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CURSO TÉCNICO EM SERVIÇOS JURÍDICOS
INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO
Centro de Educação Tecnológica do Amazonas
MANAUS - AMAZONAS
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2015
SUMARIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 4
1 A INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO ............................................................... 6
1.1 A IMPORTÂNCIA DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO .............................. 6
1.2 NATUREZA DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO ....................................... 6
1.3 OUTRAS DISCIPLINAS QUE TRAZEM IDEIA GERAL DO DIREITO ......................... 7
1.4 FENÔMENO DA SOCIABILIDADE HUMANA .............................................................. 7
1.5 DIREITO COMO PROCESSO DE ADAPTAÇÃO ........................................................... 8
1.6 AS AÇÕES HUMANAS E O DIREITO ............................................................................ 9
1.7 FORMAS DE INTERAÇÃO SOCIAL E AÇÃO DO DIREITO ......................................... 9
2 A NOÇÃO DO DIREITO ................................................................................................... 11
2.1 O NASCIMENTO DO DIREITO ....................................................................................... 11
2.2 CONCEITO DE DIREITO ................................................................................................. 11
2.2.1 Considerações prévias ..................................................................................................... 11
2.2.2 Definições do direito ....................................................................................................... 12
2.3 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO ..................................................................... 14
2.4 DIREITO E MORAL ......................................................................................................... 19
2.4.1 Considerações preliminares ............................................................................................. 19
2.4.2 Teoria do mínimo ético ................................................................................................... 20
2.4.3 Do cumprimento das regras sociais .................................................................................. 21
2.4.4 Direito e coação .............................................................................................................. 24
2.4.5 Teoria tridimensional do direito ....................................................................................... 25
2.4.5.1 A instituição de Dante .................................................................................................. 26
2.4.5.2 Estrutura tridimensional do direito ................................................................................ 27
3 NORMA JURÍDICA ........................................................................................................... 30
3.1 INTRODUÇÃO A NORMA JURÍDICA ............................................................................ 30
3.2 CONCEITO DE NORMA JURÍDICA ............................................................................... 30
3.3 CARACTERÍSTICAS DAS NORMAS JURÍDICAS ......................................................... 31
3.4 CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICAS .............................................................. 32
4 DIREITO NATURAL E DIREITO POSITIVO ................................................................ 33
4.1 DIREITO NATURAL ........................................................................................................ 33
4.1.1 Caracteres do direito natural ............................................................................................ 34
4.2 DIREITO POSITIVO ......................................................................................................... 34
4.2.1 Caracteres do direito positivo .......................................................................................... 35
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4.2.2 A divisão do direito positivo: direito público e direito privado ......................................... 35
4.2.3 Os ramos do direito público e direito privado .................................................................. 36
4.3 Parâmetros de distinção entre direito natural e direito positivo............................................ 39
5 DIREITO OBJETIVO E DIREITO SUJETIVO............................................................... 40
5.1 DIREITO OBJETIVO ........................................................................................................ 40
5.1.1 As normas de conduta e direito objetivo .......................................................................... 41
5.1.2 Origem do direito objetivo............................................................................................... 42
5.2 DIREITO SUBJETIVO ...................................................................................................... 43
5.2.1 Classificação dos direitos subjetivos ................................................................................ 43
6 FONTES DO DIREITO ...................................................................................................... 46
6.1 FONTES MATERIAIS ...................................................................................................... 47
6.2 FONTES FORMAIS .......................................................................................................... 47
6.3 CONCEITO E FORMAÇÃO DA LEI................................................................................ 47
6.3.1 Iniciativa da lei ................................................................................................................ 48
6.3.2 Exame pelas comissões técnica, discussão e aprovação ................................................... 48
6.3.3 Revisão do projeto ........................................................................................................... 49
6.3.4 Sanção............................................................................................................................. 49
6.3.5 Promulgação ................................................................................................................... 49
6.3.6 Publicação ....................................................................................................................... 49
6.3.7 A hierarquia das leis ........................................................................................................ 49
6.3.8 Vigência das leis ............................................................................................................. 50
6.3.9 Integração da norma jurídica ........................................................................................... 50
6.4 COSTUMES ...................................................................................................................... 51
6.4.1 Costume – secundum legem, praeter legem e contra legem .............................................. 51
6.5 A LEI E O COSTUME – DISTINÇÕES BÁSICAS ........................................................... 52
6.6 DOUTRINA ...................................................................................................................... 56
6.7 JURISPRUDÊNCIA .......................................................................................................... 56
6.8 ANALOGIA ...................................................................................................................... 56
6.9 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO ................................................................................56
7 RELAÇÃO JURÍDICA ...................................................................................................... 57
7.1 RELAÇÃO JURÍDICA E RELAÇÃO DE FATO .............................................................. 58
7.2 FORMAÇÃO DA RELAÇÃO JURÍDICA ......................................................................... 59
7.3 ELEMENTOS DA RELAÇÃO JURÍDICA........................................................................ 60
7.4 ESPÉCIE DE RELAÇÃO JURÍDICA ................................................................................ 60
7.5 SUJEITO DE DIREITO E PERSONALIDADE JURÍDICA .............................................. 62
7.5.1 Personalidade e capacidade ............................................................................................. 62
7.6 DAS PESSOAS JURÍDICAS ............................................................................................. 66
7.6.1 Pessoa jurídica de direito público interno......................................................................... 71
7.6.2 Pessoa jurídica de direito privado .................................................................................... 73
8 TÉCNICA JURÍDICA ........................................................................................................ 74
8.1 ESPÉCIES DE TÉCNICAS JURÍDICAS ........................................................................... 74
8.1.1Técnica de interpretação ................................................................................................... 74
8.1.2 Técnica de aplicação ....................................................................................................... 74
8.2 TÉCNICA LEGISLATIVA ................................................................................................ 75
8.2.1 Apresentação material dos atos legislativos ..................................................................... 75
9 HERMENÊUTICA OU INTEGRAÇÃO DO DIREITO ................................................... 77
9.1 A INTERPRETAÇÃO GRAMATICAL E A SISTEMÁTICA ........................................... 77
9.2 A INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA E A EVOLUTIVA ................................................... 79
9.3 COMPREENSÃO ATUAL DO PROBLEMA HERMENÊUTICO .................................... 80
9.4 INTEGRAÇÃO E APLICAÇÃO DO DIREITO ................................................................ 81
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9.5 NATUREZA LÓGICA DA APLICAÇÃO DO DIREITO .................................................. 82
REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 85
INTRODUÇÃO
Os avançados estudos desenvolvidos sobre o Direito, atualmente, diversificam-se em
vários planos de pesquisa, que no conjunto tendem a favorecer a ampla compreensão do
fenômeno jurídico decorrente da sociabilidade do homem. Por ser objeto de estudo de
inúmeras disciplinas afins, o Direito não se perde a sua unidade fundamental e sim a
fenômenos jurídicos concretos, apesar do seu enfoque unilateral, as noções trazidas por sua
composição concretizam-se pela sua aplicabilidade nas realidades concretas.
As disciplinas do Direito se dividem em duas classes: as chamadas disciplinas
fundamentais e as auxiliares. Nelas se destacam ao primeiro grupo a ciência do Direito,
Filosofia do Direito e Sociologia do Direito, enquanto que no segundo grupo temos a História
do Direito e o chamado Direito Comparado.
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O conhecimento do Direito se faz através de cada uma dessas disciplinas, que abrem,
cada qual, um visão própria de estudo, capaz de alcançar o conhecimento sistemático jurídico.
Para isso contudo, necessário se faz o estudo evolutivo do Direito, com sua ênfases e
compreensão plena dessa ciência que exige aprofundamentos anteriores ao homem e da
própria sociedade. O Direito decorre da plenitude social, pois não se pode ter sociedade sem
Direito, e tão pouco Direito sem sociedade (ubi societa ib jus).
A Introdução ao Estudo do Direito, em muito contribui nesse conhecimento, pois
como matéria de iniciação fornece noções fundamentais para compreensão dos conceitos
jurídicos que especificamente em matérias peculiares serão aprofundados, mas isso, não
significa que não possam desde já ser apresentados ao iniciante ao estudo do Direito, o que
passaremos a ver apartir de agora pelo desenvolvimento das temáticas adjacente.
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1 A INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO
A Introdução ao Estudo do Direito é a matéria de iniciação que fornece aos estudantes
noções primordiais para compreensão do universo jurídicos. Embora possua conceitos
voltados à ciência, a Introdução ao Estudo do Direito em si não é ciência, mas um sistema de
ideias gerais estruturadas para atender a finalidade pedagógica
Tem como objetivo o fornecimento aos iniciantes estudantes jurídicos uma visão
global do Direito, no qual não pode ser obtida através de estudos isolados dos diferentes
ramos jurídicos.
Nesta disciplina se aprende os conceitos gerais como o de Direito, fato jurídico,
relação jurídica, lei, justiça, segurança jurídica, muito usados nos diferentes ramos do Direito
com suas peculiaridades.
Não se trata em IED conceitos específicos, tais como, desapropriação, aviso prévio,
crime, primeiramente porque fogem da finalidade a que se propõe O estudo desta disciplina e
segundo porque são particulares a determinados ramos jurídicos:
Concluindo-se, portanto, que podemos dizer que em IED possui um tríplice objeto:
a) os conceitos gerais do Direito;
b) a visão de conjunto do Direito;
c) os lineamentos da técnica jurídica.
1.1 A IMPORTÂNCIA DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO
A importância desta disciplina, não decorre tão somente de propiciar a adaptação às
noções essenciais à formação de uma consciência jurídica, mas também a adequação ao
estudantes jurídicos aos termos da área bastante usados, tais como, brocados; além de
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descortinar os horizontes do Direito pelo estudo dos conceitos jurídicos fundamentais,
fazendo-os raciocinar enquanto futuros operadores da área.
1.2 NATUREZA DA INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO
Não é a Introdução ao Estudo do Direito uma ciência no sentido rigoroso da palavra,
por faltar-lhe um campo autônomo e próprio de pesquisa, mas é ciência enquanto sistema de
conhecimento logicamente ordenados, segundo um objetivo preciso de natureza pedagógica.
Não importa, pois que seja um sistema de conhecimentos recebidos de outras ciências e
articatisticamente unificados.
Trata-se, em suma, de ciência introdutória, como a própria palavra está dizendo, ou
seja, uma ciência propedêutica, na qual o elemento de arte é decisivo.
Podemos então concluir que a Introdução ao Estudo do Direito é um sistema de
conhecimentos, recebidos de múltiplas fontes de informação, destinados a oferecer os
elementos essenciais ao estudo do Direito, em termos de linguagem e de métodos, com uma
visão preliminar das partes que o compõem e de sua complementaridade, bem como de sua
situação na historia da cultura.
1.3 OUTRAS DISCIPLINAS QUE TRAZEM IDEIA GERAL DE DIREITO
Filosofia do Direito. A Filosofia do Direito é uma reflexão sobre o Direito e seus
postulados, com o objetivo de formular o conceito de Jus (Direito) e de analisar as instituições
jurídicas no plano do dever ser.
Teoria Geral do Direito. É a disciplina formal que apresenta conceitos úteis à
compreensão de todos os ramos do Direito. Seu objeto consiste na analise e conceituação dos
elementos estruturais e permanentes do Direito, como suposto e disposição da norma jurídica,
coação, relaçãojurídica, fato jurídico, fontes formais.
Sociologia do Direito. O estudo das relações entre a sociedade e o Direito,
desenvolvido em ampla extensão pela Sociologia do Direito. Esta não pode ter seu conteúdo
limitado ao problema da efetividade do Direito, nem empreender aquela pesquisa em
profundidade, em nível de especialização.
1.4 FENÔMENO DA SOCIABILIDADE HUMANA
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A formação humana, desde sua constituição, nos revela que o ser humano foi criado
para conviver e se relacionar com outro ser de sua espécime. Como decorrência dessa natural
união, a prole, passou a atuar como fator de organização e estabilidade do núcleo familiar.
Resultado disso, os pequenos grupos caracterizados pelos sentimentos de afetos tendeu a
propagar-se em cadeia até a formação de um grande grupo social.
O estudo histórico demonstra que o homem é capaz, durante algum tempo, de viver
isolado. Contudo, não durante toda a sua existência, o que leva a caracterização de ser social.
Nesta linha do estudo do fenômeno da sociabilidade humana, Aristóteles já dizia que o
homem fora da sociedade é “um bruto ou um deus”, considerando-se como algo inferior ou
superior à condição humana. Na visão aristotélica este homem viveria alienado sem
discernimento próprio ou se consideraria um ser perfeito acima do bem e do mal, na condição
a não ser alcançada.
São Tomás de Aquino, no mesmo estudo que Aristóteles resolveu realizar indica três
hipóteses para a vida humana fora da sociedade:
a) mala fortuna
b) corruptio naturae
c) excellencia naturae
1.5 DIREITO COMO PROCESSO DE ADAPTAÇÃO
A relação entre a sociedade e o Direito apresenta um duplo sentido de adaptação: de
um lado, o ordenamentos jurídico é elaborado como processo de adaptação social e, para isso
se ajusta-se às condições do meio; de outro, o Direito estabelecido cria a necessidade de o
povo adaptar o seu comportamento aos novos padrões de convivência.
A vida em sociedade pressupõe organização e implica a existência do Direito. A
sociedade cria o Direito no propósito de formular as bases da justiça e segurança. Com este
processo as ações sociais ganham estabilidade. A vida social torna-se viável. O Direito,
porém, não é uma força que gera unilateralmente, o bem-estar social. Por definição, o Direito
deve ser uma expressão da vontade social e assim, a legislação deve apenas assimilar os
valores positivos que a sociedade estima viver. O Direito, portanto, não pode ser tratado como
formula de transformação da natureza humana e sim sua adequação.
Para o home e para a sociedade, o Direito não constitui um fim, apena um meio para
tornar possível a convivência e progresso social.
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De forma enfática, Pontes de Miranda se refere ao Direito como um fenômeno de
adaptação: “O Direito não é outra coisa que processo de adaptação”, “Direito é processo de
adaptação social, que consiste em se estabelecerem regras de conduta, cuja incidência é
independente da adesão daqueles a que a incidência da regra jurídica possa interessar.”
A vinculação entre Direito e necessidade, essencial À compreensão do fenômeno
jurídico como processo adaptativo, é feita também por Renaséns Siches, quando afirma que
“o Direito é algo que os homens fabricam em sua vida, sob estimulo de umas determinadas
necessidades; algo que vivem em sua existência com o propósito de satisfazer àquelas
necessidades...”
1.6 AS AÇÕES HUMANAS E O DIREITO
A sociedade cria o Direito e, ao mesmo tempo, se submete aos seus efeitos, suas
normativas, suas regras. O novo Direito propõe a imposição de regras por meio da
assimilação e posteriormente, adéqua às atitudes.
A definição do espírito das leis a sociedade para ser regida por parâmetros, cada uma
adequando as ações humanas. Em relação aos seus interesses particulares e na gestão de
negócios, os homens pautam o seu comportamento e se guiam em conformidade com os
atuais conceitos de licito e de ilícito.
1.7 FORMAS DE INTERAÇÃO SOCIAL E AÇÃO DO DIREITO
As pessoas e os grupos sociais se relacionam estreitamente, na busca de seus
objetivos. Os processos de mutua influência, de relações interindividuais e intergrupais, que
se formam sob a força de variados interesses, denominam-se interação social.
A interação social se apresenta sob forma de cooperação, competição e conflito e
encontra no Direito a sua garantia, o instrumento de apoio que protege a dinâmica das ações.
Na cooperação as pessoas estão movidas por igual objetivo e valor e por isso
conjugam o seu esforço. A interação se manifesta direta e positiva. Na competição há disputa,
uma concorrência, em que as partes procuram obter o que almejam, uma visando à exclusão
da outra. Uma grande característica da sociedade moderna, esta forma revela atividades
paralelas em que cada pessoa ou grupo procura reunir os melhores trunfos.
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O conflito se faz presente a partir do impasse, quando os interesses em jogo não
logram uma solução pelo dialogo e as partes recorrem à luta, moral ou física, ou buscam a
mediação da justiça. Podemos definir como oposição de interesses.
Os conflitos são fenômenos naturais à sociedade, podendo-se até dizer que lhe são
imanentes. Quanto mais complexa a sociedade, quanto mais se desenvolve, mais se sujeita a
novas formas de conflitos.
Nesse sentido, o Direito advém como forma de intervenção, favorecendo para o amplo
relacionamento das pessoas e dos grupos sociais, em uma finalidade de paz em convívio. Ao
separa o licito do ilícito, segundo os valores de convivência que a própria sociedade elege, o
ordenamento jurídico torna possível os nexos de cooperação e disciplina as competições, por
meio do estabelecimento de limites necessários ao equilíbrio e à justiça nas relações.
Em relação ao conflito, a ação do Direito se opera em duplo sentido. Se de um lado,
temos o anseio de evitar desinteligências quanto aos direitos que cada parte julga ser
portadora; por outro, diante do conflito concreto, o Direito apresenta solução de acordo com a
natureza do caso, quer seja para definir o titular do direito, quer seja para restaurar situações
anteriores ou quer seja para aplicar penalidades de diferentes tipos, daí o silogismos da
sociabilidade expressa pelos elos que vinculam o homem, a sociedade e o Direito: Ubi homo,
ibi societas; ubi societas, ibi jus; ergo, ubi homo, ibi jus (onde o homem, aí a sociedade; onde
a sociedade, aí o Direito; logo, onde o homem, aí o Direito).
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2 A NOÇÃO DO DIREITO
2.1 O NASCIMENTO DO DIREITO
Resultante da necessidade de se estabelecer um conjunto de regras que dessem certa
ordem à vida em sociedade, o Direito surge apartir dos processos de mútua influência, de
relações interindividuais e intergrupais formadas de maneiras variadas de acordo com os
interesses naquilo que denominamos interação social. Ubi societa, ib jus – Onde houver
sociedade, aí estará o Direito.
A interação social se apresenta sob as formas de cooperação, competição e conflito e
encontra no Direito a sua garantia o instrumento de apoio de proteção as ações.
Na cooperação os seres humanos comulgam o mesmo objeto e valor, onde os esforços
passam a ser mútuos em prol de todos, neste caso a interação vem a se manifestar de maneira
direta e positiva. Já na competição os objetivos e valores são inversos, os esforços não são
cooperados, há uma disputa, uma concorrência, onde cada um procura obter o que almeja
sempre visando excluir o outro. Muitas vezes nossa sociedade moderna comuga estes
caracteres, em vezes que as pessoasagem de maneira cooperada e outras vezes como
concorrentes.
No conflito a interação social se faz presente pelos impasses, quando não se consegue
solucionar as divergências por meio do diálogo e as partes recorrem à luta, moral ou física.
No conflito a interação é direta e negativa.
Todas as vezes que as interações sociais resultantes das formas de cooperação ou
competição estiverem potencialmente conflituosas o Direito irá disciplinar, já nos conflitos,
sempre haverá a possibilidade de mediação do Direito, pois, os conflitos são fenômenos
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naturais da sociedade, inerentes da complexidade da convivência, é como já se afirmou “o
maior desafio não é o de como viver e sim o da convivência”.
2.2 CONCEITO DE DIREITO
2.2.1 Considerações Prévias
A ampla divergência entre os juristas, quanto À definição do Direito levou Kant a
afirmar, no século XVIII, que os “juristas ainda estão à procura de uma definição para o
Direito”. Decorridos dois séculos e meio, sob certo aspectos, mantém-se atual, de vez que os
cultores da Jurisprudentia não lograram abranger, através de um definição, todos os sentidos
do vocábulo. As dificuldades que o problema oferece estão ligadas a dois motivos básicos,
sendo um de natureza metodológica e outro vinculado a tendências filosóficas perante o
Direito. O primeiro se refere à prática de se examinar diretamente o tema da definição, sem
que antes se proceda ao exame dos diversos sentidos que o termo encerra.
De outro lado, definições sofrem a influência do jurista; dependem do tipo de homo
juridicus que representa. Os sociólogos do Direito, por sua vez, enfatizam o elemento social,
enquanto os historicistas fazem referência ao caráter evolutivo do Direito. Formas especiais
de experiência conduzem a definições muitas vezes curiosas, como a formulada por Pitágoras
que, sob a ótica da matemática afirmou: “O Direito é o igual múltiplo de si mesmo”.
Em lógica, o vocábulo Direito é classificado como termo análogo ou analógico, pelo
fato de possuir significados que, apesar de se diferenciarem, guardam entre si alguns nexos.
Assim, empregamos esse termo, ora em sentido objetivo como norma de organização social,
ora do ponto de vista subjetivo, para indicar o poder de agir que a lei garante; algumas vezes,
como referência à Ciência do Direito e outras, como equivalente à justiça.
2.2.2 Definições do Direito
A literatura jurídica nos fornece diversas interpretações acerca do tema “Direito”,
principalmente quando este se refere propriamente à legalidade, de acordo com Prof. Dr. Luiz
Santos (1996).
Conforme ele, assim, torna-se necessário estabelecer os diversos conceitos de autores
que divergem entre si das definições jurídicas para o entendimento da essência que a lei traz.
Além disso, como as Ciências Jurídicas fazem parte do contexto de divergências, são
necessárias, até porque ela como ciência tem paradigmas e patamares, evoluções, novos
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conceituações, modificações, razão maior porque em aspectos científicos das ciências
jurídicas, o Direito é o conceito básico.
Ademais, acresce ele, em mesma obra, quando adentra nas questões de Meio
Ambiente, Ecologia, necessária se torna também que haja uma reflexão sobre esses diversos
conceitos. Desta forma, passamos a partir deste momento enumerar, alguns conceitos sobre a
Ciência Jurídica, que mais se destacam.
Começamos nossos estudos a respeito da definição do que venha a se direito segundo
Prof. Dr. Luiz Santos (2001) que afirma:
O Direito em sentido subjetivo é a “Ciência normativa”, que estabelece e sistematiza
as regras necessárias para assegurar o equilíbrio das funções do organismo social, à
obediência de cujos membros são coercitivamente impostas pelo poder público. Em
sentido objetivo, é a universalidade dos preceitos ou normas legais que disciplinam e
protegem os interesses ou regulam as relações jurídicas.
Neste conceito o ilustre autor demonstra as diversas vertentes assumidas pelo Direito.
Para ele, o Direito é classificável, “subjetivo e objetivo”, de acordo com a “finalidade que se
propõe”, seja, pelo aspecto puramente sociológico, seja pela própria interatividade jurídica.
Já na concepção da Teoria Geral do Direito, ou seja, Teoria Geral do Estado - TGP, o
Direito enquanto lei escrita é o conjunto de regras coativas a que o Estado submete o
indivíduo e a quem assiste. É a norma de agir, que exterioriza o direito pela ação: jus est
norma agendi.
Neste conceito introdutório, segundo concepção teórica do Estado, importante frisar a
finalidade do direito, a que está inserido o individuo como parte integrante de uma sociedade
onde cada ser interfere de maneira indireta na vida alheia, e para que essa convivência seja
pacífica se tem a atuação jurídica.
Reforçando o contexto acima temos outra definição do Prof. Dr. Luiz Santos (2000)
que diz que o Direito é:
Realização da lei, subjetivamente considerado, é o interesse protegido pela ordem
jurídica, que dá a cada um o poder ou faculdade de agir, praticar ou não, livremente,
um ato lícito, ou exigir que outrem o pratique ou pode se abster de praticá-lo jus est
facultas agendi.
