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DESCRIÇÃO
Estudo da literatura portuguesa a partir da estética do Barroco e do Arcadismo.
PROPÓSITO
Conhecer o contexto e a produção literária barroca e arcádica em Portugal para a ampliação de seus
estudos sobre arte, literatura e história cultural em língua portuguesa.
PREPARAÇÃO
Tenha à mão um dicionário de literatura para compreender o vocabulário específico da área. Na internet,
você acessa gratuitamente o E-dicionário de termos literários , de Carlos Ceia, e o Dicionário de cultura
básica , de Salvatore D’Onofrio. No portal Domínio público, você pode ter acesso a obras de autores
consagrados da literatura portuguesa.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Identificar o contexto e as características do Barroco em Portugal
MÓDULO 2
Reconhecer as características barrocas da obra do Padre Antônio Vieira
MÓDULO 3
Identificar as principais características do Arcadismo em Portugal
INTRODUÇÃO
O que é o Barroco? Posso considerar uma obra como barroca por ela ser antiga e ter cunho religioso? E
o que é o Arcadismo? Qual é sua relação com a cultura clássica?
Essas são algumas perguntas bem elementares que podem surgir quando tratamos de duas estéticas
importantes na Europa dos séculos XVI, XVII e XVIII.
Responderemos a elas neste conteúdo e abordaremos outras questões relevantes no estudo sobre o
Barroco e o Arcadismo em Portugal, particularmente em sua produção literária.
Veremos os principais elementos relacionados ao contexto e às características estéticas dessa produção
literária, além de elaborarmos uma panorâmica acerca dos autores e das obras que marcaram essas
estéticas literárias em Portugal. Verificaremos ainda que as fases históricas não são isoladas dos
estudos literários ou artísticos, pois elas estão intrinsecamente conectadas aos valores e ao modo de
produzir a vida de cada sociedade.
Desse modo, compreenderemos as estéticas barroca e árcade à luz dos eventos em seus contextos e
origens históricas. Além disso, entenderemos que as denominações estéticas são fruto de terminologias
criadas por estudiosos, englobando, por conta disso, diferentes produções em um só nome.
Também faremos algumas relações entre a cultura literária portuguesa e a brasileira. Para isso,
estudaremos, por exemplo, a literatura do Padre Antônio Vieira, português que produziu boa parte de
sua obra quando esteve radicado no Brasil. Ele é considerado um dos maiores escritores da língua
portuguesa de todos os tempos.
MÓDULO 1
 Identificar o contexto e as características do Barroco em Portugal
ANTECEDENTES HISTÓRICOS DO BARROCO
Comecemos este módulo pontuando alguns elementos que antecedem o movimento do Barroco em
Portugal.
No final da Idade Média, o sistema feudal entrou em colapso devido às novas formas econômicas e de
organização social que surgiam de uma nascente cultura burguesa.
O Feudalismo se caracterizava pela predominância de uma cultura teocêntrica, centrada na figura do
rei e da Igreja. Em termos políticos e econômicos, havia uma interdependência entre rei, vassalos e
servos.
Tratava-se de uma sociedade fechada, baseada na agricultura, em que a mobilidade social era reduzida;
portanto, a cultura e as práticas sociais também se abasteciam das referências religiosas.
Portugal se tornou um país autônomo no reinado de D. Afonso Henriques, conhecido como Afonso I de
Portugal (1109-1185), no século XII.
As organizações política e econômica do país, entre os séculos XI e XIV, eram tipicamente feudais. As
letras portuguesas do período se abasteciam de:
Jograis
Cancioneiros
Trovas
Canções de amigo
Cantigas de amor
Satíricas
Hagiografias (narrações da vida dos santos)
Novelas de cavalaria
As novelas de cavalaria eram muito marcantes e resultavam de variações estéticas oriundas,
principalmente, das traduções francesas. Tratava-se de uma literatura cujos valores eram absolutamente
dependentes da cultura cristã, com personagens e situações concebidas pela Igreja Católica.
Uma importante modificação na dinastia portuguesa se deu graças à Revolução de Avis (1383-1385),
com a consequente ascensão ao trono de monarcas oriundos da Casa de Avis. Como consequência, ao
mesmo tempo em que se manteve a autonomia de Portugal, houve uma diminuição do poder
monárquico em detrimento dos poderes locais.
Foi a época na qual o país dava início ao processo da expansão naval e aos descobrimentos. D. João I
(1357-1433) e seus sucessores eram apoiados pelos mercadores burgueses. Com isso, ocorreu um
enfraquecimento do poder da nobreza e, consequentemente, de todas as referências culturais da Igreja,
o que levou Portugal a se abrir para o mundo.
Essa abertura marcou o início do que foi chamado de Humanismo, tendo o cronista Fernão Lopes
(1385-1460) como uma das referências nas letras, já que, em suas crônicas, havia um substrato que
fortalecia a ideia de que a história é resultado do empreendimento humano.
Posteriormente, entre os séculos XV e XVI, eclodiu o Renascimento, que era uma espécie de evolução
do humanismo. Suas referências eram a cultura clássica greco-romana, o racionalismo e o
antropocentrismo. O questionamento do poder divino e o elogio da razão humana são a marca dele.
O Renascimento pressupunha que o desenvolvimento da arte passava por um viés de racionalização
dos costumes, da arte e da própria vida, sendo a consequência de uma sociedade voltada para o
comércio e a livre concorrência, o que deixava transparecer a ascensão da burguesia urbana.
Esse movimento foi uma arte marcada pelas visões humanista e clássica. Seu momento histórico de
abertura ocorreu graças à aproximação entre Portugal e Espanha.
Portugal, entre 1580 e 1640, esteve sob o domínio espanhol.
Essa proximidade entre os dois países vizinhos foi fundamental para o surgimento do Barroco nas terras
lusitanas, pois as trocas culturais entre ambos fizeram com que Portugal iniciasse uma ruptura de seu
sistema feudal não aberto às fronteiras.
Devemos compreender o Barroco a partir de seu nascedouro religioso, principalmente como uma reação
à Reforma Protestante ocorrida no começo do século XVI. Martinho Lutero (1483-1586) e João Calvino
(1509-1564) são peças importantes na história da Reforma. Parte da burguesia comerciante aderiu ao
protestantismo, abandonando as crenças católicas.
 SAIBA MAIS
Padre alemão, Lutero começou a denunciar a Igreja Católica pela venda de perdões aos seus fiéis. Ele
pregava que a absolvição divina deveria vir por conta de uma vida religiosa e pela fé, contrariamente ao
perdão oferecido em troca de doações, prática no catolicismo do período. Dessa forma, muitos fiéis
começaram a seguir suas ideias e aderir ao protestantismo.
Já Calvino defendia que o lucro obtido por meio do trabalho não era pecado, o que fazia coro com as
práticas sociais do período, já que, no século XVI, o mundo europeu se expandia comercialmente por
meio da abertura de novos mercados, iniciando o que chamamos atualmente de capitalismo.
Como reação à ascensão protestante, a Igreja Católica, no Concílio de Trento (1545 - 1563), construiu
ações muito duras para combater a Reforma Protestante. Esse movimento ficou conhecido como
Contrarreforma.
 
Imagem: Pedro Berruguete/Museo Nacional del Prado/Domínio Público
 Pintura de Pedro Berruguete, representando um auto de fé da Inquisição Espanhola.
Com isso, ressurgiram os tribunais do Santo Ofício (Santa Inquisição). Livros considerados profanos
foram proibidos. Vale mencionar a criação da Companhia de Jesus, também conhecida como Ordem
dos Jesuítas, antes mesmo do Concílio de Trento.
O Barroco, desse modo, foi a arte que deu suporte e vazão à Contrarreforma com marcas fortemente
religiosas. Forma artística originária do conservadorismo da Igreja, ele reagia aos novos tempos e aos
novos valores implementados pela burguesia.
As marcas desses valores burgueses eram:
Apelos sensoriais do corpo
Novas concepções de amor
Elogio ao dinheiro, ao luxo, às posições sociais e às descobertas da ciência
 
Imagem: Diego Velázquez/Museodel Prado/Domínio Público
 As Meninas , por Diego Velázquez.
PRINCÍPIOS ESTÉTICOS DO BARROCO
CONCEPÇÃO
Nesse contexto tensionado e dúbio entre a Reforma e a Contrarreforma, assim como entre as marcas
históricas deixadas pelo Feudalismo e o surgimento da Modernidade, eclodia uma literatura também
dúbia, que trabalhava com opostos e era conflitante em suas concepções e formas.
Ao mesmo tempo em que o Barroco dava vazão aos ares de uma reação religiosa conservadora, que
recuperava os valores medievais, já não era possível apagar as transformações históricas que o
Ocidente experimentou a partir do Renascimento, cujas bases se assentavam sobre a liberdade, o
empreendimento individual e o alargamento da visão humana.
Por isso, a estética barroca acabou por conciliar, entre outros, estes opostos:
CARNE 
X 
ESPÍRITO
FÉ 
X 
RAZÃO
MEDIEVAL 
X 
MODERNO
Ela o fez por meio de uma linguagem repleta de antíteses, oscilações, contrapontos, sinestesias,
trocadilhos, rebuscamentos, tensões e irregularidades. Essas dicotomias históricas fundamentam os
princípios estéticos do Barroco tanto nas artes em geral quanto na literatura.
ORIGEM E ANÁLISE
A origem e a definição do Barroco são controversas: há vários e importantes autores que divergem entre
si. Mas vale a pena recuperar alguns pontos, pois o importante é que você, estudioso da literatura, saiba
as principais concepções e os princípios das argumentações.
A origem da palavra “barroco”, para muitos teóricos, seria castelhana: o barrueco aludia às pérolas
consideradas imperfeitas ou deformadas, tendo como parâmetro de comparação a regularidade da arte
clássica renascentista, principalmente em comparação com as obras de Leonardo da Vinci,
consideradas um protótipo de bom gosto. Segundo Lopes e Saraiva (2000), inicialmente, essa palavra
assumia um tom pejorativo.
Importante estudioso do movimento barroco, o filósofo e escritor suíço Heinrich Wölflin (1864-1945)
recuperou o termo em 1888 – só que com um valor positivo. Ele fez isso em sua obra Renascimento e
Barroco por meio da observação e da descrição de várias artes aproximadas, criando, para tal,
definições esquemáticas que opunham o Barroco ao Clássico.
 
