confundir direito de ação com ação propriamente dita
Direito de ação Ação
É o direito de ingressar em juízo, na busca da
tutela jurisdicional. Tem natureza jurídica de um
direito público, subjetivo, abstrato, autônomo
e instrumental (meio para se permitir o
exercício do direito de punir do Estado).
É a materialização do Direito de ação, razão
pela qual denomina-se de ação propriamente
dita. É o ato, por meio do qual,
instrumentaliza-se o direito de ação
assegurado constitucionalmente.
Conforme leciona Renato Brasileiro:
De acordo com a doutrina majoritária, o direito de ação penal é o direito público
subjetivo de pedir ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo a um caso
concreto. Funciona, portanto, como o direito que a parte acusadora – Ministério
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Público ou o ofendido (querelante) – tem de, mediante o devido processo legal,
provocar o Estado a dizer o direito objetivo no caso concreto (2017, p. 199).
ATENÇÃO: NÃO se pode confundir, ainda, o direito de ação com o direito que se afirma ter quando se exercita
o direito de ação, o qual pode ser designado como o direito material deduzido em juízo. O direito de ação é
abstrato, pois independe do conteúdo que se afirma quando se provoca a jurisdição.
c) Características do direito de ação penal:
● Direito público: A ação é proposta contra o Estado, pois se trata do direito de provocar o Estado-juiz
para o exercício da atividade jurisdicional, cuja natureza é pública, sendo função típica do Poder
Judiciário.
Atenção! A ação penal privada também apresenta a mesma característica, visto que há transferência
apenas da iniciativa da ação, mas NÃO da titularidade, visto que o poder punitivo pertence ao Estado.
● Direito subjetivo: O titular do direito de ação penal pode exigir do Estado-Juiz a prestação jurisdicional,
sendo essa titularidade conferida a um sujeito específico, conforme a legitimidade conferida pela lei.
OBS.: Nos ensinamentos de Aury Lopes Jr. existe um direito potestativo em relação ao acusado – aliado ao
direito subjetivo em relação ao Estado-jurisdição. Isso porque, uma vez exercitado o direito de ação, o réu
se sujeita ao processo, bem como à eventuais consequências que dele decorram (como a pena imposta em
uma sentença penal condenatória).da liquidação para a apuração do dano efetivamente
sofrido.
Art. 64. Sem prejuízo do disposto no artigo anterior, a ação para ressarcimento do
dano poderá ser proposta no juízo cível, contra o autor do crime e, se for caso, contra
o responsável civil.
Parágrafo único. Intentada a ação penal, o juiz da ação civil poderá suspender o
curso desta, até o julgamento definitivo daquela.
9.1 Execução Civil Ex Delicto (Art. 63, CPP) X Ação Civil Ex Delicto (Art. 64, CPP)
EXECUÇÃO CIVIL EX DELICTO AÇÃO CIVIL EX DELICTO
Fundamento legal: art. 63, CPP
Fundamento legal: art. 64, CPP
Exige o trânsito em julgado da sentença penal
condenatória, visto que a sentença penal
funciona como um título executivo judicial.
Pode ser proposta a qualquer momento.
Logo, não exige o trânsito em julgado da
sentença penal condenatória e pode ser
proposta ao mesmo tempo que a ação
penal.
Deve ser proposta exclusivamente em face do
condenado.
Pode ser proposta em face do condenado
ou do responsável civil (ex.: tutor,
curador, empregador, pais – em caso de
filhos menores).
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1930-1949/Ret/RetDel3689-41.doc#art387iv
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1930-1949/Ret/RetDel3689-41.doc#art387iv
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O juiz pode suspender o curso da ação
civil até o julgamento definitivo da ação
penal.
9.2 Legitimados Ativos Para Propor A Ação Civil
● Ofendido;
● Representante legal;
● Herdeiro;
No caso de vítimas hipossuficientes:
● Ministério Público (art. 68) x Defensoria Pública
Art. 68. Quando o titular do direito à reparação do dano for pobre (art. 32, §§ 1o e
2o), a execução da sentença condenatória (art. 63) ou a ação civil (art. 64) será
promovida, a seu requerimento, pelo Ministério Público.
O art. 68 prevê que, na hipótese de vítimas hipossuficientes, a legitimidade para propor a ação civil
será do Ministério Público. No entanto, não podemos perder de vista que este dispositivo está passando por
uma inconstitucionalidade progressiva (dispositivo que era constitucional e está se tornando, com o decorrer
do tempo, inconstitucional). Isso porque, a partir do momento em que a Defensoria pública estiver
devidamente estruturada em todos estados, a legitimidade ativa será da Defensoria Pública, e não mais do
Ministério Público.
Veja a jurisprudência sobre o tema:
O reconhecimento da ilegitimidade ativa do Ministério Público para, na qualidade de
substituto processual de menores carentes, propor ação civil pública ex delicto, sem a
anterior intimação da Defensoria Pública para tomar ciência da ação e, sendo o caso,
assumir o polo ativo da demanda, configura violação ao art. 68 do CPP. Antes de o
magistrado reconhecer a ilegitimidade ativa do Ministério Público para propor ação
civil ex delicto, é indispensável que a Defensoria Pública seja intimada para tomar
ciência da demanda e, sendo o caso, assumir o polo ativo da ação. STJ. 4ª Turma.
REsp 888081-MG, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 15/9/2016 (Info 592).
9.3 Indenização Na Sentença Condenatória
O art. 387, IV, CPP, prevê que o juiz deve fixar um VALOR MÍNIMO a título de reparação de danos
causados pela infração penal.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm#art32
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm#art63
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm#art64
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Essa indenização abrange qualquer tipo de dano sofrido pelo crime. Portanto, inclui:
● Danos materiais;
● Lucros cessantes;
● Danos morais;
● Danos estéticos.
Pergunta-se: Há necessidade de haver pedido expresso acerca da indenização na inicial acusatória
(denúncia/queixa crime)? Há divergência sobre o tema.
1ª Corrente (doutrina majoritária): NÃO há necessidade de pedido expresso pelo ofendido ou MP, uma
vez que se trata de um EFEITO GENÉRICO da sentença penal condenatória.
2ª Corrente (Tribunais Superiores): SIM. Para que seja fixado um valor mínimo a título de reparação de
dano, deve haver pedido expresso do MP ou do ofendido, sendo necessário oportunizar o contraditório do réu.
Atenção a jurisprudência sobre o tema:
Para fixação de indenização mínima por danos morais, nos termos do art. 387, IV, do
CP, não se exige instrução probatória acerca do dano psíquico, do grau de
sofrimento da vítima, bastando que conste pedido expresso na inicial acusatória,
garantia suficiente ao exercício do contraditório e da ampla defesa. REsp 2.029.732-
MS, Rel. Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em
22/8/2023, DJe 25/8/2023 (Info 784 STJ).
É inviável fixar, na esfera penal, indenização mínima a título de danos morais, sem
que tenha havido a efetiva comprovação do abalo à honra objetiva da pessoa
jurídica. Diferentemente do que ocorre com as pessoas naturais, as pessoas jurídicas
não são tuteladas a partir da concepção estrita do dano moral, isto é, ofensa à
dignidade humana, o que impede, via de regra, a presunção de dano ipso facto. STJ.
AREsp 2.267.828-MG,Rel. Ministro Messod Azulay Neto, Quinta Turma, por
unanimidade, julgado em 17/10/2023, DJe 23/10/2023. (Info 792)
9.4 Efeitos Civis Da Sentença Absolutória
Para descobrirmos quais são os efeitos civis de uma sentença absolutória, devemos conjugar alguns
artigos do CPP com Código Civil. Vejamos:
Art. 65. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato
praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de
dever legal ou no exercício regular de direito
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Art. 66. Não obstante a sentença absolutória no juízo criminal, a ação civil poderá ser
proposta quando não tiver sido, categoricamente, reconhecida a inexistência material
do fato
Art. 67. Não impedirão igualmente a propositura da ação civil:
I - o despacho de arquivamento do inquérito ou das peças de informação;
II - a decisão que julgar extinta a punibilidade;
III - a sentença absolutória que decidir que o fato imputado não constitui crime.
CC, Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo
questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando
estas questões se acharem decididas no juízo criminal.
