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PATOLOGIA DA NUTRIÇÃO E DIETOTERAPIA ORGANIZADORAS MARIA IZABEL DE SOUZA TABOADA; GLENDA SIQUEIRA VIGGIANO CAMPOS Patologia da Nutrição e Dietoterapia GRUPO SER EDUCACIONAL Patologia da nutrição e dietoterapia é um livro direcionado para estu- dantes dos cursos da área de nutrição e correlatas. Além de abordar assuntos triviais, o livro traz conteúdo sobre patologia da nutrição e dietoterapia, dietoterapia nas doenças cardiovasculares e endó- crinas, doenças renais, alergias e intolerâncias alimentares, e dietoterapia na desnutrição infantil e para tratar erros inatos do metabolismo. Após a leitura da obra, o leitor vai compreender sobre as modi�cações que devem ser realizadas nas dietas hospitalares para atender diversos tipos de pacientes, considerando a importância da individualidade; aprender sobre avaliação nutricional do paciente hospitalizado, considerando a importância de integrar diferentes métodos para um correto diagnóstico nutricional; entender como as escolhas alimentares e o estilo de vida estão diretamente envolvidos no desenvolvimento e agravamento das doenças cardiovascu- lares e endócrinas abordadas; conhecer ferramentas e protocolos aplicados no contexto dietoterápico das enfermidades estudadas, como contagem de carboidratos, dietas DASH e mediterrânea, e modelo de algoritmo para tratamento da obesidade; saber os diferentes mecanismos de reações adver- sas a alimentos; aprofundar o conhecimento sobre o manejo de alergias e intolerâncias; estudar a �siopatologia das formas graves de desnutrição energético-proteica infantil: marasmo e kwashiorkor, e muito mais. Aproveite a leitura do livro. Bons estudos! PATOLOGIA DA NUTRIÇÃO E DIETOTERAPIA ORGANIZADORAS MARIA IZABEL DE SOUZA TABOADA; GLENDA SIQUEIRA VIGGIANO CAMPOS gente criando futuro I SBN 9786555581829 9 786555 581829 > C M Y CM MY CY CMY K PATOLOGIA DA NUTRIÇÃO E DIETOTERAPIA Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação ou qualquer outro tipo de sistema de armazenamento e transmissão de informação, sem prévia autorização, por escrito, do Grupo Ser Educacional. Diretor de EAD: Enzo Moreira Gerente de design instrucional: Paulo Kazuo Kato Coordenadora de projetos EAD: Manuela Martins Alves Gomes Coordenadora educacional: Pamela Marques Equipe de apoio educacional: Caroline Guglielmi, Danise Grimm, Jaqueline Morais, Laís Pessoa Designers gráficos: Kamilla Moreira, Mário Gomes, Sérgio Ramos,Tiago da Rocha Ilustradores: Anderson Eloy, Luiz Meneghel, Vinícius Manzi Taboada, Maria Izabel De Souza. Patologia da nutrição e dietoterapia / . – São Paulo: Cengage – 2020. Bibliografia. ISBN 9786555581829 1. Nutrição 2. Campos, Glenda Siqueira Viggiano. Grupo Ser Educacional Rua Treze de Maio, 254 - Santo Amaro CEP: 50100-160, Recife - PE PABX: (81) 3413-4611 E-mail: sereducacional@sereducacional.com “É através da educação que a igualdade de oportunidades surge, e, com isso, há um maior desenvolvimento econômico e social para a nação. Há alguns anos, o Brasil vive um período de mudanças, e, assim, a educação também passa por tais transformações. A demanda por mão de obra qualificada, o aumento da competitividade e a produtividade fizeram com que o Ensino Superior ganhasse força e fosse tratado como prioridade para o Brasil. O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego – Pronatec, tem como objetivo atender a essa demanda e ajudar o País a qualificar seus cidadãos em suas formações, contribuindo para o desenvolvimento da economia, da crescente globalização, além de garantir o exercício da democracia com a ampliação da escolaridade. Dessa forma, as instituições do Grupo Ser Educacional buscam ampliar as competências básicas da educação de seus estudantes, além de oferecer- lhes uma sólida formação técnica, sempre pensando nas ações dos alunos no contexto da sociedade.” Janguiê Diniz PALAVRA DO GRUPO SER EDUCACIONAL Autoria Maria Izabel de Souza Taboada Graduação em Nutrição- Faculdade Arthur Sá Earp. Mestrado em Nutrição e Saúde – Universidade Federal de Goiás. Preceptora e docente em programa residência multiprofissional em Nutrição Glenda Siqueira Viggiano Campos Graduada em nutrição – Universidade Federal de Ouro Preto. Mestre em bioquímica metabólica e fisiológica – Universidade Federal de Ouro Preto.Doutora em bioquímica metabólica e fisiológica – Universidade Federal de Ouro Preto. Professora substituta de fisiologia – Universidade Federal de Minas Gerais SUMÁRIO Prefácio .................................................................................................................................................8 UNIDADE 1 - Patologia e dietoterapia ............................................................................................9 Introdução.............................................................................................................................................10 1 Fundamentos da Dietorterapia .......................................................................................................... 11 2. Dietas hospitalares ............................................................................................................................ 12 3. Antropomoetria ................................................................................................................................ 15 4. Parâmetros bioquímicos ................................................................................................................... 21 5. Terapias nutricionais ......................................................................................................................... 27 PARA RESUMIR ..............................................................................................................................32 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................33 UNIDADE 2 - Dietoterapia nas doenças cardiovasculares e endócrinas...........................................35 Introdução.............................................................................................................................................36 1 Hipertensão artéria sistêmica ............................................................................................................ 37 2 Dislipidemias e aterosclerose ............................................................................................................. 38 3. Infarto agudo do miocárdio .............................................................................................................. 41 4 Insuficiência cardíaca ......................................................................................................................... 42 5. Diabetes mellitus .............................................................................................................................. 45 6 Obesidade e síndrome metabólica .................................................................................................... 47 PARA RESUMIR ..............................................................................................................................52 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................53 UNIDADE 3 - Doenças renais, alergias e intolerâncias alimentares .................................................55 Introdução.............................................................................................................................................56 1 Doenças Renais .................................................................................................................................. 57 2 Patologia da nutrição e dietoterapia nas alergias eintolerâncias alimentares ..................................67 3 Intolerância alimentar ........................................................................................................................ 70 PARA RESUMIR ..............................................................................................................................72 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................73 UNIDADE 4 - Dietoterapia na desnutrição infantil e para tratar erros inatos do metabolismo ........75 Introdução.............................................................................................................................................76 1 Desnutrição energético-proteica infantil ........................................................................................... 77 2 Síndrome de retroalimentação .......................................................................................................... 82 3 Erros inatos do metabolismo ............................................................................................................. 84 PARA RESUMIR ..............................................................................................................................91 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................................................92 O livro Patologia da nutrição e dietoterapia traz ao leitor, além de informações básicas da área, o conteúdo parcialmente descrito a seguir em suas quatro unidades. Dando início, a primeira unidade, Patologia da nutrição e dietoterapia, explica em que consiste a dietoterapia e quais são seus objetivos na prática clínica. O leitor aprenderá sobre prescrição dietética, dietas hospitalares, métodos para avaliação nutricional, e terapia nutricional. A segunda unidade, Dietoterapia nas doenças cardiovasculares e endócrinas, apresenta a fisiopatologia e a terapia nutricional aplicada às principais doenças que afetam o sistema cardiovascular e endócrino. O papel das intervenções nutricionais e da mudança no estilo de vida na prevenção e tratamento de doenças, conceitos fundamentais e recomendações preconizadas para o manejo nutricional da hipertensão arterial sistêmica, dislipidemias e aterosclerose, infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca, transplante cardíaco, diabetes mellitus, obesidade e síndrome metabólica também são tratados nesta unidade. Na sequência, a terceira unidade, Doenças renais, alergias e intolerâncias alimentares, apresenta as abordagens da nutrição no tratamento das doenças renais e os efeitos dessa doença sobre o estado nutricional. O leitor aprenderá, ainda, sobre intervenções dietéticas nos diferentes tipos de doença renal, avaliação nutricional, alergia e intolerância alimentar. Concluindo a obra, a quarta e última unidade, Dietoterapia na desnutrição infantil e para tratar erros inatos do metabolismo, aborda a fisiopatologia e a terapia nutricional aplicada à desnutrição energético-proteica infantil, à síndrome de realimentação e à duas importantes doenças genéticas decorrentes de erros inatos do metabolismo. A leitura na íntegra deste livro faz que o leitor compreenda de forma simples os principais fundamentos da patologia da nutrição e da dietoterapia. Agora é com você! Sorte em seus estudos! PREFÁCIO UNIDADE 1 Patologia e dietoterapia Olá, Você está na unidade Patologia e Dietoterapia. Conheça aqui o que é dietoterapia e seus objetivos na prática clínica. Veja com mais detalhes o que é prescrição dietética, sua importância e como deve ser elaborada. Aprenda sobre dietas hospitalares e suas diversas modificações, tanto de consistência quanto de nutrientes e ainda, as situações em que são aplicadas. Conheça os diferentes métodos para avaliação nutricional do paciente hospitalizado. Aprenda sobre terapia nutricional nas vias oral, enteral e parenteral. Bons estudos! Introdução 11 1 FUNDAMENTOS DA DIETORTERAPIA Dietoterapia é a área da Nutrição que aplica o conhecimento de patologias para identificar necessidades nutricionais de indivíduos enfermos. Através de avaliação minuciosa, ela busca elaborar planos alimentares para prevenir doenças ou agravos, recuperar ou manter o estado nutricional e auxiliar no tratamento. Pode ainda ser um tratamento único ou fazer parte do plano terapêutico. O principal objetivo da dietoterapia é oferecer aos indivíduos nutrientes adequados para recuperar ou manter o estado nutricional atendendo necessidades nutricionais, metabólicas, físicas, psicológicas e sociais. São também objetivos da Dietoterapia promover educação nutricional, prevenir e tratar carências nutricionais Princípios para a prescrição dietoterápica A prescrição dietoterápica é atividade privativa do nutricionista conforme resolução do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), nº304/2003. Sua elaboração se dá com base em diretrizes estabelecidas para diagnóstico nutricional, de acordo com dados clínicos, antropométricos, bioquímicos e dietéticos. Ainda conforme resolução acima mencionada, ao elaborar a prescrição dietoterápica o nutricionista deve considerar o indivíduo como um todo, respeitando condições clínicas, sociais e religiosas, respeitando a bioética. Além disso, é necessário considerar laudos, diagnósticos e pareceres da equipe multiprofissional que sejam pertinentes ao tratamento do indivíduo. Para elaboração da prescrição dietética é necessário definir: Via de alimentação (oral, enteral, parenteral); VET calculado a partir de dados clínicos e antropométricos; Determinar proporção de macronutrientes: carboidratos, proteínas e lipídios; Identificar necessidades nutricionais específicas a partir de dados bioquímicos, clínicos e demandas pertinentes da equipe multiprofissional; Consistência da dieta; Mudanças na composição química da dieta. 12 2. DIETAS HOSPITALARES As dietas hospitalares são elaboradas de acordo com estado nutricional do indivíduo e devem garantir os nutrientes necessários para recuperação e manutenção do estado nutricional. Para isso, são necessárias modificações que podem ser tanto na consistência como composição, de acordo com relação abaixo. Quanto às modificações na consistência, são dietas indicadas para adaptações mecânicas (mastigação, por exemplo), para trazer maior conforto na fase de baixa aceitação ou ainda, em fases de transição, como pós-operatórios e retirada de sonda enteral ou parenteral. Veja a seguir suas classificações: Livre ou geral Não apresenta modificações, distribuição de macronutrientes, normocalórica, normoprotéica, normolipídica. Indicada para pacientes sem restrições, que possuem funções gastrintestinais preservadas. São oferecidos alimentos de todos os grupos: arroz e cereais, pães, grãos e leguminosas, leite e derivados, frutas e legumes, carnes, ovos, óleos e gorduras, açúcar com moderação. Branda Possui fibras e tecido conjuntivo abrandados por meio de cocção ou subdivisão, distribuição de macronutrientes normocalórica, normoprotéica e normolipídica. Indicada para pacientes em transição para dieta livre, em pós operatórios, alterações em mastigação, deglutição e para facilitar digestão. São oferecidos alimentos de todos os grupos, sendo legumes cozidos, carnes cozidas ou grelhadas, frutas macias ou purês, pães, biscoitos, bolos, líquidos em geral. Não são oferecidas frituras. Pastosa Alimentos em forma de purês e com consistência pastosa obtida por cocção ou processos mecânicos, distribuição de macronutrientes, normocalórica, normoprotéica e normolipídica. Indicada com finalidade de facilitar mastigação e deglutição, em pré e pós-operatórios. São oferecidos alimentos em forma de purês, cremes, vitaminas, mingaus, carnes batidas ou desfiadas com molho, arroz papa. FIQUE DE OLHO Toda prescrição deve ser registrada em prontuário e deve conter data, valor energético total, consistência,macro e micronutrientes relevantes para o caso, fracionamento, assinatura e carimbo com número da inscrição no conselho. 13 Líquida Alimentos de consistência liquida ou liquidificados, a composição de macronutrientes varia conforme cardápio e necessidades. Indicada para pré e pós-operatórios, transição de dietas, alterações do trato gastrintestinal, repouso digestivo. São oferecidos mingaus, sopas liquidificadas, caldos de carne e legumes, vitaminas, leite, iogurte, pudim, sorvete, sucos. Líquida restrita Líquidos com pouco valor nutricional, sem resíduos. Indicada para hidratação, respouso intestinal, pré e pós-operatórios, preparo para exames (colonoscopia, endoscopia). São oferecidos, suco de frutas coados, gelatina diet, caldos de legumes ou carnes coados, chás com adoçante, água de coco. Por ser uma dieta de transição e pobre nutricionalmente tem período curto de uso. Quanto a modificações na composição química, são dietas que necessitam de ajustes na oferta de um ou mais nutrientes para auxiliar na recuperação da doença e do estado nutricional. Hipercalórica Dieta com maior valor calórico indicada em casos de aumento de necessidade energética, como gestação, lactação, desnutrição, trauma, doenças catabolizas (câncer, doenças pulmonares, entre outras), alguns pré e pós-operatórios. É composta pelos alimentos da dieta livre, com aumento de porções ou suplementos. Hiperprotéica Dieta com maior oferta de alimentos fontes de proteína para suprir necessidade aumentada. Indicada em casos de desequilíbrio do balanço nitrogenado, desnutrição, doenças catabólicas, pré e pós-operatórios. É composta pelos alimentos da dieta livre, com aumento da oferta de carne, ovos, leite e derivados ou suplementos proteicos. Hipoprotéica Dieta com baixo teor de proteínas para indivíduos com necessidade reduzida. Indicada no tratamento não dialítico da doença renal e em doenças onde é necessário reduzir produtos do metabolismo proteico (ureia e creatinina). São ofertados os alimentos da dieta livre, porém com diminuição das porções de alimentos proteicos. Hipossódica Dieta com reduzido teor de sódio, que pode variar, sendo comum utilização de 2g de cloreto de sódio ao dia. Indicada para pacientes com hipertensão arterial, doenças cardíacas e renais. Segue o padrão da dieta livre, com redução de sal nas preparações e evitam-se alimentos 14 industrializados que possuem sódio em sua produção. Hipolipídica Dieta com redução de lipídios é normocalórica e normoprotéica, indicada em doenças hepáticas, pancreáticas, da vesícula biliar e dislipidemias. São ofertados alimentos com reduzido teor de gorduras como leite e derivados desnatados, corte de carnes magros, menor quantidade de óleos no preparo dos alimentos. Laxativa Dieta com maior oferta de alimentos fonte de fibras. É indicada para regularizar a função intestinal e melhorar equilíbrio da microbiota. Os alimentos refinados são substituídos por integrais e são oferecidos legumes e frutas laxativos, além do aumento da oferta hídrica. Obstipante É uma dieta pobre em fibras e resíduos, com características da dieta branda. É indicada para casos de diarreia, algumas doenças intestinais, transplante de medula óssea e preparo de exames. São ofertados alimentos macios, cozidos, com baixo teor de gordura, preparações isentas de sacarose, frutas sem a casca, não são ofertados legumes crus. Dieta para diabetes Normocalórica, normoprotéica, normolipídica, isenta de sacarose, com maior oferta de fibras e grãos integrais e reduzida em gordura saturada. É indicada para casos de diabetes ou necessidade de controle glicêmico. Vale lembrar que pode haver outras variações e composições que são padronizados conforme a necessidade de diferentes instituições e também da demanda individual do paciente. FIQUE DE OLHO Desnutrição iatrogênica é um termo utilizado para caracterizar a desnutrição decorrente de ingestão ou recuperação nutricional inadequadas durante a internação hospitalar. Possui alta prevalência conforme será visto a seguir. No sentido de prevenir e recuperar pacientes, existem diversas recomendações e diretrizes. Este artigo instrui em 11 passos formas de evitar a desnutrição hospitalar. 