Imagem: Rudolf Duhrkoop/Wissenschaftliche Sammlungen der HU Berlin/Domínio Público
 Heinrich Wölflin.
Para João Adolfo Hansen (2001), muito do que sabemos sobre o Barroco, na verdade, não corresponde
exatamente às obras e às manifestações consideradas barrocas, já que tais considerações estão
apenas baseadas na visão esquemática de Wölflin (criada no século XIX como tentativa de
compreensão do movimento). Portanto, para Hansen, o Barroco nunca existiu, sendo um conceito criado
por Wölflin.
OBRAS E MANIFESTAÇÕES ARTÍSTICAS
O fato é que aquilo que chamamos Barroco, em um sentido historicamente amplo, designa um grande
número de obras ligadas a inovações técnicas e científicas muito diferentes entre si produzidas na
Europa a partir do século XVI.
Apontaremos alguns exemplos de obras barrocas em:
 
Imagem: Caravaggio/ Basilica Parrocchiale Santa Maria del Popolo/Domínio Público
 Crucificação de São Pedro, por Caravaggio, 1601.
ARTES PLÁSTICAS
Foram produzidas obras pictóricas que exploravam gradações intensas de cor. Elas atingiam uma
atmosfera de profundidade por meio dos contratastes entre claro e escuro, assim como pela sensação
de movimento das linhas.
Exemplo: obras do pintor italiano Caravaggio (1571-1610).
Nessa tela de Caravaggio, de 1601, nota-se o contraste entre claro e escuro e o apelo sensorial às
imagens de sofrimento. A personagem caída é clara, contrastando-se com o fundo escuro, o que sugere
uma ideia de profundidade. O tema religioso reforça os dogmas da Igreja: há um apelo ao efeito criado
no espectador, como se ele devesse ser impactado diante da arte.
 
Imagem: Caravaggio/Rabanus Flavus/Domínio Público
 Transcrição de O Sacred Head, Now Wounded, do Bach.
MÚSICA
Desenvolveu-se a exploração de elementos polifônicos entre contraponto e fuga, cujas características
são a exploração de duas ou mais vozes simultâneas e entrelaçadas.
Exemplo: composições dos alemães Johann Sebastian Bach (1685-1750) e Georg Friedrich Händel
(1685-1759).
 
Imagem: Sílvia Schumacher/Own work/Domínio Público
 Santuário de Bom Jesus de Matozinhos.
ARQUITETURA
Inferindo aspectos de pompa e grandiloquência, notava-se a exploração de:
Reentrâncias 
Ornamentos 
Saliências 
Modulações em curvas
Exemplo: o arquiteto italiano Francesco Borromini (1599-1667) e o escultor brasileiro Aleijadinho (1738-
1814).
 
Imagem: Luis de Góngora/Rômulo Rosa/Domínio Público
 Luis de Góngora, Fábula de Polifemo y Galatea , 1612.
LITERATURA
Em oposição ao espírito da clareza e da harmonia, houve a recusa de vocábulos populares e a
aproximação com uma escrita aristocrática, empolada e, até certo ponto, obscura, com laivos de
misticismo e opulência, sendo, muitas vezes, até hermética.
Exemplo: o cultismo ou gongorismo, em referência ao poeta espanhol Luis de Góngora (1561-1627),
foi uma vertente que explorava o preciosismo vocabular e uma linguagem ornamental, dando especial
atenção aos aspectos formais por intermédio de jogos sonoros e sintáticos. Já no conceptismo ou
quevedismo, termo referente ao poeta espanhol Francisco de Quevedo (1580-1645), há uma ênfase na
exploração de conceitos e ideias, havendo uma atenção especial aos conteúdos temáticos da linguagem
literária.
 RESUMINDO
Em suma, o chamado Barroco, assim como suas variações, produz um efeito de euforia dos sentidos.
BARROCO EM PORTUGAL: PANORAMA
HISTÓRICO
 
Imagem: Cristóvão de Morais/Royal Collection/Domínio Público
 D. Sebastião.
O Barroco português, como em toda a Europa, deve muito ao desenvolvimento desse estilo na Espanha.
Após o desaparecimento de D. Sebastião na batalha no Marrocos (Alcácer-Quibir), em 1578, o Cardeal
D. Henrique (1512-1580), tio de D. Sebastião, assumiu o trono.
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D. SEBASTIÃO
Nascido em Lisboa, em 1554, D. Sebastião tem seu desaparecimento ou morte cercado de
mistérios, dando origem ao chamado sebastianismo. O sebastianismo, mito sebástico ou mito do
encoberto, foi uma crença messiânica e mística presente em Portugal após a segunda metade do
século XVI, sendo espalhada após o desaparecimento do rei de apenas 24 anos.
Essa crença supunha que ele retornaria para restaurar a autonomia e a glória portuguesas por
conta da dominação espanhola na figura do rei D. Filipe II. O sebastianismo, após o fim do período
filipino, no entanto, continuou existindo em Portugal como mito de restauração de uma identidade
perdida e, ao mesmo, tempo, em vias de ser conquistada.
O reinado de D. Henrique não duraria muito. Sem descendentes, a morte do monarca decretou o fim da
chamada dinastia de Avis, que havia consolidado Portugal como nação. Com o fim dessa dinastia, a
Espanha passou a dominar seu vizinho.
 
Imagem: Autor desconhecido/Lumastan/Domínio Público
 D. Henrique.
Esse domínio, que durou 60 anos, é um período de união ibérica conhecido como período filipino. Na
era da dinastia filipina, as trocas culturais entre os dois países se intensificaram, fortalecendo as
influências barrocas espanholas em Portugal.
No governo de Filipe IV (1605-1665), ocorreu a chamada revolução restauradora. Portugal enfim
retomava sua autonomia com D. João (1604-1656), Duque de Bragança e futuro D. João IV, findando a
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dominação espanhola.
FILIPINO
Em alusão aos reis Filipe II, Filipe III e Filipe IV.
BARROCO EM PORTUGAL: PRINCIPAIS
CARACTERÍSTICAS
O período dessa dominação foi marcante para a produção literária em Portugal, pois a Espanha tinha
interesses comerciais com tal união ibérica, fato que atraiu muitos judeus (os chamados cristãos-novos)
para o país. Esse grupo possuía aportes monetários altos que ajudaram a financiar os projetos de
expansão marítima de Portugal e Espanha unidos.
Nessa junção, havia forças aparentemente antagônicas, mas que, na verdade,ajudaram a formar a
atmosfera de produção barroca em Portugal:
De um lado...
Um país com forte estrutura e cultura feudal tardia, que permanecia atrelado ao espírito cristão
medieval, estando sob o domínio da contrarreforma jesuítica;
Por outro lado...
A presença dos cristãos-novos emigrados e de uma burguesia comercial crescente, que inspirava os
ares mercantis e unia uma rede mundial de comércio.
Do ponto de vista cultural, havia, portanto, um país dividido entre um Renascentismo, que nunca
chegou completamente, e uma cultura da Contrarreforma, que trazia da Espanha fortes influências
barrocas. Dessa forma, a atmosfera da Contrarreforma e do Barroco é marcada por um período de crise
política e social ocorrido entre a chamada Restauração Portuguesa e as reformas do Marquês de
Pombal no século XVIII.
A literatura do período filipino foi marcada por um teor sebastianista e anticastelhano, reivindicando,
por meio de uma resistência popular espontânea, a autonomia portuguesa em oposição à dominação
espanhola.
Destacava-se uma literatura oral e escrita com tons satíricos, sendo composta por romances, cartas,
versos soltos, atas e entremezes, além de outros textos curtos e clandestinos. O fim desse período teve
como marco uma obra-prima da prosa barroca portuguesa, A arte de furtar , atualmente atribuída ao
Padre Manuel da Costa (1601-1667).
Mesmo após o período filipino, a maior parte da produção literária portuguesa ainda possuía um tom da
retórica jesuítica, com forte influência espanhola, tendo a maior parte dela origem clerical. Contudo,
como vimos, a influência burguesa também se fazia presente, mesclando temas, linguagens e
tonalidades de uma aristocracia (nobreza) e uma burguesia letrada.
Isso confirma, aliás, a exploração das contradições e antíteses barrocas. Mesclava-se, nessa
literatura, tonalidades profanas e religiosas, satíricas e moralistas, passadistas e artificiais, com textos
mais densos sobre a condição humana.
Eis alguns temas tratados nesses escritos:
Finitude da vida
Desejo da eternidade
Contradições do amor
Liberdade do espírito versus moralidade cristã
Apego ao passado aristocrata
Arroubos de uma nova vida citadina burguesa
Sensualidade da carne
Espiritualidade a ser sempre alcançada
Em suma, trata-se de um período contraditório nas letras, embora ele revele, de forma profunda e em
um sentido histórico, as contradições de uma sociedade portuguesa decadente: acachapada entre uma
aristocracia agônica e uma burguesia incipiente, ainda sem um desenvolvimento próprio e muito
dependente do ouro das colônias, bem como de suas atividades comerciais.
Ainda tratando das características do barroco literário em Portugal, vale destacar que a poesia barroca
portuguesa foi marcada pelo aparecimento de academias literárias (academia dos Singulares e a dos
Generosos, por exemplo). Elas eram geralmente ligadas à aristocracia e com forte influência da lírica
espanhola.
Essas poesias são líricas cujos temas refletem o espírito da corte sob o domínio espanhol, estando
voltadas para as experiências formais e linguísticas típicas do gongorismo.
As poesias da época estão reunidas em coletâneas como Fênix renascida (1716-1728) e Postilhão de
Apolo (1761-1762), cujo conteúdo marca a decadência cultural portuguesa. Essas coletâneas
documentam um período no qual a poesia:

[...] PROCURA A SÍNTESE DE UM CONTEÚDO ARTIFICIAL E
DE UMA FORMA POBRE: ANTÍTESES FORÇADAS,
PEDANTISMO, USO EXAGERADO DE HIPÉRBATOS
(ESVAZIANDO SEU SENTIDO POÉTICO), RIMAS IMPOSTAS,
USO OBRIGATÓRIO DE CERTAS PALAVRAS E
TROCADILHOS.
(ABDALA JR.; PASCHOALIN, 1985, p. 61)
Elas eram, portanto, produções que marcavam a atmosfera de transformações e tensões históricas da
vida portuguesa por meio do declínio da nobreza frente à burguesia e das críticas à vida religiosa e
beata, embora ainda fossem carentes de fortes referências culturais que pudessem fortalecer a criação
de estéticas vigorosas e inovadoras. Por isso, tais escritos foram produções marcadas pela pompa,
pelos exageros e pelos artificialismos.
BARROCO EM PORTUGAL: AUTORES E OBRAS
 
Imagem: Autor desconhecido/Portal da história/Domínio Público
 Padre Antônio Vieira.
O maior autor da literatura barroca portuguesa é o Padre Antônio Vieira (1608-1697), sem dúvida um
dos maiores artistas e intelectuais de toda a língua portuguesa – incluindo-se as obras produzidas no
Brasil.
 COMENTÁRIO
Estudaremos a obra de Vieira com a devida atenção no módulo 2.
No entanto, outros autores também devem ser destacados, pois muitas de suas obras possuem um
evidente valor literário, cultural e histórico:
SÓROR MARIANA ALCOFORADO (1640-1723)
Freira do convento de Nossa Senhora da Conceição, em Beja, Alcoforado foi apaixonada por um oficial
francês que serviu em Portugal nas guerras da restauração, mas que foi obrigado a voltar a seu país
após as guerras.
Autora de uma prosa rica, ela escreveu as Cartas portuguesas , obra em que descreve seu sentimento
pelo oficial francês e revela um espírito tipicamente barroco, preso entre as volúpias de uma paixão
ausente e o espírito casto do convento.
Historicamente, segundo Lopes e Saraiva (2000), Alcoforado representa mais um dos inúmeros casos
de mulheres sem identificação religiosa que eram enviadas aos conventos por famílias aristocratas que
não queriam ver suas filhas em enlace matrimonial com burgueses ou com cristãos-novos (judeus).
Isso revela muito da sociedade conservadora portuguesa, ainda presa a uma aristocracia que ia se
findando, mas sem adentrar com profundidade no mundo burguês. A obra de Sóror Mariana, com efeito,
é marcada pela descrição de uma paixão violenta e sensual em crise com uma consciência moral.
 
