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1 PROCESSO CIVIL DANIEL WILLIAN GRANADO 1. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA Trata-se de atividade voltada à quantificação do direito, quando a sentença não determinar o valor devido e este depender de atividade jurisdicional. Uma vez confirmado o an debeatur, passa-se a perquirir o quanto é devido, o quantum debeatur, por meio da liquidação. Tanto os títulos executivos judiciais (art. 515) quanto os extrajudiciais (art. 784) são passíveis de liquidação, nos termos dos arts. 509 e seguintes do CPC/2015. Como qualquer título executivo pode ser objeto de liquidação, parte da doutrina diz, com propriedade, ser inadequado falar-se em “liquidação de sentença”. Ademais, conquanto o caput, do art. 509 faça referência apenas a sentenças, é importante ressaltar que não somente as sentenças (art. 203, § 1.º), mas também as decisões interlocutórias (art. 203, § 2.º) e os acórdãos (art. 204) podem ser liquidados, desde que reconheçam o direito sem, todavia, quantificá-lo. Nessas hipóteses, se o quantum puder ser aferido por meio de cálculos aritméticos (art. 509, § 2.º), não há falar-se em iliquidez. Nas hipóteses do art. 324, § 1.º, I a III, a lei autoriza a formulação de pedido genérico. É, em linha de princípio, nesses casos que faz necessária a liquidação de sentença. 2 A liquidação encontra-se disciplinada nos arts. 509 a 512 do CPC. A natureza jurídica da liquidação é a de ação dentro do mesmo processo em que correu (ou ainda corre) a ação de conhecimento. Coerentemente, o art. 511 prescreve que a parte contrária será intimada da liquidação na pessoa do seu advogado ou da sociedade de advogados a que estiver vinculado, tal como sucede com a reconvenção, que também é outra ação dentro do mesmo processo (CPC, art. 343, § 1.º). Dispensa-se, via de regra, a necessidade de nova citação do executado para o cumprimento da sentença justamente porque a liquidação desenvolve-se no mesmo processo. Em outras palavras, finda a fase de liquidação, é suficiente a intimação do devedor, a requerimento do credor, na pessoa de seu advogado para que tenha início o prazo de 15 dias para cumprir o julgado (art. 523). Se não o fizer, terá início outra fase do mesmo processo (cumprimento de sentença), tendente a implementar o quanto decidido na sentença, já devidamente quantificado, mercê da liquidação, somando-se ao total da condenação a multa de 10% e também honorários advocatícios de 10%, de que trata o § 1.º. do art. 523. Não há necessidade de juntada de nova procuração na liquidação, sendo suficiente aquela outorgada na fase de conhecimento. A finalidade da liquidação é, pois, definir o valor da obrigação a ser adimplida pelo devedor, uma vez reconhecida dita obrigação em título judicial ou extrajudicial. O título judicial serve para atestar a existência de um direito, se é ou não devida a prestação, o an debeatur. A liquidação é o caminho apto para se chegar ao quantum debeatur. 3 Embora a liquidação seja de ordinário instaurada pelo credor, nada obsta que o devedor, interessado em desincumbir-se da obrigação que lhe foi imposta pela sentença, tome a iniciativa. Nesse contexto, oportuno referir o art. 512, que admite que, mesmo na pendência de recurso, possa ser dado início à liquidação. Trata-se de autorização da denominada “liquidação provisória”. Conquanto o art. 512 não faça menção se o recurso pendente deve ou não ser dotado de efeito suspensivo, temos que a liquidação provisória deve incidir inclusive quando o recurso for dotado ou lhe for atribuído efeito suspensivo, dada a garantia da razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação (CF, art. 5.º, LXXVIII). Mencionado dispositivo deve ser interpretado no sentido de que o legislador, forte em imprimir modificações tendentes à agilização da prestação jurisdicional, permitiu, mesmo na pendência de recurso com efeito suspensivo, se possa dar início à liquidação provisória do julgado Além disso, ainda que o recurso seja dotado de efeito suspensivo, se vier a ser dado início à liquidação provisória, isso não trará qualquer prejuízo para a parte contrária. Sob certo enfoque, a liquidação, mesmo nesse caso, é definitiva, dado que a se a decisão liquidanda não vier a ser modificada pelo órgão ad quem, não mais será alterada. Isso não quer dizer, todavia, que o liquidante possa dar início ao cumprimento de sentença após o término da liquidação provisória se houver pendência de recurso dotado de efeito suspensivo. Para que se dê início ao cumprimento de sentença (provisório), é preciso que a decisão tenha sido impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo. A propósito, o art. 520 dispõe que o cumprimento provisório da sentença tem lugar quando esta última for impugnada por recurso desprovido de efeito suspensivo. 4 Na hipótese do art. 509, § 2.º, inexiste propriamente necessidade de liquidação. Trata-se de simples incidente da fase inicial da execução. Se o quantum é apurável mediante meros cálculos aritméticos, não se trata de provimento jurisdicional ilíquido. Os cálculos aritméticos são aqueles que podem ser realizados sem o auxílio de qualquer especialista no assunto. Diferentemente da liquidação pelo procedimento comum ou por arbitramento, o quantum deverá ser extraído da própria decisão, prescindindo, assim, de elementos novos ou externos. O credor deve apresentar a planilha devidamente discriminada com os juros, principal e correção monetária na forma do art. 524. Se a elaboração da planilha depender de dados que estejam em poder do devedor ou de terceiros, caberá ao juiz requisitá-los, fixando prazo de até trinta dias para cumprimento da diligência (§§ 3.º e 4.º, do art. 524). Se os dados não forem, injustificadamente, apresentados pelo devedor, presumir-se-ão corretos os cálculos apresentados pelo autor, não podendo o executado alegar excesso de execução posteriormente. Se houver descompasso manifesto entre a memória de cálculo apresentada e a decisão liquidanda, poderá o juiz valer-se do contabilista do juízo (§ 2.º do art. 524). De outro lado, quando o valor apontado no demonstrativo aparentemente exceder os limites da condenação, a execução será iniciada pelo valor pretendido, mas a penhora terá por base a importância que o juiz entender adequada (art. 524, § 1.º). 1. 