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João Carlos Escosteguy Filho
Ricardo Salles
aula 10
Questões 
historiográficas ii - 
império
História da Historiografia Brasileira
54
Meta da aula
Apresentar algumas das principais discussões historiográficas atuais, na historiografia 
brasileira, acerca do período imperial brasileiro.
Objetivo
Esperamos que, ao final desta aula, você seja capaz de identificar algumas linhas 
essenciais de debate a respeito do Império do Brasil, percebendo interpretações, 
autores e influências atuais. 
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
55
INTRODUÇÃO
O período imperial (1822-1889) é de grande importância 
para a compreensão de nossa formação nacional. Não à toa, as 
aulas deste curso de História da Historiografia Brasileira começaram 
com a gestação de uma interpretação da história nacional com 
raízes exatamente no Império, quando se começou a pensar o país 
em termos de nação e iniciou-se uma preocupação em relação à 
escrita de uma história nacional. Por isso se faz tão necessário 
compreender algumas das principais discussões atualmente em curso 
sobre esse período.
Nesta aula, seguiremos uma divisão que contemplará três 
linhas principais: uma a respeito da formação política da sociedade 
imperial, outra mais ligada à economia e uma terceira, abordando 
sociedade e cultura. Antes, porém, incluiremos uma seção dedicada 
a outros autores clássicos, do início a meados do século XX, os 
quais não abordamos em aulas anteriores, devido às limitações de 
tempo e espaço. São, porém, autores cruciais para a compreensão 
do período de que trataremos agora.
Abordagens iniciais da historiografia 
sobre o Império do Brasil
Muitos autores clássicos que trataram do período imperial já 
foram abordados anteriormente, começando por Joaquim Nabuco 
e avançando com Oliveira Vianna, Caio Prado Júnior, Nelson 
Werneck Sodré, Raimundo Faoro. Todos eles, em suas obras, como 
já vimos, deram especial atenção ao Império do Brasil. Por isso, não 
repetiremos sua importância nesta aula. Seguiremos com aqueles 
que foram influenciados pelas obras desses autores já tratados 
anteriormente e/ou dialogaram com elas.
História da Historiografia Brasileira
56
Precisamos, para tanto, relembrar o contexto em que tais 
produções da virada do século XIX para o XX se inserem. A 
primeira década republicana foi marcada por constantes conflitos 
intelectuais entre monarquistas e republicanos. Os primeiros, cujo 
maior símbolo foi o Nabuco de Um estadista do Império, conforme 
já vimos, procuraram analisar a sociedade imperial naquilo que 
ela tinha de maior destaque. Os grandes avanços do período, as 
grandes reformas, transformações, modernizações etc. por que 
passou a sociedade brasileira no oitocentos foram creditados à 
atuação do governo imperial. A época que surge dos escritos desses 
monarquistas, nesse período, é uma era de ouro, nostálgica, um 
tempo substituído por uma república vista como degradante. É nessa 
dimensão elogiosa de construção historiográfica do Império que se 
insere a obra do diplomata Manuel de Oliveira Lima.
Figura 10.1: Manuel de Oliveira Lima.
Fonte: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/
commons/5/52/Oliveira_lima.gif
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
57
Monarquista desgostoso com os rumos do país (a ponto de 
doar sua coleção documental para uma biblioteca norte-americana 
que, hoje, leva seu nome), Oliveira Lima foi autor de uma obra 
consistente, que abordou todo o período imperial, destacando a 
perspectiva política, embora articulasse essa dimensão a outras, 
de ordem econômica, geográfica, social etc. Seus principais 
livros (Dom João VI no Brasil, 1908; Formação histórica da 
nacionalidade brasileira, 1911; O movimento da independência, 
1922; O império brasileiro, 1927) formam uma visão que valoriza 
a atuação monárquica na condução dos rumos do país no século 
XIX, contribuindo para alterar a imagem da monarquia, desgastada 
pela propaganda republicana dos primeiros anos, num momento 
em que cada vez mais se procurava questionar o futuro político do 
Brasil. É válido lembrarmos o quanto a década de 1920, com a 
fundação do PCB, o modernismo, o tenentismo etc., foi profícua em 
termos de contestações sociais e políticas. Das páginas desses livros, 
salta uma monarquia liderada por sábios monarcas (começando por 
Dom João VI), responsável pelos rumos da nacionalidade e sagaz em 
adaptar à realidade americana as instituições europeias, formando 
uma espécie de “presidencialismo hereditário”, ou “democracia 
coroada”, que acabou por ser superior às repúblicas americanas. 
Tal interpretação teria, décadas depois, em João Camillo de 
Oliveira Torres um continuador (A democracia coroada, 1957, Os 
construtores do Império, 1968).
Podemos, então, inserir Oliveira Lima e Nabuco, em que 
pesem as diferenças entre as obras, num mesmo conjunto de autores, 
buscando revalorizar o período imperial. Poderíamos incluir nesse 
rol, ainda, os textos organizados por Vicente Licínio Cardoso, 
sob o título de À margem da História do Brasil (1933), a obra de 
Pandiá Calógeras (A política exterior do Império, 1927-1933, em 
3 volumes, e Formação Histórica do Brasil, 1935) e, por fim, um 
autor já visto anteriormente: Oliveira Vianna. Nos trabalhos desses 
três, a imagem do Imperador Pedro II é ressaltada como responsável 
pela manutenção da unidade e agregação da sociedade brasileira, 
História da Historiografia Brasileira
58
e a procura pelas razões para a crise do Império passa a envolver 
explicações alheias à atuação desse Imperador – como a questão 
militar, o abolicionismo, a má atuação dos partidos etc.
Outra linha de interpretação dessa época não buscava a 
valorização do Império nos moldes aqui definidos. Nesse grupo, 
incluem-se os já vistos Nelson Werneck Sodré, Caio Prado Júnior, 
Sérgio Buarque de Holanda, Raimundo Faoro e, ainda, outros que 
não tivemos oportunidade de estudar, como Manuel Bomfim (O Brasil 
na América, 1929; O Brasil na História, 1931; O Brasil Nação, 
idem). Para este autor, o Império era uma continuação da parasitária 
colonização portuguesa, responsável por levar a cabo uma “falsa 
independência” da qual o Brasil ainda não se livrara. Crítico tanto 
do Império quanto da República, apontava para o Brasil o caminho 
da revolução como alternativa para melhorar sua situação.
