Prévia do material em texto
0 1 Disciplina: Fundamentos Teóricos e Metodológicos da História Autores: D.ra Adriane de Quadros Sobanski Revisão de Conteúdos: D.ra Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd Designer Instrucional: Esp. Raphael Pereira Nunes de Souza Revisão Ortográfica: Esp. Lucimara Ota Eshima Ano: 2021 Copyright © - É expressamente proibida a reprodução do conteúdo deste material integral ou de suas páginas em qualquer meio de comunicação sem autorização escrita da equipe da Assessoria de Marketing da Faculdade UNINA. O não cumprimento destas solicitações poderá acarretar em cobrança de direitos autorais. 2 Adriane de Quadros Sobanski Fundamentos Teóricos e Metodológicos da História 1ª Edição 2021 Curitiba, PR Faculdade UNINA 3 Faculdade UNINA Rua Cláudio Chatagnier, 112 Curitiba – Paraná – 82520-590 Fone: (41) 3123-9000 Coordenador Técnico Editorial Marcelo Alvino da Silva Conselho Editorial D.r Eduardo Soncini Miranda / D.ra Marli Pereira de Barros Dias / D.ra Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd / D.ra Wilma de Lara Bueno / D.ra Yara Rodrigues de La Iglesia Revisão de Conteúdos Rosi Terezinha Ferrarine Gevaerd Designer Instrucional Raphael Pereira Nunes de Souza Revisão Ortográfica Lucimara Ota Eshima Desenvolvimento Iconográfico Juliana Emy Akiyoshi Eleutério Desenvolvimento da Capa Carolyne Eliz de Lima FICHA CATALOGRÁFICA SOBANSKI, Adriane de Quadros. Fundamentos Teóricos e Metodológicos da História / Adriane de Quadros Sobanski. – Curitiba: Faculdade UNINA, 2021. 88 p. ISBN: 978-65-5944-051-1 1.História. 2. Metodologia. 3. Ensino. Material didático da disciplina de Fundamentos Teóricos e Metodológicos da História – Faculdade UNINA, 2021. Natália Figueiredo Martins – CRB 9/1870 4 PALAVRA DA INSTITUIÇÃO Caro(a) aluno(a), Seja bem-vindo(a) à Faculdade UNINA! Nossa faculdade está localizada em Curitiba, na Rua Cláudio Chatagnier, nº 112, no Bairro Bacacheri, criada e credenciada pela Portaria nº 299 de 27 de dezembro 2012, oferece cursos de Graduação, Pós-Graduação e Extensão Universitária. A Faculdade assume o compromisso com seus alunos, professores e comunidade de estar sempre sintonizada no objetivo de participar do desenvolvimento do País e de formar não somente bons profissionais, mas também brasileiros conscientes de sua cidadania. Nossos cursos são desenvolvidos por uma equipe multidisciplinar comprometida com a qualidade do conteúdo oferecido, assim como com as ferramentas de aprendizagem: interatividades pedagógicas, avaliações, plantão de dúvidas via telefone, atendimento via internet, emprego de redes sociais e grupos de estudos o que proporciona excelente integração entre professores e estudantes. Bons estudos e conte sempre conosco! Faculdade UNINA 5 Sumário Prefácio ..................................................................................................... 07 Aula 1 – A história do ensino de História ...................................................... 09 Apresentação da Aula 1 ............................................................................. 09 1.1 – A influência europeia ................................................................... 10 1.2 – E agora, o que ensinar? ............................................................... 12 Conclusão da Aula 1 ................................................................................... 16 Aula 2 – A disciplina escolar: formação de professores e ensino de História 17 Apresentação da Aula 2 .............................................................................. 17 2.1 – O ensino de História no Brasil ...................................................... 17 2.1.1 – Mas a sombra dos Estudos Sociais já se anunciava ................. 22 2.2 – Cursos superiores no Brasil ......................................................... 22 2.3 – A Licenciatura e a formação de professores ................................ 25 2.3.1 – Os primeiros cursos superiores de História ............................... 27 Conclusão da Aula 2 ................................................................................... 28 Aula 3 – As teorias da História e o Ensino Positivista ................................... 29 Apresentação da Aula 3 .............................................................................. 29 3.1 – A História Tradicional, Positivista ou Metódica ............................. 29 3.2 – O Positivismo e o ensino de História ............................................ 32 3.3 – Um método tradicional ................................................................. 35 Conclusão da Aula 3 ................................................................................... 37 Aula 4 – Novas teorias, novas metodologias ............................................... 38 Apresentação da Aula 4 .............................................................................. 38 4.1 – O Marxismo e a História ............................................................... 38 4.1.1 – A metodologia marxista no ensino de História .......................... 41 4.2 – Novos olhares sobre a História: a Escola dos Annales ................ 42 4.2.1 – Uma nova metodologia em sala de aula ................................... 44 Conclusão da Aula 4 ................................................................................... 46 Aula 5 – Conteúdos históricos na sala de aula ............................................. 47 Apresentação da Aula 5 .............................................................................. 47 5.1 – O currículo escolar ....................................................................... 47 5.2 – Transposição didática ou não? .................................................... 48 5.3 – A História como disciplina escolar ................................................ 50 5.3.1 – A História na escola de nível secundário ................................... 52 5.4 – A História nos currículos escolares do século XX ........................ 53 6 5.5 – A História se reinventa! ................................................................ 55 Conclusão da Aula 5 ................................................................................... 57 Aula 6 – Que ensino de História teremos no século XXI? ............................ 58 Apresentação da Aula 6 .............................................................................. 58 6.1 – A redemocratização e o ensino de História .................................. 58 6.1.1 – A transposição política .............................................................. 59 6.2 – Um novo ensino de História? ....................................................... 60 6.3 – A Legislação e o ensino de História ............................................. 62 6.3.1 – Novos desafios: História da África e cultura afro-brasileira e indígena ...................................................................................................... 63 6.4 – A Base Nacional Comum Curricular e o ensino de História .......... 65 Conclusão da Aula 6 ................................................................................... 66 Aula 7 – Professores pesquisadores e a produção do conhecimento .......... 67 Apresentação da Aula 7 .............................................................................. 67 7.1 – Professores pesquisadores, sim! .................................................67 7.2 – A importância da pesquisa para a produção do conhecimento ... 69 7.2.1 – Onde e como pesquisar? .......................................................... 70 7.3 – As fontes históricas ...................................................................... 74 Conclusão da Aula 7 ................................................................................... 75 Aula 8 – Linguagens e metodologias no ensino e aprendizagem histórica... 76 Apresentação da Aula 8 .............................................................................. 76 8.1 – Definindo as fontes históricas ...................................................... 76 8.2 – O trabalho com as fontes históricas nas séries iniciais ................. 78 8.2.1 – As novas linguagens no ensino de História ............................... 80 Conclusão da Aula 8 ................................................................................... 83 Índice Remissivo ......................................................................................... 84 Referências ................................................................................................. 86 7 Prefácio O poeta brasileiro Ferreira Gullar, em um de seus poemas, afirmou que é preciso prestar atenção na História, nessa “matéria humilde e humilhada”. Ao fazer essa afirmação, o poeta se referia à forma como essa disciplina vem sendo encarada desde sua introdução nos currículos escolares até a atualidade. Em diferentes momentos da história do Brasil, o ensino de História foi incluído, servindo a determinados interesses. Em outros, sua exclusão também aconteceu porque não representava os interesses políticos daquele contexto. Para compreender o conceito de História e seu papel enquanto disciplina escolar, é fundamental conhecer sua origem e as formas pelas quais foi entendida e estudada ao longo do tempo. Desde a Antiguidade, a História percorreu um longo caminho até ser incluída nos currículos escolares. Heródoto e Tucídides, na Grécia antiga, acerca de 5 mil anos, procuravam dar voz aos grandes personagens das guerras e aos acontecimentos que consideravam mais importantes. Os historiadores romanos seguiam o mesmo caminho, buscando descrever, em detalhes, os aspectos psicológicos dos sujeitos das suas narrativas. Para esses historiadores da Antiguidade, essa narrativa não tinha uma função explicativa, mas somente a tentativa de relatar as coisas como acreditavam que tinham acontecido. Na Idade Média, com a supremacia do Cristianismo na sociedade europeia, a vida dos santos e anjos, assim como a dos cavaleiros, ganhou espaço nessas narrativas históricas. No entanto, a partir do século XIV, com o surgimento e desenvolvimento do Renascimento e a valorização do individualismo, a História passou a ser responsável pelo surgimento das biografias. Foi assim que essas biografias dos heróis medievais foram sendo substituídas a partir do século XVIII pela história de outros sujeitos considerados como importantes para a sociedade. A partir do século XIX, as biografias passaram a ter grande importância para a construção da ideia de nação. Ao imortalizar sujeitos considerados responsáveis pela consolidação do país príncipes, reis, generais eram destacados como “heróis”. A principal função da biografia era exaltar as glórias nacionais, no cenário de uma história que embelezava o acontecimento, o fato. 8 É nesse contexto que a História, enquanto disciplina, passa a fazer parte do currículo escolar brasileiro. Diante da necessidade de fortalecer a identidade nacional, a disciplina de História tinha o objetivo de divulgar os nomes e os feitos dos “grandes brasileiros”. A narrativa histórica seguia uma linha cronológica e linear rumo à ideia de progresso. Percebe-se, desse modo, que a compreensão sobre a História, seu conceito e ensino sempre estiveram relacionados com os interesses políticos de cada tempo histórico. No Brasil, no entanto, em diferentes momentos a presença da História nos currículos escolares tem sido ameaçada, como na época da Ditadura Civil-Militar (1964-1985), quando dividiu espaço com a Geografia a partir da criação da disciplina de Estudos Sociais. Atualmente a História tem seu lugar na Educação Básica questionado não só no Brasil, sobretudo em outros países, num processo que procura questionar a necessidade de se estudar os feitos humanos no decorrer do tempo. A partir dessa breve contextualização teremos condições de entender como a História foi inserida no contexto escolar, refletir sobre as diferentes possibilidades de ensino e dialogar com as metodologias para podermos produzir aulas que permitam atribuição de sentido para os estudantes das mais diferentes idades. 9 Aula 1 – A história do ensino de História Apresentação da aula No final do século XIX, com a estruturação das escolas e o surgimento das disciplinas escolares, a História também ganhou espaço. Naquele século, na Europa, o conhecimento das mais diversas áreas passava por um processo de cientificização, ou seja, os conhecimentos passaram a ser entendidos e estudados como científicos. Para isso, todas as áreas do conhecimento, como a Medicina, a Sociologia, a Psicologia, a Geografia, a História, entre outros, passaram a usar métodos e técnicas próprias de investigação. Enquanto ciência, a História passou a incorporar não apenas métodos e técnicas de investigação, como metodologias de ensino. Na Europa, onde o conhecimento histórico primeiro recebeu esse olhar científico, discutiam-se as formações das nações, sobretudo da França e da Alemanha. Nesses países se discutia a forma de olhar e lidar com o passado, com os arquivos e as fontes históricas, assim como deveria ser o trabalho dos historiadores. A História da humanidade tinha como ponto de partida a Europa, local do início da civilização e importante centro cultural do mundo, numa clara visão eurocêntrica! Os conteúdos escolares seguiam essa preocupação de valorizar as nações e os “grandes personagens” da História europeia. Mas o que ensinar em História? É importante perceber que ao entrar no mundo científico a História, enquanto disciplina escolar, também acompanhará aquele contexto político. Assim, a seleção dos conteúdos a serem estudados nas aulas de História terá forte relação com o próprio momento histórico. Vocabulário Eurocentrismo: visão de mundo que coloca a Europa como o centro da cultura mundial e, portanto, região fundamental da sociedade moderna. 10 No Brasil, muitas mudanças também foram vistas ao longo do século XIX: da proclamação da independência e do governo imperial, o país chega, em 1889, ao regime republicano. É nesse contexto de mudanças que as ideias chegadas da Europa vêm se alojar no Brasil. Assim como na Europa, a História era utilizada para auxiliar no fortalecimento dos laços com a identidade nacional e os primeiros passos da História como disciplina escolar seguirão o modelo francês. O ensino de História, portanto, inicia seu caminho tendo em vista a necessidade de celebrar os grandes personagens e a eles atribuir a condição dos “heróis”, responsáveis pelos grandes feitos e acontecimentos. Veremos agora, com maiores detalhes, todo esse processo de construção da História enquanto disciplina escolar. 1.1 A influência europeia É no contexto do século XIX que várias ciências passaram a ser sistematizadas a partir da utilização de procedimentos metodológicos e formas de investigação. Na Europa, particularmente na França e na Alemanha, se desenvolveram os procedimentos que garantiam o status de ciência à História. Com histórias muito particulares, esses países viam a necessidade de contar o seu passado de uma forma mais sistemática. A França, que havia passado pela Revoluçãode 1789, possuía enormes arquivos onde guardava vasta documentação. A questão recaia sobre quem lidaria com esses documentos e que forma empregaria para dar voz aos atores do passado. Depois de viver durante séculos num território dividido, a Alemanha tinha acabado de passar pela unificação, em 1871. O jovem país precisava contar sua história e lidar com esse passado também exigia organização. A História foi dividida em quatro grandes períodos, delimitados por fatos considerados importantes para a História europeia. A História Quadripartite é dividida em Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea. Esse modelo foi estendido para outras partes do mundo, inclusive para o Brasil e permanece bastante enraizado nos cursos superiores de História, assim como nas escolas brasileiras. 11 A partir dessa divisão, que tem a Europa como centro de todos os acontecimentos, a História da América, assim como a História do Brasil, só passam a existir a partir da chegada dos europeus. Em outras palavras, essa visão histórica é linear, segue uma cronologia que vem da Antiguidade até o mundo atual e tem, como objetivo, apontar a “evolução” e o “progresso” da humanidade. Essa organização do passado foi fundamental para que os países europeus, principalmente a França e a Alemanha, se afirmassem como nação. Com o surgimento da disciplina de História, essa preocupação será estendida à escola. Os jovens estudantes do século XIX passavam a olhar para o passado tendo em vista a formação de suas nações a partir da realização de grandes personagens vistos como os heróis que garantiram sua cidadania. Nas primeiras escolas brasileiras, será incluído o ensino de História e a influência francesa, quadripartite, será grande. O modelo de História que se ensinava no Brasil ficava a cargo da produção intelectual do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), criado em 1838 e que tinha, como principal objetivo, a organização de uma história verdadeiramente nacional. De acordo com o IHGB, a História do Brasil era resultado natural da colonização portuguesa, o que promovia um processo seletivo ao olhar para o nosso passado. Enquanto determinados acontecimentos e personagens da história brasileira eram excluídos, como a escravidão e os conflitos sociais do período colonial, outros eram valorizados, como os momentos decisivos da independência, a herança cultural branca e a ação evangelizadora da Igreja. Com a constituição do Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, e o Regulamento de 1838 efetivando um currículo moldado a partir da concepção francesa, era formalizada a introdução dos estudos históricos já a partir da sexta série. É importante ressaltar que esses estudos históricos se referiam ao ensino de História centrado na historiografia francesa e na perspectiva eurocêntrica da civilização mundial. A maioria dos professores que atuavam no Colégio Pedro II eram integrantes do IHGB e colaboraram na elaboração dos programas escolares, dos manuais didáticos e nas orientações dos conteúdos a serem ensinados. 