1. Espécies de liquidação A liquidação por arbitramento far-se-á na hipótese do art. 509, I. Na verdade, sempre que a apuração do quantum depender do conhecimento de 5 arbitrador, haverá de ter lugar a liquidação por arbitramento. Trata-se de modalidade de liquidação consubstanciada na realização de perícia voltada especificamente para a fixação do quantum debeatur. Em algumas situações, o próprio Código de Processo Civil dispõe que a fixação do valor devido será feita mediante arbitramento. O § 3.º do art. 81, por exemplo, estatui que “o valor da indenização será fixado pelo juiz ou, caso não seja possível mensurá-lo, liquidado por arbitramento ou pelo procedimento comum, nos próprios autos”. O procedimento atinente à liquidação por arbitramento vem previsto no art. 510. O juiz intimará as partes para apresentação de pareceres ou documentos elucidativos, no prazo que fixar, e, caso não possa decidir de plano, deverá nomear perito, observando-se, no que couber, o procedimento da prova pericial, ou seja, o quanto disposto nos arts. 464 e seguintes do CPC. Já a liquidação pelo procedimento comum deve ter lugar quando houver necessidade de alegare provar fato novo (art. 509, II), o qual ainda não foi analisado pela decisão, seja porque a ela superveniente, seja porque não foi considerado na fase de conhecimento. Neste caso, o procedimento a ser seguido será o comum, como prevê o art. 511. Feito o requerimento de liquidação pelo procedimento comum, e sendo este deferido pelo magistrado, a parte contrária será intimada na pessoa de seu advogado para que apresente defesa no prazo de 15 (quinze dias), observando-se, a seguir, no que couber, as disposições atinentes ao procedimento comum. Após apresentação da defesa, saneamento do feito e instrução probatória, o juiz decidirá a liquidação, fixando o quantum debeatur. 6 Na liquidação, será defeso discutir a lide ou a sentença que a julgou, segundo estabelece o art. 509, § 4.º. Ainda que seja o caso de liquidação pelo procedimento comum, é defeso ao juiz na liquidação discutir de novo a lide ou a sentença que a julgou. O fato novo a ser considerado na fase liquidação não foi tomado em conta pelo juiz na fase de conhecimento, ou porque ocorreu depois da decisão, ou, pura e simplesmente, porque não foi objeto de alegação e prova na fase de conhecimento. Alguns falam, nesse caso, em princípio da fidelidade à sentença liquidanda. Esta proibição destina-se a evitar que as controvérsias do recurso pendente sejam reapreciadas na liquidação, servindo esta última apenas à integração do elemento faltante, qual seja, o quantum debeatur. Assim, não é possível em sede de liquidação, por exemplo, acrescentar honorários advocatícios relativos à fase de conhecimento, se a decisão for omissa a respeito. Igual tratamento deve ser concedido à sentença em que há omissão quanto ao pagamento das custas e despesas processuais. É possível que a sentença que, por exemplo, contenha diversos tópicos distintos e suscetíveis de serem objeto de execução possa sujeitar-se, se for esse o caso, a mais da uma modalidade de liquidação simultaneamente. Mesmo que a sentença da ação de conhecimento determine que a liquidação seja feita, por exemplo, por arbitramento, não haverá ofensa à coisa julgada se ela for promovida pelo procedimento comum. Nesse sentido, a orientação do STJ cristalizada na Súmula 344, segundo a qual “a liquidação por forma diversa da estabelecida na sentença não ofende a coisa julgada”. O CPC prescreve, ademais, no art. 1.015, parágrafo único, que as decisões proferidas na fase de liquidação serão impugnáveis por agravo de instrumento. 7 Conquanto a decisão que ponha fim à liquidação seja interlocutória, impugnável por agravo de instrumento (art. 1.015, parágrafo único), isso não quer dizer que não seja apta a formar coisa julgada material. A decisão de liquidação é apta a revestir-se do manto da coisa julgada material, evitando que controvérsias atinentes ao quantum devido se eternizem no Judiciário. 2. Execução e cumprimento de sentença 2.1. Classificação da execução Cumpre analisarmos algumas classificações frequentemente utilizadas para a classificação da tutela executiva. A primeira delas diz respeito à origem do título executivo. Nesse caso, a execução pode ser fundada em títulos judiciais e em títulos extrajudiciais. Trata-se de importante distinção, haja vista que é diferente pedir a tutela jurisdicional executiva munido de título executivo judicial (art. 515) ou título executivo extrajudicial (art. 784). As diferenças se apresentam durante o desenvolvimento da execução, eis que os atos processuais praticados em uma e outra hipótese podem ser diferentes. Tal se justifica perfeitamente, haja vista que no caso de execução calcada em títulos judiciais, houve atividade jurisdicional precedente, enquanto na hipótese de execução por títulos extrajudiciais não. Isso não quer dizer, todavia, que não existam pontos de contato em aludidas modalidades de execução. Os arts. 513 e 771 deixam isso claro, ao 8 estatuírem que as disposições referentes ao cumprimento de sentença aplicam-se à execução, sendo a recíproca verdadeira. Há ainda a classificação que aparta a execução quanto à estabilidade do título executivo. Segundo esse critério, a execução pode ser classificada em definitiva e provisória. A execução definitiva pressupõe a estabilidade do título, que não admite, em linha de princípio, qualquer alteração. Na verdade, se a execução é definitiva, significa isso dizer que o título não mais poderá ser alterado no próprio processo em que teve origem. Porém, a procedência de ação rescisória, por exemplo, poderá conduzir à desconstituição do título. De outro lado, a execução provisória (ou como quer o CPC/2015, cumprimento provisório) encontra-se amparada por título que pode vir a ser alterado no próprio processo em que formado. Como consequência, o exequente sofre algumas limitações quanto aos atos de satisfação de seu direito. Como se observa, porém, as modificações legislativas a esse propósito têm sido no sentido de que a execução provisória possa, mais e mais, conduzir à efetiva realização do direito do exequente. Há também a classificação que desdobra a execução de acordo com a modalidade da obrigação. Esse critério classificatório leva em consideração a modalidade de obrigação constante do título executivo, visto que são diferentes as regras apropriadas para a realização do direito nele retratado. Nesse contexto, se se tratar de obrigação de dar coisa, sua