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SOCIOLOGIA CLÁSSICA AULA 6Simone Mota CONVERSA INICIAL Prezado(a) leitor(a), como no estudo anterior, neste material nos dedicaremos, também, a observar o modo como os autores clássicos abordaram um objeto de estudo e como sua percepção influencia o trabalho dos teóricos contemporâneos. objeto de estudo, neste caso, é o trabalho, eixo central da produção sociológica desde os seus primórdios até as décadas finais do último século. Fato é que, ainda hoje, o trabalho segue como tema relevante para a Sociologia. Entre outras, busca-se responder questões como: Como se dão as relações de trabalho? Como melhorar a situação dos trabalhadores e, ao mesmo tempo, garantir o desenvolvimento econômico. A partir de agora, não tentaremos responder essas questões, mas, como já informado, pensaremos como a Sociologia olha para as relações de trabalho, sobretudo na modernidade, a partir dos clássicos. Vamos investigar essa leitura principalmente a partir da abordagem marxista, mas também considerando os pensamentos de Durkheim e Max Weber, colocando-a como fio condutor do pensamento e da produção sociológica sobre as relações de trabalho na modernidade. Bons estudos! TEMA 1 - TRABALHO NA FÁBRICA Os autores clássicos iniciaram suas abordagens sociológicas em torno do mundo do trabalho olhando principalmente trabalho fabril.Claro que houve avanços, e a própria obra de Émile Durkheim, "Divisão do trabalho social", ampliou o conceito de trabalho ao incluir nesse grupo toda e qualquer atividade realizada em sociedade. Ou seja, para o teórico, qualquer função que se desempenhe, é um trabalho, inclusive a limpeza da casa, por exemplo. Apesar disso, a Sociologia Clássica, que deu origem à Sociologia do Trabalho, considerou que quando se trata de uma análise sociológica do universo do trabalho, é preciso deter-se ao trabalho fabril, porque ele é a expressão do trabalho na modernidade. O trabalho fabril ou o trabalho assalariado provocou importantes consequências Qualquer função que se faça em sociedade é um trabalho, no entanto a sociologia clássica, que depois deu origem à sociologia do trabalho, vai entender que quando se quer analisar sociologicamente esse universo, é preciso nos deter principalmente sobre o trabalho fabril, porque esse teria sido a expressão do trabalho na modernidade, ou seja, trabalho assalariado. E também porque foi esse o modelo que produziu mais consequências e marcou a transição do "controle sobre si" ao "controle de 1.1 "DO CONTROLE SOBRE SI AO CONTROLE DE SI" Até a Revolução Industrial, a sociedade era principalmente rural, ou seja, o ritmo do trabalho era determinado pelos ritmos da natureza, o trabalhador saia para trabalhar na agricultura ao amanhecer e o cair da noite era o limite para encerrar o expediente, interromper o trabalho. O trabalhador, nesse caso, tinha o controle do próprio corpo, sobre quando interromper ou intensificar suas atividades. Com a modernização e o advento da urbanização e da industrialização, esse "controle sobre si" transformou-se no "controle de si", uma vez que o agora operário não pode mais comandar o seu ritmo de trabalhou ou mesmo obedecer às vontades ou necessidades do seu corpo. Muitos pensadores se dedicaram à análise dessa marca do trabalho industrial, ou marca do controle sobre o corpo, do controle sobre tempo, do controle sobre o trabalhador, surgindo daí a expressão "do controle de si ao controle sobre si". 