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Prévia do material em texto

FUNDAMENTOS 
HISTÓRICOS E 
FILOSÓFICOS DA 
EDUCAÇÃO
Professor Me. Gilson da Costa Aguiar
Professor Me. Rodrigo Pedro Casteleira
GRADUAÇÃO
Unicesumar
C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação 
a Distância; AGUIAR, Gilson da Costa; CASTELEIRA, Rodrigo 
Pedro. 
Fundamentos Históricos e Filosóicos da Educação. Gilson 
da Costa Aguiar; Rodrigo Pedro Casteleira. 
Maringá-Pr.: UniCesumar, 2017. Reimpresso em 2019.
240 p.
“Graduação - EaD”.
1. História. 2. Filosoia. 3. Educação. 4. EaD. I. Título.
ISBN 978-85-459-0587-5
CDD - 22 ed. 370
CIP - NBR 12899 - AACR/2
Ficha catalográica elaborada pelo bibliotecário 
João Vivaldo de Souza - CRB-8 - 6828
Impresso por:
Reitor
Wilson de Matos Silva
Vice-Reitor
Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor Executivo de EAD
William Victor Kendrick de Matos Silva
Pró-Reitor de Ensino de EAD
Janes Fidélis Tomelin
Presidente da Mantenedora
Cláudio Ferdinandi
NEAD - Núcleo de Educação a Distância
Diretoria Executiva
Chrystiano Minco�
James Prestes
Tiago Stachon 
Diretoria de Graduação e Pós-graduação 
Kátia Coelho
Diretoria de Permanência 
Leonardo Spaine
Diretoria de Design Educacional
Débora Leite
Head de Produção de Conteúdos
Celso Luiz Braga de Souza Filho
Head de Curadoria e Inovação
Jorge Luiz Vargas Prudencio de Barros Pires
Gerência de Produção de Conteúdo
Diogo Ribeiro Garcia
Gerência de Projetos Especiais
Daniel Fuverki Hey
Gerência de Processos Acadêmicos
Taessa Penha Shiraishi Vieira
Gerência de Curadoria
Giovana Costa Alfredo
Supervisão do Núcleo de Produção 
de Materiais
Nádila Toledo
Supervisão Operacional de Ensino
Luiz Arthur Sanglard
Coordenador de Conteúdo
Priscilla Campiolo Manesco Paixão
Designer Educacional
Yasminn Talyta Tavares Zagonel
Projeto Gráico
Jaime de Marchi Junior
José Jhonny Coelho
Arte Capa
Arthur Cantareli Silva
Ilustração Capa
Bruno Pardinho
Editoração
Ana Carolina Martins Prado
Qualidade Textual
Talita Dias Tomé
Ludiane Aparecida de Souza
Em um mundo global e dinâmico, nós trabalhamos 
com princípios éticos e proissionalismo, não so-
mente para oferecer uma educação de qualidade, 
mas, acima de tudo, para gerar uma conversão in-
tegral das pessoas ao conhecimento. Baseamo-nos 
em 4 pilares: intelectual, proissional, emocional e 
espiritual.
Iniciamos a Unicesumar em 1990, com dois cursos 
de graduação e 180 alunos. Hoje, temos mais de 
100 mil estudantes espalhados em todo o Brasil: 
nos quatro campi presenciais (Maringá, Curitiba, 
Ponta Grossa e Londrina) e em mais de 300 polos 
EAD no país, com dezenas de cursos de graduação e 
pós-graduação. Produzimos e revisamos 500 livros 
e distribuímos mais de 500 mil exemplares por 
ano. Somos reconhecidos pelo MEC como uma 
instituição de excelência, com IGC 4 em 7 anos 
consecutivos. Estamos entre os 10 maiores grupos 
educacionais do Brasil.
A rapidez do mundo moderno exige dos educa-
dores soluções inteligentes para as necessidades 
de todos. Para continuar relevante, a instituição 
de educação precisa ter pelo menos três virtudes: 
inovação, coragem e compromisso com a quali-
dade. Por isso, desenvolvemos, para os cursos de 
Engenharia, metodologias ativas, as quais visam 
reunir o melhor do ensino presencial e a distância.
Tudo isso para honrarmos a nossa missão que é 
promover a educação de qualidade nas diferentes 
áreas do conhecimento, formando proissionais 
cidadãos que contribuam para o desenvolvimento 
de uma sociedade justa e solidária.
Vamos juntos!
Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está 
iniciando um processo de transformação, pois quando 
investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou 
proissional, nos transformamos e, consequentemente, 
transformamos também a sociedade na qual estamos 
inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportu-
nidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de 
alcançar um nível de desenvolvimento compatível com 
os desaios que surgem no mundo contemporâneo. 
O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de 
Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo 
este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens 
se educam juntos, na transformação do mundo”.
Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógica 
e encontram-se integrados à proposta pedagógica, con-
tribuindo no processo educacional, complementando 
sua formação proissional, desenvolvendo competên-
cias e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em 
situação de realidade, de maneira a inseri-lo no mercado 
de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal 
objetivo “provocar uma aproximação entre você e o 
conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento 
da autonomia em busca dos conhecimentos necessá-
rios para a sua formação pessoal e proissional.
Portanto, nossa distância nesse processo de cresci-
mento e construção do conhecimento deve ser apenas 
geográica. Utilize os diversos recursos pedagógicos 
que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita. 
Ou seja, acesse regularmente o Studeo, que é o seu 
Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns 
e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe das dis-
cussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe 
de professores e tutores que se encontra disponível para 
sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de 
aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranqui-
lidade e segurança sua trajetória acadêmica.
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E
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Professor Me. Gilson Costa de Aguiar
Possui mestrado em História e Sociedade pela Universidade Estadual Paulista 
Júlio de Mesquita Filho (1999). Graduação em História pela Universidade 
Estadual de Maringá (UEM/1991). Atualmente é professor titular do Centro 
Universitário de Maringá e do Ensino a Distância do UniCesumar. Atua 
nas áreas de Teoria das Ciências Sociais, Sociologia da Educação, Filosoia 
da Educação e História da Educação e possui livros publicados nas Áreas 
de Sociologia, Antropologia, Filosoia e História da Educação. Atua como 
jornalista na rede CBN de rádio e é âncora e colunista na CBN Maringá e 
Gazeta Maringá. 
http://lattes.cnpq.br/3020130108890878
Professor Me. Rodrigo Pedro Casteleira
Possui mestrado em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Maringá 
(UEM/2014). Graduação em Filosoia, pela Universidade Estadual de Maringá 
(UEM/2006). Atualmente é professor de Filosoia da Rede Pública Paranaense, 
lecionando, também, as disciplinas de Fundamentos Históricos e Filosóicos 
da Educação para os cursos de licenciatura pelo Centro Universitário de 
Maringá (UniCesumar).
http://lattes.cnpq.br/2234110887343110
SEJA BEM-VINDO(A)!
Saudações aluno(a), este trabalho é a realização de um objetivo e o começo de um de-
saio. Feito para garantir, a quem está cursando uma licenciatura, um entendimento das 
origens do pensamento ocidental e, por consequência, de como está estruturada nossa 
forma de compreender a contemporaneidade.
Este livro é fruto de uma insistência em compreender melhor o que somos para traçar 
um caminho para o desenvolvimento do pensamento ocidental e da educação no Brasil. 
É ainda um desaio quanto à função deste material qualiicar quem educa, as pessoas 
que terão em suas mãos a capacidade de preparar outras e lhes dar potencial para mu-
dar seu destino. Desejamos que cada pessoa, ao lê-lo, se permita mergulhar no universo 
da curiosidade e pesquisa, a im de alcançar saberes e conhecimentos cada vez mais 
profundos. 
Na Unidade I, trabalharemos os pensadores clássicos. Colocaremos em questão as pri-
meiras construções do pensamento ocidental com o homem grego. Resgataremos os 
pré-socráticos e seus dramas da existência - drama que ainda hoje rodeia nossas vidas.
A partir da Unidade II, avançaremos para o pensamento moderno e contemporâneo. A 
supremacia planetária da ilosoia ocidental: as conquistas econômicas e sociais da so-
ciedade europeia se expressaram em sua compreensão do homem, na sua organização 
política e, em especial, na formação dos estados nacionais. Assim, esta unidade ainda 
contemplaos grandes clássicos das ciências sociais: o positivismo de Comte, o estrutu-
ralismo de Durkheim, o materialismo de Marx e a história cultural de Weber. Mais que 
isso, resgataremos os pensadores contemporâneos do existencialismo e os que resga-
taram por meio da fenomenologia a crise do indivíduo contemporâneo. Pelo fato de o 
homem de hoje estar em crise, necessitamos analisar com profundidade os fatores que 
a determinaram. Esse é um dos temas centrais da discussão desta unidade.
A Unidade III revelará o cenário brasileiro educacional desde a chegada dos jesuítas jun-
to da comitiva de colonização até a retirada do sistema educacional das mãos religiosas. 
Nesta Unidade será possível perceber a lacuna deixada pelo Estado no âmbito educacio-
nal até o período da República.
Na Unidade IV, o período republicano não revelará um melhoramento no sistema edu-
cacional, apesar da laicidade adquirida e da absorção das ciências vindas da Europa. Na 
prática, veremos que a educação icará voltada à formação de mão de obra trabalhado-
ra.
A Unidade V é uma espécie de provocação frente a algumas questões contemporâneas 
de discussão do corpo e da antropologia ilosóica. Ao se pensar no corpo e como fo-
ram algumas de suas categorias pensadas na história e ilosoia, é possível romper com 
alguns paradigmas que o marcam como essencialidade inlexível, além de ser pensado 
como múltiplo, ao mesmo tempo passível de respeitabilidade.
Procuraremos demonstrar o papel que o estado teve na ineiciência da educação pú-
blica ao longo de boa parte da história brasileira. Mesmo quando assumiu o papel de 
APRESENTAÇÃO
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS E FILOSÓFICOS
DA EDUCAÇÃO
propagar a educação, fez de forma quantitativa e não qualitativa. Mesmo hoje, os 
resultados da educação do país, comparados com a de outros países, preocupam. 
O desempenho dos nossos alunos do ensino público comparado com o privado 
também é um dilema. A história é um importante instrumento para orientar nossa 
análise sobre esses problemas.
Esperamos que o objetivo seja atingido. Sempre haverá algo a ser refeito. Sempre 
teremos que repensar nossa forma de compreender o mundo, sempre descobrire-
mos imperfeições. A imperfeição é nossa característica mais importante, e o repen-
sar o nosso maior instrumento de superação - um trabalho que pedimos a ajuda dos 
nossos leitores. Não rogamos a plenitude, quando educar implica em reconhecer 
que se tem algo a aprender. Por isso, envie observações, faça e refaça também a sua 
versão sobre o conteúdo desta obra, ela é feita para você e deve ser revista a partir 
do momento em que você se relaciona com o conteúdo que está presente nela.
“Um homem não toma banho duas vezes no mesmo rio”, a frase de Heráclito nunca 
deve ser esquecida. Enquanto autores, pensamos que este trabalho é como um rio, 
não será visto por nós da mesma forma, assim como não seremos os mesmos após 
tê-lo produzido. Espero que você também se transforme ao entrar em contato com 
ele. Ele também irá mudar por tudo isto, com certeza. A mudança é uma necessida-
de, se a ciência puder promover as bases para que ela ocorra sem perder o sentido 
que a vida tem para cada um de nós, preservando a convivência social e respeitan-
do-a, este trabalho terá cumprido o seu papel.
Desejamos a você um proveitoso estudo!
Gilson de Costa Aguiar
Rodrigo Pedro Casteleira
APRESENTAÇÃO
SUMÁRIO
09
UNIDADE I
A ORIGEM DA FILOSOFIA
15 Introdução 
16 A Origem do Pensamento Filosóico: Dos Pré-Socráticos aos Clássicos Gregos
26 Além da Grécia: As Civilizações Que Herdaram O Pensamento Grego 
35 O Pensamento Filosóico Medieval 
45 O Nascimento do Islã 
48 Cruzadas: a Palavra, a Espada e o Combate ao Califado 
51 O Nascimento do Pensamento Ocidental Moderno 
61 A Construção do Estado Nacional e a Ciência Política 
69 O ‘Senhor’ do Pensamento Moderno 
74 Do Racionalismo às Portas do Iluminismo 
79 Considerações Finais 
UNIDADE II
DO PENSAMENTO ILUMINISTA AO CONTEMPORÂNEO
91 Introdução 
92 Iluminismo 
101 Teorias do Mundo Contemporâneo 
116 A Crise de Identidade Humana e as Teorias Contemporâneas 
125 Considerações Finais 
SUMÁRIO
10
UNIDADE III
A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL: UMA AUSÊNCIA SENTIDA
137 Introdução
138 Os Primeiros Tempos 
145 Educação Laica, o Abandono 
151 Da Colônia ao Império 
163 Considerações Finais 
UNIDADE IV
DA VELHA REPÚBLICA À REPÚBLICA NOVA
175 Introdução
176 O Regime Republicano: Educação de saliva e papel 
184 Eis Que Getúlio se Estabelece: O Modelo Imposto 
191 O Regime Militar e a Educação Abaixo de Botas 
198 Considerações Finais 
SUMÁRIO
11
UNIDADE V
FILOSOFIA, MODERNIDADES E CORPOS
209 Introdução
210 O Chamado Período Moderno e algumas Interpretações 
214 Algumas Questões para se Pensar a Filosoia Atual 
216 A Filosoia da Linguagem 
218 Corpos: Saberes que Atravessam as Fronteiras 
230 Considerações Finais 
238 CONCLUSÃO 
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Professor Me. Gilson da Costa Aguiar
Professor Me Rodrigo Pedro Casteleira
A ORIGEM DA FILOSOFIA
Objetivos de Aprendizagem
 ■ Entender os desdobramentos do pensamento ilosóico ocidental na 
Antiguidade, Grécia e Roma.
 ■ Compreender a importância dos pensadores clássicos gregos – Sócrates, 
Platão e Aristóteles – e seus princípios que se propagaram além da Grécia. 
 ■ Estabelecer a relação entre o desenvolvimento de uma ilosoia clássica 
com as mudanças que o mundo sofreu na passagem da Antiguidade para a 
Idade Média.
 ■ Compreender o pensamento moderno, derivado da lógica medieval cristã 
e suas bases, para o racionalismo do Período Moderno.
 ■ Entender a racionalidade ocidental como elemento fundamental para 
o desenvolvimento da ciência e da tecnologia que promoveram o 
desenvolvimento do Ocidente.
 ■ Relacionar o desenvolvimento da ciência política e do papel do poder na 
sociedade ocidental.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
 ■ A origem do pensamento ilosóico: dos pré-socrático aos clássicos gregos
 ■ Além da Grécia: as civilizações que herdaram o pensamento grego
 ■ O pensamento ilosóico medieval
 ■ O nascimento do Islã
 ■ Cruzadas: a palavra, a espada e o combate ao califado
 ■ O nascimento do pensamento ocidental moderno
 ■ A construção do estado nacional e a ciência política
 ■ O ‘senhor’ do pensamento moderno
 ■ Do racionalismo às portas do iluminismo
INTRODUÇÃO
Prezado(a) aluno(a), a importância da ilosoia como base para a compreensão 
do mundo, muitas vezes, é questionada. Sempre estamos à volta de que a relexão 
sobre o mundo que nos cerca é distante demais da realidade e de suas necessi-
dades. Pode haver uma verdade nisso. Se há uma verdade, ela está relacionada 
à ignorância da necessidade de compreender o signiicado da vida humana, do 
que um educador não pode abrir mão, mas que infelizmente muitos abrem.
Diante desta dúvida, procuramos apresentar em cinco unidades a trajetória 
do pensamento ocidental. Em relatos resumidos, com relacionamento constante 
com a contextualização histórica de cada pensador(a) e o contexto em que sua 
obra foi produzida, buscamos desenvolver um texto com os pontos fundamen-
tais do histórico pessoal e os elementos fundamentais que sustentam sua teoria.
Esta unidade parte do pensamento clássico grego, demonstrando as teses 
de Sócrates, Platão e Aristóteles como base do pensamento ilosóico ociden-
tal. É possível perceber que esses autores são citados no decorrer da Unidade, 
servindo de base para os demais ilósofos, além de trazer pensamentos que per-
passam a Idade Média.
Teóricos como Santo Agostinho, Santo Anselmo, São Abelardo e São homaz 
de Aquino demonstram a corrente de pensamento organizada dentro do discurso 
católico. A relação direta entre o conhecimento de Deus e a verdade humana. 
Por mais que superado na chamada “modernidade’, essa concepção dominou a 
vida europeia.
Nesta Unidade, a principal sugestão é perceber quanto o pensamento clás-
sico (grego)e o pensamento religioso moldam o que se tornará a ética ocidental. 
Ainda hoje temos instituições religiosas que estabelecem sua perspectiva de exis-
tência nas concepções que você vai estudar nesta Unidade.
Boa leitura!
Introdução
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A ORIGEM DA FILOSOFIA
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A ORIGEM DO PENSAMENTO FILOSÓFICO: DOS PRÉ-
SOCRÁTICOS AOS CLÁSSICOS GREGOS
Platão nos traz Sócrates como igura emblemática em diversas de suas obras, na 
forma de diálogo, uma vez que este nada escreveu. Em uma delas, relata o julga-
mento do pensador grego, considerado corruptor da juventude, mesmo sendo 
avaliado como o maior dos ilósofos, o “pai da ilosoia”.
Nesse episódio, o julgamento foi resultado da denúncia de três moradores 
de Atenas – Ânito, Meleto e Lícon.
O primeiro, Ânito, era um importante comerciante grego. Sua discórdia com 
Sócrates foi o ilho, um aprendiz do pensador. O comportamento questionador 
do aprendiz irritou o pai. Dessa forma, juntou-se aos demais e fortaleceu a acu-
sação assinada por Meleto.
Meleto era um poeta pouco conhecido, mas segundo se levantou nas obras 
escritas por pensadores gregos, teria se indisposto com Sócrates pela sua forma 
de propagar ideias e de questionar o ganho de quem cobrava do ministério de 
ensinar, assim como Lícon, um professor desconhecido, o prestígio de Sócrates 
irritava. “A inveja também mata, tanto quanto a vaidade”.
A Origem do Pensamento Filosóico: dos Pré-Socráticos aos Clássicos Gregos
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O PENSAMENTO SOCRÁTICO
Sócrates é um personagem controverso. Jamais deixou uma obra escrita, pelos 
menos até o momento nunca foi encontrado nenhum manuscrito de sua auto-
ria. O que se sabe sobre ele vem de relatos de outros pensadores - discípulos, 
como Platão ou inimigos e críticos, como Aristófanes.
Ele se negava aos manuscritos por considerar que a palavra escrita prenderia 
a ideia e a colocaria limites, destruindo a capacidade de mudança e eternizando 
os erros. Hoje, são exatamente estes erros escritos que nos faz reescrever o que 
somos. Mas, em uma Grécia onde a oralidade era o elemento determinante para 
a preservação da memória e repassar o saber, não havia o que julgar a postura.
Sua oposição aos soistas, homens que percorriam as cidades discursando 
sobre temas da natureza e da vida pública, lhe rendeu muitos inimigos. Sua crítica 
direcionava-se à prática de discutir sem questionar, ainal os soistas se prendiam 
ao que não discutia a essência humana, mas apenas à manutenção da conduta ou 
à complexidade de raciocínios que os afastavam dos homens comuns.
Oposto à vida dos soistas, Sócrates era visto em meio ao povo, andava des-
calço. Segundo Platão, brincava com crianças e se apegava a pensar e reletir sobre 
as questões profundas da existência humana. Jamais cobrou sobre suas palestras 
e diálogos. É possível perceber em um dos diálogos descritos por Platão: “Disse 
ele que o encontrara Sócrates, banhado e calçado com as sandálias, o que pou-
cas vezes fazia” (PLATÃO, 1972, p. 174).
A vida de ilosofar e reletir sobre a existência humana e a capacidade de enten-
der o que nos cerca veio ainda na infância do pensador grego, quando sua mãe, 
uma parteira, não de proissão, ao ajudar o nascimento de uma criança, desper-
tou em Sócrates o sentido da relexão, o que icou conhecido como “maiêutica”.
O papel de um ilósofo, então, seria colaborar para despertar o nascimento 
da relexão, o que todo mundo tem como potencial dentro de si. Permitir que 
essa capacidade se expresse e se mantenha constante ao entender os elementos 
que dão sentido à vida humana.
Por isso, Sócrates não se considerava um denunciador da verdade, mas 
alguém que tinha por propósito despertar a capacidade das pessoas de buscá-
-la. Para ele, mais importante do que propagar a certeza seria estimular a dúvida.
A ORIGEM DA FILOSOFIA
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Ficamos pensando se não seria essa a função dos educadores. Não só aque-
les que se formam hoje para a educação institucionalizada, como também os 
que têm a capacidade de nos indagar sobre o que nos cerca, sobre o dia a dia e, 
enim, toda a nossa vida. Desvendar o sentido da existência é o verdadeiro sen-
tido de existir - de que adianta existir se não se tem a compreensão do porquê 
se existe. Mas, como todo pensador que compreende além do senso comum o 
sentido da vida, Sócrates pagou com a sua própria audácia de romper com o 
esperado, de sair do controle, o que o conduziu a pagar com a vida, sendo obri-
gado a beber veneno.
Conta-se que atirou uma parte do veneno à maneira do que se fazia 
num jogo que consistia em lançar o resto de um copo de vinho numa 
bacia de metal, invocando o nome da pessoa amada; se o jato pro-
duzisse um som vibrante, era sinal de que o amor era correspondido 
(GOTO, 2010, p. 110).
Nasceu em uma família humilde em 469 a.C, e foi condenado em 399 a.C. Sua 
origem humilde contracenou com grandes momentos da história grega em que 
foi protagonista. Ele liderou tropas gregas na Guerra do Peloponeso (431 a.C a 
404 a.C) e, ao ser derrotado, preferiu preservar a vida de seus homens a trazer 
consigo os corpos dos mortos. Um crime para os gregos, mas se livrou da sen-
tença ao argumentar “que sem os vivos não se pode enterrar os mortos”. Mas, 
por ter se tornado o pensador inluente que percorria Atenas e “contaminava” 
sua juventude, foi condenado em uma assembleia de 501 cidadãos.
O interesse dos juízes era que Sócrates se calasse, que fugisse para não ser 
executado ou que tivesse a língua cortada. Ele preferiu morrer, considerava que 
era um ganho diante das outras opções que demonstravam a perda de fazer o 
que mais gostava.
Para ele, morrer teria duas possibilidades desconhecidas, uma delas seria um 
sono eterno para quem morresse, seria o bom sono de uma única noite; a outra, 
se caso existisse outra vida, seria de imortalidade e com homens bem melhores 
do que ele deixava nesta vida.
Uma das críticas feitas pelos amigos ao pensador grego, entre sua condena-
ção e a execução (30 dias), era que ele não pensava nos ilhos. Caso pensasse, 
deveria fugir para preservar a integridade de sua família. Diante dessa questão, 
A Origem do Pensamento Filosóico: dos Pré-Socráticos aos Clássicos Gregos
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19
ele dizia que os ilhos deviam seguir seu destino. Da mesma forma que eles não 
teriam que ser condenados pelo que o pai fez, não cabe ao pai fugir da conde-
nação por eles.
PLATÃO E A VERDADE UNIVERSAL, IR ALÉM 
DE SI, DAS DEMAIS PESSOAS. ALCANÇAR O 
ETERNO
A principal crítica de Platão (427 a.C a 347 a.C) direcio-
nava-se ao que não se estabelece como verdade universal. 
Por mais que exista a necessidade dos valores imedia-
tos da vida, temos que ter um sentido maior que norteia 
nossa existência. Não é por acaso que ele é um discípulo 
de Sócrates. O ilósofo compara com o sol a relação de 
verdade e de bem, considerando que o que se vê não é o 
sol em si, mas permite que se veja cada coisa.
Confessa, então, que o que derrama a luz da verdade sobre os objetos 
do conhecimento e proporciona ao indivíduo o poder de conhecer é a 
ideia do bem. Podes concebê-la como objeto de conhecimento por ela 
ser o princípioda ciência e da verdade, mas, por mais belas que sejam 
estas duas coisas, a ciência e a verdade, não te equivocarás se pensares 
que a ideia do bem é distinta delas e as ultrapassa em beleza. Como no 
mundo visível se considera, e com razão, que a luz e a visão são seme-
lhantes ao Sol, mas se acredita, erroneamente, que são o Sol da mesma 
forma no mundo inteligível é correta pensar que a cidade e a verdade 
são, uma e outra, semelhantes ao bem, mas é errado julgar que uma ou 
outra seja o bem; a natureza do bem deve ser considerada muito mais 
preciosa (PLATÃO, 2000, p. 221).
Sua trajetória dentro da ilosoia grega tentou consolidar o pensamento ilosóico 
e propagar a universalidade do conhecimento. Sua busca por orientar a forma-
ção de um governo justo, para ele, dirigido por um ilósofo, o levou a Siracusa 
em três momentos. Neles, tentou mudar o governo de Dionísio I e, depois, mais 
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duas vezes, o governo de Dionísio II. Para Platão, o bom governo tem um pen-
sador à sua frente. A razão e a sabedoria são os melhores governantes. 
Sua busca por propagar as ideias de justiça além das muralhas de Atenas lhe 
custou ser vendido como escravo por Dionísio I. Foi resgatado por seus amigos 
atenienses que o compraram e lhe devolveram a liberdade.
Entre suas idas e vindas da Magna Grécia (Sul da Itália) e de Siracusa, fun-
dou a Academia de Atenas. A primeira instituição acadêmica oicial do mundo 
ocidental. Um modelo que se propagaria e daria os moldes ao conhecimento 
desenvolvido pela civilização ocidental.
Uma das grandes contribuições de Platão (2002) foi a divisão da verdade em 
dois elementos, o material e o imaterial. O primeiro se refere às coisas em si, às 
que, pelos sentidos, percebemos em sua existência física. A outra, a imaterial, é 
a que damos sentido, valor, aos elementos que nos cercam. O conceito moral, a 
relevância social e o peso ético.
Da mesma forma que Sócrates, Platão considerava a sabedoria nata, ela 
está em nós, mas precisa ser despertada. Vivemos em um mundo de sombras 
que encobre a verdade sobre o que nos cerca. Antes de nascermos, vivíamos em 
outro lugar, em um corpo celeste, onde tínhamos a sabedoria sobre as coisas da 
Terra, porque a víamos com um saber superior. Ao nascermos, fomos jogados 
no mundo material e perdemos a consciência sobre nossa sabedoria. Cabe a 
nós, a busca pelo despertar do conhecimento e sairmos deste mundo de “som-
bras”, da ignorância.
Por isso, ele considerava que nascemos sem consciência do mundo, ao con-
vivermos com o que nos cerca, lhe damos sentido. Mas, a sabedoria repousa 
dentro de nós. Essa capacidade de reconhecer as “coisas” e desvendá-las com um 
conhecimento anterior, o qual aos poucos desperta, é chamada de anamnésia.
Essa capacidade de elucidação eleva a pessoa e lhe dá uma importância 
maior diante das demais. Esses devem ter acesso ao comando social. São eles os 
melhores elementos para conduzirem a vida de uma cidade, de uma comunidade.
É assim que Platão concebe o bom governo, o dos sábios. A ordem social 
perfeita teria neles os elementos mais elevados. Seriam os membros de “ouro” 
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de uma sociedade ideal. Seriam seguidos pelos soldados, aqueles que garantem 
a ordem e mantêm a unidade entre os elementos de uma mesma comunidade. 
Essa camada social teria como principal virtude a coragem. Por im, os elementos 
inferiores seriam os da “temperança”, os servos e escravizados, os trabalhadores, 
ligados às necessidades materiais constantes e necessárias.
Da mesma forma que o corpo social idealizado por Platão, a pessoa, segundo 
ele, deveria seguir o mesmo modelo: uma relação em que a racionalidade deve 
imperar, ainda que os desejos sejam características da alma (ROBINSON, 1998). 
Dito de outro modo, Platão acredita que, como os sentidos são imprecisos, “para 
atingir a verdade é necessário que a alma rompa tanto quanto lhe for possível a 
união com o corpo, que a engana. O ilosofar é uma forma de puriicar a alma 
dos vícios corporais” (NETO; DESTRO, 2009, p. 7). Entender a necessidade de 
uma vida dirigida por valores superiores, integrar o corpo a um ideal maior 
que conduzisse a coragem e agisse sobre as necessidades materiais concretas. 
Essa relação entre corpo e alma é conhecida como dualismo psicofísico, como 
Robinson chama a atenção:
Ao escrever dessa maneira, Platão está no limite extremo do dualismo 
psicológico; em nenhum outro diálogo ele se expressa em termos tão 
rígidos e irmes a respeito da relação entre corpo e alma. Até que pon-
to, no momento em que escreve o diálogo, ele próprio acreditou que 
esse dualismo acentuado seria uma descrição autêntica dos fatos, ou 
até que ponto tal dualismo serviu ao propósito dramático de explicar a 
disposição de Sócrates em face da morte, nunca saberemos. Mas uma 
coisa sabemos. No diálogo ao que tudo indica imediatamente posterior 
ao Fédão, isto é, na República, ele já passou para uma descrição muito 
mais soisticada da relação alma-corpo (ROBINSON, 1998, p. 343).
Essa relação descrita pelo autor revela como a alma é compreendida na medida 
em que está conectada ao conceito de racionalidade. Frente a isso, Platão des-
creve uma importante Alegoria que trata das relações com a forma: A Alegoria 
da Caverna, ou Mito da Caverna. É na República que o ilósofo grego traça um 
diálogo entre Glauco e Sócrates delineando o Mito da Caverna.
Agora imagine a nossa natureza, segundo o grau de educação que ela 
recebeu ou não, de acordo com o quadro que vou fazer. Imagine, pois, 
homens que vivem em uma morada subterrânea em forma de caverna. 
A entrada se abre para a luz em toda a largura da fachada. Os homens 
estão no interior desde a infância, acorrentados pelas pernas e pelo pes-
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coço, de modo que não podem mudar de lugar nem voltar a cabeça 
para ver algo que não esteja diante deles. A luz lhes vem de um fogo que 
queima por trás deles, ao longe, no alto. Entre os prisioneiros e o fogo, 
há um caminho que sobe. Imagine que esse caminho é cortado por um 
pequeno muro, semelhante ao tapume que os exibidores de marionetes 
dispõem entre eles e o público, acima do qual manobram as marionetes 
e apresentam o espetáculo (REPÚBLICA, 514 a).
A sequência do diálogo leva tanto Glauco como quem lê a pensar em seres acor-
rentados que jamais viram o mundo externo, tendo contato apenas com sombras 
projetadas na parede da caverna. A verdade, então, estaria fora da caverna, ou 
seja, existe uma relação entre as sombras, que seriam cópias, e o que está fora, 
a verdade. Quando uma das pessoas presas consegue fugir, promove para si a 
ruptura entre cópia e realidade, saindo das noções de senso comum para se apro-
ximar ao conhecimento.
ARISTÓTELES E A HISTÓRIA DA FILOSOFIA
Na Escola de Atenas, fundada por Platão, se destacou Aristóteles (384 a.C a 322 
a.C), o mais completo dos ilósofos, o de maior destaque. Contudo, não foi o 
herdeiro oicial platônico. Vale lembrar que a crítica ao mestre foi uma marca 
aristotélica. Mas, esta é outra história contada aqui aos poucos, enquanto enten-
demos o pensamento do preceptor (educador/professor) de Alexandre, o Grande.
Várias características do pensamento aristotélico fazem dele ilósofo distinto. 
Em primeiro lugar, a capacidade de compreensão de um mundo que vai além 
da projeção de uma sociedade ideal. Diferente de seu mestrePlatão, Aristóteles 
na Política, por exemplo, considerava fundamental compreender a pessoa em 
conjunto com os fenômenos que a cercam. A natureza e sua dinâmica foram 
algumas das preocupações do pensador, tanto que associava as concepções de 
cidade com a estrutura organizativa dos demais animais. 
No pensamento aristotélico está o respeito à reconstrução de uma lógica his-
tórica, tanto que o ilósofo escreve um tratado de lógica formal, por exemplo, 
além de categorizar as espécies, como reino, ilo e família. Aristóteles buscava 
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compreender os resultados das obras dos ilósofos que o antecederam e contri-
buir para o avanço do conhecimento.
O perigo da obra aristotélica foi a generalização do que o antecedeu, a análise 
particular de uma grande quantidade de obras com diversidade de posicionamen-
tos, nem sempre uma continuidade. Esse determinismo acabou por confundir 
dois conceitos, o de resultado e princípio.
O conceito de resultado diz respeito à preocupação de que todo o pensa-
mento deve se prender a uma única busca, a semelhança entre os elementos 
diferentes. Um exemplo é que há algo em comum entre o cérebro de um homem 
e do macaco, mas essa semelhança não pode ser o fator que determine que um 
homem qualquer e o macaco sejam iguais, pois não são. Logo, não se aponta a 
discordância com condição de se abordar um determinado conteúdo. Esta gene-
ralização ameaça as abordagens que se faz da sequência histórica que Aristóteles 
propõe. Os princípios de verdade são, conforme Almeida (2008), uma estrutura 
em que deve apontar para um fundamento que objetiva critérios de verdade.
Nesta equivalência encontra-se aquilo que se pode chamar de ‘princí-
pios de verdade’, os quais, segundo Aristóteles, são o fundamento úl-
timo (ou primeiro) de justiicação para qualquer discurso declarativo 
que se pretenda verdadeiro, sendo, por isso, também assumidos pelo 
mestre do Liceu como critérios últimos para determinar a verdade ou 
falsidade de qualquer discurso declarativo (ALMEIDA, 2008, p. 6).
Se fossemos pensar o que isso signiicaria na atualidade, seria admitir que 
Aristóteles considera o conhecimento produzido uma continuidade direcio-
nada para um determinado im. Não implicaria em uma dinâmica que pode 
apontar para diferentes formas de compreensão da existência.
Se pensarmos no signiicado de nossa vida e considerarmos como chegamos 
a um determinado ponto, nós temos a impressão de que todos os fatos que nos 
antecederam conspiraram para estarmos aqui, vivendo o que estamos vivendo. 
Isso seria incorreto. Somos um resultado, mas nem sempre de uma condição 
desejada. As relações categóricas aristotélicas, para além disso, concedem uma 
estreita relação entre linguagem e verdade, sem qualquer dualidade, prática 
comum nos escritos platônicos, mas que se conecta com princípios lógicos que 
fornecem estruturas para os argumentos.
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A PREOCUPAÇÃO COM OS QUE VIERAM ANTES
Como airmado anteriormente, Aristóteles se preocupou em resgatar os pensa-
dores que o antecederam. Aqueles que deram origem ao pensamento ilosóico, 
diferenciando-os dos historiadores ou dos soistas. Para ele, pensadores como 
Tales (624-547 a.C) ou Parmênides (530-460 a.C) foram importantes iniciado-
res da construção de uma lógica complexa e de um entendimento superior sobre 
a essência da natureza e da humanidade.
Tales, que viveu na Itália, não buscava nos elementos da natureza o princí-
pio único de tudo o que nos cerca. Para ele, o saber deve ir além do princípio 
moral, ou seja, se a água está em quase todas as coisas, e o Planeta é formado 
em sua maioria por água, não signiica que ela é a essência de tudo o que existe, 
a sua natureza não é determinante sobre as demais.
O saber verdadeiro, segundo o próprio Aristóteles, não se prende a um 
conceito moral ou ético, ele vai além, ele é eterno. Ou seja, ele independeria de 
mudanças histórico-sociais.
O ser verdadeiro ou falso é, nas coisas (epì twn pragmatwn), o estar 
reunido ou separado, de modo que diz a verdade (aletheúei) aque-
le que crê (ho oiómenos) estar separado o que está separado e que 
crê estar reunido o que está reunido; falseia, porém, aquele que se 
mantém contrariamente às coisas. Pois tu não és branco porque nós 
cremos (hoíesthai), verdadeiramente, que tu sejas branco, mas por-
que tu és branco é que nós, que dizemos isso, dizemos a verdade 
(ARISTÓTELES, 1998, p. 474). 
A relação de verdade está na airmação ou negação de determinada coisa. Desta 
forma, ou airmamos algo ou o negamos, o que não depende de subjetividades, 
mas sim das relações entre o que se fala e do que se fala, o que implica em se 
dizer que o saber verdadeiro o é segundo essa relação entre discurso e a coisa 
discursada.
Heráclito (540-470 a.C) foi emblemático, sendo o responsável pela célebre 
frase: “um homem não pode se banhar duas vezes no mesmo rio”. Ou seja, o mundo 
vive um movimento constante. Tudo é mudança. Mas o que muda?
Um pioneiro nesse princípio foi Parmênides. Em sua série de poemas com 
o título “Da Natureza”, ele considerava que o conhecimento era o saber dos 
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deuses. São eles que compreendem a lógica do que existe e sua função. A huma-
nidade nomina as coisas, mas não sabe sobre sua essência e o que ela é capaz 
de determinar.
Aqui temos mais um aprendizado fundamental. O saber é eterno, os homens 
não. Viver sem conhecer a importância da ciência, da essência de tudo, não é 
viver. Ou, se é, é existir sem dar um sentido à existência.
Mas, como é possível conhecer as coisas se tudo está em constante mudança? 
Esta é uma indagação que ainda hoje movimenta as teses ilosóicas. Vivemos 
um mundo em transformação, como seria possível conhecer sua lógica? Existiria 
um meio de compreender a permanência sem perder os elementos que expli-
cam as constantes mudanças?
Zenão (490-430 a.C), vindo de Eléia, a mesma cidade italiana de Parmênides, 
condenava o movimento, assim como a diversidade, ele considerava que ambas 
eram uma ilusão. Para o ilósofo eleata “Tempo e a mudança são tidos como con-
ceitos contraditórios e relativos” (MODENESI, 2011, p. 2). Porém, a essência do 
mundo também é importante para os pré-socráticos como elemento de compre-
ensão da natureza. Os elementos que formam a materialidade das coisas também 
podem ser os elementos que formam a materialidade da alma.
Um dos antecessores de Sócrates que tratou do tema, por mais que com dis-
túrbios das análises de Zenão e Parmênides, foi Anaximandro. Pouco se sabe 
sobre sua data de nascimento ou morte, mas foi um dos membros da escola de 
Tales de Mileto. Ele considerava que o ar, e não a água, seria o elemento vital 
para a manutenção da vida, inclusive da alma.
Mas, nem todos os pensadores comungaram com a ideia prática da iloso-
ia, do homem que deveria entender os elementos e interferir em sua existência. 
Pitágoras nasceu na Grécia, em Samos, mas desenvolveu seus trabalhos e sua 
“escola ilosóica” no sul da Itália, em Crotona. Ele considerava que o papel do 
ilósofo era a contemplação. Comparava a existência aos jogos olímpicos, uns 
vão para comprar e vender, os inferiores; outros vão para competir, os agentes 
da política, os soldados, os que determinam a vida das instituições; por im, os 
que vão assistir e contemplar, estessão superiores, estes são os ilósofos.
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ALÉM DA GRÉCIA: AS CIVILIZAÇÕES QUE 
HERDARAM O PENSAMENTO GREGO
O que vimos aqui sobre o desenvolvimento do pensamento grego é apenas um 
fragmento, uma pequena parte de uma discussão que tem uma “ininidade” de 
possibilidades de entendimento. Mas, procuramos demonstrar que a forma de 
compreender o mundo incomodou aqueles que foram os fundadores do pensa-
mento ocidental, a cultura helenística.
Para entendermos como este pensamento conseguiu ir além das fronteiras 
gregas, avançando ao longo da história e chegando aos nossos dias, é necessário 
lembrar que os próprios gregos sempre foram além de si, fundando colônias e 
mantendo relações mercantis com vários povos da antiguidade.
O momento inicial da expansão do pensamento grego, uma prévia do que 
viria a ser a expansão do “ocidentalismo”, foi a conquista da Grécia pelos mace-
dônios, no Século IV. Após conquistar os gregos, o Império Macedônico adotou 
a cultura grega como o princípio da cultura a ser levada na expansão territorial.
As vitórias macedônicas se consolidaram na Ásia Menor, no Egito e em 
todo o Mediterrâneo oriental. Os povos que foram submetidos por Alexandre, 
o Grande, foram subordinados não só a sua força militar, mas tiveram que con-
viver com a cultura grega. Instituições políticas e língua, por exemplo, passaram 
a ser introduzidas nos “quatro cantos” do Império.
A inluência não foi supericial como uma mancha em um tecido, ela se 
aprofundou e passou a ser incorporada nas práticas comerciais, na vida pública, 
na produção do conhecimento, a orientação ilosóica dos pensadores gregos 
ganhou novo sentido. Muitos desses conhecimentos, os ocidentais iriam reen-
contrar com as “Cruzadas” promovidas pelos cristãos contra os muçulmanos. 
O próprio desenvolvimento cientíico e econômico dos árabes (séculos VI ao 
XV) foi marcado pelas bases do pensamento grego. O Renascimento Cultural, 
na Europa, permitiu a retomada das raízes ilosóicas helenísticas.
O Império Macedônico não foi duradouro, na prática, sua decomposição 
começou com a morte de Alexandre (323 a.C), o seu fundador. Dividido pelos 
generais, foi aos poucos conquistado por romanos e árabes. Territórios foram 
retomados pelos persas e os egípcios se libertaram da dominação macedônica, 
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mas a cultura grega icou, deixou suas marcas e orientou o destino do conheci-
mento do universo em muitas regiões onde os macedônios percorreram.
O clima de insegurança em que o Império Macedônico se decompôs gerou 
uma angústia que predominou também no pensamento ilosóico do período. 
Um pensador que expressa esse clima é Diógenes (404 a 323 a.C), discípulo de 
Antístenes, seguidor de Sócrates, e que questionava a vida mundana, a sedução 
pela matéria e buscava uma vida simples.
Segundo a lenda, Diógenes andava perambulando pelas ruas de Atenas e, 
depois de ser expulso de sua casa, passou a viver em um barril e andava pelas 
ruas em plena luz do dia com uma lamparina. Ele airmava que fazia aquilo por 
estar à procura de um honesto.
Diógenes escolheu uma vida austera, demasiadamente simples, sem 
luxo, sem casa, sem pátria; seu único objetivo era defender, como um 
cão feroz, a sua ilosoia de vida; contentava-se com o estritamente ne-
cessário à sua sobrevivência, desprezava a suntuosidade, tinha aversão 
ao prazer, negligenciava as convenções sociais, considerava inútil o es-
tudo metafísico (DIAS, 2014, p. 131).
Sua atitude despertou a curiosidade do imperador Alexandre, que um dia quis 
conhecê-lo. Quando o encontrou, ele estava deitado dentro do barril onde vivia. 
O imperador teria dito que ele poderia fazer o pedido que quisesse e pronta-
mente seria atendido. Diógenes teria dito para que Alexandre saísse de sua frente 
e parasse de roubar sua luz com a sombra. Encantado pela convicção do “anda-
rilho” ilósofo, o imperador teria airmado que se não fosse Alexandre, gostaria 
de ter sido Diógenes.
Diógenes foi um dos adeptos do cinismo, uma corrente que associava a pes-
soa ao desprendimento das coisas materiais, e também a uma forma de crítica à 
vida de excessos. O princípio dos homens, aqui pensados como pessoas do sexo 
masculino, que seguiam esse pensamento, era ter autonomia diante do mundo. 
Não depender daqueles que buscassem o enriquecimento na manipulação dos 
indivíduos e na inluência de seus interesses.
Uma airmação de Diógenes que expressava a crítica ao mundo da materia-
lidade era a busca de inluência, convivendo com pessoas de poder: “preiro a 
companhia dos corvos a dos bajuladores”. Valorizava, assim, a realidade em detri-
mento da falsidade, que o poder material e a inluência política podiam nos dar.
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A crítica ao apego à vida material estava na forma como o homem se deforma 
diante do desejo do prestígio adquirido com o enriquecimento. O que hoje é 
uma condição que atinge grande parte dos seres humanos. Uma denúncia da 
perda de princípios profundos que possam conduzir a sociedade a uma condi-
ção superior, justa.
O que Diógenes criticava era a demonstração da decadência da sociedade 
de seu tempo. As cidades dominadas pelos macedônios eram voltadas aos inte-
resses particulares e desprezavam os temas de unidade política. A formação de 
um império com uma diversidade considerável de povos acabaria por levar à 
destruição do que os unia e elevar o particularismo. Isso estava expresso tanto 
na política quanto no comportamento de cada um.
O cinismo cresceu, mas acabou se deturpando. Passou a ganhar a conotação 
de crítica, mas incorporado aos desejos de sucesso material. Porém, não havia a 
preocupação da perda do enriquecimento pelo cínico. Ele estava mais preocupado 
com seu imediatismo. Essa é uma linha do cinismo que chegou até nossos dias. 
Viver o hoje sem se preocupar com o amanhã, uma “ilosoia de vida” expressa 
na propaganda dos cartões de crédito da atualidade.
