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LEITURA E ESCRITA ACADÊMICAS Nadia Studzinski Estima de Castro Citações diretas e indiretas Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Aplicar verbos dicendi para a elaboração da paráfrase. Usar a citação direta com parcimônia. Elaborar textos imparciais. Introdução Neste capítulo, você vai estudar as citações diretas e indiretas. A ideia é ampliar a sua capacidade de escrita no contexto de produção de textos acadêmicos. É importante que você se aproprie desses conhecimentos uma vez que, no contexto universitário, deve desenvolver uma produção reflexiva e crítica, estruturada de acordo com as normativas estabelecidas para o uso e a elaboração de citações corretas. Ao longo do capítulo, você vai ver como aplicar os verbos dicendi na elaboração das paráfrases. Da mesma forma, você vai verificar a impor- tância do uso adequado das citações. A ideia é evitar excessos para que o trabalho acadêmico mantenha a sua credibilidade e não seja um registro de recortes de outros autores. Por fim, você vai ver como elaborar textos mais imparciais na sua prática como estudante e pesquisador. A paráfrase e os verbos dicendi Na elaboração de uma pesquisa científi ca, alguns procedimentos devem ser utilizados para que a escrita seja adequada ao modelo de produção. No caso, está em jogo um texto científi co, e não um romance de aventura, por exem- plo. Ou seja, é preciso conhecer as exigências desse formato de texto para construí-lo de acordo com as normas estabelecidas. Nesse sentido, a paráfrase é fundamental. Lozada e Nunes (2018) destacam que a paráfrase corresponde à transcrição livre de um texto que foi consultado. Isto é, representa a atividade de produzir um novo texto no qual a unidade discursiva seja semanticamente equivalente àquela do texto original. Dessa forma, o objetivo da paráfrase é apresentar a mesma ideia, mas com uma construção frasal diferente. A semântica é uma área de estudo que se dedica à compreensão dos sentidos das palavras, das frases, dos enunciados e dos símbolos. É a compreensão do que essas estruturas representam no sentido denotativo da produção de conteúdo. O uso da paráfrase é importante para a pesquisa. Afinal, textos muito com- plexos são lidos e interpretados pelo leitor, que, a partir do seu entendimento, transforma-se em autor, desenvolvendo uma paráfrase para que o seu leitor, por sua vez, entenda as ideias originais do outro autor. Assim, a paráfrase funciona como uma tradução das ideias originais para uma linguagem mais acessível. Pense, por exemplo, em alguém da área da saúde que se dedica a um mestrado na área da educação. Esse sujeito não está muito familiarizado com os autores da área educacional e pouco conhece dos termos e das teorias desse campo. Por esse motivo, inclusive, e por identificação com o campo, deseja aproximar os seus saberes em saúde dos saberes em educação. Agora imagine que essa pessoa vai escrever um artigo sobre as teorias de aprendizagem aplicadas à saúde. Muitos autores serão visitados, e a forma mais assertiva de explicar os conceitos da educação para os leitores da área da saúde é com o uso da paráfrase. Assim, teorias complexas serão lidas, interpretadas e levadas para o campo da saúde. A paráfrase deve ser elaborada com dedicação e atenção para que não configure cópia e também para que ideias precipitadas não sejam associadas ao autor. Isso significa que você deve ficar atento para não atribuir a um autor ideias que não foram afirmadas por ele e que foram construídas ao longo do seu exercício de interpretação. Agora considere este texto original: As pesquisas descritivas têm como objetivo primordial a descrição das ca- racterísticas de determinada população ou fenômeno ou, então, o estabele- cimento de relações entre variáveis. São inúmeros os estudos que podem ser classificados sob este título e uma de suas características mais significativas está na utilização de técnicas padronizadas de coleta de dados, tais como o questionário e a observação sistemática (GIL, 2002, p. 43). Citações diretas e indiretas2 Nessa situação hipotética, o pesquisador seleciona o trecho da obra original a fim de apresentar ao seu leitor mais elementos para a descrição do tipo de pesquisa que escolheu. Para apresentar essa reflexão, o pesquisador elabora a paráfrase a seguir, com o objetivo de citar indiretamente Gil (2002) e, então, apresentar a sua pesquisa ao leitor. Veja o texto parafraseado: Conforme argumenta Gil (2002), as pesquisas podem ser classificadas em diferentes tipos. Entre elas, temos a pesquisa descritiva, utilizada neste trabalho de pesquisa com o objetivo de apresentar as características de determinada população. O autor afirma que múltiplos estudos podem ser classificados nesse tipo de pesquisa, mas é preciso ter atenção à técnica que é padronizada para o processo de coleta de dados, conforme realizado nesta pesquisa. Como você pode observar, as ideias originais do autor foram aplicadas à pesquisa desenvolvida, embasando a metodologia de pesquisa selecionada. Mas você percebeu que algumas palavras foram destacadas em negrito? São elas: “argumenta” e “afirma”. Esses verbos são denominados verbos dicendi (“de dizer”). Eles, assim como muitos outros, são utilizados com frequência nas citações. De acordo com Rodrigues (2008), os verbos de dizer, em sua descrição linguística, aparecem em capítulos que tratam do discurso direto e indireto. Ou seja, o verbo de dizer representa um elemento funcional dentro de um discurso específico. Como elemento funcional, o verbo dicendi indica para o leitor exatamente o que é possível encontrar na obra original, caso ela seja acessada. Nessas situações, o pesquisador deve utilizar na escrita verbos como: “argumenta”, “indica”, “justifica”, “considera”, “apresenta” etc. Mas, como você pode notar na paráfrase exemplificada anteriormente, algumas palavras não são ade- quadas. No caso do exemplo, não é possível utilizar verbos como: “pondera”, “contesta”, “refuta”, entre outros, pois o autor não empreendeu esse tipo de abordagem na obra original. O que acontece, geralmente, é o uso repetitivo de alguns verbos mais recorrentes de dizer. Contudo, existe uma lista significativa de sinônimos que podem ser utilizados no momento da elaboração do texto. A seguir, observe um exemplo de uso de um verbo dicendi: Ler significa conhecer, interpretar, decifrar. É por meio da leitura que a maior parte dos conhecimentos é obtida, possibilitando a ampliação e o aprofun- damento do saber em determinado campo cultural ou científico. Isso faz da leitura um dos fatores mais decisivos para o estudo. Ela é imprescindível em todos os tipos de investigação científica, permitindo a obtenção de informações básicas e específicas (LOZADA; NUNES, 2018, p. 41). 3Citações diretas e indiretas Agora veja a paráfrase: Lozada e Nunes (2018) dizem que a leitura possi- bilita a obtenção de conhecimento e o aprofundamento dos saberes culturais e científicos. As autoras indicam que esse é um elemento decisivo para o estudo, pois com a leitura é possível interpretar e decifrar para a obtenção de informações básicas e específicas. Nesse exemplo, estão presentes os verbos dicendi: “dizer”, “indicar” e “destacar”. O objetivo é a construção de uma paráfrase que respeite as ideias das autoras e que possa ser utilizada como citação indireta. Muitas vezes, na paráfrase, não há necessidade de indicar a página da citação, uma vez que as ideias presentes podem ser elaboradas a partir do sentido geral do texto, e não necessariamente com algum trecho específico dele. Mas é permitido indicar a página da citação caso ela esteja relacionada com um trecho pontual do texto. Assim, o leitor identifica que as ideias pertencem a outro autor e que a argumentação original pode ser acessada, pois as informações sobre a obra estão disponíveis nas referências do trabalho. Agora, observe o Quadro 1, a seguir,e veja a pluralidade de verbos dicendi que podem ser utilizados na produção de textos acadêmicos. Fonte: Adaptado de Sato (2017). Acentuar Balbuciar Complementar Dizer Achar Brincar Completar Duvidar Aconselhar Calcular Comprovar Elucidar Acreditar Citar Comunicar Endossar Acrescentar Cobrar Conceituar Entusiasmar-se Acrescer Colocar Discutir Enumerar Afirmar Comentar Dissertar Exemplificar Quadro 1. Lista de verbos dicendi Dessa forma, sempre que você elaborar uma paráfrase ou uma citação indireta das ideias de um autor, busque diversificar as expressões que intro- duzem a citação. Ou seja, amplie o uso dos sinônimos dos verbos de dizer. Utilize termos como: “dissertam”, “afirmam”, “justificam”, “conceituam”, Citações diretas e indiretas4 “destacam”, “salientam”, “enfatizam”, “abordam”, “propõem”, “conceituam”, “fundamentam” etc. O importante é que o verbo