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W BA 06 63 _v 1. 0 O PAPEL DO PSICÓLOGO NAS ORGANIZAÇÕES © 2019 POR EDITORA E DISTRIBUIDORA EDUCACIONAL S.A. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, da Editora e Distribuidora Educacional S.A. Presidente Rodrigo Galindo Vice-Presidente de Pós-Graduação e Educação Continuada Paulo de Tarso Pires de Moraes Conselho Acadêmico Carlos Roberto Pagani Junior Camila Braga de Oliveira Higa Carolina Yaly Giani Vendramel de Oliveira Juliana Caramigo Gennarini Nirse Ruscheinsky Breternitz Priscila Pereira Silva Tayra Carolina Nascimento Aleixo Coordenador Giani Vendramel de Oliveira Revisor Lucilene Tofoli Editorial Alessandra Cristina Fahl Beatriz Meloni Montefusco Daniella Fernandes Haruze Manta Hâmila Samai Franco dos Santos Mariana de Campos Barroso Paola Andressa Machado Leal Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Baptista, Rogério Rodolfo B222o O papel do psicólogo nas organizações/ Rogério Rodolfo Baptista, – Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A. 2019. 105 p. ISBN 978-85-522-1499-1 1. Psicologia organizacional e do trabalho. 2. Educação corporativa. I. Baptista, Rogério Rodolfo. II. Título. CDD 370 Thamiris Mantovani CRB: 8/9491 2019 Editora e Distribuidora Educacional S.A. Avenida Paris, 675 – Parque Residencial João Piza CEP: 86041-100 — Londrina — PR e-mail: editora.educacional@kroton.com.br Homepage: http://www.kroton.com.br/ http://www.kroton.com.br SUMÁRIO Apresentação da disciplina.........................................................................4 O mundo do trabalho e as relações trabalho-subjetividade-saúde do trabalhador ....................................................................................................5 A história da psicologia organizacional e do trabalho ............................25 As áreas da psicologia organizacional e do trabalho ..............................44 Papéis e funções do psicólogo organizacional ........................................63 Conceitos e perspectivas de estudo em Psicologia Organizacional e do Trabalho........................................................................................................81 A ética na atuação do psicólogo organizacional e do trabalho..............102 Organizações e perspectivas em Psicologia Organizacional e do Trabalho ......................................................................................................123 3 Apresentação da disciplina A disciplina “o papel do psicólogo nas organizações” aborda alguns dos principais temas relacionados ao papel, funções e atividades do psicólogo nas organizações e nos contextos de trabalho. Nessa disciplina, será abordado inicialmente o conceito de trabalho, sua evolução histórica e as implicações no trabalho do psicólogo. Em seguida, será apresentado um breve resumo da história da psicologia organizacional e do trabalho, tanto no contexto internacional quanto no Brasil. Também serão definidos os principais campos de atuação do psicólogo organizacional, que podem ser divididos em três grandes áreas: psicologia organizacional, psicologia do trabalho e gestão de pessoas. Os quatro níveis de atuação (operacional, tático, estratégico e político) do psicólogo também são temas importantes para compreender o papel do psicólogo. A pesquisa em psicologia organizacional e do trabalho, com os métodos empregados e os principais temas abordados nas últimas décadas; a questão da ética do psicólogo nos contextos de trabalho e organizações é um dos temas abordados. Por fim, serão discutidos temas atuais sobre os estudos das organizações, como os novos modelos de gestão e tendências nos estudos organizacionais. O mundo do trabalho e as relações trabalho-subjetividade- saúde do trabalhador Autor: Rogério Rodolfo Baptista Objetivos • O conceito de trabalho e suas diferentes concepções. • Compreender as relações entre o trabalho, subjetividade e a saúde do trabalhador. • Identificar as relações entre as concepções atuais sobre o trabalho e a relação com a psicologia organizacional. 1. Introdução aos temas trabalho e subjetividade “O trabalho enobrece o homem” e “primeiro o trabalho e depois o prazer” são duas expressões muito utilizadas em nossa sociedade. Mas que significados estão inseridos nessas máximas cotidianas? A primeira faz-nos pensar que o trabalho é algo que pode ser necessário às pessoas, que vai além de ser somente um meio de sobrevivência, ela nos remete à necessidade do trabalho como significante para que a pessoa se torne “alguém” e faça com que seja diferente de outros. O trabalho, para muitas pessoas, é uma das partes mais importantes da vida. Seria isso mesmo? Como conceituamos o trabalho? De que trabalho estamos falando? O trabalho, ao mesmo tempo pode ser algo que se constitui como fonte e meio de construção de nossas identidades, mas também pode ser algo que degrada, causa sofrimento e degrada o ser humano. Por outro lado, a segunda expressão coloca o trabalho como uma obrigação a ser cumprida, que exalta a importância do trabalho, e supõe ser oposto ao prazer, como se ele não pudesse existir fora do trabalho. Conhecemos pessoas que fazem seu trabalho com muito prazer e satisfação e pessoas que contam os minutos para que o dia de trabalho acabe, e ainda, outros que quando se aposentam reinventam o trabalho. Nessa aula, trataremos de como o trabalho pode ser central na vida, como ele pode ser fonte de prazer e significação positiva e, ao mesmo tempo, fonte de sofrimento, e como a psicologia pode contribuir para a compreensão e intervenção no processo trabalho-subjetividade- saúde. Primeiro começaremos entendendo o significado do trabalho e sua evolução histórica, depois como o trabalho pode contribuir ou não para a saúde e bem-estar das pessoas e, finalmente, como a psicologia pode contribuir para essa discussão e ação. Venha conosco! 6 2. Concepções sobre o trabalho e as implicações sobre a subjetividade A palavra trabalho se origina do latim das palavras tripalium, trabicula, que são associadas à tortura, mas será que devemos necessariamente ao sofrimento ou ele pode ter outras questões associadas? O trabalho possui uma variedade de significados e sentidos. Nesse tópico, iremos estudar a construção histórica e os diferentes significados de trabalho. As concepções desenvolvidas na história da sociedade vão além dos sentidos pessoais que atribuímos ao trabalho. Para compreendermos como se deu a construção dos significados atuais do trabalho, faremos uma retrospectiva desse assunto. Os primeiros relatos próximos à concepção sobre trabalho humano como entendemos hoje remonta ao ano 8.000 a.C., quando a humanidade estava se organizando em comunidades e culturas. Com base na agricultura no Oriente Médio, na China, na Índia e no norte da África. Nessas sociedades, o trabalho era basicamente realizado por escravos. A construção das concepções sobre o trabalho está mais descrita na Antiguidade e associada ao pensamento grego e romano. Como presente no pensamento de Platão e de Aristóteles, o trabalho era visto como degradante, reservado aos escravos, pois exalavam a ociosidade como um princípio importante para o homem livre, o cidadão, que devia ser poupado do trabalho. A filosofia clássica caracterizava o trabalho como degradante, inferior e desgastante. A concepção do trabalho se restringiaàs atividades braçais e manuais e as atividades dos cidadãos deveriam ser restritas à política e às artes, que não eram consideradas trabalho. Aristóteles entendia a escravidão como natural e era legitimada na estrutura da sociedade. No Império Romano, o trabalho também era atividade de escravos e se sustentava pelas guerras e conquistas. Precisamos compreender que eram sociedades baseadas na escravidão. Hoje, podemos notar ainda presente resquícios dessa concepção, onde o trabalho manual é 7 desvalorizado e o trabalho intelectual é exaltado (BORGES; YAMAMOTO, 2014: 28). Na Idade Média se dá o surgimento do capitalismo, e dá-se início à mudança da reflexão sobre o trabalho. Essa mudança de concepção do trabalho reflete em mudanças concretas na organização da sociedade e do trabalho. Marx coloca que essa mudança ocorre devido ao grande número de operários, estendendo seu campo de ação e fornecendo produtos em grande quantidade, e à eliminação das diferenças individuais, passando o capitalista a lidar com o operário médio ou abstrato, que coincide com o surgimento da manufatura e da necessidade de buscar compreensões que legitimassem a nova organização social. Nesse novo modelo, o capitalista possui os meios de produção, e basta aos operários vender sua mão de obra, que ocupa a posição de uma mercadoria. O trabalho passa a ter um valor de uso e um valor de troca. Como valor de uso, podemos entender que o trabalho tem seu valor como uma utilidade, para o trabalhador e para o capitalismo, e que como valor de troca, o trabalhador começa a vender sua força para que obtenha os recursos para sua sobrevivência, alienando-se do que produziu. O capitalista busca a mais-valia, ou seja, sempre ganhar mais como trabalho do operário quanto possível. Para que consiga isso, no início prolonga as jornadas de trabalho, chamada de exploração extensiva. Esse aumento da jornada de trabalho apresentava limitações por causa do próprio limite orgânico dos trabalhadores, assim o capitalista buscou aprimorar suas formas de ter mais lucros (BORGES; YAMAMOTO, 2014: 30). Adam Smith (economista do século XVII) atribuiu um relevante valor social ao trabalho e ao seu parcelamento, defendendo que a manufatura aumentaria a abundância geral, sendo um grande defensor da produtividade e para que isso acontecesse seria necessária a especialização e segmentação do trabalho, dando início à divisão do trabalho como um princípio importante, que depois seria amplamente utilizada nas etapas posteriores do capitalismo. Ele considerava 8 divisão do trabalho uma consequência da propensão da natureza humana para permutar, negociar e trocar bens, e das faculdades da razão e da linguagem. Essa visão contribuiu para uma hierarquização, desvalorizando o trabalho do serviço público, considerado improdutivo, e reforçou a concepção de instrumentalidade econômica do trabalho, em que esta valia tanto mais quanto aumentavam os rendimentos do detentor do capital, contribuindo com a visão do homus economicus. Esse modelo de produção afetou profundamente a sociedade. Umas das consequências foi a separação da vida privada e o trabalho. No âmbito da fábrica, surgiram as funções de direção e supervisão para fiscalizar e controlar o trabalho (BORGES; YAMAMOTO, 2014: 32). A reforma protestante também causou um grande impacto no mundo do trabalho. Max Weber (1967) defendeu que o protestantismo provocou uma nova visão sobre as relações entre o trabalho e a vida em seu livro “a ética protestante e o espírito do capitalismo”. O luteranismo criou a noção de vocação, que consistia em um chamado de Deus para a realização de um trabalho secular ou uma missão, dando ao trabalho um status de missão pessoal e espiritual, exaltando o trabalho para a glorificação de Deus e, ao mesmo tempo, reprovando a ociosidade, incutindo que quanto mais duro se trabalha, mais se prova ser merecedor da graça divina. A essa visão se deu o nome da fase de “glorificação do trabalho”. (BORGES; YAMAMOTO, 2014: 31) Segundo Marx, o trabalho tem dois sentidos: de um lado produz a própria condição humana e de outro representa um eixo da história da humanidade. Em relação ao primeiro, o trabalho é a expressão do seu próprio ser, diferenciando-o dos demais animais e no segundo representa a noção de que a história da humanidade é a história das relações de trabalho. O trabalho possui sete características principais: a) alienante, porque o trabalhador desconhece o próprio processo produtivo e o valor que agrega ao produto, além de não se identificar com os produtos de seu trabalho; b) explorador, devido aos objetivos de produção da mais-valia vinculada ao processo de acumulação do 9 capital; c) humilhante, porque afeta negativamente a autoestima; d) monótono em sua organização e conteúdo da tarefa; e) discriminante, porque classifica os homens na medida em que classifica os trabalhos; f) embrutecedor, porque, longe de desenvolver as potencialidades, inibe ou nega sua existência por meio do conteúdo pobre, repetitivo e mecânico das tarefas; e g) submisso, pela aceitação “passiva” das características do trabalho e do emprego, pela imposição da organização interna do processo de trabalho, pelas relações sociais mais amplas e, especialmente, pela força do exército industrial de reserva (BORGES; YAMAMOTO, 2014: 34). Podemos resumir as concepções sobre o trabalho apresentadas até aqui em três tipos: o pensamento greco-romano, a do capitalismo liberal (ética do trabalho) e a concepção marxista. As concepções sobre o trabalho sofreram mudanças importantes com o avanço do capitalismo. Num cenário onde capitalismo caminha para uma economia livre de mercado e do modelo monopolista e/ou oligopolista, novas circunstâncias econômicas e sociais surgem e influenciam a concepção sobre trabalho. Nesse contexto, surge “administração científica”, que tem entre seus expoentes Taylor e Fayol. PARA SABER MAIS Frederick Taylor (1856 – 1915) formou-se engenheiro mecânico estudando à noite. Escreveu o livro “Os Princípios da Administração Científica”, publicado em 1911. É considerado o pai da administração moderna e criou a teoria da Organização Racional do Trabalho (ORT), cujos princípios são: análise do trabalho e estudo dos tempos e movimentos; estudo da fadiga humana; divisão do trabalho e especialização do operário; desenho de cargos e tarefas; incentivos salariais e prêmios; conceito de homo economicus; boas condições de trabalho; padronização e supervisão funcional. 10 Taylor defendia que os principais objetivos da administração era assegurar o máximo de prosperidade ao capitalista (através do lucro) e, ao mesmo tempo, o máximo de prosperidade ao empregado (através de altos salários). Ele propôs a assunção de métodos científicos para lidar com as questões da administração e gestão das empresas e não somente a experiência prática, adotando métodos de tempos e movimentos para eliminar movimentos desnecessários e substituir os lentos e ineficientes por rápidos. Do ponto vista do trabalho, suas ideias influenciaram diretamente a forma de organização do trabalho. Ele levou a divisão do trabalho para um outro patamar, onde o trabalho de cada empregado deveria ser minuciosamente planejado pela direção da empresa, sendo que ao operário lhe caberia somente a execução, sendo poupado de pensar e obedecendo as normas. Com objetivo de aumentar a produtividade, Taylor propôs a seleção científica, baseada num perfil de tarefas e do próprio trabalhador e o treinamento sistemático na função, visando eliminar desperdícios de tempo e movimentos. Também podemos citar como um princípio importante a supervisão imediata, ou seja, a legitimação da figura do “chefe”, uma pessoa que deveria comandar e dar ordens explícitas sobre as tarefas para cada empregado. Todo esse trabalho estava aliado ao incentivo salarial. Ele acreditava que, quanto mais o empregado fosse recompensadopelo seu esforço de produtividade, mais deveria ganhar, assim os empregados começam a desejar cada vez mais a produtividade, levando muitas vezes a esforços exagerados e autodestrutivos. Uma das principais consequências é que radicalizou a monotonia e a cisão entre o pensamento e a execução das tarefas, e ampliou a mais-valia relativa. Junto com Taylor, temos também as contribuições de Fayol (1841-1925), que se preocupava mais com a organização como um todo, mais especificamente com as funções de gerenciamento. Em resumo, podemos compreender as influências deles em quatro características da concepção de trabalho: formalista (da empresa), que consiste em perceber a empresa como um conjunto de cargos hierarquizados; mecanicista (do operário), que defende uma acomodação das 11 personalidades às necessidades organizacionais; naturalista (da organização do trabalho), que defende que o parcelamento das tarefas é uma tendência natural e não uma construção social; e hedonista (da motivação), que tenta prever o comportamento, vinculando-o exclusivamente à remuneração do trabalho (BORGES; YAMAMOTO, 2014: 37). ASSIMILE Mais-valia relativa: ocorre quando tenta-se ampliar a produtividade física do trabalho pela via da mecanização. Essa forma de produção de mais-valia relativa é um modo de incrementar a produção do excedente a ser apropriado pelo capitalista. O capitalista obriga o trabalhador a trabalhar em um ritmo tal que, sem alterar a duração da jornada, produzem mais mercadorias e mais valor do que sem essa mecanização. Em paralelo ao movimento de Taylor e Fayol, surge também o movimento que ficou conhecido por fordismo, devido ao fato de ser liderado por Henry Ford. Suas contribuições consistiram em inovações tecnológicas (mecanização) e econômicas (produção em massa que influenciou as relações de consumo), tendo desdobramentos tanto na organização do trabalho quanto na gestão de pessoal. Esse modo de organizar o trabalho modificou seu ritmo , colocando as pessoas na cadência das máquinas. Ford também instituiu o five dollar day, uma política de remuneração que tinha como objetivos aumentar o poder de consumo das pessoas e possibilitar o acesso aos bens produzidos (o automóvel) e garantir que os funcionários tivessem uma boa renda, evitando problemas com sindicatos, muito comuns nessa época. Também visava resolver problemas de indisciplina, absenteísmo, 12 rotatividade, desinteresse pela produção e dificuldades de comunicação e adaptação dos imigrantes. Outro aspecto importante é que o pagamento dependia não só da sua produção como também de seus hábitos de vida em geral. Ford institui uma forma de vigilância da vida do empregado com visitas à sua casa. Os funcionários eram avaliados quanto sua dedicação à família, aos cuidados com a casa, à aplicação do salário, aos hábitos de poupança, ao uso de bebidas alcoólicas, entre outros aspectos (BORGES; YAMAMOTO, 2014: 38). Outra fase importante é a fase Gerencialista, alicerçada ao estado do bem-estar. Não era mais possível se administrar somente requerendo os esforços físicos do trabalhador, mas precisava também de sua mente, para Borges e Yamamoto (2014: 43) a concepção gerencialista do trabalho diferencia-se da capitalista tradicional no que se refere à base de poder (de controle do trabalho), que deixa de ser exclusivamente a propriedade e busca outras formas de legitimação. Passa a necessitar da aprovação daqueles sobre quem é exercida a autoridade (o trabalhador) e requer o desmantelamento da base de poder anteriormente estabelecida. O gerencialismo cria novas demandas, é preciso saber como liderar, motivar, combater a rotatividade, desenvolver gestores, como negociar, como comunicar, entre outras questões. Em resumo, esse modelo trouxe uma nova concepção de trabalho, distanciando a noção clássica de sucesso como consequência do trabalho duro, mas mantendo o papel instrumental para fins econômicos e salariais. Outro movimento que influenciou as formas de trabalho foi o Toyotismo (nome referente à implantação ter ocorrido na fábrica da Toyota no Japão). É um sistema de produção de mercadorias com vista à flexibilização na fabricação de produtos e veio como substituído ao modelo Fordista. O modelo foi desenvolvido de 1948 a 1975. Esse modelo possui basicamente os seguintes traços (ANTUNES, 2002: 54): a. É uma produção mais vinculada à demanda, visando atender às exigências mais individualizadas, diferente do da produção em 13 série aplicado pelo Fordismo, tornando-a mais variada e bastante heterogênea. b. Fundamenta-se no trabalho do operário em equipe, com multivariedade de funções, rompendo com o caráter parcelado do Fordismo. c. Adota um modelo de produção flexível, que possibilita ao empregado operar várias máquinas simultaneamente, alterando a relação homem/máquina do Fordismo. d. Adota o princípio just in time para melhor aproveitamento do tempo de produção. e. Utiliza o sistema kanban, placas ou senhas de comando para reposição de peças e de estoque. Os estoques são mínimos. f. Tem uma estrutura horizontalizada, se preocupando somente com seu produto. As demais tarefas são terceirizadas. g. Organiza os Círculos de Controle de Qualidade (CCQs), constituído por grupos de trabalhadores que são instigados para discutir seu trabalho e desempenho, visando melhorar a produtividade, sendo um importante instrumento para utilizar a capacidade intelectual e cognitiva do trabalhador, que o Fordismo desprezava. h. Implantação do “emprego vitalício” para uma parcela dos trabalhadores (25 a 30% do total). O processo implantado pelo Toyotismo promoveu ainda mais a intensificação da exploração do trabalho. Se por um lado os empregados poderiam participar mais, dando ideias, por outro a empresa poderia se apropriar desse conteúdo e utilizar para aumentar a produtividade e intensificação do trabalho. Essas mudanças significaram a diminuição ou mesclagem do modelo taylorista de participação dentro da ordem e do universo da empresa, pelo envolvimento manipulatório (ou cooptado), pela eliminação da organização autônoma dos trabalhadores e pela sociabilidade moldada pelo sistema de mercadorias. Esses modelos abriram espaço para novas formas de intensificação do trabalho com um apelo pelo envolvimento do trabalhador e ao discurso da 14 participação, muito comum hoje nas organizações. Trazendo também mecanismos de maior controle, onde a dominação ocorre de maneira inconsciente. Esperam que o trabalhador realize determinadas ações de forma autônoma porque se identifica com os objetivos e os valores das empresas e não mais pelo controle estrito da supervisão. O controle é interiorizado culturalmente e passa a ser tomado por autocontrole (HELOANI, 2007: 94). Nos dias atuais, temos que PAGÉS (1993:78) chamou de empresas hipermodernas representantes da evolução atual do capitalismo. São organizações que possuem sistemas que viabilizam a intermediação entre suas ações de exploração e dominação e as vantagens e benefícios oferecidos aos indivíduos, de tal forma que essa contradição é minimizada e os que nela trabalham até colaboram para sua própria submissão. Ela se dá basicamente através de quatro mecanismos: através da abstração, que a partir das recompensas financeiras e benefícios instaura uma lógica mercantil no conjunto das relações sociais, levando o indivíduo a separá-lo de sua realidade pessoal e social, renunciando à sua identidade pessoal e social para se identificar com o modelo proposto pela empresa; através da objetivação, quando submete a pessoa a um mundo de números, indicadores e outras racionalizações, desconsiderando a subjetividade presente nas relações sociais; através da desterritorialização, fazendo com que o indivíduo enxergue a corporação como um mundo à parte, levando-o a esquecer de sua história, ou ao menos, submetê-la aos interesses da organização e da individualização,induzindo uma exacerbada competitividade dentro da organização com objetivo de gerar aumento da produtividade, levando as pessoas à luta por seu próprio espaço, por seu próprio reconhecimento em detrimento à harmonização ou à saudável convivência com seus colegas de trabalho. Duas novas concepções sobre o trabalho estão presentes nas discussões atuais, uma designada “ética do lazer” e outra “laços sociais”, ambas possuem coisas em comum, mas também 15 diferenciações importantes que atingem os trabalhadores. Faremos um resumo das principais características de cada. A concepção da “ética do lazer” parte da crítica ao trabalho sob o taylorismo- fordismo, nessa visão, considera-se impossível a superação da alienação no trabalho, sendo que o trabalhador é incapaz de se conceber como parte do coletivo, não podendo exercer o poder para a mudança, causando o aumento da exclusão social, fazendo com que o trabalho perca sua importância na construção da identidade dos trabalhadores. A ação política e transformadora da sociedade não tem mais o trabalho como eixo central. Os movimentos sociais substituíram o movimento trabalhista em seu papel revolucionário. Na concepção “laços sociais” há uma crescente diversidade de modos de produzir nos dias atuais com diversificação de profissões e de atividades do trabalho, levando a uma flexibilização constante. Ocorre em uma sociedade onde há o individualismo de massa e fragmentação, onde as instituições perderam sua força. O mercado de trabalho é caracterizado pela precarização e desestabilização e há a diminuição das relações de trabalho com base no salário. Estamos numa transição do modelo predominantemente industrial para a chamada sociedade do conhecimento, na qual a informação regular traz desenvolvimento. O trabalho se constitui como um dos principais elementos de organização da sociedade, de integração social e de laço social. Nessa visão, há a redescoberta democrática do trabalho, valorizando a dignidade humana, e o trabalho segue implicado no processo de construção da identidade. 3. O trabalho, subjetividade e saúde do trabalhador Abordaremos agora as relações entre o trabalho, subjetividade e saúde do trabalhador. Uma questão importante é a discussão de qual é o lugar que subjetividade ocupa atualmente nas organizações. 16 É comum o estudo de temas como motivação, liderança, trabalho em equipe, talentos, gestão de pessoas, cultura organizacional, clima organizacional, esses temas são tão relevantes, mas o que mais podemos estudar? (LANCMAN; UCHIDA, 2003: 81). Para isso, utilizaremos como referência uma abordagem conhecida como Psicodinâmica do trabalho. A Psicodinâmica do Trabalho foi fundada por Christophe Dejours, doutor em Medicina, especialista em medicina do trabalho e em psiquiatria e psicánalise. Em seu percurso teórico, incialmente estava vinculado à abordagem francesa conhecida como Psicopatologia do Trabalho, que buscava o nexo causal entre determinadas organizações e condições de trabalho e o adoecimento mental. Esperava-se em que dadas certas condições ambientais, as pessoas iriam necessariamente adoecer psiquicamente. Mas Dejours, partindo do trabalho de campo e estudando situações concretas de trabalho, observava que frequentemente isso não ocorria, mas sim um estado de normalidade. Buscava compreender como os trabalhadores conseguiam manter certo equilíbrio, mesmo submetidos a condições de trabalho desestruturantes. O ponto de partida das pesquisas de Dejours passa a ser não mais o que adoece o trabalhador, mas como ele continua são apesar das adversidades. Para Dejours, o trabalho pode ser fatigante ou equilibrante. Ele se torna fatigante quando a energia pulsional não acha descarga no exercício do trabalho e se acumula no aparelho psíquico, ocasionando um sentimento de desprazer e tensão. E será equilibrante quando o trabalho é livremente escolhido ou livremente organizado oferecendo vias de descarga mais adaptadas às necessidades do sujeito. Assim, a organização do trabalho que não permite certo grau de autonomia ante o planejado (trabalho prescrito) e o efetivamente realizado 17 (trabalho real) pode ser gerador de sofrimento e desprazer. Na verdade, a própria definição de Dejours sobre o trabalho revela sua concepção; para ele, é no espaço entre o trabalho prescrito e o trabalho real que pode ocorrer ou não a sublimação e a construção da identidade no trabalho. Trabalhar é preencher a lacuna entre o prescrito e o real. Ora, o que é preciso fazer para preencher esta lacuna não tem como ser previsto antecipadamente. O caminho a ser percorrido entre o prescrito e o real deve ser, a cada momento, inventado ou descoberto pelo sujeito que trabalha. (DEJOURS, 2004:28) Ao realizar o trabalho, a pessoa não segue exatamente as regras (prescrito) na maioria das vezes, mesmo que por ínfima mudança, ele faz algo diferente de outra pessoa se fosse fazer a mesma coisa. Essa maneira de “burlar” as regras do trabalho prescrito é chamada por Dejours de inteligência astuciosa, que é fundamentalmente transgressiva e visa servir de via para a descarga psíquica do sujeito. Este tipo de inteligência requer um ajustamento das relações entre as prescrições das tarefas e obstáculos impostos pela organização do trabalho e a inteligência originada da experiência real do trabalhador e da sua concepção sobre a atividade. Ela é fundamental para o trabalhador, para sua dinâmica psíquica, que junto com o espaço para discussão, contribue para o bem-estar do trabalhador. Quando isso é cada vez menos permitido, mais o sofrimento pode estar presente (MENDES, 1995). O sofrimento, considerado inerente ao processo de trabalho e assim impossível de ser eliminado, não é necessariamente patogênico, mas pode vir a tornar-se quando todas as possibilidades de adaptação ao 18 trabalho para colocá-lo em concordância com o desejo individual forem utilizadas e as demais possibilidades estiverem bloqueadas. Contra a angústia do trabalho, assim como contra a insatisfação, os trabalhadores elaboram estratégias defensivas, de maneira que o sofrimento não é imediatamente identificável. Os trabalhadores não são passivos em relação à organização do trabalho, mas são capazes de se proteger elaborando defesas que escondem (mascaram, ocultam) ou evitam o sofrimento que os acomete, mas nem todos são capazes de se livrar dos transtornos, pois o adoecimento pode acontecer por causa de uma retenção da energia pulsional, gerada em uma situação de trabalho que impede a descarga adequada da carga (DEJOURS; ABDOUCHELI; JAYET,1994: 57). Os trabalhadores podem apresentar mecanismos de defesa individuais, como se isolar do grupo, ou estratégias de defesa coletivas, como menosprezar o perigo ou ridicularizar colegas que sofreram acidentes; essas têm como função adaptar o sujeito às pressões de trabalho com o objetivo de enfrentar o sofrimento. Essas estratégias visam tentar manter o equilíbrio entre o que se sente e o que se faz e vive. O trabalho não é apenas uma atividade; ele é, também, uma forma de relação social, o que significa que ele se desdobra em um mundo humano caracterizado por relações de desigualdade, de poder e de dominação. Apenas uma pequena parte do trabalho real é visível aos olhos da prescrição e da organização do trabalho. A maior parte dele consiste em uma infinidade de comportamentos, sentimentos, pensamentos e atitudes não reconhecidos formalmente nem pela hierarquia, nem pelos consumidores, nem pelos pares, portanto, invisíveis (DEJOURS; ABDOUCHELI; JAYET,1994: 73). A figura 1 apresenta esses conceitos de forma esquemática. 