Outra escola do período de crise macedônica foi o ceticismo. Apesar de já 
ser um tema tratado pelos pré-socráticos, o “ser cético” cresceu no mundo helê-
nico e teve em Epicuro (342 a 270 a.C) sua maior expressão. Ateniense, suas teses 
acabaram se desenvolvendo na Ásia menor, onde icou encantado pelas teses de 
Demócrito (um dos seguidores das teses céticas).
Epicuro elabora sua ética com base em três princípios fundamentais: 
(a) a correta compreensão da natureza dos deuses e a consequente eli-
minação do seu temor; (b) a correta compreensão da natureza da morte 
e a consequente eliminação do seu temor; (c) a correta compreensão da 
natureza dos desejos e a sua consequente boa vivência (FILHO, 2009, 
p. 13).
O pensamento de negar toda a verdade absoluta, defendida por ele, gerava a 
necessidade de conduzir um homem a um eterno questionamento sobre os fun-
damentos de sua existência e questionar até mesmo as resposta que viesse a ter 
a partir de suas dúvidas. A angústia como condutora e a crise como princípio 
deiniam o homem cético.
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Um contraponto ao cínico era que o cético considerava que os prazeres morais 
deviam ser uma busca e um direito humano. A condição humana de estar rode-
ada de prazeresmateriais não signiicava aboli-los, como se eles levassem a um 
mal, mas se valer deles sem culpa.
Para os céticos, a mente deve buscar na razão do mundo o espírito elevado 
da conduta, mas não deve se eximir da existência, ou seja, viver bem não impede 
uma compreensão apurada da vida. Um contraponto que para muitos foi a solu-
ção para viver com satisfação material e transformar a angústia em um ritual 
que não necessita se desfazer da realização do desejo.
Nas teses de Epicuro, a pessoa não tem mais a sensação após a morte. A 
separação entre o corpo e alma se dá quando o átomo da matéria se decompõe 
se libertando dos sentimentos de prazer e dor. Desta forma, não há o que temer 
na morte, e ela não nos aproxima dos deuses, os quais, por mais que tivessem 
nos gerado, não determinam nosso destino. Nossa alma apenas se dispersa pelo 
mundo, sem sentido. Por isso, não há o que temer na morte, ela nada signiica 
no mundo sensível.
O PENSAMENTO ROMANO: FUNCIONAL E MATERIAL
A formação do Império Romano é uma 
demonstração da eiciência da organi-
zação do Estado e sua capacidade de 
governar as diferenças constantes dos 
povos que se domina. A dimensão do 
Império, atingindo inúmeros povos, 
demonstrou sua eiciência em condu-
zir o poder a lugares onde a cultura local 
não se identiicava com as instituições 
clássicas latinas.
O pensamento romano foi expresso por pensadores como Zenão (340 a 264 
a.C), o fundador do estoicismo valorizava a rigidez do caráter, a ação que expres-
sava os valores da moral incorruptível. Filho de comerciantes, apesar de ser de 
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origem fenícia, se erradicou no mundo grego e viveu a expansão romana. Uma 
pessoa de valor é constante em seu comportamento, independente das condições 
em que se vê obrigado a conviver. Mudança do mundo não signiica despren-
dimento e mudança de valores. Estes eram princípios defendidos por Zenão.
A popularidade do estoicismo cresceu e atingiu mais adeptos do que o pen-
samento de Platão e Aristóteles em seu tempo. Um herdeiro do pensamento 
socrático, Zenão acabou por inluenciar a conduta de reis da antiguidade, ape-
gados ao comportamento “reto” como um princípio de governo. De certa forma, 
era o que Sócrates esperava do bom governante, agir como um ilósofo, ter prin-
cípios rígidos.
Dessa forma, é fácil perceber como a ação ganha força e passa a ser determi-
nante do caráter humano. É preciso dar praticidade ao comportamento, ir além 
da relexão, promover a ação. O conhecimento passa a ser um valor impregnado, 
que se expressa no comportamento. Até mesmo o valor divino, os deuses, estão 
dentro dos seres humanos, nas condutas que determinam sua proximidade ou 
não com um sentido superior da vida.
Mas se as leis mudam, o homem não muda seus valores? Essa talvez seja a 
principal crítica ao estoicismo. Não é possível ser eternamente detentor de prin-
cípios, mas não podemos ser lexíveis o tempo todo. Ou seja, não podemos ser 
uma mudança constante e transformar os conceitos sobre o mundo numa super-
icialidade momentânea. Zenão considerava que a perda de bens materiais pode 
ser reparada, se não no todo ou em partes. Já a dignidade humana, uma vez per-
dida, o desumaniza e condena.
CONTRADIÇÕES NO PENSAMENTO ROMANO
A história romana está recheada de uma glória à conduta e de contradições de 
quem deveria expressá-la. Os personagens que apelam no discurso e na estética 
pública uma conduta moral rígida são, em regra, os mesmos que têm, em sua 
privacidade, uma vida mundana.
Um destes exemplos de contradição entre o público e o privado é Sêneca 
(4 a.C. a 65), o senador romano, famoso por sua defesa à moral, discípulo de 
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Zenão. Foi um crítico da perda moral romana. Exigindo de seus governantes um 
comportamento a “altura” de seu posto. Ele mesmo não obedeceu a este critério.
Em uma de suas críticas à mulher do imperador Cláudio, acabou sendo 
banido de Roma, mas retornou quando as práticas da imperatriz foram desco-
bertas. Ele mesmo tinha uma conduta que dava espaço a críticas como cobrar 
impostos abusivos de súditos britânicos, quando o Império Romano se esten-
dia até a Bretanha. Ele mesmo foi convidado a cometer suicídio após uma série 
de atos corruptos que o envolviam.
Na atualidade, as práticas de corrupção continuam tomando conta do Estado. 
E como no tempo de Sêneca, o discurso de alguns dos adeptos do abuso é a con-
duta reta. O que na retórica prega princípios e faz alusão ao comportamento 
que não se deixa abater ou seduzir pelos excessos não corresponde à realidade. 
Podemos considerar que o abuso de quem assume o poder acaba por se contra-
dizer com o discurso.
Outro estóico foi Epicteto (60 a 100), escravo, como o seu próprio nome sugere 
(adquirido), foi liberto e passou a ministrar aulas em Roma. Mesmo sofrendo 
de doenças constantes, fruto de seu tempo de sofrimento como escravo, jamais 
abandonou o ofício da educação e da crítica. A segunda lhe gerou a persegui-
ção por parte do Imperador Nicópolis, um corrupto. Acabou por buscar exílio 
na Grécia, onde viveu até o im dos seus dias.
Uma das grandes escolas ilosóicas do período helenista, assim chamada 
pelo pórtico pintado (Stoá poikílé) onde foi fundada, por volta de 300 a.C, 
por Zenão de Cício. Os principais mestres dessa escola foram, além de Ze-
não, Cleante de Axo e Crisipo de Soles. Com as escolas da mesma época, 
epicurismo e ceticismo, compartilhou a airmação do primado da questão 
moral sobre as teorias e o conceito de ilosoia como vida contemplativa 
acima das ocupações, das preocupações e das emoções da vida comum. 
Seu ideal, portanto, é de ataraxia ou apatia. 
Fonte: Abbagnano (2007, p. 375).
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Sua principal crítica era a conduta desonrosa do poder. Considerava que o 
governo justo não se corrompe. Se obrigados a aceitar as instituições públicas, 
elas devem cumprir com suas funções. Para ele, o dever do governante está acima 
de seus interesses privados. Ele não pode transformar o poder em um instru-
mento de suas particularidades.
O mais ilustre dos estóicos foi Marco Aurélio (121 a 180), imperador romano. 
Ele buscou documentar sua vida no Império e seguir os princípios de idelidade 
à Roma e suas instituições. Dedicado a manter o poder em um império que já 
sofria as invasões dos povos vizinhos (chamados de bárbaros) e convivia constan-
temente com revoltas internas, Marco Aurélio buscou preservar Roma, garantir 
sua integridade, tanto na força física como no discurso moral.
Ter perseguido os cristãos, em seu período, não foi uma tradição ou hábito, 
foi a forma de garantir a religiosidade romana e a lógica de sua autoridade a qual 
os cristãos incitavam levantes. Para o imperador ilósofo, era necessário que o 
homem público cumprisse o seu papel. Ele necessitava executar o seu dever 
dentro do organismo social. Nesse ponto, Aurélio se aproxima da concepção de 
Platão sobre a ordem perfeita da sociedade, em que cada um dos seus elemen-
tos deve cumprir o seu papel de forma eicaz e se subordinar a ele.
A própria formação do Império Romano foi marcada pela ação violenta e 
conquista. O domínio constante possibilitou a incorporação de inúmeros povos 
e a implantação de uma estrutura militarizada em todo o território dominado 
pelos romanos.
O sucesso da expansão romana se deu sobre povos organizados das mais dife-
rentesformas. As fronteiras romanas foram os rios Danúbio e Reno, ao Norte, 
ao Leste, o deserto da Arábia e o Rio Eufrates, ao sul, o deserto do Saara e, ao 
Oeste, o Atlântico. Em todo esse território, ocorreu a integração e implantação 
de uma administração bem-sucedida. Ela alcançou seu tempo de paz nos pri-
meiros séculos da Era Cristã.
O legado romano também inluenciou o nosso tempo. Assim como os gregos, 
também deixou marcas que se mantiveram e chegaram até nós: as instituições 
jurídicas, a produção cultural, a concepção do Estado e o cristianismo. Contudo, 
os romanos tiveram na cultura grega a medida para tudo o que izeram. Podemos 
considerar que foi nas estruturas de Roma que a cultura grega se alicerçou no ocidente.
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No oriente, o legado grego se manteve subordinado à cultura predominante 
dos povos que conquistaram as terras do Império Romano, principalmente os 
muçulmanos. Nem por isso deixamos de reconhecer que a cultura grega tam-
bém foi redescoberta pelo ocidente quando da conquista da Península Ibérica 
pelos muçulmanos (século VIII), sendo necessário também mencionar o con-
tato que o ocidente teve com estes povos. O que já comentamos anteriormente.
ATRAVESSAMENTOS CRISTÃOS E O PENSAMENTO FILOSÓFICO 
MEDIEVAL
O cristianismo foi criado por Roma e sobreviveu à sua decadência. Fez-se e refez 
aos moldes do tempo e sobrevive até nossos dias. Podemos considerar, dadas as 
devidas proporções, que o Ocidente é “cristão”. Se não mais pela crença, a qual 
ele não é obrigado a professar, pela carga cultural de compreensão do mundo 
que o cristianismo construiu e permitiu durante a expansão que a civilização 
ocidental promoveu.
O ponto de encontro entre o cristianismo e a ilosoia grega foi Alexandria, 
localizada dentro do território egípcio. A cidade, que continha o principal porto da 
África durante o período romano e ainda hoje é destaque na orla do Mediterrâneo, 
foi o centro de uma cultura que nasceu de muitos caldos culturais e permitiu a 
concepção cristã que o ocidente disseminou.
As ideias de maior expressão que se difundiram em Alexandria têm autoria 
de Plotino (204 a 270). O jovem egípcio estudou em Alexandria e manteve-se 
na cidade até 243, quando fugiu após uma campanha desastrosa do imperador 
romano na África. Em Roma, cidade onde propagou seus estudos e difundiu suas 
ideias, Plotino plantou o pensamento que viria a se impor sobre todo o territó-
rio europeu ocidental e, mais tarde, sobre boa parte do Planeta.
Suas ideias, pela carga de misticismo, já demonstravam um desprendimento 
com a realidade e a despreocupação em se ter uma conduta política fundada na 
racionalidade do estado. O contexto de decadência do Império Romano, no qual 
viveu, demonstrava a diiculdade de se entender de forma racional a crise que se 
atravessava. O cristianismo nasce da sobrevivência diante da crise.
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Em nosso tempo não é diferente a forma como o pensamento se desprende 
da necessidade de ação. Se observarmos, ao longo da história, o pensamento 
ganha conotações metafísicas diante das diiculdades que as instituições racio-
nais atravessam. Hoje, em pleno desenvolvimento de uma estrutura tecnológica, 
que é fruto do desenvolvimento cientíico, nos apegamos aos misticismos dege-
nerativos da consciência, infantilizamos o pensamento do homem. Calculo que 
seja medo de enfrentar com a razão e sentir sobre os ombros o peso da existên-
cia que nos faz agir assim.
Plotino concebe que a vida é fruto de um encontro entre a “trindade”, aqui, 
diferente daquela que concebem os cristãos da atualidade. Na trindade de Plotino, 
há um elemento único que integra, o “Uno”. Esse primeiro elemento conduz a 
força criadora do “Nous” (espírito), o segundo, propagador da vida. Por im, a 
“Alma” é o terceiro elemento, o qual dá vida à toda criação. As bases desse pen-
samento são gregas, e são uma releitura da dialética platônica e de Demóstenes 
sobre os elementos da criação.
Claro que o pensamento de Plotino não deu origem imediata ao pensamento 
cristão que conhecemos. Sobre esse tema trataremos no próximo capítulo. O 
que temos que ter claro é que o desenvolvimento da civilização ocidental se deu 
com a construção de um legado grego. Nossa busca incessante por respostas, o 
desejo de encontrar uma lógica determinante para a existência e de dominar a 
natureza que nos cerca através da compreensão das leis que a regem são, sem 
dúvida, legados gregos.
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O PENSAMENTO FILOSÓFICO MEDIEVAL
A construção do mundo medieval foi o resultado da destruição do Império 
Romano, onde as invasões bárbaras não foram só um fator determinante, mas 
resultado de outros fatores.
A decadência está relacionada à crise escravista, à falta de trabalhadores nas 
áreas agrícolas e à constante tributação para manter a imensidão do império. A 
falta de trabalhadores gerou uma queda de produtividade dentro das terras do 
Império. A tributação, por consequência, caiu e a ineiciência do estado romano 
se ressaltou.
Um governo imperial, tão eiciente para integrar as províncias, não foi capaz 
de administrar as crises que tiveram origem em diversos territórios, muitos por 
problemas locais. A imposição centralizadora sempre foi a saída romana, seja 
pelas tropas, seja pelas instituições. De problemas locais, uma crise geral se alas-
trou. Foi nesse contexto que as invasões bárbaras se disseminaram. Muitos dos 
líderes estrangeiros serviram a Roma, aprenderam a combater com ela e a des-
truí-la com o conhecimento que adquiriram.
Mesmo antes da decadência do Império, os cristãos já não eram mais perse-
guidos e a religião havia se oicializado. No governo de Constantino e Teodósio, 
a Igreja Cristã formou a estrutura administrativa que acompanharia a sua exis-
tência por séculos.
Com o surgimento de uma estrutura de poder romana associada à Igreja 
Católica, um novo personagem de poder assume a função da administração dos 
homens ocidentais, o Papa. A construção de uma cúpula de comando da Igreja 
(Clero) permitiu a consolidação de uma instituição política com forte inluên-
cia sobre os demais povos que viriam a habitar os territórios que um dia foram 
do Império Romano.
A conversão dos bárbaros por membros do clero e a construção de institui-
ções que propagavam o cristianismo foi uma prática constante na decadência 
romana e ascensão do medievalismo. Muitos pensadores se dedicaram a difundir 
a fé cristã e aprimorar o pensamento religioso fundado na Bíblia, o documento 
sagrado dos cristãos que foi compilado e produzido na decadência do Império 
sob a égide dos últimos imperadores romanos.
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Uns dos princípios fundamentais da nova concepção que se estabelecia com o 
desenvolvimento do cristianismo foi a separação entre o comando do Papa – da 
igreja de uma forma geral – e dos imperadores, monarcas europeus. Enquanto 
o primeiro deveria governar a alma dos homens, o segundo deveria adminis-
trar a matéria.
Esta separação se constitui de um elemento importante até nossos dias. 
A questão da propriedade do corpo e a condução da vida. Até onde o homem 
comanda sua existência, pela sua consciência, até onde ela nãolhe pertence e 
deve obedecer às regras estabelecidas por uma legislação. De certa forma, a perda 
de uma liberdade a qual os gregos jamais se submeteram.
A concepção do mundo se organizava dentro das instituições organizadas 
pela Igreja Católica. Nelas, a ilosoia se oicializa independente do império que 
se estabelece. Seja nas monarquias dos francos, germanos, godos ou visigodos, 
o cristianismo orienta a concepção de homem e garante a supremacia de suas 
ideias por toda a Europa. Chegou, por consequência, a justiicar o próprio poder 
dos monarcas. O que só foi questionado com o advento da Reforma Protestante, 
no Século XVI.
A supremacia dos cristãos acaba por ser também uma contradição em relação 
aos judeus, religião da qual são dissidentes. No início, o cristianismo se colocava 
como um desdobramento do judaísmo, sem lhe causar rompimento e reconhe-
cendo sua validade. Mas com a ascensão dos cristãos ao poder em Roma, os judeus 
passaram a ser vistos como negadores de Cristo, o ilho de Deus. A perseguição 
aos judeus se acentuou. Ironicamente passaram a ser perseguidos por quem tinha 
sofrido perseguição.
O termo bárbaro é uma herança grega, mas que o povo egípcio já chama-
va toda pessoa que falava uma língua diferente. Na Grécia, por exemplo, o 
termo estava ligado a quem não falava o grego, mas que parecia apenas 
dizer coisas incompreensíveis, e não “compartilhava nem os costumes nem 
a civilização dos helenos. 
Fonte: Guerra (1987, p. 5).
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Uma das formas de romper com o judaísmo e iniciar sua perseguição foi 
o gnosticismo, um encontro entre o cristianismo e o helenismo. Sua principal 
expressão foi Paulo de Tarso (5 a 67), um judeu helenizado e cristão. Ele construiu 
os elementos necessários de universalização do cristianismo. Um desdobramento 
do gnosticismo foi construído a partir das ideias de Tarso. Nela, Iavé é o cria-
dor das coisas materiais, uma divindade inferior ao “supremo criador”. Ele, Iavé, 
criou as coisas materiais e deturpou o seu signiicado, fugindo ao propósito de 
Deus (o criador universal). Diante disso, a divindade suprema se materializa para 
poder colocar ordem no mundo, Cristo. Nessa construção, Deus é perseguido em 
sua materialidade e rompe com qualquer tipo de elaboração teológica judaica.
Na construção do ideário religioso judeu-cristão, a perseguição é um ele-
mento vital. Presente como um meio de unir os iéis e garantir o direito de reagir. 
Em muitos casos, são os verdadeiros agressores, mas o discurso de serem per-
seguidos eternamente os inocenta. Por isso que, tanto na defesa do território de 
Israel pelos judeus, ou no discurso de supremacia dos cristãos sobre o Mundo, 
o discurso de serem perseguidos justiica o ato de perseguir.
Um dos importantes pensadores cristãos do primitivismo foi Orígenes de 
Cesaréia (I185 a 253). Sua obra está relacionada à deinição da vida espiritual. 
Ele concebe a existência do espírito separado da matéria, sendo que, ao se jun-
tar com o corpo, lhe dá vida no nascimento. A ideia de eternizar a existência 
antes e depois de a vida lhe dar a autoria de um dos principais elementos que 
se consolidava no ideário cristão, a eternidade da alma e sua relação com Deus.
Para Orígenes, uma existência em essência espiritual, livre de toda for-
ma e substância, só se deve a Deus; o homem, mesmo o eleito que se 
estabelece no estado deiicado não pode confundir-se, amalgamar-se a 
Deus mesmo, ou seja, estabelecer-se em uma condição de panteísmo, 
pois o ser humano é por essência diferente do Criador, e mesmo se a 
natureza de sua matéria corporal ver-se limpa e puriicada, “feita total-
mente espiritual”, ela não poderá unir-se consubstancialmente a Deus, 
pois o Criador participa de um estado de perfeição próprio (AMARAL, 
2009, p. 11).
Todos estes pensamentos foram incorporados à Igreja Cristã Católica com o 
governo do imperador Constantino. Nele se organizou a estrutura dos dogmas 
católicos e o princípio administrativo do clero. A centralização da administração 
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clerical foi fundamental para, mais tarde, quando da decadência do Império 
Romano, o cristianismo prevalecer não só como culto, mas como instituição de 
poder político com forte centralização administrativa em torno da igura do Papa.
Um dos fatores importantes para o fortalecimento da autoridade papal, ainda 
durante o Império Romano, foi o discurso de defesa dos pobres proferido por 
uma Igreja voltada aos humildes. Eles, que se sentiam distantes e desamparados 
por parte de uma administração centralizada, de caráter religioso, agregaram-se 
às obras do clero católico e se tornaram sua principal base de sustentação social.
Não seria por acaso que a Igreja Católica estaria preocupada, mais tarde, com 
a organização das ordens religiosas que deveriam converter a população. Também, 
parte dessas obras estava para ações missionárias de ajuda à população carente, 
servindo-lhe de abrigo e massa de manobra para o exercício do poder clerical.
O Concílio do Nicéia (325) foi fundamental para a organização dos dogmas 
católicos. Nele se organizou a doutrinação dos iéis e os princípios que deveriam 
nortear o poder papal. Naquele momento, a Igreja Católica combatia o arianismo, 
doutrina cristã fundada no pensamento de Ário (256 a 336).
Mas o pensamento cristão que se propagou no “mundo medieval” se deve 
principalmente a quatro grandes pensadores: Ambrósio (340 a 397), Jerônimo 
(347 a 420), Santo Agostinho (354 a 430) e ao Papa Gregório (540 a 604). Foram 
eles que instituíram o pensamento predominante do cristianismo que se cons-
tituiu através da fé católica, e que também lançou bases para o protestantismo 
após a Reforma Protestante.
Ambrósio está ligado diretamente à supremacia do poder papal sobre o 
estado. Filho de uma família de nobres romanos, ele recebeu educação requintada 
para atuar na administração do estado romano. Contudo, acabou na adminis-
tração do Bispado de Milão, na época, a sede do Império Romano do Ocidente.
Durante seu bispado, assumiu a responsabilidade de preservar o poder da 
igreja sobre os senadores e, até mesmo, sobre o imperador. Enfrentou a oposição 
dos arianos, cristãos que seguiam as palavras de Ário, como já chegamos a analisar.
Ambrósio conseguiu submeter às autoridades e, até mesmo, obter um pedido 
de perdão do imperador Teodósio, quando este ordenou o Massacre de Tessalônica 
(388). Em função desse episódio, o imperador foi a Abadia de Milão e pediu per-
dão pelo ato.
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Dessa forma, Ambrósio é lembrado pela sua capacidade de argumentar e 
agir em favor dos interesses do clero, mantendo o poder da Igreja diante da deca-
dência do Império Romano. Santo Agostinho o admirava pela capacidade de 
argumentação, fator fundamental que contribuiu para sua permanência diante 
dos cargos de administração do clero dentro da estrutura de poder do Império. 
Mas, foi na produção documental da Igreja Católica que sobreviveu o instru-
mento vital para a pregação da fé: a construção da Bíblia em latim. 
Este feito de tradução e organização do principal documento sacro foi obra 
de Jerônimo. Nascido no Egito, mas com a sua vida dedicada aos estudos em 
Roma, acabou se desentendendo com autoridades da Igreja Católica. Jerônimo 
produziu documentos de condução ética e princípios morais do cristão.
Sua postura doutrinária acabou por se traduzir nos estudos dos documentosque formaram a interpretação do Velho Testamento e organização dos documentos 
do Evangelho. Em função de sua expulsão da Itália, por desentendimento com líde-
res religiosos, acabou por formar um mosteiro em Jerusalém. Assim, ele inaugurou 
uma das formas de organização dos estudos do período medieval, o clero regular.
A originalidade dos documentos sacros acabou, mais tarde, dividindo a cris-
tandade, permitindo aos católicos eliminarem interpretações que fugissem aos 
interesses do clero estabelecido em toda a Europa medieval.
O terceiro grande pensador cristão foi Santo Agostinho. Filho de nobres, ele 
nasceu no Norte da África, na cidade de Cartago. Sua vida foi marcada por rom-
pimentos entre uma formação religiosa familiar e sua vida mundana durante a 
juventude. Por causa desta última, se mudou para Roma, trazendo consigo sua 
concubina e o ilho que teve com ela.
[...] ao contrário, nada passa, tudo é presente, ao passo que o tempo nunca 
é todo presente. Esse tal, verá que o passado é impelido pelo futuro e que 
todo o futuro está precedido dum passado, e todo o passado e futuro são 
criados e dimanam d’Aquele que sempre é presente. 
(Santo Agostinho).
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Criticado pela mãe, uma cristã ortodoxa, Agostinho viveu a culpa do pecado, o 
que sempre lhe guiou em seus pensamentos acerca da religiosidade. Ele foi um 
dos principais responsáveis por traduzir o pecado como um problema de con-
duta do indivíduo e não da condição em sociedade.
Outro elemento importante nas teses de Agostinho é a predestinação. A busca 
de entender a vida na Terra como um relexo da vontade de Deus. A existência 
humana expressa aquilo que está designado, logo, a própria conduta do homem 
não lhe permitirá se salvar se esta não for a vontade de Deus. Logo, o homem 
arrasta a culpa, a fé pode lhe aproximar de Deus, mas somente a vontade divina 
pode salvá-lo. Por isso, a importância dos sinais divinos como guia do caminho 
de desvendar seu destino, expresso no pensamento de Santo Agostinho.
Ao aceitarmos a condição que Deus criou na Terra, estabelecemos uma rela-
ção de fé sem questionamento da origem dos elementos materiais que nos cercam. 
Estes são, para Agostinho, uma condição criada por Deus sem que tenhamos o 
direito ou a capacidade de questioná-la. Temos que aceitar, por exemplo, que a 
criação de todo o Universo foi feita a partir do “nada”, da inexistência de qual-
quer elemento anterior. Assim, Deus fez o tempo, fez a matéria. Ele cria a partir 
do nada e assim é, sem questionamento, acreditava Agostinho.
Deus quis criar todas as coisas, mas não se deve buscar esta causa na 
vontade de Deus, pois Ele é causa única das coisas, e sendo a causa de 
tudo, não tem causa. Deste modo, toda criação surgiu da Palavra Cria-
dora, o Verbo (CARDOSO, 2010, p. 84).
Esse pensamento coloca a condição de existência como dádiva e não con-
quista. Ou seja, o homem na terra é uma concessão divina. Sua existência está 
sequestrada por um destino que não lhe pertence construir, apenas seguir os 
desígnios divinos, conforme descreve o próprio ilósofo.
[...] a vontade de Deus não é uma criatura; está antes de toda a criatura, 
pois nada seria criado se antes não existisse a vontade do Criador. Essa 
vontade pertence à própria substância de Deus. Se alguma coisa sur-
gisse na substância de Deus que antes lá não estivesse, não podíamos, 
com verdade, chamar a essa substância eterna. Mas, se desde toda a 
eternidade é vontade de Deus que existam criaturas, por que razão não 
são criaturas eternas? (AGOSTINHO, 1981, p. 300-301). 
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O Papa Gregório I foi o propagador da fé católica, sua intenção de converter 
os pagãos, principalmente os bárbaros, levou-o a organizar expedições formadas 
por monges beneditinos. Foi o caso da conversão dos anglo-saxões na Bretanha, 
que viria a se chamar Inglaterra pelos invasores bárbaros.
Sua contribuição mais signiicativa foi a construção da identidade Papal, o 
“servo dos servos de Deus”, segundo ele mesmo, ou sumo pontíice. Sua autori-
dade seria aceita por todo o território europeu, fundando o legado de comando 
sobre diversas nações do Ocidente europeu. Uma centralização que seria seguida 
e mantida como elemento de poder por todo o medievalismo.
É importante considerar que as ordens religiosas acabariam por propagar o 
sentido de poder teológico que justiicou o poder papal e o fez ser compreendido 
por toda a população europeia. Em um continente marcado pelo analfabetismo 
da maioria da população, imersa em uma ignorância sobre o mundo, seria a 
Igreja Católica que daria o sentido de existência, a sua imagem e semelhança.
A relação de diplomacia da Igreja Católica com as invasões bárbaras explica 
por que, mesmo com a queda de Roma, a instituição prevaleceu. Sua doutrina se 
estabeleceu sobre toda a Europa se associando aos reis que assumiram o poder 
em diversas partes do antigo Império Romano. Em poucos lugares do Império, 
quando as invasões bárbaras se estabeleceram, houve uma resistência da Igreja 
à presença do invasor. Em muitos casos, ela se transformou em instrumento da 
manutenção do poder.
Muitos líderes bárbaros acabaram por incorporar o cristianismo como a reli-
gião do monarca, mesmo sem afetar a liberdade de culto. Foi o caso de Teodorico, 
herdeiro de Teodósio, o conquistador ostrogodo, que era ariano e permitiu o 
culto livre em suas terras.
A vida monástica foi, sem dúvida, um elemento importante na permanência 
do cristianismo papal como principal religiosidade na Europa e, depois, como 
elemento de poder. Ao Papa Bento se deve a propagação dos mosteiros pelos 
territórios dominados pelos reinos bárbaros.
São Bento de Núrsia (480 a 547) é apontado como o pontíice que propagou 
os mosteiros a partir da ordem que ele mesmo criou, Beneditina. O mais famoso 
mosteiro, fundado pelo próprio Bento, foi o de Monte Cassino. Lá, o fundador 
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dos monastérios acabou por encerrar sua vida. Mas antes disso, foi Papa. O que 
lhe permitiu dar aos mosteiros a função de interpretação dos desígnios divinos 
e propagar a fé.
Nesta vida de reclusão, boa parte dos membros do clero mantiveram-se dis-
tantes dos conlitos que se desenvolveram na Europa entre os reinos bárbaros. 
Dentro do ambiente do monastério, a regra que determinava a vida dos mon-
ges permitiu a execução de práticas ligada às comunidades onde os mosteiros se 
instalaram, como também a preservação da cultura clássica, permitindo o desen-
volvimento do pensamento cristão. Os principais pensadores que se destacariam 
através da construção da “escolástica” vieram das ordens religiosas.
ESCOLÁSTICA MEDIEVAL
Pensadores como Santo Agostinho são apontados como fundadores do pensa-
mento cristão europeu, contudo, ligados profundamente à particularização da 
relação do homem com Deus através da fé. A Escolástica vai além, ela é abran-
gente ao ponto de pensar o papel da razão sem abandonar a crença do elemento 
Criador.
Nascido dentro dos mosteiros cristãos, o pensamento escolástico buscou 
aprofundar a tese de Aristóteles na relação da fé e a conduta humana. Fugindo 
da imposição pura e simples de crer sobre qualquer fenômeno da vida humana. 
Nem tudo o que se vive é resultado exclusivo do “plano de Deus”. Há na exis-
tência uma responsabilidade dos homens pelos seus atos e a construção de um 
destino através das escolhas individuais.
O principalautor da escolástica é, sem dúvida, São Tomás de Aquino (1225 
a 1274). Filho de uma nobreza italiana de ascendência germânica, Aquino estu-
dou em Nápoles e em Monte Cassino, mosteiro beneditino. Contudo, acabou 
ingressando na Ordem Dominicana, contrariando a vontade da família que o 
queria um beneditino como o tio.
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Um seguidor do pensamento aristotélico, Tomás de Aquino (1979) rom-
peu com a perspectiva de submissão absoluta do homem e incentivou a capacidade 
de racionalidade do mundo. Para ele, a razão não é incompatível com a fé. Para 
chegar a Deus é preciso dois caminhos que se complementam, ou seja, a teolo-
gia e a ilosoia. Enquanto a primeira aprimora a relação do homem com Deus, a 
segunda aproxima o homem da verdade de si e das coisas que Deus criou, entre 
elas, o próprio homem, sua maior obra, segundo Aquino.
Sob a inluência da escolástica tomista, a Igreja Católica viu proliferar o 
número de universidades com a função de desenvolver a razão sintonizada com 
os preceitos da fé. Vale lembrar que o estudo desenvolvido nas instituições cató-
licas exalta o livre-arbítrio e permite a compreensão do mundo sobre uma ótica 
fundada na racionalidade particular, na busca de um conhecimento relexivo. 
Mas nunca deixou de atender as decisões que a Igreja e seus aliados tomaram 
ao longo das conquistas ocidentais.
A escolástica se transformou, ao longo da história do mundo medieval, no 
método dominante para o desenvolvimento do pensamento cristão. As institui-
ções religiosas passaram a contribuir para a construção de teses que serviriam 
de argumento doutrinário que justiicou, até mesmo, os atos políticos da Igreja 
Católica.
O próprio Tomás de Aquino organizou teses sobre a conduta dos gover-
nantes europeus inluenciados pelas Sagradas Escrituras. Ele buscava orientar o 
poder dos monarcas no sentido de contribuir com a autoridade papal, mais que 
isso, da própria Igreja.
Vale lembrar que a sobrevivência da Igreja Católica enquanto instituição está 
relacionada diretamente às alianças organizadas na Europa com a consolidação 
dos reinos cristãos. A associação do cristianismo com o poder dos governantes 
bárbaros foi uma associação gradativa, mas nenhuma delas foi mais eiciente do 
que a que uniu o Papa e o Império Franco.
Os seguidores de Clóvis, primeiro imperador dos francos, instituíram no 
centro da Europa o mais duradouro reino medieval. Sua formação se deu ainda 
dentro do Império Romano, por volta do Século V, através dos federatus, quando 
os francos se rebelaram contra a autoridade do imperador.
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A primeira dinástica franca não foi simpática à causa católica, mas acabou 
por cair na indolência, eram os merovíngios. Incapazes de governar seu próprio 
reino, devido à desobediência da nobreza, os reis acabaram por ser submetidos 
pelo majordomus (século VIII).
O mordomo do paço se estabeleceu como rei durante o governo de Pepino, 
o Breve, ilho de Carlos Martel. Pepino foi pai de Carlos Magno, o maior dos reis 
carolíngios. Vale lembrar que cada um ao seu tempo, todos os reis da dinastia 
carolíngia eram iéis à Igreja Católica e foi deles que o Papa teve o reconheci-
mento de sua autoridade e recebeu as terras do centro da Península Itálica como 
terras da Igreja, o “patrimônio de São Pedro”.
O reconhecimento da autoridade papal foi acompanhado da nomeação dos 
reis pelo Papa e da associação do poder administrativo do estado franco com 
a estrutura hierárquica do clero. Assim, a nobreza passou a governar associada 
aos membros da Igreja. O Papa era senhor do poder “eterno”, enquanto o rei era 
senhor do poder “temporal”,
A divisão do homem entre alma e corpo estaria integrada pela unidade que, 
separadas, retira do homem a vida. Dessa forma, como a própria escolástica tra-
duz, era preciso aliar fé e razão. O desenvolvimento das instituições clericais 
associou o patrimônio do poder do estado aos da Igreja, mais tarde, essa asso-
ciação seria fundamental para a formação das monarquias nacionais ou para a 
resistência a ela.
João Escoto (810 a 877) foi um dos expoentes da força de um membro do 
clero dentro da corte de um monarca. Em plena corte do imperador franco 
Carlos, o calvo (845), Escoto desenvolveu as teses de vinculação da criação do 
mundo com a existência de Deus. O princípio da origem de todas as coisas que 
regem a vida. Existirá, para ele, uma lei que determina a vida dos homens e todo 
o universo que o cerca.
Escoto acabou perseguido por suas obras que tentaram resgatar o pensa-
mento grego clássico e aliá-lo ao cristianismo. Em sua principal obra, Divisão 
Natural, ele buscou a compreensão da ordem do mundo pela razão que, para 
o pensador irlandês, seria o elemento que levaria a Deus. Logo, a lógica divina 
estaria nos elementos naturais, o próprio Deus seria a natureza. Sua compreen-
são lhe custou a condenação e perseguição pela censura clerical.
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O casamento entre a racionalidade e a religiosidade perseguiu a maioria dos 
pensadores durante a história da formação do pensamento ocidental. A iloso-
ia se deparou com os limites que a teologia lhe impôs. A associação do poder 
divino com o poder político dos monarcas está por trás desse debate. Seria o 
poder dos monarcas uma determinação de Deus? O rei e seus atos são uma mani-
festação divina? O monarca governa pelo livre-arbítrio, por isso deve seguir a 
doutrina religiosa?
O NASCIMENTO DO ISLÃ
O Ocidente não permaneceria o mesmo após o nascimento da Religião Islâmica. 
Uma religião construída nas mesmas bases que o cristianismo, mas que repre-
sentou uma nova interpretação do papel das divindades.
O islã nasceu da ação de Maomé (570 a 632), o fundador da religião islâmica. 
O profeta iniciou sua pregação após, segundo a crença islâmica, ter recebido a 
visita do Anjo Gabriel, que lhe entregou poemas enviados por Deus e a mensa-
gem era de que ele era o último dos profetas. Sua função seria a de unir o povo 
em torno da verdadeira religião. Os combatentes do profeta “conquistaram ter-
ritório e obtiveram um reino, que, por im, se estendia do Turquestão até a 
Espanha” (STORING, 2008, p. 207).
Em 622, Maomé foi expulso de Meca e se refugiou em Medina (Yatreb), 
onde iniciou a comunidade muçulmana. Desse núcleo se propagou o Islã, con-
quistando os árabes unidos ainda por Maomé. Posteriormente, os herdeiros e 
as dinastias que lideraram os muçulmanos propagaram o império da Pérsia à 
Península Ibérica. Todas essas conquistas se deram de 622 a 753. Em pouco mais 
de cem anos, o Oriente Médio, o Norte da África e a Península Ibérica compu-
seram o Império Muçulmano. 
Enquanto o centro religioso desse mundo permanecia em Meca, a terra 
natal de Maomé, com seu antiquíssimo santuário, a Caaba, formavam-
-se nos territórios limítrofes do mundo islâmico, um bem afastado do 
outro, dois brilhantes centros culturais; um ao leste, na corte dos califas 
de Bagdá, que promoviam a arte e a ciência [...], o outro ao oeste, na 
Espanha, que foi conquistada no século VIII (STORING, 2008, p. 207).
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Alguns fatores contaram para a conquista rápida efetuada pelos islâmicos: a conde-
nação das imagens, a austeridade religiosa, a reinterpretaçãodo papel dos judeus 
e do cristianismo como religiosidades que antecederam o islamismo. Outro fator 
foi o enfraquecimento militar dos impérios dominados pelos árabes. Muitos se 
encontravam em guerras civis constantes, o que promoveu uma instabilidade 
social e a facilidade de um invasor subordinar a população.
É possível considerar que os árabes se interessavam mais em saquear os 
territórios dominados do que em subordiná-los e transformá-los em um impé-
rio. Por isso, os califas acabaram por se tornar os governantes ideais das terras 
subordinadas, misturando a liderança militar com a religiosidade, no início 
eram eleitos, depois o poder passou a ser hereditário. O desenvolvimento por 
causa da relação de acúmulo de riquezas transformou, por exemplo, a Espanha 
islâmica, no século X, como o “país mais rico e populoso da Europa Ocidental” 
(STORING, 2008, p. 207).
O mundo árabe viveu três momentos dinásticos em sua liderança. Os “esco-
lhidos”, que foram os herdeiros do profeta; os Omíadas, família militar sediada 
em Damasco; e os Abássidas, que transferiram o poder para Bagdá. Quando os 
Omíadas tomaram o poder, se instalou a cisão entre a religiosidade islâmica. 
Os xiitas, que mantiveram a adoração aos herdeiros de Maomé, os aiatolás; e os 
sunitas, que seguiam a palavra, mas não se subordinavam politicamente, estes 
eram liderados pelos califas.
A cultura islâmica poderia ter se mantido simpliicada nos princípios reli-
giosos fundados por Maomé, mas cresceu e se difundiu. Uniu-se a princípios 
ilosóicos gregos, bizantinos e persas. Inclusive, foi neste último, no Império Persa, 
que se estabeleceu um dos centros culturais islâmicos, o outro foi a Península 
Ibérica.
Um dos maiores califas da Dinastia Abássida foi Harun Al Rashid (766 a 
809), que conseguiu estabilizar o poder entre os califados árabes. Como uma 
construção híbrida do mundo persa, indiano e árabe, o lorescimento da cultura 
muçulmana alcançou uma identidade própria. Uma das maiores expressões lite-
rárias deste tempo foi a obra “Mil e Uma Noites” .
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O islamismo teve expressões culturais relevantes ao longo de sua história. 
Alguns dos conhecimentos desenvolvidos pelos árabes acabaram por atingir o 
mundo ocidental. O mais conhecido foi o algarismo arábico, o desenvolvimento 
da álgebra e também a química.
Entre os intelectuais mais conhecidos do mundo árabe se destacam Avicena 
(980 a 1037) e Averróis (1126 a 1198). O primeiro foi, sem dúvida, o mais 
importante pensador árabe. Seus conhecimentos sobre medicina inluenciaram 
universidades francesas. Áreas de conhecimento como a física e a matemática 
também foram inluenciadas.
No conjunto da harmonia das ciências, Ibn Sina orquestra sua com-
posição iniciando pela Lógica, seguida da Física, da Matemática e, por 
im, da Metafísica, consumada com um estudo sobre a moral, último 
livro da obra. A ordem nada tem de aleatório e indica, dentre outras 
coisas, circularidade e interpenetração das disciplinas. Assim, desenha-
-se pela mão do mestre uma estrutura e um projeto de ciência próprios. 
Apesar disso, algumas respostas só são possíveis na trilha da tradição 
da qual é herdeiro (ATTIE FILHO, 2007, p. 52).
O segundo, Averróis, se destacou como a maior fonte de análise de Aristóteles 
para o pensamento europeu. Mesmo sendo um muçulmano, seus escritos che-
garam na Europa e inluenciaram as universidades europeias. Muito do que se 
estudou de Aristóteles na Europa Medieval vem dos estudos de Averróis, que 
resgatou, por exemplo o De Anima, de Aristóteles, como tentativa de responder 
o que o grego não havia conseguido (ATTIE FILHO, 2007).
Os séculos X a XII foram de apogeu para o mundo muçulmano. Além de 
um grandioso império territorial, a cultura desenvolvida nos centros culturais 
como Damasco (Síria), Teerã (Pérsia) e Córdoba e Sevilha (Espanha) foram 
frutos de uma ampla cadeia comercial que integrou estas regiões por meio da 
religiosidade islâmica.
Contudo, o desenvolvimento islâmico afrontou o cristianismo. A ameaça que 
a expansão muçulmana representou sobre os reinos europeus levou a organiza-
ção militar cristã a combater o “perigo” do expansionismo árabe. Nessa busca de 
unidade, a igura papal mais uma vez se sobressai e se consolida. Mas no apogeu 
do exercício de sua força, o Papa iniciaria sua trajetória de decadência.
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CRUZADAS: A PALAVRA, A ESPADA 
E O COMBATE AO CALIFADO
Cercado por todos os lados, os cristãos se viram na necessidade de combater a 
expansão dos califas, principalmente os que dominaram a Península Ibérica. O 
rei Franco, Carlos Martel, enfrentou o Califa de Córdoba na batalha de Poitiers 
(732). Essa batalha é considerada o marco de resistência dos cristãos evitando a 
tomada da Europa ocidental pelos muçulmanos. Mesmo com a garantia de sobre-
viver às conquistas islâmicas, o mundo cristão europeu se viu cercado pelo islã.
Porém o gigantismo do império muçulmano pagou seu preço. Aquilo que 
recai sobre qualquer grande império, uma crise de governabilidade. Internamente, 
a unidade começou a ruir com as guerras constantes entre califas pelo predo-
mínio regional. Povos buscaram sua autonomia em territórios como o Egito e a 
Síria. Mesmo na Pérsia, a unidade se enfraqueceu e as guerras internas eclodiram.
Para os cristãos, o conlito interno entre os árabes deu a oportunidade para 
atacar o império islâmico, uma vez que o interesse cristão mirava o domínio 
sobre a Palestina e a conquista de Jerusalém. Em seu exercício de autoridade, o 
Papa Urbano II (1042-1099) uniu os cristãos na “Guerra Santa” e iniciou o pro-
cesso de expansão ocidental fundado no discurso religioso. Um discurso que 
acompanhou, de certa forma, as diversas incursões dos cristãos sobre o mundo.
Essa preocupação em justiicar a conquista ocidental por meio de um homem 
que devia a obrigação de sua existência à vontade divina estava em debate na 
Europa, ao mesmo tempo em que as Cruzadas se desdobraram no Oriente Médio 
e no ocidente, na Península Ibérica.
As Cruzadas para o Oriente ocorreram entre 1096 e 1272, e foram nove ao 
todo. Tiveram as mais diferentes composições e destinos. Na primeira, a popu-
lação mendicante foi em busca de pagamento de seus pecados. Miseráveis, sem 
recursos para seguir em combate para o Oriente Médio, o grupo de maltrapi-
lhos foi liderado por Pedro, o Eremita. O bando saqueou cidades germânicas e 
tinha como principal alvo o ataque aos judeus. Milhares foram mortos para que 
se obtivesse recurso para a viagem a Jerusalém.
A maioria dos movimentos cruzadistas tinha como combatentes cavalei-
ros seguindo um monarca europeu ou pertencentes a ordens religiosas. As duas 
Cruzadas: a Palavra, a Espadae o Combate ao Califado 
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mais famosas ordens cruzadistas foi a dos Hospitalários e a dos Templários. As 
ordens, mais uma vez, desempenham um papel fundamental na justiicativa do 
poder papal e também como um braço de sua ação. Os cavaleiros monges pas-
saram a representar a força militar da Igreja que mediu forças com os reis que 
conquistaram terras no Oriente.