No conceito a pouco suscitado, o autor reforça os aspectos subjetivos do direito, só
que nesse momento, leva em consideração a “característica coativa”, da qual possibilita
aquele que tem “direito” de agir de acordo com a lei ou até “exigir” quando violado o seu
direito.
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Vejamos outro conceito que merece citação advinda dos da Introdução ao Estudo do
Direito - IED, onde se verifica a essência do Direito Subjetivo, na qual ele é a ciência que
estuda o conjunto de regras jurídicas, pela qual podemos ter a realização da lei subjetivamente
considerada no interesse protegido pela ordem jurídica.
A terminologia ultrapassa fronteiras jurisdicionais e adentra em outros segmentos,
especificamente da fronteira tributária / comercial (Código Tributário Nacional – CTN), em
que se pode observar o direito sendo definido como imposto, taxa, ou qualquer outro tributo
pago a uma repartição aduaneira, sobre mercadorias importadas ou exportadas.
Para Celso citado por Rebello (1980), o direito é a arte do bom e do eqüitativo. É o jus
est boni et aequi. Melhor dizendo, é a arte do justo equitativo.
Numa concepção mais filosófica, temos destaque à figura de Kant, citado por Rebello
(1980), onde o mesmo considera o direito como o conjunto das condições segundo as quais o
arbítrio de cada um pode coexistir com o arbítrio dos outros com uma lei de liberdade.
Nessa citação, o autor, tem uma visão do universo que envolve o Direito, na qual o seu
maior objetivo é o bem comum, ou seja, a melhor convivência entre os seres, isto faz reporte a
própria História do Direito, do fenômeno da sociabilidade, estudado em Sociologia Jurídica,
onde se entende que para aplicar a norma necessária se faz ter um Fato e uma Norma.
Aprofundando mais os estudos sobre a terminologia jurídica, chegamos ao conceito
atual idealizado pelo Prof. Miguel Reale (2002, p.02), na qual diz que:
“O direito é a vinculação bilateral atributiva da conduta para a realização ordenada
dos valores de convivência. Para Reale, o direito é um sistema atributivo de funções,
na qual o individuo não só têm direitos como deveres perante a sociedade. É o
reflexo de sua Teoria Tridimensional do Direito, onde para atuar a norma necessária
se faz saber o fato, valorá-lo e para enfim aplicar a norma.”
Segundo autor, esta definição é muito enfatizada pela sociologia jurídica, na qual, a
seguridade é que para o ilustre autor, um fato por si só não traz conotação alguma, pois, a
norma é a mesma, o que muda, são asações cometidas pelo ser humano, e para isso
necessária se faz à valorização do fato, demonstrar a sua caracterização, para enfim poder
aplicar eficazmente a norma.
Diante deste os conceitos e identificações, segundo Tatilaiane (2005) refletimos a
cientificidade do Direito, onde é necessariamente paradigma das Ciências Jurídicas, face às
interpretações e definições divergentes citadas no texto, podendo - se afirmar que é realmente
o grande patamar diretivo e ordenativo de tudo que existe, tendo como fundamento básico o
Ser humano.
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2.3 A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO
História é a recordação ou registro do fazer do homem em todos os campos, de acordo
com Edgar Morin (1999). Em outras palavras, segundo ele, é o registro ou memória da
cultura. Porém, do ponto de vista filosófico na sua concepção, a história é mais do que a
demonstração e estudos de dados. É a própria constituição da identidade cultural de um povo.
Por isso, o estudo da história, na sua visão, em igual obra, é importante, pois, leva-nos
a conhecermos a nós mesmos. Há uma história pessoal de cada um e há uma história social,
sendo que ambas se condicionam mutuamente.
Nesse sentido, a História do Direito pretende segundo Prof. Luiz Santos (1994), a
compreender o Direito Atual, a partir das vertentes por ele assumida dentro de sua própria
história.
Nesse contexto, iniciamos nossa evolução histórica nos reportando ao trabalho
exploratório do professor acima citado, passando primeiramente pelo estudo dos povos
primitivos, onde se destacava um Direito não escrito, influenciado, em geral, pela religião.
Indo além, o professor nos leva ao conhecimento do Direito Egípcio que passou por
três fases chamadas de "Antigo Império" (séculos 28 a 33 a.C.), "Médio Império" (1
o
quarto
do 2
o
. Milênio a.C.), e "Novo Império" (séculos 16-11 a.C.), que se caracterizaram por um
Direito Público, de Poder Monárquico e por um Direito Privado individualista no início, mas
que nos dois primeiros eram estabelecidos num regime senhorial e feudal, enquanto que o
Direito Privado é regido por clãs, até a terceira fase.
Num estudo oriental, o professor acima citado, verifica que os direitos cuneiformes,
dos povos do Oriente Próximo, se utilizaram de uma escrita em forma de cunha e de prego.
Não se trata de um direito único, mas de vários sistemas desenvolvidos na Suméria, Acádia,
Babilônia, Assíria e pelos Hititas, entre outros.
Esses povos, segundo Prof. Dr. Luiz Santos (1994), caracterizavam-se, de modo geral,
pela Teocracia, ficando o Direito nas mãos dos sacerdotes e entre os sesus monumentos
jurídicos, neles encontramos o famoso Código de Hamurabi, provavelmente de 1694
a.Creconhecido por um sistema jurídico muito desenvolvido, de modo especial na área do
direito privado, principalmente no que se refere ao direito das obrigações (contratos), sendo o
direito penal muito severo.
Numa outra feição, o citado docente, em igual obra acadêmica, se reporta ao Direito
Hebraico desenvolvido pelo povo hebreu, de origem semita e nômade, que se estabeleceu na
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Palestina, acabando por sedentarizar-se até a Diáspora (dispersão), ocorrida após a revolta
contra os romanos, que dominava a região, nos séculos I e II, D.C.
De acordo com ele, estes povos caracterizavam-se por um Direito Divino, isto é, dado
por Deus, revelando-se nos textos sagrados, de maneira que é imutável, podendo apenas ser
adaptado à realidade social.
Esse Direito, de acordo com eminente doutor citado, de certa forma vai influenciar
diretamente o Direito Canônico e o atual Direito Moderno, e mesmo no Direito Muçulmano,
pelas inovações por ele trazidas, dentre elas se destacando o dízimo (apropriação, pelo clero,
de 1/10 dos rendimentos do povo) e a sagração dos reis, que seriam representantes de Deus.
No Direito Grego, o ilustre docente, nos remete aos povos que não se qualificam tanto
pela preocupação com a sistematização do Direito, mas, sim, pelo pensamento político e
filosófico, que, na verdade, influenciou toda a civilização ocidental. Nele cada cidade tinha o
seu próprio sistema jurídico e político, não havia um Direito Grego Geral.
Dos clãs, de acordo com o eminente docente, passa-se à formação das cidades, onde
vigoram os regimes democráticos, de índole individualista, onde todos os cidadãos, a
princípio, são iguais perante a lei, que seria a expressão da vontade popular, através das
assembleias.
Observe-se, no entanto, que nem todos eram considerados cidadãos e, portanto, nem
todos eram "iguais perante a lei".
De qualquer forma, afirma Prof. Dr. Luiz Santos (1994), as leis escritas são poucas,
derivando o direito mais da consciência coletiva. Embora pensadores fundamentais como
Platão e Aristóteles tenham influenciado o mundo ocidental no campo da filosofia e da
política, os gregos não instituíram monumentos jurídicos importantes, cabendo aos romanos à
sistematização das ideias filosóficas helênicas.
Para os romanos, segundo Prof. Dr. Luiz Santos (1994), embora o Direito tenha se
desenvolvido tardiamente, em relação ao egípcio e ao grego, o Direito Privado Romano,
erigindo-se em um sistema próprio a partir dos séculos I e II A.C, acabou influenciando todo
o direito da Europa Medieval e por este veio até nós, nas Américas.
No início, conforme os docentes, os romanos, de origem pastoril, vivem em clãs,
agrupando-se mais tarde, onde seria erigida a cidade de Roma. Era um direito consuetudinário
e, em geral, sem diferenciar as instituições seculares das religiosas.
Conhecendo-se pouco a escrita, na visão do ilustre docente, não havia muitas leis
escritas, pelo menos até a época da República, que, não obstante, legislou pouco.
17
Um monumento jurídico muito conhecido, na visão dele, é de acordo com ele a
chamada Lei das XII Tábuas, que teria sido escrita para que os plebeus queixosos das atitudes
dos magistrados conhecessem os costumes da cidade.
Embora, haja dúvida sobre sua existência, afirma-se que teria sido escrita em doze
tábuas e afixada no átrio do fórum, sendo destruída na ocasião do saque a Roma pelos
gauleses em 390, afirma o Prof. Dr. Luiz Santos (1994).
Entre os séculos II A.C e III D.C, conforme o ilustre doutor, Roma domina toda a
região mediterrânea, deixando-se influenciar pelos direitos egípcio e grego.
Constata o Prof. Dr. Luiz Santos (1994), que por um lado, o direito público
caracteriza-se pela diminuição da liberdade do cidadão, e que por outro, os direitos privados,
individualistas, constrói-se de forma exemplar, reduzindo-se a formas escritas, especialmente
o direito das coisas e das obrigações, reduzindo o poder informal dos costumes, mas,
convivendo com a produção jurisprudencial e doutrinária, tendendo, no entanto, à codificação,
influenciando, pelo direito bizantino, russo, romeno e búlgaro.
O Direito Romano Clássico, na concepção do Prof. Luiz Santos (1994), em igual obra,
contudo, tem o seu renascimento no Ocidente a partir do século XII D.C, fazendo surgir
estudos que levaram à sistematização doutrinária do chamado direito romano moderno,
influenciando nossos sistemas até os dias de hoje.
Além destes, afirma o autor, em igual obra, que estes influenciaram diretamente o
Direito Europeu, temos, ainda, não menos importantes historicamente, o direito hindu, o
direito chinês, o direito japonês e o direito muçulmano.
O Direito Canônico, para o Prof. Dr. Luiz Santos (1994), é o direito da Igreja Católica
Romana, derivando o seu nome do termo canon, que significa "regras", as quais provinham
das decisões conciliares, as quais resolviam, sobretudo conflitos de fé.
É, sobremaneira, importante, pois foi, durante muito tempo, na Idade Média, oúnico
direito escrito, regulando questões de fé ou meramente seculares, proporcionando o domínio,
pela Igreja, do cenário jurídico medieval, quando era chamada a legislar e a julgar questões de
toda ordem, na falta de um sistema laico eficiente, dada à lacuna deixada pelo direito romano
desaparecido com o fim do império romano, conforme o autor.
Embora se trate de um direito religioso, baseado nas Sagradas Escrituras, com a
aproximação medieval entre a Igreja e os Estados laicos, a ingerência do direito canônico é
inevitável, de acordo com o docente.
O direito canônico influenciou, segundo ele, todo o direito ocidental europeu e dos
países colonizados, oferecendo-lhes os valores éticos e morais de origem cristã, ainda que o
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próprio direito canônico tenha sido fortemente influenciado pelo direito romano, naquilo que
não contrariava o direito divino.
Hoje, embora essa relação tenha sido mudada, separando-se Igreja e Estado, na
maioria dos países, perdendo o interesse para os leigos a partir do século XVI, a influência do
direito canônico, conforme concepção do Prof. Dr. Luiz Santos (1994), é ainda forte, sendo
ele próprio um direito vivo, ainda que só no âmbito da Igreja Romana, mas, em pleno vigor,
visto que, o atual Código Canônico foi promulgado em 1983, na visão do autor.
Os direitos romanistas são denominados os que foram influenciados pelo direito
romano, após a sua redescoberta, a partir do século XIII. Interessante, de acordo Prof. Dr.
Luiz Santos (1994), em pertinente obra, notar que, desde o século XII, os professores de
direito elaboraram um ensino do direito baseado no direito romano, especialmente na clássica
codificação de Justiniano, então chamada de Corpus iuris civilis.
Esse "direito romano", segundo ele, porém, não era o mesmo direito do Império
Romano antigo, pois os professores o interpretavam, evidentemente, a partir da sua ótica
contemporânea, influenciada pela cultura jurídica em que viviam. Sua vantagem, entretanto,
em relação ao direito feudal, era óbvia: tratava-se de um direito escrito, mais completo e mais
evoluído, conforme docente acima citado.
E, com isso, deu maior importância à lei, como norma genérica e abstrata, desprendida
do caso concreto, acabando por entender o direito mais como dever-ser do que ser, ou seja,
mais como ordem ideal do que realidade, no sentido de uma mudança do irracional para o
racional, na visão do ilustre doutor citado.
Nesse sentido, elabora-se uma "ciência jurídica" e cresce o interesse pelo direito.
Substitui-se o "irracional" representado pelos julgamentos divinos através de ordenamentos,
aumentando o poder de alguns reis, que, então, podiam legislar, fazendo desaparecer os
feudos, estabelecendo-se, por outro lado, um sistema econômico baseado no comércio, na
visão do Prof. Dr. Luiz Santos (1994).
Enfim, segundo Prof. Dr. Luiz Santos (1994), o direito passa a ser nacional, segundo
ele, regendo grandes partes territoriais de maneira uniforme, acabando por preponderar à lei,
com necessidade de uma sistematização codificada, enquanto que as expansões da cultura
européia, com os descobrimentos e colonização, levam o direito europeu para outras regiões e
continentes.
Atualmente, compreende o autor, que em alguns países da Europa, o Common Law é o
sistema jurídico criado na Inglaterra a partir do século XII, pelas decisões reais, mantendo-se
até hoje nos países de cultura inglesa, como Estados Unidos, Canadá e Austrália.
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Afirma Prof. Dr. Luiz Santos (1994) que esse nome designa o direito comum, ou
comune ley, em distinção ao direito diversificado pelos costumes locais.
Nada tem a ver com o direito comum continental, e, ao contrário, o juiz é quem faz o
direito, na concepção do autor, prevalecendo os precedentes judiciais, enquanto que a lei não
exerce qualquer influência na sua evolução.
Conforme Prof. Dr. Luiz Santos (1994), o statute law, conforme Prof. Dr. Luiz Santos
(1994) ao contrário, é um direito de leis e, na verdade, acabou havendo uma fusão, em 1875, e
não uma ruptura, de maneira que até hoje é possível aos juristas ingleses invocarem antigos
estatutos legais e decisões judiciais dos séculos XIII e XIV.
Interessante notar, de acordo com autor, ainda, que o sistema de Equity nasce de uma
necessidade de o rei, através do seu Chanceler, julgar cada vez mais casos, quando, não sendo
possível trabalhar tecnicamente como no sistema do Common Law, acaba deixando de lado as
leis substantivas e processuais, invocando o sistema romano de eqüidade, com influência do
direito canônico. Essa, no entanto, é uma forma deteriorada de eqüidade, que, na verdade,
serve ao absolutismo real, afastando a normatividade como limite ao poder de judicar.
Mais, tarde, de acordo com ele, com a reforma judiciária de 1873 e 1875, as regras de
equity passam a fazer parte do common law, com a função de corrigi-las e completá-las.
Ainda que a legislação assuma cada vez mais importância, na Inglaterra, entretanto,
não há Constituição escrita ou Códigos como no continente, ainda que seja considerado o
berço do Constitucionalismo, com a Magna Carta de 1215, na visão do Prof. Dr. Luiz Santos
(1994).
2.4. DIREITO E MORAL
2.4.1 Considerações Preliminares
Encontramo-nos, agora, diante de um dos problemas mais difíceis e também dos mais
belos da Filosofia Jurídica, o da diferença entre a Moral e o Direito.
Não pretendo, num curso de Introdução ao Estudo do Direito, esgotar o assunto mas,
apenas, dar alguns elementos necessários para que os senhores não confundam os dois
conceitos, sem, todavia, separá-los.
Nesta matéria devemos lembrar-nos de que a verdade, muitas vezes, consiste em
distinguir as coisas, sem separá-las. Ao homem afoito e de pouca cultura basta perceber uma
diferença entre dois seres para, imediatamente, extremá-los um do outro, mas os mais
20
experientes sabem a arte de distinguir sem separar, a não ser que haja razões essenciais que
justifiquem a contraposição.
Muitas são as teorias sobre as relações entre o Direito e a Moral, mas é possível
limitarmo-nos a alguns pontos de referência essenciais, inclusive pelo papel que
desempenharam no processo histórico.
2.4.2 Teoria do Mínimo Ético
Em primeiro lugar, recordemos a teoria do "mínimo ético", já exposta de certa maneira
pelo filósofo inglês Jeremias Bentham e depois desenvolvida por vários autores, entre os
quais um grande jurista e politicólogo alemão do fim do século passado e do princípio deste,
Georg Jellinek.
A teoria do "mínimo ético" consiste em dizer que o Direito representa apenas o
mínimo de Moral declarado obrigatório para que a sociedade possa sobreviver. Como nem
todos podem ou querem realizar de maneira espontânea as obrigações morais, é indispensável
armar de força certos preceitos éticos, para que a sociedade não soçobre.
A Moral, em regra, dizem os adeptos dessa doutrina, é cumprida de maneira
espontânea, mas como as violações são inevitáveis, é indispensável que se impeça, com mais
vigor e rigor, a transgressão dos dispositivos que a comunidade considerar indispensável à paz
social. Assim sendo, o Direito não é algo de diverso da Moral, mas é uma parte desta, armada
de garantias específicas.
A teoria do "mínimo ético" pode ser reproduzida através da imagem de dois círculos
concêntricos, sendo o círculo maior o da Moral, e o círculo menor o do Direito.
Haveria, portanto, um campo de ação comum a ambos, sendo o Direito envolvido pela
Moral. Poderíamos dizer, de acordo com essa imagem, que "tudo o que é jurídico é moral,
mas nem tudo o que é moral é jurídico". São aceitáveis os princípios dessa doutrina? Será
certo dizerque todas as normas jurídicas se contêm no plano moral? Será mesmo que o bem
social sempre se realiza com plena satisfação dos valores da subjetividade, do bem pessoal de
cada um? Comecemos por observar que fora da Moral existe o "imoral", mas existe também
que é apenas "amoral", ou indiferente à Moral. Uma regra de trânsito, como, por exemplo,
aquela que exige que os veículos obedeçam à mão direita, é uma norma jurídica.
Se amanhã, o legislador, obedecendo a imperativos técnicos, optar pela mão esquerda,
poderá essa decisão influir no campo moral? Evidentemente que não. Há um artigo no Código
21
de Processo Civil, segundo o qual o réu, citado para a ação, deve oferecer a sua contrariedade
no prazo de 15 dias. E por que não de 10, de 20, ou de 30? Se assim fosse, porém, influiria
isso na vida moral? Também não. Outro preceito do Código Civil estabelece que os contratos
eivados de erro, dolo ou coação, só podem ser anulados dentro do prazo de 4 anos.
Por que não no prazo de 5 anos ou de 3 anos e meio? São razões puramente técnicas,
de utilidade social, que resolvem muitos problemas de caráter jurídico. Não é exato, portanto,
dizer que tudo o que se passa no mundo jurídico seja ditado por motivos de ordem moral.
Além disso, existem atos juridicamente lícitos que não o são do ponto de vista moral.
Lembre-se o exemplo de uma sociedade comercial de dois sócios, na qual um deles se dedica,
de corpo e alma, aos objetivos da empresa, enquanto que o outro repousa no trabalho alheio,
prestando, de longe em longe, uma rala colaboração para fazer jus aos lucros sociais. Se o
contrato social estabelecer para cada sócio uma compensação igual, ambos receberão o
mesmo quinhão. E eu pergunto: é moral? Há, portanto, um campo da Moral que não se
confunde com o campo jurídico.
O Direito, infelizmente, tutela muita coisa que não é moral. Embora possa provocar
nossa revolta, tal fato não pode ficar no esquecimento. Muitas relações amorais ou imorais
realizam-se à sombra da lei, crescendo e se desenvolvendo em meios de obstá-las.
Existe, porém, o desejo incoercível de que o Direito tutele só o "lícito moral", mas, por
mais que os homens se esforcem nesse sentido, apesar de todas as providências cabíveis,
sempre permanece um resíduo de imoral tutelado pelo Direito.
Há, pois, que distinguir um campo de Direito que, se não é imoral, é pelo menos
amoral, o que induz a representar o Direito e a Moral como dois círculos secantes. Podemos
dizer que dessas duas representações - de dois círculos concêntricos e de dois círculos
secantes, - a primeira corresponde à concepção ideal, e a segunda, à concepção real, ou
pragmática, das relações entre o Direito e a Moral.
As representações gráficas têm vantagens e desvantagens. Entre as desvantagens está a
de se simplificar excessivamente os problemas. Servem, no entanto, no início dos estudos,
como pontos de referência para ulteriores pesquisas.
2.4.3 Do Cumprimento das Regras Sociais
Se analisarmos os fatos que se passam em geral na sociedade ou os que nos cercam em
nossa vida cotidiana, verificamos que regras sociais há que cumprimos de maneira
22
espontânea. Outras regras existem, todavia, que os homens só cumprem em determinadas
ocasiões, porque a tal são coagidos.
Há, pois uma distinção a fazer-se quanto ao cumprimento espontâneo e o obrigatório
ou forçado das regras sociais. A qual dessas categorias pertencerá a Moral? Podemos dizer
que a Moral é o mundo da conduta espontânea, do comportamento que encontra em si próprio
a sua razão de existir.
O ato moral implica a adesão do espírito ao conteúdo da regra. Só temos, na verdade,
Moral autêntica quando o indivíduo, por um movimento espiritual espontâneo realiza o ato
enunciado pela norma. Não é possível conceber-se o ato moral forçado, fruto da força ou da
coação. Ninguém pode ser bom pela violência.
Só é possível praticar o bem, no sentido próprio, quando ele nos atrai por aquilo que
vale por si mesmo, e não pela interferência de terceiros, pela força que venha consagrar a
utilidade ou a conveniência de uma atitude. Conquanto haja reparos a ser feitos à Ética de
Kant, pelo seu excessivo formalismo, pretendendo rigorosamente que se cumpra "o dever pelo
dever", não resta dúvida que ele vislumbrou uma verdade essencial quando pôs em evidência
a espontaneidade do ato moral.
A Moral, para realizar-se autenticamente, deve contar com a adesão dos obrigados.
Quem pratica um ato, consciente da sua moralidade, já aderiu ao mandamento a que obedece.
Respeita-se meu pai, pratico um ato na plena convicção da sua intrínseca valia, coincidindo o
ditame de minha consciência com o conteúdo da regra moral. Acontecerá o mesmo com o
Direito? Haverá, sempre, uma adequação entre a minha maneira de pensar e agir e o fim que,
em abstrato, a regra jurídica prescreve? No plano da Moral, já o dissemos, essa coincidência é
essencial, mas o mesmo não ocorre no mundo jurídico.
O exemplo que vou dar esclarece o assunto. É um exemplo trazido de minha
experiência profissional, e que pode repetir-se com qualquer dos senhores, nesta vida cheia de
imprevistos e de dramas que nos deixam perplexos. Certa vez, fui procurado por um casal de
velhos - de quase 80 anos - que me expôs a sua situação de insuficiência econômica,
carecedores que estavam dos mais elementares meios de subsistência.