Dessa disputa entre duas visões, uma valorativa e outra crítica, 
é que surgem interpretações que, nas transformações do ensaísmo à 
universidade que acompanhamos na Aula 8, tornaram-se basilares 
dos estudos sobre o período. Mal ou bem, a geração clássica 
universitária, cujos trabalhos resultaram em teses de doutorado e 
que passaram a influenciar, direta ou indiretamente, praticamente 
todos os estudos atuais sobre o período, dialogou com os autores 
clássicos dessa geração anterior. 
Parte desse debate foi sintetizada e retomada por Emilia Viotti 
da Costa, em Da Monarquia à República: momentos decisivos, 1977. 
Nesse livro, que reúne diferentes ensaios de sua autoria, Viotti da 
Costa coteja as interpretações monarquistas e republicanas e propõe 
uma nova visão de conjunto que leve em consideração fatores de 
ordem econômica e social. Ainda na década de 1970 e início de 
1980, surgiram outros autores que estabeleceram as linhas mestras 
de interpretação da história do Império as quais, de um modo geral, 
ainda dominam nossa historiografia. 
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
59
Grandes interpretações sobre a história 
do Império
Os estudos atuais sobre a política no Império brasileiro 
devem muito a algumas obras centrais que marcam, ainda hoje, a 
tônica dos debates. Podemos seguir os debates atuais a partir dos 
quadros interpretativos em que cada um desses autores se insere e 
analisar essas discussões a partir das referências a que se reportam. 
Inevitavelmente, na origem, precisamos voltar aos clássicos de nossa 
historiografiapara seguir esse caminho.
A partir do diálogo com os clássicos, duas linhagens 
principais de interpretação se formaram. A primeira é ligada a uma 
leitura de influência weberiana, de Sérgio Buarque de Holanda e 
Raimundo Faoro. Desses autores clássicos, basta apontarmos dois 
elementos essenciais: ambos se inspiraram, de formas distintas, na 
sociologia de Max Weber, conforme vimos nas aulas anteriores. 
Por outro lado, chegaram a conclusões totalmente diferentes em 
relação ao caráter da fundação do Estado e da sociedade no Brasil. 
Enquanto para Sérgio Buarque, a família, representando o domínio 
do privado sobre o público, era a marca de nossa formação, para 
Faoro era o contrário: o caráter público do Estado impusera seu 
domínio, desde sempre, sobre a sociedade brasileira. Mas também 
podemos perceber outra linhagem, ligada às obras, principalmente, 
de Caio Prado Júnior e Fernando Novais. Analisaremos essas duas 
linhagens a seguir.
A matriz interpretativa atual
Comecemos pela primeira linhagem. Da leitura dos 
questionamentos presentes em Sérgio Buarque e Raimundo Faoro 
surgiram dois trabalhos que se tornaram, também, clássicos da nossa 
historiografia, ainda influenciando obras atuais no país (embora o 
segundo tenha influenciado bem mais que o primeiro). Estamos nos 
referindo às obras de Fernando Uricoechea (O Minotauro imperial, 
História da Historiografia Brasileira
60
tese defendida nos EUA em 1976, publicada no Brasil em 1978) e 
José Murilo de Carvalho (A construção da ordem, 1980, e Teatro de 
sombra, 1988, ambas frutos de doutorado defendido no exterior em 
1974). Os dois autores partem de uma problemática estabelecida 
pela sociologia weberiana, embora José Murilo de Carvalho tenha 
se inspirado mais na chamada teoria das elites: a preocupação em 
desvendar as relações entre Estado, sociedade e nação.
Fernando Uricoechea, sociólogo colombiano, insere-se 
na vertente weberiana de interpretação do Estado imperial. 
O próprio título de sua obra já indica o viés interpretativo que 
busca: O Minotauro imperial. Assim como o Minotauro da lenda é 
metade touro, metade humano, também o Império do Brasil, para 
Uricoechea, assume uma feição mista entre a ordem patrimonial, 
característica de muitas formações políticas pré-modernas, e a ordem 
burocrática, típica do Estado moderno; entre o Estado central e a 
ordem local, entre o público e o privado. Para analisar essa feição 
mista, Uricoechea parte da interpretação weberiana, presente já 
no subtítulo de seu livro: “a burocratização do Estado patrimonial 
brasileiro no século XIX”. Ou seja, é a partir, principalmente, 
do conflito entre a permanência de práticas patrimonialistas e o 
desenvolvimento da burocracia estatal que o autor vai analisar a 
organização da sociedade imperial. O foco para essa análise foi a 
Guarda Nacional, instituição imperial onde o movimento de conflito 
entre lógica patrimonialista e lógica burocrática, para ele, mostra-se 
mais evidente.
Em suas conclusões, Uricoechea aponta para o conflito 
que tomou a sociedade ao longo do século XIX: de um lado, o 
patrimonialismo, que já, desde Faoro e Sérgio Buarque de Holanda, 
é usado como conceito para explicar a permanência de práticas 
privadas, ocupando funções públicas no Brasil. Por outro lado, 
o autor aponta para a ascensão de uma ordem burocrática que 
ameaçava esse histórico patrimonialismo e que foi caracterizada 
por duas tendências: por um lado, o aparato burocrático de 
Estado expandiu-se ao longo do século XIX, primeiro na Corte e, 
depois, espalhando-se para a periferia do Império; por outro lado, 
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
61
desenvolveu-se a criação de um sistema burocrático de autoridade 
desligado, ao menos parcialmente, da autoridade patrimonialista 
que se arrastava desde tempos coloniais. A razão para esse avanço 
da burocratização sobre o patrimonialismo, Uricoechea explica, está 
no caráter “incompleto” do patrimonialismo no Brasil: a inexistência 
de uma nobreza rigidamente estratificada, de privilégios, impediu 
o pleno desenvolvimento dessa política no país.
