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Introdução ao Direito: Origens, Conceitos e Perspectivas Metodológicas
A PRIMEIRA PARTE VERSA SOBRE A TEORIA DO DIREITO, A QUAL ESTUDA A CIÊNCIA JURÍDICA, O ESTUDO DA DOGMÁTICA, SOCIOLOGIA E FILOSOFIA. VEREMOS, PORTANTO, COMO SE DESENVOLVE O DIREITO NO DECORRER DA HISTÓRIA HUMANA.
Origens
Origem do vocábulo Direito. O vocábulo Direito não tem um significado único, sendo utilizado em vários sentidos. Assim, nasce então o questionamento de como definir ou conceituar o Direito? Haja vista que o senso comum entende, em parte, como sendo o Direito um conjunto de ideias que vão de encontro a real conduta social, reconhecendo, portanto, uma situação anômala como sendo uma declaração do Direito.
Temos com isso que para a Sociedade o Direito muitas vezes se torna um conjunto de preceitos complicados, antagônicos e às vezes coerente. Um mundo que resguarda o que é ordenado, reto, e também, o que mostra desordens.
Eis que, por isso, o Direito apresenta uma difícil tarefa para ser definido de forma estrita. E há de se considerar que os juristas procuram compreender o Direito como um fenômeno universal.
Ferraz Jr. (2001 p. 34) diz que, a compreensão do que seja o Direito não e uma tarefa fácil, haja vista, a sua amplitude e as múltiplas faces, e, também, a própria expressão Direito e os seus correlatos que possuem diferenças significativas que não podem ser desprezadas.
Portanto, são várias as definições que postulam alcançar uma definição do Direito, pois não apenas os juristas buscam compreender o Direto para defini-lo, mas também os filósofos e os cientistas sociais dão sinais de busca semelhante, na busca de uma compreensão universal, nas concepções de língua e a definição de Direito.
Conceitos
A palavra Direito provem do baixo latim directum, rectum, que significa direito, reto, aquilo que é conforme uma régua, e sucessivamente, designando aquilo que e conforme a lei, a própria lei, conjunto de leis, ciência que tem por objeto as leis. O vocábulo latino apresentou variações semânticas em quase todas as línguas – Derecho (espanhol), Diritto (italiano), Droit (francês), Recht (alemão), Rigth (inglês), Dreptu (romeno), Dret (catalão), Ret (dinamarquês), Rätt (sueco), Rett (norueguês) e Rétt (islandês). Para completar a indicação das origens do vocábulo direito, convém citar, também, a palavra grega diké, de raiz indo- européia dik que significa indicar. Todavia, ao lado dessas, há outro conjunto de palavras que na linguagem moderna estão ligadas à noção de Direito. Esse conjunto é apresentado pelos vocábulos: jurídico, jurisconsulto, judicial, jurisprudência etc., a origem dessas palavras encontra-se no termo latino jus (júris), que significa Direito, todavia a sua origem divide os filósofos.
Em português, guardou tanto o sentido do jus como aquilo que é consagrado pela justiça, e quanto o Direito como um exame da retidão da balança, por meio do ato do aparato judicial ao dizer o Direito.
Ao estudar o Direito como ciência, se busca examinar a sua definição, pois buscar a essência do fenômeno nos traz segurança ao estudo proposto. Mas em razão do princípio metódico da divisão do trabalho, existe a necessidade de se decompor analiticamente o Direito que é objeto de várias ciências como a sociologia jurídica, filosofia do direito, história do direito e outras,de maneira a constituir o aspecto que será abordado.
A doutrina, seguindo a lógica, nós diz que temos duas espécies de definição: a nominal e a real.
Nominal: designa o que uma palavra ou nome significa.
Real: expressa o que é uma coisa ou realidade, indicando a natureza do objeto ou da coisa a ser definida.
No tocante a definição real a palavra Direito apresenta várias realidades, eis a razão da dificuldade de estabelecer uma única realidade, isto é assim porque o termo Direito não é unívoco, nem tampouco equívoco, mas análogo, pois designa realidades conexas, do ponto de vista jurídico são cinco as acepções fundamentais, as quais veremos.
Dessa forma, a definição nominal de Direito e aquilo que é conforme a regra, assim o Direito passou a ser sinônimo de regra, de norma. E por outro lado, estabelecer uma definição real do termo Direito se torna difícil na medida em que esse vocábulo apresenta várias realidades, sendo praticamente impossível estabelecer uma única definição que corresponda à essa diversidade, exigindo, para tanto, tantos conceitos quantas forem as realidades a que se refere.
Direito Norma - significa a norma, a regra social obrigatória
Direito Faculdade - significa o poder, a prerrogativa que o Estado tem de criar leis
Direito Justo - aquele Direito que é devido por justiça
Direito Ciência - o estudo do Direito como uma ciência
Direito Fato Social - considerado fenômeno da vida social coletiva, encontrando-se ao lado dos fatos econômicos, artísticos, culturais, etc.
Uma das acepções mais comuns do vocábulo é o Direito Norma, pois conceitua o Direito como uma regra social obrigatória, uma norma ou lei um Direito objetivo, se opondo ao subjetivismo, como o direito faculdade; devemos considerar que nesta acepção, o Direito ainda indica realidades diferentes quando se refere ao Direito positivo e ao natural, ao estatal e não-estatal.
Conceitos de Direito:
“O Direito é a ordenação bilateral atributiva das relações sociais, na medida do bem comum.” Miguel Reale.
“Regra social obrigatória.” Clovis Beviláqua
Definimos o Direito como um conjunto de Normas, institucionalizadas, pelo Estado que serve para organizar a vida em Sociedade e busca a Justiça Social.
Perspectivas Metodológicas
No tocante a universalidade do fenômeno jurídico, os problemas dos diferentes pontos de vista teóricos como a Zetética Jurídica e a Dogmática Jurídica, e segundo Ferraz Jr. (2001 p. 39-51), esta última pretende designar claramente a distinção entre Direito público e Direito privado, a linguagem do enfoque dogmático é caracterizada pelo uso prescritivo, pois sua função é derivativa, orienta a ação,ou seja, ela diz como deve ser algo.
Enquanto a Zetética tem função especulativa, põe em dúvida, levantando questionamentos que podem ser infinitos, pois ao ser de cunho filosófico está livre de qualquer dogmatismo, destarte seja possível didaticamente dogmatizar até um pensamento dito filosófico.
A linguagem do trabalho zetético é caracterizada pelo uso descritivo e o uso do verbo ser, que é algo; estes termos seu questionamento é infinito, haja vista que admite uma questão sobre a própria questão. Zetéticas são, por exemplo, as investigações que têm por objeto o direito no âmbito da Sociologia, Antropologia,
Psicologia, História, Filosofia, Ciência Política etc. Por isso a zetética é mais aberta, porque suas premissas são dispensáveis, podendo ser substituídas se o resultado não é bom,desejado, ficando dessa forma a questão em aberto até que as condições de conhecimento e estudo sejam favoráveis.
Por outro lado a dogmática é mais fechada, considerando que ela está vinculada a conceitos fixados, obrigando-se a fazer interpretações que sejam capazes de conformar os problemas às premissas. Isto porque, o seu compromisso com a orientação da ação a impede de deixar soluções ao questionamento em aberto ou em suspenso.
Ante o exposto, necessário se faz reconhecer que o fenômeno jurídico, dentro de toda a sua complexidade, admite tanto o enfoque zetético, quanto o enfoque dogmático em sua investigação.
Juspositivismo: A codificação e princípio da legalidade.
VEREMOS QUE ESTE MODELO TEÓRICO CONCEBE A CIÊNCIA JURÍDICA COMO CIÊNCIA DOGMÁTICA, PRINCÍPIO METODOLÓGICO, POIS VÊ EM SEU OBJETO O DIREITO POSTO PELO ESTADO, COMO UM CONJUNTO COMPACTO DE NORMAS.
Codificação
Nos primórdios da nossa história, antes que o homem desenvolvesse a escrita às regras de convivência eram recebidas pelas pessoas de forma consuetudinária, ou seja, prevalecia a oralidade, de maneira que se utilizavam, também, dos rituais solenes para que os atos praticados entre eles ficassem gravados na memória coletiva, de forma a ter testemunhas, assim era a forma da família passar os seus costumes e tradições, de pai para filho e assimsucessivamente.
Leciona Ferraz Junior, “O fato de o Direito tornar-se escrito contribui para importantes transformações na concepção de Direito e de seu conhecimento. A fixação do Direito na forma escrita, ao mesmo tempo em que aumenta a segurança e a precisão de seu entendimento, aguça também a consciência dos limites.” A concepção da lei como principal fonte do direito chamará a atenção para a possibilidade do Direito mudar toda vez que a legislação seja modificada. Com isso, temos que essa verdadeira institucionalização da mutabilidade do Direito na cultura corresponderá ao chamado fenômeno da positivação do direito.
Pois bem, o Direito positivo é um conjunto de normas Estatais em vigor em determinado País em uma determinada época. É o direito posto, imposto, positivado pelo Estado. O positivismo jurídico busca reconhecer o Direito positivo como único Direito vigente, procurando limitar o estudo científico-jurídico ao estudo das legislações positivas.
O Positivismo Jurídico pretendeu purificar a ciência jurídica de qualquer fator, base, fundamento moral ou de direito natural. Pois o positivismo jurídico se limita aos fatos sem observar os valores, princípios axiológicos. Haja vista o positivismo jurídico rechaça todos os elementos de abstração na área do Direito,iniciando pelo direito natural, por considerá-lo anticientífico.
Pretende o positivismo jurídico focalizar apenas os dados fornecidos pela experiência, desprezando os juízos de valor, para se apegar apenas aos fenômenos observáveis. O objeto da Ciência do Direito tem por missão estudar as normas que compõem a ordem jurídica vigente, ocupando-se com o Direito existente. Eis porque o investigador deverá utilizar apenas os juízos de constatação ou de realidade, deixando de considerar os juízos axiológicos. O positivismo jurídico frente a concepção de justiça tem uma atitude de ceticismo absoluto, a razão para tal atitude é por considerar a justiça um ideal irracional, acessível apenas
pelas vias da emoção, considerando que o positivismo se omite em relação aos valores, conforme leciona Paulo Nader. Para esta corrente doutrinaria só existe uma ordem jurídica, a saber, a comandada pelo Estado. Para o critico do direito natural, Eisenmann, a proposição que melhor caracteriza o positivismo jurídico é: “Não há mais direito que o direito positivo” com isso assume uma postura intransigente frente ao direito natural. Dessa forma, para o positivismo jurídico a lei assume a condição de único valor. Ao que Vasconcelos se pronuncia da seguinte maneira,
“os positivistas, seduzidos pelo prestigio da cientificidade de suas teorias, que os situava na etapa derradeiro conhecimento humano, começaram a acreditar que, em nome dessa autoproclamada superioridade, tudo podiam. O formalismo e o fechamento de seu sistema transmitiam-lhe essa sensação. Reclusos no restrito território que se concederam, ficaram impedidos de ver que o muito de que pensavam dispor, dadas as limitações que se auto-impuseram, noutra perspectiva era pouco, senão muito pouco,
quase nada”
Um dos expositores desta corrente doutrinaria expressão máxima do positivismo jurídico, foi Hans Kelsen, para ele não importa o conteúdo do Direito, pois está em busca da “purificação” do Direito, o Direito como ciência. Segundo Kelsen é incontestável que a norma deve ser moralmente justa, mas essa justiça não pode ser estudada pela ciência jurídica que só descreve normas. O que importa e que a ordem legal busque o seu fundamento em algo objetivo e racional da validade legal e não em algum princípio subjetivo, supondo aquela ordem legal validamente estabelecida. Haja vista que a uniformização do direito valoriza a vontade do legislador: ‘o direito está pronto e acabado na Lei’
A Escola da Exegese surgiu na França, e as principais causas do surgimento foram a valorização do racionalismo, a codificação em 1804 com o Código de Napoleão, na qual houve uma fidelidade ao código e o desprezo as demais fontes, houve o movimento doutrinário dos comentaristas do código,excluindo as teorias gerais do direito e as concepções jusnaturalistas, os princípios da certeza e segurança do direito.
As principais características desta escola é que tem toda a sua atenção voltada, exclusivamente, para a Lei, uma concepção rigidamente estatal do Direito, a interpretação da lei é fundada na intenção do legislador, o apego excessivo às palavras da lei, a ação limitada do aplicador do Direito com a tese da aplicação mecânica do Direito, ou seja, aplicação da letra fria da lei. A sistematização de normas para a uniformização do Direito, a interpretação exegética é o primeiro modo de elaboração cientifica de um Direito codificado.
Dessa forma, para Paulo Nader, a Escola da Exegese desenvolveu, programa típico do positivismo. Defendendo o “fetichismo legal” tendo como sua doutrina o codicismo. E este, no dizer de Carnelutti, “é uma identificação exagerada ou exasperada do Direito com a lei”. Era a ideia de que o código tinha a solução para todos os problemas e que o Direito repousava exclusivamente na lei.
O Principio da Legalidade
A Constituição Federal de 1988 consagrou em seu art. 5º, II, ninguém será obrigado a fazer ou a deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
“O Estado de Direito, desde suas origens históricas, envolve associado ao princípio da legalidade, ao primado da lei, idealmente concebida como ‘expressão da vontade geral institucionalizada’” Luiz Roberto Barrozo.
O Direito norma significa a lei, regra social obrigatória. Existem vários autores que o denominam como o aspecto primordial do Direito. Dessa forma, o Direito norma é a “regra social obrigatória” ou ela garantida pelo Estado. Para Siqueira Junior, o Direito na acepção de norma apresenta, ainda, significados e realidades diversas, quando se refere ao Direito estatal e ao direito não-estatal; ao direito positivo e ao direito natural; à ordem ou o sistema jurídico.
Em sentido amplo a lei jurídica é definida por François Geny como a “norma de conduta do homem com seus semelhantes, garantida pela eventual aplicação da força social, tendo em vista a justiça”, para o jurista italiano Giorgio del Vecchio, “lei é o pensamento jurídico deliberado e consciente, expresso por órgãos adequados que representam a vontade preponderante”. A matéria ou o conteúdo da lei é sempre uma regra de Direito um preceito comum, sendo dirigida a todos os membros da sociedade. Haja vista que a lei obriga por igual a todos os membros da sociedade sobre a qual estende a sua eficácia, isto é, a lei apresenta a característica de generalidade,surgindo dessa característica duas propriedades importantes: a lei é uma regra abstrata e permanente. A lei é impessoal, não considera a pessoa individualmente e ela e abstrata,porque não visa situações particulares ou concretas. Temos, também, que a lei é uma norma permanente, pois permanece no tempo, ate que seja revogada por outra lei, ou se ela própria declarar o tempo de vigência, em caso de uma lei temporária. A lei, por outro lado, e obrigatória, ela ordena, não exorta, essa é a condição de sua eficácia.
O principio da legalidade esta ligado ao elemento instrumental da lei que é a formula escrita, pois ela sempre é escrita, com o intuito de dar maior segurança social e jurídica.
Com o principio da legalidade se põe limite no quadro da soberania da lei. Pois para quem esta endereçada a lei, nos atos privados, significa que só o que a lei obriga ou proíbe deve ser cumprido, o restante lhe é permitido. Já para o emissor de atos soberanos, significa que não só deve fazer ou deixar de fazer apenas o que a lei obriga, mas também que só pode fazer o que a lei permite. É a chamada estrita legalidade
Conclui-se, portanto, que somente a lei poderá criar direitos, deveres e vedações, pelas quais as pessoas ficam vinculadas aos comandos legais, ou seja, podemos dizer que o princípio da legalidade é uma garantia constitucional. E por meio deste princípio, procura-se proteger os indivíduos contra os arbítrios cometidos pelo Estado e até mesmo contra os arbítrioscometidos por outros particulares. Eis que os indivíduos têm ampla liberdade para fazer o que queiram desde que não seja um ato, um comportamento ou uma atividade proibida por lei.
A Superação do Paradigma do Juspositivismo
O POSITIVISMO JURÍDICO
Em estudo clássico sobre o Positivismo Jurídico, Norberto Bobbio considerava-o sobre três aspectos: como uma maneira de entender o Direito, como uma Teoria do Direito e, enfim, como uma ideologia do Direito. Para explicitar as teses principais do Positivismo Jurídico, resume as suas características por meio de sete problemas:
1. O MODO DE ENTENDER O DIREITO: o Positivismo Jurídico considera o Direito como um fato e não como um valor. O Direito compreendido sem referência a valores, isto é para sua identificação e descrição é irrelevante o fato de ser justo ou injusto, bom ou mau. Assim, a existência de uma norma jurídica, a sua validade, não implica na afirmação do seu valor;
2. A DEFINIÇÃO DO DIREITO: o Positivismo Jurídico defende a Teoria da Coatividade do Direito, o Direito é definido a partir do elemento de coação. Como explica Bobbio, tal teoria decorre do modo de entender o Direito, uma vez que, se o Direito é entendido como Fato, Direito é aquele ?comando? que atua numa determinada Sociedade por meio da força;
3. AS FONTES DO DIREITO: o Positivismo Jurídico afirma a Lei como fonte preeminente do Direito, sendo que as demais fontes derivariam direta ou indiretamente dela;
4. A TEORIA DA NORMA JURÍDICA: o Positivismo Jurídico concebe a norma jurídica como um comando, como um imperativo dirigido aos Juízes e aos Cidadãos de um modo geral, há controvérsias a respeito de quem seriam os destinatários finais das normas, se os Juízes ou os Cidadãos;
5. A TEORIA DO ORDENAMENTO JURÍDICO: o Positivismo Jurídico não concebe o Direito como normas isoladas, mas como um conjunto de normas jurídicas válidas e vigentes numa sociedade, sendo que o ordenamento jurídico será dotado de algumas características formais, como a coerência e a completude;
6. O MÉTODO DA CIÊNCIA JURÍDICA: o Positivismo Jurídico concebe a atividade dos juízes como uma declaração de um sentido já plenamente contido na norma legal. Como diz Bobbio, trata-se da ? teoria da interpretação mercanicista, que na atividade do jurista faz prevalecer o elemento declarativo sobre o produtivo ou criativo do Direito (empregando uma imagem moderna, poderíamos dizer que o positivismo considera o jurista uma espécie de robô ou de calculadora eletrônica);
7. A TEORIA DA OBEDIÊNCIA: o Positivismo Jurídico postula a teoria da obediência da Lei enquanto tal, que
pode ser sintetizada no famoso aforismo: Gesetz ist Gesetz (a Lei é a Lei).
