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Indaial – 2020 Introdução ao Estudo do dIrEIto Prof. Ismael de Córdova 1a Edição Copyright © UNIASSELVI 2020 Elaboração: Prof. Ismael de Córdova Revisão, Diagramação e Produção: Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri UNIASSELVI – Indaial. Impresso por: C796i Córdova, Ismael de Introdução ao estudo do direito. / Ismael de Córdova. – Indaial: UNIASSELVI, 2020. 184 p.; il. ISBN 978-65-5663-034-2 1. Direito - Estudo e ensino. - Brasil. Centro Universitário Leonardo Da Vinci. CDD 340.07 III aprEsEntação O direito enquanto ciência social vem sofrendo transformações diante das modificações sociais. Com isso, esta disciplina de Introdução ao Estudo do Direito contribui para a compreensão desses avanços, modificações e atribuições deste direito em crescimento. Neste sentido, ao final da disciplina, será possível compreender tanto os aspectos básicos e históricos do direito, como as fontes e fundamentos, por exemplo, os aspectos inclusos em tal ciência, os procedimentos de integração, os princípios e valores e a atuação na sociedade como um todo. Para facilitar a compreensão de tais conteúdos, esta disciplina é dividida em três unidades, sendo que cada unidade traz consigo temas de grande relevância para a área do direito, dentro dos tópicos citados anteriormente, que norteiam e orientam acerca da base do direito até a atuação profissional. Além desta divisão, dentro das unidades os temas estão divididos em quatro tópicos para que você consiga estudar cada um de forma minuciosa. Ao estudar este material, você terá acesso a um acervo de informações breves acerca do direito, mas que são de grande relevância. Aprenderemos acerca do direito como fenômeno social, os fundamentos e fontes do direito, a aplicabilidade do direito enquanto ciência social, os valores, as modificações e atualizações das teorias que fundamentaram e que ainda fundamental esta ciência, dentre outras questões. Desejamos a você bons estudos e que este conteúdo colabore significativamente para o seu crescimento pessoal e profissional. Bons estudos! Prof. Ismael de Córdova IV Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material. Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura. O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo. Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão. Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade. Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos! NOTA V VI Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento. Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complementares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada! LEMBRETE VII UNIDADE 1 – INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO ...........................................................1 TÓPICO 1 – DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL ......................................................................3 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................................................3 2 DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL ..........................................................................................3 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................15 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................16 TÓPICO 2 – FUNDAMENTOS DO DIREITO ...................................................................................17 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................17 2 FUNDAMENTOS DO DIREITO .......................................................................................................17 2.1 JUSNATURALISMO ........................................................................................................................19 2.2 JUSPOSITIVISMO ............................................................................................................................22 2.3 JUSNATURALISMO E JUSPOSITIVISMO...................................................................................25 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................28 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................29 TÓPICO 3 – FONTES DO DIREITO....................................................................................................31 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................31 2 FONTES DO DIREITO ........................................................................................................................31 RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................43 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................44 TÓPICO 4 – PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO .....................................................................45 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................45 2 PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO .........................................................................................45 LEITURA COMPLEMENTAR ...............................................................................................................61 RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................65 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................66 UNIDADE 2 – A NORMA JURÍDICA ................................................................................................69 TÓPICO 1 – ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA .......................................................................71 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................712 A ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA .......................................................................................71 RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................81 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................82 TÓPICO 2 – CARACTERÍSTICAS E CLASSIFICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA ..................83 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................83 2 CARACTERÍSTICAS E CLASSIFICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA .......................................83 RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................90 AUTOATIVIDADE .................................................................................................................................91 sumárIo VIII TÓPICO 3 – PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA .................................................93 1 INTRODUÇÃO .....................................................................................................................................93 2 PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA ......................................................................93 2.1 PLANO DA EXISTÊNCIA ..............................................................................................................95 2.2 PLANO DA VALIDADE .................................................................................................................96 2.3 EFICÁCIA .........................................................................................................................................98 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................102 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................103 TÓPICO 4 – SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO ..............................................................105 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................105 2 SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO ..................................................................................105 2.1 SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO .......................................................111 LEITURA COMPLEMENTAR .............................................................................................................116 RESUMO DO TÓPICO 4......................................................................................................................120 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................121 UNIDADE 3 – O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA ....................................................................................................................123 TÓPICO 1 – HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL ......................................................................................................125 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................125 2 HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL .....125 RESUMO DO TÓPICO 1......................................................................................................................140 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................141 TÓPICO 2 – POSIÇÕES JURÍDICAS DOS SUJEITOS DE DIREITO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS ......................................................................................................................143 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................143 2 POSIÇÕES JURÍDICAS DOS SUJEITOS DE DIREITO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS .......143 RESUMO DO TÓPICO 2......................................................................................................................155 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................156 TÓPICO 3 – DIREITO SUBJETIVO ...................................................................................................157 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................157 2 DIREITO SUBJETIVO .......................................................................................................................157 RESUMO DO TÓPICO 3......................................................................................................................167 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................168 TÓPICO 4 – ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO ................................169 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................169 2 ESTRUTURA DO PODER JUDICIÁRIO ......................................................................................169 RESUMO DO TÓPICO 4......................................................................................................................179 AUTOATIVIDADE ...............................................................................................................................180 REFERÊNCIAS .......................................................................................................................................181 1 UNIDADE 1 INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • compreender os conceitos básicos do direito; • reconhecer os aspectos teóricos e sociais do direito; • dominar os aspectos de origem e que fundamentam o direito; • adquirir os conhecimentos gerais que fundamentam o direito; • avaliar, de forma completa, o direito e a sua função desde a sua base epistemológica. Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL TÓPICO 2 – FUNDAMENTOS DO DIREITO TÓPICO 3 – FONTES DO DIREITO TÓPICO 4 – PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 2 3 TÓPICO 1 UNIDADE 1 DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL 1 INTRODUÇÃO Você já deve ter estudado ou lido alguns materiais acerca do direito. No entanto, caso você não tenha feito isso ainda, tenha calma! A partir do estudo deste tópico você poderá ser capaz reconhecer o conceito de direito, avaliá-lo e compreendê-lo enquanto fenômeno social e, ainda, conhecer alguns aspectos históricos. Aqui, apresentaremos todas estas temáticas de grande relevância para a compreensão completa do conteúdo. O direito enquanto ciência construída desde a existência humana e em constante evolução, não se reduz apenas em pequenos conceitos: mas conteúdos profundos e abrangentes que dizem respeito ao homem que vive em sociedade, aos seus direitos e deveres, a sua conduta e assuas penalidades quando esta não é de boa índole. Contudo, essa sociedade que vem se modificando ao mesmo passo da evolução humana traz consigo certas necessidades que a própria ciência jurídica está propícia a abarcar, oferecendo eficiência e eficácia diante dos procedimentos jurídicos, ao possuir base epistemológica bastante fortalecida. Bons estudos a você! 2 DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL A sociedade vem sofrendo modificações de grande relevância na atualidade. Crenças, culturas, tradições e verdades que são construídas, desconstruídas e reconstruídas. Desta maneira, o direito apresenta-se como um mensurador destas questões sociais que surgem nos sujeitos em relação. Diante disso, Ferraz Junior (2015, p. 1) nos apresenta: UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 4 O direito é um dos fenômenos mais notáveis na vida humana. Compreendê-lo é compreender uma parte de nós mesmos. É saber em parte por que obedecemos, por que mandamos, por que nos indignamos, por que aspiramos a mudar em nome de ideais, por que em nome de ideais conservamos as coisas como estão. Ser livre é estar no direito e, no entanto, o direito também nos oprime e tira-nos a liberdade. Por isso, compreender o direito não é um empreendimento que se reduz facilmente a conceituações lógicas e racionalmente sistematizadas. É notável, portanto, que o direito não pode ser reduzido a apenas uma conceituação breve, ao salientar a dimensão que esse significado possui. O direito em si envolve muitas questões de âmbito social, respaldadas na vivência de cada sujeito que move e vive em sociedade. Desta maneira, traz consigo questões de estabilidade de justiça social, colocando em primeiro lugar os direitos previstos legalmente. Diante das diferentes realidades sociais, faz-se necessário haver intermédio a fim de equilibrar e organizar a sociedade: principalmente por questões de organização e justiça. O autor ainda comenta acerca do direito de forma breve: De uma parte, consiste em grande número de símbolos e ideais reciprocamente incompatíveis, o que o homem comum percebe quando se vê envolvido num processo judicial: por mais que ele esteja seguro de seus direitos, a presença do outro, contestando-o, cria-lhe certa angústia que desorganiza sua tranquilidade. De outra parte, não deixa de ser um dos mais importantes fatores de estabilidade social, posto que admite um cenário comum em que as mais diversas aspirações podem encontrar uma aprovação e uma ordem (FERRAZ JUNIOR, 2015, p. 11). Contudo, o direito possui a função de assegurar os direitos dos cidadãos, considerando a justiça em primeiro lugar a fim de avaliar os pontos e contrapontos com o intuito de acatar a decisão mais justa perante a lei. Entretanto, deve-se considerar as modificações e avanços que o direito teve em seu desenvolvimento. Cabe aqui salientar que o Direito se torna um fenômeno do cotidiano, principalmente quando consideramos que todas as relações na sociedade da concepção até a morte, temos o direito como regente do princípio até o fim, pois, como afirma Campos (2011, p. 3), “o Direito resguarda, defende, ampara, protege e serve o indivíduo em todos os momentos”, ou seja, muito antes de nascermos, o Direito já nos antecedeu com intuito de alguma forma garantir as nossas relações em sociedade. O autor ainda nos apresenta as distinções que ocorrem no uso da palavra direito: TÓPICO 1 | DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL 5 QUADRO 1 – USO DA PALAVRA DIREITO NORMA Representa as regras que determinada sociedade segue, são mutáveis conforme a cultura de cada local, por exemplo o Direito brasileiro acolhe o instituto do Divórcio. Desta forma o Direito é formulado por códigos e leis denominado DIREITO POSITIVO. FACULDADE Neste caso é sinônimo de opção e não de uma obrigação, por exemplo: temos o direito de reclamar da administração pública, porém podemos fazer ou não, ou seja, é facultativo, só reclama se quiser. JUSTO Utilizado para conduzir a certo tipo de comportamento do ser humano podendo este ser justo ou injusto, por exemplo: a moça se comportou direito CIÊNCIA Utilizado como uma área de conhecimento a ser estudada, por exemplo: Estudo direito na faculdade. FONTE: Adaptado de CAMPOS, 2011, p. 5 Durante muito tempo a teoria do direito se constituiu de um modo, mas atualmente ela vem modificando-se: “A teoria jurídica passa a ser um construído sistemático da razão e, em nome da própria razão, um instrumento de crítica da realidade” (FERRAZ JUNIOR, 2015, p. 44). Ademais, é importante neste momento a compreensão do conceito de direito e suas considerações. Nader (2014, p. 93) corrobora que o direito “é classificado como termo análogo ou analógico, pelo fato de possuir vários significados que, apesar de se diferenciarem, guardam entre si alguns nexos”. Por exemplo, podemos falar do direito enquanto oposto de esquerdo, sendo a mesma palavra que se utiliza para o direito judicial, que tem um significado bastante distinto. No entanto, neste momento, trata-se do direito como norma de organização social – o direito referente à legislação. UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 6 FIGURA 1 – SÍMBOLO DO DIREITO FONTE: <https://laura-e-torres-abogada.webnode.com/_files/200000001- a6e92a7e2c/200/54121127-diosa-griega-Themis-Ley-de-Justicia-igualdad-Un-juicio-justo- Corona-de-laurel--Foto-de-archivo.jpg>. Acesso em: 28 fev. 2020. FIGURA 2 – BALANÇA DO DIREITO FONTE: <https://www.figueiralaser.com.br/site/fotoTexturaMaterial?id_recorte_ personalizado=974&id_materia_prima=1612&tamanho=250x250>. Acesso em: 28 fev. 2020. O direito sempre teve um grande símbolo, bastante simples, que se materializava, desde há muito, em uma balança com dois pratos colocados no mesmo nível, com o fiel no meio – quando este existia – em posição perfeitamente vertical. Para a língua vulgar dos gregos, o justo (o direito) significa o que era visto como igual (igualdade) (FERRAZ JUNIOR, 2015, p. 11). Já os romanos, tinham uma outra maneira de representar o direito – em alusão à deusa Lustitia. A imagem era similar, porém a deusa concentrava-se equilibrando os dois pratos por meio de uma balança com os olhos vendados, e proclamava: direito (FERRAZ JUNIOR, 2015). TÓPICO 1 | DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL 7 Apesar das diferenças entre os dois povos: gregos e romanos, os símbolos possuem semelhanças significativas, sendo o significado da imagem bastante parecido. Para os gregos, o direito significa igualdade, para os romanos, o significado é correto. Contudo, tais saberes fazem parte da construção do que é direito e a maneira na qual ele se constitui atualmente e ainda, nas transformações que sofrerá. Para Cruz (1971, p. 58), a palavra direito em português (e as correspondentes nas línguas românicas), guardou, tanto o sentido do jus como aquilo que é consagrado pela Justiça (em termos de virtude moral), quanto o de derectum como um exame da retidão da balança, por meio do ato da Justiça (em termos do aparelho judicial). Desta forma, o direito ganha forma e medida ao ser aquilo que mede o correto, o justo, o igual. Contudo, essa construção foi e continua sendo de povos de grande influência, como já citados anteriormente: gregos e romanos, que apesar de algumas divergências, fazem parte da história do direito e da sua relevância social. Nader (2014, p. 95) ressalta: “Examinando o vocábulo do ponto de vista objetivo, assim o consideramos: Direito é um conjunto de normas de conduta social, imposto coercitivamente pelo Estado, para a realização da segurança, segundo os critérios de justiça”. Giacomelli et al. (2018, p. 61) acresce outras atribuições ao conceito de direito: “o Direito é o conjunto de regras que regula as relações humanas, visando à convivência pacífica entre os indivíduos. Por consequência, deve estar sempre em consonância com a vontade de um povo, absorvendo os costumes e as tradições locais, embora seja imposto de forma coercitiva”. Campos (2011) apresentaa origem em latim da palavra direito “directum” que é derivada do verbo “dirigere” que etimologicamente representa (dirigir, enviar, guiar, regular, ordenar), não desviando, seguindo direção única, que está conforme, tem razoabilidade, e se fundamenta pelos princípios da justiça e equidade. Ainda, define o autor o conceito de norma: Norma é uma espécie de princípio de preceito de regra. A norma é um mandamento, nela se insere um comando imperativo. Todavia, não será somente um mandamento com o comando imperativo, será também permissões e atribuições e poder ou competência. Aquilo que se estabelece como base ou medida para a realização ou avaliação de alguma coisa: norma de serviço, normas jurídicas; normas diplomáticas (CAMPOS, 2011, p. 12). A norma, portanto, é o sujeito de ligação entre o indivíduo e a sociedade, ou seja, o direito possui ligação com os sujeitos que vivem em sociedade, ao levar UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 8 em consideração seus costumes, tradições e crenças. Já Oliveira (1997, p. 380) se pronuncia de maneira em que se acredita que “[...] o direito pode ir além disso, sendo utilizado também como instrumento de mudança social, de modo a tentar inverter o quadro de dominação”. Segundo Nader (2014), o próprio Kant afirmou no Século XVII que os juristas ainda estão em busca de uma definição para o direito diante das divergências. Contudo, Oliveira (1997, p. 380) ainda acrescenta: “Nota-se que, em nosso meio, o direito não se manifesta apenas por meio das leis – esta é a sua principal fonte –; há outras fontes de caráter secundário, porém de grande relevância, que são a doutrina e, acima de tudo, a jurisprudência”. Contudo, percebe-se ainda, que o direito possui o compromisso de promover a modificação social – de ser um agente transformador, ainda que pela legislação. Faz parte do arsenal de questões que contribuem para a mudança de uma sociedade, sendo que, os próprios povos que construíram o direito, como os gregos e romanos, a forma em que o tempo passava, foram modificando-se socialmente. Dias (2014, p. 4) retrata: A sociedade é universalidade e totalidade. É universalidade porquê é encontrada em todos os recantos do planeta, constitui-se num fenômeno social universal; é totalidade porque constitui um sistema social complexo, onde as diversas partes que o integram estão profundamente relacionadas umas às outras. Portanto, a sociedade é passível de transformações e possui um funcionamento dinâmico e mutável. O direito entra na sociedade como um organizador: das crenças, culturas e povos que estão inseridos nela, além de fazer parte de um reconhecimento grupal. O mesmo autor ainda coloca que o direito surge como uma “autodefesa coletiva do grupo primitivo e o projeta na história, assim também surge o conceito de autoridade, de poder ou de mando” (DIAS, 2014, p. 9). Os próprios povos, de forma primitiva, buscavam maneiras de organizar- se, elegendo no grupo um líder – seja por força física, inteligência ou rapidez. Desde os primórdios esses sujeitos organizavam-se a sua maneira, o que mais tarde originou a autoridade, a liderança e acabou significando a evolução das relações em grupo e da organização social. Nader (2014, p. 93, grifo do autor) nos coloca: Os sociólogos do Direito, por sua vez, enfatizam o elemento social, enquanto os historicistas fazem referência ao caráter evolutivo do Direito. Formas especiais de experiência conduzem a definições muitas vezes curiosas, como a formulada por Pitágoras que, sob a ótica da matemática, afirmou: “O Direito é o igual múltiplo de si mesmo”. TÓPICO 1 | DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL 9 Historicamente, o direito em sua origem aparece enquanto fenômeno auxiliador na organização da sociedade, podendo ser exemplificado pelos pactos conforme a citação a seguir. Segundo Giacomelli et al., 2018, o direito é descendente direto das revoluções iluministas do séc. XVII, e a partir deste marco, pôde-se entender o direito como um conjunto de regras derivadas do povo e para o povo, ou seja, as regras surgiam do povo para que este povo as seguisse – eliminando assim, a ideia de que as regras seriam colocadas por uma autoridade ou uma religião. Assim, o direito, em sua origem, foi empírico, não racional, aprendido da experiência original, não extraído da razão. Não há dúvida de que em algum momento, os homens se aproximaram uns aos outros e selaram pactos (por exemplo, de não agressão), logo, enfim, organizada a sociedade, estabelecidos os costumes, a autoridade aparece como redatora da lei, fonte privilegiada do direito. A cultura das cidades desenvolveu o direito consuetudinário e em seguida o escrito (DIAS, 2014, p. 15). Nasce em meio a sociedade o direito, e ele deriva-se de costumes, da religião, de hábitos e crenças dos indivíduos. “Em toda sociedade vigora certa ordem social que torna possível a convivência de qualquer grupo humano” (DIAS, 2014, p. 20). A ordem social é de extrema relevância, principalmente para estabelecer a organização e o estabelecimento de normas e condutas viáveis. Nader (2014, p. 93) corrobora relatando que “O direito está em função da vida social. A sua finalidade é a de favorecer o amplo relacionamento entre as pessoas e os grupos sociais, que é uma das fases do progresso da sociedade”. Entretendo, pessoas necessitam de normas para agirem em sua liberdade, respeitando o espaço alheio de forma justa. Os primeiros grupos humanos eram formados por poucos indivíduos, e a ordem era imposta pelo mais forte fisicamente, pois dependia dele a sobrevivência do próprio grupo (segurança e alimento); um comportamento análogo à maioria dos mamíferos que vivem em bandos. Assim, a sociedade humana partiu de agrupamentos para bandos, famílias, grupos de famílias, clãs, tribos, conjunto de tribos, nações e, atualmente, agrupamento de nações. Ao longo da jornada humana, a força foi substituída pela razão, e surgiu a necessidade de ordenarmos a sociedade de forma outra que não a da violência e imposição do mais forte. Surgiu, portanto, o Direito como elemento capaz de conter vontades individuais para que prevalecesse a vontade coletiva (GIACOMELLI et al., 2018, p. 62). Conforme a população foi aumentando e os indivíduos imigraram para as civilizações mais populosas, as normas e regras tornaram-se indispensáveis para a sobrevivência grupal e a evolução da construção de novos grupos sociais. O que antes era uma sobrevivência via corporal – meios físicos e corporais –, agora ganha nova forma: via razão, por meio de direitos e deveres estabelecidos. UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 10 Nenhuma sociedade poderia subsistir se ela se omitisse diante do choque de forças sociais e do conflito de interesses que se verificam constantemente no seu interior. Não haveria vida coletiva se fosse permitido que cada indivíduo procedesse de acordo com seus impulsos e desejos pessoais, sem respeitar os interesses dos demais (BETIOLI, 2015, p. 51). Ao discorrer acerca da sociedade, faz-se necessário compreender quais são suas principais características, visto que esta foi o berço do direito enquanto prática. Avalie a tabela a seguir: QUADRO 2 – PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE a) Constitui um grupo humano coerente, de ação geral e unitária. b) Este grupo se propõe à cooperação e à realização de fins ou interesses principais, como sua própria manutenção, sua preservação e sua continuidade biológica. c) A interação social é contínua, permanente e diversificada para estimular as relações sociais complexas de seres humanos diversos em sexo, idade, condição econômica etc. d) O assentamento territorial é necessário para assegurar a subsistência e a ação social permanente. e) O grupo social é atuante, estimulante da ação cultural coletiva em suas variadas relações e processos e sobre a base de que dentro de uma sociedade podem existir múltiplas culturas (subculturas).f) O grupo social imprime seu próprio caráter às criações sociais, de tal modo que até mesmo a obra individual, de um criador excepcional ou gênio, aparece como consequência da experiência coletiva ou social. O grupo social adquire consciência de sua identidade e história. FONTE: Adaptado de Dias, 2014, p. 5 Diante das demandas que emergem neste contexto, o direito articula a organização e a justiça, com o objetivo de manter a igualdade social enquanto direitos e deveres de um cidadão, precisando, muitas vezes, julgar alguns membros da sociedade. Desta forma, “O direito contém, ao mesmo tempo, as filosofias da obediência e da revolta, servindo para expressar e produzir a aceitação do status quo, da situação existente, mas aparecendo também como sustentação moral da indignação e da rebelião” (FERRAZ JUNIOR, 2015, p. 11). TÓPICO 1 | DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL 11 No entanto, nesse sentido, qual a relevância de compreender as principais características da sociedade ao se tratar do estudo do direito? Betioli (2015, p. 53) apresenta um motivo crucial: “Não há direito sem sociedade (Ubi jus, bi societas). O direito não tem existência em si próprio; ele existe na sociedade e em função da sociedade. Por isso é inconcebível fora do ambiente social”. Gusmão (2008, p. 1) também afirma que o tipo agrupamento social será norteado pelas suas normas de conduta social, viabilizando para dirimir os possíveis conflitos caminhando rumo a paz social. Desta maneira, sociedade e direito são codependentes: ou seja, um necessita do outro para a sua própria sobrevivência e para o bem-estar de todos aqueles que o cercam. Dias (2014, p. 16) complementa a fala de Betioli, ao afirmar que “Quando o homem teve plena consciência do valor de uma norma consuetudinária e mais tarde escrita, começou a lutar pelo direito”. Considera- se então, que foram os costumes que criaram o direito, sendo uma elaboração exclusiva da sociedade humana: é uma criação do homem. O direito não surge senão na sociedade, porque somente os homens, por suas faculdades mentais mais desenvolvidas, foram capazes de experimentar que reprimindo determinados atos e eliminando os seus autores, se verifica no grupo social uma diminuição da repetição desses mesmos atos, e porque somente na sociedade humana, por um lado e junto ao direito, se desenvolvem outros fenômenos de ordem econômica, familiar, política, religiosa, que nas agrupações animais não se encontra nunca (DIAS, 2014, p. 15). O direito passa a ser promissor do desenvolvimento de fenômenos relevantes para um bom funcionamento da sociedade, como coloca Dias (2014) na citação anterior, fornece subsídios e ferramentas para que os sujeitos vivam de forma harmoniosa em conjunto, sem infringir a liberdade alheia e as normas estabelecidas. Sobre a história da criação do direito, pode-se compreender, portanto, que: • O direito é uma criação humana. • Surgiu através dos costumes de povos. • Não há direito sem sociedade, nem sociedade sem direito. • O direito foi criado para organizar a sociedade. • Os grupos sociais necessitam de normas para um bom funcionamento. Em suma, o direito surge ao longo de um processo histórico, dialético e cultural, como uma prática social que utiliza um procedimento de solução de conflitos de interesses. É produto de uma realidade complexa e dinâmica que é a vida em sociedade, com seus problemas e controvérsias. É a expressão de um modo de vida de um povo e de sua cultura (BETIOLI, 2015, p. 55). UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 12 Diante das necessidades, o direito foi resultou enquanto instrumento social. Como já foi citado anteriormente, com a função de organizar a sociedade, ele também se atribuía na solução de conflitos e estabelecimento de regras de convivência nos grupos. “Atualmente, o direito pode ser compreendido como um instrumento social destinado a motivar e enquadrar as ações humanas e contribuir para que se alcance um tipo determinado de ordem social em uma sociedade secularmente organizada” (DIAS, 2014, p. 20). Desta forma, a sociedade possui maior segurança diante do comportamento humano (que é variável de acordo com a história de vida de cada sujeito) que não pode ser controlado pelo direito, mas, sim, mensurado. Com regras, normas e legislações, o homem precisa enquadrar-se neste modelo a fim de viver em liberdade, e permitir a liberdade alheia. “O direito, assim, de um lado, protege- nos do poder arbitrário, exercido à margem de toda regulamentação, salva-nos da maioria caótica e do tirano ditatorial, dá a todos oportunidades iguais e, ao mesmo tempo, ampara os desfavorecidos” (FERRAZ JUNIOR, 2015, p. 11). Cabe aqui frisar que essa relação complexa entre as normas e o convívio social, visa, nada mais, nada menos, que manter a ordem social para não chegar ao caos e a barbárie de outros tempos. Por isso as normas são fundamentais ao bom convívio social. ATENCAO Como já descrito anteriormente, independente da vontade ou do querer, o ser humano já nasce em uma sociedade que exerce o controle social por meio de suas normas/regras de conduta, que caso sejam violadas decorrem de sanções na mesma proporção, desde as mais brandas até as mais severas. As sanções, na maioria das vezes, são aplicadas pelo Estado e somente dele dependem, considerando que apenas este possui o aparato estatal para fazer valer os sistemas normativos estruturados. Assim, afirma Gusmão (2018, p. 3), “O Direito, portanto, é uma das normas sociais, das quais se distingue por ser acompanhado de sanções organizadas, institucionalizadas, aplicadas por órgãos especializados, isto é, pelo poder público [...]”. Observa-se que ora haverá por parte do direito um constrangimento social, se levarmos em consideração que quando ocorre uma transgressão por parte de algum membro de determinada sociedade, via de regra este infrator será punido conforme descrito na legislação prevista. Nesta linha de pensamento, pode-se observar que o Direito é formado a partir da realidade, ou seja, é o reflexo de fatos sociais e como consequência irá moldando, ou seja, realizando o controle social de determinado grupo. TÓPICO 1 | DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL 13 Segundo Gusmão (2008), o Direito e as relações sociais possuem uma simbiose de aproximação e afastamento, podendo com o tempo alternar-se, por exemplo, quando cita-se o instituto do casamento, de um contrato social estes são institutos de aproximação do direito, ao contrário de quando existe um litígio, como o divórcio ou qualquer outro conflito, será uma relação de afastamento que por si só trarão várias outras consequências na área do direito, como pensão, guarda, divisão de bens, quando se trata por exemplo de uma separação. Esse exemplo prático apresenta a relação intrínseca entre o direito e a realidade social. A palavra direito vem do latim directum, que significa aquilo que é reto, que tem a qualidade do que é conforme a regra. Contemporaneamente, contudo, são atribuídas diversas concepções à expressão, como: • Sistema Jurídico. • Norma Jurídica. • Lei. • Regra. • Faculdade. • Fenômeno Social. FONTE: Adaptado de GIACOMELLI et al., 2018, p. 61 INTERESSANTE Ao longo das unidades deste material, trabalharemos nas diversas concepções a expressão do direito, sendo que neste momento estamos no que diz respeito ao Fenômeno Social. Dias (2014) nos apresenta que o homem necessita viver em sociedade – não nasceu para viver isolado, sendo que esta sociedade constitui as unidades sociais e as complexas redes de relações existentes em toda a humanidade – as relações formam, constroem e delineiam a sociedade como um todo. Já a sociedade formata o direito com suas necessidades. Compreende-se, portanto, que o direito visa à organização destes sujeitos com relação social, com o objetivo de manter a igualdade e justiça entre os povos. Betioli (2015) nos coloca que o objetivo não é a mudança do homem interior, mas sim enfatizar as regrasnas relações sociais. Assim, o direito não visa ao aperfeiçoamento interior do homem; essa meta pertence à moral. Não pretende preparar o ser humano para uma vida supraterrena, ligada a Deus, finalidade buscada pela religião. Nem se preocupa em incentivar a cortesia, o cavalheirismo ou as normas de etiqueta, campo específico das regras de trato social, que procuram aprimorar o nível das relações sociais (BETIOLI, 2015, p. 51). UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 14 Enquanto fenômeno social, em seu quadro evolutivo, o direito fornece voz e autonomia para o homem, que agora possui organização na sociedade e organiza suas atitudes através de seus pensamentos, não agindo apenas por reações instintivas, mas, principalmente, agindo racionalmente – pensar e posteriormente agir. “É importante perceber o Direito como contentor social, que molda atitudes e freia comportamentos, inibindo reações instintivas e impondo reações racionais, para que prevaleça a ordem da lei em detrimento da vontade do mais forte” (GIACOMELLI et al., 2018, p. 61). Conforme o homem foi evoluindo, a sociedade como um todo segue se aprimorando e, como consequência, o direito também vai se moldando. Conforme Betioli (2015), não há direito sem sociedade, nem tampouco sociedade sem o direito. Todos os autores citados, corroboram sobre o direito enquanto ciência social e discursam o quão ele se faz relevante na esfera social – sem direito, sem organização social. Não podemos esquecer ainda que todas as ações e comportamentos de determinada sociedade, ocasiona reflexos na legislação daquele território, influenciando diretamente na vida das pessoas, que provocaram esses reflexos mesmo de maneira involuntária, com situações ligadas à economia, religião, guerras etc. IMPORTANTE A Grande Depressão (1929) é um fato histórico de um determinado comportamento social que altera drasticamente a ordem jurídica de vários países, inclusive aqui no Brasil. Com a crise econômica, várias legislações revogadas e outras surgem devido à grande recessão da época. O Estado precisava agir de forma direta na economia, os reflexos no Brasil tiveram várias proporções, a Revolução de 1930, o país emerge de uma economia com base na agricultura (café, açúcar, algodão etc.) e segue rumo à industrialização e, como consequência, à legislação trabalhista. FONTE: Gusmão (2008, p. 9). INTERESSANTE Diante desse breve exemplo prático, podemos analisar que o fator econômico foi responsável por uma mudança drástica no direito, porém não é o único fator, ainda poderão surgir fatores ligado às questões religiosas, geográficas, políticas, climáticas que também poderão trazer mudanças diretas ao ordenamento jurídico. Eis o direito enquanto fenômeno social, nasce e atua nas instâncias e realidades da sociedade. 15 Neste tópico, você aprendeu que: • O direito possui a função de assegurar os direitos dos cidadãos, considerando a justiça em primeiro lugar a fim de avaliar os pontos e contrapontos com o intuito de acatar a decisão mais justa perante a lei. • O direito é uma construção dos povos, e não existe sociedade sem direito, nem direito sem sociedade. • Conforme a evolução do homem, o direito se fez necessário diante das demandas sociais. • O direito é agente de voz e autonomia para o homem, que deixa de ser instintivo e passa a ser racional – pensar e depois agir. • O direito visa à organização social. • A construção do direito possui algumas influências, sendo algumas delas a grega e romana. RESUMO DO TÓPICO 1 16 1 O direito em si, possui uma grande trajetória. Hoje ele possui fundamentos, fontes, princípios e valores que o fortalece e embasa para uma atuação eficaz. No entanto, historicamente, ele aparece enquanto organizador social. Desta forma, Giacomelli et al. (2018) coloca que o direito é: a) ( ) Descendente direto da legislação do Século XV, e a partir deste marco, pôde-se entender o direito como um conjunto de regras derivadas do povo e para o povo. b) ( ) Descendente direto das revoluções iluministas do Século XVII, e a partir deste marco, pôde-se entender o direito como um conjunto de regras derivadas do povo e para o povo, ou seja, as regras surgiam do povo para que este povo as seguisse. c) ( ) Descendente direto da sociedade do séc. XXI, e a partir deste marco pôde-se entender o direito como um conjunto de regras derivadas do povo e para o povo, ou seja, as regras surgiam do povo para que este povo as seguisse. d) ( ) Descendente indireto da sociedade do séc. XXI, e a partir deste marco pôde-se entender o direito como um conjunto de leis do povo e para o povo, ou seja, da constituição. 2 O método positivista, enquanto fundamento do direito, diz respeito à parte legal. Nele estão presentes os estudos que levam em conta exclusivamente o fenômeno do Direito, ou seja: baseado nas questões legais. Segundo Venosa (2019), o método positivista é composto primordialmente de três fases, as quais são, necessariamente: a) ( ) Observação – Formulação de Hipótese – Experimentação. b) ( ) Julgamento – Formulação de Normas – Observação. c) ( ) Observação – Julgamento – Formulação de Hipótese. d) ( ) Formulação de leis – Formulação de Hipótese – Julgamento. AUTOATIVIDADE 17 TÓPICO 2 FUNDAMENTOS DO DIREITO UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO Neste tópico trabalharemos brevemente acerca dos fundamentos do direito. Ao estudá-lo, você será capaz de reconhecer os fundamentos, diferenciá- los, avaliar suas características e aprofundar seus estudos posteriormente no qual você sentir-se mais confortável. Ambos fazem parte da construção histórica do direito e possuem sua devida importância. Nesse sentido, os fundamentos dizem respeito à base e ao norte do direito, no sentindo de fornecer subsídio a ciência como um todo. Podemos compreender como principais fundamentos o Direito Natural e o Direito Positivo, nos quais estão detalhadamente explicados no decorrer deste tópico. Apesar de distintos, esses fundamentos contribuíram e ainda contribuem significativamente para o direito como um todo: construção, essência e aplicabilidade social. Desta forma, compreende-se a relevância de conhecermos os fundamentos jurídicos, a fim de dominarmos os aspectos gerais da ciência jurídica. 2 FUNDAMENTOS DO DIREITO O direito, como uma ferramenta social, possui alguns fundamentos que norteiam a sua eficácia. Parte de sua construção história, estes fundamentos fornecem embasamento no crescimento posterior desta ciência humana, sendo os principais: o direito natural (também chamada de jusnaturalismo e/ou naturalista) e o direito positivo (também chamada de juspositivismo e/ou positivismo). Ao se pensar no termo “natural” vem à mente a ideia de perfeição, de estabilidade e até mesmo imutabilidade, já que as mudanças nas regras da natureza quando ocorrem são de maneira lenta, sob essa premissa, Dimoulis (2013, p. 87) afirma que: “O direito natural apresenta-se como conjunto de normas de dever que são estáveis, necessárias, adequadas e regulamentam o comportamento de todos os seres da natureza”. UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 18 O autor afirma ainda que seria este o melhor “direito” para assegurar condições de ordem social e também a própria harmonia nas relações sociais. Portanto, a discussão entre os autores que defendem o jus naturalismo é a definição da origem dessa fonte do direito e a grande maioria, discorre sobre a própria natureza como fundamento primordial, distinguindo-se do arcabouço de leis artificiais “positivismo” elaboradas pelos atores políticos. Enquanto o jus naturalismo catequiza os princípios justo e necessário, o jus positivismo se contrapõe a causando uma tensão muito grande na área do direito no Século XIX, como muito bem expõe Nader (2014, p. 378) contribui com uma breve retrospectiva sobre o surgimento dos fundamentos positivista e naturalista: Durante o Século XIX, o positivismo de inspiração comtiana alcançou ampla repercussãono âmbito do Direito, colocando-se em posição antagônica ao jus naturalismo. A partir daí, estabeleceu-se a maior e definitiva cisão na área da Filosofia do Direito, porque, enquanto o jusnaturalismo preconizava uma outra ordem jurídica além da estabelecida pelo Estado, o positivismo reconhecia como Direito apenas o positivo. O positivismo surgiu em uma fase difícil e crítica na história do Direito Natural, quando o jusnaturalismo se encontrava comprometido pelos excessos da Escola do Direito Natural. São distintas concepções acerca do direito, onde o positivismo coloca o direito enquanto positivo – baseado nas legislações, já o naturalista visualiza o direito como algo além do estado. A segregação do “natural” e do “Cultural”, definido por Gusmão (2008), NATURAL – independe do ser humano (montanhas, rios, sol,) CULTURAL – concretizado pelo ser humano (carros, casas, equipamentos etc). Além do jusnaturalismo em sentido estrito, ainda está agregado a um jusnaturalismo teológico, que sustenta que o direito decorre da vontade divina. Essas duas vertentes de pensamento podem reduzir-se a duas correntes, como já apontamos. Aquela que pode ser denominada idealista, rotulação convencional que congrega as doutrinas jusnaturalistas, as quais entendem que existe um direito superior e antecedente a toda lei positiva humana; e a corrente positivista, a qual abrange as inúmeras correntes cujos seguidores, de uma forma ou de outra, afirmam que o Direito emerge dos homens, é um produto da história, do Estado ou do meio social, não existindo outras leis que não as vigentes em determinado local e em determinada época (VENOSA, 2019, p. 51). Muitos autores colocam a corrente jusnaturalista como retrógrada e antiquada, enquanto outros ressaltam que o positivismo desvaloriza o naturalismo, de modo a desclassificá-lo. Esses posicionamentos antagônicos demonstram quanto é complexa essa dualidade imposta. O fato é que a ciência do direito é bastante debatida, pois ao tratar-se de uma ciência humana, as escolhas fogem da neutralidade e perpassam questões de crenças. TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DO DIREITO 19 O homem nunca permanece neutro com relação aos fenômenos a sua volta. Com frequência, aquece e reaquece perguntas sobre sua origem e destino, sobre vida e morte. Assim também ocorre com relação às regras jurídicas, com o permanente questionamento sobre a noção da obrigatoriedade das normas e o fundamento do Direito. Essa postura é, na verdade, permanente; tão antiga quanto a Humanidade, atravessando todo o curso da História (VENOSA, 2019, p. 51). Ao considerarmos que a sociedade não mantém a mesma conduta por muito tempo e muda de lugar para lugar o direito natural perpassa a questões do estado, algo fixado em crenças, valores, e até mesmo, em questões espirituais. Já o positivismo acredita que o homem criou o direito, e este deve ser baseado nas leis do estado, para Kelsen (2003), ainda dentro do Direito natural existem ramificações entre a natureza ideal e a natureza como deve ser para atender às demandas que surgem ao longo dos tempos. Desta forma, o comportamento do ser humano em sociedade deve ser natural assim como as normas, o que significa um comportamento “normal”, a fim de melhor compreensão, tais fundamentos foram divididos para fins didáticos. 