José Murilo de Carvalho teve como principal objetivo, exposto 
em seus livros, desvendar as razões para a peculiaridade da 
formação brasileira na América. A América portuguesa mantivera-
se integrada, enquanto as ex-colônias espanholas haviam se 
fragmentado. O novo Estado nacional permanecera monárquico, 
enquanto o restante do continente caminhara para o republicanismo. 
Para explicar essa peculiaridade, José Murilo recorreu à teoria 
das elites. A unidade territorial e a forma monárquica de governo 
refletiam o sucesso de um projeto político próprio de uma elite política 
autônoma em relação à sociedade. Essa elite se formara no Brasil, 
inicialmente a serviço da monarquia portuguesa e, na conjuntura 
da independência, viu a separação da antiga metrópole como a 
melhor forma de viabilizar o projeto de construção de um império 
unitário e centralizado sob seu controle. Fora “treinada” no serviço 
do Estado, de início português (tendo recebido a mesma formação 
em Coimbra, Portugal) e, assim, partilhava experiências e formação 
semelhantes. Era unificada por sua carreira e por seus interesses 
junto ao Estado, mesmo que seus membros fossem de naturalidade 
distinta – portugueses ou brasileiros – e tivessem origem em diferentes 
setores da sociedade – na própria burocracia estatal, na Igreja, na 
classe dos grandes proprietários rurais, nos comerciantes e, em bem 
menor escala, nos setores intermediários e pobres. Tratava-se de 
uma burocracia organizada e fechada em si mesma, dependente, 
em grande parte, das rendas do próprio Estado para viver, o que 
tornava sua integração a ele ainda maior. Era uma elite cujos membros 
estavam ligados de tal forma, que houve uma redução nos conflitos 
internos a ela, aumentando sua unidade ideológica.
História da Historiografia Brasileira
62
Essa elite conferiu, segundo o historiador, relativa autonomia 
à ação estatal, possibilitando que o governo imperial implementasse 
reformas e projetos que, muitas vezes, contrariavam diretamente os 
anseios das classes econômicas mais poderosas (chamadas por José 
Murilo de “barões”). A “construção da ordem” no Império, assim, 
teria sido obra dessa elite política, ainda que, muitas vezes, essa 
ordem a ser construída contrariasse os interesses da sociedade – e, 
aqui, o termo “sociedade” refere-se, fundamentalmente, à produção 
escravista de exportação. A expressão “dialética da ambiguidade” 
foi formulada pelo historiador para explicar a relação entre política 
e economia, ou seja, a ação do governo perante os grandes 
plantadores. Por um lado, o Estado não podia prescindir da renda 
gerada pela agricultura escravista de exportação; por outro, ele 
mantinha uma relativa autonomia, devida especialmente ao tipo de 
elite por ele formada, que lhe permitia introduzir reformas, mudanças 
e transformações, muitas vezes, à revelia desses grupos econômicos. 
A fórmula da “dialética da ambiguidade” expõe essas mudanças, 
feitas a partir de relações ambíguas entre setores econômicos e 
políticos do Império.
Podemos perceber que tanto José Murilo de Carvalho quanto 
Fernando Uricoechea, apesar de valorizarem uma interpretação 
que confere autonomia à política imperial sobre a sociedade, vão 
além de Faoro, não enxergando no Estado uma “carapaça” que 
engole a sociedade e a conduz ao seu bel-prazer. Pelo contrário: 
para José Murilo, apesar de autônomo, esse Estado imperial não 
deixa de manter relações com a sociedade, ainda que muitas 
vezes conflituosa; para Uricoechea, o patrimonialismo brasileiro 
nunca permitiu a existência de um “estamento burocrático” que, 
rigidamente, mantivesse o poder sobre a sociedade.
Podemos, agora, avaliar a outra linhagem de interpretação 
para a análise política da sociedade imperial brasileira, distinta da 
de Carvalhoe Uricoechea. Essa segunda linha, como dissemos, não 
é ligada à tradição de Sérgio Buarque e Faoro, mas à de Caio Prado 
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
63
Júnior e Fernando Novais. Trata-se de Ilmar Rohloff de Mattos, cujo 
livro O tempo Saquarema, de 1986, é resultado de tese defendida 
na Universidade de São Paulo, em 1985.
Quando comparamos a obra de José Murilo de Carvalho 
e Fernando Uricoechea, em que pesem as diferenças, podemos 
perceber uma semelhança: em ambos os autores, as relações entre 
Estado e sociedade são vistas a partir de relações entre entidades 
com uma razoável dose de separação. Estado e sociedade são 
tratados como elementos isolados, em oposição. A discussão 
fica presa à análise de se o Estado é forte e a sociedade, fraca 
(predominando a ordem pública); ou se o Estado é fraco e a 
sociedade, forte (predominando a ordem privada).
A obra de Ilmar Mattos segue em outra direção. Do ponto de 
vista teórico, baseia-se principalmente em dois autores marxistas: 
o dirigente comunista italiano Antonio Gramsci e o historiador 
britânico Edward Palmer Thompson. Nesses dois autores, Ilmar 
busca uma concepção de Estado como um produto das relações e 
das lutas entre as classes sociais. Nessa concepção, o Estado tem 
uma marca de classe, constrói-se a partir das práticas de classe 
e organiza-se, no fundamental, a partir (da) e para assegurar 
a dominação de uma classe. Isso, contudo, não se deve a uma 
determinação lógica, mas é, antes, o resultado de um complexo 
histórico concreto. Na análise de Ilmar Mattos, o Estado imperial 
é visto como resultado do fortalecimento e da ascensão de uma 
classe social – a classe senhorial – ligada diretamente à produção 
cafeeira escravista do Vale do Paraíba, que, em determinado 
momento da trajetória histórica brasileira, começa a interligar 
seus destinos (isto é, suas práticas, sua concepção de mundo, seus 
valores, seus horizontes de perspectiva) aos destinos do próprio 
Estado. Os processos de formação histórica da classe senhorial e de 
construção do Estado imperial são indissoluvelmente ligados. Não 
há classe senhorial sem Estado imperial; não há Estado imperial sem 
classe senhorial. Para Ilmar, há, assim, uma associação profunda, 
no século XIX, entre escravidão, café e o Império: os interesses 
História da Historiografia Brasileira
64
imediatos dessa classe (café e escravidão) e seus interesses de longo 
prazo (sua preeminência social e política) tornam-se interesses do 
próprio Império.