1) Decisão que FAZ coisa julgada no cível
NÃO pode mais propor ação no cível quando na ação penal:
a) Houver o reconhecimento, categoricamente, da inexistência material do fato (leitura a contrario sensu
do art. 66, CPP).
b) Houver a absolvição com base na negativa de autoria (art. 935, CPP).
c) Se provada a existência de causa excludente de ilicitude penal (art. 65).
⋅ A causa excludente de ilicitude deve ser PROVADA, uma vez que, se houver DÚVIDAS, a decisão NÃO
irá fazer coisa julgada.
⋅ Não confundir com as excludentes de culpabilidade, uma vez que estas NÃO fazem coisa julgada no
cível.
⋅ Tratando-se de uma excludente de ilicitude putativa (descriminantes putativas), também NÃO fará
coisa julgada.
(...) O STJ pacificou entendimento no sentido de que a absolvição na esfera criminal,
por ausência de prova nos autos relativa ao fato de ter o acusado concorrido para a
infração penal, não tem o condão de excluir a condenação administrativa. Recurso
especial a que se nega provimento. (STJ, 5ª Turma, REsp 1.028.436/SP, Rel. Min.
Adilson Vieira Macabu, DJe 17/11/2011).
APROFUNDANDO PARA PROVAS DISCURSIVAS:
A existência de excludente de ilicitude só fará coisa julgada no juízo cível se o ofendido tiver dado causa à
excludente. Ex.: Se o ofendido for o autor da agressão injusta (no caso de uma legítima defesa), ou tiver
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provocado a situação perigo atual (no caso do estado de necessidade), nessa hipótese não poderá pleitear
indenização no juízo cível.
Por outro lado, se o fato praticado com amparo em uma excludente de ilicitude tiver atingido terceiro
inocente (como, por exemplo, no estado de necessidade agressivo, em que o bem jurídico sacrificado é de
terceiro não causador do perigo), ainda que o estado de necessidade seja reconhecido no âmbito criminal, essa
absolvição NÃO fará coisa julgada no juízo cível, de modo que a vítima atingida pode buscar a devida
reparação.
2) Decisão que NÃO faz coisa julgada no cível
É possível propor ação no cível, ainda que seja absolvido na seara criminal:
a) Se não reconhecida a inexistência material do fato (art. 66).
b) Quando a decisão julgar extinta a punibilidade (art. 67, II).
⋅ Se for extinta a punibilidade em virtude da prescrição da pretensão punitiva abstrata, retroativa ou
intercorrente, como não haverá trânsito em julgado da sentença penal condenatória, NÃO será
possível a EXECUÇÃO civil ex delicto. No entanto, nada impede o ajuizamento da AÇÃO CIVIL ex delicto.
c) Se reconhecida a atipicidade material ou formal do fato (decisão no sentido de que o fato não constitui
crime, conforme o art. 67, III).
d) Em caso de despacho de arquivamento do inquérito policial ou peças de informação (art. 67, I).
e) Se reconhecida a existência de causa excludente da culpabilidade.
f) Se NÃO houver provas suficientes para a condenação.
Inexistência material do fato Faz coisa julgada no cível
Excludente de ilicitude (real) Faz coisa julgada no cível
Negativa de autoria Faz coisa julgada no cível
Atipicidade formal ou material da conduta Não faz coisa julgada no cível
Excludente de culpabilidade Não faz coisa julgada no cível
Excludente de punibilidade Não faz coisa julgada no cível
Excludente de ilicitude putativa Não faz coisa julgada no cível
Decisão de arquivamento do IP Não faz coisa julgada no cível
Insuficiência de provas acerca da
materialidade ou autoria do fato
Não faz coisa julgada no cível
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Ainda em relação aos efeitos cíveis de possíveis decisões proferidas em sede processual penal, há de se
ficar atento às seguintes hipóteses4:
a) Sentença absolutória imprópria: É dominante o entendimento no sentido de que, por mais que haja a
imposição de internação ou de tratamento ambulatorial, como tal sentença não tem natureza
condenatória, é INCAPAZ de gerar o dever de reparação do dano, além de não funcionar como título
executivo. Isso, todavia, não impede o ajuizamento de ação civil contra a pessoa a quem competia a
guarda do inimputável.
b) Sentença absolutória proferida pelo Tribunal do Júri: diante do sigilo das votações e da adoção do
sistema da íntima convicção inerente ao Tribunal do Júri, resta impossível precisar o exato motivo que deu
ensejo à decisão dos jurados. Logo, é de se concluir que eventual sentença absolutória NÃO deve fazer
coisa julgada no cível.
c) Transação penal: esta decisão NÃO repercute no âmbito cível, vez que o art. 76, § 6º, da Lei nº 9.099/95,
dispõe expressamente que a imposição imediata de pena restritiva de direitos ou de multa não terá
efeitos civis, cabendo ao interessado propor a ação cabível no juízo cível;
d) Anistia: tem o condão de extinguir todos os efeitos penais decorrentes da prática do crime, sejam eles
principais, sejam eles secundários, mas não acarreta qualquer repercussão em relação aos efeitos
extrapenais. Logo, se concedida após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, nada impede
que o título obtido pelo ofendido seja executado perante o juízo cível.
e) Graça e indulto: Especificamente em relação aos reflexos cíveis, prevalece o entendimento de que
repercutem apenas em relação ao cumprimento da pena, subsistindo todos os efeitos penais secundários
e extrapenais, como a obrigação de reparar o dano. Logo, nada impede a execução da sentença
condenatória irrecorrível no âmbito cível.
Súmula 631 - O indulto extingue os efeitos primários da condenação (pretensão
executória), mas não atinge os efeitos secundários, penais ou extrapenais.
f) Perdão judicial: Embora haja certa controvérsia quanto à natureza jurídica da decisão concessiva do
perdão judicial, prevalece que se trata de uma decisão declaratória que NÃO produz qualquer efeito,
penal ou extrapenal. Veja a súmula nº 18 do STJ:
4 Manual de Processo Penal Volume Único. Renato Brasileiro de Lima. 8ª edição. 2020. Pg. 403
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Súmula 18 - A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da
punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.
Jurisprudência pertinente:
O réu que praticou corrupção passiva pode ser condenado, no âmbito do próprio
processo penal, a pagar danos morais coletivos. O ordenamento jurídico tutela, no
âmbito da responsabilidade, o dano moral não apenas na esfera individual como
também na coletiva, conforme previsto no inciso X do art. 5º da Constituição Federal
e no art. 186 do Código Civil. Destaque-se ainda a previsão do inciso VIII do art. 1º da
Lei n.º 7.347/85 (Lei de Ação Civil Pública). STF. 2ª Turma. AP 1002/DF, Rel. Min.
Edson Fachin, julgado em 9/6/2020 (Info 981)
Nos casos de violência contra a mulher praticados no âmbito doméstico e familiar, é
possível a fixação de valor mínimo indenizatório a título de dano moral, desde que
haja pedido expresso da acusação ou da parte ofendida, ainda que não especificada
a quantia, e independentemente de instrução probatória. STJ. 3ª Seção. REsp
1.643.051- MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, julgado em 28/02/2018 (recurso
repetitivo) (Info 621)
A posterior reconciliação entre a vítima e o agressor não é fundamento suficiente
para afastar a necessidade de fixação do valor mínimo previsto no art. 387, inciso
IV, do CPP, seja porque não há previsão legal nesse sentido, seja porque compete à
própria vítima decidir se irá promover a execução ou não do título executivo, sendo
vedado ao Poder Judiciário omitir-se na aplicação da legislação processual penal que
determina a fixação do valor mínimo em favor da ofendida. STJ. 6ª Turma. REsp
1.819.504-MS, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 10/09/2019 (Info 657)● Direito autônomo: Não se confunde com o direito material que se pretende tutelar. O direito de ação é
o instrumento que viabiliza o pedido de condenação em relação a determinado fato, imputado a certo
indivíduo.
● Direito abstrato: Existe e será exercido mesmo quando a demanda for julgada improcedente, uma vez
que independe do resultado (característica relacionada a autonomia do direito de ação).
● Direito específico: Apresenta um conteúdo, que é o objeto da imputação. Ou seja, apesar de abstrato,
desenvolve-se a partir de um caso concreto.