utilizado corresponda ao que o autor efetivamente transmitiu no texto original. O Quadro 1 mostra apenas algumas opções. Então, amplie a sua pesquisa e encontre outras expressões que podem ser utilizadas e que desempenham o mesmo papel semântico. O uso da citação direta Existe um tipo especial de citação que precisa ser utilizado com atenção e parcimônia: a citação direta. Essa é uma citação em que um trecho de outro autor é copiado, deixando-se isso claro para o leitor. Como você pode imaginar, é preciso ter cautela na utilização da citação direta, para que o trabalho não se transforme na conhecida “colcha de retalhos”. Nesse tipo de texto, o leitor identifi ca citação direta seguida de citação direta, pouca refl exão, argumentação reduzida e autoria limitada. Essa situação deve ser minimizada. Utilize a citação direta apenas quando ela for de extrema necessidade, ou seja, quando não for possível modificar o texto do autor. Por exemplo, quando se utiliza a citação de texto de lei, é possível citar diretamente (mas, mesmo nessa situação, é permitido interpretar o texto da lei e elaborar parágrafos parafraseados com base no texto original). Quando se desenvolve reflexão sobre outras temáticas, é indicado buscar bases em referências e as utilizar apenas para reforçar a argumentação construída no trabalho. Portanto, a paráfrase é uma excelente estratégia para minimizar o número de citações diretas. De acordo com as normas estabelecidas para a escrita de trabalhos acadê- micos, o autor deve utilizar a citação para reforçar os seus argumentos. Para a utilização da citação direta, é necessário um trecho composto por mais de três linhas. Esse recorte textual deve ser inserido no trabalho com diferen- ciação, ou seja, recuo de 4 cm e fonte menor do que a empregada no restante do texto. Caso no decorrer da citação exista supressão de elementos textuais, é necessário inserir símbolos indicativos. Para supressões, utilize [...]; para interpolações, acréscimos e comentários, empregue apenas [ ]; por último, 5Citações diretas e indiretas para destacar determinada informação, utilize uma das seguintes opções: grifo, negrito ou itálico (ABNT, 2002). Apropriado desse saber, você deve exercitar o processo de construção textual. Ou seja, praticar a leitura e a interpretação dos textos para, em seguida, elaborar a sua argumentação das ideias apresentadas, de tal forma que elas tenham relação e embasem as suas concepções. Exercite, portanto, a paráfrase e minimize a recorrência de citações diretas. A seguir, veja alguns conceitos importantes. Citação: menção a uma informação extraída de outra fonte. Citação de citação: citação direta ou indireta de um texto ao qual não se teve acesso, mas que foi citado por outro autor cujo texto foi consultado. Citação direta: transcrição textual de parte da obra do autor consultado. Citação indireta: texto baseado na obra do autor consultado. Notas de referência: notas que indicam fontes consultadas ou remetem a outras partes da obra em que o assunto foi abordado. Notas de rodapé: indicações, observações ou aditamentos ao texto feitos por autor, tradutor ou editor, podendo também aparecer na margem esquerda ou direita da mancha gráfica. Notas explicativas: notas usadas para comentários, esclarecimentos ou explana- ções que não podem ser incluídos no texto (ABNT, 2002). Textos impessoais Estrela (2018, p. 155) pondera que “[...] uma boa redação exige boas regras do vernáculo”. Assim, em um texto acadêmico, os parágrafos devem ser constru- ídos com conexão de ideias e assuntos, os quais devem ser organizados com coerência. Segundo o autor, os parágrafos devem iniciar com frases curtas e tópicos coerentes (ESTRELA, 2018). Dessa forma, o leitor consegue iden- tifi car objetivamente a ideia principal de cada parágrafo, ou seja, a hipótese defendida em cada uma das construções. O objetivo é que, no fi m da leitura, o leitor perceba uma construção gradativa das ideias até as conclusões, com a manutenção da coerência ao longo da estrutura de escrita. Evitar o uso do gerúndio é importante, conforme pondera Estrela (2018). Da mesma forma, é preciso limitar o uso de artigos indefinidos. Para a escrita Citações diretas e indiretas6 acadêmica, é importante evitar construções como: “estarei indicando”, “estará sendo explicado o problema”, etc. O gerúndio representa ação prolongada (em desenvolvimento), ou seja, sem