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A n d ré ia R ei s B ac h a M o ri n in g o Especial inclusiva Educação Ed u c a ç ã o e sp ec ia l in c lu si v a Ed u c a ç ã o e sp ec ia l in c lu si v a De�ciência Visual: Estratégias Educacionais para o Trabalho de Inclusão D e� ci ên ci a Vi su al Andréia Reis Bacha Moriningo Unidade 5 A Educação e Inclusão de Crianças com Deficiên- cia Visual na Pré-Escola 104 Caro (a) aluno (a) Nesta unidade, veremos que o aprendizado da leitura, da escrita e da matemática exigem pro- cedimentos metodológicos adaptados e postura in- vestigativa do professor. Neste momento crucial, é importante que à criança seja oferecido um ambiente escolar acolhedor, adequado às suas necessidades e capaz de atendê-la bem. Para isso, é necessário que a escola e o pro- fessor estejam preparados para receber o deficiente visual, fazendo-o reconhecer pertencente ao grupo. Desejamos bons estudos! Objetivos da Unidade Ao final desta unidade, você deverá ter condições de: Compreender os mecanismos para a construção sim- bólica e a formação de conceitos; Compreender a importância de um ambiente escolar aco- lhedor e adaptado às necessidades do deficiente visual; Compreender o processo de construção da leitura e da escrita através do sistema Braille; Conhecer o sorobã e outros recursos para o ensino da matemática. 105 5.1. A Construção Simbólica e a Formação de Conceitos O processo de construção simbólica e a for- mação de conceitos estão diretamente relacionados às imagens visuais que a criança experiencia do meio. A construção semiótica (significado e significante) acontece à medida que a criança recebe visualmente as informações e as imagens externas. A formação de conceitos associa-se à cog- nição, envolvendo a capacidade perceptiva e rela- cional do sujeito, pois a capacidade de discriminar e reconhecer permite perceber o que se ouve, toca e experimenta. Sob a perspectiva sociocultural estaria associada a um sistema organizada e inter-relacional da estrutura cognitiva, assim como redes de signifi- Conteúdos da Unidade Nesta unidade, você irá estudar: A construção simbólica e a formação de conceitos. A organização do espaço e do tempo escolar. O sistema Braille. O sorobã. O processo de construção da leitura e da escrita 106 cados articulados entre si (Vygotsky, 1993). Ou seja, a criança aprende a formar conceitos e a construir os significados dos objetos, quando utiliza todos os seus sentidos para experimentar as sensações que o entorno oferece. Nesse aspecto, para que a criança adquira essa habilidade é necess ário que vivencie a ação com seu próprio corpo e com os sentidos de maneira inte- grada. Nesse caso, as informações verbais desarticula- das da experiência da criança diretamente com meio, não seria o suficiente para poder formar conceitos. Na idade pré-escolar, a criança deve rece- ber um currículo planejado e estruturado de forma a oportunizar situações de pesquisa em diversas cir- cunstâncias, contando com uma diversidade signifi- cativa de objetos, materiais e elementos que a facili- tem assimilar e relacionar os conceitos através de sua atuação no mundo físico. Para Luria (1998, p.26): “[...] a linguagem carrega consigo os conceitos gene- ralizados, que são a fonte do conhecimento humano. Instrumentos culturais especiais, como a escrita ex- pandem enormemente os poderes do homem, toman- do a sabedoria do passado analisável no presente e passível de aperfeiçoamento no futuro.” 107 Ainda, segundo o autor (1991, p.80): “Quando a criança assimila a linguagem, fica apta a organizar de nova maneira a percepção e a me- mória; assimila formas mais complexas de rela- ção sobre os objetos do mundo exterior; adquire a capacidade de tirar conclusões das suas próprias observações, de fazer deduções, conquista todas as possibilidades do pensamento.” As palavras fazem nascerem os pensamentos, portanto a relação entre pensamento e palavra é um processo dinâmico, vivo, permanente. A formação de conceitos depende dessa harmonia, dessa associação, dessa relação (pensamento e palavra) constante. A criança com deficiência visual apresenta uma limitação de informações e a oportunidade de observar, analisar, perceber as características e pro- priedades dos objetos, para assim poder estabelecer a sequência das ações têmporo-espaciais, compreender as relações causa-efeito, determinantes para a aquisi- ção das representações conceituais. Ormelezi (2000) defende a ideia da lingua- gem como sistema simbólico, que serve de mediação entre o sujeito e o mundo, que interpreta os dados da realidade e influencia totalmente os processos de aquisição do conhecimento, como a representação 108 mental, o pensamento e a formação de conceitos. Se comparada à criança vidente, a criança cega apresenta o desenvolvimento mais lento, por- que existe uma maior dificuldade na compreensão do mundo externo pela ausência de visão e, além disso, os caminhos e os processamentos dessas crianças são outros. Portanto, a escola deverá atentar-se para o processo de avaliação e as estratégias metodológicas, os quais devem ser heterogêneos, a fim de contem- plarem as necessidades específicas. É importante que a professora respeite o tempo da criança com deficiência visual para a ela- boração de noções e conceitos, uma vez que precisa coordenar todas as informações captadas através dos outros sentidos, para poder generalizar e assim com- preender e abstrair. As histórias de faz de conta, os jogos de construção podem servir de grandes estímulos para aguçar a curiosidade da criança, ajudando-a também nesse processo de construção de conceitos. 5.2. Organização do Es- paço e do Tempo Escolar Sabe-se que a organização do espaço físico é essencial para a segurança e mobilidade da criança 109 com deficiência visual. Todos os ambientes da cre- che e da escola devem ser checados pelo professor especializado juntamente com o professor de sala de aula, para que nada ofereça perigo e exponha essas crianças à situação vexatória. Quando se sente segura em transitar pelo ambiente, a criança cega poderá desenvolver a inde- pendência, explorar o ambiente interno e externo. Toda mudança de posição dos mobiliários da sala ou do ambiente que essa criança frequenta deve ser co- municada, pois terá de vivenciar e reelaborar mental- mente um novo mapa do ambiente. O ambiente externo: rampas, banheiros, par- ques, corrimão devem seguir as normas técnicas uni- versais de acessibilidade. Para as crianças de baixa vi- são as escadas e os corrimãos devem possuir contraste. O parquinho da pré-escola deve estar prepa- rado, do mesmo modo, para acessibilidade das crian- ças com deficiência visual. Devem ser eliminados os brinquedos de estrutura dura ou cortante que possa machucar a criança em movimento. Como já foi mencionado, a criança com de- ficiência visual necessita de um tempo maior para realizar as atividades físicas, de leitura e escrita e organizar-se em relação a essas atividades. O tempo para a realização de atividades motoras, de brinca- deiras, de jogos e atividades didáticas difere-se em relação às demais crianças. Por isso, é necessário que 110 se planejem as atividades de modo a atender às ne- cessidades da criança. 