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RESUMO DOS INFORMATIVOS - SITE DIZER O DIREITO
DIREITO PENAL
Atualizado em 04/12/2020: novos julgados + questões de concurso
Pontos atualizados: nº 30 (Info 955); nº 39 (Info 955); nº 32 (Info 958); nº 37 (Info 964); nº 29 (Info 992)
1. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO
1.1. Um crime não pode ser absorvido por uma contravenção penal – (Info 743) – IMPORTANTE!!!
		O princípio da consunção é aplicável quando um delito de alcance menos abrangente praticado pelo agente for meio necessário ou fase preparatória ou executória para a prática de um delito de alcance mais abrangente.
Com base nesse conceito, em regra geral, a consunção acaba por determinar que a conduta mais grave praticada pelo agente (crime-fim) absorve a conduta menos grave (crime-meio).
O STF decidiu que o agente que faz uso de carteira falsa da OAB pratica o crime de uso de documento falso, não se podendo admitir que esse crime seja absorvido (princípio da consunção) pela contravenção penal de exercício ilegal da profissão (art. 47 do DL nº 3.688/41).
Não é possível que um crime tipificado no Código Penal seja absorvido por uma infração tipificada na Lei de Contravenções Penais.
STF. 1ª Turma. HC 121652/SC, rel. Min. Dias Toffoli, j. 22/4/2014 (Info 743).
2. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA 
2.1. Possibilidade de aplicar o regime inicial aberto ao condenado por furto, mesmo ele sendo reincidente, desde que seja insignificante o bem subtraído – (Info 793 e Info 938) – (TJCE-2018)
		A reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto.
No entanto, com base no caso concreto, o juiz pode entender que a absolvição com base nesse princípio é penal ou socialmente indesejável. Nesta hipótese, o magistrado condena o réu, mas utiliza a circunstância de o bem furtado ser insignificante para fins de fixar o regime inicial aberto. Desse modo, o juiz não absolve o réu, mas utiliza a insignificância para criar uma exceção jurisprudencial à regra do art. 33, § 2º, “c”, do CP, com base no princípio da proporcionalidade.
STF. 1ª T. HC 135164/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 23/4/19 (Info 938).
A aplicação do princípio da insignificância envolve um juízo amplo (“conglobante”), que vai além da simples aferição do resultado material da conduta, abrangendo também a reincidência ou contumácia do agente, elementos que, embora não determinantes, devem ser considerados. 
A reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto. Na hipótese de o juiz da causa considerar penal ou socialmente indesejável a aplicação do princípio da insignificância por furto, em situações em que tal enquadramento seja cogitável, eventual sanção privativa de liberdade deverá ser fixada, como regra geral, em regime inicial aberto, paralisando-se a incidência do art. 33, § 2º, c, do CP no caso concreto, com base no princípio da proporcionalidade. STF. Plenário. HC 123108/MG, HC 123533/SP e HC 123734/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 3/8/2015 (Info 793).
	(TJCE-2018-CESPE): Um homem, maior de idade e capaz, foi preso em flagrante por ter subtraído duas garrafas de uísque de um supermercado. A observação da ação delituosa por meio do sistema de vídeo do estabelecimento permitiu aos seguranças a detenção do homem no estacionamento e a recuperação do produto furtado. O valor do produto subtraído equivalia a pouco mais de um terço do valor do salário mínimo vigente à época. Na fase investigatória, constatou-se que o agente do delito possuía condenação transitada em julgado por fato semelhante e que respondia por outras três ações penais em curso. Tendo como referência essa situação hipotética, assinale a opção correta, considerando a jurisprudência dos tribunais superiores: A reincidência do acusado não é motivo suficiente para afastar a aplicação do princípio da insignificância. BL: Info 793 do STF.
	OBS:
Resumindo. Condenado reincidente pode ser absolvido do crime de furto com base no princípio da insignificância?
• Sim. A reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto.
• No entanto, com base no caso concreto, o juiz pode entender que a absolvição com base nesse princípio é penal ou socialmente indesejável. Nesta hipótese, o magistrado condena o réu, mas utiliza a circunstância de o bem furtado ser insignificante para fins de fixar o regime inicial aberto. Desse modo, o juiz não absolve o réu, mas utiliza a insignificância para criar uma exceção jurisprudencial à regra do art. 33, § 2º, “c”, do CP, com base no princípio da proporcionalidade.
Atenção: No caso em tela, o STF reafirmou que é possível ao juiz, com base nas circunstâncias do caso concreto, afastar a absolvição do réu com base no princípio da insignificância no caso de ele já ser reincidente. Por outro lado, admitiu a fixação do regime aberto na hipótese.
2.2. STF reconheceu que o valor econômico do bem furtado era muito pequeno, mas, como o réu era reincidente, em vez de absolvê-lo aplicando o princípio da insignificância, o Tribunal utilizou esse reconhecimento para conceder a pena restritiva de direitos – (Info 913) – IMPORTANTE!!!
		Em regra, o reconhecimento do princípio da insignificância gera a absolvição do réu pela atipicidade material. Em outras palavras, o agente não responde por nada. 
Em um caso concreto, contudo, o STF reconheceu o princípio da insignificância, mas, como o réu era reincidente em crime patrimonial, em vez de absolvê-lo, o Tribunal utilizou esse reconhecimento para conceder a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. 
Em razão da reincidência, o STF entendeu que não era o caso de absolver o condenado, mas, em compensação, determinou que a pena privativa de liberdade fosse substituída por restritiva de direitos.
STF. 1ª Turma. HC 137217/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 28/8/18 (Info 913).
	OBS: 
É possível aplicar o princípio da insignificância em favor de um réu reincidente ou que já responda a outros inquéritos ou ações penais? A aplicação do princípio da insignificância envolve um juízo amplo (“conglobante”), que vai além da simples aferição do resultado material da conduta, abrangendo também a reincidência ou contumácia do agente, elementos que, embora não determinantes, devem ser considerados. A reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto. Na hipótese de o juiz da causa considerar penal ou socialmente indesejável a aplicação do princípio da insignificância por furto, em situações em que tal enquadramento seja cogitável, eventual sanção privativa de liberdade deverá ser fixada, como regra geral, em regime inicial aberto, paralisando-se a incidência do art. 33, § 2º, "c", do CP no caso concreto, com base no princípio da proporcionalidade. STF. Plenário. HC 123108, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03/08/2015 (Info 793).
 
Caso concreto julgado pelo STF: Antônio foi denunciado por tentar furtar quatro frascos de xampu de um supermercado, bens avaliados em R$ 31,20. O réu foi condenado pelo art. 155 c/c art. 14, II, do CP a uma pena de 8 meses de reclusão. Foi aplicado o regime inicial semiaberto e negada a substituição por pena restritiva de direitos. A defesa impetrou habeas corpus pedindo a absolvição do condenado com base na aplicação do princípio da insignificância. O “problema” é que Antônio é reincidente (já possuía uma condenação anterior por furto).
 
Primeira pergunta: por que o juiz negou a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos? Porque o réu era reincidente em crime doloso, nos termos do art. 44, II, do CP:
Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: (...)
II – o réu não for reincidente em crime doloso;
 
Segunda pergunta:eventual, não cabe ao Supremo alterar esta tipificação, sendo uma decisão legítima do júri popular.
Vale ressaltar, no entanto, que o simples fato do condutor do veículo estar embriagado não gera a presunção de que tenha havido dolo eventual:
A embriaguez do agente condutor do automóvel, por si só, não pode servir de premissa bastante para a afirmação do dolo eventual em acidente de trânsito com resultado morte. STJ. 6ª Turma. REsp 1.689.173-SC, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, julgado em 21/11/2017 (Info 623).
 
Dessa forma, haverá assunção do risco – apta a caracterizar o dolo eventual –, "quando o agente tenha tomado como séria a possibilidade de lesar ou colocar em perigo o bem jurídico e não se importa com isso, demonstrando, pois, que o resultado lhe era indiferente”( TAVARES, Juarez apud PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 332).
 
Assim, diante da existência de elementos concretos delineados no caso concreto – embriaguez ao volante, excesso de velocidade (120 km/h) e direção perigosa (ultrapassagens em movimentos de zigue-zague) –, entende-se haver o mínimo de evidências acerca do possível dolo eventual do réu, isto porque, em tese, demonstrou ao que tudo indica, sua indiferença com a vida e com a integridade física alheia.
 
Nesse sentido: 
STJ. 6ª T. AgRg-AREsp 1.226.580-DF, Rel. Min. Rogério Schietti Cruz, j. 5/6/18.
STJ. 5ª T. AgRg no AREsp 965.57-/RS, Rel. Ministro Jorge Mussi, j. 19/5/2017.
9.2. Entrega de veículo automotor a pessoa embriagada e inexistência de homicídio doloso – (Info 812)
		Se houver incorreto enquadramento fático-jurídico na capitulação penal, que repercuta na competência do órgão jurisdicional, admite-se, excepcionalmente, a possibilidade de o magistrado, antes da pronúncia e submissão do réu ao júri popular, efetuar a desclassificação para outro tipo penal e encaminhar o feito ao órgão competente. 
No caso, o STF considerou que não havia homicídio doloso na conduta de um homem que entregou o seu carro a uma mulher embriagada para que esta dirigisse o veículo, tendo havido acidente por conta do excesso de velocidade e da embriaguez, resultando na morte da mulher (condutora). 
STF. 2ª Turma. HC 113598/PE, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 15/12/2015 (Info 812).
9.3. Dolo eventual não é compatível com qualificadora de traição, emboscada, dissimulação (art. 121, §2º, IV do CP) – (Info 677)
		O dolo eventual não se compatibiliza com a qualificadora do art. 121, § 2º, IV (traição, emboscada, dissimulação).
STF. 2ª Turma. HC 111.442/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 28/8/2012 (Info 677).
	OBS:
No caso julgado pela 2ª Turma, o réu foi denunciado pela suposta prática do crime de homicídio qualificado pela surpresa (art. 121, § 2º, IV, CP), e embriaguez ao volante (art. 306 do Código de Trânsito) porque, ao conduzir veículo em alta velocidade e em estado de embriaguez, ultrapassara sinal vermelho e colidira com outro carro, cujo condutor viera a falecer.
A 2ª Turma considerou que, em se tratando de crime de trânsito, cujo elemento subjetivo teria sido classificado como dolo eventual, não se poderia, ao menos na hipótese sob análise, concluir que tivesse o paciente deliberadamente agido de surpresa, de maneira a dificultar ou impossibilitar a defesa da vítima.
Assim, a 2ª Turma aplicou o entendimento prevalecente no sentido de que o dolo eventual é incompatível com a qualificadora prevista no inciso IV do § 2º do art. 121 do CP (traição, emboscada, dissimulação).
 
Por que o dolo eventual é incompatível com a qualificadora da surpresa? Para que incida a qualificadora da surpresa é indispensável que fique provado que o agente teve a vontade de surpreender a vítima, impedindo ou dificultando que ela se defendesse. Ora, no caso do dolo eventual, o agente não tem essa intenção, considerando que não quer matar a vítima, mas apenas assume o risco de produzir esse resultado. Como o agente não deseja a produção do resultado, ele não direcionou sua vontade para causar surpresa à vítima. Logo, não pode responder por essa circunstância (surpresa).
10. CRIME DE ABORTO 
10.1. Interrupção da gravidez no primeiro trimestre da gestação – (Info 849) – IMPORTANTE!!! – (Advogado/BANPARÁ-2017) (Analista em Previdência/RO-2017) (TJMS-2020)
		A interrupção da gravidez no primeiro trimestre da gestação provocada pela própria gestante (art. 124) ou com o seu consentimento (art. 126) não é crime. 
É preciso conferir interpretação conforme a Constituição aos arts. 124 a 126 do Código Penal – que tipificam o crime de aborto – para excluir do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre.
A criminalização, nessa hipótese, viola diversos direitos fundamentais da mulher, bem como o princípio da proporcionalidade. 
STF. 1ª T. HC 124306/RJ, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, j. 29/11/16 (Info 849).
	(Advogado/BANPARÁ-2017): Acerca do aborto, o STF, em recente julgado de sua 1ª Turma, afirmou ser necessário conferir interpretação conforme a Constituição aos arts. 124 a 126 do Código Penal (que tipificam o crime de aborto) para excluir do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre do período gestacional. BL: Info 849, STF.
(Analista em Previdência/RO-2017-IBADE): Acerca da decisão do STF sobre a interrupção da gravidez de feto anencefálico, assinale a alternativa correta: Tencionava-se fosse dada a dispositivos do Código Penal uma interpretação conforme a Constituição e o instrumento escolhido para sua propositura foi a arguição de descumprimento de preceito fundamental.
OBS: ADPF 54: A Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde do Brasil ingressou com uma ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental no Supremo Tribunal Federal (ADPF n.º 54) pedindo que a Corte Constitucional conferisse ao Código Penal uma interpretação conforme a Constituição e declarasse que o aborto de fetos anencéfalos não é crime. (...)
A cirurgia de retirada de um feto anencéfalo é considerada aborto? NÃO. Sete Ministros que participaram do julgamento consideraram que não se trata de aborto porque não há a possibilidade de vida do feto fora do útero. O Min. Gilmar Mendes votou pela descriminalização da prática, mas considerou que tal prática configura sim aborto. Segundo o Min. Mendes, o aborto de feto anencéfalo pode ser enquadrado no inciso II do art. 128 do CP, que afirma que não se pune o aborto praticado por médico se não há outro meio de salvar a vida da gestante.
	OBS:
Exceções em que o aborto não é crime: O Código Penal, em seu art. 128, traz duas hipóteses em que o aborto é permitido:
· 1ª) se não há outro meio de salvar a vida da gestante. É o chamado aborto “necessário” ou “terapêutico”, previsto no inciso I.
· 2ª) no caso de gravidez resultante de estupro. Trata-se do aborto “humanitário”, “sentimental”, “ético” ou “piedoso”, elencado no inciso II. Segundo o texto expresso do CP, essas são as duas únicas hipóteses em que o aborto é permitido no Brasil.
· 3ª) Interrupção da gravidez de feto anencéfalo: O STF, no julgamento da ADPF 54/DF, criou uma nova exceção e decidiu que a interrupção da gravidez de feto anencéfalo é conduta atípica (Plenário. ADPF 54/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 11 e 12/4/12). Assim, por força de interpretação jurisprudencial, realizar aborto de feto anencéfalo também não é crime.
· 4ª) Interrupção da gravidez no primeiro trimestre da gestação: A 1ª Turma do STF, no julgamento do HC 124306, mencionou a possibilidade de se admitir uma quarta exceção: a interrupção da gravidez no primeiro trimestre da gestação provocado pela própria gestante (art. 124) ou com o seu consentimento (art. 126) também não seria crime (HC 124306/RJ, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 29/11/2016. Info 849).
Vamos entender o julgado veiculado no Info 849.
INTERRUPÇÃO DA GRAVIDEZ NO PRIMEIRO TRIMESTRE DA GESTAÇÃO
Requisitos para que a tipificação de umaconduta seja compatível com a Constituição: Segundo o Min. Roberto Barroso, para ser compatível com a Constituição, a criminalização de uma conduta exige o preenchimento de três requisitos:
a) este tipo penal deverá proteger um bem jurídico relevante;
b) o comportamento incriminado não pode constituir exercício legítimo de um direito fundamental; e
c) deverá haver proporcionalidade entre a ação praticada e a reação estatal.
Em outras palavras, se determinada conduta for prevista como crime, mas não atender a algum desses três requisitos, este tipo penal deverá ser considerado inconstitucional.
Verifique abaixo os argumentos invocados pelo Min. Relator Roberto Barroso:
VIOLAÇÃO A DIREITOS FUNDAMENTAIS DAS MULHERES
Violação à autonomia da mulher: A criminalização viola, em primeiro lugar, a autonomia da mulher, que corresponde ao núcleo essencial da liberdade individual, protegida pelo princípio da dignidade humana (art. 1º, III, da CF/88). Autonomia significa a autodeterminação das pessoas (o direito de elas fazerem suas escolhas existenciais básicas e de tomarem as próprias decisões morais sobre o rumo de sua vida). Quando se trata de uma mulher, um aspecto central de sua autonomia é o poder de controlar o próprio corpo e de tomar as decisões a ele relacionadas, inclusive a de cessar ou não uma gravidez.
Violação do direito à integridade física e psíquica: Em segundo lugar, a criminalização do aborto afeta a integridade física e psíquica da mulher. A integridade física é abalada porque é o corpo da mulher que sofrerá as transformações, riscos e consequências da gestação. Aquilo que pode ser uma bênção quando se cuide de uma gravidez desejada, transmuda-se em tormento quando indesejada. A integridade psíquica, por sua vez, é afetada pelo fato de ela estar sendo obrigada a assumir uma obrigação para toda a vida, exigindo renúncia, dedicação e comprometimento profundo com outro ser. Também aqui, o que seria uma bênção se decorresse de vontade própria, pode se transformar em provação quando decorra de uma imposição heterônoma. Ter um filho por determinação do direito penal constitui grave violação à integridade física e psíquica da mulher.
Violação aos direitos sexuais e reprodutivos da mulher: A criminalização viola, também, os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, que incluem o direito de toda mulher de decidir sobre se e quando deseja ter filhos, sem discriminação, coerção e violência, bem como de obter o maior grau possível de saúde sexual e reprodutiva. O reconhecimento dos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres como direitos humanos percorreu uma longa trajetória, que teve como momentos decisivos a Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (CIPD), realizada em 1994, conhecida como Conferência do Cairo, e a IV Conferência Mundial sobre a Mulher, realizada em 1995, em Pequim. A partir desses marcos, vem se desenvolvendo a ideia de liberdade sexual feminina em sentido positivo e emancipatório. A criminalização do aborto afeta a capacidade de autodeterminação reprodutiva da mulher, ao retirar dela a possibilidade de decidir, sem coerção, sobre a maternidade, sendo obrigada pelo Estado a manter uma gestação indesejada.
Violação à igualdade de gênero: A punição do aborto traduz-se, ainda, em quebra da igualdade de gênero. Na medida em que é a mulher que suporta o ônus integral da gravidez, e que o homem não engravida, somente haverá igualdade plena se a ela for reconhecido o direito de decidir acerca da sua manutenção ou não. "Se os homens engravidassem, não tenho dúvida em dizer que seguramente o aborto seria descriminalizado de ponta a ponta" (Min. Ayres Britto, na ADPF 54-MC, j. 20.10.2004).
Discriminação social e impacto desproporcional sobre mulheres pobres: A tipificação penal do aborto produz também discriminação social, já que prejudica, de forma desproporcional, as mulheres pobres, que não têm acesso a médicos e clínicas particulares, nem podem se valer do sistema público de saúde para realizar o procedimento abortivo. Por meio da criminalização, o Estado retira da mulher a possibilidade de submissão a um procedimento médico seguro. Não raro, mulheres pobres precisam recorrer a clínicas clandestinas sem qualquer infraestrutura médica ou a procedimentos precários e primitivos, que lhes oferecem elevados riscos de lesões, mutilações e óbito.
Em suma: A criminalização da interrupção da gestação no primeiro trimestre vulnera o núcleo essencial de um conjunto de direitos fundamentais da mulher. Trata-se, portanto, de restrição que ultrapassa os limites constitucionalmente aceitáveis.
VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Funções do princípio da proporcionalidade nos crimes e penas: O legislador, ao definir crimes e penas, deverá fazê-lo levando em consideração dois valores essenciais:
· o respeito aos direitos fundamentais dos acusados;
· a necessidade de garantir a proteção da sociedade, cabendo-lhe resguardar valores, bens e direitos fundamentais dos indivíduos.
Assim, o princípio da razoabilidade-proporcionalidade funciona com uma dupla dimensão, tendo por objetivo proibir os excessos e também a insuficiência.
Divisão do princípio da proporcionalidade: O princípio da proporcionalidade divide-se em três subprincípios:
a) subprincípio da ADEQUAÇÃO: no qual deve ser analisado se a medida adotada é idônea (capaz) para atingir o objetivo almejado;
b) subprincípio da NECESSIDADE: consiste na análise se a medida empregada é ou não excessiva; e
c) subprincípio da PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO: representa a análise do custo-benefício da providência pretendida, para se determinar se o que se ganha é mais valioso do que aquilo que se perde.
Subprincípio da adequação: Aqui, deve-se analisar se os tipos penais previstos nos arts. 124 e 126 do CP protegem realmente o feto. A medida adotada (punir o aborto consensual) é idônea para proteger o feto? O STF entendeu que não. De acordo com estudos da OMS a criminalização não produz impacto relevante sobre o número de abortos. As taxas de aborto nos países onde esse procedimento é permitido são muito semelhantes àquelas encontradas nos países em que ele é ilegal. Atualmente, existem medicamentos que são facilmente encontrados e que a mulher, ao usá-los, consegue interromper a gravidez sem que o Poder Público tenha meios para tomar conhecimento e impedir a sua realização. Assim, a criminalização não gera uma diminuição na quantidade de abortos. Eles continuam sendo realizados constantemente, de forma clandestina e perigosa para a saúde da mulher. Por outro lado, se não houvesse a punição haveria a possibilidade de estes procedimentos serem realizados de forma segura e sem tantos riscos. Na prática, portanto, a criminalização do aborto é ineficaz para proteger o direito à vida do feto. Do ponto de vista penal, ela constitui apenas uma reprovação “simbólica” da conduta.
Subprincípio da necessidade: Aqui, a pergunta a ser analisada e respondida é a seguinte: existe meio alternativo à criminalização que proteja igualmente o direito à vida do nascituro, mas que produza menor restrição aos direitos das mulheres? O Min. Barroso defendeu que sim. Há instrumentos que são eficazes à proteção dos direitos do feto e, simultaneamente, menos lesivos aos direitos da mulher. Uma política alternativa à criminalização implementada com sucesso em diversos países desenvolvidos do mundo é a descriminalização do aborto em seu estágio inicial (em regra, no primeiro trimestre), desde que se cumpram alguns requisitos procedimentais que permitam que a gestante tome uma decisão refletida. É assim na Alemanha, em que a grávida que pretenda abortar deve se submeter a uma consulta de aconselhamento e a um período de reflexão prévia de três dias. Procedimentos semelhantes também são previstos em Portugal, na França e na Bélgica. Além disso, o Estado deve atuar sobre os fatores econômicos e sociais que dão causa à gravidez indesejada ou que pressionam as mulheres a abortar. As duas razões mais comumente invocadas para o aborto são a impossibilidadede custear a criação dos filhos e a drástica mudança na vida da mãe (que a faria, p. ex., perder oportunidades de carreira). Nessas situações, é importante a existência de uma rede de apoio à grávida e à sua família, como o acesso à creche e o direito à assistência social. Além disso, muitas gestações não programadas são causadas pela falta de informação e de acesso a métodos contraceptivos. Isso pode ser revertido, por exemplo, com programas de planejamento familiar, com a distribuição gratuita de anticoncepcionais e assistência especializada à gestante e educação sexual. Logo, a criminalização do aborto também não é aprovada no teste relacionado com o subprincípio da necessidade.
Subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito: As restrições aos direitos fundamentais das mulheres decorrentes da criminalização são ou não compensadas pela proteção à vida do feto? O fato de as mulheres serem privadas do direito de abortar gera uma maior proteção ao feto? O STF entendeu que não. Conforme demonstrado, a tipificação penal do aborto produz um grau elevado de restrição a direitos fundamentais das mulheres. Por outro lado, a criminalização do aborto promove um grau reduzido (se algum) de proteção dos direitos do feto, uma vez que não tem sido capaz de reduzir o índice de abortos. Dessa forma, não há proporcionalidade em sentido estrito em se manter a punição do aborto consentido nos três primeiros meses da gravidez. Praticamente nenhum país democrático e desenvolvido do mundo trata a interrupção da gestação durante a fase inicial da gestação como crime, aí incluídos Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido, Canadá, França, Itália, Espanha, Portugal, Holanda e Austrália.
Primeiro trimestre da gravidez: Ressalta-se que, pela decisão do STF, só não será punido o aborto consentido (realizado pela mulher ou por terceiro com sua concordância) e desde que feito nos três primeiros meses da gravidez. Se for realizado após o primeiro trimestre, continua sendo crime.
Por que este critério de três meses? Existe uma intensa e polêmica discussão sobre quando se inicia a vida e qual é o status jurídico do embrião durante a fase inicial da gestação. Dentre outras, há duas posições principais e antagônicas em relação a isso:
1ª) de um lado, os que sustentam que existe vida desde a concepção, desde que o espermatozoide fecundou o óvulo, dando origem à multiplicação das células.
2ª) de outro lado, estão os que sustentam que antes da formação do sistema nervoso central e da presença de rudimentos de consciência (o que geralmente se dá após o terceiro mês da gestação) não é possível ainda falar-se em vida em sentido pleno.
ESCLARECIMENTOS SOBRE OS EFEITOS DA DECISÃO COMENTADA: Tão logo esta decisão foi proferida, surgiram várias notícias na imprensa no sentido de que o STF teria descriminalizado o aborto realizado nos três primeiros meses de gravidez. Esta afirmação não é tecnicamente correta. No caso concreto, o STF analisava um habeas corpus impetrado por dois médicos que foram presos em flagrante no momento em que supostamente estariam realizando um aborto com o consentimento da gestante (art. 126 do CP). No HC impetrado, os pacientes buscavam a liberdade provisória. O Min. Barroso, ao analisar o writ, entendeu que não estavam presentes os pressupostos da prisão preventiva. Um desses pressupostos é a existência de crime, o que é exigido na parte final do art. 312 do CPP:
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
Segundo o Ministro, não havia motivo para a prisão preventiva, considerando o fato de que a gravidez da mulher estava ainda no primeiro trimestre, razão pela qual a punição prevista nos arts. 124 e 126 do CP não seria compatível com a CF/88, ou seja, não teria sido recepcionada pela atual Carta Magna. Por conta disso, o Ministro concedeu a ordem de habeas corpus para afastar a prisão preventiva dos pacientes, concedendo-lhes liberdade provisória.
É importante, no entanto, pontuar três observações:
1) Esta decisão foi tomada pela 1ª Turma do STF (não se sabe como o Plenário decidiria);
2) A discussão sobre a criminalização ou não do aborto nos três primeiros meses da gestação foi apenas para se analisar se seria cabível ou não a manutenção da prisão preventiva;
3) O mérito da imputação feita contra os réus ainda não foi julgado e o STF não determinou o "trancamento" da ação penal. O habeas corpus foi concedido apenas para que fosse afastada a prisão preventiva dos acusados.
Atenção: Obviamente, esta decisão representa um indicativo muito claro do que o STF poderá decidir caso seja provocado de forma específica sobre o tema, tendo o Min. Roberto Barroso proferido um substancioso voto que foi acompanhado pelos Ministros Edson Fachin e Rosa Weber. Os demais Ministros da 1ª Turma (Marco Aurélio e Luiz Fux) não se comprometeram expressamente com a tese da descriminalização e discutiram apenas a legalidade da prisão preventiva. Dessa forma, existem três votos a favor da tese, não se podendo afirmar que o tema esteja resolvido no STF. Ao contrário, ainda haverá muita discussão a respeito.
10.2. Interrupção de gravidez de feto anencéfalo é conduta atípica – (TJRJ-2016)
		É inconstitucional a interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo seria conduta tipificada nos arts. 124, 126 e 128, I e II, do CP.
A interrupção da gravidez de feto anencéfalo é atípica.
STF. Plenário. ADPF 54/DF, rel. Min. Marco Aurélio, j. 11 e 12/4/2012.
	(TJRJ-2016-VUNESP): A anencefalia, de acordo com entendimento jurisprudencial do STF, no julgamento da ADPF, ajuizada pela Confederação dos Trabalhadores na Saúde – CNTS, sob relatoria do Ministro Marco Aurélio de Mello: permite a antecipação terapêutica do parto, com proteção à vida da mãe, a exemplo do aborto sentimental, que tem por finalidade preservar a higidez física e psíquica da mulher, conclusão que configura interpretação do Código Penal de acordo com a Constituição Federal, orientada pelos preceitos que garantem o Estado laico, a dignidade da pessoa humana, o direito à vida e a proteção à autonomia, da liberdade, da privacidade e da saúde. BL: Entendimento do STF.
11. CRIMES CONTRA A HONRA 
11.1. INJÚRIA: Esposa tem legitimidade para propor queixa-crime contra autor de postagem que sugere relação extraconjugal do marido – (Info 919)
		A esposa tem legitimidade para propor queixa-crime contra autor de mensagem que insinua que o seu marido tem uma relação extraconjugal com outro homem.
Se alguém alega que um indivíduo casado mantém relação homossexual extraconjugal com outro homem, a esposa deste indivíduo tem legitimidade para ajuizar queixa-crime por injúria, alegando que também é ofendida.
Caso concreto: Roberto insinuou que Weverton teria um relacionamento homossexual extraconjugal com outro homem. A mulher de Weverton tem legitimidade para ajuizar queixa-crime contra Roberto pela prática do crime de injúria.
STF. 1ª T. Pet 7417 AgR/DF, Rel. Min. Luiz Fux, red. p/ o ac. Min. Marco Aurélio, j. 9/10/18 (Info 919).
11.2. DIFAMAÇÃO: Difamação pode ser praticada mediante a publicação de vídeo no qual o discurso da vítima seja editado – (Info 876)
		Configura, em tese, difamação a conduta do agente que publica vídeo de um discurso no qual a frase completa do orador é editada, transmitindo a falsa ideia de que ele estava falando mal de negros e pobres.
A edição de um vídeo ou áudio tem como objetivo guiar o espectador e, quando feita com o objetivo de difamar a honra de uma pessoa, configura dolo da prática criminosa.
Vale ressaltar que esta conduta do agente, ainda que praticada por Deputado Federal, não estará protegida pela imunidade parlamentar.
STF. 1ª Turma. Pet 5705/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 5/9/2017 (Info 876).
	OBS:
A situação concreta foi a seguinte: Durante a reunião de uma CPI instaurada paraapurar a violência contra jovens negros e pobres no Brasil, o Deputado Federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) proferiu a seguinte frase: “tem um imaginário impregnado, sobretudo nos agentes das forças de segurança, de que uma pessoa negra e pobre é potencialmente perigosa. É mais perigosa do que uma pessoa branca de classe média. Esse é um imaginário que está impregnado na gente”. O Deputado Eder Mauro (PSD-PA) publicou, em sua página no Facebook, um vídeo no qual o discurso do Deputado Jean Wyllys é editado. No vídeo publicado, a parte inicial e final da frase são cortadas e ouve-se apenas: “Uma pessoa negra e pobre é potencialmente perigosa. É mais perigosa do que uma pessoa branca de classe média”. Assim, o vídeo editado dá a entender, falsamente, que o Deputado estaria defendendo essa afirmação pejorativa contra pessoas negras e pobres. Diante disso, o Deputado Federal Jean Wyllys ingressou com queixa-crime contra o Deputado Eder Mauro afirmando que o querelado praticou contra ele o crime de difamação (art. 139 do CP):
Art. 139. Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:
Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.
O STF analisou se deveria receber ou não a queixa-crime. O que decidiu o Supremo? A 1ª Turma do STF recebeu a queixa-crime contra o Deputado Eder Mauro. O Min. Luiz Fux afirmou que a edição do discurso de Wyllys foi feita com “a clara intenção de difamar”. Ele observou que a edição de um vídeo ou áudio tem como objetivo guiar o espectador e, quando feita com o objetivo de difamar a honra de uma pessoa, configura dolo da prática criminosa. Segundo o Ministro, a edição buscou imputar ao parlamentar do PSOL o crime de racismo, o que poderia dar motivação, inclusive, a uma denúncia pelo crime de calúnia. No entendimento do relator, ficou constatada a vontade de difamar (animus difamandi), o que leva, nesta fase, ao recebimento da queixa. Os ministros entenderam, ainda, que a divulgação do vídeo editado não estaria abrangido pela imunidade parlamentar.
STF. 1ª Turma. Pet 5705/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 5/9/2017 (Info 876).
11.3. INJÚRIA: Não deve ser punido Deputado Federal que profere palavras injuriosas contra adversário político que também o ofendeu imediatamente antes – (Info 838)
		Determinado Governador afirmou, em rede social, que certo Deputado Federal estava financiando, com a utilização de “dinheiro sujo”, a produção de injúrias contra ele e que o parlamentar estava sendo processado pelos crimes de tortura, corrupção e estupro. 
No dia seguinte, o Deputado, em resposta, afirmou, também em uma rede social, que o Governador era acusado de corrupção eleitoral, que tinha como costume fazer acusações falsas para tentar incriminar seus desafetos políticos, que costumava espancar seu pai e que era desequilibrado mental. 
O STF entendeu que o Deputado Federal praticou fato típico, antijurídico e culpável, mas que não deveria ser punido, com base no art. 140, § 1º, II, do CP. 
O Deputado postou as mensagens ofensivas menos de 24 horas depois de o Governador publicar a manifestação também injuriosa. Dessa forma, as mensagens do parlamentar foram imediatamente posteriores às veiculadas pelo ofendido e elaboradas em resposta a elas. Ao publicá-las, o acusado citou parte do conteúdo da mensagem postada pelo ofendido, comprovando o nexo de pertinência entre as condutas. Dessa maneira, o ofendido não só, de forma reprovável, provocou a injúria, como também, em tese, praticou o mesmo delito, o que gerou a retorsão imediata do acusado. Logo, o STF entendeu que não havia razão moral para o Estado punir o Deputado. 
STF. 1ª Turma. AP 926/AC, Rel. Min. Rosa Weber, j. 6/9/2016 (Info 838).
	OBS:
O motivo para isso foi a imunidade parlamentar? Ao proferir estas palavras o Deputado estava sob o abrigo da imunidade material? NÃO. O STF entendeu que não deveria se falar em imunidade parlamentar no presente caso. Isso por conta de dois motivos:
1) As declarações foram proferidas fora do recinto parlamentar e em ambiente virtual.
2) Não havia relação entre as declarações e o exercício do mandato. As postagens atacaram a dignidade e o decoro do Governador, sem qualquer relação com o exercício do mandato. Mesmo sendo adversários políticos, o que se contata é que nas declarações proferidas pelo Deputado não há um propósito de crítica ou de debate. O seu intuito é apenas o de atribuir condutas negativas ao Governador.
Obs: se o STF tivesse reconhecido que o Deputado Federal estava acobertado pela imunidade parlamentar, a conduta por ele praticada seria considerada atípica (STF Inq 3677).
Qual foi o motivo, então, para o Deputado não ser condenado? Perdão judicial.
Perdão judicial na injúria: O perdão judicial é um instituto do direito penal, segundo o qual mesmo constatando que o fato praticado é típico, antijurídico e culpável, o juiz, com base em hipóteses previstas na lei, deixa de punir o agente por entender que, naquele caso concreto, a punição seria desnecessária ou ilegítima. O perdão judicial consiste em uma causa de extinção da punibilidade (art. 107, IX, do CP). A sentença que concede o perdão judicial não é considerada condenatória nem absolutória, mas sim declaratória da extinção da punibilidade. Nesse sentido:
Súmula 18-STJ: A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.
No § 1º do art. 140 são previstas duas hipóteses de perdão judicial para o crime de injúria, ou seja, duas situações em que se reconhece que o agente praticou injúria, mas mesmo assim ele não será punido. Veja:
Art. 140 (...)
§ 1º - O juiz pode deixar de aplicar a pena:
I - quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;
II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.
Retorsão imediata (inciso II): O STF deixou de aplicar a pena ao Deputado com base no inciso II do § 1º do art. 140 (retorsão imediata). Conforme explica Cleber Masson:
"A retorsão é a injúria proferida pelo ofendido contra quem antes o injuriou. É o revide: tão logo ofendida, a vítima também ataca a honra de seu agressor. Deve ser imediata, ou seja, efetuada tão logo o injuriado tiver conhecimento da ofensa. Assim, tratando-se de injúrias verbais, a retorsão deve se verificar na mesma ocasião em que o ofendido suportar a ofensa.
Admite-se também o perdão judicial no tocante a injúrias escritas. Nessa hipótese, a relação de imediatidade impõe o revide quando o injuriado conhecer a sua existência, pois somente a partir de então surge a possibilidade de retorsão imediata." (Direito Penal esquematizado. São Paulo: Método, 2014, p. 199).
11.4. Deputado que, em entrevista à imprensa, afirma que determinada Deputada "não merece ser estuprada" pratica, em tese, injúria (art. 140 do CP) – (Info 831)
		O Deputado Federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) afirmou que a também Deputada Federal Maria do Rosário (PT-RS), “não merece ser estuprada por ser muito ruim, muito feia, não faz meu gênero”. E acrescentou que, se fosse estuprador, "não iria estuprá-la porque ela não merece". 
O STF entendeu que a conduta do parlamentar configura, em tese, para fins de recebimento de denúncia, o crime de injúria: "Art. 140. Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa." 
As declarações do Deputado atingiram a honra subjetiva da Deputada porque rebaixaram sua dignidade moral, expondo sua imagem à humilhação pública, além de associar as características da mulher à possibilidade de ser vítima de estupro. 
STF. 1ª Turma. Inq 3932/DF e Pet 5243/DF, Rel. Min. Luiz Fux, j. 21/6/16 (Info 831).
12. CRIME DE FURTO 
12.1. Sistema de vigilância em estabelecimento comercial não constitui óbice para a consumação do furto – (Info 897)
		A existência de sistema de vigilância em estabelecimento comercial não constitui óbice para a tipificação do crime de furto.
STF. 1ª Turma. HC 111278/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Luiz Roberto Barroso, j. 10/4/18 (Info 897).
Súmula567-STJ: Sistema de vigilância realizado por monitoramento eletrônico ou por existência de segurança no interior de estabelecimento comercial, por si só, não torna impossível a configuração do crime de furto.
12.2. Causa de aumento do § 1º pode ser aplicada tanto para furto simples como qualificado – (Info 851) – IMPORTANTE!!!
		É legítima a incidência da causa de aumento de pena por crime cometido durante o repouso noturno (art. 155, § 1º) no caso de furto praticado na forma qualificada (art. 155, § 4º). 
Não existe nenhuma incompatibilidade entre a majorante prevista no § 1º e as qualificadoras do § 4º. São circunstâncias diversas, que incidem em momentos diferentes da aplicação da pena. 
Assim, é possível que o agente seja condenado por furto qualificado (§ 4º) e, na terceira fase da dosimetria, o juiz aumente a pena em 1/3 se a subtração ocorreu durante o repouso noturno. 
A posição topográfica do § 1º (vem antes do § 4º) não é fator que impede a sua aplicação para as situações de furto qualificado (§ 4º). 
STF. 2ª Turma. HC 130952/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 13/12/16 (Info 851). 
STJ. 6ª Turma. HC 306.450-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 4/12/14 (Info 554).
	OBS:
Exemplo: Se João e Pedro, durante a madrugada, invadem a residência da vítima enquanto esta dormia, e de lá subtraem a televisão, eles irão ter praticado furto qualificado:
§ 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:
IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.
Além disso, na 3ª fase da dosimetria da pena, ao analisar as causas de aumento, o juiz irá aumentar a pena em 1/3 pelo fato de o crime ter sido cometido durante o repouso noturno, conforme prevê o § 1º.
13. CRIME DE ROUBO
13.1. Inexistência de continuidade delitiva entre roubo e extorsão – (Info 899) – IMPORTANTE!!! – (TJCE-2012) (PCMT-2017)
		Não há continuidade delitiva entre os crimes de roubo e extorsão, ainda que praticados em conjunto. Isso porque, os referidos crimes, apesar de serem da mesma natureza, são de espécies diversas.
STJ. 5ª T. HC 435.792/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 24/05/2018.
STF. 1ª T. HC 114667/SP, rel. org. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, j. 24/4/18 (Info 899).
Não há como reconhecer a continuidade delitiva entre os crimes de roubo e o de latrocínio porquanto são delitos de espécies diversas, já que tutelam bens jurídicos diferentes. (PROVA PCMT-2017)
STJ. 5ª Turma. AgInt no AREsp 908.786/PB, Rel. Min. Felix Fischer, j. 06/12/2016.
	OBS:
CONCEITO DE CRIME CONTINUADO: Ocorre crime continuado quando o agente:
-          por meio de duas ou mais condutas
-          pratica dois ou mais crimes da mesma espécie
-          e, analisando as condições de tempo, local, modo de execução e outras,
-          pode-se constatar que os demais crimes devem ser entendidos como mera continuação do primeiro.
 
O crime continuado é uma ficção jurídica, inspirada em motivos de política criminal, idealizada com o objetivo de ajudar o réu. Ao invés de ele ser condenado pelos vários crimes, receberá a pena de somente um deles, com a incidência de um aumento previsto na lei.
 
EXEMPLO: Carlos era caixa de uma lanchonete e estava devendo R$ 500,00 a um agiota. Ele decide, então, tirar o dinheiro do caixa para pagar sua dívida. Ocorre que, se ele retirasse toda a quantia de uma só vez, o seu chefe iria perceber. Carlos resolve, portanto, subtrair R$ 50,00 por dia. Assim, após dez dias ele consegue retirar os R$ 500,00. Desse modo, Carlos, por meio de dez condutas, praticou dez furtos. Analisando as condições de tempo, local, modo de execução, pode-se constatar que os outros nove furtos devem ser entendidos como mera continuação do primeiro, considerando que sua intenção era furtar o valor total de R$ 500,00. Ao invés de Carlos ser condenado por dez furtos, receberá somente a pena de um furto, com a incidência de um aumento de 1/6 a 2/3. 
 
PREVISÃO LEGAL: 
Art. 71. Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.
 
NATUREZA JURÍDICA: Existem três teorias que foram desenvolvidas para tentar explicar a natureza jurídica da continuidade delitiva.
a)   Teoria da unidade real: afirma que todas as condutas praticadas que, por si sós, já se constituiriam em infrações penais, são um único crime. Segundo essa teoria, para todos os efeitos, Carlos praticou apenas um único furto.
b)   Teoria da ficção jurídica: sustenta que cada uma das condutas praticadas constitui-se em uma infração penal diferente. No entanto, por ficção jurídica, esses diversos crimes são considerados, pela lei, como crime único. Segundo essa teoria, Carlos praticou dez furtos, entretanto, considera-se, ficticiamente, para fins de pena, que ele cometeu apenas um.
c)   Teoria mista: defende que, se houver crime continuado, surge um terceiro crime, resultado do próprio concurso. Segundo essa teoria, Carlos praticou uma nova categoria de crime, chamada de furto por continuidade delitiva.
 
O Brasil adotou a teoria da ficção jurídica. 
 
REQUISITOS: Para o reconhecimento do crime continuado, são necessários quatro requisitos:
1)   Pluralidade de condutas (prática de duas ou mais condutas subsequentes e autônomas);
2)   Pluralidade de crimes da mesma espécie (prática de dois ou mais crimes iguais);
3)   Condições semelhantes de tempo, lugar, maneira de execução, entre outras;
4)   Unidade de desígnio.
 
1) Pluralidade de condutas
O agente deve praticar duas ou mais condutas, ou seja, mais de uma ação ou omissão.
 
2) Pluralidade de crimes da mesma espécie
O agente deve praticar dois ou mais crimes da mesma espécie. Segundo o STJ e o STF, quando o CP fala em crimes da mesma espécie, ele exige que sejam crimes previstos no mesmo tipo penal, protegendo igual bem jurídico. Desse modo, para que seja reconhecida a continuidade delitiva, é necessário que o agente pratique dois ou mais crimes idênticos (ex.: quatro furtos simples consumados e um tentado). Se a pessoa comete um furto e depois um roubo, não há continuidade delitiva. Se a pessoa pratica um roubo simples e, em seguida, um latrocínio, igualmente, não haverá crime continuado. Para que haja continuidade, repita-se, é indispensável que os crimes sejam previstos no mesmo dispositivo legal e protejam o mesmo bem jurídico. Nesse sentido:
Não há continuidade delitiva entre os crimes de roubo e extorsão, ainda que praticados em conjunto. Isso porque, os referidos crimes, apesar de serem da mesma natureza, são de espécies diversas. 
STJ. 5ª Turma. HC 435.792/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 24/05/2018.
STF. 1ª Turma. HC 114667/SP, rel. org. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 24/4/2018 (Info 899).
 
Importante: Também não se reconhece continuidade delitiva entre roubo e latrocínio:
Não há como reconhecer a continuidade delitiva entre os crimes de roubo e o de latrocínio porquanto são delitos de espécies diversas, já que tutelam bens jurídicos diferentes.
STJ. 5ª Turma. AgInt no AREsp 908.786/PB, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 06/12/2016.
 
3) Condições semelhantes de tempo, lugar, maneira de execução, entre outras
A doutrina afirma que deve haver uma conexão de tempo, de lugar e de execução entre os crimes para que se caracterize o crime continuado.
 
3.1 Conexão de tempo (conexão temporal): 
Significa dizer que, para que haja continuidade delitiva, não pode ter se passado um longo período de tempo entre um crime e outro. Para os crimes patrimoniais, a jurisprudência afirma que entre o primeiro e o último delito não pode ter se passado mais que 30 dias. Se houve período superior a 30 dias, não se aplica mais o crime continuado, havendo, neste caso, concurso material. Vale ressaltar que,em alguns outros delitos, como nos crimes contra a ordem tributária, a jurisprudência admite que esse prazo seja maior.
 
3.2 Conexão de lugar (conexão espacial):
Para que haja continuidade delitiva, os crimes devem ter sido praticados em semelhantes condições de lugar. Segundo a jurisprudência, semelhantes condições de lugar significa que os delitos devem ser praticados dentro da mesma cidade, ou, no máximo, em cidades contíguas.
 
3.3 Conexão quanto à maneira de execução (conexão modal):
Para que haja continuidade delitiva, os crimes devem ter sido praticados com o mesmo modus operandi, ou seja, com a mesma maneira de execução (mesmos comparsas, mesmos instrumentos etc.).
 
4) Unidade de desígnio
Esse quarto requisito não está previsto expressamente no art. 71 do CP. Por isso, alguns doutrinadores afirmam que ele não é necessário. Sobre o tema, surgiram duas teorias:
 
4.1 Teoria objetiva pura (puramente objetiva)
Segundo esta teoria, os requisitos para a continuidade delitiva são apenas objetivos e estão expressamente elencados no art. 71 do CP. Daí o nome: puramente objetiva. Não é necessário que se discuta se a intenção do agente era ou não praticar todos os crimes em continuidade delitiva. No exemplo que demos acima, não interessa discutir se o objetivo de Carlos era praticar um único furto de R$ 500,00 dividido em várias vezes ou se sua intenção era ficar subtraindo o dinheiro da padaria por tempo indeterminado. Essa teoria é minoritária e ultrapassada.
 