Ao mesmo tempo em que os embates militares ocorreram entre cristãos e 
muçulmanos, a Europa passou a receber a inluência do mundo oriental, seja 
na forma de produtos ou do legado cultural. A riqueza do mundo árabe encan-
tava os Europeus. Os comerciantes italianos foram os grandes interessados em 
desbravar o território muçulmano a procurade mercadorias (especiarias) que 
iriam mudar o destino da Europa cristã.
Não por acaso, a própria Itália se transformou no berço da economia mer-
cantil europeia a partir do Século XI, como também no centro cultural que gerou 
a Renascença (séculos XIV a XVI), a revolução cultural que mudou decisiva-
mente os rumos do ocidente cristão.
No contexto em que as cruzadas se desdobraram no Oriente Médio e tam-
bém na Península Ibérica, os pensadores europeus se aprofundaram na relação 
entre o homem, a razão e Deus.
Ao mesmo tempo em que a Igreja Católica consolidava seu poder e se impu-
nha como instituição, os pensadores cristãos reavaliavam o papel do homem 
na Terra e a inluência da formação divina e a razão como condutor das ações 
humanas.
O crescimento populacional europeu, o desenvolvimento das práticas mer-
cantis e o renascimento da vida urbana, aos poucos, davam um novo contorno a 
Europa, prenunciando aquilo que seria o mundo moderno. Em nenhuma outra 
instituição o pensamento foi mais trabalhado, o conhecimento aprimorado, do 
que nas universidades europeias.
Dois pensadores ganham destaque neste contexto, Anselmo (1033 a 1109) 
e Abelardo (1049 a 1142), considerados como a maior expressão da escolás-
tica na busca de justiicar a existência de Deus dentro da razão ilosóica. Um 
dos principais argumentos desses pensadores era a questão dos universais, 
ou seja, daquilo que está em tudo, dá sentido a tudo, mas só se percebe na 
particularidade.
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Anselmo (1979), por exemplo, desenvolveu a razão da existência de todas 
as coisas em Deus. Ele seria o princípio que justiica tudo, mas não necessita ser 
justiicado. Dessa forma, a fé é o elemento que desvenda a verdade do Universo. 
Contudo, para ele, há uma razão para tudo o que existe, ela deve ser buscada 
pelo conhecimento do homem.
Já para Abelardo, o homem usa da particularidade para dar sentido aos valo-
res universais. Segundo ele, não há outra forma de se constituir uma verdade 
se não for transformada em palavra. Desta forma, o conhecimento universal só 
existe na medida em que o ser humano consegue lhe dar um sentido, mas não 
signiica que o domine, apenas o desvenda e lhe conceitua.
É preciso, para que ique claro ao leitor, entender que a busca de um conhe-
cimento universal vai orientar a vida do homem ocidental ao longo de sua 
existência até nossos dias. Por meio do conhecimento que produzimos, procu-
ramos um sentido, é o desejo de universalizar o saber. Um saber que vá além 
da subjetividade de quem o desvendou. Chegar ao movimento do universo, de 
certa forma, chegar a Deus.
Em suas defesas, São Tomás de Aquino considerava que Deus é um cons-
trutor do Universo com uma inteligência, com uma intenção. Diferente de 
Aristóteles que considerava a criação do universo como uma obra do acaso, de 
uma divindade desinteressada em suas consequências ou sem se preocupar com 
seus resultados inais.
Tomás de Aquino se insere nessas discussões tomando a seguinte posição: 
que é demonstrável a criação do mundo por Deus, mas que é indemonstrável 
se o mundo possui duração eterna ou a partir de um princípio (MONTEIRO, 
2009, p. 38).
Desta forma, para o homem ocidental, o universo tem uma razão lógica e 
um sentido comum, por mais que marcado por contradições entre a existência 
particular e coletiva. Por mais que marcado pela universalidade que se expressa 
na individualidade, ou se contrapõe a ela, a busca de entender a lógica do uni-
verso por meio da experimentação sensorial particular é fundamental. Estamos 
vivos, e a vida tem que ter um sentido para todos, este é o paradigma do ocidente.
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O NASCIMENTO DO PENSAMENTO OCIDENTAL 
MODERNO
Podemos apontar diversos fatores como responsáveis pelo nascimento do pen-
samento moderno, contudo, antes de qualquer um, destacam-se as mudanças 
ocorridas nas relações que as pessoas estabeleceram ao longo de sua história e 
que construíram na Europa os elementos que geraram a bases da racionalidade 
cientíica de nossos dias.
A razão ter se sobressaído sobre a fé foi o resultado de uma longa jornada. Não 
foi a construção de um pensador especíico, mas o resultado de diversos deles e 
de um contexto histórico que gerou o ambiente necessário para esta construção.
Se dentro dos mosteiros e universidades europeias do Período Medieval 
foi gestada a lógica de entender a universalidade da humanidade, dentro deste 
ambiente se resgatou o conhecimento de Platão e Aristóteles, se aprofundou a 
visão do universo e da capacidade humana de compreendê-lo. Esta compreen-
são inluenciada pelo paradigma cristão.
O cristianismo serviu não apenas como um condutor do pensamento medie-
val, mas também como um sentido do que viria a ser os elementos ilosóicos e 
cientíicos que o negariam sem perder os modelos que ele gerou. A ilosoia oci-
dental deve muito ao pensamento cristão forjado desde o Império Romano e, 
principalmente, à escolástica medieval.
Mas as mudanças na ordem econômica, social e política da Europa foram 
um campo fértil para o desenvolvimento do pensamento moderno. As transfor-
mações pelas quais a Europa passou entre os séculos XI a XVI abriram espaço 
para a emergência de novas forças sociais.
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As bases de sustentação do poder econômico e político, por exemplo, dei-
xaram de ser exclusivamente a posse da terra e a interpretação religiosa sobre a 
existência do homem. A economia mercantil fez emergir os mercadores e suas 
cidades, onde a cultura loresceu sustentada na dinâmica da vida terrena e não 
na busca de uma salvação. A expressão “o mundo antes da morte icou mais 
interessante” traduz bem a relação entre vida terrena e a pós-morte. O desejo 
de concentração da riqueza passou a ser relevante para uma parte da sociedade.
Os interesses dos governantes europeus, em especial os monarcas e príncipes 
que tinham certa ascendência sobre determinados territórios, já não se sustenta-
vam apenas no controle de relações de vassalagem sobre um grupo de senhores 
feudais (nobres em alguns casos).
Em sua obra “Política como Vocação”, Max Weber descreve com detalhes 
a importância da transferência da autoridade dos senhores para os príncipes. 
A transição de poder das regiões feudais, dos condados, para o estado nacional 
centralizado em torno do rei:
Em toda parte, o desenvolvimento do Estado moderno é iniciado 
através da ação do príncipe. Ele abre o caminho para a expropriação 
dos portadores autônomos e “privados” do poder executivo que estão 
ao seu lado, daqueles que possuem meios de administração próprios, 
meios de guerra e organização inanceira, assim como os bens poli-
ticamente usáveis, de todos os tipos. A totalidade do processo é um 
paralelo complexo ao desenvolvimento da empresa capitalista através 
da expropriação gradativa dos produtores independentes. Por im, o 
Estado moderno controla os meios totais de organização política, que 
na realidade se agrupam sob um chefe único. Nenhuma autoridade iso-
lada possui o dinheiro que paga, ou os edifícios, armazéns, ferramentas 
e máquinas de guerra que controla. No “Estado” contemporâneo – e 
isso é essencial ao conceito de Estado – a “separação” entre o quadro 
administrativo, os funcionários administrativos e os trabalhadores, em 
relação aos meios materiais de organização administrativa, é completa 
(WEBER, 1982, p. 102-103).
Um dos fatores fundamentaisdessa formação do estado nacional se deu pela 
inluência das atividades mercantis e da emergência de uma racionalidade ligada 
à existência da vida em coletividade.
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O isolamento dos mosteiros se rompeu com a circulação dos homens dentro 
do território feudal. As atividades mercantis se intensiicaram com as cruzadas. 
A guerra com o oriente não movimentou apenas tropas, mais produtos e inte-
lectuais. Todo o conlito trouxe refugiados.
Mesmo sendo combates em terras do Oriente Médio, os cristãos trouxeram 
para a Europa uma compreensão diferente da existência. Precisamos nos lembrar 
que os “ocidentais” construíram reinos católicos em Edessa, Chipre e Palestina. 
Formaram núcleos cristãos em terras muçulmanas. A religiosidade cristã não 
livrou o homem europeu de ser inluenciado pela vida oriental. As cruzadas 
foram um confronto, mas também uma troca.
A RAZÃO EMPÍRICA E A VIDA MONETÁRIA
O desenvolvimento de uma economia mercantil, a agitação do mundo urbano 
e o contato com um legado cultural cada vez mais intenso geraram na Europa 
uma nova compreensão do papel que o homem exerce na vida. Sua forma de 
compreender sua existência levava a questionar a imposição da fé sobre o conhe-
cimento racional. Até onde iria a compreensão da verdade universal divina e a 
existência particular e perecível do ser humano.
Vamos considerar que o desenvolvimento da vida material na Europa levou 
à busca de uma compreensão desta vida material dentro da lógica cientíica, 
eiciente para dar respostas ao que as necessidades materiais impunham. Não 
podemos negar que o desenvolvimento material da humanidade foi resultado de 
um conhecimento cientíico que jamais cessou na Europa, desde a Renascença.
Um contemporâneo de Tomás de Aquino e que expressa essa mudança de 
pensamento é Roger Bacon (1214 a 1294). Sua compreensão sobre a existência 
humana e a experimentação como um campo distinto da teologia em relação 
à ilosoia marcaria a cisão entre fé e razão. Crer não implica em não pensar. O 
livre pensamento não leva ao campo da existência divina.
A relação entre razão e fé é outro ponto de divergências entre eles. Para 
Boaventura razão e fé só podem coexistir se numa perspectiva que po-
nha a razão como coadjuvante em relação à fé. Bacon, por sua vez, vê 
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a aliança entre fé e razão como instrumento de salvação espiritual e 
temporal da cristandade, como condição de possibilidade para que se 
realizem completamente os elementos da revelação que iluminaram os 
patriarcas, profetas e ilósofos (LACERDA, 2009, p. 37).
Como franciscano, Bacon desenvolve a ideia de que para entender as coisas da 
natureza não se deve subordinar a razão a uma crença que lhe imponha limites 
na busca da verdade. Para ele, se constituímos uma análise e buscamos com-
prová-la e se, dessa comprovação, se detecta uma lei sobre a natureza, estamos 
apenas desvendando o que, de certa forma, é uma criação divina.
O que determina, em seu pensamento, uma compreensão básica do que 
seria o conhecimento contemporâneo é a matemática. O conhecimento cientí-
ico que parte da lógica dos números (o que foi tão caro a Bacon). Ele acabou 
preso e permaneceu por 15 anos em cárcere, morreu dois anos depois de sua 
libertação (1294).
Essa valorização da capacidade de racionalização do homem, da construção 
de uma lógica fundada em suas experiências, ganhou terreno. Mesmo dentro 
da ordem franciscana, a qual Bacon pertencia, outros pensadores desenvolve-
ram as teses da racionalidade. Uma humanização do saber universal que serviu 
de matéria-prima para o Renascimento Cultural.
Não podemos jamais deixar de considerar que o desenvolvimento mercantil, 
que teve na Itália o seu centro entre os séculos XI a XV, estimulou a necessidade de 
dar ao conhecimento cientíico uma ação prática. As descobertas da astronomia, 
física, química e biologia, durante a Renascença, permitiram o desenvolvimento 
dos meios pelos quais a civilização ocidental se impôs sobre o mundo.
Aqui podemos voltar à ideia de universalidade que predominou no ocidente 
medieval, sendo utilizada para o aprimoramento cientíico que deu aos euro-
peus a capacidade de domínio sobre o planeta.
As descobertas de Copérnico deram forma ao mundo, desenharam um uni-
verso com uma mecânica compreendida pela razão humana e colocou Deus em 
uma fronteira além. O modelo geocêntrico, em que se acreditava que a Terra estava 
parada e os corpos celestes giravam ao seu redor, foi questionado por Copérnico.
O grande feito do alemão Nicolau Copérnico [...] foi destruir esse sistema 
artiicial e susbtituí-lo por outro sistema de pensamento claro e coerente, partindo 
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da suposição de que a Terra é um corpo que se move em torno do Sol, ao mesmo 
tempo que gira em torno do seu próprio eixo (STORING, 2008, p. 243).
A humanidade avançou, assim, sobre a natureza e passou a lhe impor um 
domínio sem igual, partindo de pressupostos racionais. As grandes conquistas 
marítimas estão ligadas diretamente a esta capacidade de compreender cienti-
icamente o mundo.
O rompimento com a submissão da autoridade divina sobre o pensamento 
humano também atingiu a cristandade. A Igreja Católica foi abalada por um 
cisma que já se desenhava na Europa no século XV, com os chamados pré-re-
formistas como John Huss, Wyclif e Erasmo de Roterdã.
Huss (1369 a 1415) nasceu na Boêmia e desenvolveu sua vida dentro do 
clero católico, por mais que fosse um crítico da atuação da Igreja em relação 
aos iéis. Sua principal crítica se dava pela forma como a dominação da dinastia 
Habsburgo se dava sobre os povos do leste europeu. Uma dominação respaldada 
pelo clero católico, o qual ele criticava.
Suas pregações contrárias à dominação administrativa do clero encantaram 
a nobreza que discordava da dominação papal e de seus representantes sobre as 
terras da República Tcheca. As teses do precursor luterano condenavam a concen-
tração das terras nas mãos da Igreja Católica, assim como a venda de indulgências 
promovida para poder pagar os conlitos militares na Itália. 
Huss era seguidor de John Wyclif (1320 a 1384), o mais importante pen-
sador pré-reformista da Europa. Inglês, originário de família de nobres e com 
grande quantidade de terras na região de Yorkshire, sua vida dentro do clero foi 
de crítica ao poder do clero e à inluência que este exercia no poder monárquico.
Wyclif, assim como Huss, pregou a religiosidade em língua nacional. Foi um 
dos primeiros tradutores da Bíblia em língua inglesa. O pensador inglês defen-
deu a transferência da autoridade papal para os monarcas, por isso é considerado 
um precursor das teses do anglicanismo.
Mesmo dentro da Igreja e sem sofrer as perseguições que Wyclif e Huss 
sofreram, Erasmo de Roterdã acabou por se transformar no “pai do humanismo”. 
Um expoente da reforma protestante sem sair do catolicismo, mais que isso, um 
dos pensadores básicos do Renascimento Cultural.
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Roterdã (1466 a 1536), o autor de “O elogio à loucura”, condenava a imposição 
clerical e a construção de um pensamento complexo para entender a existência 
humana como uma obra divina. Para ele, o homem comum podee tem o direito 
de ter acesso direto ao pensamento de Deus por meio do Evangelho e das pala-
vras do pensamento do apóstolo Paulo.
Para Roterdã, esses documentos bíblicos são a base do cristianismo que fun-
damentam a relação de Deus com os homens e os documentos necessários para 
a compreensão da existência do homem em contato com o Criador.
Com esse pensamento, Erasmo de Roterdã desaiou o poder Papa e clerical, 
o qual achava desnecessário. Criticou a escolástica tomista ao considerar que a 
fé é o determinante da salvação, assim como a ação humana é uma expressão 
da vontade de Deus. O homem por si se salva, através de sua busca por Deus.
A compreensão de Roterdã inluenciou o pensamento luterano, discordando 
apenas da predestinação defendida por Lutero. Assim como Wyclif, ele conde-
nava a transubstanciação na eucaristia ou nas imagens dos santos e pregava a 
necessidade de uma reforma na Igreja Católica.
Por viver na Holanda, um país com uma liberdade imensa de convivência 
entre diferentes facções de pensamento religioso, Roterdã não foi perseguido 
como seus antecessores. Ele viajou por diversos países europeus e chegou a deba-
ter com Lutero, seu contemporâneo.
Uma das principais defesas de Roterdã era a educação que, para ele, deveria 
se constituir como um interesse de todos, mas a educação requintada apenas para 
os homens de governo. Ao povo, segundo ele, a educação deveria ser compreen-
dida como uma iniciação à religiosidade, ao conhecimento da universalidade.
Mesmo assim, o pensador holandês criticava o monopólio do conhecimento 
pelos membros do clero. Considerava que o aprendizado é direito de todos. Para 
ele, o saber racional deve ser livre. A especulação humana deve ir além da simples 
retórica repetitiva imposta pela Igreja Católica em sua época. O livre pensamento 
é uma de suas mais importantes defesas.
Se a religiosidade tradicional católica é questionada, se a determinação de 
Deus sobre a vida dos homens ganha uma conotação libertária, essa condição está 
associada diretamente ao desenvolvimento de uma ciência que se estabelece sobre 
as leis do Universo e sobre a mecânica dos corpos – a física, química e biologia.
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Impossível deixar de entender o que Copérnico, Galileu e Kepler signiica-
ram para o mundo moderno. Os três grandes astrofísicos mudaram o destino da 
humanidade, descobriram o mundo 
para os seres humanos e geraram as 
possibilidades de um conhecimento 
que está em todo o nosso cotidiano.
As transformações que assisti-
mos nos últimos seis séculos em que 
a Europa conquistou o planeta e lhe 
impôs uma integração mercantil e cul-
tural tem no conhecimento cientíico 
o instrumento fundamental. Todas as 
coisas que nos cercam, os bens mate-
riais e serviços que adquirimos e com os quais nos relacionamos são fruto de 
um saber cientíico fundado por esses pensadores.
Nicolau Copérnico (1473 a 1543), polonês, formado em medicina e direito, 
dedicou-se ao estudo dos astros. Sua principal contribuição foi a teoria helio-
cêntrica, em que descobre a rotação da terra e os demais planetas em torno do 
Sol. Para Copérnico, os movimentos dos corpos celestes acabam por revelar que 
a Terra não era o centro , mas o próprio Sol:
[…] o primeiro lugar, abaixo do irmamento ou da esfera das estrelas 
ixas, coube à esfera de Saturno, dentro desta está contida a esfera de 
Júpiter, depois a de Marte; o Sol é circundado pela esfera de Mercúrio, 
em seguida Venus, de modo tal que os centros das esferas dos cinco 
planetas se encontram na proximidade do Sol [...] o globo terrestre não 
diversamente dos outros corpos planetários tem movimentos próprios 
entre eles (COPÉRNICO, 1979, p. 780-81).
Membro do clero, Copérnico viveu entre os estudos de medicina, lógica e astro-
nomia e a vida clerical. Acabou por viajar para a França e Itália na busca de 
aperfeiçoar seus conhecimentos sobre a mecânica do Universo. Suas descober-
tas acabaram por demorar a serem publicadas pelo temor do próprio cientista 
sobre a reação que a Igreja Católica teria de suas descobertas. Sobre o que, de 
certa forma, Copérnico tinha razão.
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Muitos consideram as descobertas de Copérnico o maior símbolo cientíico do que 
foi a Renascença enquanto movimento cultural. O despertar do homem ocidental 
para uma nova forma de compreender o Universo que o cerca e a própria Terra.
Galileu (1564-1642), o italiano, também foi estudante de medicina, mas 
acabou por se interessar por astronomia e matemática, ao que se dedicou pelo 
resto de sua vida. Uma de suas principais teses foi o desenvolvimento da física 
e o movimento dos corpos.
Por meio de observações, estudou o movimento dos planetas e reairmou 
as teses de Copérnico sobre o sistema solar e o movimento rotativo da Terra. 
Ele também desenvolveu o conhecimento sobre o movimento dos corpos e a 
cinemática. Foram essas teses que lhe izeram discordar de Aristóteles sobre a 
velocidade de queda dos corpos. Sua lei da gravidade icou famosa, lhe rendeu 
títulos universitários na Itália, mas sua defesa das teses de Copérnico gerou sua 
perseguição. Acabou tendo que negar suas descobertas e defesas. 
Johannes Kepler (1571 a 1630) nasceu na Alemanha e foi matemático. Suas 
teses se desenvolvem em torno dos movimentos dos astros, a que se dedica a 
observar e a buscar entender a força que os atrai. Ele descobre que o movimento 
dos astros, devido à atração que as massas dos planetas provocam, é elíptico e 
não circular como se acreditava.
Como Copérnico e Galileu, com quem se correspondeu, Kepler foi perseguido 
pelos protestantes alemães, tendo que se mudar para Praga para poder continuar 
suas pesquisas. A ciência parecia incomodar os católicos e protestantes. As teses 
A ideia sobre os movimentos dos corpos, irmado pela Igreja Católica, era a 
de que a Terra estava parada e as demais estrelas e corpos celestes giravam 
à sua volta, teoria conhecida como geocentrismo. Com as observações de 
Copérnico, por exemplo, que refutavam o modelo aristotélico-ptolomaico, 
o paradigma passa a ser o heliocêntrico, em que o Sol é o centro de um 
sistema.
Fonte: Storing (2008, p. 242-243).
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desenvolvidas pelos pensadores renascentistas, que ironicamente eram religiosos, 
despertavam o temor do fanatismo sustentado em verdades absolutas e inquestio-
náveis. Os administradores religiosos demonstram ignorância no trato da ciência
Enquanto o poder cientíico conduziu o homem europeu para descobertas e 
conquistas, movimentadas pela busca do enriquecimento que o comércio europeu 
centralizava desde sua experiência com as cruzadas e o contato com as especia-
rias do oriente, as monarquias nacionais se sobressaíam sobre o poder papal. A 
Reforma Protestante foi o golpe fatal no poder do sumo pontíice.
Os movimentos protestantes nasceram das discordâncias e críticas à con-
duta do clero católico, dos Papas interessados e voltados apenas para o poder. Os 
excessos materiais da Igreja Católica e seu abuso de autoridade já tinham sido 
questionados no passado, os pré-reformistas, dos quais tratamos aqui, já tinham 
se pronunciado e demonstrado o caminho que a conduta do clero católico leva-
ria à cisma entre os cristãos no ocidente.
Essa cisão da cristandade tem em suas bases os mesmos princípios que teve 
o Renascimento Cultural em sua origem, os elementos que determinaramas 
descobertas cientíicas, o humanismo. A busca de valorizar o homem acima das 
crenças e dogmas impostos, como a escolástica exigia.
Em vez do homem introspectivo, o que se desejava era um homem especu-
lativo, que busca conhecer-se ao conhecer o mundo que o cerca, sem limites de 
moral ou crença que impeça de ir além do que se é.
Neste sentido, da mesma forma que a física foi fruto da especulação, a reinter-
pretação das palavras divinas e a busca de uma relação direta com Deus também 
seguiu a liberdade, mas apenas a princípio. Posteriormente, o temor das desco-
bertas cientíicas abalou também as igrejas que nasceram da Reforma.
Não podemos deixar de mencionar o papel que a Igreja Católica teve nos 
primeiros anos da Renascença. Papas, cardeais e bispos foram inanciadores dos 
renascentistas. Obras como as de Da Vinci, Michelangelo e Donatello foram 
dedicadas, em grande parte, a Igreja Católica. Claro que, diante de uma remu-
neração. Talvez aí esteja um segredo de conduta, até que ponto se age pela fé ou 
pela materialidade.
Contudo, mais tarde, a própria Igreja viria a condenar os artistas da 
Renascença, considerando-os uma ameaça. Censurando suas obras e descobertas. 
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Foi o caso de Da Vinci, de Galileu e Copérnico. Mas nada disso impediria a pro-
pagação do conhecimento que o Renascimento gerou. O movimento humanista 
cresceu em um ambiente onde a autoridade papal estava decadente, a burgue-
sia mercantil emergia e a nobreza feudal enfraquecida se agarrava nos direitos 
hereditários subsidiados por uma monarquia nacional que lhe sugava o poder 
político e militar. Os mesmos monarcas que recebiam dos empresários mercan-
tis os tributos para ampliar poder territorial e consolidar a autoridade.
A força dos monarcas garantiu em muitos reinos europeus a cultura renascentista, 
a qual, contudo, também foi perseguidas por eles. Um exemplo desta instabilidade 
ocorreu na Península Ibérica que, carregada de religiosidade, soube usar o desen-
volvimento da ciência náutica como nenhuma outra nação da Europa. Os monarcas 
Ibéricos que se constituíram como guardiões do poder papal, cobraram caro para pro-
teger a Igreja Católica, transferiram o poder do vaticano para os interesses do trono.
Se observarmos as grandes navegações, vamos entender por que o discurso 
religioso norteia as conquistas ibéricas. A cruz estampada nas velas dos navios 
portugueses e espanhóis, o prestígio que a religiosidade católica tinha ao orien-
tar a conquista dos territórios e catequizar, por exemplo, e os gentis americanos 
são exemplos da inluência do ideário cristão.
Vários pensadores se dedicaram a entender as conquistas náuticas e o papel 
da Igreja na conversão dos povos indígenas na América. A ordem inaciana merece 
destaque neste papel de conversora. Nascida dentro da Contra-Reforma, ou que 
alguns chamam de Reforma Católica, no Século XVI, o seu fundador, Inácio 
de Loyola, aliou a hierarquia militar à constituição de uma ordem religiosa que 
tivesse como função o papel de converter e educar. Disciplinados, os jesuítas se 
destacaram na conversão dos nativos americanos.
Na Europa, a Ordem Jesuíta passou a administrar inúmeras universidades 
católicas. Gerando um retrocesso em centros culturais cristãos. Um retrocesso 
que custou caro ao clero em alguns países europeus, como a Alemanha, Holanda 
e, até mesmo, na França.
Foram os inacianos os responsáveis pelo desenvolvimento do Barroco, a arte 
oicial da Igreja Católica, que se apoderou das técnicas renascentistas e carregou 
de uma religiosidade fantasiosa e desmedida os templos do período moderno.
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Uma peculiaridade da Companhia de Jesus foi seu papel importante na educação 
das terras coloniais da América. Ao mesmo tempo em que se responsabilizaram 
pela conversão dos nativos, os inacianos se destacaram na formação de semi-
nários e nas artes.
A CONSTRUÇÃO DO ESTADO NACIONAL E A CIÊNCIA 
POLÍTICA
Na reorganização do poder na Europa, a formação do Estado Nacional tem um 
papel relevante. As monarquias nacionais conseguiram deslocar as forças sociais, 
culturais e econômicas para a modernização da sociedade ocidental e para a con-
quista planetária que adveio da organização do poder nacional.
Podemos considerar que os últimos 600 anos foram construídos pela rela-
ção entre as nações. O modelo de governo que emergiu no ocidente cristão entre 
1100 a 1800 escreveu a história da humanidade e refez o mapa do Mundo. Um 
mapa político recortado por estados nações.
O estabelecimento do poder monárquico nacional se deu com a unidade 
entre os condados feudais e com o deslocamento do poder papal para a igura do 
rei. Um processo longo e que, em alguns casos, levou à ruptura entre o monarca 
e a Igreja Católica.
Inácio de Loyola teve a incumbência de estruturar uma espécie de exército 
jesuítico, a Companhia de Jesus, que tinham por intuito não apenas letrar 
os homens que desembarcaram nas novas terras, mas também as pessoas 
nativas encontradas, carregando as palavras de salvação para toda e qual-
quer criatura.
Fonte: Saviani (2013, p. 40-42).
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O exercício de poder em que o monarca fortaleceu sua autoridade foi deter-
minado pela imposição da autoridade sobre os súditos que habitavam o território 
nacional. Mas, para isso, era necessário o reconhecimento da hierarquia estabe-
lecida a partir do rei e da burocracia que o servia.
A unidade territorial em torno do monarca não se deu de forma linear, foi 
diferente em cada território da Europa cristã. Não obedeceram às mesmas for-
ças econômicas e políticas, muito menos teve como fator de unidade os mesmos 
elementos.
Se observarmos os países ibéricos, a unidade nacional contou com o ingre-
diente de expulsão dos muçulmanos da Península Ibérica, o que convencionamos 
chamar de “reconquista”. Esse processo de expulsão reuniu nobres católicos na 
luta contra os califas. Portugal nasceu primeiro, no século XII, sob a liderança de 
Henrique de Borgonha, um nobre francês que expulsou os mouros de Portucale 
e, posteriormente, seu herdeiro, Dom Afonso Henriques de Borgonha conquis-
tou Alcobaça e Santarém.
Na unidade espanhola, os chamados “reinos católicos” (Leão, Castela, Aragão 
e Navarra) se reúnem para expulsar os mouros. A luta se deu por mais de seis 
séculos e culminou com a Batalha de Andaluzia (1492), quando os reinos se uni-
ram em torno de Fernando de Aragão e Isabel de Castela, formando a Espanha.
Se a unidade ibérica foi tutelada pela Igreja Católica, nos países ao norte 
da Europa a unidade foi uma guerra, muitas vezes, contra a própria Igreja. A 
Inglaterra tem o caso mais emblemático, a criação da Igreja Anglicana (Igreja 
Nacional Inglesa) com Henrique VIII de Tudor, no século XVI.
No mesmo século XVI, Na França, a unidade nacional foi obtida por meio de 
uma guerra constante entre os nobres, os quais estavam divididos pelos interes-
ses regionais e tentando impor sua autoridade sobre o território nacional. Depois 
de uma longa batalha entre as famílias Guise, Valois e Bourbon, foi esta última 
que conseguiu se sobressair com apoio dos mercadores da Região de Navarra e 
Normandia. Contudo, Henrique de Bourbon era protestante, calvinistas hugue-
note e teve que se converter ao catolicismo para poder governar.
Aqui podemos entender a importância que a unidade nacional teve no futuro 
daEuropa. As grandes navegações, o que chamamos de “Expansão Marítima”, 
não poderiam ter ocorrido sem a orientação dos estados nacionais absolutistas. 
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Foi com a autoridade de seus monarcas que nações como Portugal, Espanha, 
Inglaterra, França e, posteriormente, e de forma singular, a Holanda promove-
ram as navegações.
Foi nesse ambiente de ebulição das monarquias nacionais que o pensamento 
político ganhou as bases para o desenvolvimento de uma ciência que discutisse e 
transformasse o poder em tema. Um dos principais expoentes deste pensamento 
foi Nicolau Maquiavel, Florentino, cuja obra mais conhecida é “O Príncipe”.
As teses de Maquiavel (1997) partem da análise dos governantes da anti-
guidade e do período medieval, em uma análise dos sucessos e insucessos dos 
homens que buscaram o poder. Dessa análise, o lorentino busca entender os 
princípios fundamentais de onde o poder se sustenta. Uma tentativa de enten-
der a lógica das forças sociais, econômicas e culturais que permitem o controle 
do Estado e a manutenção do governo.
O interesse de Maquiavel nessa obra, que é uma receita das experiências de 
governantes do passado, é dar a Lourenço de Médici (Príncipe de Florença) os 
ingredientes para poder unir a Península Ibérica e garantir o desenvolvimento 
italiano à altura do que os países ibéricos promoviam naquele tempo. Ou seja, 
“O Príncipe apresenta um conciso compêndio de conselhos e recomendações 
sobre modos de ação política aos príncipes da época” (GONÇALVES, 2010, p. 
8). O estado nacional português e espanhol eram senhores dos mares, mesmo 
não tendo a riqueza e a experiência náutica dos italianos.
O destaque da obra “O Príncipe” é a sua racionalidade em relação ao poder. 
Sua capacidade de projetar o governo se impondo sobre forças até então dominan-
tes à supremacia do rei. A ciência política tem em Maquiavel (1997) seu precursor. 
Sua capacidade de elaborar regras para atingir a estabilidade do governo ainda 
hoje é base dos estudos da ciência política.
Hoje, o preconceito recai sobre a obra do autor italiano e lhe associa a quem 
utiliza de meios vis para chegar ao poder. Como se aquele que busca manter-se 
no governo estivesse livre para todos os atos que achasse necessário para impor 
a dominação. O que não é uma verdade.
A obra estabelece o papel do governante como determinante para o equilíbrio 
de forças que, até então, se encontravam dispersas. Canalizar esta “força” para o 
interesse comum que o rei representa é o objetivo da obra de Nicolau Maquiavel. 
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Para ele, o Rei que se traduzir neste equilíbrio e nesta força se mantém no poder.
Aquele que chega ao principado com a ajuda dos grandes mantém 
com mais diiculdade do que aquele que se torna príncipe com a aju-
da do povo, porque tem ao seu redor muitos cidadãos que pensam 
ser seus iguais, e, por isso, não os pode comandar nem governar a 
seu modo. Mas aquele que chega ao principado com o favor popular, 
se encontra sozinho e tem em torno de si ninguém ou pouquíssimos 
que não estejam prontos a obedecer (MAQUIAVEL, 1997, LIVRO 
IX, §2).
Como se pode notar, a todo momento Maquiavel traz os elementos positivos 
e negativos das tomadas de decisões elaboradas no passado, o que remete ao 
conceito de poder e Estado Civil como uma análise temporal. As noções políti-
cas dispostas em sua obra reletem uma escrita analisada sem vinculação com a 
valoração moral, como se a obra estivesse apartada dessas relações. Esse apara-
mento, por exemplo, concede à escrita esse caráter de ‘manual’, como a descrição 
de Roma, a que ele constantemente chama de principado para depois vir a ser 
uma república.
São os conlitos religiosos associados ao desenvolvimento do comércio as 
principais forças que os monarcas europeus têm que administrar para a manu-
tenção do poder. Não podemos deixar de considerar que a religiosidade não é 
meramente uma escolha particular, é um instrumento de unidade e de reconhe-
cimento do homem em relação às demais e em relação ao poder.
Um dos exemplos da relação entre o desenvolvimento do comércio e a reli-
giosidade está na obra “Ética Protestante e o Espírito Capitalista”, de Max Weber. 
Nela, o autor alemão apresenta o papel que a mentalidade econômica protes-
tante desempenhou para o sucesso da economia capitalista nos países europeus, 
como também nos Estados Unidos. A mentalidade católica, segundo o autor, foi 
um entrave para a modernização das relações econômicas.
O que se deve levar em consideração é que o desenvolvimento mercantil 
fez surgir a necessidade do aprimoramento cientíico. As conquistas efetuadas 
pelas nações europeias nas grandes navegações, as atividades econômicas que 
foram desenvolvidas na Europa, a partir do período moderno, e as condições 
em que os estados nacionais se desenvolveram foram exigindo um aprimora-
mento da ciência.
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O RENASCIMENTO DA CIÊNCIA A SERVIÇO DO MUNDO DOS 
NEGÓCIOS
Os artistas da Renascença foram os que mais expressaram a importância das 
descobertas cientíicas. Inicialmente para atender à produção de uma arte que 
buscava a perfeição de suas obras, depois para a construção de um conhecimento 
necessário para os interesses de expansão que a sociedade ocidental viveu a par-
tir do Século XV.
As descobertas territoriais, durante as grandes navegações, efetuadas pelas 
nações europeias, foram impulsionadas pelo conhecimento cientíico e pela 
tecnologia. A Reforma Protestante também é um elemento importante para se 
pensar no desenvolvimento cientíico moderno. Vale lembrar que as descobertas 
também foram um campo fértil para o desenvolvimento da ciência. O encontro 
com novas civilizações, novos espaços geográicos, novas espécies de plantas e 
animais mudaram a compreensão do homem ocidental sobre si mesmo e sobre 
o mundo. Contudo, vale lembrar que o discurso de supremacia se sobressaiu.
Seria da Europa que emanaria toda a compreensão e registro das grandes 
descobertas e de seus efeitos. O olhar do homem ocidental determina o con-
ceito, julgou e executou os povos “não ocidentais”.
O discurso de supremacia europeia se apoderou de parte do saber produzido, 
trazendo o caráter de cientiicidade e racionalidade sobre as coisas humanas. Mesmo 
Deus, uma entidade metafísica, passa a ser visto como um “grande arquiteto mate-
mático” que procurou construir os elementos vivos com o modelo de perfeição.
O mais importante personagem dessa transformação pela qual a Europa pas-
sou foi, sem dúvida, Nicolau Copérnico. Sua teoria heliocêntrica se transformou 
em um marco na concepção de universo. Rompeu com as teses predominantes 
até o Século XVI da teoria de Ptolomeu e deslocou a Terra do centro do Universo 
para um sistema solar. 
As teses de Copérnico foram combatidas pela cristandade quase como um 
todo. Contudo, o desenvolvimento cientíico do que ele apresentou foi mais 
intenso nos países protestantes pela limitação da igreja diante da autoridade dos 
reis. A Igreja Católica continuou, em alguns países, exercendo uma forte inlu-
ência na vida política e interferindo na produção cientíica.
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Importante ressaltar que a ciênciacolocava a igura humana em condição 
de criar e transformar. O conhecimento cientíico signiicava o poder humano 
sobre a natureza. A capacidade de transformá-la em busca de interesses terre-
nos e não divinos vai mudar o curso da história.
Os complementos das teses de Copérnico foram feitos por Kepler e Galileu. 
Enquanto o primeiro desenvolveu as teses de movimentação dos corpos celes-
tes através de um movimento elíptico e não circular como previa Copérnico, o 
segundo desenvolveu a tese do movimento dos corpos, a dinâmica.
Dessa forma, o estudo da matemática e da física ganhou um papel central. A 
partir da busca da compreensão das chamadas “leis naturais”, aquelas que aprende-
mos nos “bancos das escolas”, passando por Galileu, por Newton e posteriormente 
Einstein, deram-se as bases para as ciências naturais como conhecemos hoje.
Destaque, no pensamento racionalista, para Francis Bacon (1561 a 1626). O 
teórico inglês que tem participação no parlamento britânico, indutivo. Nele, ao 
partir de premissas estabelecidas e das diferenças entre os elementos, procura 
se chegar à classiicação e compreensão comparativa.
Segundo o pensador inglês, a função da ciência é servir ao homem, lhe dar 
condições de dominação sobre as leis naturais e garantir a transformação do 
mundo para a satisfação humana. Dessa forma, o homem tem um poder natu-
ral sobre as coisas, mas para exercê-lo deve desenvolver o seu conhecimento e 
sua racionalidade sobre o mundo. Se livrar dos “ídolos”, segundo Bacon.
Para ele, os “ídolos” têm uma classiicação diversiicada, vão desde o senso 
comum ao idealismo exagerado, por mais que racional. Dessa forma, só deve-se 
crer naquilo que se entende pela racionalidade cientíica, deve-se compreender 
as “leis gerais”, mas conhecer as particularidades que as justiicam. Bacon quer 
que a humanidade chegue à verdade, mas se faz necessário que se desvincule de 
tudo aquilo que possa impor ídolos (imagens) que são obstáculos para tal inten-
ção. Para isso, ele estabelece um método pontual para atingir seus ins.
Nosso método, contudo, é tão fácil de ser apresentado quanto difícil de 
se aplicar. Consiste no estabelecer os graus de certeza, determinar o al-
cance exato dos sentidos e rejeitar, na maior parte dos casos, o labor da 
mente, calcado muito de perto sobre aqueles, abrindo e promovendo, 
assim, a nova e certa via da mente, que, de resto, provém das próprias 
percepções sensíveis. Foi, sem dúvida, o que também divisaram os que 
tanto concederam à dialética (BACON, 2000, p.27-28).
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O problema do método perpassa consideravelmente a história da ilosoia, uma 
vez que se constitui como um caminho a guiar quem pesquisa, como veremos 
mais adiante. Da mesma forma, ao se projetar para o universo da educação, o 
método, o erro, a certeza, temos discussões não apenas ilosóicas, mas também 
pedagógicas. Bacon (2000, p. 35), alinhava a linguagem à noção de conheci-
mento, ora, o “silogismo consta de proposições, as proposições de palavras, 
as palavras são o signo das noções”. Falar da verdade, ou do que se quer como 
verdade, só seria possível se livrando dos pré-conceitos, como os ídolos men-
cionados pelo ilósofo.
Envolvido com o governo inglês em profunda transformação, é sempre bom 
lembrar que o pensamento de Bacon se desenvolveu em uma Inglaterra marcada 
pelas mudanças das primeiras revoluções liberais. Os primeiros momentos em 
que a o poder monárquico se limitava diante da força do Parlamento. O próprio 
Bacon foi membro da Câmara dos Comuns.
Na política, mas sustentado na racionalidade, homas Hobbes (1588 a 1679) 
foi uma das expressões políticas e ilosóicas que mudou a concepção de poder 
através da racionalidade. Nesse aspecto, ele comunga com Maquiavel, autor que 
já trabalhamos. O princípio de Hobbes está na função do poder monárquico, o 
rei é uma autoridade necessária diante da impossibilidade do acordo entre os 
homens com uma natureza de constante conlito.
Assim como Bacon, mas o superando, Hobbes foi um empirista e defensor 
da matemática, dedicando-se aos estudos da dedução. Assim como os pensado-
res de seu tempo, estava à procura de uma lei natural que pudesse ser o elemento 
impulsionador da existência de todas as coisas.
A trajetória de Hobbes como pensador lhe colocou no destino da política. O 
jovem inglês perdeu o pai cedo e foi criado pelo tio. Estudando lógica e se dedi-
cando ao estudo da conduta humana, o pensador foi tutor de diversos nobres 
ingleses. Acabou por viajar para toda a Europa, conhecendo Galileu em suas 
viagens (1636).
Sua principal obra é “O Leviatã”, o grande monstro eleito pelos homens com 
plenos poderes e capaz de se impor pela ambição, que é da natureza humana, e 
pela necessidade de convivência entre os indivíduos, o que é fundamental para 
o desenvolvimento da sociedade. O monarca, dessa forma, não é senhor por 
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virtude de Deus ou de si, mas foi eleito pelos homens para conter a ganância 
que reina em cada um de nós.
Dessa concepção de Hobbes, é possível deinir a necessidade do poder, que 
em nossos dias ainda é discutida. Para movimentos políticos ideológicos como o 
Anarquismo, ou mesmo para pensadores materialistas históricos, o estado repre-
senta o repressor, qualquer forma de autoridade atende a interesses de classes 
ou grupos privilegiados na sociedade. Mas, para os seguidores de Hobbes, ele é 
necessário. O poder garante a ordem entre os homens, segundo ele.
Todo homem é opaco aos olhos de seu semelhante – eu não sei o que o outro 
deseja, e por isso tenho que fazer uma suposição de qual será a sua atitude mais 
prudente, mais razoável. Como ele também não sabe o que quero, também é for-
çado a supor o que farei. Dessas suposições recíprocas, decorre que geralmente o 
mais razoável para cada um é atacar o outro, ou para vencê-lo, ou simplesmente 
para evitar um ataque possível: assim a guerra se generaliza entre os homens
Outra característica do pensamento do ilósofo inglês é o experimentalismo, 
o que estará presente em diversos teóricos de seu tempo: considerar apenas aquilo 
que é possível ser observado e através da observação constituir as leis naturais 
que regem a vida humana. Por isso, era também um simpatizante da matemática.
Hobbes foi um ativista político e buscou inluenciar o poder da sua época. 
Na França, lançou “O Leviatã” à procura de esclarecimento acerca da função 
do poder, como foi citado anteriormente, mas sua concepção acabou recebendo 
críticas tanto de monarquistas como de republicanos. Dos primeiros por não 
reconhecer a origem divina do rei, dos segundos por considerar que o homem 
necessita de uma autoridade absoluta sobre ele. Dentro dessa obra, o ilósofo 
descreve acerca das paixões da alma, o que nos remete a pensar não apenas na 
posição política do autor, mas em que medida esses atributos conduzem a huma-
nidade a escolher determinada postura.
Conforme descreve Hobbes, a primeira ‘provocação’ seria por causa dos sen-
tidos, “pois não há concepção no espírito do homem que primeiro não tenha 
sido originada, total ou parcialmente, nos órgãos dos sentidos” (HOBBES, 2003, 
p.15). Decorre que dele surgem as imaginações, que podem ser declínios das ações 
humanas. Se as coisas conhecidas o são pelos sentidos, e esses conduzem a imagi-
nação, ela pode provocar apetites e aversões que levam a uma determinada ação.
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apetites e aversões, esperanças e medos, relativamente a uma mesma 
coisa; [que] quando passam sucessivamente pelo pensamento as diver-
sas consequências boas ou más de praticar ou abster-se de praticar a 
coisa proposta, de modo tal que às vezes se sente um apetite em rela-
ção a ela, e às vezes uma aversão, às vezes a esperança de ser capaz de 
praticar, e às vezes o desespero ou medo de a empreender, toda a soma 
de desejos, aversões, esperanças e medos, que se vão desenrolando até 
que a ação seja praticada, ou considerada impossível, leva o nome de 
deliberação (HOBBES, 2003, p. 55).
Apesar das pontuações bem delineadas sobre sociedade civil, estado e governo, 
e seu contato com os monarcas ingleses, jamais foi um inluente no destino do 
governo inglês. Suas obras icaram mais conhecidas fora do reino britânico.
O ‘SENHOR’ DO PENSAMENTO MODERNO
Uma das maiores inluências no pensamento moderno foi a de René Descartes 
(1596 a 1650). Sua obra marcou profundamente os fundamentos da ciência, a 
análise do conhecimento e as estruturas ilosóicas que foram construídas em 
seu tempo. Podemos considerar Descartes um pensador completo.
