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1 AÇÃO PENAL 4a EDIÇÃO/2024 1. ASPECTOS GERAIS 3 2. CARACTERÍSTICAS DO DIREITO DE AÇÃO PENAL 3 3. CONDIÇÕES DA AÇÃO 4 3.1. CONDIÇÕES GENÉRICAS DA AÇÃO PENAL 5 3.1.1. LEGITIMIDADE AD CAUSAM OU LEGITIMIDADE PARA AGIR 5 3.1.1.1. LEGITIMIDADE ATIVA 6 3.1.1.2.LEGITIMIDADE PASSIVA 7 3.1.2. INTERESSE DE AGIR 8 3.1.3. JUSTA CAUSA 9 3.2. CONDIÇÕES GENÉRICAS DA AÇÃO PARA A CORRENTE MINORITÁRIA (AURY LOPES JÚNIOR) 10 3.3. CONDIÇÕES ESPECÍFICAS DA AÇÃO (CONDIÇÕES DE PROCEDIBILIDADE) 11 3.4. CONDIÇÕES DE PROSSEGUIBILIDADE (CONDIÇÃO SUPERVENIENTE DA AÇÃO) 11 3.4. CONDIÇÕES OBJETIVAS DE PUNIBILIDADE E ESCUSAS ACUSATÓRIAS 12 4. CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS 13 4.1. AÇÃO PENAL PÚBLICA 13 4.1.1. TITULARIDADE 13 4.1.2. PEÇA ACUSATÓRIA 14 4.1.3. ESPÉCIES 14 4.1.3.1. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA 14 4.1.3.2. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA 14 4.2. AÇÃO PENAL PRIVADA 15 4.2.1. TITULARIDADE 16 4.2.2. PEÇA ACUSATÓRIA 16 4.2.3. ESPÉCIES 16 4.2.3.1. AÇÃO PENAL PRIVADA EXCLUSIVA 16 4.2.3.2. AÇÃO PENAL PRIVADA PERSONALÍSSIMA 17 4.2.3.3. AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA OU AÇÃO PENAL ACIDENTALMENTE PRIVADA OU AÇÃO PENAL SUPLETIVA 17 5. PRINCÍPIOS APLICÁVEIS À AÇÃO PENAL 19 5.1. PRINCÍPIOS APLICÁVEIS À AÇÃO PENAL PÚBLICA E À AÇÃO PENAL PRIVADA 19 5.1.1. PRINCÍPIO DA INÉRCIA DA JURISDIÇÃO (NE PROCEDAT IUDEX EX OFFICIO) 19 5.1.2. PRINCÍPIO DO NE BIS IN IDEM PROCESSUAL OU INADMISSIBILIDADE DA PERSECUÇÃO PENAL MÚLTIPLA 20 5.1.3. PRINCÍPIO DA INTRANSCENDÊNCIA 20 5.2. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL PÚBLICA 21 5.2.1. PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE OU LEGALIDADE PROCESSUAL 21 5.2.2. PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE OU INDESISTIBILIDADE 31 5.2.3. PRINCÍPIO DA DIVISIBILIDADE 32 5.3. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL PRIVADA 32 5.3.1. PRINCÍPIO DA OPORTUNIDADE OU CONVENIÊNCIA 32 5.3.2. PRINCÍPIO DA DISPONIBILIDADE 33 5.3.3. PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE 34 5.4. QUADRO COMPARATIVO DOS PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL 35 6. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA 38 7. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA 38 7.1. AÇÃO PENAL CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO DO OFENDIDO 39 7.1.1. REPRESENTAÇÃO 39 7.1.2. PRAZO 40 7.1.3. RETRATAÇÃO 40 7.2. AÇÃO PENAL CONDICIONADA À REQUISIÇÃO DOMINISTRO DA JUSTIÇA 41 8. AÇÃO PENAL DE INICIATIVA PRIVADA 41 8.1. AÇÃO PENAL EXCLUSIVAMENTE PRIVADA 42 8.2. AÇÃO PENAL PRIVADA PERSONALÍSSIMA 42 8.3. AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA 42 8.3.1. CABIMENTO 43 8.3.2. HIPÓTESES NA LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL 43 8.3.3. PRAZO 44 8.3.4. PODERES DOMINISTÉRIO PÚBLICO NA AÇÃO PÚBLICA SUBSIDIÁRIA 44 9. EXTINÇÃO DE PUNIBILIDADE E AÇÃO PENAL DE INICIATIVA PRIVADA 45 9.1. DECADÊNCIA 45 9.2. RENÚNCIA 45 9.3. PERDÃO DO OFENDIDO 46 9.4. PEREMPÇÃO 47 10. OUTRAS CLASSIFICAÇÕES DOUTRINÁRIAS 47 10.1. AÇÃO PENAL PÚBLICA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA 47 10.2. AÇÃO PENAL POPULAR 48 10.3. AÇÃO PENAL ADESIVA 48 10.4. AÇÃO DE PREVENÇÃO PENAL 48 10.5. AÇÃO PENAL SECUNDÁRIA 48 10.6. AÇÃO PENAL INDIRETA 49 10.7. AÇÃO PENAL EXTENSIVA 49 11. PEÇA ACUSATÓRIA 49 2 11.1. REQUISITOS 49 11.1.1. EXPOSIÇÃO DO FATO CRIMINOSO E CIRCUNSTÂNCIAS 49 11.1.2. QUALIFICAÇÃO DO ACUSADO 52 11.1.3. CLASSIFICAÇÃO DO CRIME 52 11.1.4. ROL DE TESTEMUNHAS 53 11.2. PROCURAÇÃO NA QUEIXA-CRIME 53 11.3. PRAZO PARA OFERECIMENTO DA DENÚNCIA - Art. 46, CPP 54 11.4. PRAZO PARA OFERECIMENTO DA QUEIXA 55 12. PONTOS IMPORTANTES NA JURISPRUDÊNCIA 55 3 1. ASPECTOS GERAIS Ação penal é tema cujo fundamento legal encontra-se nos arts. 24 a 62, do CPP e 100 a 106, do CP, nos quais se busca disciplinar a segunda fase da persecução penal. Isso porque, o Direito Penal não é um direito de aplicação imediata, já que ninguém será levado à prisão para cumprir uma pena sem o devido processo legal. Além dos dispositivos acima elencados, destaca-se que o direito de ação também encontra fundamento constitucional no art. 5º, inc. XXXV, que prevê que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Art. 5.º, XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; Adentrando ao conceito do direito de ação, pode-se afirmar que é o direito ao julgamento do mérito da causa (TEORIA ECLÉTICA). Assim, é o direito que a parte tem de pedir ao juiz um pronunciamento sobre o mérito da demanda, conforme estejam presentes ou não as condições da ação. Ou seja, somente é possível o pronunciamento jurisdicional sobre o mérito da causa, se estiverem presentes determinadas condições (condições da ação). Noutras palavras, trata-se do direito público subjetivo de pedir ao Estado-Juiz a aplicação do direito penal objetivo ao caso concreto. Vale ressaltar que há corrente minoritária que sustenta que a ação penal não seria um direito, mas sim um poder, porque a contrapartida seria uma sujeição do Estado-Juiz, que está obrigado a se manifestar. 🚩 NÃO CONFUNDA: Direito de ação ≠ Ação (propriamente dita) A AÇÃO PROPRIAMENTE DITA “é o ato jurídico, ou mesmo a iniciativa de se ir à justiça, em busca do direito, com efetiva prestação da tutela jurisdicional, funcionando como a forma de se provocar o Estado a prestar a tutela jurisdicional.”1 2. CARACTERÍSTICAS DO DIREITO DE AÇÃO PENAL2 a) DIREITO PÚBLICO A atividade jurisdicional é de natureza pública (ação penal é um direito público), mesmo quando o Estado transfere ao ofendido a possibilidade de ingressar em juízo. b) DIREITO SUBJETIVO Possibilidade de exigir do Estado-juiz a prestação jurisdicional. c) DIREITO AUTÔNOMO Não se confunde com o direito material que se pretende tutelar. d) DIREITO ABSTRATO Independe do resultado da pretensão acusatória. e) DIREITO DETERMINADO Por visar solucionar uma pretensão de direito material, é instrumentalmente conexo a um fato concreto. f) DIREITO ESPECÍFICO Apresenta um conteúdo, que é o fato delituoso atribuído ao acusado. 2 LIMA, Renato Brasileiro de.Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.294. 1 LIMA, Renato Brasileiro de.Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.291. 4 3. CONDIÇÕES DA AÇÃO As condições da ação consistem nos requisitos necessários e condicionantes ao exercício regular do direito de ação. A análise das condições da ação é feita unicamente com fundamento nas afirmações contidas na petição inicial do autor (TEORIA DA ASSERÇÃO ou TEORIA DELLA PROSPETTAZIONE), sem aprofundamento probatório. As condições da ação, dentre elas o interesse processual e a legitimidade ativa, definem-se da narrativa formulada inicial, não da análise do mérito da demanda (teoria da asserção), razão pela qual não se recomenda ao julgador, na fase postulatória, se aprofundar no exame de tais preliminares. STJ. 3ª Turma REsp 1561498/RJ, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 01/03/2016. As condições da ação devem ser analisadas, pelo juiz, no momento do juízo de admissibilidade da peça acusatória. Estando presentes, o juiz RECEBERÁ a peça (Art. 396, CPP). Todavia, se quaisquer das condições da ação estiver ausente, deverá o juiz REJEITAR a peça acusatória (Art. 395, inc. II, CPP). Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: I - for manifestamente inepta; II - faltar pressuposto processual ou condição para o exercício da ação penal. 🚨 JÁ CAIU Na prova para o cargo de Juiz de Direito Substituto do Estado do Espírito Santo (Ano: 2023, Banca: FGV), a questão trouxe o presente enunciado “Luíz foi denunciado pelo Ministério Público em razão da prática do delito de roubo agravado pelo uso de arma. Contudo, a denúncia não expôs a conduta criminosa de Luíz com todas as suas circunstâncias, tampouco especificou a arma utilizada para o cometimento do delito”, seguido da afirmativa considerada correta pela banca: “Diante desse cenário, é correto afirmar que a denúncia deve ser rejeitada liminarmente pelo juiz, em razão da sua manifesta inépcia”. ⚠ ATENÇÃO Recebida a peça acusatória, percebendo o juiz a AUSÊNCIA de condição da ação, deverá declarar a NULIDADE ABSOLUTA do processo (Art. 564, inc. II, CPP). Segundo Renato Brasileiro (2020, p.296):iv) pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 Código Penal, a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou v) cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada. Também, por força do art. 28-A, §2º, do CPP, está vedada a proposta de acordo nas seguintes hipóteses (requisitos negativos do ANPP): 1. se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais; 2. se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas; 3. ter sido o agente beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e 4. nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor. O juiz não deve se imiscuir no mérito do acordo, devendo apenas verificar a regularidade, a 27 legalidade e a sua voluntariedade. Por meio desse acordo, o autor do delito confessa e aceita o cumprimento de condições não privativas de liberdade. Em contraprestação, o Ministério Público se compromete a não oferecer a denúncia. Após o cumprimento das condições impostas, dar-se-á o arquivamento do inquérito policial. O acordo de não persecução penal consiste em um negócio jurídico pré-processual entre o MP e o investigado, juntamente com seu defensor, como alternativa à propositura de ação penal para certos tipos de crimes, principalmente no momento presente, em que se faz necessária a otimização dos recursos públicos. Cabe ao MP justificar expressamente o não oferecimento do ANPP, o que poderá ser, após provocação do investigado, passível de controle pela instância superior do Ministério Público, nos termos do art. 28-A, § 14, do CPP. O instituto é resultante de convergência de vontades (MP e acusado), não podendo afirmar que se trata de um direito subjetivo do acusado. Quando o ANPP é negado pelas duas instâncias do Ministério Público, não há possibilidade legal de intervenção do Poder Judiciário nesse tema. (STJ, HC 584.843, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, decisão monocrática de 24.06.2020). Sobre a eficácia no tempo do ANPP, tem-se algumas correntes: ● 1ª CORRENTE (minoritária): Como o ANPP possui natureza mista (versa sobre direito penal e processual penal), deve retroagir para atingir fatos passados em benefício do investigado/imputado, na forma do art. 5, inciso XL, da CRFB/88 (a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu) e art. 2º, parágrafo único, do CP (Art. 2º - Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória. Parágrafo único - A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado). Assim, essa corrente entende que deve ser oferecido o ANPP inclusive a casos com sentença já transitada em julgado, diante da natureza também material que o ANPP possui. ● 2ª CORRENTE: A corrente que era defendida pelo Min. Nefi Cordeiro era no sentido de que era cabível ANPP em todos os processos, desde que não possuíssem trânsito em julgado. Vejamos: É reconsiderada a decisão inicial porque o cumprimento integral do acordo de não persecução penal gera a extinção da punibilidade (art. 28-A, § 13, do CPP), de modo que como norma de natureza jurídica mista e mais benéfica ao réu, deve retroagir em seu benefício em processos não transitados em julgado (art. 5º, XL, da CF). AgRg no HC 575395/RN, 6ª Turma, rel. Min. Nefi Cordeiro, j. 08/09/2020, DJe 14/09/2020. ● 3ª CORRENTE: A 6ª Turma dp STJ, no AgRg no HC 628.647, Min. Rel. Nefi Cordeiro, Min. Rel. para acórdão Laurita Vaz, j. 09/03/2021, pacificou o entendimento e, por maioria, a 6ª Turma do STJ entendeu que deve o ANPP retroagir aos processos cuja denúncia não tenha sido recebida. O STF, hoje, possui o mesmo entendimento da 6ª Turma/STJ: Embora cabível acordo de não persecução penal considerado fato anterior à Lei nº 28 13.694/2019, a natureza mista da norma conduz à retroação tendo como limite o recebimento da denúncia, quando inaugurada a fase processual. STF, HC 199.950, Rel. Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, j. 10.06.2021. A Lei nº 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”) inseriu o art. 28-A ao CPP, criando, no ordenamento jurídico pátrio, o instituto do acordo de não persecução penal (ANPP). A Lei 13.964/2019, no ponto em que institui o ANPP, é considerada lei penal de natureza híbrida, admitindo conformação entre a retroatividade penal benéfica e o tempus regit actum. O ANPP se esgota na etapa pré-processual, sobretudo porque a consequência da sua recusa, sua não homologação ou seu descumprimento é inaugurar a fase de oferecimento e de recebimento da denúncia. O recebimento da denúncia encerra a etapa pré-processual, devendo ser considerados válidos os atos praticados em conformidade com a lei então vigente. Dessa forma, a retroatividade penal benéfica incide para permitir que o ANPP seja viabilizado a fatos anteriores à Lei 13.964/2019, desde que não recebida a denúncia. Assim, mostra-se impossível realizar o ANPP quando já recebida a denúncia em data anterior à entrada em vigor da Lei nº 13.964/2019. STJ. 5ª Turma. HC 607003-SC, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 24/11/2020 (Info 683). STF. 1ª Turma. HC 191464 AgR, Rel. Roberto Barroso, julgado em 11/11/2020. Há alguns membros do Ministério Público que sustentam sustentando que a intenção do legislador é de que o ANPP tenha aplicação apenas na fase pré-processual, isto é, antes do oferecimento da denúncia e direcionado apenas ao indiciado, e não ao já imputado. No entanto, majoritariamente, defende-se que, se a intenção do legislador fosse essa, a norma não seria inserida no título referente à “AÇÃO PENAL”, mas sim no Título II do CPP, que trata “DO INQUÉRITO POLICIAL”. Assim, dúvidas não há de que se o ANPP foi incluído no quadro normativo relacionado à ação penal, é claro que se aplica não apenas ao indiciado, mas também ao imputado/acusado (já denunciado). Não se nega que a primeira intenção do ANPP seja impedir a deflagração da ação penal, mas, ultrapassada esta questão, caso durante o curso do processo ocorra uma desclassificação, deve ser oferecido o ANPP, se presentes os requisitos. No caso da suspensão condicional do processo e na transação penal, se no decorrer do processo ou na sentença ocorre uma desclassificação para um crime mais brando em que incida a suspensão condicional ou transação penal, tais institutos devem ser ofertados ao acusado, evitando-se uma condenação (conforme se depreende do do art. 383, §1º, do CPP e da súmula 337/STJ). Assim, se tais mecanismos valem para os