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759. 760. § 79. EFEITOS DA INTERPOSIÇÃO DO RECURSO Sumár io: 759. Efeitos básicos do recurso: devolutivo e suspensivo. 760. Efeito substitutivo. 761. Efeito translativo. 762. Efeito expansivo. Efeitos básicos do recurso: devolutivo e suspensivo Os recursos podem ter, em princípio, dois efeitos básicos: o devolutivo e o suspensivo. Pelo primeiro, reabre-se a oportunidade de reapreciar e novamente julgar questão já decidida; e, pelo segundo, impede-se ao decisório impugnado produzir seus naturais efeitos enquanto não solucionado o recurso interposto. Em regra, nenhuma questão, depois de solucionada em juízo, pode ser novamente decidida, porque se forma em torno do pronunciamento jurisdicional a preclusão pro iudicato (NCPC, art. 505, caput),261 requisito necessário a que o processo caminhe sempre para frente, sem retrocesso, rumo à solução do litígio. O mecanismo dos recursos, porém, tem sempre a força de impedir a imediata ocorrência da preclusão e, assim, pelo efeito devolutivo, inerente ao sistema, dá-se o restabelecimento do poder de apreciar a mesma questão, pelo mesmo órgão judicial que a decidiu ou por outro hierarquicamente superior. Não se pode, logicamente, conceber um recurso que não restabeleça, no todo ou em parte, a possibilidade de rejulgamento. E nisso consiste o denominado efeito devolutivo dos recursos. Já o efeito suspensivo (impedimento da imediata execução do decisório impugnado), que era a regra geral para o Código de 1973, passou a ser a exceção no novo CPC, prevista apenas para a apelação (art. 1.012, caput).262 Assim é que o art. 995 dispõe que “os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso”. Apenas excepcionalmente a decisão será suspensa, “se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso” (parágrafo único do art. 995). Isto, todavia, dependerá sempre de decisão do relator, caso a caso. Efeito substitutivo 1241 (a) (b) 761. A par dos efeitos devolutivo e suspensivo, um outro efeito – o substitutivo – é atribuído pelo art. 1.008 do NCPC263 aos recursos em geral. Consiste ele na força do julgamento de qualquer recurso de substituir, para todos os efeitos, a decisão recorrida, nos limites da impugnação. Trata-se de um derivativo do efeito devolutivo. Se ao órgão ad quem é dado reexaminar e redecidir a matéria cogitada no decisório impugnado, torna-se necessário que somente um julgamento a seu respeito prevaleça no processo. A última decisão, portanto, i.e., a do recurso, é que prevalecerá. Para que a substituição ocorra, todavia, hão de ser observados alguns requisitos: o recurso deverá ter sido conhecido e julgado pelo mérito; se o caso for de não admissão do recurso, por questão preliminar, ou se o julgamento for de anulação do julgado recorrido, não haverá como o decidido no recurso substituir a decisão originária; deverá o novo julgamento compreender todo o tema que foi objeto da decisão recorrida; se a impugnação tiver sido parcial, a substituição operará nos limites da devolução apenas. É irrelevante, in casu, que o recurso julgado pelo mérito tenha sido provido ou improvido. Em qualquer caso (até mesmo quando de fato resulte “confirmada” a decisão recorrida), o decidido na instância recursal é que prevalecerá e que irá fazer coisa julgada. É possível, outrossim, que a mesma matéria seja objeto de sucessivas impugnações recursais no mesmo processo. Ocorrendo tal, cada julgamento substitui o precedente e apenas o último prevalece para operar a coisa julgada e para sub- meter-se a eventual rescisória. No caso de a sentença recorrida cogitar do mérito e ter acarretado revogação de anterior antecipação de tutela, já se decidiu que a cassação do julgado, em via recursal, “implica o restabelecimento dos efeitos da medida antecipatória”.264 Mesmo que não o diga expressamente, o efeito maior do julgamento substitutivo, alcança a restauração completa do status quo, inclusive a medida tutelar de urgência, no entendimento do TJMG.265 Efeito translativo Por força do efeito devolutivo, em regra o recurso transfere o conhecimento da causa para o juízo recursal nos limites da impugnação formulada pelo recorrente, 1242 uma vez que se admite o ataque à decisão “no todo ou em parte” (NCPC, art. 1.002), e que o julgamento do tribunal deva substituir a decisão impugnada “no que tiver sido objeto do recurso” (art. 1.008). Reconhece-se que o recurso, como desdobramento do direito de ação, rege-se pelo princípio dispositivo. Daí que cabe à parte definir o objeto da impugnação, limitando a devolução de conhecimento da causa ao tribunal àquilo que o recor-rente lhe haja transferido por meio do efeito devolutivo. Além, contudo, da transferência compreendida nos termos do recurso, exis-tem matérias de que o tribunal ad quem poderá conhecer, independentemente da devolução operada pela vontade impugnante do recorrente. Trata-se das questões de ordem pública, como aquelas ligadas às condições da ação e aos pressupostos processuais, e outras que, por força de lei, os tribunais têm de apreciar e resolver ex officio, a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição (art. 485, § 3º). A afetação de tais temas à cognição do tribunal ad quem recebe da dou-trina a denominação de efeito translativo do recurso, para diferenciar do efeito devolutivo provocado pela vontade do recorrente. Enquanto o efeito devolutivo emana do princípio dispositivo (que impera enquanto se acha em jogo interesses disponíveis da parte), o efeito translativo (que de certa forma conecta-se com o efeito devolutivo) é uma decorrência direta do princípio inquisitivo, que atua no direito processual nos domínios do interesse coletivo, ultrapassando a esfera dos interesses individuais em conflito no processo. Essa eficácia recursal, que é comum a todos os recursos, inclusive o extraor- dinário e o especial, faz que, uma vez conhecido o recurso, o tribunal superior, constatando a ausência de algum pressuposto processual, de alguma condição da ação, possa apreciá-la de ofício.266 Em outros termos, o efeito translativo, que amplia e complementa o efeito devolutivo, se apresenta como consectário do ca-ráter publicista do processo contemporâneo, para permitir ao órgão de superior instância o exame, mesmo sem constar das razões ou contrarrazões recursais, de questões de ordem pública, nos termos dos arts. 485, § 3º, e 1.013, I a IV. Não há, na Constituição (que define os casos de admissibilidade dos recursos extraordinário e especial), nada que vede a incidência do efeito translativo nos domínios dos recursos excepcionais endereçados aos Tribunais Superiores. O que se acha definido na Constituição são os casos de admissibilidade de tais recursos. O seu alcance e seus efeitos são matérias que se comportam na disciplina do Código de Processo Civil e na legislação infraconstitucional que cuidam do tema. 1243 762. O efeito translativo, definido na lei comum, nada tem a ver com o poder da parte de definir o objeto da impugnação recursal, que se presta para justificar a exigência de prequestionamento dos temas cabíveis no objeto dos recursos especial e extraordinário. O efeito em questão é algo que existe primariamente na esfera de atribuições de qualquer órgão jurisdicional que assuma a função de decidir emqualquer processo, não importa o grau de jurisdição em que ele esteja tramitando.267 Por isso, “uma vez conhecido o recurso extraordinário/especial, poderá o tribunal examinar todas as matérias que possam ser examinadas a qualquer tempo, inclusive a prescrição, a decadência e as questões de ordem pública de que trata o § 3º, do art. 267 do CPC [NCPC, art. 485, § 3º]”.268 Embora não haja uniformidade de entendimento na jurisprudência do STF e do STJ, a boa doutrina tem prevalecido, pelo menos na área do STJ, como se vê do seguinte aresto, que pode ser qualificado como emblemático: “Em virtude da sua natureza excepcional, decorrente das limitadas hipóteses de cabimento (Constituição, art. 105, III), o recurso especial tem efeito devolutivo restrito, subordinado à matéria efetivamente prequestionada, explícita ou implicitamente, no tribunal de origem. 2. Todavia, embora com devolutividade limitada, já que destinado, fundamentalmente, a assegurar a inteireza e a uniformidade do direito federal infraconstitucional, o recurso especial não é uma via meramente consultiva, nem um palco de desfile de teses meramente acadêmicas. Também na instância extraordinária o Tribunal está vinculado a uma causa e, portanto, a uma situação em espécie (Súmula 456 do STF; Art. 257 do RISTJ). 3. Assim, quando eventual nulidade processual ou falta de condição da ação ou de pressuposto processual impede, a toda evidência, que o julgamento do recurso cumpra sua função de ser útil ao desfecho da causa, cabe ao tribunal, mesmo de ofício, conhecer da matéria, nos termos previstos no art. 267, § 3º e no art. 301, § 4º do CPC. Nesses limites é de ser reconhecido o efeito translativo como inerente também ao recurso especial”.269 Efeito expansivo Outra variação do efeito devolutivo do recurso é o denominado efeito expansivo, que é explicitado na disciplina da apelação. O efeito em questão, que 1244 261 262 263 264 delimita a área de cognição e decisão dos Tribunais Superiores, na espécie, consiste em reconhecer que a devolução operada pelo recurso “não se restringe às questões resolvidas na sentença, compreendendo também as que poderiam ter sido deci-didas, seja porque suscitadas pelas partes, seja porque conhecíveis de ofício (§ 2º do art. 515/CPC) [NCPC, art. 1.013, § 2º]”.270 É possível, em doutrina, falar-se em duas dimensões para a expansão do efeito recursal: (i) uma no plano horizontal, que permite a abordagem pelo tribu-nal ad quem de questões novas, como as de ordem pública e os pedidos que não chegaram a ser enfrentados pelo julgado recorrido (art. 1.013, § 2º); e, (ii) outra no plano vertical, que atinge as questões precedentes levantadas no processo e que interferem, ou deveriam interferir, em caráter prejudicial, na decisão recorrida (art. 1.013, § 1º). A regra cogitada foi traçada para o recurso de apelação, mas sua extensão para os recursos especial e extraordinário se impõe, visto que também nestes o tribunal ad quem, uma vez admitido o apelo, terá de “julgar o processo, aplicando o direito” (NCPC, art. 1.034, caput). Dessa nova disposição legal – que manda “julgar o processo”, e não apenas reexaminar o “julgamento da causa” realizado na instância de origem –, decorre a necessidade de o Tribunal Superior apreciar, de ofício, os pressupostos processuais e as condições da ação, porque verificada sua inobservância não será possível o pronunciamento válido sobre o mérito do processo. Haverá, também, de enfren-tar e decidir os pedidos que acaso não chegaram a ser apreciados pelo decisório recorrido, sempre que tal se imponha para que a resolução do mérito, agora a seu cargo, seja completa. Faltando condições para que isto se dê, pelo menos o processo não será extinto na instância extraordinária ou especial. Os autos baixarão ao juízo local, a fim de se solucionarem as questões remanescentes ao julgado do recurso excepcional.271 O tema será mais extensamente abordado quando se analisar o recurso de apelação (item nº 767). CPC/1973, art. 471, caput. Mesmo no caso da apelação, o NCPC exclui do efeito suspensivo numerosas situações, como, por exemplo, a da sentença que confirma, concede ou revoga tutela provisória e a que julga improcedentes os embargos do executado (art. 1.012, § 1º, III e V). CPC/1973, art. 512. TJMG, 8ª Câm. Cível, Ap. 1.0024.08.196814-1/011, Rel. Des. Edgard Penna Amorim, ac. 1245 265 266 267 268 269 270 271 05.07.2012, DJe 17.07.2012. TJMG, Apelação cit. OLIVEIRA, Gleydson Kleber Lopes de. Recurso especial. São Paulo: RT, 2002, p. 342; SOUZA, Bernardo Pimentel de. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. Brasília: Brasília Jurí-dica, 2000, p. 313; PESSOA, Roberto D’Orea. Juízo de mérito e grau de cognição nos recursos de estrito direito. In: NERY JR., Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (coords.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo: RT, 2006, v. 10, p. 502. Em relação à cognosvibilidade das questões de ordem pública no âmbito dos recursos extraordinário e especial, “o quesito do prequestionamento pode ter-se por inexigível, até em homenagem à lógica do processo e à ordem jurídica justa” (MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Recurso extraordinário e recurso especial. 10. ed. São Paulo: RT, 2007, p. 311). DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de direito processual civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. 5. ed. Salvador: JusPodivm, 2008, v. 3, p. 281. Nesse sentido: GOES, Gisele Santos Fernandes. Recurso especial, extraordinário e embargos de divergência: efeito translativo ou correlação recursal? Revista Dialética de Direito Processual, n. 22, São Paulo, p. 64, jan. 2005. STJ, 1ª T., REsp 609.144/SC, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 06.05.2004, DJU 24.05.2004, p. 197. No mesmo sentido: STJ, 1ª T., REsp 109.474/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 09.09.1997, DJU 20.10.1997, p. 52.978. STJ, 4ª T., REsp 136.550/MG, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 23.11.1999, DJU 08.03.2000, p. 118. No mesmo sentido: STJ, 3ª T., REsp 536.964/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 04.05.2006, DJU 29.05.2006, p. 230. A apelação devolve ao tribunal as questões impugnadas pelas partes, as apreciadas de ofício (questões de ordem pública) “e aquelas suscitadas e não examinadas” (STJ, 2ª T., REsp 1.189.458/ RJ, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 25.05.2010, DJe 07.06.2010). Diante de pedidos sucessivos, “o Tribunal, ao julgar a apelação, deve observar os ditames do art. 515 do CPC [NCPC, art. 1.013, § 2º], podendo examinar as teses suscitadas e discutidas no processo, mesmo que a sentença não as tenha julgado por inteiro” (STJ, 2ª T., REsp 363.655/MS, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 19.09.2002, DJU 16.06.2003, p. 280). 1246 763. § 80. A APELAÇÃO Sumár io: 763. Conceito. 764. O novo CPC e a superação das dificuldades conceituais do Código anterior em relação à sentença. 765. Apelação e decisões incidentais excluídas das hipóteses de agravo de instrumento. 766. Interposição da apelação. 767. Efeitos da apelação. 768. Questão relevante a respeito do efeito devolutivo da apelação contra sentença terminativa. 769. Questão de fato e questão de direito. 770. Vinculação do tribunal ao dever de julgar o mérito na hipótese do § 3º do art. 1.013. 770-A. Posição consolidada do STJ. 771. Prescrição e decadência. 772. A apelação e as nulidades sanáveis do processo. 773. Tutela provisória e o efeito suspensivo da apelação. 774. Recebimento da apelação. 775. A irrecorribilidade da sentença proferida em conformidadecom súmula do STJ ou do STF. 776. Juízo de retratação: reexame da matéria decidida na sentença apelada por ato de seu próprio prolator. 777. Deserção. 778. Prazo para interposição da apelação. 779. Interposição de apelação antes do julgamento dos embargos de declaração. 780. Julgamento em segunda instância. Conceito São sentenças finais ou simplesmente “sentenças” são pronunciamentos judiciais que encerram a fase cognitiva do procedimento comum, bem como extinguem a execução. Distingue a doutrina entre sentença definitiva e sentença terminativa, conforme o encerramento da relação processual se dê com ou sem julgamento do mérito da causa. O Código de 1973, em seu texto originário, unificou os conceitos de sentença e de recurso cabível. Se se põe termo ao processo, haja ou não decisão do mérito, o caso será sempre de sentença (CPC/1973, art. 162, § 1º). E o recurso interponível também será sempre um só: o de apelação (CPC/1973, art. 513). O Código atual manteve a mesma sistemática do anterior (NCPC, art. 1.009). Apelação, portanto, é o recurso que se interpõe das sentenças dos juízes de primeiro grau de jurisdição para levar a causa ao reexame dos tribunais do segundo grau, visando a obter uma reforma total ou parcial da decisão impugnada,272 ou mesmo sua invalidação. São apeláveis tanto as sentenças proferidas em procedimentos contenciosos 1247 764. como as dos feitos de jurisdição voluntária. Também nos procedimentos incidentes ou acessórios, como habilitação, restauração de autos etc., a apelação é o recurso cabível contra a sentença que os encerrar. O mesmo, todavia, não ocorre com o julgamento de simples incidentes do processo, a exemplo da exibição de documento ou coisa e das tutelas provisórias, já que in casu ocorrem apenas decisões interlocutórias. O novo CPC e a superação das dificuldades conceituais do Código anterior em relação à sentença Depois da última reforma operada pela Lei nº 11.232, de 22.12.2005, o CPC de 1973 adotou como definição da sentença, em lugar de ato judicial que põe termo ao processo, a de “ato do juiz que implica alguma das situações previstas nos arts. 267 e 269”. A justificativa para a nova conceituação adveio da circunstância de terem sido unificados os procedimentos de conhecimento e de cumprimento da sentença, o que levou o legislador a pensar que aquele ato decisório não poderia mais ser visto como o que encerra o processo. Esse entendimento tomou como ponto de partida, indevidamente, o objeto da decisão, entrando em colisão com o sistema recursal. Neste, a apelação não era usada para impugnar essa ou aquela matéria, mas toda e qualquer sentença, fosse de mérito ou terminativa. Com a conceituação inovada de sentença, criou--se uma dificuldade de custosa solução. É que nem sempre as matérias tomadas pela reforma como padrão de identificação da sentença eram, necessariamente, solucionadas em ato judicial da espécie. O novo CPC, sem embargo de continuar adotando o caráter de procedimento unitário para a cognição e a execução, logrou definir a sentença levando em conta as fases de desenvolvimento do processo unificado, sem embaraçar-se com o objeto decidido. Com efeito, para a lei atual, sentença é “o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução (art. 203, § 1º).273 Como se vê, a nova lei foi bastante clara e objetiva na conceituação. Assim, se o ato decisório é proferido durante a marcha processual, sem colocar fim à fase cognitiva ou à execução, trata-se de decisão interlocutória, que desafia o recurso de agravo de instrumento. Se, contudo, a decisão finaliza a atividade jurisdicional da primeira instância, é sentença, contra a qual deve ser interposto o recurso de apelação. 1248 765. 766. O entendimento é complementado pelo § 5º do art. 356,274 que determina que a decisão que julga parcialmente o mérito, de forma antecipada, é impugnável por meio de agravo de instrumento. Ou seja, a decisão que, julgando parcialmente o mérito, não coloca fim à fase de cognição, desafia agravo de instrumento e, não, apelação. Ao contrário, a decisão que extingue o processo é sempre sentença, apreciando ou não o mérito da causa. O recurso, portanto, será a apelação, qualquer que sejam as questões decididas (NCPC, art. 1.009). Apelação e decisões incidentais excluídas das hipóteses de agravo de instrumento O NCPC aboliu a figura do agravo retido, interposto em face de decisão proferida pelo juiz de primeiro grau, que, se não fosse reformada pelo magistrado, era objeto de análise pelo tribunal, caso o recurso fosse reiterado em preliminar de apelação ou de contrarrazões de apelação (art. 523 do CPC/1973). A nova sistemática, embora semelhante à anterior, afasta a necessidade de interposição imediata de recurso, para impedir a preclusão. Agora, se a matéria incidental decidida pelo magistrado a quo não constar do rol taxativo do art. 1.015, que autoriza a interposição de agravo de instrumento, a parte prejudicada deverá aguardar a prolação da sentença para, em preliminar de apelação ou nas contrarrazões, requerer a sua reforma (art. 1.009, § 1º).275 Vale dizer, a preclusão sobre a matéria somente ocorrerá se não for posteriormente impugnada em preliminar de apelação ou nas contrarrazões. Se a parte prejudicada pela decisão interlocutória for vencida na ação, deverá arguir a matéria em preliminar de apelação, sendo a parte contrária intimada para contrarrazoar. Se, contudo, a sentença lhe for favorável, a impugnação poderá ocorrer em sede de contrarrazões de eventual apelação interposta pela parte contrária. Nessa última hipótese, o vencedor manejaria, na verdade, um recurso eventual e subordinado, visto que só seria apreciado caso o recurso do vencido fosse provido para reformar a sentença. Ou seja, a impugnação do apelado teria o papel de condicionar o julgamento da pretensão do apelante ao prévio exame das preliminares suscitadas nas contrarrazões da parte vencedora no decisório de primeiro grau. Outrossim, para cumprir-se o contraditório, sendo a matéria suscitada em preliminar de contrarrazões, o apelante será intimado para, em quinze dias, manifestar-se a respeito (art. 1.009, § 2º).276 Interposição da apelação 1249 (a) (b) (c) (d) O recurso de apelação será interposto contra a sentença (art. 1.009, caput). Como se viu (itens nos 349 e 351, vol. I), a sistemática atual não classifica a sentença em razão do conteúdo das questões nela decididas, mas, sim, em função do momento no qual foi proferida. Se a decisão puser fim à fase cognitiva do procedimento comum ou extinguir a execução (art. 203, § 1º), desafiará apelação. Nessa esteira, ainda que a questão decidida em sentença seja daquelas impugnáveis por meio de agravo, nos termos do art. 1.015, do NCPC, deverá ser interposto o recurso de apelação para discuti-la (art. 1.009, § 3º).277 Imagine-se, assim, que o juiz tenha cassado a tutela provisória na própria sentença. Muito embora a matéria conste do inciso I, do art. 1.015, como sen-do impugnável por meio de agravo de instrumento, deverá ser abrangida pela apelação. Vale dizer, não haverá interposição de dois recursos distintos contra a mesma decisão. Nesse sentido, o § 5º do art. 1.013 é expresso: “o capítulo da sentença que confirma, concede ourevoga a tutela provisória é impugnável na apelação”.278 O apelante deve manifestar seu recurso por meio de petição dirigida ao juiz de primeiro grau, que conterá (art. 1.010):279 os nomes e a qualificação das partes (inciso I); a exposição do fato e do direito (inciso II); as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade (inciso III); e o pedido de nova decisão (inciso IV). “A apelação deve ser interposta, obrigatoriamente, por petição, não se po-dendo considerar tal aquela que é feita por cota lançada em espaço em branco dos autos”.280 A jurisprudência tem, porém, admitido a interposição do recurso por tele- grama, desde que atendidos os requisitos legais. E a Lei nº 9.800, de 26.05.1999, franqueou, também, o uso de fac-símile (ou “fax”) para todas as petições, inclusive as dos recursos, desde que se faça chegar ao tribunal, até cinco dias depois do fim do respectivo prazo, o original da peça retransmitida magneticamente (ver item nº 338 do vol. I). O pedido de nova decisão pode referir-se a um novo pronunciamento de mérito favorável ao apelante, ou apenas à invalidação da sentença por nulidade. “A falta das razões do pedido de nova decisão impede o conhecimento da apelação”.281 Quanto ao prazo para interposição do recurso, o novo Código, na esteira do anterior, pôs fim à controvérsia que existia sobre o tema. Não basta ser despa-chada 1250 767. a petição dentro do prazo legal. É preciso que o recurso seja protocolado no Cartório dentro do citado prazo. Se foi submetida a prévio despacho do juiz, é indispensável que seja entregue em cartório antes do vencimento do prazo de recurso (NCPC, art. 1.003, § 3º).282 Documentos, em regra, só poderão acompanhar a petição da apelação, ou suas contrarrazões, quando se destinarem a provar fatos novos, dentro da exceção permitida pelos arts. 435 e 1.014.283 A doutrina preconizava que “nessa hipótese e somente nela é lícito ao apelante que já era parte no processo produzir documentos com a interposição do recurso. Documentos que se refiram a fatos já alegados perante o órgão a quo devem ter sido juntos aos autos pelas partes nas oportunidades próprias, consoante as regras dos arts. 434 e 435 do NCPC.284 O terceiro prejudicado que apela, naturalmente, pode sempre instruir o recurso com os documentos de que disponha: visto que não era parte, não teve qualquer oportunidade anterior de produzir prova, e contra ele não se operou preclusão”285 (veja-se o nº 732 do vol. I). A jurisprudência atual, todavia, adota posição mais liberal, entendendo que “as restrições dos arts. 396 e 397 [NCPC, arts. 434 e 435] só se aplicam, a rigor aos documentos tidos como pressupostos da causa, de sorte que quanto aos demais podem ser produzidos a qualquer tempo, desde que não haja má-fé e se respeite a regra do contraditório”.286 Efeitos da apelação A apelação tem, ordinariamente, duplo efeito: o devolutivo e o suspensivo. I – Efeito devolutivo “A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada” (NCPC, art. 1.013, caput).287 Visa esse recurso a obter um novo pronunciamento sobre a causa, com reforma total ou parcial da sentença do juiz de primeiro grau. As questões de fato e de direito tratadas no processo, sejam de natureza substancial ou processual, voltam a ser conhecidas e examinadas pelo tribunal. A apelação, no entanto, pode ser parcial ou total, conforme a impugnação atinja toda a sentença ou apenas parte dela. Sendo parcial, a devolução abrangerá apenas a matéria impugnada.288 Nem mesmo a circunstância de se tratar de matéria de ordem pública deve ensejar reexame livre pela instância recursal. Se o tema corresponde a um capítulo distinto da sentença e o recurso ataca apenas outro capítulo, não se pode deixar de 1251 reconhecer a formação de coisa julgada a impedir o rejulgamento pelo Tribunal no tocante ao que não foi objeto de recurso. A matéria de ordem pública se devolve por força de profundidade do efeito da apelação, quando figura como antecedente lógico do tema deduzido no recurso e, quando, além disso, não esteja afetada pela coisa julgada. É importante ter em conta que o recurso pode compreender, em profundidade, matérias prejudiciais não tratadas na impugnação formulada pelo recorrente. Não pode, todavia, desempenhar função rescisória diante dos capítulos da sentença já transitados em julgado, mesmo que esteja em jogo questão de ordem pública, pois as decisões em torno de questões dessa natureza não são imunes ao princípio da coisa julgada. Dentro do âmbito da devolução, o tribunal apreciará todas as questões sus- citadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido solucionadas pela sentença recorrida, desde que relativas ao capítulo impugnado (art. 1.013, § 1º).289- 290 Em matéria de efeito devolutivo, portanto, urge fazer uma distinção entre a extensão e a profundidade da devolução: (a) A extensão é limitada pelo pedido do recorrente, visto que nenhum juiz ou órgão judicial pode prestar a tutela jurisdicional senão quando requerida pela parte (art. 2º);291 por isso, o art. 1.013 afirma que a apelação devolverá ao tribu-nal a “matéria impugnada”, o que quer dizer que, em seu julgamento, o acórdão deverá se limitar a acolher ou rejeitar o que lhe for requerido pelo apelante (por exemplo: se se requereu a reforma parcial, não poderá haver a reforma total; se pediu a improcedência da demanda, não se poderá decretar a prescrição, contra a vontade do apelante; se pediu apenas a prescrição, não caberá a improcedência da causa; se se pediu para excluir juros, não se poderá cancelar correção monetária ou multa, e assim por diante. (b) A profundidade abrange os antecedentes lógico-jurídicos da decisão impugnada, de maneira que, fixada a extensão do objeto do recurso pelo reque- rimento formulado pela parte apelante, todas as questões suscitadas no processo que podem interferir assim em seu acolhimento como em sua rejeição terão de ser levadas em conta pelo tribunal (art. 1.013, § 1º).292 Nessa ordem de ideias, qualquer que seja o pedido do recorrente, terá sempre o tribunal possibilidade de examinar as questões pertinentes aos pressupostos processuais e às condições da ação, visto que são matérias de ordem pública con- dicionadoras da formação e desenvolvimento válidos do processo, bem como de 1252 qualquer provimento jurisdicional de mérito (motivo pelo qual são conhecíveis e solucionáveis a qualquer tempo e grau de jurisdição, a requerimento de parte ou de ofício) (art. 485, § 3º).293-294 Não são, portanto, apenas as questões preliminares que se devolvem implici- tamente. São, também, todas as prejudiciais de mérito propostas antes da sentença e que deveriam influir na acolhida ou rejeição do pedido, ainda que o juiz a quo não as tenha enfrentado ou solucionado (art. 1.013, § 1º). É o que se passa, por exemplo, com a cumulação de pedidos conexos e consequentes. O juiz, negando o primeiro, deixa de examinar os demais. Recorrendo a parte vencida e logrando reformar a sentença para acolher o primeiro pedido, terá o tribunal de completar o julgamento decidindo os demais pedidos conexos prejudicados pela decisão de primeira instância. Por exemplo: pedia-se, originariamente, a anulação do contrato, a condenação a perdas e danos, e restituição do bem negociado, e lucros cessantes. Como a sentença denegou a anulação, todos os demais pedidos do autor nem sequer foram por ela cogitados. Ao tribunal, porém, não é lícito limitar o julgamento da apelação ao tema daanulação. Se entender que é o caso de acolhê-la, terá também de prosseguir na análise das outras pretensões consequenciais (perdas e danos, restituição, lucros cessantes), pouco importando que tais temas não tenham sido julgados na instância de origem. Ainda, em matéria de profundidade do efeito devolutivo, o § 2º do art. 1.013295 cuida do caso de multiplicidade de fundamentos para o pedido. O juiz acolheu apenas um e deu pela procedência da ação. Impugnada a sentença em apelação, o tribunal pode reconhecer a procedência do apelo quanto ao fundamento da sen-tença, mas deixar de dar-lhe provimento, porque a matéria não acolhida pelo juiz de primeiro grau se apresenta suficiente para assegurar a procedência da ação. O mesmo pode acontecer, também, com a defesa, quando se fundamente em razões múltiplas e seja acolhida em face de apenas uma delas.296 (c) Efeito translativo: competência originária do tribunal para julgar em ins- tância única o mérito da causa Se o juiz extingue o processo sem julgamento de mérito, naturalmente o objeto da sentença ficou restrito a questão preliminar. Recorrendo a parte para impugnar tão somente o conteúdo do decisório de primeiro grau, não poderia, a nosso ver, o tribunal, depois de cassada a sentença, passar a julgar o mérito da causa, sem que a parte o tivesse requerido. Aí já não se trataria de se aprofundar no julgamento das questões que lhe foram devolvidas pelo recurso, mas de ampliar o seu objeto, dando-lhe extensão maior do que lhe emprestara o requerimento da parte. 1253 Sempre entendemos que era preciso estar atento para não ofender o princípio da disponibilidade da tutela jurisdicional e o da adstrição do julgamento ao pedido (princípio da congruência). Entretanto, o § 3º do art. 1.013 permite que o tribunal, ao julgar o recurso de apelação, decida desde logo o mérito da causa, sem aguardar o pronunciamento do juízo de primeiro grau, quando: (i) reformar sentença que não tenha resolvido o mérito; (ii) decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir; (iii) constatar a omissão no exame de um dos pedidos; e (iv) decretar a nulidade por falta de fundamentação. Tal técnica se estendeu para o caso de o tribunal reformar a sentença que houver reconhecido a decadência ou a prescrição, quando for possível o exame das demais questões debatidas, sem retorno do processo ao juízo de primeiro grau (art. 1.013, § 4º).297-298 Isso, porém, ainda sob nosso ponto de vista, não queria dizer que a questão de mérito não suscitada na apelação pudesse ser inserida de ofício pelo tribunal no julgamento do recurso. O objeto do recurso quem define é o recorrente. Sua exten- são mede-se pelo pedido nele formulado. A profundidade da apreciação do pedido é que pode ir além das matérias lembradas nas razões recursais; nunca, porém, o próprio objeto do apelo. No entanto, como já informamos, o entendimento do STJ, formado no regime do Código de 1973, era muito liberal ao permitir o julgamento do mérito no caso ora em apreciação e, ao que parece, o NCPC inclina-se pela tese do julgamento da “causa madura”, sem expressa exigência de esgotamento do pri- meiro grau de jurisdição, a seu respeito. Entretanto, continuávamos pensando que a exegese da regra legal merecia uma releitura em face das normas fundamentais, como intentávamos demonstrar no item nº 770 adiante. (d) Vedação de suscitar novas questões de fato Quanto às questões de fato, a regra é que a apelação fica restrita às alegadas e provadas no processo antes da sentença. O recurso devolve o conhecimento da causa tal qual foi apreciada pelo juiz de primeiro grau. Pode, todavia, ter ocorrido impos- sibilidade de suscitação do fato pelo interessado, antes da sentença. Assim provada a ocorrência de força maior, poderá o apelante apresentar fato novo perante o tribunal (art. 1.014).299 Caberá, todavia, ao recorrente provar não só o fato como o motivo de força maior que o impediu de argui-lo no momento processual adequado.300 Não cabe ao juiz a quo interferir na questão do fato novo, nem impedir a subida do recurso que nele se baseie. A questão será inteiramente apreciada e decidida pelo tribunal ad quem. 1254 (a) (b) (c) (d) (e) (f) (e) A reformatio in pejus não é admitida, embora omisso o Código. A dou-trina é uniforme em repelir o julgamento do tribunal que piore a situação do apelante, sem que tenha a outra parte também recorrido. Como lembra Rogério Lauria Tucci, “não se pode perder de vista que, tanto quanto o juiz de primeira instância, o órgão colegiado de segundo grau, apesar de investido dos mesmos poderes para conhecer do processo e da lide, não pode manifestar-se sobre o que não constituía objeto do pedido – do ‘pedido de nova decisão’... e, outrossim, que, com a instituição do apelo incidental sob a rubrica de recurso adesivo, previsto no art. 500... [NCPC, art. 997], já não mais pode subsistir qualquer dúvida sobre a vedação da reforma para pior”, pois, como observa Barbosa Moreira, “a função do recurso adesivo é justamente a de levar ao conhecimento do tribunal matéria que, só por força do recurso principal, não se devolveria”.301 Sobre a parte da sentença que não foi objeto de recurso pelo adversário do apelante, e que even-tualmente poderia ser alterada em prejuízo deste, incidiu a coisa julgada, diante de inércia daquele a que a reforma da sentença favoreceria. Assim, não há que se pensar em reformatio in pejus, já que qualquer providência dessa natureza esbarraria na res iudicata. II – Efeito suspensivo A apelação normalmente suspende os efeitos da sentença, seja esta condena- tória, declaratória ou constitutiva. “Efeito suspensivo, assim, consiste na suspensão da eficácia natural da sentença, isto é, dos seus efeitos normais”.302 Via de regra, a apelação tem o duplo efeito suspensivo e devolutivo. Há exceções, no entanto. O § 1º do art. 1.012303 enumera seis casos em que o efeito de apelação é apenas devolutivo, de maneira que é possível a execução provisória enquanto estiver pendente o recurso. Assim, será recebida só no efeito devolutivo a sentença que: homologa a divisão ou demarcação de terras (inciso I); condena a pagar alimentos (inciso II); extingue sem resolução do mérito ou julga improcedentes os embargos do executado (inciso III); julga procedente o pedido de instituição de arbitragem (inciso IV); confirma, concede ou revoga tutela provisória (inciso V); decreta a interdição (inciso VI). Mesmo nas hipóteses expressamente previstas em que a apelação tem efeito 1255 (a) (b) 768. apenas devolutivo, diante das particularidades da causa, demonstrando o apelante a probabilidade de provimento do recurso, evidenciada pela relevância de sua fun- damentação, e havendo risco de dano grave ou de difícil reparação, pode o relator determinar a suspensão da eficácia da sentença (art. 1.012, § 4º).304 Para tanto, o apelante formulará o requerimento em petição separada, com a seguinte destinação: o pedido será dirigido ao tribunal, se feito no período compreendido entre a interposição da apelação e sua distribuição. Nessa hipótese, será sorteado um relator para apreciá-lo, ficando ele prevento para a apelação; endereçar-se-á ao relator da apelação, se já distribuída no tribunal (art. 1.012, § 3º).305 O pedido de suspensão terá de demonstrar: (i) a probabilidade de provimento do recurso; e (ii) a ocorrência de risco de “dano grave ou de difícil reparação” (§ 4º). Em outros termos, caberá ao apelante demonstrara configuração do fumus boni iuris e do periculum in mora, em grau que não permita aguardar o normal julgamento do recurso. Nos casos em que a apelação não é recebida no efeito suspensivo, o apelado poderá promover o pedido de cumprimento provisório do julgado, logo após a publicação da sentença (art. 1.012, § 2º).306 Questão relevante a respeito do efeito devolutivo da apelação contra sentença terminativa Conforme visto no item nº 767 retro, o § 3º do art. 1.013 do NCPC, a exemplo do que já ocorria no Código de 1973 (art. 515, § 3º), permite que o tribunal, ao julgar o recurso de apelação, decida desde logo o mérito da causa, sem aguardar o pronunciamento do juízo de primeiro grau, quando: (i) reformar sentença que não tenha resolvido o mérito; (ii) decretar a nulidade da sentença por não ser ela congruente com os limites do pedido ou da causa de pedir (sentenças ultra ou extra petita); (iii) constatar a omissão no exame de um dos pedidos; e (iv) decretar a nulidade por falta de fundamentação. Essa técnica também se estendeu para o caso de o tribunal reformar a sentença que houver reconhecido a decadência ou a prescrição, quando for possível o exame das demais questões debatidas, sem retorno do processo ao juízo de primeiro grau (art. 1.013, § 4º). O novo Código, destarte, ampliou a possibilidade de julgamento de mérito da causa pelo tribunal, bastando que esta esteja “em condições de imediato julgamento”. 1256 É o que se costuma chamar de “causa madura”, entendida como tal aquela cujo objeto já foi suficientemente debatido na instância de origem, mesmo que nela não se tenha decidido o mérito. Não basta, portanto, que a questão de mérito a decidir seja apenas de direito; é necessário que o processo esteja maduro para a solução do mérito da causa. Mesmo que não haja prova a ser produzida, não poderá o Tribunal enfrentá-lo no julgamento da apelação formulada contra a sentença terminativa, se uma das partes ainda não teve oportunidade processual adequada para debater a questão de mérito. Estar o processo em condições de imediato julgamento significa, em outras palavras, não apenas envolver o mérito da causa questão só de direito que se deve levar em conta, mas também a necessidade de cumprir o contraditório. Tomem-se como exemplos os casos de extinção por indeferimento da inicial, ou os ocorridos na fase de saneamento antes de completar o debate sobre o mérito e sobre as provas cabíveis. Em casos como estes, obviamente, o processo não terá ainda alcançado o momento apropriado para o julgamento do mérito. Os autos terão de retornar ao juízo de origem a fim de que o debate e a instrução probatória se completem. Se, todavia, o debate amplo já se deu em primeiro grau entre os litigantes, o Tri-bunal estará em condições de julgar o mérito, e deverá fazê-lo, sempre que for afastada a preliminar causadora da sentença terminativa, e que a parte interessada o requeira. Nisso não há ofensa à garantia do duplo grau de jurisdição, mesmo porque tal garantia não é absoluta nem figura expressamente entre as que a Constituição considera inerentes ao devido processo legal.307 O NCPC incluiu, expressamente, em tal possibilidade, as sentenças incomple- tas, como as citra petita e as que acolhem preliminar de mérito, sem solucionar as demais questões de fundo propostas pelas partes (art. 1.013, § 3º, II). Se o tribunal está autorizado a julgar o mérito da causa, quando o juiz extingue o processo sem apreciá-lo, razão não há para impedi-lo de assim agir quando o juiz tenha senten- ciado apenas sobre parte das questões de fundo. O fim de economia processual justificador da regra do art. 1.013, § 3º, está tão presente no caso da apelação contra sentença terminativa quanto na sentença definitiva parcial ou incompleta. A regra estatuída pelo § 3º do art. 515 do CPC/1973, e mantida no § 3º do art. 1.013 do NCPC, tem sido estendida analogicamente pelo STJ ao recurso ordinário, no caso de extinção de mandado de segurança de competência originária dos tribunais de segundo grau de jurisdição.308 O STF, todavia, entende não ser aplicável 1257 769. (a) (b) 770. a medida ao recurso ordinário interposto contra acórdão do STF em relação a mandado de segurança, para prestigiar a competência definida, na espécie, no próprio texto constitucional, evitando-se, assim, o salto de grau de jurisdição.309 Questão de fato e questão de direito No regime do Código de 1973, para o mecanismo de julgamento pelo tribunal sobre o mérito ainda não resolvido na primeira instância, estabeleciam-se dois requisitos (art. 515, § 3º): versar a causa apenas sobre questão de direito; e processo maduro para julgamento de mérito. Se houvesse instrução probatória, mesmo encerrada, não se aplicaria, portanto, a regra do art. 515, § 3º. Haveria questão de fato a acertar, mediante apreciação do quadro probatório controvertido. Instalou-se, entretanto, divergência a respeito da possibilidade de considerar-se questão de direito aquela estabelecida na causa em que a instrução probatória já se completara (causa madura). Para o STJ, finalmente, na aplicação do § 3º do art. 515, “caso propiciado o contraditório e a ampla defesa, com regular e completa instrução do processo, deve [o tribunal] julgar o mérito da causa, mesmo que para tanto seja necessária apreciação do acervo probatório”.310 O NCPC não repetiu o requisito da questão de direito, mantendo, apenas, a necessidade de o processo estar “em condições de imediato julgamento” (art. 1.013, § 3º). Com isso, superada restou a divergência, prevalecendo a orientação já traçada pelo STJ. Vinculação do tribunal ao dever de julgar o mérito na hipótese do § 3º do art. 1.013 À época do Código de 1973, o § 3º do art. 515 dizia que naqueles casos “o tribunal pode julgar desde logo a lide”. A inserção, de imediato, gerou séria polêmica entre os processualistas: ao falar a lei em “poder” o Tribunal, no julgamento da apelação contra a sentença terminativa, enfrentar o mérito da causa, estar-se-ia criando uma faculdade ou um dever para o juízo de segundo grau? O entendimento predominante era no sentido de poder-se extrair as seguintes conclusões: (i) o referido dispositivo não criou simples faculdade para o Tribunal, que tem o dever de enfrentar o mérito da causa, quando configurados os requisitos 1258 legais para tanto; (ii) o julgamento de mérito, no entanto, deveria ser pleiteado pelo recorrente, para que se tornasse objeto da devolução operada pela apelação ao Tribunal ad quem. O novo CPC aderiu à exegese dominante, uma vez que dispôs, expressamente, no § 3º do art. 1.013, que, “se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito”. Não obstante, é de se ressaltar o prestígio que o NCPC dedica aos princípios constitucionais do processo, enunciados com ênfase no rol de suas normas fundamentais, onde merecem destaque o princípio dispositivo (art. 2º) e a garantia do contraditório efetivo (arts. 9º e 10). Com isso, veda o julgamento sobre questões não propostas pela parte e as decisões sobre questões não previamente submetidas à audiência de ambas as partes, bem como as decisões com base em fundamento a respeito do qual não se lhes tenha dado oportunidade de se manifestar, ainda quando se trate de matéria sobre a qual se deva decidir de ofício. Ora, se a parte vencida recorre pedindo apenas a anulação ou cassação da sentença que extinguiu o processo sem apreciação do mérito, não nos parecelícito ao tribunal o enfrentamento de questão de mérito que não tenha integrado o pedido do recorrente e, por isso, não tenha passado pelo contraditório da apelação.311 Deve-se ressaltar, sempre, que “a devolutividade da apelação e, de resto, a de qualquer recurso é definida pela parte recorrente”.312 Se a profundidade com que se examinam as questões recursais é definida pela lei (art. 1.013, § 1º), a extensão do efeito devolutivo cabe exclusivamente à parte. “A extensão é, repita-se, fixada pelo recorrente, nas razões de seu apelo”.313 A lei, aliás, exige que da petição recursal conste o “pedido de nova decisão” e “a exposição do fato e do direito”, que o justifiquem (CPC, art. 1.010, II e IV). Daí por que “o Tribunal, concordando ser caso de análise do mérito, somente poderá dele conhecer após dar provimento ao apelo na parte que impugna a sentença termi-nativa, na hipótese de o apelante requerê-lo expressamente em suas razões recursais”.314 Ao se atribuir ao Tribunal, em exegese ao § 3º do art. 1.013, o poder de proferir decisão de mérito sobre tema (o mérito) que não foi objeto de requerimento e de-bate no procedimento recursal, estar-seá afrontando direito das partes, sobretudo do litigante que vier a experimentar derrota.315 Em sentido contrário, pensa Cândido Dinamarco que o Tribunal, mesmo jul- gando o mérito sem pedido do apelante e contra sua posição no litígio, não haverá 1259 770-A. (a) “quebra do due process of law, nem exclusão do contraditório, porque o julgamento feito pelo Tribunal incidirá sobre o processo precisamente no ponto em que incidiria a sentença do juiz inferior”.316 É certo que, já estando maduro o processo para sentença de mérito, o retorno dos autos para que o juiz de primeiro grau decidisse o mérito, não se reabrirá instrução e debate no juízo a quo. Mas a parte sucumbente terá opor-tunidade de rediscutir a causa perante o tribunal, enriquecendo o debate, com nova argumentação. É certo, também, que o duplo grau de jurisdição pode ser suprimido pela lei. Mas isto deverá ser feito por dispositivo expresso e de fundo razoável. Não é aceitável, todavia, que podendo o apelante definir a extensão do recurso, venha o Tribunal a decidir questão que intencionalmente a parte recorrente não quis incluir na devolução recursal. Cabendo-lhe o poder legal de fixar o conteúdo da apelação (art. 1.013, caput), não é de aplicar-se o § 3º do mesmo art. 1.013, quando o recurso contra a sentença terminativa não contenha pedido de apreciação do mérito da causa. Mais benemérita de acolhida se me afigura a lição do próprio mestre Cândido Dinamarco quando recomenda, em princípio, o prevalecimento da disposição contida no art. 1.013 caput, em relação também aos casos regidos por seu § 3º “em nome das razões sistemáticas inerentes à regra da correlação entre a decisão e o pedido (arts. 128 e 460) [NCPC, arts. 141 e 492]”.317 Releva notar, porém, que a Corte Especial do STJ enfrentou e solucionou a divergência instalada entre a 2ª e a 4ª Turma, assentando que “a regra do art. 515, § 3º, do CPC [NCPC, art. 1.013, § 3º] deve ser interpretada em consonância com a preconizada pelo art. 330, I, do CPC [NCPC, art. 355, I], razão pela qual, ainda que a questão seja de direito e de fato, não havendo necessidade de produzir prova (causa madura), poderá o Tribunal julgar desde logo a lide, no exame da apelação interposta contra a sentença que julgara extinto o processo sem resolução de mérito”.318 Posição consolidada do STJ Através de julgamento da Corte Especial, o STJ consolidou seu entendimento acerca da apelação contra sentença terminativa pronunciada diante de “causa madura” para enfrentamento do mérito, de forma originária pelo tribunal de segundo grau. Superando todas as objeções doutrinárias lembradas nos itens 767 e 770, retro, aquela Alta Corte firmou as seguintes teses:319 “A novidade representada pelo § 3º do art. 515 do Código de Processo Civil [§ 3º do art. 1.013 do NCPC] nada mais é do que um atalho, legitimado 1260 (b) (c) (d) (e) (f) 771. pela aptidão a acelerar os resultados do processo e desejável sempre que isso for feito sem prejuízo a qualquer das partes”. A medida “constituiu mais um lance da luta do legislador contra os males do tempo e representa a ruptura com um velho dogma, o do duplo grau de jurisdição, que por sua vez só se legitima quando for capaz de trazer benefícios, não demoras desnecessárias”. “Diante da expressa possibilidade de o julgamento da causa ser feito pelo tribunal que acolher a apelação contra sentença terminativa, é ônus de ambas as partes prequestionar em razões ou contrarrazões recursais todos os pontos que depois pretendam levar ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça. Elas o farão, do mesmo modo como fariam se a apelação houvesse sido interposta contra uma sentença de mérito.” Constando o sistema de norma expressa do direito positivo, em sua observância “não se vislumbra o menor risco de mácula à garantia constitucional do due process of law, porque a lei é do conhecimento geral e a ninguém aproveita a alegação de desconhecê-la, ou de não ter previsto a ocorrência de fatos que ela autoriza (LICC, art. 3º)”. “A doutrina admite aplicação do art. 515, § 3º, do CPC [art. 1.013, § 3º, do NCPC] aos Agravos de Instrumento.” “Por fim, de essencial relevância destacar que a jurisprudência do STJ admite a não aplicação da teoria da causa madura quando for prejudicada a produção de provas pela parte de forma exauriente.” Prescrição e decadência À época do Código de 1973, a inovação do § 3º do art. 515 eliminava, de vez, uma controvérsia que de longa data se mantinha na jurisprudência. Questionava-se sobre a extensão do efeito devolutivo no caso de a sentença apelada ter acolhido a prescrição ou a decadência. Havia uma corrente mais volumosa que negava ao Tribunal a possibilidade de, afastada a prejudicial extintiva, prosseguir no exame de mérito ainda não decidido em primeira instância,320 para não violar o duplo grau de jurisdição. A corrente minoritária, contudo, decidia que, sendo de mérito o julgado acerca da prescrição ou da decadência, os juízes do recurso, ao rejeitar a prejudicial, poderiam prosseguir ao julgamento da causa.321 Após a Lei nº 10.352, de 26.12.2001, o dissídio perdeu a razão de ser. Se até 1261 772. no caso de decisão terminativa o julgamento da apelação poderia avançar sobre o mérito ainda não julgado no juízo de origem, com muito mais razão seria possível fazê-lo diante da reforma das sentenças baseadas em prejudicial de prescrição e decadência, que já pertencem ao mérito da causa.322 O novo Código reforçou esse entendimento esposado ao tempo do Código anterior, estabelecendo no § 4º do art. 1.013: “quando reformar sentença que reconheça a decadência ou a prescrição, o tribunal, se possível, julgará o mérito, examinando as demais questões, sem determinar o retorno do processo ao juízo de primeiro grau”. Naturalmente, será necessário atentar para o estágio do processo em que se acolheu a prejudicial, bem como sobre a necessidade de provas ainda por colher para se examinar o restante das questões de mérito. A causa pode ainda não se encontrar madura para julgamento dessas novas questões. A lei prevê acolhida da prescrição e da decadência até na decisão de indeferimento da petição inicial. Em qualquer caso de aplicação do § 4º do art. 1.013 o Tribunal terá de ficar atento para não violar o contraditório e nãoimpedir o direito das partes à ampla defesa. Nesse sentido, é importante ressaltar que o NCPC previu, na hipótese de rejeição da prescrição e da decadência, o julgamento do mérito pelo tribunal, “se possível”, e não genericamente em qualquer hipótese. A apelação e as nulidades sanáveis do processo A Lei nº 11.276, de 07.02.2006, à época do Código anterior, acrescentou o § 4º do art. 515 para tentar salvar as sentenças afetadas por nulidades processuais sanáveis. Previa o dispositivo que, “constatando a ocorrência de nulidade sanável, o tribunal poderá determinar a realização ou renovação do ato processual, intimadas as partes; cumprida a diligência, sempre que possível prosseguirá o julgamento da apelação”. O novo CPC repetiu o dispositivo, ampliando sua aplicação para qualquer recurso ou processo de competência originária do tribunal, uma vez que a regra correspondente está localizada no Capítulo referente à ordem dos processos no tribunal. Dispõe o § 1º do art. 938 que, “constatada a ocorrência de vício sanável, inclusive aquele que possa ser conhecido de ofício, o relator determinará a realização ou a renovação do ato processual, no próprio tribunal ou em primeiro grau de jurisdição, intimadas as partes”. E o § 2º determina que, cumprida a diligência, sempre que possível, o relator prosseguirá no julgamento do recurso. 