Como ocorre em toda escola do pensamento, não são todos os pensadores juspositivistas que compartilham de todas as sete teorias, então, reduzi-las a três teses principais:
a. A Tese das Formas Sociais do Direito: as normas jurídicas são criadas mediante um procedimento que pode ser empiricamente verificável;
b. A Tese da Separação Conceitual entre Direito e Moral: para que uma norma seja jurídica não é necessário
que ela seja justa ou esteja de acordo com algum tipo de padrão moral ou extrajurídico e;
c. A Tese do Ceticismo Ético: não existem princípios morais e de justiça universalmente validos, princípios que poderiam ser reconhecidos por meios racionais e objetivos. ?Os únicos juízos cuja verdade ou falsidade podem ser afirmados são os juízos que tem conteúdo empírico?. Os enunciados valorativos são subjetivos e relativos e a seu respeito não pode existir discussão racional.
O Pós-Positivismo supera o paradigma do Positivismo Jurídico ao ultrapassar aquelas três teses:
a. Existem normas jurídicas que não são provenientes de fontes sociais, isto é, não são positivadas, não retiram sua validade de uma outra norma positiva do ordenamento jurídico. Essas normas são os princípios, que podem estar positivados, mas isso não é necessário. Eles valem em função do que dispõem, da justiça (do valor) do seu conteúdo . Para o Pós-Positivismo, a norma é entendia como gênero que admite duas espécies: as regras e os princípios. As regras são enunciados dotados de uma descrição de conduta e, a partir dessa descrição, mediante a subsunção, chega-se a uma solução jurídica ? por essa razão, ou as regras se aplicam ou não se aplicam (? tudo ou nada" como diz Ronald Dworkin), ou os fatos nela se enquadram, aplicando-se a consequência jurídica ou não se enquadram. Os princípios, por sua vez, são relatos mais abstratos, sem se determinar uma conduta concreta, sua aplicação deve se dar mediante uma ponderação a ser realizada em cada caso concreto.
b. Como os princípios carregam conteúdo moral, a separação conceitual entre Direito e Moral cai por terra, uma vez que se admitem normas jurídicas em função do seu conteúdo moral, de justiça. Os princípios são considerados verdadeiras normas jurídicas, dotados de normatividade e eficácia. E acabam por assumir um papel de destaque porque:
Decidem os casos difíceis, diminuindo a discricionariedade judicial; Limitam as regras que se relacionam com eles;
Constituem pautas para a interpretação de outras normas; Integram as lacunas e;
Possuindo eficácia, são concretizados gerando direitos subjetivos.
c. Com o Pós- Positivismo, ocorre uma relativização da dicotomia entre descrição (o Direito o que é) e prescrição (o Direito que deve ser), tão cara aos Positivistas. O papel da TEORIA DO DIREITO não se limita mais a descrever o Direito válido, mas também toma parte do Direito. A TEORIA DO DIREITO contribui para a fundamentação da validade da solução jurídica do caso concreto, razão pela qual o papel da argumentação jurídica ganha o primeiro plano.
Para concluir, se o Positivismo Jurídico entende o Direito como um conjunto de objetos (as normas jurídicas) externos ao sujeito que as deve conhecer objetivamente, o Pós- Positivismo vai entender o Direito como argumentação, na qual as normas jurídicas adquirem sentindo enquanto são utilizadas numa atividade que agora é intersubjetiva.
Direito e moral; ser e dever ser: Causalidade e Imputação
VEREMOS NESTE CAPITULO QUE OS FATORES E VALORES SOCIAIS SE EXTERIORIZAM POR MEIO DO DIREITO E MORAL, SENDO DUAS FORMAS DE EXPRESSÃO DA ÉTICA. ASSIM UM COMPORTAMENTO PREVISTO NA NORMA À QUAL SE IMPUTA UMA CONSEQUÊNCIA.
São instrumentos de controle social em que a moral se identifica com a noção de “bem”, do que seja bom, ter uma boa convivência em sociedade.
Direito e moral não são sistemas absolutamente autônomos, sem qualquer comunicação. Embora distintos, o Direito é grandemente influenciado por esta, da qual recebe valioso fundamento.
E preciso reconhecer certa similaridade entre normas jurídicas e preceitos morais. E segundo Ferraz Junior (2001, p., 351) “Ambos têm caráter prescritivo, vinculam e estabelecem obrigações numa forma objetiva, isto é, independentemente do consentimento subjetivo individual. ” Haja vista, que ambos, Direito e moral, são inextirpáveis da convivência, pois se não há sociedade sem Direito, também não haverá sociedade sem moral. Todavia, ambos se confundem, e marcar a diferença entre eles é uma das grandes dificuldades da filosofia do direito.
Direito e Moral segundo Miguel Reale (2002, p.41) “são instrumentos de controle social que não se excluem, antes, se completam e mutuamente se influenciam. Não obstante cada qual tenha o seu objeto próprio, é indispensável que a análise cuidadosa do assunto mostre a ação conjunta desses processos, evitando-se colocar um abismo entre o Direito e a Moral. Seria um grave erro, portanto, pretender-se a separação ou o isolamento de ambos, como se fossem sistemas absolutamente autônomos, sem qualquer comunicação, estranhos entre si. O direito e a moral, afirmou Giorgio Del Vecchio, são conceitos que se distinguem, mas que não se separam. ” Salienta Reale, que o acerto está em saber distinguir, não em separar.
Moral
Conjunto de práticas, costumes e padrões de conduta formadores da ambiência ética. Trata-se de algo que varia no tempo e no espaço, porquanto cada povo possuisua moral, que evolui no curso da história, consagrando novos modos de agir e pensar.
Vejamos a distinção entre Direito e Moral segundo Miguel Reale, haja vista que cumprir de forma obrigatória a sentença satisfaz o mundo jurídico, todavia, continua alheio ao campo propriamente moral, isto deixa ver que há uma diferença básica que se pode indicar com a seguinte expressão: a Moral é Incoercível e o Direito Coercível, portanto, o que distingue o direito e a moral é a Coercibilidade: que serve para mostrar a plena compatibilidade que existe entre o Direito e a Moral. Inicialmente dizia-se que o Direito era uma ordenação coercitivada conduta humana -Hans Kelsen-. Entretanto, a verdade é que o Direito é uma ordenação coercível da conduta humana.
Heteronomia: A consciência moral evolui da heteronomia para a autonomia, ou seja, começamos a interiorizar as normas e as obedecemos seja por medo ou receio do castigo. Esta situação evolui para um estágio ao qual nem todos os indivíduos chegam que é quando nos autodeterminarmos, em função de princípios e valores morais justificados de forma racional.
A Heteronomia significa que a sujeição às normas jurídicas não depende do livre arbítrio de quem ela está sujeito, é uma imposição exterior que decorre da sua natureza obrigatória. Haja vista que as regras jurídicas são impostas. Valem independente de nossa adesão ou opinião.
Regras morais são aceitas unanimemente. Brotam de uma consciência coletiva. (Autonomia)
A Bilateralidade Atributiva, “É uma proporção intersubjetiva em função da qual os sujeitos de uma relação ficam autorizados a pretender, exigir, ou a fazer, garantidamente, algo.” Miguel Reale. Exemplo clássico disto é a compra e venda de algum bem, ou seja, em que um se obriga e entregar o bem e o outro a pagar pelo bem que está a adquirir. Sem relação que vincule duas ou mais pessoas não há Direito, para que haja Direito é indispensável que a relação entre os sujeitos seja objetiva, ou seja, insuscetível de ser reduzida, unilateralmente, a qualquer dos sujeitos da relação da proporção estabelecida deve resultar a atribuição garantida de uma pretensão ou ação, que podem se limitar aos sujeitos da relação ou estender-se a terceiros.
Dentro deste tema, destacamos três teorias: o Positivismo Jurídico; Teoria do Mínimo Ético; Teoria dos Círculos Secantes.
Para o Positivismo Jurídico, o Direito não possui nenhuma relação com a moral, sendo conceitos distintos. O positivismo, ao desvincular a norma de qualquer conteúdo valorativo acaba por afastar consequentemente a moral. Nesse sentido, Hans Kelsen concebeu a moral e o direito como esferas independentes. Dessa forma, a norma é o único elemento essencial ao direito, sendo extirpado qualquer conteúdo valorativo, pois a validade da norma não depende de conteúdos morais ou axiológicos. A norma e avalorativa.
Para a Teoria do Mínimo Ético, o Direito e a moral são semelhantes, teoria desenvolvida por Jellinek, mas já exposta de certa maneira pelo filósofo inglês Jeremy Bentham, que consiste em dizer que o Direito representaria um mínimo da moral declarado obrigatório para a sociedade sobreviver como tal. Para essa doutrina, nem todos os membros da sociedade estão dispostos a realizar de maneira espontânea as obrigações morais. Daí ser o Direito o meio utilizado como instrumento de força para o cumprimento de certos princípios éticos. Dessa forma, o Direito não é algo diverso da moral, mas uma parte desta, armada de garantias especificas. Esta teoria é representada por dois círculos concêntricos, em que no maior está indicada a Moral, sendo mais abrangente, e no círculo menor, o direito, por ela compreendido. Dessa maneira, tudo o que é jurídico é moral, todavia, a recíproca não é verdadeira, ou seja, nem tudo o que é moral é jurídico. Mas esse aspecto e refutável na medida em que no direito muitas normas existem indiferentes à moral. De outra feita, não podemos considerar a moral e o direito como compartimentos estanques, devemos concebê-los como interseccionados, em que entre eles apresentam uma parte que é comum a ambos, mas outras autônomas e independentes.
Para a Teoria dos Círculos Secantes a representação geométrica da relação entre o Direito e a moral não seria a dos círculos concêntricos, mas a dos círculos secantes, concebendo uma parte comum e outra autônoma entre o direito e a moral.
O saudoso mestre, Miguel Reale filósofo do Direito, ganhou projeção internacional com o desenvolvimento da sua teoria tridimensional do Direito. São inúmeras as teorias do Direito, cada qual proclamando-se a absoluta, o jusnaturalista, o historicista, o sociologista e outras, todavia o nobre mestre teve o brilho de conciliar a matéria sob um ângulo tridimensional, em que propõe a tese de que um fenômeno jurídico só pode ser devidamente entendido a partir da interação de três pontos de vista distintos.
1. O Direito como resultado de uma conjunção de fatos sociais
2. O Direito como expressão de normas validas;
3. O Direito como expressão dos valores sociais.
Esses três enfoques precisam ser unidos em um modelo comum que evidencie as relações entre essas três faces da experiência jurídica, que é ao mesmo tempo expressão da autoridade política e um resultado de fatos e valores sociais, o Direito teria assim três dimensões:
Dimensão fática: compreende os fatos sociais que influenciam na criação do direito, bem como as condutas reguladas pelo direito.
Dimensão normativa: compreende as relações de validade formal das normas, as suas inter-relações no
plano lógico das proposições de dever-ser.
Dimensão axiológica: O direito, como toda atividade humana, é direcionado a finalidades escolhidas pelas pessoas, o que significa dizer que ele é sempre orientado a valores...
Essas dimensões podem ser distinguidas entre si, mas nunca poderão ser completamente separadas, pois estará sob a terrível pena de não se compreender o fenômeno jurídico na sua completude.
SER E DEVER SER: Causalidade e Imputação
Cabe observar que, no centro de todas estas distinções que temos estudado, se encontra precisamente a oposição vislumbrada por Hans Kelsen entre o ser e o dever ser. Com efeito, tal oposição define o objeto constitutivo da ciência do direito, fixa o conhecimento por ela proporcionado no quadro geral das demais ciências normativas.
Nesse sentido, escreve o citado autor: “ninguém pode negar que o enunciado: tal coisa é — ou seja, o enunciado através do qual descrevemos um ser fático — se distingue essencialmente do enunciado: algo deve-ser — com o qual descrevemos uma norma — e que de circunstância de algo ser não se segue que algo deva ser, assim como da circunstância de que algo deve ser não se segue que algo seja.”
Kelsen apresenta a divisão entre o ser e o dever ser como uma oposição entre duas realidades desiguais, por um lado a da natureza e por outro a dos valores, todavia, segundo ele, a norma jurídica é a “significação de um ato de vontade” por meio da qual uma determinada conduta é ordenada, autorizada, habilitada ou derrogada. A norma jurídica não se confunde, portanto, com o ato de vontade que a instaura. Ela é, pois, um dever-ser, enquanto que tal ato de vontade é apenas um ser.
O primeiro tipo de conhecimento é oriundo das ciências naturais, que, segundo Kelsen, são ciências “causais”, no sentido de que elas se relacionam com os seus objetos (os fenômenos físicos, temporal e espacialmente situados) por meio de uma descrição fundada sobre o princípio de causalidade do tipo “se A é, B é ou será”.
Ao lado das ciências causais, se localizam as ciências normativas, que recebem tal denominação, não porque elas estabelecem normas ou prescrevem um comportamento qualquer, mas porque descrevem normas. Ainda que as normas sejam fatos objetivos situados no tempo e no espaço, elas não se deixam apreender por uma relação de causa e efeito. Ao contrário, elas exigem um princípio de interpretação específico, a que Kelsen, utilizando-se da terminologia Kantiana, dá o nome de princípio de imputação. Tal princípio toma a forma de um juízo hipotético do tipo“Se A é, então B deve ser”, juízo que estabelece uma conexão entre certa conduta e as suas consequências.
Uma proposição é um enunciado descritivo, isto é, um enunciado indicando que algo é, foi ou será. Uma norma, ao contrário, é uma prescrição (no sentido mais amplo do termo, isto é, englobando as permissões e as habilitações), criada por uma autoridade jurídica competente, e que deve ser observada pelos operadores jurídicos.
As normas jurídicas, ao contrário, não são susceptíveis ao tratamento de verdadeiro ou falso, pois uma prescrição não é verdadeira ou falsa, mas simplesmente válida ou inválida. Assim, se a verdade é uma propriedade da proposição de Direito, a validade, por sua vez, é o próprio modo de existência de uma norma jurídica.
Temos por tanto, que o princípio da causalidade afirma o seguinte, quando é A, B também é (ou será). O princípio da imputação afirma que, quando A é, B deve ser. Imputação designa uma relação normativa. É esta relação - e não qualquer outra - que é expressa na palavra dever-ser, sempre que esta é usada numa lei moral ou jurídica.
Normatividade social e jurídica; conceitos, validade/vigência e eficácia.
VEREMOS NESTE CAPÍTULO O DIREITO COMO PROCESSO DE ADAPTAÇÃO SOCIAL. O SISTEMA DE NORMAS É UM SISTEMA DINÂMICO. PARA COMPREENDER TAL DINÂMICA VEREMOS OS CONCEITOS DOGMÁTICOS DE VALIDADE/VIGÊNCIA E EFICÁCIA.
Miguel Reale expôs certa vez que, os fenômenos sociais são tão relevantes na história da humanidade que, por serem expressão espontânea e comum de agir do homem desde tempos imemoriais, acabam deixando de ser objeto primordial de sua atenção. Dentre eles nenhum sobreleva em termos de importância o da normatividade, apesar de constituir uma das notas essenciais e distintivas do próprio ser humano, podendo-se dizer que onde está o homem, aí está a regra.
Ela não é mero produto de nenhuma vontade exterior mesmo no início de nossa formação cultural, porque com ela se confunde, desde quando o homem passou a agir como algo de distinto no seio da natureza, diversificando-se dos outros animais. No ato de lançar a primeira pedra contra um agressor, ou no de criar o
primeiro utensílio em função de atividades vitais, neles estava imanente a função de regrar-se, filha primeira da memória, muito embora ainda não tivesse consciência de sua auto-afirmação, dando origem à cultura.
Nesse diapasão temos as diversas formas de normatização social, a saber: Normas éticas: são as que disciplinam o comportamento do homem, quer o íntimo e subjetivo, quer o exterior e social; Normas religiosas: são aquelas consideradas, pelos crentes de determinada confissão religiosa, como emanada da divindade, ou por ela sancionadas; Normas morais: são aquelas endereçadas à consciência das pessoas, cuja efetividade depende da aceitação individual, uma vez que são normas desprovidas de coerção; Norma jurídica: são aquelas que regulam, coercitivamente, as relações das pessoas, em interferência uma com as outras, sob a chancela do Estado; Normas de trato social: normas convencionais de padrões de conduta social elaborados pela sociedade.
Conceitos
A norma jurídica um preceito de direito estabelecido pela sociedade e que em um determinado momento da dinâmica social transforma-se em conduta obrigatória, ou seja, se torna um preceito comum obrigatório, emanado do poder competente e provido de sanção.
Em um sentido formal e toda disposição de caráter imperativo, emanada da autoridade competente que, no Estado, se reconhece como a função legislativa.
Em um sentido material seria toda disposição imperativa, de caráter geral, que contiver uma regra de direito positivo.
O que busca ou a finalidade da norma jurídica, instituir regras ou normas de caráter permanente e universal, reguladoras ou aplicáveis a todos os casos que se apresentem dentro de seu alcance.
Validade/ Vigência
A norma vigente é uma norma de direito positivo, todavia, ocorre que nem sempre toda norma de direito positivo é válida. Para o eminente professor Miguel Reale a “Validade formal ou vigência é, em suma, uma propriedade que diz respeito à competência dos órgãos e aos processos de produção e reconhecimento do Direito no plano normativo”. Outros sim, a vigência, equivale ao período de vida, ou seja, desde o início de sua obrigatoriedade e observância até a sua revogação, quando deixa de existir no mundo jurídico, pelo surgimento de outra norma que disponha sobre a mesma matéria em sentido contrário, ou quando o ordenamento jurídico prevê a sua anulação, devido a algum vício que ela tenha o que é feito por meio de processos específicos, ou, ainda quando a própria norma prevê o período determinado para a sua existência. Vacatio Legis é o espaço de tempo compreendido entre a publicação da lei e a sua entrada em vigor.
Revogação e a cessação da obrigatoriedade da Lei, podendo ser:
I. Expressa: quando a lei revogadora faz referência à lei a ser revogada;
II. Tácita: quando a lei nova regulamenta inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior;
III. Ab-rogação: revogação integral da lei;
IV. Derrogação: revogação parcial da lei; ou seja, parte dela continua em vigor, enquanto outra parte dela é extinta em decorrência da publicação de uma nova lei que expressamente a declare revogando determinados dispositivos ou quando tratar da mesma matéria , porém de forma diversa.
Eficácia
A eficácia é a efetiva aplicação e observância da norma, no que se refere aos seus efeitos ou às suas consequências, que podem ser jurídicas ou sociais. O professor Miguel Reale tem o seguinte entendimento: “A eficácia, ao contrário, tem um caráter experimental, porquanto se refere ao cumprimento efetivo do Direito por parte de uma sociedade, ao reconhecimento do Direito pela comunidade, no plano social, ou, mais particularizadamente aos efeitos sociais que uma regra suscita através de seu cumprimento.”A eficácia social é a efetiva conduta social em que a norma é aplicada e respeitada, quando a sociedade aceita e/ou acata a norma imposta; e a eficácia jurídica diz respeito à produção dos efeitos jurídicos, quando da sua aplicação por descumprimento.