Imagem: Autor desconhecido/Cartas de amor ao cavaleiro de Chamilly/Domínio Público
RODRIGUES LOBO (1580-1622)
 
Imagem: Autor desconhecido/Corte na Aldea/Domínio Público
Tendo vivido na dinastia filipina, Rodrigues Lobo produziu uma obra com fortes influências da cultura
hispânica – inclusive, a maioria de seus textos foi escrita em espanhol.
Escrito em homenagem à coroa portuguesa – mais especificamente a D. Duarte, irmão do Duque de
Bragança –, o livro Corte da aldeia constitui uma das primeiras manifestações barrocas em Portugal.
Nessa obra, o autor descreve a vida da corte. Sua temática faz referência ao fim da corte portuguesa
diante da dominação espanhola durante a dinastia filipina. Esse livro, portanto, absorve as influências
barrocas. Há também a inserção de temas portugueses, incorporando, de certa forma, o Barroco ao
espírito da nação.
Rodrigues Lobo também escreveu, entre outras obras, as novelas Primavera e Pastor peregrino .
PADRE MANUEL BERNARDES (1644 - 1710)
Bernardes escreveu Nova floresta , obra elaborada em cinco volumes, retratando o espírito religioso e o
culto das virtudes da fé. Seus escritos refletem a condição da clausura inerente à vida religiosa e casta
do período.
 
Imagem: Autor desconhecido/Biblioteca Nacional Digital/Domínio Público
FRANCISCO MANUEL DE MELO (1608-1666)
 
Imagem: Nicolas Regnesson/Biblioteca Nacional de Portugal/Domínio Público
Destacou-se em sua escrita o gênero epistolar (mais de 20.000 cartas foram produzidas), mas sua obra
é vasta, envolvendo teatro, biografias e poesia, além de outros gêneros.
Em 1651, Melo escreveu Carta de guia de casados , obra que possui uma forte influência aristocrática
em oposição a valores puramente nobres e cristãos, o que imprime a ela um tom irônico e bem-
humorado.
ANTÔNIO JOSÉ DA SILVA, “O JUDEU” (1705 - 1739)
Teatrólogo, José da Silva foi um inovador. Ele escreveu suas peças em prosa, o que era novidade no
contexto português. Elas tinham uma forte influência da comédia renascentista espanhola e francesa,
além de aludirem à mitologia e aos autores da Antiguidade Clássica.
Sua obra foi marcada pelo riso e pela sátira. Inspirada na linguagem e nas práticas populares, ela
ironizava os costumes e os valores da sociedade de Lisboa.Nascido no Brasil, o autor foi perseguido e
morto pela coroa portuguesa e pela Inquisição, já que era acusado da prática de “judaísmo”.
Silva é considerado o maior autor teatral de seu tempo, compondo o que chamou de “ópera”, uma vez
que ela continha música e canto. Em Guerras do alecrim e da manjerona , ele alcançou o ápice de seu
estilo.
 
Imagem: Autor desconhecido/Courtesy of Museum of the Inquisition/Domínio Público
FREI ANTÔNIO DAS CHAGAS (1631-1682)
 
Imagem: Autor desconhecido/Courtesy of Museum of the Inquisition/Domínio Público
Trata-se do nome pelo qual ficou conhecido o autor Antônio da Fonseca Soares. Ele deixou uma obra
em prosa e verso repleta de traços barrocos.
Os poemas de circunstância o aproximam da escrita do espanhol Góngora, mas é em Cartas
espirituais que ele conseguiu desenvolver todo o seu estilo. Chagas também escreveu Sermões ,
tendo Sermões genuínos como o exemplo de uma prosa elegante e clara.
Um famoso soneto barroco atribuído ao Frei Antônio das Chagas, Conta e tempo , mostra toda a
dualidade de seu estilo, repondo em choque os vícios humanos versus as virtudes divinas. Isso, aliás,
dialogava perfeitamente com sua biografia. Suas experiências, afinal, estão divididas entre a guerra e os
prazeres terrenos, por um lado, e uma existência voltada à vida religiosa, por outro.
No poema, há um diálogo tenso com o divino: o eu lírico exclama suas dúvidas em relação ao destino
diante da fugacidade da vida, o que representa um tópico recorrente da lírica barroca.
CONTA E TEMPO
Deus pede estrita conta de meu tempo.
E eu vou do meu tempo, dar-lhe conta.
Mas, como dar, sem tempo, tanta conta
Eu, que gastei, sem conta, tanto tempo?
Para dar minha conta feita a tempo,
O tempo me foi dado, e não fiz conta,
Não quis, sobrando tempo, fazer conta,
Hoje, quero acertar conta, e não há tempo.
javascript:void(0)
Oh, vós, que tendes tempo sem ter conta,
Não gasteis vosso tempo em passatempo.
Cuidai, enquanto é tempo, em vossa conta!
Pois, aqueles que, sem conta, gastam tempo,
Quando o tempo chegar, de prestar conta
Chorarão, como eu, o não ter tempo...
(CHAGAS, 2021)
No vídeo a seguir, o professor Daniel Abrão abordará o contexto e as características da estética barroca
em Portugal:
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. O ENTENDIMENTO DO CONTEXTO E DAS CARACTERÍSTICAS DO BARROCO
LITERÁRIO PORTUGUÊS PASSA PELA RELAÇÃO HISTÓRICA ENTRE
PORTUGAL E ESPANHA, RELAÇÃO MUITAS VEZES CONFLITUOSA E DE LUTA
PELA AUTONOMIA OU SOBERANIA PORTUGUESA. A POESIA BARROCA
PORTUGUESA DOS ANOS DA DINASTIA FILIPINA (1580-1640) É MARCADA
PELA ARTIFICIALIDADE E PELOS TEMAS SUPERFICIAIS, RECHEADA DE
EXERCÍCIOS DE LINGUAGEM TÍPICOS DE UM GONGORISMO DESLOCADO DE
SEU CONTEXTO DE ORIGEM. TAL ARTIFICIALIDADE ACONTECE PORQUE ESSA
PRODUÇÃO LITERÁRIA ERA HISTORICAMENTE:
A) Caracterizada esteticamente como uma poesia com forte influência do modo de vida dos mosteiros,
ou seja, uma vida de castidade.
B) Resultante das academias literárias portuguesas conhecidas como Singulares e Generosos,
compostas de poetas aristocratas que ansiavam pelo retorno dos valores portugueses abandonados
pela dinastia filipina.
C) Escrita por poetas da corte portuguesa dominada pela dinastia filipina, enquanto Portugal vivia a
tensão entre o fim da autonomia e a crise da nobreza, bem como a ascensão da aristocracia e da
burguesia comercial.
D) Consequência da estética conceptista do Barroco vinda da Espanha, que pressupunha uma lírica
com forte ênfase nos jogos de linguagem.
E) Expressão dos poetas portugueses que, mesmo dentro do período barroco, tinham como referência a
cultura clássica.
2. EM RELAÇÃO AO CONTEXTO DO BARROCO EM PORTUGAL E ÀS
INFLUÊNCIAS RECEBIDAS, ASSINALE A ALTERNATIVA CORRETA:
A) A estética barroca em Portugal é resultado principalmente da influência dos cristãos-novos (judeus)
em Portugal.
B) O Barroco foi um movimento criado pela forte atuação das academias literárias portuguesas.
C) A produção literária barroca foi decorrente da forte presença da estética renascentista em Portugal.
D) As influências da arte barroca se intensificaram após o domínio espanhol durante a dinastia filipina.
E) As influências barrocas se devem à retomada da autonomia do país após a restauração portuguesa.
GABARITO
1. O entendimento do contexto e das características do Barroco literário português passa pela
relação histórica entre Portugal e Espanha, relação muitas vezes conflituosa e de luta pela
autonomia ou soberania portuguesa. A poesia barroca portuguesa dos anos da dinastia filipina
(1580-1640) é marcada pela artificialidade e pelos temas superficiais, recheada de exercícios de
linguagem típicos de um gongorismo deslocado de seu contexto de origem. Tal artificialidade
acontece porque essa produção literária era historicamente:
A alternativa "C " está correta.
 
Os poemas possuíam temas artificiais porque refletiam o clima histórico da perda da autonomia de
Portugal para a Espanha e a consequente crise da nobreza frente à ascendente burguesia.
2. Em relação ao contexto do Barroco em Portugal e às influências recebidas, assinale a
alternativa correta:
A alternativa "D " está correta.
 
O Barroco dominou a cultura espanhola dos séculos XVI e XVII; após a dominação de Portugal, as
trocas culturais entre os dois países se intensificaram. Isso contribuiu para o incremento da produção
literária barroca naquele país.
MÓDULO 2
 Reconhecer as características barrocas da obra do Padre Antônio Vieira
PADRE ANTÔNIO VIEIRA
O Padre Antônio Viera nasceu em Portugal, em 1608, e morreu na Bahia, com quase 90 anos, em 1697.
Aos 7 anos, foi trazido para o Brasil, onde o pai exerceria funções burocráticas no governo. Ele
ingressou na Companhia de Jesus aos 15 anos; desde cedo, já conseguia redigir textos, desenvolvendo
uma cadeira de retórica dentro do universo jesuíta.
Ele se tornou uma figura política importante no Brasil durante o reinado de D. João IV. Agindo
politicamente, Vieira escreveu textos, cartas e sermões em prol das questões políticas de Portugal,
opondo-se, muitas vezes, aos pares da Companhia de Jesus.
 