finalização. Na apresentação da pesquisa, esse não é o objetivo. A intenção do autor é apresentar dados e informações para defender a sua hipótese. Portanto, a presença do gerúndio no texto enfraquece as afirmações. O mesmo ocorre com o excesso de artigos indefinidos, por exemplo, em estruturas como “um certo autor”, “uma dada pesquisa”, “um dos dados” etc. A assertividade é fundamental para a apresentação da pesquisa. Os artigos indefinidos generalizam e distaciam o leitor do foco. Portanto, devem ser evitados. Você deve utilizar o sobrenome do autor que está citando e afirmar com clareza dados sobre a pesquisa realizada, os indi- cadores utilizados etc. A linguagem figurada também deve ser evitada. Mas o mais importante para a redação acadêmica é o cuidado com as pessoas do verbo, expressas pelos pronomes pessoais. É possível variar entre: primeira, segunda e terceira pessoas do singular e do plural. Veja no Quadro 2, a seguir. Singular Plural Primeira pessoa Eu Nós Segunda pessoa Tu/você Vós/vocês Terceira pessoa Ele/ela Eles/elas Quadro 2. Pessoas do verbo O leitor deve conduzir o processo de leitura de forma a elaborar as suas próprias conclusões. Portanto, o autor deve buscar a maior imparcialidade possível na apresentação de suas argumentações. Isso não significa que ele deve evitar o posicionamento frente a determinada hipótese, em absoluto. O que deve ser priorizado é a defesa de ideias a partir de fundamentação teórica. É por esse motivo que as pesquisas são construídas com base em análises de dados, seja de forma qualitativa, quantitativa ou com a presença das duas. Assim, os dados são os responsáveis por apresentar fatos para o leitor. A partir dessa análise, o leitor elabora as suas inferências. 7Citações diretas e indiretas A análise quantitativa é a base da pesquisa. Ela está centrada na análise numérica. Já a análise qualitativa busca explicar realidades observáveis a partir de conceitos, comportamentos, percepções e avaliações dos sujeitos. O uso da primeira e da terceira pessoas do plural (nós e elas/eles), como justifica Estrela (2018), favorece a marca da impessoalidade no texto. O objetivo é omitir as pessoas do discurso para defender determinada ideia. Ao longo do texto, deve-se priorizar o uso dessas pessoas do verbo em vez de se utilizar a primeira pessoa do singular (eu). Tanto o “nós” quanto o “elas” e o “eles” distanciam o autor e generalizam o ponto de vista. Observe um paralelo entre o uso do sujeito na primeira pessoa do singular e na primeira e terceira pessoas do plural: acredito que [...]/acreditamos que [...]; defendo que seja necessário [...]/autoresda área defendem [...]; demonstro no meu estudo [...]/procuramos demonstrar com este estudo [...]. Também é possível utilizar construções como: “conclui-se que”; “deter- minou-se que”; “evidenciou-se que” etc. Quando você amplia as afirmações atribuindo-as a outros autores da área e a pesquisas realizadas, aumenta a confiabilidade das ideias apresentadas ao longo do seu texto. Com esse mesmo efeito, é possível ocultar o agente, ou seja, construir estruturas frasais do tipo: “é importante”, “é necessário”, “faz-se necessário”, “é válido”, “é urgente” etc. Por fim, lembre-se de sempre buscar referências concisas na sua área de estudo para o embasamento teórico adequado do seu trabalho. Em seguida, após o processo de leitura e de interpretação das análises, construa o seu texto com referências corretas, de acordo com as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) — caso essa seja a exigência no seu contexto de produção. Além disso, elabore um texto com a marca da impessoalidade, para que o leitor faça as próprias inferências sobre o material lido. Citações diretas e indiretas8 ABNT. NBR 10520: informação e documentação: citações em documentos; apresenta- ções. Rio de Janeiro: ABNT, 2002. ESTRELA, C. (org.). Metodologia científica: ciência, ensino, pesquisa. 3. ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2018. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002. LOZADA, G.; NUNES, K. S. Metodologia científica. Porto Alegre: SAGAH, 2018. RODRIGUES, T. Funções linguísticas dos verbos dicendi. Rio de Janeiro: UFRRJ, 2008. SATO, N. Lista de verbos dicendi. [S. l.; s. n.], 2017. Disponível em: https://sendajuridica. files.wordpress.com/2017/07/lista-de-verbos-dicendi.pdf. Acesso em: 18 set. 2019. 9Citações diretas e indiretas