Como diziam os romanos, na sua compreensão realística da vida, a velhice é a pior das
doenças. Pois bem, o casal de velhos revelou-me que tinha um filho, um industrial de grande
capacidade econômica, possuidor de várias fábricas e estabelecimentos comerciais e que,
entretanto, não admitia que seus prepostos ou a esposa prestassem qualquer auxilio a seus
pais.
23
Ora, o Código Civil brasileiro, como o de todas as nações civilizadas, consagra o
princípio da solidariedade econômica entre os cônjuges e os parentes. Nesse sentido, os
descendentes não podem faltar à assistência devida aos pais e avós, toda a vez que estes se
encontrem em dificuldades econômicas, por motivos que não possam ser superados. É,
evidentemente, um preceito de ordem jurídica e, ao mesmo tempo, de ordem moral.
É o princípio de solidariedade humana, ou melhor, de solidariedade familiar que dita à
regra jurídica consagrada nos códigos. Se a lei civil estabelece a obrigação de prestar
alimentos, por sua vez, o Código de Processo assegura aos necessitados remédios
indispensáveis à realização desse desideratum, graças à interferência do juiz.
Admitamos - como no caso concreto que me foi dado apreciar como advogado - que o
filho não ceda a qualquer razão e se recuse, obstinadamente, a prestar assistência a seus
genitores. Não restará aos pais senão uma via - a de propor uma ação que se chama "ação de
alimentos".
Feita a prova, com a demonstração de carência econômica dos interessados e da
abastança do filho, para pagar a quantia arbitrada pelos peritos, o juiz proferiu a sentença,
condenando o descendente a pagar uma prestação alimentícia mensal. Essa sentença, depois
da apelação, passou em julgado, isto é, tornou-se uma sentença da qual não cabia qualquer
recurso. Sentença passada em julgado é aquela contra a qual não é possível mais recorrer; é
uma sentença que se tornou exequível, por terem os órgãos do Poder Judiciário se
pronunciado de maneira definitiva sobre a lide. Tínhamos uma sentença e podíamos, com ela,
promover a execução e até a penhora dos bens do filho, a fim de garantir o que tinha sido
decidido pelo juiz. O filho passou a efetuar, mensalmente, o pagamento da pensão, mas com
revolta: vencido, mas não convencido. Eu lhes pergunto: Até que ponto a regra moral
coexistiu,nesse caso, com a regra jurídica? Até que ponto o pagamento se tornou moral? A
regra moral de assistência aos ascendentes coexistiu com a regra jurídica até o momento em
que se tornou indeclinável o recurso à força, através do Judiciário. No momento em que os
pais compareceram ao pretório para propor a ação, visando à prestação compulsória do dever
filial, a partir desse instante a regra moral não acompanhou mais a regra jurídica, mas entrou
em eclipse por falta de apoio no plano da consciência do obrigado.
A Moral é incompatível com a violência, com a força, ou seja, com a coação, mesmo
quando a força se manifesta juridicamente organizada. O filho que, mensalmente, paga a
prestação alimentícia por força do imperativo da sentença, só praticará um ato moral no dia
em que se convencer de que não está cumprindo uma obrigação, mas praticando um ato que o
24
enriquece espiritualmente, com tanto mais valia quanto menos pesar nele o cálculo dos
interesses.
2.4.4 Direito e Coação
O cumprimento obrigatório da sentença satisfaz ao mundo jurídico, mas continua
alheio ao campo propriamente moral. Isto nos demonstra que existe, entre o Direito e a Moral,
uma diferença básica, que podemos indicar com esta expressão: a Moral é incoercível e o
Direito é coercível.
O que distingue o Direito da Moral, portanto, é a coercibilidade. Coercibilidade é uma
expressão técnica que serve para mostrar a plena compatibilidade que existe entre o Direito e
a força. Há três posições diferentes em face da relação entre o Direito e a força: uma teoria
imbuída de eticismo absoluto, que sustenta que o Direito nada tem a ver com a força, não
surgindo, nem se realizando graças à intervenção do poder público. Haveria, segundo os
adeptos dessa doutrina, no tocante ao Direito, a mesma incompatibilidade que há com a
Moral. Essa teoria, como se vê, idealiza o mundo jurídico, perdendo de vista o que
efetivamente acontece na sociedade.
Em campo diametralmente oposto, temos a teoria que vê no Direito uma efetiva
expressão da força. Para Jhering, um dos maio-res jurisconsultos da passada centúria, o
Direito se reduz a "norma + coação", no que era seguido, com entusiasmo, por Tobias
Barreto, ao defini-lo como "a organização da força". Ficoufamoso o seu temerário confronto
do direito à "bucha do canhão", o que se deve atribuir aos ímpetos polêmicos que arrebatavam
aquele grande espírito. Segundo essa concepção, poderíamos definir o Direito como sendo a
ordenação coercitiva da conduta humana.
Esta é definição incisiva do Direito dada pelo grande mestre contemporâneo, Hans
Kelsen, que, com mais de noventa anos, sempre se manteve fiel aos seus princípios de
normativismo estrito. A título de ilustração, cabe lembrar que Jhering simbolizava a atividade
jurídica com uma espada e uma balança: o Direito não seria o equilíbrio da balança se não
fosse garantido pela força da espada, consoante é exposto em seu famoso livro.
A Luta pelo Direito, que a minha geração lia com entusiasmo e que é pena ande tão
esquecido, tantas são as lições magistrais que encerra sobre a dignidade das tarefas do jurista.
25
A teoria da coação se logrou larga adesão na época do predomínio positivista, foi
depois alvo de críticas irrespondíveis, a começar pela observação fundamental de que, via de
regra, há o cumprimento espontâneo do Direito.
Para milhares de contratos que se executam espontaneamente, bem reduzido é o
número dos que geram conflitos sujeitos a decisão judicial. Não se pode, pois, definir a
realidade jurídica em função do que excepcionalmente acontece. Por outro lado, a coação já é,
em si mesma, um conceito jurídico, dando-se a interferência da força em virtude da norma
que a prevê, a qual, por sua vez, pressupõe outra manifestação de força e, por conseguinte,
outra norma superior, e, assim sucessivamente, até se chegar a uma norma pura ou à pura
coação...
Foi essa objeção que Hans Kelsen procurou superar com a sua teoria da "norma
fundamental", que analisaremos numa de nossas aulas. O que há, porém, de verdade na
doutrina da coação é a verificação da compatibilidade do Direito com a força, o que deu lugar
ao aparecimento de uma teoria que põe o problema em termos mais rigorosos: é a teoria da
coercibilidade, segundo a qual o Direito é a ordenação coercível da conduta humana.
A diferença está apenas em um adjetivo, mas é fundamental. Para uns, a força está
sempre presente no mundo jurídico, é imanente a ele, e, portanto, inseparável dele. Para
outros, a coação no Direito não é efetiva, mas potencial representando como que uma segunda
linha de garantia da execução da norma, quando se revelam insuficientes os motivos que,
comumente, levam os interessados a cumpri-la.
A teoria da coercibilidade, certa enquanto revela a possibilidade de haver execuções
jurídicas compulsórias, sem que isso comprometa a sua juridicidade deixa-nos, porém, no
vestíbulo do problema, pois surge logo a seguinte pergunta: "Que é que explica essa
compatibilidade entre o Direito e a força?".
2.4.5 Teoria Tridimensional do Direito
O estudo das diferenças e correlações entre a Moral e o Direito já nos permite dar uma
noção do Direito, sem que nos mova a preocupação de definir. Resumindo o já exposto
podemos dizer que o Direito é a ordenação bilateral atributiva das relações sociais, na medida
do bem comum. Todas as regras sociais ordenam a conduta, tanto as morais como as jurídicas
e as convencionais ou de trato social. A maneira, porém, dessa ordenação difere de uma para
outra. É próprio do Direito ordenar a conduta de maneira bilateral e atributiva, ou seja,
estabelecendo relações de exigibilidade segundo uma proporção objetiva.
26
O Direito, porém, não visa a ordenar as relações dos indivíduos entre si para satisfação
apenas dos indivíduos, mas, ao contrário, para realizar uma convivência ordenada, o que se
traduz na expressão: "bem comum". O bem comum não é a soma dos bens individuais, nem a
média do bem de todos; o bem comum, a rigor, é a ordenação daquilo que cada homem pode
realizar sem prejuízo do bem alheio, uma composição harmônica do bem de cada um com o
bem de todos. Modernamente, o bem comum tem sido visto, - e este é, no fundo, o
ensinamento do jusfilósofo italiano Luigi Bagolini, - como uma estrutura social na qual sejam
possíveis formas de participação e de comunicação de todos os indivíduos e grupos.
2.4.5.1 A Intuição de Dante
Essa conceituação ética do Direito, que coloca a coação como elemento externo e não
como elemento intrínseco da própria vida jurídica, teve uma formulação feliz, por obra não de
um jurista, mas de um poeta.
Conhecem os senhores evidentemente a personalidade extraordinária do poeta Dante
Alighieri. O “divino poeta”, alem de ter-nos legado a Divina Comédia – o poema maravilhoso
da Cristandade – deixou obras de Política e Filosofia e, numa delas, esculpidas no espírito dos
juristas, pela apreensão genial daquilo que o Direito existe de substancial: “O Direito é uma
proporção real e pessoal, de homem para homem, que, conservada, conserva a sociedade;
corrompida, corrompe-a”.
Dante esclarece que a relação é uma proporção. A proporção é sempre, uma expressão
de medida. O Direito não é uma relação qualquer entre os homens, mas sim aquela relação
que implica uma proporcionalidade, cuja medida é o homem mesmo.
É aqui que se nota a atualidade da conceituação jurídica oferecida por Dante, pois,
dentre as múltiplas distinções do Direito, nenhuma é tão fundamental como a que distingue os
direito em reais e pessoais.
“O Direito é uma proporção real e pessoal, de homem para homem...” parece, àprimeira vista, uma expressão redundante: pessoal, de homem para homem. Se é pessoal, por
que dizer de homem para homem? É que, para Dante, o Direito tutela as coisas somente em
razão dos homens: a relação jurídica conclui-se entre pessoas, não entre homens e coisas, mas
é “real” quando tem uma coisa (res) como seu objeto.
A sua definição inspira-se na obra e nos ensinamentos aristotélicos-tomistas e,
também, nas grandes lições dos jurisconsultos romanos, especialmente nas lições de Cícero,
27
que dizia que devemos conhecer perfeitamente o homem, a natureza humana para, depois,
conhecer o Direito.
O Direito, indiscutivelmente, inova, apresenta elementos de renovação permanente,
mas conserva, sempre, um fulcro de tradição.
2.4.5.2 Estrutura Tridimensional do Direito
O simples fato de existirem várias acepções da palavra Direito já devia ter suscitado
uma pergunta, que, todavia, só recentemente veio a ser formulada, isto é: esses significados
fundamentais que, através do tempo, têm sido atribuídos a uma mesma palavra, já não
revelam que há aspectos ou elementos complementares na experiência jurídica?
Uma análise em profundidade dos diversos sentidos da palavra Direito veio
demonstrar que eles correspondem a três aspectos básicos, discerníveis em todo e qualquer
momento da vida jurídica: um aspecto normativo (o Direito como ordenamento e sua
respectiva ciência); um aspecto fático (o Direito como fato, ou em sua efetividade social e
histórica) e um aspecto axiológico (o Direito como valor de Justiça).
Nas últimas quatro décadas o problema da tridimensionalidade do Direito tem sido
objeto de estudos sistemáticos, até culminar numa teoria, à qual penso ter dado uma feição
nova, sobretudo pela demonstração de que:
a) onde quer que haja um fenômeno jurídico, há, sempre e necessariamente, um fato
subjacente (fato econômico, geográfico, demográfico, de ordem técnica etc.); um valor, que
confere determinada significação a esse fato, inclinando ou determinando a ação dos homens
no sentido de atingir ou preservar certa finalidade ou objetivo; e, finalmente, uma regra ou
norma, que representa a relação ou medida que integra um daqueles elementos ao outro, o fato
ao valor;
b) tais elementos ou fatores (fato, valor e norma) não existem separados um dos
outros, mas coexistem numa unidade concreta;
c) mais ainda, esses elementos ou fatores não só se exigem reciprocamente, mas atuam
como elos de um processo (já vimos que o Direito é uma realidade histórico-cultural) de tal
modo que a vida do Direito resulta da interação dinâmica e dialética dos três elementos que a
integram1 . Isto posto, analisemos o esquema ou estrutura de uma norma ou regra jurídica de
conduta: a) Se F é, deve ser P; b) Se não for P, deverá ser SP2 . Há, por exemplo, norma legal
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que prevê o pagamento de uma letra de câmbio na data de seu vencimento, sob pena do
protesto do título e de sua cobrança, gozando o credor, desde logo, do privilégio de promover
a execução do crédito. Logo, diríamos: a) se há um débito cambiário (F), deve ser pago (P); b)
se não for quitada a dívida (não P), deverá haver uma sanção penal (SP). Mais tarde,
estudaremos melhor essa questão.
O que por ora desejamos demonstrar é que, nesse exemplo, a norma de direito cambial
representa uma disposição legal que se baseia num fato de ordem econômica (o fato de, na
época moderna, as necessidades do comércio terem exigido formas adequadas de relação) e
que visa a assegurar um valor, o valor do crédito, a vantagem de um pronto pagamento com
base no que é formalmente declarado na letra de câmbio.
Como se vê, um fato econômico liga-se a um valor de garantia para se expressar
através de uma norma legal que atende às relações que devem existir entre aqueles dois
elementos.
Pois bem, se estudarmos a história da letra de câmbio, que, numa explicação elementar
e sumária, surgiu como um documento mediante o qual Fulano ordenava a Beltrano que
pagasse a Sicrano determinada importância, à vista da apresentação do título; se estudarmos a
evolução dessa notável criação do Direito mercantil, verificamos que ela veio sofrendo
alterações através dos tempos, quer em virtude de mudanças operadas no plano dos fatos
(alterações nos meios de comunicação e informação, do sistema de crédito ou organização
bancária), quer devido à alteração nos valores ou fins econômico-utilitários do crédito e da
circulação garantida da riqueza, até se converter num título de crédito de natureza autônoma,
literal, abstrata e exequível.
Desse modo, fatos, valores e normas se implicam e se exigem reciprocamente, o que,
como veremos, se reflete também no momento em que o jurisperito (advogado, juiz ou
administrador) interpreta uma norma ou regra de direito (são expressões sinônimas) para dar-
lhe aplicação.
Desde a sua origem, isto é, desde o aparecimento da norma jurídica, - que é síntese
integrante de fatos ordenados segundo distintos valores, - até ao momento final de sua
aplicação, o Direito se caracteriza por sua estrutura tridimensional, na qual fatos e valores se
dialetizam, isto é, obedecem a um processo dinâmico que aos poucos iremos desvendando.
Nós dizemos que esse processo do Direito obedece a uma forma especial de dialética
que denominamos "dialética de implicação-polaridade", que não se confunde com a dialética
hegeliana ou marxista dos opostos. Esta é, porém, uma questão que só poderá ser melhor
esclarecida no âmbito da Filosofia do Direito.
29
Segundo a dialética de implicação-polaridade, aplicada à experiência jurídica, o fato e
o valor nesta se correlacionam de tal modo que cada um deles se mantém irredutível ao outro
(polaridade) mas se exigindo mutuamente (implicação) o que dá origem à estrutura normativa
como momento de realização do Direito.
Por isso é denominada também "dialética de complementaridade". Isto posto, podemos
completar a nossa noção inicial de Direito, conjugando a estrutura tridimensional com a nota
específica da bilateralidade atributiva, neste enunciado: Direito é a realização ordenada e
garantida do bem comum numa estrutura tridimensional bilateral atributiva, ou, de uma forma
analítica: Direito é a ordenação heterônoma, coercível e bilateral atributiva das relações de
convivência, segundo uma integração normativa de fatos segundo valores.
Ultimamente, pondo em realce a ideia de justiça, temos apresentado, em complemento
às duas noções supra da natureza lógico-descritiva, esta outra de caráter mais ético: Direito é a
concretização da ideia de justiça na pluridiversidade de seu dever ser histórico, tendo a pessoa
como fonte de todos os valores. Se analisarmos essas três noções do Direito verão que cada
uma delas obedece, respectivamente, a uma perspectiva do fato ("realização ordenada do bem
comum"), da norma ("ordenação bilateral-atributiva de fatos segundo valores") ou do valor
("concretização da ideia de justiça").
Donde devemos concluir que a compreensão integral do Direito somente pode ser
atingida graças à correlação unitária e dinâmica das três apontadas dimensões da experiência
jurídica, que se confunde com a história mesma do homem na sua perene faina de harmonizar
o que é com o que deve ser. Se, como bem adverte Jackson de Figueiredo, a vida vale
sobretudo como oportunidade de aperfeiçoar-nos, o Direito, em razão de sua própria estrutura
e destinação, representa uma das dimensões essenciais da vida humana.
30
3 NORMA JURÍDICA
3.1 INTRODUÇÃO AS NORMAS JURÍDICAS
Normas Jurídicas são regras sociais, cuja função é disciplinaro comportamento dos
homens. Em um conceito mais definido diríamos que as normas jurídicas são regras sociais
garantidas pelo poder de coerção do Estado, tendo como objetivo teórico a promoção da
justiça. Estas podem ser:
a) Normas morais – aquelas que se baseiam na consciência moral das pessoas (valores
e princípios);
b) Normas religiosas – aquelas que se baseiam na fé revelada pela religião.
3.2 CONCEITO DE NORMAS JURÍDICAS
Na Teoria Geral do Direito o estudo da norma jurídica é de fundamental importância,
porque se refere a elemento essencial do Direito objetivo. Ao dispor sobre fatos e consagrar
valores, as normas jurídicas são o ponto culminante do processo de elaboração do Direito e a
estação de partida operacional da Dogmática Jurídica, cuja função é sistematizar e descrever a
ordem jurídica vigente. Conhecer o Direito é conhecer as normas jurídicas em seu
encadeamento lógico e sistemático.
Para promover a ordem social, o Direito Positivo deve ser prático, ou seja, revelar-se
mediante normas orientadores das condutas interindividuais. Não é suficiente, para se
alcançar o equilíbrio na sociedade, que os homens estejam dispostos a pratica da justiça; é
necessário que se lhes indique a formula de justiça que satisfaça a sociedade em determinado
momento histórico. A norma jurídica exerce justamente esse papel de ser o instrumento de
definição da conduta exigida pelo Estado. Ela esclarece ao agente como e quando agir. O
Direito Positivo, em todos os sistemas, compõem-se de normas jurídicas, que são padrões de
31
conduta ou de organização social impostos pelo Estado, para que seja possível a convivência
dos homens em sociedade. Pelas regras jurídicas o Estado dispõe também quanto à sua
própria organização. Em síntese, norma jurídica é a conduta exigida ou o modelo imposto de
organização social.
As expressões normas e regra jurídicas são sinônimas, apesar de alguns autores
reservarem a denominação regra para o setor da técnica e, outros, para o mundo natural.
Distinção há entre norma jurídica e lei. Esta é apenas uma das formas de expressão das
normas, que se manifestam também pelo Direito costumeiro e, em alguns países, pela
jurisprudência.
3.3 CARACTERÍSTICAS DAS NORMAS JURÍDICAS
Se levarmos em conta, ma pesquisa dos caracteres das normas jurídicas, todas as
categorias de regras existentes; forçosamente chegaremos à mesma conclusão que Miguel
Reale: “o que efetivamente caracteriza uma norma jurídica, de qualquer espécie; é o fato de
ser uma estrutura proposicional enunciativa de uma forma de organização ou de conduta, que
deve ser seguida de maneira objetiva e obrigatória”.
Isto porque há regras jurídicas de natureza tão peculiar, que escapariam a quase todos
os critérios lógicos de enquadramento. O art. 579 do Código Civil de 2002, ao definir o
comodato como “empréstimo gratuito de coisa não fungíveis”, expressa, por exemplo, uma
norma jurídica que não encerra, em si, nenhuma determinação.
Considerando-se, contudo, as categorias mais gerais das normas jurídicas, verifica-se
que estas apresentam caracteres que, na opinião predominante dos autores, são seguintes:
bilateralidade, generalidade, abstratividade, imperatividade, coercibilidade e promoção da
justiça.
a) Bilateralidade: O Direito existe sempre vinculando duas ou mais pessoas atribuindo
poder a uma parte e impondo dever à outra. Bilateralidade significa, pois, que a norma
jurídica possui dois lados: um representado pelo direito subjetivo e outro pelo dever jurídico,
de tal sorte que um não pode existir sem o outro.
b) Generalidade: O princípio da generalidade revela que a norma jurídica é preceito de
ordem geral, obrigatório a todos que se acha em igual situação jurídica.
c) Abstratividade: Visando atingir o maior numero possível de situações, a norma
jurídica é abstrata, regulando os casos dentro do seu denominador comum, ou seja, com
ocorrem via de regra.
32
d) Imperativiade: Na sua missão de disciplinar as maneiras de agir em sociedade, o
Direito deve representar o mínimo de exigências, de determinações necessárias. Para garantir
efetivamente a ordem social, o Direito se manifesta através de normas que possuem caráter
imperativo.
e) Coercibilidade: nela a conduta transgressora sofre coerção, ou seja, repressão, uso
da força. O Direito existe coerção (força) potencial do Estado, que se concretiza em alguma
forma de sanção (punição). A sanção deve ser aplicada à pessoa ou instituição que transgrediu
a norma jurídica; tem o poder de imperar, de impor a uma parte o cumprimento de um dever.
f) Promoção da Justiça: a norma jurídica deve ter em seu conteúdo a finalidade de
estabelecer a justiça entre os homens.
3.4 CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICAS
A classificação apresentada por García Máynez, por sua clareza e objetividade fornece
ao jurista um conjunto terminológico e conceitual útil ao discurso jurídico. Os critérios de sua
classificação são os seguintes:
a) quanto ao sistema a que pertencem;
b) quanto à fonte;
c) quanto aos diversos ambitos de validez;
d) quanto à sanção;
e) quanto à qualidade;
f) quanto às relações de complementação;
g) quanto às relações com a vontade dos particulares
33
4 DIREITO NATURAL E DIREITO POSITIVO
A tradição do pensamento jurídico ocidental é marcada pela distinção entre direito
positivo e direito natural. Embora, do ponto de vista teórico, essa distinção já possa ser
encontrada no pensamento grego, o uso da expressão "direito positivo" é bastante tardia.
O direito romano não faz uso do termo "positivo". Entre os estudiosos romanos, ele é
citado uma vez por Áulio Gélio: "Quod P. Nigidus arguitissime docuit nomina non positiva
esse sed naturalia" ("Conforme ensinou de modo muito arguto P. Nígido, os nomes não são
positivos postos pelos homens, mas naturais"), para se referir à linguagem, não ao direito.
Referido ao direito, o termo positivo aparece pela primeira vez no Século IV, em
Calcídio, um filósofo neoplatônico que, em seu comentário ao Timeu de Platão, diferencia
"justiça natural" de "justiça positiva". Segundo esse autor, a justiça natural decorre das leis
naturais que regem o universo, a criação e a natureza em geral, enquanto a justiça positiva
regula as relações sociais.
A distinção de Calcídio ainda está distante da que aparece no direito moderno.
Segundo resultados de pesquisas feitas por Kurttner, e aceitas por Norberto Bobbio (cf.