2.1 JUSNATURALISMO Um dos fundamentos do direito, o Jusnaturalismo é uma teoria um pouco mais antiga com registros históricos datados nas cidades-Estados gregas, já naquela época, houveram as tensões entre jusnaturalistas, Sófocles foi um poeta dramático grego positivista que questionava as leis dos reis que eram impostas ao povo como “vontade de Deus”, dessa forma, coloca-se superior ao jus positivista por considerar a existência de um direito natural que chega antes da existência do positivismo. “Chama-se jusnaturalismo a corrente de pensamento que reúne todas as ideias que surgiram, no correr da história, em torno do Direito Natural, sob diferentes orientações” (NADER, 2014, p. 373). O adjetivo natural, agregado à palavra direito, indica que a ordem de princípios não é criada pelo homem e que expressa algo espontâneo, revelado pela própria natureza. A ideia do Direito Natural tem sido apresentada em dois níveis: como ontologia e como deontologia. Os jusnaturalistas que defendem o Direito Natural ontológico admitem o Direito Natural como ser do Direito, como o legítimo Direito. Os jusfilósofos partidários do Direito Natural deontológico representam esse Direito apenas como um conjunto de valores imutáveis e universais, mais identificado com a Ética. Como salienta Elías Díaz, a primeira fórmula engloba a segunda (NADER, 2014, p. 374). Muito antigo, o jusnaturalismo está nas literaturas ocidentais desde a civilização europeia. Nesse sentido, a teoria apresenta-se como maleável a todos os homens, atendendo às demandas sociais por um direito mais justo, perfeito e protetor (GUSMÃO, 2018). UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 20 Apresentamos aqui, como exemplo, O Código de Hamurabi, de origem da Babilônia (pedra Natural) com as seguintes dimensões 2,25m de altura com 1,50m de circunferência, neste monumento monolítico eram expostos situações exemplares e suas respectivas punições de maneira proporcional, assim o velho brocardo “olho por olho dente por dente” de origem da lei de Talião que é uma lei de retaliação, assim uma pessoa que viola direitos de outra deverá ser penalizada no mesmo grau, dessa forma, visando evitar novas situações e assim controlar o comportamento social. “Lei de talião está presente em muitos códigos de leis antigas, pode ser encontrada nos livros do Antigo Testamento do Êxodo, Levítico e Deuteronômio” (WIKIPÉDIA, 2019). O referido Código tem como principais regras defender os contratos em caso de não cumprimento destes, evitar que se dê falso testemunho, evitar os crimes de roubo, receptação e estupro e fazer a defesa também da família entre outras situações (WIKIPÉDIA, 2019). QUADRO 3 – CÓDIGO DE HAMURÁBI Código de Hamurabi Pena de morte para roubo de templo ou propriedade estatal, ou por aceitação de bens roubados (Seção 6). Morte por ajudar um escravo a fugir ou abrigar um escravo foragido (Seção 15, 16). Se uma casa mal-construída causa a morte de um filho do dono da casa, então o filho do construtor será condenado à morte (Seção 230). Mero exílio por incesto: "Se um senhor (homem de certa importância) teve relações com sua filha, ele deverá abandonar a cidade" (Seção 154). Distinção de classes em julgamento: Severas penas para pessoas que prejudicam outras de classe superior. Penas médias por prejuízo a membros de classe inferior (Seção 196–205). FONTE: <https://pt.wikipedia.org/wiki/C%C3%B3digo_de_Hamurabi#cite_note-multipla-1>. Acesso em: 28 fev. 2020. Retornando para a discussão sobre a natureza das leis, o autor Nader (2014, p. 374) corrobora ao considerar que: A natureza, ou seja, as propriedades que compõem o ser, define o fim a que este tende a realizar. Para que as potências ativas do homem se transformem em ato e com isto ele desenvolva, com inteligência, o seu papel na ordem geral das coisas, é indispensável que a sociedade se organize com mecanismos de proteção à natureza humana. Em concordância com isso, Venosa (2019, p. 53) ressalta que “O direito natural busca assegurar o bem comum com a aplicação da justiça”. Contudo, o direto natural considera as questões sociais e de condições humanas, sendo o TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DO DIREITO 21 direito algo inato do ser humano, algo que não necessita ser pautado apenas no estado e nas legislações. “O pensamento predominante na atualidade é o de que o Direito Natural se fundamenta na natureza humana” (NADER, 2014, p. 373). A filosofia grega também relativizava as leis humanas. Para os sofistas, o direito natural tinha como base a natureza humana, em que deveriam se enfatizar a liberdade e a igualdade dos homens. Os sofistas invocam o direito naturalpara destacar o caráter arbitrário e artificial do Estado. Posteriormente, Sócrates, Platão e Aristóteles distinguiram o justo segundo a natureza e segundo a lei. O justo por natureza está no pensamento de cada um dos homens. O direito natural orienta o sentido do direito positivo (VENOSA, 2019, p. 53). Portanto, Venosa (2019) coloca que é o direito natural que orienta o direito positivo e serve de inspiração para a criação do mesmo. “O Direito Natural ou jus naturalismo é uma teoria que procura fundamentar o Direito no bom senso, na equidade e no pragmatismo” (GIACOMELLI et al., 2018, p. 44). Alguns autores ainda colocam que o direito natural é a semente do direito positivo, e outros corroboram que o direito positivo é a evolução do direito natural, pois tornou-se retrógrado diante das demandas atuais na sociedade. Tradicionalmente os autores indicam três caracteres para o Direito Natural: QUADRO 4 – CARACTERES DO DIREITO NATURAL Ser eterno, imutável e universal O jurista chileno Eduardo Novoa Monreal apresenta um elenco bem mais amplo de caracteres, onde enumera: 1) universalidade (comum a todos os povos); 2) perpetuidade (válido para todas as épocas); 3) imutabilidade (da mesma forma que a natureza humana, o Direito Natural não se modifica); 4) indispensabilidade (é um direito irrenunciável); 5) indelebilidade (no sentido que não podem os direitos naturais ser esquecidos pelo coração e consciência dos homens); 6) unidade (porque é igual para todos os homens); 7) obrigatoriedade (deve ser obedecido por todos os homens); 8) necessidade (nenhuma sociedade pode viver sem o Direito Natural); 9) validez (seus princípios são válidos e podem ser impostos aos homens em qualquer situação em que se encontrem). FONTE: Adaptado de NADER, 2014, p. 376 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 22 O jusnaturalismo, portanto, é uma teoria fundamental do direito que coloca os homens em igualdade, podendo ser aplicada a qualquer realidade social. No entanto, possui características específicas de ser universal, imutável e eterno, por ser aplicável nas mais variadas demandas, segundo os autores citados. Voltando à origem do direito natural, as duas amplas posições, teológica ou escolástica e racionalista, contudo, discrepam. A posição mais antiga é também menos ampla, pois admite apenas certos princípios absolutos e fundamentais para reger todo o Direito, enquanto a posição racionalista se baseia no uso ilimitado da razão, a qual pode ilustrar qualquer meandro do Direito, qualquer detalhe de convivência. Como apontamos, com o protestantismo inicia-se a decadência do direito natural (VENOSA, 2019, p. 56). Portanto, o Direito Natural é superior ao Estado, está ligado a princípios e nasce da própria natureza humana. Temos como exemplos de Direitos Naturais: o direito à vida, o direito à liberdade, o direito à reprodução e o direito à justiça (NADER, 2014). Reconhecendo que há diversas maneiras de se conceber o direito natural, podemos dizer que sua ideia básica está́ no reconhecimento de que, na sociedade há um conjunto de valores e de pretensões humanas legítimas que não decorrem de uma norma jurídica emanada do Estado, ou seja, que independem do direito positivo. Esse direito natural tem, portanto, validade em si, legitimado por uma ideia superior, e estabelece limites à própria norma estatal. Seus adeptos não compreendem, portanto, os princípios gerais de direito tão somente em função das normas positivas, historicamente reveladas no Brasil e nas demais nações. Entendem que eles se legitimam como princípios de direito natural (BETIOLI, 2015, p. 489). Desta maneira, o naturalismo vai sendo deixado de lado e o positivismo vai ganhando força por estar mais ligado nas questões racionais, de legislação e governo. Alguns juristas ainda utilizam o jusnaturalismo, mas grande parte deles adotam o juspositivismo enquanto fundamento de direito. No entanto, é necessário lembrar que ambos fazem parte da história da constituição do direto. 2.2 JUSPOSITIVISMO Enquanto o jusnaturalismo coloca as questões naturais como primordiais, “O positivismo jurídico defende a tese de que os princípios gerais de direito são os consagrados pelo próprio ordenamento jurídico” (BETIOLI, 2015, p. 490). Desta forma, neste fundamento, o que orienta a atuação de direito são as legislações criadas baseadas na razão – o homem enquanto criador do direito. Apesar de abrangente, a expressão Direitos do Homem é empregada como referência ao conjunto de normas e princípios enunciados sob a forma de declarações, por organismos internacionais, dentro TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DO DIREITO 23 do propósito de despertar a consciência dos povos e governantes quanto à necessidade de esses se organizarem internamente a partir da preservação dos valores fundamentais de garantia e proteção ao homem (NADER, 2014, p. 380). Em concordância com Nader, Venosa (2019, p. 64) coloca que “O direito positivo objetiva atingir os fins de justiça”. Faz-se necessário aqui um esclarecimento acerca das nomenclaturas. Os autores utilizam de forma distinta, mas fazem referência a mesma teoria: Juspositivismo, positivismo jurídico, direitos do homem e direito positivo dizem respeito ao Direito Positivo. O positivismo nega a existência de regras fora do direito positivo, isto é, fora do direito imposto pelos homens. Os estudiosos positivistas só creem naquilo que pode ser objeto de observação e experiência. Pautado nas normas sociais e legislações, o direito positivo faz o uso da razão enquanto base filosófica, ressaltando que os instintos e crenças pessoais não devem inferir ao outro, e a organização social deve ser estruturada com base nas leis (que possuem a função de estabelecer regras e limites na sociedade). “Esse positivismo que se pretende avalorativo – portanto, neutro – identifica todo o direito com o direito positivo legal. É a partir dele que a escola da exegese encontra a condição propícia para fundamentar uma ciência neutra do direito” (MADEU; MACIEL, 2015, p. 73). O Direito Positivo, quando surgiu, foi considerado uma doutrina primária, esteve presente na Grécia, mas o pai do Direito Positivo foi Augusto Comte, porque a ele se deve a sua sistematização e o aprofundamento da doutrina. Os seus traços já se delineavam em Bacon, Descartes, Galileu, Hume Locke e mais proximamente nas lições fundamentais de Kant (GIACOMELLI et al., 2018, p. 46). Considerando que o direito é apenas aquilo posto pelo estado, no positivismo, as questões naturais são deixadas de lado, como o próprio Venosa (2019) contribui relatando que no juspositivismo exclui-se qualquer norma da natureza, sendo exclusivamente correto o direito positivo. Ambos os posicionamentos – natural e positivo – são necessários para os governantes, porém aquele que deve prevalecer é o positivismo. No positivismo estão presentes os estudos que levam em conta exclusivamente o fenômeno do Direito, isento de noções metafísicas. Nessa senda, podem ser vistos os escritos de Hans Kelsen, Alf Ross, Herbert Hart, Norberto Bobbio, pensadores do século XX, entre tantos outros, nomes com quem certamente o iniciante e o estudioso travarão contato mais ou menos profundo (VENOSA, 2019, p. 51). Colocando o ser humano como criador das leis, “o ponto de partida do positivismo é, de fato, afirmar que direito é apenas aquele existente nas leis criadas pelo ser humano e postas pelo Estado” (VENOSA, 2019, p. 64). Desta forma, a base do positivismo também é a criação racional do homem enquanto legislação e organizações sociais. UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 24 O método positivista é composto primordialmente de três fases: Observação. Formulação de hipótese. Experimentação. Essa experimentação não provoca fenômenos sociais, mas deve ser vista mais como uma confirmação do ocorrido nos citados fenômenos. FONTE: Adaptado de VENOSA, 2019, p. 64 NOTA Entretanto, este método é baseado em fatos e legislaçõesconcretas, com pontos e contrapontos a serem avaliados. “O positivismo jurídico é uma concepção do Direito que nasce quando o Direito Positivo e Direito Natural não são mais considerados Direito no mesmo sentido, mas o Direito Positivo passa a ser considerado Direito em sentido próprio” (GIACOMELLI et al., 2018, p. 45). Os métodos citados compõem o positivismo no direito, sendo estes utilizados a fim de comprovar a eficácia deste fundamento enquanto ciência humana, deixando de basear-se apenas em fenômenos sociais, passando a creditar os fatos comprovados, como os próprios Madeu e Maciel (2015, p. 30) colocam: O direito posto (direito positivo), portanto, é constituído por um conjunto ordenado de prescrições abrigadas na estrutura das normas jurídicas, em um certo espaço territorial e um determinado espaço de tempo: é um objeto da cultura porque foi criado pelo homem para organizar os comportamentos intersubjetivos em sociedade e, com isso, buscar a realização dos valores sociais. Desta forma, fica elucidado o embasamento legislativo do juspositivismo de modo a ser neutro, científico e investigador nas demandas sociais, não apenas baseando nos fenômenos sociais, mas investigando-os com base jurídica. Este seria o horizonte ideal, para as discussões que permeavam sobre a “Lei Divina versus Lei dos Homens”, muito embora o jus positivismo tenha como prerrogativa atender às demandas sociais por meio de seus valores atentando-se para a neutralidade e o caráter cientifico, ainda não é em sua integralidade, pois não acompanha muitas vezes as mudanças na sociedade devido a sua característica político-burocrata que torna lenta as alterações legais necessárias. TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DO DIREITO 25 2.3 JUSNATURALISMO E JUSPOSITIVISMO São duas vertentes distintas que fundamentam e fazem parte da construção do direito enquanto ciência humana. Enquanto o Jusnaturalismo baseia-se na criação e na natureza, o juspositivismo tem como base o estado e as leis, sendo neutro em suas escolhas. O Jusnaturalismo é mais antigo, e muitos adeptos deixaram-no para seguir o juspositivismo diante das demandas sociais e das modificações da sociedade. O jusnaturalismo e o juspositivismo são posicionamentos de extrema importância e cuja aceitação ou não define os rumos da aplicação prática pelos operadores do direito, e como consequência disso surgem os resultados do que costumamos denominar como justiça. O motivo fundamental que canaliza o pensamento ao Direito Natural é a permanente aspiração de justiça que acompanha o homem. Este, em todos os tempos e lugares, não se satisfaz apenas com a ordem jurídica institucionalizada. O Direito Positivo, visto como expressão da vontade do Estado, é um instrumento que tanto pode servir à causa do gênero humano como pode consagrar os valores negativos que impedem o pleno desenvolvimento da pessoa (NADER, 2014, p. 373). Como já colocado anteriormente, ambos fazem parte da história do direito. As duas vertentes possuem prós e contras, mas possuem também sua eficácia quando bem aplicadas na sociedade. Conforme Madeu e Maciel (2015), os fundamentos do direito são: • Jusnaturalismo: eterno, mutável, universal, acredita além do Estado, considera questões naturais do homem, considera questões subjetivas. • Juspositivismo: baseado no Estado, imutável, atualizado para as demandas atuais, considera as leis, homem como criador do direito, possui posição neutra. No entanto, cada vez menos se usa a teoria jusnaturalista. Para Nader (2014), é através do reconhecimento da inflexibilidade do juspositivismo quanto as suas bases que se compreende que, em relação ao jusnaturalismo, o primeiro possui conteúdo progressivo que atenda às novas exigências da sociedade na atualidade, geradas pelo desenvolvimento científico e ético. Tanto o jusnaturalismo como o juspositivismo possuem suas particularidades e, por isso, tornam-se diferentes um do outro, diante disso, “é importante perceber que no pensamento medieval o direito natural e o direito positivo se harmonizavam, contudo, o direito natural era o fundamento do direito positivo, o que legitimava este” (MADEU; MACIEL, 2015, p. 71). Com o passar do tempo, a sociedade foi sendo modificada, e isto refletiu no uso do naturalismo, sendo menos utilizado. UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO 26 Os Direitos do Homem estabelecem parâmetros básicos, estruturais, e formam um núcleo de condições essenciais ao relacionamento dos homens entre si e com o Estado. O Direito Natural e os Direitos do Homem, apesar de participarem de igual faixa ontológica e cultivarem idênticos valores, são conceitos que não se confundem. Enquanto o Direito Natural pesquisa a natureza humana e dela extrai os princípios modelares do Direito Positivo, os Direitos do Homem se desprendem do Direito Natural, com o qual se vinculam umbilicalmente para apresentarem, de uma forma menos abstrata, aqueles princípios já transformados em normas básicas (NADER, 2014, p. 380). De modo mais estruturado, estes fundamentos são de extrema relevância, principalmente quando se fala da constituição do direito e sua eficácia social. Jusnaturalismo e Juspositivismo com seus pontos e contrapontos fazem e fizeram parte do direito enquanto ciência humana, sendo que, na atualidade, aquela que cabe nas demandas sociais, segundo os autores citados é o juspositivismo. Os autores irão ter seus posicionamentos frente a cada uma destas correntes, Hans Kelsen por exemplo desenvolveu a “Teoria Pura do Direito”, que busca uma análise da estrutura do direito positivo e todas as suas fontes ao longo da sua existência: A Teoria Pura do Direito limita-se a uma análise estrutural do Direito Positivo, baseada em um estudo comparativo das ordens sociais que efetivamente existem e existiram historicamente sob o nome de direito. Portanto, o problema da origem do Direito – o Direito em geral ou uma ordem jurídica particular – isto é, das causas de existência do Direito em geral ou de uma ordem jurídica em particular, com seu conteúdo específico, ultrapassa o escopo desta teoria. São problemas da sociologia e da história e, como tais, exigem métodos totalmente diferentes dos de uma análise estrutural de ordens jurídicas dadas (KELSEN, 2001, p. 291). Podemos perceber que Kelsen, não emite juízo de valor, e também busca demais ciências para explicar o fenômeno do direito, tais como a sociologia, história entre outras que podem corroborar com as causas do surgimento do Direito como uma ordem jurídica social que será pautada em valores contidos naquela sociedade em determinada época, essa conduta social para ser justa é necessária a sua norma escrita, para que esse comportamento seja aceito socialmente e conserve o sentimento de justiça para todos, caso contrário entraria em cena a injustiça, assim temos a simbiose: FIGURA 3 – FUNDAMENTOS DO DIREITO FONTE: O autor TÓPICO 2 | FUNDAMENTOS DO DIREITO 27 O conceito de norma justa é precedido pela conduta social, observa Kelsen (2003). Pode ser compreendida como um comportamento humano socialmente aceitável ou reprovável, moral ou imoral, justa ou injusta. Contudo, através destes elementos, classifica-se o tipo de conduta social e a definição da necessidade de regras que definirão quais condutas serão aprovadas ou reprovadas, e, ainda, as possíveis punições aplicadas ao indivíduo de determinada sociedade. Destarte, na Norma Escrita, o positivismo pretende realizar a manutenção do conceito de moral no comportamento humano. Com a mudança das sociedades, essa classificação foi naturalmente se transformando, assim como os valores sociais. No entanto, mesmo com as mudanças, o conceito de Justiça está conectado à Conduta humana em sociedade. 28 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • Os fundamentos do direito são: jusnaturalismo e juspositivismo. • O jusnaturalismo tem relação com a natureza e os fenômenos sociais. • O juspositivismo está ligado fortementecom a legislação, o estado e as normas sociais. • O jusnaturalismo é além do estado: crê em questões além do homem. • Ambos os fundamentos são importantes para o direito, porém o jus positivismo é o que mais atende às demandas sociais da atualidade. 29 1 São distintas as concepções acerca do direito, no qual o positivismo coloca o direito enquanto positivo – baseado nas legislações, já o naturalista visualiza o direito como algo além do estado. A segregação do “natural” e do “Cultural”, definido por Gusmão (2008, p.10) considera: a) ( ) Natural: independe do ser humano (montanhas, rios, sol,); cultural: concretizado pelo ser humano (carros, casas, equipamentos etc.). b) ( ) Natural: concretizado pelo ser humano; cultural: fenômenos sociais que independem do ser humano. c) ( ) Natural: unifica a natureza com a ação do homem; cultural: movimentos culturais. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 2 Acerca do Direito Positivo, Venosa (2019, p. 64) coloca que “O direito positivo objetiva atingir ____________. Assinale a alternativa que apresenta o complemento correto da lacuna: a) ( ) Os fins de justiça. b) ( ) O jusnaturalismo. c) ( ) Os fundamentos do direito. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. AUTOATIVIDADE 30 31 TÓPICO 3 FONTES DO DIREITO UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO O direito é uma ciência social que foi surgindo ao longo do tempo através dos povos, aumento da população e a necessidade de organizar a sociedade. Diante disso, algumas fontes norteiam e orientam o fazer jurídico, a fim de que as decisões tomadas sejam padronizadas corretamente com base na justiça. Neste tópico iremos aprender sobre tais fontes e suas funções, a fim de compreender de forma abrangente a constituição do direito e sua relevância. Desta forma, não há como falarmos em base do direito sem apontarmos as suas fontes: de onde ele surgiu, de fato. Porém, é relevante que saibamos que o direito não surge de apenas uma fonte: mas de inúmeras delas, nas quais serão colocadas neste tópico. A partir do estudo destes conteúdos, você será capaz de compreender cada fonte do direito. Além disso, faz-se importante ressaltar que as fontes são provenientes dos próprios povos - ou seja, o direito surge do povo e para o povo. Sendo assim, as fontes são fatores contribuintes para a construção das normas jurídicas. Percebe a importância de estudarmos este conteúdo? Desejo a você bons estudos! 2 FONTES DO DIREITO O direito possui, desde os primórdios de sua construção, algumas fontes que foram fundamentais para o seu fortalecimento. Algumas delas são mais utilizadas, outras menos, mas todas fazem parte da construção do direito e de sua atualização na contemporaneidade. Não existe um consenso no que tange à classificação das fontes do Direito, alguns doutrinadores apenas consideram como fonte a lei e os costumes, outros somam a estes as jurisprudências e os princípios gerais do direito, e ainda existem os que consideram também a Doutrina e Equidade. Sob a ótica do Direito Positivo apenas a Lei e os Costumes podem ser classificados sem questionamentos como Fontes do Direito. Por exemplo, o costume é uma fonte do direito desde seu início. 32 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO O sentido próprio da palavra “fonte”, pois ela pode significar tanto um local como um fator ou a relação entre dois fenômenos, dos quais o primeiro serve de causa para o outro. Entendemos, porém, que fonte, em sentido próprio, é o ponto em que surge a água. É o lugar em que ela passa do subsolo à superfície, do invisível ao visível. De fato, a água tem “origem” nas camadas mais profundas da terra, chegando até nós, tem sua primeira “aparição” na superfície da terra, se manifesta numa nascente (fonte). De certa forma, a fonte é o próprio curso d’água no ponto de transição entre essas duas situações ou momentos: do subsolo à superfície (BETIOLI, 2015, p. 181). Ao tratar-se de fonte, fala-se de início, de onde vem, de onde foi concebido. Diante disso, na dimensão que o direito possui, existem tipos variados de fontes que alimentam esta ciência social. Na atualidade moderna, em uma velocidade cada vez maior, o direito vem se atualizando diante das demandas sociais, mas sempre respaldado em suas fontes. Há normas, direitos e deveres a serem seguidos para uma boa execução do direito. As populações vêm aumentando, a expectativa de vida também, e isso tudo fornece modificação à sociedade que necessita manter-se em ordem. Por outro lado, temos que analisar que o Estado é o aplicador de forma coercitiva do ordenamento jurídico por ele editado, sendo a Lei, a principal origem da grande maioria do Direito aplicado na sociedade e sobrepondo até mesmo ao costume de longa tradição. O sentido mais amplo da palavra lei, segundo Gomes (2008), abrange os decretos e regulamentos, sendo a lei o Stricto sensu com objetivo de criar uma solução para os problemas nas relações sociais oriundos do Legislativo, os decretos e regulamentos são originários do poder executivo (via de Regra), muito embora o poder executivo poderá exercer a função legislativa em alguns casos (ex. Medida Provisória), excluem aqui os atos simples de expediente/administrativos (ex. portarias, avisos etc.). Já o costume, considerado como regra de conduta habitualmente obedecido, sem a necessidade de estar positivado (escrito), mesmo assim exerceu e exerce um protagonismo no Direito por suas características nas relações das sociedades mais primitivas. O autor destaca ainda a necessidade de o costume reunir dois elementos primordiais, o objetivo e o subjetivo. “O elemento objetivo é o uso, a observância uniforme da regra pela generalidade dos interessados [...], o elemento subjetivo é representado pela convicção geral de que o uso corresponde à necessidade jurídica” (GOMES, 2008, p. 326). É importante, portanto, a compreensão das fontes para posteriormente visualizar o direito como um todo: não existiu do dia para a noite, e se faz essencial enquanto fenômeno social na atualidade, ele foi desenvolvido perante a cultura dos povos que viviam, podemos citar aqui os gregos e romanos. TÓPICO 3 | FONTES DO DIREITO 33 A teoria das fontes, em suas origens modernas, reporta-se à tomada de consciência de que o direito não é essencialmente um dado, mas uma construção elaborada no interior da cultura humana. Ela desenvolve-se desde o momento em que a ciência jurídica percebe seu objeto (o direito) como um produto cultural e não mais como um dado da natureza ou sagrado (FERRAZ JUNIOR, 2015, p. 181). Mascaro (2019, p. 123) afirma que “saber de onde vem as normas é um dos postulados mais importantes para a ideia de coerência do ordenamento jurídico e, consequentemente, para que as necessidades da reprodução capitalista estejam respaldadas”, ou seja, faz com que o direito possua um embasamento e, ao compreendê-lo, o entendimento acerca do direito fica ampliado. Para os pensadores gregos, a fonte do direito é o nomos, que se traduz geralmente por lei. É o nomos o meio de limitar o poder das autoridades, já que a liberdade política consiste em não ter que obedecer, senão à lei. Como consequência, os gregos fizeram poucas leis no sentido moderno do termo, visto que nomos significa tanto a lei como o costume. É na filosofia que está a principal contribuição dos gregos para a cultura ocidental, principalmente com Sócrates, Platão e Aristóteles (MACIEL; AGUIAR, 2017, p. 104). Já para os romanos, “a lei escrita deixa de ser a principal fonte jurídica e os costumes ganham cada vez mais projeção. Esse retorno ao passado é tão grande que o direito escrito desaparece da Europa, ficando restrito ao direito canônico” (MACIEL; AGUIAR, 2017, p. 177). Percebe-se então a influência destes dois grandes povos, de modo a fazerem parte da construção de fontes do direito. Maluf e Maluf (2017) apontam que as fontes do direito são os meios pelos quais se formam ou se estabelecem as normas jurídicas.Assim, são os órgãos sociais de que emana o direito objetivo. A evolução dos costumes e o progresso induziram o legislador a buscar novas formas de aplicação para os princípios legais. Quanto à classificação das fontes do direito, elas podem ser: fontes diretas ou imediatas e fontes indiretas ou mediatas (MALUF; MALUF, 2017, p. 39). Desta forma, as fontes do direito são meios que contribuem para a construção das normas jurídicas, pois fornecem fundamento e embasamento para tal. Nesse sentido, a fim de compreensão, as fontes foram subdivididas em algumas classes: fontes diretas e indiretas. As fontes diretas ou imediatas são aquelas que, pela sua própria forca, são suficientes para gerar a regra jurídica. São a lei e o costume. Já as fontes indiretas ou mediatas são as que não têm tal virtude, porém encaminham os espíritos, mais cedo ou mais tarde, à elaboração da norma. São a doutrina e a jurisprudência (MALUF; MALUF, 2017, p. 39). 34 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Entre as subdivisões das fontes, em primeiro momento tem-se as materiais e formais. Nas fontes materiais, enquadram-se as regras, o estado e as normas jurídicas, subdivide-se em mediatas, também chamadas de indiretas e imediatas, também chamadas de diretas. Nas diretas, enquadram-se a doutrina e a jurisprudência, enquanto nas indiretas ficam as leis, costumes e regras. A expressão “fontes do direito” é polissêmica, ou seja, pode ser empregada em sentidos diversos, como o sociológico, o histórico, o filosófico, o técnico-formal etc. Esse fato explica as discrepâncias da doutrina sobre o tema. Há autores que chamam de fonte tanto os meios pelos quais o direito se forma como aqueles por meio dos quais ele se manifesta. E há autores, aos quais nos filiamos, que preferem chamar de fonte tão somente os meios de expressão do direito na vida social (BETIOLI, 2015, p. 179). Gusmão (2018, p. 104) corrobora ressaltando que as únicas fontes do direito são as materiais. “Ora, são as materiais (fatos econômicos, fatos sociais, problemas demográficos, clima etc.) que dão o conteúdo das normas jurídicas, e não as formais, que dão as formas de que se revestem as primeiras (lei, costume etc.) ”. Para este autor, as fontes materiais é que são as fontes mais relevantes e fornecem maior fundamento ao direito em si, você ainda lembra do exemplo da crise de 1929? Anterior a este fato, ocorreu a Revolução Industrial, momento da história que novas riquezas foram criadas em detrimento a outras, esse fato social é também uma fonte de novos direitos, assim como os fatores religiosos e morais estão diretamente voltados ao direito inerente as famílias, afinal de contas não se pude negar a influência da moralidade cristão no seio do ambiente familiar podemos observar dessa análise que a moral também se torna uma fonte de direito. “Se o direito sofre influência da moral, da religião e da economia, além da pressão de fatores políticos, como negar a influência das ideologias no direito” (Gusmão, 2008, p. 281). O que se deve entender por fontes materiais do direito? São as constituídas por fenômeno sociais e por dados extraídos da realidade social, das tradições, e dos ideais dominantes, com os quais o legislador, resolvendo questões que dele exigem solução, dá conteúdo ou matéria às regras jurídicas, isto é, às fontes formais do direito (lei, regulamento etc.) (GUSMÃO, 2008). IMPORTANTE TÓPICO 3 | FONTES DO DIREITO 35 Já Bagnoli, Barbosa e Oliveira (2014, p. 7) acrescentam que “As fontes do Direito, principalmente quando pensadas em sua tripla dimensão, têm por finalidade fornecer ao historiador elementos suficientes para a realização das análises subjetivas e objetivas do processo de construção desse determinado fenômeno social”. Contudo, lembra-se dos fundamentos do direito que também fazem parte desta construção social. Há vários conceitos acerca das fontes, e os autores constantemente atualizam-se e publicam acerca da temática. O próprio autor Nader acrescenta a diferenciação entre fontes históricas do direito e fontes materiais. As fontes históricas do Direito indicam a gênese das modernas instituições jurídicas: a época, o local, as razões que determinaram a sua formação. A pesquisa pode limitar-se aos antecedentes históricos mais recentes ou se aprofundar no passado, na busca das concepções originais. Como causa produtora do Direito, as fontes materiais são constituídas pelos fatos sociais, pelos problemas que emergem na sociedade e que são condicionados pelos chamados fatores do Direito, como a Moral, a Economia, a Geografia, entre outros (NADER, 2014, p. 134). Desta forma, compreende-se que existem diferenças, mas que ambas são importantes para o direito como um todo. As fontes históricas enquanto gênese, e as fontes materiais enquanto fatos e demandas sociais. O direito, desta forma, bebe de fontes distintas, mas que levam a um lugar: à legislação e à justiça. Há ainda as fontes estatais e fontes formais do direito, conforme será visto posteriormente. Para Bagnoli, Barbosa e Oliveira (2014), diante das fontes formais, temos em primeiro a lei: influenciadora da constituição de vários sistemas jurídicos até os dias atuais. A segunda fonte são os costumes: tratam-se de usos e hábitos de natureza jurídica que recebem validade diante da sua permanência e eficácia. Em terceiro temos a doutrina: esta é formada pelos juristas e constitui-se em ser a mais participativa por questões de parecer, estudos, opiniões e teorias. Temos ainda a jurisprudência, que auxilia significativamente na compreensão dos sistemas jurídicos. Para Betioli (2015), “[...] há um numeres clausus de fontes do direito, ou seja, só quatro são as fontes, porque quatro são as formas do poder de decidir na experiência social: a fonte legal, a fonte jurisdicional (fontes estatais), a fonte costumeira e a fonte negocial (fontes não estatais)”. Diante disso, Betioli (2015, p. 183) diz que as fontes do Direito são: • O processo legislativo, ou seja, aquele conjunto de fases estabelecidas na Constituição Federal e que dão origem a normas jurídicas de ordem legal. É a expressão do Poder Legislativo. • O costume jurídico, isto é, a repetição habitual de um comportamento com a convicção da sua obrigatoriedade. Eles se vinculam ao poder social, que vem a ser o poder decisório anônimo do povo e inerente à vida coletiva. 36 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO • A jurisdição, ou melhor, o exercício pelos magistrados do seu poder legal de conhecer e julgar os litígios. Corresponde ao Poder Judiciário. • O negócio jurídico, ou seja, a manifestação de vontade que, instaurando uma relação entre dois ou mais sujeitos, busca produzir determinado efeito jurídico protegido pelo direito. É a expressão do poder negocial como uma das exteriorizações da autonomia da vontade. Para Mascaro (2019), o direito positivo é a fonte fundamental do direito, sendo a legislação indispensável para a atividade jurídica. “A legalidade, tomada no sentido de respeito às normas jurídicas estabelecidas, é um pressuposto para a criação de outras normas, para o julgamento de casos concretos pelos tribunais e para a realização de negócios jurídicos, como os contratos” (MASCARO, 2019, p. 125). Desse modo, a legislação pode ser considerada como impulso para a criação de novas normas, critérios e formas de julgamento. Ao colocá-la junto às fontes, a aplicação do direito como um todo e os valores atribuídos a ela, pode-se dizer que é fator de criação e atualização de novos fazeres jurídicos – com o objetivo de atender às demandas sociais com eficácia ao mesmo passo em que reconhece a importância da sua história: evoluir sem excluir o passado. “Podemos dizer que, sob o aspecto da vigência, a rigor só a lei é fonte formal do direito, nos países de tradição romanística, porque todas as demais só possuem validade segunda, de adequação ou conformidade ao modelo legal” (BETIOLI, 2015, p. 230). Betioli (2015)apresenta que a partir do Século XVIII os estados modernos colocaram a lei como principal fonte do direito, deixando o costume em desprestígio. Maluf e Maluf (2017, p. 39) reafirmam isso ao relatar que “A lei é a principal fonte formal do direito na maioria dos sistemas ocidentais; por via da qual o Estado politicamente organizado dita as regras de comportamento aos seus súditos”. Desta forma, a lei é considerada uma fonte de grande relevância ao direito, sendo que contribui significativamente para a organização social há muito tempo. Ferraz Junior (2015, p. 184) esclarece o conceito de lei: “Quando, porém, dizemos que a lei é fonte do direito, tomamos a palavra ‘lei’ no sentido de regra estrutural, isto é, de regra que institucionaliza a entrada de uma norma no sistema, dentro do qual ela será reconhecida como legal ou lei no sentido estrito”. Etimologicamente, a palavra lei vem do verbo latino ligare, sendo a lei aquilo que liga, aquilo que vincula, aquilo que obriga. Há também quem assegure que sua origem é o verbo legere, aquilo que se lê (MALUF; MALUF, 2017, p. 40). IMPORTANTE TÓPICO 3 | FONTES DO DIREITO 37 Ao ser formalizada, a lei possui seu poderio e eficácia, estabelecendo normas no sistema social. Por isso, a lei de uma forma geral é considerada uma fonte do direito: pela sua relevância e eficácia. Giacomelli et al. (2018, p. 56) acrescenta que a lei só é fonte “[...] quando introduz algo de novo no sistema jurídico vigente”. Além da lei enquanto fonte do direito, temos os costumes. Estes, oriundos de povos específicos, possuem grande importância na era do direito antigo – surgindo do povo para o povo. Desta forma, podem ser considerados fonte do direito. Conceitua-se costume como “[...] normas de condutas sociais que, devido a sua repetição ao longo do tempo, tornam-se obrigatórias para a sociedade” (GIACOMELLI et al., 2018, p. 57). Betioli (2015, p. 237) corrobora que “O costume, por sua vez, nasce de maneira anônima. Geralmente não sabemos onde e como surgiu. Por isso, o costume é chamado também de ‘fonte não intencional’, e a lei de ‘fonte intencional’. Diferente da lei, o direito foi surgindo ao longo do tempo em meio à sociedade sem nenhum tipo de objetivo específico – surgiu no dia a dia”. Costume é o uso geral constante e notório, observado na convicção de corresponder a uma necessidade jurídica. Regra de conduta habitualmente obedecida, sua força coativa credencia-o como fonte formal do Direito. O costume é, em síntese, “um uso juridicamente obrigatório” (GOMES, 2016, p. 31). Maluf e Maluf (2017) retrata a relevância do costume no direito antigo diante da escassez do legislativo e das poucas leis escritas, sendo o costume uma fonte enriquecedora. Na atualidade, ela é considerada uma fonte secundária, sendo a lei uma fonte primária – não perdendo sua relevância e eficácia, mas no reconhecimento das modificações sociais e das novas demandas que surgem. Ainda com referência à lei, o costume oferece vantagens e desvantagens: a lei é a vontade precisa da consciência jurídica, sendo ela uma vantagem; mas essa manifestação é rígida, o que representa uma desvantagem. O costume, por outro lado, é mais obscuro do que a lei, o que significa uma desvantagem; em compensação, é mais flexível do que aquela, o que significa uma vantagem (MALUF; MALUF, 2017, p. 50). Entretanto, ambos são fontes do direito e possuem suas relevâncias particulares. Embora a lei seja mais precisa, é rígida. Enquanto isso, o costume é mais obscuro e flexível: cada qual com suas singularidades e relevâncias. Tal comparação é realizada, pois muitos autores ainda colocam que o costume não é uma fonte, mas, sim, é considerado uma fonte do direito desde os primórdios. Discute-se, também, se o costume deve ser provado. Divergem os autores, entendendo alguns que, sendo o uso – elemento material do costume – um conjunto de fatos, sua prova é indispensável para que possa ser aplicado pelos tribunais, enquanto sustentam outros que, sendo fonte formal do Direito, dispensa prova, tal como a lei, que deve ser conhecida pelos juízes (GOMES, 2016, p. 31). 38 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Segundo Gomes (2016), para ser considerada fonte formal, o costume necessita possuir duas características ao menos, uma objetiva e outra subjetiva. “O elemento objetivo é o uso; ‘a observância uniforme da regra pela generalidade dos interessados’, durante longo tempo [...] o elemento subjetivo é representado pela convicção geral de que o uso corresponde a uma necessidade jurídica” (GOMES, 2016, p. 31). Contudo, Maluf e Maluf (2017, p. 50) conteplam: “São condições indispensáveis à vigência do costume [...] a sua continuidade; a sua uniformidade; a sua diuturnidade; a sua moralidade; e a sua obrigatoriedade”. Desta forma, o costume tem seu valor singular inegavelmente, desde que possua tais condições para a sua efetivação enquanto fonte do direito. No direito anglo-saxão, o costume é preponderante; nos países de tradição romano-germânica, a jurisprudência representa fonte de lei, embora não constitua uma norma imperativa, como fonte normal do direito positivo; em alguns casos mostra-se a importância da jurisprudência na formação do direito, visto que, à luz do deliberado pelo Supremo Tribunal Federal, “a sequência dos julgamentos torna-se como o suplemento da própria legislação. Praticamente é o que estaria a suceder, na atualidade, com o direito sumular, bem como com a jurisprudência vinculante dos tribunais superiores” (MALUF; MALUF, 2017, p. 52). Diante disso, percebe-se que além da lei e dos costumes se têm a jurisprudência e a doutrina enquanto fontes. “A jurisprudência é o conjunto de princípios e doutrinas contidos nas decisões reiteradas interpretadoras do Direito vigente” (GIACOMELLI et al., 2018, p. 57). Desta forma, ela não se configura enquanto fonte geral, mas sim como o exercício da jurisdição como um todo. Sendo a jurisprudência o histórico de decisões a respeito de casos parecidos, que podem ser utilizados como forma de indicar o caminho a ser seguido em casos semelhantes, essa fonte do Direito pode ser utilizada para corroborar o entendimento judicial sobre determinado assunto (GIACOMELLI et al., 2018, p. 123). Ademais, compreende-se a relevância da jurisprudência, sendo que ela “[...] pode ser entendida como o exercício da jurisdição que se dá em virtude de uma sucessão harmônica de decisões dos tribunais” (MALUF; MALUF, 2017, p. 51). Contudo, a jurisprudência enquanto ciência do direito e das leis auxilia na compreensão judicial em certos conteúdos. Bagnoli, Barbosa e Oliveira (2014) postulam que a jurisprudência não é uma fonte geral como as leis e os costumes, mas sim um instrumento de extrema relevância que auxilia na promoção do direito enquanto valor jurídico e segurança jurídica. Entretanto, possui suas singularidades e particularidades que a tornam importante, assim como a doutrina. TÓPICO 3 | FONTES DO DIREITO 39 A doutrina é o pensamento dos estudiosos do Direito reduzido a escrito em tratados, compêndios, manuais, monografias, teses ou comentários à legislação. Em síntese, a elaboração teórica do Direito. Já foi fonte quando um imperador romano determinou que nos casos controvertidos devia prevalecer a opinião de Gaio, Papiniano, Ulpiano, Paulo e Modestino (GOMES, 2016, p. 34). NOTA Sendo uma fonte do direito, a doutrina apresenta-se enquanto fonte teórica – fornecendo subsídio para alterações e criação de leis. Desta forma, ela aparece de maneira documental, apresentando ferramentas para os juristas modificarem o direito conforme a necessidade. “A doutrina se desenvolve no plano teórico fornecendo preciosos subsídios ao legislador para a elaboração ou alteração das leis” (MALUF; MALUF, 2017, p. 51). A doutrina incorpora os estudos de caráter científico realizados pelos juristas acerca do Direito, com fim puramente teórico de sistematização, doa seus preceitos com a finalidade deinterpretar as suas normas e sinalizar as regras de aplicação, ou seja, a literatura jurídica (GIACOMELLI et al., 2018, p. 57). Além disso, a doutrina serve de base para o direito ao se tratar de princípios, teorias, ideias de juristas que produzem documentos judiciais. A doutrina norteia e formaliza a documentação no direito. “A doutrina moderna tem admitido que os atos jurídicos que não se limitam à aplicação das normas jurídicas e criam efetivamente regras de Direito objetivo constituem fontes formais” (NADER, 2014, p. 135). Duguit denominou atos-regras às diferentes espécies de atos jurídicos que, apesar de não possuírem generalidade, atingem a um contingente de indivíduos, de que são exemplos os estatutos de entidade, consórcios, contratos particulares e públicos. A doutrina tradicional, contudo, não admite essa categoria de fonte formal sob o fundamento de que suas normas não possuem generalidade. O argumento é falho, de vez que há leis que não são gerais; por outro lado, há atos- regras que possuem amplo alcance, como ocorre, por exemplo, com os contratos coletivos de trabalho firmados por sindicatos (NADER, 2014, p. 135). Portanto, a doutrina é uma fonte do direito que diz respeito a questões documentais, de estudo e revisão. Por ser uma fonte secundária, apresenta suas particularidades e sua relevância em tal ciência social, podendo ser utilizada ainda para a interpretação dos documentos e legislações. Para Bagnoli, Barbosa e Oliveira (2014), dentre as fontes do direito, as primárias/principais são: a Lei e os Costumes. Já a doutrina e jurisprudência, são fontes suplementares – atuam apenas em situações pertinentes ou em interpretações das normas jurídicas. Além disso, têm os valores e princípios jurídicos que são levados em consideração pelos juristas. 40 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO FIGURA 4 – FONTES DO DIREITO FONTE DO DIREITO MATERIAL (zetéticas) FORMAL (dogmáticas) PRIMÁRIAS (Autossuficiente para gerar regra jurídica) SECUNDÁRIAS (Não Autossuficiente para gerar regra jurídica,depende da primária) Sociologia jurídica Psicologia jurídica Filosofia jurídica... Fatos Sociais) Lei (Legalistas) Lei + Jurisprudência (Normativistas) Lei + Jurisprudência + Costume (Realistas) Sentenças, Contratos, Testamentos... + Jurisprudência + Costume (Legalistas) + Costume (Normativistas) Doutrina Súmulas, Teses, Tratados, Manuais, Artigos, Parecer, etc. FONTE: <https://resumosdeumestudantededireito.files.wordpress.com/2016/09/b.png?w=640>. Acesso em: 2 mar. 2020. Para Campos (2011), as fontes do Direito podem ser históricas, sociais, filosóficas e materiais: • Fontes Históricas – como exemplo podem ser citados testemunhos ou forma escritas voltada especificamente à disciplina História do Direito. • Fontes Sociais – tratam de comportamentos sociais que produzem as normas jurídicas, estão diretamente ligados a questões econômicas, políticas, religiosos direcionada à disciplina de Sociologia do Direito. • Fontes Filosóficas – ligada diretamente à disciplina de Filosofia do Direito, tem como objetivo fundamentar e justificar o direito de uma ideologia dominante para que seja reconhecido pela coletividade. • Fontes Materiais – produzem o Direito, atuam neles os operadores do direito, elaborando a partir do Poder Legislativo, Poder Judiciário que utilizam como instrumentos as sentenças normativas e jurisprudências para contribuir com a fonte de normas gerais do Direito. Gusmão (2018) traz alguns valores que permeiam o direito, sendo estes indispensáveis, além das fontes citadas. Eis alguns: o princípio de legalidade, que em direito penal impede a aplicação da lei nova mais prejudicial ao réu e no direito público, impõem em geral a anterioridade da lei ao ato governamental; o princípio do “primado do direito”, isto é, o princípio do direito acima das conveniências do governo, de suas ideias, de sua política e de sua vontade, bem como dos interesses individuais; a regra da boa-fé; o princípio da prescrição; o princípio da coisa julgada; as “declarações de direito”; o controle pelo Judiciário da legalidade de atos de direito público e de direito privado, bem como o controle da constitucionalidade de leis e de atos da Administração Pública etc. Estes e outros princípios são inspirados pelo valor segurança. Não só a justiça está na raiz do princípio summum jus et summa injuria, do qual resulta não só a condenação do abuso do direito, como, também, a responsabilidade civil pelos riscos criados, a revisão judicial de contratos leoninos. O direito internacional público é norteado pelo valor paz (GUSMÃO, 2018, p. 104). TÓPICO 3 | FONTES DO DIREITO 41 Mascaro (2019) acrescenta ainda a moral e a ética. Segundo o autor, a partir do Século XIX com o movimento positivo do direito buscou por meio de regras do estado a avaliação se uma norma é ou não jurídica, e esta avaliação começou a ser realizada perante ao próprio nascimento das normas – como qualidade formal, pois ali estaria a essência e o fundamento da norma, sendo possível sua avaliação completa. Isso contribui em maior eficácia e controle social. Ao referir-se à moral (palavra que vem do latim mores: que significa modos de comportamento, costumes) estamos falando de uma coletânea de convicções de uma pessoa, determinado grupo ou sociedade sobre a dualidade entre o bem e o mal, o aprovável e reprovável para este grupo. Todos concordam que a moral é composta por regras de conduta que cumprem duas funções. Primeiro lugar: orientam o comportamento dos indivíduos na vida cotidiana; todos devem fazer o bem e evitar a prática do mal. Em segundo lugar: servem como critério de avaliação da conduta humana. A sociedade as utiliza para julgar a conduta dos indivíduos, que é aprovada ou reprovada segundo sua correspondência com os imperativos morais (Dimoulis, 2013, p. 55). IMPORTANTE Mascaro (2019) pontua a equidade, baseado em Aristóteles. Ele retrata que as normas e os princípios jurídicos atuam em âmbito bastante amplo, e que muitas vezes necessitam da equidade para alcanças algumas questões. “A equidade é a justiça que se mede no concreto” (MASCARO, 2019, p. 126). Desta forma, compreende-se a equidade enquanto um ajuste na área do direito. FIGURA 5 – DIFERENÇA DE IGUALDADE E EQUIDADE FONTE: <https://definicao.net/significado-de-equidade/>. Acesso em: 2 mar. 2020. 