execução será implementada segundo as regras constantes dos arts. 538 e 802 a 813. Para as obrigações de fazer e não fazer, aplicam-se os arts. 536 e 537 e arts. 814 a 823. No que tange às obrigações de pagar, tratando-se de execução baseada em título judicial, esta seguirá as regras do art. 523 e seguintes. Na 9 hipótese da execução ser baseada em título executivo extrajudicial, aplicam-se os arts. 824 e seguintes. Pode-se dizer, grosso modo, que as técnicas sub-rogatórias são mais adequadas para as execuções por quantia, ao passo que a execução indireta revela-se mais apropriada no caso de execução de obrigação de fazer ou de não fazer, bem como na de entregar coisa. Sem prejuízo, essas distinções não são absolutas, sobretudo em função do art. 139, IV, do CPC. Relativamente às obrigações de pagar quantia, existe um critério classificatório próprio. Isso porque em alguns casos, a lei prescreve procedimentos especiais para a prática dos atos executivos. Se a dívida tiver origem alimentar, há normas especiais no próprio CPC que tratam do assunto (arts. 528 e subsequentes e arts. 911 a 913), além de lei extravagante referente ao assunto (Lei 5.478/68), devendo-se observar que houve revogação, nesse particular, dos arts. 16 a 18, da Lei 5.478/68, nos termos do art. 1.072, V, do CPC/2015. De outro lado, a dívida pode ter origem em alguma obrigação de que participe a Fazenda Pública. Nesse contexto, sendo devedora a Fazenda Pública, a Constituição Federal, no art. 100 e a lei infraconstitucional (arts. 534, 535 e 910) estabelecem procedimentos diferenciados para a execução, que se justificam principalmente tendo em vista a impenhorabilidade dos bens públicos, bem como a necessidade de respeito ao princípio constitucional da isonomia. 2.2 Princípios relativos à execução Assim como outras questões referentes ao direito processual civil, a tutela jurisdicional executiva comporta princípios específicos que devem ser considerados, sem prejuízo dos princípios genéricos que norteiam o direito processual civil. 10 Vejamos, pois, os princípios específicosda tutela jurisdicional executiva. Há, em primeiro lugar, o princípio da iniciativa. A instauração da execução, seja da execução por título extrajudicial, seja da fase de cumprimento de sentença, depende de iniciativa do credor, não cabendo ao juiz agir de ofício. Já os ônus da fase de cumprimento da sentença ou do processo autônomo de execução devem recair sobre o devedor. O princípio da iniciativa sobressai com maior evidência nas hipóteses de execução amparadas por títulos executivos extrajudiciais, pois, nesses casos, como não houve a formação do título em decorrência de pronunciamento judicial, sequer houve atuação estatal, sendo rompida sua inércia justamente para essa finalidade. Mas, de qualquer forma, o cumprimento de sentença, no caso dos títulos judiciais, depende de “requerimento do exequente”, conforme consta expressamente do caput do art. 523 e § 1.º, do art. 513. De outro lado, costuma-se mencionar o princípio da autonomia, em contrapartida ao denominado princípio do sincretismo. A execução é autônoma e não se confunde com as funções de conhecimento. Deve-se repisar que precedentemente à execução pode ter havido processo ou não. Tudo depende da execução estar ou não lastreada em título judicial. O art. 515 e seus incisos tratam dos títulos judiciais. Para a formação de título judicial é necessário que tenha havido atividade jurisdicional precedente (hipótese do inc. I do art. 515, por exemplo). O inc. VII do art. 515 alude à sentença arbitral. Como a arbitragem é considerada como jurisdição privada, temos que, segundo essa concepção a assertiva antes lançada de que a formação do título judicial pressupõe prévia atividade jurisdicional não tem quaisquer exceções. De seu turno, a execução pode fundar-se em título extrajudicial (CPC, art. 784). Neste último caso – 11 execução por título extrajudicial – o executado poderá opor-se à execução por meio de embargos, que dão origem a um outro processo (CPC, art. 914, § 1.º). É certo que as várias modificações que vêm sendo introduzidas no CPC desde 1.994, sob certo enfoque, têm atenuado o rigor do princípio da autonomia, principalmente. De fato, com as modificações introduzidas pela Lei 8.952/94 no artigo 461, do CPC/73, que tratava das obrigações de fazer e de não fazer, temos para nós que, desde então, a execução de sobreditas obrigações haveria de realizar-se no mesmo processo, prescindindo da instauração de um processo autônomo, tal como originariamente previsto no sistema do Código. De fato, o regime do art. 644 do CPC/73 mostrou-se superado com o advento da Lei 8.954/94. De qualquer sorte, a redação do art. 644, do CPC/73, introduzida pela Lei 10.444/02 era expressa quanto à aplicação do regime do art. 461 do CPC/73 para a execução das obrigações de fazer ou não fazer. Por outro lado, a mesma Lei 10.444/02 também mandou aplicar o regime do art. 461, do CPC/73 às obrigações de entrega de coisa (§ 3º do art.461- A, do CPC/73). Assim, desde 2.002, pelo menos, já não se podia mais falar em processo de execução autônomo no caso de obrigações de fazer ou de não fazer ou ainda de entrega de coisa. Finalmente, a Lei 11.232/05 introduziu o chamado sincretismo processual no caso das obrigações de pagar quantia, que veio a ser mantido pelo CPC/2015, de tal sorte que hoje não se há mais espaço para falarmos em processo de execução autônomo de título executivo judicial, salvo nas hipóteses previstas no § 1.