outros institutos despenalizadores, também devem valer para o ANPP. Além disso, a jurisprudência tem se consolidado no sentido de que o ANPP não se trata de direito subjetivo do réu, já que o MP possui discricionariedade no exercício de suas funções e no oferecimento do acordo. Defende esta corrente que, se fosse um direito público subjetivo, o próprio juiz poderia propor o acordo no lugar do MP, o que seria vedado, pois é uma iniciativa apenas do órgão do MP. No entanto, caso o magistrado não concorde com a não-oferta do ANPP, poderá invocar o art. 28 e remeter ao órgão superior, assim como previsto para o investigado: §14. No caso de recusa, por parte do 29 Ministério Público, em propor o acordo de não persecução penal,o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior, na forma do art. 28 deste Código. As condições descritas em lei são requisitos necessários para o oferecimento do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), importante instrumento de política criminal dentro da nova realidade do sistema acusatório brasileiro. Entretanto, não obriga o Ministério Público, nem tampouco garante ao acusado verdadeiro direito subjetivo em realizá-lo. Simplesmente, permite ao MP a opção, devidamente fundamentada, entre denunciar ou realizar o acordo, a partir da estratégia de política criminal adotada pela Instituição. O art. 28-A do Código de Processo Penal, alterado pela Lei 13.964/19, foi muito claro nesse aspecto, estabelecendo que o Ministério Público “poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições”. A finalidade do ANPP é evitar que se inicie o processo, não havendo lógica em se discutir a composição depois da condenação, como pretende a defesa. (STF, AgR no HC 191.124, Rel. Min. Alexandre de Moraes, 1ª Turma, j. 07.04.2021). Em caso de descumprimento, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia. Também, esse descumprimento pode ser utilizado pelo Ministério Público como justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo (art. 28-A, §§ 10 e 11, do CPP). Ainda, havendo descumprimento dos termos do acordo, a denúncia a ser oferecida poderá utilizar como suporte probatório a confissão formal e circunstanciada do investigado (prestada voluntariamente na celebração do acordo). A confissão, nesse caso, se trata de mero indício, obtido extrajudicialmente. Note-se que a homologação pelo juízo não se refere à confissão em si, mas ao próprio conteúdo do acordo e se a voluntariedade da manifestação foi feita de forma voluntária. Base legal: (i) art. 155, CPP (confissão é mero elemento informativo), (ii) art. 197 do CPP (necessidade de ser corroborada por outros elementos, pois o juiz não pode basear a condenação exclusivamente na confissão), e (iii) art. 93, IX, CF/88 (princípio da persuasão racional). Quanto à possibilidade de sua aplicação em crimes hediondos, há aqui 2 correntes: ● 1ª CORRENTE: Não é cabível a oferta de ANPP aos crimes hediondos e equiparados, pois em relação a estes o acordo não é suficiente para a reprovação e prevenção do crime; ● 2ª CORRENTE: Como não há vedação legal, não se pode deixar de propor o acordo exclusivamente sob a justificativa de que se trata de crime hediondo. Não se pode olvidar que o STF entende que os crimes hediondos e equiparados admitem a fixação de regime inicial aberto e a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, preenchidos os requisitos legais, razão pela qual, do mesmo modo, o fato de ser hediondo ou equiparado não pode, ser empecilho para o oferecimento do acordo de não persecução penal. Ainda, é importante salientar que a celebração desse acordo não constará de certidão de antecedentes criminais. Caberá RESE da decisão, despacho ou sentença que recusar homologação à proposta de acordo de não persecução penal, previsto no art. 28-A desta Lei. 30 Outro conceito interessante é o do ANPP adesivo/bifurcado. Isso porque, a ação penal adesiva é caracterizada quando há conexão entre um crime de ação penal pública e um crime de ação penal privada. Assim, há um litisconsórcio entre o querelante e o MP. De acordo com Mauro Messias, este fenômeno também pode ocorrer, de certa forma, em relação à legitimidade para o oferecimento do ANPP. Em relação à ação penal, o autor explica que o termo correto deveria ser “ação penal bifurcada”, uma vez que não há uma bifurcação narrativa fática e da consequente persecução, em um único processo crime, respeitando-se as regras de legitimidade. O autor menciona uma primeira situação: quando o crime de ação pública admite acordo, assim como delito de ação privada, querelante e MP devem oferecer propostas separadas, o que se denominou de ANPP adesivo. Uma segunda hipótese seria quando o crime de ação pública admitir acordo e o crime de ação privada não (ou vice-versa): nessa situação, um legitimado oferece o ANPP e o outro ajuíza a ação penal. Assim, percebe-se que o autor admite a possibilidade de o querelante oferecer ANPP na ação penal privada. Por fim, veja alguns julgados relevantes sobre o tema: O Poder Judiciário não pode impor ao Ministério Público a obrigação de ofertar acordo de não persecução penal. Não cabe ao Poder Judiciário, que não detém atribuição para participar de negociações na seara investigatória, impor ao MP a celebração de acordos. Não se tratando de hipótese de manifesta inadmissibilidade do ANPP, a defesa pode requerer o reexame de sua negativa, nos termos do art. 28-A, § 14, do CPP não sendo legítimo, em regra, que o Judiciário controle o ato de recusa, quanto ao mérito, a fim de impedir a remessa ao órgão superior no MP. Isso porque a redação do art. 28-A, § 14, do CPP determina a iniciativa da defesa para requerer a sua aplicação. Tem-se, portanto, que se o MP se recusar a oferecer o acordo e a defesa requerer a remessa dos autos ao órgão superior, o juiz é obrigado a remeter. No entanto, o STF já afirmou que o juiz não precisa remeter ao órgão superior do MP em caso de manifesta inadmissibilidade do ANPP. STF. 2ª Turma. HC 194677/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 11/5/2021 (Info 1017). A finalidade do ANPP é evitar que se inicie o processo, não havendo lógica em se discutir a composição depois da condenação, como pretende a defesa. STF, AgRg no HC 191.124, Rel. Min. Alexandre de Moraes, 1ª Turma, j. 08.04.2021. Impossibilidade de impetrar HC para discutir ausência de justa causa após aceitar ANPP. São inúmeros os argumentos a não se dar guarida ao pleito defensivo de aplicação do princípio da insignificância, após a aceitação do acordo de não persecução penal. O primeiro deles parte do próprio instituto utilizado, haja vista a inexistência de risco iminente à liberdade de locomoção no caso, pois o debate de falta de justa causa a um eventual oferecimento de denúncia somente ocorrerá em caso de descumprimento do acordo, em outras palavras, por evento futuro e incerto. Não obstante, o revolvimento fático-probatório aqui almejado sequer foi realizado na origem, sem se olvidar que a dilação probatória no caso vertente foi dispensada pela defesa quando da aceitação 31 do benefício do acordo de não persecução penal, configurando nítido nemo potes vender contra fartum proprium afirmar a ausência de tipicidade material neste momento. STJ, HC 619.751, Rel. Min. Felix Fischer, decisão monocrática de 11.12.2020. É incabível o oferecimento de acordo de não persecução penal pelo Ministério Público nos casos de tráfico ilícito de entorpecentes – cuja pena mínima é superior a 4 anos –, em razão do não preenchimento de um dos requisitos objetivos do art. 28-A, caput, do CPP. STJ, AgRg no HC 584.807, Rel. Min. João Otávio de Noronha, 5ª Turma, j. 13.10.2020. A atuação, por força do art. 28-A, § 14, do CPP, da Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Militar, por meio dos Sub-Procuradores Gerais de Justiça Militar que a integram, em ação penal militar em trâmite no primeiro grau de jurisdição, por si só, não desloca a competência diretamente para o Superior Tribunal de Justiça para o processamento e julgamento de habeas corpus contra a decisão que manteve o não oferecimento do acordo de não persecução penal no âmbito da Justiça Militar. STJ, AgRg no HC 628.595, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª Turma, j. 15.12.2020. O instituto do acordo de não persecução penal, previsto no art. 28-A do CPP, não se aplica aos crimes militares previstos na legislação penal militar, tendo em vista sua evidenteincompatibilidade com a Lei Adjetiva castrense, opção que foi adotada pelo legislador ordinário, ao editar a Lei nº 13.964, de 2019, e propor a sua incidência tão somente em relação ao Código de Processo Penal comum. Inexiste violação dos preceitos constitucionais, insculpidos no art. 5º, caput, e incisos LIV e LXVIII, da Constituição Federal de 1988, e art. 467, “b” e “c”, do CPPM, uma vez que a negativa dos Órgãos judicantes da JMU, afastando a incidência do acordo de não persecução penal em relação aos delitos previstos na legislação penal militar, por óbvio, não pode ser considerada violação de formalidade legal e tampouco se configura constrangimento ilegal em relação ao acusado. STM, HC 7000374-06.2020.7.00.0000, Rel. Min. José Coelho Ferreira, Plenário, j. 26.08.2020. Ao final, importa lembrar que uma vez cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção da punibilidade. 5.2.2. PRINCÍPIO DA INDISPONIBILIDADE OU INDESISTIBILIDADE Decorre logicamente do primeiro, não podendo o MP desistir da ação penal, conforme o Art. 42 do CPP: Art. 42. O Ministério Público não poderá desistir da ação penal. Da mesma forma, não pode o MP desistir de recurso por ele mesmo interposto. Salienta-se que o MP não é obrigado a recorrer, mas uma vez recorrido, não é possível desistir. 🚨 JÁ CAIU Na prova para o cargos e Promotor de Justiça do Estado de Santa Catarina (Ano: 2023, Banca: CESPE/CEBRASPE), foi considerada incorreta a 32 seguinte afirmativa: “De acordo com o Código de Processo Penal, é facultada ao Ministério Público a desistência da ação penal na hipótese de convencimento da inexistência de razões para a condenação do réu”. Art. 576. O Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja interposto. Obviamente isso não impede o MP de pedir a absolvição do acusado, ao final do processo. Conforme o Art. 385, CPP: Art. 385. Nos crimes de ação pública, o juiz poderá proferir sentença condenatória, ainda que o Ministério Público tenha opinado pela absolvição, bem como reconhecer agravantes, embora nenhuma tenha sido alegada. EXCEÇÃO INDISPONIBILIDADE MITIGADA ou DISCRICIONARIEDADE REGRADA: suspensão condicional do processo, prevista na Lei 9.099/95. É possível a formalização, pelo Ministério Público, de acordo de não continuidade da ação penal? Parcela minoritária da doutrina aponta tal hipótese como exceção ao princípio da indisponibilidade de ação penal pública. Seria uma hipótese facultada ao Promotor de Justiça após o ajuizamento do processo criminal. Ressalta-se que o STF e o STJ entendem que “o instituto do acordo de não persecução penal torna-se inviabilizado após o recebimento da denúncia”.13 5.2.3. PRINCÍPIO DA DIVISIBILIDADE Para esse princípio nós temos duas correntes: 1.ª CORRENTE (Divisibilidade - MAJORITÁRIA): O MP pode denunciar alguns autores e prosseguir as investigações em relação aos demais. É a posição que prevalece no STJ e STF. O MP não tem a absoluta discricionariedade para escolher quem vai processar ou não. Na verdade, o princípio diz que o MP poderá denunciar aqueles contra quem haja indícios de autoria já sedimentados, e prosseguir as investigações contra aqueles contra os quais ainda não haja elementos de autoria e materialidade. 2.ª CORRENTE (Indivisibilidade - MINORITÁRIA): Havendo justa causa, o MP deverá denunciar todos os investigados. É o entendimento de Renato Brasileiro, Fernando da Costa Tourinho Filho, Aury Lopes Jr. e outros. Conclusão: Perceba que, na verdade, as duas correntes dizem a mesma coisa de formas distintas. 5.3. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL PRIVADA 5.3.1. PRINCÍPIO DA OPORTUNIDADE OU CONVENIÊNCIA O ofendido ou seu representante legal podem optar pelo oferecimento ou não da queixa-crime, atendendo a critérios próprios de conveniência e oportunidade. Contrasta com o princípio da obrigatoriedade. 13 Avena, Norberto. Processo Penal. Disponível em: Minha Biblioteca, (14th edição). Grupo GEN, 2022. 33 Se o ofendido não tiver interesse em propor a ação penal privada, há duas possibilidades: a) RENÚNCIA AO DIREITO DE QUEIXA: o ofendido abre mão do direito de queixa (explícita ou implicitamente). Independe de aceitação do agente. b) DECADÊNCIA: O ofendido deixa escoar o prazo de 6 MESES, da data do conhecimento da autoria, para propor a queixa-crime. 📌 OBSERVAÇÕES ■ Tanto a renúncia ao direito de queixa quanto a decadência se aplicam antes do início do processo penal, ainda na fase pré-processual, por isso se relacionam ao princípio da oportunidade ou conveniência. ■ Em ambos os casos (decadência e renúncia) temos causas extintivas da punibilidade. 5.3.2. PRINCÍPIO DA DISPONIBILIDADE O querelante poderá desistir da ação penal privada em andamento (desistência). Temos 3 formas de desistência: a) PERDÃO DO OFENDIDO - Art. 51, CPP: O querelante perdoa o querelado, que precisa ACEITAR o perdão. É causa de extinção de punibilidade . Art. 51. O PERDÃO concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que produza, todavia, efeito em relação ao que o recusar. 🚨 JÁ CAIU Na prova para o cargo de Promotor de Justiça do Estado da Bahia (Ano: 2023, Banca CESPE/CEBRASPE), foi considerada correta a seguinte afirmativa: “O perdão, se recusado pelo agente do crime, não produz efeito”. b) PEREMPÇÃO - Art. 60, CPP: Se o querelado não aceitar o perdão, é possível desistir do processo, deixando o querelante de dar andamento à ação penal privada (negligência). Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á PEREMPTA a ação penal: I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30 dias seguidos; II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36 - CADI; III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais; IV - quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor. c) CONCILIAÇÃO NOS CRIMES CONTRA A HONRA - Arts. 520 e 522, CPP Art. 520. Antes de receber a queixa, o juiz oferecerá às partes oportunidade para se reconciliarem, fazendo-as comparecer em juízo e ouvindo-as, separadamente, SEM A PRESENÇA DOS SEUS ADVOGADOS, não se lavrando termo. Art. 522. No caso de reconciliação, depois de 34 assinado pelo querelante o termo da desistência, a queixa será arquivada. 