4.2 Teoria objetivo-subjetiva (também chamada de teoria mista)
De acordo com esta teoria, os requisitos para a continuidade delitiva são de natureza tanto objetiva como subjetiva. Daí o nome da teoria: objetivo-subjetiva. Os requisitos objetivos estão previstos no art. 71 (mesmas condições de tempo, lugar e forma de execução). O requisito subjetivo, por sua vez, é a unidade de desígnio, ou seja, o liame volitivo entre os delitos, a demonstrar que os atos criminosos se apresentam entrelaçados (a conduta posterior deve constituir um desdobramento da anterior).
Conforme explica Nucci:
“Somente deveria ter direito ao reconhecimento desse benefício legal o agente criminoso que demonstrasse ao juiz o seu intuito único, o seu propósito global, vale dizer, evidenciasse que, desde o princípio, ou pelo menos durante o iter criminis, tinha o propósito de cometer um crime único, embora por partes. Assim, o balconista de uma loja que, pretendendo subtrair R$ 1.000,00 do seu patrão, comete vários e contínuos pequenos furtos até atingir a almejada quantia. Completamente diferente seria a situação daquele ladrão que comete furtos variados, sem qualquer rumo ou planejamento, nem tampouco objetivo único.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 6ª ed., São Paulo: RT, 2006, p. 405).
 
Essa é a teoria adotada pelo STJ e STF:
(...) O Superior Tribunal de Justiça firmou compreensão no sentido de que para caracterizar a continuidade delitiva é necessária a demonstração da unidade de desígnios, ou seja, o liame volitivo que liga uma conduta a outra, não bastando, portanto, o preenchimento dos requisitos objetivos (mesmas condições de tempo, espaço e modus operandi).
2. No caso, observa-se que o Tribunal a quo, ao aplicar a regra do art. 71 do Código Penal, adotou a teoria puramente objetiva, deixando de valorar os aspectos subjetivos. (...)
(REsp 421.246/SP, Rel. Min. Og Fernandes, Sexta Turma, julgado em 15/12/2009)
13.2. Arma utilizada no roubo e a majorante do art. 157, §2º, I do CP – (TJPA-2019) (MPPI-2019)
		É necessário que a arma utilizada no roubo seja apreendida e periciada para que incida a majorante do art. 157, § 2º, I, do Código Penal?
NÃO. O reconhecimento da referida causa de aumento prescinde (dispensa) da apreensão e da realização de perícia na arma, desde que o seu uso no roubo seja provado por outros meios de prova, tais como a palavra da vítima ou mesmo de testemunhas.
STF. 1ª T. HC 108034/MG, rel. Min. Rosa Weber, j. 7/8/12.
STJ. 5ª T. AgRg no AREsp 1076476/RO, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 04/10/18. 
STJ. 6ª T. AgRg no HC 449102/MS, Rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 09/10/18.
No entanto, se a arma é apreendia e periciada, sendo constatada a sua inaptidão para a produção de disparos, neste caso, não se aplica a majorante do art. 157, § 2º, I, do CP, sendo considerado roubo simples (art. 157, caput, do CP). O legislador, ao prever a majorante descrita no referido dispositivo, buscou punir com maior rigor o indivíduo que empregou artefato apto a lesar a integridade física do ofendido, representando perigo real, o que não ocorre na hipótese de instrumento notadamente sem potencialidade lesiva. Assim, a utilização de arma de fogo que não tenha potencial lesivo afasta a mencionada majorante, mas não a grave ameaça, que constitui elemento do tipo “roubo” na sua forma simples.
STJ. 6ª Turma. HC 247.669-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 4/12/2012.
13.3. Participação de menor de idade em roubo e a sua majoração pelo concurso de pessoas
		Se um maior de idade pratica o roubo juntamente com um inimputável, esse roubo será majorado pelo concurso de pessoas (art. 157, § 2º do CP).
A participação do menor de idade pode ser considerada com o objetivo de caracterizar concurso de pessoas para fins de aplicação da causa de aumento de pena no crime de roubo.
STF. 1ª Turma. HC 110425/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 5/6/2012.
STJ. 6ª Turma. HC 150.849/DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 16/08/2011.
14. LATROCÍNIO 
14.1. O que fazer se foi atingido um único patrimônio, mas houve pluralidade de mortes? – (Info 855) – IMPORTANTE!!!
		Carlos e Luiza estão entrando no carro quando são rendidos por João, assaltante armado, que deseja subtrair o veículo. Carlos acaba reagindo e João atira contra ele e Luiza, matando o casal. João foge levando o carro. Haverá dois crimes de latrocínio em concurso formal de ou um único crime de latrocínio? 
· STJ: concurso formal impróprio. 
· STF e doutrina majoritária: um único crime de latrocínio. 
STJ. 5ª Turma. HC 336.680/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 17/11/2015. 
STF. 1ª Turma. RHC 133575/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 21/2/17 (Info 855).
	(DPERN-2015-CESPE): Plínio praticou um crime de latrocínio (previsto no art. 157, § 3.º, parte final, do CP) no qual houve uma única subtração patrimonial, com desígnios autônomos e com dois resultados mortes (vítimas). Nessa situação, segundo o entendimento do STJ, Plínio praticou o crime de latrocínio em concurso formal impróprio, disposto no art. 70, caput, parte final, do CP, no qual se aplica a regra do concurso material, de forma que as penas devem ser aplicadas cumulativamente.
14.2. Agente que participou do roubo pode responder por latrocínio ainda que o disparo que matou a vítima tenha sido efetuado pelo corréu – (Info 855) – IMPORTANTE!!! – (TJMG-2018)
		Aquele que se associa a comparsa para a prática de roubo, sobrevindo a morte da vítima, responde pelo crime de latrocínio, ainda que não tenha sido o autor do disparo fatal ou que sua participação se revele de menor importância. 
Ex: João e Pedro combinaram de roubar um carro utilizando arma de fogo. Eles abordaram, então, Ricardo e Maria quando o casal entrava no veículo que estava estacionado. Os assaltantes levaram as vítimas para um barraco no morro. Pedro ficou responsável por vigiar o casal no cativeiro enquanto João realizaria outros crimes utilizando o carro subtraído. Depois de João ter saído, Ricardo e Maria tentaram fugir e Pedro atirou nas vítimas, que acabaram morrendo. João pretendia responder apenas por roubo majorado (art. 157, § 2º, I e II) alegando que não participou nem queria a morte das vítimas, devendo, portanto, ser aplicado o art. 29, § 2º do CP. O STF, contudo, não acatou a tese. Isso porque João assumiu o risco de produzir resultado mais grave, ciente de que atuava em crime de roubo, no qual as vítimas foram mantidas em cárcere sob a mira de arma de fogo. 
STF. 1ª Turma. RHC 133575/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 21/2/2017 (Info 855).
	(TJMG-2018-Consulplan):“A e B, imputáveis, resolvem cometer um roubo em um estabelecimento comercial na companhia do menor M, mediante emprego de um revólver eficaz e completamente municiado. Na ocasião programada, A conduz os demais comparsas e estaciona em local estratégico próximo ao estabelecimento comercial para facilitar a fuga e dificultar que testemunhas anotem a placa do veículo. B e M descem do veículo, entram no estabelecimento comercial perto do horário do encerramento e anunciam o assalto. A vítima V reage e entra em luta corporal com os agentes. Para pôr fim à briga, M efetua três disparos de arma de fogo e foge, em seguida, na companhia de B sem nada subtrair do estabelecimento comercial. V morre em função dos disparos de arma de fogo que lhe atingiram. B e M entram rapidamente no veículo conduzido por A, que empreende rápida fuga do local.” Sobre a punibilidade de A, assinale a alternativa correta: A responde por latrocínio consumado em concurso formal com corrupção de menor, sem incidência da causa de diminuição de pena da participação de menor importância. BL: art. 157, §3º, II; art. 70, 1ª parte; art. 244-B, todos do CP; Súmula 610, STF; Info 855 do STF.
	OBS: Imagine a seguinte situação adaptada: João e Pedro combinaram de roubar um carro utilizando arma de fogo. Eles abordaram, então, Ricardo e Maria quando o casal entrava no veículo que estava estacionado. Os assaltantes levaram as vítimas para um barraco no morro. Pedro ficou responsável por vigiar o casal no cativeiro enquanto João realizaria outros crimes utilizando o carro subtraído. Depois de João ter saído, Ricardo e Maria tentaram fugir e Pedro atirou nas vítimas, que acabaram morrendo.
Qual foi o crime praticado por Pedro? Latrocínio (art. 157, § 3º, 2ª parte) em concurso com sequestro e cárcere privado (art. 148 do CP):
Art. 157 (...)
§ 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de sete a quinze anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa.
Art. 148. Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado:
Pena - reclusão, de um a três anos.
João também foi denunciado por latrocínio, mas alegou em sua defesa que deveria responder apenas por roubo majorado (art. 157, § 2º, I e II), considerando que não participou nem queria a morte das vítimas, devendo, portanto, ser aplicado o art. 29, § 2º do CP. A tese de João foi aceita pelo STF? NÃO. O art. 29, § 2º prevê:
§ 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave.
No caso concreto, o juiz sentenciante julgou que o réu contribuiu ativamente para a realização do delito, em unidade de desígnios e mediante divisão de tarefas, com pleno domínio do fato. O STF entendeu que a decisão do magistrado foi correta. Segundo decidiu a Corte: 
Aquele que se associa a comparsa para a prática de roubo, sobrevindo a morte da vítima, responde pelo crime de latrocínio, ainda que não tenha sido o autor do disparo fatal ou que sua participação se revele de menor importância. O agente assumiu o risco de produzir resultado mais grave, ciente de que atuava em crime de roubo, no qual as vítimas foram mantidas em cárcere sob a mira de arma de fogo. STF. 1ª T. RHC 133575/PR, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 21/2/17 (Info 855).
No caso concreto, o magistrado sentenciante utilizou a seguinte argumentação: No concurso de pessoas não é necessário que todos os agentes pratiquem os mesmos atos executivos, sendo suficiente o encontro de vontades para a prática da infração penal. Assim, embora não existam provas de que João tenha ordenado que o corréu Pedro matasse as vítimas, não há dúvidas de que ele assumiu o risco de produzir o resultado mais grave, pois, após terem juntos praticado a subtração e mantido os ofendidos em cárcere, os deixou com seu comparsa enquanto levava o veículo para a prática de outros crimes.
Assim, João tinha domínio do fato e sua conduta não pode ser considerada meramente acessória ou de menor importância, estando ciente de que atuava em um roubo, no qual as vítimas era mantidas em cárcere sob a mira de uma arma de fogo, tendo anuído e aderido à conduta violenta do corréu, sendo a sua ação fundamental para a concretização da subtração do patrimônio visado.
Não tendo havido rompimento do liame subjetivo entre os agentes, não há que se falar em participação de menor importância, tampouco em responsabilização por crime menos grave, pois em se tratando de roubo, respondem pelo resultado morte todos aqueles que, mesmo não tendo de mão própria realizado o ato letal, planejaram e executaram o tipo básico, assumindo o risco do resultado mais grave durante a ação criminosa.
15. DANO 
15.1. Destruição de acessões feitas em terras indígenas pode configurar dano qualificado – (Info 760)
		Se um indivíduo que tinha uma fazenda em uma terra indígena, ao receber ordem para desocupar o local, destrói as acessões (construções e plantações) que havia feito no local, ele pratica, em tese, o delito de dano qualificado (art. 163, parágrafo único, III, do CP). Isso porque essas terras pertencem à União (art. 20, XI, da CF/88), de forma que, consequentemente, as acessões também são patrimônio público federal. 
STF. 2ª Turma. Inq 3670/RR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 23/9/2014 (Info 760).
16. ESTELIONATO 
16.1. Estelionato e devolução da vantagem indevida antes do recebimento da denúncia – (Info 796) – IMPORTANTE!!!
		O art. 9º, § 2º da Lei 10.684/2003 prevê que o pagamento integral do débito fiscal realizado pelo réu é causa de extinção de sua punibilidade. 
Imagine que determinado indivíduo tenha praticado estelionato causando prejuízo aos cofres públicos. Antes do recebimento da denúncia, o agente paga integralmente os danos produzidos. Isso poderá extinguir sua punibilidade, com base no art. 9º, § 2º da Lei 10.684/2003? 
NÃO. A causa especial de extinção de punibilidade prevista no § 2º do art. 9º da Lei nº 10.684/2003, relativamente ao pagamento integral do crédito tributário, não se aplica ao delito de estelionato (CP, art. 171). 
O art. 9º da Lei 10.684/2003 menciona os crimes aos quais são aplicadas suas regras: a) arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137/90; b) art. 168-A do CP (apropriação indébita previdenciária); c) Art. 337-A do CP (sonegação de contribuição previdenciária). Repare, portanto, que o estelionato (art. 171 do CP) não está listado nessa lei. 
Mesmo sem o estelionato previdenciário estar previsto, não é possível aplicar essas regras por analogia em favor do réu? 
NÃO. O art. 9º da Lei 10.684/2003 somente abrange crimes tributários materiais, delitos que são ontologicamente distintos do estelionato previdenciário e que protegem bens jurídicos diferentes. Dessa forma, não há lacuna involuntária na lei penal a demandar analogia. 
O fato de o agente ter pago integralmente o prejuízo trará algum benefício penal? 
SIM. O agente poderá ter direito de receber o benefício do arrependimento posterior, tendo sua pena reduzida de 1/3 a 2/3 (art. 18 do CP). 
STF. 2ª T. RHC 126917/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 25/8/2015 (Info 796). 
STJ. 6ª T. REsp 1.380.672-SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 24/3/2015 (Info 559).
17. APROPRIAÇÃO INDÉBITA 
17.1. Ressarcimento do prejuízo em acordo homologado no juízo cível e sua repercussão no processo criminal – (Info 793)
		A advogada ficou com o dinheiro recebido pelo cliente e só devolveu a quantia após ser demandada judicialmente e fazer acordo em ação de cobrança. 
Vale ressaltar que, a esta altura, já havia um inquérito policial instaurado para apurar eventual crime de apropriação indébita. 
O STF, com base em peculiaridades do caso concreto, decidiu trancar a ação penal por falta de justa causa.
Salientou-se que o acordo firmado no juízo cível que colocou fim à pendência ocorreu em novembro de 2012 e a denúncia só foi formalizada quase um ano após.
Além disso, o juiz do processo cível determinoua comunicação à Delegacia de Polícia sobre o acordo. Diante desses fatos, a 1ª Turma entendeu que a situação seria excepcional e suficiente para se trancar a ação penal. Entendeu-se que a relação jurídica cível repercute porque o acerto de contas se deu em data anterior à propositura da ação penal. 
STF. 1ª Turma. RHC 125283/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 4/8/2015 (Info 793).
18. RECEPTAÇÃO
18.1. Constitucionalidade do §1º do art. 180 do Código Penal
		O STF entende que o § 1º do art. 180 do CP é CONSTITUCIONAL.
O objetivo do legislador ao criar a figura típica da receptação qualificada foi justamente a de punir de forma mais gravosa o comerciante ou industrial que, em razão do exercício de sua atividade, pratica alguma das condutas descritas no referido § 1°, valendo-se de sua maior facilidade para tanto devido à infraestrutura que lhe favorece.
O crime foi qualificado pelo legislador em razão da condição do agente que, por sua atividade profissional, merece ser mais severamente punido com base na maior reprovabilidade de sua conduta.
Para o STF, o § 1º do art. 180 pune tanto o agente que atua com dolo eventual como também no caso de dolo direto.
STF. 1ª Turma. RHC 117143/RS, rel. Min. Rosa Weber, 25/6/2013.
19. CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL 
19.1. ESTUPRO DE VULNERÁVEL (art. 217-A): Homem que beijou criança de 5 anos de idade, colocando a língua no interior da boca (beijo lascivo) praticou estupro de vulnerável (art. 217-A do CP), não sendo possível a desclassificação para a contravenção penal de molestamento (art. 65 do DL 3.668/41) – (Info 954)
		Um homem beijou uma criança de 5 anos de idade, colocando a língua no interior da boca. 
O STF entendeu que essa conduta caracteriza o chamado “beijo lascivo”, havendo, portanto, a prática do crime de estupro de vulnerável, previsto no art. 217-A do Código Penal.
Não é possível desclassificar essa conduta para a contravenção penal de molestamento (art. 65 do Decreto-Lei nº 3.668/41). 
Para determinadas idades, a conotação sexual é uma questão de poder, mais precisamente de abuso de poder e confiança. No caso concreto, estão presentes a conotação sexual e o abuso de confiança para a prática de ato sexual. Logo, não há como desclassificar a conduta do agente para a contravenção de molestamento (que não detém essa conotação sexual).
O art. 227, § 4º, da CF/88 exige que a lei imponha punição severa à violação da dignidade sexual da criança e do adolescente. Além do mais, a prática de qualquer ato libidinoso diverso ou a conduta de manter conjunção carnal com menor de 14 anos se subsome, em regra, ao tipo penal de estupro de vulnerável, restando indiferente o consentimento da vítima.
STF. 1ª T. HC 134591/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 1/10/19 (Info 954).
19.2. Legitimidade ativa do Ministério Público e crime de estupro sem lesão corporal – (Info 905) – IMPORTANTE!!!
		A Súmula 608 do STF prevê que “no crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada.”
O entendimento dessa súmula pode ser aplicado independentemente da existência da ocorrência de lesões corporais nas vítimas de estupro. A violência real se caracteriza não apenas nas situações em que se verificam lesões corporais, mas sempre que é empregada força física contra a vítima, cerceando-lhe a liberdade de agir segundo a sua vontade.
Assim, se os atos foram praticados sob grave ameaça, com imobilização de vítimas, uso de força física e, em alguns casos, com mulheres sedadas, trata-se de crime de estupro que se enquadra na Súmula 608 do STF e que, portanto, a ação é pública incondicionada.
STF. 2ª Turma. RHC 117978, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 05/06/2018 (Info 905).
A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o advento da Lei nº 12.015/2009. 
Assim, em caso de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada mesmo após a Lei nº 12.015/2009.
STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 27/2/2018 (Info 892).
	OBS:
Ação penal no crime de estupro: A ação penal no crime de estupro deve ser analisada antes e depois da Lei 12.015/09. Veja como essa Lei alterou o art. 225 do Código Penal:
	CÓDIGO PENAL
	Antes da Lei nº 12.015/2009
	Depois da Lei nº 12.015/2009
	Art. 225. Nos crimes definidos nos capítulos anteriores, somente se procede mediante queixa.
§ 1º Procede-se, entretanto, mediante ação pública:
I - se a vítima ou seus pais não podem prover às despesas do processo, sem privar-se de recursos indispensáveis à manutenção própria ou da família;
II - se o crime é cometido com abuso do pátrio poder, ou da qualidade de padrasto, tutor ou curador.
§ 2º - No caso do nº I do parágrafo anterior, a ação do Ministério Público depende de representação.
	Art. 225.  Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.
Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.
 
O estupro pode ser praticado mediante grave ameaça ou violência. Se o estupro é praticado mediante violência real, qual será a ação penal neste caso? Em 1984, o STF editou uma súmula afirmando que se trata de ação pública incondicionada. Confira:
Súmula 608-STF: No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada.
 
Com a edição da Lei 12.015/09, a maioria da doutrina defendeu a ideia de que esta súmula teria sido superada. Isso porque o caput do art. 225 do Código Penal falou que a regra geral no estupro é a ação pública condicionada. Ao tratar sobre as exceções nas quais o crime será de ação pública incondicionada, o parágrafo único do art. 225 não fala em estupro com violência real. Logo, para os autores, teria havido uma omissão voluntária do legislador.
 
O STF acatou esta tese? Depois da Lei nº 12.015/2009, o estupro praticado mediante violência real passou a ser de ação pública condicionada? Com a Lei nº 12.015/2009, a Súmula 608 do STF perdeu validade? NÃO. O tema ainda não está pacificado, mas a 1ª Turma do STF decidiu que:
A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o advento da Lei nº 12.015/2009. Assim, em caso de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada. STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 27/2/2018 (Info 892).
 
Vale ressaltar que é dispensável a ocorrência de lesões corporais para a caracterização da violência real nos crimes de estupro. Em outras palavras, mesmo que a violência praticada pelo agressor não deixe marcas, não gere lesões corporais na vítima, ainda assim a ação será pública incondicionada:
Nos termos da Súmula 608 do STF, no crime de estupro praticado mediante violência real, a ação é pública incondicionada. 
O entendimento dessa súmula pode ser aplicado independentemente da existência da ocorrência de lesões corporais nas vítimas de estupro. A violência real se caracteriza não apenas nas situações em que se verificam lesões corporais, mas sempre que é empregada força física contra a vítima, cerceando-lhe a liberdade de agir segundo a sua vontade.
Assim, se os atos foram praticados sob grave ameaça, com imobilização de vítimas, uso de força física e, em alguns casos, com mulheres sedadas, trata-se de crime de estupro que se enquadra na Súmula 608 do STF e que, portanto, a ação é pública incondicionada.
STF. 2ª Turma. RHC 117978, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 05/06/2018 (Info 905).
E no caso de estupro que resulta lesão corporal grave ou morte (art. 213, §§ 1º e 2º)? Qual será a ação penal nestas hipóteses? A doutrina também defende que neste caso a ação penal seria pública condicionada. A Procuradoria-Geral da República ajuizou até mesmo uma ADI contra a nova redação do art. 225 do Código Penal, dada pela Lei nº 12.015/09. Na ação, a PGR pede que o caput do art. 225 seja declarado parcialmente inconstitucional,sem redução de texto, apenas “para excluir do seu âmbito de incidência os crimes de estupro qualificado por lesão corporal grave ou morte, de modo a restaurar, em relação a tais modalidades delituosas, a regra geral da ação penal pública incondicionada (artigo 100 do Código Penal e artigo 24 do Código de Processo Penal)”. Em outras palavras, a PGR pediu que o STF interprete o art. 225 do CP dizendo que o estupro que resulte lesão corporal grave ou morte será crime de ação pública incondicionada. O processo é a ADI 4301, que deve ser julgada ainda este ano. Vale ressaltar que, com a decisão acima explicada (HC 125360/RJ), ganha força essa ADI proposta pela PGR e a tendência é que ela seja julgada procedente.
 
Resumindo. Ação penal no caso de estupro (após a Lei nº 12.015/2009):
Regra: ação penal condicionada à representação.
Exceções:
• Vítima menor de 18 anos: incondicionada.
• Vítima vulnerável: incondicionada.
• Se foi praticado mediante violência real: incondicionada (Súmula 608-STF).
• Se resultou lesão corporal grave ou morte: polêmica acima exposta. Deve ser aplicado o mesmo raciocínio da Súmula 608-STF.
19.3. Em caso de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada – (Info 892) – IMPORTANTE!!! Atualize seus livros!
		A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o advento da Lei 12.015/2009. 
Assim, em caso de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada mesmo após a Lei nº 12.015/2009.
STF. 1ª Turma. HC 125360/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 27/2/2018 (Info 892).
	OBS:
Ação penal no crime de estupro: A ação penal no crime de estupro deve ser analisada antes e depois da Lei 12.015/09. Veja como essa Lei alterou o art. 225 do Código Penal:
	CÓDIGO PENAL
	Antes da Lei nº 12.015/2009
	Depois da Lei nº 12.015/2009
	Art. 225. Nos crimes definidos nos capítulos anteriores, somente se procede mediante queixa.
§ 1º Procede-se, entretanto, mediante ação pública:
I - se a vítima ou seus pais não podem prover às despesas do processo, sem privar-se de recursos indispensáveis à manutenção própria ou da família;
II - se o crime é cometido com abuso do pátrio poder, ou da qualidade de padrasto, tutor ou curador.
§ 2º - No caso do nº I do parágrafo anterior, a ação do Ministério Público depende de representação.
	Art. 225.  Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.
Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável.
 
O estupro pode ser praticado mediante grave ameaça ou violência. Se o estupro é praticado mediante violência real, qual será a ação penal neste caso? Em 1984, o STF editou uma súmula afirmando que se trata de ação pública incondicionada. Confira:
Súmula 608-STF: No crime de estupro, praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada.
 
Com a edição da Lei nº 12.015/2009, a maioria da doutrina defendeu a ideia de que esta súmula teria sido superada. Isso porque o caput do art. 225 do Código Penal falou que a regra geral no estupro é a ação pública condicionada. Ao tratar sobre as exceções nas quais o crime será de ação pública incondicionada, o parágrafo único do art. 225 não fala em estupro com violência real. Logo, para os autores, teria havido uma omissão voluntária do legislador.
 
O STF acatou esta tese? Depois da Lei nº 12.015/2009, o estupro praticado mediante violência real passou a ser de ação pública condicionada? Com a Lei nº 12.015/2009, a Súmula 608 do STF perdeu validade? NÃO. O tema ainda não está pacificado, mas a 1ª Turma do STF decidiu que:
A Súmula 608 do STF permanece válida mesmo após o advento da Lei nº 12.015/2009. Assim, em caso de estupro praticado mediante violência real, a ação penal é pública incondicionada. STF. 1ª T. HC 125360/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 27/2/2018 (Info 892).
 
Vale ressaltar que é dispensável a ocorrência de lesões corporais para a caracterização da violência real nos crimes de estupro. Em outras palavras, mesmo que a violência praticada pelo agressor não deixe marcas, não gere lesões corporais na vítima, ainda assim a ação será pública incondicionada. Nesse sentido: STF. 2ª Turma. HC 102683, Rel. Min. Ellen Gracie, julgado em 14/12/2010.
 
E no caso de estupro que resulta lesão corporal grave ou morte (art. 213, §§ 1º e 2º)? Qual será a ação penal nestas hipóteses? A doutrina também defende que neste caso a ação penal seria pública condicionada. A Procuradoria-Geral da República ajuizou até mesmo uma ADI contra a nova redação do art. 225 do Código Penal, dada pela Lei nº 12.015/2009. Na ação, a PGR pede que o caput do art. 225 seja declarado parcialmente inconstitucional, sem redução de texto, apenas “para excluir do seu âmbito de incidência os crimes de estupro qualificado por lesão corporal grave ou morte, de modo a restaurar, em relação a tais modalidades delituosas, a regra geral da ação penal pública incondicionada (artigo 100 do Código Penal e artigo 24 do Código de Processo Penal)”. Em outras palavras, a PGR pediu que o STF interprete o art. 225 do CP dizendo que o estupro que resulte lesão corporal grave ou morte será crime de ação pública incondicionada. O processo é a ADI 4301, que deve ser julgada ainda este ano. Vale ressaltar que, com a decisão acima explicada (HC 125360/RJ), ganha força essa ADI proposta pela PGR e a tendência é que ela seja julgada procedente.
 
Resumindo. Ação penal no caso de estupro (após a Lei nº 12.015/2009):
Regra: ação penal condicionada à representação.
Exceções:
• Vítima menor de 18 anos: incondicionada.
• Vítima vulnerável: incondicionada.
• Se foi praticado mediante violência real: incondicionada (Súmula 608-STF).
• Se resultou lesão corporal grave ou morte: polêmica acima exposta. Deve ser aplicado o mesmo raciocínio da Súmula 608-STF.
19.4. Bisavô é considerado ascendente para os fins da causa de aumento do art. 226, II, do CP – (Info 866)
		No caso de crimes contra a liberdade sexual (arts. 213 a 216-A) e crimes sexuais contra vulnerável (arts. 217-A a 218-B), se o autor do delito for ascendente da vítima, a pena deverá ser aumentada de metade (art. 226, II, do CP). 
O bisavô está incluído dentro dessa expressão “ascendente”. 
O bisavô está no terceiro grau da linha reta e não há nenhuma regra de limitação quanto ao número de gerações. 
Assim, se o bisavô pratica estupro de vulnerável contra sua bisneta, deverá incidir a causa de aumento de pena prevista no art. 226, II, do CP. 
STF. 2ª Turma. RHC 138717/PR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 23/5/17 (Info 866).
	OBS:
Causa de aumento de pena: No caso de crimes contra a liberdade sexual (arts. 213 a 216-A) e crimes sexuais contra vulnerável (arts. 217-A a 218-B), se o autor do delito for ascendente da vítima, a pena deverá ser aumentada de metade (art. 226, II, do CP). É o que prevê o art. 226, II, do CP:
Art. 226. A pena é aumentada: (...)
II – de metade, se o agente é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tem autoridade sobre ela;
O bisavô está incluído dentro dessa expressão “ascendente”? Claro. O bisavô está no terceiro grau da linha reta e não há nenhuma regra de limitação quanto ao número de gerações.
19.5. Passar as mãos nas coxas e seios da vítima – (Info 837) – (TJCE-2018)
		O agente que passa as mãos nas coxas e seios da vítima menor de 14 anos, por dentro de sua roupa, pratica, em tese, o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP). 
Não importa que não tenha havido penetração vaginal (conjunção carnal). 
STF. 1ª T. RHC 133121/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/o acórdão Min. Edson Fachin j. 30/8/16 (Info 837).
20. INCITAÇÃO AO CRIME 
20.1. Deputado que, em entrevista à imprensa, afirma que determinada Deputada "não merece ser estuprada"pratica, em tese, incitação ao crime (art. 286 do CP) – (Info 831)
		O Deputado Federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) afirmou que a também Deputada Federal, Maria do Rosário (PT-RS), “não merece ser estuprada por ser muito ruim, muito feia, não faz meu gênero”. E acrescentou que, se fosse estuprador, "não iria estuprá-la porque ela não merece". 
O STF entendeu que a conduta do parlamentar configura, em tese, para fins de recebimento de denúncia, o delito do art. 286 do CP (incitação ao crime): "Art. 286. Incitar, publicamente, a prática de crime: Pena - detenção, de três a seis meses, ou multa." 
A manifestação do Deputado tem o potencial de incitar outros homens a expor as mulheres à fragilidade e à violência física, sexual, psicológica e moral, considerando que foi proferida por um parlamentar, que não pode desconhecer os tipos penais. 
O crime de estupro tem consequências graves, e sua ameaça constante mantém todas as mulheres em situação de subordinação. Portanto, discursos que relativizam essa gravidade e a abjeção do delito contribuem para agravar a vitimização secundária produzida pelo estupro.
O parlamentar, ao utilizar o vocábulo “merece” transformou o estupro em algo como se fosse um prêmio, um favor, uma benesse à mulher. Além disso, transmitiu a ideia de que as vítimas podem merecer os sofrimentos a elas infligidos pelo estupro. Essa fala reflete os valores de uma sociedade desigual, que ainda tolera e até incentiva a prática de atitudes machistas e defende a naturalidade de uma posição superior do homem, nas mais diversas atividades. 
Para que se consuma o tipo penal do art. 286 do CP, não é necessário que o agente incentive, verbal e literalmente, a prática de determinado crime. Este delito pode ser praticado por meio de qualquer conduta que seja apta a provocar ou a reforçar em terceiros a intenção da prática criminosa. 
Ademais, o delito do art. 286 do CP é crime formal, de perigo abstrato, e independe da produção de resultado. Além disso, não exige o fim especial de agir, mas apenas o "dolo genérico", consistente na consciência de que o comportamento do agente instigará outros a praticar crimes. 
No caso, a frase do parlamentar tem potencial para estimular a perspectiva da superioridade masculina e a intimidação da mulher pela ameaça de uso da violência. Assim, a afirmação pública do Deputado tem, em tese, o potencial de reforçar a ideia eventualmente existente em outros homens de praticarem violência contra a mulher. 
STF. 1ª T. Inq 3932/DF e Pet 5243/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgados em 21/6/2016 (Info 831).
21. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PÚBLICO 
21.1. Prefeito que insere artigo em projeto de lei aprovado pelo Parlamento – (Info 832)
		Prefeito que, ao sancionar lei aprovada pela Câmara dos Vereadores, inclui artigo que não constava originalmente no projeto votado pratica o crime de falsificação de documento público (art. 297, § 1º do CP). 
No momento da dosimetria, o fato de o réu ser Prefeito não pode ser utilizado como circunstância desfavorável para aumentar a pena-base na primeira fase e, em seguida, ser empregado como causa de aumento do § 1º do art. 297 do CP. Se ele for utilizado duas vezes, haverá bis in idem. 
Assim, essa circunstância (condição de Prefeito) deve ser considerada apenas uma vez, na terceira fase da pena, como majorante (causa de aumento). 
STF. 1ª Turma. AP 971/RJ, Rel. Min. Edson Fachin, j. 28/6/2016 (Info 832).
	OBS:
Imagine a seguinte situação adaptada: A Câmara dos Vereadores aprovou determinada lei municipal. João, Prefeito, quando foi sancionar a lei, incluiu um artigo que não constava originalmente no projeto aprovado pelo Parlamento. O objetivo foi possibilitar a prorrogação da dotação orçamentária sem a necessidade de nova aprovação legislativa.
Qual foi o delito praticado pelo Prefeito? Falsificação de documento público, previsto no art. 297, § 1º do CP:
Art. 297. Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa.
§ 1º - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, aumenta-se a pena de sexta parte.
O Tribunal aumentou a pena na primeira fase da dosimetria (circunstâncias judiciais) alegando que a culpabilidade do réu era intensa, já que ele, na qualidade de Prefeito, deveria respeitar a vontade do Poder Legislativo. Além disso, aplicou-se a majorante do § 1º do art. 297 do CP. Esta dosimetria foi feita corretamente? NÃO. Houve bis in idem. Como a regra do art. 297, § 1º, do CP, estabelece que a pena deve ser aumentada de um sexto quando o agente for funcionário público e cometer o crime prevalecendo-se do cargo, essa circunstância deveria ser considerada apenas por ocasião da majorante, na terceira fase da dosimetria e não na primeira fase.
	
22. FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO PARTICULAR
22.1. Falsidade de contrato social para ocultar o verdadeiro sócio – (Info 758) – IMPORTANTE!!! – (TJSP-2018)
		O contrato social de uma sociedade empresária é documento particular. Assim, caso seja falsificado, haverá o crime de falsificação de documento particular (e não de documento público). 
Não se pode condenar o réu pelo crime de uso de documento falso quando ele próprio foi quem fez a falsificação do documento. A pessoa deverá ser condenada apenas pela falsidade, e o uso do documento falso configura mero exaurimento do crime de falso. 
STF. 1ª Turma. AP 530/MS, rel. orig. Min. Rosa Weber, red. p/ o acórdão Min. Roberto Barroso, julgado em 9/9/2014 (Info 758).
23. FALSIDADE IDEOLÓGICA 
23.1. Necessidade de prova de que o Prefeito que assinou documentos do Município tinha ciência inequívoca de que a declaração era falsa – (Info 868)
		Prefeito que assina documentos previdenciários com conteúdo parcialmente falso não deve ser condenado por falsidade ideológica se não foram produzidas provas de que ele tinha ciência inequívoca do conteúdo inverídico da declaração. Neste caso, ele deverá ser absolvido, nos termos do art. 386, III, do CPP, por ausência de dolo, o que exclui o crime.
STF. 1ª Turma. AP 931/AL, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 6/6/2017 (Info 868).
23.2. Pratica falsidade ideológica (art. 299 do CP) o candidato que deixa de contabilizar despesas em sua prestação de contas no TER – (Info 765)
		Determinado Parlamentar federal, quando foi candidato ao Senado, ao entregar a prestação de contas ao TRE, deixou de contabilizar despesas com banners e cartazes no valor de 15 mil reais. 
O STF considerou que havia indícios suficientes para receber a denúncia contra ele formulada e iniciar um processo penal para apurar a prática do crime de falsidade ideológica (art. 299 do CP). 
STF. 1ª Turma. Inq 3767/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 28/10/2014 (Info 765).
24. CRIME DE ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR (ART. 311 DO CP)
24.1. Colocação de fita adesiva ou isolante para alterar o número ou as letras da placa do carro
		Segundo a jurisprudência atual do STJ e do STF, a conduta de colocar uma fita adesiva ou isolante para alterar o número ou as letras da placa do carro e, assim, evitar multas, pedágio, rodízio etc, configura o delito do art. 311 do CP.
STF. 2ª Turma. RHC 116371/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 13/8/2013.
25. PECULATO
25.1. STF recebeu denúncia contra o Senador Renan Calheiros em razão de ter desviado recursos públicos da verba parlamentar para pagamento de pensão alimentícia à filha – (Info 849)
		O MP ofereceu denúncia contra o Senador Renan Calheiros pelas seguintes condutas: 
· o denunciado teria desviado recursos públicos da chamada verba indenizatória (destinada a despesas relacionadas ao exercício do mandato parlamentar) para pagar pensão alimentícia à filha. Com isso, teria praticado peculato (art. 312 do CP). 
· além disso, ele teria inserido e feito inserir, em documentos públicos e particulares, informações diversas das que deveriam ser escritas, com o propósito de alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante (sua capacidade financeirao STF concordou com o pedido da defesa e absolveu o réu com base no princípio da insignificância? NÃO. A 1ª Turma do STF adotou uma posição “intermediária”. Como o réu era reincidente em crimes patrimoniais, o STF decidiu que não se poderia aplicar o princípio da insignificância para absolver o agente. No entanto, apesar disso, o STF concedeu habeas corpus de ofício para que a pena privativa de liberdade imposta ao condenado seja substituída por restritiva de direitos, com base no art. 44, § 3º do CP:
§ 3º Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime.
 
Desse modo, o princípio da insignificância pode ser utilizado em alguns casos para não absolver o agente, mas conceder a ele benefício penal, como por exemplo, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, mesmo havendo óbice legal. Situação parecida já havia sido reconhecida pelo STF no julgamento do HC 123533. Veja:
(...) Por maioria, foram também acolhidas as seguintes teses:
(i) a reincidência não impede, por si só, que o juiz da causa reconheça a insignificância penal da conduta, à luz dos elementos do caso concreto; e
(ii) na hipótese de o juiz da causa considerar penal ou socialmente indesejável a aplicação do princípio da insignificância por furto, em situações em que tal enquadramento seja cogitável, eventual sanção privativa de liberdade deverá ser fixada, como regra geral, em regime inicial aberto, paralisando-se a incidência do art. 33, § 2º, c, do CP no caso concreto, com base no princípio da proporcionalidade. (...)
STF. Plenário. HC 123533, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03/08/2015.
 
O Min. Alexandre de Moraes afirmou que, em pequenas comunidades, a substituição da pena privativa de liberdade por medida restritiva de direito, a permitir que as pessoas vejam onde está sendo cumprida, tem valor simbólico e pedagógico maior do que a fixação do regime semiaberto ou aberto. STF. 1ª Turma. HC 137217/MG, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em 28/8/2018(Info 913).
2.3. É possível a aplicação do princípio da insignificância para o furto de um galo, quatro galinhas caipiras, uma galinha garnizé e três quilos de feijão – (Info 911)
		Em regra, a habitualidade delitiva específica (ou seja, o fato de o réu já responder a outra ação penal pelo mesmo delito) é um parâmetro (critério) que afasta o princípio da insignificância mesmo em se tratando de bem de reduzido valor. 
Excepcionalmente, no entanto, as peculiaridades do caso concreto podem justificar o afastamento dessa regra e a aplicação do princípio, com base na ideia da proporcionalidade.
É o caso, por exemplo, do furto de um galo, quatro galinhas caipiras, uma galinha garnizé e três quilos de feijão, bens avaliados em pouco mais de cem reais. O valor dos bens é inexpressivo e não houve emprego de violência. Enfim, é caso de mínima ofensividade, ausência de periculosidade social, reduzido grau de reprovabilidade e inexpressividade da lesão jurídica.
Mesmo que conste em desfavor do réu outra ação penal instaurada por igual conduta, ainda em trâmite, a hipótese é de típico crime famélico.
A excepcionalidade também se justifica por se tratar de hipossuficiente. Não é razoável que o Direito Penal e todo o aparelho do Estado-polícia e do Estado-juiz movimente-se no sentido de atribuir relevância a estas situações.
STF. 2ª Turma. HC 141440 AgR/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 14/8/18 (Info 911).
	OBS: Ressalte-se, mais uma vez, que não há uma regra geral e absoluta para a aplicação do princípio da insignificância em favor de reincidentes ou réus que já possuam outras ações penais. No Info 910, por exemplo, foi noticiado um julgado no qual o STF negou a aplicação do referido princípio tendo como principal fundamento a circunstância de o réu ser reincidente.
2.4. (In) aplicabilidade do princípio no caso do crime previsto no art. 34 da Lei 9.605/98 – (Info 901)
		O princípio da bagatela não se aplica ao crime previsto no art. 34, caput c/c parágrafo único, II, da Lei 9.605/98:
Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:
Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:
II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;
Caso concreto: realização de pesca de 7kg de camarão em período de defeso com o uso de método não permitido.
STF. 1ª Turma. HC 122560/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 8/5/18 (Info 901).
Obs: apesar de a redação utilizada no informativo original ter sido bem incisiva (“O princípio da bagatela não se aplica ao crime previsto no art. 34, caput c/c parágrafo único, II, da Lei 9.605/98”), existem julgados tanto do STF como do STJ aplicando, excepcionalmente, o princípio da insignificância para o delito de pesca ilegal. Deve-se ficar atenta(o) para como isso será cobrado no enunciado da prova.
	OBS:
Imagine a seguinte situação adaptada: João foi encontrado pescando camarões pelo método de arrasto motorizado no período de defeso. Esse método não é permitido no período de defeso. Em seu barco foram localizados 7kg de camarão-rosa. Diante desse fato, João foi denunciado pela suposta prática do delito previsto no art. 34, caput e parágrafo único, II, da Lei nº 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais):
Art. 34. Pescar em período no qual a pesca seja proibida ou em lugares interditados por órgão competente:
Pena - detenção de um ano a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem:
II - pesca quantidades superiores às permitidas, ou mediante a utilização de aparelhos, petrechos, técnicas e métodos não permitidos;
 
A defesa invocou a aplicação do princípio da insignificância e o caso chegou até o STF. Indaga-se: o Supremo admitiu a incidência da insignificância neste caso concreto? NÃO. 
A jurisprudência aplica o princípio da insignificância para o crime de pesca ilegal? Essa resposta envolve três afirmações:
1) A jurisprudência entende que, em tese, é possível aplicar o princípio da insignificância para crimes ambientais.
2) Na prática, a esmagadora maioria dos julgados do STF e STJ nega a incidência do princípio da insignificância para o delito do art. 34 da Lei nº 9.605/98:
(...) Esta Corte entende ser possível a aplicação do princípio da insignificância aos delitos ambientais, quando demonstrada a ínfima ofensividade ao bem ambiental tutelado (AgRg no REsp 1558312/ES, Rel. Ministro FELIX FISCHER, Quinta Turma, julgado em 02/02/2016).
Na espécie, contudo, é significativo o desvalor da conduta, a impossibilitar o reconhecimento da atipicidade material da ação ou a sua irrelevância penal, ante o fato de o recorrente ter sido surpreendido com considerável quantidade de pescado em período no qual, sabidamente, é proibida a pesca, demonstrando a relevância do dano causado e o risco criado à estabilidade do meio ambiente pela prática notadamente ilícita. (...)
STJ. 5ª Turma. RHC 59.507/RS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 04/05/2017.
 
(...) Não é insignificante a conduta de pescar em época proibida, e com petrechos proibidos para pesca (tarrafa, além de varas de pescar), ainda que pequena a quantidade de peixes apreendidos. (...)
STJ. 6ª Turma. REsp 1685927/RJ, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 12/09/2017.
Caso concreto: não aplicado à atividade de pesca em período de defeso, em que apreendidos 5 varas com molinete, 1 tarrafa e 250g de peixe robalo.
 
3) Apesar de não ser comum, a jurisprudência já reconheceu a aplicação do princípio da insignificância para o delito do art. 34. Veja:
Não se configura o crime previsto no art. 34 da Lei nº 9.605/98 na hipótese em há a devolução do único peixe – ainda vivo – ao rio em que foi pescado. STJ. 6ª T. REsppara custear despesas da referida pensão). Isso porque o parlamentar, ao prestar contas dos valores recebidos a título de verba indenizatória, teria apresentado notas fiscais fictícias, ou seja, de serviços que não teriam sido prestados. Ademais, ele teria apresentado livros-caixa de suas atividades como pecuarista com informações supostamente falsas. Por conta desses fatos, foi denunciado pelos crimes de falsidade ideológica (art. 299) e de uso de documento falso (art. 304). 
Quanto ao art. 312 do CP, a denúncia foi recebida porque o STF entendeu estarem presentes indícios de autoria e materialidade minimamente suficientes. 
No que tange aos arts. 299 e 304 do CP, a denúncia foi rejeitada em virtude de os delitos imputados estarem prescritos. 
STF. Plenário. Inq 2593/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 1º/12/16 (Info 849).
25.2. Deputado Federal que utiliza do trabalho de assessor parlamentar para serviços particulares pratica crime de peculato? – (Info 834)
		O servidor público (ex: um Deputado Federal) que se utiliza do trabalho de outro servidor público (ex: assessor parlamentar) para lhe prestar serviços particulares pratica crime de peculato (art. 312 do CP)? 
Situação 1. Servidor público que se utiliza da mão-de-obra de outro servidor público (normalmente seu subordinado) para, em determinados momentos, fazer com que este preste serviços particulares a ele. Esta conduta não configura peculato nem qualquer outro crime. Nesse sentido: STF. 1ª Turma. Inq 3776, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 07/10/2014. Atenção: se o indivíduo que se utilizou do servidor público for Prefeito, ele cometerá o delito do art. 1º, II, do DL 201/67.
 