º do art. 515. Nesse sentido, é que dissemos que o princípio de autonomia da execução perdeu seu vigor original, falando-se hoje em princípio do sincretismo, 12 onde conhecimento e execução se fazem nos mesmos autos. Contudo, para as execuções de título executivo extrajudicial, tal autonomia ainda perdura. Outro princípio relativo à execução é conhecido como princípio do título. Por tal princípio, fala-se que a execução pressupõe, sempre, a existência de título, seja ele judicial (art. 515) ou extrajudicial (art. 784). Esse princípio consagra o conhecido brocardo, segundo o qual nulla executio sine titulo. É o que se depreende da leitura do art. 783, bem como do inc. I do art. 803, ambos do CPC. A lei arrola os títulos executivos judiciais e extrajudiciais de maneira taxativa. Isso não quer dizer, todavia, que todos os títulos executivos judiciais estejam arrolados no art. 515, nem que todos os títulos executivos extrajudiciais estejam elencados nos incisos do art. 784. Se há concessão de tutela provisória de urgência antecipada, por exemplo, ocorre na verdade antecipação de efeitos executivos do título (que ainda não foi formado), de modo que a possibilidade de cumprimento provisório (execução provisória) das decisões de tutela provisória não descaracteriza o princípio ora sob enfoque. Nesse caso, o cumprimento é provisório. A finalidade do título consubstancia-se em trazer certeza, liquidez e exigibilidade de um direito, de modo a autorizar a prática de atos executivos tendentes à sua satisfação. Será nula a execução se o título não consubstanciar obrigação líquida, certa e exigível (art. 803, I, CPC). Em última análise, no caso de execução instaurada sem título, não se faz presente o requisito do interesse processual, na medida em que a via eleita se revela inadequada. A liquidez, como já pontuado, diz respeito à quantificação da dívida ou à identificação do objeto da prestação. A simples circunstância de o crédito retratado no título não ser determinado não lhe retira o atributo da liquidez, desde que o mesmo seja determinável. A exigibilidade, por outro lado, está ligada à 13 inexistência de termo ou condição suspensiva. A certeza, por fim, atina com a ausência de dúvida sobre a existência da obrigação. Pode-se falar também no princípio da patrimonialidade. A execução é voltada contra os bens do devedor. São este que constituem a garantia do débito, a respeito do que é expresso o art. 789 do CPC. Dispositivos como o § 1.º do art. 536, de uma certa forma, mitigam o rigor desse princípio, quando admitem a busca e apreensão e a remoção de pessoas e coisas. As técnicas de execução indireta atenuam também o vigor desse princípio. De qualquer sorte, podemos dizer que, como regra, o devedor deve satisfazer a execução com seus bens, presentes e futuros, salvo as exceções previstas em lei (CPC, art. 789). Trata-se do princípio da patrimonialidade. A execução, portanto, não recai sobre a pessoa do devedor. Alguns, por isso, falam que a execução deve ser real. A execução é disciplinada, outrossim, pelo princípio da responsabilidade, segundo o qual o exequente deverá responder pelos danos causados ao executado caso promova contra este execução infundada ou indevida. O art. 520, que disciplina o cumprimento provisório de sentença (execução provisória) é claro a respeito. Segundo o inc. I de aludido dispositivo legal, o cumprimento provisório “corre por iniciativa e responsabilidade do exequente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido”. O valor da reparação a que se refere o inc. I do art. 520 deverá ser apurado nos mesmo autos (art. 520, II). A responsabilidade daquele que promove cumprimento provisório infundado ou indevido é objetiva. Em outras palavras, os prejuízos sofridos pelo executado prescindem de demonstração de que decorreram por culpa do exequente. 14 Trata também do princípio da responsabilidade o art. 776 do CPC. Prescreve esse dispositivo legal que “o exequente ressarcirá ao executado os danos que este sofreu,quando a sentença, transitada em julgado, declarar inexistente, no todo ou em parte, a obrigação que ensejou a execução”. Representa a situação em que o título executivo, do qual se valeu o exequente, deixou de existir. Tem incidência o art. 776 se se tratar de execução definitiva. Figure-se, por exemplo, a hipótese em que há julgamento de procedência de ação rescisória proposta pelo executado, em que seja rescindida a decisão transitada em julgado que ensejou a formação do título executivo judicial. Nesse caso, poderá o executado, uma vez desconstituído o título, pretender a responsabilização do exequente pelos prejuízos sofridos. Fala-se também no princípio do exato adimplemento. A execução deve proporcionar ao credor o mesmo que ele obteria se houvesse o adimplemento espontâneo da obrigação. As modificações introduzidas no regime do art. 461 do CPC/73 (obrigações de fazer/não-fazer) tornaram regra também a execução específica dessas modalidades de obrigações (princípio da especificidade). Com o § 3º do art.461-A, do CPC/73 isso foi estendido às obrigações de entrega de coisa certa. Tal sistemática veio a ser mantida no CPC/2015. Confira-se, por exemplo, o quanto disposto no art. 139, IV, do CPC/2015. A conversão em perdas e danos no caso não cumprimento de obrigação de fazer infungível hoje reveste-se de caráter nitidamente excepcional. Assim, a ideia de que a execução deve proporcionar o exato adimplemento da obrigação constante do título aplica-se, hoje, não apenas às obrigações de pagar quantia, mas às de fazer ou de não fazer, bem como às de entregar coisa. O lado disso, pode o exequente desistir de toda execução ou de apenas algumas medidas executivas (CPC, art. 775). Trata-se do princípio da 15 disponibilidade. Neste caso, os embargos (ou a impugnação, se de cumprimento de sentença se tratar) só serão automaticamente extintos versarem apenas questões processuais caso em que deverá o credor arcar com as custas e honorários advocatícios; do contrário, a extinção dependerá da anuência do embargante (ou daquele que tiver oferecido a impugnação). É o que estatuem os incisos I e II do parágrafo único do art. 775 do CPC. Conquanto a execução se realize no interesse do credor (art. 797), deve ela realizar-se da forma menos gravosa possível. Trata-se de princípio que vem expressamente previsto no art. 805. Havendo alternativas à prestação da tutela jurisdicional, deve ser eleito aquela que gere menor onerosidade ao devedor. Deve haver um equilíbrio entre o princípio da menor onerosidade com o já estudado princípio do exato adimplemento, de modo que a tutela executiva traga um resultado desejável ao credor, sem, contudo, onerar de maneira excessiva o devedor. 3. Título executivo 3. 1. Generalidades Nenhuma execução prescinde de título executivo. O título executivo representa pressuposto necessário e suficiente para qualquer execução. Diz-se necessário, tendo em vista que não há que se falar em execução se não houver título executivo. Trata-se de aplicação do princípio da nulla executio sine titulo. De outro lado, basta a apresentação do título para que tenha início a prática dos atos executivos, independentemente de qualquer 16 valoração a respeito do direito nele certificado. Por isso diz-se que o título é suficiente. A importância do título executivo sobressai quando se examina a modalidade de tutela executiva a ser implementada pelo Judiciário. Com efeito, dependendo de sua origem, os atos executivos serão diferentes em alguma medida, se judicial (art. 515) ou extrajudicial (art. 784) o título. 