1.2 A PRODUÇÃO PRÉ-FABRILPara compreender como se deu a emergência e a consolidação do trabalho fabril, principal expressão de trabalho na modernidade, antes é preciso compreender o modo como ocorria a produção de bens antes disso. Até o advento das fábricas, a produção de bens se caracterizava por uma produção artesanal. São características da produção artesanal ou produção pré-fabril: A casa e a oficina do artesão eram mesmo lugar, não havia separação; A produção ocorria em pequena escala; O conhecimento sobre ofício era transmitido de geração para geração. O artesão, portanto, trabalhava em sua oficina que, normalmente, estava no mesmo terreno de sua casa e seu conhecimento fora recebido do pai ou avô e era sua obrigação repassar a formação aos filhos, sobrinhos, enfim, às gerações seguintes. Nesse modo de produção, o artesão era responsável por todas as etapas do processo produtivo, desde contato com o cliente e fechamento do negócio até a entrega, efetiva, do produto. Um sapateiro, por exemplo, era responsável por tirar as medidas do pé do cliente, escolher os materiais a ser utilizado, escolher e preparar as matérias-primas, como o couro e o solado, por exemplo, até a costura, colagem e polimento do calçado. Nesta situação, além de deter todo conhecimento e realizar todas as etapas do processo produtivo, artesão era o proprietário e detinha controle sobre a oficina, sobre a matéria-prima, sobre as ferramentas, bem como sobre seu tempo e sobre a mercadoria. Em resumo, o artesão possuía autonomia sobre seu ofício, sobre seu trabalho, enfim, sobre sua fonte de renda. Ocorre, porém, que ao observarmos esse processo por uma perspectiva e em escala, essa produção artesanal não era massiva e sua capacidade se limitava a atender pequenas demandas. Nesse período pré-industrial, quando ainda não existiam as indústrias têxteis e de vestuário, os camponeses produziam as próprias roupas. As mulheres, principalmente, após trabalho no campo, produziam fios em seus teares para então costurar as roupas das famílias. Até então, as cidades e os burgos não eram constituídos e o comércio se dava em pequenas feiras onde os artesãos expunham seus produtos, vendiam e faziam contato com seus clientes. Essasolução, portanto, era suficiente para uma realidade de baixa densidade demográfica, pouca atividade comercial e pequena circulação de dinheiro. No entanto, a monetarização da economia provocou inúmeras mudanças, e entre elas, uma das principais foi a substituição do modelo artesanal de produção para o modelo fabril. 1.3 CORPORAÇÕES DE OFÍCIO - SÉCULO XII A substituição do modelo artesanal de produção para o modelo fabril não ocorreu de forma abrupta, mas por meio de um processo cuja etapa seguinte à realidade da produção artesanal foi o advento das chamadas corporações de ofício, por volta do século XII, na idade média nascente. Essas corporações eram organizadas com a liderança de um mestre, que era o dono da oficina e que ficava com a maior parte do lucro dos produtos vendidos e também era o responsável por determinar o preço e o ritmo da produção. Além dos mestres, a estrutura das corporações incluía também os oficiais e os aprendizes. Muitos pais, interessados em garantir aos seus filhos o conhecimento de um ofício, pagavam aos mestres para que estes repassassem seu conhecimento a estes, que dentro das corporações eram os aprendizes. Entre esses dois grupos, os oficiais eram os empregados que, de fato, produziam os bens dentro das oficinas e ficavam encarregados de ensinar e fiscalizar a atuação dos aprendizes. Na prática, os mestres se ocupavam de impedir a ascensão profissional e econômica dos mais pobres, no caso, os oficiais, que possuíam equivalência em conhecimento e experiência a esses mestres. Normalmente, as corporações de ofício são tomadas como uma espécie de antepassado dos sindicatos, afinal, havia um conjunto de trabalhadores que atuava na mesma área e que criou regras e procedimentos com o objetivo de padronizar a produção aumentar a lucratividade. Apesar dessa similaridade, a atuação das corporações não pode ser romantizada, porque dentro dessas corporações, que deveriam assegurar o direito de todos os trabalhadores da área, os mestres, responsáveis por estabelecer os parâmetros e padronização dos processos, atuaram para regrar os processos de tal forma que os oficiais jamais conseguissem evoluir na carreira e chegar à posição demestres. As corporações de ofício, como é possível notar, não podem ser consideradas um embrião do cooperativismo. Ao estabelecer uma verificação empírica dos fatos, observa-se que o modo como as corporações se organizaram é determinante para entender como o capital Industrial passou a se organizar em torno da produção de mercadorias. 