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Beatriz Santos Processos agudos do periodonto Processos agudos do periodonto são condições clínicas que se estabelecem rapidamente envolvendo periodonto e às vezes gengiva associada, caracterizadas por dor, desconforto e infecção aguda. As duas grandes classes dessas doenças são: - Doenças periodontais necrosantes - Abscessos do periondonto Doenças periodontais necrosantes 1) Gengivite Ulcerativa Necrosante (GUN) É uma doença inflamatória necrosante causada por uma infecção endógena, na qual alterações sistêmicas predispõem o tecido gengival à invasão de bactérias da microbiota. Nos países desenvolvidos a prevalência vem diminuindo e atinge principalmente pessoas com cerca de 30 anos e países não desenvolvidos, como os da África, a prevalência é grande e atinge principalmente crianças. No Brasil, a faixa etária inclui adolescentes e jovens adultos. Etiologia: a) Fator etiológico primário: bactérias oportunistas (bactérias endógenas e que por alguma alteração passam a proliferar em maior quantidade em detrimento de outras). As bactérias responsáveis são anaeróbias, principalmente espiroquetas e bacilos fusiformes. As evidências para isso incluem o fato de pacientes com GUN apresentarem alto número de anticorpos para essas bactérias e o fato da doença regredir com o uso de Metronidazol (eficaz contra bactérias anaeróbias). b) Fatores predisponentes: gengivite preexistente, fumo, estresse emocional, deficiência nutricional e doenças debilitantes. Características clínicas: Sempre presentes: -Úlceras gengivais crateriformes na gengiva interdental e inversão papilar -Vermelhidão -Sangramento fácil ao toque ou espontâneo -Dor e desconforto Possivelmente presentes: -Grande quantidade de placa bacteriana, porém não associadas à causa e sim como uma consequência (o paciente não consegue manter uma correta higienização) -Presença de pseudomembrana (formada por leucócitos etc.) -Odor fétido -Linfoadenopatia -Febre -Aumento de salivação -Sensação de gosto metálico Normalmente é observada na região anterior. 2) Periodontite Ulcerativa Necrosante (PUN) É uma doença infecciosa de etiologia semelhante à GUN, caracterizada pela necrose tanto dos tecidos gengivais quanto do periodonto de sustentação. Muito se discute se realmente GUN e PUN são doenças diferentes ou se a PUN seria a progressão da GUN. Obs.: A PUN acomete principalmente pacientes imunossuprimidos (HIV+ etc.). Características clínicas: -Todas da GUN -Perda e desnudação óssea (o osso fica visível) -Sequestro ósseo Diagnóstico das doenças periodontais necrosantes (GUN e PUN) Baseia-se em características clínicas e na história médica (altamente associadas ao vírus HIV). Diagnóstico diferencial: -Gengivoestomatite herpética -Doenças infecciosas e condições mucocutâneas -Lesões gengivais traumáticas A gengivoestomatite herpética (GEH) é a mais frequentemente associada à GUN, por ser uma lesão que pode apresentar ulcerações, acúmulo de biofilme, inflamação gengival, linfoadenopatia e febre. O quadro abaixo lista diferenças entre elas que ajudam a diferenciá-las. GUN GEH Idade 15-30 Crianças Sítio na gengiva Papila e gengival marginal Sem predileção Úlceras Protuberantes e crateriformes que sangram facilmente Vesículas que se rompem formando úlceras arredondadas que não sangram facilmente Febre Ausente ou moderada Alta Dor Gengiva Boca toda Duração 1 a 3 dias com tratamento Mais ou menos 1 semana com tratamento Tratamento das doenças periodontais necrosantes (GUN e PUN) Tratamento da fase aguda: a) Na clínica: -Remoção de debris superficiais com gaze e H2O2 (a água oxigenada é indicada por se tratar de doenças causadas por bactérias anaeróbias) -Raspagem superficial com ultrassom b) Em casa: -Bochechos com partes iguais de água morna e peróxido de hidrogênio (H2O2) 10vol a cada 2h durante 4 a 5 dias - Metronidazol 350mg ou 400mg, 3x ao dia, durante 4 a 5 dias -Analgésicos como Paracetamol (se necessário) Tratamento da condição residual: -RAR -OHB -Eliminação de fatores retentores de placa -Complementação cirúrgica (se necessário) -Controle e manutenção Abscesso periodontal Abscesso é uma área circunscrita de inflamação que tem em sua parte central uma coleção de pus. Etapas da formação de um abscesso: 1. Bactérias invadem os tecidos moles; 2. Células inflamatórias são atraídas para o local; 3. Neutrófilos liberam enzimas que digerem células e outros componentes teciduais, formando pus; 4. O infiltrado encapsula a região afetada para tentar impedir a disseminação da infecção. Abscessos odontogênicos: Podem ser de origem endodôntica (dentoalveolares/periapicais) ou de origem periodontal. Os de origem periodontal se dividem em três grupos: 1) Abscesso periodontal: É uma infecção purulenta circunscrita, no interior da parede gengival de uma bolsa periodontal, que resulta na destruição dos tecidos do periodonto de sustentação. É a terceira urgência odontológica mais prevalente (representa de 15 a 