19 t ' Figura 1 Trabalho prescrito Inteligência astuciosa Trabalho real Trabalho fa�gante Estratégias denfensivas e mecanismos de defesa Trabalho equilibrante Bem-estare sa�sfação Fonte: elaborado pelo autor. 4. Conclusão Nessa aula, dialogamos sobre as diversas concepções de trabalho, sua evolução histórica e suas relações com a subjetividade e saúde do trabalhador. Apresentamos também uma visão sobre a relação saúde-trabalho nas relações de trabalho. Pode-se notar que nossas concepções sobre o trabalho estão encharcadas de ideologias que foram sendo acumuladas na história. O psicólogo deve estar consciente desses significados e como eles interferem na sua atuação profissional. 20 TEORIA EM PRÁTICA Reflita sobre a seguinte situação: Você é o psicólogo(a) responsável pelo serviço de apoio ao trabalhador de um órgão público na área da saúde. Um supervisor procurou o serviço com queixas de um servidor. Ele reclama que o servidor só chega atrasado, não interage com os com seus pares, está se isolando de todos, responde de forma ríspida aos questionamentos, reclama que o trabalho é chato e monótono, que não é respeitado e é visto como se fosse uma “máquina de trabalhar”. O supervisor diz que o trabalho é assim mesmo, que ele que escolheu trabalhar ali e não é problema dele, que o papel do supervisor é fazer as pessoas trabalharem direito, afinal é cobrado disso todos os dias pelo gerente. O servidor foi procurado para conversar e disse que está insatisfeito com a supervisão e a forma que é tratado, que, pra ele, o trabalho é fundamental para sua vida, pois investiu muito para chegar até ali e quer respeito, quer participar das decisões sobre seu trabalho, mas não tem espaço para isso. Agora reflita: Quando falamos sobre o trabalho no cotidiano, tendemos a revelar, de maneira implícita ou não, as concepções sobre o trabalho que incorporamos em nossa história pessoal. Com base nos relatos fictícios, descreva quais são as concepções sobre o trabalho presentes nos discursos do supervisor e do trabalhador. VERIFICAÇÃO DE LEITURA 1. As concepções sobre o trabalho variaram no decorrer da história. Em cada época tivemos pessoas que influenciaram nessas visões. Assinale a alternativa 21 abaixo que identifica corretamente a concepção de trabalho com seu respectivo autor: a. Para Taylor, o trabalho deveria ser equilibrado, ou seja, prazeroso e criativo, onde cada pessoa deveria escolher livremente a forma de realizá-lo. b. Para Marx, o trabalho ao mesmo tempo produz a própria condição humana e representa um eixo da história da humanidade. c. Para Adam Smith, o trabalho ocorre no espaço entre o trabalho prescrito e o trabalho real, onde pode ocorrer ou não a sublimação e a construção da identidade no trabalho. d. Para Ford, o trabalho é alienante, porque o trabalhador desconhece o próprio processo produtivo e o valor que agrega ao produto, além de não se identificar com os produtos de seu trabalho. e. Para Dejours, o trabalho deve possuir uma natureza mecanicista, pois deve haver uma acomodação das personalidades às necessidades organizacionais. 2. O Toyotismo foi implantado inicialmente na fábrica da Toyota no Japão. É considerado um dos princípios do Toyotismo: a. Organizar os Círculos de Controle de Qualidade (CCQs). b. Fazer a análise do trabalho e estudo dos tempos e movimentos. c. Promover a divisão do trabalho e especialização do operário. d. Fornecer supervisão funcional constante. e. Realizar estudos da fadiga humana. 22 3. Dejours trouxe uma nova visão sobre as relações entre trabalho e saúde. Sobre suas construções teóricas, é correto afirmar que: a. O trabalho equilibrante ocorre quando a energia pulsional não acha descarga no exercício do trabalho e se acumula no aparelho psíquico, ocasionando um sentimento de desprazer e tensão. b. O trabalho prescrito é a tarefa efetivamente realizada. c. Trabalhar é preencher a lacuna entre o trabalho fatigante e o real. d. Dejours procurava compreender como os trabalhadores conseguem manter certo equilíbrio, mesmo submetidos a condições de trabalho desestruturantes. e. A inteligência astuciosa está relacionada ao cumprimento estrito das normas de trabalho. Referências Bibliográficas ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. 6. ed. São Paulo: Boitempo Editorial, 2002. 258 p. BORGES, Livia de Oliveira; YAMAMOTO, Oswaldo H. Mundo do trabalho: Construção histórica e desafios contemporâneos. In: ZANELLI, José Carlos; BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; BASTOS, Antônio Vergílio Bittencourt. Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. Cap. 1. p. 25-94. DEJOURS, C.; ABDOUCHELI, E.; JAYET, C. Psicodinâmica do trabalho: contribuições da escola dejouriana à análise da relação prazer, sofrimento e trabalho. São Paulo: Atlas, 1994. DEJOURS, Christophe. Subjetividade, trabalho e ação. Prod. [online]. 2004, vol.14, n.3, pp.27-34. ISSN 0103-6513. HELOANI, Roberto. Gestão e Organização no Capitalismo Globalizado: História da Manipulação Psicológica no Mundo do Trabalho. São Paulo: Editora Atlas S.A., 2007. 23 LANCMAN, Selma; UCHIDA, Seiji. Trabalho e subjetividade: o olhar da Psicodinâmica do Trabalho. Cadernos de Psicologia Social do Trabalho, São Paulo, n. 6, p.79-90, 2003. Disponível em: < http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S1516-37172003000200006 >. Acesso em: 17 fev. 2019. MENDES, Ana Magnólia Bezerra. Aspectos psicodinâmicos da relação homem- trabalho: as contribuições de C. Dejours. Psicologia: Ciência e Profissão, [s.l.], v. 15, n. 1-3, p.34-38, 1995. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s1414- 98931995000100009. PAGÉS, Max et al. O poder das organizações. São Paulo: Atlas, 1993. Gabarito Questão 1 – Resposta: B Resolução: Para Marx, o trabalho é fundamental para a formação humana, está na gênese sua identidade e isso nos diferencia de todos os outros seres. Por outro lado, ele também representa o momento histórico da humanidade, pois é determinado pelas condições sociais e econômicas que vivemos. Questão 2 – Resposta: A Resolução: Os CCQs – Círculos de Controle de Qualidade–é uma estratégia importante para o Toyotismo; ele visa à participação das pessoas na solução de problemas do cotidiano e também faz com que os operários foquem sua atenção em problemas que a empresa deseja e não em outras questões. Questão 3 – Resposta: D Resolução: Dejours começou a perceber que aparentemente nem todos adoeciam e começou a se preocupar porque isso acontecia. Ampliou sua visão sobre esses fenômenos. 24 http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-37172003000200006 http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-37172003000200006 http://dx.doi.org/10.1590/s1414-98931995000100009 http://dx.doi.org/10.1590/s1414-98931995000100009 A história da psicologia organizacional e do trabalho Autor: Rogério Rodolfo Baptista Objetivos • Apresentar os mais importantes marcos históricos da psicologia organizacional e do trabalho. • Refletir criticamente sobre os impactos dos acontecimentos sobre a história da psicologia organizacional e do trabalho. • Compreender as influências dos acontecimentos históricos para as atuais concepções e relações da psicologia organizacional e do trabalho. 1. Da psicologia organizacional e do trabalho A psicologia organizacional e do trabalho é umas áreas mais importantes da psicologia nos dias atuais. A psicologia organizacional é a segunda maior área de atuação do psicólogo, segundo pesquisa realizada pelo CFP – Conselho Federal de Psicologia em 1988 (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 1988). Já em 2000, foi tida como a terceira área onde concentra mais profissionais, com 12.4% dos psicólogos registrados (WHO & CFP, 2001). Ela se constitui um campo muito importante na atuação e pesquisa na psicologia atual. A psicologia organizacional e do trabalho pode ser entendidacomo campo de compreensão e intervenção sobre o trabalho e as organizações, visando analisar a interação das múltiplas dimensões que caracterizam pessoas, grupos e organizações, com a finalidade de construir estratégias e procedimentos que promovam, preservem e reestabeleçam o bem-estar das pessoas (ZANELLI; BORGES- ANDRADE; BASTOS, 2014: 98). A psicologia organizacional refere-se ao desenvolvimento e à aplicação de princípios científicos no ambiente de trabalho. (SPECTOR, 2006:5). Segundo Spector (2006:5), a psicologia organizacional contém duas grandes divisões: a industrial (ou seja, recursos humanos) e a organizacional; já para Zanelli Borges-Andrade; Bastos (2014: 102) a Psicologia Organizacional tem três grandes áreas de preocupações: o trabalho, a organização e a gestão de pessoas. Nessa aula, compreenderemos como a psicologia organizacional tomou a forma atual, quais são os fatores que influenciaram na construção desse campo do conhecimento e suas implicações no cenário atual da profissão. 2. História da psicologia organizacional e do trabalho As origens da psicologia organizacional remontam às experiências da psicologia experimental no final do século XVIII, no início da psicologia 26 científica. Em 1899, o fisiologista Luigi Patrizi cria o laboratório para o estudo da fadiga em Modena, na Itália. Na Alemanhã, Kraeplin e na Itália, Mosso criam laboratórios para estudar aspectos psicofisiológicos relacionados à carga de trabalho. Já na França, Lahy utilizou-se de testes na seleção de trabalhadores (DALBOSCO; ROSA; PISONI, 2019). Nos Estados Unidos da América, temos dois grandes expoentes da psicologia organizacional, considerados os fundadores dessa ciência, Hugo Münsterberg e Walter Dill Scott. Ambos eram professores universitários e psicólogos experimentais, se interessavam por um campo aplicado da psicologia emergente, os problemas organizacionais. Münsterberg estava especialmente interessado na seleção de funcionários e no uso de novos testes psicológicos. Seu trabalho foi fortemente influenciado por Taylor, considerando três aspectos principais: o melhor homem, o melhor trabalho e o melhor resultado. Ele publicou o que foi considerado o primeiro compêndio sobre psicologia organizacional, intitulado de Psychology and Industrial Efficiency (1913). Já Scott publicou The Teory of Advertising (1903), cujo interesse principal era a psicologia da publicidade. A principal área de interesse de Scott era a aplicação do conhecimento científico a problemas de negócios. Alguns de seus métodos de seleção de pessoal incluíam testes para medir certas características desejáveis e escalas de classificação para avaliar candidatos em habilidades e atributos necessários (aparência, comportamento, limpeza, julgamento, precisão). Em 1919, Scott e seus associados fundaram a Scott Company Engineers and Consultants in Industrial Personnel, e prestaram serviços para mais de 40 empresas industriais em seu primeiro ano (SPECTOR; 2006:9). Como já havia referido, nessa época, uma das principais influências da psicologia organizacional foi o trabalho de Frederick W. Taylor, que desenvolveu a administração cientifica, como estudamos na 27 primeira aula. Nesse sentido, as preocupações principais da psicologia organizacional na época estava em proporcionar ferramentas práticas para a adaptação do homem ao trabalho e aumentar sua produtividade. Os temas principais giravam em torno de: análise cargos e do trabalho; redução e controle da fadiga humana; como selecionar os funcionários mais adequados às tarefas, segundo as características exigidas para o desempenho do cargo; como treinar melhor os funcionários para o desempenho de tarefas e como recompensar e incentivar os funcionários para uma maior produtividade. Outra influência importante da época foi o casal Frank e Lilian Gilbreth. Ele um engenheiro e ela uma psicóloga, que estudaram como desempenhar eficientemente as tarefas numa fábrica. Eles se ocuparam de estudos sobre tempo e movimentos, que envolveram medição e a sincronização de ações executadas pelas pessoas durante as tarefas, com o objetivo de desenvolver uma maneira mais eficiente de trabalhar. Eles aperfeiçoaram novas técnicas, que visavam a melhor forma de projetar a tecnologia para as pessoas. Eles foram responsáveis pelo início do que se tornaria o campo fator humano na psicologia organizacional. Outros fatos interessantes sobre o casal são que ela foi considerada a primeira pessoa a receber o título de Ph.D. em psicologia organizacional em 1915, e que eles serviram de inspiração para o filme Cheaper by the Dozen (no Brasil uma versão posterior foi nomeado de “doze é demais”), que conta suas vidas como atarefados pais de 12 crianças (SPECTOR; 2006:9). As guerras mundiais trouxeram forte impacto para o desenvolvimento da psicologia organizacional. O Exército americano sempre foi um dos principais campos para os psicólogos organizacionais da época. Na primeira guerra mundial, em 1917, um grupo de psicólogos, liderado por Robert Yerkes, criou os testes Army Alpha e Army Beta para medir a habilidade mental dos soldados e ajudar as forças armadas a alocá- los nas melhores posições dentro das tropas. Esses testes serviram de 28 fundamento para aplicação de testes em massa nos EUA, que depois foram utilizados na área educacional e no ambiente de trabalho. No período entre guerras, a psicologia expandiu-se na maioria das áreas de como é conhecida hoje. As organizações cresciam e novas demandas surgiam, a psicologia organizacional aproveitou e se inseriu nessas oportunidades. Muitos psicólogos americanos se interessaram pela nova área e começaram a estudá-la e atuar no campo profissional, trabalhando em empresas ou constituindo consultorias específicas na área. A Phychological Corporation, de James Mckeen Cattell, foi uma das principais e existe até os dias de hoje (SPECTOR; 2006:10). George Elton Mayo, em 1933, publicou o livro The Human Problems of Industrial Civilization. O livro se originou de estudos coordenados por ele entre 1924 e 1927, numa fábrica da Western Electric Company, localizada no bairro de Hawthorne (Chicago – EUA). Originalmente, esses estudos tinham como objetivo estudar a influência do nível de iluminação sobre a produtividade dos trabalhadores. Os estudiosos que dirigiam a pesquisa ocupavam uma sala especial onde os níveis de iluminação eram alterados, porém, os pesquisadores perceberam que, durante a pesquisa, quando o nível de produtividade aumentava, isso tinha pouca relação com o nível de produtividade. Foram pesquisados vários fatores que poderiam influenciar o nível de produtividade, e chegaram à conclusão que a simples presença da equipe de pesquisadores fazia com que o comportamento dos trabalhadores fosse alterado. O fato de estarem participando fazia com que o trabalhador mudasse seu comportamento; esse fenômeno ficou conhecido como efeito Hawthorne; dessa forma concluí-se que, qualquer que seja o motivo, parecia claro que os fatores sociais podem ser mais importantes que os fatores físicos no desempenho das pessoas no trabalho (SPECTOR; 2006:11). 29 PARA SABER MAIS Os estudos de Hawthorne foram realizados entre 1924 e 1932 em uma fábrica da Western Electric Company, situada em Chicago, no bairro de Hawthorne, que inicialmente procurava verificar os efeitos da luminosidade sobre o desempenho do trabalhador. Contudo, com o desenvolvimento, percebeu-se que os fatores sociais interferiam mais que as condições ambientais na produtividade das pessoas. Esses fatores foram: a integração social; comportamento social do empregado; recompensas e sanções sociais; grupos informais; relações humanas; a importância do conteúdo do cargo e ênfase nos aspectos emocionais. Os elementos do contexto macrossocial, político, econômico e cultural impuseram desafios e oportunidades para a psicologia organizacional. Na segunda guerra mundial, muitospsicólogos contribuíram para os esforços de guerra. Muitos estudos e trabalhos surgiram na área de seleção de soldados, treinamento, aspecto moral avaliação de desempenho, desenvolvimento de equipes e projetos de equipamentos. Até esse momento, a Associação Americana de Psicologia–APA -, dava ênfase à psicologia experimental somente, contudo, após a segunda guerra, a APA criou a divisão 14 da Psicologia Comercial e Industrial em 1944. As empresas privadas demonstraram um grande interesse em psicologia organizacional, implementando muitos procedimentos, como os testes psicológicos. Também podemos separar a evolução da psicologia organizacional em três momentos: o primeiro período vai até 1945, o segundo de 1945 a 1960 e o terceiro de 1960 em diante. O primeiro período é caracterizado pelo surgimento da psicotécnica, dos testes psicológicos como 30 ferramenta para a seleção de pessoas, além de abordagens e métodos como a análise e intervenção com foco em pequenos grupos e métodos de treinamento. De 1945 a 1960 surge o período chamado “expansão e consolidação pós-guerra”, que se caracterizou pela reconstrução da economia, da expansão das industrias de base, de novos mercados, tanto na Europa quanto nos Estados Unidos. Esse cenário possibilitou que surgissem novos campos de trabalho para o psicólogo, como trabalhar com elaboração de postos de trabalho, seleção, treinamento, inserção de novas tecnologias, aquisição de habilidades, motivação e desenvolvimento organizacional. Esse período se estabeleceu com a nomenclatura de psicologia organizacional. (DALBOSCO; ROSA; PISONI, 2019) No final dos anos 50, Douglas McGregor, professor do Massachusetts Institute of Technology–MIT–realizou estudos comparativos das dimensões da subjetividade ao apresentar a análise de duas categorias, X e Y, existentes no campo de gestão do comportamento das pessoas na esfera da produção. Em resumo, a teoria X funda-se na ideia de que as pessoas são sempre preguiçosas, desobedientes, sem ambição e evitam responsabilidades, por isso precisam ser controladas, vigiadas e, quando necessário, penalizadas. Já a teoria Y, vê as pessoas como empreendedoras, que buscam reconhecimento e dispostas ao trabalho. Essas visões foram construídas com base nas respostas de centenas de gestores que participaram da pesquisa. Outro fator foi que McGregor verificou que o atendimento de uma necessidade básica gera um efeito que logo passa e para que algo seja motivador vai depender de intervenções na esfera da subjetividade, como reconhecimento do empenho e disponibilização de meios para autorrealização, assim o comprometimento surgiria somente a partir do estabelecimento de uma relação de confiança entre a empresa (gestores) e funcionários. Também afirmava que é possível alinhar interesses corporativos e interesses pessoais de autorrealização dos trabalhadores. 31 ASSIMILE As teorias X e Y de Douglas MacGregor foram um marco na história da Psicologia Organizacional e do Trabalho. Elas delinearam uma nova visão sobre os fenômenos organizacionais. Elas são mais abrangentes do que usualmente é divulgado nos livros de administração (pois somente enfocam a questão das diferenças entre os dois tipos de percepção dos gestores), demonstrando a importância de uma gestão de pessoas coerente e saudável nas organizações. Nas décadas de 70 e 80 surge um novo modelo de relações de trabalho e crescem as críticas aos testes psicológicos e o desafio de ir além do âmbito individual da análise. Nessa época, as questões humanistas passaram a dominar esse campo da psicologia, voltando para questões como a satisfação. A proposta era tornar as relações menos conflituosas no ambiente de trabalho. Também se inicia a concretização de programas de Qualidade de Vida no Trabalho–QVT -, a mudança de modelos de gestão de controle para compromisso e envolvimento, o foco não mais em pequenos grupos e cresce o debate sobre questões éticas. (DALBOSCO; ROSA; PISONI, 2019) No Brasil, o desenvolvimento da psicologia organizacional está ligado ao desenvolvimento da psicologia geral e ao processo de industrialização que o país passou no início do século XX. A regulamentação da profissão de psicólogo só ocorreu na década de 60, porém a psicologia organizacional já estava bem consolidada nessa época. Alguns fatos históricos contribuíram para isso. No Brasil, no início do século XX, houve a instalação de um grande número de multinacionais, aumentando a competividade entre as empresas, com crescimento das fábricas, principalmente nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, montadoras 32 de automóveis e grandes linhas de produção. Com esse crescimento, surgem duas grandes necessidades: por um lado, a mão de obra era desqualificada e os produtos eram de baixa qualidade. Dessa forma, surge a tentativa de racionalização do trabalho e o uso das técnicas, oriundas principalmente dos Estados Unidos, eram utilizadas com empolgação, abrindo espaço para a atuação de psicólogos nas indústrias, principalmente no campo da seleção de pessoal e aplicação de testes psicológicos. Léon Walther foi um dos primeiros a contribuir para esse campo no Brasil. Seu livro Tecno-psicologia do trabalho industrial, lançado em 1929, foi um marco nessa área. Em 1927 ministrou, em parceria com a Associação Comercial, cursos sobre aplicação de testes psicológicos em Belo Horizonte e em São Paulo. Em 1931, foi fundado o Instituto de Organização e Racionalização do Trabalho–IDORT -, existente até os dias atuais, que atuava em diferentes áreas, como seleção e educação profissionais, de organização psicológica do trabalho, de higiene do trabalho, de orientação profissional, e de estudos de legislação e estatística ligadas ao trabalho (GONÇALVES, 2000). Vale ressaltar que Henry Piéron também contribuiu para essa área no Brasil. Ele criou o Instituto Nacional de Orientação Profissional (INOP) na França, que se tornou o Instituto Nacional de Trabalho e Orientação Profissional (INETOP), em 1942. No Brasil, ajudou a difundir a psicotécnica. Esteve por aqui em várias épocas, realizando cursos no Rio de Janeiro e em São Paulo, onde ministrou um curso no Laboratório de Psicologia da Escola Normal, sob a responsabilidade dos professores Lourenço Filho e Noemy Silveira Rudolfer e também ministrou cursos no Serviço de Seleção Ferroviário, dirigido pelo Prof. Roberto Mange. (HENRI... 2019). Em 1925, no antigo Instituto de Psicologia de Pernambuco, criado por Ulysses Pernambuco (neurologista e psiquiatra), foram realizados estudos de psicologia aplicada. Em 1929, o instituto passou a se chamar Instituto de Seleção e Orientação Profissional de Pernambuco. Até a década de 50, os principais campos de aplicação 33 da psicologia organizacional eram: treinamento; fadiga e monotonia; luminosidade e ventilação; testes de seleção de pessoal; estudos de tempo e movimento; turnos de trabalho; segurança; disciplina; liderança e supervisão; relações interpessoais; atitudes dos empregados; moral no trabalho; avaliação de executivos; relações homem-máquina; entrevistas e aconselhamento. Nos anos 90, os avanços tecnológicos transformaram o ambiente de trabalho. Na nova sociedade do conhecimento, o ritmo ditado pela era digital é intenso e vem modificando as profissões e funções dentro da organização. A globalização também trouxe novos desafios para a psicologia organizacional. As empresas começam a mostrar a necessidade da presença de psicólogos para o desenvolvimento corporativo (PSICOLOGIA, 2007). Em suma, podemos dizer que a psicologia organizacional e do trabalho possui três grandes fases: a primeira, quando é denominada de Psicologia Industrial, que vai até a década de 30, cuja ênfase foi a psicotécnica, a seleção e colocação de pessoal; a segunda fase foi a da Psicologia Organizacional, onde a ênfase era a produtividade das empresas, a ampliação do foco de atuação do psicólogo e o trabalho com grupos;a terceira fase é a Psicologia do Trabalho, com uma maior ampliação do foco, com ênfase nas questões de saúde na preocupação para além das organizações. Essas fases não se excluem, mas se completam em suas atividades, e hoje, elas convivem em diversas teorias e formatos de atuação (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES, 2014:558). 