Prévia do material em texto
Moisés Bertoni: Uma Vida para a Ciência. Aline Niemeyer e Evaldo Buttura. Editora Epígrafe Foz do Iguaçu, 2012. 54 capítulos 202 páginas “Que sean incansables en estudiar, constantes en experimentar e prudentes en reformar.” Moisés Bertoni Professor de integração das Ciências Naturais e Humanas O livro revisado trata da vida do naturalista Moisés Santiago Bertoni (1857 – 1929) de cultura enciclopédica, conhecido popularmente como “El Bigotón” na trifron Argentina, Brasil e Paraguai. Ele nasceu na Suíça, onde há a pluralidade de línguas, o que incentiva o poliglotismo e o aprendizado de que os homens são capazes de se entender quanto há boa vontade. Falava italiano, espanhol, francês, latim, alemão, inglês, português, romanche e guarani, do qual compôs uma gramática: La Lengua Guarani como Documento Histórico, publicada em 1920, uma de suas 530 publicações científicas. Bertoni influenciou intensamente a região das trifon. Em 1918 instalou, em plena selva, a Editora ExSylvis (Da Selva), a qual foi responsável pela impressão do primeiro jornal da região chamado Jornal do Alto Paraná, escrito em dois idiomas: espanhol e português. A casa e sede da Editora ExSylvis são protegidas legalmente desde 1955, e atualmente é o Monumento Científico Moisés Bertoni - Patrimônio Natural e Cultural do Paraguai, o qual preserva parte do acervo multidiversificado da época. Aos 17 anos ingressou na Universidade de Genebra para estudar Direito, polivalente, curioso e inteligente pesquisou diferentes área das ciências entre elas: Antropologia, Astronomia, Botânica, Geografia, Medicina, Meteorologia, Mineralogia, Política, Química, Sociologia e Zoologia. Abandonou o curso de Direito para iniciar o de Ciências Naturais na Universidade de Zurique, e aos 19 anos casou-se com Eugenia Rossetti, sua companheira de estudos. Tiveram 13 filhos. Dedicou-se especialmente à Botânica na faculdade de Ciências Naturais. Carl Von Linné (1707-1778) fortaleceu em Bertoni a importância da observação detalhada da natureza. Em 1882 publicou sua primeira obra científica das 530 que viria a produzir. O enciclopedismo, o detalhismo e os ideais humanitários compunham a essência de seus trabalhos científicos. Bertoni sob a inspiração da filosofia chinesa taoísta de LaoTse (604 até 531 a.C.), dos filósofos franceses Rousseau e Fourier e do humanista inglês Thomas Moore, sonhava desde a juventude com uma colônia agrícola autossustentável semelhante às dos Jesuítas, porém isenta de dogmas religiosos. Esse sonho o trouxe à América do Sul, e em 1884, Bertoni, seus familiares e agricultores contemporâneos atravessaram o Oceano Atlântico. Primeiro instalou-se na Argentina e mais tarde no Paraguai. Idealizava a irmandade universal, ao conhecer a civilização guarani viu nela um exemplo de sociedade a ser seguido. Povo, na qual a característica que mais se destaca é a generosidade. A maturidade coletiva dos guaranis impressionava Bertoni, pois eram organizados em um comunismo espontâneo, em uma sociedade econômica sem mercado, instintivamente ajustada à coletividade e ao comunismo puro, sendo que um é sócio-amigo do outro. O livro traz em detalhes a vida deste cientista que estava à frente do seu tempo. Há 110 anos, Bertoni já tinha dados da perda da fertilidade dos solos, variações climáticas e poluição atmosférica, consequências da destruição do manto florestal com uso das queimadas. Publicou intensamente, disposto a transmitir seus conhecimentos e experiências de maneira clara, detalhada e prática. Dava especial atenção ao modo de proteger a independência dos agricultores de interesses capitalistas, e de ensinar como utilizar a terra sem agredi-la, pois já previa as mazelas a serem causadas pelo consumismo excessivo ao se importar com o equilíbrio entre a produção e consumo. Em meio às adversidades da Mata Atlântica, do clima e das políticas governamentais, mantinha constante a motivação de manter-se produtivo, pois considerava que a Ecologia e a Sociologia eram ciências de relações e tinham o desafio de romper fronteiras, estabelecendo a conexão entre as mais diferentes espécies, incluindo a humanidade. O livro também traz informações da atuação de Bertoni como professor. Ele valorizava os conhecimentos práticos, promovendo regularmente excursões práticas, e tinha como propósito a transmissão de conhecimentos científicos-econômicos e novas soluções para o aproveitamento eficaz da terra. Sabia conjugar produção agrícola e investigação científica. Na condição de professor era prático, idealista e ousado. Comentava que os homens incorriam em dois graves nos erros: o de não perceberem ser a causa da