1262 773. A diligência funda-se no princípio de economia processual. Preocupa-se em evitar a anulação de sentenças ou de recursos, quando o vício detectado mostrar-se sanável. Em lugar de frustrar o recurso com a imediata decretação de nulidade, o tribunal converterá o julgamento em diligência, determinando a realização do ato faltante ou a renovação do ato defeituoso, intimando-se as partes para as providências cabíveis.323 Somente se não for sanada a nulidade é que seu pronunciamento será feito pelo tribunal. Superado o defeito, o recurso será apreciado normalmente em seu mérito. Sempre que possível, portanto, serão evitados a invalidação e o retrocesso do processo a estágios anteriores à sentença, com repetição de atos e decisões no juízo de origem. As nulidades sanáveis de que cogita o § 2º do art. 938 tanto podem ser suscitadas pela parte como conhecidas de ofício pelo tribunal. O que importa é a sua sanabilidade, a tempo de salvar a sentença, para seu reexame no julgamento do recurso que já alcançou o tribunal. Alguns exemplos de nulidades sanáveis: havendo litisconsórcio necessário, a sentença ou o recurso foram intimados apenas a um ou alguns deles; o advogado que subscreveu o recurso não juntou o competente substabelecimento; o preparo do recurso ficou incompleto, mas o apelante não foi intimado a completá-lo; o recurso subiu sem ter dado oportunidade ao apelado para contrarrazões; o apelado juntou documento novo às contrarrazões sem ouvida do apelante; a apelação foi processada sem que o juiz decidisse os embargos declaratórios tempestivamente interpostos etc. Tutela provisória e o efeito suspensivo da apelação Ao elenco dos casos em que a apelação não tem efeito suspensivo (NCPC, art. 1.012),324 destaca-se o inciso V, que contempla a sentença que “confirma, concede ou revoga tutela provisória”. Isso quer dizer que, existindo medida provisória (conservativa, cautelar ou de evidência) já deferida nos moldes dos arts. 300 e 311, e que venha a ser mantida pela sentença, a apelação terá de ser recebida apenas no efeito devolutivo, de maneira a não pôr em dúvida a subsistência do provimento antecipatório. O texto do art. 1.012, V, cogita da sentença que confirma, concede ou revoga a tutela provisória. Mas não deve ser diferente o efeito da apelação em caso de a tutela ser deferida na própria sentença. Uma vez que a tutela provisória não tem momento prefixado em lei para deferimento, e pode acontecer em qualquer fase do processo e 1263 774. em qualquer grau de jurisdição, não há motivo para negar ao juiz a possibilidade de decidi-la em capítulo da própria sentença, desde que o faça apoiado nos seus pressupostos. E, se a sentença for expressa a respeito de tal provimento, a apelação acaso manejada haverá de ser recebida apenas no efeito devolutivo. À época do Código anterior, já havia jurisprudência sobre a possibilidade de a sentença conter capítulos distintos para o mérito e a antecipação de tutela.325 O inconveniente, não enfrentado pelo legislador, situava-se no aspecto dos efeitos da apelação, ora devolutivo e suspensivo, ora apenas devolutivo, questão essa que desapareceu diante da inserção do inciso VII no art. 520 do CPC/1973, que foi repetido no inciso V do art. 1.012 do NCPC.326 Em qualquer caso, portanto, em que a sentença mantenha (ou defira ou revogue) a tutela provisória, a apelação não a suspenderá. Não se há, contudo, de pensar que, doravante, o simples fato de o juiz julgar procedente uma demanda já o autoriza, imediatamente, a deferir a antecipação dos efeitos da sentença, sem aguardar o julgamento da apelação eventualmente interposta. Em qualquer circunstância em que se atenda a requerimento da tutela provisória, ter-seá sempre de observar os requisitos dos arts. 300 e 311. Recebimento da apelação I – Pelo juiz de primeiro grau A petição da apelação é dirigida ao juiz prolator da sentença impugnada. No sistema do Código anterior, ao recebê-la deveria o juiz declarar os efeitos do recurso (art. 518). O novo Código alterou profundamente essa sistemática, uma vez que ao juiz de primeiro grau coube, apenas, processar o recurso, abrindo vista à parte contrária para contrarrazoar. Depois de realizada essa formalidade, “os autos serão remetidos ao tribunal pelo juiz, independentemente do juízo de admissibilidade” (art. 1.010, § 3º).327 O recebimento da apelação e a declaração de seus efeitos, portanto, são feitos única e exclusivamente pelo tribunal ad quem. Assim, interposta a apelação, o juiz intimará o apelado para apresentar con- trarrazões, no prazo de quinze dias (art. 1.010, § 1º).328 Se o recorrido interpuser apelação adesiva, o apelante será intimado para apresentar resposta (art. 1.010, § 2º).329 Realizadas essas formalidades, o juiz remeterá os autos ao tribunal (§ 3º). Convém lembrar que uma vez prolatada a sentença e interposto o recurso, o juiz não tem, em regra, como rever ou modificar o julgado.330 Todavia, casos especiais 1264 775. há em que o próprio código permite o juízo de retratação, como, v.g., o do indeferimento da petição inicial (art. 331 e § 1º)331 e o da improcedência liminar do pedido (art. 332, § 3º)332 (a respeito dessa sistemática, ver itens nos 564 a 568 do v. I). II – Pelo tribunal ad quem Recebido o recurso no tribunal, será ele imediatamente distribuído ao relator, que deverá: (i) pronunciar-se sobre sua admissibilidade, ou não, e seus efeitos (arts. 932, III, e 1.012, § 3º, II); (ii) decidi-lo monocraticamente, se for o caso; ou, (ii) elaborar seu voto para julgamento do recurso pelo órgão colegiado (art. 1.011).333 Sobre as hipóteses em que o relator poderá julgar monocraticamente a apelação, veja o item nº 606, retro. Da decisão do relator que admite ou não o recurso, ou que o julga monocra- ticamente, caberá agravo interno para o colegiado (art. 1.021). Quanto aos efeitos do recurso, omitindo o relator declaração a respeito, a decisão que recebe a apelação deve ser tida como portadora do duplo efeito legal.334 Já se decidiu que “julgados pela mesma sentença ações conexas, uma comportando recurso em seus dois efeitos,outra no devolutivo apenas, será aplicável o princí-pio processual do maior benefício e, assim, atribuído a tal recurso, para ambas as demandas, também o efeito suspensivo”.335 No entanto, é mais razoável a tese segundo a qual nada impede que uma decisão recorrida se submeta por partes a efeitos recursais distintos. Assim, se numa só sentença são julgadas duas causas, o recurso interposto pode suspender o efeito dado a uma delas e não o fazer em relação a outra, se diversa é a eficácia particular que a lei prevê para as duas situações congregadas: deferida, por exemplo, tutela provisória e julgada procedente, ao mesmo tempo, a ação principal, a apelação única suspenderá a execução da parte relativa ao mérito da causa, mas não impedirá a efetivação da medida preventiva.336 A irrecorribilidade da sentença proferida em conformidade com súmula do STJ ou do STF À época do Código anterior, a Lei nº 11.276, de 07.02.2006, acrescentou o § 1º ao art. 518 do CPC/1973, adotando o princípio da denominada súmula impeditiva, segundo o qual “o juiz não receberá o recurso de apelação quando a sentença estiver em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou do Supremo Tribunal Federal”.337 A Exposição de Motivos do Ministro da Justiça, que acompanhou a proposta de 1265 alteração do art. 518 do CPC/1973, a justificou como uma adequação salutar que contribuiria para a redução do número excessivo de impugnações sem possibilidade de êxito. Trata-se da figura que se tornou conhecida na linguagem processual como “súmula impeditiva” e que guarda uma certa simetria com a orientação da “súmula vinculante”, preconizada pela Emenda Constitucional nº 45, de 30.12.2004. Essa regra não foi mantida pelo novo CPC, mas foi substituída pelos amplos poderes dados ao relator no tribunal, dentre os quais se inclui o de decidir monocraticamente os recursos, para dar ou negar-lhes provimento, quando a decisão recorrida ou o apelo forem contrários a súmulas do STJ, STF ou do próprio tribunal; ou a acórdãos proferidos pelo STJ e STF em julgamento de recursos repetitivos; bem como a entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência (NCPC, art. 932, IV e V). O raciocínio determinante é no sentido de que, se se admite que uma súmula vincule juízes e tribunais, impedindo-os de julgamento que a contrarie, válido é, também, impedir a parte de exigir, invariavelmente, que a apelação seja sempre julgada pelo órgão colegiado de segunda instância. O que se destaca é a grande relevância que o NCPC confere à jurisprudência sumulada pelos dois mais altos tribunais do país. Nos dois casos está em jogo o mesmo valor, qual seja, o prestígio da Súmula do STJ e do STF pela ordem jurídica. Afinal, a regra dos incisos IV e V do art. 932 do NCPC não é nada mais do que a previsão de uma hipótese de sumarização do regime do duplo grau de jurisdição. É bom lembrar que o trancamento ou o provimento da apelação pelo relator, in casu, pressupõe inteira fidelidade da sentença à súmula do STJ, do STF ou do próprio tribunal. É preciso que a decisão seja toda ela assentada na súmula, e não apenas em parte, de modo que se esta serviu tão só de argumento utilizado pelo sentenciante, para solucionar parte das questões deduzidas no processo, havendo outros dados influentes na motivação do julgado, não será o caso de julgar o recurso monocraticamente. Fora do tema da súmula, restariam questões passíveis de ampla discussão recursal, sem risco de contradizer a matéria sumulada. Quanto à hipótese de equívoco do relator em considerar a sentença adequável ao entendimento da súmula, não acarretará ele uma irremediável supressão do direito da parte de acesso ao colegiado. É que, segundo o art. 1.021 do NCPC, cabe agravo interno contra a decisão monocrática proferida pelo relator. Mediante o adequado manejo do agravo interno, portanto, a parte prejudicada pela equivocada aplicação de súmula para sumarizar a decisão de segundo grau, 1266 776. 777. encontraria remédio eficiente para corrigir o error in iudicando cometido monocraticamente pelo relator e fazer chegar o apelo ao exame do órgão colegiado. Juízo de retratação: reexame da matéria decidida na sentença apelada por ato de seu próprio prolator Publicada a sentença, tem-se como encerrada a tarefa de acertamento a cargo do juiz. Torna-se, por isso, inalterável o decisório por ato do respectivo julgador, a não ser que haja erro material ou de cálculo a corrigir ou que tenham sido interpostos embargos de declaração para eliminar obscuridade, contradição ou omissão da sentença (art. 494 do NCPC).338 A possibilidade de reforma do conteúdo do julgado depende de interposição do recurso de apelação e somente competirá ao Tribunal de segundo grau, em regra. O efeito devolutivo do recurso, na espécie, redundará no deslocamento da causa para o órgão judicante hierarquicamente superior. A apelação, de regra, é um recurso reiterativo, e não iterativo. Há, no entanto, alguns casos excepcionais em que, interposta a apelação, a lei abre oportunidade ao juiz para rever sua sentença, podendo, assim, impedir a subida do processo ao tribunal. Quando, por exemplo, a decisão consistir em indeferimento da petição inicial, o art. 331 do NCPC339 faculta ao juiz, diante da apelação formulada pelo autor, reformar sua própria sentença, no prazo de cinco dias. Somente se o juízo de retratação não ocorrer é que os autos serão encaminhados ao tribunal. Se o juiz se retratar, a apelação ficará sem objeto. Também na hipótese de processos seriados, em que o juiz é autorizado a proferir sentença de improcedência in limine litis do pedido, antes mesmo da citação do réu (art. 332),340 há previsão legal de que, ocorrendo apelação do autor, terá o juiz a faculdade de, em cinco dias, “retratar-se”. Nesse caso, determinará o prosseguimento do processo (art. 332, §§ 3º e 4º).341 Por fim, o NCPC também admitiu a retratação do juiz na apelação interposta contra a decisão que julga o processo, sem resolução de mérito (art. 485, § 7º).342 Trata-se, pois, de mais um caso em que o juízo de retratação em primeiro grau se torna possível, no curso da apelação. Deserção Denomina-se deserção o efeito produzido sobre o recurso pelo não cumprimento do requisito do preparo no prazo devido. Sem o pagamento das custas devidas, o recurso torna-se descabido, provocando a coisa julgada sobre a sentença 1267 778. apelada.343 O art. 1.007 do NCPC344 abrandou o rigor da deserção, admitindo, inclusive, o pagamento em dobro do preparo e do porte de remessa e retorno, quando o recorrente interpuser o recurso sem o seu devido recolhimento (§ 4º) (sobre o tema, ver item nº 752 retro). Segundo a sistemática atual, que retirou do juiz de primeiro grau a competência para realizar, em toda a extensão, o juízo de admissibilidade da apelação, caberá ao relator a decretação ou não da deserção. Poder-se-ia argumentar que, para as partes, seria mais fácil que a análise e o saneamento da falta ou deficiência do preparo ficasse a cargo do juiz a quo e, não, do relator. A lei, no entanto, não excepcionou nenhuma parcela do juízo de admissibilidade, relegando-o, por completo, à instância superior. Se fosse dado ao juiz inadmitir o recurso por deserção, também teria de ser competente para indeferi-lo nos casos de intempestividade ou de manifesto descabimento. Ademais, com a adoção do protocolo integrado (art. 929, parágrafo único), a parte não teria maior dificuldadeem regularizar o recolhimento do preparo e do porte de remessa e retorno, já que poderia fazê-lo na comarca de origem e encaminhar o comprovante ao tribunal, sem necessidade de deslocamento do advogado para a capital. Por outro lado, ao se tolerar que o juiz pudesse decretar a deserção, estar-se-ia num dilema grave, pois o Código não prevê recurso contra essa espécie de decisão, já que não a menciona no rol do art. 1.015, e tampouco haveria como o apelante suscitar o questionamento em preliminar de apelação (art. 1.009, § 1º), afinal, a decisão, na espécie, seria ato posterior àquele recurso. Prazo para interposição da apelação O prazo legal é de quinze dias, tanto para apelar como para contra-arrazoar a apelação (art. 1.003, § 5º, do NCPC).345 Em verdade, o NCPC estabeleceu prazo único para todos os recursos, excetuados, apenas, os embargos de declaração. Se, todavia, o prazo é ultrapassado em razão de obstáculo do serviço forense, não pode a parte ficar prejudicada, dado que, durante o embaraço judicial, não flui nenhum prazo.346 O prazo vence-se, outrossim, em cartório. De sorte que, “sem embargo de haver sido despachada no prazo legal, a apelação fica prejudicada pelo retardamento da respectiva juntada, por culpa da parte interessada”.347 Mas “não fica prejudicada a apelação entregue em cartório no prazo legal, embora despachada tardiamente”.348 1268 779. 780. Interposição de apelação antes do julgamento dos embargos de declaração Como já visto no item nº 743 retro, o STJ editou a Súmula nº 418, à época do Código anterior, reconhecendo ser inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação. Muito embora o entendimento sumulado versasse sobre o recurso especial, aquela Corte Superior o aplicava indiscriminadamente, também, à apelação.349 A orientação justificava-se pelo fato de que, à semelhança do que ocorre com o recurso especial, o apelo dirige-se contra o pronunciamento último do juiz de primeiro grau, razão pela qual a decisão dos embargos integra a sentença, fazendo-se necessária a ratificação da apelação.350 Ainda à época do Código anterior, esse entendimento era questionado pela doutrina, na medida em que existem diferenças substanciais entre o objetivo da apelação e do recurso especial, o que afastaria a aplicação analógica da Súmula às duas espécies recursais. Enquanto o recurso ao tribunal superior visa a estabilização da jurisprudência, sendo vedado o simples reexame das provas, a apelação busca a correção da justiça da sentença, ampliando a extensão da impugnação. O NCPC solucionou a controvérsia, afastando a necessidade de ratificação de qualquer recurso interposto antes da publicação do julgamento dos embargos, se eles forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior (art. 1.024, § 5º). Por outro lado, caso haja modificação da decisão recorrida, o embargado que já tiver interposto outro recurso contra a decisão originária poderá complementar ou alterar suas razões, nos exatos limites da modificação, no prazo de quinze dias (art. 1.024, § 4º). Julgamento em segunda instância O tribunal ad quem, antes de apreciar a apelação, deverá decidir os agravos de instrumento porventura interpostos no mesmo processo (NCPC, art. 946).351 A competência funcional para julgar o recurso é de câmara ou turma do tribunal, mas o voto é tomado apenas de três juízes, que formam a denominada “turma julgadora” (art. 941, § 2º).352 Há, porém, possibilidade de o relator, em casos de relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem repetição em múltiplos processos, propor seja o recurso julgado por um colegiado maior previsto no regimento interno, dando lugar ao incidente de assunção de competência (art. 947) (v. o item nº 605). 1269 272 273 274 275 276 277 Fluxograma nº 28 – Apelação (arts. 1.009 a 1.014) AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras linhas de direito processual civil. 4. ed. São Paulo: Max Limonad, 1973, v. III, n. 708. CPC/1973, art. 162, § 1º. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. 1270 278 279 280 281 282 283 284 285 286 287 288 289 290 CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, art. 514. STJ, 1ª T., REsp 1.065.412/RS, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 10.11.2009, DJe 14.12.2009. STF, RE 68.710, Rel. Min. Amaral Santos, RTJ 56/112; STJ, REsp 62.466-5/RJ, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, ac. 28.08.1995, DJU 09.10.1995, p. 33.553; STJ, 1ª T., REsp 1.065.412/RS, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 10.11.2009, DJe 14.12.2009. CPC/1973, art. 506, parágrafo único. CPC/1973, arts. 397 e 517. CPA/1973, arts. 396 e 397. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., p. 206. O STF decidiu que “a norma excludente da suscitação de novas questões de fato, na apelação, não impede que se juntem documentos às razões, para que os aprecie a instância recursal” (RE 75.946, Rel. Min. Rodrigues Alckmin, RTJ 67/852). “A juntada de documentos com a apelação é possível, desde que respeitado o contraditório e inocorrente a má-fé, com fulcro no art. 397 do CPC [NCPC, art. 435]” (STJ, 4ª T., AgRg no REsp 785.422/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, ac. 05.04.2011, DJe 12.04.2011). STJ, 4ª T., REsp 431.716/PB, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 22.10.2002, DJU 19.12.2002, p. 370; STJ, 4ª T., AgRg no REsp 785.422/DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, ac. 05.04.2011, DJe 12.04.2011. CPC/1973, art. 515. Se o recurso se restringe a um determinado ponto, “não é lícito à Superior Instância se pronunciar sobre assunto extravagante ao âmbito do pedido de nova decisão” (TJMG, Apel. 13.444, D. Jud. MG, de 27.04.1960). Pela mesma razão, “não pode o tribunal pronunciar, no seu julgamento, nulidade não arguida na respectiva interposição” (STF, RE 77.360, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, D. Jud. MG de 26.04.1974). “A apelação transfere ao conhecimento do tribunal a matéria impugnada, nos limites dessa impugnação, salvo matérias examináveis de ofício pelo juiz” (STJ, REsp 48.357/MG, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 13.02.1996, DJU 15.04.1996, p. 11.537). No mesmo sentido: STJ, REsp 52.991-3/SP, Rel. Min. Barros Monteiro, ac. 04.10.1994, DJU 14.11.1994, p. 30.962; STJ, REsp 7.143-0/ES, Rel. Min. César Rocha, ac. 16.06.1993, DJU 16.08.1993, p. 15.955; STJ, 2ª T., REsp 761.534/PR, Rel. Min. Castro Meira, ac. 01.10.2009, DJe 09.10.2009. CPC/1973, art. 515, § 1º. Segundo antigo entendimento, quando o julgamento de primeiro grau houvesse se restringindo a questões preliminares, não poderia o tribunal, por força da apelação, apreciar desde logo o mérito da causa, sob pena de abolir o duplo grau de jurisdição (STF, RE 71.515, 72.352, 73.716 e Ação Resc. 1.006, RTJ 60/207, 60/828, 62/535 e 86/71; STJ, REsp 28.515-3/RJ, Rel. Min. Dias Trindade, ac. 03.11.1992, DJU 23.11.1992, p. 21.891; 1271 291 292 293 294 295 296 297 STJ, REsp 34.391-8/RJ, Rel. Min. Hélio Mosimann, ac. 15.03.1995, DJU 03.04.1995, p. 8.122. No mesmo sentido: BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil, vol. V, n. 244, p. 444; MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil, vol. III, p. 620). Esse entendimento, entretanto, foi superado quando a Lei nº 10.352/2001 acrescentou o § 3º ao art. 515 ao CPC/1973, cujo teor foi conservado pelo NCPC, art. 1.013, § 3º. O alcance, porém, da nova regra deve ser definido em harmonia com o caput do artigo, onde se define oobjeto da apelação, cujo conhecimento é devolvido ao tribunal. Adiante, no texto principal, essa harmonização será melhor explicada (v. item nº 767). CPC/1973, art. 2º. “Por força da amplitude e profundidade do efeito devolutivo da apelação, todas as questões suscitadas e discutidas no processo devem ser objeto de apreciação do Tribunal quando do julgamento da apelação, mesmo que o Juiz tenha acolhido apenas um dos fundamentos do pedido ou da defesa (art. 515, §§ 1º e 2º, do CPC) [NCPC, art. 1.013, §§ 1º e 2º]” (STJ, 2ª T., REsp 1.008.249/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 15.10.2009, DJe 23.10.2009). CPC/1973, art. 267, § 3º. Questões de ordem pública são aquelas que envolvem interesses que escapam à disponibilidade das partes, por afetarem “interesses públicos”, cuja inobservância conduz, no caso do processo, a nulidades absolutas e cuja decretação independe de provocação da parte. Podendo, ou devendo ser examinadas de ofício pelo tribunal, há quem veja, a seu respeito, um efeito recursal distinto do efeito devolutivo, que, por sua vez, ficaria restrito ao pedido formulado pelo recorrente. Fala--se em efeito translativo. O problema, porém, é apenas terminológico. Se é efeito devolutivo o fenômeno de deslocar o conhecimento da causa, no todo ou em parte, do juízo a quo, para o tribunal ad quem, não há pecado lógico na inclusão das matérias de ordem pública no âmbito da devolução de competência operada por força do recurso. Quando muito, se poderia especificar um efeito devolutivo em sentido estrito, compreendendo o pedido formulado pelo recorrente e um efeito devolutivo em sentido lato abarcando, genericamente, a extensão do conhecimento transferido, em suas múltiplas dimensões, de modo a compreender o suscitado pela parte e tudo o mais que a lei permite ao tribunal apreciar, em razão do conhecimento do recurso. Assim, o efeito dito translativo não seria mais do que um dos aspectos do efeito devolutivo lato sensu. CPC/1973, art. 515, § 2º. O exame dos “demais” fundamentos a que alude o art. 515, § 2º, do CPC [NCPC, art. 1.013, § 2º], “independe de recurso próprio ou de pedido específico formulado em contrarrazões” (STJ, 1ª T., REsp 1.201.359/AC, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 05.04.2011. DJe 15.04.2011). CPC/1973, sem correspondência. 1272 298 299 300 301 302 303 304 305 306 307 308 A nova regra tem evidente caráter de economia processual, com o fito de abreviar a solução do processo. Também o novo Código de Processo Civil francês, de 1975, contém norma de igual sentido (art. 568) [NCPC, art. 779]. CPC/1973, art. 517. Quanto às questões de fato alegáveis originariamente na apelação, ou até mesmo depois de sua interposição, devem ser incluídas as autorizadas pelo art. 462 do CPC [NCPC, art. 493], ou seja, as relativas a fato superveniente. A regra em referência é de aplicar-se não só ao juízo de 1º grau, mas também ao tribunal (STJ, 4ª T., REsp 12.673-0/RS, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, ac. 01.09.1992, RSTJ 42/352; STJ, 3ª T., REsp 75.003/RJ, Rel. Min. Waldemar Zveiter, ac. 26.03.1996, RSTJ 87/237; STJ, 4ª T., REsp 500.182/RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, ac. 03.09.2009, DJe 21.09.2009). TUCCI, Rogério Lauria. Curso de direito processual – Processo civil de conhecimento-II. São Paulo: J. Bushastsky, 1976, p. 247. AMARAL SANTOS, Moacyr. Op. cit., n. 711. CPC/1973, art. 520. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, art. 521. Ainda no regime do CPC anterior, para Bedaque, a autorização da lei a que o tribunal julgue o mérito da causa – mesmo que a apelação tenha sido manifestada contra sentença apenas ter-minativa – indica que o direito positivo, sem ofender o princípio do contraditório, porquanto a causa já teria sido suficientemente debatida no juízo de primeiro grau, superou o rigor do duplo grau de jurisdição, excepcionalmente, “em nome da celeridade processual”. E por ficar o tribunal autorizado a enfrentar originariamente o mérito da causa, inclusive no tocante a pedido não decidido pelo juízo a quo, teria o legislador, até mesmo, afastado, também excepcionalmente, a vedação da reformatio in pejus: a parte que recorreu contra uma sentença terminativa pode-ria ver não só cassada a decisão, como ainda rejeitada sua pretensão de mérito, que não fora colocada como objeto do recurso (BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Apelação: questões sobre admissibilidade e efeitos. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; NERY JÚNIOR, Nelson (coords.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e de outros meios de impugnação às decisões judiciais. São Paulo: RT, 2003, p. 454). Já na interpretação do NCPC, Sandro Marcelo Kozikoski adota o mesmo entendimento de Bedaque (O CPC 2015 e a relativização do princípio da proibição da reformatio in pejus. In: DIDIER JR., Fredie (coord.). Processo nos tribunais e meios de impugnação às decisões judiciais. 2. ed. Salvador: JusPodivm, 2016, p. 648-649). STJ, 1ª T., RMS 15.877, Rel. Min. Teori Zavascki, ac. 18.05.2004, DJU 21.06.2004, p. 163; STJ, 5ª T., RMS 17.891, Rel.ª Min.ª Laurita Vaz, ac. 24.08.2004, DJU 13.09.2004, p. 264; STJ, 2ª T., RMS 17.220, Rel.ª Min.ª Eliana Calmon, ac. 28.09.2004, DJU 13.02.2004, p. 1273 309 310 311 312 313 314 315 316 317 266; STJ, 1ª T., RMS 20.675/RJ, Rel. Min. José Delgado, ac. 14.03.2006, DJU 03.04.2006, p. 225. STF, 1ª T., RO em MS 24.789/DF, Rel. Min. Eros Grau, ac. 26.10.2004, DJU 26.11.2004, RT 834/176; STF, 1ª T., RE 621.473, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 23.11.2010, DJe 23.03.2011. STJ, 4ª T., REsp 1.179.450/MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, ac. 15.05.2012, DJe 28.05.2012, RT 926/840. No mesmo sentido: STJ, 3ª T., AgRg no Ag 836.287/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 18.10.2007, DJU 31.10.2007, p. 325; STJ, 2ª T., REsp 797.989/SC, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 22.04.2008, DJU 15.05.2008, LEXSTJ, v. 227, p. 108; STJ, 5ª T., AgRg no Ag 878.646/ SP, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 18.03.2010, DJe 12.04.2010; STJ, 1ª T., REsp 1.113.408/SC. Rel. Min. Luiz Fux, ac. 28.09.2010, DJe 08.10.2010; STJ, 6ª T., AgRg nos EDcl no REsp 1.142.225/ PA, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, ac. 19.06.2012, DJe 29.06.2012. “O pedido do apelante para que o tribunal julgue o mérito da causa é requisito intransponível para que seja aplicado o novo § 3º do art. 515 [NCPC, art. 1.013, § 3º], sob pena de violação ao art. 2º do Código de Processo Civil [NCPC, art. 2º], aplicado analogicamente aos recursos. A incidência do princípio dispositivo, e consequentemente do efeito devolutivo, neste caso é plena e obrigatória” (JORGE, Flávio Cheim. Teoria geral dos recursos cíveis. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 268). DIDIER JÚNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de direito processual civil. Salvador: JusPodivm, 2006, v. III, n. 4.2, p. 88. CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Inovações no processo civil. São Paulo: Dialética, 2002, n. 6.4, p. 85. CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Op. cit., n. 6.4, p. 85. CUNHA, Leonardo José Carneiro Op. cit., n. 6.4, p. 85. TUCCI, José Rogério Cruz e. Lineamentos da nova reforma do CPC: Lei 10.352. de 26.01.2001, Lei nº 10.358, de 27.12.2001. São Paulo: RT, 2002, p. 60. DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da Reforma. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 160. DINAMARCO, Cândido Rangel. A Reforma da Reforma, cit., pp. 159-160. O STJ, porém, já decidiu que, à luz do art. 515, § 3º, do CPC, o tribunal pode, independente de requerimento da parte, analisar o mérito da causa, ou determinar a baixa dos autos para que o juiz de 1º grau o faça (REsp. 657.407, 2ª T., Rel.Min. Castro Meira, ac. 21.06.2005, DJU 05.09.2005, p. 365). No mesmo sentido: STJ, 4ª T., REsp. 836.932/RO, Rel. Min. Fernando Gonçalves, ac. 06.11.2008, DJe 24.11.2008; STJ, 3ª T., AgRg. no Ag. 836.287/DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 18.10.2007, DJU 31.10.2007, p. 325. No sentido de ser necessário o pedido da parte: STJ, 5ª T., REsp. 645.213/SP, Rel. Min. Laurita Vaz, ac. 18.10.2005, DJU de 14.11.2005, p. 382; STJ, 5ª T., RMS 18.910/RJ, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 06.09.2005, DJU de 10.10.2005, p. 398. 1274 318 319 320 321 322 323 324 325 326 327 328 329 330 331 332 333 334 335 STJ, Corte Especial EREsp 874.507/SC, Rel. Min. Arnaldo Esteve Lima, ac. 19.06.2013, DJe 01.07.2013. STJ, Corte Especial, REsp 1.215.368/ES, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 01.06.2016, DJe 19.09.2016. STJ, 1ª T., REsp 6.130-0/SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, ac. 23.08.1993, p. 16.560; STJ, 2ª T., REsp 21.008/BA, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 14.03.1996, DJU 22.04.1996, p. 12.556; STJ, 4ª T., REsp 6.643/SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, ac. 11.09.1991, RSTJ 26/445; STJ, 5ª T., REsp 97.251/SP, Rel. Min. José Dantas, ac. 24.09.1996, DJU 29.10.1996, p. 41.683. STJ, 3ª T., REsp 2.306/SP, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, ac. 19.06.1990, DJU 24.09.1990, p. 9.978; STJ, 4ª T., REsp 141.595/PR, por maioria, Rel. Min. César Asfor Rocha, ac. 23.11.1999, DJU 08.05.2000, p. 95. CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Inovações no processo civil. São Paulo: Dialética, 2002, n. 6.4, p. 84-85; STJ, 6ª T., REsp 300.366/SC, Rel. Min. Fontes de Alencar, ac. 11.03.2003, DJU 06.10.2003, p. 335. Também no atual Código de Processo Civil francês, de 1975, há regra similar à do atual § 1º do art. 938 de nosso NCPC, conferindo ao tribunal, no caso de reconhecimento da nulidade de sentença, o poder de, em grau de apelação, conhecer do pedido e julgar a causa. CPC/1973, art. 520. TJDF, AI 8.741/97, Rel. Des. Mário Machado, Revista Jurídica, v. 246/74; STJ, 3ª T., AgRg no Ag 1.217.740/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, ac. 17.06.2010, DJe 01.07.2010. CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Op. cit., n. 6.6, p. 89-90. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, art. 518, caput. CPC/1973, sem correspondência. STF, RE 67.311, Rel. Min. Djaci Falcão, RTJ 52/129; STJ, REsp 6.446/RJ, Rel. Min. Dias Trindade, ac. 10.12.1990, DJU 18.02.1991, p. 1.040; 2º TACiv.-SP, Ag. 385.383/9-00, Rel. Juiz João Batista Lopes, ac. 09.08.1993, JTACiv.-SP 145/254; STJ, 2ª T., REsp 135.520/SP, Rel. Min. Franciulli Netto, ac. 19.04.2001, DJU 13.08.2001, p. 85. CPC/1973, art. 296, parágrafo único. CPC/1973, art. 285-A, § 1º. CPC/1973, sem correspondência. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., n. 258. 2º TACiv.-SP, M. Seg. 3.894, Rel. Juiz Marino Falcão, RT 452/151; 1º TACiv.-SP, Ap. 711.410-7, Rel. Juiz Cyro Bonilha, ac. 11.03.1998, JTACiv.-SP 171/90. 1275 336 337 338 339 340 341 342 343 344 345 346 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., n. 348, p. 636. No mesmo sentido: NERY JÚNIOR, Nelson. Código de Processo Civil comentado. 3. ed. São Paulo: RT, 1997, p. 753: “Da sentença que julga ações conexas, para as quais estão previstos recursos com efeitos diferentes (para uma: só devolutiva; para outra: duplo efeito), deve ser recebida também (a apelação) com efeitos diferentes para cada capítulo. É comum o juiz julgar, na mesma sentença, ação principal e cautelar. Como o CPC, 520, V [de 1973], prevê apenas o efeito devolutivo da sentença da cautelar, deve receber o recurso, nessa parte, somente no efeito devolutivo e no duplo efeito na parte que julgou a ação principal”. Este entendimento também tem sido adotado pelo Superior Tribunal de Justiça: “Julgados concomitantemente a ação principal e a cautelar, interposta apelação global, ao Juiz cabe recebê-la com efeitos distintos, a correspondente medida cautelar tão somente no efeito devolutivo (art. 520, inciso IV, do CPC [de 1973])” (REsp 81.077, 4ª T., Rel. Min. Barros Monteiro, ac. 26.06.1996, RF 339/298). No mesmo sentido: STJ, REsp 61.609-3/MG, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, ac. 23.04.1996, DJU 03.06.1996, p. 19.249; STJ, 4ª T., AgRg no REsp 707.365/ SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 27.09.2005, DJU 13.02.2006, p. 823. A súmula a que se refere o § 1º do art. 518 não é necessariamente a de efeitos vinculantes (CF, art. 103-A). Basta a existência de súmula nos moldes comuns do STF ou do STJ. CPC/1973, art. 463. CPC/1973, art. 296. CPC/1973, art. 285-A. CPC/1973, art. 511. CPC/1973, sem correspondência. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, v. V, n. 219. O prazo de 10 dias, para preparo da apelação, foi reduzido para 5 dias, pela Lei nº 6.032/1974, art. 10, II, nas causas de competência da Justiça Federal. As custas do preparo são somente as do recurso e não todas as vencidas no processo. Mas o recorrente está sujeito ao pagamento dos gastos de primeira e segunda instâncias, relacionados com a tramitação do recurso, segundo o regimento de custas, e não apenas os de remessa e retorno dos autos (TJMG, AI 17.207, Rel. Des. Humberto Theodoro). STJ, 2ª T., REsp 1.216.685/SP, Rel. Min. Castro Meira, ac. 12.04.2011, DJe 27.04.2011. CPC/1973, art. 511. CPC/1973, art. 508. STJ, 2ª T., REsp 200.482/PR, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 01.04.2003, DJU 28.04.2003, p. 181; STJ, 3ª T., REsp 1.191.059/MA, Rel.ª Min.ª Nancy Andrighi, ac. 01.09.2011, DJe 09.09.2011; STF, HC 48.877, Rel. Min. Thompson Flores, RTJ 63/339. “Não constitui motivo relevante para impedir o início da fluência do prazo recursal a falha atribuída à empresa encarregada na remessa dos cortes do Diário Oficial” (STJ, REsp 155.086/RJ, Rel. Min. Barros Monteiro, ac. 03.02.1998, DJU 04.05.1998, p. 186). 1276 347 348 349 350 351 352 TJMG, Apel. 28.130, Rel. Des. Natal Campos, D. Jud. MG 14.02.1968; STJ, REsp 34.288- 4/PR, Rel. Min. Flaquer Scartezzini, ac. 01.09.1993, DJU 27.09.1993, p. 19.826. “Não deve ser considerada intempestiva a protocolização da Apelação, no prazo legal, em Vara diversa do mesmo Foro, inexistindo má-fé ou intuito de conseguir vantagem processual” (STJ, 2ª T., AgRg no Ag 775.617/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 27.05.2008, DJe 13.03.2009). STF, Súmula nº 428. STJ, 4ª T., REsp 659.663/MG, Rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, ac. 01.12.2009, DJe 22.03.2010. NETTO, José Laurindo de Souza; CARDOSO, Cassiana Rufato. A ratificação da apelação após o julgamento dos embargos de declaração: uma exigência nem sempre necessária. Revista de Processo, n. 229, São Paulo, p. 234, mar. 2014. CPC/1973, art. 559. CPC/1973, art. 555, caput. 1277 781. § 81. AGRAVO DE INSTRUMENTO Sumár io: 781. Conceito. 782. Espécies de agravo. 783. Recorribilidade das decisões interlocutórias. 783-A. Decisão interlocutória e mandado de segurança. 784. Agravo de instrumento. 785. Prazo de interposição. 786. Formação do instrumento do agravo. 787. Efeitos do agravo de instrumento. 788. Processamento do agravo de instrumento. 789. O contraditório. 790. Juízo de retratação do magistrado a quo. 791. Julgamento do recurso pelo colegiado. 792. Encerramento do feito. 793. Formação da coisa julgada antes do julgamento do agravo. Conceito Agravo de instrumento é o recurso cabível contra algumas decisões interlocutórias (NCPC, art. 1.015, caput),353 ou seja, contra os pronunciamentos judiciais de natureza decisória que não se enquadrem no conceito de sentença (art. 203, § 2º).354 Sob o nome de agravo de instrumento, a redação primitiva do Código de Processo Civil de 1973 indicavao meio impugnativo das decisões interlocutórias prevendo que, a requerimento da parte, o instrumento pudesse não ser formalizado e que o recurso ficasse retido nos autos, para futura apreciação junto com a eventual apelação relativa à sentença da causa. Assim, estranhamente, o agravo retido era regulado como espécie do agravo de instrumento. Com a Lei nº 9.139, de 30.11.1995, o recurso em questão passou a denominar-- se, à época do Código anterior, simplesmente agravo, que admitia o processamento sob a forma de retido ou de instrumento. A maior inovação da lei anterior, todavia, não se deu no plano da nomenclatura do agravo, mas no seu processamento, quando adotada a via do instrumento. Ao contrário dos demais recursos que eram sempre interpostos perante o órgão judicial responsável pelo ato decisório impugnado, para posterior encaminhamento ao tribunal competente para revisá-lo, o agravo por instrumento deveria ser endereçado diretamente àquele tribunal (art. 524 do CPC/1973).355 Com essa sistemática, o legislador, à época, teve em mira afastar dois grandes inconvenientes que o agravo de instrumento tradicional produzia, com acentuada 1278 frequência, a saber: (i) a longa e penosa tarefa da formação e discussão do recurso em primeiro grau de jurisdição, que fazia que o agravo fosse o mais complicado e mais demorado recurso utilizado no processo civil, em flagrante contradição com a natureza interlocutória das decisões por ele impugnadas; (ii) a constante necessidade do uso do mandado de segurança, em situação totalmente fora de sua elevada destinação constitucional, para apenas conseguir suspender efeitos de decisões interlocutórias capazes de gerar graves e imediatos prejuízos à parte, já que o agravo de instrumento não tinha efeito suspensivo, nem contava com um mecanismo interno que acelerasse o conhecimento da impugnação pelo tribunal ad quem. A partir da Lei nº 9.139/1995, o agravo de instrumento passou a ser despachado pelo relator, já em segunda instância, a ele competindo, liminarmente, apreciar o cabimento, quando fosse o caso, da pretensão do agravante de obter suspensão imediata dos efeitos do ato impugnado (art. 527, III, do CPC/1973). Aquilo que se buscava, penosamente, com o simultâneo manejo do recurso e do mandado de segurança, passou a ser alcançável, prontamente, pelo simples despacho da petição recursal, com evidente economia para a justiça e para as partes. A modernização do agravo continuou por meio de outras alterações do Código de 1973, operadas pelas Leis nos 10.352, de 26.12.2001, e 11.187, de 19.10.2005. Já, então, o que preocupava o legislador era o excesso tumultuário do uso do agravo de instrumento, que, segundo reclamos dos Tribunais, embaraçava inconvenientemente a tramitação e julgamento dos demais recursos em segunda instância. As reformas realizadas por meio das Leis nos 10.352 e 11.187 tiveram, portanto, o explícito objetivo de reduzir os casos de agravo de instrumento, tornando prioritário o agravo retido e reservando o primeiro apenas para questões graves e urgentes. O NCPC, na esteira das alterações anteriores e dos princípios da celeridade e da efetividade do processo, promoveu outras modificações no recurso, tais como: (i) elaborou um rol taxativo de decisões que admitem a interposição do agravo de instrumento (art. 1.015);356 (ii) aboliu o agravo na modalidade retida, determinando que, para as situações não alcançáveis pelo agravo, a impugnação deverá ser feita em preliminar de apelação ou contrarrazões de apelação, depois da sentença (art. 1.009, § 1º). O agravo é, outrossim, cabível em todo e qualquer tipo de processo, inclusive no de execução, assim como no procedimento comum e nos especiais (de jurisdição voluntária ou contenciosa). 