12 Curiosidade O Colégio Pedro II foi fundado em 1837, durante o império, no Rio de Janeiro, então capital do Brasil. Ainda em atividade, o colégio integra a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica. Atualmente, o Colégio possui cerca de 13 mil alunos divididos em 14 campi e em um Centro de Educação Infantil. Assim, a história enquanto disciplina escolar que começava a ser ensinada no Brasil era a História da Europa, apresentada como a única e verdadeira História universal. A História do Brasil, por sua vez, era abordada somente nas séries finais, com poucas horas de estudo e tendo, como objetivo, narrar as biografias de homens “importantes”, datas e acontecimentos considerados relevantes. Homens, sim! Não havia espaço para as mulheres! Somente eles eram os sujeitos da História! Com a proclamação da República, em 1889, a relação com a história europeia foi ainda mais aprofundada. Em 1892, na Câmara dos Deputados de São Paulo, se discutia a manutenção de uma narrativa que ensinasse a importância dos grandes acontecimentos europeus, assim como da biografia de europeus considerados notáveis. Vemos, portanto, que o objetivo do ensino de História era narrar uma verdade pronta e acabada a partir da visão eurocêntrica, cronológica e linear. Reflita A visão eurocêntrica, cronológica e linear ainda está presente na forma de ensinar História? Você percebe isso? Como? 1.2 E agora, o que ensinar? Como o Brasil sempre seguiu as tendências europeias, com a organização das escolas, a elaboração das disciplinas e a seleção dos conteúdos não foi diferente. Mas como isso seria possível? Sabemos que o 13 Brasil é um país formado por povos de diferentes origens e condições: indígenas, europeus e africanos. Com a proclamação da República, em 1889, todos os símbolos que faziam referência ao Império foram eliminados e, em seu lugar, foram eleitos outros, que retratavam essa nação moderna. Nomes de ruas e praças foram modificados. Monumentos e bustos foram edificados em homenagem aos novos “heróis”. Saiba mais A construção da memória nacional: os heróis no panteão da pátria. Disponível em: http://bd.camara.leg.br/bd/handle/bdcamara/4163 Embora a formação do povo brasileiro seja resultante de intensa miscigenação, a proposta de trabalho a ser realizado pela escola procurava acentuar a ideia de uma identidade comum, ignorando as diferenças e, sobretudo, as divergências. Havia uma clara tendência em negar que o Brasil tenha sido colonizado. Pelo contrário, apresentava-se uma ideia de que a formação do país aconteceu devido ao caráter civilizatório europeu, numa clara aceitação do eurocentrismo. A narrativa sobre o processo histórico que promoveu o surgimento e desenvolvimento do Brasil foi centralizada no papel do colonizador português e, a seguir, no imigrante europeu. Houve, claramente, a eliminação do papel dos Indígenas e africanos na formação da sociedade brasileira. Além da presença europeia, com todas as suas características civilizacionais, acrescentava-se – embora de maneira secundária – a presença dos indígenas e africanos. Nada existia no passado que demonstrasse a exploração e a escravização desses povos. Pelo contrário, se exaltava uma relação amistosa entre eles e os europeus, naquilo que ficou conhecido como “mito da democracia racial”. Como a escola era o local onde se pretendia legitimar conceitos como nação, cidadão e pátria, a seleção dos conteúdos ensinados nas aulas de História deveria estar de acordo com a perspectiva de uma sociedade homogênea e harmoniosa. Formava-se, desse modo, o que podemos denominar http://bd.camara.leg.br/bd/handle/bdcamara/4163 http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/4163/construcao_memoria_2010.pdf?sequence=1 http://bd.camara.gov.br/bd/bitstream/handle/bdcamara/4163/construcao_memoria_2010.pdf?sequence=1 14 de uma “memória oficial”, uma única versão considerada como a verdadeira e que supostamente, refletia a História brasileira. Apesar da suposta harmonia entre europeus, indígenas e africanos, os conteúdos de história não abriam espaço para que uma cultura, que não fosse a europeia, entrasse no espaço escolar. Não havia, portanto, nenhuma referência à história, cultura, personagens ou resistência dos povos indígenas ou dos africanos escravizados e trazidos à força ao Brasil. A partir de 1930, com Getúlio Vargas, um discurso de valorização da educação como principal meio de incentivo à cidadania foi ainda mais reforçado. Nessa data é criado o criado o Ministério da Educação e Saúde Pública e, em 1931, foi implantada a Reforma Francisco Campos, que tinha como objetivo a organização tanto do Ensino Secundário quanto do Ensino Superior no Brasil. Em 1931, com a ReformaFrancisco Campos, foi criado o Ministério da Educação e Saúde Pública definindo programas e métodos de ensino. Com a Constituição de 1934, a educação passou a ser considerada direito de todos os brasileiros, sendo considerada responsabilidade do Estado e da família. Em 1937, uma nova Constituição, outorgada por Vargas e, no contexto das reformas trabalhistas, a educação foi reorganizada de acordo com dois públicos bem distintos: de um lado, uma educação voltada para a formação da classe trabalhadora; de outro, uma educação adequada aos filhos da elite, destinada a formar os líderes políticos. Em 1942, com a Reforma Gustavo Capanema, a História do Brasil foi formalizada como disciplina independente, tendo como objetivo uma formação moral e patriótica. O currículo de História, mais uma vez, tinha como objetivo garantir uma narrativa que destacasse os “heróis” e uma suposta tradição que promoveu a nação brasileira. Essa tendência, no que se refere aos conteúdos históricos, será uma vez mais reforçada no período da ditadura civil-militar (1964-1985). Durante o período marcado pelo domínio dos militares no Brasil, a censura e a ausência de liberdades democráticas acentuaram as pressões econômicas e político- ideológicas, o que pode ser observado de forma consistente na maneira de pensar o ensino de História. 15 Importante Durante a Ditadura civil-militar a Educação Básica, sob a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), Lei 5692 de 11 de setembro de 1971, a História permaneceu apenas como disciplina destinada ao então Segundo Grau, atual Ensino Médio. Para o Primeiro Grau, agora Ensino Fundamental, foi criada a disciplina de Estudos Sociais, a qual englobava os conteúdos de História e de Geografia, porém com a quantidade de aulas e abordagens diminuídas. Logo no início do ano de 1969, houve a instalação das chamadas licenciaturas curtas, com a formação de professores em cursos rápidos. Denominado de Estudos Sociais, o curso de licenciatura curta tinha, em seu currículo, as disciplinas de História, Geografia, Ciências Sociais, Filosofia, Ciência Política e OSPB (Organização Social e Política do Brasil). Os Estudos Sociais também ofereciam as disciplinas obrigatórias para todos os cursos: Estudos dos Problemas Brasileiros (EPB), Educação Física e as disciplinas da área pedagógica. Os conteúdos dos Estudos Sociais afastavam-se da concepção científica da História e tinham como objetivo um modelo educacional propagandístico e cívico. Aos estudantes cabia memorizar as datas, nomes e acontecimentos considerados significativos para a exaltação do civismo, seguindo a concepção eurocêntrica, linear e cronológica. As fontes históricas utilizadas eram “as oficiais”, ou seja, aquelas que o governo militar considerava como as verdadeiras. Divulgava-se uma narrativa do passado em que somente os personagens “mais importantes” eram estudados e criava-se uma memória histórica de exaltação da pátria. Novamente, a função dessa disciplina estava voltada ao reconhecimento dos “heróis” da nação, das principais datas e acontecimentos do passado. Os cursos superiores de Estudos Sociais, implantados nacionalmente, foram definitivamente encerrados somente na década de 1990 e formaram uma grande geração de professores polivalentes, com habilitação para ministrar aulas de História, Geografia e Educação Moral e Cívica. 16 Figura 1 – Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes Fonte: https://s2.glbimg.com/9qSVUarSXwU5WIDJ4OC77NOkc1g=/e.glbimg.com/og/ed/f/orig inal/2020/04/21/tiradentes1.png Curiosidade Você já percebeu que, de modo geral, os heróis na História do Brasil não são índios, negros ou mulheres? Com a Ditadura Civil-militar figuras como D. Pedro I, Princesa Isabel, Duque de Caxias e Tiradentes receberam destaque especial na construção da história do Brasil, sendo considerados como heróis da nação. Saiba mais Para mais informações, ler o artigo: ORIÁ, Ricardo. Construindo o Panteão dos Heróis Nacionais: monumentos à República, rituais cívicos e o ensino de História. Revista História Hoje, v. 3, nº 6, 2014. p. 43-66. Disponível em: https://rhhj.anpuh.org/RHHJ/article/view/137/106 Conclusão da aula Até agora, você ficou sabendo que o ensino de História se iniciou no século XIX ao mesmo tempo em que diversas áreas do conhecimento passavam a ser tratadas como ciência. Além disso, aprendeu que foi na Europa que essa cientificidade ganhou espaço e se expandiu, inclusive até o Brasil. https://rhhj.anpuh.org/RHHJ/article/view/137/106 17 Aqui, no século XIX, o país passava por uma importante transição política: da monarquia, passávamos a ser uma jovem República. O ensino de História nas escolas brasileiras terá grande influência europeia e irá se adaptar de acordo com as mudanças políticas ao longo das décadas. Atividade de aprendizagem 1. De acordo com o que você estudou até agora, é possível identificar a influência europeia no ensino de História? Explique. 2. De que maneira a criação da disciplina de Estudos Sociais, em substituição da História, atendia os interesses da Ditadura Civil-militar? Aula 2 – A disciplina escolar: formação de professores e ensino de História Apresentação da aula É interessante perceber que a própria História tem história, não é mesmo? E essa história é permeada de muitos acontecimentos que são de extrema importância para entendermos sua existência, a forma como entrou no ambiente escolar e, principalmente, como ela é apresentada no processo de ensino- aprendizagem. Vamos retomar essa construção histórica da disciplina e as formas de se ensinar! 2.1 O ensino de História no Brasil Para iniciar qualquer discussão sobre o ensino de História no Brasil, é fundamental haver uma referência ao Regulamento de 1838, do Colégio D. Pedro II, no Rio de Janeiro, então capital do Brasil, que determinou a inserção da História como conteúdo no currículo escolar. Instituída como disciplina autônoma, a concepção de História estava atrelada aos acontecimentos recentes europeus, como a Revolução Francesa e a unificação de países como a Itália e a Alemanha. Era papel da História fortalecer uma identidade nacional e, assim, os conteúdos escolarizados 18 estavam voltados para a valorização dos grandes personagens, “heróis nacionais” e os acontecimentos que comprovavam suas ações. Os estudos dos clássicos e literários como Ovídio, César, Cícero, Horácio, Homero, entre outros, tinham a função de formar na juventude as virtudes liberais e os sentimentos patrióticos, versando sobre os deveres dos grandes homens e sobre suas ações dantescas. Criada sob a tutela do modelo francês, o ensino de história nos trópicos carrega o estigma de pertencer à civilização ocidental e marcadamente cristã. LIMA, Guilherme Pontieri de. O ensino de História no Brasil: da “História natural” à História naturalizada. Campinas: UNICAMP, 2011. p. 61. Dissertação de Mestrado. Disponível em: http://repositorio.unicamp.br/jspui/bitstream/REPOSIP/251116/1/Lima_Guilhe rmePontieride_M.pdf - Acesso em 12 de julho de 2020. Foi assim que a disciplina de História foi incluída nos currículos escolares brasileiros. Havia a concepção de que a História europeia, notadamente a francesa, representava uma História universal, de onde partiram os principais acontecimentos da humanidade. Os episódios da História brasileira, desse modo, eram mencionados como apêndices desses acontecimentos gerais. Para entender melhor, o ensino de História nesse período foi marcado por uma “História Universal” que se baseava no eurocentrismo e na perspectiva de atingir o progresso e a civilização. Nesse caso, a ideia era a de que a América deveria estudar e se desenvolver para atingir a civilização representada pela Europa! Com a Proclamação da República,em 1889, se acentuou a necessidade de efetivar uma identidade nacional, ou seja, os brasileiros precisavam se pensar como brasileiros e se identificar com a nação. E como fazer isso? O hino nacional, composto em 1831, se mantinha firme como um dos principais símbolos dessa identidade. A bandeira do Brasil foi adaptada. Os elementos da monarquia foram retirados e símbolos que identificavam o momento da Proclamação da República foram incorporados. http://repositorio.unicamp.br/jspui/bitstream/REPOSIP/251116/1/Lima_GuilhermePontieride_M.pdf http://repositorio.unicamp.br/jspui/bitstream/REPOSIP/251116/1/Lima_GuilhermePontieride_M.pdf 19 Reflita Você já percebeu momentos em que os brasileiros se identificam com o país por meio do hino e da bandeira? Mas além da simbologia, era preciso encontrar uma forma mais consistente para formar a identidade nacional. E foi na escola que se encontrou a opção mais adequada. Ensinar as novas gerações, desde cedo, a ver o país da forma que se pretendia era um objetivo muito claro. E foi assim que, mais uma vez, a História foi entendida como a disciplina que poderia exercer essa função. A ideia era projetar e desenvolver um cidadão brasileiro a partir do conhecimento da história nacional. Mas atenção: que História era essa? Era aquela que promovia e exaltava os grandes personagens políticos, as lideranças regionais, os “heróis” da pátria brasileira. Uma História que se dedicava a apresentar um passado glorioso, sem conflitos ou reações, em que indígenas e africanos não tinham destaque, não tinham participação na construção da identidade nacional. Importante A estrutura da disciplina de História foi organizada de acordo com uma periodização que obedecia aos marcos políticos, dando ênfase a uma história oficial em que os sujeitos destacados representavam a elite e o Estado. Essa perspectiva foi construída a partir do século XIX e ampliada com a chegada de Getúlio Vargas à presidência em 1930. Nesse período, em particular, se apresentava uma proposta de valorização da educação pública e da formação e professores. É inegável que o período foi muito importante para a educação brasileira, sobretudo com relação aos investimentos na área da educação pública a partir da criação do Ministério da Educação e de Saúde. Nesse período, um número maior de brasileiros terá acesso à educação formal. 20 Sob a tutela do Ministro Francisco Campos, o Ministério da Educação e de Saúde promove uma verdadeira revolução com uma reforma educacional, em 1931. Com a reforma Francisco Campos, houve uma organização sistemática do ensino brasileiro nos níveis secundário, comercial e superior. A educação básica foi estruturada para que os estudantes passassem por dois diferentes ciclos: um fundamental, com duração de cinco anos, e outro complementar, com dois anos. A estrutura curricular nesses níveis de educação passou a ser organizada por séries, característica que marcou a educação brasileira até 2007, quando foi instituído o ensino fundamental de 09 anos. LEI nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006 Altera a redação dos arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei: Art. 1º (VETADO) Art. 2º (VETADO) Art. 3º O art. 32 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar com a seguinte redação: "Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: ..................................................................................." (NR) Art. 4º O § 2º e o inciso I do § 3º do art. 87 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passam a vigorar com a seguinte redação: "Art. 87 ................................................................................... ................................................................................... § 2º O poder público deverá recensear os educandos no ensino fundamental, com especial atenção para o grupo de 6 (seis) a 14 (quatorze) anos de idade e de 15 (quinze) a 16 (dezesseis) anos de idade. § 3º ................................................................................... 21 I – matricular todos os educandos a partir dos 6 (seis) anos de idade no ensino fundamental; a) (Revogado) b) (Revogado) c) (Revogado) ..................................................................................." (NR) Art. 5º Os Municípios, os Estados e o Distrito Federal terão prazo até 2010 para implementar a obrigatoriedade para o ensino fundamental disposto no art. 3º desta Lei e a abrangência da pré-escola de que trata o art. 2º desta Lei. Art. 6º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Brasília, 6 de fevereiro de 2006; 185º da Independência e 118º da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004- 2006/2006/lei/l11274.htm#:~:text=Altera%20a%20reda%C3%A7%C3%A3o%20dos %20arts,(seis)%20anos%20de%20idade. A História era oficializada como disciplina autônoma no currículo escolar e tinha a finalidade de formar os cidadãos brasileiros. Influenciada pelo educador norte-americano John Dewey, a educação brasileira e, por consequência, o ensino de História, privilegiava os aspectos econômicos e éticos, com o estudo sobre a vida de grandes “heróis” da sociedade brasileira. O pensamento de John Dewey está presente nos ideais de reforma educacional no Brasil na década de 1930. Na compreensão de Francisco Campos e Anísio Teixeira está a proposta deweyana de organizar a escola de acordo com a sociedade, e, em sintonia com ela. Nas palavras de Dewey, a escola organizada como “sociedade em miniatura” (DEWEY, 1959). SOUZA, R. A. de; MARTINELI, T. A. P. Considerações históricas sobre a influência de John Dewey no pensamento pedagógico brasileiro. Revista HISTEDBR On- line, Campinas, SP, v. 9, n. 35, 2012. p. 160–172. Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/histedbr/article/view/8639620 Acesso em: 7 dez. 2020. 22 Saiba mais Reforma Francisco Campos – Decreto N. 21.241 de 4 de abril de 1932. http://www.histedbr.fe.unicamp.br/navegando/fontes_escritas/5_Gov_Vargas/de creto%2021.241-1932%20reforma%20francisco%20campos.htm Acesso em 20 de julho de 2020. 2.1.1 Mas a sombra dos Estudos Sociais já se anunciava! Com a Ditadura Civil-militar, a História perde sua autonomia enquanto disciplina escolarizada e, com a Lei n. 5.692, de 1971, passa a dividir espaço com a Geografia a partir da criação de uma nova disciplina, os Estudos Sociais. De influência norte-americana, a disciplina de Estudos Sociais se baseava na interdisciplinaridade e na organização curricular a partir dos chamados “círculos concêntricos”. Basicamente, essa concepção parte da ideia de educação a partir do mais próximo para o mais distante. Assim se ensinava conteúdos relacionados à criança, depois à família e, assim, sucessivamente. Tendo em vista o contexto de uma Ditadura, o ensino de História esteve voltado aos interesses daquele regime político, numa clara intenção de legitimar as ideias do governo. Assim, o ensino de História esteve voltado a promover os nomes dos “heróis nacionais” e à identificação com valores como a pátria e a nação, sem autonomia e desenvolvimento de um pensamento crítico. Com a redemocratização do país no final da década de 1980 e a volta da História como disciplina autônoma, as discussões sobre o seu ensino e o papel dos professores foram acentuados. 2.2Cursos superiores no Brasil Foram os jesuítas que iniciaram o processo de escolarização no Brasil, ainda no século XVI. E foram eles, também, que criaram os primeiros cursos superiores. Dentro de uma grande área chamada de Humanidades, eles ofereciam cursos de Artes, também chamado de Ciências Naturais ou Filosofia; http://www.histedbr.fe.unicamp.br/navegando/fontes_escritas/5_Gov_Vargas/decreto%2021.241-1932%20reforma%20francisco%20campos.htm http://www.histedbr.fe.unicamp.br/navegando/fontes_escritas/5_Gov_Vargas/decreto%2021.241-1932%20reforma%20francisco%20campos.htm 23 e o curso de Teologia. Com o curso de Artes, com duração de três anos, se obtinha os graus de Bacharelado e de Licenciatura. Já com o curso de Teologia, com duração de quatro anos, a graduação obtida era a de doutor. Com a vinda da família real portuguesa para o Brasil, em 1808, houve reformulações no Ensino Superior no Brasil e novos cursos foram criados, como Medicina, Engenharia e Direito. Importante Preste atenção! Como chegava uma elite ao Brasil era preciso formar os filhos dessas pessoas que seriam, mais tarde, aqueles que iriam dominar a política e a vida pública! Essa situação persistiu até a Proclamação da República, em 1889. Em 1891, o Brasil teve sua primeira Constituição da República e o ensino superior passou a ser considerado responsabilidade do Governo Federal, mas não com exclusividade. Em 1911, com a Reforma Rivadávia, é instituída a “desoficialização” do ensino, o que gerou condições para o surgimento de novas universidades e a transferência dessa iniciativa, provisoriamente, do Governo Federal para os estados. Assim, ainda em 1909, por iniciativa de grupos ligados à exploração da borracha, foi criada a Universidade de Manaus. Entre 1911 e 1917, em São Paulo, também como resultado de grupos privados, foi criada e mantida a Universidade de São Paulo e, em 1912, por iniciativa estadual, foi criada a Universidade Federal do Paraná. Em 07 de setembro de 1920, através do Decreto 14.343, o Governo Federal criou sua primeira universidade, a Universidade do Rio de Janeiro (URJ). Mais tarde, em 05 de julho de 1937, pela Lei nº. 452 ela passou a ser chamada de Universidade do Brasil (UB). 24 Figura 2 – Fachada do segundo prédio da Universidade de Manáos, na Avenida Joaquim Nabuco. Fonte: Jornal O Tempo (https://idd.org.br/acervo/universidade-de-manaos/) Saiba mais Para mais informações ler o artigo: Fávero, Maria de Lourdes de Albuquerque. A Universidade no Brasil: das origens à Reforma Universitária de 1968. Educar, Curitiba, n. 28, p. 17-36, 2006. Editora UFPR. p. 17-36. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/er/n28/a03n28 - Acesso em 22/07/2020. A partir de 1930, com Getúlio Vargas na presidência, a preocupação com a educação pública é ampliada, tanto que é criado o Ministério da Educação e Saúde Pública. Sob a direção de Francisco Campos, várias reformas são feitas na educação que, pela primeira vez na História do país, atingia todos os níveis do ensino brasileiro. A Reforma Francisco Campos trouxe nova proposta com relação ao Ensino Superior no Brasil. Um projeto, organizado em três partes, definia uma atenção específica com relação ao ensino superior, outra a respeito da reorganização da Universidade do Rio de Janeiro, a qual serviria de modelo aos outros institutos isolados que pretendessem adotar o novo Estatuto, e a terceira, que criou o Conselho Nacional de Educação, definindo competências e composição. https://idd.org.br/acervo/universidade-de-manaos/ https://www.scielo.br/pdf/er/n28/a03n28%20-%20Acesso%20em%2022/07/2020 https://www.scielo.br/pdf/er/n28/a03n28%20-%20Acesso%20em%2022/07/2020 25 Com o Estatuto das Universidades Brasileiras, instituído pelo Decreto nº 19.851, de 11 de abril de 1931, Francisco Campos pretendia organizar o sistema educacional promovendo os professores secundários a partir de sua formação obrigatória na recém-criada Faculdade de Educação, Ciências e Letras. Até aquele momento, pode-se afirmar que os professores secundários tinham uma formação quase autodidata e, com a criação da Faculdade de Educação, oficializava-se o Magistério, concedendo-lhe um caráter mais científico e, portanto, mais compatível com a produção do conhecimento e com a prática da pesquisa. A Faculdade de Educação, Ciências e Letras não chegou a ser instalada, cabendo às faculdades de Filosofia ou de Filosofia, Ciências e Letras a formação dos futuros professores. Nesse período foram criadas, em 1934, a Universidade de São Paulo (USP) e, em 1935, a Universidade do Distrito Federal (UDF). A partir da década de 1950, sobretudo com as discussões referentes ao projeto de Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, são criadas as primeiras Universidades federais em todo o Brasil, tendo seu auge com a Universidade de Brasília (UnB) em 1961. 2.3 A Licenciatura e a formação de professores Vimos até agora como o ensino se estabeleceu no Brasil e o processo de criação dos cursos superiores. Mas e a formação de professores? Foi na passagem do século XIX para o século XX que aconteceram as primeiras discussões sobre a necessidade de universalizar o acesso à educação e, principalmente, de realizar a formação de professores. Até aquele momento se pensava em preparar professores capacitados para dar aula para crianças, nas escolas primárias. Assim, acreditava-se que a formação desses professores deveria estar voltada para o domínio de conteúdos para que pudessem transmitir os conhecimentos, ou seja, quanto mais o professor soubesse, mais poderia ensinar! Nos anos 1930, no entanto, um grupo de educadores influenciados pelas ideias do educador norte americano John Dewey se organiza como um grupo denominado de Escola Nova. Esses educadores passam a defender a ideia de que a função dos professores não deveria ser a de apenas “transmitir 26 conteúdos”, mas eles deveriam pesquisar e produzir o conhecimento a ser ensinado. Foi assim que promoveram a criação dos primeiros Institutos de Educação em 1932, em Brasília, a partir da iniciativa de Anísio Teixeira, e em 1933, em São Paulo, por iniciativa de Fernando de Azevedo. Vocabulário Escola Nova: Movimento de renovação educacional surgido na passagem do século XIX para o século XX. A grande novidade dos Institutos de Educação era a maneira como entendiam a formação de professores. Ensinar era um processo que deveria envolver o conhecimento científico e, somente com uma preparação adequada, seria possível atender a essa exigência pedagógica! Como a ideia de formar professores era uma coisa muito séria, esses institutos acabaram sendo responsáveis pela formação de professores também em nível superior. Assim, o Instituto de Educação de São Paulo foi incorporado à Universidade de São Paulo, fundada em 1934, e o Instituto de Educação do Rio de Janeiro incorporado à Universidade do Distrito Federal (UDF), criada em abril de 1935. No seu primeiro ano de funcionamento, a UDF inaugurou os primeiros cursos de formação de professores e de especialização em diversas disciplinas. A organização dos cursos de formação de professores para as escolas secundárias em todo o país foi instituída por meio do Decreto-Lei n. 1.190, de 04 de abril de 1939/43, bem como a criação da Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil. Na formação dos professores havia a diferenciação entre a Licenciatura e a Pedagogia: aquela formaria os professores para as várias disciplinas que compunham os currículos das escolas secundárias, enquanto que esta era voltada para a formação dos professores que atuariam nas Escolas Normais. Em ambos os casos vigorava o mesmo esquema, isto é, três anos para o estudo das disciplinas específicas e um ano para a formação didática. 27 2.3.1 Os primeiros cursossuperiores de História Voltados à formação de professores que atuariam nas escolas secundárias, os primeiros cursos superiores de História surgem junto com as primeiras Faculdades brasileiras. Curiosidade Os primeiros cursos superiores de História eram ofertados junto com Geografia e tinham a duração de 3 anos. Os estudantes que concluíam o curso eram diplomados bacharéis e só teriam a Licenciatura se fizessem mais um ano de estudos cursando a disciplina de Didática. Essa sistematização que unificava História e Geografia em curso único. O curso de História só se tornou independente a partir de 1955 com a Lei 2.5945! Quadro 1.1 – Primeiros Cursos Superiores de História no Brasil Instituição Estado Início de funcionamento UFRJ USP UDF UFPR PUC-RS PUC-RJ UFBA UERJ PUC - Campinas PUC - Minas Gerais UFRGS UEPG Rio de Janeiro São Paulo Rio de Janeiro Paraná Rio Grande do Sul Rio de Janeiro Bahia Rio de Janeiro São Paulo Minas Gerais Rio Grande do Sul Paraná 11/04/1931 25/01/1934 04/04/1935 01/10/1938 26/03/1940 01/03/1941 06/03/1941 13/05/1941 02/03/1942 14/01/1943 01/01/1943 01/03/1950 Fonte: Elaborada pela autora a partir de informações obtidas no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP. (2017). Mas essa independência do curso superior de História não durou muito tempo. Com a instalação da Ditadura Civil-militar (1964 a 1985), o ensino de História foi tomado como alvo pelo poder político dominante, o qual procurou 28 adequá-lo às suas necessidades de afirmação. Essas estratégias foram acompanhadas de um forte ataque à formação de professores. No início de 1969, com amparo legal no Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, o Governo Militar, por meio do decreto-lei 547, de 18 de abril de 1969, com a Reforma Universitária, autorizou a criação de cursos de licenciatura de curta duração. Denominado de Estudos Sociais, o curso de licenciatura curta com duração de apenas três anos tinha, em seu currículo, as disciplinas de História, Geografia, Ciências Sociais, Filosofia, Ciência Política, OSPB (Organização Social e Política do Brasil). Os Estudos Sociais também ofereciam as disciplinas obrigatórias para todos os cursos: EPB (Estudos dos Problemas Brasileiros), Educação Física e as disciplinas da área pedagógica. Os cursos superiores de Estudos Sociais, implantados nacionalmente, foram definitivamente encerrados somente na década de 1990 e formaram uma grande geração de professores polivalentes, com habilitação para ministrar aulas de História, Geografia e Educação Moral e Cívica. Tiveram, como grande característica, a desvalorização das ciências humanas como um campo autônomo e com referencial teórico específico. Conclusão da aula Você deve ter percebido ao longo desta aula que a disciplina de História tem uma trajetória, na educação brasileira, atrelada aos interesses políticos. Como disciplina escolar a História foi sendo moldada de acordo com os interesses de cada período. No entanto, fica claro que a construção dessa disciplina resultou da influência europeia, com características muito específicas na ênfase em uma suposta “História Universal” que tem, no continente europeu, o ponto de partida. Essa estrutura ainda é presente nas grades curriculares de Cursos superiores e, consequentemente, também na educação básica. Com relação aos cursos superiores, uma etapa da educação que, por muito tempo foi privilégio da elite brasileira, vimos que a criação e organização dos Cursos superiores de História aconteceram somente no século XIX e, desde então, tem passado por várias adaptações. Uma dessas adaptações foi a 29 supressão da disciplina no então primeiro grau para a incorporação dos Estudos Sociais, o que promoveu a criação desse curso superior de Licenciatura curta. Somente na década de 1990 os Cursos de Estudos Sociais foram encerrados e a História voltou a ser uma disciplina autônoma nos currículos da Educação Básica. Atividade de aprendizagem 1. Por que é importante que haja um Curso superior específico de História? 2. Leia o documento com a Lei 5692/71 e identifique a abordagem dada a História na Educação básica. Aula 3 - As teorias da História e o Ensino Positivista Apresentação da aula Em nossa primeira aula, estudamos como a História surgiu enquanto disciplina escolar e como isso tem relação com as intenções políticas de cada contexto. Agora vamos aprender como essa disciplina foi se formando a partir das ideias históricas que se desenvolviam. Você vai perceber que conforme a historiografia ia se desenvolvendo, a maneira de olhar para o passado, o jeito de narrar os acontecimentos e ações das pessoas também se alterava. Compreender como a História enquanto ciência foi se desenvolvendo, ajuda-nos a compreender como a disciplina escolar foi sendo organizada e ensinada nas escolas brasileiras. 3.1 A História Tradicional, Positivista ou Metódica É importante lembrar que, no século XIX, várias áreas do conhecimento começam a ser entendidas enquanto ciências, ou seja, entendia-se que todas possuíam metodologias de pesquisa próprias, adequadas com sua área. A Física e a Química, por exemplo, renasceram como disciplinas exatas, mas o caso mais destacado desse processo de construção de conhecimento é a 30 transformação que ocorreu nas chamadas disciplinas humanistas, como a Sociologia e a História. Foi a partir do século XIX, portanto, que a História conhecida desde a Antiguidade, também passou a ser estudada de acordo com métodos e técnicas específicas, garantindo a ela a condição da cientificidade. Nessa mesma época houve a profissionalização dos historiadores, pois passaram a realizar seu trabalho de investigação sobre o passado a partir da utilização desses métodos e técnicas específicos. Já estudamos que tudo isso tem, como ponto de partida, o continente europeu, por isso a França e a Alemanha serão pioneiras nessa valorização da ciência histórica, dando origem ao que se denominou de Escola Metódica ou Positivista. A História positivista é representada por duas importantes obras francesas: a Revista Histórica, fundada em 1876 por Gabriel Monod e o manual Introdução aos estudos históricos, de 1898, elaborado por Langlois e Seignobos. Fustel de Coulanges (1830-1889) foi outro importante representante do positivismo francês. Em todos os casos se acreditava na neutralidade dos historiadores diante das informações apresentadas pelas fontes históricas, ou seja, os historiadores deveriam relatar o passado exatamente como era descrito pelos documentos, sem emitir qualquer opinião. De acordo com os historiadores positivistas, os documentos escritos eram sinônimos de fontes históricas, sendo muito importantes para o estudo do passado. Somente eles poderiam contar como as coisas, de fato, aconteceram. Por esse motivo era muito importante reunir um número grande de documentos escritos e registrar os fatos históricos. Os positivistas acreditavam numa neutralidade do historiador ao lidar com os documentos do passado e afirmavam que ao realizar suas pesquisas deveria manter distanciamento de sua obra. Esta, por sua vez, seria o resultado de uma descrição exata, sem interpretações, já que os fatos falavam por si. 31 Importante Não havia nenhum interesse em realizar análises teóricas mais profundas porque, de acordo com o positivismo, tudo o que está registrado nos documentos é verdadeiro e, portanto, eles “falam” por si. Para ser considerados fontes históricas, esses documentos deveriam ser utilizados exatamente de acordo como haviam sido escritos, sem nenhum questionamento ao seu conteúdo ou objetivo. Além disso, era preciso comprovar que esses documentos eram legítimos. Tinham que ser originais,possuir assinaturas, selos ou timbres que comprovassem sua autenticidade. Figura 3 – Documentos escritos. Fonte: Shutterstock (https://image.shutterstock.com/image-photo/magic-scrolls-books- medieval-library-260nw-1618590166.jpg) Para você entender melhor, esses documentos escritos seriam aqueles produzidos pelos governantes, como legislações estabelecidas por reis e rainhas, cartas oficiais trocadas entre reinos, planos de guerras ou tratados de paz. Além dos documentos “oficiais”, também eram consideradas fontes históricas os objetos encontrados em sítios arqueológicos, edificações arquitetônicas, como pirâmides, aquedutos e estátuas, assim como objetos colecionados e apresentados em museus, como moedas, selos e medalhas. Além disso, os historiadores positivistas também acreditavam que, observando o passado, a humanidade tinha uma tendência a se desenvolver e atingir o progresso. Essa ideia de progresso estava, normalmente, relacionada aos avanços tecnológicos e ao conjunto das explicações científicas para os diversos fenômenos naturais e sociais. 32 Assim, com essa visão histórica, havia a crença em diferentes “estágios da civilização” entre as civilizações. A Europa, dentro de uma hierarquia de desenvolvimento, era tratada como aquela que estava no topo, fortalecendo a concepção eurocêntrica. Curiosidade Você já esteve em um museu? Observou como ele é organizado? Os museus, normalmente, são organizados de acordo com uma concepção positivista, com os objetos acompanhados de fichas contendo informações para que o visitante conheça aspectos relacionados à sua história. Dessa forma, o museu faz com que as peças “falem por si só”, pois o visitante obtém “todas” as informações do próprio objeto e da ficha que o acompanha. 3.2 O Positivismo e o ensino de História A escola, do modo como a conhecemos, surgiu entre os séculos XV e XVIII na Europa Ocidental, num período de grande efervescência política. Nesse contexto, os pensadores do Iluminismo, como o francês Rousseau, deixaram de considerar as crianças como miniaturas de adultos e passaram a determinar que a infância era uma fase específica da vida do ser humano. Outro importante pensador foi o alemão Emanuel Kant, para quem a educação das crianças, de maneira integral, deveria ser a principal responsável pelo desenvolvimento da sociedade. Após a Revolução Francesa, em 1789, o povo exigia uma educação igualitária para todas as classes sociais que atendesse as necessidades principalmente da classe operária. Na prática, o que se viu foi o desenvolvimento de uma educação voltada para as classes mais ricas e a escola pública atendendo aos interesses da burguesia. O modelo de educação positivista, surgido nesse contexto, pretendia mostrar às crianças que a sociedade deve se manter estável, sem grandes mudanças sociais. 33 Podemos afirmar que o pensamento positivista influenciou um modelo de educação em que a sociedade prepararia as crianças para que elas fossem condicionadas a saber que, em sua vida adulta, deveriam se submeter, de forma acrítica, às exigências do mundo do trabalho burguês. Para consolidar os ideais burgueses, o positivismo estabeleceu o lema da “ordem e progresso”, que podemos perceber foi muito bem aceito no Brasil, já que está presente em nossa bandeira desde a Proclamação da República, em 1889. Ao ser incorporada ao currículo escolar, a disciplina de História seguia o mesmo caminho de utilizar apenas os documentos oficiais em suas aulas, portanto, reforçava a ideia de uma narrativa pronta e acabada sobre o passado. No Brasil, o Positivismo foi muito bem recebido, tanto na historiografia quanto no espaço escolar. Aqui, é importante lembrar que quem iniciou o processo de educação formal no Brasil foram os padres Jesuítas, ainda em 1549. A educação brasileira, portanto, foi dominada pelos preceitos religiosos durante séculos. A própria História era estudada apenas do ponto de vista religioso, abordando a vida de santos e personagens bíblicos. No século XIX, com o advento das ciências e da historiografia positivista, há um rompimento com essa visão religiosa. A presença do positivismo nas escolas brasileiras foi vista, portanto, como algo muito importante para o lançamento de novas ideias que contribuíam para o ensino das ciências em oposição ao ensino religioso. Os ideais positivistas chegaram ao Brasil por volta do ano de 1850 e influenciaram a Proclamação da República em 1889. É importante lembrar que, durante os primeiros anos da República, o Brasil foi governado pelos militares, os quais seguiam as ideias positivistas. Nessa época, o Brasil ainda era um país em que a maioria da população brasileira, analfabeta, vivia na zona rural. De acordo com os ideais republicanos, era necessário que essa população participasse da vida política, porém, a Constituição de 1891 estabelecia o direito à cidadania somente aos alfabetizados. A escolarização, portanto, era fundamental! O ensino primário seria responsabilidade dos governos estaduais e o ensino secundário, assim como o superior, ficava a cargo do governo federal. Estava instalada uma educação nos moldes positivistas que tinha, como 34 objetivo, fazer de cada brasileiro um cidadão consciente de seus deveres cívicos, saber valorizar a família e a pátria para construir o caráter e o sentimento nacional da população brasileira. Quando Getúlio Vargas chega ao poder em 1930, o Estado ficou mais centralizado. Vargas rompeu com a tradição da política do Café com leite, em vigor desde a Proclamação da República e concentrava o poder nas mãos do Governo Federal. Importante Entre a Proclamação da República (1889) e 1930, o Brasil foi governado pelas oligarquias. Inicialmente, o país teve dois presidentes militares e, na sequência, todos os outros representantes dos fazendeiros. Nesse período, esses presidentes fizeram um acordo político de revezamento no poder em que paulistas e mineiros escolhiam os candidatos que chegariam à presidência. Era a política do café-com-leite. Ao assumir o poder, Vargas anunciava a modernização do país e o ensino de História, nesse contexto, devia estar voltado à formação de estudantes que entendessem a necessidade de promover o desenvolvimento do país. Por esse motivo, o ensino de História se tornou importante aliado da ideologia de Vargas, ou seja, com a modernização do país seria possível romper com os problemas que, tradicionalmente, atrasavam o Brasil. E como fazer com que os estudantes compreendessem a necessidade do desenvolvimento? O ensino de História se voltou para a valorização dos heróis nacionais com o objetivo de reconstruir uma identidade de unidade nacional sem desigualdades étnicas, sociais e econômicas. Com o método positivista, somente as fontes “oficiais” eram utilizadas, colocando os estudantes em contato somente com informações referentes aos acontecimentos políticos de acordo com a concepção ideológica vigente. A História regional também não tinha espaço. Não se estudava o local, os acontecimentos e pessoas comuns de espaços que não representassem a nação. 35 Com a implantação da ditadura Civil-militar, em 1964, a escola também foi vista como espaço privilegiado de divulgação da ideologia militar. Houve a valorização de uma educação tecnicista, ou seja, uma educação voltada para a formação de pessoas qualificadas para o mercado de trabalho. Durante esse período, a História deixou de ser uma disciplina autônoma, inclusive sendo retirada do currículo no primeiro grau, com a introdução dos Estudos Sociais. Somente numa única série do segundo grau a História era obrigatória. Sua função? Formar indivíduos obedientes e ordeiros que fossem patriotas e que reproduzissem a moral estabelecida pela ideologia dos militares. 