2.2 Condições Da Ação
2.2.1 Conceito
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São requisitos mínimos indispensáveis ao julgamento da causa. Segundo Nestor Távora:
São os requisitos necessários e condicionantes ao exercício do direito de ação. Como
se depreende, o exercício do direito de ação não se pode traduzir numa aventura
desmedida. É certo que a deflagração da ação implica sérias consequências ao réu,
exigindo-se do demandante o preenchimento de certas condições, para que o pleito
jurisdicional possa ser exercido de forma legítima (2017, p. 156).
Como o direito de ação é autônomo e abstrato, pode ser exercido mesmo que as condições não
estejam presentes. O direito de invocar a tutela estatal é constitucional e incondicionado. Assim as condições
da ação são analisadas no âmbito do processo penal, uma vez que, na sua ausência, o processo não se
desenvolve, ou seja, não será objeto de análise meritória do Estado. O direito de ação é exercido com a
propositura de inicial e a análise das condições é feita em seguida, pelo juiz, que pode rejeitar a peça
acusatória.
A análise das condições da ação observa a Teoria da Asserção, segundo a qual é realizada com base
nos elementos fornecidos na inicial acusatória, conforme narrado pelo demandante, sem adentrar em aspectos
probatórios. Assim, há um juízo superficial / precário de admissibilidade, sendo possível que, no curso do
processo, seja demonstrada a ausência de uma dessas condições, dando azo à absolvição do réu. Conforme
explica Renato Brasileiro:
“Conforme a teoria da asserção, a presença das condições da ação deve ser analisada
pelo juiz com base nos elementos fornecidos pelo próprio autor em sua petição
inicial, que devem ser tomados por verdadeiros, sem nenhum desenvolvimento
cognitivo. Se o juiz constatar a ausência de uma condição da ação mediante uma
cognição sumária,
deverá extinguir o processo sem resolução do mérito por carência de ação; se houver
necessidade de uma cognição mais aprofundada para a análise da presença das
condições da ação, a carência de ação passa a ser analisada como mérito, gerando
uma sentença de rejeição do pedido do autor, com a formação de coisa julgada
formal e material”.
Historicamente, a doutrina se valia do Processo Civil para estabelecer as condições da ação:
legitimidade da parte, interesse de agir e possibilidade jurídica do pedido. O CPC 15 suprimiu a “possibilidade
jurídica do pedido” e, diversos doutrinadores (como Aury Lopes Jr.) defendem que não é possível importar
institutos do processo civil para o processo penal, sem qualquer adaptação. Nesse sentido, doutrina moderna
aponta condições próprias da ação para o processo penal, como será visto adiante.
A doutrina trabalha com duas espécies de condições da ação: condições genéricas e as condições
específicas (condições de procedibilidade).
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a) Condições Genéricas:
São aquelas condições que deve estar presente em toda e qualquer ação penal, independentemente
da natureza do crime, da pessoa processada, e do procedimento a ser seguido.
São elas:
1) Legitimidade para agir;
2) Interesse de agir;
3) Possibilidade jurídica do pedido + Justa causa (lastro probatório mínimo de suporte para
início da ação penal).
b) Condições Específicas
São necessárias apenas em relação a determinadas infrações penais, ou ainda, em alguns
procedimentos específicos.
Ex.1: representação nos crimes de ação penal pública condicionada.
Ex.2: autorização de Assembleia para que determinados agentes políticos sejam criminalmente
processados.
Sobre o tema, confira a dica do Prof. Matheus de Palma:
https://youtu.be/1UCAVZiXLRE
2.2.2 Condições Genéricas
a) Legitimatio ad causam (Ativa/Passiva): é a pertinência subjetiva da ação.
● Legitimidade ativa:
Nessa esteira, segundo Renato Brasileiro, é a situação prevista em lei que permite a um determinado
sujeito propor a demanda judicial e a um determinado sujeito ocupar o polo passivo dessa mesma demanda.
Há legitimidade de partes quando o autor afirma ser titular do direito subjetivo material demandado
(legitimidade ativa) e pede a tutela em face do titular da obrigação correspondente àquele direito (legitimidade
passiva).
https://youtu.be/1UCAVZiXLRE
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# DICA DD: A espécie da ação penal definirá o seu legitimado.
▪ Na ação penal pública: A legitimidade ativa é, em regra, do Ministério Público.
▪ Na ação penal privada: A legitimidade ativa é do ofendido ou de seu representante legal.
Lembre-se que, ainda que de ação penal pública, se verificada a inércia do MP, surge para o ofendido a
possibilidade de propor queixa-crime subsidiária (ação penal privada subsidiária da pública).
● Legitimidade passiva:
A ação penal pode ser proposta em face apenas do suposto autor do fato delituoso, com 18 anos
completos ou mais.
ATENÇÃO!
(1) Legitimidade ad causam ativa e passiva da Pessoa Jurídica
A pessoa jurídica é dotada de legitimidade ativa (pode oferecer ação penal pública, se restar
caracterizada a inércia do MP, ou privada). Nesse sentido, a disciplina do art. 37, CPP.
Art. 37. As fundações, associações ou sociedades legalmente constituídas poderão
exercer a ação penal, devendo ser representadas por quem os respectivos contratos
ou estatutos designarem ou, no silêncio destes, pelos seus diretores ou sócios-
gerentes.
Também é admitida a legitimidade passiva (pode ser o provável autor do delito), porém adstrita aos
crimes ambientais. O art. 173, CF permite que a pessoa jurídica seja responsabilizada criminalmente quanto
aos crimes ambientais, e também quanto aos crimes contra a ordem econômica, financeira e contra a
economia popular, na forma da lei. Contudo, não há lei ordinária regulando a responsabilidade penal da pessoa
jurídica no que diz respeito aos crimes contra a ordem econômica, financeira e contra a economia popular.
Lei 9.605/98 – Art. 3º As pessoas jurídicas serão responsabilizadas administrativa, civil
e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em que a infração seja
cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão
colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.
Anteriormente, no ordenamento jurídico brasileiro trabalhava-se com a adoção da Teoria da Dupla
Imputação, segundo a qual a imputação da pessoa jurídica deveria ter por consequência a imputação também
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da pessoa física. Em outras palavras: a pessoa jurídica só poderia ser denunciada pela prática de crimes
ambientais se a pessoa física também fosse.
Contudo, esse não é o entendimento que prevalece atualmente. Assim, é possível dizer que a pessoa
jurídica figurar como polo passivo da ação penal, independentemente da responsabilização concomitante das
pessoas físicas, pois os Tribunais Superiores não mais adotam a Teoria da Dupla Imputação.
STJ: “(...). A personalidade fictícia atribuída à pessoa jurídica não pode servir de
artifício para a prática de condutas espúrias por parte das pessoas naturais
responsáveis pela sua condução. 4. Recurso ordinário a que se nega provimento”.(STJ, 5ª Turma, RMS 39.173/BA, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 06/08/2015,
Dje 13/08/2015).
(2) Legitimidade ad causam ativa de Ente Sem Personalidade Jurídica
O CDC possibilita que certas entidades e órgãos da administração pública, direta e indireta, ainda que
sem personalidade jurídica, atuem como assistentes do Ministério Público e, também ajuízem a queixa-crime
em caso de inércia do órgão ministerial.
Art. 80. No processo penal atinente aos crimes previstos neste código, bem como a
outros crimes e contravenções que envolvam relações de consumo, poderão intervir,
como assistentes do Ministério Público, os legitimados indicados no art. 82, inciso III e
IV, aos quais também é facultado propor ação penal subsidiária, se a denúncia não for
oferecida no prazo legal.
Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente:
(...)
III – as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem
personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos
protegidos por este
código;
IV – as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam
entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este
código, dispensada a autorização assemblear.
(3) Legitimidade Ordinária x Extraordinária (Substituição Processual) x Sucessão Processual x
Representação Processual (Legitimidade Ad Processum)
Na legitimação ordinária, alguém pleiteia, em seu próprio nome, um direito também próprio. Essa é a
regra: defender em juízo um direito seu. É o caso da legitimação do Ministério Público para iniciar a ação penal
pública.
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AÇÃO PENAL
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Já na legitimação extraordinária (substituição processual), há a defesa de direito alheio em nome
próprio. Essa é a hipótese da ação penal privada: o ofendido vai a juízo, mediante transferência do Estado da
legitimidade para iniciar a ação. A vítima tem legitimidade para estar em juízo, enquanto o Estado permanece
titular da pretensão punitiva.