3. Desenvolvimento teórico e atuação da psicologia organizacional e do trabalho Sobre o campo de atuação, em uma pesquisa realizada com 4000 psicólogos, também em 2010, e depois analisada por Borges-Andrade 34 e Pagotto (2010), verificou-se que 83% dos psicólogos que atuam no campo da psicologia organizacional são mulheres, 49% são residentes no sudeste, 23% no sul, 17% no nordeste e 10% no centro-oeste do país, trabalhando em escritórios, consultórios ou residências, empresas privadas e órgãos públicos (8%). Metade tem vínculos assalariados e trabalho autônomo, muitos combinando o trabalho na psicologia organizacional e psicologia clínica. Entre as atividades realizadas pelos psicólogos, destacam-se, de modo cumulativo, a aplicação de testes psicológicos e psicodiagnósticos (61%), avaliação de desempenho (53%) e diagnóstico organizacional (50%), seguidos de atividades relacionadas à gestão (23%), análise de função ou ocupacional (22%) e recrutamento e seleção (19%), aplicações referentes à dinâmica de grupo (16%), ao desenvolvimento de grupos e equipes (16%), à reabilitação profissional (13%), análise de cargos e salários (13%) e intervenção organizacional (12%) (BORGES-ANDRADE; PAGOTTO, 2010). Desde o início da Psicologia Organizacional, sua produção teórica também esteve ligada às universidades. No princípio, as universidades, principalmente em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Pernambuco, fizeram as primeiras pesquisas e experiências em psicologia organizacional, no campo da psicometria. Com o passar do tempo, o campo se desenvolveu principalmente nos programas de pós- graduação stricto sensu nas formações de mestrado e doutorado. Em um levantamento feito em 2010, verificou-se que muitas universidades possuíam áreas de concentração ou linhas de pesquisa em temáticas relacionadas com a psicologia organizacional e do trabalho. Dentre essas universidades podemos citar: Pontifícia Universidade Católica de Goiás; Universidade de Brasília; Universidade de Fortaleza; Universidade de São Paulo (Ribeirão Preto); Universidade de São Paulo (São Paulo); Universidade do Estado do Rio de Janeiro; Universidade Federal da Bahia; Universidade Federal de Minas Gerais; Universidade Federal de Santa Catarina; Universidade Federal de São João del Rei; Universidade Federal de Uberlândia; Universidade Federal do Ceará; Universidade 35 Federal do Rio Grande do Norte; Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Universidade Metodista de São Paulo; Universidade Salgado de Oliveira; Universidade São Francisco; Universidades Federais da Paraíba e Rio Grande do Norte (BORGES-ANDRADE; PAGOTTO, 2010). Com crescimento da psicologia organizacional e o aumento de pesquisadores, surgem instituições que foram e são fundamentais para o desenvolvimento do campo da psicologia organizacional no Brasil. A SBPOT (Associação Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho) foi fundada em 26 de junho de 2001, com apenas 60 pesquisadores e hoje é uma das principais referências no Brasil e no mundo referente ao campo. A SBPOT promove bianualmente o CBPOT – Congresso Brasileiro de Pscicologia Organizacional e do Trabalho– que na edição de 2018 foi realizado em Goiânia-GO. Também temos a ANPEPP (Associação Nacional de Pesquisa e Pós-graduação em Psicologia) que foi fundada em 1983, durante a XXXV Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, realizada em Belém do Pará, que contribui grandemente no desenvolvimento do campo da psicologia organizacional e do trabalho no Brasil (BORGES-ANDRADE; PAGOTTO, 2010). A pesquisa em POT – Psicologia Organizacional e do Trabalho–é relativamente recente no Brasil. Nas décadas de 70 e 80, as principais referências eram estrangeiras, hoje já temos uma extensa produção científica na área, nos mais variados temas. Vários artigos científicos já foram publicados sobre quais são as temáticas mais pesquisadas na área, os chamados estudos do Estado da Arte, que trazem uma visão panorâmica das pesquisas realizadas em um determinado período. Destacamos alguns desses levantamentos e suas conclusões: O primeiro estudo foi o de Bastos, França, Pinho e Pereira (1997), que concluiu que os principais temas estudados foram a cultura organizacional e o impacto de novas tecnologias, seguidos de processos decisórios, motivação e produtividade, percepções, estresse e saúde; poder e conflito. Observou-se também, a redução de estudos sobre funções 36 de RH (avaliação de desempenho, recrutamento e seleção, cargos e salários) e o aumento de estudos sobre políticas de RH (como, por exemplo, qualidade de vida no trabalho, qualificação, gestão de competências, programas de qualidade e gestão participativa) (CAMPOS et al., 2011). No mesmo ano, outro trabalho no campo de estudo do comportamento organizacional, realizado por Borges-Andrade et. (1997) Al. verificou que as principais temáticas foram: a percepção, comunicação, comprometimento, desempenho, comportamento gerencial e organização do trabalho. Um terceiro estudo realizado por Tonelli, Caldas, Lacombe e Tinoco (2003), nos principais periódicos científicos brasileiros sobre a temática de Recursos Humanos, concluiu que as temáticas mais estudadas foram trabalho e saúde, relações no trabalho, liderança e poder, satisfação e motivação, políticas da área e funções de Recursos Humanos (CAMPOS et al., 2011). Em outro estudo realizado em 2009, a partir do levantamento de artigos publicados na área de Psicologia organizacional e do trabalho no ano de 1998 ao mês de maio de 2009, por Campos et al. (2011), com 116 artigos, concluiu-se alguns dados interessantes. Dos artigos analisados, o maior número de publicações foi no Estado de São Paulo, com 44 artigos, seguido do Rio Grande do Sul (16), Rio de Janeiro (15) Distrito Federal (10) e com apenas uma publicação nos Estados da Bahia e do Piauí. No ano de 2001, ocorreu um aumento significativo no número de publicações em relação aos anos anteriores, e que nos anos de 2002, 2005, 2006 e 2008 também foi bem produtivo para área. Isso deve-se ao fato de que houve um aumento de formação de mestres e doutores nos programas de pós-gradução no mesmo período. Quanto às temáticas, aferiu-se que os assuntos mais pesquisados foram: significado do trabalho/imagem profissional/subjetividade; relações no trabalho/liderança/poder; condições de trabalho; modelo teórico/ modelo RH; desemprego; clima e cultura; empregabilidade; assédio moral; trabalho comunitário/ONGs/cooperativa; satisfação/motivação; recrutamento e seleção; comunicação; dinâmica de grupo; treinamento 37 1913 Münsterberg lança o livro Psychology and Industrial Efficiency 1899 Luigi Patrizi Cria laboratório da Fadiga 1924 Inicia os estudos de Hawthorne 1917 Criação dos testes Army Alpha e Army Beta 1925 (BR) Fundação do Instituto Pernambuco 1931 (BR) Fundação do IDORT Década de 50 Décadas de Douglas 90 (BR) MacGregor Ampliação da Estudos Relações Humanas 1939-1945 21 guerra mundial e novos usos da POT nas forças armadas Décadas de 70 e 80 Novas atuações da POT área 2001 (BR) Fundação da SBPOT e desenvolvimento e avaliação de desempenho (em ordem de frequência). Campos et al. (2011). Esses estudos refletem a preocupação dos profissionais da área quanto a esses temas e, de certa forma, estão alinhados com a perspectiva anterior de pesquisar temas com relevância em comportamento organizacional mais que em temas mais comuns de recursos humanos. Em outro estudo mais recente (NASCIMENTO; BORGES-ANDRADE; PORTO: 2016), especificamente no terceiro setor,constatou-se também novos temas de interesse de pesquisa, dentre eles, as interações sociais nas equipes e nas organizações de trabalho; afeto no trabalho; significado do trabalho; dos seus produtos e identidade no trabalho; bem-estar e saúde no trabalho; aprendizagem natural/induzida no trabalho e sua transferência para outros indivíduos e outros desempenhos; contratos psicológicos; cognição no trabalho; tomada de decisão (gerencial, técnica e líderes) e julgamentos (sobre subordinados, pares e superiores de trabalho); motivação no trabalho; cultura organizacional; comportamento de fuga e esquiva no trabalho. Esse estudo demonstrou a ampliação do interesse em novos temas como o afeto, significado e cultura organizacional, que tem sido uma tendência nos congressos atuais. Figura 1–Breve Linha do Tempo da História da POT Fonte: elaborado pelo autor. 38 4. Considerações finais Como pudemos acompanhar a POT – Psicologia Organizacional e do Trabalho -, como é hoje conhecida, passou por várias transformações ao longo da história. Sua origem está associada ao próprio surgimento das organizações como hoje conhecemos. Do ponto de vista da aplicação e construção do conhecimento, ela estava ligada às ideias da administração científica e aos problemas de organização da época, como a seleção de pessoal, verificação de habilidades, testes psicológicos e avaliação de desempenho, período que ficou conhecida como Psicologia Industrial. Mas, como o passar do tempo, houve uma ampliação do seu campo de trabalho; passou a intervir mais em outros aspectos organizacionais como formação de líderes, diagnóstico organizacional, gestão de pessoas. Do ponto de vista de pesquisa, amplia-se o paradigma e começam interesses no campo do comportamento organizacional micro, meso e macroorganizacional, incluindo desde personalidade, tomada de decisão, motivação no trabalho, significado no trabalho e outros temas como vimos anteriormente, período onde de concretizou com o nome de Psicologia Organizacional. Sua evolução continua, novas demandas surgem, sejam sociais, econômicas ou tecnológicas, ampliando mais uma vez suas perspectivas, agora com preocupações como gestão do estresse no trabalho, qualidade de vida no trabalho, saúde do trabalhador, afetos e vai além das organizações tradicionais (empresas), se preocupando mais com as relações de trabalho como um todo. Nesse período, se concretiza o campo da Psicologia do Trabalho. Hoje, ela continua em evolução frente aos novos desafios que se apresentam. TEORIA EM PRÁTICA Faça uma pesquisa sobre a história da POT no Brasil: A SBPOT é a principal entidade da psicologia organizacional e do trabalho no Brasil. Ela congrega os principais esforços da área no Brasil, com a produção teórica recente da área, 39 eventos, formações, assuntos e temas da área. Acesse o site da SBPOT e procure na aba Eventos como foram os congressos, se atentando em quais foram os principais temas abordados. Após essa pesquisa, relacione suas informações com a história da psicologia organizacional e do trabalho. VERIFICAÇÃO DE LEITURA 1. Segundo Zanelli; Borges-Andrade; Bastos (2014: 102), a psicologia organizacional tem três grandes áreas de preocupação, que são: a. o trabalho, a sociedade e a gestão de pessoas. b. o trabalho, a organização e a gestão de pessoas. c. a sociedade, a subjetividade e o trabalho. d. a organização, o trabalho e a subjetividade. e. a sociedade, o trabalho e a gestão de pessoas. 2. No início da psicologia organizacional, uma das principais influências foi: a. Frederick W. Taylor. b. Karl Marx. c. Max Weber. d. Immanuel Kant. e. Christophe Dejours. 40 3. Um importante marco da psicologia organizacional brasileiro foi a fundação de uma entidade em São Paulo em 1931, esse foi: a. IDORT (Instituto de Organização e Racionalização do Trabalho). b. SBPOT (Sociedade Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho). c. ANPEPP (Associação Nacional de Pesquisa e Pós- graduação em Psicologia). d. APA (Associação de Psicologia Americana). e. INOP (Instituto Nacional de Orientação Profissional). Referências Bibliográficas A CONTRIBUIÇÃO de Henri Piéron no desenvolvimento da psicologia científica e da orientação profissional. 2014. Disponível em: <https://pupitre.hypotheses.org/ files/2014/05/COLLOQUE-PIERON-Version-en-Portugais.pdf>. Acesso em: 28 fev. 2019. BASTOS, A. V. B., FRANÇA, A., PINHO, A. P. M., & Pereira, L. Pesquisa em comportamento organizacional no Brasil: O que foi divulgado nos nossos periódicos científicos? In: Sociedade Interamericana de Psicologia (Org.), Anais, XXVI Congresso Interamericano de Psicologia (p. 52). São Paulo: 1997. BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; PAGOTTO, Cecília do Prado. O Estado da Arte da Pesquisa Brasileira em Psicologia do Trabalho e Organizacional. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, v. 26, p.37-50, 2010. Disponível em: <http://www.scielo. br/pdf/ptp/v26nspe/a04v26ns.pdf>. Acesso em: 28 fev. 2019. BORGES-ANDRADE, J. E., OLIVEIRA-SOUZA, C. M., PILATI, R., NONATO, A. J., SILVINO, A. M. D., GAMA, A. L. G. 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O trabalho como uma categoria ampla, as organizações com todos seus aspectos e os processos de gestão de pessoas nas organizações. Questão 2 Resposta: A Resolução: Taylor foi uma das principais influências da psicologia organizacional em seu início. A administração científica colocou várias questões para a psicologia organizacional e suas demandas. Questão 3–Resposta: B Resolução: O IDORT atuava em diferentes áreas ligadas ao trabalho e ajudou a impulsionar a psicologia organizacional no Brasil. 43 As áreas da psicologia organizacional e do trabalho Autor: Rogério Rodolfo Baptista Objetivos • Descrever o processo da constituição da psicologia organizacional e do trabalho como área de conhecimento e campo de aplicação. • Compreender como se constitui o modelo clássico de atuação e produção de conhecimento na área. • Apresentar as principais áreas de atuação e produção de conhecimento em Psicologia Organizacional e do Trabalho. • Apresentar as relações da Psicologia Organizacional e do Trabalho com outros campos do conhecimento científico. 1. Construção da Psicologia como área de atuação profissional e pesquisa Nesse tópico, faremos uma breve descrição da história da psicologia organizacional e do trabalho, agora sob a luz da formação das subáreas desta disciplina. No cenário internacional, as origens da psicologia organizacional remontam à criação do laboratório para o estudo da fadiga, na Itália, em 1899, por Luigi Patrizi e a criação do laboratório de estudos psicofisiológicos, na Alemanhã, 1990, por Kraplin, que pesquisou a fadiga e a carga de trabalho. Esses foram considerados os primeiros estudos da nascente psicologia em relação ao trabalho, portanto, com um viés experimental. Em seguida, temos os estudos de Lahy, na França, que começou a utilizar testes para seleção de pessoal em funções como datilógrafos, motoristas de trem, operadores de telefone. Ainda temos outros eventos que ajudaram a definir a psicologia organizacional em seu início, como a produção de conhecimento de Walter Dill Scott que, em 1913, publicou um livro sobre a questão da eficiência dos trabalhadores na indústria e de Hugo Munsterberg, que publicou um livro, em 1909, sobre a aplicação da psicologia na indústria e na propaganda. Nesse momento, havia um contexto histórico e social, que influenciava fortemente para que a psicologia fornecesse soluções para a produtividade e adaptação do homem ao trabalho. Os assuntos dominantes eram: a seleção de pessoal e o uso de testes psicológicos, a avaliação do desempenho do trabalhador. Podemos separar a construção histórica da psicologia organizacional em quatro grandes períodos: o primeiro período, que se caracteriza pela definição do campo da psicologia organizacional, que vai até 1945; o segundo período, chamada de “expansão e consolidação pós-guerra”, que vai de 1945 a 1960; o terceiro período, que compreende de 1960 a 1970 e o quarto período que vai de 1970 a 2010. Segue uma análise de cada período, levando em consideração três aspectos: O contexto social, político, econômico e cultural onde ocorreu, gerando desafios no campo 45 científico e profissional; como a psicologia respondeu a esses desafios, desenvolvendo ações e produtos e, por último, quais abordagens teóricas, procedimentos, métodos e áreas, caracterizaram esse período, em reposta as essas demandas (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES: 2014, 553). O primeiro período, até 1945, foi marcado por grandes mudanças macrossociais, como a segunda revolução industrial, gerando um forte processo de industrialização, o avanço tecnológico, com a criação de máquinas e novos métodos de trabalho, a pressão por reformas sociais e a luta contra a exploração do trabalho, impulsionado pelo marxismo (com as crescentes formas de governo socialistas ao redor do mundo); a Primeira Guerra Mundial, que impulsionou a indústria bélica mundial. Esse conjunto de fatores gerou muitas demandas para a psicologia organizacional, que era uma ciência emergente e estava muito ligada às ideias da Administração Científica de Taylor, como a necessidade de capacitação de trabalhadores, racionalização do trabalho e a própria aplicação da psicologia no contexto do trabalho, uma questão ainda em construção. Os psicólogos do início do século XX começaram a criar métodos e produtos para atender essas demandas, como o uso de testes psicológicos para a seleção de pessoas e o conceito de Human Engineering (o desenho de equipamentos para o uso humano, incluindo armamentos). Nesse período, cresceu muito a psicologia aplicada às indústrias, a Psicometria, os métodos de seleção de pessoal, os métodos de treinamento e as abordagens com foco na intervenção de pequenos grupos (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES: 2014, 554). O segundo período, de 1945 a 1960, foi caracterizado pelo pós-guerra mundial, no qual havia uma necessidade de reconstrução da economia em muitos países, a reintegração de veteranos (nos EUA – Estados Unidos da América–e outros países) na sociedade, e um crescimento econômico impulsionado pela retomada da indústria e reconstrução de cidades. Também foi o período do estabelecimento do Estado de Bem-estar Social e da Guerra Fria (que se refere ao período histórico, 46 entre o final da segunda guerra mundial o final da União Soviética) de disputas estratégicas e conflitos indiretos entre os Estados Unidos e a antiga União Soviética. Esse contexto ajudou a consolidar a aplicação da psicologia nas organizações como uma disciplina importante e útil para sua manutenção e desenvolvimento. A psicologia aplicada às organizações se firma como Psicologia Organizacional e do Trabalho e não mais como Psicologia Industrial. A psicologia organizacional e do trabalho amplia sua atuação em contextos mais amplos da organização, desenvolvendo, além da seleção de pessoal (que se solidifica como atividade central da psicologia organizacional), o desenho de postos de trabalho, introdução a novas tecnologias e desenvolvimento organizacional. Há desenvolvimento de ações e teorias ligadas à aprendizagem, aquisição de habilidades, métodos de ensino, treinamento gerencial e motivação (como a teoria da hierarquia das necessidades de Maslow e a teoria X e Y de McGregor) (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES: 2014, 554). PARA SABER MAIS O Estado de Bem-estar Social (Welfare State) é uma ideologia política e econômica que coloca o estado como agente da promoção social e organizador da economia; ele torna-se o grande regulador da sociedade, cabendo ao estado garantir serviços públicos e proteção para a população.Os países europeus foram os primeiros e principais incorporadores do modelo que agradou os defensores da socialdemocracia. O terceiro período, de 1960 a 1970, foi um período de grandes mudanças, pois havia a transição de uma sociedade industrial, alicerçada no modelo taylorista-fordista, para uma sociedade pós-industrial, com o crescimento do setor de serviços e organizações sem fins lucrativos. 47 O Japão despontava como uma grande potência com seu modelo de gestão empresarial. Ampliou-se a competição com o avanço tecnológico e a busca de lucros. Todo esse contexto gerou muitas tensões no ambiente de trabalho das organizações, ocasionando conflitos e a busca de novas formas de relações de trabalho. Os testes psicológicos, aplicados até então, começam a ser questionados quanto sua validade, com críticas ao modelo psicométrico. Descreve-se a necessidade de a psicologia ir além do nível individual de análise e trabalhar outros problemas mais amplos da organização, deixando o foco de pequenos grupos para questões mais abrangentes, como a interação entre o indivíduo e a organização. Surgem trabalhos que lidam com o desenvolvimento organizacional, resolução de conflitos e desenho de cargos. Nesse período, surgem também os programas de qualidade de vida no trabalho e ações para aumentar o comprometimento e envolvimento dos trabalhadores (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES: 2014, 555). O quarto período, de 1990 até 2010, se caracterizou pelo processo de globalização e crises mundiais. Os avanços da globalização e da tecnologia da informação criaram muitos impactos na economia e nas relações de trabalho. O aumento dos empregos terceirizados e temporários contribuiu para a precarização das relações de trabalho e a constituição de novos modelos de gestão. Num contexto social mais amplo, o neoliberalismo dominou o modelo de estado e o Estado do bem-estar social entra em crise, com vários reflexos na sociedade, principalmente nos países capitalistas centrais. Nesse contexto, também emergem os países em desenvolvimento, chamados de BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África de Sul). Há a busca por novos modelos de relações de trabalho, políticas de distribuição de renda e valorização do salário-mínimo, além de políticas compensatórias. Na psicologia há uma crescente atenção às questões de saúde do trabalhador com preocupações em assuntos como estresse, conflito, relação trabalho- família, aposentadoria, assédio moral. Novas abordagens e métodos 48 surgem. Os estudos tradicionais sobre liderança e racionalização do trabalho dão lugar a novos conceitos: gestão do conhecimento, ética empresarial, organização visual, tempo ocioso, entre outros (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES: 2014, 556). No Brasil, a construção do campo da psicologia organizacional esteve alinhada aos acontecimentos mundiais, mas com certo atraso, sendo considerada como uma das primeiras áreas da psicologia a se solidificar como atuação e área de pesquisa. No Brasil, ela passou por três fases: a psicologia industrial, a partir dos anos 30; a psicologia organizacional, entre os anos de 50 e 60 e a psicologia do trabalho, a partir dos anos 70. Serão abordados nesse tema os campos de atuação e pesquisa dessa Psicologia Organizacional e do Trabalho. A fase da psicologia industrial está fortemente ligada à psicotécnica e ao atendimento das demandas da indústria que estava em plena expansão e solidificação no país. Alguns nomes são comumente citados nesse primeiro período: Henry Pieron, Roberto Mange, Emilio Myra y Lopes (criador do teste PMK– Psicodiagnóstico Mio cinético), Ulysses Pernambuco, Beti Katzentein e Oswaldo de Barros, que desenvolveram ou promoveram pesquisas e cursos de aplicação de testes psicológicos, ao mesmo tempo em que incentivaram a aplicação da psicologia no trabalho. A segunda fase sofreu influência da intensificação do processo de industrialização, na Era Vargas e no pós-guerra, com a ênfase na produtividade das empresas, ampliando o foco de atuação do psicólogo, considerando as organizações como um todo; sua estrutura, sua dinâmica cultural, política e o desenvolvimento de técnicas de trabalho com grupos. A área de recursos humanos mostrou um incremento das ações de recrutamento e seleção, treinamento e desenvolvimento e avalição de desempenho. A terceira fase se caracterizou por críticas aos modelos vigentes de atuação do psicólogo nas organizações. Nesse momento, houve uma maior ampliação do foco, com ênfase nas questões de saúde e preocupação para além das organizações. No momento presente, a área se caracteriza pela preocupação com três ênfases: a organização 49 (produtividade, qualidade e competividade); gestão (modelos de gestão de pessoa e políticas de pessoal) e os trabalhadores (saúde, bem-estar e qualidade de vida) (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES: 2014, 558). 2. A psicologia organizacional e seus campos interdisciplinares A trajetória da psicologia organizacional revela que ela foi se estruturando em três grandes eixos: o trabalho (ou não trabalho), as organizações (políticas e práticas de gestão) e os indivíduos ou grupos. No primeiro, com maior ênfase na psicologia do trabalho, o foco está em compreender e lidar com as questões relacionadas ao comportamento humano e o trabalho (emprego e tarefas), no qual estuda a natureza dos processos da organização do trabalho e seus impactos psicossociais, com ênfase na qualidade de vida e saúde do trabalhador. Esse campo se preocupa em entender como o desempenho humano é afetado por fatores pessoais, ambientais e pela organização do trabalho, mas vai além da organização, com interesse em temas como o desemprego e aposentadoria. O segundo, a psicologia organizacional, trata das relações entre o comportamento no trabalho e as organizações. O interesse está em entender e lidar com os processos psicossociais que caracterizam as organizações de trabalho como conjuntos de pessoas coordenadas para atingir os objetivos organizacionais. Esse campo está inteiramente ligado ao campo de estudos do comportamento organizacional; a área do “comportamento organizacional é um campo que investiga o impacto que indivíduos, grupos e estrutura têm sobre o comportamento dentro das organizações, com o propósito de usar este conhecimento para melhorar a eficácia organizacional” (ROBBINS, 2005). O terceiro campo surge das relações entre as ações humanas e a organização, enfocando o conjunto de políticas e práticas que se relacionam à estratégia de organizar a ação individual e coletiva com os objetivos organizacionais; está relacionada às práticas de gestão 50 de pessoas nas organizações. Nesses campos, há uma diversidade de fenômenos, que incluem as práticas de seleção de pessoal, treinamento e desenvolvimento, avaliação de desempenho, entre outras. Nesses três campos interdisciplinares há uma diversidade de fenômenos que podem ser analisados e estudados sob prismas oriundos dos três campos, portanto, não devem ser vistos como separados, mas complementares e inter-relacionados (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES: 2014,562). Esses fenômenos devem ser analisados em variados níveis de amplitude, não somente no nível individual ou grupal, pois não podem ser abordados cientificamente se não forem levados em consideração todos os fatores implicados. Níveis de estresse, por exemplo, não podem ser explicados apenas pela características da personalidade dos indivíduos, mas devemos considerar outros fenômenos como as relações entre chefia e trabalhador, estruturas de poder, cargas de trabalho, organização do processo produtivo, políticas empresariais e cultura organizacional. Esses níveis de análise são: individual; contexto e conteúdo do trabalho; social, grupal e das unidades de trabalho; organizacional; interface trabalho/não trabalho e societário (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES: 2014, 564). Para o psicólogo atuar de forma abrangente e competente, é necessária uma aproximação de conhecimentosoriundos de diversas fontes, seja de outros campos da própria psicologia ou de outras disciplinas científicas, assim, o psicólogo organizacional depende de resultados de várias pesquisas vindos das mais variadas fontes. No entanto, essa convivência nem sempre é pacífica, pois essa multiplicidade de interfaces provoca tensões a respeito da natureza do objeto (questões ontológicas), da relação entre esse objeto e o pesquisador (questões epistemológicas) e de como o objeto pode ser estudado (questões metodológicas). As interfaces da psicologia organizacional ocorrem com outras áreas da psicologia e, também, outras disciplinas científicas. Quanto às outras áreas da psicologia, as interfaces ocorrem com a psicologia educacional, referente aos processos educativos, treinamento 51 e desenvolvimento, material instrucional, aprendizagem individual e grupal; a psicologia da saúde, quanto ao processo de saúde e adoecimentos no trabalho, psicopatologia, bem-estar, prevenção e outros níveis de intervenção; saúde mental e trabalho, estresse e Burnout; psicologia da personalidade, a aplicação das teorias das diferenças individuais, fatores de personalidade, comportamento no trabalho; psicologia geral e experimental, referente aos processos cognitivos, atenção, processos emocionais e motivacionais, processos decisórios, processamento de informações e solução de problemas; a psicologia social, quanto às atitudes, valores, crenças, motivação, desempenho de grupos, equipes, liderança, poder e conformidade, negociação, relações intergrupais, mudança social e socialização; psicometria, sobre a construção e validação de medidas para uso em pesquisa ou nos processos de diagnóstico e seleção; a psicologia do desenvolvimento, sobre a noção de ciclo vital, processos de envelhecimento, metas de vida e relação trabalho-família e a psicobiologia, sobre a cronobiologia, bases biológicas sobre estresse, fadiga, carga mental, percepção, motivação e ansiedade. Essas áreas contribuem para a construção dos conhecimentos e interesses típicos da Psicologia Organizacional e do Trabalho, tais como: aprendizagem; competência; treinamento e desenvolvimento; afeto; bem-estar e saúde; fuga e esquiva; criatividade e solução de problemas; identidade e significados; cognição; contratos psicológicos; motivação; cultura e clima organizacional; desvios de comportamento; atitudes diante de mudanças organizacionais; tomada de decisão e julgamentos; interações sociais nas equipes e nas organizações; desempenho produtivo do indivíduo, gerentes e equipes. Para além da psicologia, há diálogos interdisciplinares com várias disciplinas das ciências humanas, ciências sociais aplicadas, ciências da saúde e tecnológicas. Essas disciplinas contribuem grandemente para a construção do conhecimento da psicologia organizacional e do trabalho. As demais disciplinas com suas respectivas contribuições 52 são: a administração, com as teorias das organizações, tecnologia organizacional, mudança organizacional, ambiente organizacional e estratégias organizacionais; a sociologia, com estudos sobre poder, política, conflito, dinâmica do mundo do trabalho, emprego e desemprego e sociologia do trabalho; a antropologia, com o conhecimento sobre diversidade cultural, valores e atitudes comparadas, análise transcultural e cultura organizacional; as ciências políticas, com conflito, políticas intraorganizacionais, poder e coalizões; educação, com pesquisas sobre a qualificação e trabalho, processos educativos, métodos de ensino e aprendizagem, recursos instrucionais e ensino a distância; a economia, sobre dinâmica produtiva, impactos de novas tecnologias, produtividade, emprego e desemprego, políticas macroeconômicas e mercado de trabalho; o direito, com as relações trabalhistas, leis trabalhistas, assédio moral, discriminação, retaliação e implicações legais; a engenharia/arquitetura, sobre as novas tecnologias, organização dos processos de trabalho, planejamento ambiental e sistemas sociotécnicos e a medicina/saúde coletiva, com a anatomia humana, fisiologia, antropometria, biomecânica, políticas de saúde, comportamento de risco, prevalência e prevenção/controle. Como podemos notar, a relação com as várias disciplinas contribui para a amplitude desse campo do conhecimento. A relação com a administração é a mais antiga de todas, está ligada ao surgimento da psicologia organizacional e muitas trazem alguma confusão sobre os limites de atuação dos profissionais destas áreas. A psicologia organizacional se caracteriza como uma área interdisciplinar com necessidade de uma visão multidisciplinar do psicólogo na sua atuação. 