Norberto Bobbio. O positivismo jurídico: lições de filosofia do direito. São Paulo: Ícone,
1996.), o primeiro autor no qual aparece uma distinção entre jus naturale e jus positivum
aceitável entre os modernos é Pedro Abelardo (1079-1142). Em seu Dialogum inter
philosophum, judaeum et christianum, Abelardo chama de direito positivo "aquele que é posto
pelos homens" (illud est quod ab hominibus positum) e o direito natural é aquele que não é
posto por eles, mas por algo ou alguém que está acima deles, a natureza ou Deus (considerado
por Abelardo o autor da natureza).
4.1 DIREITO NATURAL
O Direito Natural revela ao legislador os princípios fundamentais de proteção ao
homem, que forçosamente deverão ser consagrados pela legislação, a fim de que se obtenha
34
um ordenamento jurídico substancialmente justo. O Direito Natural não é escrito, não é criado
pela sociedade, nem é formulado pelo Estado. Com o adjetivo natural indica, é um Direito
espontâneo, que se origina da própria natureza social do homem e que é revelado pela
conjugação da experiência e razão. É constituídopor um conjunto de princípios, e não regras,
de caráter universal, eterno e imutável.
A ideia do Direito Natural tem sido apresentada em dois níveis: como ontologia e
como deontologia. Os jusnaturalistas que defendem o Direito Natural ontológico admitem o
Direito Natural como ser do Direito, com o legitimo Direito. Os jusfilosofos partidários do
Direito Natural deontologico representam esse Direito apenas com um conjunto de valores
imutáveis e universais, mais identificado como Ética.
Como destinatário do Direito Natural, o legislador deve ser, ao mesmo tempo um
observador dos fatos sociais e um analista da natureza humana, para que assim, as leis e os
códigos atinjam a realização da justiça – objetivo do Direito – é indispensável que se apoiem
nos princípios do Direito.
4.1.1 Caracteres do Direito Natural
O jusnaturalismo atual concebe o Direito Natural apenas como um conjunto de amplos
princípios, a partir dos quais o legislador deverá compor a ordem jurídica. Os princípios mais
apontados referem-se ao direito à vida, à liberdade, à participação na vida social, à união entre
os seres para criação da prole, à igualdade de oportunidade.
Tradicionalmente os autores indicam inicialmente três caracteres para o Direito
Natural: ser eterno, imutável e universal, isto porque, sendo a natureza humana a grande fonte
desses Direitos, ela é, fundamentalmente, a mesma em todos os tempos e lugares.
Direito Eterno: porque o homem é eterno;
Direito Universal: válido em todos os lugares;
Direito Imutável: independe de tempo e espaço
4.2 DIREITO POSITIVO
Positivo é o Direito institucionalizado pelo Estado. É a ordem jurídica obrigatória em
determinado lugar e tempo. Malgrado imprópria, a expressão Direito Positivo foi cunhada
para efeito de distinção com o Direito Natural. Logo, não houvesse este não haveria razão
35
para aquele adjetivo. As normas costumeiras que se manifestam pela oralidade, constituem
também Direito Positivo.
O positivismo filosófico floresceu no século XIX, quando o método experimental era
amplamente empregado, com sucesso, no âmbito das ciências da natureza. O positivismo
pretendeu transportar o método para o campo das ciências sociais.
Augusto Comte (1798-1857) é considerado o fundador dessa corrente filosófica,
através de sua obra Curso de Filosofia Positiva , em que destaca dois aspectos principais: a lei
dos três estados; classificação das ciências.
Segundo a Lei dos Três Estados, o pensamento humano passaria por três etapas as
quais: teológica, metafísica e positiva. Teleológica nesse período, os fenômenos que ocorriam
eram atribuídos aos deuses, demônios, duendes e espíritos. Predominava a imaginação, a mera
fantasia. Os chefes e imperadores eram considerados representantes dos deuses. Etapa
metafísica: a explicação das coisas passa a ser feita através de princípios abstratos. Etapa
positiva, nela, há caracterização do exame empírico dos fatos.
Já na Classificação das Ciências, Augusto Comte, formulou uma classificação da
ciência adotando o critério de caminhar das mais gerais às mais especificas e, ao mesmo
tempo, das mais simples às mais complexas. Para Comte o Direito era uma seção da
Sociologia e a Psicologia.
4.2.1 Caracteres do Direito Positivo
O Direito Positivo como um conjunto de normas que regulam a vida do homem em
sociedade ou conjunto de normas estabelecidas pelo Poder Público que regula a vida de um
povo em uma determinada época é posto pelo Estado, sendo válido por determinado tempo e
base territorial o que o fundamenta a estabilidade e a ordem social.
Tem por características ser: temporal, territorial, formal, revogável, variável e mutável.
Territorial: ou seja, aplicado à determinada localidade, determinado território
vinculado;
Formal: respeita a uma forma, maneira de se estabelecer, sempre escrita;
Revogável: pode ser anulado;
Variável e mutável: ao mesmo tempo em que pode variar conforme a sociedade, se
transforma com ela.
4.2.2 A divisão do Direito Positivo: Direito Público e Direito Privado
36
A mais antiga divisão do Direito Positivo e considerado a maior é representada pelas
classes do Direito Público e Direito Privado.
No Direito Público as relações se referem ao Estado e traduzem o predomínio do
interesse coletivo são chamadas relações públicas. Já no Direito Privado a relação que não
interessa de maneira direta ao Estado, mas sim ao indivíduo enquanto particular.
4.2.3 Os Ramos do Direito Público e do Direito Privado
O Direito, como toda é qualquer ciência se divide, em várias áreas de conhecimento. A
primeira divisão, http://estudantes.zeronet.com.br 13/09/2006, às 22:00, que já existia há
algum tempo é a divisão pelo meio de atuação onde se tem o Direito Público e o Direito
Privado, também divididos em dois grupos de estudo, em Direito Objetivo e Subjetivo.
O Direito Público trabalha, segundo Cotrim (2001) com os Direito gerais de uma
nação, cultura, sociedade e também políticos de um governo ou constitucionais. Já o Direito
Privado trabalha, conforme autor citado, com os direitos mas privativos, particulares “lato
sensu”, particulares “lato sensu”, ou seja, com os direitos de família, direito do consumidor e
etc.
Na verdade, na concepção dele, não existe uma diferença tão rigida entre o Direito
Público e Privado. Entre os juristas que se dedicam ao tema há muita contravérsia sobre os
critérios satisfatórios para delimitar, com exatidão, as fronteiras entre esses dois ramos do
Direito. De modo geral, podemos agrupar os principais ramos do Direito da seguinte maneira,
com base na distinção entre Direito Público e Privado:
Direito Constitucional é o ramo do direito público interno, segundo Cotrim (2001) que
analisa e interpreta as normas constitucionais, essas compreendidas como o ápice da pirâmide
normativa de uma ordem jurídica, são consideradas Leis Supremas de um Estado soberano, e
tem por escopo regulamentar e delimitar o poder estatal, além de garantir os direitos
considerados fundamentais.
Direito Civil é o núcleo do direito privado, incluindo todas as normas, segundo Cotrim
(2001), referente à pessoa, à familia e à sua forma de aquisição, à sucessão (com quem os
bens ficam depois da morte de alguém), às obrigações de fazer e de não fazer, aos contratos,
etc.
37
Direito Processual é o ramo do direito que regula, segundo Cotrim (2001, p. 22) “as
atividades do Poder Judiciário e das partes em conflito no decorrer do processo judicial”.
Direito Penal é o conjunto de normas que o Estado emprega para prevenir ou reprimir
os fatos que atentem contra a segurança e a ordem social, definindo as infrações,
estabelecendo e limitando as responsabilidades e relacionando as sanções punitivas
correspondentes (http://www.dji.com.br/dicionario/direito_penal.htm,13/09/2006, às 22:10).
Direito Administrativo é ramo do direito que regula, de acordo com Cotrim (2001,
p.22) “a organização e funcionamento da Administração Pública e dos órgaos que executam
servicos públicos”.
Direito Internacional Público, regula, conforme Cotrim (2001, p.22) “as relações entre
Estados, por meio de normas aceitas como obrigatórias pela comunidade internacional”.
Direito Comercial, regula a prática de atos mercantins pelo empresário e pelas
sociedades comerciais (Cotrim apud Lei 10.406/2002 – Direito Empresarial).
Direito do Trabalho, regula (Cotrim, 2001, p.p 22) “as relações de trabalho entre
empregado e empregador, preocupando-se, ainda, com a condição social dos trabalhadores”.
Direito do Consumidor, é o ramo do Direito que trata da defesa do consumidor através
da divulgaçãode informação sobre a qualidade dos bens e serviços e através do exercício de
pressão sobre as entidades públicas com o objetivo de defender os direitos dos consumidores
(http://www.procon.se.gov.br/cdconiver.htm,13/09/2006, às 22:30 ).
Direito Internacional Privado, regula, segundo Cotrim (2001, p. 22) “os problemas
particulares ocasionandos pelo conflito de leis de diferentes países”.
Direitos Humanos ou Direitos Naturais, Direitos Humanos, Direitos do Homem,
Direitos Individuais, Direitos Públicos Subjetivos, Direitos Fundamentais, Liberdades
Fundamentais, Liberdades Públicas são todas expressões equivalente a categoria.
Originalmente, designado de direitos naturais, decorrente da própria natureza humana,
enquanto criada à imagem e semelhança de Deus ou enquanto ser racional. Com a evolução
histórica e a positivação desses direitos, passou-se a preferir, nos países anglo-saxões e
latinos, a expressão “direitos do homem”, mas que foi, por ocasião da Segunda Guerra
Mundial e da fundação da ONU, substituída por “direitos humanos” na medida em que aquela
não necessariamente contemplava as mulheres, conforme pesquisa no site
http://www.direitos.org.br/index.php?option=com.contet&task=view&id=607&itemid=25,
13/09/2006, às 22:45.
Na mesma página de pesquisa, encontrou-se que os direitos individuais, liberdades
fundamentais e liberdades públicas são designações modernas, mas que estão demasiado
38
vinculadas a uma concepção específica de Estado, a liberal. Decorre de duas definições, a do
Estado político e a dos direitos.
Acrescenta da pesquisa eletrônica que, assim sendo, a designação coletivista,
fundamentada na qualificação “fundamentais” daria a entender que se trata de “situações
jurídicas sem as quais a pessoa humana não se realiza, não convive e, às vezes, nem mesmo
sobrevive”. Já o qualificativo “da pessoa humana” implica que tais situações “a todos, por
igual, devem ser, não apenas formalmente reconhecidos, mas concreta e materialmente
efetivados”.
E que apesar disso, segundo site eletrônico, a expressão mais utilizada nos idiomas
românicos é "direitos humanos", que está sujeita à crítica de que todos os direitos são
necessariamente humanos, uma vez que só seres humanos, singularmente ou coletivamente,
tem direitos e deveres jurídicos .
Direito Tributário é o setor do Direito Financeiro que se ocupa, segundo Cotrim
(2001) dos tributos, como por exemplo, os impostos e as taxas.
Biodireito é o ramo do Direito Público que se associa à Bioética, de acordo dom Prof.
Dr. Luiz Santos (2001) estudando as relações jurídicas entre o Direito e os avanços
tecnológicos conectados à medicina; e seus aporches; peculiaridades relacionadas ao corpo, à
diginidade da pessoa humana.
A DIVISÃO DO DIREITO
DIREITO
PÚBLICO
PRIVADO
INTERNO
Direito Constitucional
Direito Administrativo
Direito Penal
Direito Tributário
Direito Processual
Biodireito
EXTERNO
Direito Internacional Público
INTERNO
Direito Civil
Direito Comercial
Direito do Trabalho
EXTERNO
Direito Internacional Privado
Direito do Consumidor
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FIGURA 1 – A Divisão do Direito.
Fonte: CONTRIM, Gilberto Vieira. Direito e Legislação – Introdução ao Direito, 2001.
4.3 PARÂMETROS DE DISTINÇÃO ENTRE DIREITO NATURAL E DIREITO
POSITIVO
Tendo em vista as distinções apresentadas até aqui, podem ser apontados os seguintes
parâmetros para distinguir o direito natural do direito positivo:
Direito Natural Direito Positivo
1. Universalidade - O direito natural vale em
qualquer lugar.
1. Particularidade - O direito positivo vale
apenas em alguns lugares.
2. Imutabilidade - O direito natural vale
sempre.
2. Mutabilidade - O direito positivo vale em
certos momentos.
3. Fonte do direito - A fonte do direito
natural é a própria natureza.
3. Fonte do direito - A fonte do direito
positivo é a vontade do legislador
(governante - povo).
4. Modo de conhecimento - O direito
natural é conhecido pela razão.
4. Modo de conhecimento - O direito
positivo é conhecido quando se conhece a
vontade do legislador.
5. O objeto do direito - O direito natural
regula comportamentos que são bons ou
maus por si mesmos, indiferentes à vontade
do legislador.
5. O objeto do direito - O direito positivo
regula comportamentos que em si mesmos
são indiferentes e que passam a ser bons ou
maus de acordo com a vontade do legislador.
6. Fim do direito - O direito natural
estabelece o que é bom e justo.
6. Fim do direito - O direito positivo
estabelece o que é útil.
Fonte: Nader, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito.
40
5 DIREITO OBJETIVO E DIREITO SUBJETIVO
O Direito vigente pode ser analisado sob dois ângulos diferentes: objetivo e subjetivo.
Em uma percepção objetiva do Direito temos que o mesmo é norma de organização social,
chamado termo Jus norma agendi. Exemplo: Quando frisamos que o Direito do Trabalho não
adota formalidades, ou seja, não é formalista, emprega-se o termo Direito no sentido objetivo,
adotando como exemplificação de norma que trata das relações de trabalho.
Já o Direito Subjetivo corresponde às possibilidades ou poderes de agir, que a ordem
jurídica garante a alguém, no que antigamente idealizava-se Jus facultas agendi. Este direito é
caracterizado pela personificação, ou seja, aquele que é projetado à relação jurídica concreta
para permissão de um conduta ou estabelecimento de consequência jurídicas. Exemplo: o ato
de dizer que “tenho direito a indenização” afirma-se pelo direito subjetivo de possuir algo.
O direito subjetivo se apresenta sempre em relação jurídica. Embora se relacione com
Direito Objetivo, ele se opõe corretamente ao dever jurídico. Um não existe sem o outro.
Temos que na relação jurídica os sujeitos se diferenciam, enquanto que um é portador de
direito subjetivo (sujeito ativo), o outro é titular do dever jurídico (sujeito passivo).
Acrescenta-se a isso o fato que este direito decorre da incidência de normas jurídicas
sobre fatos sociais em que as regras qualificam os direitos tanto pela imposição de deveres
jurídicos aos sujeitos de determinada relação ou reconhecendo vantagens. Consiste, portanto,
segundo Paulo Nader “na possibilidade de agir e de exigir aquilo que as normas de Direito
atribuem a alguém como próprio”.
Para Miguel Reale, o direito subjetivo é gênero da espécie situação subjetiva, ou seja,
“a possibilidade de ser, pretender ou fazer algo, de maneira garantida, nos limites atributivos
das regras de direito”.
5.1 DIREITO OBJETIVO
O Direito objetivo é o conjunto de normas que o Estado mantém em vigor. É aquele
proclamado como ordenamento jurídico e, portanto, fora do sujeito de direitos. Essas normas
vêm através de sua fonte formal: a lei. O direito objetivo constitui uma entidade objetiva
frente aos sujeitos de direitos, que se regem segundo ele.
41
Ao falar-se em direito objetivo cria-se desde já uma delimitação entre algo e outra
coisa que se lhe contrapõe. Na verdade, ao se referir a direito objetivo, três grandes
delimitações se procuram fazer no decorrer da história: a diferença entre o direito divino e o
direito dos homens; a referência ao direito meramente escrito, constante das leis; ao direito
com plena eficácia jurídica; e, finalmente, a delimitação entre o direito objetivo (norma
agendi) e o direito subjetivo (facultas agendi). No princípio não haviaplena consciência da
diferença entre o direito divino e o direito dos homens.
Todo direito era fruto do direito dos deuses, ou dos homens como seus mandatários.
Tal unificação foi cedendo, já no pensamento grego, e cresceu e se desenvolveu com o
cristianismo: umas leis são dos Césares, outras de Cristo, na expressão de São Jerônimo.
Numa visão mais moderna, o direito positivo se apresenta como o conjunto das regras
vigentes em um determinado sistema jurídico, emanadas de uma autoridade estatal. A este se
contrapõe o direito natural, que deve inspirar o direito objetivo.
Com essa visão temos Castro y Bravo, que o conceitua “como a ‘regulamentação
organizadora de uma comunidade, legitimada por sua harmonia com o direito natural’. Se
recolhem como características do direito positivo: seu caráter específico de eficácia, de
organizador e criador de uma realidade social (a ordem jurídica), e, portanto, a necessidade de
sua vigência (validade jurídica); sua subordinação em relação à lei eterna de Justiça, que exige
seu próprio caráter de direito, isto é, a necessidade de sua legitimidade; por último, se indica
na definição que se compreende dentro do conceito amplo de direito positivo a todos os atos
que tenham tais características, sejam ou não normas jurídicas”.
5.1.1 As Normas de Conduta e o Direito Objetivo
O direito objetivo, através das normas, determina a conduta que membros da
sociedade devem observar nas relações sociais. Mas não devemos confundir a norma
propriamente dita com a lei, pois a norma é o mandado, a ordem, com eficácia organizadora,
enquanto a lei é o signo, o símbolo mediante o qual se manifesta a norma. Poderíamos dizer
simbolicamente que a norma é a alma, enquanto a lei o corpo.
Alguns autores, como Allara, reputam insuficiente conceituar-se o direito objetivo
como norma de conduta, preferindo caracterizá-la como norma de organização dos poderes
públicos. Uma visão intermediária do direito objetivo lhe atribui dois objetos: um interno e
outro externo.
42
O objeto interno consiste em que o direito objetivo disciplina a organização social, isto
é, os órgãos e os poderes que exercem a autoridade pública, as relações entre as várias
autoridades, enfim, a formação e a ação da máquina do Estado. Já o objeto externo se
caracteriza pelo fato de que o direito objetivo regula a conduta externa dos homens nas sua
relações recíprocas.
5.1.2 Origem do Direito Objetivo
Para alguns, a norma agendi (direito objetivo) teria sua origem no Estado, como
preconizam Hegel, Ihering e toda a corrente alemã do direito positivo escrito; para outros, o
direito objetivo resulta do espírito do povo; outros pensam que sua origem está no
desenvolvimento dos fatos históricos, e temos aí os defensores da escola histórica do Direito;
e, finalmente, ainda há os que defendem que o direito positivo tem sua origem na própria vida
social, como os defensores da escola sociológica.
Comentando a fonte do direito objetivo, e analisando a teoria que defende a exclusiva
estatalidade do direito, Ruggiero afirma que todo direito positivo (direito objetivo) é estatal e
exclusivamente estatal, visto que nenhum outro poder, fora do que é constitucionalmente
soberano, pode ditar normas obrigatórias e muni-las de coação.
Tal ideia se desenvolveu com a nova estrutura dos Estados modernos, com a
consequente divisão dos poderes, e, portanto, com a atribuição ao poder legislativo do poder
de criar o direito objetivo, bem como em consequência da codificação desenvolvida no século
XIX.
Logo, segundo a ordem constitucional de cada Estado, cabe dizer qual o órgão com
poder para criar e estabelecer o direito positivo. O princípio geral é o de que se a norma
provém de um órgão incompetente, não é obrigatória e não constitui, portanto, Direito.
5.2 DIREITO SUBJETIVO
Enquanto para muitos autores a distinção entre o Direito objetivo e o subjetivo era
familiar aos romanos, Michel Villey defende a tese de que para o Direito Romano clássico, o
seu de cada um era apenas o resultado da aplicação dos critérios da lei, “uma fração de coisas
e não um poder sobre as coisas”.
Para o ilustre professor da Universidade de Paris, “o jus é definido no Digesto como o que é
justo (id quod justum est) ; aplicado ao indivíduo, a palavra designará a parte justa que lhe
43
deverá ser atribuída (jus suum cuique tribuendi) em relação aos outros, neste trabalho de
repartição (tributio) entre vários que é a arte do jurista”.
A ideia do direito como atributo da pessoa e que lhe proporciona benefício, somente
teria sido claramente exposta, no século XIV, por Guilherme de Occam, teólogo e filósofo
inglês, na polêmica que travou com o Papa João XXII, a propósito dos bens que se achavam
em poder da Ordem Franciscana. Para o Sumo Pontífice, aqueles religiosos não eram
proprietários das coisas, não obstante o uso que delas faziam há longo tempo.
Em defesa dos franciscanos, Guilherme de Occam desenvolve a sua argumentação, na
qual se distingue o simples uso por concessão e revogável, do verdadeiro direito, que não
pode ser desfeito, salvo por motivo especial, hipótese em que o titular do direito poderia
reclamá-lo em juízo. Occam teria, assim, considerado dois aspectos do direito individual: o
poder de agir e a condição de reclamar em juízo.
No processo de fixação do conceito de direito subjetivo, foi importante a contribuição
da escolástica espanhola, principalmente através de Suárez, que definiu como “o poder moral
que se tem sobre uma coisa própria ou que de alguma maneira nos pertence”. Posteriormente,
Hugo Grócio admitiu o novo conceito, também aceito por seus comentaristas Puffendorf,
Feltmann, Thomasius, integrantes da Escola do Direito Natural. É reconhecida especial
importância à adesão de Christian Wolf (1679-1754) ao novo conceito, sobretudo pela grande
penetração de sua doutrina nas universidades europeias.
5.2.1 Classificação dos Direitos Subjetivos
A primeira classificação sobre o direito subjetivo refere-se ao seu conteúdo, figurando,
como divisão maior, a relativa do Direito Público e Direito Privado.
1. Direitos Subjetivos Públicos – O direito subjetivo público divide-se em direito de
liberdade, de ação, de petição e direitos políticos. Em relação ao direito de liberdade, na
legislação brasileira, como proteção fundamental, há os seguintes dispositivos:
a) Constituição Federal: item II do art. 5º - “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar
de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (princípio denominado por norma de
liberdade);
b) Código Penal: art. 146, que complementa o preceito constitucional – “Constranger
alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer
outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela
não manda – pena...” (delito de constrangimento ilegal);
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c) Constituição Federal: item LXVIII do art. 5º - “Conceder-se-á habeas corpus
sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua
liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.” O direito de ação consiste na
possibilidade de se exigir do Estado, dentro das hipóteses previstas, a chamada prestação
jurisdicional, isto é, que o Estado, através de seus órgãos competentes, tome conhecimento de
determinado problema jurídico concreto, promovendo a aplicação do Direito. O direito de
petição refere-se à obtenção de informação administrativa sobre o assunto de interesse do
requerente.
A Constituição Federal, no item XXXIV, a, do art. 5º, prevê tal hipótese. Qualquer
pessoa poderá requerer aos poderespúblicos, com direito à resposta. É através dos direitos
políticos que os cidadãos participam do poder. Por eles os cidadãos podem exercer as funções
públicas tanto no exercício da função executiva, legislativa ou judiciária. Incluem-se, nos
direitos políticos, os direitos de votar e de ser votado.
2. Direitos Subjetivos Privados – Sob o aspecto econômico, os direitos subjetivos
privados dividem-se em patrimoniais e não patrimoniais. Os primeiros possuem valor de
ordem material, podendo ser apreciados pecuniariamente, o que não sucede com os não
patrimoniais, de natureza apenas moral.