Situação diversa é a de sucessão processual, que decorre da morte ou ausência do ofendido, quando o
seu direito de queixa ou de prosseguir na ação passará aos legitimados do art. 31, CPP.
ATENÇÃO: Cuidado para não confundir legitimação extraordinária (substituição processual) com sucessão
processual. Ocorre sucessão processual quando um sujeito sucede outro no processo, assumindo a sua
posição processual. Há, por conseguinte, uma troca de sujeitos no processo, uma mudança subjetiva da
relação jurídica processual.
Por fim, a representação processual (legitimidade ad processum) se opera quando alguém vai em
juízo, atuando em nome e na defesa de direito alheio. O sujeito não é parte, mas apenas confere capacidade
para que o legitimado ingresse em juízo. Ex.: vítima de crime de ação penal privada menor de 18 anos, cuja
legitimidade pode ser conferida a curador especial nos termos do art. 33, CPP, na ausência de representante
legal ou na hipótese de colisão de interesses.
b) Interesse de Agir: Composto pelo trinômio necessidade, adequação e utilidade. Consoante ensina Nestor
Távora, “deve haver necessidade para bater às portas do judiciário no intuito de solver a demanda, através do
meio adequado, e este provimento deve ter o condão de trazer algo de relevo, útil ao autor”.
b.1) Necessidade: No processo penal a necessidade é presumida, pois “nulla poena sine judicio”. Desse
modo, NÃO é possível a imposição de pena sem existência de um processo penal.
Exceções:
1. Transação Penal (art. 76, Lei 9.099/95);
2. Acordo de não persecução penal (art. 28-A, CPP – inserido pelo Pacote Anticrime);
3. Colaboração premiada (art. 4º, Lei 12.850/13).
Art. 76. Havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública
incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor
a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na
proposta.
Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal
e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e
com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor
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acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação
e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e
alternativamente: (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Art. 4º O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir
em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de
direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação
e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos
seguintes resultados.
(...)
§ 4º Nas mesmas hipóteses do caput deste artigo, o Ministério Público poderá deixar
de oferecer denúncia se a proposta de acordo de colaboração referir-se a infração de
cuja existência não tenha prévio conhecimento e o colaborador:
I - não for o líder da organização criminosa;
II - for o primeiro a prestar efetiva colaboração nos termos deste artigo.
OBS.: Todas as exceções elencadas são mitigações do princípio da obrigatoriedade da ação penal pública,
segundo o qual, presentes as condições da ação, o MP é obrigado a denunciar (art. 24 CPP).
b.2) Adequação: É preciso pleitear-se uma medida adequada para buscar seus interesses. Assim,
traduz-se no ajustamento da providência judicial requerida à solução do conflito subjacente ao pedido.
Atenção: Essa adequação NÃO tem importância para as ações penais condenatórias. Tem relevância nas
ações penais não condenatórias, por exemplo, habeas corpus.
b.3) Utilidade: Consiste na eficácia da atividade jurisdicional para satisfazer a tutela do direito do autor.
A prescrição em perspectiva (virtual/hipotética) consiste no reconhecimento antecipado da prescrição
em virtude da constatação de que, no caso de possível condenação, eventual pena que venha a ser imposta ao
acusado estaria fulminada pela prescrição da pretensão punitiva retroativa, tornando inútil a instauração do
processo penal.
Nesse sentido, grande parte da doutrina sustenta a sua aplicação com fundamento na ausência de
condição de procedibilidade à luz da utilidade.
Entretanto, STF e STJ NÃO admitem a prescrição virtual, sob o argumento de ausência de previsão
legal, assim como de violação ao princípio da inocência, já que se parte do pressuposto de que o acusado
necessariamente será condenado.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art3
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Súmula 438, STJ. É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da
pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da
existência ou sorte do processo penal.
c) Justa Causa: Podemos conceituar justa causa como sendo o lastro probatório mínimo indispensável para a
instauração de um processo penal.
Assim, deve a acusação ser portadora de elementos de informação que justifiquem a admissão da
acusação e o custo que representa o processo penal em termos de estigmatização e penas processuais.
Funciona, pois, como uma condição de garantia contra o uso abusivo de direito de acusar, evitando a
instauração de processos levianos ou temerários.
A natureza jurídica da justa causa é alvo de divergência doutrinária, no entanto, prevalece que o CPP
insere a justa causa como condição genérica da ação, em razão do art. 395, III, CPP:
Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: (Redação dada pela Lei nº
11.719, de 2008).
I - for manifestamente inepta;
I - faltar pressupostoprocessual ou condição para o exercício da ação penal; ou
III - faltar justa causa para o exercício da ação penal.
Vejamos a jurisprudência sobre o tema:
A ocorrência dos fatos narrados na denúncia está indicada, nos autos, por inúmeros
elementos indiciários - oriundos de buscas e apreensões, quebras de sigilo e outras
medidas investigativas -, a justificar a presença de justa causa para a deflagração da
ação penal.
Além disso, tradicionalmente, a justa causa é analisada apenas sob a ótica
retrospectiva, voltada para o passado, com vista a quais elementos de informação
foram obtidos na investigação preliminar já realizada. Todavia, a justa causa também
deve ser apreciada sob uma ótica prospectiva, com o olhar para o futuro, para a
instrução que será realizada, de modo que se afigura possível incremento probatório
que possa levar ao fortalecimento do estado de simples probabilidade em que o juiz
se encontra quando do recebimento da denúncia.
STJ. Corte Especial. APn 989/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 16/02/2022
(Info 726).
ATENÇÃO! Tema importante para a prova de Delegado da Polícia Federal:
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(1) Justa causa DUPLICADA na lavagem de capitais
A expressão “justa causa duplicada” refere-se à condição para que seja iniciada uma ação penal para
julgar um crime de lavagem de capitais, previsto na Lei nº. 9.613/98.
Segundo Renato Brasileiro:
Em se tratando de crime de lavagem de capitais, porém, não basta demonstrar a presença de lastro
probatório quanto à ocultação de bens, direitos ou valores, sendo indispensável que a denúncia também seja
instruída com suporte probatório demonstrado que tais valores são provenientes, direta ou indiretamente, de
infração penal (Lei 9.613/98, art. 1º, caput, com redação dada pela Lei 12.683/12). Tem-se aí o que a doutrina
chama de justa causa duplicada, ou seja, lastro probatório mínimo quanto à lavagem e quanto à infração
precedente. A propósito, o art. 2º, § 1º, da Lei 9.613/98, estabelece que a denúncia será instruída com indícios
suficientes da existência da infração penal antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que
desconhecido ou isento de pena o autor, ou extinta a punibilidade da infração penal antecedente.
Lei n. 9.613/98, art. 2º, § 1º: A denúncia será instruída com indícios suficientes da existência da
infração penal antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei, ainda que desconhecido ou isento de
pena o autor, ou extinta a punibilidade da infração penal antecedente.
A doutrina aponta ainda para a existência de uma justa causa TRIPLICADA que ocorre quando a
infração penal antecedente à lavagem de capitais também possui uma infração penal antecedente para a sua
configuração. É o exemplo do crime de lavagem que tem como infração penal antecedente o crime de
receptação, o qual, por sua vez, tem como infração penal antecedente o crime de roubo.
Assim, quando do oferecimento da denúncia, cabe ao Parquet revelar o suporte probatório mínimo em
relação a estes três delitos, daí porque a justa causa se apresenta, de fato, triplicada.
ATENÇÃO!
(1) Justa causa DUPLICADA na lavagem de capitais
A expressão “justa causa duplicada” refere-se à condição para que seja iniciada uma ação penal para
julgar um crime de lavagem de capitais, previsto na Lei nº. 9.613/98.
Segundo Renato Brasileiro:
Em se tratando de crime de lavagem de capitais, porém, não basta demonstrar a
presença de lastro probatório quanto à ocultação de bens, direitos ou valores, sendo
indispensável que a denúncia também seja instruída com suporte probatório
demonstrado que tais valores são provenientes, direta ou indiretamente, de infração
penal (Lei 9.613/98, art. 1º, caput, com redação dada pela Lei 12.683/12). Tem-se aí o
que a doutrina chama de justa causa duplicada, ou seja, lastro probatório mínimo
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quanto à lavagem e quanto à infração precedente. A propósito, o art. 2º, § 1º, da Lei
9.613/98, estabelece que a denúncia será instruída com indícios suficientes da
existência da infração penal antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei,
ainda que desconhecido ou isento de pena o autor, ou extinta a punibilidade da
infração penal antecedente.