3. As atividades que definem a atuação da psicologia organizacional e do trabalho Várias pesquisas ao longo dos anos ajudaram a demonstrar quais são as atividades que caracterizam a atuação do psicólogo organizacional. 53 A prática do psicólogo organizacional é diversificada, ele é capaz de desenvolver multitarefas. Uma forma de definir as suas atividades é classificá-las como campos interdisciplinares, que possuem disciplinas e atividades específicas. Zanella (2005:27) aponta uma pesquisa desenvolvida por Muchinsky (1990: 7-10), onde divide-se a psicologia organizacional em seis ramos ou subespecialidades, a saber: 1. Psicologia de pessoa: a psicologia de pessoa que é o ramo mais tradicional da área, onde a atenção está nos aspectos das diferenças individuais, descrição de requisitos de trabalho, seleção de pessoal, avaliação de desempenho e treinamento. 2. Comportamento organizacional: o comportamento organizacional tem como ênfase os estudos dos comportamentos de indivíduos, grupos e seus fenômenos. 3. Ergonomia: busca compreender o desempenho humano no trabalho associado às relações estabelecidas pelos sistemas homem-máquina. 4. Aconselhamento de carreira e vocacional: se preocupa com a integração da pessoa com o trabalho e sua satisfação. 5. Desenvolvimento organizacional: envolve modificações no sistema psicossocial, no sistema técnico e nos procedimentos de trabalho para melhorar a eficiência do trabalhador. 6. Relações industriais: as relações industriais dizem respeito aos problemas das relações entre empregados e empregadores, negociações e legislação trabalhista. Em uma obra mais recente Zanelli; Bastos; Rodrigues (2014, 569) dividem a atuação do psicólogo organizacional e do trabalho em três grandes campos interdisciplinares: a psicologia organizacional, a psicologia do trabalho e gestão de pessoas. Cada campo comporta disciplinas específicas com suas respectivas atividades. Abaixo faremos um resumo das principais atividades do psicólogo organizacional segundo o autor: 54 Campo: Psicologia organizacional Disciplina: Comportamento Organizacional. Atividades: Diagnósticos de cultura e clima organizacional; pesquisas sobre satisfação, comprometimento e envolvimento com o trabalho; análise de processos grupais e relações interpessoais; desenvolvimento de modelos de motivação no trabalho; programas sobre diversidade na força de trabalho e ações para redução de rotatividade e absenteísmo. Disciplina: Desenho organizacional. Atividades: Análise de cenários; planejamento estratégico, design organizacional; modelos de gestão; análise de ambientes; diagnósticos organizacionais e arranjos flexíveis de trabalho. Disciplina: Consultoria organizacional. Atividades: Assessoria e consultoria para as mais variadas organizações para realização de diagnósticos, intervenção e mudanças organizacionais. Campo: Psicologia do trabalho Disciplina: Condições e higiene do trabalho. Atividades: Segurança e prevenção de acidentes; programas de ajustamento, bem-estar e qualidade de vida no trabalho e assistência psicossocial. Disciplina: Saúde no trabalho. Atividades: Diagnóstico de saúde e adoecimento no trabalho; trabalho para prevenção de distúrbios musculoesqueléticos; diagnósticoe manejo de estresse no trabalho e síndrome de burnout; clínica no trabalho. 55 ASSIMILE A síndrome de burnout é um dos principais adoecimentos psicológicos do mundo moderno. É a exaustão física e emocional e a diminuição do interesse em trabalhar. Também é chamada de síndrome do esgotamento profissional. Fonte: KateDemianov/iStock.com Disciplina: Ergonomia. Atividades: Análise do trabalho e suas cargas físicas e mentais; avaliação ergonômica (contexto de trabalho, equipamentos, ferramentas); intervenções ergonômicas e análise da interseção homem-computador. Disciplina: Orientação profissional e carreira. Atividades: Análise de interesses e aspirações vocacionais; orientação e aconselhamento de escolhas profissionais; aconselhamento de carreira; coaching e preparação para a aposentadoria. Disciplina: Emprego, desemprego e empregabilidade. Atividades: Manejo de impactos psicossociais do desemprego e construção de estratégias para recolocação no mercado de trabalho. 56 Campo: Gestão de pessoas Disciplina: Administração de pessoal. Atividades: Atividades de administração de pessoal em geral; remuneração e benefícios e planejamento de recursos humanos. Disciplina: Análise de trabalho. Atividades: Análise de postos de trabalho; descrição de rotinas e fluxos de trabalho; mapeamento de competências, descrição e análise de cargos e desenho de layout de postos de trabalho. Disciplina: Recrutamento e seleção. Atividades: Diagnósticos de necessidade de pessoal; realização de pesquisa salarial; planejamento de processo seletivo; criação e ou adoção de instrumentos de seleção; realização de avaliação psicológica para seleção; realização de entrevistas de seleção e dinâmicas de grupo; execução de processos de admissão. Disciplina: Treinamento, desenvolvimento e educação (TD&E). Atividades: Avaliação de necessidades de TD&E; avaliação de ações de TD&E; desenvolvimento de material instrucional; implantação de políticas de estágios e trainee; desenvolvimento de planos de carreira e sucessão; desenvolvimento gerencial e de equipes e programas de qualidade. Disciplina: Avaliação de desempenho (AD). Atividades: Desenvolvimento de modelos de AD; preparação para a AD; análise de avaliação e processo de AD e avaliação de potencial dos trabalhadores. 57 Disciplina: Relações de trabalho. Atividades: Programas de integração e socialização; regulação de conflitos; negociação trabalhista e programas de relacionamento família-trabalho. Como podemos ver, a área da POT é ampla, com várias atividades. Geralmente o psicólogo organizacional atua em diversas frentes ao mesmo tempo, o que requer habilidades diversas e complementares. Em seguida, a figura 1 apresenta uma síntese das diversas atividades do psicólogo organizacional. Figura 1 – As áreas de atuação da Psicologia Organizacional e do Trabalho As áreas de atuação da POT POT Psicologia Organizacional Psicologia do Trabalho Gestão de Pessoas Comportamento Organizacional Desenho Organizacional Consultoria Organizacional Condições e higiene do trabalho Saúde no trabalho Orientação proÿssional e carreira Emprego, desemprego e empregabilidade Fonte: elaborado pelo autor. Administração de pessoal Análise de trabalho Recrutamento e seleção TD&E Avaliação de desempenho Relações de trabalho 58 4. Considerações finais A POT – psicologia organizacional e do trabalho–é uma das áreas mais complexas da psicologia moderna. Ela congrega conhecimentos de diversos campos e de outras áreas da psicologia. Para o exercício da psicologia organizacional, são exigidas diversas competências e a capacidade de realizar multitarefas. TEORIA EM PRÁTICA O psicólogo organizacional e do trabalho, em seu cotidiano, exerce atividades variadas, ora com foco em determinada área, ora em outra. Alguns psicólogos se tornam especialistas em alguma atividade. Faça uma entrevista com um psicólogo(a) que atue na área organizacional e amplie um pouco mais seu conhecimento sobre a temática. Para isso, você pode utilizar algumas das questões a seguir para apoiá-lo na entrevista: “Quais são as principais atividades desenvolvidas no seu cotidiano de trabalho?”; “Como as desenvolve?”; “Utiliza algum tipo de instrumento em seu trabalho? Quais?”; “Qual é a sua formação (graduação, pós-graduação, cursos complementares)?”; “Quais são os principais desafios da sua profissão?”. Depois relacione com as disciplinas e atividades apresentadas no texto. VERIFICAÇÃO DE LEITURA 1. Podemos separar a construção histórica da psicologia organizacional em quatro grandes períodos. O 59 primeiro período do desenvolvimento da psicologia organizacional foi caracterizado: a. Pelo desenvolvimento da psicotécnica e dos testes psicológicos. b. Pela introdução de novas tecnologias e desenvolvimento organizacional. c. Pelo desenvolvimento dos estudos sobre motivação no trabalho. d. Por atividades que visavam à resolução de conflitos. e. Por uma crescente atenção às questões de saúde do trabalhador. 2. No momento presente, a psicologia organizacional se caracteriza pela preocupação com três ênfases, são estas: a. A sociedade, o indivíduo e a motivação. b. A organização, a gestão e os trabalhadores. c. A sociedade, a administração e as pessoas. d. A motivação, a satisfação e o engajamento do trabalhador. e. A organização, o trabalho e o trabalhador. 3. Um dos campos de atuação intradisciplinar da PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO é a psicologia do trabalho. Esse campo se caracteriza por: a. Se preocupar em entender como o desempenho humano é afetado por fatores pessoais, ambientais e pela organização do trabalho. b. Tratar das relações entre o comportamento no trabalho e as organizações. 60 c. Enfocar o conjunto de políticas e práticas que se relacionam com os objetivos organizacionais. d. Investigar o impacto que indivíduos, grupos e estrutura têm sobre o comportamento dentro das organizações. e. Incluir as práticas de seleção de pessoal, treinamento e desenvolvimento, e avaliação de desempenho. Referências Bibliográficas ROBBINS, Stephen P. Comportamento Organizacional. 11. ed. São Paulo: Pearson, 2005. ZANELLI, José Carlos. O psicólogo nas organizações de trabalho. Porto Alegre: Artmed Editora, 2005. ZANELLI, José Carlos; BASTOS, Antônio Vergílio Bittencourt; RODRIGUES, A. C. A. Campo profissional do psicólogo em organizações e no trabalho. In: ZANELLI, José Carlos; BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; BASTOS, Antônio Vergílio Bittencourt. Psicologia, organizações e trabalho no Brasil. Porto Alegre: Artmed, 2. ed., 2014. ZANELLI, José Carlos; BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; BASTOS, Antônio Vergílio Bittencourt. Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. Gabarito Questão 1 – Resposta: A Resolução: A primeira fase da PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO se chamava Psicologia Industrial e se ocupava principalmente de seleção de pessoal, utilizando os testes psicológicos. Questão 2 – Resposta: B Resolução: As ênfases atuais da PSICOLOGIA ORGANIZACIONAL E DO TRABALHO são: a organização (produtividade, qualidade e 61 competividade); gestão (modelos de gestão de pessoa e políticas de pessoal) e os trabalhadores (saúde, bem-estar e qualidade de vida). Questão 3 – Resposta: A Resolução: A psicologia do trabalho estuda a natureza dos processos da organização do trabalho e seus impactos psicossociais, com ênfase na qualidade de vida e saúde do trabalhador. 62 Papéis e funções do psicólogo organizacional Autor: Rogério Rodolfo Baptista Objetivos • Discutir a construção da atuação do psicólogo nas organizações de trabalho. • Compreender o campo de atuação do psicólogo nas organizações de trabalho. • Conhecer os níveis de atuaçãoe as competências necessárias para a atuação do psicólogo organizacional e do trabalho. 1. A construção da atuação do psicólogo nas organizações Nesta que regem aula, trataremos da atuação profissional do psicólogo organizacional e do trabalho, dos aspectos gerais sua atuação (como a contextualização histórica, o papel do psicólogo, seus níveis de atuação e as competências necessárias para sua atuação) e das atividades realizadas pelo psicólogo organizacional. A psicologia organizacional e do trabalho é um dos principais campos de atuação do psicólogo atualmente (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 1988; (WHO & CFP, 2001). A construção das práticas de atuação do psicólogo foi acontecendo de forma gradativa ao longo da história, passando por várias fases. Alguns textos foram marcos na discussão do papel do psicólogo na atuação nas organizações, como por exemplo: o papel do psicólogo na organização industrial (notas sobre o “lobo mal” em psicologia) de Wanderley Codo (CODO, 1984), que discute o papel do psicólogo organizacional de sua época (que era visto como um profissional acrítico e servidor da ideologia capitalista); o artigo “O que pode fazer o psicólogo organizacional” de Antônio Virgílio Bittencourt Bastos e Ana Helena Caldeira Galvão-Martins (BASTOS; GALVÃO-MARTINS, 1990), que faz um resumo dos principais papéis do psicólogo nas organizações e o livro de José Carlos Zanelli, “O papel do psicólogo nas organizações de trabalho” (ZANELLI, 2002), que apresenta os principais papéis do psicólogo nas organizações. A psicologia organizacional passou por várias transformações, de psicologia industrial para psicologia organizacional e desta para psicologia do trabalho. O papel e atuação do psicólogo variaram conforme a época, com objetivo de suprir as deficiências e novas necessidades de cada época. As definições “do que fazer”, “como fazer” e “por que fazer” podem variar conforme o enfoque adotado. Será 64 apresentado um resumo das principais funções do psicólogo segundo três enfoques: o individualista, o sistêmico e o político. Esses enfoques se diferenciam em alguns aspectos: o contexto socioeconômico do seu surgimento e as demandas correspondentes; o estilo de gestão e de organização do trabalho aos quais se dirigem; o tipo de organização (indústria, serviços, tecnologia e outras) a que se aplica; a unidade de análise básica dos estudos (indivíduo, grupo e organizações); os conteúdos mais focalizados e as ações predominantes (BORGES; OLIVEIRA; MORAIS, 2005;105). O primeiro enfoque é o individualista, que é o mais antigo e está associado às características do modelo capitalista mais tradicional do início do século XX. Esse modelo é caracterizado pela produção em massa e a necessidade de reunir os funcionários em linhas de produção com eficiência e custos baixos. É caracterizado também pela alienação do trabalhador, separando o planejar e o fazer do trabalho. Também coincide com o período inicial da administração científica de Taylor, com seus estudos de tempos e movimentos e os seus demais princípios. O gerenciamento do trabalho fundava-se na concepção do ser humano com indolente, que necessitava de controle constante e movido por incentivos financeiros. Nesse contexto, era primordial para a administração de pessoas as atividades de seleção e treinamento para a execução das funções, e o psicólogo era chamado para resolver os problemas de produção como a definição e identificação nos trabalhadores das aptidões básicas para a produção; a adaptação do homem ao cargo; treinar habilidades; disciplinar o trabalhador; e definir como usar as recompensas econômicas para manter a produtividade. Essas demandas fizeram com que o psicólogo dirigisse sua atenção para o indivíduo e em como adaptá-lo às tarefas e à empresa, fazendo com que seu papel fosse de analisar as características básicas do trabalho, participar de estudos de tempos e movimentos, analisar os indivíduos para definir quais 65 eram as melhores formas de executar suas atividades (por meio do recrutamento e seleção), treinar os indivíduos para tarefas específicas e estudar sistemas de recompensas e punições (BORGES; OLIVEIRA; MORAIS, 2005; 106). O segundo enfoque é o sistêmico. Após o início do esgotamento do modelo individualista no início do século XIX, com a organização trabalhista mais avançada; “medo vermelho” (avanço dos ideais socialistas no mundo) e a crescente crítica às más condições de trabalho, cresciam também as críticas aos modelos de gestão nas empresas, surgem novos modelos de gestão sob influência de um novo modelo de capitalismo com a maior intervenção do estado sobre a economia e as relações entre o capital e a economia, chamado de Welfore State, o estado do bem estar social. Cresce o setor de serviços e as guerras reduziram os contingentes de trabalhadores disponíveis. Com esse cenário, torna-se necessário aproveitar melhor os trabalhadores existentes, reter e combater a rotatividade, ao mesmo tempo em que precisava aprender a lidar com o trabalhador organizado. Esse contexto renova os problemas de gestão, tais como organizar o processo de trabalho, processos de comunicação, produtividade e outros. O que oferecer para os trabalhadores para retê-los? Como se comunicar com eles? Como motivá-los? A psicologia, respondendo a essas questões, passou a estudar novos conteúdos, como liderança, motivação, relações interpessoais, processo de comunicação, identificação de grupos formais, mudança organizacional e estilos de gestão. Sob a influência da Teoria Geral dos Sistemas, cujo objetivo era lançar um olhar sobre os problemas por perspectiva holística, ou seja, sob um ponto de vista mais amplo, de modo a englobar todos os aspectos que pudessem contribuir com o desenvolvimento do problema em questão, ou seja, tratar o problema como um sistema (ALBURQUEQUE, 2019:110), o foco da análise migra para os aspectos organizacionais, os psicólogos passam a se preocupar com o ajuste da organização ao indivíduo e do indivíduo à organização. 66 Nesse enfoque, a ênfase está nos aspectos cultural, político e das relações interpessoais da organização, assumindo que os simples incentivos econômicos não eram suficientes para manter a relação entre os trabalhadores e organização, era necessário também investir nas questões interpessoais e sociais. Nesse período, a psicologia organizacional e do trabalho teve um momento fértil, a reflexão sobre o papel do psicólogo é vista criticamente e ampliada. Podemos resumir esses papéis em quatro: realizar estudos e pesquisas para a produção de conhecimento, planejamento e políticas aplicadas a recursos humanos nas organizações; desenvolver atividades de avaliação, capacitação e formação de empregados; aprimorar as técnicas para a melhor alocação e controle funcional dos trabalhadores; definir e implantar programas de saúde, proteção, valorização e satisfação do trabalhador (BORGES; OLIVEIRA; MORAIS, 2005: 107). Como pano de fundo do terceiro enfoque, temos as mudanças socioeconômicas oriundas das crises mundiais e da chamada terceira revolução industrial (presentes nas empresas japonesas), com seus novos estilos de gestão que visavam responder aos problemas comuns nos modelos tayloristas anteriores, como a questão da motivação, o envolvimento do empregado e, principalmente, sua participação no processo decisório, articulando-se com as novas tecnologias (principalmente a informatização e automação). Se de um lado as transformações do mundo do trabalho reduziam a alienação do trabalhador por meio da desapropriação do saber fazer (presente na participação), por outro submetia-se às condições adversas de trabalho por meio da ameaça do desemprego. Saber fazer, ter autonomia, criar, buscar a qualidade, ser proativo, entre outras questões, formam um conjunto de novas possibilidades que funciona comouma sedução ao envolvimento no trabalho. Também cresce a pressão por ambientes mais salutares de trabalho com o enrijecimento das leis trabalhistas. 67 Nesse contexto, o psicólogo organizacional e do trabalho precisou lidar com conceitos mais abrangentes e dinâmicos da organização, compreender os significados atribuídos ao trabalho, ao emprego. Começa a pensar em um âmbito mais estratégico das organizações com as políticas organizacionais e ao seu redor, acrescentando novos níveis de análise (multiníveis). Tais mudanças abrangem políticas públicas de geração de emprego, políticas de saúde no trabalho, ações públicas de controle de qualidade de trabalho. Os objetivos relativos ao assessoramento, diagnóstico passaram a ser encarados também numa perspectiva estratégica, envolvendo o zelo pelos direitos de todos os atores do mundo do trabalho. Há também uma crescente preocupação com a saúde do trabalhador. Hoje questões como o estresse e síndrome de burnout são muito importantes para a atuação do psicólogo nas organizações. As ações dos psicólogos também devem envolver temas como a cultura organizacional, comprometimento e envolvimento, valores e significado do trabalho, aprendizagem organizacional, bem-estar subjetivo e outros temas. O psicólogo é chamado para atuar em entidades de classe e poder público para ajudar a compor políticas e ações mais abrangentes quanto à saúde do trabalhador. O psicólogo também exerce um papel social de agente nas organizações como promotor da equidade social e política. A esse enfoque deu-se o nome de enfoque político do trabalho, muito presente na psicologia do trabalho, que deve ser contextualizada e, por consequência, mediar politicamente as relações de trabalho nas organizações. Essa postura mais politizada do psicólogo se reflete em três características: a necessidade de considerar os aspectos do poder presentes nas relações de trabalho; fazer análises mais multiníveis e que abarcam políticas públicas e aspectos socioeconômicos e maior preocupação com a dimensão ético-social da sua atuação (BORGES; OLIVEIRA; MORAIS, 2005; 110). 68 Na comparação de dois estudos realizados sobre a identidade e as atividades do psicólogo, um em 1988 pelo Conselho Federal de Psicologia (1988) e outro em 2010 por Gondim, Bastos e Peixoto (2005), Zanelli; Bastos; Rodrigues (2014, 579) apontam a evolução das principais atividades do psicólogo organizacional e do trabalho no Brasil nas últimas décadas. Na década de 80, do total de psicólogos que atuavam na área organizacional e do trabalho, 40% deles se concentravam na aplicação de testes psicológicos para a atividade de recrutamento e seleção; entre 20 a 40% ocupavam cargos administrativos, faziam análise de função/ocupação e exerciam atividades como: avaliação de desempenho, planejamento e execução de projetos, desenvolvimento organizacional, acompanhamento de pessoal, treinamento, assessoria e triagem e menos de 20% se concentravam nas atividades relacionadas com análise de cargos e salários e outras atividades como: psicodiagnóstico, consultoria, supervisão de estágios acadêmicos, orientação para profissionais, aconselhamento psicológico e diagnóstico situacional. Em 2010 acontecem algumas mudanças, mais de 40% se ocupavam de aplicação de testes psicológicos, porém agregavam outras atividades como o psicodiagnóstico, consultoria e avaliação de desempenho; entre 20 e 40% ainda possuiam cargos administrativos e se ocupavam da supervisão extra acadêmica e menos de 20% ocupavam atividades com análise de cargos e salários, recrutamento e seleção, dinâmica de grupo, desenvolvimento de grupos e equipes, reabilitação profissional, intervenção na organizações e instituições. Com base nesses dados, podemos perceber as mudanças em consonância com as descrições anteriores, nas quais o psicólogo vai migrando para atividades mais estratégicas como a consultoria e avaliação de desempenho e deixando as atividades mais operacionais como o recrutamento e seleção (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES: 2014, 579). 69 2. A atuação do psicólogo nas organizações de trabalho A Psicologia Organizacional sempre foi acusada de manter uma posição acrítica em sua atuação profissional e ajudar a manter o status quo social do trabalhador. O alinhamento da psicologia organizacional, em sua origem, com a administração científica foi um dos grandes fatores que contribuíram para essa questão. Os psicólogos surgem nesse contexto como o grande aliado do capital, aqueles que se preocupavam com a aplicação, sem questionar sua finalidade. A aplicação dos seus conhecimentos dessa forma lhe atribuiu uma prática ideologicamente comprometida com a expropriação do trabalhador. PARA SABER MAIS Status quo é um termo muito utilizado pela sociologia e pode ser traduzido como “o estado das coisas”, que significa o estado em que as os fatos, situações e as coisas, independente do momento, estão situadas. Em termos mais leigos, é o jeito que as coisas são tratadas e significadas numa sociedade. É o “jeitão” de compreender as situações e como as coisas são. No entanto, é interessante contrapor a esse ataque a pouca influência que os psicólogos possuíam nas posições ocupadas nas organizações e as poucas possibilidades de intervenção de um modo mais crítico. Muitas vezes, essas críticas têm sentido devido a uma atuação do psicólogo pobre em autocrítica (ZANELLI, 2002; 34). O trabalho de Coelho-Lima; Costa; Yamamoto; 2011: 25 faz um levantamento de como a questão da atuação do psicólogo organizacional foi tratada em artigos científicos nas últimas décadas. Eles concluíram que o papel do 70 psicólogo nas organizações pode ser visto em três grandes categorias: o papel do psicólogo no contexto do trabalho; críticas à profissão de psicólogo no contexto do trabalho; prescrições para a profissão no contexto do trabalho. A primeira categoria trata das posições adotadas pelo psicólogo nas organizações em relação aos interesses das organizações versus os dos trabalhadores. Assim, podemos dividir essa categoria em três gradações: o compromisso com a empresa, em detrimento dos trabalhadores; equidade entre o compromisso com a empresa e com os trabalhadores e o compromisso com os trabalhadores, em detrimento da empresa. Na primeira, o psicólogo é visto como um profissional que se sujeita de forma acrítica às demandas do capital, se colocando a serviço do poder deste nas organizações. Sua atuação se dá, principalmente, nas atividades mais tradicionais dos setores de Recursos Humanos, como a seleção de pessoas, treinamento e avaliação de desempenho. A segunda compreende a atuação do psicólogo de forma mais equilibrada, que colocam lado a lado o compromisso com a organização e com o trabalhador. E inclusive, é colocado que é impossível escapar desse duplo compromisso: por um lado deve atuar a favor do desenvolvimento dos trabalhadores, realizando atividades de saúde mental, por exemplo, e por outro deve atuar em prol dos resultados empresariais, principalmente no incremento da produtividade e competitividade. A última defende que o psicólogo deveria se comprometer prioritariamente com os trabalhadores, estando em segundo plano o compromisso com a empresa, pois o psicólogo deveria ter como objetivo final a melhoria de vida e das condições de trabalho do trabalhador, promovendo ações para o desenvolvimento e emancipação dos trabalhadores e não dos interesses do sistema (COELHO-LIMA; COSTA; YAMAMOTO: 2011; 25-26). Podemos perceber que o papel do psicólogo 71 nas organizações é complexo, se de um lado ele tem que dar suporte para que os objetivos empresariais sejam atingidos, por outro também deve se preocupar com os trabalhadores, promovendo sua saúde mental e melhoria nas condições de trabalho. A segunda categoria faz críticas à atuação do psicólogo no contexto de trabalho. Começando que os própriospsicólogos fazem críticas a sua atividade, avaliando negativamente a remuneração; a satisfação com o trabalho; as condições de atuação e interação com outros profissionais; desconhecimento da gestão das organizações do papel do psicólogo nesse contexto; a carga excessiva de trabalho e a falta de equilíbrio entre a vida pessoal e profissional do psicólogo. Outro fator criticado é a utilização da psicologia com ênfase na regulação dos trabalhadores para a promoção da produtividade organizacional, fazendo com que o psicólogo, muitas vezes, limite a atuação a esse fator. Outra crítica é a defasagem teórica e prática desses profissionais, fazendo com utilizem um ferramental teórico e metodológico ultrapassado e superficial, principalmente oriundos de outros campos do conhecimento como a administração. Os psicólogos organizacionais também acabam atuando em um nível muito operacional, o que dificulta o aperfeiçoamento de metodologias mais estratégicas. A prática do “clinicismo” ainda é muito comum ao psicólogo organizacional. Esse fator se refere à adoção de modelos clínicos (fundamentos muitas vezes numa visão médica) nas ações dentro das organizações, descontextualizando as práticas e não utilizando outros referenciais mais apropriados, fazendo com que o profissional acabe extrapolando o modelo clínico para o ambiente organizacional, descaracterize a identidade profissional do psicólogo organizacional, negligencie a compreensão do comportamento humano no contexto do trabalho e desvalorize as atividades específicas do ambiente organizacional. A última crítica nessa categoria refere às deficiências na formação do psicólogo organizacional. As universidades ainda possuem uma ênfase muito grande na psicologia clínica e na 72 formação de um profissional liberal, o que dificulta a inserção do psicólogo nesse contexto (COELHO-LIMA; COSTA; YAMAMOTO: 2011; 26-27). A última categoria indica possiblidades para o desenvolvimento mais consistente da profissão no contexto do trabalho. A primeira ação seria melhorar a formação dos psicólogos, alterando os currículos dos cursos de Psicologia, inserindo mais disciplinas relacionadas à Psicologia Organizacional e do Trabalho, bem como a atualização teórica e metodológica das existentes. A segunda seria o psicólogo se apropriar de sólidas bases teóricas e metodológicas para sua atuação ser mais coerente com o que a psicologia organizacional e do trabalho proporciona no campo de pesquisa. A outra ação é a inovação na atividade do profissional no contexto de trabalho. Essas inovações girariam em torno de uma atuação mais proativa e preventiva, o incentivo ao autodesenvolvimento através de reflexões mais críticas e contextualizadas, a inserção destes profissionais em outros campos como sindicatos, grupos de trabalhadores desempregados, cooperativas de trabalhadores e ações que tenham como norte o benefício dos trabalhadores. A última ação seria a própria reorientação da profissão, fazendo com que os psicólogos atuem em níveis mais estratégicos e decisórios da organização, ampliando suas atividades e impactando de forma mais eficaz no desenvolvimento dos trabalhadores. Também é necessário que o psicólogo se torne mais presente nas equipes multidisciplinares formadas por médicos, assistentes sociais, administradores, engenheiros de segurança do trabalho e outros, participando mais efetivamente da formulação de estratégias, políticas e ações nas organizações (COELHO-LIMA; COSTA; YAMAMOTO: 2011; 27-28). 