1.4 A LÓGICA DA FÁBRICA Passando pelas corporações de ofício, o modo de produção saiu de um sistema artesanal, em que o artesão era dono de todos os elementos e possuía autonomia sobre todos eles, para uma nova lógica de fábrica em que as condições de trabalho incluíam longas jornadas, disciplinamento dos corpos e preferência pelas mãos de obra feminina e infantil. Essa mudança foi oportunizada por alguns elementos e momentos históricos. Entre eles está a emergência da burguesia, classe social com grande capital acumulado graças ao comércio e que passou a concentrar toda a matéria-prima dos bens de consumo e impedir que artesão tivesse acesso a esses produtos e, consequentemente, impedir que ele pudesse continuar sua produção por conta própria. Ao perder a capacidade de trabalhar por conta própria, os artesãos foram obrigados a trabalhar nas fábricas. Esse novo modelo de organização do trabalho em fábricas foi centrado no disciplinamento dos corpos agora não era mais o ritmo da natureza que determinava a intensidade do trabalho, mas o ritmo da máquina passou a condicionar e determinar a produtividade do trabalhador. Além disso, esse sistema fabril nascente, sobretudo no contexto inglês, revelou uma preferência dos donos das fábricas pelas mãos de obra feminina e infantil, isso porque mulheres e crianças eram mais submissas às ordens superiores, enquanto que os homens eram mais resistentes às determinações dos patrões e ao intenso ritmo das máquinas. Nesse contexto, a crescente urbanização provocou também excesso de mão de obra disponível, que provocou um achatamento dos salários e a precarização das condições de trabalho, afinal, ainda não havia uma legislação que protegesse minimamente o trabalhador sobre jornada e condições de trabalho.Aliás, a preferência por mão de obra feminina e infantil é um indício forte da precarização do trabalho e revela como opera desde sempre o capital: importa manter ou aumentar o lucro, independentemente das condições como isso ocorrerá. TEMA 2 - A DIVISÃO MANUFATUREIRA DO TRABALHO A transição do modelo de trabalho artesanal, ao longo da sociedade feudal, para o modelo fabril, cujo ponto alto foi a Revolução Industrial, levou décadas ou mesmo séculos. Às etapas intermediárias dessa mudança deu-se o nome de processo de manufatura ou processo manufatureiro de trabalho. 2.1 DA CASA PARA Com grande capital acumulado, a burguesia, nova classe social - sem o prestígio político da nobreza, mas muito mais rica que os camponeses observou uma espécie de limite para os seus ganhos apenas com o comércio interno e marítimo. Acontece que, assim como ocorrera no período feudal, quando a agricultura chegou ao seu limite e motivou outras práticas econômicas, o comércio para a burguesia se mostrou pouco rentável em certo momento, levando-os a atuar em outras frentes, ou seja, ao invés de ganhar apenas com a circulação e bens, eles passaram a produzir esses bens. A burguesia, então, utilizou capital acumulado nas relações comerciais para investir na produção fabril, com a construção de fábricas, aquisição de ferramentas e pagamento da mão de obra, e para garantir o sucesso de sua empreitada, utilizou a estratégia do monopólio da matéria- prima. Com a retenção da matéria-prima pela burguesia, o trabalhador, artesão, teve de render-se às fábricas e abandonou a oficina de sua casa para trabalhar para outras pessoas. A partir de então, ele não era mais dono do bem que produzia, bem como do seu local de trabalho e das ferramentas utilizadas. Agora ele era proprietário apenas de sua força de trabalho e do conhecimento. 