1279 782. Espécies de agravo I – Agravo de instrumento e agravo interno O Código de 1973 previa duas modalidades de agravo, manejáveis durante a tramitação do processo em primeiro grau de jurisdição: (i) agravo retido ou (ii) agravo de instrumento. O NCPC, como se viu, aboliu o agravo retido, substituindo-- o pela impugnação em preliminar de apelação ou de contrarrazões de apelação (sobre o tema, ver item nº 765, retro). Assim, atualmente, contra a decisão inter-locutória proferida pelo juiz a quo cabem o agravo de instrumento ou a apelação, conforme o caso. Não é, porém, somente a decisão interlocutória do juiz de primeira instância que desafia agravo. Também nos tribunais superiores há situações em que se veri- ficam decisões interlocutórias com previsão, no Código, do cabimento de agravo. Pela peculiaridade desses casos, há uma disciplina própria a ser observada (NCPC, art. 1.021).357 A linguagem do novo Código, para distinguir o agravo utilizável contra decisões singulares proferidas em segunda instância, passou a nominá-lo de agravo interno. O Código de 1973 admitia o agravo interno apenas para impugnar algumas poucas decisões monocráticas proferidas nos tribunais. A nova legislação ampliou a utilização do recurso, admitindo-o contra qualquer “decisão proferida pelo relator” (art. 1.021, caput). Na verdade, os agravos interponíveis perante tribunais nem sempre se limitam a decisões interlocutórias. Dispondo os relatores de poder para proferir, em alguns casos, julgamento de mérito, o agravo interno então manejável terá como objeto decisão que, obviamente, não será interlocutória, mas definitiva ou final (é o que ocorre nas situações previstas no art. 932, III a V, do NCPC).358 II – Agravo em recurso especial e em recurso extraordinário Ainda nos tribunais há o agravo em recurso especial e em recurso extraordinário, que não é interno nem de instrumento. Cabe contra certas decisões singulares que, no tribunal de origem, inadmitem os recursos extraordinários e especiais intempes-tivos ou não os excluam da retenção provocada pelos mecanismo da repercussão geral ou dos recursos repetitivos (art. 1.042). Não é interno porque não é julgado pelo colegiado local, mas pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se trate de recurso extraordinário ou de recurso especial. A peculiaridade desse agravo é que seu processamento se dá dentro dos autos do processo em que o acórdão recorrido foi pronunciado. A exemplo do 1280 (a) (b) (c) (d) (a) (b) (c) 783. que se passa com o recurso de apelação em primeiro grau, o agravo do art. 1.042359 provoca a subida dos autos em sua totalidade ao tribunal a que for endereçado o recurso (a regra vale tanto para o recurso extraordinário como para o recurso especial). III – Casos de agravo interno Eis alguns exemplos mais frequentes de decisões singulares pronunciadas em tribunal que desafiam agravo interno: decisão do relator que nega seguimento a recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida (art. 932, III); decisão do relator que nega provimento a recurso contrário a súmula do STF, do STJ ou do próprio tribunal (art. 932, IV, “a”); decisão do relator que dá provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal (art. 932, V, “a”). qualquer decisão, no âmbito do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça, proferida por Presidente do Tribunal, de Seção, de Turma, ou de Relator, que cause gravame à parte (Lei nº 8.038, de 28.05.1990, art. 39). IV – Síntese Em síntese, existem três variações do agravo noCódigo de Processo Civil atual: o agravo de instrumento; o agravo em recurso especial e em recurso extraordinário; o agravo interno. O primeiro é próprio para atacar algumas decisões interlocutórias proferidas em primeiro grau de jurisdição, e os dois últimos, para impugnar decisões singulares ocorridas nos tribunais. Observe-se que, nos tribunais não há agravo contra julgamentos de órgãos colegiados, mesmo quando decidam questões incidentais. Recorribilidade das decisões interlocutórias 1281 É impróprio afirmar que há decisões irrecorríveis no sistema do NCPC, apenas pelo fato de ter sido abolido o agravo retido e de o agravo de instrumento não abranger todas as decisões interlocutórias proferidas pelos juízes. Com efeito, todas as interlocutórias são passíveis de impugnação recursal. O que há são decisões imediatamente atacáveis por agravo de instrumento (NCPC, art. 1.015)360 e outras que se sujeitam, mais remotamente, ao recurso de apelação (art. 1.009, § 1º).361 De tal sorte pode-se reconhecer que todas as sentenças desafiam apelação e todas as decisões interlocutórias são recorríveis, ora por meio de agravo de instrumento, ora por meio de apelação. Por outro lado, a manifestação recursal contra a decisão não agravável não é privativa da parte vencida e que tem legitimidade para interpor apelação contra a sentença definitiva ou terminativa (art. 1.009, caput). O vencido recorre contra as decisões interlocutórias que, antes da sentença, lhe foram adversas, por meio de preliminares inseridas na apelação, enquanto ao vencedor é facultado impugná-las nas contrarrazões (art. 1.009, § 1º).362 Quanto ao vencedor, sem embargo de não lançar mão formalmente de um recurso, na realidade veicula autêntico recurso por meio das contrarrazões da apelação aforada pelo vencido. In casu, numa só peça o vencedor pratica dois atos processuais: (i) responde à apelação do vencido; e (ii) recorre das decisões interlocutórias não agraváveis pronunciadas antes da sentença.363 O recurso do vencedor, todavia, não é autônomo, visto que adere à apelação do vencido e sua apreciação, em regra, dependerá do resultado a que chegar a apelação. Trata-se, pois, de um recurso subordinado e condicionado; i.e., o interesse do vencedor perdura enquanto subsistir a apelação do vencido. Inadmitida esta ou extinta sem decisão de seu mérito, desaparece a possibilidade de apreciação da impugnação contida nas contrarrazões. Daí falar-se em recurso subordinado. Por outro lado, se improvida a apelação, quase sempre, desaparecerá também o interesse do vencedor na apreciação do recurso embutido nas contrarrazões, que somente fora manifestado levando em conta a eventualidade de a sentença ser reformada em benefício do apelante (ou seja, sob tal condição). Por isso, se reconhece que o remédio impugnativo previsto no art. 1.009, § 1º, do NCPC é, a um só tempo, recurso subordinado e recurso condicional.364 Admite-se, todavia, que em circunstâncias excepcionais, possa o vencedor exigir o julgamento das contrarrazões, quando estas envolverem pretensões inde- pendentes em face do julgamento da apelação, e cuja solução corresponda a legítimo 1282 783-A. interesse da parte vencedora, ainda que a apelação do vencido seja desprovida.365 Decisão interlocutória e mandado de segurança No regime primitivo do CPC de 1973, como o agravo de instrumento não tinha efeito suspensivo e sua tramitação era longa e demorada, tornou-se pacífico o entendimento jurisprudencial de que, nos casos de urgência, o mandado de segurança era o remédio ao alcance da parte ameaçada de lesão grave e iminente para obter a pronta suspensão dos efeitos da decisão recorrida.366 Todavia, depois que o agravo de instrumento passou a ser processado diretamente no tribunal ad quem, com possibilidade de liminar de plano pelo relator, inclusive para atribuir efeito suspensivo ao recurso (CPC/1973, art. 527, III), desapareceu a possibilidade de usar a ação mandamental, como antes se permitia. O próprio recurso, desde então, contava com mecanismo expedito para atingir o efeito suspensivo, quando necessário.367 A sistemática procedimental do agravo de instrumento continua sendo a mesma no Código de 2015. Mas, embora o processamento ainda se dê diretamente no tribunal, surgiu um novo problema: o agravo de instrumento não é mais admissível perante todas as decisões interlocutórias, já que o regime do NCPC é o do casuísmo, em numerus clausus. Fora das hipóteses expressamente enumeradas pela lei, as decisões interlocutórias não são impugnáveis, senão depois da sentença, através de preliminar ou contrarrazões da apelação. Não há, pois, nesses casos, recurso capaz de atacar, de imediato, a ilegalidade ou o abuso de poder praticado em decisão interlocutória. Uma vez que a Lei nº 12.016/2009 permite a impetração do mandado de segurança contra ato judicial em face do qual não caiba recurso com efeito suspensivo (art. 5º, II), parece irrecusável o enquadramento das decisões não agraváveis nesse permissivo da lei especial. De fato, se o recurso manejável (a apelação) é remoto e problemático, a conclusão é de que o decisório, na verdade, não se apresenta como passível de suspensão imediata pela via recursal. Logo, estando demonstrada a lesão de direito líquido e certo da parte, causada pela decisão interlocutória não agravável, o remédio com que o lesado pode contar será mesmo o mandado de segurança, nos termos do art. 5º, II, da Lei nº 12.016/2009.368 Não será admissível, dentro do processo justo e efetivo, garantido pela ordem constitucional, deixar desamparado o titular de direito líquido e certo ofendido por ato judicial abusivo ou ilegal. Daí o cabimento do mandamus, nos termos do direito fundamental 1283 784. (a) (b) (c) (d) (e) (f) (g) (h) (i) (j) (k) (l) assegurado pelo art. 5º, LXIX, da Constituição. Agravo de instrumento O Código de 1973 impunha como regra a interposição de agravo retido contra as decisões interlocutórias, admitindo a modalidade de instrumento apenas quando a decisão fosse suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, bem como nos casos de inadmissão da apelação e nos relativos aos efeitos em que a apelação era recebida (art. 522 do CPC/1973). A orientação do novo Código de Processo Civil foi diversa, na medida em que enumerou um rol taxativo de decisões que serão impugnadas por meio de agravo de instrumento. Aquelas que não constam dessa lista ou de outros dispositivos esparsos do Código deverão ser questionadas em sede de preliminar de apelação ou contrarrazões de apelação. Segundo o art. 1.015 do NCPC, o agravo de instrumento será cabível apenas quando se voltar contra decisão que verse sobre: tutelas provisórias (inciso I);369 mérito do processo (inciso II);370 rejeição da alegação de convenção de arbitragem (inciso III);371 incidente de desconsideração da personalidade jurídica (inciso IV);372 rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pedido de sua revogação (inciso V);373 exibição ou posse de documento ou coisa (inciso VI);374 exclusão de litisconsorte (inciso VII);375 rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio (inciso VIII);376 admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros (inciso IX);377 concessão, modificação ou revogação do efeito suspensivo aos embargos à execução (inciso X);378 redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1º (inciso XI);379outros casos expressamente referidos em lei (inciso XIII).380 Admitem, ainda, agravo de instrumento as decisões proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execu-ção e no processo de inventário (art. 1.015, parágrafo único).381 Isso porque esses procedimentos terminam por decisões que não comportam apelação. Assim, as 1284 785. interlocutórias ali proferidas não poderão ser impugnadas por meio de preliminar do apelo ou de suas contrarrazões. Com efeito, no processo de execução e no cumprimento de sentença não há a perspectiva de uma nova sentença sobre o mérito da causa, já que o provimento esperado não é o acertamento do direito subjetivo da parte, mas sua material satisfação, que se consumará antes de qualquer sentença, e nem mesmo a posteriori se submeterá a uma sentença que lhe aprecie o conteúdo e validade. Daí que os atos executivos preparatórios e finais, que provocam imediatamente repercussões patrimoniais para os litigantes, reclamam pronta impugnação por agravo de instrumento. No inventário, a fase que discute a admissão ou não de herdeiros, termina por decisão interlocutória e, não, por sentença. O mesmo acontece na fase de liquidação da sentença. É por isso que os incidentes desses dois procedimentos devem ser objeto de agravo de instrumento. A necessidade de comprovação de risco de lesão grave e de difícil reparação, não é mais, no regime do CPC/2015, requisito para o cabimento do agravo. Sua admissibilidade ocorre pela configuração de alguma das hipóteses nele elencadas. Prazo de interposição O agravo de instrumento segue o prazo geral de quinze dias previsto para a generalidade dos recursos (NCPC, art. 1.003, § 5º).382 A apuração de sua tempestividade far-se-á de maneira diversa, conforme a modalidade de interposição escolhida pela parte. Se for por protocolo integrado ou direto, a petição terá de ser ajuizada dentro dos quinze dias, apurados pela autenticação da entrada no serviço competente. Caso se utilize o serviço postal, o recurso será considerado interposto na data de sua postagem (art. 1.003, § 4º). Na hipótese de remessa eletrônica, a tempestividade será aferida pela data em que a petição for encaminhada por aquela via. Se o agravante utilizar o fac-símile, terá que proceder à transmissão dentro do prazo legal do recurso. Além disso, a tempestividade do agravo ficará na dependência de o original da petição e os documentos que a instruem serem protocolados no tribunal até cinco dias depois de findo aquele prazo (Lei nº 9.800, art. 2º). É interessante notar que o prazo, como ocorre em todas as modalidades recursais, é peremptório e, por isso, não se suspende nem se interrompe diante de eventual pedido de reconsideração submetido ao prolator da decisão recorrida. A 1285 786. (a) (b) (c) (d) previsão legal de um juízo de retratação na espécie, não interfere na fluência do prazo de interposição do agravo, porque se trata de medida aplicável depois de interposto o recurso. Formação do instrumento do agravo I – Conteúdo e instrução do recurso Interposto agravo por instrumento, o recurso será processado fora dos autos da causa onde se deu a decisão impugnada. O instrumento será um processado à parte formado com as razões e contrarrazões dos litigantes e com as cópias das peças necessárias à compreensão e julgamento da impugnação.383 A autenticação das peças reproduzidas no instrumento não depende de certificação do escrivão ou do chefe de secretaria, cabendo ao próprio advogado declará-la, sob sua responsabilidade pessoal (NCPC, art. 425, IV).384 O recurso será dirigido diretamente ao tribunal competente, por meio de petição que deverá conter os seguintes requisitos (art. 1.016):385 os nomes das partes (inciso I); a exposição do fato e do direito (inciso II); as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão e o próprio pedido (inciso III); o nome e endereço completo dos advogados constantes do processo. Atualmente, assim como já ocorria ao tempo do Código anterior, cabe ao próprio agravante obter previamente as cópias dos documentos do processo principal que deverão instruir o recurso. Por isso, a petição de agravo será, conforme o art. 1.017,386 instruída da seguinte maneira: (a) peças obrigatórias: (i) cópias da petição inicial, da contestação, da petição que ensejou a decisão agravada, da própria decisão agravada, da certidão da respectiva intimação ou outro documento oficial que comprove a tempestividade, e das procurações outorgadas aos advogados das partes (inciso I). A novidade do CPC/2015 diz respeito à possibilidade de se juntar “outro documento oficial” para comprovar a tempestividade do recurso. Como, por exemplo, o protocolo do agravo feito no prazo de quinze dia úteis a contar da data da decisão. A omissão da certidão de intimação, nessa hipótese, é perfeitamente suprida pela força probante do próprio protocolo. Com efeito, a jurisprudência à época do Código anterior já admitia essa 1286 situação, que foi apenas positivada pela nova lei;387 (ii) declaração de inexistência de qualquer desses documentos acima referidos, feita pelo advogado do agravante, sob pena de sua responsabilidade pessoal (inciso II); (iii) tratando-se de causa de interesse da Fazenda Nacional, admite-se que o termo de vista pessoal ao seu procurador possa fazer as vezes da certidão de intimação da decisão agravada, atentando-se ao princípio da instrumentalidade das formas;388 (b) peças facultativas: quaisquer outras que o agravante reputar úteis para a melhor compreensão da questão discutida no agravo (inciso III). Havendo custas e despesas de porte de retorno, será obrigatória a instrução da petição de agravo, também, com o comprovante do respectivo preparo, conforme tabela publicada pelos tribunais (art. 1.017, § 1º).389 II – Meios para a interposição do agravo Controlar-se-á a tempestividade do recurso pelo protocolo, pelo registro pos-tal ou por fac-símile, conforme a via utilizada para interposição do agravo. Com efeito, o recurso poderá ser interposto: (i) por protocolo realizado diretamente no tribunal competente para julgá-lo; (ii) por protocolo na própria comarca, seção ou subseção judiciárias (protocolo integrado); (iii) por postagem, sob registro, com aviso de recebimento; (iv) por transmissão de dados tipo fac-símile, nos termos da lei; ou, (v) por outra forma prevista em lei, como, por exemplo, por meio eletrônico, quando se tratar de autos da espécie (art. 1.017, § 2º). Essa multiplicidade de formas corresponde à intenção do Código novo de facilitar ao máximo o acesso à justiça. Se a parte interpuser o recurso por fax, o original deverá ser juntado aos autos até cinco dias do término do prazo recursal (Lei nº 9.800, art. 2º). Os documentos obrigatórios ao agravo somente deverão ser juntados nessa oportunidade, ou seja, no momento do protocolo da peça original (art. 1.017, § 4º).390 Se se tratar de autos eletrônicos, o agravante é dispensado de anexar as peças obrigatórias, facultando-lhe, contudo, anexar outros documentos não constantes do processo, que entender úteis para a compreensão da controvérsia (§ 5º).391 III – Vícios sanáveis ou ausência de peças obrigatórias no instrumento Uma vez que o NCPC dá prevalência aos julgamentos que resolvem o mérito, em lugar de simplesmente extinguir o processo por questões formais, o art. 1.017, § 3º, determina que, antes de considerar inadmissível o recurso por ausência de peças obrigatórias oupor algum outro vício sanável, o relator intime o recorrente para que, em cinco dias: (i) complete a documentação, ainda que a falta seja de peça 1287 787. obrigatória, ou, (ii) corrija o defeito. Entre os vícios corrigíveis a jurisprudência do STJ tem incluído a falta de assinatura do advogado na petição recursal, sendo, pois, caso de “ser concedido prazo para suprimento da irregularidade, conforme art. 13, do CPC [NCPC, art. 76]”.392 Efeitos do agravo de instrumento Trata-se de recurso que, normalmente, limita-se ao efeito devolutivo: “os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso” (art. 995).393 No entanto, o efeito suspensivo poderá, em determinados casos, ser concedido pelo relator. Dois são os requisitos da lei, a serem cumpridos cumulativamente, para a obtenção desse benefício: (i) a imediata produção de efeitos da decisão recorrida deverá gerar risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação; e (ii) a demonstração da probabilidade de provimento do recurso (arts. 995, parágrafo único, e 1.019, I). Na lei anterior havia uma especificação de vários casos de presunção de risco de dano grave, como a prisão civil, a adjudicação e remição de bens e o levantamento de dinheiro sem caução idônea (art. 558 do CPC/1973). O Código novo não repete tal previsão, mas é fácil entender que se trata de casos em que não haverá dificuldade maior em configurar o motivo de suspensão. O regime atual parece confiar ao relator a prudente averiguação de maior ou menor risco no caso concreto, sem limitá-lo ao casuísmo de um rol taxativo. Em outros termos: os requisitos para obtenção do efeito suspensivo no despacho do agravo serão os mesmos que, já à época do Código anterior, a jurisprudência havia estipulado para a concessão de segurança contra decisão judicial, na pendência de recurso com efeito apenas devolutivo: o fumus boni iuris e o periculum in mora.394 Para que o efeito suspensivo seja dado, terá o agravante de formular requerimento ao relator, o qual poderá ser incluído na petição do agravo ou em peça separada. A liminar em questão é ato da exclusiva competência do relator que, de plano, a concederá, ou não, ao despachar a petição do agravante (art. 1.019, caput). O relator poderá, ainda, deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal (art. 1.019, I). Para tanto, deverão estar presentes os mesmos requisitos para a concessão do efeito suspensivo, quais sejam, o fumus boni iuris e o 1288 788. periculum in mora. Com efeito, não se pode negar ao relator o poder de também conceder medida liminar positiva, quando a decisão agravada for denegatória de providência urgente e de resultados gravemente danosos para o agravante. No caso de denegação, pela decisão recorrida, de medida provisória cautelar ou antecipatória, por exemplo, é inócua a simples suspensão do ato impugnado. Caberá, portanto, ao relator tomar a providência pleiteada pela parte, para que se dê o inadiável afastamento do risco de lesão, antecipando o efeito que se espera do julgamento do mérito do agravo. É bom ressaltar que o poder de antecipação de tutela instituído pelo art. 300 não é privativo do juiz de primeiro grau e pode ser utilizado em qualquer fase do processo e em qualquer grau de jurisdição. No caso do agravo, esse poder está expressamente previsto ao relator no art. 1.019, I. Se for deferido o efeito suspensivo ou concedida a antecipação de tutela, o relator ordenará a imediata comunicação ao juiz da causa, para que, de fato, se suste o cumprimento da decisão interlocutória (art. 1.019, I, in fine). Processamento do agravo de instrumento I – Juntada de cópia do agravo no juízo de primeiro grau O recorrente, após encaminhar o agravo diretamente ao tribunal, requererá, em três dias, a juntada, aos autos do processo, da cópia da petição recursal, com a relação dos documentos que a instruíram, e, ainda, o comprovante de sua interposição (art. 1.018, caput e § 2º).395 Essa diligência não tem o objetivo de intimar a parte contrária, porque sua cientificação será promovida diretamente pelo tribunal (art. 1.019, II). Sua função é apenas de documentação e, também, serve como meio de provocar o magistrado ao juízo de retratação (art. 1.018, § 1º),396 que, se ocorrido, tornará prejudicado o agravo. A jurisprudência do STJ, à época do Código anterior, após uma certa oscilação, se fixou no sentido de considerar não prejudicial ao conhecimento do agravo o não cumprimento da diligência em questão.397 A Lei nº 10.352, de 26.12.2001, acrescentou um parágrafo ao art. 526 do CPC/1973 para tornar a medida nele contida um ônus processual cuja inobservância poderia acarretar o não conhecimento do agravo pelo tribunal. O NCPC ignorou a antiga orientação do STJ, uma vez que, num apego ao formalismo, a exemplo da Lei nº 10.352, previu, expressamente, que o descumprimento da juntada em primeiro grau da cópia do recurso, “importa inadmissibi-lidade do agravo de instrumento”. Todavia, o rigor da regra formal foi 1289 abrandado pela ressalva de que a inadmissão não poderá ser declarada de ofício pelo relator, já que ficará condicionada à arguição e comprovação pelo agravado (art. 1.018, § 3º). II – Atos do relator A distribuição do agravo, no tribunal, deve ocorrer incontinenti, ou seja, como ato imediato ao protocolo ou ao recebimento do registrado postal. Quando utilizada a via postal, o invólucro do recurso, onde se acha o registro feito pelo Correio, deverá ser mantido nos autos para facilitar o exame do relator sobre a tempestividade do recurso. Caso não seja possível, por qualquer razão, o uso des-se meio de controle, haverá sempre o comprovante de remessa cuja juntada aos autos de origem é obrigatória, nos termos do art. 1.018. Para esse fim se aplicará ao relator a obrigação de abrir prazo ao agravante para completar a demonstração dos requisitos do recurso (art. 1.017, § 3º). Efetuada a distribuição, os autos do agravo serão imediatamente conclusos ao relator sorteado. No despacho da petição poderá ocorrer (art. 1.019):398 (a) o não conhecimento do recurso, por ser ele: (i) inadmissível (v.g., fora do prazo legal; ou sem o comprovante do pagamento das custas, quando for o caso; ou, ainda, quando o ato impugnado não for agravável, como se dá com o despacho de expediente e a sentença; enfim, sempre que não se puder conhecer do agravo); (ii) prejudicado (o agravo perdeu o objeto, em situação como a de ter o juiz de origem retratado a decisão impugnada, ou por ter sido decidida questão prejudicial em outra sede, ou, ainda, por ter havido desistência do agravante); ou, (iii) não impugnar especificamente os fundamentos da decisão agravada (art. 932, III); (b) o improvimento do recurso, se: (i) for ele contrário a súmula do STF, do STJ ou do próprio tribunal; (ii) for ele contrário a acórdão proferido pelo STF ou STJ em julgamento de recursos repetitivos; ou, (iii) se contrariar entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência (art. 932, IV). O trancamento do recurso é permitido não apenas no despacho da inicial, mas também posteriormente, quando apurado o fato que legalmente o autoriza, antes de chegar o feito ao julgamento do órgão colegiado competente; (c) o deferimento do processamento do agravo, caso em que, em cinco dias, o relatordeverá: (i) ordenar a intimação do agravado pessoalmente, por carta com aviso de recebimento, quando não tiver procurador constituído, ou pelo Diário da Justiça ou 1290 por carta com aviso de recebimento dirigida ao seu advogado, para que respon-da no prazo de quinze dias, facultando-lhe juntar a documentação que entender necessária ao julgamento do recurso (art. 1.019, II); (ii) determinar a intimação do Ministério Público, preferencialmente por meio eletrônico, quando for o caso de sua intervenção, para que se manifeste em quinze dias (art. 1.019, III). Havendo requerimento de efeito suspensivo, formulado pelo agravante, será, também, na fase de despacho da petição de agravo que o relator o apreciará (art. 1.019, I). O relator suspenderá a decisão impugnada, quando cabível a providência, até o pronunciamento do colegiado sobre o agravo. De ordinário, a suspensão da decisão é suficiente para afastar o risco de dano, porque o ato do juiz de primeiro grau deixará, temporariamente, de produzir seus efeitos. Mas, quando se tratar de decisão negativa, será inócua sua suspensão. Aí, havendo o risco de dano grave e de difícil reparação, justamente pela falta do deferimento, pelo juiz a quo, da pretensão do agravante, caberá ao relator afastar o perigo, por meio de uma liminar positiva, de natureza antecipatória. Cabe também ao relator, segundo a regra geral do art. 932, V, dar provimen-to ao agravo, em decisão singular, quando a decisão recorrida: (i) for contrária a súmula do STF, do STJ ou do próprio tribunal; (ii) for contrária a acórdão profe- rido pelo STF ou STJ em julgamento de recursos repetitivos; ou, (iii) se contrariar entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência. Em tal hipótese, porém, haverá de ser resguardado o contraditório, mediante prévia intimação do agravado para responder ao recurso. Sem essa providência, a decisão singular de provimento do agravo será nula por “quebra dos princípios do contraditório e do devido processo legal”.399 Para contrabalançar os amplos poderes conferidos ao relator, o art. 1.021 prevê, contra suas decisões singulares, o cabimento de agravo interno para o órgão colegiado competente, no prazo de quinze dias. Por outro lado, para coibir o manejo abusivo desse agravo interno, o § 4º do referido dispositivo comina multa entre um e cinco por cento do valor da causa atualizado, sempre que o recurso seja declarado manifestamente inadmissível ou improcedente, por votação unânime do colegiado.400 A observância efetiva da sistemática de processamento e julgamento do agravo de instrumento pelo relator tem condições de proporcionar um significativo passo rumo à desburocratização e celeridade do processo de que tanto se queixa na atualidade. 1291 789. (a) (b) A possibilidade de o relator requisitar informações ao juiz da causa (CPC/1973, art. 527, IV) não foi repetida no NCPC, certamente por considerá-la pouco relevante para o julgamento do recurso, diante das peças que o instruem, e para evitar delongas desnecessárias ao seu processamento. Diante do caso concreto, porém, podem surgir dúvidas que justifiquem a iniciativa do relator, mesmo com o silêncio da lei. O contraditório Para garantir o contraditório e o tratamento isonômico das partes, o art. 1.019, II, prevê que o agravado será intimado a responder em quinze dias, prazo igual ao conferido ao agravante para interpor seu recurso. Na oportunidade, poderá o recorrido juntar a documentação que entender necessária ao julgamento do recurso. Como o agravo é processado diretamente no tribunal, e, portanto, quase sempre longe do foro onde corre o processo de origem, instituiu a lei duas modalidades de intimação do advogado do agravado: intimação pelo correio, com aviso de recebimento, sempre que se tratar de comarca diversa daquela em que se encontra a sede do tribunal, e cujo expediente não seja divulgado pelo Diário da Justiça; intimação pelo órgão da imprensa oficial, quando se tratar de processo em curso na comarca da sede do tribunal ou em outra comarca, desde que o respectivo expediente seja divulgado pelo Diário da Justiça. Se o agravado ainda não tiver procurador constituído nos autos, deverá ser intimado pessoalmente, por carta, com aviso de recebimento. Em qualquer uma das hipóteses, o marco inicial do tempo útil de resposta será aquele previsto na regulamentação comum do Código sobre a contagem de prazos: data da publicação na imprensa ou juntada do aviso de recebimento da intimação postal (arts. 272 e 231, I).401 Para tornar viável a sistemática, ao agravante se impôs a obrigação de, na petição do recurso, indicar o nome e o endereço completo de todos os advogados, constantes do processo (art. 1.016, IV); e, ainda, incluir entre os documentos obrigatórios da petição recursal as cópias das procurações outorgadas tanto ao advogado do próprio agravante como ao do agravado (art. 1.017, I, in fine). Ao responder, o agravado terá oportunidade de anexar às contrarrazões, que 1292 790. serão encaminhadas também diretamente ao tribunal, a documentação que entender conveniente, e que, a seu critério, possa ser útil à solução do recurso. Com isso, manteve-se a ampliação, realizada pelo Código de 1973, da possibilidade de instrução das contrarrazões do agravado, que poderá ser feita não apenas com cópias de outras peças do processo, mas com qualquer documento que sirva para contrapor aos fundamentos do decisório agravado. Diante dessa ampliação do poder instrutório do agravado, não poderá o agravo ser julgado sem que previamente seja ouvido o agravante sobre a documentação nova (i.e., aquela que não seja simples reprodução de peças já existentes no processo principal) (arts. 435 e 437, § 1º).402 Incumbe a cada um deles o ônus processual de instruir seus arrazoados com as peças que forem necessárias ou convenientes. Fora desse momento, não há mais oportunidade de produzir outros traslados, salvo embaraço dos serviços forenses ou da parte contrária, devidamente justificado (força maior), caso em que se observará o art. 221.403 A tempestividade da resposta será aferida segundo o mesmo critério empregado para a interposição do recurso. Levar-seá em conta o momento do protocolo no tribunal ou do registro no correio, se se utilizar a via postal. Vale dizer: o agravado, a exemplo do que se passa com o agravante, pode protocolar sua resposta junto ao tribunal ou enviá-la pelo correio, sob registro com aviso de recebimento, por fax (observada a Lei nº 9.800, art. 2º) ou por meio eletrônico (art. 1.017, § 2º). Juízo de retratação do magistrado a quo O juízo de retratação, previsto no Código anterior, permanece na atual legislação, como eventualidade, já que o novo Código nem sequer prevê a necessidade de o relator requisitar informações ao juiz da causa. Assim, desde que o agravante, nos três dias subsequentes à remessa direta ao tribunal, junte ao processo a cópia do agravo, está o juiz autorizado a rever o ato impugnado, independentemente de ficar aguardando a resposta do agravado, mesmo porque esta não lhe será endereçada, mas sim ao tribunal. De qualquer maneira, a comprovação de que houve o recurso funciona como mecanismo de impedimento da preclusão, deixando o tema da decisão interlocutória em aberto para nova apreciação do magistrado. Convencido do equívoco cometido, o juiz poderá emendá-lo desde logo, comunicando a retratação ao tribunal. Nessa hipótese, o relatorconsiderará prejudicado o recurso (art. 1.018, § 1º). 1293 791. 792. Como a retratação funciona apenas como expressa causa de extinção do agravo (art. 1.018, § 1º), a nova deliberação do juiz de origem, como outra decisão interlocutória que é, desafiará novo agravo a ser aviado por aquele que se tornou vencido no incidente. Se, porém, ao retratar a decisão agravada, o juiz extinguir o processo, seu ato configurará sentença. O recurso, então, haverá de ser a apelação. Julgamento do recurso pelo colegiado I – Prazo para julgamento Para ressaltar o empenho da lei na solução rápida dos agravos de instrumento, o art. 1.020404 fixou em um mês, contado da intimação do agravado, o prazo máximo para ser pedido pelo relator “dia para julgamento” (i.e., a inclusão do feito em pauta). Trata-se, como é óbvio, de um prazo meramente administrativo, sem nenhum efeito preclusivo, porque estabelecido para o tribunal e não para as partes. II – Intervenção do Ministério Público O Ministério Público, quando o agravo disser respeito a processo onde deva dar-se sua intervenção, terá o prazo de quinze dias para pronunciar-se (art. 1.019, III). III – Sustentação oral Na sessão de julgamento, os advogados e o membro do Ministério Público, nos casos de sua intervenção, poderão nos casos previstos em lei ou no regimento interno do tribunal, fazer sustentação oral de suas razões, pelo prazo improrrogável de quinze minutos cada, depois da exposição da causa pelo relator (art. 937).405 O NCPC (art. 937) enumera os casos de cabimento da sustentação oral, dentre os quais está o agravo de instrumento contra decisões interlocutórias sobre tutelas provisórias de urgência ou da evidência (inciso VIII). Portanto, não são todos os agravos de instrumento que admitem a sustentação oral. Encerramento do feito Como se trata de feito processado originariamente no tribunal, caberá a seu regimento determinar o destino dos autos do agravo de instrumento, i.e., se permanecerão em seus arquivos ou se serão encaminhados ao juízo de primeiro grau para apensamento aos autos principais. Na primeira hipótese, o tribunal deverá oficiar ao juiz da causa, encaminhandolhe cópia da decisão do relator ou do acórdão, conforme o caso. Na segunda, não haverá necessidade de comunicação apartada, 1294 793. porque os próprios autos do agravo servirão como veículo de transmissão do teor do decisório de segundo grau.406 Formação da coisa julgada antes do julgamento do agravo Uma vez que o agravo não tem efeito suspensivo, pode acontecer que o processo chegue à sentença antes do julgamento, pelo Tribunal, do recurso manejado contra a decisão interlocutória. Se a parte vencida interpuser apelação, o órgão recursal deverá julgar primeiro o agravo, por seu caráter prejudicial em face da sentença apelada (NCPC, art. 946).407 É que, sendo provido o agravo, cairá a sen- tença, ficando prejudicada a apelação. Diversa, porém, é a sorte do agravo, se o vencido na sentença deixar de in- terpor a apelação. Já então prejudicado restará o agravo, porquanto da inércia da parte perante o julgamento que põe fim ao processo emana a coisa julgada, ou seja, torna-se imutável e indiscutível a solução dada à causa (art. 502).408 Aplica-se, analogicamente, a regra do art. 1.000,409 ou seja, a aceitação ex- pressa ou tácita da sentença pelo vencido importa renúncia ao direito de recorrer. Ora, se a aceitação é superveniente ao recurso, o efeito sobre ele não pode ser diferente; terá de ser tratado como desistência do agravo pendente. O princípio a ser observado é o que manda levar-se em conta o fato superveniente, modificativo ou extintivo, que possa influir no julgamento da causa (art. 493).410 Parece claro que, deixando de apelar, o vencido aceita a sentença e a faz intangível pela força de coisa julgada. Logo, terá adotado supervenientemente atitude incompatível com a vontade de manter o agravo contra decisão interlocutória anterior à sentença não impugnada.411-408 Diversa é, porém, a situação do processo em que a parte vencida apela da sentença antes de ser definitivamente julgado o seu agravo de instrumento an- teriormente manifestado contra decisão interlocutória sobre questão prejudicial à solução contida na sentença (como, v.g., a exclusão de litisconsorte arguição de incompetência do juízo prolator da sentença). Sendo apreciada a apelação antes do agravo, não se pode dizer que o trânsito em julgado da sentença preju-dique o agravo. Na verdade, persistindo a litispendência, nem mesmo se chega a formar a coisa julgada, ou, se se entender que tal ocorreu, ter-seá uma coisa julgada meramente formal e sujeita à condição resolutiva: se improvido o agravo, consolida- se o decidido na sentença; se provido, resolve-se a sentença, por ele prejudicada, voltando o processo ao estágio em que se encontrava no momento em que a decisão 1295 agravada for proferida. No caso de incompetência proclamada pelo acórdão do agravo, os autos principais serão encaminhados ao novo juízo, para que outra sentença seja prolatada pelo juiz reconhecido como competente pela instância superior.413 É preciso, portanto, diferenciar as duas situações: (i) a de aquiescência ou aceitação da sentença, pela parte vencida, posterior ao agravo pendente, postura que realmente faz extinguir os agravos ainda não decididos por incompatibilidade com a coisa julgada material formada em torno da posterior sentença. Aí, sim, haverá perda de objeto do recurso anterior, e o agravante não terá mais interesse para justificar seu julgamento; e (ii) a de não aceitação da sentença impugnada pelo próprio agravante por apelação oportuna. Nesse caso, o agravante não po-derá ser tido como renunciante ao julgamento do agravo e, mesmo após decisão adversa da apelação, conservará o interesse em ver julgada a questão prejudicial tratada na interlocutória antes agravada, pois, com seu desate, poderá obter a resolução da sentença, dada em processo onde a coisa julgada anterior ainda não se aperfeiçoou, justamente em razão do agravo pendente.414 Se houve inversão na ordem cronológica de encerrar-se na segunda instância a apreciação dos recursos de agravo e apelação, isto se deveu a problemas ou deficiências do próprio serviço forense, não podendo, de maneira alguma, redundar em prejuízo para o direito do agravante de ver eficazmente apreciada e julgada a questão prejudicial suscitada no agravo, com seus necessários efeitos sobre a sentença apelada. Fluxograma nº 29 – Agravo de instrumento (arts. 1.015 a 1.020) 1296 353 354 355 356 357 358 CPC/1973, art. 522. CPC/1973, art. 162, § 2º. NCPC, art. 1.016. CPC/1973, art. 522. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, art. 557, caput e § 1º-A. 1297 359 360 361 362 363 364 365 366 367 368 369 CPC/1973, art. 544. CPC/1973, art. 522. CPC/1973, sem correspondência. “O recurso de que se serve a parte para impugnar as interlocutórias não sujeitas a agravo de instrumento, portanto, é a apelação. Se for vencido, apelará, impugnando estas decisões e a sentença. Se for vencedor, deve impugná-las por meio de contrarrazões, e estas desempenharão o papel de recurso” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil cit., p. 1.440). CUNHA, Leonardo Carneiro da; DIDIER JÚNIOR, Fredie. Apelação contra decisão interlo-cutória não agravável:a apelação do vencido e a apelação subordinada do vencedor. Revista de Processo, n. 241, São Paulo, p. 237, mar. 2015. CUNHA, Leonardo Carneiro da; DIDIER JR., Fredie. Op. cit., p. 239. Cita-se como exemplo o caso da revisão do valor da causa, deliberada pelo juiz durante o curso do processo, e que foi objeto de impugnação em contrarrazões do recorrido à apelação interposta pelo vencido. Mesmo que a apelação não tenha vingado, o apelado continua tendo interesse legítimo na revisão da respectiva decisão interlocutória não agravável que lhe foi adversa e cujos efeitos subsistem sobre o cálculo da verba honorária, qualquer que tenha sido a solução do apelo (cf. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 1.440). STJ, 2ª T., RMS 353/SP, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, ac. 31.10.1990, RT v. 672, p. 197, out./1991; STF, Pleno, RE 76.909/RS, Rel. Min. Xavier de Albuquerque, ac. 05.12.1973, DJU 17.05.1974, p. 3.250; STF, 1ª T., RE 92.107/SP, Rel. Min. Oscar Corrêa, ac. 14.09.1982, DJU 08.10.1982, p. 10.189. STJ, 4ª T., RMS 12.017/DF, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 19.08.2003, DJU 29.09.2003, p. 252; STJ, 1ª T., RMS 7.246/RJ, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 05.09.1996, DJU 21.10.1996, p. 40.201; STJ, 1ª T., RMS 6.685/ES, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 16.12.1996, RSTJ n. 95, p. 56, jul./1997; STJ, 4ª T, REsp 299.433/RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 09.10.2001, DJU 04.02.2002, p. 381. “Não havendo previsão de medida eficiente contra o ato ilegal, deverá ser admitido o mandado de segurança. Deve-se admitir o mandado de segurança como sucedâneo do agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas em 1º grau de jurisdição, à luz do Código de Processo Civil de 2015, sempre que se demonstrar a inutilidade do exame do ato acoimado de ilegal apenas por ocasião do julgamento da apelação” (MEDINA, José Miguel de Garcia. Direito processual civil moderno. 2. ed. São Paulo: RT, 2016, p. 1.334). Tutelas provisórias são aquelas que o novo Código prevê como urgentes (medidas cautelares ou antecipatórias) e medidas de tutela da evidência (arts. 300 e 311). O agravo 1298 370 371 372 373 374 375 376 nesses procedimentos cabe tanto das decisões que deferem como das que indeferem as medidas provisórias, no todo ou em parte. Justifica-se o agravo de instrumento na espécie, “dada a urgência dessas medidas e os sensíveis efeitos produzidos na esfera de direitos e interesses das partes”, de sorte que “não haveria interesse em se aguardar o julgamento da apelação” (STJ, 3ª T., RMS 31.445/ AL, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 06.12.2011, DJe 03.02.2012). Questão de mérito é qualquer ponto controvertido que interfira no objeto principal do processo, retratado no pedido e na causa de pedir (sobre o tema ver itens nos 77 e 759 do vol. I). Decisão de mérito que desafia agravo ocorre quando o Código admite fracionamento da resolução das questões que compõem o objeto do processo (meritum causae). O art. 356 do NCPC arrola vários casos em que, na fase do julgamento conforme o estado do processo, o juiz está autorizado a pronunciar julgamento antecipado parcial do mérito. São estes exemplos das decisões interlocutórias agraváveis, na forma do art. 1.015, II. Além deles, em qualquer outra situação que uma questão de mérito for submetida a decisão imediata do juiz, sem prejuízo do prosseguimento do processo, o agravo de instrumento caberá (por exemplo, a solução da questão de redução ou ampliação do pedido, ou do reconhecimento parcial dele pelo réu, o indeferimento liminar da reconvenção etc.). A propósito, anota Roberto Antônio Malaquias que “o ato de indeferimento da ação de reconvenção é uma decisão interlocutória que estaria suscetível ao recurso denominado agravo de instrumento” (MALAQUIAS, Roberto Antônio Darós. Agravo de instrumento contra o indeferimento liminar da reconvenção à luz do princípio do duplo grau de jurisdição e das garantias processuais. Revista de Processo, n. 239, São Paulo, 2015, p. 189). A alegação de convenção de arbitragem se faz em preliminar da contestação, como ausência de pressuposto processual para formação e desenvolvimento válido do processo em juízo (art. 337, X). A decisão interlocutória que rejeita a arguição se dá normalmente na fase de saneamento e organização do processo (art. 357, I). O incidente de desconsideração de personalidade jurídica figura entre os casos de intervenção de terceiro, cabendo em qualquer tipo de processo (arts. 133 a 137). O agravo será admissível tanto quando for deferida, como indeferida a medida. O pedido de assistência gratuita pode ser formulado na petição inicial, na contestação, na petição para ingresso de terceiro no processo, em recurso ou em petição simples (art. 99). A impugnação, por sua vez, poderá ocorrer na contestação, na réplica, nas contrarrazões de recurso ou por meio de petição simples (art. 100). A exibição de documento ou coisa integra a fase probatória do processo e regula-se pelos arts. 396 a 404, cabendo agravo de instrumento contra a decisão que defere ou indefere o pedido. A exclusão de litisconsorte ocorrida na fase de saneamento, sem encerrar o processo, configura decisão interlocutória agravável. A limitação do litisconsórcio por decisão judicial cabe quando este é facultativo e 1299 377 378 379 380 381 382 383 384 385 386 387 388 389 390 envolva número excessivo de colitigantes, capaz de comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa ou o cumprimento da sentença. E a decisão a esse respeito pode ocorrer na fase de conhecimento, na liquidação de sentença ou na execução (art. 113, § 1º). O agravo é manejável quando o pedido de limitação é rejeitado, não quando deferido. As intervenções de terceiro consistem na assistência (art. 121), na denunciação da lide (art. 125), no chamamento ao processo (art. 130), na desconsideração da personalidade jurídica (art. 133) e na participação do amicus curiae (art. 138). O agravo cabe assim na admissão, como na inadmissão, da intervenção. Em regra, os embargos à execução não têm efeito suspensivo (art. 919, caput). Entretanto, este poderá ser, excepcionalmente, concedido, nos termos do art. 919, § 1º. A redistribuição do ônus da prova se dá por meio de decisão interlocutória, na fase de saneamento e organização do processo (art. 357, III). Por exemplo, é agravável a interlocutória que decide requerimento de distinção em afetação por recurso repetitivo, para que o recurso especial ou extraordinário da parte não tenha seu andamento sobrestado (art. 1.037, § 13, I; CPC/1973, sem correspondência). É, também, agravável a decisão do juiz de primeiro grau que conceder ou denegar a liminar em mandado de segurança (Lei nº 12.016/2009, art. 7º, § 1º). CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, art. 508. Já antes da dispensa legal, o STJ decidia que a formalidade da autenticação solene não tinha amparo jurídico (STJ, 4ª T., REsp 248.341/RS, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, ac. unânime de 02.05.2000, DJU 28.08.2000. No mesmo sentido: STJ, 1ª T., REsp 1.122.560/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 23.03.2010, DJe 14.04.2010). CPC/1973, art. 365, IV. CPC/1973, art. 524. CPC/1973, art. 525, I. O STJ, para os efeitos uniformizadores do art. 543-C do CPC [NCPC, art. 1.036], fixou o seguinte entendimento: “A ausência da cópia da certidão de intimação da decisão agravada não é óbiceao conhecimento do Agravo de Instrumento quando, por outros meios inequívocos, for possível aferir a tempestividade do recurso, em atendimento ao princípio da instrumentalidade das for-mas” (STJ, 2ª Seção, REsp 1.409.357/SC, Rel. Min. Sidnei Beneti, ac. 14.05.2014, DJe 22.05.2014). STJ, Corte Especial, REsp 1.383.500/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 17.02.2016, DJe 26.02.2016. CPC/1973, art. 525, § 1º. CPC/1973, sem correspondência. 