73 3. Níveis de atuação e competências necessárias ao psicólogo organizacional e do trabalho Uma organização possui muitos níveis do ponto de vista estrutural e político. Para Mintzberg (1983, apud PAZ; MARTINS; NEIVA, 2014: 459), um sistema organizacional é composto pela cúpula estratégica, a linha intermediária, o núcleo operacional, assessoria de apoio e a tecnoestrutura. No nível estratégico, temos os detentores do poder de decisão da organização e os formadores de opinião, que podem ser compostos pela presidência, diretores e gerentes de alto nível. No nível da linha intermediária, temos os gerentes de linha média, que detém poder formal e legitimidade para atuação junto às pessoas da organização, sendo responsáveis pelo nível tático, que é transformar as estratégias em planos de ações e gerenciá-las. No nível operacional, estão os responsáveis pelas atividades fim da organização, sendo os trabalhadores menos ou mais qualificados. Também teremos a função de assessoria, que são o staff (atividades de suporte e assessoria) com atividades de apoio ao sistema e a tecnoestrutura que fornecem modelos e ferramentas para o gerenciamento do sistema. Uma outra maneira de entender os níveis organizacionais é defendida por Chiavenato (2010:72), que divide as organizações em três níveis: institucional/estratégico; intermediário/ tático e o operacional. O nível institucional/estratégico é constituído por presidente e diretores da alta administração, diretamente responsáveis pelas principais decisões – ou, no caso de organizações de grande porte, instruídos pelo Conselho de Administração. O nível intermediário/tático é composto por gerentes e representa o meio de campo da organização, faz a articulação interna entre os níveis institucional e operacional e cuida de amortecer o impacto das pressões externas sobre o ambiente particular da organização, porque precisa internalizar as decisões globais tomadas pelo nível institucional. O nível operacional é composto pelas pessoas que executam as atividades. 74 O psicólogo organizacional atua em todos esses níveis com variados tipos de atuações. No nível estratégico, dá suporte para a formulação de políticas e estratégias, sempre colaborando com o viés da psicologia organizacional. No nível intermediário, dá suporte aos gestores e ao mesmo tempo fornece ferramentas e subsídios para a gestão de pessoas nas organizações e no nível operacional intervém diretamente sobre os trabalhadores com diversas ações para a promoção do desenvolvimento e saúde mental. Também podemos acrescentar o nível político a essa lista. Nele, o psicólogo atua de forma transversal nas organizações promovendo a equidade e apoiando o desenvolvimento organizacional. O campo de atuação da psicologia organizacional e do trabalho é complexo, exigindo múltiplas competências deste profissional. Aqui entendemos competência em três dimensões: como a capacidade de tomar iniciativa, assumir responsabilidades perante situações profissionais, envolvendo autonomia e automobilização; uma compreensão prática das situações a partir do conhecimento adquirido, que é orientado pelo êxito a obter a solução de algum desafio e a mobilização de rede de atores em torno das mesmas situações, levando a compartilhar implicações de suas ações, definindo corresponsabilidades. Serão abordadas aqui as competências mais transversais (e não as individuais) da atuação do psicólogo nas organizações. Essas competências são: saber explicar as principais mudanças no mundo do trabalho e como este se estrutura na contemporaneidade (conhecer os fatores que impactam nas organizações e nas pessoas); identificar e articular as principais interfaces entre a psicologia organizacional e do trabalho com outros campos da psicologia (como a psicologia social e da saúde); compreender e comunicar a natureza da organização como fenômeno psicossocial, contribuindo para processos de transformação de sua estrutura e dos seus modelos de gestão (conhecimentos do funcionamento político e social da organização); analisar e ampliar o diálogo da psicologia organizacional com outras profissões (como o administrador, o médico e o engenheiro de segurança do trabalho); 75 reconhecer os diferentes níveis que estruturam os processos organizacionais e do trabalho; analisar criticamente a constituição da psicologiaorganizacional e do trabalho como área de atuação profissional; reconhecer os diferentes níveis de intervenção dos fenômenos organizacionais e do trabalho, buscando contemplar todos; conhecer as produções científicas em psicologia organizacional e do trabalho, identificando os principais construtores, estratégias metodológicas e avanços recentes (ZANELLI; BASTOS; RODRIGUES: 2014, 576). Figura 1 – Níveis de atuação do psicólogo organizacional e do trabalho Níveis Organizacionais Papel do Psicólogo Organizacional e do trabalho Político nas organizações. Estratégico Tático Operacional Dar suporte para a formulação de políticas e estratégias , sempre colaborando com o viés da psicologia organizacional. Dar suporte aos gestores e ao mesmo tempo fornecer ferramentas e subsídios para a gestão de pessoas Intervir diretamente sobre os trabalhadores com diversas ações para a promoção do desenvolvimentoe saúde mental. Fonte: elaborado pelo autor. ASSIMILE Os níveis de administração também podem ser divididos em três tipos: a alta administração, que se encontra no topo da pirâmide e é representada pela alta direção ou diretoria 76 (presidente e diretorias); a média administração, que está no nível médio da pirâmide, composta pelas gerências de departamento ou setores e a administração operacional, que compreende o primeiro nível e é constituída pelos gerentes de linha, com gerente de vendas, produção e recursos humanos (ALBURQUEQUE, 2019:42). O papel do psicólogo que atua nos contextos de trabalho vem se alterando ao longo do tempo. Nos dias atuais, ele possui mais possibilidades de atuar de uma forma mais estratégica, contribuindo como agente de mudanças para a organização e para os trabalhadores. O profissional precisa se atualizar e estar mais preparado para atuar em novos contextos, atuando em diferentes níveis de intervenção. TEORIA EM PRÁTICA O psicólogo organizacional e do trabalho atua em diversos níveis na organização. Imagine a seguinte situação hipotética: um psicólogo que trabalha em uma grande organização foi chamado para colaborar na solução de problemas relacionados à gestão de gerentes de primeira linha (que atuam diretamente na condução de equipes de trabalho). Os problemas levantados pela pesquisa de clima organizacional apontavam que os colaboradores sentiam falta de feedback (retorno de informações dos supervisores) sobre as atividades cotidianas e queriam que os gerentes fizessem isso de forma mais rotineira. Elabore um plano de ação que envolva ações nos três níveis de atuação do psicólogo organizacional: estratégico, tático e operacional abordando os aspectos: o que, porque, como e quando será executada cada ação. 77 VERIFICAÇÃO DE LEITURA 1. O enfoque individualista da evolução do papel do psicólogo organizacional e do trabalho é caracterizado por: a. O gerenciamento do trabalho fundava-se na concepção do ser humano como indolente, que não necessitava de controle e supervisão. b. Nesse período, crescem as críticas às más condições de trabalho. c. É o enfoque mais antigo e está associado às características do modelo capitalista mais tradicional do início do século XX. d. Nesse período, também cresce a pressão por ambientes mais salutares de trabalho com enrijecimento das leis trabalhistas. e. O psicólogo organizacional e do trabalho precisou lidar com conceitos mais abrangentes e dinâmicos da organização. 2. Os níveis organizacionais de atuação do psicólogo organizacional e do trabalho são: a. Estratégico, tático, operacional e político. b. Intermediário, político, tático e operacional. c. Tático, estratégico, operacional e político. d. Intermediário, estratégico, operacional e institucional. e. Institucional, estratégico, político e tático. 3. São críticas dos próprios psicólogos sobre o papel do psicólogo nas organizações: 78 a. Avaliam positivamente a remuneração. b. Há grande satisfação com o trabalho. c. As condições de atuação e interação com outros profissionais são satisfatórias. d. Os psicólogos que atuam nesse contexto conhecem bem o seu papel. e. Há uma carga excessiva de trabalho e a falta de equilíbrio entre a vida pessoal e profissional do psicólogo. Referências Bibliográficas ALBURQUEQUE, Ricardo Azenha Loureiro. Teorias da administração. Mariangá-pr: Unicesumar, 2019. 160 p. BASTOS, Antônio Virgilio Bittencourt; GALVÃO-MARTINS, Ana Helena Caldeira. O que pode fazer o psicólogo organizacional. Psicologia: Ciência e Profissão, [s.l.], v. 10, n. 1, p.10-18, 1990. FapUNIFESP (SciELO). http://dx.doi.org/10.1590/s1414- 98931990000100005. BORGES, Livia de Oliveira; OLIVEIRA, Andréa Carla Ferreira de; MORAIS, Thude Wolvua Almeida de. O exercício do papel profissional na Psicologia Organizacional e do Trabalho. Revista Psicologia Organizações e Trabalho, Florianópolis, v. 5, n. 2, p.101-139, 2005. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S1984-66572005000200005>. Acesso em: 04 abr. 2019. CHIAVENATO, Idalberto. Gestão de Pessoas: o novo papel dos recursos humanos nas organizacoes. 3. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010. 579 p. CODO, Wanderley. O papel do psicólogo na organização industrial: (notas sobre o “lobo mau” em psicologia). In: LANE, Silvia T. M.; CODO, Wanderley. Psicologia Social: O homem em movimento. 5. ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1984. p. 195-202. COELHO-LIMA, Fellipe; COSTA, Ana Ludmila Freire; YAMAMOTO, Oswaldo Hajime. O exercício profissional do psicólogo do trabalho e das organizações: uma revisão da produção científica. Rev. Psicol. Organ. Trab., Florianópolis , v. 11, n. 2, p. 21- 35, dez. 2011 . Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S1984-66572011000200003&lng=pt&nrm=iso>. Acessos em: 14 abr. 2019. CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. Quem é o psicólogo brasileiro. São Paulo: Edicon, 1988. 79 http://dx.doi.org/10.1590/s1414-98931990000100005 http://dx.doi.org/10.1590/s1414-98931990000100005 http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1984-66572005000200005 http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1984-66572005000200005 http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1984-66572011000200003&lng=pt&nrm=iso http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1984-66572011000200003&lng=pt&nrm=iso GONDIM, Sônia Maria Guedes; BASTOS, Antonio Virgílio Bittencourt; PEIXOTO, Liana Santos Alves. Áreas de atuação, atividades e abordagens teóricas do psicólogo brasileiro. In: BASTOS, Antonio Virgílio Bittencourt; GONDIM, Sônia Maria Guedes. O trabalho do psicólogo no Brasil: um exame à luz das categorias da psicologia organizacional e do trabalho. Porto Alegre: Artmed, 2005. Cap. 9. p. 174-199. PAZ, Maria das Graças Torres da; MARTINS, Maria do Carmo Fernandes; NEIVA, Elaine Rabelo. Poder nas organizacões. In: ZANELLI, José Carlos; BORGES-ANDRADE, Jairo Educardo; BASTOS, Antonio Virgílio Bittencourt. Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. Cap. 12. p. 450-490. WHO INSTITUTO DE PESQUISA DE OPINIÃO E MERCADO; CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA. (2001). Pesquisa de Opinião WHO – Quem é o psicólogo brasileiro. 2001. Disponível em: <http://www.pol.org.br/pol/export/sites/default/pol/publicacoes/ publicacoesDocumentos/ Pesquisa_WHO.pdf>. Acesso em: 26 fev. 2009. ZANELLI, José Carlos. O psicólogo nas organizações de trabalho. Porto Alegre–Rs: Artmed Editora, 2002. ZANELLI, José Carlos; BASTOS, Antônio Vergílio Bittencourt; RODRIGUES, A. C. A. Campo profissional do psicólogo em organizações no trabalho. In: ZANELLI, José Carlos; BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; BASTOS, Antônio Vergílio Bittencourt. Psicologia, organizações e trabalho no Brasil. Porto Alegre: Artmed, 2. ed., 2014. Gabarito Questão 1 – Resposta: C Resolução: O enfoque individualista é o mais antigoe está associado aos princípios do capitalismo tradicional e da administração científica de Taylor. Questão 2 – Resposta: A Resolução: Os níveis de atuação do psicólogo organizacional são: estratégico ou institucional; intermediário ou tático, operacional e político. Questão 3 – Resposta: E Resolução: Os psicólogos que atuam nas organizações se queixam constantemente da sobrecarga de trabalho e como isso afeta suas vidas pessoais. 80 http://www.pol.org.br/pol/export/sites/default/pol/publicacoes/publicacoesDocumentos/ Pesquisa_WHO.p http://www.pol.org.br/pol/export/sites/default/pol/publicacoes/publicacoesDocumentos/ Pesquisa_WHO.p Conceitos e perspectivas de estudo em Psicologia Organizacional e do Trabalho Autor: Rogério Rodolfo Baptista Objetivos • Compreender a psicologia organizacional e de trabalho como campo de investigação e produção do conhecimento. • Discutir sobre os aspectos metodológicos de pesquisa em Psicologia Organizacional e do Trabalho. • Apresentar um retrato atual da produção científica em Psicologia Organizacional e do Trabalho no Brasil. 1. A psicologia organizacional e de trabalho como campo de investigação e produção do conhecimento O que a Psicologia Organizacional e do Trabalho estuda? Quais são suas preocupações? Como é realizada a pesquisa nesse campo? Nesta aula, serão estudados alguns aspectos sobre a investigação científica em Psicologia Organizacional e do Trabalho, mas sem a pretensão de esgotar esse assunto. A primeira questão é que a Psicologia Organizacional e do Trabalho estuda fenômenos como comportamentos, relações entre as pessoas e grupos, motivação, percepções, crenças, atitudes, significados e sentimentos, assim como outras subáreas da psicologia (BORGES-ANDRADE; PAGOTTO: 2010: 37). O que a torna específica é que seu foco de interesse nesses fenômenos está relacionado ao contexto do trabalho. Quando estuda valores e significados, por exemplo, o faz relacionando com as questões do trabalho, seja dentro das organizações ou não. Existem dois desafios para se estudar esses fenômenos. O primeiro é encontrar uma definição que o represente ou corresponda ao seu objeto de estudo, uma vez que possui diversos constructos. Outro desafio é encontrar evidencias empíricas que possam demonstrar o quanto os fenômenos de POT estão presentes nos contextos em que são estudados. A Psicologia Organizacional e do Trabalho não está interessada somente em descrever ou mensurar esses fenômenos, busca entender o porquê eles acontecem, ela precisa conhecer os antecedentes e consequentes que os geraram identificado às causas e consequências desses fenômenos, ou seja, suas causas e contextos que os geraram. Os antecedentes estão divididos em quatros tipos: os antecedentes dos indivíduos (por exemplo, as diferenças entre homens e mulheres referentes ao seu comportamento nas organizações); os antecedentes do grupo (por exemplo, entender como a interdependência entre tarefas e produtos em uma equipe, afeta a produtividade de cada trabalhador); 82 os antecedentes da organização (por exemplo, entender como os tipos de estruturas organizacionais aumentam o estresse no trabalhador) e os antecedentes da sociedade (entender como a cultura nacional pode influenciar a criatividade das pessoas no trabalho) (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:590). A Psicologia Organizacional e do Trabalho está interessada em conhecer como esses fenômenos podem produzir mudanças, ou seja, seus consequentes. Da mesma forma, os consequentes aparecem em quatro níveis: o individual (por exemplo, como o estresse no trabalho pode afetar a motivação da pessoa); do grupo (por exemplo, como os níveis de produtividade dos membros de uma equipe podem afetar a interação social nas equipes de trabalho); da organização (por exemplo, as pessoas mais criativas no trabalho podem produzir mudança mais substanciais na cultura da organização) e da sociedade (se indivíduos mais comprometidos em suas carreiras tornam a sociedade mais competitiva). Dessa forma, busca-se compreender as relações entre os antecedentes e consequentes, mas a relação entre eles pode variar, pois muitas vezes deve se analisar os fenômenos não só no nível que acontece, mas nos outros níveis. A abordagem multinível envolve variáveis relativas a distintos níveis dispostos em uma hierarquia (indivíduo, grupo, organização e sociedade), podem ter efeitos em níveis diferentes. Encontrar uma forma de descrever corretamente os fenômenos é um desafio constante na Psicologia Organizacional e do Trabalho. O indivíduo é modificado pelos diferentes níveis do seu ambiente, mas também pode produzir mudanças nesses níveis. Essa dupla transformação produz significado para o indivíduo e esse significado pode passar a produzir seus próprios efeitos no desempenho e nos diversos níveis do ambiente. As organizações são sistemas complexos onde existem relações multiderminantes entre as partes e, ao mesmo tempo, se configura como um conjunto de fenômenos distintos (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:591). 83 A investigação dos fenômenos nos contextos de trabalho exige o manejo de conceitos oriundos do estudo de processos psicológicos básicos, tais como motivação e aprendizagem, presentes em outras subáreas da psicologia como a psicologia social e a psicologia da aprendizagem. Já as ferramentas metodológicas para sua investigação, escalas e testes, por exemplo, podem ser obtidas de áreas como a psicometria e a psicologia experimental. O uso desses conceitos torna possível a interpretação psicológica dos dados obtidos. Os processos psicossociais são diferentes nas organizações, com suas especificidades, portanto, simplesmente transpor teorias de outros campos para as organizações, sem as devidas críticas, pode ser perigoso e ineficiente. É preciso entender as características distintas das organizações como, por exemplo, hierarquia, interações repetidas entre as pessoas, conflitos entre os objetivos pessoais e organizacionais. Outro fator importante é refletir que as organizações de trabalho são distintas de outras entidades sociais como a família e comunidades, por exemplo. Por outro lado, a diversidade de problemas que configuram o campo das organizações e do trabalho demanda que sejam estabelecidas interfaces com várias outras disciplinas como a sociologia, antropologia, ciências políticas, economia, administração, pedagogia e educação, pois é preciso compreender como o desempenho humano se relaciona com variáveis sociais, culturais, políticas e econômicas e com processos relativos à gestão das organizações e à educação dos indivíduos que trabalham (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:592). Para compreender a produção do conhecimento em Psicologia Organizacional e do Trabalho é necessário conhecer algumas crenças ou suposições do pesquisador e algumas normas ou características da maneira cientifica de pensar. As crenças do pesquisador e normas de pesquisa constituem um esquema mental que influenciam as decisões teórica e metodológica do pesquisador. As histórias de vida do pesquisador, seus processos e aprendizagem, seus esquemas de deferência, sua curiosidade, insatisfações, dúvidas, interrogações 84 orientam as diferentes perguntas que faz e permitem elaborar uma delimitação inicial de um processo de pesquisa inicial que vai orientar o processo de sistematização, quais informações buscar e delimitar o problema de pesquisa a ser investigado e as opções metodológicas adotadas. O processo de construção do conhecimento pode ser organizado nas seguintes etapas: elaboração de uma pré-teoria (aquilo que se acredita ser); a delimitação do problema de pesquisa a ser estudado; as perguntas a serem respondidas; as informações necessárias para responder a essas questões; as fontes utilizadas para obter os dados; a definição dos procedimentos para coletar dados; a definição dos instrumentos para coletar e registar os dados; a coletae o registro de informações; a organização dos dados; o tratamento dos dados; a análise dos dados; a interpretação dos dados e os resultados da pesquisa. A sequência dessas etapas pode não ocorrer necessariamente nessa ordem. Por exemplo, a escolha e definição de instrumentos de pesquisa pode levar o pesquisador a reformular o problema a ser estudado ou as perguntas a serem respondidas, antes mesmo da coleta de dados (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:593). As crenças do pesquisador estão ligadas às suas referências teóricas e metodológicas e à própria história de vida do pesquisador. Um mesmo assunto pode ser abordado de diversas formas no campo da Psicologia Organizacional e do Trabalho. Um exemplo disso é o assunto de comportamento organizacional. Alguns pesquisadores podem considerá-lo como um enfoque afetivo, que considera uma atitude que envolve a crença e a aceitação dos objetivos e valores organizacionais e a disposição para defender e contribuir para o bem-estar da organização. Já para outros autores, o comprometimento organizacional envolve o desejo de manter vínculo com a organização. Dependendo do enfoque teórico do pesquisador, sua pesquisa pode caminhar para uma direção ou outra. Na próxima seção, será abordado como as normas de pesquisa influenciam no processo de construção do conhecimento em 85 Psicologia Organizacional e do Trabalho (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:594). 2. Aspectos metodológicos de pesquisa em Psicologia Organizacional e do Trabalho A produção do conhecimento em Psicologia Organizacional e do Trabalho é influenciada pelas normas de pesquisa que o pesquisador deve seguir. Essas normas estão relacionadas ao “como fazer” pesquisa e influenciam na produção do conhecimento. Isso determina fatores importantes como o planejamento da pesquisa, o uso de ferramentas de pesquisa, a forma de coleta de dados, a interpretação dos dados de pesquisa. Vale serem resgatados alguns princípios básicos da ciência. A ciência compõe-se de um conjunto de conhecimentos sobre fatos ou aspectos da realidade (objeto de estudo), expresso por meio de uma linguagem precisa e objetiva com rigor. O conhecimento deve ser obtido de maneira programada, sistemática e controlada, para que se permita a verificação empírica. Assim, pode-se apontar o objeto dos diversos ramos da ciência e saber exatamente como determinado conteúdo foi construído, possibilitando a replicabilidade do estudo. Dessa forma, o saber pode ser transmitido, verificado, utilizado e desenvolvido. A ciência deve possuir alguns princípios básicos, que são a base do método científico, como: objeto específico, linguagem rigorosa, métodos e técnicas específicas, processo cumulativo do conhecimento e objetividade (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2001:19). O objeto deve ser delimitado claramente; corresponde ao “o que é pesquisado”; a linguagem deve ser clara e objetiva; os métodos e técnicas de pesquisa devem ser comprovadamente eficientes para descrever e pesquisar o objeto; sempre deve-se fazer pesquisa sobre estudos realizados sobre o assunto e pela metodologia que prima pela objetividade tanto da descrição quanto das conclusões da pesquisa. 