2.2 MODELO DE COOPERAÇÃO SIMPLESO modelo de trabalho fabril de cooperação simples nada tem a ver com um sistema solidário de cooperativismo e trabalho. Acontece que nesse primeiro momento a estratégia dos donos das fábricas foi reunir em barrações os artesãos, que dominavam ofício e a produção do bem, na condição de empregados, e que construíam o bem em sua totalidade. Essa foi a primeira estratégia de produção de mercadoria em escala e tirou do trabalhador, como já dito, a autonomia sobre a estrutura de produção, a propriedade do bem e domínio do tempo, mas nesse momento ele ainda era detentor do conhecimento e sabia construir a mercadoria em sua totalidade. Portanto, grande diferencial dessa etapa do processo é a não divisão do trabalho, exatamente a grande mudança da etapa seguinte do processo. 2.3 FRACIONAMENTO DA PRODUÇÃO OU COOPERAÇÃO AVANÇADA Até aqui, apesar de já não ser dono do bem produzido e ter seu ritmo de trabalho ditado pelo dono da fábrica da qual era empregado, o artesão ainda era responsável pela construção do bem e sabia como fazer todo processo. No entanto, aumento da produtividade e, consequentemente, do lucro, era um desejo dos empresários, e isso provocou que conhecemos como divisão do trabalho. A partir de então, aconteceu um fracionamento da produção para melhoria da produtividade. O trabalhador que realizava todas as etapas do processo passou a realizar apenas uma ou pequena parte do processo, tornando, assim, processo mais célere. Por exemplo, sapateiro agora não faz mais todo processo. Um corta o solado, outro corta couro, outro costura as partes e um último cola a sola, ou seja, houve uma espécie de hiperespecialização das atividades, que conferiu ao trabalhador maior destreza e habilidade para a atividade que se converteu em maior produtividade e, consequentemente, aumentou ritmo de trabalho. O problema é que essa hiperespecialização tirou do trabalhador o último elemento de sua condição original de artesão: conhecimento do processo completo. Isso porque a fragmentação do processo destituiu dessa última posse, além da força de trabalho. Aliás, Karl Marx entende que este foi o principal ou mais intenso momento do processo de alienação do trabalhador, que, por não conhecer todo processo em que atua, não é mais capaz de se perceber como alguém que produz um trabalho socialmente útil, além de, ao final do processoprodutivo, também não ser proprietário do bem construído, já que a mercadoria pertence ao patrão e não ao trabalhador. Marx considera esse um grande pois apenas o trabalho humano produz riqueza e não é admissível que quem produz a riqueza não seja dono da mesma. Essa questão foi uma das que o teórico se dedicou a responder ao longo de sua obra. É bem verdade que a perspectiva de Marx era o capitalismo pós-Revolução Industrial e suas análises se concentraram no processo que transitou da produção artesanal, cooperação simples, cooperação avançada e agora tinha na maquinofatura o seu auge. Para Marx, esse desconhecimento do todo que a divisão do trabalho gerou no trabalhador produz sobre ele o que o autor chamou de subjetividade do trabalhador. Ele explica que, se na produção artesanal, o artesão se sentia participe do mundo e alguém capaz de transformar a natureza e, a partir disso, estabelecer relações sociais, neste último momento esse trabalhador não se reconhece como alguém que produz conhecimento ou algo socialmente útil. Crítico à divisão do trabalho, Marx afirmou que esta forma alienada ou estranhada do trabalho desumaniza o trabalhador, pois ele perde a consciência sobre seu potencial de ação no mundo. Diferentemente dele, outras abordagens sobre o tema foram positivas. Durkheim, por exemplo, observou a divisão de trabalho de forma positiva e afirmou que esse processo gerou na sociedade moderna contemporânea o sentimento e a consciência da interdependência dos indivíduos. Quer dizer, ao perceber que faz apenas uma parte do trabalho necessário à sua sobrevivência, o indivíduo consegue compreender sua dependência do trabalho da outra pessoa. Nesse contexto, além de valorizar o trabalho do outro, o indivíduo tem consciência da importância do cumprimento adequado de sua função em proteção do equilibro social. TEMA 3 A GERÊNCIA CIENTÍFICA: TAYLORISMO E FORDISMO A sociologia contemporânea acompanha as etapas do processo produtivo e o desenvolvimento