Os patrimoniais subdividem-se em reais, obrigacionais, sucessórios e intelectuais. Os
direitos reais – jura in re – são aqueles que têm por objeto um bom móvel ou imóvel, como o
domínio, usufruto, penhor. Os obrigacionais, também chamados de crédito ou pessoais, têm
por objeto uma prestação pessoal, como ocorre no mútuo, contrato de trabalho etc.
Sucessórios são os direitos que surgem em decorrência do falecimento de seu titular e
são transmitidos aos seus herdeiros. Finalmente, os direitos intelectuais dizem respeito aos
autores e inventores, que têm o privilégio de explorar a sua obra, com exclusão de outras
pessoas.
Os direitos subjetivos de caráter não patrimonial desdobram-se em personalíssimos e
familiais. Os primeiros são os direitos da pessoa em relação à sua vida, integridade corpórea e
moral, nome etc. São também denominados inatos, porque tutelam o ser humano a partir do
seu nascimento. Já os direitos familiais decorrem do vínculo familiar, como os existentes
entre os cônjuges e seus filhos. A segunda classificação dos direitos subjetivos refere-se à sua
eficácia. Dividem-se em absolutos e relativos, transmissíveis e não transmissíveis, principais e
acessórios, renunciáveis e não renunciáveis.
1. Direitos absolutos e relativos – Nos direitos absolutos a coletividade figura como
sujeito passivo da relação. São direitos que podem ser exigidos contra todos os membros da
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coletividade, por isso são chamados erga omnes. O direito de propriedade é um exemplo. Os
relativos podem ser opostos apenas em relação à determinada pessoa ou pessoas, que
participam da relação jurídica. Os direitos de crédito, de locação, os familiais são alguns
exemplos de direitos que podem ser exigidos apenas contra determinada ou determinadas
pessoas, com as quais o sujeito ativo mantém vínculo, seja decorrente de contrato, de ato
ilícito ou por imposição legal.
2. Direitos transmissíveis e não transmissíveis – Como os nomes indicam, os primeiros
são aqueles direitos subjetivos que podem passar de um titular para outro, o que não ocorre
com os não transmissíveis, seja por absoluta impossibilidade de fato ou por impossibilidade
legal. Os direitos personalíssimos são sempre direitos não transmissíveis, enquanto os direitos
reais, em princípio, são transmissíveis.
3. Direitos principais e acessórios – Os primeiros são independentes, autônomos,
enquanto que os direitos acessórios estão na dependência do principal, não possuindo
existência autônoma. No contrato de mútuo, o direito ao capital é o principal e o direito aos
juros é acessório. 4. Direitos renunciáveis e não renunciáveis – Os direitos renunciáveis são
aqueles que o sujeito ativo, por ato de vontade, pode deixar a condição de titular do direito
sem a intenção de transferi-lo a outrem, enquanto que nos irrenunciáveis tal fato é
impraticável, como se dá com os direitos personalíssimos.
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6 FONTES DO DIREITO
Fonte, em seu sentido clássico, é o nascedouro. É na fonte que se retira água, ainda,
em muitos locais do nosso Brasil. Fonte é o princípio, é a origem. É um dos sentidos a ser
dado às fontes do direito. O direito, foi dito, está entre nós desde a origem da sociedade. Não
há forma de convivência sem direito, qualquer que seja a sua expressão.
Assim, o nascedouro do direito, ou sua fonte inicial, devem ser os Costumes e Usos de
um determinado povo. Parece claro que a sociedade precisa orientar-se por um senso comum.
A partir desses costumes e usos, nasce a lei.
E é esta a primeira fonte a ser mencionada na solução das questões que surgem no dia-
a-dia. Então temos duas fontes primárias: fontes imediatas ou ainda fontes diretas do direito.
Segundo Washington, 12: “Fontes diretas ou imediatas são aquelas que, por si sós,
pela sua própria força, são suficientes para gerar a regra jurídica. São elas a lei e o costume.”
Por lei, entenda-se a norma que emana de poder competente com alcance geral e força
coativa. Por outro lado, o direito não pode prescindir de outras duas fontes: fontes mediatas
ou indiretas, a doutrina e a jurisprudência.
Segundo Washington, 12: “Fontes indiretas ou mediatas são as que não têm tal virtude
(das fontes imediatas), porém encaminham os espíritos, mais cedo ou mais tarde, à elaboração
da norma. São a doutrina e a jurisprudência.”
A doutrina é a fonte que emana dos estudos dos doutos, dos grandes estudiosos do
direito, normalmente grandes juristas e filósofos. Esses estudos que fazem, muitas vezes
baseados no direito de outros países, informam nossos legisladores e nossos juízes,
complementando o nosso direito. Há também a jurisprudência, que é o entendimento que os
tribunais (segunda instância) têm quando da apreciação de casos levados à justiça.
Nem sempre essas decisões concordam com a lei e acabam sendo a nova base do
direito. Quando são unificadas em documentos, passam a ser Enunciados (Tribunais do
Trabalho) ou Súmulas (Tribunal Federal).
A doutrina jurídica não se apresenta uniforme quanto ao estudo das fontes do Direito.
Entre os cultores da ciência do direito, há uma grande diversidade de opiniões quanto ao
presente tema, principalmente em relação do elenco das fontes. Esta palavra provém do latim,
fons, fontis e significa nascente de água. No âmbito de nossa ciência é empregada como
metáfora, como observa Du Pasquier, pois “remontar à fonte de um rio é buscar o lugar de
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onde as suas águas saem da terra; do mesmo modo, inquirir sobre as fonte de regra jurídica é
buscar o ponto pelo qual sai das profundidades da vida social para aparecer na superfície do
Direito”.
Distinguimos duas espécies de fontes de Direito: fontes formais e fontes materiais.
6.1 FONTES MATERIAIS
O Direito não é produto arbitrário da vontade de legislador, mas uma criação que se
lastreia no querer social. É a sociedade, como centro de relações de vida, como sede de
acontecimentos que envolvem o homem, quem fornece ao legislador os elementos necessários
à formação dos estatutos jurídicos. Como causa produtora do Direito, as fontes materiais é
constituídas pelos fatos sociais, pelos problemas que emergem na sociedade e que é
condicionados pelos chamados fatores do Direito, como Moral, a Economia, a Geografia,
entre outros. Hubner Gelo divide as fontes materiais em fontes diretas e indiretas. Estas são
identificadas com os fatores jurídicos, enquanto que as fontes diretas são representadas pelos
órgãos elaboradores do Direito Positivo, como a sociedade, que cria o Direito
Consuetudinário, o Poder Legislativo, que elabora as leis, e o Judiciário, que produz a
jurisprudência.
6.2 FONTES FORMAIS
O Direito Positivo apresenta-se aos seus destinatários por diversas formas de
expressão, notadamente pela lei e costumes. Fontes formais são meios de expressão do
Direito, as formas pelas quais as normas jurídicas se exteriorizam, tornam-se conhecidas.
6.3 CONCEITO E FORMAÇÃO DA LEI
A Lei é forma moderna de produção do Direito Positivo.É ato do Poder Legislativo,
que estabelece normas de acordo com os interesses sociais. Não constitui, com outrora, a
expressão de uma vontade individual, pois traduz as aspirações coletivas. Apesar de uma
elaboração intelectual que exige técnica especifica, não tem base os artifícios da razão, pois se
estrutura na realidade social. A sua fonte material é representada pelos próprios fatos e valores
que a sociedade oferece.
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A origem da palavra lei ainda não foi devidamente esclarecida. As opiniões se
dividem, recaindo as preferências nos seguintes verbos: legere (ler); ligare (ligar); eligere
(escolher). Segundo Cícero, a origem da palavra provém deste último verbo: “Julgam que esta
lei deriva seu nome grego da ideia de dar a cada um o que é seu, e eu julgo que o nome latino
está vinculado à ideia de escolher; pois, sob a palavra lei eles apresentam um conceito de
equidade e nós um conceito de escolha, e ambos são atributos verdadeiros da lei”. Para Tomás
de Aquino “lei vem de ligar, porque obriga a agir”.
Em sentido amplo, emprega-se o vocábulo lei para indicar o Jus scriptum. É uma
referência genérica que atinge à lei propriamente, à medida provisória e ao decreto. Em
sentido estrito, a lei é o preceito comum e obrigatório, emanado do Poder Legislativo, no
âmbito de sua competência. A lei possui duas ordens de caracteres: substanciais e formais. 1º)
Caracteres substanciais – como a lei agrupa normas jurídicas, há de reunir também os
caracteres básicos destas; generalidade, abstratividade, bilateralidade, imperatividade,
coercibilidade. É indispensável ainda que o conteúdo de lei expresse o bem comum. 2º)
Caracteres Formais – sob aspecto de forma, a lei deve ser: escrita, emanada do Poder
Legislativo em processo de formação regular, promulgada e publicada.
A lei forma-se mediante processo legislativo estabelecido pela Constituição Federal e
se desdobra nas seguintes etapas: apresentação de projeto, exame das comissões, discussão e
aprovação, revisão, sanção, promulgação e publicação.
6.3.1 Iniciativa da Lei
Conforme dispõe o art. 61 da Constituição Federal de 1988, a iniciativa das leis
complementares e ordinárias compete: a qualquer membro ou comissão da Câmara dos
Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao
Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador Geral da República e ao
cidadão.
6.3.2 Exame pelas Comissões Técnica, Discussão e Aprovação
Uma vez apresentado, o projeto tramita por diversas comissões parlamentares, às quais
se vincula por seu objeto. Passado pelo crivo das comissões parlamentares deverá ir ao
plenário para discussão e votação. No regime bicameral, como é nosso, é indispensável à
aprovação do projeto pelas duas Casas.
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6.3.3 Revisão do Projeto
O projeto pode ser apresentado na Câmara ou no Senado Federal. Iniciado na Câmara,
o Senado funcionará como Casa revisadora e vice-versa, com a circunstância de que os
projetos encaminhados pelo Presidente da República, Supremo Tribunal Federal e Tribunais
Federal serão apreciados primeiramente pela Câmara dos Deputados. Se a Casa revisora
aprová-lo, deverá ser encaminhado à Presidência da República para sanção, promulgação e
publicação; se rejeitar será arquivado; se apresentar emenda volverá à Casa de origem para
nova apreciação. Não admitida à emenda, o projeto será arquivado.
6.3.4 Sanção
A sanção consiste na aquiescência, na concordância do Chefe do Executivo com o
projeto aprovado pelo Legislativo. É ato da alçada exclusiva do Poder Executivo: do
Presidente da República, Governadores Estaduais e Prefeitos Municipais.
6.3.5 Promulgação
A lei passa a existir com a promulgação, que ordinariamente é ato do Chefe do
Executivo. Consiste na declaração formal da existência da lei. Rejeitado o veto presidencial,
será o projeto encaminhado à presidência, para efeito de promulgação no prazo de quarenta e
oito horas.
6.3.6 Publicação
A publicação é indispensável para que a lei entre em vigor e deverá ser feita por órgão
oficial. O início de vigência pode dar-se com a publicação ou decorrida da vacatio legis, que é
o tempo que medeia entre a publicação e o início da vigência.
6.3.7 A Hierarquia das Leis
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As leis devem respeitar uma ordem hierárquica, hierarquia essa estabelecida de três
formas: Quanto à origem, leis Federais precedem às Estaduais e às Municipais e as Estaduais
precedem às Municipais.
Quanto à formação, têm preferência as normas constitucionais sobre as demais.
Quanto à edição, as mais novas prevalecem sobre as mais antigas.
6.3.8 Vigência das Leis
As leis entram em vigor conforme sua própria determinação ou, na ausência dessa
determinação, em 45 dias para território nacional e três meses para território estrangeiro.
Normalmente as leis trazem em seu último artigo o texto: ”Esta lei entra em vigor na
data de sua publicação”.
Para os casos em que não haja determinação constitucional em contrário, essa é a
forma correta. Também há casos em que a lei, embora feita em determinada data, apenas seja
do interesse do legislador que ela entre em vigor em outra data qualquer.
Nesse caso, a própria lei determina a data do seu início de vigência. Portanto, a lei
nunca tem vigor, isto é, nunca pode ser exigida antes de sua publicação.
Também quanto ao término da vigência das leis há três maneiras a considerar.
A lei pode ter vigência temporária, aquela em que há determinação expressa para o
término de sua vigência. Por exemplo: esta lei vigorará até 31 de dezembro de 2007.
6.3.9 Integração da Norma Jurídica
Suponha que, em certa situação, seja apresentado a um juiz um caso que não encontre
amparo legal. Assim, para o referido caso, não há nenhuma lei que prescreva a solução para
ele mesmo. Ao juiz não é permitido encerrar o caso sem solução, portanto ele tem por
obrigação encontrar uma saída para a situação proposta. Para tanto, ele se vale de todas as
fontes de direito existentes e já estudadas.
Assim vai o juiz vasculhar os costumes e depois destes a jurisprudência e a doutrina.
Se, mesmo assim não encontrar solução para o caso, é necessário optar por outros métodos de
integração da norma jurídica, como: analogia, equidade e os princípios gerais do Direito.
Analogia é a busca de situações parecidas, semelhantes, que possam ser comparadas à
situação em estudo e, por essa comparação, darem-se também solução semelhante à dada
anteriormente para o caso análogo.
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Equidade diz respeito a um sentimento de justiça que, mesmo sendo distintos dos
critérios rigorosos e legais, leva o juiz à aplicação de seu entendimento.
Princípios Gerais de Direito – São fundamentos que orientam o direito, embora não
escritos nas leis. Assim, no Direito de Família, o princípio maior é o da proteção da célula
familiar, seu núcleo. No Direito das Obrigações, o princípio a consagrar é o da igualdade das
partes.
No Direito Penal, o princípio básico é o da recuperação do réu. Alguns princípios
gerais podem ser apresentados, sem que representem toda a gama possível.
Assim: I – ninguém pode transferir mais direito do que tem; II – ninguém pode ser
condenado sem ser ouvido; III – ninguém pode invocar a própria malícia para tirar proveito
disso; IV – os contratos devem ser cumpridos (pacta sunt servanda).
6.4 COSTUMES
É a prática reiterada de atos, em uma dada região, a respeito de um determinado
assunto; poderá ser alegada pelo profissional de direito para conduzir a decisão de um caso
concreto.
Trata-se, portanto, de umanorma não escrita, ou seja, surge da prática reiterada de atos
de uma determinada sociedade. Temos como exemplo o cheque pré-datado
(texto_chequepredatado.doc).
6.4.1 Costume – Secundum Legem, Praeter Legem e Contra Legem
O Direito foi originalmente, e por muito tempo, formado unicamente de costumes,
nascidos antes do Estado, este também nas suas origens, realizado sob forma de costume.
A certo momento, costumes vieram a ser fixados por escrito. Com o “Corpus Iuris
Civilis”, de Justiniano, a lei passou a predominar sobre o costume. Mas o Direito
Consuetudinário (costumeiro) recobrou vigor, com a visão dos bárbaros, que trouxe o Direito
Germânico, formado de costumes. O mesmo se deu quando do desenvolvimento da profissão
mercantil, dando inicio ao Direito Mercantil, em que os costumes predominavam somente o
Direito Romano.
Com a Revolução Francesa, deu-se preferência à lei, de elaboração mais refletida do
que o costume, que é de formação espontânea, imprecisa e empírica. Com isso o costume teve
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diminuída sua importância, passando a ser fonte subsidiária do direito, sendo a lei a fonte
principal.
Os motivos pelos quais os costumes perderam importância em face da lei foram: i) a
existência de órgãos legislativos, cuja função especifica é a criação do Direito; ii) leis
numerosas surgem cada vez mais, regulando todas as matérias; iii) frequentemente as leis
assumem forma de códigos, cobrindo todo o terreno a ser disciplinado; iv) a lei é fácil de ser
renovada, poupando com isso a formação de novos costumes; v) atualmente, antes de se
tornar costume, um hábito que se aplica bem se torna lei; vi) o mundo moderno vive de
urgência, impedindo a formação de costume, que é de formação lenta; vii) a vida jurídica cada
vez mais o tecnicismo jurídico, e este se realiza melhor com a lei.
Os costumes podem ser de três espécies: i) secundum legem (de acordo com a lei) – é
o costume que estabelece forma costumeira de interpretação ou aplicação de uma lei, é o
costume intepretativo; ii)praeter legem (além da lei) – é o que vigora na falta de preceito
legal. A aplicação de costume nesses casos é autorizada pelo art. 4º da Lei de Introdução do
Código Civil; iii) contra legem (contra lei) – é o modo de agir aplicando prática costumeira
contrária a lei (por exemplo, o uso do cheque pré-datado).
6.5 A LEI E O COSTUME - DISTINÇÕES BÁSICAS
A distinção entre a lei e o costume pode ser feita segundo vários critérios. Quanto à
origem, a da lei é sempre certa e predeterminada.
Há sempre um momento no tempo, e um órgão do qual emana o Direito legislado.
Trata-se de uma lei federal, por exemplo, será o Congresso, através de suas duas Casas, a
Câmara dos Deputados e o Senado, o órgão elaborador da lei a ser sancionada pelo Presidente
da República, que integra o processo legislativo, pelo poder de iniciativa, pela sanção ou pelo
veto.
A origem da lei, portanto, não sofre qualquer dúvida, porquanto o órgão, que tem
competência para editá-la, já está anteriormente previsto, com sua linha de atividade
claramente marcada no espaço e no tempo. O Direito costumeiro, ao contrário, não tem
origem certa, nem se localiza ou é suscetível de localizar-se de maneira predeterminada.
Geralmente não sabemos onde e como surge determinado uso ou hábito social, que, aos
poucos, se converte em hábito jurídico, em uso jurídico.
O Direito costumeiro nasce por toda parte, de maneira anônima, ao passo que a lei,
desde a sua origem, se reveste de segurança e de certeza. A segunda característica é quanto à
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forma de elaboração. A lei não só se origina de um órgão certo como, na sua formação,
obedece a trâmites prefixados. Uma lei é o resultado, o ponto culminante de um processo,
que, em todos os seus momentos, em todos os seus ritmos, já está previsto em uma lei
anterior, quanto mais não seja na Constituição.
A Constituição vigente tem, no capítulo relativo ao Processo Legislativo, alguns
artigos referentes às várias espécies de normas legais, e ao modo de sua elaboração. 146
Acontecerá a mesma coisa com referência aos usos e costumes? É claro que não. Os usos e
costumes jurídicos aparecem na sociedade da forma mais imprevista; ninguém poderia
predeterminar os processos reveladores dos usos e costumes.
Ora é um ato consciente de um homem que, por atender a uma exigência social, passa
a ser imitado e repetido, até transformar-se em um ato consciente no todo social; às vezes, é
uma simples casualidade, que sugere uma solução no plano da conduta humana. Há uma
subconsciência social - por assim dizer - governando o aparecimento e a elaboração dos usos
e costumes, tendo falhado todas as tentativas no sentido de subordinarmos esses processos a
esquemas estereotipados.
Costuma-se dizer que a lei se distingue do costume também quanto à extensão ou
âmbito de eficácia. Alega-se que, no mais das vezes, a lei é genérica, ou seja, possui um
elemento de universalidade, enquanto que a maioria dos costumes são particulares, atendendo
a uma categoria de pessoas ou de atos, bem como a situações locais, de um município ou de
uma região.
Na realidade, assim como há leis desprovidas de generalidade, também há costumes
genéricos, como os que vigoram no Direito Internacional. Outro critério distintivo válido diz
respeito à forma. Quanto à forma verificamos a existência de muitas confusões que devem ser
dissipadas. É com a devida cautela que podemos dizer que a lei é sempre escrita, enquanto
que o Direito costumeiro é Direito não escrito. Casos há, com efeito, em que o Direito
costumeiro é consolidado e publicado por iniciativa de órgãos administrativos.
Para dar um exemplo concreto, lembramos que a Junta Comercial de São Paulo,
através de resolução publicada no Diário Oficial do Estado, consolidou os usos e costumes
das praças comerciais de São Paulo e Santos, especialmente em matéria de comércio cafeeiro.
Temos uma publicação oficial que facilita a indagação dos preceitos dos usos e costumes
mercantis que governam grande parte da atividade de nosso Estado.
Trata-se, entretanto, de um Direito costumeiro coligido por órgão da Administração e
não por órgão a que esteja privativamente afeta a função legislativa.
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O problema da forma está ligado intimamente a um outro critério, que o completa e
esclarece, que é o problema da vigência em correlação com o da eficácia de uma norma legal
ou costumeira. A norma legal exatamente porque já teve prevista a sua formação através de
um órgão predeterminado, se não estiver previsto o prazo de sua vigência, vigorará até o
advento de nova lei que a revogue, salvo o caso de manifesto desuso, a que já aludimos.
Verificada a prolongada falta de aplicação de uma norma legal, a sua validade formal ou
vigência torna-se aparente, esvazia-se por perda de eficácia.
A vigência da lei é, por conseguinte, de natureza tal que ela, normalmente, somente
cessa nas condições e no tempo em que nela mesmo se determinar, ou que venha a ser
determinado por nova lei.
Quanto ao Direito costumeiro propriamente dito, não é possível a determinação do
tempo de sua duração, nem tampouco prever-se a forma pela qual vai operar-se a sua
extinção. As regras de Direito costumeiro perdem a sua vigência pelo desuso, pois a sua
vigência é mera decorrência da eficácia.
Quando o juiz reconhece a habitualidade duradoura de um comportamento, com
intencionalidade ou motivação jurídica, confere-lhe validade formal e obrigatoriedade. Na
vida da norma legal, a vigência é prius; a eficácia é posterius.
Em se tratando de regra costumeira, dá-se o contrário, pois a vigência deflui da
eficácia. Eis aí alguns critérios básicos parase diferençar a regra legal da regra
consuetudinária ou costumeira. Há, no entanto, mais uma distinção a assinalar-se, que é
quanto à produção dos respectivos efeitos.
Dissemos que a lei tem sempre uma origem determinada, ligada a um órgão prefixado,
enquanto que o costume surge de forma indeterminada e, até certo ponto, imprevisível. Torna-
se costume jurídico, porém tão somente quando confluem dois elementos fundamentais: um é
a repetição habitual de um comportamento durante certo período de tempo; o outro é a
consciência social da obrigatoriedade desse comportamento.
O primeiro desses elementos é dito objetivo. Porquanto diz respeito à repetição de um
comportamento de maneira habitual; o segundo elemento é chamado subjetivo, visto como
está ligado à atitude espiritual dos homens, considerando tal conduta como necessária ou
conveniente ao interesse social.
É em virtude da existência do "elemento intencional" que os antigos ensinavam não
haver norma jurídica consuetudinária sem opinio juris seu necessitatis. Não basta a repetição
material do ato, porque é essencial que seja marcada pela convicção da juridicidade do
comportamento.
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De maneira mais objetiva poderíamos dizer que um costume adquire a qualidade de
costume jurídico quando passa a se referir intencionalmente a valores do Direito, tanto para
realizar um valor positivo, considerado de interesse social, como para impedir a ocorrência de
um valor negativo, de um desvalor.
Do que acabamos de expor já se vê que o Direito costumeiro tem um sentido de
espontaneidade, como que instintivo.
O Direito legislado é um Direito racional, em que os elementos da obrigatoriedade são
expressos de maneira esquematizada, após uma apreciação racionalmente feita da conduta
humana. Vale a pena referir-nos a outro aspecto importante pelos seus efeitos práticos.