📌 OBSERVAÇÃO Os institutos que se relacionam ao princípio da Disponibilidade ocorrem após o início do processo penal, isto é, já na fase processual, diferentemente do que ocorre no princípio da Conveniência ou Oportunidade. 5.3.3. PRINCÍPIO DA INDIVISIBILIDADE Nas Lições de Renato Brasileiro: “(...) se optar pelo oferecimento da queixa, uma coisa é certa: o querelante não pode escolher quem vai processar; ele está obrigado a processar todos os autores do delito, por força do princípio da indivisibilidade.”14 Conforme o Art. 48, CPP: Art. 48. A queixa contra qualquer dos autores do crime obrigará ao processo de todos, e o Ministério Público velará pela sua INDIVISIBILIDADE. Perceba que o MP é o fiscal do princípio da indivisibilidade na ação penal privada. Constatada a inobservância do princípio em comento surgem duas possibilidades: a) OMISSÃO VOLUNTÁRIA (DELIBERADA): Se a omissão em incluir determinado autor/partícipe foi proposital - considera-se renúncia ao direito de queixa, o que se estende aos demais. 14LIMA, Renato Brasileiro de.Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.311. Não oferecida a queixa-crime contra todos os supostos autores ou partícipes da prática delituosa, há afronta ao princípio da indivisibilidade da ação penal, a implicar renúnciatácita ao direito de querela, cuja eficácia extintiva da punibilidade estende-se a todos quantos alegadamente hajam intervindo no cometimento da infração penal. STF. 1ª Turma Inq 3526/DF, Rel. Min. Roberto Barroso, julgado em 2/2/2016 (Info 813). b) OMISSÃO INVOLUNTÁRIA: o MP deve se manifestar para que o querelante adite a inicial para incluir os demais autores/partícipes. Caso o querelante se recuse expressamente ou permaneça inerte, o juiz deverá entender que houve renúncia (art. 49, CP), bem como deverá extinguir a punibilidade em relação a todos os envolvidos. Decorrem do princípio da indivisibilidade as seguintes regras: a) Renúncia concedida a um dos acusados estende-se aos demais; Art. 49. A RENÚNCIA ao exercício do direito de queixa, em relação a um dos autores do crime, a todos se estenderá. b) Perdão concedido a um dos querelados estende-se aos demais, desde que haja aceitação. Art. 51. O PERDÃO concedido a um dos querelados aproveitará a todos, sem que produza, todavia, efeito em relação ao que o recusar. 🚨 JÁ CAIU Na prova para o cargo de Juiz Federal - TRF 1ª Região (Ano: 2023, Banca: FGV), o enunciado trouxe o 35 seguinte caso “Mateus oferece queixa-crime contra João, alegando, supostamente, que o querelado, juntamente com Tiago, teria feito postagens nas redes sociais, afirmando ser o querelante corrupto e fraudador de licitações”. Diante da hipótese narrada, é correto afirmar que o crime praticado é o de “injúria, e João deverá ter extinta a sua punibilidade, ante a aplicação do princípio da indivisibilidade.” 5.4. QUADRO COMPARATIVO DOS PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL15 PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL PÚBLICA PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL DE INICIATIVA PRIVADA Princípio do ne procedat iudex ex officio: com a adoção do sistema acusatório pela Constituição Federal, ao juiz não é dado iniciar um processo de ofício. O denominado processo judicialiforme, por meio do qual o juiz dava início a um processo por meio de portaria, não foi recepcionado pela Constituição Federal. Princípio do ne procedat iudex ex officio: também se aplica à ação penal de iniciativa privada. Princípio do ne bis in idem: ninguém pode ser processado duas vezes pela mesma imputação. Previsto expressamente Princípio do ne bis in idem: também se aplica à ação penal de iniciativa privada. 15 LIMA, Renato Brasileiro de.Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.331/332 na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Dec. 678/92, art. 8º, nº 4) Princípio da intranscendência: a ação penal pública só pode ser proposta em relação ao provável autor do delito. Princípio da intranscendência: a ação penal de iniciativa privada só pode ser proposta em relação ao provável autor do delito. Princípio da Obrigatoriedade (ou legalidade processual): presentes as condições da ação penal e havendo justa causa para a deflagração de um processo criminal, o Ministério Público é obrigado a oferecer denúncia. Deriva do art. 24 do CPP e do art. 30 do CPPM. Exceções ao princípio da obrigatoriedade: 1) Transação penal (art. 76 da Lei nº 9.099/95); 2) Acordo de leniência (Lei nº 12.529/11, arts. 86 e 87 ); 3) Termo de ajustamento de conduta (Lei nº 7.347/85, art. 5º, § 6º); Princípio da oportunidade ou da conveniência: mediante critérios próprios de oportunidade ou conveniência, o ofendido pode optar pelo oferecimento (ou não) da queixa-crime. Caso não pretenda exercer seu direito, pode permanecer inerte durante o curso do prazo decadencial, ou renunciar (expressa ou tacitamente) ao direito de queixa, situações que darão ensejo à extinção da punibilidade em relação aos crimes de ação penal exclusivamente privada e de ação penal privada personalíssima, nos 36 4) Parcelamento do débito tributário (Lei nº 9.430/96, art. 83, § 2º, com redação dada pela Lei nº 12.382/11); 5) Colaboração premiada na nova Lei das Organizações Criminosas (Lei nº 12.850/13, arts. 4º a 7º); 6) Acordo de não persecução penal (Resolução n. 181 do CNMP, art. 18); termos do art. 107, inciso IV e V, do Código Penal. Princípio da indisponibilidade: se, por conta do princípio da obrigatoriedade, o Ministério Público é obrigado a oferecer denúncia, não pode desistir da ação penal pública, nem tampouco do recurso que haja interposto (CPP, arts. 42 e 576). Isso, todavia, não significa dizer que o Ministério Público não possa pedir a absolvição do acusado. Exceção ao princípio da indisponibilidade: 1) suspensão condicional do processo (Lei nº 9.099/95, art. 89); Princípio da disponibilidade: se a ação penal de iniciativa privada está sujeita a critérios próprios de oportunidade ou conveniência do ofendido ou de seu representante legal, isso significa dizer que o querelante poderá dispor do processo penal em andamento. Formas de disposição: 1) perdão do ofendido: tem natureza jurídica de causa extintiva da punibilidade nos crimes de ação penal exclusivamente privada ou personalíssima, porém, ao contrário da renúncia, depende de aceitação do querelado; 2) perempção: é a perda do direito de prosseguir com o exercício da ação penal exclusivamente privada ou personalíssima em virtude da desídia do querelante, com a consequente extinção da punibilidade; 3) conciliação e assinatura de termo de desistência, no procedimento dos crimes contra a honra de competência do juiz singular (CPP, art. 522). Princípio da (in) divisibilidade: parte da doutrina entende que vigora na ação penal pública o princípio da indivisibilidade. Logo, havendo lastro probatório contra todos os coautores e partícipes, o Ministério Público é obrigado a oferecer denúncia contra todos (nossa posição). Outra parte da doutrina e a Princípio da indivisibilidade: o ofendido não é obrigado a agir (princípio da oportunidade ou conveniência). Porém, se quiser exercer seu direito de queixa-crime, é obrigado a exercê-lo em relação a todos os coautores e partícipes do fato delituoso. Como dispõe o art. 48 do CPP, o processo de um obriga ao processo de 37 jurisprudência majoritária entende que vigora o princípio da divisibilidade, significando que o Parquet pode oferecer denúncia contra certos agentes, sem prejuízo do aprofundamento das investigações quanto aos demais envolvidos. todos. Como consequência desse princípio, a renúncia ao exercício do direito de queixa em relação a um dos autores do crime estende-se aos demais (CPP, art. 49). Da mesma forma, o perdão concedido a um dos querelados aproveita a todos, salvo se um deles não o aceitar (CPP, art. 51). O fiscal desse princípio é o Ministério Público, que não tem legitimidade ad causam para aditar a queixa crime para incluir coautores. Verificando-se que a omissão do querelante fora voluntária, haverá renúncia tácita, extensiva a todos os envolvidos. Afinal, se sabia da existência de outros coautores e partícipes, e deixou de inclui-los no polo passivo da demanda, é porque renunciou ao direito de ação quanto a eles, renúncia esta que se estende aos demais, nos termos do art. 48 do CPP. Se, todavia, a omissão do querelante foi involuntária, deve o MP instar o querelante a aditar a queixa-crime para incluir os demais envolvidos, sob pena de caracterização de renúncia tácita, acarretando a extinção da punibilidade de todos os envolvidos. Princípio da oficialidade: a legitimidade para a persecução penal recai sobre órgãos do Estado, tanto na fase pré-processual, quanto na fase processual. Princípio da oficialidade: aplica-se à ação penal de iniciativa privada, porém apenas na fase pré-processual. Princípio da autoritariedade: o órgão responsável pela persecução criminal é autoridade pública, tanto na fase pré-processual, quanto na fase processual. Princípio da autoritariedade: aplica-se à ação penal de iniciativa privada, porém apenas na fase pré-processual.Princípio da oficiosidade: nos crimes de ação penal pública incondicionada, às autoridades estatais Princípio da oficiosidade: não se aplica à ação penal de iniciativa privada, já que, mesmo na fase 38 são obrigadas a agir de ofício, independentemente de provocação do ofendido ou de terceiros. investigatória, a atuação da polícia investigativa depende de prévio requerimento do ofendido ou de seu representante legal. Postas as características gerais do tema, voltaremos agora a trabalhar com alguns assuntos que já adiantamos, mas que, neste momento, consideramos relevante aprofundar e fixar. 6. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA A ação penal pública incondicionada é a regra, conforme o art. 100, caput, do CP: Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. O titular da ação é o Ministério Público e a peça acusatória é denominada de denúncia, conforme estabelece o art. 129, inc. I, CF: Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; 🚨 JÁ CAIU Na prova para o cargo de Promotor de Justiça do Estado de Santa Catarina (Ano: 2023, Banca: CESPE/CEBRASPE), foi considerada correta a seguinte afirmativa: O texto constitucional vigente prevê expressamente ser função institucional do Ministério Público promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei“ EXCEÇÃO: Titularidade na ação penal de iniciativa privada subsidiária da pública. O Ministério Público não depende de nenhuma manifestação da vítima ou de terceiros quanto à iniciativa da ação penal. Desta forma, se a lei não estabelecer sentido diverso, a ação será pública incondicionada. ⚠ IMPORTANTE Em regra, as lesões corporais leves e culposas são crimes de ação penal pública condicionada à representação, conforme estabelece o art. 88 da Lei nº 9.099/95. A EXCEÇÃO para essa regra é no caso de lesão corporal praticada contra mulher no âmbito das relações domésticas, sendo de ação penal pública incondicionada, uma vez que a Lei nº 9.099/95 não se aplica nos casos de violência doméstica (art. 41 da Lei nº 11.340/06). Súmula 542, STJ: A ação penal relativa ao crime de lesão corporal resultante de violência doméstica contra a mulher é pública incondicionada. 7. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA Existem crimes que afetam diretamente interesses particulares, cabendo ao ofendido decidir sobre iniciar ou não o processo. 39 Desta forma, a promoção da ação penal pública pelo Ministério Público depende da representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça. A lei vai dispor quando a ação for pública condicionada. 7.1. AÇÃO PENAL CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO DO OFENDIDO 7.1.1. REPRESENTAÇÃO A representação nada mais é do que a manifestação do ofendido ou de seu representante no sentido de que possui interesse na persecução penal do autor do fato criminoso. Trata-se de uma CONDIÇÃO DE PROCEDIBILIDADE. Necessário, portanto, que as condições genéricas estejam presentes e a representação. Em outras palavras, sem o seu implemento a ação penal não pode ter início. Não há necessidade de maiores formalidades para a representação. Basta que a vítima demonstre de forma clara que ela tem interesse na persecução penal. Assim, o Art. 39 dispõe: Art. 39. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério Público, ou à autoridade policial. 🚨 JÁ CAIU Na prova para o cargo de Delegado de Polícia Civil do Estado de Alagoas (Ano: 2023, Banca CESPE/CEBRASPE), foi considerada incorreta a seguinte afirmativa: “A representação do ofendido é imprescindível à propositura da ação penal, em se tratando de crime de ação penal pública condicionada à representação, não o sendo, todavia, para a instauração do respectivo inquérito policial”. São destinatários da representação o Juiz, Ministério Público e a Autoridade Policial. Já a titularidade (quem pode representar) é de: 1. OFENDIDO MAIOR E CAPAZ: Essa representação pode ser realizada pessoalmente ou por meio de procurador COM PODERES ESPECIAIS. 2. OFENDIDO MENOR DE 18 ANOS OU MAIOR COM ANOMALIA MENTAL: Aqui o REPRESENTANTE LEGAL oferecerá a representação. 3. OFENDIDO MENOR DE 18 ANOS OU MAIOR COM ANOMALIA MENTAL SEM REPRESENTANTE LEGAL OU COM REPRESENTANTE COM INTERESSES COLIDENTES: Neste caso, nomear-se-á um CURADOR ESPECIAL para oferecer representação. Conforme o Art. 33, CPP: Art. 33. Se o ofendido formenor de 18 anos, ou mentalmente enfermo, ou retardado mental, e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os daquele, o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, pelo juiz competente para o processo penal. ⚠ ATENÇÃO: Essa norma se aplica por analogia à queixa-crime. 40 4. MORTE OU AUSÊNCIA DA VÍTIMA - Art. 31, CPP: O direito de representação será transmitido para o cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. Art. 31. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (CADI) 📌 OBSERVAÇÕES ■ A doutrina inclui aqui o companheiro. Todavia, esse dispositivo diz respeito ao direito de punir e isso acaba ampliando o poder punitivo estatal, gerando assim uma verdadeira “analogia in malam partem”. O STJ entendeu que o companheiro possui legitimidade para ajuizar ação penal privada. A companheira, em união estável homoafetiva reconhecida, goza do mesmo status de cônjuge para o processo penal, possuindo legitimidade para ajuizar a ação penal privada. STJ. Corte Especial. APn 912-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 07/08/2019 (Info 654).16 ■ Ordem preferencial para o oferecimento da representação. Assim, seguimos a ordem elencada. ■ Aplica-se essa ordem de preferência à queixa crime. ■ Em caso de divergência no CADI, prevalece a vontade de quem deseja dar início ao processo. 