das sociedades modernas com foco nas relações de trabalho. Na continuação do processo, a etapa seguinte é reconhecida como processo de racionalização dos processos produtivos ou racionalização da economia e racionalização do trabalho.Neste momento, o clássico que acionamos para compreender tais etapas é Max Weber, para quem essa racionalização produziu formas específicas de trabalho, formas específicas de economia e até formas específicas de Estado, afinal, essa racionalização ocorre em paralelo à transição das monarquias para os estados nacionais. Weber entendia que a monarquia representava uma forma irracional de política e de economia. O autor acreditava que o feudalismo não era uma forma de economia racionalizada, ao passo que o capitalismo se apresentou como uma forma mais eficiente de gestão dos recursos. Já do ponto de vista do indivíduo, que até aquele momento se referenciava pela religião, a partir desse momento tornou-se o que Weber nomeou de homem econômico. Esse nome homem econômico não diz respeito a riquezas materiais do indivíduo, mas referencia sujeito mais racional, que calcula as vantagens e desvantagens das suas ações, em outras palavras, que calculas a consequências de suas ações. Partindo do entendimento weberiano, considera-se, então, que o processo de racionalização do trabalho foi colocado em curso a fim de tornar mais eficiente o uso dos recursos frente às demandas existentes. A partir desse senso de racionalização, dois nomes se destacam na continuidade do processo de racionalização dos processos produtivos, são eles Frederick Taylor e Henri Ford. Taylor foi o responsável por introduzir princípios de administração aos processos fabris e Ford se tornou conhecido e é reconhecido até a contemporaneidade como criador da Ford, indústria de veículos. Taylor criou os princípios de racionalidade administrativa e os aplicou ao universo fabril. De forma resumida, ele reconheceu a existência de um conjunto de recursos e de uma demanda e passou a combinar recursos e demandas para produzir bens de forma eficaz, evitando o desperdício de recursos e, paralelamente, impondo tal ritmo à produção que fosse capaz de atender toda sua demanda. A racionalização de Taylor, portanto, buscou maximizar lucros e diminuir prejuízos. Além disso, essa busca de eficiência na produção promoveu maior disciplinamento do trabalho e uma separação radical entre quem planeja os processos e quem produz os bens ou alguma etapa deles. Essa separação se deu inclusive de forma física, quando os setores administrativos foram separados do chamado "chão de fábrica" para o mezanino, por exemplo.Esse posicionamento de Taylor revelou o entendimento de que, para ele, existem indivíduos mais capacitados para atividades intelectuais e outros mais capacitados para atividades repetitivas. O grande problema desta lógica é que, se por um lado a racionalização do trabalho resulta em mais eficiência, essa distinção das atividades reproduz assimetrias sociais ao separar os indivíduos entre aqueles com maior potencial intelectual e aqueles com maior facilidade para o trabalho braçal. Essa naturalização das desigualdades sociais, entre outros aspectos, desconsidera as condições reais e efetivas de vida de cada indivíduo, afinal, não se pode afirmar que uma pessoa que jamais teve a oportunidade de estudar, por exemplo, não possua vocação para a área administrativa. A abordagem taylorista, portanto, apesar de aprimorar a produtividade, reproduziu e solidificou desigualdades que já estavam presentes naquela sociedade. Além de todas essas questões, a principal tônica da racionalização implementada por Taylor na rotina da fábrica diz respeito ao disciplinamento dos corpos. Ao organizar e rotinizar os procedimentos, ele estabeleceu movimentos certos e errados, o que gerou a intensificação do controle sobre o corpo. A partir disso, o funcionário que precisa abandonar a linha de produção para in ao banheiro gera uma espécie de prejuízo e se torna indesejável e, portanto, está sujeito a ser substituído por outro