Dessa forma, as normas jurídicas não são geradas por acaso, mas visando alcançar certos resultados sociais. Como o processo de adaptação social que é, o Direito se apresenta como fórmula capaz de resolver problemas de convivência e de organização da sociedade. A eficácia significa que a norma jurídica produz efetivamente os efeitos sociais planejados. Para que a eficácia se manifeste indispensável é que a norma jurídica seja observada socialmente.1
[1] Nader, Paulo. “Introdução ao estudo do Direito” Rio de Janeiro, Forense, 2006., cit., p. 94.
Categorias Fundamentais do Direito: Sujeito de Direito
VEREMOS NESTE CAPÍTULO AS RELAÇÕES JURÍDICAS, OS SUJEITOS DE DIREITO, PESSOA NATURAL, SUSCETÍVEL DE DIREITOS E OBRIGAÇÕES. A PESSOA JURÍDICA, A SUA NATUREZA.
O vocábulo pessoa é derivado do latim persona, no sentido técnico-jurídico, exprime ou designa todo ser, capaz ou suscetível de direitos e obrigações. Praticamente, é o ser, a que se reconhece aptidão legal para ser sujeito de direitos, no que se difere da coisa, tida sempre como o objeto de uma relação jurídica. Podemos observar tal preceito pelo que preceitua o Art. 1º “toda pessoa e capaz de direitos e deveres na ordem civil.” Código Civil Brasileiro de 2002.
Capacidade e o atributo que a lei confere para que elas sejam capazes de direitos e obrigações, ou seja, aptidão para uma pessoa adquirir e exercer direitos, ela e conferida pela lei para todos. A finalidade é para ela ser um sujeito de direito e não um objeto de direito “res”, distinguir o ser humano das outras coisas. Devemos lembrar que em Roma os escravos eram coisas, res, ou seja, objetos de direito que podiam ser vendidos e comprados.
Cabe salientar, por oportuno, que sendo a pessoa natural – ser humano- ou jurídica – agrupamentos humanos - sujeitos das relações jurídicas e a personalidade, a possibilidade de ser sujeito, ou seja, uma aptidão a ele reconhecida, toda pessoa é dotada de personalidade.Como vimos à capacidade e um atributo geral conferido pela Lei para a pessoa ser sujeito de Direito e Obrigações. Ela não se confunde com a chamada legitimidade, que é uma forma especial atribuída pela Lei a certas pessoas possibilitando ou restringindo os exercícios de certos direitos que, via de regra, poderiam ser exercidos por quem tem capacidade de fato.
Começo e fim da personalidade, o homem é sujeito de direito, posto que aquela possibilidade de se determinar a ele se atribui, já que ele tem uma vontade, aqui trata-se de afirmar o sujeito como titular da propriedade privada. A noção de propriedade privada é identificada com a riqueza e a possibilidade de produzir bens. Pois bem, como o homem tem em seu próprio corpo a primeira das propriedades, haja vista que seu corpo lhe permite ter uma fonte de trabalho, o individuo humano é por excelência o sujeito jurídico
– o homem como ser que trabalha ou homo faber.
O conceito de pessoa advém do cristianismo, e que aponta para a dignidade da pessoa humana, principio acolhido em nossa Magna Carta, a personificação do homem foi uma resposta cristã à distinção, na antiguidade, entre cidadãos e escravos. Com a expressão pessoa obteve-se a extensão moral do caráter de ser humano a todos os homens, considerados iguais perante Deus.
Por outro lado, a Pessoa Jurídica é uma construção elaborada pela ciência do Direito, devido a necessidade social de ter entidades que fossem capazes de realizar determinados fins, os quais não poderiam ser alcançados pelas atividades individuais, são no pensamento de Orlando Gomes, “grupos humanos personificados para a realização de um fim comum”, para o autor Jefferson Daibert, pessoa jurídica “é o conjunto de pessoas ou bens destinados à realização de um fim a quem o Direito reconhece aptidão para ser titular de Direitos e obrigações na ordem civil”
Na realidade, a ideia de pessoa jurídica tem origem na Idade Média e na necessidade de conferir ao comércio das corporações que então organizavam uma certa garantia jurídica.
Em que pese às dificuldades de fundamentação, as ideias ou noções de sujeito jurídico, pessoa física e pessoa jurídica são correntes na dogmática. Nesses termos o que chamamos de pessoa nada mais é do que feixe de papeis institucionalizados.
Categorias Fundamentais do Direito: Relação Jurídica
VEREMOS NESTE CAPÍTULO AS RELAÇÕES JURÍDICAS, OS SUJEITOS DE DIREITO. AS RELAÇÕES SOCIAIS QUE SÃO REGIDAS OU TUTELADAS PELA ORDEM JURÍDICA.
A vida em sociedade produz relações sociais, já dizia Aristóteles que o homem e um ser eminentemente social. Pois bem, estas relações sociais que regidas ou tuteladas pela ordem jurídica, transformam-se em relações jurídicas, ou podendo ser entendida também como, a relação jurídica é aquela relação social que a ordem jurídica entende relevante.
Para Maria Helena Diniz “as normas de direito regulam comportamentos humanos dentro da sociedade. Isto é assim porque o homem, na vida social, está sempre em interação, influenciando a conduta de outrem, o que dá origem às relações sociais que disciplinadas por normas jurídicas transformam-se em relações de direito”.
Assim, portanto, só haverá relação jurídica se a relação social estiver normada pelo direito. Sem uma norma incidente, em uma relação social ou fática, essa relação não é elevada à categoria jurídica.
Elementos da relação jurídica
A transformação do vínculo de fato ou social em relação jurídica possui os seguintes elementos:
I. Sujeitos (ativo e passivo);
II. Vínculo de atributividade;
III. Objeto (imediato e mediato);
IV. Fato propulsor; e
V. Proteção jurídica.
Sujeitos de direito: o sujeito ativo pode ser classificado como a pessoa que tem o direito subjetivo, ou seja, pode exigir da outra pessoa o cumprimento de uma prestação. Já o sujeito passivo é aquele que dever cumprir a obrigação em favor do outro, prestação essa, denominada dever jurídico.
Vínculo de atributividade: é o liame jurídico, o nexo entre as partes e estabelecida pela lei ou pela vontade humana (negócio jurídico).
Objeto: o bem sobre o qual incide a relação jurídica. O bem jurídico. Somente pode ser objeto de direito o bem suscetível de valoração econômica ou moral. O objeto imediato pode ser verificado por meio das formas do cumprimento das obrigações (dar, fazer e não fazer). O objeto mediato é o bem jurídico (coisas ou pessoas). Por tanto, o bem jurídico são as coisas materiais ou materiais que têm valor econômico ou moral e que podem servir de objeto a uma relação jurídica.
Fato propulsor: o acontecimento idôneo a produção de efeitos jurídicos. Segundo o professor Orlando Gomes, o fato jurídico é aquilo a que uma norma jurídica atribui um efeito jurídico. Por tanto, o fato propulsor é o que vai desencadear ou criar a relação jurídica entre os sujeitos.
Proteção jurídica: em caso de o sujeito passivo não cumprir a sua obrigação, o sujeito ativo tem a seu dispor a proteção jurídica para reaver ou proteger o seu direito. A proteção jurídica pode ser extrajudicial por meio de notificações, ou judicial por ações judiciais cabíveis. Está, em suma, é a tutela estatal.
Categorias fundamentais do Direito: Fato jurídico
VEREMOS NESTE CAPÍTULO OS FATOS JURÍDICOS, OS ACONTECIMENTOS DO MUNDO FÁTICO AOS QUAIS O DIREITO DETERMINA EFEITOS JURÍDICOS.
Em sentido amplo, fato jurídico é qualquer acontecimento que gera, modifica ou extingue uma relação jurídica. Fato jurídico é uma espécie do gênero fato. Este é definido como ?qualquer transformação da realidade? ou ?transformação do mundo exterior?. O qualificativo jurídico significa que o fato concreto é regulado pelo direito. Os fatos jurídicos criam novas situações jurídicas, tanto em relação às pessoas de Direito Privado, quanto às Pessoas de Direito Público. Apesar de os princípios e normas, referentes aos fatos jurídicos, localizarem-se, em nosso sistema, no Código Civil, a matéria é de interesse de todos os ramos do direito e se apresenta como objeto da Teoria Geral do Direito.
É o acontecimento do mundo fático a que o Direito determina efeitos jurídicos, como: o nascimento, roubo, testamento, emancipação etc. necessariamente reúne dois elementos: suporte fático e regra de Direito. Suporte fático e regra de Direito. Suporte fático é o fenômeno definido na hipótese ou suposto da norma jurídica. É o fato que, ocorrido, provoca aplicação da disposição ou consequência da regra jurídica. Para ser jurídico é indispensável que o fato seja regulado pelo ordenamento jurídico, isto é, que sofra a incidência das normas de Direito. Os fatos jurídicos são as fontes que geram, modificam ou extinguem relações jurídicas.
Portanto, fato jurídico é todo e qualquer acontecimento proveniente da ação do homem ou da natureza, a que a lei confere consequências ou efeitos jurídicos.Dos Fatos jurídicos "stricto sensu". São fatos jurídicos que não decorrem de uma ação volitiva humana, ou seja, sua realização não exige como pressuposto a manifestação da vontade do homem. Contudo, apesar da vontade humana não ser necessária à sua formação, pode haver a participação do homem em seu desenvolvimento. Porém, a intervenção humana em tais casos não exerce papel essencial, figurando apenas como elemento secundário.
Entre as características dos fatos jurídicos, a doutrina apresenta os seguintes: o acontecimento a que se refere o fato jurídico é sempre relevante para o bem estar da coletividade. O qualificativo jurídico só é atribuído aos fatos que se relacionem com os objetivos básicos do Direito, como a manutenção da ordem e segurança pelos critérios de justiça; os fatos jurídicos podem ser produzidos por ato de vontade do homem ou por eventos naturais que produzam efeitos jurídicos.
Categorias Fundamentais do Direito: Direito Privado
VEREMOS NESTE CAPITULO A SEGUNDA PARTE DA DICOTOMIA ENTRE O DIREITO PÚBLICO E DIREITO PRIVADO. ENTENDENDO QUE A DIVISÃO NÃO É CONSIDERADA COMO COMPARTIMENTOS ESTANQUES, HAJA VISTA A COMUNICAÇÃO ENTRE ELES.
Como vimos a doutrina apresenta um sem número de critérios utilizados para justificar a dicotomia do direito em públicoe privado. Em princípio podemos estabelecer que o direito público regula as relações ou situações jurídicas em que o Estado é parte. E o direito privado regula as relações entre os particulares. Para alguns, existe a questão da unificação do direito privado, que até hoje é controvertida. O conteúdo de toda relação jurídica é sempre um interesse, tomada a palavra na sua acepção genérica, abrangendo tanto os bens de natureza material como os de ordem espiritual.
Há duas maneiras complementares de fazer-se a distinção entre Direito Público e Privado, uma atendendo ao conteúdo; a outra com base no elemento formal, mas, todavia, sem cortes rígidos, ou seja, não se deve pensar que sejam dois compartimentos estanques, estabelecendo uma absoluta separação entre as normas de direito público e direito privado, haja vista que intercomunicam-se com certa frequência.
Quanto ao conteúdo ou objeto da relação jurídica temos:
1. quando é visado imediata e prevalecentemente o interesse geral, o Direito é público;
2. quando imediato e prevalecente o interesse particular, o Direito é privado. Quanto à forma da relação:
1. se a relação é de coordenação, trata-se, geralmente, de Direito Privado;
2. se a relação é de subordinação, trata-se, geralmente, de Direito Público.
Como vimos, o Direito Privado regula as relações entre particulares. Nas relações jurídicas de Direito Privado, o Estado pode participar como sujeito ativo ou passivo, em regime de coordenação com os particulares, isto é, dispensando sua supremacia ou poder de Império. Pois no Direito privado vige, supremamente, o princípio da autonomia privada. Os entes privados gozam dessa capacidade de estabelecer normas conforme seus interesses. Esse princípio está na base dos acordos de vontade, como os contratos, mas também dos atos de vontade unilaterais como a doação. Contudo, eles também, submetem-se à legalidade, mas não à estrita legalidade, haja vista que se a lei não lhes proíbe nem lhes obriga a agir, eles podem agir. Há, contudo, outros princípios que limitam essa permissão, como o da boa-fé, que protege a confiança e exige a lealdade nos negócios jurídicos.
Categorias fundamentais do direito: direitos difusos e coletivos.
VEREMOS NESTE CAPÍTULO A MASSIFICAÇÃO DAS RELAÇÕES INTERSUBJETIVAS, DEMANDA MAIOR ATENÇÃO POR PARTE DOS ÓRGÃOS ESTATAIS, FAZENDO-SE NECESSÁRIO VIABILIZAR INSTRUMENTOS APTOS A DEFENDER OS INTERESSES DA COLETIVIDADE.
Hodiernamente, observa-se uma tendência reducionista da esfera do Direito Privado, buscando-se a edição de normas capazes de assegurar uma maior igualdade nas relações intersubjetivas, a despeito das diferenças sociais, econômicas e culturais Normas que socorram os mais fracos e desarmem os poderosos, organizando a vida em sociedade com maior atenção aos princípios da justiça distributiva. A concentração de capital e poder nas mãos de poucos, com a consequente criação de problemas pessoais e patrimoniais que atingem a todos; a crescente padronização do modo de vida, transformando em questão coletiva o que outrora pertencia à esfera individual. Todas estas constatações, somadas a tantas outras, demandam uma atuação cada vez mais efetiva do Estado. Para alcançar uma verdadeira socialização do Direito, é mister recorrer à força estatal, pois compete ao Estado atender às exigências do bem comum, as quais não podem estar relegadas a interesse particulares ou à boa vontade de cada indivíduo; devem ser previstas em lei, constituindo verdadeiras obrigações impostas à toda coletividade.
Esclarece André Franco Montoro, que a essência do bem comum, na doutrina de São Tomás Aquino, consiste na vida dignamente humana da população, onde todos os membros da sociedade estão aptos a desenvolver suas faculdades e exercer suas virtudes, como a cultura e a vida familiar. Seu instrumento são os bens materiais mínimos para exercer tais virtudes, como moradia e alimentos para realização de uma vida digna. Conclui o pensamento tomista que a condição do bem comum é a paz, o mínimo de tranquilidade e segurança sem a qual a sociedade inexiste.
A justiça social deve estar calcada, pois, na ordenação da atividade social para o bem comum, devendo se fazer presente enquanto inspiração para a elaboração normativa, estimulando o senso de solidariedade humana na população, com ajustamento da conduta do indivíduo e seu bem particular à satisfação dos interesses de todos. Embora guardem semelhanças, não se confundem o interesse público e o interesse social. Assevera Fernando Rodrigues Martins, que este último traduz um anseio da sociedade na preservação do bem comum, e seus desejos visualizados em conjunto, estando presente ou não o Estado. Por seu turno, o interesse público realça a função do estado como responsável pelo atendimento das necessidades da coletividade, a ele incumbindo zelar dos anseios populares.
Na lição de Hugo Nigro Mazzilli, “ao tomar decisões na suposta defesa do interesse público, nem sempre os governantes fazem o melhor para a coletividade: políticas econômicas e sociais ruinosas, guerras, desastres fiscais, decisões equivocadas, desperdício dos recursos públicos e outras tantas ações daninhas não raro contrapõem governantes e governados, Estado e indivíduos”. Concluindo o autor que nem sempre o interesse do Estado coincide com o bem geral da coletividade, distingue o interesse público primário, que é o bem geral, interesse da sociedade como um todo, do interesse público secundário, que consiste no modo pelo qual os órgãos da Administração Pública percebem o interesse público e traçam seus planos de ação.
Direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos
O Estado, em busca da viabilização dos interesses que não são necessariamente estatais, passa a reconhecer questões comuns a toda coletividade, compartilhados por grupos, classes ou categorias de pessoas. Trata-se dos interesses transindividuais, os quais transcendem o âmbito puramente individual, mas não consistem exatamente em interesse público.
Fala-se em interesses transindividuais para significar a parcela de interesses pertencentes a um número razoavelmente extenso de pessoas unidas por circunstâncias comuns, situando-se em terreno intermediário entre o direito privado e o direito público. Os estudos iniciais sobre o tema são creditados a Mauro Cappelletti, “A concepção tradicional do processo civil não deixava espaço para a proteção dos interesses difusos. O processo era visto apenas como um assunto entre duas partes, que se destinava à solução de uma controvérsia entre estas mesmas partes a respeito de seus próprios interesses individuais. Direitos que pertencessem a um grupo, ao público em geral ou a um segmento do público não se enquadravam bem nesse esquema”.
De fato, o mundo contemporâneo revela uma série de questões que transcendem a esfera de interesse dos particulares. Num primeiro momento histórico, a principal preocupação do ordenamento jurídico era cuidar dos chamados direitos fundamentais de primeira dimensão, surgidos com o Estado liberal do século XVIII, atinentes à liberdade, à igualdade e à propriedade, impondo ao Estado uma abstenção, um afastamento para permitir o exercício dos direitos de cada cidadão. Já na fase do Estado social, surgem os direitos de segunda dimensão, de cunho positivo, exigindo melhoria da qualidade de vida e trabalho do cidadão, aí incluídos o direito à saúde, à educação e ao trabalho como instrumentos necessários para implementação efetiva dos direitos individuais. A terceira dimensão, por sua vez, rompe com a titularidade exclusivamente individual dos direitos e interesses, demandando ativa participação do cidadão na defesa da coletividade. Esta dimensão abrange o Direito à paz, à solidariedade, ao ambiente sadio, os direitos do consumidor, ou seja, interesses massificados, coletivos, metaindividuais.
Para André Ramos Tavares, “a consequência mais veemente do reconhecimento desta categoria foi a de pôr a descoberto a insuficiência estrutural de uma Administração Pública e de um sistema judicial calcados exclusivamente no ideárioliberal, que apenas comporta a referência individual, incapaz que é de lidar com fenômenos metaindividuais”. A doutrina inclusive já sinaliza com a quarta, quinta, sexta e até sétima dimensões de novos e novíssimos direitos, tratando do direito ao pluralismo, à informação, ao patrimônio genético, questões de biodireito, direitos virtuais, dentre outros, todos carecedores de atenção e normatização adequadas. No que tange aos retromencionados interesses transindividuais, o primeiro avanço decorreu da modificação da Lei de Ação Popular (Lei 4717/65), que passou a tutelar como patrimônio público os bens e Direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico e turístico. A seguir, a Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6938/81) tratou da responsabilidade objetiva por danos ambientais, legitimando o Ministério Público para ação de reparação de danos. O marco decisivo coube à Lei de Ação Civil Pública (Lei 7347/85), que tratou da legitimação ativa coletiva, pluralista e concorrente para proteção do ambiente, do consumidor e dos bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico. Com o advento da Constituição Federal de 1988, os direitos coletivos foram alçados à categoria dos direitos e garantias fundamentais, expressos em seu artigo 5º, ao lado dos direitos individuais.