5.3. O Sistema Braille O sistema Braille foi inventado, na França em 1825, por Louis Braille e constitui-se um sistema universal de leitura tátil e escrita. Inspirado no siste- ma de comunicação Barbier, Louis Braille reduziu o sistema para seis pontos em relevo, que formam a “cela Braille”, verticalmente colocados no espaço em duas colunas de três pontos, organizados da seguinte forma: os seis pontos formam sessenta e três combi- nações diferentes, as quais representam as letras do alfabeto, as vogais acentuadas, os sinais de pontua- ção, os numerais, os símbolos matemáticos, químicos e as notas musicais. (MEC, 2006, p.50) Os pontos são numerados da seguinte manei- ra: doalto para baixo, coluna da esquerda: pontos 1-2- 3; do alto para baixo, coluna da direita: pontos 4-5-6. A disposição desses pontos permite a formação de 63 (sessenta e três) combinações, a saber: • os quatro pontos superiores (1-2-4-5) formam as dife- rentes combinações das dez primeiras letras do alfabeto; • as dez letras seguintes referem-se às combinações das dez primeiras letras, acrescidas do ponto 3, e que for- 111 mam a 2ª linha de sinais; • o acréscimo dos pontos 3 e 6 às combinações da 1ª linha forma a terceira linha. O alfabeto Braille serve-se de vinte e seis si- nais, sendo dez para os sinais de pontuação de uso in- ternacional, correspondendo aos 10 sinais da 1ª linha, localizados na parte inferior da cela Braille: pontos 2-3-5-6. E os sinais restantes atendem às necessida- des especiais de cada língua, como acentuação de le- tras e abreviaturas. Emprega-se o sistema Braille por extenso, adotando-se códigos especiais de abreviaturas para cada língua ou grupo linguístico, sendo que por ex- tenso é denominado grau 1. Já, o grau 2 é a forma abreviada, que é empregada para representar as con- junções, preposições, pronomes, prefixos, sufixos etc. Para a produção dos livros em Braille utili- zam-se as máquinas estereotípicas, que permitem a escrita em matrizes de metal, feita dos dois lados, cuja impressão acontece nas duas faces do papel. Denomina-se esse de Braille interpontado, cujos pontos não coincidem com os pontos da outra face, permitindo uma leitura corrente, o aproveitamento do papel, e a redução do volume de livros transcri- tos no sistema Braille. Atualmente, o Braille pode ser produzido através de recursos de computadores. 112 5.3.1. A Leitura Braille A posição da leitura Braille segue da esquer- da para a direita, através das pontas dos dedos que se pressionam levemente. É natural ver algumas crian- ças com deficiência visual utilizarem inicialmente a polpa do indicador da mão direita ou esquerda, se- gundo a preferência, para a leitura. Outras pessoas podem utilizar as duas mãos, outras o dedo médio ou anular, substituindo o indicador. A destreza manual varia de pessoa para pessoa. O importante é que con- sigam compreender o texto à medida que tateiam. Por isso, o sistema Braille pode ser classifica- do em vários “graus” 10: 1. Grau um: só utiliza os sinais que representam o alfabeto e a pontuação, os números e alguns poucos sinais especiais de composição, que são específicos do sistema. Corresponde letra por letra, à impressão visual que é observável num texto comum. É um grau mais fácil de aprender-se, visto que há menos sinais para memorizar. Porém, é o mais lento para ser transcrito e lido, e o produto final, impresso, é mais volumoso. 2. Grau dois: é uma forma mais abreviada do Braille. Se o sinal é usado em combinação com outros padrões dentro de uma palavra, representa apenas uma letra, mas se estiver isolado representa uma palavra comum. 10 Disponível para download em: http://www. braillevirtual.fe.usp.br 113 3. Grau três: é uma forma de Braille altamente abre- viada, especialmente usada em inglês. No grau três há várias contrações e abreviaturas a memorizar, e as regras que governam o seu uso são correspondente- mente difíceis. É usualmente utilizado em anotações científicas ou em outras matérias muito técnicas. É recomendável o domínio do alfabeto Brai- le e das noções básicas desse sistema por parte dos educadores. Existe, no entanto, o Braille Virtual, um curso on-line, criado e desenvolvido por uma equipe de profissionais da Universidade de São Paulo (USP), com o objetivo de possibilitar o aprendizado do sis- tema de forma simples, gratuita e lúdica. 5.4. Sorobã O sorobã, aparelho de procedência japone- sa, é um instrumento matemático manual, composto de duas partes, separadas por uma régua denominada de “régua de numeração”, que aparesenta na parte inferior 4 contas em cada eixo, sendo que de 3 em 3 eixos, apresenta um ponto em relevo, destinado, prin- cipalmetne, a separar as classas dos números. 114 O sorobã ao ser utilizado deverá ser coloca- do sobre a mesa, de modo que o retângulo inferior, o mais largo, fique próximo da pessoa (operador). No Brasil, foi adaptado para ser utilizado por pessoas ce- gas, que, conforme Reily (2004, p.62): “Trata-se de uma moldura separada por uma régua em duas partes horizontais, a inferior e a superior. A régua é dividida em seis partes iguais, com pon- tos salientes de três em três hastes, representando as unidades, dezenas e centenas de cada classe. Há 21 hastes verticais, em que se movimentam as contas, sendo que, na parte inferior, cada haste tem quatro contas e, na superior, uma.” Figura 1 – Sorobã, utilizado por deficientes visuais para aprendizagem da Matemática. Fonte: http://www.planetaeducacao.com.br. 115 Escrevem-se os números, deslocando os nú- meros das contas com as extremidades dos dedos, para junto da régua. Cada conta do retângulo infe- rior vale uma unidade da ordem a que corresponde, enquanto que cada conta do retângulo superior vale cinco unidades da ordem a que corresponde. Chega- -se ao zero quando todas as contas do mesmo eixo estiverem afastadas da régua. Para iniciar a operação, deve-se verificar se as contas estão afastadas da régua de modo que fique registrado zero em toda sua extensão. Para a escrita de 1,2,3,4 basta deslocar sucessivamente para junto da régua, uma, duas, três ou quatro contas do retângulo inferior. Para a escrita do 5, uma conta do retângulo superior. Para a escrita do 6, 7, 8, 9, basta deslocar sobre o mesmo eixo a conta do retângulo superior, juntamente com uma, duas, três ou quatro contas do retângulo inferior. Para escrever numerais de dois ou mais algarismos, devem-se utilizar tantos eixos quantos forem os algarismos. Para