maior parte dos males que nos afligem como também das boas condições de vida e o de buscar a felicidade onde ela não possa estar. Bertoni é bom exemplo para o ensino das Ciências Naturais, devido a sua determinação e de autodidatismo. Sua biblioteca pessoal de estudo e pesquisa continha mais de 17.600 volumes. O nível, a variedade, a profundidade e a extensão de pesquisas realizadas por Bertoni é impressionante. Embora estivesse no meio da selva, mantinha contato com os maiores cientistas internacionais de sua época. Além disso, era uma pessoa influente na região, e periodicamente recebia a visita de políticos e pessoas ilustres, tais como Alberto Santos Dumont. Através de seu contato com os povos guaranis descobriu a stévia (adoçante natural análogo a glicose) e o uso das plantas medicinais, cuja pesquisa ajudou no tratamento de grande epidemia de malária na região, tornando Bertoni reconhecido como o médico dos pobres. Bertoni, exemplo da aplicação prática da interdisplinaridade, era pesquisador e conhecedor de Agronomia, Antropologia, Astronomia, Botânica, Cartografia, Climatografia, Comércio, Educação, Entomologia, Etnologia, Fitoterapia, Geografia, Linguística, Medicina, Meteorologia, Mineralogia, Química, Sociologia, Topografia, Zoologia e outras áreas científicas mais que pudesse lhe interessar. Seus métodos de estudos, investigação e ensino buscavam interligar diversas áreas científicas, unindo as áreas das ciências naturais às humanas. O livro traz a essência da personalidade de Bertoni, para ele “nada é mais difícil do que desarraigar-se das ideias pré-concebidas”, assim valorizava a seriedade das pesquisas científicas e não admitia preconceitos. Utilizava a metodologia científica do filósofo chinês, professor de Confúcio, LaoTse do trinômio intuição-análise-dedução., ou seja, indução(hipóteses), observações (coleta de dados) e conclusões. Bertoni é um notório exemplo de pesquisador/professor interdisciplinar a ser estudado e seguido, pois, provavelmente, tem muito a colaborar para o ensino de interdisciplinar de ciências naturais, um desafio constante no dia-a-dia escolar da atualidade, a qual ele já havia superado a mais de um século atrás. Para Bertoni é a história que faz os povos, assim sendo quem se importa com a História compreende e se responsabiliza pela sociedade na qual está inserido, percebe o envolvimento da relação consequência do passado-presente e presente-passado. Também ao estudar o princípio do apoio mútuo, o qual fundamenta-se na ética e na moral de cooperação, acrescentou a este o conceito de sensibilidade e assim incluía a relevância da sensibilidade nas relações humanas, inclusive dentro do detalhismo e da integração das observações científicas. Bertoni observou a condição mutante da natureza moral humana em contraposição com a imutabilidade da tradição, no entanto, paradoxalmente, embora o homem em sua natureza anseie por mudanças, ainda se desorienta ao lidar com elas. Assim percebeu a sabedoria da educaçãoinfantil guarani que ocorria sem repreensões nem castigos, mas buscavam explicar para que as crianças entendessem a razão. A educação infantil guarani era pautada no princípio de que a delicadeza estimula a dignidade. O livro dedica-se me grande parte na descrição da cultura guarani, na qual Bertoni sentiu profundamente identificado, pois ele também fazia questão de relacionar o respeito à natureza ao respeito recíproco entre os homens. Respeitar a natureza significava, antes de tudo, autorrespeito, correspondente à livre expressão das potencialidades naturais. O livro traz ricos detalhes da biografia deste notório cientista, onde cada novo capítulo é recheado de surpreendentes informações. Informações essas que nós fazem viajar para o fascinante modo de pensar ciências. Uma obra gratificante por nós apresentar essa personalidade ímpar e de impressionante força em despertar a generosidade, a criatividade e a motivação para a busca do saber. Seu pioneirismo e empreendedorismo como professor/pesquisador interdisciplinar podem inspirar tanto estudantes, professores, cientistas em prol da construção das pedras fundamentais de uma sociedade ética, honesta, generosa e cidadã. E, principalmente, mostra como é possível integrar diversos saberes, ensinando-nos como fazer a profilaxia dos preconceitos. Os educadores de vários países podem encontrar inspirações para atualizar seus métodos de ensino de ciências naturais e integrá-los às ciências humanas e assim, potencializar seu próprio desenvolvimento profissional, bem como de seus estudantes. Tanise Knakievicz, PhD. Biologia Molecular e Celular; Diretora do espaço Multiverso: Oficina Científica.