42 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO A equidade possui grande valia, sendo considerada, por vezes, como fonte do direito. “A equidade é tida, em casos excepcionais, como fonte de Direito, quando a própria lei comete ao juiz a atribuição de julgar consoante seus ditames” (GOMES, 2016, p. 35). Portanto, a equidade, assim como os demais valores e princípios jurídicos, atua enquanto complemento das fontes, fornecendo aspectos não fornecidos por elas – a fim de auxiliá-las. No entanto, pode-se dizer que tanto as fontes quanto os princípios e valores fazem parte do direito como um todo – cada qual fornecendo sua contribuição com suas particularidades, porém adicionando coesão a tal ciência. De forma breve, compreende-se as bases do direito, assim como seus fundamentos diante da reflexão das fontes, sendo que a fonte é o berço do direito. 43 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que: • As fontes do direito são: leis, costumes, doutrina e jurisprudência. • O direito utiliza-se de alguns princípios e valores, como equidade e legalidade. • As fontes são extremamente necessárias para a atuação do direito. • Para o costume ser considerado uma fonte, ele necessita apresentar alguns requisitos. • As fontes, valores e princípios constituem o direito como um todo. 44 1 Para Bagnoli, Barbosa e Oliveira (2014), diante das fontes formais, temos em primeiro __________ influenciadora da constituição de vários sistemas jurídicos até os dias atuais. A segunda fonte, _________________: tratam- se de usos e hábitos de natureza jurídica que recebem validade dianteda sua permanência e eficácia. Em terceiro, temos a _______________ esta é formada pelos juristas e constitui-se em ser a mais participativa por questões de parecer, estudos, opiniões e teorias. Temos ainda a ______________ que auxilia significativamente na compreensão dos sistemas jurídicos. Complete as lacunas e assinale a alternativa correta: a) ( ) Equidade – Julgamento – Jurisprudência – Doutrina. b) ( ) Analogia – Costume – Princípios do Direito – Equidade. c) ( ) Lei – Costume – Doutrina – Jurisprudência. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 2 Segundo Gomes (2016), para ser considerada fonte formal, o costume necessita possuir duas características ao menos: uma objetiva e outra subjetiva. Considerando o exposto, assinale a alternativa correta: a) ( ) O elemento objetivo é o uso, já o elemento subjetivo é representado pela crença e costume que cada família possui. b) ( ) O elemento objetivo é o uso, já o elemento subjetivo é representado pela convicção geral de que o uso corresponde a uma necessidade jurídica. c) ( ) O elemento objetivo é a convicção geral, já o elemento subjetivo é representado pelo uso rotineiro. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. AUTOATIVIDADE 45 TÓPICO 4 PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO UNIDADE 1 1 INTRODUÇÃO O processo legislativo do direito traz consigo fundamentos que fazem com que ele seja constante, inflexível e geral. Isso faz com que, muitas vezes, apareçam lacunas nas leis, quando aplicadas aos casos corriqueiros do dia a dia, e com isso, os procedimentos de integração aparecem como uma ferramenta de preenchimento destas lacunas e como complemento, de forma legal. O direito, desde a sua construção, trabalha para abarcar todos os casos e situações, e mesmo quando possui lacunas/brechas legislativas, pode contar com meios que o auxiliem no sentido de preencher tal lacuna. Neste tópico estudaremos os métodos utilizados, assim como a sua relevância na ciência do direito. Contudo, essas modalidades de integração oferecem ainda ao jurista, maiores ferramentas na sua atuação cotidiana. Lembra-se dos outros tópicos em que ressaltamos a atualização do direito perante as modificações sociais? Os métodos de integração fazem parte desta atualização. É sobre isso e muito mais que falaremos de forma breve neste tópico, aproveite! 2 PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO O direito foi criado pelo homem e para o homem. Avalia cada situação de forma pontual, e muitas vezes a legislação acaba por deixar lacunas. Nesse sentido, os juristas possuem uma ferramenta chamada integração. Ela serve para preencher essas lacunas de forma eficiente, a fim de tornar o processo judicial completo. “Sob esse aspecto, a integração vem a ser um processo de preenchimento das lacunas existentes na lei” (BETIOLI, 2015, p. 471). A integração é um processo de preenchimento de lacunas, existentes na lei, por elementos que a própria legislação oferece ou por princípios jurídicos, mediante operação lógica e juízos de valor. A doutrina distingue a autointegração, que se opera pelo aproveitamento de elementos do próprio ordenamento, da heterointegração, que se faz com a aplicação de normas que não 46 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO participam da legislação, como é a hipótese, por exemplo, do recurso às regras estrangeiras. Considerado o sistema jurídico pátrio, a integração se processa pela analogia e princípios gerais de Direito (NADER, 2017, p. 190). “A integração é um fenômeno de criação do direito, pressupondo a ideia de tornar completo, chamar alguma coisa para o campo de incidência da norma, absorver determinada hipótese a princípio não prevista” (MADEU; MACIEL, 2015, p. 174). A integração propõe um novo pensar: flexível e justo, diante da realidade de cada caso, possuindo aplicabilidade pela lei. A questão dos modos de integração diz respeito aos instrumentos técnicos à disposição do intérprete para efetuar o preenchimento ou a colmatação da lacuna. Na verdade, tais instrumentos têm dupla utilidade, pois não só servem para o preenchimento, como também para a constatação da lacuna (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 264). Compreende-se, portanto, a integração como parte do direito e, ainda, enquanto suporte legislativo. Além de preencher as lacunas, auxilia na interpretação e decisão. “Quando se refere aos meios de integração, a doutrina fala em analogia, costumes, equidade, princípios gerais de direito, indução amplificadora, interpretação extensiva etc.” (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 265). Atualmente, o fato inegável é que os legisladores, por mais que queiram, não conseguem acompanhar com suas normas jurídicas a dinâmica de transformações da realidade social. Com outras palavras, as normas jurídicas não conseguem disciplinar todo o volume de situações que emergem nas relações sociais. Dessa forma, quando surge um caso que não está previsto pelas normas jurídicas, ou seja, quando para um fato não há norma adequada, estamos diante de uma lacuna que deve ser preenchida pelo aplicador mediante a integração do direito (BETIOLI, 2015, p. 471). Além disso, muitas leis foram criadas há bastante tempo – o que ocasiona que elas se tornem ultrapassadas para algumas demandas sociais da atualidade. Neste quesito, a integração e seus componentes fornecem grande eficácia para os juristas, a fim de ampliar as possibilidades. Desse modo, pode-se afirmar que o sistema jurídico é lacunoso, mas ele próprio oferece mecanismos para preencher as referidas lacunas. Trata-se dos chamados instrumentos de integração do direito, a saber: a analogia; os costumes; os princípios jurídicos; e a equidade (SOARES, 2017, p. 121). Há duas modalidades de integração: uma direcionada ao preenchimento das lacunas legais, e outra voltada à complementação da normatividade constitucional (MADEU; MACIEL, 2015). Além disso, é necessário ressaltar que “Os elementos de integração não constituem fontes porque não formulam diretamente a norma jurídica, apenas orientam o aplicador para localizá-las. Igualmente, não é atividade de interpretação, porque não se ocupa em definir o sentido e o alcance das normas jurídicas” (BETIOLI, 2015, p. 472). TÓPICO 4 | PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO 47 Contudo, os elementos integrativos possuem função diferenciada das fontes – colocadas no Tópico 3 desta unidade. Entretanto, possuem suas particularidades e especificidades e, neste sentido, junta-se às fontes e fundamentos do direito com a finalidade de complementação. “A integração não se confunde com as “fontes” nem com os processos de “interpretação” do direito” (BETIOLI, 2015, p. 471). Os elementos de integração não constituem fontes formais porque não formulam diretamente a norma jurídica, apenas orientam o aplicador para localizá-las. A pesquisa dos meios de integração não é atividade de interpretação, porque não se ocupa em definir o sentido e o alcance das normas jurídicas. Uma vez assentada a disposição aplicável, aí sim se desenvolve o trabalho de exegese (NADER, 2017, p. 190). Entretanto, as lacunas do direito são preenchidas pela integração. Podemos classificar os métodos de integração em: analogia, costumes, princípios gerais do direito e equidade. Desta forma, estes elementos contribuem no sentido da complementação no direito, cada qual com suas peculiaridades e particularidades. “A lacuna se caracteriza não só quando a lei é completamente omissa em relação ao caso, mas igualmente quando o legislador deixa o assunto a critério do julgador” (NADER, 2017, p. 190). As lacunas podem ser definidas como “[...] a ausência de lei que permita resolver uma situação da vida social que reclama uma solução jurídica, ou como a ausência de lei para um caso concreto” (BETIOLI, 2015, p. 472). Como a lei é geral e abrangente nem sempre consegue alcançar os detalhes de um caso, e são nessas situações em que as lacunas aparecem e os procedimentos de integração se fazem necessários. Para Betioli, a integração “[...] ultrapassaos seus limites, abrangendo a totalidade das normas jurídicas que, de acordo com as diversas fontes do direito de que se originam, classificam-se em legais, costumeiras, jurisdicionais e negociais” (BETIOLI, 2015, p. 471). Diante das lacunas, ela se torna indispensável para uma boa execução do caso. “Assim, embora a lacuna seja definida como omissão ou falta de norma no ordenamento, ela é, na realidade, uma válvula pela qual entram no ordenamento os fatores extrapositivos, como os ideais de justiça, as exigências da equidade, os raciocínios quase formais” (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 271). A lacuna é, na verdade, uma oportunidade de utilização da integração. “A verdadeira lacuna, no seu entender e diferentemente da definição que demos supra, se verifica não mais por falta de uma norma expressa pela regulamentação de um determinado caso, mas pela falta de um critério para a escolha de qual das duas regras gerais, a exclusiva ou a inclusiva, deva ser aplicada” (BETIOLI, 2015, p. 474). 48 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Venosa (2019) apresenta que as lacunas podem ser voluntárias – quando a inexistência de norma é proposital pelo jurista – ou involuntárias – quando não há a previsão de tal lacuna pelo legislador. Uma vez manifesta, a lacuna deverá ser preenchida, utilizando-se, em primeiro lugar, do procedimento analógico. Ainda aqui o juiz, ou o simples intérprete, se mantém cativo ao Direito Positivo, pois não poderá agir com liberdade na escolha da norma jurídica aplicável. A sua função será localizar, no sistema jurídico vigente, a hipótese prevista pelo legislador e que apresente semelhança fundamental, não apenas acidental, com o caso concreto. A hipótese definida em lei é chamada paradigma (NADER, 2017, p. 194). Desta forma, onde há lacuna, as ferramentas de integração entram a fim de serem utilizadas conforme a demanda solicita em cada caso. Não deve ser encarada como uma falha na legislação, mas, sim, como um ajuste que necessita ser realizado, e que momentaneamente é realizado pela integração em si. “O Artigo 4º da LINDB indica os meios de que o juiz dispõe para solucionar os casos lacunosos: quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito” (BETIOLI, 2015, p. 475). A aplicação da analogia legal decorre necessariamente da existência de lacunas da lei. É uma técnica a ser empregada somente quando a ordem jurídica não oferece uma regra específica para determinada matéria de fato. Normalmente essas lacunas surgem em razão do desencontro cronológico entre o avanço social e a correspondente criação de novas regras disciplinadoras (NADER, 2017, p. 194). Entretanto, cada tipo de integração – analogia, costumes e princípios – são utilizadas de acordo com as orientações legislativas, sendo que estas lacunas são previstas em lei. Soares (2017) coloca que a lacuna pode ser considerada um recurso de argumentação, com a finalidade de busca de uma solução mais favorável entre a ausência de flexibilidade da lei, e a realidade de cada caso. A necessidade da integração resulta da paz social que o direito deve assegurar para permitir a convivência humana. Por isso, é princípio consagrado universalmente que os juízes não podem deixar de julgar, alegando inexistência de normas aplicáveis. Se não fosse assim, a segurança jurídica ficaria seriamente comprometida. Na legislação brasileira, o Artigo 126 do CPC dispõe a respeito: “O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei” (BETIOLI, 2015, p. 474). Bertoli (2015, p. 475) acrescenta: “Com outras palavras, no ordenamento jurídico existem princípios e normas latentes, capazes de solucionar situações não previstas, expressamente, pelo legislador”. Desta forma, sabe-se que a lei é generalista e nem sempre cobre todas as situações a serem julgadas, e por isso a integração se faz presente. “Assim, os meios de integração do direito seriam a analogia, os costumes, os princípios gerais de direito e a equidade” (BETIOLI, 2015, p. 475). TÓPICO 4 | PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO 49 Apesar de a nossa atual Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e da Constituição Federal vigente nada mencionarem sobre a equidade, contudo ela é de ser considerada como meio distinto de preenchimento de vazios no sistema legal. Vale relembrar que a equidade, como meio de integração de lacuna, foi expressamente prevista no Artigo 113, nº 37, da Constituição Federal de 1934: “Nenhum juiz deixará de sentenciar por motivo de omissão na lei. Em tal caso, deverá decidir por analogia, pelos princípios gerais de direito ou por equidade” (BETIOLI, 2015, p. 475). INTERESSANTE Diante disso, considera-se processo de integração do direito: o costume, a analogia, os princípios gerais do direito e a equidade. Como um dos meios de integração, a analogia é “uma técnica que deve ser usada somente quando a ordem jurídica não apresenta uma norma específica para um determinado fato” (BETIOLI, 2015, p. 479). Sendo assim, ela é um recurso que compreende a vontade legal que se estende a casos em que a legislação não alcança por si só. Segundo a doutrina jurídica, analogia é um procedimento lógico argumentativo, que consiste em aplicar a um determinado caso, não contemplado de modo direto ou específico por uma norma jurídica, outra regra prevista para uma hipótese distinta, porém semelhante ao caso não contemplado (CARVALHO, 2009, p. 368). A analogia auxilia o intérprete em sua descoberta, a fim de estender a ele um novo arsenal de ferramentas investigativas. “A analogia vem a ser um recurso técnico que consiste em se aplicar a um caso não previsto pelo legislador uma norma jurídica prevista para um outro caso fundamentalmente semelhante ao não previsto” (BETIOLI, 2015, p. 479). Betioli (2015) ainda coloca que a analogia não se constitui enquanto fonte do direito por não criar normativas jurídicas, e seu papel é o de auxiliar o intérprete e fornecer novas informações. “A analogia não é só entender a vontade legal, mas estendê-la a casos não contidos na norma” (MADEU; MACIEL, 2015, p. 175). Quando não existe uma lei expressa para a solução de um caso, o intérprete, pela analogia, o resolve juridicamente com uma regra de direito estabelecida para um caso semelhante. Assim, há um fato previsto (F1), ao qual está vinculada uma consequência (C). Pela analogia, junta-se essa consequência a um fato não previsto (F2), pela semelhança (S) deste com o fato previsto (BETIOLI, 2015, p. 479). Pode-se compreender, portanto, que “utilizando-se do recurso da analogia, o intérprete, em tese, amplia o conceito normativo, incorporando-lhe uma situação nova, tendo como base um juízo de semelhança” (CARVALHO, 2009, p. 368). 50 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Essa questão acaba fornecendo ao jurista novas maneiras de solucionar um caso, por exemplo. Apresenta novas perspectivas, além de um ângulo diferenciado de análise da situação. Carvalho (2009, p. 368) ainda corrobora que “O aplicador subsome o conceito do fato, que de acordo com seu juízo de convencimento não é contemplado pela norma, à significação normativa interpretada de “forma extensiva”, de modo que ela, devido a tal valoração, passa a regulá-lo” (CARVALHO, 2009, p. 368). Enquanto uma ferramenta do processo de integração, a analogia subdivide- se em: investigação lógica e investigação axiológica. Observe o esquema a seguir. FIGURA 6 – ANALOGIA FONTE: Adaptado de Betioli, 2015, p. 480 Desta maneira, percebe-se a fundamentação deste procedimento de integração, quando se parte de princípios lógicos e axiológicos para alcançar a igualdade e justiça no direito. “A analogia fundamenta-se no princípio da igualdade jurídica, o qual exige que os casos semelhantes devem ser regulados por normas semelhantes. É necessário, então, que haja semelhança material de casos e identidade de razão” (BETIOLI, 2015, p. 480). Em geral, fala-seem analogia quando uma norma, estabelecida com e para determinada facti species, é aplicável à conduta para a qual não há norma, havendo entre ambos os supostos fáticos uma semelhança. Define-se também como aplicação extensiva (gerando confusão entre analogia e interpretação extensiva) de princípios extraídos de uma lei a casos juridicamente semelhantes, isto é, que são essencialmente iguais nos aspectos importantes e desiguais nos secundários, tendo em vista uma decisão (Enne-cerus-Nipperdey, 1960 apud FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 266). Por exemplo: TÓPICO 4 | PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO 51 Tem-se admitido a aplicação, por analogia, do disposto no Decreto n. 2.681, de 7-12-1912, sobre estradas de ferro, para solucionar casos atinentes à estrada de rodagem, no que diz respeito à responsabilidade pela vida e integridade dos passageiros. Na verdade, há semelhança de fato e identidade de razão, justificando a aplicação às empresas de transportes rodoviários do preceito da responsabilidade das companhias ferroviárias, com relação à vida e integridade dos passageiros. Há aqui uma verdade e justiça na igualdade encontrada. Mas não há, por exemplo, a mesma razão para aplicar, por analogia, às empresas rodoviárias, o preceito da responsabilidade das ferrovias pela conservação do leito viário, representado por dormentes, trilhos etc. Ou na hipótese de transporte gratuito de passageiros (BETIOLI, 2015, p. 481). Ademais, a analogia possui algumas distinções, como coloca Ferraz Junior (2019, p. 267) “costuma-se distinguir entre analogia legis e analogia juris (analogia da lei e analogia do direito). A distinção tem a ver com um segundo procedimento quase lógico, a indução amplificadora”. Entretanto, Betioli (2015, p. 481) reforça estes dois tipos de analogias: • Analogia Legis ou Legal – consiste na aplicação de uma norma existente destinada a reger caso semelhante ao não previsto. O paradigma, no caso, se localiza em determinado ato legislativo. • Analogia Juris ou Jurídica – Ela se fundamenta em um conjunto de normas, para extrair elementos que possibilitem sua aplicabilidade ao caso não previsto. Assim, com base em várias disposições legais, que disciplinam um instituto semelhante, descobre-se a norma aplicável ao caso não previsto, pela combinação de muitas outras. A solução precisa ser buscada no sistema como um todo. Enquanto a analogia legal busca aplicar uma norma existente a um caso semelhante não previsto, a analogia juris fundamenta-se na extração de elementos que possuam aplicabilidade a um caso não previsível, e para este tipo de analogia, a solução precisa ser integral. Parece-nos que a chamada analogia juris é uma espécie de conjugação de dois métodos lógicos: a indução e a dedução. Com base em casos particulares, obtém-se uma generalização da qual resultam princípios, os quais se aplicam, então, dedutivamente, a outros casos (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 267). Portanto, o uso da analogia fundamenta-se na igualdade ao tratamento de casos semelhantes, sendo que esta semelhança deve ser demonstrada nas questões jurídicas. “Demonstrada a semelhança entre dois casos, o intérprete percebe, simultaneamente, que um não está regulado e aplica a ele a norma do outro. A analogia permite constatar e preencher a lacuna” (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 267). Diante disso, Betioli (2015) apresenta quando a analogia não deve ser utilizada, em termos gerais, não se utiliza analogia: 52 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO • No direito penal, a analogia é condenada para efeito de enquadramento em figuras delituosas, em penas ou como fator de agravamento destas. Dado o princípio da reserva legal, a conduta não prevista legalmente como crime é penalmente licita. No caso das normas penais, as lacunas legais constituem vazios jurídicos que não podem ser preenchidos. • Não se aplica ainda o procedimento analógico no direito fiscal, quando for para impor tributos ou penas ao contribuinte. • Limitado também é o seu recurso no tocante às normas de exceção, que restringem ou suprimem direitos (ius singulare). Como situado anteriormente, após a analogia temos o costume. Enquanto instrumento de processo de integração, costume é um elemento bastante importante. “Como valor, o costume é um elemento condicionante da cultura e como norma é uma significação construída pelo intérprete da realidade social ao verificar uma série de práticas reiteradas as quais, devido à repetição, consideram-se como obrigatórias” (CARVALHO, 2009, p. 369). Além disso, “Costume é a pratica pública e geral, reiterada com constância e uniformidade, de um modo de agir, acompanhado da convicção de sua obrigatoriedade jurídica”, assim define Campos (2011, p. 21). Houve um tempo que o Direito foi constituído somente por costumes, considerando que o aplicador do Direito positivo ainda não existia, o Estado. Em um determinado tempo da história percebeu-se a necessidade de fixar os costumes de forma escrita sendo o primeiro o Corpus Iuris Civilis, de Justiniano, chamado também de Direito Consuetudinário (costumes), que resistiu com fundamentos no Direito Germânico, formado por costumes durante a invasão dos bárbaros. Na Revolução Francesa, foi extremamente necessária alguma segurança jurídica nas decisões daquele importante momento, havia necessidade de muita reflexão nos atos daquela sociedade, que posteriormente seria a grande protagonista das mudanças em nível global, partindo do pressuposto de imprecisão e empirismo refletida à imagem dos costumes, tornando como fonte principal a Lei (positivismo), deixando o costumes como fonte subsidiária do Direito, diminuindo de forma exponencial sua trajetória de perpetuação na vida da sociedade (Campos, 2011). Pontos positivos do Positivismo: existências de órgãos responsáveis pela criação das Leis; regulação de todas as áreas e relações jurídicas, novas leis sendo criadas; por meio de Códigos específicos novas relações jurídicas surgem; facilidade de elaboração e aplicação, evitando novos costumes; hábito bom (costume) transforma-se em Lei; demanda de aprimoramento do fluxo de trabalho. NOTA TÓPICO 4 | PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO 53 Há dúvidas que permeiam entre o costume ser fonte do direito, ou elemento de integração. Soares (2017, p. 121) esclarece tal questão, colocando que “[...] os costumes, além de figurar como fonte do direito, podem também apresentar-se como elemento de integração da lei, especialmente quando a norma legal expressamente autorize a utilização da norma consuetudinária para o preenchimento da lacuna legislativa”. Compreende-se, portanto, que além de ser fonte do direito, constitui-se ainda enquanto elemento de integração no preenchimento e complemento das lacunas legislativas. “Como fonte supletiva, cuida-se do costume praeter legem: aquele que intervém na falta ou omissão da lei. Tem caráter supletivo, suprindo a lei nos casos omissos pela observância de práticas consuetudinárias” (BETIOLI, 2015, p. 476). Diante disso, considera-se que “a lei é emanação do Poder Legislativo; o costume é a expressão do poder social; a sentença, ato do Poder Judiciário; os atos- regras, que denomina por fonte negocial, são manifestações do poder negocial ou da autonomia da vontade” (NADER, 2017, p. 143). Nader (2017) apresenta as três maneiras em que o costume se apresenta à lei: Costume Secundum Legem, Costume Praeter Legem e Costume Contra Legem: • Costume secundum legem: para alguns ele se caracteriza quando a prática social corresponde à lei. Não seria uma prática social ganhando efetividade jurídica, mas a lei introduzindo novos padrões de comportamento à vida social e que são acatados efetivamente. É também denominado costume interpretativo, pois expressando o sentido da lei, a prática social espontaneamente consagra um tipo de aplicação das normas. De acordo com a Lei, costume interpretativo. • Costume praeter legem: é o que se aplica supletivamente, além da Lei, na hipótesede lacuna da lei. Esta espécie é admitida pela generalidade das legislações. Em nosso país, o costume assume o mesmo caráter, pelo que dispõe o art. 4º da Lei de Introdução Código Civil: quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. • Costume contra legem: é a chamada consuetudo abrogatoria, que se caracteriza pelo fato de a prática social contrariar as normas de Direito escrito. Apesar de haver divergência doutrinária quanto a sua validade, é pensamento predominante que a lei só pode ser revogada por outra. O mérito da presente questão se confunde com o problema da validade das leis em desuso. Prática Costumeira contrária à lei. Ex.: uso do cheque pré-datado. O costume, portanto, coloca-se enquanto mediador quando as lacunas da lei surgem. Ao colocar-se com relação à realidade social, o costume tem o poder de avaliar a série de práticas realizadas via repetição, que se tornam ao longo do tempo obrigatórias. Além da analogia e do costume, temos, ainda, os princípios gerais do direito. 54 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Os princípios gerais do direito são aqueles principais – os que norteiam a ação do direito, sendo estes os que embasam os valores, por exemplo. “O princípio é uma proposição jurídica que pertence ao direito posto, pois são construídos a partir dos enunciados que compõem seu plano de expressão. Aplicar um princípio, assim, é aplicar uma norma pertencente ao sistema” (CARVALHO, 2009, p. 377). Os princípios possuem duas características importantes: a primeira delas é que são abstratos e genéricos, o que ocasiona aos operadores do direito uma incerteza de sua aplicação, por exemplo, o Artigo 6º da Constituição Federal, que discorre sobre a garantia à moradia, porém é totalmente omisso no que tange ao titular desse direito, seria a população em vulnerabilidade e de baixa renda? Seriam os integrantes do MST? Nem mesmo indica o órgão responsável por viabilizar o acesso ao direito de moradia, desse modo, são em situações como esta que se aplicam os princípios gerais do direito. A segunda característica refere-se à colisão entre princípios. Dimoulis (2013, p. 184) contempla que “o art. 170 da Constituição Federal prevê, como princípios da ordem econômica, o pleno emprego e a livre concorrência”. Desse modo, ainda, o autor exemplifica considerando o caso de uma empresa que demita 50% dos seus colaboradores para poder se manter no mercado. Nessa situação, qual princípio aplicar? Existe a necessidade de se ponderar com muita sabedoria os princípios que estão conflito. A palavra “princípio” tem duas acepções: uma de natureza moral e outra de ordem lógica. Quando dizemos que determina pessoa é uma figura de princípios, estamos empregando o vocábulo na sua acepção moral, ou seja, queremos dizer que se trata de uma pessoa de virtudes, de boa formação e que sempre se conduz fundado em razões morais. Em seu significado lógico, são verdades ou juízos fundamentais que servem de alicerce ou de garantia de certeza a um sistema de conhecimento filosófico ou científico (BETIOLI, 2015, p. 485). Dessa maneira, os princípios possuem característica reflexiva enquanto elemento de integração do direito. Carvalho (2009, p. 377) coloca alguns exemplos de princípios: justiça, segurança jurídica, certeza do direito, igualdade etc. Todos com suas fundamentações e regulamentações, que auxiliam no processo de preenchimento de lacunas e complementação legal. Por princípios gerais de direito entende-se todos aqueles que encontram suporte na Constituição Federal e regulam todos os campos do direito. Gomes (2008) define os princípios como “diretrizes ou forças propulsoras” que contribuem para a expansão do ordenamento jurídico por meio de um fluxo processual lógico que garantirá a resolução da lide de maneira mais justa e equânime possível. Existem algumas situações específicas em que os princípios estão expressos de forma escrita na própria legislação, como é o exemplo dos Artigos 1º a 4º da Constituição Federal que apresenta o princípio da soberania popular, liberdade e solidariedade social, entre outros, como a paz, o bem-estar etc. TÓPICO 4 | PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO 55 Nesse sentido, os operadores do direito, ao realizarem a interpretação das normas jurídicas, podem identificar os princípios gerais do direito em sua forma positivada no ordenamento, que irão nortear o caso concreto para solucionar uma determinada demanda específica, considerando os valores e o “espírito do ordenamento jurídico” que também apresenta as suas contradições, como liberdade empresarial versus redução das desigualdades sociais. Dessa forma, podemos observar que apenas um princípio não abrangerá a totalidade da matéria, abrindo margens a controvérsias e permitindo múltiplas interpretações e por sua vez não garantir a tão almejada segurança jurídica (Dimoulis, 2013). Incontestavelmente, os princípios gerais do direito são importantes e relevantes quando colocados enquanto elementos de integração, porém Betioli (2015) coloca que este conceito vai muito mais além: Como vimos pela sua definição, a função dos princípios gerais de direito é bem mais ampla do que o preenchimento de lacunas encontradas na legislação. No dizer de Simonius, o direito vigente está impregnado de princípios até as suas últimas ramificações. Podemos dizer que os princípios dão consistência ao direito, enquanto os valores dão-lhe sentido (BETIOLI, 2015, p. 487). Para o autor, os princípios constituem o direito, enquanto o sentido é dado pelos valores. “Invariavelmente, todos os princípios apresentam-se na forma de proposições, significações construídas em nossa mente a partir da leitura dos textos do direito positivo, e se materializam na forma de enunciados (leis, postulados)” (CARVALHO, 2009, p. 3). Entretanto, “O princípio pode expressar: (i) um valor; ou (ii) um limite objetivo. Toda norma jurídica traz um valor, devido à força com que o dado axiológico está presente na linguagem do direito” (CARVALHO, 2009, p. 600). Desta forma, Nader (2017) coloca que os princípios que dão consistência ao direito, enquanto os valores dão sentido, e que sem os princípios não haveria justiça. “A qualidade da lei depende, entre outros fatores, dos princípios escolhidos pelo legislador. O fundamental, tanto na vida como no Direito, são os princípios, porque deles tudo decorre” (NADER, 2017, p. 198). Segundo Betioli (2015), os princípios jurídicos dividem-se em: omnivalentes, plurivalentes e monovalentes, conforme quadro a seguir: 56 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO QUADRO 5 – PRINCÍPIOS JURÍDICOS PRINCÍPIOS OMNIVALENTES Validos em todas as ciências, como os de identidade (“o ser é idêntico a si mesmo – A é A”), de causa eficiente (“nada existe sem sua causa ou sua razão suficiente”) e da não contradição (“o ser não pode ser e não ser ao mesmo tempo”). PRINCÍPIOS PLURIVALENTES Quando se aplicam a vários campos de conhecimento, como o de finalidade, essencial às ciências culturais, mas não extensivo a todos os campos do conhecimento. PRINCÍPIOS MONOVALENTES Quando são válidos só para determinada ciência, como é o caso dos princípios gerais de direito, aplicáveis apenas à Ciência do Direito, deve-se notar, todavia, que nem todos os princípios gerais de direito tem a mesma amplitude, uma vez que há os que se aplicam neste ou naquele ramo do direito. Pelo Artigo 4º da Lei de Introdução se conclui que o nosso legislador reconhece solenemente que o direito possui seus princípios fundamentais. FONTE: Adaptado de BETIOLI (2015, p. 486) Portanto, os princípios omnivalentes referem-se à causa eficiente, enquanto os plurivalentes dizem respeito a vários campos de conhecimento, e os monovalentes são aplicáveis apenas à Ciência do Direito: estes três envolvem os princípios do direito como um todo. “Em suma, são as ideias fundamentais e informadoras do ordenamentojurídico: inspiram e lhe dão embasamento” (BETIOLI, 2015, p. 486). Os princípios jurídicos despontam como cânones éticos, implícitos ou expressos no direito, que apontam para a realização dos valores e das finalidades maiores da ordem jurídica, potencializando a tomada de decisões mais justas, mormente nas hipóteses de lacunas valorativas (SOARES, 2017, p. 121). Como parte fundamental do direito e dos elementos de integração, os princípios do direito são valores e princípios hierarquicamente elevados – os principais. Na vida do Direito, os princípios são importantes em duas fases principais: na elaboração das leis e na aplicação do Direito, pelo preenchimento das lacunas da lei (NADER, 2017). Betioli (2015, p. 488) apresenta alguns exemplos de princípios que estão prescritos juridicamente: TÓPICO 4 | PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO 57 a) de “isonomia”, ou seja, da igualdade de todos perante a lei (CF, art. 5o, caput); b) de “irretroatividade da lei” para proteção dos direitos adquiridos (CF, art. 5o, XXXVI); c) de “legalidade”, isto é, ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” (CF, art. 5o, II); d) o exposto no art. 3o da LINDB: “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”; e) o previsto no art. 112 do CC: “Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem”. Registra-se que os ordenamentos jurídicos da atualidade têm como característica a multiplicidade das fontes formais que se apresentam na forma positivada ou não, se sobressaindo as fontes escritas por sua lógica e analogia aplicada, executando o seu papel de subsidiariedade e que em muitos casos torna- se um poder vinculante na sua aplicação direta. É interessante que quando não é utilizado para solucionar as demandas, poderá ocasionar o descumprimento de preceito fundamental a ser avaliado pelo Superior Tribunal Federal (STF), que possui a competência para esse fim, conforme exposto no Artigo 102 § 1º, da Constituição Federal de 1988, ensejando assim uma ação específica, garantindo o respeito de sua aplicação no caso concreto (DIMOULIS, 2013). Por fim, “[...] podemos dizer que a experiência jurídica é rica de princípios ou modelos hermenêuticos que, transformados ou não em modelos jurídicos, nos dão o embasamento ético do direito positivo” (BETIOLI, 2015, p. 488). Desta maneira, os princípios do direito fornecem elementos para a atuação dos juristas em si. Entretanto, além da analogia, costume e princípios do direito, há, ainda, a equidade. A equidade pode ser definida como aquela que leva em consideração as questões particulares de cada caso. “Como elemento de integração, a equidade exerce função supletiva quanto às lacunas involuntárias e, às vezes, voluntárias” (BETIOLI, 2015, p. 497). Desta maneira, a equidade preenche as lacunas de forma a ser mediadora e complementadora. Ainda, Gomes (2008, p. 333) aponta que a função da equidade do ordenamento jurídico é “temperar a rigidez da norma escrita”, assim o juiz em casos excepcionais irá realizar o julgamento de determinada lide, levando em consideração o tratamento desigual para os desiguais, o que torna-se discrepante do princípio da igualdade, sendo que este não abarca todos os casos. Já o princípio da equidade possui características sui generis, como a necessidade de elementos serem considerados, de fato, relevantes. Para melhor compreensão, faz-se necessário observar quais as funções da equidade, sendo elas: substitutiva, integrativa, supletiva, interpretativa: 58 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Equidade substitutiva ocorre quando o juiz é autorizado a invocar uma norma diversa à lei em face da particularidade do caso concreto; integrativa quando a atribui ao juiz o poder de completar a norma, integrando-a conforme as circunstâncias do caso; supletiva, quando o legislador confere ao juiz poderes de decisão dos casos que não resolve; interpretativa quando o juiz dá à norma um sentido diverso do adotado, por lhe parecer mais equitativo. A equidade é empregada em certas situações para compatibilizar “o princípio da legalidade no qual se exprime o poder do Estado e os valores emergentes da sociedade civil” (GOMES, 2008, p. 333, grifos do autor). A equidade pode integrar o direito de diferentes modos. Por exemplo, por seu intermédio, podemos expandir uma obrigação, criando deveres adicionais para além dos que constam de um contrato ou decorrem expressamente de lei; podemos ainda limitar o exercício de direitos, para prevenir abusos; podemos também criar regras para situações que se alteraram, desde seu regulamento, ou que nele não foram previstas (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 269). NOTA A equidade fornece o olhar humano dentro do direito: dentre a lei que é imutável, no quesito de integração do direito, destaca-se por ser parceira da justiça. “Seja como elemento de integração ou de aplicação da lei, a equidade sempre leva em conta o que há de particular em cada caso concreto, em cada relação, para dar-lhe a solução mais justa” (BETIOLI, 2015, p. 497). Venosa (2019, p. 150) coloca a equidade como “[...] Forma de manifestação de justiça que tem o condão de atenuar, amenizar, dignificar a regra jurídica”. Com este olhar mais humano, a equidade penetra nas lacunas legislativas e faz com que o jurista considere algumas questões ao avaliar cada caso. Por isso, Aristóteles comparava a equidade à Régua de Lesbos, régua especial de que se serviam os operários para medir certos blocos de granito. Por ser feita de metal flexível (chumbo), podia ajustar-se às irregularidades do objeto: “a régua adapta-se à forma da pedra e não é rígida, exatamente como o decreto se adapta aos fatos” (BETIOLI, 2015, p. 499). Portanto, este princípio fornece a flexibilidade que a legislação em si não apresenta, como o próprio Aristóteles a compara à Régua de Lesbos. “A função da equidade, então, é atenuar (e mesmo eliminar) essa oposição. Trata-se, na verdade, de ‘humanizar’ o direito positivo e de flexibilizar a rigidez exterior das regras jurídicas” (BETIOLI, 2015, p. 499). TÓPICO 4 | PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO 59 Também configura a equidade o fato de o juiz, devidamente autorizado por lei, julgar determinado caso com plena liberdade. Nesta circunstância não ocorre uma adaptação da norma ao caso concreto, mas a elaboração da norma e sua aplicação. Tal prática se enquadra no conceito de que equidade é a justiça do caso concreto (NADER, 2017, p. 114). Venosa (2019) coloca que a equidade nada mais é do que uma posição filosófica para cada caso com a finalidade de flexibilizar a norma jurídica. Além disso, ela fornece a abertura de visão para várias concepções “maquiadas” pela legislação rígida. “A equidade seria, então, um princípio ético que orienta a realização do direito no sentido de evitar-se uma injustiça, dada a eventual rigidez da fórmula legal” (BETIOLI, 2015, p. 499). Compreende-se, portanto, que “por derradeiro, a equidade consiste no ideal do justo empiricamente concretizado, implicando a aplicação prudente pelo julgador de seu sentimento de justiça, ao observar as singularidades de um dado caso concreto” (SOARES, 2017, p. 123). Entretanto, a equidade é a mediadora entre os casos de forma humana e a legislação rígida e sem negociações a fim de humanizar o direito através das lacunas. Dessa forma, podemos superar as lacunas do sistema legal graças às normas de equidade, quando esta é tida como sendo o direito do caso concreto. É também função da equidade adaptar a norma ao caso concreto, exercendo um papel corretivo para sanar defeitos oriundos da generalidade das leis (BETIOLI, 2015, p. 498). Ademais, possui função de interpretar a regra nos casos, dando abertura a critérios de igualdade e proporcionalidade enquanto função de correção, além de ter função quantificadora – ao quantificar os efeitos da norma (BETIOLI, 2015). “Fala-se aqui no sentimento do justoconcreto, em harmonia com as circunstâncias e adequado ao caso” (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 269). Betioli (2015) coloca a equidade, ainda, como uma misteriosa companheira da justiça que se compõe em um elemento de adaptação da norma às circunstâncias reais do caso. “Flexível como a régua de Lesbos, a equidade não mede apenas aquilo que é normal, mas também as variações e curvaturas inevitáveis da experiência humana, e, flexibilizando a rigidez da lei, determina o que é justo em cada situação particular” (BETIOLI, 2015, p. 499). São lacunas voluntárias, ou casos em que a própria norma remete ao órgão judicante a utilização da equidade. Assim, por exemplo, o Artigo 1.456 do Código Civil de 1916 dispunha que “no aplicar a pena do Artigo 1.454 [perda do direito ao seguro], procederá o juiz com equidade, atentando nas circunstâncias reais, e não em probabilidades infundadas, quanto à agravação dos riscos” (BETIOLI, 2015, p. 498). INTERESSANTE 60 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Além disso, “Há casos que, de modo involuntário, escapam à previsão do legislador, surgindo então lacunas involuntárias que devem ser preenchidas pela analogia, costume, princípios gerais de direito e também recorrendo à equidade” (BETIOLI, 2015, p. 497). Desta forma, os elementos de integração do direito atuam perante a sua demanda e diante de suas características singulares. Betioli (2015) retrata que nem tudo são flores. A partir do direito moderno, a equidade sofreu uma profunda crise por conta do racionalismo jurídico e do positivismo que desvalidava a equidade enquanto parte do direito, a ideia destas concepções era de tornar o direito com maior exatidão geométrica – ou seja, mais inflexível. Equidade é a justiça do caso particular. Não é caridade, nem misericórdia, como afirmavam os romanos – justitia dulcore misericordiae temperata (justiça doce, temperada de misericórdia). Não é, via de regra, fonte criadora do Direito, apenas sábio critério que desenvolve o espírito das normas jurídicas, projetando-o nos casos concretos (NADER, 2017, p. 114). No entanto, até hoje, no Código Civil, há várias referências à equidade, e isso a valida enquanto pertencente ao processo de integração do direito: “[...] Artigos 413, 479, 944, parágrafo único; Artigo 953, parágrafo único; Artigo 954, Artigo 928, parágrafo único. Contudo, o Artigo 140, parágrafo único, do CPC manda que o juiz decida por equidade nos casos previstos em lei” (BETIOLI, 2015, p. 502). Além disso, o autor ainda acresce: “encontramos uma interpretação do Artigo 140 do CPC na seguinte decisão: a proibição de que o juiz decida por equidade, salvo quando autorizado por lei, significa que não haverá de substituir a aplicação do direito objetivo por seus critérios pessoais de justiça” (BETIOLI, 2015, p. 502). “A equidade, entretanto, é o instrumento que fornece uma solução jurídica justa nos casos concretos de realidade”. No Direito brasileiro, a equidade está prevista no art. 8º da Consolidação das Leis do Trabalho, que determina a sua aplicação “na falta de disposições legais ou contratuais (NADER, 2017, p. 114). Ao mesmo passo que é legal, possui olhar humano e olha para os casos de forma única e singular, diferente da lei que é geral, abrangente e imutável. Obviamente, a equidade não deve ser avaliada por si só, mas deve estar com conjunto com os demais aspectos do direito. TÓPICO 4 | PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO 61 LEITURA COMPLEMENTAR O DIREITO COMO FENÔMENO SOCIAL NA VISÃO DE MARX Augusto César Ramos A análise do tema exige algumas reflexões preliminares, uma vez que se faz necessário conceituar e delimitar o campo de abrangência da Sociologia e do Direito, para somente depois relacioná-los. A dificuldade dessa empreitada avulta-se ante as várias acepções que envolvem as ciências mencionadas. Poder-se-ia dizer, sem maiores digressões, que à Sociologia cabe o estudo da sociedade. Dessa assertiva exsurge a seguinte indagação: mas o que é sociedade? Não estaria de todo errado concebê-la como uma associação de indivíduos que vivem em coletividade num espaço determinado e com peculiaridade de costumes comuns a todos. Nessa perspectiva, Aristóteles afirmou que o homem é essencialmente um animal gregário, que não encontra razão para viver e tampouco se desenvolver, se considerado isoladamente dos seus semelhantes. Em última análise, à sociologia cumpre o estudo do homem e suas instituições "tão imparcialmente quanto a biologia estuda os animais e o meio onde vivem", sem, contudo, prescindir das ciências sociais como um todo (antropologia, economia, ciência política, história e psicologia) na medida em que tem como objeto de pesquisa e estudo o "comportamento social humano e suas várias formas de organização". O conceito de Direito não é unívoco, porquanto há pensadores que ora aproximam-no da moral, ora da ética, o que requer a uma investigação, ainda que perfunctória, do que se entende por essas palavras. Aristóteles doutrinava em sua obra "A República" uma ética das virtudes, considerando-as como "funções da alma determinadas pela natureza da alma e pela divisão das suas partes. Para Adolfo Sanches Vásquez ética é uma "teoria ou ciência do comportamento moral dos homens em sociedade". Moral, por seu turno, compreende "um conjunto de normas e regras destinadas a regular as relações dos indivíduos numa comunidade social dada", o que significa dizer que se circunscreve numa determinada sociedade, subsumindo-se as suas características econômicas, sociais e religiosas. Não raro encontra-se quem sustente que "a ética como técnica de conduta à primeira vista parece mais ampla que o direito como técnica de coexistência, mas se refletirmos que toda espécie ou forma de conduta é uma forma ou uma espécie de conduta, ou vice-versa, logo veremos que a distinção dos dois campos é apenas circunstancial, com vistas a delimitar problemas particulares, grupos de problemas ou campos específicos de consideração e estudo". 