16 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Apesar de o § 1º do art. 24 do CPP falar apenas em “cônjuge”, a companheira (hetero ou homoafetiva) também possui legitimidade para ajuizar ação penal privada. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . 7.1.2. PRAZO a) PRAZO DECADENCIAL PARA O OFERECIMENTO DA REPRESENTAÇÃO: Aplica-se tanto à representação quanto à queixa. O prazo para exercer o direito de representação é decadencial de 6 meses contados do dia em que vier a ser quem é o autor do crime, conforme o art. 38 do CPP: Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de 6 meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia. Parágrafo único. Verificar-se-á a decadência do direito de queixa ou representação, dentro do mesmo prazo, nos casos dos arts. 24, parágrafo único, e 31. b) PRAZO DO SUCESSOR: O sucessor terá direito ao prazo restante. Assim, morrendo o ofendido ou sendo declarado ausente, seu sucessor não terá restituído o prazo para oferecer representação. Exemplo: Já se passaram 2 meses do prazo decadencial e a vítima morre, o sucessor terá mais 4 meses para representar. 📌 OBSERVAÇÃO: Isso também se aplica à queixa. 7.1.3. RETRATAÇÃO No tocante à retratação da representação, uma vez oferecida a representação, é possível retratar-se (voltar atrás) dela até o OFERECIMENTO da denúncia. 41 Art. 25. A representação será irretratável, DEPOIS DE OFERECIDA a denúncia. ⚠ ATENÇÃO LEI MARIA DA PENHA - É permitida a retratação (equivocadamente chamadade renúncia) até o RECEBIMENTO da denúncia. Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, ANTES DO RECEBIMENTO da denúncia e ouvido o Ministério Público. É possível fazer retratação da retratação? Feita a representação, a vítima se retrata (não deseja mais representar). Depois, a vítima se arrepende de retratar-se, querendo representar novamente. Sim, é POSSÍVEL, desde que respeitado o prazo decadencial de 6 meses. EFICÁCIA OBJETIVA DA REPRESENTAÇÃO: Feita a representação contra apenas um dos coautores ou partícipes, ela se ESTENDE aos demais autores. ⚠ ATENÇÃO Uma vez realizada a representação em relação a um fato criminoso, ela NÃO SE ESTENDE aos demais fatos criminosos. 7.2. AÇÃO PENAL CONDICIONADA À REQUISIÇÃO DO MINISTRO DA JUSTIÇA É a manifestação de vontade do Ministro da Justiça no sentido de que possui interesse na persecução penal do fato delituoso, vigorando o princípio da oportunidade e conveniência. Trata-se de condição específica da ação penal (condição de procedibilidade). Em outras palavras, sem o seu implemento a ação penal não pode ter início. NÃO VINCULAÇÃO (INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO): A requisição não vincula o MP (independência funcional). O MP somente deverá denunciar se houver justa causa. Quanto ao prazo, não há prazo decadencial para requisição, o crime se sujeita apenas ao prazo prescricional. A doutrina majoritária defende que também é cabível a retratação da requisição, nos mesmos moldes da representação, ou seja, enquanto não oferecida a denúncia. 8. AÇÃO PENAL DE INICIATIVA PRIVADA Há situações em que o Estado, titular do direito de punir, transfere ao particular o direito de PERSEGUIR a pena, legitimando-o à propositura da ação penal (privada). Na ação penal privada, temos como peça inicial acusatória a QUEIXA-CRIME, que deverá ser proposta por intermédio de um profissional da advocacia, inscrito na OAB, com capacidade postulatória. 42 DIREITO DE PUNIR DIREITO DE PERSEGUIR A PENA Estado (indelegável) O Estado pode delegar ao particular (ação penal privada). ⚠ ATENÇÃO Lembre-se que no silêncio da lei, a ação penal será pública incondicionada. Somente quando a lei expressamente mencionar que “somente se procede mediante queixa” é que a ação penal será privada. 8.1. AÇÃO PENAL EXCLUSIVAMENTE PRIVADA Nesta que é a REGRA, em caso de morte ou ausência do ofendido, ocorre a SUCESSÃO PROCESSUAL, assumindo o polo ativo o CADI. Art. 31. No caso de morte do ofendido ou quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (CADI) Importante ressaltar que a legitimidade pertence também a(o) companheiro(a), tendo em vista a equiparação da união estável ao casamento, é o entendimento da doutrina majoritária e do STJ: A companheira, em união estável homoafetiva reconhecida, goza do mesmo status de cônjuge para o processo penal, possuindo legitimidade para ajuizar a ação penal privada. STJ. Corte Especial. APn 912-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 07/08/2019 (Info 654). 8.2. AÇÃO PENAL PRIVADA PERSONALÍSSIMA O direito de ação só pode ser exercido pelo ofendido. Em caso de morte do ofendido, não haverá sucessão processual: haverá extinção da punibilidade, seja pela decadência (queixa ainda não proposta), seja pela perempção (queixa já em trâmite). Aqui, não caberá atuação do representante legal ou de curador especial. ⚠ ATENÇÃO Temos aqui UM ÚNICO EXEMPLO: Induzimento a erro essencial ou ocultação de impedimento (Art. 236, CP). Assim, somente o contraente enganado pode propor a queixa-crime. 8.3. AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA Inicialmente, trata-se de um direito fundamental da vítima, conforme o Art. 5º, LIX da CF: Art. 5º (...) LIX - será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal; Assim, diante da inércia do Ministério Público em oferecer a denúncia, em crime de ação penal pública, a vítima passa a ser COLEGITIMADA à propositura da ação penal, mediante queixa-crime substitutiva. Perceba que esta ação penal é essencialmente pública. Todavia, esgotado o prazo para o Ministério Público oferecer a denúncia, a vítima passa a ser colegitimada. Isso não significa, entretanto, que o MP deixa de ser legitimado, mas a 43 vítima também passa a ter legitimidade ativa concorrente. ⚠ ATENÇÃO O direito de ação privada subsidiária é inaplicável nos CRIMES VAGOS, pois delitos sem vítima determinada, v.g. crime de perigo abstrato. 🚨 JÁ CAIU Na prova para o cargo de Promotor de Justiça do Estado de Roraima (Ano: 2023, Banca: Instituto AOCP), foi considerada correta a seguinte afirmativa: “A vítima poderá, em hipótese específica, provocar a prestação da tutela jurisdicional, mesmo em crime de ação pública incondicionada”. 8.3.1. CABIMENTO A ação privada subsidiária só é cabível em caso de inércia do Ministério Público, após o prazo legal para oferecimento da denúncia (no CPP: 15 dias, se solto; 05 dias, se preso). Art. 29. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte principal (AÇÃO PENAL INDIRETA) Art. 46. O prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de 5 dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15 dias, se o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito à autoridade policial (art. 16), contar-se-á o prazo da data em que o órgão do Ministério Público receber novamente os autos. ⚠ ATENÇÃO ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO: Em caso de arquivamento, não houve inércia do Ministério Público, logo, não caberá a propositura de queixa subsidiária. 8.3.2. HIPÓTESES NA LEGISLAÇÃO PENAL ESPECIAL a) CRIMES DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: Temos aqui entidade e órgãos da Administração direta ou indireta e Associações podem propor ação privada subsidiária da pública (Art. 80 e 82 do CDC). Art. 80. No processo penal atinente aos crimes previstos neste código, bem como a outros crimes e contravenções que envolvam relações de consumo, poderão intervir, como assistentes do Ministério Público, os legitimados indicados no art. 82, inciso III e IV, aos quais também é facultado propor ação penal subsidiária, se a denúncia não for oferecida no prazo legal. Art. 82. Para os fins do art. 81, parágrafo único, são legitimados concorrentemente: III - as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este código; IV - as associações legalmente constituídas 44 há pelo menos 1 ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este código, dispensada a autorização assemblear b) CRIMES FALIMENTARES: Temos aqui a possibilidade de o administrador judicial ou o credor habilitado. Art. 184. Os crimes previstos nesta Lei são de ação penal pública incondicionada. Parágrafo único. Decorrido o prazo a que se refere o art. 187, § 1º, sem que o representante do Ministério Público ofereça denúncia, qualquer credor habilitado ou o administrador judicial poderá oferecer ação penal privada subsidiária da pública, observado o prazo decadencial de 6 (seis) meses. 8.3.3. PRAZO O prazo DECADENCIAL para o oferecimento da queixa subsidiária é de 6 meses. a) INÍCIO DO PRAZO: O prazodo ofendido para propor a queixa subsidiária começa a ser contado assim que se esgota o prazo para o oferecimento da denúncia do Ministério Público. Art. 38. Salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixa ou de representação, se não o exercer dentro do prazo de 6 meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia. Parágrafo único. Verificar-se-á a decadência do direito de queixa ou representação, dentro do mesmo prazo, nos casos dos arts. 24, parágrafo único, e 31. Se o investigado for solto, o Ministério Público terá o prazo de 15 dias. Assim, a partir do 16º dia, começa a correr o prazo da vítima para oferecer a queixa substitutiva. b) DECADÊNCIA IMPRÓPRIA: Findo o prazo decadencial para que a vítima ofereça queixa subsidiária, não ocorrerá extinção da punibilidade, porque o MP ainda poderá oferecer a denúncia até o término do prazo prescricional. A decadência do direito de queixa subsidiária, portanto, não extingue a punibilidade. Vejamos o seguinte quadro: ATÉ O 15º DIA EM CASO DE INVESTIGADO SOLTO Somente o MP pode oferecer a denúncia. A PARTIR DO 16º DIA E ATÉ 6 MESES DEPOIS Teremos legitimidade concorrente em que a vítima pode propor a ação privada subsidiária e o MP a denúncia. PASSADOS OS 6 MESES Ocorre a decadência imprópria em relação à vítima, mas o MP continua a ser legitimado para oferecer a denúncia até o término do prazo prescricional. 8.3.4. PODERES DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA AÇÃO PÚBLICA SUBSIDIÁRIA Art. 29. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia 45 substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte principal (AÇÃO PENAL INDIRETA) Temos, portanto, os seguintes poderes: ✓ Aditar a queixa-crime (v.g. querelante não incluiu um crime); ✓ Repudiar a queixa, oferecendo denúncia substitutiva (v.g. queixa inepta); ✓ Intervir em todos os termos do processo (v.g. participar de audiências); ✓ Fornecer elementos de prova (v.g. arrolar testemunhas e juntar documento); ✓ Interpor recurso; ✓ Retomar a titularidade da ação, em caso de negligência do querelante (AÇÃO PENAL INDIRETA). 9. EXTINÇÃO DE PUNIBILIDADE E AÇÃO PENAL DE INICIATIVA PRIVADA Há hipóteses previstas em lei que haverá a extinção da punibilidade do autor do delito caso configuradas na ação penal de iniciativa privada. São elas a decadência, a renúncia, o perdão e a perempção. 9.1. DECADÊNCIA É a perda do direito de ação penal privada ou de representação em virtude de seu não exercício no prazo legal. a) NATUREZA JURÍDICA: Tem natureza de causa extintiva de punibilidade (Art. 107, IV, CP). Além disso, trata-se de um prazo FATAL e improrrogável: Não se suspende, nem se interrompe. b) CONTAGEM: Como causa extintiva da punibilidade, o prazo é de natureza MATERIAL. Assim, conta-se conforme o Art. 10 do CP: Art. 10. O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum. c) INÍCIO DO PRAZO: O prazo de 6 meses será contado a partir do momento do conhecimento da autoria da infração penal. Aplicamos aqui a TEORIA DA ACTIO NATA. 9.2. RENÚNCIA Ato unilateral pelo qual o ofendido abre mão do direito de queixa. Logo, não há necessidade de que haja concordância do agente criminoso. A renúncia materializa o PRINCÍPIO DA OPORTUNIDADE (o ofendido ou seu representante legal podem optar pelo oferecimento ou não da queixa-crime). a) NATUREZA JURÍDICA: Causa extintiva da punibilidade (Art. 107, V, CP). b) CABIMENTO: Apenas na ação penal exclusiva e na personalíssima. Não cabe na subsidiária. Lembre-se que a ação subsidiária é essencialmente pública. 📌 OBSERVAÇÃO O fato de o ofendido receber a indenização do dano causado pelo crime não implica em renúncia tácita - art. 104, parágrafo único, CP. 46 Art. 104. Parágrafo único - Importa renúncia tácita ao direito de queixa a prática de ato incompatível com a vontade de exercê-lo; não a implica, todavia, o fato de receber o ofendido a indenização do dano causado pelo crime. c) COMPOSIÇÃO CIVIL DOS DANOS (JECRIM): Trata-se de renúncia ao direito de queixa. Conforme o Art. 74, §único da Lei 9.099/95: Art. 74 (...) Parágrafo único. Tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação. 9.3. PERDÃO DO OFENDIDO Ato bilateral pelo qual, no curso do processo, o querelante resolve perdoar o querelado. Temos aqui a materialização do PRINCÍPIO DA DISPONIBILIDADE (o querelante poderá desistir da ação penal privada em andamento (DESISTÊNCIA). O perdão exige a aceitação do querelado (pois é ato bilateral). Conforme o Art. 58, CPP: Art. 58. Concedido o perdão, mediante declaração expressa nos autos, o querelado será intimado a dizer, dentro de 3 dias, se o aceita, devendo, ao mesmo tempo, ser cientificado de que o seu SILÊNCIO IMPORTARÁ ACEITAÇÃO. a) NATUREZA JURÍDICA: Trata-se de causa de extinção da punibilidade (Art. 107, V, CP). b) CABIMENTO: Só terá cabimento na ação privada exclusiva e na personalíssima. Se o querelado não aceitar o perdão, o que poderá o querelante fazer? Poderá provocar a perempção. Qual o limite do perdão do ofendido? É possível o perdão até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (Ver. 106, §3º, CP). 🚩 NÃO CONFUNDA17: RENÚNCIA ≠ PERDÃO DO OFENDIDO RENÚNCIA PERDÃO DO OFENDIDO Causa extintiva da punibilidade nas hipóteses de ação penal exclusivamente privada e de ação penal privada personalíssima. Causa extintiva da punibilidade nas hipóteses de ação penal exclusivamente privada e de ação penal privada personalíssima. Decorre do princípio da oportunidade ou conveniência Decorre do princípio da disponibilidade. Ato unilateral: não depende de aceitação Ato bilateral: depende de aceitação do querelado É concedida antes do início do processo (até o oferecimento da queixa-crime). É concedido durante o curso do processo. Por força do princípio da indivisibilidade, a renúncia concedida a um dos coautores ou Por força do princípio da indivisibilidade, o perdão concedido a um dos querelados 17 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.355/356 47 partícipes do delito estende-se aos demais. estende-se aos demais, mas desde que haja aceitação. 