1300 391 392 393 394 395 396 397 398 399 400 401 CPC/1973, sem correspondência. STJ, 1ª T., AgRg no REsp 1.288.052/PE, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 20.03.2012, DJe 23.03.2012. No mesmo sentido: STJ, 4a T., AgRg no REsp 1.260.676/RN, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, ac. 12.11.2012, DJe 20.11.2012. CPC/1973, art. 497. “A jurisprudência do STJ pacificou entendimento no sentido de que aviar mandamus ao escopo de emprestar efeito suspensivo a recurso ou a medida cautelar só tem guarida quando se possa vislumbrar presentes no ato judicial os princípios do fumus boni iuris e do periculum in mora” (STJ, 3ª T., RMS 5.576-0/RJ, Rel. Min. Waldemar Zveiter, ac. unân. de 13.06.1995, DJU 09.10.1995, p. 33.547). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., Ag 784.662/AL, Rel. Min. João Otávio de Noronha, ac. 07.11.2006, DJU 14.12.2006, p. 332. CPC/1973, art. 526. CPC/1973, art. 529. “Segundo passou a entender o Tribunal, o descumprimento da norma do art. 526 do CPC [NCPC, art. 1.018] não impede o conhecimento do agravo” (STJ, Corte Especial, Emb. Div. no REsp 172.411/RS, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, ac. 15.12.1999, DJU 28.02.2000, p. 29). No mesmo sentido: STJ, 3ª T., REsp 299.064/MA, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 20.02.2001, DJU 16.03.2001, p. 630; STJ, 5ª T., REsp 307.575/RJ, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, ac. 07.11.2002, DJU 02.12.2002, p. 332. CPC/1973, art. 527. STJ, 5ª T., REsp 629.441/DF, Rel. Min. Felix Fischer, ac. 17.06.2004, DJU 13.09.2004, p. 285; STJ, 1ª T., REsp 917.564/RS, Rel. Min. José Delgado, ac. 28.08.2007, DJU 13.09.2007. p. 173. Só não há necessidade de ouvida do agravado, quando o pronunciamento singular é de rejeição ou improvimento do agravo, já que, in casu, a decisão é dada em seu benefício. Todavia, “a inti-mação para a resposta é condição de validade da decisão monocrática que vem em prejuízo do agravado, ou seja, quando o relator acolhe o recurso, dando-lhe provimento (art. 557, § 1º-A) – NCPC, art. 932, V” (STJ, 1ª Seção, EREsp 1.038.844/PR, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 08.08.2008, DJe 20.10.2008). Agravo inadmissível, por exemplo, é aquele interposto fora do prazo legal ou contra mero despacho ordinatório, bem como, aquele a que não correspondam os pressupostos legais de admissibilidade do recurso. Por agravo manifestamente improcedente, tem-se aquele “interposto com a formulação de pretensões contrárias ao texto legal ou a interpretações consagradas na jurisprudência, ou contrárias às provas produzidas nos autos” (NOTARIANO JÚNIOR, Antônio; BRUSCHI, Gilberto Gomes. Agravo contra as decisões de primeiro grau. 2. ed. São Paulo: Método, 2015, p. 42). No mesmo sentido: DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma da reforma. São Paulo: Malheiros, 2002, p. 186. CPC/1973, arts. 236 e 241, I. 1301 402 403 404 405 406 407 408 409 410 411 412 413 CPC/1973, arts. 397 e 398. CPC/1973, art. 180. CPC/1973, art. 528. CPC/1973, art. 554. No Tribunal de Justiça de Minas Gerais prevalece a praxe de remeter os autos do agravo já julgado para arquivamento na comarca de origem. CPC/1973, art. 559. CPC/1973, art. 467. CPC/1973, art. 503. CPC/1973, art. 462. “A não interposição do recurso de apelação contra a sentença faz coisa julgada material, não obstante pendente de julgamento ou provido o agravo, já que a situação determinada pela sentença permanecerá imutável” (STJ, 2ª T., REsp 204.348/PE, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, ac. 27.04.2004, RSTJ 181/147). No mesmo sentido: STJ, 4ª T., REsp 292.565/RS, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, ac. 27.11.2001, DJU 05.08.2002, p. 347; TJSP, AI 30.228-0, Rel. Des. Dirceu de Mello, ac. 04.07.1996, JTJSP 187/129. Em sentido contrário: STJ, REsp 182.562, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, ac. 27.04.1999, RSTJ 121/112. Em doutrina, merece destaque a lição de Teresa Arruda Alvim Wambier, no sentido de que não pode prevalecer o agravo, na espécie, porque, “escoados os quinze dias dentro dos quais a apelação deveria ter sido interposta, há o trânsito em julgado” (NERY JÚNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis. São Paulo: RT, 2003, v. 7, p. 697). O STJ já decidiu que o reconhecimento da prejudicialidade da falta de apelação em face do agravo anterior pode ser afastado, em razão de peculiaridades do caso concreto (STJ, 4ª T., REsp 1.389.194/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, ac. 20.11.2014, DJe 19.12.2014). A posição dominante consolidada daquela Corte, porém, é no sentido de que, em regra, “a superveniên-cia do trânsito em julgado da sentença proferida no feito principal enseja a perda de objeto de recursos anteriores que versem sobre questões resolvidas por decisão interlocutória combatida via agravo de instrumento” (STJ, 3ª T., Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, ac. 28.04.2015, DJe 08.05.2015). No mesmo sentido: STJ, 3ª T., REsp 1.074.149/RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 01.12.2009, DJe 11.12.2009; STJ, 1ª T., AgRg no REsp 899.315/PR, Rel. Min. Denise Arruda, ac. 18.12.2007, DJU 07.02.2008, p. 265. “O efeito devolutivo do agravo de instrumento, interposto contra o despacho saneador, faz com que a sentença, proferida na causa, fique com sua eficácia condicionada ao desprovimento do agravo, no que concerne às questões nele ventiladas” (STF, 1ª T., RE 89.980/SP, Rel. Min. Soares Muñoz, ac. 24.10.1978, DJU 10.11.1978, p. 8.950; RTJ 91/320). No mesmo sentido: STF, 1ª T., RE 94.344/BA, Rel. Min. Soares Muñoz, ac. 16.06.1981, RTJ 101/386. 1302 414 A sentença, quando proferida na pendência de recurso interposto contra decisão interlocutória, é considerada doutrinariamente “como um dos mais notáveis casos de sentença condicional” (VASSALI, Filippo E. La sentenza condizionale: studio sul processo civile. Roma: Athenaeum, 1916, n. 14, p. 45. Apud NERY JÚNIOR, Nelson. Parecer. Revista de Processo, n. 130/168, dez. 2005). 1303 794. 795. § 82. AGRAVO INTERNO Sumár io: 794. Conceito. 795. Procedimento. 796. Efeitos do agravo interno. 797. Sustentação oral. 798. Fungibilidade. Conceito Conforme visto no item nº 782 retro, segundo o NCPC, não existe mais decisão monocrática irrecorrível prolatada pelo relator. Nos termos do art. 1.021, caput,415 “contra decisão proferida pelo relator caberá agravo interno para o respectivo órgão colegiado”. Isso porque mostra-se inconstitucional qualquer barreira regimental imaginada para impedir o reexame dos decisuns singulares do relator pelo colegiado competente para a apreciação do recurso primitivo.416 O agravo interno, destarte, preserva o princípio da colegialidade, garantindo que decisões singulares sejam revistas pelo órgão colegiado a quem toca o recurso.417 Afinal, os recursos e as causas de competência originária são endereçadas ao tribunal e não ao relator, de sorte que suas decisões singulares, embora autorizadas, não suprimem a competência principal do colegiado. Procedimento Esse recurso é disciplinado pelo art. 1.021 do NCPC,418 mas o seu processamento será regulado pelos regimentos internos dos tribunais, como determinado pela parte final do caput do referido dispositivo. Eis, em linhas gerais,o procedimento básico do agravo interno: (a) Ao interpor o recurso, o recorrente deverá impugnar, especificadamente, os fundamentos da decisão agravada (art. 1.021, § 1º). Não se admite, destarte, impugnações genéricas, que dificultem a defesa ou a decisão pelo tribunal;419 (b) O agravo será dirigido ao relator que, tão logo receba a petição, intimará o agravado para manifestar-se no prazo de quinze dias, a fim de cumprir o contraditório (art. 1.021, § 2º); (c) Após a resposta do recorrido, ao relator é dado retratar-se. Não havendo retratação, o relator levá-lo-á a julgamento pelo órgão colegiado, incluindo o recurso em pauta (art. 1.021, § 2º, in fine); 1304 796. (d) O julgamento do agravo interno, pelo colegiado, dependerá da prévia inclusão do recurso em pauta (art. 934 c/c art. 1.021, § 2º), com intimação das partes na pessoa de seus advogados, por meio do Diário da Justiça, observada a antecedência mínima de cinco dias úteis (art. 212 c/c art. 935); (e) Tratando-se de recurso contra decisão do relator, o agravo interno não pode ser julgado, no mérito, pelo seu próprio prolator. Aliás, o § 2º do art. 1.021 deixa claro que, não sendo o caso de retratação, “o relator levá-lo-á a julgamento pelo órgão colegiado”. Portanto, apenas em caso de manifesto descabimento do recurso, como se passa com a intempestividade, é que o relator estará em condições de inadmiti--lo. O § 3º do art. 1.021, que veda ao relator julgar improcedente o agravo interno limitando-se à reprodução dos fundamentos da decisão agravada, aplica-se ao voto condutor do julgamento do colegiado. Não corresponde, portanto, a uma autorização a que o relator julgue monocraticamente o recurso procedente ou improcedente; (f) Quando, em votação unânime, o órgão colegiado declarar o agravo interno manifestamente inadmissível ou improcedente, condenará o agravante a pagar ao agravado multa fixada entre um e cinco por cento do valor atualizado da causa. Aplicação dessa multa, todavia, “não é automática, não se tratando de mera decorrência lógica do não provimento do agravo interno em votação unânime”. Como já acentuou o STJ, pressupõe em cada caso concreto análise que conclua, de plano, pelo reconhecimento de ter sido a interposição do agravo “abusiva ou protelatória”. A decisão deverá ser fundamentada (art. 1.021, § 4º), de modo a demonstrar a manifesta inadmissibilidade ou improcedência do recurso ao colegiado;420 (g) Fixada a multa, a interposição pela parte de qualquer outro recurso estará condicionada ao depósito prévio do valor estipulado pelo órgão colegiado. Entretanto, estão dispensados do pagamento prévio a Fazenda Pública e o beneficiário de gratuidade da justiça, cujo pagamento será feito somente ao final (art. 1.021, § 5º). Efeitos do agravo interno A regra geral é de que, salvo a apelação, os recursos não tenham efeito suspensivo, permitindo, pois, a imediata execução do decisório impugnado (NCPC, art. 995, caput). Aplicada ao agravo interno, poder-se-ia pensar que seu efeito seria sempre o de não impedir o cumprimento da decisão monocrática recorrida. No 1305 797. 798. entanto, há um aspecto particular a ser ponderado: o agravo interno, no comum dos casos, incide sobre o julgamento de outro recurso, que se poderia considerar o principal. Se este suspendeu a eficácia do julgado primitivamente impugnado, não poderia o incidente do agravo interno gerar efeito diverso. Assim, “se o recurso julgado pelo relator já detinha efeito suspensivo da eficácia da decisão recorrida, o agravo apenas prolongará esse efeito na sua pendência; diversamente, se não detinha esse efeito, não será o agravo interno que o conferirá”.421 Se convier à parte suspender os efeitos que o recurso principal não afetou, nem o agravo interno o fez, deverá manejar pedido cautelar para obtê-lo.422 Sustentação oral Na sessão de julgamento colegiado do agravo interno, em regra, não se admite a sustentação oral dos advogados e do membro do Ministério Público, nos casos de sua intervenção (NCPC, art. 937). Quando, porém, o recurso for interposto contra decisão singular do relator que extinga a ação rescisória, o mandado de segurança ou a reclamação, o NCPC permite, excepcionalmente, a sustentação oral (art. 937, § 3º).423 Fungibilidade O novo CPC previu mais um caso de fungibilidade recursal, agora especificamente entre os embargos de declaração e o agravo interno (art. 1.024, § 3º).424Assim, caso o órgão julgador entenda que os embargos de declaração opostos pela parte não são o meio impugnativo adequado, poderá conhecê-los como agravo interno. Nesse caso, deverá determinar previamente a intimação do recorrente para que, no prazo de cinco dias, complemente as razões recursais, a fim de que adequá- las ao art. 1.021, § 1º, ou seja, para que impugne especificadamente os argumentos da decisão recorrida. A nova regra processual teve duplo propósito de combater: (i) a chamada jurisprudência defensiva que, no caso, considerava inadmissível embargos declaratórios contra decisões singulares do relator; e (ii) a má aplicação do princípio da fungibilidade, conhecendo, na espécie, os embargos declaratórios como agravo regimental, de imediato.425 A um só tempo, o NCPC entende cabíveis os declaratórios se a decisão singular do relator se enquadrar nos permissivos do art. 1.022,426 ou seja, for obscura, omissa, contraditória ou contiver erro material; e admite a fungibilidade entre eles e o agravo interno se a parte manejá-los com 1306 finalidade infringente. O principal da nova sistemática legal consiste no resguardo da ampla defesa e do contraditório, na aplicação da fungibilidade permitida. Como acontecia na praxe antiga, o conhecimento direto dos declaratórios como agravo interno causava inegável cerceamento de defesa ao embargante, uma vez que a matéria arguida em embargos de declaração é enfocada e discutida de maneira muito mais restrita do que aquela que deve constar do recurso adequado (i.e., o agravo interno). Daí ter o § 3º do art. 1.024 determinado que, ao proceder à fungibilidade, o relator deverá intimar o recorrente para, no prazo de cinco dias, complementar as razões recursais, de maneira a ajustá-las às exigências do recurso de agravo interno. Fluxograma nº 30 – Agravo interno (art. 1.021) 1307 415 416 Nota: Cabe também agravo interno contra decisão do presidente ou do vice-presidente do tribunal local, nos casos de negação de seguimento a recurso especial ou extraordinário com base no art. 1.030, I, e de sobrestamento de recursos em regime repetitivo, com base no art. 1.030, III. CPC/1973, sem correspondência. STF, Pleno, Repres. 1.299/GO, Rel. Min. Célio Borja, ac. 21.08.1956, RTJ 119/980; STF, 1ª T., RE 85.201/MT, Rel. Min. Rodrigues Alckmin, ac. 06.05.1977, RTJ 83/240; STF, 1ª 1308 417 418 419 420 421 422 423 424 425 426 T., RE 112.405/ GO, Rel. Min. Oscar Corrêa, ac. 24.03.1987, RTJ 121/373. MENDONÇA, Ricardo Magalhães de. Revisão das decisões monocráticas do relator no julgamento antecipado do recurso: breve análise do agravo interno previsto nos Códigos de Processo Civil vigente e projetado. Revista Dialética de Direito Processual, n. 145, p. 101, abr. 2015. CPC/1973, sem correspondência. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil cit., p. 1.464. STJ, 2ª Seção, AgInt nos EREsp 1.120.356/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, ac. 24.08.2016, DJe 29.08.2016.MENDONÇA, Ricardo Magalhães de. Revisão das decisões monocráticas do relator cit., p. 105. Idem, ibidem. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. “Em homenagem aos princípios da economia processual e da fungibilidade, devem ser recebidos como agravo regimental os embargos de declaração que contenham exclusivo intuito infringente” (STJ, 4ª T., EDcl no AREsp 678.883/PR, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, ac. 16.06.2015, DJe 22.06.2015). CPC/1973, art. 535. 1309 799. § 83. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO Sumár io: 799. Conceito e cabimento. 800. Pressupostos dos embargos de declaração. 801. Obscuridade no julgamento. 802. Contradição. 803. Omissão. 804. Hipóteses de omissão. 805. Erro material. 806. Compreensão extensiva do cabimento dos embargos de declaração. 807. Procedimento. 808. Prequestionamento. 809. Efeito interruptivo. 810. Recurso interposto antes dos embargos de declaração. 811. Efeito suspensivo especial. 811-A. Possibilidade de concessão de efeito suspensivo. 812. Efeito integrativo. 813. Embargos manifestamente protelatórios. Conceito e cabimento Dá-se o nome de embargos de declaração ao recurso destinado a pedir ao juiz ou tribunal prolator da decisão que afaste obscuridade, supra omissão, elimine contradição existente no julgado ou corrija erro material.427 Qualquer decisão judicial comporta embargos declaratórios, porque, como destaca Barbosa Moreira, é inconcebível que fiquem sem remédio a obscuridade, a contradição a omissão ou o erro material existente no pronunciamento jurisdicional. Não tem a mínima relevância ter sido a decisão proferida por juiz de primeiro grau ou tribunal superior, monocrática ou colegiada, em processo de conhecimento ou de execução; nem importa que a decisão seja terminativa, final ou interlocutória.428 São cabíveis ditos embargos até mesmo da decisão que tenha solucionado anteriores embargos declaratórios, desde, é claro, que não se trate de repetir simplesmente o que fora arguido no primeiro recurso. É preciso que se aponte defeito (obscuridade, omissão, contradição ou erro material) no julgamento dos próprios embargos. Com a Lei nº 8.950, de 13.12.1994, ainda sob a égide do Código anterior, eliminou-se a distinção procedimental entre os embargos de declaração contra sentença e os manejados contra acórdãos. A disciplina do recurso passou a ser única e ficou concentrada nos arts. 535 a 538 do CPC/1973.429 O novo Código manteve a unidade de disciplina e foi mais claro ao prever, expressamente, que “cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial” (NCPC, art. 1.022, 1310 800. 801. caput). Corrigiu, destarte, a imperfeição da legislação anterior que falava, apenas, em acórdão ou sentença, o que dava margem a discussões doutrinárias e jurisprudenciais (CPC/1973, art. 535), principalmente a propósito de decisões monocráticas.430 Releva destacar que se trata de recurso com fundamentação vinculada, vale dizer, somente pode ser oposto nas hipóteses restritas previstas em lei.431 Se a decisão embargada não contiver os vícios elencados no art. 1.022, a parte haverá de interpor outro recurso, mas, não, os embargos de declaração. Ademais, como o seu objetivo não é reformar ou cassar a decisão, mas, tão somente, aclará-la, qualquer das partes tem interesse para utilizá-lo, seja o vencedor ou o vencido. Pressupostos dos embargos de declaração O pressuposto de admissibilidade dessa espécie de recurso é a existência de obscuridade ou contradição na decisão; de omissão de algum ponto sobre que devia pronunciar-se o juiz ou tribunal, ou erro material (NCPC, art. 1.022, I, II e III).432 Se o caso é de omissão, o julgamento dos embargos supri-la-á, decidindo a questão que, por lapso, escapou à decisão embargada. No caso de obscuridade ou contradição, o decisório será expungido, eliminando-se o defeito nele detectado.433 Tratando-se de erro material, o juiz irá corrigi-lo. Em qualquer caso, a substância do julgado será mantida, visto que os embargos de declaração não visam à reforma do acórdão,434 ou da sentença. No entanto, será inevitável alguma alteração no conteúdo do julgado, principalmente quando se tiver de eliminar omissão ou contradição. O que, todavia, se impõe ao julgamento dos embargos de declaração é que não se proceda a um novo julgamento da causa, pois a tanto não se destina esse remédio recursal. As eventuais novidades introduzidas no decisório primitivo não podem ir além do estritamente necessário à eliminação da obscuridade ou contradição, ao suprimento da omissão ou à correção do erro material.435 Obscuridade no julgamento A obscuridade caracteriza-se pela falta de clareza, pela confusão das ideias, pela dificuldade no entendimento de algo. Como registra Bondioli, para os fins dos embargos de declaração, “decisão obscura é aquela consubstanciada em texto de difícil compreensão e ininteligível na sua integralidade. É caracterizada, assim, pela impossibilidade de apreensão total de seu conteúdo, em razão de um defeito na 1311 802. fórmula empregada pelo juiz para a veiculação de seu raciocínio no deslinde das questões que lhe são submetidas”.436 Não há obscuridade apenas quando o julgador, na decisão, utiliza má redação, segundo as regras gramaticais ou mediante emprego de palavras inadequadas para precisar o enunciado sentencial; ela está presente também quando, na composição do texto, se depara com uma conjuntura lógico-jurídica que evidencia “imperfeições na própria ideia que norteia o julgamento”. Ou seja: os enunciados confusos, no plano jurídico, se apresentam como “consequência de desordem, hesitação nas convicções do julgador”.437 O quadro, em seu conjunto é de obscuridade, não de palavras ou frases, mas das ideias reveladas caoticamente na formulação do decisório.438 É farta a inteligência doutrinária acerca do tema. Para Araújo Cintra, por exemplo, a obscuridade cogitada no art. 1.022, I, do NCPC, tanto pode decorrer da simples imperfeição na “expressão do pensamento do juiz” como pode “proceder da incompleta formação do convencimento do juiz a respeito das questões de fato ou de direito submetidas à sua apreciação”. De maneira que “se o pensamento do magistrado hesita quanto à melhor solução a dar a uma determinada questão, a expressão do seu pensamento tende a refletir a sua vacilação”.439 No mesmo sentido, ensina Vicente Greco Filho que a obscuridade impugnável pelos embargos de declaração “pode decorrer de simples defeito redacional ou mesmo de má formulação de conceitos”.440 Também Moniz de Aragão entrevê a falta de clareza na simples expressão do juízo, como vício da sentença, e a obscuridade como vício localizado no “próprio raciocínio” utilizado pelo julgador (i.e., “um vício de julgamento”).441 Essas ilogicidades, incongruências e dubiedades na formulação do ato sentencial, quando conduzem a um alto grau de obscuridade, ensejam o emprego dos embargos de declaração, com possibilidades maiores do que o mero aclaramento do julgado; a atuação do juiz, na supressão da ambiguidade, pode se prestar “para atribuir efeitos modificativos aos embargos”,442 se estes forem consequência do saneamento da decisão embargada. É importante ressaltar, outrossim, que a dubiedade a ser corrigida pelos embargos não é exclusiva do dispositivo da sentença. Pode situar-se na fundamentação, no dispositivo ou em ambos, como advertem Barbosa Moreira443 e Pontes de Miranda.444Contradição 1312 803. A decisão judicial é um ato lógico, de maneira que entre as conclusões e suas premissas não pode haver contradição alguma. Os argumentos e os resultados do decisório devem ser harmônicos e congruentes. Se no decisório acham-se presentes “proposições entre si inconciliáveis”, impõe-se o recurso aos embargos de declaração.445 Distingue-se a contradição da obscuridade: aquela ocorre quanto são inconciliáveis duas ou mais proposições do decisório. A conclusão, por exemplo, não pode contradizer a fundamentação da sentença.446 Mas, se os fundamentos são imprecisos ou incompreensíveis, tornando difícil sua harmonização com o dispositivo da sentença, o caso não é, propriamente, de julgamento contaminado por contradição, mas sim por obscuridade.447 Para Calamandrei a consequência da contradição, assim como da obscuridade, é a ineficácia do julgado e sua inaptidão para pacificar o litígio, em total prejuízo do “acesso à ordem jurídica justa”. A sentença contaminada por proposições contraditórias se torna ineficaz porque elas reciprocamente se neutralizam e se eliminam. Em outras palavras, a ineficácia da sentença assim viciada decorre do fato de a “indecisão” (o litígio) ter sido acertada com a “incerteza”.448 Enfim, a contradição é sempre um gravíssimo vício da decisão judicial, mesmo quando fique restrita à fundamentação. É que fundamentação contraditória se equipara à própria ausência de motivação, na lição de Calamandrei.449 Omissão Configura-se a omissão quando o ato decisório deixa de apreciar matéria sobre o qual teria de manifestar-se.450 É induvidoso, portanto, o direito processual de nosso tempo, que “é direito da parte obter [da Justiça] comentário sobre todos os pontos levantados nos embargos declaratórios”, de modo que “é nulo, por ofen-sa ao art. 535, do CPC [NCPC, art. 1.022], o acórdão que silencia sobre questão formulada nos embargos declaratórios”.451 No processo justo, instituído e garantido pelo Estado Democrático, o con- traditório deve ser completo, desde o diálogo da propositura da demanda até a resposta jurisdicional. Como o acesso à justiça há de ser pleno (CF, art. 5º, XXXV), pois não é dado ao litigante praticar a autotutela mediante suas próprias forças, nenhuma questão relevante para a justa composição do litígio pode deixar de ser apreciada e ponderada pelo juiz. A resposta do órgão judicial não é arbitrária, nem mesmo discricionária. Tem de ser “suficiente e adequada” diante das pretensões 1313 contrapostas, devendo a motivação do decisório abarcar as questões de fato e de direito integrantes do litígio. As garantias do processo e da tutela jurisdicional constituem direitos fundamentais assegurados pela Constituição, com destaque ao dever de proferir decisões adequadamente fundamentadas, sob pena de nulidade do julgamento (CF/1988, art. 93, IX).452 Grave não é apenas a falta de resposta a um pedido do autor ou a uma defesa do réu; é também igualmente grave a análise incompleta dos fundamentos das pretensões deduzidas em juízo. Nesta última situação, há uma resposta judicial àquelas pretensões, mas uma resposta imperfeita e insuficiente para cumprir o dever constitucional de fundamentação imposto ao Judiciário em todas as suas decisões. Se decidir aquém da demanda, reduzindo indevidamente o pedido ou os fundamentos postos pelas partes, ou por alguma delas, o juiz infringirá a garantia constitucional da ação e de acesso à justiça (CR/1988, art. 5º, XXXV), como adverte Cândido Dinamarco.453 Decorre diretamente da garantia do devido processo legal (CR/1988, art. 5º, LIV) a obrigatoriedade de que a motivação da decisão judicial (CR/1988, art. 93, IX) tenha extensão e profundidade para “justificar suficiente e racionalmente o des-linde dado à causa”.454 E isto só acontecerá quando, no dizer de Taruffo, a sentença ostentar a completeza da motivação.455 Qualquer falha ou omissão no campo da apreciação das pretensões e respecti- vos fundamentos deduzidos em juízo vicia a sentença em elemento essencial à sua validade e eficácia. Ainda que alguns argumentos tenham sido trabalhados pelo juiz, a análise incompleta diante das questões propostas pelas partes significa que a fundamentação não terá sido adequada, o que “implica insuficiência de motiva-ção e autoriza a oposição de embargos de declaração”. Se tal se passa no primeiro grau de jurisdição, muito mais grave se torna a lacunosidade dos julgamentos dos tribunais, visto que, as instâncias especiais e extraordinárias não apreciam recursos sobre matérias não enfrentadas pelo segundo grau de jurisdição.456 Não merece acolhida a tese, às vezes invocada pela jurisprudência à época do Código anterior, de que o tribunal não está obrigado a responder a todos os argumentos da parte, bastando justificar as razões adotadas para chegar à conclusão adotada pelo decisório. O NCPC foi bem claro, no art. 489, § 1º, IV,457 não se consi-derar fundamentada a decisão que “não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador”. 1314 804. (a) (b) (i) (ii) Se remanesce alguma questão arguida pelo litigante cuja solução se apresente potencialmente capaz de influir na eventual composição do litígio, o tribunal não pode deixar de enfrentá-la. Se se ignorar essa imposição do sistema do contradi- tório e da completude obrigatória da apreensão e resolução do conflito deduzido em juízo e se der ao privilégio de escolher as questões a compor, dentre as diversas formuladas pelo litigante, o juiz ou tribunal estará proferindo decisão incompleta, deficiente e passível de nulidade. Os embargos de declaração são, in casu, o remé- dio recursal, específico para sanar esse tipo de vício de julgamento, e completar o ato judicial, tornando-o congruente com as questões validamente deduzidas no processo. Com isso se alcança não só um decisório completo, como se cumpre o dever constitucional de que as decisões judiciais sejam sempre adequadamente fundamentadas, sob pena de nulidade (CF, art. 93, IX). O novo Código foi expresso, ainda, em determinar ser cabível os embargos para suprir omissão de ponto ou questão sobre a qual o juiz deveria pronunciar de ofício (art. 1.022, II). Resolveu, assim, controvérsia que existia à época da legislação anterior acerca da possibilidade ou não de a parte arguir em embargos matéria não debatida ainda nos autos, mas que, por ser de ordem pública, podia ser conhecida pelo magistrado de ofício.458 Em tal hipótese, os embargos assumem feitio infringente, para permitir a cassação do julgamento impugnado, podendo, outrossim, determinar, se for o caso, nova apreciação do recurso principal.459 Hipóteses de omissão O novo Código deu maior e mais explícita dimensão às decisões omissas, passando no parágrafo único do art. 1.022460 a considerar como tais os seguintes julgados: o que deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento (inciso I); o que incorra em qualquer uma das seguintes condutas (inciso II): o que se limite à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; o que empregue conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência nocaso; 1315 (iii) (iv) (v) (vi) 805. o que invoque motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; o que não enfrente todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; o que se limite a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; e, o que deixe de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento (art. 489, § 1º) (tratamos mais detalhadamente do tema no item nº 766 do v. I). A legislação nova foi severa e minuciosa na repulsa à tolerância com que os tribunais vinham compactuando com verdadeiros simulacros de fundamentação, em largo uso na praxe dos juízos de primeiro grau e nos tribunais superiores. Por isso a enumeração explícita do NCPC das situações em que não se deva considerar como fundamentada a decisão, sendo ela, portanto, omissa. Em todas essas situações, são cabíveis os embargos de declaração, para forçar o órgão judicante a completar o decisório. Erro material O novo CPC acrescentou uma outra hipótese ao rol de cabimentos dos embargos, estabelecendo, expressamente, serem admissíveis para corrigir erro material, ou seja, aquele manifesto, visível, facilmente verificável (NCPC, art. 1.022, III).461 A jurisprudência, à época da codificação anterior, já vinha ampliando as hipóteses de cabimento desse recurso, de modo a permitir seu emprego com o fim corrigir erro material no decisum.462 De tal sorte que a nova legislação apenas positivou o entendimento jurisprudencial dominante. A rigor, o erro material consiste na “dissonância flagrante entre a vontade do julgador e a sua exteriorização; num defeito mínimo de expressão, que não interfere no julgamento da causa e na ideia nele veiculada (por exemplo, 2 + 2 = 5)”.463 Ocorre essa modalidade de erro quando a declaração, de fato, não corresponde à vontade real do declarante. Assim, e ainda a rigor, não se enquadram nessa categoria a inobservância de regras processuais e os erros de julgamento, vale dizer, o error 1316 in procedendo e o error in iudicando.464 E desse modo, o NCPC, visto em sua literalidade, não teria chegado a incluir entre os casos de embargos de declaração, os chamados “erros evidentes”, que acontecem quando o juiz, ao decidir, incorre em equívoco manifesto na análise dos fatos ou na aplicação do direito. Lembra Rodrigo Mazzei, a propósito, que o erro admitido pelo novo CPC como corrigível por meio dos declaratórios poderia, a exemplo do que se passa no Código português, incluir o error in iudicando.465 Assim, no conceito de erro, para efeito dos embargos, estaria incluída a premissa equivocada, que a jurisprudência já vinha dando como vício corrigível no espaço dos declaratórios,466 inclusive no âmbito da justiça do trabalho.467 Ressalte-se, no entanto, que além de se prestar ao reconhecimento de nulidade de ordem pública e da correção do erro material, os embargos de declaração têm sofrido uma ampliação de cabimento por obra pretoriana, em nome dos moder-nos princípios da instrumentalidade e da efetividade do processo. Em caso, por exemplo, de contraste entre o acórdão embargado e a jurisprudência pacífica do STJ, já decidiu aquela alta Corte que a modificação do julgado pelo tribunal de origem, embora ofenda o art. 1.022, não merece ser sancionada com a decretação de nulidade. A prevalência da regra instrumental somente retardaria e tornaria mais cara e penosa a obtenção da tutela jurisdicional. Cassar um julgamento, para que a mesma matéria retorne, por meio do recurso especial, ao conhecimento do STJ, para afinal receber solução exatamente igual a que prevaleceu no julgamento dos declaratórios, entraria em atrito com a teleologia do processo justo, fundada na garantia de celeridade, efetividade e razoabilidade da duração do processo.468 Com isso, o STJ preferiu manter, na particularidade do caso, um acórdão de tri-bunal inferior, que na literalidade da lei processual estaria exorbitando os limites do art. 535 do CPC/1973 (NCPC, art. 1.022), mas que, à evidência aplicou no mérito tese corretíssima, avaliada pela própria jurisprudência da Corte Superior. Nota-se, portanto, uma tendência de reconhecer, na jurisprudência, um papel mais prático e mais amplo aos embargos de declaração, sem, é claro, ignorar os limites do art. 1.022 do NCPC, na ausência de razões relevantes que justifiquem sua pontual inobservância. Nessa mesma perspectiva, nos últimos tempos, os tribunais superiores têm admitido que os embargos de declaração se prestem a corrigir decisão contaminada por “escancarado engano” formado a partir do desconhecimento de determinada circunstância evidente nos autos ou de premissa totalmente equivocada. O equívoco, em tais casos, seria tão acentuado que o reparo não exigiria um verdadeiro reexame 1317 806. (a) (b) nem um profundo rejulgamento da causa. Um simples alerta mostrar-se-ia suficiente para a necessária reformulação do entendimento equivocadamente manifestado. Esse avançado emprego dos embargos de declaração não pode ser desprezado na aplicação do novo Código, como já se advertiu em doutrina.469 Compreensão extensiva do cabimento dos embargos de declaração O art. 1.022 do NCPC alargou as hipóteses de cabimento dos embargos de declaração, seguindo a tendência da jurisprudência à época da legislação anterior de ampliação do cabimento dos declaratórios de modo a alcançar situações que, a rigor, não se enquadrariam no casuísmo do art. 535 do CPC/1973. De longa data os tribunais construíram a tese de ser o erro material passível de correção por intermédio dos embargos de declaração, o que agora está expresso no NCPC. Não se deteve, porém, a criação jurisprudencial apenas no erro material. Mais ampliou o uso do recurso do art. 1.022 para alcançar o erro de fato e até de direito, quando qualificável como “erro manifesto”.470 Argumenta-se, para justificar a correção do equívoco grave e evidente, com o princípio da economia processual, já que os embargos teriam, nesses casos especialíssimos, o papel de evitar o ajuizamento de futura ação rescisória, de efeitos facilmente previsíveis. Em dois outros acórdãos, o STJ assentou: em caso de ter sido reconhecido um contrato no pressuposto de que havia um início de prova escrita, os embargos, que demonstraram só existir no processo prova testemunhal, foram providos para modificar o julgamento de mérito, por ter sido resultado de “erro manifesto”;471 em caso de deferimento de índice de atualização monetária não pleiteado pelo recorrente, também foram acolhidos e providos os embargos para “corrigir o erro evidente”.472 A invocação de premissas equivocadas no acórdão tem sido reiteradamente admitida como “erro material”, ou “erro de fato” capaz de justificar a reforma do acórdão por meio de embargos de declaração.473 Tomando como ponto de partida a jurisprudência do STJ e a nova redação do art. 1.022 do NCPC, parece certo que, em relação aos casos legais de cabimento dos embargos de declaração, deve-se evitar a interpretação literal e restritiva, para fazer prevalecer maior utilidade e funcionalidade do recurso integrativo. Por exemplo, 1318 (a) (b) (c) (d) cabem as seguintes ponderações: a obscuridadedo julgado não deve ser visualizada apenas nas palavras e frases do decisório, mas também na forma desconexa de organizar o raciocínio na construção dos fundamentos que devem alicerçar as conclusões do julgado; nas contradições, deve-se avançar a avaliação para além dos contrastes entre conclusões e premissas. A coerência deve instalar-se sobre todo o arcabouço lógico da sentença, tanto na apreciação dos fatos e provas como das questões de direito, em razão da conduta de boa-fé e lealdade exigida, pelo moderno processo justo, não só das partes mas também dos juízes e tribunais. Não se admite contradição entre a conduta que antecede à sentença e aquela que se observou no julgamento de mérito;474 por fim, as omissões justificadoras dos embargos de declaração podem referir-se tanto aos pedidos como aos seus fundamentos, e podem se apresentar como falta total de consideração à questão de fato ou de direito arguida no processo, como na apreciação apenas de parte das pretensões e respectivos fundamentos. A fundamentação do decisório há de conter resposta completa e adequada a todos os argumentos relevantes deduzidos em juízo. Assim, a omissão a corrigir por meio de embargos declaratórios pode ser total ou parcial, referindo-se aos pedidos ou aos fundamentos que os sustentem; são cabíveis, ainda os embargos de declaração para corrigir erro material ou de fato, configurador de premissa falsa ou equivocada adotada pela decisão embargada.475 Com esse comportamento, a jurisprudência tem transformado os embargos de declaração num poderoso e eficiente instrumento de extirpação dos erros cometidos nas decisões, de maneira grave e evidente. Segundo o espírito da tutela justa e efetiva, assegurada pela ordem constitucional democrática, não há justificativa para se recusar a aplicação de um procedimento idôneo para superar, de pronto, tais erros judiciais, principalmente quando não houver outro recurso para a reforma do decisório equivocado, ou quando o recurso existente for de problemática eficácia para evitar o prejuízo imediato e certo do litigante. Nessa quadra evolutiva do direito processual civil, os erros conspícuos, mesmo ultrapassando literalmente os estritos limites dos erros materiais, têm sido tratados 1319 807. como sanáveis em sede de embargos de declaração, e tudo conspira para que devam continuar a sê-lo no regime do novo CPC, com as devidas cautelas. Convém, por último, registrar que as duas turmas do STF, em decisões recentíssimas, pronunciadas no final da vacatio legis, do NCPC e nos primeiros dias de sua vigência, acentuaram a tendência jurisprudencial de elastecer os casos de admissibilidade dos embargos declaratórios, admitindo seu emprego para corrigir erros evidentes, ainda que não enquadrados com exatidão no casuísmo do Código. Trata-se de interpretação e aplicação dos instrumentos processuais, de maneira funcional e teleológica, mais atenta às metas da tutela jurisdicional justa do que à subserviência às formalidades legais. Nessa linha: (a) a 1ª Turma acolheu os embargos de declaração para reconhecer o erro cometido no provimento do recurso, consistente em aplicar “teto financeiro” a empregado de sociedade de economia mista estadual (CEDAE), quando, na verdade, “possui autonomia financeira”. O recurso extraordinário que não havia sido conhecido, por força dos declaratórios acabou sendo conhecido e provido.476 (b) a 2ª Turma, por sua vez, através de decisão do Relator Min. Teori Zavascki, acolheu embargos declaratórios para reconhecer o erro cometido acerca do índice de correção monetária aplicado no julgamento do recurso extraordinário e reformou a decisão embargada, dando dessa forma efeito infringente aos embargos.477 Procedimento I – Proposição dos embargos Os embargos de declaração devem ser propostos no prazo de cinco dias, tanto no caso de decisão de primeiro grau, como de tribunal. Contar-se-á em dobro se houver litisconsortes, com diferentes advogados.478 A petição do embargante será endereçada ao juiz ou ao relator, com precisa indicação do erro, obscuridade, contradição ou omissão (art. 1.023 caput).479 Que justifique a pretendida declaração. Não há preparo. II – Julgamento Em regra, sem audiência da parte contrária, o juiz decidirá o recurso em cinco dias. Nos tribunais, o julgamento caberá ao mesmo órgão que proferiu o acórdão embargado. Para tanto, o relator apresentará os embargos em mesa na sessão 1320 808. subsequente, proferindo seu voto. Se não houver julgamento nessa sessão, o recurso será incluído em pauta automaticamente (art. 1.024, § 1º).480 Quer isso dizer que o relator do acórdão impugnado continuará sendo o relator para o julgamento dos embargos declaratórios. Não lhe cabe, portanto, julgar monocraticamente embargos de declaração opostos a decisório do colegiado. O NCPC, contudo, tem regra no sentido de que se o recurso for oposto contra decisão singular do relator ou outra unipessoal proferida em tribunal, o prolator da decisão embargada decidi-lo-á monocraticamente (art. 1.024, § 2º). Vale dizer, nesses casos, não há cabimento de serem os embargos julgados pelo órgão especial. O recurso será sempre decidido pelo mesmo órgão singular que proferiu a decisão impugnada.481 III – Contraditório Em regra, não há contraditório após a interposição do recurso, pois os embargos de declaração não se destinam a um novo julgamento da causa, mas apenas ao aperfeiçoamento do decisório já proferido. Havendo, porém, casos em que o suprimento de lacuna ou a eliminação do erro ou da contradição possa implicar modificação da decisão embargada, deverá o juiz intimar o embargado para, querendo, manifestar-se no prazo de cinco dias (art. 1.023, § 2º).482 Registre-se que há uma corrente que defende entendimento muito mais amplo, segundo o qual o contraditório deveria ser observado em qualquer situação, e não apenas nos casos em que se pleiteia modificação da decisão embargada.483 Prequestionamento O novo Código superou o drama frequentemente enfrentado pela parte que tem de atender a exigência de prequestionamento como requisito de admissibilidade do recurso especial e do recurso extraordinário, e encontra resistência do tribunal a quo a pronunciar-se sobre os embargos de declaração, havidos como necessários pela jurisprudência do STF e do STJ. Para não deixar desamparado o recorrente, dispôs o art. 1.025:484 “consideram-- se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré- questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”. Com essa inovação, desde que se considere realmente ocorrente no acórdão 1321 809. embargado, erro, omissão, contradição ou obscuridade, considerar-se-ão prequestionados os elementos apontados pelo embargante, ainda que o Tribunal de origem não admita os embargos. Vale dizer, o Tribunal Superior deverá considerar “incluídos no acórdão os elementos que o recorrente afirma deverem constar, se os embargos de declaração tiverem sido indevidamente inadmitidos”.485 Com essa postura, o novo CPC adotou orientação que já vinha sendo aplicada pelo STF, segundo sua Súmula nº 356,486 no sentido de ser suficiente a oposição de embargos de declaração pela parte, para se entender realizado o prequestionamento necessário para a viabilidade do recurso extraordinário. A nosso ver, a tese do novo CPC a respeito do prequestionamentose afina com o posicionamento que já vinha sendo adotado pelo STF, segundo o qual, se o tribunal de origem se recusa a suprir, em embargos declaratórios devidamente manifestados, omissão efetivamente ocorrida, deve o requisito do prequestionamento ser dado como superado.487 Portanto, à luz do art. 1.025 do NCPC, o julgamento do recurso extraordinário ou especial não deve limitar-se ao reconhecimento da ofensa cometida às regras dos declaratórios, a fim de impor ao tribunal de origem outro julgamento ao recurso aclarador, como prevalecia na jurisprudência do STJ anteriormente ao Código atual.488 Nos termos da lei nova, o que ocorre é o reconhecimento de estar superado o requisito do prequestionamento, na espécie, malgrado a omissão indevida cometida pelo tribunal a quo. Caberá, assim, ao tribunal superior (STF ou STJ) julgar o recurso extraordinário ou especial e não devolver o processo à inferior instância para novo julgamento dos embargos. Efeito interruptivo Segundo o texto primitivo do art. 538 do CPC/1973, os embargos de declaração suspendiam o prazo para a interposição de outros recursos, efeito que valia tanto para o embargante como para a parte contrária, e até para terceiros prejudi-cados.489 Com a nova redação dada ao dispositivo do Código anterior pela Lei nº 8.950, de 13.12.1994, os embargos passaram a ter efeito interruptivo em relação ao prazo dos demais recursos.490 Esse efeito foi mantido pelo NCPC, ao dispor, no art. 1.026, que “os embargos de declaração não possuem efeito suspensivo e interrompem o prazo para a interposição de recurso”. Após o julgamento dos declaratórios, portanto, recomeça-se a contagem por inteiro do prazo para interposição do outro recurso cabível na espécie contra a 1322 decisão embargada. A reabertura do prazo deve beneficiar todos que tenham legitimação para recorrer, e não apenas o embargante. Interrompe-se o prazo do recurso principal na data do ajuizamento dos embargos e permanece sem fluir até a intimação do aresto que os decidir.491 Considerando que os embargos de declaração não se destinam ao reexame das questões já decididas, o Superior Tribunal de Justiça tem acentuado, reiteradamente, que se a parte usar o recurso fora dos permissivos do art. 1.022, e o empregar para simplesmente encobrir o verdadeiro pedido de reconsideração, será o caso de não lhes reconhecer a força interruptiva do prazo do recurso principal prevista no art. 1.026.492 Ou seja: a jurisprudência do STJ no sentido de que “os embargos de declaração, ainda que rejeitados, interrompem o prazo recursal não pode servir para mascarar meros pedidos de reconsideração nomeados de ‘embargos de declaração’”.493 Todavia, instalada divergência entre as Turmas,494 a questão foi levada à apreciação da Corte Especial do STJ, a qual, por decisão unânime, repeliu a tese da possibilidade de tratar os embargos declaratórios como mero “pedido de re- consideração”. Ainda que o objetivo tenha sido puramente infringente da decisão embargada, aquela Alta Corte considerou a tese em foco como violadora do art. 538 do CPC/1973 (art. 1.026 do CPC/2015). Os fundamentos do acórdão da Corte Especial, que teve o fito de uniformizar a jurisprudência do STJ, foram os seguintes: “(...) 