62 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Juridicamente, Direito significa um conjunto de regras (ou normas de conduta) coercitivas engendradas por um Poder estatal visando à convivência harmônica entre os indivíduos de uma sociedade. Observe-se, por oportuno, que o Direito, ao lado da Sociologia e de outras ciências, ainda que sob outro enfoque, o da normatização de regras de conduta, tem como objeto de conhecimento a sociedade. Não é demais lembrar que o Direito é coercível, heterônomo e bilateral, enquanto a moral é incoercível, autônoma e unilateral, e, ainda, que não há sociedade sem direito ubi societas ibi jus, ou ainda que não há direito sem sociedade ubi jus ibi societas. Afinal, que razão haveria de impor-se "o direito na ilha do solitário Robson Crusoé antes da chegada do índio Sexta-Feira”? Nesse particular, vale transcrever os lúcidos ensinamentos de José de Aguiar Dias ao se referir a necessidade do direito para o convívio social pacífico: "Seja dom dos deuses, seja criação dos homens, o direito tem como explicação e objetivo o equilíbrio, a harmonia social. Estivesse o homem sozinho no mundo, como seu primeiro habitante ou seu último sobrevivente, e não haveria necessidade de direito, por ausência de possibilidade de interpretação e conflito de interesses, cuja repercussão na ordem social impõe a regulação jurídica, tendente à pacificação ou, pelo menos, à contenção desses conflitos". Com efeito, o Direito transcende conceitos herméticos, porquanto é mais que um conjunto de normas coercitivas de condutas; é mais que um instrumento pacificador de conflitos sociais, ou de controle social, pois, sob uma perspectiva ideológica significa também um discurso do poder. Não obstante pareça emergir cristalino o entendimento segundo o qual o direito não pode ser estudado separadamente das outras ciências, porquanto incorpora valores sociais, Hans Kelsen, eminente jurista austríaco, de formação positivista, defendeu a teoria pura doDireito sob o fundamento de que para a construção de um conhecimento consistentemente científico o Direito deve abstrair-se dos aspectos políticos, morais, econômicos e históricos. No entanto, um pensamento coerente e estruturado não admite um estudo do Direito isolado das demais ciências, de sorte que a teoria pura do Direito de Kelsen sucumbiu ante a clareza com que a palavra Direito designa um fenômeno que tem conexão com outro conjunto de fenômenos sociais que se inscrevem no contexto do exercício do poder em uma sociedade. Sob essa ótica de poder, Karl Marx elaborou uma tese em que o Direito, como regra de conduta coercitiva, encontra sua origem na ideologia da classe dominante, que é precisamente a classe burguesa. Necessário fazer-se uma ressalva a esse pensamento, uma vez que o Direito não é o efeito exclusivo da vontade da classe econômica senão a síntese de um processo dialético de conflito de interesses entre as classes sociais, que Marx denominava de luta de classes. E aí se insere a Sociologia Jurídica com o intuito de explicar as causas e os efeitos do Direito, uma vez que este se imiscui com os fenômenos sociais, construindo e organizando uma hierarquia social em que o poder é exercido de forma legítima TÓPICO 4 | PROCEDIMENTOS DE INTEGRAÇÃO 63 pela classe dominante, que é de fato quem legisla, ainda que não ilimitadamente em razão da resistência da classe operária, entendida lato sensu. Marx acreditava existir uma ingerência extraordinariamente forte do poder econômico sobre o Direito, atingindo também a cultura, a história e as relações sociais. Não estão por completo equivocados aqueles que vêm a gênese da dominação secular, laicizada, de uma classe sobre a outra, tendo como marco a Revolução Francesa de 1789, momento em que os detentores do poder econômico conquistam também o poder político do Estado, rompendo com o "ancien regime" que tanto lhes comprimia a expansão mercantil. Com a Revolução Francesa, ao lado das revoluções industriais, torna-se premente a regulação das relações sociais, surgindo então o direito comercial e mais adiante o direito do trabalho, configurando-se este num autêntico direito de classes. Assim, a dominação econômica de uns poucos sobre tantos outros se legitima por intermédio de um Estado de Direito, cujo princípio basilar é a lei. Não se pode olvidar, como lembra Marx, que o processo de dominação encontra suas raízes na origem da humanidade, haja vista que inicialmente deu-se por força do "direito escravagista; depois, feudal; finalmente burguês ou capitalista, acompanhando o desenvolvimento das forças produtivas que vão fazendo história". Marx acreditava que "as forças econômicas numa sociedade eram as principais responsáveis pelas modificações em todos os outros setores e, consequentemente, pelos rumos do curso da história", o que não significa dizer que o Direito é exclusivamente efeito da vontade da superestrutura econômica, e não a sua causa. Afinal, não se pode responder sem maiores reflexões à seguinte questão: o Direito, enfim, é causa ou efeito das relações sociais, dos fenômenos sociais, do poder econômico, da classe dominante etc.? A história responde a esta indagação, pois houve momentos em que os fenômenos sociais precederam e determinaram o Direito, quando das revoluções francesa, russa e mexicana, por exemplo. Em outros momentos da história, tal como hoje ocorre no Brasil, em que a Constituição Federal vem sendo diuturnamente vilipendiada a ponto de fazer o povo ajoelhar-se à vontade do rapinante e volátil capital alienígena, o Direito serviu como causa determinante sem a qual o capitalismo não floresceria, haja vista a necessidade de garantir-se um mínimo de estabilidade social, econômica e jurídica para a expansão de um mercado inserido na eterna e conflitante relação do capital com o trabalho. Hodiernamente, pode-se vislumbrar uma dissonância entre o fato social e o Direito, uma vez que o primeiro é dinâmico e multifacetado, e o segundo, conservador, consegue abrigar em sua "proteção" somente parte das relações sociais. Nesse sentido, urge um aperfeiçoamento do Direito frente à evolução da sociedade, se não pela via legislativa, ao menos jurisprudencial, cujas bases devem pautar-se na democracia, na solidariedade e no respeito à dignidade das pessoas. 64 UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO Consentâneo observar que o Direito é ao mesmo tempo causa e feito das relações sociais, porquanto se configura em si um fenômeno social. Desse modo, não é difícil perceber que "causa e efeito estão inextrincavelmente entrelaçados e o efeito de uma causa, num processo de mudança, torna-se, por seu turno, uma causa em mudança ulterior". Afinal, o Direito não é determinado por si próprio ou a partir de normas ou princípios superiores abstratos, mas por sua referência à sociedade como fenômeno social que produz. Por fim, mister repisar o fato de que Marx defendeu a tese segundo a qual a evolução econômica é ponto de partida para as evoluções política, jurídica, filosófica, religiosa, literária etc., mas também afirmou que a base econômica não é causa única do complexo processo de mudança social, uma vez que todas as evoluções se encontram umbilicalmente jungidas, reagindo umas sobre as outras. De fato, "a afirmação de que Marx reduziu toda a vida social à vida econômica é fundamentalmente falsa, pois ele fez exatamente o contrário: revelou que a vida econômica não é mais do que uma parte integrante da vida social e que a nossa representação do que se passa na vida econômica é falseada precisamente na medida em que não percebemos que atrás do capital, da mercadoria, do valor, dos preços, da distribuição dos bens se esconde a sociedade dos homens que nela participam", que serão a posteriori pelo direito regulados e, em certa medida, alienados. FONTE: RAMOS, Augusto Cesar. Revista Jus Navigandi, Teresina, n. 52, 1º nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2474. Acesso em: 21 jan. 2020. 65 RESUMO DO TÓPICO 4 Neste tópico, você aprendeu que: • Os processos de integração do direito são: analogia, costumes, princípios do direito e equidade. • A legislação é rígida e geral, por isso aparecem as lacunas, em que a integração entra para suprir as lacunas e complementar a legislação. • O costume é considerado tanto uma fonte do direito, como uma ferramenta do processo de integração. • As lacunas servem para proporcionar aos juristas a utilização de princípios e valores do direito de forma legal. • Os processos de integração estão previstos em lei e podem ser utilizados em determinadas situações de forma legal. Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. CHAMADA 66 AUTOATIVIDADE 1 O direito foi criado pelo homem e para o homem. Avalia cada situação de forma pontual, e muitas vezes a legislação acaba por deixar lacunas. Nesse sentido, os juristas possuem uma ferramenta chamada integração. Ela serve para preencher essas lacunas de forma eficiente, a fim de tornar o processo judicial completo. Assinale a alternativa correta que diz respeito às ferramentas do processo de integração: a) ( ) Jurisprudência – Julgamento – Doutrina – Analogia. b) ( ) Analogia – Costume – Princípios do Direito – Equidade. c) ( ) Equidade – Lei – Julgamento – Segurança. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 2 Sabe-se que a analogia faz parte das ferramentas do processo de integração. Nesse sentido, muitos juristas questionam o motivo pelo qual ela não se constitui enquanto fonte do direito, sendo que seu papel não é apenas compreender a legislação, mas estendê-la a casos não contidos na norma. Segundo Betioli (2015) a analogia não se constitui enquanto fonte por: a) ( ) Não criar normas jurídicas, tendo o papel de auxiliar e fornecer novas informações. b) ( ) É bastante recente, surgiudepois do surgimento do direito. c) ( ) Não fornecer elementos plausíveis para o julgamento dos casos. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 3 Como um dos meios de integração, a analogia é: a) ( ) Uma técnica que deve ser usada somente quando a ordem jurídica não apresenta uma norma específica para um determinado fato. b) ( ) Uma técnica que deve ser usada rotineiramente. c) ( ) Uma fonte do direito. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 4 A equidade, enquanto parte dos processos de integração do direito, é definida como: a) ( ) Aquela que leva em consideração as questões particulares de cada caso. b) ( ) Aquela que a preenche as lacunas de forma a ser mediadora e complementadora destes. c) ( ) Aquela que apresenta o olhar mais humano para as situações. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 67 5 Como parte fundamental do direito, e dos elementos de integração, os princípios do direito são valores e princípios hierarquicamente elevados – os principais. Na vida do Direito, os princípios são importantes em duas fases principais: na elaboração das leis e na aplicação do Direito, pelo preenchimento das lacunas da lei. Entretanto, o princípio pode expressar: a) ( ) Uma lei e uma doutrina. b) ( ) Um dado axiológico e uma investigação. c) ( ) Um valor e um limite objetivo. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 68 69 UNIDADE 2 A NORMA JURÍDICA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • reconhecer os componentes da norma jurídica; • avaliar as potencialidades da norma jurídica enquanto componente do direito; • dominar os aspectos em geral da norma jurídica; • conhecer, de forma específica, a estruturação da norma jurídica. Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade você encontrará auto atividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA TÓPICO 2 – CARACTERÍSTICAS E CLASSIFICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA TÓPICO 3 – PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA TÓPICO 4 – SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 70 71 TÓPICO 1 ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Norma Jurídica: conjunto de normas do direito, que prevê e regulamenta a conduta dos indivíduos. Baseada na sociedade, e criada a fim de facilitar na aplicação das sanções, ela possui grande relevância jurídica, no sentido de fornecer subsídios e padronizar elementos necessários. Desta forma, compreende-se de maneira breve a relevância da norma jurídica para o direito de modo geral, visto que seu papel é assegurar o conjunto de normas da ciência jurídica, assim como, o papel de obedecer a sua complexa estrutura. Uma de suas atribuições é o fato de deixar padronizadas e regulamentadas as regras jurídicas, facilitando sua aplicação nos casos cotidianos. Entretanto, faz-se necessária a compreensão da norma jurídica como um todo: desde a sua estruturação, aplicação, até seus fundamentos. Seu papel na ciência jurídica e a de assegurar as normas do direito, mantendo assim, as características normativas, que faz parte da construção do direito enquanto ciência e profissão. Contudo, neste tópico abrandaremos acerca de sua estrutura, que é composta por várias características extremamente importantes para a prática jurídica. 2 A ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA A norma jurídica, sendo um conjunto de normas do direito, faz parte do ordenamento jurídico. Desta forma, “O direito, como conjunto de normas, adquire, assim, o acabamento racional de um programa formal de ação: se está na constituição ou foi estabelecido por lei, é um conteúdo jurídico” (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 84). Ela postula as regras jurídicas, deixando-as de maneira formal e regularizadas. “A norma jurídica é, antes do mais, um modelo, uma fórmula ou uma regra de comportamento humano que se manifesta por sinais exteriores, que se impõe com carácter obrigatório, uma vez que o seu respeito pode ser exigido UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA 72 pela força democrática e organizada do Estado nos termos da Constituição” (LOURENÇO, 2017, p. 68). É relevante lembrar que “o conteúdo da norma é um pensamento, uma proposição (proposição jurídica), mas uma proposição de natureza prática, isto é, uma orientação para a ação humana; a norma é, portanto, uma regra, conforme a qual nós devemos guiar” (BAGNOLI; BARBOSA; OLIVEIRA, 2014, p. 60). A norma jurídica, portanto, faz parte da construção teórica da ciência jurídica. Reale (2002, p. 96) coloca: “Pensamos que o conceito de normas que acabamos de dar abrange todos os tipos de regras jurídicas, sem esvaziá-la de sua referibilidade ao seu possível conteúdo (a conduta humana e os processos de organização social) e sem reduzi-la a mero enlace lógico”. Entretanto, pode-se dizer que “a norma é produto do intelecto do intérprete e a norma só se constrói se for tomado o seu sentido dentro do contexto do sistema no qual está inserida” (CALGARO, 2013, p. 15). O conceito de norma aparece, hoje, mais do que nunca, como uma noção integradora, capaz de determinar o objeto e o âmbito da Ciência do Direito. Na verdade, porém, nas formas e no modo pelo qual é tratada pela Dogmática Jurídica, percebemos que o conceito representa, no mais das vezes, um ponto crítico a partir do qual se põe à mostra as limitações do pensamento científico-jurídico (BAGNOLI; BARBOSA; OLIVEIRA, 2014, p. 59). Desta forma, a norma jurídica, composta por uma estrutura jurídica que lhe fornece subsídios, possui o papel de manter as características normativas. A norma jurídica, da qual fala o jurista, é, portanto, verdadeira construção teórica da própria ciência jurídica, em que os diferentes mecanismos estabilizadores manifestam, idealmente, uma congruência consistente (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 85). Contudo, “Kelsen fixou o axioma de que a norma jurídica apresenta um caráter hipotético condicional, em que a transgressão de uma hipótese de uma conduta prevista no enunciado da norma, se descumprido, leva à aplicação de uma sanção” (CALGARO, 2013, p. 9). Enquanto parte da construção teórica da ciência jurídica, a normativa jurídica apresenta sua relevância e autoridade, ao fornecer aos juristas a ferramenta legislativa de atuação, a fim de apresentá-los uma ciência com embasamento técnico e ético, com a possibilidade de alcançar os variados tipos de casos em que necessitam ser avaliados. “A norma jurídica será o lugar da valoração da conduta, que conduzirá obrigatoriamente a um ordenamento dela, consequentemente denominado “positivismo jurídico” ou sistema normativo” (LOURENÇO, 2017, p. 60). Contudo, a norma apresenta consigo a regra do que deve ser feito, como postula Reale (2002, p. 95): TÓPICO 1 | ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA 73 Afirmamos que uma norma jurídica enuncia um “dever ser” porque nenhuma regra descreve algo que é, mesmo quando, para facilidade de expressão, empregamos o verbo ser. É certo que a Constituição declara que o Brasil é uma República Federativa, mas é evidente que a República não é algo que esteja aí, diante de nós, como uma árvore ou uma placa de bronze. Com a finalidade de disciplinar condutas do ser humano, as normas jurídicas são caracterizadas por serem bilaterais, sendo que ela prevê o acontecimento e, caso ele ocorra, será produzido um efeito jurídico. “As normas jurídicas de conduta, ou seja, aquelas cujo objetivo imediato é disciplinar o comportamento dos indivíduos ou grupos sociais e que são a maioria, assumem a estrutura de um ‘juízo hipotético’” (BETIOLI, 2015, p. 204), ou seja, a consequência dependerá da validação da hipótese colocada pela norma. As normas jurídicas postulam o “dever ser” de forma em que as regras colocadas facilitam o controle da conduta social, de forma a pensar na penalizaçãocaso o dever ser não seja executado como previsto. Por exemplo, se alguém cometer o crime de furto, terá a sanção previamente elaborada, a fim de que seja aplicada a medida referente a conduta estabelecida. Isso oferece organicidade, praticidade e clareza na ciência do direito enquanto legislação. A construção das estruturas lógicas da norma passa pela constatação de uma implicação dual entre proposições do dever/ser, em que a proposição implicante, antecedente, vazada numa hipótese, desempenha função de descritor de uma conduta de possível ocorrência, enquanto a proposição implicada, consequente, vazada numa tese, desempenha função de prescritora de condutas intersubjetivas, modalizadas nas formas ‘proibido’, ‘permitido’ e ‘obrigatório’ (CALGARO, 2013, p.13). Sendo aplicável nas diversas relações jurídicas, a norma é vista com extrema importância pelos juristas. Pode-se dizer que ela se coloca de forma imperativa, a fim de impor um determinado tipo de comportamento a ser avaliado. Como coloca Reale (2002, p. 93): Sendo a norma um elemento constitutivo do Direito, como a célula do organismo jurídico, é natural que nela se encontrem as mesmas características já apontadas, quando do estudo daquele, a saber, a sua natureza objetiva ou heterônoma e a exigibilidade ou obrigatoriedade daquilo que ela enuncia. Dizemos que a norma jurídica é uma estrutura proposicional porque o seu conteúdo pode ser enunciado mediante uma ou mais proposições entre si correlacionadas, sendo certo que o significado pleno de uma regra jurídica só é dado pela integração lógico-complementar das proposições que nela se contém (REALE, 2002, p. 93). Kelsen, autor da Teoria Pura do Direito, a estrutura da norma jurídica possui duas partes: a norma secundária e a norma primária. Segundo ele, a norma secundária diz respeito ao fato de não ter sido cumprido tal dever, é sancionado. Já a norma primária é acerca de fatos temporais – a longo prazo. Avalie o quadro a seguir. UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA 74 QUADRO 1 – ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA Estrutura da Norma Jurídica Norma Secundária Norma Primária a) Norma secundária: “Dado a não prestação, deve ser aplicada a sanção” Exemplo: o pai que não prestou assistência moral ou material ao filho menor de idade deve ser submetido a uma penalidade. b) Norma primária: “Dado um fato temporal deve ser feita a prestação. Exemplo: o pai que possui filho menor de idade, deve prestar-lhe assistência moral e material. FONTE: Adaptado de Nader, 2017, p. 84 Hans Kelsen distinguiu, ainda, o conceito de proposição normativa de norma jurídica. A primeira é um juízo hipotético o qual enuncia que, “sob certas condições ou pressupostos fixados por esse ordenamento, devem intervir certas consequências pelo mesmo ordenamento determinadas”. Em outras palavras, a proposição jurídica é a linguagem que descreve a norma jurídica. Esta não foi considerada juízo lógico, conforme alguns autores apontam, mas um mandamento ou imperativo: “As normas jurídicas, por seu lado, não são juízos, isto é, enunciados sobre um objeto dado ao conhecimento. Elas são antes, de acordo com o seu sentido, mandamentos e, como tais, comandos, imperativos” (NADER, 2017, p. 84). Tais elementos constituem a estrutura da norma jurídica, de modo em que acaba por envolver várias características da norma, podendo não ser compatíveis uma com a outra. Ferraz Junior (2019, p. 77) coloca: “Na verdade, as estruturas sociais em geral manifestam mais normas que a sociedade pode suportar. A expectativa normativa de A pode contrapor-se a expectativa normativa de B (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 77). Nader (2017) traz que a visão atual acerca da estrutura das normas tem como base Immanuel Kant. Para o filósofo alemão, o imperativo categórico, próprio dos preceitos morais, obriga de maneira incondicional, pois a conduta é sempre necessária. Exemplo: deves honrar a teus pais. O imperativo hipotético, relativo às normas jurídicas, técnicas, políticas, impõe-se de acordo com as condições especificadas na própria norma, como meio para alcançar alguma outra coisa que se pretende. Exemplo: se um pai deseja emancipar o filho, deve assinar uma escritura pública (NADER, 2017, p. 83, grifo nosso). Para fins de compreensão, a norma jurídica possui algumas subdivisões. No entanto, apresenta uma estrutura única, na qual a sanção possui o papel de TÓPICO 1 | ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA 75 integradora. “Como decorrência lógica, o esquema possui o seguinte enunciado: “Se A é, B deve ser, sob pena de S”, em que “A” corresponde à situação de fato, “B” é a conduta exigida e “S” a sanção aplicável, na eventualidade do não cumprimento de “B” (NADER, 2017, p. 85). Avalie o quadro a seguir: QUADRO 2 – ESQUEMA DAS NORMAS FONTE: NADER, 2017, p. 85 Considerando as classificações gerais da normativa jurídica, apresenta-se ainda alguns adjetivos que fazem parte da estrutura, a fim de classificá-las de forma clara e objetiva, discriminando umas das outras: “bilateralidade, generalidade, abstratividade, imperatividade, coercibilidade” (NADER, 2017, p. 86). Observe o quadro a seguir. QUADRO 3 – CARACTERES DA NORMA JURÍDICA CARACTERES DA ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA SEGUNDO NADER BILATERALIDADE O Direito existe sempre vinculando duas ou mais pessoas, atribuindo poder a uma parte e impondo dever à outra. Bilateralidade significa que a norma jurídica possui dois lados: um representado pelo direito subjetivo e outro pelo dever jurídico, de tal sorte que um não pode existir sem o outro. GENERALIDADE O princípio da generalidade revela que a norma jurídica é preceito de ordem geral, obrigatório a todos que se acham em igual situação jurídica. A importância dessa característica levou o jurisconsulto Papiniano a incluí-la na definição da lei: Lex est generale praeceptum. Da generalidade da norma jurídica deduzimos o princípio da isonomia da lei, segundo o qual todos são iguais perante a lei. UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA 76 ABSTRATIVIDADE Visando a atingir o maior número possível de situações, a norma jurídica é abstrata, regulando os casos dentro do seu denominador comum, ou seja, como ocorrem via de regra. Se o método legislativo pretendesse abandonar a abstratividade em favor da casuística, para alcançar os fatos como ocorrem singularmente, com todas as suas variações e matizes, além de se produzirem leis e códigos muito mais extensos, o legislador não lograria o seu objetivo, pois a vida social é mais rica do que a imaginação do homem e cria sempre acontecimentos novos e de formas imprevisíveis. IMPERATIVIDADE Na sua missão de disciplinar as maneiras de agir em sociedade, o Direito deve representar o mínimo de exigências, de determinações necessárias. Para garantir efetivamente a ordem social, o Direito se manifesta através de normas que possuem caráter imperativo. Se não fosse assim, o Direito não lograria estabelecer segurança, nem justiça. A norma não imperativa não pode ser jurídica. COERCIBILIDADE E A QUESTÃO DA ESSÊNCIA DA NORMA JURÍDICA Coercibilidade quer dizer possibilidade de uso da coação. Esta possui dois elementos: psicológico e material. O primeiro exerce a intimidação, através das penalidades previstas para a hipótese de violação das normas jurídicas. O elemento material é a força propriamente, que é acionada quando o destinatário da regra não a cumpre espontaneamente. FONTE: Adaptado de Nader, 2017, p. 87 Portanto, a bilateralidade, generalidade, abstratividade, imperatividade, coercibilidade fazem parte da estrutura da norma jurídica. Gusmão (2018) contribui com os conceitos. Bilateralidade A norma jurídica desempenha várias funções, que não devem ser confundidas com as finalidades ideais da norma (justiça, segurança etc.), e com os seus fins históricos, estes, na dependência de interesses ou de exigências sociais etc., mas que são funções a ela inerentes, motivo por que, como dissemos em nossa Filosofia do Direito(1994), são funções formais do direito (GUSMÃO, 2018, p. 81). Generalidade e abstração da norma A norma jurídica é geral e abstrata por não regular caso singular e por estabelecer modelo aplicável a vários casos, enquadráveis no tipo nela previsto. Pode-se dizer, com Bobbio (Studiper una Teoria Generale del Diritto), desde que se queira distinguir “abstração” de TÓPICO 1 | ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA 77 “generalidade”, que a norma é geral quando tem por destinatários várias pessoas, e abstrata quando prescreve ação ou ato típico. A generalidade, característica da norma jurídica, reconhecida a partir dos romanos, permite alcançar indeterminado número de ações, de atos e de pessoas. Resulta da aplicação do processo lógico de abstração pelo qual são abstraídas as circunstâncias, os detalhes, as particularidades de ações e atos, isto é, como eles ocorrem na vida real, para regular- lhes naquilo que lhes for essencial (GUSMÃO, 2018, p. 82). Imperatividade A norma jurídica é imperativa, não só quando comanda, impõe ou proíbe uma conduta, como, também, quando impõe ou estabelece forma de organização de ente jurídico, uma situação jurídica etc. O porquê da imperatividade e da obrigatoriedade do direito depende do fundamento que se lhe dê. Apesar da divergência de opiniões (Cap. XXXVI), há um modo de entendê-las admitido por todos os juristas: imposição imperativa de uma ordem jurídica como garantia de haver paz social. No entanto, apesar disso, não impede que ela seja transgredida. Daí a coercibilidade da norma jurídica, que veremos a seguir (GUSMÃO, 2018, p. 84). Coercibilidade A norma jurídica é executável coercitivamente. Há quem diga ser ela coativa. Como, porém, ela caracteriza-se pela possibilidade jurídica de coação, é preferível considerá-la coercitiva. Assim, ao contrário das demais normas sociais, a jurídica se caracteriza pela coercibilidade: se inobservada, a sanção é imposta pelo Estado (direito estatal) ou por uma organização internacional (direito internacional). Coação de duas espécies: psicológica e material. Esta, pouco usada, ou melhor, exercida razoavelmente; o número de condenados no cível ou no crime é muito menor em relação ao dos que respeitam o direito. Isso porque a coação psicológica, geradora do temor à sanção, bem como a educação familiar e escolar, fazem com que a maioria se conduza dentro da lei (GUSMÃO, 2018, p. 85). Tanto Nader quanto Gusmão apresentam aspectos coerentes e válidos acerca da estrutura da norma jurídica, diante disso, percebe-se a complexidade da estrutura de tal normativa ao possuir tantos elementos significativos e elucidados, que devem ser levados em conta pelo jurista. Ao avaliar tais características, ela torna-se completa e considerada relevante enquanto pertencente ao direito. Temos, agora, condições de examinar a norma jurídica em sua complexidade estrutural. Falamos, em síntese, de expectativas contrafáticas, que se expressam por meio de proposições de dever-ser (deve, é obrigatório, é proibido, é permitido, é facultado), estabelecendo-se entre os comunicadores sociais relações complementares institucionalizadas em alto grau (relação metacomplementar de autoridade/sujeito), cujos conteúdos têm sentido generalizável, conforme núcleos significativos mais ou menos abstratos (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 84). UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA 78 Ferraz Junior (2019) apresenta que a norma, quanto a sua estrutura, divide-se em autônomas e dependentes. As autônomas apresentam, por si só, um sentido completo. Já as dependentes ligam-se a outras normas, pois se reporta as outras que disciplinam a sanção em caso de violação de algum direito. É importante ressaltar que a norma é baseada em fatos sociais, criada diante da conduta humana. Kelsen (1985) postula que as normas autônomas são aquelas que prescreve sanção a uma conduta prevista, já a dependente, é a norma que prevê um comportamento sem prescrever determinada sanção, dependendo assim, de alguma norma sancionadora. No Século XVII, Pufendorf, por exemplo, distinguia as normas jurídicas (direito natural) das normas morais, por se referirem as primeiras ao sentido e à finalidade das ações humanas desta vida, enquanto as segundas eram referentes às ações da outra vida, tomando-se por critério a distinção das ações em internas e externas, assumindo, pois, que o que permanecia guardado no coração humano e não se manifestava exteriormente deveria pertencer ao âmbito moral. Não obstante a dificuldade de um critério universal, sem, portanto, perder de vista o fato de que, historicamente, não reconhecem o caráter jurídico de suas normas pelo mesmo critério, vamos buscar na forma de um postulado teórico um ângulo de abordagem suficientemente genérico, capaz de dar conta do problema, tendo em vista a norma como comunicação. FONTE: FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 77 INTERESSANTE Lembra-se, portanto, que “O que efetivamente caracteriza uma norma jurídica, de qualquer espécie, é o fato de ser uma estrutura proposicional enunciativa de uma forma de organização ou de conduta, que deve ser seguida de maneira objetiva e obrigatória” (REALE, 2002, p. 95). “Assim, toda norma de conduta se desdobra em duas outras que se conjugam e se complementam. Há, com outras palavras, a conjugação de duas proposições hipotéticas que se integram numa só; e também há em ambas a articulação lógica de dois elementos, ou seja, uma hipótese e uma consequência” (BETIOLI, 2015, p. 205). Como falado anteriormente, algumas normas são autônomas e outras são dependentes, sendo que as dependentes necessitam de outras normas para serem complementadas e as autônomas atuam de forma independente, não dependendo de outras normas para existirem e nem para serem colocadas em prática. “A estrutura hierárquica do sistema jurídico pode representar-se de forma TÓPICO 1 | ESTRUTURA DA NORMA JURÍDICA 79 esquemática, partindo da norma fundamental e representando-a num escalão superior do direito positivo, para não dizer no topo da pirâmide conhecida por pirâmide de Kelsen” (LOURENÇO, 2017, p. 68). Kelsen apresenta uma concepção do direito, colocando-o enquanto norma e apenas isto. Contudo, essa ideia tem relação com o entendimento da regra jurídica como uma simples sacada lógica de relacionar a hipótese com a ação (REALE, 2002). Já Ferraz Junior (2019, p. 79) traz que “A norma, em seu cometimento, instaura uma relação de autoridade, exigindo, pois, a desconfirmação da desconfirmação”. “A norma jurídica fundamental para a doutrina impõe-se na lógica e estrutura do pensamento jurídico e no fim do ordenamento, ao mesmo tempo que exige o desenvolvimento do princípio e do direito que a norma fundamental encerra, impondo-se mesmo ao legislador que a deve desenvolver” (LOURENÇO, 2017, p. 67). Não obstante a existência de algumas controvérsias a respeito do tema, grande parte dos estudiosos da teoria normativa do Direito continua a defender a posição clássica segundo a qual a norma jurídica possui sempre uma estrutura externa e uma estrutura interna, além de um conteúdo próprio e particular. A estrutura externa, segundo esta ótica, corresponde exatamente ao denominado “revestimento” da norma jurídica, que pode ser em forma de lei (norma jurídica escrita que tem origem na autoridade) ou de costume (norma jurídica não escrita que surge de forma difusa na sociedade). A estrutura interna, por seu turno, encontra-se intimamente associada, por partes, à denominada endonorma (ou seja, o preceito do dispositivo normativo ou, em outras palavras, o interesse protegido e, portanto, exatamente aquilo que a norma contém) e à convencionalmente chamada perinorma (descrição do injusto – ilícito – e a consequente sanção a ser aplicada) (FRIEDE, 2015, p. 99). INTERESSANTE Portanto, toda a estrutura externa já foi explicitada. Tem-se, ainda, a estrutura interna da norma jurídica, conhecida como endonorma e perinorma. Endonorma é aquela que enuncia um dever, impondo, assim, umaconduta. Já a Perinorma prevê uma sanção penal. Friede (2015) coloca a existência de quatro diferentes posições fundamentais a respeito da estrutura da norma jurídica, que devem ser avaliados: • A solução tradicional da unitariedade da norma jurídica, equivalendo a sanção à prestação. amand Destacar amand Destacar UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA 80 • A solução de Kelsen, na qual a norma jurídica constitui juízo hipotético, desmembrado em norma primária e secundária. • A solução de Maynez, para a qual a norma jurídica envolve duas normas paralelas, atributiva e perceptiva, cada qual com seus conceitos lógico-jurídicos e respectivos correlatos ontológico-jurídicos. • E, finalmente, a solução de Cossio, que parcialmente nos filiamos, em perfeita consonância, com o pensamento jurídico contemporâneo, e para quem a norma jurídica constitui juízo disjuntivo, abrangendo a perinorma e a endonorma. Contudo, pode-se compreender a magnitude da norma jurídica enquanto ferramenta legislativa, e enquanto estrutura interna e externa. Por fim, se faz necessária a compreensão dos componentes da norma, os quais são: um operador normativo, a descrição de ação/argumento e a condição da ação. “O operador determina o caráter normativo: norma obrigatória ou proibitiva ou permissiva; a descrição da ação constitui o conteúdo da norma; e a condição da ação é a sua condição de aplicação” (BAGNOLI; BARBOSA; OLIVEIRA, 2014, p. 74). “A norma de direito transforma-se em proposição jurídica, a qual, por sua vez, concede a forma estrutural da lei, e que vai tutelar e vincular a condição ou consequência jurídica. Tal como o afecto é atribuído à causa da norma moral, também a consequência jurídica é imputada à condição de norma jurídica” (LOURENÇO, 2017, p. 62). Com suas particularidades, características e relevância no âmbito jurídico, a norma jurídica em sua estrutura possui componentes essenciais para o bom funcionamento. Desta maneira, é essencial a sua compreensão, seja ela moral, jurídica, técnica etc. Em cada espaço ela possui suas atribuições e relevância. amand Destacar 81 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você aprendeu que: • A norma jurídica é um conjunto de normas do direito. • Na estrutura interna da norma, têm-se a endonorma e a perinorma, sendo que a primeira enuncia um dever, e a segunda propõe a sansão. • Algumas normas são autônomas e outras são dependentes, sendo que as dependentes necessitam de outras normas para serem complementadas. • Considerando as classificações gerais da normativa jurídica, apresenta-se ainda alguns caracteres que fazem parte da estrutura: bilateralidade, generalidade, abstratividade, imperatividade, coercibilidade. • A norma jurídica, da qual fala o jurista, é a verdadeira construção teórica da própria ciência jurídica 82 AUTOATIVIDADE 1 Com a finalidade de disciplinar condutas do ser humano, as normas jurídicas são caracterizadas por serem bilaterais, sendo que ela prevê o acontecimento e, caso ele ocorra, será produzido um efeito jurídico. Para Betioli (2015, p. 2014), o objetivo das normas jurídicas é o de: a) ( ) Padronizar o comportamento dos indivíduos ou grupos sociais. b) ( ) Prever o comportamento dos indivíduos ou grupos sociais de forma exclusiva. c) ( ) Disciplinar o comportamento dos indivíduos ou grupos sociais. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 2 Acerca das normas jurídicas, o que efetivamente a caracteriza é o fato de: a) ( ) Ser uma estrutura proposicional enunciativa de uma forma de organização ou conduta que deve ser seguida de forma objetiva e obrigatória. b) ( ) Ser uma lei com o intuito de organização de conduta que deve ser seguida de forma objetiva e obrigatória. c) ( ) Ser uma norma proposicional enunciativa de uma forma de organização ou conduta que não deve ser seguida de forma objetiva e obrigatória. d ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 3 Considerando os conceitos abordados, assinale a alternativa que apresenta a definição de norma jurídica: a) ( ) Uma fonte do direito. b) ( ) Um consenso entre juristas. c) ( ) Um conjunto de normas do direito. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 83 TÓPICO 2 CARACTERÍSTICAS E CLASSIFICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Você já deve ter estudado ou lido algum material acerca da norma jurídica, não é mesmo? No entanto, caso você não tenha feito isso ainda, tenha calma! Neste tópico estudaremos as características e a classificação da norma jurídica, a fim de que você tenha uma ampla compreensão deste conteúdo. Sendo um conjunto de normas do direito, é extremamente importante o entendimento deste conteúdo a fim de compreender os conteúdos posteriores. A norma jurídica é dividida em características e classificações a fim de compreendermos a sua estrutura e funcionalidade, assim, cada elemento que faz parte da norma é estudado e avaliado, a fim de que seja aplicado da forma correta de acordo com a ciência jurídica. Há a estrutura interna e externa, e dentre as classificações, temos várias subdivisões – as quais você terá acesso neste tópico. Cada classificação corresponde a um tipo de norma específica, a qual possui determinada atribuição. As normas jurídicas como um todo possuem um papel essencial na ciência do direito, principalmente quando se fala em modificações sociais e em alcançar todas as demandas que chegam ao judiciário. Por isso, estude com calma e absorva todo o conhecimento. Bons estudos! 2 CARACTERÍSTICAS E CLASSIFICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA Entendendo a norma jurídica enquanto um conjunto de normas do direito, se faz relevante compreender suas características e classificações a fim de conhecê-la de forma profunda e eficiente. “A norma jurídica, da qual fala o jurista, é, portanto, verdadeira construção teórica da própria ciência jurídica, em que os diferentes mecanismos estabilizadores manifestam, idealmente, uma congruência consistente” (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 85). UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA 84 Diferentes elementos fazem parte da norma jurídica, que nem sempre possuem conectividades entre si, como coloca Ferraz Junior (2019, p. 85): Expectativas contrafáticas, institucionalizações, núcleos significativos podem estar contidos em uma norma, de forma a se contradizerem mutuamente. Por exemplo, numa norma de trânsito, a expectativa contrafática de que, diante do semáforo vermelho, deve-se parar, pode estar em contraposição com a institucionalização, conforme a qual, numa rua sem movimento, o motorista do carro de trás supõe o consenso geral de que, nessa condição, deve-se ir adiante: ele buzina e irrita-se. Desta forma, é fato que “o conteúdo da norma jurídica, como já visto, é a conduta humana e os processos de organização social. Daí a existência de dois tipos primordiais da norma jurídica: de organização e de conduta” (BETIOLI, 2015, p. 213). Avalie o esquema a seguir: FIGURA 1 – NORMA JURÍDICA FONTE: Friede (2015, p. 100) A norma possui uma estrutura interna e externa. Na estrutura externa se tem a lei e o costume. Já na interna estão colocados a endonorma e a perinorma – que foi estudado no tópico anterior. Esta é a estrutura principal da norma jurídica. Se levarmos em conta, na pesquisa dos caracteres das normas jurídicas, todas as categorias de regras existentes, forçosamente chegaremos a seguinte conclusão: “o que efetivamente caracteriza uma norma jurídica, de qualquer espécie, é o fato de ser uma estrutura proposicional enunciativa de uma forma de organização ou de conduta, que deve ser seguida de maneira objetiva e obrigatória”. Isto porque há regras jurídicas de natureza tão peculiar, que escapariam a quase todos os critérios lógicos de enquadramento (NADER, 2019, p. 82). TÓPICO 2 | CARACTERÍSTICAS E CLASSIFICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA 85 Portanto, a norma carrega consigo a característica da organização, como coloca Reale (2002, p. 93) “já nos é dado inferir das lições anteriores que a Ciência doDireito tem por objeto a experiência social na medida em que esta é disciplinada por certos esquemas ou modelos de organização e de conduta que denominamos normas ou regras jurídicas”. Desta forma, Nader (2019) coloca os critérios de classificação da norma jurídica diante de sua eficácia. Para o autor, “classificar implica uma arte que deve ser desenvolvida com espírito prático, pois a sua validade se revela à medida que traduz uma utilidade teórica ou prática” (NADER, 2019, p. 85). Os critérios da classificação são: a) quanto ao sistema a que pertencem; b) quanto à fonte; c) quanto aos diversos âmbitos de validez; d) quanto à hierarquia; e) quanto à sanção; f) quanto à qualidade; g) quanto às relações de complementação; h) quanto às relações com a vontade dos particulares. Contudo, Friede (2015) complementa a colocação de Nader apresentando as classificações que se destacam: normas jurídicas sanção, aplicação, obrigatoriedade, aplicação territorial, pessoal, sistema jurídico, à fonte, ao âmbito material de aplicação, à situação que estabelecem, ao âmbito formal de aplicação, ao tempo de duração e ao seu conteúdo. Avalie o quadro a seguir: QUADRO 4 – CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICAS CONFORME FRIEDE (2015) NORMAS JURÍDICAS QUANTO À SANÇÃO Normas jurídicas mais que perfeitas Quando há infração ao preceito, o ato jurídico é desfeito, adicionado à aplicação da sanção correspondente (hipótese de casamento com ocultação de impedimento: o ato jurídico é desfeito, além de também ser aplicada punição ao infrator). Normas jurídicas perfeitas Quando o ato jurídico é desfeito, porém não há aplicação de sanção (hipótese de indivíduo menor de idade que vende seu bem sem autorização judicial ou sem preenchimento dos requisitos legais). Normas jurídicas menos que perfeitas Quando o ato jurídico é mantido, mas há efetiva aplicação de sanção (hipótese de mulher viúva que se casa antes do prazo determinado em lei). Normas jurídicas imperfeitas (obrigação natural) Quando o ato jurídico é mantido e não há aplicação de sanção (hipótese de dívida de jogo ou dívida prescrita) (FRIEDE, 2015, p. 101). UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA 86 NORMAS JURÍDICAS QUANTO À APLICAÇÃO Normas jurídicas rígidas Quando as normas não permitem outra interpretação ou aplicação (verba legis = mens legis). Normas jurídicas elásticas Quando há a possibilidade de examinar características da norma jurídica, existindo, por consequência, várias e diferentes interpretações ou aplicações (verba legis + complementação = mens legis). NORMAS JURÍDICAS QUANTO À OBRIGATORIEDADE Normas jurídicas imperativas Quando há efetiva obrigação positiva (como a prestação do serviço militar) ou efetiva obrigação negativa (proibitiva). Normas jurídicas permissivas Quando não há propriamente obrigação e, sim, possibilidade de escolha (como a livre opção pelo regime de casamento) ou ampla liberdade de realizar o direito consignado da normatividade (FRIEDE, 2015, p. 101). NORMAS JURÍDICAS QUANTO À APLICAÇÃO TERRITORIAL Normas jurídicas comuns Quando as normas atingem todo o território nacional. Normas jurídicas locais Quando as normas se restringem ao território do estado-membro, do Distrito Federal ou de município. NORMAS JURÍDICAS QUANTO À APLICAÇÃO PESSOAL Normas jurídicas gerais ou genéricas Quando as normas abrangem um grupo determinado de pessoas (Código de Defesa do Consumidor). Normas jurídicas especiais Quando as normas abrangem um grupo determinado de pessoas (Código de Defesa do Consumidor). NORMAS JURÍDICAS QUANTO AO SISTEMA JURÍDICO Normas jurídicas nacionais Quando as normas vigoram no Brasil. Normas jurídicas estrangeiras Quando as normas não vigoram no Brasil. NORMAS JURÍDICAS QUANTO À FONTE Normas jurídicas escritas (legais). Normas jurídicas não escritas (costumeiras). NORMAS JURÍDICAS QUANTO AO ÂMBITO MATERIAL DE APLICAÇÃO Normas jurídicas de Direito Público. Normas jurídicas de Direito Privado. TÓPICO 2 | CARACTERÍSTICAS E CLASSIFICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA 87 NORMAS JURÍDICAS QUANTO À SITUAÇÃO QUE ESTABELECEM Normas jurídicas que impõem deveres. Normas jurídicas que impõem efeitos. Normas jurídicas declaratórias ou definidoras de situações jurídicas. Normas jurídicas interpretativas (quando objetivam interpretar outra lei). Normas jurídicas supletivas (quando vigoram no silêncio da parte ou suprem a vontade das partes quando não expressa). NORMAS JURÍDICAS QUANTO AO ÂMBITO FORMAL DE APLICAÇÃO Normas jurídicas de conduta ou primárias (normas substantivas). Normas jurídicas processuais ou secundárias (normas adjetivas). NORMAS JURÍDICAS QUANTO AO TEMPO DE DURAÇÃO Normas jurídicas permanentes Quando possuem prazo indeterminado de vigência. Normas jurídicas temporárias (ou transitórias) Quando possuem prazo determinado e estabelecem na própria normatividade ou quando, por natureza, possuem vigência temporalmente restrita (lei orçamentária). NORMAS JURÍDICAS QUANTO À APLICABILIDADE DE SEU CONTEÚDO Normas jurídicas autoaplicáveis. Normas jurídicas pendentes de regulamentação. FONTE: Adaptado de FRIEDE, 2015, p. 100 Diante de tais classificações da norma jurídica, percebe-se sua relevância e especificidade. Nader (2019, p. 89) apresenta que: “O estudo sobre a norma jurídica não estará completo se não for acompanhado da abordagem dos atributos de vigência, efetividade, eficácia e legitimidade. Em torno da matéria há muita controvérsia, a começar pela própria terminologia, notadamente em relação ao termo eficácia”. Gusmão (2018) apresenta a classificação das normas jurídicas de uma outra forma, que pode possuir a mesma validade da conceituação feita por Friede (2015). Segundo Gusmão (2018), esta classificação pode ser estabelecida diante do seu conteúdo, pela sua imperatividade, natureza da sanção e em sua forma. UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA 88 QUADRO 5 – CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICAS CONFORME GUSMÃO (2018) DA EXTENSÃO ESPACIAL DE SUA VALIDADE Regra de direito comum (§ 57). Direito particular (§ 57). DA AMPLITUDE DE SEU CONTEÚDO Regra de direito geral (§ 58). Direito especial (§ 58). Direito de exceção. FORÇA DE SEU CONTEÚDO Lei ou norma constitucional (§ 63). Lei ou norma ordinária (§ 63). APLICABILIDADE IMEDIATA DO CONTEÚDO Lei autoaplicável (§ 64). Lei regulamentável (§ 64). INTERESSE QUE TUTELA Regra de direito público (§§ 88 e 97). Direito privado (§§ 89 e 119). Direito misto. Pelo grau de imperatividade COM RELAÇÃO AO PARTICULAR Norma taxativa (§ 61). Norma dispositiva (§ 61). COM RELAÇÃO AO PODER PÚBLICO Norma rígida (§ 65). Norma elástica (§ 65). Norma de direito privado. Lei fiscal (multa, correção monetária do débito fiscal). Norma disciplinar (§§ 107 e 116). Norma ou lei perfeita (§ 54). Norma ou lei imperfeita (§ 54). Norma ou lei menos-que-perfeita (§ 54). Norma ou lei mais que perfeita (§ 54). AS NORMAS AINDA PODEM SER: Escritas (lei, tratado, regulamento etc.). Não escritas (costume, princípios gerais do direito). FONTE: Adaptado de Gusmão, 2018, p. 90 Tais classes indicam a funcionalidade da norma jurídica enquanto prática e adaptabilidade nos casos em que precisam ser aplicadas. Nader (2019) ainda classifica a vigência, efetividade, eficácia e legitimidade: Vigência: para que a norma disciplinadora do convívio social ingresse no mundo jurídico e nele produza efeitos, indispensável é que apresente validade formal, isto é, que possua vigência. Significa que a norma social preenche os requisitos técnico-formais e imperativamente se impõe aos destinatários. TÓPICO 2 | CARACTERÍSTICAS E CLASSIFICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA 89 Efetividade: este atributo consiste no fato de a norma jurídica ser observada tanto por seus destinatários quanto pelos aplicadores do Direito. No dizer de Luís Roberto Barroso (1993), a efetividade [...] simboliza a aproximação, tão íntima quanto possível, entre o dever ser normativo e o ser da realidade social. Eficácia: as normas jurídicas não são geradaspor acaso, mas visando a alcançar certos resultados sociais. Como processo de adaptação social que é, o Direito se apresenta como fórmula capaz de resolver problemas de convivência e de organização da sociedade. O atributo eficácia significa que a norma jurídica produz, realmente, os efeitos sociais planejados. Para que a eficácia se manifeste, indispensável é que seja observada socialmente. Eficácia pressupõe, destarte, efetividade. Legitimidade: inúmeros são os questionamentos envolvendo o atributo legitimidade. O seu estudo mais aprofundado se localiza na esfera da Filosofia do Direito. Para um positivista, na abordagem da norma é suficiente o exame de seus aspectos extrínsecos – vigência. A pesquisa afeta ao sistema de legitimidade, sendo algo estranho à instância jurídica. Para as correntes espiritualistas, além de atender aos pressupostos técnico-formais, as normas necessitam legitimidade. Além disso, nas classificações ainda há as normas primárias e secundárias – daquelas citadas anteriormente. Segundo Hart (1963), as normas primárias se distinguem por se referirem à ação ou criarem uma obrigação (o que, no fundo, corresponde à doutrina tradicional), enquanto que as secundárias, que se reportam às primárias e delas são subsidiárias, não se limitam a estabelecer sanções, mas são mais complexas, importando na atribuição de poderes. As normas secundárias, no seu modo de ver, abrangem três tipos de normas, que ele denomina de reconhecimento, de modificação e de julgamento (REALE, 2002, p. 98). Reale (2002) aponta que a principal distinção entre as normas primárias e secundárias são os pontos de vista, sendo que uma é cronológica, indicando tempo, e a outra, axiológica, seguindo uma ordem valorativa. Assim, as normas primárias são conhecidas pela possibilidade de verificação da sua validade, sendo que são aplicadas quando as normas de julgamento disciplinam. Contudo, diante de sua construção histórica, as normas jurídicas em suas classes e classificações apresentam grande avanço na ciência social do direito como um todo, sendo que, para cada tipo de situação, a norma está possibilitada a agir conforme a demanda. Por isso, este conteúdo foi depositado de forma detalhada e cuidadosa para que você conseguisse compreender. 