representar um número isolado em qualquer parte do sorobã, de- ve-se escrever a unidade à esquerda de um dos pon- tos em relevo. (MEC 2001, vol. III, p. 33) 116 5.4.1. Orientação Metodológica para o Uso do Sorobã Conforme orientações do Programa de Capa- citação de Recursos Humanos do Ensino Fundamen- tal – Deficiência visual – MEC (2001, Vol. III, p.34), para a leitura e a escrita dos numerais recomenda-se: 1 “a aprendizagem de ambas deve ser simultânea, uma vez que são processos que se complementam; 2 maior eficiência nas técnicas operatórias no so- robã poderá ser alcançada se o aluno for orientado, desde o início a utilizar ambas as mãos independen- temente, tanto na leitura quanto na escrita, sendo que a mão direita deverá atuar da 1ª à 4ª classe e a mão esquerda nas classes restantes; 3 a escrita e a leitura de numerais poderão ser mais eficientes se o aluno utilizar o indicador para as con- tas do retângulo superior, e o polegar para as do re- tângulo inferior; 4 o deslocamento dos dedos, na leitura e a movi- mentação das contas na escrita, devem ser feitas de maneira suave e precisa, evitando-se assim o desloca- mento desnecessário de outras contas; 5 nos exercícios de leitura, os numerais devem ser es- critos pelo professor, pois a escrita feita pelo próprio aluno prejudicará o objetivo principal dessa atividade; 117 6 a aprendizagem da escrita e da leitura consideradas técnicas básicas para a utilização do sorobã, deve ser consolidada pela realização de muitos e diversificados exercícios; 7 os alunos não devem utilizar sorobã que esteja em mal estado de conservação; cumpre ao professor ve- rificar o estado do aparelho, bem como orientar os alunos no sentido de mantê-los sempre em perfeito estado.” O professor do ensino regular que tiver em sua turma um aluno cego, que se utiliza do sorobã não precisa necessariamente ter o domínio operató- rio desse material, pois o ensino dessa técnica cabe ao professor especializado que atende esse aluno. Entre- tanto, nada impede o professor de aprender a utilizar esse recurso, ficando a seu critério. O professor do ensino regular deve, pois, observarse o aluno tem utilizado adequadamente o material, se o aluno realiza cálculos com exatidão ou resolve situações-problema de modo adequado. É importante que se esclareça a diferença técnico-operatória do sorobã, em relação a que se utiliza nas escolas de ensino regular, considerando a disposição linear dos números, embora estejam se- parados por espaço, “e em operações como a adição, por exemplo, opera-se da ordem mais elevada para a ordem mais baixa”. (MEC op.cit., p.36) 118 Ao professor especializado cabe, em relação à utilização do sorobã (MEC, op.cit. p. 36): • “utilizar uma caixa matemática própria na compo- sição de números; • orientar o aluno para o uso correto de ambas as mãos; • adquirir domínio do conteúdo que esteja sendo de- senvolvido nas aulas, para evitar qualquer forma de defasagem na aprendizagem; • associar o uso do sorobã ao desenvolvimento do cálculo mental, funcionando o aparelho como meio de anotação dos resultados obtidos; • propiciar vivências em atividades esportivas, lúdi- cas e recreativas.” 5.5. Processo de Cons- trução da Leitura e Escrita A criança desde que nasce está imersa num ambiente letrado e alfabetizador: imagens, símbolos, letras e números. A criança com deficiência visual terá acesso, geralmente, a esses elementos quando ingres- sam na escola ou na creche. Precisam, para isso, utilizar o tato para decodificar o mundo, perceber nuances nos elementos (forma, espessura, detalhes, pontos etc.). O aprendizado da leitura e da escrita requer um ambiente propício, cercado por letras, jogos e 119 textos variados que contemplem a diversidade de gê- neros textuais. Entretanto, a criança com deficiência visual deverá ser integrada a esse ambiente, partici- pando coletivamente das atividades de práticas so- ciais de leitura e escrita com os colegas. Essas crianças deverão estar integradas no grupo, podendo participar de dramatizações, saraus, declamação de poesias, contação de histórias, dan- ças, teatro etc. Projetos que envolvem a elaboração de parlendas, histórias, poesias, músicas, criação em argilas etc. são atividades, nas quais as crianças com deficiência visual alcançam sucesso. Além do mais, o trabalho em grupo conta com o olhar das crianças videntes que fornecem informações e auxiliam as crianças com deficiência visual, contribuindo para que sua aprendizagem seja construída. Para as crianças de baixa visão, é aconse- lhado o uso de recursos ópticos específicos desde a pré-escola, como instrumentos mediadores e facili- tadores do processo de aprendizagem, em atividades como literatura, jogos pedagógicos, atividades artís- ticas e esportivas, entre outras. Isso permite que o aluno tenha a oportunidade de ampliar suas experi- ências, familiarizando-se e adaptando-se ao recurso no momento de sua alfabetização. A capacidade acomodativa é outro fator de- terminante para as atividades de perto e no processo 120 de leitura e escrita, pois permite magnificação, cla- rificação da imagem e contraste para boa resolução visual. Por isso, é importante que o professor consul- te o oftalmologista para ver a prescrição óptica que favoreça essa função, uma vez que interfere no nível de atenção, interesse e motivação do aluno para as atividades escolares. Nesse sentido, a habilidade da leitura e da escrita envolvem funcionalmente diferentes aspectos, a saber (MEC, op.cit., p. 57): “capacidade de fixação, controle dos movimentos oculares, sensibilidade aos contrastes, a existência de escotomas no campo visual, magnificação, tempo de saturação e a capacidade de adaptação à claridade e ao escuro. Todas essas variáveis devem ser investiga- das, analisadas pelos profissionais da área médica e educacional, como também experimentados todos os recursos e ajudas ópticas e não ópticas, para depois se discutir com o aluno sobre a necessidade do Braille.” O processo de formação de conceitos e o desenvolvimento do pensamento físico e lógico-ma- temático são determinantes para o avanço do aluno na aprendizagem da leitura e escrita. Os recursos de alto poder dióptrico ou re- cursos de magnificação eletrônica podem ser uti- 121 lizados em caso de perdas visuais significativas que comprometam o desempenho para a leitura. Se não houver esses recursos, poderá ser utilizado o com- putador na sala de aula. Em caso de perdas visuais profundas, utilizam-se os sistemas de magnificações por vídeo para leituras de palavras, e recomenda-se o sistema Braille para leituras extensas. Pode acontecer, também, de os alunos com alterações vítreas, retinianas, maculares, de nervo óp- tico e glaucoma necessitarem de novas modificações dos materiais ou da iluminação do ambiente. No caso de alteração de campo visual central especificamente, recomenda-se a intervenção do professor especializa- do que irá apoiar o aluno no processo de leitura (dis- tância do papel, movimentos de cabeça ou oculares de rastreamento visual para composição da imagem). E, finalmente, quando ocorrem os casos de alterações maculares importantes, nas retinopatias, nos glaucomas severos, nas alterações neurológicas, altera-se a sensibilidade aos contrastes, o que influen- cia na percepção dos detalhes, no reconhecimento de símbolos e leitura. Nesse caso, torna-se necessário o aumento do contraste, principalmente nos casos de escotomas11 ou campo visual alterado. 