Imagem: Autor desconhecido/Biblioteca Nacional de Portugal/Domínio Público
 Vieira.
Vieira foi um ferrenho defensor do Rei D. João IV, a quem dedicou, em parceria política, muitas lutas e
dissabores, chegando a tomar, em muitas querelas, partido mais próximo do rei do que da Companhia
de Jesus.
Ele desenvolveu uma luta em favor dos cristãos-novos (judeus) em Portugal, pois entendia que o país
precisava ter “uma política fundada no poder econômico da burguesia”, explicam Lopes e Saraiva (2000,
p. 518).
Por esse motivo, foi perseguido e exilado pelo Santo Ofício, já que os jesuítas se opunham aos cristãos-
novos por questões religiosas, políticas e de interesse econômico. Os jesuítas tinham a massa popular a
seu favor, além de inúmeros grupos internos que disputavam o poder com os judeus na constante luta
da nobreza contra a burguesia do período.
Apesar de pertencer ao clero e à Companhia de Jesus, além de, em princípio, estar a favor da nobreza,
Vieira acabou tomando, nessas questões, partido da burguesia mercantil, pois tinha uma visão de futuro
mais pragmática, antecipando inclusive alguns elementos pragmáticos do que viria a ser a política na
época do Marquês de Pombal (1699-1782), um déspota esclarecido em favor da burguesia e contra os
jesuítas.
Vieira tinha consciência de que a máquina mercante era algo definitivo e irreversível; portanto, ele via
que lamentar sua intrusão nos portos da colônia seria uma atitude vã. Por conta disso, era necessário
dominar essa máquina, “imitando os seus mecanismos e criando, na esfera do poder monárquico luso,
uma estrutura similar que pudesse vencê-la na concorrência entre os impérios”, aponta Bosi (1998, p.
120).
A visão e a atuação política dele no Brasil também suscitaram inimigos, principalmente em questões
relacionadas aos colonos locais. Afinal, eles eram a favor da escravidão indígena,mas o Padre Antônio
Vieira e uma parte dos jesuítas se opunham a ela.
Ele escreveu muitos textos em favor dos ameríndios, acabando por sugerir, em decisão controversa (no
seu tempo e ainda nos dias atuais), que Portugal deveria trazer os escravos da África a fim de substituir
a mão de obra escrava indígena, embora, segundo Saraiva e Lopes (2000, p. 521), “o próprio Vieira
tenha escrito páginas vibrantíssimas sobre os sofrimentos desses mesmos negros”.
Bosi (1998) afirma que Vieira, em seus Sermões , acabou assumindo as próprias contradições, as
quais, aliás, eram inerentes ao próprio projeto português, por ele assumido, entre a fé cristã e a
benevolência, assim como à necessidade de imprimir no Brasil o projeto de domínio de Portugal.
Com esses dois conflitos intensos (em relação à política portuguesa e à questão dos colonos no Brasil),
o Padre Antônio Vieira acabou sendo exilado no Maranhão e, posteriormente, em 1661, expulso da
Companhia por ação dos jesuítas.
 
Imagem: Peter Paul Rubens/Revista de História da Arte/Domínio Público
 D. João IV.
D. João IV, o principal sustentáculo político de Vieira, já estava morto havia cinco anos. Após esse
acontecimento, o padre foi processado por heresia, embora tenha sido anistiado posteriormente.
Em 1669, ele partiu para Roma, onde continuou seu ofício de pregador e defensor de uma política
econômica aberta para Portugal. Vieira regressou definitivamente à Bahia em 1681, onde desempenhou
tarefas na coordenação das missões, além do trabalho de compilação de suas obras.
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DA ESCRITA
DO PADRE ANTÔNIO VIEIRA
Vieira é o ourives da palavra. Poucas vezes a língua portuguesa encontrou uma maestria tão eficiente
em suas construções sintáticas, lexicais e imagéticas.
Toda a sua obra se funda no trabalho com a palavra e suas variações infinitas. Sua escrita era
engenhosa e aguda, trazendo a marca barroca, embora, na época, fosse denominada “retórica da
agudeza”, aponta Hansen (2000).
O engenho não submete o pensamento ou o bom senso à lógica. A escrita engenhosa pensa por
intermédio das palavras, arrancando delas uma outra lógica persuasiva, artística e encantadora em
oposição a uma retórica clássica racionalista e calcada em silogismos puramente lógicos.
Nos sermões de Vieira, assim como em muitos textos, o tema é desenvolvido a partir de um trecho
bíblico comentado e desenvolvido. Para entender sua escrita, é fundamental reconhecer que ele não só
comenta moral e doutrinariamente os trechos escolhidos, mas que também “desempenha” esses textos.
Desempenhar o texto consiste em tomar um termo isoladamente. Isso significa, entre outros recursos:

[...] FORJAR UMA PRETENSA ETIMOLOGIA DAS PALAVRAS,
EM ATENDER À SUA POSIÇÃO, ÀS REPETIÇÕES, AO
NÚMERO DE SÍLABAS E LETRAS DE QUE SE COMPÕEM,
AOS SEUS VÁRIOS SIGNIFICADOS, AO JOGO DE
SINÔNIMOS E ANTÔNIMOS, À INTERPRETAÇÃO
ALEGÓRICA OU ANALÓGICA.
(LOPES; SARAIVA, 2000, p. 552)
Para Vieira, existe uma analogia entre palavra e mundo, a natureza e seus sinais. A palavra, assim, é
um sinal da natureza, que esconde mistérios e conceitos. Essa é a essência do pensamento
“engenhoso” (ou pensamento alegórico).
A natureza não seria conhecida pela revelação ou pelo desempenho dos conceitos arraigados no interior
da palavra. Para esse intento, Vieira apela para a etimologia das palavras, desdobrando-as em
conceitos associativos. Para as associações, é válido utilizar não somente os significados, mas também
os significantes das palavras, ou seja, o corpo fônico e gráfico delas.
Os efeitos desse tipo de discurso não são apenas lógico-dedutivos: eles também procuram a persuasão
pelas qualidades estéticas do texto. A palavra e seus desdobramentos são o centro do trabalho retórico-
literário. Os sinais da natureza, neste caso, manifestam-se na palavra e no vislumbre.
Vieira investe na palavra os silogismos progressivos. E investe no vislumbre a tradução dos sinais, de
forma que a aparência do rigor do pensamento esconde a manipulação artística da língua e da
linguagem na criação de conceitos que se passam por naturais, enquanto são artifícios associativos.
 ATENÇÃO
Esse tipo de procedimento recebe nos estudos literários o nome de “jogo de ideias”, porém é preciso
ressaltar que tal jogo só acontece diante de um extremo conhecimento das possibilidades da língua.
Confira um exemplo no seguinte trecho dos Sermões escolhidos :
Os homens não amam aquilo que cuidam que amam. Por quê? Ou porque o que amam não é o que
cuidam; ou porque amam o que verdadeiramente não há. Quem estima vidros, cuidando que são
diamantes, diamantes estima e não vidros; quem ama defeitos, cuidando que são perfeições, perfeições
ama, e não defeitos. Cuidais que amais diamantes de firmeza, e amais vidros de fragilidade: cuidais que
amais perfeições Angélicas, e amais imperfeições humanas. Logo os homens não amam o que cuidam
que amam. Donde também se segue, que amam o que verdadeiramente não há; porque amam as
coisas, não como são, senão como as imaginam, e o que se imagina, e não é, não o há no mundo.
(VIEIRA, 1984, p. 144-145)
ANÁLISE
O sentido central do texto é que não devemos amar o ideal, e sim o real. Mas, até chegar a essa ideia,
Vieira realiza uma série de comparações positivas:
AMAR 
X 
CUIDAR
VIDROS 
X 
DIAMANTES
DEFEITOS 
X 
PERFEIÇÕES
FIRMEZA 
X 
FRAGILIDADE
SER 
X 
IMAGINAR
IDEAL 
X 
REAL
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IDEAL X REAL
Pressuposto com o qual Vieira finaliza a questão.
O cultismo e o conceptismo ainda estão presentes em seu texto. No caso do ocultismo, por meio do
uso frequente da metáfora e da hipérbole; no caso do conceptismo, por intermédio do uso frequente de
um jogo de ideias encadeado por um raciocínio “lógico”.
Existe, porém, uma função específica no discurso de Vieira, a qual, aliás, merecerá especial atenção
quando falarmos nos Sermões , já que um texto sempre é escrito na hipótese de um interlocutor. No
caso dessa obra, o interlocutor é aquele que precisa ser persuadido para a fé católica presente nas
igrejas ou nos espaços de interlocução religiosa do período.
Essa necessidade retórica de persuasão molda o discurso de Vieira, embora absorva grande parte dos
procedimentos linguístico-literários do período. Esses procedimentos, aos quais parte considerável da
crítica literária chama de Barroco, funcionalizam as atividades específicas de interlocução.
ATIVIDADE DE REFLEXÃO
MAS POR QUE VIEIRA É CONSIDERADO UM AUTOR
IMPORTANTE PARA A LÍNGUA E A LITERATURA
PORTUGUESA?
RESPOSTA
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Na França, o poeta Mallarmé (1842-1898), em resposta ao pintor Degas (1834-1917), teria dito que a
poesia é feita com palavras, e não com ideias. Fazendo uma analogia, diríamos que Vieira, comparado
ao pensamento artístico da atualidade, estaria próximo daquele que considera a escrita literária como
arte – e não apenas como filosofia ou pensamento a ser veiculado pelas palavras.
No contexto do que entendemos como Barroco, a elaboração da forma requer o “desempenho”, ou seja,
uma geometria de opostos que se tencionam e se desdobram. Com isso, o mistério da palavra é
revelado e o divino se acende no encadeamento de conceitos criados.
O SERMÃO DA SEXAGÉSIMA
O Sermão da sexagésima é considerado uma obra exemplar da escrita “barroca”, o que não deixa de
ser verdade por conta da nomeação sofrida pelas escritas dos Setecentos. Porém, ainda que sutis, as
variações desse sermão, em contraste com os tratados e os autores considerados barrocos, são
importantes e merecem ser comentadas.
 