90 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • As normas jurídicas são classificadas em primárias e secundárias. • Nas subdivisões das classificações das normas jurídicas se tem as normas jurídicas quanto à sanção, aplicação, obrigatoriedade, aplicação territorial, pessoal, sistema jurídico, fonte, âmbito material de aplicação, situação que estabelecem, âmbito formal de aplicação, tempo de duração e ao seu conteúdo. • É relevante considerar, dentro das normas jurídicas, a fim de garantir a eficácia, a vigência, efetividade, eficácia e legitimidade. • A norma possui uma estrutura interna e externa. 91 AUTOATIVIDADE 1 Qual a distinção entre uma norma mais que perfeita e uma norma perfeita? a) ( ) A norma mais que perfeita visa padronizar o comportamento dos indivíduos ou grupos sociais, diferente da norma perfeita. b) ( ) A norma mais que perfeita supera a norma perfeita, que dita regras. c) ( ) As duas são semelhantes. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 2 Betioli (2015) apresenta o conteúdo da norma jurídica. Conforme os estudos deste tópico, sobre o que esse conteúdo se refere, assinale a alternativa correta: a) ( ) Aplicação das normas e disciplina. b) ( ) Ser uma estrutura proposicional enunciativa de uma forma de organização ou conduta que deve ser seguida de forma objetiva e obrigatória. c) ( ) Conduta humana e processos de organização social. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 3 Avaliando a classificação das normas jurídicas, quando trata-se das normas jurídicas quanto à fonte, fala-se em: a) ( ) Normas jurídicas escritas e não escritas. b) ( ) Normas jurídicas perfeitas e mais que perfeitas. c) ( ) Normas jurídicas autoaplicáveis. d) ( ) Todas as alternativas estão incorretas. 92 93 TÓPICO 3 PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO A norma jurídica em si já foi explanada de forma esclarecedora nesta unidade, não é mesmo? Neste tópico abordaremos acerca dos planos de validade da norma jurídica, sendo que estes são divididos em: existência, validade e eficácia: um complementa o outro para um ótimo funcionamento da normativa jurídica, pautada nos princípios técnicos e éticos. Sua compreensão é válida a fim de entendermos os aspectos extrínsecos e intrínsecos da norma jurídica. Todavia, os planos de validade possuem a função de assegurar a veracidade e a eficácia da norma jurídica em si, além dos elementos envolvidos nesta validade. Além disso, pode-se compreender que os planos de existência, validade e eficácia são codependentes: auxiliam-se entre si para validar determinada norma jurídica. Contudo, ter a compreensão geral de tais conteúdos faz total diferença na prática do jurista, a fim de validar o conjunto de normas do direito, tornando a ação jurídica mais ágil, eficaz e certeira. Ressalta-se ainda que a função dos planos de validade é a de comprovar de forma técnica e ética a eficácia da norma jurídica perante o negócio jurídico. Bons estudos! 2 PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA A norma jurídica enquanto parte do direito traz consigo grande relevância, como já foi estudado nos demais tópicos desta unidade. Desta forma, ela possui planos de validade a fim de que seja aplicável de forma eficaz e eficiente, a fim de adaptar-se e alcançar a sociedade em geral. Uma norma jurídica, para que seja obrigatória, não deve estar apenas estruturada logicamente segundo um juízo categórico ou hipotético, pois é indispensável que apresente certos requisitos de validade. Seguindo a esteira de Miguel Reale (2002), o termo “validade” é empregado apenas em sentido genérico, abrangendo a validade formal, a social e a ética (BETIOLI, 2015, p. 273). 94 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA Para Degani (2015), o negócio jurídico tem o objetivo de regularizar os direitos e deveres da sociedade em geral. Desta forma, o autor coloca o “principal exercício da autonomia privada da liberdade negocial. Respeitando sempre os pressupostos de existência, validade e eficácia impostos pela norma jurídica que sobre ele incide” (DEGANI, 2014, p. 3). Ao analisar a juridicidade de um possível negócio jurídico, a tarefa que se impõe ao intérprete, em primeiro lugar, é a verificação, no plano da existência, da presença dos elementos essenciais ao ato: declaração de vontade, indicação de objeto, solenidade do ato quando exigida. Na prática, o legislador civil não distingue negócio jurídico inexistente de negócio jurídico nulo, o que é um equívoco de natureza teórica (NADER, 2019, p. 316). Além disso, o Degani (2014) classifica os planos de validade da norma jurídica em três: o plano da existência, plano de validade e de eficácia. Observe o quadro a seguir. QUADRO 6 – PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA PLANO DA EXISTÊNCIA São os elementos essenciais, os pressupostos de existência. PLANO DA VALIDADE São os elementos do plano da existência com algumas qualificações. PLANO DA EFICÁCIA Neste plano estão os efeitos gerados pelo negócio com relação às partes e com relação a terceiros. São elementos relacionados com a suspensão e resolução de direitos e deveres. FONTE: Adaptado de DEGANI, 2014, p. 3 Sendo essa a classificação, compreende-se a relevância e participação de cada plano na norma jurídica enquanto funcionalidade. Venosa (2017) corrobora relatando que não devemos esquecer dos três planos: existência, validade e eficácia. “O ato pode existir, isto é, possuir um aspecto externo de negócio jurídico, mas não ter validade, por lhe faltar, por exemplo, capacidade de agente. Por outro lado, o negócio pode existir, ser válido, mas ser ineficaz, quando sobre ele, porexemplo, pender condição suspensiva” (VENOSA, 2017, p. 382). Os três planos complementam-se e são necessários para o sucesso e eficácia de um negócio. Desta maneira, faz-se necessário o aprofundamento em cada elemento citado. TÓPICO 3 | PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA 95 2.1 PLANO DA EXISTÊNCIA O plano da existência aparece em primeiro lugar por conta de seu objetivo: é a partir deste que surgem os pressupostos de exigência, que são os elementos essenciais para o negócio jurídico. Desta forma, cita-se ainda alguns elementos primordiais no plano de existência: manifestação ou declaração de vontade; partes ou agente emissor de vontade; objeto e forma: exatamente os aspectos mais primários e básicos do negócio jurídico. “Constatada a existência do negócio jurídico, na etapa seguinte o intérprete analisa o plano da validade, quando o ato poderá ser válido ou inválido. Se inválido, a sua classificação será de negócio jurídico nulo ou anulável, conforme o critério da Lei Civil” (NADER, 2019, p. 316). A classificação é realizada a fim de clarificar os tipos de normas jurídicas existentes, com o objetivo de facilitar na organização e funcionalidade aos juristas. Sendo assim, o negócio jurídico apresenta sua efetividade. Enquanto base dos conteúdos de planos da norma jurídica, há a consigna da existência, como coloca Azevedo (2002). Elemento do negócio jurídico é tudo aquilo que compõe sua existência no campo do direito. Antes de classificarmos esses elementos, é preciso considerar, em primeiro lugar, que a expressão negócio jurídico exprime uma abstração; in concreto, o que há são negócios jurídicos particulares (por exemplo, a compra e venda realizada entre A e B) (AZEVEDO, 2002, p. 31). Contudo, o autor ainda traz que a classificação dos elementos nas normas jurídicas são os elementos gerais, os elementos categoriais e os elementos particulares – todos estes sendo colocados nos planos de existência. Lembra- se ainda que os demais planos se encaixam a este a fim de fornecer validade e eficácia ao negócio jurídico. Elemento do negócio jurídico é tudo aquilo que lhe dá existência no campo do direito. Classificam-se, conforme o grau de abstração, em elementos gerais, isto é, próprios de todo e qualquer negócio; categoriais, que são próprios de cada tipo de negócio; e particulares, ou seja, existentes, sem serem gerais ou categoriais, em determinado negócio (AZEVEDO, 2002, p. 39). Ao discorrer acerca de negócio jurídico, fala-se na “manifestação de vontade que, instaurando uma relação entre dois ou mais sujeitos, busca produzir determinado efeito jurídico protegido pelo direito. É a expressão do poder negocial como uma das exteriorizações da autonomia da vontade” (BETIOLI, 2015, p. 183). O autor ainda coloca que “em suma, o negócio jurídico consiste, fundamentalmente, na manifestação de vontade que, instaurando uma relação 96 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA intersubjetiva, procura produzir determinado efeito jurídico, protegido pelo direito e que se subordina à vontade declarada” (BETIOLI, 2015, p. 263). Há ainda os elementos gerais, que são aqueles essenciais à existência do negócio jurídico. Esses elementos são: FIGURA 2 – ELEMENTOS GERAIS DO NEGÓCIO JURÍDICO FONTE: Adaptado de Azevedo (2002, p. 32) “No plano da existência estão os pressupostos para um negócio jurídico, ou seja, os seus elementos mínimos, enquadrados por alguns autores dentro dos elementos essenciais do negócio jurídico. Constituem, portanto, o suporte fático do negócio jurídico (pressupostos de existência)” (TARTUCE, 2018, p. 377). Com esses elementos, o plano da existência toma forma e torna-se eficaz a fim de unir-se com os demais planos perante o negócio jurídico. Tem-se ainda o plano de validade e o plano de eficácia. 2.2 PLANO DA VALIDADE O plano da validade, sequência do plano de existência, traz os mesmos elementos do plano da existência, com o acréscimo de alguns outros, a fim de validar a existência do negócio jurídico de forma lícita. A validade pressupõe o exame da competência dos órgãos. Imaginemos um decreto do Governador do Estado que não se contenha dentro das leis vigentes, mas inove na matéria, acrescentando um Direito novo, ou melhor, uma regra jurídica genérica ao Direito já existente (REALE, 2002, p. 110). TÓPICO 3 | PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA 97 Entretanto, a validade fornece informações que façam com que a norma/ negócio jurídico sejam validados juridicamente de forma lícita. “A regra jurídica costumeira é algo de socialmente eficaz, e como tal reconhecida, para depois adquirir validade formal” (REALE, 2002, p. 113). Azevedo (2002) acrescenta ainda que: “O plano da validade é próprio do negócio jurídico. É em virtude dele que a categoria ‘negócio jurídico’ encontra plena justificação teórica” (AZEVEDO, 2002, p. 41). A teoria defendida por Kelsen explica a validez de uma norma por outra a ela imediatamente superior, que a torna jurídica exclusivamente por tê-la observado. Assim, segundo esta teoria, a Constituição dá validade à lei, se de conformidade com ela ou se formulada segundo suas prescrições; ao regulamento, à sentença e aos atos e negócios jurídicos (GUSMÃO, 2018, p. 61). Há ainda os elementos essenciais para o plano de validade, que são: fundamento, vigência e eficácia para possuir efetividade e cumprir seu papel nos planos de validade do direito. “O estudo de qualquer ato jurídico só será realizado adequadamente se tiver em vista que este deve ser analisado em três esferas: a da existência, a da validade e a da eficácia. É preciso verificar se o ato jurídico em exame existe juridicamente” (CÂMARA, 2014, p. 289). Por possuírem o mesmo fundamento de validade, as normas integrantes de uma ordem jurídica formam uma unidade de proposições jurídicas que não são logicamente contraditórias entre si. É certo que há possibilidade de, em algumas situações, haver um conflito aparente entre diferentes normas, situação que é saneada por meio da interpretação (MELLO, 2017, p. 4). Desta maneira, a validade desempenha um papel fundamental no negócio jurídico, na qual valida de forma lícita. Ela é alcançada quando elaborada com todos os critérios estabelecidos para sua validade. “O negócio jurídico que não se enquadra nesses elementos de validade é, por regra, nulo de pleno direito, ou seja, haverá nulidade absoluta ou nulidade” (TARTUCE, 2018, p. 378). “A validade é a qualidade que o negócio deve ter ao entrar no mundo jurídico, consistente em estar de acordo com as regras jurídicas (“ser regular”). Validade é, como o sufixo da palavra indica, qualidade de um negócio existente. “Valido” é adjetivo com que se qualifica o negócio jurídico formado de acordo com as regras jurídicas” (AZEVEDO, 2002, p. 42). Contudo, a validade sinaliza as normas jurídicas que são lícitas, ou seja, eficazes, e as que não são, o plano de validade consiste nisso, demonstrar a funcionalidade da norma jurídica como um todo, dentro da ciência do direito e das ciências sociais. “Pensando assim e dentro do princípio da hierarquia das normas, o sistema jurídico em vigor tem como fundamento a Constituição Federal e a partir dela é que as demais normas encontraram sua validade, quer com relação ao âmbito formal, como também no âmbito material” (JORGE JUNIOR, 2019, p. 1). 98 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA “O problema da validade de um sistema normativo como um todo aparece com maior nitidez quando dois sistemas incompatíveis concorrem entre si. No caso de uma revolução ou guerra civil, por exemplo, um novo sistema normativo pode passar a valer, na hipótese de se impor ao antigo” (BETIOLI, 2015, p. 274). “Para o primeiro, no caso do direito nacional (estatal), a validade do direito depende da competência para legislar da autoridade que o prescrever. Emanado de uma autoridade competente para formulá-lo, tem validade” (GUSMÃO, 2018, p. 60). Entretanto, a validade encontra-se enquanto essencial na estrutura danorma jurídica, pois se esta for nula ou desconsiderada, assim o estará também o negócio jurídico. Enquanto parte do plano de validade do direito, constitui- se enquanto extremamente necessária. Ainda está em construção e adaptações, porém segue as evoluções da sociedade como um todo. 2.3 EFICÁCIA O negócio jurídico como um todo necessita possuir a essência, a validade e, por fim, a eficácia. Sem os dois primeiros, a eficácia inexiste e por isso são interconectados e codependem um do outro para o funcionamento correto. “Neste sentido, a “eficácia” é vista como a circunstância de a norma ser efetivamente aplicada e observada, sentido diverso, portanto, da “vigência”, apesar de haver certa conexão” (MELLO, 2017, p. 7). O terceiro e último plano em que a mente humana deve projetar o negócio jurídico para examiná-lo é o plano da eficácia. Nesse plano, não se trata, naturalmente, de toda e qualquer possível eficácia prática do negócio, mas, sim, tão só da sua eficácia jurídica e, especialmente, da sua eficácia própria ou típica, isto é, da eficácia referente aos efeitos manifestados como queridos (AZEVEDO, 2002, p. 49). Desta maneira, a eficácia possui o papel de avaliar se determinada norma funciona de fato diante da realidade social. “Neste plano, interessa identificar se o Negócio Jurídico repercute juridicamente no plano social, isto é, a eficácia da declaração negocial manifestados como queridos” (DEGANI, 2014, p. 5). Além disso, a eficácia possui a responsabilidade de avaliar se o negócio jurídico funciona no plano social, ou seja: na prática. “Contudo, o fato é que não há norma jurídica sem um mínimo de eficácia, de execução ou aplicação no seio da comunidade a que se destina” (BETIOLI, 2015, p. 282). Contudo, Mello (2017) coloca: “[...] assim, a regra é a de que a eficácia da norma, que pode ser evidenciada na modalidade observância por parte dos jurisdicionados ou aplicação pelas autoridades competentes, não opera efeitos concernentes à validade, exceto na hipótese de ela ser duradouramente ineficaz” (MELLO, 2017, p. 2). TÓPICO 3 | PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA 99 Eficácia vem a ser o reconhecimento e vivência do direito pela sociedade; é a regra jurídica enquanto momento da conduta humana. A eficácia da norma é o fenômeno fático real da sua observância, vivência e aplicação. Quando as normas jurídicas são acatadas nas relações intersubjetivas e aplicadas pelas autoridades administrativas ou judiciárias, há eficácia. Ela pode ser reconhecida por meio de dois critérios: o da observância e o da punição da não observância. FONTE: Adaptado de Betioli (2015, p. 282) INTERESSANTE Entretanto, a eficácia possui alguns fatores preponderantes para a sua funcionalidade. “O princípio de efetividade, que pertence ao direito internacional, faz depender a validade da norma de sua eficácia” (GUSMÃO, 2018, p. 63). Para Azevedo (2002), são os fatores de atribuição da eficácia em geral, diretamente visada e mais extensa. Observe o quadro a seguir. QUADRO 7 – FATORES DA EFICÁCIA • Fatores de atribuição da eficácia em geral: que são aqueles sem os quais o ato praticamente nenhum efeito produz; é o que ocorre no primeiro exemplo citado (ato sob condição suspensiva), em que, durante a ineficácia, poderá́ haver a possibilidade de medidas cautelares, mas, quanto aos efeitos do negócio, nem se produzem os efeitos diretamente visados, nem outros, substitutivos deles. • Fatores de atribuição da eficácia diretamente visada: que são aqueles indispensáveis para que um negócio, que já é de algum modo eficaz entre as partes, venha a produzir exatamente os efeitos por ele visados; quer dizer, antes do advento do fator de atribuição da eficácia diretamente visada, o negócio produz efeitos, mas não os efeitos normais; os efeitos, até a ocorrência do fator de eficácia, são antes efeitos substitutivos dos efeitos próprios do ato; é o que ocorre no segundo exemplo citado, em que o negócio, realizado entre o mandatário sem poderes e o terceiro produz, entre eles, seus efeitos, que, porém, não são os efeitos diretamente visados. • Fatores de atribuição de eficácia mais extensa: que são aqueles indispensáveis para que um negócio, já com plena eficácia, inclusive produzindo exatamente os efeitos visados, dilate seu campo de atuação, tornando-se oponível a terceiros ou, até mesmo, erga omnes; é o que ocorre no terceiro e último exemplo dado (cessão de crédito notificada ao devedor e registrada). FONTE: Adaptado de Azevedo (2002, p. 57) 100 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA No plano da eficácia estão os elementos relacionados à suspensão e resolução de direitos e deveres, caso da condição, do termo, do encargo ou modo, das regras de inadimplemento negocial (juros, multa e perdas e danos), do registro imobiliário, da rescisão contratual, do regime de bens do casamento, entre outros (TARTUCE, 2018, p. 378). Portanto, os fatores da eficácia fazem parte da estrutura dela em si, a fim de que apresente a funcionalidade conforme lhe é atribuído. Mello (2017) coloca que Kelsen concedeu importância fundamental à eficácia, visto que ela se torna indispensável na definição da validade das normas diante da ordem jurídica. Não basta que uma regra jurídica se estruture, pois é indispensável que ela satisfaça a requisitos de validade para que seja obrigatória. A validade de uma norma de direito pode ser vista sob três aspectos: o da validade formal ou técnico- jurídica (vigência), o da validade social (eficácia ou efetividade) e o da validade ética (fundamento) (REALE, 2002, p. 105). Contudo, Reale (2002) reafirma a relevância dos três planos de validade acerca do negócio jurídico. Degani (2014, p. 5) corrobora: “O negócio é juridicamente nulo, mas o ordenamento jurídico não pode deixar de levar em conta efeitos materiais produzidos por esse ato. Isso é verdadeiro tanto com relação aos atos nulos como com relação aos atos anuláveis”. A eficácia possui consigo o papel de validar a norma jurídica enquanto funcionamento, se ela de fato oferece aquilo que lhe é atribuído. Azevedo (2002, p. 58) coloca: “As medidas de publicidade em geral enquadram-se entre os fatores de atribuição de eficácia mais extensa (letra ‘c’ supra), enquanto grande parte dos casos ditos de legitimidade do agente incluem-se por sua vez, entre os de fatores de atribuição da eficácia diretamente visada (letra ‘b’ supra)”. Passando pela existência – fato de existir, a validade – ser válida juridicamente, é chegada a eficácia a fim de avaliar se irá funcionar de fato. Os três planos possuem sua relevância e complementam-se entre si, não há validade sem existência, nem eficácia sem validade e ao menos, existência sem validade e sem eficácia. Dessa forma, o direito enquanto negócio jurídico apresenta-se enquanto ciência social segura e científica, a fim de provar e comprovar seus fundamentos. A norma pode ser hoje eficaz e amanhã tornar-se ineficaz. A vigência delimita, em regra, a eficácia do direito. O direito, porém, pode ter eficácia depois de revogado por respeito a situações jurídicas constituídas ao tempo em que era vigente, que devem continuar a ser regidas pelo direito abolido, por exemplo, no caso de direito adquirido (GUSMÃO, 2018, p. 62). Utilizando de uma analogia, podemos pensar nos planos de validade como tijolos de uma construção jurídica, em que um sustenta o outro para que a construção prossiga com sucesso. TÓPICO 3 | PLANOS DE VALIDADE DA NORMA JURÍDICA 101 Interconexão, codependência e funcionalidade: os planos de validade da norma jurídica possuem a função de comprovar eticamente que a norma é válida e favorecerá o negócio jurídico como um todo. Pautada nos princípios técnicos e éticos, elas fornecem ferramentas para o jurista, de maneira a contribuir com sua atuação profissional. Há quem faça distinção entre eficácia e efetividade. A primeira, dependendo de a norma alcançar o resultado jurídico pretendido pelo legislador, enquanto a efetividade,do fato da observância efetiva da norma, por parte das autoridades e de seus destinatários (GUSMÃO, 2018, p. 63). Em primeiro lugar, a norma jurídica deve ser estabelecida por um órgão competente. Assim é que a norma legal (a lei) somente pode ser elaborada pelo Poder Legislativo, com a sanção do Chefe do Poder Executivo. Em se tratando, por exemplo, de lei federal, ela deve ser aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República. É claro que a lei estadual é elaborada pela Assembleia Legislativa com sanção do governador. É na Constituição Federal que se deve buscar a distribuição originaria das competências. A Constituição é a lei fundamental que distribui, de maneira originária, a competência dos elementos institucionais do Estado, fixando as atribuições conferidas à União que exprime o Brasil na sua unidade interna; o que toca, de maneira especial, a cada um dos Estados-membros da Federação e, por fim, o círculo de competência que se reserva ao Município. FONTE: Reale (2002, p. 106) INTERESSANTE 102 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que: • Os planos de validade da norma jurídica estão pautados em: plano de existência, plano de validade e plano de eficácia. • Os três planos se conectam e dependem um do outro para coexistirem e exercerem suas atribuições corretamente. • A função dos planos de validade é a de comprovar de forma técnica e ética a eficácia da norma jurídica perante o negócio jurídico. • Dentre os três planos, nenhum se sobrepõe ao outro: ambos possuem a mesma relevância e funcionalidade para o direito como um todo. • O negócio jurídico tem o objetivo de regularizar os direitos e deveres da sociedade em geral. 103 1 Dentro do plano de validade há a existência, a validade e a eficácia. No tópico validade, há alguns fundamentos que fornecem subsídios a ela, tais elementos são essenciais. Sobre esses elementos, assinale a alternativa CORRETA: a) ( ) Existência, validade e vigência. b) ( ) Fundamento, vigência e eficácia. c) ( ) Validade, vigência e fundamento. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 2 Avalie o texto a seguir: “O plano da existência aparece em primeiro lugar por conta de seu objetivo: é a partir deste que surgem os pressupostos de exigência, que são os elementos essenciais para o negócio jurídico”. Isto quer dizer que: a) ( ) O plano da existência é o principal plano da norma jurídica. b) ( ) O plano da existência é o menos favorecido da norma jurídica. c) ( ) O plano da existência é tão importante quanto os demais planos da norma jurídica. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 3 Correlacione as informações a seguir conforme estudado neste tópico e enumere corretamente: 1. Plano de existência. 2. Plano de validade. 3. Plano de eficácia. ( ) Fundamento, vigência e eficácia. ( ) Fatores de atribuição da eficácia em geral; fatores de atribuição da eficácia diretamente visada; fatores de atribuição de eficácia mais extensa. ( ) Forma, objeto e circunstâncias negociais. Assinale a ordem CORRETA: a) ( ) 2,3,1. b) ( ) 3,2,1. c) ( ) 1,2,3. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. AUTOATIVIDADE 104 105 TÓPICO 4 SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO UNIDADE 2 1 INTRODUÇÃO Até aqui avaliamos e compreendemos a norma jurídica, certo? Neste tópico aprenderemos como as normas são organizadas, e o motivo pelo qual elas precisam passar por este processo de organização, assim como sua relevância. Cada país possui um ordenamento jurídico de acordo com a sua realidade social, sendo que o principal objetivo do ordenamento é a organização das normas jurídicas para disciplinar a conduta humana. Quando se fala em Sistema e Ordenamento Jurídico, fala-se em organização jurídica e hierarquia de normas jurídicas. Imagine você quantas normas existem! Por isso, a fim de fornecer maior facilidade ao jurista, essas normas são classificadas e organizadas segundo o ordenamento jurídico. Porém, não se trata de uma simples organização: a estrutura hierárquica utilizada no ordenamento jurídico faz com que as normas jurídicas sejam organizadas em hierarquia, cronologia e especialidade. Com isso, verifica-se a relevância do ordenamento jurídico e a responsabilidade do mesmo em armazenar tais normas. Portanto, as normas jurídicas não existem de forma isolada, mas sim em um contexto de normas com particularidades em comum entre si. No ordenamento jurídico, essas normas são revisadas e colocadas em ordem. Neste tópico estudaremos este conteúdo de forma específica. Bons estudos! 2 SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO Com o objetivo de hierarquizar e organizar as normas jurídicas, a fim de disciplinar a conduta humana, o sistema e ordenamento jurídico possuem a atribuição de organizar – de forma jurídica – as normas jurídicas estudadas anteriormente. “O direito objetivo/positivo, como conjunto de normas e modelos jurídicos, constitui no seu todo um sistema global que se denomina ordenamento jurídico” (BETIOLI, 2015, p. 302). 106 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA Composto por várias normas jurídicas, esta organização ocorre através de hierarquias. Bobbio coloca: “Essa organização complexa é o produto de um ordenamento jurídico. Significa, portanto, em uma definição satisfatória, que o Direito só é possível se nos colocarmos do ponto de vista do ordenamento jurídico” (BOBBIO, 1995, p. 22). Entendemos por "sistema" uma totalidade ordenada, um conjunto de entes entre os quais existe uma certa ordem. Para que se possa falar de uma ordem, é necessário que os entes que a constituem não estejam somente em relacionamento com o todo, mas também num relacionamento de coerência entre si (BOBBIO, 1995, p. 70). O autor ainda coloca que o termo sistema é cerceado de variados significados, sendo utilizado por várias situações (BOBBIO, 1995). No entanto, quando se trata do sistema e ordenamento jurídico, traz consigo a consigna de organização das normas jurídicas – que são várias, e, segundo o autor, são como as estrelas do céu, impossíveis de serem contadas. O ordenamento jurídico tem por fim realizar a segurança e a justiça, mas esta não deve ser procurada como algo que existe, em si e por si, na natureza, na razão divina ou em uma razão humana universal, mas tampouco pode, por isso, ser equiparada a tudo o que venha a ser imposto pela autoridade (SEGUNDO, 2009, p. 1). A estrutura hierárquica utilizada no ordenamento jurídico faz com que as normas jurídicas sejam organizadas em hierarquia, cronologia e especialidade. “Em outros termos, não existem ordenamentos jurídicos porque há normas jurídicas, mas existem normas jurídicas porque há ordenamentos jurídicos” (BOBBIO, 1995, p. 30). Carvalho (2009, p. 333) corrobora relatando que “É o ordenamento jurídico que prescreve a criação, transformação e extinção de suas normas, determinando como suas estruturas devem ser movimentadas e os requisitos a serem observados para a transformação de sua linguagem”. Compreende-se, portanto, a relevância e eficácia do ordenamento. O ordenamento jurídico em si não deve haver lacunas, porém, quando isso ocorre, são utilizadas nos casos de heterointegração as fontes diversas, já nos casos de auto integração são utilizadas a analogia e os princípios gerais (BOBBIO, 1995). Segundo (2009, p. 54) ressalta que “o fundamento do ordenamento jurídico, com efeito, é pressuposto pelo positivismo, que estuda o direito tal como ele é, sem indagar por que ele é como é, ou por que não é de outra forma”. O autor corrobora ainda que o ordenamento pauta-se ainda na igualdade entre as pessoas que serão disciplinadas. TÓPICO 4 | SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO 107 O termo “ordenamento” é utilizado como substantivo do verbo “ordenar”, para fazer referência ao seu ato ou efeito. O verbo “ordenar” vem do latim ordino, as, ávi,, átum, áre que, em uma de suas acepções, significa “pôr em ordem, arranjar, organizar, dispor de forma regular ou harmônicapartes de um todo”. Assim, o conceito que temos de “ordenamento” é de um conjunto de elementos organizados harmonicamente (CARVALHO, 2009, p. 470). Como o próprio autor coloca, o ordenamento é o principal responsável por atualizar, organizar e descartar as normas jurídicas conforme seu uso/desuso. “O ordenamento é o ponto de partida para se chegar ao sistema” (CARVALHO, 2009, p. 471). O ordenamento jurídico é formado pela totalidade das normas vigentes, e estas devem estar ajustadas entre si e conjugadas à Constituição Federal. Daí surge o problema da sua estrutura, ao qual está correlato o problema do seu fundamento, uma vez que, em última análise, no modo de conceber o ordenamento jurídico, já está implícita a sua fundamentação. A compreensão da estrutura e fundamento do ordenamento jurídico deu azo, sobretudo, a duas teorias, que passamos a examinar (BETIOLI, 2015, p. 303). É importante ressaltar que “a validade de todo o ordenamento jurídico, segundo Kelsen, depende do disposto na Constituição vigente, não cabendo ao jurista indagar das causas sociais ou políticas que dão origem a determinado ordenamento jurídico” (BETIOLI, 2015, p. 303). Muitas vezes, surgem conflitos diante das normas jurídicas, as chamadas antinomias jurídicas. Estas antinomias são resolvidas diante de três tópicos: • Hierarquia (por nível de poderio, por exemplo, a Constituição Federal). • Cronologia (dos mais novos para os mais antigos). • Especialidade (maior poder às normas específicas). Avalie o quadro a seguir: 108 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA FIGURA 3 – PIRÂMIDE DE KELSEN FONTE: Kelsen (1987, p. 68) Diante do esquema apresentado, é possível elucidar o poderio de cada normativa legislativa. Kelsen, o autor da pirâmide, dividiu-a em força da lei e inconstitucionalidade da lei, separando em cores a fim de facilitar a compreensão e separar as leis de maior/menor força. As normas jurídicas, como explica Paulo de Barros Carvalho, “formam um sistema, na medida em que se relacionam de várias maneiras, segundo um princípio unificador”. Estas relações se imperam de forma organizada, sob certa ordem e, por isso, o chamamos de “ordenamento” (CARVALHO, 2009, p. 470). Além disso, Bobbio (1995, p. 72) classifica os ordenamentos normativos em: estático e dinâmico. • Sistema estático: é aquele no qual as normas estão relacionadas umas às outras como as proposições de um sistema dedutivo, ou seja, pelo fato de que derivam umas das outras partindo de uma ou mais normas originárias de caráter geral, que têm a mesma função dos postulados ou axiomas num sistema científico. • Sistema dinâmico: é aquele no qual as normas que o compõem derivam umas das outras através de sucessivas delegações de poder, isto é, não através do seu conteúdo, mas através da autoridade que as colocou; uma autoridade inferior deriva de uma autoridade superior, até que chega à autoridade suprema que não tem nenhuma outra acima de si. TÓPICO 4 | SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO 109 Ambos os sistemas derivam do ordenamento jurídico e servem para adequar-se a cada tipo de conteúdo jurídico, já que são incontáveis. “Ordenamento é a ordem posta, o direito positivado, um conjunto de disposições jurídicas, produzidas por um ato de autoridade, estruturadas por vínculos de subordinação e coordenação. É aquilo que chamamos de sistema jurídico” (CARVALHO, 2009, p. 470). É obvio que, para se assegurar imparcialidade do Estado, é preciso que haja imparcialidade do agente estatal que irá, no caso concreto, exercer a função jurisdicional. Assim, em primeiro lugar, cuida do ordenamento jurídico, através de norma jurídica, hierarquicamente superior às demais, de estabelecer garantias para os magistrados, ou seja, a Constituição da República arrola uma série de garantias dos juízes, destinadas a assegurar que a atuação do magistrado se dê no processo de forma imparcial (CÂMARA, 2014, p. 171). O autor ainda coloca que o ordenamento jurídico “é o conjunto ou a totalidade das disposições jurídicas, que integram um domínio heterogêneo, pois produzidas por pessoas diferentes, em tempos diversos e por procedimentos distintos” (CARVALHO, 2009, p. 471). Já o sistema jurídico, diferente do ordenamento, “vai buscar fora dele (no seu ambiente – sociedade) a comunicação que deseja disciplinar e a traz para dentro dele como comunicação jurídica atribuindo-lhe tratamento normativo ao qualificá-la na forma lícita ou ilícita” (CARVALHO, 2009, p. 117). Por fim, normas, modelos, institutos e instituições se ordenam em sistemas, porque são hierarquizados, existindo entre eles relações de superioridade e de subordinação. O direito não é simplesmente um conjunto de normas, mas ele constitui um sistema cujos elementos são interligados e ordenados, cumprindo determinadas funções. Os elementos citados obedecem, portanto, a exigências lógicas ditadas pela correlação dos fatos e das razões de sua disciplina, segundo espécies, gêneros e classes. Temos, assim, o sistema legal, consuetudinário, jurisdicional e negocial. Eles, no seu todo, constituem um “sistema global”, que é o ordenamento jurídico (BETIOLI, 2015, p. 311). Considera-se, portanto, o fato de o direito não ter se constituído de forma única, como aponta Betioli (2015, p. 302): “De fato, o direito se apresenta, concretamente, em qualquer país, sob a estrutura de um ordenamento: as normas jurídicas não existem isoladas, não atuam de forma solitária, mas se correlacionam e se implicam, formando um todo uniforme e harmônico”. O autor ainda acresce que o ordenamento jurídico não fica restrito apenas à legislação. “A complexidade de um ordenamento jurídico deriva da multiplicidade das fontes, das quais afluem regras de conduta, em última análise, do fato de que essas regras são de proveniências diversas e chegam à existência (adquirem validade) partindo de pontos mais diferentes” (BOBBIO, 1995, p. 38). 110 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA “Desta forma, o direito não atua de forma solitária, sendo que o ordenamento jurídico está amplamente ligado a múltiplos fatores. Isto se justifica porque o sistema jurídico tem como objeto o sistema social e, por isso, o que não é social está fora do seu âmbito de incidência” (CARVALHO, 2009, p. 398). O ordenamento jurídico é formado pela totalidade das normas vigentes, e estas devem estar ajustadas entre si e conjugadas à Constituição Federal. Daí surge o problema da sua estrutura, ao qual está correlato o problema do seu fundamento, uma vez que, em última análise, no modo de conceber o ordenamento jurídico já está implícita a sua fundamentação (BETIOLI, 2015, p. 303). INTERESSANTE Contudo, o fato jurídico é também social. “A linguagem jurídica incide sobre a linguagem da realidade social, de tal sorte que a projeção semântica do direito abrange somente relações intersubjetivas, excluídas as manifestações meramente subjetivas” (CARVALHO, 2009, p. 395). A norma que afirma a igualdade de todos só́ será́ adequadamente interpretada quando se compreender que a mesma tem por fim afirmar que, diante das naturais desigualdades entre os homens, o ordenamento jurídico deve se comportar de modo capaz de superar tais desigualdades, igualando as pessoas. É dever de o Estado assegurar tratamento que supra as desigualdades naturais existentes entre as pessoas. Somente assim ter-se-á assegurado a igualdade substancial (e não meramente formal) que corresponde a uma exigência do processo justo, garantido pela cláusula due process of law (CÂMARA, 2014, p. 51). Obviamente, o direito nasceu e se constitui até os dias atuais perante as movimentações sociais e mudanças da sociedade como um todo. Ele é criado para disciplinar a conduta dos sujeitos, a fim de que vivam em harmonia socialmente. “Por ora, cumpre notar apenas que o Direito, entendido como ordenamento jurídico, vale dizer, como um “conjunto de normas jurídicas”, sistema de prescrições destinadas a disciplinar a conduta dos integrantes de uma comunidade,é inerente ao ser humano” (SEGUNDO, 2009, p. 20). Betioli (2015, p. 308) corrobora, ainda, acerca da validade do ordenamento jurídico enquanto informal. Contudo, a validade do ordenamento jurídico não deve ser apreciada de um ponto de vista puramente formal, pois ele não é apenas um conjunto gradativo de normas entre si logicamente subordinadas e coerentes. Como já vimos, as normas representam o momento culminante de um processo que é, essencialmente, inseparável dos “fatos” que estão na sua origem e dos “valores” que constituem a sua razão de ser (BETIOLI, 2015). TÓPICO 4 | SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO 111 Desta forma, o ordenamento jurídico também passa por uma validação que se faz necessária pelo número de normas existentes, sendo que estas são organizadas pelo ordenamento e sistema jurídico. Contudo, faz-se relevante, ainda, observarmos o ordenamento jurídico brasileiro, ao lembrar que cada país possui uma maneira de organizar suas normas jurídicas. 2.1 SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO Os conceitos acerca de sistema e ordenamento jurídico são os mesmos, porém “em cada país há um ordenamento jurídico. No entanto, subordinados a ele, podem formar-se ordenamentos menores, com menor grau de positividade. É a teoria da pluralidade dos ordenamentos internos” (BETIOLI, 2015, p. 311). Por isso a relevância de observarmos o sistema e ordenamento jurídico brasileiro. Além disso, “há, portanto, países, Estados, com mais de um ordenamento jurídico, que nem sempre obedecem aos mesmos princípios, como é o caso dos cantões da Suíça e dos Estados Federados dos EUA, em que existe um direito local, ao lado de um federal” (VENOSA, 2019, p. 61). Geralmente isso ocorre pelo número elevado de normas dentro de um ordenamento jurídico, para facilitar a organização, portanto, o Estado decide criar mais um ordenamento. Isso não significa que um funcione melhor que o outro, mas que todos funcionam de forma técnica e ética. Contudo, Venosa (2019, p. 61) ainda amplia este conceito. Para o autor, toda sociedade possui seu próprio ordenamento jurídico. “Toda sociedade política possui seu próprio ordenamento jurídico. Nele há um conjunto de normas ditadas para ter vigência sobre essa determinada sociedade. Nem sempre, porém a sociedade política juridicamente ordenada em Estado terá o mesmo ordenamento jurídico” (VENOSA, 2019, p. 61). É importante ressaltar ainda que “a validade de todo o ordenamento jurídico depende do disposto na Constituição vigente, não cabendo ao jurista indagar das causas sociais ou políticas que dão origem a determinado ordenamento jurídico” (BETIOLI, 2015, p. 304). Desta forma, cabe à Constituição confirmar a validade de todo ordenamento jurídico, garantindo, assim, sua eficácia. A noção de ordenamento é complexa. Em princípio, um ordenamento é um conjunto de normas. O ordenamento jurídico brasileiro é o conjunto de todas as suas normas, em que estão incluídas todas as espécies que mencionamos ao classificá-las. Nele estão contidos critérios de classificação, como é o caso das classificações legais das coisas (Código Civil Brasileiro de 1916, arts. 43 ss e Código Civil de 2002, arts. 79 ss) que organizam NOTA 112 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA a matéria, esclarecem as relações de integração, mas não são normas, não constituem imposição vinculante e institucionalizada. Também nele se encontram meras definições (que não se confundem com as definições normativas, isto é, com a imposição compulsória de uma definição). Além das normas, no ordenamento jurídico também estão contidos os critérios de classificações legais, a fim de otimizar a organização. Betioli (2015, p. 312) ressalta que o Brasil é um Estado federal. “O Artigo 1º da Constituição Federal afirma que a República Federativa do Brasil é formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal”. Estes são autônomos e possuem a capacidade de: • Auto-organização e Normatização própria. • Autogoverno. • Autoadministração. Isso demonstra, em grande escala, a organicidade do ordenamento jurídico brasileiro. Conforme postula Nader (2019, p. 72): “Além de normas que disciplinam o convívio social, o ordenamento jurídico reúne disposições que organizam o Estado e se impõem a quem detém parcela de poder, cuidando ainda das relações entre as pessoas e os órgãos públicos”. Nosso ordenamento jurídico é constitucionalista, uma vez que o sistema de legalidade brasileiro é do tipo em que a Constituição Federal preside a todo o ordenamento jurídico. Isso significa que todas as normas jurídicas têm de estar em conformidade com os seus preceitos, sob pena de serem inválidas pelo vício da “inconstitucionalidade” (BETIOLI, 2015, p. 312). Desta forma, a Constituição Federal torna-se a autoridade máxima ao falar-se de poderio legislativo, sendo a norteadora de todo ordenamento jurídico brasileiro. “No âmbito da Teoria Geral do Direito, ocupa a teoria do ordenamento jurídico lugar de destaque, ao oferecer uma proposta racional de compreensão da totalidade do direito como um sistema ordenado dos elementos que compõem o direito” (SOARES, 2017, p. 115). Assim, quanto à capacidade de auto-organização e normatização própria, além do ordenamento jurídico “federal” ou “nacional”, que vigora em todo o território, cada Estado-membro da Federação, cada Município e o Distrito Federal têm também seu ordenamento jurídico, a partir da Constituição Federal. Há, portanto, um ordenamento jurídico de âmbito federal, com eficácia em todo o país, assim como há um ordenamento jurídico de âmbito estadual, exclusivo para cada Estado-membro da Federação; e há ainda um ordenamento jurídico de âmbito municipal para cada um dos municípios, em consonância com a Constituição Federal e a Constituição do respectivo Estado (BETIOLI, 2015, p. 312). TÓPICO 4 | SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO 113 As normas jurídicas não existem de forma isolada, mas sim em um contexto de normas com particularidades em comum entre si. No ordenamento jurídico, essas normas são revisadas e colocadas em ordem. Como reforça Nader (2019, p. 214), “As formalidades exigidas pelo ordenamento jurídico têm a finalidade de proteger os interesses dos que participam na realização dos fatos jurídicos, a fim de manter organizados os assentamentos públicos, como o de registro das pessoas naturais e jurídicas e de imóveis”. Ademais, o ordenamento jurídico ofertado aos juristas necessita de uma sistematização que apresente os aspectos técnicos e éticos, assim como alcance o âmbito das ciências da natureza (Nader, 2019). Contudo, lembra-se que o direito é produto da sociedade, é feito por e pela sociedade em comum. “São dois os planos do ordenamento jurídico, o substancial e o processual, e em cada um deles se encontra uma posição jurídica: o direito subjetivo e a ação” (CÂMARA, 2014, p. 349). Desta forma, “o ordenamento jurídico dinamiza-se por laços de fundamentação e derivação entre as normas de direito: a norma jurídica inferior se fundamenta na norma jurídica superior ou, vice-versa, a norma jurídica inferior deriva da norma jurídica superior (SOARES, 2017, p. 117). Um ordenamento, como sistema, contém um repertório, contém também uma estrutura. Elementos normativos e não normativos (repertório) guardam relações entre si. Por exemplo, quando dizemos que as normas estão dispostas hierarquicamente, umas são superiores, outras inferiores, estamos pensando em sua estrutura. FONTE: FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 140 NOTA Devemos entender que ordenamentos de um mesmo sistema jurídico partem dos mesmos pressupostos filosóficos e sociais, dos mesmos conceitos e técnicas, embora com adaptações às situações que lhes são particulares. Sob a ação da conquista de um povo por outro, da colonização ou simplesmente da pura imitação, as leis de um sistema jurídico e, por vezes, mesmo de sistemas jurídicos diversos interpenetram-se e unificam-se (VENOSA, 2019, p. 62). O autor ainda coloca que se deveconsiderar, enquanto sistema jurídico, um agrupamento de ordenamentos unidos por elementos em comum, tanto por questões sociais, quanto por questões jurídicas e administrativas (VENOSA, 2019). Portanto, a concepção de ordenamento é relevante a fim de identificar se as normativas jurídicas são válidas ou não. “O Estado tem por finalidade manter 114 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA íntegro o ordenamento jurídico, atuando a vontade das normas nos casos concretos que lhe sejam levados por aqueles que se consideram titulares de direitos lesados ou ameaçados de lesão” (CÂMARA, 2014, p. 93). Avalie a seguir a tabela que exemplifica o ordenamento jurídico brasileiro: FIGURA 4 – ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO FONTE: Adaptado de Kelsen (1987) Contudo, o ordenamento jurídico rege-se por uma coerência material e por um princípio dinâmico-formal, como coloca Soares (2017, p. 117): O ordenamento jurídico rege-se por um princípio estático-material, que reflete a coerência material (o que se prescreve), e por um princípio dinâmico-formal, relativo à coerência formal entre as normas (quem prescreve – competência – e como se prescreve – procedimento). Com base no princípio dinâmico-formal, pode-se afirmar inclusive que o direito regula sua própria criação e aplicação. Ao classificar a norma em determinado ordenamento jurídico, é importante que este a classifique enquanto norma válida, a fim de garantir os princípios técnicos e éticos do direito enquanto ciência social. Isso contribui ainda para a correlação entre os elementos normativos pertencentes ao ordenamento em si (FERRAZ JUNIOR, 2019). O autor ainda coloca que: TÓPICO 4 | SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO 115 A concepção do ordenamento como sistema é consentânea com o aparecimento do Estado moderno e o desenvolvimento do capitalismo. As primeiras manifestações de uma diferença entre entes privados comuns (sociedades religiosas, comerciais) e entes públicos datam da Idade Média e ocorrem por duas razões profundas: as finanças e a guerra (FERRAZ JUNIOR, 2019, p. 141). Com o advento do capitalismo, houve a necessidade de diferenciação a fim de organicidade social. “A fundamentação das decisões judiciais é exigida pelo ordenamento jurídico brasileiro por dois motivos. Em primeiro lugar, protege-se com tal exigência um interesse das partes e, em segundo, um interesse público” (CÂMARA, 2014, p. 64). Entretanto, as modificações sociais cada vez mais evidentes fazem com que os sistemas jurídicos se atualizem e abarquem as demandas sociais. Ao mesmo passo que o ordenamento jurídico organiza as demandas normativas, ele as atualiza, descarta e atua de forma fidedigna e correta, oferecendo a seus juristas o material necessário para atuar eticamente. 