O emblemático nesse autor francês, de formação conservadora, é que pas-
sou sua vida em busca de entender a natureza e o homem. Chegou a se alistar 
em exércitos para ter tempo de se dedicar aos estudos por meio de viagens pela 
Europa. Foi durante sua vida militar que produziu a obra “O discurso do método”.
Apesar de francês, passou parte considerável de sua vida na Holanda, onde 
desenvolveu a maioria de suas obras, que buscavam em Copérnico e Galileu uma 
referência. Em especial no estudo do movimento do universo. Ele também era 
um defensor da matemática. Quando Galileu foi julgado, Descartes não divul-
gou parte de seus trabalhos temendo as controvérsias que poderiam gerar, pois 
não gostava de perder tempo com embates que considerava desnecessários.
Algum dos princípios fundamentais do pensamento de Descartes está em 
não ser considerado uma verdade cientíica aquilo que não fosse claro e distinto. 
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Para ele, todo o problema deve ser dividido em partes até que seja compreendido 
todo o seu funcionamento e compreendida a lógica de seu funcionamento. Por 
isso, ao observarmos uma questão, deve-se partir do simples para o complexo, 
sempre nesta ordem. Quando a ordem não existir, deve-se estabelecer uma. Por 
isso, sem um método é impossível entender uma questão. Apesar de descrever 
em sua obra, o “Discurso do Método”, que não quer propor um método para as 
pessoas, mas revela qual foi o seu, acaba por conceder um caminho para guiar 
o conhecimento e chegar a alguma verdade.
Assim, meu propósito não é ensinar aqui o método que cada um deve 
seguir para bem conduzir sua razão, mas somente mostrar de que modo 
procurei conduzir a minha. Aqueles que se metem a dar preceitos de-
vem achar-se mais hábeis do que aquelas a quem os dão; e, se falham na 
menor coisa, são por isso censuráveis (DESCARTES, 1996, p.7). 
A ideia de Descartes é revelar como estruturou um método a im de se afastar de 
tudo o que seja duvidoso, além de esboçar como diversos conhecimentos herda-
dos desde a infância acabaram por prejudicar o alcance da verdade: 
assim que terminei todo esse ciclo de estudos, no termo do qual se cos-
tuma ser acolhido nas ileiras dos doutos, mudei inteiramente de opi-
nião. Pois me encontrava enredado em tantas dúvidas e erros, que me 
parecia não ter tirado outro proveito, ao procurar instruir-me, senão 
o de ter descoberto cada vez mais minha ignorância (DESCARTES, 
1996, p.8). 
Apesar de ser um ilósofo que marca um período de forma emblemática, na sua 
vida pessoal, Descartes era um conservador. Talvez o brilhantismo intelectual 
veio acompanhado de um temor de fugir de uma vida segura agindo de forma 
conservadora e sem colocar a vida em risco.
Católico fervoroso, jamais se meteu em embates que ameaçassem a sua exis-
tência. Descartes defendeu manter-se no caminho, evitar os jogos da incerteza. 
A mudança só pode ser feita se comprovada sua verdadeira necessidade. Como 
o pensador francês era um homem recluso, pouco se sabe do que ele realmente 
defendeu e manteve como uma verdade em sua vida.
Quem usava de alternativas para fugir das perseguições era Spinoza (1632 
a 1677), pensador holandês, ilho de família judaica e origem portuguesa. Ele 
desenvolveu suas teses por meio da reinterpretação da Bíblia e dos documentos 
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religiosos judaicos. Foi estudioso dos ilósofos clássicos. Sua postura crítica em 
relação à essência divina lhe deu a excomunhão da religião dos judeus. Acabou 
por icar recluso a uma vida simples como polidor de lentes, vivendo na casa de 
famílias que admiravam seu trabalho.
Mas a admiração pelo trabalho do Spinoza foi muito além dos Países Baixos 
onde viveu. Foi convidado a ser professor na Alemanha, em Heidelberg, mas recu-
sou diante de ter sua liberdade de pensamento limitada. Até mesmo o Rei Luís 
XIV o convidou para fazer parte de sua corte e receber uma pensão em troca de 
escrever uma obra dedicada a ele. Spinoza se recusou.
A base do pensamento do autor holandês está na busca de associar a essência 
divina à natureza. Para ele, Deus e a natureza eram o mesmo elemento. Sua tese 
provocou rejeição tanto de judeus como de cristãos. Por isso, sua sobrevivência 
com pensador esteve associada a sua reclusão, icar imóvel para poder pensar.
Outro elemento importante no pensamento de Spinoza é a individualidade 
como capacidade de compreensão do mundo. A liberdade de pensamento que 
deve ser respeitada e que não tem limite. Para ele, se há o temor com o que se 
pensa, temos que lembrar que esse é o preço que se paga pela busca da verdade. 
Esse conceito de individualidade e liberdade irá nortear o pensamento ociden-
tal a partir do Século XVIII, em especial, o pensamento liberal.
A busca pela realização pessoal diante do mundo será uma orientação neces-
sária para se efetivar a liberdade política do estado liberal iluminista que iniciou 
sua trajetória de implantação na Europa a partir das Revoluções Inglesas. Vale 
lembrar que a Holanda de Spinoza já era um exemplo de estado liberal com 
ampla liberdade aos seus habitantes.
Para encerrarmos os pensadores que anteciparam as teses liberais e deini-
ram as bases metodológicas da ciência contemporânea, vamos falar de Leibniz, 
o germânico que travou debates com Newton (2010) e questionou suas teses 
matemáticas. Sua contribuição está na lógica e na política. Ele busca dar às leis 
naturais uma fragmentação, levando em consideração as condições especíicas 
para cada nova descoberta observada. Dessa forma, considera que há uma ini-
nita gama de acontecimentos que não devem ser julgados sob a ótica de uma 
lógica universal determinante. Estes elementos se agrupam por uma lógica inte-
ligível e cabe entender suas partes.
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São algumas das obras de Leibniz: “Discurso da metafísica”; “Discurso sobre a 
teologia natural dos chineses”; “Filosoia para princesas”; “A proissão de fé do iló-
sofo”; “Monadologia” e “Novos Ensaios sobre o Entendimento Humano”. Esta última 
estabelece o que seriam as ideias, como já o izeram Descartes, por exemplo. Para 
Leibniz elas estão tanto na alma como são provenientes da experiência corpórea.
Assim, podem denominar-se idéias essas expressões concebidasou não, 
existentes na nossa alma, mas aquelas que se concebem ou formam po-
dem denominar-se noções, conceptus (LEIBNIZ, 1988, p. 143).
O autor, então, trabalha tanto com o conceito de inatismo, em que um ser meta-
físico imprime na alma diversas ideias, como também defende que só se pode 
conhecer utilizando os sentidos. Os sentidos precisam estar atentos para que pos-
sam captar o universo empírico, o que sempre traz à tona, na ilosoia, a relação 
entre alma, conhecimento e sentidos.
basta, porém, que possamos descobri-los em nós em virtude da aten-
ção, sendo que a ocasião é fornecida pelos sentidos, e a sequência das 
experiências serve ainda como conirmação à razão, mais ou menos 
como as provas servem na aritmética para melhor evitar o erro do cál-
culo quando o raciocínio é longo (LEIBNIZ, 1988, p. 5).
A carga teórica ligada a estes pensadores demonstra o quanto a ciência avançou, 
e o quanto esteve ligada diretamente à política. A compreensão dos fenômenos 
naturais levou ao questionamento da própria existência humana, de suas ina-
lidades e de seus interesses. Não é por acaso que, mesmo tentando se esquivar 
dos debates políticos, como foi o caso de Descartes e Spinoza, os grandes pen-
sadores jamais puderam deixar de transformar suas obras em instrumentos de 
mudança do poder.
Podemos até considerar que exista uma distância entre a produção inte-
lectual e ação, mas é impossível negar que uma não pode se manifestar sem a 
outra. Os pensadores que discutimos até agora contribuíram para a construção 
de uma capacidade nova de estabelecer a relação do homem com a natureza, o 
que já estava em andamento com o advento da sociedade mercantil. A mesma 
sociedade que possibilitou o advento da indústria e o aprimoramento das téc-
nicas de produção. Os intelectuais que analisamos produziram o que expressou 
essas mudanças como, também, orientou-as.
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As principais mudanças na história do ocidente ainda estavam para ser 
traçadas pelo desenvolvimento de uma economia cada vez mais integrada mun-
dialmente. Pelo desenvolvimento da eiciência do estado nacional que se traduziu 
em uma representação constante das forças sociais na vida pública. Também, por 
isso, acabou direcionando suas ações para atender a determinados interesses de 
parcela da sociedade através do aprimoramento do conhecimento cientíico. A 
ciência serviu a civilização ocidental como um instrumento de conquista, mas 
também refez o papel desta humanidade diante da natureza e de sua existência.
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DO RACIONALISMO ÀS PORTAS DO ILUMINISMO
Dois países podem ser considerados o berço do racionalismo que permitiu o 
desenvolvimento do liberalismo: a Holanda e a Inglaterra. Enquanto no primeiro 
as guerras religiosas foram uma constante, levando à interferência de diversos 
países na Holanda, no segundo, o desenvolvimento das ideias liberais foi conse-
quência da fraqueza das questões religiosas diante das necessidades do estado. 
Nos dois, a pressão dos mercadores emergentes contra os privilégios do Estado 
teve um efeito de crítica e busca de rompimento com o absolutismo monárquico. 
Não é por acaso que foi exatamente na Inglaterra e Holanda que pioneiramente 
se implantaram os estados liberais.
É importante ressaltar que um fator teve ligação direta com essa onda liberal. 
Enquanto nos países católicos da Europa a resistência da Igreja se dava dentro do 
estado monárquico, muitas vezes promovendo perseguições a pensadores racio-
nalistas, nos países protestantes, as religiões necessitavam da concessão do poder 
para poderem existir. Vale lembrar, também, que as teses luteranas e calvinistas 
acabavam por valorizar individualidade, elemento importante no liberalismo.
John Locke foi a expressão entre essas duas nações. Sua vida se deu se deslo-
cando, em parte, de uma para outra. Aproveitando-se da tolerância à liberdade 
religiosa da Holanda quando a Inglaterra se viu à volta de uma guerra civil fun-
dada no movimento puritano.
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Um dos fatores que levou Locke a ser perseguido foi sua postura contrá-
ria ao governo dos Stuarts, dinastia reinante na Inglaterra. Ele considerava que 
o poder não tem interferência divina é uma obra dos homens. O poder é uma 
construção de um contrato social estabelecido pela sociedade.
Parte de sua vida Locke dedicou à vida no Parlamento, foi secretário do Lorde 
Shatesbury, membro da Câmara dos Lordes e presidente do Conselho Privado, 
uma igura ilustre dentro do governo britânico, opositor dos Stuarts. Quando o 
Lorde foi deposto, Locke fugiu da Inglaterra e passou a dedicar-se aos seus tra-
tados sobre política.
Entre suas principais defesas estava a liberdade de conduta do homem. 
Defende a natureza da propriedade e o direito à liberdade e também estabelece 
os princípios da igualdade dos homens perante a natureza. Segundo ele, todo 
homem nasce capaz ao conhecimento. Cada homem é uma página em branco 
que pode ser preenchida com o conteúdo da experiência e da relexão.
Na relação entre o cidadão e o estado, cabe ao segundo respeitar os direitos 
naturais dos primeiros, caso isso não ocorra é legítimo que se destitua o gover-
nante. Mas a formação de uma estrutura civil só se efetivo primeiro com a noção 
de liberdade de cada indivíduo. Considerando o ilósofo a existência de Deus e a 
criação da humanidade e racionalidade graças a ele, a humanidade se vê obrigada 
a instituir um corpo artiicial e mantê-lo, dando legitimidade à gênese do Estado.
Se concluir que Deus fez a ele e a todos os homens numa condição na qual 
não podem subsistir sem a sociedade, e dotou-os de raciocínio para discernir 
o que é capaz de perseverar e manter tal sociedade, resta-lhe outra alternativa 
senão concluir que ele está obrigado, e que Deus exige que obedeça às normas 
que conduzem à perseveração da sociedade? (LOCKE, 1998, p.50-51).
Desta forma, Locke considera que o papel do Estado é expressar a vontade 
coletiva e os direitos naturais dos homens. Contudo, ele considerava necessá-
rio garantir a permanência das instituições como forma de garantir a unidade 
social, vital para a liberdade humana.
Locke foi um defensor da propriedade privada, mas sempre a considerando 
com um im ao interesse social. Para ele, ao se apoderar de uma parte da natureza 
e transformar esta parte em um bem privado, se direcionado ao interesse coletivo 
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e ao progresso social, é justa a posse. Dessa forma, em locais onde a propriedade 
já está estabelecida e integrada à vida social, tomar o que é do outro é um crime.
Ele também se dedicou à educação. Considerava que o exemplo e a repeti-
ção são meios fundamentais na formação do homem educado. Para ele, todos 
devem estar comprometidos para a formação de um homem ético, mas que tivesse 
para isso o pleno domínio do corpo. É necessário que o educador, assim como 
os pais e, se possível, um preceptor, se dediquem a moldar as ações. Um homem 
que controle seus instintos e saiba domesticar o corpo é um homem civilizado. 
O inal da vida do pensador inglês foi marcado pelo retorno à Inglaterra, 
depois de um longo período de refúgio na Holanda. A volta foi possível com o 
governo de Guilherme de Orange,um holandês, que foi coroado pelo parlamento 
britânico após a queda de Jaime II de Stuart, inimigo de Locke.
Em sua volta, o pensador inglês se dedicou ao desenvolvimento de sua obra 
e à construção dos princípios que iriam consolidar o liberalismo como teo-
ria. Das suas teses seriam estabelecidas as bases que levaram o iluminismo a se 
espalhar pela Europa, em especial pela França. Voltaire, que analisaremos ainda 
nesta unidade, pensador iluminista francês, considerava que se devia a Locke o 
legado da liberdade.
O LIBERALISMO CHEGA À FRANÇA: UMA IDEIA IMPORTADA
No inal do Século XVII, as teses liberais já estavam estabelecidas na França, mas 
de uma forma discreta, dentro dos círculos acadêmicos. Ela tomaria as ruas na 
segunda metade do Século XVIII, respaldaria as principais mudanças ocorridas 
no país, mas seria mais uma base teórica dos acadêmicos do que um espírito de 
liberdade construído pelos franceses. O país nunca teve uma tradição libertária 
para ter gerado uma revolução a partir desses princípios.
O estado absolutista francês atravessava uma crise política e econômica que 
se traduzia na instabilidade social desde meados do Século XVII. O reinado de 
Luís XIV foi marcado de glória, mas também foi o precursor do caos. O rei fran-
cês consolidou o absolutismo e aproximou as decisões do estado da eiciência 
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das práticas mercantis. Colbert, ministro da economia de Luís XIV, foi peça 
fundamental no desenvolvimento da economia mercantilista. Contudo, o endi-
vidamento da máquina pública era marcado por uma carga tributária excessiva.
A política de privilégios na França contrastava com a produtividade dos que 
pagavam tributos. Uma sociedade dividida entre nobres e plebeus, sendo que 
os empresários emergentes estavam entre os que não tinham direitos políticos 
e pagavam a maioria dos tributos. O descontentamento ganhou um clima tenso 
quando as classes populares começaram a sentir as mudanças econômicas e o 
peso da carga tributária.
O absolutismo francês caiu pelo autoritarismo e incapacidade da monar-
quia em se adequar às mudanças. Aquela falta de tolerância da qual falamos 
anteriormente. Ela promoveu a tensão entre a sociedade e o estado, uniu os inte-
resses dos emergentes empresários burgueses, descontentes com a tributação, e 
uma classe popular empobrecida, miserável, sem direitos e decepcionada com 
a igura do monarca.
Segundo Anderson (1998), o absolutismo francês provocou diversas mudan-
ças não vistas, por exemplo, na Espanha, mas o que podemos considerar é que a 
expansão comercial força o processo de urbanização, tanto que “houve uma onda 
de novas construções nas cidades e, pelo inal do século, as cidades provinciais da 
França ainda suplantavam as da Inglaterra em número e tamanho” (ANDERSON, 
1998, p. 109). Com esses crescimentos todos, a nova classe surgida, a burguesa, 
crescia, junto a juristas e jornalistas, fortemente inluenciados pela ideias ilumi-
nistas, contudo, era um crescimento “fora do âmbito do Estado, com resultados 
inevitáveis para a autonomia política da classe burguesa” (ANDERSON, 1998, 
p. 109). Como resultado dessa equação toda, a monarquia não acompanhava as 
mudanças e foi incapaz de proteger os interesses burgueses, ainda que, por vezes, 
eram os mesmos que os do absolutismo.
A impossibilidade da manutenção de um sistema monárquico e absoluto e 
os impostos cada vez mais altos, conduziram a própria monarquia desesperada 
à dissolução, que retoma seu posto graças à comoção de classes proprietárias, 
mas que não suportou o ataque efetivo da aristocracia que alinhavou a revolu-
ção burguesa que acabaria por derrubar em deinitivo.
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A Alemanha foi outro exemplo do iluminismo, o que se convencionou cha-
mar de esclarecimento. No território germânico, um fato marcou a trajetória da 
sociedade, a Guerra dos Trinta Anos (1618 a 1648). Fruto inicialmente do con-
lito entre católicos e protestantes, sobre territórios da boêmia (atual República 
Checa), acabou por se transformar em uma guerra generalizada entre os prín-
cipes germânicos divididos pelo catolicismo e protestantismo, assim como pela 
interferência de nações europeias interessadas em destruir o poder do Sacro 
Império Romano-Germânico.
O resultado desse conlito foi a perda da unidade germânica e a inluência 
da cultura francesa. A busca por encontrar uma identidade intelectual para os 
alemães levou ao desenvolvimento do “esclarecimento” e, aliado a ele, por meio 
do movimento cultural denominado Romantismo, o nacionalismo.
Mas o Romantismo, enquanto movimento intelectual, produziu diferentes 
tendências. Algumas exaltavam a racionalidade e consideravam a necessidade 
do homem que busca da racionalidade para resolver seus embates. A ideia de 
que todo o homem educado pela racionalidade estaria mais próximo de resol-
ver os seus problemas inspirou teses como o materialismo histórico.
O existencialismo seria o exemplo do oposto, de se libertar da racionali-
dade com a emotividade e da inconstância do sentido da existência. Uma vida 
pode ter no homem sua compreensão diante de suas necessidades e desejos, nem 
sempre dominados pela racionalidade. Essa foi uma forma de fugir do mundo 
industrial que passava a dominar o cotidiano da maioria dos indivíduos. Uma 
repetição de atos previsíveis e de uma constante social estética da qual a chamada 
classe média, ou pequena burguesia, foi a maior expressão. A maior expressão 
do romantismo foi Lorde Byron (1788 a 1824), o poeta inglês que produziu inú-
meros poemas que inspiram literários europeus até hoje. Sua vida excêntrica foi 
marcada por desaios à autoridade e romances tórridos e proibidos, o maior deles 
foi com sua própria irmã.
Considerações Finais
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Caro(a) aluno(a), nesta unidade percebermos que o resgate do pensamento ilo-
sóico ocidental em sua origem, na Grécia Antiga, está relacionado à formação 
de uma compreensão da natureza e à forma de como atuar diante dela. Também, 
com a mesma racionalidade, busca-se compreender a organização da sociedade 
e de sua função, assim como direcionar nossos atos em busca de um futuro que 
supere as diiculdades da vida em sociedade e a angústia de cada pessoa.
Nessa linha do tempo, a humanidade da antiguidade começa a deinir um 
papel da natureza em sua vida, da busca por uma ‘ordem’, de uma explicação 
da gênese de todas as coisas. Mas, é possível concluir a importância que o pen-
samento grego determinará na Europa, mesmo durante a formação do mundo 
medieval, quando a teologia cristã se soma ao pensamento helênico. 
Essa dimensão de pensamento helênico perpassa a História europeia, atraves-
sando o tempo e o espaço, na mesma medida em que se conecta com a educação 
e a ciência. A ciência recebe inluência, assim como a política e sua noção de 
poder e a unidade nacional; a economia e as relações contratualistas; a cisão 
entre fé e razão e que despontará como o desenvolvimento de outros saberes e 
conhecimentos. O que ica patente é a elaboração do conceito de racionalidade 
europeia que inluenciará sobremaneira os demais pensamentos, sem se esque-
cer que a ocidentalidade também fora atravessada pelos saberes orientais. Além 
disso, a educação, como pôde ser notado, detinha um recorte pontual: não era 
destinada a todas as pessoas. Quando o era, havia uma distinção ao se ensinar 
para a grande populaçãoe para a elite.
O pensamento ilosóico, então, ajudou a determinar o desenvolvimento 
educacional no mundo ocidental, como o conhecimento se constituiu, quais ins-
trumentos do pensar, como a ciência se molda e os pilares do que conhecemos 
da governabilidade contemporânea.
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1. A ilosoia surge na Grécia Antiga, com os chamados primeiros ilósofos. Ain-
da que muitos outros pensadores tenham colaborado para o desenvolvimento
desta área do conhecimento, algumas características lhe são permanentes. As-
sinale a alternativa correta que melhor deina esta atividade racional:
a. O pensamento ilosóico é, tão somente, uma atividade racional voltada à
discussão.
b. A ilosoia é um sistema acabado fechado em si mesmo.
c. A relexão ilosóica deve ser de conjunto, radical e rigorosa.
d. O sistema ilosóico é uma relexão das coisas que nos circundam e nada
além disso.
e. A ilosoia é oriunda de uma miríade de relações puramente religiosas.
2. Sócrates desenvolve seu pensamento por meio daquilo que conhecemos como
método socrático, o qual consiste, basicamente, em duas partes: ironia e maiêutica. 
Sobre estes termos, dentro do pensamento socrático é correto airmar que:
I. Em todos os livros escritos por Sócrates, ao tratar do termo maiêutica reme-
te-se a sua mãe que era parteira. Assim como sua mãe, Sócrates pretendia
dar luz às ideias, por meio da relexão.
II. A ironia consiste em dizer o contrário daquilo que se pretende. A famosa
frase socrática “só sei que nada sei” pode ser exemplo de sua ironia, já que
quer dizer o oposto daquilo que airma.
III. A maiêutica ocorre quando o interlocutor de Sócrates consegue encontrar,
por meio do diálogo e da relexão, a resposta para o questionamento ini-
cial.
IV. Sócrates e seu discípulo Platão nada têm em comum, tanto é que nas obras 
platônicas, este pensador ridiculariza seu mestre por andar descalço e pe-
rambular pelas ruas.
V. A ironia e a maiêutica são partes de um mesmo método, empregado por
Sócrates nas ruas e praças públicas, visando levar os homens a conhece-
rem-se a si mesmos.
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Assinale a alternativa correta:
a. Somente I, IV e V estão corretas.
b. Somente II, III, IV e V estão corretas.
c. Somente I, III e V estão corretas.
d. Somente II, III e V estão corretas.
e. Somente III e IV estão corretas.
3. A maiêutica é uma teoria conceituada por Sócrates sobre como o conhecimen-
to seria atingido por todas as pessoas, uma forma ‘pedagógica’ de suscitar as
respostas. Explique o que seria esse processo conhecido como maiêutica.
4. Contemporâneo a Tomás de Aquino, Roger Bacon relete sobre a ciência mo-
derna, sobre a cisão entre o pensamento teológico e ilosóico, cientíico. Leia
as airmativas abaixo e assinale a alternativa correta:
a. Para Bacon, o livre pensamento leva ao campo da existência divina, conse-
quente não há ruptura entre fé e razão.
b. Para Bacon, para entender as coisas da natureza não se deve subordinar a
razão a uma crença.
c. Para Bacon, a ciência poderia comprovar uma lei sobre a natureza, o que
implicaria na não existência de Deus, já que o homem se impõe à criação.
d. Para Bacon, a teologia e a ilosoia não devem separar-se. Fazer ciência é
também fazer teologia.
e. Ambos acreditavam nas mesmas teorias, tanto que trabalharam juntos por
força do processo religioso da época.
5. René Descartes é considerado o ‘pai’ da modernidade, pois inaugura investiga-
ções pautadas na dúvida hiperbólica, que não se trata de uma conduta cética,
mas um instrumento investigativo. Dentro dessas relações, o ilósofo pontua
alguns princípios fundamentais sobre como investigar um problema, frente a
isso, disserte sobre esses princípios investigativos.
82 
O que seria o método para Descartes e Spinoza? Qual o papel da dúvida nesse 
processo todo? O texto nos faz refletir as comparações entre esses dois filósofos de 
modo que Spinoza aponta suas objeções.
DESCARTES E A ANÁLISE 
Descartes vai tomar como ponto de partida em sua obra maior, as Médita-tions 
Metaphysiques, o conhecimento de um efeito que vai sendo metodi-camente 
desenvolvido e ampliado até atingir o conhecimento de sua causa. Este movimento 
do efeito em direção a sua causa é duplo: vai da dúvida, enquanto ato do 
pensamento, à sua causa (o sujeito que tem os atos do pen-samento); e vai deste 
sujeito, enquanto efeito, à sua causa: Deus. O primeiro, enquanto movimento interno 
ao pensamento, corresponde a um solipsis-mo; o segundo, enquanto movimento 
externo ao entendimento, em direção a Deus, corresponde à saída deste solipsismo. 
O movimento solipsista, ou o primeiro movimento do efeito à causa, ocor-re em 
dois momentos distintos, sendo ambos perpassados pela dúvida. No primeiro 
momento, o conhecimento do qual parte o cartesianismo é expres-so pela dúvida, 
enquanto ato do pensamento de um sujeito do qual inicial-mente só se pode 
afirmar, de forma confusa, que é o autor do próprio ato de pensar, ou a causa da 
dúvida. Este é o tema da Primeira Meditação. 17 No segundo momento, esta 
mesma dúvida, agora enquanto método tem a finalidade de nos libertar “[...] de toda 
sorte de prejuízos e nos prepara um caminho muito fácil para acostumar nosso 
espírito [esprit] a desligar–se dos sentidos, [...]”,18 visando desenvolver até à 
radicalização este conhecimento inicial, ainda confuso, possibilitando assim extrair a 
primeira verdade (ainda que temporária), o primeiro conhecimento claro e distinto do 
sistema, aque-le que vai inaugurar a longa cadeia de razões do cartesianismo, o 
cogito: “Eu sou, eu existo”.19 Entretanto, o cogito, por ser um efeito, não é a 
verdade mais importante do sistema cartesiano; ele é apenas a primeira. A verdade 
mais importante do cartesianismo, aquela que vai ser o suporte da teoria do 
conhecimento de Descartes, por ser causa, é a idéia de Deus. Mas, mesmo sendo 
causa primeira, ela só será desenvolvida na Terceira Meditação; 20 é segundo 
movimento do efeito (o cogito) em direção a sua causa (Deus), é o movimento de 
saída do solipsismo cartesiano. Esta ordem de entrada ou disposição dos temas 
tratados nas Méditations é determinada, de forma geral, pela ordem geométrica, e 
de forma mais específica, pela ordem ana-lítica. É determinada pela ordem 
geométrica, enquanto dispõe “[...] que as coisas que são propostas primeiro devem 
83 
ser conhecidas sem a ajuda das seguintes, e que as seguintes devem ser dispostas 
de tal forma que elas se-jam demonstradas unicamente pelas coisas que as 
precedem [...]”,21 numa ordenação das razões, cuja direção dirige–se unicamente para 
a compreensão das próprias razões, conforme elas vão sendo ordenadas pelo 
entendimento. É determinada pela ordem analítica, pela via da análise, enquanto 
dispõe o efeito e somente depois, a causa, conforme aos preceitos do 
procedimento analítico: examinam–se antes os efeitos para depois examinar–se as 
causas; ou melhor, a ordem é rigorosa: parte–se do conhecimento dos efeitos, em di-
reção ao conhecimento das causas. O contrário, em termos direcionais desta ordem 
analítica seria a ordem sintética: parte–se do conhecimento das cau-sas, em direção 
ao conhecimento dos efeitos. É justamente esta que será utili-zada por Benedictus de 
Spinoza em sua obra maior, a Ética. 
Fonte: Fragoso (2006). 
MATERIAL COMPLEMENTAR
Discurso do método
René Descartes
Editora: Textos Filosói cos
Sinopse: a obra prima pela reunião do pensamento moderno de 
René Descartes em que o exercício da razão se faz necessário para 
que se atinja a verdade. Além disso a organização do pensamento 
estrutura um método a que o i lósofo chama de seu, mas que 
orienta os pensamentos que o sucedem.
O enigma de Kaspar Hause (1974)
Sinopse: um jovem chamado Kaspar Hauser (Bruno S.) surge 
repentinamente na cidade de Nuremberg em 1828, com 
dii culdades na fala ou mesmo em andar, portando um estranho 
bilhete. Sua presença não i ca incógnita, virando atração e 
mistério da cidade, sobretudo por ter passado boa parte de sua 
vida trancado em um cativeiro. Ao ser solto nas ruas semmotivo, 
a comunidade decide ajudá-lo a se integrar na sociedade, mas 
rapidamente Kaspar se transforma em uma atração popular.
Comentário: Por que assistir? Porque mostra como a linguagem 
media o que conhecemos do mundo, além de revelar a relação 
assimétrica em que os saberes ‘cultos’ tentam se sobrepor aos 
saberes ‘menores’. Kaspar percebe que precisa dela para aprender a conhecer, o que nos faz 
pensar como o conhecimento sobre o que nos rodeia está intimamente ligado à linguagem e 
experiências.
A i m de explicar de outro modo o Mito da Caverna, a i lósofa Viviane Mosé, apresentadora do 
quadro ‘Ser ou Não Ser’, nos revela didaticamente a busca pela verdade pensada por Platão. Acesse 
e coni ra!
Web: <https://www.youtube.com/watch?v=ei-kSPL4Lg4>. 
REFERÊNCIAS
85
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Técnicos e Cientíicos S.A., 1982.
GABARITO
87
1. C.
2. D.
3. Esse processo, segundo o ilósofo, é similar ao parto, ou seja, todas as respostas 
estão dentro de todas as pessoas, no entanto, se faz necessário parir cada uma 
delas. Como sua mãe era parteira, Sócrates acabou por receber essa inluência 
toda, o que o ajudou a elaborar uma espécie de inatismo das ideias.
4. B.
5. A resposta é subjetiva, mas espera-se que você possa compreender que os prin-
cípios fundamentais do pensamento cartesiano está em não ser considerada 
uma verdade cientíica aquilo que não possa ser claro e distinto. Para o ilósofo, 
todo o problema deve ser dividido em partes até que seja compreendido todo 
o seu funcionamento e compreendida a lógica de seu funcionamento. Ao ana-
lisarmos uma questão, devemos partir do simples para o complexo, seguindo 
sempre esta ordem. Quando a ordem não existir, devemos elaborar uma. Por 
isso, sem um método é impossível entender uma questão.
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Professor Me. Gilson Aguiar
Professor Me. Rodrigo Pedro Casteleira
DO PENSAMENTO 
ILUMINISTA AO 
CONTEMPORÂNEO
Objetivos de Aprendizagem
 ■ Compreender a relação entre o pensamento racional e o 
desenvolvimento da economia e da política liberal.
 ■ Analisar a inluência do desenvolvimento da economia capitalista e 
a associação com a reformulação do sentido de humanidade. Assim 
como entender os questionamentos sobre a ordem econômica com 
a emergência da classe operária e o pragmatismo estruturalista ou 
capitalista.
 ■ Considerar as tendências de compreensão da individualidade, a 
necessidade de uma lógica que posicione a pessoa em uma condição 
determinante na vida social.
 ■ Destacar o momento que estamos vivendo diante da crise de 
identidade e a emergência do individualismo exaltado por uma 
lógica egocêntrica.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
 ■ Iluminismo
 ■ Teorias do mundo contemporâneo
 ■ Crise de identidade humana e as teorias contemporâneas
INTRODUÇÃO
Prezado(a) aluno(a), o que vimos na unidade anterior foi o desenvolvimento do 
pensamento racionalista e uma nova concepção de humanidade ocidental par-
tindo de uma ruptura com a mentalidade teocêntrica. Nesta Unidade, vamos 
trabalhar o desdobramento do pensamento racional e a constituição das teses 
iluministas que acompanharam as mudanças na Europa ocidental. O libera-
lismo foi a proposta política e econômica que se desdobrou da “teoria das luzes”.
Unindo uma contextualização do período revolucionário, século XVIII, 
colocamos os/as autores/as desse período em uma ordem de orientação que 
possibilita entender as diferentes concepções de humanidade, ou pessoa, e de 
sociedade diante das mudanças que a Europa viveu.
Mas, o momento mais importante desta unidade está nos conceitos elabora-
dos nos séculos XIX e XX. Por isso, destacamos o estudo sobre as teses de Comte, 
Marx, Durkheim e Weber, considerados clássicos das ciências sociais. Neles se 
sustenta a construção de toda a estrutura metodológica contemporânea. Muitodo que discutimos hoje como proposta para a docência, como orientação polí-
tica e ideológica da educação, passa por esses pensadores.
Por im, também com uma importância signiicativa, está o drama da socie-
dade contemporânea. Na parte inal desta Unidade, destacaremos pensadores 
como Pavlov, Freud, Sartre, Hannah Arendt, Baudrillard, Bruckner e Enzensberger. 
Uma coletânea de teorias que discutem o comportamento humano em sociedade. 
Nas teorias da segunda metade do século XX e início deste século, procuramos 
salientar a angústia da existência individual, o drama da existência em um sen-
tido político mais amplo.
Portanto, nossa expectativa é a de que os estudos desta Unidade possam con-
tribuir para uma ressigniicação de cada pessoa frente à sociedade, uma vez que 
os conteúdos trazem apontamentos para que possamos analisar nossas ações 
individuais e coletivas. 
Boa leitura!
Introdução
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ILUMINISMO
O iluminismo enquanto um termo ilosóico está ligado diretamente à defesa 
de ideias liberais fundadas na razão cientíica. A obra que marcou a corrente 
iluminista foi a “Enciclopédia”. Ela contém a reunião de inúmeros intelectuais 
que reuniram alguns de seus principais textos. Neles, diversos temas tratavam 
da humanidade e de sua relação com a natureza, com a religião e com a política.
Entre os “enciclopedistas”, como acabariam sendo chamados, pode-se res-
saltar D’Alambert (1717 a 1783). Autor da introdução da obra, o matemático se 
destacou pelos estudos em álgebra e também em física (vibração). Seu conheci-
mento foi reconhecido em Paris, onde passou a fazer parte da Academia Francesa, 
da qual se transformou secretário perpétuo. Era um crítico do estado autoritá-
rio absoluto e defensor da representatividade liberal e um racionalista convicto.
Diderot (1713 a 1784) foi o responsável pela maior parte das obras contidas 
na “Enciclopédia”. Seu trabalho abrangeu diversos temas ligados à política e reli-
gião - criticava a religiosidade institucionalizada, era um ateu. Escritor de peças 
teatrais e utilizando de um humor britânico, apesar de ser francês, ele acabou 
tendo problemas com a Igreja Católica e com o Estado, mas nada que levasse ao 
extremo. Foi preso por um curto período após escrever a obra “Cartas sobre os 
cego para o uso por aqueles que sabem ler”.
Uma peça de sua autoria, “A Religiosa”, foi acusada por muito tempo de ser 
um instrumento de inspiração das atrocidades que foram feitas a clérigos durante 
a Revolução Francesa (1789), o que nunca se comprovou. Sua tendência era a 
de buscar a crítica direta, expondo de forma irônica suas considerações, o que 
desagradava os alvos de sua crítica.
Se a religiosidade foi o alvo da crítica de Diderot, foi também de Voltaire 
(1694 a 1778), um dos mais conhecidos teóricos iluministas do Século XVIII. 
Sua obra se transformou em um clássico na crítica à Igreja e aos privilégios do 
Clero. Ele foi o autor da célebre frase em que relaciona a criação de Deus pelo 
homem e do homem a Deus.
Apesar dessas airmações, Voltaire, diferente de Diderot, não era um ateu. 
Ele condenava a religiosidade institucional, mas considerava a existência de Deus 
da mesma forma que Spinoza, Ele era a natureza.
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Aqui, apenas de passagem, já que trabalharemos essa questão mais à frente, 
está a obra “O homem máquina”, de La Mettrie. O pensador materialista fran-
cês condenava a existência cartesiana de dois mundos, o da matéria e da alma. 
Para ele, somente a matéria existe sem a necessidade de um entendimento do 
que lhe deu vida, o acaso dos elementos para La Mattrie.
Para esse pensador francês, a religião era apenas um instrumento que trazia 
benefícios a quem governava a sociedade beneiciando determinados elementos 
em detrimento de outros. De certa forma, um pioneiro das teses de Karl Marx que 
considerava a Igreja o ópio do povo, um instrumento de poder para submeter e 
alienar a classe operária, mas também um ‘suporte’ para aliviar seus sofrimentos. 
O relexo religioso do mundo real só pode desaparecer, quando as con-
dições práticas das atividades cotidianas do homem representem, nor-
malmente, relações racionais claras entre os homens e entre estes e a 
natureza. A estrutura [...] do processo da produção material, só pode 
desprender-se do seu véu nebuloso e místico, no dia em que for obra de 
homens livremente associados, submetida a seu controle consciente e 
planejado (MARX, 1980, p. 88).
Tanto para Marx como para Engels, seu parceiro em muitas escritas, as relações 
de produção, comércio e espiritualidade se conectam enquanto comportamento 
material, como se uma emanasse da outra, o mesmo aconteceria “a produção 
espiritual, tal como aparece na linguagem da política, das leis, da moral, da reli-
gião, da metafísica, etc., de um povo” (MARX; ENGELS, 2006, p. 51).
Conhecido como um dos mais importantes iluministas de sua época, 
Jean-Jacques Rousseau (1712 a 1778) merece destaque como um exemplo do 
romantismo. Mesmo tendo importantes tratados sobre o governo, “Contrato 
Social”, sua autobiograia, “Conissões”, acabou por ganhar mérito.
Embora tenha tido uma vida pessoal marcada por atos de moral duvidosa, 
Rousseau se destacou como um dos principais teóricos do iluminismo. Sua obra 
maior foi o “Contrato Social”. Nele, estabeleceu os princípios da liberdade indi-
vidual limitada pela relação contratual com o estado. Ao submeter a liberdade 
individual ao estado, os homens entregam a sua liberdade e a limita. Mas devem 
ter preservados os seus direitos naturais, o que para Rousseau eram poucos, visto 
que a tirania do estado poderia anulá-los.
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Instituamos regulamentos de justiça e de paz, aos quais todos sejam 
obrigados a conformar-se, que não abram exceção para ninguém e que, 
submetendo igualmente a deveres mútuos o poderoso e o fraco, repa-
rem de certo modo os caprichos da fortuna. Em uma palavra, em lugar 
de voltar nossas forças contra nós mesmos, reunamo-nos num poder 
supremo que nos governe segundo sábias leis, que protejam e defen-
dam todos os membros da associação, expulsem os inimigos comuns e 
nos mantenham em concórdia eterna (ROUSSEAU, 1973, p. 275).
Para Rousseau (1964), a forma de se manter seguro é a renúncia de um estado de 
liberdade que vivia na natureza e instituir um contrato, o que substitui as noções 
de instinto pelas de justiça. A base da democracia de Rousseau estava muito 
mais sustentada no seu romantismo do que na racionalidade. Ele mesmo foi 
uma expressão romântica do liberalismo. Sua racionalidade limitava-se quando 
tendia a colocar na emoção o sentido da existência individual, tanto que acre-
ditava que ensinar a noção de amor poderia ser o que moveria a humanidade: 
“ensinando-lhe a experiência ser o amor ao bem estar o único móvel 
das ações humanas, encontrou-se em situação de distinguir as situa-
ções raras em que o interesse comum poderia fazê-lo contar com a de-
sistência de seus semelhantes” (ROUSSEAU, 1973, p .267). 
Considerava que os homens corriam riscos ao delegarem ao estado os seus direi-
tos. A sociedade civilizada corrompe a pessoa. Ser civilizado é estar em estado 
de infelicidade constante, por isso a necessidade dos contratosentre os indiví-
duos e o estado. Para ele, a pessoa selvagem é feliz e boa, a sociedade civilizada 
corrompe.
Ainda envolto em seu romantismo, Rousseau escreve “Emílio ou da edu-
cação”, em que retrata o papel formativo da educação considerando sua época 
e seu projeto educativo para a formação de uma pessoa. O personagem Emílio 
representaria a pessoa como fenômeno natural e que precisaria ser ‘lapidado’ por 
intermédio da educação. Segundo o ilósofo, naturalmente há a aspiração para o 
que ele chama de ‘estado de homem’, mas que a necessidade educativa se cumpra.
Na ordem natural, sendo os homens todos iguais, sua vocação comum 
é o estado de homem; e quem quer seja bem educado para esses, não 
pode desempenhar-se mal dos que com esse se relacionam. Que se des-
tine meu aluno à carreira militar, à eclesiástica ou à advocacia pouco me 
importa. Antes da vocação dos pais, a natureza chama-o para a vida hu-
mana. Viver é o ofício que lhe quero ensinar (ROUSSEAU, 1973a, p. 15).
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Para o autor, não é possível educar alguém para ser cidadão e depois estabelecer 
a formação enquanto humana, nem mesmo o contrário. Rousseau (1973a) con-
sidera que tal projeto só seja possível concomitante, ou seja, educar para que a 
pessoa seja um ser ativo na sociedade, considerando que a formação atue for-
mando-lhe o coração, o espírito e o juízo (ROUSSEAU, 1994).
A REVOLUÇÃO E AS MUDANÇAS NA EUROPA
Em 1789, a Revolução Francesa eclodiu 
e trouxe consigo uma onda de mudanças 
que assolou a Europa. Dentro da França, 
o movimento teve diversas fases. De um 
movimento constitucional que durou 
até 1792, passou para uma fase radical 
que se estabeleceu até 1795, o chamado 
“terror jacobino”. Nessa fase, os revolu-
cionários passaram a eliminar todos que 
eram considerados inimigos da “revo-
lução”. Para exempliicar a insanidade 
que o movimento francês atingiu, a exe-
cução de Lavoisier é signiicativa. O pai 
da química moderna foi executado por ter sido cobrador de impostos durante 
a monarquia dos Bourbon. Quando argumentaram em defesa do químico, sua 
inteligência cientíica, os “revolucionários” airmaram que “a Revolução não pre-
cisa de cientistas”.
Enquanto a Revolução se processou dentro da França, também se des-
dobrou pelos países vizinhos. Inicialmente, os franceses se defenderam da 
tentativa de sufocar a Revolução, as “Coligações Antifrancesas”. Depois os 
revolucionários passaram ao ataque e iniciaram uma sequência de conquis-
tas dos países vizinhos.
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O momento de apogeu dessas conquistas se deu com o Período Napoleônico 
(1799 a 1815). O império estabelecido pelo general francês partia dos princípios 
liberais da Revolução para estabelecer a tirania. Quando as tropas francesas inva-
diram os países que eram governados pelo absolutismo, foram recebidas como 
libertadoras, mas aos poucos a esperança virou ódio e a “libertação” se transfor-
mou em dominação. A obra de Beethoven, a sinfonia “Heroica”, foi composta 
em 1803 em homenagem a Napoleão Bonaparte. Contudo, o compositor ale-
mão, uma expressão do romantismo, arrependeu-se um ano depois e, num ato 
de ódio, riscou o nome de Bonaparte do texto original.
As ideias liberais nem sempre encontraram nos governantes europeus dos 
séculos XVIII e XIX uma expressão a altura. Mas não se pode negar a inluên-
cia que o imperador francês teve sobre o destino da Europa. Mesmo derrotado e 
tendo o seu destino selado no Congresso de Viena (1814 e 1815), as ideias libe-
rais se propagaram e as monarquias absolutistas estavam com seus dias contados, 
mesmo tendo vencido Napoleão.
Na Alemanha, onde o pensamento liberal alcançou uma expansão desdobrada 
do iluminismo francês, mas com aspectos típicos da cultura alemã, produziram-
-se pensadores que marcaram as bases do “esclarecimento”. O mais importante e 
considerado último pensador clássico da modernidade, mas uma expressão das 
ideias liberais, foi Immanuel Kant (1724 a 1824).
Nascido na Prússia oriental, em Königsverg, hoje Kalingrado, pertencente 
à Federação Russa, Kant jamais se afastou da cidade natal. Sua vida foi mar-
cada pela docência no ensino médio e na universidade da cidade onde nasceu. 
Mesmo com uma vida simples e com um cotidiano regrado, o pensador alemão 
Conforme o historiador Grespan (2008, p. 9), a Revolução Francesa foi um 
ícone no processo de mudança do pensamento ocidental contemporâneo, 
“moldando as instituições e os ideais que nos animam e que consideramos 
universais”.
Fonte: Grespan (2008, p. 9).
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foi um dos mais brilhantes ilósofos de seu tempo e sua inluência é signiica-
tiva até os dias de hoje.