O elo entre a classe senhorial e o Estado é constituído por 
intelectuais (categoria central no pensamento de Antonio Gramsci), 
que atuam como agentes de elaboração da visão de mundo e de 
exercício da dominação dessa classe. O núcleo desses intelectuais 
foram os dirigentes do Partido Conservador do Rio de Janeiro, 
tradicionalmente chamados de “Saquaremas”. Por isso, o título 
do livro O tempo Saquarema significa, na verdade, a construção 
da direção dos caminhos do Império a partir dos interesses desse 
núcleo, que acaba incorporando todas as demais classes e frações 
de classe do Império aos seus objetivos mais gerais. 
Os termos do debate sobre a natureza do Estado imperial, 
que ainda regem nossa historiografia sobre o período, foram 
estabelecidos por essas interpretações, particularmente as de José 
Murilo de Carvalho e Ilmar Rohloff de Mattos. Em primeiro lugar, 
há a questão da relação entre Estado e sociedade, especificamente 
entre Estado e a classe dos grandes proprietários rurais escravistas: 
o Estado era ou não, e até que ponto, autônomo em relação aos 
interesses dessa classe? Havia um projeto de modernização política 
e mesmo social e econômica capitaneado pela elite política? Ou o 
Estado imperial, ao fim e ao cabo, defendia os interesses da classe 
de proprietários rurais escravistas? Em segundo lugar, trata-se de 
discutir as relações entre o Estado central e os grupos dominantes 
locais: as políticas centralizadas predominavam ou não, e até que 
ponto, sobre as práticas de mandonismo e clientelismo locais? 
Evidentemente, nenhuma dessas dualidades pode ser tomada 
em termos absolutos, e não o foram pelos autores analisados. A 
questão e o debate estão na linha interpretativa, predominantemente 
empregada por cada um deles, e nos resultados historiográficos 
obtidos. Na verdade, termos e noções como elite, classe senhorial, 
centralização, patrimonialismo, clientelismo etc. têm sido, muitas 
vezes, usados de forma mais ou menos consciente, com maior ou 
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
65
menor rigor em sua caracterização e eventual contradição, pelos 
historiadores que se dedicam a estudar o Império. De um modo geral, 
podemos assinalar o amplo predomínio da interpretação de José 
Murilo de Carvalho, em relação ao termo “elite”, com doses maiores 
ou menores de ênfase no peso da classe senhorial, no patrimonialismo 
e no clientelismo por parte da historiografia corrente. 
Renovação interpretativa e estado atual
Alguns historiadores, no entanto, têm conscientemente entrado 
no debate sobre a natureza do Estado imperial de forma mais 
sistemática. 
Richard Graham, por exemplo, em seu livro Clientelismo e 
política no Brasil do século XIX, de 1997 (primeira edição em inglês, 
de 1990), afirma que o clientelismo e a centralização política não 
se contradiziam, mas se complementavam. Os mandantes locais 
dependiam dos favorecimentos do governo central para montarem 
suas clientelas, e o governo, por sua vez, dependia do apoio dessas 
redes clientelares locais para vencer as eleições.
Ricardo Salles, em ensaio interpretativo intitulado Nostalgia 
imperial (1996), propôs a continuidade da análise de Ilmar Rohloff 
de Mattos, ainda em termos gramscianos, para entender o Império, 
mais especificamente a partir do final da década de 1860 até a 
abolição e a proclamação da República. Esse período, a partir 
da Guerra do Paraguai, do novo quadro internacional gerado 
pela derrota da Confederação na Guerra da Secessão e das 
novas condições das relações entre senhores e escravos depois da 
abolição do tráfico internacional, em 1850, deve ser entendido 
como de crise hegemônica da classe dos grandes proprietários 
escravistas, especialmente de sua fração fluminense. O mesmo 
autor retomou essa perspectiva com foco nas relações das regiões 
de Vassouras e do Vale do Paraíba com o Estado imperial em E o 
Vale era o escravo (2008).
História da Historiografia Brasileira
66
Nos últimos anos, surgiram, ainda, duas correntes que 
propõem uma revisão mais radical da matriz interpretativa da história 
do Estado imperial. 
A primeira é representada pelo trabalho de Maria Fernanda 
Vieira Martins, A velha arte de governar, tese de doutorado de 
2005, publicada em 2007. Para essa autora, as teses de um Estado 
central controlado por uma elite política com seu próprio projeto de 
modernização ou, de forma mais indireta, de um Estado representativo 
dos interesses da classe senhorial devem ser contestadas. Maria 
Fernanda segue a ideia de que a colonização portuguesa havia 
criado um “Antigo Regime nos trópicos”. De acordo com essa visão, 
o Estado português, até o século XIX, não deve ser entendido como 
um Estado moderno, burocrático e centralizado administrativamente, 
mas sim como um Estado corporativo, atravessado por órgãos, 
instâncias e grupos com práticas e interesses próprios. O Império 
do Brasil teria dado continuidade a essas práticas, apesar de a 
autora reconhecer uma tensão entre sua manutenção e a presença 
de um certo projeto modernizador. Estudando o segundo Conselho 
de Estado (1840-1889), Maria Fernanda procurou analisar as 
teias de relações pessoais entre seus membros, concluindo que a 
atuação dessa elite era pautada, em grande parte, pela busca por 
estratégias de sobrevivência pessoal. Ou seja, a compreensão do 
Estado imperial se dá pela análise das formaspelas quais essas 
elites buscam a melhor forma de manter sua posição, seu prestígio 
e o encaminhamento de sua dominação. A ação estatal soa como 
um desdobramento, no plano institucional, das ações locais e 
cotidianas dessas elites.