trabalhador que tenha maior controle sobre suas funções fisiológicas, e isso é realidade até os dias de hoje em algumas fábricas. A busca pela eficiência da produção provocou ainda o estabelecimento da jornada fixa sobre o trabalho e sobre o trabalhador. Esse controle total sobre o tempo culminou na internalização da noção de tempo no trabalhador, que no período feudal seguia o ritmo da natureza, e agora passa a contar tempo como algo valioso, ou seja, a partir da lógica do dinheiro, gerando o entendimento, que hoje consideramos um entendimento popular, de que "tempo é dinheiro". Inovador quanto ao último processo idealizado por Taylor, Ford introduziu a esteira mecânica nas linhas de produção como forma de acelerar a produtividade. Mas ele foi além e observou a combinação da redução da jornada de trabalho e aumento dos salários era capaz de alimentar desejo do trabalhador em dedicar-se à sua função. A redução da jornada de trabalho criou o tempo livre do trabalhador e o aumento do salário introduziu esses operários no mercado de consumo, dando a eles a oportunidade de consumir o bemque estavam produzindo. A intenção de Ford ao incluir os operários no grupo de consumidores dos seus veículos não foi uma ação de boa intenção. Na realidade, ele percebeu muito rapidamente que a capacidade de a burguesia consumir a sua produção esgotou-se rapidamente e oferecer o seu produto aos empregados das fábricas foi, na realidade, uma estratégia de abertura de mercado, considerando que esse setor da sociedade reunia um grande grupo capaz de absorver a produção de veículos. Ao reduzir jornada, aumentar salários e introduzir os trabalhadores no circuito do consumo, Ford deu um grande salto na produtividade es também na sua lucratividade. Num contexto social mais amplo, as práticas taylorista-fordista se mostraram eficientes para além dos limites das fábricas. As regras de filas, horários rígidos para entrar e sair da escola e até o sinal sonoro indicando início e fim das aulas são elementos das construções teyloristas-fordistas para as fábricas implementados dentro das instituições escolares. Sendo assim, a vivência escolar desde a infância, na realidade, promove a domesticação dos corpos a fim de preparar as crianças para o ritmo das fábricas. TEMA 4 - PÓS-FORDISMO E A GLOBALIZAÇÃO Até aqui, o caminho da evolução do trabalho perpassou trabalho artesanal, trabalho nas manufaturas, o trabalho nas máquinofaturas até os processos de Taylor e Ford de racionalização da produção nas fábricas. Mas trabalho permanece transformando e hoje vivemos uma era pós-fordista do trabalho que diz respeito ao mundo do trabalho nas últimas décadas. Esse novo modelo produtivo vivenciado a partir das décadas de 1960 e 1970 foi batizado de toyotismo, justamente pelo impacto causado pelas inovações da Toyota, fábrica japonesa de automóveis. Também chamado de pós-fordista, esse novo modelo produtivo foi marcado pelo esgotamento do modelo de acumulação, ou seja, assim como a agricultura se esgotou na idade média e comércio se tornou limitado do ponto de vista da rentabilidade para a burguesia, que passou a investir na produção de bens em larga escala, agora ocorre uma nova transição e o dinheiro, o capital, torna a mudar de lugar.Produzir mercadorias não é mais suficientemente rentável na ótica dos investidores. Por isso mesmo, o capital até então concentrado na produção de mercadorias passa a ser um capital de investimento ou, como alguns denominam, um capital especulativo. Trata-se do investidor que não produz, mas que investe capital em algum setor de produção ou na compra de títulos de dívida pública, ou seja, os países se endividam, o investidor compra essa que é uma espécie de nota promissória e se torna credor daquela nação. Essa estratégia gera grande acúmulo de capital na atualidade e marca o modelo pós-fordismo de produtividade. Acontece que essa transição do capital produtivo para o capital especulativo gerou impacto na realidade dos trabalhadores. Com o advento do toyotismo, a lógica das pirâmides