Defensor da liberdade de conduta, Kant considerava que a pessoa deveria 
buscar, por meio do esclarecimento, as condições necessárias para sua maturidade 
intelectual. Libertar-se da mentalidade infantil é difícil pela autodeterminação, 
segundo ele. É necessária a busca do conhecimento produzido e da experiência 
libertária. Os homens são presos às crenças por causa de sua zona de conforto, 
o que impede o desenvolvimento intelectual. Por isso, segundo ele, muitos per-
manecem na ignorância, por temer o peso das decisões e da responsabilidade 
com a própria vida.
Sua principal obra foi a “Crítica da Razão Pura”, publicada em 1781, e que 
demonstra todo o peso da compreensão racional do mundo. O desaio de se posi-
cionar diante de uma percepção maniqueísta da realidade, dividida naquilo que 
percebemos subjetivamente, herdamos culturalmente, e aquilo que conhecemos 
pela experiência. Essa forma de compreensão do mundo por um direcionamento 
subjetivo seria transformada nas bases do idealismo que tomou a Alemanha no 
Século XIX.
Kant compreende que a razão guia o conhecimento, contudo seria ela con-
iável? O ilósofo, então, a coloca como ré, a im de julgá-la como detentora de 
validade no âmbito do conhecimento humano. Se a experiência, proveniente dos 
sentidos, revela à pessoa um conhecimento, se faz necessário saber se isso se dá 
de forma a priori ou a posteriori.
A própria experiência é uma forma de conhecimento que exige o con-
curso do entendimento, cuja regra devo pressupor em mim antes de 
me serem dados os objetos, por consequência, a priori e essa regra é 
expressa em conceitos a priori, pelos quais têm de se regular todos os 
objetos da experiência e com os quais devem concordar (KANT, CRP, 
B XVIII).
Esse exame da razão pura é para compreender como ela se envereda para além 
dos fenômenos empíricos, daquilo que se pode compreender utilizando a expe-
riência, e tenta responder o que seja a metafísica (aquilo que está além da física). 
Como a metafísica não é experienciável, Kant quer investigar o teor de cientii-
cidade das inferências metafísica para que possa receber a chancela de ciência, 
o que revoluciona o pensamento ocidental e os âmbitos da ciência.
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A tarefa desta crítica da razão especulativa consiste neste ensaio de al-
terar o método que a metafísica até agora seguiu, operando assim nela 
uma revolução completa, segundo o exemplo dos geômetras e dos fí-
sicos. É um tratado acerca do método, não um sistema da própria ci-
ência; porém, circunscreve-a totalmente, não só descrevendoo contor-
no dos seus limites, mas também toda a sua estrutura interna (KANT, 
CRP, B XXII-B XXIII).
Kant estabelece um método de investigação em que defende a possibilidade de 
conhecimentos da natureza a priori, ainda que pensemos na experiência como 
forma de conhecimento apenas.
Apesar de ter em Hegel sua maior expressão, o idealismo teve antecessores e está 
intimamente ligado em suas bases às teses de Fichte (1762 a 1814) e Schelling 
(1775 a 1854). O primeiro pode ser considerado um precursor do idealismo e 
do nacionalismo alemão.
Fichte desenvolveu estudos sobre a obra de Kant e passou a defender a liber-
dade como uma condição necessária ao exercício da razão. Essa liberdade, no 
entanto, não deveria ter como inalidade a felicidade, mas sim o conjunto da 
compreensão do sentido da vida humana. Assim, a felicidade poderia mudar seu 
sentido conforme a racionalidade desvendasse um novo sentido para a existên-
cia particular e, no particular, o conceito de felicidade coletiva.
De tudo isto resulta a idéia de uma ciência particular [que se pode chamar 
Crítica da razão pura] . [Porque] a razão é a faculdade que nos fornece os 
princípios do conhecimento a priori. Logo, a razão pura é a que contém os 
princípios para conhecer algo absolutamente a priori. Um organon da razão 
pura seria o conjunto desses princípios, pelos quais são adquiridos todos os 
conhecimentos puros a priori e realmente constituídos.
(Immanuel Kant)
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Acusado de ateísmo, acabou por perder o emprego na Universidade de Jena. 
Em suas teses de felicidade fundada na idealização racional, Fichte estabelecia 
que a crença em um elemento divino fosse apenas uma forma da ideia de dar sen-
tido à existência. A humanidade, que era para ser criatura, passa a ser criadora.
Já a obra de Schelling apresenta o pensamento idealista sobre bases mais 
complexas. Uma de suas principais contribuições foi a elaboração da dialética 
idealista. Ele considerava que na construção de um terceiro elemento estará 
sempre a negação e a identiicação dos dois elementos que se negam e o geram. 
Nessa concepção, há uma noção clara da dialética dos contrários, que seria fun-
damental às teses de Karl Marx e Friedrich Engels.
Mas no idealismo alemão, a posição de Hegel é incontestável. Sua inlu-
ência sobre seu tempo e, posteriormente, sobre a escola ilosóica germânica é 
inquestionável.
Para compreendermos melhor o tempo de Hegel (1770 a 1831), temos que 
esclarecer o seu tempo histórico no território germânico em seu tempo. Nele, a 
Alemanha enquanto estado nacional não existia, ainda. Desde o Século XVIII, 
quando o Império Germânico havia se desfeito, a inluência da cultura francesa 
tinha se mantido como um elemento de diferenciação da aristocracia, da nobreza.
Essa diferença afastava a elite agrária das regiões ao sul da Germânia em 
relação aos territórios do norte, onde predominava a inluência da Prússia, um 
império militar e nacionalista. As classes camponesas e agrárias da Alemanha 
não se reconheciam nos hábitos da nobreza afrancesada. Com esse sentimento 
de discordância e com uma forte identiicação popular com os sentimentos ger-
mânicos, é que os primeiros movimentos militares em defesa do nacionalismo 
se desenvolveram.
Foi da política diplomática e militar prussiana que acabou por se organizar 
o movimento nacionalista. Sob a liderança prussiana, as guerras para a forma-
ção do Estado Nacional Alemãs obtiveram êxito em 1871. A formação do estado 
nacional liderado pela Prússia colocou Berlim no centro do poder político e cul-
tural alemão. Foi nesse centro que as obras de Hegel ganharam reconhecimento, 
assim como as de Fichte e Schelling.
Uma das principais obras de Hegel foi a “Filosoia da História”, em que 
desenvolve a tese de construção dos estágios do pensamento e o relaciona com o 
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desenvolvimento da história humana. É nesse contexto que a dialética se expressa 
em sua obra com a construção dos três elementos – tese, antítese e síntese – que 
estará presente no pensamento materialista histórico que o sucedeu.
Dessa forma, nas teses do pensador alemão, não há uma substituição, destruição 
ou exclusão, mas transformação sem extermínio dos elementos que se opõem. 
Toda a relação se estabelece como uma condição de construção derivada da relação 
entre os elementos contrários. Dessa forma, a própria história é uma construção 
de relações contrárias que vai permitindo o desenvolvimento da experiência, o 
que Hegel chama de “absoluto”. Para o autor, o que move a história é o espírito, 
que seria “real e ativo no mundo” (HEGEL, 1998, p. 21), a história, assim, seria 
universal pois está conectada ao sujeito que é um ser pensante. Bertrand Russell, 
em sua obra “História do Pensamento Ocidental” explica a dialética hegeliana:
Quanto ao processo dialético que conduz ao Absoluto, nos ajuda a 
compreender melhor esta noção difícil. Exempliicar isto em lingua-
gem simples está além do alcance de Hegel e, sem dúvida, de qualquer 
outra pessoa. Mas neste ponto Hegel recorre a uma das surpreendentes 
ilustrações tão abundantes em suas obras. O contraste se estabelece en-
tre alguém cuja noção do Absoluto não se apóia na sua passagem pela 
dialética, e outro alguém que tenha passado por ela. Isso se compara 
ao signiicado que uma oração tem para uma criança e para um velho. 
Ambos recitam as mesmas palavras, porém para a criança elas signii-
cam pouco mais do que certos ruídos, enquanto para o velho evocam 
experiências de toda uma vida (RUSSELL, 2001, p. 355-356).
A velhice natural é fraqueza, mas a velhice do espírito é a perfeita maturida-
de e força; nela, ele retorna à unidade consigo, em seu caráter totalmente 
desenvolvido como espírito.
(George W. F. Hegel)
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Esta totalidade da dialética será mais acentuada na obra de Karl Marx, mas, por 
enquanto, podemos considerar que Hegel tenta dar à história a capacidade de 
ser o relato das relações de lutas que levam, dialeticamente, ao amadurecimento 
e, por conta disso, a superioridade de uma determinada civilização. Para ele, a 
formação do Estado Alemão seria o resultado dessa superioridade dialética.
Mais uma vez lembramos de que a valorização do germanismo está presente 
no período em que Hegel desenvolveu seus trabalhos.
TEORIAS DO MUNDO CONTEMPORÂNEO
O desenvolvimento da sociedade capitalista marcou a organização de uma ilo-
soia da coletividade, mas também da angústia do particular. Ao mesmo tempo 
se estabeleceu dois campos de debate entre os pensadores, a questão da subjeti-
vidade e da objetividade.
Parte considerável dessa dualidade, objetividade e subjetividade cresceu 
como um relexo da sociedade industrial. As relações sociais passaram a envolver 
meios diversos, tanto na produção de bens como no transporte, na comunica-
ção, até mesmo na intimidade. Nossa vida passa a icar repleta de produtos que 
são fruto da produção industrial. O que antes era uma arte de todos nós, agora se 
adquire na prateleira de mercado, oferecido para todos. Contudo, icamos mais 
íntimos de “certas” coisas do que íntimos de “certas” pessoas.
No século 19, destaca-se o papel da ciência, e seu avanço torna-se ne-
cessário. O crescimento da nova ordem econômica — o capitalismo 
— traz consigo o processo de industrialização, para o qual a ciência de-
veria dar respostas e soluções práticas no campo da técnica. Há, então,um impulso muito grande para o desenvolvimento da ciência, enquan-
to um sustentáculo da nova ordem econômica e social, e dos problemas 
colocados por ela (BOCK, 2002, p. 46).
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Esse processo de desenvolvimento da sociedade industrial abalou a socie-
dade europeia do século XIX. Ela viu a população urbana se multiplicar e o 
desenvolvimento da produção industrial que atingiu diversos objetos. A classe 
operária se multiplicou e ocupou as periferias das grandes cidades da Europa. 
Cidades que não estavam preparadas para receber uma população imensa, resul-
tado do êxodo rural.
Não demorou para que os problemas sociais se multiplicassem. Violência 
urbana associada a assaltos, homicídios, suicídios. Também surgiram as epide-
mias. A fome foi outra questão a ser resolvida nas grandes cidades, em especial 
naquelas em que se multiplicaram os desempregados e também a quantidade 
de indigentes nas ruas.
Se por um lado as cidades industriais multiplicam sua população perifé-
rica, em determinados espaços, se observava o progresso material. A construção 
de edifícios modernos, maquinaria, meios de transporte e comunicação. Até 
mesmo as obras literárias, até então restritas a um número limitado de indi-
víduos pelo seu custo, passaram a se multiplicar com a industrialização, assim 
como os periódicos. As teorias percorriam um número imenso de indivíduos, 
desde que fossem alfabetizados. A noção de alfabetização não signiica interpre-
tar o mundo, mas saber reconhecer os caracteres a im de poder ler e estar com 
aptidão para o mundo do trabalho nas indústrias.
O conhecimento, por isso, tem caminhado para ser a mola propulsora 
da economia mundial e cujo valor de produtos e serviços depende cada 
vez mais da parcela do conhecimento a eles incorporados (LOPES, 
2002, p. 11).
O processo de industrialização acabar por promover a multiplicação de esco-
las nesse período, que atende às necessidades de uma qualiicação humana, 
seja para o trabalho operário ou para as qualiicações de maior complexidade. 
Produção e conhecimento assinaram uma aliança indivisível ao longo da histó-
ria, o que promoveu o progresso da economia e da vida social, mas infelizmente 
não para todas as pessoas. A escola, então, atenderia não apenas o processo for-
mativo de uma criança, mas também a prepara para o mundo adulto, com suas 
regras sociais, o universo organizativo do trabalho e comportamentos conside-
rados correto (BOCK, 2002).
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Podemos considerar também até que ponto a educação poderia garantir uma 
melhora nas competências humanas, atendendo ao processo de industrialização 
em andamento e até os dias atuais. O analfabetismo, por exemplo, não impe-
diria a capacidade de um ser humano conseguir o ingresso dentro do “mundo 
do trabalho”. Mesmo em nossos dias, a educação que as instituições de ensino 
propõem não corresponde de forma eiciente às necessidades da produção de 
forma integral. Talvez nas qualiicações especíicas e vinculadas diretamente à 
atividade produtiva.
A modernização das formas de produção e o uso constante da ciência e 
da tecnologia foram percebidos na produção industrial partindo do aprimora-
mento da máquina a vapor. O que assistimos no constante desenvolvimento da 
indústria é o que foi inaugurado no século XVIII. O grau de complexidade da 
cadeia produtiva tem delegado a mão de obra braçal à periferia da produção de 
bens. Por isso, quando temos a necessidade do aprimoramento do trabalhador 
em nossos dias, vive-se uma adequação especíica de atividades. A educação, de 
uma forma geral, tem se tornado desconexa da necessidade de produção ime-
diata, mas fundamental para entendermos a complexidade da organização social 
em que vivemos.
Hoje vemos uma relação contraditória entre o progresso material, os avan-
ços da tecnologia e da ciência e o aprimoramento humano. Contudo, na mesma 
proporção, se propagou a miséria. As cidades passaram a ser o campo onde esta 
contradição icou visual, cotidiana e se avizinhou.
As manifestações das classes populares, em especial dos trabalhadores, se 
multiplicaram por toda a Europa e também pelos Estados Unidos, enim, onde 
houvesse chegado a industrialização. Diversas teorias passaram a se dedicar à 
compreensão desse industrial, sua vida coletiva e sua angústia pessoal. Mais 
uma vez, dando continuidade à busca da ilosoia: “onde repousa a felicidade do 
homem, independente de seu tempo”.
Os movimentos revolucionários do Século XVIII inspiraram os intelectuais 
europeus, desde os defensores do liberalismo, como vimos na unidade anterior, 
até os que desenvolveram suas teses durante e após a I Revolução Industrial (1750 
a 1830), a Independência dos Estados Unidos (1776) e a Revolução Francesa 
(1789 a 1815). Podemos considerar que nenhum pensador icou isento de se 
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posicionar diante dos movimentos que transformaram política e economica-
mente o mundo, em especial a Europa.
Alguns desenvolveram o elogio e o aprimoramento das teses liberais, promo-
veram sua “veia” nacionalista e exaltaram o papel do Estado como instrumento 
de garantia dos interesses coletivos e individuais. Outros desenvolveram a opo-
sição, a crítica, a busca de se contrapor à sociedade industrial capitalista que 
consideravam um ambiente de destruição das qualidades humanas.
O desenvolvimento de uma sociedade industrial complexa passou a movi-
mentar o meio intelectual para entender os elementos que compunham as relações 
econômicas cada vez mais destacadas na vida do ser humano cada vez mais 
urbano. A cadeia de produção ganhava conotações de complexidade com uma 
quantidade cada vez maior de pessoas envolvidas na produção de bens e servi-
ços. A concentração dessa população nas cidades colocava em xeque as funções 
do estado, a organização política. O liberalismo parecia idealista demais para 
resolver os problemas que a sociedade industrial apresentava.
Os conlitos entre os pragmáticos, que veremos a seguir, e os resistentes do 
romantismo tomaram o palco dos debates intelectuais, principalmente na primeira 
metade do século XIX. Só para ilustrar esse debate, podemos citar o pensamento 
de Arthur Schopenhauer (1788 a 1860). O crítico das teses de Hegel conside-
rava que o amor não era a felicidade, mas uma condição que expunha a pessoa 
à dor. A vida deveria ser compreendida pela capacidade de dar sentido aos ele-
mentos que a cercam e não na materialidade que ela expressa. Schopenhauer foi 
autor da obra “O mundo como vontade e representação” (1818), desenvolveu 
uma escrita de uma metafísica ética e ateia chamada de pessimismo ilosóico, e 
que inluenciou as bases psicanalíticas de Freud.
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Contrário a Hegel, distante do interesse feminino e reconhecido como grande 
pensador, praticamente após sua morte, Schopenhauer não considerava que a 
razão movia a pessoa, mas sua paixão pela existência. O signiicado que estabe-
lecemos ao mundo é mais importante do que ele realmente é. Segundo o ilósofo, 
é a vontade que guia cada pessoa frente ao seu próprio fenômeno, dando-lhe 
signiicação, mostrando a “engrenagem interior de seu ser, de seu agir, de seus 
movimentos”(SCHOPENHAUER, 2005, §18, p.156-157), refutando a ideia de 
verdade como mestra guia no caminho da investigação.
agora a verdade não é, como nos outros casos, a referência de uma re-
presentação abstrata a uma outra representação, ou à forma necessária 
do representar intuitivo e abstrato, mas é a referência de um juízo à 
relação que uma representação intuitiva, o corpo, tem com algo que 
absolutamente não é representação, mas toto genere diferente dela, a 
saber: vontade” (SCHOPENHAUER, 2005, §18, p.160). 
Outro expoente do seu tempo, nessa disputa entre o pragmatismo e neorroman-
tismo, é Friedrich Nietzsche (1844 a 1900). O pensador alemão foi um crítico do 
cristianismo, considerava uma religião pessimista e vinculada aos exemplos dos 
derrotados ao estimular a piedade. Assim, segundo Nietzsche, acaba por esti-
mular a ação contrária ao progresso humano. Os modelos que devemos buscar 
devem estar associados ao crescimento, ao orgulho e trazer à superfície a supe-
rioridade humana eiciente, segundo ele.
Nietzsche não se esquiva em falar do processo educacional de seu tempo com 
sua escrita aguda e pessimista, atribuindo à noção de ‘homem’ a necessidade de 
cultura atrelada ao “lucro geral e do comércio mundial” (Nietzsche, 2004, p. 186). 
A cultura na modernidade, conforme o ilósofo, parece se preocupar apenas com 
“Quando lhe falta o objeto do querer, retirado pela rápida e fácil satisfação, 
assaltam-lhe vazio e tédio aterradores, isto é, seu ser e sua existência mesma 
se lhe tornam um fardo insuportável. Sua vida, portanto, oscila como um 
pêndulo, para aqui e para acolá, entre a dor e o tédio”.
(Arthur Schopenhauer)
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as formas, não mais com os conteúdos, tornando a humanidade escravizada de 
momentos efêmeros e fugidios.
Por mais que a falta de dignidade e de decência salte muito penosa-
mente aos olhos e que uma elegância mentirosa se mostre novamente 
necessária para mascarar a doença desta pressa indigna. Pois este é o 
liame que une a moda ávida da bela forma ao conteúdo horroroso do 
homem contemporâneo: aquela deve dissimular, este deve ser dissimu-
lado. Ser culto daqui por diante signiica: não se permitir observar até 
que ponto se é miserável e mau, feroz na ambição, insaciável na acu-
mulação, egoísta e desavergonhado na fruição (NIETZSCHE, 2004, p. 
189-190).
Uma educação que apenas se dedicaria à formação de pessoas para o traba-
lho não é uma educação preocupada com a cultura, logo não poderia produzir 
grandes genialidades (NIETZSCHE, 2004), a questão de ampliação de escolas 
sem uma pauta cultural só revelaria o projeto de formar pessoas para consegui-
rem sobreviver no mundo, mais nada. E é no paradigma de Schopenhauer que 
Nietzsche se ancora para defende que existem pessoas que conseguem estabele-
cer uma coerência entre a vida e a obra, haja vista que o exemplo deve ser dado 
“pela vida real e não unicamente pelos livros” (Nietzsche, 2004, p. 150). 
Fazendo parte desse conjunto temos Jeremy Bentham (1748 a 1832), inglês 
e um dos fundadores da Univesity College. Sobre a história desse autor, a título 
de curiosidade, é bom lembrar que o seu corpo até hoje está guardado na uni-
versidade que ajudou a fundar a seu pedido. Ele desejava que seu esqueleto fosse 
preenchido com cera e mantivessem seu corpo preservado. Foi um pragmático e 
criticava o idealismo. Também foi um crítico da religiosidade a qual considerava 
um instrumento de dominação de uma elite sobre a grande maioria da socie-
dade. Suas teorias partem da experiência para que se alcance o conhecimento, 
mas que nem é nova ou mesmo desnecessária.
Não estamos aqui diante de uma teoria nova e pouco segura, ou inútil. 
Com efeito, tudo quanto acabamos de expor representa um dado com o 
qual concorda plena e perfeitamente a experiência do gênero humano, 
onde quer que os homens possuam uma visão clara acerca dos seus 
próprios interesses (BENTHAM, 1974, p. 24).
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A propagação da educação seria a forma de libertar as pessoas dessa inconsci-
ência, o que mais tarde Marx chamaria de alienação. Inclusive, vale ressaltar, 
Bentham foi um dos precursores do pensamento marxista que se constituiria 
como a grande crítica à sociedade capitalista. Também pode ser considerado um 
defensor da busca da experiência material como elemento de formação do pen-
samento, o que de certa forma estaria nas teses de Comte, o “positivista”.
O PRAGMATISMO
O que chamamos de pragmatismo, outros autores (Russell, principalmente) 
chamam de “utilitarismo”, se tornou as teses de entendimento e valorização da 
eiciência da sociedade sobre os princípios de moralidade que, por muitas vezes, 
a trava. É aquela distância absurda entre a necessidade de uma ação e o seu 
adiamento por um julgamento moral. O que necessita ser feito para garantir o 
progresso humano deve estar à frente dos conceitos de moralidade. Com o sur-
gimento da sociedade capitalista, as mudanças materiais se dinamizaram e o ser 
humano não acompanhou com a abstração moral a urgência dessa nova ordem.
Entre os pragmáticos, vale ressaltar Adam Smith (1723 a 1790), o “pai da 
economia política”, e sua principal obra, “A Riqueza das Nações”. Seu trabalho de 
compreensão do desenvolvimento da economia e o desenvolvimento dos meios 
de produção associados à divisão do trabalho para o crescimento do capitalismo 
deu base a uma sequência de pensamentos econômicos que tinham como fonte 
de pesquisa o entendimento da produção capitalista.
Smith também foi responsável pela inauguração da escola econômica inglesa 
que predominou durante mais de cem anos. Por isso, e como fator estimulante, 
a Inglaterra foi a nação que liderou a economia mundial entre os Séculos XVII 
e o início do Século XX.
Sua tese se fundamenta na compreensão da economia como um fenômeno 
natural com leis próprias. O domínio dessas leis econômicas pode permitir à 
humanidade aprimorar a capacidade produtiva e atender com mais eiciência 
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a suas necessidades materiais. Dessa forma, ao aprimorarem-se as relações de 
produção com a especialidade dos trabalhadores e o desenvolvimento técnico, 
o volume e lucratividade da produção aumentam.
Por outro lado, a crítica ao capitalismo também se intensiicou. Da mesma 
forma que a o conhecimento econômico ganhava uma ciência própria para apri-
morar a produção, se desenvolvia a crítica utilizando a mesma racionalidade.
O socialismo moderno surge nesse momento chamado inicialmente de 
“utópico”. O termo foi originado por Karl Marx em sua crítica ao idealismo dos 
primeiros críticos do capitalismo. O pensador alemão considerava que os “socia-
listas utópicos” queriam mudar a sociedade “de cima para baixo”. Acreditavam 
que a “boa vontade” dos homens mudaria seu comportamento. Um dos que acre-
ditou nessa possibilidade foi Saint-Simon (1760 a 1825).
Filho da baixa nobreza francesa, Simon teve uma educação conservadora, 
da qual só pode se livrar depois de ingressar no serviço militar. Na sua vida de 
soldado, foi à América do Norte atuar na Independência dos Estados Unidos. 
Sua estadia na nova nação republicana e democrática o levou a ser simpático ao 
governo liberal democrático instalado na ex-colônia inglesa. Ele considerava que 
nos Estados Unidos não há a fusão de privilégio econômico com a vida política. 
Além de elogiar a liberdade de culto.
Aovoltar à França foi um dos atuantes na Revolução Francesa, onde desen-
volveu a tese da racionalidade absoluta e a promoção da pessoa pelo progresso 
econômico e cientíico. Para ele, o desenvolvimento da humanidade dependia 
do conhecimento e dos benefícios materiais chegarem a todos. Daqui se extraem 
seus primeiros princípios socialistas.
Para Saint-Simon, a igualdade não seria uma condição absoluta, mas o 
desempenho das potencialidades humanas poderia aproximar a pessoa de uma 
condição material qualitativa, na proporção em que sua conduta izesse jus, ou 
seja, a teoria da meritocracia.
Um dos discípulos de Simon, e que acabou por superá-lo em importância 
na herança intelectual do Ocidente, foi Augusto Comte (1798 a 1857). O “pai da 
Sociologia” ou “físico social”, como alguns pensadores defendem. Apaixonado pelas 
ciências naturais desde sua juventude, quando cursava a Escola Politécnica, Comte 
defendeu a percepção da vida social como os mesmos critérios das ciências naturais.
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A defesa da evolução do pensamento humano é um dos pontos altos do tra-
balho de Comte. Seu pensamento é fundado no desenvolvimento cientíico ao 
longo da história da humanidade. Um desenvolvimento que permitiu o apri-
moramento da civilização ocidental, a qual considera superior às demais pela 
capacidade cientíica. A organização racional de uma sociedade deine seu grau de 
habilidade em superar os problemas que ocorrem devido à complexidade social.
Dessa forma, Comte estabelece uma relação direta entre os elementos que 
deinem um corpo biológico do corpo social. A complexidade do organismo social 
o faz icar sujeito a problemas resultantes do desenvolvimento. Dessa forma, se 
faz necessária uma compreensão objetiva dos fenômenos sociais. A física social 
seria a ciência capaz de responder a esses problemas.
Fundamental considerar que, para Comte, todas as ciências verdadeiras se 
positivam, ou seja, se sustentam no mesmo método que as ciências naturais. 
Todas devem derivar sua lógica da matemática, única capaz de trabalhar com a 
abstração e dar a dimensão exata da existência de todas as coisas materiais. Esse 
seria o destino das ciências consideradas sociais e humanas, como a Economia, 
Política, a História e a Sociologia. Dessa forma, Comte se enquadra nos auto-
res da experimentação, naqueles que consideram que as experiências concretas 
estabelecem a fonte de todas as leis universais que sustentam o desenvolvimento 
do conhecimento cientíico.
Em sua obra “Conceitos Gerais e Surgimento da Sociologia”, Comte faz 
considerações acerca da Física Social, que tenta estabelecer como a ciência da 
sociedade:
entendo por física social a ciência que tem por objeto próprio o es-
tudo dos fenômenos sociais, considerados no mesmo sentido que 
os fenômenos astronômicos, físicos, químicos e isiológicos, isto é, 
como submetidos a leis naturais invariáveis, cuja descoberta é o im 
especial de suas pesquisas. Assim, ela se propõe diretamente a expli-
car, com a maior precisão possível, o grande fenômeno do desenvol-
vimento da espécie humana, visto em todas as suas partes essenciais 
(...) (COMTE, 1972, p. 86).
É possível notar nessa citação que o teórico francês estabelece uma relação entre o 
desenvolvimento da sociedade com as ciências naturais e justiica a superioridade 
ocidental pela capacidade de se organizar fundada no conhecimento cientíico.
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As teses de Comte ainda são fundamentais na organização do conhecimento. 
Sua compreensão de uma pessoa que valoriza a experiência material será a base 
para outros métodos cientíicos que surgiram a partir de seu método. Essa pos-
tura de instituir a cientiicidade às ciências humanas garantiu respeitabilidade, 
além de revelar que possui métodos tão válidos como as demais ciências.
A ilosoia teológica e a ilosoia metafísica nada mais dominam hoje 
em dia senão o sistema do estudo social. Elas devem ser expulsas deste 
último refúgio. Isto será feito principalmente pela interpretação básica 
do movimento social como necessariamente sujeito a leis físicas inva-
riáveis, em lugar de ser governado por qualquer espécie de vontade 
(COMTE, 1978, p.16).
O pensador que desdobrou o pensamento de Comte foi Émilie Durkheim (1858 a 
1917) - teórico francês que conquistou o reconhecimento acadêmico da Sociologia 
como ciência. Apesar de pertencer a uma família judia com forte tendência reli-
giosa, Durkheim se afastou da religiosidade a qual considerava uma necessidade 
social e não fruto da existência de uma divindade. Por sinal, sua compreensão 
da inluência da coletividade na vida particular é seu grande mérito como pen-
sador. Teve em Augusto Comte o pensador que inspirou seu desenvolvimento 
metodológico.
Durkheim considera que o indivíduo é uma expressão da coletividade que 
determina sua condição e ação. Na sociedade industrial, a pessoa vive em uma 
rede complexa em que as funções sociais se impõem e levam à coação sobre o 
indivíduo. Dessa forma, a conduta particular é condição que as estruturas coleti-
vas determinam. O sentimento de particularidade e a individualidade exacerbada 
nada mais são do que uma precária visão que cada um tem das relações com 
o todo. O comportamento de um único ser humano não é capaz de demons-
trar qual é a sua real condição e função dentro do corpo social, como também, 
de um comportamento particular, em uma sociedade complexa, é impossível 
entender o comportamento coletivo. A particularidade não expressa a coletivi-
dade para o pensador francês.
Outro ponto a ser ressaltado na obra de Durkheim é a importância da soli-
dariedade como condição de dependência entre os elementos que compõem a 
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sociedade. A complexidade industrial é a sua grande divisão de trabalho. Dessa 
forma, se torna importante a integração pela elevação moral das funções de maior 
relevância para a existência coletiva. Preservar as instituições fundamentais que 
garantam a vida em coletividade. Essa noção só poderia ser compreendida sob 
o viés sociológico, agora mais seguro com a física social estabelecida por Comte 
e que conecta com a educação. Para o pensador, dessa forma, a sociologia é um 
campo de proicuidade para o terreno educacional. 
A sociologia pode alguma coisa mais e com mais proveito. Pode forne-
cer-nos o de que mais instantemente temos necessidade: um corpo de 
ideias diretrizes que sejam a alma de nosso labor, e que os sustenham, 
deem nítida signiicação à nossa atividade e nos prendam a ela. Tal con-
dição é indispensável à proicuidade de toda e qualquer ação educativa 
(DURKHEIM, 1952, p.74).
Esse processo educacional não seria atingido de forma rápida, como uma seta no 
alvo, mas de forma lenta e gradativa, tendo objetivos bem pontuais, sem se dei-
xar “desviar por incidentes exteriores e circunstâncias adventícias, então chega 
a dispor de todos os meios necessários para inluenciar profundamente a alma 
da criança” (DURKHEIM, 1952, p.42) 
Em relação à coletividade, ela pode ser vista como o resultado de um desen-
volvimento econômico determinado pelo controle das condições de produção 
da vida material. Ou seja, o que para Durkheim seria o aprimoramento da vida 
em coletividade, que necessita de regulagem para manter o progresso, para Karl 
Marx (1818 a 1883), é a capacidade de concentração de riqueza promovida pelo 
desenvolvimento dos meiosde produção concentrados nas mãos da classe domi-
nante, a burguesia.
O pai do socialismo cientíico, fundador do materialismo histórico dialético, 
questiona o papel que o desenvolvimento material trouxe. Não pelo desenvol-
vimento em si, mas a que interessa esse desenvolvimento. O capitalismo se 
apresenta como uma relação entre duas classes, a burguesia dominante e pro-
prietária dos meios de produção e a classe operária, o proletário, que é a força 
de trabalho.
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A exploração da classe operária, de sua força de trabalho, é fundamental para 
garantir ao capitalista, o burguês, a concentração de capital, segundo Marx. Para 
ele, o desenvolvimento das forças produtivas mostra o grau de concorrência entre 
as empresas capitalistas, na qual a produção da vida material não visa à satisfa-
ção coletiva, mas à concentração de riqueza nas mãos burguesas.
Dessa forma, a teoria de Marx considera que o futuro desse antagonismo 
é a destruição da própria sociedade capitalista. Destruição esta que poderia se 
dar pelo domínio da classe operária sobre o estado, seja pela via político-parti-
dária ou revolucionária.
As teses de Marx consistem em defender a dialética como o elemento que 
permite a elevação das relações de produção capitalista em grau de exploração 
e desenvolvimento das forças produtivas. Dessa forma, o capitalismo é, para 
ele, o resultado do aprimoramento de todas as formas de produção existentes 
ao longo da história humana. Ao se libertar dessa exploração, a classe operária 
poderia se apoderar de todo o desenvolvimento material promovido pela econo-
mia capitalista e colocá-la a serviço da coletividade, uma sociedade sem classes. 
Do socialismo ao comunismo.
A principal característica do método de Marx é a dialética, herdada do hege-
lianismo do qual ele foi seguidor durante a sua juventude. A relação entre os 
contrários, que já trabalhamos aqui em outra oportunidade, apresenta a trans-
formação material por meio da intervenção da pessoa partindo do confronto 
da condição existente a sua compreensão desta condição e ação. Não é neces-
sário ter apenas uma visão sobre o mundo, mas se faz necessário intervir para 
mudá-lo. Ao agirmos, nossa compreensão muda, e nossa ação ganha um novo 
signiicado, e isso tudo dentro do próprio tempo, que é o “campo do desenvol-
vimento humano” (MARX, 1974, p.98). É nesse tempo que o pensar também se 
faz, ou a própria educação. Produzir, seja no campo material ou imaterial, revela 
a vida como estado de consciência.
A produção de ideias de representações, da consciência está, de início, dire-
tamente entrelaçada com a atividade material e com o intercâmbio material 
dos homens, com a linguagem da vida real. O representar, o pensar, o inter-
câmbio espiritual dos homens, aparece aqui como emanação direta de seu 
comportamento material. [...] Não é a consciência que determina a vida, 
mas a vida que determina a consciência (MARX; ENGELS, 1979, p.36).
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Mas a busca de implantar um estado socialista não se realizou exatamente onde 
Marx considerava mais próximo de acontecer, nos países industrializados da 
Europa. Alemanha, França e Inglaterra seriam para ele as nações onde a classe 
operária estaria mais próxima de sua consciência enquanto classe. Os trabalha-
dores da Europa ocidental se mantiveram iéis à condição de trabalhadores e 
elegeram outras prioridades para sua vida do que a implantação do socialismo. 
Temas como o nacionalismo e a cultura passaram a interessar intensamente ao 
operário industrial.
 O socialismo buscado por Marx acabou se 
instalando em sociedades predominantemente 
agrárias e dominadas pela corporação militar 
como a Rússia, Polônia, Hungria, ou seja, no leste 
europeu. Tudo indica que o socialismo se coloca 
como uma imposição para o controle rígido da 
vida social em que o bem-estar individual não 
se estabelece e a democracia não se consolida.
Quem percebeu, de certa forma, essa rup-
tura entre o pensamento material e a forma 
como ele se expressa na vida humana foi Max 
Weber (1864 a 1920). Filho de um empresário 
bem sucedido na Alemanha, sendo a mãe ilha 
de nobres, de formação calvinista conservadora, Weber se destacou nos estu-
dos em economia política e no estudo do desenvolvimento da racionalidade 
no ocidente. O capitalismo lhe interessou substancialmente. Principalmente 
como resultado do desenvolvimento da racionalidade econômica associado a 
um legado cultural propício para a ação econômica em busca da acumulação. 
Para ele, determinadas condições sociais geram possibilidades de desenvolvi-
mento em detrimento de outras. O que se justiica, na compreensão de Weber, 
que o desenvolvimento do capitalismo não poderia ter se dado da mesma 
forma em sociedades como modelos culturais distintos. É desse ponto de par-
tida que se organizou o principal trabalho de Weber, “A Ética Protestante e o 
Espírito Capitalista”.
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Para o pensador alemão, a construção subjetiva de modelos de ação resulta 
em um sentido particular para a conduta a ser tomada diante de necessidades 
semelhantes. Em outras palavras, mesmo que vivendo condições idênticas, indi-
víduos podem ter condutas diferenciadas por não estabelecerem um sentido 
futuro igual para o seu ato. Podemos considerar que o dinheiro é um valor abso-
luto, mas o que fazer com ele está relacionado diretamente ao seu sentido futuro.
Com isso, as heranças culturais constroem um sentido ao comportamento 
presente, assim como a ação é orientada por uma consequência futura. Essa con-
sequência imaginada como condição a posterior. O futuro pode ser para alguns 
um longo período, para outros o imediato. Por isso, alguém pode agir hoje visando 
a resultados que serão obtidos em anos, outros em minutos.
O importante de Weber é lhe contextualizar em seu tempo. Ele viveu na 
Europa em um período de “Paz Armada” (1870 a 1914), uma fase marcada por 
potências europeias que dominaram diversas regiões do planeta e transformaram 
a África e a Ásia em colcha de retalhos, dividida entre as nações que buscavam 
o domínio da economia e da diplomacia mundial. O que se convencionou cha-
mar de neocolonialismo e imperialismo. Weber acredita que a ciência é algo que 
se debruça para compreender a realidade, ainda que existam conexões subjeti-
vas que perpassam os saberes e conhecimentos.
A ciência social que nós pretendemos praticar é uma ciência da reali-
dade. Procuramos compreender a realidade da vida que nos rodeia e 
na qual nos encontramos situados naquilo que tem de especíico; por 
um lado, as conexões e a signiicação cultural das suas diversas mani-
festações na sua coniguração atual e, por outro, as causas pelas quais 
se desenvolveu historicamente assim e não de outro modo (WEBER, 
1986, p. 88).
Essas conexões são fruto de uma estrutura de coletividade, que o pensador conse-
guiu detectar como interesse da coletividade que não se funda exclusivamente na 
racionalidade teórica. Mas se esta estiver associada a valores culturais arraigados 
na vida social, a orientação da ação pode mudar. O que isso signiica? Em uma 
crítica a Marx, Weber estabelece que os operários alemães, diante da iminência 
da Primeira Guerra Mundial (1914 a 1918), foram orientados pelo Partido Social 
Democrata alemão a não se alistarem no exército, para não morrerem em uma 
guerra“imperialista” que interessava exclusivamente aos empresários alemães, 
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segundo as teses marxistas. Mas, o que ocorreu? Os operários eram germânicos, 
nacionalistas, e abandonaram a orientação do partido para vestir a farda militar 
e morrerem nos campos de batalha, “dignamente” como alemães.
Não é por acaso que Max Weber é apontado como um precursor do existencia-
lismo, além da defesa do conceito de ação como motora, a racional e a irracional. 
Ação racional com relação a ins, “determinada por expectativas no 
comportamento tanto de objetos do mundo exterior como de outros 
homens, e utilizando essas expectativas como ‘condições’ ou ‘meios’ 
para alcançar ins próprios e racionalmente avaliados e perseguidos”. 
Ação racional orientada a valores, “determinada pela crença consciente 
no valor ético, estético, religioso ou de qualquer outra forma como seja 
interpretado, próprio e absoluto de determinada conduta, sem relação 
alguma com o resultado, ou seja, puramente em consideração desse 
valor”. Ação afetiva, ação irracional emotiva, “determinada por afetos e 
estados sentimentais”. Ação tradicional, “determinada por um costume 
arraigado” (WEBER apud BARROS, 2010, 150-151).
Essas ações determinam os modelos de dominação considerados ‘modelos ide-
ais’ partindo de pressupostos pessoais, o que nos leva a considerá-lo como um 
pensador que deslocou da percepção humana os condicionamentos sociais, abor-
dando muito do que a teoria freudiana iria desenvolver no campo da psicologia. 
Porém a Europa, e o Mundo de certa forma, não seriam mais a mesma depois 
das duas guerras mundiais.
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A CRISE DE IDENTIDADE HUMANA E AS TEORIAS 
CONTEMPORÂNEAS
A euforia com os descobrimentos cientíicos no século XIX foi abalada com o 
advento de duas guerras mundiais. A primeira, entre 1914 e 1918, e a segunda, 
entre 1939 e 1945. As duas tiveram como objetivo impor a supremacia de interes-
ses imperialistas que dividam as nações. Alianças foram estabelecidas lideradas 
pela Inglaterra e Alemanha, as duas principais rivais no campo econômico e 
diplomático europeu.
O resultado destes conlitos foi a emergência de um novo jogo de forças entre 
os Estados Unidos e a União Soviética, a Guerra Fria (1945 a 1898), uma fase já 
superada, mas marcada por um temor que até nosso dias assombra a humani-
dade, o temor nuclear. Temor marcado inicialmente pela possibilidade de uma 
guerra utilizando armamentos atômicos. Hoje é a energia que nos preocupa com 
os acidentes nucleares.
Durante e após as duas guerras mundiais, o pensamento ilosóico entrou em 
crise com a ciência e rompeu com a arte. A humanidade se fragmentou entre o 
avanço do conhecimento cientíico inegável e o conceito de humanidade sobre 
si mesma, um dos sentidos da ilosoia. Ainda que próxima da ilosoia, a arte 
se descomprometeu com a realidade e passou a construir um imaginário de 
sonhos, não é por acaso que o cubismo, surrealismo e o expressionismo cresce-
ram neste período.
A Crise de Identidade Humana e as Teorias Contemporâneas
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A fragmentação dos campos do conhecimento atingiu um grau de comple-
xidade expressivo. O que vemos em nossos dias, em que uma pessoa não é capaz 
de desenvolver todo o saber em um determinado campo de conhecimento, muito 
menos em todos aqueles que estão ligados à vida humana. Desta forma, enten-
der o pensamento sobre a pessoa a partir do século XX é valorizar os destaques 
em campos especíicos, além dos ilósofos clássicos.
Um exemplo da pesquisa cientíica que desvenda um conceito humano foi 
o trabalho do isiologista Ivan Pavlov (1849 a 1936). Por acaso, ao fazer pesquisa 
sobre a salivação, utilizando em seus experimentos cães, ele descobriu que a sali-
vação, estímulo natural à alimentação, era produzida quando outro fato associado 
a ela era apresentado. Um exemplo era que todas as vezes que seu assistente que 
alimentava os cães surgia no laboratório, os cães salivavam. Diante disso, o pes-
quisador russo começou a manipular experimentos para perceber o grau de 
condicionamento e sua extensão.
Burrhus Frederic Skinner (1904 a 1990), um estadunidense, também se 
enveredou no campo comportamental humano, tanto que se tornou um dos 
precursores do behaviorismo e da crença sobre a possibilidade de controlar e 
moldar o comportamento, mas discorda das teorias de Pavlov. É possível com-
preender como ele disserta em suas obras como “Tecnologia do ensino” (1972) 
e “Ciência e comportamento humano” (2003). Suas investigações cientíicas 
revelam que se trata de uma matéria difícil por causa de sua complexidade e 
plasticidade. Porém, é possível dimensioná-lo graças ao empenho e técnicas de 
quem o estuda sendo, portanto, factível compreender a causa e o efeito decorren-
tes do comportamento. Um exemplo desse sistema de estímulo resposta Skinner 
dá ao descrever um texto como dispositivo:
A literatura é produto de uma prática especial, que faz surgir um com-
portamento que, de outra forma, permaneceria latente no repertório 
dos falantes. Entre outras coisas, a tradição e a prática da poesia lírica 
encoraja a emissão de comportamentos sob controle de fortes priva-
ções – em outras palavras, respostas sob formas de mandos (SKIN-
NER, 1957, p.72-3).
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Skinner em “Tecnologia do ensino” (1972) observa que os comportamentos dos 
organismos individuais são previsíveis fora do contexto estatístico e que prever 
as respostas só seria possível graças a uma série inferências. O comportamento, 
segundo ele, no campo da aprendizagem pode ser observado conforme duas 
principais melhorias: a primeira seria a Lei do Efeito, que possibilita a mode-
lagem comportamental e a segunda, que permite manter o controle sobre o 
comportamento por mais tempo. Partindo desses conceitos o pensador cria o 
que chama de máquinas de ensinar, que eram estruturas mecânicas desenvol-
vidas para auxiliar na aprendizagem com etapas especíicas. Quem educa seria 
uma espécie de monitor(a), e quem é educado(a) avança em seu próprio ritmo 
tendo uma resposta da máquina, se acertar continua, caso errar, continua até 
resolver o problema ou questão proposta.
Desses estudos surgiu a teoria do comportamento relexivo e as bases da 
teoria comportamental. Hoje, uma das principais correntes da psicologia. Dessa 
forma, valoriza o estudo da exterioridade humana e a sua adaptação ao meio 
por meio da associação de comportamentos adquiridos com condicionamento. 
Uma particularização das teses que o positivismo de Comte já havia apresentado.
Nesse sentido, se desenvolveu o princípio de atender ao interesse da sociedade 
integrando a pessoa à vida social através do condicionamento de seu compor-
tamento. Sendo assim, dessa mesma forma tratar os problemas de adaptação 
social. O comportamento observável é o elemento de partida para a compreen-
são de si enquanto humanidade e sua educação.