86 O processo de construção do conhecimento em Psicologia Organizacional e do Trabalho precisa seguir as etapas de construção do conhecimento científico: a identificação dos problemas de pesquisa; a formulação dos objetivos de pesquisa; a escolha da(s) abordagem(ens) metodológica(s); a busca pelos locais de pesquisa; a definição de fontes e estruturas de coletas e análise de dados; a seleção das estratégias apropriadas de controle de pesquisa e a realização da pesquisa planejada e a escolha pela forma de divulgação (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:593). A identificação dos problemas de pesquisa. Os problemas que a psicologia organizacional e do trabalho busca resolver podem ser oriundos das teorias, assim o esforço será no sentido de testar hipóteses. Os autores elaboram e testam modelos teóricos para a compreensão dos fenômenos. Isso é mais comum quando as temáticas estudadas já dispõem de literatura científica desenvolvida no sentido de conceitos, metodologia e instrumentos. Nesse caso, o pesquisador busca em pesquisas já desenvolvidas na literatura, os relatos e informação que possam apoiá-lo em identificar oportunidades de novas pesquisas. Os problemas também podem ser oriundos da observação de um contexto ou de demanda de algum profissional ou organização, assim o esforço será no sentido de criar ou gerar hipóteses. Isso ocorre quando a temática é nova ou quando há evidências de que o conhecimento existente ou o método utilizado anteriormente não são suficientes para descrever esses fenômenos. Essas pesquisas estão sempre vinculadas a pressupostos teóricos e metodológicos e o campo de observação. Isso tem ocorrido menos devido ao estado atual do desenvolvimento da pesquisa em Psicologia Organizacional e do Trabalho, mas pode acontecer quando, por exemplo, surgem novos processos campos de trabalho ou novas demandas dentro do âmbito organizacional (BORGES- ANDRADE; ZANELLI, 2014:596). Formulação dos objetivos de pesquisa. Após identificar o problema, os objetivos de pesquisa podem ser formulados visando resolvê-los. Esses 87 objetivos podem ser de quatro tipos distintos: O descritivo, quando o pesquisador visa identificar e organizar diferentes características da situação ou problema. Levando a um sistema de classificação, simples ou complexo, dos dados obtidos na pesquisa, sem se preocupar com uma explicação dinâmica do problema ou uma interpretação das razões para a ocorrência dos fenômenos. Um exemplo desse objetivo seria: “descrever um processo de aprendizagem organizacional e identificar suas deficiências”. Outro tipo de objetivo é o instrumental, cuja finalidade é construir ou validar instrumentos ou procedimentos para serem utilizados em outras pesquisas ou em diagnóstico organizacional. Incluem-se aqui tanto os testes psicológicos quanto qualquer outro instrumento que visa investigar ou gerar informações para tomadas de decisão como em seleção de pessoal, treinamento, avaliação de desempenho ou clima organizacional. O terceiro tipo de objetivo é o explicativo. Essa explicação pode estar baseada em uma teoria prévia ou pode levar à construção de outra teoria. Um exemplo desse tipo de objetivo pode ser: estudar as razões pelas quais as pessoas são comprometidas com as organizações. O tipo formal tem interesse no desenvolvimento de uma teoria psicológica ou de um modelo abstrato simbólico ou matemático para explicar um determinado fenômeno, mas em qualquer tipo de coleta ou análise de dados. Sendo produtos desse tipo de pesquisa os modelos “heurísticos” (quando se propõe fazer relações entre categorias de variáveis) ou “ontológicos” (quando simulam uma realidade, geralmente usando computadores). Os estudos também podem combinar dois ou mais tipos de objetivos, sendo que a origem do problema pode se iniciar em um e partir para outro tipo. Pode-se, por exemplo, iniciar um estudo com objetivos descritivos e depois para objetivos mais explicativos (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:597). Escolha da(s) abordagem(ns) metodológicas. Após a formulação dos objetivos de pesquisa há de definir como alcançá-los. Existem vários procedimentos metodológicos de que o pesquisador pode dispor para 88 sua investigação. Suas escolhas definirão as técnicas, procedimentos e instrumentos de pesquisa (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:597). As técnicas dizem respeito às formas gerais de como a coleta de dados será conduzida, por exemplo, o pesquisador poderá utilizar a técnica de entrevista. Os procedimentos são o como se dará a coleta de dados, são as instruções que o pesquisador deve seguir para conduzir uma entrevista, por exemplo. E os instrumentos são as ferramentas utilizadas para a coleta de dados (roteiro de entrevista, por exemplo). Um fator importante é a utilização do tipo deabordagem que o pesquisador vai utilizar. Essas abordagens podem ser quantitativas, qualitativas ou mistas (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:597). A abordagem quantitativa tem como premissas: as preocupações centrais são objetividade, generabilidade, reprodutibilidade do conhecimento; lógica da verificação; o que será significativo é conhecido precisamente; o controle a priori das variáveis; procedimentos codificados, variáveis e fixados. Em Psicologia Organizacional e do Trabalho esses pressupostos significam que se considera que os fenômenos são mensuráveis e podem ser compreendidos utilizando técnicas de pesquisa. Ao utilizar a abordagem quantitativa é importante a confiabilidade e validade dos instrumentos utilizados, pois acredita-se que é necessário ter medidas precisas para poder explicar ou identificar determinados fenômenos. Nessa abordagem, o uso das escalas e inventários na pesquisa é constante para os mais variados assuntos. A abordagem qualitativa possui uma lógica diferente da quantitativa, seu objetivo é compreender os fenômenos através da coleta de dados narrativos, estudando as particularidades e experiências individuais. Em Psicologia Organizacional e do Trabalho ela está mais associada às questões relativas ao significado dos fenômenos do que à preocupação em os medir. A abordagem qualitativa é utilizada frequentemente para descrever fenômenos mais complexos nos quais a mensuração não seria suficiente. A abordagem qualitativa também dá grande importância ao envolvimento do pesquisador na organização e no trabalho e acredita 89 que o uso dos sentidos humanos é necessário para interpretar os fenômenos comportamentais que ocorrem nesses ambientes, fazendo frequente uso da fala e do discurso colhidos por meio de questionários abertos ou não estruturados. São exemplos de abordagens qualitativas: análise de discurso, análise de estrutura semiótica, análise de conteúdo e análise fenomenológica. Uma abordagem mista integra as duas anteriores. Isso tem uma complexidade alta, pois envolve variáveis epistemológicas, mas por outro lado tem demonstrado um caminho alternativo na pesquisa em Psicologia Organizacional e do Trabalho. Essas abordagens podem ter seus problemas de pesquisa originados na prática, na teoria ou em ambas e podem estudar fenômenos ao longo do tempo, com desenhos de investigação denominados “corte longitudinal” ou em um tempo único determinado, com desenhos denominados de “corte transversal” (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:597). ASSIMILE Sempre houve muita discussão sobre as vantagens e desvantagens das abordagens quantitativas e qualitativas na pesquisa em psicologia. Essas abordagens possuem características distintas. A relação entre o quantitativo e o qualitativo é complementar, isto é, o quantitativo se ocupa de ordens, grandezas e suas relações e o qualitativo formula um quadro de interpretações para medidas ou a compreensão para o que não é quantificável e validar conceitos (SILVA, 2019). Os fenômenos de interesse da Psicologia Organizacional e do Trabalho pertencem a diversos níveis da organização, que podem ser definidos como macro, meso ou micro. Os fenômenos do nível macro estão mais 90 relacionados à organização em si, à sua estrutura, como por exemplo, o clima e a cultura organizacional. O nível meso corresponde aos grupos e equipes da organização, onde se investiga, por exemplo, a coesão dessas equipes de trabalho. No nível micro, busca-se compreender os atributos dos indivíduos, onde se estudam questões como competências, estilos de aprendizagem ou personalidade. É importante compreender as especificidades de cada nível em uma pesquisa, pois elas influenciarão tanto na forma metodológica quanto na análise e suas interpretações. Ao estudar um determinado atributo, primeiro deve-se estabelecer o nível que ele pertence, como por exemplo, ao estudar a cultura organizacional precisa-se compreender as características da organização, seus antecedentes e consequentes, pois isso será importante durante a pesquisa. O que ocorre muitas vezes é o desalinhamento entre o nível do fenômeno estudado e o nível de análise. Ao estudar o clima organizacional (atributo macro), por exemplo, deve-se fazer análise nesse nível e não no nível micro (individual), relacionando com a personalidade dos indivíduos. Não quer dizer que características do nível micro (personalidade) não influenciam no nível macro (clima organizacional), mas este construto (clima organizacional) é coletivo e assim deve ser estudado e analisado. A incongruência entre o nível teórico estudado e o nível de análise pode resultar em erros na compreensão dos fenômenos, seja do ponto de vista teórico ou nas escolhas metodológicas. Esses erros geralmente ocorrem de duas formas. Os dados coletados no nível individual (micro) são utilizados para compor escores grupais somente somando os escores individuais. Por exemplo, somar os escores dos desempenhos individuais e tirar uma média deles, compreendendo que corresponda à medida do desempenho da organização. Por outro lado, os escores grupais são desagregados em escores individuais, por exemplo, dividir o volume de vendas da equipe entre seus membros. Nos últimos anos tem- se observado o crescimento do discurso a favor dos métodos mistos 91 no campo da Psicologia Organizacional e do Trabalho, pois há uma suposição que os métodos mistos oferecem uma compreensão melhor dos fenômenos estudados, porém a utilização de um método multinível exige alguns cuidados e forte domínio teórico e metodológico do pesquisador (ABBAD; PUENTE-PALÁCIOS; GONDIM, 2014). Busca pelos locais de pesquisa. A pesquisa em Psicologia Organizacional e do Trabalho pode ser realizada em laboratório ou no campo. No segundo caso, a pesquisa é realizada no contexto organizacional e do trabalho, deixando as variáveis surgirem normalmente. A presença do pesquisador pode apresentar-se de diversas maneiras, sendo mais ativa (por exemplo, fazendo entrevistas, conduzindo reuniões) até numa forma de uma observação direta (por exemplo, a coleta de informações em arquivos sobre as ocorrências de doença do trabalho) ou a aplicação de questionários. Quando o contexto de pesquisa for o laboratório, pouco utilizado no Brasil, os contextos físicos e sociais de pesquisa não serão aqueles que aparecem de forma natural. Utilizam-se as premissas de estudos experimentais, como o controle de variáveis e simulações (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:599). Definição de fontes e estruturas de coleta de dados. A coleta de dados pode ser obtida de forma estruturada (por exemplo, com questionários, entrevistas com respostas estruturadas, testes, observação sistemática e registro de arquivo de dados) ou não estruturada (por exemplo, entrevistas com respostas abertas, observação participante, documentos pessoais e oficiais e gravações em áudio e vídeo). As formas estruturadas são mais comuns na abordagem quantitativa e são estruturadas na abordagem qualitativa, mas pode-se utilizar instrumentos mais estruturados (como um questionário) em uma abordagem qualitativa ou utilizar a observação participante em alguma fase na abordagem quantitativa. As fontes são os meios que “fluem” as informações durante a pesquisa. O pesquisador deve ir às fontes mais 92 adequadas segundo seus objetivos de pesquisa (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:600). Seleção das estratégias apropriadas de controle de pesquisa. O controle na pesquisa tem a ver com o controle que o pesquisador tem sobre as variáveis da pesquisa e sobre os sujeitos da pesquisa. Na pesquisa não experimental (laboratório) não existe nenhum desses dois controles. O pesquisador não consegue delimitar essas variáveis antes da pesquisa, por exemplo, ele pode se propor a estudar o clima organizacional de uma organização, mas algumas questões, como um grande número de demissões na organização durantea pesquisa, podem influenciar seus resultados. O pesquisador precisa estar sensível às variáveis organizacionais durante o processo de pesquisa (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:602). A realização da pesquisa e sua divulgação. É o momento da pesquisa em si e sua posterior divulgação. No Brasil, o maior número das pesquisas em Psicologia Organizacional e do Trabalho é realizado nos programas de pós-graduação de universidades e faculdades, sejam em linhas de pesquisa específicas da área ou em alguma subárea em outro tipo de programa. 3. Produção científica em Psicologia Organizacional e do Trabalho no Brasil A produção científica em Psicologia Organizacional e do Trabalho no Brasil se concentra nos programas de pós-graduação stricto sensu (mestrado, doutorado pós-doutorado), seja em áreas de concentração específicas ou em programas correlatos, como administração, psicologia, pedagogia, antropologia, sociologia, economia, apesar de ter um crescente número de programas lato sensu (pós-graduação com o mínio de 360 horas de duração) em diversas universidades públicas e particulares. A Sociedade Brasileira de Psicologia 93 Organizacional e do Trabalho - SBPOT - em seu site publica uma lista das principais universidades que possuem algum tipo de produção em Psicologia Organizacional e do Trabalho no nível stricto sensu, são 19 programas em universidades públicas e privadas (PÓS- GRADUAÇÃO, 2019). As publicações científicas na área vêm aumentando gradativamente nas últimas décadas. No início do século só existiam dois periódicos brasileiros direcionados à área da Psicologia Organizacional e do Trabalho: Psicologia: organizações e trabalho e Cadernos de psicologia social do trabalho (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2014:605). Hoje existem muitos outros periódicos científicos que publicam com frequência artigos sobre temáticas relacionadas à área. Mas quais são os temas mais frequentemente publicados? Em um estudo publicado em 2010 por Borges-Andrade e Pagotto (2010), fez-se um estudo sobre os principais temas, publicados no período de 1996 a 2009, na área de comportamento organizacional e gestão de pessoas no Brasil. Os principais temas em Comportamento Organizacional encontrados nos periódicos brasileiros foram em ordem decrescente de frequência: afeto no trabalho; aprendizagem no trabalho e resultados de T&D; Interações sociais nas equipes e nas organizações; bem-estar e saúde no trabalho; identidade e significados do trabalho e de seus produtos; cognição no trabalho; contratos psicológicos; atitudes frente a mudanças organizacionais; desempenho produtivo de indivíduos, gerentes e equipe; cultura organizacional; competências no trabalho e nas organizações; clima organizacional; desvios de comportamento no trabalho; tomada de decisão e julgamentos no trabalho; motivação no trabalho; fuga e esquiva no trabalho; criatividade e solução de problemas. 94 Em outra pesquisa publicada em 2011 por Campos et al. (2011), foram levantados os principais temas em Psicologia Organizacional e do Trabalho presentes em 116 artigos, que foram publicados em periódicos, no período de 1998 a 2009. As principais temáticas que foram abordadas no período foram (em ordem decrescente de frequência): trabalho e saúde; significado do trabalho/imagem; profissional/subjetividade; relações no trabalho/liderança/poder; condições de trabalho; modelo teórico/modelo de recursos humanos; desemprego; clima e cultura; empregabilidade; assédio moral; trabalho comunitário/ONGs/cooperativa; satisfação/ motivação; recrutamento e seleção; comunicação; dinâmica de grupo; treinamento e desenvolvimento; avaliação de desempenho. Os autores da pesquisa concluíram que houve uma diminuição de alguns temas, como recrutamento e seleção, por exemplo, e que os interesses se deslocaram para as questões de saúde e significado do trabalho e subjetividade. Também concluíram que houve um distanciamento de questões de aplicação técnica na área de gestão de pessoas (como por exemplo: seleção de pessoas e treinamento) (CAMPOS et al., 2011). PARA SABER MAIS No artigo “Psicologia do Trabalho e das Organizações: Produção Científica e Desafios Metodológicos”, Gondim, Borges-Andrade e Bastos (2010), para os diversos artigos sobre a produção científica na área da psicologia organizacional e do trabalho, sinalizam o crescimento e a diversificação do campo da Psicologia do Trabalho e das Organizações, e que essa expansão está relacionada com as mudanças do mundo do trabalho e da ampliação da pós- graduação stricto sensu no Brasil. 95 Podemos sintetizar os processos de produção do conhecimento nas seguintes etapas: Figura 1 – Processo de produção do conhecimento A identiÿcação dos problemas de pesquisa Formulação dos objetivos de pesquisa Escolha da(s) abordagem(ns) metodológicas Busca pelos locais de pesquisa Deÿnição de fontes e estruturas de coleta de dados Seleção das estratégias apropriadas de controle de pesquisa A realização da pesquisa e sua divulgação Fonte: Borges-Andrade; Zanelli, 2014:593 (adaptado pelo autor). O desenvolvimento do conhecimento em Psicologia Organizacional e do Trabalho é umas das principais atribuições do psicólogo que atua nos contextos de trabalho. Mesmo que o psicólogo não atue como um pesquisador vinculado a um programa de pós-graduação, ele precisa manter-se atualizado e sugere-se que frequente os eventos científicos da sua área de atuação, leia pesquisas da sua área, frequente outros eventos e cursos de atualização. TEORIA EM PRÁTICA Uma das principais competências do psicólogo organizacional e do trabalho é ser capaz de conduzir pesquisas, seja no âmbito acadêmico ou na atuação profissional nas organizações. Com base no texto estudado, elabore de forma simples um pequeno esboço de projeto 96 de pesquisa sobre um tema de interesse seu em Psicologia Organizacional e do Trabalho. Esse esboço deve conter: “o problema de pesquisa”; “um objetivo de pesquisa” e “estratégias metodológicas de pesquisa”. O problema de pesquisa se refere ao “o que” deseja pesquisar (um assunto ou tema; um grupo; uma situação); o objetivo de pesquisa se refere ao o que se pretende atingir com a realização da pesquisa, como resolver o problema de pesquisa. As estratégias metodológicas de pesquisa correspondem ao “como” você pretende realizar a pesquisa. Elas incluem o uso de procedimentos, materiais, equipamentos e métodos. Para uma orientação, sugere-se que leia o artigo “Como elaborar um projeto de pesquisa”. VERIFICAÇÃO DE LEITURA 1. Sobre a investigação científica em Psicologia Organizacional e do Trabalho é correto afirmar que: a. A Psicologia Organizacional possui uma definição clara e sem divergências do que a represente ou corresponda ao seu objeto de estudo. b. A Psicologia Organizacional e do Trabalho está interessada somente em mensurar os fenômenos que estuda. c. O que torna a Psicologia Organizacional e do Trabalho um campo de estudo específico é seu foco de interesse em fenômenos relacionados ao contexto social mais amplo. 97 d. Os consequentes dos fenômenos estudados pela Psicologia Organizacional e do Trabalho são suas causas e contextos que os geraram. e. Na Psicologia Organizacional e do Trabalho busca-se compreender as relações entre os antecedentes e consequentes dos fenômenos estudados. 2. Os consequentes dos fenômenos estudados na Psicologia Organizacional e do Trabalho aparecem em quatro níveis, que são: a. Individual, grupo, organização e sociedade. b. Equipe, trabalhador, comprometimento e motivação. c. Desempenho, organização, desenvolvimento e sociedade. d. Satisfação, trabalho em equipe, motivação e desempenho. e. Grupo, sociedade, equipe e vida cotidiana. 3. A formulação dos objetivos de pesquisa pode ser de quatro tipos.Assinale a alternativa que corresponda à correta definição do tipo de objetivo de pesquisa: a. O objetivo descritivo ocorre quando simulam uma realidade, geralmente usando computadores. b. O objetivo instrumental tem como finalidade a construção ou validação de instrumentos ou procedimentos para serem utilizados em outras pesquisas ou em diagnóstico organizacional. c. O objetivo explicativo se propõe a fazer relações entre categorias de variáveis. 98 d. O objetivo heurístico busca encontrar uma explicação baseada em uma teoria prévia ou a construção de outra teoria. e. O objetivo ontológico ocorre quando o pesquisador visa identificar e organizar diferentes características da situação ou problema de pesquisa. Referências Bibliográficas ABBAD, Gardênia; PUENTE-PALÁCIOS, Katia; GONDIM, Sônia Maria Guedes. Abordagens Metodológicas em Psicologia Organizacional e do Trabalho. Revista Brasileira de Psicologia, Salvador, v. 02, n. 01, p.71-78, 2014. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/269689528_Abordagens_Metodologicas_ em_Psicologia_Organizacional_e_do_Trabalho>. Acesso em: 26 abr. 2019. BOCK, Ana Mercês Bahia; FURTADO, Odair; TEIXEIRA, Maria de Lourdes Trassi. Psicologias: Uma introdução ao estudo da psicologia. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. 492 p. BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; PAGOTTO, Cecília do Prado. O Estado da Arte da Pesquisa Brasileira em Psicologia do Trabalho e Organizacional. Psicologia: Teoria e Pesquisa, Brasília, v. 26, p.37-50, 2010. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ ptp/v26nspe/a04v26ns.pdf>. Acesso em: 28 abr. 2019. BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; ZANELLI, José Carlos. Psicologia e produção do conhecimento em organizações e trabalho. In: ZANELLI, José Carlos; BORGES- ANDRADE, Jairo Eduardo; BASTOS, Antonio Virgílio Bittencourt. Psicologia, Organizações e Trabalho no Brasil. 2. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. Cap. 16. p. 583-608. CAMPOS, Lara et al. Psicologia organizacional e do trabalho: retrato da produção científica na última década. Psicologia Ciência e Profissão, Brasília, v. 31, n. 4, p.702-717, 2011. GONDIM, Sonia Maria Guedes; BORGES-ANDRADEII, Jairo Eduardo; BASTOS, Antonio Virgílio Bittencourt. Psicologia do Trabalho e das Organizações: Produção Científica e Desafios Metodológicos. Psicologia em Pesquisa, Juiz de Fora, v. 2, n. 4, p.84-99, 2010. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/ scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1982-12472010000200002>. Acesso em: 26 abr. 2019. 99 https://www.researchgate.net/publication/269689528_Abordagens_Metodologicas_em_Psicologia_Organizacional_e_do_Trabalho https://www.researchgate.net/publication/269689528_Abordagens_Metodologicas_em_Psicologia_Organizacional_e_do_Trabalho http://www.scielo.br/pdf/ptp/v26nspe/a04v26ns.pdf http://www.scielo.br/pdf/ptp/v26nspe/a04v26ns.pdf http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1982-12472010000200002 http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1982-12472010000200002 MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO CÂMARA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR. Resolução n. 1, de 08 de junho de 2018. PÓS-GRADUAÇÃO stricto sensu. 2019. SBPOT [home page]. Disponível em: <http:// www.sbpot.org.br/formacao/pos-graduacao-stricto-sensu/>. Acesso em: 26 abr. 2019. RUBIO, Maria Andrea Bonilla. Produção Científica em Psicologia Organizacional e do Trabalho no Brasil nos anos 2009-2014. 2016. 33 f. Monografia (Especialização) - Curso de Especialização em Psicologia- Ênfase em Psicologia Organizacional, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2016. Disponível em: <https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/147084/000998326. pdf?sequence=1>. Acesso em: 23 maio 2019. SILVA, Gisele Cristina Resende Fernandes da. O método científico na psicologia: abordagem qualitativa e quantitativa. 2019. Disponível em: <http://www. psicologia.pt/artigos/textos/A0539.pdf>. Acesso em: 26 abr. 2019. TONETTO, Aline Maria et al. Psicologia organizacional e do trabalho no Brasil: desenvolvimento científico contemporâneo. Psicologia & Sociedade, São Paulo, v. 20, p.165-173, 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/psoc/v20n2/ a03v20n2>. Acesso em: 23 maio 2019. Gabarito Questão 1 - Resposta: E Resolução: A pesquisa em Psicologia Organizacional e do Trabalho busca compreender as relações entre os antecedentes (suas causas e contextos) e os consequentes (o que gerou) dos fenômenos que estuda. Questão 2 - Resposta: A Resolução: Os antecedentes dos fenômenos estudados pela Psicologia Organizacional e do Trabalho são: individual (por exemplo, as diferenças entre homens e mulheres, referente ao seu comportamento nas organizações); o Grupal ou Equipe (por exemplo, entender como a interdependência entre tarefas e produtos; Organização (por exemplo, entender como os tipos de estruturas organizacionais aumentam o estresse no trabalhador) e da sociedade (por exemplo, entender como a cultura nacional pode influenciar a criatividade das pessoas no trabalho). 100 http://www.sbpot.org.br/formacao/pos-graduacao-stricto-sensu/ http://www.sbpot.org.br/formacao/pos-graduacao-stricto-sensu/ https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/147084/000998326.pdf?sequence=1 https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/147084/000998326.pdf?sequence=1 http://www.psicologia.pt/artigos/textos/A0539.pdf http://www.psicologia.pt/artigos/textos/A0539.pdf http://www.scielo.br/pdf/psoc/v20n2/a03v20n2 http://www.scielo.br/pdf/psoc/v20n2/a03v20n2 Questão 3 - Resposta: B Resolução: O objetivo instrumental tem como finalidade a construção ou validação de instrumentos ou procedimentos para serem utilizados em outras pesquisas ou em diagnóstico organizacional. Incluem-se aqui tanto os testes psicológicos quanto qualquer outro instrumento que visa investigar ou gerar informações para tomadas de decisão como em seleção de pessoal, treinamento, avaliação de desempenho ou clima organizacional. 101 A ética na atuação do psicólogo organizacional e do trabalho Autor: Rogério Rodolfo Baptista Objetivos • Discutir o compromisso social do psicólogo organizacional e do trabalho. • Compreender as implicações éticas da atuação do psicólogo organizacional e do trabalho. • Apresentar as relações da atuação do psicólogo organizacional e do trabalho e o Código de Ética Profissional da profissão. 1. Compromisso social do psicólogo organizacional e do trabalho Uma profissão consiste em uma comunidade de pessoas que, em uma base mais ou menos comum de práticas, compartilha regras de conduta que asseguram tanto um padrão de qualidade de suas intervenções quanto a qualidade das relações com seus pares e a sociedade, portanto, uma profissão possui um conjunto de práticas, técnicas, saberes que a define e também é uma prática relacional e de conduta que as caracteriza. A Psicologia é caracterizada por um compromisso ético e social, que perpassa suas práticas, estratégias, modelos de intervenção, posturas e formas de relação com seus usuários, beneficiários, colegas e a sociedade. Os desafios éticos estão postos para todas as profissões e com a Psicologia não é diferente, independentemente de sua área de atuação, pois o trabalho do psicólogo não ocorre no vácuo social e na área da Psicologia Organizacional e do Trabalho também estão sujeitos a especifidades do seu campo de atuação, pois irá se deparar com uma realidade social complexa, multifacetadas, repleta de conflitos e contradições (BASTOS; YAMAMOTO; RODRIGUES, 2013: 26). Para a Psicologia, o que viria a ser esse compromisso social da profissão? Será abordado a seguir algumas dimensões mais usuais da conceituação de compromisso social da Psicologia enquanto profissão, suas características e limitações. Primeiro serão analisados esses dois termos e os significados “compromisso” e “social”. O termo “compromisso” possui duas noções principais: a de obrigação e de envolvimento.A noção de obrigação traz a questão da responsabilidade ou promessa mais ou menos solene de fazer algo. O envolvimento corresponde a um significado afetivo de uma forma de vínculo com algo ou alguém (nesse caso uma profissão) e ambas trazem a ideia de um conjunto de ações 103 motivadas por um sentimento de obrigação, que pode ser originado pela identificação ou por compartilhamento de valores e crenças individuais ligados a um objeto, uma pessoa ou uma causa. O compromisso social remete a uma obrigação ou vínculo em relação à sociedade para atender às suas demandas, seus interesses, mas essa é exatamente uma das questões: que concepção de sociedade utilizarmos para categorizar um conjunto de interesses e diferenciá-los daqueles que não são interesses? A qual sociedade não referimos? Será que atender as demandas de uma sociedade por si só, ou de forma não crítica, torna a Psicologia comprometida com a sociedade ou com uma organização? E se essas demandas não representam necessariamente os melhores interesses da sociedade ou da organização? Por outro lado, o termo “social” também pode trazer suas questões. O termo social se refere à sociedade, um conjunto de indivíduos, instituições, organizações, etc., que pode ser muito amplo, perdendo de vista os indivíduos e grupos, suas particularidades e necessidades específicas. O compromisso social da Psicologia, muitas vezes, é entendido de forma tão ampla, por exemplo, que a concepção de que o psicólogo “ajuda as pessoas”, pode perder a possibilidade de qualificar e distinguir as necessidades dos indivíduos e grupos específicos e dos diferentes graus ou tipos de compromissos assumidos pelo psicólogo em suas diversas formas de atuação (BASTOS; YAMAMOTO; RODRIGUES, 2013: 28). Esse tipo de definição poderia levar aos dois extremos do significado de compromisso social do psicólogo. De um lado, qualquer atuação do psicólogo possui compromisso social, uma vez que todas as demandas recebidas são sociais, seja oriunda de indivíduos, grupos, instituições, organizações ou qualquer outro segmento social, independentemente de sua qualidade, interesse, forma ou consequência. De outro lado, somente as ações de psicólogos em resposta às demandas oriundas apenas de grupos minoritários ou excluídos socialmente é que teriam esse compromisso social, pois se contraporiam aos interesses sociais 104 da elite, assim qualquer uma atuação que não enfraqueça as estruturas de desigualdade social constitui práticas não comprometidas com a sociedade. O risco de se pensar assim é localizar o contexto onde se dá o compromisso social, e rejeitar atuações em outros segmentos dizendo que não possuem compromisso social (BASTOS; YAMAMOTO; RODRIGUES, 2013: 30). Outra forma de entender o compromisso social da Psicologia é colocar o psicólogo como um agente de transformação social, sendo que a única forma de se ter compromisso social é que o psicólogo promova transformação e supressão das desigualdades sociais. O compromisso social, portanto, seria garantido somente pela adoção da lógica da ruptura, por ações transformadoras do modo de vida das pessoas subordinadas às normas e condições sociais associadas à elite social. O outro extremo é que uma atuação do psicólogo numa linha mais assistencialista seria meramente reformista, contribuindo para perpetuar