Situação 2. Servidor público que utiliza a Administração Pública para pagar o salário de empregado particular. Aqui o chefe contrata um indivíduo supostamente para ser servidor público (cargo comissionado), mas, na verdade, ele manda que a pessoa contratada preste exclusivamente serviços particulares ao seu superior. Esta conduta, em tese, configura peculato. Isso porque o dinheiro público está sendo desviado para o pagamento de um "servidor" que, formalmente está vinculado à Administração Pública, mas que, na prática, apenas executa serviços para outro servidor público no interesse particular deste último. 
Caso concreto: o Deputado Federal Celso Russomanno (PRB-SP) contratou para o cargo de secretária parlamentar, com remuneração paga pela Câmara dos Deputados, a senhora "SJ". Ocorre que, de acordo com a acusação, "SJ" trabalhava, na verdade, não na Câmara, mas sim na produtora de vídeo do Deputado, em São Paulo. Assim, para o MP, o Deputado utilizou a assessora para o exercício de atividade privada, embora recebendo pelos cofres públicos. A 2ª Turma do STF absolveu o réu. Segundo ficou decidido, "SJ", ainda que tenha exercido algumas atividades de interesse particular do Deputado na produtora, dedicou-se preponderantemente ao cargo de secretária parlamentar no escritório político de Celso Russomano em São Paulo, atendendo cidadãos que se sentiam lesados em suas relações de consumo. Assim, a prova dos autos demonstrou que “SJ” exercia as atribuições inerentes ao cargo de assessora parlamentar, ainda que também, algumas vezes, desempenhasse outras atividades no estrito interesse particular do parlamentar. Dessa forma, pela prova colhida, a conduta do Deputado foi penalmente atípica, uma vez que consistiu no uso de funcionário público que, de fato, exercia as atribuições inerentes ao seu cargo para, também, prestar outros serviços de natureza privada. Em outras palavras, o caso de Russomano se enquadrou na situação 1 acima explicada. 
STF. 2ª Turma. AP 504/DF, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, j. 9/8/2016 (Info 834).
	OBS:
Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:
Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.
Usar servidor público em atividade privada X usar a Administração para pagar salário de empregado privado: Existe, portanto, diferença entre usar funcionário público em atividade privada e usar a Administração Pública para pagar salário de empregado particular. O primeiro é conduta atípica (salvo para o Prefeito). O segundo configura peculato. 
A utilização dos serviços de um funcionário público por outro funcionário público no seu interesse particular não é conduta típica na órbita penal, por não encontrar perfeita subsunção ao art. 312 do CP. 
Este tipo penal descreve como criminosa a conduta consistente em apropriar-se ou desviar em proveito próprio ou alheio "dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel", público ou particular. 
A utilização, em proveito próprio ou alheio, dos serviços executados por quem é remunerado pelos cofres públicos não se configura em desvio ou apropriação de bem móvel. Não se pode, sob pena de malferir o princípio da taxatividade (art. 5º, XXXIX, da CF/88) ampliar o tipo penal para situações que estritamente não se amoldem a ele.
Situação diversa ocorre quando o dinheiro público é desviado para o pagamento de empregado que, apenas formalmente, está vinculado à Administração Pública, mas que, na verdade, desempenha e executa serviços para outro servidor público no interesse particular deste último.
O objeto material do peculato, nessas situações, é o valor desviado para o pagamento do salário.
Nessas hipóteses, tem-se um pseudo funcionário público, que, na verdade, é um empregado privado de um outro funcionário, o qual está formalmente na condição de funcionário apenas como meio para o desvio do dinheiro público utilizado no pagamento de seus salários.
(STF. 1ª Turma. Inq 3776, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 07/10/2014)
26. CORRUPÇÃO PASSIVA
26.1. Pratica corrupção passiva o Deputado que concede apoio político à permanência de Diretor da Petrobrás em troca do recebimento de propina – (Info 904) – IMPORTANTE!!!
		Determinado Deputado Federal integrava a cúpula de um partido de sustentação do governo federal.
Como importante figura partidária, ele exercia pressão política junto à Presidência da República a fim de que Paulo Roberto Costa fosse mantido como Diretor de Abastecimento da Petrobrás.
Como “contraprestação” por esse apoio, o Deputado recebia dinheiro do referido Diretor, quantia essa oriunda de contratos ilegais celebrados pela Petrobrás.
O STF entendeu que esta conduta se enquadra no crime de corrupção passiva (art. 317 do CP).
Obs: foi a primeira condenação do STF envolvendo a chamada “operação Lava Jato”.
STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/5/2018 (Info 904).
	OBS:
A situação concreta foi a seguinte: O Deputado Federal Nelson Meurer (PP/PR) integrava a cúpula do Partido Progressista (PP). Como importante figura partidária, ele exercia pressão política junto à Presidência da República a fim de que Paulo Roberto Costa fosse mantido como Diretor de Abastecimento da Petrobrás. Como “contraprestação” por esse apoio, o Deputado recebia dinheiro do referido Diretor, quantia essa oriunda de contratos ilegais celebrados pela Petrobrás. Essa prática foi revelada pelo próprio Paulo Roberto Costa em declaração prestada no bojo de acordo de colaboração premiada. O Deputado foi denunciado pela prática de corrupção passiva (art. 317 do CP) e também por lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/98).
 
O que o STF decidiu? O STF condenou o réu pela prática dos delitos. O delito de lavagem de dinheiro, será apreciado em tópico separado.
 
E quanto ao crime de corrupção passiva, o que decidiu o STF? O STF entendeu que a conduta descrita se enquadra no crime de corrupção passiva (art. 317 do CP):
Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
 
O regime presidencialista brasileiro confere aos parlamentaresum poder que vai além da elaboração e votação de lei e outros atos normativos. Os parlamentares possuem intensa participação nas decisões de governo, inclusive por meio da indicação de cargos no Poder Executivo. Essa dinâmica é própria do sistema presidencialista brasileiro, que exige uma coalizão para viabilizar a governabilidade. Trata-se do chamado “presidencialismo de coalizão”. 
Não se pode esquecer, contudo, que a Constituição Federal atribui ao Congresso Nacional competência para fiscalizar e controlar os atos do Poder Executivo, incluídos os da Administração Indireta (art. 49, X, da CF/88). Vale lembrar, inclusive, que o Congresso Nacional possui poderes próprios de autoridade judicial quando instituídas comissões parlamentares de inquérito para apuração de fatos determinados (art. 58, § 3º).
Ademais, para evitar conflitos de interesses, os Deputados e Senadores são proibidos de:
a) firmar ou manter contrato com pessoa jurídica de direito público, autarquia, empresa pública, sociedade de economia mista ou empresa concessionária de serviço público, salvo quando o contrato obedecer a cláusulas uniformes; e
b) aceitar ou exercer cargo, função ou emprego remunerado, inclusive os de que sejam demissíveis "ad nutum", nas entidades constantes da alínea anterior.
Isso demonstra que os parlamentares devem manter independência em relação ao Poder Executivo para o exercício de suas atribuições. Nesse contexto, se um parlamentar recebe vantagens indevidas em troca de sustentação política a um diretor da Petrobrás, isso significa evidente omissão em sua função de fiscalizar a lisura dos atos do Poder Executivo.
O exercício ilegítimo da atividade parlamentar, mesmo num governo de coalizão, é apto a caracterizar o crime de corrupção passiva. Esse tipo penal tutela a moralidade administrativa e tem por finalidade coibir e reprimir a mercancia da função pública, cujo exercício deve ser pautado exclusivamente pelo interesse público.
O STF afastou o argumento da defesa de que se estaria “criminalizando a atividade político-partidária”. Não é nada disso. A atividade política continua sendo permitida, sendo lícito que partidos políticos apoiem determinada pessoa para os cargos de destaque do governo (exs: ministérios, diretorias etc.). O que se está punindo, neste caso, são atos que transbordaram os limites do exercício legítimo do mandato, ou seja, puniu-se um Deputado que recebia propina para dar sustentação política a um Diretor de estatal.
 
Provas: No caso concreto, o réu foi delatado por Paulo Roberto Costa. No entanto, o STF afirmou que não estava condenando o réu apenas com base nas declarações do colaborador. Isso porque tais declarações, de forma isolada, não servem para fundamentar um decreto condenatório (art. 4º, § 16, da Lei nº 12.850/2013). O STF afirmou que os fatos retratados encontram consistente suporte em outros elementos de prova (cruzamento de dados de companhias aéreas; afastamento de sigilo bancário; perícias em sistemas de contabilidade de pagamentos de propina; depoimentos de testemunhas; e quebra e disponibilização de dados telefônicos), produzidos sob o crivo do contraditório. Esse conjunto de provas atesta e reforça a veracidade das declarações prestadas no âmbito de colaboração premiada e autoriza a sua utilização como fundamento à resolução do mérito da causa penal.
 
Lavagem de dinheiro: O Deputado também foi denunciado pela prática de lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/98).
Inicialmente, o STF afirmou que o réu não cometeu o crime quando recebeu o pagamento das propinas em espécie (em “dinheiro vivo”). O mero recebimento de valores em dinheiro não tipifica o delito de lavagem, seja quando recebido pelo próprio agente público, seja quando recebido por interposta pessoa. 
Por outro lado, o STF entendeu que o Deputado praticou a lavagem pelo fato de ter recebido a propina em depósitos bancários fracionados, em valores que não atingem os limites estabelecidos pelas autoridades monetárias à comunicação compulsória dessas operações. Ex: suponhamos que, na época, a autoridade bancária dizia que todo depósito acima de R$ 20 mil deveria ser comunicado ao COAF; diante disso, o Deputado recebia depósitos periódicos de R$ 19 mil para burlar essa regra. Para o STF, isso configura o crime de lavagem. Trata-se de uma forma de ocultação da origem e da localização da vantagem pecuniária recebida pela prática do crime anterior.
Além disso, a apresentação de informações falsas em declarações de ajuste anual de imposto de renda foi uma forma de tentar dar um ar de licitude a patrimônio oriundo de práticas delituosas.
 
Efeitos da condenação: Em relação aos efeitos da condenação, o STF condenou o réu a pagar danos materiais, mas negou pedido do Ministério Público para condená-lo em danos morais coletivos.
27. DENUNCIAÇÃO CALUNIOSA
27.1. Denunciação caluniosa exige dolo direto do agente – (Info 753)
		Para configuração do delito de denunciação caluniosa, exige-se que o agente saiba que a pessoa é inocente, ou seja, é necessário dolo direto. 
O simples fato de a pessoa “investigada” ou “denunciada” ter sido absolvida não significa que o autor da “denúncia” deverá responder por denunciação caluniosa, sendo necessário comprovar a sua má-fé, ou seja, que a sua única intenção era a de atribuir fato criminoso a pessoa que ele sabia ser inocente. 
STF. 1ª Turma. Inq 3133/AC, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 5/8/2014 (Info 753).
28. DESCAMINHO
28.1. Descaminho é crime formal – (Info 904) – IMPORTANTE!!! – (MPCE-2020)
		O descaminho é crime tributário FORMAL. Logo, para que seja proposta ação penal por descaminho não é necessária a prévia constituição definitiva do crédito tributário. 
Não se aplica a Súmula Vinculante 24 do STF.
O crime se consuma com a simples conduta de iludir o Estado quanto ao pagamento dos tributos devidos quando da importação ou exportação de mercadorias.
STJ. 6ª T. REsp 1.343.463-BA, Rel. para acórdão Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 20/3/14 (Info 548).
STF. 2ª T. HC 122325, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 27/05/2014.
É dispensada a existência de procedimento administrativo fiscal com a posterior constituição do crédito tributário para a configuração do crime de descaminho (art. 334 do CP), tendo em conta sua natureza formal.
STF. 1ª T. HC 121798/BA, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 29/5/2018 (Info 904).
	(MPCE-2020-CESPE): Julgue o próximo item, acerca de crimes contra a administração pública: A configuração do delito de descaminho dispensa a constituição definitiva do crédito tributário, por se tratar de crime formal. BL: Info 548, STJ e Info 904, STJ.
	OBS:
O delito de descaminho está previsto no art. 334 do Código Penal com a seguinte redação:
Art. 334. Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
 
O descaminho é crime tributário material? Para o ajuizamento da ação penal é necessária a constituição definitiva do crédito tributário? Aplica-se a Súmula Vinculante 24 ao descaminho? NÃO. Tanto o STJ como o STF entendem que o descaminho é crime tributário FORMAL. Logo, para que seja proposta ação penal por descaminho não é necessária a prévia constituição definitiva do crédito tributário.
Não se aplica a Súmula Vinculante 24 do STF:
Súmula vinculante 24-STF: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.
29. DESACATO
29.1. Desacato continua sendo crime – (Info 992)
		A norma do art. 331 do CP, que tipifica o crime de desacato, foi recepcionada pela CF/1988.
Trata-se de arguição de descumprimento de preceito fundamental em que se questiona a conformidade com a Convenção Americana de Direitos Humanos, bem como a recepção pela Constituição de 1988, do art. 331 do Código Penal, que tipifica o crime de desacato.
De acordo com a jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e do STF, a liberdade de expressãonão é um direito absoluto e, em casos de grave abuso, é legítima a utilização do direito penal para a proteção de outros interesses e direitos relevantes.
A diversidade de regime jurídico – inclusive penal – existente entre agentes públicos e particulares é uma via de mão dupla: as consequências previstas para as condutas típicas são diversas não somente quando os agentes públicos são autores dos delitos, mas, de igual modo, quando deles são vítimas.
A criminalização do desacato não configura tratamento privilegiado ao agente estatal, mas proteção da função pública por ele exercida.
Vale ressaltar, no entanto, que, considerando que os agentes públicos em geral estão mais expostos ao escrutínio e à crítica dos cidadãos, deles se exige maior tolerância à reprovação e à insatisfação, limitando-se o crime de desacato a casos graves e evidentes de menosprezo à função pública.
STF. Plenário. ADPF 496, Rel. Roberto Barroso, julgado em 22/06/2020 (Info 992).
	OBS:
Previsão do desacato no direito brasileiro: O Código Penal prevê o crime de desacato no art. 331:
Art. 331. Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela:
Pena - detenção, de seis meses a dois anos, ou multa.
 
Algumas características desse delito: 
· Desacatar significa "menosprezar a função pública exercida por determinada pessoa. Em outras palavras, ofende-se o funcionário público com a finalidade de humilhar a dignidade e o prestígio da atividade administrativa." (MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado. 4ª ed., São Paulo: Método, 2014, p. 748).
· O delito de desacato, quer conforme tipificado na legislação penal comum, quer na militar, tem por sujeito passivo secundário o funcionário público (civil ou militar), figurando o Estado como sujeito passivo principal.
· O bem jurídico tutelado é a Administração Pública, levando-se em conta seu interesse patrimonial e moral. A vítima primária deste delito é o Estado. O servidor ofendido é apenas o sujeito passivo secundário. A tutela penal está no interesse em se assegurar o normal funcionamento do Estado, protegendo-se o prestígio do exercício da função pública.
· O destinatário da proteção legal é mais a função pública do que a pessoa (civil ou militar). Portanto, para a configuração do crime, não é necessário que o funcionário público se sinta ofendido, sendo indispensável que o menoscabo tenha alvo certo, de forma que a vítima deve ouvir a palavra injuriosa ou sofrer diretamente o ato.
· É essencial para a configuração do delito que o funcionário público esteja no exercício da função, ou, estando fora, que a ofensa seja empregada em razão dela. Deve, pois, haver o chamado nexo funcional. A crítica ou a censura sem excessos, por sua vez, não constituem desacato, ainda que veementes.
 
Convenção Americana de Direitos Humanos: O Brasil é signatário da Convenção Americana de Direitos Humanos, que ficou conhecida como "Pacto de São José da Costa Rica". Neste tratado internacional, promulgado pelo Decreto nº 678/92, foi previsto como um dos direitos ali consagrados a liberdade de expressão. Confira:
Artigo 13. Liberdade de pensamento e de expressão
 1. Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e de expressão. Esse direito compreende a liberdade de buscar, receber e difundir informações e ideias de toda natureza, sem consideração de fronteiras, verbalmente ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer outro processo de sua escolha.
 2. O exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar sujeito a censura prévia, mas a responsabilidades ulteriores, que devem ser expressamente fixadas pela lei e ser necessárias para assegurar:
a. o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas; ou
b. a proteção da segurança nacional, da ordem pública, ou da saúde ou da moral públicas.
3. Não se pode restringir o direito de expressão por vias ou meios indiretos, tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de imprensa, de frequências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos usados na difusão de informação, nem por quaisquer outros meios destinados a obstar a comunicação e a circulação de ideias e opiniões.
4. A lei pode submeter os espetáculos públicos a censura prévia, com o objetivo exclusivo de regular o acesso a eles, para proteção moral da infância e da adolescência, sem prejuízo do disposto no inciso 2.
5. A lei deve proibir toda propaganda a favor da guerra, bem como toda apologia ao ódio nacional, racial ou religioso que constitua incitação à discriminação, à hostilidade, ao crime ou à violência.
 
Comissão Interamericana de Direitos Humanos: Há muitos anos, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) vem decidindo que a criminalização do desacato contraria o artigo 13 do Pacto de San José da Costa Rica. Em 1995, a Comissão afirmou que as leis de desacato se prestam ao abuso, como meio para silenciar ideias e opiniões consideradas incômodas pelo establishment, bem assim proporcionam maior nível de proteção aos agentes do Estado do que aos particulares, em contravenção aos princípios democrático e igualitário (CIDH, Relatório sobre a compatibilidade entre as leis de desacato e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, OEA/Ser. L/V/II.88, doc. 9 rev., 17 de fevereiro de 1995, 197-212). Em 2000, a CIDH aprovou a Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão, onde reafirmou sua posição sobre a invalidade da tipificação do desacato:
"11. Os funcionários públicos estão sujeitos a um maior controle por parte da sociedade. As leis que punem a manifestação ofensiva dirigida a funcionários públicos, geralmente conhecidas como 'leis de desacato', atentam contra a liberdade de expressão e o direito à informação."
Em suma, para a CIDH, as leis de desacato restringem indiretamente a liberdade de expressão, porque carregam consigo a ameaça do cárcere ou multas para aqueles que insultem ou ofendam um funcionário público. Por essa razão, este tipo penal (desacato) é inválido, por contrariar o artigo 13 da Convenção Americana de Direitos Humanos.
 
O STJ acolhe esta tese? O desacato deixou de ser crime no ordenamento jurídico brasileiro por força do Pacto de San Jose da Costa Rica? NÃO. O STJ, apreciando um caso envolvendo o art. 331 do Código Penal, decidiu que: 
Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela continua a ser crime, conforme previsto no art. 331 do Código Penal. STJ. 3ª S. HC 379.269-MS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Rel. para acórdão Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 24/5/17 (Info 607).
 
Desacato não viola a liberdade de expressão: A figura penal do desacato não prejudica a liberdade de expressão, pois não impede o cidadão de se manifestar, “desde que o faça com civilidade e educação”. A responsabilização penal por desacato existe para inibir excessos e constitui uma salvaguarda para os agentes públicos, expostos a todo tipo de ofensa no exercício de suas funções.
 
Descriminalizar o desacato não traria benefícios porque o fato constituiria injúria: A exclusão do desacato como tipo penal não traria benefício concreto para o julgamento dos casos de ofensas dirigidas a agentes públicos. Isso porque, com o fim do crime de desacato, as ofensas a agentes públicos passariam a ser tratadas pelos tribunais como injúria (art. 140 do CP), crime para o qual a lei já prevê um acréscimo de 1/3 da pena quando a vítima é servidor público (art. 141, II).
 
Corte IDH admite que excessos na liberdade de expressão sejam punidos: Apesar de a posição da Comissão Interamericana de Direitos Humanos ser contrária à criminalização do desacato, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão que efetivamente julga os casos envolvendo indivíduos e estados, já deixou claro em mais de um julgamento que o Direito Penal pode punir as condutas que representem excessos no exercício da liberdade de expressão. Assim, o Poder Judiciário brasileiro deve continuar a repudiar reações arbitrárias eventualmente adotadas por agentes públicos, punindo pelo crime de abuso de autoridade quem,no exercício de sua função, reagir de modo autoritário a críticas e opiniões que não constituam excesso intolerável do direito de livre manifestação do pensamento.
 
E o STF? O STF entendeu no mesmo sentido do STJ e decidiu que:
A norma do art. 331 do CP, que tipifica o crime de desacato, foi recepcionada pela Constituição de 1988. STF. Plenário. ADPF 496, Rel. Roberto Barroso, j. 22/06/20 (Info 992).
 
Natureza do Pacto de São José da Costa Rica: Os tratados de direitos humanos podem ser:
a) equivalentes às emendas constitucionais, se aprovados após a EC 45/2004 e conforme os requisitos do § 3º do art. 5º da CF/88; ou
b) supralegais, se aprovados antes da EC 45/2004 e sem os requisitos do § 3º do art. 5º da CF/88.
De toda forma, estando acima das normas infraconstitucionais, são também paradigma de controle da produção normativa. O Pacto de São José da Costa Rica possui, portanto, status supralegal, estando hierarquicamente acima das leis, mas abaixo da Constituição Federal.
 
Desacato não é incompatível com o Pacto de São José da Costa Rica: Ao se ler o Pacto de São José da Costa Rica não se identifica uma incompatibilidade do crime de desacato em relação a esse tratado. Assim, o tratado não revogou a norma penal, tendo havido a recepção do crime de desacato pela regra supralegal (Pacto de São José). O texto do Pacto dispõe que o exercício do direito à liberdade de pensamento e de expressão, embora não sujeito a censura prévia, deve assumir responsabilidades ulteriores, expressamente fixadas em lei, para assegurar o respeito aos direitos ou à reputação das demais pessoas. Portanto, o Pacto impõe sim limites à liberdade de expressão, não tendo havido descriminalização do crime de desacato ou “abolitio criminis”. A forma como a liberdade de expressão foi tratada no Pacto de São José é parecida com a disciplina dada pela Constituição Federal ao tema, sendo que esse direito não possui caráter absoluto. Vale ressaltar que a Constituição, ao tutelar a honra, a intimidade e a dignidade da pessoa humana, também recepcionou o crime de desacato na forma como prevista em nossa legislação penal.
 
Direito à liberdade de expressão não é absoluto: O direito à liberdade de expressão deve harmonizar-se com os demais direitos envolvidos, não eliminá-los. Incide o princípio da concordância prática, pelo qual o intérprete deve buscar a conciliação entre normas constitucionais. O exercício abusivo das liberdades públicas não se coaduna com o Estado democrático. A ninguém é lícito usar sua liberdade de expressão para ofender a honra alheia. O desacato constitui importante instrumento de preservação da lisura da função pública e, indiretamente, da dignidade de quem a exerce. Não se pode despojar a pessoa de um dos mais delicados valores constitucionais, a dignidade da pessoa humana, em razão do “status” de funcionário público (civil ou militar). O fato de o indivíduo ter se investido em uma função pública não significa que ele tenha renunciado à sua honra e à sua dignidade.
 
Corte Interamericana de Direitos Humanos: Vale ressaltar que a Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão responsável pelo julgamento de situações concretas de abusos e violações de direitos humanos, tem, reiteradamente, decidido contrariamente ao entendimento da Comissão de Direitos Humanos, estabelecendo que o direito penal pode sim punir condutas excessivas no exercício da liberdade de expressão.
 
Desacato não tolhe a liberdade de expressão: A figura penal do desacato não tolhe o direito à liberdade de expressão, não retirando da cidadania o direito à livre manifestação, desde que exercida nos limites de marcos civilizatórios bem definidos, punindo-se os excessos. A Constituição impõe à Administração a observância dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, podendo-se dessumir daí a compatibilidade entre a defesa da honra e intimidade do funcionário público e a liberdade de expressão.
 
Não se aplica a teoria da adequação social: Não se pode aplicar ao caso o princípio da adequação social. O princípio da adequação social, desenvolvido por Hanz Welzel, afasta a tipicidade dos comportamentos que são aceitos e considerados adequados ao convívio social. De acordo com o referido princípio, os costumes aceitos por toda a sociedade afastam a tipicidade material de determinados fatos que, embora possam se subsumir a algum tipo penal, não caracterizam crime justamente por estarem de acordo com a ordem social em um determinado momento histórico. Havendo lei, ainda que deficitária, punindo o abuso de autoridade, pode-se afirmar que a criminalização do desacato se mostra ainda compatível com o Estado democrático.
29.2. Desacato continua sendo crime – (Info 894)
		O crime de desacato é compatível com a Constituição Federal e com o Pacto de São José da Costa Rica.
A figura penal do desacato não tolhe o direito à liberdade de expressão, não retirando da cidadania o direito à livre manifestação, desde que exercida nos limites de marcos civilizatórios bem definidos, punindo-se os excessos.
STF. 2ª T. HC 141949/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13/3/18 (Info 894).
Desacatar funcionário público no exercício da função ou em razão dela continua a ser crime, conforme previsto no art. 331 do Código Penal.
STJ. 3ª Seção. HC 379.269-MS, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Rel. para acórdão Min. Antônio Saldanha Palheiro, j. 24/5/17 (Info 607).
30. CRIMES CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 
30.1. CORRUPÇÃO PASSIVA: Deputado Federal que recebe propina para apoiar permanência de diretor de estatal comete crime de corrupção passiva – (Info 955) – (Anal. Judic./TREPA-2020)
		É possível que se configure o crime de corrupção passiva (art. 317 do CP) na conduta de Deputado Federal (líder do seu partido) que receba vantagem indevida para dar sustentação política e apoiar a permanência de determinada pessoa no cargo de Presidente de empresa pública federal.
STF. 1ª T. Inq 3515/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 8/10/19 (Info 955).
	(Anal. Judic./TREPA-2020-IBFC): Considere o posicionamento do STF em relação às disposições do Código Penal e demais leis extravagantes para assinalar a alternativa correta: É possível que se configure o crime de corrupção passiva (art. 317 do CP) na conduta de Deputado Federal (líder do seu partido) que receba vantagem indevida para dar sustentação política e apoiar a permanência de determinada pessoa no cargo de Presidente de empresa pública federal. BL: Info 955, STF.
30.2. TRÁFICO DE INFLUÊNCIA: Mero fato de o Ministro ter pedido vista do processo sem saber que estava impedido, devolvendo na sessão seguinte e declarando seu impedimento, não configura indício de que ele tenha praticado tráfico de influência (art. 332, caput, do Código Penal) – (Info 951)
		O Procurador-Geral da República ofereceu denúncia contra um Ministro do TCU pela prática do crime de tráfico de influência (art. 332, caput, do Código Penal).
Segundo a denúncia, o filho do Ministro, em nome do pai, recebeu pagamento (“propina”) de um empreiteiro, sob o pretexto de que iria influenciar em um processo que estava em curso no TCU e no qual se analisava uma licitação fraudulenta, vencida pela empresa do empreiteiro.
Para o PGR, o Ministro do TCU teria demonstrado ao empreiteiro que poderia influenciar no trâmite do caso ao pedir vista do processo. Na sessão seguinte do TCU, ele devolveu os autos e declarou seu impedimento para atuar no feito.
O colegiado considerou não haver, em relação ao Ministro, lastro probatório mínimo, consistente em conjunto de evidências seguro e idôneo capaz de demonstrar a materialidade do crime e indícios razoáveis de autoria.
O cerne da imputação formulada contra o Ministro decorre, essencialmente, do fato de ele ter pedido vista de um processo, com a suposta intenção deliberada de postergar o julgamento, apesar de já saber que estaria impedido de atuar no feito. Ocorre que, desde a primeira vez em que o processo foi inserido na pauta de julgamento no TCU até a ocasião do pedido de vistapelo denunciado, transcorreram quase cinco meses, com diversos adiamentos e retiradas, mas nenhuma delas por ato do Ministro acusado.
Além disso, na sessão em que ele solicitou vista, por equívoco, não foi registrado impedimento ou suspeição do Ministro no sistema. Vale ressaltar também que não houve nem mesmo advertência quanto ao pedido de vista do denunciado pelos demais Ministros do TCU, advogados, partes, pelo secretário da sessão ou, até mesmo, pelo representante do MP que atua no TCU. Essa circunstância revela a ausência de conhecimento geral sobre o mencionado impedimento e a eventual irregularidade do ato praticado pelo Ministro. 
Em razão disso, mostra-se crível a versão do acusado no sentido de que foi levado a acreditar que se encontrava plenamente apto a participar do referido julgamento e, assim, desempenhar as funções e prerrogativas inerentes ao cargo, dentre elas a de pedir vista regimental para melhor estudar os casos em julgamento. 
O Ministro devolveu os autos após quatorze dias e declarou-se impedido, não tendo participado da discussão ou votação do processo em análise.
STF. 1ª T. Inq 4075/DF, rel orig. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Ricardo Lewandowski, j. 10/9/19 (Info 951).
30.3. CRIMES FUNCIONAIS: Causa de aumento do art. 327, § 2º, do CP não se aplica para autarquias – (Info 950) – IMPORTANTE!!! – (Anal. Judic./TREPA-2020)
		A causa de aumento prevista no § 2º do art. 327 do Código Penal não pode ser aplicada aos dirigentes de autarquias (ex: a maioria dos Detrans) porque esse dispositivo menciona apenas órgãos, sociedades de economia mista, empresas públicas e fundações.
STF. 2ª T. AO 2093/RN, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 3/9/2019 (Info 950).
	(Anal. Judic./TREPA-2020-IBFC): Considere o posicionamento do STF em relação às disposições do Código Penal e demais leis extravagantes para assinalar a alternativa correta: A causa de aumento prevista no § 2º do art. 327 do Código Penal, incidente nos crimes praticados por funcionário público contra a Administração em geral, quando os autores forem ocupantes de cargos em comissão, função de direção ou assessoramento, não pode ser aplicada aos dirigentes de autarquias. BL: Info 950, STF.
	OBS: O Detran/RN é uma autarquia e, portanto, não se encontra no rol previsto no art. 327, § 2º, do CP, que prevê aumento de pena quando o autor do crime for ocupante de cargo em comissão ou de função de direção ou assessoramento de...
• órgão da administração direta;
• sociedade de economia mista;
• empresa pública ou
• fundação.
Repare, portanto, que o dispositivo não fala em autarquia.
30.4. CONTRABANDO: A importação de arma de pressão por ação de gás comprimido, ainda que de calibre inferior a 6 mm, configura o crime de contrabando, sendo inaplicável o princípio da insignificância – (Info 939) – IMPORTANTE!!!
		A importação de arma de ar comprimido configura CONTRABANDO (e não descaminho) a conduta de importar, à margem da disciplina legal, arma de pressão por ação de gás comprimido ou por ação de mola, ainda que se trate de artefato de calibre inferior a 6 mm.
A importação de arma de pressão está sujeita à autorização prévia da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados do Exército Brasileiro, e só pode ser feita por colecionadores, atiradores e caçadores registrados no Exército. Além disso, deve se submeter às normas de desembaraço alfandegário previstas no Regulamento para a Fiscalização de Produtos Controlados.
Logo, trata-se de mercadoria de proibição relativa, sendo a sua importação fiscalizada não apenas por questões de ordem tributária, mas outros interesses ligados à segurança pública.
Não é possível aplicar o princípio da insignificância, já que este postulado é incabível para contrabando.
STJ. 5ª T. REsp 1428628/RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, j. 28/04/15.
STJ. 6ª T. REsp 1.427.796-RS, Rel. Min. Maria Thereza De Assis Moura, j. 14/10/14 (Info 551).
STF. 2ª T. HC 131943/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, red. p/ o ac. Min. Edson Fachin, j. 7/5/19 (Info 939).
30.5. CRIMES FUNCIONAIS: Diretor de organização social é considerado funcionário público por equiparação para fins penais – (Info 915) – IMPORTANTE!!!
		O diretor de organização social pode ser considerado funcionário público por equiparação para fins penais (art. 327, § 1º do CP). Isso porque as organizações sociais que celebram contratos de gestão com o Poder Público devem ser consideradas “entidades paraestatais”, nos termos do art. 327, § 1º do CP.
STF. 1ª Turma. HC 138484/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 11/9/18 (Info 915).
	OBS:
ORGANIZAÇÕES SOCIAIS
O que são as organizações sociais? São pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, prestadoras de atividades de interesse público e que, por terem preenchido determinados requisitos previstos na Lei 9.637/98, recebem a qualificação (título, selo) de “organização social”. A pessoa jurídica, depois de obter esse título de “organização social”, poderá celebrar com o Poder Público um instrumento chamado de “contrato de gestão” por meio do qual receberá incentivos públicos para continuar realizando suas atividades. As regras relacionadas com as organizações sociais estão previstas na Lei nº 9.637/98. Veja o que diz o art. 1º:
Art. 1º O Poder Executivo poderá qualificar como organizações sociais pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, cujas atividades sejam dirigidas ao ensino, à pesquisa científica, ao desenvolvimento tecnológico, à proteção e preservação do meio ambiente, à cultura e à saúde, atendidos aos requisitos previstos nesta Lei.
 
Quem concede a qualificação de OS? O Ministro do Planejamento em conjunto com o Ministro da área na qual atua a pessoa jurídica que pretende a qualificação de OS. Ex: se essa pessoa jurídica desempenha funções na área de educação, quem concederá será o Ministro da Educação em conjunto com o Ministro do Planejamento.
 
O que é o contrato de gestão? Contrato de gestão é o instrumento firmado entre o Poder Público e a entidade qualificada como organização social, com o objetivo de que, a partir daí, seja formada uma parceria entre eles para fomento e execução das atividades que uma OS faz (ensino, pesquisa científica etc.). No contrato de gestão serão listadas as atribuições, responsabilidades e obrigações do Poder Público e da organização social. O contrato de gestão deve ser submetido ao Ministro de Estado da área correspondente à atividade fomentada. Ex: se a OS desenvolve atividades de saúde, quem aprovará o contrato será o Ministro da Saúde.
Obs.1: apesar de a lei dizer que esse ajuste é um “contrato”, a doutrina critica a nomenclatura e afirma que, na verdade, o melhor seria chamá-lo de convênio, termo de colaboração ou termo de fomento. Isso porque no contrato existem interesses opostos e, nessa relação da OS com o Poder Público, os objetivos são os mesmos, são convergentes.
Obs.2: os responsáveis pela fiscalização do contrato de gestão, ao tomarem conhecimento de qualquer irregularidade ou ilegalidade na utilização de recursos ou bens de origem pública por organização social, deverão comunicar o Tribunal de Contas da União, sob pena de responsabilidade solidária.
 
As organizações sociais que celebrarem contrato de gestão com o Poder Público passam a ser consideradas entidades da Administração Pública? NÃO. Mesmo tendo celebrado contrato de gestão, continuam sendo entidades paraestatais (não estatais).
 
As organizações sociais que celebrarem contrato de gestão com o Poder Público podem ser consideradas delegatárias de serviços públicos? NÃO. As organizações sociais exercem, em nome próprio, serviços públicos, mas não são consideradas delegatárias, tendo em vista que não recebem uma concessão ou permissão de serviço do Poder Público. Os setores de saúde, educação, cultura, desporto e lazer, ciência e tecnologia e meio ambiente são classificados como serviços públicos sociais. Segundo a CF/88, tais serviços devem ser desempenhados não apenas pelo Estado, como também pela sociedade (são “deveres do Estado e da Sociedade”).Assim, é permitida a atuação, por direito próprio, dos particulares, sem que para tanto seja necessária a delegação pelo Poder Público. Não se aplica, portanto, o art. 175, “caput”, da CF/88 às atividades desenvolvidas pelas organizações sociais.
 
Quais são os incentivos que uma OS recebe do Poder Público? As organizações sociais poderão receber os seguintes incentivos para cumprir o contrato de gestão:
a) Recursos orçamentários: podem receber “dinheiro público”;
b) Cessão de bens públicos, mediante permissão de uso, dispensada licitação: podem receber, sem licitação, bens públicos para serem usados em suas atividades;
c) Cessão especial de servidor, com ônus para o órgão de origem do servidor cedido: servidores públicos podem ser colocados à disposição das organizações sociais para lá trabalharem, continuando recebendo sua remuneração dos cofres públicos;
d) Contratadas sem licitação: as organizações sociais podem ser contratadas, com dispensa de licitação, para prestarem serviço a órgãos e entidades da Administração Pública, recebendo por isso (art. 24, XXIV, da Lei nº 8.666/93). Desse modo, quando a Administração contratar serviços a serem prestados pelas organizações sociais, está dispensada de realizar licitação, desde que aquela atividade esteja prevista no contrato de gestão.
 
CONCEITO DE FUNCIONÁRIO PÚBLICO PARA EFEITOS PENAIS: O CP prevê diversos crimes que são praticados por “funcionários públicos” contra a Administração em geral (arts. 312 a 326). Repare que o CP utilizou a nomenclatura “funcionário público” e não “servidor público” ou “agente público”, expressões que são atualmente preferidas pelo Direito Administrativo. A fim de que não houvesse muita dúvida sobre o que é funcionário público, o Código Penal resolveu conceituar essa expressão no art. 327. No caput, há o conceito padrão de funcionário público e, no § 1º, o chamado “funcionário público por equiparação”:
Funcionário público
Art. 327. Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. (...)
 
Imagine agora a seguinte situação hipotética: O “Instituto de Solidariedade” é uma organização social que celebrou contrato de gestão com a Administração Pública do Distrito Federal. João é diretor do Instituto de Solidariedade. A referida organização social recebeu R$ 300 mil do Governo do DF para prestar serviços de assistência social a pessoas carentes. Ocorre que João desviou parte dessa quantia em proveito próprio. Diante disso, o Ministério Público denunciou o agente pela prática de peculato-desvio, delito tipificado no art. 312 do CP:
Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:
Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.
 
Segundo o Parquet, João deveria ser considerado funcionário público por equiparação, nos termos do art. 327, § 1º do CP. A defesa do réu refutou essa afirmação e alegou que João não poderia ser enquadrado no art. 327, § 1º, porque ele era diretor em um instituto que possui natureza jurídica de “organização social” e as organizações sociais não fazem parte da Administração Pública nem podem ser consideradas entidades paraestatais. Para a defesa, o conceito de entidade paraestatal deve ser interpretado conforme o art. 84, § 1º, da Lei nº 8.666/93, o qual não inclui as organizações sociais:
Art. 84. Considera-se servidor público, para os fins desta Lei, aquele que exerce, mesmo que transitoriamente ou sem remuneração, cargo, função ou emprego público.
§ 1º Equipara-se a servidor público, para os fins desta Lei, quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, assim consideradas, além das fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista, as demais entidades sob controle, direto ou indireto, do Poder Público. (...)
 
Qual das duas argumentações foi acolhida pelo STF? João pode ser considerado funcionário público por equiparação, nos termos do art. 327, § 1º do CP? SIM. O STF acolheu a tese do MP.
 
Organizações sociais que celebram contratos de gestão são consideradas entidades paraestatais: O STF, adotando lição da Prof. Maria Sylvia Zanella Di Pietro, entendeu que as organizações sociais que celebram contratos de gestão devem ser consideradas “entidades paraestatais”:
“(...) Exatamente por atuarem ao lado do Estado e terem com ele algum tipo de vínculo jurídico, recebem a denominação de entidades paraestatais; nessa expressão podem ser incluídas todas as entidades integrantes do chamado terceiro setor, o que abrange as declaradas de utilidade pública, as que recebem certificado de fins filantrópicos, os serviços sociais autônomos (como Sesi, Sesc, Senai), os entes de apoio, as organizações sociais e as organizações de sociedade civil de interesse público.” (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 27ª ed. Atlas: São Paulo, 2014. p. 566-567).
 
Luiz Régis Prado posiciona-se no mesmo sentido:
“Entidades paraestatais são pessoas jurídicas de direito privado, instituídas por lei, ‘para realização de atividades, obras, serviços de interesse coletivo, sob normas e controle do Estado’. Inserem-se como modalidades de entidades paraestatais as empresas públicas, as sociedades de economia mista, os serviços sociais autônomos e modernamente o que se denomina ‘terceiro setor’ (entes da sociedade civil de fins públicos e não lucrativos).” (PRADO, Luiz Régis. Comentários ao código penal: jurisprudência. Conexões lógicas com os vários ramos do direito. 11.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p. 863).
 
Mas e o art. 84, § 1º, da Lei nº 8.666/93...? Não importa para nada aqui. O art. 84, § 1º, da Lei nº 8.666/93 tem influência, ou seja, repercute no âmbito administrativo, mas não constitui parâmetro interpretativo para os crimes definidos no Código Penal. Para os crimes funcionais, o Código Penal traz uma regra específica no art. 327. Vale ressaltar que o legislador fez questão de fornecer, no Código Penal, um conceito mais amplo do que o utilizado no Direito Administrativo. Assim, o conceito de funcionário público previsto no art. 327 do CP não se confunde com as definições próprias do direito administrativo. O caput do dispositivo, que serve como referencial interpretativo dos parágrafos, estabelece que o conceito de funcionário público agasalhado pelo estatuto é “para os efeitos penais”. Além disso, o título é mais abrangente do que o geralmente adotado no âmbito do direito administrativo, pois abarca funções temporárias e não remuneradas. Trata-se, portanto, de um conceito instrumental concebido pelo legislador unicamente para fins de aplicação da lei penal. A figura equiparada do § 1º é ainda mais ampla. Considera-se funcionário público, para fins penais, quem exerce cargo, emprego ou função em entidade parestatal. Recebe igualmente essa qualificação “quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública”. Os requisitos não são cumulativos, e sim, disjuntivos. Isso quer dizer que a acusação não precisa comprovar que a entidade paraestatal executa atividade típica da Administração Pública.
O art. 327, § 1º, é exemplo de norma penal em branco? NÃO. O art. 327, tanto no caput como no § 1º, não pode ser considerado como norma penal em branco. Não é necessário buscar seu complemento em outro ato normativo. Na verdade, o art. 327 do CP é uma norma interpretativa.
 
VAMOS AGORA REVISAR
SÃO CONSIDERADOS “FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS” PARA FINS PENAIS:
Diretor de organização social: O diretor de organização social pode ser considerado funcionário público por equiparação para fins penais (art. 327, § 1º do CP). As organizaçõessociais que celebram contratos de gestão com o Poder Público são consideradas “entidades paraestatais”. STF. 1ª Turma. HC 138484/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 11/9/2018(Info 915).
 
Administrador de Loteria: Administrador de Loteria é equiparado a funcionário público para fins penais porque a Loteria executa atividade típica da Administração Pública que lhe foi delegada por regime de permissão. STJ. 5ª Turma. AREsp 679.651/RJ, Rel. Min. Joel Ilan Paciornik, julgado em 11/09/2018.
 
Advogados dativos: O advogado que, por força de convênio celebrado com o Poder Público, atua de forma remunerada em defesa dos hipossuficientes agraciados com o benefício da assistência judiciária gratuita, enquadra-se no conceito de funcionário público para fins penais. Sendo equiparado a funcionário público, é possível que responda por corrupção passiva (art. 317 do CP). STJ. 5ª Turma. HC 264.459-SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 10/3/2016 (Info 579).
 
Médico de hospital particular credenciado/conveniado ao SUS (após a Lei 9.983/2000): Depois da Lei nº 9.983/2000, que alterou o § 1º do art. 327 do CP, o médico credenciado ao SUS pode ser equiparado a funcionário público para efeitos penais. Vale ressaltar, no entanto, que a Lei nº 9.983/2000 não pode retroceder alcançar situações praticadas antes de sua vigência. STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1101423/RS, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 06/11/2012.
 
Estagiário de órgão ou entidade públicos: Estagiário de órgão público que, valendo-se das prerrogativas de sua função, apropria-se de valores subtraídos do programa bolsa-família subsume-se perfeitamente ao tipo penal descrito no art. 312, § 1º, do Código Penal (peculato-furto), porquanto estagiário de empresa pública ou de entidades congêneres se equipara, para fins penais, a servidor ou funcionário público, em decorrência do disposto no art. 327, § 1º, do Código Penal. STJ. 6ª Turma. REsp 1303748/AC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 25/06/2012.
 