116 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA LEITURA COMPLEMENTAR A APLICAÇÃO DA NORMA JURÍDICA E A EXISTÊNCIA DE LACUNA NO DIREITO Eduardo Augusto Alckmin Jacob Resumo O estudo aborda a questão da aplicação da norma jurídica em três momentos: o da subsunção, integração e da correção de antinomias reais. Diante de uma visão tridimensional do direito, analisando a norma conjuntamente com os fatos e valores sociais, constatasse a existência de lacunas ontológicas, axiológicas, e normativas, além das lacunas reais ou de conflitos. Palavras-chave: Aplicação da norma jurídica, lacunas no direito. A aplicação da norma jurídica pode ser analisada em três momentos. O primeiro deles, o da subsunção, consiste na ligação entre um conceito normativo e a realidade fática, prática essa que nem sempre leva o aplicador do direito a um resultado único e satisfatório. Dá-se através da interpretação da norma, relacionando a ao caso concreto em evidência. O resultado pode ser simplesmente constatativo, restritivo ou ampliativo. Será constatativo, quando apenas evidencia a aplicação de uma norma ao caso concreto. Poderá ser restritivo, quando restringir a sua eficácia a determinado fato social e, finalmente, será ampliativo quando ampliar sua eficácia. Nesse primeiro momento, segundo o filósofo Karl Engisch, duas são as grandes dificuldades: a falta de conhecimento dos fatos por parte do aplicador do direito, conhecendo apenas o que lhe foi dirigido, e a indeterminação semântica dos vocábulos contidos na norma. Porém, alerta ainda o filósofo, ser do jurista a tarefa de definir os conceitos normativos, e não do legislador. Assim, para subsumir é preciso interpretar. A hermenêutica, ciência da interpretação, muito bem analisada pelo jurista paulista, Rubens Limongi França é repleta de técnicas ou processos interpretativos que visam orientar a tarefa do interprete e do aplicador. São eles: gramatical ou literal, lógico, sistemático, histórico e sociológico ou teleológico. O segundo momento da aplicação da norma jurídica, a integração, consiste na análise da existência, constatação e preenchimento da lacuna. Todavia, antes de se adentrar ao tema, necessários se fazem alguns esclarecimentos. O direito não é um sistema, mas sim pode ser analisado de forma sistemática, contendo cada sistema repertórios e estruturas próprias. Assim, a admissão ou não de lacunas no direito dependerá do sistema utilizado. Para Kelsen, não há lacunas no direito, uma vez que esse é visto de maneira estática, TÓPICO 4 | SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO 117 fechada e completa. Para esse jusfilósofo, o direito, que constitui objeto do conhecimento jurídico-científico, deve ser entendido como norma, daí o caráter da completude ou da plenitude do sistema normativo, já que as normas que o compõem contêm, em si, possibilidade de solucionar todos os conflitos levados à apreciação dos magistrados ou órgãos competentes, sendo o sistema, em si mesmo, suficiente. Kelsen parte da premissa de que “tudo que não está proibido, está permitido”, afastando a ideia da existência de lacunas no direito, visto como um sistema de normas. Funda-se ainda o jusfilósofo, no princípio da proibição do non liquet, através do qual o aplicador da lei não pode deixar de julgar um caso, devendo sempre encontrar uma solução. Porém, embora Kelsen não tenha admitido a existência de lacunas no sistema jurídico, reconhece a importância da teoria das lacunas no âmbito da jurisdição, como um limite ao poder normativo do magistrado, considerando a lacuna como ficção utilizada pelo legislador com a finalidade de restringir o poder de interpretação e de integração conferido aos tribunais. Já para aqueles que concebem o direito como um sistema dinâmico, aberto e incompleto, revelando o direito como uma realidade complexa, contendo várias dimensões, não só a normativa, como também fática e axiológica, tem-se um conjunto contínuo e ordenado que se abre numa desordem, descontinuidade, surgindo um vazio, ou seja, uma lacuna, por não conter uma solução expressa para determinado caso. Na visão tridimensional do direito, criada de forma pelo jurista Miguel Reale, o sistema do direito se compõe de um subsistema de normas, de um subsistema de valores e de um subsistema de fatos. Referida visão levou a professora Maria Helena Diniz, também de forma majestosa, a concluir, em sua obra “As lacunas no direito”, que ante a consideração dinâmica do direito e a concepção multifária do sistema jurídico, que abrange um subsistema de normas, de fatos e de valores, havendo quebra da isomorfia, três são as principais espécies de lacunas: 1ª) normativa, quando tiver ausência de norma sobre determinado caso; 2ª)ontológica, se houve norma, as ela não corresponder aos fatos sociais, facilmente verificada, por exemplo, diante de uma análise ao nosso Código Comercial, hoje parcialmente revogado pelo Código Civil vigente; e 3ª) axiológica, no caso de ausência de norma justa, ou seja, quando existe uma norma, mas, caso seja aplicada, sua solução será insatisfatória ou injusta. As lacunas acima apontadas demonstram um estado incompleto do sistema, ante a impossibilidade de o legislador conhecer e prever todos os fatos,conflitos e comportamentos que surgem nas relações sociais, bem como do entendimento de que, dentro de uma visão dinâmica do direito, é impossível pretender que no ordenamento existam normas regulando e prescrevendo todas as relações jurídicas presentes e todas as que o progresso trará. 118 UNIDADE 2 | A NORMA JURÍDICA Karl Engisch chegou a definir a lacuna como uma “incompletude insatisfatória no seio do todo jurídico”, sendo afastada por meio da integração. Nesse sentido, segundo os ensinamentos da professora Maria Helena Diniz, dois são os mecanismos por meio dos quais se completa, dinamicamente, um ordenamento: a autointegração e a heterointegração, previstos na Lei de Introdução ao Código Civil, Artigos 4º e 5º. O primeiro consiste no método pelo qual o ordenamento se completa, recorrendo à fonte dominante do direito: a lei. O procedimento típico é a analogia. Já a heterointegração é a técnica pela qual a ordem jurídica se completa, utilizando-se de fonte diversas da norma legal, como por exemplo: o costume, a equidade e até mesmo, em determinados casos, os princípios gerais do direito. Porém, importante ressaltar, que não obstante o reconhecimento da existência de lacunas no direito, essa não deve ser analisada como um problema, e sim uma decorrência lógica, ante o caráter dinâmico do direito e a impossibilidade por parte do legislador de prever todas as relações jurídicas existentes e as que certamente virão em razão da alteração de valores e comportamentos. Maria Helena Diniz conclui que se não admitisse o caráter lacunoso do direito, sob o prisma dinâmico, o Poder Legislativo, em um dado momento, não mais teria qualquer função, porque todas as condutas já estariam prescritas, cabendo ao órgão jurisdicional, com base na “ficção”, no sentido Kelseniano, da teoria das lacunas, ir, mediante os recursos do Artigo 4º da Lei de introdução ao Código Civil, preenchendo tais lacunas. Conclui-se dessa forma, seguindo os ensinamentos da professora Diniz, que o direito é lacunoso, mas ao mesmo tempo sem lacunas, o que, incialmente, poderia parecer paradoxal, porém não o é. Lacunoso porque a vida social apresenta nuanças infinitas nas condutas, problemas surgem diariamente, mudam-se as necessidades com o progresso, de maneira que seria impossível, ante a visão dinâmica do direito, a previsão legal de todos os comportamentos, mas, concomitantemente, sem lacunas porque o próprio dinamismo do direito mobiliza soluções que servem de base para qualquer decisão, seja ela do órgão jurisdicional, seja ela do Poder Legislativo. Ocorre que é suma importância apontar, que o preenchimento da lacuna não tem força de eliminá-la do ordenamento, mas apenas solucionar um dado caso concreto, permanecendo assim no sistema, a lacuna apenas, momentaneamente, preenchida. O ordenamento é aquilo que é e não uma outra coisa. Se for completo é completo, mas se não o for, não será a jurisdição que o tornará completo. A jurisdição não instaura a completude, porém é complementar ao ordenamento, de modo que o juiz, diante de uma lacuna, não tem o escopo de eliminar lacunas, mas tão somente por fim ao litígio. TÓPICO 4 | SISTEMA E ORDENAMENTO JURÍDICO 119 Há ainda o terceiro momento quanto à aplicação da norma a ser analisado, qual seja, o da correção. Ao lado das três espécies de lacunas acima mencionadas, também conhecidas como lacunas aparentes, vez que sempre se encontra no ordenamento uma saída jurídica, há a lacuna real ou antinomia real. A antinomia real é o estado incorreto do sistema, também conhecido como lacuna de conflito ou de colisão. Teles Sampaio Ferraz classifica como sendo “a oposição entre duas normas, ou dois princípios emanados de autoridade competentes, no mesmo âmbito normativo, que coloca o aplicador do direito em uma posição insustentável ante a incompletude de critérios lógicos e inconsistência de critérios normativos”. Dá-se sempre diante da ausência de critério normativo solucionador, ou, diante da contrariedade existente entre dois critérios. O atual Código Civil está repleto de antinomias. Para se configurar uma antinomia real necessário se faz a presença das seguintes condições: 1) conflito entre normas jurídicas; 2) as normas vigentes devem ser vigentes, válidas e pertencentes ao mesmo ordenamento jurídico; 3) as normas devem ser emanadas de autoridades competentes no mesmo âmbito normativo; 4) as normas conflitantes tenham operadores opostos, um permitindo dado comportamento, outra proibindo; 5) o sujeito aplicador deverá se ver diante de uma posição insustentável ante a ausência de critérios normativos ou conflito de critérios normativos. Karl Engisch resume em três condições: incompatibilidade, indecidibilidade e necessidade de decisão. Como se verifica, diante das lacunas aparente há uma série de soluções, todavia, diante de uma lacuna real, ou antinomia real, não se tem solução, o que se busca é resolver o problema através de uma interpretação corretiva dos artigos 4º e 5º da Lei de Introdução ao Código Civil. Ressalta-se ainda, que a eliminação de uma lacuna real por meio do Poder Legislativo, quando, por exemplo, edita uma nova norma, sempre poderá ensejar uma nova lacuna, de modo que o sistema, jamais será perfeito e completo como possam imaginar ou idealizar alguns juristas. Logo, referida conclusão longe está de ser uma crítica ao ordenamento jurídico, mas, simplesmente, uma constatação lógica, que tem com intuito maior, sempre buscar melhorar e adaptar o direito à realidade social, correspondendo assim, cada vez mais aos anseios dos seus jurisdicionados. FONTE: <file:///C:/Users/02371584932/Downloads/2113-Texto%20do%20artigo-8115-1-10-20150 709%20(2)%20(1).pdf>. Acesso em: 30 mar. 2020. 120 RESUMO DO TÓPICO 4 Neste tópico, você aprendeu que: • Com o objetivo de hierarquizar e organizar as normas jurídicas a fim de disciplinar a conduta humana, o sistema e ordenamento jurídico possuem a atribuição de organizar – de forma jurídica – as normas jurídicas estudadas anteriormente. • A estrutura hierárquica utilizada no ordenamento jurídico faz com que as normas jurídicas sejam organizadas em hierarquia, cronologia e especialidade. • O ordenamento é o principal responsável por atualizar, organizar e descartar as normas jurídicas conforme seu uso/desuso. • O ordenamento jurídico também passa por uma validação que se faz necessária pelo número de normas existentes, sendo que estas são organizadas pelo ordenamento e sistema jurídico. • O ordenamento pode ser classificado em sistema estático ou dinâmico. Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. CHAMADA 121 1 Bobbio (1995) classifica o ordenamento jurídico em sistema estático e sistema dinâmico. Diferencie-os e assinale a alternativa correta: I- Sistema estático: normas relacionadas umas às outras. II- Sistema dinâmico: normas derivam-se umas das outras através de sucessivas delegações de poder. a) ( ) Somente a opção I está correta. b) ( ) Somente a opção II está correta. c) ( ) As opções I e II estão corretas. d) ( ) As opções I e II estão incorretas. 2 As antinomias são os conflitos dentro do ordenamento jurídico. Esses conflitos são resolvidos através de algumas instâncias, nas quais são: a) ( ) Hierarquia, cronologia e especialidade. b) ( ) Analogia, costumes e fontes. c) ( ) Constituição federal, leis e decretos. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 3 Observe o texto a seguir: “O ordenamento jurídico dinamiza-se por laços de fundamentação e derivação entre as normas de direito: a norma jurídica inferior ____________ na norma jurídica superior ou, vice-versa, a norma jurídica inferior _________ da norma jurídica superior (SOARES, 2017, p. 117). Assinale a alternativa que corresponde aos conteúdos faltantes nas lacunas, respectivamente:a) ( ) Se fundamenta – deriva. b) ( ) É descartada – faz parte. c) ( ) Contribui – deriva. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. AUTOATIVIDADE 122 123 UNIDADE 3 O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM PLANO DE ESTUDOS A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de: • avaliar os componentes da teoria da relação jurídica; • reconhecer os aspectos estruturais do poder judiciário; • compreender de forma geral as características da hermenêutica e interpretação jurídica; • adquirir conhecimentos específicos acerca do direito subjetivo. Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade você encontrará auto atividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado. TÓPICO 1 – HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL TÓPICO 2 – POSIÇÕES JURÍDICAS DOS SUJEITOS DE DIREITO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS TÓPICO 3 – DIREITO SUBJETIVO TÓPICO 4 – ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações. CHAMADA 124 125 TÓPICO 1 HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO Você já ouviu falar em hermenêutica e intepretação jurídica? Estas são responsáveis por grande parte da eficácia jurídica enquanto prática cotidiana. É a partir destas que a organicidade na atuação jurídica ocorre, sendo a hermenêutica a criadora da intepretação. Diante desta concepção, verifica-se a relevância e funcionalidade da hermenêutica na prática jurídica, de modo a contribuir significativamente na interpretação dos conteúdos jurídicos. A aplicação e a integração do direito também dizem respeito a esta hermenêutica na qual estamos falando. Hermenêutica e a intepretação são interconectadas, cada qual com sua funcionalidade, mas que uma acaba a contribuir com a outra no quesito funcional das aplicabilidades do direito como um todo. Desta forma, compreende-se a importância de compreender tais conceitos, e entender a maneira na qual eles funcionam e se conectam entre si. Neste tópico abrandaremos ainda mais acerca dessa temática, que diz muito respeito à sistematização dos procedimentos jurídicos. Estude com atenção e cuidado! Bons estudos! 2 HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL O surgimento da hermenêutica é muito anterior do que se pode imaginar: derivou-se do mito de hermes, um deus que traduzia as mensagens dos demais deuses à linguagem dos homens para que estes pudessem compreender o que os deuses falavam, como traz Nader (2019, p. 246): “A palavra hermenêutica provém do grego, Hermeneúein, interpretar, e deriva de Hermes, deus da mitologia grega, filho de Zeus e de Maia, considerado o intérprete da vontade divina. Habitando a Terra, era um deus próximo à Humanidade, o melhor amigo dos homens”. UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 126 Desde o Século XIX, começam a surgir teorias especificamente jurídicas sobre a Hermenêutica. Múltiplas e em disputa entre si, podem ser vistas em correntes que buscam interpretar a lei em sentidos externos a ela mesma – espírito do povo, bons costumes etc. – e, ainda, aquelas que pretendem se fixar apenas em aspectos gramaticais ou de coerência lógica interna sistemática, fazendo aí ressaltar o juspositivismo. Já no Século XX, a pretensão de um controle científico da hermenêutica jurídica cai por terra. Com Kelsen, a interpretação jurídica não é mais tratada como verdadeira ou falsa, e sim como autêntica (quando feita pelo poder estatal) ou doutrinária (quando obra de intelecção sem poder jurídico decisório) (MAXIMILIANO, 2017, p. 11). No Direito, ela possui papel fundamental, como traz Magalhães Filho (2015, p. 52): “Em sentido amplo, a hermenêutica jurídica deve ter por objeto não apenas a interpretação do Direito, mas também a aplicação e a integração do Direito”. Desta forma, ela contribui de forma significativa na aplicabilidade do direito como um todo. No mundo do Direito, hermenêutica e interpretação constituem um dos muitos exemplos de relacionamento entre princípios e aplicações. Enquanto a hermenêutica é teórica e visa a estabelecer princípios, critérios, métodos, orientação geral; a interpretação é de cunho prático, aplicando tais diretrizes. Não se confundem os dois conceitos, apesar de ser muito frequente o emprego indiscriminado de um e de outro. A interpretação aproveita, portanto, os subsídios da hermenêutica. Esta descobre e fixa os princípios que regem a interpretação. A hermenêutica estuda e sistematiza os critérios aplicáveis na interpretação das regras jurídicas (NADER, 2019, p. 246). Como postula Nader (2019), hermenêutica e interpretação em conjunto sistematizam a atuação do direito enquanto ciência social e humana, a fim de organização e tradução dos aspectos legislativos, além de fornecer princípios nos negócios jurídicos, “Se considerarmos, ainda, que a hermenêutica fornece princípios para a exegese dos negócios jurídicos (contratos, declarações unilaterais de vontade), vamos ter uma visão maior do significado e importância que representa para o mundo do Direito” (NADER, 2019, p. 246). Maximiliano (2017, p. 17) corrobora ressaltando que “a hermenêutica jurídica tem por objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito”. Compreende-se ainda que a hermenêutica possui, dentro de suas atribuições, a de sistematizar os processos do negócio jurídico, sendo, assim, indispensável para a atuação do jurista. Além disso, “As regras de hermenêutica são regras de interpretação, de aplicação e de integração do Direito. Elas são classificadas em legais, jurisprudenciais e doutrinárias” (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 54). Friede (2015, p. 176) corrobora ainda que: TÓPICO 1 | HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL 127 Muito embora a palavra hermenêutica, etimologicamente, represente interpretação, pois o vocábulo vem do grego hermeneuein, que significa interpretação, renomados autores, como Carlos Maximiliano, Hermes Lima, Vicente Raó, afirmam que hermenêutica é a parte da Ciência Jurídica que estuda o processo de interpretação da lei (sentido amplo). Em sentido estrito é entendida por alguns autores, como Machado Neto, como sinônimo de interpretação, integração e aplicação da norma jurídica. Epistemologicamente, entretanto, o objeto da ciência hermenêutica é o estudo e sistematização dos processos lógicos de interpretação, integração e aplicação do Direito. A hermenêutica é um processo da filosofia responsável pela criação de métodos interpretativos para cada matéria científica. No âmbito jurídico, é responsável pela discussão dos diferentes métodos e tipos interpretativos, como a interpretação l. NOTA Ademais, a hermenêutica é pertencente ainda à filosofia, sendo aplicável a várias áreas da ciência, sendo responsável por maneiras de intepretação, “Enquanto a hermenêutica é uma teoria voltada à organização das ciências, a interpretação é ligada a sua prática, sendo a sua aplicação no âmbito do Direito uma parte importante da produção dogmática normativa” (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 45). Como já citado anteriormente, a hermenêutica e intepretação fazem parte da aplicação da ciência do direito. Sendo um processo dinâmico, cíclico e vivo, a hermenêutica cria os métodos de intepretação, adquirindo enquanto consequência, a sistematização e organização dos processos aplicáveis a fim de alcançar a eficácia na área do Direito prático (FRIEDE, 2015). No âmbito jurídico, a hermenêutica trata da organizaçãode métodos conforme determinados períodos evolutivos, que não excluem os métodos anteriores, mas buscam uma composição e organização da sua aplicabilidade, que, na prática, é determinada pela convicção dos julgadores do caso concreto. Além disso, a modalidade clássica ligada aos preceitos exegéticos da interpretação literal e determinação da vontade do legislador, apesar das críticas apontadas pela escola antipositivista de Savigny, possui relevância mesmo nos dias atuais a partir da evolução do positivismo e das suas influências na ciência da interpretação jurídica (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 51). Desta forma, é necessário compreender ainda que a hermenêutica é uma construção histórica, e que hoje é utilizada de maneira funcional na aplicabilidade do direito, conforme Eltz, Teixeira e Duarte: “[...] a hermenêutica é um ramo UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 128 filosófico responsável pela construção de métodos interpretativos. No âmbito jurídico, diversos métodos, correspondentes a uma evolução de visão da própria ciência jurídica, foram desenvolvidos ao longo dos séculos” (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 47). Diante da eficácia desta ferramenta, “o jurista, esclarecido pela Hermenêutica, descobre, em Código, ou em um ato escrito, a frase implícita, mais diretamente aplicável a um fato do que o texto expresso” (MAXIMILIANO, 2017, p. 13). Além de ser organizadora e criadora de métodos interpretativos para o jurista, ela promove maior eficácia do direito aplicado. No campo da Hermenêutica, a teoria de Wurzel encontra aplicação direta. O elaborador de um Código moderno concentra em norma ampla, nítida, um princípio, uma regra geral. Circundam o núcleo, expresso, positivo, as ideias conexas, espalhadas na zona de transição, na penumbra legal. Parte o intérprete do princípio em foco e descobre, nos lineamentos na aparência imprecisos dos contornos, verdades preciosas, que resolvem dúvidas, esclarecem situações, concorrem para a realização do objetivo supremo do Direito – a harmonia social, a ordem jurídica, alicerce, fundamento de todo progresso humano (MAXIMILIANO, 2017, p. 14). Entretanto, “a hermenêutica jurídica tem que lidar com um texto normativo que, escrito no passado, será aplicado ao presente. É preciso, assim, fixar o seu campo de incidência, o limite de sua abrangência, o seu âmbito de validade (Kelsen) ou o âmbito normativo (Müller)” (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 51). A hermenêutica tem por objeto investigar e coordenar, por modo sistemático, os princípios científicos e leis decorrentes que disciplinam a apuração do conteúdo, do sentido e dos fins das normas jurídicas e a restauração do conceito orgânico do Direito, para efeito de sua aplicação e interpretação, por meio de regras e processos especiais, procurando realizar, praticamente, estes princípios e estas leis científicas; a aplicação das normas jurídicas consiste na técnica de adaptação dos preceitos, nelas contidos e assim interpretados, às situações de fato que se lhes subordinam. FONTE: FRIEDE, 2015, p. 157 NOTA Compreende-se, portanto, a relevância que a hermenêutica possui ao estar inserida na ciência do direito, sendo advinda da filosofia. Eltz, Teixeira e Duarte (2018) colocam que a hermenêutica geralmente é baseada em alguns valores. TÓPICO 1 | HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL 129 Dessa forma, mesmo uma hermenêutica baseada em valores (um positivismo axiológico) é representante de uma evolução exegética, desde que restrita aos chamados hard cases, ou seja, casos em que a solução não pode ser encontrada no sistema normativo e que, por essa característica, merecem um tratamento hermenêutico flexível o suficiente para permitir a presença de elementos exógenos (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 53). Os autores ainda corroboram acerca da temática, acrescendo que o jurista precisa saber diferenciar a teoria da hermenêutica e a prática da interpretação. “A primeira é responsável pela elaboração e discussão dos métodos, princípios e critérios de aplicação do Direito; a segunda, uma ferramenta a ser utilizada pelos juristas ao perseguir o sentido e o alcance da norma” (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 46). Não representa nenhum exagero, sob a ótica anteriormente exposta, afirmarmos que o estudo e o conhecimento da hermenêutica revestem-se de uma importância verdadeiramente capital no contexto das ciências jurídicas, considerando ser seu objetivo específico a indispensável sistematização dos processos aplicáveis, objetivando, em última análise, determinar o sentido final e o alcance específico das variadas expressões do Direito (FRIEDE, 2015, p. 156). Até aqui foi possível compreender os aspectos da hermenêutica jurídica, porém ainda se faz necessária a compreensão da intepretação, sendo esta mais um elemento do direito de grande relevância, conforme Magalhães Filho (2015). Em sentido estrito, poderíamos dizer que a hermenêutica jurídica tem por objeto a interpretação do Direito. Hermenêutica não é interpretação. A primeira é uma teoria que pensa a interpretação e lhe dita as regras do acontecer. A interpretação é um processo cognitivo de apreensão de sentido, orientado pela hermenêutica. A interpretação no Direito tem por objeto as normas jurídicas (normativismo) ou a conduta em interferência intersubjetiva (egologismo) (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 52). Conforme Friede (2015), os conceitos de intepretação e hermenêutica não se confundem, pois a primeira é a aplicação da hermenêutica, fixando os seus preceitos e princípios; e a segunda deve ser compreendida como a teoria da intepretação jurídica. Nader (2019, p. 246) acresce: “A efetividade do Direito depende, de um lado, do técnico que formula as leis, decretos e códigos e, de outro lado, da qualidade da interpretação realizada pelo aplicador das normas”. Portanto, a intepretação não deve ser considerada nem maior e nem menor diante da hermenêutica, mas, sim, seu produto, possuindo a mesma relevância e oferecendo maior eficácia ao jurista diante da ciência jurídica. Sob o império das assertivas anteriormente expostas, é imperioso concluirmos que não se encontra propriamente na norma jurídica – ou mesmo na lei em seu sentido extra amplo – a verdadeira e indispensável UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 130 segurança do Direito. Muito pelo contrário, é importante entendermos que a hermenêutica e, mais especificamente, seu mecanismo próprio – a interpretação da norma jurídica – são o que verdadeiramente desempenham a função básica de proteger o Direito, garantindo, em última análise, uma estabilidade às relações sociopolíticas e socioeconômicas (FRIEDE, 2015, p. 157). Diante das modificações sociais, atualizações e movimentos que surgem a cada dia na sociedade trazendo certa repercussão, é necessário que o direito esteja protegido e preparado para lidar com os casos que surgem no cotidiano e vão se transformando através dos tempos, com isso, a hermenêutica sistematiza as normas jurídicas e oferece a intepretação enquanto ferramenta. “A forma tradicional de interpretação hierárquica, no entanto, é sucedida pelo uso dos já mencionados princípios constitucionais, quando não há regra clara mesmo na lei maior” (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 76). “A interpretação conforme a Constituição é uma ruptura com a hermenêutica clássica dogmática, fazendo parte de uma segunda etapa dessa arte. Nela, os princípios gerais de determinada nação, presentes na sua Constituição, servem como base de preenchimento de lacunas legais” (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 74). Maximiliano (2017, p. 9) traz o conceito de interpretar: “interpretar é explicar, esclarecer; dar o significado de vocábulo, atitude ou gesto; reproduzir por outras palavras um pensamento exteriorizado; mostrar o sentido verdadeiro de uma expressão; extrair, defrase, sentença ou norma, tudo o que na mesma se contém”. Essa ferramenta fornece aos juristas, maneiras de lidar com as questões jurídicas de difícil compreensão de forma legal, ética, correta e eficaz. Se interpretar é conhecer, não há norma jurídica que, de uma forma ou de outra, possa escapar à interpretação. Algumas, sem a menor dúvida, conhecem-se facilmente; outras, no entanto, são conhecidas com maior dificuldade. O somatório de todas, entretanto, é passível, sem qualquer exceção de interpretação. Esta é, justamente, a razão que nos obriga a afastar a crença errônea de que somente se interpretam as normas jurídicas cujo conhecimento envolva necessariamente dificuldades. É totalmente falso o princípio segundo o qual “in claris non fit interpretatio” – quando a norma é clara não se procede à interpretação ou, em outras palavras, as normas claras, as leis claras, não se interpretam ou dispensam a teoria hermenêutica. A afirmação de clareza de uma lei, muito pelo contrário, é, apenas, um estágio obrigatório de sua interpretação (FRIEDE, 2015, p. 160). A interpretação derivada da hermenêutica é caracterizada pela seriedade e o foco na ciência: não é o jurista com suas crenças pessoais e culturais que irá interpretar com seu olhar pessoal, mas, sim, através de uma base teórica e fundamentada no direito que trabalhará de forma ética e de acordo com seus princípios profissionais. “A palavra interpretação possui amplo alcance, não se limitando à Dogmática Jurídica. Interpretar é o ato de explicar o sentido de alguma coisa; é revelar o significado de uma expressão verbal, artística ou constituída por um objeto, atitude ou gesto” (NADER, 2019, p. 247). TÓPICO 1 | HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL 131 A interpretação que dá o legislador, por exemplo, a uma posição preliminar é uma modalidade de justificação de atos legislativos, privativa, contudo, das codificações. É uma peça ampla, analítica, que não se limita às referências fáticas ou às informações jurídicas. É elaborada, na realidade, pelos autores de anteprojeto de códigos. Nela são indicadas as inovações incorporadas ao texto e suas fontes inspiradoras, as teorias consagradas e as referências necessárias do Direito Comparado. FONTE: FRIEDE, 2015, p. 163 NOTA Interpretação é um ato de inteligência, cultura e sensibilidade. Somente o espírito capaz de compreender se acha apto às tarefas de decodificação. Ao sujeito cognoscente não basta, assim, a capacidade de articulação do raciocínio, pois a cultura – ou conhecimento da vida e da realidade – é um fator essencial à busca de novos conhecimentos (NADER, 2019, p. 248). Nesse sentido, é importante ressaltar que a aplicação da interpretação não dispensa a hermenêutica, como apresenta Maximiliano (2017). A aplicação não prescinde da hermenêutica: a primeira pressupõe a segunda, como a medicação a diagnose. Em erro também incorre quem confunde as duas disciplinas: uma, a Hermenêutica, tem um só objeto: a lei; a outra, dois: o Direito, no sentido objetivo, e o fato. Aquela é um meio para atingir a esta; é um momento da atividade do aplicador do Direito. Pode a última ser o estudo preferido do teórico; a primeira, a aplicação, revela o adaptador da doutrina à prática, da ciência à realidade: o verdadeiro jurisconsulto (MAXIMILIANO, 2017, p. 8). Contudo, a intepretação oriunda da hermenêutica possui sua eficácia sendo resultado de bases fundamentadas pela ciência do direito. “Da simplicidade, clareza e concisão do Direito escrito, vai depender a boa interpretação, aquela que oferece uma diretriz segura, que orienta quanto às normas a serem vividas no plexo social, nos pretórios e onde mais é considerado (obras doutrinárias, salas de aula etc.)” (NADER, 2019, p. 246). A interpretação das normas jurídicas de Direito Constitucional, por obra do óbvio, também se enquadra no mesmo sistema básico de interpretação hermenêutica a que estão adstritas todas as demais normas jurídicas do Direito como um todo. A única diferença que deve ser observada, neste particular, cinge-se apenas e tão somente à efetiva caracterização binária – de natureza político-jurídica – que ostenta, de forma diversa das normas infraconstitucionais, as normas jurídicas constitucionais, notadamente as de cunho materialmente constitucionais (FRIEDE, 2015, p. 176). UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 132 Entretanto, a intepretação na esfera constitucional necessita possuir embasamento jurídico de acordo com a ciência do direito como um todo. Friede (2015, p. 166) apresenta: “O argumento a contrário sensu, por outro lado, é o componente da interpretação lógica, que utiliza o fato de que a lei sempre faculta a conclusão pela exclusão, dada a regra hermenêutica que afirma que as exceções devem vir sempre expressas”. “O intérprete é o renovador inteligente e cauto, o sociólogo do Direito. O seu trabalho rejuvenesce e fecunda a fórmula prematuramente decrépita, e atua como elemento integrador e complementar da própria lei escrita. Esta é a estática e a função interpretativa, a dinâmica do Direito” (MAXIMILIANO, 2017, p. 11). O profissional que exerce a interpretação é o responsável por manter os princípios e valores do direito, independente da interpretação, baseado na hermenêutica. Ele precisa estar atento sobre a teoria da hermenêutica e a prática da intepretação e possuir isso de maneira nítida ao tomar decisões (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018). Por outro lado, se a todos, por seu cunho de generalidade, as normas se destinam, é necessário interpretá-las. No entanto, é claro que não é preciso dizer que algumas pessoas estão mais capacitadas do que outras para a interpretação das normas jurídicas. Também se torna desnecessário que se diga que o conhecimento de muitas normas é extremamente difícil e, às vezes, tais dificuldades são agravadas até mesmo pelo próprio legislador. Na verdade, estuda-se o Direito acima de tudo e, inclusive, com essa finalidade elementar (a interpretação) (FRIEDE, 2015, p. 160). No entanto, em especial, será a filosofia que abrirá os horizontes – e, mesmo, deslocará o problema – da Hermenêutica jurídica. Passam por essa ruptura com o modelo burguês-iluminista de controle racional da argumentação e da decisão estatal pensadores notoriamente ocupados da questão, como Hans-Georg Gadamer, ao tratar da pré-compreensão existencial, mas também Freud, com a descoberta do inconsciente e de sua natureza determinante do sentido, Marx e Althusser, ao desvendarem a ideologia como horizonte de constituição da intelecção de mundo dos sujeitos, e Foucault, com a perspectiva de uma estruturação das relações de compreensão a partir da microfísica do poder (MAXIMILIANO, 2017, p. 11). INTERESSANTE Todavia, compreende-se a construção histórica da hermenêutica, assim como a da interpretação na esfera constitucional, podendo considerar tais construções enquanto evoluções em caráter organizativo do direito, ao fornecer TÓPICO 1 | HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL 133 ferramentas ao jurista de caráter científico e aplicável aos casos, ao mesmo passo em que demonstra efetividade. “O método hermenêutico é um só, mas as técnicas interpretativas são várias. As técnicas exteriorizam o método, assim como no Direito Processual diz-se que o procedimento exterioriza o processo” (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 61). Pontua-se, portanto, que “a interpretação jurídica é a aplicação dos métodos hermenêuticos na busca da definição do alcance e do conteúdo da norma. Essa interpretação é necessária quando o sistema não dá ao jurista a clareza necessária para a aplicação direta da norma ao caso concreto” (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 67). Desta forma, a intepretação fornece ao jurista a clarificação necessária para atuar no caso concreto de formacorreta diante das normativas do direito. A interpretação consiste na busca do verdadeiro sentido das coisas e, para isso, o espírito humano lança mão de diversos recursos, analisa os elementos, utiliza-se de conhecimentos da lógica, psicologia e, muitas vezes, de conceitos técnicos, a fim de penetrar no âmago das coisas e identificar a mensagem contida (NADER, 2019, p. 247). Os autores ainda acrescem: “a interpretação é o aspecto prático da hermenêutica. Enquanto a hermenêutica é o ramo da filosofia responsável pela criação de métodos de interpretação, a interpretação é a aplicação desses métodos em determinado objeto” (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 67). A interpretação jurídica é um instrumento indispensável ao jurista. No período das glosas do Corpus Iuris Civilis de Justiniano e na exegese positivista de Hans-Kelsen, o culto à literalidade da lei resultava em um exercício de aplicação limitado pelos juristas da época (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 67). IMPORTANTE Certamente a interpretação jurídica trouxe maiores ferramentas ao jurista, sendo indispensável a sua utilização na atualidade, retirando estes profissionais de uma atuação limitada, e fornecendo maiores subsídios jurídicos. “Essa interpretação pode ser realizada a partir da literalidade da norma ou a partir da descoberta de sentidos ocultos da norma, revelados por métodos sistemáticos ou mesmo pela aplicação dos seus princípios gerais” (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 71). UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 134 A interpretação, como as artes em geral, possui a sua técnica, os meios para chegar aos fins colimados. Foi orientada por princípios e regras que se desenvolveu e aperfeiçoou à medida que evolveu a sociedade e desabrocharam as doutrinas jurídicas. A arte ficou subordinada, em seu desenvolvimento progressivo, a uma ciência geral, o Direito obediente, por sua vez, aos postulados da Sociologia; e a outra, especial, a Hermenêutica. Esta se aproveita das conclusões da Filosofia Jurídica; com o auxílio delas fixa novos processos de interpretação; enfeixa-os num sistema e, assim, areja com um sopro de saudável modernismo a arte, rejuvenescendo-a, aperfeiçoando-a, de modo que se conserve à altura do seu século, como elemento de progresso, propulsor da cultura profissional, auxiliar prestimosa dos pioneiros da civilização (MAXIMILIANO, 2017, p. 17). Para Nader (2019), a eficácia da interpretação é resultado da eficiência da técnica legislativa, o jurista, além de avaliar os fatos sociais e categorizá-los, deve manter as regras jurídicas mediante a sua estrutura. O intérprete encontra menor complexibilidade quando os documentos estão melhor escritos, além de a hermenêutica oferecer princípios para tal atuação. Assim, é possível dizer que a interpretação é a aplicação das ferramentas hermenêuticas às normas jurídicas, sejam leis, atos administrativos, sentenças e outras fontes de Direito a partir de ferramentas que se atenham a sua literalidade ou aos seus sentidos ocultos a partir do uso de critérios e ferramentas desenvolvidas para determinar o alcance e sentido das normas (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 70). “Compreendido o conceito e as características da intepretação do ordenamento jurídico, faz-se necessário avaliar e conhecer os tipos de interpretações, que são as ferramentas interpretativas para os juristas utilizarem no dia a dia” (ELTZ; TEIXEIRA; DUARTE, 2018, p. 79). A interpretação jurídica é um meio de aplicar a legislação, em que devem ser considerados pelo intérprete a literalidade da lei, a coerência sistemática e hierárquica das leis, a vontade do legislador como aspecto histórico e as circunstâncias do caso concreto. Por fim, a finalidade objetiva da lei extraída do próprio sistema jurídico e, em caso de lacunas substanciais, devemos buscar na Constituição e nos princípios fundamentais a solução do conflito normativo que se apresenta. TÓPICO 1 | HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL 135 QUADRO 1 – ELEMENTOS INTERPRETATIVOS CONFORME MAGALHÃES FILHO INTERPRETAÇÃO GRAMATICAL A interpretação gramatical consiste numa análise morfológica e sintática do texto normativo. Por ela, se procuram verba legis. Essa era a única interpretação admitida pela Escola de Exegese na França. Essa Escola surgiu com a pretensão de fazer a exegese do Código, ou seja, a sua dissecação e análise textual, o que se dava geralmente através dos comentários. A Escola Histórica do Direito, entretanto, mostrou que a compreensão do sentido (espiritual) é diferente da exegese do texto (literal). A interpretação gramatical, embora necessária, não é suficiente (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 62). INTERPRETAÇÃO LÓGICA A interpretação lógica em sentido amplo é a pesquisa do sentido da norma à luz de qualquer elemento exterior com o qual ela deve se compatibilizar. Desse modo, toda interpretação que não fosse gramatical seria lógica. A interpretação lógica em sentido estrito, que nos interessa agora, é a interpretação da norma a partir do elemento exterior que está imediatamente ligado a ela, ou seja, à vontade do legislador. É verdade que já houve quem entendesse a interpretação lógica como aquela que estuda a conexão entre as palavras dentro das frases que compõem o texto normativo, mas, aí, nós teríamos a análise sintática e, logo, interpretação gramatical (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 63). INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA A interpretação sistemática é a responsável pela unidade e coerência do ordenamento jurídico. O legislador não cria o ordenamento jurídico, mas um conjunto de normas que são desconexas. É o jurista que constitui o objeto de sua ciência através de um método que sistematiza a matéria jurídica amorfa, imprimindo-lhe forma de ordenamento jurídico. Para Nelson Saldanha, existem as fontes jurídicas que estão dentro da ordem normativa, as fontes formais e as fontes da própria ordem normativa, denominadas de fontes reais ou materiais. Na interpretação sistemática tradicional, aquela que estamos destacando agora, busca-se a coerência formal, ou seja, do sistema exterior (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 67). INTERPRETAÇÃO FILOLÓGICA Alguns autores inserem a interpretação filológica na interpretação gramatical, enquanto outros, como Savigny, a consideram presente na interpretação histórica. Para Savigny, a interpretação histórica se dividia em interpretação histórica em sentido próprio e interpretação histórica em sentido filológico. A interpretação filológica é a interpretação dos textos à luz da tradição ou sentido histórico das palavras. A filologia considera o sentido das palavras no tempo, pois as palavras mudam de sentido com o passar dos anos dentro dos novos jogos de linguagem. Assim, o intérprete precisa considerar as palavras usadas na norma com o significado que possuíam quando houve a elaboração de seu texto. Isso não impede novas interpretações da norma, mas, se elas forem necessárias, não se basearão no novo uso das palavras, porém em novas necessidades sociais (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 71). UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 136 INTERPRETAÇÃO HISTÓRICA A interpretação histórica, proposta como método primeiramente por Savigny, é a interpretação da norma jurídica à luz da occasio legis – circunstância histórica da regra interpretada – e da origo legis – origens da lei, remontando às primeiras manifestações da instituição regulada. Assim, a occasio legis diz respeito às causas históricas próximas e a origo legis, às causas remotas. Na interpretação da norma que leva em conta as causas históricas próximas, o exame dos acontecimentos no interior do órgão do Poder Legislativo resultará na chamada interpretação genética. Aqui, há uma grande proximidade com a interpretação lógica. Savigny trouxe para o Direito o método hermenêutico utilizado nas ciências históricas, visando a elevar oDireito à categoria de ciência do espírito, daí o nome de sua Escola ser Escola Histórica do Direito (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 71). INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA OU FINALÍSTICA A interpretação teleológica ou finalística é a interpretação da norma a partir do fim (vantagem) social a que ela se destina. É uma interpretação que faz da norma um meio para atingir um fim, sendo que o meio será valorado pela sua aptidão para atingir o fim do modo mais efetivo possível dentro das circunstâncias dadas (pragmatismo, utilitarismo). Dentro dessa premissa, o sentido literal do dispositivo ganha maleabilidade para se subordinar ao fim social colimado. O fim social específico de uma norma é, em sentido amplo, uma ênfase da sociedade. Assim, a política de proteção ao consumidor, por exemplo, determinou, no art. 47 da Lei número 8.078/90, o seguinte acerca da interpretação contratual: “Art. 47. As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor” (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 72). FONTE: Adaptado de Magalhães Filho (2015) Para Nader, tais são os elementos interpretativos do direito: gramaticais, lógico, sistemático, histórico e teleológico, que compõem a interpretação oriunda da hermenêutica. “A interpretação pode ter dupla finalidade: teórica e prática. É teórica quando visa apenas a esclarecer, como é próprio da doutrina. É prática quando se destina à administração da justiça e aplicação nas relações sociais” (NADER, 2019, p. 249). Nader ainda coloca: “A hermenêutica jurídica não se ocupa apenas das regras jurídicas genéricas. Fornece também princípios e regras aplicáveis na interpretação das sentenças judiciais e negócios jurídicos” (NADER, 2019, p. 249). TÓPICO 1 | HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL 137 QUADRO 2 – ELEMENTOS INTERPRETATIVOS CONFORME NADER ELEMENTO GRAMATICAL Se tratando de Direito escrito é pelo elemento gramatical que o intérprete toma o primeiro contato com a proposição normativa. Malgrado a palavra se revele, às vezes, um instrumento rude de manifestação do pensamento, pois nem sempre consegue traduzir as ideias, constitui a forma definitiva de apresentação do Direito, pelas vantagens que oferece do ponto de vista da segurança jurídica. Cumpre ao legislador aperfeiçoar os processos da técnica legislativa, objetivando sempre uma redação simples, clara e concisa. O elemento gramatical compõe-se da análise do valor semântico das palavras empregadas no texto, da sintaxe, da pontuação etc. No Direito antigo, o processo literal era mais importante do que hoje (NADER, 2019, p. 260). ELEMENTO LÓGICO Por ser estrutura linguística que pressupõe vontade e raciocínio, o texto legislativo exige os subsídios da lógica para a sua interpretação. A partir de F. Gény surgiu a distinção, na hermenêutica, da lógica interna, que explora os elementos fornecidos pela lógica formal e se limita ao estudo do texto, e a lógica externa, que investiga as razões sociais que ditaram a formação dos comandos jurídicos. Modernamente se fala na lógica do razoável, doutrina desenvolvida por Recaséns Siches, que visa a combater o apego às fórmulas frias e matemáticas da lógica formal, em favor de critérios flexíveis, mais favoráveis à justiça (NADER, 2019, p. 260). ELEMENTO SISTEMÁTICO Não há, na ordem jurídica, nenhum dispositivo autônomo, autoaplicável. A norma jurídica somente pode ser interpretada e ganhar efetividade quando analisada no conjunto de normas pertinentes a determinada matéria. Quando um magistrado profere uma sentença, não aplica regras isoladas; projeta toda uma ordem jurídica ao caso concreto. O ordenamento jurídico compõe-se de todos os atos legislativos vigentes, bem como das normas costumeiras válidas, que mantêm entre si perfeita conexão. Entre as diferentes fontes normativas, não pode haver contradições. De igual modo, deve haver completa harmonia entre os dispositivos de uma lei, a fim de que haja unicidade no sistema jurídico, ou seja, uma única voz de comando. Para que a ordem jurídica seja um todo harmônico, é indispensável que a hierarquia entre as fontes formais seja preservada. Se os dispositivos de uma lei se interdependem e se as diferentes fontes formais do Direito possuem conexão entre si, a interpretação não pode ter por objeto dispositivos ou textos isolados. O trabalho de exegese tem de ser feito considerando-se todo o acervo normativo ligado a um assunto (NADER, 2019, p. 262). ELEMENTO HISTÓRICO Muitas vezes, os conhecimentos gramatical e lógico do texto legislativo não são suficientes à compreensão do espírito da lei, sendo necessário o recurso à pesquisa do elemento histórico. Como força viva que acompanha as mudanças sociais, o Direito se renova, ora aperfeiçoando os institutos vigentes, ora criando outros, para atender ao desafio dos novos tempos. Em qualquer situação, o Direito se vincula à história, e o jurista que almeja um conhecimento profundo da ordem jurídica, forçosamente, deverá pesquisar as raízes históricas do Direito Positivo. A Escola Histórica do Direito, concebendo o fenômeno jurídico como um produto da história, enfatizou a importância do elemento histórico para o processo de interpretação. O Direito atual, manifesto em leis, códigos e costumes, é um prolongamento do Direito antigo. A evolução da ciência jurídica nunca se fez mediante saltos, mas através de conquistas graduais, que acompanharam a evolução cultural registrada em cada época. Quase todos os institutos jurídicos atuais têm suas raízes no passado, ligando-se às legislações antigas. UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 138 Entre as disciplinas jurídicas, a História do Direito tem por escopo o estudo do Direito sob a perspectiva histórica; dedica-se à investigação das origens do Direito de uma sociedade específica ou de todos os povos, com a preocupação de estudar o desenvolvimento das instituições e dos sistemas (NADER, 2019, p. 263). ELEMENTO TELEOLÓGICO Na moderna hermenêutica, o elemento teleológico assume papel de primeira grandeza. Tudo o que o homem faz e elabora é em função de um fim a ser atingido. A lei é obra humana e assim contém uma ideia de fim a ser alcançado. Na fixação do conceito e alcance da lei, sobreleva de importância o estudo teleológico, isto é, o estudo dos fins colimados pela lei. Enquanto a occasio legis ocupa-se dos fatos históricos que projetaram a lei, o fator teleológico investiga os fins que a lei visa a atingir. Quando o legislador elabora uma lei, parte da ideia do fim a ser alcançado. Os interesses sociais que pretende proteger inspiram a formação dos documentos legislativos. Assim, é natural que no ato da interpretação se procure avivar os fins que motivaram a criação da lei, pois nessa descoberta estará a revelação da mens legis. Como se revela o elemento teleológico? Os fins da lei se revelam através dos diferentes elementos de interpretação (NADER, 2019, p. 264). FONTE: Adaptado de Nader (2019) O trabalho de interpretação do Direito é uma atividade que tem por escopo levar ao espírito o conhecimento pleno das expressões normativas, a fim de aplicá-lo às relações sociais. Interpretar o Direito é revelar o sentido e o alcance de suas expressões. Fixar o sentido de uma norma jurídica é descobrir a sua finalidade; é pôr a descoberto os valores consagrados pelo legislador, aquilo que teve por mira proteger. Fixar o alcance é demarcar o campo de incidência da norma jurídica; é conhecer sobre que fatos sociais e em que circunstâncias a norma jurídica tem aplicação (NADER, 2019, p. 248). Nader (2019) e Magalhães Filho (2015) colocam os elementos interpretativos oriundos da hermenêutica, que podem ser considerados organizados e pontuados a fim de serem utilizados pelo jurista, facilitando o trabalho dos intérpretes. A interpretação sociológica possui três objetivos: a) eficacial; b) atualizador; e c) transformador. Através doseu primeiro objetivo, a interpretação sociológica procura conferir aplicabilidade à norma com relação aos fatos sociais por ela previstos, ou seja, prefere-se a interpretação que propicie mais eficácia para a norma. Para os autores que entendem que a nova hermenêutica constitucional não passa de um desdobramento da velha hermenêutica jurídica, o princípio de interpretação constitucional da máxima efetividade dos valores é apenas uma extensão da interpretação sociológica considerada no seu objetivo eficacial (MAGALHÃES FILHO, 2015, p. 74). TÓPICO 1 | HERMENÊUTICA E INTERPRETAÇÃO JURÍDICA E APLICAÇÃO DO DIREITO NA SOLUÇÃO DO CASO CONCRETO NA ESFERA CONSTITUCIONAL 139 A interpretação, conforme a Constituição, desenvolve-se, atualmente, no âmbito doutrinário e dos tribunais. Nesse sentido, sempre que a norma jurídica oferecer mais de um sentido e um deles for contrário à Lei Maior, apenas este será considerado inconstitucional. De acordo com o critério, uma norma pode ser parcialmente inconstitucional, quando então deverá ser aproveitado apenas o sentido que se harmonize com a regra hierarquicamente superior. O princípio em pauta é mais de aplicação do que de interpretação do Direito, pois visa a orientar sob qual sentido a norma integra a ordem jurídica (NADER, 2019, p. 249). INTERESSANTE Contudo, considera-se a hermenêutica relevante e precursora da interpretação: ferramentas para o jurista em sua atuação cotidiana executar o direito enquanto ciência de forma ética e correta. A interpretação fornece subsídios de clareamento das constituições, artigos e cláusulas legislativas, a fim de ofertar ainda mais organicidade na constituição como um todo. 140 RESUMO DO TÓPICO 1 Neste tópico, você aprendeu que: • A Hermenêutica Jurídica tem por objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito. • As regras de hermenêutica são regras de interpretação, de aplicação e de integração do Direito. • A hermenêutica é pertencente à filosofia. • Interpretar é explicar, esclarecer; dar o significado de vocábulo, atitude ou gesto; reproduzir por outras palavras um pensamento exteriorizado; mostrar o sentido verdadeiro de uma expressão; extrair, de frase, sentença ou norma, tudo o que na mesma se contém. • O profissional que exerce a interpretação é o responsável por manter os princípios e valores do direito, independente da interpretação, baseado na hermenêutica. • A hermenêutica jurídica fornece também princípios e regras aplicáveis na interpretação das sentenças judiciais e negócios jurídicos. 