A lei, cercada como está, desde a sua origem, por tantas certezas e garantias, opera,
por si mesma, erga omnes, é universal quanto à sua aplicação. É de execução imediata e geral,
dispensando a prova de sua existência. Ela é, de per si, o seu conteúdo normativo e a força de
sua obrigatoriedade, se não houver elemento de ordem formal condicionando a sua
executoriedade. E o Direito costumeiro? O Direito costumeiro é suscetível de prova em
contrário. Não são, portanto, iguais os efeitos da lei e do costume.
As leis têm efeitos indeclináveis, contra os quais nem as partes, nem o juiz podem
oferecer elemento de fato que os conteste, salvo a hipótese extrema de desuso manifesto.
O Direito costumeiro, mesmo quando consolidado por escrito, é suscetível de ceder
ante uma prova em contrário.
Surgem, aqui, três possíveis posições na apreciação da matéria. Uma determinada
corrente sustenta que também o Direito costumeiro deve presumir-se conhecido. Há um
brocardo romano que diz: Jura novit curia, o que quer dizer que 149 o foro, os juízes e
tribunais presumem-se conhecedores do Direito.
Esse brocardo é, indiscutivelmente, certo quanto à lei. Invoca-se uma lei, não preciso
exibir o Diário Oficial que a publicou. Alguns autores pretendem que o mesmo deva ocorrer
quanto aos usos e costumes, de maneira que também eles dispensariam a produção da prova
de sua existência.
Uma teoria contraposta declara que o Direito costumeiro deve sempre vir
acompanhado de prova, enquanto que, segundo uma solução intermédia, que me parece a
melhor, a prova do Direito costumeiro deverá ser feita em havendo contestação da parte ou
determinação ex officio do juiz; isto quer dizer que, se eu proponho uma ação em juízo,
invocando uma regra costumeira, não precisarei fazer prova de sua existência, se não for
contestada pela parte contrária ou não for à prova exigida pelo juiz a quo, pelo juiz
competente.
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6.6 DOUTRINA
São os estudos elaborados pelos juristas a respeito do Direito. Trata-se de publicações
especializadas sobre os diversos ramos do Direito. Funcionam como uma fonte de pesquisa
para o operador jurídico.
Segundo Cotrim (2000), pag. 19, a doutrina jurídica é o conjunto sistemático de teorias
sobre o Direito elaborado pelos juristas. A doutrina é produto da reflexão e do estudo que os
grandes juristas desenvolvem sobre o Direito.
O parecer em comum sobre determinados assuntos, de diversos especialistas de
notório saber jurídico, constitui verdadeiras normas que orientam legisladores, juízes e
advogados.
6.7 JURISPRUDÊNCIA
A jurisprudência é o conjunto de decisões judiciais reiteradas (repetidas) sobre
determinado assunto. Segundo Cotrim (2000), pág. 19, é dinâmica a jurisprudência, pois vai
formando a partir das soluções adotadas pelos órgãos judiciais ao julgar casos jurídicos
semelhantes.
6.8 ANALOGIA
A palavra significa “semelhança, nivelamento”. Em resumo, analogia é a adaptação de
uma situação jurídica que já tenha sido objeto de decisão do Poder Judiciário, para a solução
de outra situação jurídica semelhante.
6.9 PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITO
“São exigências do ideal de justiça a ser concretizado na aplicação do Direito”.
(Instituições de Direito Privado e de Direito Público - Ricardo Teixeira Brancato). Como
exemplo, temos o princípio da ampla defesa, de suma importância no mundo Jurídico, pois, é
com base nesse princípio que ninguém poderá ser processado/condenado, sem ter o direito de
se defender.
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7 RELAÇÃO JURÍDICA
Os fatos e, mais especificamente, os atos humanos podem se apresentar como relações
jurídicas, que não são quaisquer relações sociais, mas tão somente aquelas que reúnem
diversos requisitos previstos na lei e em outras normas jurídicas.
Um dos elementos essenciais da experiência jurídica é representado pela relação
jurídica, cujo conceito é fundamental na Ciência do Direito, tendo sido estabelecido, de
maneira mais clara por F. C Savigny, no decorrer do século XIX.
Muito embora o conceito de “relação jurídica” não desempenhe, hoje em dia, o mesmo
papel que lhe foi conferido, até bem pouco tempo, dado o reconhecimento de outras
categorias jurídicas não menos relevantes, não a deixa de ser um tema básico da Teoria Geral
do Direito.
Todas as ciências implicam relações. O químico, o físico, o astrônomo, estudam,
indiscutivelmente, relações entre fatos antecedentes, consequentes ou, então, concomitantes.
Era, por, preciso delimitar o campo das relações que pertencem propriamente ao domínio da
Ciência do Direito. Esse campo, uma vez delimitado, importa na delimitação de um objeto
próprio.
O que devemos entender pela expressão “relação jurídica”? Em primeiro lugar, trata-
se de uma espécie de relação social. Os homens, visando à obtenção de fins diversos e
múltiplos, entram em contato uns com os outros. Há uma infinidade de laços prendendo os
homens entre si, mas nem todos são de natureza jurídica. A rigor, ninguém se relaciona na
sociedade com fins estritamente jurídicos. São fins morais, religiosos, econômicos, estéticos,
artísticos, utilitários, que determinam a conduta humana.
O Direito é mais instrumento de vida do que finalidade de vida. Quando os romanos
ensinavam que a Justiça é fundamental regência, estavam, por certo, vendo um aspecto
efetivo do problema, ou seja, o Direito como condição de vida visando à realização de fins
não-juridicos.
Ora se o homem, na sociedade, não objetiva a fins estritamente jurídicos, mas, ao
contrario, fins multiplos, devemos reconhecer que nem todas as relações são jurídicas, embora
possam às vezes, reunir duas ou mais pessoas através de vínculos estáveis e objetivos.
Quais das relações dever ser tidas como jurídicas? Podemos dizer que há doisenfoques principais a considerar. De acordo com a teoria tradicional, baseada numa
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concepção individualista do Direito, as relações jurídicas seriam sociais postas por si mesmas,
apenas reconhecidas pelo Estado, com a finalidade de protegê-las.
Prevalece, hoje em dia, uma concepção operacional do Direito, não se atribuindo mais
ao Estado a mera função de reconhecer e amparar algo já estabelecido pelo livre jogo dos
interesses individuais. Ao contrário, o Estado, baseado é claro, nos dados do processo social
instaura modelos jurídicos que condicionam e orientam o constituir-se das relações jurídicas.
7.1 RELAÇÃO JURÍDICA E RELAÇÃO DE FATO
As normas de direito regulam o comportamento humano dentro da sociedade. Isto é
assim porque o homem, em vida social, está sempre em interação, influenciando a conduta de
outrem, o que dá origem a relações sociais que, disciplinadas por normas jurídicas,
transformam-se em relações de direito.
A relação regulada pelo direito recebe o nome de relação jurídica.
Nem toda relação interpessoal (entre pessoas) interessa ao ordenamento jurídico. A
essa categoria de relações que não interessa ao direito dá-se o nome de relação de fato.
Exemplo: o namoro que não caracteriza a constituição de uma entidade familiar.
Conceito: relação jurídica é o vínculo entre sujeitos de direito estabelecido por lei ou
pela vontade humana, para a consecução dos respectivos interesses (Roberto Senise Lisboa,
p. 223).
Outra definição: “é a relação da vida social disciplinada pelo Direito, mediante
atribuição a uma pessoa de um direito subjetivo e a imposição à outra de um dever jurídico
ou de uma sujeição”.
Mais sinteticamente: “relação jurídica é qualquer relação da vida social relevante
para o Direito, ou seja, susceptível de produzir efeitos jurídicos” (Rui Gomes da Silva e
Miguel Medina Silva).
Para Pontes de Miranda a relação jurídica “é a relação inter-humana, a que a regra
jurídica, incidindo sobre os fatos, torna jurídica”. As relações jurídicas se formam pela
incidência de normas jurídicas sobre fatos sociais.
Exemplo: O proprietário/locador “A” pode exigir do inquilino “B” o valor do aluguel
(R$ 500,00, por exemplo). Estamos diante de uma relação jurídica concreta.
A relação jurídica é sempre um vínculo entre pessoas. Portanto, supõe
necessariamente a presença de, pelo menos, duas pessoas.
59
7.2 FORMAÇÃO DA RELAÇÃO JURÍDICA
As relações de vida formam-se em decorrência de determinados fatores que
aproximam os homens e os levam ao convívio. Tais fatores são de natureza fisiológica,
econômica, moral, cultural, recreativa etc. a necessidade que o homem possui de suprir as
suas varias carências o induz à convivência. É pela vida associativa que obtém os
complementos indispensáveis à sua sobrevivência, à satisfação de seus instintos básicos, ao
conhecimento das coisas e da própria natureza. São as relações intersubjetivas que formam o
suporte ou a matéria das relações de direito. Quando essas relações de vida repercutem no
equilíbrio social, não podem permanecer sob comando aleatório das preferências individuais.
Nessa hipótese é mister a regulamentação jurídica. Uma vez subordinadas ao império da lei,
as relações sociais ganham qualificativo jurídico.
Quanto às relações sociais que surgem espontaneamente e não em decorrência de uma
elaboração legal, como assinalada Jean Dabin, há categorias que se revela legitima e outra que
se forma de acordo com os princípios e valores sociais. Quanto à relações sociais
consideradas negativas ou prejudiciais ao interesse coletivo, o Estado pode proibi-las
mediante normas especificas. Tais relações passam a ser consideradas ilícitas e combatidas
pela coercitividade estatal. A atitude quanto a essa classe de relação social poderá ser outra,
contudo. Por razões de oportunidade ou de impotência para controlá-la, o Estado é levado à
tolerância. Não as proíbe, mas também não as declara licitas. Quanto à relações sociais
voluntarias, que beneficiam o interesse coletivo, além de reconhecer a sua licitude, o Estado
poderá disciplina-las, se for conveniente, e até mesmo ajudá-las.
As relações jurídicas se forma pela incidência de normas jurídicas em fatos sociais.
Em sentido amplo, os acontecimentos que instauram, modificam ou extinguem relações
jurídicas denominam-se fatos jurídicos. Quando ocorre um determinado acontecimento
regulado por regras de Direito, instaura-se uma relação jurídica. Se toda relação jurídica
pressupõe uma relação de vida, nem toda relação social ingressa no mundo do Direito, apenas
as relativas aos interesses fundamentais de proteção à pessoa e à coletividade. Assim, os
vínculos de amizade, laços sentimentais, permanecem apenas no plano fático.
É a política jurídica que indica ao legislador as relações sociais carentes de
regulamentação jurídica. O Estado possui a faculdade de impor normas de conduta às
diferentes questões sociais. A legitimidade para ação legislativa, contudo, apresenta limites.
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As relações puramente espirituais, os fatos da consciência, escapam à competência do
legislador, pois “o espírito sopra onde quer”. Quando as relações sociais se desenvolvem
normalmente pelos costumes, sem acusar problemas de convivência, não é recomendável que
a lei as discipline, pois, além de inútil, pode quebrar a harmonia que espontaneamente existe
nas relações intersubjetivas.
7.3 ELEMENTOS DA RELAÇÃO JURÍDICA
Numa relação jurídica identificam-se quatro elementos: os sujeitos (ativo e passivo), o
objeto (imediato e mediato), o fato e a garantia.
Elemento Subjetivo: Maior importância deve ser dada ao elemento subjetivo da
relação jurídica, que é a pessoa. Em cada relação jurídica simples podemos distinguir dois
sujeitos: o sujeito ativo e o sujeito passivo.
A pessoa é o único ente que pode integrar um dos pólos da relação jurídica, sendo
classicamente denominado de sujeito ativo e sujeito passivo. Há duas categorias de pessoas no
direito: a pessoa natural ou física e a pessoa jurídica. Os demais entes que não se enquadram
nessas categorias não podem ocupar a posição jurídica de parte de uma relação, mas tão
somente a de objeto.
Sujeito ativo: é aquele que tem o poder de exigir determinada conduta de outra pessoa.
É o titular do direito ou do poder jurídico. Exemplo: o credor.
Sujeito passivo: é aquele que se subordina ao poder da outra pessoa, por força da
relação jurídica existente entre eles. Exemplo: o devedor. É o que está adstrito ao
comprimento da obrigação.
Elemento Objetivo: O elemento objetivo da relação jurídica é o bem da vida. A
própria pessoa ou alguns caracteres a ela inerentes podem ser objeto de direito (exemplo:
direitos da personalidade). Abrange o objeto, portanto, os modos de ser do sujeito ativo ou
titular do direito (sua vida, sua honra, seu nome, sua liberdade, etc.). Dois são, na realidade,
os objetos da relação jurídica:
a) o objeto imediato ou direto: que é a operação, qual seja, o ato ou o negócio jurídico
considerado em si mesmo e que se constitui em meio para se obter a necessidade ou utilidade
visada pela pessoa. Exemplos: o negócio jurídico de compra e venda, o negócio jurídico de
doação.
61
É o binômio direito-vinculação. É o conjunto de um direito e da correspondente
vinculação. Na relação jurídica, a cada direito de uma pessoa corresponde o dever (a
vinculação) de outra pessoa.
b) o objeto mediato ou indireto: que é o bem da vida. Por exemplo: no negócio
jurídico de compra e venda de um veículo, seria o próprio veículo. É aquilo a que o binômio
direito-vinculação se refere.
Fato Jurídico: Fato jurídico é o eventoao qual o Direito atribui relevância. Nem tudo
que acontece na natureza, bem como nem toda atuação do ser humano é relevante para o
direito. Uma tempestade em mar aberto não é relevante para o direito, sendo simples
acontecimento natural. Mas se atinge um navio e provoca naufrágio ou mortes, passa a ser
relevante para o direito, constituindo desse modo fato jurídico.
Só tem relevância para o Direito os fatos naturais ou humanos que constituem,
modificam ou extinguem relações jurídicas. Ou seja, que geram efeitos ou consequências no
mundo do direito.
Garantia: A garantia consiste na tutela que o Direito reconhece à relação social,
conferindo ao titular do interesse ou direito os meios para a sua efetivação.
Por exemplo: se o devedor não paga o credor, este tem a garantia do ordenamento
jurídico, que lhe possibilita os meios para compelir o devedor ao pagamento, através das
ações judiciais apropriadas.
Vínculo de Atributividade: No dizer de Miguel Reale, “é o vinculo que confere a cada
um dos participantes da relação o poder de pretender ou exigir algo determinado ou
determinável”. O vinculo de atributividade pode ter por origem o contrato ou a lei.
7.4 ESPÉCIES DE RELAÇÃO JURÍDICA
As relações jurídicas podem ser: SIMPLES ou COMPLEXAS.
Simples: Na relação jurídica simples há somente um binômio: direito – vinculação. Ou
seja uma pessoa tem o direito e a outra pessoa está vinculada ao cumprimento desse direito.
Exemplo: “A” doa a “B” uma casa. Trata-se de uma relação jurídica entre “A” e “B”.
“A” é o doador (sujeito passivo, devedor, vinculado)
“B” é o donatário (sujeito ativo, credor, titular do direito).
Complexa: Na maioria das relações jurídicas, há uma bilateralidade obrigacional, ou
seja, cada pessoa possui direitos em relação à outra (direitos e deveres recíprocos). Por
exemplo, no negócio jurídico de compra e venda, o comprador é aquele que deve pagar o
62
preço, porém adquire o direito de exigir do vendedor a entrega da coisa. É o que se denomina
de relação jurídica complexa. Exemplo: “A” vende a “B” um carro. Neste caso:
“A” é sujeito passivo (devedor) da entrega do carro, e é sujeito ativo (credor) do
dinheiro.
“B” é sujeito passivo (devedor) do dinheiro, e é sujeito ativo (credor) do carro.
7.5 SUJEITO DE DIREITO E PERSONALIDADE JURÍDICA
7.5.1 Personalidade e Capacidade
O ordenamento jurídico destina-se a reger as relações sociais entre indivíduos e
grupos. As pessoas, às quais as regras jurídicas se destinam, chamam-se sujeitos de direitos,
que podem ser tanto uma pessoa natural ou física quanto uma pessoa jurídica, que é um ente
coletivo.
Na exposição feita no primeiro semestre, tivemos ocasião de mostrar que o Direito é
uma ordenação bilateral atributiva das relações sociais na medida do bem comum. Isto quer
dizer que, em toda relação jurídica, duas ou mais pessoas ficam ligadas entre si por um laço
que lhes atribui, de maneira proporcional ou objetiva, poderes para agir e deveres a cumprir.
O titular, ou seja, aquele a quem cabe o dever a cumprir ou o poder de exigir, ou ambos, é que
se denomina sujeito de direito.
Refletindo esta ordem de noções é que o nosso Código Civil logo no art. 2° estabelece
cristalinamente o seguinte: "Todo o homem é capaz de direitos e obrigações na ordem civil".
O art. 3°, completando essa matéria de tão grande relevo para a civilização e para a cultura
jurídica, dispõe, ressalvadas as exceções, que: “A lei não distingue entre nacionais e
estrangeiros quanto à aquisição e ao gozo dos direitos civis”.
Esses dois preceitos formam como que o pórtico da legislação civil dos povos
modernos. Representam eles o resultado de uma longa e trabalhosa evolução histórica. Dizer
que todos os homens, via de regra, sem distinção de 212 nacionalidade, são titulares de
direitos e obrigações na ordem civil é afirmar uma conquista da civilização.
Nem sempre foi assim, evidentemente. Não precisamos remontar aos povos
primitivos, às sociedades ainda em formação, quando nem mesmo se podia vislumbrar a ideia
de pessoa ou de personalidade. Se nos limitarmos ao mundo clássico, podemos verificar que
nem todos os homens foram tidos como pessoas, ou titulares de direitos.
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Havia escravos e homens livres. A ideia mesmo de liberdade civil, que nos parece
conatural ao homem, pelo simples fato de ser homem, tinha um valor secundário resultante de
uma situação política. O grego ou o romano não eram livres por serem homens, mas sim, por
serem cidadãos de Atenas ou de Roma. O status libertatis era uma decorrência do status
civitatis. O ateniense e o romano deviam, em primeiro lugar, satisfazer a certos requisitos de
pertinência à sua cidade politicamente organizada, ou seja, à polis ou a civitas romana.
O elemento fundamental, que dava a um indivíduo a sua qualidade de pessoa, era o
elemento "grupalista", ou seja, o elemento político. Somente aquele que tinha poderes para
deliberar numa assembleia, votando e resolvendo em nome da polis, é que podia exercer
direitos na ordem privada.
Enquanto que para o homem moderno o que há de fundamental é a liberdade civil,
tanto ou mais que a própria liberdade política, no mundo antigo dava-se uma inversão,
porquanto a liberdade, no plano dos direitos civis comuns, só era possível a quem possuísse
preliminarmente a condição de cidadania. Na escala dos valores modernos podemos dizer que
a cidadania, se não vem depois pelo menos está ao nível da liberdade civil, enquanto que na
antiguidade clássica a cidadania primava sobre a liberdade privada. Privado, em grego, era
idiotes, aquele que, no famoso discurso de Péricles, só cuidava de si, em detrimento do bem
comum. Significativa é a derivação da palavra "idiota", o privado de senso...
O estudo do status libertatis constitui um dos capítulos mais belos do Direito clássico,
notadamente em virtude dos esclarecimentos que fornece à teoria do Direito Constitucional.
Já sabem os senhores, por certo, a esta altura dos estudos de Direito Romano, que a família
romana era uma entidade complexa, ético política e não apenas uma instituição ético-
biológica, como é em nossos dias.
A família romana era uma entidade política na qual o pater familias exercia um feixe
de poderes ou de funções. Dentro dessa unidade política de natureza familiar nem todos
possuíam igual liberdade no plano civil. Apenas o pater familias podia livremente adquirir
bens e deles dispor, isto é, constituir o seu patrimônio e desenvolvê-lo. O filius familias não
tinha essa independência jurídica, impedido, nos primórdios do Direito Romano e durante
longa fase do seu desenvolvimento, de possuir algo de próprio.
Foi aos poucos que se atribuiu ao filius familias o direito de ter certos bens, a começar
do pecúlio castrense que lhe advinha do fato de ter prestado serviço militar. Este exemplo nos
mostra que foi através de longa evolução histórica que os homens vieram se emancipando dos
grupos a que pertenciam.
64
É um processo que nós poderemos chamar de integração social, graças ao qual se
operam, concomitantemente, dois fenômenos complementares: a atribuição progressiva de
poderes autônomos e iguais aos indivíduos como tais; e a constituição de uma estrutura
jurídica superior capaz de garantir essa autonomia.
A sociedade é, primitivamente, amorfa, no sentido de que apresenta poucas diferenças
internas, mas, aos poucos, a divisão do trabalho vai se operando, até que, com o crescer da
civilização, a cada homem como que corresponde certa tarefa, ou situação. A esse trabalho de
discriminação progressiva das vocações e das atividades corresponde outro fenômeno de
natureza centrípeta, que se traduz naconstituição de um sistema de garantias que representa a
essência da vida pública e jurídica.
Quanto mais os indivíduos adquirem autonomia na sua capacidade de agir, segundo
tendências próprias e peculiares, tanto mais se estabelecem ligações comuns de natureza
objetiva ou transpessoal tendentes a garantir a livre coexistência das iniciativas privadas.
Quando se atinge certo grau de evolução é que se proclama, como na Revolução Francesa,
que todos os homens nascem livres e iguais, afirmando-se de forma solene, e com projeção
universal, aquilo que já fora proclamado por ocasião da independência norte-americana, com
a Declaração de Filadélfia, que o homem vale como sujeito de direitos e deveres tão somente
pelo fato de ser homem. Ainda assim, apesar de tudo, existem certas restrições, não somente
no plano da ordem civil, mas também no que se refere ao Direito Político.
Se todos são iguais no concernente aos direitos fundamentais da ordem civil, o mesmo
não acontece no tocante à cidadania. Sabem os senhores que nem todos podem ser eleitores,
votar e ser votados. Ainda se reserva ao brasileiro nato ou naturalizado o direito do voto,
limitando a atual Constituição o exercício de certos cargos públicos, como o de Presidente da
República, tão somente aos nascidos no Brasil.
Em confronto, todavia, com a maioria dos povos, nossa posição é das mais avançadas
quanto ao reconhecimento dos direitos civis e políticos aos estrangeiros. Veem os senhores,
portanto, como é importante na história da cultura e do Direito, o referido art. 2.°, que, na sua
singeleza, declara algo que parece tão evidente, ou seja, que todo o homem é capaz de direitos
e obrigações na ordem civil. Todo homem, mas tão somente o homem, é capaz de direitos e
obrigações. Não pode ser sujeito de direitos uma coisa, nem tampouco um animal irracional.
Já houve tempo em que se atribuíram direitos aos animais, mesmo sem se falar no episódio
ridículo de Calígula garantindo situações excepcionais a seu cavalo, ou, ainda, sem fazer
referência ao tirano renascentista que obrigava todos os seus concidadãos a saudar com
reverência o seu chapéu...
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Na Idade Média era frequente o caso de se processar um animal, ou de se apurar a
responsabilidade das coisas, o que pareceria absurdo ou aberrante a qualquer homem do povo,
em nossos dias.