Lei n. 9.613/98, art. 2º, § 1º: A denúncia será instruída com indícios suficientes da
existência da infração penal antecedente, sendo puníveis os fatos previstos nesta Lei,
ainda que desconhecido ou isento de pena o autor, ou extinta a punibilidade da
infração penal antecedente.
A doutrina aponta ainda para a existência de uma justa causa TRIPLICADA que ocorre quando a
infração penal antecedente à lavagem de capitais também possui uma infração penal antecedente para a sua
configuração. É o exemplo do crime de lavagem que tem como infração penal antecedente o crime de
receptação, o qual, por sua vez, tem como infração penal antecedente o crime de roubo.
Assim, quando do oferecimento da denúncia, cabe ao Parquet revelar o suporte probatório mínimo em
relação a estes três delitos, daí porque a justa causa se apresenta, de fato, triplicada.
(2) Trancamento da ação penal por ausência de justa causa
Súmula 648-STJ: A superveniência da sentença condenatória prejudica o pedido de
trancamento da ação penal por falta de justa causa feito em habeas corpus.
Imagine a seguinte situação hipotética: O Ministério Público ajuizou ação penal contra João acusando-o
da prática de determinado crime. O juiz recebeu a denúncia e determinou a citação do réu para responder à
acusação. João apresentou resposta escrita alegando que não havia justa causa e que, portanto, ele deveria ser
absolvido sumariamente. O magistrado, contudo, rejeitou o pedido de absolvição sumária e determinou o
início da instrução penal.
Pergunta-se: Diante desse cenário, existe algum recurso que João possa interpor? Cabe algum
recurso contra a decisão do juiz que rejeita o pedido de absolvição sumária?
R.: NÃO. Não existe recurso cabível na legislação para esse caso. Nesse contexto, contudo, a
jurisprudência admite a impetração de habeas corpus sob o argumento de que existe risco à liberdade de
locomoção. Desse modo, em nosso exemplo, a defesa de João impetrou habeas corpus no Tribunal de Justiça
pedindo o trancamento da ação penal por falta de justa causa. O Desembargador negou o pedido de liminar e
designou o dia 15/08 para o julgamento do habeas corpus pela Câmara Criminal do TJ. Ocorre que, antes disso,
no dia 08/08, o juiz proferiu sentença condenando o réu.
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Pergunta-se: Diante desse cenário, o que acontece com o julgamento do habeas corpus? O Tribunal
de Justiça irá apreciar o mérito do habeas corpus?
R.: NÃO. A superveniência de sentença condenatória torna prejudicado o pedido feito no habeas
corpus se buscava o trancamento da ação penal sob a alegação de FALTA DE JUSTA CAUSA. A sentença
condenatória analisa a existência de justa causa de forma mais aprofundada, após a instrução penal com
contraditório e ampla defesa. Logo, não faz mais sentido o Tribunal examinar a decisão de rejeição da
absolvição sumária se já há uma nova decisão mais aprofundada. Será essa nova manifestação (sentença) que
precisará ser analisada.
Logo, o réu terá que interpor apelação contra a sentença condenatória, recurso de cognição ampla por
meio do qual toda a matéria será devolvida ao Tribunal, que terá a possibilidade de examinar se a condenação
foi acertada, ou não.
Pergunta-se: E se a sentença tivesse sido absolutória? Se o juiz tivesse absolvido João, o HC também
ficaria prejudicado?
R.: SIM. Com maior razão, o habeas corpus estaria prejudicado, mas agora por outro motivo: FALTA DE
INTERESSE PROCESSUAL já que a providência buscadapela defesa foi alcançada em 1ª instância. Nesse
sentido:
A superveniência de sentença absolutória, na linha da orientação firmada nesta Corte,
torna prejudicado o pedido que buscava o trancamento da ação penal sob a alegação
de falta de justa causa. STJ. 6ª Turma. AgInt no RHC 31.478/SP, Rel. Min. Antonio
Saldanha Palheiro, julgado em 26/03/2019.
d) Originalidade
E, por fim, como uma condição da ação (mas que não é citada por toda a doutrina), tem-se a
ORIGINALIDADE. Segundo Afrânio Silva Jardim, a “originalidade” como condição genérica para o regular
exercício de qualquer ação. O autor sustenta que os tradicionais pressupostos objetivos extrínsecos
denominados “litispendências” e “coisa julgada” são, em verdade, condições da ação, porquanto não são
sanáveis, sem viabilidade de renovação da demanda com correção do vício. Em outros termos, a ação (penal)
tem que ser original, não se admitindo reproduções, em face da vedação de dupla persecução penal.
2.2.3 Condições Específicas da Ação
Também chamadas de condições de procedibilidade. Vejamos alguns exemplos:
1) Representação do ofendido;
2) Requisição do Ministro da Justiça;
3) Sentença anulatória de casamento, no crime do art. 236, do CP;
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4) Ingresso no país do autor do crime praticado no estrangeiro;
5) Declaração de procedência da acusação pela Câmara dos Deputados, no julgamento do
Presidente da República;
6) Sentença que decreta a falência, nas ações falimentares.
CUIDADO! NÃO confundir condição de procedibilidade com condição de prosseguibilidade:
● Condição de procedibilidade: é aquela necessária para dar início à ação penal.
Ex.: nos crimes contra a honra, em regra, a representação é uma condição de procedibilidade, pois, sem
ela, a ação penal não pode ser iniciada.
● Condição de prosseguibilidade: é aquela necessária para dar prosseguimento à ação penal. Trata-se
da situação na qual a ação penal já está em curso, mas uma lei posterior altera a natureza da ação
penal para aquele crime. Ou seja: o crime que antes era de ação penal pública incondicionada (e, por
isso, não exigia representação), passou a ser de ação penal pública condicionada, de modo que essa
representação passa a ser condição necessária para dar prosseguimento na ação penal.
Ex.: A lei dos Juizados Especiais (Lei nº 9099/95) passou a exigir representação para os crimes de lesão
corporal leve e lesão corporal culposa. Ou seja, tais crimes, que antes eram de ação penal pública
incondicionada, passaram a exigir a representação tanto para dar início à ação penal (hipótese em que a
representação funciona como condição de procedibilidade), como para dar continuidade à ação que já estava
em andamento (hipótese em que funciona como condição de prosseguibilidade).
Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de
representação a ação penal relativa aos crimes de lesão corporais leve e lesões
culposas. (CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE)
Art. 91. Nos casos em que esta Lei passa a exigir representação para a propositura da
ação penal pública, o ofendido ou seu representante legal será intimada para oferecê-
la no prazo de 30 dias, sob pena de decadência. (CONDIÇÃO DE PROSSEGUIBILIDADE)
OBS.: É certo que sem a representação não se pode nem iniciar a persecutio criminis, conforme preconiza o
artigo 5º, §4º, do CPP. Nesse caso, a representação é condição especial de persequibilidade, porque sem a
representação não há como deflagrar a persecutio criminis, que antecede a ação penal.
Sem representação a autoridade policial NÃO pode instaurar o inquérito e assim dar início à
persecutio (condição especial de persequibilidade), sem a representação não se procede em Juízo, isto é, não
se deflagra ação penal (condição especial de procedibilidade) e sem a representação não se pode dar
sequência ao feito (condição especial de prosseguibilidade).
Considerações Importantes:
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1) A lei que altera a natureza jurídica de uma ação penal é considerada norma penal MISTA ou HÍBRIDA.
Vamos relembrar os tipos de norma penal e processual?
● Normas penais: Cuidam do crime, da pena, da medida de segurança, dos efeitos da condenação e do
direito de punir do Estado (ex.: causas extintivas da punibilidade).
● Normas processuais penais: Versam sobre o processo desde o seu início até o final da execução ou
extinção da punibilidade. Lembre-se que, à luz do art. 2º do CPP, a lei processual penal possui aplicação
imediata:
Art. 2º - A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos
atos realizados sob a vigência da lei anterior.