O termo “elite”, aliás, é muito usado nessa obra, porém com 
sentido diverso daquele dado por José Murilo de Carvalho. Se, para 
Carvalho, elite constitui o conjunto dos estadistas do império e liga-se 
à ideia de política, nas obras relacionadas à ideia do Antigo Regime 
nos trópicos o termo é mais abrangente, incorporando os grupos 
que mantêm o controle dos capitais, simbólicos ou não, que acabam 
servindo como um sinal de distinção perante o restante da sociedade.
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
67
Na última das correntes que abordaremos, essa ideia é posta 
em xeque, visto que, para seus estudiosos, o Império, na verdade, 
alcançou, em algum momento, um equilíbrio federativo. Ao invés 
de centralizado, ele seguiu uma “vocação americana” tal, que 
manteve o poder, o exercício da política e a organização social nas 
províncias, e não na Corte. O espaço da política na Corte seria, na 
verdade, apenas uma dimensão de debate das “elites provinciais”, 
em que elas teriam plena força para atuar com seus projetos locais. 
Além disso, essa dimensão não foi abalada significativamente pelas 
políticas de regresso, que viam a interpretação do Ato Adicional 
como a medida centralizadora por excelência.
O maior expoente dessa corrente é o trabalho de Miriam 
Dolhnikoff, professora da USP, especialmente no livro O pacto 
imperial, 2005 (fruto de doutorado defendido em 2000). Nessa 
obra, a autora analisou a política imperial, relacionando a 
atuação dos representantes e das elites de três províncias centrais 
(São Paulo, Pernambuco e Rio Grande do Sul), concluindo que, 
na construção do Estado imperial, esses grupos provinciais 
impuseram uma organização institucional e um arranjo político 
que, simultaneamente, garantia-lhes a condução da direção em 
suas províncias e a influência na ação oriunda da Corte. Em outras 
palavras, não apenas as províncias mantinham sua força local, 
mas também atuavam diretamente levando suas demandas e suas 
questões ao poder central.
É difícil, ainda, antever o impacto que essas duas últimas 
análises – a de Maria Fernanda Vieira Martins e a de Miriam 
Dolhnikoff – ainda podem causar nos estudos sobre o Estado 
imperial. As interpretações de Ilmar Mattos e José Murilo de 
Carvalho, tomadas como grandes matrizes interpretativas – a partir 
da perspectiva de classe ou da perspectiva de elite – ainda provocam 
muitos debates e conduzem expressivamente as análises sobre a 
política e a sociedade do período em questão.
História da Historiografia Brasileira
68
Atende ao objetivo da aula
1. A partir do que foi estudado sobre a política imperial, relacione as abordagens dos 
principais autores tratados às influências teóricas que lhes servem de inspiração.
Resposta Comentada
Podemos perceber, na abordagem política do Império do Brasil, três grupos principais de análise.
O primeiro, influenciado por Max Weber, traça um perfil da construção do Estado imperial a 
partir dos conceitos de patrimonialismo e burocracia. Nesse sentido, está o trabalho de Fernando 
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
69
Urichoechea, feito a partir da Guarda Nacional.
O segundo, de diferentes formas, utiliza o conceito de elite para construir sua análise. Essa 
vertente é bastante heterogênea: temos o trabalho de José Murilo de Carvalho, no qual o termo 
“elites” é acompanhado do termo “políticas” e cuja abordagem procura analisar o papel dessas 
“elites políticas” a partir de sua formação e treinamento. Temos também a corrente do “Antigo 
Regime nos trópicos”, na qual o termo “elites” aparece mais ligado ora a questões econômicas, 
ora a questões meramente descritivas, com menor precisão em relação ao universo a que se 
refere. Por fim, no trabalho de Miriam Dolhinikoff, o termo “elites” vem acompanhado do termo 
“regionais”, pois, invertendo a interpretação de José Murilo de Carvalho, Dolhinikoff aborda a 
construção do Estado não pela visão da centralização, mas pela perspectiva federalista.
Por fim, temos a análise de Ilmar Rohloff de Mattos, fortemente influenciada pelo marxismo de 
Thompson e, principalmente, Antonio Gramsci, vendo a construção do Estado imperial a partir 
de suas relações com a formação da chamada classe senhorial.
A economia no Império
Já desde o século XIX se dizia que “o Império é o café”. Não 
surpreende, portanto, que a maior parte dos estudos dedicados à economia 
do Império tomasse a produção cafeeira como eixo central explicativo.
Figura 10.2: O ramo de café presente na bandeira imperial brasileira.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Ficheiro:Flag_of_Empire_of_Brazil_(1847-
1889).svg&page=1
História da Historiografia Brasileira
70
A historiografia sobre o café é vastíssima, mas duas correntes 
interpretativas centrais são, atualmente, as mais trabalhadas pelos 
historiadores. Para entendê-las, precisamos voltar à Aula 9: a 
primeira corrente é a formulada pela historiografia do arcaísmo como 
projeto; a segunda é uma crítica a ela, que recupera argumentos 
trabalhados por uma historiografia mais clássica.
Para não tornarmos a aula redundante, não repetiremos 
os argumentos acerca da ideia do arcaísmo como projeto. Basta 
lembrarmos que tal abordagem encontrou sua formulação mais 
elaborada na obra de João Fragoso e Manolo Florentino, ambos 
analisando a economia colonial nacional num período que avança 
até o aumento da produção de café, a partir das estruturas internas 
à sociedade brasileira do período, e não a partir das flutuações 
do mercado mundial. Para Fragoso e Florentino, o investimento em 
terras, escravos e produção agrícola não se explica pela busca 
por lucros, e sim por um ideal arcaizante que identifica terras e 
escravos com ascensão social, portanto desejável, ainda que o 
empreendimento fosse menos lucrativo que o capital mercantil. Este, 
por sua vez, seria o espaço de concentração maior de riqueza para 
esses autores.