Defende Gregório Assagra de Almeida, que a clássica divisão romana que divide o Direito em Público e Privado não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, a despeito de nosso ordenamento seguir as tradições romanísticas. Ao dispor sobre direitos individuais e coletivos como direitos e garantias fundamentais, o texto constitucional acaba por relativizar a dicotomia anteriormente consagrada entre o interesse público e o interesse privado. Em suas palavras, “no País não há regra prévia de preferência de um Direito ao outro. Ambos, Direito coletivo e individual, encontram-se inseridos como Direitos constitucionais fundamentais. Nas hipóteses concretas podem surgir pontos de tensão entre eles; nesses casos, o princípio (ou postulado) da proporcionalidade é o caminho a ser trilhado em busca da solução do impasse”.
Do individualismo à tutela jurídica ampla e integral, o ordenamento jurídico vem acompanhando os ditames constitucionais e regulamentando interesses que dizem respeito ao bem geral da coletividade. Diversos diplomas legislativos tratam de questões essenciais para o pleno desenvolvimento social, tais como a proteção à pessoa portadora de deficiência, ao idoso, à criança e ao adolescente, ao consumidor, ao meio ambiente, à ordem econômica, ao patrimônio público, à biodiversidade, à ordem urbanística, dentre tantas outras. Percebe-se que os direitos transindividuais decorrem da massificação da sociedade e da complexização das relações intersubjetivas, ultrapassando os limites da esfera de direitos e obrigações de cunho individual e das finalidades egoísticas e projetando-se na ordem coletiva com finalidade altruística. No sistema normativo brasileiro, a divisão e conceituação de categorias de interesses transindividuais são ofertadas pelo Código de Defesa do Consumidor (LEI 8.078/90) em seu artigo 81, que os diferenciam em Direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos.
Para o CDC, interesses difusos são transindividuais, de natureza indivisível, compartilhados por pessoas indeterminadas ligas por circunstâncias de fato. Para Hugo Nigro Mazzilli, “são como um feixe ou conjunto de interesses individuais, de objeto indivisível, compartilhadas por pessoas indetermináveis, que se encontram unidas por circunstâncias de fato concretas”. Com efeito, verifica-se que o interesse difuso concerne a um amplíssimo universo.
Segundo Rodolfo Mancuso, suas características são:
a) A indeterminação dos sujeitos, posto não possuírem titularidade individualizada, mas sim relacionarem- se a um conjunto indeterminável de sujeitos. A tutela jurídica não tem por base a titularidade, mas a relevância social do interesse em si, haja vista que os sujeitos encontram-se ligados por uma relação fática comum;
b) Indivisibilidade do objeto, determinada pela uniformidade de seu conteúdo, sendo que tais interesses são insuscetíveis de repartição em quotas atribuíveis a pessoas ou grupos preestabelecidos;
c) A intensa litigiosidade interna, pois em virtude de serem soltos e desagregados, podem gerar conflitos ente interesses de grupos ligados às mesmas circunstâncias fáticas, não havendo parâmetro axiológico para definir qual posição é “certa” ou “errada”;
d) Transição ou mutação no tempo e no espaço, visto que se não exercitados, modificam-se, acompanhando o evento que os desencadeou. É possível ilustrar o tema, por exemplo, tomando-se o direito ao meio ambiente, compartilhado por um número de pessoas que não é possível precisar, não podendo ser fracionado entre os membros da coletividade, nem ser quantificado o dano sofrido por cada indivíduo.
Por seu turno, os chamados interesses coletivos, nos termos do CDC, artigo 81, II, são transindividuais, de natureza também indivisível, pertencentes a pessoas indeterminadas, porém determináveis, unidas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base. Assim sendo, estão ancorados num portador concreto e determinado, pois seus titulares são sujeitos públicos ou privados, como é o caso das associações, sindicatos, entidades profissionais, dentre outros. Os interesses coletivos abrangem grupos, classes ou categorias de pessoas, ligadas não apenas por circunstâncias fáticas, mas pela identidade de relação jurídica básica. Ilustra a explanação o direito dos advogados possuírem representação na composição de tribunais.
Os interesses individuais homogêneos distinguem-se dos interesses difusos e coletivos tanto em termos subjetivos como objetivos. Quanto ao sujeito, este se encontra perfeitamente individualizado, e sua ligação com os demais sujeitos deve-se ao fato de estarem ligados a Direitos com origem comum. O objeto da pretensão é passível de divisão, sendo possível precisar e quantificar o que é devido a cada lesado, embora tal lesão decorra de uma mesma origem. Exemplifica-se com o direito dos adquirentes de um produto viciado ao abatimento proporcional no preço da mercadoria.
É mister ressaltar que, dada a amplitude e a abrangência dos interesses transindividuais, é até por questões pertinentes à economia processual, faz-se necessário recorrer a uma tutela coletiva dos direitos massificados. O Estado Democrático de Direito pressupõe uma superação dos interesses individualistas e a busca efetiva da igualdade material, não permitindo passivamente a ocorrência de injustiças sociais.
Neste diapasão, sustenta Gregório Assagra de Almeida, que o Estado “tem que atuar para se reestruturar, reestruturando também a sociedade. A sua atuação não é voltada para o indivíduo unicamente ou para o grupo simplesmente, mas para a comunidade, educando-a, conscientizando-a, além de ter que preservar a dignidade da pessoa humana em todos os aspectos da vida – econômico, político, jurídico, moral e biológico
– e abrir igualmente as portas para a participação popular, como fator de sua legitimação político- democrática”.
Interesse e legitimação
Cabe ao Estado Democrático de Direito, pois, a disponibilização de instrumentos eficazes para tutela dos interesses coletivos, para que ocorra a proteção efetiva dos direitos e garantias fundamentais. A resolução coletiva de conflitos potencializa a transformação social, vez que mediante um único processo, o judiciário abarca um enorme contingente de sujeitos unidos por laços jurídicos ou fáticos comuns.
A defesa dos interesses em juízo se dá comumente por legitimação ordinária, pela qual o próprio lesado invoca a tutela jurisdicional para solução de sua lide. Contudo, em sede de interesses transindividuais, é preciso considerar a chamada legitimação extraordinária, para casos específicos em que o Estado permite que a defesa de um direito se faça por intermédio de quem não seja o próprio titular do interesse. É o que ocorre na substituição processual,onde alguns legitimados substituem processualmente a coletividade de lesados, comparecendo em juízo em nome próprio na defesa de interesse alheio.
Na observação de Hugo Nigro Mazzilli, “nas lesões a interesses de grupos, classes ou categorias de pessoas, seria impraticável buscar a restauração da ordem jurídica violada se tivéssemos de sempre nos valer da legitimação ordinária, e, com isso, deixar a cada lesado a iniciativa de comparecer em juízo, diante do ônus que isto representa (não só os relacionados ao custeio da ação, como os de caráter probatório)”.
Outrora desapercebido das repercussões práticas das ações coletivas, o legislador passou a discipliná-las em alguns poucos diplomas, como no caso dos dissídios coletivos da Justiça do Trabalho e na Lei de Ação Popular (L. 4.717/65). Com o advento da Lei de Ação Civil Pública (L. 7.347/85), da Constituição Federal de 1988 e, em especial, do Código de Defesa do Consumidor (L. 8.078/90), as ações coletivas alcançaram novos patamares.
Diversos são os legitimados ativos para a defesa dos interesses coletivos, como a União, Estados, Municípios, órgãos da Administração Pública direta e indireta, associações constituídas há pelo menos um ano, com fins de proteção a interesses socialmente relevantes, mas, a bem da verdade, talvez seja o Ministério público a instituição melhor preparada para a propositura de ações coletivas.
Regulamentado na Carta Magna no título “Da Organização dos Poderes”, inserido no capítulo das “Funções essenciais à justiça”, o Ministério Público erige-se como instituição de defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, ganhando especial relevância no que tange à transformação da sociedade, efetivação da justiça social e do próprio Estado Democrático de Direito. Preconiza a Constituição Federal, em seu artigo 129, III, que é função institucional do Ministério Público promover o inquérito civil e a ação civil pública, para proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos, ganhando a ação coletiva um destaque constitucional. Mais do que um guardião da lei, o Ministério Público revela-se um guardião da sociedade, atuando ativamente na defesa dos interesses ou direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, tanto na esfera preventiva como repressiva, cível ou criminal, buscando a manutenção da ordem pública e a viabilização do bem social. Sua participação é indispensável nas ações coletivas, ainda que não figure como autor das mesmas.
Categorias Fundamentais do Direito: Direito Objetivo e Direito Subjetivo
OBJETIVO DA AULA: VEREMOS NESTE CAPITULO QUE O DIREITO OBJETIVO É A REGRA. O DIREITO SUBJETIVO É A TRANSFUSÃO DA REGRA ABSTRATA NO DIREITO CONCRETO DE CADA PESSOA.
O Direito Objetivo e o Direito Subjetivo, não são duas realidades distintas, mas dois lados de um mesmo objeto. Entre eles não há uma antítese ou oposição. Haja vista que o direito vigente pode ser analisado sob dois ângulos distintos, a saber, objetivo e subjetivo. Se olharmos do ponto de vista objetivo, o direito à de ser a norma de organização social, é a norma jurídica – norma agendi -. O direito subjetivo é a faculdade, as possibilidades ou poderes de agir que a ordem jurídica garante ao titular da norma. É o próprio direito faculdade – facultas agendi -. O direito subjetivo é o reconhecimento pelo Direito objetivo de um interesse, seja ele qual for. O direito subjetivo é a faculdade, a prerrogativa concedida pelo Direito objetivo. O direito subjetivo é um direito personalizado, em que a norma perdendo o seu caráter teórico, projeta-se na relação jurídica concreta, a fim de permitir uma conduta ou estabelecer consequências jurídicas. Por exemplo: quando dizemos que “fulano tem direito à indenização”, afirmamos que ele possui direito subjetivo. A partir do Direito objetivo que deduzimos os direitos subjetivos de cada parte dentro de uma relação jurídica.
A expressão direito subjetivo se explica e se justifica, porque o direito nessa acepção é realmente um poder do sujeito. O art. 7º do Código de Processo Civil reza que “Toda pessoa que se acha no exercício dos seus direitos tem capacidade para estar em juízo”. Esse é um exemplo de direito subjetivo, ou seja, a faculdade que o Código de Processo Civil confere a alguém para fazer valer um direito de que é titular.
Compete à norma jurídica ordenar tais faculdades humanas, logo o uso dessas faculdades é licito ou ilícito, conforme lhe for permitido ou proibido. Portanto, o direito subjetivo é a permissão para o uso dessas prerrogativas humanas. Por exemplo: todos têm a faculdade de ser proprietário, porém essa faculdade não é mera faculdade de ser proprietário, mas a permissão, dada a quem é proprietário, de usar, gozar e dispor de seus bens, conforme dispõe o art. 1228, caput, do Código Civil 2002. O Direito Objetivo de ser proprietário pode ser vislumbrado no art. 5º, XXII, da Constituição Federal 1988, o qual reza “é garantido o direito de propriedade”.
Existem várias teorias no campo da ciência do Direito que se preocupam em explicar a natureza jurídica do direito subjetivo, que vão desde a negação de sua existência até a confirmação. Veremos agora algumas teorias ou correntes principais natureza jurídica do Direito Subjetivo.
TEORIA DA VONTADE
De Savigny e Windscheid, que entende que o direito subjetivo é o poder da vontade reconhecido pela ordem jurídica; o direito subjetivo é a expressão da vontade, a sua existência fica sempre na dependência da vontade do titular. Em suma, o direito subjetivo é a vontade juridicamente protegida. É o poder de querer.
A crítica à referida teoria surge na medida em que a existência do direito subjetivo nem sempre depende da vontade do titular:
1. os incapazes, tanto os menores como os privados de razão e os ausentes, apesar de não possuírem vontade no sentido psicológico, têm direito subjetivo e os exercem por meio de seus representantes legais;
2. o credor pode não pretender cobrar o devedor. O direito subjetivo subsiste apesar do titular não exercê-lo. O fato do não exercício não implica na extinção do direito subjetivo. Dessa forma, verificamos claramente que o direito subjetivo pode existir apesar de seus titulares não possuírem vontade no sentido psicológico ou vontade juridicamente reconhecida.
TEORIA DO INTERESSE
De Rudolf Von Ihering, para o qual o direito subjetivo é o interesse juridicamente protegido por meio de uma ação judicial. Maria Helena Diniz, argumenta “não se diga, também, que o direito subjetivo é interesse juridicamente protegido porque há interesses, protegidos pela lei, que não constituem direitos subjetivos”. A teoria do Interesse, também, chamada de teoria objetiva em oposição à teoria subjetiva, afirmava que o direito subjetivo seria “o interesse juridicamente protegido”, não sendo mais definido como a vontade juridicamente protegida. Ihering, apontava a presença de dois elementos no direito subjetivo, a saber, o elemento interno e o externo. O elemento interno é o direito subjetivo que carrega o interesse. O elemento externo carrega a proteção do Direito, ou seja, os remédios jurídicos que o Estado concede a pessoa para a defesa de seus direitos. O direito subjetivo é esse “interesse enquanto protegido”, o referido autor define o direito objetivo como a soma dos princípios jurídicos aplicados pelo Estado, a ordem legal da vida. E o direito subjetivo, como a transfusão da regra abstrata no Direito concreto da pessoa interessada.Podemos então verificar que não existe interesse sem vontade, assim, as criticas feitas á teoria subjetiva são repetidas na teoria objetiva, com pequenas variações. O nascituro, por exemplo, não tendo vontade não pode chegar a ter interesse, segundo essa teoria.
TEORIA MISTA OU ECLÉTICA
De Georg Jellinek, que define o direito subjetivo como o poder da vontade reconhecido e protegido pela ordem jurídica, tendo por objeto um bem ou interesse. Esta teoria surge da conjugação dos dois elementos: vontade e interesse. Assim,o direito subjetivo seria o bem ou interesse protegido pelo reconhecimento do poder da vontade. Nítida é a correlação existente entre o direito objetivo e o subjetivo. Apesar de intimamente ligados, são inconfundíveis.
As criticas feitas isoladamente à teoria da vontade e á dos interesse foram acumuladas na teoria eclética. Ensina Miguel Reale, “o ecletismo é sempre uma soma de problemas, sem solução para as dificuldades que continuam nas raízes das respostas, pretensamente superadas. As mesmas objeções feitas, isoladamente, à teoria da vontade e à do interesse, continuam, como e claro, a prevalecer contra a teoria eclética de Jellinek”.
Ornamento Jurídico: A Perspectiva Monista
VEREMOS NESTE CAPÍTULO QUE O ORDENAMENTO JURÍDICO É O CONJUNTO DE NORMAS EMANADAS PELO ÓRGÃO COMPETENTE, VINCULADO AO PODER POLÍTICO HEGEMÔNICO EM UMA SOCIEDADE DETERMINADA.
O Monismo é um modelo técnico, formal, preocupado com a legalidade e o reducionismo normativista para garantir a hegemonia do Estado “juiz” e frear as manifestações concomitantes com a imposição estatal. Surge com o esgotamento do feudalismo e emergência burguesa, sendo um instrumento de desenvolvimento socioeconômico no qual o capital é o instrumento principal, e posteriormente vai servir de arma para a manutenção do poder burguês que ascende e deseja a supremacia de seus valores.
O monismo esta centrado no interesse individual, por meio de um Estado soberano, correspondendo à sistematização dogmática do monismo jurídico, em que se torna perceptível a gradativa postulação do Direito Estatal ao Direito positivo; consagrando assim a explicação de que todo o direito não só é Direito enquanto produção do Estado, mas, sobretudo, de que somente o Direito positivo é verdadeiramente Direito, haja vista, o reflexo do senso comum segundo o qual o direito significa “conjunto de normas obrigatórias, dotadas de sanção e coação e reconhecidas pelo Estado”. E segundo esse entendimento, não são jurídicas as ordens normativas existentes em uma penitenciária, em uma favela ou em uma quadrilha do crime organizado, pois ela somente considera como jurídicas as normas cuja validade é admitida pelos órgãos estatais e o vinculo entre Direito e Estado é tão grande, que para grande parte dos juristas, não é admissível falar de direito fora do Estado, único com o poder de legislar.
Como exemplo disso, podemos dizer que mesmo nos casos de normas que são criadas pelo poder político centralizado, como os costumes e os contratos, o senso comum somente às reconhece como jurídicas quando são elas reconhecidas pelo poder estatal.
Temos, pois, que, dessa forma, se percebe que no senso comum dos operadores do Direito ou juristas consideram:
a. que o Direito depende de coação e;
b. que a coação é monopólio do Estado e, partindo dessas premissas, concluem que o Direito é monopólio do Estado.
Porém, essa afirmativa tende a não ser confirmada por análises sociais desvinculadas da necessidade ideológica de contribuir para manutenção do poder estatal.
Na época em que os diferentes instrumentos de controle social ainda se mantinham indiferenciados, era comum o legislador disciplinar os mais simples fatos do trato social. Por exemplo, em Esparta, conforme relato de Fustel de Coulanges, o penteado feminino era previsto em lei; as mulheres, em Atenas, não podiam levar consigo mais de três vestidos em viagem; enquanto a lei espartana proibia o uso do bigode, a de Rodes impedia que se fizesse a barba. Percebemos, portanto, o monopólio Estatal para ditar regras, até os costumes elevados à norma jurídica, a fim de fazê-la cumprir de forma coercitiva.
A ideia básica, fundamento da teoria do ordenamento, leva a supor que as normas do ordenamento jurídico estão dispostas numa ordem sistemática. O sentido de uma norma não está, portanto, somente nos termos que expressam sua articulação sintática, mas também em sua relação com outras normas. Em outras palavras, entende-se que o Direito é composto pelo conjunto organizado de regras diretoras, os princípios, que presidem o sistema e as regras simples que perfazem o todo sistemático. O Direito, portanto, é um sistema que se caracteriza pela disposição organizada e hierárquica de princípios e normas.
O sistema jurídico é um todo, composto de estrutura e de repertório, ou seja, o repertório é o conjunto de normas jurídicas; e a estrutura é o conjunto de regras que demonstram as relações existentes entre as normas.
O sistema jurídico é, fundamentalmente, o conjunto de normas jurídicas válidas, dispostas numa estrutura hierarquizada. Norma jurídica válida é aquela emanada de autoridade competente, ou seja, o Estado. E a competência da autoridade competente é determinada pelas próprias Leis. Sendo, portanto, o ordenamento jurídico um sistema unitário de normas dispostas numa estrutura hierarquizada. Hierarquia é um conjunto de relações estabelecidas conforme regras de subordinação. Estas regras não são normas jurídicas, noutras palavras, não fazem parte do repertorio, mas sim da estrutura do sistema.