3.3 Um método tradicional O métodopositivista, também chamado de tradicional, foi incorporado pelas escolas, as quais organizaram um currículo voltado para a memorização, a repetição, o tecnicismo e o autoritarismo dos professores. Você, provavelmente, já conheceu alguém que afirma não gostar de História. E por qual motivo? De modo geral, as pessoas mais velhas, que frequentaram as escolas entre as décadas de 1970 e 1990, tiveram uma relação muito distante com a História. É provável que tenham sido “vítimas” de um ensino de História no qual a sua única obrigação era decorar nomes e datas e, como avaliação, deveriam realizar a memorização para poder tirar uma boa nota nas avaliações. Em sua memória escolar devem ter ficado nomes como Pedro Álvares Cabral, Tiradentes, D. Pedro I, D. Pedro II, Princesa Isabel e tantos outros. E o significado desses sujeitos? Qual sua relação com o tempo presente? Qual a sua utilidade em sua vida prática? Reflita Será que essas pessoas que estudaram História na perspectiva positivista tiveram uma boa impressão dessa disciplina escolar? Por quê? Outra característica que pode ter trazido péssimas impressões a quem estudou a partir de uma concepção positivista da História é o fato dessa 36 disciplina se voltar, quase exclusivamente, para conteúdos relativos à política. Era preciso, por exemplo, conhecer e decorar os nomes de todos os presidentes do Brasil, assim como suas principais realizações. Nomes de reis, rainhas, faraós e generais faziam parte dos conteúdos de História. Além de acreditar na importância da memorização de datas e nomes, a escola positivista não via os estudantes como pessoas com conhecimentos prévios. Nessa concepção de ensino, os estudantes chegavam à escola sem conhecimento algum. Os professores, esses sim, dominavam todos os conhecimentos científicos e sua função era repassar aos alunos os conteúdos considerados como “verdades absolutas”. As aulas de História eram, portanto, marcadas pelas exposições orais dos professores, sem nenhuma participação dos estudantes. Além do quadro de giz, o único material que servia de apoio ao professor era o livro-didático. Utilizados pelas escolas brasileiras desde o final do século XIX, os livros- didáticos vão ganhar muita importância nessa educação tradicional. Acreditava- se que os textos ali apresentados e escritos por historiadores representavam uma verdade inquestionável! E o professor? Este fazia seu papel de transmitir essas verdades em aulas expositivas nas quais os estudantes não tinham espaço para questionar ou problematizar. Acreditava-se que, quanto mais conhecimentos uma pessoa era capaz de absorver, mais sua educação tinha qualidade e mais culta ela era. De acordo com uma perspectiva eurocêntrica, os conteúdos de História seguiam a velha linha do tempo, com uma sucessão regular de acontecimentos que vinham desde a Antiguidade até o tempo presente. Esses acontecimentos, no entanto, nunca eram relacionados com o tempo presente, muito menos com um exercício de buscar perspectivas com relação ao futuro. O próprio recorte temporal acontece a partir de eventos importantes para a sociedade europeia, como a Revolução Francesa (1789), que define a separação entre a Idade Moderna e a Idade Contemporânea. Não há referências a outras Histórias, como da África, da Índia ou da China. Se o positivismo pretendia manter a sociedade tal como ela era, sem confrontos entre as diferentes classes, o ensino de História era realizado a partir da visão de que existia uma cultura dominante, a qual era apresentada como a 37 condutora do processo histórico. Na concepção positivista, a Europa era o local de onde saia essa cultura dominante. Nenhum apontamento sobre diferenças culturais ou sobre relações de poder era estabelecido. Tomemos como exemplo a concepção clássica sobre o “Descobrimento do Brasil”. Na visão positivista, o Brasil só passou a existir a partir do momento em que os portugueses aqui chegaram em 1500. A existência das populações indígenas, sua história e cultura eram completamente ignoradas. Saiba mais FERREIRA, Evaldo A. M. ET alli. O Positivismo e a educação brasileira na 1ª República. Educar em Revista. v. 1, n. 1 (1977). p. 70-108. https://revistas.ufpr.br/educar/article/view/35196/21851 Conclusão da aula Vimos nesta aula que as concepções teóricas sobre a própria História afetaram a forma como a disciplina escolar foi organizada e instituída no Brasil. A História Positivista teve forte influência sobre a organização da disciplina no Brasil. Foi essa concepção de História que dominou por mais tempo os currículos escolares, formando gerações de estudantes com base num método que privilegiava as fontes oficiais, a memorização e a passividade dos alunos. Atividade de aprendizagem 1) De que maneira o Positivismo teve influência sobre o modo como a História, enquanto disciplina escolar, é compreendida por muitas pessoas? 2) Pesquise a relação do lema positivista “Ordem e Progresso” com a Proclamação da República e a bandeira do Brasil. https://revistas.ufpr.br/educar/issue/view/1555 https://revistas.ufpr.br/educar/article/view/35196/21851 38 Aula 4 – Novas teorias, novas metodologias Apresentação da aula Após estudarmos o Positivismo e sua influência sobre o ensino de História, é fundamental conhecer as outras duas correntes historiográficas que exerceram acentuada presença no ensino de História: o Marxismo e a Escola dos Annales. O Positivismo, baseado em análises de documentos oficiais e que defendia os heróis nacionais, viu, no Marxismo, uma grande oposição, pois neste a história é narrada a partir da visão dos trabalhadores. No Brasil, a pedagogia histórico-crítica procurou romper com essa visão dos grandes heróis e levar os estudantes a estudar a História a partir das ações de pessoas simples, trabalhadoras. No início do século XX, outra corrente historiográfica, a Escola dos Annales, também afirmava que os sujeitos históricos não eram somente os homens ricos e poderosos. Além disso, a forma de estudar o passado desses sujeitos ganhou novas possibilidades com a ampliação do conceito de fontes históricas. Nesta aula, além de conhecer essas correntes historiográficas veremos como elas foram incorporadas ao ensino de História. 4.1 O Marxismo e a História De todas as formas de pensar a História, o Materialismo Histórico ou Marxismo foi, com certeza, o mais ousado e, também, o mais polêmico devido às críticas e propostas que fazia. Vamos voltar um pouco no tempo para que você entenda a origem do marxismo. No século XVIII, a Europa viveu o início do processo de industrialização. Apesar de ser revolucionária devido ao surgimento das fábricas e ao aumento de produção, essa industrialização também foi responsável por uma profunda divisão de classes sociais. De um lado ficavam os burgueses, donos das fábricas e dos meios de produção, vivendo de maneira muito confortável por causa dos lucros; de outro, os proletários, assalariados que tinham seu trabalho explorado 39 e viviam em péssimas condições. Foi nesse contexto que, na Alemanha, nasceram Karl Marx (1818–1883) e Friedrich Engels (1820-1895). Figura 4 – Escultura de Karl Marx e Friedrich Engels Fonte: Shutterstock (https://image.shutterstock.com/image-photo/monument-karl-marx- friedrich-engels-600w-1070997650.jpg) Engels era filho de um rico industrial e trabalhou nas empresas do pai, testemunhando as péssimas condições de trabalho, miséria e exploração em que viviam os operários. Ao escrever vários artigos em que denunciava essa situação conheceu diversos pensadores, como Karl Marx, advogado recém- formado, com quem escreveu várias obras. O ano de 1848, na Europa, foi bastante movimentado por causa de revoltas e manifestações populares que procuravam combater a exploração dos trabalhadores.Aproveitando esse momento, Marx e Engels lançaram uma pequena, mas muito importante obra, que procura orientar a organizar os trabalhadores, chamada Manifesto Comunista. O objetivo dessa obra era conscientizar os trabalhadores da necessidade de união para combater a exploração de que eram vítimas. Curiosidade O Manifesto Comunista foi, inicialmente, lançado como um panfleto, com uma linguagem clara e de fácil compreensão. Somente algum tempo depois ele se tornou um livro, organizado com uma breve introdução, três capítulos e uma conclusão. 40 Você lembra aquela ideia de uma narrativa histórica cronológica e linear rumo ao progresso? Pois bem, até então a História era vista apenas como uma sucessão de fatos e eventos sem relação entre si. Marx e Engels, por sua vez, afirmavam que as alterações sociais ao longo do tempo aconteciam devido aos modos de produção e não devido às ideias e pensamentos. A história humana, portanto, sempre se desenvolveu a partir da exploração de um grupo sobre o outro. Para compreender melhor, vamos observar alguns exemplos: no Egito antigo, o faraó e a nobreza egípcia exploravam o trabalho dos camponeses e artesãos; na Idade Média o senhor feudal, a nobreza e o clero exploravam o trabalho dos servos; com a revolução industrial a burguesia explorava os operários. Pronto! Por essa lógica, a História vinha se construindo, sempre, a partir da oposição entre dois grupos, um dominante e o outro, dominado. Marx e Engels, então, elaboraram uma teoria segundo a qual durante todo o processo histórico da humanidade as classes subalternas foram vítimas do discurso da classe dominante, acreditando que a exploração a que eram submetidas era um fenômeno natural. A desigualdade social se mantinha justificada, sendo a classe dominante a única a se beneficiar com essa exploração e divisão social do trabalho. A teoria marxista, também chamada de materialismo histórico acredita, portanto, que é a partir dos confrontos entre as diferentes classes sociais que a História acontece. De todas as sociedades estudadas, aquela do século XIX, capitalista, foi a que recebeu maior atenção. Para Marx, ao enfrentar a burguesia, a classe operária pode ser revolucionária, porque possui a capacidade de transformar a sociedade a partir de novas relações de produção. Com essa atitude revolucionária haveria uma verdadeira libertação humana e o fim da divisão de classes, de exploração e de dominação. 41 Mídias Assista ao filme “O jovem Karl Marx” (2006), com direção de Raoul Peck. Link: https://www.youtube.com/watch?v=2M5vo2n6G7Y 4.1.1 A metodologia marxista no ensino de História De acordo com o método tradicional de ensino de História, como os acontecimentos são vistos de forma cronológica e linear, tendo como objetivo a busca pelo progresso, percebemos que a História é estudada tendo o passado como ponto de partida. Já na perspectiva marxista, a ideia é olhar primeiro para o presente, para os problemas sociais do presente para, a partir dele, olhar para o passado. Podemos afirmar que essa corrente historiográfica acreditava em uma história-problema, ou seja, que o estudo do passado deveria analisar o passado a partir dos problemas vividos por uma determinada sociedade. Nessa perspectiva, é possível compreender que a História humana está sempre em movimento, o que rompe com a ideia de que o passado foi igual para todos ao mesmo tempo. As investigações sobre o passado devem acontecer levando em consideração a luta de classes e os modos de produção. Ao contrário do positivismo, que via os grandes homens e seus feitos como os principais sujeitos, no marxismo são os trabalhadores os sujeitos mais atuantes da História. Essa teoria, portanto, ao ser relacionada com o ensino, coloca os próprios estudantes como sujeitos históricos. No Brasil a teoria marxista teve grande destaque a partir de 1980, com a Pedagogia histórico-critica, criada pelo pedagogo brasileiro Dermeval Saviani. Esse método de ensino tem, como objetivo, a interpretação da realidade; a visão de mundo; a relação entre a teoria e a prática; a organização das pessoas em https://www.youtube.com/watch?v=2M5vo2n6G7Y 42 sociedade e a forma como as sociedades constroem sua sociedade através dos tempos. De acordo com essa concepção de ensino, o conhecimento se constrói a partir da ideia de que, ao longo da História, devem ser observadas a existência de continuidades, rupturas, permanências e avanços, o que nos mostra uma grande diferença com relação à visão positivista. 4.2 Novos olhares sobre a História: a Escola dos Annales Durante a primeira metade do século XX, na França, um grupo de historiadores também passou a pensar a História de forma diferente da Escola Positivista, dando início a uma corrente historiográfica conhecida como Escola dos Annales. A principal proposta desse grupo era propor uma nova concepção de História, para confrontar a visão positivista que vinha dominando desde o final do século XIX. Como substituição, pretendia realizar análises de processos de longa duração para permitir uma melhor compreensão das “mentalidades”. Com essa nova concepção, a chamada História Nova deixava de ver a História a partir de uma sequência linear de acontecimentos. Segundo os historiadores dessa corrente, o tempo histórico apresenta ritmos diferentes para os acontecimentos. Para lidar com o passado de acordo com essa nova perspectiva, foram incluídos os domínios dos fatores econômicos, da organização social e da psicologia das mentalidades. Ao contrário da História Positivista, para quem os documentos por si próprios mostram todos os fatos sobre o passado, a Escola dos Annales acreditava que os historiadores deveriam fazer perguntas às fontes para obrigá- las a dar o maior número possível de informações. Resumindo: não basta ler um documento escrito. É preciso tirar dele as informações que estão nas entrelinhas! Outra mudança que vai ser promovida pelos Annales se refere aos sujeitos históricos. Se até o momento a História se interessava somente por homens importantes do passado, normalmente relacionados a situações políticas e religiosas, a Escola dos Annales vai afirmar que todas as pessoas são importantes para se conhecer o passado. A intenção agora era dar voz às pessoas comuns: as mulheres da antiguidade e sua forma de pensar e agir, as 43 crianças operárias durante a industrialização no século XVIII, as relações homossexuais em diferentes épocas e locais, o imaginário dos marinheiros durante as grandes navegações, a vida dos negros escravizados no Brasil, entre várias outras possibilidades. Os sujeitos históricos não são mais apenas os homens, muito menos os homens poderosos! Mídias Assista ao filme “Uma cidade sem passado” (1990) Link: https://www.youtube.com/watch?v=kKiykbMCtRM Para conhecer o passado dessas pessoas comuns também era preciso das fontes históricas. Só que agora, era necessário ampliar a concepção de fonte histórica, pois apenas os documentos oficiais, escritos, não eram suficientes. Assim, as fontes históricas foram diferenciadas em dois tipos: material ou imaterial. As fontes materiais se referem a documentos como diários, cartas, fotografias, filmes ou achados arqueológicos como esqueletos, vasos de cerâmicas, pinturas rupestres. Já as fontes imateriais dizem respeito às festas, receitas culinárias, danças, entre outros. Além de aumentar as possibilidades de estudos históricos com a utilização de novas e diferentes fontes históricas, também foram ampliadas as pesquisas sobre o passado das pessoas a partir de aspectos relativos à existência e tratamento de doenças, mentalidades com relação à existência de epidemias, relação com a morte, religiosidade, características da alimentação, festas típicas,entre tantos outros exemplos relacionados ao comportamento humano ao longo do tempo. https://www.youtube.com/watch?v=kKiykbMCtRM 44 Curiosidade O Diário de Anne Frank é considerado o diário mais famoso do mundo e narra a vida da adolescente Anne enquanto esteve escondida, junto com sua família, durante a Segunda Guerra Mundial. É, portanto, considerado uma rica e importante fonte histórica! 4.2.1 Uma nova metodologia em sala de aula A História Nova procurou romper completamente com a ideia positivista. Como já vimos, a ideia de fonte histórica foi ampliada e, assim, os historiadores deixavam de ver os documentos de forma passiva. A ideia agora era a de que deveriam dialogar, interrogar, analisar as fontes e obter o maior número de informações sobre o passado para produzir conhecimentos. Imagine um historiador diante de uma múmia egípcia. De acordo com o positivismo ela, por si só, revelava as informações consideradas importantes para a História. Agora o historiador vai “dialogar” com essa múmia e, como um detetive, tentar descobrir o maior número possível de informações sobre ela: era homem ou mulher? Com que idade morreu? Há quanto tempo morreu? Que atividade realizava? Que alimentos consumia? Era alguém da nobreza ou do povo? Que elementos indicam essas características? Nas aulas de História, essa forma de compreender as fontes históricas possibilitou aos professores que motivassem os estudantes em busca do conhecimento histórico, estimulando sua relação com o passado, com a memória e com o conhecimento produzido por outras pessoas por meio da empatia histórica. Percebemos que esse novo olhar sobre as fontes históricas deslocou para os alunos o centro do processo ensino-aprendizagem e o professor passou a ser o orientador. 45 Vocabulário Empatia histórica: capacidade de se colocar no lugar de outro, de tentar pensar e ver o mundo com outros olhos, outras mentalidades, em diferentes temporalidades. A utilização de uma grande variedade de fontes históricas se tornou um importante instrumento pedagógico nas aulas de História, fazendo com que os alunos substituíssem a passividade por uma relação mais próxima com os sujeitos e acontecimentos do passado. Mas, atenção! As fontes históricas, por si só, não trazem informações sobre o passado. Somente com as questões feitas a elas é que se tornam evidências de um determinado passado. Você lembra da ideia de que o historiador deve agir como um detetive? Muitas perguntas podem ser feitas e muitas respostas podem ser obtidas! Se até então, o interesse se dava somente pelo estudo da vida de alguns homens, agora todos os homens, e não somente eles, passavam a ser entendidos como sujeitos da História. As mulheres, os pobres, os índios, os africanos e os trabalhadores passaram a ser estudados em toda sua amplitude. Temáticas sobre gênero, mentalidades, crenças, revoltas, rebeliões tornaram-se interessantes aos historiadores. O cotidiano das pessoas mais simples passou a ser o foco de interesse e, assim, era necessário conhecer as relações familiares, as festas, o tratamento dado às mulheres e crianças. Tudo o que envolvia o universo cultural das pessoas, como festas, costumes, religiosidade e mentalidade passaram a fazer parte dos estudos históricos. Por esse motivo, a História Nova passou a se preocupar com tudo aquilo que as pessoas fizeram no passado e fazem no presente, dando um novo sentido ao tempo histórico. Lembra-se da múmia egípcia? Você sabia que, em locais diferentes e em outras épocas, variados povos também realizavam a mumificação? Logo, a 46 História Nova passou a compreender que há diferentes formas de viver e de registrar o tempo, diferente da forma cronológica e linear. Conclusão da aula Nesta aula, fizemos uma viagem por duas das principais correntes teóricas da História. Pudemos conhecer como a História, ao ser considerada ciência, recebeu um tratamento específico com o Positivismo. Esse caráter científico deu à História uma metodologia específica de pesquisa, porém “engessou” a ideia de sujeitos e fontes históricas, pois, assim como somente os documentos escritos eram considerados como referências do passado, apenas os homens ricos e importantes eram considerados para conhecer ideias e comportamentos. Ainda no século XIX, uma nova forma de compreender a História foi possível com o Marxismo. As relações desenvolvidas entre as diferentes classes sociais deram um novo significado à História. Finalmente, já no começo do século XX, a Escola dos Annales trouxe novas concepções de fontes históricas e de sujeitos históricos. A História rompia a ideia de um mundo formado somente por homens ricos e abria as portas para que pudéssemos conhecer a vida, as ideias e os comportamentos de mulheres, crianças e pessoas simples. A História se aproximava da vida cotidiana e de nós mesmos. Atividade de aprendizagem 1) A História da alimentação é uma nova corrente de estudos que se desenvolveu nos últimos tempos. Faça uma investigação para saber como essas pesquisas se relacionam com o que estudamos nesta aula. 2) Assim como “O Diário de Anne Frank” há outros diários de guerra que podem ser utilizados como fontes históricas. Pesquise quais são eles e procure descobrir como eles podem ser utilizados em aulas de História. 47 Aula 5 – Conteúdos históricos na sala de aula Apresentação da aula A História é uma ciência que nos apresenta uma quantidade enorme de informações e curiosidades. Temos tantas opções! Desde a história do futebol, do bordado, dos índios da floresta Amazônica, das pirâmides do Egito e do México, das famílias chinesas, da vida dos piratas, das religiões africanas... Podemos fazer uma lista quase infinita de possibilidades de estudo sobre o passado. A História é muito rica! Mas, como determinar quais dessas histórias devem ser ensinadas? Quais e quantas dessas históricas podem ser contempladas num currículo, seja de um Curso superior de História, seja nas séries escolares da Educação Básica? 