As normas processuais penais podem ser:
a) Norma genuinamente processual: Cuidam de procedimentos, atos processuais, técnicas de processo.
b) Norma processual material (ou norma mista ou híbrida): Versam sobre o processo desde o seu início
até o final da execução ou extinção da punibilidade. Assim, se um dispositivo legal, embora inserido em
lei processual, versa sobre regra penal, de direito material, a ele serão aplicáveis os princípios que
regem a lei penal, de ultratividade e retroatividade da lei mais benigna. (Renato Brasileiro, Manual de
Processo Penal, 2017).
Em outras palavras: quando se tratar de norma penal mista, o critério a ser aplicado é o mesmo do
direito penal, ou seja, irretroatividade da lei maléfica e retroatividade da lei benigna.
As normas que alteram a natureza jurídica de uma ação penal são consideradas normas híbridas porque,
embora inseridas em diploma processual penal, possuem reflexos diretos em institutos de direito penal, como,
por exemplo, a extinção da punibilidade. Isso porque, o crime que antes era de ação penal pública
incondicionada e se torna de ação penal pública condicionada, passa a admitir uma nova hipótese de extinção
da punibilidade, qual seja, a decadência pela ausência de representação.
2) Considerando que a norma sobre a natureza jurídica da ação penal é uma norma híbrida e que as
normas híbridas devem seguir as regras das normas penais, é possível dizer que, em regra, caberá a
retroatividade da lei em benefício do réu.
ATENÇÃO! Essa retroatividade nem sempre será possível! Não basta analisar o instituto apenas de acordo
com a lei penal no tempo, sendo necessário também analisar se se trata de uma condição de procedibilidade
ou prosseguibilidade.
Vamos exemplificar para uma melhor compreensão:
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A Lei 13.964/2019 alterou a natureza jurídica da ação penal referente ao crime de estelionato. Antes, o
crime de estelionato era sempre de ação penal pública incondicionada. Com a vigência da lei, o crime passou a
ser de ação penal pública condicionada à representação, salvo algumas hipóteses expressamente previstas.
Veja:
Art. 171, § 5º Somente se procede mediante representação, salvo se a vítima for:
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - a Administração Pública, direta ou indireta; (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019)
II - criança ou adolescente; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
III - pessoa com deficiência mental; ou (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
IV - maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
Logo, temos que:
● Antes da Lei 13.964/2019: o crime era de ação penal pública incondicionada
● Após a Lei 13.964/2019: o crime passou a ser tratado, em regra, como crime de ação penal pública
condicionada à representação.
Regra: ação penal pública condicionada à representação.
Exceção: ação penal pública incondicionada quando o estelionato for perpetrado em face de:
✔ Administração Pública, direta ou indireta;
✔ Criança ou adolescente;✔ Pessoa com deficiência mental;
✔ Maior de 70 (setenta) anos de idade;
✔ Incapaz.
Inicialmente, pergunta-se: Trata-se de alteração de ordem penal ou de ordem processual?
Essa pergunta é relevante já que definimos que se a norma é penal e for considerada benéfica, terá
retroatividade e deverá ser aplicada as ações penais em curso. Assim, aquelas pessoas que se encontram
processadas pelo delito de estelionato deverão ter em seus processos a aplicação da referida norma, havendo
a necessidade de ocorrer a representação como condição de prosseguibilidade do processo.
Por outro lado, se entendermos que a norma possui caráter processual, a aplicação será imediata e
sem retroatividade, somente se aplicando aos delitos de estelionato ocorridos após a entrada em vigor da
referida legislação.
Assim, respondendo ao questionamento, a referida norma possui caráter híbrido, penal e processual,
e, nesses casos, há de prevalecer a sua vertente penal.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art2
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art2
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art2
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art2
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art2
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art2
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art2
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E como se posiciona a jurisprudência?
Considerando a alteração promovida pela Lei 13.964/2019, os Tribunais Superiores foram instados a se
manifestar acerca da retroatividade da sua aplicação e, consequentemente, necessidade de oferecimento ou
não da representação aos processos em curso.
A discussão teve início no STJ (HC 573.093), em 2020 e, desde então foi objeto de uma série de
divergências. EM SUMA:
(1) Em 13/04/2021, a 3ª Seção consolidou o entendimento das turmas criminais do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) ao definir que a exigência de representação da vítima como pré-requisito para a ação penal
por estelionato – introduzida pelo Pacote Anticrime– não pode ser aplicada retroativamente para
beneficiar o réu nos processos que já estavam em curso (Info 691).
(2) Em 13/04/2023, o debate foi levado ao Plenário do STF que decidiu a interpretação de normas
constitucionais não podem limitar o alcance da retroatividade em benefício do réu e, sendo a exigência de
representação para o crime de estelionato norma processual de caráter híbrido favorável ao acusado, há
de ser aplicada retroativamente aos processos em curso, sendo conferido a vítima o prazo de 30 dias
para oferecer a representação, sob pena de decadência do direito (HC-AgR 208.817/RJ)
Logo, no cenário atual acerca da matéria, o tema está pacificado em cada Tribunal Superior, mas
permanece a divergência entre eles. Temos o entendimento pacificado do STJ no sentido de que deve ser
observada a retroatividade, respeitando-se a limitação do ato jurídico perfeito e acabado materializado com o
oferecimento da denúncia. Já no STF, em decisão mais recente do Plenário, deve ser observada a extensão da
retroatividade para todas as ações penais em curso que ainda não tenham transitado em julgado.
Atenção! É preciso ficar atento às próximas decisões do STJ, diante da possibilidade de se curvar ao
entendimento do STF.
OBS.: Para o professor Aury Lopes Jr, como dissemos alhures, o processo penal não poderia se valer da teoria
geral do processo civil para conferir das mesmas condições da ação. Para o processualista penal, são condições
da ação penal:
1) Prática de fato aparentemente criminoso;
2) Punibilidade concreta;
3) Legitimidade da parte;
4) Justa Causa.
a) Prática de fato aparentemente criminoso (fumus comissi delicti): O fato penalmente relevante praticado
em tese, deve ser típico, ilícito e culpável, não se admitiria uma ação penal por um fato que não fosse crime.
Ex.: denúncia por incesto, furto de coisa própria.
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b) Punibilidade concreta: Deve o juiz rejeitar a peça acusatória quando houver prova de extinção da
punibilidade. Quando presente a causa de extinção de punibilidade, como prescrição, decadência, renúncia, a
denúncia ou queixa deverá ser rejeitada e o réu absolvido sumariamente, conforme o momento em que seja
reconhecida.
As outras duas condições para o professor Aury são idênticas as já exauridas acima e, por uma questão
de economia nos estudos, não abordaremos.
3. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL
3.1 Princípios Comuns Da Ação Penal Pública E Privada
1) PRINCÍPIO DA INTRANSCENDÊNCIA OU PESSOALIDADE:
A denúncia ou queixa só podem ser oferecidas contra o provável autor do fato delituoso. Esse princípio
funciona como evidente desdobramento do princípio da pessoalidade da pena (art. 5, XXXXV, CF).
2) PRINCÍPIO DA OFICIOSIDADE:
O MP, titular da ação penal, pode agir de ofício, não dependendo da autorização de ninguém, da
mesma forma que o ofendido também pode agir de ofício quando legitimado.
OBS.: O juiz não pode dar início ao processo de ofício, uma vez que a ação penal é de iniciativa do MP,
nos crimes de ação penal pública, ou do ofendido ou seu representante legal, nos crimes de ação penal
privada.
OBS.2: O juiz pode conceder habeas corpus de ofício (art. 654, §2º, CPP), visto que a restrição se limita
a atuação de ofício em ação penal condenatória. Ademais, a execução tem início de ofício.
3) PRINCÍPIO DO NE BIS IN IDEM
Trata da inadmissibilidade da persecução penal múltipla. Nesse sentido, ninguém pode ser processado
duas vezes pela mesma imputação.
3.2 Princípios Da Ação Penal Pública
1) PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE OU LEGALIDADE:
O princípio da obrigatoriedade está previsto no art. 24 do CPP. Com isso, diferentemente do que ocorre
com os demais princípios que possuem status constitucional ou convencional, possui status de lei ordinária.
Consequentemente, pode ser excepcionado por outra lei ordinária.
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24
Art. 24: Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério
Público, mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou
de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.