São regras estruturais:
1. o princípio da Lei superior: regra segundo a qual a norma que dispõe sobre a edição de outras normas prevalece sobre estas;
2. o princípio da Lei posterior: regra segundo a qual havendo normas contraditórias, desde que do mesmo
nível hierárquico, prevalece a que, no tempo, apareceu por ultimo;
3. princípio da Lei especial: regra segundo a qual a norma especial prevalece sobre a geral, no que dispõe especificamente.
Portanto, o monismo jurídico, segundo o senso comum dos operadores do Direito ou juristas, opta pela posição dada por Kelsen “se uma ordem de coação é limitada no seu domínio territorial de validade a um determinado território e, dentro desse território, é de tal forma eficaz que exclui toda e qualquer outra ordem de coação, pode ela ser considerada como ordem jurídica e a comunidade através dela constituída como Estado”. Podemos, perceber, assim, que o jurista austríaco entende que apenas podemos chamar de jurídico o conjunto de normas vinculadas ao poder político hegemônico em uma sociedade determinada.
Ordenamento Jurídico: O Pluralismo Jurídico
VEREMOS NESTE CAPÍTULO QUE O PLURALISMO JURÍDICO VOLTA-SE CONTRA AS TEORIAS MONISTAS DO ORDENAMENTO JURÍDICO. OS PLURALISTAS ENTENDEM QUE HÁ UMA SUPERPOSIÇÃO DE ORDENAMENTOS JURÍDICOS, DE LINHA SOCIOLÓGICA.
Contra as teorias monistas, que hodiernamente, dominam a cena jurídica, voltam-se as teorias pluralistas, sustentando que, para cada organização social que possua certa parcela de poder político, existe um ordenamento jurídico correspondente.
Os pluralistas sustentam que existe uma superposição de ordenamentos jurídicos dentro de uma mesma sociedade, cada qual ligado a uma determinada organização social, e, assim, ao contrário dos monistas, que somente consideram jurídicas as ordens normativas hegemônicas, os pluralistas consideram que, ao lado do Direito estatal e oficial, existe uma série de ordenamentos jurídicos paralelos, não-estatais e não-oficiais, cada qual vinculado a um determinado grupo socialmente organizado.
As teorias pluralistas têm origem em correntes jurídicas de linha sociológica, que, observando as formas de organização das sociedades, concluíram que não havia qualquer critério razoável para a distinção entre normas cuja validade é reconhecida pelo Estado e regras cuja validade é reconhecida por outras instituições sociais.
Das sociedades globais surgem os sistemas ou ordens jurídicas, como o sistema jurídico americano, o germânico ou feudal. Dos grupos sociais particulares surgem os ordenamentos jurídicos ou as chamadas normas de direito não-estatal, com características peculiares de cada grupo, como o Estatuto de um Clube, Código de Ética Médica, Empresa e Sindicato.
Ao estudarmos os ordenamentos desses grupos sociais particulares, vislumbramos claramente a existência de um Poder Legislativo, que cria normas, ao lado de um Poder Jurisdicional, que aplica a norma, e que se exercem dentro da esfera da instituição. Cabe anotar que a existência desse direitonão estatal dá-se apenas nos Grupos Sociais Particulares Institucionalizados, ou seja, que possuem a característica de instituição. A instituição é o organismo que perpetua-se no meio social, configurando-se pela sua organização e finalidade própria e que não se confunde com a vida individual de seus membros.
Assim, a cada Grupo Social Particular Institucionalizado, surge um correspondente ordenamento jurídico, com características próprias. Estas caminham ao lado do direito estatal, tendo, portanto, norma não- estatal, as quais são erigidas à verdadeira manifestação de direito. Daí o porque, para o pluralismo jurídico existe dentro da vida social uma pluralidade de ordenamentos. André Franco Montoro elenca como
manifestações importantes desse direito: o direito social comum; o direito social do trabalho; o direito social do esporte; o direito social da igreja; o direito social da escola; o direito social da família; e, em um plano diferente, mas com características semelhantes, o direito social internacional.
Com o desenvolvimento da vida social a existência do direito não estatal é uma realidade que não pode ser encoberto, ou seja, é solar. Duas são as características principais do direito não estatal:
a) as normas dos Grupos Sociais Particulares são aplicadas e elaboradas pelo próprio grupo. Dessa forma, os grupos institucionalizados apresentam um poder legislativo, que é o responsável pela produção ou elaboração das normas interna corporis; e um poder jurisdicional que é o responsável pela aplicação das referidas normas;
b) o direito não-estatal é reconhecido pelo Estado, na medida em que é coeso com ele, fazendo pois parte do sistema jurídico.
No Brasil, um dos principais estudos sobre o pluralismo jurídico foi realizado pelo sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, que, na década de 70, analisou a ordem interna de uma favela do Rio de Janeiro. Ao avaliar as causas da situação precária do direito não oficial interno e informal, gerido pelos moradores, conclui Boaventura que “a situação de pluralismo tem lugar sempre que as contradições se condensam na criação de espaços sociais, mais ou menos segregados, no seio dos quais se geram litígios ou disputas processados com bases em recursos normativos ou institucionais internos”.
Entre os vários ordenamentos paralelos, a maioria não se opõe diretamente à ordem estatal. No caso de incompatibilidade com a ordem estatal, não há dúvida de que tais ordenamentos devem ser considerados ilegais, haja vista que ilegal significa contrário à lei e Lei significa norma jurídica criada pelo Estado. Todavia, dentro de uma teoria pluralista, legal e jurídico não são palavras sinônimas, na medida em que uma norma é jurídica quando admitida por um ordenamento jurídico qualquer e é legal quando reconhecida especificamente pelo ordenamento jurídico Estatal.
Ordenamento Jurídico: as Fontes do Direito
VEREMOS NESTE CAPITULO O QUE SÃO FONTES DO DIREITO COMO AQUELES FATOS OU ATOS AOS QUAIS UM DETERMINADO ORDENAMENTO JURÍDICO ATRIBUI A COMPETÊNCIA OU A CAPACIDADE DE PRODUZIR NORMAS JURÍDICAS.
A evolução da vida social traz em si novos fatos e conflitos, de modo que os legisladores, diariamente, passam a elaborar novas Leis, juízes e Tribunais, de forma constante estabelecem novos precedentes, e os próprios valores sofrem mutações,devido ao grande e peculiar dinamismo da vida.
O termo fonte do direito é empregado metaforicamente, pois em sentido próprio fonte é a nascente de onde brota uma corrente de água. Nelson Saldanha nos ensina que a expressão latina fons et origo aponta para a origem de algo, origem no sentido concreto do ponto de partida.
Fonte material ou real: os fatores que condicionam a gênese e o conteúdo da norma jurídica. Exemplo: a realidade social, o complexo dos fatores econômicos,cultural, políticos, religiosos que condicionam tanto na elaboração quanto na aplicação do Direito, também, os valores ou a ideologia que direciona o Direito.
Fonte formal: como fundamento de validade da ordem jurídica, os canais por onde se manifestam as fontes materiais, meios de expressão do Direito.
As normas que formam o Direito Positivo não têm uma origem única, elas podem ter origem na atividade legislativa e jurisdicional do Estado como podem ser criadas sem a intervenção direta de um órgão estatal. Chamamos como Fontes do Direito cada um dos diversos processos de criação de normas jurídicas, entendidas como regras heterônomas e coercitivas que são impostas a uma determinada sociedade.
O positivismo jurídico reduz direito a um conjunto de normas emanadas do Estado. Dessa forma, o Estado seria a única fonte do Direito, vez que as fontes da norma jurídica são unicamente aquelas elaboradas e formalizadas pelos órgãos do Poder Público.
Parte da doutrina juspositivista é baseada no princípio da prevalência de uma determinada fonte do Direito, isto é, aquela que emana direitamente do Estado, a LEI, que esta sobre todas as outras.
Hans Kelsen é o principal teórico do positivismo jurídico. Em sua obra Teoria Pura do Direito, defende a autonomia da ciência jurídica ao conferir-lhe método e objeto próprios, capazes de assegurar o conhecimento cientifico do direito. Para isso, estabelece um princípio metodológico, o principio da pureza, com o qual pretende reduzir a complexidade do objeto do Direito ao afastar da ciência jurídica as ingerências intrusas e perturbadoras, de ordem epistemológica, qual seja, a sociologia, antropologia, axiologia etc. Para Kelsen, o objeto da ciência jurídica consiste em normas jurídicas, e a tarefa do jurista consiste em descrever esse objeto mediante proposições.
Para Marcus Acquaviva, a doutrina tradicional enumera três espécies de fontes do direito: 1) fontes materiais; 2) fontes históricas; e 3) fontes formais.
1. As fontes materiais são todos os fatores sociais representados pelas necessidades políticas, econômicas e culturais, bem assim fatores naturais, como o clima e o relevo. Constituem a matéria-prima da elaboração do direito.
2. As fontes históricas são todos os documentos jurídicos e coleções legislativas do passado que, devido à sua importância e sabedoria, continuam a influenciar as legislações do presente, por exemplo, a Lei das Doze Tábuas, o Código de Hamurábi
3. As fontes formais são a Lei, os costumes, a doutrina e a jurisprudência.
François Geny parte da noção que o Direito não é essencialmente um dado, mas uma construção elaborada no interior da cultura humana. A partir, dessa noção estabelece dois tipos básicos de fontes: materiais e formais.
Fontes Materiais: correspondem ao dado, ou seja, os elementos –materiais, históricos, morais, econômicos- que não são prescrições, mas que contribuem para a formação do direito. Nesse sentido, as fontes materiais são constituídas pelos fatos sociais, pelos problemas morais, econômicos, históricos, geográficos que emergem da sociedade.
Fontes Formais: corresponde ao construído, ou seja, os meios técnicos de elaboração e expressão do Direito, as formas pelas quais as normas jurídicas se exteriorizam.
Por outro lado, a dogmática costuma classificar as fontes formais em:
Fontes formais estatais: Legislação – Constituição, Leis, Decretos, Regulamentos, Portarias etc; Jurisprudência (conjunto de decisões uniformes e constantes dos tribunais), Tratados e Convenções internacionais.
Fontes formais não estatais: Doutrina (atividade cientifica dos juristas), práticas consuetudinárias (costumes negativos, costumes para suprir lacunas na lei), para que seja caracterizado um costume, é preciso que se conjuguem três elementos:
a) deve haver um padrão de comportamento reiterado, entre os membros de um determinado grupo;
b) esse comportamento deve ser repertido por um número significativo de membros da comunidade, pois o costume não é um fenômeno individual, mas uma atitude coletiva;
c) deve haver um certo consenso sobre a obrigatoriedade da conduta, pois não se trata de um mero hábito, mas de uma norma social que pode ser exigida.
Prosseguindo, o Poder Negocial (contratos entre empresários), podernormativo dos grupos sociais (Igreja, clube, sindicato etc.).
O Direito contemporâneo conclui que o Estado não detém o monopólio da elaboração das normas jurídicas, visto que estas emergem dos vários grupos sociais particulares contidos no Estado, muito embora limitado em seu âmbito.
Conforme aponta André Franco Montoro,
“ao lado das normas jurídicas elaboradas pelo Estado, existem outras normas efetivamente obrigatórias e exigíveis, de origem não-estatal. São elaboradas pelos diferentes grupos sociais e destinadas a reger a vida interna desses grupos. Esses ordenamentos jurídicos, elaborados por diferentes grupos sociais e não pelo Estado, constituem também fontes do direito, embora em caráter subsidiário e, em regra, desde
que não colidam com a legislação em vigor”.
Nesse diapasão, salutar o ensinamento de Maria Helena Diniz, ao explicar que:
“vários são os grupos, mas todos pertencem a uma sociedade global, que é a sociedade política; múltiplas são as ordenações jurídicas (direito estatutário, direito esportivo e direito religioso), mas todas são vistas como partes de uma mesma ordem jurídica. Assim sendo, é necessário que as normas dos agrupamentos sociais ocupemum lugar apropriado
no ordenamento jurídico da sociedade política. Uma norma só terá juridicidade se estiver apoiada na ordenação da sociedade política; portanto o Estado desempenha o papel de fator de unidade normativa da nação. De um lado se tem um pluralismo de ordenações
jurídicas e, de outro, a unidade da ordem normativa”.
Temos assim:
Fontes Estatais: Legislativas (leis, decretos, regulamentos etc.); Produção Jurisprudencial (sentenças, precedentes judiciais, súmulas etc.); e Convenção Internacional (tratados e convenções internacionais).
Fontes Não-estatais: Direito consuetudinário (costume jurídico, secundum legem, preater legem, contra legem); Direito científico (a doutrina atividade científico-jurídica); Poder negocial (negócios jurídicos e as convenções em geral); Poder normativo dos grupos sociais.
Ordenamento Jurídico: Completude e Integração do Direito
VEREMOS NESTE CAPITULO QUANTO ÀS LACUNAS JURÍDICAS, E DO PONTO DE VISTA PRATICO HÁ O POSTULADO DA PLENITUDE DA ORDEM JURÍDICA, TODAVIA, QUANDO CARECER DE LEGISLAÇÃO O QUE HÁ DE SE FAZER PARA PREENCHER A LACUNA LEGAL.
Se existem divergências no âmbito doutrinário quanto às lacunas legais, do ponto de vista prático, vigora o postulado da plenitude da ordem jurídica, em que o Direito Positivo é pleno de respostas e soluções para todas as questões que surgem no meio social.
Por mais inusitado e imprevisível que seja o assunto, e desde que submetido a apreciação judicial, deve ser julgado à luz do direito vigente. Principio consagrado no art. 5º, XXXV, “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;” da Constituição Federal/88. O Princípio consagrado de que os juízes não podem deixar de julgar, sob a alegação de inexistência de normas aplicáveis ou de que são obscuras. O Código de Processo Civil dispõe no art. 126, “O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei...” haja vista que se o juiz pudesse deixar de conhecer uma causa, sob qualquer um daqueles fundamentos estaria comprometida a segurança jurídica.
O art. 4º da LINDB, em ordem de preferência, indica os meios dos quais o magistrado dispõe para solucionar os casos, reza o referido artigo “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais do direito.”
Como vimos, a concepção do ordenamento como sistema dinâmico envolve o problema de saber se este tem a propriedade peculiar de qualificar normativamente todos os comportamentos possíveis ou se, eventualmente, podem ocorrer condutas para as quais o ordenamento não oferece qualificação.
A integração é um processo de preenchimento de lacunas, existentes na lei, por elementos que a própria legislação oferece ou por princípios jurídicos, mediante operação lógica e juízos de valor.
A doutrina distingue a auto-integração, que se opera pelo aproveitamento de elementos do próprio ordenamento jurídico, conhecida como a heterointegração, que se faz com a aplicação de normas que não participam da legislação, como é a hipótese, por exemplo, do recurso às regras estrangeiras, como entende Miguel Reale. A integração se processa por meio da Analogia e princípios gerais do direito.
O trabalho de elaboração legislativa por mais bem planejadas que sejam, não conseguem acompanhar a dinâmica social, pois esta sempre cria novas situações, estabelece novos rumos e improvisa circunstâncias. Ainda que se recorra ao processo de interpretação evolutiva do Direito vigente, muitas situações escapam inteiramente aos parâmetros legais.
A lacuna se caracteriza não só quando a lei é completamente omissa em relação ao caso, mas igualmente quando o legislador deixa o assunto a critério do julgador.
A integração da lei não se confunde com as fontes formais, nem com os processos de interpretação do Direito. Os elementos de integração não constituem fontes formais porque não formulam diretamente a norma jurídica, apenas orientam o aplicador para localizá-las.
Os romanos já admitiam a possibilidade das lacunas, tanto quanto ao Direito legislado quanto ao costume conforme se pode inferir do texto de Justiniano Nequeleges, nequesenatusconsulta ita scribipossunt ut omnes casus qui quando inciderint, comprehendentur(nem as leis, nem os senatus-consultos podem ser escritos de tal sorte que todos os (casos) que acontecerem estejam nelas compreendidos).
Por outro lado o princípio da ausência de lacunas foi interpretado por grande parte dos juristas positivistas como uma ficção de política jurídica, ou, pelo menos da ciência do Direito.
É necessário compreender que, entre os momentos de integração sistemática, nem sempre é possível estabelecer cortes rígidos, aliás, incompatíveis com a dialética da experiência jurídica. Não há dúvida, porém, que, no cumprimento de sua nobre obrigação de não deixar postulação a Direito sem resposta, segundo o princípio da plenitude do ordenamento jurídico não falta ao juiz meios técnicos adequados. Haja vista que o Direito como experiência, deve ser pleno, e muitos são os processos por meio dos quais o magistrado ou o administrador realizam a integração da lei para atingir a plenitude da vida.
Ordenamento Jurídico: Antinomia; Antinomias entre Princípios
RELEVÂNCIA DO ESTUDO: A ANTINOMIA É A PRESENÇA DE DUAS NORMAS CONFLITANTES, VÁLIDAS EMANADAS DE AUTORIDADE COMPETENTE. QUAL DEVERÁ PREVALECER AO CASO CONCRETO?
No presente tópico abordaremos o estudo das Antinomias Jurídicas, com o surgimento de uma Lei nova ganha relevância o estudo das Antinomias, também chamadas lacunas de conflito. Partindo da premissa que o ordenamento jurídico é um sistema aberto, em que há lacunas na Lei, como já ressaltamos no tópico das Fontes do Direito. Desta forma a Antinomia Jurídica é a presença de normas conflitantes, válidas emanadas de Autoridade competente, sem que se possa dizer qual delas merecerá aplicação em determinado caso concreto.
Nas palavras de Maria Helena Diniz em sua Obra intitulada Conflito de Normas, ela nos diz que não há duvidas que este estudo será fundamental para a compreensão dos novos conceitos privados que emergiram com a nova Codificação.
IMPORTANTE LEMBRAR
Quando analisamos Antinomias Jurídicas, três critérios devem ser levados em consideração para a solução do conflito, quais sejam:
1. Critério Cronológico- norma posterior prevalece sobre norma anterior;
2. Critério da Especialidade- norma especial prevalece sobre norma geral;
3. Critério Hierárquico- norma superior prevalece sobre norma inferior.
É importante destacar que nós temos no Ordenamento Jurídico Antinomias de Primeiro e Segundo grau a destacar:
1) Antinomia de Primeiro Grau: Conflito de Normas que envolve apenas um critério exposto, como acima abordado.
2) Antinomia de Segundo Grau: Conflito de Normas que envolve dois critérios expostos, como acima abordado.
Existindo a possibilidadede solução conforme os critérios abordados, é importante destacar a Antinomia Real e Antinomia Aparente.
Antinomia Real é a situação em que não há um critério para solução do conflito, pelo menos aparentemente, dentre os critérios que expomos.