A abordagem de Fragoso e Florentino, se atentarmos para 
os aspectos mais diretamente relacionados ao período imperial, e 
não ao Brasil colonial, é um exemplo dos estudos que reavaliaram 
as análises clássicas para a montagem da cafeicultura brasileira. 
Os trabalhos clássicos, desde a década de 1940, concentravam-
se na relação direta entre café e mercado mundial, destacando a 
crise da mineração, a partir de meados do século XVIII, e a queda 
exponencial nos preços do açúcar, à mesma época, como fatores 
decisivos para a cafeicultura no século XIX. Segundo essa linha de 
raciocínio, o café seria quase uma sequência na secular produção 
agrária e escravista brasileira, sempre voltada para o mercado 
externo e praticada a baixos custos. A disponibilidade de terras, 
capitais e escravos, devido à dupla crise que mencionamos acima, 
quase automaticamente teria sido dirigida para o café. A sequência 
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
71
açúcar-mineração-café seria marca indelével do nosso passado. 
Podemos perceber essa visão, em que pesem as diferenças entre 
os autores, nas obras de Roberto Simonsen (Aspectos da história 
econômica do café, 1940), Caio Prado Júnior (História econômica 
do Brasil, 1945), Celso Furtado (Formação econômica do Brasil, 
1959), Emília Viotti da Costa (Da senzala à colônia, 1966) e até na 
obra de brasilianistas como Stanley Stein (Vassouras: um município 
brasileiro do café, 1957).
Foi contra essa historiografia clássica que a obra de Fragoso 
e Florentino argumentou. Por sua vez, a crítica à visão do arcaísmo 
começou a ser formulada retomando-se seu fundamento. Se a obra 
de Fragoso e Florentino priorizou as relações internas à sociedade 
brasileira, a crítica a essa análise voltou a olharas relações entre 
sociedade e mercado mundial.
Podemos apontar a nova perspectiva, principalmente, nos 
trabalhos de Rafael Marquese e Ricardo Salles, ambos preocupados 
com a construção da sociedade cafeeira no Vale do Paraíba 
fluminense. A ideia fundamental, formulada pelo historiador norte-
americano Dale Tomich e que norteia essa abordagem, é a de que, 
no mesmo período em que a escravidão colonial entra em crise, 
finais do século XVIII, conectada com a expansão do mercado 
mundial capitalista, desenvolve-se uma “segunda escravidão” 
(a expressão é de Dale Tomich), que, já estudada na primeira 
aula do curso de História do Brasil II, teve lugar principalmente 
no sul dos Estados Unidos, no Brasil e em Cuba, e significou o 
fortalecimento da escravidão como regime de trabalho moderno 
e extremamente lucrativo. Esse fortalecimento ocorreu tanto por 
meio do recrudescimento do tráfico internacional, quanto por meio 
da reprodução natural da população escrava, da implantação, 
intensificação e expansão do regime de plantations, e do 
fortalecimento político de “novas” classes nacionais ou regionais 
de proprietários de terras e de escravos. 
Mas não apenas de café vivia a economia do Império. Duas 
outras temáticas têm levado cada vez mais historiadores a voltar-se 
para o passado brasileiro, ambas referindo-se às transformações 
História da Historiografia Brasileira
72
sociais e mudanças políticas por que passou o país ao longo do século 
XIX. Trata-se da questão do abastecimento interno, das atividades 
financeiras bancárias e mesmo da industrialização incipiente.
Em relação à primeira temática, a de abastecimento, a 
obra clássica de Alcir Lenharo (As tropas da moderação, 1978) 
já apontava a importância de estudos desse tipo para a melhor 
compreensão da política e sociedade imperiais. Em seu livro, 
Lenharo analisa a progressiva integração da região Centro-Sul do 
Império, especialmente a partir da vinda da Corte e da política 
joanina. Tal integração, possibilitada pela abertura de estradas e 
pelo fomento à agricultura de abastecimento, fortaleceu um grupo 
ligado a essa produção agrícola que, nas primeiras décadas do 
Império, ascendeu socialmente e influenciou decisivamente nos 
rumos da política imperial, especialmente na Regência. Essa ligação 
entre agricultura de abastecimento e política da Corte exemplifica 
a necessidade de se olhar para o Império a partir de horizontes 
mais amplos: não obstante a importância do café seja indiscutível, 
o Império tinha diversos outros grupos não diretamente ligados a 
ele, como demonstram estudos mais recentes de Francisco Luna 
e Herbet Klein (Evolução da sociedade e economia escravista de 
São Paulo, 2006) e de Pedro Henrique Campos (Nos caminhos da 
acumulação, 2010).
Quanto às atividades financeiras, bancárias e de industrialização 
e modernização, desenvolvidas no Império a partir da década de 
1850, ainda há um vasto mundo a ser pesquisado. Sobre os bancos 
e as finanças, podemos citar a tese de doutorado Bancos, economia e 
poder no Segundo Reinado, defendida na USP em 1997, assim como 
diversos artigos sobre o assunto, de Carlos Gabriel Guimarães. Sobre 
o tema da construção das ferrovias, que ganha grande dimensão na 
economia brasileira a partir de 1850, há o livro pioneiro de Almir 
Chaiban El-Kareh, Filha branca de mãe preta, de 1982. O ponto 
central desses dois trabalhos é o de apontar a compatibilidade e 
mesmo a sinergia entre as atividades financeiras e de modernização 
tecnológica, e a ordem escravista dominante.
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
73
Cultura e sociedade imperiais
Os temas ligados à cultura em termos de historiografia 
brasileira, como já tivemos oportunidade de discutir na Aula 9, 
são cada vez mais diversificados. Podemos perceber o mesmo 
movimento de multiplicação temática no tocante ao Império do 
Brasil. Antes dessa análise pluralista, porém, desenvolveu-se toda 
uma historiografia que via a vida cultural no Brasil por outros olhos.