Imagem: António Vieira/Biblioteca Nacional de Portugal/Domínio Público
 Primeira edição publicada do Sermão da Sexagésima.
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SETECENTOS
Produção literária do século XVII.
Observando os poemas de Góngora, principalmente no tocante ao conceptismo, veremos que eles são
textos de difícil compreensão, já que sua agudeza exige uma leitura culta, atenta e interpretativa. No
caso do Padre Antônio Vieira, os Sermões foram feitos para serem pregadospara o povo; portanto,
isso exigia deles um grau de comunicabilidade maior e uma clareza de exposição que surtisse o efeito
desejado: a catequização de povos que, em sua maioria, eram analfabetos.
Para tanto, Vieira recorreu a algumas práticas de escritas tanto da Igreja quanto do que se considera
Barroco. Apesar do rebuscamento de suas ideias, ele escolheu temas ou chaves muito claras.
 EXEMPLO
Situações, fenômenos, palavras e imagens que estabelecem uma ligação objetiva com os elementos da
realidade imediata.
O Sermão da sexagésima estabelece um diálogo com a parábola do semeador, retirada do Evangelho
de São Lucas, na Bíblia. O tema do Sermão é a própria pregação do Evangelho; portanto, trata-se de
um tema metalinguístico, já que ele traz reflexões sobre a fé, mas, principalmente, sobre o ato de pregar
e o de receber os ensinamentos da pregação.
Sua temática reflete, em última instância, o próprio texto que profere, bem como suas qualidades na
eficiência da pregação. Todo o Sermão é elaborado a partir da imagem da semeadura, desdobrando-se
em metáforas. Vamos então ao Sermão da Sexagésima (VIEIRA, 1984):
“Começou ele a semear (diz Cristo), mas com pouca ventura. Uma parte do trigo caiu entre espinhos, e
afogaram-no os espinhos. Outra parte caiu sobre pedras, e secou-se nas pedras por falta de humidade,
outra parte caiu no caminho, e pisaram-no os homens e comeram-no as aves.”
A semeadura é comparada à pregação, pois três partes das sementes são desperdiçadas, só a quarta
parte frutificou; assim, metaforicamente, apenas uma parte daqueles que ouvem os sermões e as
pregações do Evangelho é tocada pela palavra de Cristo.
Logo adiante, Vieira incrementa a reflexão, afirmando que, para uma conversão, são necessários três
elementos:
PREGADOR
OUVINTE
GRAÇA DE DEUS
Analogamente, por meio de silogismos, ele estabelece comparações desses três elementos com os
olhos, o espelho e a luz:
“Para um homem se ver a si mesmo, são necessárias três cousas: olhos, espelho e luz. Se tem espelho
e é cego, não se pode ver por falta de olhos; se tem espelho e olhos, e é de noite, não se pode ver por
falta de luz. Logo, há mister luz, há mister espelho e há mister olhos. Que cousa é a conversão de uma
alma, senão entrar um homem dentro em si e ver-se a si mesmo? Para essa vista são necessários
olhos, é necessário luz e é necessário espelho. O pregador concorre com o espelho, que é a doutrina;
Deus concorre com a luz, que é a graça; o homem concorre com os olhos, que é o conhecimento. Ora
suposto que a conversão das almas por meio da pregação depende destes três concursos: de Deus, do
pregador e do ouvinte, por qual deles devemos entender que falta? Por parte do ouvinte, ou por parte do
pregador, ou por parte de Deus?”
Ele conclui observando que se a evangelização não produz efeito, o problema pode estar no pregador,
no ouvinte ou em Deus: o pregador doutrina com a persuasão, o ouvinte assimila com o entendimento
e Deus ilumina com a graça.
Comparando, afirma que para um homem ver a si mesmo, isto é, compreender-se, há a necessidade
dos olhos, do espelho e da luz, pois o espelho sem olhos, o espelho sem luz, ou a cegueira com olhos
e espelhos de nada adiantam. Os ouvintes, pois, são os diferentes tipos de terrenos em que caem os
grãos da semeadura. Analogamente, estabelece as seguintes proximidades:
 Atenção! Para visualização completa da tabela utilize a rolagem horizontal
Espelho Ensinamento dos pregadores
Olhos Ouvintes
Luz Graça de Deus
Em seguida, outras instâncias foram fundadas em relação à pregação. Para Vieira, havia cinco
circunstâncias necessárias para a evangelização:
1. A PESSOA
Para a pessoa do pregador, o importante não é pregar pelas palavras, e sim por suas ações:
A definição do pregador é a vida e o exemplo. Por isso Cristo no Evangelho não o comparou ao
semeador, senão ao que semeia. Reparai. Não diz Cristo: saiu a semear o semeador, senão, saiu a
semear o que semeia.
Nessa passagem, Vieira critica os pregadores que não dão exemplo pelas ações, fazendo com que as
“sementes” não frutifiquem ou que os ouvintes não se vejam no espelho. Trata-se daqueles pregadores
mais preocupados consigo do que com a conversão religiosa.
2. A CIÊNCIA
Vieira defende que o pregador deve ensinar aquilo que sabe, não o que os outros sabem:
Muitos pregadores há que vivem do que não colheram e semeiam o que não trabalharam. [...] Quando
David saiu a campo com o gigante, ofereceu-lhe Saul as suas armas, mas ele não as quis aceitar. Com
armas alheias ninguém pode vencer, ainda que seja David. As armas de Saul só servem a Saul, e as de
David a David; e mais aproveita um cajado e uma funda própria, que a espada e a lança alheia.
Pregador que peleja com as armas alheias, não hajais medo que derrube gigante.
3. A MATÉRIA
Mais uma vez, ele utiliza recursos metafóricos baseados em imagens: Vieira compara o sermão a uma
árvore, cujo tronco é matéria única, enquanto os galhos e as flores são comparados aos diferentes
desdobramentos da mesma matéria.
Dessa maneira, ele reivindica, para a eficiência da pregação, que o sermão deve ter uma matéria única
para não confundir ou dispensar ouvintes:
Se o lavrador semeara primeiro trigo, e sobre o trigo semeara centeio, e sobre o centeio semeara milho
grosso e miúdo, e sobre o milho semeara cevada, que havia de nascer? Uma mata brava, uma confusão
verde. Eis aqui o que acontece aos sermões deste género. Como semeiam tanta variedade, não podem
colher coisa certa. Quem semeia misturas, mal pode colher trigo.
4. O ESTILO
Com efeito, o estilo precisa ser claro, já que, metaforicamente falando, para Vieira, as sementes devem
cair naturalmente. Ele compara o estilo correto com o próprio céu, pois ele seria o mais antigo estilo de
onde os homens aprenderam.
O estilo, portanto, é comparado à natureza:
Será porventura o estilo que hoje se usa nos púlpitos? Um estilo tão empeçado, um estilo tão dificultoso,
um estilo tão afetado, um estilo tão encontrado a toda a arte e a toda a natureza? Boa razão é também
esta. O estilo há de ser muito fácil e muito natural. Por isso Cristo comparou o pregar ao semear.
5. A VOZ
Vieira afirma a “definição do pregador, cuidava eu que era: voz que arrazoa e não voz que brada” com a
intenção de esclarecer que o ouvinte se vê no espelho por meio de uma persuasão arrazoada, não
exatamente racional, e sim branda, já que ela toca o coração mais do que o grito, o que corresponderia
ao horror ou ao medo.
É o que a estrutura do Sermão nos diz com suas progressivas associações entre formas e ideias.
Todos esses temas são estruturados a partir de fortes influências. Destacaremos duas influências a
seguir:
Pregações cristãs mais antigas e praticadas pela Igreja
Vieira resgata uma oratória medieval de construção de alegorias para os comentários bíblicos, pois o
interlocutor é um público geral e não culto.
Discurso engenhoso ou agudo muito utilizado no século XVII na Península Ibérica
Ele retoma essa prática sermonária nos termos da agudeza, isto é, próximo dos artifícios verbais típicos
da prosa denominada “barroca”.
De acordo com Saraiva (1980, p. 120), prevalecem, no Sermão da sexagésima , “as leis da repetição,
da simetria e da oposição” em sua construção. Podemos verificar a repetição de pares antônimos. Eis
algumas repetições de Vieira (1984): “boca e mão, ver e ouvir, cair e subir, arte e natureza, semear e
ladrilhar, soar e significar, contente e descontente”.
A construção das frases evidencia, para Saraiva (1980, p. 120), os dois membros desses pares, os
quais, às vezes, aparecem numa oposição simétrica. Vieira constrói essas oposições tomando a palavra
em seu significante e significado, separando-os e desdobrando-os em pares de opostos que dialogam.
 
Imagem: Autor anônimo/Escarlati/Domínio Público
 Baltasar Gracián.
Existe uma referência místico-religiosa nesse procedimento, pois o autor retoma a palavra como se ela
contivesse, em suas conexões, os mistériosdivinos, ou seja, como se ela fosse o invólucro de uma
verdade misteriosa. No entanto, há algo muito próximo dos procedimentos da agudeza descritos pelo
escritor jesuíta Baltasar Gracián (1601-1658), que trata da escrita produzida pelo engenho e pela
agudeza.
O Padre Antônio Vieira, afinal, isola um termo e força de maneira muito pessoal uma etimologia.
Diferentemente de Gracián, entretanto, esses procedimentos ou “desempenhos” vão criando conceitos
que se dirigem a uma Verdade. Para esse escritor jesuíta, os efeitos deveriam ser estéticos, caminhando
rumo ao Belo – e não ao Verdadeiro.
O fato é que, apesar de se dirigir à construção de uma verdade, Vieira constrói tal discurso por meio de
associações que aparentam uma engenharia sólida do raciocínio lógico, mas que, no fundo, constituem
operações criadas e inventadas exatamente com o intuito de convencer os ouvintes. Trata-se de
construções não lógicas, e sim funcionais, que se utilizam de efeitos estéticos em sua composição.
Já Gracián se propunha exatamente a descobrir palavras dentro de outras e, a partir disso, escolher os
extremos a serem operados por oposições e analogias. A capacidade de, nessas analogias, distinguir os
extremos, segundo esse escritor jesuíta, configurava a agudeza ou o concepto.