Cuidado. Depositário judicial NÃO é considerado funcionário público: Depositário judicial não é funcionário público para fins penais, porque não ocupa cargo público, mas a ele é atribuído um munus, pelo juízo, em razão do fato de que determinados bens ficam sob sua guarda e zelo. STJ. 6ª T. HC 402.949-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 13/03/2018 (Info 623).
30.6. Receber propina sob o disfarce de doações eleitorais oficiais e tipificação penal – (Info 856)
		Determinado Senador solicitou e recebeu de uma construtora R$ 500 mil, valor destinado à sua campanha política. A quantia foi repassada pela construtora não diretamente ao Senador, mas sim ao partido político, como se fossem doações eleitorais oficiais. Ao pedir o valor, o Senador teria se comprometido com a construtora a manter João como Diretor da Petrobrás.
Isso era de interesse da construtora porque João, em nome da estatal, celebrava contratos fraudulentos com a empresa. O Senador foi reeleito e, com sua influência decorrente do cargo, conseguiu manter João na Diretoria.
Em um juízo preliminar, para fins de recebimento da denúncia, o STF entendeu que a conduta do Senador, em tese, configura a prática dos seguintes crimes:
· Corrupção passiva (art. 317, caput e § 1º, do CP);
· Lavagem de dinheiro (art. 1º, caput, da Lei nº 9.613/98).
STF. 2ª Turma. Inq 3982/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 7/3/2017 (Info 856).
	OBS:
Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
§ 1º A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.
Segundo entendeu o STF, o repasse de propina ao parlamentar teve por finalidade a manutenção do Diretor no cargo, fosse pela não interferência nessa nomeação e no funcionamento do esquema criminoso, fosse pelo apoio político, para sua sustentação, por parte do parlamentar, forte candidato à reeleição e nome de relevo de partido político, agremiação partidária da base do Governo Federal e uma das responsáveis pela Diretoria de Abastecimento da estatal.
A propina foi paga sob o disfarce de doações eleitorais “oficiais” realizadas por empresa empreiteira que fazia parte do esquema criminoso em questão em favor do diretório estadual do partido do parlamentar.
Os Ministros entenderam que havia indícios suficientes para o recebimento da denúncia.
Se condenado, o Senador poderá receber a causa de aumento de pena prevista no art. 327, § 2º do CP? NÃO. O § 2º do art. 327 do CP prevê:
Art. 327 (...)
§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.
Conforme a jurisprudência pacífica do STF:
O simples fato de o réu exercer um mandato popular não é suficiente para fazer incidir a causa de aumento do art. 327, § 2º, do CP. É necessário que ele ocupe uma posição de superior hierárquico (o STF chama de "imposição hierárquica").
STF. 2ª T. Inq 3982/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 7/3/2017 (Info 856).
No caso concreto, o Senador não exercia função de superior hierárquico na Petrobrás, de forma que não se deve aplicar a referida causa de aumento.
30.7. Empréstimos consignados retidos pelo Município e dinheiro utilizado para pagamento de despesas da Administração, sem repasse ao banco mutuante – (Info 826)
		Diversos servidores municipais tinham empréstimos consignados cujos valores eram descontados da folha de pagamento. O Prefeito ordenou que fosse feita a retenção, mas que tais valores não fossem repassados à instituição e sim gastos com o pagamento de despesas do Município. Isso foi feito no último ano do mandato do Prefeito, quando não havia mais recursos para pagar o banco, o que só foi feito no mandato seguinte. 
O STF entendeu que, nesta situação, restou configurada a prática de dois delitos: arts. 312 e 359-C do Código Penal. 
STF. 1ª Turma. AP 916/AP, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 17/5/16 (Info 826).
	OBS:
Peculato-desvio, delito previsto no art. 312 do CP e também do art. 359-C do CP:
Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:
Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.
Art. 359-C. Ordenar ou autorizar a assunção de obrigação, nos dois últimos quadrimestres do último ano do mandato ou legislatura, cuja despesa não possa ser paga no mesmo exercício financeiro ou, caso reste parcela a ser paga no exercício seguinte, que não tenha contrapartida suficiente de disponibilidade de caixa:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.
30.8. CRIMES FUNCIONAIS: Causa de aumento do art. 327, § 2º, do CP – (Info 816)
		O simples fato de o réu exercer um mandato popular não é suficiente para fazer incidir a causa de aumento do art. 327, § 2º, do CP. É necessário que ele ocupe uma posição de superior hierárquico (o STF chamou de "imposição hierárquica"). 
STF. Plenário. Inq 3983/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 02 e 03/03/2016 (Info 816).
30.9. Desvio de recursos de convênio e sua aplicação em finalidade diversa – (Info 813)
		Secretária de Estado que desvia verbas de convênio federal que tinha destinação específica e as utiliza para pagamento da folha de servidores não pratica o crime de peculato (art. 312 do CP), mas sim o delito de emprego irregular de verbas ou rendas públicas (art. 315).STF. 2ª Turma. Inq 3731/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 2/2/2016 (Info 813).
	OBS: A 2ª Turma do STF rejeitou a alegação de prática de peculato, uma vez que os recursos desviados foram incorporados ao Tesouro estadual, não havendo utilização em proveito próprio ou alheio. O STF reconheceu que a conduta da Secretária amolda-se, em tese, ao crime do art. 315 do CP. No caso concreto, contudo, já havia ocorrido a prescrição quanto ao delito do art. 315 do CP.
30.10. CRIMES FUNCIONAIS: Causa de aumento do art. 327, § 2º do CP – (Info 757)
		A causa de aumento de pena prevista no § 2º do art. 327 do CP aplica-se ao Chefe do Poder Executivo (ex: Governador do Estado) e aos demais agentes políticos. 
STF. Plenário. Inq 2606/MT, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 4/9/2014 (Info 757).
	OBS:
Essa causa de aumento aplica-se também para agentes políticos detentores de mandato eletivo? SIM. É o caso, por exemplo, de um Governador do Estado que, valendo-se de seu cargo, pratique crime contra a Administração Pública. Como ele desempenha uma função de direção do Estado, contra ele incidirá a causa de aumento do § 2º do art. 327 do CP. 
30.11. CRIMES FUNCIONAIS: CAUSA DE AUMENTO DO ART. 327, §2º: Agentes detentores de mandato eletivo (agentes políticos)
		A causa de aumento prevista no § 2º do art. 327 do CP é aplicada aos agentes detentores de mandato eletivo (agentes políticos).
STF. 2ª Turma. RHC 110513/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 29/5/2012.
31. CRIMES CONTRA AS FINANÇAS PÚBLICAS 
31.1. Ordenação de despesa não autorizada (art. 359-D do CP) – (Info 760)
		O art. 359-D do CP prevê, como crime, ordenar despesa não autorizada por lei. Não comete esse delito o Governador do Estado que faz o remanejamento das verbas destinadas aos precatórios para outras despesas do Poder Judiciário se a legislação estadual dava margem para intepretações de que isso seria permitido. 
STF. 1ª Turma. Inq 3393/PB, Rel. Min. Luiz Fux, j. 23/9/2014 (Info 760).
32. LEI DE DROGAS 
32.1. A habitualidade no crime e o pertencimento a organizações criminosas deverão ser comprovados pela acusação, não sendo possível que o benefício do tráfico privilegiado (art. 33, § 4º) seja afastado por simples presunção – (Info 958) – IMPORTANTE!!!
		A Lei de Drogas prevê, em seu art. 33, § 4º, a figura do “traficante privilegiado”, também chamada de “traficância menor” ou “traficância eventual”: 
§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.
A habitualidade no crime e o pertencimento a organizações criminosas deverão ser comprovados pela acusação, não sendo possível que o benefício seja afastado por simples presunção. Assim, se não houver prova nesse sentido, o condenado fará jus à redução da pena. 
A quantidade e a natureza são circunstâncias que, apesar de configurarem elementos determinantes na definição do quanto haverá de diminuição, não são elementos que, por si sós, possam indicar o envolvimento com o crime organizado ou a dedicação a atividades criminosas.
Vale ressaltar, por fim, que é possível a aplicação deste benefício mesmo para condenados por tráfico transnacional de drogas.
STF. 2ª T. HC 152001 AgR/MT, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, j. 29/10/19 (Info 958).
32.2. Não é possível a fixação de regime de cumprimento de pena fechado ou semiaberto para crime de tráfico privilegiado de drogas sem a devida justificação – (Info 945) – (TJBA-2019)
		Não é possível a fixação de regime de cumprimento de pena fechado ou semiaberto para crime de tráfico privilegiado de drogas sem a devida justificação.
Não se admite a fixação automática do regime fechado ou semiaberto pelo simples fato de ser tráfico de drogas.
Não se admite, portanto, que o regime semiaberto tenha sido fixado utilizando-se como único fundamento o fato de ser crime de tráfico, não obstante se tratar de tráfico privilegiado e ser o réu primário, com bons antecedentes. 
A gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para justificar a fixação do regime mais gravoso.
STF. 1ª T. HC 163231/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 25/6/19 (Info 945).
32.3. Atipicidade da importação de pequena quantidade de sementes de maconha – (Info 915) – IMPORTANTE!!!
		Não configura crime a importação de pequena quantidade de sementes de maconha.
STF. 2ª Turma. HC 144161/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 11/9/18 (Info 915).
	OBS:
Imagine a seguinte situação hipotética: João, por meio de um site da internet, importou da Holanda para o Brasil 26 frutos aquênios, popularmente conhecidos como “sementes” de maconha (cannabis sativa linneu). Quando as sementes chegaram ao Brasil, via postal, o pacote foi inspecionado pelo setor de Alfândega da Receita Federal no aeroporto, que descobriu seu conteúdo por meio da máquina de raio-X e avisou a Polícia Federal. Diante disso, João foi denunciado pelo MPF pela prática de tráfico transnacional de drogas (art. 33 c/c art. 40, I, ambos da Lei 11.343/06). O Procurador da República argumentou que, pela grande quantidade de sementes encomendadas e pela própria palavra do denunciado, restou demonstrado que ele pretendia iniciar uma plantação de cannabis sativa (maconha) em seu quintal.
 
A questão chegou até o STF. Houve crime? NÃO. O STF entende que não há crime na importação de sementes de maconha. Vamos entender com calma.
 
O que é considerado “droga” para fins penais? O parágrafo único do art. 1º da Lei 11.343/06 prevê que, para uma substância ser considerada como "droga", é necessário que possa causar dependência, sendo isso definido em uma lista a ser elencada em lei ou ato do Poder Executivo federal. Veja:
Art. 1º (...) Parágrafo único.  Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo da União.
 
O art. 66 da mesma Lei complementa esta regra:
Art. 66. Para fins do disposto no parágrafo único do art. 1º desta Lei, até que seja atualizada a terminologia da lista mencionada no preceito, denominam-se drogas substâncias entorpecentes, psicotrópicas, precursoras e outras sob controle especial, da Portaria SVS/MS nº 344, de 12 de maio de 1998.
 
Assim, o conceito é técnico-jurídico e só será considerada droga o que a lei (em sentido amplo) assim reconhecer como tal. Mesmo que determinada substância cause dependência física ou psíquica, se ela não estiver prevista no rol das substâncias legalmente proibidas, ela não será tratada como droga para fins de incidência da Lei nº 11.343/2006 (ex: álcool).
 
Este rol existe? Onde ele está previsto? O rol das substâncias que são consideradas como “droga”, para fins penais, continua previsto na Portaria SVS/MS nº 344/1998, considerando que ainda não foi editada uma nova lista. Perceba, portanto, que estamos diante de uma norma penal em branco heterogênea (em sentido estrito ou heteróloga). Isso porque o complemento do que é considerado droga é fornecido por um ato normativo elaborado por órgão diverso daquele que editou a Lei. A Lei 11.343/06 foi editada pelo Congresso Nacional e o seu complemento é dado por uma portaria, editada pela ANVISA, autarquia ligada ao Poder Executivo.
 
Tetrahidrocanabinol (THC): Tetrahidrocanabinol, também conhecido como THC, é uma substância psicoativa encontrada na planta Cannabis Sativa, mais popularmente conhecida como maconha. A quantidade de THC na maconha pode variar de acordo com uma série de fatores, como o tipo de solo, a estação do ano, a época em que foi colhida, o tempo de colheita e consumo etc. A THC é prevista expressamente como droga na Portaria SVS/MS nº 344/1998, da ANVISA.
 
Sementes de maconha não têm THC: Os frutos aquênios da cannabissativa linneu não apresentam na sua composição o THC. A planta da cannabis sativa linneu está prevista na lista “E” da Portaria SVS/MS 344/1998. Ocorre que essa Portaria prevê apenas a planta como sendo droga (e não a sua semente). Assim, a semente de maconha não pode ser considerada droga.
 
O § 1º do art. 33 da LD prevê que também é crime a importação de “matéria-prima” ou “insumo” destinado à preparação de drogas. A semente de maconha poderia ser considerada como “matéria-prima” ou “insumo” destinado à preparação de drogas? Também não. A semente de maconha não pode ser considerada matéria-prima ou insumo destinado à preparação de drogas. Isso porque ela não é um “ingrediente” para a confecção de drogas. Não se faz droga misturando a semente de maconha com qualquer coisa. Dito de outro modo: não se prepara droga com semente de maconha. Isso porque a semente de maconha não tem substância psicoativa (ela não tem nada em sua composição que atue no sistema nervoso central gerando euforia, mudança de humor, prazer etc.). Em seu voto, o Ministro Gilmar Mendes assentou:
“Na doutrina, afirma-se que a matéria-prima, conforme Vicente Greco Filho e João Daniel Rassi, é a substância de que podem ser extraídos ou produzidos os entorpecentes que causem dependência física ou psíquica (GRECO FILHO, Vicente; RASSI, João Daniel. Lei de drogas anotada. 3ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 99). Ou seja, a matéria-prima ou insumo devem ter condições e qualidades químicas para, mediante transformação ou adição, por exemplo, produzirem a droga ilícita, o que não é o caso das sementes da planta Cannabis sativa, que não possuem a substância psicoativa (THC)”.
 
Desse modo, a semente da cannabis sativa não é, em si, droga (não está listada na Portaria) e também não pode ser considerada matéria-prima ou insumo destinado à preparação de droga ilícita.
 
Mas é possível que o indivíduo plante a semente de maconha e que daí nasça a planta da cannabis sativa linneu... A planta tem THC (substância psicoativa proibida)...: É verdade. Pode ser que o indivíduo germine a semente, que isso vire uma muda, que ele cultive a muda e que se torne a planta da maconha. No entanto, a mera importação da semente não é crime algum porque configuraria, no máximo, mero ato preparatório da figura típica prevista no § 1º do art. 28 da Lei nº 11.343/2006:
Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
§ 1º Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica. (...)
 
Nem chega a ser, portanto, ato executório do § 1º do art. 28 porque o agente não iniciou a semeadura ou o cultivo.
 
A importação das sementes não poderia configurar a tentativa da prática do crime do art. 28, § 1º da Lei nº 11.343/2006? Particularmente, penso que não. Isso porque, como já dito, o agente não iniciou nenhuma conduta executória dos verbos previstos no tipo penal (semear, cultivar ou colher). No entanto, ainda que se considere que se iniciou a execução e que ele não se consumou por circunstâncias alheias à vontade do agente, não há razão para a instauração de processo penal. O preceito secundário do art. 28 da LD prevê como sanções penais:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo.
 
Logo, como não é prevista pena privativa de liberdade para esta conduta, é inviável a aplicação da regra da tentativa do art. 14, II, do CP.
 
A conduta pode ser considerada contrabando (art. 334-A do CP)? Existe divergência sobre o tema. O contrabando consiste na importação de mercadoria proibida (art. 334-A do CP). A importação de sementes desprovidas de inscrição no Registro Nacional de Cultivares é proibida pelo art. 34 da Lei nº 10.711/2003:
Art. 34. Somente poderão ser importadas sementes ou mudas de cultivares inscritas no Registro Nacional de Cultivares.
 
A semente de cannabis sativa não consta da lista do Registro Nacional de Cultivares (RNC), não podendo, portanto, ser importada, salvo para tratamentos de saúde (Portaria RDC/ANVISA nº 66/2016). No entanto, há vários julgados que defendem que não se deve condenar o réu porque não há, neste caso, lesão ao bem jurídico tutelado pela norma prevista no art. 334-A do Código Penal. Isso porque, dada a pequena quantidade e a natureza das sementes, considera-se que não há ofensa aos bens jurídicos protegidos pelo delito de contrabando (proteção da saúde, da moralidade administrativa e da ordem pública). Esse é o entendimento que prevalece, por exemplo, no TRF3: HC 67576 - 0010869-41.2016.4.03.0000, Rel. Juiz Convocado Ricardo Nascimento, julgado em 26/07/2016.
Posição do MPF: A 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal possui o entendimento de que:
· A importação de pequena quantidade de sementes de maconha não configura o crime do art. 33, § 1º nem o delito do art. 28, § 1º, ambos da Lei nº 11.343/2006;
· Esta conduta, em tese, amolda-se ao crime de contrabando (art. 334-A do CP);
· A importação de pequena quantidade de sementes de maconha para o plantio destinado ao consumo próprio induz à mínima ofensividade da conduta, à ausência de periculosidade da ação e o ínfimo grau de reprovabilidade do comportamento, razões que comportam a aplicação do princípio da insignificância à hipótese.
· Assim, a conduta é tipificada como contrabando, mas deve-se aplicar o princípio da insignificância, razão pela qual é correta a decisão do Procurador da República que não denuncia o indiciado nestes casos.
Foi o que decidiu a 2ª CCR, em 09/11/2018, no processo nº 0001111-51.2018.4.03.6181, Relatora Subprocuradora Geral da República Luiza Cristina Fonseca Frischeisen. No mesmo sentido é o entendimento do Conselho Institucional do Ministério Público Federal – CIMPF: a importação de sementes de maconha pela via postal, em pequenas quantidades, não deve gerar denúncia, ante a configuração da prática do delito descrito no art. 334-A, do CP, e, neste, a incidência do princípio da insignificância (procedimentos 0008476-98.2014.4.03.6181 e 0002458-64.2015.4.03.6104).
 
Qual é a posição do STJ sobre o tema? O STJ está dividido, por enquanto:
	A importação de pequenas quantidade de sementes de maconha configura tráfico de drogas?
	5ª Turma: SIM
	6ª Turma: NÃO
	A importação clandestina de sementes de cannabis sativa linneu (maconha) configura o tipo penal descrito no art. 33, § 1º, I, da Lei nº 11.343/2006. Não é possível aplicar o princípio da insignificância.
STJ. 5ª Turma. REsp 1723739/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 23/10/2018.
	Tratando-se de pequena quantidade de sementes e inexistindo expressa previsão normativa que criminaliza, entre as condutas do art. 28 da Lei de Drogas, a importação de pequena quantidade de matéria prima ou insumo destinado à preparação de droga para consumo pessoal, forçoso reconhecer a atipicidade do fato.
STJ. 6ª Turma. AgRg no AgInt no REsp 1616707/CE, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 26/06/2018.
 
 
32.4. A grande quantidade de droga, isoladamente, não constitui fundamento idôneo para afastar a causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º da LD – (Info 866) – (TJCE-2018)
		Se o réu é primário e possui bons antecedentes, o juiz pode, mesmo assim, negar o benefício do art. 33, § 4º da LD argumentando que a quantidade de drogas encontrada com ele foi muito elevada? 
O tema é polêmico.
· 1ª Turma do STF: encontramos precedentes afirmando que a grande quantidade de droga pode ser utilizada como circunstância para afastar o benefício. Nesse sentido: não é crível que o réu, surpreendidocom mais de 500 kg de maconha, não esteja integrado, de alguma forma, a organização criminosa, circunstância que justifica o afastamento da causa de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas (HC 130981/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 18/10/16. Info 844). 
· 2ª Turma do STF: a quantidade de drogas encontrada não constitui, isoladamente, fundamento idôneo para negar o benefício da redução da pena previsto no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006 (RHC 138715/MS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, julgado em 23/5/2017. Info 866). 
STF. 2ª Turma. RHC 138715/MS, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 23/5/17 (Info 866). 
Obs: o tema acima não deveria ser cobrado em uma prova objetiva, mas caso seja perguntado, penso que a 2ª corrente é majoritária.
32.5. CONFISCO DE BENS: O confisco de bens apreendidos em decorrência do tráfico pode ocorrer ainda que o bem não fosse utilizado de forma habitual e mesmo que ele não tenha sido alterado – (Info 865)
		É possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito além daqueles previstos expressamente no art. 243, parágrafo único, da Constituição Federal. 
STF. Plenário. RE 638491/PR, Rel. Min. Luiz Fux, j. 17/5/17 (repercussão geral) (Info 865).
	OBS: Art. 243, § único, CF:
Art. 243 (...)
Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei. (Redação dada pela EC 81/2014)
Mandados constitucionais de criminalização: Os preceitos constitucionais sobre o tráfico de drogas e o respectivo confisco de bens constituem parte dos mandados de criminalização previstos pelo poder constituinte originário a exigir uma atuação enérgica do Estado sobre o tema, sob pena de o ordenamento jurídico brasileiro incorrer em proteção deficiente dos direitos fundamentais.
Princípios da unidade e da supremacia da Constituição: O confisco previsto no art. 243, parágrafo único, da CF/88, deve ser interpretado à luz dos princípios da unidade e da supremacia da Constituição, ou seja, não se pode ler o direito de propriedade em separado, sem considerar a restrição feita a esse direito. Assim, a habitualidade do uso do bem na prática criminosa ou sua adulteração para dificultar a descoberta do local de acondicionamento não são pressupostos para o confisco de bens.
Confisco de bens previsto na legislação infraconstitucional: O julgado acima foi proferido tendo como parâmetro de exame unicamente o texto do art. 243, parágrafo único, da CF/88. No entanto, que, para a explicação ficar completa, seja necessário mencionar que a legislação infraconstitucional também prevê hipóteses de confisco dos bens.
É o caso, por exemplo, do Código Penal:
Art. 91. São efeitos da condenação:
(...)
II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé:
a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;
b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.
A Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006) também traz uma previsão nesse sentido:
Art. 62. Os veículos, embarcações, aeronaves e quaisquer outros meios de transporte, os maquinários, utensílios, instrumentos e objetos de qualquer natureza, utilizados para a prática dos crimes definidos nesta Lei, após a sua regular apreensão, ficarão sob custódia da autoridade de polícia judiciária, excetuadas as armas, que serão recolhidas na forma de legislação específica.
(...)
Art. 63. Ao proferir a sentença de mérito, o juiz decidirá sobre o perdimento do produto, bem ou valor apreendido, sequestrado ou declarado indisponível.
32.6. Se o réu, não reincidente, for condenado a pena superior a 4 anos e que não exceda a 8 anos, e se as circunstâncias judiciais forem favoráveis, o juiz deverá fixar o regime semiaberto – (Info 859)
		O condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 anos e não exceda a 8 anos, tem o direito de cumprir a pena corporal em regime semiaberto (art. 33, § 2°, b, do CP), caso as circunstâncias judiciais do art. 59 lhe forem favoráveis. 
Obs: não importa que a condenação tenha sido por tráfico de drogas. 
A imposição de regime de cumprimento de pena mais gravoso deve ser fundamentada, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima (art. 33, § 3°, do CP) 
A gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para justificar a fixação do regime mais gravoso. 
STF. 2ª Turma. HC 140441/MG, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 28/3/17 (Info 859).
	OBS:
A situação em tela se amolda ao art. 33, § 2º, "c", do Código Penal, que é aplicável também aos condenados por tráfico de drogas:
Art. 33 (...)
§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:
c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.
Mas o § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90 afirma que o regime inicial no caso de crimes hediondos e equiparados deverá ser o fechado... O STF decidiu que o § 1º do art. 2º da Lei nº 8.072/90, ao impor o regime inicial fechado, é inconstitucional. HC 111.840/ES, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 27/6/2012 (Info 672).
Assim, o regime inicial nas condenações por crimes hediondos ou equiparados (ex: tráfico de drogas) não tem que ser obrigatoriamente o fechado, podendo ser também o regime semiaberto ou aberto, desde que presentes os requisitos do art. 33, § 2º, alíneas “b” e “c”, do Código Penal.
Logo, o juiz poderá condenar o réu por crime hediondo ou equiparado e fixar o regime semiaberto ou aberto, desde que cumpridos os requisitos do Código Penal.
32.7. Ocorrendo o tráfico de drogas nas imediações de presídio, incidirá a causa de aumento do art. 40, III, da LD, não importando quem seja o comprador – (Info 858) – IMPORTANTE!!! – (TRF5-2017)
		Se o agente vende a droga nas imediações de um presídio, mas o comprador não era um dos detentos nem qualquer pessoa que estava frequentando o presídio, ainda assim deverá incidir a causa de aumento do art. 40, III, da Lei 11.343/06? 
SIM. A aplicação da causa de aumento prevista no art. 40, III, da Lei 11.343/06 se justifica quando constatada a comercialização de drogas nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, sendo irrelevante se o agente infrator visa ou não aos frequentadores daquele local. 
Assim, se o tráfico de drogas ocorrer nas imediações de um estabelecimento prisional, incidirá a causa de aumento, não importando quem seja o comprador do entorpecente. 
STF. 2ª Turma. HC 138944/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 21/3/17 (Info 858).
	OBS:
A Lei de Drogas (Lei nº 11.343/2006), em seu art. 40, traz sete causas de aumento de pena. Veja a hipótese do inciso III, com destaque para a parte grifada:
Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se:
(...) III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou1.409.051-SC, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 20/4/2017 (Info 602).
 
Se a pessoa é flagrada sem nenhum peixe, mas portando consigo equipamentos de pesca, em um local onde esta atividade é proibida, ela poderá ser absolvida do delito do art. 34 da Lei de Crimes com base no princípio da insignificância? A 2ª Turma do STF possui decisões conflitantes sobre o tema:
· SIM. Inq 3788/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 1°/3/16 (Info 816).
· NÃO. RHC 125566/PR e HC 127926/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 26/10/16 (Info 845).
2.5. Crimes tributários e o limite de 20 mil reais – (Infos 749 e 898)
		Qual é o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários e descaminho?
20 mil reais (tanto para o STF como para o STJ)
Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda.
STJ. 3ª S. REsp 1688878-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 28/2/18 (recurso repetitivo).
STF. 1ª T. HC 137595 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 07/05/2018.
STF. 1ª T. HC 127173, Rel. Min. Marco Aurélio, Rel. p/ Acórdão: Min. Roberto Barroso, j. 21/3/17.
STF. 2ª T. HC 155347/PR, Rel. Min. Dias Tóffoli, j. 17/4/2018 (Info 898).
STF. 1ª Turma. HC 121717/PR, Rel. Min. Rosa Weber, j. 3/6/14 (Info 749).
	OBS: 
Incide o princípio da insignificância aos crimes tributários federais e de descaminho quando o débito tributário verificado não ultrapassar o limite de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a teor do disposto no art. 20 da Lei n. 10.522/2002, com as atualizações efetivadas pelas Portarias n. 75 e 130, ambas do Ministério da Fazenda.
STJ. 3ª Seção. REsp 1.709.029/MG, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 28/02/2018 (recurso repetitivo).
Em suma, qual é o valor máximo considerado insignificante no caso de crimes tributários e descaminho? Tanto para o STF como o STJ: 20 mil reais (conforme as Portarias 75 e 132/2012 do MF).
2.6. É possível aplicar o princípio da insignificância para a conduta de manter rádio clandestina? – (Info 853)
		É possível aplicar o princípio da insignificância para a conduta de manter rádio comunitária clandestina? 
· STJ: NÃO. É inaplicável o princípio da insignificância ao delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97, nas hipóteses de exploração irregular ou clandestina de rádio comunitária, mesmo que ela seja de baixa potência, uma vez que se trata de delito formal de perigo abstrato, que dispensa a comprovação de qualquer dano (resultado) ou do perigo, presumindo-se este absolutamente pela lei. Nesse sentido: STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 740.434/BA, Rel. Min. Antonio Saldanha Palheiro, julgado em 14/02/2017. 
· STF: SIM, é possível, em situações excepcionais, o reconhecimento do princípio da insignificância desde que a rádio clandestina opere em baixa frequência, em localidades afastadas dos grandes centros e em situações nas quais ficou demonstrada a inexistência de lesividade. 
STF. 2ª Turma. HC 138134/BA, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 7/2/2017 (Info 853).
2.7. Provedor clandestino de internet sem fio – (Info 842)
		O réu que disponibiliza provedor de internet sem fio pratica atividade clandestina de telecomunicação (art. 183 da Lei 9.472/97), de modo que a tipicidade da conduta está presente, devendo ser afastada a aplicação do princípio da insignificância mesmo que, no caso concreto, a potência fosse inferior a 25 watts, o que é considerado baixa potência, nos termos do art. 1º, § 1º, da Lei nº 9.612/98. 
STF. 1ª Turma. HC 118400/RO, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 04/10/2016 (Info 842).
	OBS:
A conduta de transmitir sinal de internet, via rádio, como se fosse um provedor de internet, sem autorização da ANATEL, configura algum crime? SIM. A conduta de transmitir sinal de internet, via rádio, de forma clandestina, caracteriza, em princípio, o delito descrito no art. 183 da Lei 9.472/97 (STJ. 6ª T. AgRg no REsp 1483107/RN, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 1/12/15).
Veja o que diz este dispositivo legal:
Art. 183. Desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação:
Pena - detenção de dois a quatro anos, aumentada da metade se houver dano a terceiro, e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Mas o art. 183 fala em “atividades de telecomunicação”. O provedor de acesso à internet desenvolve atividade de telecomunicação? O provedor de acesso à Internet via radiofrequência (internet via rádio) desenvolve dois serviços:
· um serviço de telecomunicações (Serviço de Comunicação Multimídia); e
· um Serviço de Valor Adicionado (Serviço de Conexão à Internet).
Dessa forma, a chamada “internet via rádio” pode ser considerada também um serviço de telecomunicação.
Os provedores de internet via rádio precisam de autorização da Anatel para funcionar? Prevalece que sim. As atividades de telecomunicação precisam de autorização prévia da ANATEL, salvo se forem praticadas dentro de uma mesma edificação ou propriedade (art. 75 da Lei 9.472/97).
O acusado argumentou também que não deveria ser condenado, considerando que não ficou provado que ele causou prejuízo, seja para os clientes, seja para os serviços de telecomunicações. Essa alegação é acolhida pelos Tribunais? NÃO. O delito do art. 183 da Lei 9.427/97 é crime de perigo abstrato. Isso significa que, para a sua consumação, basta que alguém desenvolva de forma clandestina as atividades de telecomunicações, sem necessidade de demonstrar prejuízo concreto para o sistema de telecomunicações (STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1560335/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 21/06/2016).
2.8. Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em violência doméstica – (Info 825) – IMPORTANTE!!!
		Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em situação de violência doméstica. 
Os delitos praticados com violência contra a mulher, devido à expressiva ofensividade, periculosidade social, reprovabilidade do comportamento e lesão jurídica causada, perdem a característica da bagatela e devem submeter-se ao direito penal. 
O STJ e o STF não admitem a aplicação dos princípios da insignificância e da bagatela imprópria aos crimes e contravenções praticados com violência ou grave ameaça contra a mulher, no âmbito das relações domésticas, dada a relevância penal da conduta. 
O fato de o casal ter se reconciliado não significa atipicidade material da conduta ou desnecessidade de pena. 
STJ. 5ª Turma. HC 333.195/MS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 12/4/16. 
STJ. 6ª Turma. AgRg no HC 318.849/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 27/10/15. 
STF. 2ª Turma. RHC 133043/MT, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 10/5/16 (Info 825).
2.9. Aplica-se o princípio da insignificância aos crimes ambientais – (Info 816)
		É possível aplicar o princípio da insignificância para crimes ambientais. 
Ex: pessoa encontrada em uma unidade de conservação onde a pesca é proibida, com vara de pescar, linha e anzol, conduzindo uma pequena embarcação na qual não havia peixes. 
STF. 2ª Turma. Inq 3788/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 1°/3/2016 (Info 816).
STJ. 5° Turma. AgRg no AREsp 654.321/SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 9/6/15.
	OBS:
A jurisprudência do STF é no sentido da aplicabilidade do princípio da insignificância aos crimes ambientais, tanto com relação aos de perigo concreto — em que haveria dano efetivo ao bem jurídico tutelado —, quanto aos de perigo abstrato, como no art. 34, caput, da Lei nº 9.605/98.
No processo em exame, não se produziu prova material de que tenha havido qualquer dano efetivo ao meio ambiente. Ademais, mesmo diante de crime de perigo abstrato, não é possível dispensar a verificação “in concreto” do perigo real ou mesmo potencial da conduta praticada pelo acusado com relação ao bem jurídico tutelado. Esse perigo real não se verificou no caso concreto.
2.10. Contrabando – (Sem Info)
		Não se aplicaem transportes públicos;
32.8. A grande quantidade de droga, isoladamente, não constitui fundamento idôneo para afastar a causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º da LD – (Info 849) – (TRF5-2017) (DPEAM-2018)
		Se o réu é primário e possui bons antecedentes, o juiz pode, mesmo assim, negar o benefício do art. 33, § 4º da LD argumentando que a quantidade de drogas encontrada com ele foi muito elevada? O tema é polêmico. 
1ª Turma do STF: encontramos precedentes afirmando que a grande quantidade de droga pode ser utilizada como circunstância para afastar o benefício. Nesse sentido: não é crível que o réu, surpreendido com mais de 500 kg de maconha, não esteja integrado, de alguma forma, a organização criminosa, circunstância que justifica o afastamento da causa de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas (HC 130981/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 18/10/2016. Info 844). 
2ª Turma do STF: a quantidade de drogas encontrada não constitui, isoladamente, fundamento idôneo para negar o benefício da redução da pena previsto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06 (HC 138138/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 29/11/16. Info 849). (TRF5-2017)
STF. 2ª Turma. HC 138138/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 29/11/16 (Info 849).
32.9. A grande quantidade de droga pode justificar o afastamento da causa de diminuição de pena do art. 33, § 4º da LD – (Info 844)
		Não é crível que o réu, surpreendido com mais de 500 kg de maconha, não esteja integrado, de alguma forma, a organização criminosa, circunstância que justifica o afastamento da causa de diminuição prevista no art. 33, §4º, da Lei de Drogas. 
STF. 1ª Turma. HC 130981/MS, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 18/10/16 (Info 844).
	OBS:
Imagine a seguinte situação hipotética: João foi preso enquanto transportava 500kg de maconha, tendo sido denunciado pela prática de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei 11.343/06). A defesa alegou que o réu é primário, possui bons antecedentes e que agiu na condição de “mula”, de forma que merece ser beneficiado com a minorante prevista no § 4º do art. 33:
Art. 33 (...) § 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.
Requisitos para aplicação da causa de diminuição: Para que o juiz deixe de aplicar a minorante prevista no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06 é necessário que demonstre na sentença a existência de conjunto probatório que possa afastar ao menos um dos seguintes critérios, que são autônomos:
a) primariedade;
b) bons antecedentes;
c) não dedicação a atividades criminosas; e
d) não integração à organização criminosa.
Em suma, se o réu não preencher algum desses requisitos, não terá direito à minorante.
O que são as chamadas “mulas”? “Mula” é o nome dado a pessoa, geralmente primária e de bons antecedentes (para que não desperte suspeitas), que é cooptada pelas quadrilhas de tráfico de drogas para que realize o transporte do entorpecente de uma cidade, estado, país, para outros, em troca de uma contraprestação pecuniária, ou por conta de ameaças. Normalmente, a droga é transportada pela “mula” de forma dissimulada, escondida em fundos falsos de bolsas, junto ao corpo ou até mesmo em cápsulas dentro do estômago da pessoa. A “mula” também é conhecida como “avião” ou “transportador”.
É possível aplicar o § 4º do art. 33 da LD às “mulas”?
· STF: SIM. Segundo o entendimento que prevalece no STF é possível aplicar o § 4º do art. 33 da LD às “mulas”. O fato de o agente transportar droga, por si só, não é suficiente para afirmar que ele integre a organização criminosa. Assim, é possível aplicar a causa de diminuição, não se podendo fundamentar tal negativa em mera suposição de que o réu se dedique a atividades criminosas em face da quantidade de droga apreendida. Confira:
(...) O exercício da função de mula, embora indispensável para o tráfico internacional, não traduz, por si só, adesão, em caráter estável e permanente, à estrutura de organização criminosa, até porque esse recrutamento pode ter por finalidade um único transporte de droga. (...)
STF. 1ª Turma. HC 124107, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 04/11/14.
(...) A atuação da agente no transporte de droga, em atividade denominada “mula”, por si só, não constitui pressuposto de sua dedicação à prática delitiva ou de seu envolvimento com organização criminosa. Impõe-se, para assim concluir, o exame das circunstâncias da conduta, em observância ao princípio constitucional da individualização da pena (art. 5º, XLVI, da CF). (...)
STF. 2ª Turma. HC 131795, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 03/05/16.
No mesmo sentido: STF. 1ª Turma. RHC 118008/SP, Rel. Min. Rosa Weber, j. 24/9/13 (Info 721); STF. 1ª Turma. HC 124107, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 04/11/14.
· STJ: NÃO. O STJ possui vários precedentes afirmando que, em regra, a "mula" integra a organização criminosa e, portanto, não faz jus ao benefício:
(...) O atual entendimento jurisprudencial do Pretório Excelso e desta Corte Superior é no sentido de que, regra geral, o agente que transporta drogas, na qualidade de 'mula' do tráfico, integra organização criminosa. Na hipótese, a concessão da minorante em sua fração mínima configura ato benéfico, já que, considerando o entendimento ora firmado, o recorrente sequer faria jus à tal redução. (...)
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1407115/SP, Rel. Min. Felix Fischer, j. 18/08/16.
(...) A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é firme em assinalar que o agente que transporta entorpecentes, no exercício da função de "mula", integra organização criminosa, o que afasta a incidência do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, de maneira que a atrair a incidência da Súmula n. 83 do STJ. (...)
STJ. 6ª Turma. AgRg no AREsp 411.424/SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 02/02/16.
Fique atento(a) como a redação do tema pode aparecer na sua prova. Na prática, o que vale é a análise das circunstâncias do caso concreto, não sendo possível conceder ou afastar a minorante pelo simples fato de o agente ter desempenhado a função de "mula".
E no caso concreto acima relatado, o STF concordou com a tese da defesa? Deverá ser concedido o benefício a João? NÃO. É o que foi decidido no Info 844 do STF. Desse modo, o Tribunal entendeu que, embora primário, o agente transportava grande quantidade de entorpecente o que demonstra envolvimento com a organização criminosa. Existe outro precedente do STF no mesmo caminho:
(...) In casu, a paciente, na condição de “mula”, foi surpreendida transportando expressiva quantidade de droga ao exterior. Tal fato afasta o preenchimento dos requisitos do art. 33, § 4°, da Lei de Drogas (...) STF. 1ª Turma. HC 123430, Rel. Min. Luiz Fux, j. 14/10/14.
32.10. Regime inicial para condenado não reincidente a pena de até 4 anos com circunstâncias judiciais favoráveis – (Infos 821 e 843) – (MPAM-2016) (TJRS-2016)
		Se o réu, não reincidente, for condenado, por tráfico de drogas, a pena de até 4 anos, e se as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP forem positivas (favoráveis), o juiz deverá fixar o regime aberto e deverá conceder a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, preenchidos os requisitos do art. 44 do CP. 
A gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para justificar a fixação do regime mais gravoso. 
STF. 1ª Turma. HC 129714/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 11/10/16 (Info 843). 
STF. 1ª Turma. HC 130411/SP, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, j. 12/4/16 (Info 821). STF. 2ª Turma. HC 133028/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 12/4/16 (Info 821).
	(MPAM-2016): Segundo o entendimento do STF, o crime de tráfico de drogas, conforme o caso concreto, enseja a possibilidade de fixação de regime inicial diferente do fechado, devendo o magistrado atentar à regra do artigo 33 do Código Penal.
	Imagine que o réu foi condenado a 1 ano e 8 mesesde reclusão por tráfico de drogas (art. 33 da LD). O juiz fixou o regime inicial semiaberto. Vale ressaltar que o condenado era primário e as circunstâncias judiciais favoráveis a ele. Como argumento para fixar o regime semiaberto, o juiz alegou que o crime de tráfico de drogas é muito grave, sendo extremamente nocivo para a sociedade. Agiu corretamente o magistrado? NÃO.
A situação em tela se amolda ao art. 33, § 2º, "c", do Código Penal, que é aplicável também aos condenados por tráfico de drogas:
Art. 33 (...)
§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:
c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.
Mas o § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 afirma que o regime inicial no caso de crimes hediondos e equiparados deverá ser o fechado... O STF decidiu que o § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, ao impor o regime inicial fechado, é inconstitucional. STF. Plenário. HC 111.840/ES, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 27/6/2012 (Info 672).
Assim, o regime inicial nas condenações por crimes hediondos ou equiparados (ex: tráfico de drogas) não tem que ser obrigatoriamente o fechado, podendo ser também o regime semiaberto ou aberto, desde que presentes os requisitos do art. 33, § 2º, alíneas “b” e “c”, do Código Penal.
Logo, o juiz poderá condenar o réu por crime hediondo ou equiparado e fixar o regime semiaberto ou aberto, desde que cumpridos os requisitos do Código Penal acima explicados.
Obs: no caso do exemplo dado, o réu não foi condenado por crime hediondo ou equiparado considerando que o STF entende que o chamado "tráfico privilegiado", previsto no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06 não deve ser considerado crime equiparado a hediondo (HC 118533, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 23/06/2016. Info 831).
32.11. O crime de tráfico privilegiado de drogas não tem natureza hedionda – (Info 831) – IMPORTANTE!!! ATUALIZAR LIVROS!!! – (TRF5-2017) (MPRS-2017) (TJSC-2019) (MPCE-2020)
		O chamado tráfico privilegiado, previsto no § 4º do art. 33 da Lei 11.343/06 (Lei de Drogas) não deve ser considerado crime de natureza hedionda. 
STF. Plenário. HC 118533/MS, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 23/6/16.
STJ. 3ª S. Pet 11.796-DF, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 23/11/16 (recurso repetitivo) (Info 595).
	(MPRS-2017): A aplicação da causa de diminuição da pena de um sexto a dois terços, prevista na Lei de Drogas, em favor do traficante primário, de bons antecedentes e que não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa, afasta a hediondez ou a equiparação à hediondez do crime de tráfico de entorpecentes. BL: Info 595, STJ.
	OBS:
Na prática, o que muda para o réu condenado por tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da LD)? Podemos apontar três mudanças principais:
	Segundo a posição anterior
	Conforme o entendimento ATUAL
	Não tinha direito à concessão de anistia, graça e indulto.
	Passa a ter, em tese, direito à concessão de anistia, graça e indulto, desde que cumpridos os demais requisitos.
	Para a concessão do livramento condicional, o condenado não podia ser reincidente específico em crimes hediondos ou equiparados e teria que cumprir mais de 2/3 da pena.
	Para a concessão do livramento condicional, o apenado deverá cumprir 1/3 ou 1/2 da pena, a depender do fato de ser ou não reincidente em crime doloso.
	Para que ocorresse a progressão de regime, o condenado deveria cumprir: 
- 2/5 da pena, se fosse primário; e 
- 3/5, se fosse reincidente.
	Para que ocorra a progressão de regime, o condenado deverá cumprir 1/6 da pena.
32.12. Valoração negativa da natureza e quantidade da droga autoriza a fixação de regime inicial de pena mais gravoso – (Info 819) – IMPORTANTE!!! – (TJPR-2017) (PCMT-2017) (DPEAM-2018)
		É legítima a fixação de regime inicial semiaberto, tendo em conta a quantidade e a natureza do entorpecente, na hipótese em que ao condenado por tráfico de entorpecentes tenha sido aplicada pena inferior a 4 anos de reclusão. A valoração negativa da quantidade e da natureza da droga representa fator suficiente para a fixação de regime inicial mais gravoso. 
STF. 2ª T. HC 133308/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 29/3/16 (Info 819).
	OBS:
Imagine que o réu foi condenado a 3 anos de reclusão por tráfico de drogas (art. 33 da LD). O juiz fixou o regime inicial semiaberto sob o argumento de que foi muito grande a quantidade de droga comercializada e que se tratava de crack, substância entorpecente cuja natureza é altamente viciante. Agiu corretamente o magistrado? Ele poderia ter feito isso? SIM.
Segundo entendeu o STF, a decisão respeitou o disposto no art. 33, § 2º, “b”, e § 3º, do CP c/c o art. 42 da Lei nº 11.343/2006:
CP/Art. 33 (...)
§ 2º As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:
b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto; (...)
§ 3º A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código.
LD/Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.
Dessa forma, conjugando o § 3º do art. 33 do CP com o art. 42 da LD, é possível fixar o regime inicial mais gravoso, no caso de tráfico, com base na natureza e quantidade da droga. Existem outros precedentes do STF no mesmo sentido:
(...) 1. É pacífico o entendimento do STF de que a natureza e a quantidade da droga constituem motivação idônea para a exasperação da pena-base, nos termos do art. 59 do Código Penal e do art. 42 da Lei nº 11.343/06. Precedentes. 2. Como o regime inicial de cumprimento de pena deve observar o disposto no art. 33, § 3º, do Código Penal, e no art. 42 da Lei nº 11.343/06, que expressamente remetem às circunstâncias do crime (art. 59, CP) e à natureza e quantidade da droga, não há que se falar em bis in idem na valoração negativa desses mesmos vetores na majoração da pena-base e na fixação do regime prisional mais gravoso. (...) STF. 2ª Turma. HC 131887, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 02/02/2016.
(...) A valoração negativa da quantidade, natureza e diversidade do entorpecente apreendido representa fator suficiente para a fixação de regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade mais gravoso e para obstar a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. (...) STF. 2ª Turma. HC 131761, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 02/02/2016.
(...) A determinação do regime inicial de cumprimento da pena deve levar em conta dois fatores: (a) o quantum da reprimenda imposta (CP, art. 33, § 2º); e (b) as condições pessoais do condenado estabelecidas na primeira etapa da dosimetria (CP, art. 59 c/c art. 33 § 3º). Nesse contexto, não há ilegalidade na decisão que, mediante fundamentação jurídica adequada, estabelece o regime inicial mais grave, como medida necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime. (...) STF. 2ª Turma. RHC 129811, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 24/11/2015.
32.13. Pureza da droga é irrelevante na dosimetria da pena – (Info 818) – IMPORTANTE!!!
		O grau de pureza da droga é irrelevante para fins de dosimetria da pena. 
De acordo com a Lei 11343/06, preponderam apenas a natureza e a quantidade da droga apreendida para o cálculo da dosimetria da pena. 
STF. 2ª Turma. HC 132909/SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 15/3/2016 (Info 818).
	OBS:
O juiz, ao condenar o réu por tráfico de drogas, no momento da dosimetria da pena, poderá aumentar a pena-base (1ªfase) utilizando como argumento a natureza e a quantidade do entorpecente? SIM. A natureza e quantidade da droga são fatores preponderantes no momento da dosimetria da pena, conforme previsto expressamente no art. 42 da Lei 11.343/2006:
Art. 42. O juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente.
Algumas drogas são mais nocivas e têm maior potencial viciante do que outras. Ex: a maconha é considerada uma substância entorpecente mais "leve"; por outro lado, a heroína é altamente viciante. Assim, o juiz pode aumentar a pena-base (1ª fase da dosimetria) sob o argumento de que a heroína possui alto potencial destrutivo. De igual forma, se a quantidade da droga for muito grande, isso também poderá ser utilizado como fundamento para se aumentar a pena-base.
E o grau de pureza da droga? Pode ser utilizado como argumento para aumentar ou diminuir a reprimenda? NÃO. No caso concreto julgado, a defesa pediu ao juiz que realizasse exame pericial para aferir o grau de pureza da droga, tendo sido indeferido pelo magistrado. Diante da negativa, a defesa alegou que houve nulidade, pedido que foi rejeitado pelo STF, que entendeu ser desnecessário determinar a pureza do entorpecente.
32.14. A causa de aumento prevista no inciso V do art. 40 não exige a efetiva transposição da fronteira (Info 808) – IMPORTANTE!!!
		O art. 40, V, da Lei de Drogas prevê que a pena do tráfico e de outros delitos deverá ser aumentada se ficar "caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal". 
Para que incida essa causa de aumento não se exige a efetiva transposição da fronteira interestadual pelo agente, sendo suficiente a comprovação de que a substância tinha como destino localidade em outro Estado da Federação. 
Ex: João pegou um ônibus em Campo Grande (MS) com destino a São Paulo (SP); algumas horas depois, antes que o ônibus cruzasse a fronteira entre os dois Estados, houve uma blitz da polícia no interior do coletivo, tendo sido encontrados 10kg de cocaína na mochila de João, que confessou que iria levá-la para um traficante de São Paulo. 
STF. 1ª Turma. HC 122791/MS, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 17/11/2015 (Info 808). 
32.15. Tráfico privilegiado e “mulas” – (Info 766)
		É possível aplicar o benefício do § 4º do art. 33 da Lei de Drogas às “mulas”. 
STF. 1ª Turma. HC 124107/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 4/11/2014 (Info 766).
32.16. Natureza e quantidade da droga: o mesmo fato só pode ser utilizado para aumentar a pena base ou para analisar o benefício do tráfico privilegiado – (Info 759) – IMPORTANTE!!! – (PCMT-2017)
		A natureza e a quantidade da droga NÃO podem ser utilizadas para aumentar a pena-base do réu e também para afastar o tráfico privilegiado (art. 33, § 4º) OU para, reconhecendo-se o direito ao benefício, conceder ao réu uma menor redução de pena. Haveria, nesse caso, bis in idem. 
STF. 2ª Turma. RHC 122684/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 16/9/2014 (Info 759).
	(PCMT-2017-CESPE): Com referência aos parâmetros legais da dosimetria da pena para os crimes elencados na Lei 11.343/06 — Lei Antidrogas — e ao entendimento dos tribunais superiores sobre essa matéria, assinale a opção correta: A natureza e a quantidade da droga apreendida não podem ser utilizadas, concomitantemente, na primeira e na terceira fase da dosimetria da pena, sob pena de bis in idem. BL: art. 42 da LD e Info 759 do STF.
Explicação:
STF: Natureza e quantidade da droga: o mesmo fato só pode ser utilizado para aumentar a pena base ou para analisar o benefício do tráfico privilegiado - A natureza e a quantidade da droga NÃO podem ser utilizadas para aumentar a pena-base do réu e também para afastar o tráfico privilegiado (art. 33, § 4º) ou para, reconhecendo-se o direito ao benefício, conceder ao réu uma menor redução de pena. Haveria, nesse caso, bis in idem. STF. 2ª Turma. RHC 122684/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 16/9/2014 (Info 759).
STJ: HABEAS CORPUS SUBSTITUTO DE RECURSO PRÓPRIO. [...] ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM. OCORRÊNCIA. [...] 2. Esta Corte Superior, na esteira do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal em sede de repercussão geral (ARE 666.334/MG, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJ 6/5/2014), pacificou entendimento de que a natureza e a quantidade da droga não podem ser utilizadas, concomitantemente, na primeira e na terceira fase da dosimetria da pena, sob pena de bis in idem. 3. No caso dos autos, o acórdão atacado diverge do atual entendimento da Suprema Corte sobre a matéria, pois considerou a quantidade da droga na primeira e na terceira fases da dosimetria. [...] 7. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida ex officio para determinar que o Juízo das Execuções proceda à nova dosimetria da pena, afastando o bis in idem identificado e reduzindo a pena, em razão da atenuante da menoridade, de forma fundamentada e proporcional, (HC nº 305.627 - SC, Relator: Min. Reynaldo Soares da Fonseca - Julg. 10 de dezembro de 2015)
32.17. Dosimetria da pena no caso de tráfico de drogas – (Info 759)
		Na dosimetria da pena de tráfico, o juiz não pode aumentar a pena base utilizando como argumento o fato de terem sido encontradas muitas trouxinhas com o réu, se o peso delas era pequeno (7,1 gramas), sendo esse fato preponderante. 
De igual modo, o magistrado não pode aumentar a pena pelo simples fato de a venda da droga ocorrer dentro da própria casa do condenado. Isso porque esse fato, por si só, não enseja uma maior reprovabilidade da conduta delituosa. 
Por fim, o julgador não pode aumentar a pena do réu porque este declarou, em seu interrogatório, que era usuário frequente de droga. O uso contumaz de drogas não pode ser empregado como indicativo de necessidade de agravamento da reprimenda, visto que a conduta do réu que vende drogas para sustentar o próprio vício é menos reprovável do que a daquele que pratica esse crime apenas com intuito de lucro. 
STF. 2ª Turma. RHC 122469/MS, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o acórdão Min. Celso de Mello, julgado em 16/9/2014 (Info 759).
32.18. Droga transportada em transporte público e causa de aumento do art. 40 da Lei 11.343/2006 – (Info 749) – (DPU-2017)
		O art. 40, III, da Lei de Drogas prevê como causa de aumento de pena o fato de a infração ser cometida em transportes públicos. 
Se o agente leva a droga em transporte público, mas não a comercializa dentro do meio de transporte, incidirá essa majorante? 
NÃO. A majorante do art. 40, II, da Lei 11.343/06 somente deve ser aplicada nos casos em que ficar demonstrada a comercialização efetiva da droga em seu interior. É a posição majoritária no STF e STJ. 
STF. 1ª T. HC 122258-MS, Rel. Min. Rosa Weber, j. 19/08/2014.
STF.2ª T. HC 120624/MS, Red. p/ o acórdão, Min. Ricardo Lewandowski, j. 3/6/14 (Info 749). 
STJ. 5ª T. AgRg no REsp 1.295.786-MS, Rel. Min. Regina Helena Costa, j. 18/6/14 (Info 543). 
STJ. 6ª T. REsp 1.443.214-MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 22/09/2014.
32.19. Vedação ao indulto para o traficante privilegiado – (Info 745) – IMPORTANTE!!!
		Não é possível o deferimento de indulto a réu condenado por tráfico de drogas, ainda que tenha sido aplicada a causa de diminuição prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006 à pena a ele imposta, circunstância que não altera a tipicidade do crime. 
Os condenados por crimes hediondos e equiparados não podem ser contemplados com o indulto, mesmo o chamado “indulto humanitário”. 
O fato de o condenado estar doente ou ser acometido de deficiência não é causa de extinção da punibilidade nem de suspensão da execução da pena. 
STF. 2ª Turma. HC 118213/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 6/5/2014.
32.20. A NATUREZA E A QUANTIDADE DA DROGA PODEM SER UTILIZADAS PARA AUMENTAR A PENA-BASE E TAMBÉM PARA AFASTAR O TRÁFICO PRIVILEGIADO? – (Info 733)
		A natureza e a quantidade da droga podem ser utilizadas para aumentar a pena-basee também para afastar o tráfico privilegiado? 
1ª corrente: SIM. Utiliza-se a mesma regra em finalidades e momentos distintos. Posição do STJ. 
2ª corrente: NÃO. Isso porque haveria, no caso, bis in idem. Posição do STF. 
STF. Plenário. HC 112776/MS e HC 109193/MG, Rel. Min. Teori Zavascki, julgados em 19/12/2013 (Info 733).
32.21. Dever ou não de demonstrar que a droga encontrada consigo seria utilizada apenas para consumo próprio
		O réu não tem o dever de demonstrar que a droga encontrada consigo seria utilizada apenas para consumo próprio.
Cabe à acusação comprovar os elementos do tipo penal, ou seja, que a droga apreendida era destinada ao tráfico. Ao Estado-acusador incumbe demonstrar a configuração do tráfico, que não ocorre pelo simples fato dos réus terem comprado e estarem na posse de entorpecente.
Em suma, se a pessoa é encontrada com drogas, cabe ao Ministério Público comprovar que o entorpecente era destinado ao tráfico. Não fazendo esta prova, prevalece a versão do réu de que a droga era para consumo próprio.
STF. 1ª Turma. HC 107448/MG, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 18.6.2013.
33. LEI MARIA DA PENHA
33.1. Impossibilidade de pena restritiva de direitos em caso de contravenção penal envolvendo violência doméstica contra a mulher – (Info 884) – IMPORTANTE!!! – (TJCE-2018)
		Cabe substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos em caso de contravenção penal envolvendo violência doméstica contra a mulher?
NÃO. Posição majoritária do STF e Súmula 588 do STJ.
SIM. Existe um precedente da 2ª Turma do STF (HC 131160, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 18/10/16).
STF. 1ª Turma. HC 137888/MS, Rel. Min. Rosa Weber, j. 31/10/17 (Info 884).
	OBS:
Cuidado: Decisão da 2ª Turma do STF:
Afirma que é possível a conversão da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, nos moldes previstos no art. 17 da Lei Maria da Penha, aos condenados pela prática de contravenção penal. Isso porque a contravenção penal não está na proibição contida no inciso I do art. 44 do CP, que fala apenas em crime. Logo, não existe proibição no ordenamento jurídico para a aplicação de pena restritiva de direitos em caso de contravenções. Nesse sentido: STF. 2ª Turma. HC 131160, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 18/10/2016.
O STJ e a 1ª Turma do STF fazem, portanto, uma ampliação do inciso I do art. 44 do CP para abranger também os casos de contravenção penal praticados com violência ou grave ameaça (STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1607382/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 27/09/2016). A 2ª Turma do STF não admite essa ampliação e trabalha com o texto literal do art. 44, I, do CP.
Resumindo:
É possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos nos casos de crimes ou contravenções praticadas contra a mulher com violência ou grave ameaça no ambiente doméstico?
1) Crime: NÃO. Posição tanto do STJ como do STF.
2) Contravenção penal:
• 2ª Turma do STF: entende que é possível a substituição.
• 1ª Turma do STF e STJ: afirmam que também não é permitida a substituição.
Em concursos, se o enunciado não estiver fazendo qualquer distinção, fiquem com a posição exposta na súmula e que também é adotada pela 1ª Turma do STF.
33.2. Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em violência doméstica – (Info 825) – IMPORTANTE!!!
		Não se aplica o princípio da insignificância aos delitos praticados em situação de violência doméstica. 
Os delitos praticados com violência contra a mulher, devido à expressiva ofensividade, periculosidade social, reprovabilidade do comportamento e lesão jurídica causada, perdem a característica da bagatela e devem submeter-se ao direito penal. 
O STJ e o STF não admitem a aplicação dos princípios da insignificância e da bagatela imprópria aos crimes e contravenções praticados com violência ou grave ameaça contra a mulher, no âmbito das relações domésticas, dada a relevância penal da conduta. 
O fato de o casal ter se reconciliado não significa atipicidade material da conduta ou desnecessidade de pena. 
STJ. 5ª Turma. HC 333.195/MS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, j. 12/4/2016. 
STJ. 6ª Turma. AgRg no HC 318.849/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 27/10/15. 
STF. 2ª Turma. RHC 133043/MT, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 10/5/16 (Info 825).
33.3. Impossibilidade de penas restritivas de direito – (Info 804) – IMPORTANTE!!! (TJPR-2017)
		Não é possível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ao condenado pela prática do crime de lesão corporal praticado em ambiente doméstico (art. 129, § 9º do CP). 
A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos pressupõe, entre outras coisas, que o crime não tenha sido cometido com violência ou grave ameaça (art. 44, I, do CP).
STF. 2ª Turma. HC 129446/MS, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 20/10/15 (Info 804).
33.4. Competência para o processamento de crimes dolosos contra a vida praticados no contexto de violência doméstica – (Info 748)
		A Lei de Organização Judiciária poderá prever que a 1ª fase do procedimento do júri seja realizada na Vara de Violência Doméstica em caso de crimes dolosos contra a vida praticados no contexto de violência doméstica. Não haverá usurpação da competência constitucional do júri. 
Apenas o julgamento propriamente dito é que, obrigatoriamente, deverá ser feito no Tribunal do Júri. 
STF. 2ª Turma. HC 102150/SC, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 27/5/2014 (Info 748).
33.5. Princípio da Igualdade e proteção das mulheres
		Não há violação do princípio constitucional da igualdade no fato de a Lei n. 11.340/06 ser voltada apenas à proteção das mulheres.
STF. Plenário. ADC 19/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 9/2/2012.
33.6. Crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher e a Lei dos Juizados Especiais – (TJGO-2012)
		Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher não se aplica a Lei dos Juizados Especiais (Lei n. 9.099/95), mesmo que a pena seja menor que 2 anos. 
STF. Plenário. ADI 4424/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 9/2/2012.
34. ESTATUTO DO DESARMAMENTO 
34.1. Posse ou porte apenas da munição configura crime – (Info 844) – IMPORTANTE!!! – (TJRJ-2016) (TJSP-2018)
		A posse (art. 12 da Lei 10.826/03) ou o porte (art. 14) de arma de fogo configura crime mesmo que ela esteja desmuniciada. Da mesma forma, a posse ou o porte apenas da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o resultado concreto da ação. 
STF. 1ª T. HC 131771/RJ, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 18/10/16 (Info 844).
STJ. 5ª T. HC 432.691/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 21/6/18.
STJ. 5ª T. HC 467.148/DF, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 23/10/18.
STJ. 6ª T. HC 441.752/SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 12/6/18.
STJ. 6ª T. AgRg-AREsp 1.367.442/MS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 27/11/18.
	(TJRJ-2016-VUNESP): Bonaparte, com o objetivo de matar Wellington, aciona o gatilho com o objetivo de efetuar um disparo de arma de fogo na direção deste último. Todavia, a arma não dispara na primeira tentativa. Momentos antes de efetuar uma segunda tentativa, Bonaparte ouve “ao longe" um barulho semelhante a “sirenes" de viatura e, diante de tal fato, guarda a arma de fogo que carregava, deixando o local calmamente, não sem antes proferir a seguinte frase a Wellington: “na próxima, eu te pego". Momentos após, Bonaparte é abordado na rua por policiais e tem apreendida a arma de fogo por ele utilizada. A arma de fogo era de uso permitido, estava registrada em nome de Bonaparte, mas este não possuía autorização para portá-la. No momento da abordagem e apreensão, também foi constatado pelos policiais que a arma de fogo apreendida em poder de Bonaparte estava sem munições, pois ele havia esquecido de municiá-la. Diante dos fatos narrados e da atual jurisprudência do STF, é correto afirmar que Bonaparte poderá ser responsabilizado pelos crimesde ameaça e porte ilegal de arma de fogo de uso permitido. BL: art. 17 do CP (crime impossível) c/c art. 147 do CP (crime de ameaça) e art. 14 do Estatuto do Desarmamento e Entendimento do STF.
	OBS:
A posse ou o porte de arma de fogo desmuniciada configura crime? SIM. A posse (art. 12 da Lei 10.826/03) ou o porte (art. 14) de arma de fogo configura crime mesmo que ela esteja desmuniciada. Trata-se, atualmente, de posição pacífica tanto no STF como no STJ. Para a jurisprudência, a simples posse ou porte de arma, munição ou acessório de uso permitido — sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar — configura os crimes previstos nos arts. 12 ou 14 da Lei 10.826/03. Isso porque, por serem delitos de perigo abstrato, é irrelevante o fato de a arma apreendida estar desacompanhada de munição, já que o bem jurídico tutelado é a segurança pública e a paz social. 
STJ. 3ª Seção. AgRg nos EAREsp 260.556/SC, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 26/03/14. 
STF. 2ª Turma. HC 95073/MS, red. p/ o acórdão Min. Teori Zavascki, 19/3/13 (Info 699).
A posse ou porte apenas da munição configura crime? SIM. A posse ou o porte apenas da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o resultado concreto da ação. O objetivo do legislador foi o de antecipar a punição de fatos que apresentam potencial lesivo à população, prevenindo a prática de crimes. 
STF. 2ª Turma. HC 119154, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 26/11/13.
STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1442152/MG, Min. Maria Thereza de Assis Moura, j. 07/08/14.
34.2. Uso de munição como pingente e aplicação do princípio da insignificância – (Info 826) – IMPORTANTE!!!
		É atípica a conduta daquele que porta, na forma de pingente, munição desacompanhada de arma. 
STF. 2ª Turma. HC 133984/MG, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 17/5/16 (Info 826). 
Obs: vale ressaltar que, em regra, a jurisprudência não aplica o princípio da insignificância aos crimes de posse ou porte de arma ou munição.
	OBS:
A posse ou porte apenas da munição configura crime? SIM. A posse ou o porte apenas da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o resultado concreto da ação. O objetivo do legislador foi o de antecipar a punição de fatos que apresentam potencial lesivo à população, prevenindo a prática de crimes. STF. 2ª Turma.HC 119154, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 26/11/2013. STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1442152/MG, Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 07/08/2014.
Aplica-se o princípio da insignificância ao crime de posse ou porte de arma ou munição? Em regra não. O STJ possui posição consolidada no sentido de que o princípio da insignificância não é aplicável aos crimes de posse e de porte de arma de fogo, por se tratarem de crimes de perigo abstrato, sendo irrelevante inquirir a quantidade de munição apreendida (STJ. 5ª Turma. HC 338.153/RS, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 03/05/2016).
Caso excepcional de uma munição utilizada como pingente: Os entendimentos acima expostos configuram a regra geral e devem ser adotados nos concursos caso não seja feito nenhum esclarecimento adicional. No entanto, em um caso concreto, o STF reconheceu a incidência do princípio da insignificância para o crime de porte ilegal de munição de uso restrito.
A situação foi a seguinte: determinado indivíduo foi parado em uma blitz e os policiais encontraram em seu poder um cartucho de munição calibre 0.40, que é de uso restrito.
Não foi encontrada nenhuma arma ou outras munições com o homem, que afirmou que usaria o cartucho para fazer um pingente que utilizaria como colar. O indivíduo foi denunciado pela prática do crime previsto no art. 16 da Lei 10826/03 (Estatuto do Desarmamento). O STF aplicou o princípio da insignificância afirmando que as peculiaridades do caso concreto justificavam a flexibilização do entendimento tradicional da jurisprudência. Na situação julgada, o cartucho ainda seria utilizado para fazer o pingente.
34.3. O porte ilegal de arma de fogo deve ser absorvido pelo crime de homicídio? – (Info 775) – IMPORTANTE!!! – (TJPA-2019)
		Se o agente, utilizando arma de fogo, atira e mata alguém, haverá homicídio e porte de arma de fogo ou apenas homicídio? Se uma pessoa pratica homicídio com arma de fogo, a acusação por porte deverá ser absorvida? Aplica-se o princípio da consunção? 
Depende da situação: 
· Situação 1: NÃO. O crime de porte não será absorvido se ficar provado nos autos que o agente portava ilegalmente a arma de fogo em outras oportunidades antes ou depois do homicídio e que ele não se utilizou da arma tão somente para praticar o assassinato. Ex: a instrução demonstrou que João adquiriu a arma de fogo três meses antes de matar Pedro e não a comprou com a exclusiva finalidade de ceifar a vida da vítima. 
· Situação 2: SIM. Se não houver provas de que o réu já portava a arma antes do homicídio ou se ficar provado que ele a utilizou somente para matar a vítima. Ex: o agente compra a arma de fogo e, em seguida, dirige-se até a casa da vítima, e contra ela desfere dois tiros, matando-a. 
No caso concreto julgado pelo STF, ficou provado que o réu havia comprado a arma 3 meses antes da morte da vítima. Além disso, também se demonstrou pelas testemunhas que o acusado, várias vezes antes do crime, passou na frente da casa da vítima, mostrando ostensivamente o revólver utilizado no crime. Desse modo, restou provado que os tipos penais consumaram-se em momentos distintos e que tinham desígnios autônomos, razão pela qual não se pode reconhecer o princípio da consunção entre o homicídio e o porte ilegal de arma de fogo. 
STF. 1ª T. HC 120678/PR, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, j. 24/2/15 (Info 775).
	(TJPA-2019-CESPE): Para se vingar de uma agressão pretérita, João, maior de idade, com vontade livre e consciente de matar, efetuou disparos de arma de fogo contra Pedro. Tendo se certificado de que apenas um projétil havia atingido Pedro, em local não letal, e de que ele ainda estava vivo, João, então, efetuou mais dois disparos. Esses dois disparos foram letais, e o homicídio se consumou. João possuía o porte e a posse legal da arma utilizada. Considerando essa situação, assinale a opção correta: Em razão do princípio da consunção, que será aplicado ao caso, João responderá unicamente pelo homicídio. BL: Info 775, STF (Situação 2).
34.4. A posse ou o porte apenas de munição configura crime – (Sem Info)
		A posse ou o porte apenas da munição (ou seja, desacompanhada da arma) configura crime. Isso porque tal conduta consiste em crime de perigo abstrato, para cuja caracterização não importa o resultado concreto da ação.
STF. 2ª Turma. HC 113295/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 13/11/2012.
35. RACISMO
35.1. A Lei nº 7.716/89 pode ser aplicada para punir as condutas homofóbicas e transfóbicas – (Info 944) – IMPORTANTE!!!
		1. Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08.01.1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”); 
2. A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanose líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero; 
3. O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito.
STF. Plenário. ADO 26/DF, Rel. Min. Celso de Mello; MI 4733/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 13/6/19 (Info 944).
	OBS:
Lei 7.716/89: A Lei 7.716/89 prevê os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. O art. 20 da Lei nº 7.716/89, por exemplo, trata sobre o crime de racismo:
Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
Pena: reclusão de um a três anos e multa.
 