Os processos das feiticeiras muitas vezes envolviam as vassouras, às quais se
atribuíam qualidades ou aptidões que somente poderiam ser purificadas através de um
julgamento especial. Tais fatos estranhos representam momentos da evolução jurídica, sendo
hoje unânime o consenso de que tão somente o homem é sujeito de direitos. Mas se assim é,
como se explicam os dispositivos legais que protegem os animais irracionais e as plantas? Há
uma Sociedade Protetora dos Animais e, toda a vez que um indivíduo esteja mostrando a
perversidade de seus instintos, causando sofrimentos a um animal, poderá ser processado.
Com isso não se estaria reconhecendo, de certa forma, o direito do animal à própria
vida ou integridade? Não. Na realidade, quando se protege um animal, não se lhe reconhece
um direito, mas apenas se respeitam os valores de afetividade, de "bons sentimentos" que é
um apanágio dos homens civilizados.
A proteção dispendida aos animais visa, desse modo, à salvaguarda de certos
princípios de ordem moral sem os quais os homens se reduziriam aos próprios irracionais. O
mesmo ocorre quando as normas legais, inclusive de caráter constitucional, mandam que se
respeitem as plantas, os monumentos ou as paisagens. Estabelecida, assim, a significação
ética e histórica do que seja sujeito de direito, devemos acrescentar que todo sujeito de direito
é também uma pessoa.
Também a palavra "pessoa" guarda o segredo de seu significado. Persona era a
máscara usada pelos artistas no teatro romano - do qual, por sinal, não participavam as
mulheres - a fim de configurar e caracterizar os tipos ou "personagens" e, ao mesmo tempo,
dar maior ressonância à voz. O símile é feliz, pois a "pessoa" é a dimensão ou veste social do
homem, aquilo que o distingue e o "presenta" e projeta na sociedade, para que ele possa ser,
de maneira autônoma, o que corresponde às virtualidades de seu ser individual.
Pessoa é, por outras palavras, a dimensão atributiva do ser humano, ou seja, a
qualificação do indivíduo como ser social enquanto se afirma e se correlaciona no seio da
convivência através de laços éticos-jurídicos.
A ideia de pessoa é fundamental tanto no domínio da Ética como no campo estrito do
Direito. A criatura humana é pessoa porque vale de per si, como centro de reconhecimento e
convergência de valores sociais. A personalidade do homem situa-o como ser autônomo,
conferindo-lhe dimensão de natureza moral. No plano jurídico a personalidade é isto: a
capacidade genérica de ser sujeito de direitos, o que é expressão de sua autonomia moral.
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Em sentido amplo, poderíamos estabelecer uma sinonímia entre "personalidade" e
"capacidade". A personalidade é a capacidade in abstracto de ser sujeito de direitos ou
obrigações, ou seja, de exercer determinadas atividades e de cumprir determinados deveres
decorrentes da convivência em sociedade.
O conceito de capacidade, em sentido estrito e próprio, não se confunde, porém, com o
de personalidade.
A palavra "capacidade" por si mesma está dizendo que ela indica uma extensão do
exercício da personalidade, como que a medida da personalidade em concreto. Personalidade
todos os homens têm, desde o nascimento.
Para se reconhecer a personalidade não é mister indagar do sexo, da idade ou do
discernimento mental. Recém-nascidos ou dementes, todos são pessoas, todos possuem
personalidade. Nem todos, porém, dispõem de igual capacidade jurídica, isto é, têm igual
possibilidade de exercer certos atos e por eles serem responsáveis. A capacidade pressupõe
certas condições de fato que possibilitam o exercício de direitos. Assim, por exemplo, a
criança não é capaz, e o demente também carece de capacidade.
Costuma-se distinguir entre capacidade de fato e capacidade de direito, referindo-se a
primeira às condições materiais do exercício, enquanto que a segunda é concernente à aptidão
legal para a prática dos atos. Nem sempre o ser humano está em condições de exercer o que
lhe cabe como pessoa.
A personalidade sempre é protegida, mas, às vezes, a proteção é feita por outrem. A
criança é uma pessoa que o Direito cerca de todo um complexo de garantias, que, pela
natureza das coisas, não é confiado a ela mesma, mas a seus pais ou representantes: é um caso
típico em que a capacidade de direito não é senão reflexo de uma incapacidade natural ou de
fato.
7.6 DAS PESSOAS JURÍDICAS
Todo ser humano, como vimos, é capaz de direitos e obrigações na ordem civil. Mas,
não é apenas o homem, na sua estrutura física, o único sujeito, em sentido jurídico. Não
podemos realizar os nossos objetivos mantendo-nos isolados, sem laços permanentes com
outros homens. Surgem, assim, grupos que o Direito dimensiona situa, conferindo-lhes
também personalidade. Descarte, aparece que tecnicamente chamamos pessoa jurídica e que
em outros sistemas de Direito se denomina pessoa moral.
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A pessoa jurídica não é algo de físico e de tangível como é o homem, pessoa natural. É
preciso que se explique por que e como Direito reconhece personalidade com efeitos amplos a
certas entidades, cuja "realidade" é, desse modo, admitida.
Como se explica a existência da pessoa jurídica? Qual a natureza destas organizações
que o Direito trata como "pessoas"? O Código Civil, no Livro 1, que é relativo às Pessoas,
cuida dessas entidades, dedicando-lhesos arts. 13 e seguintes, concernentes à sua formação,
às suas espécies e aos requisitos de sua atividade.Antes de apreciarmos esses dispositivos, sob
o aspecto da Teoria Geral de Direito, devemos responder a esta pergunta: como se pode
explicar doutrinariamente o ser de uma pessoa jurídica? De acordo com a nossa legislação, ela
tem uma existência que não se confunde com a de seus membros componentes.
É o que estabelece claramente o art. 20 do Código Civil: "As pessoas jurídicas têm
existência distinta da dos seus membros". Se assim é, cabe indagar como pode ela existir de
per si. O problema tem provocado grandes debates, promovendo a formação de correntes ou
teorias que seria impossível explicar num curso de Introdução ao Estudo do Direito.
Vamos, por isso, nos limitar a algumas concepções fundamentais. Em primeiro lugar,
temos a teoria que se filia à tradição romanística, com Savigny à frente, vendo na pessoa
jurídica uma simples fictio juris, ou seja, uma simples ficção do Direito.
Os jurisconsultos romanos, práticos e pragmáticos por excelência, foram mestres no
emprego da fictio juris: quando queriam atingir um resultado, e deparavam com embaraços de
qualquer ordem, contornavam-nos, colocando o problema como se ele fosse deveras
compatível com a aplicação de uma norma jurídica já existente, ou, então, construíam
ficticiamente uma regra adequada ao caso.
A fictio juris, que continua sendo um dos instrumentos da Lógica jurídica concreta,
não é expressão de arbítrio, mas sim algo que se impõe na praxis, à vista de certas
circunstâncias. Pois bem, preferiu Savigny ver no conceito de pessoa jurídica mais um
exemplo de fictio juris, existente apenas como artifício técnico imposto pelas necessidades da
vida em comum.
Não existe como entidade dotada dê existência própria, mas como elemento técnico,
uma conceituação ficta, mediante a qual os juristas podem coordenar normas jurídicas
distintas, para disciplinar a responsabilidade resultante do ato associativo.
Por mais engenhosa que seja, é inegável que a compreensão da pessoa jurídica como
simples ficção não corresponde à prática do Direito.
Antes que o Código Civil brasileiro houvesse estabelecido que a pessoa jurídica não se
confunde com a pessoa de seus membros, a jurisprudência pátria passou por grandes
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dificuldades para explicar certos fatos. Se uma sociedade anônima vem a falir, a falência não
atinge a pessoa dos acionistas. Se uma sociedade civil de intuitos recreativos falha em seus
objetivos e se vê a braços com imensas dívidas, por estas não respondem os seus associados.
Como, então, justificar tais fatos com base em mera ficção? Se atualmente tais conceitos se
põem de maneira clara, antigamente, por força da teoria de ficção, surgiam dúvidas que a todo
instante deixavam em embaraço os nossos juízes e tribunais.
Foi por esse motivo que, contra a teoria da ficção, se constituiu outra sustentada
especialmente pelo jurista alemão Gierke, que é a teoria organicista ou teoria real. Segundo a
teoria organicista, quando os homens se reúnem para realizar qualquer objetivo, de natureza
política, comercial, civil, estética ou religiosa, forma-se efetivamente uma entidade nova.
Constitui-se um grupo que possui existência inconfundível com a de seus membros, tendo
sido, mesmo, observado, por adeptos dessa teoria, que também nas combinações químicas o
corpo composto apresenta qualidades que nem sempre são as dos elementos que o formam. O
hidrogênio e o oxigênio são dois gases que, combinados, dão origem a um líquido que é a
água. O todo nem sempre mantém as mesmas qualidades dos membros componentes, pondo-
se como realidade distinta.
Essa teoria atende a certos aspectos do problema, mas exagera quando dá às pessoas
jurídicas uma existência substancial, ou seja, quando atribui às pessoas jurídicas uma
existência real efetiva, vamos dizer assim, de natureza ontológica.
Entre esses dois pólos extremos, o da mera ficção e o da pessoa jurídica como
organismo real situa-se outras doutrinas. Entre elas merece especial menção a chamada teoria
institucional. A doutrina institucionalista constituiu-se especialmente em nosso século por
obra de um grande jurista francês, Maurice Hauriou, mestre de Direito Constitucional e de
Direito Administrativo.
O institucionalismo de Hauriou estendeu-se a vários países, afirmando-se não só na
França, onde ainda é marcante a sua influência em todos os quadrantes do Direito, mas
também na Itália, graças às contribuições originais e altamente valiosas de Santi Romano. Os
adeptos do institucionalismo sustentam que as pessoas jurídicas são instituições. Que é que se
entende pela palavra instituição? Devemos partir da ideia de que existem dois tipos de
unidades, de acordo com uma velha tradição tomista: uma unidade física e uma unidade de
fim ou de ordem, unitas ordinis. Unidade física é aquela em que o todo é homogêneo, de
maneira que as partes não apresentam entre si diferenças fundamentais ou relevantes.
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A unidade de fim, ao contrário, estabelece-se mediante a complementação de partes
diferençadas. Exemplo de unidade física é o oferecido por um bloco de ferro ou granito.
Exemplo de unidade de fim ou de ordem é-nos dado pelo corpo humano ou por um relógio.
A unidade existe porque partes múltiplas e diferentes se compõem, correlacionando-se
a fim de ser atingido um objetivo comum. Ora, dizem Os institucionalistas, também nas
sociedades diversos homens se reúnem tentando alcançar um fim determinado, e é esse fim ou
ideia diretora que confere unidade à entidade que surge. A pessoa jurídica é uma existência,
mas uma existência teleológica, ou seja, finalística.
Uma sociedade comercial existe porque nela se reúnem duas ou mais pessoas dirigidas
pela ideia de fundar uma empresa. O elemento nuclear da instituição é a ideia que congrega e
inspira aqueles que se dedicam à mesma tarefa, conjugando esforços diversos visando a um
fim determinado. A teoria, que vê na pessoa jurídica uma unidade de fins, e que, por
conseguinte, não reduz a pessoa jurídica a algo existencial, no plano biológico, mas
existencial no plano teleológico, é, a nosso ver, a que melhor atende à natureza do problema
que estamos examinando. O erro dos que apresentam a pessoa jurídica como ficção consiste
em pensar que real seja tão somente aquilo que é tangível.
É, em última análise, pensar que a realidade é sinônimo de coisa que se vê, que se
toca, que se sente. A realidade, entretanto, é muito mais complexa. Quando tiverem ocasião
de, no quarto ano, estudar Filosofia do Direito, tomará contato com a teoria das realidades, ou
dos objetos, e verão que é tão real um círculo ou um triângulo, a respeito dos quais fazemos
cálculos e desenvolvemos demonstrações, como esta mesa que oferece resistência tátil aos
meus sentidos.
Assim, ao lado dos objetos (no sentido lógico deste termo) de natureza material, ou
coisas, temos objetos naturais psíquicos, como uma emoção que dura no tempo, ou objetos
ideais como um retângulo. É da composição desses objetos fundamentais que resultam os
objetos culturais, que tanto podem ser uma norma jurídica quanto uma associação civil. De
certa forma, os institucionalistas, sem se basearem, como nós o fazemos, na teoria dos
objetos, desenvolvida sobretudo a partir dos estudos de Frank Brentano e Edmund Husserl, já
reconheceram a natureza específica das pessoas jurídicas. Situado numa teoria geral das
realidades, o problema das pessoas jurídicas adquire contornos mais precisos.
Não podemos concluir esta parte de nossa exposição sem uma breve referência à
posição de Hans Kelsen e dos adeptos da Teoria pura do Direito, que tamanha influência temexercido no pensamento jurídico contemporâneo. Kelsen é um adversário sistemático
daqueles que querem reduzir a Ciência Jurídica a um capítulo da Sociologia, da Economia, da
70
História ou da Geografia. Para ele, a Ciência Jurídica é ciência autônoma, que deve operar
com métodos próprios e com absoluta fidelidade a seus prismas de observação. Partindo desta
colocação metodológica, Hans Kelsen sustenta que a Ciência do Direito é uma pura ciência de
normas e proposições normativas.
As regras jurídicas dispõem-se, desse modo, escalonadamente, sendo umas
subordinantes e outras subordinadas, inseridas todas num sistema que haure a sua validade do
pressuposto lógico fundamental do respeito devido à norma constitucional originária.
Afirmando que o Direito é tão somente um conjunto de normas, Hans Kelsen chega a uma
conclusão, que parece paradoxal, de que não há distinção logicamente possível entre Direito e
Estado.
Do ponto de vista estritamente normativo, o Estado é o Direito e o Direito é o Estado.
Para o jurista, o Estado não é a pessoa do Presidente ou do Governador, tampouco é a
sociedade enquanto se estrutura numa unidade de poder, mediante um sistema objetivo de
normas. O Estado, para o jurista, sempre segundo Kelsen, é apenas o próprio sistema de
regras jurídicas, enquanto referido a um sujeito único, tomado como centro comum de
imputação da totalidade das normas.
O Estado é, em suma, a personificação da totalidade do sistema de regras, que tem
força coercitiva nos limites de um território. Estado Brasileiro é o conjunto unitário das regras
de direito que vigem no território nacional.
A teoria de Kelsen, muito embora dela discordemos, dada a sua compreensão
unilateral da experiência jurídica, teve o grande mérito, não só de reivindicar pureza de
métodos na indagação da Ciência Jurídica, como, também, de contribuir para a análise crítica
e rigorosa de problemas que pareciam pacificamente resolvidos.
A respeito do assunto aqui versado, Hans Kelsen afirma que as pessoas jurídicas, ditas
privadas – pois ele praticamente não distingue entre Direito Público e Direito Privado..., - não
representam senão sistemas parciais de regras segundo distintos prismas de imputabilidade
normativa. Isto quer dizer, em palavras mais pobres, que assim como o Estado é a pessoa
jurídica geral, à qual se refere logicamente à totalidade do sistema normativo, as pessoas
jurídicas menores são “conjuntos normativos” referidos a sujeitos particulares.
Trata-se pois, de entidades normativas, como, “centro de imputação” de distintos
conjuntos de normas. Pensamos, todavia, que esse modo de ver, que só considera o aspecto
lógico-normativo da questão, põe fora do Direito dois outros aspectos não menos essenciais: o
fato de certos homens se congregarem para a realização de um valor ou fim que os inspira e
determina.
71
Sem essa base fático-axiológica como seria possível recortar, no sistema universal das
normas jurídicas, aquele conjunto considerado referido (imputável) a estes ou àqueles outros
indivíduos? Notem os senhores como a teoria tridimensional, superando o normativismo
kelseniano, também no tocante à natureza das pessoas jurídicas, ao mesmo tempo que
reconhece serem estas “realidades normativas”, não as secciona, mas antes as vincula,
necessariamente, aos fatos e valores que são a razão de ser ou o conteúdo daquelas realidades.
7.6.1 Pessoas Jurídicas de Direito Público Interno
Lendo-se o art. 14 da Lei Civil, encontramos uma enumeração que tem provocado, vez
por outra, certa vacilação da jurisprudência, como reflexo, aliás, de contrastes doutrinários de
grande importância.
Segundo a lei, são pessoas jurídicas de Direito interno a União, cada um dos seus Estados e o
Distrito Federal, e, finalmente, cada um dos municípios legalmente constituídos. O art. 14 faz
referência a pessoas jurídicas de Direito Público interno, o que pressupõe a existência de
pessoas jurídicas de Direito Público externo, que seriam os Estados na sua unidade total.
O Estado Brasileiro, expressão jurídica da Nação Brasileira, é a pessoa jurídica de
Direito Público externo. Quando o Estado Brasileiro é examinado, internamente. Ele se
diversifica ou se discrimina em três aspectos distintos, que são a União, os Estados membros
da Federação, e os Municípios.
Aqui já começa a haver um problema que nem sempre é bem posto. Geralmente se
pratica o erro de pensar que o Estado Brasileiro é a União, quando a União é efetivamente um
dos aspectos internos do Estado Brasileiro.
Para quem focaliza o Brasil, digamos assim, considerando-o de fora, como um todo,
não existem Municípios, nem Estados, nem União: existe apenas e tão somente a pessoa
jurídica unitária do Estado Brasileiro.
O problema da Federação é de ordem interna, de estrutura interna corporis. Em que
dispositivos legais encontramos as linhas demarcatórias das pessoas jurídicas fundamentais a
que se refere o Código Civil? Evidentemente que na Constituição Federal, no Título III (arts.
18 e segs.) relativo à “Organização do Estado”.
Em 1988, o legislador constituinte manteve a forma federativa e deu a cada um dos
elementos formadores do Estado Brasileiro uma esfera privativa de ação e outra
complementar onde as competências são concorrentes. Embora já tenhamos tratado desse
assunto, não é demais lembrar que cabe à União representar o Brasil no exterior, ou seja, falar
72
em nome da totalidade do Estado Brasileiro. O Estado de São Paulo não tem personalidade
jurídica externa de maneira tal que possa fazer-se representar em qualquer país estrangeiro.
O Estado de São Paulo é Estado tão somente do ponto de vista do poder de constituir-
se livremente na órbita de sua competência. Não é uma entidade soberana, mas sim autônoma.
Podemos, então, fazer, desde logo, duas distinções fundamentais. As pessoas jurídicas podem
ser, em primeiro lugar, de Direito Externo e de Direito Interno e, em segundo lugar, soberanas
ou autônomas.
Pessoa Jurídica soberana é aquela que possui, de maneira eminente e originária, o
poder de declaração ou de legitimação do Direito positivo. Hans Kelsen declara que pessoa
jurídica soberana é aquela que de maneira imediata e direta recebe a sua competência da
ordem jurídica internacional, sustentando, assim, a tese do primado do Direito Internacional
sobre o Direito Interno. Mas prossigamos, pois este assunto do primado do Direito
Internacional nos afastaria muito do tema que estamos desenvolvendo. Ora, vimos que o
Código Civil, ao tratar das pessoas jurídicas internas, só cogita de quatro delas, sem sequer
fazer referência aos Territórios, que se compõem de Municípios.
Alguns juristas apegados ao texto, ao valor gramatical das palavras, entenderam que
no Brasil não pode prevalecer qualquer doutrina que acrescente outras espécies de pessoas
jurídicas de Direito Interno às discriminadas no Código.
Prevaleceu, todavia, o bom senso, isto é, a tese de que o dispositivo do Código é
apenas exemplificativo, não havendo, atualmente, quem recuse a qualidade de pessoas de
Direito Público às entidades autárquicas, por exemplo. Nem poderia ser de outra forma numa
civilização marcada pela interferência crescente do Estado em todos os planos da vida social,
o que exige a personalização de certos serviços públicos, como instrumento de
descentralização e eficiência. Estamos bem longe da concepção do Estado gendarme,
incumbido apenas de velar pela ordem interna e a segurança externa do País, tendo por missão
essencial à distribuição da justiça. Essa concepção formal do Estado de Direito cede, cada vez
mais, o lugar a uma nova imagem do Estado de Direito, entendido concretamentecomo
Estado da Justiça Social, que, além das altas funções de elaborar e aplicar leis, deve
necessariamente desenvolver o bem-estar social, a ciência, as artes, a cultura.
Ora, esse crescimento contínuo da atividade do Estado exige novas técnicas na
execução dos serviços. O serviço público é sempre tardo porque amarrado aos entraves das
formalidades burocráticas. Não é possível obter-se, na Administração pública, o mesmo élan
construtivo que caracteriza as entidades privadas. O homem, quando empolgado por interesse
próprio, multiplica-se, sentindo, de maneira concreta e premente, uma identificação entre o
73
fim e a atividade. Já no plano do Estado tudo obedece a ritmo muito mais lento, com perda de
responsabilidade em virtude da concentração exagerada da responsabilidade mesma.
Diante desses defeitos técnicos, surgiu a necessidade de se desafogar o serviço público
do excesso de centralização. A ideia que prevaleceu foi exatamente no sentido de desmembrar
certas porções de serviço público para lhes dar uma personalidade jurídica própria, a fim de
que pudessem funcionar como serviços públicos autônomos. Daí a ideia da autarquia e, de
maneira geral, das entidades paraestatais, que tamanha importância assume nos sistemas
jurídicos não socialistas.
Pois bem, ao lado das autarquias e fundações de Direito Público, outros modelos ou
tipos de entidades públicas já apareceram, tais como as sociedades de economia mista, que se
caracterizam por serem serviços públicos organizados sob forma de sociedades anônimas, o
que leva alguns juristas, erroneamente, a considerá-las de Direito Privado. A nosso ver, as
empresas públicas, muito embora se sujeitem ao regime jurídico próprio das empresas
privadas (Const., art. 173, § 1.°), nem por isso perdem sua personalidade de Direito Público.
7.6.2 Pessoas Jurídicas de Direito Privado
Nos termos do art. 16 do Código Civil, "são pessoas jurídicas de Direito Privado:
a) as sociedades civis, religiosas, pias, morais, científicas ou literárias; as associações
de utilidade pública e as fundações;
b) as sociedades mercantis". Como se vê, as pessoas jurídicas de Direito Privado
discriminam-se em duas grandes categorias: as civis e as mercantis, podendo aquelas também
ser de fins econômicos.
No Anteprojeto do Código Civil, elaborado pela Comissão por nós presidida, a matéria
se acha disciplinada com maior rigor técnico e com terminologia mais apurada, distinguindo-
se, consoante sua redação final, as: i) entidades de fins não econômicos, que são sempre civis,
compreendendo as associações e as fundações; ii) entidades de fins econômicos, que podem
ser ou sociedades simples ou sociedades empresárias. Não é mais possível continuar-se a
empregar a antiga denominação de "sociedades mercantis", pois a empresa é uma estrutura
que atende a outros ramos não menos relevante de atividade econômica como é o industrial.
Vamos, pois, dar aos termos "mercantil" ou "comercial" um sentido lato. Por outro
lado, há certas sociedades de fins econômicos que não são empresas, como as constituídas
para exercer atividades de ensino, a advocacia, a medicina etc. Não basta o simples "escopo
74
de lucro", para transformar um ente em sociedade de tipo empresarial, que pressupõe estrutura
e organização específicas.
8 TÉCNICA JURIDICA
Para que o Direito cumpra a finalidade de prover o meio social de segurança e justiça,
é indispensável que, paralelamente ao seu desenvolvimento filosófico e cientifico, avance
também no campo da técnica.