15 2.1 Avaliação do estado nutricional de pacientes hospitalizados A função da avaliação nutricional é identificar distúrbios a fim de realizar intervenção nutricional adequada para recuperação e manutenção da saúde. No meio hospitalar, tem o objetivo de diagnosticar precocemente a desnutrição e monitorizar o estado nutricional. Pacientes hospitalizados são mais vulneráveis à desnutrição, que ocorre frequentemente neste ambiente e é muitas vezes negligenciada. Dados de estudo IBRANUTRI mostram que a taxa de desnutrição iatrogênica é em torno de 50% em adultos. É de suma importância detectar um quadro de desnutrição, pois uma vez instalado, dependendo da gravidade é difícil de ser revertido pelas complicações envolvidas. São elas, risco de complicações cirúrgicas e infecciosas, desenvolvimento de lesões por pressão, atraso no processo de cicatrização, maior tempo de ventilação mecânica pela falência de músculos respiratórios. Não existe um padrão único para avaliação nutricional dos pacientes hospitalizados, pois suas complicações clínicas são muito variáveis. Por isso combinam-se métodos objetivos e subjetivos. Figura 1 - Avaliação nutricional Fonte: Elaborada pela autora, 2020 #ParaCegoVer: A imagem mostra uma tabela de duas colunas e cinco linhas apresentando métodos objetivos combinados com métodos subjetivos. 3. ANTROPOMOETRIA Antropometria é a medida do tamanho corporal e de suas proporções. Ela é utilizada para avaliar a composição corporal total e suas regiões, que podem refletir riscos à saúde. A avaliação antropométrica é fundamental para uma avaliação adequada, para com isso estabelecer o prognóstico nutricional e proporcionar ao paciente tratamento dietético específico e acompanhar sua evolução clínica e nutricional. 3.1 Peso O peso é a soma de todos os compartimentos corporais e representa o equilíbrio energético do indivíduo, aonde mudanças refletem alterações desse equilíbrio. A perda de peso não intencional 16 maior que 10% em um período de 6 meses é um indicador de prognóstico clínico. É recomendado que todos os pacientes ao ser admitidos em hospital tenham o peso registrado pois seu valor auxilia a prever risco nutricional. Alguns dos tipos de mensuração do peso são: Peso atual Aferido em balança antropométrica calibrada, com o indivíduo de pé, no centro da balança, descalço e de roupas leves. Peso usual Utilizado quando não é possível aferir o peso atual ou que é considerado normal quando o indivíduo está hígido. Peso ideal ou teórico Obtido por meio do valor do índice de massa corporal (IMC), utilizando-se a seguinte fórmula: Peso ideal = IMC desejado X (estatura)2 Peso ajustado Peso ideal corrigido para determinação de necessidade de energia e proteínas quando a adequação do peso foi inferior a 95% ou superior a 115%; é útil em pacientes desnutridos e sobrepeso, por exemplo. É obtido por meio da seguinte fórmula: Peso ajustado = (peso ideal – peso ajustado) x 0,25 + peso atual Estimativa de peso Circunstâncias como trauma, sepse, nível de consciência podem dificultar a aferição do peso atual do paciente. Desta forma, pode-se estimar o peso por meio das Equações de Chumlea Figura 2 - Equações de Chumlea Fonte: CHUMLEA et al., 1985 (Adaptado). #ParaCegoVer: A imagem ilustra os cálculos das equações de Chumlea para mulheres e para homens. 17 Correção para amputações Correção para amputações: Para corrigir o peso ideal de amputados subtrai-se o peso da extremidade amputada do peso ideal calculado. Percentual de perda de peso É uma informação importante para avaliar a gravidade do problema de saúde. A perda de peso tem grande correlação com mortalidade. Figura 3 - Significado da perda de peso em relação ao tempo Fonte: CUPPARI,2005 (Adaptado). #ParaCegoVer: A imagem mostra uma tabela de três colunas e seis linhas apresentando o significado da perda de peso como significativa ou grave, relacionada ao tempo em que a perda demorou para ocorrer. 3.2 Estatura A estatura é medida é medida em estadiômetro ou antropômetro. O indivíduo deve ficar de pé com a coluna reta, pés unidos, olhos fixos no horizonte e braços estendidos ao longo do corpo. A estatura é utilizada associada com o peso para determinar o IMC e também reflete alterações corporais crônicas. Alguns métodos alternativos podem ser utilizados quando não o uso do estadiômetro não for possível. A altura do joelho é a medida com o indivíduo em posição supina ou sentado próximo da extremidade de uma cadeira com o joelho flexionado em ângulo de 90º, o comprimento medido vai do calcanhar à superfície anterior da perna na altura do joelho, de acordo com o gênero, conforme equações propostas por Chumlea. Essa técnica é indicada principalmente para utilização em idosos. 18 Figura 4 - Fórmula para a estimativa da estatura a partir da altura do joelho Fonte: CUPPARI, 2005 (Adaptado). #ParaCegoVer: A imagem mostra uma tabela de duas colunas e duas linhas apresentando uma fórmula para cada sexo para estimativa da estatura a partir da altura do joelho. A extensão dos braços é calculada com os braços estendidos, formando um ângulo de 90º com o corpo, mede-se a distância entre dos dedos médios das mãos utilizando-se uma fita métrica. A medida obtida corresponde à estimativa da altura do paciente. Já a estatura recumbente é calculado com o indivíduo em posição supina e em leito horizontal completo. Em um lençol marcam-se a altura da extremidade da cabeça e da base do pé do lado direito, depois se mede a distância entre esses dois pontos com fita métrica. O Índice de Massa Corporal (IMC) é um indicador simples de estado nutricional que utiliza peso e altura para estimar tecido adiposo. Embora não seja capaz de distinguir gordura corporal de massa magra e da presença de edemas, é um dos indicadores mais importantes no diagnóstico nutricional. O IMC deve ser interpretado com cautela, associados a outros parâmetros sempre que possível. 3.3 Circunferências As circunferências representam a soma das áreas muscular, gordurosa e óssea. São medidas simples e de baixo custo. Utiliza-se fita métrica não elástica ou trena, evitando compressão do tecido. São feitas medidas seriadas e é importante que sejam pelo mesmo observador. As mais utilizadas na prática clínica, são as circunferências do braço, cintura, coxa e panturrilha, pois são sensíveis às mudanças corporais por curtos períodos de tempo. Este método tem limitações, como por exemplo, a distribuição de gordura corporal, que é variável entre indivíduos, pode ser influenciada por presença e edemas e necessita experiência do observador. A circunferência do braço é a soma dos tecidos ósseo, muscular e adiposo. É sensível para indicar estado nutricional utilizando-se tabelas e equações. A circunferência muscular do braço avalia a reserva de tecido muscular com as medidas da circunferência do braço e da dobra cutânea tricipital, por meio de equação para estimativa e interpretação de dados, utilizando-se a tabela de Frisancho: 19 Figura 5 - Conferência muscular do braço (CBM) A circunferência da cintura é um indicador de adiposidade abdominal e risco cardiovascular. É importante identificar a distribuição de gordura, pois a obesidade abdominal (androide) está ligada ao desenvolvimento de doenças cardiovasculares e metabólicas. 3.4 Dobras cutâneas As dobras cutâneas são medidas para estimar a quantidade de tecido adiposo subcutâneo, que é diretamente relacionado à gordura corporal total. São bons indicadores de mudanças no tecido adiposo em longo prazo. É um método não invasivo, de baixo custo, aplicado utilizando-se um adipômetro. São medidas as dobras cutâneas bicipital, tricipital, subescapular, supra ilíaca, peitoral e abdominal. A dobra cutânea tricipital é a mais utilizada na prática clínica para monitoramento do estado nutricional. Considera-se que a região do tríceps é a mais representativa da camada subcutânea de gordura. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 3.5 Composição corporal O estudo da composição corporal é de fundamental importância para prescrição dietética e avaliação de indivíduos e populações. A avaliação da composição corporal permite diagnosticar possíveis anormalidades para com isso obter maior eficiência nas intervenções nutricionais. 20 A massa corporal humana é dívida em dois grupos, massa gordurosa e massa magra. A gordura é o componente mais variável do corpo, pode ser diferente entre mesmo sexo, idade, peso e altura. Em mulheres o conteúdo de gordura é maior do que em homens, sendo 26,9% do peso corporal total em mulheres e 14,7% em homens. A gordura corporal encontra-se em dois locais de reserva, o primeiro, chamado gordura essencial é a gordura presente na medula dos ossos, coração, pulmões, fígado, baço, rins, intestinos. Músculos e tecidos ricos em lipídios localizados no sistema nervoso central. Essa gordura é necessária para as funções fisiológicas do organismo. O outro depósito é chamado de gordura de reserva ou não essencial, é constituído por pela gordura acumulada no tecido adiposo, inclui os tecidos adiposos que protegem os órgãos internos de traumas e também, em maior volume o tecido adiposo localizado na superfície abaixo da pele (subcutâneo). O componente livre de gordura, chamado de massa magra é baseado na proporção de água, minerais, músculos, matéria orgânica e a quantidade de lipídios essenciais. Os métodos utilizados para avaliar a composição corporal podem ser diretos (dissecção macroscópica e extração lipídica, feitos em cadáveres) e indiretos (densitometria, absorciometria radiológica de dupla energia (DEXA), ultrassom, tomografia computadorizada, ressonância magnética). Entretanto, eles apresentam custo elevado, requerem locais apropriados, alta tecnologia e avaliadores especializados. Estes fatores os tornam limitados para aplicação na prática clínica. Os métodos duplamente indiretos, como bioimpedância elétrica e antropometria são de fácil utilização, não são invasivos e possuem baixo custo. O método da Bioimpedância elétrica é baseado no princípio da condutividade elétrica para estimativa de compartimentos corpóreos. A impedância, resultante da resistência à reatância ao fluxo elétrico se relaciona com o volume do corpo como condutor. Os tecidos magros são altamente condutores de corrente elétrica pela grande quantidade de água e eletrólitos, já a gordura e os ossos são pouco condutores. A avaliação é feita com o paciente deitado com as pernas afastadas e os braços paralelos, afastados do corpo. São colocados eletrodos em locais específicos da mão e do pé do lado dominante. Por meio de eletrodos distais é introduzida uma corrente elétrica imperceptível que é captada pelos eletrodos proximais. Desta forma, os valores de reatância e resistência são utilizados para determinação de água corporal, massa magra e gordura corporal por meio de cálculos fornecidos pelo software dos fabricantes. A bioimpedância é um método confiável e reconhecido por pesquisadores, inclusive para verificar estado de hidratação de indivíduos. Sua limitação é que os resultados podem ser influenciados pela alimentação, ingestão de líquidos, desidratação, presença de edemas, uso de diuréticos e ciclo menstrual. As circunferências podem ser utilizadas na avaliação da gordura corporal total, por meio de aferição com fita métrica inelástica e tabelas de conversão. Para mulheres adultas utilizam-se as 21 circunferências da cintura, coxa e panturrilha; para mulheres jovens cintura, coxa e antebraço; quadril, cintura e antebraço para homens adultos e braço, cintura e antebraço para homens jovens. As dobras cutâneas são utilizadas para estimar a gordura corporal total. Vários locais podem ser utilizados, porém,sugere-se que com a medida das 4 dobras (tricipital, bicipital, subescapular e supra ilíaca) a chance de erro é diminuída. As dobras cutâneas devem ser utilizadas para avaliar a gordura subcutânea em indivíduos baixo peso, eutróficos e moderadamente obesos. O uso deste método possui algumas limitações, entre elas está a consistência do tecido adiposo e a elasticidade da pele, que variam a pressão aplicada sobre o adipômetro. Além disso, as medidas estão sujeitas a importante margem de erro. É possível encontrar diferenças significativas em um mesmo ponto, mesmo quando a pessoa que realiza as medidas possui experiência. O erro maior está na localização incorreta do tecido a ser medido. Se a equipe observadora padronizar os procedimentos de medida, a margem de erro pode ser diminuída. 4. PARÂMETROS BIOQUÍMICOS Os parâmetros bioquímicos são úteis na avaliação nutricional pois permitem detectar deficiências nutricionais antes de suas manifestações clínicas. Os estágios fisiológicos e clínicos se apresentam na seguinte sequência quando o consumo alimentar de um ou mais nutrientes é inadequado: 1. Adaptação à menor ingestão de nutrientes, diminuindo sua excreção; 2. Manifestação de alterações bioquímicas ou hematológicas, que mostram piora nas funções celulares ou depósitos de nutrientes; 3. Manifestação clínica da deficiência nutricional, com sinais clínicos visíveis. A validade dos exames laboratoriais pode sofrer interferência de fatores como idade, sexo, estado fisiológico, estado emocional, algumas medicações, jejum não realizado ou incorreto e tipo de análise realizada. Por estas razões a avaliação nutricional por exames bioquímicos não deve ser considerado parâmetro isolado. O método mais apropriado para elaboração do diagnóstico e intervenção nutricional é a combinação de dados antropométricos, de consumo alimentar e achados laboratoriais. Os exames bioquímicos utilizados para avaliação do estado nutricional podem ser divididos em três blocos: avaliação da massa muscular, estado nutricional proteico e avaliação da competência imunológica. 22 4.1 Avaliação da massa muscular pelo índice de creatina/altura O músculo é a maior reserva de proteína do organismo. A creatina está localizada em 98% do tecido muscular e é sintetizada em vários órgãos (fígado, pâncreas, cérebro, baço, glândula mamária e principalmente rins). Seu produto de degradação (metabólito) é a creatinina. A diminuição do volume muscular é uma característica da desnutrição energético-proteica e sua estimativa é valiosa no diagnóstico nutricional. Considerando-se que a creatinina é 100% excretada na urina, a dosagem e creatinina urinária de 24h é utilizada como parâmetro para identificar condições da massa muscular. Para o cáculo é utilizada a seguinte fórmula: ICA (%) = creatina urinária de 24 h (mg) X 100 creatina urinária ideal (mg) Sendo: 80-90% = depleção leve 60-80% = depleção moderada < 60% = depleção grave. Embora seja um método útil, possui limitações: não deve ser usado em presença de doenças renais e na fase aguda de traumas, é influenciado pela ingestão proteica e atividade física intensa; e ainda, para que seja válido é fundamental que haja precisão na coleta na urina de 24 horas, pois em uma coleta com erro de apenas 15 minutos o resultado pode ser alterado. 4.2 Estado nutricional de proteínas Quando a depleção proteica é muito severa, as concentrações de proteínas plasmáticas diminuem, assim como os percentuais de proteínas viscerais. A queda na concentração dessas proteínas indica diminuição da síntese de proteínas pelo fígado, devido à limitada oferta de substrato energético e proteico, que estão associados à desnutrição. Entretanto, é importante entender que diversos fatores podem alterar a concentração de proteínas séricas, como variações no estado de hidratação, infecções, inflamação, aumento do catabolismo, doenças hepáticas. 23 Figura 6 - Principais proteínas plasmáticas utilizadas na avaliação nutricional Fonte: CUPPARI, 2005 (Adaptado). #ParaCegoVer: A imagem mostra uma tabela de cinco colunas e seis linhas apresentando as principais proteínas plasmáticas utilizadas para a avaliação nutricional. 4.3 Avaliação da competência imunológica Existe uma relação complexa entre nutrição e imunidade devido aos efeitos dos nutrientes no sistema imunológico. A carência de nutrientes específicos como aminoácidos, vitaminas, zinco, ferro, outros minerais e ácidos graxos é acompanhada por diversas alterações no sistema imunológico, refletindo em repostas imunes. A depressão da imunidade é observada a medida que um quadro de desnutrição progride. Desta forma, a avaliação da função imunológica auxilia na identificação de alterações nutricionais. Os testes imunológicos mais utilizados na avaliação do estado nutricional são a contagem total de linfócitos e testes de hipersensibilidade cutânea. Veja a seguir suas definições: Contagem de linfócitos ou linfocimetria glogal Representa o estado de imunidade celular e sofre influências não nutricionais, como a anestesia utilizada em cirurgias (nível retorna ao normal em 48h). É o número de linfócitos por mm³ encontrados no sangue, o valor 3 mínimo é 1500/mm³. Teste de hipersensibilidade cutânea tardia Injeção intradérmica de antígenos de memória e realiza-se a leitura em 24 a 48h. Caso o resultado seja uma enduração maior que 5 mm a reposta é considerada positiva, este método sofre influência da doença de base, portanto não é confiável na avaliação e monitorização do estado nutricional, entretanto apresenta bom valor prognóstico. 24 4.4 Monitorização da terapia nutricional Depois de realizado o diagnóstico nutricional, a conduta tomada precisa ser periodicamente avaliada. A excreção urinária de nitrogênio é utilizada para avaliar a adequação e direcionar o tratamento nutricional. Quando o nitrogênio diário total excretado na urina é igual ao nitrogênio liberado no metabolismo das proteínas considera-se que o indivíduo está em balanço neutro. Quando a ingestão de nitrogênio é maior que a excreção, considera-se balanço positivo, ou seja, o anabolismo é maior que o catabolismo de proteínas. O balanço positivo ocorre na gestação, períodos de crescimento, e na formação de novos tecidos, como em casos de cirurgias ou mesmo desnutrição prolongada. Quando a excreção de nitrogênio é maior que a ingestão, considera-se que o indivíduo está em balanço nitrogenado negativo, ou seja, o catabolismo está maior que o anabolismo de proteínas. Essa situação ocorre quanto a quantidade de proteína ingerida não é suficiente para suprir as necessidades do indivíduo. O balanço nitrogenado é calculado utilizando- se a seguinte fórmula: Ingestão proteica 24h (g) ÷ 6,25 – nitrogênio urinário 24 horas (g) + 4g A limitação deste método é que não deve ser realizado em pacientes com doença renal ou doenças que apresentem perdas maiores de nitrogênio pela presença de diarreia, fístulas, trauma, entre outros. 