hierárquicas deu lugar às redes e a figura do gerente foi substituída pela concepção de colaboração, transformando todos os funcionários em colaboradores. A lógica taylorista que separava fisicamente os trabalhos braçal e intelectual se dissolve em virtude da concepção toyotista que eleva o operador de máquinas à condição de colaborador, ou seja, como responsável pelo funcionamento daquela máquina, o trabalhador é quem melhor conhece a realidade da função e, portanto, a pessoa mais indicada para sugerir melhorias no sistema, nos processos, na própria máquina, e isso descaracteriza a hierarquia taylorista e as figuras de chefe, gerente, encarregado e supervisor, além de devolver ao operador a possibilidade de ter novamente o domínio de processos, um conhecimento legítimo sobre sua profissão. Esse reconhecimento do potencial do trabalhador e a sua elevação à condição de colaborador produzem um efeito subjetivo psíquico no indivíduo que agora se percebe essencial para a instituição e passa a entender que o sucesso da empresa é, naturalmente, o seu sucesso. No entanto, esse sistema pautado na lógica da rede gera um reconhecimento superficial do trabalhador, isso porque sua reconhecida importância não é contemplada com a revisão do seu ordenamento, e apesar de toda contribuição, ele continua recebendo bem menos que o patrão. Apesar de fortalecer as desigualdades sociais, no modelo fordista, as pessoas que desenvolviam o trabalho intelectual de planejamento eram financeiramente reconhecidas por sua função e nesse modelo, essas figuras são extintas e o reconhecimento financeiro pela atuação intelectual dooperador das máquinas não acontece. Existe apenas um reconhecimento social, mas não reconhecimento monetário. 4.1 JUST IN TIME O modelo pós-fordista ou toyotista trouxe também a substituição das linhas de produção pelas células. Os grandes estoques foram substituídos pela chamada produção just in time. No período anterior, Ford revolucionou o ritmo de produção com a introdução das esteiras mecânicas. O toyotismo aprimorou essa lógica e a implementação das células agora estabelece um número de máquinas maior sob o controle de apenas um trabalhador ou sob o controle de um número menor de trabalhadores. O problema dessa reengenharia é que agora as metas de produção são estipuladas para a célula de trabalho e não para o trabalhador, sendo assim, se dentro de uma equipe de três profissionais para controle de cinco máquinas, um dos trabalhadores, por qualquer motivo, como uma falta por motivo de saúde, por exemplo, não consegue acompanhar ritmo dos demais, a célula fica sob risco de não cumprimento da meta. Por conta desse risco, os operadores passam a fiscalizar o desempenho uns dos outros, tornando obsoleta a figura do gerente para fiscalização e eliminando qualquer chance de solidariedade entre esses operários, pois qualquer proteção que um trabalhador faça pelo outro pode se tornar prejudicial a ele mesmo. Na prática, agora, é o próprio trabalhador impõe pressão sobre trabalhador. Em relação à produção, no modelo toyotista ela se tornou: Globalizada; Altamente fracionada; Terceirizada; Flexibilizada (local, horário); e Orientada pela demanda (consumo). O nome desta nova lógica produtiva é just in time, e nela os grandes estoques tanto de matéria- prima quanto de mercadorias produzidas são extintos e as indústrias passam a trabalhar conforme ademanda. Mesmo bens de grandes proporções, como os automóveis, por exemplo, são produzidos conforme o ritmo de consumo Essas mudanças se deram pela observação de que grandes estoques tornam a produtividade mais lenta e mais cara e a globalização permitiu que as fábricas, que até então concentravam todas as etapas produtivas, distribuíssem suas etapas e agora cada peça é fabricada em uma unidade, às vezes em cidades diferentes e até em países e continentes distintos. Com isso, capital produtivo passou a migrar para os lugares onde a mão de obra é mais barata. Essa migração de capital para lugares com mão de obra mais em conta está relacionada à