NAS PRECEPTIVAS RETÓRICAS DO SÉCULO XVII, A
AGUDEZA É DEFINIDA COMO A METÁFORA RESULTANTE
DA FACULDADE INTELECTUAL DO ENGENHO, QUE A
PRODUZ COMO “BELO EFICAZ” OU EFEITO INESPERADO
DE MARAVILHA QUE ESPANTA, AGRADA E PERSUADE.
(HANSEN, 2000)
Existe, na concepção de escrita de Vieira e Gracián, uma distinção entre juízo e engenho. Juízo seria
adequado ao discurso clássico, que apela para a lógica e toma as palavras como referentes de
significados e ideias. Já Engenho entenderia que elas se abrem e que é por meio delas – e nunca sem
as palavras – que um efeito (no caso de Vieira, uma verdade) é construído.
O Padre Antônio Vieira se insurgiu contra os pregadores que procuravam apenas efeitos estéticos, pois
um sermão deveria transmitir uma mensagem. Ela nunca deveria ser construída apenas pelo engenho, e
sim para revelar a palavra de Deus por meio do engenho e da agudeza.
Confira alguns comentários a partir da leitura de trechos do Sermão da sexagésima :
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. INDIQUE A ALTERNATIVA QUE POSSUI UMA DAS CARACTERÍSTICAS DA
OBRA OU DA ESCRITA DO PADRE ANTÔNIO VIEIRA:
A) Escrita marcada pela simplicidade do estilo, não sendo engenhosa e aguda.
B) Desenvolvimento das temáticas bíblicas a partir de reflexões teóricas e filosóficas mundanas.
C) Recusa a recursos alegóricos e metafóricos ao mesmo tempo em que valoriza a etimologia.
D) Uso de recursos de repetição e de jogo de sinônimos e antônimos, além de interpretação alegórica.
E) Trabalho apenas com o significado das palavras, desprezando os aspectos fônicos e gráficos do
significante.
2. CONSIDERE O SEGUINTE TRECHO DO SERMÃO DA SEXAGÉSIMA :
POR ISTO SÃO MAUS OUVINTES OS DE ENTENDIMENTOS AGUDOS. MAS OS
DE VONTADES ENDURECIDAS AINDA SÃO PIORES, PORQUE UM
ENTENDIMENTO AGUDO PODE-SE FERIR PELOS MESMOS FIOS E VENCER-SE
UMA AGUDEZA COM OUTRA MAIOR; MAS CONTRA VONTADES ENDURECIDAS
NENHUMA COISA APROVEITA A AGUDEZA, ANTES DANA MAIS, PORQUE
QUANDO AS SETAS SÃO MAIS AGUDAS, TANTO MAIS FACILMENTE SE
DESPONTAM NA PEDRA. OH! DEUS NOS LIVRE DE VONTADES ENDURECIDAS,
QUE AINDA SÃO PIORES QUE AS PEDRAS.
(VIEIRA, 1984)
A PARTIR DESSE TEXTO, É CORRETO AFIRMAR QUE O SERMÃO DA
SEXAGÉSIMA ABORDA
A) as questões da pregação religiosa a partir do papel dos pregadores e da resposta dos fiéis.
B) a conclamação ao envolvimento dos fiéis nas lutas contra os colonizadores infiéis.
C) as humilhações e as perseguições por causa da defesa dos índios e dos negros.
D) a admoestação do pregador para adesão ao projeto da Campanha das Índias Ocidentais.
E) a reprovação lançada aos governantes locais pela rejeição deles ao mercantilismo português.
GABARITO
1. Indique a alternativa que possui uma das características da obra ou da escrita do Padre
Antônio Vieira:
A alternativa "D " está correta.
 
O Padre Antônio Vieira não se limitou a comentar moral e doutrinariamente os trechos bíblicos em sua
obra. Ele trabalhava ou “desempenhava” o texto, usando recursos que se caracterizam pela
engenhosidade e pela agudeza e lançando mão de procedimentos, como, por exemplo, repetições de
pares de antônimos, uso de analogias, interpretação alegórica e exploração de elementos fônicos e
gráficos das palavras.
2. Considere o seguinte trecho do Sermão da sexagésima :
Por isto são maus ouvintes os de entendimentos agudos. Mas os de vontades endurecidas ainda
são piores, porque um entendimento agudo pode-se ferir pelos mesmos fios e vencer-se uma
agudeza com outra maior; mas contra vontades endurecidas nenhuma coisa aproveita a agudeza,
antes dana mais, porque quando as setas são mais agudas, tanto mais facilmente se despontam
na pedra. Oh! Deus nos livre de vontades endurecidas, que ainda são piores que as pedras.
(VIEIRA, 1984)
A partir desse texto, é correto afirmar que o Sermão da sexagésima aborda
A alternativa "A " está correta.
 
O Sermão da sexagésima dialoga com a narrativa bíblica da “parábola do semeador”, abordando o
próprio ato da pregação e questionando os motivos pelos quais muitos ouvintes não assimilam a
evangelização ou a doutrina por intermédio da pregação religiosa.
MÓDULO 3
 Identificar as principais características do Arcadismo em Portugal
O ILUMINISMO NA EUROPA
 
Imagem: Gabriel Lemonnier/Private collection/Domínio Público
 Pintura “A Leitura de O Órfão da China de Voltaire no Salão da Madame Geofrin”, de Lemonnier.
Você já deve ter notado que existe uma relação muito estreita entre literatura e história, não é mesmo?
Sempre que estudamos uma manifestação artística, notamos que ela sequer existiria – e nem teria a
capacidade de surgir – se não fossem as condições sociais de cada período. Não se trata de falar
somente em “contexto social”, listando os eventos históricos do mesmo período.
Na verdade, trata-se de pontuar a origem histórica de tais manifestações, compreendendo a existência
de um entrelaçamento inevitável entre:
Condições políticas, econômicas e históricas
Cada escola, autor ou manifestação artístico-literária estudada
Com o Arcadismo, isso não é diferente. Para entendermos esse movimento em Portugal, precisamos
compreender o significado do século XVIII – o chamado Séculos das Luzes – para a Europa.
Para isso, a seguir, analisaremos esse fenômeno a partir de dois pontos de vista:
ECONÔMICO
CAMPO DAS IDEIAS
 
Foto: Shutterstock.com
ECONÔMICO
A Inglaterra encabeçava o processo industrial no continente. Sabemos que o desenvolvimento das
indústrias requer grande investimento nas ciências, o que leva a um apreço pela razão. Esse fato gerou
muitas ideias e ações contra os conhecimentos dominados pela Igreja e pela religião da época.
Após um período mercantilista, a classe burguesa fica cada vez mais insurgente, pois ela luta contra o
poder dos Estados absolutistas comandados pela nobreza, já que a propriedade privada e a não
intervenção do Estado se transformam em algo essencial para o desenvolvimento da economia.
 RESUMINDO
Em suma, no período, há o poder da Igreja, da nobreza e dos Estados absolutistas contra o da
burguesia e do capitalismo insurgente.
CAMPO DAS IDEIAS
Devemos compreender as implicações do Iluminismo relacionadas com o pensamento da burguesia em
ascensão no século XVIII, o que foi o resultado das transformações políticas e econômicas do período.
As principais bases do pensamento iluminista são:
Elogio da razão;
Revisão do conhecimento até então produzido;
Mudança de um ensino religioso para um ensino laico;
Luta pela liberdade individual na economia por meio do elogio da propriedade privada;
Defesa pela igualdade entre os poderes sociais.
Nesse contexto, surgiram alguns pensadores fundamentais para tal movimento:
 
Imagem: Jaybear/University of Chicago/Domínio PúblicoPENSADORES FRANCESES (SÉCULO XVII)
Na França, em 1751, é lançada a Enciclopédia das ciências, das artes e dos ofícios (imagem). Seu
objetivo era compilar o conhecimento produzido até então como forma de contraposição ao
conhecimento clerical.
 
Imagem: Nicolas de Largillierre/Palace of Versailles/Domínio Público
FRANÇOIS-MARIE AROUET, CONHECIDO COMO VOLTAIRE
(1694-1778)
Filósofo e escritor francês, Voltaire (imagem) elaborou sua obra contra o poder da Igreja. Ele não era
exatamente a favor de uma revolução social ampla, e sim da ascensão de um “déspota esclarecido”, isto
é, de alguém que concentrasse o poder, embora ainda mantivesse ideais iluministas.
 
Imagem: Maurice Quentin de La Tour/Musée Antoine-Lécuyer/Domínio Público
JEAN-JACQUES ROUSSEAU (1712-1778)
Filósofo, político e escritor francês, Rousseau (imagem) defendeu uma liberdade individual e coletiva
que só seria possível por meio de um “contrato social”. Tal contrato era o instrumento que garantiria
tanto a liberdade quanto a igualdade, pois, a fim de existir o bem comum, seria necessário equilibrar as
vontades individuais e a necessidade para o bem-estar da sociedade. Rousseau foi um dos principais
influenciadores da Revolução Francesa.
 
Imagem: Autor desconhecido/Scottish National Gallery/Domínio Público
ADAM SMITH (1723-1790)
No contexto britânico, o economista e filósofo Adam Smith, autor da obra A riqueza das nações ,
defendia um Estado que não interferisse na economia, pois ele seria um entrave para o crescimento do
capitalismo, o qual, por sua vez, se equilibraria entre a oferta e a procura de bens e serviços.
CONTEXTO DO SURGIMENTO DO ARCADISMO
EM PORTUGAL
Em 1775, D. José assumia o reinado em Portugal. Seu ministro, o Marquês de Pombal, foi um dos
grandes responsáveis pela adoção das transformações políticas, educacionais e culturais do país. O
projeto de Pombal era antijesuítico em todos os sentidos.
A concepção dos Estados absolutistas comandados pela nobreza submete todos os poderes à
mediação da Igreja. A concepção de Pombal, porém, era de que as leis de Deus (e da Igreja) deviam ser
mediadas e interpretadas pelo monarca, pois ele seria um “déspota esclarecido”.
Pombal, tanto em Portugal quanto no Brasil, substituiu o ensino religioso pelo ensino burguês, ligado às
ciências desenvolvidas até a época. Pouco a pouco, a influência espanhola foi dando lugar à francesa, à
italiana, à inglesa e à alemã.
Em 1779, foi fundada a Academia Real das Ciências, importante instituição que conectava o ensino às
práticas e às necessidades econômicas. Pombal fortalecia, com isso, o Estado e seu poder em relação
às colônias portuguesas, como o Brasil.
 
Imagem: Autor desconhecido/Academia das Ciências de Lisboa/Domínio Público
Outra atuação importante foi a do Padre Luís Antônio Verney (1713-1792), autor de O verdadeiro
método de estudar , obra fundamental que influenciou as ideias do Marquês de Pombal.
Padre Verney foi um discípulo dos jesuítas portugueses, mas boa parte de sua formação se deu em
Roma, onde ele, além de membro da Arcádia de Roma e secretário do embaixador, foi feito Cavaleiro da
Ordem de Cristo. Verney escreveu muitos manuais didáticos, cujos temas, políticos, econômicos e
estéticos, estavam direcionados para um amplo projeto iluminista em Portugal.
Ele defendia:
 
Educação laica: proposição de mudanças profundas nos currículos escolares e nas universidades,
introduzindo novas concepções no Direito, na Medicina, no estudo das Humanidades e das línguas
latinas e europeias.
 
Governo assentado na opinião pública.
 