20% delas). Manifestações clínicas: apresenta tumefação geralmente na região interdental, com alteração da consistência, grande profundidade de sondagem, sangramento à sondagem, desconforto irradiado moderado, supuração à sondagem ou pressão, dente sensível à percussão, pode haver mobilidade dentária, pode apresentar evidência radiográfica de perda óssea. Ocorre em qualquer face. Etiologia: REAVALIAÇÃO REAVALIAÇÃO FINAL a) Fator etiológico primário: causado pela presença de bactérias patogênicas nos tecidos periodontais. b) Fatores predisponentes: dependem da presença ou não de bolsa preexistente. Formados em locais COM bolsas periodontais preexistentes: são mais comuns, tendem a ocorrer em pacientes com bolsas periodontais profundas e/ou sinuosas. Podem decorrer da própria terapia periodontal (principalmente quando se faz a RAR supragengival e a subgengival em outra), pode ter relação com o diabetes e antibioticoterapia recente sem terapêutica periodontal. Formados em locais SEM bolsas periodontais preexistentes: causados por corpos estranhos impactados, fraturas, perfurações e reabsorções dentais ou, ainda, por forças oclusais excessivas. Diagnóstico: Baseia-se na anamnese, características clínicas e achados radiográficos. Abscesso periapical x periodontal: Podem ser muito semelhantes, tendo em comum: -Tumefação da gengiva/mucosa oral -Dor -Mobilidade dentária -Sensibilidade à percussão -Febre e linfoadenopatia O diagnóstico diferencial entre elas se dá com base nas seguintes características: Aspecto Abscesso periodontal Abscesso periapical Tumefação e lesão radiográfica Interdental, raramente forma celulite Apical, formação mais frequente de celulite Vitalidade Positivo ou negativo Negativo Dor Ausente ou moderada Intensa Profundidade de sondagem Aumentada Normal História dental Doença periodontal Cárie, restauração extensa Tratamento: Tratamento da fase aguda: dura mais ou menos 2 dias. a) Na clínica: -Drenagem (pode ser feita de duas maneiras: 1. Com a sonda no sulco, abre o caminho e faz uma pequena raspagem para diminuir a carga bacteriana, irrigando com uma seringa com Clorexidina a 0,12%; 2. Faz-se a antissepsia, anestesia tópica e depois por bloqueio e, finalmente, a drenagem via bolsa ou incisão externa) b) Em casa: -Bochechos com Clorexidina a 0,12%, 2x ao dia -Antibioticoterapia com Amoxicilina 500mg a cada 8h, por 4 a 5 dias (em caso de manifestações sistêmicas, como febre, moleza e linfoadenopatia) -Analgésicos como Paracetamol (se necessário) Tratamento da fase residual: - Avaliação (1 semana após) - Terapia não cirúrgica (RAR) REAVALIAÇÃO - Terapia cirúrgica 2) Abscessos gengivais: É uma infecção purulenta no sulco gengival, sem destruição dos tecidos periodontaisde suporte. Manifestações clínicas: tumefação na gengiva marginal ou papilar em superfície lisa, brilhante e avermelhada, de consistência flácida ou semi-flácida e dolorosa. Frequentemente ocorre em locais de normalidade ou com bolsas periodontais não severas. Etiologia: corpos estranhos introduzidos forçadamente nos tecidos gengivais, provocando uma reação inflamatória local (Ex.: restos alimentares, palito, fio dental, fragmentos de materiais restauradores, cerdas de escovas, bandas ortodônticas mal adaptadas etc.). Diagnóstico: anamnese e exame físico periodontal. Tratamento: Consulta inicial: remoção do agente etiológico, drenagem (através do sulco ou por incisão externa), bochecho com solução salina aquecida a cada 2 horas. 24 horas depois: RAR 3) Abscesso pericoronário ou pericoronarite: É uma infecção purulenta localizada no tecido que recobre a coroa de um dente (capuz pericoronário) parcialmente ou totalmente erupcionado. Manifestações clínicas: tumefação, vermelhidão, dor intensa ao toque. Pode apresentar dificuldade para abrir e fechar a boca (trismo), halitose, manifestações sistêmicas (febre, mal- estar e linfoadenopatia), envolvimento de outros sítios e formação de celulite. Maior prevalência: região de terceiros molarez mandibulares parcialmente erupcionados. Etiologia: a) Fator etiológico primário: acúmulo de restos alimentares e, consequentemente, de bactérias no espaço entre a coroa do dente e o capuz pericoronário. b) Fatores predisponentes: -Dentes parcialmente erupcionados em contato com a cavidade oral -Trauma por dentes antagonistas -Higiene oral deficiente -Infecções no trato respiratório Tratamento: Fase aguda: -Irrigação com soro ou clorexidina e debridamento leve abaixo do capuz -Analgesia com AINES (se necessário) -Antibioticoterapia com Amoxicilina 500mg + Metronidazol 250mg 3x ao dia (caso hajam manifestações sistêmicas) -Bochechos com Clorexidina a 0,12% -Relaxante muscular (Ex.: Carisprodol) em caso de trismo Após o fim da fase aguda, faz-se uma avaliação para saber: -Posição de erupção do dente -Presença de tecido queratinizado distal ao elemento dentário (se for queratinizado, remove-se o tecido e este não retorna; se não for queratinizado, ocorre a recidiva, havendo indicação para exodontia)