9.4. PEREMPÇÃO Perda do direito de prosseguir na ação, em virtude de negligência do querelante. Art. 60. Nos casos em que somente se procede mediante queixa, considerar-se-á PEREMPTA a ação penal: I - quando, iniciada esta, o querelante deixar de promover o andamento do processo durante 30 dias seguidos; II - quando, falecendo o querelante, ou sobrevindo sua incapacidade, não comparecer em juízo, para prosseguir no processo, dentro do prazo de 60 dias, qualquer das pessoas a quem couber fazê-lo, ressalvado o disposto no art. 36 - CADI; III - quando o querelante deixar de comparecer, sem motivo justificado, a qualquer ato do processo a que deva estar presente, ou deixar de formular o pedido de condenação nas alegações finais; IV - quando, sendo o querelante pessoa jurídica, esta se extinguir sem deixar sucessor. a) NATUREZA JURÍDICA: Trata-se de causa de extinção da punibilidade (Art. 107, IV, CP). b) CABIMENTO: ação privada exclusiva e personalíssima 10. OUTRAS CLASSIFICAÇÕES DOUTRINÁRIAS 10.1. AÇÃO PENAL PÚBLICA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA Diante da inércia de um órgão estatal, outro órgão estatal oferecerá a ação penal, em substituição. Sua inserção como espécie de ação penal pública não é pontopacífico na doutrina.18 a) CRIME DE RESPONSABILIDADE DE PREFEITOS (DECRETO-LEI 201/67): Se o MPE (PGJ) permanecer inerte em oferecer a ação penal contra o prefeito, será possível pedir providências ao PGR (MPF). A doutrina entende que este dispositivo atenta contra a autonomia dos ministérios públicos estaduais, sendo não recepcionado pela CF. b) CÓDIGO ELEITORAL (ART. 357, §§ 3º E 4º): Se o promotor eleitoral não oferecer denúncia, o juiz poderá solicitar ao procurador regional eleitoral a designação de outro promotor para oferecer a denúncia ou oferecer pessoalmente denúncia. Vejamos: Art. 357 (...) § 3º Se o órgão do Ministério Público não oferecer a denúncia no prazo legal representará contra ele a autoridade judiciária, sem prejuízo da apuração da responsabilidade penal. § 4º Ocorrendo a hipótese prevista no parágrafo anterior o juiz solicitará ao Procurador Regional a designação de outro promotor, que, no mesmo prazo, oferecerá a denúncia. 18 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.318. 48 c) INCIDENTE DE DESLOCAMENTO DE COMPETÊNCIA (violação a direitos humanos): Conforme o Art. 109, §5º da CF: Art. 109 (...) § 5º Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal. 10.2. AÇÃO PENAL POPULAR Parcela da doutrina discute a possibilidade de qualquer do povo propor uma ação penal. Hipóteses: a) HABEAS CORPUS: O CPP prevê que o HC pode ser proposto por qualquer pessoa. Assim, parcela da doutrina aponta o HC como exemplo possível de ação penal popular. Todavia, outra parcela critica no seguinte sentido: Não se trata de ação penal CONDENATÓRIA popular. b) CRIME DE RESPONSABILIDADE DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA OU MINISTRO DE ESTADO (Art. 14, Lei 1.079/50) Art. 14. É permitido a qualquer cidadão denunciar o PR ou Ministro de Estado, por crime de responsabilidade, perante a câmara dos deputados. 🔔 Crítica: A expressão “denúncia” é, na verdade, uma “notitia criminis” dirigida à Câmara dos deputados e não a peça acusatória de uma ação penal condenatória. Além disso, a Lei 1.079/50 não tipifica crimes, mas sim infrações político-administrativas. Assim, não se trata de ação penal condenatória popular. 10.3. AÇÃO PENAL ADESIVA 1ª CORRENTE (MAJORITÁRIA) 2ª CORRENTE (MINORITÁRIA) O Ministério Público oferece denúncia em crimes de ação penal privada, desde que haja interesse público. Seria um litisconsórcio ativo entre o MP, em crime de ação penal pública, e o querelante, em crimes de ação penal privada. 10.4. AÇÃO DE PREVENÇÃO PENAL Ação penal ajuizada com o objetivo de aplicar medida de segurança ao inimputável. O objetivo é a prolação de uma sentença absolutória imprópria. Para Tourinho Filho, a ação penal condenatória é gênero com duas espécies: a ação penal propriamente dita, tendo por finalidade a aplicação a pena privativa de liberdade, e a ação de prevenção penal, visando à imposição de medida de segurança.19 10.5. AÇÃO PENAL SECUNDÁRIA Ocorre na hipótese em que a lei estabelece uma espécie de ação penal para determinado crime, porém, em virtude do surgimento de circunstâncias especiais, passa a prever, secundariamente, uma nova espécie de ação penal para essa infração.20 20 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.359. 19 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 31ª ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2009. p. 515. 49 Exemplo: Furto – ação pública incondicionada. O furto cometido contra as pessoas do Art. 182, CP, será de ação penal pública condicionada à representação. Art. 182 - Somente se procede mediante representação, se o crime previsto neste título é cometido em prejuízo: I - do cônjuge desquitado ou judicialmente separado; II - de irmão, legítimo ou ilegítimo; III - de tio ou sobrinho, com quem o agente coabita. 10.6. AÇÃO PENAL INDIRETA Quando o querelante abandona a ação penal privada subsidiária da pública e o MP reassume o polo ativo da ação penal. 10.7. AÇÃO PENAL EXTENSIVA Segundo Norberto Avena, “relativa aos crimes complexos, esta modalidade de ação penal decorre do art. 101, do CP, dispondo que “quando a lei considera como elemento ou circunstâncias do tipo legal fatos que, por si mesmos, constituem crimes, cabe ação pública em relação àquele, desde que, em relação a qualquer destes, se deva proceder por iniciativa do Ministério Público”. Por crime complexo entende-se aquele que surge da conjugação de dois ou mais crimes. Exemplo clássico é o crime de roubo, correspondente à junção dos crimes relativos à ameaça ou à violência com o delito de furto. Pois bem, de acordo com o referido art. 101 do CP, se, na formação do crime complexo, um dos delitos, na sua forma autônoma, deva ser apurado mediante ação penal privada e o(s) remanescente(s), por meio de ação penal pública, esta última modalidade deverá prevalecer, abrangendo toda a conduta do agente.21” 11. PEÇA ACUSATÓRIA AÇÃO PENAL PÚBLICA AÇÃO PENAL PRIVADA Denúncia (Ministério Público) Queixa-crime (querelante/ofendido) 11.1. REQUISITOS Art. 41. A denúncia ou queixa conterá a EXPOSIÇÃO DO FATO criminoso, com todas as suas circunstâncias, a QUALIFICAÇÃO DO ACUSADO ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a CLASSIFICAÇÃO do CRIME e, quando necessário, o ROL DAS TESTEMUNHAS. 11.1.1. EXPOSIÇÃO DO FATO CRIMINOSO E CIRCUNSTÂNCIAS A peça acusatória deve narrar pormenorizadamente a conduta imputada, sob pena de cerceamento de defesa. ⚠ ATENÇÃO CRIPTOIMPUTAÇÃO: Trata-se da peça acusatória com DEFICIÊNCIA na narrativa do fato criminoso (inépcia). Em virtude disso, a peça acusatória será REJEITADA (juízo de admissibilidade negativo). 4. Pontue-se a necessária distinção conceitual entre denúncia geral e genérica, essencial para aferir a regularidade da peça acusatória 21 Avena, Norberto. Processo Penal. Disponível em: Minha Biblioteca, (14th edição). Grupo GEN, 2022. 50 no âmbito das infrações de autoria coletiva, em especial nos crimes societários (ou de gabinete), que são aqueles cometidos por representantes (administradores, diretores ou quaisquer outros membros integrantes de órgão diretivo, sejam sócios ou não) da pessoa jurídica, em concurso de pessoas. A denúncia genérica caracteriza-se pela imputação de vários fatos típicos, genericamente, a integrantes da pessoa jurídica, sem delimitar, minimamente, qual dos denunciados teria agido de tal ou qual maneira. Patente, pois, que a criptoimputação da denúncia genérica vulnera os princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório, bem como a norma extraída do art. 8º, 2, "b" e "c", da Convenção Americana de Direitos Humanos e do art. 41 do CPP, haja vista a indevida obstaculização do direito conferido ao acusado de preparar dignamente sua defesa. (STJ, RHC n. 45.872/MG, relator Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 17/8/2017, DJe de 28/8/2017.) 🚩 NÃO CONFUNDA: DENÚNCIA GENÉRICA ≠ DENÚNCIA GERAL DENÚNCIA GENÉRICA DENÚNCIA GERAL Aponta fato incerto e imprecisamente descrito. Caracteriza-se pela imputação de vários fatos típicos, genericamente, a integrantes da pessoa jurídica, sem delimitar, minimamente, qual dos Há acusação da prática de fato específico atribuído a diversas pessoas, ligadas por circunstâncias comuns, mas sem a indicação minudente da responsabilidade interna e individual dos imputados. denunciados teria agido de tal ou qual maneira Segundo o STF, “2. Não há abuso de acusação na denúncia que, ao tratar de crimes de autoria coletiva, deixa, por absoluta impossibilidade, de esgotar as minúcias do supostocometimento do crime. 3. Há diferença entre denúncia genérica e geral. Enquanto naquela se aponta fato incerto e imprecisamente descrito, na última há acusação da prática de fato específico atribuído a diversas pessoas, ligadas por circunstâncias comuns, mas sem a indicação minudente da responsabilidade interna e individual dos imputados. 4. Nos casos de denúncia que verse sobre delito societário, não há que se falar em inépcia quando a acusação descreve minimamente o fato tido como criminoso.” (HC 118891-SP). De igual maneira, para o STJ: Pontue-se a necessária distinção conceitual entre denúncia geral e genérica, essencial para aferir a regularidade da peça acusatória no âmbito das infrações de autoria coletiva, em especial nos crimes societários (ou de gabinete), que são aqueles cometidos por representantes (administradores, diretores ou quaisquer outros membros integrantes de órgão diretivo, sejam sócios ou não) da pessoa jurídica, em concurso de pessoas. A denúncia genérica caracteriza-se pela imputação de vários fatos típicos, genericamente, a integrantes da pessoa jurídica, sem delimitar, minimamente, qual dos denunciados teria agido de tal ou qual maneira. STJ, RHC 96.507/PE, Rel. Ministro 51 RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 17/10/2019, DJe 29/10/2019. Na hipótese dos autos, assevera o recorrente ser inepta a denúncia, uma vez que não descreve de forma adequada sua participação nos fatos imputados na denúncia. Importante esclarecer que não se pode confundir a denúncia genérica com a denúncia geral, pois o direito pátrio não admite denúncia genérica, sendo possível, entretanto, nos casos de crimes societários e de autoria coletiva, a denúncia geral, ou seja, aquela que, apesar de não detalhar minudentemente as ações imputadas ao denunciado, demonstra, ainda que de maneira sutil, a ligação entre sua conduta e o fato delitivo. STJ, RHC 54.075/RS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 01/08/2017. 🚩 NÃO CONFUNDA: IMPUTAÇÃO IMPLÍCITA ≠ IMPUTAÇÃO ALTERNATIVA IMPUTAÇÃO IMPLÍCITA IMPUTAÇÃO ALTERNATIVA A imputação deve ser clara, precisa e completa. O art. 41 do CPP estabelece que a denúncia deve proceder à exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, dessa forma, a imputação implícita acarreta evidente prejuízo ao exercício do direito de defesa. Afrânio Silva Jardim pontua que ocorre imputação alternativa “quando a peça acusatória vestibular atribui ao réu mais de uma conduta penalmente relevante, asseverando que apenas uma delas efetivamente terá sido praticada pelo imputado, embora todas se apresentem como prováveis, em face da prova do inquérito”22. Segundo Renato Brasileiro (2020, p.391), a maioria da doutrina “se posiciona contrariamente a ela, já que, ainda quando houver compatibilidade entre os fatos imputados, seu oferecimento quase sempre acarreta dificuldades ao exercício do direito de defesa.” IMPUTAÇÃO ALTERNATIVA OBJETIVA23 “Refere-se à alternatividade quanto aos dados objetivos do fato narrado, podendo ser de duas espécies: a) imputação alternativa objetiva ampla: é aquela que incide sobre a ação principal, furto ou receptação; b) imputação alternativa objetiva restrita: é aquela que se refere a uma 23 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.390. 22 JARDIM, Afrânio Silva. Direito Processual Penal. 11ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002. p. 149. 52 circunstância qualificadora.” IMPUTAÇÃO ALTERNATIVA SUBJETIVA24 “diz respeito ao sujeito passivo da imputação, subdivide-se em: a) simples: a alternatividade decorre de dúvida sobre a autoria do crime, como ocorre nos exemplos em que os investigados se acusam reciprocamente, sendo contraditórios os elementos de informação colhidos no inquérito (v.g., briga em bares); b) complexa: é aquela que abrange não só o autor do delito, como também a própria infração penal.” IMPUTAÇÃO ALTERNATIVA ORIGINÁRIA “Na denúncia ou na queixa, os fatos delituosos já são atribuídos de maneira alternativa ao agente (imputação alternativa objetiva ampla originária).” 24 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.391. IMPUTAÇÃO ALTERNATIVA SUPERVENIENTE “Resultava do aditamento da peça acusatória nos casos de mutatio libelli, prevista na redação original do parágrafo único do art. 384 do CPP, antes das alterações produzidas pela reforma processual de 2008 (...) De acordo com a nova redação do art. 384, § 4º, do CPP, havendo aditamento, ficará o juiz, na sentença, adstrito aos termos do aditamento.” 11.1.2. QUALIFICAÇÃO DO ACUSADO O acusado deverá ser qualificado ou deverão ser indicadas suas características físicas. Art. 259. A impossibilidade de identificação do acusado com o seu verdadeiro nome ou outros qualificativos não retardará a ação penal, quando certa a identidade física. A qualquer tempo, no curso do processo, do julgamento ou da execução da sentença, se for descoberta a sua qualificação, far-se-á a retificação, por termo, nos autos, sem prejuízo da validade dos atos precedentes. 11.1.3. CLASSIFICAÇÃO DO CRIME Trata-se da tipificação penal da conduta imputada. O acusado se defende dos fatos 53 imputados (não da capitulação jurídica). Assim, é possível a aplicação do Art. 383 do CPP (Emendatio libelli). Art. 383. [EMENDATIO LIBELLI] O juiz, sem modificar a descrição do fato contida na denúncia ou queixa, poderá atribuir-lhe definição jurídica diversa, ainda que, em consequência, tenha de aplicar pena mais grave 11.1.4. ROL DE TESTEMUNHAS O Ministério Público e o querelante devem arrolar as testemunhas na peça acusatória, sob pena de PRECLUSÃO consumativa. Quanto ao número de testemunhas, vejamos o quadro: PROCEDIMENTO COMUM Até 8 (por fato criminoso) PROCEDIMENTO SUMÁRIO Até 5 PROCEDIMENTO SUMARÍSSIMO Até 3 1ª FASE DO JÚRI Até 8 PLENÁRIO DO JÚRI Até 5 DROGAS Até 5 Sem prejuízo das testemunhas arroladas pelas partes, o juiz poderá ouvir as chamadas “testemunhas do juízo”. 