4.5 Inquéritos alimentares Os inquéritos alimentares são úteis para análise quantitativa da ingestão de energia e nutrientes, a avaliação do consumo de alimentos ou grupos alimentares e a avaliação do padrão alimentar individual. Os métodos de avaliação do consumo alimentar podem ser divididos em dois grupos: retrospectivos e prospectivos. Os primeiros incluem recordatório 24 horas, questionário de frequência alimentar e história dietética. O principal método prospectivo é o registro alimentar estimado e pesado, porém, não é utilizado em pacientes hospitalizados. No recordatório 24 horas, é pedido ao indivíduo que descreva todos os alimentos e bebidas ingeridos nas últimas 24 horas, com horários e quantidades, que geralmente são em medidas caseiras. Este método é fácil, rápido, tem baixo custo, pode ser aplicado às pessoas de baixa escolaridade, não afeta a dieta atual e pode ser usado para estimar o valor energético da dieta. Suas limitações são depender da memória do entrevistado,a ingestão nas últimas 24 horas que pode ter sido atípica, não fornece dados quantitativos precisos, pode ocorrer sub ou superestimação. A aplicação deste método requer treinamento do entrevistador, no sentido de evitar questionar alguns alimentos, mostrar espanto ou sinais de aprovação e desaprovação, não induzir o entrevistado, verificar ingestão de bebidas e se aquele foi um dia atípico. 25 O questionário de frequência alimentar consiste em uma lista definida de alimentos ou grupos alimentares em que o entrevistado indica a frequência em um período de tempo (diário, semanal, quinzenal, mensal). O número e o tipo de alimentos presentes na lista variam de acordo com o objetivo da avaliação. Este questionário fornece dados qualitativos sobre o consumo alimentar, não são fornecidos dados quantitativos. Existe o questionário de frequência alimentar semiquantitativo, em que as porções dos alimentos são estimadas em medidas caseiras. É um método de baixo custo, pode descrever padrões alimentares, pode ser auto aplicado e utilizado para estudos epidemiológicos da associação de nutrientes específicos com doenças crônicas. Suas desvantagens são: não ser possível saber sobre a circunstância e horário em que o alimento foi consumido, pode ocorrer subestimação já que nem todos os alimentos consumidos podem constar na lista. O diário ou registro alimentar é o método prospectivo em que o indivíduo registra no momento do consumo os alimentos e bebidas ingeridos em um período que pode variar de um dia a uma semana. As quantidades são registradas em medidas caseiras e depois convertidas em gramas. Dentre suas vantagens estão maior acurácia e precisão nas quantidades, não depende de memória, identifica os tipos de alimentos e os horários das refeições. Algumas desvantagens são: pode interferir no padrão alimentar, exige que o indivíduo saiba ler e escrever, é comum a subestimação e requer alto nível de colaboração e motivação. 4.6 Avaliação subjetiva global (ASG) A avaliação subjetiva global (ASG) identifica precocemente risco nutricional em pacientes. A primeira ASG foi desenvolvida para pacientes cirúrgicos, porém vem sendo amplamente utilizada em diferentes condições clínicas. A avaliação baseia-se na história clínica e exame físico. É um método simples, de baixo custo e que pode ser realizado à beira do leito. Identifica perdas de peso importantes, capacidade funcional (atividades de rotina que foram interrompidas), presença se sinais gastrintestinais (significativos se ocorrem diariamente por 2 a 3 semanas), avalia também por observação perdas de reserva muscular e gordurosa. Segue abaixo exemplo de ASG. 26 Figura 7 - Avaliação subjetiva global Fonte: DETSY et al., 1987 (Adaptado). #ParaCegoVer: A imagem mostra um modelo de Avaliação Subjetiva Global do estado nutricional. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 27 5. TERAPIAS NUTRICIONAIS A Terapia Nutricional Oral consiste na administração de nutrientes por meio de alimentação adequada e quando necessário, suplementos nutricionais para a prescrição de dietas orais é necessário que o trato gastrintestinal esteja íntegro, com condições de digerir e metabolizar os nutrientes. Os alimentos precisam ser adequados à doença, distribuídos de forma equilibrada e de acordo com as recomendações específicas. Ao elaborar a prescrição dietética e também o cardápio, além da adequação do ponto de vista fisiológico, é importante que a alimentação ofertada atenda aos sentidos e ao prazer em comer, respeitando hábitos regionais saudáveis e suprindo necessidades individuais. 5.1 Terapia Nutricional Enteral (TNE) A alimentação via trato gastrintestinal é a forma mais eficiente de nutrir o paciente quando suas funções de digestão e absorção funcionam, mas quando não é possível suprir o aporte nutricional adequado, a Terapia Nutricional Enteral (TNE) deve ser considerada. Ela é utilizada como via única de alimentação ou associada à via oral quando a ingestão é insuficiente. Fornece ainda nutrição adequada em casos de doenças crônicas, desnutrição, condições neurológicas, disfagia, queimaduras, traumas e alguns tipos de câncer. A TNE pode ser indicada em duas situações: em caso de risco de desnutrição por ingestão oral insuficiente, provendo de 2/3 a 3/ 4 das necessidades nutricionais diárias; ou o trato gastrintestinal está total ou parcialmente funcionaste, mas a ingestão pela via oral não é possível. Seguem abaixo alguns exemplos de indicação da nutrição enteral: • Impossibilidade de alimentação, em casos de inconsciência, anorexia nervosa, lesões orais, acidente vascular cerebral (AVC), neoplasias, doenças neurológicas; • situações em que a alimentação via oral causa desconforto, como doença de Crohn, coli- te ulcerativa, pancreatite, quimioterapia, neoplasia no trato gastrintestinal; • disfunção no trato gastrintestinal, como as síndromes de má absorção, síndrome do in- testino curto, fístulas. As complicações em TNE são relativas e temporárias, porém é necessário que haja conhecimento e seguimento cuidadoso do paciente, assim como da reavaliação frequente das metas da terapia nutricional. São complicações da terapia de nutrição enteral: • Disfunção do trato gastrintestinal que requeira descanso intestinal; • Vômitos e diarreia incoercíveis; • Fístulas digestivas de alto débito (>500 ml/dia); 28 • Hemorragia gastrintestinal severa; • Pancreatite aguda grave; • Obstrução mecânica do trato gastrintestinal; • Doença terminal; • Expectativa de uso menor do que 5 a 7 dias para pacientes desnutridos ou 7 a 9 dias para pacientes bem nutridos. Após a decisão de iniciar a TNE, é preciso considerar o tempo estimado em que será necessária para definir a melhor via de acesso, para isso deve-se avaliar o estado geral do paciente, integridade do trato gastrintestinal e funções de motilidade gástrica e intestinal. O acesso gástrico é utilizado quando o estômago possui suas funções e na ausência de retardo no esvaziamento, obstrução ou fístula. O posicionamento intestinal (duodeno ou jejuno) é indicado na presença de retardo no esvaziamento gástrico, gastroparesia, obstrução, pancreatite e quando há risco de refluxo e aspiração. A TNE é considerada de curta duração quando o tempo previsto para uso é menor do que seis semanas. Nesse caso, utilizam-se sondas nasoenterais, que podem ter posicionamento gástrico, duodenal ou jejunal. O uso além de seis semanas não é indicado, pois podem causar complicações infecciosas para os pacientes. A terapia nutricional por estomias (gástrica ou jejunal) é indicada para pacientes impedidos, temporariamente ou definitivamente, de se alimentar por via oral, quando o tempo estimado para uso é superior a seis semanas, em casos de disfunção na deglutição, neoplasias obstrutivas do trato gastrintestinal, entre outros. A inserção deste tipo de acesso é realizada por meio de cirurgia aberta ou percutânea. 5.2 Administração da TNE Os métodos de administração da NE podem ser intermitentes, em bolos ou contínuo. Veja a seguir suas definições: Administração intermitente Utiliza a força da gravidade, volume de 50 a 500 ml de dieta administrada por gotejamento, durante 2 a 4 horas, precedida e seguida por irrigação da sonda enteral com 20 a 30 ml de água potável. Administração em bolos Infusão de 100 a 350 mL com seringa por impulsionamento lento no estômago, precedida e seguida por irrigação da sonda enteral com 20 a 30 ml de água potável. 29 Administração contínua Uso de bomba de infusão, 25 a 150 ml/h, por 20 a 24h, interrompida a cada 4-6 horas para irrigação da sonda com 20-30 ml de água potável. 5.3 Complicações da TNE A TNE pode apresentar complicações, que quando conhecidas são tratáveis ou podem ser prevenidas com a adequada monitorização dos pacientes. As complicações podem ser classificadas em gastrintestinais, metabólicas, mecânicas, infecciosas, respiratórias e psicológicas. Veja abaixo quais os sinais ajudam a diagnosticá-las:Gastrointestinais Náuseas; vômitos; diarreia/obstipação; Distensão abdominal, cólicas, empachamento, flatulência. Metabólica Hiperidrataçao/desidratação; Hiperglicemia/hipoglicemia; Alterações de eletrólitos e elementos traço. Mecância Erosão nasal e necrose; obstrução da sonda; saída ou migração acidental; faringite. Infecciosas Gastroenterocolites por contaminação microbiana no preparo ou na administração da fórmula Respiratórias Aspiração pulmonar ou pneumonia infecciosa. Psicológicas Ansiedade; depressão; falta de estímulo alimentar; monotonia alimentar. 30 Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 5.4 Terapia de nutrição parental A terapia de nutrição parental é a forma de nutrir um indivíduo quando o trato gastrintestinal não está em condições de realizar a digestão e metabolismo de nutrientes. Consiste na administração de solução estéril contendo todos os nutrientes necessários por vias que não são do trato gastrintestinal. Pode ser de dois tipos: Nutrição parenteral periférica: A solução parenteral é administrada em veias menores, como mão ou antebraço. Indicada para períodos curtos, de 7 a 10 dias, em geral não atinge as necessidades do paciente e funciona como complemento; Nutrição parenteral central ou total: A solução parenteral é administrada em veias centrais de maior calibre (jugular ou subclávia interna). Indicada para uso superior a 7 dias e fornece aporte calórico e proteico para suprir totalmente as necessidades do indivíduo. A nutrição parenteral é indicada quando a alimentação pela via oral não é possível, quando a absorção de nutrientes é incompleta, se o trato gastrintestinal não funciona, está obstruído e ainda, se alguma dessas condições se associa a um quadro de desnutrição. Antes de indicar a nutrição parenteral alguns fatores devem ser considerados na decisão, como acesso venoso disponível, limitação de aporte hídrico, previsão da duração da terapia, aporte energético e proteico necessários. Abaixo estão relacionadas algumas indicações específicas: • Vômitos intratáveis: pancreatite aguda, quimioterapia, hiperêmese gravídica; • Diarreia grave, doença inflamatória intestinal, síndromes de má absorção, síndrome do intestino curto; • Obstrução, neoplasias, aderências; 31 • Íleo paralítico; • Repouso intestinal, fístulas enteroentéricas ou enterocutâneas; • Pré-operatórios: somente em casos de desnutrição grave na qual a cirurgia não possa ser adiada. A nutrição parenteral é contraindicada em pacientes hemodinamicamente instáveis, com hipovolemia, choque cardiogênico ou séptico, edema agudo de pulmão, anúria ou em diálise e distúrbios metabólicos e eletrolíticos graves. Todos os nutrientes essenciais devem estar presentas na solução parenteral e devem ser fornecidos em quantidades adequadas. Deve ser composta por carboidratos, lipídios, aminoácidos, eletrólitos, oligoelementos e vitaminas. Esses nutrientes estão modificados, pois serão diretamente lançados na corrente sanguínea. Os carboidratos são utilizados na forma de glicose, as proteínas na forma de aminoácidos e lipídios sob a forma de emulsão lipídica. A terapia de nutrição parenteral pode apresentar complicações, particularmente em pacientes desnutridos. As seguintes complicações podem surgir: Mecânicas Relacionadas à inserção do cateter e incluem pneumotórax, hemotórax e lesão vascular. Infecciosas Sepses relacionadas ao cateter por infecção por fungos e bactérias. Metabólica Hiperglicemia, disfunção hepática, síndrome de realimentação, distúrbios no equilíbrio acidobásico. 32 Nesta unidade, você teve a oportunidade de: • conhecer as noções e conceitos da Dietoterapia e prescrição dietética; • compreender sobre as modificações que devem ser realizadas nas dietas hospitalares para atender diversos tipos de demanda de pacientes, considerando a importância da individualidade; • aprender sobre avaliação nutricional do paciente hospitalizado considerando a importância de integrar diferentes métodos para um correto diagnóstico nutricional; • analisar indicações, vantagens e desvantagens da terapia nutricional nas formas oral, enteral e parenteral. PARA RESUMIR BANKHEAD, R. et al. Enteral Nutrition Practice Recommendations. Journal of Parenteral and Enteral Nutrition, Chicago, v. 33, n. 2, p. 122-167, 2009. BARBOSA, A. et al. Comparação dos critérios da NRS-2002 com o risco nutricional em pacientes hospitalizados. 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Aprenda conceitos fundamentais e recomendações preconizadas para o manejo nutricional da hipertensão arterial sistêmica, dislipidemias e aterosclerose, infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca, transplante cardíaco, diabetes mellitus, obesidade e síndrome metabólica. Bons estudos! Introdução 37 1 HIPERTENSÃO ARTÉRIA SISTÊMICA A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é caracterizada pela elevação crônica da pressão arterial (≥ 140 x 90 mmHg) e possui etiologia múltipla, incluindo fatores biológicos e comportamentais, como obesidade, sedentarismo, tabagismo, e elevado consumo de sódio e álcool. Segundo a Sociedade Brasileira de Cardiologia, 32,5% dos adultos e 60% dos idosos brasileiros são hipertensos (Scala et al. 2015), sendo assim considerada um problema de saúde pública. Apesar de geralmente ser assintomática, a HAS é um dos principais fatores de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares (DCV), como infarto agudo do miocárdio, acidente vascular encefálico e insuficiência cardíaca, sendo associada à cerca de 50% das mortes por DCV (Scala et al., 2015). 1.1 Fisiopatologia da hipertensão arterial sistêmica Os fatores determinantes da pressão arterial são o débito cardíaco e a resistência periférica, ou seja, o volume de sangue que o coração bombeia por minuto e a resistência dos vasos ao fluxo sanguíneo, respectivamente. Considerando isto, nota-se que alterações em um ou em ambos os fatores promoverão variações na pressão arterial (Raymond et al., 2013; Costa et al., 2014). O sistema nervoso central e os rins são principais mecanismos que regulam os níveis pressóricos. Assim, quando há uma falha ou desequilíbrio permanente desses mecanismos reguladores, os fatores determinantes da pressão são alterados em favor do aumento da pressão, e então a HAS é instalada (Raymond et al., 2013; Costa et al., 2014). 1.2 Dietoterapia na hipertensão arterial sistêmica Diretrizes nacionais e internacionais vem preconizando mudanças no estilo de vida e adoção de hábitos saudáveis como tratamento não-farmacológico, uma vez que tal abordagem tem se mostrado eficiente tanto para a prevenção quanto para o controle da HAS. A tabela “Efeito das mudanças no estilo de vida sobre a pressão arterial” apresenta as principais modificações dietoterápicas e comportamentais relacionadas a evidências de redução da pressão arterial sistólica (pressão durante a fase contração do coração). 38 Figura 1 - Efeito das mudanças no estilo de vida sobre a pressão arterial Fonte: Sociedade Brasileira de Cardiologia, 2016 (Adaptado). #ParaCegoVer: Na tabela, temos as principais mudanças de estilo de vida que estão associadas a redução da pressão arterial, bem como os valores aproximados de redução. IMC = índice de massa corporal; DASH = Dietary approaches to stop hypertension. A dieta DASH é considerada ideal para hipertensos. Nela preconiza-se a ingestão de frutas, verduras, cereais, frango, peixe e laticínios com baixo teor de gordura, e redução de carne vermelha, doces e bebidas açucaradas, garantindo aporte necessário de potássio, cálcio e magnésio. Adicionalmente à diet DASH, recomenda-se a restrição de sódio e de álcool, bem como a prática regular de exercício físico e redução de peso corpora, que são fatores que também contribuem para a redução da pressão arterial. É importante destacar que o sucesso e eficiência da terapia não-medicamentosa só serão sustentados à longo prazo se houver adesão à dieta e à novos hábitos saudáveis. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 2 DISLIPIDEMIAS E ATEROSCLEROSE Dislipidemia é uma condição decorrente da disfunção no metabolismo lipídico, caracterizada 39 por níveis elevados de triglicérides (TG) e/ou alterações nas frações de colesterol (total, LDL e HDL) plasmáticos, e por isso é considerada um fator de risco muito significativo para o desenvolvimento de DCV. Esta patologia pode ter etiologia genética, sendo classificada como primária ou familiar; ou pode ser de origem ambiental e comportamental, resultantes do estilo de vida, de hábitos alimentares e de doenças prévias, sendo então denominada como secundária. As dislipidemias também são rotuladas quanto às anomalias lipídicas manifestadas. Os valores de referência para a população brasileira foram determinados na Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose (2017, p.13): Hipercolesterolemia isolada LDL ≥160 mg/dL Hipertrigliceridemia isolada TG ≥150 mg/dL Hiperlipidemia mista LDL ≥160 mg/dL e TG ≥150 mg/dL Redução do HDL HDL em homens <40 mg/dL e em mulheres <50 mg/dL; ou associado a LDL ≥160 mg/dL ou de TG ≥150 mg/dL As dislipidemias estão diretamente ligadas ao processo de aterogênese, levando, de forma lenta ou acelerada, a depender dos fatores genéticos e ambientais, ao desencadeamento da aterosclerose. Essa patologia de origem multifatorial é apontada como a principal causa de mortes no Brasil (Montenegro et al., 1999) e no mundo, e é considerada a causa primária de eventos graves como infarto agudo do miocárdio e acidente vascular encefálico. 