2. Tal descabida mutação: a) não atende a nenhuma pre-visão legal, tampouco aos requisitos de aplicação do princípio da fungibilidade recursal; b) traz surpresa e insegurança jurídica ao ju-risdicionado, pois, apesar de interposto tempestivamente o recurso cabível, ficará à mercê da subjetividade do magistrado; c) acarreta ao embargante grave sanção sem respaldo legal, qual seja a não interrup-ção de prazo para posteriores recursos, aniquilando o direito da parte embargante, o que supera a penalidade objetiva positivada no art. 538, parágrafo único, do CPC. 3. A única hipótese de os embargos de declaração, mesmo con-tendo pedido de efeitos modificativos, não interromperem o prazo para posteriores recursos é a de intempestividade, que conduz ao não conhecimento do recurso. 4. Assim como inexiste respaldo legal para se acolher pedido de reconsideração como embargos de declaração, tampouco há arrimo legal 1323 810. para se receber os aclaratórios como pedido de reconsideração. Não se pode transformar um recurso taxativamente previsto no art. 535 do CPC em uma figura atípica, ‘pedido de reconsideração’, que não possui previsão legal ou regimental”.495 Relevante, por fim, é a distinção feita pelo STJ entre o efeito dos embargos de declaração diante dos prazos de recurso e de contestação, quando, por exemplo, se está perante decisão de medida liminar anterior à citação. Para aquela Corte “os em- bargos de declaração interrompem o prazo para a interposição de outros recursos, por qualquer das partes, nos termos do art. 538 do CPC/73”. “Tendo em vista a natureza jurídica diversa da contestação e do recurso, não se aplica a interrupção do prazo para oferecimento da contestação, estando configurada a revelia”. Fundamentou-se, o aresto, no argumento de que “a contestação possui natureza jurídica de defesa. O recurso, por sua vez, é uma continuação do exercício do direito de ação, representan-do remédio voluntário idôneo a ensejar a reanálise de decisões judiciais proferidas dentro de um mesmo processo. Denota-se, portanto, que a contestação e o recurso possuem naturezas jurídicas distintas (...)”496. Daí porque não se pode aplicar uma suspensão específica do prazo de recurso a um prazo típico de defesa. Recurso interposto antes dos embargos de declaração Que ocorre se uma parte já havia interposto o recurso principal, quando a outra lançou mão dos embargos de declaração? Duas são as situações a considerar: (i) o objeto dos embargos não interfere no do recurso principal, de maneira que o julgamento daqueles nada alterou quanto à matéria impugnada no último; (ii) o objeto dos embargos incide sobre questões enfocadas no recurso principal. No primeiro caso, não haverá necessidade de ser renovado ou ratificado o recurso anteriormente interposto;497 no segundo, todavia, a reiteração se faz necessária, porque, uma vez julgados e acolhidos os embargos, a decisão recorrida já não será a mesma que o recurso principal antes atacara498 (ver, retro, o nº 743). O problema que suscitou divergências no passado, no regime do NCPC é objeto de regulação clara e precisa: não pode o recurso interposto antes dos embargos de declaração ser tratado como intempestivo e sujeito à obrigatória reiteração após resolução dos aclaratórios. Mesmo que haja modificação da decisão originária, ter--se-á de abrir, obrigatoriamente, prazo de quinze dias para que o recorrente possa alterar suas razões, compatibilizando-as com o teor do último 1324 811. julgado (NCPC, art. 1.024, § 4º). Por outro lado, o novo Código é também expresso na previsão de que, independentemente de ratificação, o primitivo recurso será normalmente conhecido e julgado, “se os embargos de declaração forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior” (art. 1.024, § 5º). Sobre o tema, ver, retro, o item nº 743. O STJ chegou a sumular sua jurisprudência, com o seguinte enunciado: “É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação” (Súmula nº 418). A Corte Especial daquele tribunal, no entanto, em questão de ordem suscitadano REsp 1.129.215/DF, firmou entendimento de que “a única interpretação cabível para o enunciado da Súmula 418 do STJ é aquela que prevê o ônus da ratificação do recurso interposto na pendência de embargos declaratórios apenas quando houver alteração na conclusão do julgamento anterior”.499 Efeito suspensivo especial A regra básica do NCPC é que todo recurso, em princípio, tem apenas o efeito devolutivo, não suspendendo a eficácia da decisão recorrida (NCPC, art. 995), de modo que não impede a preclusão nem o imediato cumprimento da decisão judicial impugnada. Enquanto o efeito devolutivo é constante, o suspensivo só ocorre quando a lei o preveja ou o autorize em norma especial, como ressalva o citado art. 995, no caput e no parágrafo único. Ao tratar especificamente dos embargos de declaração, a lei nova dispôs que eles “não possuem efeito suspensivo” (art. 1.026, caput, primeira parte). Afastou-se, portanto, de forte doutrina existente à época do Código anterior, que reconhecia a força suspensiva desse recurso.500 Destarte, os embargos de declaração não têm o condão de suspender a eficácia da decisão recorrida. Com a nova disciplina, a oposição de embargos não impede a interposição do recurso principal. Todavia, o conhecimento e o processamento deste último se darão apenas depois de julgados os embargos, criando-se assim um intervalo suspensivo no tocante ao recurso principal apenas, já que se estabelece uma relação de condicionamento ou de prejudicialidade lógica entre os dois recursos manejáveis contra a mesma decisão. É nulo, portanto, o julgamento do recurso principal antes de decididos os embargos de declaração. Isto porque é vedada a prática de atos processuais enquanto suspenso o processo. O ato atingido pelos embargos fica com o seu teor 1325 811-A. (a) (b) condicionado ao resultado dos declaratórios. Julgar o recurso principal antes dos embargos declaratórios importa julgar algo sem objeto definido, ou seja, julgar algo que pode ser ou não ser aquilo que se ataca pela via recursal. Enquanto não se resolvem os embargos, não se tem o que rejulgar em segundo grau. E se tal acontecer, ter-se-á configurado o risco de decidir, no tribunal, sobre ato diverso daquele que efetivamente foi praticado na instância inferior. Esse efeito suspensivo especial dos declaratórios, que não afeta o processo como um todo, mas apenas o recurso principal, é uma imposição lógica e necessária, para evitar a incongruência e a contradição que podem advir da concomitância do processamento e resolução dos declaratórios e do recurso principal diante da mesma decisão. Possibilidade de concessão de efeito suspensivo Muito embora os embargos de declaração não tenham, em regra, efeito suspensivo, – permitindo por isso o imediato cumprimento da decisão embargada –, o § 1º do art. 1.026 autoriza, em caráter excepcional, a suspensão da eficácia da referida decisão em duas hipóteses: quando demonstrada a probabilidade de provimento dos embargos ou, quando relevante a fundamentação dos embargos, houver risco de dano grave ou de difícil reparação,501 que naturalmente não possa aguardar o julgamento do recurso. Ocorre, por exemplo, o caso da letra (a) quando a probabilidade de reforma da decisão embargada se torna evidente, diante de inocultável contradição ou omissão, nela contida, de sorte que o sentido e alcance efetivos do decisório somente se determinem e se fixem depois de solucionados os embargos. A hipótese da letra (b) pode ser exemplificada com a ocorrência de embargos de efeitos infringentes, manejados com relevante fundamentação, num quadro processual em que a imediata execução da decisão embargada crie, para o embargante, risco de dano grave ou de difícil reparação. Trata-se, portanto, de conjuntura autorizadora da tutela de urgência, em que a suspensão dos efeitos da decisão embargada ocorre a partir da conjugação dos requisitos do fumus boni iuris (relevante fundamentação dos embargos) e do periculum in mora (risco de dano grave e iminente). 1326 812. 813. Naturalmente, nunca se haverá de conceder efeito suspensivo quando os embargos tiverem sido manifestados fora das hipóteses do art. 1.022 e com evidente intenção procrastinatória. É bom lembrar que em certos casos, a intensa má-fé do recorrente torna inútil a multa do art. 1.026, §§ 2º e 3º; e autorizada se torna, segundo o STF e o STJ, a recusa até mesmo do efeito interruptivo dos declaratórios. Em tal situação, provoca-se o trânsito em julgado do decisório embargado, bem como sua imediata execução.502 O novo Código endossa tal orientação quando determina que “não serão admitidos novos embargos de declaração se os 2 (dois) anteriores houverem sido considerados protelatórios” (art. 1.026, § 4º). Com essa reação firme, a lei procura reprimir o abuso processual. Efeito integrativo O julgamento dos embargos de declaração não goza de autonomia em face da decisão embargada. O seu papel é de complementá-la ou aperfeiçoá-la, tornando--se parte integrante dela. Fala-se, a propósito, no efeito integrativo ostentado por esta particular modalidade recursal. O Superior Tribunal de Justiça interpretou muito bem a natureza dos embargos de declaração, in verbis: “A decisão proferida em grau de embargos declaratórios (tenha ou não efeito modificativo) é meramente integrativa do acórdão embargado, não possuindo natureza autônoma, sem liame com este”.503 Isso quer dizer que não se pode recorrer separadamente da decisão embargada e da decisão dos embargos. Uma vez julgados os embargos, somente existe uma decisão recorrível: aquela resultante do somatório dos dois decisórios. Não se há de pensar sequer em efeito substitutivo, tal como ocorre, por exemplo, com o recurso de apelação ou os recursos especial e extraordinário. Mesmo quando, por meio dos embargos, se chega excepcionalmente a alguma modificação do que fora anteriormente decidido, não se pode retirar dos declaratórios a natureza integrativa da sentença ou do acórdão embargado. Continuará o novo julgamento a ser parte integrante daquele que o antecedeu e justificou o pronunciamento complementar.504 Embargos manifestamente protelatórios I – Sanções aplicáveis aos embargos protelatórios Os embargos de declaração terão sempre efeito de impedir o fluxo do prazo de 1327 outros recursos. Mas, quando o embargante utilizar o recurso como medida manifestamente protelatória, o juiz ou o tribunal, reconhecendo a ilicitude da conduta, condenará o embargante a pagar ao embargado multa, que não poderá exceder de dois por cento sobre o valor atualizado da causa (NCPC, art. 1.026, § 2º).505 No caso, porém, de reiteração dos embargos protelatórios, a multa será elevada a até dez por cento do valor atualizado da causa, e, além disso, o embargante temerário, para interpor qualquer outro recurso, ficará sujeito ao depósito do valor da multa (NCPC, art. 1.026, § 3º).506 Só estão liberados do depósito prévio a Fazenda Pública e o beneficiário de gratuidade da justiça, que recolherão a multa ao final. À época do Código anterior, a fim de uniformizar a configuração dos embar- gos que provocam a aplicação da multa prevista no art. 538, parágrafo único, do CPC/1973,507 o STJ fixou, de acordo com o art. 543-C do CPC/1973,508 o seguinte entendimento: “Caracterizam-se como protelatórios os embargos de declaração que visam rediscutir matéria já apreciada e decidida pelacorte de origem em con- formidade com súmula do STJ ou STF ou, ainda, precedente julgado pelo rito dos arts. 543-C e 543-B, do CPC”.509 O entendimento continua perfeitamente aplicável à nova legislação, muito embora outras situações também possam configurar o manejo protelatório do referido recurso, segundo apreciação de peculiaridades dos casos concretos. O enunciado do precedente do STJ deve ser visto como exemplificativo e não exaustivo. II – Embargos de prequestionamento para recursos especial e extraordinário Não devem ser qualificados como protelatórios, segundo a jurisprudência, os embargos manifestados com o propósito de atender à exigência de preques- tionamento para recurso especial ou extraordinário.510 Também, salvo o caso de evidente má-fé, não se pode considerar “pedido de reconsideração” sem força interruptiva do prazo de recurso, aquele formulado por meio de embargos de declaração para obter o referido prequestionamento (aplicação da Súmula nº 98 do STJ). III – Aplicação da penalidade aos embargos protelatórios A aplicação da penalidade em análise deve se fazer ex officio pelo tribunal ou pelo juiz. Se houver omissão a respeito da pena, o embargado poderá lançar mão de novos embargos declaratórios para compelir o órgão judicial a suprir a falta.511 Em qualquer caso a decisão sancionatória deverá ser devidamente fundamentada, como 1328 ressalta o § 2º do art. 1.026 do NCPC. Segundo entendimento consolidado do STJ, para fins do art. 1.036 do NCPC, “a multa prevista no artigo 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil (NCPC, art. 1.026, §§ 2º e 3º) tem caráter eminentemente administrativo – pu-nindo conduta que ofende a dignidade do tribunal e a função pública do processo –, sendo possível sua cumulação com a sanção prevista nos artigos 17, VII, e 18, § 2º, do Código de Processo Civil (NCPC, arts. 80, VII e 81, § 3º), de natureza reparatória”.512 Releva destacar, outrossim, que o STJ já decidiu pela interpretação restritiva da aplicação da multa, alcançando apenas “qualquer outro recurso da mesma cadeia recursal”, inibindo a reiteração “de recursos sucessivos sobre a questão já decidida no processo”, não sendo admissível inibir “também a interposição de recursos contra novas decisões que venham a ser proferidas no processo”.513 Por fim, dispôs a nova legislação não serem admitidos novos embargos de declaração se os dois anteriores tiverem sido considerados protelatórios (art. 1.026, § 4º).514 O consectário desse preceito é que os novos embargos abusiva-mente manejados não terão força de impedir o trânsito em julgado da decisão indevidamente recorrida. Fluxograma nº 31 – Embargos de declaração no primeiro grau de jurisdição (arts. 1.022 a 1.026) 1329 Fluxograma nº 32 – Embargos de declaração a julgados de tribunal (arts. 1.022 a 1.026) 1330 427 AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras linhas de direito processual civil. 4. ed. São Paulo: Max Limonad, 1973, v. III, n. 761. 1331 428 429 430 431 432 433 434 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003, v. V, n. 306. NCPC, arts. 1.022 a 1.026. “É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de não ter como cabíveis embargos de declaração contra despacho do relator...” (STF, Pleno, Pet 1.245-3-SP Edcl-Ag, Rel. Min. Moreira Alves, ac. 22.04.1998, DJU 22.05.1998, p. 5. No mesmo sentido: STJ, Corte Especial, EDcl nos EREsp 117.134/MG, Rel. Min. Vicente Leal, ac. 29.06.2001, DJU 22.10.2001, p. 260). Em sentido contrário: “As decisões exaradas pelo relator expõem-se a embargos declaratórios, opostos no escopo de obviar omissões e contradições ou obscuridades – tudo em homenagem ao princípio da motivação” (STJ, 1ª T., REsp 190.488/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 1º. 12.1998, DJU 22.03.1999, p. 93; STJ, 4ª T., RMS 12.172/MA, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, ac. 15.02.2001, DJU 02.04.2001, p. 294). WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. Primeiros comentários ao novo Código cit., p. 1466. CPC/1973, art. 535, I e II. Caso interessante de contradição foi reconhecido pelo STJ, num acórdão em que, a um só tempo, proclamava a necessidade de prova pericial como indispensável à elucidação da controvérsia, e se concluía julgando a causa, em sentido contrário ao apurado na prova técnica, sem fazer qualquer apreciação em torno da existência do laudo técnico e de suas conclusões. Suscitada a contradição, o STJ reconheceu a “violação do art. 535, I, do CPC [NCPC, art. 1.021, I], por permanecer omisso [o Tribunal a quo] no ponto, mesmo após a interposição dos aclaratórios”. O Recurso Especial foi provido “para cassar o acórdão” e determinar que outro fosse proferido “em atenção às conclusões exaradas no laudo pericial” (STJ, 3ª T., REsp 1.143.851, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 24.05.2011, DJe 02.08.2011). “Os embargos declaratórios não são cabíveis para a modificação do julgado que não se apresenta omisso, contraditório ou obscuro” (STJ, 2ª T., EDcl no AgRg no REsp 1.230.127/SP, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 24.05.2011, DJe 01.06.2011). Nesse sentido: STF, 2ª T., RE 567.673 AgR-ED, Rel.ª Min.ª Ellen Gracie, ac. 14.12.2010, DJe 07.02.2011. Já se decidiu, contudo, que “Os embargos declaratórios são cabíveis nas hipóteses de omissão, obscuridade, contradição, ou ainda, quando verificado erro material no julgado” (STJ, 2ª T., EDcl no REsp 1.177.092/RJ, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 02.06.2011, DJe 09.06.2011; STF, Pleno, AI 775.798 AgR--ED, Rel. Min. Cezar Peluso, ac. 23.02.2011, DJe 11.04.2011. Advirta-se, porém, que “a dúvida que enseja a declaração não é a dúvida subjetiva, residente tão só na mente do embargante, mas aquela objetiva resultante de ambiguidade, dubiedade ou indeterminação das proposições, inibidoras da apreensão do sentido” (STF, AI 90.344, Rel. Min. Rafael Mayer, RTJ 105/1.047; RE 94.988, Rel. Min. Moreira Alves, RTJ 104/360). STJ, 1ª Seção, PET nos EDcl nos EDcl nos EDcl nos EDcl no AgRg nos EREsp 611.938/RS, Rel. Min. Humberto 1332 435 436 437 438 439 440 441 442 443 444 445 446 447 Martins, ac. 10.12.2008, DJe 19.12.2008. “Os embargos de declaração só podem ter efeitos infringentes quando estes resultarem diretamente de omissão ou contradição do acórdão” (STJ, EDcl. em AGMC 1.228/SP, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 23.09.1998, DJU 16.11.1998, p. 3). No mesmo sentido: STJ, EDcl. no Emb. Div. no REsp 19.683/SP, Rel. Min. Peçanha Martins, ac. 06.11.1998, DJU 29.03.1999, p. 59; STJ, 3ª T., EDcl no AgRg no CC 98.778/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, ac. 24.08.2011, DJe 02.09.2011. BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. Embargos de declaração. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 101. BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. Op. cit., loc. cit. Um exemplo de sentença obscura por imperfeição do enunciado é aquela que condena o réu ao pagamento de indenização de perdas e danos segundo as verbas constantes de certo documento dos autos, do qual, porém, contém valores heterogêneos, muitos deles imprestáveis ou inadequados para a correta quantificação dos danos a reparar. ARAÚJO CINTRA, Antônio Carlos de. Sobre os embargos de declaração. Revista dos Tribunais, v. 595, p. 15, maio 1985. GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 1995, v. II, n. 55, p. 237. MONIZ DE ARAGÃO, Egas Dirceu. Embargos de declaração. Revista dos Tribunais, v. 633, jul. 1988, p. 15-16. BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. Op. cit., p. 102. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense,2002, v. V, n. 300, p. 545. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, t. VII, p. 323. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, v. V, p. 537. “O dispositivo deve sempre ser um consequente lógico da fundamentação e com ela estar afinado na sua integralidade. E os fundamentos expressos nas razões de decidir também devem ser coerentes entre si, assim como a parte dispositiva deve manter uma coerência interna” (BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. Op. cit., p. 110). A motivação e o dispositivo devem ser “lógicos e congruentes, de modo a constituírem elementos inseparáveis de um ato unitário, que se interpretam e se iluminam reciprocamente” (LIEBMAN, Enrico Tullio. Manuale di diritto processuale civile. Milano: A. Giuffrè, 1974, v. II, n. 270, p. 212-213). “A contradição estendida da fundamentação ao dispositivo representa um caso não só de contradição, mas também de obscuridade, tendo em vista que será impossível determinar 1333 448 449 450 451 452 453 454 455 456 457 458 em que direção tencionou decidir o magistrado, pois estarão convivendo lado a lado no mesmo ato decisório duas linhas de argumentação que conduzem a soluções díspares, com a expressão de ambas na parte dispositiva, em situação semelhante à de decisão passível de mais de uma interpretação” (BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. Op. cit., p. 113). CALAMANDREI, Piero. La cassazione civile. Opere giuridiche. Napoli: Morano, 1976, v. II, parte III, n. 114, p. 319-320. “Tanto vale a absoluta falta de motivação, quanto uma motivação apenas aparente, que seja uma série de frases insignificantes ou contraditórias, as quais em substância não dão justificação alguma ao dispositivo” (CALAMANDREI, Piero. Op. cit., v. II, parte 4ª, n. 121, p. 350). DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001, v. III, n. 1.238, p. 686. STJ, 1ª T., REsp 152.347/SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 19.11.1998, DJU 15.03.1999, p. 96. Segundo igual entendimento, assentou a Suprema Corte que “os provimentos judiciais, como ato de inteligência, devem mostrar-se completos (g.n.), expungidas as dúvidas nefastas ao entendimento que lhes é próprio. Por isso mesmo, o órgão investido do ofício ju-dicante deve receber os embargos declaratórios como oportunidade ótima (g.n.) para possível elucidação quanto ao alcance do que for decidido” (STF, Pleno, ADIn 1.098 EDcl/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 25.05.1995, DJU 29.09.1995, p. 31.904). “Ofende o art. 535, II, do CPC, o acórdão que, em resposta lacônica, rejeita os embargos de-claratórios, sem tratar das questões neles formuladas” (STJ, 1ª T., REsp 67.943/RS, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 13.12.1995, DJU 04.03.1996, p. 5.361). “Tal é a fórmula sistemática e global da regra de correlação entre o provimento jurisdicional e a demanda, a qual se apresenta com a dupla face de veto a excessos e de exigência de inteireza na oferta da tutela jurisdicional” (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 2001, v. II, n. 456, p. 139). BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. Embargos de declaração cit., p. 120. TARUFFO, Michele. La motivazione della sentenza civile. Padova: CEDAM, 1975, p. 55. Para Barbosa Moreira, é inegável o interesse da parte diante do julgado de segunda instância, em instar o tribunal a manifestar-se sobre inapreciados fundamentos a seu favor (até mesmo quando vencedora), a fim de possibilitar discussões em torno do assunto perante o órgão ad quem (Comentários ao Código de Processo Civil. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, v. V, n. 301, p, 547). CPC/1973, sem correspondência. O Superior Tribunal de Justiça já entendeu ser possível a oposição de embargos para 1334 459 460 461 462 463 464 465 466 467 468 suscitar questão que o juiz poderia ter conhecido de ofício (STJ, 6ª T., EDcl no AgRg no REsp 982.011/ SC, Rel. Min. Rogério Schietti, ac. 19.09.2013, DJe 27.09.2013; STJ, 2ª T., REsp 1.225.624/RJ, Rel. Min. Castro Meira, ac. 18.10.2011, DJe 03.11.2011). Entretanto, também já decidiu que não se pode inovar nos embargos para trazer questão jamais debatida nos autos (STJ, 2ª T., AgRg no AREsp 557.560/PB, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, ac. 07.10.2014, DJe 15.10.2014; STJ, 2ª T., EDcl no REsp 1.343.129/SC, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 01.04.2014, DJe 15.04.2014). “(...) As questões cognoscíveis de ofício na instância ordinária devem ser analisadas nos embargos declaratórios apresentados na origem, independentemente da ocorrência de omissão” (STJ, 3ª T., AgRg no REsp 1.218.007/MT, Rel. Min. Moura Ribeiro, ac. 05.05.2015, DJe 13.05.2015). CPC/1973, sem correspondência. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 1.475. STJ, 3ª T., EDcl. no AgRg no AREsp 523.100/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, ac. 04.12.2014, DJe 11.12.2014; STJ, Corte Especial, EDcl na SEC 2.410/EX, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 21.05.2014, DJe 28.05.2014. BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. Novidades em matéria de embargos de declaração no CPC de 2015. Revista do Advogado, São Paulo, n. 126, p. 153, maio 2015. Idem, ibidem. MAZZEI, Rodrigo. Embargos de declaração e agravo interno no Projeto de CPC (Substitutivo de Lavra do Deputado Paulo Teixeira): algumas sugestões para retificações do texto projetado. Revista de Processo, v. 221, p. 255, jul. 2013. O dispositivo do atual Código Português (2013) que trata da matéria é o art. 616º, nº 2: “2 – Não cabendo recurso da decisão, é ainda lícito a qualquer das partes requerer a reforma da sentença quando, por manifesto lapso do juiz (g.n.): a) Tenha ocorrido erro na determinação da norma aplicável ou na qualificação jurídica dos factos; b) Constem do processo documentos ou outro meio de prova plena que, só por si, impliquem necessariamente decisão diversa da proferida”. MONTEIRO NETO, Nelson. Âmbito dos embargos de declaração. Revista de Processo, 232, p. 203, jun. 2014. MAZZEI, Rodrigo. Comentários ao art. 1.022. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DIDIER JR., Fredie; TALAMINI, Eduardo; DANTAS, Bruno. Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 2.276. “Seria excessivo rigor processual restabelecer um acórdão incorreto, meramente para privi-legiar a aplicação pura do art. 535 do CPC [NCPC, art. 1.022]. Tal medida obrigaria a parte, que atualmente sagrou-se vitoriosa no processo, a interpor um novo recurso especial, movi-mentando toda a máquina judiciária, para atingir exatamente o mesmo resultado prático que já obteve. Isso implicaria um desperdício de tempo e de recursos 1335 469 470 471 472 473 474 públicos incompatível com a atual tendência em prol de um processo efetivo” (STJ, 3ª T., REsp 970.190/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 20.05.2008, DJe 15.08.2008). O aresto apoiou-se na mesma linha de praticidade e efetividade anteriormente adotada pela mesma Turma julgadora, a propósito das nulidades processuais em geral: “O processo civil foi criado para possibilitar que se profiram decisões de mérito, não para ser, ele mesmo, objeto das decisões que proporciona. A extinção de processos por meros óbices processuais deve ser sempre medida de exceção” (STJ, 3ª T., REsp 802.497/ MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 15.05.2008,DJe 24.11.2008). BONDIOLI, Luis Guilherme Aidar. Novidades em matéria de embargos de declaração cit., p. 153. Para Rodrigo Mazzei, o fato de nos arts. 1.023 e 1.025 o NCPC falar simplesmente em “erro” e não mais em “erro material”, autoriza a interpretação de que está admitindo o cabimento dos embargos de declaração para “outros tipos de erro” além dos limites estritos do erro material (MAZZEI, Rodrigo. Comentários cit., p. 2.276). Teresa Arruda Alvim Wambier cita exemplo da jurisprudência do STJ em que os embargos de declaração foram admitidos para corrigir decisão acerca de correção monetária, que, se prevalecesse, geraria intolerável enriquecimento sem causa. O erro cometido foi qualificado de “manifesto” (STJ, 4ª T., EDREsp 259.260/RS, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, ac. 26.06.2001, DJU 20.08.2001, p. 472; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Omissão judicial e embargos de declaração. São Paulo: RT, 2005, p. 97). STJ, 5ª T., EDREsp 255.709/SP, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, ac. 13.09.2000, DJU 23.10.2000, p. 169. STJ, 5ª T., REsp 199.046/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, ac. 16.03.2000, DJU 10.04.2000, p. 108. STJ, 1ª T., AgRg nos EInf nos EDcl no REsp 912.564/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 08.04.2008, DJe 17.04.2008; STJ, 3ª T., REsp 883.119/RN, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 04.09.2008, DJe 16.09.2008. O TJMG já teve oportunidade de adotar a orientação traçada pelo STJ: “É permitido ao julgador, em caráter excepcional, atribuir efeitos infringentes aos embargos de declaração, para correção de premissa equivocada, com base em erro de fato, sobre o qual tenha se fundado o julgado embargado, quando tal for decisivo para o resultado do julgamento” (TJMG, 10ª Câm. Cív., ED-Cv 1.0024.01.566861-9/004, Rel. Des. Paulo Roberto Pereira da Silva, j. 26.02.2013). O STJ, por exemplo, reconheceu contradição, num acórdão em que, a um só tempo, proclamava a necessidade de prova pericial como indispensável à elucidação da controvérsia, e concluía julgando a causa, em sentido contrário ao apurado na prova técnica, sem fazer qualquer apreciação em torno da existência do laudo técnico e de suas conclusões. Suscitada a contradição, o STJ reconheceu a “violação do art. 535, I, do CPC [NCPC, art. 1.022, I], por permanecer omisso [o Tribunal a quo] no ponto, mesmo após a interposição dos aclaratórios”. O recurso especial foi provido “para cassar o acórdão” e determinar que outro fosse proferido “em atenção às conclusões exaradas no laudo 1336 475 476 477 478 479 480 481 482 483 484 485 486 487 pericial” (STJ, 3ª T., REsp 1.143.851, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 24.05.2011, DJe 02.08.2011). “Embargos declaratórios. Erro material. Prescrição. 1 – Demonstrado o erro material, deve o recurso de embargos de declaração ser acolhido para integrar o acórdão. 2 – Embargos de declaração acolhidos com efeitos infringentes para reduzir o julgamento aos termos do pedido formulado no recurso especial” (STJ, 2ª T., EDcl nos EDcl nos EDcl no REsp 357.317/SP, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJU 22.11.2007). “Embargos de declaração. Equívoco. Existência. Efeitos infringentes. Cabimento. I – Constatado equívoco na decisão embargada, é possível a concessão de efeitos modificativos aos embargos de declaração. II – Tempestividade do agravo demonstrada por meio de documento trazido na formação do instrumento, em razão de feriado municipal. Embargos acolhidos, com efeitos infringentes, para dar provimento ao agravo de instrumento, determinando sua convolação em recurso especial” (STJ, 3ª T., EDcl no AgRg no Ag 640.808/PR, Rel. Min. Castro Filho, DJU 10.09.2007). STF, 1ª T., ARE 660.089 ED/RJ, Decisão do Relator Min. Roberto Barroso de 15.02.2016, DJe 23.02.2016. STF, 2ª T., RE 817.100 ED/RS, Decisão do Relator Min. Teori Zavascki de 04.04.2016, DJe 08.04.2016. NCPC, art. 229; CPC/1973, art. 191. CPC/1973, art. 536. CPC/1973, art. 537. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. Primeiros comentários ao novo Código cit., p. 1.478. CPC/1973, sem correspondência. MAZZEI, Rodrigo. Embargos de declaração e agravo interno no Projeto de CPC (Substitutivo de Lavra do Deputado Paulo Teixeira): algumas sugestões para retificações do texto projetado. Revista de Processo, v. 221, jul. 2013, p. 269. CPC/1973, sem correspondência. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Embargos de declaração e omissão do juiz. 2. ed. São Paulo: RT, 2014, p. 225. “O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento” (Súmula nº 356 do STF). “A falta de manifestação do tribunal a quo sobre as normas discutidas no recurso extraordinário não impede, em princípio, o seu exame pelo STF, se a parte buscou o suprimento da omissão mediante embargos declaratórios (Súmula nº 356) (...)” (STF, 1ª T., AI 198.631 AgR/PA, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, a c. 11.11.1997, DJU 19.12.1997, 1337 488 489 490 491 492 493 494 495 p. 48). STJ, 1ª T., REsp 1.111.976/DF, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 06.08.2009, DJe 19.08.2009; STJ, 5ª T., REsp 509.953/RS, Rel. Min. Jorge Scartezzini, ac. 04.12.2003, DJU 08.03.2004, p. 319. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., n. 306. Mesmo no caso de não conhecimento por serem considerados incabíveis os embargos, o prazo para interposição dos outros recursos sofrerá interrupção (STJ, REsp 153.324/RS, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 29.04.1998, DJU 22.06.1998, p. 94). Quando, porém, o recurso for extemporâneo, não haverá aquela interrupção, mesmo porque o prazo teria vencido antes da manifestação dos declaratórios (STF, AgRg. em RE 160.322-5/SP, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 25.05.1993, DJU 18.06.1993, p. 12.118). STJ, 3ª T., AgRg no REsp 816.537/PR, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 25.09.2007, DJU 15.10.2007, p. 258. O novo prazo começa a ser contado no primeiro dia útil seguinte ao que foi publicado o aresto dos embargos (STJ, 4ª T., REsp 107.212/DF, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, ac. 17.06.1997, DJU 08.09.1997, p. 42.509). Reinicia-se a contagem do prazo, observando-se o art. 184 [NCPC, art. 224], isto é, “com a exclusão do dia em que se deu a intimação da decisão proferida nos embargos” (STF, RE 92.781, Pleno, Rel. Min. Cunha Peixoto, ac. 23.10.1980, Boletim Jurídico da CEF, n. 22 mar. 1981, p. 2-3). “Os embargos de declaração com a finalidade de pedido de reconsideração não interrompem o prazo recursal” (STJ, 2ª T., REsp 1.073.647/PR, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 07.10.2008, DJe 04.11.2008. No mesmo sentido: STJ, 1ª T., REsp 984.724/MG, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 20.05.2008, DJe 02.06.2008; STJ, 6ª T., AgRg no REsp 1.108.166/SC, Rel. Min. Og Fernandes, ac. 20.10.2009, DJe 09.11.2009; STJ, 2ª T., REsp 1.214.060/GO, Rel. Min. Mauro Campbell, ac. 23.11.2010, DJe 28.09.2010; STJ, 2ª T., REsp 1.214.060/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 23.11.2010, DJe 04.02.2011; STJ, 1ª T., AgRg no Ag no REsp 187.507/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, ac. 13.11.2012, DJe 23.11.2012). STJ, 2ª T., REsp 964.235/PI, Rel. Min. Castro Meira, ac. 20.09.2007, DJU 04.10.2007, p. 226. No sentido da tese antiga: STJ, 4ª T., AREsp 468.743/RJ, Rel. Min. Raul Araújo, ac. 08.04.2014, DJe 13.05.2014; STJ, 3ª T., AgRg no REsp 1.505.346/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, ac. 02.06.2015, DJe 16.06.2015. Rejeitando a tese: STJ, 2ª T., AgRg no Ag 1.433.214/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, ac. 28.04.2015, DJe 1º.07.2015; STJ, 3ª T., AgRg nos EDcl no AREsp 101.940/ RS, Rel. Min. Paulode Tarso Sanseverino, ac. 12.11.2013, DJe 20.11.2013; STJ, 1ª T., REsp 1.213.153/SC, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ac. 15.09.2011, DJe 10.10.2011. STJ, Corte Especial, REsp 1.522.347/ES, Rel. Min. Raul Araújo, ac. 16.09.2015, DJe 16.12.2015. 1338 496 497 498 499 500 501 502 503 STJ, 3ª T., REsp 1.542.510/MS, Rel. Min. Nancy Andrighi, ac. 27.09.2016, DJe 07.10.2016. “Pelas peculiaridades da espécie, não se tem por extemporânea a apelação interposta antes do julgamento dos declaratórios apresentados pela parte contrária, uma vez que os pontos da sentença que foram atacados na apelação em nada foram alterados pelo decisum dos aclaratórios, que, por ser meramente integrativo, apenas complementou o primeiro decisório, sem dar-lhe qualquer outro conteúdo, principalmente modificativo, no atinente àqueles tópicos” (STJ, 4ª T., REsp 280.427/RJ, Rel. Min. César Rocha, ac. 19.02.2002, DJU de 26.08.2002, p. 226). Se os dois recursos tiverem o mesmo objeto, a apelação não pode, em regra, ser interposta antes do julgamento dos embargos, principalmente se estes exercerem algum tipo de eficácia modificativa sobre o decisório embargado. Nesse caso, “não ofende o art. 465 do CPC (hoje art. 538 – NCPC, art. 1.026) o acórdão que deixa de conhecer de apelação interposta antes de concluído o julgamento da causa, se, após a rejeição de embargos declaratórios, não é reiterada a sua interposição, a significar a renúncia tácita do recurso” (STJ, 3ª T., REsp 9.629/SP, Rel. Min. Dias Trindade, ac. 14.05.1991, DJU 17.06.1991, p. 8.205). “É prematura a interposição de recurso especial antes do julgamento dos embargos de declaração, momento em que ainda não esgotada a instância ordinária e que se encontra interrompido o lapso recursal” (STJ, Corte Especial, REsp 776.265/SC, Rel. p/ acórdão Min. César Asfor Rocha, ac. 18.04.2007, DJU 06.08.2007). STJ, Corte Especial, AgRg nos EAREsp 300.967/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, ac. 16.09.2015, DJe 20.11.2015. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., n. 306, p. 559. CPC/1973, sem correspondência. “Descabimento de embargos protelatórios que constitui abuso do direito de recorrer e autoriza a imediata devolução dos autos à origem para a imediata execução do acórdão no recurso especial embargado. Precedentes do Supremo Tribunal Federal” (STJ, 5ª T., EDcl nos EDcl nos EDcl nos EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 731.024/RN, Rel. Min. Gilson Dipp, ac. 26.10.2010, DJe 22.11.2010. No mesmo sentido: STJ, 3ª T., EDcl nos EDcl nos EDcl no AgRg no Ag 720.839/GO, Rel. Min. Sidnei Beneti, ac. 07.06.2011, DJe 08.06.2011). “A reiteração de embargos de declaração, sem que se registre qualquer dos pressupostos legais de embargabilidade (CPC, art. 535 – NCPC, art. 1.022), reveste-se de caráter abusivo e evidencia o intuito protelatório que anima a conduta processual da parte recorrente (...) constitui fim ilícito que desqualifica o comportamento processual da parte recorrente e que autoriza, em consequência, o imediato cumprimento da decisão emanada desta Colenda Segunda Turma, independentemente da publicação do acórdão consubstanciador do respectivo julgamento e de eventual interposição de novos embargos de declaração ou de qualquer outra espécie recursal. Precedentes” (STF, 2ª T., AI 222.179 – AgR-ED-ED-ED-ED, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 09.03.2010, DJe 09.04.2010). STJ, 1ª T., EDcl no REsp 15.072/DF, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, ac. 17.02.1993, DJU 1339 504 505 506 507 508 509 510 511 512 513 22.03.1993, p. 4.510, DJ 31.05.1993, p. 10.628). “Conceber-se um acórdão pertinente aos embargos declaratórios como autônomos, sem liame algum com o originário da apelação, é tarefa evidentemente impossível, ante o sistema processual vigente” (voto condutor do ac. dos EDcl no REsp 15.072/DF cit.). CPC/1973, art. 538, parágrafo único. Segundo jurisprudência do STJ, “a parte final do parágrafo único do art. 538 do CPC – NCPC, art. 1.026, que condiciona ao prévio depósito da multa a ‘interposição de qualquer outro recurso’, deve ser interpretada restritivamente, alcançando apenas ‘qualquer outro recurso’ da mesma cadeia recursal. É que a sanção prevista na norma tem a evidente finalidade de inibir a reiteração de recursos sucessivos sobre a questão já decidida no processo. Não é legítima, portanto, a sua aplicação à base de interpretação ampliativa, para inibir também a interposição de recursos contra novas decisões que venham a ser proferidas no processo”. Assim, “a falta de depósito da multa imposta em face de reiteração de embargos declaratórios de acórdão que julgou decisão interlocutória não inibe a interposição de apelação contra a superveniente sentença que julgou a causa” (STJ, 1ª T., REsp 1.129.590/MS, Rel. Min. Teori Zavascki, ac. 20.10.2011, DJe 25.10.2011). Em doutrina Nelson Monteiro Neto, invocando precedentes do STF, critica a interpretação restritiva do STJ, com argumentação consistente (Reiteração de embargos protelatórios, multa processual e admissibilidade “de qualquer outro recurso”. Revista Dialética de Direito Processual, n. 107, p. 65-70, fev. 2012). NCPC, art. 1.026, §§ 2º e 3º. NCPC, art. 1.036. STJ, 2ª Seção, REsp 1.410.839/SC, Rel. Min. Sidnei Beneti, ac. 14.05.2014, DJe 22.05.2014. STJ, Súmula nº 98. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Op. cit., loc. cit. Uma vez que os embargos declaratórios se destinam a aperfeiçoar a prestação jurisdicional, não se deve aplicar, com excessivo rigor, a pena prevista para recurso manifestamente protelatório. “A multa cominada no art. 538, parágrafo único, do CPC [NCPC, art. 1.026, §§ 2º e 3º], reserva-se à hipótese em que se faz evidente o abuso” (STJ, 1ª T., REsp 8.970/SP, Rel. Min. Gomes de Barros, ac. 18.12.1991, RSTJ 30/379). Mas é cabível a aplicação da multa por expediente protelatório quando “o embargante não demonstrou qualquer dos vícios do art. 535 do CPC [NCPC, art. 1.022], mas apenas revelou a intenção de rediscutir, com efeitos infringentes, a tese lançada no voto” (STJ, 1ª Seção, EDcl no REsp 1.104.775/RS, Rel. Min. Castro Meira, ac. 14.10.2009, DJe 22.10.2009). STJ, Corte Especial, REsp 1.250.739/PA, Rel. p/ ac. Min. Luís Felipe Salomão, ac. 04.12.2013, DJe 17.03.2014. STJ, 1ª T., REsp 1.129.590/MS, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, ac. 20.10.2011, DJe 25.10.2011. 1340 514 CPC/1973, sem correspondência. 1341 814. (a) (b) Capítulo XXVIII RECURSOS PARA O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA § 84. RECURSO ORDINÁRIO Sumár io: 814. Introito. 815. Recurso ordinário para o Supremo Tribunal Federal. 