5.1 O currículo escolar A História, assim como outras disciplinas escolares como a Matemática, a Língua Portuguesa, a Geografia e tantas outras, há algumas décadas já faz parte da vida diária de estudantes e professores. Temos até a impressão de que a organização curricular sempre foi assim. No entanto, é importante saber que, ao longo do tempo, houve momentos em que algumas disciplinas foram ocupando ou sendo removidas dos espaços escolares, como é o caso da própria História. Foi a partir do início do século XX, mais especificamente por volta de 1910, que as escolas passaram a dividir os conhecimentos escolarizados em “disciplinas”. Já naquela época, as coisas não foram muito fáceis, pois houve um processo de disputa entre os conhecimentos para determinar quais eram aqueles que mereciam fazer parte do currículo escolar. Uma coisa era certa: desde o final do século XIX já havia um consenso sobre a necessidade de organizar um currículo que tivesse uma característica mais humanística, voltada para o estudo das línguas e da literatura. É importante enfatizar que essa concepção estava voltada para a formação de uma elite que teria acesso às obras literárias e à cultura clássica. Era essa formação humanista que iria formar os intelectuais e líderes políticos. 48 Mas nessa mesma época, com o desenvolvimento da industrialização e a necessidade de especialização da mão de obra, passou a acontecer a valorização de conhecimentos das áreas das Ciências Exatas. O processo de industrialização tornava importante ter acesso a conhecimentos do campo da Biologia, da Química, da Física e da Matemática. Assim, as escolas passaram a contar, em seu currículo, com disciplinas desses dois campos do conhecimento. A formação escolar passava a acontecerpor meio de disciplinas “humanísticas” e “científicas”! Era preciso, agora, definir as finalidades de cada disciplina e selecionar os conteúdos que deveriam ser ensinados, assim como os métodos que possibilitassem a sua aprendizagem. Assim como todas as outras disciplinas, a História faz parte de um sistema educacional que possui especificidades no processo de organização e constituição do chamado conhecimento escolar. Mas o que seria esse conhecimento escolar? Qual o conhecimento deve ser levado para a escola e para os estudantes da Educação Básica? Diversos pesquisadores e estudiosos dos currículos escolares têm se debruçado sobre esse questionamento. Entre eles, os pesquisadores franceses e ingleses têm tido destaque no que se refere às disciplinas escolares e aos conteúdos que devem ser ensinados. 5.2 Transposição didática ou não? Para uma parte desses pesquisadores franceses e ingleses, as disciplinas escolares são resultado das pesquisas desenvolvidas nas universidades, sendo, portanto, resultado das ciências de referência. Isso, grosso modo, significa afirmar que é nas Universidades que os especialistas, os cientistas formados realizam as pesquisas e produzem o conhecimento que, por sua vez, será adaptado para que possa ser repassado, de maneira bem mais simplificada, para os estudantes da Educação básica. Para o matemático francês Yves Chevallard, essa forma de organização das disciplinas escolares é chamada de transposição didática. De acordo com essa abordagem, as disciplinas escolares, caso da História, são dependentes do conhecimento considerado verdadeiramente científico e, portanto, necessitam 49 de uma adaptação para chegar aos estudantes, ou seja, precisam da didática para atingir seu objetivo. É, portanto, a didática, a responsável por promover a transposição do conhecimento científico para a sala de aula. Figura 5 – Livro A Transposição didática, de Yves Chevallard. Fonte: Acervo pessoal da autora. A transposição didática também promove a ideia da existência de uma hierarquia de conhecimentos. Sob esse ponto de vista, os pesquisadores das Universidades são os verdadeiros pesquisadores, os cientistas que produzem o conhecimento científico autêntico; já nas escolas, os professores seriam meros reprodutores de um saber simplificado do conhecimento científico para que seja possível a compreensão dos estudantes. Compete, então, aos professores, a utilização de técnicas pedagógicas, de uma didática, que garanta a aprendizagem. Importante De acordo com a concepção da Transposição Didática, o professor é apenas um intermediário no processo de aprendizagem. O que o destaca é sua capacidade de transpor e reproduzir o conhecimento da melhor maneira possível. A disciplina escolar, portanto, passa a ser entendida como uma “metodologia”. 50 Para outros estudiosos, como o historiador francês André Chervel, no entanto, as disciplinas escolares não podem ser pensadas somente de acordo com essa concepção de “transposição didática” de um saber científico. Elas devem ser entendidas como uma organização muito mais complexa que envolve vários outros conhecimentos além do científico e do escolar. Chervel é um dos maiores críticos a essa forma de entender as disciplinas escolares, pois considera que essa concepção de transposição didática organiza as disciplinas a partir da ideia de uma hierarquia dos conhecimentos. Para esse historiador é preciso valorizar a potencialidade da escola como local também de produção de conhecimento. Ao invés de separar o conhecimento científico desenvolvido pela Universidade e os saberes comuns, a escola deve ser entendida como um local que consegue trabalhar com vários outros saberes e isso produz aquilo que Chervel denomina de “cultura escolar”. Portanto, é justamente dentro dessa cultura que as disciplinas escolares se organizam e passam a definir objetivos próprios, tornando-se autônomas! Assim, embora faça parte de uma organização mais complexa que envolve vários agentes internos e externos, a escola é uma instituição que se destaca pela capacidade de produção de um saber específico. Sendo assim, as disciplinas não podem ser entendidas somente como momentos de desenvolver metodologias para a aprendizagem de um conhecimento considerado científico. 5.3 A História como disciplina escolar A disciplina de História nasceu, ainda no século XIX, nas escolas primárias, com a missão de promover uma “história nacional”. A partir dessa concepção, métodos e técnicas foram sendo organizados para promover um projeto pedagógico que tinha como objetivo o desenvolvimento de uma “identidade nacional”. Fazendo parte das “escolas de primeiras letras”, os professores utilizavam textos como a Constituição do Império para que os estudantes exercitassem a leitura e, ao mesmo tempo, fortalecessem o sentimento nacionalista e o respeito à pátria. Assim, desde os primeiros tempos da presença do ensino de História nas escolas brasileiras, essa disciplina esteve voltada para uma formação moral e cívica. 51 Outra característica marcante durante o Império e início da República foi com relação ao ensino da História Sagrada. Apesar da República ter tornado o Brasil um Estado laico, a Igreja Católica ainda tinha grande influência sobre a concepção educacional e a doutrina religiosa acabava sendo mais difundida do que a História profana. Assim, as aulas de História se utilizavam de estudos sobre a vida de santos, personagens considerados como exemplares para atingir o objetivo de uma educação moral e cívica. A História do Brasil, nesse período, era optativa e cabia aos professores decidir se iriam trabalhar com esse conteúdo ou não. Em caso de optar por essa História, a narrativa seguia a mesma linha de exaltar a vida e os feitos dos grandes personagens da vida pública indicados como exemplos a serem seguidos. No final do século XIX, com a abolição da escravatura e a proclamação da República, foi ampliado o público que passou a ter acesso à escola primária. Isso, no entanto, não ampliou o enfoque com relação aos sujeitos que compunham a sociedade brasileira e mereciam ser estudados, caso de indígenas e africanos. Pelo contrário, essas mudanças políticas e sociais reforçaram a ideia da necessidade de ampliar o conceito de cidadania e, para isso, os feitos dos “grandes homens” deveriam ser cada vez mais valorizados! A História, assim, tinha a tarefa de ensinar sobre as “tradições nacionais”, buscando desenvolver o sentimento patriótico. Os livros didáticos da disciplina de História eram formulados para apresentar uma pátria sem guerras ou conflitos, em que prevalecia a harmonia entre as diferentes raças. Originada a partir da chegada dos portugueses, europeus civilizados, a pátria brasileira era marcada pelo pacifismo de um povo cristão. É importante ressaltar que houve quem questionasse esse olhar sobre a disciplina de História. Alguns educadores, como o professor Manoel Bomfim (1868-1932), eram contrários a essa ideia de valorização de um passado em que predominavam sujeitos brancos e que tinha como objetivo atingir o mesmo grau de uma suposta civilização europeia. Eles acreditavam que era preciso valorizar a história americana e buscar entender como se processou a miscigenação cultural que deu origem ao povo brasileiro. 52 Para implementar estudos sobre as sociedades americanas, Manoel Bomfim usou como estratégia uma abordagem sob outra concepção da história da civilização que serviria como meio de confrontar o domínio de uma cultura sobre as demais, opondo “civilizados e selvagens” e, consequentemente, serviria de instrumento para enfrentar o racismo difundido pelas teorias da superioridade da raça branca ariana sobre mestiços e negros e índios, ou seja do “povo brasileiro”. Para implementar o novo currículo,Manoel Bomfim promoveu um concurso público para a composição de um manual sobre História da América, cujo vencedor foi o Compêndio de História da América, de Rocha Pombo. BITTENCOURT, Circe Fernandes. Reflexões sobre o ensino de História. Estud. av. vol.32 no.93 São Paulo May/Aug. 2018. S/p. Disponível em: https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103- 40142018000200127&script=sci_arttext#fn10 – Acesso em 20/08/2020. A partir da década de 1930, sobretudo com a criação do Ministério da Educação, foi consolidada ainda mais a ideia de uma história nacional e patriótica! As aulas de História fortaleceram o culto aos heróis da pátria, como o caso de Tiradentes, eleito o grande herói nacional. Do mesmo modo as comemorações do 07 de setembro foram oficializadas, passando a integrar os calendários escolares. 5.3.1 A História nas escolas de nível secundário A História entra, oficialmente, nos currículos do ensino secundário em 1838, no Colégio Pedro II. Naquela época, a História integrava o currículo dentro da área do “humanismo clássico”. Sem nenhuma utilidade prática imediata, os estudos do Latim e da literatura clássica da Antiguidade permitiam aos jovens demonstrarem que pertenciam a uma classe privilegiada, a uma elite “letrada”. A organização curricular do Colégio Pedro II foi muito importante, principalmente porque era usada como modelo para todos os colégios secundários existentes em vários lugares do país. Assim como nas escolas primárias, o predomínio da religião ainda era grande, o que incluía o estudo de uma História religiosa. Com forte inspiração francesa, o ensino de História tinha 53 como base o estudo da História Geral, já dividida de acordo com uma cronologia e marcos temporais representados por grandes episódios da História europeia: História Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea. Com as pesquisas e produções desenvolvidas por historiadores do Instituto Histórico e Geográfico do Brasil (IHGB), principais responsáveis pela criação do Colégio Pedro II e também professores dessa instituição, a História do Brasil ganhou um espaço próprio. Embora tivesse um caráter de disciplina complementar aos conteúdos gerais e fosse apresentada aos estudantes somente nas séries finais de estudo, trazia as bases de uma história nacional. Ela estava dividida em períodos definidos de acordo com acontecimentos políticos que se iniciavam com a “descoberta” do Brasil e se desenvolvia a partir de ações europeias, como a cristianização, a colonização e o próprio processo de independência. 5.4 A História nos currículos escolares do século XX No final do século XIX, no Brasil, muitas críticas foram feitas ao currículo humanístico. A partir das ideias que buscavam favorecer a modernização do país nos moldes da industrialização e do desenvolvimento do capitalismo, diversas pessoas, como o filósofo Gaston Bachelard, passavam a defender um currículo que garantisse o ensino das ciências da natureza. Disciplinas como a Química, a Física e a Biologia estavam muito mais de acordo com esses interesses, o que determinou a organização dos currículos escolares. A História teve que se adequar a esses interesses, adotando uma função mais pragmática. Assim, a ideia de uma História da Civilização, sempre relacionada aos acontecimentos europeus, passou a ser o grande referencial, sempre articulada aos quatro grandes períodos históricos (Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea), separando-se definitivamente da História sagrada. Desenvolvida a partir da influência iluminista, a História escolar buscava fortalecer a ideia da racionalidade humana e na necessidade de valorização do Estado e da nação como garantia para se atingir o progresso. A cronologia era fundamental para o ensino de História, pois assim se garantia a organização dos conteúdos que tinham, como objetivo, demonstrar o caminho até o progresso. 54 Importante É importante ressaltar que, no final do século XIX, se desenvolveu a teoria de que a Europa era superior tecnológica e culturalmente, sobretudo porque era formada por uma população branca. Essas características acentuavam a concepção de que a evolução já teria acontecido na Europa e, portanto, aquele continente já teria atingido um maior grau de progresso. Com um interesse político, o ensino de História tinha como objetivo garantir à elite que seus filhos estariam recebendo uma educação voltada para a conscientização de sua condição como futuros líderes políticos. Estudar e entender a sua cidadania, assim como desenvolver uma moral cívica eram fundamentais. Prevalecia a ideia de que a identidade nacional estava fortemente relacionada com os acontecimentos europeus, afinal, fomos colonizados por Portugal, o “berço de nossa nação”, e a história do Brasil tinha surgido devido às ações europeias. Nesse contexto, a História do Brasil se apresentava como um conteúdo complementar, o que explica até mesmo a ideia de que nossa história se inicia somente em 1500, após a chegada dos portugueses. O mesmo acontecia com a história da América, que só entrava como conteúdo escolar quando associada aos episódios europeus, ou seja, a partir da expansão marítima e da colonização europeia. Considerando essa ideia de que a história nacional só merecia ser destacada a partir das realizações europeias, a referência ao povo brasileiro, formado por índios, negros e mestiços, também era desconsiderada. Acreditava- se que só mereciam lugar nas aulas de história os sujeitos considerados como os responsáveis pela formação e organização da nação, dando ênfase aos líderes políticos. Apesar das grandes transformações ocorridas na educação brasileira a partir da década de 1930, esse enfoque sobre a história do Brasil não teve mudanças. A história nacional, assim como a história da América, se manteve como complemento à história europeia. 55 Foi somente com a Lei 4.244 de 1942 que a História do Brasil tornou-se mais presente nas escolas com uma carga horária maior. Ficou estabelecido que o ensino secundário seria dividido em duas etapas: o curso ginasial, com duração de quatro anos, e o curso colegial, separado em dois níveis: clássico e o científico, com duração de três anos. Nas décadas seguintes, houve grandes críticas à forma como acontecia o ensino de História e muitos educadores defendiam a necessidade de se alinhar os conhecimentos sobre a história política com a história econômica. O objetivo? Fazer com que os estudantes entendessem seu papel e sua situação como trabalhadores no processo de desenvolvimento capitalista que acontecia no país. Apesar dessas críticas, não houve nenhuma sugestão de modificar o enfoque eurocêntrico ou a concepção de civilização no ensino de História. Mantinha-se a concepção de que a história nacional tinha começado graças às ações dos portugueses e de que nossa nação era formada por elementos exclusivamente brancos e cristãos. Na década de 1970, em plena Ditadura Civil-militar, uma nova e grande mudança no ensino de História durante o Primeiro Grau, hoje Ensino Fundamental, se fez presente a partir da Lei 5.692/71, que instituiu o ensino dos Estudos Sociais. Ao abolir as disciplinas de História e de Geografia, com os Estudos Sociais o Estado pretendia levar para as escolas um ensino voltado para os interesses políticos de formação moral e cívica, o que, aliás, era complementado com o ensino da disciplina de Educação Moral e Cívica, assim como de Organização Social e Política do Brasil. No Segundo Grau, atual Ensino Médio, a disciplina de História se manteve, porém com uma carga horária menor. 5.5 A História se reinventa! Um marco para a reestruturação dos conteúdos de História, com certeza, foi o período da redemocratização política no final da década de 1980. Daquele momento em diante,muitas coisas foram repensadas e os currículos passaram a ser reorganizados. Os novos currículos que iam se formando estavam pautados pela necessidade de atendimento às camadas populares, com um enfoque voltado para a formação política. De especial relevância, foi a elaboração dos 56 Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN – 1997), responsáveis pela organização curricular do ensino fundamental e médio. A característica desse documento está baseada nos pressupostos da psicologia da aprendizagem de Piaget. Um detalhe importante sobre a organização desses currículos é a preocupação em estabelecer uma relação entre o ensino e a aprendizagem, diferente de correntes anteriores que focavam somente na questão de como ensinar. No caso das séries iniciais do ensino fundamental, os PCN promoveram a separação da História e da Geografia como campos do conhecimento específicos, em substituição aos Estudos Sociais. A organização dos conteúdos de História foi realizada de forma a romper com a ideia dos heróis e dos grandes personagens relacionados a “grandes acontecimentos”. Apesar da referência às datas comemorativas, foram introduzidos outros elementos e personagens históricos que merecem ser estudados nas aulas de História, como o caso do dia 20 de novembro, em que se comemora o Dia da Consciência Negra ou, mesmo, com um novo enfoque ao rememorar o dia 21 de abril, Dia do Índio, desmistificando os estereótipos. Entendendo a História como um campo específico de conhecimento, os PCN procuram enfatizar a necessidade de introduzir noções e conceitos históricos, os quais serão progressivamente trabalhados ao longo do período de escolarização. Importante Como conceitos históricos básicos que devem ser trabalhados nas séries iniciais estão a cultura, a organização social e do trabalho e as noções de tempo/espaço históricos. Essa noção de tempo histórico está associada à ideia de antes e depois, de geração e de duração, procurando romper com a concepção de tempo histórico como tempo cronológico. Ao estudar a concepção de tempo, essas novas propostas buscavam romper com a ideia dos círculos concêntricos, substituindo-os pela noção de 57 história local ou do lugar que busca promover uma relação entre o que está mais próximo dos estudantes e a história nacional, regional ou geral. O estudo da História, nesse caso, parte de questões do tempo presente para buscar, no passado, as respostas ao que se coloca. A problematização do estudo histórico, portanto, parte sempre do local e deve estar relacionada com a história do cotidiano. Dessa forma, os estudantes das séries iniciais passam a compreender que as pessoas comuns, como homens, mulheres, crianças e idosos são sujeitos históricos, diferente das concepções anteriores que enfatizavam os feitos dos “grandes personagens”. Além disso, nessa visão histórica torna-se fundamental o trabalho com as noções de diferenças e semelhanças, permanências e mudanças, propiciando uma análise mais ampla daquilo que está sendo estudado. Conclusão da aula Nesta aula, vimos que as disciplinas escolares foram sendo organizadas ao longo de tempo de acordo com vários interesses. No caso do ensino de História, além de criação de uma disciplina própria que seria ensinada nas escolas de educação básica, colocou-se sempre a questão sobre quais assuntos sobre o passado se deveria estudar. A seleção desses conteúdos não tem variado muito, mas depende da relação que o professor estabelece com a ciência histórica, podendo produzir conhecimento a partir de um olhar especial sobre o passado com o qual está lidando. Atividade de aprendizagem Normalmente, os conteúdos de História são pré-selecionados em currículos e sumários de livros-didáticos. Você acredita que o professor que dará aulas de História pode, também, fazer sua própria seleção dos conteúdos com os quais vai trabalhar? Por quê? 58 Aula 6 – Que ensino de História teremos no século XXI? Apresentação da aula A História é uma ciência que vive em constante transformação, por isso tudo o que se relaciona com seu conceito e com o ensino está sempre em movimento. Nesta aula, vamos ver como a História enquanto disciplina escolar tem sido tratada, sobretudo no Brasil, a partir da redemocratização política iniciada no final da década de 1980 até os dias atuais. Precisamos lembrar que, de 1964 a 1985, o Brasil viveu uma Ditadura civil- militar e que, nesse período, a História foi suprimida com a criação da disciplina dos Estudos Sociais. Com o retorno da História ao currículo escolar, muitas questões precisavam ser revistas, o que provocou novas mudanças na forma de pensar o seu ensino e sua aprendizagem. 