11.2. PROCURAÇÃO NA QUEIXA-CRIME PODERES ESPECIAIS: nome do querelado e menção do fato criminoso. Conforme o Art. 44, CPP: Art. 44. A queixa poderá ser dada por procurador com poderes especiais, devendo constar do instrumento do mandato o nome do querelante e a menção do fato criminoso, salvo quando tais esclarecimentos dependerem de diligências que devem ser previamente requeridas no juízo criminal. Na Jurisprudência: Não se desconhece a existência de precedentes desta Corte Superior de Justiça no sentido de que a exigência contida no artigo 44 do Código de Processo Penal, consistente na menção do fato criminoso no aludido documento, é cumprida com a indicação do dispositivo de Lei no qual o querelado é dado como incurso. Para que reste atendido o comando contido no art. 44 do CPP, é indispensável que a procuração contenha uma descrição, ainda que sucinta, dos fatos a serem abordados na queixa-crime. Doutrina. Precedentes do STJ e do STF. No caso dos autos, a procuração ofertada pela querelante não contém a descrição, ainda que sucinta, dos fatos a serem apurados com o oferecimento de queixa-crime, não estando atendida a exigência contida no artigo 44 da Lei Penal Adjetiva. Eventual defeito na representação processual da querelante só pode ser sanado dentro do prazo decadencial previsto no art. 38 do CPP. O intuito de abrigar o pleito acusatório e determinar que a inicial seja recebida, in casu, exige o revolvimento do material fático-probatório, providência exclusiva das instâncias ordinárias, vedada a este Sodalício em sede de Recurso Especial, ante o óbice do Enunciado Nº (STJ; AgRg-REsp 1.673.988; Proc. 2017/0128746-9; SP; Quinta Turma; Rel. Min. Jorge Mussi; Julg. 22/05/2018; 54 DJE 28/05/2018; Pág. 2559)25 Para que o advogado proponha queixa-crime em nome do seu cliente, eleprecisa ter recebido procuração com poderes especiais para praticar esse ato. Se o cliente outorga procuração sem conferir poderes ao advogado para ajuizar queixa-crime, este advogado não pode oferecer substabelecimento a outro advogado mencionando que este terá poderes para propor queixa-crime. Ora, se o advogado originário não recebeu poderes para ajuizar queixa-crime, ele não poderá substabelecer para outro advogado poderes para propor queixa-crime. Em palavras mais simples, o advogado não pode substabelecer poderes que não recebeu. Apenas os poderes originariamente outorgados podem ser transferidos. Assim, deve ser tida por inexistente a inclusão, ao substabelecer, de poderes especiais para a propositura de ação penal privada, se eles não constavam do mandato originário. Portanto, cabe reconhecer a nulidade da queixa-crime, por vício de representação, tendo em vista que a procuração outorgada para a sua propositura não atende às exigências do art. 44 do CPP. STJ. 6ª Turma. RHC 33790-SP, Rel. originário Min. Maria Thereza De Assis Moura, Rel. para Acórdão Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 27/6/2014 (Info 544).26 Para que seja protocolizada queixa-crime é necessária capacidade postulatória. A procuração outorgada pelo querelante ao seu 26 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Poderes especiais para advogado propor queixa-crime. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: 25 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Procuração para queixa-crime. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 08/12/2022 advogado para o ajuizamento de queixa-crime é uma procuração com poderes especiais. Nesta procuração deve constar o “nome do querelado” e a “menção ao fato criminoso”. Para o STJ, “menção ao fato criminoso” significa que, na procuração, basta que seja mencionado o tipo penal ou o nomen iuris do crime, não precisando identificar a conduta. Para o STF, “menção ao fato criminoso” significa que, na procuração, deve ser individualizado o evento delituoso, não bastando que apenas se mencione o nomen iuris do crime. Caso haja algum vício na procuração para a queixa-crime, esse vício deverá ser corrigido antes do fim do prazo decadencial de 6 meses, sob pena de decadência e extinção da punibilidade. STF. 2ª Turma. RHC 105920/RJ, Rel. Min. Celso de Mello, julgado em 8/5/2012 (Info 665). O vício na representação processual do querelante é sanável, desde que dentro do prazo decadencial. STJ. 5ª Turma. AgRg no REsp 1392388/MG, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 18/08/2015.27 11.3. PRAZO PARA OFERECIMENTO DA DENÚNCIA - Art. 46, CPP Art. 46. O prazo para oferecimento da denúncia, estando o réu preso, será de 5 dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15 dias, se o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito à autoridade policial (art. 16), contar-se-á o prazo da data 27 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Procuração para queixa-crime. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: 55 em que o órgão do Ministério Público receber novamente os autos. § 1o Quando o Ministério Público dispensar o inquérito policial, o prazo para o oferecimento da denúncia contar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informações ou a representação RÉU PRESO RÉU SOLTO CPP 5 DIAS 15 DIAS DROGAS 10 DIAS ECONOMIA POPULAR 2 DIAS CÓDIGO ELEITORAL 10 DIAS 11.4. PRAZO PARA OFERECIMENTO DA QUEIXA O prazo será sempre de 6 meses. Todavia, questão importante é saber sobre o início da contagem do prazo: INÍCIO DA CONTAGEM DO PRAZO DE 6 MESES AÇÃO PRIVADA EXCLUSIVA E PERSONALÍSSIMA AÇÃO PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA A partir do conhecimento da autoria (“actio nata”) Esgotamento do prazo do MP para oferecer denúncia. LEMBRE-SE: na ação exclusiva e na personalíssima teremos uma decadência própria caso não seja cumprido o prazo, gerando a extinção da punibilidade. No caso da subsidiária, a decadência é imprópria. 12. PONTOS IMPORTANTES NA JURISPRUDÊNCIA a) Inexistindo a demonstração do mínimo vínculo entre o acusado e o delito a ele imputado, impossibilitado está o exercício do contraditório e da ampla defesa. Inexistindo a demonstração do mínimo vínculo entre o acusado e o delito a ele imputado, impossibilitado está o exercício do contraditório e da ampla defesa. STJ. 6ª Turma. RHC 154.162-DF, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 22/03/2022 (Info 730).28 b) Recebimento da denúncia e princípio do in dubio pro societate. No momento da denúncia, prevalece o princípio do in dubio pro societate. STF. 1ª Turma. Inq 4506/DF, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Roberto Barroso, julgado em 17/04/2018 (Info 898).29 ⚠ ATENÇÃO Para o STJ, é possível ao Juiz reconsiderar a decisão de recebimento da denúncia, para rejeitá-la, quando acolhe matéria suscitada na resposta preliminar defensiva relativamente às hipóteses 29 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Princípio do in dubio pro societate. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . 28 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Inexistindo a demonstração do mínimo vínculo entre o acusado e o delito a ele imputado, impossibilitado está o exercício do contraditório e da ampla defesa. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 08/12/2022 56 previstas nos incisos do art. 395 do Código de Processo Penal. 🚨 JÁ CAIU Na prova de juiz do TJ-SC (Ano: 2022 Banca: FGV), foi considerada correta a seguinte afirmação: De acordo com a doutrina e a jurisprudência dominantes nos Tribunais Superiores, no tocante ao exercício da ação penal, suas condições e o respectivo controle jurisdicional, é correto afirmar que não poderá o juiz, de ofício, fora dos casos de absolvição sumária, rever a decisão que recebeu a denúncia para rejeitá-la. c) Trancamento de inquérito policial por excesso de prazo e oferecimento de denúncia O eventual trancamento de inquérito policial por excesso de prazo não impede, sempre e de forma automática, o oferecimento da denúncia STF. 2ª Turma. HC 194023 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 15/09/2021.30 d) Denúncia e Teoria do Domínio do Fato Não há óbice para que a denúncia invoque a teoria do domínio do fato para dar suporte à imputação penal, sendo necessário, contudo, que, além disso, ela aponte indícios convergentes no sentido de que o Presidente da empresa não só teve conhecimento do crime de evasão de divisas, como dirigiu finalisticamente a atuação dos demais acusados. Assim, não basta que o acusado se encontre em posição hierarquicamente 30 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. O eventual trancamento de inquérito policial por excesso de prazo não impede, sempre e de forma automática, o oferecimento da denúncia. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: superior. Isso porque o próprio estatuto da empresa prevê que haja divisão de responsabilidades e, em grandes corporações, empresas ou bancos há controles e auditorias exatamente porque nem mesmo os sócios têm como saber tudo o que se passa. STF. 2ª Turma. HC 127397/BA, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 6/12/2016 (Info 850).31 e) Denúncia e lastro probatório Deve ser rejeitada a queixa-crime que, oferecida antes de qualquer procedimento prévio, impute a prática de infração de menor potencial ofensivo com base apenas na versão do autor eEm sede processual penal, a presença dessas condições da ação deve ser analisada por ocasião do juízo de admissibilidade da peça acusatória. A denúncia ou queixa deve ser rejeitada pelo magistrado quando faltar condição para o exercício da ação penal (CPP, art. 395, II). Se, no entanto, isso não ocorrer por ocasião do juízo de admissibilidade da peça acusatória, é perfeitamente possível o reconhecimento de nulidade absoluta do processo, em qualquer instância, com fundamento no art. 564, inciso II, do CPP – o dispositivo refere-se apenas à ilegitimidade de parte, mas, por analogia, também pode ser aplicado às demais condições da ação penal. Há quem entenda que também seria possível a extinção do processo sem julgamento do mérito, aplicando-se, por analogia, o disposto no art. 485, VI, do NCPC. 5 As condições da ação classificam-se em duas ordens: i) as condições gerais ou genéricas e ii) as condições especiais ou específicas. Quando ausentes, segundo o CPP, implicarão em rejeição da denúncia ou queixa pelo Estado-Juiz. São condições genéricas aquelas que devem estar presentes em qualquer ação penal, independente da natureza ou do tipo penal infringido. Neste grupo, encontram-se: i) o interesse de agir, ii) a legitimidade “ad causam” ativa e passiva e iii) a justa causa. Quanto às condições especiais ou específicas da ação – também chamadas de condições de procedibilidade, ao contrário das condições genéricas que são exigidas para todas as espécies de ação penal, elas devem estar presentes apenas em determinadas ações penais. É que, as condições específicas dizem respeito ao próprio exercício da ação penal e são exigidas a partir de previsão expressa. Incluem-se neste rol de hipóteses i) a representação do ofendido, que é exigida nas ações penais públicas condicionadas à representação daquele; ii) a requisição do Ministro da Justiça, que é exigida nas ações penais públicas condicionadas à sua requisição; iii) a presença de provas novas quando o inquérito policial tiver sido arquivado com base na ausência de elementos probatórios; iv) a presença de provas novas após a preclusão da decisão de impronúncia em crimes dolosos contra a vida (art. 414, do CPP); v) a presença de laudo pericial nos crimes contra a propriedade imaterial (art. 525, do CPP); vi) a autorização por 2/3 dos membros da Câmara dos Deputados para instauração de processo contra o Presidente e o Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado (art. 51, I, da CF/88) e vii) o trânsito em julgado da sentença que anule o casamento por motivo de erro ou impedimento nos crimes de induzimento a erro essencial e de ocultação de impedimento de casamento (art. 236, parágrafo único, do CP). Abaixo, aprofundaremos melhor todas elas. 3.1. CONDIÇÕES GENÉRICAS DA AÇÃO PENAL No tocante às condições genéricas da ação penal, temos duas correntes doutrinárias: 1ª CORRENTE (MAJORITÁRIA) 2ª CORRENTE (AURY LOPES JUNIOR) As condições seriam as mesmas do processo civil, adicionando-se a “justa causa”. Assim, teríamos legitimidade, interesse e justa causa para a ação penal. Portanto, aplicamos aqui o Art. 17 do CPC. O processo penal tem peculiaridades que demandam condições próprias do processo penal, quais sejam: a) Fato aparentemente criminoso; b) Punibilidade concreta; c) Legitimidade e justa causa. 3.1.1. LEGITIMIDADE AD CAUSAM OU LEGITIMIDADE PARA AGIR Através da terceira condição genérica, legitimidade “ad causam” (ou legitimidade para agir) ativa e passiva, diz-se que é necessário que a propositura da inicial acusatória (denúncia ou queixa) seja patrocinada pelos respectivos legitimados ativos – Ministério Público, ofendido ou pessoas do art. 31 do Código de Processo Penal, conforme o caso. 6 Já o legitimado passivo deve ser o provável autor do delito, maior de idade no momento da conduta, já que os menores de idade são inimputáveis (art. 228, da CF/88), sujeitos à disciplina dos atos infracionais do Estatuto da Criança e do Adolescente. A legitimidade, portanto, é a pertinência subjetiva para a ação, ou seja, é a capacidade de constar do polo ativo ou do polo passivo da ação penal. Há legitimidade quanto o autor é titular do direito subjetivo material que se pretende proteger, assim como quando o demandado é o titular da obrigação correspondente ao seu direito. ⚠ CUIDADO A ilegitimidade ad causam consiste em nulidade absoluta do processo penal, nos termos do art. 564, II, do CPP. 3.1.1.1. LEGITIMIDADE ATIVA a) Ação penal pública: Ministério Público (dominus littis), conforme o Art. 129, I da CF. b) Ação penal privada: O querelante (sujeito passivo da infração). Em termos de legitimidade, a regra geral está consagrada no art. 18 do CPC, que prevê que somente o titular do alegado direito poderá pleitear em nome próprio seu próprio interesse. É o que se denomina de legitimação ordinária. Portanto, em regra, alguém só pode agir, em nome próprio, na defesa de interesse próprio. É o que ocorre no âmbito processual penal, nas hipóteses de ação penal pública, pois, na medida em que a Constituição Federal outorga ao Ministério Público a titularidade da ação penal pública, é evidente que o parquet age em nome próprio na defesa de interesse próprio. Mas, se a regra é a legitimação ordinária, excepcionalmente, e desde que autorizado por lei, o ordenamento jurídico prevê situações em que alguém pode pleitear, em nome próprio, direito alheio. É o que se denomina de legitimação extraordinária ou substituição processual. Aqui, a doutrina costuma citar como exemplo a ação penal de iniciativa privada. Nessa espécie de ação penal, o Estado, titular exclusivo do direito de punir, transfere a legitimidade para a propositura da ação penal à vítima ou ao seu representante legal, a eles concedendo o jus persequendi in judicio. Cuida-se, portanto, de hipótese de legitimação extraordinária, já que o ofendido age, em nome próprio, na defesa de um interesse alheio, pois o Estado continua sendo o titular da pretensão punitiva. ⚠ CUIDADO Súmula 714-STF: É concorrente a legitimidade do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, condicionada à representação do ofendido, para a ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções. Com o teor da Súmula n.