816. Recurso ordinário para o STJ. Introito Além da dualidade de instâncias ordinárias, entre os juízes de primeiro grau e os Tribunais de segundo grau, existe, também, no sistema processual brasileiro, a possibilidade de recursos extremos ou excepcionais, para dois órgãos superiores que formam a cúpula do Poder Judiciário nacional, ou seja, para o Supremo Tribunal Federal e para o Superior Tribunal de Justiça. O primeiro deles se encarrega da matéria constitucional e o segundo, dos temas infraconstitucionais de direito federal. Cabe-lhes, porém, em princípio, o exame não dos fatos controvertidos, nem tampouco das provas existentes no processo, nem mesmo da justiça ou injustiça do julgado recorrido, mas apenas e tão somente da revisão das teses jurídicas federais envolvidas no julgamento impugnado. A par dessa revisão puramente jurídica das questões debatidas, há na Constituição Federal previsão de alguns casos em que se admitem recursos ordinários também para os doismais elevados Tribunais do País. Em matéria civil, a Carta Magna prevê, para o Supremo Tribunal Federal, então, dois tipos de competência recursal, a saber: recurso ordinário, nos casos do art. 102, II, “a”; recurso extraordinário, nos casos do art. 102, III. Com a criação do Superior Tribunal de Justiça, a Constituição Federal de 1988 transferiu-lhe parte da competência originária e recursal antes confiada ao Supremo Tribunal Federal, que, então, assumiu quase que apenas a função de Corte 1342 (a) (b) 815. constitucional. Para o Superior Tribunal de Justiça, os recursos previstos na nova Carta são os seguintes, em matéria civil: I – recurso ordinário, em duas hipóteses, a saber: nos casos de mandado de segurança, denegados em julgamento de única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, Distrito Federal e Territórios (art. 105, II, “b”); nas causas, julgadas em primeiro grau pela Justiça Federal, em que forem partes Estado estrangeiro ou organismo internacional, de um lado, e, de outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no País (art. 105, II, “c”); II – recurso especial, nas causas decididas em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, nas três hipóteses do art. 105, III, da Constituição Federal, que serão examinados no tópico seguinte. Nos recursos ordinários, ao contrário do que se passa nos extraordinários e especiais, a devolução ao Tribunal ad quem é a mais ampla possível. Abrange tanto a matéria fática como a de direito, ensejando, por isso, uma completa revisão, em todos os níveis, do que se decidiu no Tribunal inferior. E a admissibilidade do recurso não se limita a situações específicas como as dos arts. 102, III, e 105, III, da Constituição. Alcança todo e qualquer caso de sucumbência. Basta estar vencida a parte para poder interpor o recurso ordinário, como acontece em qualquer situação comum de dualidade de graus de jurisdição. A disciplina procedimental de todos os recursos para o Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça constava da Lei nº 8.038, de 28.05.1990, cujos arts. 13 a 18, 26 a 29 e 38 foram revogados pelo NCPC. Com a Lei nº 8.950, de 13.12.1994, foi o tema reincorporado ao texto codificado, constando atualmente dos arts. 1.027 a 1.043 do NCPC.1 Recurso ordinário para o Supremo Tribunal Federal I – Cabimento As ações de mandado de segurança, habeas data e mandado de injunção, quando julgadas em única instância pelos Tribunais Superiores (STJ, TST, STM e 1343 TSE), desafiam, normalmente, recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal, se atendidos os requisitos do art. 102, III, da Constituição Federal. Se, porém, forem denegadas, haverá possibilidade de recurso ordinário para a Suprema Corte (Constituição Federal, art. 102, II, e Lei nº 12.016/2009, art. 18). Só as decisões coletivas dos Tribunais, e não as singulares de Relatores e Presidentes, desafiam recurso ordinário. Assim, a decisão do agravo interno interposto contra decisum do relator é que será objeto de recurso ordinário. Por outro lado, não interessa a natureza da questão jurídica enfrentada no acórdão, se constitucional ou se infraconstitucional. Se se trata de decisão enquadrada no art. 102, II, da Carta Magna, o caso é de recurso ordinário e não de recurso extraordinário. Convém ficar bem claro que não são todas as decisões de mandados de se- gurança de competência originária de tribunais superiores que desafiam recurso ordinário para o STF, mas unicamente aquelas de caráter denegatório (CF, art. 102, II). Por decisão denegatória, entende-se, na espécie, tanto a que não admite a ação de segurança como a que a julga improcedente.2 II – Requisitos de admissibilidade Para o recurso ordinário, os requisitos de admissibilidade são os comuns a qualquer recurso e não aqueles especiais exigidos para o recurso extraordinário. Assim, ao autor, repelido em sua pretensão, bastará apoiar-se na sucumbência para demonstrar seu interesse de recorrer e sua legitimidade para tanto. III – Interposição O recurso ordinário deve ser interposto perante o Tribunal Superior de ori-gem. Ao receber o recurso, o presidente ou vice-presidente intimará o recorrido para que, em quinze dias, apresente suas contrarrazões (NCPC, art. 1.028, § 2º).3 O contraditório, destarte, será realizado no órgão ad quem. Findo o prazo de contrarrazões, os autos serão remetidos ao STF, “independen- temente de juízo de admissibilidade” (art. 1.028, § 3º).4 Tal como se dá com a apelação e o agravo de instrumento, o novo Código aboliu o juízo de admissibilidade provisório, já que o exame do cabimento do recurso foi atribuído unicamente ao tribunal ad quem. Desta forma, a sistemática do NCPC é a de um só juízo de admissibilidade. Distribuído o recurso, poderá o Relator, nos termos do art. 932, III, IV e V (RISTF, art. 21, XX, § 1º), não conhecer dele, negar-lhe ou dar-lhe provimento, em 1344 (a) (b) 816. decisão monocrática, da qual caberá agravo interno para o Colegiado (NCPC, art. 1.021) (sobre o cabimento da decisão singular, na espécie, ver, retro, o item 606). IV – Julgamento do mérito Uma vez que o recurso ordinário se assemelha à apelação, o NCPC autoriza, expressamente, que o STF decida, desde logo, o mérito do recurso (art. 1.013, § 3º), ainda quando a extinção do processo tenha ocorrido sem resolução do mérito, sempre que a ação estiver em condições de imediato julgamento (art. 1.027, § 2º)5 (ver item nº 770 retro). V – Concessão de efeito suspensivo O recurso ordinário, como os recursos em geral, não possui efeito suspensivo. Entretanto, o recorrente poderá pedir a suspensão dos efeitos da decisão impugnada com base no art. 1.027, § 2º c/c o art. 1.029, § 5º: o pedido se dirigirá ao STF (na pessoa de seu presidente), no período compreendido entre a publicação da decisão de admissão do recurso e sua distribuição (art.1.029, § 5º, I), ou ao relator, no STF, se o recurso já houver sido distribuído (art. 1.029, § 5º, II). Quando o pedido de efeito suspensivo é dirigido ao STF, procede-se ao sorteio de um relator para o incidente, o qual ficará prevento para o posterior processamento do extraordinário (NCPC, art. 1.029, § 5º, I). Para alcançar a suspensão em causa não há necessidade de uma ação cautelar, nos moldes tradicionais. Embora se trate de providência tipicamente cautelar ou antecipatória, a pretensão da parte é veiculada por simples petição, cabendo o julgamento ao relator, com recurso de agravo interno para o colegiado competente. VI – Fungibilidade Segundo jurisprudência do STF, consolidada sob o regime do CPC/1973, ocorre erro grosseiro na interposição de recurso ordinário quando cabível o extraordinário, o que impossibilita a aplicação do princípio da fungibilidade recursal, por inexistente dúvida objetiva a respeito de qual o recurso adequado.6 Recurso ordinário para o STJ I – Cabimento 1345 O art. 1.027, II, “a” e “b”, do NCPC repetiu as hipóteses de cabimento do recurso ordinário para o STJ constantes na Constituição Federal. Convém ressaltar que somente as decisões coletivas dos Tribunais, e não as singulares de Relatores e Presidentes, desafiam recurso ordinário. Assim, a decisão do agravo interno interposto perante o colegiado contra decisum monocrático do relator é que poderá ser objeto de recurso ordinário. II – Requisitos de admissibilidadeOs recursos ordinários interpostos nos processos em que forem partes, de um lado, Estado estrangeiro ou organismo internacional e, de outro, Município ou pessoa residente ou domiciliada no País, processam-se segundo o rito comum de apelação e de agravo de instrumento (quando a decisão for daquelas elencadas no art. 1.015), inclusive no que diz respeito aos requisitos de admissibilidade, aplicando-se as disposições do NCPC relativas àqueles recursos e do Regimento interno do STJ, conforme determina o art. 1.028, caput e § 1º, do NCPC.7 Aliás, no caso da letra “c” do art. 105, II, da Constituição, o recurso ordinário é a própria apelação que se interpõe diretamente da sentença de primeiro grau para o Superior Tribunal de Justiça, em lugar do Tribunal Regional Federal (RISTJ, art. 249); o mesmo ocorre em relação ao agravo de instrumento interposto das decisões interlocutórias proferidas em tais demandas (RISTJ, art. 253). Na verdade, nas causas da Justiça Federal de primeira instância, em que o Estado estrangeiro ou organismo internacional atuarem como parte, o STJ desempenha, de forma ordinária, o papel de órgão de segundo grau de jurisdição.8 Daí por que não se deve empregar, in casu, a denominação de recurso ordinário, mas a de apelação e de agravo, pois não são outros os recursos cabíveis segundo a previsão do art. 105, II, “c”, da Constituição; e é assim que os nomeia o Regimento Interno do STJ (arts. 249 e 253). Já nos casos de mandado de segurança, aludidos no art. 105, II, “b”, da Cons- tituição (art. 1.027, II, “a”, do NCPC),9 não se pode falar em apelação, porque o recurso ordinário é manejado contra acórdão, e a definição legal de apelação é a de recurso interponível contra sentença (NCPC, art. 1.009). Por isso, o RISTJ, ao classificar os diversos recursos ordinários, fala em recurso ordinário em mandado de segurança, e apelação civil, e agravo de instrumento, nos demais casos. III – Interposição O recurso ordinário contra decisão proferida, em instância única, por tri-bunal 1346 de segundo grau, em mandado de segurança, deve ser interposto perante o tribunal de origem. Ao receber o recurso, o presidente ou vice-presidente intimará o recorrido para que, em quinze dias, apresente suas contrarrazões (art. 1.028, § 2º).10 O contraditório, destarte, será realizado no órgão ad quem. Findo o prazo de contrarrazões, os autos serão remetidos ao STJ, “indepen- dentemente de juízo de admissibilidade” (art. 1.028, § 3º).11 Tal como se dá com a apelação e o agravo de instrumento, o novo Código aboliu o juízo de admissibi- lidade provisório no juízo da causa, já que o exame do cabimento do recurso foi atribuído unicamente ao tribunal ad quem. Desta forma, a sistemática do NCPC é a de um só juízo de admissibilidade. IV – Recurso adesivo Nos casos de sucumbência recíproca prevê a lei a possibilidade de uma das partes aderir ao recurso da outra, no prazo de contrarrazões (NCPC, art. 997, § 2º I), em se tratando apenas de apelação, recurso extraordinário e recurso especial (art. 997, § 2º, II). Diante de tal limitação, admissível é o adesivo ao recurso ordinário interposto nas causas em que figurem como partes Estado estrangeiro ou organismo internacional, uma vez que a esse recurso se aplica toda a sistemática da apelação (art. 1.028, caput). Já quanto ao recurso ordinário em mandado de segurança, não há como enquadrá-lo nas regras de cabimento da adesão recursal, pela impossi-bilidade de tratá-lo, quer como apelação, quer como recurso extraordinário ou especial. Não se lhe estende, portanto, o regime excepcional do art. 997, §§ 1º e 2º. V – Julgamento do mérito Ao relator, além do juízo sobre o cabimento do recurso ordinário, cabe julgá--lo pelo mérito, nos casos do art. 932, IV e V, do NCPC, e art. 34, XVIII, do RISTJ. Dessa decisão monocrática, caberá agravo interno (art. 1.021, caput). Não tendo sido inadmitido nem resolvido pelo mérito preliminarmente, o relator, ouvido o Ministério Público, pedirá dia para o julgamento do colegiado (RISTJ, arts. 250 e 254). Uma vez que o recurso ordinário, em essência, se assemelha à apelação, fica o STJ, no julgamento colegiado, autorizado a decidir, desde logo, o mérito da causa (art. 1.013, § 3º), ainda quando a decisão recorrida tenha decretado a extinção do processo sem resolução do mérito, sempre que a ação estiver madura, ou seja, em condições de imediato julgamento (art. 1.027, § 2º)12 (ver item nº 770 retro). VI – Concessão de efeito suspensivo 1347 O recurso ordinário, como os recursos em geral, não possui efeito suspen-sivo. Entretanto, o recorrente poderá pedir a suspensão dos efeitos da decisão impugnada, endereçando-se: (i) diretamente ao STJ, no período compreendido entre a interposição do recurso e sua distribuição; ou (ii) ao relator, no STJ, se já distribuído o recurso (art. 1.027, § 2º). Fluxograma nº 33 – Recurso ordinário para o STF e para o STJ (arts. 1.027 e 1.028) 1348 Nota: O recurso ordinário assume a forma de agravo de instrumento ou de apelação naquelas ações que correm no 1º grau de jurisdição, com o 2º grau atribuído constitucionalmente ao STJ (CF, art. 105, II, “c”; NCPC, art. 1.027, II, “b” e § 1º, e 1.028, caput). 1349 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 CPC/1973, arts. 539 a 546. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil cit., p. 1.487. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. STF, 2ª T., ARE 673.726/RO, Rel. Min. Teori Zavascki, ac. 19.09.2013, DJe 01.10.2013. CPC/1973, art. 540. STJ, 3ª T., Ag. 12.262/GO, Rel. Min. Nilson Naves, ac. 09.12.1991, RSTJ 36/37; STJ, 6ª T., Ag 1.199.659/SP, Rel. Min. Og Fernandes, ac. 14.04.2011, DJe 02.05.2011. CPC/1973, art. 539, II, “a”. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. 1350 817. § 85. RECURSO EXTRAORDINÁRIO E ESPECIAL Sumár io: 817. Recurso extraordinário. 818. Pressupostos do recurso extraordinário. 819. Repercussão geral das questões constitucionais debatidas no recurso extraordinário. 820. Conceituação legal de decisão que oferece repercussão geral. 821. Procedimento no STF. 822. Reflexos da decisão acerca da repercussão geral. 823. O procedimento regimental de apreciação da arguição de repercussão geral pelo Plenário do STF. 824. Formas de solução tácita da arguição de repercussão geral. 825. Procedimentos a serem adotados após o reconhecimento da repercussão geral. 826. Função do recurso extraordinário. 827. Efeitos do recurso extraordinário. 828. Processamento do recurso extraordinário. 829. O preparo dos recursos para o STF e para o STJ. 830. O recurso extraordinário por via eletrônica. 831. Julgamento do recurso e julgamento da causa. 832. Julgamento incompleto do recurso extraordinário, no juízo de revisão. 833. Poderes do relator. 834. Recurso especial para o STJ. 835. Jurisprudência formada antes da Constituição de 1988. 836. Jurisprudência do STJ formada após a Constituição de 1988. 836-A. Juízo de cassação e juízo de reexame, no âmbito do recurso especial. Controle de constitucionalidade. 837. Recurso especial fundado em dissídio jurisprudencial. 838. Obtenção de efeito suspensivo excepcional para o recurso especial. 839. Concomitância de recurso extraordinário e recurso especial. 840. Fungibilidade entre o recurso especial e o recurso extraordinário. 840-A. Cabimento de recurso extraordinário contra decisão do STJ em recurso especial. 841. Preferência do julgamento domérito dos recursos especial e extraordinário. 842. Recurso especial e recurso extraordinário adesivo. Recurso extraordinário Entre nós, o recurso extraordinário se apresenta como uma criação do Direito Constitucional brasileiro, inspirado no Judiciary Act do Direito norte-americano. Sua finalidade é manter, dentro do sistema federal e da descentralização do Poder Judiciário, a autoridade e a unidade da Constituição.13 O cabimento do recurso está previsto no art. 102, III, “a”, “b”, “c” e “d”, da Constituição da República, que o admite nas causas julgadas por outros órgãos judiciais, em única ou última instância, quando a decisão recorrida: 1351 (a) (b) (c) (d) 818. contrariar dispositivo da Constituição Federal;14 declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; julgar válida lei ou ato do governo local contestado em face da Constituição;15 julgar válida lei local contestada em face de lei federal.16 Trata-se de um recurso excepcional, admissível apenas em hipóteses restritas, previstas na Constituição com o fito específico de tutelar a autoridade e aplicação da Carta Magna. Dessas características é que adveio a denominação de “recurso extraordinário”, adotada inicialmente no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, e, posteriormente, consagrada pelas diversas Constituições da República, a partir de 1934. Desde a EC nº 45/2004, além dos requisitos enumerados nas alíneas do inciso III do art. 102 da CF, ficou a admissibilidade do recurso extraordinário dependente de demonstração, pela parte, de repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso (CF, art. 102, § 3º) (v., adiante, os itens nos 819 a 822). Pressupostos do recurso extraordinário A admissibilidade do recurso extraordinário pressupõe: (a) O julgamento da causa, em última ou única instância, entendida como causa tanto a que envolve decisão final de mérito, como a questão resolvida em decisão interlocutória. Excluem-se, no entanto, da área de cabimento do extraordinário, os acórdãos que deferem tutela provisória, uma vez que a definição de periculum in mora e fumus boni iuris, além de precária, envolve essencialmente matéria fática, não compatível com o objetivo daquele recurso (STF, Súmula nº 735). A Constituição, outrossim, não condiciona o cabimento do extraordinário à ocorrência de julgamento final de tribunal. Exige apenas que se trate de causa decidida em única ou última instância. Em hipótese de causas de alçada, portanto, pode haver recurso de sentença do juízo de primeiro grau diretamente para o Supremo Tribunal Federal.17 (b) A existência de questão federal constitucional, i.e., uma controvérsia em torno da aplicação da Constituição da República. A questão apreciável pela via do recurso extraordinário somente pode ser uma questão de direito, i.e., um ponto controvertido que envolva diretamente a interpretação e aplicação da lei. Se o que se 1352 debate são os fatos (e sua veracidade), tem-se a questão de fato que é prejudicial à questão de direito e que não pode ser renovada por meio do extraordinário.18 A questão federal, para justificar o cabimento do recurso extraordinário, não exige prévia suscitação pela parte, mas deve já figurar no decisório recorrido; i.e., deve ter sido anteriormente enfrentada pelo tribunal a quo. Nesse sentido, fala-se em prequestionamento como requisito de admissibilidade do extraordinário. É, aliás, o que se extrai da regra constitucional que exige, para ser conhecido esse recurso, verse ele sobre “causa decidida”, na instância de origem. (c) A demonstração da repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, requisito esse que, todavia, somente prevalece em relação aos recursos extraordinários interpostos contra decisões publicadas a partir da regulamentação da matéria pelo RISTF.19 (d) A observância do prazo legal de interposição do recurso extraordinário, que é de quinze dias, a contar da intimação do julgamento impugnado (NCPC, art. 1.003, caput e § 5º).20 O STF, no regime do CPC/1973, considerava intempestivo o recurso manifestado antes do julgamento dos embargos de declaração, se não fosse posteriormente ratificado.21 Essa questão foi superada por regulamentação diversa adotada pelo NCPC, cujo art. 218, § 4º, dispõe textualmente que “será considerado tempestivo o ato praticado antes do termo inicial do prazo” (ver, retro, item nº 742). (e) A existência do prequestionamento. Quanto à questão constitucional, não pode ela ser suscitada originariamente no próprio recurso extraordinário. O apelo extremo só será admissível se o tema nele versado tiver sido objeto de debate e apreciação na instância originária. Por isso, se a decisão impugnada tiver sido omissa a seu respeito ou se a pretensa ofensa à Constituição tiver origem em posicionamento do órgão julgador adotado pela vez primeira no próprio julgado recorrido, deverá a parte, antes de interpor o recurso extraordinário, provocar o pronunciamento sobre a questão constitucional por meio de embargos de de- claração.22 Mesmo quando a alegada ofensa à Constituição surge na prolação do próprio acórdão, “impõe-se a imposição de embargos declaratórios, a fim de que seja suprido o requisito do prequestionamento”23 (sobre o prequestionamento realizado em embargos de declaração, ver itens nos 808, retro, e 836, infra). Para ter-se configurada a questão constitucional é ainda necessário que a ofensa invocada pelo recorrente tenha-se dado diretamente contra a regra traçada pela Constituição, e não tenha decorrido, intermediariamente, de atentado às regras infraconstitucionais. É o que se acha sintetizado na Súmula nº 636 do STF, in verbis: 1353 “Não cabe recurso extraordinário por contrariedade ao prin-cípio constitucional da legalidade, quando a sua verificação pressu-ponha rever a interpretação dada a normas infraconstitucionais pela decisão recorrida”. Justifica-se a exigência do prequestionamento da questão constitucional (tese debatida na decisão recorrida) porque a Constituição instituiu o recurso extraordinário para apreciação de “causas decididas em única ou última instância” (art. 102, III). Cumpre, pois, ao recorrente demonstrar, necessariamente, que a questão ventilada no extraordinário (i.e., a causa) foi objeto de apreciação e julgamento na instância ordinária. O que se busca com esse remédio excepcional é, na verdade, um rejulgamento da causa, no tocante à questão de direito nela contida. Isso, obviamente, só pode acontecer em face de questão anteriormente já decidida. Daí a exigência do STF de prequestionamento, na origem, da tese constitucional, como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário (Súmulas nos 282 e 356).24 Mesmo as questões de ordem pública que os tribunais, nas instâncias ordinárias, podem conhecer de ofício, quando se trata do recurso extraordinário não são apreciáveis pelo STF, se não passaram pelo crivo do preques-tionamento. É tranquila a jurisprudência daquela Alta Corte sobre essa matéria.25 No regime do Código anterior, não se tinha como prequestionada a matéria constante apenas de algum voto vencido (Súmula nº 320/STJ). O Código de 2015 adotou orientação em sentido contrário, dispondo que “o voto vencido será ne- cessariamente declarado e considerado parte integrante do acórdão para todos os fins legais, inclusive de prequestionamento” (art. 941, § 3º). (f)Quanto à tempestividade do recurso extraordinário (quinze dias, confor-me o art. 1.003), o STF, ao tempo do Código anterior, impunha ao recorrente o ônus de comprovar, no ato da respectiva interposição na instância de origem, a eventual ocorrência de feriado local que pudesse ter influenciado na determinação do término do prazo legal.26 A jurisprudência da referida Corte considerava inad-missível que tal evento fosse demonstrado posteriormente, quando o processo já se encontrasse na superior instância.27 A orientação foi adotada pelo NCPC, que, no § 6º do art. 1.003,28 impõe ao recorrente comprovar a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso. A regra, todavia, não deve ser aplicada de forma excessivamente rígida. Em função da instrumentalidade das formas e da garantia constitucional de acesso à justiça, o Supremo Tribunal Federal, ainda à época do CPC/1973, houve por bem rever sua antiga jurisprudência, passando a permitir que o feriado local ou a 1354 819. suspensão de expediente do tribunal de origem pudessem ser comprovados posteriormente à interposição do extraordinário, inclusive em sede de agravo regimental.29 Em seguida, o Superior Tribunal de Justiça, que acompanhava em matéria de recurso especial a mesma orientação, adotou também a mudança de entendimento ocorrida no Supremo Tribunal Federal.30 Portanto, atualmente, admite-se, tanto no processamento do recurso extraordinário como do especial, que a causa de prorrogação do prazo recursal, por motivo local, seja comprovada não só no ato de interposição do recurso, mas também ulteriormente, quando a dúvida a seu respeito surgir, durante a tramitação do processo no Tribunal ad quem.31 Sem embargo da regra do § 6º do art. 1.003 do NCPC, a orientação deve permanecer no regime da nova legislação, uma vez que o § 3º do art. 1.029 do mesmo estatuto, permite que o STF determine a correção de vícios que não se reputem graves, desestimulando a jurisprudência defensiva e estimulando a sanação de falhas formais.32 Ainda no tocante à tempestividade, o STF já decidiu que o carimbo ilegível do protocolo não é motivo, por si só, para a declaração de intempestividade do recurso, quando for possível aferir a tempestividade por outros meios. Entende a Corte Superior que o defeito, nesse caso, é do órgão jurisdicional, de tal sorte que se a tempestividade do recurso puder ser aferida por outros elementos acostados aos autos, não pode “a parte jurisdicionada sofrer prejuízo por um defeito ao qual não deu causa”.33 Repercussão geral das questões constitucionais debatidas no recurso extraordinário O regime da Constituição anterior ensejou a criação da arguição de relevância como mecanismo de filtragem do recurso extraordinário, expediente que a Carta de 1988 repeliu. A matriz constitucional do recurso extraordinário veio, porém, a sofrer significativas alterações por força da Emenda nº 45, de 30.12.2004, dentre elas a que figurou no novo § 3º acrescido ao art. 102 da Constituição. Por força desse dispositivo, doravante caberá à parte fazer, em seu recurso, a demonstração da “repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso”. À luz desse dado, o STF poderá, por voto de dois terços de seus membros, “recusar” o recurso. Ou seja: está o Tribunal autorizado a não conhecer do recurso extraordinário se, preliminarmente, entender que não restou demonstrada a “repercussão geral” das 1355 questões sobre que versa o apelo extremo.34 Foi, sem dúvida, a necessidade de controlar e reduzir o sempre crescente e intolerável volume de recursos da espécie que passou a assoberbar o Supremo Tribunal a ponto de comprometer o bom desempenho de sua missão de Corte Constitucional, que inspirou e justificou a reforma operada pela EC nº 45. Essa preocupação com a redução do número de recursos endereçados às Cortes Su- premas de Justiça não é um fenômeno local, já que tem se manifestado em vários países. Lembra, a propósito, Andrea Proto Pisani, a respeito do direito italiano, que as Cortes de Cassação, gênero a que se filiam em certos aspectos tribunais como o STF e o STJ brasileiros, se destinam institucionalmente a garantir a uniformidade da aplicação da lei federal nos Estados organizados de maneira federativa, e com isso cumprir-se a garantia constitucional de igualdade de todos perante a lei. Acontece que o acesso indiscriminado a esses tribunais provoca seu crescimento numérico e o congestionamento de seus serviços, com o que, além da intolerável demora na resposta jurisdicional definitiva, se acaba por produzir decisões divergentes entre os diversos órgãos fracionários em que a Corte se vê forçada a instituir. De tal maneira o tratamento igualitário que justificaria a existência desses tribunais superiores acaba sendo inviabilizado, diante da inevitabilidade de divergência in-terna na interpretação e aplicação da lei federal. É assim que se justifica a adoção de critérios de redução drástica do volume de processos que vão ter aos tribunais de último grau de jurisdição, limitando-os apenas àqueles que versem sobre questões relevantes de alta repercussão nacional.35 A regulamentação do dispositivo constitucional encontra-se no art. 1.035, do NCPC e seus parágrafos,36 onde foram traçadas regras de definição do que se deva entender por repercussão geral das questões constitucionais debatidas no processo; e instituíram-se regras simplificadoras da tramitação de outros extraordinários pendentes com veiculação de igual controvérsia. Disciplinando o direito intertemporal, à época do CPC/1973, o art. 4º da Lei nº 11.418/2006 dispôs que sua aplicação dar-seia aos recursos interpostos a partir do primeiro dia de sua vigência, ou seja, a partir do dia 18.02.2007. Continuam fora da sistemática da repercussão geral todos os recursos extraordinários pendentes antes daquela data, que estejam tramitando nas instâncias locais ou no STF.37 É de se ressaltar que o controle de admissibilidade criado pelo novo § 3º do art. 102 da Constituição é específico do recurso extraordinário, pelo que não poderá ser estendido ao recurso ordinário perante o STF, e tampouco ao especial e outros recursos manejáveis no âmbito do STJ. 1356 820. A apreciação da ocorrência (ou não) de repercussão geral é exclusiva do STF (art. 1.035, § 2º).38 A competência é do Pleno, por decisão de pelo menos oito de seus onze Ministros (art. 102, § 3º, da CF). Essa decisão é irrecorrível (NCPC, art. 1.035, caput).39 Não obstante, é inequívoca a possibilidade de oposição de embargos de declaração, se presentes os requisitos legais dessa modalidade recursal, porque incide na espécie, a norma do art. 93, IX, da Constituição, que obriga a fundamentação adequada das decisões judiciais.40 Aliás, é importante ressaltar que o novo CPC aboliu o juízo de admissibilidade do recurso extraordinário no tribunal de origem, reservando-o, em regra, para o próprio STF. Conceituação legal de decisão que oferece repercussão geral Para justificar o recurso extraordinário, não basta ter havido discussão constitucional no julgado recorrido. O STF não conhecerá do recurso “quando a questão constitucional nele versada não tiver repercussão geral” (NCPC, art. 1.035, caput). Por repercussão geral, a lei entende aquela que se origina de questões “que ultrapassem os interesses subjetivos do processo”, por envolver controvérsias que vão além do direito individual ou pessoal das partes. É preciso que, objetivamente, as questões repercutam fora do processoe se mostrem “relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico” (art. 1.035, § 1º).41 Para que o extraordinário, portanto, tenha acesso ao STF, incumbe ao recorrente demonstrar, em preliminar do recurso, a existência da repercussão geral (art. 1.035, § 2º).42 Não pode se dar de ofício tal reconhecimento. A arguição pela parte é pressuposto processual, de maneira que, não cumprido, o recurso será fatalmente não conhecido. A apreciação da matéria, por outro lado, será exclusiva do STF, isto é, não passará pelo crivo do tribunal de origem; e seu pronunciamento dar-seá em decisão irrecorrível (art. 1.035, caput).43 A avaliação da repercussão geral in concreto se faz sobre a questão debatida no recurso. Não há necessidade da coexistência de numerosos processos sobre a mesma questão. Ainda que só um recurso extraordinário exista entre partes singulares, é possível que a matéria nele cogitada envolva tema, cuja solução, ultrapasse o interesse individual delas, repercutindo significativamente no plano social e jurídico.44 Vale dizer: embora inexistente a multiplicidade de recursos, deverá a questão de direito envolver interesses de um grande número de pessoas, ainda que não configurado o interesse de massa.45 1357 821. Há na lei a previsão de alguns casos em que a repercussão geral é categorica- mente assentada. São eles, de acordo com o art. 1.035, § 3º, I e III: (i) qualquer decisão recorrida que tenha contrariado súmula ou jurisprudência dominante do STF (inciso I), (ii) decisão de qualquer tribunal que tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da Constituição Federal (inciso III).46 A súmula, in casu, não precisa ser a vinculante, mas apenas a que retrate jurispru-dência assentada, pois, mesmo sem súmula, a repercussão geral estará configurada em qualquer julgamento que afronte “jurisprudência dominante” do STF. Por jurisprudência dominante, deve-se ter a que resulta de posição pacífica, seja porque não há acórdãos divergentes, seja porque as eventuais divergências já tenham se pacificado no seio do STF. O STF, em sua página na Internet, divulga vários casos em que a repercussão geral, diante de processos múltiplos, já foi reconhecida naquela Corte, versando em sua maioria sobre questões tributárias e previdenciárias (RE 559.607, 559.943, 560.626, 561.908, 566.471, 564.413 e 567.932), e algumas de remuneração de servidores públicos (RE 561.836 e 570.177) ou problemas de saúde, na ordem social (RE 566.471).47 Por fim, presume-se haver repercussão geral se o recurso impugnar acórdão que tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal, proferida pelo voto da maioria absoluta dos membros do Pleno ou do órgão especial de Tribunal de segundo grau (art. 97 da CF). Procedimento no STF Ao Plenário compete declarar a ausência de repercussão geral, por voto de dois terços de seus membros (CF, art. 102, § 3º). Pelo menos oito dos onze ministros do STF devem negar a repercussão, para que o recurso extraordinário não seja admitido.48 Negada a repercussão geral, a decisão do Pleno valerá para todos os recursos sobre matéria idêntica, ainda pendentes de apreciação. O presidente ou vice-pre- sidente do tribunal de origem negará seguimento a todos os recursos sobrestados na origem que versem sobre matéria idêntica (art. 1.035, § 8º).49 Pode o relator, durante a análise da repercussão geral, permitir intervenção de terceiros interessados, por meio de procurador habilitado, de acordo com o que dispuser o Regimento Interno do STF (art. 1.035, § 4º).50 Essas manifestações se 1358 (a) (b) (i) (ii) (iii) (iv) (c) (i) (ii) justificam em face da repercussão que o julgamento pode ter sobre outros recursos, além daquele sub apretiatione no momento (art. 1.036).51 É um dos casos, outrossim, em que a intervenção do amicus curiae se torna cabível. Depois de certa vivência da repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal, pelo seu Pleno, em 11.06.2008, tomou deliberações acerca do procedimento de aplicação desse requisito do recurso extraordinário, principalmente em relação à jurisprudência já pacificada da Corte, que podem ser assim sintetizadas: Simplificação do procedimento: decidiu que o dispositivo da repercussão geral, criado em 2004 pela Emenda Constitucional 45, poderá ser aplicado pelo Plenário da Corte a recursos extraordinários que discutem matérias já pacificadas pelo STF, sem que esses processos tenham de ser distribuídos para um relator. Preconizou quatro medidas possíveis a observar em relação aos recursos extraordinários: versando os recursos sobre matérias já julgadas pelo STF, serão eles enviados para a Presidência do Tribunal, que, antes da distribuição do processo, levará a questão ao Plenário; no Plenário, caberá aos Ministros aplicar a jurisprudência da Corte; ou rediscutir a matéria; ou então simplesmente determinar o seguimento normal do recurso, caso se identifique que a questão não foi ainda discutida pelo Plenário. Reflexos sobre outros recursos: nos casos em que for confirmada a jurisprudência dominante, o STF negará a distribuição ao recurso e a todos os demais que tratem sobre a mesma matéria. Com isso, os Tribunais poderão exercer o chamado juízo de retratação, ou seja: aplicar a decisão do STF; ou considerar prejudicados os recursos sobre a matéria, quando o Supremo não reformar a decisão. O objetivo da decisão do Plenário da Suprema Corte foi declaradamente acelerar o trâmite dos recursos extraordinários e evitar a subida de um outro tipo de recurso ao STF – o agravo nos próprios autos, de que cogita o art. 544 do CPC/1973 (NCPC, art. 1.042). 1359 822. Reflexos da decisão acerca da repercussão geral I – Sobre processos em curso em grau inferior de jurisdição “Reconhecida a repercussão geral, o relator no Supremo Tribunal Federal determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem em território nacional” (NCPC, art. 1.035, § 5º). A regra tem o duplo objetivo de economia processual, simplificando a resolução dos múltiplos casos pendentes, e de assegurar a isonomia, proporcionando condição a que todos sejam solucionados segundo a mesma tese. II – Sobre outros recursos extraordinários em curso Reconhecida a repercussão geral em um recurso extraordinário, havendo no STF outros que versem sobre questão igual, observar-se-á a sistemática do julgamento dos recursos repetitivos (NCPC, arts. 1.036 e ss.). A propósito, prevê o art. 1.036, caput,52 que ao Regimento Interno do STF cabe disciplinar o modo de tratar a multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, tendo em vista permitir que o julgamento de um caso possa refletir sobre os demais, simplificando as respectivas tramitações. Havendo diversos recursos extraordinários em processamento na origem, que tratam da mesma controvérsia, deverá o tribunal local selecionar dois ou mais recursos que a representem para encaminhá-los ao STF. Os demais ficarão sobrestados na origem até o pronunciamento definitivo do Supremo (art. 1.036, § 1º).53 Duas situações distintas podem ocorrer no pronunciamento do STF: (i) pode ser negada a repercussão geral; ou (ii) pode ela ser reconhecida. Na primei-ra, o extraordinário não será apreciado pelo STF (NCPC, art. 1.035, caput);e, na segunda, será julgado pelo mérito, por aquela Corte Superior (art. 1.035, § 9º). Acontecerão, nesse último caso, duas decisões, em acórdãos distintos, uma sobre a admissibilidade do recurso extraordinário e outra sobre sua procedência ou não. Ocorrendo a negativa de repercussão geral, pelo STF, todos os recursos sobrestados na origem “serão considerados automaticamente inadmitidos” (art. 1.039, parágrafo único).54 Não chegarão, pois, a subir ao STF. Se o STF julgou o mérito do extraordinário, poderão surgir nos tribunais de origem, duas situações: os acórdãos recorridos retidos poderão estar em confor- midade ou desconformidade com a tese firmada pela Suprema Corte. Caberá às 1360 (a) (b) instâncias locais,55 uma das seguintes decisões: se o julgado recorrido estiver conforme ao que decidiu o STF, o recurso ex- traordinário suspenso no tribunal de origem, terá seu seguimento negado pelo presidente ou vice-presidente daquele tribunal (NCPC, art. 1.040, I); se estiver em desacordo, os autos retornarão ao órgão do tribunal local que proferiu o acórdão recorrido, para juízo de reexame daquilo que tiver sido decidido no processo de competência originária, na remessa necessária, ou no recurso anteriormente julgado (art. 1.040, II). Como se vê, a repercussão geral, editada com o fito de reduzir o excessivo e intolerável volume de recursos a cargo do STF, não teve como objeto principal e imediato os extraordinários manejados de maneira isolada por um ou outro litigante. O que se ataca, de maneira frontal, são, quase sempre, as causas seriadas ou a constante repetição das mesmas questões em sucessivos processos, que levam à Suprema Corte milhares de recursos substancialmente iguais, o que é muito frequente, v.g., em temas de direito público, como os pertinentes aos sistemas tri- butário e previdenciário, e ao funcionalismo público. A exigência de repercussão geral em processos isolados, e não repetidos em causas similares, na verdade, não reduz o número de processos no STF, porque, de uma forma ou de outra, teria aquela Corte de enfrentar todos os recursos para decidir sobre a ausência do novo requisito de conhecimento do extraordinário. O grande efeito redutor dar-se-á pelos mecanismos de represamento dos recursos iguais nas instâncias de origem, os quais, à luz do julgado paradigma do STF, se extinguirão sem subir à sua apreciação (art. 1.039, parágrafo único); e ainda pela extensão do julgado negativo do STF de um recurso a todos os demais em tramitação sobre a mesma questão (art. 1.035, § 8º). A página do STF na Internet, a título de orientação aos jurisdicionados, ressalta que a exigência da “repercussão geral”, como requisito de admissibilidade do recurso extraordinário, tem as seguintes finalidades: “a) firmar o papel do STF como Corte Constitucional e não como instância recursal; b) ensejar que o STF só analise questões relevantes para a ordem constitucional, cuja solução extrapole o interesse subjetivo das partes; c) fazer com que o STF decida uma única vez cada questão constitucional, não se pronunciando em outros processos com idêntica matéria”. III – Desistência do recurso após reconhecimento da repercussão geral 1361 823. Como o julgamento do recurso extraordinário de repercussão geral, se destina, quase sempre, a repercutir sobre uma série de outros recursos sobrestados para aguardar o pronunciamento definitivo do STF (art. 1.035, § 5º), surge o problema de ser possível ou não à parte desistir do recurso adotado pelo tribunal como padrão. Muito se discutiu sobre o tema ao tempo do CPC/1973. O novo Código enfrentou expressamente a matéria, adotando, a nosso ver, o melhor entendimento, em seu art. 998, segundo o qual o fato de o processo estar inserido na cadeia de recursos repetitivos, por si só, não priva a parte do direito de desistir de seu apelo, direito esse amplamente assegurado pelo caput do dispositivo.56 Sua deliberação, todavia, não impedirá o STF de prosseguir na apreciação da tese de direito envolvida na arguição de repercussão geral. Na dinâmica dos recursos repetitivos e daqueles que contêm repercussão geral, o julgamento do objeto do extraordinário ultrapassa o interesse do recorrente, como se vê do disposto no § 1º do art. 1.035. Logo, mesmo que ocorra a desistência do recurso padrão, persistirá o interesse coletivo, relacionado com os demais recursos que se acham sobrestados, no aguardo do pronunciamento do STF (art. 1.036, § 1º). É o que determina, de forma clara, o parágrafo único do art. 998, ao assegurar que a questão, cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida, será examinada pelo STF, sem embargo de ter a parte desistido de seu recurso. O procedimento regimental de apreciação da arguição de repercussão geral pelo Plenário do STF O novo Código de Processo Civil confere ao Regimento Interno do STF regulamentar as atribuições dos Ministros, das Turmas e de outros órgãos da-quele Tribunal na análise da repercussão geral, principalmente quando inserida na sistemática dos recursos repetitivos (NCPC, arts. 1.035, § 5º, e 1.036, caput). A Emenda Regimental nº 21/2007 cuidou de disciplinar a matéria dentro do RISTF e, assim, estipulou como o relator acolheria a manifestação do Plenário recomendada pelo art. 102, § 3º, da Constituição. Para tanto, instituiu-se um pro- cedimento eletrônico de comunicação entre o relator do extraordinário e os demais Ministros que compõem o Plenário, o qual prescinde de sessão de julgamento e lavratura de acórdão específico para o incidente da arguição de repercussão geral da questão constitucional debatida. Após recebimento da manifestação, os diversos Ministros terão o prazo de vinte dias para endereçarem seus pronunciamentos ao relator, também por meio 1362 824. eletrônico (RISTF, art. 324). Decorrido o prazo sem manifestações suficientes para a recusa do recurso, “reputar-se-á existente a repercussão geral” (RISTF, art. 324, § 1º). Quer isto dizer que a rejeição tem sempre de ser expressa e fundamentada. Mas o reconhecimento da repercussão pode ser presumido diante do silêncio dos votantes que se abstêm de pronunciar sobre a arguição feita na preliminar do recurso. A súmula da decisão sobre a repercussão geral, de acordo com o § 11 do art. 1.035 do NCPC, será publicada no Diário Oficial e valerá como acórdão. Pode-se estranhar o processamento e julgamento do incidente sem a realização de uma sessão do Plenário no sentido tradicional e sem a lavratura de acórdão específico. Acontece que a Constituição, ao cuidar da repercussão geral, não exigiu nada além da “manifestação de dois terços” dos membros do STF para recusar os recursos que não evidenciassem tal repercussão. Não se impôs, assim, que a solenidade da sessão de julgamento e a lavratura de acórdão fossem requisitos indispensáveis para decidir o incidente. Aliás, a desnecessidade de acórdão foi prevista, expressamente, no art. 1.035, § 11, do NCPC,57 onde se contenta com a publicação de súmula da decisão a respeito da preliminar em torno da repercussão. Ademais, já consta de lei a autorização para a ampla adoção do processo eletrô-nico na Justiça brasileira, cujos moldes práticos de implantação foram confiados à regulamentação dos Tribunais na esfera de suas circunscrições (Lei nº 11.419, de 19.12.2006, art. 18). Não se entrevê, portanto, ilegalidade na sistemática de intercâmbio eletrônico adotado pelo RISTF para formação doquorum de rejeição, ou não, do incidente sub apretiatione. Havendo processos ou recursos sobrestados, nos termos do art. 1.035, § 5º, é após a resolução do caso padrão, proceder-se-á quanto aos demais segundo as regras gerais dos recursos extraordinários repetitivos (arts. 1.036 e ss.) Formas de solução tácita da arguição de repercussão geral Por meio de disposições de seu Regimento Interno, o Supremo Tribunal Federal instituiu o apelidado “plenário eletrônico”, segundo o qual a comunicação entre o relator e os demais ministros, para deliberar acerca da negativa de repercussão geral, será feita por via eletrônica (RISTF, arts. 323 e 324). Dentro dessa sistemática virtual, duas formas de solução tácita ou implícita foram adotadas, para propiciar que o simples silêncio dos membros do colegiado fosse havido como manifestação eficaz na solução do incidente (RISTF, art. 324, §§ 1º e 2º). 