11 Escotoma (do grego scotoma, escuridão) é uma região do campo visual que apresenta perda total ou parcial da acuidade visual, rodeada de outra região em que a visão normal está preservada. 122 5.5.1. Adaptações Didático-Me- todológicas para Crianças com Baixa Visão e Cegueira A criança com baixa visão necessita partici- par ativamente de todas as atividades e tarefas desen- volvidas pelos demais alunos. Por isso, recomenda-se que o professor, a princípio, conheça as possibilida- des de funcionamento visual do aluno para, junta- mente com o professor especializado, oferecer-lhe subsídios de aprendizagem. A baixa visão caracteriza-se essencialmen- te pela visão prejudicada a distância (MEC, op.cit., p. 53), por isso o professor deverá observar a qual distância o aluno enxerga para realizar tarefas visuais com bom desempenho. Algumas crianças com baixa visão conseguem enxergar aproximando o material dos olhos ou do na- riz. Nesse caso, não há excesso de convergência, pois só assim é que a criança consegue ver. Outras podem perceber os objetos somente em determinadas posi- ções: posição temporal, nasal, inferior ou superior. Por isso, a TV, os jogos de vídeo ou outros recursos que exijam o emprego visual a distância, pouco interessam às crianças com alterações visuais severas ou moderadas. Além disso, a criança com vi- são a distância prejudicada e a alteração de campo 123 visual associada sente dificuldade nas atividades de jogos corporais e atividades de educação física. Nesses casos, as atividades e o material ela- borados pelo professor deverão sofrer as adaptações adequadas que possam servir para os demais alunos, também. Por exemplo: no jogo de amarelinha, o tra- çado deverá ser mais largo e com bastante contraste. As crianças cegas poderão participar, se as bordas fo- rem em relevo e se houver dado sonoro. A. Livros Sensoriais Os livros sensoriais são confeccionados com os materiais descartáveis de festa, lanchonete ou com aquilo que fizer sentido para a criança, incluindo os símbolos gráficos. Ou ainda, podem ser elaborados com materiais multissensoriais, de diferentes textu- ras, pintados com tintas que dão relevo (tipo tinta de farinha), cola plástica. O ideal é que esses livros sejam elaborados para servir tanto para as crianças com bai- xa visual como para as crianças cegas. As figuras não têm significado para a crian- ça cega, porém é importante que a imagem seja-lhe descrita, para que o aluno possa estabelecer relações partindo de suas próprias experiências. A criança poderá narrar histórias a partir das experiências cotidianas,como passeios, festas, lan- chonetes, parques etc., representando-as com objetos bi e tridimensionais. 124 Embora, o aluno cego ainda não disponha de esquemas conceituais na pré-escola que o possi- bilite reconhecer gravuras de forma bidimensional, é importante que represente essas imagens desde cedo, elaborando-as e expressando-as, uma vez que a atividade de representação mental ajuda nas ativi- dades de metacognição. A construção de maquetes e mapas táteis con- tribui, também, para a construção da noção e do domí- nio do espaço e independência nos ambientes externos. B. Jogos para Matemática Para as crianças com deficiência visual os jogos como dama, dados, dominós, bingos, tangram, blocos lógi- cos, material dourado desde que adaptados, poderão ser utilizados com excelência na educação infantil, facilitando o desenvolvimento da capacidade de se- riação, classificação e raciocínio lógico. 125 Sugestão para Complementação de Estudos Biografia Louis Braille nasceu em 4 de Janeiro de 1809 em Coupvray, na França, a cerca de 40 quilômetros de Paris. O seu pai, Simon-René Braille, era um fabri- cante de arreios e selas. Aos três anos, provavel- mente ao brincar na oficina do pai, Louis feriu-se no olho esquerdo com uma ferramenta pontiaguda, possivelmente uma sovela. A infecção que se seguiu ao ferimento alastrou-se ao olho direito, provocan- do a cegueira total. Na tentativa de que Louis tivesse uma vida o mais normal possível, os pais e o padre da paró- quia, Jacques Pallury, matricularam-no na escola lo- cal. Louis tinha enorme facilidade em aprender o que ouvia e em determinados anos foi selecionado como líder da turma. Com 10 anos de idade, Louis ganhou uma bolsa do Institut Royal des Jeunes Aveugles de Paris (Instituto Real de Jovens Cegos de Paris). O fundador do instituto, Valentin Haüy, foi um dos primeiros a criar um programa para ensinar os cegos a ler. As primeiras experiências de Haüy en- volviam a gravação em alto-relevo de letras grandes, em papel grosso. Embora rudimentares, esses esfor- ços lançaram a base para desenvolvimentos posterio- 126 res. Apesar de as crianças aprenderem a ler com este sistema, não podiam escrever porque a impressão era feita com letras costuradas no papel. Louis aprendeu a ler as grandes letras em al- to-relevo nos livros da pequena biblioteca de Haüy. Mas, também se apercebia que aquele método, além de lento, não era prático. Na ocasião, escreveu no seu diário: “Se os meus olhos não me deixam obter informações sobre homens e eventos, sobre ideias e doutrinas, terei de encontrar uma outra forma.” Em 1821, quando Louis Braille tinha somen- te 12 anos, Charles Barbier, capitão reformado da artilharia francesa, visitou o instituto onde apresentou um sistema de comunicação chamado de escrita no- turna, também conhecido por Serre e que mais tar- de veio a ser chamado de sonografia. Tratava-se de um método de comunicação táctil que usava pontos em relevo dispostos num retângulo com seis pontos de altura por dois de largura e que tinha aplicações práticas no campo de batalha, quando era necessário ler mensagens sem usar a luz que poderia revelar po- sições. Assim, era possível trocar ordens e informa- ções de forma silenciosa. Usava-se uma sovela para marcar pontinhos em relevo em papelão, que então podiam ser sentidos no escuro pelos soldados. A es- 127 crita noturna baseava-se numa tabela de trinta e seis quadrados, cada quadrado representando um som básico da linguagem humana. Duas fileiras, com até seis pontos cada uma, eram gravadas em relevo no papel. O número de pontos na primeira fileira indica- va