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Unidade Universitária de Guarapuava 4º ano da Engenharia de Alimentos Economia para Engenharia de alimentos Aula Determinação da renda e do produto nacional: O mercado de Bens e Serviços Cap. 9: Vasconcellos e Garcia Prof.: Pierre Joseph NELCIDE Conteúdo Introdução Hipóteses do modelo básico O equilíbrio macroeconômico Comportamento dos agregados macroeconômicos no mercado de bens e serviços O multiplicador keynesiano de gastos Política fiscal, inflação e desemprego Questões para revisão Introdução Até 1930, os economistas acreditavam que as forças de mercado se encarregariam de equilibrar o fluxo econômico, conduzindo a economia automaticamente ao pleno emprego de recursos. No entanto, a crise econômica vivida pelo mundo capitalista a partir da quebra da Bolsa de Nova York em 1929, que redundou numa queda brutal do nível de atividade e numa elevação do desemprego e da capacidade ociosa, mostrou que o mercado sozinho não teria condições de tirar a economia da depressão. O economista inglês John Maynard Keynes desenvolveu suas teorias, cuja base se assenta no pressuposto de que é necessária a intervenção do governo para regular a atividade econômica e levar a economia ao pleno emprego, a curto prazo. O governo, principalmente com seus gastos, seria um elemento fundamental para a inversão do quadro de recessão e desemprego, uma vez que, gastando mais, estaria aumentando a despesa agregada e, consequentemente, o nível de produção, permitindo às empresas ocupar sua capacidade ociosa e elevar a procura de mão de obra. Desde então, o grande paradigma da teoria macroeconômica tem sido a questão do grau de intervenção do Estado na atividade econômica, que é provavelmente o maior divisor entre as correntes de pensamento econômico (neoliberais ou monetaristas, keynesianos ou fiscalistas, estruturalistas e marxistas, entre outros). Essa parte do estudo econômico é denominada teoria de determinação do equilíbrio da renda nacional, ou modelo keynesiano básico, que se divide em lado real (mercado de bens e serviços e mercado de trabalho) e lado monetário (mercado monetário e de títulos). Neste capítulo discutiremos o lado real; no próximo, o lado monetário. O foco desse modelo é a conjuntura econômica de curto prazo, não abordando questões estruturais, como progresso tecnológico, distribuição de renda, qualificação da mão de obra etc., tratadas com detalhes na teoria do desenvolvimento econômico, a longo prazo. Antes de prosseguir, lembrem-se a contabilidade social trabalha com valores ex post (após ocorrerem), enquanto a teoria macroeconômica lida com valores ex ante (antecipados, antes de ocorrerem). Quando se fala em consumo, poupança, investimento, na contabilidade social, são os valores realizados (ex post); para a teoria macroeconômica, são os planejados (ex ante). Hipóteses do modelo básico Economia com desemprego de recursos (subemprego) O modelo macroeconômico básico foi criado por Keynes a partir da crise dos anos 1930, período em que a taxa de desemprego alcançou valores elevados não só nos Estados Unidos, mas também em todos os países da Europa Ocidental. O modelo keynesiano supõe a existência de desemprego, ou seja, que a economia esteja em equilíbrio abaixo do pleno emprego, produzindo abaixo de seu potencial: as empresas estão com capacidade ociosa e uma parcela da força de trabalho está desempregada. Nível geral de preços constante Como a economia está em desemprego, não há razões para as empresas elevarem os preços de seus produtos, num eventual aumento da demanda. Supõe-se que as empresas, quando estimuladas por um aumento de demanda por seus produtos, procurarão elevar sua produção, e não os preços, porque estão com capacidade ociosa, e existem muitos trabalhadores disponíveis, a custos relativamente baixos. Todas as variáveis monetárias do modelo que veremos a seguir são, ao mesmo tempo, variáveis reais, pois os preços estão fixados. Curto prazo O modelo básico analisa a teoria de determinação da renda, ou seja, analisa o papel das políticas macroeconômicas na