economia política. Cabe ao Estado impor uma regulamentação das relações entre capital e trabalho e o capital produtivo prioriza investir em países onde a legislação trabalhista é mais flexível e provêm menos segurança jurídica ao trabalhador, com encargos sociais menores que tornam a mão de obra mais barata. Sob novo modelo produtivo, portanto, os investidores ignoram questões como a seguridade social dos trabalhadores, bem como não possuem responsabilidade socioambientais, como a preocupação com o correto descarte dos restos de produção da fábrica. Analisar esta relação capital-trabalho a partir de uma perspectiva macrossociológica demanda uma busca por entender: O modo como os Estados Nacionais se posicionam frente a essa postura dos investidores; Como os sindicatos se posicionam em relação à mesma questão; e Que cultura essa nova subjetividade do trabalho está produzindo. Em temos de nova subjetividade, podemos aqui destacar recente conceito de home office, que trouxe a ideia de flexibilização do local e do horário de trabalho. Inclusive por conta da pandemia do Coronavírus iniciada em 2020, muitas empresas passaram a adotar o trabalho remoto, ou seja, os profissionais levaram seus computadores e celulares profissionais para casa e passaram a trabalhar de lá. Para muitos trabalhadores, esse novo modelo de trabalho em casa soou como uma espécie de liberdade, mas muitos críticos defendem que ao levar computador para casa, empregado se tornou refém do empregador, ficando a sua disposição 24 horas por dia e, portanto, não há liberdade, mas trabalhador agora se tornou refém da nova lógica produtiva.Da mesma forma, a implementação dos escritórios criativos, com soluções que pretendem melhorar ambiente e as condições de trabalho, não geraram profundas mudanças na lógica produtiva, uma vez que essas medidas não alteram a lógica da desigualdade de renda, nem o modo como a relação capital-trabalho está posta e que inclui dono da empresa com grande acúmulo de capital e os operários com baixa remuneração. Nomear esta como uma economia colaborativa é, de certa forma, mascarar a nova face desse capitalismo pós-industrial que impõe ao trabalhador a responsabilização pelo seu próprio sucesso ou insucesso, diminui as chances de este produzir uma carreira a longo prazo e amplia sua vulnerabilidade frente ao enfraquecimento das redes de proteção. Em resumo, todas as desvantagens desse modelo de capitalismo flexível ou pós-fordista são do indivíduo. NA PRÁTICA Para melhor compreensão do que é o novo modelo toyotista de lógica de produção, procure na internet que é o método Jidoka e como este foi inspirado no dispositivo inventado por Sakichi Toyoda, dono da Toyota, para resolver alguns problemas de produção da sua fábrica. Bom trabalho! FINALIZANDO Como vimos, as abordagens contemporâneas sobre as relações de trabalho incluem muitas variáveis que precisam ser compreendidas a fim de entendermos como se dá essa relação capital- trabalho ao longo da história e seus impactos sociais sobre trabalhador e também sobre os países frente a essa nova reconfiguração dos modelos de produção e lógica de consumo. Iniciando pelo modelo artesanal de produção até a lógica just in time, observamos sempre um capitalismo que se reorganiza a partir da necessidade de se adaptar à produção por conta de alguma obsolescência do potencial lucrativo, mas que em todas as suas transformações, mantém a prática de retirar dos trabalhadores a possibilidade de estabelecer trajetórias e narrativas de vida a longo prazo.REFERÊNCIAS DIAS, R. Sociologia Clássica. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2014. HOBSBAWN, E. J. A Era das revoluções: Europa 1789-1848. 21. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007. MARX, K. o 18 Brumário de Luís Bonaparte. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977. PAIXÃO, A. E. Sociologia geral. Curitiba: Instersaberes, 2012. WEBER, M. A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. 2. ed. rev. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2001.