141 1 Conforme estudado neste tópico, a interpretação sociológica possui três objetivos: a) ( ) Hermenêutica, constituição, transformador. b) ( ) Interpretação, hermenêutica e gramatical. c) ( ) Eficacial, atualizador e transformador. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 2 Nader (2019) trouxe alguns elementos que compõem a intepretação, os quais podem ser chamados de elementos interpretativos dos direitos. Quais são eles? a) ( ) Gramaticais, lógico, sistemático, histórico e teleológico. b) ( ) Teleológico, gramaticais e sistemático, apenas. c) ( ) Histórico e teleológico, apenas. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. AUTOATIVIDADE 142 143 TÓPICO 2 POSIÇÕES JURÍDICAS DOS SUJEITOS DE DIREITO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO O homem atual vive e permeia em sociedade – isso é fato. Além disso, somos seres relacionais – vivemos em relação o tempo todo: patrão e empregado, esposa e marido, pai e filho... A estas, chamamos de relações sociais. Essas relações sociais possuem um grande potencial de gerar conflito, e com isso, o direito entra através das relações jurídicas. Você já ouviu falar em relação jurídica? Ela diz respeito sobre a conduta dos sujeitos no meio jurídico. Ela é proveniente das relações sociais, mas agrega- se com alguns elementos do direito científico. Já parou para pensar que, sem sociedade e sem sujeitos o direito não existiria? Pois é! Quando tratamos da relação jurídica em si, estamos nos referindo ao vínculo que o direito acaba reconhecendo entre pessoas ou grupos em seus direitos e deveres. Neste tópico você aprenderá o que é uma relação jurídica, as posições dos sujeitos de direito nessas relações e os elementos que a constitui. Portanto, reconhecerá a maneira na qual as relações jurídicas são aplicáveis, sua eficácia e funcionalidade no direito enquanto prática. Bons estudos! 2 POSIÇÕES JURÍDICAS DOS SUJEITOS DE DIREITO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS As relações jurídicas são compostas por indivíduos que vivem em âmbito social, sendo assim, são formadas pela sociedade. “As relações sociais fornecem como que a matéria-prima do Direito. Se reguladas pelo Direito, fundam relações jurídicas” (ASCENSÃO, 2010, p. 10). Além disso, Betioli (2015, p. 337) acresce que “Não há relação jurídica se não houver um fato que corresponda a certas normas ou regras de direito”. 144 UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA Pode-se dizer ainda que: “A teoria da relação jurídica surge como complemento à teoria da norma jurídica. De fato, há um conteúdo concreto inerente à norma jurídica, cuja vivência se manifesta por meio das relações de vida determinadas pelas normas. São as relações jurídicas” (BETIOLI, 2014, p. 336). Dessa forma, compreende-se a relação de complementariedade entre a relação e a norma jurídica de forma geral. A relação jurídica tem como pressuposto um fato que adquire significação jurídica se a lei o tem como idôneo à produção de determinados efeitos, estatuídos ou tutelados. Assim, todo evento, um acontecimento natural, uma ação humana, converte-se em fato jurídico, em condições de exercer essa função (GOMES, 2016, p. 72). Entretanto, Amaral (2017, p. 257) coloca: “Relação jurídica é o vínculo que o direito reconhece entre pessoas ou grupos, atribuindo-lhes poderes e deveres. Representa uma situação em que duas ou mais pessoas se encontram a respeito de bens ou interesses jurídicos”. Sendo o direito formado por fenômenos sociais vivenciados pelo homem, a relação jurídica diz respeito a este vínculo entre direito e indivíduo. A relação jurídica em si é uma realidade pré-legal: há relações jurídicas independentemente de leis que as moldem. Haverá que estudá- las, além de outras realidades, como as pessoas, bens e ações. No entanto, na Teoria Geral, só nos pode ocupar a análise dos elementos constantes e não o conteúdo ilimitadamente variável de cada situação (ASCENSÃO, 2010, p. 10). Para Betioli (2014, p. 112), “A relação que se diz jurídica diz mais do que relação social, exatamente porque dela resulta um “ter que fazer” ou um “ter que aceitar” inexorável. Ninguém conceitua como direito a resultante de mera conveniência, ou de simples conselho”. Desse modo, a relação jurídica é cerceada por imposições e regras, a fim de conduzir determinados comportamentos e normatizar questões do direito. Os homens entram em contato uns com os outros visando à obtenção dos mais diversos fins: econômicos, morais, recreativos, culturais etc. Em decorrência desses laços que os prendem entre si, formam-se as “relações sociais”. Na busca desses fins, o homem serve-se do direito para a sua realização. Como ressalta Reale (2002), ninguém se relaciona socialmente visando a fins estritamente jurídicos; “o Direito é mais um instrumento de vida do que finalidade de vida”. Consequência disso é que toda relação jurídica sempre é uma relação social; mas nem sempre todos os laços sociais são jurídicos. A relação jurídica é uma espécie de relação social (BETIOLI, 2014, p. 336). Sendo uma espécie de relação social, a relação jurídica coloca-se enquanto acessível, porém não é reduzida apenas a isso. Mantém seus valores, regras e normativas, seguindo os preceitos do direito. “A relação jurídica é um dos TÓPICO 2 | POSIÇÕES JURÍDICAS DOS SUJEITOS DE DIREITO NASRELAÇÕES JURÍDICAS 145 critérios ou ângulos de apreciação do fenômeno jurídico, e traduz uma concepção personalista do fenômeno jurídico” (AMARAL, 2017, p. 258). As relações sociais são uma realidade, embora não material nem psicológica. Apreendem-se por meio de juízos, que são juízos de realidade. Tal como muitas outras entidades são reais, não obstante o observador só pode captá-las por meio de um juízo. O perigo, por exemplo, é real, embora só seja determinável por um juízo do observador (ASCENSÃO, 2010, p. 10). Para Gomes (2016), a relação jurídica pode ser encarada sob dois aspectos: • Aspecto 1: vínculo entre dois ou mais sujeitos de direito que obriga um deles, ou os dois, a ter certo comportamento. É, também, o poder direto de uma pessoa sobre determinada coisa. • Aspecto 2: quadro no qual se reúnem todos os efeitos atribuídos por lei a esse vínculo, ou a esse poder. Em outras palavras, é o conjunto dos efeitos jurídicos que nascem de sua constituição, consistentes em direitos e deveres - com estes, entretanto, não se confundindo. Diante disso, compreende-se a relevância da relação jurídica em ambos os aspectos citados por Gomes, sendo a relação social um canal de surgimento da relação jurídica, passando assim, a um novo patamar relacional. “Em suma, na relação jurídica há sempre um valor que integra os comportamentos de dois ou mais indivíduos, permitindo-lhes e assegurando-lhes um âmbito de pretensões exigíveis” (BETIOLI, 2014, p. 117). O autor ainda acresce: “A relação jurídica, portanto, vem a ser o vínculo entre pessoas, do qual derivam consequências obrigatórias, por corresponder a uma hipótese normativa” (BETIOLI, 2014, p. 338). Sua principal fonte de referência é a experiência jurídica privada, conjunto de relações cujo conteúdo, isto é, os poderes e os deveres, é determinado pela autonomia dos particulares. Essa experiência particular consiste nas relações sociais de que os indivíduos participam e que, pela possibilidade potencial de gerarem conflitos de interesses, são disciplinadas pelo direito (AMARAL, 2017, p. 258). São exemplos de relação jurídica a relação que se estabelece entre consumidor e fornecedor, a relação matrimonial, a relação de parentesco entre descendentes do mesmo ancestral, a relação locatícia entre locador e locatário, a relação de condomínio entre os coproprietários de uma coisa, a relação de responsabilidade civil solidária entre os que praticam um ato ilícito, a relação que existe entre os herdeiros do mesmo falecido etc. (AMARAL, 2017, p. 258) INTERESSANTE 146 UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA Além disso, Betioli (2014, p. 337) corrobora acerca das relações sociais enquanto ressonância social: De fato, há certas relações sociais que, pela sua ressonância no equilíbrio social, não podem ficar dependendo e sob o comando das preferências individuais. Elas devem, então, ser reguladas pelo direito, passando a ser “jurídicas”. O que as torna jurídicas é o fato de que o ordenamento jurídico atribui aos sujeitos da relação direitos e deveres. Portanto, o que caracteriza a relação jurídica não é o “conteúdo”, mas a “forma”, ou seja, o modo como os sujeitos se comportam um em relação ao outro, segundo a atribuição de direitos e deveres. Entretanto, a relação jurídica é regulada pelo direito, passando pelo ordenamento jurídico e chegando na relação de direitos e deveres, sendo que, de forma geral, diz respeito a questões de comportamento com os demais cidadãos. “É conceito básico do direito privado, representando a situação jurídica de bilateralidade que se estabelece entre sujeitos, uns em posição de poder, e outros em correspondente posição de dever” (AMARAL, 2017, p. 257). Uma vez que as relações jurídicas são predominantemente relações humanas, de pessoa para pessoa, de sujeito para sujeito, supõe-se que todas hão de ser um vínculo pessoal. De fato, a relação social é, por definição, a que se trava entre homens, mas isso não significa que o Direito rege apenas relações sociais, nem que outras sujeições, como a de coisa ao homem, não possam ter igual qualificação no vocabulário jurídico. Não há coincidência necessária entre relação humana e relação jurídica. Outros tipos de vinculação também se classificam como autênticas relações jurídicas, ou vínculos dessa natureza (GOMES, 2016, p. 70). Betioli (2014, p. 339) apresenta que a relação jurídica apresenta dois requisitos: “um, de ordem material (a relação social, o comportamento dos indivíduos) e outro de ordem formal (o seu reconhecimento pela ordem jurídica). Portanto, dois requisitos são necessários para que haja uma relação jurídica”. Observe o esquema a seguir: QUADRO 3 – REQUISITOS DA RELAÇÃO JURÍDICA REQUISITOS DA RELAÇÃO JURÍDICA a) Uma relação intersubjetiva, ou seja, um vínculo entre duas ou mais pessoas. Só “pessoas” podem ser sujeitos da relação jurídica. b) A correspondência ou adequação do vínculo com uma hipótese normativa, decorrendo por isso consequências obrigatórias. Tal adequação, em certos campos do direito, como no direito civil, pode operar-se por analogia. Em outros, por exemplo no direito penal, tem de ser precisa e rigorosa com a hipótese prevista na norma jurídica. Uma relação social pode também caracterizar-se como jurídica em um ramo de direito e não em outro: uma relação jurídica, por exemplo, pode ser “civil” e não ser relação jurídica “penal”. FONTE: Betioli (2014, p. 339) TÓPICO 2 | POSIÇÕES JURÍDICAS DOS SUJEITOS DE DIREITO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS 147 Ademais, faz necessário considerar que o conceito de relação jurídica é um tanto quanto moderno na ciência do direito, como pontua Amaral (2017, p. 262). O conceito de relação jurídica é, assim, um conceito moderno na ciência do direito. Pertence ao direito privado, embora, por sua importância, seja também objeto da teoria do direito, e utilizado nos demais campos da ciência jurídica. É também ponto de partida do raciocínio jurídico, como pressuposto de legitimidade das partes intervenientes na questão de direito ou problema jurídico que se oferece ao intérprete. Portanto, ainda em desenvolvimento, a relação jurídica traz consigo questões de avaliação, verificação, elementos pontuais, sujeitos relacionais, dentre outras questões que permeiam o direito. “O conceito de relação jurídica tem grande importância para a teoria do direito e, particularmente, para o direito civil, pelas funções que desempenha” (AMARAL, 2017, p. 267). ASPECTOS HISTÓRICOS DA RELAÇÃO JURÍDICA O conceito de relação jurídica é produto da pandectística alemã. Introduzido por Savigny, influenciado por Kant, que pela primeira vez se serviu dessa categoria para explicar a ideia do jurídico, consiste, ainda hoje, em uma das mais importantes categorias da técnica do direito privado e um dos mais importantes critérios de orientação da teoria do direito. Embora noção antiga, com antecedentes no direito romano (iuris vinculum, nexum, coniunctio), e no direito canônico medieval em matéria de casamento (relatio), foi com a pandectística alemã que se alçou à condição de conceito básico do sistema jurídico, considerada “relação de pessoa a pessoa, determinada por uma regra jurídica”. Com os juristas alemães do século XIX, que viam o direito como expressão da vida social e das relações que a constituem, a relação jurídica sofre uma dupla e complexa evolução. Por um lado, talvez pela circunstância de o direito civil ser, na época, o mais importante ramo do direito, tentou-se aplicar esse conceito aos demais ramos jurídicos (AMARAL, 2017, p. 260). NOTA A importância da relação jurídica manifesta-se ainda em algumas constatações de ordem prática. Só existem problemas jurídicos, ou conflitos de interesses, entre pessoas que integram relações jurídicas. Por isso, a ideia de direito e de justiça pressupõe um vínculo intersubjetivo, com direitos e deveres (AMARAL, 2017, p. 268). 148 UNIDADE 3 | O DIREITONO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA Todavia, conclui-se que os problemas jurídicos e conflitos surgem a partir das relações jurídicas, perante a violação dos direitos/deveres dos sujeitos que vivem em sociedade. “Nesta ordem de ideias, é de se admitir a existência de relações jurídicas: 1º – entre uma pessoa e uma coisa; 2º – entre duas pessoas; 3º – entre uma pessoa e determinado lugar” (GOMES, 2016, p. 71). Amaral (2017, p. 272) discorre que “a relação jurídica e os direitos nela contidos nascem, modificam-se e extinguem-se por efeito de certos acontecimentos que o direito considera importantes e que, por isso, lhes dá eficácia jurídica. São os fatos jurídicos”. Desta forma, percebe-se a seriedade, ao mesmo passo da flexibilidade diante da relação jurídica ao ponderar os fatos jurídicos, conforme o direito de modo geral. Visto que a relação jurídica se trata entre dois sujeitos de direito, eles ocupam posições contrapostas. Na relação designam-se como partes. Destas distinguem-se os terceiros, que são as pessoas alheias à relação, mas que têm algum interesse em sua normalidade ou podem sofrer por sua causa um prejuízo. Uma vez que a relação jurídica é uma correlação entre posições contrárias, poderes e deveres das partes têm ordinariamente conteúdo distinto, mas em algumas, como na relação entre marido e mulher, o conteúdo é idêntico para as duas (GOMES, 2016, p. 70). Betioli (2014) postula ainda sua concepção acerca dos aspectos filosóficos acerca da relação jurídica, conforme a tabela a seguir. QUADRO 4 – ASPECTOS FILOSÓFICOS ACERCA DA RELAÇÃO JURÍDICA a) De acordo com a teoria tradicional (jusnaturalista), as relações jurídicas seriam relações sociais postas por si mesmas, apenas reconhecidas pelo Estado, com a finalidade de protegê-las. b) Atualmente, segundo Reale (2002), prevalece a concepção segundo a qual as relações jurídicas surgem em virtude de ato constitutivo do Estado, ou seja, o Estado instaura modelos jurídicos que condicionam e orientam o constituir das relações jurídicas. Estas existem somente a partir da regulamentação jurídica, como visto anteriormente. De fato, a relação jurídica é uma relação direito-dever. Ela deriva, portanto, de uma regra, que no mesmo momento em que atribui a um o poder, atribui a outro o dever de não impedir o seu exercício. Dessa forma, mesmo considerando o direito como “relação intersubjetiva”, o fato não elimina a consideração “normativa”. TÓPICO 2 | POSIÇÕES JURÍDICAS DOS SUJEITOS DE DIREITO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS 149 c) O conceito de relação jurídica é produto da pandectística alemã, introduzido por Savigny. Contudo, a filosofia grega já considerava o direito e a justiça como relação. A filosofia medieval escolástica destaca o aspecto relacional da virtude, da justiça e de seu objeto (o ius sive justum), com Santo Tomás de Aquino criando as bases de uma filosofia da relação de direito. A escolástica, por sua vez, influenciou os juristas glosadores e os decretalistas, sendo Savigny (e com ele a escola histórica) quem eleva esse conceito à categoria básica da ciência do direito. Kant o traz para o campo da filosofia do direito, apontando a relação como o primeiro dos requisitos constitutivos do conceito do direito: “O conceito do direito, enquanto ele se refere a uma obrigação correspondente [...], diz respeito em primeiro lugar apenas à relação externa de uma pessoa para com outra, uma vez que as ações delas podem ter como fatos influência umas sobre as outras”. d) A relação jurídica, coerente com as ideias individualistas da época, surge tendo como princípio fundamental a liberdade, expressa na mais ampla esfera de autonomia da vontade. FONTE: Adaptado de Betioli, 2014 Dessa forma, percebe-se a construção histórica e filosófica acera da relação jurídica, desde a sua concepção até as modificações da atualidade: e que houveram críticas da parte de alguns juristas, mas que não impediram a sua implementação. “Qualquer que seja o entendimento seguido, o conceito de relação jurídica ocupa um lugar de relevo na teoria do direito, no direito civil e até na filosofia do direito” (AMARAL, 2017, p. 267). Foi Windscheid quem limitou o conceito de relação jurídica a vínculo entre pessoas, apadrinhando a ideia de que toda relação jurídica há de ter, necessariamente, um sujeito passivo. Durante algum tempo, a doutrina inclinou-se para essa concepção personalista, da qual resultou a construção teórica dos direitos reais como integrantes de relações jurídicas entre um sujeito ativo e um sujeito passivo indeterminado. Verificou-se, mais tarde, a desnecessidade de tal construção. Nem é preciso imaginar a existência de sujeito passivo universal para defini- las, uma vez que, tecnicamente, torna-se possível conceber relação entre pessoa e coisa, e, até, relação jurídica entre coisas (GOMES, 2016, p. 71). Contudo, apesar desta construção e organização, a relação jurídica possui ainda alguns componentes: elementos, sujeitos, espécies e posições da relação jurídica. Observe os quadros a seguir: 150 UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA QUADRO 5 – ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA RELAÇÃO JURÍDICA CONFORME BETIOLI 1º - sujeito ativo e sujeito passivo; 2º - vínculo de atributividade; 3º - objeto. O fato e a norma jurídica, arrolados por alguns autores como elementos, são antes pressupostos da existência da relação jurídica. FONTE: Adaptado de BETIOLI, 2014 Todavia, Gomes (2016) apresenta tais elementos com outro olhar, apresentando novos aspectos. QUADRO 6 – ELEMENTOS FUNDAMENTAIS DA RELAÇÃO JURÍDICA CONFORME GOMES a) Sujeito. Em toda relação jurídica, figura, pelo menos, um sujeito. Não há direito sem sujeito. b) Objeto. Objeto é o bem no qual incide o poder do sujeito, ou a prestação exigível. c) Fato propulsor. O fato é o acontecimento, dependente ou não da vontade humana, a que a lei atribui a função de criar, modificar ou extinguir direitos. FONTE: Adaptado de Gomes, 2016 Dessa forma, os elementos são indispensáveis para a constituição da relação jurídica em sua forma correta, sendo os componentes: sujeito, objeto e fato propulsor. Além dos elementos, a relação jurídica possui os sujeitos da relação jurídica. Observe o quadro a seguir: QUADRO 7 – SUJEITOS DA RELAÇÃO JURÍDICA “Toda pessoa que se insere numa relação jurídica tem sempre direitos e deveres, e não apenas direitos ou somente deveres. Assim, por exemplo, se A é devedor de certa quantia a B, em virtude de uma letra de câmbio, ele tem o “dever” de pagar o débito no vencimento. Se B, entretanto, quiser antecipar o pagamento, A tem o “direito” de pagar apenas na data prevista no título” (BETIOLI, 2014, p. 339). a) Sujeito ativo É o credor da prestação principal. O portador do direito subjetivo de poder exigir o seu cumprimento. Num contrato de mútuo, aquele que empresta certa quantia em dinheiro e possui o direito de ser pago no prazo e em condições estipuladas é o sujeito ativo. O que não elide, como dito, que ele também tenha deveres correlatos ou não. TÓPICO 2 | POSIÇÕES JURÍDICAS DOS SUJEITOS DE DIREITO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS 151 b) Sujeito passivo Aquele que integra a relação jurídica como responsável ou devedor da prestação principal. No exemplo dado, é o mutuário ou o devedor. O que não exclui que também tenha direito de exigir algo em sentido complementar. FONTE: Adaptado de BETIOLI, 2014 Além dos elementos e dos sujeitos essenciais à relação jurídica, há ainda as espécies, que foram minuciosamente colocadas por Betioli (2014) conforme o quadro a seguir: QUADRO 8 – ESPÉCIES DA RELAÇÃO JURÍDICA a) Quanto à disciplina normativa, a relação jurídica pode ser civil, penal, trabalhista, comercial etc. b) Com relação ao objeto, elas se distinguem em pessoais, obrigacionais e reais, conforme seja uma pessoa, uma prestação ou uma coisa. c) Quanto ao sujeito, as relações jurídicas podem ser relativas: aquelas em que uma pessoa ou um grupode pessoas figura como sujeito passivo. Ou absolutas: quando a coletividade apresenta-se como sujeito passivo, como ocorre quanto ao direito de propriedade que todas as pessoas têm o dever de respeitar. d) Quanto às formas de relações jurídicas, há de salientar, entre as obrigacionais, as de tipo “negocial” que resultam diretamente da vontade manifestada na forma da lei. Aqui vale ressaltar que, além da relação jurídica do tipo contratual em que há prestação e contraprestação recíprocas (do ut des), há outra na qual os sujeitos não se integram num plano de re ciprocidade, não se exigindo, pois, paridade entre as mútuas pretensões, como acontece nos contratos. É uma relação do tipo institucional, que pode ser de “coordenação” (como acontece, por exemplo, nas relações entre os sócios de uma sociedade anônima), de “subordinação” (como entre o Fisco e o contribuinte) ou de “integração” (como as que se constituem entre o marido e a mulher, os pais e os filhos no seio da comunidade familiar). e) A relação jurídica pode ainda ser de “direito público” ou de “subordinação”: ocorre quando o Estado participa na relação como sujeito ativo, impondo-se com o seu poder de mando. De “direito privado” ou de “coordenação”, quando é integrada por particulares em um plano de igualdade, podendo nela o Estado participar desde que não investido de sua autoridade. FONTE: Adaptado de BETIOLI, 2014 Contudo, tais elementos fazem parte da relação jurídica e a fortalecem enquanto pertencente à ciência do direito. “No campo da teoria constitui-se em categoria básica para a explicação do fenômeno jurídico, juntamente à norma jurídica e à instituição, ambas complementares” (AMARAL, 2017, p. 267). O autor ainda acresce: 152 UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA A ideia de relação jurídica como vínculo normativo permite, ainda, explicar uma série de fatos da vida jurídica, em que se verificam mudanças subjetivas na relação, como a cessão de crédito, a assunção de dívida, a função social da propriedade, os direitos e deveres matrimoniais, e ainda mudanças objetivas, como a sub-rogação prevista no art. 1.409 do Código Civil (AMARAL, 2017, p. 268). Dessa forma, é necessário compreender que o direito é um sistema repleto de relações jurídicas, diante da pluralidade de sujeitos, fatos e comportamentos (GOMES, 2016). Entretanto, “As relações jurídicas são consequência dos fatos jurídicos. Nascem da qualificação dos fatos da vida real pelo sistema jurídico (ex facto ius oritur)” (AMARAL, 2017, p. 278). Pontua-se ainda que “As relações jurídicas que, a princípio, somente se travavam em restrito setor da vida econômica, ultrapassaram e se incorporaram praticamente à vida de todas as pessoas” (GOMES, 2016, p. 15). Dessa forma, a relação jurídica é modificada ao mesmo passo em que os sujeitos ou objetos modificam-se (Amaral, 2017). Merece atenção especial o enfoque tridimensional com que Michell Virally se refere ao conceito de relação jurídica. Essa relação, segundo ele, “nasce de uma simples situação de fato, que uma norma carrega de significação jurídica à luz dos valores que ela exprime e onde ela encontra o fundamento de sua força específica”. No comentário de Reale, “não poderia ser melhor determinado tridimensionalmente o conceito de relação jurídica, não só pela presença dos três fatores integrados em unidade, como também pela compreensão de que a norma, como instrumento de qualificação jurídica, traduz a significação dos valores que lhe servem de fundamento” (BETIOLI, 2014, p. 338). Neste tópico já foram explanados os elementos, sujeitos e espécies, por último e não menos importante, as posições da relação jurídica: que são extremamente relevantes na ciência do direito. Avalie o esquema a seguir: QUADRO 9 – POSIÇÕES JURÍDICAS POSIÇÕES JURÍDICAS ATIVAS I- Modalidades: há numerosas categorias de posições jurídicas ativas. Este é mesmo um domínio tumultuado, perante a emergência de novas figuras. Sem preocupação de exaustividade, distinguimos: poderes elementares (ou faculdades), poderes genéricos, direitos subjetivos, poderes funcionais, interesses juridicamente protegidos. TÓPICO 2 | POSIÇÕES JURÍDICAS DOS SUJEITOS DE DIREITO NAS RELAÇÕES JURÍDICAS 153 II- Poderes elementares ou faculdades: a distinção entre os poderes elementares e as outras figuras só é possível porque as posições jurídicas podem combinar, por sua vez, entre si, de maneira a formarem posições jurídicas complexas. No entanto, os poderes, a que chamamos elementares para distinguir das outras realidades, são elementos simples; os restantes serão em princípio complexos. Os poderes elementares surgem por isso por sua vez no conteúdo das outras realidades. Será por eles que vamos começar a nossa análise, justamente por serem simples. Advertimos, porém, que a ordem expositiva não corresponde à ordem da vida. A realidade da vida é a complexidade. É apenas mediante um esforço de abstração que conseguimos divisar os elementos simples como seus componentes. III- Poderes genéricos: no respeito aos poderes genéricos nada acrescentaremos ao que ficou atrás dito, na crítica à relação jurídica absoluta. Assim, o direito constitucionalmente atribuído de representação é provavelmente um poder genérico, pois compõe sempre a esfera jurídica do sujeito, independentemente das situações concretas com relação às que possam ser exercidas. Não implica, nomeadamente, qualquer relação. M. Gomes da Silva versa em termos coincidentes essa matéria. Denomina, porém, os poderes genéricos direitos integradores, por se destinarem a integrar ou preencher o conteúdo de outras situações; e exemplifica com o direito de defesa, o direito da ação judicial e o direito de disposição e aquisição. POSIÇÕES JURÍDICAS PASSIVAS I- Passando às posições jurídicas passivas, temos desde logo a dificuldade de encontrar um termo que a todos abranja. Como a palavra «deveres» está muito comprometida, vamos falar de vinculações ou adstrições. As grandes categorias de vinculações são, dentro do possível paralelismo com as situações jurídicas ativas: deveres genéricos, obrigações. sujeições, deveres funcionais. II- Sujeições: são as situações contrapostas aos direitos subjetivos de crédito. Representam uma situação autônoma e complexa. Serão objeto de estudo específico no Direito das Obrigações. As sujeições são as situações globais contrapostas aos direitos potestativos. Tivemos oportunidade de dizer que há situações ativas com caráter potestativo que, quando autônomas, constituem os direitos potestativos. As situações passivas correspondentes, também necessariamente autônomas, são as sujeições. Por isso não é correto falar em deveres para designar também esta categoria. O dever acorda necessariamente uma ideia de dever ser, logo de violabilidade. As sujeições, como vimos já, são rigorosamente invioláveis. Enfim, os deveres funcionais são posições passivas a que se aplica muta tis mutandis o que dissemos sobre os poderes funcionais. 154 UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA III- Ônus: se considerarmos que há figuras autônomas de ônus, caracterizadas pelo aspecto ativo – alguém é titular de uma situação jurídica cujo conteúdo é representado pela outorga de uma vantagem em contrapartida de um sacrifício – vemos que nessa situação há um aspecto ativo e um aspecto passivo, simultaneamente, na mesma titularidade. Este caráter misto de atividade e passividade é típico do ônus. Mas o que interessa agora acentuar é que, se há esse aspecto ativo, também tem de haver correlativamente uma posição passiva de outro titular. Suponhamos que se atribui isenção de impostos a quem for doador de sangue, para além de certo grau. Há uma figura autônoma de ônus. A estas situações jurídicas unilaterais chamamos posições jurídicas, num sentido decerto convencional, mas em que se aproveita a disponibilidade da expressão e a sua acepção tendencial, nomeadamentena doutrina italiana. Toda a situação jurídica de uma pessoa pode ser designada posição jurídica, por oposição às relações jurídicas. E é ainda por si uma situação jurídica, dada a grande latitude desta noção (ASCENSÃO, 2010, p. 48). Para o autor, “a posição jurídica ou coloca o sujeito em posição de vantagem ou em posição de desvantagem, no seio da ordem jurídica” (ASCENSÃO, 2010, p. 49). Dessa forma, as posições na relação jurídica propiciam situações unilaterais. Pode-se definir posição jurídica como: situações de uma pessoa regulada pelo direito (ASCENSÃO, 2010). Nesse sentido, compreende-se os elementos e aspectos que constroem e constituem as relações jurídicas, de modo a enriquecer, fundamentar e norteá- las, a fim de manter as relações sociais em ordem, sendo que a relação jurídica é oriunda da relação social. O direito, como ciência humana e social não teria eficácia sem o homem: eis a relação jurídica. FONTE: Adaptado de ASCENSÃO, 2010 155 RESUMO DO TÓPICO 2 Neste tópico, você aprendeu que: • As relações sociais fornecem a matéria-prima do Direito. • Relação jurídica é o vínculo que o direito reconhece entre pessoas ou grupos, atribuindo-lhes poderes e deveres. • A relação jurídica é um dos critérios ou ângulos de apreciação do fenômeno jurídico, e traduz uma concepção personalista do fenômeno jurídico. • Na relação jurídica há sempre um valor que integra os comportamentos de dois ou mais indivíduos, permitindo-lhes e assegurando-lhes um âmbito de pretensões exigíveis. • Nesta ordem de ideias, é de se admitir a existência de relações jurídicas: 1º – entre uma pessoa e uma coisa; 2º – entre duas pessoas; 3º – entre uma pessoa e determinado lugar. • Na relação jurídica se tem: elementos, sujeitos, espécies e posições. 156 AUTOATIVIDADE 1 Componentes da relação jurídica e do direito como um todo, as posições jurídicas podem ser __________ ou _____________. Complete as lacunas em branco com a alternativa correta: a) ( ) Poderes elementares ou genéricos. b) ( ) Sujeições ou Ônus. c) ( ) Ativas ou Passivas. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 2 Conforme Betioli (2014) os elementos fundamentais da relação jurídica são: I- Sujeito ativo e passivo. II- Vínculo de atributividade. III- Objeto. Assinale a alternativa correta: a) ( ) Somente a alternativa I está correta. b) ( ) As alternativas I e II estão corretas, apenas. c) ( ) Somente a alternativa II está correta. d) ( ) Todas as alternativas estão corretas. 157 TÓPICO 3 DIREITO SUBJETIVO UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO Direito Subjetivo e suas particularidades: é sobre isso que iremos estudar neste tópico. Dentre os aspectos, o direito subjetivo possui modalidades, classificações, elementos e ferramentas oriundas de uma construção histórica e teórica, que subsidia a prática dos juristas na atualidade diante das modificações sociais. Desta forma, precisamos citar também o direito objetivo, que em uma breve conceituação, pode ser definido como o conteúdo que está na norma de maneira abstrata, enquanto o poder subjetivo é a ação oriunda da norma, a fim de que os cidadãos possam defender os seus interesses. Falar de direito subjetivo, fala-se ainda em ação: em retirarmos a norma do papel e colocarmos na prática diante dos fatos atuais. Neste tópico abrandaremos de maneira profunda o Direito Subjetivo a fim de que você compreenda-o de maneira completa. Além disso, é importante reconhecermos a importância do Direito Objetivo como um todo enquanto aplicabilidade do direito. Bons estudos! 2 DIREITO SUBJETIVO Após estudarmos os conteúdos acerca da relação jurídica, faz-se importante compreender os conceitos relevantes acerca do direito objetivo, que é conceituado por Ferraz Junior (2018, p. 114): “O direito subjetivo é o poder ou domínio da vontade livre do homem, que o ordenamento protege e confere” (FERRAZ JUNIOR, 2018, p. 114). Nesse sentido, “temos, desse modo, uma compreensão do direito subjetivo vinculado à pessoa humana, como ente racional e volitivo, o que corresponde a uma superada visão antropomórfica do Direito” (REALE, 2002, p. 251). Contudo, o direito subjetivo traz aspectos vinculados ao indivíduo diante da visão jurídica. UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 158 Todavia, entende-se que “O direito subjetivo consiste, assim, na possibilidade de agir e de exigir aquilo que as normas de Direito atribuem a alguém como próprio” (NADER, 2019, p. 289). Desta maneira, Betioli (2015) ainda acresce: “O direito subjetivo, como espécie de situação subjetiva, vem a ser a possibilidade de exigir-se, de maneira garantida, aquilo que as normas de direito atribuem a alguém como próprio”. Em suma, é o poder que a ordem jurídica confere a alguém de agir e de exigir de outrem determinado comportamento (BETIOLI, 2015, p. 364). Sendo assim, o direito subjetivo é cerceado por algumas teorias, como coloca Nunes (2018, p. 171) “A ideia de direito subjetivo aponta para muitas alternativas de explicação, existindo mesmo uma série de teorias que disputam seu sentido”. Portanto, “Se o direito subjetivo pode ser exercido, mas não de forma ilimitada ou injustificada, sob pena de ser taxado de abusivo, então, o que existe junto desse direito subjetivo é, no exato momento em que surge o limite, um dever” (NUNES, 2018, p. 174). Compreende-se ainda que o direito subjetivo é sistematicamente fundamentado, como veremos em breve neste tópico. Costuma-se ligar o conceito de direito subjetivo a uma antiga distinção, de origem latina, entre facultas agendi e norma agendi no sentido de que a regra jurídica delimita objetivamente o campo social dentro do qual é facultado ao sujeito da relação pretender ou fazer aquilo que a norma lhe atribui (REALE, 2002, p. 249). O autor ainda corrobora relatando que “O direito subjetivo não é o querer, mas a possibilidade de querer. Não é a vontade, mas a potencialidade da vontade” (REALE, 2002, p. 255). Portanto, o direito subjetivo proporciona a possibilidade do fazer, oferecendo modalidades de atuação na instancia jurídica, como traz Betioli (2015, p. 364): “Assim, o direito subjetivo opõe-se correlativamente ao dever jurídico. De um lado tem-se o direito subjetivo e, de outro, um dever jurídico colocado em posição diametralmente oposta; um não existe sem o outro”. Ao lidar com o ser humano, o direito têm muito bem estabelecido o seu papel no âmbito jurídico, como coloca Reale (2002, p. 251) “O homem sabe, quer e age. Enquanto o homem quer e age, ele se situa variavelmente no âmbito de regras de direito. O direito subjetivo, portanto, é a vontade juridicamente protegida”. Ademais, considera-se que o direito positivo é um grande influenciador do direito subjetivo, conforme o autor coloca: Observa-se, por exemplo, que muitas vezes o direito subjetivo existe e continua existindo a despeito da vontade do titular ou contra essa mesma vontade. Imagine-se que o credor de uma importância não se disponha a cobrá-la. O Direito positivo lhe dá a ação para efetivar o seu direito. O credor, entretanto, por um motivo qualquer, de amizade, ou por mero espírito altruístico, não exerce o seu direito, tampouco se preocupa com ele. Há, portanto, uma carência de vontade, mas isto não implica na extinção do direito subjetivo. Para todos os efeitos, o credor continua sendo o titular de um direito subjetivo (REALE, 2002, p. 252). TÓPICO 3 | DIREITO SUBJETIVO 159 Ainda se tem o direito objetivo, que chega anterior ao direito subjetivo, como apresenta Nunes (2018, p. 170): “O direito objetivo corresponde à norma jurídica em si, enquanto comando que pretende um comportamento. É aquele objetivado independentemente do momento de uso e exercício. O direito positivo é a soma do direito objetivo com o direito e o dever subjetivos”. Entretanto, se faz relevante visualizar o direito subjetivo com seu arcenal de potencialidades e efetividades, conforme as teorias fundamentame regulamentam-na diante da ciência do direito como um todo. O direito subjetivo decorre da incidência de normas jurídicas sobre fatos sociais. As regras podem qualificar os direitos tanto pela imposição de deveres jurídicos aos sujeitos que se encontrem em determinadas situações ou reconhecendo, diretamente, vantagens aos portadores de situações jurídicas específicas (NADER, 2019, p. 289). Dessa forma, Nunes (2018, p. 174) destaca que “[...] o direito subjetivo é a prerrogativa colocada pelo direito objetivo, à disposição do sujeito do direito”. Sendo o direito objetivo uma prática pautada principalmente na constituição e na imutabilidade, o direito subjetivo leva em consideração os sujeitos envolvidos. Esse direito subjetivo — direito de propor ação para despejar o inquilino — é posto à disposição do locador como uma prerrogativa. Ou, em outras palavras, o locador não tem a obrigação de ingressar com ação de despejo contra o inquilino. Pode ou não ingressar. É direito subjetivo seu, e somente a ele cabe decidir se o exercita ou não (NUNES, 2018, p. 172). Nas origens remotas, o direito subjetivo tem a ver com a noção de privilegium, direitos especiais que se conferiam, na Idade Média, ao status de cada categoria social. Os romanos, propriamente, sempre entenderam que o jus era algo delimitadamente conferido a um grupo social: o jus civile era o direito dos cidadãos e, mais tarde, o jus gentium era o direito próprio das situações em que os litígios envolviam estrangeiros e que exigiam um pretor especial, o praetor peregrinus (FERRAZ JUNIOR, 2018, p. 112) NOTA É importante compreendermos, ainda, que “Direito objetivo e direito subjetivo, no pensamento kelseniano, são apenas posições distintas do Direito, que é um único sistema lógico-gradativo de normas” (REALE, 2002, p. 256). Contudo, “O direito subjetivo apresenta-se sempre em relação jurídica. Apesar de relacionar-se com o Direito objetivo, ele se opõe correlatamente é ao dever jurídico. Um não existe sem o outro” (NADER, 2019, p. 289). Ambos os direitos fazem parte do ordenamento jurídico, de modo a executarem seus papéis na ciência do direito. UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 160 Os conceitos de direito objetivo e de direito subjetivo se complementam, não sendo possível conceber o direito subjetivo antes ou independentemente do direito objetivo, com o qual forma um par inseparável. Já disseram que o direito subjetivo está para o objetivo como a área interna de um cone está para a sua face externa protetora (W. Burckhardt) (BETIOLI, 2015, p. 365). QUADRO 10 – DIREITO OBJETIVO E SUBJETIVO CONFORME NADER DIREITO OBJETIVO Do ponto de vista objetivo, o Direito é norma de organização social. É o chamado Jus norma agendi. Quando se afirma que o Direito do Trabalho não é formalista, emprega-se o vocábulo Direito em sentido objetivo, como referência às normas que organizam as relações de emprego. DIREITO SUBJETIVO Corresponde às possibilidades ou poderes de agir, que a ordem jurídica garante a alguém. Equivale à antiga colocação romana, hoje superada, do Jus facultas agendi. O direito subjetivo é um direito personalizado, em que a norma, perdendo o seu caráter teórico, projeta-se na relação jurídica concreta, para permitir uma conduta ou estabelecer consequências jurídicas. Quando dizemos que “fulano tem direito à indenização”, afirmamos que ele possui direito subjetivo. É a partir do conhecimento do Direito objetivo que deduzimos os direitos subjetivos de cada parte dentro de uma relação jurídica. FONTE: Adaptado de Nader, 2019 Contudo, compreende-se que é a partir do direito objetivo que o direito subjetivo vem à tona nos casos jurídicos, e por isso eles se complementam, como coloca Nunes (2018, p. 175): “Não há direito subjetivo sem o outro que o tenha de respeitar”. Além disso, “[...] o uso tradicional reporta-se à noção de direito subjetivo para identificar o sujeito jurídico em geral. A ideia de que se trata do portador do direito reporta-se à liberdade no sentido de autonomia” (FERRAZ JUNIOR, 2018, p. 120). A expressão direito subjetivo cobre diversas situações, difíceis de serem trazidas a um denominador comum. A própria liberdade, em seu ambíguo sentido moderno de autonomia e de não impedimento, é ela própria um lugar comum, um importante topos que orienta e organiza o raciocínio, mas que não lhe confere um caráter lógico rigoroso. Dada essa diversidade de casos, é possível opor, assim, a noção de direito objetivo às diferentes situações subjetivas, entendidas como posições jurídicas dos destinatários das normas em seu agir: exercer atos de vontade, ter interesses protegidos, conferir poder, ser obrigado etc. (FERRAZ JUNIOR, 2018, p. 115). TÓPICO 3 | DIREITO SUBJETIVO 161 Dessa forma, “o Direito subjetivo, no sentido específico e próprio deste termo, só existe quando a situação subjetiva implica a possibilidade de uma pretensão, unida à exigibilidade de uma prestação ou de um ato de outrem” (REALE, 2002, p. 259). Entretanto, há correntes teóricas que fundamentam o direito subjetivo. QUADRO 11 – PRINCIPAIS TEORIAS DO DIREITO SUBJETIVO TEORIA DA VONTADE Para Bernhard Windscheid (1817–1892), jurisconsulto alemão, o direito subjetivo “é o poder ou senhorio da vontade reconhecido pela ordem jurídica”. O maior crítico dessa teoria foi Hans Kelsen, que por meio de vários exemplos a refutou, demonstrando que a existência do direito subjetivo nem sempre depende da vontade de seu titular. Os incapazes, tanto