estabilização do nível de atividade e emprego e do nível de preços a curto prazo. O curto prazo: período em que pelo menos um fator de produção permanece constante. O objetivo fundamental da política econômica nesse modelo: criação de empregos para os trabalhadores desempregados, a curto prazo. Oferta agregada potencial fixada a curto prazo A oferta agregada de bens e serviços (OA) é o valor total da produção de bens e serviços finais colocados à disposição da coletividade num dado período. É o próprio produto real, ou PIB. É interessante distinguir oferta agregada potencial e oferta agregada efetiva ou real. A oferta agregada potencial refere-se à produção máxima da economia, quando os fatores de produção estão plenamente empregados. A oferta agregada efetiva refere-se à produção que está sendo efetivamente colocada no mercado, o que pode ocorrer sem que os fatores de produção estejam sendo plenamente empregados. Ex: a produção pode atender à demanda desejada pelo mercado, mesmo apresentando capacidade ociosa, desemprego de mão de obra etc. Como a teoria keynesiana supõe curto prazo e, portanto, fatores fixos de produção, a oferta agregada potencial permanece constante no curto prazo. A oferta agregada potencial só se altera se houver alterações na quantidade física de fatores de produção ou no nível de tecnologia. Contudo, a produção efetiva (oferta agregada efetiva) pode estar abaixo do pleno emprego e pode ser alterada em função de mudanças na demanda do mercado. Princípio da demanda efetiva A demanda ou procura agregada de bens e serviços (DA) é a soma dos gastos planejados dos quatro agentes macroeconômicos: despesas das famílias com bens de consumo (C), gastos das empresas com investimentos (I), gastos do governo (G) e despesas líquidas do setor externo (X – M): 𝑫𝑨 = 𝑪 + 𝑰 + 𝑮 + (𝑿 – 𝑴) Uma vez que a oferta agregada potencial não se altera no curto prazo, as flutuações da demanda agregada são as responsáveis pelas variações do produto e da renda nacional no curto prazo. Esse é o chamado princípio da demanda efetiva. Numa situação de desemprego de recursos, a política econômica deve procurar elevar a demanda agregada, o que permitiria às empresas recuperar sua produção potencial e restabelecer os níveis de renda e emprego. Embora a elevação da demanda agregada possa se dar por meio de políticas que estimulem o consumo, o investimento privado e as exportações, Keynes enfatizava o papel dos gastos do governo para que a economia saísse mais rapidamente da crise de desemprego. A demanda agregada (global) é realmente mais sensível e responde mais rapidamente aos instrumentos de política econômica. Já a resposta da oferta (produção) agregada é mais lenta, pois depende da disponibilidade de recursos, da infraestrutura, do ambiente de negócios etc. O equilíbrio macroeconômico Renda de pleno emprego diferente da renda de equilíbrio (renda efetiva) Renda de pleno emprego: todos os recursos produtivos disponíveis estão empregados. Renda de equilíbrio (renda efetiva): oferta agregada iguala a demanda agregada de bens e serviços. A produção agregada, abaixo de sua capacidade potencial, atende às necessidades da demanda. Objetivo da política econômica, no modelo keynesiano: encontrar o equilíbrio a pleno emprego, ou seja, fazer o equilíbrio entre ofertae demanda agregadas coincidir com a renda ou produto de pleno emprego. A política econômica deve se concentrar em elevar a demanda agregada, por meio de instrumentos que proporcionem aumento dos gastos em consumo, investimento, gastos do governo, elevação das exportações acima das importações etc. Análise gráfica 𝑃𝑟𝑜𝑑𝑢𝑡𝑜 𝑟𝑒𝑎𝑙 = 𝑃𝑟𝑜𝑑𝑢𝑡𝑜 𝑛𝑜𝑚𝑖𝑛𝑎𝑙 (𝑚𝑜𝑛𝑒𝑡á𝑟𝑖𝑜) 𝑁í𝑣𝑒𝑙 𝑔𝑒𝑟𝑎𝑙 𝑑𝑒 𝑝𝑟𝑒ç𝑜𝑠 Supondo o produto nominal dado, se o nível de preços se eleva, o produto real se reduz. Já o formato da curva de oferta agregada depende da hipótese sobre o nível de produto corrente da economia: ■ economia com desemprego de recursos (trecho horizontal nas Figuras 9.1 e 9.2): situação em que as empresas estão operando com capacidade ociosa. Se houver algum estímulo de demanda (DA0 para DA1), as empresas preocupar-se-ão