3.2. Características da obrigação retratada no título A obrigação retratada no título executivo deve ser certa, líquida e exigível. São requisitos da obrigação que deve constar do título executivo, seja ele judicial ou extrajudicial. Os atributos de certeza, liquidez e exigibilidade não são propriamente do título, em si mesmo, mas sim, da obrigação nele constante. Devemos entender por obrigação certa, aquela em que se encontram definidos, de forma suficiente, os elementos subjetivos e objetivos da obrigação, é dizer, aquela em que é possível estabelecer quem é o credor e o devedor (elemento subjetivo), bem como aquilo que é devido, quanto é devido e quando é devido (elemento objetivo). De seu turno, a obrigação será exigível se não estiver sujeita a nenhuma condição ou termo para que seja cumprida. Por fim, a liquidez diz com o valor da obrigação. Será líquida se for quantificada ou quantificável. 17 Sendo a obrigação constante do título certa, líquida e exigível, é possível dar-se início à execução, vale dizer, dar início aos atos jurisdicionais tendentes à implementação da obrigação nele certificada. 3.3. Natureza jurídica do título Examinemos, neste passo, a natureza do título executivo. Para parcela da doutrina, o título executivo representa um documento, no sentido de que o título retrata, suficientemente para fins da prestação da tutela jurisdicional executiva, uma obrigação, sempre compreendida amplamente como sinônimo de relação jurídica, dever, “direito”, com os atributos da certeza, liquidez e exigibilidade. Segundo tal orientação doutrinária, não se trata de prova no sentido frequentemente empregado de convencer o juiz de algo que aconteceu ou deixou de acontecer para que seja reconhecido o direito aplicável aos fatos em prol de uma ou de outra parte. Trata-se de prova de uma obrigação que, quando apresentada ao magistrado, autoriza a prática dos atos executivos. A formação da convicção do magistrado nessa hipótese, destarte, não se dá para fins de reconhecimento do direito, mas para sua realização concreta. Tal entendimento é criticado diante da constatação de que prova só existe para fins de atividade cognitiva, atividade essa que seria completamente estranha à execução e à prática dos atos executivos. Todavia, a prova deve ser entendida como qualquer elemento que ajude a formar a convicção do magistrado. Neste contexto, a prova e o convencimento do magistrado se justificam para a autorização do início da prática dos atos executivos materiais. Assim, como se admite prova em contrário (que se faz por meio da impugnação ao cumprimento de sentença ou por meio dos 18 embargos à execução), existe presunção relativa de que a obrigação retratada no título é certa, líquida e exigível. O título representa um documento que conduz o Judiciário à satisfação do direito nele certificado. Dispensa a indagação do magistrado sobre a existência do direito. Até que se prove o contrário, o direito a ser satisfeito é aquele documentado no título. Percebe-se, assim, que o título exerce o papel desempenhado por qualquer modalidade de prova no plano do processo, com a diferença de que nessa fase (execução) o juiz não precisa certificar o direito, senão que, diante da existência do título, cabe-lhe, a requerimento do exequente, determinar os atos tendentes à realização empírica da obrigação nele retratada (a qual não foi voluntariamente adimplida), cabendo ao executado, se o quiser, resistir à execução, o que ordinariamente fará ou por meio da impugnação (no caso de execução por título judicial – cumprimento de sentença) ou por intermédio dos embargos (se de execução por título extrajudicial se tratar). O fato do título desempenhar a função de prova suficiente de obrigação certa, líquida e exigível, não quer significar que não possa vir a ser complementado por outros elementos probatórios paraque a obrigação nele constante se mostre certa, líquida e exigível. 3.4. Eficácia abstrata do título executivo A eficácia abstrata do título executivo deve ser entendida da mesma forma que a autonomia do direito de ação. Com efeito, não há necessidade daquele que exerce o direito de ação ser efetivamente credor, que ele efetivamente tenha tido um direito seu lesionado. Para exercer o direito de ação, 19 basta que a lesão seja suficientemente afirmada perante o Judiciário, para que este reconheça se aquele que exerceu o direito de ação tenha direito a ser tutelado. Essa mesma função é desempenhada pelo título executivo, seja ele judicial ou extrajudicial. Basta sua apresentação para desencadear a atividade jurisdicional tendente à realização concreta do direito nele documentado, sem que haja necessidade de uma declaração prévia do próprio Judiciário quanto à existência do título. Em outras palavras, para que tenham início os atos executivos, é suficiente que o credor se afirme como tal com base no título executivo. Essa a denominada eficácia abstrata do título executivo. Não por outro motivo que a ausência do título executivo evidencia falta de interesse processual por inadequação da via eleita (execução). 3.5 Títulos executivos judiciais Os títulos executivos judiciais são tratados no art. 515. Vejamos, pois, os títulos executivos judiciais arrolados em mencionado dispositivo legal. O art. 515, I, reconhece como título executivo judicial as decisões proferidas no processo civil que reconheçam a exigibilidade de obrigação de pagar quantia, de fazer, de não fazer ou de entregar coisa. Configura título executivo judicial a sentença que reconhece a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia, seja ou não de cunho condenatório. O inc. I do art. 515, em rigor, no mesmo sentido do CPC/73, veio a tornar lei expressa o que o STJ, anteriormente à própria Lei 11.232/05, já decidia. Há inúmeros e corretos precedentes, anteriores a esse diploma legal, no sentido 20 de que a sentença meramente declaratória, desde que defina todos os elementos da obrigação, poderia ser objeto de execução. Deveras, referido inc. I do art. 515 tem caráter meramente expletivo. A possibilidade de execução de sentenças meramente declaratórias, quando estas definam todos os elementos da obrigação, já