Antinomia Aparente é a antinomia que há critério(s) para solução do conflito, dentro dos que abordamos. Diante desta analise, vamos analisar alguns casos práticos para melhor entender.
No caso de existir um conflito de norma posterior e norma anterior, valerá a primeira pelo critério cronológico, antinomia de primeiro grau aparente.
No caso de existir norma especial esta deve prevalecer sobre norma geral, emergencial que é o critério da
especialidade, também antinomia de primeiro grau aparente.
Existindo conflito entre norma superior e norma inferior, prevalecerá a primeira pelo critério hierárquico, também antinomia de primeiro grau aparente.
Passamos as Antinomias de segundo grau, vejamos:
Quando temos um conflito de uma norma especial anterior e uma norma especial posterior, prevalecerá o critério da especialidade, valendo a primeira norma.
Existindo conflito entre norma superior anterior e outra inferior posterior, prevalece a primeira, critério
hierárquico, caso também de antinomia de segundo grau aparente.
Existindo um conflito entre uma norma geral superior e outra norma especial para esta questão Maria Helena nos diz:
“ No conflito entre critério hierárquico e o da especialidade, havendo uma norma superior geral e outra norma inferior especial, não será possível estabelecer uma regra geral. Poder-se-á preferir qualquer um dos critérios , não existindo portanto, qualquer prevalência. Norberto Bobbio argumenta que dever-se-á optar pelo hierárquico. Uma lei constitucional geral deverá prevalecer sobre uma lei ordinária especial, pois se admitisse o principio de que uma lei ordinária especial pudesse derrogar normas constitucionais, os princípios fundamentais do ordenamento jurídico estariam destinados a esvaziar-se rapidamente de seu conteúdo. Mas, na pratica a exigência de adotarem as normas gerais de uma Constituição a situações novas levaria as vezes à aplicação de uma lei especial, ainda que ordinária sobre a Constituição.”
Na realidade o critério da especialidade e muito importante, pois o artigo 5º da Constituição Federal de 1988, consagra em seu artigo supra citado(caput) o principio da igualdade da isonomia, todavia a Lei garante tratamento desigual para os desiguais. Assim o critério da especialidade prevalecerá sobre o cronológico, estando justificando a razão pelo próprio texto Constitucional.
Diante destas premissas, podemos entender que ao encontrarmos uma situação de antinomia o Juiz poderá firmar sua convicção com base nos artigos 4º e 5º LINDB, adotando uma das duas normas para solucionar o problema. Seria o principio da máxima Justiça, deve o juiz buscar a função social da norma as exigências do bem comum, para se chegar à justiça social.
Direito e política judiciária: A interpretação e a aplicação do direito
DEMONSTRAR A NECESSIDADE DE INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICAS.
Interpretar uma Norma é fixar seu verdadeiro alcance e sentido. HERKENHOFF define que interpretar é apreender ou compreender os sentidos implícitos das normas jurídicas. Interpretar uma LEI é revelar o pensamento que anima as suas palavras. Desta forma temos três elementos que integram o conceito de interpretação:
1- Revelar o seu sentido-conhecer o significado das palavras 2- Fixar o seu alcance –delimitar o seu campo de incidência
3- Norma jurídica – no sentido de Leis, que precisam ser interpretadas.
A função de interpretar uma Lei no passado era conferida ao Imperador, pois somente ele teria competência para isso. Hoje a possibilidade agregada a necessidade de interpretação das normas jurídicas hão de ser reconhecidas mesmo em relação aquelas normas entendidas como claras. Sendo assim brocardo latino “ in claris cessat interpretatio” (dispensa a interpretação quando o texto é claro) revela não haver necessidade de interpretação quando a norma é clara.
Essa premissa não existe para o mundo jurídico, pois mesmo clara uma LEI sempre se faz necessário sua interpretação. O conceito de clareza é muito relativo e subjetivo, ou seja, o que parece claro para alguém pode ser obscuro para outrem.
Não existe um critério único da boa e correta interpretação como nos ensina FERRAZ JR (xvi), o critério da boa e correta interpretação no Direito privilegia o enfoque entre muitos que uma escolha socialmente prevalecente.
Quando nos valemos das disposições legais estamos aplicando o Direito no sentido comum da palavra. Todavia quando a aplicação é feita por uma autoridade administrativa ou judicial, que tem o dever de ofício, esta interpretação se reveste de um sentido técnico. Assim, consiste em submeter o fato concreto a norma que o regula. A aplicação transforma a norma geral e abstrata em norma individual e concreta, na forma de sentença ou decisão administrativa. A aplicação do Direito consiste em encaixar um caso concreto a norma adequada. Miguel Reale, destaca que os problemas de eficácia do Direito e sua aplicação, embora distintos correlacionam-se intimamente. Com efeito, quando o juiz aplica uma norma jurídica, concretiza-se sua eficácia, produzindo efeitos entre as partes. Assim aplicar significa assegurar eficácia a uma regra.
As transformações na realidade social são dinâmicas. Os legisladores não conseguem acompanhar com as normas jurídicas estas dinâmicas. Portanto, quando surge um caso que não está previsto pelas normas jurídicas , ou quando para tal fato não há uma norma adequada estamos diante de uma lacuna que deve ser
preenchida pelo aplicador mediante a integração do Direito, se valendo das fontes do Direito para preencher estas lacunas. E assim termos a solução para o caso concreto, como menciona o próprio artigo 4º da LINDB.
Direito e Realidade Social
VEREMOS NESTE TÓPICO A SOCIABILIDADE HUMANA, A DEPENDÊNCIA ENTRE O DIREITO E A SOCIEDADE, HAJA VISTA A INTERAÇÃO SOCIAL E A AÇÃO DO DIREITO.
Aristóteles ao examinar o fenômeno da sociabilidade humana, considerou o homem fora da sociedade como um bruto ou um deus, significando algo inferior ou superior à condição humana. O homem viveria alienado, sem discernimento próprio ou, na segunda hipótese, o homem viveria como um ser perfeito, condição não alcançada por ele.
É na sociedade, e não fora dela, que o homem encontra o complemento necessário ao desenvolvimento de suas faculdades, de todas as potencias que carrega em si. Por não conseguir a auto-realização, concentra os seus esforços na construção da sociedade, se habitat e que representa o grande empenho do homem para adaptar o mundo exterior às suas necessidades de vida.
Os seres humanos e os grupos sociais se relacionam estreitamente, na busca de seus objetivos. A interação social, formada pelos processos de mútua influência, de relações interindividuais e intergrupais que se formam sob a força de variados interesses. A interação social se apresenta sob as formas de cooperação, competição e conflito e encontra no Direito a sua garantia, o instrumento de apoio que protege a dinâmica das ações.
O Direito está em função da vida social, a finalidade dele é a de favorecer o amplo relacionamento entre as pessoas e os grupos sociais, que é uma das bases do progresso da sociedade. Ao fazer uma distinção entre o licito e o ilícito, segundo valores de convivência que a própria sociedade elege, o ordenamento jurídico torna possíveis os liames de cooperação e disciplina a competição, estabelecendo as limitações necessárias ao equilíbrio e à justiça nas relações. No que tange ao conflito, a ação do Direito se opera em duplo sentido, de um lado preventivamente, ao evitar desentendimentos quanto aos direitos que cada parte julga ser portadora. Isto se faz mediante a correta e perfeita definição do Direito, que deve ter na clareza, simplicidade e concisão das suas regras, algumas de suas qualidades. De outro lado, frente ao conflito concreto, o Direito apresenta soluçãode acordo com a natureza do caso, seja ele para definir o titular do direito, determinar a restauração da situação anterior ou aplicar penalidades dos mais diversos tipos.
O silogismo da sociabilidade expressa os elos que vinculam o homem, a saber, a sociedade e o direito: Ubi homo, ibi societas; ubi societas, ibi jus; ergo,ubi homo, ibi jus (onde está o homem, há sociedade; onde há sociedade, há o Direito) .
Em nosso hodierno estágio de conhecimento cientifico sobre o estudo do Direito, tem predominado o entendimento de que não há sociedade sem Direito, ubi societas, ibi jus. Isto por que se entende ter o Direito importante função na sociedade como: coordenar e organizar as relações na vida social. Pellegrini diz que “A tarefa da ordem jurídica é exatamente a de harmonizar as relações sociais intersubjetivas, a fim de ensejar a máxima realização dos valores humanos com o mínimo de sacrifício e desgaste.” O Direito manifesta-se assim como corolário inafastável da sociedade.
Vivemos em uma sociedade em que a informação se tornou objeto valorativo central contemporâneo, surgindo a sociedade da informação. Marcada pelo avanço tecnológico do tratamento da informação.
Sociedade da informação se contempla com o efeito de uma mudança ou deslocamento de paradigma nas estruturas industriais e nas relações sociais, tal como vimos na Revolução Industrial que modificou, no último quarto do século XIX, as sociedades de fundamento essencialmente agrário. A sociedade da informação designa uma nova forma de organização da economia e da sociedade.
O Direito informacional é, portanto, o conjunto de institutos jurídicos que convergem para a tutela da informação. Maria Eduarda Gonçalves diz “o Direito da informação agrupará, assim, as normas e princípios jurídicos cujo objecto são as relações jurídicas geradas em torno da utilização das novas tecnologias da informação e da comunicação para o processamento e/ou a transmissão da informação.”
As relações próximas entre o Direito e Sociedade são relações de interação mútua em que uma influencia o outra.
O fato social tem como seus principais atributos: Coercitividade, Exterioridade e Generalidade. O principal exemplo de fato social é o Direito porque é coercitivo por excelência, é exterior (surge na consciência coletiva, todavia, se materializa na legislação) e deve ser aceito pela coletividade.
E de suma importância o equilíbrio, e a simetria do funcionamento de esses três atributos (Coercitividade, Exterioridade e Generalidade) para a eficácia do direito.
Imagine uma sociedade em que o criminoso não vai preso, um empregador demite um empregado por justa causa sem uma devida motivação e apesar de tudo isso, a Justiça não reverta à situação e nem sequer de um parecer. O que estamos a vivenciar é a impunidade. Cabe ressaltar que o Estado tem obrigação de garantir a prestação jurisdicional, ou seja, todo cidadão, independentemente de sua situação econômica, tem Direito de defender seus interesses, sendo obrigação do Estado garantir-lhe o acesso à justiça. Da mesma forma, a Constituição garante a todas as pessoas o Direito de defesa, ou seja, ninguém, no Brasil, pode ser condenado sem o devido processo legal e ampla defesa.
O Direito de acesso à justiça significa não só acesso aos órgãos judiciais existentes, mas a um processo judicial justo, promovido por uma justiça imparcial. É um Direito fundamental do cidadão e conquista da sociedade moderna, de importância basilar para a efetivação das liberdades e garantias individuais e coletivas.
Já a questão da Generalidade é fundamental, pois com a impunidade e a injustiça o Direito deixa de ser geral, ou seja, o Direito é igual para todos, pois é uma garantia legal todos são iguais perante a Lei, ademais estamos sob um Estado Democrático de Direito, conforme dita o artigo 1º da Constituição Federal, em que governantes e governados estão sob a tutela da mesma Lei, com as expressas exceções previstas em Lei. Diariamente tratamos com a isonomia e a igualdade material e formal.
Em todos os aspectos de uma sociedade se faz presente a regra do Direito.
Exemplo.
1. Quando estamos em nossas casas, lá se faz presente o Direito. A própria definição do que é família é uma definição jurídica; a posse, os bens são feitos por meio de contratos, compra e venda, aluguel, permuta etc... está tudo no mundo do Direito.
2. Ao dirigir um veiculo automotor há o Código de Trânsito para regulamentar, tanto o condutor, quanto o pedestre, ciclista etc.
O Direito tem profunda integração social. A expressão máxima disso é o Estado, pois o poder emana do povo, e os que lá estão o fazem em representação do nosso poder político seguindo regras constitucionais. Por causa dessa profunda representação, qualquer mudança na sociedade acaba causando mudança no Direito e assim vice e versa.
Três funções que o Direito exerce na Sociedade:
1. Educativa – surgem os costumes de origem legal. A simples existência de uma regra de Direito resulta na convicção de que a conduta recomendada na referida nota é a mais conveniente moldando as opiniões sociais sobre o que é justo ou injusto, bom ou mau, correto e incorreto.
2. Conservadora – existem as normas de autodefesa do sistema jurídico. A ordem jurídica é a expressão de
uma determinada ordem social cuja proteção se destina a realidade.
3. Transformadora – ação do Direito sobre a sociedade. As normas jurídicas quando editadas resultam em modificações na sociedade alterando-lhe o sistema de controle social e as demais condicionantes da vida grupal.
Alfim, todas essas funções devem ser exercidas de forma conjunta para se chegar a verdadeira Justiça Social.
Categorias Fundamentais do Direito: Direito Público
VEREMOS NESTE CAPÍTULO A PRIMEIRA PARTE DA DICOTOMIA ENTRE O DIREITO PÚBLICO E DIREITO PRIVADO. INICIANDO COM O DIREITO PÚBLICO E A SUA BASE HISTÓRICA.
A clássica divisão do Direito em Direito Público e Direito Privado é oriunda do Direito Romano, jus publicum e jus privatum,segundo o critério da utilidade pública ou particular da relação: o primeiro diria respeito às coisas do Estado, enquanto que o segundo seria pertinente ao interesse de cada um, como pode se observar na seguinte sentença de Ulpiano“Hujusstudiiduae sunt positiones, publicum et privatum. Publicum jus est, quod ad statum rei Romanaespectat, privatum quod ad singulorumutilitatem; sunt enimquaedamplubiceutilia, quaedam privatum.”(Ulpiano, “Digesto”, I, I, I,2). O Direito Público é aquele que tem em vista a situação (status) da coisa (res) romana, o Privado é o que se volta para a utilidade dos indivíduos.
Para Miguel Reale o Estado cobre, na atualidade, a sociedade inteira, com a visão de proteger a universalidade dos indivíduos, crescendo, dia a dia, a interferência dos poderes públicos, mesmo fora da órbita dos Estados socialistas ou comunistas, onde se apagam cada vez mais as distinções entre o que cabe
ao Estado e o que é garantido permanentemente aos cidadãos como tais.
Oliveira Faria, faz uma observação de ordem histórica “no momento em que o poder público sofreu alterações profundas, ao fim da Antiguidade e no início da Idade Media, quando o Estado sofreu grave colapso, em decorrência da invasão dos bárbaros e com o estabelecimento do feudalismo, o direito público entrou em crise, tornando-se inexistente. Depois da queda do Império Romano, os textos sobre a administração imperial tornaram-se destituídos de qualquer valor ou utilidade. Os jurisconsultos passaram a recorrer às fontes do direito romano, compiladas por Justiniano, apenas para procurar as normas de direito privado. Por outro lado, diz o referido autor que o feudalismo confundiu a soberania coma propriedade, haja vista que atribuiu ao titular do domínio poderes típicos do Estado, como o de distribuir justiça, mantença do exército e o de cunhar moedas. Daí resultava, na possibilidade das funções públicas serem reguladas com base em normas de âmbito privado. Portanto, para ele, desapareceu na Era Medieval a clássica distinção entre Direito Público e Direito Privado. Sendo somente após a RevoluçãoFrancesa, com a fixação do novo conceito de soberania, é que retorna a divisão entre direito público e privado.
A homogeneidade da esfera pública só pode ser garantida, então, como um conjunto, a saber, a sociedade, que se opõe a outro conjunto de um só elemento, a saber, o indivíduo, que caracterizará a esfera privada. Todavia, como a esfera privada também é social fazer a distinção entre ambas exigirá um novo elemento caracterizador, que seja capaz de conformar o que seja público e o que é privado. Esse elemento novo é um ente artificial, como os produtos do fazer humano, qual seja: o Estado. Hobbes, irá falar do Estado-Leviatã, como um corpo artificial que incorpora o social e possibilita a convivência dos indivíduos. Juridicamente, o Estado, um verdadeiro organismo de funções (burocrático) de funções, um ente abstrato, produto do agir político do supremo com soberania. O Direito explicado pela soberania torna-se um comando, relação de autoridade no sentido de poder. Portanto, a distinção entre o poder soberano e sua esfera e o poder dos indivíduos em suas relações marcam assim, a distinção entre a esfera pública e a privada e, por conseguinte, entre Direito público e privado.
Miguel Reale, considera que, na realidade não há uma concepção que, em rigor, defina essas noções. No entanto, praticamente, alguns princípios podem ser agrupados em um e em outro âmbito, ainda que nem todos se apliquem uniformemente aos ramos do Direito usualmente considerados públicos ou privados. No entanto, o princípio máximo do Direito público é o princípio da Soberania.
Portanto, o Direito Público regula os interesses predominantes da sociedade considerada como um todo. Nas relações de Direito Público, o Estado participa como sujeito ativo (titular do poder jurídico) ou como sujeito passivo (destinatário do dever jurídico), mas sempre como órgão da sociedade e, portanto, sem perder a posição de supremacia ou poder de império, jus imperii.
República e República Velha
APRESENTAR O PROCESSO POLÍTICO QUE CULMINOU COM A PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA, O DESENHO INSTITUCIONAL QUE NORTEOU ESSE MOMENTO HISTÓRICO E AS CONSEQUÊNCIAS DE TAL DESENHO PARA O FUNCIONAMENTO DAS INSTITUIÇÕES POLÍTICAS.
PROCLAMAÇÃO DA REPÚBLICA (15 de novembro de 1889)
O que se convencionou chamar de “Proclamação da República” pode ser entendido como um movimento político-militar que extinguiu o Império e instaurou no país um regime presidencialista e federativo.
A monarquia encontrava-se enfraquecida devido a ruptura das relações do governo com os três setores que o sustentavam: a Igreja, o Exército e a aristocracia escravista (FAUSTO, 2001).
Igreja - Vigorava submissão da Igreja ao Estado desde 1824. Em 1864, o Vaticano proibiu as relações entre Igreja e maçonaria. Como os maçons eram muito influentes, D. Pedro II rejeitou a decisão papal. Bispos de Olinda e Belém mandaram fechar as irmandades que se negassem a expulsar os maçons. D. Pedro II mandou prendê-los.
Exército - O positivismo ganhou força e os militares se viam como aqueles que deveriam impor ao país “ordem e progresso”. O Tenente Coronel Sena Madureira e o Coronel Cunha Matos manifestaram-se contra o governo por meio da imprensa, o que era proibido. Em 1887, foi criado o Clube Militar que passou a pressionar o governo.
Aristocracia escravista - Governo perde seu apoio devido à abolição da escravidão em 1888 (Lei Áurea), uma vez que não foi paga indenização aos senhores de escravos.
O regionalismo passou a ser a forma de organização política da República e a base do regime federativo (FAUSTO, 2001).