Além dele, existem outros delitos tipificados pela Lei 7.716/89, como, por exemplo, os arts. 5º e 13:
Art. 5º Recusar ou impedir acesso a estabelecimento comercial, negando-se a servir, atender ou receber cliente ou comprador.
Pena: reclusão de um a três anos.
 
Art. 13. Impedir ou obstar o acesso de alguém ao serviço em qualquer ramo das Forças Armadas.
Pena: reclusão de dois a quatro anos.
 
O grande ponto, contudo, da Lei nº 7.716/89 é que ela prevê que a punição para essas condutas ocorre se o preconceito manifestado for em razão da raça ou da cor da vítima. O art. 20 fala também em preconceito relacionado com a etnia, religião e procedência nacional.
 
Preconceito: É o pensamento que existe em determinados indivíduos no sentido de que certas pessoas ou grupos sociais são inferiores, nocivos, prejudiciais. “O preconceito é subjetivo, interior, está no intelecto da pessoa, configura um pré-julgamento negativo com relação a outro indivíduo ou grupo.” (LAURIA, Mariano Paganini. Leis Penais Especiais comentadas artigo por artigo. Salvador: Juspodivm, 2018, p. 534).
 
Discriminação: É a exteriorização do preconceito por meio da prática de atos materiais.
 
Raça: O conceito de “raça” é amplo e não está limitado a uma definição biológica. Em outras palavras, o conceito de raça não exige que as pessoas possuam as mesmas características genéticas, tais como cor do cabelo, dos olhos e da pele (LAURIA, Mariano Paganini. ob. cit., p. 534). “A divisão dos seres humanos em raças resulta de um processo de conteúdo meramente político-social.” (Min. Maurílio Correia no HC 82424, julgado pelo STF em 17/09/03). Assim, por exemplo, os judeus são uma raça, mesmo que os indivíduos que componham essa coletividade possuam características genéticas distintas entre si.
 
Cor: É a cor que a pessoa possui. É tonalidade, a pigmentação da pele.
 
Etnia: São os grupos humanos que apresentam aspectos comuns, tais como língua, religião e maneiras de agir. Trata-se do “conceito mais adotado e recomendado pela sociologia hodiernamente para designar o que antes era entendido por ‘raça’”. (LAURIA, Mariano Paganini. ob. cit., p. 507). Exemplos: índios, árabes, judeus, quilombolas.
 
Religião: “Religião pode ser conceituada como conjunto de crenças relacionadas ao divino e sagrado, permeada por uma série de rituais e códigos morais derivados de tais convicções. Não se inclui o ateísmo (ausência de crença religiosa), prevalecendo o entendimento de que este é justamente a negação da crença na existência de uma divindade superior, motivo pelo qual não poderia ser equiparado à religião, constituindo-se em espécie de doutrina filosófica. A discriminação por ateísmo seria, assim, fato atípico.” (LAURIA, Mariano Paganini. ob. cit., p. 508).
 
Procedência nacional: É o lugar de onde a pessoa veio, ou seja, o lugar onde ela nasceu ou morava. Interessante ressaltar que, segundo a doutrina, este conceito abrange tanto os estrangeiros (ex: venezuelanos, haitianos) como também os nacionais que se deslocam dentro do país (exs: nortistas, nordestinos, sulistas etc.).
 
A Lei 7.716/89 previu, expressamente, que os crimes nela tipificados podem ser aplicados em caso de manifestações de preconceito relacionadas com orientação sexual? A Lei 7.716/89 prevê, expressamente, punição para condutas homofóbicas e transfóbicas? NÃO. A Lei 7.716/89 não traz, expressamente, previsão para punição de condutas homofóbicas e transfóbicas. A doutrina e a jurisprudência, por sua vez, afirmavam que o rol de elementos de preconceito e discriminação do art. 20 era taxativo. Nesse sentido: STF. 1ª Turma. Inq 3590/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 12/8/2014.
 
Projetos de lei: Tramitavam no Congresso alguns projetos de lei buscando incluir, expressamente, na Lei 7.716/89, como crime, as condutas homofóbicas e tansfóbicas. Contudo, sempre se observou uma resistência muito grande de certos setores da sociedade com a punição de tais condutas e, em razão disso, esses projetos nunca foram aprovados.
 
Mandado de injunção: Diante do cenário acima descrito, em 2012, a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT) impetrou mandado de injunção no STF no qual pediu o reconhecimento de que a homofobia e a transfobia se enquadrassem no conceito de racismo ou, subsidiariamente, que fossem entendidas como discriminações atentatórias a direitos e liberdades fundamentais. Com fundamento nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição Federal, a ABGLT sustentou que a demora do Congresso Nacional é inconstitucional, tendo em vista o dever de editar legislação criminal sobre a matéria. O Min. Edson Fachin foi sorteado relator deste mandado de injunção.
 
ADO: Cerca de um ano depois, em 2013, o Partido Popular Socialista (PPS) ajuizou ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO), na qual pediu que o STF declarasse a omissão do Congresso Nacional por não ter votado projeto de lei que criminaliza atos de homofobia. A ação foi proposta a fim de que seja imposto ao Poder Legislativo o dever de elaborar legislação criminal que puna a homofobia e a transfobia como espécies do gênero “racismo”. A criminalização específica, conforme o partido, decorre da ordem constitucional de legislar relativa ao racismo - crime previsto no art. 5º, XLII, da CF/88 - ou, subsidiariamente, às discriminações atentatórias a direitos e liberdades fundamentais (art. 5º, XLI) ou, ainda, também subsidiariamente, ao princípio da proporcionalidade na acepção de proibição de proteção deficiente (art. 5º, LIV). De acordo com o partido, o Congresso Nacional tem se recusado a votar o projeto de lei que visa efetivar tal criminalização. O Min. Celso de Mello foi designado como relator da ADO.
 
Síntese dos argumentos: As duas ações desenvolveram a seguinte linha de raciocínio:
• a CF/88 possui mandados de criminalização, ou seja, “ordens” dadas pelo legislador constituinte ao legislador infraconstitucional (Congresso Nacional) no sentido de que eledeveria editar lei punindo criminalmente condutas que configurem discriminação e racismo. Esses mandados de criminalização estão em dois dispositivos constitucionais:
Art. 5º (...)
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
 
• o Congresso Nacional já puniu diversas condutas discriminatórias na Lei 7.716/89, mas continua sendo omisso no que tange à homofobia e transfobia. Logo, essa omissão precisa ser corrigida;
• a Lei 7.716/89 pune condutas racistas. Enquanto não se edita uma lei específica para se punir as condutas homofóbicas e transfóbicas, deve-se aplicar os crimes previstos na Lei nº 7.716/89 para tais condutas. Isso porque o conceito de racismo é amplo, não ficando limitado a uma definição biológica.
 
Depois de muitas sessões de discussão, o que decidiu o STF? O STF concordou com as ações propostas? SIM.
Quanto ao MI: O STF, por maioria, julgou procedente o mandado de injunção para:
a) reconhecer a mora inconstitucional do Congresso Nacional e;
b) aplicar, com efeitos prospectivos, até que o Congresso Nacional venha a legislar a respeito, a Lei nº 7.716/89 a fim de estender a tipificação prevista para os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional à discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero.
 
Quanto à ADO: O STF, também por maioria, julgou a ADO procedente, com eficácia geral e efeito vinculante, para:
a) reconhecer o estado de mora inconstitucional do Congresso Nacional na implementação da prestação legislativa destinada a cumprir o mandado de incriminação a que se referem os incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição, para efeito de proteção penal aos integrantes do grupo LGBT;
b) declarar, em consequência, a existência de omissão normativa inconstitucional do Poder Legislativo da União;
c) cientificar o Congresso Nacional, para os fins e efeitos a que se refere o art. 103, § 2º, da Constituição c/c o art. 12-H, caput, da Lei nº 9.868/99:
Art. 103. (...)
§ 2º Declarada a inconstitucionalidade por omissão de medida para tornar efetiva norma constitucional, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.
 
Da Decisão na Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão
Art. 12-H. Declarada a inconstitucionalidade por omissão, com observância do disposto no art. 22, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias.
 
d) dar interpretação conforme à Constituição, em face dos mandados constitucionais de incriminação inscritos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Carta Política, para enquadrar a homofobia e a transfobia, qualquer que seja a forma de sua manifestação, nos diversos tipos penais definidos na Lei 7.716/89, até que sobrevenha legislação autônoma, editada pelo Congresso Nacional, por dois motivos:
d.1) porque as práticas homotransfóbicas qualificam-se como espécies do gênero racismo, na dimensão de racismo social consagrada pelo STF no julgamento plenário do HC 82.424/RS (caso Ellwanger), na medida em que tais condutas importam em atos de segregação que inferiorizam membros integrantes do grupo LGBT, em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero;
d.2) porque tais comportamentos de homotransfobia ajustam-se ao conceito de atos de discriminação e de ofensa a direitos e liberdades fundamentais daqueles que compõem o grupo vulnerável em questão;
 
e) declarar que os efeitos da interpretação conforme a que se refere a alínea “d” somente se aplicarão a partir da data em que se concluir o presente julgamento.
 
O tema é extremamente amplo e irei fazer um breve resumo dos principais argumentos apresentados pelos Ministros:
 
Min. Celso de Mello: 
Ausência de proteção estatal a condutas homofóbicas e transfóbicas: O gênero e a orientação sexual constituem elementos essenciais e estruturantes da própria identidade da pessoa humana e integram uma das mais íntimas e profundas dimensões de sua personalidade. No entanto, devido à ausência de adequada proteção estatal, especialmente em razão da controvérsia gerada pela denominada “ideologia de gênero”, os integrantes da comunidade LGBT acham-se expostos a ações de caráter segregacionista, com caráter homofóbico, que têm por objetivo limitar ou suprimir prerrogativas essenciais de gays, lésbicas, bissexuais, travestis, transgêneros e intersexuais, entre outros. Tais práticas culminam no tratamento dessas pessoas como indivíduos destituídos de respeito e consideração, degradados ao nível de quem não tem nem sequer direito a ter direitos, por lhes ser negado, mediante discursos autoritários e excludentes, o reconhecimento da legitimidade de sua própria existência. Essa visão de mundo, fundada na ideia artificialmente construída de que as diferenças biológicas entre o homem e a mulher devem determinar os seus papéis sociais, impõe uma inaceitável restrição às suas liberdades fundamentais, com a submissão dessas pessoas a um padrão existencial heteronormativo, incompatível com a diversidade e o pluralismo que caracterizam uma sociedade democrática, e, ainda, a imposição da observância de valores que, além de conflitarem com sua própria vocação afetiva, conduzem à frustração de seus projetos pessoais de vida.
 
Existe um dever imposto pela CF/88 ao Congresso Nacional para que se crie normas de punição das condutas discriminatórias: A Constituição Federal possui dois mandados de incriminação para condutas discriminatórias: art. 5º, incisos XLI e XLII. Assim, é possível concluir que a omissão do Congresso Nacional em produzir normas legais de proteção penal à comunidade LGBT traduz situação configuradora de ilicitude, em afronta ao texto da CF/88.
 
Há descumprimento, por inércia estatal, de norma impositiva de comportamento atribuído ao Parlamento: Na tipologia das situações inconstitucionais, estamos diante do descumprimento, por inércia estatal, de uma norma impositiva de determinado comportamento atribuído ao poder público pela própria Constituição. Trata-se, portanto, de omissão abusiva no adimplemento da prestação legislativa. Há uma imposição constitucional de legislar e um estado de mora do legislador, mora essa que já superou, de forma excessiva, qualquer prazo razoável, considerando que a Constituição Federal foi editada em 1988. Esse cenário faz com que se chegue à conclusão de que estão presentes os requisitos para a declaração de inconstitucionalidade por omissão.
 
ADO como instrumento de concretização das cláusulas constitucionais frustradas: A ação direta de inconstitucionalidade por omissão deve ser vista como instrumento de concretização das cláusulas constitucionais frustradas pela inaceitável omissão do poder público. Isso porque as imposições feitas pela Constituição não podem ficar na inadmissível condição subalterna de um estatuto subordinado à vontade ordinária do legislador comum.
 
Possibilidade diante do reconhecimento da omissão: Ficou reconhecido que há uma mora imputável ao Congresso Nacional. O Min. Celso de Mello afirmou que haveria duas possibilidades de o STF agir diante disso:
a) apenas cientificar o Congresso Nacional para que ele adote, em prazo razoável, as medidas necessárias à efetivação da norma constitucional (art. 103, § 2º, c/c art. 12-H da Lei nº 9.868/99); ou
b) reconhecer, imediatamente, que a homofobia e a transfobia enquadram-se, mediante interpretação conforme à Constituição, na noção conceitual de racismo prevista na Lei nº 7.716/89.
 
Mero apelo ao legislador não tem sido eficaz: Para o Min. Celso de Mello, o mero apelo ao legislador não tem se mostrado uma solução eficaz, em razão da indiferença do Poder Legislativo que, em determinadas decisões anteriormente emanadas do STF, tem persistido em permanecer em estado de inadimplemento da prestação legislativa que lhe incumbe promover. Diantedisso, o STF, ao longo dos últimos trinta anos, evoluiu no plano jurisprudencial em busca da construção de soluções que pudessem fazer cessar esse estado de inconstitucional omissão normativa. Isso se deu, por exemplo, no caso do direito de greve por servidores públicos, no qual o STF determinou que, diante da ausência da lei prevista no art. 37, VII, da CF/88, os servidores públicos podem fazer greve, devendo ser aplicadas as leis que regulamentam a greve para os trabalhadores da iniciativa privada (Lei nº 7.701/88 e Lei nº 7.783/89): STF. Plenário. MI 708, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 25/10/2007.
 
Esse exercício de interpretação não significa legislar (não se está usurpando a competência do CN): Para o Ministro, essa postura adotada no caso da greve – que não se limita a cientificar o Congresso da mora, fornecendo, desde logo, uma solução jurídica para o caso – é um procedimento hermenêutico realizado pelo Poder Judiciário para extrair a necessária interpretação dos diversos diplomas legais. Segundo o Ministro, isso não se confunde com o processo de elaboração legislativa, ou seja, não se pode dizer que o STF esteja legislando. O processo de interpretação dos textos legais e da Constituição não importa em usurpação das atribuições normativas dos demais poderes da República.
 
Conceito de “raça”: O conceito de “raça” que compõe a estrutura normativa dos tipos penais incriminadores previstos na Lei 7.716/89 tem merecido múltiplas interpretações, revestindo-se, por isso, de inegável conteúdo polissêmico (algo que tem muitos significados). Um exemplo disso foi o célebre julgamento do “caso Ellwanger” (HC 82424), em setembro de 2003, quando o STF manteve a condenação imposta ao escritor gaúcho Siegfried Ellwanger por crime de racismo contra os judeus. Naquela ocasião, o STF afastou a alegação da defesa de que os “judeus” não seriam uma “raça”. Pode-se dizer, portanto, que o STF adotou uma espécie de conceito “social” de raça.
(...) 3. Raça humana. Subdivisão. Inexistência. Com a definição e o mapeamento do genoma humano, cientificamente não existem distinções entre os homens, seja pela segmentação da pele, formato dos olhos, altura, pêlos ou por quaisquer outras características físicas, visto que todos se qualificam como espécie humana. Não há diferenças biológicas entre os seres humanos. Na essência são todos iguais. 4. Raça e racismo. A divisão dos seres humanos em raças resulta de um processo de conteúdo meramente político-social. Desse pressuposto origina-se o racismo que, por sua vez, gera a discriminação e o preconceito segregacionista. (...) STF. Plenário. HC 82424, Relator p/ Acórdão Min. Maurício Corrêa, julgado em 17/09/2003.
 
Racismo é um conceito aberto que abrange preconceitos contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou identidade de gênero: Assim, a noção de racismo – para efeito de configuração típica dos delitos previstos na Lei 7.716/89 – não se resume a um conceito de ordem estritamente antropológica ou biológica. Projeta-se, ao contrário, numa dimensão abertamente cultural e sociológica, a abranger até mesmo situações de agressão injusta resultantes de discriminação ou de preconceito contra pessoas por sua orientação sexual ou sua identidade de gênero.
 
Atos homofóbicos e transfóbicos são formas contemporâneas de racismo: A configuração de atos homofóbicos e transfóbicos como formas contemporâneas do racismo objetiva preservar a incolumidade dos direitos da personalidade, como a essencial dignidade da pessoa humana. Busca inibir, desse modo, comportamentos abusivos que possam, impulsionados por motivações subalternas, disseminar criminosamente o ódio público contra outras pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero.
 
Interpretação conforme: Vale ressaltar que a aplicação da Lei 7.716/89 para condutas homofóbicas e transfóbicas resulta da aplicação do método da interpretação conforme. Assim, fazendo-se uma intepretação conforme do conceito de “raça”, previsto na Lei 7.716/89, chega-se à conclusão de que ele pode abranger também orientação sexual e identidade de gênero. Nas exatas palavras do Min. Celso de Mello: “A constatação da existência de múltiplas expressões semiológicas propiciadas pelo conteúdo normativo da ideia de “raça” permite reconhecer como plenamente adequado o emprego, na presente hipótese, da técnica de decisão e de controle de constitucionalidade fundada no método da interpretação conforme à Constituição.”
 
Não se trata de analogia: Atenção. Para o Min. Celso de Mello, a construção que foi feita, ou seja, a aplicação da Lei nº 7.716/89 às condutas homofóbicas e transfóbicas, não é aplicação analógica. Para ele, houve apenas interpretação conforme a Constituição. Confira:
“A solução propugnada não sugere a aplicação analógica das normas penais previstas na Lei 7.716/1989 nem implica a formulação de tipos criminais ou cominação de sanções penais.
É certo que, considerado o princípio constitucional da reserva absoluta de lei formal, o tema pertinente à definição de tipo penal e à cominação de sanção penal subsume-se ao âmbito das normas de direito material, de natureza eminentemente penal, regendo-se, em consequência, pelo postulado da reserva de parlamento.
Assim, inviável, em controle abstrato de constitucionalidade, colmatar, mediante decisão desta Corte Suprema, a omissão denunciada pelo autor da ação direta, procedendo-se à tipificação penal de condutas atentatórias aos direitos e liberdades fundamentais dos integrantes da comunidade LGBT.
Na verdade, a solução ora proposta limita-se à mera subsunção de condutas homotransfóbicas aos diversos preceitos primários de incriminação definidos em legislação penal já existente (Lei 7.716/89), pois os atos de homofobia e de transfobia constituem concretas manifestações de racismo, compreendido em sua dimensão social, ou seja, o denominado racismo social.”
 
Não há ofensa à liberdade religiosa: É necessário destacar que a decisão, no presente caso, não implica a ocorrência de qualquer ofensa ou dano potencial à liberdade religiosa, qualquer que seja a dimensão em que aquela se projete. A liberdade religiosa faz parte do regime democrático e não pode nem deve ser impedida pelo poder público nem submetida a ilícitas interferências do Estado. A adoção pelo Estado de meios destinados a impedir condutas homofóbicas e transfóbicas em hipótese alguma poderá restringir ou suprimir a liberdade de consciência e de crença, nem autorizar qualquer medida que interfira nas celebrações litúrgicas ou que importe em cerceamento à liberdade de palavra, seja como instrumento de pregação da mensagem religiosa, seja, ainda, como forma de exercer o proselitismo em matéria confessional em espaços públicos ou privados. Há que se preservar, portanto, a possibilidade de os líderes e membros das religiões exporem suas narrativas, conselhos, lições ou orientações constantes de seus livros sagrados, seja qual for a religião (como a Bíblia, a Torah, o Alcorão, a Codificação Espírita, os Vedas hindus e o Dhammapada budista). Essas práticas não configuram delitos contra a honra, porque veiculados com o intuito de divulgar o pensamento resultante do magistério teológico e da filosofia espiritual que são próprios de cada uma dessas denominações confessionais. Tal circunstância descaracteriza, por si só, o intuito doloso dos delitos contra a honra, a tornar legítimos o discurso e a pregação como expressões dos postulados de fé dessas religiões.
 
Em caso de insultos, ofensas ou estimulo à violência, poderá haver crime: Por outro lado, o direito de dissentir deixa de ser legítimo quando a sua exteriorização ofender valores e bens jurídicos igualmente protegidos pela ordem constitucional, como sucede com o direito de terceiros à incolumidade de seu patrimônio moral. Assim, pronunciamentos de índole religiosa que extravasem (extrapolem) os limites da livre manifestação de ideias, constituindo-se em insultos, ofensas ou em estímulo à intolerância e ao ódio público contra os integrantes da comunidade LGBT, nãomerecem proteção constitucional e não podem ser considerados liberdade de expressão. Em tais situações, haverá crime.
 
Função contramajoritária do STF: Para o Min. Celso de Mello, este julgamento reflete a função contramajoritária que o STF possui de, no Estado Democrático de Direito, conferir efetiva proteção às minorias. É uma função exercida no plano da jurisdição das liberdades. Nesse sentido, o STF desempenha o papel de órgão investido do poder e da responsabilidade institucional de proteger as minorias contra eventuais excessos da maioria ou contra omissões que se tornem lesivas, diante da inércia do Estado, aos direitos daqueles que sofrem os efeitos perversos do preconceito, da discriminação e da exclusão jurídica. Assim, para que o regime democrático não se reduza a uma categoria político-jurídica meramente conceitual ou simplesmente formal, torna-se necessário assegurar às minorias a plenitude de meios que lhes permitam exercer, de modo efetivo, os direitos fundamentais assegurados a todos. Ninguém se sobrepõe, nem mesmo os grupos majoritários, aos princípios superiores consagrados pela Constituição da República.
Min. Edson Fachin:
A CF/88 impõe um dever estatal de legislar (mandado de criminalização contra a discriminação homofóbica e transfóbica) em seu art. 5º, XLI, da CF/88. O trâmite de projetos de lei sobre a matéria no Congresso Nacional não obsta o conhecimento do mandado de injunção, haja vista jurisprudência do STF no sentido de que esse fato não serve para afastar o reconhecimento da omissão inconstitucional.
Há um quadro de violações sistemáticas aos direitos da população LGBTI, constatado também pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos e pelo Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas.
No mérito, o Ministro consignou que o direito constante do art. 5º, XLI, efetivamente contém mandado de criminalização contra a discriminação homofóbica e transfóbica.
Ante a mora do Congresso Nacional, essa ordem comporta, até que seja suprida, a colmatação pelo STF por meio de interpretação conforme da legislação de combate à discriminação. A seu ver, conforme o inciso XLI, qualquer espécie de discriminação é atentatória ao Estado Democrático de Direito, inclusive a que se fundamenta na orientação sexual das pessoas ou na sua identidade de gênero.
Vale ressaltar que na ADI 4275 o STF consignou que o direito à igualdade sem discriminações abrange a identidade ou expressão de gênero e a orientação sexual. Ademais, no âmbito internacional, o posicionamento é na mesma direção.
O princípio da proporcionalidade, na modalidade de proibição de proteção insuficiente, é o fundamento pelo qual o STF tem reconhecido que o Direito Penal pode ser um instrumento adequado para a proteção dos bens jurídicos expressamente indicados pelo texto constitucional. Os tratados internacionais de que a República brasileira é parte também contêm mecanismos de proteção proporcional. À luz desses tratados, dessume-se da leitura da CF/1988 um mandado constitucional de criminalização no tocante a toda e qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais, incluída a de orientação sexual e de identidade de gênero.
O mandado de injunção é a garantia para a efetividade do direito protegido pelo mandado de criminalização e que o STF compreendeu ser cabível ao Poder Judiciário atuar nas hipóteses de inatividade ou omissão do Legislativo.
No caso, além da falta de norma que proteja o público LGBT, verifica-se também uma situação de ofensa ao princípio da igualdade. Isso porque condutas igualmente reprováveis recebem tratamento jurídico distinto. Ex: impedir ou obstar acesso a órgão da Administração Pública, ou negar emprego em empresa privada, por preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional são condutas típicas, nos termos da Lei nº 7.716/89. Se as mesmas condutas fossem praticadas com preconceito a homossexual ou transgênero, não haveria crime.
Dessa maneira, a omissão legislativa em tipificar a discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero ofende um sentido mínimo de justiça ao sinalizar a tolerância à violência dirigida a pessoa, como se não fosse digna de viver em igualdade.
Toda pessoa deve ser protegida contra qualquer ato que atinja sua dignidade. É preciso dar sentido e concretude ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, que se torna passível de aplicação direta à situação em análise, por ter sido seu conteúdo nitidamente violado.
É certo que não pode o STF substituir o legislador, mas aqui há comando constitucional para regulamentar situações concretas. Lei específica sobre o tema deveria ter sido editada, porque o legislador constituinte originário, desde 1988, vinculou o legislador derivado. A falta de norma inviabiliza o exercício de direitos, e o texto constitucional não exclui o mandado de injunção de qualquer seara específica de incidência.
O Min. Fachin também sustentou que o STF não está fazendo analogia in malam partem ao aplicar a Lei 7.716/89 para manifestações homofóbicas ou transfóbicas. A CF contém expresso comando de punição penal para a discriminação homofóbica e a extensão prospectiva da lei de discriminação racial, até a edição específica de norma pelo Poder Legislativo, não viola o princípio da anterioridade da lei penal.
 
Min. Alexandre de Moraes:
O Min. Alexandre de Moraes também acompanhou os relatores pela procedência das ações. Em seu voto, reconheceu a inconstitucionalidade por omissão do Congresso Nacional em editar norma protetiva à comunidade LGBTI. Segundo ele, a atuação do Congresso Nacional em relação a grupos tradicionalmente vulneráveis foi sempre no sentido de que a ampla proteção depende de lei penal. O Congresso atuou dessa forma em relação às crianças e aos adolescentes, aos idosos, às pessoas com deficiência, às mulheres e até aos consumidores, No entanto, passados 30 anos da Constituição Federal, só a discriminação homofóbica e transfóbica permanece sem nenhum tipo de aprovação. O único caso em que o próprio Congresso não seguiu o seu padrão. A compreensão de que as práticas homofóbicas configuram racismo social, segundo o Ministro, não ofendem a liberdade religiosa, que é consagrada constitucionalmente.
 