6.1 A redemocratização e o ensino de História A partir do início do século XX, com o surgimento do termo “disciplina”, são elencados os conhecimentos, ou seja, os conteúdos a serem trabalhados nas escolas. Desse modo, surge também uma didática específica, influenciada pela Pedagogia e pela Psicologia, com uma normatização do que se deveria utilizar para o uso escolar do conhecimento. Cabia à escola, então, organizar os conteúdos e selecionar o que deveria ser ensinado em cada série e de acordo com cada faixa etária. Com o fim da Ditadura civil-militar, em 1986, a reivindicação pela volta da História e da Geografia ganhou maior expressão com o crescimento das associações de historiadores, como a Associação Nacional de História (ANPUH), e de geógrafos, Associação dos Geógrafos do Brasil (AGB). Mas que História deveria ser ensinada? Quais os conteúdos deveriam ser apresentados aos estudantes? Qual seria a melhor metodologia? Na década de 1980, as discussões sobre o retorno da disciplina de História aos currículos escolares se tornaram recorrentes, sobretudo no que se refere a que e como ensinar o conhecimento histórico. 59 A década de 1980, portanto, foi fundamental para se discutir o papel da História e dessa disciplina escolar. Como ela se tornava uma disciplina independente de novo, era preciso discutir o que seria ensinado e de que forma isso iria acontecer. Figura 6 – A escola democrática Fonte: Schutterstock (https://image.shutterstock.com/image-photo/group-students- studies-class-her-260nw-1118557286.jpg) 6.1.1 A transposição didática Com o retorno da disciplina de História no final da década de 1980, uma coisa era certa: não se aceitava a chamada “transposição didática”, presente nas escolas. Lembre que, de acordo com essa teoria, os saberes científico e escolar são diferentes devido ao seu contexto, espaços, objetivos. Desse modo, o conhecimento científico deve ser adaptado para poder ser ensinado aos estudantes da Educação Básica. Não há relação entre o saber acadêmico e o saber ensinado, então, esses dois conhecimentos não se encontram. O conhecimento científico, na escola, passa por um processo de “pedagogização” e a escola torna-se, portanto, o grande referencial para falar em nome da ciência. A transposição didática, portanto, foi apresentada como um movimento que traduz o processo de transformação do saber acadêmico em objeto de ensino de uma disciplina específica, ou seja, parte-se do conhecimento científico para 60 o conhecimento escolarizado. Desse modo, o conhecimento científico deve ser adaptado para poder ser ensinado aos estudantes da Educação Básica. De forma resumida, essa teoria se fundamenta na ideia de que aquilo que se aprende nas escolas é a reprodução de um conhecimento que foi pensado e elaborado nas universidades. Os professores, portanto, tomariam esse conhecimento elaborado e o transformariam, deixando mais simples e fácil de ser compreendido pelos estudantes. Aqui no Brasil, com o retorno da disciplina de História às escolas, no entanto, essa ideia da “transposição didática” não foi bem vista.Diversos historiadores e educadores passaram a destacar a importância da escola como local de produção de conhecimento, contrariando a concepção proposta de que os professores em suas salas de aula, simplesmente, reproduzem os saberes elaborados pelas universidades. Curiosidade O conceito de Transposição Didática foi desenvolvido, originalmente, pelo sociólogo Michel Verret, mas foi Yves Chevallard quem o popularizou utilizando essa ideia na Didática da Matemática. 6.2 Um novo ensino de História? Acredita-se que, para que alguém seja considerado um bom professor, é preciso ter Didática, um campo da Pedagogia que se refere às técnicas e métodos de ensino necessários para a realização das aulas, independente da ciência de referência. Historicamente, a função da didática se concentra na ideia de que a ela cabem todas as orientações voltadas para as ações exigidas para as atividades dos professores no ambiente escolar e, sobretudo, dentro de uma sala de aula, tais como a seleção dos conteúdos, elaboração das aulas, postura diante dos alunos, utilização de materiais alternativos. Com o retorno do ensino da História como uma disciplina autônoma, a existência de uma Didática específica da História passa a ganhar destaque, pois é associada diretamente a uma ciência de referência e, portanto, entendida 61 enquanto disciplina científica. Nesse caso, os professores devem fazer com que os estudantes se apropriem dos processos de construção do conhecimento histórico e, ao se apropriar desses processos, eles passam a ter condições de se apropriar da própria ciência. Importante Perceba que essa ideia de uma didática própria da História é completamente diferente daquela da transposição didática, pois ela acredita que os estudantes devem se relacionar com o conhecimento científico, assim como aquelas pessoas que estudam História na universidade. A ideia, portanto, não é simplificar o conhecimento científico para, então, apresentar aos estudantes. De acordo com essa ideia de trabalhar com o conhecimento científico, uma grande novidade do período da abertura democrática no Brasil e do retorno do ensino de História nas escolas, foi a utilização das fontes históricas e dos recursos tecnológicos (filmes, músicas, projeções de imagens) como elementos fundamentais para a aprendizagem histórica em sala de aula. Vale lembrar que, na década de 1980, o vídeo cassete começa a se popularizar e os filmes são introduzidos nas aulas de História. Acreditava-se que a utilização das “novas linguagens” disponíveis na época era a prova de que os professores da Educação Básica tinham uma visão das possibilidades de utilização de fontes e metodologias diversificadas, portanto, estavam em constante produção de conhecimento. Como resultado da restauração das liberdades individuais, as discussões sobre reformas democráticas na Educação repercutiram nas novas propostas para o ensino de História, levando a uma produção diferenciada de materiais didáticos e à elaboração de novas propostas curriculares. Assim, toda a década de 1980 seria marcada por um intenso debate em torno do ensino de História, o qual se expressou na realização de congressos, seminários, reformas curriculares, publicação de coletâneas. Tais atividades revelam uma forte disposição para o redimensionamento das teorias, métodos, conteúdos e linguagens de ensino da disciplina. 62 6.3 A Legislação e o ensino de História Na década de 1990, a legislação educacional brasileira trouxe novas mudanças quando o Ministério da Educação divulgou as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), 1996, e os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para o Ensino Fundamental e Médio. O Ensino Fundamental foi organizado de forma que as disciplinas ficaram concentradas em áreas do conhecimento. A História foi mantida em sua especificidade, mas ficava integrada às demais disciplinas através dos chamados “temas transversais”. No artigo 2° da LDB, o documento destacava a finalidade da educação: o preparo para o exercício da cidadania, e qualificação para o trabalho. No caso do Ensino Médio, as Diretrizes Curriculares determinaram que o currículo estivesse organizado em áreas do conhecimento, sendo que a História, junto com a Geografia, a Sociologia e a Filosofia, integraria as ciências humanas e suas tecnologias. No artigo 35, a LDB afirma que os objetivos do ensino de História visam à consolidação e ao aprofundamento dos conhecimentos, ao mesmo tempo em que prepara o aluno para o trabalho e para a cidadania, baseado em orientações éticas, além de possibilitar a compreensão dos fundamentos científicos e tecnológicos de nosso tempo. O ensino de História deve estar atento ao desenvolvimento de três conceitos fundamentais: o fato histórico, o sujeito histórico e o tempo histórico. Com esses conceitos, acredita-se que seja possível o desenvolvimento da consciência humana, pois os estudantes serão conduzidos a conhecer e compreender suas identidades individuais, assim como as sociais e coletivas. Do mesmo modo, o ensino de História deveria se dedicar ao estudo do local para poder entender a relação existente entre o particular e o geral, construindo noções de diferenças e semelhanças, de mudanças e permanências. Ao conhecer a História da sua localidade, os estudantes terão maior facilidade de fazer a relação com outras localidades, em diferentes épocas, formadas por diferentes sujeitos. Também poderão perceber a existência das diferenças ou semelhanças, das mudanças ou permanências. Mais uma vez a visão de uma História linear e cronológica é negada! 63 Mas como levar os estudantes a se relacionar com o passado de forma mais ampla? A ideia dos PCNs, justamente, recai sobre a necessidade de selecionar e se apropriar de partes dos resultados acadêmicos, articulando-os de acordo com os objetivos das aulas de História na Educação Básica. Para tanto, os conhecimentos prévios dos estudantes devem ser valorizados, assim como a utilização da maior quantidade possível de vestígios do passado, ou seja, de fontes históricas das mais variadas origens. 6.3.1 Novos desafios: História da África e cultura afro-brasileira e indígena Os currículos de História produzidos após a Lei de Diretrizes e Bases de 1996, assim como as propostas dos Parâmetros Curriculares Nacionais de 1997 se estenderam para todos os níveis de ensino, incluindo escolas das comunidades indígenas e quilombolas. A introdução de novos conteúdos históricos, com base em seu compromisso de formação de uma cidadania democrática, promoveu uma grande mudança na seleção dos conteúdos. A ideia da pluralidade cultural foi tomada como elemento fundamental para o ensino de História. Após anos de debates e lutas de movimentos sociais, como o movimento negro, foram introduzidas a História da África e da cultura afro-brasileira e a História dos indígenas nos currículos da Educação Básica. Em 2003, o Governo Federal elaborou a Lei 10.639, alterando a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelecia as Diretrizes e Bases da Educação Nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira". Pouco tempo depois, em 2008, a Lei 11.645 alterou a Lei 10.639/2003, para incluir no currículo oficial da rede de ensino também a obrigatoriedade da temática “História e cultura afro-brasileira e indígena”. De acordo com a legislação, todas as disciplinas, especialmente a História, a Geografia e a Literatura, devem incorporar a contribuição dos negros e indígenas à cultura brasileira. 64 Reflita Para você, qual a importância de se incluir o estudo da História da África e dos povos indígenas nas aulas de História? Como a escola é considerada um dos principais lugares para refletir, ensinar e aprendersobre a variedade cultural que forma o Brasil, a música, a dança, a culinária, a fala, a literatura, a forma de se vestir, os costumes e tantos outros aspectos devem estar presentes nos currículos. As Diretrizes mostram enorme preocupação com relação à importância que a escola tem nesse processo de valorização da cultura afro-brasileira e indígena e nas formas de inserção dessas populações. Para isso, podemos perceber que o papel dos professores também é fortalecido, pois espera-se que eles tenham, como referência, princípios relativos à consciência política e histórica da diversidade que forma a sociedade brasileira. Na última década, os livros-didáticos de História tiveram que se adequar incluindo os conteúdos sobre e História da África e da cultura afro-brasileira. Do mesmo modo, uma grande quantidade de livros sobre essa temática e sobre a História indígena passaram a povoar as livrarias, assim como passaram a ser inseridos nas escolas. O dia 20 de novembro, data da morte de Zumbi dos Palmares, virou feriado em alguns estados do Brasil e a celebração do dia da consciência negra foi incorporado como uma data de estudos e de reflexão. Mas é importante destacar que, apesar da inclusão desses conteúdos, eles ainda aparecem nos currículos submetidos à lógica eurocêntrica: a História indígena ainda é mencionada dentro do conteúdo “descobrimento do Brasil”, assim como a história e cultura africana e afro-brasileira ainda está relacionada com o processo da escravidão africana. 65 Saiba mais Por que é importante estudar a história da África nas escolas? Acesse: https://www.brasildefato.com.br/2019/07/03/por-que-e-importante- estudar-a-historia-da-africa-nas- escolas/?fbclid=IwAR07laAp3w3lwpTuYAFXTyyO5q8X8ud1_Tm- ogXvKHjn08GmzAgeU77W_pk 6.4 A Base Nacional Comum Curricular e o ensino de História Nos últimos anos, a discussão de um novo documento sobre a educação e, consequentemente, sobre o ensino de História foi formalizado. Resultado de discussões que vêm se desenvolvendo desde a promulgação da Constituição brasileira de 1988, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), foi apresentada oficialmente entre 2017 e 2018. A Base Nacional Comum Curricular é um documento que determina as competências, as habilidades e as aprendizagens essenciais que todos os estudantes devem desenvolver durante cada etapa da educação básica (Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio). Ela também determina que essas competências, habilidades e conteúdos devem ser os mesmos, independentemente de onde as crianças, os adolescentes e os jovens moram ou estudam. Desde que a primeira versão desse documento foi apresentada, os professores, entidades e outros sujeitos ligados ao ensino de História manifestaram desagrado. Um dos motivos deve-se à própria elaboração do documento, sem a participação de especialistas em História ou em ensino de História; uma segunda questão se refere à seleção dos conteúdos, uma vez que na primeira versão do documento foram excluídos conteúdos como história Antiga e Medieval. Passada essa primeira discussão e com a reinserção desses conteúdos a partir da terceira versão apresentada em 20/12/2017, a História e a Geografia foram contempladas como componentes curriculares, desde o primeiro ano do ensino fundamental, integrantes da área de Ciências Humanas. O documento 66 define para as escolas de todo território nacional, a Base Comum Curricular de História, estruturada em: Competências Gerais da Base; Competências Específicas de História para o Ensino Fundamental; Unidades Temáticas, Objetos de Conhecimento e Habilidades a serem desenvolvidas em cada uma das etapas/anos do ensino fundamental. O documento apresenta algumas das perspectivas recorrentes no debate da área de ensino de História como a importância de estabelecer relações entre passado e presente. Vemos também um grande destaque na utilização de diferentes fontes históricas e tipos de documentos. Outro ponto importante se refere à interdisciplinaridade, pois estabelece que a História deve permitir a relação entre os saberes, possibilitando aos estudantes reconhecer a estreita relação entre os saberes escolares e a vida social. Mas as críticas continuam! Inicialmente, a BNCC apresenta uma visão cronológica da História e podemos ver isso, particularmente, com relação ao ensino fundamental. A BNCC retoma uma metodologia há muito deixada de lado, que é a dos chamados “círculos concêntricos”. Mas o que seriam esses círculos? De acordo com essa perspectiva, as crianças devem iniciar o estudo de História a partir daquilo que está mais próximo, como a sua própria história, a história da família, do bairro e assim por diante para a história do mais distante, numa perspectiva linear. Tal concepção, além de linear, também reafirma a visão eurocêntrica da História. Isso tudo apesar de algumas “pitadas” de história da África, dos afrodescendentes e povos indígenas. Conclusão da aula Nesta aula, fizemos uma rápida jornada sobre a forma como a disciplina de História foi entendida e organizada a partir da reabertura política na década de 1980. Aqui, pudemos perceber o quanto a História é uma disciplina dinâmica, promovendo discussões sobre a forma de entender o passado e de aprender sobre ele. Como disciplina em constante movimento, novos sujeitos e 67 metodologias foram sendo incorporados, tendo elogios e críticas, como no caso da elaboração da Base Nacional Comum Curricular. Conhecer a teoria e a legislação que regem o ensino de História é muito importante para compreender como é possível trabalhar com essa disciplina e a forma como os materiais são elaborados. Atividade de aprendizagem 1) Faça a leitura da Lei 11.645/08 e observe como o ensino da História e cultura afro-brasileira e indígena é proposta. 2) Pesquise a BNCC e leia a parte que se refere à disciplina de História. Aula 7 - Professores pesquisadores e a produção do conhecimento Apresentação da aula Nesta aula, veremos que o ensino de História só é possível com o auxílio das fontes históricas! Para ter acesso ao conhecimento histórico, é preciso agir como os detetives e isso só é possível a partir da investigação de pistas deixadas por aqueles que viveram em outras épocas. No caso do trabalho dos detetives, eles procuram provar a autoria de um crime que tem em si mesmo todo o universo de significados que se busca. Já o trabalho de professores ao ensinar História é semelhante a este, mas enquanto o detetive tem que descobrir um autor, o trabalho historiográfico já conhece a autoria e, com a ajuda das fontes históricas, vai buscar as motivações que envolveram as ações humanas num dado contexto. 7.1 Professores pesquisadores, sim! Discussões sobre o papel dos professores são muito férteis em várias direções, desde a sua formação inicial até a valorização salarial. Uma dessas discussões tem trazido à pauta, no caso da formação inicial e continuada, a perspectiva da pesquisa como princípio fundamental para que os professores se 68 reconheçam enquanto produtores de conhecimento, refletindo sobre sua prática cotidiana no ambiente escolar. As reflexões sobre o papel dos professores enquanto pesquisadores estão presentes há algum tempo, sendo muito abordado, sobretudo a partir da década de 1980, com o processo de redemocratização do país após o término da Ditadura Civil-Militar. Especificamente no campo do ensino de História, fez-se presente a necessidade de compreender o papel desses professores e sua relação com o conhecimento escolarizado com as primeiras discussões sobre o professor enquanto pesquisador. Após o longo período em que a educação brasileira foi controlada e manipulada pelos interesses da Ditadura Civil-Militar, o ensino de História no Brasil passou por um processode revitalização e de novos propósitos. A década de 1980, nesse sentido, foi muito importante para as novas discussões que surgiram em torno da forma como a História, sobretudo com relação ao seu retorno aos currículos escolares, seria tratada pela cultura escolar, o que caminhava junto com propostas nacionais sobre mudanças no que e como ensinar o conhecimento histórico escolarizado. Lembre-se de que durante o período da Ditadura Civil-Militar foram os Estudos Sociais que estiveram presentes nas escolas, pelo menos no então chamado Primeiro Grau, hoje Ensino Fundamental. Foi durante esse período de resgate da disciplina que passou a ser discutido o papel dos professores-pesquisadores. Esse conceito se baseava na ideia de que cabia ao professor adotar práticas de investigação acerca do seu próprio campo de atuação, atitude que permitiria ao profissional da docência tomar consciência da sua própria profissão, assumindo a postura de sujeito pensante e de profissional entendido enquanto intelectual. 