O movimento republicano que a inspirou havia se organizado principalmente em São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, a partir de 1870. Esse movimento congregava apenas setores da elite, em sua maioria cafeicultores aborrecidos com a abolição da escravidão, setores da classe média urbana, estudantes de escolas superiores, e militares. Apesar de defenderem a instauração de uma república federativa, os mineiros defendiam um modelo liberal de república. Os gaúchos, por outro lado, devido a sua inspiração positivista e a influência militar na região sul, defendiam maior centralização de poder no Executivo.
Os militares que comandaram a proclamação da República haviam entrado em contato com o movimento republicano poucos dias antes da data marcada para o início do ato da proclamação. Não houve registros de participação popular no ato da proclamação, que em si, foi feito de surpresa e tomado por muitos como uma parada militar (FAUSTO, 2001).
A primeira Constituição republicana brasileira, promulgada em 1891 inspirou-se no modelo norte- americano, que consagrava uma República presidencialista federativa liberal. Aos Estados era dada a possibilidade de contrair empréstimos no exterior, sem a necessidade do aval do governo central e também de organizar forças militares próprias. Atendia-se, assim, aos interesses dos grandes Estados, sobretudo de São Paulo.
A Constituição determinou que a União seria responsável por gerir os impostos de importação, atribuía-lhe o direito de criar bancos emissores de moeda, de organizar as forças armadas nacionais e garantia-lhe a faculdade de intervir nos Estados para restabelecer a ordem.
Com relação aos direitos políticos, houve avanços e retrocessos. O voto se tornou direto e universal, suprimiu-se o censo econômico e foram considerados eleitores todos os cidadãos brasileiros maiores de 21 anos, excluídas certas categorias, como os analfabetos, os mendigos e os praças militares. Como se vê, o censo literário, o que efetivamente cerceava a participação política foi mantido (CARVALHO, 2004).
Com relação aos direitos civis, a Constituição de 1891 consagrou o direito dos brasileiros e estrangeiros residentes no país à liberdade, à segurança individual e à propriedade. A pena de morte foi abolida e o Estado tornou-se laico.
Também houve retrocessos com relação aos direitos sociais. A Constituição Republicana de 1891 retirou do Estado a obrigação de fornecer educação primária, constante da Constituição de 1824. Adotando um liberalismo ortodoxo, essa constituição proibia ao governo federal interferir na regulamentação do trabalho. A questão social era caso de polícia e ainda que os sindicatos já tivessem sido reconhecidos como legítimos representantes dos operários, os operários estrangeiros que ousaram se organizar e pressionar por direitos foram expulsos devido a acusação de anarquismo e agitação política.
A CONSTRUÇÃO DO ESTADO SOB A PRIMEIRA REPÚBLICA
A passagem de Império à República no Brasil deixou como legado o enfraquecimento do poder despótico do Estado, segundo Reis (1991). Esse enfraquecimento possibilitou que a capacidade infraestrutural do Estado ficasse muito mais acessível aos interesses sociais dominantes, com a descentralização do poder fomentada pelo federalismo.
A criação do Estado e o fortalecimento de interesses privados não são processos necessariamente excludentes no Brasil. Haja vista que, durante a Primeira República, a preponderância das oligarquias favoreceu o processo de construção do poder público. Sendo assim, Reis (1991) afirma ter existido uma forte interação entre a construção do Estado e o jogo dos interesses privados em disputada, durante o intervencionismo estatal da Primeira República. A partir de sua análise, nem a construção do Estado brasileiro pode ser vista como tarefa e realização histórica do Império e nem o predomínio total das oligarquias rurais teria encolhido o espaço do Estado.
Isso porque, o processo de construção do Estado envolve sempre uma tensão entre o poder privado e poder público, não havendo uma contraposição simples entre Estado e sociedade civil ou entre público e privado. Afirma Reis (1991) que, o triunfo da ideologia intervencionista que fez da República Velha a República dos fazendeiros, foi também responsável pelo avanço da construção do Estado. Como consequência, lançou as bases que logo serviriam de alicerce ao processo autoritário-modernizante que se implantaria com a Revolução de 1930.
AREPÚBLICA DOS CORONÉIS E A POLÍTICA DOS GOVERNADORES
A Primeira República ficou conhecida também como “República dos Coronéis”. Com a descentralização do poder, as oligarquias regionais passaram a influenciar fortemente as decisões do governo central, já que o poder deslocou-se do centro para a periferia. Esse deslocamento de poder deu ensejo à política dos governadores.
Ao mesmo tempo em que influíam na condução dos Estados, os governadores afirmavam a importância da União como centro de poder, que era disputado pelos interesses econômicos dominantes na vida do país.
A política dos governadores foi, em linhas gerais, um acordo - firmado no governo do presidente Campos Salles - por meio do qual a presidência da República e as oligarquias estaduais se comprometiam a manter uma relação de apoio mútuo. Com essa política criava-se certa autonomia para ambos, embora um dependesse politicamente do outro: as oligarquias precisavam do presidente para se manter no poder e nomear funcionários na esfera federal; e a presidência da República, para obter o apoio dos governadores na implementação de suas políticas, sustentava-se nas forças locais, ou seja, nas províncias.
Foram duas, as principais consequências da política dos governadores. A primeira foi o fortalecimento do poder dos coronéis e a segunda foi a predominância dos interesses de Minas Gerais e São Paulo sobre as demais províncias, a ponto dessas oligarquias terem controlado os acordos para sucessão presidencial durante mais de 30 anos. Ora elegia-se um presidente paulista, ora um presidente mineiro, no que se convencionou chamar política café-com-leite.
O coronelismo foi um sistema político de abrangência nacional, baseado em barganhas entre o governo e os coronéis. O governo estadual garantia, para baixo, o poder do coronel sobre seus dependentes e seus rivais, sobretudo cedendo-lhe o controle dos cargos públicos, desde o delegado de polícia até a professora primária. O coronel hipotecava seu apoio ao governo, sobretudo na forma de votos, advindos de seu curral eleitoral. Para garantir uma quantidade específica de votos, o coronel se utilizava tanto da fraude eleitoral quanto da violência. Intimidados pelo próprio coronel, do qual dependiam ou por seus capangas, os eleitores legitimavam a política dos governadores. Essa prática de intimidação do eleitor ficou conhecida como voto de cabresto.
Para cima, os governadores davam seu apoio ao Presidente da República em troca do reconhecimento deste de seu domínio no estado. Além da violência, o clientelismo também podia ser entendido como um elemento característico do coronelismo. Esse sistema de lealdades que distribui prestígio e autoridade em troca de apoio político, ainda é a base da política nacional. Para formar a sua base aliada, o Chefe do Executivo Federal, geralmente distribui recursos do Estado. Entre esses recursos estão o controle de ministérios e empresas estatais, empregos ou liberação de verba para obras.
O coronelismo é fase de processo mais longo de relacionamento entre os fazendeiros e o governo. Ele morreu simbolicamente quando se deu a prisão dos grandes coronéis baianos, em 1930.
No entanto, durante os anos de sua existência, o coronelismo deixou sua marca, cerceando a autonomia do trabalhador rural. O pacto coronelístico garantia ao trabalhador rural alguma assistência social, uma vez que ele era completamente dependente do Coronel. No entanto, havia certa reciprocidade. Em troca do trabalho e da lealdade, o trabalhador recebia proteção contra a política e assistência em momentos de necessidade. O paternalismo do coronel mascarava a exploração do trabalhador e pode ser uma das causas explicativas sobre a durabilidade desse sistema.
De outro lado, a política café-com-leite teve início em 1906, quando os presidentes de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo selaram o Acordo de Taubaté. Esse acordo tinha como objetivos centrais: a) elevar o preço do café; b) regular o comércio do produto; c) estabilizar a taxa de câmbio e, d) estimular o consumo. Com o Acordo de Taubaté, o Estado passou a atuar como promotor dos interesses oligárquicos.
Devido a esse acordo, em 1922 o Congresso Nacional aprovou legislação criando um instituto para a defesa permanente do café, provido de fundos próprios. O Instituto de Defesa Permanente do Café se tornou um órgão efetivo em 1924, quando o governo do estado de São Paulo assumiu a sua direção. Através da regionalização, os interesses privados diretamente envolvidos assumiam um maior controle da condução da política cafeeira.
Com as elites se revezando no poder e os coronéis atuando livremente nas províncias, também na República não houve espaço para a participação do povo no sistema político.
A Revolução de 1930
APRESENTAR O CONTEXTO POLÍTICO QUE ANTECEDE A REVOLUÇÃO DE 1930, SEU OBJETIVO, SEUS ALCANCES E SEUS LIMITES.
REVOLUÇÃO DE 1930: INDUSTRIALIZAÇÃO E A CONCESSÃO DE DIREITOS SOCIAIS
Com a Revolução de 1930 teve fim a Primeira República. A urbanização do país e a sua crescente industrialização criaram uma incômoda modernidade que, trouxe como consequência a potencialização dos conflitos e contradições sociais. As greves operárias de 1917-1918 são exemplos dessa incômoda modernidade e contribuíram para um aumento de qualidade na organização e na consciência dos trabalhadores (NOGUEIRA, 1988).
A fundação do Partido Comunista Brasileiro em 1922 e a realização da Semana de Arte Moderna, assim como o movimento tenentista, esse último um ciclo de revoltas da oficialidade militar, também devem ser ressaltados como manifestações importantes. O objetivo dessas manifestações era denunciar e combater a velha ordem oligárquica e suas práticas corruptas e clientelísticas, a onipresença do café como produto nacional e a inexistência de direitos sociais. Esses fatores combinaram-se também com o avanço da crise mundial do capitalismo com a quebra da bolsa de Nova York em 1929 e, com a cisão entre as elites dos grandes Estados, destacando-se entre eles, São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
O Presidente Washington Luis, paulista, insistiu na candidatura de outro paulista à sua sucessão e sugeriu fortemente o nome de Júlio Prestes, desrespeitando o revezamento entre paulistas e mineiros na Presidência da República. Como consequência, a oligarquia mineira uniu-se à oligarquia gaúcha contra a oligarquia paulista (FAUSTO, 2001).
Em meados de 1929, as oposições lançaram as candidaturas de Getúlio Vargas à Presidência e João Pessoa à Vice-Presidência, formando a Aliança Liberal. Apoiavam a Aliança Liberal as classes dominantes regionais não associadas ao núcleo cafeeiro e tentava-se sensibilizar a classe média para a causa. O programa político da Aliança Liberal defendia a necessidade de incentivar a produção nacional em geral e não apenas do café; combatia os esquemas de valorização do produto em nome da ortodoxia financeira. Propunha algumas medidas de proteção aos trabalhadores e defendia os ideais da liberdade individual, anistia aos tenentes e reforma política que proporcionasse a verdade eleitoral (FAUSTO, 2001).
Devido ao pacto coronelístico, o governo central conseguiu garantir a eleição de Júlio Prestes em 1º de março de 1930. Os quadros jovens da Aliança Liberal revoltados com o resultado das eleições, claramente fraudadas, aproximaram-se do movimento tenentista.
Em 26 de julho de 1930, João Pessoa foi assassinado em uma confeitaria em Recife por um opositor político, João Dantas. O crime combinava razões públicas e privadas. As públicas prevaleceram e os oposicionistas utilizaram-se desse evento como uma grande arma. Daí em diante a articulação revolucionária deslanchou. Minas Gerais e Rio Grande do Sul estiveram à frente da Revolução que se iniciou em 03 de outubro de 1930, tendo São Paulo ficado à margem desse movimento. No Nordeste, a Paraíba sob liderança de Juarez Távora foi o centro de operações. O povo de Recife apoiou Juarez Távora ocupando prédios públicos federais e um depósito de armas, enquanto os ferroviários da Great Western entraramem greve.
Os militares haviam assumido o controle do sul do país e preparavam-se para invadir São Paulo. Porém, antes do confronto decisivo, em 24 de outubro, integrantes da cúpula militar, em nome do Exército e da Marinha, depuseram o presidente da República no Rio de Janeiro e constituíram uma Junta Provisória de governo.
Essa Junta Provisória tentou permanecer no poder, mas recuou diante das manifestações populares e da pressão dos revolucionários vindos do sul.
Getúlio Vargas tomou posse em 03 de novembro de 1930, apoiado por um quadro heterogêneo, tanto do ponto de vista social quanto político. Os setores dominantes foram reagrupados e a hegemonia do latifúndio consolidada. Assim, velhos oligarcas, os tenentes civis, o movimento tenentista e membros do Partido Democrático, que defendia a efetiva adoção dos princípios do Estado liberal constituíram a base de apoio de Getúlio Vargas.
Os objetivos do Estado passaram a ser promover a industrialização, proteger os trabalhadores urbanos e apoiar o Exército. Assim, a burguesia industrial, os trabalhadores urbanos e os militares formaram a base de apoio do capitalismo nacional sustentado pela ação do Estado implementado por Getúlio Vargas, o que gerou um processo de modernização conservadora.
A Revolução de 1930 não modificou a estrutura social vigente, uma vez que ocorreu apenas uma troca de elite no poder, sem grandes rupturas. Dessa forma, os quadros oligárquicos tradicionais foram substituídos por militares, técnicos diplomados, jovens políticos e um pouco mais tarde, por industriais.
A burguesia industrial brasileira devido à competição internacional foi obrigada a conciliar-se com a estrutura agrária e a procurar refúgio no protecionismo estatal. A ordem oligárquica anterior e posterior à Revolução de 1930 lhe oferecia a indispensável estabilidade política para a acumulação de capital. Dessa forma, a burguesia industrial não chegou a se forjar como “classe revolucionária” e jamais apresentou um projeto claramente industrializante, antiagrarista e democrático. O projeto de industrialização brasileiro, em si, foi desenhado muito mais pelos quadros técnicos governamentais do que pela burguesia industrial (FAUSTO, 2001).
Afirma Nogueira (1988, pág. 93) sobre os anos 30,
“Embora ‘restaurando’ o passado - vale dizer, o latifúndio, a miséria, a dependência, o autoritarismo -, aqueles foram anos de mudança, de desenvolvimento, de contato mais profundo com a modernidade da indústria, da ciência, do capitalismo. Exatamente por isso, foram ricos em turbulência institucional, agitação política e efervescência cultural.”
A velha República latifundiária dos “coronéis” não foi substituída pelo novo país da indústria e dos trabalhadores urbanos. Embora esse novo país dinamizasse a sociedade e redefinisse o sistema de poder, não houve a eliminação radical de seu polo mais atrasado. O que se viu, mais uma vez, foi um acordo mediado pelo Estado, entre as velhas e as novas elites, que passaram a conviver quase que harmoniosamente. A modernização do Brasil se deu em moldes conservadores, uma vez que não rompeu com a tendência “passiva” e “restauradora” desde sempre em vigência (NOGUEIRA, 1988).
O Federalismo foi descaracterizado e a força dos estados perdeu terreno. Apesar da centralização do poder no Executivo Federal, as oligarquias regionais não desapareceram, nem o padrão de relações clientelistas deixou de existir. Bastante ilustrativa foi a prática de destruição do café levada a cabo pelo Estado Varguista, com o intuito de proteger a cafeicultura. Entre julho de 1931 e julho de 1944 o governo federal eliminou 78,2 milhões de sacas, uma quantidade equivalente ao consumo mundial de três anos. O que havia mudado, realmente, foi a irradiação de poder, que passou a vir do centro para a periferia.
O Estado Varguista teve uma inspiração autoritária desde sempre. Em 1931, Getúlio Vargas dissolveu o Congresso nacional e assumiu o poder executivo e legislativo nas esferas estaduais e municipais. Foram nomeados interventores federais para os estados, em sua grande maioria, militares.
O Código dos Interventores estabeleceu as normas de subordinação dos estados ao poder central. Os Estados ficaram proibidos de contrair empréstimos externos sem a autorização do governo federal, de gastar mais de 10% de sua despesa ordinária com os serviços da política militar e de dotar as polícias estaduais de artilharia e aviação, ou armá-las em proporção superior ao Exército.
Houve grande avanço dos direitos sociais durante o Estado Varguista. A criação do Ministério da Educação e Saúde e do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio deu impulso a uma legislação social que não parou de ampliar seu alcance.
Para enfrentar o grave problema educacional o Ministério da Educação e Saúde levou a cabo a Reforma Campos que estabeleceu um currículo seriado, o ensino em dois ciclos e determinou que a frequência do aluno deveria ser obrigatória. Determinou-se também a obrigatoriedade de possuir diploma de nível secundário para ingresso no ensino superior. A Universidade de São Paulo (USP) foi fundada em 1934 e a Universidade do Distrito Federal em 1935.
O Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio também conhecido como “Ministério da Revolução” centrou seus esforços em três áreas: trabalhista, previdência social e sindical. Apresentando uma política trabalhista inovadora com relação ao período anterior, o Governo Vargas criou leis de proteção ao trabalhador, de enquadramento dos sindicatos pelo Estado e órgãos para arbitrar conflitos entre patrões e operários (Juntas de Conciliação e Julgamento). A questão social, aos poucos, deixava de ser caso de polícia. Em 1931, foi criado o Departamento Nacional do Trabalho e os primeiros decretos sobre sindicalização foram publicados. A área sindical era o cerne da estratégia do governo Varguista e a concepção de sindicato como órgão de cooperação entre operários, patrões e Estado começou a ser gestada. Para isso, ao Estado cabia garantir a harmonia social, exercendo papel de regulação e arbitramento, que incluía a capacidade de intervir no sindicato caso fosse comprovada alguma irregularidade. Os sindicatos passaram a ser dotados de personalidade jurídica pública, entendidos como um órgão consultivo e técnico do governo e só podia existir um sindicato por categoria profissional em cada localidade. A existência de delegados do governo
dentro dos sindicatos que assistiam às reuniões, examinavam sua situação financeira e enviavam relatórios trimestrais ao governo denota a forte vigilância do Estado infligida aos sindicatos. Como consequência, o sindicalismo autônomo desapareceu.
1932 foi um ano de muitas concessões: foi decretada a jornada de oito horas de trabalho para o comércio e a indústria; foi regulamentado o trabalho feminino, proibindo-se o trabalho noturno para mulheres e estabelecendo-se salário igual para homens e mulheres; regulamentado o trabalho de menores; foi criada a carteira de trabalho como documento de identidade do trabalhador; foram criadas as Comissões e Juntas de Conciliação e Julgamento que reconheciam convenções coletivas de trabalho.
Entre 1933 e 1934 novas concessões ocorreram: foi regulamentado o direito de férias de maneira efetiva para comerciários, bancários e industriários e a Constituição de 1934 consagrou ao governo a competência para regular as relações de trabalho. Essa última medida fez com que o governo confirmasse a jornada de trabalho de oito horas e determinasse a criação do salário mínimo que só veio a ser adotado a partir de 1940.