1363 (a) (b) 825. Cabe ao relator, de início, fazer a distinção entre recurso que enfrenta matéria efetivamente constitucional e aquele que, na verdade, discute direito infraconstitucional, a pretexto de arguir ofensa à norma constitucional. Feita distinção do tema central do extraordinário, passar-seá à ouvida do plenário por via eletrônica, devendo os ministros se manifestarem, perante o relator, no prazo de vinte dias, pela mesma via (RISTF, art. 324, caput). É nesse “plenário eletrônico” que a solução do incidente pode ocorrer por meio do simples silêncio dos ministros na fase em que lhes cabia pronunciar sobre a repercussão. Duas são as hipóteses regimentais: se a questão foi reconhecida como constitucional pelo relator, e este não receber, no prazo de vinte dias, o voto eletrônico de todos os ministros, de modo a atingir o quorum de dois terços do colegiado, necessário para rejeitar a repercussão geral, esta será tida como automaticamente reconhecida (RISTF, art. 324, § 1º); se a matéria do extraordinário for considerada como infraconstitucional, o fato de os ministros não se manifestarem no referido prazo de vinte dias será interpretado como não reconhecimento da repercussão geral (RISTF, art. 324, § 2º). Há, pois, possibilidade de o “plenário eletrônico”, pelo silêncio dos votantes, tanto reconhecer como negar a repercussão geral. O que é importante, nesse tema, é a qualificação da matéria sobre que versa o extraordinário. Procedimentos a serem adotados após o reconhecimento da repercussão geral I – Sobrestamento dos processos que versem sobre a mesma questão Uma vez que a repercussão geral caracteriza-se por ser questão relevante, que ultrapasse os interesses subjetivos do processo, o seu reconhecimento pelo STF pode impactar outras ações em andamento perante os diversos tribunais pátrios. Destarte, reconhecida a repercussão geral, o relator no STF determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional (NCPC, art. 1.035, § 5º).58 Embora a lei não estabeleça expressamente, o relator do STF deverá comu-nicar os tribunais pátrios, de preferência por meio eletrônico, acerca da matéria 1364 considerada de repercussão geral, para que os presidentes ou vice-presidentes possam cumprir a determinação de suspensão dos processos em curso perante sua jurisdição, em primeira ou segunda instâncias. II – Recurso contra decisão de sobrestamento Não prevê a lei recurso manejável contra a deliberação do Relator no STF que ordena a suspensão prevista no § 5º do art. 1.035. À falta de recurso próprio a ser endereçado ao STF, o caso será de adotar-se o agravo interno, previsto no art. 1.021 do NCPC. Destarte, se tiver ocorrido equívoco na inserção do processo na série dos re- cursos repetitivos, visto que a parte discute questão que, na verdade, não se iguala àquela em que se trava o debate sobre a repercussão geral, o interessado lançará mão do agravo interno para que o próprio relator ou o órgão colegiado reveja a decisão. A hipótese ora aventada, no entanto, será de rara aplicação prática no STF, uma vez que a ordem de suspensão é dada pelo relator de forma genérica, sem in- dividualizar um ou outro recurso pendente. Na maioria das vezes, a suspensão será concretizada por deliberação de órgão do tribunal local, contra quem, portanto, se deverá manejar o agravo interno. O recurso somente será cogitável perante o STF quando o relator do extraordinário de repercussão geral individualizar o processo a ser suspenso, nos termos do art. 1.035, § 5º. Aos demais casos, aplicar-se-á, a regra do art. 1.037, § 13, II, que prevê o agravo interno contra decisão do relator que indefere o pedido de exclusão do recurso extraordinário que se pretende de objeto distinto daquele cogitado no caso paradigma. III – Recurso contra decisão de sobrestamento de recurso intempestivo A fim de evitar o indevido atraso do trânsito em julgado de recursos extraordinários intempestivos, o novo Código permite que o interessado requeira, ao presidente ou vice-presidente do tribunal de origem, que exclua o processo da decisão de sobrestamento e inadmita o apelo extremo intempestivo (art. 1.035, § 6º).59 Antes, porém, da decisão, atendendo ao princípio do contraditório, deverá ser ouvido o recorrente, em cinco dias. Portanto, o presidente ou vice-presidente do tribunal a quo, quando provo-cado por requerimento do recorrido, poderá, adotar uma das seguintes soluções: (i) acolher o pedido, inadmitindo o recurso extraordinário extemporâneo; ou, (ii) indeferir o requerimento e, por conseguinte, manterá o sobrestamento do andamento do recurso até ulterior decisão do STF. Na segunda hipótese, a decisão de 1365 826. indeferimento desafiará agravo interno (art. 1.021),60 conforme previsão expressa do art. 1.035, § 7º.61 Na hipótese de inadmissão do extraordinário, até então sobrestado, o recurso cabível será ora agravo para o STF, ora agravo interno para o colegiado local, conforme o fundamento adotado pelo julgador monocrático (arts. 1.042 e 1.035, § 7º, com a redação da Lei nº 13.256/2016 (sobre o agravo, ver itens nos 851 a 856 a seguir). IV – Julgamento do recurso extraordinário cuja repercussão geral foi reconhecida Para impedir a eternização dos processos paralisados (art. 1.035, § 5º), o NCPC prevê o prazo máximo de um ano para que o STF julgue o recurso, cuja repercussão geral tiver sido reconhecida (art. 1.035, § 9º).62 É certo que referido prazo é impróprio, não trazendo consequências para o STF em caso de descumprimento. Mas, para facilitar o julgamento dentro do referido prazo, prevê a nova legislação que o apelo extremo, enquadrável nessa situação, terá preferência sobre os demais feitos em trâmite perante a Corte Suprema. Essa preferência apenas não existirá em face de processos que envolvam réu preso e os pedidos de habeas corpus (§ 9º, in fine). O art. 1.035, § 10, previa que se o julgamento do recurso extraordinário não ocorresse no prazo de um ano a contar do reconhecimento da repercussão geral, deveria cessar, em todo o território nacional, a suspensão dos processos que versavam sobre a questão, ficando restabelecido o seu curso normal. A Lei nº 13.256/2016, no entanto, revogou o dispositivo, de modo que agora não existe predeterminação legal da duração do sobrestamento ordenado pelo art. 1.035, § 5º. Função do recurso extraordinário O Supremo Tribunal Federal, diante dos pressupostos do recurso extraordinário,realiza, por meio desse remédio processual, a função de tutelar a autoridade e a integridade da lei magna federal.63 Tem, assim, o recurso extraordinário, uma finalidade “eminentemente política”. Mas, nada obstante, essa função especial não lhe retira o “caráter de instituto processual destinado à impugnação de decisões judiciárias, a fim de se obter a sua reforma”.64 Isso porque, conhecendo do recurso e dando-lhe provimento, a Suprema Corte, a um só tempo, terá tutelado a autoridade e unidade da lei federal (especificamente das normas constitucionais) bem como proferido nova decisão sobre o caso concreto.65 1366 827. Diante dessa dupla função exercida pelo Supremo Tribunal Federal, por meio do recurso extraordinário, a doutrina costuma qualificar esse remedium juris como “um instituto de direito processual constitucional” (Frederico Marques). Efeitos do recurso extraordinário A interposição e o recebimento do recurso extraordinário geram efeitos de natureza apenas devolutiva, limitados à “questão federal” controvertida. Não fica a Suprema Corte investida de cognição quanto à matéria de fato, nem quanto a outras questões de direito não abrangidas pela impugnação do recorrente e pelos limites fixados pela Constituição para o âmbito do recurso.66 Por não apresentar eficácia suspensiva, o recurso extraordinário não impede a execução do acórdão recorrido (NCPC, art. 995).67 Nesse caso, a execução será provisória. No regime do CPC de 1939, o STF editou a Súmula nº 228, que considerava definitiva a execução de sentença na pendência do recurso extraordinário. A motivação de tal entendimento ligava-se ao fato de que aquele velho Código nada dispunha a respeito dos efeitos do questionado recurso. Desde, porém, o Código de 1973 que se tornou certo que o recurso extraordinário, como a generalidade dos recursos, não tem efeito suspensivo e que a execução provisória se aplica às decisões impugnadas por meio de recurso apenas devolutivo. Essa situação normativa é mantida pelo NCPC (arts. 520 e 995). Daí o acerto dos ensinamentos de Luiz Antônio de Andrade68 e Barbosa Moreira69 de que, desde o CPC/1973, é provisória a execução de sentença na pendência do recurso extraordinário, não mais prevalecendo o enunciado da Súmula nº 228/STF. O juízo competente para a execução, contudo, nunca será o do recurso, mas sempre o da causa (NCPC, art. 516, I e II),70 a quem a parte deverá recorrer se lhe interessar promover, por conta e risco, a execução provisória, observado o procedimento constante do art. 522.71 I – Tutela de urgência no recurso extraordinário para obtenção do efeito suspensivo O recurso especial e o extraordinário não gozam de eficácia suspensiva, por isso permitem que a decisão recorrida possa ser de imediato posta em execução. Se do temor desse cumprimento provisório surge o perigo para a eficácia do julgamento final do apelo, configurado estará o primeiro requisito da tutela de urgência, o periculum in mora. Mas, para obter a medida cautelar de suspensão da decisão recorrida, cum- 1367 (a) (b) (c) prirá, ainda, à parte demonstrar o fumus boni iuris, que, na espécie, se revelará pela relevância dos fundamentos do recurso, ou seja, a possibilidade aparente de cassação ou reforma do acórdão impugnado. A previsão de cabimento da concessão cautelar de efeito suspensivo aos re- cursos extraordinário e especial, além de enquadrar-se na teoria geral das tutelas de urgência, encontra apoio específico no art. 1.029, § 5º, do NCPC. O Novo Código aboliu a ação cautelar, de modo que a parte interessada for- mulará, incidentemente no processo, por meio de petição avulsa, o requerimento de atribuição de efeito suspensivo aos recursos em tela, quando cabível. Matéria de muita discussão, ao tempo do Código de 1973, era a relacionada com a competência para processar e decidir o pedido de efeito suspensivo para os recursos extraordinário e especial. O STF chegou a sumular seu entendimento, estabelecendo que a competência em questão caberia ao presidente do Tribunal de origem, enquanto não pronunciado o juízo de admissibilidade do recurso (Súmula nº 635). Somente após tal juízo é que a competência cautelar se firmaria no STF (Súmula nº 634). O novo Código tratou do tema, de modo explícito e claro, nos termos do art. 1.029, § 5º, I, II e III (redação alterada pela Lei nº 13.256/2016), estatuindo o seguinte: O requerimento de concessão do efeito suspensivo a recurso extraor-dinário ou a recurso especial será processado no tribunal superior res-pectivo, “no período compreendido entre a publicação da decisão de admissão do recurso e sua distribuição”. Nesse caso, o relator designado para o exame da medida cautelar ficará prevento para o julgamento do recurso (inciso I). Se o recurso já tiver sido distribuído no tribunal superior, a competên-cia para a medida cautelar caberá ao respectivo relator (inciso II). No período compreendido entre a interposição do recurso e a publicação da decisão que o admitir, a competência caberá ao presidente ou vice- presidente do tribunal recorrido (inciso III). Essa competência, por força do mesmo dispositivo, prevalece, ainda, para o caso de recurso sobrestado, nos termos do art. 1.037 (recursos repetitivos). É bom registrar que o sobrestamento do recurso, para aguardo da resolução de caso representativo da controvérsia no STJ, já foi, no regime do Código anterior, reconhecido como não impedimento a que a parte requeira a medida cautelar para suspender os efeitos do acórdão recorrido, se o requisito do periculum in mora se 1368 828. afigure presente, assim como a relevância dos fundamentos do recurso.72 Também o STF já havia decidido que, na mesma circunstância, era possível a ação cautelar, atribuindo-a, porém, ao Tribunal de origem, “quando o apelo extremo estiver sobrestado em face do reconhecimento da existência de repercussão geral da matéria constitucional nele tratada”.73 No Tribunal Superior, a competência para conhecer do pedido de tutela de urgência é do relator, ao qual foi distribuído o recurso (art. 1.029, § 5º, II). Se ainda não houve a distribuição do recurso, será designado relator para a medida cautelar, que ficará prevento para julgá-lo (art. 1.029, § 5º, I, in fine, com a redação da Lei nº 13.256/2016). Ocorrida interposição simultânea dos recursos especial e extraordinário, caberá ao STJ o exame do pedido de efeito suspensivo, porque é para ele que os autos serão remetidos (art. 1.031). O STF só tomará conhecimento da causa depois de concluído o julgamento do STJ (art. 1.031, § 1º). Observe-se, por fim, que o efeito suspensivo pleiteado, em regra é apenas negativo, ou seja, destina-se tão somente a impedir a execução do acórdão recorrido; pode, porém, ser também ativo; vale dizer, à parte é dado requerer a tutela antecipada, para que o STF conceda, provisoriamente, o que se pediu, mas que foi indeferido pela decisão recorrida.74 Processamento do recurso extraordinário I – Interposição A parte vencida terá o prazo de quinze dias para interpor o recurso extraordinário (NCPC, art. 1.003, § 5º),75 perante o presidente ou vice-presidente do tribunal onde se pronunciou o acórdão recorrido (art. 1.029).76 Já à época do Código anterior, com a alteração do art. 542 feita pela Lei nº 10.352, fora eliminada a obrigatoriedade de ser a petição do extraordinário pro- tocolada na secretaria do tribunal de origem, abrindo-se oportunidade ao uso dos protocolos descentralizados,desde que o tribunal delegasse tais atribuições a ofícios de justiça de primeiro grau (CPC/1973, art. 547, parágrafo único). Após alguma divergência entre as Cortes Superiores, assentou-se que os protocolos integrados aplicavam-se a todos e quaisquer recursos, inclusive o extraordinário e o especial.77 O NCPC adotou a mesma orientação do anterior, ao estabelecer, no parágrafo único do art. 929, que “a critério do tribunal, os serviços de protocolo poderão ser descentralizados, mediante delegação a ofícios de justiça de primeiro grau”. 1369 II – Contraditório Recebida a petição do recurso, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de quinze dias (art. 1.030, caput).78 III – Juízo de admissibilidade À época do Código anterior, após a manifestação do recorrido o presidente ou vice-presidente do tribunal realizaria o juízo de admissibilidade, admitindo ou não o recurso (CPC/1973, art. 542, § 1º). Se fosse admitido, o processo era reme-tido ao STF, onde se processaria segundo o disposto em seu Regimento Interno. Se ocorresse inadmissão, caberia agravo nos próprios autos, no prazo de dez dias, para a Suprema Corte (CPC/1973, art. 544). O sistema legal era de duplo controle de admissibilidade do recurso extraordi- nário: um no Tribunal de origem e outro no Supremo Tribunal Federal, sendo que o primeiro não vinculava o Tribunal ad quem, ao qual era possível reapreciar toda a matéria de cabimento do recurso, fosse para confirmá-lo, fosse para reformá-lo. O STF só não teria como alterar o decisório local se este fosse de inadmissão do extraordinário, e a parte prejudicada deixasse de manejar o agravo do art. 544. Aí, ocorreria o trânsito em julgado do acórdão recorrido, sem que o STF tivesse assumido competência para conhecê-lo. O NCPC, em seu texto original, pretendeu uniformizar o sistema de um único regime de admissibilidade, a ser exercitado apenas pelo tribunal destinatário do recurso (ver, retro, o nº 738). Previa, nesse sentido, o primitivo parágrafo único do art. 1.030 que, apresentadas as contrarrazões pelo recorrido, a remessa do recurso extraordinário ou especial ao tribunal superior dar-se-ia “independentemente de juízo de admissibilidade”, no tribunal de origem. Antes, porém, que o Código novo entrasse em vigência, a Lei nº 13.256/2016 alterou o regime procedimental dos recursos em questão, para reimplantar a duplicidade de juízo de admissibilidade, dispondo, o novo texto do art. 1.030, V, que ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido compete “realizar o juízo de admissibilidade e, se positivo, remeter o feito ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça”. Continua, portanto, condicionada a subida dos recursos extremos aos tribunais superiores, ao conhecimento do apelo pelo presidente ou vice-presidente do tribunal no qual a decisão impugnada foi pronunciada. Trata-se, porém, de um juízo provisório, destinado a sofrer reexame pelo tribunal superior, a quem a lei reserva o poder de dar a última palavra sobre a matéria, sem ficar vinculado ao primitivo juízo 1370 (a) (b) (c) (a) (b) (c) de admissibilidade acontecido no tribunal a quo. IV – Casos em que não ocorrerá o juízo de admissibilidade no tribunal recorrido, com a subida do feito ao tribunal superior Prevê o art. 1.030, V, do NCPC, na redação da Lei nº 13.256/2016, que, para realizar-se juízo de admissibilidade do recurso extraordinário ou do recurso especial, na instância de origem, com remessa do feito ao tribunal superior competente, é necessário: que o recurso ainda não tenha sido submetido ao regime de repercussão geral ou de julgamento de recursos repetitivos (art. 1.030, V, “a”), pois, se o apelo tiver como tema questão já figurante em tal sistemática, o seu destino será o sobrestamento para aguardar a solução dos casos paradigma; ou que “o recurso tenha sido selecionado como representativo da controvérsia” (art. 1.030, V, “b”), o que, naturalmente, pressupõe tenha sido positivo o juízo de admissibilidade (art. 1.030, V); ou que, após a fixação do entendimento do STF (ou do STJ, se for o caso) em regime de repercussão geral ou de recurso repetitivo, o órgão julgador local prolator do acórdão em sentido diverso “tenha refutado o juízo de retratação” (art. 1.030, V, “c”). V – Juízo de admissibilidade negativo no tribunal recorrido Prevê o art. 1.030, em seu novo texto, algumas situações em que o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido deverá negar seguimento ao recurso extraordinário ou especial. Fala-se, na espécie, em “não admissibilidade” do recurso decretada na instância ordinária. Essa competência será exercida quando ocorrer uma das seguintes hipóteses: quando o recurso extraordinário versar sobre questão constitucional a que o STF já recusou o reconhecimento de repercussão geral (art. 1.030, I, “a”, primeira parte); quando o recurso extraordinário tenha sido interposto contra acórdão “que esteja em conformidade com entendimento do Supremo Tribunal Federal exarado no regime de repercussão geral” (art. 1.030, I, “a”, segunda parte); quando o recurso extraordinário (ou, também, o recurso especial) impugna 1371 (a) (b) (a) acórdão proferido em conformidade com entendimento do STF exarado no regime de recursos repetitivos. Igual regra aplica-se ao recurso especial, perante entendimento do STJ, também manifestado no mesmo regime recursal (art. 1.030, I, “b”) VI – Recursos manejáveis em face do juízo que inadmite o recurso extraordinário (ou o especial) Com base na sistemática que a Lei nº 13.256/2016 introduziu no NCPC, o juízo de admissibilidade dos recursos extraordinário e especial, sujeita-se ao seguinte regime: o juízo positivo (i. é, aquele com que o presidente ou o vice-presidente acolhe o recurso extremo) é irrecorrível, embora o tribunal superior continue com o poder de revê-lo; quando o juízo for negativo, ou seja, quando o recurso for inadmitido no tribunal de origem, a decisão do presidente ou do vice-presidente será sempre recorrível, mas nem sempre pela mesma via impugnativa, pois: (i) o recurso será o agravo interno, se o fundamento da inadmissão consistir em aplicação de entendimento firmado em regime de repercussão geral; ou em recursos repetitivos; caso em que a solução será dada pelo colegiado do tribunal local, sem possibilidade de o caso chegar à apreciação dos tribunais superiores (NCPC, art. 1.030, I); (ii) se a negativa de seguimento do recurso extraordinário ou do especial, se der por razão que não se relacione com teses oriundas de decisão proferidas em regime de repercussão geral, ou de recursos repetitivos, caberá o agravo endereçado diretamente ao tribunal superior destinatário do recurso inadmitido (NCPC, art. 1.042, caput). VII – Outros poderes do presidente ou vice-presidente do tribunal recorrido Fixado o entendimento do STF no regime de repercussão geral ou de recursos repetitivos, se o presidente ou vice-presidente do tribunal recorrido se deparar com recurso manifestado contra acórdão divergente da tese assentada pela Suprema Corte nos referidos regimes, caber-lhe á “encaminhar o processo ao órgão julgador para realização do juízo de retratação” (art. 1.030, II). Esse juízo de retratação faz parte da dinâmica 1372 (b) (c) 829. procedimental do julgamento dos recursos extraordinário e especial e é preconizado pelo art. 1.040, II. Uma vez deflagrado o processamento de recursos em caráter repetitivo, e não tendo ainda ocorridoa decisão do STF sobre a questão constitucional discutida, caberá ao presidente ou vice-presidente do tribunal de origem sobrestar o recurso extraordinário que volte a debater a mesma matéria (art. 1.030, III). Igual providência caberá em relação às questões infraconstitucionais disputadas, perante o STJ, em recursos especiais repetitivos. Compete, ainda, ao presidente ou vice-presidente referido, selecionar recurso representativo de controvérsia constitucional ou infraconstitucional, para remessa aos tribunais superiores, nos moldes do § 6º, do art. 1.036 (art. 1.030, IV). Tal diligência pressupõe requisição do relator, no tribunal superior, autorizada pelo art. 1.037, III, dos recursos repetitivos, para ampliar o espectro dos paradigmas. O preparo dos recursos para o STF e para o STJ Os recursos para o Supremo Tribunal Federal, inclusive o extraordinário, sempre se sujeitaram a preparo, que compreende o pagamento de custas e despesas de remessa e retorno. Em resolução, o STF fixa e revê periodicamente as tabelas de custas e despesas recursais, cujo recolhimento se faz antecipadamente, junto ao tribunal de onde se origina o recurso. O recurso especial não se sujeitava a custas, mas apenas às despesas de remessa e retorno. A partir, entretanto, da Lei nº 11.636, de 28.12.2007, regulamentada pela Resolução nº 1, do Superior Tribunal de Justiça, publicada no DJU de 18.01.2008, as custas também são devidas no recurso especial, assim como em outros recursos interpostos para aquele tribunal. Segundo a referida Resolução, a cobrança das custas entrou em vigor no dia 27 de março de 2008. O valor de tais custas consta de tabela baixada pela própria Lei nº 11.636, que prevê sua correção anual segundo a variação do IPCA do IBGE (Lei nº 11.636, art. 2º, parágrafo único). O STJ promove a atualização periódica por meio de Resolução, tal como se passa no STF. O formulário e a conta de recolhimento das despesas recursais constam de Resoluções do STF e do STJ, relativas às tabelas de custas e de porte de remessa e devolução dos autos.79 1373 830. 831. Tanto na esfera do STF como na do STJ, excluem-se da obrigatoriedade do preparo os recursos que, por expressa disposição de lei, sejam isentos desses gastos, ou de antecipação de despesas processuais. É o caso, v.g., dos feitos amparados pela assistência judiciária gratuita (NCPC, art. 82),80 bem como dos recursos em geral quando interpostos pela Fazenda Pública ou pelo Ministério Público (art. 91).81 O recurso extraordinário por via eletrônica O STF, de acordo com a autorização do art. 18 da Lei nº 11.419/2006, instituiu o e-STF (software) como instrumento de processamento eletrônico do recurso extraordinário, que assim pode ser resumido: (i) a petição física endereçada ao tribunal de origem será nele digitalizada e, em seguida, transmitida eletronicamente ao Supremo Tribunal Federal, por meio do e-STF (Resolução nº 427, de 20.04.2010, art. 23); (ii) o mesmo acontecerá com as peças que formarão o processo eletrônico para apreciação do recurso extraordinário pelo STF (Res. nº 427, art. 24);82 (iii) os autos físicos não mais subirão ao STF (Res. nº 427, art. 28); (iv) uma vez transitado em julgado o recurso extraordinário, o STF transmitirá à origem os autos virtuais, para fins de impressão e juntada aos autos físicos (parágrafo único do citado art. 28). Julgamento do recurso e julgamento da causa O último recurso autorizado pelo processo, para atingir o Tribunal maior da estrutura do Poder Judiciário, nem sempre exerce mesmo papel. Em alguns países, a corte suprema cumpre função que consiste apenas em anular o julgamento irregular proferido no tribunal inferior. Atribui-se a esse órgão superior a denominação de Tribunal de Cassação. O rejulgamento da causa não é feito por ele, de modo que, cassada a decisão recorrida, o processo é enviado a outro tribunal a quem se atribui a competência de julgar a questão anteriormente tratada no acórdão invalidado. No Brasil, o recurso extraordinário (e também o especial) destina-se tanto a invalidar julgamento impugnado como, se necessário, a rejulgar a causa. Vale dizer: entre nós, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça têm poder tanto de cassação como de revisão do julgamento da causa. É o que declara a Súmula nº 456 do STF: “O Supremo Tribunal Federal, co- nhecendo do recurso extraordinário, julgará a causa, aplicando o direito à espécie”. No mesmo sentido, dispõe o art. 257 do regimento interno do STJ, a pro-pósito do recurso especial: “No julgamento do recurso especial, verificar-seá, 1374 preliminarmente, se o recurso é cabível. Decidida a preliminar pela negativa, a Turma não conhecerá do recurso; se pela afirmativa, julgará a causa, aplicando o direito à espécie”. O NCPC positivou o entendimento sumular do STF e do regimento interno do STJ, ao dispor, no art. 1.034,83 que “admitido o recurso extraordinário ou o recurso especial o Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça julgará o processo, aplicando o direito”. No novo julgamento da causa, o STF e o STJ, naturalmente, terão de examinar o fato em que se achava apoiada a decisão cassada. Isto, porém, não quer dizer que possa reavaliar os fatos para formar nova e diversa convicção sobre a respectiva veracida-de.84 Os fatos que são levados em conta são exatamente aqueles fixados pelo tribunal de origem. O novo exame se limita a verificar qual foi a versão fática assentada no julgado originário para sobre ela fazer incidir a tese de direito considerada correta, em lugar da tese incorreta aplicada pelo tribunal inferior.85 É soberana a decisão local sobre a questão fática, de sorte que, de acordo com o STF, se apresenta inadmissível o reexame de provas e fatos em sede de recurso extraordinário.86 Julgar a causa, dentro do recurso extraordinário ou especial, portanto, tem sentido menor do que aquele referente ao ato do tribunal de origem. Este, sim, examina amplamente todas as questões de fato e de direito que a causa envolve. Os tribunais superiores não fazem, senão sobre a questão de direito, uma avaliação e um julgamento amplo. Fixada a tese de direito, esta será simplesmente aplicada sobre os fatos acertados no decisório originário, para que o rejulgamento da causa se realize.87 É importante, todavia, respeitar-se o direito à prova, o contraditório e a ampla defesa. Se para avançar sobre a solução de questões não apreciadas pelo tribunal a quo, o STF depende de provas ainda por colher, ou se o processo ainda não está maduro, por inexistência de debate adequado sobre as questões novas a enfrentar, não lhe compete julgá-las. A Corte Superior, depois de provido o extraordinário, haverá de remeter o feito à instância originária, atribuindo-lhe a incumbência de completar a instrução probatória ou o contraditório, bem como de julgar a causa novamente, segundo as exigências do devido processo legal. Somente em casos especiais os recursos extraordinários e especiais levam em conta fatos não avaliados pela instância anterior. É o que, por exemplo, se dá quando a causa compreende vários pedidos e a decisão cassada solucionou apenas aquele que 1375 832. tinha natureza prejudicial em face dos demais. Ocorrendo a cassação, o Tribunal Superior terá de julgar os demais pedidos, i.e., aqueles que não che-garam a ser decididos no acórdão originário, e cuja solução, na última instância, dependerá, naturalmente, de avaliação de suporte fáticopróprio, até então não enfrentado no processo.88 O mesmo se dá com as causas em que o pedido ou a defesa se apresenta apoiada em causa de pedir (fundamentação) múltipla.89 Tudo, porém, haverá de corresponder a uma causa madura, na sua totalidade, ou seja, as novas questões a enfrentar no julgamento do recurso extraordinário ou especial já deverão ter passado por suficiente contraditório e provas. Em tais excepcionalidades, o STF ou o STJ examinará a prova dos autos, mas não a reexaminará a ponto de ignorar as questões de fato já definitivamente julgadas pelo tribunal a quo. Se se apresenta admissível a sujeição dos recursos extraordinário e especial ao efeito devolutivo previsto nos §§ 1º e 2º do art. 1.013 do NCPC,90 o mesmo não se passa com o § 3º daquele dispositivo. É que, tendo o tribunal de origem julgado apenas questão processual própria de sentença terminativa, não teria o STF ou o STJ como enfrentar o mérito da causa. Não tendo havido nem mesmo começo de exame das questões de mérito na instância de origem, faltaria o pressuposto do prequestionamento, ou seja, não se estaria diante de causa decidida em única ou última instância (CF, arts. 102, II, e 105, III).91 Em outros termos: “Sob pena de supressão de instância e de desrespeito à necessidade de prequestionamento, este Superior Tribunal de Justiça não se encontra autorizado a avançar no exame da matéria de fundo que não foi debatida no acórdão recorrido, ainda que se trate de ‘causa madura’”.92 Julgamento incompleto do recurso extraordinário, no juízo de revisão O fato de o extraordinário não ter no direito constitucional brasileiro apenas a natureza de recurso de cassação (como ocorre geralmente na Europa), mas também de revisão, gera muita controvérsia, tanto na doutrina, como na jurisprudência, e na prática do Supremo Tribunal Federal (e também no Superior Tribunal de Justiça, quando se trata de recurso especial) é muito comum prevalecer apenas a função de cassação, ou seja: o recurso é provido para invalidar o decisório impugnado, voltando o processo ao tribunal de origem para que a causa seja por ele rejulgada. O certo, contudo, é que, em hipótese alguma, pode o recorrente, vitorioso no 1376 juízo de cassação, ficar privado do rejulgamento da causa (Súmula nº 456/STF; RISTJ, art. 257). O STF tem tomado, nos últimos tempos, posição firme a respeito, que se acha retratada, por exemplo, no RE 346.736/DF: “1. Em nosso sistema processual, o recurso extraordinário tem natureza revisional, e não de cassação, a significar que ‘o Supremo Tribunal Federal, conhecendo o recurso extraordinário, julgará a causa, aplicando o direito à espécie’ (Súmula 456). Conhecer, na linguagem da Súmula, significa não apenas superar positivamente os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, mas também afirmar a existência de violação, pelo acórdão recorrido, da norma constitucional invocada pelo recorrente. 2. Sendo assim, o julgamento do recurso do extraordinário comporta, a rigor, três etapas sucessivas, cada uma delas subordinada à superação positiva da que lhe antecede: (a) a do juízo de admissibilidade, semelhante à dos recursos ordinários; (b) a do juízo sobre a alegação de ofensa a direito constitucional (que na terminologia da Súmula 456/STF também compõe o juízo de conhecimento); e, finalmente, se for o caso, (c) a do julgamento da causa, ‘aplicando o direito à espécie’. 3. Esse ‘julgamento da causa’ consiste na apreciação de outros fundamentos que, invocados nas instâncias ordinárias, não compuseram o objeto do recurso extraordinário, mas que, ‘conhecido’ o recurso (vale dizer, acolhido o fundamento constitucional nele invocado pelo recorrente), passam a constituir matéria de apreciação inafastável, sob pena de não ficar completa a prestação jurisdicional. Nada impede que, em casos assim, o STF, em vez de ele próprio desde logo ‘julgar a causa, aplicando o direito à espécie’, opte por remeter esse julgamento ao juízo recorrido, como frequentemente o faz”.93 O NCPC acolheu esse entendimento do STF, no parágrafo único do art. 1.034,94 ao dispor que, “admitido o recurso extraordinário ou o recurso especial por um fundamento, devolve-se ao tribunal superior o conhecimento dos demais fundamentos para a solução do capítulo impugnado”. Assim, perante o dever de rejulgar a causa, após o provimento do recurso extraordinário, não pode o STF escusar-se de enfrentar nem mesmo questões não decididas pelo tribunal de origem, se este decidira apenas parte do objeto litigioso, por meio de acolhimento de matéria prejudicial a outras questões ligadas à res in 1377 833. iudicium deducta.95 “É que, tendo acolhido o fundamento constitucional invocado pelo recorrente (ou, no dizer da Súmula nº 456, tendo ‘conhecido’ o recurso), cum- pre ao STF o dever indeclinável de ‘julgar a causa, aplicando o direito à espécie’”, como consta do referido aresto. Aduz mais o voto do Min. Zavascki: “Alarga-se, portanto, em casos tais o âmbito horizontal de devo- lutividade do recurso extraordinário, para abranger todas as questões jurídicas submetidas à cognição do acórdão recorrido, mesmo as que, por desnecessário, não tenham sido por ele examinadas. Aplica-se, aqui, analogicamente, por inafastável imposição do sistema, o dis-posto no § 2º do art. 515 do CPC [NCPC, art. 1.013, § 2º]: ‘quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais’”.96 Segundo esse posicionamento jurisprudencial, nada impede que, em alguns casos, o STF, em vez de ele próprio “julgar a causa”, desde logo, opte por remeter esse julgamento ao juízo recorrido, o que, aliás, ocorre com frequência. “Todavia, o que não pode, sob pena de incorrer em grave insuficiência na prestação jurisdi- cional, é dar por definitivamente julgada a causa, sem efetuar, ou propiciar que o tribunal recorrido efetue, o exame de um fundamento legitimamente invocado e que pode conduzir a um juízo favorável à parte que o invocou”.97 Verificada essa deficiência no aresto do STF (ou do STJ), o caso é de aperfeiçoá--lo, mediante a acolhida de embargos de declaração, com efeitos infringentes, cujo resultado haverá de ser o suprimento da lacuna, seja por imediato julgamento da causa na própria instância extraordinária, seja por ordem de retorno do processo ao tribunal de origem a fim de que este examine a questão não enfrentada no acórdão recorrido.98 Poderes do relator Em todos os feitos do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, a lei reconhece ao relator o poder de decisão singular, enfrentando até mesmo as questões de mérito, em situações de manifesta improcedência do pedido ou do recurso, especialmente quando a pretensão contrariar Súmula jurisprudencial do respectivo Tribunal. À época do Código anterior, o art. 38 da Lei nº 8.038 dispunha expressamente que “o relator, no Supremo Tribunal Federal ou no Superior Tribunal de Justiça, 1378 (a) (b) (c) 834. decidirá o pedido ou o recurso que haja perdido seu objeto, bem como negará seguimento a pedido ou recurso manifestamente intempestivo, incabível ou improcedente, ou, ainda, que contrariar, nas questões predominantemente de direito, Súmula do respectivo Tribunal”. Contra essa decisão, a parte poderia agravar, no prazo de cinco dias, para o colegiado (art. 39 da referida Lei). Écerto que o art. 38 da Lei nº 8.038 foi revogado pelo inciso IV do art. 1.072 do NCPC. Essa circunstância, contudo, não afetou os poderes conferidos ao relator no STJ e no STF, uma vez que estão expressamente previstos no art. 932, III, IV e V, do NCPC, que trata, de maneira geral, das prerrogativas do relator. Assim, é dado ao relator (art. 932): não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida (inciso III); negar provimento a recurso que for contrário a (inciso IV): (i) súmula do STF, do STJ ou do próprio tribunal; (ii) acórdão proferido pelo STF ou pelo STJ em julgamento de recursos repetitivos; (iii) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; dar provimento ao próprio recurso, se a decisão recorrida for contrária a (inciso V): (i) súmula do STF, do STJ ou do próprio tribunal; (ii) acórdão proferido pelo STF ou pelo STJ em julgamento de recursos repetitivos; (iii) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência. Da decisão do relator caberá agravo interno para o colegiado, no prazo de quinze dias (art. 1.021).99 Recurso especial para o STJ I – Cabimento do recurso especial A função do recurso especial, que antes era desempenhada pelo recurso extraordinário, é a manutenção da autoridade e unidade da lei federal, tendo em vista que na Federação existem múltiplos organismos judiciários encarregados de aplicar o direito positivo elaborado pela União.100 Daí que não basta o inconformismo da parte sucumbente para forçar o reexame 1379 do julgamento de tribunal local pelo Superior Tribunal de Justiça, por meio do recurso especial. Dito remédio de impugnação processual só terá cabi-mento dentro de uma função política, qual seja, a de resolver uma questão federal controvertida. Por meio dele não se suscitam nem se resolvem questões de fato nem questões de direito local. Entretanto, é preciso fazer uma distinção entre a verificação da ocorrência do fato e o exame dos efeitos jurídicos do fato certo ou inconteste. Saber se ocor-reu ou não, ou como ocorreu certo fato, é matéria própria da análise da prova; é o que tecnicamente se denomina questão de fato, que não se inclui no âmbito do recurso especial. Quando, porém, a controvérsia gira, não em torno da ocorrência do fato, mas da atribuição dos efeitos jurídicos que lhe correspondem, a questão é de direito, e, portanto, pode ser debatida no especial.101 II – Elasticidade do conceito de questão de direito A limitação de apreciação apenas às questões de direito no âmbito do recurso especial somente pode ser vista como relativa, já que, na maioria dos casos, é quase impossível examinar a questão jurídica deduzida em juízo sem vinculá-la ao respectivo suporte fático. Daí considerar a jurisprudência do STJ como questão de direito aquela relacionada à valoração dos fatos incontroversos ou bem delineados no processo.102 Além disso, há de se ter em conta a utilização crescente pelo direito positivo contemporâneo de “conceitos juridicamente indeterminados”, “conceitos vagos” e “cláusulas gerais”. Conceitos, por exemplo, como de “boa-fé objetiva”, “função social do contrato”, “usos e costumes”, “crise econômica”, “intenção manifestamente protelatória”, “conduta desleal” e tantos outros presentes a toda hora nos textos normativos exigem do aplicador da lei enfocar diretamente a situação fática sobre que incidem, sob pena de não ter como definir e aplicar o próprio comando legal. As controvérsias surgem justamente no esforço exegético para subsumir ou não o mundo fático à compreensão do próprio alcance da regra de direito. A atividade intelectual, in casu, nunca ficará restrita à interpretação apenas ao texto da lei. São os fatos é que, na experiência jurisprudencial, conduzirão o Tribunal a considerar, por exemplo, abusiva uma cláusula contratual, ou excessiva uma verba honorária, ou, ainda, irrisória uma reparação de dano moral. Nestas e tantas outras hipóteses regidas por normas veiculadoras de cláusulas gerais ou fundadas em conceitos vagos, será impossível ao STJ avaliar a ofensa à lei federal sem a análise adequada dos fatos sobre os quais se apoiou o decisório 1380 (a) (b) (c) 835. recorrido. Aliás, o STJ tem se mostrado sensível à necessidade de observar tal orienta-ção em várias situações particulares, embora não tenha ainda logrado estabelecer um posicionamento mais amplo e generalizante em torno da matéria,103 como pensamos se deva fazer. III – Casuísmo constitucional Nos precisos termos do art. 105, III, da nova Constituição, somente caberá o recurso especial, quando o acórdão recorrido: contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhe vigência; julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal;104 der à lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal. O procedimento a observar na tramitação do recurso especial é, em regra, o mesmo previsto para o recurso extraordinário (v. retro os nos 828 e ss.). As diferenças surgem no tocante aos pressupostos particulares da repercussão geral, no caso do extraordinário (v., retro, os nºs 819, 820 e 821), e às peculiaridades das causas repetitivas, no âmbito do recurso especial (v. adiante os nos 845, 846 e 847). Quanto ao controle da tempestividade do recurso especial, cuja interposição é cabível no prazo de quinze dias (NCPC, art. 1.003, § 5º) veja-se o item nº 818, retro, onde se aborda, principalmente, o problema da prorrogação do termo final do referido prazo, quando provocado por feriado local ou suspensão de expediente forense no Tribunal de origem. Jurisprudência formada antes da Constituição de 1988 Por se tratar de mero desdobramento do antigo recurso extraordinário, deverá prevalecer, também para o recurso especial, a jurisprudência assentada pelo STF, pelo menos enquanto o STJ não adotar, eventualmente, outro posicionamento em face de algum ou outro tema específico. Eis alguns exemplos de orientação traçada para o recurso extraordinário e que tem sido adotada no recurso especial: (a) decisão que deu razoável interpretação à lei, ainda que não seja a melhor, não autoriza recurso extraordinário por negativa de vigência de lei federal (STF, Súmula nº 400); (b) julgados do mesmo tribunal não servem para fundamentar recurso 1381 836. extraordinário por divergência jurisprudencial (STF, Súmula nº 369); (c) é inadmissível recurso extraordinário quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia (STF, Súmula nº 284); (d) é inadmissível recurso extraordinário quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federal suscitada (STF, Súmula nº 282), salvo se houver impossibilidade do prequestionamento, por ter a violação à lei federal ocorrido no próprio julgamento em que se proferiu o acórdão recorrido (exemplo: julgamento ultra ou extra petita, julgamento nulo etc.) (STF, acs. in RT 620/216, 626/239 e 614/232);105 (e) não se conhece do recurso extraordinário interposto sem especificação do permissivo constitucional;106 (f) interposto o recurso extraordinário por mais de um dos fundamentos previstos na Constituição, a admissão apenas por um deles não prejudica o seu conhecimento por qualquer dos outros (STF, Súmula nº 292). Também quando o recurso envolver váriasquestões autônomas e for admitido, na instância de origem em relação apenas a parte delas, o STF não ficará impedido de apreciar todas, independentemente de interposição de agravo de instrumento (STF, Súmula nº 528); (g) simples interpretação de contrato não dá lugar a recurso extraordinário (STF, Súmula nº 454); (h) é inadmissível o recurso extraordinário, quando couber, na Justiça de origem, recurso ordinário da decisão impugnada (STF, Súmula nº 281); (i) para simples reexame da prova não cabe recurso extraordinário (STF, Súmula nº 279). Mas admite-se sua interposição para corrigir inexata valoração jurídica da prova disponível no processo.107 Jurisprudência do STJ formada após a Constituição de 1988 Após longo tempo de funcionamento do STJ, a experiência nos revela que algumas exigências traçadas com muito rigor pela antiga jurisprudência do STF foram, de certa forma, abrandadas pelo novo Tribunal. Assim, por exemplo, o prequestionamento não foi dispensado, mas teve sua configuração admitida em termos muito mais flexíveis. Eis a posição do STJ a respeito do tema: (a) “É o prequestionamento pressuposto de cabimento do recurso. À sua falta, torna-se inadmissível o recurso especial”.108 Esse entendimento já se consolidou no Superior Tribunal de Justiça, encontrando apoio em jurisprudência sumulada.109 1382 (b) “Em tema de prequestionamento, o que deve ser exigido é apenas que a questão haja sido posta na instância ordinária. Se isto ocorreu, tem-se a figura do prequestionamento implícito, que é o quanto basta”.110 (c) “Para efeito de prequestionamento, não basta que a questão federal seja suscitada pela parte, sendo necessário o seu debate pelo tribunal de origem”.111 (d) “Incompleto o julgamento, conquanto interpostos os embargos declarató- rios, persistente a omissão, o conhecimento do recurso especial exige a arguição de contrariedade ou negativa de vigência ao art. 535, I e II, CPC [NCPC, art. 1.022, I e II], a fim de que, se procedente, a instância ordinária ultime o exame pedido”.112 In casu, o provimento do especial provoca a nulidade do aresto impugnado, “para que outro acórdão seja proferido com o esclarecimento das omissões”.113 Não pode o STJ enfrentar a questão omitida na instância de origem, por ausência do indispensável prequestionamento.114 Essa orientação, contudo, não irá mais prevalecer, uma vez que o art. 1.025, do NCPC, determina que “consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de pré- questionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere existentes erro, omissão, contradição ou obscuridade”. (e) Quando não se trata de omissão, mas de vício ou defeito intrínseco do próprio acórdão recorrido, a jurisprudência do STJ oscila: às vezes dispensa o prequestionamento,115 outras vezes exige o prévio manejo dos embargos decla- ratórios.116 A meu ver, a melhor corrente é aquela que, na espécie, dispensa os embargos de declaração, por inúteis e desnecessários.117 Mas, se se cumprir a exi- gência de tais embargos, não será razoável que, à vista da recusa de conhecê-los pelo Tribunal a quo, venha o STJ a anular o julgamento, tal como faz na hipótese de questão omitida. Mais razoável é a solução que tem sido adotada pelo STF, qual seja, tem-se como satisfeito o prequestionamento, com ou sem o pronunciamento do Tribunal de origem quanto ao defeito intrínseco de seu acórdão, porque a parte fez o que lhe competia para configuração do requisito do prequestionamento e não pode ser punida pela desídia que não a sua (cf. item nº 818 e suas notas). Essa é a orientação do NCPC, art. 1.025. (f) Discute-se sobre ser, ou não, o prequestionamento condição para que o Superior Tribunal de Justiça examine questão de ordem pública não enfrentada pelo acórdão impugnado por meio de recurso especial, havendo correntes em ambos os sentidos.118 O entendimento que se coloca numa posição intermediária parece ser bem razoável: o STJ poderia apreciar, de ofício, questão de ordem pública como as 1383 condições da ação, desde que tenha sido conhecido o especial, caso em que lhe cabe aplicar o direito à espécie. O tema incluir-se-ia no efeito devolutivo em profundidade, que abrange os pressupostos do julgamento a ser reexaminado.119 Esse, a certa altura, aparentava ser o pensamento predominante no STJ. Advertia-- se, no entanto, sobre a necessidade de entendê-lo cum grano salis, para que fosse mantida a fidelidade ao sistema recursal traçado pela Constituição, e se evitasse que o recurso especial se tornasse palco de uma terceira e ampla instância, o que desfiguraria, por completo, sua função institucional.120No entanto, convocada a pacificar a controvérsia interna sobre a matéria, a Corte Especial do STJ, em em- bargos de divergência, firmou a tese de que, mesmo para a apreciação das questões de ordem pública em sede de recurso especial, “é necessário o cumprimento do requisito do prequestionamento”.121 Ou seja, o STJ passou a adotar a mesma posição que o STF segue, em matéria de recurso extraordinário. (g) Ainda sobre o mesmo tema, entende-se que o prequestionamento deve ser pesquisado no acórdão recorrido, e não em voto individual discordante, ou seja, “a questão federal somente ventilada no voto vencido não atende ao requi-sito do prequestionamento” (STJ, Súmula nº 320). Esse entendimento sumulado, todavia, foi repelido pelo NCPC, cujo art. 941, § 3º, dispõe expressamente que “o voto vencido será necessariamente declarado e considerado parte integrante do acórdão para todos os fins legais, inclusive de prequestionamento”. Não vigora mais, portanto, o enunciado da Súmula nº 320 do STJ. Merece, outrossim, registrar a tomada de posição do STJ a respeito