O MP, titular da ação penal pública, está OBRIGADO a oferecê-la, sempre que constatar a presença de
prova da materialidade e indícios de autoria ou participação.
Assim, se presentes as condições da ação penal e havendo justa causa, o MP está obrigado a oferecer
denúncia. Em outras palavras: não se reserva ao MP qualquer juízo de discricionariedade quando constatada a
presença de conduta delituosa e das condições da ação penal.
“Se o legislador incriminou determinada conduta, dando relevância social ao bem
jurídico afetado ou posto em risco pelo comportamento do agente, não pode o
membro do Ministério Público afirmar que a ação delituosa não tem relevância, que o
interesse público ficaria atendido diante de sua inércia, deixando de manifestar em
juízo a pretensão punitiva estatal” (Afrânio Silva Jardim. Ação penal pública: princípio
da obrigatoriedade. 4ª Edição. Forense, 2001. p. 53).
A doutrina aponta dois mecanismos de fiscalização do princípio da obrigatoriedade:
a) Princípio da devolução (art. 28-A, caput e §1º nos termos da interpretação conforme conferida pelo
STF no julgamento das ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305);
ATENÇÃO: O STF, nos autos das ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305, por maioria, atribuiu interpretação
conforme ao caput do art. 28 para assentar que, ao se manifestar pelo arquivamento do inquérito
policial ou de quaisquer elementos informativos de mesma natureza, o MP submeterásua manifestação
ao juiz competente e comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial, podendo encaminhar
os autos ao Procurador-Geral ou para a instância de revisão ministerial, quando houver, para fins de
homologação, na forma da lei.
E, por unanimidade, atribuiu interpretação conforme ao §1º do art. 28 para assentar que, além da vítima
ou de seu representante legal, a autoridade judicial competente também poderá submeter a matéria à
revisão da instância competente do órgão ministerial, caso verifique patente ilegalidade ou teratologia
no ato do arquivamento.
b) Ação penal privada subsidiária da pública.
ATENÇÃO: Obrigatoriedade da Ação Penal x Pedido de Absolvição pelo MP:
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De acordo com o art. 385 do CPP, fica claro que o MP poderá opinar pela absolvição. Isso porque (i)
trata-se da garantia da independência funcional do promotor, e (ii) ao MP incumbe zelar por interesses
individuais indisponíveis, a exemplo da liberdade de locomoção.
Nesse sentido, tem-se que o princípio da obrigatoriedade NÃO é incompatível com o pedido da
absolvição.
Ressalta-se, ainda, que o juiz pode condenar o acusado, mesmo com o pedido de absolvição feito pelo
MP.
Art. 385: Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória,
ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer
agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada.
Atenção à jurisprudência:
O art. 385 do Código de Processo Penal é compatível com o sistema acusatório e
não foi tacitamente derrogado pelo advento da Lei n. 13.964/2019, responsável por
introduzir o art. 3º-A no Código de Processo Penal. REsp 2.022.413-PA, Rel. Ministro
Sebastião Reis Júnior, Rel. para acórdão Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma,
por maioria, julgado em 14/2/2023.
APROFUNDANDO PARA PROVAS DISCURSIVAS / ORAIS:
Alguns doutrinadores (como Aury Lopes Jr.) sustentam que, havendo o pedido de absolvição, o juiz
seria obrigado a absolver, já que o MP estaria retirando sua pretensão acusatória. Com isso, caso o juiz
condenasse, estaria agindo de ofício, em um verdadeiro processo judicialiforme, incompatível com o princípio
da inércia da jurisdição.
Contudo, a maioria da doutrina, e principalmente a jurisprudência, compreendem que, a partir do
momento em que a denúncia foi oferecida, o juízo foi provocado. Por isso, mesmo que o MP tenha pedido a
absolvição, o juiz continua livre para condenar ou para absolver, já que a pretensão punitiva já teria sido
deduzida em juízo.
*O procedimento judicialiforme, ocorria na hipótese em que a ação penal, quando envolvesse
contravenções penais, seria iniciada com o auto de prisão em flagrante ou com portaria expedida pela
autoridade policial ou judicial, conforme previsão no art. 26, CPP. Ocorre que referido artigo NÃO foi
recepcionado pela CF/88. O art. 129, CF traz as funções institucionais do Ministério Público, dentre estas
“promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei”.
Exceções ao princípio da obrigatoriedade:
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Como visto acima, o princípio da obrigatoriedade possui status de lei ordinária. Por isso, é possível que
uma lei ordinária crie exceções ao princípio.
1. Transação Penal (art. 76 da Lei 9.099/95):
Lei n. 9.099/95, art. 76: Havendo representação ou tratando-se de crime de ação
penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público
poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser
especificada na proposta.
Trata-se de um acordo celebrado entre o MP e o autor do delito, objetivando o cumprimento imediato
de pena restritiva de direito ou pena de multa.
É uma exceção, já que, se cabível, ao invés de oferecer uma denúncia o MP irá oferecer um acordo.
Alguns autores chamam de discricionariedade regrada1. Contudo, para Renato Brasileiro, o correto
seria obrigatoriedade mitigada:
Transação penal: em se tratando de infrações penais de menor potencial ofensivo,
ainda que haja lastro probatório suficiente para o oferecimento de denúncia, desde
que o autor do fato delituoso preencha os requisitos objetivos e subjetivos do art. 76
da Lei nº 9.099/95, ao invés de o Ministério Público oferecer denúncia, deve propor a
transação penal, com a aplicação imediata de penas restritivas de direitos e multa.
Nessa hipótese, há uma mitigação do princípio da obrigatoriedade, comumente
chamada pela doutrina de princípio da discricionariedade regrada ou princípio da
obrigatoriedade mitigada (BRASILEIRO, Renato).
2. Acordo de Não Persecução Penal (art. 28-A, CPP)
É um acordo celebrado entre o MP e o autor do delito, devidamente assistido por seu defensor, por
meio do qual sujeita-se a determinadas condições. Após o cumprimento, o MP irá requerer o arquivamento.
O acordo de não persecução penal, introduzido pelo Pacote Anticrime, também é um exemplo de
exceção ao princípio da obrigatoriedade da ação penal pública, haja vista que, presentes os requisitos e as
condições dispostas em lei, o MP pode deixar de oferecer denúncia.
3. Acordo de Leniência nos Crimes Contra a Ordem Econômica:
1 Obviamente que o MP, por mandamento constitucional, já que o artigo 129, VIII, 2ª parte, da CR, diz que todas as
manifestações processuais do MP hão de ser fundamentadas – TEM que fundamentar. Por isso que é REGRADA!
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É uma espécie de colaboração premiada.
O parcelamento do crédito tributário quando feito antes do recebimento da denúncia, fica suspensa a
pretensão punitiva.
Lei n. 9.430/96, art. 83, § 2º: É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos
crimes previstos no caput, durante o período em que a pessoa física ou a pessoa
jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no
parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do
recebimento da denúncia criminal (Incluído pela Lei nº 12.382, de 2011)
4. Termo de Ajustamento de Conduta em Crimes Ambientais:
Em relação ao tema, há controvérsias. Parte da doutrina entende que o termo de ajustamento de
conduta (TAC) em crimes ambientais é uma exceção ao princípio da obrigatoriedade. Já que, pelo menos
enquanto o indivíduo cumpre o TAC, o MP está impedido de oferecer denúncia (falta interesse de agir do órgão
ministerial).
Contudo, o STJ entende que o TAC produz reflexos no âmbito administrativo, mas não representa óbice
à persecução penal.
STJ: “(...) A assinatura de termo de ajustamento de conduta, com a reparação do dano
ambiental são circunstâncias que possuem relevo para a seara penal, a serem
consideradas na hipótese de eventual condenação, não se prestando para elidir a
tipicidade penal”. (STJ, 6ª Turma, HC 187.043/RS, Rel. Min. Maria Thereza de Assis
Moura, j. 22/03/2011, Dje 11/04/2011)
5. Acordo de Colaboração Premiada na Lei de Organizações Criminosas (Lei 12.850/13):
§ 4º § 4º Nas mesmas hipóteses do caput deste artigo, o Ministério Público poderá
deixar de oferecer denúncia se a proposta de acordo de colaboração referir-se a
infração de cuja existência não tenha prévio conhecimento e o
colaborador: (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - não for o líder da organização criminosa;
II - for o primeiro a prestar efetiva colaboração nos termos deste artigo.