decorria do sistema do CPC/73. Com o vigente Código de Processo Civil, a ação meramente declaratória deixou de ter um caráter essencialmente preventivo. Tanto é assim, que o art. 20 do CPC admite o manejo da ação meramente declaratória mesmo que tenha havido lesão a direito. Não teria sentido, em tal situação, exigir que o interessado, após o trânsito em julgado da ação declaratória, tivesse de ajuizar ação de cunho condenatório, na qual o juiz, em essência, não poderia vir a decidir, em razão da coisa julgada, diferentemente do que antes fora decidido, mas, pura e simplesmente, teria de acrescer ao comando da condenação à decisão já transitada em julgado. Pelo art. 515, II e III, são títulos executivos judiciais a decisão homologatória de autocomposição judicial, bem como a decisão homologatória de autocomposição extrajudicial de qualquer natureza. Ou seja, o acordo que venha a ser levado a efeito tanto judicial quanto extrajudicialmente, se vier a ser homologado por decisão judicial passa a ter eficácia de título executivo. O inciso IV do art. 515 dispõe constituir título judicial o formal e a certidão de partilha, exclusivamente em relação ao inventariante, aos herdeiros e aos sucessores a título singular ou universal. O formal ou a certidão de partilha se prestam a documentar a passagem do patrimônio do autor da herança aos seus herdeiros, permitindo que seja transferido ou registrado perante os órgãos competentes. Todavia, se os bens estiverem em mãos de outras pessoas que não aquelas elencadas no inc. IV do 21 art. 515, haverá necessidade de prévia ação de conhecimento do direito do inventariante, herdeiro ou sucessor a eles para que então esteja autorizada a execução. Nos termos do art. 515, V, constitui-se como título executivo judicial o crédito de auxiliar da justiça, quando as custas, emolumentos ou honorários tiverem sido aprovados por decisão judicial. Assim, por exemplo, os honorários que tiverem sido fixados pelo magistrado para pagamento do perito. Também constitui título executivo judicial, a teor do inc. VI do art. 515, a sentença penal condenatória transitada em julgado. Dito dispositivo legal alberga o efeito civil da sentença penal condenatória, que, de acordo com o art. 91 do Código Penal, é o de tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime. Nesta hipótese, muito possivelmente, o valor do dano deverá ser apurado antes da execução propriamente dita, haja vista que esta pressupõe a liquidez da obrigação. Assim sendo, antes de terem início os atos executivos, deverá ser efetivada a apuração do quantum debeatur, o que será feito por meio de liquidação. A Lei 11.719/08 veia a incluir um parágrafo único ao art. 63 do Código de Processo Penal, cuja redação é a seguinte: “Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido”. De outro lado, a Lei 11.719/06 também inseriu o inciso IV ao art. 387, do Código de Processo Penal que dispõe que o juiz criminal, ao proferir a sentença condenatória, “fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos 22 pelo ofendido”. Dito diploma legal veio a permitir que o juiz criminal estabeleça uma indenização mínima, o que não significa dizer que a discussão sobre o quantum debeatur não possa continuar no juízo cível. Esse o significado da parte final do parágrafo único do art. 63, quando utiliza a expressão “sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido”. Na hipótese da vítima do crime desejar responsabilizar outra pessoa que não aquela condenada pelo juízo criminal, mas que, por força da lei material, tem responsabilidade sobre o ato criminoso, não haverá incidência do inc. VI do art. 515. Nessa hipótese, a sentença penal condenatória servirá apenas de documento para provar que houve o crime e que um outro sujeito é responsável pelo ressarcimento à vítima. Entendimento diverso significaria a extensão da condenação criminal, atribuindo verdadeiro efeito ultra partes à sentença penal condenatória. Assim sendo, para quaisquer outras pessoas que não propriamente o causador do dano, é necessário ajuizar ação de conhecimento para que sua responsabilidade seja aferida no juízo cível. O inc. VII do art. 515 equipara a decisão arbitral a uma decisão jurisdicional. Nesse sentido, dispõe o art. 31 da Lei 9.307/96, que a sentença arbitral produz, entre as partes e seus sucessores, os mesmos efeitos da sentença proferida pelos órgãos do Poder Judiciário e, sendo condenatória, constitui título executivo. Conquanto seja título executivo judicial, a sentença arbitral não encontra origem na jurisdição estatal. Dita equiparação encontra amparo no propósito da Lei 9.307/96 em evitar a revisão judicial do quanto for decidido no juízo arbitral (salvo as hipóteses elencadas nos incisos do art. 32 da Lei 9.307/96). 23 A arbitragem, segundo posição doutrinária dominante, constitui atividade jurisdiciona, de modo quea sentença arbitral constitui título executivo. Tanto a sentença estrangeira homologada pelo STJ quanto a decisão interlocutória estrangeira, após a concessão do exequatur à carta rogatória por esse mesmo tribunal constituem título executivo judicial, por força do art. 515, VIII e IX. A Emenda Constitucional n.º 45/04 veio a alterar a competência anteriormente atribuída ao STF, incluindo a alínea “i” ao inc. I do art. 105 da CF/88, passando a homologação de sentença estrangeira a ser de competência do STJ. O procedimento da homologação de sentença estrangeira e de concessão de exequatur à carta rogatória são disciplinados pelos arts. 960 e seguintes do CPC e regulamentado pelo respectivo Regimento Interno do Tribunal. O art. 109, X da CF/88 dispõe que a competência para a execução da sentença estrangeira será da Justiça Federal, independentemente da presença da União, entidade autárquica ou empresa pública federal. Se se tratar de título executivo extrajudicial de origem estrangeira, não há necessidade de prévia homologação do STJ para ser executado no território brasileiro. É o que dispõe o art. 784, § 2.º. 3.6. A necessidade de citação para cumprimento de sentença Dispõe o § 1.