Técnica Jurídica é o conjunto de meios e de procedimentos que tornam prática e
efetiva a norma jurídica. Quando o legislador elabora um código, as normas ficam acessíveis
ao conhecimento; ao desenvolver a técnica de interpretação, o exegeta revela o sentido e o
alcance da norma jurídica; com a técnica de aplicação, os juízes e administradores dão
efetividade à norma jurídica. Para cumprir as suas tarefas, o técnico obrigatoriamente deverá
possuir o conhecimento cientifico do Direito.
8.1 ESPÉCIES DE TÉCNICA JURÍDICA
Dividimos três espécies de técnica jurídica: a da elaboração, a de interpretação e da
aplicação do Direito. A técnica de elaboração, ligada ao Direito escrito, engloba a fase de
composição e apresentação do ato legislativo, denominada técnica legislativa e a parte
relativa à proposição, andamento e aprovação de um projeto de lei, chamada processo
legislativo.
8.1.1 Técnica de Interpretação
Esta tem por objetivo a revelação do significado das expressões jurídicas. Não é uma
tarefa a ser executada apenas pelos juízes e administradores, mas por todos os destinatários
das normas jurídicas. A finalidade da interpretação consiste em proporcionar ao espírito o
conhecimento do Direito. Os principais meios empregados na interpretação do Direito são: o
gramatical, o lógico, o sistemático e o histórico.
8.1.2 Técnica de Aplicação
75
Por alguns denominada judicial, a técnica de aplicação tem por finalidade a orientação
aos juízes e administradores, na tarefa de julgar. Não se limita à simples aplicação das normas
aos casos concretos, mas compreende os meios de apuração das provas e pressupõe o
conhecimento da técnica de interpretação. Tradicionalmente a aplicação do Direito é
considerada um silogismo, em que a premissa maior é a norma jurídica, a premissa menor é o
fato e a conclusão é a sentença ou decisão.
8.2 TÉCNICA LEGISLATIVA
A elaboração do Direito pressupõe conteúdo e forma.
A denominada técnica legislativa envolve duas ordens de estudo: a) processo
legislativo, que é uma parte administrativa da elaboração do ato legislativo, disciplina pela
Constituição Federal e que dispõe sobre as diversas fases que envolvem a formação do ato,
desde a sua proposição, até a aprovação final; b) apresentação formal e material do ato
legislativo, que é uma analítica da distribuição dos assuntos e da redação dos atos legislativos.
Esta espécie não obedece a procedimentos rígidos, antes a orientações doutrinarias que
seguem um mesmo curso em seus aspectos mais gerais. Apesar de tal estudo ser próprio do
segmento doutrinário, não é fora de propósito se fixar, em resoluções, algumas normas gerais
quanto à apresentação formal e material, com exclusão, naturalmente, à técnica de produção
dos códigos.
A elaboração, redação, alteração e consolidação das leis acham-se disciplinadas,
atualmente, em nosso país na Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998.
8.2.1 Apresentação Material dos Atos Legislativos
Os critérios metodológicos empregados na distribuição do conteúdo normativo de uma
lei, em artigos, subseções, seções, capítulos e títulos, imprimem um sentido de ordem lógica
aos atos legislativos e proporcionam ao Direito uma forma prática de exteriorização.
a) Dos Artigos: o vocábulo artigo define como “a unidade generalidade para
apresentação, divisão ou agrupamento do assunto”. É utilizado pela generalidade das
codificações como elemento básico. Os artigos devem ser numerados, observando-se a
seguinte orientação: a) os nove primeiros pela sequencia ordinal: art. 1º, art. 2º...art. 9º; b) os
que se seguem ao art. 9º, pelos números cardinais: art. 10, art. 11.. quando o artigo é dividido
76
em parágrafos ou outros recursos técnicos, denomina-se caput a parte anterior ao
desdobramento.
Os artigos podem ser desdobrados em parágrafos, inciso, alíneas e itens.
b) Parágrafos: este divisor tem por símbolos o sinal gráfico §, formado pela junção
vertical da letra “s” repetida, abreviação equivalente a signo de seção ou corte. Sua finalidade
é explicar ou midificaro artigo. Como escrita secundaria, o parágrafo não deve formular a
regra geral nem principio básico, mas limitar-se a complementar o caput do artigo.
c) Inciso, Alínea e Item: o primeiro são representados por algarismos romanos,
enquanto as alíneas o serão por letras minúsculas e os itens, por algarismo arábicos. A função
do inciso, alínea e item é a mesma, ou seja, a de apresentar requisitos, enumerar situações,
elementos, hipóteses.
Fonte: Nader, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito.
77
9 HERMENEUTICA OU INTERPRETAÇÃO DO DIREITO
9.1 A INTERPRETAÇÃO GRAMATICAL E A SISTEMÁTICA
Já dissemos que a Revolução Francesa atinge um ponto culminante com a publicação
do Código Civil de Napoleão. A Revolução Francesa vinha declarar a igualdade de todos
perante a lei e, ao mesmo tempo esfacelava os núcleos nos quais ainda subsistiam sistemas
jurídicos particularistas com pretensão de "soberania" perante o Estado.
Os privilégios e as prerrogativas da nobreza e do clero desapareceram para que o
Direito se revelasse apenas através da vontade geral. "Todos os direitos são fixados pela lei",
como expressão da vontade geral, proclamou Jean Jacques-Rousseau, fundando
criadoramente o pensar político de seu tempo.
Surgia, assim, o Código Civil, como expressão da vontade comum, não admitindo
qualquer concorrência por parte dos usos e costumes e, também, por parte de elaborações
legislativas particulares. A lei insurgiu a plano tão alto que passou a ser como que a única
fonte de direito. O problema da Ciência do Direito resolveu-se, de certa maneira, no problema
da interpretação melhor da lei.
Havia duas verdades paralelas: o Direito positivo é a lei; e, outra: a Ciência do Direito
depende da interpretação da lei segundo processos lógicos adequados. Foi por esse motivo
que a interpretação da lei passou a ser objeto de estudos sistemáticos de notável finura,
correspondentes a uma atitude analítica perante os textos segundo certos princípios e
diretrizes que, durante várias décadas, constituíram o embasamento da Escola da Exegese.
Sob o nome de "Escola da Exegese" entende-se aquele grande movimento que, no transcurso
do século XIX, sustentou que na lei positiva, e de maneira especial no Código Civil, já se
encontra a possibilidade de uma solução para todos os eventuais casos ou ocorrências da vida
social. Tudo está em saber interpretar o Direito.
Dizia, por exemplo, Demolombe que a lei era tudo, de tal modo que a função do
jurista não consistia senão em extrair e desenvolver o sentido pleno dos textos, para
apreender-lhes o significado, ordenar as conclusões parciais e, afinal, atingir as grandes
78
sistematizações. Grandes mestres que obedeceram a essa tendência achavam que os usos e
costumes não poderiam valer, a não ser quando a lei lhes fizesse expressa referência.
O dever do jurista era ater-se ao texto, sem procurar soluções estranhas a ele.
Lançaram-se, assim, as bases do que se costuma denominar Jurisprudência conceitual, por dar
mais atenção aos preceitos jurídicos, esculpidos na lei, do que às estruturas sociais, aos
campos de interesse aos quais aqueles conceitos se destinam. Era natural que, nesse quadro
espiritual, a interpretação fosse vista, de início, apenas sob dois prismas dominantes: um
prisma literal ou gramatical, de um lado, e um prisma lógico-sistemático, do outro.
O primeiro dever do intérprete é analisar o dispositivo legal para captar o seu pleno
valor expressional. A lei é uma declaração da vontade do legislador e, portanto, deve ser
reproduzida com exatidão e fidelidade. Para isto, muitas vezes é necessário indagar do exato
sentido de um vocábulo ou do valor das proposições do ponto de vista sintático.
A lei é uma realidade morfológica e sintática que deve ser, por conseguinte, estudada
do ponto de vista gramatical. É da gramática - tomada esta palavra no seu sentido mais amplo
- o primeiro caminho que o intérprete deve percorrer para dar-nos o sentido rigoroso de uma
norma legal. Toda lei tem um significado e um alcance que não são dados pelo arbítrio
imaginoso do intérprete, mas são, ao contrário, revelados pelo exame imparcial do texto. Após
essa perquirição filológica, impõe-se um trabalho lógico, pois nenhum dispositivo está
separado dos demais.
Cada artigo de lei situa-se num capítulo ou num título e seu valor depende de sua
colocação sistemática. E preciso, pois, interpretar as leis segundo seus valores linguísticos,
mas sempre as situando no conjunto do sistema.
Esse trabalho de compreensão de um preceito, em sua correlação com todos os que
com ele se articulam logicamente, denomina-se interpretação lógico-sistemática. Levados
pelo apego ao texto, alguns mestres da Escola da Exegese sustentavam ser necessário
distinguir a interpretação lógica da interpretação sistemática.
A primeira cuidaria, apenas, do valor lógico das palavras, abstração feita da posição
distribuída a cada grupo de normas no conjunto geral do ordenamento jurídico. A
interpretação sistemática viria num segundo momento, ou melhor, num terceiro momento,
para elucidar dúvidas possivelmente ainda existentes, após a exegese gramatical e lógica.
É somente graças à interpretação lógica e gramatical que, segundo, a Escola Exegese,
o jurista cumpria o seu dever primordial de aplicador da lei, de conformidade com a intenção
original do legislador.
79
Determinar a intenção do legislador passou a ser um imperativo de ordem jurídica e
política, visto como, em virtude de rígido e desmedido apego ao princípio constitucional da
divisão dos poderes, - que foi uma das vigas mestras do constitucionalismo liberal,-chegava-
se ao extremo de afirmar: "se o intérprete substituir a intenção do legislador pela sua, o
Judiciário estará invadindo a esfera de competência do Legislativo..." É claro que, logo após a
elaboração e a promulgação do Código, uma concepção rígida como essa podia prevalecer
sem maiores contrastes, dada a correspondência que, durante algumas décadas, existiu entre
as estruturas sociais e o conteúdo das normas. Em linhas gerais, enquanto não houve
mudanças sensíveis nas relações sociais, à suposta intenção do legislador coincidia com a
intenção do juiz, isto é, com o que este considerava ser justo no ato de aplicar a regra em
função de seus estritos valores gramaticais e lógicos.
Deve-se lembrar de que, nesse contexto de interpretação gramatical e lógica,
permaneceram velhos ensinamentos de Hermenêutica Jurídica, representados por antigos
brocardos, que ainda hoje têm curso no foro, tal como o que pondera que deve ser entendida
extensivamente a norma benéfica, mas estritamente a que impõem penas ou restringe direitos,
o que, de certo modo, atenuava os males de uma atitude puramente formalista.
A distinção entre interpretação extensiva e interpretação estrita, esta de maior alcance
no campo do Direito Penal e na aplicação das regras de caráter excepcional (no
impropriamente chamado “Direito Excepcional”, serviu, na realidade, de instrumento técnico
que permitia a adequação das normas às relações sociais, em função da tábua de valores
dominantes).
9.2 A INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA E A EVOLUTIVA
É preciso lembrar que, quando foi promulgado o Código de Napoleão, a França ainda
era um país agrícola por excelência, e a Inglaterra apenas ensaiava os primeiros passos na
mecanização indispensável ao capitalismo industrial.
Foi no decorrer do século passado que se operou a revolução técnica, especialmente
através dos grandes inventos no plano da Física e da Química e das aplicações de natureza
prática, notadamenteatravés da utilização da força a vapor e, depois, da eletricidade.
Com essa mudança no sistema de produção e as transformações consequentes em
vários outros países, a vida social alterou-se profundamente. Verificou-se, então,
compreensível desajuste entre a lei, codificada no início do século passado, e a vida com
novas facetas e novas tendências. As pretensões de "plenitude legal" da Escola de Exegese
80
pareceram pretensiosas. A todo instante apareciam problemas de que os legisladores do
Código Civil não haviam cogitado.
Por mais que os intérpretes forcejassem em extrair dos textos uma solução para a vida,
a vida sempre deixava um resto. Foi preciso, então, excogitar outras formas de adequação da
lei à existência concreta. Foi especialmente sob a inspiração da Escola Histórica de Savigny
que surgiu outro caminho, a chamada interpretação histórica. Sustentaram vários mestres que
a lei é algo que representa uma realidade cultural, ou, para evitarmos a palavra cultura, que
ainda não era empregada nesse sentido, - era uma realidade histórica que se situava, por
conseguinte, na progressão do tempo. Uma lei nasce obedecendo a certos ditames, a
determinadas aspirações da sociedade, interpretadas pelos que a elaboram, mas o seu
significado não é imutável.
Não basta, pois, querer descobrir a intenção do legislador através dos trabalhos
preparatórios da legislação, que é mera história externa do texto, pois é necessário verificar
qual teria sido a intenção do legislador, e a sua conclusão, se no seu tempo houvesse os
fenômenos que se encontram hoje diante de nossos olhos.
Segundo a teoria da interpretação histórico-evolutiva, uma norma legal, uma vez
emanada, desprende-se da pessoa do legislador, como a criança se livra do ventre materno.
Passa a ter vida própria, recebendo e mutuando influências do meio ambiente, o que importa
na transformação de seu significado. Pretende Saleilles ir além do Código Civil, mas através
de sua exegese evolutiva, graças ao poder que tem o juiz de combinar, de maneira autônoma,
diversos textos legais e integrá-los para atender a novos fatos emergentes.
9.3 COMPREENSÃO ATUAL DO PROBLEMA HERMENÊUTICO
Interpretar uma lei importa, previamente, em compreendê-la na plenitude de seus fins
sociais, a fim de poder-se, desse modo, determinar o sentido de cada um de seus dispositivos.
Somente assim ela é aplicável a todos os casos que correspondam àqueles objetivos.
Como se vê, o primeiro cuidado do hermeneuta contemporâneo consiste em saber qual
a finalidade social da lei, no seu todo, pois é o fim que possibilita penetrar na estrutura de suas
significações particulares. O que se quer atingir é uma correlação coerente entre "o todo da
lei" e as "partes" representadas por seus artigos e preceitos, à luz dos objetivos visados.
A teoria da interpretação, que prevaleceu até poucos anos atrás, procedia como a
antiga Psicologia, que explicava as idéias como "uma associação de imagens": começava pela
análise de cada preceito para, paulatinamente, reuni-los e obter o sentido global da lei.
81
Cumpre, ao contrário, reconhecer que o processo interpretativo não obedece a essa ascensão
mecânica das partes ao todo, mas representa antes uma forma de captação do valor das partes
inserido na estrutura da lei, por sua vez inseparável da estrutura do sistema e do ordenamento.
É o que se poderia denominar Hermenêutica estrutural.
Já o nosso genial Teixeira de Freitas, inspirado nos ensinamentos de Savigny, nos
ensinara, em meados do século passado, que basta a mudança de localização de um
dispositivo, no corpo do sistema legal, para alterar-lhe a significação. Esse ensinamento, antes
de alcance mais lógico-formal, passou, com tempo, a adquirir importância decisiva, porque
ligado à substância da lei, que é o seu significado, em razão de seus fins. A compreensão
finalística da lei, ou seja, a interpretação teleológica veio se afirmando, desde as contribuições
fundamentais de Rudolf Von Jhering, sobretudo em sua obra O Fim no Direito. Atualmente,
porém, após os estudos de teoria do valor e da cultura, dispomos de conhecimento bem mais
seguro sobre a estrutura das regras de direito, sobre o papel que o valor nela representa: o fim,
que Jhering reduzia a uma forma de interesse, é visto antes como o sentido do valor
reconhecido racionalmente enquanto motivo determinante da ação.
9.4 INTEGRAÇÃO E APLICAÇÃO DO DIREITO
Interpretação, integração e aplicação são três termos técnicos que correspondem a três
conceitos distintos, que às vezes se confundem, em virtude de sua íntima correlação. O
Direito, como vimos, é sempre uma prescrição ou imperativo, e não uma simples indicação
que possa ou não ser atendida, a critério exclusivo dos interessados. O Direito existe para ser
obedecido, ou seja, para ser aplicado. Todos nós, na nossa vida comum, aplicamos o Direito.
Não se realiza contrato algum sem que uma forma de juridicidade se aplique nas relações
humanas.
O termo "aplicação do direito" reserva-se, entretanto, à forma de aplicação feita por
força da competência de que se acha investido um órgão, ou autoridade. O juiz aplica o
Direito porquanto age, não como homem comum, mas como membro do Poder Judiciário. O
mesmo acontece com o administrador.
A aplicação do Direito é a imposição de uma diretriz como decorrência de
competência legal. Mas, para aplicar o Direito, o órgão do Estado precisa, antes, interpretá-lo.
A aplicação é um modo de exercício que está condicionado por uma prévia escolha, de
natureza axiológica, entre várias interpretações possíveis. Antes da aplicação não pode deixar
de haver interpretação, mesmo quando a norma legal é clara, pois a clareza só pode ser
82
reconhecida graças ao ato interpretativo. Ademais, é óbvio que só aplica bem o Direito quem
o interpreta bem. Por outro lado, se reconhecemos que a lei tem lacunas, é necessário
preencher tais vazios, a fim de que se possa dar sempre uma resposta jurídica, favorável ou
contrária, a quem se encontre ao desamparo da lei expressa. Esse processo de preenchimento
das lacunas chama-se integração do direito, e a ele já fizemos alusão quando lembramos o
dispositivo da Lei de Introdução ao Código Civil, segundo o qual, em sendo a lei omissa,
deve-se recorrer à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.
9.5 NATUREZA LÓGICA DA APLICAÇÃO DO DIREITO
A chamada "aplicação da lei no tempo e no espaço" refere-se, a bem ver, à eficácia do
Direito segundo o âmbito ou extensão de sua incidência, ou então em função dos momentos
temporais ligados à sua vigência.
Nestas lições preliminares, não nos cabe discorrer sobre tais questões de Teoria Geral
do Direito e, mais especificadamente, de Teoria Geral de Direito Civil ou de Direito
Internacional Privado, focalizando as leis em função do espaço e do tempo.
É assunto que vai merecer a sua atenção sob múltiplos aspectos, envolvendo
problemas fundamentais, como, por exemplo, o da irretroatividade das leis e a tutela dos
direitos adquiridos, que a tradição jurídica brasileira alçou à categoria máxima de princípio
constitucional.
De qualquer modo, estão vendo como os problemas da eficácia do Direito, e sua
aplicação, embora distintos, intimamente se correlacionam. De certo modo, o que em sentido
técnico e próprio se denomina "aplicação" é uma "forma de eficácia", o que os senhores
compreenderão melhor com o seguinte exemplo.
Um juiz brasileiro, chamado a decidir sobre a situação patrimonial de um casal de
italianos, residentes no Brasil, mas casados na Itália, reconhece a eficácia da lei pessoal dos
cônjuges e aplica-a no Brasil: nesse caso, concretiza-se aeficácia da norma italiana, para que
produza efeitos no território nacional. Aplicar equivale, pois, a assegurar eficácia a uma regra.
Ora, o problema que nos parece necessário analisar, nesta aula, ainda que de maneira singela,
é o do significado geral dos modos de aplicação do Direito, em função do princípio de sua
realizabilidade ou efetividade.
O Direito é "aplicado", no sentido vulgar desta palavra, por todos os indivíduos e
grupos, ao se valerem das disposições legais para concluir relações jurídicas, constituir
83
sociedades etc. A "aplicação" reveste-se, todavia, de sentido técnico especial quando a
execução da lei é feita, por dever de ofício, por uma autoridade judicial ou administrativa.
A aplicação do Direito envolve a adequação de uma norma jurídica a um ou mais fatos
particulares, o que põe o delicado problema de saber como se opera o confronto entre uma
regra "abstrata" e um fato "concreto", para concluir pela adequação deste àquela (donde a sua
licitude) ou pela inadequação (donde a ilicitude).
Esta questão representa o cerne da atividade jurisdicional, pois é função primordial do
magistrado dizer qual é o Direito in concreto, quando alguém propõe uma ação postulando o
reconhecimento de um interesse legítimo. Pois bem, durante muito tempo, uma compreensão
formalista do Direito julgou possível reduzir a aplicação da lei à estrutura de um silogismo, no
qual a norma legal seria a premissa maior; a enunciação do fato, a premissa menor; e a
decisão da sentença, a conclusão.
À luz desses ensinamentos, não faltam processualistas imbuídos da convicção de que a
sentença se desenvolve como um silogismo. Na realidade, porém, as coisas são bem mais
complexas, implicando uma série de atos de caráter lógico e axiológico, a começar pela
determinação prévia da norma aplicável à espécie, dentre às várias normas possíveis, o que
desde logo exige uma referência preliminar ao elemento fático.
É com esse ponto de apoio inicial no fato ocorrente, ainda que provisoriamente aceito
como tal, que é possível ao juiz proceder à escolha da norma de direito possivelmente
aplicável ao caso descrito na ação, o que tudo exige também apoio em princípios gerais, sem
os quais seria impossível ao magistrado eleger a norma adequada à espécie.
É inegável que o problema da configuração do fato sub judice, para saberse, por
exemplo, se trata de um crime de difamação, de injúria ou de calúnia, já implica, por sua vez,
uma referência às regras que unificam cada um desses delitos.
Como se vê, a norma não fica antes, nem o fato vem depois no raciocínio do juiz, pois
este não raro vai da norma ao fato e vice-versa, cotejando-os e aferindo-os repetidas vezes até
formar a sua convicção jurídica, raiz de sua decisão. É antes uma questão complexa, na qual
fatores lógicos, axiológicos e fáticos se correlacionam, segundo exigências de uma unidade
dialética, desenvolvida ao nível da experiência, à luz dos fatos e de sua prova.
Donde podermos concluir que o ato de subordinação ou subsunção do fato à norma
não é um ato reflexo e passivo, mas antes um ato de participação criadora do juiz, com a sua
sensibilidade e tato, sua intuição e prudência, operando a norma como substrato
condicionador de suas indagações teóricas e técnicas. Ora, essas considerações aplicam-se,
84
em linhas gerais, às outras formas de aplicação do Direito, como ocorre quando um
administrador tem de dar execução à lei para realizar os fins da administração.
Também a "atualização da lei" através de resoluções e atos administrativos não é
redutível a uma simples subordinação da autoridade à diretriz legal. Esta é também por ele
valorada, posta em cotejo com os fatos, dependendo de razões de conveniência e
oportunidade, da necessária adequação entre os fins da norma e os meios e instrumentos
indispensáveis à sua consecução.
Não é uma frase convencional a de Holmes quando nos adverte que o Direito tem
sido e há de ser cada vez mais experiência, o que começa a ser reconhecido também pelo
legislador, conforme se depreende do art. 335 do novo Código de Processo Civil, segundo o
qual, no caso de inexistirem normas jurídicas particulares, o juiz aplicará "as regras de
experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece". Isto
não quer dizer, porém, que nos caiba optar, ou pela Lógica, ou pela experiência. Não tem
sentido essa alternativa, porquanto seria inútil e nociva, no mundo jurídico, qualquer
concepção lógica divorciada da experiência social e histórica.
85
REFERÊNCIAS
BARROS, Alberto Moniz da Rocha. Apostilas de introdução à ciência do direito. São
Paulo: Arcadas, 1966.
BASTOS, Celso Ribeiro. Elementos de direito constitucional. São Paulo: Educ Editora da
Universidade Católica, 1975.
BRASIL. Lei 10.406/2002. Dispõe sobre o novo Código Civil. Brasília – DF, 2005.
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