Evoluir em princípio signiica desenrolar, como se desenrola um 
pergaminho; desenvolver antigamente signiicava desdobrar, como 
se desdobra uma carta. Ambas as palavras signiicam expor alguma 
coisa que estava encoberta. Já se sabia antes de Darwin, certamente, 
que as espécies haviam mudado, embora presumivelmentede acor-
do com um plano. Os psicólogos do desenvolvimento acompanham 
o desenrolar ou desdobrar do comportamento das crianças enquanto 
crescem. Uma criança pode ser “treinada”, no sentido horticultural de 
ser guiada durante o crescimento, mas os fundamentos do que eventu-
almente aparece são de alguma forma predeterminados. Teóricos so-
ciais tais como Hegel e Marx e alguns antropólogos argumentam que 
as culturas também evoluiriam através de uma ordem ixa de estágios 
(SKINNER, 2005, p. 78).
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Oposto a essa ideia está um dos inspiradores da arte surrealista, Sigmund Freud 
(1856 a 1939). O que o médico austríaco desenvolveu foi a representação do 
mundo material por meio de uma lógica subjetiva. Esta, nem sempre consciente 
ao ser humano. A própria hierarquia de valores que construímos aparentemente 
consciente seria, na verdade, iltrada por uma escala pessoal. Nossas experiências 
sensíveis são retrabalhadas dentro do subconsciente, uma espécie de depósito 
de sentimentos reprimidos.
Nos sonhos, no inconsciente se revela e pode expressar na imaginação toda a 
vontade reprimida, ou mesmo, trabalhar as situações vividas que nos ocasiona-
ram traumas.
Na relação entre os sentimentos natos e a ação racional existe uma escola de 
estágios em que são iltrados nossos atos. Aqui a teoria dos três estágios (id, ego e 
superego). O id como a expressão e instinto, o ego como o iltro de sobrevivência e 
adaptação e o superego como instrumento de imposição das exigências coletivas.
O indivíduo ganhou o ponto central das teorias ilosóicas a partir da década 
de 1950. O conhecimento sobre a capacidade de a ação individual conviver com 
as necessidades coletivas acabou por ter um signiicado invertido do que o pensa-
mento ocidental construiu ao longo de sua história. A busca por um ideal social 
agora se centra na máxima da potencialidade individual, como já vinham bus-
cando Pavlov, Skinner e Freud, por exemplo. Assim, como diria Sartre (2010, 
O surrealismo está centrado na imaginação, nos sonhos, no simbolismo e na 
intuição, afastando-se da lógica, do racionalismo, dos causalismos e de tudo 
que constitua um obstáculo à sua livre e plena manifestação e atuação no 
mundo da arte. O Surrealismo tem como principais fontes de inspiração o 
romantismo alemão, a psicanálise freudiana, o esoterismo, a magia, o cubis-
mo e o dadaísmo.
Fonte: Alvarez Ferreira (2013, p. 191).
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p.29), “sou responsável por mim e por todos e crio uma determinada imagem 
de homem que escolho ser; ao escolher a mim, estou escolhendo o homem”, 
revelando em que medida o processo histórico gesta o processo individual e de 
responsabilidade do ser.
Nesta crise entre o todo e o particular, a ilosoia existencialista foi uma 
expressão signiicativa na segunda metade do Século XX. Ninguém a expres-
sou de forma mais intensa que Jean Paul Sartre (1905 a 1980). Fundador de um 
existencialismo que rompe com a dependência do legado racional, Sartre coloca 
sobre a decisão das pessoas a sua capacidade de universalizar o valor, sendo o 
comportamento único, mas a escolha de uma posição humana diante do mundo, 
não por causa de uma estrutura essencialista, mas que parte de escolhas indivi-
duais, como a covardia, por exemplo.
O existencialista quando descreve um covarde declara que este covarde 
é responsável por sua covardia. Ele não é assim por ter um coração, 
um pulmão ou um cérebro de covarde, ele não é assim a partir de uma 
organização isiológica, mas sim porque ele se modelou um covarde 
por meio de seus atos. Não existe temperamento covarde. Há tempera-
mentos que são nervosos, há o “sangue fraco”, como dizem as pessoas, 
ou temperamentos ricos. Mas o homem de sangue fraco não é necessa-
riamente covarde, pois o que deine a covardia é o ato de renunciar ou 
ceder; um temperamento não é um ato; o covarde se deine a partir dos 
atos que realiza. O que as pessoas sentem obscuramente e lhes causa 
horror é o que o covarde que apresentamos é responsável por sua co-
vardia (SARTRE, 2010, p.44). 
Ao desprender a pessoa de sua obrigação com o legado, ao determinar no com-
portamento particular um posicionamento diante de todos, Sartre impregna à 
humanidade de seu maior fardo, a liberdade. Dessa mesma forma, sendo um 
simpatizante das ideias de Nietzsche, declara seu ateísmo considerando que Deus 
é uma afronta à liberdade humana. Nada pode justiicar o ato, a não ser a esco-
lha, airma o ilósofo existencialista francês (SARTRE, 2010).
Algo que nos falta hoje, reconhecer o poder do ato, da ação particular sobre 
o mundo. Nossa covardia diante da necessidade de fazer escolhas e se respon-
sabilizar por elas. Sartre vai além, de assinarmos nossa existência com as ações 
que decidimos tomar, não aquela que tomam por nós. Esta, por sinal, as escolhas 
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que nos são impostas, permitem a muitos viverem em uma “zona de conforto”, 
de eternos vitimados pela imposição autoritária que aceitam para não correrem 
o risco da decisão.
Hannah Arendt (1906-1975), judia e ilósofa, recebe as inluências da Segunda 
Guerra Mundial, o que é possível perceber na escrita que desenvolve ao falar 
sobre natureza e condições humanas no livro “A condição humana” (2010). A 
condição humana é aquela que permite à humanidade efetivar uma vida ativa, 
que nos direciona como uma agulha de bússola, sem determinismos. Uma ‘natu-
reza humana’, segundo ela, nos é impossível de conhecer. Seria possível de ser 
conhecida apenas sob um olhar de um ser metafísico ou entidade superior à 
humanidade. A noção de vida ativa se relaciona com o desdobramento de três 
atividades humanas diferentes: o trabalho, enquanto atividade do próprio corpo 
em seu aspecto biológico; a obra, pensada na transformação da natureza e cria-
ção cultural e a ação, que se espraia para o campo político. Preocupada com essas 
relações, a ilósofa distingue bens de consumo de produtos, que são elementos 
garantidores da durabilidade da própria noção de mundo, de bens de consumo, 
que garantem a sobrevivência, mas que surgem e desaparecem dando-nos fami-
liaridade do mundo. 
Vistos como parte do mundo, os produtos da obra – e não os produtos 
do trabalho – garantem a permanência e a durabilidade sem as quais 
o mundo simplesmente não seria possível. É dentro desse mundo de 
coisas duráveis que encontramos os bens de consumo com os quais a 
vida assegura os meios de sua sobrevivência. Exigidas por nosso corpo 
e produzidas pelo trabalho deste último, mas sem estabilidade própria, 
essas coisas destinadas ao consumo incessante surgem e desaparecem 
num ambiente de coisas que não são consumidas, mas usadas, e às 
quais, à medida em que as usamos, nos habituamos e acostumamos. 
Como tais, elas geram a familiaridade do mundo, seus costumes e há-
bitos de intercâmbio entre os homens e as coisas, bem como entre ho-
mens e homens. O que os bens de consumo são para a vida humana, os 
objetos de uso são para o mundo do homem. É destes que os bens de 
consumo derivam o seu caráter de objeto; e a linguagem, que não per-
mite que a atividade do trabalho produza algo tão sólido e não-verbal 
como um substantivo, sugere a forte probabilidade de que nem mesmo 
saberíamos o que uma coisa é se não tivéssemos diante de nós ‘o traba-
lho de nossas mãos’ (ARENDT, 2010, p. 106). 
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Consideramos, porém, que a maior crise que o pensamento ocidental enfrenta 
está na angústia da sociedade diante de um futuro sem ideologia. A perda de 
uma proposta mais substanciada da existência humana. Alguns pensamentos 
contemporâneos apontam para esse problema com profundidade, como o que 
vimos anteriormente.
Nosso dilema se encontra nos conlitos civis que foram substituídos pelas 
guerras entre nações. Conlitos sem sentido ideológico, mas que promovem a 
morte de milhares de pessoas todos os anos no mundo. A violência gratuita, 
algumas promovidas pelas próprias vítimas, como se procurássemos a morte.
Nada expressa tanto a decadência da ideologia do que o redesenho da 
diplomacia mundial após a Guerra Fria (1989). A formação de conglomerados 
econômicos não se mostrou eiciente diante do rompimento de barreiras que a 
economia mundial desenhou além do mapa dos territórios nacionais. Por sinal, 
as próprias nações reizeram seu sentido. O nacionalismo nunca esteve tão deca-
dente em seu sentido ideológico e tão exaltado no patriotismo de mercado.
A sociedade capitalista e liberal, criticada por muitos, se manteve diante 
da alternativa socialista. A China, após a Guerra Fria, se transformou em uma 
nação plenamente integrada ao capitalismo, vivendo uma ditadura social para 
a maioria de sua população e satisfazendo uma minoria com toda a pompa que 
a vida de consumo material “burguesa” pode gerar.
Nesse mundo que estamos vivendo, desenhar o pensamento humano con-
temporâneo é um desaio que não arriscamos airmar, mas apenas apresentar 
pontos para que você, no momento da leitura, possa compreender melhor o 
impasse que estamos vivendo.
O primeiro autor de quem ressaltamos a obra é Jean Baudrillard (1929 a 
2007), pensador francês que tentava manter sua privacidade e fugir dos excessos 
que sua vida como intelectual lhe impunha, criticou a forma como a humani-
dade está se relacionando com os símbolos em uma sociedade midiática. Para 
ele, a cultura de massas tem se transformado numa desinformação e em uma 
imposição de “verdades prontas”, ou “falsas verdades”.
Essa aproximação aparente que vivemos, onde podemos nos relacionar 
com pessoas distantes, só demonstram nossa falsa ideia de espaço, tempo e sen-
tido. Estamos convivendo com uma construção mercadológica, um produto 
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apresentado, que é construído por meio de uma interatividade. Não nos rela-
cionamos com o real.
Uma das críticas centrais de Baudrillard está na “sociedade de consumo”. 
O papel que o ato de consumir ganhou na relação entre as pessoas diante dos 
objetos (BAUDRILLARD, 1995). Como esses atos se transformaram em uma 
cultura de reconhecimento da dignidade, superando muitas vezes a cidadania. 
Podemos certamente, num primeiro tempo, considerar os objetos em 
si próprios e a sua soma como índice de pertença social, mas é muito 
mais importante considerá-los, na sua escolha, organização e prática, 
como o suporte de uma estrutura global do ambiente circundante, 
que é simultaneamente uma estrutura ativa de comportamento (BAU-
DRILLARD, 1996, 17).
Ter um cartão de crédito é mais signiicativo para a vida em sociedade do que 
ter uma carteira de identidade. O consumo torna-se um modo ativo “de relação 
como modo de atividade sistemática e de resposta global, que serve de base a 
todo nosso sistema cultural” (BAUDRILLARD, 1995, p. 11).
Hans Magnus Enzensberger (1929) - ilósofo, poeta e ensaísta, intelectual 
alemão - é um dos maiores defensores do paciismo. Atualmente tem feito pales-
tras em todo o mundo a procura de defender ações contra a violência propagada 
na sociedade civil. Uma de suas mais importantes obras, “Guerra Civil”, ele apre-
senta uma análise do comportamento humano contemporâneo.
A guerra civil está em andamento, segundo Enzensberger. Uma guerra 
constante e cotidiana, ausente de qualquer fundamento ideológico, em que o 
culto à violência é o seu principal motor. Para ele, o instinto humano está sendo 
acusado e a violência banalizada. Como Baudrillard, considera que a mídia con-
temporânea se mostra como uma arma poderosa para o bem e o mal. Muitas 
vezes propaga falsas ilusões sobre o mundo que pretende aproximar através dos 
meios de comunicação. Pela parabólica se propaga a ideia de “paraísos terrenos”, 
lugares fantásticos, que movimentam migrantes em busca da “terra prometida”.
Esta pessoa perdida por meios de comunicação eletrônicos que propagam 
valores também constrói uma ausência. Esta ausência é a falta de consciência e o 
desejo de não se responsabilizar por nada. Para o ilósofo francês, Pascal Bruckner, 
um crítico do comportamento humano diante da sociedade de consumo, a viti-
mização tem sido o discurso oicial do mercado, uma forma de induzir a pessoa 
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a não sentir culpa pelos seus atos. Associada à infantilização, outra crítica feita 
por Bruckner à humanidade contemporânea, a pessoa vitimada se sente no 
direito de tudo sem ter que arcar com as consequências de suas escolhas. Assim 
como Baudrillard e Enzensberger, Pascal Bruckner faz a crítica ao que se pro-
paga como conteúdo na mídia contemporânea. Segundo ele, não estamos atrás 
de conhecer outras pessoas na mídia eletrônica, mas estamos atrás de cúmpli-
ces para nossos interesses mesquinhos.
Considerações Finais
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Somos uma civilização superior? Em alguns aspectos a nossa modernização é 
inquestionável. O que aprimoramos nas técnicas de comunicação, o conheci-
mento que aprofundamos em diversas áreas da vida humana podem ser notadas 
no dia a dia, infelizmente, nem sempre, na vida de todas as pessoas.
Talvez essa ainda seja a principal polêmica da existência contemporânea: o 
desenvolvimento cientíico que permite o aprimoramento técnico que, por sua 
vez, garante as condições materiais de melhora da qualidade de vida. Mas essa 
condição não é universal. Essa desigualdade se aprofunda à medida que a dife-
rença mantida pela sociedade de mercado acaba por condenar o ser humano 
sem permitir o seu aprimoramento dentro da vida social.
A chamada modernidade é pouco compreendida pela grande maioria de nós 
como uma condição contraditória. Estamos com as discussões sobre os temas 
sociais focados na particularidade, nos anseios individuais. Parece não haver um 
estabelecimento com a racionalidade a relação das pessoas com suas responsabi-
lidades sociais, contudo, a educação está atravessada por esses elementos e pode 
ajudar a humanidade com o ritmo dos saberes sem ignorar as marcas dos passado.
Ao encerrarmos esta unidade, se percebe que os temas que norteiam as dis-
cussões sobre a existência humana, com uma proposta de engajamento e de 
organização voltada à coletividade, agora se estabelecem em um particularismo 
“raso” e sem comprometimento.
O desaio para quem educa é maior, pois a quem necessita do conhecimento 
para compreender que precisa receber a educação é uma prerrogativa delicada, 
porque existe uma ideia de plenitude de “direitos”, mas sem obrigações, além de 
uma prática crescente do consumo pelo consumo. A ciência ainda é fundamental 
para mudarmos essa condição. No entanto, um dosdesaios de hoje é demons-
trar a importância para a vida para a humanidade.
126 
1. (ENADE/2014) Da visão dos direitos humanos e do conceito de cidadania fun-
damentado no reconhecimento das diferenças e na participação dos sujeitos, 
decorre uma identiicação dos mecanismos e processos de hierarquização que 
operam na regulação e produção de desigualdades. Essa problematização ex-
plicita os processos normativos de distinção dos alunos em razão de caracterís-
ticas intelectuais, físicas, culturais, sociais e linguísticas, estruturantes do mode-
lo tradicional de educação escolar (BRASIL, MEC. Política Nacional de Educação 
Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, 2008, p. 6 [adaptado]).
As questões suscitadas no texto ratiicam a necessidade de novas posturas docen-
tes, de modo a atender a diversidade humana presente na escola. Nesse sentido, 
no que diz respeito a seu fazer docente frente aos alunos, o professor deve:
I. Desenvolver atividades que valorizem o conhecimento historicamente 
elaborado pela humanidade e aplicar avaliações criteriosas com o im de 
aferir, em conceitos ou notas, o desempenho dos alunos.
II. Instigar ou compartilhar as informações e a busca pelo conhecimento de 
forma coletiva, por meio de relações respeitosas acerca dos diversos posi-
cionamentos dos alunos, promovendo o acesso às inovações tecnológicas.
III. Planejar ações pedagógicas extraescolares, visando ao convívio com a di-
versidade; selecionar e organizar grupos, a im de evitar conlitos.
IV. Realizar práticas avaliativas que evidenciem as habilidades e competências 
dos alunos, instigando esforços individuais para que cada um possa melho-
rar o desempenho escolar.
V. Utilizar recursos didáticos diversiicados, que busquem atender a necessi-
dade de todos e de cada um dos alunos, valorizando o respeito individual 
e coletivo.
É correto apenas o que se airma em:
a. I e III.
b. II e V.
c. II, III e IV.
d. I, II, IV e V.
e. I, III, IV e V. 
2. Hannah Arendt (1906-1975), ilósofa contemporânea, desenvolve uma relação 
entre natureza e condição humana, o que nos faz pensar sobre a ideia de es-
sencialidade e das relações que permeiam a vida humana nos diversos campos 
sociais. Frente a isso, descreva quais as diferenças, para a autora, entre na-
tureza e condição humana.
127 
3. Skinner em Tecnologia do ensino (1972) observa que os comportamentos dos 
organismos individuais são previsíveis fora do contexto estatístico e que prever 
as respostas só seria possível graças a uma série de inferências. Sobre esses 
conceitos assinale a alternativa correta:
a. O comportamento, segundo ele, no campo da aprendizagem pode ser ob-
servado conforme duas principais melhorias: a de causa e efeito e o avanço 
genético.
b. Skinner cria o que chama de máquinas de ensinar, que eram estruturas me-
cânicas desenvolvidas para auxiliar na aprendizagem com etapas especíi-
cas.
c. A pessoa que educa está para além de um conceito de monitoria, mas par-
te de uma estrutura familiar em que se adequa a um universo de ensino-
-aprendizagem envolta nas relações de empatia.
d. Skinner, similar a Pavlov, acredita na impossibilidade de moldar um com-
portamento, seja de organismos simples ou mesmo mais complexos, como 
o humano.
e. A relação entre comportamento e aprendizagem educacional inexiste, 
uma vez que o processo de se aprender e apreender algo é parte funda-
mental que estrutura na dinâmica platônica do Mundo das Ideias.
4. O Iluminismo, importante fenômeno humano europeu em que a racionalida-
de cientíica é a prerrogativa para o pensamento, inluenciou sobremaneira as 
diversas áreas do conhecimento. Sobre esse período é correto airmar que:
a. Os pensadores considerados ‘enciclopedistas’ marcaram seus pensamentos 
por conseguir unir as pesquisas cientíicas junto ao pensamento teológico, 
o que acabou por provocar a Reforma Protestante.
b. Jean-Jacque Rousseau (1712-1778) escreveu a obra “Contrato Social, em 
que estabeleceu os princípios da liberdade coletiva barrada pela relação 
contratual com o estado. Ao submeter a liberdade coletiva ao estado, as 
pessoas cedem a sua liberdade limitando. 
c. Tanto Marx como Engels estiveram presentes na escrita da obra mais em-
blemática do Iluminismo, a saber, a “Enciclopédia”.
d. Diderot (1713 a 1784) foi o responsável pela maior parte das obras contidas 
na “Enciclopédia”, tendo seu trabalho que se espraiou para temas ligados à 
política e religião. 
e. O Iluminismo, conhecido como Século das Luzes, pouco inluenciou o de-
senvolvimento epistemológico (cientíico) na Europa, como se pode verii-
car com as leituras históricas.
128 
5. Jean Baudrillard (1929 a 2007) faz críticas pontuais em relação à sociedade con-
temporânea e a relação com os símbolos em uma sociedade midiática, entre 
elas, a “sociedade de consumo”. Explique o que seria essa crítica do autor.
129 
O recorte do ensaio a seguir nos leva à relexão de como o consumo e a mercadoria se 
constituem como fatores de relações sociais que predomina entre as pessoas, se conec-
tando com o conceito de crise do sistema capitalista e ampliando o conceito de alienação.
O ‘falso socialmente necessário’
As pessoas, aqui no sentido de humanidade, são o que elas fazem. Os seres humanos 
são as relações sociais que estabelecem entre si; os indivíduos são as conexões que es-
tabelecem com a história da qual são partícipes. Como vivemos em uma sociedade que 
produz mercadorias, fazemos a nós próprios “guardiões de mercadorias”. Os da classe 
dominante são “guardiões do capital”, os assalariados são guardiões da sua força de tra-
balho, a única mercadoria que têm para vender. Todavia, como a riqueza do patrão é 
produzida pelo trabalhador, o capital da burguesia nada mais é que a riqueza produzida 
pelo operário e, assim, o capital termina revelando-se o que de fato é: a força de trabalho 
convertida em propriedade do burguês. No fundo, portanto, o burguês e o proletário 
são guardiões da mesma mercadoria sob formas diversas. Isto que vale para o burguês 
e o operário vale para todos os trabalhadores, entre eles os assalariados em geral. E vale 
também para os marginalizados e desempregados: são guardiões que são miseráveis 
por não conseguirem vender suas mercadorias. As mercadorias têm uma propriedade 
curiosa. Tal como Midas, que transformava em ouro tudo o que tocava, as mercadorias, 
ao serem produzidas, convertem os homens em sua imagem e semelhança. As mercado-
rias não “podem ir ao mercado” por si próprias, não podem se trocar umas pelas outras a 
não ser que os seres humanos as troquem. Portanto, para que as mercadorias “se reiram 
umas às outras como mercadorias, é necessário que os seus ‘guardiões’ se relacionem 
entre si como pessoas cuja vontade reside” nas mercadorias, de tal modo que troquem 
suas mercadorias segundo as vontades do vendedor e do comprador. Mas, para que 
as pessoas se relacionem enquanto vendedores e compradores, é preciso, ainda, que 
se reconheçam “reciprocamente como proprietários privados. Esta relação jurídica, cuja 
forma é o contrato, desenvolvida legalmente ou não, é uma relação de vontade, em que 
se relete a relação econômica” (Marx, 1983, p. 79). Quando a economia força o indivíduo 
a vender e comprar mercadorias para viver, as relações de concorrência moldam até 
mesmo a ‘vontade’ dos indivíduos: é assim que vivemos em função do dinheiro, que é a 
mercadoria das mercadorias, a mercadoria universal.
Fonte: Lessa (2006, p. 231-246). 
MATERIAL COMPLEMENTAR
Sociedade de Consumo
Jean Baudrillard
Editora: Almedina
Sinopse: obra constitui uma das principais rel exões para a socio-
logia contemporânea, em que Baudrillard analisa incisivamente um 
dos fenômenos mais nevrálgicos das sociedades desenvolvidas da 
segunda metade do século XX. Ele revela como o consumo huma-
no substitui os mitos tribais, concedendo um novo, além de impli-
car na moral do mundo contemporâneo.
REFERÊNCIAS
131
ARENDT, H. A Condição Humana. Tradução de Roberto Raposo; Revisão técnica:Adriano Correia. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2010. 
Alvarez Ferreira, A. E. Dicionário de imagens, símbolos, mitos, termos e concei-
tos Bachelardianos [livro eletrônico]. Londrina: Eduel, 2013.
BARROS, L. A. A ação humana nos caminhos de Max Weber e Hannah Arendt. Edu-
cação em Foco, Minas Gerais, Ano 13, n. 16, p. 147-161, 2010.
BAURDRILLARD, J. A Sociedade de Consumo. Tradução de 
Arthur Morão. Rio de Janeiro: Elfos Editora, 1995.
BAUDRILLARD, J. Sociedade do consumo. Lisboa: Edições 70, 1995.
BAUDRILLARD, J. Função-signo e lógica de classe. In: A Economia Política dos Sig-
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GABARITO
133
1. B.
2. A ideia central é que você compreenda que a condição humana seria aque-
la em que se efetiva a vida ativa, uma forma de direcionamento em que nos 
orientamos, a natureza humana, por sua vez, não é possível de ser conhecida 
pois somos partes de um todo, logo, apenas um ser acima de nós poderia ter 
condições de saber qual nossa verdadeira natureza.
3. B.
4. D.
5. Baudrillard, ao falar sobre “sociedade de consumo”, chama a atenção do papel 
que o ato de consumir ganhou na relação humana, como esses atos se transfor-
maram em uma cultura de reconhecimento da dignidade, superando, muitas 
vezes, a cidadania. 
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Professor Me. Gilson Aguiar
Professor Me Rodrigo Pedro Casteleira
A HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO 
NO BRASIL: UMA AUSÊNCIA 
SENTIDA
Objetivos de Aprendizagem
 ■ Compreender as condições em que a educação foi implantada na 
colônia e o seu signiicado em uma sociedade caracterizada pelos 
interesses da metrópole portuguesa.
 ■ Avaliar as consequências da educação estruturada na colônia para a 
sociedade atual.
 ■ Estabelecer a relação entre a educação na colônia e após o processo 
de independência com a instituição da monarquia.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
 ■ Os primeiros tempos
 ■ Educação laica, o abandono
 ■ Da colônia ao império
INTRODUÇÃO
Caro(a) aluno(a), esta unidade é um relato da história da educação no Brasil 
tendo por princípio o Brasil Colônia até chegar ao Brasil Império, considerando 
a educação jesuítica até passar para o processo laico, iniciado com o Marquês de 
Pombal. Percorremos as políticas educacionais brasileiras, se é que elas existi-
ram, mas o que importa é procuramos dar condições para que você conheça os 
caminhos que a educação percorreu ao longo da história do país.
Partindo do entendimento dos interesses que levaram o Estado Nacional 
Português a instalar um processo de colonização associado também à conversão 
do elemento nativo e a educação dos primeiros colonizadores a uma doutrina-
ção dirigida pela Igreja Católica, em pleno período de guerras religiosas que 
assolaram a Europa. Esse processo de colonização mesclada à catequização só 
foi possível graças à Ordem Jesuítica, orientada pelas mãos de Inácio de Loyola. 
Passamos pelo completo abandono, ainda durante o período colonial, do 
Período Pombalino até a emancipação e a formação do Estado Nacional Brasileiro, 
constituído a fórceps pela transferência da corte portuguesa, o que não vai con-
tribuir para uma melhora das condições de ensino nos primeiros anos após a 
independência, mas que já traz algumas mudanças trazidas da Europa por inlu-
ência das ideias iluministas.
A lacuna educacional manteve-se até meados do Império (1822 a 1889) 
quando a política educacional começou a ser desenhada, sem atender à grande 
maioria da população, característica que vai dominar até a Primeira República 
(1889 a 1930). Contudo, a educação não foi destinada para toda a população, 
mas à elite, como constante tentativa de manter os interesses da elite a salvo, 
além de deixar de lado mulheres, pessoas escravizadas e indígenas, revelando a 
postura de permanência de dominação. Esta Uidade revela uma ‘fotograia’ do 
passado para que possamos compreender os passos do presente dentro da edu-
cação brasileira.
Boa leitura!
Introdução
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OS PRIMEIROS TEMPOS
Ao desembarcar no território no qual 
a colônia portuguesa viria a se organi-
zar, os primeiros representantes da coroa 
europeia estabeleceram as relações de ocu-
pação e organização das primeiras unidades 
produtivas, assim como os primeiros povo-
amentos de interesse luso.
É preciso considerar que não ocorreu 
uma padronização no território colonial, em 
algumas regiões se estabeleceram os centros 
de interesses, as plantations, unidades pro-
dutoras fundadas na produção extensiva, 
com mão de obra escrava e monocultora.
O trabalhoescravizado se tornou um 
dos principais fundamentos da área colonial 
portuguesa (o Brasil), o que, por interesse 
de concentração de riqueza derivada das prá-
ticas mercantis, através do tráico de escravos, viria ser o africano. Dessa forma, 
as pessoas nativas, indígenas, deveriam ser poupadas do regime compulsório de 
trabalho, pelo menos em parte. Uma das decisões tomadas pelo governo portu-
guês foi a implementação da Ordem Jesuíta no território colonial, o que ocorreu 
em terras coloniais da Espanha e da França, no mesmo período.
Bom lembrar que a Ordem Jesuíta foi criada por Inácio de Loyola, um nobre 
e militar espanhol que lutou na expulsão dos Mouros da Península Ibérica (século 
XV). A Ordem é formada com o espírito militar da expansão cristã, o que já tinha 
sido praticado nas cruzadas. A Ordem somada à Inquisição representavam um 
grandioso aparato da Contra-Reforma católica, na tentativa de barrar o avanço 
tanto de mouros como de protestantes (LUZURIAGA, 2001).
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A reforma protestante ganhava terreno na Europa, o que levou a igreja cató-
lica a se articular para não perder mais iéis, travando lutas tanto internas como 
externas, o que gerou a chamada Contra-Reforma, que duraria cerca de dois 
séculos. A forma encontrada, então, para barrar essas perdas se alicerçaram em 
dois órgãos, a Companhia de Jesus e o Concílio de Trento (LUZURIAGA, 2001).
Não estava em jogo apenas o número de iéis que se ganha ou perde, mas 
também de teorias. O projeto era o da retomada anterior ao humanismo, como 
tentativa de barrar a racionalidade como condutora das ações humanas, deixan-
do-a submissa aos valores religiosos. 
No Brasil, assim como nas colônias católicas onde a Ordem se estabeleceu, a 
prática dos padres jesuítas era voltada à conversão das pessoas nativas e instru-
ção da cristandade. Na Europa, a Ordem icou com o controle das instituições 
de ensino como universidades e colégios, servindo de braço do Papa para man-
ter uma educação conservadora.
Durante a Reforma Protestante, no século XVI, a Ordem passou a ser o ins-
trumento de combate à expansão do luteranismo e calvinismo. O interesse era 
garantir a permanência dos iéis na Igreja e propagar o catolicismo nas terras colo-
niais para evitar a propagação do protestantismo. Os reis católicos adotaram o 
monopólio religioso e a própria Ordem Jesuíta como instrumentos de seu poder.
A Companhia de Jesus foi quem introduziu a educação ocidental em terri-
tório colonial. Com seu caráter conservador buscou a formação religiosa com 
ensino de lógica, latim, canto e jogos lúdicos, em que os princípios morais do 
cristianismo norteavam os conteúdos. O professor, o padre jesuíta, era o elemento 
“Nascida oicialmente no começo do século XIII e durando até o século XIX, 
a Inquisição dedicou-se, dizem eles, a semear o terror e a embrutecer os es-
píritos. Adotando como método de trabalho a pedagogia do medo, reinou, 
de modo implacável, para impor aos povos uma ordem, a sua ordem, que 
não admitia divergências, nem sequer hesitações”.
Fonte: GONZAGA (1993, p. 17).
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principal da educação. Tinha sobre sua responsabilidade a preparação diária de 
materiais de educação e correção de atividades, o que exigia demasiadamente 
dos mestres da Ordem.
Mas entre indígenas, a resistência da educação jesuítica também se fazia 
presente. Muitos nativos fugiam dos aldeamentos para o interior da mata, pre-
ferindo a aventura, a vida nômade, os combates, ou mesmo a educação familiar 
que os indígenas recebiam de seus familiares. O encontro entre a cultura oci-
dental e indígena não foi harmônica. Muitos padres jesuítas acabaram mortos 
na tentativa de constituir uma unidade catequética, como menciona a historia-
dora Maria Luisa Santos Ribeiro.
Entre as diretrizes básicas constantes no Regimento, isto é, na nova po-
lítica ditar por D. João III (17-12-1548), é encontrada uma, referente 
à conversão dos indígenas à fé católica pela catequese e pela instrução 
(RIBEIRO, 1992, p. 19).
Está bem deinida a que modelo de educação o Brasil Colônia tinha por projeto: 
“à política colonizadora dos portugueses” (RIBEIRO, 1992, p. 20). A educação 
da elite colonial também se fez pelas mãos dos jesuítas. A criação de seminários 
e colégios nas principais cidades da colônia se constituiu como centro de for-
mação de uma elite culta. A educação se dava em tempo integral, e apenas 10% 
dos homens livres teriam acesso a esta educação, que durava onze anos. Os que 
se destacavam poderiam continuar seus estudos na Europa, já que nos trópicos 
portugueses não existia ensino superior, 20% dos formados nos seminários e 
colégios inacianos seguiam esse destino.
Até 1759, a Ordem Jesuíta construiu uma poderosa rede de ensino na colô-
nia, com seminários nas principais cidades coloniais e um imenso número de 
missões e aldeamentos em diversas partes do território brasileiro. Para se ter 
uma ideia da dimensão que Ordem representava, ela tinha 670 membros espa-
lhados pelo território português nos trópicos e, em sua região de maior atuação, 
a Bacia do Prata, ela tinha aliciado 150 mil nativos. A Ordem detinha um con-
texto especíico de interesse e a quem servir.
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Num contexto social com tais características, a instrução, a educação 
escolarizada só podia ser conveniente e interessar a esta camada diri-
gente (pequena nobreza e seus descendentes) que, segundo o modelo 
de colonização adotado, deveria servir de articulação entre os interes-
ses metropolitanos e as atividades coloniais (RIBEIRO, 1992, p. 22).
Aos jesuítas está relacionada uma série de ações que foram marcos na história 
colonial brasileira. Foram eles que iniciaram o estudo da língua indígena com 
a inalidade de catequese e apresentaram as primeiras classiicações dos diale-
tos nativos, o guarani e o jê. Também resgataram, por meio de obras literárias, o 
cotidiano do território colonial e a análise dos problemas que envolviam o ter-
ritório colonial.
Os primeiros jesuítas a se instalarem na colônia foram Manoel da Nóbrega 
e José de Anchieta. Nóbrega veio com a instalação do Governo Geral na colô-
nia (1549), já Anchieta chegou ao Brasil com o governador Duarte da Costa, 
em 1553. Os planos de estudo da Ordem (1570) não encontraram terreno fértil 
para seu desenvolvimento, uma vez que os colégios jesuíticos tinham grandes 
diiculdades para manter as classes de gramática latina funcionando. A oferta 
educacional se resumia, no início da colonização, ao ensino conhecido como 
elementar, oqual se aprendia a escrever, ler e fazer contas e ainda alguns cursos 
da área das ciências humanas, como retórica e classe gramatical.
A estrutura pedagógica jesuítica no início do processo de colonização esteve 
par e passo às elaborações das Constituições e do Ratio Studiorum, implicando em 
relações antagônicas das práticas. A Ratio Studiorum consistia em um método 
educacional, não como organização pedagógica, mas estando mais para um con-
junto de práticas e condutas positivas. Vejamos, por exemplo, o que o Ratio fala 
sobre o procedimento de castigos físicos:
Não seja precipitado no castigar nem demasiado no inquirir; dissimule 
de preferência quando o puder sem prejuízo de ninguém; não só não 
inlija nenhum castigo físico (este é ofício do corretor) mas abstenha-se 
de qualquer injúria, por palavras ou atos não chame ninguémse não 
por seu nome ou cognome; por vezes é útil em lugar do castigo acres-
centar algum trabalho literário além do exercício de cada dia; ao Prefei-
to deixe os castigos mais severos ou menos costumados, sobretudo por 
faltas cometidas por fora da aula, como a ele remeta os que se recusam 
aceitar os castigos físicos [...] principalmente se forem mais crescidos 
(RATIO, 1952, p. 122-123, J- 40). 
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A proposta pedagógica era a de formar um ‘novo homem’ pautada no humanismo, 
com a intenção de garantir uma criticidade e independência do pensamento, 
porém, na prática, o que aconteceu foi contrário, pois os dogmas religiosos con-
duziram à educação à tradicionalidade (LUZURIAGA, 2001).
Enquanto na Europa os documentos para a educação eram elaborados para 
que a educação fosse ao encontro dos ideários iluministas, no Brasil as práti-
cas promovidas pelas missões eram opostas. Mas não podemos ter uma visão 
romantizada da presença jesuítica no Brasil, uma vez que era uma ordem que 
atendia a um ideal religioso e político à sua época, tanto que a educação não era 
pensada de forma igualitária a toda e qualquer pessoa, como já mencionado. 
Existia pontualmente uma forma de educação destinada a uma determinada 
categoria de pessoa.
A educação proissional (trabalho manual), sempre muito elementar 
diante das técnicas rudimentares de trabalho, era conseguida através 
do convívio, no ambiente de trabalho, quer de índios, negros ou mesti-
ços que formavam a maioria da população colonial.
A educação feminina restringia-se a boas maneiras e prendas domésticas.
A elite era preparada para o trabalho intelectual segundo um modelo 
religioso (católico), mesmo que muitos de seus membros não chegas-
sem a ser sacerdotes (RIBEIRO, 1992, p. 25).
O projeto pedagógico educacional da época para a formação da elite colonial 
possuía objetivamente inalidades para a manutenção do sistema de domínio 
da Coroa, marcada pela ‘rigidez’ no modo de pensar, conforme aponta Ribeiro 
(1992), o que implica em como se interpreta a própria realidade.
A formação da elite colonial em tais moldes adequa-se quase que com-
pletamente à política colonial, uma vez que:
a. a orientação universalista jesuítica baseada na literatura antiga e 
na língua latina;
b. a necessidade de complementação dos estudos na metrópole (Uni-
versidade de Coimbra);
c. o privilégio do trabalho intelectual em detrimento do manual 
afastavam os alunos dos assuntos e problemas relativos à reali-
dade imediata, distinguiam-se da maioria da população que era 
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escrava e iletrada e alimentava a ideia de que o mundo civiliza-
do estava “lá fora” e servia de modelo. Os “letrados” acabavam 
por rejeitar não apenas esta maioria, e exercer sobre ela uma 
eiciente dominação, como também a própria realidade colo-
nial, contribuindo para a manutenção deste traço de dominação 
externa e não para sua superação (RIBEIRO, 1992, p. 27-28). 
É importante mencionar que, de diversos colégios jesuíticos saíram intelectuais 
que iguram como importantes, tais como Descartes, Rousseau e Montesquieu, 
no entanto, não podemos nos furtar a dizer que todo projeto educacional atende 
a princípios políticos, bem como as distinções entre o que ocorria na Europa e 
nas Américas. No Brasil surgem os primeiros indícios de uma ilosoia nativa, 
mas colada ainda à teologia. As primeiras escritas da considerada ilosoia bra-
sileira são inluenciadas por Aristóteles, Tomás de Aquino e Duns Scotus. 
Aqui, no Brasil, alguns padres da Ordem marcaram a literatura brasileira 
como o Padre Antônio Vieira (1608 a 1697). “Os Sermões”, uma coletânea de 
documentos escritos durante a sua presença no nordeste brasileiro, faz uma 
interpretação dos trabalhos da ordem e crítica à conduta de elementos coloniais.
O elemento do ar representa o estado da nobreza, não por ser a esfera 
da vaidade, mas por ser o elemento da respiração, porque os idalgos de 
Portugal foram o instrumento felicíssimo por que respiramos, deven-
do este reino eternamente à resolução de sua nobreza os alentos com 
que vive, os espíritos com que se sustenta. Finalmente, o elemento da 
água representa o estado do povo: Aquae sunt populi – diz um texto do 
Apocalipse – e não como dizem os críticos, por ser elemento inquieto 
e indômito, que à variedade de qualquer vento se muda, mas por servir 
o mar de muitos e mui proveitosos usos à terra, conservando os comér-
cios, enriquecendo as cidades, sendo o melhor vizinho que a natureza 
deu às que amou mais (VIEIRA, 1957, p. 32-33).
Vieira se destaca por receber sua formação no Brasil, o que resulta em uma escrita 
cheia de emoção religiosa e relexiva sobre o conhecimento, mas sem deixar de 
lado uma estrutura hierárquica entre a Metrópole e a Colônia, como na citação 
anterior. Para o jesuíta, nosso primeiro passo ativo deve ser o de auto-conheci-
mento. Essa produção nativa signiica defender uma ilosoia luso-brasileira, sem 
reprodução da ilosoia portuguesa no Brasil, mas uma possibilidade de abertura 
para a emancipação da própria razão (CERQUEIRA, 2011).
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Um dos principais objetos de ataque de Vieira foi a ação dos bandeirantes 
em relação aos indígenas. A “defesa” de indígenas, por sinal, é uma das con-
trovérsias na história dos padres da Companhia de Jesus. A conduta em sua 
defesa está aliada à empresa de catequese que retirava indígenas de sua organi-
zação original. As missões, ou reduções, como eram chamadas as áreas que os 
padres constituíam em meio à mata para estabelecer sua “obra” também é vista 
como uma violência contra pessoas nativas. Se o bandeirante capturava indíge-
nas para o trabalho escravo, os jesuítas os destruíam pela imposição da cultura 
ocidental cristã.
O grande patrimônio estabelecido pelos jesuítas na colônia mostrou a eici-
ência da ordem e signiicou um risco para a coroa portuguesa. O fortalecimento 
da ordem dava aos padres poderes excessivos em territórios coloniais portugue-
ses. Ficava cada vez mais claro que os nativos catequizados estavam mais ligados 
aos interesses dos padres do que da coroa.
Em algumas regiões onde a ordem se estabeleceu, a prosperidade trazia 
benefícios maiores à Igreja do que a Portugal. Uma dos exemplos foi a região 
da Bacia do Prata, que era área de fronteira com as colônias da Espanha, objeto 
de disputa entre os dois reinos, onde os jesuítas estavam presentes por todas as 
margens dos rios da Bacia (rios Paraguai, Uruguai, Paraná e Prata). Os interes-
ses das nações ibéricas estavam ameaçados pela presença da instituição religiosa 
que tinha em seu poder milhares de nativos.
Mesmo em Portugal, os interesses dos jesuítas e da coroa estavam em conlito. 
Opositores de Pombal, o ministro do Rei Dom José, a Ordem se opunha às deci-
sões do ministro. Acostumados a terem inluência sobre a decisão do estado, os 
padres acabaram sendo acusados de um atentado contra o Marquês de Pombal. 
Tendo sido culpados ou não, os jesuítas foram expulsos.
Mas, em 1759, o ministro de Portugal, administrador da Coroa, o Marquês 
de Pombal, expulsou a Ordem do território lusitano e de suas colônias. A prá-
tica do despotismo esclarecido do Marquês, aliada a sua intenção de concentrar 
o poder, o fez se confrontar com os clérigos da ordem inaciana. Essa medida 
teve um importante efeito na colônia, rompeu uma política educacionalque, 
bem ou mal, se consolidava na sociedade brasileira. Mas não apenas isso. O 
poder econômico que possuíam deveria ser devolvido ao governo e educavam 
Educação Laica, o Abandono
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apenas com o interesse em uma “ordem religiosa e não dos interesses do país” 
(RIBEIRO, 1992, p. 34).
Em diversos casos houve resistência da Ordem em se retirar. No Brasil, a 
Revolta ou Revolução Guaranítica demonstrou isso. Jesuítas organizaram mis-
sões na Região do Prata que se levantaram contra a autoridade portuguesa. Os 
missionários foram eliminados e os nativos que sobreviveram foram obrigados 
a retornarem à loresta ou icarem à mercê dos traicantes de escravos.
Vale a pena lembrar que a primeira biblioteca da colônia pertenceu à Ordem 
Jesuíta e estava instalada no Seminário de Olinda, em Pernambuco. O destino 
dessa biblioteca, após a expulsão dos inacianos, foi cruel. Diante da negativa de 
compra, ou de quem quisesse os livros, eles se tornaram papel de embrulho para 
comerciantes da cidade pernambucana.
EDUCAÇÃO LAICA, O ABANDONO
Com a saída dos jesuítas, a educação passa a 
ser responsabilidade do Estado Português, o 
qual não cumpriu com interesse sua função. 
Contudo, Portugal regulamentou diretrizes 
para a prática educacional que deveria ser 
executada por professores, mestres, contrata-
dos pelo estado. Poucos se interessaram pela 
tarefa, muitos que receberam para ministrar 
aulas não cumpriram sua função. O Marquês 
de Pombal tinha preocupações, conforme 
aponta Carvalho (1978), sobretudo no tocante 
à reforma da economia portuguesa, tanto que 
cria um agrupamento em torno do comércio.
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Pombal antes de pensar na formação dos teólogos, canonistas, advo-
gados e médicos – problema que não foi estranho aos propósitos do 
gabinete de D. José I – cuidava preliminarmente de amparar o trabalho 
econômico por intermédio da criação de uma escola destinada a for-
mar a “elite” indispensável ao progresso inanceiro das empresas e dos 
grupos que a política monopolista do novo governo planejara e orga-
nizara, ao pretender motivar o acúmulo de riquezas individuais de tal 
forma que as novas condições econômicas melhor pudessem satisfazer 
aos reclamos dos interesses estatais (CARVALHO, 1978, p.43).
Além disso, Pombal defende a ideia de que a Companhia de Jesus foi um empe-
cilho para que as ideias iluministas se efetivassem em Portugal e na Colônia, 
como já acontecia no restante da Europa. Ele ‘compra’ as ideias iluministas e as 
utiliza, contudo, mais no âmbito da forma do que na essência, na reorganização 
da educação. A Universidade de Coimbra está aquém do mundo ocidental exa-
tamente por causa do período em que icou nas mãos de jesuítas, necessitando 
urgentemente de modernização para tentar se aproximar um pouco do centro 
principal europeu da época: a Inglaterra (de 1680 a 1720) (RIBEIRO, 1992, p. 33).