Min. Roberto Barroso:
O Min. Luís Roberto Barroso também reconheceu a omissão legislativa. Ele observou que é papel do STF, no entanto, estabelecer diálogo respeitoso com o Congresso e também com a sociedade. “Se o Congresso atuou, a sua vontade deve prevalecer. Se não atuou e havia um mandamento constitucional nesse sentido, que o Supremo atue para fazer valer o que está previsto na Constituição”. A regra geral, afirmou, é a de autocontenção, deixando o maior espaço possível para a atuação do Legislativo. “Porém, quando estão em jogo direitos fundamentais ou a preservação das regras do jogo democrático, se justifica uma postura mais proativa do STF”. Esse é o caso dos autos. Barroso explicou que a punição para atos de homofobia e transfobia deve ser de natureza criminal por três razões: a relevância do bem jurídico tutelado e a sistematicidade de violação a este direito, o fato de que outras discriminações são punidas pelo direito penal e a circunstância de que a punição administrativa não é suficiente, uma vez que não coíbe de maneira relevante as violências homofóbicas. “Deixar de criminalizar a homofobia seria tipicamente uma hipótese de proteção deficiente”. Afirmou que a solução dada (aplicar a Lei do Racismo) não configura analogia nem interpretação extensiva. Isso porque no conceito de racismo firmado pelo STF estão colhidas as situações tipificadas na lei. Por fim, o Ministro também acolheu o pedido para interpretar o Código Penal conforme a Constituição para fixar que, se a motivação de homicídio for a homofobia, estará caracterizado o motivo fútil ou torpe, constituindo circunstância agravante ou qualificadora.
 
Min. Cármen Lúcia:
A Min. Cármen Lúcia acompanhou os relatores pela procedência dos pedidos. Ela avaliou que, após tantas mortes, ódio e incitação contrahomossexuais, não há como desconhecer a inércia do legislador brasileiro e afirmou que tal omissão é inconstitucional.
 
Min. Gilmar Mendes:
O Min. Gilmar Mendes acompanhou a maioria dos votos pela procedência das ações. Além de identificar a inércia do Congresso Nacional, ele entendeu que a interpretação apresentada pelos relatores de que a Lei do Racismo também pode alcançar os integrantes da comunidade LGBT é compatível com a Constituição Federal.
 
Min. Ricardo Lewandowski (vencido):
O Min. Ricardo Lewandowski reconheceu a mora legislativa e a necessidade de dar ciência dela ao Congresso Nacional a fim de que seja produzida lei sobre o tema. No entanto, entendeu que a homofobia e a transfobia não se enquadram na Lei do Racismo. É indispensável a existência de lei para que seja viável a punição penal de determinada conduta.
“A extensão do tipo penal para abarcar situações não especificamente tipificadas pela norma incriminadora parece-me atentar contra o princípio da reserva legal, que constitui uma garantia fundamental dos cidadãos que promove a segurança jurídica de todos”.
 
Min. Marco Aurélio (vencido):
Para o Min. Marco Aurélio, a Lei do Racismo não pode ser ampliada em razão da taxatividade dos delitos expressamente nela previstos. Ele considerou que a sinalização do STF para a necessária proteção das minorias e dos grupos socialmente vulneráveis, por si só, contribui para uma cultura livre de todo e qualquer preconceito e discriminação, preservados os limites da separação dos Poderes e da reserva legal em termos penais.
 
Min. Dias Toffoli (vencido):
O Min. Dias Toffoli acompanhou o ministro Ricardo Lewandowski pela procedência parcial dos pedidos, com a mera notificação do Congresso Nacional acerca da mora.
35.2. Palestra proferida por Bolsonaro com críticas aos quilombolas e estrangeiros não configurou racismo – (Info 915)
		O então Deputado Federal Jair Bolsonaro proferiu palestra no auditório de determinado clube e ali fez críticas e comentários negativos a respeito dos quilombolas e também de povos estrangeiros.
No trecho mais questionado de sua palestra, ele afirmou: “Eu fui em um quilombola em El Dourado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem para procriador eles servem mais. Mais de um bilhão de reais por ano gastado com eles. Recebem cesta básica e mais material em implementos agrícolas. Você vai em El Dourado Paulista, você compra arame farpado, você compra enxada, pá, picareta por metade do preço vendido em outra cidade vizinha. Por que? Porque eles revendem tudo baratinho lá. Não querem nada com nada.”
O STF entendeu que a conduta de Bolsonaro não configurou o crime de racismo (art. 20 da Lei nº 7.716/89).
As palavras por ele proferidas estão dentro da liberdade de expressão prevista no art. 5º, IV, da CF/88, além de também estarem cobertas pela imunidade parlamentar (art. 53 da CF/88).
O objetivo de seu discurso não foi o de repressão, dominação, supressão ou eliminação dos quilombolas ou dos estrangeiros.
O pronunciamento do parlamentar estava vinculado ao contexto de demarcação e proveito econômico das terras e configuram manifestação política que não extrapola os limites da liberdade de expressão.
Além disso, as manifestações de Bolsonaro estavam relacionadas com a sua função de parlamentar. Inclusive, o convite para a palestra se deu em razão do exercício do cargo de Deputado Federal a fim de dar a sua visão geopolítica e econômica do País.
Assim, havia uma vinculação das manifestações apresentadas na palestra com os pronunciamentos do parlamentar na Câmara dos Deputados, de sorte que incide a imunidade parlamentar.
STF. 1ª Turma. Inq 4694/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 11/9/2018 (Info 915).
	OBS: A denúncia oferecida contra Jair Bolsonaro foi recebida pelo STF? NÃO. A 1ª Turma do STF, por maioria (3x2), rejeitou a denúncia apresentada contra Bolsonaro. O colegiado entendeu que não ficou configurado o conteúdo discriminatório das declarações do acusado. As palavras por ele proferidas estão dentro da liberdade de expressão prevista no art. 5º, IV, da CF/88, além de também estarem cobertas pela imunidade parlamentar (art. 53 da CF/88).
35.3. A incitação de ódio público feita por líder religioso contra outras religiões pode configurar o crime de racismo – (Info 893) – IMPORTANTE!!! – (MPRR-2017) (PGERS-2015)
		A incitação ao ódio público contra quaisquer denominações religiosas e seus seguidores não está protegida pela cláusula constitucional que assegura a liberdade de expressão.
Assim, é possível, a depender do caso concreto, que um líder religioso seja condenado pelo crime de racismo (art. 20, §2º, da Lei nº 7.716/81) por ter proferido discursos de ódio público contra outras denominações religiosas e seus seguidores.
STF. 2ª Turma. RHC 146303/RJ, rel. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Dias Toffoli, j. 6/3/18 (Info 893).
Atenção. Compare com RHC 134682/BA, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/11/16 (Info 849). 
	OBS:
A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: Tiago, pastor de uma determinada igreja evangélica, publicou, em seu blog, vídeos e posts de conteúdo religioso nos quais ofendeu líderes e seguidores de outras crenças religiosas diversas da sua (católica, judaica, espírita, islâmica, umbandista etc.), pregando inclusive o fim de algumas delas e imputando fatos ofensivos aos seus devotos e sacerdotes. O pastor afirmou, por exemplo, que os seguidores dessas outras crenças “sofrem” e “padecem”, sendo “estuprados”, “violentados” e “destruídos” por seguirem “caminhos de podridão”. Utilizou expressões como “religião assassina”, “líderes assassinos”, “prostituta católica”, “prostituta espiritual” e “pilantragem”. Tiago vinculou, ainda, de forma pejorativa, tais religiões à adoração ao diabo. Diante disso, ele foi denunciado e condenado pela prática do crime previsto no art. 20, §2º, da Lei nº 7.716/81:
Art. 20. Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
Pena: reclusão de um a três anos e multa. (...)
§ 2º Se qualquer dos crimes previstos no caput é cometido por intermédio dos meios de comunicação social ou publicação de qualquer natureza:
Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.
 
A defesa de Tiago interpôs uma série de recursos até que o caso chegou ao STF. No Supremo, alegou a atipicidade da conduta. Segundo a defesa, a condenação ideológica de outras crenças é inerente à prática religiosa, e se trataria de exercício de uma garantia constitucionalmente assegurada.
 
A tese da defesa foi acolhida pelo STF? NÃO. O STF manteve a condenação e afirmou que:
A incitação ao ódio público contra quaisquer denominações religiosas e seus seguidores não está protegida pela cláusula constitucional que assegura a liberdade de expressão. STF. 2ª Turma. RHC 146303/RJ, rel. Min. Edson Fachin, red. p/ o ac. Min. Dias Toffoli, julgado em 6/3/2018 (Info 893).
 
Conforme explicou o Min. Dias Toffoli, o Brasil, social e historicamente, orgulha-se de ser um país de tolerância religiosa, valor que faz parte da construção de nosso estado democrático de direito. De acordo com o Ministro, existem diversos trechos no discurso do condenado que alimentam o ódio e a intolerância. Assim, se o Estado não exercer seu papel de pacificar a sociedade, vai se chegar a uma guerra de religiões. “Ao invés de sermos instrumento de pacificação, vamos aprofundar o que acontece no mundo”, afirmou o Ministro. O preâmbulo da CF/88 fala na construção de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social. A ação do condenado atua contra um importante valor escolhido como fundamento da República Federativa do Brasil, que é a solidariedade. A despeito da importância conferida à liberdade de expressão, o próprio texto constitucional determina que sejam respeitados determinados limites. O art. 220, § 1º, da CF/88 diz que nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à liberdade de informação jornalística em qualquero princípio da insignificância no caso de contrabando, tendo em vista o desvalor da conduta do agente.
STF, HC 110964, Relator Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma, julgado em 07/02/2012.
STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1472745/PR, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 1/9/15.
3. TEORIA DO DOMÍNIO DO FATO
3.1. O superior hierárquico não pode ser punido com base na teoria do domínio do fato se não tiver sido demonstrado o dolo – (Info 880)
		A teoria do domínio do fato não permite que a mera posição de um agente na escala hierárquica sirva para demonstrar ou reforçar o dolo da conduta. 
Do mesmo modo, também não permite a condenação de um agente com base em conjecturas. Assim, não é porque houve irregularidade em uma licitação estadual que o Governador tenha que ser condenado criminalmente por isso. 
STF. 2ª Turma. AP 975/AL, Rel. Min. Edson Fachin, j. 3/10/17 (Info 880).
	OBS: Sobre o tema, confira outro precedente semelhante:
Não há óbice para que a denúncia invoque a teoria do domínio do fato para dar suporte à imputação penal, sendo necessário, contudo, que, além disso, ela aponte indícios convergentes no sentido de que o Presidente da empresa não só teve conhecimento do crime de evasão de divisas, como dirigiu finalisticamente a atuação dos demais acusados.
Assim, não basta que o acusado se encontre em posição hierarquicamente superior. Isso porque o próprio estatuto da empresa prevê que haja divisão de responsabilidades e, em grandes corporações, empresas ou bancos há controles e auditorias exatamente porque nem mesmo os sócios têm como saber tudo o que se passa.
STF. 2ª Turma. HC 127397/BA, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 6/12/16 (Info 850).
4. DOSIMETRIA DA PENA 
4.1. MULTA: MP é quem deve executar a pena de multa e, apenas se ficar inerte por mais de 90 dias, essa legitimidade é transferida para a Fazenda Pública – (Info 927) – IMPORTANTE!!! Mudança de Entendimento!!!
		O Ministério Público possui legitimidade para propor a cobrança de multa decorrente de sentença penal condenatória transitada em julgado, com a possibilidade subsidiária de cobrança pela Fazenda Pública.
Quem executa a pena de multa?
• Prioritariamente: o Ministério Público, na vara de execução penal, aplicando-se a LEP.
• Caso o MP se mantenha inerte por mais de 90 dias após ser devidamente intimado: a Fazenda Pública irá executar, na vara de execuções fiscais, aplicando-se a Lei nº 6.830/80.
STF. Plenário. ADI 3150/DF, Rel. para acórdão Min. Roberto Barroso, j. 12 e 13/12/18 (Info 927).
STF. Plenário. AP 470/MG, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 12 e 13/12/18 (Info 927).
Obs: A Súmula 521-STJ fica superada e deverá ser cancelada. Súmula 521-STJ: A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública.
	OBS:
Multa: é uma espécie de pena, por meio da qual o condenado fica obrigado a pagar uma quantia em dinheiro que será revertida em favor do Fundo Penitenciário.
Pagamento da multa: A pena de multa é fixada na própria sentença condenatória. Depois que a sentença transitar em julgado, o condenado terá um prazo máximo de 10 dias para pagar a multa imposta (art. 50 do CP). O Código prevê a possibilidade de o condenado requerer o parcelamento da multa em prestações mensais, iguais e sucessivas, podendo o juiz autorizar, desde que as circunstâncias justifiquem (ex.: réu muito pobre, multa elevadíssima etc.). O parcelamento deverá ser feito antes de esgotado o prazo de 10 dias. O Juiz, antes de decidir, poderá determinar diligências para verificar a real situação econômica do condenado e, ouvido o MP, fixará o número de prestações (art. 169, § 1º da LEP). Se o condenado for impontual ou se melhorar de situação econômica, o Juiz, de ofício ou a requerimento do MP, poderá revogar o benefício (art. 169, § 2º da LEP).
O que acontece caso o condenado não pague nem parcele a multa no prazo de 10 dias?
1) Antes da Lei 9.268/96: se o condenado, deliberadamente, deixasse de pagar a pena de multa, ela deveria ser convertida em pena de detenção. Em outras palavras, a multa era transformada em pena privativa de liberdade.
2) Atualmente: a Lei 9.268/96 alterou o art. 51 do CP e previu que, se a multa não for paga, ela será considerada dívida de valor e deverá ser exigida por meio de execução (não se permite mais a conversão da pena de multa em detenção).
 
	Antes da Lei 9.268/96
	Depois da Lei 9.268/96 (ATUALMENTE)
	Art. 51. A multa converte-se em pena de detenção, quando o condenado solvente deixa de paga-lá ou frustra a sua execução.
	Art. 51. Transitada em julgado a sentença condenatória, a multa será considerada dívida de valor, aplicando-se-lhes as normas da legislação relativa à dívida ativa da Fazenda Pública, inclusive no que concerne às causas interruptivas e suspensivas da prescrição.
 
Multa permaneceu com caráter penal: Importante esclarecer que, mesmo com essa mudança trazida pela Lei 9.268/96, a multa continua tendo caráter de sanção criminal, ou seja, permanece sendo uma pena, por força do art. 5º, XLVI, “c”, da CF/88:
Art. 5º (...)
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:
c) multa;
Assim, a única coisa que a Lei 9.268/96 fez foi mudar a forma de cobrança da multa não paga: antes, ela virava pena de detenção; agora, deve ser cobrada por meio de execução.
Quem executa a pena de multa? 
	STJ: Fazenda Pública
	STF:
Prioritariamente: o Ministério Público.
Subsidiariamente: a Fazenda Pública
	O STJ sempre sustentou que, como se trata de dívida de valor, a pena de multa deveria ser executada pela Fazenda Pública por meio de execução fiscal que tramita na vara de execuções fiscais.
O rito a ser aplicado seria o da Lei nº 6.830/80.
A execução da pena de multa ocorreria como se estivesse sendo cobrada uma multa tributária.
Não se aplica a Lei nº 7.210/84 (LEP).
 
Esse era o entendimento pacífico do STJ, tanto que foi editada uma súmula nesse sentido.
 
Súmula 521-STJ: A legitimidade para a execução fiscal de multa pendente de pagamento imposta em sentença condenatória é exclusiva da Procuradoria da Fazenda Pública.
	A Lei nº 9.268/96, ao considerar a multa penal como dívida de valor, não retirou dela o caráter de sanção criminal. 
Diante de tal constatação, não há como retirar do MP a competência para a execução da multa penal, considerado o teor do art. 129 da CF/88, segundo o qual é função institucional do MP promover privativamente a ação penal pública, na forma da lei.
Promover a ação penal significa conduzi-la ao longo do processo de conhecimento e de execução, ou seja, buscar a condenação e, uma vez obtida esta, executá-la. Caso contrário, haveria uma interrupção na função do titular da ação penal.
Ademais, o art. 164 da LEP é expresso ao reconhecer essa competência do MP. Esse dispositivo não foi revogado expressamente pela Lei nº 9.268/96.
Vale ressaltar, entretanto que, se o titular da ação penal, mesmo intimado, não propuser a execução da multa no prazo de 90 dias, o juiz da execução criminal deverá dar ciência do feito ao órgão competente da Fazenda Pública (federal ou estadual, conforme o caso) para a respectiva cobrança na própria vara de execução fiscal, com a observância do rito da Lei 6.830/80.
	Quem executa: Fazenda Pública.
Juízo: vara de execuções fiscais.
Legislação: Lei nº 6.830/80.
	Quem executa:
• Prioritariamente: o Ministério Público, na vara de execução penal, aplicando-se a LEP.
• Caso o MP se mantenha inerte por mais de 90 dias após ser devidamente intimada: a Fazenda Pública irá executar, na vara de execuções fiscais, aplicando-se a Lei nº 6.830/80.
 
Exemplo: João foi sentenciado por roubo e o juiz de direito (Justiça Estadual) o condenou a 4 anos de reclusão e mais 10 dias-multa no valor de meio salário mínimo cada. Depois do trânsito em julgado, o condenado foi intimado para pagar a pena de multa no prazo de 10 dias, mas não o fez. Diante disso, o escrivão da vara irá fazer uma certidão na qual constarão as informações sobre a condenação e o valor da multa.veículo de comunicação social, observados determinados incisos do art. 5º, onde estão contidas as limitações. O direto de pensar, falar e escrever sem censuras ou restrições é o mais precioso privilégio dos cidadãos, mas esse direito não é absoluto e sofre limitações de natureza ética e jurídica.
Os abusos, quando praticados, legitimam a atuação estatal. “Se assim não fosse, caluniar, injuriar, difamar ou fazer apologia de fatos criminosos não seriam suscetíveis de punições”, explicou o Min. Celso de Mello.
O abuso no exercício da liberdade de expressão não pode ser tolerado. Assim, a incitação ao ódio público não está protegida nem amparada pela cláusula constitucional que assegura liberdade de expressão.
 
Caso Ellwanger: Os Ministros relembraram ainda o célebre julgamento do “caso Ellwanger” (HC 82424), em setembro de 2003, quando o STF manteve a condenação imposta ao escritor gaúcho Siegfried Ellwanger por crime de racismo contra os judeus. Veja trechos da ementa:
(...) 1. Escrever, editar, divulgar e comerciar livros "fazendo apologia de idéias preconceituosas e discriminatórias" contra a comunidade judaica (Lei 7716/89, artigo 20, na redação dada pela Lei 8081/90) constitui crime de racismo sujeito às cláusulas de inafiançabilidade e imprescritibilidade (CF, artigo 5º, XLII). (...) 6. Adesão do Brasil a tratados e acordos multilaterais, que energicamente repudiam quaisquer discriminações raciais, aí compreendidas as distinções entre os homens por restrições ou preferências oriundas de raça, cor, credo, descendência ou origem nacional ou étnica, inspiradas na pretensa superioridade de um povo sobre outro, de que são exemplos a xenofobia, "negrofobia", "islamafobia" e o anti-semitismo. (...) 13. Liberdade de expressão. Garantia constitucional que não se tem como absoluta. Limites morais e jurídicos. O direito à livre expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam ilicitude penal. 14. As liberdades públicas não são incondicionais, por isso devem ser exercidas de maneira harmônica, observados os limites definidos na própria Constituição Federal (CF, artigo 5º, § 2º, primeira parte). O preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o "direito à incitação ao racismo", dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra. Prevalência dos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade jurídica. (...) STF. Plenário. HC 82424, Relator p/ Acórdão Min. Maurício Corrêa, j. 17/09/2003.
 
Questão de concurso: 
(PGEPA-2011): No HC 82424-2 – “Caso Ellwanger” –, o STF julgou pedido de “habeas corpus” em favor de editor de obras que veiculavam ideias supostamente antissemitas. Analise as proposições abaixo e assinale a alternativa correta: A ordem de “habeas corpus” foi indeferida com fundamento, entre outros, de que o direito à liberdade de expressão não pode abrigar, em sua abrangência, manifestações de conteúdo imoral que implicam em ilicitude penal. (CERTA)
Hate speech (discurso de ódio): O tema acima exposto está ligado ao que a doutrina chama de hate speech (discurso de ódio). Discurso de ódio (hate speech) são “manifestações de pensamento que ofendam, ameacem ou insultem determinado grupo de pessoas com base na raça, cor, religião, nacionalidade, orientação sexual, ancestralidade, deficiência ou outras características próprias. (...) No direito norte-americano, prevalece o entendimento de que até o discurso de ódio (hate speech) inclui-se no âmbito de proteção da liberdade de expressão.” (BERNARDES, Juliano Taveira; FERREIRA, Olavo Augusto Vianna Alves. Direito Constitucional. Tomo II. 7ª ed. Salvador: Juspodivm, 2017, p. 128).
No Brasil, ao contrário dos EUA, prevalece que o hate speech não é protegido pela ordem constitucional. Isso porque o direito à liberdade de expressão não é absoluto, podendo a pessoa que proferiu o discurso de ódio ser punida, inclusive criminalmente, em caso de abuso. Esse tem sido, por exemplo, o entendimento das bancas examinadoras:
(PGE-RS FUNDATEC 2015): Ao tratar do alcance da liberdade de expressão em relação ao chamado “discurso do ódio” (“hate speech”), o STF sustentou que o direito à liberdade de expressão é um direito relativo, objeto de ponderação, à luz dos princípios da dignidade humana, proporcionalidade e razoabilidade, não podendo acolher a incitação ao ódio racial ou religioso. (certo)
 
Situação deve ser analisada com base no caso concreto: Assim, podemos concluir que é possível a condenação de um líder religioso pelo crime de racismo (art. 20, §2º, da Lei nº 7.716/81) em caso de discursos de ódio público contra outras denominações religiosas e seus seguidores. Vale ressaltar, no entanto, que essa condenação dependerá do caso concreto, ou seja, das palavras que foram proferidas e da intenção do líder religioso de suprimir ou reduzir a dignidade daquele que é diferente de si. Desse modo, não é qualquer crítica de um líder religioso a outras religiões que configurará o crime de racismo. Nesse sentido, recentemente o STF absolveu um líder religioso dessa imputação por falta de dolo. Relembre:
Determinado padre escreveu um livro, voltado ao público da Igreja Católica, no qual ele faz críticas ao espiritismo e a religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé.
O Ministério Público da Bahia ofereceu denúncia contra ele pela prática do art. 20, § 2º da Lei nº 7.716/89 (Lei do racismo).
No caso concreto, o STF entendeu que não houve o crime.
A CF/88 garante o direito à liberdade religiosa. Um dos aspectos da liberdade religiosa é o direito que o indivíduo possui de não apenas escolher qual religião irá seguir, mas também o de fazer proselitismo religioso.
Proselitismo religioso significa empreender esforços para convencer outras pessoas a também se converterem à sua religião.
Desse modo, a prática do proselitismo, ainda que feita por meio de comparações entre as religiões (dizendo que uma é melhor que a outra) não configura, por si só, crime de racismo.
Só haverá racismo se o discurso dessa religião supostamente superior for de dominação, opressão, restrição de direitos ou violação da dignidade humana das pessoas integrantes dos demais grupos. Por outro lado, se essa religião supostamente superior pregar que tem o dever de ajudar os "inferiores" para que estes alcancem um nível mais alto de bem-estar e de salvação espiritual e, neste caso não haverá conduta criminosa.
Na situação concreta, o STF entendeu que o réu apenas fez comparações entre as religiões, procurando demonstrar que a sua deveria prevalecer e que não houve tentativa de subjugar os adeptos do espiritismo.
Pregar um discurso de que as religiões são desiguais e de que uma é inferior à outra não configura, por si, o elemento típico do art. 20 da Lei nº 7.716/89. Para haver o crime, seria indispensável que tivesse ficado demonstrado o especial fim de supressão ou redução da dignidade do diferente, elemento que confere sentido à discriminação que atua como verbo núcleo do tipo. STF. 1ª Turma. RHC 134682/BA, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 29/11/2016 (Info 849).
 
Desse modo, em concursos públicos deve-se ficar atento para a redação do enunciado.
35.4. Análise do caso "Jonas Abib" – (Info 849) – IMPORTANTE!!!
		Determinado padre escreveu um livro, voltado ao público da Igreja Católica, no qual ele faz críticas ao espiritismo e a religiões de matriz africana, como a umbanda e o candomblé. 
O MP da Bahia ofereceu denúncia contra ele pela prática do art. 20, § 2º da Lei 7.716/89 (Lei do racismo). 
No caso concreto, o STF entendeu que não houve o crime. 
A CF/88 garante o direito à liberdade religiosa. Um dos aspectos da liberdade religiosa é o direito que o indivíduo possui de não apenas escolher qual religião irá seguir, mas também o de fazer proselitismo religioso. 
Proselitismo religioso significa empreender esforços para convencer outras pessoas a também se converterem à sua religião. 
Desse modo, a prática do proselitismo, ainda que feitapor meio de comparações entre as religiões (dizendo que uma é melhor que a outra) não configura, por si só, crime de racismo. 
Só haverá racismo se o discurso dessa religião supostamente superior for de dominação, opressão, restrição de direitos ou violação da dignidade humana das pessoas integrantes dos demais grupos. Por outro lado, se essa religião supostamente superior pregar que tem o dever de ajudar os "inferiores" para que estes alcancem um nível mais alto de bem-estar e de salvação espiritual e, neste caso não haverá conduta criminosa. 
Na situação concreta, o STF entendeu que o réu apenas fez comparações entre as religiões, procurando demonstrar que a sua deveria prevalecer e que não houve tentativa de subjugar os adeptos do espiritismo. 
Pregar um discurso de que as religiões são desiguais e de que uma é inferior à outra não configura, por si, o elemento típico do art. 20 da Lei 7.716/89. Para haver o crime, seria indispensável que tivesse ficado demonstrado o especial fim de supressão ou redução da dignidade do diferente, elemento que confere sentido à discriminação que atua como verbo núcleo do tipo. 
STF. 1ª Turma. RHC 134682/BA, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/11/16 (Info 849).
36. CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO 
36.1. O art. 305 do CTB é constitucional e não viola o princípio da não autoincriminação – (Info 923) – IMPORTANTE!!!
		A regra que prevê o crime do art. 305 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é constitucional, posto não infirmar o princípio da não incriminação, garantido o direito ao silêncio e ressalvadas as hipóteses de exclusão da tipicidade e da antijuridicidade.
STF. Plenário. RE 971959/RS, Rel. Min. Luiz Fux, j. 14/11/18 (repercussão geral) (Info 923).
	OBS:
Evasão do local do acidente para evitar responsabilidade penal ou civil: O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê o seguinte delito em seu art. 305:
Art. 305. Afastar-se o condutor do veículo do local do acidente, para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída:
Penas - detenção, de seis meses a um ano, ou multa.
 
Em que consiste o crime: O agente se envolve em um acidente de trânsito e foge do local para não ser identificado e não ter que responder a um processo criminal ou uma ação de indenização. Arnaldo Rizzardo dispõe: “(...) o condutor, uma vez verificado o acidente, simplesmente abandona o local, não aguardando a realização das providências de identificação dos veículos, dos condutores, e demais anotações, a cargo da autoridade de trânsito, e mesmo dos outros envolvidos.” (RIZZARDO, Arnaldo. Comentários ao Código de Trânsito brasileiro. 9ª ed., São Paulo: RT, 2013, p. 627).
 
Bem jurídico tutelado: De forma imediata, o crime protege a administração da justiça, que fica prejudicada pela fuga do agente do local do evento, uma vez que tal atitude impede sua identificação e a consequente apuração do ilícito, para fins de se promover a responsabilização cível ou penal de quem, eventualmente, provocar um acidente de trânsito, dolosa ou culposamente. De forma mediata, tutela o direito da vítima à reparação do dano.
 
Sujeitos do crime: Tanto o sujeito ativo como o sujeito passivo podem ser qualquer pessoa. Trata-se, portanto, de crime bicomum.
 
Elemento subjetivo: É o dolo. Vale ressaltar que se exige especial fim de agir (dolo específico), considerando que o agente deve ter saído do local “para fugir à responsabilidade penal ou civil que lhe possa ser atribuída”. Não admite modalidade culposa.
 
Consumação: É crime material. Assim, o delito se consuma quando o agente consegue se afastar (evadir-se, fugir) do local do acidente. Se ele tenta fugir, mas é impedido pela vítima, por populares ou pela polícia, por exemplo, haverá tentativa.
 
Outras informações:
• a ação penal é pública incondicionada;
• trata-se de infração de menor potencial ofensiva, de forma que o rito é sumaríssimo (Lei 9.099/95), cabendo transação penal e suspensão condicional do processo.
 
Discussão quanto à constitucionalidade deste crime: Os Tribunais de Justiça dos Estados de São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina e Rio Grande do Sul possuíam entendimento no sentido de que este crime do art. 305 do CTB seria inconstitucional ou, pelo menos, inconvencional. Isso porque ele violaria o direito à não autoincriminação. O direito à não autoincriminação é uma decorrência da ampla defesa, prevista no art. 5º, LV e LXIII. Além disso, o Pacto de San José da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos), que vige em nosso ordenamento jurídico com caráter supralegal, estabelece em seu artigo 8º, inciso II, alínea “g”, que “toda pessoa tem direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada”.
 
Essa discussão chegou finalmente ao STF. O que decidiu o STF? O art. 305 do CTB é constitucional ou não? O art. 305 do CTB é constitucional. O STF, em repercussão geral, fixou a seguinte tese: A regra que prevê o crime do art. 305 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é constitucional, posto não infirmar o princípio da não incriminação, garantido o direito ao silêncio e ressalvadas as hipóteses de exclusão da tipicidade e da antijuridicidade. STF. Plenário. RE 971.959/RS, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 14/11/2018 (repercussão geral) (Info 923).
 
Vou fazer um breve resumo dos argumentos invocados.
 
Flexibilização do princípio da vedação à autoincriminação: De fato, a CF/88 prevê, como uma decorrência da ampla defesa, o direito à não autoincriminação (nemo tenetur se detegere). De igual modo, o Pacto de San José da Costa Rica também assegura esse direito aos acusados. No entanto, para o STF, é “admissível a flexibilização do princípio da vedação à autoincriminação proporcionada pela opção do legislador de criminalizar a conduta de fugir do local do acidente”. O legislador, ao exigir que o agente envolvido no acidente continue no local do fato até que sejam feitos os procedimentos de identificação das pessoas e do sinistro, “não afeta o núcleo irredutível” do direito fundamental à não autoincriminação. O direito à não autoincriminação preconiza que jamais se pode obrigar o investigado ou réu a agir ativamente na produção de prova contra si próprio. Ocorre que o tipo penal do art. 305 do CTB apenas obriga a permanência do agente no local para garantir a identificação dos envolvidos no sinistro e o devido registro da ocorrência pela autoridade competente. Assim, ele não viola o núcleo da garantia de não autoincriminação.
 
Obriga-se o condutor a permanecer no local, mas não a “assumir a culpa” (continua “garantido o direito ao silêncio”): O art. 305 do CTB exige que o agente permaneça no local do acidente e se identifique perante a autoridade de trânsito. Mas o tipo penal não obriga que o condutor assuma eventual responsabilidade cível ou penal. Se ele permanecer no local e negar que tenha culpa, não incide o crime do art. 305 do CTB. Vale ressaltar, inclusive, que o condutor, após sua identificação pela autoridade de trânsito, pode optar por permanecer em silêncio quanto à dinâmica do acidente e não prestar nenhum esclarecimento sobre como ocorreu o sinistro. Em suma, depois de se identificar, pode exercer seu direito ao silêncio, que não significará confissão nem poderá ser interpretado em prejuízo da defesa (art. 186, parágrafo único, do CPP).
 
Princípio da proporcionalidade: Eventual declaração de inconstitucionalidade da conduta tipificada no art. 305 do CTB, em nome de uma leitura absoluta e irrestrita do princípio da vedação à autoincriminação, caracterizaria afronta ao princípio constitucional da proporcionalidade em sua dimensão que proíbe a proteção deficiente. Desse modo, o princípio que veda a não autoincriminação pode ser relativizado pelo legislador, considerando que, segundo a teoria geral dos direitos fundamentais, havendo conflito entre dois princípios, é necessário um juízo de ponderação. Assim ocorre, por exemplo, com os postulados da proibição de excesso e da vedação à proteção insuficiente.
 
Fragilização da tutela penal: A criação de empecilhos à responsabilizaçãopenal do condutor que foge do local do acidente fragiliza a tutela penal do Estado e deixa descoberto o bem jurídico que o referido crime deveria proteger. Além disso, indiretamente, deixa sem proteção direitos fundamentais que um trânsito seguro busca preservar, dentre eles o direito à vida.
 
Negar a vontade do Parlamento: Descriminalizar o crime de fuga significaria efetivamente negar a vontade do Parlamento. Essa conduta é criminalizada porque a Constituição promete, em nome do povo, uma sociedade justa e solidária, o que não poderia ser garantido caso afastada a juridicidade de uma conduta de quem abandona o local do acidente para fugir à responsabilidade penal e civil.
 
Convenção de Trânsito de Viena: Importante mencionar que existe uma norma de direito internacional que abona (avaliza) essa opção feita pelo legislador no art. 305 do CTB. Trata-se da Convenção de Trânsito de Viena, promulgada pelo Decreto 86.714/1981. Esta Convenção prevê que o condutor e demais envolvidos em caso de acidente devem comunicar a sua identidade, caso isso seja exigido (artigo 31).
 
Precedente do STF na análise do art. 307 do CP: Vale ressaltar que o STF já tem um precedente análogo. Isso porque o STF reconheceu que o art. 307 do CP é constitucional e não viola o princípio que veda a autoincriminação. Relembre o que diz o art. 307 do CP:
Falsa identidade
Art. 307. Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato não constitui elemento de crime mais grave.
 
O STF entende que há crime quando o agente, para não se incriminar, atribui a si uma identidade que não é sua. Essa questão já foi, inclusive, analisada pelo Pleno do STF em regime de repercussão geral:
O princípio constitucional da autodefesa (art. 5º, inciso LXIII, da CF/88) não alcança aquele que atribui falsa identidade perante autoridade policial com o intento de ocultar maus antecedentes, sendo, portanto, típica a conduta praticada pelo agente (art. 307 do CP). STF. Plenário. RE 640139 RG, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 22/09/2011.
 
No mesmo sentido:
Súmula 522-STJ: A conduta de atribuir-se falsa identidade perante autoridade policial é típica, ainda que em situação de alegada autodefesa.
 
A persecução penal admite a relativização dos direitos na hipótese de justificável tensão entre o dever do poder público de promover uma repressão eficaz às condutas puníveis e as esferas de liberdade ou intimidade daquele que se encontre na posição de suspeito ou acusado. Nesse âmbito, o direito à não autoincriminação se insere no mesmo conjunto de direitos subjetivos e garantias do cidadão brasileiro, de que são exemplos os direitos à intimidade, à privacidade e à honra. Essa relativização é admissível, embora mediante a observância dos parâmetros constitucionais pertinentes à harmonização de princípios eventualmente colidentes. Diante desse quadro, trata-se de garantia que não pode ser interpretada como o direito do suspeito, acusado ou réu a não participar da produção de medidas probatórias. A referida flexibilização possibilita que se efetivem, em maior medida, outros princípios fundamentais com os quais aquele colide no plano concreto, sem que isso acarrete qualquer violação à dignidade da pessoa humana.
 
Mesmo no caso de condutas ativas do acusado/investigado têm sido admitidas flexibilizações: O direito do investigado de não realizar condutas ativas que importem na introdução de informações ao processo também comporta níveis de flexibilização, muito embora a regra geral seja a da sua vedação. A jurisprudência do STF, historicamente, adotava uma postura restrita quanto à admissibilidade das intervenções corporais. Contudo, na linha do que se visualiza no cenário internacional, o STF, gradativamente, iniciou uma caminhada em sentido oposto. Um precedente exemplificativo desse processo é a Rcl 2.040/DF, na qual se decidiu que a autoridade jurisdicional poderia autorizar a realização de exame de DNA em material colhido de gestante mesmo sem sua autorização, tendo em vista o objetivo de investigar possível crime de estupro. O direito comparado à luz da legislação e da jurisprudência dos principais países da Europa Continental admite a intervenção corporal coercitiva, desde que autorizada judicialmente, restrita à cooperação passiva do sujeito investigado ou acusado e sem ofensa à dignidade humana.
 
Se o agente fugiu com medo de eventuais agressões ou para cuidar de um ferimento sofrido, não haverá crime (“hipóteses de exclusão da tipicidade e da antijuridicidade”): Vale ressaltar, por fim, que o abandono do local do acidente pode ser legitimado em caso de eventual risco de agressões que o condutor possa vir a sofrer por parte dos populares presentes ou ainda caso ele esteja ferido e precise se deslocar imediatamente em busca de atendimento médico. Para o Min. Lewandowski, nos casos concretos em que houver perigo de vida do causador do evento caso permaneça no local do acidente, o juiz poderá aferir a exclusão da antijuridicidade da conduta, tal como a legítima defesa ou o estado de necessidade. Já para o Min. Alexandre de Moraes, essas situações realmente não configuram crime, mas por outra razão: atipicidade. Segundo o Ministro, esses casos representam condutas atípicas, uma etapa anterior à excludente de ilicitude, porque o tipo penal exige que o condutor do veículo se afaste do local do crime “para fugir à responsabilidade penal ou civil”. Havendo necessidade de o agente evadir-se pelas circunstâncias apresentadas, não ocorre dolo específico do tipo.
 
Votos vencidos: Ficaram vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Dias Toffoli, que entendiam que o tipo penal do art. 305 do CTB viola o princípio da não autoincriminação.
36.2. Crime de dirigir sem habilitação é absorvido pela lesão corporal culposa na direção de veículo – (Info 796) – IMPORTANTE!!! - (TJPR-2017)
		Se um indivíduo, que não possui habilitação para dirigir (art. 309 do CTB), conduz seu veículo de forma imprudente, negligente ou imperita e causa lesão corporal em alguém, ele responderá pelo crime do art. 303, § 1º, do CTB, ficando o delito do art. 309 do CTB absorvido por força do princípio da consunção.
O delito de dirigir veículo sem habilitação é crime de ação penal pública incondicionada. Por outro lado, a lesão corporal culposa (art. 303 do CTB) é crime de ação pública condicionada à representação. Imagine que a vítima não exerça seu direito de representação no prazo legal. Diante disso, o Ministério Público poderá denunciar o agente pelo delito do art. 309?
NÃO. O delito do art. 309 já foi absorvido pela conduta de praticar lesão corporal culposa na direção de veículo automotor, tipificada no art. 303 do CTB, crime de ação pública condicionada à representação. Como a representação não foi formalizada pela vítima, houve extinção da punibilidade, que abrange tanto a lesão corporal como a conduta de dirigir sem habilitação.
STF. 2ª Turma. HC 128921/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 25/8/15 (Info 796).
37. CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA (LEI 8.137/90) 
37.1. O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei 8.137/90 – (Info 964 do STF e Info 633 do STJ) – IMPORTANTE!!!
		A conduta de não recolher ICMS em operações próprias ou em substituição tributária enquadra-se formalmente no tipo previsto no art. 2º, II, da Lei 8.137/90 (apropriação indébita tributária), desde que comprovado o dolo.
O não repasse do ICMS recolhido pelo sujeito passivo da obrigação tributária, em qualquer hipótese, enquadra-se (formalmente) no tipo previsto art. 2º, II, da Lei 8.137/90, desde que comprovado o dolo.
Em outras palavras, o tipo do art. 2º, II, da Lei 8.137/90 não fica restrito apenas às hipóteses em que há substituição tributária.
O que se criminaliza é o fato de o sujeito passivo se apropriardo dinheiro relativo ao imposto, devidamente recebido de terceiro, quer porque descontou do substituído tributário, quer porque cobrou do consumidor, não repassando aos cofres públicos.
STJ. 3ª Seção. HC 399109-SC, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 22/08/18 (Info 633).
O contribuinte que, de forma contumaz e com dolo de apropriação, deixa de recolher o ICMS cobrado do adquirente da mercadoria ou serviço, incide no tipo penal do art. 2º, II, da Lei nº 8.137/90. 
O valor do ICMS cobrado do consumidor não integra o patrimônio do comerciante, o qual é mero depositário desse ingresso de caixa que, depois de devidamente compensado, deve ser recolhido aos cofres públicos. 
Vale ressaltar, contudo, que, para caracterizar o delito, é preciso comprovar a existência de intenção de praticar o ilícito (dolo).
STF. Plenário. RHC 163334/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 18/12/19 (Info 964).
37.2. O prazo da prescrição da pretensão punitiva fica suspenso durante o parcelamento do débito tributário – (Info 911) – IMPORTANTE!!! - (TJSC-2019)
		O que acontece se o réu de um crime contra a ordem tributária aderir ao parcelamento da dívida?
Haverá a suspensão do processo penal. Nos crimes contra a ordem tributária, quando o agente ingressa no regime de parcelamento dos débitos tributários, fica suspensa a pretensão punitiva penal do Estado (o processo criminal fica suspenso).
Durante o parcelamento o que ocorre com o prazo prescricional?
Também fica suspenso. O prazo prescricional não corre enquanto estiverem sendo cumpridas as condições do parcelamento do débito fiscal. É o que prevê o art. 9º, § 1º da Lei nº 10.684/2003.
Se, ao final, o réu pagar integralmente os débitos, haverá a extinção da punibilidade.
STF. 2ª Turma. ARE 1037087 AgR/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 14/8/2018 (Info 911).
	OBS:
Imagine a seguinte situação: Após procedimento administrativo fiscal, ficou comprovado que João praticou apropriação indébita previdenciária (art. 168-A, § 1º, I do CP) e sonegação de contribuição previdenciária (art. 337-A, III do CP). Diante disso, o devedor, com medo do processo penal, decidiu aderir a um parcelamento do débito fiscal, ou seja, ele foi até a Receita Federal e pediu para pagar parceladamente a quantia devida.
 
Esse parcelamento terá influência na esfera penal? SIM. 
· Quando o agente ingressa no regime de parcelamento dos débitos tributários: fica suspensa a pretensão punitiva penal do Estado.
· Caso o agente pague integralmente os débitos: haverá extinção da punibilidade.
 
Isso está previsto no art. 9º da Lei 10.684/03. Veja:
Lei nº 10.684/2003
Art. 9º É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento. (...)
§ 2º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos neste artigo quando a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos e contribuições sociais, inclusive acessórios.
 
Também é a redação do art. 83 da Lei 9.430/96, com redação dada pela Lei 12.382/11:
Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária previstos nos arts. 1º e 2º da Lei n.° 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a Previdência Social, previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei n.° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), será encaminhada ao Ministério Público depois de proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente. (Redação dada pela Lei nº 12.350/2010) (...)
§ 2º É suspensa a pretensão punitiva do Estado referente aos crimes previstos no caput, durante o período em que a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no parcelamento, desde que o pedido de parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da denúncia criminal. (Incluído pela Lei 12.382/2011) (...)
§ 4º Extingue-se a punibilidade dos crimes referidos no caput quando a pessoa física ou a pessoa jurídica relacionada com o agente efetuar o pagamento integral dos débitos oriundos de tributos, inclusive acessórios, que tiverem sido objeto de concessão de parcelamento. (Incluído pela Lei 12.382/2011)
 
Durante o parcelamento, o que ocorre com o prazo prescricional? Também fica suspenso. É o que foi decidido no Info 911 do STF. Vimos que o parcelamento da dívida tributária acarreta a suspensão do processo penal. Em outras palavras, o Estado não pode julgar criminalmente este réu enquanto ele estiver no parcelamento tributário.
Ora, como está suspensa a pretensão punitiva durante o período do parcelamento do débito, também deve ficar suspenso o prazo prescricional. Se o Estado está impedido legalmente de julgar e punir o indivíduo, não se pode dizer que o Estado está inerte. A prescrição é um instituto relacionado com a inércia do titular. Além disso, permitir que a prescrição siga seu curso normal durante o período de adesão voluntária do contribuinte ao programa de recuperação fiscal serviria como estratégia do réu para alcançar a impunidade. Por essas razões, o legislador estabeleceu expressamente a suspensão da prescrição nestes casos. Veja:
Lei nº 10.684/2003
Art. 9º É suspensa a pretensão punitiva do Estado, referente aos crimes previstos nos arts. 1º e 2º da Lei nº 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, durante o período em que a pessoa jurídica relacionada com o agente dos aludidos crimes estiver incluída no regime de parcelamento.
§ 1º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva. (...)
 