os menores como os privados de razão e os ausentes, apesar de não possuírem vontade no sentido psicológico, possuem direitos subjetivos e os exercem por meio de seus representantes legais. Reconhecendo as críticas, Windscheid tentou salvar a sua teoria, esclarecendo que a vontade seria a da lei. Para Del Vecchio, a falha de Windscheid foi situar a vontade na pessoa do titular in concreto, enquanto deveria considerar a vontade como simples potencialidade. A concepção do jusfilósofo italiano é uma variante da teoria de Windscheid, pois também inclui o elemento vontade (querer) em sua definição: “a faculdade de querer e de pretender, atribuída a um sujeito, em que corresponde uma obrigação por parte dos outros”. TEORIA DO INTERESSE Rudolf von Ihering (1818-1892), jurisconsulto alemão, centralizou a ideia do direito subjetivo no elemento interesse, afirmando que direito subjetivo seria “o interesse juridicamente protegido”. As críticas feitas à teoria da vontade são repetidas aqui, com pequena variação. Os incapazes, não possuindo compreensão das coisas, não podem chegar a ter interesse e nem por isso ficam impedidos de gozar de certos direitos subjetivos. Considerado o elemento interesse sob o aspecto psicológico, é inegável que essa teoria já estaria implícita na da vontade, pois não é possível haver vontade sem interesse. Se tomarmos, porém, a palavra interesse não em caráter subjetivo, de acordo com o pensamento da pessoa, mas em seu aspecto objetivo, verificamos que a definição perde em muito a sua vulnerabilidade. O interesse, considerado não como “o meu” ou “o seu” interesse, mas tendo em vista os valores gerais da sociedade, não há dúvida de que é elemento integrante do direito subjetivo, de vez que este expressa sempre interesse de variada natureza, seja econômica, moral, artística etc. Muitos criticam ainda esta teoria, entendendo que o seu autor confundiu a finalidade do direito subjetivo com a natureza TEORIA ECLÉTICA Georg Jellinek (1851–1911), jurisconsulto e publicista alemão, considerou insuficientes as teorias anteriores, julgando-as incompletas. O direito subjetivo não seria apenas vontade, nem exclusivamente interesse, mas a reunião de ambos. O direito subjetivo seria “o bem ou interesse protegido pelo reconhecimento do poder da vontade”. As críticas feitas isoladamente à teoria da vontade e à do interesse foram acumuladas na presente. UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO– TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 162 TEORIA DE DUGUIT Seguindo a linha de pensamento de Augusto Comte, que chegou a afirmar que “chegará um dia em que nosso único direito será o direito de cumprir o nosso dever [...], em que um Direito Positivo não admitirá títulos celestes e assim a ideia do direito subjetivo desaparecerá”, Léon Duguit (1859–1928), jurista e filósofo francês, no seu propósito de demolir antigos conceitos consagrados pela tradição, negou a ideia do direito subjetivo, substituindo-o pelo conceito de função social. Para Duguit, o ordenamento jurídico se fundamenta não na proteção dos direitos individuais, mas na necessidade de manter a estrutura social, cabendo a cada indivíduo cumprir uma função social. FONTE: Adaptado de Nader, 2019 Essas quatro grandes teorias fornecem e subsidiam a funcionalidade do direito subjetivo que, ainda hoje, vêm se construindo e reconstruindo através das modificações sociais, como coloca Ferraz Junior (2018): Ora, o direito subjetivo nada mais é do que essa garantia conferida pelo direito objetivo, a qual se invoca quando a liberdade é violada. Essa teoria, porém, ao salvar o direito subjetivo das objeções mencionadas (afinal, mesmo à criança ou ao louco se confere a garantia de invocar a proteção da legislação, se sua liberdade é violada) acaba por eliminá- lo como realidade por si, pois ele passa a confundir-se com a proteção (da liberdade) conferida pelo direito objetivo (FERRAZ JUNIOR, 2018, p. 114). A Teoria Geral do Direito hodierna, partindo dessas e de outras críticas às antigas teses que já examinamos, reelaborou os estudos sobre o direito subjetivo, fixando alguns pontos essenciais. Um deles se refere exatamente ao conceito de situação subjetiva, que, a princípio, passou a ser sinônimo de direito subjetivo para, mais acertadamente, ser vista depois como o gênero no qual o direito subjetivo representa uma espécie (REALE, 2002, p. 257). NOTA Além disso, o direito subjetivo possui consigo uma série de classificações, modalidades e elementos. “Em linhas gerais, o direito subjetivo representa a possibilidade de exigir-se, como próprios, uma prestação, ou um ato, de maneira garantida, nos limites atributivos das regras de direito” (REALE, 2002, p. 265). Nader (2018) reforça a potencialidade e eficácia do direito subjetivo, ao reportar-se a sua autonomia e independência: TÓPICO 3 | DIREITO SUBJETIVO 163 E mesmo que estejamos falando de um direito subjetivo que independa do exercício da prerrogativa para poder existir, como o direito à vida, à honra, à imagem etc., ainda assim sempre existirá o outro. No caso, o outro são todos os outros, que devem respeitar tais direitos. É um direito que se impõe erga omnes, isto é, a todos (NUNES, 2018, p. 175). QUADRO 12 – CLASSIFICAÇÃO DO DIREITO SUBJETIVO DIREITOS SUBJETIVOS PÚBLICOS A distinção entre o direito subjetivo público e o privado toma por base a pessoa do sujeito passivo da relação jurídica. Quando o obrigado for pessoa de Direito Público, o direito subjetivo será público e, inversamente, quando na relação jurídica o obrigado for pessoa de Direito Privado, o direito subjetivo será privado. Essa distinção não é antiga, de vez que até há pouco tempo, relativamente, não se admitia a existência de direito subjetivo público, em face da ideia predominante de que o Estado, como autor e responsável pela aplicação do Direito, não estaria sujeito as suas normas. O direito subjetivo público divide-se em direito de liberdade, de ação, de petição e direitos políticos. DIREITOS SUBJETIVOS PRIVADOS Sob o aspecto econômico, os direitos subjetivos privados dividem-se em patrimoniais e não patrimoniais. Os primeiros possuem valor de ordem material, podendo ser apreciados pecuniariamente, o que não sucede com os não patrimoniais, de natureza apenas moral. Os patrimoniais subdividem-se em reais, obrigacionais, sucessórios e intelectuais. Os direitos reais – jus in re – têm por objeto um bem móvel ou imóvel, como o domínio, usufruto, penhor. Os obrigacionais, também chamados de crédito ou pessoais, têm por objeto uma prestação pessoal, como ocorre no mútuo, contrato de trabalho etc. Sucessórios são os direitos surgidos em decorrência do falecimento de seu titular e transmitidos aos herdeiros. Finalmente, os direitos intelectuais dizem respeito aos autores e inventores, que têm o privilégio de explorar a sua obra, com exclusão de outras pessoas. DIREITOS ABSOLUTOS E RELATIVOS Nos direitos absolutos, a coletividade figura como sujeito passivo da relação. São direitos que podem ser exigidos contra todos os membros da coletividade, por isso são chamados erga omnes. O direito de propriedade é um exemplo. Os relativos podem ser opostos apenas em relação a determinada pessoa ou pessoas, que participam da relação jurídica. Os direitos de crédito, de locação, os familiais são alguns exemplos de direitos que podem ser exigidos apenas contra determinada ou determinadas pessoas, com as quais o sujeito ativo mantém vínculo, seja decorrente de contrato, de ato ilícito ou por imposição legal. DIREITOS TRANSMISSÍVEIS E NÃO TRANSMISSÍVEIS Como os nomes indicam, os primeiros são os direitos subjetivos que podem passar de um titular para outro, o que não ocorre com os não transmissíveis, seja por absoluta impossibilidade de fato ou por impossibilidade legal. Os direitos personalíssimos são sempre direitos não transmissíveis, enquanto os direitos reais, em princípio, são transmissíveis. A transmissibilidade dos direitos se opera inter vivos ou mortis causa, isto é, entre pessoas vivas, como nos contratos de locação e comodato, ou UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 164 em razão de morte, como na sucessão legítima e na testamentária. Na sucessão mortis causa, o direito se transmite no momento da morte do autor da herança, abertura da sucessão, ainda que os herdeiros sejam desconhecidos. Trata-se de uma ficção jurídica, que visa a evitar a figura de direitos subjetivos sem titularidade. Com a aceitação da herança pelos herdeiros verifica-se a ratificação da aquisição da propriedade e da posse, que se mantêm indivisíveis até o momento da partilha. DIREITOS PRINCIPAIS E ACESSÓRIOS Os primeiros são independentes, autônomos, enquanto os direitos acessórios estão na dependência do principal, não possuindo existência autônoma. No contrato de mútuo, o direito ao capital é o principal e o direito aos juros, acessório. DIREITOS RENUNCIÁVEIS E NÃO RENUNCIÁVEIS Os direitos renunciáveis são os que o sujeito ativo, por ato de vontade, pode deixar a condição de titular do direito sem a intenção de transferi-lo a outrem, enquanto nos irrenunciáveis tal fato é impraticável, como se dá com os direitos personalíssimos. FONTE: Adaptado de NADER, 2019 Diante dessas classificações, compreende-se a dimensão do direito subjetivo, sendo este complementar do direito objetivo, como traz Ferraz Junior (2018): A estrutura do direito subjetivo aponta, como vimos, para elementos básicos que, por sua vez, constituem conceitos jurídicos fundamentais. Um deles é o de sujeito de direito ou sujeito jurídico. O uso mais tradicional da expressão costumava ver – e o senso comum jurídico ainda tende a ver – como sujeito o ser humano concreto ou, pelo menos, os conjuntos de seres humanos. A tese, porém, é demasiado restritiva e sofre reformulações (FERRAZ JUNIOR, 2018, p. 120). Dessa maneira, as modificações realizadas e que permeiam o direito subjetivo são parte do direito como um todo, visto que a sociedade como um todo é imutável e passível de modificação com o passar dos tempos. “O convívio humano revela conflitos de interesses. Alguns destes tornam-se juridicamente protegidos pelo ordenamento. O interesse juridicamente protegido constitui o direito subjetivo” (FERRAZ JUNIOR, 2018, p. 115). O direito subjetivo significa que a situação jurídica é considerada da perspectiva de um sujeito a quem ela favorece. Em segundo lugar, geralmente,essa situação favorável surge em face de normas que restringem o comportamento dos outros. Daí a usual NOTA TÓPICO 3 | DIREITO SUBJETIVO 165 correlação entre direito (de um) e dever (do outro), bem como a ideia de que a liberdade é um privilégio a que se contrapõe uma restrição à liberdade dos demais. Em terceiro lugar, o uso do conceito pressupõe a possibilidade de fazer valer sua situação em face de outros, ou seja, implica “faculdade’’ ou “poder’’ e ainda a afirmação autônoma do indivíduo (note-se que faculdade ou poder não designam coisas, substâncias, mas relações ou modo de operar relações: ter poder significa que os outros se comportam perante a mim de modo submisso, ter faculdade significa que tenho condições de provocar certos comportamentos dos outros) (FERRAZ JUNIOR, 2018, p. 116). Como citado anteriormente, o direito subjetivo pode ser visualizado através de três elementos, que fazem parte da estrutura do direito objetivo e que acabam por fornecer ferramentas de atuação. Na doutrina exposta por San Tiago Dantas, o direito subjetivo pode ser identificado por três elementos: a) porque a um direito corresponde um dever jurídico; b) porque esse direito é passível de violação, mediante o não cumprimento do dever jurídico pelo sujeito passivo da relação jurídica; c) porque o titular do direito pode exigir a prestação jurisdicional do Estado, ou seja, tem a iniciativa da coerção. [...] A possibilidade jurídica de se contrair matrimônio, emancipar o filho menor, doar bens, é mera faculdade decorrente da permissibilidade legal. Quando se afirma que o trabalhador possui direito a receber salário, a situação jurídica desse, efetivamente, é de portador de direito subjetivo porque, correlatamente, a empresa se apresenta com o dever jurídico; pode ocorrer a hipótese de esse direito ser violado pelo sujeito passivo da relação jurídica e o seu titular fazer valer a sua pretensão na justiça (NADER, 2019, p. 290). Observa-se os benefícios e as ferramentas fornecidos pelo direito subjetivo diante do seu crescimento, embasamento e fundamentação teórica e subsídios práticos para a sua execução. Ele traz consigo ainda, certa garantia para negócios, conforme coloca Betioli a seguir: QUADRO 13 – OBSERVAÇÕES ACERCA DE DIREITO SUBJETIVO CONFORME BETIOLI Específico e próprio do direito subjetivo é a possibilidade de uma pretensão unida à exigibilidade de uma prestação ou de um ato de terceiro. Assim, a pretensão, dentro dos moldes previstos pela norma, é garantida pela ordem jurídica, e pode transformar-se concretamente numa exigência. Trata-se, portanto: 1º) De um exigir garantido, graças ao recurso à via judicial, daquilo que a norma atribui a alguém como próprio. 2º) Nele há aquilo que é pretendido por um sujeito e aquilo que é devido pelo outro. Não há direito subjetivo sem o outro que o tenha de respeitar. Com outras palavras, sempre há um dever jurídico na contrapartida de um direito subjetivo. FONTE: Adaptado de Betioli, 2015 UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 166 Entretanto, pode-se compreender a objetividade e a eficácia do direito subjetivo enquanto sucessor do direito objetivo, trazendo-o consigo ainda em suas bases teóricas e precedentes, como coloca Nunes: Assim, o direito subjetivo é tanto o efetivo exercício do direito objetivo quanto a potencialidade do exercício desse mesmo direito. Por exemplo, o direito objetivado como Lei do Inquilinato, que regula o despejo do inquilino por falta de pagamento, faz nascer para o proprietário-locador o direito subjetivo de pleitear o despejo do inquilino (NUNES, 2018, p. 172). O quadro social registra um permanente movimento de forças individuais e coletivas, que lutam pela obtenção e eficácia de direitos subjetivos. Nas relações de vida, cada qual procura assumir a posição de comando, de senhorio, de titular de direitos. No meio civilizado, o ter e o poder decorrem de direitos subjetivos, constituídos à luz do ordenamento jurídico. O esforço pela conquista e firmeza de direitos não se limita ao plano amistoso. Quando não é possível o diálogo e o entendimento, os tribunais podem definir a existência de direitos e seus respectivos titulares. O significado dos direitos subjetivos é tão amplo, que se pode dizer, ainda, que o próprio Direito Positivo é instituído para defini-los e para determinar a sua forma de aquisição e tutela. Esta é a dimensão de importância do presente capítulo de estudo (NADER, 2019, p. 288). NOTA Contudo, compreende-se portanto, os elementos, classificações e modalidades do direito subjetivo, assim como sua complementariedade com o direito objetivo e seus aspectos teóricos e práticos, fundamentados pelas teorias da vontade, de interesse, eclética e de Duguit. Percebe-se ainda sua construção história e sua evolução enquanto prática na sociedade atual. 167 RESUMO DO TÓPICO 3 Neste tópico, você aprendeu que: • Do ponto de vista objetivo, o Direito é norma de organização social. É o chamado Jus norma agendi. • Não há direito subjetivo sem o outro que o tenha de respeitar. • As principais teorias do Direito Subjetivo são: teoria da vontade, teoria do interesse, teoria eclética e teoria de Duguit. • Compreende-se que é a partir do direito objetivo que o direito subjetivo vem à tona nos casos jurídicos, e por isso eles se complementam. • Em linhas gerais, o direito subjetivo representa a possibilidade de exigir-se, como próprios, uma prestação, ou um ato, de maneira garantida, nos limites atributivos das regras de direito. • O direito subjetivo é tanto o efetivo exercício do direito objetivo quanto a potencialidade do exercício desse mesmo direito. 168 AUTOATIVIDADE 1 Conforme estudado nesse tópico, avalie as seguintes nomenclaturas e assinale a alternativa que corresponda a sua categoria. I- Direitos subjetivos privados. II- Direitos absolutos e relativos. III- Direitos transmissíveis e não transmissíveis. IV- Direitos principais e acessórios. V- Direitos renunciáveis e não renunciáveis. a) ( ) São as principais teorias do direito subjetivo. b) ( ) São as fontes do direito subjetivo. c) ( ) São as modalidades do direito subjetivo. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 2 Há a distinção entre Direito Subjetivo e Direito Objetivo, sendo que: a) ( ) Do ponto de vista objetivo, o Direito é norma de organização social. Do ponto de vista subjetivo, corresponde-se às possibilidades ou poderes de agir, que a ordem jurídica garante a alguém. b) ( ) Do ponto de vista subjetivo, o Direito é norma de organização social. Do ponto de vista objetivo, corresponde-se às possibilidades ou poderes de agir, que a ordem jurídica garante a alguém. c) ( ) Do ponto de vista objetivo, o Direito é norma de organização subjetiva. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 169 TÓPICO 4 ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO UNIDADE 3 1 INTRODUÇÃO Poder Judiciário: provavelmente você já leu algo sobre ele, não? Neste tópico você aprenderá os aspectos estruturais e composição deste poder, que se faz extremamente importante na ciência jurídica a fim de organização e sistematização, agregando a cada fragmento do poder, suas atribuições. Ao tratarmos do poder judiciário em si, não podemos deixar de falar em direito do cidadão, de uma forma em que este poder em si consiste na defesa dos direitos do cidadão, de uma forma a assegurar que estes não sejam violados. Além disso, o poder judiciário possui como base a constituição, tendo ainda, como órgão máximo o Supremo Tribunal Federal. Por ser um órgão independente e imparcial, possui a principal função de proteger os direitos dos cidadãos previstos constitucionalmente. Desta forma, compreendemos a relevância do poder judiciário, no qual estudaremos detalhadamente por aqui. Estude com calma e cuidado. Bons estudos! 2 ESTRUTURA DO PODER JUDICIÁRIO O poder judiciário consiste na concentração da defesa dos direitos dos cidadãos,com isso, possui uma estrutura bastante reforçada com arcabouços legislativos e de acordo com a ciência jurídica. Ademais, “Confere-se autonomia institucional, desconhecida na história de nosso modelo constitucional e que se revela, igualmente, singular ou digna de destaque também no plano do direito comparado” (MENDES; BRANCO, 2019, p. 1062). Com isso, após a reforma da constituição, o poder judiciário obteve maior autonomia nas suas ações, como colocam os autores a seguir. UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 170 A atuação independente e eficaz do Poder Judiciário, no entanto, tem sido obstada por limitações inerentes a sua estrutura administrativa. De fato, o crescente número de demandas e o aumento do tempo médio de tramitação dos processos indicam um quadro de deficiências que comprometem a efetividade da prestação jurisdicional (MENDES; BRANCO, 2019, p. 1063). Diante do quadro de demandas existentes, torna-se indispensável o caráter autônomo do poder judiciário na atualidade, como coloca Bulos (2018, p. 1295): “O Judiciário, nos moldes do Texto de 1988, é um poder autônomo, de enorme significado no panorama constitucional das liberdades públicas”. Avalia- se, portanto, o processo evolutivo e de transformação positiva do poder judiciário, adaptando-se às demandas e movimentos sociais como um todo. O autor ainda reforça: “Sua independência e imparcialidade, asseguradas constitucionalmente, são uma garantia dos cidadãos, porque ao Judiciário incumbe consolidar princípios supremos e direitos fundamentais, imprescindíveis à certeza e segurança das relações jurídicas” (BULOS, 2018, p. 1295). Alguns autores colocam a relevância da constituição de 1988, sendo que esta trouxe maior autonomia e evoluções. “Buscou-se garantir a autonomia administrativa e financeira do Poder Judiciário. Assegurou-se a autonomia funcional dos magistrados” (MENDES; BRANCO, 2019, p.1062). A Constituição de 1988 dotou os tribunais de um poder de autogoverno consistente na eleição de seus órgãos diretivos, elaboração de seus regimentos internos, organização de suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízos que lhes forem vinculados, no provimento dos cargos de magistrados de carreira da respectiva jurisdição, bem como no provimento dos cargos necessários à administração da Justiça (CF, art. 96, I) (MENDES; BRANCO, 2019, p. 1070). Desse modo, a referida constituição chega para organizar o poder judiciário, apresentando-lhe novas perspectivas de atuação e eficácia. Ademais, assegura-lhe a autonomia e segurança nos procedimentos judiciários, sendo que “A Constituição de 1988 confiou ao Judiciário papel até então não outorgado por nenhuma outra Constituição” (MENDES; BRANCO, 2019, p. 1062). Entretanto, o poder judiciário possui funções de extrema relevância no âmbito jurídico, desta forma, entende-se que em um primeiro momento “A função típica, imediata, primária ou própria do Poder Judiciário é, simplesmente, julgar. Compete-lhe dirimir conflitos de interesses, aplicando a lei nas hipóteses concretas, produzindo coisa julgada, formal e material, no que substitui a vontade das partes” (BULOS, 2018, p. 1296). Vasconcelos (2018) ainda acresce algumas funções além do julgamento: TÓPICO 4 | ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO 171 Conquanto sua função típica seja julgar, o Poder Judiciário também exerce funções atípicas ou secundárias, de natureza administrativa e legislativa. A função legislativa é desempenhada, por exemplo, quando edita normas regimentais, dispondo sobre a competência e funcionamento de seus corpos internos. Por outro lado, a função administrativa é exercida ao organizar o quadro de pessoal, prover cargos de carreira na respectiva jurisdição, entre outros (VASCONCELOS, 2018, p. 577) Além de administrar a justiça, solucionando conflitos, o Poder Judiciário é, também, o oráculo da Constituição. Juízes e Tribunais, indistintamente, têm o dever de obediência às normas constitucionais. Para tanto, o constituinte outorgou-lhes garantias, dentre as quais a vitaliciedade, a inamovibilidade e a irredutibilidade de vencimentos, que existem para evitar reprimendas e pressões ao ofício de julgar (BULOS, 2018, p. 1295). NOTA Acrescenta-se ainda que, “O acesso ao Judiciário, pois, é amplo, mas a inefetividade da prestação jurisdicional ou lentidão da Justiça contraria o fato de possuirmos uma das melhores estruturas judiciárias do mundo” (BULOS, 2018, p. 1325). Na atualidade, apesar das ferramentas fornecidas pelo judiciário, ainda há a lentidão nos processos jurídicos, de modo a atrasar as devolutivas. Destaca-se que, diferentemente do Legislativo e do Executivo, que se encontram com relação de certo entrelaçamento, o Poder Judiciário, ou a Jurisdição, é aquele que de forma mais inequívoca se singulariza com referência aos demais Poderes. Konrad Hesse observa que não é o fato de o Judiciário aplicar o Direito que o distingue, uma vez que se cuida de atividade que, de forma mais ou menos intensa, é exercida, também, pelos demais órgãos estatais, especialmente pelos da Administração (MENDES; BRANCO, 2019, p. 1062). Pontua-se a relevância dos demais poderes, sendo o judiciário pertencente a eles. Com funções e atribuições distintas, cada poder possui sua relevância, porém, quando se retrata acerca do poder judiciário, fala-se em proteção de direitos. Dessa forma, “O princípio da proteção judicial efetiva configura pedra angular do sistema de proteção de direitos” (MENDES; BRANCO, 2019, p. 1062). Moraes (2019, p. 573) apresenta que “A atividade jurisdicional, a partir da Reforma do Poder Judiciário, é informada por seis princípios constitucionais”. UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 172 QUADRO 14 – PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PODER JUDICIÁRIO CONFORME MORAES I- Transcendência, dado que a admissão do recurso extraordinário é condicionada à demonstração da repercussão geral da questão constitucional discutida no caso concreto. II- Celeridade processual, eis que a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a eficiência na sua tramitação. III- Publicidade dos atos processuais, já que os julgamentos do Poder Judiciário são públicos, podendo a presença, em certos atos, ser limitada às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação. IV- Pluralidade dos meios de acesso à justiça, posto que os Tribunais devem instalar a Justiça itinerante, como também podem funcionar, descentralizadamente, pela instituição das Câmaras regionais. V- Federalização das graves violações de direitos humanos, tendo que a competência é suscetível de deslocamento para a Justiça Federal, a requerimento do Procurador- Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados dos quais o Brasil seja parte. VI- Precedente judiciário e súmula de tribunal de aplicação obrigatória, visto que a súmula aprovada, revisada ou cancelada, de ofício ou por iniciativa de legitimado ativo para ação direta de inconstitucionalidade, por dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal, quanto à interpretação, validade e eficácia de normas determinadas, é dotada de efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública, direta ou indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. FONTE: Adaptado de Moraes, 2019 Tais princípios redigem a atuação do poder judiciário, sendo que em sua estruturação, possui subdivisões de cargos e atribuições, conforme o organograma a seguir: FIGURA 1 – ORGANOGRAMA DOS ÓRGÃOS JURISDICIONAIS FONTE: Vasconcelos, 2018, p. 593 Juízes de Direito Juízes Federais Juízes do Trabalho Juízes Eleitorais Juízes Militares TJs STJ TST TSE STM TMsTREsTRTsTRFsSTF TÓPICO 4 | ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO 173 Visualiza-se, portanto, a dimensão do poder judiciário em sua complexidade de fatores e atribuições. Vasconcelos (2018) ainda apresenta as regras de estruturação do poder, previstas nos Artigo 92 a 126 da Constituição Federal. • Supremo Tribunal Federal (STF). • Conselho Nacional de Justiça (CNJ). • Superior Tribunal de Justiça (STJ). • Tribunais Regionais Federais (TRFs) e Juízes Federais. • Tribunais – Tribunal Superior do Trabalho (TST) e Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) e Juízes do Trabalho. • Tribunais – Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) e Juízes Eleitorais. • Tribunais – Superior Tribunal Militar (STM) e Tribunais Militares (TM) e Juízes Militares. • Tribunais (TJs) e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios. Desta maneira, A organização do Judiciário deve ser disciplinada no Estatuto da Magistratura, estabelecido em lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, observados os princípios previstos na Constituição (CF, art. 93). Segundo a jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal, até o advento da lei complementar prevista no artigo 93, caput, da Constituição de 1988, o Estatuto da Magistratura será disciplinado pelo texto da Lei Complementar n. 35/79 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LO-MAN), que foi recebida pela Constituição (MENDES; BRANCO, 2019, p. 1070). “Na realidade, todo esse exame da estrutura orgânica do Poder Judiciário mostra-nos que, no Brasil, não faltam órgãos jurisdicionais para se invocar” (BULOS, 2018, p. 1326). Nesse sentido, com uma estrutura organizada e dividida desta forma, o poder judiciário, possui, de fato, autonomia para executar muitas ações. Conforme Moraes (2019, p. 554): A organização judiciária é dividida em dois planos de análise, a partir do Supremo Tribunal Federal, que se afasta de uma Corte Constitucional, pois não somente exerce a defesa da Constituição da República, e do Superior Tribunal de Justiça, que se aproxima de uma Corte de Cassação, posto que também executa a defesa da legislação federal, reunidos sob a expressão organismos de superposição. Dessa maneira, faz-se necessária a distinção entre Justiça Federal e Estadual. A Justiça Federal é “Aquela é composta pelos órgãos jurisdicionais integrados no ordenamento normativo federal, encerrando a Justiça Federal Comum, Justiça do Trabalho, Justiça Eleitoral e Justiça Militar Federal” (MORAES, 2019, p. 556). Já a Estadual, “é constituída pelos órgãos jurisdicionais integrados no ordenamento normativo estadual, englobando a Justiça Estadual Comum e Justiça Militar Estadual” (MORAES, 2019, p. 556). UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 174 Ademais, apresenta-se ainda as classificações de cada órgão membro do Poder Judiciário. Analise a tabela a seguir: QUADRO 15 – ÓRGÃOS DO PODER JUDICIÁRIO E SUAS ATRIBUIÇÕES SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL O Supremo Tribunal Federal é composto por 11 Ministros, escolhidos dentre brasileiros natos, no pleno exercício dos direitos políticos, com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada, e nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo voto da maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para o exercitamento de competências originárias e recursais, em atenção aos Artigos 101 a 103 da CRFB. SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA O Superior Tribunal de Justiça é composto por, no mínimo, 33 Ministros, escolhidos dentre brasileiros com mais de 35 e menos de 65 anos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, e nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado Federal, sendo um terço dentre juízes dos Tribunais Regionais Federais, um terço dentre desembargadores dos Tribunais de Justiça e um terço dentre advogados, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, e membros do Ministério Público Federal, Estadual, do Distrito Federal e Territórios, com mais de dez anos de carreira, alternadamente, para a exercitação de competências originárias e recursais, em atendimento aos Artigos 104 e 105 da CRFB. JUSTIÇA FEDERAL COMUM A Justiça Federal Comum é composta pelos Tribunais Regionais Federais, constituídos por, no mínimo, sete Juízes, escolhidos dentre brasileiros com mais de 30 e menos de 65 anos, quando possível, na respectiva região, e nomeados pelo Presidente da República, sendo um quinto dentre advogados, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, e membros do Ministério Público Federal, com mais de dez anos de carreira, e os demais dentre juízes federais, com mais de cinco anos de exercício, promovidos por antiguidade e merecimento, alternadamente, e Juízos Federais, contidos nos limites da circunscrição judiciária, na dicção dos Artigos 106 a 110 da CRFB. TRIBUNAIS REGIONAIS FEDERAIS Os Tribunais Regionais Federais detêm competência para processar e julgar, originariamente, os juízes federais da área de sua jurisdição, incluídos os da Justiça Militar e da Justiça do Trabalho, nos crimes comuns e de responsabilidade, e os membros do Ministério Público da União, excluída a competência da Justiça Eleitoral; revisões criminais e ações rescisórias de julgados seus ou dos juízes federais da região; mandado de segurança e habeas data contra ato do próprio Tribunal ou de juiz federal; habeas corpus, quando a autoridade coatora for juiz federal, e conflitos de competência entre juízes federais vinculados ao Tribunal, bem assim julgar, em grau de recurso, as causas decididas pelos juízes federais e pelos juízes estaduais no exercício da competência federal da área de sua jurisdição. TÓPICO 4 | ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO 175 JUSTIÇA DO TRABALHO A Justiça do Trabalho é composta pelo Tribunal Superior do Trabalho, constituído por 27 Ministros, escolhidos dentre brasileiros com mais de 35 e menos de 65 anos, nomeados pelo Presidente da República e, por força da EC nº 92/16, de notável saber jurídico e reputação ilibada, depois de aprovada a indicação pelo voto da maioria absoluta dos membros do Senado Federal, sendo um quinto dentre advogados, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, e membros do Ministério Público do Trabalho, com mais de dez anos de carreira, e os demais dentre juízes dos Tribunais Regionais do Trabalho, oriundos da magistratura de carreira, Tribunais Regionais do Trabalho, construídos por, no mínimo, sete Juízes, escolhidos dentre brasileiros com mais de 30 e menos de 65 anos, quando possível, na respectiva região, e nomeados pelo Presidente da República, sendo um quinto dentre advogados, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, e membros do Ministério Público do Trabalho, com mais de dez anos de carreira, e os demais dentre juízes do trabalho, promovidos por antiguidade e merecimento, alternadamente, e Juízos do Trabalho, contidos nos limites da circunscrição judiciária, na esteira dos Artigos 111 a 116 da CRFB. TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO O Tribunal Superior do Trabalho encerra competência para processar e julgar, originariamente, os dissídios individuais e coletivos de natureza econômica ou jurídica, assim como controvérsias em matéria de direito de greve e representação sindical, na esfera de sua jurisdição; reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões e litígios relativos ao cumprimento de laudos arbitrais, convenções e acordos coletivos, bem como julgar os recursos interpostos contra pronunciamentos dos Tribunais Regionais do Trabalho. JUSTIÇA ELEITORAL A Justiça Eleitoral é composta pelo Tribunal Superior Eleitoral, constituído por, no mínimo, sete Ministros, escolhidos dentre brasileiros com mais de 35 e menos de 65 anos, de notável saber jurídico e idoneidade moral, e nomeados pelo Presidente da República, sendo três dentre os Ministrosdo Supremo Tribunal Federal, três dentre os Ministros do Superior Tribunal de Justiça e dois dentre advogados, indicados por aquele, Tribunais Regionais Eleitorais, construídos por sete Juízes, escolhidos dentre brasileiros com mais de 30 e menos de 65 anos, de notável saber jurídico e idoneidade moral, e nomeados pelo Presidente da República, sendo um dentre juízes federais do Tribunal Regional Federal com sede na Capital do Estado ou Distrito Federal, dois dentre desembargadores, dois dentre juízes de direito do Tribunal de Justiça e dois dentre advogados, indicados por este, Juntas Eleitorais, consubstanciadas por um Juiz de Direito, assim como por dois ou quatro cidadãos de notória idoneidade, aprovados pelo Tribunal Regional Eleitoral, designados pela Presidência, e Juízos Eleitorais, contidos nos limites da circunscrição judiciária, na imposição dos Artigos 118 a 121 da CRFB. UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 176 TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL O Tribunal Superior Eleitoral incorpora competência para processar e julgar, originariamente, o registro e a cassação de registro de partido político, diretório nacional e candidatos à Presidência e Vice-Presidência da República; conflitos de jurisdição entre Tribunais Regionais e Juízes Eleitorais de Estados diferentes; crimes eleitorais e comuns que lhes forem conexos praticados por Juízes de Tribunais Eleitorais; habeas corpus em matéria eleitoral, referentes a atos do Presidente da República e Ministros de Estado e dos Tribunais Regionais, ou, ainda, quando houver perigo de se consumar a violência antes que o Juiz competente possa prover sobre a impetração; reclamações relativas a obrigações impostas pela legislação aos partidos políticos, quanto a sua contabilidade e apuração da origem dos seus recursos; impugnações à apuração do resultado geral, proclamação dos eleitos e expedição de diploma na eleição de Presidente e Vice-Presidente da República; pedidos de desaforamento dos feitos não decididos nos Tribunais Eleitorais no prazo de 30 dias a contar da conclusão ao relator e ação rescisória, nos casos de inelegibilidade, desde que intentada dentro de 120 dias de decisão irrecorrível, bem como julgar os recursos interpostos das decisões dos Tribunais Regionais, nas hipóteses de contrariedade à expressa disposição da Constituição ou legislação; divergência na interpretação de lei entre dois ou mais Tribunais Eleitorais; denegação de habeas corpus, habeas data, mandado de injunção ou mandado de segurança; decretação de inelegibilidade ou perda de mandatos eletivos 90 e expedição ou anulação de diplomas nas eleições federais e estaduais. JUSTIÇA MILITAR FEDERAL A Justiça Militar Federal é composta pelo Superior Tribunal Militar, constituído por 15 Ministros, escolhidos dentre brasileiros com mais de 35 e menos de 65 anos, de notório saber jurídico e conduta ilibada, e nomeados pelo Presidente da República, depois de aprovada a indicação pelo Senado Federal, sendo quatro dentre oficiais-generais do Exército, três dentre oficiais-generais da Marinha e três dentre oficiais-generais da Aeronáutica, todos da ativa e do posto mais elevado da carreira, assim como três dentre advogados, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, e dois dentre juízes- auditores e membros do Ministério Público Militar, e Conselhos de Justiça Militar, especiais ou permanentes, constituídos por um Juiz-Auditor e quatro Juízes militares, sob a presidência, dentre estes, de um oficial-general ou oficial superior, de posto mais elevado que o dos demais juízes, ou de maior antiguidade, no caso de igualdade, bem como por um Juiz-Auditor, um Oficial Superior, que será o presidente, e três Oficiais de posto até capitão-tenente ou capitão, na medida dos Artigos 122 a 124 da CRFB. SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR O Superior Tribunal Militar maneja competência para processar e julgar, originariamente, os oficiais generais das Forças Armadas, nos crimes militares; habeas corpus, habeas data e mandado de segurança contra atos de autoridades da Justiça Militar Federal, como também do próprio Superior Tribunal Militar; pedidos de desaforamento de feitos não decididos; revisão de processos findos; conflitos de competência entre Conselhos de Justiça Militar, Juízes-Auditores, ou entre estes e aqueles, bem assim conflitos de atribuição entre autoridades administrativa e judiciária militares, e julgar os recursos interpostos das decisões dos Juízes de primeira instância. TÓPICO 4 | ESTRUTURA E COMPOSIÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO 177 JUSTIÇA ESTADUAL COMUM A Justiça Estadual Comum é composta pelo Tribunal de Justiça, constituído por Desembargadores em número fixado por lei estadual, sendo um quinto dentre advogados, com mais de dez anos de efetiva atividade profissional, e membros do Ministério Público do Estado, com mais de dez anos de carreira, e os demais dentre juízes de direito, com mais de dois anos de exercício na última ou única entrância, promovidos por antiguidade e merecimento, alternadamente, e Juízos de Direito, contidos nos limites da circunscrição judiciária, nas palavras dos Artigos 125, caput e §§ 1º, 2º, 6º e 7º, e 126 da CRFB. TRIBUNAL DE JUSTIÇA O Tribunal de Justiça porta competência definida na Constituição do Estado, concernindo-lhe, por exemplo, processar e julgar, originariamente, a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou municipal, inclusive a que tenha por objeto a intervenção em Município; Vice-Governador e Deputados Estaduais, nos crimes comuns; Secretários de Estado, Prefeitos, Vice-Prefeitos e Vereadores, Juízes de Direito e membros do Ministério Público, Defensoria Pública e Procuradorias-Gerais do Estado e da Assembleia Legislativa, nos crimes comuns e de responsabilidade, excetuada a competência da Justiça Eleitoral. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA O Conselho Nacional de Justiça, formado por 15 membros com mais de 35 e menos de 66 anos de idade, com mandato de dois anos, admitida, exceto para o Presidente, uma recondução, sendo um Ministro do Supremo Tribunal Federal, um Ministro do Superior Tribunal de Justiça, um Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, um Juiz de Tribunal Regional Federal, um Juiz de Tribunal Regional do Trabalho, um Desembargador de Tribunal de Justiça, um Juiz Federal, um Juiz do Trabalho e um Juiz de Direito, definidos pelos órgãos judiciários aos quais estão vinculados, ou não, um membro do Ministério Público da União e um membro de Ministério Público Estadual, denominados pelo Procurador-Geral da República, dois advogados, deliberados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, e dois cidadãos, de notável saber jurídico e reputação ilibada, designados pela Câmara dos Deputados e Senado Federal, por escolha paritária. FONTE: Adaptado de Moraes, 2019 Ademais, acrescenta-se dizer que “A função típica do Poder Judiciário é a jurisdicional, ou seja, a sua tarefa é dirimir os conflitos de interesses, aplicando a lei ao caso concreto, substituindo a vontade das partes” (VASCONCELOS, 2018, p. 577). Entretanto, todos estes órgãos são disponibilizados aos cidadãos a fim de resolução de problemas jurisdicionais. O órgão de cúpula do Poder Judiciário é o STF, guardião da Constituição e Corte Máxima de toda a Federação, ao qual foi atribuída competência para julgamento das mais elevadas autoridades públicas e relações internacionais de que o Brasil faça parte, bem como para julgar, em última instância, matéria de UNIDADE 3 | O DIREITO NO TEMPO E NO ESPAÇO – TEORIA DA RELAÇÃO JURÍDICA 178 natureza constitucional. O STJ é o órgão máximo da Justiça Federal e os juízes e tribunais equivalem aos órgãos judiciários federal e estadual. Observe-se que o Conselho Nacional de Justiça não desempenha funções jurisdicionais, apenas realizando o controle administrativo e disciplinar da magistratura. Desta forma, não se insere no organograma dos órgãos jurisdicionais doPoder Judiciário. O STF, o Conselho Nacional de Justiça e os Tribunais Superiores têm sede na Capital Federal (CF, art. 92, § 1o) (VASCONCELOS, 2018, p. 594). Há ainda, certa hierarquização a ser respeitada – isso muito anterior à constituição de 1988, sendo o STF considerado o oráculo das constituições –, como postula Bulos: O Supremo Tribunal Federal é o oráculo de nossas Constituições, sendo a mais delicada instituição do regime republicano. Instituição moderadora, limitadora, que cerca as demais instituições, como uma garantia de todas, o Supremo foi criado para ser inacessível às influências da desordem, das paixões, dos interesses e das inclinações corruptíveis. Por isso, é joia da República, como o é no regime dos Estados Unidos, de onde para aqui o trouxemos. Incumbem-lhe, preponderantemente, as seguintes missões: fiscalizar a constitucionalidade das leis e dos atos normativos; emitir a última palavra nas questões submetidas ao seu veredito; primar pela regularidade do Estado Democrático de Direito, garantindo a separação de Poderes; e defender a supremacia das liberdades públicas, dos direitos fundamentais, em face dos Poderes do Estado (BULOS, 2018, p. 1326). Contudo, é compreensível a relevância do Poder Judiciário, assim como suas subdivisões e atribuições de cada parte constituída, cabe a este, manter a ordem nacional no que diz respeito aos direitos dos cidadãos, seja em qual área for. A partir deste tópico, foi possível avaliar cada elemento presente no Poder Judiciário, e, ainda, adquirir a breve percepção do trabalho no qual ele desempenha a plano nacional. 179 RESUMO DO TÓPICO 4 Neste tópico, você aprendeu que: • O Judiciário, nos moldes do Texto de 1988, é um poder autônomo, de enorme significado no panorama constitucional das liberdades públicas. • A Constituição de 1988 confiou ao Judiciário papel até então não outorgado por nenhuma outra Constituição. • O poder judiciário possui funções de extrema relevância no âmbito jurídico, desta forma, entende-se que em um primeiro momento a função típica, imediata, primária ou própria do Poder Judiciário é, simplesmente, julgar. • A atividade jurisdicional, a partir da Reforma do Poder Judiciário, é informada por seis princípios constitucionais. • A estruturação do poder judiciário consiste em: Supremo Tribunal Federal (STF); Conselho Nacional de Justiça (CNJ); Superior Tribunal de Justiça (STJ); Tribunais Regionais Federais (TRFs) e Juízes Federais; Tribunais – Tribunal Superior do Trabalho (TST) e Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) e Juízes do Trabalho; Tribunais – Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) e Juízes Eleitorais; Tribunais – Superior Tribunal Militar (STM) e Tribunais Militares (TM) e Juízes Militares; Tribunais (TJs) e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios. Ficou alguma dúvida? Construímos uma trilha de aprendizagem pensando em facilitar sua compreensão. Acesse o QR Code, que levará ao AVA, e veja as novidades que preparamos para seu estudo. CHAMADA 180 AUTOATIVIDADE 1 Conforme estudado neste tópico, há distinções entre Justiça Federal e Estadual. Avalie as afirmações a seguir e assinale a alternativa correta. I- A Justiça Federal é aquela composta pelos órgãos jurisdicionais integrados no ordenamento normativo federal, encerrando a Justiça Federal Comum, Justiça do Trabalho, Justiça Eleitoral e Justiça Militar Federal. II- A Justiça Estadual é constituída pelos órgãos jurisdicionais integrados no ordenamento normativo estadual, englobando a Justiça Estadual Comum e Justiça Militar Estadual. III- A Justiça Federal é aquela composta pelos órgãos jurisdicionais integrados no ordenamento normativo federal, encerrando a Justiça Estadual Comum, Justiça do Trabalho, Justiça Militar Estadual. a) ( ) As alternativas I e II estão corretas. b) ( ) As alternativas II e III estão corretas. c) ( ) As alternativas I e III estão corretas. d) ( ) Somente a alternativa I está correta. 2 No poder judiciário, encontramos os princípios constitucionais – que norteiam toda a ação dentro deste poder por parte dos juristas. Quais são eles? a) ( ) Transcendência, pluralidade dos meios de acesso à jus, federalização das graves violações de direitos humanos, precedente judiciário e súmula de tribunal de aplicação obrigatória, apenas. b) ( ) Transcendência, celeridade processual, publicidade dos atos processuais, pluralidade dos meios de acesso à jus, federalização das graves violações de direitos humanos, precedente judiciário e súmula de tribunal de aplicação obrigatória, apenas. c) ( ) Celeridade processual, publicidade dos atos processuais, pluralidade dos meios de acesso à jus, federalização das graves violações de direitos humanos, precedente judiciário e súmula de tribunal de aplicação obrigatória, hermenêutica jurídica, apenas. d) ( ) Nenhuma das alternativas está correta. 181 REFERÊNCIAS AMARAL, F. Direito civil: introdução. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2017. ASCENSÃO, J. de O. Direito Civil: Teoria Geral – Relações e Situações Jurídicas. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. AZEVEDO, A. J. de. Negócio jurídico: existência, validade e eficácia. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. BAGNOLI, V.; BARBOSA, S. M.; OLIVEIRA, C. G. B. de. Introdução à História do direito. São Paulo: Atlas, 2014. BARROSO, L. R. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas. 2. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 1993. BETIOLI, A. B. Introdução ao Direito: Lições de propedêutica jurídica tridimensional. 14. ed. São Paulo: Saraiva, 2015. BOBBIO, N. Teoria do ordenamento jurídico. 6. ed. Brasília: Universidade de Brasília, 1995. BULOS, U. L. Curso de direito constitucional. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2018. CALGARO, G. A. Noções sobre a estrutura da norma jurídica de direito privado. Revista Eletrônica da Faculdade de Direito de Franca, Franca, v. 7, n. 1, p. 3-21, jul. 2013. CÂMARA, A. F. Lições de direito processual civil. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2014. CAMPOS, N. R. (2011). Noções essenciais de direito. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. CARVALHO, A. T. de. 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Disponível em: https://resumosdeumestudantededireito.wordpress.com/2016/05/30/fontes-do- direito/. Acesso em: 2 mar. 2020. DIAS, R. Sociologia do Direito: a abordagem do fenômeno jurídico como fato social. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2014. DIMOULIS, D. Manual de introdução ao estudo do direito. 5. ed. São Paulo: Revistas do Tribunais, 2013. ELTZ, M. K. de F.; TEIXEIRA, J. K. M.; DUARTE, M. de F. Hermenêutica e argumentação jurídica. Porto Alegre: Sagah, 2018. FERRAZ JUNIOR, T. S. Introdução ao estudo do direito. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2019. FERRAZ JUNIOR, T. S. Introdução ao estudo do direito. 10. ed. São Paulo: Atlas S.A., 2018. FERRAZ JUNIOR, T. S. Introdução ao estudo do direito. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2015. FRIEDE, R. Ciência do Direito, norma, interpretação e hermenêutica jurídica. 9. ed. Barueri: Manole, 2015. GIACOMELLI,