2.1 Fisiopatologia das dislipidemias e aterosclerose Suscintamente, o metabolismo lipídico ocorre como descrito a seguir. Os lipídeos oriundos da dieta são absorvidos e transportados por quilomícrons (Qm), que entregam ácidos graxos livres para os tecidos e músculo, e colesterol para o fígado. Já o colesterol e TG sintetizados pelo fígado são transportados no sangue pela lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL). A VLDL então libera TG para tecidos muscular e adiposo, e transformando-se assim na lipoproteína de baixa densidade (LDL). A LDL remanescente é removida pelos receptores de LDL presentes na superfície dos hepatócitos. No entanto, quando há disfunção nesse mecanismo de regulação ou excesso de produção de LDL, a concentração plasmática dela pode aumentar. Assim, o excesso de LDL 40 que não foi removido pode sofrer oxidação e são retiradas da circulação por macrófagos que se encontram na camada íntima das artérias, contribuindo para o processo de aterogênese. Já a lipoproteína de alta densidade (HDL), que é secretada pelo fígado e pelo intestino, faz o chamado transporte reverso de colesterol, retirando o colesterol das membranas celulares e de outras lipoproteínas (Qm e VLDL) e o levando de volta ao fígado. Dessa forma, a HDL contribui para a remoção de colesterol dos tecidos periféricos e circulação, sendo considera benéfica por reduzir o risco de aterogênese (Costa et al., 2014). Logo, disfunções nesses mecanismos leva a alterações no perfil lipídico, que são denominadas como dislipidemia, e por sua vez podem acelerar o processo de aterogênese e provocar a aterosclerose. A aterosclerose pode ser considerada como um processo inflamatório crônico em resposta a danos causados ao tecido endotelial das artérias de grande e médio porte. O acúmulo de LDL oxidada é apontado como o principal fator para a formação da placa aterosclerótica, constituída por LDL, leucócitos e tecido conectivo, criando uma placa fibrosa que pode levar à serias complicações a longo prazo, como ilustrado na figura “Processo de formação da placa aterosclerótica”, que mostra a evolução da formação de uma placa aterosclerótica até chegar a obstrução total da artéria. Este evento causará complicações vasculares importantes dependendo do local que a obstrução ocorrer, podendo ocasionar infarto agudo do miocárdio e acidente vascular encefálico, por exemplo (Corrêa-Camacho et al., 2007). 2.2 Dietoterapia nas dislipidemias e asterosclerose Diante das evidências de que dietas inadequadas e hábitos não saudáveis, como sedentarismo e tabagismo, têm grande contribuição no desenvolvimento das dislipidemias e processos aterogênicos, constata-se que a terapia nutricional exerce um papelimportante e deve sempre ser considerada, juntamente com mudanças no estilo de vida, como a primeira estratégia terapêutica na prevenção e tratamento de dessas enfermidades. A tabela “Recomendações dietéticas para o tratamento de dislipidemias e aterosclerose” sintetiza as principais recomendações dietoterápicas eficientes para o normalizar diferentes faixas de valores de LDL-c e TG. FIQUE DE OLHO As lipoproteínas têm a função de transportar os lipídeos e são classificadas de acordo com sua densidade, que por sua vez depende do conteúdo que transportam. Assim, a VLDL que é rica em TG e colesterol é menos densa, a LDL que é rica em colesterol tem densidade moderada, e a HDL é a mais densa por ser rica em proteína. 41 Figura 2 - Recomendações dietéticas para o tratamento de dislipidemias e aterosclerose Fonte: Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose, 2017 (Adaptado). #ParaCegoVer:Na tabela, temos as principais recomendações nutricionais para diferentes valores de LDL-c e triglicérides.VET = valor energético total. De maneira geral, as diretrizes para dislipidemias e aterosclerose incentivam a adoção da dieta do Mediterrâneo, que enfatiza a redução de gordura saturada e aumento da gordura poli e principalmente monoinsaturada, e eliminação total de ácido graxo trans, além da ingestão de carnes magras, frutas, grãos e hortaliças na dieta, mantendo níveis adequados de fibras e redução do açúcar (Sociedade Brasileira de Cardiologia, 2017). Apesar do consumo de bebida alcoólica ser desaconselhado, especialmente para os portadores de hipertrigliceridemia, a dieta Mediterrânea recomenda a ingestão moderada de vinho (1 a 2 taças diariamente). O resveratrol, um composto polifenólico encontrado na uva, é um potente antioxidante e parece contribuir para a redução da pressão arterial e prevenção da aterosclerose, provavelmente por inibir a oxidação das LDL-c (Costa et al., 2014). Devemos lembrar, no entanto, que qualquer composto antioxidante possui a propriedade de reduzir o estresse oxidativo. Orientações mais recentes têm indicado que o colesterol dietético pouco influencia os níveis plasmáticos de colesterol, portanto não há recomendação de redução ou valores máximos de ingestão. Além das mudanças dietéticas, modificações do estilo de vida também como perda de peso corporal, prática regular de exercícios físicos e cessação do tabagismo também são medidas muito eficientes no tratamento das dislipidemias e consequentemente na prevenção da aterosclerose. 3. INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO O infarto agudo do miocárdio (IAM) é uma condição clínica grave, geralmente causada por 42 aterosclerose, com alto índice de mortalidade, sendo classificada como a causa primária de morte por DCV no Brasil. Os principais fatores de risco são a genética, gênero (homens), idade (> 45 anos), doenças preexistentes como HAS, diabetes mellitus, dislipidemias e obesidade, e fatores ambientais como tabagismo e estresse (Costa et al., 2014). 3.1 Fisiopatologia do infarto agudo do miocárdio As placas ateroscleróticas formadas ao longo da vida levam ao estreitamento luminal das artérias coronárias reduzindo ou até mesmo impedindo o fluxo coronário. Com isso, o coração recebe um aporte insuficiente sangue e, portanto, de oxigênio, provocando necrose do músculo cardíaco. Quando há necrose por oclusão total pelo trombo, o IAM é classificado como IAM Q. Já quando a oclusão é parcial, com fluxo sanguíneo reduzido, porém sem afetar toda a extensão do músculo cardíaco, é denominado como IAM não Q (Costa et al.). 3.2 Dietoterapia no infarto agudo do miocárdio A dietoterapia no IAM visa reduzir a sobrecarga cardíaca e corrigir as alterações metabólicas, garantindo suporte nutricional adequado através da ingestão de uma dieta equilibrada e sempre considerando as enfermidades associadas. É importante salientar que o paciente deve permanecer em repouso alimentar durante as primeiras 4h a 12h horas após o diagnóstico de IAM. A alimentação por via oral é sempre a opção preferencial, porém se o paciente estiver impossibilitado de se alimentar por essa via e apresentar-se hemodinamicamente estável, o protocolo de suporte nutricional enteral deve ser iniciado. Caso contrário, a dieta deve ser suspensa até que o quadro hemodinâmico estabilize. Recomenda-se que as primeiras refeições por via oral sejam fornecidas em consistência liquida ou pastosa, fracionadas em pequenos volumes (5 a 6 refeições), evitando temperaturas extremas, com o intuito de reduzir o trabalho cardíaco durante os processos digestórios. Além disso, deve-se incluir fibras na dieta (20 a 30 g/dia) devido a tendência à constipação nos primeiros dias após o evento. É essencial orientar os pacientes quanto a adoção de dieta e estilo de vida saudáveis após a recuperação clínica 4 INSUFICIÊNCIA CARDÍACA A insuficiência cardíaca (IC) consiste em uma síndrome complexa em que o coração não funciona de forma eficiente, resultando em perfusão insuficiente para atender às demandas metabólicas do organismo. Tem-se notado o aumento gradativo da incidência de IC nas últimas décadas, o que tem sido associado a fatores como envelhecimento da população, maior sobrevivência ao IAM, e aumento da obesidade. Nesse sentido, a IC é considerada como um problema de saúde pública que tem levado a um número considerável de hospitalizações, 43 cerca de 25% do total de internações no Brasil. Condições clínicas como IAM, hipertensão arterial sistêmica, diabetes mellitus, hipertrofia ventricular esquerda, valvulopatia, obesidade, dislipidemia e, particularmente no Brasil, a doença de Chagas constituem-se como os principais fatores de risco para IC. 4.1 Fisiopatologia da insuficiência cardíaca A IC é caracterizada por um bombeamento insuficiente de sangue (insuficiência sistólica) ou dificuldade de enchimento do coração (insuficiência diastólica), impedindo que o fluxo sanguíneo circule de maneira adequada, o que leva a manifestações clínicas como fadiga, dispneia (falta de ar) e retenção de líquidos, entre muitos outros sintomas, dependendo do estágio de gravidade da doença. Uma das mais importantes complicações da IC é a caquexia cardíaca apresentada nos estágios finais da doença, que acomete entre 10% a 15% dos portadores de IC. A caquexia cardíaca é definida como uma perda significativa e involuntária de peso corporal, especificamente de massa magra, que está diretamente relacionada ao agravamento da IC por afetar também o coração, uma vez que implica na redução do músculo cardíaco também (Raymond e Couch, 2013). As principais causas de morte por IC são de forma súbita, por progressiva falência de bomba, IAM e acidente vascular encefálico (Sociedade Brasileira de Cardiologia, 2009). 4.2 Estado nutricional de proteínas A dietoterapia para IC objetiva fornecer uma dieta adequada em termos de energia e nutrientes para recuperar o estado nutricional do paciente, minimizar a perda de peso ponderal e de massa magra, impedir a sobrecarga cardíaca, e dessa forma reduzir o tempo de hospitalização bem como evitar futuras internações. Como muitos pacientes apresentam perda de peso acentuada e desnutrição, uma estratégia interessante para alcançar as metas de ingestão calórica é aumentar a densidade calórica das refeições e/ou oferecer suplementos nutricionais, além de fracionar as refeições e fornecê-las com a consistência de preferência do paciente, a fim de aumentar a aceitação e adesão à nova dieta. Recomenda-se dieta normoglicídica, normolipídica e normo a hiperprotéica, devido ao estado hipermetabólico e hipercatabólico característicos da doença. Em quadros de desnutrição ou caquexia deve-se oferecer entre 1,5 a 2,0 g/kg/dia de proteína. Além disso, a inclusão 25 a 30 g/dia de fibra, sendo 6 g de fibra solúvel, bem como a substituição parcial de gordura saturada por mono e poli-insaturadas, e a restrição de sódio são medidas dietéticas fortemente indicadas. É importante tambémgarantir a ingestão adequada de micronutrientes como potássio e magnésio devido ao uso crônico de diuréticos. Em alguns casos é necessário restringir a ingestão de líquidos. 44 4.3 Transplante cardíaco O transplante cardíaco é indicado para pacientes com IC em níveis mais graves, consistindo em alto risco de morte, sendo estes, portanto, casos em que não há outra alternativa de tratamento a não ser a realização desta cirurgia. Tais pacientes são submetidos à uma rigorosa bateria de exames, com o intuito de avaliar possíveis comorbidades associadas, prognóstico da doença e chance de adesão ao tratamento para definir se eles estão aptos ou não para integrar a lista de espera pelo transplante. O protocolo de transplante cardíaco consiste nas fases pré-transplante, pós-transplante imediato e pós-transplante de longo prazo. A dietoterapia é considerada como um fator fundamental durante esse processo e será abordada a seguir. 4.4 Dietoterapia no pré e no pós-transplante cardíaco O estado nutricional na fase pré-transplante interfere diretamente no sucesso do pós- transplante. Por isso a adoção de um estilo de vida saudável antes da cirurgia, como controle do peso corporal, prática de exercícios físicos, cessação do tabagismo, restrição de sódio e de bebida alcoólica são altamente recomendados. Fatores como baixo peso e obesidade no pré- cirúrgico e doenças pré-existentes como HAS e dislipidemia aumentam a morbi-mortalidade no pós-transplante. Portanto, uma avaliação nutricional minuciosa deve ser realizada nesta fase para melhorar o estado nutricional do paciente e evitar complicações adiante. Na fase pós-transplante imediato as necessidades nutricionais do paciente estão aumentadas devido ao estado catabólico característico após cirurgias de grande porte, como estresse cirúrgico e processo de cicatrização, e particularmente no caso de cirurgia de transplante de órgãos, pelos efeitos metabólicos provocados pelo uso de imunossupressores. Além disso, condições referentes a IC, tais como hipermetabolismo e caquexia, também podem influenciar estado nutricional do pós-transplantado e devem ser consideradas na definição da terapia nutricional adotada para esses pacientes nesta fase. Nesse contexto, os principais objetivos dietoterápicos são fornecer calorias suficientes para manutenção ou recuperação do peso, maior aporte proteico e controle da hiperglicemia, que é frequentemente ocasionada pela terapia imunossupressora. Em caso de baixa aceitação da dieta ou ingestão insuficiente por via oral, recomenda-se a complementação com suplementos de alta densidade calórica, ou até mesmo a iniciar a terapia nutricional por via enteral. A terapia farmacológica geralmente prescrita no pós-transplante aumenta consideravelmente o risco de dislipidemia, osteoporose, infecções, obesidade e HAS, que por sua vez aumentam as chances de IC no pós-transplante e a rejeição do órgão. Com isso, a mudança no estilo de vida e alimentação saudável, são medidas imprescindíveis para aumentar a sobrevida no pós- transplante de longo prazo. 45 5. DIABETES MELLITUS O diabetes mellitus (DM) é definido como um distúrbio metabólico caracterizado por quadro hiperglicêmico crônico, causado por falha na produção e/ou no mecanismo de ação de insulina, levando a alterações do metabolismo de carboidratos, proteínas e lipídios. As principais complicações resultantes do DM são retinopatia, nefropatia, neuropatia, doença coronariana, doença cerebrovascular e doença arterial periférica. É considerado um problema de saúde pública mundial, acometendo 12,5 milhões de brasileiros. 5.1 Fisiopatologia dos diferentes tipos de diabetes mellitus Os principais e mais recorrentes tipos de DM são DM tipo 1 (DM1), DM tipo 2 (DM2) e DM gestacional (DMG). Entretanto, antes da evolução para DM, há um estágio intermediário com valores glicêmicos situados entre a faixa normal e hiperglicemia (≥ 100 e < 126 mg/dL). A adoção de medidas preventivas como dieta saudável e exercício físico são determinantes para evitar a instalação definitiva de DM2. Veja a seguir suas definições: DM 1 O DM1 é causado pela destruição progressiva das células β pancreáticas por mecanismos autoimunes ou de origem idiopática, resultando na deficiência total de insulina. Por isso também é conhecido como “insulino-dependente”, uma vez que o principal tratamento para controlar a hiperglicemia nesses casos é a injeção diária de insulina exógena. O DM1 é diagnosticado geralmente na infância ou adolescência. DM2 O DM2 está associado a resistência à insulina combinado a um comprometimento das células β pancreáticas. No entanto, este tipo tem etiologia principalmente ambiental, sendo a obesidade e o sedentarismo os principais fatores de risco por estarem diretamente relacionados ao aumento da resistência à insulina nos tecidos periféricos. Estima-se que 80% das pessoas acometidas por DM2 são obesas DMG O DMG consiste em hiperglicemia detectada pela primeira vez durante a gravidez, que pode cessar ou persistir após o parto. Constam como alguns fatores de risco para DMG idade materna avançada, obesidade, ganho excessivo de peso ou pré-eclâmpsia na gravidez atual, crescimento fetal excessivo, HAS, DMG prévio e história familiar de DM (Sociedade Brasileira de Diabetes, 2019). 46 5.2 Dietoterapia na diabetes mellitus A terapia nutricional é um componente essencial do protocolo terapêutico do DM. O foco dietoterápico é controlar a glicemia, o perfil lipídico, a pressão arterial e o peso corporal, visto que a redução de peso melhora todas essas condições e também a resistência à insulina em portadores de DM com sobrepeso ou obesidade. Diante disso, as diretrizes para o tratamento de obesidade incluem a prática regular de exercício físico como tratamento do DM. Como preconizado pelas Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2019-2020 (2019, p. 99) na tabela “Recomendações nutricionais para portadores de diabetes mellitus”, a dieta ideal para diabéticos deve ser normoglicídica, normoproteica e normolipídica, normo ou hipocalórica, dependendo se objetivo é de manutenção ou redução do peso corporal, respectivamente. Recomenda-se a ingestão de quantidades normais de fibras e micronutrientes, e optar preferencialmente por gordura mono e poliinsaturada ao invés de saturada. Apesar da orientação para limitar o consumo de sacarose para no máximo 10% do valor energético total da dieta, sabe-se que a sacarose e o amido elevam a glicemia de forma igual. No entanto, a justificativa para a restrição de sacarose é que os alimentos integrais fonte de amido fornecem, além de carboidratos, quantidades interessantes de vitaminas e minerais, por isso eles devem ser consumidos preferencialmente em relação a sacarose. Figura 3 - Recomendações nutricionais para portadores de diabetes mellitus Fonte: Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2019-2020, 2019 (Adaptado). #ParaCegoVer: Na tabela, temos listadas as recomendações nutricionais de macro e micronutrientes para portadores de diabetes mellitus. VET = valor energético total. 47 A principal estratégia nutricional para a manutenção do controle glicêmico dos diabéticos é monitorar quantidade de carboidrato ingerida por refeição, que pode ser realizada a partir de métodos de contagem de carboidratos e de substituições de alimentos. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 6 OBESIDADE E SÍNDROME METABÓLICA A obesidade (IMC ≥ 30 kg/m²) é uma doença crônica, caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, que por sua vez provoca alterações metabólicas e endócrinas, o que a classifica como fator de risco para inúmeras outras doenças, incluindo a síndrome metabólica (SM). De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2016 haviam 650 milhões de adultos obesos no mundo e 124 milhões de crianças e adolescentes, o que torna a obesidade uma epidemia mundial que atinge todas as faixas etárias.A SM é um transtorno complexo composto por disfunções metabólicasassociadas, geralmente correlacionado a obesidade central (deposição de gordura na região abdominal) e a resistência à insulina. 