em que linha horizontal da tabela de sons vocálicos encontrava-se o som desejado, e o número de pontos na segunda fileira designava o som correto naquela linha. Esta ideia de usar um código para representar palavras em forma fonética foi introduzido no Insti- tuto. Louis Braille dedicou-se de forma entusiástica ao método e passou a efetuar algumas melhorias. Assim, nos dois anos seguintes, Braille esfor- çou-se em simplificar o código. Por fim, desenvolveu um método eficiente e elegante que se baseava numa célula de apenas três pontos de altura por dois de lar- gura. O sistema apresentado por Barbier, era baseado em 12 pontos, ao passo que o sistema desenvolvi- do por Braille é mais simples, com apenas 6 pontos. Braille, em seguida, melhorou o seu próprio sistema, incluindo a notação numérica e musical. Em 1824, com apenas 15 anos, Louis Braille terminou o seu sistema de células com seis pontos. Pouco depois, co- meçou a ensinar no instituto e, em 1829, publicou o seu método exclusivo de comunicação, que hoje tem o seu nome. Exceto algumas pequenas melhorias, o sistema permanece basicamente o mesmo até hoje. Apesar de tudo, levou tempo até essa inova- 128 ção ser aceita. As pessoas com visão não entendiam quão útil o sistema inventado por Braille podia ser, e um dos professores principais da escola chegou a proibir seu uso pelas crianças. Felizmente, tal deci- são teve efeito contrário ao desejado, encorajando as crianças a usar o método e a aprendê-lo em segredo. Com o tempo, mesmo as pessoas com visão acaba- ram por perceber os benefícios do novo sistema. No instituto, o novo código só foi adotado oficialmente em 1854, dois anos após a morte de Braille, provoca- da pela tuberculose em 6 de Janeiro de 1852, com apenas 43 anos. Na França, a invenção de Louis Braille foi fi- nalmente reconhecida pelo Estado. Em 1952, seu corpo foi transferido para Paris, onde repousa no Panthéon. Disponível: http://pt.wikipedia.org/wiki/Louis_Braille Recursos Ópticos para Perto São os óculos especiais com lentes de aumento que servem para melhorar a visão de perto (óculos bi- focais12, lentes esferoprismáticas, lentes monofocais esféricas13, sistemas telemicroscópicos14). 12 São lentes com dois campos de visão, sendo um para longe e outro para perto, separados por uma linha divisória visível. São usados por pessoas que possuem presbiopia (falta de visão para perto). 13 Lentes de visão simples, ou monofocais são lentes designadas para as pessoas que necessitam de correção tanto para perto como para longe. 14 São óculos especiais, lentes de contato, lupas especiais. 129 Para perto, devem-se usar lentes positivas de grau geralmente elevado. Às vezes há a opção pela correção de apenas um olho, pela dificuldade acarre- tada de obter-se visão simultânea em ambos os olhos com auxílios ópticos. Ressalta-se, ainda, que quando se utiliza um sistema óptico que aumenta o tamanho da imagem, há a diminuição do campo de visão, ou seja, a área focada é menor do que o normal. Embora, as lupas manuais são de fácil lo- comoção, para uma leitura mais prolongada podem causar certo desconforto, pois precisam ser segura- das o tempo todo e serem mantidas próximas ao ma- terial de leitura. Nesse sentido, as lupas de apoio são funcionais para uma leitura prolongada. Sua base já as coloca na distância correta de utilização em rela- ção ao material de leitura ou estudo, variando, assim, apenas a posição do olho do observante. Recursos Ópticos para Longe Pode ser o telescópio: usado para leitura no quadro negro podem restringir o campo visual; teles- sistemas, telelupas e lunetas. Esses auxílios são, em geral, usados estatica- mente, isto é, quando o portador visual encontra-se parado, pois o campo visual fica reduzido e a percep- ção de distância altera-se. São os únicos auxílios ópti- cos empregados para longe e utilizados pelas crianças 130 para observar o quadro negro, assistir à TV, reconhe- cer ônibus ou pessoas. Recursos Não Ópticos15 • Tipos ampliados: ampliação de fontes, de sinais e símbolos gráficos em livros, apostilas, textos avulsos, jogos, agendas, entre outros. • Acetato amarelo: diminui a incidência de claridade sobre o papel. • Plano inclinado: carteira adaptada, com a mesa incli- nada para que o aluno possa realizar as atividades com conforto visuale estabilidade da coluna vertebral. • Acessórios: lápis 4B ou 6B, canetas de ponta poro- sa, suporte para livros, cadernos com pautas pretas espaçadas, tiposcópios (guia de leitura), gravadores. • Softwares com magnificadores de tela e Programas com síntese de voz. • Chapéus e bonés: ajudam a diminuir o reflexo da luz em sala de aula ou em ambientes externos. • Circuito fechado de televisão - CCTV: aparelho acoplado a um monitor de TV monocromático ou colorido que amplia até 60 vezes as imagens e trans- fere-as para o monitor. Sites: • http://www.utp.br/Cadernos_de_Pesquisa/pdfs/ cad_pesq11/10_o_ensino_cp11.pdf 15 Disponível em “Atendimento Educacional Especializado” Deficiência Visual SEESP/SEED/MEC – Brasília 2007 – p. 20 131 Atividades 1 Faça um levantamento principais jogos utilizados no ensino regular da matemática que tanto servem para os alunos videntes, como para os deficientes vi- suais, com as devidas adaptações. 2 Entreviste uma pessoa cega e procure responder às questões: A. Como foi o aprendizado da leitura? B. Gosta de ler histórias através do sistema Braille? C. Com qual disciplina melhor se identifica: matemá- tica ou português? D. Existe uma preferência por gênero literário? Qual? Unidade 6 Socialização e Profissio- nalização da Pessoa com Deficiência Visual 134 Caro (a) aluno (a) Nesta unidade, você entrará em contato com os recursos tecnológicos disponíveis no mercado que atendem aos deficientes visuais. Perceba que iniciamos nossa disciplina con- tando um pouco da história da deficiência no Brasil e em outros lugares. E encerramo-na com a temática da tecnologia da informação. Muito progresso, não acha? Além disso, o deficiente visual hoje é inse- rido no mercado de trabalho, podendo levar uma vida normal. Bons estudos! Objetivos da Unidade Ao final desta unidade, você deverá ter condições de: Avaliar a evolução histórica da deficiência visual no Brasil e em outros lugares; Identificar a utilidade da tecnologia da informação para o deficiente visual como meio de aprendiza- do, socialização e inserção no mundo do trabalho. Conteúdos da Unidade Nesta unidade, você estudará: Tecnologia na educação da pessoa cega e de baixa visão. O papel da família frente às necessidades educativas especiais. Orientações para escolha profissional. 