em aumentar a produção e as vendas (RN0 para RN1), e não seus preços (que permanecem constantes em P0); ■ economia com pleno emprego de recursos (trecho vertical): situação em que as empresas operam com capacidade máxima. Qualquer aumento de demanda (DA3 para DA4) provocará apenas aumento do nível geral de preços (P3 para P4). A produção não pode ser aumentada no curto prazo, pois não há recursos ou fatores de produção disponíveis, por estarem plenamente utilizados; ■ economia com alguns setores em desemprego e outros em pleno emprego (trecho intermediário na Figura 9.2). Aumentos da demanda geram aumentos tanto no produto quanto no nível de preços. Simplificando a análise, vamos considerar apenas as duas situações extremas, economia com desemprego de recursos e com pleno emprego de recursos. O objetivo da política econômica é elevar a demanda agregada até o ponto 1, quando a economia estará em equilíbrio de pleno emprego. Ainda neste capítulo, exploraremos com maior detalhamento os instrumentos de política fiscal mais adequados para levar a economia ao equilíbrio de pleno emprego. Comportamento dos agregados macroeconômicos no mercado de bens e serviços Para a atuação eficaz das políticas macroeconômicas, torna-se necessário tentar estabelecer relações funcionais, de causa e efeito, entre os grandes agregados, isto é, que fatores afetam seu comportamento. Consumo agregado Os estudos empíricos (estatísticos) mostram que as decisões de consumo da coletividade são influenciadas fundamentalmente pela renda nacional disponível: 𝑪 = 𝒇(𝑹𝑵𝑫) 𝑪 = 𝑪𝟎 + 𝒄𝟏(𝒀𝒅) em que: C = consumo agregado; RND = renda nacional disponível (RN – Total de Impostos) Um conceito importante, criado por Keynes, é o de propensão marginal a consumir: 𝑃𝑟𝑜𝑝𝑒𝑛𝑠ã𝑜 𝑚𝑎𝑟𝑔𝑖𝑛𝑎𝑙 𝑎 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑢𝑚𝑖𝑟 = 𝑣𝑎𝑟𝑖𝑎çã𝑜 𝑛𝑜 𝑐𝑜𝑛𝑠𝑢𝑚𝑜 𝑎𝑔𝑟𝑒𝑔𝑎𝑑𝑜 𝑣𝑎𝑟𝑖𝑎çã𝑜 𝑛𝑎 𝑟𝑒𝑛𝑑𝑎 𝑛𝑎𝑐𝑖𝑜𝑛𝑎𝑙 𝑑𝑖𝑠𝑝𝑜𝑛í𝑣𝑒𝑙 = ∆𝐶 ∆𝑅𝑁𝐷 Poupança agregada Parte residual da renda nacional disponível, ou seja, a parcela da renda nacional que não é gasta em bens de consumo: 𝑺 = 𝒇(𝑹𝑵𝑫) em que: S = poupança agregada; RND= renda nacional disponível. A propensão marginal a poupar: variação da poupança e a variação da renda disponível. Investimento agregado Acréscimo ao estoque de capital que leva ao crescimento da capacidade produtiva (construções, instalações, máquinas, entre outros). Na teoria macroeconômica, ele pode ser interpretado por dois ângulos: no curto prazo e no longo prazo. No curto prazo, o investimento é visto pelo lado dos gastos necessários para a ampliação da capacidade produtiva. A produção ou oferta agregada serão afetadas somente no longo prazo, uma vez que sempre decorre certo período de tempo entre os gastos incorridos para ampliação da capacidade produtiva e o aumento efetivo da quantidade produzida (isto é, até a maturação do investimento). No curto prazo o investimento afeta apenas a demanda agregada. O investimento apresenta grande instabilidade, pois seu comportamento é de difícil previsão, por depender de fatores não apenas econômicos, mas também das expectativas quanto ao futuro, ambiente de negócios etc. O investimento agregado é determinado por dois fatores básicos: 1) a taxa de rentabilidade esperada (taxa de retorno, eficiência marginal do capital): calculada a partir da estimativa do retorno líquido esperado pela aquisição do bem de capital. Esses valores são calculados pelo valor presente dos retornos futuros (da renda esperada ao longo da vida útil do capital físico, descontam-se a taxa de inflação futura e os custos de manutenção e depreciação previstos). 