(...) marcando o divisor das águas entre a pedagogia jesuítica e a orien-
tação nova dos modeladores dos estatutos pombalinos de 1772, já apa-
recem indícios claros da época que se deve abrir no século XIX e em 
que se defrontam essas duas tendências principais. Em lugar de um 
sistema único de ensino, a dualidade de escolas, umas leigas, outras 
confessionais, regidas todas, porém, pelos mesmos princípios; em lugar 
de um ensino puramente literário, clássico, o desenvolvimento do en-
sino cientíico que começa a fazer lentamente seus progressos ao lado 
da educação literária, preponderante em todas as escolas; em lugar da 
exclusividade de ensino de latim e do português, a penetração pro-
gressiva das línguas vivas e literaturas modernas (francesa e inglesa); 
e, ainal, a ramiicação de tendências que, se não chegam a determinar 
a ruptura de unidade de pensamento, abrem o campo aos primeiros 
choques entre as idéias antigas, corporiicadas no ensino jesuítico, e a 
nova corrente de pensamento pedagógico, inluenciada pelas idéias dos 
enciclopedistas franceses, vitoriosos, depois de 1789, na obra escolar da 
Revolução (AZEVEDO, 1976, p. 56-57).
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Os materiais didáticos eram impressos pela coroa através da Imprensa Régia. 
Neste momento surge o ensino público, voltado para formar o indivíduo “inan-
ciado pelo e para o Estado” (RIBEIRO, 1992, p. 34), além de regras especíicas 
para o funcionamento das instituições, do corpo docente e de obras lícitas ou 
ilícitas, segundo o Alvará de 28 de junho de 1759.
O Alvará de 28-6-1759 criava o cargo de diretor geral dos estudos, de-
terminava a prestação de exames para todos os professores, que passa-
ram a gozar do direito de nobres, proibia o ensino público ou particular 
sem licença do diretor geral dos estudos e designava comissários para o 
levantamento sobre o estado das escolas e professores. 
Em cumprimento a ele, ainda neste mesmo ano foi aberto, no Brasil, 
um inquérito com o im de veriicar quais os professores que leciona-
vam sem licença e quais usavam livros proibidos. Foram realizados 
concursos para provimento das cátedras de latim e retórica na Bahia, o 
que parece ter havido também no Rio. Foram enviados dois professores 
régios portugueses para Pernambuco (RIBEIRO, 1992, p. 34).
O projeto de modernização da Reforma Pombalina está explícito, porém não 
podemos esquecer que quem lecionava na época havia recebido sua formação e 
prática do sistema jesuítico, o que não mudou foi a preocupação em formar uma 
elite mais eiciente em se articular para manter os interesses da classe dominante 
portuguesa (RIBEIRO, 1992). 
Nas grandes capitais, a educação foi direcionada aos ilhos de fazendeiros, 
senhores de engenho e também de funcionários do estado. O número de fre-
quentadores das escolas representou um quinto da população de homens livres.
Mesmo entre as famílias de elite agrária, não existia um interesse em formar 
ilhos e ilhas, a herança das terras e as práticas das lavouras eram marcadas por 
relações brutas aprendidas na lida com o trabalho, não nos estabelecimentos de 
ensino. Os poucos que conseguiam se formar, lembrando que a educação formal 
era destinada aos homens e não às mulheres, tinham posição social de privilé-
gio e, mais ainda, os que conseguiam ingressar em uma universidade europeia. 
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Gilberto Freyre (1900-1987), um historiador que tem um papel importante 
ao ‘mapear’ o Brasil e a identidade brasileira, chama a atenção para a postura 
social que a mulher era enquadrada no século XIX, mas que já era paradigma 
de séculos anteriores: a sinhá-moça, que era desposada entre treze e quinze 
anos de idade, “abafadas sob as carícias de maridos dez, quinze, vinte anos mais 
velhos”, esposos de carreira de bacharéis e de escolha do pai: senhores de enge-
nho, comerciantes, médicos ou oiciais (FREYRE, 2006, p. 423).
Em uma economia fundada no trabalho escravizado, em que a produção agrí-
cola para o mercado externo não implicava na qualiicação de mão de obra, as 
baixas técnicas de produção dos engenhos se mantiveram por séculos no Brasil 
sem qualquer alteração. Nesse ambiente, também estão as roças de subsistência, 
conduzidas por pequenos produtores com trabalho familiar. Em nenhuma des-
sas lavouras háa necessidade de especialização do trabalho.
Vamos perceber que a necessidade de trabalhadores mais qualiicados se 
dava em setores restritos da sociedade. Os cargos administrativos do estado 
português exigiam uma mão de obra mais qualiicada, mas esta era importada 
de Portugal. Poucos eram os ilhos da elite que atingiam uma formação educa-
cional mais apurada.
A sociedade colonial, ao longo da história brasileira, se constituiu em uma 
ordem agrária patriarcal. O domínio da igura máscula tinha seu elemento maior 
no senhor de engenho - ele se impunha sobre o restante da sociedade pelo con-
trole que tinha sobre a principal atividade econômica do território colonial - o 
engenho. Todos estavam indiretamente subordinados a ele, e a sua autoridade 
patriarcal se reproduzia sobre os demais elementos sociais.
No ambiente doméstico, a mulher do senhor era uma extensão de seus bens 
e se impunha diretamente a sua autoridade. Existindo apenas para dar sequên-
cia à produção da hereditariedade, era plenamente submissa à autoridade de seu 
marido. As ilhas seguiam o destino da mãe. Tinham pouca formação, quando 
a tinham. Caso recebessem alguma instrução, esta ocorria no ambiente domés-
tico, como já mencionado.
As meninas não tinham acesso à educação, eram raros os casos, entre elas, 
de quem conseguia o acesso a alfabetização. A instrução das mulheres ocorria 
dentro do ambiente domiciliar, ainda por interesse da família. Quando ocorria, 
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entre os privilegiados sociais, era para preparar a jovem para um casamento, um 
complemento das prendas femininas. Por isso, o casamento era um arranjo de 
interesses inanceiros entre as famílias mais abastadas.
Já a prática da poligamia era mantida e se estabelecia como uma prática con-
denável pela moral cristã, contudo, exercida intensamente no território colonial. 
Em algumas regiões de menor importância econômica para o estado português, 
nos primeiros séculos de colonização, conviver com mais de uma mulher em um 
ambiente doméstico era tolerado. São Paulo, vila fundada pelos jesuítas (Nóbrega 
e Anchieta), no século XVI, foi marcada pelo convívio entre pessoas brancas e 
indígenas unidas pelo concubinato.
A presença de indígenas na vida colonial não ocorreu apenas pela misci-
genação, mas mais que isso. A alimentação, assim como as próprias técnicas de 
produção agrícola eram predominantemente uma reprodução do que os nativos 
promoviam. A língua guarani também passou a ser utilizada costumeiramente 
em algumas regiões da colônia. O exemplo mais signiicativo foi a vila de São 
Paulo. Nela, o guarani era língua corrente entre a população.
Assim, a educação ocidental não se sustentou e não foi priorizada. Ela não era 
uma necessidade da vida colonial. A instrução formal foi limitada pela própria 
organização da economia agrária exportadora, como as regiões de subsistência. 
Vale lembrar que o europeu que migrou para o território colonial, em grande 
parte, era um desterrado, sem o interesse de uma atividade especíica nas terras 
portuguesas na América.
As diferenças entre as diversas regiões coloniais se aprofundaram. A mine-
ração na Região Sudeste, em especial, gerou um núcleo próspero que atingia as 
cidades mineiras (Ouro Preto, São João Del Rei, Diamantina), também na capi-
tal da colônia, que foi transferida da Bahia para o Rio de Janeiro. Mesmo nos 
centros de exportação do açúcar, como Salvador e Recife, a prosperidade se acen-
tuou, mas foi um benefício para poucos.
A educação foi uma expressão dessa diferença. As escolas, muitas ainda liga-
das à Igreja Católica, atendiam aos ilhos das elites. Esses faziam sua formação 
básica no Brasil e depois ingressavam nas universidades europeias. Foi dessa 
“inteligência” que se organizou a intelectualidade colonial que lideraria os movi-
mentos de emancipação que se multiplicaram ao longo dos séculos XVIII e XIX.
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Com o advento da ordem de Pombal pela saída dos jesuítas do sistema 
educacional, em 1759, o resultado foi o de mais de 20 colégios existentes e 17 
seminários, além de um sistema pedagógico que foi seguido pelo novo: o ensino 
de lógica, com memorização.
Na segunda metade do século XVIII, os movimentos liberais tomaram 
a Europa. A revolução Industrial (1750) e Francesa (1789), assim como a 
Independência dos Estados Unidos (1776), mudaram o quadro das intenções 
da formação educacional. O conhecimento racional laico passou a imperar como 
necessidade de instrução. Mas, no Brasil, essa medida só começou a se fazer sen-
tir com a transferência da Corte Portuguesa em 1808.
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DA COLÔNIA AO IMPÉRIO
Obrigada a se refugiar em sua principal colônia, a coroa portuguesa chega ao 
território colonial e transfere a estrutura administrativa de Lisboa para o Rio 
de Janeiro. Essa medida fez surgir a necessidade de formação de especialidades 
necessárias aos membros da corte. Assim surgiram as primeiras aulas de cirurgia 
em Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo. O que muitos consideram a implanta-
ção do ensino superior no Brasil.
A segunda biblioteca brasileira quase teve o destino da primeira. Com a trans-
ferência da corte portuguesa para o Brasil, chegaram com Dom João VI, e depois 
em mais duas etapas, os livros da Biblioteca Real de Lisboa. Sem um lugar apro-
priado para ser instalada, icou no Porto do Rio de Janeiro. Mas acabou sendo 
transferida para prédios públicos e foi o acervo embrião da Biblioteca Nacional, 
a maior da América Latina e uma das sete maiores do mundo.
O ensino superior implantado por Dom João acabou se restringindo a um 
grupo especíico de membros da corte, sendo formados para atender aos interes-
ses do estado ou para exercerem sua proissão em um círculo seleto de habitantes 
da colônia. Em relação ao ensino fundamental e médio, no período, não houve 
alteração em relação ao que a Ordem Jesuíta tinha estabelecido e Pombal mantido.
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É importante destacar que as Cortes Gerais, Extraordinárias e Cons-
tituintes da Nação Portuguesa decretaram, em 30 de junho de 1821, 
que o ensino fosse livre a qualquer cidadão, assim como a abertura de 
escolas de primeiras letras, desde que contasse com a gratuidade, sem 
a dependência de exame ou licença. Esse decreto é o único documento 
que se destaca no período e, somente com a Independência, agora pro-
clamada, que se iniciou uma nova política no campo da instrução, no 
Brasil (ZICHIA, 2005, p. 22). 
Com o processo de independência do país (1822), os debates sobre a educação 
chegaram ao Congresso Nacional, mas sem relevância ou primazia. Manteve-se 
como um tema necessário para dar ao país uma instrução aos súditos, os quais 
se deiniam como homens livres, sendo que a maioria era uma sociedade for-
mada por escravos.
Saviani (2013) retrata, de forma pontual, as ideias pedagógicas que perme-
aram os debates desse período de Proclamação da Independência, que dá luz a 
uma Constituição em 3 de maio de 1823. No discurso de Dom Pedro I quando 
da inauguração e instauração dos trabalhos constituintes da Assembleia, há o 
destaque da necessidade de uma “legislação especial sobre instrução pública”(SAVIANI, 2013, p. 119). É neste momento que existe a preocupação de um pro-
jeto educacional (instrução pública), contudo, a forma encontrada para isso foi a 
de uma espécie de concurso de projetos, com intuito em estimular um “Tratado 
Completo de Educação da Mocidade Brasileira” (SAVIANI, 2013, p. 119).
As discussões se voltaram para o projeto elaborado por Martim Francisco 
Ribeiro d’Andrada Machado, conhecido como Memória de Martim Francisco. 
Seu projeto estava mais para uma (re)interpretação das propostas laicas de escola 
do francês Marie-Jean-Antonie-Nicolas Caritat, conhecido mais como Condorcet 
(1734-1794). O projeto de Martim altera algumas características como a dura-
ção de primeiro grau e o ajusta a seu peril ideológico. Condorcet é o autor que 
melhor gesta a relação entre Estado, escola pública e sistema liberal, defendendo 
que a universalização da instrução é aproveitável a todo e qualquer cidadão.
Esta instrução será suiciente mesmo aos que aproveitarão as lições 
dadas aos homens para torná-los capazes de exercer as funções pú-
blicas mais simples, às quais é bom que todo cidadão possa ser con-
vocado, como aquela de jurado, de guarda municipal (CONDOR-
CET, 2010, p. 25).
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A ideia de instrução pública brasileira estava atrelado ao projeto da concepção 
laica da própria burguesia que fomentou e triunfou no processo de “independên-
cia e da organização do Estado brasileiro, ajustando-a, porém, às peculiaridades 
dessa situação particular” (SAVIANI, 2013, p. 121). Para melhor compreender 
o projeto de Condorcet, Savini o sintetiza do seguinte modo:
Primeira memória - natureza e objeto de da instrução pública; segunda 
memória - da instrução comum para as crianças; terceira memória - 
sobre a instrução comum para os homens; quarta memória - sobre a 
instrução relativa às ciências (SAVIANI, 2013, p. 121).
A Constituição outorgada em 1824 promoveu as primeiras mudanças na dire-
triz da educação, como mencionado, mas o projeto todo foi abandonado para 
se centrar nas discussões sobre a criação de universidades. A proposta de uma 
“Instrução Geral” que orientava a educação nas principais cidades brasileiras, 
partindo de pressupostos modernos e laicos que não saíram da noção de pro-
jeto, ou seja, na prática a religião católica ainda era associada ao Império na 
forma legal, as demais seriam aceitas, desde que suas práticas se mantivessem 
nos cultos domésticos, ou particular em casas para isso destinadas” (SAVIANI, 
2013, p. 124), sem qualquer templo destinado como no caso de igrejas apostó-
licas romanas.
Vale lembrar que a medida tentou laicizar ao máximo uma educação que con-
tinuou sendo mantida, no âmbito privado, pelas instituições católicas, carregando 
consigo o modelo lancasteriano de ensino, outorgado pelo imperador em 1823.
Hei por bem mandar criar nesta Corte uma Escola de primeiras letras, 
na qual se ensinará pelo método do ensino mútuo, sendo em benefí-
cio, não somente dos militares do Exército, mas de todos as classes dos 
meus súditos que queiram aproveitar-se de tão vantajoso estabeleci-
mento (BRASIL, Decreto de 1º de março de 1823).
O Decreto menciona o método do ensino mútuo, um sinônimo para o método 
que o inglês Joseph Lancaster (1778-1838) havia elaborado: um sistema de 
ensino com monitores auxiliando os demais alunos. O monitor seria aquele que 
revela mais destreza, bom comportamento e geralmente mais adiantados que os 
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demais. O professor icaria em um lugar especíico na sala, em uma espécie de 
tablado ou palco mais elevado de onde possa ver toda a sala a um só golpe de 
visão (LANCASTER, 1821).
Uma das primeiras medidas efetuadas foi a implantação de mestres para 
salas de aula de até 30 alunos. Os professores elegiam monitores, os melhores 
alunos, em número de dez, os quais ensinariam os demais alunos. Os livros eram 
manuseados pelos professores, os alunos reproduziam o conteúdo em caixas de 
areia de pequeno porte, onde copiavam o conteúdo com pedaços de madeira 
ou com o dedo. 
A adoção do método lancasteriano gerou avaliações divergentes, principal-
mente porque o método se preocupava mais com a quantidade formada do que 
a qualidade, uma vez que era possível formar várias pessoas a custos baixos.
As meninas podiam frequentar o ensino, mas nas escolas religiosas eram 
separadas dos meninos. Poucas, elas tinham um controle rígido sobre seu com-
portamento. Era um mundo educacional masculino que ainda discriminava sua 
presença. Mesmo como docentes, as mulheres eram discriminadas, só poderiam 
ministrar aula com uma autorização, “Declaração de Boa Conduta”, o que era 
um expediente raro durante o Império.
Em 1831, o monarca Dom Pedro I, proclamador da independência, foi obri-
gado a abdicar do trono. Após nove anos de um reinado marcado por rupturas 
com as elites agrárias e sem apoio popular, perdido ao longo de uma administra-
ção marcada por desmandos na vida pública e pessoal, o país viveu a Regência 
(1831 a 1840). É em 1834 que a aprovação do Ato Adicional à Constituição do 
Império que o governo se desobriga a gerenciar as escolas primárias e secun-
dárias, transferindo aos governos das províncias esse papel (SAVIANI, 2013). 
As Assembleias Provinciais, de outro lado, elaboraram a seu modo leis referen-
tes à instrução pública, muitas vezes desconexas com a proposta de unidade 
da coerência.
Na primeira metade do século XIX, portanto, sob a vigência da Lei das 
Escolas de Primeiras Letras, a instrução públicas caminhou a passos 
lentos. As críticas principais recaíam sobre a inluência quantitativa, 
falta de preparo (a tentativa de resolver esse problema com a criação 
de Escolas Normais ainda não surtira efeito e vinha sendo objeto de 
críticas constantes), parca remuneração e pouca dedicação dos profes-
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sores; a ineicácia do método lancasteriano atribuída, sobretudo, à falta 
de instalações físicas adequadas à prática do ensino mútuo; e a ausên-
cia de iscalização por parte das autoridades do ensino, o que tornava 
frequente nos relatórios a demanda pela implantação de um serviço 
de inspeção das escolas. A situação estava, pois, a reclamar uma ampla 
reforma da instrução pública (SAVIANI, 2013, 129-130).
A monarquia se manteve, mas sem o comando de um monarca. O jovem impera-
dor, com cinco anos de idade quando o período regencial se estabeleceu, assumiria 
prematuramente o trono em 1840, diante da instabilidade que se manteve.
Foi durante o Período da Regência que uma das mais importantes insti-
tuições de ensino pública se estabeleceu, o Colégio Dom Pedro II. O qual foi 
administrado, durante a monarquia, pelo próprio imperador. Era ele que esco-
lhia professores, acompanhava a qualidade do que era ensinado e interferia na 
organização da instituição educacional. O Colégio era para ser um modelo para 
o surgimento de novas unidades de educação no país. A escola tinha um cur-
rículo fundado em gramática, literatura, latim, grego, botânica, astronomia e 
princípios de física.
O Colégio Dom Pedro II teve no seu corpo docente ilustres personagens da 
literatura brasileira, entre eles, Machado de Assis e Euclides da Cunha. Com for-
mação exclusiva do ensino médio, o Dom Pedro II foi e é uma das referências do 
ensino público no Brasil. Após seis anos na instituição, os alunos ingressavam 
automaticamente nos cursos de Medicina, Engenhariae Direito.
O reinado de Dom Pedro II foi marcado por mudanças profundas na orga-
nização social e na organização da economia agroexportadora. Tais mudanças 
deram oportunidade para a ascensão de uma nova elite agrária e de um novo 
produto agrícola, o café, que reorganizou o poder de forma diferente daquela 
no processo açucareiro. Inicialmente na órbita do imperador, mas com o tempo, 
contrária a ele.
[...] a economia cafeeira contou, desde o início, com uma vanguarda 
constituída por homens com experiência comercial, entrelaçando-se, 
assim, os interesses da produção e os do comércio. [...] Tendo consci-
ência clara de seus interesses, esses dirigentes compreenderam a im-
portância do governo na atividade econômica, o que os levou a colocar 
a política a serviço do grupo econômico por eles representado (SAVIA-
NI, 2013, 159-160).
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A abolição da escravidão foi um capítulo duro na vida da monarquia. Buscando 
atender aos interesses de uma economia agrária herdada do império e que susten-
tava o país, o segundo reinado manteve o quanto pode o trabalho compulsório. 
Contudo, sofreu os desgastes de tal prática. O império perdeu popularidade e 
legitimidade junto às forças que o sustentavam.
Sofrendo pressões do imperialismo inglês para pôr im ao trabalho escravo, a 
monarquia fez da abolição uma guerra diplomática e um trauma social. Rompeu 
simbolicamente com a Inglaterra, mas tomou todas as medidas para abolir o 
trabalho escravo sem prejudicar os interesses da lavoura extensiva, em espe-
cial a cafeeira.
Uma das alternativas para a substituição da mão de obra escrava foi o imi-
grante europeu, o qual já se dirigia ao Brasil, principalmente no Sul do país, para 
reproduzir parcialmente a vida que tinha na Europa, mas com as características 
das terras gaúchas, catarinenses e paranaenses. No Sudeste, o imigrante iria ser 
utilizado na grande lavoura de café, por meio da parceria, o que gerou conlitos 
entre os trabalhadores livres de origem europeia e proprietários de terra, acos-
tumados com a escravidão. Efetivamente, “quando ocorre a Abolição deinitiva, 
1888, a imigração europeia, principalmente italiana, já luía regularmente para 
os cafezais, em especial os paulistas” (SAVIANI, 2013, 163).
O governo, a despeito dos gastos dessas imigrações, acaba por assumir os 
custeios dos transportes, o que gera o aumento do contingente de pessoas de 13 
mil, em 1870, para 184 mil, em 1880, passando, ainda, para 609 mil na década 
de 1890, isso apenas no estado de São Paulo.
Nicolau Campos Vergueiro, senador do Império, produtor de café no inte-
rior de São Paulo, em Ibicaba, contratou o trabalho de 177 famílias de imigrantes 
alemães e suíços, através do regime de parceria – forma de produção em que se 
dividiam os lucros da venda do produto com as famílias produtoras. Contudo, 
a tentativa não foi bem sucedida. Tratados como escravos, os imigrantes acaba-
ram se revoltando e queimando as plantações de café em 1857.
Mesmo com o fracasso das primeiras tentativas, o trabalho imigrante no 
campo se propagou. Após 1870, o governo estabelece a Lei de Imigração e passa 
a incentivar, com propaganda na Europa e subsídios para as viagens de europeus 
para o Brasil, a importação de mão de obra.
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A medida acabou por beneiciar também o trabalho urbano e o advento da 
indústria com a concentração de trabalhadores assalariados e com grau de ins-
trução bem mais elevado do que o trabalhador nacional. O braçal brasileiro, que 
nunca teve uma política de formação e qualiicação para o mundo do trabalho, 
agora se via diante dos interesses dos empregadores, interessados em substitui-
ção rápida do trabalho escravo pelo estrangeiro (europeu). Uma solução imediata 
para a economia que manteve um problema crônico: a instrução. Durante o 
império diversas instituições de pesquisa foram criadas, algumas ainda em fun-
cionamento até hoje:
Museu Paraense, criado por Emílio Goeldi em 1885, o Instituto Agro-
nômico, criado pelo Governo Imperial em 1887, em Campinas. O Li-
ceu de Artes e Ofícios de São Paulo foi criado em 1873, por ato do 
Governo Imperial. Em Recife, dentre as muitas obras encomendadas, 
entre 1840 e 1846 ao engenheiro Francês Louis Vauthier, estava o Tea-
tro Santa Izabel (NASCIMENTO, 1999, p. 32)
As localizações dessas instituições revelam, em certa medida, a preocupação em 
construir locais de conhecimento de forma a não centralizar apenas em uma 
localidade do Brasil, considerando tanto a extensão territorial como a oferta de 
ensino superior, o que não implica mais em ter que ir para a Europa para dar 
sequência nos estudos. Conforme aponta, 
os cursos jurídicos de Olinda e São Paulo eram os que maior clientela 
atendiam. Existiam, ainda, cursos médicos na Bahia e no Rio, a Escola 
Politécnica (Rio), os cursos militares no Rio Grande do Sul, no rio e 
em Fortaleza, o curso de Minas em Ouro Preto, o curso da Marinha 
(Rio), o ensino artístico (Rio) e o ensino religioso em seis seminários 
(RIBEIRO, 1992, p. 52).
Na política educacional inicia-se uma discussão acerca da instrução nacional e 
da preparação do elemento brasileiro, como apontado nas citações anteriores, 
para enfrentar a presença do estrangeiro. Nos debates políticos no Congresso 
Nacional, inicia-se a defesa de uma educação positiva.
Nesse processo todo, a ilosoia brasileira gesta alguns autores como Tobias 
Barreto (1839-1889) e Sílvio Romero (1851-1914), com infulências mencio-
nadas anteriormente. Tobias Barreto escreve Estudos de ilosoia (1977), obra 
em que defende que a adesão ao positivismo de Comte não leva a humanidade 
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ao panteísmo ou ateísmo, algo difundido constantemente pelos clérigos, mas 
que ajuda a racionalidade na compreensão do conhecimento de forma mais 
organizada.
Não nos enganamos, quando irmemente aderimos ao pensamento da 
escola de Augusto Comte, na parte relativa ao desdém da teologia; e 
cremos que o positivismo teria uma grande vitória, se empreendesse a 
crítica de todos os sistemas teístas, católicos ou não, para mostrar-lhes 
o falso caminho em que pisam e as contradições em que caem. Não 
seria jogar o jogo dos ateus, como pensa Paulo Janet, em uma crítica 
ultimamente feita a Guizot; mas antes seria deixar, por uma vez, pa-
tentes as parvas pretensões dos ilósofos e teólogos, sobre a natureza 
e atributos divinos; seria dizer a todos eles, homens da fé e homens da 
razão, clérigos e leigos: - basta de luta entre vós, e abraçai-vos como 
irmãos, porque ides cair juntos no fundo do mesmo abismo. É sabido 
que a ilosoia do clero, em seus continuados ataques à razão especu-
lativa, costuma entoar como um hino de vitória esta fórmula soberba: 
o racionalismo leva necessariamente ao panteísmo (BARRETO, 1977, 
p. 116-117).
O culto à ciência e racionalização das questões públicas iniltram-se entre os 
intelectuais. A ilosoia de Comte ganha força entre os maçons, intelectuais de 
uma forma geral, e também dentro da corporação militar. Contudo, a adesão 
ao positivismo não é eterna para Barreto, vindo a romper com o que acreditava 
de parcialmente válido, entre 1875 e 1882, quando tem contato com a cultura 
alemã, sobretudo pelas leitura kantianas, e ao se questionar sobre a metafísica 
está morta ou não.
É isto suiciente para caracterizar, de um lado, a deplorável condição 
emque nos achamos, e, por outro, justiicar o interesse que tomamos 
em responder à pergunta proposta. Se em nossos dias nenhum homem 
verdadeiramente culto deve ignorar que o dogmatismo da metafísica 
moderna foi abalado por Hume, cuja implacável crítica coube a Kant 
concluir em mais largas proposições e com mais considerável profun-
deza, há de causar admiração o grande espanto que tão triviais verda-
des ainda despertam entre nós.
[...] Toda a ilosoia até o aparecimento de Kant, como ensina Schope-
nhauer, não passou de um sonho estéril de falsidades e servilismo inte-
lectual, do qual os novos tempos só se libertaram pelo grado partido da 
Crítica da Razão Pura (BARRETO, 1977, p. 292-293).
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Seu amparo está em Kant para romper deinitivamente com os paradigmas 
positivistas, considerando que o pensador alemão só ampliou a própria visão 
após romper com a escolástica e se valer dos caminhos de Hume, alargando-o 
(BARRETO, 1977).
A Guerra do Paraguai foi um marco para a propagação destas ideias, mas também 
umas das guerras mais sangrentas e de maior duração na América Latina, con-
forme descreve Doratioto (2006), com seu início em 1864 e o advento de novos 
modelos bélicos “resultado de inovações tecnológicas decorrentes do avanço da 
industrialização na Europa e nos Estados Unidos” (DORATIOTO, 2006, p. 253). 
Existia uma relação de disputa política e territorial entre Paraguai e seus países 
vizinhos, Brasil e Argentina.
Na Argentina e no Brasil, funcionavam instituições liberais, embora 
acessíveis apenas a parcelas minoritárias das respectivas populações. 
No Paraguai, nem esse mínimo, pois era impossível o indivíduo diver-
gir do governo e inexistiam imprensa privada, partidos políticos, juízes 
independentes, e o Legislativo era uma icção. Este não se reunia por 
anos a io e, quando o fazia, era por convocação do Executivo para rati-
icar decisões governamentais (DORATIOTO, 2006, p. 255-256).
A situação se agrava entre esses países, o que resulta na entrada do Uruguai como 
parceiro de Brasil e Argentina, formando a Tríplice Aliança contra o Paraguai. 
Para resumir, a guerra custou não apenas contingente humano de cada país, 
mas também capital monetário investido, para o Império Brasileiro, por exem-
plo, “a guerra causou gastos de 614 mil contos de réis, valor equivalente a onze 
vezes o orçamento do governo brasileiro para 1864” (DORATIOTO, 2006, p. 
“A ilosoia quer e deve ser livre; a liberdade é para ela mais que um distinti-
vo; é sua própria vida, pois que constitui o seu poder”.
Fonte: Barreto (1977, p. 67).
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281-282). Como a economia brasileira estava em crescimento na tentativa de 
modernização, os recursos foram desviados para manter a disputa, ‘atrasando’ 
o desenvolvimento em meio século.
A criação de escolas de oiciais, a mais importante foi a da Praia Vermelha, no 
Rio de Janeiro, instruída por mestres europeus de tendência positivista, asso-
ciada ao fortalecimento políticos do exército, faria dos militares os líderes do 
movimento republicano. Contudo, não seriam eles que conduziriam o destino 
do país após a Proclamação da República em 1889. Seria uma aristocracia cafe-
eira já consolidada no poder durante a monarquia.
Nesse momento, se interpela em diversos momentos da vida pública do país 
a questão do elemento nacional. Leis são aprovadas para facilitar a imigração. 
O país precisa de mão de obra para sua principal atividade agrícola, o café. O 
estrangeiro se traduz como principal agente de trabalho e é criado o Ministério 
de Estrangeiros, o qual determina a política de imigração para o país.
No período colonial a lei portuguesa e espanhola proibia a entrada de 
imigrantes. Estimulava a imigração “forçada” de trabalhadores, escra-
vos africanos. Do início do século XIX (período das Independências) à 
meados de 1960 a legislação dos países da América Latina enfatizavam 
as migrações estimuladas, “livres”, pois os imigrantes representavam fa-
O Paraguai, derrotado, perdeu os territórios que disputava com Argentina e 
Brasil e assistiu ao im do Estado autoritário e patrimonial, o que não signii-
cou, porém, que as novas instituições, supostamente liberais, contribuíssem 
para o desenvolvimento do país. O Brasil manteve sob sua inluência os go-
vernos paraguaios até 1904, quando uma revolução liberal afastou o país 
da órbita brasileira, vinculando-o politicamente à Argentina, cuja economia 
havia satelizado a paraguaia na década de 1870.
Fonte: Doratioto (2006, p. 282-283).
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tor importante na ocupação territorial – colonização (1824-1939) e no 
fomento ao crescimento dos países (1945-1960), como mão-de-obra 
qualiicada (ZAMBERLAM, 2004, p. 29).
A educação passa a ser uma possibilidade de garantir ao país o preparo ao o 
trabalho. A necessidade de força de trabalho se torna vital, mas agora na condi-
ção de pessoa livre. A multiplicação do assalariamento já estava se processando 
desde o Império e, na Primeira República, se transformou em uma questão vital.
Uma das primeiras instituições que buscou o preparo do trabalhador visando à 
qualiicação para o ofício foram os liceus. O primeiro foi fundado em 1883, já 
na derrocada do Império. Por meio da inluência das ideias positivistas e com 
o apadrinhamento da Maçonaria, surge ‘O Liceu de Artes e Ofícios’ na cidade 
de São Paulo.
Os liceus nunca se multiplicaram e icaram nas mãos dos empreendimentos 
privados. Sustentados por empresários, com pouco recurso, acabaram min-
guando ao longo do tempo. Fechados, não conseguiram dar início ao processo 
de qualiicação que se esperava.
As mulheres, como já citamos, ampliaram, mas de forma lenta, sua parti-
cipação na educação. A instrução fundamental ganhou nela um dos principais 
agentes da docência, mas é inevitável falar de como a mulher foi apartada dos 
estudos sem mencionar o fato de que também se constitui como uma relação 
de gênero.
A legislação portuguesa proibia a entrada de qualquer estrangeiro. Estimu-
lava a migração forçada (escravos africanos), cujo regime e proteção jurídica 
era similar ao dos animais. Cabia ao escravo aprender a língua e exercer uma 
atividade produtiva. Ao dono cabia dar-lhe comida e moradia. A crueldade 
não era coibida.
Fonte: Zamberlam (2004, p. 32).
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Não parece ser possível compreender a história de como as mulheres 
ocuparam as salas de aula sem notar que essa foi uma história que se 
deu também no terreno das relações de gênero: as representações do 
masculino e do feminino, os lugares sociais previstos para cada um 
deles são integrantes do processo histórico. Gênero, entendido como 
construção social, e articulado à classe, etnia, religião, idade determi-
nou algumas posições de sujeito que as mulheres professoras ocuparam 
(LOURO, 1997, p. 478).
Estabelecimentos de ensino especializados na educação feminina surgiram nas 
capitais brasileiras no segundo reinado. Mas a subordinação à vida doméstica 
continua até hoje a ser uma atribuição imposta à mulher. A educação pública 
brasileira, então, se desenha como um projeto lento e que, por vezes, o próprio 
Estado parece se ausentar da responsabilidade, deixando explícitoa quais inte-
resses se destina desde o processo de desembarque português nas novas terras 
tropicais: à classe burguesa. À margem dessas relações, historicamente, estão 
indígenas, pessoas negras e mulheres, evidenciando o descompasso que se arras-
tou e se arrasta tanto no universo educacional como nos demais espaços sociais 
e de disputas.
Considerações Finais
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A educação pode ser considerada um marco cultural necessário e que todas as 
sociedades ao longo da história mantiveram. Nós a institucionalizamos e izemos 
dela uma condição para perpetuar valores, manter necessidades, buscar respos-
tas para nossos problemas e lutar pela superação. Mas a educação também foi 
o meio de submeter as “estranhezas” e dominá-las. A educação que o Ocidente 
impôs sobre as áreas coloniais europeias tinha este interesse.
A presença de uma educação catequética no território colonial brasileiro tinha 
esta intenção: se impor. Garantir o interesse do conquistador dando a quem se 
domina uma imagem de mundo concebida a partir do poder europeu. Era um 
tempo de uma Europa que vivia a crise da identidade cristã, da vida econômica, 
da incerteza de um continente em mudança.
Muitos desses conlitos se transferiram para a área colonial e marcaram a 
vida das pessoas que viveram na colônia. A imposição do cristianismo e dos valo-
res que ele expressou no território brasileiro marcou o nosso futuro. Mas não se 
consolidou por toda a colônia esta educação catequética, ela não terminou sua 
obra, os jesuítas foram expulsos. A educação dita “laica” que foi implantada após 
a expulsão dos padres da Companhia de Jesus não teve o efeito que os anteces-
sores promoveram, não atingiu a mesma dimensão. 
A formação do estado nacional brasileiro não teve a participação popular, 
não foi um projeto da sociedade organizada. A formação do estado nacional não 
foi uma realização de manifestações culturais de identidade comum que pode-
ria se chamar “brasileiros e brasileiras” efetivamente.
Essa condição demonstra que não há uma educação que expresse a iden-
tidade comum, mas a múltipla. Foi e será o estado, como veremos em nossa 
próxima unidade, que fará da educação um instrumento de construção do estado 
nacional. Uma imposição que nos fez, como tantas imposições construiu nossa 
história até nossos dias.
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1. Explique o que era a Ratio Studiorum, amplamente utilizada pelos jesuítas.
2. A expulsão da Ordem Jesuíta em 1759, pelo então ministro de Portugal, Mar-
ques de Pombal, representou uma ruptura para com os poderes religiosos no 
sistema educacional, mas outras situações se relacionam a esse período. Leia as 
airmativas a seguir: 
I. Não foi com resistência que a Ordem permaneceu. Assim que a expulsaram 
e voltaram a Portugal.
II. A Revolução Guaranítica pode ser considerada como um ponto de resis-
tência da Ordem.
III. Depois da saída da Ordem, a biblioteca, concentrada em suas instalações, 
virou papel de embrulho para os comerciantes.
IV. A expulsão apenas se deu em documento e não isicamente. O que a Or-
dem perdeu foi o prestígio, não seu lugar.
Conforme o que leu das sentenças, assinale a única alternativa correta:
a. I e III.
b. I e IV.
c. II e III.
d. II.
e. III.
3. Sobre a vinda da coroa portuguesa ao Brasil e a chegada de Dom João VI, leia 
as airmativas a seguir e assinale a alternativa correta:
a. O ensino superior implantado por D. João VI conseguiu democratizar o acesso 
à educação a todas as pessoas, sem distinção.
b. A educação inicia, com a vinda da família real, o processo de readequação, 
ofertando, então, escolas tanto para pessoas nativas quanto as que estão na 
corte.
c. O ensino implantado nesta época modiicou drasticamente o ensino que era 
ofertado desde a época da Ordem Jesuítica.
d. A estrutura administrativa portuguesa é obrigada a vir para o Brasil, o que 
implica na necessidade de formação de especialidades necessárias aos mem-
bros da corte.
e. Sentindo os ventos do Iluminismo, Dom João VI decide instituir uma educa-
ção laica de fato, além de um ensino voltado às investigações epistemológi-
cas e racionais.
165 
4. (ENADE/2014) As reformas religiosas são protestantes e católicas e interagem 
de tal modo que são se compreendem as suas consequências se não levarmos 
em conta as relações que vão se veriicando ao longo do século XVI. Nesse sen-
tido, a reação protestante ativa e antecipa mudanças que a Igreja Católica já 
vinha considerando. Da mesma forma, nem todas as reformas protestantes ti-
veram um sentido capitalista. Também, a Reforma Católica não implicava um 
retorno à Idade Média; e tanto católicos quanto protestantes reformistas perse-
guiram bruxas e bruxos.
RODRIGUES, A. E.; FALCON, F. J. C. A formação do mundo moderno. 2. Ed. Rio de Ja-
neiro: Elsevier, 2006, p. 121 (adaptado).
O fenômeno mencionado no texto acima, conhecido como reformas religiosas, re-
presentou uma nova coniguração no contexto político da Europa Ocidental no sé-
culo XVI. Nesse sentido, considera-se que tais reformas religiosas:
a. Resultaram da relação de diferentes conlitos, que remontam a questões 
teológicas, políticas, econômicas e ainda à posse e exploração do Novo 
Mundo.
b. Representaram o novo clima vivido pela Europa Ocidental no século XVI, 
constituindo-se em movimentos circunstâncias que responderam a inte-
resses particulares da burguesia.
c. Inauguraram um novo tempo na relação Estado e Igreja, ao estabelecer a 
separação entre política e religião, tanto no catolicismo quanto no protes-
tantismo.
d. Ocasionaram, no caso da Reforma Católica, um retrocesso político, que se 
reletiu na reativação do Tribunal do Santo Ofício, vinculado à Inquisição.
e. Promoveram maior liberdade de culto, decorrente da concorrência que se 
estabeleceu entre as duas correntes do cristianismo e das ideias humanas.
5. A educação no período colonial estava toda centrada nas mãos dos jesuítas, 
mesmo sendo participante da elite, além da criação de seminários e colégios 
nas principais cidades da colônia como centro de formação de uma elite mais 
culta. Em relação à educação elitista dessa época, é correto airmar que:
a. Apenas 50% dos homens e mulheres teria acesso a esta educação, que du-
rava onze anos. Os que se destacavam poderiam continuar seus estudos 
no Brasil mesmo, o que representava 20% dos formados nos seminários e 
colégios inacianos.
b. Apenas 10% dos homens e mulheres livres teria acesso a esta educação, 
que durava dez anos. Os que se destacavam poderiam continuar seus es-
tudos na Europa, já que nos trópicos portugueses não existia ensino supe-
rior, 20% dos formados nos seminários e colégios inacianos seguiam esse 
destino.
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c. Apenas 10% dos homens livres teria acesso a esta educação, que durava 
sete anos. Os que se destacavam poderiam continuar seus estudos no Bra-
sil mesmo, o que representava 20% dos formados nos seminários e colé-
gios inacianos.
d. Apenas 50% dos homens, livre ou não, teria acesso a esta educação, que du-
rava sete anos. Os que se destacavam poderiam continuar seus estudos na 
Europa, já que nos trópicos portugueses não existia ensino superior, 20% 
dos formados nos seminários e colégios inacianos seguiam esse destino.
e. Apenas 10% dos homens livres teria acesso a esta educação, que durava 
onze anos. Os que se destacavam poderiam continuar seus estudos na Eu-
ropa, já que nos trópicos portugueses não existia ensino superior, 20% dos 
formados nos seminários e colégios inacianos seguia esse destino.
167 
PARA ALÉM DOS JESUÍTAS
Até 1580 somente os jesuítas tinham autorização para estabelecerem-se na Colônia, 
mas isso mudou nas seis décadas seguintes com a chegada de algumas antigas ordens 
religiosas fundadas ainda no período medieval. Esta “liberação”, se deu sobretudo graças 
a anexação de Portugal à Espanha,o que propiciou a vinda de Franciscanos, Carmelitas, 
Beneditinos, Mercedários e Capuchinhos. As ordens que chegaram ao território brasilei-
ro tinham basicamente dois objetivos principais, primeiro de expandir as suas obras em 
novos territórios e segundo de responder às solicitações dos habitantes locais [...].
SAGRADO E O FEMININO
Diante de uma sociedade majoritariamente masculina, as mulheres também tiveram 
seu espaço no meio religioso, mesmo sendo consideradas menos importantes e por 
isso mesmo denominadas de segunda ordem, considerando que a primeira era sem-
pre a dos homens. Alguns grupos religiosos femininos como as franciscanas e as car-
melitas chegaram e se estabeleceram no território brasileiro, embora bem mais tarde, 
sobretudo pela lógica social predominante. A inserção de religiosas e consequente-
mente a construção de conventos no Brasil passou de repente a ser uma solicitação 
bastante insistente por parte de algumas famílias, pois seria uma forma de manter a 
virgindade de suas ilhas e ao mesmo tempo afastá-las de eventuais maridos despro-
vidos de qualquer título de nobreza ou de condições inanceiras para mantê-las [...]. 
Um dos fatores que justiicava a repulsa do governo português em criar conven-
tos femininos se dava pelo seu projeto de dominação colonial que icaria enfraque-
cido se muitas mulheres brancas começassem a ingressar nos conventos, já que elas 
eram parte essencial para o “branqueamento” da nova terra. Por outro lado, as famí-
lias nobres continuavam insistindo nas fundações, pois no caso delas era uma garan-
tia de solução para os problemas de ordem social, moral e política. Ao ingressar em 
um convento, a jovem passava a viver não mais somente sob a vigilância das leis esta-
tais, mas também eclesiásticas e patriarcais. No convento a jovem não tinha acesso ao 
exterior, exceto em momentos de visitas monitoradas e separadas por estruturas que 
impediam qualquer contato corporal. Os conventos eram verdadeiras fortalezas, com 
espessas paredes envoltas por altos e resistentes muros, portanto a jovem interna ti-
nha uma vida totalmente voltada à oração e até o seu traje diário seguia rígidos pa-
drões estabelecidos por cada ordem, mas que basicamente cobria todo o seu corpo. 
Fonte: Gumieiro (2013, p. 63-78). 
MATERIAL COMPLEMENTAR
Casa Grande & Senzala
Gilberto Freyre
Editora: Global
Sinopse: Gilberto Freyre retrata, a seu modo, a formação do pen-
samento brasileiro fazendo contrapontos entre dois espaços que dia-
logam e atritam: a Casa Grande, onde reside a família e proprietária 
das terras e das pessoas escravizadas, e a Senzala, local onde pessoas 
negras escravizadas i cavam coni nadas.
A Missão
Sinopse: Rodrigo Mendoza (Robert De Niro) é um mercador espanhol 
escravista do i nal do século XVIII que vale de violências como método 
de vida, a ponto de matar seu irmão em uma disputa pelo amor de uma 
mesma mulher. O arrependimento acaba o conduzindo para junto dos 
jesuítas, nas l orestas brasileiras, mudando radicalmente sua postura 
violenta, passando a defender indígenas que antes escravizava.
Comentário: o i lme é baseado em fatos reais e retrata o processo de 
inl uência jesuítica junto a indígenas, além de revelar as estruturas das 
missões e as dii culdades todas para se chegar até ela, entremeado aos 
interesses da coroa portuguesa.
Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR
Há algo para se deliciar neste vídeo, o encontro entre o elemento europeu e o indígena. O olhar 
europeu sobre um povo que via os “recém chegados” como divindades, mas na prática o início de 
uma grande transformação que forjou o que somos, “O Brasil”.
Link: <http://www.youtube.com/watch?feature=endscreen&v=hzGAcqGiV0g&NR=1>.
Aqui temos Chico Buarque, cantor e compositor clássico brasileiro, falando da obra “O Povo Brasi-
leiro” de Darcy Ribeiro. A formação da índole do povo e do seu peril contraditório é o tema. Vale a 
relexão de assumirmos o que somos.
Link: <http://www.youtube.com/watch?v=bv9DqymwzBc&feature=related>.
REFERÊNCIAS
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Melhoramentos/INL, 1976.