135 6.1. Tecnologia na Educação da Pessoa Cega e de Baixa Visão 6.1.1. Recursos Especiais para Pessoas Cegas16 • Microcomputador – proporciona vários recursos aos deficientes visuais, uma vez providos de progra- mas específicos e de diferentes periféricos, entre os quais podemos destacar: • Sintetizador de voz – através deste periférico é possível ler as informações exibidas no monitor, além disso, dentre as diferentes modalidades pro- duzidas com voz sintetizada na Língua Portuguesa, destaca-se o Dosvox17. • Sistema Operacional Dosvox – sistema que per- mite aos deficientes visuais desenvolverem diferentes tarefas. Para tanto, desenvolveram-se as seguintes fer- ramentas computacionais: “- sintetizador de voz portátil, que possibilita a pro- dução de fala, ainda que o computador não possua placa de som; 16 Disponível em MEC – Deficiência Visual – Volume 3 – pág. 106-111 17 Desenvolvido pelo Núcleo de Computação Eletrônica da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ 136 - sistema operacional complementar DOS, desti- nado a produzir saída sonora, com fala em língua portuguesa; - editor de textos; - caderno de telefones, agenda de compromissos, cal- culadora, relógio, jogos etc.; - utilitários de acesso à Internet, para preenchimento de cheques e outros.” • Terminal Braille (Display Braille) - são caracte- res Braille que correspondem às informações exibi- das em um monitor, produzidos por pinos que movi- mentam verticalmente em celas. • Impressora Braille – o mercado mundial ofere- ce diferentes tipos de impressoras Braille, seja para o uso individual (pequeno porte) ou para produção em larga escala (médio e grande porte). Variam em velocidades de impressão, podendo imprimir em seis ou oito pontos e produzir desenhos em relevo. • Scanner de Mesa – permite que o texto digitali- zado seja lido por meio de um sintetizador de voz, de um terminal impresso em Braille ou no sistema comum ampliado. • Braille Falado18 – pode funcionar como agenda eletrônica, calculadora científica e cronômetro. É utilizado como sintetizador de voz, transferindo ou recebendo arquivos. 18Microcomputador que pesa 450 g e dispõe de 7 teclas. É utilizado para edição de textos a serem impressos no sistema comum ou em Braille. 137 • Virtual Vision19 – trata-se de um leitor de telas em voz sintetizada para o ambiente Windows. • Open Book – este software lê revistas, livros e ou- tros materiais impressos, por meio de um scanner. Ele ainda analisa a diagramação da página que vai ler, identificando colunas, títulos, legendas e quaisquer outros elementos que compõem a página a ser scane- ada e toma a decisão correta sobre a ordem da leitura. • Sistema Tecla Fácil – utiliza voz sintetizada para auxiliar o treinamento de digitação para os deficien- tes visuais: dita os exercícios a serem repetidos, conta os erros cometidos e o tempo gasto em cada lição, só permitindo que o aluno avance após atingir parâme- tros pré-estabelecidos. • Zoom Text – ampliam o tamanho das letras na tela do computador, permitindo sua utilização por pesso- as de visão reduzida. 6.1.2. Meios de Locomoção A. Bengala A bengala proporciona aos deficientes visuais liberdade, independência, autonomia e expectativa de mobilização por todos os lugares que a pessoa precise ir. 19 Esse sistema é produzido e comercializado pela empresa Micropower, com sede em São Paulo. 138 B. Cães-Guia ou Cães de Assistência Os cães-guia são treinados com a finalidade de guiar as pessoas com deficiência visual. O profissional habilitado deverá proceder à escolha do cão-guia, fazendo a sele- ção do filhote na ninhada, levando em consideração os diferentes temperamentos e assim, selecionar somente aqueles que apresentarem independência, serenidade, equilíbrio e pró-atividade. Feita essa primeira etapa, o cão irá integrar-se a uma família, passando por um período de 4 (quatro) meses de experiência (dos dois aos seis meses de idade). Após isso, o cão poderá iniciar o treinamento, o que dura em média seis meses e somente entre cão e treinador. O passo seguinte diz respeito ao alinhamento de personalidade e estatura do cão com o seu usuário, que é acompanhado pelo cego com o cão. É um processo que demora de cinco a sete meses. No Brasil, o treinamento de cães-guia é realizado pelo Projeto Integrar da Polícia Federal do Distrito Federal e por treinadores autônomos. Os cães-guia podem também ser chamados de cães de assistência, pois depois de bem treinados podem desempenhar atividades assistivas, como por exemplo, avisar a pessoa com deficiência auditiva que o telefone ou a campainha está tocando, alertar para ruídos não co- muns, auxiliar pessoas com dificuldade motora etc. É a inteligência animal a serviço do ser humano. 139 6.2. O Papel da Família Frente às Necessidades Educativas Especiais A família é o porto seguro e o aconchego para todos os seus membros. A criança necessita do equilíbrio psíquico, principalmente, para poder cres- cer e desenvolver-se naturalmente, sem que haja um fator desencadeante de conflitos internos que fu- turamente possam prejudicar sua conduta na vida, descartando nesse sentido, qualquer interferência de fatores genéticos. O ambiente familiar precisa ser acolhedor e suprir as necessidades de alimento, de carinho, de afeto de seus filhos, sem, contudo, desconsiderar a formação de valores e de limites necessários à estru- tura integral das crianças. Uma criança quando se sente amada, respei- tada, valorizada, acolhida é capaz de responder bem a quaisquer estímulos provenientes do ambiente social, de lidar melhor com as frustrações, com a imposição delimites. A criança quando em perfeito equilíbrio psíquico irradia harmonia em torno de seu universo e apresenta uma autoestima elevada. Famílias que apresentam crianças que so- frem de deficiência visual precisam receber todo o apoio necessário e o conhecimento para lidar com 140 as necessidades do filho. Isso pode até tornar-se uma resistência e uma negação da deficiência por parte dos pais, que muitas vezes levam tempo para aceitar a deficiência do filho. Nesse sentido, a escola, os centros de aten- dimento às crianças portadoras de necessidades edu- cativas especiais devem oferecer a esses pais os sub- sídios de como lidar com a realidade inesperada, na maioria dos casos. Uma ajuda terapêutica precoce, no sentido de desenvolver na família um olhar diferen- ciado sobre filho, é fundamental, pois a partir disso é possível descobrir caminhos possíveis para apoiar e ajudar a criança em seu desenvolvimento. Isso se confirma com as palavras de Kortmann (apud Sto- báus e Mosquera, 2006, p. 222): “Os peculiares fenômenos das relações familiares parecem expressar hipoteticamente vicissitudes que tradicionalmente são enfatizadas quando referidas à problemática das pessoas portadoras de deficiên- cia; as vicissitudes da relação com o outro. O filho do nosso sonho tem um lugar guardado dentro de nós, com um imaginário todo próprio em termos de características, o jeitinho do pai, os olhas da mãe. E quando o filho do imaginário não vem, e no lugar