Fonte: Autor/Shutterstock
Extinção de ações da Inquisição e das delações religiosas direcionadas aos cristãos-novos.
Em relação à literatura, Verney preconizava o fim dos excessos da retórica da agudeza, criticando
inclusive a escrita do Padre Vieira, dado à retórica artificial composta por silogismos irreais e forçados.
Esse cenário mudou com a morte do Rei D. José (1714-1777). Pombal teve de sair do poder. Retornam
toda a nobreza e o poder da Igreja.
A maçonaria, os burgueses, o ensino laico, as ciências – tudo isso passou a ser reprimido novamente.
Livros foram proibidos; escritores foram exilados. Criou-se uma tensão histórica entre Portugal e o resto
da Europa, pois, enquanto o continente respirava os ares da revolução burguesa e a ascensão do modo
de produção capitalista, Portugal retomava o poder da nobreza.
CARACTERÍSTICAS DO ARCADISMO EM
PORTUGAL
Equilibrando-se entre reformas e contrarreformas, vivenciando tensões entre os poderes da nobreza e
da burguesia e entremeado pela ascensão capitalista e o modo de economia imperial com as colônias,
está o Arcadismo em Portugal.
Ele floresceu sob a inspiração do contexto europeu. As ideias iluministas, afinal, impõem uma troca de
referências culturais.
Enquanto o Barroco tinha como pano de fundo as ideias eclesiásticas, com forte influência medieval
tanto nos temas e na retórica quanto nas formas, o Arcadismo teve como referência o universo da
cultura clássica greco-romana. Autores da Antiguidade Clássica, como Horácio, são prestigiados,
operando em contraposição ao conhecimento escolástico ainda presente na educação europeia.
CONHECIMENTO ESCOLÁSTICO
Filosofia cristã presente nas universidades medievais.
 SAIBA MAIS
Filósofo e poeta latino, Horácio (65 a.C. – 8 a.C.) foi uma referência para os princípios classicistas do
Arcadismo. Em seu livro Arte poética , ele defendia uma poética dominada por técnica, razão,
objetividade, bom senso e simplicidade: todos esses predicados deveriam permitir a construção de
textos que contivessem unidade e que fossem naturais, como a natureza. Cada gênero literário ou
artístico deveria ser respeitado em sua integridade (respeito às convenções); para tanto, os antigos
(greco-romanos) deveriam servir como modelos ainda na observação, já que, para eles, a arte deve
seguir o Belo, o Bom e o Verdadeiro.
Do ponto de vista literário e artístico, sabemos que a cultura clássica tem como princípios:
Harmonia das formas;
Verossimilhança em relação à natureza;
Ideal da razão que conduz ao belo; e
Equilíbrio das emoções e dos arroubos da subjetividade (fenômeno chamado de
despersonalização lírica).
Nesse sentido, dada a universalidade do mundo clássico, os princípios estéticos que serviam como
referência para os poetas árcades portugueses não diferiam dos princípios árcades (ou classicistas) da
França, da Itália ou mesmo do Brasil:
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Vida no campo (fugere urbem );
Contemplação equilibrada e calma da natureza (locus amoenus );
Uso da simplicidade, do bom senso e do meio-termo na escola dos vocábulos e procedimentos
estéticos (aurea mediocritas ); e
Eliminação do supérfluo e do inútil nas composições (inutilia truncat ).
 
Imagem: Friedrich von Kaulbach/Art Renewal Center/Domínio Público
 Representação de Arcádia, do pintor romântico Friedrich von Kaulbach (1850-1920).
 ATENÇÃO
Esses temas ou tópicos não eram exatamente correspondentes à vida pessoal de cada poeta, pois eram
convenções clássicas, modelos e situações artificiais que revestiam o labor poético.
As mudanças, nesse sentido, foram incrementadas pelo surgimento de várias academias literárias.
Como verificamos anteriormente, as academias, no período barroco, eram formadas por aristocratas que
atuavam para a manutenção dos poderes existentes. Já na era árcade, tais academias serviam como
renovação.
Em 1756, é fundada a Arcádia Lusitana; 34 anos depois, a Academia de Belas-Artes (chamada
posteriormente de Nova Arcádia).
A escrita barroca, recheada de oposições, contrapontos obscuros e vernáculos rebuscados, é
substituída por uma linguagem clara, simples e objetiva, fazendo coro com o ideal clássico da
simplicidade e de uma vida natural e campestre. Os versos brancos (sem rima) se tornaram mais
comuns, embora as métricas continuassem próximas das formas fixas.
Nem tudo, entretanto, foi evolução, até porque as estéticas se sobrepõem conformeas épocas, sem que
delas possamos extrair uma análise qualitativa engendrada a partir de valores fixos.
Segundo Lopes e Saraiva (2000), a escrita elocubrante do barroco foi substituída por um excesso de
regras e regulamentações estabelecidas a partir de uma leitura interpretativa dos moldes clássicos.
Alguns críticos ainda falam que a recorrência à mitologia clássica, misturada ao racionalismo iluminista,
acabou por modelar os padrões e gostos, disfarçando as limitações de certas poéticas pessoais.
O certo é que, de todo modo, vários autores surgiram – alguns mais criativos e outros nem tanto, como
ocorre, aliás, em toda geração literária.
NOMES E OBRAS DO ARCADISMO EM
PORTUGAL
Não há forma melhor de entender a literatura do que o conhecimento de seus autores e obras. Por isso,
falaremos a seguir sobre os principais nomes da Arcádia Lusitana e da Nova Arcádia:
ARCÁDIA LUSITANA
Como vimos anteriormente, o Arcadismo em Portugal se fortaleceu com a criação de academias – e a
mais importante delas foi a Arcádia Lusitana. Em torno dela, estiveram reunidos diversos nomes.
Listaremos alguns deles a seguir:
ANTÔNIO DINIS DA CRUZ E SILVA
TEOTÔNIO GOMES DE CARVALHO
MANUEL NICOLAU ESTEVES NEGRÃO
VALADARES E SOUZA
MANUEL DE FIGUEIREDO
CORREIA GARÇÃO
PADRE JOSÉ FREIRE (CÂNDIDO LUSITANO)
 
Imagem: Autor desconhecido/Biblioteca Nacional de Portugal/Domínio Público
 Cândido Lusitano.
Cândido Lusitano sistematizou em vários trabalhos os princípios da academia, sendo uma das
referências teóricas do grupo. Em sua Arte poética , ele definiu os princípios ou códigos estéticos dos
árcades portugueses. Já em seus tratados, Lusitano defendia a proeminência da lógica frente à estética,
polemizando com Verney.
Voltado aos preceitos clássicos, ele se baseou em Aristóteles ao falar que a arte precisa se voltar à
verossimilhança em sua criatividade. Como todo classicista de origem, Lusitano pensava que a arte
deve ser pautada pela proporção equilibrada, pela ordem e pela unidade.
As academias, bem como o Arcadismo, eram o resultado do surgimento da chamada burguesia
ilustrada, isto é, não aristocrata (nobre), culta, letrada e, mais especificamente, ciente e cordata em
relação aos valores emanados do Iluminismo: ciência, razão e liberdade.
Em sua maioria, esses acadêmicos eram recém-saídos das faculdades de Direito. Bacharéis, eles não
encontravam de imediato uma ocupação dada a situação social de Portugal. Tal condição levava a
maioria dos jovens poetas a procurar mecenas e postos de trabalho no governo por meio de bajulações,
não raras vezes presentes na forma de temas no interior dos poemas árcades.
A Arcádia Lusitana possuía regras rígidas. Para o ingresso, havia provas, juízes, avaliações coletivas e
procedimentos voltados para a verificação da adequação de cada obra aos princípios árcades e aos
modelos dos antigos.
Os grandes autores latinos da Antiguidade Clássica eram observados com rigores doutrinários e serviam
como modelos quase que absolutos.
Entre as regras sociais de convívio e trato, havia a diretiva de que todos deveriam ser iguais
independentemente de sua origem (estirpe): nobre, aristocrata, pobre ou rica. Isso levou os poetas a
assumirem pseudônimos latinos como forma ou tentativa de apagar suas origens em busca desse ideal
de simplicidade – ideal, aliás, da cultura clássica.
Cruz e Silva era Elpino Nonacriense; Correia Garção era Alcino Micênio; e Manuel de Figueiredo era
Lícidas Cíntio.
O pseudônimo também era uma forma de adequação aos novos tempos políticos, já que a burguesia em
crescimento não possuía, como os nobres, exatamente um sobrenome que pudesse garantir, pela
origem, um status social. Isso era um sinal, inclusive, das transformações sociais e políticas de Portugal!
NOVA ARCÁDIA
Posteriormente, desentendimentos esmoreceram a Academia Lusitana. Por isso, em 1790, foi fundada a
Nova Arcádia. Ela era composta por diversos autores, como Agostinho de Macedo e Manuel Maria
Barbosa du Bocage (do qual falaremos mais adiante de forma detalhada).
 SAIBA MAIS
Alguns poetas importantes não pertenceram às academias, como, por exemplo, Nicolau Tolentino de
Almeida. Outros ainda foram dissidentes: isso foi o caso de Felino Elísio, Basílio da Gama e Silva
Alvarenga.
Mencionaremos brevemente alguns poetas da Academia Lusitana:
PEDRO ANTÔNIO CORREIA GARÇÃO (CORIDÓN
ERIMANTEU) (1724 - 1772)
Muito influente nas discussões, ele escreveu suas “dissertações”, que continham parâmetros para a
escrita árcade. Garção cultivou os gêneros clássicos, inclusive canções báquicas, como os
ditirambos, que eram típicos dos gregos e estão na origem da tragédia grega.
REIS QUITA (ALCINO MENÉCIO) (1728-1770)
Reis Quita escreveu tragédias, como Hermíone , Mégara , Inês de Castro e Astarto , além do drama
pastoril Licore . Ele tinha preferência por estéticas arcaicas com temas bucólicos ou o saudosismo.
Suas Obras poéticas foram publicadas postumamente em 1176.
NICOLAU TOLENTINO DE ALMEIDA (1740-1811)
Autor de Obras poéticas e Obras póstumas , Nicolau Tolentino de Almeida escreveu uma obra satírica,
embora tenha homenageado mecenas que os sustentavam em muitas odes. Muito rica é a dimensão de
sua crítica de costumes dirigida aos poderosos, mas também ao cidadão comum, explorando situações
sociais caricaturais daqueles vulneráveis do período português.
Isso fez com que seus escritos tivessem um certo tom de coloquialidade e de formas populares – até de
autoironia – em muitos momentos, já que sua condição social nunca foi das melhores.
MANUEL DE FIGUEIREDO (LÍCIDAS CÍNTIO) (1725-1801)
Figueiredo foi o maior dramaturgo português do século XVIII. Representante do teatro neoclássico, ele
escreveu mais de 30 obras. Apresentou as peças Viriato e Édipo na Arcádia Lusitana, pelas quais
recebeu valorosos elogios.
Bastante autocrítico, Figueiredo considerava-se mais filósofo do que dramaturgo ou poeta, já que suas
peças, segundo muitos críticos e o próprio autor, possuíam muitos defeitos, os quais, muitas vezes, as
tornavam irrepresentáveis.
Sua obra é marcada por uma discrepância entre a composição e o gosto do público da época. As
comédias burguesas João Fernandes feito homem , A mulher que não parece ou O homem que o não
quer ser são textos que ironizam os fidalgos e as linhagens nobres, exaltando os valores da burguesia.
CANÇÕES BÁQUICAS
Em louvor ao deus do vinho, Baco (Dionísio para os gregos).
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DITIRAMBOS
Forma de lírica coral arcaica em louvor ao deus Dionísio.
BOCAGE
Vamos destacar agora um dos principais expoentes do Arcadismo em Portugal.
VIDA E OBRA
Manuel Maria Barbosa du Bocage nasceu em Setúbal, em 1765, e viveu em Macau. Na Nova Arcádia,
escrevia sob o pseudônimo de Almano Sadino. Os temas satíricos, recheados de erotismo e humor,
levaram Bocage à fama, tornando-o talvez o poeta árcade português mais conhecido até os dias atuais.
 