a desigualdade e exclusão. Esse tipo de linha de pensamento pode acarretar uma visão de que os psicólogos que atuam em instituições (e organizações) regidas por uma lógica de manutenção da ordem social não poderiam ter compromisso social em suas práticas. Se levarmos essa reflexão para o contexto da Psicologia Organizacional e do Trabalho, onde um grande contingente de profissionais da psicologia atua em organizações “tradicionais” (empresas privadas, portanto, numa lógica social capitalista), poderíamos concluir que se torna difícil ter compromisso social, mas será que é tão simples assim? Não haveria margem para uma atuação profissional comprometida com a sociedade? Talvez não se deva ser tão simplista assim (BASTOS; YAMAMOTO; RODRIGUES, 2013: 30). Outra concepção de compromisso social do psicólogo está atrelada somente à forma de realizar suas práticas. Nessa concepção, somente os psicólogos que adotam novas práticas (ditas muitas vezes como “mais modernas”) em seus contextos de trabalho são os que possuem compromisso social, o que pode desqualificar aqueles profissionais que 105 adotam formas mais tradicionais de trabalho em suas intervenções. O fato de simplesmente adotar novas práticas, novos instrumentos, novos modelos, não necessariamente torna a atuação do psicólogo mais crítica ou com compromisso social. No campo da Psicologia Organizacional e do Trabalho isso é uma prática muito comum, o fato de adotar instrumentos mais “modernos” sem fazer uma análise crítica de sua necessidade e benefícios. Como exemplo, se pode citar o uso de uma técnica de entrevista mais atual (como a entrevista de seleção comportamental por competências) versus um modelo mais tradicional (a entrevista de seleção funcional). O fato de usar uma e não a outra não garante uma atuação mais crítica ou socialmente responsável. Um psicólogo pode usar uma técnica mais tradicional e ainda assim agir de forma mais responsável técnica e socialmente. Outro exemplo é a utilização do coaching nas ações nas organizações. Acredita-se que as técnicas de coaching por si só são transformadoras, mas tudo depende da qualidade do profissional que as pratica e seus interesses/ motivações. A limitação está na imposição de uma necessidade de mudança sem um diagnóstico prévio do que é realmente imprescindível mudar e quais são os limites e benefícios para os usuários, beneficiários e sociedade (BASTOS; YAMAMOTO; RODRIGUES, 2013: 31). Outro critério usado para definir o que seria uma atuação crítica e socialmente responsável do psicólogo é a escolha do referencial téorico- metodológico que o profissional adota. Muitas vezes acredita-se que somente aqueles profissionais que utilizam abordagens com dito viés crítico é que possuem um compromisso social e que aqueles que adotam tantos outros referenciais existentes e legítimos não possuiriam esse compromisso social. Um exemplo é acreditar que somente os profissionais que seguem a abordagem sócio-histórica da Psicologia teriam condições de promover uma emancipação social em seus contextos de trabalho. No entanto, esse tipo de pensamento desqualifica as demais abordagens e desconsidera a complexidade das relações trabalhadas por outros referenciais. Um psicólogo que, por exemplo, 106 adote uma visão mais analítica (como a Psicanálise) em seu trabalho, também pode atuar de forma a contribuir para a emancipação dos indivíduos (BASTOS; YAMAMOTO; RODRIGUES, 2013: 31). Considerando todas essas questões, se pode observar que definir o compromisso social do psicólogo numa visão muito restrita pode atrapalhar uma compreensão da complexidade desse tema na sua prática profissional, pois a Psicologia possui diversas teorias, metodologias e contextos de atuação. Essas questões são muito importantes para a Psicologia Organizacional e do Trabalho, pois se manifestam em seu cotidiano. Nesse campo, é comum a crítica externa (daqueles que não inseridos na prática diária do profissional e muitas vezes de psicólogos de outros campos da Psicologia) que contribui para a criação do estereótipo do psicólogo organizacional como um profissional sem compromisso social. Esses discursos externos podem ser agrupados em quatro categorias: a primeira é que dizem que o psicólogo organizacional e do trabalho está totalmente alinhado aos interesses do capital (dos empresários, acionistas, proprietários) e que seu papel é de ajustar os trabalhadores às necessidades das organizações. A segunda é que ele é acomodado do ponto de vista teórico e técnico, “importando” instrumentos e técnicas de outras áreas (em especial da Administração) deforma acrítica e que possui um viés tecnicista (focado somente nas técnicas e instrumentos), contaminando sua prática com essas técnicas e se afastando da Psicologia. O terceiro é que o profissional no contexto de trabalho está condenado a estar a serviço do capital, acusado de “vender-se ao capital com suas técnicas manipuladoras”, perdendo o seu potencial de ser um ator transformador da sociedade e que para poder ser um profissional comprometido socialmente teria que inevitavelmente abandonar a organização, afinal ali não teria espaço para isso. A quarta é que possui um papel alienado de controle social, que pode ser um instrumento de controle do capital e não possui uma visão crítica das relações de poder na organização. Visto essas quatro categorias de discursos em conjunto que geram o descompromisso social da 107 Psicologia Organizacional e do Trabalho, compreende-se que poderiam se referir a um conjunto de práticas e posicionamentos já há muito superados (ou em fase de superação avançada) que estavam presentes nesse campo até meados do século XX, sendo ainda um resquício do tempo da Psicologia Industrial. Essas concepções desconsideram todo o processo de evolução histórica da área nas últimas décadas e que a Psicologia Organização e do Trabalho já avançou bastante nessas questões, oferecendo novas práticas e posicionamentos. Como resposta a essas demandas e outros fatores, a área passou por muitos momentos que modificaram significativamente sua atuação (BASTOS; YAMAMOTO; RODRIGUES, 2013: 35). Num primeiro momento, houve uma renovação de práticas clássicas, inserindo novas ferramentas ou inserindo-as em preocupações mais amplas. É o caso da atividade de análise de trabalho (campo tradicional da Psicologia Organizacional) que incorporou novas concepções (como a concepção de cargos mais amplos e espaços ocupacionais) e de novas tecnologias de treinamento (ensino a distância, por exemplo) e novas concepções (como o desenvolvimento integral do trabalhador). Em outro momento, há a emergência de novas práticas ampliando o foco das ações. Por exemplo, o enriquecimento de cargos, qualidade de vida no trabalho, programas de saúde do trabalhador, ergonomia e desenvolvimento de equipes. No terceiro momento, o psicólogo amplia seu lócus de atuação, diversificando os níveis e os contextos organizacionais. Cada vez mais o psicólogo vai ampliando sua atuação de níveis mais operacionais para níveis mais estratégicos nas organizações. O psicólogo passa a ver não somente o indivíduo isolado de seu contexto, mas todo contexto, atuando sobre grupos e a própria organização. E no quarto momento, o psicólogo extrapola os muros da organização, atuando não somente em organizações privadas, mas se inserindo em outros campos, como projetos junto a desempregados, ONGs–Organizações Não Governamentais -, Políticas Públicas (BASTOS; YAMAMOTO; RODRIGUES, 2013: 37). 108 Pode-se concluir que o psicólogo inserido em contextos de trabalho, como qualquer outro profissional, está sujeito a diversas questões como: divergências de interesses, papéis sociais diversos e muitas vezes conflituosos e até mesmo contradições; ele pode atuar com compromisso social em suas práticas, para isso precisa fazer constantemente uma análise crítica de sua atuação e do contexto onde está inserido. 2. A atuação ética do psicólogo organizacional e do trabalho Para falar sobre a atuação ética do psicólogo não se pode deixar de conceituar o que é ética e moral. Estes termos muitas vezes podem ser tratados como sinônimos, mas diferenciá-los é importante para estabelecer um entendimento sobre a atuação ética do POT. Moral é originária do radical latino mos/mores, que significa costume. Ética provém do termo grego ethos, que também quer dizer costume ou respeito, mas ethos tem uma variante que se refere à caráter, assim, moral pode significar costumes que são considerados coletivamente melhores, e ética pode significar o homem que atua deliberadamente (BASTOS; YAMAMOTO; RODRIGUES, 2013: 39). A ética se desenvolve em contextos históricos específicos e está voltada para a compreensão do comportamento das pessoas envolvendo a reflexão, a sistematização, a defesa e a sugestão sobre o certo e o errado nos comportamentos, que se manifesta sob a forma de normas de conduta que são provisórias nas ações humanas. A ética, diferentemente da moral, não é um padrão geral de conduta, mas um padrão de uma profissão em uma sociedade (PEIXOTO, 2016). Ao falar sobre a ética de atuação do psicólogo, isso nos remete ao Código de Ética Profissional do psicólogo. O código de ética profissional estabelece princípios e normas que devem ser seguidos 109 pelos profissionais de uma classe. Nesse sentido, aproxima-se mais do conceito de moral do que da ética, pois determina em linhas gerais a conduta para o público ao qual é dirigido. No entanto, um código também procura fomentar a autorreflexão exigida de cada indivíduo acerca da sua práxis, de modo a responsabilizá-lo, pessoal e coletivamente, por ações e suas consequências no exercício profissional. A missão primordial de um código de ética profissional não é de normatizar a natureza técnica do trabalho e, sim, a de assegurar, dentro de valores relevantes para a sociedade e para as práticas desenvolvidas, um padrão de conduta que fortaleça o reconhecimento social da categoria. O Código de Ética Profissional do Psicólogo no Brasil é estabelecido pela Resolução do Conselho Federal de Psicologia nº 10/05 de 21 de julho de 2005 (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005). PARA SABER MAIS O Código de Ética Profissional do Psicólogo está em sua terceira versão. Ele foi construído com ampla participação dos profissionais. A apresentação do atual Código de Ética enfatiza sua concepção reflexiva e norteadora, com a valorização de seus princípios fundamentais que embasam a relação psicólogo/sociedade/ciência e está presente em suas práticas, independentemente de seu campo de atuação. Ele é composto por sete princípios fundamentais e vinte e cinco artigos dispostos de forma clara e abrangente. No capítulo “Princípios Fundamentais” é enfocado pelas pessoas, sua integridade e igualdade. Ao psicólogo é atribuída a função social de promover a saúde e qualidade de vida. Os demais capítulos referem-se aos seus deveres, ao que é vedado e a orientações gerais sobre sua conduta. 110 No campo da Psicologia Organizacional e do Trabalho, o código de ética pode fornecer importantes reflexões sobre a prática do psicólogo. Aqui serão abordados alguns aspectos do código de ética da profissão que influenciam especialmente nesse campo. Para essa tarefa, serão transcritos alguns trechos do código de ética e depois será realizada uma reflexão sobre as implicações destes na área da Psicologia Organizacional e do Trabalho. Os princípios fundamentais do código definem que: I. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) O psicólogo no campo do trabalho também deve observar os preceitos norteadores da dignidade humana. Sendo importante observar as questões da igualdade entre as pessoas e a integridade do ser humano. Muitas vezes, o psicólogo está sujeito e/ou presencia situações de trabalhadores que ferem sua dignidade. Ele não deve compactuar com isso e tomar ações necessárias para contribuir para sua solução. II. O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) Esse é um dos princípios maisfundamentais para o psicólogo organizacional e do trabalho na atualidade. Ele tem um papel fundamental na promoção da saúde e qualidade de vida dos trabalhadores e no combate às diversas formas de discrição e violência que podem acontecer no ambiente de trabalho. 111 III. O psicólogo atuará com responsabilidade social, analisando crítica e historicamente a realidade política, econômica, social e cultural. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) Esse princípio está totalmente ligado à reflexão realizada na primeira parte desse texto. O psicólogo possui um compromisso social claro e deve agir proativamente sobre a realidade, fazendo uma análise crítica das relações e situação nas organizações e contextos de trabalho. IV. O psicólogo atuará com responsabilidade, por meio do contínuo aprimoramento profissional, contribuindo para o desenvolvimento da Psicologia como campo científico de conhecimento e de prática. V. O psicólogo contribuirá para promover a universalização do acesso da população às informações, ao conhecimento da ciência psicológica, aos serviços e aos padrões éticos da profissão. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) O psicólogo organizacional e do trabalho precisa estar em constante atualização teórico-metodológica para aprimorar o desempenho de suas atividades em seu trabalho. Também precisa contribuir para o crescimento da Psicologia Organizacional e do Trabalho, contribuindo com pesquisas, participando de congressos, publicando artigos e promovendo o conhecimento tanto dentro quanto fora das organizações. VI. O psicólogo zelará para que o exercício profissional seja efetuado com dignidade, rejeitando situações em que a Psicologia esteja sendo aviltada. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) O profissional da psicologia deve lutar para ter condições dignas de trabalho e que a Psicologia seja valorizada como um conhecimento necessário e legítimo. Muitas vezes, nas organizações, o psicólogo se depara com situações onde as questões das práticas da psicologia são duramente questionadas e muitas vezes desprezadas. E em outras 112 situações o psicólogo é colocado para trabalhar em situações que não oferecem o mínimo de condições para o exercício da profissão, nessas situações o profissional necessita reagir e, se necessário, rejeitar fazer determinado trabalho. VII. O psicólogo considerará as relações de poder nos contextos em que atua e os impactos dessas relações sobre as suas atividades profissionais, posicionando-se de forma crítica e em consonância com os demais princípios deste Código. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) O psicólogo organizacional precisa analisar e compreender as relações de poder existentes na organização, se posicionando criticamente nas diversas situações. Tomar consciência da dimensão política da sua atuação e suas implicações para suas práticas, usuários, beneficiários e a sociedade. Dentre outras práticas, é vedado ao psicólogo: VIII. Interferir na validade e fidedignidade de instrumentos e técnicas psicológicas, adulterar seus resultados ou fazer declarações falsas. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) Essa proibição é de especial importância para o psicólogo organizacional. Mesmo que uma organização ou um superior do psicólogo ordene que ele faça a adulteração de um resultado (por exemplo, de um teste psicológico), o psicólogo deve negar-se e ser fiel aos resultados analisados e interpretados de acordo com o teste aplicado. IX. Induzir qualquer pessoa ou organização a recorrer a seus serviços. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) Não pode induzir pessoas ou organizações para que recorram aos seus serviços, mesmo que seja necessário. Uma coisa é sugerir, orientar e, até mesmo, fazer uma autopromoção de seus serviços, no entanto, não deve induzir ou manipular para conduzir uma pessoa ou organização 113 para uma atuação mais exclusivista, servindo ao seu próprio interesse. Um exemplo é um psicólogo que atua como consultor e foi contratado para fazer um diagnóstico organizacional e levantou alguns problemas na organização. Ele pode, após terminar seu trabalho inicial, oferecer seus serviços, mas nunca manipular ou induzir a organização para que continue prestando serviços. X. Prestar serviços profissionais a organizações concorrentes de modo que possam resultar em prejuízo para as partes envolvidas, decorrentes de informações privilegiadas. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) O psicólogo que presta serviços a diversas organizações deve tomar cuidado ao lidar com concorrentes. Um profissional, que por exemplo, estiver ajudando a conduzir um processo de planejamento estratégico em uma organização não poderá ser contratado para conduzir o mesmo processo em uma empresa concorrente direta, pois isso pode representar conflitos de interesse e riscos de confidencialidade de informações estratégicas. XI. Desviar para serviço particular ou de outra instituição, visando benefício próprio, pessoas ou organizações atendidas por instituição com a qual mantenha qualquer tipo de vínculo profissional. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) O psicólogo organizacional não deve manipular resultados, induzir pessoas e conduzir grupos para que esses recorram aos seus serviços, seja dentro ou fora da organização. Um psicólogo, por exemplo, que atua na área organizacional e também na área clínica, não pode induzir um funcionário da empresa dizendo que precisa fazer um tratamento para depressão e encaminhar para seu próprio consultório particular. XII. Realizar diagnósticos, divulgar procedimentos ou apresentar resultados de serviços psicológicos em meios de comunicação, de forma a expor pessoas, grupos ou organizações. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) 114 A questão aqui é não expor as pessoas e organizações. Por exemplo, um psicólogo que fez um trabalho numa organização não pode expor informações que possam constranger as pessoas publicamente ao proferir uma palestra em outro local. Ao falar de assédio moral, por exemplo, na palestra não pode citar que isso ocorre na organização “x”. Art. 5 – O psicólogo, quando participar de greves ou paralisações, garantirá que: a. As atividades de emergência não sejam interrompidas. b. Haja prévia comunicação da paralisação aos usuários ou beneficiários dos serviços atingidos pela mesma. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) Um psicólogo que, por exemplo, trabalha com a saúde do trabalhador, que dirige grupos terapêuticos-informativos sobre saúde mental e faz atendimentos para encaminhamento, no caso de uma greve ou paralisação, deve garantir que o atendimento emergencial continue e comunicar previamente as pessoas do grupo para que estas se organizem. Art. 6 – O psicólogo, no relacionamento com profissionais não psicólogos: a. Encaminhará aos profissionais ou entidades habilitados e qualificados demandas que extrapolem seu campo de atuação. c. Compartilhará somente informações relevantes para qualificar o serviço prestado, resguardando o caráter confidencial das comunicações, assinalando a responsabilidade, de quem as receber, de preservar o sigilo. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) O psicólogo não deve extrapolar suas competências profissionais e realizar atividades que não lhe cabem. Se a situação necessita da intervenção de outro profissional, por exemplo um médico, o psicólogo deve encaminhar o trabalhador para esse atendimento. Da mesma forma, ao trabalhar em uma equipe multidisciplinar, o psicólogo 115 organizacional deve compartilhar somente informações do trabalhador que sejam relevantes para o andamento do trabalho. Nunca deve, por exemplo, mostrar resultados de testes psicológicos para não psicólogos, mas somente as informações relevantes para ajudar em diagnóstico. Art. 9 – É dever do psicólogo respeitar o sigilo profissional a fim de proteger, por meio da confidencialidade,a intimidade das pessoas, grupos ou organizações, a que tenha acesso no exercício profissional. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) Esse item está relacionado ao sigilo profissional. O psicólogo precisa respeitar a intimidade e privacidade das pessoas, não divulgando informações que possam constranger ou gerar problemas para os trabalhadores. Ao fazer uma entrevista, muitas vezes, as pessoas falam de sua intimidade, mas o profissional deve compartilhar somente o necessário com a equipe para dar continuidade ao trabalho. ASSIMILE O sigilo profissional está estreitamente associado ao trabalho do psicólogo, colocando para este uma série de questões e tem por finalidade tutelar a intimidade das pessoas, protegendo-as contra violações e indiscrições de outros. Essa questão se refere tanto à confidencialidade como aà privacidade. A confidencialidade é o resguardo das informações dadas em confiança e a proteção contra a revelação não autorizada e a privacidade é a limitação de acesso a informações de uma dada pessoa, ao acesso à própria pessoa, à sua intimidade, os seus segredos. (QUESTÕES, 2019) 116 Art. 10 Nas situações em que se configure conflito entre as exigências decorrentes do disposto no Art. 9º (sigilo profissional) e as afirmações dos princípios fundamentais do código de ética, excetuando-se os casos previstos em lei, o psicólogo poderá decidir pela quebra de sigilo, baseando sua decisão na busca do menor prejuízo. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) Muitas vezes o psicólogo é colocado em um dilema, que leva a quebrar a confidencialidade para o bem do próprio trabalhador, da família, da organização ou da sociedade. Um trabalhador que procura um psicólogo no ambiente de trabalho e diz que já tentou suicídio e que vai fazer outra tentativa, pode ser um caso onde este profissional (se julgar conveniente) procure a família do trabalhador para dar ajuda ou suporte para a situação. Art. 12 – Nos documentos que embasam as atividades em equipe multiprofissional, o psicólogo registrará apenas as informações necessárias para o cumprimento dos objetivos do trabalho. (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005) Quando o psicólogo atua em uma equipe disciplinar, preceda tomar cuidado ao registrar suas observações sobre o trabalhador. É muito comum, em serviços de saúde, o trabalhador possuir somente um único prontuário que é compartilhado com toda a equipe. O psicólogo deve registrar somente o necessário para que o trabalho seja realizado. Essas são algumas questões importantes para atuação ética do psicólogo nos contextos de trabalho. Todo o código se aplica também à Psicologia Organizacional e do Trabalho. 117 L.. .J • Figura 1 – Síntese sobre o significado de “Compromisso Social na Psicologia” Obrigação Envolvimento Compromisso Social INTERESSE DA SOCIEDADE Diversas abordagens teóricas Referencial Sócio Histórico Práticas Tradicionais Novas práticas Assistencialismo Transformação social Somente demandas de grupos minoritários/ excluídos Todas as demandas são sociais Fonte: Bastos; Yamamoto; Rodrigues, 2013: 28 (adaptado pelo autor). 118 Em sua atuação, o psicólogo enfrenta diversos dilemas éticos ao se deparar com potenciais conflitos entre as demandas impostas pelo mundo do trabalho e pelas organizações e as normas que pautam sua conduta profissional. O psicólogo não deve buscar soluções prontas, mas refletir constantemente sobre seu cotidiano e suas ações profissionais, ampliando continuamente a consciência sobre os impactos potenciais de suas decisões profissionais. TEORIA EM PRÁTICA Imagine a seguinte situação: Ao ser contratado para a função de recrutamento e seleção, um profissional negociou com a empresa que forneceria feedbacks (retornos) detalhados a todos os candidatos, tendo em vista o direito do indivíduo de saber o motivo pelo qual não foi selecionado. Recentemente, em um processo seletivo para o cargo de auxiliar de manutenção, o psicólogo identificou que um dos candidatos apresentava evidências de transtorno da personalidade paranoide, depressão e possível fobia social. Embora tivesse todos os requisitos de formação e certificação necessários para o cargo, o candidato encontrava-se, devido aos resultados dos testes, inapto para o cargo. Como previsto, deveria receber um feedback detalhado. O psicólogo, contudo, estava ciente de que, após essa ocasião, não teria nenhum outro contato com o candidato para monitorar os efeitos desse feedback (BASTOS; YAMAMOTO; RODRIGUES, 2013: 51). Com base nas discussões desse capítulo sobre o Código de Ética Profissional do Psicólogo, faça uma reflexão e diga quais são as possíveis implicações éticas envolvida no caso. 119 VERIFICAÇÃO DE LEITURA 1. Sobre o compromisso social e ético do psicólogo é correto afirmar que: a. Essa questão perpassa suas práticas, estratégias, modelos de intervenção, posturas e formas de relação com seus usuários, beneficiários, colegas e a sociedade. b. Os desafios éticos estão postos exclusivamente para o psicólogo que atua na área da Psicologia Organizacional e do Trabalho. c. Nem toda profissão possui um compromisso social de alguma forma, pois nem todas estão inseridas na sociedade como um todo. d. O significado de compromisso traz a noção de envolvimento, que diz respeito aà questão da responsabilidade ou promessa mais ou menos solene de fazer algo. e. A noção de obrigação do significado de compromisso corresponde a um significado afetivo de uma forma de vínculo com algo ou alguém. 2. Sobre os argumentos apresentados sobre o que seria ou não o compromisso social da psicologia, é correto afirmar que: a. Somente as ações de psicólogos em resposta às demandas oriundas apenas de grupos minoritários ou excluídos socialmente são caracterizadas como compromisso social. b. Somente o psicólogo que promova transformação e supressão das desigualdades sociais possui compromisso social. c. Todo psicólogo que atua numa linha mais assistencialista não possui compromisso social, pois 120 está contribuindo para perpetuar a desigualdade e a exclusão. d. Somente os psicólogos que adotam novas práticas (ditas muitas vezes como “mais modernas”) em seus contextos de trabalho é que possuem compromisso social. e. Definir o compromisso social do psicólogo numa visão muito restrita pode atrapalhar uma compreensão da complexidade desse tema na sua prática profissional. 3. Muitos discursos contribuíram para a criação do estereótipo do psicólogo organizacional como um profissional sem compromisso social. Um desses discursos afirma que o psicólogo organizacional e do trabalho: a. Não está alinhado aos interesses do capital. b. É inovador do ponto de vista teórico e técnico. c. Não está a serviço do capital. d. Possui um papel alienado de controle social. e. Age de forma crítica e não possui um viés tecnicista (focado somente nas técnicas e instrumentos). Referências Bibliográficas AMENDOLA, Marcia Ferreira. História da construção do Código de Ética Profissional do Psicólogo. Estud. pesqui. psicol., Rio de Janeiro , v. 14, n. 2, p. 660-685, ago. 2014 . Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S1808-42812014000200016&lng=pt&nrm=iso>. Acessos em: 17 maio 2019. BASTOS, Antonio Virgilio Bittencourt; YAMAMOTO, Oswaldo H.; RODRIGUES, Ana Carolina de Aguiar. Compromisso social e ético: desafios para a atuação em psicologia organizacional e do trabalho. In: BORGES, Livia de Oliveira; MOURÃO, 121 http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-42812014000200016&lng=pt&nrm=iso http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1808-42812014000200016&lng=pt&nrm=iso Luciana. O trabalho e as organizações: atuações a partir da psicologia. Porto Alegre: Artmed, 2013. p. 25-52. CONSELHO FEDERALDE PSICOLOGIA. Código de Ética Profissional do Psicólogo. Brasília, 2005. PEIXOTO, Adriano de Lemos Alves. Regulação e controle ético de pesquisa em Psicologia Organizacional e do Trabalho. Revista Psicologia, Organizações e Trabalho, [s.l.], v. 16, n. 4, p.324-332, 2016. Sociedade Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho. <http://dx.doi.org/10.17652/rpot/2016.4.12658>. QUESTÕES éticas: o prontuário, a comunicação dos atendimentos e o SIGILO PROFISSIONAL. 2019. Conselho Regional de Psicologia de São Paulo [home page]. Disponível em: <http://www.crpsp.org.br/portal/comunicacao/jornal_crp/163/ frames/fr_questoes_eticas.aspx>. Acesso em: 18 maio 2019. SCHMIDT, Beatriz; KRAWULSKI, Edite; MARCONDES, Renatto Cesar. Psicologia e Gestão de Pessoas em Organizações de Trabalho: investigando a perspectiva estratégica de atuação. Revista de Ciências Humanas, [s.l.], v. 47, n. 2, p.344- 361, 4 out. 2014. Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). <http://dx.doi. org/10.5007/2178-4582.2013v47n2p344>. TISSOT, Cinthia. Postura do Psicólogo nas Organizações Diante do Assédio Moral. Revista Especialize On-line Ipog, Goiânia, v. 01, p.01-17, 2017. Disponível em: <https://www.ipog.edu.br/download-arquivo-site.sp?arquivo=cinthia- tissot-310111118.pdf>. Acesso em: 16 maio 2019. Gabarito Questão 1 – Resposta: A Resolução: As questões éticas e de compromisso social perpassam todas as ações do psicólogo, independente do seu campo de atuação. Questão 2 – Resposta: E Resolução: Definir de forma restrita do que é ou não compromisso social na psicologia pode atrapalhar uma visão mais ampla do papel da Psicologia na sociedade, pois a Psicologia possui diversas teorias, metodologias e contextos de atuação. 122 http://dx.doi.org/10.17652/rpot/2016.4.12658 http://www.crpsp.org.br/portal/comunicacao/jornal_crp/163/frames/fr_questoes_eticas.aspx http://www.crpsp.org.br/portal/comunicacao/jornal_crp/163/frames/fr_questoes_eticas.aspx http://dx.doi.org/10.5007/2178-4582.2013v47n2p344 http://dx.doi.org/10.5007/2178-4582.2013v47n2p344 https://www.ipog.edu.br/download-arquivo-site.sp?arquivo=cinthia-tissot-310111118.pdf https://www.ipog.edu.br/download-arquivo-site.sp?arquivo=cinthia-tissot-310111118.pdf Questão 3 – Resposta: D Resolução: Um dos discursos que contribuíram para o estereótipo do psicólogo organizacional e do trabalho como um profissional sem compromisso social é: “ele tem papel alienado de controle social, seu papel é ser instrumento de controle do capital e não possui uma visão crítica das relações de poder na organização”. 123 Organizações e perspectivas em Psicologia Organizacional e do Trabalho Autor: Rogério Rodolfo Baptista Objetivos • Apresentar os novos modelos de gestão e suas influências nas práticas do psicólogo organizacional e do trabalho. • Discutir os conceitos e perspectivas de estudos das organizações. • Conhecer as implicações dos novos modelos de gestão na atuação do psicólogo organizacional e do trabalho. 1. Novos modelos de gestão Modelos de gestão representam um conjunto de características centrais que envolvem as formas de estruturação, organização e funcionamento das organizações, sintetizando as características abstraídas da realidade concreta e expressas de forma a simplificar o entendimento dessa realidade. Existem diferentes formas de se conceber os modelos de gestão de uma organização com suas políticas, estruturas e práticas organizacionais. Esse modelo pode ser compreendido como um conjunto de práticas administrativas exercidas pela direção de uma organização para conseguir atingir os objetivos organizacionais. A gestão envolve as condições de trabalho, a organização do trabalho, a natureza das relações hierárquicas, o tipo de estruturas organizacionais, os sistemas de avaliação e o controle de resultados, as políticas de gestão de pessoal, os objetivos e valores e a filosofia da gestão (SOUZA; PEIXOTO: 2013:123). Existem muitas maneiras de definir um modelo de gestão na literatura. Eles podem ser classificados como: o modelo de gestão taylorista, modelo técnico-burocrático, modelo fundamentado na excelência e o modelo de gestão participativa (SOUZA; PEIXOTO: 2013:124). Aqui será adotada uma análise referente a três dimensões principais, que envolvem um conjunto de características estruturantes do ambiente de trabalho nas organizações, que são: a gestão da produção, a organização do trabalho e as relações de trabalho. A gestão da produção é a forma como são organizados os processos de produção e distribuição de bens e serviços; essa forma de organização depende do tipo de produto e serviços que a organização entrega e da tecnologia utilizada no processo. O modelo tradicional depende de duas características: a capacidade da organização em fornecer serviços ou produzir bens em larga escala e o alto grau de padronização dos produtos ou serviços. Nesse modelo, existe uma estrutura organizacional com diversos níveis hierárquicos e múltiplas funções, 125 devido às necessidades relacionadas ao planejamento e à operação. Esse modelo vem sofrendo mudanças nas últimas décadas devido a vários fatores como: a necessidade das organizações em fornecer serviços e produtos cada vez mais não padronizados, que atendam as demandas de diferentes públicos e a internacionalização dos mercados, elevando a competitividade em nível global. Essas mudanças estão criando oportunidades para as empresas mudarem seus sistemas para uma maior flexibilidade na forma de organização dos meios de produção. A variedade de produtos e serviços levaram as organizações a aderirem a um novo modelo de gestão organizacional para atender novas demandas organizacionais (SOUZA; PEIXOTO: 2013:125). Na organização do trabalho trata-se das características que o trabalho assume em uma organização, com sua configuração geral do processo de produção de bens e serviços, de como o trabalho é organizado, tais como: se o trabalho é mais organizado de forma individual ou em equipe, o grau em que trabalho é especializado, parcelado e dividido (nível técnico), se o empregado recebe supervisão extensiva ou possui mais autonomia para realizar seu trabalho. O modelo de organização tradicional do trabalho é caracterizado da seguinte forma: há uma separação bem definida entre a execução e o planejamento do trabalho; a divisão do trabalho ocorre em uma série de tarefas simplificadas e fragmentadas; há uma análise de cada tarefa para definir o melhor método de execução; há uma cadeia hierárquica clara para supervisionar e controlar o trabalho; há um controle rígido para assegurar o cumprimento do planejado; há a utilização de trabalhadores com baixa qualificação e a há uma estrutura de trabalho com um conjunto fragmentado de tarefas interdependentes. O modelo tradicional ainda é o mais recorrente nas organizações, no entanto, vem sofrendo mudanças por causa da necessidade de uma maior flexibilidade na produção e ao uso intensivo da tecnologia nos processos produtivos. Esses fatores provocaram mudanças na organização de trabalho como: uma redução do trabalho manual, 126 alterando muito a natureza do trabalho; a produção e a qualidade dos bens se tornam mais dependentes da aplicação das habilidades e competências dos trabalhadores e uma alteração na forma de avaliar a produtividade no trabalho. Essas mudanças proporcionaram uma nova forma de ver o trabalho. Agora a ênfase não está somente no ritmo de produção, mas como e quanto cada trabalhador utiliza do seu conhecimento e cognição para obter mais resultados. Também há uma maior ênfase nos modelos de organização do trabalho baseados em equipes transfuncionais ou multidisciplinares e na coordenação horizontalizada. Nesse novo contexto, há uma ampliação dos espaços de trabalho; aumento da necessidade de se compartilhar o conhecimento e a mudança para modelos de liderança que permitam ao trabalhador mais liberdade de ação eautonomia (SOUZA; PEIXOTO: 2013:127). As relações de emprego são as políticas e práticas que regem as relações entre indivíduos, grupos e organizações. Incluem as práticas de gestão de recursos humanos. No modelo tradicional de gestão, as relações com os empregados são caracterizadas principalmente pela organização coletiva dos trabalhadores em forma de sindicatos, que buscam resolver conflitos entre a organização e os trabalhadores, mas criando uma divisão dos trabalhadores em classes profissionais, que também tem consequências no interior da organização, segmentando ainda mais o trabalho dividindo-os em funções especializadas. Nos novos modelos de gestão duas características alteram significativamente as relações com os empregados. A primeira é o relaxamento das regras para aumentar a flexibilização das condições de emprego, como por exemplo, a diversificação dos tipos de contrato de trabalho. Essas mudanças também provocam o aumento do grau de segurança que era oferecido ao trabalhador no sentido de manutenção do emprego e do cumprimento das leis trabalhistas. Também desenvolvem-se alternativas aos modelos tradicionais de remuneração fixa, vinculando o reconhecimento financeiro ao desempenho ou ao uso de novas habilidades. A segunda mudança se refere à exigência da adesão 127 social para garantir as formas de comprometimento consideradas mais consistentes com o grau maior de autonomia do trabalhador. E a busca do compromisso do trabalhador por meio da alteração de suas condições de trabalho, alinhando-as a um maior grau de engajamento. Essas mudanças podem ser oferecer horários mais flexíveis, ambientes mais aconchegantes ou até benefícios mais atraentes (SOUZA; PEIXOTO: 2013:129). 2. Conceitos e perspectivas de estudo das organizações Serão abordados agora alguns conceitos sobre as organizações e como elas têm sido estudadas pela POT- Psicologia Organizacional e do Trabalho. Esse conhecimento é importante para situar as tendências de estudo da POT e a atuação do psicólogo nesse contexto. O termo organização tem várias definições na literatura. Serão colocadas algumas definições em seguida: A organização é uma unidade social, coordenada conscientemente, composta de uma ou mais pessoas e que funciona numa base relativamente contínua para atingir objetivos. (ROBBINS, 2010 apud BASTOS et al., 2013:75) Disposição de relações entre componentes ou indivíduos que produz uma unidade complexa ou sistema dotado de qualidades desconhecidas em nível dos componentes individuais. [...] Assegura solidariedade e solidez a essas unidades e uma certa possibilidade de duração, apesar das perturbações aleatórias. A organização, pois, transforma, produz, reúne e mantém. (MORIN, 1981, apud BASTOS et al., 2013:75) Organizações são um conjunto de pessoas que compartilham crenças, valores e pressupostos que os encorajam a fazer interpretações 128 mutuamente reforçadas dos seus próprios atos e dos atos de outros. (SMIRCICH; STUBBART, 1985, apud BASTOS et al., 2013:75) Podemos definir organização como um conjunto de indivíduos cujos membros podem se modificar ao longo do tempo; formam um sistema coordenado de atividades especializadas com a finalidade de alcançar objetivos específicos ao longo de um período de tempo. (HITT; MILLER; COLELLA, 2013, apud BASTOS et al., 2013:75) Organizações correspondem a: a) sistemas sociais que transformam entradas em saídas; b) dirigida a metas; c) desenhadas como sistemas de atividades deliberadamente estruturados e coordenados; d) ligadas ao ambiente externo. (DAFT, 2006, apud BASTOS et al., 2013:75) Unidades socialmente construídas para atingir fins específicos. (ETZIONI, 1989, apud BASTOS et al., 2013:75) Essas são somente algumas das definições de organização, mas pode- se dividir as perspectivas dos autores sobre o que é a organização em três grandes tipos de sistemas: sistemas racionais, sistemas naturais ou sistemas abertos. A organização como um sistema racional é composta por coletividades altamente formalizadas voltadas para atingir de modo colaborativo objetivos específicos, explícitos e bem definidos. A organização como sistemas naturais é formada por coletividades forjadas pelo consenso e conflitos, buscando a sua sobrevivência e nos sistemas abertos é um sistema social inserido em um ambiente maior, envolvendo fluxos de atividades de coalizões de membros com distintos interesses (BASTOS et al., 2013: 76). Na primeira perspectiva, inserem-se algumas teorias dos estudos das organizações como a Teoria da Administração Científica de F. W. Taylor; A Teoria Administrativa de H. Fayol; a Teoria da Burocracia de M. Weber e a Teoria do Comportamento Administrativo de H. Simon, pois elas se apoiam na noção de um sistema racional e de que os arranjos 129 estruturais da organização são planejados para ampliar a eficiência de funcionamento do sistema na realização dos seus objetivos. Na segunda perspectiva, o conceito de organização remete às coletividades em que os membros perseguem distintos interesses, mas reconhecem o valor de perpetuar a organização como um recurso importante. As organizações são vistas como compartilhando características comuns a todas as coletividades sociais. As diferenças em relação à perspectiva racional é que se assume que existe uma complexidade de objetivos organizacionais (muitas vezes conflitantes) e que há a existência de uma “estrutura informal” que surge da interação entre as pessoas e impactam com intensidade no comportamento das pessoas. Algumas teorias podem ser incluídas nessa perspectiva: a Escola das Relações Humanas de E. Mayo e a Teoria de Sistemas Cooperativos de C. Barnard. Enquanto os teóricos do sistema racional buscam fatores que distinguem as organizações de outras coletividades, os teóricos do sistema natural buscam encontrar características que aproximam as organizações de outras coletividades sociais (BASTOS et al., 2013: 78). Para a terceira perspectiva, as organizações são entendidas como sistemas abertos que interagem com seu meio. A visão sistêmica vê a organização como um conjunto de elementos que interagem, são interdependentes e estão relacionados ao seu ambiente de modo a formar um todo organizado. A ideia de sistema compreende: um conjunto de entidades chamadas partes, elementos ou componentes; alguma espécie de relação ou interação das partes e a visão de entidade nova e distinta, criada por essa relação e que se revela quando se olha o conjunto (MAXIMIIANO, 2009: 47). Uma teoria muito importante nessa perspectiva é a Teoria da Contingência de A. Chandler. A ideia central dessa teoria é que inexiste um modelo universalmente adequado ou melhor de organização e que a estrutura deve se ajustar às pressões ambientais, quer do ambiente geral ou de ambientes específicos (BASTOS et al., 2013: 78). 130 As tendências nos estudos organizacionais apontam para uma visão de organização que pode ser dividida em três abordagens: a visão cognitivista, a visão culturalista e a visão institucionalista. A visão baseada em perspectivas cognitivistas tem mostrado, nas últimas décadas, uma forte tendência de crescimento, tanto nos estudos de gestão de recursos humanos e na POT, quanto nos estudos das organizações. Na visão cognitivista, estão presentes alguns elementos como: a organização se constitui de um processo de ação e de decisão, é um fenômeno processual e desenvolvimental. A organização é influenciada pelos limites humanos no processamento da informação. Trata-se de um complexo sistema de comunicações e interrelações de um grupo que fornece parte substancial das informações, pressupostos, objetivos e atitudes que influenciam suas decisões e, ao mesmo tempo, fornecem um conjunto de expectativas de como as pessoas deveriam agir (BASTOS et al., 2013: 89). A visão culturalista incorpora a noção de cultura como um conjunto de sistemas entrelaçados de signos interpretáveis que são construídoshistoricamente e que se traduzem em um sistema de concepções expressas em formas simbólicas, por meio dos quais as pessoas se comunicam, interpretam, perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e suas atividades. Nessa visão, as organizações são minissociedades que têm seus próprios padrões culturais e subculturais, apoiados em normas e rituais, exercendo influência na forma que lida com as situações do dia a dia (BASTOS et al., 2013: 94). A organização, na visão institucionalista, possui três pilares ou funções. Ela possui um pilar regulatório, que é um sistema de regras formais e informais, de vigilância e sanção que desperta comportamentos de medo/culpa ou de inocência/corrupção. Possui também um pilar normativo que institui valores e normas que impõem restrições aos comportamentos sociais e um pilar cultural-cognitivo, cuja ênfase está nas concepções compartilhadas da natureza da realidade social e nas maneiras que os significados são atribuídos (BASTOS et al., 2013: 96). 131 Em síntese, as organizações podem ser compreendidas de diversas formas: como um grupo de indivíduos que interagem regularmente e partilham uma identidade coletiva; como uma estrutura de autoridade e fluxo de informações; como um instrumento para atingir propósitos sociais; como sistemas de comunicação e controle; como minissociedades; como uma arena de conflitos, interesses e negociações; como um produto ou um processo ou como unidades cooperativas e/ou conflitivas (BASTOS et al., 2013: 96). 3. As implicações dos novos modelos de gestão na atuação do psicólogo organizacional e do trabalho Os novos modelos de gestão têm impactos sobre a atuação do psicólogo no contexto do trabalho. Ao considerar que a maioria das organizações apresentam uma forma híbrida em termos de características dos modelos de gestão apresentados anteriormente, ou seja, essas organizações se situam em algum lugar entre dois extremos: de um lado as organizações que possuem predominantemente características dos modelos tradicionais de gestão e do outro as organizações com predominância de características de novos modelos de gestão organizacional. Essa diversidade e complexidade organizacional pode exigir do psicólogo a habilidade de lidar com ambientes em constante transformação, dinâmicos e, muitas vezes, pouco estruturados, tornando uma competência importante a capacidade de gerir mudanças. Esse contexto torna difícil para o psicólogo adotar um padrão que se aplique a todas as realidades. Fazer a gestão da mudança organizacional tornou-se um dos principais papéis do psicólogo organizacional, que pode atuar de várias formas: preparando as pessoas para as mudanças; oferecer suporte para as equipes e gestores para os impactos gerados pela mudança; promover o desenvolvimento de competências necessárias às pessoas e à organização; promover 132 melhorias contínuas nos processos de trabalho; desenhar programas de treinamento, desenvolvimento e educação para o curto, médio e longo prazo; apoiar o desenvolvimento das equipes; melhorar os mecanismos de comunicação de normas e políticas da organização; desenvolver/incentivar a autonomia e o autocontrole nas equipes de trabalho; oferecer suporte aos empregados em relação aos impactos do aumento de complexidade organizacional; e das contradições nas relações de trabalho; ajudar a minimizar os impactos gerados pela ambiguidade de papéis; desenvolver competências gerenciais para a gestão da mudança; auxiliar no projeto de gestão da mudança cultural da organização; contribuir e acompanhar a definição e previsão de cenários futuros para a organização; auxiliar na identificação das mudanças importantes que ocorrem no ambiente externo e das tendências do mercado e dos concorrentes; participar e influenciar na definição do planejamento estratégico da organização; contribuir para o desenvolvimento de ambientes de trabalho que estimulem e facilitem a criatividade, a participação e a inovação; construir na prevenção de fatores geradores de estresse resultante de pressões constantes por produtividade e inovação constantes e conscientizar as pessoas para minimizar o desequilíbrio entre as diversas esferas da vida humana (família, trabalho e lazer). ASSIMILE A Mudança Organizacional é qualquer alteração planejada ou não, ocorrida na organização, decorrente de fatores internos e/ou externos à organização, que traz algum impacto nos resultados e/ou, nas relações entre as pessoas no trabalho. A mudança pode acontecer de forma: incremental (quando se busca agregar algo, implantar melhorias aos processos existentes); transformacional (com grandes alterações nos processos da organização, sendo reestruturada internamente para atender a uma nova estratégia); evolucionária (adequar a evolução da 133 empresa às demandas do mercado) e revolucionária (a mudança é profunda, com alteração nos princípios básicos da empresa, na sua gestão, na sua atuação e nos produtos) (MARQUES, 2019). O psicólogo precisa refletir sobre sua forma de atuação, pois as demandas emergentes de contextos nas organizações exigem novas habilidades, tais como: a capacidade de diagnosticar problemas, mapear cenários, prever impactos de mudanças, priorizar o desenvolvimento de pessoas a longo prazo e ser capaz de perceber as inter-relações entre os diversos fatores organizacionais e as diversas disciplinas que se relacionam com a psicologia (BASTOS et al., 2013: 145). Figura 1 – Modelo tradicional de gestão e novos modelos de gestão Dimensões da Organização Aspectos Modelo Tradicional Novos Modelos Gestão da Produção Fonte de vantagem competitiva. Fonte de Eÿciência. Economia de escala, produção em massa. Padronização de produtos. Flexibilidade produtiva. Padronização de processos mas com a capacidade ajustes no tipo de produção. Aplicação do Conhecimento. Organização Grau de do Trabalho Especialização. Grau de Supervisão. Menor mobilização do conhecimento do trabalhador. Separação entre concepção e execução do trabalho. Maior especialização e divisão do trabalho. Alto grau de supervisão direta. Alta mobilização do conhecimento do trabalhador para resolver problemas. Aumento da polivalência do trabalhador. Maior autorregulação ou regulação dirigida por processo. Grau de Segurança Maior: menor ˜exibilidade Baixa: maior ˜exibilidade Relações de Oferecido. para osmempregados. para os empregados. Trabalho Adesão social Menor: divisão técnica Alta: integral para requerida. do trabalho reduz a alcançar os objetivos necessidade do de produção. comprometimento social. Fonte: Bastos et al, 2013: 129 (adaptado pelo autor). 134 PARA SABER MAIS Jean-François Chanlat é um emérito pesquisador e professor francês, que teve grande influência nos estudos da Psicologia Organizacional sobre o tema organizações. Sua concepção é que a organização é um “subsistema estrutural e material” e um “subsistema simbólico”. O primeiro está relacionado à função produção e segundo às representações individuais, sendo o poder a forma utilizada para mediar as relações entre estes dois subsistemas e com isso gerar o que o autor chama de “ordem organizacional” (CHANLAT, 1996, p. 40). Ele é organizador da coleção “O indivíduo na organização: dimensões esquecidas”. Os novos modelos de gestão e os conhecimentos sobre organizações são fundamentais para os psicólogos que atuam nos contextos de trabalho. Os modelos de gestão têm uma grande influência nos processos organizacionais. Hoje esses modelos influenciam como as organizações lidam com as pessoas em vários níveis, como os modelos de gestão de trabalho, buscando uma maior flexibilidade de tarefas e atribuições, o aumento de polivalência dos funcionários com diversas tarefas, o aumento da mobilização do conhecimento do trabalhador e maior autorregulação do seu trabalho, promovendo mais autonomia e autorresponsabilidade. TEORIAEM PRÁTICA Selecione uma organização de qualquer tipo, localizada na sua região/município e que você tenha interesse em conhecer. Levante algumas informações sobre essa 135 organização, seja por fontes primárias (pesquisando diretamente na organização ou entrevistando alguém da organização) e/ou secundárias. (textos e dados disponíveis para consulta, sejam na internet ou de outra fonte). Depois responda o seguinte roteiro de questões: Qual é o negócio da organização? Quais são seus principais produtos/serviços? Faça um breve resumo da trajetória histórica da organização. Qual é o tipo de gestão de produção adotado pela organização? Ele é mais do tipo tradicional ou está relacionado aos novos modelos de gestão? Como é realizada a organização do trabalho? O quanto e como o trabalhador é incentivado a aplicar seu conhecimento no dia a dia? A organização tem um alto grau de especialização nas funções ou o trabalho é realizado com empregados polivalentes? Como é exercida a supervisão de pessoas na organização? É uma supervisão mais direta ou permite-se maior autonomia e autorregulação? Como são as relações de trabalho na organização? Os trabalhadores possuem maior ou menor segurança de seus empregos? Os trabalhadores tendem a ser mais ou menos comprometidos com a organização? Escreva um texto respondendo as questões anteriores, utilizando como referência o conteúdo apresentado nesse capítulo. 136 VERIFICAÇÃO DE LEITURA 1. Sobre os modelos de gestão, é correto afirmar que: a. Representam um conjunto de características centrais tais como: as formas de estruturação, organização e funcionamento das organizações. b. São um conjunto de práticas de mercado exercidas pela direção da organização. c. Envolvem as condições de trabalho, políticas de governo e a natureza das relações hierárquicas. d. Segundo Chalant, 1995 apud Souza; Peixoto: 2013: 124, podem ser classificados como: modelo burocrático, taylorista ou culturalista. e. O modelo de gestão participativa depende de duas características: a capacidade da organização em fornecer serviços ou produzir bens em larga escala e o alto grau de padronização dos produtos ou serviços. 2. O modelo de gestão envolve três características relacionadas ao trabalho das pessoas: a gestão da produção, a organização do trabalho e as relações de trabalho. Sobre esse tema é correto afirmar que: a. A gestão da produção são as políticas e práticas que regem as relações entre indivíduos, grupos e organizações. b. A organização do trabalho é a forma como são organizados os processos de produção e distribuição de bens e serviços, com sua configuração geral do processo de produção de bens e serviços, de como o trabalho é organizado: individual ou em equipe e o grau que o trabalho é especializado. 137 c. As relações de emprego são a forma como são organizados os processos de produção e distribuição de bens e serviços; essa forma de organização depende do tipo de produto e serviços que a organização entrega e da tecnologia utilizada no processo. d. No modelo moderno de gestão, há uma separação bem definida entre a execução e o planejamento do trabalho e a divisão do trabalho ocorre em uma série de tarefas simplificadas e fragmentadas. e. A organização do trabalho inclui as práticas de gestão de recursos humanos, tais como recrutamento e seleção, treinamento e carreira. 3. As perspectivas e concepções sobre as organizações podem ser divididas em três grandes tipos de sistemas: sistemas racionais, sistemas naturais ou sistemas abertos. As teorias que possuem uma visão de organização como um sistema racional são: a. A Teoria da Administração Científica de F. W. Taylor e a Escola das Relações Humanas de E. Mayo. b. A Teoria Administrativa de H. Fayol e a Teoria da Burocracia de M. Weber. c. A Teoria do Comportamento Administrativo de H. Simon e Teoria de Sistemas Cooperativos de C. Barnard. d. A Teoria da Contingência de A. Chandler e a Teoria da Administração Científica de F. W. Taylor. e. A Teoria da Burocracia de M. Weber e a Teoria de Sistemas Cooperativos de C. Barnard. 138 Referências Bibliográficas BASTOS, Antonio Virgílio Bittencourt et al. Conceito e perspectivas de estudo das organizações. In: ZANEILI, Jose Carlos; BORGES-ANDRADE, Jairo Eduardo; BASTOS, Antonio Virgilio Bittencourt. Psicologia, organizações e trabalho no Brasil. Porto Alegre: Artmed, 2013. p. 73-109. CHANLAT, Jean-François (Coord.). O indivíduo na organização: dimensões esquecidas. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1996. v. 1. MACHADO, Lílian Cristina Palhares; NEIVA, Elaine Rabelo. Práticas de gestão da mudança: Impacto nas atitudes e nos resultados percebidos. Revista Psicologia, Organizações e Trabalho, [s.l.], v. 17, n. 1, p.22-29, 2017. 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Questão 2 – Resposta: B Resolução: A organização do trabalho trata das características que o trabalho assume em uma organização, com sua configuração geral do processo de produção de bens e serviços, de como o trabalho é organizado, tais como: se o trabalho é de forma individual ou em equipe, o grau em que o trabalho é especializado, parcelado e dividido (nível técnico), se o empregado recebe supervisão extensiva ou possui mais autonomia para realizar seu trabalho. Questão 3 – Resposta: B Resolução: São exemplos de teorias que se inserem na visão da organização como um sistema racional: a Teoria da Administração Científica de F. W. Taylor; A Teoria Administrativade H. Fayol; a Teoria da Burocracia de M. Weber e a Teoria do Comportamento Administrativo de H. Simon. 140 estudos! J 1 ... 141 O mundo do trabalho e as relações trabalho-subjetividade-saúde do trabalhador A história da psicologia organizacional e do trabalho As áreas da psicologia organizacional e do trabalho Papéis e funções do psicólogo organizacional Conceitos e perspectivas de estudo em Psicologia Organizacional e do Trabalho A ética na atuação do psicólogo organizacional e do trabalho Organizações e perspectivas em Psicologia Organizacional e do Trabalho