A legislação previdenciária começou a avançar apenas em 1933 com a criação dos Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAP). Teve início o formato corporativista de previdência social, em que cada categoria profissional possuía seu IAP. O governo era integrante do sistema e o presidente da República nomeava o presidente de cada IAP. Representantes de organizações sindicais de patrões e empregados formavam o Conselho de Administração de cada IAP, que determinava como os recursos advindosdo governo, dos patrões e dos empregados seriam gerenciados e quais benefícios seriam concedidos. Em 1938, o IAP já possuía mais de 01 milhão de inscritos, ou seja, quase todos os trabalhadores urbanos haviam recebido o benefício da previdência social.
Apesar da sindicalização não ser obrigatória, aos trabalhadores que pertenciam aos sindicatos reconhecidos pelo Ministério do Trabalho eram garantidas algumas vantagens, como: proteção do governo em caso de perseguição por parte dos empregadores, possibilidade de recorrer às Comissões e Juntas de Conciliação e Julgamento, direito a férias e a previdência social.
Baseado na noção de privilégio e não na de direito, esse sistema corporativo de previdência social era fortemente excludente, uma vez que deixava de fora além dos trabalhadores não sindicalizados, todos os trabalhadores autônomos e domésticos, além de todos os trabalhadores rurais. Afinal, se essa política social tivesse sido concebida como direito, teria que beneficiar a todos os trabalhadores e da mesma maneira.
Segundo Carvalho (2004, pág. 115),
“(...) Do modo como foram introduzidos, os benefícios atingiam aqueles a quem o governo decidia favorecer, de modo particular aqueles que se enquadravam na estrutura sindical corporativa montada pelo Estado. Por esta razão, a política social foi bem caracterizada por Wanderley G. dos Santos como “cidadania regulada¹ ”, isto é, umacidadania
limitada¹por restrições políticas.”
¹ Santos (1979, pág. 75), define cidadania regulada como “o conceito de cidadania cujas raízes encontram-se, não em um código de valores políticos, mas em um sistema de estratificação ocupacional, e que, ademais, tal sistema de estratificação ocupacional é definido por norma legal. Em outras palavras, são cidadãos todos aqueles membros da comunidade que se encontram localizados em qualquer uma das ocupações reconhecidas e definidas em lei. A extensão da cidadania se faz, pois, via regulamentação de novas profissões e/ou ocupações, em primeiro lugar, e mediante ampliação do escopo dos direitos associados a estas profissões, antes que por expansão dos valores inerentes ao conceito de membro da comunidade. A cidadania está embutida na profissão e os direitos do cidadão restringem-se aos direitos do lugar que ocupa no processo produtivo, tal como reconhecido por lei. Tornam-se pré-cidadãos, assim, todos aqueles cuja ocupação a lei desconhece. A implicação imediata deste ponto é clara: seriam pré-cidadãos todos os trabalhadores da área rural, que fazem parte ativa do processo produtivo e, não obstante, desempenham ocupações difusas, para efeito legal; assim como seriam pré-cidadãos os trabalhadores urbanos em igual condição, isto é, cujas ocupações não tenham sido reguladas por lei.”
Foi durante a década de 1930 que se organizou a estrutura sindical brasileira – corporativista, subordinada ao Estado e despolitizadora – e, se delineou uma política de massas fundada no paternalismo estatal (o “populismo”), que tanta importância teria nos movimentos posteriores do capitalismo e da classe operária no Brasil (NOGUEIRA, 1988).
Afirmando ter como intuito proteger o trabalhador, o Estado constrangeu a autonomia e independência do movimento sindical, colocando-o sob a dependência do Ministério do Trabalho. Devido ao grande desequilíbrio de forças entre operários e patrões, um dilema se colocava. Os operários deviam escolher: liberdade sem proteção ou proteção sem liberdade?
Houve resistências a essa tutela, porém em estados com menor tradição de luta e organização sindical do que Rio de Janeiro e São Paulo, o apoio do Estado e os privilégios do sindicalismo oficial foram aceitos prontamente. O dilema havia chegado ao fim.
A CONSTITUIÇÃO DE 1934
Em 1933, foram realizadas eleições para a Assembleia Nacional Constituinte. Houve progresso quanto aos direitos políticos, pois para as eleições novas regras eleitorais foram implementadas. Foi introduzido o voto secreto, arma essencial para proteger o eleitor das pressões dos coronéis e foi criada a Justiça Eleitoral que contava com juízes profissionais para fiscalizar o alistamento, a votação, a apuração dos votos e o reconhecimento dos eleitos. O voto feminino tornou-se realidade. O novo código eleitoral introduziu o instituto da representação classista, outra arma interessante a fim de arrefecer a influência das oligarquias regionais. Delegados escolhidos pelos sindicatos elegiam deputados federais. De um total de 40 deputados eleitos, 18 representavam os empregados, 17 os empregadores, 03 os profissionais liberais e 02 os funcionários públicos. A Assembleia Nacional Constituinte elegeu por voto indireto, Getúlio Vargas como presidente da República (CARVALHO, 2004).
Importante ressaltar que a instalação dessa Assembleia Nacional Constituinte foi fruto da oposição dos paulistas ao governo Vargas, que defendiam o fim do governo ditatorial e restauração da legalidade, ou seja, do governo constitucional. O estado de São Paulo tinha sido marginalizado por Vargas e crescia a irritação das elites paulistas com a nomeação dos interventores federais. Em 1932, a Revolução Constitucionalista, que durou três meses e foi segundo Carvalho (2004, pág. 101), “a mais importante guerra civil brasileira do século XX”, foi deflagrada.
Apesar da importância desse movimento e do entusiasmo cívico demonstrado pela população paulista, ele apresentava um caráter conservador, uma vez que se opunha as reformas sociais, ao tenentismo e buscava restabelecer o controle do governo federal pelos estados. Foi difícil angariar outros estados como aliados, pois havia o receio de que a vitória paulista restabelecesse a política dos governadores e conseqüentemente, o poder excessivo de São Paulo sobre o governo federal.
A Constituição de 1934 instituiu a nacionalização progressiva das minas, jazidas minerais e quedas de água; a pluralidade e autonomia dos sindicatos e o fim da unicidade sindical; proibiu diferenciar salários para um mesmo trabalho por motivo de idade, sexo, nacionalidade ou estado civil; criou o salário mínimo; regulamentou o trabalho das mulheres e dos menores; criou o descanso semanal, as férias remuneradas e a indenização por dispensa sem justa causa. O ensino primário gratuito e de frequência obrigatória foi reintroduzido. Essa foi a primeira constituição brasileira a trazer um capítulo sobre a ordem econômica e social.
Estado Novo, Ideologia e Movimentos de Massa
DISCUTIR O PROCESSO DE INSTAURAÇÃO DO ESTADO NOVO, SEU CARÁTER REPRESSIVO E SUA QUEDA.
O ESTADO NOVO (1937-1945)
Dois grandes movimentos políticos nasceram após a promulgação da Constituição de 1934. Eram eles, a Aliança Nacional Libertadora (ANL) e a Ação Integralista Brasileira (AIB). A primeira, de orientação comunista era liderada por Luís Carlos Prestes e agia segundo as instruções da Terceira Internacional. A segunda, de orientação fascista era dirigida por Plínio Salgado. Esses dois movimentos representavam as lutas ideológicas em curso durante os anos 1930. Comunistas e fascistas se digladiavam pelas ruas brasileiras. A grande novidade, no entanto, advém do fato desses movimentos serem organizações de massa e que haviam alcançado representação em nível nacional. Em choque com o velho Brasil das oligarquias regionais, lideradas pelos coronéis, a ANL e a AIB assinalaram a emergência de um país urbano e industrial. Ambas atraíram setores da classe média, prejudicados desde sempre pelo pacto coronelístico e tinham simpatizantes nas Forças Armadas. Enquanto a AIB influenciava oficiais da Marinha, a ANL influenciava o Exército.
Em 1935, a ANL liderou uma revolta com o intuito de promover uma revolução popular. A Intentona Comunista de 19351, como ficou conhecida, limitou-se a três capitais, Rio de Janeiro, Recife e Natal e concentrou-se nos quartéis do Exército arregimentando pouco envolvimento popular. Devido ao seu pequeno alcance, a revolta foi reprimida com facilidade pelo governo.
1O filme Olga traz um bom relato sobre esse momento da história brasileira.
O governo expulsou do Exército os elementos maisradicais e criou uma campanha de luta contra o comunismo. Foi criado também, com o apoio do Congresso, um Tribunal de Segurança Nacional para julgar crimes políticos.
A repressão contra os integrantes da Intentona Comunista de 1935 foi tão contundente que Getúlio Vargas, em 1936 assinou o Decreto nº 750, que determinou a perda da patente e a "morte civil" do segundo-tenente Vital Carmanin Necchi, estabelecendo que sua mulher passasse a receber pensão por viuvez. O militar faleceu em 1980 e durante os 44 anos após ter sido decretada sua morte civil, não pode comprar, vender,
trocar ou administrar sua propriedade, que foi dividida entre seus herdeiros. Deixou de ser capaz de celebrar contratos, inclusive os de trabalho e não podia ser remunerado. Todos os seus direitos civis foram cassados e ele viveu todos esses anos, como se já houvesse morrido. Em dezembro de 2009, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em Porto Alegre, fixou em R$ 100 mil o valor de indenização por dano moral a ser paga pela União a cada um dos cinco filhos do militar. O militar foi declarado anistiado político e concederam-lhe a promoção post mortem ao posto de coronel (ROCHA, 2009).
A Intentona Comunista abriu caminho não só para amplas medidas repressivas, como se viu, como também
para a escalada autoritária de Getúlio Vargas, que desembocaria no Estado Novo.
Ao mesmo tempo, a Intentona Comunista possibilitou que uma nova visão sobre o papel do Exército fosse consolidada dentro da corporação, tendo como expoentes os generais Góis Monteiro e Gaspar Dutra. Segundo Carvalho (2004, pág. 105), para esses generais,
“o Exército não devia ser instrumento político dos chefes civis, como era prática na Primeira República, nem fator de revolução social, como queriam os “tenentes”. Devia ter papel tutelar sobre o governo e a nação. Devia ter seu projeto próprio para o país, um projeto que incluísse propostas de transformações econômicas e sociais, mas dentro dos
limites da ordem.”
É importante notar que os generais supracitados apoiaram Getúlio Vargas em 1937, quando Flores da Cunha, o governador do Rio Grande do Sul foi deposto. Com a deposição de Flores da Cunha, Vargas havia derrotado o último reduto da velha oligarquia estadualista e o Exército reforçava o seu apoio a ele.
O comunismo era um inimigo a ser combatido por todos e a notícia de que eles ameaçavam derrubar o governo e assassinar vários políticos precipitou o golpe de 1937. Com o apoio entusiasmado dos integralistas, o Estado Novo foi estabelecido em 10 de novembro, quando tropas da polícia militar cercaram o Congresso, pois o general Dutra se opusera a que a operação fosse realizada por forças do Exército.
O Congresso aprovou às pressas o estado de guerra e a supressão das garantias constitucionais por noventa dias. À noite, Getúlio Vargas anunciou uma nova fase da política e a entrada em vigor de uma Carta Constitucional elaborada por Francisco Campos.
A resistência ao golpe foi nula. A burocracia civil e militar e a burguesia industrial foram as forças sociais que sustentaram o golpe. Em comum, possuíam como objetivo promover a industrialização do país.
Utilizando-se do apoio dos integralistas ao golpe, da campanha de luta contra o comunismo e da uma postura nacionalista e industrializante, a inclinação centralizadora de Getúlio Vargas pôde se realizar plenamente.
O Estado Novo que compreendeu o período de 1937 a 1945 pode ser categorizado como um regime ditatorial civil, uma vez que, sustentado pelas Forças Armadas, as manifestações políticas foram proibidas, o governo legislava por decretos, a censura controlava a imprensa e os inimigos do regime eram encarcerados, inclusive integralistas, após sua fracassada tentativa de golpe em 1938 (FAUSTO, 2001).
A ditadura Vargas divergia do nazismo e do fascismo ao buscar não interferir demasiadamente na vida privada das pessoas. Por outro lado, combinava repressão, ao cercear direitos civis e políticos e paternalismo, ao conceder direitos sociais.
A legislação trabalhista tomou forma durante o Estado Novo. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) tornou-se realidade em 1943 e foi fortemente influenciada pela Carta Del Lavoro, lei sindical corporativa do fascismo italiano. Foi restabelecida a unicidade sindical, e o controle do Estado sobre os sindicatos tornou- se mais rígido. Os sindicatos só podiam funcionar legalmente se o Ministério do Trabalho lhes concedesse uma carta de reconhecimento. O Ministério deveria aprovar o orçamento e as decisões das assembleias e o ministro podia intervir nos sindicatos a qualquer momento. Houve também uma redefinição das categorias econômicas e profissionais que poderiam organizar sindicatos e que englobava tanto sindicatos operários quanto patronais.
Os tribunais regionais do Trabalho e um Tribunal Superior do Trabalho foram criados para aperfeiçoar a Justiça do Trabalho.
Em 1940, foi criado o imposto sindical, vigente até os dias de hoje. Todos os trabalhadores, sindicalizados ou não, passaram a ter o salário de um dia de trabalho descontado compulsoriamente, uma vez por ano. Assim, sem a necessidade de campanhas de sindicalização, e, portanto sem esforço algum, os sindicatos passaram a dispor de recursos para manter sua burocracia.
Além da proliferação de pequenos sindicatos que se aproveitavam da facilidade em conseguir recursos sem fazer força, a instituição do imposto sindical contribuiu para o surgimento do peleguismo. A cúpula sindical era repleta de pelegos, em geral um operário que procurava beneficiar-se do sistema, bajulando o governo e o empregador, de quem recebia favores e, em contrapartida negligenciando a defesa dos interesses dos trabalhadores que deveria representar. Mal vistos pelos sindicalistas mais combativos, os pelegos eram avessos ao conflito e podiam ser bons administradores dos recursos sindicais, a ponto de tornar o sindicato atraente para o operário de acordo com os benefícios que oferecia como: assistência jurídica e tratamento odontológico.
Durante a vigência do Estado Novo, órgãos técnicos que contavam com representantes da burguesia industrial e especialistas do próprio governo foram criados em substituição ao Congresso Nacional. A política foi eliminada do processo de tomada de decisões, restando apenas questões puramente técnicas.
Durante os quinze anos em que Getúlio Vargas esteve no poder foi implantada a base de nossa legislação trabalhista e previdenciária. No entanto, enquanto a legislação social tomava fôlego, a participação política era quase nula e os direitos civis foram cerceados (CARVALHO, 2004).
Com a introdução dos direitos sociais antes da expansão dos direitos políticos, o que se viu foi a classe trabalhadora ser incorporada à sociedade em virtude da legislação social e, não em virtude de sua ação sindical e política independente.
Assim, é bastante difícil caracterizar a concessão dos direitos sociais durante a Era Vargas como uma conquista democrática. Desse modo, para Carvalho (2004), o avanço da legislação social durante o Estado Varguista não contribuiu para o processo de construção de uma cidadania ativa.
O Estado Novo – regime autoritário e modernizador onde predominou o capitalismo nacional sustentado pela ação do Estado – teve fim devido, principalmente, a divergências ideológicas, uma vez que as elites que outrora apoiaram Vargas entendiam ser contraditório que um Estado ditatorial apoiasse democracias.
A sociedade civil começou a movimentar-se contra a continuidade do regime ditatorial. Em 1943, os estudantes universitários se organizam e criaram a União Nacional dos Estudantes (UNE) que organizou uma passeata bastante importante. Nessa passeata,
“(...) os estudantes caminhavam de braços dados e com um lenço na boca, simbolizando a supressão da palavra, foi dissolvida violentamente pela polícia. Morreram duas pessoas e mais de vinte ficaram feridas, provocando ondas de indignação”
(FAUSTO, 2002, PáG. 212).
A oposição liberal passou a pressionar o governo a fim de que houvesse a convocação de eleições. Em fins de 1944, surgiua candidatura do Major-brigadeiro da Aeronáutica Eduardo Gomes à Presidência da República pela oposição liberal. Militar da ativa, Eduardo Gomes associava seu nome ao tenentismo e a Intentona Comunista de 1935. A imprensa contribuiu para o sucesso desse movimento, pois burlava a censura e defendia a convocação das eleições diretas para Presidente.
O candidato escolhido pelo governo para disputar as eleições foi o General Dutra, Ministro da Guerra de Vargas e que nos bastidores já vinha articulando a saída de Vargas há pelo menos um ano.
Como Getúlio Vargas havia perdido o apoio político dos militares, ele buscou o apoio das massas populares urbanas, valendo-se de sua grande popularidade, devido à instrumentalização da legislação social e trabalhista em vigência.
Desde 1943, o ministro do Trabalho, Alexandre Marcondes Filho, pelo rádio, proferia palestras dirigidas aos trabalhadores durante um programa de transmissão obrigatória, chamado “A Hora do Brasil”. Em suas palestras o ministro exaltava os êxitos do Estado Novo, creditando a ele o estabelecimento da dignidade do trabalho e do trabalhador e sua transformação em cidadão. As leis trabalhistas e previdenciárias, programas de construção de casas populares e de oferta de alimentação barata serviam como exemplo de como o regime agia em defesa do povo, sendo assim, democrático.
Com esses programas, o mito a personalidade de Vargas foi reforçado, já que ele era exaltado como grande estadista, que havia se aproximado do povo, como grande benfeitor, ou seja, como “o pai dos pobres”.
Com o objetivo de buscar apoio nas massas populares urbanas, Getúlio Vargas realizou grandes comícios, organizados através da ação do Ministério do Trabalho, dos “pelegos” sindicais e da iniciativa dos comunistas.
Ao mesmo tempo em que as greves operárias passaram a reaparecer e os trabalhadores se mobilizavam graças à gradativa restauração das liberdades democráticas e também por se sentirem pressionados pelo agravamento da inflação nos últimos anos de guerra, surgiu o queremismo. O queremismo era um movimento advindo dos círculos trabalhistas ligados a Getúlio e aos comunistas, em que as massas populares lutavam por sua permanência no poder e utilizavam a máxima “Queremos Getúlio”. No entanto, a política populista implantada por Vargas não foi capaz de mantê-lo no poder.
Sua queda pode ser analisada como decorrência de um jogo político complexo. O início do fim da ditadura civil implantada por Vargas ocorreu quando, em 25 de outubro de 1945, ele afastou o chefe de polícia do distrito Federal e o substituiu por seu irmão, Benjamim Vargas. O General Góis Monteiro, Ministro da
Guerra em exercício mobilizou as tropas do Distrito Federal. Vargas se recusou a revogar a nomeação de seu irmão e foi forçado a renunciar por aqueles que haviam sido responsáveis por alçá-lo ao poder em 1930. Assim, mais uma vez, a iniciativa militar esteve presente em nosso processo de transição política. Vargas retirou-se do poder, fazendo uma declaração pública de que concordara com sua saída.

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