Os primeiros estudos que visavam à dupla cultura/sociedade 
foram marcados por duas vertentes principais: em primeiro lugar, a 
descrição idealizada da época imperial, em especial dos hábitos, 
costumes e atitudes da “boa sociedade” de então, alinhada a 
padrões aristocráticos europeus; em segundo lugar, a escrita sobre 
a vida cultural-literária do período, que se influenciou pela formação 
de um campo estético/literário no Brasil marcado, principalmente, 
por suas relações com os movimentos europeus da mesma época. 
Em relação à primeira vertente, podemos citar o clássico livro de 
Wanderley Pinho, Salões de damas do Segundo Reinado (1939); 
em relação à segunda, podemos citar os autores que descreveram 
a vida literária no Brasil da época, especialmente Antônio Cândido 
(Formação da literatura brasileira, 1957) e Alfredo Bosi (História 
concisa da literatura brasileira, 1970).
Em relação à sociedade, estritamente falando, os trabalhos 
de cunho biográfico predominavam no princípio, fortemente 
influenciados por uma visão da História que associava o 
desenvolvimento social à ação dos “grandes homens”. Multiplicaram-
se, assim, estudos biográficos sobre os “grandes nomes” do Império. 
Podemos mencionar, nessa vertente, os trabalhos de Octávio 
Tarquínio de Sousa (História dos fundadores do Império do Brasil, 
1957) e Hélio Vianna (Vultos do Império, 1968).
A partir das influências da nova história cultural e da 
antropologia, que já tivemos oportunidade de ver antes, os estudos 
sobre cultura e sociedade imperiais se alteraram. Essas influências, 
História da Historiografia Brasileira
74
somadas às da história social inglesa e da micro-história, conferiram 
à abordagem biográfica um “outro olhar”, saindo dos “grandes 
nomes” e adentrando no domínio da “gente comum”.
Exemplos dessas influências e abordagens não faltam. Para 
nos mantermos, por enquanto, nas duas vertentes mencionadas 
anteriormente, podemos apontar, na primeira, a obra de Jeffrey 
Needell (Belle époque tropical, 1993) como um retrato crítico da 
sociedade carioca de finais do oitocentos, analisando a influência 
que aí tiveram os hábitos franceses e ingleses. Na segunda, podemos 
indicar as obras de Maria Helena Rouanet (Eternamente em berço 
esplêndido, 1991) e de Roberto Ventura (Estilo tropical, 1991) como 
exemplos de pesquisas articulando a vida cultural no Império aos 
debates acerca do caráter nacional, da civilização, raça, religião 
etc. Trata-se, enfim, de um panorama mais amplo das questões 
políticas, sociais e culturais da época.
Em relação à segunda vertente, a biográfica, destacaram-
se, nos últimos anos, os estudos sobre personagens peculiares ou 
clássicos, mas a partir da relação entre suas vidas e do contexto 
em que viveram. Personagens do primeiro tipo foram retratados nos 
livros de Eduardo Silva (Dom Obá II d´África, o príncipe do povo, 
1997), João José Reis (Domingos Sodré: um sacerdote africano, 
2008) e a obra coletiva envolvendo o mesmo João Reis, Flávio 
Gomes e Marcus Joaquim de Carvalho (O alufá Rufino: tráfico, 
escravidão e liberdade no Atlântico negro, 2010). Nessas três 
obras, nota-se a preocupação dos autores em relacionar a vivência 
dos protagonistas de seus trabalhos ao contexto mais amplo da 
sociedade escravista em que se inserem. As vidas narradas são 
portas de entrada para esse universo.
Também, nesse sentido, as biografias clássicas foram 
revisitadas, como, por exemplo, a de Pedro II, com Lilian Moritz 
Schwartz (As barbas do Imperador, 1998) e as diversas, reunidas 
na coleção “Perfis brasileiros”, da Companhia das Letras, abordando 
Dom Pedro I (por Isabel Lustosa), José Bonifácio (por Miriam 
Dolhnikoff), o general Osório (por Francisco Doratioto), Castro Alves 
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
75
(por Alberto da Costa e Silva), Joaquim Nabuco (por Angela Alonso) 
e, por fim, novamente Dom PedroII (por José Murilo de Carvalho). 
Essa coleção, em que pesem os diferentes autores, portadores 
de diversas visões sobre o passado brasileiro, tem em comum a 
abordagem que liga indivíduo e sociedade, afastando-se, nesses 
termos, das biografias laudatórias de décadas anteriores.
Outros elementos essenciais dos estudos sobre cultura e 
sociedade, no Brasil Imperial, podem ser apontados nesta aula. Uma 
boa porta de entrada para esse universo é o volume correspondente 
ao Império da História da vida privada no Brasil, na obra intitulada 
"Império: a Corte e a modernidade nacional" (1997), sob direção de 
Luiz Felipe de Alencastro, contendo artigos de diversos historiadores 
do país, enfocando diferentes aspectos da sociedade e da cultura 
imperiais. Mas, se essa obra aborda as temáticas de forma mais 
geral, outros estudos mais setorizados têm inspirado trabalhos que 
envolvam a questão cultural. São exemplares os livros de João 
José Reis (A morte é uma festa, 1991), sobre as formas como as 
pessoas viam a questão da morte, dos enterros e da religiosidade; 
o de Martha Abreu (O império do divino, 2000), sobre as festas e 
cerimônias de rua que se ligavam à reiteração da dimensão católica 
da sociedade imperial; e o de Mariana Muaze (As memórias da 
Viscondessa, 2008), sobre as representações de si que faziam 
membros da classe senhorial do Vale do Paraíba fluminense. A esses 
poderíamos somar centenas de outros trabalhos.
Podemos perceber, desse modo, que os temas ligados à 
cultura e à sociedade imperiais, de uma forma ou outra, acabam 
englobando aspectos políticos e econômicos daquela sociedade, 
seja pela escolha dos objetos, seja pela forma de abordagem.
História da Historiografia Brasileira
76
Atende ao objetivo da aula
2. Relacione a importância do Vale do Paraíba fluminense nos estudos econômicos sobre o 
Império à relevância que vários estudos sobre a cultura imperial conferem à “boa sociedade”.