6.1 Fisiopatologia da obesidade e síndrome metabólica A etiologia da obesidade é diretamente relacionada aos hábitos de vida e escolhas alimentares que são potencializados por fatores genéticos individuais. O estilo de vida moderno, caracterizado por aumento do sedentarismo, da ingestão de dietas hipercalóricas e de alimentos ultraprocessados, resulta em balanço energético positivo, ou seja, se a ingestão alimentar é maior que o gasto energético, há acúmulo de gordura e ganho de peso. O acúmulo de tecido adiposo, principalmente na região abdominal, leva a disfunções neuroendócrinas, metabólicas e a uma condição inflamatória generalizada, o que tem sido considerado como um dos principais mecanismos responsáveis pela resistência à insulina 48 frequentemente desenvolvida por indivíduos obesos. Além disso, o aumento de ácidos graxos livres circulantes e de gordura no fígado contribuem para o desencadeamento de dislipidemias. A obesidade central também está relacionada ao aumento da pressão arterial (Carvalho et al., 2009). Tais desordens compõem a SM, que parece ter a obesidade central como fator de base devido as alterações metabólicas induzidas por ela. A SM é diagnosticada quando três dos cinco critérios estão presentes. Os critérios para SM estão apresentados na tabela “Critérios para diagnóstico da síndrome metabólica”. Figura 4 - Critérios para diagnóstico da síndrome metabólica Fonte: Diretriz Brasileira de Diagnóstico e Tratamento da Síndrome Metabólica, 2005 (Adaptado). #ParaCegoVer: Na tabela, temos listadas os critérios e seus valores de referência para diagnóstico de síndrome metabólica. 6.2 Dietoterapia na obesidade e síndrome metabólica A terapia nutricional para o paciente obeso consiste em promover uma perda de peso moderada e sustentada, com metas possíveis e de fácil adesão, com o intuito de melhorar a qualidade de vida e reduzir os danos metabólicos. Além disso, deve-se incentivar mudanças no estilo de vida, alimentação saudável e prática regular de exercício físico. 49 Portanto, recomenda-se uma dieta de restrição energética moderada, com redução 500 kcal a 1.000 kcal por dia da ingestão energética habitual, não devendo ser inferior a 1.500 kcal. Como apresentado na tabela “Recomendações nutricionais para tratamento da obesidade”, a dieta deve ser normoglicídica, normolipídica e normoprotéica, no entanto, deve-se atentar para a escolhas de opções saudáveis, incluindo fontes de fibras, vitaminas, minerais e gorduras mono e poliinsaturadas, e evitar alimentos com alta densidade energética e bebidas açucaradas. Figura 5 - Recomendações nutricionais para tratamento da obesidade Fonte: CARVALHO, et al., 2009 (Adaptado). #ParaCegoVer: Na tabela, temos listadas as principais recomendações dietéticas para o tratamento da obesidade. VET = valor energético total. Para indivíduos com SM a orientação é manter a recomendação acima associada à terapia nutricional adequada às outras disfunções apresentadas, como por exemplo restrição de sódio, controle da glicemia, atenção à qualidade e quantidade de lipídios. Considerando isto, a I Diretriz Brasileira de Diagnóstico e Tratamento da Síndrome Metabólica (2005) orienta a adoção da dieta DASH ou Mediterrânea. 50 Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 6.3 Terapia nutricional na cirurgia de obesidade A cirurgia de obesidade, também chamada cirurgia bariátrica, é considerada para indivíduos com obesidade mórbida (IMC ≥ 40 kg/m²) que por algum motivo não obtiveram sucesso suficiente de perda de peso e controle das comorbidades por meio de tratamentos dietoterápicos e medicamentosos. O acompanhamento nutricional é um pilar fundamental nesse processo, especialmente no período pós-operatório, devido a modificações drásticas na ingestão alimentar que podem induzir um estado de desnutrição, complicações pós-cirúrgicas relacionadas ao volume e escolhas alimentares inadequadas, aumento da morbi-mortalidade. Além disso, há perda ponderal acentuada nos estágios iniciais de pós-operatório, devido à baixa ingestão energética, devendo ser acompanhado cautelosamente por um nutricionista. Portanto, o manejo nutricional está diretamente ligado ao sucesso ou fracasso do procedimento à curto e longo prazo. A terapia nutricional no período pré-operatório consiste em estimular o paciente a perder peso para reduzir o risco cirúrgico e orientar sobre as adaptações dietéticas, reeducação alimentar e mudança do estilo de vida. No período pós-operatório deve-se focar na recuperação e adaptação do trato gastrointestinal, por isso é importante atentar para a consistência da dieta em cada fase, o volume oferecido e os alimentos proibidos, cuidando para evitar episódios de síndrome de dumping (esvaziamento gástrico rápido, causado por excesso de açúcar e gordura). O foco inicialmente é gerar o mínimo de trabalho gástrico, por isso o fornecimento de dieta líquida restrita por 1 a 3 dias (chás, refrescos e caldos de legumes). Em seguida introduz-se a dieta líquida completa. As preparações devem ser liquidificadas, oferecidas como sopas e consumidas lentamente em quantidades menores. Para garantir um maior aporte calórico e nutricional, que ainda é bastante inadequado nesta fase, é aconselhado 51 incluir frutas, legumes, leite, iogurtes e carnes, e evitar a adição de açúcar. Após aproximadamente um mês evolui-se para dieta pastosa, mantida por cerca de 15 dias. Há maior variedade de alimentos permitidos gerando modesto aumento do valor energético das refeições. Carnes desfiadas ou moídas, purês de legumes, arroz empapado e macarrão são exemplos de alimentos liberados. Orienta-se evitar preparações de alta densidade energética como doces e dar preferência para fontes proteicas. Em seguida dá-se início a dieta branda, constituída por alimentos sólidos, porém pobres em fibras e gordura, facilitando a digestibilidade e permitindo observar a tolerância alimentar dos pacientes, além de prepara-los para a transição para a dieta normal. Essa fase dura em média um mês. Por fim, evolui-se para dieta normal, sem restrição alimentar, porém ainda hipocalórica e fracionada, respeitando a capacidade gástrica. Recomenda-se a adoção de hábitos alimentares saudáveis, como a ingestão de frutas, hortaliças e fontes proteicas, e a redução de produtos ultraprocessados, doce e gordura. Suplementos polivitamínicos e minerais devem ser prescritos, devido processos disabsortivos e inadequação do aporte de micronutrientes em uma dieta hipoenergética. 52 Nesta unidade, você teve a oportunidade de: • estudar a fisiopatologia das doenças cardiovasculares e endócrinas mais prevalen- tes; • entender como as escolhas alimentares e o estilo de vida estão diretamente envolvi- dos no desenvolvimento e agravamento das doenças cardiovasculares e endócrinas abordadas; • compreender a importância da terapia nutricional como principal tratamento não- -medicamentoso para as desordens estudadas; • conhecer ferramentas e protocolos aplicados no contexto dietoterápico das enfer- midades estudadas, como contagem de carboidratos, dietas DASH e Mediterrânea, e modelo de algoritmo para tratamento da obesidade; • aprender as principais orientações e cuidados envolvidos em todas as fases do acompanhamento nutricional do paciente submetido à cirurgia da obesidade. PARA RESUMIR CARVALHO, K.M.B. et al. Obesidade e Síndrome Metabólica. In: CUPPARI, L. Nutrição nas Doenças Crônicas Não-Transmissíveis. 1ª. ed. São Paulo: Manole, 2009. CORRÊA-CAMACHO, C. R. et al. Aterosclerose, uma resposta inflamatória. Arquivo de Ciências da Saúde, 14(1):41-48, jan-mar/2007. COSTA, R. P. et al. Doenças cardiovasculares. In: CUPPARI, L. Guia de Nutrição: Nutrição Clínica no Adulto. 3ª. ed. São Paulo: Manole, 2014. CUPPARI, L. Guia de Nutrição: Nutrição Clínica no Adulto. 3ª. ed. São Paulo: Manole, 2014.CUPPARI, L. Nutrição nas Doenças Crônicas Não-Transmissíveis. 1ª. ed. São Paulo: Manole, 2009. MAHAN, L. K. et al. Krause Alimentos, Nutrição e Dietoterapia. 13ª. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2013. MONTENEGRO, M.R. Atherosclerosis morphology and pathogenesis. Annual Review Biomedical Science, 1:133-44, dez/1999. RAYMOND, J. L. et al. Tratamento nutricional clínico da doença cardiovascular. In: MAHAN, L. K. et al. Krause Alimentos, Nutrição e Dietoterapia. 13ª. ed. Rio de Janeiro: Elsevier; 2013. SCALA, L. C. et al. Epidemiologia da hipertensão arterial sistêmica. In: MOREIRA, S. M. et al. Livro Texto da Sociedade Brasileira de Cardiologia. 2ª. ed. São Paulo: Manole; 2015. SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. I Diretriz Brasileira de Diagnóstico e Tratamento da Síndrome Metabólica. 107, nº 3, Supl. 3, abr/ 2005. SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. III Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica. 1-28, jun/ 2009. SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. Atualização da Diretriz Brasileira de Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. 109, nº 2, Supl. 1, ago/ 2017. SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA. VII Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial. Arquivos Brasileiros de Cardiologia. 107, nº 3, Supl. 3, set/ 2016. SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2019-2020. Clannad Editora Científica. 1-249, 2019. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS UNIDADE 3 Doenças renais, alergias e intolerân- cias alimentares Introdução Você está na unidade Doenças renais, alergias e intolerâncias alimentares. Conheça aqui as diferentes abordagens da Nutrição no tratamento das doenças renais e os efeitos dessa doença sobre o estado nutricional. Conheça as intervenções dietéticas possíveis nos diferentes tipos de doença renal. Aprofunde seus conhecimentos sobre avaliação nutricional, por meio de outros métodos utilizados. Sobre alergia e intolerância alimentar, saiba diferenciar os dois. Entenda como deve ser o diagnóstico e tratamento dietético em cada uma delas. Bons estudos! 57 1 DOENÇAS RENAIS Os dois rins estão localizados na parte de trás do abdômen, abaixo da caixa torácica. Cada rim de um adulto pesa cerca de 150 gramas, tem o formato de um feijão e tamanho aproximado de um punho. O néfron é a unidade funcional do rim. Cada rim possui 1 milhão de néfrons, aproximadamente, que não se regeneram ao longo da vida. Cada um possui um grupo de vasos glomerulares que formam a unidade chamada glomérulo, por onde são filtrados líquidos do sangue. Possui também o túbulo contorcido no qual o líquido filtrado é convertido em urina. Uma das funções mais conhecidas dos rins é eliminar substâncias tóxicas do organismo. Outra função importante é de controlar o volume e a composição dos eletrólitos dos líquidos corporais, essa função é necessária para manter o ambiente interno estável. Segundo Guyton e Hall (2017), os rins realizam suas funções em intensidades variáveis, de acordo com a necessidade do organismo, removem substâncias indesejáveis ou tóxicas e devolve as que são necessárias ao organismo para a corrente sanguínea. As principais funções dos rins são: Excreção Excreção da ureia, creatinina, produtos finais da degradação de hemoglobina, como a bilirrubina e metabólitos de hormônios. Também eliminam toxinas e substâncias que foram ingeridas, como medicamentos, pesticidas e aditivos alimentares. Regulação do equilíbrio de água e dos eletrólitos A excreção de líquidos deve ser proporcional à ingestão. Os hábitos de ingestão de líquidos controlam sua entrada no organismo, desta forma os rins ajustam a excreção de forma que tenha equilíbrio com a quantidade de liquido ingerida. Pensando de forma prática: se um indivíduo aumenta sua ingestão de sódio, os rins aumentam a sua excreção para alcançar o equilíbrio. Regulação da pressão arterial Ocorre por meio do sistema renina-angiotensina-aldosterona. É um mecanismo hormonal que regula o aumento ou a redução do volume sanguíneo para controlar a pressão arterial. Regulação do equilíbrio ácido-base O metabolismo das células tende a deixar o meio interno mais ácido e os rins auxiliam a promover o equilíbrio, facilitando a excreção de ácidos e a conservação de bases. 58 Regulação da produção de hemácias A produção de hemácias na medula óssea ocorre por meio da eritropoietina, hormônio secretado pelos rins. Pessoas que tiveram um rim removido ou que fazem hemodiálise possuem maior risco de anemia pela diminuição da produção de eritropoietina. Secreção de vitamina D Os rins produzem calcitriol, a forma ativa de vitamina D, (1,25-di-hidroxivitamina D3). O calcitriol atua no intestino delgado regulando a absorção de cálcio e em menor quantidade a absorção de fósforo. Glicogênese Em situações de jejum prolongado, os rins sintetizam glicose a partir de aminoácidos e outros precursores. Nesses períodos, a capacidade de os rins produzir glicose equivale à do fígado. Na doença renal crônica ou na lesão renal aguda todas essas funções são afetadas: ocorrem anormalidades dos volumes de líquidos corporais; potássio, ácidos e outras substâncias se acumulam no corpo, e precisam ser restauradas ou normalizadas por meio da terapia substitutiva renal (hemodiálise). 1.1 Doença Renal Crônica A Doença Renal Crônica (DRC) é uma síndrome clínica complexa que ocorre pela perda progressiva e irreversível das funções renais. A síndrome urêmica ou uremia é caracterizada pelo acúmulo de resíduos orgânicos, como ureia, fosfato inorgânico e outros produtos da degradação de proteínas. O quadro clínico na síndrome urêmica apresenta edema decorrente da retenção hídrica e sódio, acidose metabólica, alta concentração de ureia, creatinina e ácido úrico (Cuppari,2005). As causas da doença renal crônica podem ser várias, as mais comuns são a hipertensão arterial grave, diabetes mellitus, gromerulonefrite crônica, nefropatia tubulointersticial (pielonefrite), doenças renais obstrutivas (litíase, bexiga neurogênica, tumor), lúpus eritomatoso sistêmico, uso crônico de anti-inflamatórios não esteroides (AINE’s) e doenças hereditárias, como rins policísticos. Na DRC, com a perda progressiva da capacidade excretória do rim, ou seja, com a diminuição da filtração gromerular, uma variedade de solutos tóxicos, principalmente provenientes do metabolismo de proteínas e aminoácidos se acumula no plasma ou no soro; os mais importantes são a creatinina e a ureia. A taxa de filtração gromerular é calculada por meio de um exame chamado clearance de creatinina ou depuração de creatinina. Este método verifica a capacidade 59 dos rins de depurar do plasma algumas substâncias, como exemplo, a creatinina. A doença renal crônica é classificada em estágios, de acordo com a taxa de filtração gromerular, conforme tabela abaixo. A evolução da doença ocorre na medida em que a taxa de filtração gromerular é progressivamente reduzida. Figura 1 - Estadiamento e classificaçao da doença renal crônica Fonte: National Kidney Foundation – Kidney Disease Outcome Quality Initiative, 2012 (Adaptado). De acordo com o estadiamento da doença, definem-se os tratamentos a serem instituídos, tanto médicos como multiprofissionais. A importância da terapia nutricional no tratamento de pacientes com DRC é bem reconhecida e o acompanhamento nutricional tem grande importância. São objetivos da terapia nutricional: • Reduzir o acúmulo de produtos nitrogenados e eletrólitos; • Reduzir sintomas da síndrome urêmica; • Retardar o ritmo de progressão da doença; • Auxiliar na previsão ou controle de alterações nutricionais; • Auxiliar no controle de complicações metabólicas e hormonais. 1.2 Tratamentos conservador e dialítico O indivíduo classificado entre os estágios de 2 a 5 segue o tratamento conservador. Nesta fase do tratamento, o objetivo é tratar as complicações decorrentes da redução da TFG, diminuir a velocidade da perda de função renal e preparar o pacientepara o tratamento dialítico e/ou transplante. 60 A terapia renal substitutiva ou diálise exerce a função dos rins, removendo os solutos urêmicos acumulados e o excesso de água. Também permite a restauração do equilíbrio acidobásico do organismo. Na hemodiálise (HD) e na diálise peritoneal (DP) o plasma urêmico do indivíduo é colocado em contato com um banho de diálise (dialisato), separado apenas por uma membrana permeável que na (HD é artificial e na DP é a membrana do peritônio) por meio da qual ocorre a passagem de solutos e da água acumulada por meio de difusão, ultrafiltração e osmose (Cuppari, 2005). Um dos riscos durante o tratamento dialítico é a desnutrição. Os fatores que resultam nesse quadro, podem ser conferidos na tabela abaixo: Figura 2 - Causas da desnutrição em pacientes realizando diálise Fonte: CUPPARI, 2005 (Adaptado). #ParaCegoVer: A tabela aponta as causas da desnutrição em pacientes em diálise. 1.3 Avaliação nutricional A avaliação do estado nutricional em DRC tem o objetivo de identificar indivíduos com desnutrição ou em risco nutricional, além de oferecer suporte à prescrição dietética. Não existe um parâmetro único que reflita a condição nutricional do paciente, são utilizados métodos subjetivos (história médica, ASG, exame físico), e objetivos (antropometria, exames bioquímicos e consumo alimentar). Veja a seguir a definição de alguns dos exames utilizados para essa avaliação nutricional: Antropometria A medida do peso deve ser realizada após a sessão de diálise, devido à retenção hídrica que afeta as medidas antropométricas. As circunferências e dobras cutâneas devem ser tomadas sempre do lado contrário ao acesso vascular. No contexto da DRC é uma limitação a falta de métodos precisos para avaliar a massa magra nesses pacientes. As alterações no volume de massa óssea e água corporal dificultam a obtenção de resultados precisos. 61 Exames laboratoriais Entre os indicadores bioquímicos das reservas proteicas comuns utilizadas na avaliação nutricional de pacientes com DRC, estão a albumina, pré-albumina e transferrina, que tem relação com as reservas viscerais, no entanto não devem ser utilizadas como parâmetro único de avaliação, visto que valores anormalmente baixos de creatinina (ingestão de proteínas e marcador de massa muscular), de ureia (consumo de proteínas) e colesterol (reflete ingestão de gorduras) são sugestivas de desnutrição ou redução do consumo alimentar. Porém valores altos desses exames também devem ser observados. Consumo alimentar A redução na ingestão alimentar é frequente em pacientes com DRC, tanto em tratamento dialítico, como conservador. Também é comum que indivíduo apresentem hábitos alimentares pouco saudáveis, com ingestão excessiva de sódio, açúcar e gorduras e insuficiente de hortaliças. Métodos de avaliação de consumo alimentar, como recordatório 24 horas, questionário de frequência alimentar e diário alimentar são úteis tanto para conhecer hábitos quanto para nortear o tratamento dietético, desde que sejam aplicados por pessoas treinadas e capazes de interpretar os resultados. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 1.4 Terapia nutricional no tratamento conservador Na fase conservadora da doença, os objetivos da terapia nutricional são: manter ou reestabelecer o estado nutricional, retardar a progressão da doença, reduzir o acúmulo de compostos nitrogenados tóxicos, prevenir ou minimizar os distúrbios hidroeletrolíticos. Existem evidências de que a terapia nutricional ajuda no controle da hiperpotassemia e da hipertensão e reduz a proteinúria. A principal alteração dietética é a restrição proteica, que ainda é controversa, 62 mas que é capaz de retardar o início da terapia renal substitutiva. Veja a seguir algumas das terapias nutricionais utilizadas no tratamento conservador: Recomendações de proteína A restrição proteica não é recomendada a indivíduos que tenham a taxa de filtração gromerular (TFG) acima de 60 mL/min, porém, é necessário que a proteína seja consumida em excesso, desta forma a ingestão deve seguir a recomendação para indivíduos saudáveis (0,8 a 1,0g/Kg/dia). Não existe definição a respeito do grau de disfunção renal em que a diminuição na quantidade de proteína da dieta deve ser iniciada. Porém, estima-se que, a partir do estágio três da DRC (TFG <60 mL/min) existam benefícios da restrição proteica. É uma limitação da dieta restrita em proteínas a adesão dos indivíduos em longo prazo, pela questão de paladar e também porque este tipo de dieta pode ter maior custo. 1.5 Terapia nutricional no tratamento dialítico O início do tratamento dialítico ocorre quando a taxa de filtração gromerular está em torno de 10mL/min, sobretudo se o indivíduo apresenta sintomas urêmicos e/ou deterioração do estado nutricional. A hemodiálise (HD) é uma terapia intermitente. Ocorre, em geral, três vezes por semana, durante quatro horas cada sessão. Os maiores problemas nutricionais estão relacionados ao acúmulo de metabólitos entre as sessões dialíticas e à perda de nutrientes durante o procedimento. O tratamento dialítico contribui para a diminuição de reservas corporais de proteína e energia; e é resultante das alterações no metabolismo provenientes da própria doença e também do procedimento dialítico. Outros fatores que alteram o metabolismo energético e proteico são a resposta inflamatória causada pelo contato do paciente com o dialisador (é uma membrana não totalmente biocompatível) e a perda de aminoácidos e outros nutrientes que ocorre nas sessões de diálise. FIQUE DE OLHO A dieta vegetariana pode ser um recurso dietético para pacientes com doença renal em tratamento conservador. Esse tipo de dieta pode ser nutricionalmente adequada tendo em vista a importância da restrição proteica necessária neste caso. Alguns estudos sugerem que dietas ricas em proteína vegetal não aceleram a progressão da DRC na mesma velocidade que as dietas com proteína de origem animal. Para saber mais acesse este link: https://www. mdpi.com/2072-6643/9/4/374 63 Os objetivos da terapia nutricional são: recuperar e/ou manter o estado nutricional; minimizar o catabolismo proteico; manter o equilíbrio acidobásico, hidroeletrolítico, de minerais e de vitaminas e melhorar o prognóstico. Veja a seguir algumas das terapias nutricionais utilizadas no tratamento dialítico: Recomendação de proteínas Devido à perda de aminoácidos que ocorre durante o procedimento dialítico, a necessidade de proteína desses pacientes é superior a de indivíduos saudáveis. Estima-se que para obter balanço nitrogenado neutro em pacientes estáveis é recomendado o consumo de 1,2 g/kg/dia. Para pacientes em hemodiálise e diálise peritoneal a recomendação é que pelo menos 50% das proteínas sejam de alto valor biológico. Recomendação de energia O gasto energético de repouso de pacientes em diálise é semelhante ao de indivíduos saudáveis, porém o gasto energético aumenta durante e até duas horas após o procedimento dialítico. Para paciente em diálise peritoneal (CAPD) a energia proveniente da glicose do dialisato (cerca de 40-60% da glicose infundida) deve ser subtraída do total recomendado. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 1.6 Terapia nutricional na lesão renal aguda A lesão renal aguda (LRA) é caracterizada por redução abrupta da função renal que resulta em desequilíbrio hidroeletrolítico e acúmulo de compostos nitrogenados. É uma síndrome complexa com manifestações clínicas que podem variar entre pequenas elevações na creatinina sérica até insuficiência renal com necessidade de diálise. A terapia nutricional em pacientes com síndrome urêmica aguda é mais limitada do que na doença renal crônica. A desnutrição em pacientes com 64 LRA está associada à maior incidência de complicações, maior tempo de internação e maior mortalidade. A terapia nutricional na lesão renal aguda é uma importante forma de prevenção de complicações. Seus objetivos são: manter ou recuperaro estado nutricional, minimizar efeitos do hipercatabolismo, auxiliar no equilíbrio hidroeletrolítico, ácido básico e mineral. Por serem variadas e individualizadas, as necessidades de nutrientes dos pacientes com LRA precisam da monitorização diária de eletrólitos (potássio, sódio, magnésio e fósforo) para determinação da terapia nutricional adequada. Veja a seguir alguns exemplos de terapias nutricionais em caso de lesão renal aguda: Avaliação nutricional A obtenção do diagnóstico nutricional preciso pode ser complicada por fatores não nutricionais, como inflamação e distúrbios hidroeletrolíticos. Recomendação de energia As necessidades de energia variam com o grau de hipercatabolismo, gravidade da doença de base e estado nutricional prévio e atual. Esses fatores, a frequência e a duração da terapia de reposição renal é que determinam o desfecho clínico, a intervenção e a recomendação de nutrientes para esses pacientes. Recomendação de proteínas A necessidade de proteína no paciente com LRA pode variar de acordo com o grau de injúria da doença de base e do nível de catabolismo, assim como a necessidade de diálise. A oferta proteica deve ser suficiente para minimizar as perdas nitrogenadas. 1.7 Síndromes nefrótica e nefrítica A síndrome nefrótica (SN) é uma doença nos gromérulos, que são os responsáveis pela filtração do sangue. Quando são afetados, essa capacidade de filtrar fica prejudicada, levando à redução da barreira gromerular e as consequências são a eliminação de proteínas na urina (proteinúria), hipoalbuminemia e hiperlipidemia. A principal manifestação clínica é o edema, decorrente da diminuição da pressão oncótica dentro dos vasos, pela hipoalbuminemia. Seus sinais e sintomas variam de acordo com a intensidade da doença. A principal manifestação clínica é o edema, que ocorre em diferentes locais e graus de intensidade, podendo progredir para anasarca e extravasamento para cavidades corporais, como o abdômen. É frequente o edema mais acentuado nas pálpebras pela manhã e nos membros inferiores no período vespertino ou 65 ao final da deambulação. A avaliação nutricional ser realizada por meio de anamnese alimentar detalhada, medidas antropométricas, exames bioquímicos, entre outros. É importante que o avaliador seja treinado para identificar edemas e realizar os descontos no peso corporal quando for necessário. Os objetivos são da terapia nutricional são: minimizar a perda proteica, auxiliar no controle da hipertensão arterial e fornecer a quantidade adequada de energia e nutrientes. Para o paciente com função renal preservada, a dieta deve ser hipossódica e normoprotéica. A ingestão de líquidos deve ser controlada. A síndrome nefrítica é caracterizada por hematúria (sangue na urina), proteinúria, oligúria (redução na diurese), hipertensão arterial sistêmica e déficit de função renal em alguns casos. A forma clássica da síndrome nefrítica é a glomerulonefrite pós-estreptocócica (GNPE). É muito comum em crianças. Entre seus sintomas e sinais estão: edema, hipertensão e hematúria. O edema ocorre em 65-90% dos pacientes e se mantém de 7 a 10 dias. Nesse quadro, a dieta deve ter as seguintes características: dieta hipossódica e repouso enquanto houver edema. 1.8 Transplante renal Quando o rim perde sua função decorrente progressão da doença renal crônica, é necessário que o indivíduo faça diálise ou receba um novo rim por meio de transplante. Quando é bem sucedido pode restaurar suas as funções. O transplante renal é um procedimento cirúrgico complexo e invasivo, que envolve trauma físico e uso imediato de imunossupressores. A imunossupressão causa efeitos colaterais, como dificuldade de aporte alimentar, menor absorção de nutrientes, distúrbios do metabolismo e aumento das necessidades energéticas. Além disso, os pacientes submetidos ao transplante podem evoluir com sobrepeso, anemia, hipoalbuminemia e desnutrição. Alguns fatores que contribuem para a desnutrição no paciente transplantado são: consequências gastrointestinais da cirurgia, anorexia, dietas restritivas, toxicidade urêmica, infecções, terapia imunossupressora, entre outros (Teplan et al, 2009). Segundo Teplan et al (2009), o manejo nutricional no transplante renal é dividido em: período pré-transplante, pós-transplante imediato e pós-transplante tardio. Veja a seguir o tratamento nutricional de cada uma dessas etapas: Período pré-transplante Os objetivos do acompanhamento nutricional pré-transplante são fornecer aporte adequado de nutrientes para preservar o estado nutricional e reserva muscular, reduzir o risco de infecções, auxiliar na cicatrização da ferida operatória e promover melhor recuperação no pós-operatório, 66 considerando que o paciente ainda está realizando hemodiálise. Período pós-transplante imediato São objetivos da terapia nutricional nesta etapa: manutenção dos estoques de proteína na vigência de catabolismo, auxiliar na cicatrização da ferida operatória, prevenção de infecções associadas à cirurgia e a imunossupressão e prevenção de distúrbios hidroeletrolíticos. Pacientes transplantados recuperam a função renal em ritmos diferentes, sendo assim, alguns podem necessitar de diálise por dia e até semanas após a cirurgia. Período pós-transplante tardio Os principais objetivos da terapia nutricional são: alcançar metas de energia e proteína para manutenção do estado nutricional, prevenir ou tratar obesidade, dislipidemia e hipertensão; contribuir para controle glicêmico, prevenir e tratar deficiências nutricionais. 1.9 Litíase renal A litíase renal ou nefrolitíase acomete cerca de 10% das pessoas que vivem em países desenvolvidos e sua incidência tem aumentado juntamente com outros problemas relacionados às mudanças nos padrões alimentares da população como obesidade, hipertensão e diabetes mellitus (NERBASS, 2014). A formação de cálculos no trato urinário resulta da supersaturação da urina, nucleação de cristais, agregação, retenção e crescimento desses cristais. Existem vários tipos de cálculos renais que diferem na composição, porém, o mais comum é o oxalato de cálcio. A cristalização ocorre devido à composição anormal da urina, que é grandemente determinada pela composição da dieta (CUPPARI,2005). A dieta pode promover ou inibir a formação de cálculos de oxalato de cálcio. A dieta rica em sódio, proteína animal e açúcar resulta em elevada excreção de cálcio, ácido úrico, oxalato e fósforo e em redução do citrato urinário e do pH, favorecendo, assim, a formação de cálculos renais. Por outro lado, um consumo adequado de frutas, legumes e verduras parece ser um fator protetor para a formação dos cálculos (CUPPARI,2005). A Nutrição tem papel importante na prevenção da nefrolitíase, as recomendações incluem a ingestão de níveis adequados de cálcio, no aumento da ingestão de líquidos, frutas e verduras, e na redução do consumo de sódio e proteína animal (NERBASS, 2014). Veja a seguir a importância do consumo de cada um deles: Cálcio: A restrição de cálcio já foi utilizada na prevenção e tratamento da litíase renal, no entanto, hoje se sabe que essa terapia é inapropriada e pode ser perigosa, isso porque a restrição de cálcio pode resultar em balanço negativo e perda de massa óssea. 67 Oxalato: O oxalato está presente em uma grande quantidade de alimentos de origem vegetal, sendo o espinafre, beterraba e cacau os que apresentam maior concentração. A razão para sua restrição é o oxalato ser o principal componente dos cálculos renais e também por existir uma menor concentração urinária do que de cálcio. Sódio: Estudos sugerem que pessoas com elevada ingestão de sódio têm maior risco de formação de cálculos. Pacientes litisiáticos ou com hipercalciúria devem evitar a ingestão excessiva de sal e de alimentos ultraprocessados. Proteína: É o componente da dieta que mais tem efeito na formação de cálculos. A recomendação de proteína para pacientes litisiáticos é de 0,8 a 1,2g/Kg/dia, sendo 50% de alto valorbiológico. Purinas: o produto final do metabolismo das purinas é o ácido úrico. Pacientes litisiáticos devem evitar alimentos ricos em purinas: vitela, bacon, vísceras, mariscos, ostras, ovas de peixe. Líquidos: Para litíase renal é recomendada alta ingestão de líquidos por aumentar o volume urinário e diminuir a concentração de componentes que formam os cálculos. A orientação é ingestão de 30 ml de líquidos/kg/dia. É importante que os líquidos sejam água e sucos, especialmente de limão e laranja, por conterem elevado teor de citrato que é um fator protetor. Chá preto e mate devem ser consumidos com moderação devido ao alto teor de oxalato. Bebidas alcoólicas devem ser consumidas com cautela, por conterem purinas. 2 PATOLOGIA DA NUTRIÇÃO E DIETOTERAPIA NAS ALERGIAS E INTOLERÂNCIAS ALIMENTARES A alergia alimentar (AA) é definida como uma reação decorrente de uma resposta imunológica, que ocorre após a ingestão e/ou contato com determinado(s) alimento(s). Atualmente, é considerada um problema de saúde pública (SOLÉ et al., 2018). De acordo com os mecanismos fisiopatológicos envolvidos, as reações adversas a alimentos podem ser classificadas em imunológicas ou não-imunológicas. As reações não imunológicas dependem principalmente da substância ingerida (por exemplo: toxinas bacterianas presentes em alimentos contaminados) ou das propriedades farmacológicas de substâncias presentes em alimentos (por exemplo: tiramina em queijos maturados). As reações adversas não imunológicas podem ser desencadeadas também pela fermentação e efeito osmótico de carboidratos ingeridos e não absorvidos. O exemplo clássico é a intolerância por má absorção de lactose. (SOLÉ et al., 2014). 68 2.1 Fisiopatologia Segundo Ferreira et al. (2007), vários fatores têm papel importante na patogênese da alergia, entre eles a genética, a flora intestinal do hospedeiro, o período da vida, a dosagem e a frequência de exposição a alérgenos alimentares, bem como o potencial alergênico de algumas proteínas. A imaturidade da barreira mucosa intestinal tem sido apontada como um dos mecanismos que poderia explicar a incidência mais alta de AA em lactentes e crianças. As reações imunológicas de hipersensibilidade aos alimentos podem ser de dois tipos: mediadas por IgE (imunoglobulina E) e não mediadas por IgE. As reações mediadas por IgE são desencadeadas pela produção de anticorpos específicos da classe IgE que ocorrem dentro de minutos até 2 horas após a ingestão do alimento. As manifestações incluem urticária e angioedema, hipersensibilidade gastrointestinal imediata, síndrome oral alérgica e anafilaxia. São as formas mais comuns de alergia alimentar (SOLÉ et al., 2014). As manifestações não mediadas por IgE surgem horas após ingerir o alimento, são exemplos a doença celíaca, enteropatia induzida por proteína, dermatite herpetiforme e síndrome de Heiner. Pode ocorrer também de forma mista (mediada por IgE e hipersensibilidade celular) cujas manifestações são dermatite atópica, esofagite eosinofílica, gastrite e enterocolite eosinofílicas e asma (Solé et al, 2014). Segundo Solé et al. (2014), uma série de fatores de risco têm sido associada à alergia alimentar, como, ser lactente do sexo masculino, etnia asiática e africana, comorbidades alérgicas (dermatite atópica), desmame precoce, insuficiência de vitamina D, redução do consumo dietético de ácidos graxos do tipo ômega 3, redução de consumo de antioxidantes, uso de antiácidos que dificulta a digestão dos alérgenos, entre outros. 2.2 Alérgenos alimentares De acordo com Ferreira et al. (2007), alérgeno alimentar é qualquer substância capaz de estimular uma resposta de hipersensibilidade. Mais de 170 alimentos são reconhecidos como potencialmente alergênicos, porém uma pequena parcela entre eles tem sido responsabilizada pela maioria das reações ocorridas. Vale ressaltar que as reações a esses alérgenos comuns é variável de acordo com a idade dos pacientes e a região que habitam. Na infância, os alimentos mais responsabilizados pelas alergias alimentares são leite de vaca, ovo, trigo e soja, e em geral são transitórias; menos de 10% dos casos persistem até a vida adulta. Entre os adultos, os alimentos mais identificados são amendoim, castanhas, peixe e frutos do mar. As reações adversas aos aditivos alimentares são raras (abaixo de 1%). Os mais implicados em reações adversas são os sulfitos, o glutamato monossódico, a tartrazina e o vermelho carmin. 