Lei nº 9.430/96
Art. 83. (...)
§ 3º A prescrição criminal não corre durante o período de suspensão da pretensão punitiva. (Incluído pela Lei 12.382/2011)
37.3. Causa de aumento do art. 12, I, da Lei nº 8.137/90 – (Info 882) – IMPORTANTE!!!
		O art. 12, I, da Lei 8.137/90 prevê que a pena do crime de sonegação fiscal (art. 1º, I, da Lei nº 8.137/90) deverá ser aumentada no caso de o delito “ocasionar grave dano à coletividade”.
A jurisprudência entende que se configura a referida causa de aumento quando o agente deixa de recolher aos cofres públicos uma vultosa quantia. Em outras palavras, se o valor sonegado foi alto, incide a causa de aumento do art. 12, I.
A Portaria nº 320, editada pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, prevê que os contribuintes que estão devendo acima de R$ 10 milhões são considerados “grandes devedores” e devem receber tratamento prioritário na atuação dos Procuradores.
Diante disso, surgiu uma tese defensiva dizendo que somente as dívidas acima de R$ 10 milhões poderiam ser consideradas de grande porte, justificando a incidência da causa de aumento do art. 12, I.
Essa tese não foi acolhida pelo STF e STJ.
Não é razoável dizer que somente deverá incidir a causa de aumento de pena do art. 12, I, se o valor dos tributos sonegados for superior a R$ 10 milhões, previsto no art. 2º da Portaria nº 320/PGFN. Isso porque este dispositivo define "quantia vultosa" para fins internos de acompanhamento prioritário pela Fazenda Nacional dos processos de cobrança, não limitando ou definindo o que seja grave dano à coletividade.
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1274989/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 19/08/14.
STF. 2ª Turma. HC 129284/PE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 17/10/17 (Info 882).
	OBS:
Art. 12. São circunstâncias que podem agravar de 1/3 (um terço) até a metade as penas previstas nos arts. 1°, 2° e 4° a 7°:
I - ocasionar grave dano à coletividade;
37.4. Não se pode invocar a teoria do domínio do fato, pura e simplesmente, sem nenhuma outra prova – (Info 866)
		O diretor-geral da empresa de telefonia Vivo foi denunciado pelo fato de que na filial que funcionano Estado de Pernambuco teriam sido inseridos elementos inexatos em livros fiscais. 
Diante disso, o Ministério Público denunciou o referido diretor pela prática de crime contra a ordem tributária (art. 1º, II, da Lei nº 8.137/90). 
A denúncia aponta que, na condição de diretor da empresa, o acusado teria domínio do fato, o poder de determinar, de decidir, e de fazer com que seus empregados contratados executassem o ato, sendo responsável pelo delito.
O STF determinou o trancamento da ação penal afirmando que não se pode invocar a teoria do domínio do fato, pura e simplesmente, sem nenhuma outra prova, citando de forma genérica o diretor estatutário da empresa para lhe imputar um crime fiscal que teria sido supostamente praticado na filial de um Estado-membro onde ele nem trabalha de forma fixa. 
Em matéria de crimes societários, a denúncia deve apresentar, suficiente e adequadamente, a conduta atribuível a cada um dos agentes, de modo a possibilitar a identificação do papel desempenhado pelos denunciados na estrutura jurídico-administrativa da empresa. 
Não se pode fazer uma acusação baseada apenas no cargo ocupado pelo réu na empresa. 
STF. 2ª Turma. HC 136250/PE, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 23/5/17 (Info 866).
	OBS:
Teoria do domínio do fato: Nos crimes tributários, é muito comum o Ministério Público invocar a aplicação da teoria do domínio do fato para pedir a condenação do réu. Isso porque, na maioria dos casos, quem pratica a conduta de suprimir ou reduzir tributo é o empregado, gerente ou contador da pessoa jurídica. No entanto, o MP alega que a orientação para essa conduta partiu de um sócio-administrador ou diretor-geral da empresa.
Pela teoria tradicional, o autor é aquela pessoa que pratica o verbo nuclear do tipo. Logo, o empregado, gerente ou contador seriam os autores do delito.
A teoria do domínio do fato, criada na Alemanha, em 1939, por Hans Welzel, teve a finalidade de ampliar o conceito de autor. Por força dessa teoria, pode também ser considerado autor aquele que, mesmo não realizando o núcleo do tipo, domina finalisticamente todo o seu desenrolar. Welzel dizia que autor é o “senhor do fato”. Dessa forma, pela teoria do domínio do fato, o autor seria o sócio-administrador que decidiu e determinou que fossem praticados os atos necessários à supressão ou redução do tributo.
37.5. Investigação preliminar antes da constituição definitiva do crédito tributário – (Info 819)
		Imagine que determinada empresa deixou de pagar tributos, fraudando a fiscalização tributária (inciso II do art. 1º da Lei nº 8.137/90). Ocorre que o Fisco ainda não terminou o processo administrativo-fiscal instaurado para apurar o fato. É possível que seja instaurado inquérito policial para apurar o crime mesmo não tendo havido ainda a constituição definitiva do crédito tributário? 
SIM. Nos crimes de sonegação tributária, apesar de a jurisprudência do STF condicionar a persecução penal à existência do lançamento tributário definitivo, o mesmo não ocorre quanto à investigação preliminar. Em outras palavras, mesmo não tendo havido ainda a constituição definitiva do crédito tributário, já é possível o início da investigação criminal para apurar o fato. 
STF. 1ª Turma. HC 106152/MS, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 29/3/2016 (Info 819).
	Sonegação fiscal: O art. 1º da Lei nº 8.137/90 tipifica o chamado delito de sonegação fiscal:
Art. 1º Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas: (Vide Lei nº 9.964, de 10.4.2000)
I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;
II - fraudar a fiscalização tributária, inserindo elementos inexatos, ou omitindo operação de qualquer natureza, em documento ou livro exigido pela lei fiscal;
III - falsificar ou alterar nota fiscal, fatura, duplicata, nota de venda, ou qualquer outro documento relativo à operação tributável;
IV - elaborar, distribuir, fornecer, emitir ou utilizar documento que saiba ou deva saber falso ou inexato;
V - negar ou deixar de fornecer, quando obrigatório, nota fiscal ou documento equivalente, relativa a venda de mercadoria ou prestação de serviço, efetivamente realizada, ou fornecê-la em desacordo com a legislação.
Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. A falta de atendimento da exigência da autoridade, no prazo de 10 (dez) dias, que poderá ser convertido em horas em razão da maior ou menor complexidade da matéria ou da dificuldade quanto ao atendimento da exigência, caracteriza a infração prevista no inciso V.
Os crimes dos incisos I a IV do art. 1º da Lei nº 8.137/90 são materiais. Assim, para que se configurem, é indispensável a constituição definitiva do crédito tributário, nos termos da SV 24-STF:
Súmula vinculante 24: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo.
Imagine que determinada empresa deixou de pagar tributos, fraudando a fiscalização tributária (inciso II do art. 1º da Lei nº 8.137/90). Ocorre que o Fisco ainda não terminou o processo administrativo-fiscal instaurado para apurar o fato. É possível que seja instaurado inquérito policial para apurar o crime mesmo não tendo havido ainda a constituição definitiva do crédito tributário? SIM. A 1ª Turma do STF decidiu que nos crimes de sonegação tributária, apesar de a jurisprudência do STF condicionar a persecução penal à existência do lançamento tributário definitivo, o mesmo não ocorre quanto à investigação preliminar. Em outras palavras, mesmo não tendo havido ainda a constituição definitiva do crédito tributário, já é possível o início da investigação criminal para apurar o fato.
O argumento utilizado pelo STF foi o de que, mesmo antes da constituição definitiva, já teria havido o início da execução e, portanto, seria possível a investigação. 
Obs: A decisão acima é polêmica e se mostra contrária a alguns precedentes anteriores do STJ. Será necessário aguardar para ver se irá se consolidar. Por enquanto, fique atento(a) porque poderá ser cobrada em concursos no sentido do que foi decidido.
37.6. Dosimetria da pena – (Info 799)
		Determinado réu foi condenado por sonegação fiscal (art. 1º, I, da Lei 8.137/90).
O STF considerou correta a sentença do juiz que, na 1ª fase da dosimetria da pena, aumentou a pena-base com fundamento em dois argumentos:
1) Na análise das circunstâncias, o magistrado aumentou a pena sob a alegação de que o réu omitiu seu nome do quadro societário da empresa com o objetivo de esconder que era ele quem realmente administrava a empresa.
O STF afirmou que o ardil utilizado pelo réu (omissão do seu nome do quadro societário da empresa) teve como objetivo acobertar sua real condição de administrador da empresa investigada e, com isso, furtar-se de possível aplicação da lei penal. Essa omissão do nome do réu no quadro societário não é a mesma omissão de que trata o inciso I do art. 1º.
A omissão que é elementar do tipo é a omissão para suprimir ou reduzir tributo. A omissão do nome do réu foi para evitar que ele fosse descoberto. Logo, punir a omissão do nome do réu não significa punir o condenado duas vezes pelo mesmo fato.
2) No exame das consequências do crime, o juiz também majorou a pena argumentando que o crime praticado gerou um grande prejuízo ao erário (mais de 2 milhões de reais), o que autorizaria a elevação da pena-base. Segundo entende o STF, em se tratando de infrações penais contra a ordem tributária, a extensão do dano causado pode ser invocada na 1ª fase da dosimetria como critério para exasperação da pena-base, sem que tanto implique bis in idem.
STF. 2ª Turma. HC 128446/PE, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 15/9/2015 (Info 799).
37.7. Aplicação da SV 24-STF a fatos anteriores à sua edição – (Info 786) – IMPORTANTE!!!
		A SV 24-STF diz que o crime tributário material só se consuma com o lançamento definitivo do tributo. Em outras palavras, não existecrime antes da constituição definitiva do crédito tributário. Logo, indiretamente, a SV afirma que o prazo prescricional só começa a ser contado no dia da constituição definitiva do crédito tributário já que é nessa data que o delito se consuma (art. 111, I, do CP). 
Perceba, portanto, que sob o ponto de vista da prescrição, a SV 24-STF é prejudicial para o réu porque mesmo ele tendo praticado a conduta anos antes, o prazo prescricional nem começou a correr se ainda não houve constituição definitiva do crédito tributário. Fica assim mais difícil de o agente escapar da prescrição. O Estado-acusação acaba “ganhando” mais tempo para oferecer a denúncia antes que o crime prescreva. 
Desse modo, surgiu a tese defensiva de que a SV 24-STF, por ser mais gravosa ao réu, não poderia retroagir para ser aplicada a fatos anteriores à sua edição, sob pena de isso ser considerado aplicação retroativa “in malam partem”. Esse argumento foi aceito? É proibido aplicar a SV 24-STF para fatos anteriores à sua edição? 
NÃO. A tese não foi aceita. A SV 24-STF pode sim ser aplicada a fatos anteriores à sua edição. 
Não se pode concordar com o argumento de que a aplicação da SV 24-STF a fatos anteriores à sua edição configura retroatividade “in malam partem”. Isso porque o aludido enunciado apenas consolidou interpretação reiterada do STF sobre a matéria. 
A súmula vinculante não é lei nem ato normativo, de forma que a SV 24-STF não inovou no ordenamento jurídico. O enunciado apenas espelhou (demonstrou) o que a jurisprudência já vinha decidindo. 
STF. 1ª Turma. RHC 122774/RJ, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/5/2015 (Info 786).
37.8. Sonegação fiscal e art. 42 da Lei 9.430/96 – (Info 750) – IMPORTANTE!!! CONCURSOS FEDERAIS!!!
		A Lei n. 9.430/96 trata sobre procedimentos de fiscalização tributária realizados pela Receita Federal. Em alguns dispositivos, a Lei define omissão de receita, ou seja, situações em que a fiscalização considera que o contribuinte não declarou corretamente as receitas ou rendimentos obtidos. Veja o que diz o art. 42: 
Art. 42. Caracterizam-se também omissão de receita ou de rendimento os valores creditados em conta de depósito ou de investimento mantida junto a instituição financeira, em relação aos quais o titular, pessoa física ou jurídica, regularmente intimado, não comprove, mediante documentação hábil e idônea, a origem dos recursos utilizados nessas operações.
 
Em outras palavras, se é depositada uma determinada quantia na conta bancária do indivíduo e este não consegue provar a origem desses recursos, a Receita Federal irá presumir que são rendimentos e, consequentemente, irá lavrar auto de infração e cobrar o valor do imposto de renda sobre tais quantias. 
Se o contribuinte não se defender administrativamente ou se a sua defesa não for acatada, haverá a constituição definitiva desse crédito tributário. 
A partir daí, a RFB comunica o fato ao MPF que, então, irá formular denúncia (ação penal) contra o contribuinte alegando que ele praticou o delito do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/90. 
Caso o contribuinte/réu seja condenado por esse fato, haverá violação ao princípio da presunção de inocência? 
NÃO. Não ofende o princípio constitucional da presunção de inocência a exigência de comprovação da origem de valores estabelecida no art. 42 da Lei n. 9.430/96. 
Para o STF, o contribuinte, ao não comprovar a origem dos recursos depositados em sua conta bancária, cria, contra si, uma presunção relativa de que houve omissão de rendimentos, ensejando a condenação criminal. 
Não há ofensa ao princípio da presunção de inocência porque se trata de um procedimento legalmente estabelecido e disciplinado, sendo certo que ao contribuinte é garantido o contraditório e a ampla defesa.
STF. 2ª Turma. HC 121125/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 10/6/2014 (Info 750).
38. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL (Lei 7.492/86) 
38.1. Dinheiro mantido no exterior integrando trust revogável cujo instituidor e beneficiário é a mesma pessoa deverá ser declarado ao Banco Central – (Info 831)
		Foi encontrada conta bancária em nome de um Deputado Federal no exterior na qual estavam depositados milhões de dólares. Vale ressaltar que o Parlamentar não comunicou a existência dessa conta ao Banco Central e que, na declaração que os candidatos a cargos eletivos devem prestar à Justiça Eleitoral sobre seus bens, ele também não mencionou a existência desse dinheiro no exterior. 
Diante disso, ele foi denunciado pela prática de lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei 9.613/98), evasão de divisas (art. 22, § único, da Lei 7.492/86) e falsidade ideológica para fins eleitorais (art. 350 do Código Eleitoral). 
Em sua defesa, o denunciado alegou que a conta bancária encontrada não está em nome dele. A sua titularidade pertence a um trust e, portanto, ele não teria obrigação de declará-la ao BACEN nem à Justiça Eleitoral. 
Esta tese não foi aceita pelo STF no momento do recebimento da denúncia. 
O Deputado Federal foi o instituidor do trust e figura como beneficiário. Além disso, o trust era revogável, de forma que a relação contratual poderia ser a qualquer momento desfeita e o patrimônio voltaria à sua titularidade. Logo, para o STF, ele detém a plena disponibilidade jurídica e econômica dos valores que integram o trust. 
Assim, se ele não declarou a existência de tais valores ao Banco Central e à Justiça Eleitoral, praticou, em tese, os crimes de lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei 9613/98), evasão de divisas (art. 22, § único, da Lei 7.492/86) e falsidade ideológica para fins eleitorais (art. 350 do Código Eleitoral). 
O fato de as quantias não estarem formalmente em seu nome é absolutamente irrelevante para a tipicidade da conduta.
A manutenção de valores em contas no exterior, mediante utilização de interposta pessoa ou forma de investimento (trust), além de não desobrigar o beneficiário de apresentar a correspondente declaração ao BACEN, revela veementes indícios do ilícito de lavagem de dinheiro. 
STF. Plenário. Inq 4146/DF, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 22/6/16 (Info 831).
39. LAVAGEM DE DINHEIRO 
39.1. Não configura o crime de lavagem a conduta do agente que esconde as notas de dinheiro recebido como propina nos bolsos do paletó, na cintura e dentro das meias – (Info 955) – IMPORTANTE!!! – (Anal. Judic./TREPA-2020)
	Não configura o crime de lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei 9.613/98) a conduta do agente que recebe propina decorrente de corrupção passiva e tenta viajar com ele, em voo doméstico, escondendo as notas de dinheiro nos bolsos do paletó, na cintura e dentro das meias.
Também não configura o crime de lavagem de dinheiro o fato de, após ter sido descoberto, dissimular (“mentir”) a natureza, a origem e a propriedade dos valores.
STF. 1ª T. Inq 3515/SP, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 8/10/19 (Info 955).
	(Anal. Judic./TREPA-2020-IBFC): Considere o posicionamento do STF em relação às disposições do Código Penal e demais leis extravagantes para assinalar a alternativa correta: Não configura o crime de lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei 9.613/98) a conduta do agente que recebe propina decorrente de corrupção passiva e tenta viajar com ele, em voo doméstico, escondendo as notas de dinheiro nos bolsos do paletó, na cintura e dentro das meias, tampouco o fato de, após ter sido descoberto, dissimular ("mentir") a natureza, a origem e a propriedade dos valores. BL: Info 955, STF.
39.2. Não se deve reconhecer a consunção entre corrupção passiva e lavagem quando a propina é recebida no exterior por meio de transação envolvendo offshore na qual resta evidente a intenção de ocultar os valores – (Info 937) – IMPORTANTE!!! (Anal. Judic./TREPA-2020)
	Eduardo Cunha foi condenado pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, por ter solicitado e recebido dinheiro de uma empresa privada para interferir em um contrato com a Petrobrás.
A propina teria sido acertada entre o indivíduo chamado “IC”, proprietário da empresa beneficiada, e “JL”, ex-Diretor Internacionalda Petrobrás. O pagamento foi realizado mediante transferências para contas secretas no exterior.
O STF entendeu que não se podia reconhecer a consunção entre a corrupção passiva e a lavagem, considerando que não houve simples pagamento da propina para interposta pessoa, mas sim pagamento mediante utilização de contas secretas no exterior em nome de uma offshore, de um lado, e de um trust, de outro, e da realização de transação por meio da qual a propina foi depositada e ocultada em local seguro. Logo, ficou demonstrada da autonomia entre os delitos.
STF. 2ª Turma. HC 165036/PR, Rel. Min. Edson Fachin, j. 9/4/19 (Info 937).
39.3. Simples fato de ter recebido a propina em espécie não configura lavagem de dinheiro – (Info 904) 
39.4. Recebimento de propina em depósitos bancários fracionados pode configurar lavagem – (Info 904)
	O mero recebimento de valores em dinheiro não tipifica o delito de lavagem, seja quando recebido pelo próprio agente público, seja quando recebido por interposta pessoa.
STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/5/18 (Info 904).
	Pratica lavagem de dinheiro o sujeito que recebe propina por meio de depósitos bancários fracionados, em valores que não atingem os limites estabelecidos pelas autoridades monetárias à comunicação compulsória dessas operações. 
Ex: suponhamos que, na época, a autoridade bancária dizia que todo depósito acima de R$ 20 mil deveria ser comunicado ao COAF; diante disso, um Deputado recebia depósitos periódicos de R$ 19 mil para burlar essa regra. Para o STF, isso configura o crime de lavagem. Trata-se de uma forma de ocultação da origem e da localização da vantagem pecuniária recebida pela prática do crime antecedente.
STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, j. 29/5/2018 (Info 904).
	OBS: 
A situação concreta foi a seguinte: O Deputado Federal Nelson Meurer (PP/PR) integrava a cúpula do Partido Progressista (PP). Como importante figura partidária, ele exercia pressão política junto à Presidência da República a fim de que Paulo Roberto Costa fosse mantido como Diretor de Abastecimento da Petrobrás. Como “contraprestação” por esse apoio, o Deputado recebia dinheiro do referido Diretor, quantia essa oriunda de contratos ilegais celebrados pela Petrobrás. Essa prática foi revelada pelo próprio Paulo Roberto Costa em declaração prestada no bojo de acordo de colaboração premiada. O Deputado foi denunciado pela prática de corrupção passiva (art. 317 do CP) e também por lavagem de dinheiro (art. 1º da Lei nº 9.613/98).
 
O que o STF decidiu? O STF condenou o réu pela prática dos delitos. O crime de lavagem de dinheiro é tipificado nos seguintes termos:
Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.
Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa.
 
O Ministério Público apontava uma série de condutas que configurariam o crime de lavagem de dinheiro. Inicialmente, o STF afirmou que o réu não cometeu o crime quando recebeu o pagamento das propinas em espécie (em “dinheiro vivo”).
O mero recebimento de valores em dinheiro não tipifica o delito de lavagem, seja quando recebido pelo próprio agente público, seja quando recebido por interposta pessoa. STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 29/5/2018 (Info 904).
 
Assim, se uma pessoa recebe propina em dinheiro, isso não significa, necessariamente, a prática de lavagem de dinheiro.
Por outro lado, o STF entendeu que:
O agente praticou a lavagem pelo fato de ter recebido a propina em depósitos bancários fracionados, em valores que não atingem os limites estabelecidos pelas autoridades monetárias à comunicação compulsória dessas operações. STF. 2ª Turma. AP 996/DF, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 29/5/2018 (Info 904).
 
Ex: suponhamos que, na época, a autoridade bancária dizia que todo depósito acima de R$ 20 mil deveria ser comunicado ao COAF; diante disso, o Deputado recebia depósitos periódicos de R$ 19 mil para burlar essa regra. Para o STF, isso configura o crime de lavagem. Trata-se de uma forma de ocultação da origem e da localização da vantagem pecuniária recebida pela prática do crime anterior.
Além disso, a apresentação de informações falsas em declarações de ajuste anual de imposto de renda foi uma forma de tentar dar um ar de licitude a patrimônio oriundo de práticas delituosas.
39.5. Lavagem de dinheiro, na modalidade “ocultar”, é crime permanente – (Info 866)
		O delito de lavagem de bens, direitos ou valores (“lavagem de dinheiro”), previsto no art. 1º da Lei nº 9.613/98, quando praticado na modalidade de ocultação, tem natureza de crime permanente. 
A característica básica dos delitos permanentes está na circunstância de que a execução desses crimes não se dá em um momento definido e específico, mas em um alongar temporal. Quem oculta e mantém oculto algo, prolonga a ação até que o fato se torne conhecido. 
Assim, o prazo prescricional somente tem início quando as autoridades tomam conhecimento da conduta do agente. 
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/17 (Info 866).
39.6. Culpabilidade de parlamentar que exerce mandato há muitos anos é mais intensa – (Info 866)
		Na primeira fase da dosimetria em caso de condenação por lavagem de dinheiro, o órgão julgador poderá aumentar a pena-base do Deputado Federal que exerce mandato há muitos anos, sob o argumento de que sua culpabilidade é mais intensa. 
A transgressão da lei por parte de quem usualmente é depositário da confiança popular para o exercício do poder enseja juízo de reprovação muito mais intenso do que seria cabível em se tratando de um cidadão comum. 
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/17 (Info 866).
39.7. Reprovabilidade do crime cometido por “homem público” é maior – (Info 866)
		Se um Deputado Federal que exerce mandato há muitos anos é condenado, o órgão julgador poderá aumentar a pena-base atribuindo destaque negativo para a “reprovabilidade”. 
A circunstância de o réu ser homem de longa vida pública, acostumado com regras jurídicas, enseja uma maior reprovabilidade em sua conduta considerando a sua capacidade acentuada de conhecer e compreender a necessidade de observar as normas. 
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/2017 (Info 866).
39.8. Pena pode ser aumentada se o crime de lavagem envolveu grandes somas de valores – (Info 866)
		Se a lavagem de dinheiro envolveu valores vultosos, a pena-base poderá ser aumentada (“consequências do crime”) tendo em vista que, neste caso, considera-se que o delito violou o bem jurídico tutelado de forma muito mais intensa do que o usual. 
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/17 (Info 866).
39.9. Pena pode ser aumentada se a lavagem de dinheiro ocorreu por meio de várias transações financeiras envolvendo diversos países – (Info 866)
		A pena-base pode ser aumentada, no que tange às “circunstâncias do crime”, se a lavagem de dinheiro ocorreu num contexto de múltiplas transações financeiras e de múltipla transnacionalidade, o que interfere na ordem jurídica de mais de um Estado soberano. 
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/2017 (Info 866).
39.10. Condenação por lavagem no “caso Maluf” – (Info 866)
		Pratica o crime de lavagem de dinheiro o Deputado Federal que encobre (oculta) o dinheiro recebido decorrente de corrupção passiva, utilizando-se, para tanto, de contas bancárias e fundos de investimentos situados na Ilha de Jersey, abertos em nome de empresas “offshores”, com o objetivo de encobrir a verdadeira origem, natureza e propriedade dos referidos aportes financeiros. 
STF. 1ª Turma. AP 863/SP, Rel. Min. Edson Fachin, j. 23/5/2017 (Info 866).
40. CRIMES DE RESPONSABILIDADE DOS PREFEITOS (DL 201/67) 
40.1. Prefeito que utiliza dinheiro destinado a um programa de saúde para pagamento de dívidas da Secretaria de Saúde com a previdência municipal praticao crime do art. 1º, III, do DL 201/67 – (Info 944)
		Configura o crime do art. 1º, III, do DL 201/67, a conduta do Prefeito que utiliza verbas oriundas do Fundo Nacional de Saúde (vinculadas a determinado programa de saúde) para o pagamento de débitos da Secretaria Municipal de Saúde junto ao instituto de previdência do Município. 
O delito previsto no art. 1º, III, do DL 201/1967 consiste em o administrador público aplicar verba pública em destinação diversa da prevista em lei. Não se trata, portanto, de desviar em proveito próprio.
Para a configuração deste crime, é irrelevante verificar se houve, ou não, efetivo prejuízo para a Administração Pública.
STF. 1ª Turma. AP 984/AP, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 11/6/2019 (Info 944).
	OBS:
A situação concreta, segundo a denúncia do MP, foi a seguinte: Em 2011, Roberto Góes, então Prefeito de Macapá (AP), e dois de seus Secretários Municipais, aplicaram indevidamente verbas públicas no montante de R$ 858 mil, oriundas do Fundo Nacional de Saúde (vinculadas ao Programa DST/AIDS), para pagamento de débitos da Secretaria Municipal de Saúde junto à Macapá Previdência (Macaprev). Em outras palavras, as verbas que seriam para um programa de saúde foram utilizadas para pagamento de dívidas da Secretaria com o instituto de previdência do Município.
 
Qual foi o crime, em tese, praticado pelo Prefeito e os Secretários? O delito previsto no art. 1º, III, do Decreto-Lei 201/67:
Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores: (...)
III - desviar, ou aplicar indevidamente, rendas ou verbas públicas; (...)
§1º Os crimes definidos nêste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos.
O Decreto-Lei 201/67 é um ato normativo com status de lei ordinária e que prevê, em seu art. 1º, uma lista de crimes cometidos por Prefeitos no exercício de suas funções. O DL 201/67 traz também regras de processo penal que deverão ser aplicadas quando ocorrerem os crimes ali previstos. Vale ressaltar, mais uma vez, que o DL 201/67 foi recepcionado pela CF/88 como lei ordinária (Súmula 496 do STF).
 
O que são crimes de responsabilidade? Tecnicamente falando, crimes de responsabilidade são infrações político-administrativas praticadas por pessoas que ocupam determinados cargos públicos. Caso o agente seja condenado por crime de responsabilidade, ele não receberá sanções penais (prisão ou multa), mas sim sanções político-administrativas (perda do cargo e inabilitação para o exercício de função pública).
 
O art. 1º prevê realmente crimes de responsabilidade? NÃO. O art. 1º afirma que os delitos nele elencados são “crimes de responsabilidade”. Apesar de ser utilizada essa nomenclatura, a doutrina e a jurisprudência “corrigem” o legislador e afirmam que, na verdade, esses delitos são crimes comuns, ou seja, infrações penais iguais àquelas tipificadas no Código Penal e em outras leis penais. Desse modo, o que o art. 1º traz são crimes funcionais cometidos por Prefeitos. Vale ressaltar que os crimes de responsabilidade (em sentido estrito) dos Prefeitos estão previstos no art. 4º do DL 201/67. É nesse dispositivo que estão definidas as infrações político-administrativas dos alcaides. Nesse sentido: STF. Plenário. HC 70671, Rel. Min. Carlos Velloso, j. 13/04/1994.
 
Os crimes funcionais dos Prefeitos estão previstos exclusivamente no art. 1º do DL 201/67? NÃO. Os Prefeitos poderão responder também pelos crimes funcionais previstos no Código Penal, na Lei de Licitações (Lei 8.666/93) e em outras leis penais, desde que tais condutas não estejam descritas no art. 1º do DL 201/67. Os crimes tipificados nas demais leis somente incidirão para os Prefeitos se não estiverem previstos no DL 201/67, que é norma específica.
 
Bem jurídico protegido pelos tipos do art. 1º: O patrimônio da Administração Pública e a moralidade administrativa.
 
Sujeito ativo: Trata-se de crime próprio, uma vez que somente pode ser praticado pelo Prefeito (ou por quem esteja no exercício desse cargo, como o Vice-Prefeito ou o Presidente da Câmara de Vereadores).
 
É possível a coautoria e a participação? SIM. O crime do art. 1º é próprio, somente podendo ser praticado por Prefeito, mas é possível que ocorram as figuras da coautoria e da participação, nos termos do art. 29 do CP. Em outras palavras, além do Prefeito, outras pessoas podem responder pelo delito como coautores ou partícipes. Exs: um Secretário Municipal, um contador, um assessor etc.
 
Se o sujeito comete o crime do art. 1º do DL 201/67, mas termina seu mandato sem que ele seja denunciado, é possível que ele responda pelo delito mesmo não sendo mais Prefeito? Claro que sim. Existem dois enunciados afirmando isso:
Súmula 164-STJ: O prefeito municipal, após a extinção do mandato, continua sujeito a processo por crime previsto no art. 1º do Dec. lei n. 201, de 27/02/67.
Súmula 703-STF: A extinção do mandato do Prefeito não impede a instauração de processo pela prática dos crimes previstos no art. 1º do DL 201/67.
 
Julgamento pelo STF: Roberto Góes deixou a prefeitura e assumiu o cargo de Deputado Federal em 2015. O MP ofereceu denúncia contra Roberto Góes pelo delito acima explicado e, em 2016, o STF recebeu a peça acusatória do Parquet. Por que a denúncia foi recebida pelo STF? Porque, nesta época, Roberto Góes já havia deixado o cargo de Prefeito e tinha sido eleito Deputado Federal (art. 102, I, “b”, da CF/88). Com isso, o STF recebeu a denúncia e passou a realizar a instrução do processo.
 
Decisão do STF restringindo o foro por prerrogativa de função: Ocorre que, em maio de 2018, o STF decidiu restringir o foro por prerrogativa apenas para os crimes cometidos durante o exercício do mandato e que tenham relação com ele. Foi fixada a seguinte tese: 
O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas. STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 03/05/2018 (Info 900).
 
Essa tese foi definida na sessão de julgamento do dia 03/05/18. Ocorre que havia centenas de inquéritos e processos criminais tramitando no STF envolvendo autoridades com foro por prerrogativa de função. Um desses processos era o de Roberto Góes. Daí surgiu a dúvida: essa tese já se aplica imediatamente para esses processos? SIM. O STF decidiu que essa tese interpretativa deveria ser aplicada imediatamente aos inquéritos e processos em curso.
 
O que significou isso, na prática? A assessoria dos Ministros fez o levantamento de todos os inquéritos e processos envolvendo autoridades e que estavam tramitando no Tribunal. Em seguida, foram analisados se os crimes imputados às autoridades estavam ou não relacionados com as suas funções.
• Se o processo estivesse relacionado com as funções e a autoridade ainda estivesse no cargo: o feito permanecia no STF para ser julgado pelo Tribunal. Ex: processo envolvendo um Senador que teria recebido vantagem indevida para votar de acordo com os interesses de um grupo econômico. Isso porque, neste caso, a situação se amolda à tese fixada pelo STF.
• Se o processo não estivesse relacionado com as funções ou a autoridade não mais estivesse no cargo: neste caso, o feito foi remetido para ser julgado pelo juízo de 1ª instância. Ex: processo envolvendo um Deputado Federal que teria praticado crime funcional na época em que era Prefeito. Essa situação não se amolda à tese fixada porque o crime não está relacionado com as funções de Deputado Federal. Logo, não existe aqui foro por prerrogativa de função, devendo o réu ser julgado em 1ª instância.
 
O processo de Roberto foi, então, remetido para a 1ª instância? NÃO. Ele continuou no STF. Explico o motivo. Na sessão do dia 03/05/18, o STF, além da restrição acima explicada, também fixou uma segunda tese, dizendo o seguinte:
Após o final da instrução processual, com apublicação do despacho de intimação para apresentação de alegações finais, a competência para processar e julgar ações penais não será mais afetada em razão de o agente público vir a ocupar outro cargo ou deixar o cargo que ocupava, qualquer que seja o motivo. STF. Plenário. AP 937 QO/RJ, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 03/05/2018.
Entendido o motivo pelo qual o STF julgou o crime mesmo ele tendo sido praticado antes do mandato de Deputado Federal. Mas agora queremos saber o que o STF decidiu quanto ao mérito. O réu foi condenado? SIM. Por maioria de votos, a 1ª Turma do STF condenou o réu pelo delito do art. 1º, III, do Decreto-Lei 201/67. Apesar disso, ficou constatada a prescrição em razão do tempo transcorrido entre a aceitação da denúncia e a condenação.
 
Conduta narrada subsome-se ao crime do art. 1º, III, do DL 201/67: A conduta narrada na denúncia se amolda, com precisão, ao tipo previsto no inciso III do art. 1º do DL 201/1967. Para o STF, os elementos probatórios produzidos na instrução processual demonstram que o réu, com plena consciência da ilicitude dos seus atos, atuou na forma descrita na peça acusatória, ausentes as causas de exclusão da ilicitude ou da culpabilidade.
 
Crime do art. 1º, III, do DL 201/67 não envolve desviar recursos em proveito próprio: O crime previsto no art. 1º, III, do DL 201/1967 consiste em o administrador público aplicar verba pública em destinação diversa da prevista em lei. Não se trata, portanto, de desviar em proveito próprio. Para a configuração deste crime, é irrelevante verificar se houve, ou não, efetivo prejuízo para a Administração Pública.
 
Dolo: O STF entendeu que era evidente o conhecimento do fato pelo ex-Prefeito, que assinou a ordem de pagamento para a transferência, a demonstrar domínio do fato e o poder de gestão dos recursos efetivamente empregados em finalidade diversa da estabelecida por lei. Observou que, na véspera da referida transferência, houve uma reunião com os corréus na qual foi decidida a destinação das verbas. Ressalte-se que um deles até mesmo declarou que o parlamentar sabia da operação ilegal descrita na denúncia. Ademais, no mesmo dia da citada reunião, foi enviado ofício do Gabinete da Secretaria Municipal de Saúde, que fez remissão à “determinação superior” e encaminhou à Secretaria Municipal de Finanças a relação das contas referentes às transferências “fundo a fundo”, para que fosse processada a imediata centralização dessas contas em uma única conta.
40.2. Para a configuração do delito do art. 1º, XIV, é indispensável a inequívoca ciência do Prefeito – (Info 802)
		O art. 1º, XIV, do DL 201/67 prevê que o Prefeito pratica crime quando nega execução a lei federal, estadual ou municipal, ou deixa de cumprir ordem judicial, sem dar o motivo da recusa ou da impossibilidade, por escrito, à autoridade competente. 
Vale ressaltar, no entanto, que, segundo entende o STF, para a configuração do delito em tela é indispensável que o MP comprove a inequívoca ciência do Prefeito a respeito da ordem judicial. 
Ex: em Joinville (SC), o juiz expediu ordem judicial determinando que o Município se abstivesse de praticar determinado ato administrativo. A ordem judicial foi endereçada à Procuradoria do Município. Mesmo após a intimação ser efetivada, o ato administrativo questionado foi praticado. Diante disso, o Ministério Público ofereceu denúncia contra o Prefeito, imputando-lhe a prática do crime previsto no art. 1º, XIV, do DL 201/67. O STF absolveu o réu. Segundo entenderam os Ministros, não foram produzidas provas de que o réu tenha tido conhecimento da ordem judicial ou que tenha concorrido para seu descumprimento. Para configuração do delito em tela, é indispensável que o MP comprove a inequívoca ciência do Prefeito a respeito da ordem judicial, não sendo suficiente que a determinação judicial tenha sido comunicada a terceiros. Para que o Prefeito pudesse ser responsabilizado criminalmente, seria indispensável a sua intimação pessoal.
STF. 1ª Turma. AP 555/SC, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 6/10/2015 (Info 802).
40.3. Delito do inciso I do DL 201/67 – (Info 788)
		O crime do art. 1º, I, do Decreto-Lei 201/1967 é próprio, somente podendo ser praticado por prefeito, admitida, porém, a participação, nos termos do art. 29 do CP. 
Ex: Deputado Federal apresentou emenda parlamentar ao orçamento da União autorizando o repasse de recursos para o Município “X”, verba destinada à aquisição de uma ambulância. O recurso foi transferido, foi realizada a licitação, mas o certame foi direcionado em favor de determinada empresa que superfaturou o preço. Ficou demonstrado que o Prefeito, o Deputado e os donos da empresa vencedora estavam em conluio para a prática dessa conduta. Desse modo, todos eles irão responder pelo delito do art. 1º, I, do DL 201/67. 
STF. 2ª Turma. Inq 3634/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 2/6/15 (Info 788).
41. LEI DE SEGURANÇA NACIONAL 
41.1. Transporte de granada sem motivação política não configura crime contra a segurança nacional – (Info 827) – IMPORTANTE!!!
		O agente que é preso com duas granadas de uso exclusivo do Exército que seriam utilizadas para roubar um banco não pratica crime do art. 12 da Lei 7.170/83. Isso porque não há, no presente caso, a motivação política, que consiste no "dolo específico" (elemento subjetivo especial do tipo) exigido para a configuração dos crimes de que trata a Lei de Segurança Nacional. 
Se o sujeito praticar uma conduta semelhante a esta, em tese, ele deverá responder pelo crime do art. 16 do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/03). 
STF. Plenário. RC 1472/MG, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 25/5/16 (Info 827).
	OBS:
O agente não responderá por tentativa de roubo? NÃO. Isso porque ele não chegou a praticar nenhum ato executório do crime de roubo. Não houve início de execução. O agente percorreu apenas as fases de cogitação e de preparação, tendo sido interrompido nos atos preparatórios. Como regra, os atos preparatórios não são punidos.
42. CRIMES HEDIONDOS 
42.1. Com a revogação do art. 224 do CP pela Lei 12.015/09, há de ser redimensionada a pena aplicada ao condenado, subtraindo-lhe o acréscimo sofrido em razão do aumento da pena previsto no art. 9º da Lei 8.072/90, que foi tacitamente revogado – (Info 947)
		A causa de aumento prevista no art. 9º da Lei de Crimes Hediondos foi tacitamente revogada pela Lei 12.015/09, considerando que esta Lei revogou o art. 224 do CP, que era mencionado pelo referido art. 9º.
Se um indivíduo foi condenado, antes da Lei 12.015/09, pela prática de estupro contra menor de 14 anos com a incidência da causa de aumento do art. 9º da Lei de Crimes Hediondos, esta majorante deverá ser retirada de sua condenação por força da novatio legis in mellius (art. 2º, parágrafo único, do CP).
Diante da revogação do art. 224 do CP pela Lei 12.015/09, ainda que o fato delituoso seja anterior a esta alteração, é o caso de se decotar da pena do condenado o acréscimo baseado no art. 9º da Lei nº 8.072/90.
STF. Plenário. HC 100181/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 15/8/19 (Info 947).
 
42.2. Natureza hedionda do estupro e do antigo atentado violento ao pudor – (Info 835)
		Os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, mesmo que cometidos antes da edição da Lei 12.015/09, são considerados hediondos, ainda que praticados na forma simples. 
Em outras palavras, seja antes ou depois da Lei 12.015/09, toda e qualquer forma de estupro (ou atentado violento ao pudor) é considerada crime hediondo, sendo irrelevante que a prática de qualquer deles tenha causado, ou não, lesões corporais de natureza grave ou morte. 
STF. 1ª T. HC 100612/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Roberto Barroso, j. 16/8/16 (Info 835).
	OBS:
Atualmente, o crime de estupro simples (art. 213, caput, do CP) e de estupro de vulnerável são considerados hediondos? SIM. Isso está previsto expressamente no art. 1º, V e VI, da Lei 8.072/90:
Art. 1º São considerados hediondos os seguintes crimes, todostipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados: (...)
V - estupro (art. 213, caput e §§ 1º e 2º); (Redação dada pela Lei nº 12.015/2009)
VI - estupro de vulnerável (art. 217-A, caput e §§ 1º, 2º, 3º e 4º); (Redação dada pela Lei nº 12.015/2009)
E antes da Lei 12.015/09, o estupro e o atentado violento ao pudor eram considerados hediondos? SIM.
43. CRIMES NA LEI DE LICITAÇÕES
43.1. Não compete ao assessor jurídico averiguar se está presente a causa de emergencialidade, mas apenas se há, nos autos, decreto que a reconheça – (Info 952) – IMPORTANTE!!!
		Não se pode exigir do assessor jurídico conhecimento técnico de todas as áreas e não apenas do Direito. No processo licitatório, não compete à assessoria jurídica averiguar se está presente a causa de emergencialidade, mas apenas se há, nos autos, decreto que a reconheça. Sua função é zelar pela lisura sob o aspecto formal do processo, de maneira a atuar como verdadeiro fiscal de formalidades, somente.
Assim, a assinatura do assessor jurídico na minuta do contrato serve de atestado do cumprimento de requisitos formais, e não materiais.
STF. 2ª T. HC 171576/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 17/9/19 (Info 952).
43.2. Ausência do crime do art. 89 em conduta de Secretário de Estado que compra, sem licitação, livros didáticos escolhidos por equipe técnica, de fornecedor exclusivo, sem sobrepreço – (Info 913)
		Não comete o crime do art. 89 da Lei nº 8.666/93 Secretária de Educação que faz contratação direta, com base em inexigibilidade de licitação (art. 25, I), de livros didáticos para a rede pública de ensino, livros esses que foram escolhidos por equipe técnica formada por pedagogos, sem a sua interferência. Vale ressaltar que havia comprovação, por meio de carta de exclusividade emitida por entidade do setor, de que a empresa contratada era a única fornecedora dos livros na região.
Além disso, não houve demonstração de sobrepreço.
Diante dessas circunstâncias, o STF absolveu a ré por ausência de “dolo específico” (elemento subjetivo especial).
STF. Plenário. AP 946/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 30/8/18 (Info 913).
	OBS:
Administrador inábil ≠ administrador ímprobo: Para a responsabilização penal do administrador público com base no art. 89 da Lei de Licitações (norma penal em branco), cumpre analisar se foram violados os pressupostos de dispensa ou inexigibilidade de licitação previstos nos arts. 24 e 25 da Lei, bem como se houve vontade livre e consciente de violar a competição e de produzir resultado lesivo ao patrimônio público. Tal compreensão busca distinguir o administrador probo que, sem má-fé, agindo com culpa, aplica equivocadamente a norma de dispensa ou inexigibilidade de licitação, daquele que afasta a concorrência de forma deliberada, sabendo-a imperiosa, com finalidade ilícita.
 
Acusada não interferiu na escolha dos livros: Segundo observou o Min. Relator dos embargos, a acusada não interferiu na escolha dos livros que foram adquiridos, tendo eles sido selecionados por uma equipe técnica formada por pedagogos. Não há também qualquer prova de que a ré tenha manifestado preferência por qualquer uma das obras, editoras ou distribuidoras específicas. Não há qualquer vínculo entre a Deputada e os sócios das empresas contratadas nem qualquer indício de acerto prévio entre eles. Ademais, a escolha dos livros ideais para alcançar os objetivos do programa governamental em questão é matéria circunscrita ao mérito do ato administrativo. Desse modo, a seleção do melhor material didático não está vinculada a critérios estritamente objetivos sobre os quais o Poder Judiciário possa exercer controle jurisdicional.
 
Formalidades foram atendidas: As etapas necessárias para a declaração de inexigibilidade de licitação por inviabilidade de competição foram cumpridas conforme exige a lei e não ficou demonstrado o “dolo específico” da acusada para favorecer empresas e lesar o Estado, o que afasta o enquadramento da conduta como crime.
 
Carta de exclusividade: A empresa que foi contratada apresentou, na época, uma “carta de exclusividade” na qual informa haver uma divisão regional de atuação entre os concorrentes e que, naquela localidade, somente ela poderia comercializar os livros. Isso justifica a inexigência de licitação com base no art. 25, I, da Lei nº 8.666/93:
Art. 25.  É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:
I - para aquisição de materiais, equipamentos, ou gêneros que só possam ser fornecidos por produtor, empresa ou representante comercial exclusivo, vedada a preferência de marca, devendo a comprovação de exclusividade ser feita através de atestado fornecido pelo órgão de registro do comércio do local em que se realizaria a licitação ou a obra ou o serviço, pelo Sindicato, Federação ou Confederação Patronal, ou, ainda, pelas entidades equivalentes;
 
Vale ressaltar que essa prática (“carta de exclusividade”) é reconhecida como lícita pelo Tribunal de Contas da União desde que emitida por entidade idônea vinculada ao setor de mercado respectivo. No caso concreto, a carta de exclusividade foi emitida pela Câmara Brasileira do Livro.
 
Compatibilidade dos preços: Outro ponto ressaltado é que os preços contratados são compatíveis com aqueles praticados no mercado, não havendo provas de que tenha havido sobrepreço (superfaturamento).
 
Faltou dolo: Assim, no caso concreto, o STF entendeu que não restou demonstrado o “dolo específico” (elemento subjetivo especial) na conduta da ré. Em outras palavras, não ficou provado que ela agiu com o intuito de beneficiar as empresas contratadas nem que tenha agido com o objetivo de lesar o erário.
43.3. Aspectos importantes sobre o crime do art. 89 da Lei de Licitações – (Info 891) – IMPORTANTE!!!
		Elemento subjetivo
Para a configuração da tipicidade subjetiva do crime previsto no art. 89 da Lei 8.666/93, exige-se o especial fim de agir, consistente na intenção específica de lesar o erário ou obter vantagem indevida.
Exige-se descumprimento de formalidades mais violação aos princípios da Administração Pública
O tipo penal previsto no art. 89 não criminaliza o mero fato de o administrador público ter descumprido formalidades. Para que haja o crime, é necessário que, além do descumprimento das formalidades, também se verifique que ocorreu, no caso concreto, a violação de princípios cardeais (fundamentais) da Administração Pública.
Se houve apenas irregularidades pontuais relacionadas com a burocracia estatal, isso não deve, por si só, gerar a criminalização da conduta. 
Assim, para que ocorra o crime, é necessária uma ofensa ao bem jurídico tutelado, que é o procedimento licitatório. Sem isso, não há tipicidade material.
Decisão amparada em pareceres técnicos e jurídicos
Não haverá crime se a decisão do administrador de deixar de instaurar licitação para a contratação de determinado serviço foi amparada por argumentos previstos em pareceres (técnicos e jurídicos) que atenderam aos requisitos legais, fornecendo justificativas plausíveis sobre a escolha do executante e do preço cobrado e não houver indícios de conluio entre o gestor e os pareceristas com o objetivo de fraudar o procedimento de contratação direta.
STF. 1ª Turma. Inq 3962/DF, Rel. Min Rosa Weber, j. 20/2/2018 (Info 891).
	OBS: A Lei de Licitação (Lei nº 8.666/93) prevê alguns tipos penais. O art. 89 tipifica como crime a dispensa ou inexigibilidade indevida de licitação. Veja:
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade: 
Pena — detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa. 
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.
 