º do art. 515, que nos casos dos incisos VI a IX, leia-se, se se tratar de sentença penal condenatória, sentença arbitral, sentença estrangeira homologada pelo STJ ou ainda decisão interlocutória estrangeira, após a concessão do exequatur à carta rogatória pelo STJ, o devedor será citado 24 no juízo cível para o cumprimento da sentença ou para a liquidação no prazo de 15 (quinze) dias. Nessas hipóteses, diferentemente das demais que são reguladas pelo art. 515, como não houve processo precedente perante o juízo cível, é imperioso que o executado seja efetivamente citado. Assim, nesses casos, a execução de títulos judiciais faz-se mediante a instauração de um novo processo. Todavia, de se ressaltar que, nada obstante haja um processo de execução próprio, uma vez instaurado, devem ser seguidas as regras do cumprimento da sentença e não as de execução de títulos extrajudiciais, o que significa que eventual oposição do devedor deverá ser feita por meio de impugnação e não através de embargos do devedor. 3.7. Títulos executivos extrajudiciais Os títulos executivos extrajudiciais vêm tratados no art. 784 do CPC. Tais títulos dão ensejo à execução de título executivo extrajudicial, dando-se início a uma nova relação jurídica processual, eis que independem de instauração de processo prévio. Cuida-se de rol de documentos que possuem eficácia executiva independentemente de decisão judicial a seu respeito. Assim, são títulos executivos extrajudiciais: I – a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque; II – a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; III – o documento particular assinado pelo devedor e por 2 (duas) testemunhas; IV – o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública, pela Advocacia Pública, pelos advogados dos 25 transatores ou por mediador ou conciliador credenciado por tribunal; V – o contrato garantido por hipoteca, penhor, anticrese ou outro direito real de garantia e aquele garantido por caução; VI – o contrato de seguro de vida, em caso de morte; VII – o crédito decorrente de foro e laudêmio; VIII – o crédito, documentalmente comprovado, decorrente de aluguel de imóvel, bem como de encargos acessórios, tais como taxas e despesas de condomínio; IX – a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei; X – o crédito referente às contribuições ordinárias ou extraordinárias de condomínio edilício, previstas na respectiva convenção ou aprovadas em assembleia geral, desde que documentalmente comprovadas; XI – a certidão expedida por serventia notarial ou de registro relativa a valores de emolumentos e demais despesas devidas pelos atos por ela praticados, fixados nas tabelas estabelecidas em lei; XII – todos os demais títulos aos quais, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva. Deve-se ter presente que a propositura de qualquer ação relativa a débito constante de título executivo não obsta a que o credor venha a promover a execução do título. Ao lado disso, conforme já dissemos, os títulos executivos extrajudiciais estrangeiros não dependem de homologação judicial para serem executados. Contudo, o título estrangeiro só terá eficácia executiva quando satisfeitos os requisitos de formação exigidos pela lei do lugar de sua celebração e quando o Brasil for indicado como o lugar de cumprimento da obrigação. Ainda, é importante mencionar o disposto no art. 785, do CPC. Por aludido dispositivo legal, a existência de título executivo extrajudicial não impede a parte de optar pelo processo de conhecimento, a fim de obter título executivo judicial. Em outros termos, ainda que o credor tenha em mãos algum dos títulos descritos em lei, pode, mesmo assim, propor ação de conhecimento, com o propósito de vir a obter título executivo judicial, que se sujeita a impugnações menos contundentes que aquele primeiro. 26 4. Cumprimento de sentença e execução por quantia certa e demais procedimentos 4.1. Generalidades Neste passo, cumpre-nos voltar nossa atenção a para execução por quantia certa contra devedor solvente lastreada em título executivo judicial. Os arts. 513 e seguintes, em homenagem à ideia de sincretismo processual, passaram a regulamentar o cumprimento da sentença. Primeiramente nos cumpre advertir que o art. 523 não diz respeito ao cumprimento de qualquer sentença. Volta-se o dispositivo a regulamentar uma modalidade específica de sentença, qual seja, a que determina o pagamento em dinheiro. Isso porque, se estivermos diante de uma sentença que ordene o cumprimento de obrigação de fazer ou de não fazer o seu cumprimento far-se-á nos moldes dos arts. 536 e seguintes. Na hipótese da sentença determinar uma obrigação de entregar coisa que não seja dinheiro, o seu cumprimento far-se-á de acordo com os ditames do art. 538. “Execução” e “cumprimento de sentença” devem ser tidas como expressões sinônimas. Ambas querem significar o desenvolvimento de atividade jurisdicional voltada à satisfação do direito reconhecido ao credor, em título judicial ou extrajudicial. Na verdade, o cumprimento de sentença (leia-se: execução) realizar-se, como regra, nos próprios autos, como uma fase subsequente à de conhecimento, sem instauração de um processo de execução autônomo. Nos termos do art. 532 “no caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o 27 cumprimento definitivo da sentença, far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver”. De outro lado, não ocorrendo pagamento voluntário no prazo de 15 (quinze) dias, o débito será acrescido de multa de dez por cento e, também, de honorários de advogado de dez por cento, nos termos do art. 523, § 1.º, do CPC. Diante de sentença que reconheça a obrigação do devedor de pagar quantia certa (a qual não precisa ser necessariamente condenatória), tem o devedor quinze dias para adimplir a prestação imposta pelo provimento jurisdicional sob pena de terem início as providências elencadas no art. 523, entre as quais a incidência de multade 10% sobre o valor total da condenação e também de honorários de advogado de 10%. A multa de 10% tem como principal função a de incentivar o devedor a acatar voluntariamente o disposto na sentença. Pode incidir sobre o restante, caso o pagamento seja parcial (§2º do art. 523). Não cumprida a ordem judicial determinada na sentença no prazo de 15 dias a partir da intimação do devedor, o § 3.º, do art. 523 estabelece claramente não só a imposição de multa, como também prescreve o início das atividades jurisdicionais voltadas à satisfação daquilo que houver sido certificado na sentença. A intimação para pagamento deve ser feita, como regra, na pessoa do advogado do devedor, devendo ser observadas as exceções do art. 513, § 2.