69 2.3 Tratamento O objetivo principal do tratamento nutricional é evitar o desencadeamento dos sintomas, a progressão da doença e a piora das manifestações alérgicas, prevenir distúrbios nutricionais, e na criança, proporcionar crescimento e desenvolvimento adequados. Três modalidades são geralmente empregadas no tratamento de alergias alimentares: • Eliminar e evitar alérgenos específicos; • tratamentos medicamentosos; • medidas preventivas. A forma mais eficaz de tratamento de alergia alimentar é excluir totalmente da dieta do paciente o alimento identificado. Isso nem sempre é fácil, especialmente se o alimento é encontrado em todo lugar e, portanto, difícil de ser evitado, tais como laticínios. Os rótulos podem ser confusos e pequenas quantidades do alérgeno alimentar podem estar presentes em alimentos tolerados e, além disso, pode haver contaminação oculta de alimentos considerados seguros. Como as dietas de eliminação apresentam risco de desnutrição e deficiências nutricionais é importante assegurar que as necessidades nutricionais do paciente sejam atendidas e que este e/ ou o responsável sejam totalmente instruídos sobre o manejo nutricional. FIQUE DE OLHO Probióticos na intolerância a lactose. Os probióticos são organismos vivos administrados em doses pré-definidas que auxiliam diversas funções do organismo, uma delas é reduzir os sintomas gastrintestinais da intolerância a lactose, esta revisão de literatura aprofundará os conhecimentos sobre este assunto. O artigo pode ser acessado no link: http:// faculdadedeamericana.com.br/revista/index.php/Ciencia_Inovacao/article/view/229 70 Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 3 INTOLERÂNCIA ALIMENTAR A intolerância alimentar é uma reação adversa aos alimentos que não envolve o sistema imunológico. Pode ser resultado de contaminação, reações farmacológicas, tóxicas, metabólicas, entre outras. Alguns exemplos de intolerância alimentar são a intolerância à lactose, que é a mais comum, além da intolerância à glicose e à frutose. Em função do tipo de mecanismo envolvido na intolerância, existem algumas que se apresentam com maior frequência. Os sinais e sintomas de intolerância alimentar são parecidos com os de alergia alimentar. Porém a probabilidade de aparecimento de algum sintoma e sua intensidade depende da dose ingerida. Por exemplo, uma pessoa com intolerância a lactose pode não apresentar nenhum sintoma ao ingeri 50g de queijo e apresentar um quadro de flatulência e dor abdominal pela ingestão de 200 de leite. O tipo de manifestação está associado ao mecanismo causal da intolerância. Na intolerância à lactose, existe um aumento de sua concentração intestinal que leva a maior secreção de líquidos na luz intestinal como consequência do efeito osmótico que pode causar diarreia. Posteriormente ao chegar ao cólon à lactose digerida por bactérias produzem gases que causam a flatulência, dor e distensão abdominal. Existem outras intolerâncias causadas por déficits enzimáticos, como à frutose e sacarose. Das intolerâncias farmacológicas as mais conhecidas são pelo déficit de diamino oxidase (DAO) e déficit de fenilalanina, que levam à intolerância à histamina e a fenilalanina (fenilcetonúria), respectivamente. Assim como nas alergias alimentares o principal tratamento é a exclusão do alimento da dieta. Essa recomendação varia em rigorosidade de acordo com o grau de manifestações clínicas de cada indivíduo e da severidade do déficit enzimático. Desta forma pode haver indivíduos que 71bastam 30 gramas de lactose para desencadear sintomas, como outros em que as reações ocorrem com ingestão de apenas cinco gramas. Por este motivo é importante que a dieta de exclusão seja orientada por profissional, pois necessita ser individualizada. Atualmente existem recursos farmacológicos para facilitar a digestão, absorção e metabolização das substâncias causadoras da intolerância, por meio do uso de enzimas. Estes tratamentos devem ser individualizados, de acordo com a gravidade dos sintomas. FIQUE DE OLHO Doença celíaca ou sensibilidade ao glúten? O termo sensibilidade ao glúten não celíaca (SGNC) foi estabelecido para se referir aos indivíduos que possuem intolerância ao glúten, quando o diagnóstico de doença celíaca ou de alergia ao trigo foi descartado. Foi realizada uma revisão de literatura que apresenta não só as diferenças entre doença celíaca e sensibilidade ao glúten como também traz informações sobre rótulos de alimentos e FODMAPs. 72 Nesta unidade, você teve a oportunidade de: • conhecer as doenças renais que podem ocorrer de forma crônica ou aguda; • entender a importância do acompanhamento e monitorização do paciente renal crônico e agudo na prevenção e manejo da desnutrição energético proteica; • aprender sobre os diferentes mecanismos de reações adversas a alimentos; • aprofundar o conhecimento sobre o manejo de alergias e intolerâncias. PARA RESUMIR BERBEL, M.A. et al. Aspectos nutricionais na lesão renal aguda. Revista da Associação Médica Brasileira, [s. l.], v. 57, n. 5, p. 600-606, 2011 CELENO PORTO, C. Semiologia Médica. 7. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2014. CUPPARI, L. et al. Avaliação nutricional na doença renal crônica: desafios na prática clínica. Jornal Brasileiro de Nefrologia, Rio de Janeiro, v. 31, n. 1, p. 28-35, 2009 CUPPARI, L. Guias de Medicina ambulatorial e hospitalar: Nutrição Clínica do adulto. 2. ed. São Paulo: Manole, 2005. FERREIRA, C.T. et al. Food Allergy: a practical update from the gastroenterological point. Jornal de Pediatria, Rio de Janeiro, v. 83, n. 1, p. 7-20, 2007. GUYTON, A. C. et al. Tratado de Fisiologia Médica. 13. ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2017. KDIGO 2012 Clinical Practice Guideline for the Evaluation and Management of Chronic Kidney Disease. Official Journal of the International Society of Nephrology: Kidney International Supplements, [s. l.], v. 3, n. 1, 2013 LAGE, F.B. Recomendação proteica para crianças com síndrome nefrótica. Revista Brasileira de Nutrição Clínica, São Paulo, v. 29, ed. 4, p. 360-366, 2014. 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Disponível em: https://diretrizes.amb.org.br/_BibliotecaAntiga/terapia_ nutricional_para_pacientes_em_hemodialise_cronica.pdf. Acesso em: 13 abr. 2020 MARTINS, C et al. Terapia Nutricional para Pacientes na Fase Não-Dialítica da Doença Renal Crônica. S Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina: Projeto Diretrizes, [s. l.], v. 1, p. 1-10, 2009. Disponível em: https://diretrizes.amb.org. br/_BibliotecaAntiga/terapia_nutricional_para_pacientes_na_fase_nao_dialitica_da_ doenca_renal_cronica.pdf. Acesso em: 13 abr. 2020. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS MORAIS, C. et al. Alterações dermatológicas nos pacientes em hemodiálise e em transplantados. Jornal Brasileiro de Nefrologia, Rio de Janeiro, v. 33, n. 2, p. 268-275, 2011. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/jbn/v33n2/a24v33n2.pdf. Acesso em: 19 abr. 2020. NERBASS, F.B. Orientação dietética e litíase renal. Jornal Brasileiro de Nefrologia, [s. l.], v. 36, n. 4, p. 428-429, 2014. 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Aprenda conceitos fundamentais e recomendações preconizadas para o manejo nutricional do marasmo e kwashiorkor, da síndrome de realimentação, e dos erros inatos do metabolismo: fenilcetonúria e galactosemia. Bons estudos! Introdução 77 1 DESNUTRIÇÃO ENERGÉTICO-PROTEICA INFANTIL A desnutrição energético-proteica é uma condição clínica resultante da deficiência de energia e de proteína, que afeta a composição corporal e todos os sistemas e órgãos devido à falta de suprimentos para organismo. Essa patologia é classificada como primária quando é causada pela ingestão insuficiente de calorias e proteína, e secundária quando é decorrente de outras patologias ou fármacos que influenciam na absorção e utilização dos nutrientes. Além disso, pode ser classificada também quanto a intensidade – leve, moderada ou grave, ou de 1º, 2º e3º grau, respectivamente – e se é uma condição aguda ou crônica. Dados epidemiológicos mostram que essa doença é muito mais prevalente entre crianças pré-escolares e lactentes, constituindo a faixa etária de até 5 anos de idade. Estima-se que há cerca de 200 milhões de crianças desnutridas em todo o mundo. A desnutrição é a causa de 56% das mortes de crianças nessa faixa etária em países em desenvolvimento (PELETIER et al., 1995). No Brasil a taxa de mortalidade de crianças desnutridas hospitalizadas é de 20%, o que extrapola bastante os 5% de mortalidade que a Organização Mundial da Saúde (OMS) considera como aceitável (MONTE et al., 2002). Com isso, a desnutrição energético-proteica infantil constitui-se como problema de saúde pública global, mas também é considerada como um problema social, visto que é muito mais prevalente em países em desenvolvimento do que naqueles desenvolvidos. E mesmo dentro desses países em desenvolvimento percebe-se que a desnutrição infantil é indiretamente proporcional a renda familiar, ou seja, a desnutrição ocorre com mais frequência nos estratos mais baixos da população. Além da situação socioeconômica da família, que interfere claramente no acesso à uma alimentação adequada, fatores sanitários como saneamento básico e acesso à água, por exemplo, também tem uma grande contribuição na incidência de desnutrição infantil nesta parcela da sociedade, o que reforça ainda mais o caráter social desta enfermidade. A deficiência nutricional provocada, principalmente, pela privação alimentar nos casos da desnutrição infantil, induz inúmeras alterações metabólicas que afetam o crescimento e desenvolvimento da criança, podendo gerar danos na vida adulta ou levar à morte precoce. Geralmente, os primeiros sinais observados nas crianças são perda peso e, um pouco mais tardiamente, a baixa estatura para a idade. Além disso, ocorrem disfunções hormonais, enzimáticas e no sistema imunológico, e por tais motivos as crianças desnutridas tornam-se mais propensas às infecções, diarreia, hipoglicemia e hipotermia, apresentam má-absorção de alguns nutrientes e podem ainda ter prejuízos no sistema nervoso central (SNC) (GOULART et al., 2008). Os quadros clínicos mais graves e considerados como os estágios finais da desnutrição infantil são conhecidos como marasmo e kwashiorkor. 78 1.1 Marasmo O marasmo é uma forma de desnutrição infantil causado por deficiência de energia, ou seja, pela redução acentuada da ingestão calórica de forma geral e acomete principalmente crianças de seis a 18 meses, porém há casos em toda a faixa etária. Em razão da carência energética, o marasmo é caracterizado por uma perda de peso intensa resultando em magreza excessiva, retardo no crescimento, depleção muscular e de gordura subcutânea, que leva à sinais como costela proeminente, pele com aparência de frouxa e desaparecimento da bola de Bichat, que é uma reserva de gordura no rosto e por isso essa criança passa a ter uma aparência mais senil. A importância clínica do desaparecimento da bola de Bichat dá-se por esse ser considerado o último depósito de gordura a ser consumido. As crianças com marasmo apresentam sinais relacionados também à deficiência de micronutrientes – que está relacionada a ingestão alimentar reduzida – como anemia ferropriva, xeroftalmia, cabelos finos e escassos. Além disso, fraqueza muscular, irritabilidade e apetite também estão associados ao marasmo (PROJETO DIRETRIZES, 2011). As perdas de massa muscular e tecido adiposo ocorrem como uma adaptação do organismo para poupar energia para os órgãos vitais, como o cérebro, o coração e as vísceras. Em decorrência da privação alimentar prolongada, os níveis de insulina se apresentam baixos enquanto os de cortisol estão elevados na tentativa de aumentar a produção de glicose. Assim, induz a degradação da proteína muscular e do tecido adiposo, que serão utilizados pelo fígado como substratos para a síntese de glicose (gliconeogênese), que por sua vez será utilizada prioritariamente pelo cérebro e em seguida pelos outros órgãos vitais (FERNANDES et al., 2004). Dessa forma, o emagrecimento acentuado e as demais alterações associadas são resultantes desse mecanismo de sobrevivência do organismo. A figura “Adaptações metabólicas decorrentes da privação alimentar no marasmo” mostra como de forma esquemática como esse processo ocorre. FIQUE DE OLHO Os parâmetros antropométricos utilizados para o diagnóstico da criança desnutrida são essencialmente o peso e a altura. A partir daí esses dados são combinados nos seguintes índices: peso/idade, estatura/idade e peso/estatura. Os valores obtidos são então comparados às curvas de referência da Organização Mundial da Saúde avaliando- se em qual percentil esses valores estão inseridos. 79 Figura 1 - Adaptações metabólicas decorrentes da privação alimentar no marasmo Fonte: FERNANDES, et al., 2004 (Adaptado). #ParaCegoVer: No fluxograma, temos o mecanismo de adaptação metabólica resultante da privação alimentar que ocorre no marasmo. 1.2 Kwashiorkor A outra forma de desnutrição energético-proteica infantil é o kwashiorkor, que é resultante da ingestão insuficiente de proteína especificamente, mesmo que o aporte energético esteja adequado. A palavra kwashiorkor é de origem ganesa e significa “a doença do bebê que foi destronado pelo nascimento de um irmão” (GOULART et al., 2008, p.92). Logo, a criança que estava sendo amamentada, e portanto estava recebendo pelo leite materno o aporte adequado de todos os nutrientes incluindo proteico, é desmamada para que o bebê mais novo possa ser amamentado apropriadamente. Como já relatado anteriormente, a desnutrição infantil está intimamente relacionada à situação socioeconômica da família, e por isso, muitas vezes após o desmame a criança passar a ter uma alimentação rica principalmente em carboidratos e pobre em proteína, por razão do custo baixo e elevado, respectivamente, dos alimentos fonte desses macronutrientes. Devido a esse contexto, o kwashiorkor ocorre com mais frequência em crianças a partir dos 18 meses de idade. O principal sinal clínico do kwashiorkor é a presença de edema, sendo esse considerado o 80 diagnóstico diferencial desse quadro e por isso essa condição também é conhecida como forma edematosa de desnutrição infantil. Além do edema, a criança acometida apresenta hepatomegalia com esteatose hepática, albumina sérica baixa, descamações e lesões na pele, cabelo finos e quebradiços, apatia, hiporexia e irritabilidade, e aparentam uma característica de face em lua. A perda de peso não é tão severa como no marasmo, sendo por vezes diagnosticado em crianças com peso normal ao descontar o valor do edema. A ingestão de uma dieta pobre em proteínas envia mensagens confusas e contrárias ao hipotálamo, uma vez que a ingestão de uma dieta rica principalmente em carboidratos aumenta os níveis de insulina, o que induz aumento dos processos anabólicos e preservação dos tecidos muscular e adiposo. Por outro lado, a falta de aminoácidos essenciais (provenientes da dieta) prejudica o anabolismo e reduz a produção de proteínas plasmáticas no fígado, levando à hipoalbuminemia e consequentemente ao edema. Nesse processo o fígado é bastante prejudicado, havendo acúmulo de gordura devido a redução da produção de lipoproteínas (FERNANDES et al., 2004). Esse mecanismo está resumido na figura “Alterações metabólicas e bioquímicas ocorridas no kwashiorkor”. Figura 2 - Alterações metabólicas e bioquímicas ocorridas no kwashiorkor Fonte: FERNANDES, et al., 2004 (Adaptado). #ParaCegoVer: No fluxograma, temos o mecanismo do desenvolvimento do kwashiorkor, mostrando as alterações metabólicas e bioquímicas decorrentes da ingestão de uma dieta pobre em proteínas e rica em carboidratos. 1.3 Dietoterapia na desnutrição infantil A desnutrição energético-proteica infantil é classificada em leve ou de 1º grau, moderada 81 ou de 2º grau, ou grave ou de 3º grau, considerando-se osíndices peso/idade, estatura/idade e peso/estatura. Além das medidas antropométricas, outros parâmetros – como exame físico e bioquímico, e avaliação do consumo alimentar e da vulnerabilidade social – são analisados e associados para avaliar o estado nutricional da criança e diagnosticar a intensidade da desnutrição, bem como identificar o desenvolvimento de marasmo ou kwashiorkor nos casos mais graves. Dessa forma, os casos leves e moderados são tratados em regime ambulatorial ou domiciliar, enquanto os casos mais graves normalmente necessitam de internação para tratamento de complicações e doenças associadas, e estabilização e recuperação do estado nutricional. Assim, a terapia nutricional para crianças com desnutrição leve ou moderada visa recuperar o estado nutricional, com o objetivo de atingir o peso e estatura adequados para a idade dela. Dessa forma, deve-se orientar a família quanto às necessidades nutricionais da criança, incentivando o aleitamento materno para aquelas que ainda são amamentadas, e aumentando o aporte calórico e proteico para aquelas que não são mais amamentadas exclusivamente ou já foram desmamadas. Recomenda-se a ingestão média de 150 kcal a 200 kcal/kg/dia e 4 g a 6 g de proteína/kg/dia, fornecendo alimentos com alta densidade calórica, pois essas crianças podem estar com o apetite reduzido e com a capacidade gástrica diminuída e por isso não toleram grandes volumes de alimento. Se for verificado deficiência de micronutrientes, considera-se a suplementação para adequação nutricional (FERNANDES et al., 2004). O manejo nutricional de crianças hospitalizadas com desnutrição grave é segmentado em três fases – estabilização, reabilitação e acompanhamento – que serão discutidas a seguir. Veja a seguir a definição de cada uma das fases: Estabilização Consiste em tratar inicialmente as intercorrências para evitar o agravamento do quadro e reduzir o risco de morte, corrigindo disfunções metabólicas como hipoglicemia, desequilíbrio hidroeletrolítico, deficiência de micronutrientes e tratando infecções. A dieta deve ser iniciada em seguida – ou imediatamente, caso a criança não apresente intercorrências – de preferência por via oral. Como o foco neste período não é recuperar o estado nutricional e sim estabilizar o quadro clínico, recomenda-se dieta com aporte energético entre 80 kcal e 100 kcal/kg/dia, 1 g a 1,5 g de proteína/kg/dia, fracionada em volumes pequenos e 130 mL de líquidos/kg/dia, e sem lactose. Reabilitação O principal objetivo é a recuperação do estado nutricional e do peso corporal. Nesse sentido, orienta-se a oferta de 150 kcal/ kg/dia, 3 g a 4 g de proteína/kg/dia e 150 mL a 200 mL de líquidos/ kg/dia, sendo permitido adicionar de forma discreta alimentos que contenham lactose. Além disso, é recomendado a suplementação de vitaminas e minerais como zinco, cobre e ferro. Nesta fase o peso deve ser acompanhado e espera-se a recuperação de 10 g a 15 g de peso por dia. Tais 82 recomendações devem ser sustentadas após a alta, mantendo o tratamento em domicílio até que a criança alcance 90% de adequação do peso em relação à estatura. Acompanhamento Compreende o período em que a criança e a família são monitoradas regularmente por uma equipe multiprofissional para reforçar as orientações e verificar o crescimento e desenvolvimento da criança. Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 2 SÍNDROME DE RETROALIMENTAÇÃO A síndrome de realimentação foi reportada pela primeira vez em um estudo da época pós II Guerra Mundial que relatou que soldados japoneses prisioneiros de guerra que foram submetidos a longos períodos de jejum apresentaram alterações cardíacas e até mesmo morte após serem realimentados. Essa síndrome é desencadeada em indivíduos desnutridos que se encontram em estado de jejum prolongado, de forma voluntária ou involuntária, e são realimentados por via oral, enteral ou parenteral sem nenhum monitoramento bioquímico. É caracterizada por um desequilíbrio eletrolítico, que interfere nos processos metabólicos e hemodinâmicos, resultando em disfunções cardíacas, respiratórias e neurológicas, podendo ser fatal se não tratadas a tempo. As condições clínicas decorrentes da síndrome de realimentação começam a ser percebidas por volta do terceiro ou quarto dia após o início do fornecimento dietético. Considerando isto, é importante manter cuidado redobrado antes e durante o processo de realimentação de pacientes com desnutrição moderada a grave, como crianças com marasmo ou kwashiorkor, pacientes com perda de peso significativa em pouco período de tempo, em jejum 83 por pelo menos sete dias, em pós-operatório de cirurgia bariátrica ou outras de grande porte, com transtorno alimentar ou anorexia nervosa, que são alguns exemplos de grupos que apresentam grandes chances de desenvolver a síndrome de realimentação devido ao estado nutricional. 