§ 4º-A. Considera-se existente o conhecimento prévio da infração quando o
Ministério Público ou a autoridade policial competente tenha instaurado inquérito ou
procedimento investigatório para apuração dos fatos apresentados pelo
colaborador. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art14
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13964.htm#art14DIREITO PROCESSUAL PENAL
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2) PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE:
De acordo com o princípio da indisponibilidade, o MP NÃO pode desistir da ação penal após o
oferecimento da denúncia.
Exceções ao princípio da indisponibilidade:
1. Suspensão Condicional do Processo (art. 89, Lei 9.099/95);
2. Transação Penal (art. 79, Lei 9.099/95).
3) PRINCÍPIO DA OFICIALIDADE:
O titular da ação é o órgão oficial do Estado.
4) PRINCÍPIO DA (IN)DIVISIBILIDADE:
Há controvérsia sobre o caráter divisível da ação penal pública.
1ª Corrente (majoritária na doutrina): Entende que a ação penal pública é indivisível.
2ª Corrente (Tribunais Superiores): A ação penal pública admite a divisibilidade. Ou seja: o MP pode
oferecer denúncia em face de alguns investigados, sem prejuízo do prosseguimento das investigações
dos demais autores. Nesse contexto, até a sentença final, o MP pode incluir novas pessoas no polo
passivo, por meio do aditamento da denúncia. Isso porque o Parquet é livre para formar sua
convicção, incluindo na denúncia as pessoas que ele entenda terem praticado o crime, mediante a
constatação de indícios de autoria e materialidade. STJ. 6ª Turma. RHC 34233-SP, Rel. Min. Maria
Thereza de Assis Moura, julgado em 6/5/2014 (Info 540)- (é a corrente que deve ser adotada em
provas objetivas!)
3.3 Princípios Da Ação Penal Privada
1) PRINCÍPIO DA OPORTUNIDADE E CONVENIÊNCIA:
Compete à vítima ou ao seu representante analisar a conveniência e oportunidade para o exercício da
ação. Ou seja: o titular da ação penal tem a FACULDADE de decidir se tem ou não interesse em dar início ao
processo criminal, visando à responsabilização do autor do delito.
Há 2 mecanismos através dos quais a vítima pode optar por NÃO exercer seu direito de ação:
a) Decadência: A vítima dispõe do prazo decadencial de 06 (seis) meses para o exercício da ação
privada, contados do conhecimento do responsável pelo delito, sob pena de extinção da
punibilidade (art. 107, IV, CP)
b) Renúncia: É ato unilateral do ofendido, e ocorre quando a vítima se recusa a tomar providência
contra o seu agressor.
⋅ Se opera até o oferecimento da ação penal;
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⋅ É irretratável;
⋅ A renúncia feita para um agressor necessariamente beneficia os demais (art. 49, do CPP);
⋅ Pode ser expressa ou tácita (atos do ofendido incompatíveis com o desejo de processar o
agressor);
⋅ Enseja a extinção da punibilidade.
OBS.1: Tanto a decadência como a renúncia ocorrem antes de iniciada a ação penal com o
oferecimento da queixa crime.
OBS.2: O prazo decadencial para a queixa-crime é improrrogável e NÃO se sujeita a nenhuma forma de
suspensão ou interrupção.
OBS.3: O princípio se aplica também a ação penal pública condicionada, no que tange à representação
ou à requisição (e APENAS nesse ponto, visto que uma vez presentes as demais elementos para o oferecimento
da ação, o MP é obrigado a agir).
2) PRINCÍPIO DA DISPONIBILIDADE:
Após iniciada a queixa crime, o querelante pode dispor do seu direito de dar continuidade à queixa-
crime através de 2 institutos:
a) Perdão: Ato de liberalidade, e requer a aceitação pelo réu (ato bilateral). Trata-se de causa extintiva de
punibilidade e só é admissível até o trânsito em julgado;
OBS.1: Cuidado para não confundir a renúncia com o perdão.
OBS.2: Não cabe o instituto do perdão do ofendido na ação penal privada subsidiária da pública.
RENÚNCIA PERDÃO
Instituto pré-processual. Instituto processual.
Ato unilateral. Ato bilateral.
A renúncia feita a um dos agentes
se estende aos demais (art. 49,
CP).
O perdão concedido a apenas um
dos agentes delitivos não
necessariamente se estende aos
demais.
b) Perempção: É sanção processual pela desídia do querelante na ação privada (art. 60, CPP). Assim,
conforme entendimento da jurisprudência, descabe o seu reconhecimento em sede de ação penal
privada subsidiária da pública, uma vez que, originariamente, trata-se de hipótese de ação penal
pública.
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CONCLUSÃO: Independentemente do momento em que o querelante decide abrir mão do seu direito de
queixa, antes mesmo de oferecida a queixa (através da decadência ou renúncia), ou após o oferecimento desta
(através do perdão ou perempção), a consequência será a mesma: extinção da punibilidade.
Art. 61. Em qualquer fase do processo, o juiz, se reconhecer extinta a punibilidade,
deverá declará-lo de ofício.
A CESPE exige conhecimento sobre a perempção e seus efeitos.
Possível questão: O que ocorre se o querelante abandonar a ação penal privada sem
justificativa?
Resposta correta: Ocorre a perempção, que extingue a punibilidade do réu, nos termos do art.
60 do CPP.
c) Conciliação nos crimes contra a honra de competência do juiz singular (art. 522, CPP)
Art. 522. No caso de reconciliação, depois de assinado pelo querelante o termo da
desistência, a queixa será arquivada.
OBS.: Esse princípio NÃO se aplica a ação penal privada subsidiária da pública, pois, eventual
manifestação do querelante no sentido de dispor da ação penal já em curso importa na retomada, pelo
Ministério Público, da titularidade da ação penal. Trata-se da chamada ação penal indireta.
Vamos esquematizar?
● Antes de iniciada a queixa crime:
(a) Decadência Princípio da Conveniência e Oportunidade
(b) Renúncia
● Após iniciada a queixa crime
(a) Perdão Princípio da Disponibilidade
(b) Perempção
3) PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE:
Proposta ação penal privada, o querelante deve promovê-la contra TODOS os que contribuíram para o
delito, NÃO podendo deixar de processar os que sabidamente concorreram para a prática do crime.
Nesse sentido, a ação penal deve se estender a todos aqueles que praticaram a infração penal.
CPP - Art. 48. A queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de
todos, e o Ministério Público velará pela sua indivisibilidade.
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Em razão do princípio da indivisibilidade, a renúncia e o perdão concedidos a um dos coautores
estendem-se ao demais (no perdão, caso um dos coautores não aceite, continuará correndo contra ele o
processo).
Art. 49. A renúncia ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do
crime, a todos se estenderá.
Art. 51. O perdão concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que
produza, todavia, efeito em relação ao que o recusar.
ATENÇÃO: Princípio da indivisibilidade da ação penal privada nas hipóteses de omissão voluntária e
involuntária.
O princípio da indivisibilidade significa que a ação penal deve ser proposta contra todos os autores e
partícipes do delito. Segundo a posição da jurisprudência, o princípio da indivisibilidade SÓ se aplica para a
ação pena privada (art. 48 do CPP). O que acontece se a ação penal privada não for proposta contra todos? O
que ocorre se um dos autores ou partícipes, podendo ser processado pelo querelante, ficar de fora? Qual é a
consequência do desrespeito ao princípio da indivisibilidade?
● Se a omissão foi VOLUNTÁRIA (DELIBERADA): O juiz deverá rejeitar a queixa e declarar a extinção da
punibilidade para todos (arts. 104 e 107, V, do CP).
● Se a omissão foi INVOLUNTÁRIA: o MP deverá requerer a intimação do querelante para que ele faça o
aditamento da queixa-crime e inclua os demais coautores ou partícipes que ficaram de fora. Assim,
conclui-se que a não inclusão de eventuais suspeitos na queixa-crime não configura, por si só, renúncia
tácita ao direito de queixa. Para o reconhecimento da renúncia tácita ao direito de queixa, exige-se a
demonstração de que a não inclusão de determinados autores ou partícipes na queixa-crime se deu de
forma