de algumas questões referentes ao novo recurso especial, como, v.g.: (a) “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”122 (Súmula nº 7 do STJ). “Somente o erro de direito quanto ao valor da prova, in abstrato, dá azo ao conhecimento do recurso especial”.123 Dessa maneira, não se considera, para fins de recurso especial, como ma-téria de fato ou de reexame de prova, mas como questão de direito, a arguição de recusa de efeito a uma perícia realizada com rigorosa observância dos pro-cedimentos legais.124 E, da mesma forma, se, dentro do quadro probatório dos autos, o fato é certo, e o que se questiona, no especial, é a não aplicação a ele do dispositivo legal pertinente, o que houve foi, realmente, negativa de vigência do referido preceito.125 Por outro lado, o STJ tem feito uma distinção entre juízo de admissibilidade e juízo de mérito, no processamento do recurso especial. Para decidir sobre o ca- bimento ou não do especial, o juízo deve restringir-se às questões de direito; mas 1384 “superado o juízo de admissibilidade, o recurso especial comporta efeito devolutivo amplo, porquanto cumpre ao Tribunal julgar a causa, aplicando o direito à espécie (art. 257 do RISTJ; Súmula nº 456 do STF)”.126 Vale dizer: ao decidir o mérito do especial, o STJ realiza um juízo de revisão, não tendo como evitar o exame dos fatos sobre os quais haverá de aplicar as regras de direito material pertinentes.127 (b) “Inexiste espaço, no âmbito do recurso especial, para apreciação de acór- dão, no ponto em que interpretou norma estadual”.128 (c) “Inadmite-se o recurso especial, quando o aresto recorridoassenta em mais de um fundamento suficiente, autônomo, e o mesmo não abrange todos eles”.129 Por igual motivo, “é inadmissível recurso especial, quando o acórdão recorrido assenta em fundamentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só, para mantê-lo, e a parte vencida não manifesta recurso extraordinário”.130 (d) “A simples interpretação de cláusula contratual não enseja recurso especial” (Súmula nº 5, do STJ). (e) O acórdão que dá razoável interpretação à lei federal (Súmula nº 400 do STF) não autoriza a interposição de recurso especial.131 Registra-se, contudo, uma tendência no STJ a afastar a incidência da Súmula nº 400 do STF, que já chegou a ser considerada como “incompatível com a teleologia do sistema recursal introduzido pela Constituição de 1988”.132 (f) “O conhecimento do recurso especial, tendo como causa dissídio de jurisprudência, requer demonstração analítica para comprovar a identidade do suporte fático”.133 (g) “A divergência entre julgados do mesmo Tribunal não enseja recurso especial” (Súmula nº 13 do STJ). (h) Ocorre inépcia do recurso especial, “quando apontadas como divergentes – alínea ‘c’ – decisões do primeiro grau”.134 (i) Admite-se o recurso especial por ofensa à lei federal nos casos de arbitramento de reparação de dano moral, sob o argumento de que esse tipo de indenização “não pode escapar ao controle do Superior Tribunal de Justiça”.135 (j) “Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos juizados especiais” (Súmula nº 203 do STJ). A razão desse enunciado prende--se à regra constitucional que somente autoriza o recurso especial contra causas decididas por tribunais de segunda instância (CF, art. 105, III). Como as Turmas Recursais dos Juizados Especiais dos Estados não são Tribunais, suas decisões ficam fora do âmbito de cabimento do recurso especial. O STF, no entanto, 1385 836-A. decidiu que não pode persistir divergência dos Juizados Especiais com a jurisprudência assentada pelo STJ, tendo em conta sua função constitucional de intérprete máximo da lei federal ordinária. Por isso, verificada a contradição de teses oriundas das Turmas Recursais com o posicionamento do STJ, o impasse haverá de ser superado por meio da reclamação constitucional prevista no art. 105, I, f, da CF.136 (k) “É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação” (Súmula nº 418 do STJ). Essa orientação, contudo, não poderá prevalecer com a vigência do NCPC, em razão do disposto no art. 1.024, § 5º, que dispõe ser desnecessária a ratificação se os embargos de declaração forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior (ver item nº 810). Quanto ao procedimento do recurso especial, o Código o submete à mesma tramitação do recurso extraordinário, seja na instância de origem, seja na de destino (arts. 1.029 e 1.030).137 Aplica-se, destarte, ao recurso especial tudo o que se expôs nos itens nos 828 e 829, retro. A técnica e o objeto do julgamento do recurso especial, que conjugam possibilidade de cassação do acórdão impugnado e rejulgamento da causa, observam a mesma sistemática já exposta em relação ao recurso extraordinário (v., retro, o nº 831). Juízo de cassação e juízo de reexame, no âmbito do recurso especial. Controle de constitucionalidade Como já visto no item 831, o STJ, ao julgar o recurso especial, pelo mérito, não se restringe ao juízo de cassação, pois pode ir até o rejulgamento da causa (juízo de reexame). Devendo, após admitido o recurso especial, ser julgado o processo, “aplicando o direito” (NCPC, art. 1.034), não há como impedir o STJ de analisar os aspectos da constitucionalidade da norma que se pretende aplicar à solução do litígio. Ao julgar a causa, “aplicando o direito”, é claro que qualquer tribunal terá, necessariamente, de verificar a validade da norma que fundamenta a pretensão do recorrente. No Estado de Direito, submetido à supremacia da Constituição, o controle difuso da constitucionalidade é dever que toca a todo juiz. Não é possível, pois, que o STJ, como Corte Superior que é, tenha menos poder que um juiz de primeiro grau. 1386 Não há, no reconhecimento de tal poder ao STJ, invasão alguma à competência do STF, mas apenas afirmação de exercício comum de controle constitucional difuso confiado, pela própria Carta Magna, a todo e qualquer juiz ou tribunal. É que o STJ para cumprir o art. 1.034 do NCPC e aplicar o direito infraconstitucional ao julgamento do processo, como todos os órgãos jurisdicionais, realiza uma atividade de concretização da norma ordinária, na qual “estará envolvida, de forma explícita ou não, uma operação mental de controle da constitucionalidade”, na lição de Luís Roberto Barroso. Explica o constitucionalista: “A razão é simples de demonstrar. Quando uma pretensão jurídica funda-se em uma norma que não integra a Constituição – uma lei ordinária –, o intérprete, antes de aplicá-la, deverá certificar-se de que ela é constitucional”.138 É certo que o recurso especial, endereçado ao STJ, está previsto constitucio- nalmente para combater as ofensas à legislação infraconstitucional, assim como o recurso extraordinário tem por função garantir a autoridade da Constituição. Mas como defender o direito comum sem aferir sua validade perante a ordem suprema da Constituição? De fato, não se pode interpor um recurso especial tendo como objeto apenas a inconstitucionalidade da lei aplicada no julgamento do tribunal a quo. Recurso de tal natureza não passaria pelo filtro do juízo de admissibilidade. No entanto, se o especial foi conhecido por reconhecimento de ofensa manifesta à lei infraconstitucional, a questão de sua validade diante da Constituição terá de ser, necessariamente, avaliada pelo STJ, antes de proceder à respectiva aplicação no julgamento do processo, preconizado pelo art. 1.034 do NCPC. Em conclusão: não se pode, sem ferir a estrutura constitucional do Poder Judiciário, suprimir do STJ, no julgamento de mérito do recurso especial que passou pelo juízo de admissibilidade, nos termos do art. 1.034 do CPC/2015, o poder de realizar o necessário “contraste do direito infraconstitucional à Constituição da República, base e fundamento das demais leis presentes no nosso ordenamento”,139 porque, “num ordenamento jurídico que se pauta pela supremacia da Constitui-ção, a averiguação da constitucionalidade da lei infraconstitucional é decorrência do desempenho normal da função judicial, que comporta na interpretação e na aplicação do Direito.140 E não há de ser diferente no julgamento do recurso especial pelo STJ. 1387 837. Recurso especial fundado em dissídio jurisprudencial Na hipótese de recurso especial fundado em dissídio jurisprudencial (CF, art. 105, III, “c”), impunha o parágrafo único do art. 541 do CPC/1973 ao recorrente a necessidade de provar a divergência, instruindo sua petição com certidão ou cópia autenticada, ou ainda utilizando citação de repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado, em que tiver sido publicada a decisão divergente, tudo seguido de menção às circunstâncias “que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados”. De acordo com o art. 255, § 1º, do Regimento Interno do STJ, alterado em 12.08.2002, a autenticação das cópias dos acórdãos divergentes passou a ser admitida mediante “declaração de autenticidade dopróprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal”. Adotou-se, portanto, o mesmo critério que a Lei nº 11.382, de 06.12.2006, recomenda para a autenticação de quaisquer cópias reprográficas de peças do processo (NCPC, art. 425, IV),141 e que a Lei nº 12.322, de 09.09.2010, determina para as peças utilizáveis no procedimento da execução provisória (NCPC, art. 522, parágrafo único).142 Uma outra importante inovação do texto do parágrafo único do art. 541 do CPC/1973 foi feita pela Lei nº 11.341, de 07.08.2006. Consagrando orientação que já vinha sendo seguida pelo Superior Tribunal de Justiça (cf. v. I, item nº 338), o Código de 1973, passou a permitir que a divergência jurisprudencial pudesse ser comprovada com utilização de mídia eletrônica. Recorrendo ao site do STJ ou de outro Tribunal, na Internet, a parte poderia obter cópia, considerada oficial, para instruir o recurso especial, em comprovação da divergência necessária quando interposto com apoio na letra “c” do permissivo constitucional. O posicionamento foi mantido pelo NCPC, no § 1º do art. 1.029. Assim, o recorrente hoje pode, para tanto, utilizar: (i) certidão do acórdão-- paradigma passada pela secretaria judicial; (ii) cópia autenticada pelo advogado; (iii) citação de texto publicado em repositório de jurisprudência, oficial ou credenciado; (iv) cópia obtida na rede mundial de computadores, em fonte do próprio tribunal ou credenciada para a divulgação de seus acórdãos.143 O NCPC, na redação original do § 2º de seu art. 1.029, dispunha que o recurso especial, quando fundado em dissídio jurisprudencial, não poderia ser inadmitido mediante “fundamento genérico” de serem diferentes às circunstâncias fáticas nas duas decisões cotejadas. O desconhecimento do recurso, in casu, teria de ser feito mediante demonstração da necessária “existência da distinção”. Tal dispositivo foi revogado pelo art. 3º, II, da Lei nº 13.256/2016. O expediente legislativo, no 1388 838. (a) (b) (c) entanto, foi inútil, visto que subsiste a regra geral, aplicável a toda e qualquer decisão, que considera não fundamentada aquela que se limita genericamente a indicar, reproduzir ou parafrasear ato normativo, “sem explicar sua relação com a questão decidida” (NCPC, art. 489, § 1º, I). Logo, continua contaminada de nulidade por falta de fundamentação (CF, art. 93, IX), a decisão que rejeita o recurso especial, em caso de dissídio jurisprudencial, sem demonstrar como são diferentes os suportes fáticos das decisões confrontadas. Nem se diga que se está imputando tarefa impossível ou difícil ao julgador. Para declarar que inexiste identidade quadro fático, bastará que, em poucas linhas, se aponte quais foram os fatos em que se apoiou o acórdão paradigma (cuja cópia obrigatoriamente constará dos autos), e quais os constantes da motivação do decisório recorrido. Trata-se de exigência singela, mas que assume alta significação para respeitar-se o contraditório efetivo e facilitar à parte o exercício do direito de impugnar, adequadamente, o decisório que lhe foi adverso, por via do recurso cabível. Aliás, o dever imposto ao julgador é simétrico ao que o art. 1.029, § 1º atribui ao recorrente, de “mencionar as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados”. Se a parte deve demonstrar analiticamente a semelhança, o juiz que a recusa também há de fazê-lo da mesma maneira. Obtenção de efeito suspensivo excepcional para o recurso especial O recurso especial, assim como o extraordinário, tem efeito apenas devolutivo (NCPC, art. 995). Contudo, a ele também é dado conferir efeito suspensivo, nos termos do art. 1.029, § 5º, sempre que houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e restar demonstrada a probabilidade de provimento do apelo. Caberá ao recorrente requerer a concessão de efeito suspensivo: ao STJ, no período compreendido entre a publicação da decisão de admissão do recurso e sua distribuição. Nesse caso, o relator designado para decidir o requerimento ficará prevento para julgar o apelo; ao relator, se já distribuído o recurso; ou, ao presidente ou vice-presidente do tribunal recorrido, no período compreendido entre a interposição do recurso e a publicação da decisão de admissão do recurso. Igual competência prevalece, também, para os casos de recursos repetitivos sobrestados (art. 1.029, § 5º, com a redação da Lei 1389 839. 840. nº 13.256/2016)144 (sobre o tema, ver item nº 827 retro). Concomitância de recurso extraordinário e recurso especial Um só acórdão local pode incorrer tanto nas hipóteses do recurso extraordinário como nas do recurso especial. Quando isto se der, o prazo de quinze dias será comum para a interposição de ambos os recursos, mas a parte terá de elaborar duas petições distintas (NCPC, art. 1.029, caput, in fine).145 O recorrido também produzirá contrarrazões separadas e o presidente ou vice-presidente, uma vez admitidos os recursos, enviará os autos ao Superior Tribunal de Justiça (art. 1.031, caput). Na sistemática do Código, apresentadas ou não as contrarrazões aos dois recursos, os autos subirão em primeiro lugar ao STJ, para julgamento do especial. Depois de decidido este, é que haverá a remessa para o STF, para apreciação do extraordinário, salvo se, com a solução do primeiro, restar prejudicado o segundo (art. 1.031, § 1º). O relator do STJ pode entender que a matéria do recurso extraordinário é prejudicial ao recurso especial. Permite-se, em tal conjuntura, o sobrestamento do recurso a cargo do STJ, com a remessa dos autos ao STF, invertendo-se, então, a ordem de apreciação dos recursos (art. 1.031, § 2º).146 O Supremo Tribunal, todavia, não fica submetido forçosamente ao que se deliberou no STJ, pois a lei reconhece ao relator do STF o poder de reexame da questionada prejudicialidade e, se concluir pela sua inexistência, devolverá os autos, por meio de decisão irrecorrível, a fim de que o recurso especial seja julgado normalmente em primeiro lugar (art. 1.031, § 3º). Entre o que decide o relator do recurso especial e o que pronuncia o relator do extraordinário, como se vê, a última palavra é dada por este. Não há conflito, nem é preciso ouvir-se o Tribunal. O que decidir o relator do recurso extraordinário, em decisão singular, prevalecerá a respeito da ordem de julgamento dos dois recursos concorrentes. Fungibilidade entre o recurso especial e o recurso extraordinário O novo Código consagrou, nos arts. 1.032 e 1.033,147 a fungibilidade no tocante à interposição de recurso especial e extraordinário. O objetivo do legislador foi evitar a jurisprudência defensiva, em que um tribunal afirmava ser a competência para julgar o recurso do outro e, em razão disso, nenhum dos dois julgava.148 Com efeito, muitas vezes, a questão discutida no acórdão recorrido pode ser 1390 840-A. analisada sob a ótica constitucional e infraconstitucional. Ocorre que nem sempre é fácil verificar claramente a distinção entre uma e outra. É o que se verifica quando o recorrente alega não ter sido respeitado o contraditório nas instâncias ordinárias. A matéria, embora constitucional (art. 5º, LV), também encontra disposição na legislação infraconstitucional (NCPC, arts. 7º e 9º). Assim, o recorrente interpõe o recurso especial e o extraordinário para que as Cortes Superiores analisem a questão. Entretanto, nenhum dos tribunais admite o respectivo recurso, por entenderque a competência para analisar o tema é da outra corte. Para resolver situações como essa é que o NCPC permite que o relator, no STJ, entendendo que o recurso especial versa sobre questão constitucional, conceda prazo de quinze dias para que o recorrente demonstre a existência de repercussão geral (requisito para o recurso extraordinário) e se manifeste sobre a questão constitucional (art. 1.032).149 Cumprida essa exigência, o relator remeterá o recurso ao STF que, em juízo de admissibilidade, poderá devolvê-lo ao STJ (parágrafo único). Por outro lado, determina que o relator, no STF, considerando como reflexa a ofensa à Constituição Federal afirmada no recurso extraordinário, o remeta ao STJ para julgamento como recurso especial (art. 1.033).150 Com isso, restou claro para o NCPC, no campo dos recursos excepcionais, ser irrelevante o equívoco da parte em usar o especial em lugar do extraordinário e vice e versa, pois sempre será possível a conversão do inadequado no adequado. Cabimento de recurso extraordinário contra decisão do STJ em recurso especial Ocorrendo no acórdão do tribunal de segundo grau ofensa tanto à Constituição como à lei infraconstitucional, o manejo dos recursos extraordinário e especial deve ser simultâneo (NCPC, art. 1.031). Não se admite que a parte vencida interponha apenas o especial e deixe para questionar a matéria constitucional depois do julgamento do STJ, na eventualidade do insucesso do recurso que lhe foi endereçado. Sendo o recurso extraordinário cabível desde a época do decisório do tribunal de origem, ocorre preclusão do direito de manejá-lo – como é de tranquilo entendimento jurisprudencial – se a parte não o interpuser no momento adequado. E mesmo que tenham sido oportunamente manifestados os dois apelos extremos, mas o especial tenha sido inadmitido na origem, sem que o recorrente tivesse interposto 1391 841. o necessário agravo, o STF não conhecerá do extraordinário, em virtude da preclusão do apelo dirigido ao STJ, visto como questão prejudicial.151 É que se o acórdão tem fundamentos, tanto suficientes no direito infraconstitucional como no direito constitucional, não cabe ao STF apreciar a questão constitucional. O decisório recorrido, com efeito, poderá substituir apenas pela base infraconstitucional, cujo exame haveria de ter sido feito pelo STJ, e não mais será possível realizá-lo porque o especial não foi interposto ou não foi conhecido, e o STF não tem competência para fazê-lo. No entanto, há caso em que se torna viável o extraordinário para atacar diretamente o acórdão do STJ pronunciado em julgamento de recurso especial. Isto ocorrerá quando a ofensa à norma constitucional for cometida não pelo acórdão do tribunal de segundo grau, mas pelo próprio STJ. In casu, não se poderia exigir da parte que manejasse o extraordinário simultaneamente com o especial, pois nenhum ultraje à ordem constitucional teria sido praticado pelo tribunal de origem. Explica-se, em tal conjuntura, o cabimento do extraordinário porque o STJ, ao decidir o especial, teria enveredado pelo terreno constitucional, área de exclusiva competência do STF. A hipótese de cabimento do extraordinário posterior ao julgamento do especial, portanto, se verifica quando o STJ aplica originariamente norma constitucional, a pretexto de julgar o especial, transbordando do tema infraconstitucional, e o faz de maneira ofensiva ao preceito da Lei Maior.152 Outro caso em que o acórdão do STJ desafia recurso extraordinário para o STF é aquele em que o recurso especial não é conhecido, com apoio em “premissas que conflitem, diretamente com o que dispõe o art. 105, III, da Carta Política”.153 Preferência do julgamento do mérito dos recursos especial e extraordinário O novo Código adotou posição menos formalista do que a legislação anterior preferindo, sempre que possível, o julgamento da causa pelo mérito (arts. 4º e 6º). Para tanto, admite a superação de defeitos meramente formais, sempre que isto não causar prejuízo às partes e viabilizar o julgamento definitivo da lide. Nessa esteira, o art. 1.029, § 3º,154 autoriza que o STF e o STJ desconsiderem vício formal de recurso tempestivo ou determine sua correção, desde que não o repute grave. Essa inovação do Código visa desestimular a jurisprudência defensiva que se instaurou sob a égide da legislação anterior, numa tentativa de diminuir os recursos interpostos para as Cortes Superiores. 1392 842. É o chamado efeito consuntivo das formas e das formalidades do processo. Deste modo, “a imperfeição é elipticamente desconsiderada, pela eficácia consuntiva, conhecendo-se o recurso e julgando seu mérito, sem qualquer consideração ou ligação entre o beneficiado pelo descompasso e o resultado do julgamento”.155 Recurso especial e recurso extraordinário adesivo Conforme salientamos no § 78, sobre as disposições gerais relativas a recursos civis, quando houver sucumbência recíproca, as duas partes podem impugnar a decisão. Algumas vezes, contudo, embora não completamente satisfeita, a parte poderia conformar-se com o julgamento da ação se tivesse a certeza de que a outra também o aceitaria. Uma vez que não existe garantia nesse sentido, o NCPC, a exemplo do anterior, previu a figura do recurso adesivo (art. 997).156 Com esse remédio processual, o recorrido pode fazer sua adesão ao recurso da parte contrária, depois de vencido o prazo adequado para o recurso próprio. Adesão, na espécie, significa que o novo recorrente se vale da existência do recurso do adversário para legitimar a interposição do seu, fora do tempo legal. O recurso adesivo é admissível na apelação, no recurso extraordinário e no recurso especial (art. 997, II). Em qualquer uma dessas modalidades recursais, os requisitos do apelo adesivo são os mesmos: (i) deve haver sucumbência recíproca; (ii) fica subordinado ao recurso principal; e, (iii) aplicam-se a ele as mesmas regras do recurso independente quanto às condições de admissibilidade e de julgamento no tribunal (sobre o tema, ver item nº 756 retro). No tocante ao recurso especial e extraordinário adesivo, é importante ressaltar o que a doutrina denomina de recurso adesivo condicionado cruzado, vislumbrado para a hipótese de a decisão admitir a interposição de mais de um recurso. Nessa situação, a parte pode aderir a espécie recursal diversa, cujo apelo será analisado apenas se o recurso principal for acolhido. Pense-se no caso de o pedido se fundar em questão constitucional e federal. A decisão, embora favorável ao autor, baseou-- se no fundamento federal, repelindo o constitucional. Não terá ele, portanto, interesse em interpor recurso extraordinário imediatamente. Entretanto, caso o recurso especial aviado pela parte contrária seja provido, o autor terá interesse para discutir a questão constitucional, que poderá lhe favorecer. Nessa hipótese, a doutrina admite que o autor interponha recurso extraordinário adesivo a recurso especial, que será “condicionado, isto é, interposto ad cautelam, para ser julgado unicamente no caso de convencer-se o órgão ad quem da procedência do pedido principal”.157 1393 Fluxograma nº 34 – Recurso extraordinário (arts. 1.029 a 1.035) Nota: Há possibilidade de concessão de efeito suspensivo ao recurso extraordinário: a) pelo presidente ou vice-presidente do tribunal local, antes do juízo de admissibilidade (art. 1394 1.029, § 5º, III). b) por relator sorteado no STF antes da subida dos autos (art. 1.029, § 5º, I). c) por relator do REapós a subida dos autos (art. 1.029, § 5º, II). Fluxograma nº 35 – Recurso especial (arts. 1.029 a 1.035) Nota: Há possibilidade de concessão de efeito suspensivo ao recurso especial: 1395 13 14 15 16 17 a) pelo presidente ou vice-presidente do tribunal local, antes do juízo de admissibilidade (art. 1.029, § 5º, III). b) por relator sorteado no STJ antes da subida dos autos (art. 1.029, § 5º, I). c) por relator do REsp após a subida dos autos (art. 1.029, § 5º, II). AMARAL SANTOS, Moacyr. Primeiras linhas de direito processual civil. 4. ed. São Paulo: Max Limonad, 1973, v. III, n. 779. Pode haver recurso extraordinário de decisão de qualquer outro tribunal, até mesmo do Superior Tribunal de Justiça. Por outro lado, a Constituição revogada somente admitia recurso extraordinário contra acórdãos de tribunais. A Carta 1988, no entanto, de um lado limita o recurso à matéria constitucional apenas, e de outro fala genericamente em “causas decididas em única ou última instância” (art. 102, III). Logo, passou a caber o apelo extremo contra qualquer sentença de instância única, inclusive de juiz singular, em hipótese de julgamento irrecorrível (causas de alçada) desde, é claro, que o objeto da impugnação recursal seja matéria constitucional federal. “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles” (STF, Súmula nº 283). “Interposto o recurso extraordinário por mais de um dos fundamentos indicados no art. 101, nº III, da Constituição, a admissão apenas por um deles não prejudica o seu conhecimento por qualquer dos outros” (STF, Súmula nº 292). Na CF atual a referência da Súmula corresponde ao art. 102, III. A hipótese da letra d foi acrescida pela Emenda Constitucional nº 45, de 30.12.2004. Prevaleceu, na inovação, o critério de tratar como questão constitucional o conflito de lei local com lei federal. Anteriormente, o tema figurava na competência do STJ (CF, art. 105, III, “b”). “Ora, se entre uma lei federal e uma lei estadual ou municipal, a decisão optar pela aplicação da última por entender que a norma central regulou matéria de competência local, é evidente que a terá considerado inconstitucional, o que basta à admissão do recurso extraordinário pela letra b do art. 102, III, da Constituição, como aliás ocorreu neste processo” (STF, Pleno, AI 132.755, QO/ SP, Rel. Min. Moreira Alves, Rel. p/acórdão Min. Dias Toffoli, ac. 19.11.2009, DJe 26.02.2010). STF, 1ª T., RE 140.075/DF, Rel. Min. Sydney Sanches, ac. 06.09.1995, DJU 22.09.1995, p. 30.599; 2ª T., AI 153.367-AgRg, Rel. Min. Carlos Velloso, ac. 04.10.1993, RTJ 156/644; 2ª T., RE 140.427/DF, Rel. Min. Carlos Velloso, ac. 31.05.1994, RTJ 159/963. Também dos julgados dos Juizados Especiais, que não desafiam apelação ou agravo para os Tribunais de Justiça, cabem recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal (STF, Pleno, Recl. 476/GO, Rel. Min. Carlos Velloso, ac. 20.09.1995, RTJ 162/830). A matéria já se acha sumulada: “É cabível recurso ex-traordinário contra decisão proferida por juiz de primeiro grau nas causas de alçada, ou por turma recursal de juizado especial cível e 1396 18 19 20 21 22 23 24 25 criminal” (STF, Súmula nº 640). Mas é indispensável que, contra a sentença, antes se tenha interposto o recurso interno para a turma de que cogita o art. 41, § 1º, da Lei nº 9.099, de 26.09.1995, pois sem isso não se terá configurado o julgamento “em última instância”, exigido pela CF para viabilizar o recurso extraordinário (art. 102, caput) [NCPC, art. 54]. “Inadmissibilidade de reexame de provas e fatos em sede recursal extraordinária (Súmula nº 279/STF)” (STF, 2ª T., AgR no RE c/ Ag 705.643/MS, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 16.10.2012, DJe 13.11.2012, p. 34). “Assim sendo, a exigência da demonstração formal e fundamentada, no recurso extraordinário, da repercussão geral das questões constitucionais discutidas só incide quando a intimação do acórdão recorrido tenha ocorrido a partir de 03 de maio de 2007, data da publicação da Emenda Regimental nº 21, de 30 de abril de 2007” (STF, Pleno, AI 664.567 QO/RS, Rel. Mil. Sepúlveda Pertence, ac. 18.06.2007, DJU 06.09.2007, p. 37). CPC/1973, art. 508. STF, 2ª T., RE 447.090 AgRg, Rel. Min. Carlos Velloso, ac. 31.05.2005, DJU 24.06.2005, p. 68; STF, 1ª T., AI 742.611 AgRg, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, ac. 23.03.2011, DJe 13.04.2011. STF, Súmulas nos 282 e 356. AI 141.223/BA, 1ª T., Rel. Min. Ilmar Galvão, ac. 28.08.1992, RTJ 144/344-345; AI 120.682/RJ, 1ª T., Rel. Min. Moreira Alves, ac. 25.09.1987, RTJ 123/383. “É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que, se a ofensa à Lei Maior exsurgir com a prolação do acórdão dissentido, faz-se necessária a oposição de embargos declaratórios para propiciar o debate da matéria perante o juízo a quo. Tendo sido observada essa providência pela embargante, não há que falar na impossibilidade de se conhecer do recurso extraordinário devido à ausência de prequestionamento da matéria constitucional suscitada” (STF, EDcl. no RE 223.521-1/RS, 2ª T., Rel. Min. Maurício Corrêa, DJU 09.04.1999, p. 33). “A teor da Súmula 456, o que se reputa não prequestionado é o ponto indevidamente omitido pelo acórdão pri-mitivo sobre o qual ‘não foram opostos embargos declaratórios’. Mas, se opostos, o Tribunal a quo se recuse a suprir a omissão, por entendê-la inexistente, nada mais se pode exigir da parte” (STF, RE 176.626-3/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU 11.12.1998. No mesmo sentido: RE 210.638-1/SP, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJU 19.06.1998, p. 11). STF, 1ª T., RE 231.452, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, ac. 31.08.2004, DJU 24.09.2004, p. 43. STF, 1ª T., RE 230.109 AgR, Rel.ª Min.ª Ellen Gracie, ac. 18.03.2003, DJU 04.04.2003. “Questão não decidida na instância inferior não enseja revisão por meio de RE: o que não foi decidido não pode ser redecidido (revisto). Daí por que tem razão o STF quando exige o pre-questionamento da questão constitucional, para que possa conhecer do RE (STF 282 e 356)” (NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de Processo Civil comentado. 10. ed. São Paulo: RT, 2007, p. 924). STF, 1ª T., ARE 822.344-AgRg/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, ac. 10.02.2015, DJe 1397 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 09.03.2015;STF, 2ª T., RE 554.680-AgR/AM, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, ac. 05.08.2014, DJe 15.08.2014; STF, 1a T., RE 801.065-AgR/PR, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 13.05.2014, DJe 29.05.2014. STF, Pleno, AI-AgRg 621.919/PR, Rel. Min Ellen Gracie, ac. 11.10.2006, DJU 19.12.2006, p. 35; STF, 2ª T., AI 680.906/MG, Rel. Min. Cezar Peluso, ac. 25.11.2008, DJe 19.12.2008. STF, Pleno, RE 536.881/MG – AgRg, Rel. Min. Eros Grau, ac. 08.10.2008, DJe 12.12.2008. CPC/1973, sem correspondência. STF, Pleno, AgRg no RE 626.358/MG, Rel. Min. Cezar Peluso, ac. 22.03.2012, DJe 23.08.2012. STJ, Corte Especial, AgRg no Ag no REsp 137.141/SE, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, ac. 19.08.2012, DJe 15.10.2012. STF, Pleno, AgRg no RE 626.358/MG, Rel. Min. Cezar Peluso, ac. 22.03.2012, DJe 23.08.2012. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim et al. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil cit., p. 1.498. STF, 1ª T., RE 611.743 AgR/PR, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 25.09.2012, DJe 06.11.2012. No âmbito da legislação trabalhista ocorreu, anteriormente, introdução na CLT do art. 896-A, pela Medida Provisória nº 2.226, de 04.09.2001, que instituiu o requisito da “transcendência” da matériatratada no Recurso de Revista interposto para o TST. Há, porém, a ADI nº 2.527 interposta pela OAB contra dita Medida Provisória, ainda não julgada pelo STF. PISANI, Andrea Proto. Principio d’eguaglianza e ricorso per cassazione. Revista de Processo, São Paulo, v. 191, p. 201-210, jan. 2011. CPC/1973, arts. 543-A e 543-B. Como a aplicação da exigência da repercussão geral ficou subordinada a estabelecimento de nor-mas necessárias a serem introduzidas no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (Lei nº 11.418/2006, art. 3º), entendeu aquela Corte que o referido pressuposto de admissibilidade seria exigido apenas para os recursos extraordinários interpostos de acórdãos publicados a partir de 3 de maio de 2007, data da entrada em vigor da Emenda Regimental 21/07 ao RISTF (QO AI nº 664.567/ RS), que estabeleceu as normas necessárias à execução das disposições legais e constitucionais sobre o novo instituto. Assim, os recursos extraordinários anteriores não devem ter seu seguimento dene-gado por ausência da demonstração da repercussão geral. No entanto, os recursos extraordinários anteriores e posteriores, quando múltiplos, sujeitam-se a sobrestamento, retratação e reconhecimento de prejuízo, podendo ser devolvidos à origem, se já pendentes no STF, sempre que versarem sobre temas com repercussão geral reconhecida pelo STF (art. 543- 1398 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 B, §§ 1º e 3º [NCPC, art. 1.036], RE-QO AI 715.423, Min. Gilmar Mendes; RE-QO 540.410, Rel. Min. Cézar Peluso). Nesse sentido: STF, 2ª T., RE 478.450, Rel. Min. Cezar Peluso, ac. 11.01.2008, DJe 05.12.2008. CPC/1973, art. 543-A, § 2º. CPC/1973, art. 543-A, caput. PINHO, Humberto Dalla Bernardina; SANTANA, Ana Carolina Squadri. O writ of certiorari e sua influência sobre o instituto da repercussão geral do recurso extraordinário. Revista de Processo, n. 235, São Paulo, set. 2014, p. 396. CPC/1973, art. 543-A, § 1º. CPC/1973, art. 543-A, § 2º. De acordo com o STF, não basta ao recorrente alegar que a matéria ventilada no recurso extraordinário tem repercussão geral. “Cabe à parte recorrente demonstrar de forma expressa e clara as circunstâncias que poderiam configurar a relevância – do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico – das questões constitucionais invocadas no recurso extraordinário”, sob pena de inviabilizá-lo (STF – 1ª T., AgRg no RE c/ Ag 637.634/GO, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 07.02.2012, Rev. Jurídica LEX 55/212). WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Primeiros comentários cit., p. 1.506. STJ, PETREQ no REsp 1.060.210, Decisão monocrática, Rel. Min. Luiz Fux, j. 29.11.2010, DJe 16.12.2010. O texto primitivo do art. 1.035, § 3º, II, incluía entre os casos de repercussão geral as decisões proferidas em julgamento de casos respectivos. O dispositivo, todavia, foi revogado pela Lei nº 13.256/2016. Tomando como exemplo os casos mais frequentes de repercussão geral admitida, o STF tem reconhecido a relevância jurídica da questão sobre tributos, quase sempre “tendo em conta os princípios constitucionais tributários da isonomia e da uniformidade geográfica”, princípios esses que, obviamente, envolvem interesses gerais, e que transcendem o interesse individual do recorrente (STF, Pleno, QO no AgRg no RE 614.232/RS e no RE 614.406/RS, Rel.ª Min.ª Ellen Gracie, ac. 20.10.2010, DJe 04.03.2011; STF, Pleno, RE 540.829/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, ac. 26.08.2010, DJe 15.10.2010). Não adotou o NCPC a regra do art. 543-A, § 4º, do CPC/1973, de que a decisão da existência da repercussão geral por, no mínimo, quatro votos da Turma, dispensaria a remessa do recurso à apreciação do Plenário. No sistema atual, portanto, o extraordinário sempre irá ao Plenário, a fim de avaliação da preliminar de repercussão geral suscitada pela parte. CPC/1973, art. 543-A, § 5º. CPC/1973, art. 543-A, § 6º. CPC/1973, art. 543-B. 1399 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 CPC/1973, art. 543-B, caput. CPC/1973, art. 543-B, § 1º. CPC/1973, art. 543-B, § 2º. As instâncias locais que poderão apreciar os recursos sobrestados e, eventualmente, exercitar o juízo de retratação são os Tribunais Federais ou Estaduais, as Turmas de Uniformização de Jurisprudência, nos Juizados Especiais Federais (Lei nº 10.259/2001, art. 14, § 2º), e as Turmas Recursais, nos Juizados Especiais Federais ou Estaduais (Lei nº 9.099/1995, art. 41, § 1º; Lei nº 10.259/2001, art. 14, caput). CPC/1973, art. 501. CPC/1973, art. 543-A, § 7º. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, art. 532. CPC/1973, sem correspondência. CPC/1973, sem correspondência. PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Apud AMARAL SANTOS, Moacyr. Op. cit., n. 784. AMARAL SANTOS, Moacyr. Op. cit., v. III, n. 784. “Admitido o recurso extraordinário ou o recurso especial, o Supremo Tribunal Federal ou o superior Tribunal de Justiça julgará o processo, aplicando o direito” (NCPC, art. 1.034, caput). “Não se conhece de recurso extraordinário contra acórdão da justiça local que, examinando fatos e dando as razões de seu convencimento, decide não ter havido simulação na venda de ascendente a descendente” (STF, RE 51.438, Rel. Gonçalves de Oliveira, Revista Forense 209/86). “Não se conhece do recurso extraordinário contra decisão que, baseada nas provas dos autos, anula nota promissória eivada de simulação fraudulenta” (STF, RE 37.722, Rel. Min. Barros Monteiro, Revista Forense 202/137). Nesse sentido: STF, RE 140.979-7/GO, Rel. Min. Marco Aurélio, ac. 22.04.1997, DJU 27.06.1997, p. 30.244; STF, RE 171.419-1/SP, Rel. Min. Ilmar Galvão, ac. 03.12.1996, DJU 14.03.1997, p. 6.914; STF, 2ª T., RE 632.973 AgR, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 02.08.2011, DJe 31.08.2011. CPC/1973, art. 497. ANDRADE, Luis Antonio de. Aspectos e inovações do Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1974, n. 327, p. 276. BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, v. V, n. 158, p. 284. 1400 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 CPC/1973, art. 475-P, I e II. CPC/1973, art. 475-O, § 3º. STJ, 2ª T., MC 15.142/SP, Rel. Min. Humberto Martins, ac. 04.11.2010, DJe 17.11.2010. STF, Pleno, AC 2.177 MC-QO, Rel. Min. Ellen Gracie, Humberto Martins, ac. 12.11.2005, DJe 20.02.2009.. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015, p. 1.497. CPC/1973, art. 508. CPC/1973, art. 541. STF, Pleno, AgRg. no AI 476.260/SP, Rel. Min. Carlos Britto, ac. 23.02.2006, DJU 16.06.2006, p. 5; STF, 2ª T., RE 420.618 AgR, Rel. Min. Ayres Britto, ac. 26.04.2011, DJe 02.09.2011; STJ, Corte Especial, AgRg no Ag 792.846/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, Rel. p/ Acórdão Min. Luiz Fux, ac. 21.05.2008, DJe 03.11.2008. CPC/1973, art. 542. A jurisprudência do STJ tem sido no sentido de recusar, nos recursos que lhe são endereçados, a comprovação do preparo por meio de “comprovantes bancários emitidos pela internet”, ao argumento de que esses documentos “somente possuem veracidade entre a agência bancária e o correntista, não possuindo fé pública e, tampouco, aptidão para comprovar o recolhimento do preparo recursal” (STJ, 3ª T., AgRg no AREsp 55.918/DF, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, ac. 21.03.2013, DJe 26.03.2013). No mesmo sentido: STJ, 2ª T., AgRg no AREsp315.018/MG, Rel. Min. Castro Meira, ac. 27.08.2013, DJe 04.09.2013; STJ, 3ª T., AgRg no AREsp 200.925/SC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, ac. 02.05.2013, DJe 08.05.2013. No entanto, a 4ª Turma diverge, para reconhecer a possibilidade da comprovação do preparo por meio de guia (GRU simples) paga por meio da internet, como, aliás, se acha autorizado no site do Tesouro Nacional, a que se reporta a Resolução do STJ nº 4/2010 (STJ, 4ª T., AgRg no REsp 1.232.385/MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, ac. 06.06.2013, DJe 22.08.2013). CPC/1973, art. 19. CPC/1973, art. 27. STF, Resolução nº 344/2007: “Art. 15. O Recurso Extraordinário ingressará no e-STF instruído com as seguintes peças, segundo o que couber no caso: I – decisões proferidas em primeira instância; II – recursos para a segunda instância; III – decisões proferidas em segunda instância; IV – recursos para os tribunais superiores; V – decisões proferidas nos tribunais superiores; VI – certidão de intimação da decisão recorrida; VII – Recurso Extraordinário; VIII – contrarrazões ao Recurso Extraordinário ou certidão de sua não apresentação; IX – procurações outorgadas aos advogados das partes e respectivos substabelecimentos. § 1º Os autos originariamente eletrônicos ingressarão no e-STF em 1401 83 84 85 86 87 sua integralidade. § 2º O(A) Relator(a) poderá: I – requisitar a transmissão de outras peças ou a remessa dos autos físicos; II – determinar a exclusão de peças indevidamente juntadas aos autos. § 3º As peças processuais e petições eletrônicas enviadas deverão ser gravadas em formato compatível com o e-STF. § 4º Os documentos, cuja digitalização seja tecnicamente inviável em razão do grande volume ou por motivo de ilegibilidade, deverão ser apresentados ao cartório ou à secretaria no prazo de até 10 (dez) dias contado do envio de comunicado eletrônico do fato à parte interessada, sendo eles devolvidos após o trânsito em julgado da decisão”. CPC/1973, sem correspondência. “Para simples reexame de prova não cabe o recurso extraordinário” (STF, Súmula nº 279). “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial” (STJ, Súmula nº 7). Eduardo Ribeiro, analisando a hipótese em que o acórdão recorrido não havia esgotado as questões de mérito, observou que o STJ, depois de prover o recurso especial, haveria de “pros-seguir no exame da causa para saber se o acórdão não deveria ser mantido por alguma outra razão que não foi objeto de consideração na origem”. A parte, obviamente, não poderia ser privada da apreciação de “relevante fundamento de seu direito” oportunamente invocado. Daí que, no exemplo analisado, o STJ passou ao exame da referida matéria, “não importando que, para isso, tivesse de examinar matéria de fato”. Alertou, todavia, para o limite a ser respeitado: “o que não se pode, no especial é modificar os fundamentos fáticos da decisão recorrida, rever provas já analisadas” (OLIVEIRA, Eduardo Ribeiro de. Recurso Especial. In: FONTES, Renata Barbosa (coord.). Temas de direito: homenagem ao Ministro Humberto Gomes de Barros. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 56). STF, 2ª T., AgR no RE c/ Ag 705.643/MS, Rel. Min. Celso de Mello, ac. 16.10.2012, DJe 13.11.2012, p. 34. “Superado o juízo de admissibilidade e verificada a efetiva ocorrência do error iuris atacado pelo recurso, o tribunal de superposição deve julgar a causa com base em todos os elementos de prova constantes nos autos, ainda que não mencionados no acórdão recorrido, desde que respeite dois limites. O primeiro consiste na garantia do direito à prova, assegurado consti-tucionalmente pela cláusula do devido processo legal, de modo que se o julgamento integral da causa, após a fixação da tese jurídica correta, depender de prova ainda não produzida, o tribunal de superposição deve devolver os autos para que o juízo de primeira instância, ou o tribunal de origem, complete a instrução probatória e profira nova decisão. O segundo limite são os pontos de fato já decididos pelo tribunal local, porque este é soberano quanto à matéria fática decidida no acórdão – é vedado o reexame, não o exame. Aliás, tais fatos já foram aceitos como verdadeiros pelo tribunal de superposição no momento de verificar a existência de uma questão de direito que superasse a barreira de admissibilidade, especialmente se o recurso invocou erro na subsunção do fato à norma (qualificação jurídica do fato)” (FONSECA, João Francisco 1402 88 89 90 91 92 93 94 95 Naves da. Exame dos fatos nos recursos extraordinário e especial. São Paulo: Saraiva, 2012, n. 24, p. 100-102). O recurso especial ou o extraordinário, quando tenha de ensejar o “julgamento da causa”, ob-servará, analogicamente, a regra do § 1º do art. 515 do CPC [NCPC, art. 1.013, § 1º], traçada para a apelação, segundo o qual, por força de efeito devolutivo, serão objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal “todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não tenha julgado por inteiro”. Recorre-se à regra do § 2º do art. 515 do CPC [NCPC, art. 1.013, § 2º]: “Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento, e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais”. Por isso, também nas instâncias extraordinárias, “se o tribunal local acolheu apenas uma das causas de pedir declinadas na inicial, declarando pro-cedente o pedido formulado pelo autor, não é lícito ao STJ, no julgamento de recurso especial do réu, simplesmente declarar ofensa à lei e afastar o fundamento em que se baseou o acórdão recorrido para julgar improcedente o pedido. Nessa situação, deve o STJ aplicar o direito à espécie, apreciando as outras causas de pedir lançadas na inicial, ainda que sobre elas não tenha se manifestado a instância precedente, podendo negar provimento ao recurso especial e manter a procedência do pedido inicial” (STJ, Corte Especial, ED no REsp 58.265, Rel. p/ ac. Min. Barros Monteiro, ac. 05.12.2007, DJU 07.08.2008). CPC/1973, art. 515, §§ 1º e 2º. STJ, 1ª T., AgRg. no REsp 988.034/DF, Rel. Min. Luiz Fux, ac. 22.04.2008, DJe 08.10.2008; STJ, 2ª T., EDcl. no REsp 524.889/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, ac. 06.04.2006, DJU 22.05.2006, p. 179. Há, no entanto, acórdãos do STJ em sentido contrário: STJ, 1ª T., REsp 761.379, Rel. Min. José Delgado, ac. 16.08.2005, DJU 12.09.2005, p. 256; STJ, 3ª T., REsp 337.094, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, ac. 29.11.2005, DJU 19.12.2005, p. 393; STJ, 1ª T., EREsp 1.062.962/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, ac. 28.10.2009, DJe 06.11.2009. STJ, 2ª T., AgRg. no REsp 1.063.110/SP, Rel. Min. Castro Meira, ac. 06.11.2008, DJe 01.12.2008. STF, 2ª Turma, EDcl no AgRg no RE 346.736/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, ac. 04.06.2013, DJe 18.06.2013, Rev. de Processo 223/406, set. 2013. CPC/1973, sem correspondência. Segundo Nelson Nery Júnior, “aplicar o direito à espécie é exatamente julgar a causa, examinando amplamente todas as questões suscitadas e discutidas nos autos, inclusive as de ordem pública que não tiverem sido examinadas pelas instâncias ordinárias. (...) removido o óbice constitu-cional da causa decidida (CF 102, III e 105, III), o que só se exige para o juízo de cassação dos RE e REsp, o STF e o STJ ficam libres para amplamente, rever a causa” (NERY JÚNIOR, Nelson. Teoria geral dos recursos. 7. ed. São Paulo: RT, 2014, p. 422). 1403 96 97 98 99 100 101 102 103 STF, acórdão cit., RP 223/410. Idem, ibidem. Idem, ibidem. CPC/1973, art. 545. O Recurso Especial somente é admissível contra