Resposta Comentada
Podemos responder a essa questão por dois ângulos distintos, porém relacionados.
Por um lado, percebemos que a centralidade de muitos estudos econômicos na produção 
cafeeira liga-se a toda uma gama de estudos culturais que abordam o cotidiano da classe 
senhorial fluminense. Assim, podemos relacionar a importância do café, dada pela historiografia 
econômica, à importância da cultura da classe senhorial, da “boa sociedade”, conferida por 
diversos outros estudos a respeito das sociabilidades no Império do Brasil.
Por outro lado, podemos responder a essa pergunta relacionando as consequências sociais da 
expansão cafeeira, especialmente no tocante à escravidão, ressaltadas pela historiografia sobre 
o tema, com a profusão de estudos culturais que focalizam a cultura escrava, como mencionamos 
nas biografias apontadas anteriormente.
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
77
CONClUSÃO
O que o futuro da historiografia brasileira reserva para o 
Império do Brasil? Repassando as publicações dos últimos anos, 
podemos acompanhar algumas linhas de desenvolvimento. Vale a 
pena falar sobre elas.
Em primeiro lugar, percebemos, para o Império do Brasil, 
o mesmo movimento que acometeu as demais áreas da pesquisa 
histórica no Brasil: a expansão dos programas de pós-graduação, 
regionalizando os temas e multiplicando as pesquisas. Hoje 
podemos ir além do eixo Rio - São Paulo - Minas e acompanhar o 
século XIX nas regiões Norte, Nordeste, Sul e Centro-Oeste, sempre 
preocupadas em articular a política que se desenrolava na Corte 
às realidades locais.
Em segundo lugar, podemos perceber como algumas 
temáticas passaram a sobressair nos estudos sobre o Império, 
especialmente os eixos de pesquisa sobre o Estado, a nação e a 
cidadania. Nesse sentido, o período que marca, tradicionalmente, 
nossa independência (1820-1823) e o momento de consolidação 
do Estado imperial (por volta das décadas de 1840 e 1850) 
ganharam destaque. Percebem-se, nos estudos produzidos hoje 
sobre esses três eixos, uma ampla influência da chamada História 
dos Conceitos, que teve no trabalho do historiador alemão Reinhart 
Koselleck (especialmente pelo livro Futuro passado) um grande exemplo. 
Também crescem, cada vez mais, as comparações entre o processo de 
construção do Estado e das identidades nacionais no Brasil, e aquele 
que acometeu as ex-colônias hispânicas à mesma época.
Essa direção de pesquisas cresce cada vez mais, principalmente 
após a publicação do trabalho da professora Lúcia Bastos Pereira das 
Neves (Corcundas e Constitucionais, 2003), cuja tese foi defendida 
na USP em 1992. A USP, aliás, principalmente a partir do projeto 
de pesquisa coordenado pelo saudoso professor István Jancsó, 
denominado “Brasil: formação do Estado e da nação”, produziu 
História da Historiografia Brasileira
78
uma ampla sequência de estudos articulando esses três conceitos 
centrais. Além dos inúmeros livros, podemos perceber mostras 
desses trabalhos nas duas coletâneas publicadas por esse projeto: 
a primeira homônima, publicada em 2003, e a segunda intitulada 
Independência: história e historiografia, publicada em 2005.
Os grupos de pesquisa têm crescido cada vez mais, ligando 
pesquisadores de diversas universidades do país em torno de 
problemáticas semelhantes. Além do mencionado grupo da USP, 
podemos mencionar a formação do CEO (Centro de Estudos do 
Oitocentos), sob direção de José Murilo de Carvalho, conectando 
pesquisas em torno especialmente das relações entre nação e 
cidadania. Desse grupo surgiram também várias coletâneas, dentre 
as quais destacam-se Nação e cidadania no Império (2007), 
Repensando o Brasil do oitocentos (2009) e a trilogia organizada 
por Ricardo Salles e Keila Grinberg (O Brasil imperial, 2009).
Para onde caminharão os estudos agora? É cada vez 
mais difícil dizer. Nota-se que, neste espaço de poucas páginas, 
abordamos apenas uma pequena fatia de nossa produção. O 
Império do Brasil, como momento privilegiado de nossa formação 
nacional, está cada vez mais ligado aos anseios que nos movem 
no presente. A celebração dos 200 anos da vinda da Corte, por 
exemplo, provocaram uma explosão de estudos e publicações a 
respeito do período joanino em torno do ano de 2008. É de se 
esperar que algo semelhante, se não maior, ocorra em 2022.
Podemos concluir esta aula, então, afirmando que os 
estudos sobre o Império do Brasil refletem muito de nosso modo 
de enxergar o Brasil atual. Se boa parte da nossa historiografia 
clássica, no alvorecer do século XX, procurou no Império nossa 
origem nacional a partir do elogio da monarquia, é preciso, 
cada vez mais, recuperar a preocupação com a nossa formação 
identitária, sem que isso nos faça cair no elogio simples ou em 
uma nostalgia imperial.
Aula 10 – Questões historiográficas II - Império
79
ReSUMO
Diversos temas e interpretações a respeito do século XIX no 
Brasil foram tratados nesta aula.
Em relação à questão política e social, abordamos as obras 
de José Murilo de Carvalho, Fernando Uricoechea e Ilmar Rohloff 
de Mattos, cada um interpretando a formação do Estado imperial a 
partir de problemáticas centrais e conferindo a esses questionamentos 
respostas distintas, de acordo com seus aportes teóricos.
Em relação à economia, pudemos perceber que, não obstante 
as diversas interpretações para a formação econômica do Império, 
a maioria dos estudos centra, ainda, na questão do café, principal 
produto de exportação do país no período.
Por fim, em relação à cultura e à sociedade, pudemos 
perceber as duas principais diferenças de enfoque: uma, mais 
ligada à cultura da “boa sociedade”; e outra, ligada à questão 
da cultura “vista de baixo”.
Informação sobre a próxima aula
Na próxima aula, trataremos da historiografia a respeito da 
República. Até lá!

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