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pelo método do Ensino Mútuo para instrução das corporações militares. Cole-
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Nacional, 1887.
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Cavazzotti e Lígia Regina Klein. Campinas: Autores Associados, 2010.
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ção de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Educação. Faculdade de Educa-
ção, Universidade de São Paulo, 2005.
GABARITO
1. Consistia em um método educacional e de organização de estudos, sendo a 
principal marca pedagógica dos jesuítas. 
2. C.
3. D.
4. A.
5. E.
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Professor Me Gilson Aguiar 
Professor Me Rodrigo Pedro Casteleira
DA VELHA REPÚBLICA À 
REPÚBLICA NOVA
Objetivos de Aprendizagem
 ■ Reconhecer que a mudança de regime – da monarquia para a 
república – não mudou a realidade da educação no país.
 ■ Compreender a história da educação como um instrumento de 
implantação do poder público, mas sem atingir o objetivo ao que se 
propôs.
 ■ Entender os limites da educação na atualidade como uma 
consequência histórica.
 ■ Identiicar velhos problemas na educação e que ainda não foram 
superados.
Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
 ■ O regime republicano: educação de saliva e papel
 ■ Eis que Getúlio se estabelece: o modelo imposto
 ■ O regime militar e a educação abaixo de botas
INTRODUÇÃO
A república não veio acompanhada de uma mudança na melhora da qualidade de 
vida para as pessoas do Brasil. As mesmas condições que a cidade viveu durante a 
monarquia se mantiveram na primeira fase da república. O que explica essa con-
tinuidade são as lideranças políticas que se colocaram à frente do novo governo. 
Uma república proclamada pela elite agrária, com a ação dos oiciais do exército 
e intelectuais,que estiveram no início do regime, mas depois foram afastados 
pelos interesses dos grandes proprietários de terra. A república foi proclamada 
sem a participação popular, “que assistiu bestializada a proclamação”, segundo 
Aristides Lobo, um dos intelectuais que participou de sua proclamação e que 
escreveu, em 1889, um artigo no Diário Popular sobre o que havia presenciado 
(MARTINS, 2016, on-line)1.
O desenvolvimento da economia agrária também gerou o crescimento de um 
mercado interno, incentivou a imigração de pessoas vindas da Europa e Ásia, for-
mando novas forças sociais como a classe média e a operária. As cidades passaram 
a ter um papel importante na vida política. Dessas novas composições, emergi-
ram as forças que levaram à desestabilização do regime que, aliadas ao contexto 
mundial da crise cafeeira, permitiram a ascensão de Getúlio Vargas ao poder.
Por meio da ação tecnocrata do Estado, a educação serviu aos interesses do 
poder estabelecido, mas nunca a uma construção de um projeto de educação 
que demonstrasse eiciência e criasse condições de superação da sociedade de 
suas condições de marginalização no mercado de trabalho. Mesmo durante o 
período em que Vargas esteve no poder (1930 a 1945), a educação técnica icou 
a serviço dos centros econômicos e não preparam a população de regiões mar-
ginais com a qualiicação que atraísse investimentos.
No Regime Militar (1964 a 1985), o sistema educacional se modernizou, 
mas ainda permaneceu com resultados precários para as classes populares. Os 
programas de alfabetização de adultos e a multiplicação das instituições públi-
cas não vieram acompanhados de qualidade, o que, de certa forma, ainda é um 
dilema na educação nacional.
Introdução
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O REGIME REPUBLICANO: EDUCAÇÃO DE SALIVA E 
PAPEL
Com o advento da república (1889), a educação passou estar presente na retó-
rica dos homens públicos, mas sem um efeito prático. Mesmo que a Constituição 
de 1891 viesse a prever a alfabetização para a garantia do voto ao cidadão, a 
escola não conseguiu executar esta inclusão para a maioria dos brasileiros. Não 
se multiplicaram as instituições de ensino públicas, como idealizaram políticos 
e intelectuais como Rui Barbosa. Os imigrantes, por exemplo, que ingressaram 
no país desde o império, eram alfabetizados. O elemento nacional não tinha por 
parte do estado esta prerrogativa.
O país está envolto em concepções liberais de diversas matizes, como evolu-
cionismo social, positivismo e todas as formas de liberalismo político (SAVIANI, 
2013), mas, neste sistema todo, o Estado é protagonista de um sistema antagônico 
de si, ele requer para si a centralidade de tudo sem que o seja responsável. Rui 
Barbosa elabora pareceres em que defende essa posição do Estado, legitimando 
que só é possível se a reforma educacional realizar todas as metas a ela impostas, 
“[...] a expectativa era que, atingida essa meta, ocorreria uma diminuição do papel 
do Estado no que se refere à sua função centralizadora” (SAVIANI, 2013, 169).
Neste período de tensões, em 1890, José Veríssimo (1857-1916) escreve “A 
educação nacional”, em que delineia uma reforma da educação pautada como 
antecessora da reforma política. Dito de outro modo, para Veríssimo, ao modi-
icar a estrutura moral da população, posterior e consequentemente, a reforma 
do regime político teria se efetivado. Ele considera como base de reforma a 
reconstrução do caráter e do sentimento nacional, tendo um espírito brasileiro 
(VERÍSSIMO, 1906), educação física, educação cívica e, mais uma vez, uma 
concepção do papel da mulher como responsável pela educação de caráter de 
gerações futuras (SAVIANI, 2013). Veríssimo foi inluenciado por diversas cor-
rentes ilosóicas, o que explica como ele estava em sintonia com ideias modernas 
de ciência e educação.
No campo da ilosoia a geração de Veríssimo sofreria os impactos do 
cientiismo dominante, que se irmara com o progresso das ciências di-
tas experimentais (física, química, biologia) e a inauguração da ilosoia 
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moderna por Descartes. Importante, no século XIX, como se sabe, o 
desenvolvimento da ilosoia transcendental, do criticismo, da psicolo-
gia e Cosmologia racionais, que se entroncam em Kant (1724-1804) e 
no cartesianismo (séc. XVII). O idealismo e o panteísmo alemães (Fi-
chte, Schelling), que se seguem, em conseqüência, sem falar em Hegel 
(1770-1830) e em Marx, desembocariam nas duas correntes até hoje 
em confronto: a “ala esquerda” radical, materialista, revolucionária, an-
ti-metafísica e a “ala direita”, teísta, ortodoxa, conservadora, racional, 
com suas consequências naturais sobre as idéias das elites letradas no 
Brasil. Filosoias que inspirariam tanto o materialismo dialético quan-
to o pessimismo de Schopenhauer e o voluntarismo de Nietzsche, do 
mesmo passo que o positivismo idealista de Comte, Taine, Spencer, 
Durkheim, Buckle, com dignos seguidores entre nós (Sílvio Romero, 
Euclides da Cunha, Clóvis Be-vilacqua), nos vários campos das ciên-
cias do espírito (BRANDÃO, 1987, p. 25).
Esses pressupostos todos o conduziram a defender uma educação pautada na 
ilosoia especulativa junto à empiria (experiência), que promova uma educa-
ção com ins objetivos e que se corrija ao longo do processo. 
Uma das contradições da República Velha era que uma das exigências para 
o exercício da cidadania seria o voto, restrito aos alfabetizados, homens acima 
de 21 anos, além de ser facultativo. O processo de instrução permaneceu cerce-
ado à maioria da população, em sua maioria residente na zona rural, à mercê de 
grandes proprietários de terras, os “coronéis”.
“Embora Veríssimo tivesse passado pouco tempo pelos bancos da Politécni-
ca, obrigado a abandonar o curso de engenharia por questões de saúde, aos 
19 anos de idade, o comtismo marcá-lo-ia para sempre”.
(Adelino M. Brandão) 
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Outro dado curioso do regime republicano instalado no Brasil foi o papel que 
as mulheres passaram a desempenhar nas instituições de ensino. Incentivadas 
a se dedicarem à educação, mas com baixos salários, elas foram incorporadas 
ao sistema de ensino para cuidar do ensino fundamental e normal. Elas passa-
ram a ter uma escolha a mais em um destino marcado pela submissão à igura 
masculina. Para a maioria das mulheres, o destino era casar, serem operárias, 
trabalhadoras agrícolas, lavadeiras ou parteiras.
Com a proclamação do regime republicano, a Igreja Católica deixou de ser 
agregada ao Estado. Na Constituição, o poder público se torna laico e as insti-
tuições públicas e católicas foram separadas. Esta medida tirou a educação em 
massa da Igreja e transferiu ao Estado a responsabilidade de gerir a instrução.
O discurso de importância da educação para a formação do brasileiro deveria 
se estender à primeira idade. Dessa forma, foram criados os primeiros “jardins 
da infância” - nome dado aos estabelecimentos de ensino que deveriam iniciar 
a instrução à primeira idade. Em 1895, surge o primeiro Centro de Educação 
Infantil. As crianças permaneciam até os sete anos em casa, depois começavam 
sua vida na escola.
Mas a educação infantil não atingiu 
a todos os brasileiros.As fábricas que se 
multiplicaram na Primeira República 
arregimentavam um grande número 
de crianças para o trabalho operário. 
Principalmente durante e após a Primeira 
Guerra Mundial (1914 a 1918), foi neces-
sária a política de substituição de bens 
importados. Associado ao número de 
trabalhadores assalariados no país, o mer-
cado interno brasileiro aumentou a demanda de bens de consumo.
Nesse contexto, em longas jornadas de trabalho, algumas de 10 a 12 horas, 
mulheres e crianças eram exploradas nas indústrias. Os poderes públicos, apro-
veitando-se da autonomia prevista na Constituição, criaram mecanismos para 
facilitar o uso do trabalho feminino e infantil com remunerações menores que a 
dos homens. Com relação à conjuntura econômica e política da Primeira Guerra 
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Mundial, Araripe expõe:
A Grande Guerra foi travada no ambiente resultante do salto tecno-
lógico da Revolução Industrial que, da Grã-Bretanha, se irradiou pela 
Europa continental e pelos Estados Unidos, e os meios e os processos 
de combate de 1914-18 reletem necessariamente esse fato. Tais rele-
xos são tantos e tão profundos que somente é possível citar alguns. A 
estrada de ferro e a telegraia sem io (a TSF), presentes na Guerra de 
Secessão e na Guerra Franco-Prussiana, são extensivamente utilizadas 
na Grande Guerra, permitindo transportar, controlar e abastecer gran-
des massas de homens e de materiais. O desenvolvimento do motor 
a explosão e do motor elétrico respondem pelo aparecimento do au-
tomóvel, do avião e do tanque, o carro de combate na terminologia 
militar. O submarino, em fase de protótipo na guerra entre os Estados, 
tornou-se arma temível no ataque à navegação aliada. Aços especiais e 
mecânica pesada possibilitaram o aumento de calibre da artilharia e da 
blindagem dos navios de guerra (ARARIPE, 2006, p. 324-325).
O sistema belicoso da Primeira Grande Guerra promoveu um ‘salto’ tecnológico 
que as indústrias receberam, mesmo que fossem de outros artefatos. Com a mar-
cha de homens para os fronts, restou absorver mulheres e crianças nas fábricas, 
a im de que o sistema não parasse. O Brasil, assim como boa parte da América 
Latina, recebia inluências francesas, com a literatura e a formação artística, por 
exemplo, e de outras partes da Europa “vinham, também, a manteiga e a moda, 
ternos e camisas feitos em Londres, por intermédio de representantes no Brasil” 
(ARARIPE, 2006, p. 342), tanto que se manteve no discurso de neutralidade, o 
que a população recebeu positivamente, mas essa atmosfera não permaneceu 
por muito tempo.
Em 3 de abril de 1917, um navio mercante americano é torpedeado e 
os Estados Unidos rompem relações diplomáticas com a Alemanha. 
Nesse mesmo dia, outro navio mercante, este brasileiro, é torpedeado 
no canal da Mancha. Uma semana depois, o presidente Wenceslau Braz 
rompeu relações com a Alemanha, em solidariedade aos Estados Uni-
dos e com fundamento na Doutrina de Monroe.9 Mais navios brasilei-
ros são torpedeados, e em outubro é a vez do Macau, afundado ao largo 
da costa francesa. A indignação dos jornais e da opinião pública cresce. 
A 26 de outubro de 1917, o Congresso brasileiro decreta e o presidente 
sanciona resolução proclamando a existência de um estado de guerra 
entre o Brasil e o Império Alemão (ARARIPE, 2006, p. 342).
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As primeiras organizações operárias tentaram remediar, inicialmente, este tipo 
de prática, sustentando escolas para os ilhos dos trabalhadores, as quais eram 
mantidas por associações dos trabalhadores. Posteriormente, com o advento dos 
primeiros sindicatos, se mantiveram escolas e a luta para romper com o traba-
lho infantil se iniciou. 
O DISCURSO NACIONAL
A humanização da educação e a proposta de uma escola que desenvolvesse o 
conhecimento a partir das condições biológicas e psíquicas dos alunos chegaram 
ao Brasil no início dos anos de 1920. Essa nova forma de pensar a educação e a 
realidade do aprendiz fez parte de uma tendência nacionalista, que veio com um 
discurso modernizador que viria a promover o projeto político da Era Vargas 
(1930 a 1945).
Podemos considerar que o Brasil estava descobrindo o “Brasil”, mas não 
seria uma descoberta fundada na pesquisa e no autoconhecimento dos brasilei-
ros por si. O Estado teria a batuta dos conteúdos que poderiam ser conhecidos 
e os maquiaria para justiicar sua autoridade.
Após uma série de movimentos culturais conhecidos como “Modernismo”, 
a Semana de Arte Moderna (1922) foi o grande exemplo, a produção literária 
e a intelectualidade brasileira tinham expoentes dedicados ao sonho de uma 
nação do futuro. O desejo de construir uma nação para o futuro viria, infeliz-
mente, pelo intervencionismo do Estado. Não podemos, conforme descreve 
Boaventura (2000), pensar que foi ela quem inaugurou, contudo, ela é a anun-
ciadora do início da caminhada a uma nova mentalidade com traços marcados 
pelo simbolismo e futurismo:
1. As marcas nítidas de certo modernismo datado e desatual que, en-
tre nós, caiu no gosto do público; 2. a penetração desastrosa no meio 
literário de um futurismo obcecado pela modernidade aparente, no 
âmbito da linguagem e de tiradas bombásticas, praticando, em outro 
registro, o mesmo artifício linguístico que os novos almejavam derru-
bar (BOAVENTURA, 2000, p. 19-20).
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Boaventura (2000) elabora uma crítica à Semana de Arte Moderna, pois consi-
dera que ela acaba por engessar a estética ao invés de expandi-la, sobretudo ao 
se comparar qualquer produção “estapafúrdia” com o futurismo. Indiferente das 
pessoas defenderem ou atacarem esse movimento, o Brasil, no século XX, dese-
java o espírito moderno mais do que o vivia, uma vez que as as tecnologias e 
ciências eram incipientes. No entanto, o elemento central do Modernismo está 
alicerçado na busca por uma identidade nacional, para isso, a necessidade em 
se romper com padrões estrangeiros, ainda que a sintonia com o que ocorria na 
Europa era necessária, e se voltar para o próprio passado.
O Brasil precisava se redescobrir: seu povo, folclore, ancestralidades. É neste 
caldeirão de profusão de ideias que Mário de Andrade (1893-1945) lança seu 
ideário da fusão do povo brasileiro a partir das três ‘raças’: indígena, negras e 
branca. É na obra Macunaíma, escrita na primeira fase do Modernismo, em que 
traça a história de seu anti-herói Macunaíma, rompendo com a escrita romântica. 
Em meio a tudo isso, desponta o pronunciamento da autoridade estatal sobre a 
vida social, chamada de Movimento Tenentista. Jovens oiciais se organizaram para 
a defesa do que consideravam o bem público maior, a pátria. Mas seu conceito 
de valor patriótico vestia “verde oliva”, nome que acabou sendo dado ao Clube 
fundado pelos “tenentes”. Hermes da Fonseca, marechal que já tinha sido presi-
dente da república, foi o presidente honorário da associação dos jovens militares.
“E estava lindíssima na Sol da lapa os três manos um louro um vermelho 
outro negro, de pé bem erguidos e nus. Todos os seres do mato espiavam as-
sombrados. O jacarèuna o jacarètinga, o jacaré-açu o jacaré-ururau de papo 
amarelo, todos esses jacarés botaram os olhos de rochedo pra fora d’água”. 
(Mário de Andrade) 
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O Movimento Tenentista se desenvolveu de 1920 a 1935 sob as ordens de 
revolucionários do período, muitos desses homens sem a patente de tenente, 
contudo, recebeu ainda assim o nome de Tenentista. Esse movimento foi res-
ponsável pela crise das oligarquias cafeeiras e por delagrar a Revolução de 1930, 
ganhando apoio popular, mas não obtendo êxito na permanência do poder. O 
insucesso se deve às plataformas econômicas que desagradaram o sistema agrá-
rio, as disputas internas e a retomada de poder pelo exército. 
O que se pode airmar do Tenentismo, em suas etapas iniciais – até 
1926, vamos dizer -, é que se mantém, predominantemente, no âmbito 
de um reformismo pequeno-burguês, que divaga em formulações ou 
que se repete, mas não se renova (SODRÉ, 1978, p. 28). 
Antes da Revolução de 1930 propriamente dita, ainda em 1920, o Brasil era um 
país de cultura fortemente agrária e de escassa tecnologia, aliado a uma crise 
política advinda do sistema capital internacional o país viu sua economia interna 
encolher devido à queda das exportações. A crise se intensiica quando o pre-
juízo é dividido entre todo o sistema oligárquico: agropecuaristas e cafeeiros 
recebem o mesmo ônus. 
Nesse cenário, Artur Bernardes assume a cadeira da presidência, mesmo com 
uma conspiração militar que tenta impedir sua posse. Os atritos militares cres-
cem, generalizou-se entre as corporações, intelectualidade, grupos econômicos 
e, por im, contou com a adesão inócua de instituições populares. As propostas 
eram pontuais, como, por exemplo, defesa do voto secreto, combater o sistema 
de corrupção, imprensa livre, equilíbrio dos três poderes e efetiva centralidade 
do poder federal. 
Entre os principais nomes que integravam o Movimento Tenentista, pode-
mos destacar o de Luís Carlos Prestes, que fez oposição a Bernardes. O Centro de 
Pesquisas e Documentação de História Contemporânea (CPDOC), uma Escola 
de Ciências Sociais Da Fundação Getúlio Vargas (FGV)2, abriga documentos per-
tinentes sobre a história recente brasileira. O CPDOC (2016, on-line)3 chama a 
atenção para as práticas de Prestes:
O Regime Republicano: Educação de Saliva e Papel
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Comprometeu-se com o movimento revolucionário de 1924, que se 
propunha a depor o presidente Artur Bernardes, e por conta disso li-
cenciou-se do Exército. Em julho, a capital paulista foi palco de uma 
primeira tentativa revolucionária naquele ano, icando a cidade sob 
o controle dos rebeldes por três semanas. Comandados pelo general 
Isidoro Dias Lopes e pelo oicial da Força Pública, Miguel Costa, os 
revolucionários paulistas, após serem desalojados da capital pelas for-
ças legalistas, rumaram para o estado do Paraná. Em outubro, foi a vez 
das guarnições do interior do Rio Grande do Sul se sublevarem lide-
radas por Prestes e contando, ainda, com o apoio de tropas irregulares 
comandadas por caudilhos gaúchos. Derrotados, os rebeldes rio-gran-
denses também rumaram para o Paraná, onde encontraram, em abril 
de 1912, as forças paulistas (CPDOC, 2016, on-line)3.
Os rebeldes se unem, primeiro se conciliando com o sul, fundindo-se à força 
tenentista e recebendo o nome de Coluna Miguel Costa-Prestes. A coluna per-
correu boa parte do território nacional, agremiando adeptos, mas as revoluções 
esperadas não aconteceram, sendo massacrados na Bahia por forças de jagunços 
contratados pelos coronéis dos sertões. O período de poder de Artur Bernardes 
já estava no im, principal intento do movimento. Washington Luís assume a 
posse, e o ciclo de revoluções iniciado em 1922 ainda se propaga até o golpe de 
1930. Em paralelo, Washington Luís, paulista, apadrinha Carlos Prestes, tam-
bém paulista, como sucessor à presidência. Assim, em oposição, Getúlio Vargas, 
com o apoio dos tenentistas, passa a representar a força de Minas Gerais, Rio 
Grande do Sul e Paraíba.
Júlio Prestes ganha as eleições, mas, com as condições econômicas insus-
tentáveis, o assassinato do vice de Vargas e o descontentamento da população, 
é delagrado o golpe de 1930 e Vargas é conduzido a um governo provisório.
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EIS QUE GETÚLIO SE 
ESTABELECE: O MODELO IMPOSTO
Um dos personagens de maior importância da modernização da educação bra-
sileira foi Anísio Teixeira. O advogado, intelectual baiano, assumiu diversos 
cargos no poder executivo, tanto na Bahia como no Rio de Janeiro. Além do 
Governo Federal,
[...] as diiculdades enfrentadas pela educação vinham desses setores 
resistentes às mudanças, os quais continuavam controlando a socieda-
de brasileira. Anísio identiicava essas resistências também na forma 
como nosso processo político tinha se organizado, cristalizando a ten-
dência dos políticos de defesa de interesses privados, o que conduzia a 
uma política clientelista e personalista (SAVIANI, 2013, p. 22).
Anísio Teixeira (1900-1971) se destaca pela preocupação com a integração da 
educação no país, escreve algumas obras voltadas à educação: “Educação não é 
privilégio” (1957) e “Educação é um direito” (1968). Unir o destino do brasileiro 
na escola pública à universidade; promover condições para que todos tivessem 
acesso à instrução que, para Teixeira, era a forma de conter o atraso do país.
[...] as diiculdades enfrentadas pela educação vinham desses setores 
resistentes às mudanças, os quais continuavam controlando a socieda-
de brasileira. Anísio identiicava essas resistências também na forma 
como nosso processo político tinha se organizado, cristalizando a ten-
dência dos políticos de defesa de interesses privados, o que conduzia a 
uma política clientelista e personalista (SAVIANI, 2013, 22).
A democratização do conhecimento também era uma preocupação do educador 
baiano. Foi dele a fundação do Centro Educacional Carneiro Ribeiro, em Salvador, 
que daria modelo aos conhecidos CIACs (Centro Integrado de Atendimento à 
Criança), criado em 1991, durante o governo de Fernando Collor de Melo.
O nacionalismo defendido por Anísio Teixeira se traduziu numa tendência 
da política educacional no país, no momento em que os movimentos sociais se 
articulavam para implantar mudanças contra as oligarquias regionais e a desi-
gualdade latente do projeto econômico brasileiro.
Em 1924, a Associação Brasileira de Educação (ABE), que tinha por inali-
dade a divulgação de ideias com alicerces em teorias estadunidenses, surge pela 
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iniciativa de 13 idealizadores, tendo, entre outras metas, rejeitar os modelos fran-
ceses até então amplamente utilizados nas escolas. Anísio se tornou presidente 
da ABE em 1931, e é nesse cenário que as ideias de John Dewey (1859-1952) 
foram introduzidas por ele, após viajar aos Estados Unidos e receber uma for-
mação pedagógica:
Na formação pedagógica de Anísio Teixeira, foram decisivas as duas viagens 
que fez aos Estados Unidos. Da primeira, em 1927, resultou o livro Aspectos 
americanos da educação, publicado em 1928, no qual relata os resultados de sua 
viagem, apresentando comentários sobre estabelecimentos de ensino, órgãos de 
administração, edifícios, métodos práticos de ensino, currículo lexível e variado, 
vida estudantil, além de uma primeira sistematização da concepção de Dewey 
(SAVIANI, 2013, 228).
O pensamento de Dewey representou o avanço tecnológico de sua época, 
somando os conceitos darwinianos sobreevolução, a física social comtiniana, 
bem como sua leitura de Marx, Weber e Durkheim, o que levou o pensador a 
dar destaque aos fatores sociológicos enquanto objeto epistemológico. Nas pala-
vras de Anísio Teixeira:
Podemos, já agora, deinir, com Dewey, educação como o processo de 
reconstrução e reorganização da experiência, pelo qual lhe percebemos 
mais agudamente o sentido, e com isso nos habilitamos a melhor di-
rigir o curso de nossas experiências futuras (TEIXEIRA, 2010, p. 37).
Conforme Teixeira (2010), a educação, para Dewey, não se localiza em um 
determinado tempo da vida, mas a qualquer tempo, seja na infância, moci-
dade ou velhice. Mas ressalta os aspectos plásticos conforme cada etapa de vida, 
onde quanto mais jovens somos, mais experiências aproveitadas teremos. Sob 
o aspecto social, a sociedade se organiza e mantém a organização por causa da 
comunicação, ou seja, a transmissão. Ser sociedade implica em comunicação, e 
comunicação é educação (TEIXEIRA, 2010). O processo de ensinar e aprender 
consiste em educação que, por sua vez, é exigida pela vida social.
Em 1931 é realizado no Rio de Janeiro um evento com pessoas do universo 
da educação, a IV Conferência Nacional de Educação, organizada pela ABE. É 
neste evento que o presidente do Brasil, Getúlio Vargas, pede na plenária uma 
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ilosoia que possa nortear a educação brasileira. Como as ideias eram diversas 
das pessoas presentes na conferência, o resultado é a divisão em dois blocos: um 
mais conservador e o outro mais pioneiro e liberal.
O Manifesto dos Pioneiros da Escola Nova, nome mais conhecido da obra “A 
Reconstrução Educacional no Brasil” (1932), é fruto da escrita da parte pioneira 
e que declara abertamente a educação como direito para todas as pessoas e como 
uma obrigação do Estado, airmando a defesa do interesse de formar a popula-
ção para superar a desigualdade instalada no país, uma herança do seu passado.
À luz dessas verdades e sob a inspiração de novos ideais de educação, 
foi que se gerou, no Brasil, o movimento de reconstrução educacio-
nal, com que, reagindo contra o empirismo dominante, pretendeu um 
grupo de educadores, nesses últimos doze anos, transferir do terreno 
administrativo para os planos político-sociais a solução dos problemas 
escolares (AZEVEDO et al, 2010, p. 35).
O slogan lançado pela Escola Nova era “ensinamos crianças, não matérias”, dei-
xando objetiva a chamada “curvatura da vara” para o lado das crianças, e não 
para o das matérias, como faziam os tradicionalistas (SAVIANI, 2013). As pessoas 
que compunham o Manifesto eram proissionais que possuíam uma mobilidade 
nas áreas institucionais, urbanas e ideológicos. Suas formações eram de cursos 
tradicionais superiores, como medicina, direito e engenharia, mas não apenas 
nesses espaços, como indica Nunes (1998).
Os seminários, as livrarias, as editoras, os bares e os quartos de pensão 
foram também locus de reunião e formação desses intelectuais. O pri-
meiro ponto a reter é, portanto, o fato de que para a geração de inte-
lectuais dos anos 20 e 30, a universidade ou o ensino superior não foi o 
local exclusivo e muitas vezes nem o mais importante da sua formação 
intelectual.
Qual foi a tarefa básica dos intelectuais assim forjados? Secularizar a 
cultura. Um ponto importante dessa secularização para a qual traba-
lharam incansavelmente foi operar a passagem da escola enquanto ex-
tensão do campo familiar, privado e religioso para o espaço público da 
cidade (NUNES, 1998, p. 110).
O papel das pessoas que se aliaram para elaborar uma nova forma de educação 
era o de estabelecer sua secularização, como indicado, se afastando dos ranços 
religiosos e formando pessoas na área educacional com desejos para o futuro, 
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valorizando a democracia, a ciência e a indústria. Para que esse projeto desse 
certo, reformas foram necessárias nos anos de 1920 e 1930: linguagem comum, 
prioridades, hierarquias. Para tanto, a apropriação de elementos jurídicos pode 
dar esse rigor, surgindo os Departamentos de Educação (NUNES, 1998). 
O desenvolvimento do capital industrial e a regulação do Estado sobre as 
atividades econômicas e sociais necessitaram de uma política de cunho nacio-
nalista e com o sentimento de assistência do poder público na vida do cidadão. 
Era preciso proliferar as instituições públicas e promover a assistência à popu-
lação para garantir a autoridade do estado em todos os cantos do país.
A escola seria fundamental na formação do ideário brasileiro, na construção 
de um sentido patriótico que tivesse no líder, o presidente da república, a per-
soniicação do país. Não foi por acaso que a história de Getúlio Vargas ganhou 
destaque nas cartilhas do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda). No 
dia do aniversário do ditador, 19 de abril, crianças prestavam homenagem a 
Vargas. Ele era personagem de inspiração para a alfabetização de crianças; um 
“bom” exemplo que, obrigatoriamente, deveria ser seguido.
O papel do DIP, entre outras coisas, era o de deinir no rádio, televisão, jornal e 
cinema as propostas do governo nos âmbitos da educação, cultura, economia, 
censurando qualquer projeto que julgasse contrário ao próprio Estado.
A educação também tinha como prioridade a formação sintonizada com o 
mundo do trabalho. Para isso, os cursos proissionalizantes passaram a ser uma 
O DIP foi criado por decreto presidencial em 1939, com a inalidade de di-
vulgar e propagandear a ideologia do Estado Novo à massa como um todo, 
o que implica em veicular uma imagem ‘pronta’ do próprio governo interna-
mente e externamente.
Fonte: CPDOC (2016, on-line)2.
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das prioridades do Estado. A reforma da educação promovida pelo então Ministro 
da Educação e Saúde, Gustavo Capanema, priorizou essa meta.
Capanema foi ministro da Educação de 1934 a 1945, e foi o que mais tempo 
permaneceu à frente do ministério, promovendo mudanças para estrutura da 
educação contemporânea no país. Entre as suas realizações está a reforma que 
leva seu nome “Capanema”.
Por esta reforma, a educação deveria exaltar o civismo associado ao valor do 
trabalho e à qualiicação da sociedade em seus diferentes segmentos. Preparar 
o operário, mas também qualiicar as elites. As universidades deveriam estar 
preparadas para o desenvolvimento da liderança com caráter patriótico. O tra-
balhador deveria ser qualiicado e voltado a uma especialidade em benefício 
do desenvolvimento do país. Até mesmo as mulheres deveriam receber uma 
educação adequada para a complementação da educação doméstica. Propostas 
como a de qualiicar a mão de obra revelam o interesse de uma classe aristo-
crática para que o desenvolvimento industrial se efetive, sem uma preocupação 
com a educação emancipadora ou mesmo igualitária que a elite tinha acesso 
(ROMANELLI, 1999).
O discurso nacionalista teve um papel de destaque na reforma do ministro 
do Estado Novo. Seu interesse era fortalecer a imagem do governo utilizando 
os meios educacionais para a hegemonia do poder federativo. O presidente é 
o representante da pátria. O DIP, ins-
trumento de propaganda do governo 
Vargas, aliou-se a este interesse, como 
falamos anteriormente.
A alfabetização de adultos pas-
sou, também, a ser preocupação do 
Estado Brasileiro. Era preciso tirar uma 
grande leva de brasileiros daignorân-
cia através das letras e prepará-los para 
as atividades proissionais. A urbani-
zação fortalecida pelo êxodo rural e a 
redução da imigração europeia impunham a necessidade de preparação do ele-
mento nacional.
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A REDEMOCRATIZAÇÃO POPULISTA E A EDUCAÇÃO POPULAR
A queda do Estado Novo, em 1945, não signiicou uma mudança na política eco-
nômica do país, já que a saída de Getúlio Vargas do poder manteve os grupos 
políticos, parcialmente, que lhe deram suporte na esfera de comando do estado. 
Sempre é importante lembrar que as classes populares eram afastadas dessa dis-
cussão. Os dados sobre a população eram trabalhados por especialistas - eles é 
que desenhariam a estratégia para resolver o problema do analfabetismo, por 
exemplo.
O nome de destaque no contexto da alfabetização de adultos foi Paulo Freire 
(1921-1997). O educador pernambucano que se dedicou à alfabetização das clas-
ses populares acabou sendo conhecido pelo trabalho com adultos. Seu destaque 
inicial foi, em 1963, ter alfabetizado 300 adultos em 45 dias. Seu método “revo-
lucionário” ganhou fama - acreditava que a educação não era capaz de mudar o 
país por completo, pois ela estaria atrelada a outros interesses, como os da elite, 
contudo, ela também pode ser agente de mudança.
Você, eu, um sem-número de educadores sabemos todos que a educa-
ção não é a chave das transformações do mundo, mas sabemos também 
que as mudanças do mundo são um que fazer educativo em si mesmas. 
Sabemos que a educação não pode tudo, mas pode alguma coisa. Sua 
força reside exatamente na sua fraqueza. Cabe a nós pôr sua força a 
serviço de nossos sonhos (FREIRE, 1991, p. 126).
Adaptado ao projeto nacionalista e desenvolvimentista do país, marcado pela 
necessidade de superar o legado amargo do passado, enterrando os brasileiros 
no analfabetismo, Paulo Freire era a possibilidade de encurtar o tempo para a 
qualiicação necessária.
Formado em direito, nunca tendo exercido a proissão, preferiu traba-
lhar como professor de língua portuguesa em Recife. Acabou sendo indicado 
para o cargo de Secretário de Estado da Educação, Cultura e Serviço Social de 
Pernambuco (1946). Encontrava-se nessa oportunidade a possibilidade prática 
de colocar seu método em funcionamento.
Quando recebeu apoio do governo federal, na presidência de João Goulart, 
com as Reformas de Base, para propagar seu método de ensino em todo o país, o 
Regime Militar (1964 a 1985) se estabeleceu e foi abortada a iniciativa de Freire. 
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O Método Paulo Freire, como icou conhecido, buscava alfabetizar a partir 
da realidade que a pessoa vivia, utilizando “ichas da descoberta”, sistema em que 
utilizava uma palavra do cotidiano e depois separava suas sílabas e “daí mostra-
vam-se as famílias fonêmicas” (SAVIANI, 2013, p. 325). 
O seu cotidiano e elementos de existência seriam a matéria-prima para a 
orientação à ciência. Desta forma, considerava fundamental que a consciência 
fosse o elemento de impulso para a aquisição do conhecimento formal. Para ele, 
a liberdade do ser humano está ligada diretamente à capacidade de racionalizar 
a existência dentro da condição que o cerca. Partindo do cotidiano e reletindo 
sobre si, a pessoa se percebe agente racional, humanizando-se e se conscienti-
zando da própria existência.
A conscientização implica, pois, que ultrapassemos a esfera espontânea 
de apreensão da realidade, para chegarmos a uma esfera crítica na qual 
a realidade se dá como objeto cognoscível e na qual o homem assume 
uma posição epistemológica (FREIRE, 2006, p. 30).
Por isso, parte considerável de seus postulados metodológicos está ligada às ten-
dências de esquerda, o que resultou em sua perseguição pelo Regime Militar.
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O REGIME MILITAR E A 
EDUCAÇÃO ABAIXO DE BOTAS
O golpe militar instalado no Brasil em 1964 foi um desdobramento da crise polí-
tica que o país vivia desde o inal da Segunda Guerra Mundial (1939 a 1945). 
O desenvolvimentismo como uma política de crescimento econômico permitiu 
a transformação da educação como elemento de proissionalização, o aumento 
do capital estrangeiro no país modernizou a economia, mas aprofundou as dife-
renças regionais.
O analfabetismo e qualiicação do trabalhador continuavam como priori-
dade, mas distante de ser atingida rapidamente. Neste contexto, o Método Paulo 
Freire foi um importante avanço, mas colocava uma ameaça, a conscientização 
dos trabalhadores aliada à alfabetização. A educação não podia libertar os cida-
dãos das classes populares, a massa sem instrução não poderia questionar as 
formas de dominação que já existiam no país havia séculos.
Na luta pelo poder, o presidente João Goulart (1961 a 1964) buscou na popu-
lação o apoio que não conseguia no Congresso Nacional. Entre os meios para 
atingir o poder, o presidente lançou as Reformas de Base. Essas reformas pro-
punham modiicações na economia, política e na sociedade, fomentadas pelo 
Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) na tentativa de superar o subdesenvolvi-
mento nacional, mas que só em 1961 com Goulart (Jango) na presidência é que 
as discussões avançam.
O que gerou o ambiente para a ação dos militares, apoiados nos grupos 
econômicos dominantes, aliados ao capital multinacional e a classe média con-
servadora. Em primeiro de Abril de 1964, uma junta militar tomou o poder e o 
entregou ao General Castelo Branco.
No regime dominado pelos generais, o domínio sobre as instituições educa-
cionais foi constante, impedindo que se colocasse contra os interesses do estado 
uma camada social crítica, uma vez que era dentro dessas instituições que esta-
vam expressões da intelectualidade que discordavam das ações do regime.
A construção de uma política centralizadora implicava em anular os meios 
em que a educação se tornava um mecanismo representativo. Dessa forma, 
interferir nas instituições de ensino e reprimir as manifestações representativas 
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seria fundamental. E o regime militar fez isso. Uma das primeiras medidas foi o 
Decreto Lei 477 - por ele, o regime militar fechou os centros acadêmicos, pren-
deu professores e fechou instituições.
O regime, de forte caráter tecnicista, ampliou o número de universidades no 
país, ao mesmo tempo em que implantou o vestibular. A justiicativa era permi-
tir que um maior número de alunos ingressasse nas instituições superiores, mas 
selecionar a vaga por desempenho em uma prova de conhecimento. E aí os cur-
sinhos pré-vestibulares se proliferaram.
Aqui a educação tecnicista ganha terreno guiada por programas como Aliança 
para o Progresso ou acordos de parceria com os Estados Unidos (LUCKESI, 
2003). As leis 5.540/68 e 5.692/71 tornam oiciais o ensino técnico, o que implica 
na ação do comportamento operante, ao estilo behaviorista, a instituição escolar 
se torna engrenagem no sistema (re)produtivo do capitalismo.
A escola atua, assim, no aperfeiçoamento da ordem social vigente (o 
sistema capitalista), articulando-se diretamente com o sistema produ-
tivo; para tanto, emprega a ciência da mudança de comportamento, ou 
seja, a tecnologia comportamental (LUCKESI,2003, p. 61).
A relação estabalecida entre quem educa e quem recebe educação se dá de modo 
formal, o qual quem ensina apenas transmite o conhecimento, revelando uma 
estrutura onde a passividade do alunato é exercida e os conteúdos decorados, 
fragmentando ainda mais os saberes. Nas palavras de Aranha (1996, p. 183), a 
tendência tecnicista tem por inalidade “as funções de planejar, organizar, diri-
gir e controlar,intensiicando a burocratização que leva à divisão do trabalho”.
Na base da pirâmide, a ditadura militar negou e reairmou, contraditoria-
mente, o processo de alfabetização de adultos. Se Paulo Freire, o educador das 
Reformas de Base, foi expurgado do país, seu método serviu como base para a 
implantação do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), sob a lei nº 
5.379, de 15 de dezembro de 1967. O corpo militar estaria no controle de todos 
os conteúdos ensinados, o que ganha maior corpos em 1970, sob o enfoque de 
eliminar o analfabetismo no Brasil em pouco tempo.
Mas a experiência de alfabetização dos militares não foi bem-sucedida. 
Impregnado por corrupção e falta de uma ação mais eicaz para fazer executar 
o plano de alfabetização nacional, a proposta minguou. Os recursos previstos 
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vinham da loteria federal e imposto de renda, mas sem o devido controle, os 
gastos foram maiores do que a arrecadação, sendo substituído em 1985 pela 
Fundação Educar, pelo Decreto nº 91.980.
Na interferência dos conteúdos, o regime substitui disciplinas humanis-
tas como História e Geograia e introduziu Estudos Sociais e Educação Moral e 
Cívica – esta desdobrada nos demais anos de ensino como Ordem Social Política 
Brasileira (OSPB) e Estudo de Problemas Brasileiros (EPB).
Nas escolas de ensino médio, chamados de Colegial, se implantou o ensino 
técnico e proissionalizante. As escolas públicas se dedicaram à formação média 
associada a uma proissão técnica, a qual já havia sido prioridade dos regimes 
que antecederam a ditadura.
As duas medidas mais signiicativas do regime foram a implantação das leis 
nº 4.024/1961 e 5.692/1971. A primeira deu ao regime condições de interferên-
cia direta nas instituições de ensino, a segunda implantou as diretrizes e bases da 
educação, em 1971. Ironicamente foi a primeira Lei de Diretrizes e Base (LDB) 
nacional, implantada por um regime autoritário.
Dentro de uma diretriz ideológica, sintonizada com o contexto mundial, a 
educação proposta pelos militares teve uma carga ideológica anticomunista. O 
que fez do regime, de certa forma, “uma caça às bruxas”, ironicamente a educa-
ção seria, para os generais, o caldeirão dos ideais de esquerda.
Como ocorre em toda ditadura, a busca pela perpetuação desgasta a socie-
dade. O autoritarismo excessivo fez com que setores que apoiaram o regime 
inicialmente começassem a declinar e engrossar a oposição aos militares.
A economia mundial ampliou o descontentamento, principalmente após a 
crise mundial do petróleo (1973). A crise mundial restringiu o crédito interna-
cional e encerrou a sequência de crescimento a que o país assistia desde 1969, 
o que foi chamado de “milagre econômico”. Os objetivos dentro desse milagre 
estavam pontualmente aixados:
a) a icção da moeda estável na legislação econômica; b) a desordem 
tributária; c) a propensão ao déicit orçamentário; d) as lacunas do sis-
tema inanceiro; e) os focos de atrito criados pela legislação trabalhista 
(SIMONSEN; CAMPOS, 1974, p.119).
DA VELHA REPÚBLICA À REPÚBLICA NOVA
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A falta de recursos por parte do Governo Federal fez com que se paralisassem 
obras de grande envergadura que davam sentido ao regime e propunham a cons-
trução de uma potência econômica no futuro. Discurso que predominou em 
diversos governos, como um ideário a ser cumprido, mas que nunca se realizou.
A partir de 1974, com a eleição de Ernesto Geisel, o penúltimo presidente 
do regime militar, inicia-se um processo de abertura, lento e gradual, com retro-
cessos no caminho da liberdade política. O encerramento deste processo se deu 
ao inal do governo João Batista Figueiredo (1979 a 1985) e foi nele que se anis-
tiaram os exilados políticos em 1979.
A transição para uma democracia se mostrou conservadora. Apesar do 
movimento pelas “Diretas Já”, que desejava implantar eleições ainda em 1984 
para a escolha de um presidente da república, o governo, de forma habilidosa, 
retardou a escolha pelo voto e promoveu as eleições indiretas por meio do con-
gresso. Em 1985, Tancredo Neves foi eleito para a sucessão presidencial, com 
José Sarney como vice.
Sarney assumiria o governo após a morte de Tancredo, enfermo e afastado 
do poder. A posse de eleito foi simbólica, feita pelo seu vice. O titular jamais saiu 
de hospitais onde foi tratado até a morte, em abril de 1985. 
A posse de José Sarney fazia da transição um processo extremamente con-
servador. Ele havia sido representante da ditadura militar no Congresso e iel 
aos interesses dos militares. Sua dissidência era imediatista e sua presidência 
uma fatalidade para quem desejava uma democracia que reiniciasse com mais 
originalidade histórica.
Em 1988, icou pronta a Constituição do país que coroava a reabertura polí-
tica e a defesa da democracia. Para a educação, as verbas foram estabelecidas em 
porcentagens acima do que o governo militar designava – União deveria inves-
tir 18%, estados membros 25% – o que acabou não se realizando na prática, com 
manipulações de recursos para outros ins, tirados da educação (BRASIL, 1988). 
O Estado passa a se reconhecer como responsável pelo sistema educacional, con-
ferindo o acesso à educação como direito.
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será pro-
movida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao ple-
no desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercícios da cida-
dania e sua qualiicação para o trabalho (BRASIL, 1988, Art. 205).
O Regime Militar e a Educação Abaixo de Botas 
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Em 1996, a nova LDB (Leis de Diretrizes e Bases da Educação) é aprovada. Nela 
a educação infantil é incluída como parte do processo educacional e obrigatória 
sua oferta pelo estado. São as novas formas de organização do ensino fundamen-
tal. A educação média também é reformulada, assim como o ensino superior. 
A inalidade da educação básica (a educação infantil, o ensino fundamental e o 
ensino médio) é inalmente pontuada, revelando uma novidade fruto dos emba-
tes educacionais ao longo dos anos:
A educação básica tem por inalidade desenvolver o educando, assegu-
rar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania 
e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posterio-
res (BRASIL, 1996, Art. 22).
A proliferação das instituições de ensino superior privadas foi também uma marca 
da educação brasileira nos últimos 15 anos. Com um número cada vez maior de 
cursos ofertados, o país viveu uma procura imensa pelas cadeiras universitárias, 
as quais agora apresentam ociosidade. Conforme retrata Teixeira (1989), antes 
da Era Vargas, o ensino superior no Brasil era deicitário no campo das huma-
nidades, uma vez que as cadeiras ofertadas eram de medicina, ciências agrárias 
ou engenharias, o que gerava uma precariedade de formação docente, se conec-
tando a uma formação da educação básica carente.
Sabemos que todo sistema de educação, em seus diferentes níveis de 
estudos e em seus diferentes

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