2) a taxa de juros de mercado: se a empresa já dispõe de capital próprio, a taxa de juros representará quanto a empresa ganharia se, em vez de investir em suas instalações, aplicasse o dinheiro no mercado financeiro. Ex: Se a empresa precisa tomar emprestado para comprar equipamentos ou ampliar suas instalações, a taxa de juros de mercado representa para ela o custo do empréstimo. Nas duas situações, quanto maior a taxa de juros de mercado, menores os investimentos em bens de capital. Para a tomada de decisões sobre as despesas de investimento, o empresário compara as duas taxas: 1) se a taxa de retorno superar a taxa de juros de mercado, ele investirá na compra de bens de capital; 2) se a taxa de retorno for inferior à taxa de juros de mercado, ele não investirá, preferindo direcionar seus recursos em aplicações financeiras. O multiplicador keynesiano de gastos Mostra que, se uma economia estiver com recursos desempregados, um aumento na demanda agregada provocará um aumento da renda nacional mais que proporcional ao aumento da demanda. Isso ocorre porque, numa economia em desemprego, abaixo de seu produto potencial, qualquer injeção de despesas (por gastos com C, I, X, mas principalmente G) provoca um efeito multiplicador nos vários setores da economia. O multiplicador keynesiano (k): 𝑘 = ∆𝑅𝑁 ∆𝐷𝐴 = 𝑣𝑎𝑟𝑖𝑎çã𝑜 𝑑𝑎 𝑟𝑒𝑛𝑑𝑎 𝑛𝑎𝑐𝑖𝑜𝑛𝑎𝑙 𝑣𝑎𝑟𝑖𝑎çã𝑜 𝑑𝑎 𝑑𝑒𝑚𝑎𝑛𝑑𝑎 𝑎𝑔𝑟𝑒𝑔𝑎𝑑𝑎 Os mais conhecidos são o multiplicador dos gastos de investimentos (kI) e o de gastos de governo (kG): 𝑘𝐼 = ∆𝑅𝑁 ∆𝐼 = 𝑣𝑎𝑟𝑖𝑎çã𝑜 𝑑𝑎 𝑟𝑒𝑛𝑑𝑎 𝑛𝑎𝑐𝑖𝑜𝑛𝑎𝑙 𝑣𝑎𝑟𝑖𝑎çã𝑜 𝑑𝑜𝑠 𝑔𝑎𝑠𝑡𝑜𝑠 𝑑𝑒 𝑖𝑛𝑣𝑒𝑠𝑡𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜𝑠 𝑘𝐺 = ∆𝑅𝑁 ∆𝐺 = 𝑣𝑎𝑟𝑖𝑎çã𝑜 𝑑𝑎 𝑟𝑒𝑛𝑑𝑎 𝑛𝑎𝑐𝑖𝑜𝑛𝑎𝑙 𝑣𝑎𝑟𝑖𝑎çã𝑜 𝑑𝑜𝑠 𝑔𝑎𝑠𝑡𝑜𝑠 𝑑𝑜 𝑔𝑜𝑣𝑒𝑟𝑛𝑜 Ex: Se o multiplicador for igual a 5, o aumento inicial de gastos do governo de $ 100 milhões levará a um aumento da renda nacional de $ 500 milhões (5 × 100 milhões). Deve-se observar que: a) o multiplicador também tem um efeito perverso: se os gastos caírem em $ 100 milhões, a renda cairá $ 500 milhões. Os multiplicadores de tributos e de importações são negativos, já que representam vazamentos do fluxo de renda; b) supõe-se que a economia esteja operando abaixo de seu potencial (com desemprego): Em todas as etapas do processo, os setores sempre responderão ao estímulo de recursos com aumentos de produção. Se os setores estivessem operando à plena capacidade, uma injeção adicional de recursos só levaria ao aumento de preços, não do produto, podendo detonar um processo inflacionário. Política fiscal, inflação e desemprego. Como os instrumentos de política fiscal são aplicados para reduzir inflação e desemprego? Política fiscal pura: a aplicação de políticas tributárias ou de gastos públicos independente de políticas monetárias. Economia com desemprego de recursos Como tirar a economia do desemprego? A produção agregada potencial, de pleno emprego, nãose altera no curto prazo, a política econômica deve recair sobre os elementos da demanda agregada, que precisará ser elevada, para que todo o produto potencial da economia possa ser comprado. Isso pode ser feito com os seguintes instrumentos de política fiscal: a) aumento dos gastos públicos; b) diminuição da carga tributária, estimulando as despesas de consumo e de investimento; c) subsídios e estímulos às exportações, que elevam a demanda do setor externo pela produção interna; d) tarifas e barreiras às importações, que protegem a produção nacional da concorrência externa. Economia com inflação O hiato inflacionário ocorre quando a demanda agregada de bens e serviços supera a capacidade produtiva da economia. Ou seja, a procura agregada está muito aquecida, e a oferta de bens e serviços não tem condições de acompanhá-la, o que leva à elevação dos preços. Trata-se de um diagnóstico de inflação de demanda. Nesse caso, os instrumentos de política fiscal seriam: a) diminuição dos gastos públicos; b) elevação da carga tributária sobre bens de consumo, desestimulando os gastos em consumo; c) elevação das importações, pela redução das tarifas e barreiras, o que aumentaria o grau de abertura da economia para produtos estrangeiros, acirrando a competitividade, inibindo elevações de preços internos. Questões para revisão 1. Qual a diferença fundamental entre a abordagem da contabilidade social e a da teoria macroeconômica? 2. Defina oferta agregada e demanda agregada de bens e serviços. Quais hipóteses são feitas para esses conceitos no modelo keynesiano básico? 3. Do que depende a demanda de investimentos em bens de capital? 4. Explique, usando um exemplo, como opera o multiplicador keynesiano de gastos. 5. Exercício Proposto: Apêndice A