deste nasce outro com outras características, o mundo do casal e da família desfaz-se muitas vezes, eles sentem-se perdidos e muitas vezes se desautorizam a 141 serem pais dessa nova criança mesmo sendo pais de outros filhos, pois se perdem na maneira de agir.” Os pais necessitam adaptar-se à ideia da defi- ciência do filho, e vão ganhando segurança à medida que conseguem lidar com as necessidades da criança, quando conhecem procedimentos de intervenção fa- miliar. Portanto, a família deve ser sempre orientada a ensinar, a ajudar, a oferecer suporte, a compartilhar e a respeitar a criança com deficiência visual. Con- forme Herimers (1970), à família cabe a tarefa de oferecer ao portador de deficiência visual condições suficientes para seu crescimento como indivíduo, de modo que seja capaz de construir a felicidade e de sentir-se útil dentro de sua realidade, a partir das po- tencialidades, que tem a oferecer e dos limites que devem ser considerados. Esse processo é essencial para a aprendiza- gem, pois a criança irá ter contato com outras pes- soas que compartilham de sua deficiência e os sem deficiência, frequentarão a escola e participarão da sociedade com outras pessoas. 142 6.3. Escolha Profissional – Orientações Para orientar o jovem estudante portador de deficiência visual a uma escolha profissional, é neces- sário levar em conta os interesses, as aptidões, e se as atribuições do trabalho se encaixam nos limites da deficiência do jovem. O Art. 35 da Seção IV da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), assim se refere ao ensino médio: “O ensino médio, etapa final da educação básica, com duração mínima de três anos, terá como finali- dades: I - a consolidação e o aprofundamento dos conheci- mentos adquiridos no ensino fundamental, possibili- tando o prosseguimento dos estudos; II - a preparação básica para o trabalho e a cida- dania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; III - o aprimoramento do educando como pessoa hu- mana, incluindo a formação ética e o desenvolvimen- to da autonomia intelectual e do pensamento crítico; IV - a compreensão dos fundamentos científico- -tecnológicos dos processos produtivos relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.” 143 Embora, seja objetivo do ensino médio a preparação para o mundo do trabalho, a percepção do valor de trabalho deverá configurar-se a partir da interação da criança nas práticas pedagógicas, que se deverão fazer pertinentes, para que o conceito de tra- balho seja construído gradativamente, com base no prazer de fazer, de autorrealizar-se e de participar ati- vamente da sociedade. A criança tem como seu primeiro trabalho o estudo. Por isso, é importante que o ensino ministra- do nas escolas seja intencionalmente planejado, com vistas a incutir no aluno a necessidade da aprendiza- gem para sua vida e as consequências decorrentes de um esforço intelectual persistente. Nós, em geral, tendemos a compensar de- terminadas limitações, focando naquilo que somos capazes de executar sem tantos problemas. Isso pode acontecer muito com os deficientes. Especialmente, com o deficiente visual, essa tendência compensató- ria pode ser positiva se bem direcionada. Os planejamentos pedagógicos da escola de- vem ser acompanhados pelo coordenador pedagógi- co, que juntamente com os professores e os demais profissionais da instituição, programarão atividades diversificadas que ofereçam aos alunos oportunida- des de atuação na vida social. Nisso reside a importância de um planeja- mento pedagógico que inclua as artes plásticas, as 144 artes cênicas, música, dança, trabalhos manuais, culi- nária, literatura, informática e outras opções. Essas atividades quando sistematizadas tornam-se estraté- gias para a escolha profissional. Algumas escolas especiais oferecem aos alu- nos cegos e de baixa visão, além desses programas outros que não fazem parte do universo pedagógico das escolas comuns como, por exemplo, a prática da afinação de piano, as oficinas para trabalhos com ma- deira, para preparação de produtos de higiene pesso- al e ambiental, para a confecção de artesanato, bem como cursos diversos compatíveis com o interesse de algumas pessoas com deficiência visual, tais como massoterapia, telefonista, operador de telemarketing, operador de microcomputador para cegos e para pes- soas de baixa visão. (MEC, 2001, p. 114-115) Tendo por base o estudo profissiográfico realizado pelo Instituto Benjamin Constant, reco- menda-se às entidades especializadas na área (centros de reabilitação, centros de habilitação, associações de pessoas deficientes, centros de vida independente) o seguinte (MEC, op.cit., p. 119-1120): • “criação de uma equipe técnica interdisciplinar (as- sistente social, orientador vocacional, psicólogo, pro- fessor) conhecedoras das potencialidades e limitações das pessoas cegas ou de baixa visão; • realização de cadastramento do público alvo, com 145 informações a respeito de sua formação, aptidão, in- teresse e experiência profissional; • realização de pesquisa de mercado voltada para realidade local; • indicação e/ou organização de cursos voltados para a informação e qualificação profissional; • indicação e/ou organização de cursos e/ou pales- tras sobre preparação para o trabalho.” Em relação a pessoas que pretendem atuar como autônomas ou abrir seu próprio negócio, deve- -se orientá-las a fazer contato com as empresas obje- tivando (MEC, op.cit., p. 120): • “verificar se a empresa possui, em seu quadro, um histórico de aproveitamento de pessoas cegas ou de visão reduzida (VR); • ouvir e esclarecer as preocupações dos empregado- res quanto à contratação ou manutenção das pessoas cegas ou de VR; • realizar o levantamento das vagas existentes e analisar os requisitos do emprego e as condições de trabalho; • verificar entre as vagas oferecidas aquelas compatí- veis com as possibilidades do público alvo; • orientar os empregadores quanto às possíveis aqui- sições, adaptações e utilização de recursos técnicos, 146 ópticos e ambientais que facilitam o desempenho das pessoas cegas ou de VR no exercício de suas tarefas; • divulgar junto aos empregadores a efetiva capacida- de profissional das pessoas cegas e de VR; • realizar pré-seleção dos candidatos que preencham o perfil exigido para a vaga oferecida; • promover o encaminhamento dos candidatos para avaliação naempresa; • garantir apoio técnico na fase de adaptação da pes- soa cega ou de VR na empresa e consequente acom- panhamento no decorrer do processo; • realizar contato com serviços que atuam no en- caminhamento profissional de pessoas cegas ou de VR a fim de promover o desenvolvimento de ações integradas.” O deficiente visual como qualquer outra pes- soa vidente pode ser um fazedor de ideias, um criador, um inventor. Deve partir da crença de que em seu íntimo existe uma força que o impulsiona a buscar o caminho, que o faça empreender em algo que lhe traga satisfação, realização e contribuição social. 