OBRIGATORIEDADE DE LICITAÇÃO
Regra: obrigatoriedade de licitação: Como regra, a CF/88 impõe que a Administração Pública somente• Para o STJ, o magistrado deveria remeter a certidão para Procuradoria Geral do Estado e um dos Procuradores do Estado iria ajuizar, em nome do Estado, uma execução fiscal que tramitaria na vara de execuções fiscais (não era na vara de execuções penais).
• Agora, com a decisão do STF, o magistrado deverá intimar o Ministério Público e o Parquet irá propor a execução da multa na vara de execução penal. Caso o MP, devidamente intimado, não proponha a execução da multa no prazo de 90 dias, o juiz da execução criminal deverá dar ciência do feito ao órgão competente da Fazenda Pública (federal ou estadual, conforme o caso) para a respectiva cobrança na própria vara de execução fiscal, com a observância do rito da Lei 6.830/80.
· Alerta: se João tivesse sido condenado pela Justiça Federal, quem iria ingressar com a execução seria prioritariamente o MPF e, apenas subsidiariamente, a União, por intermédio da Procuradoria da Fazenda Nacional (PFN).
O que acontece com o entendimento do STJ manifestado na Súmula 521? Fica superado e a súmula será cancelada. Isso porque a decisão do STF foi proferida em ação direta de inconstitucionalidade possuindo, portanto, eficácia erga omnes e efeito vinculante (art. 102, § 2º, da CF/88).
4.2. Correto conceito de culpabilidade, princípio da não-culpabilidade e vedação ao bis in idem – (Info 851) – (TJCE-2018)
		Determinado réu foi condenado por furto qualificado por rompimento de obstáculo (art. 155, § 4º, I, do CP). 
O STF considerou incorreta a sentença do juiz que, na 1ª fase da dosimetria da pena, aumentou a pena-base com fundamento em três argumentos: 
a) Culpabilidade. O magistrado afirmou que era patente a culpabilidade do réu considerando que ele tinha plena consciência da ilicitude de seu ato.
O juiz confundiu os conceitos. Para fins de dosimetria da pena, culpabilidade consiste na reprovação social que o crime e o autor do fato merecem. Essa culpabilidade de que trata o art. 59 do CP não tem nada a ver com a culpabilidade como requisito do crime (imputabilidade, potencial consciência da ilicitude do fato e inexigibilidade de conduta diversa). 
b) Antecedentes. O juiz aumentou a pena pelo fato de o agente já responder a quatro outros processos criminais. 
A jurisprudência entende que, em face do princípio da presunção de não culpabilidade, os inquéritos policiais e ações penais em curso não podem ser considerados maus antecedentes (Súmula 444-STJ e STF RE 591054/SC). 
c) Circunstâncias do crime. O julgador considerou que as circunstâncias do crime eram negativas porque o crime foi praticado com rompimento de obstáculo à subtração da coisa. 
Aqui, o erro do magistrado foi utilizar como circunstância judicial (1ª fase da dosimetria) um elemento que ele já considerou como qualificadora (inciso I do § 4º do art. 155). Houve, portanto, bis in idem (dupla punição pelo mesmo fato). 
STF. 2ª Turma. HC 122940/PI, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13/12/16 (Info 851).
4.3. Elevados custos da investigação e enriquecimento do réu não são argumentos para aumentar a pena-base – (Info 845)
		Os elevados custos da atuação estatal para apuração da conduta criminosa e o enriquecimento ilícito obtido pelo agente não constituem motivação idônea para a valoração negativa do vetor "consequências do crime" na 1ª fase da dosimetria da pena. 
Em outras palavras, o fato de o Estado ter gasto muitos recursos para investigar os crimes (no caso, era uma grande operação policial) e de o réu ter obtido enriquecimento ilícito com as práticas delituosas não servem como motivo para aumentar a pena-base. 
STF. 2ª Turma. HC 134193/GO, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 26/10/16 (Info 845).
4.4. Aumento da pena-base pelo fato de a concussão ter sido praticada por policial – (Info 835) – IMPORTANTE!!!
		É legítima a utilização da condição pessoal de policial civil como circunstância judicial desfavorável para fins de exasperação da pena-base aplicada a acusado pela prática do crime de concussão. 
Aquele que está investido de parcela de autoridade pública — como é o caso de um juiz, um membro do Ministério Público ou uma autoridade policial — deve ser avaliado, no desempenho da sua função, com maior rigor do que as demais pessoas não ocupantes de tais cargos. 
STF. 1ª T. HC 132990/PE, rel. orig. Min. Luiz Fux, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, j. 16/8/16 (Info 835).
	OBS:
Imagine a seguinte situação adaptada: João, policial civil, foi condenado pela prática do crime de concussão (art. 316 do CP). No momento da dosimetria, na 1ª fase (circunstâncias judiciais), o magistrado aumentou a pena-base sob o argumento de que havia acentuada culpabilidade, já que o delito foi cometido por policial, pessoa encarregada de garantir a segurança pública dos cidadãos. A defesa recorreu contra este ponto alegando que a majoração da pena com base neste argumento configura bis in idem. Isso porque a concussão é um crime que só pode ser praticado por funcionário público. Logo, o fato de o agente ser policial teria sido utilizado duas vezes.
O argumento invocado pela defesa foi aceito pelo STF? Houve bis in idem neste caso? A decisão do magistrado foi equivocada? NÃO.
O delito previsto no art. 316 do CP realmente só pode ser praticado por funcionário público. No entanto, é possível que o magistrado, ao fazer a dosimetria da pena, analisando as circunstâncias do art. 59 do CP, aumente a pena invocando a qualidade específica ou a qualificação do funcionário público.
4.5. Condenações anteriores transitadas em julgado não podem ser utilizadas como conduta social desfavorável – (Info 825)
		A circunstância judicial "conduta social", prevista no art. 59 do CP, representa o comportamento do agente no meio familiar, no ambiente de trabalho e no relacionamento com outros indivíduos. 
Os antecedentes sociais do réu não se confundem com os seus antecedentes criminais. São circunstâncias distintas, com regramentos próprios. Não se mostra correto o magistrado utilizar as condenações anteriores transitadas em julgado como "conduta social desfavorável".
STF. 2ª Turma. RHC 130132, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 10/5/2016 (Info 825).
	OBS:
Critério trifásico: A dosimetria da pena na sentença obedece a um critério trifásico:
1º passo: o juiz calcula a pena-base de acordo com as circunstâncias judiciais do art. 59, CP;
2º passo: o juiz aplica as agravantes e atenuantes;
3º passo: o juiz aplica as causas de aumento e de diminuição.
Este critério trifásico, elaborado por Nelson Hungria, foi adotado pelo Código Penal, sendo consagrado pela jurisprudência pátria: STJ. 6ª Turma. AgRg no REsp 1021796/RS, Rel. Min. Assusete Magalhães,julgado em 19/03/2013.
Primeira fase (circunstâncias judiciais): Na primeira fase, as chamadas circunstâncias judiciais analisadas pelo juiz são as seguintes: a) culpabilidade, b) antecedentes, c) conduta social, d) personalidade do agente, e) motivos do crime, f) circunstâncias do crime, g) consequências do crime, h) comportamento da vítima.
Imagine agora a seguinte situação: João possui quatro condenações transitadas em julgado. Ele está agora sendo julgado pela prática do crime 5. No momento da dosimetria da pena, o juiz aumentou a pena-base com base em duas circunstâncias judiciais:
· Utilizo a condenação do crime 1 como maus antecedentes;
· Os crimes 2 a 4 indicam que sua conduta social é péssima, pois já se viu envolvido em vários outros episódios que não aqueles valorados no item anterior e que demonstram que o réu não se adéqua às regras sociais.
A defesa impugnou a decisão afirmando que o magistrado valorou negativamente circunstâncias judiciais diversas com fundamento na mesma base empírica (registros criminais), conferindo-lhes conceitos jurídicos assemelhados.
A tese da defesa foi aceita pelo STF? Houve erro na dosimetria da pena? SIM. Teori explicou que, antes da reforma da Parte Geral do CP (1984), a análise dos antecedentes abrangia todo o passado do agente, incluindo, além dos registros criminais, o seu comportamento na sociedade. Após a aprovação da Lei 7.209/84, a condutapode contratar obras, serviços, compras e alienações se realizar uma licitação prévia para escolher o contratante (art. 37, XXI).
 
Exceção: contratação direta nos casos especificados na legislação: O inciso XXI afirma que a lei poderá especificar casos em que os contratos administrativos poderão ser celebrados sem esta prévia licitação. A isso, a doutrina denomina “contratação direta”.
 
Resumindo: A regra na Administração Pública é a contratação precedida de licitação. Contudo, a legislação poderá prever casos excepcionais em que será possível a contratação direta sem licitação.
CONTRATAÇÃO DIRETA
A Lei de Licitações e Contratos prevê três grupos de situações em que a contratação ocorrerá sem licitação prévia. Trata-se das chamadas licitações dispensadas, dispensáveis e inexigíveis. Vejamos o quadro comparativo abaixo: 
	Dispensada
	Dispensável
	Inexigível
	Art. 17
	Art. 24
	Art. 25
	Rol taxativo
	Rol taxativo
	Rol exemplificativo
	A lei determina a não realização da licitação, obrigando a contratação direta.
	A lei autoriza a não realização da licitação. Mesmo sendo dispensável, a Administração pode decidir realizar a licitação (discricionariedade).
	Como a licitação é uma disputa, é indispensável que haja pluralidade de objetos e pluralidade de ofertantes para que ela possa ocorrer. Assim, a lei prevê alguns casos em que a inexigibilidade se verifica porque há impossibilidade jurídica de competição.
	Ex.: quando a Administração Pública possui uma dívida com o particular e, em vez de pagá-la em espécie, transfere a ele um bem público desafetado, como forma de quitação do débito. A isso chamamos de dação em pagamento (art. 17, I, "a").
	Ex.: compras de até R$ 8 mil.
	Ex.: contratação de artista consagrado pela crítica especializada ou pela opinião pública para fazer o show do aniversário da cidade.
Procedimento de justificação: Mesmo nas hipóteses em que a legislação permite a contratação direta, é necessário que o administrador público observe algumas formalidades e instaure um processo administrativo de justificação.
 
CRIME DO ART. 89
Tipo objetivo: O crime do art. 89 da Lei 8.666/93 ocorre se o administrador público...
• dispensar a licitação fora das hipóteses previstas em lei;
• inexigir (deixar de exigir) licitação fora das hipóteses previstas em lei; ou
• deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade (as formalidades estão previstas especialmente no art. 26 da Lei).
 
Desse modo, haverá o crime tanto na hipótese em que a licitação é dispensada mesmo sem lei autorizando ou determinando a dispensa, como na situação em que a lei até autoriza ou determina, mas o administrador não observa os requisitos formais para tanto.
 
Norma penal em branco: Como as hipóteses de dispensa e inexigibilidade estão previstas na Lei nº 8.666/93, este tipo penal é taxado como:
· norma penal em branco (porque depende de complemento normativo);
· imprópria, em sentido amplo ou homogênea (o complemento normativo emana do legislador);
· do subtipo homovitelínea ou homológa (o complemento emana da mesma instância legislativa).
 
Tipo subjetivo: Para a configuração da tipicidade subjetiva do crime previsto no art. 89 da Lei 8.666/93, exige-se o especial fim de agir, consistente na intenção específica de lesar o erário ou obter vantagem indevida. Esse entendimento é pacífico na jurisprudência do STF e STJ:
Para a caracterização da conduta tipificada no art. 89 da Lei 8.666/93, é indispensável a demonstração, já na fase de recebimento da denúncia, do elemento subjetivo consistente na intenção de causar dano ao erário ou obter vantagem indevida. STF. 2ª T. Inq 3965, Rel. Min. Teori Zavascki, j. 22/11/16.
 
O delito em questão exige, além do dolo genérico (representado pela vontade consciente de dispensar ou inexigir licitação com descumprimento das formalidades), a presença do especial fim de agir, que consiste no dolo específico de causar dano ao erário ou de gerar o enriquecimento ilícito dos agentes envolvidos na empreitada criminosa.
 • Dolo genérico: vontade de dispensar ou inexigir licitação com descumprimento das formalidades;
• Especial fim de agir (“dolo específico”): intenção de causar dano ao erário ou de gerar o enriquecimento ilícito dos agentes envolvidos na empreitada criminosa.
Só há o crime do art. 89 se houver o dolo genérico mais o especial fim de agir.
 
Exige-se descumprimento de formalidades mais violação aos princípios da administração pública:
O tipo penal previsto no art. 89 não criminaliza o mero fato de o administrador público ter descumprido formalidades. Para que haja o crime é necessário que, além do descumprimento das formalidades, também se verifique que ocorreu, no caso concreto, a violação de princípios cardeais (fundamentais) da administração pública. Se houve apenas irregularidades pontuais relacionadas com a burocracia estatal, isso não deve, por si só, gerar a criminalização da conduta. Assim, para que ocorra o crime é necessária uma ofensa ao bem jurídico tutelado, que é o procedimento licitatório. Sem isso, não há tipicidade material. STF. 1ª T. Inq 3962/DF, Rel. Min Rosa Weber, j. 20/2/2018 (Info 891).
 
Decisão amparada em pareceres técnicos e jurídicos:
Não haverá crime se a decisão do administrador de deixar de instaurar licitação para a contratação de determinado serviço foi amparada por argumentos previstos em pareceres (técnicos e jurídicos) que atenderam aos requisitos legais, fornecendo justificativas plausíveis sobre a escolha do executante e do preço cobrado. Exceção a essa regra seria o caso de haver provas de que o administrador estaria em conluio com os pareceristas, com o objetivo de fraudar o procedimento de contratação direta. Ausentes essas provas, não há crime por falta de conduta dolosa do gestor público. STF. 1ª T. Inq 3962/DF, Rel. Min Rosa Weber, julgado em 20/2/2018 (Info 891).
 
Caso semelhante julgado pelo STF:
O objetivo do art. 89 não é punir o administrador público despreparado, inábil, mas sim o desonesto, que tinha a intenção de causar dano ao erário ou obter vantagem indevida. Por essa razão, é necessário sempre analisar se a conduta do agente foi apenas um ilícito civil e administrativo ou se chegou a configurar realmente crime.
Deverão ser analisados três critérios para se verificar se o ilícito administrativo configurou também o crime do art. 89:
1º) existência ou não de parecer jurídico autorizando a dispensa ou a inexigibilidade. A existência de parecer jurídico é um indicativo da ausência de dolo do agente, salvo se houver circunstâncias que demonstrem o contrário.
2º) a denúncia deverá indicar a existência de especial finalidade do agente de lesar o erário ou de promover enriquecimento ilícito.
3º) a denúncia deverá descrever o vínculo subjetivo entre os agentes.
STF. 1ª Turma. Inq 3674/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 7/3/2017 (Info 856).
43.4. Se o software adquirido sem licitação tinha mais especificações do que os das concorrentes e era mais adequado ao seu objeto, não há o crime do art. 89 – (Info 861)
		Determinado Secretário de Educação fez contratação direta, com inexigibilidade de licitação, com a empresa "X", por meio da qual adquiriu mil licenças de uso do software "XX" para organizar os horários e grades escolares da rede de ensino estadual, no valor total de R$ 1 milhão.
O Ministério Público denunciou o Secretário pela prática do crime do art. 89 da Lei 8.666/93 argumentando que outras empresas ofereciam softwares diferentes, mas com as mesmas funcionalidades, por preço menor. Dessa forma, o Parquet alegou que seria possível sim a concorrência entre as empresas, não sendo caso de inexigibilidade de licitação.
O STF entendeu que não houve crime.
O laudo pericial constatou que o “software” da empresa escolhida tinha mais especificações do que os das concorrentes e era mais adequado ao seu objeto.
O STF afirmou também que não há nos autos prova de conluio com a empresa escolhida e de recebimento de qualquer vantagem econômica pelo então Secretário.
Por fim, asseverou que o crime previstosocial passou a ter significado próprio. A conduta social passou a ser utilizada apenas para avaliar o comportamento do condenado no meio familiar, no ambiente de trabalho e no relacionamento com outros indivíduos. Ou seja, os antecedentes sociais do réu não mais se confundem com os seus antecedentes criminais. Trata-se de circunstâncias diversas. Assim, a análise da circunstância judicial da conduta social não tem relação com a vida criminal do acusado. O histórico criminal já é utilizado para aferir os antecedentes (primeira fase de aplicação da pena) ou a reincidência (segunda fase de aplicação da pena). A conduta social está relacionada com aspectos extrapenais.
5. MAUS ANTECEDENTES 
5.1. Cinco anos após o cumprimento ou extinção da pena, a condenação pretérita ainda poderá ser utilizada como maus antecedentes? – (Sem Info) – IMPORTANTE!!!
		A existência de condenação anterior, ocorrida em prazo superior a cinco anos, contado da extinção da pena, poderá ser considerada como maus antecedentes? Após o período depurador, ainda será possível considerar a condenação como maus antecedentes?
SIM.
As condenações atingidas pelo período depurador quinquenal do art. 64, inciso I, do CP, embora afastem os efeitos da reincidência, não impedem a configuração de maus antecedentes, na primeira etapa da dosimetria da pena.
STJ. 5ª T. AgRg no HC 558.745/SP, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, j. 15/09/2020.
STJ. 6ª T. AgRg no HC 471.346/MS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, j. 21/05/2019.
Não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal.
STF. Plenário. RE 593818/SC, Rel. Min. Roberto Barroso, j. 17/8/20 (Repercussão Geral - Tema 150).
5.2. Inquéritos policiais e ações penais sem trânsito em julgado – (Infos 791 e 772) – IMPORTANTE!!!
		A existência de inquéritos policiais ou de ações penais sem trânsito em julgado não podem ser considerados como maus antecedentes para fins de dosimetria da pena. 
STF. Plenário. HC 94620/MS e HC 94680/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. 24/6/15 (Info 791).
STF. Plenário. RE 591054/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 17/12/14 (repercussão geral) (Info 772).
6. AGRAVANTES
6.1. As agravantes (tirando a reincidência) não se aplicam aos crimes culposos – (Info 735) – (TJGO-2012) (MPSP-2019)
		As circunstâncias agravantes genéricas não se aplicam aos crimes culposos, com exceção da reincidência. 
STF. 1ª T. HC 120165/RS, rel. Min. Dias Toffoli, j. 11/2/14 (Info 735).
	(MPSP-2019): Considere a afirmação a seguir: Segundo entendimentos doutrinário e jurisprudencial majoritários, levando-se em consideração o rol do art. 61 do CP, a reincidência é a única agravante que pode ser reconhecida tanto em crime doloso como em crime culposo. BL: Info 735, STF.
(TJGO-2012-FCC): As circunstâncias agravantes não incidem nos crimes culposos, salvo a reincidência. BL: Info 735, STF.
7. PRESCRIÇÃO
7.1. Interpretação do art. 112 do CP – (Info 890) – IMPORTANTE!!! TEMA POLÊMICO!
		Se o Ministério Público não recorreu contra a sentença condenatória, tendo havido apenas recurso da defesa, qual deverá ser o termo inicial da prescrição da pretensão executiva? O início do prazo da prescrição executória deve ser o momento em que ocorre o trânsito em julgado para o MP? Ou o início do prazo deverá ser o instante em que se dá o trânsito em julgado para ambas as partes, ou seja, tanto para a acusação como para a defesa? 
· Posicionamento pacífico do STJ: o termo inicial da prescrição da pretensão executória é a data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação, ainda que a defesa tenha recorrido e que se esteja aguardando o julgamento desse recurso. Aplica-se a interpretação literal do art. 112, I, do CP, considerando que ela é mais benéfica ao condenado. 
· Entendimento da 1ª Turma do STF: o início da contagem do prazo de prescrição somente se dá quando a pretensão executória pode ser exercida. Se o Estado não pode executar a pena, não se pode dizer que o prazo prescricional já está correndo. Assim, mesmo que tenha havido trânsito em julgado para a acusação, se o Estado ainda não pode executar a pena (ex: está pendente uma apelação da defesa), não teve ainda início a contagem do prazo para a prescrição executória. É preciso fazer uma interpretação sistemática do art. 112, I, do CP. Vale ressaltar que, com o novo entendimento do STF admitindo a execução provisória da pena, para essa segunda corrente (Min. Roberto Barroso) o termo inicial da prescrição executória será a data do julgamento do processo em 2ª instância. Isso porque se estiver pendente apenas recurso especial ou extraordinário, será possível a execução provisória da pena. Logo, já poderia ser iniciada a contagem do prazo prescricional. 
STF. 1ª T. RE 696533/SC, Rel. Min. Luiz Fux, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, j. 6/2/18 (Info 890).
	OBS:
Conceito de prescrição: É a perda do direito do Estado de punir (pretensão punitiva) ou de executar uma punição já imposta (pretensão executória) em razão de não ter agido (inércia) nos prazos previstos em lei.
Espécies: Existem duas espécies de prescrição:
I – Prescrição da pretensão punitiva, que pode ser:
I.a) prescrição da pretensão punitiva propriamente dita;
I.b) prescrição superveniente ou intercorrente;
I.c) prescrição retroativa;
II – Prescrição da pretensão executória.
Prescrição da pretensão executória (prescrição da condenação): Ocorre quando o Estado perde o seu poder-dever de executar uma sanção penal já definitivamente imposta pelo Poder Judiciário em razão de não ter agido nos prazos previstos em lei.
Cálculo da prescrição executória no caso de pena privativa de liberdade: A prescrição da pretensão executória da pena privativa de liberdade é calculada com base na pena concreta, fixada na sentença ou no acórdão que já transitou em julgado e, portanto, não pode mais ser alterada.
Termo inicial: Como vimos, o Estado tem um prazo máximo para fazer com que o réu condenado inicie o cumprimento da pena. Caso não o faça, ocorre a prescrição executória.
A pergunta é: a partir de que dia começa a correr esse prazo que o Estado tem para fazer com que o condenado inicie o cumprimento da pena? Dito de outra forma: qual é o termo inicial do prazo da prescrição da pretensão executória? A resposta encontra-se no art. 112, I do CP:
Termo inicial da prescrição após a sentença condenatória irrecorrível
Art. 112. No caso do art. 110 deste Código [que trata da prescrição executória], a prescrição começa a correr: 
I - do dia em que transita em julgado a sentença condenatória, para a acusação, ou a que revoga a suspensão condicional da pena ou o livramento condicional;
Desse modo, segundo o art. 112, I do CP, o termo inicial da prescrição executória é a data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação.
E se o MP não recorre, mas a defesa apresenta recurso? Nesse caso, a sentença condenatória transitou em julgado para a acusação. Logo, segundo a redação do art. 112, I do CP, inicia-se a contagem do prazo de prescrição executória mesmo ainda estando pendente a apreciação do recurso interposto pela defesa.
Veja o seguinte exemplo hipotético: João foi condenado a 4 anos de reclusão pelo Tribunal de Justiça. O Ministério Público concorda com o acórdão e não recorre, razão pela qual ocorre trânsito em julgado para a acusação no dia 18/02/2010. O advogado do réu apresenta recurso extraordinário, de forma que, para a defesa, não houve trânsito em julgado.
Qual é o prazo de prescrição executória quando o réu é condenado a 4 anos? A prescrição ocorre em 8 anos (art. 109, IV, do CP). Em outras palavras, se o réu for condenado a 4 anos, o Estado tem o poder-dever de fazer com que esse condenado inicie o cumprimento da pena em até 8 anos. Se passar desse prazo, o Estado perde o poder de executar a sanção e o condenado não mais terá que cumprir a pena imposta.
Em nosso exemplo, quando se iniciou a contagem do prazo de prescrição executória (levando-seem consideração a regra do art. 112, I do CP)? No dia 18/02/2010, data em que a sentença transitou em julgado para a acusação. Isso significa que o Estado tinha um prazo de 8 anos para fazer com que o réu iniciasse o cumprimento da pena. Se o réu não começou a cumprir a pena até 18/02/2018, aconteceu a prescrição. Essa é a regra que está presente no art. 112, I do CP.
Crítica à regra do art. 112, I do CP: A CF/88 prevê que ninguém poderá ser considerado culpado até que haja o trânsito em jugado da sentença penal condenatória (art. 5º, LVII). Por força desse princípio, durante os anos de 2009 até 2016 prevaleceu no STF o entendimento de que não existia no Brasil a execução provisória (antecipada) da pena.
Assim, de 2009 até 2016 o STF entendia que, enquanto não tivesse havido trânsito em julgado para a acusação e para a defesa, o réu não poderia ser obrigado a iniciar o cumprimento da pena.
Se ainda estava pendente de julgamento qualquer recurso da defesa, o condenado não podia iniciar o cumprimento da pena porque ainda era presumivelmente inocente. Isso perdurou, como já dito, de 2009 (STF. Plenário. HC 84078, julgado em 05/02/2009) até 2016, quando o STF mudou sua jurisprudência no HC 126292/SP, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 17/2/2016.
Desse modo, perceba a seguinte situação estranha que o art. 112, I, ocasionava (entre 2009 a 2016):
· Se o réu fosse condenado, a defesa recorresse e o MP não, esse condenado não podia iniciar o cumprimento da pena enquanto estivesse pendente o recurso;
· Apesar disso, pela redação literal do art. 112, I, do CP, já começava a correr o prazo da prescrição executória.
Diante desse paradoxo que podia ser ocasionado pela regra do art. 112, I, do CP, alguns doutrinadores e membros do Ministério Público idealizaram a seguinte tese: O início do prazo da prescrição executória devia ser o momento em que ocorre o trânsito em julgado para ambas as partes, ou seja, tanto para a acusação como para a defesa. Não se pode dizer que o prazo prescricional começa com o trânsito em julgado apenas para a acusação, uma vez que, se a defesa recorreu, o Estado não pode dar início à execução da pena, já que ainda não haveria uma condenação definitiva. Se há recurso da defesa, o Estado não inicia o cumprimento da pena não por desinteresse dele, mas sim porque há uma vedação de ordem constitucional decorrente do princípio da presunção de inocência. Ora, se não há desídia do Estado, não se pode falar em prescrição. Desse modo, foi uma tese que surgiu para desconsiderar a interpretação literal do art. 112, I, do CP.
Essa tese que desconsidera a regra do art. 112, I, do CP foi aceita pela jurisprudência? 
· STJ: NÃO. Para o STJ, conforme determina o art. 112, I do CP, o termo inicial da prescrição da pretensão executória é a data do trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação, ainda que a defesa tenha recorrido e que se esteja aguardando o julgamento desse recurso. Nesse sentido: STJ. 6ª Turma. AgRg no RHC 74.996/PB, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 12/09/2017.
O argumento de que se deveria aguardar o trânsito em julgado para ambas as partes não tem previsão legal e contraria o texto do Código Penal.
Além disso, não se pode querer “corrigir” a redação do art. 112, I, do CP invocando-se o art. 5º, LVII da CF/88, porque, nesse caso, se estaria utilizando um dispositivo da Constituição Federal para respaldar uma “interpretação” totalmente desfavorável ao réu e contra expressa disposição legal.
Exigir o trânsito em julgado para ambas as partes como termo inicial da contagem do lapso da prescrição da pretensão executória, ao contrário do texto expresso da lei, seria inaugurar novo marco interruptivo da prescrição não previsto no rol taxativo do art. 117 do CP, situação que também afrontaria o princípio da reserva legal.
Assim, somente com a devida alteração legislativa é que seria possível modificar o termo inicial da prescrição da pretensão executória, e não por meio de "adequação hermenêutica".
· Precedente da 1ª Turma do STF: SIM. A 1ª Turma do STF acolhe a tese acima explicada e entende que o art. 112, I, do CP deve ser interpretado sistematicamente à luz da jurisprudência que prevaleceu no STF de 2009 a 2016, segundo a qual só era possível a execução da decisão condenatória depois do trânsito em julgado.
Assim, se não era possível a execução provisória da pena, não era razoável considerar que o curso da prescrição da pretensão punitiva já começou a correr pelo simples fato de a acusação não ter recorrido. Ora, não é possível prescrever aquilo que não pode ser executado.
Veja ementa nesse sentido:
(...) 2. A partir do julgamento pelo Plenário desta Corte do HC nº 84.078, deixou-se de se admitir a execução provisória da pena, na pendência do RE.
3. O princípio da presunção de inocência ou da não-culpabilidade, tal como interpretado pelo STF, deve repercutir no marco inicial da contagem da prescrição da pretensão executória, originariamente regulado pelo art. 112, I do Código Penal.
4. Como consequência das premissas estabelecidas, o início da contagem do prazo de prescrição somente se dá quando a pretensão executória pode ser exercida. (...)
STF. 1ª Turma. HC 107710 AgR, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 09/06/2015.
7.2. Inadmissibilidade da prescrição em perspectiva – (Info 831)
		A prescrição em perspectiva (ou prescrição virtual) não é admitida nos crimes militares, assim como ocorre também nos crimes comuns. 
STF. 2ª Turma. HC 125777/CE, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 21/6/16 (Info 831).
	OBS:
O que é a chamada prescrição virtual? Ocorre quando o juiz, verificando que já se passaram muitos anos desde o dia em que o prazo prescricional começou ou voltou a correr, entende que mesmo que o inquérito ou processo continue, ele não terá utilidade porque muito provavelmente haverá a prescrição pela pena em concreto. Para isso, o juiz analisa a possível pena que aplicaria para o réu se ele fosse condenado e, a partir daí, examina se, entre os marcos interruptivos presentes no processo, já se passaram mais anos do que o permitido pela lei.
Sinônimos: A prescrição virtual é também chamada de prescrição “em perspectiva”, “por prognose”, “projetada” ou “antecipada”.
A prescrição virtual possui previsão na lei? NÃO. Apesar de ser comum na prática, a prescrição virtual não tem previsão na lei, sendo considerada uma “criação” dos juízes e Tribunais.
A prescrição virtual é admitida pelo STF e pelo STJ? NÃO. O STF e o STJ afirmam que é inadmissível a prescrição virtual por dois motivos principais:
· em virtude da ausência de previsão legal;
· porque representaria uma afronta ao princípio da presunção de não-culpabilidade.
7.3. Redução do prazo prescricional para condenados maiores de 70 anos e momento de sua aferição – (Info 822) – IMPORTANTE! Cuidado com alguns livros!
		Para que incida a redução do prazo prescricional prevista no art. 115 do CP, é necessário que, no momento da sentença, o condenado possua mais de 70 anos. Se ele só completou a idade após a sentença, não terá direito ao benefício, mesmo que isso tenha ocorrido antes do julgamento de apelação interposta contra a sentença. 
Existe, no entanto, uma situação em que o condenado será beneficiado pela redução do art. 115 do CP mesmo tendo completado 70 anos após a sentença: isso ocorre quando o condenado opõe embargos de declaração contra o acórdão condenatório e esses embargos são conhecidos. Nesse caso, o prazo prescricional será reduzido pela metade se o réu completar 70 anos até a data do julgamento dos embargos. Nesse sentido: STF. Plenário. AP 516 ED/DF, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, julgado em 5/12/2013 (Info 731). 
STF. 2ª Turma. HC 129696/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 19/4/2016 (Info 822).
	OBS:
Redução do prazo prescricional para condenados maiores de 70 anos: O art. 115 do CP preconiza:
Art. 115. São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença,maior de 70 (setenta) anos.
Situação 1. Imagine o seguinte exemplo hipotético: João, com 69 anos, foi condenado, em 1ª instância, no dia 02/02/2010. O condenado interpôs apelação. O TJ julgou a apelação em 03/03/2014 e manteve, na íntegra, a sentença. Nesta data, ele já tinha 73 anos.
O réu terá direito ao art. 115 do CP? NÃO. Isso porque, na data da sentença, ele tinha menos de 70 anos.
Este é também o entendimento do STJ:
(...) A Terceira Seção desta Corte, no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n. 749.912/PR, pacificou o entendimento de que o benefício previsto no artigo 115 do Código Penal não se aplica ao réu que completou 70 anos de idade após a data da primeira decisão condenatória (...) STJ. 6ª T. AgRg no AREsp 332.735/RJ, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 16/02/2016.
Situação 2. Imagine agora o exemplo um pouco diferente: João, com 69 anos, foi condenado, em 1ª instância, no dia 02/02/2010. O condenado opôs embargos de declaração. O juiz conheceu dos embargos, mas os julgou improvidos em 05/05/2010, mantendo a sentença. Nesta data, o condenado já tinha mais de 70 anos.
O réu terá direito ao art. 115 do CP? SIM. O STF admite a redução do prazo prescricional pela metade quando o réu completa 70 anos após a sentença condenatória, mas antes de terem sido julgados os embargos de declaração opostos contra a decisão (se conhecidos). Isso porque se entende que a decisão dos embargos integra a sentença.
7.4. Não se admite a denominada prescrição em perspectiva – (Info 788)
		A prescrição virtual ocorre quando o juiz, verificando que já se passaram muitos anos desde o dia em que o prazo prescricional começou ou voltou a correr, entende que mesmo que o inquérito ou processo continue, ele não terá utilidade porque muito provavelmente haverá a prescrição pela pena em concreto. 
Para isso, o juiz analisa a possível pena que aplicaria para o réu se ele fosse condenado e, a partir daí, examina se, entre os marcos interruptivos presentes no processo, já se passaram mais anos do que o permitido pela lei. 
A prescrição virtual é também chamada de prescrição “em perspectiva”, “por prognose”, “projetada” ou “antecipada”.
O STF e o STJ afirmam que é inadmissível a prescrição virtual por dois motivos principais: 
a) em virtude da ausência de previsão legal; 
b) porque representaria uma afronta ao princípio da presunção de não-culpabilidade. 
O STJ tem, inclusive, um enunciado proibindo expressamente a prática (Súmula 438-STJ). 
STF. 1ª Turma. Inq 3574 AgR/MT, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 2/6/2015 (Info 788).
7.5. A publicação do acórdão condenatório para fins de prescrição ocorre no dia da sessão de julgamento – (Info 776) – IMPORTANTE!!!
		A prescrição da pretensão punitiva do Estado, em segundo grau de jurisdição, se interrompe na data da sessão de julgamento do recurso e não na data da publicação do acórdão. 
Para efeito de configuração do marco interruptivo do prazo prescricional a que se refere o art. 117, IV, do CP, considera-se como publicado o “acórdão condenatório recorrível” na data da sessão pública de julgamento, e não na data de sua veiculação no Diário da Justiça ou em meio de comunicação congênere. 
A publicação do acórdão nos veículos de comunicação oficial deflagra o prazo recursal, mas não influencia na contagem do prazo da prescrição. 
STF. 1ª Turma. RHC 125078/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 3/3/2015 (Info 776).
7.6. O § 1º do art. 110 do CP, alterado pela Lei 12.234/2010, é constitucional – (Info 771) – IMPORTANTE!!!
		A Lei 12.234/2010 alterou o § 1º do art. 110 do CP, acabando, parcialmente, com a prescrição retroativa. 
Atualmente, não mais existe prescrição retroativa com relação ao período compreendido entre a data do fato e o recebimento da denúncia (ou queixa). No entanto, ainda pode ocorrer a prescrição retroativa na fase processual, ou seja, após o recebimento da denúncia ou queixa. 
Surgiu uma tese sustentando que a alteração promovida pela Lei 12.234/2010 seria inconstitucional em virtude de praticamente ter eliminado as possibilidades de se reconhecer a prescrição retroativa, o que violaria diversos princípios constitucionais. 
O STF não concordou com a tese e decidiu que o § 1º do art. 110 do CP, com redação dada pela Lei 12.234/2010, é CONSTITUCIONAL. 
O sistema de justiça criminal no Brasil ainda é pouco eficiente e a taxa de esclarecimento de crimes é baixa, não se conseguindo investigar, com eficiência, todos os delitos praticados. 
Diante disso, o legislador optou por não mais prestigiar um sistema de prescrição da pretensão punitiva retroativa que culminava por esvaziar a efetividade da tutela jurisdicional penal. Vale ressaltar que a chamada prescrição retroativa é uma peculiaridade existente somente na lei brasileira, não havendo similar no direito comparado. Isso demonstra que a definição sobre as espécies de prescrição é questão de política criminal, ficando a cargo do legislador. 
STF. Plenário. HC 122694/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 10/12/14 (Info 771).
7.7. Durante a suspensão condicional da pena não corre prazo o prescricional – (Info 744)
		Durante a suspensão condicional da pena (art. 77 do CP), não corre o prazo prescricional. 
STF. 2ª Turma. Ext 1254/Romênia, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 29/4/2014 (Info 744)
	OBS: Ao analisar um pedido de extradição, o STF confirmou que a conclusão (pacífica) de que durante a suspensão condicional da pena (art. 77 do CP), não corre prazo o prescricional. Segundo o art. 112, I, do CP, a prescrição somente começa a correr do dia em que for revogada a suspensão condicional da pena (sursis).
8. FIXAÇÃO DO REGIME PRISIONAL
8.1. Imposição do regime semiaberto para réu reincidente, condenado a 1 ano e 4 meses de reclusão pelo furto de uma garrafa de licor – (Info 910)
		João, reincidente, foi condenado a uma pena de 1 ano e 4 meses de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática do crime de furto simples (art. 155, caput, do CP).
A defesa postulou a aplicação do regime aberto com base no princípio da insignificância, considerado o objeto furtado ter sido apenas uma garrafa de licor.
O STF decidiu impor o regime semiaberto. 
Entendeu-se que, de um lado, o regime fechado deve ser afastado. Por outro, não se pode conferir o regime aberto para um condenado reincidente, uma vez que isso poderia se tornar um incentivo à criminalidade, ainda mais em cidades menores, onde o furto é, via de regra, perpetrado no mesmo estabelecimento. 
A reincidência delitiva do paciente, que praticou o quinto furto em pequeno município, eleva a gravidade subjetiva de sua conduta.
STF. 1ª Turma. HC 136385/SC, Rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ ac. Min. Alexandre de Moraes, j. 7/8/2018 (Info 910).
8.2. Fixada a pena-base no mínimo legal, não é possível a imposição de regime inicial mais severo do que aquele abstratamente imposto – (Info 881)
		Se todas as circunstâncias judiciais são favoráveis, de forma que a pena-base foi fixada no mínimo legal, então, neste caso, não cabe a imposição de regime inicial mais gravoso. 
STF. 2ª Turma. RHC 131133/SP, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 10/10/2017 (Info 844). 
Obs: o STJ possui um enunciado nesse sentido: 
Súmula 440-STJ: Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito.
8.3. Fixada a pena-base no mínimo legal, não é possível a imposição de regime inicial mais severo do que aquele abstratamente imposto – (Info 844)
		Se a pena-base foi fixada no mínimo legal (circunstâncias judiciais favoráveis), o juiz deverá estabelecer o regime inicial semiaberto para o condenado a pena superior a 4 e que não exceda a 8 anos. 
Aplica-se ao caso a Súmula 440 do STJ: Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito. 
STF. 2ª Turma. RHC 135298/SP, rel.orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o ac. Min. Teori Zavascki, j. 18/10/16 (Info 844).
	OBS:
Fixação do regime inicial: O juiz, ao prolatar a sentença condenatória, deverá fixar o regime no qual o condenado iniciará o cumprimento da pena privativa de liberdade. A isso se dá o nome de fixação do regime inicial. Os critérios para essa fixação estão previstos no art. 33 do Código Penal.
O que o juiz deve observar na fixação do regime inicial? O juiz, quando vai fixar o regime inicial do cumprimento da pena privativa de liberdade, deve observar quatro fatores:
1) o tipo de pena aplicada: se reclusão ou detenção;
2) o quantum da pena definitiva;
3) se o condenado é reincidente ou não;
4) as circunstâncias judiciais (art. 59 do CP).
Imagine a seguinte situação hipotética: João foi condenado a 5 anos e 4 meses de reclusão pela prática do crime previsto no art. 157, § 2º, I e II, do CP. 
Na dosimetria, o juiz fixou a pena-base no mínimo legal. Apesar disso, estabeleceu o regime inicial fechado. Agiu corretamente o magistrado? NÃO. Se o réu não reincidente foi punido com pena de reclusão maior que 4 e menor que 8 anos, o CP prevê que, em regra, deverá ser imposto a ele o regime inicial semiaberto. Confira:
Art. 33 (...) § 2º As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso:
a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;
b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;
É possível que seja imposto ao condenado primário um regime inicial mais rigoroso do que o previsto para a quantidade de pena aplicada? Ex.: se uma pessoa pode ser condenada a 6 anos de reclusão e o juiz fixar o regime inicial fechado? SIM, é possível, desde que o juiz apresente motivação idônea na sentença.
Súmula 719-STF: A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea.
O juiz pode fundamentar a imposição do regime mais severo devido ao fato do crime praticado ser, abstratamente, um delito grave? Ex.: o juiz afirma que, em sua opinião, no caso de tráfico de drogas o regime deve ser o fechado em razão da gravidade desse delito. NÃO. A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime NÃO constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada (Súmula 718-STF).
O que é considerado, então, motivação idônea para impor ao condenado regime mais gravoso? Exige-se que o juiz aponte circunstâncias que demonstrem que o fato criminoso, concretamente, foi grave. Se as circunstâncias judiciais do art. 59 forem desfavoráveis, é possível que o juiz se fundamente nesses dados para impor ao condenado regime inicial mais gravoso que o previsto para a quantidade de pena aplicada. Nesse sentido:
(...) Se as penas-base de ambos os crimes são fixadas acima do mínimo legal em face da valoração negativa das circunstâncias do art. 59 do Código Penal, não há ilegalidade na imposição de regime inicial mais gravoso do que o abstratamente previsto de acordo com a quantidade de pena aplicada. (...)
STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1471969/RN, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 20/11/14)
Se a pena privativa de liberdade foi fixada no mínimo legal, é possível a fixação de regime inicial mais severo do que o previsto pela quantidade de pena? Ex.: Paulo, réu primário, foi condenado a uma pena de seis anos de reclusão. As circunstâncias judiciais foram favoráveis. Pode o juiz fixar o regime inicial fechado? NÃO. A posição que prevalece no STJ é a de que, fixada a pena-base no mínimo legal e sendo o acusado primário e sem antecedentes criminais não se justifica a fixação do regime prisional mais gravoso. STJ. 5ª Turma. AgRg no HC 303.275/SP, Rel. Min. Jorge Mussi, j. 03/02/15.
O STJ possui um enunciado no mesmo sentido:
Súmula 440-STJ: Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito.
Esse é também o entendimento do STF:
Habeas corpus. Penal. Processual penal. Roubo. Artigo 33, § 2º, do CP. Imposição de regime inicial de cumprimento de pena mais gravoso. Possibilidade, desde que seja a decisão devida e concretamente fundamentada. Circunstâncias judiciais reconhecidamente favoráveis. Pena-base fixada no mínimo legal. Ausência de fundamentação apta ao agravamento do regime prisional. Habeas corpus deferido. (...)
3. A Corte tem entendido que a fixação de regime mais severo do que aquele abstratamente imposto pelo art. 33, § 2º, do CP não se admite senão em virtude de razões concretamente demonstradas nos autos.
4. Ausência, no caso concreto, de fundamentação válida, nas razões de convencimento, para a fixação do cumprimento da pena em regime inicialmente fechado.
STF. 1ª Turma. HC 118.230, Rel. Min. Dias Toffoli, j. 08/10/2013.
8.4. Fixação de regime inicial de cumprimento de pena e circunstâncias judiciais – (Info 775)
		Se a pena-base é fixada acima do mínimo legal em virtude de as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP serem desfavoráveis, é possível que o juiz determine regime inicial mais gravoso do que o abstratamente previsto de acordo com a quantidade de pena aplicada.
Ex.: Paulo, réu primário, foi condenado a uma pena de 2 anos e 6 meses de detenção. Em regra, o regime inicial seria o aberto (art. 33, § 2º, “c”, do CP). Ocorre que duas circunstâncias judiciais foram desfavoráveis a ele, conforme fundamentação do juiz (circunstâncias e consequências do crime). Nesse caso, o magistrado, fundamentando sua decisão nesses dados, pode impor ao condenado o regime inicial semiaberto. 
STF. 2ª Turma. HC 124876/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 24/2/15 (Info 775).
8.5. Regime inicial de cumprimento de pena para o condenado por crime hediondo ou equiparado
		Qual é o regime inicial de cumprimento de pena do réu que for condenado por crime hediondo ou equiparado?
O regime inicial nas condenações por crimes hediondos ou equiparados (como é o caso do tráfico de drogas) não tem que ser obrigatoriamente o fechado, podendo ser também o regime semiaberto ou aberto, desde que presentes os requisitos do art. 33, § 2º, alíneas “b” e “c”, do Código Penal.
STF. Plenário. HC 111840/ES, rel. Min. Dias Toffoli, 27/6/2012.
STJ. 3ª Seção. EREsp 1.285.631-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, j. 24/10/2012.
9. CRIME DE HOMICÍDIO 
9.1. Dirigir alcoolizado na contramão: reconhecimento de dolo eventual – (Info 904)
		Verifica-se a existência de dolo eventual no ato de dirigir veículo automotor sob a influência de álcool, além de fazê-lo na contramão. Esse é, portanto, um caso específico que evidencia a diferença entre a culpa consciente e o dolo eventual. O condutor assumiu o risco ou, no mínimo, não se preocupou com o risco de, eventualmente, causar lesões ou mesmo a morte de outrem.
STF. 1ª Turma. HC 124687/MS, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, j. 29/5/2018 (Info 904).
	OBS:
A situação concreta, com adaptações, foi a seguinte: João, na direção de veículo automotor, entrou na contramão e atingiu uma motocicleta, causando a morte do condutor. Não foi feito teste de etilômetro (“bafômetro”) em João, mas as testemunhas afirmaram que ele exalava hálito etílico e que estava cambaleante. João foi pronunciado e condenado a 6 anos de reclusão em regime inicial semiaberto por homicídio doloso simples (dolo eventual). O condenado impetrou sucessivos habeas corpus até que a questão chegou ao STF. No writ, João pede a desclassificação do delito para homicídio culposo na condução de veículo automotor, crime previsto no art. 302 do CTB.
 
O pedido foi acolhido pelo STF? NÃO. O STF entende que, em casos de homicídio causado por motorista embriagado, se o Tribunal do Júri entender que houve dolo

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