69 Saiba mais SOBANSKI, Adriane de Quadros. Formação de professores de História: educação histórica, pesquisa e produção de conhecimento. UFPR: 2017. Tese de Doutorado. Disponível em: https://www.prppg.ufpr.br/siga/visitante/trabalhoConclusaoWS?idpessoal=323&i dprograma=40001016001P0&anobase=2017&idtc=1228 Acesso em 25 de agosto de 2020. 7.2 A importância da pesquisa para a produção do conhecimento Foi entre meados das décadas de 1960 e de 1970 do século XX, na Inglaterra, que a ideia de que os professores são também pesquisadores se iniciou. Mas por que da necessidade de falar sobre isso? Durante a década de 1980, as discussões sobre o papel dos professores como produtores de conhecimento se intensificaram. No caso do ensino de História, houve forte discussão para esclarecer a função dos professores da educação básica. Formados em História, tendo contato com sua ciência de referência eram, portanto, historiadores! Os professores, portanto, podem e devem se pensar e agir enquanto sujeitos produtores de conhecimento, com a competência de refletir sobre seu trabalho. Curiosidade Durante a década de 1980, no Brasil, Pedro Demo tornou-se referência com relação a uma ideia de prática de pesquisa no cotidiano escolar. Para esse autor, a pesquisa era definida enquanto princípio científico e educativo, colocando-a como imprescindível ao professor para sua elaboração própria, com o propósito de superar o que entendia como reprodução nas práticas pedagógicas. Perceba que essa ideia entendia que todos os professores são, também, pesquisadores! Nos anos 90 essas discussões se aprofundaram. Era necessário, de acordo com as novas concepções, repensar o papel dos professores no processo de ensino aprendizagem a partir de sua autonomia na realização da https://www.prppg.ufpr.br/siga/visitante/trabalhoConclusaoWS?idpessoal=323&idprograma=40001016001P0&anobase=2017&idtc=1228 https://www.prppg.ufpr.br/siga/visitante/trabalhoConclusaoWS?idpessoal=323&idprograma=40001016001P0&anobase=2017&idtc=1228 70 pesquisa e, portanto, da construção do conhecimento, o que deu origem ao conceito de Professor Pesquisador Reflexivo. Assim, essa perspectiva a respeito do papel da pesquisa passou a fazer parte constante das discussões sobre a formação de professores. A partir daquele momento, passou-se a discutir a importância de formar professores-pesquisadores capazes de transformar sua realidade e refletir sobre a sua própria prática. De acordo com o educador Paulo Freire, é fundamental que os professores mantenham uma reflexão crítica sobre a sua própria prática. Segundo ele, o ideal é que os professores passem daquilo que chama de “curiosidade ingênua” para a “curiosidade epistemológica”, o que somente seria possível por meio da pesquisa. 7.2.1 Onde e como pesquisar? Novamente, assim como os detetives que precisam de um crime para solucionar, para haver pesquisa histórica é preciso que existam problemas a serem resolvidos historiograficamente. A pesquisa é uma atividade pela qual o professor pesquisador deve responder, empiricamente, por meio das fontes, os problemas históricos. Vocabulário Epistemologia: estudo baseado no conhecimento científico. Empiria/empírico: conhecimento obtido a partir de atividade prática. Vamos pensar! A História tem como objeto de estudo os seres humanos ao longo do tempo e, assim, o passado é um tempo histórico fundamental. Conhecer as formas de pensar, de viver, de agir e de se relacionar das pessoas do passado só é possível a partir dos vestígios deixados por elas. E são esses vestígios que nos trazem as pistas que precisam ser olhadas, observadas, analisadas para construir o conhecimento sobre um determinado passado. 71 Figura 7 – Pesquisa histórica Fonte: Shutterstock (https://image.shutterstock.com/image-photo/efficient-businesswoman-sitting-office- desk-260nw-1557969245.jpg) Os documentos ou fontes históricas são os vestígios produzidos pelos seres humanos e que nos permitem ir até uma determinada parte do passado realizando uma investigação sistematizada. A valorização dos documentos ou das fontes históricas como recursos fundamentais para o trabalho dos historiadores se iniciou no século XIX. Foram eles que passaram a validar o trabalho historiográfico enquanto uma ciência com características e metodologias próprias. Naquela época, numa perspectiva Positivista, no entanto, somente os documentos escritos se apresentavam como um fiel retrato do que havia acontecido no passado e o trabalho dos historiadores era, simplesmente, narrar as coisas como “de fato tinham acontecido”. O ensino de História, que começava a ser introduzido nas escolas, também se apoiava na ideia de utilização desses documentos escritos. Acreditava-se que aquela História, produzida a partir dos documentos escritos era a que deveria ser repassada para os estudantes, afinal, o que estava escrito era considerado como verdade inquestionável. Entretanto, esse conhecimento histórico era muito limitado! 72 Importante No caso brasileiro, é de se supor que os documentos escritos no século XIX ou em épocas anteriores eram reduzidos e pertenciam somente a um determinado grupo privilegiado. Afinal, a maioria da população brasileira era composta por indígenas, negros que haviam sido escravizados ou por brancos pobres. Desse modo, os documentos escritos pertenciam a uma elite e diziam respeito a interesses daquele grupo. Foi assim, portanto, que o ensino no Brasil introduziu os documentos nas aulas de História. Com a proclamação da República e a introdução da disciplina de História nas escolas, ela passava a ter um objetivo bem específico que era o de narrar a origem da nação brasileira até a atualidade. Assim, a relação com o passado se dava a partir de produções feitas por um único grupo, já que era ele quem tinha condições de escrever o que, teoricamente, havia se passado. Negros, indígenas e pobres, sem o domínio da escrita e, portanto, sem deixar documentação escrita que fosse validada pela pesquisa histórica, ficavam de fora do passado que teria produzido uma história brasileira. Nessa perspectiva tradicional ou positivista o documento histórico servia para a pesquisa e para o ensino como prova inquestionável do que havia ocorrido no passado. Você consegue perceber como os estudantes eram levados a conhecer ideias, atitudes, pensamentos, modos e perspectivas de apenas um determinado grupo privilegiado? Um exemplo dessa concepção sobre os documentos e seu papel no ensino de História pode ser visto claramente nos livros didáticos. Recheados de documentos produzidos por pessoas que tinham a capacidade de registrar os acontecimentos do passado a partir da escrita esses livros utilizados pelos estudantes nas aulas de Históriaacabavam “confirmando” determinados episódios do passado. Episódios que eram vistos e registrados por um único grupo e, se esses documentos estavam lá no livro, é porque sua narrativa era a verdadeira. Pronto! Essa forma de ensino a partir da qual os documentos legitimavam a narrativa dos professores também centrava neles o processo metodológico. Isso porque era o professor que explorava o documento, descrevendo seus 73 elementos e buscando comprovar seu discurso. Aqui, cabe lembrar outra característica muito importante da História, que é o fato de ser narrativística, ou seja, o professor narra os acontecimentos históricos e os documentos, por sua vez, passam a ser utilizados como forma de comprovação do que foi narrado. E os estudantes? Pois bem, estes eram tratados como sujeitos passivos em relação às fontes sobre o passado, já que não interagiam com os documentos. No entanto, na passagem do século XIX para o XX, com a Escola Nova se insere uma nova perspectiva com relação ao uso dos documentos na sala de aula, fazendo com que os alunos passem a ser o centro do processo ensino- aprendizagem. A ideia era a de que os alunos tivessem contato direto com as fontes, as quais ganharam novos formatos e possibilidades: filmes, mapas, gravuras, ilustrações, fotografias deveriam estar ao alcance de estudantes nas aulas de História numa relação mais dinâmica de estudar o passado. Apesar dessa mudança no tratamento didático dos documentos é importante registrar que no processo de aprendizagem a ideia dos documentos como prova inquestionável de um determinado passado se manteve. Foi ao longo do século XX que a ideia de documento foi ampliada e a relação dos historiadores com ele foi modificada. O documento, considerado como um vestígio do passado, passou a ser compreendido como um produto da sociedade que o fabricou e isso de acordo com determinadas relações de poder. Assim, tudo o que foi produzido pelos seres humanos merecia ser entendido como fonte histórica passível de ser investigada e de possibilitar conhecer o passado. Importante O documento deixou de ser visto como prova inerte do real, mas era entendido como uma testemunha que somente dá as respostas quando é questionado. Novamente, tal qual um detetive o historiador e o professor de História precisam perguntar para obter respostas! É claro que essa nova forma de entender os documentos também exigiu que na sala de aula a relação com a aprendizagem se modificasse. Os documentos passaram a operar como princípio de investigação, o que exigiu dos 74 professores uma concepção cada vez mais ampla das fontes e de sua utilização de forma mais dinâmica, promovendo uma relação mais estreita entre os estudantes, os vestígios do passado e o processo de construção do conhecimento histórico. Sobre as fontes históricas a historiadora e professora Rosalyn Ashby afirma que: Pode-se depreender que o ensino de História necessita prestar atenção à natureza das afirmações históricas conjuntamente aos trabalhos em que alunos se ocupam com as fontes. Se os alunos devem desenvolver um conceito de evidência, eles necessitarão compreender a relação de evidência entre as fontes históricas (compreendidas a partir de um conceito de que foi a sociedade quem as produziu), e as afirmações sobre o passado que elas apoiam. (ASHBY, 2006, p. 155). A perspectiva da pesquisa, como requisito para os futuros professores, é um elemento a ser considerado durante todo o percurso da formação inicial. 7.3 As fontes históricas Ao longo do século XX, a concepção de fonte histórica foi sendo ampliada. Da ideia inicial de que somente os documentos escritos poderiam revelar informações sobre o passado, os historiadores começaram a defender que tudo o que foi produzido pelos seres humanos ao longo do tempo pode nos trazer informações sobre um determinado passado. Assim, a ampliação do conceito de documento nos trouxe à tona inúmeras possibilidades de leitura sobre o passado: fotografias, gravuras, brinquedos, roupas, acessórios, cartas, filmes, diários, enfim, tudo o que foi produzido no passado, entre muitos outros. Mas, para trabalhar com essas fontes históricas, é preciso compreender que elas se dividem em duas categorias: as fontes primárias e as fontes secundárias. Como fontes primárias entendemos os documentos originais, verdadeiras testemunhas do passado. São aqueles objetos caracterizados por terem sido produzidos no período histórico ao qual estão sendo relacionados. Por exemplo, 75 ao realizar uma pesquisa sobre a história da escola, fundada na década de 1900, são investigadas fotografias, registros de matrícula e boletins originais daquele período. As fontes secundárias, por sua vez, são o resultado das discussões realizadas a partir da fonte primária, portanto, não são fontes originais. São, portanto, as produções historiográficas realizadas a partir das fontes históricas e aquelas mais utilizadas nas aulas de História, pois representam as explicações de professores ou mesmo os textos contidos nos livros didáticos. As formas de utilização dessas fontes históricas nas aulas de História serão o tema da próxima aula! Conclusão da aula Embora persista uma ideia tradicional que diferencia os professores dos historiadores, percebemos nesta aula que os professores são, sim, pesquisadores. Portanto, são historiadores porque produzem conhecimento histórico. Essa definição ocorre uma vez que os professores de História precisam lidar com a construção do conhecimento histórico e isso só é possível com a utilização dos documentos, das fontes históricas. Um professor de História precisa se relacionar com esses vestígios do passado e promover essa interação também com os estudantes, mostrando que o estudo histórico é dinâmico e pode obter inúmeras respostas sobre o passado de acordo com as perguntas enunciadas! Atividade de aprendizagem 1. A partir do que estudamos nesta aula, como estudante de História e futuro professor você se considera também um historiador? Por quê? 2. Qual a importância dos professores de História utilizarem as fontes históricas em sala de aula? 76 Aula 8 – Linguagens e metodologias no ensino e aprendizagem histórica Apresentação da aula Na aula anterior chegamos a um consenso: os professores precisam agir e serem entendidos como pesquisadores, pois realizam pesquisa e, portanto, produzem conhecimento. Mas como fazer isso? Nesta aula, trataremos das possibilidades de utilização dos documentos, das fontes históricas nas aulas de História da Educação Básica. Vamos lá? 8.1 Definindo as fontes históricas Os documentos históricos, fontes históricas, registros históricos ou vestígios são termos diferentes, mas com conceito igual, pois se referem a toda produção humana ao longo do tempo. Desde que os documentos escritos deixaram de ser entendidos como os únicos recursos para investigar e conhecer o passado pode-se dizer que não há praticamente limites quanto às possibilidades de usar qualquer coisa como fonte histórica. Diante da grande variedade de fontes históricas, elas podem ser organizadas em quatro categorias: as fontes escritas, as fontes materiais não escritas, as fontes não materiais e, recentemente, devido à ampla relação que se tem estabelecido com o mundo virtual, há também as fontes digitais. As fontes escritas são as mais comuns na pesquisa histórica tendo sido, durante muito tempo, entendidas como as únicas possíveis de dar informações sobre os acontecimentos do passado. Aparentemente, sua utilização pode parecer mais simples, uma vez que traz a informação em si e, por isso, para os metódicos a “verdade” estava contida nas palavras registradas. Comumente essas fontes são encontradas e organizadas em bibliotecas ou arquivos, o que também facilitaa pesquisa historiográfica. Podem ser relacionadas como fontes escritas as cartas, os diários, uma legislação, os registros de compra e venda, os censos, entre vários outros tipos de documentos manuscritos ou impressos. 77 As fontes materiais não escritas englobam uma enorme quantidade de possibilidades, pois fazem referência a diversos objetos produzidos pelos seres humanos ao longo do tempo. Podem ser citados como exemplos os utensílios domésticos, roupas, brinquedos, construções, pinturas, esculturas, entre outros. Além dessa grande variedade, essas fontes permitem também que se abram maiores possibilidades de pesquisa histórica, criando a oportunidade para conhecer outros aspectos da vida humana ao longo do tempo: as formas como homens e mulheres, ricos e pobres se vestiam, os alimentos consumidos e as maneiras de se alimentar, os materiais utilizados para a fabricação de brinquedos e as formas de brincar, os modos de se enfeitar e os materiais utilizados. Enfim, você pode perceber que essa concepção de fonte histórica nos abre muitas possibilidades de investigação! Encontradas em diferentes lugares, como nas próprias casas de pessoas comuns, assim como em museus, bibliotecas e até mesmo em sítios arqueológicos, essas fontes exigiram que os historiadores passassem a formar parceria com outras ciências, como a arqueologia, a arquitetura, a geografia, a química, a sociologia e até mesmo a medicina. Com a Escola dos Annales, organizada na França a partir da década de 1920, um grupo de historiadores começou a refletir também sobre a forma como as pessoas se entendiam e pensavam, expressando uma mentalidade religiosa, mitológica, cultural. Assim, as fontes não materiais foram identificadas como sendo aquelas que não estão registradas diretamente em objetos, mas são transmitidas a partir da cultura de forma corporal, oral ou simbólica. Destacam- se como exemplo a história oral, os mitos e lendas, as celebrações, as festas, as receitas culinárias, as músicas e tantas outras possibilidades. Por fim, como uma novíssima definição de fonte histórica, têm-se as fontes digitais. Como a rede mundial de computadores tornou-se uma ferramenta de comunicação poderosa, um computador conectado à internet se tornou importante ferramenta de troca de informação. Entendendo os documentos como registros de uma determinada época, os historiadores do tempo presente são unânimes em afirmar a necessidade de se trabalhar com os documentos digitais. Estes têm, como característica, a dissociação entre o suporte físico e a informação contida. Sendo assim, é possível descartar o suporte físico, mas manter seu conteúdo em um novo suporte. Em outras palavras, toda a produção 78 humana registrada no mundo virtual pode ser utilizada como fonte histórica digital. 8.2 O trabalho com as fontes históricas nas séries iniciais Levando em consideração o amplo conceito de fontes históricas e como registrado anteriormente, nós todos podemos ter diferentes documentos que auxiliam na descoberta de informações sobre um determinado passado. Para iniciar uma apresentação sobre a utilização das fontes históricas em sala de aula, veremos uma possibilidade prática que pode muito bem ser adequada para trabalhar com alunos das séries iniciais (1º a 5º ano) e 6º ano do Ensino Fundamental. Levando em consideração que as fontes históricas se relacionam com todo tipo de produção humana ao longo do tempo é de se supor que todos nós temos em casa objetos de outros períodos que pertenceram a nossos pais, avós ou outro familiar no passado. Essa atividade pode estar relacionada com diversos conteúdos históricos, como a definição da própria História e as formas de estudá-la, a história local, da infância, dos meios de comunicação, das relações de trabalho, das atividades escolares, entre vários outros. Enfim, cabe ao professor definir previamente qual conteúdo histórico será abordado e, partir disso, dar um desafio para que os alunos pesquisem em casa e coletem possíveis objetos que considerem como sendo fontes históricas. Importante Esta atividade que utiliza os documentos em estado de arquivo familiar exige que os professores rompam com a concepção de que devem seguir o currículo tradicional de História e privilegiem conteúdos relacionados às experiências das pessoas comuns. Esses objetos fazem parte do que chamamos de arquivos em estado familiar, sendo registros que podem revelar parte da memória do indivíduo e da coletividade. De acordo com o professor historiador Geyso Germinari, 79 Os documentos em estado de arquivo familiar não fazem parte da vida de personagens do cenário político ou midiático. Estes documentos podem ser encontrados no interior das mais diversas residências, arquivados em gavetas, em caixas de papelão, esquecidas temporariamente em cima de armários. Encontram-se aí, velhas fotografias amareladas, certidões de nascimento, escrituras de terreno, agendas, cartas, bilhetes confidenciais, carteiras de trabalho. GERMINARI, Geyso. Arquivar a vida: uma possibilidade para o ensino de História. Roteiro, Joaçaba, v. 37, n. 1, p. 51-70, jan./jun. 2012. p. 53. Disponível em: https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/4150445.pdf - Acesso em 25/08/2020. Após investigar a existência desses objetos em casa e levá-los para a sala de aula, o encaminhamento deve ser o de mostrar cada uma das fontes para os colegas e procurar apresentar suas características e finalidades, observando conceitos históricos como os de temporalidade, diferenças e semelhanças, mudanças e permanências. Essa atividade permite entender que a história é uma ciência e uma disciplina escolar que estuda a vida de todas as pessoas se preocupando em demonstrar o sentido das experiências individuais e coletivas. Feitas as apresentações e as discussões a partir das histórias em estado de arquivo familiar, é preciso desenvolver uma narrativa histórica que pode ser feita de várias maneiras: a produção de um texto, de uma ilustração, da organização de uma exposição dos objetos, entre outras. Perceba que com essa atividade em que ocorre o contato com as fontes históricas primárias está acontecendo produção de conhecimento: com o estabelecimento prévio do conteúdo histórico a ser trabalhado, a definição do roteiro com a solicitação das fontes em estado de arquivo familiar, o encaminhamento da atividade e de uma narrativa posterior, assim como da realização de problematizações históricas, da observação e da conscientização de que todos somos sujeitos históricos, professor e estudantes estarão produzindo conhecimento histórico! https://dialnet.unirioja.es/descarga/articulo/4150445.pdf 80 Saiba mais ARTIÈRES, Philippe. Arquivar a própria vida. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 11, n. 21, p. 9-34, jul. 1998. ISSN 2178-1494. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/2061>. 8.2.1 As novas linguagens no ensino de História Ao longo do século XX, novas linguagens foram sendo apresentadas como possibilidade de ampliar o trabalho de pesquisa e informação nas aulas de História. Literatura, cinema, música e histórias em quadrinhos passaram a ser incorporados como documentos históricos auxiliares na aprendizagem sobre o passado. Integrada à ideia das fontes escritas, a literatura sempre foi um caminho muito significativo para o conhecimento de assuntos sobre o passado. As biografias, durante muito tempo, se revelaram como auxiliares na apresentação de acontecimentos históricos. Inicialmente destinadas a reforçar os grandes acontecimentos e os “atos heroicos” de grandes personagens, com o passar do tempo as biografias também foram utilizadas para apresentar as condições de vida e as formas de pensamento das pessoas comuns. Atualmente, é possível encontrarcom muita facilidade obras biográficas de diferentes sujeitos, as quais podem auxiliar no conhecimento de uma determinada época, suas condições e experiências daqueles que viveram o contexto descrito. Por meio da produção literária é possível compreender o que se pensava, como se agia e vivia num determinado contexto. Um exemplo significativo que pode aqui ser utilizado é o livro O diário de Anne Frank, escrito por uma menina durante a Segunda Guerra Mundial. Reconhecido como um documento de extrema importância para obter informações de um período histórico de proporções mundiais, ele também revela as ideias, sonhos e esperanças de uma garota. Além das biografias, outras obras literárias expressam o pensamento e o modo de vida de uma determinada época, com a descrição de lugares, roupas, http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/2061 81 comportamentos que auxiliam no conhecimento de um determinado tempo histórico. Ainda no início do século XX, com a difusão do cinema e do rádio, muitos foram os educadores que perceberam a possibilidade de ampliar os recursos a serem utilizados nas aulas de História. Imagem e som passaram a ser vistos como excelentes parceiros no processo de ensino e aprendizagem. No Brasil, os professores Jonathas Serrano (1885-1944), catedrático em história das civilizações do Colégio Pedro II, e Venâncio Filho (1894-1946), produziram um livro chamado “Cinema e Educação” (1930) no qual ofereciam um método para o uso do cinema nas escolas. Com a utilização dos chamados filmes educativos, o cinema, dessa maneira, seria utilizado como uma fonte histórica complementar às informações apresentadas pelos professores. Daquela época em diante os filmes passaram a ser importantes auxiliares na aprendizagem histórica promovendo a interação entre estudantes e as informações trabalhadas em sala de aula. É importante salientar que apenas a apresentação de um filme em sala de aula não se configura como utilização de fonte histórica e de análise do passado. Cabe ao professor selecionar o filme que será assistido, podendo utilizar apenas trechos, os quais precisam ter referência e análise sistemática, elencando data, local e objetivos da produção. Recentemente, na Alemanha, os famosos diários da menina Anne Frank, tão conhecido sob a forma literária, ganharam uma nova versão em vídeo. A série alemã, produzida em 15 episódios e disponível no Youtube, instiga a conhecer a sua história e da Segunda Guerra Mundial de outra maneira: e se Anne Frank tivesse uma câmera em vez de um diário? Esse material visual torna-se, portanto, um documento histórico em um formato que agrada aos estudantes e que pode ser um interessante recurso para que tenham acesso a informações sobre um determinado período histórico. Mídias Episódio 1 - Sentindo-se tão sozinho | Diário em vídeo de Anne Frank | Casa de Anne Frank. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=Npa8lUU-m70 https://www.youtube.com/watch?v=Npa8lUU-m70 82 Da mesma forma que o cinema, a música se apresenta como importante aliada nas aulas de História, sobretudo porque têm importância significativa na cultura cotidiana dos alunos. De modo geral, as músicas são produzidas num determinado contexto e, por esse motivo, podem servir de reflexo para entendermos as formas como as pessoas de uma determinada época sentiam e se expressavam. No caso da História do Brasil, há uma grande produção de músicas de vários estilos que passaram a revelar críticas, sátiras e análises da sociedade brasileira e que podem ser utilizadas como importantes documentos sobre nossa História. A diversidade musical brasileira oferece possibilidades para que os professores aproximem os estudantes dos mais variados acontecimentos, podendo se valer desde a música caipira, do samba, dos jingles políticos e do rock. De acordo com o professor historiador Luciano de Azambuja, ao trabalhar com a música em sala de aula, o professor está colocando “o aluno em contato e relação ao objeto delimitado, no caso a canção, e investigar as ideias e significados atribuídos à letra e à música a partir do pressuposto de que conhecer é atribuir significados, na intenção de compreender como ele aprende história por meio da canção, em outras palavras, aprender como se aprende história”. AZAMBUJA, Luciano. Jovens alunos e aprendizagem histórica: perspectivas a partir da canção popular. Curitiba: UFPR, 2013. p. 14. Tese de doutorado. Disponível em: http://www.ppge.ufpr.br/teses/d2013_Luciano%20de%20Azambuja.pdf As histórias em quadrinhos, por sua vez, fazem parte do imaginário e da vida cotidiana de muitas crianças. Quem nunca teve contato com as tirinhas dos mais variados personagens em sua infância? Durante muito tempo se discutiu a validade da leitura desse formato de livro, porém, as análises sobre esse tipo de produção textual foram ampliadas e, atualmente, são utilizadas em diversas disciplinas, como no caso da História. Os quadrinhos passaram a ser entendidos como importantes fontes históricas, uma vez que se apresentam como narrativas históricas gráficas e, portanto, podem ser entendidas como narrativas históricas estruturadas. 83 As histórias em quadrinhos são entendidas como fontes históricas que geralmente apresentam uma representação objetiva dos cenários, paisagens e vestimentas, o que denota uma rigorosa e criteriosa pesquisa histórica realizada pelos seus autores, a partir de vestígios arqueológicos e iconográficos, além de narrativas historiográficas. SOBANSKI, Adriane et ali. Ensinar e aprender História: histórias em quadrinhos e canções. Curitiba: Base, 2010. p. 47. O ensino de História, portanto, tem tudo para oferecer um procedimento metodológico dinâmico e variado, em que os estudantes possam conhecer o processo de construção do conhecimento histórico. Compreender o passado dessa maneira torna-se muito mais significativo. Cabe ao professor selecionar o conteúdo com o qual vai trabalhar e escolher as possibilidades de analisar o passado. A diversidade de fontes históricas está à disposição! Conclusão da aula Partindo do princípio de que a História é uma ciência e o papel dessa disciplina é desenvolver o pensamento histórico, o uso dos documentos, das fontes históricas, é fundamental! Compreender o que são essas fontes históricas e as possibilidades de trabalho nas aulas de História é um importante passo para que os professores desenvolvam um trabalho mais completo e até mesmo atrativo para os estudantes, pois vão participar ativamente como sujeitos de uma História sempre em processo de construção. Atividade de aprendizagem Qual a importância das fontes históricas para a aprendizagem da História? 84 Índice Remissivo A Base Nacional Comum Curricular e o ensino de História ......................... (Ensino; formalização; componente curricular) 65 A disciplina escolar: formação de professores e ensino de História............. (Disciplina; formação; ensino) 17 A História como disciplina escolar ............................................................... (Projeto pedagógico; identidade nacional; metodologia) 50 A história do ensino de História ................................................................... (Conhecimento científico; metodologia; fonte histórica) 09 A História na escola de nível secundário ..................................................... (Colégio Pedro ll; humanismo clássico; escola) 52 A História nos currículos escolares do século XX ........................................ (Influência iluminista; progresso; ensino) 53 A História se reinventa! ............................................................................... (Reestruturação; formação política; camadas populares) 55 A História Tradicional, Positivista ou Metódica ............................................(Metodologia; positivismo; ensino) 29 A importância da pesquisa para a produção do conhecimento .................... (Historiadores; pesquisa; ensino) 69 A influência europeia ................................................................................... (IHGB; eurocentrismo; História universal) 10 A Legislação e o ensino de História ............................................................. (Legislação; ensino; passado) 62 A Licenciatura e a formação de professores ................................................ (Escola Nova; Instituto de Educação; professores) 25 A metodologia marxista no ensino de História ............................................. (Corrente historiográfica; pedagogia; marxismo) 41 A redemocratização e o ensino de História .................................................. (Didática; metodologia; ensino) 58 A transposição política ................................................................................ (Educação básica; política; conhecimento) 59 As fontes históricas ..................................................................................... (Informação; fontes; categorias) 74 As novas linguagens no ensino de História ................................................. (Inovação; ensino; metodologia) 80 As teorias da História e o Ensino Positivista ................................................ (Historiografia; ciência; teoria) 29 Conteúdos históricos na sala de aula .......................................................... (Ciência; estudo; conteúdo) 47 Cursos superiores no Brasil ........................................................................ (Humanidades; jesuítas; ensino) 22 Definindo as fontes históricas ...................................................................... (Fonte histórica; aprendizado; metodologia) 76 85 E agora, o que ensinar? .............................................................................. (Tendências europeias; eurocentrismo; memória universal) 12 Linguagens e metodologias no ensino e aprendizagem histórica................ (Metodologia; ensino; aprendizagem) 76 Mas a sombra dos Estudos Sociais já se anunciava .................................... (Estudos Sociais; ditadura; círculos concêntricos) 22 Novas teorias, novas metodologias ............................................................. (Marxismo; Escola dos Annales; teoria) 38 Novos desafios: História da África e cultura afro-brasileira e indígena ........ (Negros; indígenas; cultura) 63 Novos olhares sobre a História: a Escola dos Annales ................................ (Corrente historiográfica; História Nova; fontes históricas) 42 O currículo escolar ...................................................................................... (Organização curricular; conhecimento escolar; humanismo) 47 O ensino de História no Brasil ..................................................................... (Colégio D. Pedro ll; currículos escolares; ensino) 17 O Marxismo e a História .............................................................................. (Materialismo Histórico; Manifesto Comunista; teoria) 38 O Positivismo e o ensino de História ............................................................ (Educação positivista; historiografia; ideologia militar) 32 O trabalho com as fontes históricas nas séries iniciais ................................ (Conteúdo; séries iniciais; metodologia) 78 Onde e como pesquisar? ............................................................................ (Documentação; fontes históricas; processo metodológico) 70 Os primeiros cursos superiores de História ................................................. (Reforma Universitária; Estudos Sociais; curso) 27 Professores pesquisadores e a produção do conhecimento ....................... (Fontes históricas; investigação; pesquisa) 67 Professores pesquisadores, sim! ................................................................ (Produtores de conteúdo; pesquisa; resgate) 67 Que ensino de História teremos no século XXI? .......................................... (Redemocratização; mudança; política) 58 Transposição didática ou não? .................................................................... (Conhecimento; didática; saber científico) 48 Um método tradicional ................................................................................ (Memorização; autoritarismo; verdades absolutas) 35 Um novo ensino de História? ....................................................................... (Didática; disciplina científica; novas linguagens) 60 Uma nova metodologia em sala de aula ...................................................... (História Nova; fontes; metodologia) 44 86 REFERÊNCIAS ARTIÈRES, Philippe. Arquivar a própria vida. Revista Estudos Históricos, Rio de Janeiro, v. 11, n. 21, p. 9-34, jul. 1998. ISSN 2178-1494. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/reh/article/view/2061>. ASHBY, Rosalyn. Desenvolvendo um conceito de evidência histórica: as ideias dos estudantes sobre testar afirmações factuais singulares. Educar, Curitiba, Especial, p. 151-170, 2006. Editora UFPR. AVELAR, Alexandre de Sá. Os desafios do ensino de História: problemas, teorias e métodos. Curitiba: InterSaberes, 2012. AZAMBUJA, Luciano. Jovens alunos e aprendizagem histórica: perspectivas a partir da canção popular. Curitiba: UFPR, 2013. Tese de doutorado. Disponível em: http://www.ppge.ufpr.br/teses/d2013_Luciano%20de%20Azambuja.pdf BASE NACIONAL COMUM CURRICULAR. Disponível em <http://basenacionalcomum.mec.gov.br/>. Acesso em: 15/07/2019, às 14h00min. BARBOSA, Jacqueline Peixoto; COLLINS, Heloisa; ROJO, Roxane. Práticas de leitura e escrita na web. LAEL/PUC-SP e IEL/UNICAMP: Fevereiro 2006. BARCA, Isabel. Aula Oficina: do Projeto à Avaliação. In. Para uma educação de qualidade: Atas da Quarta Jornada de Educação Histórica. Braga, Centro de Investigação em Educação (CIED)/ Instituto de Educação e Psicologia, Universidade do Minho, 2004, p. 131 – 144. Disponível em: http://sefarditas.net.br/ava/aula_oficina/isabel_barca1.pdf - Acesso em 1/09/2020. _____. Literacia e consciência histórica. In. SCHMIDT, M.A./ BRAGA, T.G. Educar em Revista. Dossiê Educação Histórica. Curitiba: Editora da UFPR, 2006. ________. Cognição histórica situada: que aprendizagem histórica é essa? In: SCHMIDT, Maria Auxiliadora; BARCA, Isabel. Aprender História: perspectivas da Educação Histórica. Ijuí: Unijuí, 2009, p. 21-51. BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cortez, 2004. BITTENCOURT, Circe Maria Fernandes. (org.) O saber histórico na sala de aula. São Paulo: Contexto, 1998. BLOCH, Marc. Introdução à História. Publicações Europa-América, LTDA. Col. Saber. s/ ano. 87 BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: Lembrança de Velhos. 2. ed., São Paulo: T.A. Queiroz, 1994. CABRINI, Conceição. O Ensino de História: revisão urgente. São Paulo: Brasiliense, 1987. CARAMEZ, Cláudia Senra. A aprendizagem histórica de professores mediada pelas tecnologias da informação e comunicação: perspectivas da educação histórica. Curitiba: Universidade Federal do Paraná, 2014. Dissertação de Mestrado. Disponível em: <https://lapeduh.files.wordpress.com/2014/10/2014_claudia- senra-caramez.pdf> - Acesso em 15/08/2020. CARVALHO, José Murilo de. A formação das almas. O imaginário da República no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. CAVAZZANI, André Luiz. Ensino de História: itinerário histórico e orientações práticas. Curitiba: InterSaberes, 2017. CHERVEL, André. História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa. In: Teoria & Educação, 2, Porto Alegre: Pannônica, 1990. P.177- 277. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação dasRelações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília, Outubro de 2004. Disponível em <http://portal.inep.gov.br/informacao-da-publicacao/- /asset_publisher/6JYIsGMAMkW1/document/id/488171>. Acesso em: 15/07/2019, às 17h00min. FERNANDES, Lindamir Zeglin. Patrimônio cultural e saber histórico escolar. Curitiba: UFPR, 2004. Dissertação de Mestrado. Disponível em: https://acervodigital.ufpr.br/bitstream/handle/1884/34227/R%20-%20D%20- %20LINDAMIR%20ZEGLIN%20FERNANDES.pdf?sequence=1&isAllowed=y – Acesso em 20/08/2020. FILIPOVIC, Zlata e CHALLENGER, Melanie. Vozes roubadas. São Paulo: Companhia das Letras, 2008. FONSECA, Thais Nivia de Lima. História & ensino de História. Belo Horizonte: Autêntica, 2003. FONTOURA, Antonio. Recursos audiovisuais nas aulas de História. Curitiba: InterSaberes, 2018. GERMINARI, Geyso. D. Educação Histórica: a constituição de um campo de pesquisa. Revista HISTEDBR On-line, Campinas, n.42, p. 54-70, jun2011. GERMINARI, Geyso. D. e GILLIES, Ana Maria (org.). Ensino de História e debates contemporâneos. Guarapuava: Unicentro, 2017. 88 GUIMARÃES, Marcela Lopes. Capítulos de História: o trabalho com fontes. Curitiba: Aymará Educação, 2012. GUIMARÃES, Selva. Didática e prática de ensino de História: experiências, reflexões e aprendizados. Campinas: Papirus, 2015. Coleção Magistério: formação e trabalho pedagógico. _____ (org.). Ensino de História e cidadania. Campinas: Papirus, 2017. LE GOFF, Jacques. Documento/ monumento. Enciclopédia Einaudi. Vol. 1: Memória – História. Imprensa Nacional, Casa da Moeda, 1984. PAULINO, Carla Viviane ET alli. Perspectivas do ensino de História: teorias, metodologias e desafios para o século XXI. Curitiba: InterSaberes, 2018. PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS: introdução aos parâmetros curriculares nacionais / Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília: MEC/SEF, 1997. SILVA, Marcos (org.). História: que ensino é esse? Campinas: Papirus, 2016. _____ (org.) Repensando a História. Rio de Janeiro: Marco Zero, 1984. SILVA, Marcos e GUIMARÃES, Selva. Ensinar História no século XXI: em busca do tempo entendido. São Paulo: Papirus, 2012. SOBANSKI, Adriane et ali. Ensinar e aprender História: histórias em quadrinhos e canções. Curitiba: Base, 2010. SOBANSKI, Adriane de Quadros. Formação de professores de História: educação histórica, pesquisa e produção de conhecimento. Curitiba: UFPR, 2017. Tese de doutorado. Disponível em: https://www.prppg.ufpr.br/siga/visitante/trabalhoConclusaoWS?idpessoal=323&i dprograma=40001016001P0&anobase=2017&idtc=1228 - Acesso em 22/08/2020. SCHMIDT, Maria A. M. dos S. e CAINELLI, Marlene. Ensinar História. São Paulo: Scipione, 2004. Copyright © - É expressamente proibida a reprodução do conteúdo deste material integral ou de suas páginas em qualquer meio de comunicação sem autorização escrita da equipe da Assessoria de Marketing da Faculdade UNINA. O não cumprimento destas solicitações poderá acarretar em cobrança de direitos autorais.