147 Complementação de Estudos O uso da Bengala Conheça um pouco mais como tudo começou... “Em 1945, o exército americano sentia-se passivo e inoperante diante dos soldados cegados na guerra; 2358 recrutas recebendo pensão do governo e com sua locomoção comprometida. Primeiro Te- nente Oftalmologista, Richard Hoover, junto com sua equipe, propôs estudar e tratar o problema da ce- gueira e o mecanismo da marcha. Hoover criou um método revolucionário de locomoção. Usando um instrumento que lembrava um bastão, mas com fun- ção, material e comprimento diferentes. A aplicação desta técnica foi um sucesso extraordinário. Hoover desenvolveu um sistema de exploração para ser efe- tuado com o toque da ponta da bengala, que transmi- tiria todas as sensações táteis detectadas por ela. Em 1948, terminada a primeira etapa, Hoover estendeu o projeto aos demais soldados cegos. Vendo o interesse da sociedade civil, educadores e familiares dos cegos civis, a partir daí difundiu-se, a todos os interessa- dos, a técnica da bengala longa. A técnica de Hoover pela sua comprovada eficácia segue sendo a única em vigor em todo o mundo. Em 1957, Joseph Albert 148 Apenjo, enviado pela ONU ao Brasil, veio transmitir as técnicas de orientação e mobilidade ao primeiro grupo de profissionais interessados.” (Juliana Durand - Professora do Instituto Hélio Góes) Referências Bibliográficas: ARCIA, Nely, 2003 - “Como” desenvolver progra- mas de Orientação & Mobilidade; MEC-SEESP, 2003 - Orientação & Mobilidade: Conhecimentos básicos para inclusão do defi- ciente visual - Brasília. Laramara20 Histórico Associação Brasileira de Assistência ao De- ficiente Visual é uma organização da sociedade civil, sem fins de lucro e sem vínculos políticos ou reli- giosos. Foi fundada em 7 de setembro de 1991, pelo casal Victor e Mara Siaulys - pais de uma garota cega - e por um grupo de profissionais atuantes na área. Desde o início, o foco de atenção da insti- tuição não foi apenas o atendimento individual da criança, como usualmente se fazia, mas a educação e 20 Informações de http://www.laramara.org.br 149 inclusão como um todo, num trabalho centrado tam- bém na família, escola e comunidade. Atualmente, o Atendimento Educacional Especializado é desenvolvido através de ações de complementação e suplementação educacional vi- sando questões muito mais amplas como a empre- gabilidade, a cultura e o lazer das crianças, jovens e adultos com deficiência visual. Laramara dispõe de uma área de 9.000 m2 distribuídos em 5 prédios, sendo 2 deles dedicados às Unidades de Negócios (que colaboram na susten- tabilidade da instituição). A concepção arquitetônica foi baseada nas necessidades específicas das pessoas com cegueira e baixa visão e tem servido de referên- cia para muitos profissionais, que buscam ideias para adaptações de prédios e espaços públicos. Desde sua fundação até os dias de hoje, atendeu cerca de 9.000 famílias vindas de todo o Bra- sil e do exterior e tem 600 crianças, jovens e adultos integrados em algum tipo de programa ou serviço; possui 250 funcionários. Prestadora de serviços e produtos especializados para pessoas com deficiência visual A Laramara dispõe de dois principais depar- tamentos, a fábrica de máquinas Braille e Bengalas, e o Laratec. O trabalho com as máquinas Braille é realiza- 150 do por meio de parcerias internacionais, as quais pos- sibilitam a Laramara montar, importar e distribuir para todo o Brasil diferentes modelos de máquina Braille. As bengalas produzidas são de diversos ta- manhos com as seguintes características: • Bengala dobrável de alumínio leve com cabo de borracha anatômico (macio e de fácil manuseio), pintura eletrostática que reflete a luz, ponteira fixa ou rolle de nylon 6.0 diâmetro 20 mm que dá maior durabilidade, elástico revestido com nylon – 4 voltas que oferece maior resistência. A Laratec é um departamento de tecnologias criado pela Laramara e objetiva o acesso à tecnologia de ponta do primeiro mundo. A Laramara comercializa produtos e servi- ços da mais alta tecnologia, dentre os quais se po- dem destacar: • Software Jaws e Jaws Talke • Diferentes tipos de bengalas • Diferentes tipos de relógios • Impressoras Braille • Diversos modelos de máquinas Braille • Suporte diferenciado ao usuário • Atendimento personalizado • Pesquisa permanente 151 • Materiais informativos que divulga o que existe de mais atualizado em tecnologia assistiva para pessoas com deficiência visual. A empresa Bengala Branca Importação e Comér- cio LTDA, situada em Porto Alegre/RS, importa e comercializa produtos e serviços especializados que tornam a pessoa com deficiência visual mais inde- pendente. Os principais produtos comercializados são: • Agendas Braille • Bengalas de locomoção • Calculadoras falantes • Gráficos táteis • Impressoras Braille • Jogos adaptados • Jogos pedagógicos • Lupas e ampliadores de imagem • Papéis para escrita e impressão Braille • Regletes • Relógios Braille e falante, além de outros produtos Os principais serviços comercializados são: • Gráfica Braille: impressão em Braille e encadernação; • Suporte técnico; • Manutenção. 152 Atividades 1 Relacione os recursos tecnológicos especiais para os deficientes visuais. 2 Pesquise no mercado de trabalho como está a in- serção do deficiente visual. 3 Procure fazer um levantamento das atividades de trabalho possíveis de serem desenvolvidos pelo defi- ciente visual. 153 Referências Bibliográficas ALMEIDA, Maria da Glória de Souza. Prontidão para alfabetização através do sistema Braille. Rio de Janeiro: Instituto Benjamin Constant, 1995. Mimeo. _____________________________. Guia teórico para alfabetização em Braille (Mimeo). Rio de Janei- ro: Instituto Benjamin Constant, 1995. AMIRALIAN, M. L. T. M. Interação – condição bá- sica para o trabalho do portador de Deficiência Visual – tendências e desafios da educa- ção especial. Brasília: SEESP, 1994. BARRAGA, Natalie. Programa para desenvolver a eficiência visual. Trad. Fundação para o livro de Cego no Brasil. São Paulo: Atual, 1983. BRUNO, Marilda Moraes Garcia. Educação Infantil: saberes e práticas de inclusão: dificuldades de comu- nicação sinalização: deficiência visual. Brasília: MEC – Secretaria de Educação Especial, 2006. __________________________. O deficiente vi- sual na classe comum. São Paulo: CENP/SEE/SE, 1993. 154 CARVALHO, Rosita Edler. A nova LDB e a educa- ção especial. Rio de Janeiro: WVA, 1997. COOL, César Palacios J. Necessidades educativas es- peciais e aprendizagem escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. Vol.3. CUNHA, Maria Isabel da. O bom professor e sua prática. 12ª ed. 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