º, do CPC. O devedor, nos termos do art. 526 pode dar início ao cumprimento da sentença. Abre-se, a ele a oportunidade de, assim querendo, cumprir o julgado. Nesse caso, antes de ser intimado para o cumprimento da sentença é lícito ao réu 28 comparecer em juízo e oferecer em pagamento o valor que entender devido, apresentando memória discriminada do cálculo. Como deflui claro da leitura do art. 523, o início dos atos executivos dependerá sempre da iniciativa do credor. Mencionado dispositivo alude expressamente à necessidade de “requerimento”. Incide aqui plenamente o princípio dispositivo. Não há, porém, ao menos como regra, instauração de um novo processo, senão que o devedor deverá ser intimado na pessoa de seu advogado. O requerimento formulado pelo credor deve ser suficientemente instruído com os dados do patrimônio do executado, bem como com os demais requisitos do art. 524. Ao lado do início dos atos expropriatórios, a falta de pagamento no prazo de 15 (quinze) dias de que cuida o art. 523, conduz ao início do prazo sucessivo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação ao cumprimento de sentença, hipótese em que poderá veicular todas as matérias de que cuida o art. 525. Tenha-se presente, ademais, o quanto estabelecido no art. 518, no sentido de que “todas as questões relativas à validade do procedimento de cumprimento de sentença e dos atos executivos subsequentes poderão ser arguidas pelo executado nos próprios autos e nestes serão decididas pelo juiz”. Ainda,, prescreve o art. 525, § 11 que “as questões relativas a fato superveniente ao término do prazo para apresentação da impugnação, assim como aquelas relativas à validade e à adequação da penhora, da avaliação e dos atos executivos subsequentes, podem ser arguidas por simples petição, tendo o executado, em qualquer dos casos, o prazo de 15 (quinze) dias para formular esta arguição, contado da comprovação da ciência do fato ou da intimação do ato”. 29 A impugnação ao cumprimento de sentença, por si só, não tem o condão de suspender o cumprimento de sentença. Nada obsta, contudo, que seja atribuído efeito suspensivo à impugnação, nos termos do art. 525, § 6.º, caso que dependerá de requerimento do executado, garantia do juízo e ainda da demonstração de requisitos da relevância dos fundamentos, bem como da urgência. De outro lado, caso a obrigação de pagar quantia esteja retratada em título executivo extrajudicial, o procedimento é outro. Nos casos de execução de título extrajudicial, o início da atividade executiva dar-se-á com a provocação do Poder Judiciário através da petição inicial (arts. 798 e 799). Aqui, não existiu anteriormente atividade jurisdicional, como nas hipóteses de título executivo judicial, em que as atividades tendentes à expropriação do patrimônio do devedor para satisfação do direito do credor iniciam-se com requerimento do interessado nos moldes do art. 523 inaugurando a fase de cumprimento de sentença no mesmo processo em que proferida a decisão da fase de conhecimento. Uma vez admitida a inicial, deve ser determinada a citação do executado para adimplemento da sua obrigação no prazo de três dias, fixando, o juiz, os honorários do advogado (arts. 827 e 829). Diferentemente do que sucede como regra, na fase de cumprimento de sentença, aqui há instauração de um novo processo, de modo que, como dito, o executado será citado para pagamento em três dias. A citação, seja permitido, enfatizar, é para pagamento. Dispõe o art. 827, § 1.º que, caso haja pagamento integral em três dias, a verba honorária será reduzida pela metade. Por outro lado, é a partir da 30 citação que o executado pode apresentar embargos à execução, nos termos do art. 914 e 915 ou propor o pagamento parcelado, nos moldes previstos no art. 916. As matérias suscetíveis de serem arguidas nos embargos encontram-se estampadas no art. 917. Tenha-se presente que assim como a impugnação ao cumprimento de sentença, os embargos à execução não dispõe de efeito suspensivo automático (art. 919). Contudo, tal efeito poderá ser atribuído aos embargos, a requerimento do embargante quando verificados os requisitos para a concessão da tutela provisória (art. 300) e desde que a execução já esteja garantida por penhora, depósito ou caução suficientes. Relativamente às obrigações de pagar quantia, repise-se que existe critério classificatório próprio. Isso porque em alguns casos, a lei prescreve procedimentos especiais para a prática dos atos executivos. Se a dívida tiver origem alimentar, há normas especiais no próprio CPC que tratam do assunto (arts. 528 e subsequentes e arts. 911 a 913), além de lei extravagante referente ao assunto (Lei 5.478/68), devendo-se observar que houve revogação, nesse particular, dos arts. 16 a 18, da Lei 5.478/68, nos termos do art. 1.072, V, do CPC/2015. De outro lado, a dívida pode ter origem em alguma obrigação de que participe a Fazenda Pública. Nesse contexto, sendo devedora a Fazenda Pública, a Constituição Federal, no art. 100 e a lei infraconstitucional (arts. 534, 535 e 910) estabelecem procedimentos diferenciados para a execução, que se justificam principalmente tendo em vista a impenhorabilidade dos bens públicos, bem como a necessidade de respeito ao princípio constitucional da isonomia. 31 Nas obrigações de pagar quantia, as técnicas sub-rogatórias encontram amplo espaço de aplicação. Isso porque há, conforme vimos, a classificação que desdobra a execução de acordo com a modalidade da obrigação. Esse critério classificatório leva em consideração a modalidade de obrigação constante do título executivo, visto que são diferentes as regras apropriadas para a realização do direito nele retratado. Nesse contexto, se se tratar de obrigação de dar coisa, sua execução será implementada segundo as regras constantes dos arts. 538 e 802 a 813. Para as obrigações de fazer e não fazer, aplicam-se os arts. 536 e 537 e arts. 814 a 823. No que tange às obrigações de pagar, tratando-se de execução baseada em título judicial, esta seguirá as regras do art. 523 e seguintes. Na hipótese da execução ser baseada em título executivo extrajudicial, aplicam-se os arts. 824 e seguintes. Pode-se dizer, grosso modo, que as técnicas sub-rogatórias são mais adequadas para as execuções por quantia, ao passo que a execução indireta revela-se mais apropriada no caso de execução de obrigação de fazer ou de não fazer, bem como na de entregar coisa. Sem prejuízo, essas distinções não são absolutas, sobretudo em função do art. 139, IV, do CPC.