Imagem: Francisco Augusto Flamengo/Sapo Viagens/Domínio Público
 Manuel Maria Barbosa du Bocage.
Sua fase mais lírica abarca elementos gerais do Arcadismo, cujos temas estão voltados para a desilusão
amorosa e os dramas existenciais, além de terem uma predileção por tópicos misteriosos e noturnos.
Bocage foi tradutor de poetas latinos e franceses. Por conta de sua inclinação para a
autorrepresentação lírica mais confessional e sentimental, foi considerado um precursor do Romantismo
em Portugal.
O escritor foi preso pela acusação de proximidade com os ideais da Revolução Francesa e por ter
publicado um poema político, Pavorosa ilusão da eternidade , que atacava os poderes vigentes.
Entregue à Inquisição, ele posteriormente fez acordos que lhe garantiram a continuidade de sua vida
desde que se convertesse às crenças religiosas em voga.
Vejamos um soneto de Bocage:
CONVITE À MARÍLIA
Já se afastou de nós o Inverno agreste,
Envolto nos seus húmidos vapores;
A fértil Primavera, a mãe das flores
O prado ameno de boninas veste:
Varrendo osares o subtil nordeste
Os torna azuis: as aves de mil cores
Adejam entre Zéfiros, e Amores,
E torna o fresco Tejo a cor celeste;
Vem, ó Marília, vem lograr comigo
Destes alegres campos a beleza,
Destas copadas árvores o abrigo:
Deixa louvar da corte a vã grandeza:
Quanto me agrada mais estar contigo
Notando as perfeições da Natureza!
(BOCAGE, 1968)
ANÁLISE
O soneto de Bocage apresenta as seguintes marcas do Arcadismo:
Descrição e valorização do ambiente bucólico para onde a amada deve fugir com seu amado
(fugere urbem ).
Natureza como lugar agradável e de paz (locus amoenus ).
Ideal de simplicidade e alegria (aurea mediocritas ).
Ideias e linguagem caracterizadas pela clareza e simplicidade.
Ainda vemos nesse soneto uma referência ao mundo clássico por meio da citação de elementos
mitológicos. Um exemplo é a alusão ao vento do Ocidente usando aquele que personifica
mitologicamente esse vento: Zéfiro.
Acompanhe a abordagem das características da estética árcade em Portugal, com leitura e comentários
de poema(s) de Bocage, feita pelo professor Daniel Abrão:
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. INDIQUE A ALTERNATIVA COM UMA CARACTERÍSTICA DO ARCADISMO EM
PORTUGAL:
A) Abandono das influências estéticas greco-latinas, como, por exemplo, a obra de Horácio.
B) Presença dos temas bíblicos e do prestígio da educação escolástica.
C) Rejeição à lírica marcada pela harmonia das formas e pela verossimilhança em relação à natureza.
D) Uso mais comum dos versos brancos e linguagem mais próxima do ideal clássico de simplicidade.
E) Escrita marcada por oposições, contrapontos enigmáticos e rebuscamentos do vocabulário.
2. (UNIFESP – ADAPTADO) LEIA O SEGUINTE SONETO DE BOCAGE:
“OLHA, MARÍLIA, AS FLAUTAS DOS PASTORES
QUE BEM QUE SOAM, COMO ESTÃO CADENTES!
OLHA O TEJO A SORRIR-SE! OLHA, NÃO SENTES
OS ZÉFIROS BRINCAR POR ENTRE FLORES?
VÊ COMO ALI, BEIJANDO-SE, OS AMORES
INCITAM NOSSOS ÓSCULOS ARDENTES!
EI-LAS DE PLANTA EM PLANTA AS INOCENTES,
AS VAGAS BORBOLETAS DE MIL CORES.
NAQUELE ARBUSTO O ROUXINOL SUSPIRA,
ORA NAS FOLHAS A ABELHINHA PARA,
ORA NOS ARES, SUSSURRANDO, GIRA:
QUE ALEGRE CAMPO! QUE MANHÃ TÃO CLARA!
MAS AH! TUDO O QUE VÊS, SE EU TE NÃO VIRA,
MAIS TRISTEZA QUE A MORTE ME CAUSARA.”
(BOCAGE, 1968)
ASSINALE A ALTERNATIVA NA QUAL OS DOIS VERSOS REPRESENTAM
RESPECTIVAMENTE O BUCOLISMO E A VALORIZAÇÃO DA CULTURA
CLÁSSICA GRECO-ROMANA:
A) Tudo o que vês, se eu te não vira/Olha, Marília, as flautas dos pastores.
B) Ei-las de planta em planta as inocentes/Naquele arbusto o rouxinol suspira.
C) Que bem que soam, como estão cadentes!/Mais tristeza que a morte me causara.
D) Mais tristeza que a morte me causara./Olha o Tejo a sorrir- se! Olha, não sentes.
E) Que alegre campo! Que manhã tão clara!/Os Zéfiros brincar por entre flores?
GABARITO
1. Indique a alternativa com uma característica do Arcadismo em Portugal:
A alternativa "D " está correta.
 
Identificamos na escrita arcádica uma diferença em relação ao rebuscamento e ao uso de oposições
presentes na escrita barroca. A escrita no Arcadismo é caracterizada por uma linguagem mais simples,
próxima ao ideal clássico de simplicidade. Além disso, há uma presença mais comum dos versos sem
rima (versos brancos), ainda que a métrica mantenha características também próximas das formas fixas.
2. (Unifesp – adaptado) Leia o seguinte soneto de Bocage:
“Olha, Marília, as flautas dos pastores
Que bem que soam, como estão cadentes!
Olha o Tejo a sorrir-se! Olha, não sentes
Os Zéfiros brincar por entre flores?
Vê como ali, beijando-se, os Amores
Incitam nossos ósculos ardentes!
Ei-las de planta em planta as inocentes,
As vagas borboletas de mil cores.
Naquele arbusto o rouxinol suspira,
Ora nas folhas a abelhinha para,
Ora nos ares, sussurrando, gira:
Que alegre campo! Que manhã tão clara!
Mas ah! Tudo o que vês, se eu te não vira,
Mais tristeza que a morte me causara.”
(BOCAGE, 1968)
Assinale a alternativa na qual os dois versos representam respectivamente o bucolismo e a
valorização da cultura clássica greco-romana:
A alternativa "E " está correta.
 
O verso “Que alegre campo! Que manhã tão clara!” remete ao bucolismo, porque o eu lírico valoriza o
ambiente campestre e a natureza como lugar de alegria e desejável. O verso “Os Zéfiros brincar por
entre flores?” traz uma referência à mitologia clássica na menção que faz aos Zéfiros, personificação
mitológica do vento que sopra do Ocidente.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percorremos neste tema o universo do Barroco e do Arcadismo em Portugal, extraindo relações da
produção literária em diálogo com a história. Observamos que, enquanto o Barroco tem sua referência
no universo da Igreja e da Contrarreforma, capitaneada pelos jesuítas, o Arcadismo tem suas
referências na Antiguidade Clássica.
Enquanto o Barroco prima pela chamada “retórica da agudeza”, apostando em silogismos e
contrapontos e extraindo sua força desses extremos que se digladiam, o Arcadismo se destaca pela
limpeza do verso, pela busca da simplicidade das formas e pelo apelo à razão, características que, aliás,
deveriam se destacar na realização de seus efeitos estéticos. As duas estéticas, em Portugal,
conviveram com idas e vindas entre os poderes, se equilibrando na relação tensa entre os valores da
aristocracia e da burguesia em conflito.
Entre os módulos do Barroco e do Arcadismo, conhecemos ainda a obra do Padre Antônio Vieira, uma
das mais belas homenagens à língua portuguesa que conhecemos. Sua obra representa o que, em
português, existe de mais elaborado para o que ficou conhecido didaticamente como Barroco.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
ABDALA JR, B.; PASCHOALIN, M. A. História social da literatura portuguesa. São Paulo: Ática,
1985.
BOSI, A. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das letras, 1998.
BOCAGE, M. M. M. Obras. Porto: Lello & Irmão, 1968.
CHAGAS, F. A. Conta e tempo. In: Conta e tempo – um poema de Frei Antonio das Chagas – 1631-
1682. Consultado em meio eletrônico em: 18 mar. 2021.
GRACIÁN, B. Arte de Ingenio: tratado de la agudeza. Madri, 1648.
HANSEN, J. A. A retórica da agudeza. In: Letras Clássicas. n. 4. 2000. p. 317-342.
HANSEN, J. A. Barroco, Neobarroco e outras ruínas. In: Teresa - revista de literatura brasileira. n. 2.
2001.
LOPES, Ó.; SARAIVA, A. J. História da literatura portuguesa. 17. ed. Porto: Porto Editora, 2000.
SARAIVA, A. J. O discurso engenhoso. São Paulo: Perspectiva, 1980.
VIEIRA, P. A. Sermões escolhidos. Seleção, introdução e notas de Maria das Graças Moreira de Sá.
Lisboa: Ulisseia, 1984.
EXPLORE+
Veja como é polêmico o nome “Barroco” na historiografia literária lendo o artigo Barroco,
Neobarroco e outras ruínas , de João Hansen, disponível no portal de revistas da USP.
Há um estudo muito interessante, escrito por Marina Massini, sobre o uso de imagens na retórica
de Padre Vieira. O artigo se chama A função das imagens na elaboração da experiência em
sermões de Antônio Vieira e suas matrizes conceituais e está disponível no portal da UFRN.
Navegue por diversos poemas e textos de Bocage acessando o portal Domínio Público.
CONTEUDISTA
Daniel Abrão
 CURRÍCULO LATTES
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