2.1 Fisiopatologia da síndrome de realimentação A síndrome de realimentação é decorrente de uma oferta inadequada de nutrientes para pacientes desnutridos e seu quadro clínico é associado principalmente à hipofosfatemia. No entanto, alterações na concentração plasmática de outros eletrólitos como potássio e magnésio estão diretamente envolvidos na fisiopatologia dessa condição. O estado de desnutrição derivado do jejum prolongado é caracterizado por secreção reduzida de insulina e elevada de glucagon e cortisol, levando à utilização dos tecidos muscular e adiposo como substrato para a síntese de glicose e reduzindo os estoques intracelulares de eletrólitos nesse processo. Na realimentação, a glicose ofertada eleva os níveis de insulina e reduzem de glucagon e cortisol, levando à metabolização da glicose e deslocamento de fosfato, potássio e magnésio para dentro da célula. Se os estoques desses eletrólitos já tiverem sido esgotados, o organismo recorrerá ao conteúdo extracelular, o que irá reduzir as concentrações séricas destes elementos resultando no desequilíbrio eletrolítico visto na síndrome de realimentação, que ocorre cerca de quatro dias após o início da dieta. Devido as suas funções desempenhadas por esses eletrólitos, variações pequenas da concentração deles eletrólitos na corrente sanguínea causa inúmeras disfunções em órgãos vitais e por isso levam a complicações neurológicas, cardíacas e respiratórias (VIANA et al., 2012). 2.2 Prevenção da síndrome de realimentação Antes de iniciar o processo de realimentação, é fundamental avaliar o estado nutricional do paciente e monitorar as concentrações séricas de fosfato, potássio e magnésio, principalmente se o paciente estiver desnutrido. No caso de alguma alteração, deve-se fazer a correção e restabelecer o equilíbrio eletrolítico antes de introduzir a dieta. FIQUE DE OLHO Considera-se hipofosfatemia severa quando os níveis séricos de fosfato estão < 1,5 mg/L; hipocalemia severa quando os níveis séricos de potássio estão < 3 mEq/L; e hipomagnesemia severa quando os níveis séricos de magnésio estão < 1 mEq/L. A combinação dessas três desordens eletrolíticas provoca as manifestações clínicas potencialmente letais observadas na síndrome de realimentação. 84 É importante ressaltar que sempre que o paciente estiver desnutrido ou em risco de desnutrição, a terapia nutricional preconizada, independente da via de acesso, é iniciar com uma dieta hipocalórica, mesmo que as alterações eletrolíticas tenham sido corrigidas antes. Dessa forma, recomenda-se a oferta de 20 Kcal/ kg/dia e de 1,2 g a 1,5 g de proteína/kg/dia, considerando o peso ideal para o cálculo de pacientes denutridos e o peso ajustado para os indivíduos obesos. Orienta-se ofertar essa dieta nos primeiros dias e depois ir progredindo até alcançar a adequação energética e de nutrientes. Além disso, os eletrólitos devem ser monitorados durante a fase de realimentação por pelos menos quatro dias (VIANA et al., 2012). Assim, nota-se a importância do acompanhamento desses pacientes pela equipe de nutrição, identificandoos casos de risco e garantindo o fornecimento de uma dieta adequada para prevenir a síndrome de realimentação e suas complicações. 3 ERROS INATOS DO METABOLISMO Erros inatos do metabolismo é o nome dado ao grupo de doenças de natureza genética hereditária, geralmente autossômica-recessiva, decorrente de alguma deficiência enzimática ou de algum cofator que resulta no comprometimento de alguma via metabólica, levando à problemas na síntese, transporte, armazenamento ou degradação de determinada substância. Como consequência, pode haver acúmulo da substância precursora, levando muitas vezes ao desenvolvimento de vias metabólicas alternativas, e redução ou ausência do produto, o que prejudica a síntese de outras substâncias daquela via (EL HUSNY et al., 2006). Este mecanismo é ilustrado na figura “Interrupção de uma via metabólica nos erros inatos do metabolismo”. 85 Figura 3 - Interrupção de uma via metabólica nos erros inatos do metabolismo Fonte: EL HUSNY, et al., 2006 (Adaptado). #ParaCegoVer: No fluxograma, temos na porção de cima uma via metabólica normal, e na porção de baixo um erro inato do metabolismo, lavando a concentração elevada do substrato, redução do produto e seus derivados e surgimento de uma via alternativa. Cerca de 700 tipos de erros inatos do metabolismo já foram relatados, sendo que as manifestações clínicas são relacionadas ao defeito específico, portanto a gravidade e os sintomas variam de acordo com a via metabólica afetada. Devido à esta variedade de tipos são consideradas como doenças raras isoladamente, pois quando somadas ainda constituem apenas 10% das doenças genéticas. Esses distúrbios podem se apresentar em qualquer fase da vida, no entanto, geralmente surgem na primeira infância, e dependendo da desordem, pode se manifestar ainda nas primeiras horas de vida. A terapia nutricional constitui-se como um dos principais tratamentos dessas doenças, buscando reduzir os danos causados pelo acúmulo e/ou deficiência de determinada substância. 86 Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 3.1 Fenilcetonúria A fenilcetonúria é um erro inato do metabolismo de aminoácidos, decorrente de uma modificação no gene do cromossomo 12, que é responsável pela codificação da enzima hepática fenilalanina-hidroxilase. A função desta enzima é converter o aminoácido essencial fenilalanina em tirosina, que por sua vez é usada como substrato metabólico em muitas outras vias. Na ausência ou inatividade da fenilalanina-hidroxilase a fenilalanina não é convertida em tirosina, aumentando a proporção fenilalanina/tirosina, o que resulta em acúmulo do aminoácido precursor na corrente sanguínea, cérebro e tecidos, e levando à sérios problemas neurológicos e cognitivos que podem ser irreversíveis, como retardo mental. Essa doença é autossômica-recessiva, ou seja, ambos os pais devem ser portadores do gene modificado. O recém-nascido afetado nasce com peso normal e nenhuma manifestação clínica, no entanto, os níveis de fenilalanina e já começam a se alterar horas após a primeira mamada, pois tanto o leite materno, em menor proporção, como as fórmulas infantis contêm esse aminoácido. O tratamento deve ser iniciado de forma mais precoce possível, pois o excesso de fenilalanina é tóxico para o sistema nervoso central, influenciando diretamente nos processos de neurodesenvolvimento, mielinização e neurotransmissão, além de limitar a produção de neurotransmissores derivados da tirosina, como a serotonina, dopamina, epinefrina, norepinefrina e melatonina. Por isso, as crianças não diagnosticadas e/ou tratadas manifestam os sintomas clínicos já nos primeiros meses de vida, como retardo no desenvolvimento neuromotor, cognitivo e intelectual, convulsões, irritabilidade, eczema crônico, hipopigmentação da pele, cabelos e olhos, e urina com cheiro forte devido a presença de ácido fenilacético, um metabólito da fenilalanina, por isso é popularmente chamada de “urina de rato” por ter um odor semelhante (BRASIL, 2019). Esse distúrbio genético é normalmente categorizado de acordo com a concentração plasmática de fenilalanina em indivíduos não tratados, sendo classificados como: 87 • Fenilcetonúria clássica, quando os níveis de fenilalanina se encontram > 20 mg/dL; • Fenilcetonúria leve, se a concentração de fenilalanina estiver entre 8 mg/dL e 20 mg/dL; • Hiperfenilalaninemia não-fenilcetonúrica, quando fenilalanina plasmática está 2 mg/dL e 8 mg/dL. A forma clássica é o tipo mais grave da doença, associada à retardo mental se não tratada precocemente. No segundo caso as complicações são mais brandas, porém não exclui a necessidade de tratamento. Já para o terceiro caso não há indicação de tratamento, pois o aumento das concentrações de fenilalanina e seus metabólitos são discretos e por isso não causa danos e sintomas (BRASIL, 2019). A fenilcetonúria é considerada o erro inato do metabolismo de aminoácidos mais comum, sendo que sua incidência varia muito de país para país. A prevalência no mundo é 1:10.000 recém-nascidos, enquanto no Brasil é de 1:15.000 (MONTEIRO et al., 2006). É importante salientar que esta doença é identificada no teste do pezinho, realizado pelo Programa Nacional de Triagem Neonatal, que deve ser realizada entre o terceiro e quinto dia de vida do bebê. O diagnóstico precoce aliado ao tratamento sustentado à longo prazo são fundamentais para evitar o desenvolvimento dos sintomas e o comprometimento neurológico da criança, proporcionando a ela uma vida normal e saudável. 3.2 Dietoterapia na fenilcetonúrua A fenilcetonúria é uma doença genética decorrente de um erro inato do metabolismo que não tem cura, porém o tratamento quando iniciado precocemente impede o desenvolvimento das complicações e proporciona uma vida saudável aos portadores dessa disfunção. Nesse contexto, a estratégia terapêutica mais eficiente até o momento tem sido restrição da ingestão de fenilalanina, evidenciando o papel crucial do manejo nutricional realizado por um profissional da nutrição, que deve acompanhar o paciente desde os primeiros dias de vida. A terapia nutricional tem o intuito de manter a concentração plasmática de fenilalanina dentro dos valores normais, controlando a ingestão diária desse aminoácido a fim de evitar o acúmulo dele na corrente sanguínea, visto que as complicações da doença estão associadas ao efeito neurotóxico deste aminoácido. Dessa forma, a principal recomendação dietoterápica é a combinação de uma dieta restrita em fenilalanina aliada ao fornecimento de uma fórmula proteica isenta de fenilalanina. O tratamento deve ser iniciado o mais cedo possível, idealmente até o décimo dia de vida, para evitar qualquer possível dano neurológico. Mesmo contendo fenilalanina no leite materno, o aleitamento é recomendado devido aos inúmeros benefícios deste já comprovados, no entanto, deve ser associado ao uso da fórmula. A dieta de um fenilcetonúrico não deve conter alimentos de 88 origem animal, bem como deve-se evitar os vegetais que contenham teor elevado de fenilalanina. O tratamento dietético restritivo suplementado com a fórmula isenta de fenilalanina deve ser seguido pelo resto da vida. A fórmula proteica isenta de fenilalanina é constituída por aminoácidos ou proteínas hidrolisadas de origem vegetal e é acrescida de minerais e vitaminas em quantidades adequadas para o suprimento dos requerimentos diários. Como a proteína de origem vegetal é menos biodisponível que a de origem animal, recomenda-se a oferta de 120% a 140% das necessidades diárias de proteína por faixa etária para que o crescimento e desenvolvimento das crianças não sejam comprometidos. Os níveis plasmáticos de fenilalanina devem ser monitorados frequentemente e a dieta seguida com rigor para prevenção das manifestações clínicas (Trahms e Ogata, 2013; Brasil, 2019). A tabela “Recomendações de ingestão de proteínas para indivíduos com fenilcetonúria por faixa etária” mostra a faixa de valores de consumo de fenilalanina, tirosina,proteínas ingeridas pela fórmula e o total de proteínas ingeridas por peso diariamente ideais para cada idade. Figura 4 - Recomendações de ingestão de proteínas para indivíduos com fenilcetonúria por faixa etária Fonte: BRASIL, 2019 (Adaptado). FIQUE DE OLHO O teor de fenilalanina nos alimentos pode ser verificado na tabela disponível no site da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) acessando o link: http://portal.anvisa. gov.br/fenilalanina-em-alimentos. 89 Utilize o QR Code para assistir ao vídeo: 3.3 Galactosemia A galactosemia clássica é um erro inato do metabolismo de carboidratos, de característica autossômica-recessiva, resultante da falha ou deficiência galactose-1-fosfato uridiltransferase (GALT) levando ao acúmulo de galactose na corrente sanguínea. No entanto, pode haver falha das outras enzimas da via da galactose – galactocinase (GALK) e UDP galactose-4-epimerase (GALE) –, que ocorrem com menos frequência. A prevalência global da galactosemia clássica é de cerca de 1:30.000 a 1:60.000 nascidos vivos. Entretanto ela pode ser considerada um pouco mais recorrente no Brasil, uma vez que a proporção é de 1:20.000 nascidos vivos (CAMELO JR. et al., 2009), apesar de ser uma doença considerada rara, assim como todos os erros inatos do metabolismo. A galactose é um monossacarídeo derivado da lactose, que por sua vez é o principal carboidrato do leite. Assim, o recém-nascido nasce assintomático, porém já começa a desenvolver a doença a partir da primeira mamada e, por isso, os sintomas aparecem rapidamente, já nas primeiras semanas de vida. Os sintomas mais comuns nessa fase são ganho de peso e estatura abaixo do esperado, vômito, diarreia, letargia, icterícia, hepatomegalia catarata e comprometimento neurológico. Uma complicação mais séria é a sepse neonatal, decorrente do quadro hipoglicêmico apresentado por alguns bebês que aumentam a vulnerabilidade à infecção bacteriana e pode levar à morte neonatal (TRAHMS et al., 2013). Dessa forma, o diagnóstico precoce é fundamental para prevenir manifestações clínicas que podem ser irreversíveis. É importante salientar que o galactosemia não é investigada na Triagem Neonatal simples disponibilizada gratuitamente nos serviços públicos, ela pode ser detectada somente no teste do pezinho ampliado. Devido às sequelas do excesso plasmático de galactose à longo prazo, como distúrbios neurológicos, renais, hormonais e oftalmológicos, é aconselhável, sempre que possível, a realização da triagem neonatal ampliada ao invés da simples. 90 3.4 Dietoterapia na galactosemia A galactose é uma doença genética crônica, ou seja, não há cura. Dessa forma, o diagnóstico deve ocorrer o mais precoce possível, ainda no período neonatal, e o paciente deve aderir às restrições pelo resto da vida, a fim de evitar o surgimento de sequelas graves e que podem ser letais. A terapia nutricional é o tratamento primordial da galactosemia, sendo recomendada a exclusão total de lactose da dieta, pois esta é convertida em galactose no processo de digestão. Assim, o aleitamento materno é contraindicado, e por esse motivo é importante que a doença seja identificada já nos primeiros dias de vida, para suspensão do fornecimento de leite materno ao neonato e substituição por fórmulas especiais à base de soja. Preconiza-se a exclusão de leites e derivados, bem como de preparações que contenham leite. Dessa forma, o indivíduo com galactosemia – ou cuidadores, durante a infância do paciente – deve adquirir o hábito de ler o rótulo dos alimentos industrializados e se manterem atentos aos ingredientes adicionados a qualquer preparação que forem consumir (TRAHMS et al., 2013). Orienta-se o monitoramento periódico dos pacientes, para acompanhamento da concentração de galactose no sangue e de detecção precoce de sintomas clínicos. A galactose endógena é metabolizada por vias alternativas, o que garante a quantidade de substrato necessário para a síntese de substâncias como galactolipídeos e cerebrosídeos (TRAHMS et al., 2013). No entanto, como as vias alternativas não conseguem metabolizar toda a galactose proveniente da dieta, essa se acumula no sangue causando as complicações mencionadas. Por esse motivo, a não ingestão de lactose apresenta-se como um tratamento eficiente no controle da galactosemia. 91 Nesta unidade, você teve a oportunidade de: • estudar a fisiopatologia das formas graves de desnutrição energético-proteica infantil: marasmo e kwashiorkor; • conhecer o manejo nutricional na recuperação de crianças com desnutrição energético-proteica leve, moderada e com as formas graves marasmo e kwashiorkor; • aprender como prevenir a síndrome da realimentação em pacientes desnutridos; • entender o papel crucial da terapia nutricional como principal tratamento da fenilcetonúria e da galactosemia, bem como a importância da adesão à dietoterapia preconizada; • compreender a importância da realização da Triagem Neonatal, preferencialmente de forma ampliada, para diagnosticar e tratar precocemente doenças decorrentes dos erros inatos do metabolismo. PARA RESUMIR BRASIL. Ministério da Saúde. Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas Fenilcetonúria. 2019. CAMELO, J. R. et al. Galactosaemia in a Brazilian population: High incidence and cost– benefit analysis. Online Report. 2009. EL HUSNY, A.S et al. Erros inatos do metabolismo: revisão de literatura. Revista Paraense de Medicina. v. 20, no.2, jun/2006. FERNANDES, B.S. et al. Vencendo a desnutrição: abordagem clínica e preventiva. 2. ed. -- São Paulo: Salus Paulista; 2004. GOMEZ, F. Desnutrición. Boletín Médico del hospital infantil de México. 3:543-51, 1946. GOULART, L. M. H. F. et al. Saúde da criança e do adolescente: agravos nutricionais. Belo Horizonte: Coopmed, 2008. MONTE, C. M. G. et al. Tratamento hospitalar da criança gravemente desnutrida. Temas de Nutrição em Pediatria. Departamento Cientifico de Nutrição da Sociedade Brasileira de Pediatria, v. 2, p. 24-50, 2002. MONTEIRO, L. T. B. et al. Fenilcetonúria no Brasil: evolução e casos. Revista de Nutrição.19(3):381-387, maio/jun 2006. PELLETIER, D. L. et al. The effects of malnutrition and child mortality in developing countries. 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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Patologia da nutrição e dietoterapia é um livro direcionado para estudantes dos cursos da área de nutrição e correlatas. Além de abordar assuntos triviais, o livro traz conteúdo sobre patologia da nutrição e dietoterapia, dietoterapia nas doenças cardiovasculares e endócrinas, doenças renais, alergias e intolerâncias alimentares, e dietoterapia na desnutrição infantil e para tratar erros inatos do metabolismo. Após a leitura da obra, o leitor vai compreender sobre as modificações que devem ser realizadas nas dietas hospitalares para atender diversos tipos de pacientes, considerando a importância da individualidade; aprender sobre avaliação nutricional do paciente hospitalizado, considerando a importância de integrar diferentes métodos para um correto diagnósticonutricional; entender como as escolhas alimentares e o estilo de vida estão diretamente envolvidos no desenvolvimento e agravamento das doenças cardiovasculares e endócrinas abordadas; conhecer ferramentas e protocolos aplicados no contexto dietoterápico das enfermidades estudadas, como contagem de carboidratos, dietas DASH e mediterrânea, e modelo de algoritmo para tratamento da obesidade; saber os diferentes mecanismos de reações adversas a alimentos; aprofundar o conhecimento sobre o manejo de alergias e intolerâncias; estudar a fisiopatologia das formas graves de desnutrição energético-proteica infantil: marasmo e kwashiorkor, e muito mais. Aproveite a leitura do livro. Bons estudos! Capa E-Book_Patologia da Nutrição Dietoterapia_CENGAGE_V2 E-Book Completo_Patologia da Nutrição e Dietoterapia_CENGAGE_V2