º 714 do STF, pois, conforme a doutrina e jurisprudência majoritárias, trata-se de uma LEGITIMIDADE ALTERNATIVA, isto é, ou o ofendido representa e o MP oferece a denúncia ou o ofendido resolve, por si só, oferecer a queixa-crime. Não é possível, portanto, que, ao mesmo tempo, o ofendido represente e ofereça a queixa-crime, devendo optar por uma das opções. 🚨 JÁ CAIU Na prova para o cargo de Promotor de Justiça do 7 Estado da Bahia (Ano: 2023, Banca CESPE/CEBRASPE), foi considerada correta a seguinte afirmativa: “De acordo com a jurisprudência do STF, a propositura da ação penal por crime contra a honra de servidor público em razão do exercício de suas funções é de legitimidade concorrente do ofendido, mediante queixa, e do Ministério Público, mediante ação penal condicionada à representação do ofendido”. Na prova de técnico do TRT - 13ª Região (PB) (Ano: 2022 Banca: FGV), foi considerada correta a seguinte afirmação: Cristiano é servidor público do Tribunal Regional do Trabalho há mais de 10 anos e, no exercício de suas funções, foi vítima de crime contra a honra praticado por Rodrigo, um jurisdicionado. Nessa hipótese, é correto afirmar que Cristiano, mediante queixa-crime, e o Ministério Público, mediante representação do ofendido, possuem legitimidade concorrente. 3.1.1.2.LEGITIMIDADE PASSIVA Pode ser acusado do cometimento de infração penal: ● Pessoa física com 18 anos completos, inclusive o inimputável por anomalia mental; ● Pessoa jurídica, em crimes ambientais. 📌 OBSERVAÇÃO A jurisprudência pátria superou a TEORIA DE DUPLA IMPUTAÇÃO, não sendo mais condicionante da responsabilizaçãona indicação de rol de testemunhas, desacompanhada de Termo Circunstanciado ou de qualquer outro documento hábil a demonstrar, ainda que de modo indiciário, a autoria e a materialidade do crime. STJ. 5ª Turma. RHC 61822-DF, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 17/12/2015 (Info 577).32 f) Denúncia e Norma Penal em Branco A denúncia que deixa de mencionar a legislação complementar a que se refere o tipo penal não atende o disposto no art. 41 do CPP porque não descreve por completo a conduta delitiva, dificultando a compreensão da acusação e, por conseguinte, o exercício do 32 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Rejeição de queixa-crime desacompanhada de documentos hábeis a demonstrar, ainda que de modo indiciário, a autoria e a materialidade do crime. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: 31 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Inépcia caso a denúncia se baseie apenas no fato de que o réu era Diretor-Presidente da empresa. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: 57 direito de defesa. STJ. 5ª Turma. RHC 64430/SP, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 19/11/201533. g) Queixa-crime e elemento subjetivo Deve ser rejeitada a queixa-crime que impute ao querelado a prática de crime contra a honra, mas que se limite a transcrever algumas frases, escritas pelo querelado em sua rede social, segundo as quais o querelante seria um litigante habitual do Poder Judiciário (fato notório, publicado em inúmeros órgãos de imprensa), sem esclarecimentos que possibilitem uma análise do elemento subjetivo da conduta do querelado consistente no intento positivo e deliberado de lesar a honra do ofendido. STJ. Corte Especial. AP 724-DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 20/8/2014 (Info 547).34 34 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Queixa-crime deverá demonstrar o elemento subjetivo do agente. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: 33 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Em caso de norma penal em branco, a denúncia deverá explicitar qual é o complemento, sob pena de ser considerada inepta. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: da pessoa jurídica que a pessoa física também seja responsabilizada. Assim, atualmente, é possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome.3 Segundo o entendimento atual da jurisprudência, é possível a responsabilização penal da pessoa jurídica por delitos ambientais independentemente da responsabilização concomitante da pessoa física que agia em seu nome. A jurisprudência não mais adota a chamada teoria da "dupla imputação". STJ. 6ª Turma. RMS 39.173-BA, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 6/8/2015 (Info 566). STF. 1ª Turma. RE 548181/PR, Rel. Min. Rosa Weber, julgado em 6/8/2013 (Info 714)4. 🚩 NÃO CONFUNDA5 ■ “Legitimidade ad causam não se confunde com legitimatio ad processum, fenômeno relacionado à capacidade de estar em juízo, tida como pressuposto processual de validade. Essa capacidade processual refere-se à capacidade de exercer direitos e deveres processuais, ou seja, de praticar validamente atos processuais. É o que ocorre com um ofendido menor de 18 (dezoito) anos, que não tem capacidade processual para oferecer queixa-crime, razão pela qual sua incapacidade é suprida por seu representante legal.” ■ “Capacidade processual, por sua vez, não se confunde com capacidade postulatória, assim compreendida a aptidão para postular perante órgãos do Poder Judiciário. Supondo, assim, 5 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.299. 4 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Responsabilidade penal da pessoa jurídica e abandono da dupla imputação. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . 3 https://www.dizerodireito.com.br/2015/10/e-possivel-responsabilizacao-p enal-da.html 8 ofendido que não seja advogado inscrito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, o ajuizamento da queixa-crime deverá ser feito por advogado com poderes especiais (CPP, art. 44).” ■ “Não se pode confundir o conceito de legitimidade ad causam com o de capacidade de ser parte, pressuposto de existência de um processo. A capacidade de ser parte deriva da personalidade, consistindo na capacidade de adquirir direitos e contrair obrigações (CC, art. 1º). No âmbito processual penal, além de pessoas físicas e jurídicas, é interessante perceber que alguns “entes” também são considerados como pessoas formais.” 3.1.2. INTERESSE DE AGIR É composto por 3 elementos: necessidade, adequação e utilidade. a) NECESSIDADE DE OBTENÇÃO DA TUTELA JURISDICIONAL PLEITEADA No processo penal, a ação penal é sempre necessária para obtenção de uma sentença condenatória definitiva (nulla poena sine judicio), ante o devido processo penal. Segundo Renato Brasileiro (2020, p. 302): A ressalva à possibilidade de aplicação de pena sem processo no âmbito processual penal fica por conta da transação penal no âmbito dos Juizados Especiais Criminais (Lei nº 9.099/95, art. 76). Presentes os pressupostos objetivos e subjetivos, deverá o titular da ação penal formular proposta de aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou de multa. Nesse caso, ainda não há processo. O ato compositivo ocorre por ocasião da audiência preliminar, logo, antes do oferecimento da denúncia. b) ADEQUAÇÃO ENTRE O PEDIDO E A PROTEÇÃO JURISDICIONAL QUE SE PRETENDE OBTER No processo penal, a ação penal condenatória sempre será adequada à obtenção da tutela jurisdicional pretendida (sentença condenatória). A relevância da adequação se fará presente nas ações penais não condenatórias (HC). Vejamos a súmula 693, STF: Não cabe habeas corpus contra decisão condenatória a pena de multa, ou relativo a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada. c) UTILIDADE Só será útil a ação penal em que haja a possibilidade concreta de aplicação de uma sanção penal (v.g. prescrição virtual – Não é aceita pelos tribunais superiores). 📌 OBSERVAÇÃO O STF e o STJ consideram inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, também denominada de prescrição virtual, em perspectiva, por prognose”, “projetada” ou “antecipada” (Súmula 438-STJ). Mas, como ressalta Renato Brasileiro (2020, p. 305) ao falar sobre o interesse de agir, “qual seria a utilidade de um processo penal, com grande desperdício de atos processuais, de tempo, de trabalho humano, etc., se, antecipadamente, já se pode antever que não haverá resultado algum?” 3.1.3. JUSTA CAUSA 9 No que se refere à justa causa, temos que ela não é condição da ação pacífica na doutrina. Ainda assim, consta no art. 395, do CPP, como uma das causas de rejeição da denúncia ou queixa, se ausente. Quanto ao seu conteúdo, a justa causa representa o lastro probatório mínimo, indicativo da autoria e da materialidade da infração penal, necessário para o oferecimento da denúncia ou queixa. Funciona, pois, como uma condição de garantia contra o uso abusivo do direito de acusar, evitando a instauração de processos levianos ou temerários, ou seja, evita-se que sejam ajuizadas ações penais infundadas. Esse lastro probatório mínimo que dá suporte à acusação evita a instauração de processos criminais temerários. Por isso, para a deflagração da ação exige-se que haja, cumulativamente: ✓ Certeza da existência da infração penal; ✓ Indícios suficientes de autoria. A justa causa para a ação penal é obtida, como regra, pelos elementos de informação produzidos na fase investigatória no bojo do inquérito policial ou de outro procedimento investigatório preliminar à ação penal. 📌 OBSERVAÇÃO Com a reforma do CPP pela Lei nº 13.964/19, o inquérito não poderá mais acompanhar a denúncia quando do seu encaminhamento do juiz das garantias ao juiz da instrução e julgamento. Nos termos do art. 3º-C, § 3º, do CPP: os autos que compõem as matérias de competência do juiz das garantias ficarão acautelados na secretaria desse juízo, à disposição do Ministério Público e da defesa, e não serão apensados aos autos do processo enviados ao juiz da instrução e julgamento, ressalvados os documentos relativos às provas irrepetíveis, medidas de obtenção de provas ou de antecipação de provas, que deverão ser remetidos para apensamento em apartado. A peça acusatória oferecida sem justa causa deverá ser REJEITADA pelo juiz. Art. 395. A denúncia ou queixa será rejeitada quando: III - faltar justa causa para o exercício da ação penal. O STJ, no HC 193254, pontuou que “A justa causa é exigência legal para o recebimento da denúncia, instauração e processamento da ação penal, nos termos do artigo 395, III, do Código de Processo Penal, e consubstancia-se pela somatória de três componentes essenciais: (a) TIPICIDADE (adequação de uma conduta fática a um tipo penal); (b) PUNIBILIDADE (além de típica, a conduta precisa ser punível, ou seja, não existir quaisquer das causas extintivas da punibilidade); e (c) VIABILIDADE (existência de fundados indícios de autoria)”. ⚠ ATENÇÃO JUSTA CAUSA DUPLICADA: Trata-se de um instituto inerente à Lei de Lavagem de Dinheiro. É necessário instruir a denúncia com lastro probatório mínimo do crime de lavagem de dinheiro e também do crime antecedente (Art. 2º, §1º da Lei 9.613/98). 4. No caso do delito previsto no art. 1º da Lei n. 9.613/98, a aptidão da denúncia é aferida a partir da verificação da presença de elementos informativos suficientes que sirvam de lastro probatório mínimo que apontem a materialidade e ofereçam indícios 10 da autoria da prática de atos de ocultação ou de dissimulação da origem dos bens ou valores. Além disso, a inicial acusatória deve trazer elementos que sinalizem a existência de infração penal antecedente, demonstrando a chamada justa causa duplicada. 5. Neste caso, não se pode falar em inépcia da peça acusatória,já que esta descreve uma conduta, em tese, criminosa, embora apresente capitulação jurídica inadequada. De fato, o crime antecedente está corretamente narrado, tendo a acusação demonstrado que o recorrente tinha pleno conhecimento a respeito da origem ilícita dos valores convertidos. (STJ, RHC n. 150.451/TO, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 13/12/2021, DJe de 16/12/2021.) ÓTICA RETROSPECTIVA E PROSPECTIVA DA JUSTA CAUSA: Entende a jurisprudência do STJ que a justa causa não deve ser analisada tão somente com um ótica voltada para o passado, baseada nos elementos de informação colhidos em procedimentos investigativos - ótica retrospectiva -, mas também com um ótica voltada para o futuro - ótica prospectiva -, para a instrução processual que ocorrerá, nos seguintes termos: A ocorrência dos fatos narrados na denúncia está indicada, nos autos, por inúmeros elementos indiciários - oriundos de buscas e apreensões, quebras de sigilo e outras medidas investigativas -, a justificar a presença de justa causa para a deflagração da ação penal. Além disso, tradicionalmente, a justa causa é analisada apenas sob a ótica retrospectiva, voltada para o passado, com vista a quais elementos de informação foram obtidos na investigação preliminar já realizada. Todavia, a justa causa também deve ser apreciada sob uma ótica prospectiva, com o olhar para o futuro, para a instrução que será realizada, de modo que se afigura possível incremento probatório que possa levar ao fortalecimento do estado de simples probabilidade em que o juiz se encontra quando do recebimento da denúncia. STJ. Corte Especial. APn 989/DF, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 16/02/2022 (Info 726).6 3.2. CONDIÇÕES GENÉRICAS DA AÇÃO PARA A CORRENTE MINORITÁRIA (AURY LOPES JÚNIOR) Para esta corrente, as condições deveriam ser buscadas no antigo Art. 43 do CPP (revogado em 2008). a) FATO APARENTEMENTE CRIMINOSO O fato imputado deve ser, aparentemente, típico, ilícito e culpável. EXCEÇÃO: inimputabilidade por anomalia mental. b) PUNIBILIDADE CONCRETA Para que o mérito da ação seja julgado, a punibilidade não pode ter sido extinta. Ou seja, nenhuma das hipóteses do Art. 107 do CP podem estar presentes para que o mérito da ação possa ser julgado. c) LEGITIMIDADE DE PARTE Mesma da primeira corrente. 6 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Ótica retrospectiva e ótica prospectiva da justa causa. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 26/10/2023 https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/fe87435d12ef7642af67d9bc82a8b3cd https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/fe87435d12ef7642af67d9bc82a8b3cd 11 d) JUSTA CAUSA Mesma da primeira corrente. 3.3. CONDIÇÕES ESPECÍFICAS DA AÇÃO (CONDIÇÕES DE PROCEDIBILIDADE) Além das condições genéricas, são aquelas exigidas pela lei para que o mérito de uma ação penal possa ser julgado. São exemplos: ● Representação do ofendido (Art. 147, §único); ● Requisição do Ministro da Justiça (crimes contra a honra do PR); ● Laudo pericial nos crimes contra a propriedade imaterial (Art. 525, CPP); ● Provas novas, quando o inquérito policial tiver sido arquivado com base na ausência de elementos probatórios; ● Autorização da Câmara dos Deputados, por dois terços de seus membros, para a instauração de processo contra o Presidente e o Vice-Presidente da República e os Ministros de Estado (CF, art. 51, I). 🚩 NÃO CONFUNDA: Condições de Procedibilidade ≠ Condições de Prosseguibilidade CONDIÇÕES DE PROCEDIBILIDADE CONDIÇÕES DE PROSSEGUIBILIDADE Devem estar presentes para que a ação penal tenha início.7 Devem estar presentes para que a ação penal já em curso possa prosseguir. 7 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.311. 3.4. CONDIÇÕES DE PROSSEGUIBILIDADE (CONDIÇÃO SUPERVENIENTE DA AÇÃO) As condições da ação diferenciam-se das condições de prosseguibilidade. Aquelas são necessárias para o próprio início da ação penal, enquanto estas, para o seu prosseguimento, sua continuação. Ou seja, o processo já está em andamento e uma condição deverá ser implementada para que ele siga seu curso normal. É o caso dos crimes de lesão corporal leve e culposa, os quais, antes da Lei nº 9.099/95 eram de ação pública incondicionada e passaram a ser de ação pública condicionada à representação (art. 88, do CPP). Nesses casos, nos processos já em andamento, foi necessária a intimação do ofendido ou representante legal para oferecerem a representação no prazo de trinta dias. 🚩 NÃO CONFUNDA: Condições da ação ≠ Condições objetivas de punibilidade CONDIÇÕES DA AÇÃO CONDIÇÕES OBJETIVAS DE PUNIBILIDADE “Relacionadas ao direito processual penal, sendo exigidas para o exercício regular do direito de ação, subdividindo-se em condições genéricas e específicas”. 8 “Referem-se ao direito penal, funcionando como fatos externos ao tipo penal, que devem ocorrer para a formação de um injusto culpável punível, sendo chamadas de objetivas porquanto independem do dolo ou da culpa do agente.” 8 LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de Processo Penal. 8ª ed. Juspodivm, 2020, p.312. 12 “Se não estiver presente uma condição de procedibilidade, ocorre a anulação do processo e não a absolvição do agente, pois não há, em regra, análise do mérito, ou seja, nada impede a renovação do processo, desde que seja removido o impedimento processual. Em outras palavras, tal decisão só faz coisa julgada formal.” “A ausência de uma condição objetiva de punibilidade impede o início da persecução criminal; porém, proposta a ação penal, haverá decisão de mérito e, portanto, formação de coisa julgada formal e material.” 3.4. CONDIÇÕES OBJETIVAS DE PUNIBILIDADE E ESCUSAS ACUSATÓRIAS As condições objetivas de punibilidade são circunstâncias nas quais a punibilidade do crime depende do aperfeiçoamento de certos elementos, os quais não são elementos normativos do tipo penal. São chamadas objetivas porque não dependem do dolo ou culpa do agente, tratando-se de acontecimento futuro e incerto. A ausência de condição objetiva de punibilidade impede o próprio início da persecução penal e, caso proposta a ação penal quando ausente, dará ensejo a uma decisão de mérito, que fará coisa julgada formal e material. Possuem natureza jurídica de excludente de punibilidade. Exemplos: ● Circunstância de o fato ser punível no país em que foi praticado e estar incluído entre aqueles que a lei brasileira permite a extradição nos crimes praticados fora do território nacional (art. 7º, § 2º, “b” e “c”, do CP); ● Decisão final do procedimento administrativo nos crimes materiais contra a ordem tributária: Súmula Vinculante 24-STF: Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo. 1. É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que, "nos termos da Súmula Vinculante n. 24, o termo inicial da prescrição dos crimes materiais tributários é a data do lançamento definitivo, após o encerramento do procedimento administrativo-fiscal, visto que, somente a partir daí, consoante entendimento do Supremo Tribunal Federal, está caracterizado o elemento normativo do tipo penal e preenchida a condição objetiva de punibilidade" (AgRg no REsp n. 1.430.892/PB, relator Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 15/3/2018, DJe 27/3/2018). Já as escusas acusatórias são as condições de punibilidade negativamente formuladas, que excluem a punibilidade do crime em relação a determinadas pessoas quando presentes. Segundo Avenda, “compreendem as situações em que, conquanto exista o crime, não se impõe pena em razão de circunstâncias pessoais do agente. É o que ocorre no caso de furtopraticado por descendente 13 contra ascendente menor de 60 anos (art. 181, II, c/c o art. 183, III, do CP), em que, pela condição pessoal do agente (filho da vítima), considerou-o o legislador isento de pena.9” Exemplo: Isenção de pena prevista nos arts. 181, I e II, e 348, § 2º, do CP. 4. CLASSIFICAÇÃO DAS AÇÕES PENAIS 4.1. AÇÃO PENAL PÚBLICA Como regra, a ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente declara privativa do ofendido. Conforme veremos melhor a seguir, a ação penal pública pode ser incondicionada, que é a regra, ou condicionada à requisição do Ministro da Justiça ou à representação do ofendido. 4.1.1. TITULARIDADE A titularidade é do Ministério Público, conforme o Art. 129 da CF. Havendo conflito de atribuições entre membros do Ministério Público Federal e do Ministério Público Estadual o Supremo Tribunal Federal entende que compete ao Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP, vejamos: 1. Incompetência originária do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL para conhecer e dirimir conflito de atribuições entre membros de ramos diversos do Ministério Público. Inaplicabilidade do art. 102, I, f, da CF, por ausência de risco ao equilíbrio federativo. 9 Avena, Norberto. Processo Penal. Disponível em: Minha Biblioteca, (14th edição). Grupo GEN, 2022. 2. Impossibilidade de encaminhamento do conflito de atribuição para o Procurador-Geral da República, enquanto autoridade competente, pois é parte interessada na solução da demanda administrativa, uma vez que acumula a Chefia do Ministério Público da União com a chefia de um de seus ramos, o Ministério Público Federal, nos termos da LC 75/1993. 3. Os membros do Ministério Público integram um só órgão sob a direção única de um só Procurador-Geral, ressalvando-se, porém, que só existem unidade e indivisibilidade dentro de cada Ministério Público, inexistindo qualquer relação de hierarquia entre o Ministério Público Federal e os dos Estados, entre o de um Estado e o de outro, ou entre os diversos ramos do Ministério Público da União. 4. EC 45/2004 e interpretação sistemática da Constituição Federal. A solução de conflitos de atribuições entre ramos diversos dos Ministérios Públicos pelo CNMP, nos termos do artigo 130-A, § 2º, e incisos I e II, da Constituição Federal e no exercício do controle da atuação administrativa do Parquet, é a mais adequada, pois reforça o mandamento constitucional que lhe atribuiu o controle da legalidade das ações administrativas dos membros e órgãos dos diversos ramos ministeriais, sem ingressar ou ferir a independência funcional. 5. Não conhecimento da Ação Cível Originária e encaminhamento dos autos ao Conselho Nacional do Ministério Público para, nos termos do artigo 130-A, incisos I e II, da Constituição Federal, dirimir o conflito de atribuições. (ACO 843, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 14 08/06/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-263 DIVULG 03-11-2020 PUBLIC 04-11-2020) Essa posição se trata do acolhimento pelo Supremo Tribunal Federal, de uma tese institucional defendida pelos Ministérios Públicos Estaduais, os quais não concordavam com o entendimento anterior que afirmava que a competência para dirimir esse conflito era do PGR. CONFLITO ENTRE MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO MPE X MPF ■ Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP. MPE ESTADO “A” X MPE DO ESTADO “N” ■ Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP. 4.1.2. PEÇA ACUSATÓRIA Conforme o Art. 24 do CPP, a ação penal pública será promovida por DENÚNCIA do Ministério Público. 4.1.3. ESPÉCIES 4.1.3.1. AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA A ação penal pública incondicionada é promovida privativamente pelo Ministério Público sem a interferência de quem quer que seja, sendo irrelevante, para a sua promoção, a vontade do ofendido. Sobre o tema, veja o que diz os arts. 24, do CPP, 100, do CP e 129, da CF/88: CÓDIGO DE PROCESSO PENAL Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta será promovida por denúncia do Ministério Público, mas dependerá, quando a lei o exigir, de requisição do Ministro da Justiça, ou de representação do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo. CÓDIGO PENAL Art. 100 - A ação penal é pública, salvo quando a lei expressamente a declara privativa do ofendido. § 1º - A ação pública é promovida pelo Ministério Público, dependendo, quando a lei o exige, de representação do ofendido ou de requisição do Ministro da Justiça. CONSTITUIÇÃO FEDERAL Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei; 4.1.3.2. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA Quanto à ação penal pública condicionada, diz-se que se trata de ação penal pública, pois é promovida pelo órgão do Ministério Público – que permanece sendo o titular da ação; de outro lado, diz-se que é condicionada, pois o parquet não poderá promovê-la sem que haja o implemento de condição imposta por lei: a representação do ofendido ou a requisição do Ministro da Justiça. A representação do ofendido, nos termos do art. 39, do CPP, poderá ser exercida pessoalmente ou por procurador com poderes especiais. Trata-se, pois, de manifestação daquele ou de seu representante legal no sentido de que possui interesse na persecução penal do autor do fato delituoso. Outrossim, a representação pode ser feita por escrito ou de forma oral, não se exigindo nenhuma formalidade, bastando o elemento volitivo, ou seja, a 15 manifestação de vontade. Sobre o tema, confira as disposições legais: Art. 39. O direito de representação poderá ser exercido, pessoalmente ou por procurador com poderes especiais, mediante declaração, escrita ou oral, feita ao juiz, ao órgão do Ministério Público, ou à autoridade policial. § 1o A representação feita oralmente ou por escrito, sem assinatura devidamente autenticada do ofendido, de seu representante legal ou procurador, será reduzida a termo, perante o juiz ou autoridade policial, presente o órgão do Ministério Público, quando a este houver sido dirigida. § 2o A representação conterá todas as informações que possam servir à apuração do fato e da autoria. § 3o Oferecida ou reduzida a termo a representação, a autoridade policial procederá a inquérito, ou, não sendo competente, remetê-lo-á à autoridade que o for. § 4o A representação, quando feita ao juiz ou perante este reduzida a termo, será remetida à autoridade policial para que esta proceda a inquérito. § 5o O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de 15 dias. Em regra, a representação possui natureza jurídica de condição de procedibilidade. Todavia, se o processo estiver em andamento e a lei passar a condicionar seu prosseguimento à representação, a natureza jurídica será de condição de prosseguibilidade. Importa anotar, também, que em relação àquela vigora o princípio da oportunidade ou conveniência, uma vez que o ofendido pode escolher representar ou não. Ainda, de acordo com o CPP a representação tem como destinatário o delegado de polícia, o juiz ou o membro do Ministério Público (art. 39, do CPP) e deve conter todas as informações que possam servir à apuração do fato e de sua autoria. Também, a representação é retratável até o oferecimento da denúncia, desde que não se trate da Lei Maria da Penha, pois, nesta, a retratação pode ser feita até o recebimento da denúncia. Neste ponto, prevalece na doutrina o entendimento de que, ainda que tenha ocorrido a retratação do direito de representação, o ofendido poderá oferecer nova representação, desde que respeitado o prazo decadencial. Já a requisição do Ministro da Justiça, que é condição sine qua non para a instauração de inquérito policial e para o oferecimento da ação penal pública nos crimes em que a leia exigir, não é muito comum na prática, mas é possível, por exemplo, nas seguintes hipóteses: a) crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil (art. 7º, § 3º, “b”, do CP); b) crimes contra a honra do Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro (art. 141, I, do CP). O Ministro da Justiça não está condicionado ao prazo decadencial de 6 meses, previsto para a representação e para a ação penal de iniciativa privada, por falta de previsão legal. No entanto, a doutrina entende que ele deve observar o prazo prescricional do delito cometido. 4.2. AÇÃO PENAL PRIVADA 16 A ação penal privada pode ser intentada pelo ofendido ou por quem tenha qualidade para representá-lo (art. 30, do CPP). Quando um crime for processado por meio de ação penal de iniciativa privada, a lei expressamente o dirá: “somente se procede mediante queixa”. Não esqueça que o direito de punir (jus puniendi) é do Estado, seu titular único e exclusivo. Há casos, todavia, em que ele concede ao ofendido, ou ao seu representante legal, o jus persequendi in judicio, ou seja, o direito de dar início à persecução penal em juízo – o que ocorrerá por meio de uma queixa-crime. Nesses casos, o Estado transfere o direito de ação penal ao particular. Diz-se, então, que aqui o particular atua como um substituto processual (legitimação extraordinária), porque vai a juízo, em nome próprio, defender interesse do Estado (direito de punir). Na hipótese de morte do ofendido ou quando ele for declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão (art. 31, do CPP). Esta regra também se aplica à ação penal pública condicionada à representação. Neste ponto, uma observação importante é necessária. É que, conquanto o art. 31, do CPP, fale apenas em “cônjuge”, o(a) companheiro(a) hetero ou homoafetivo(a) também possui legitimidade para ajuizar ação penal privada. Neste sentido, o STJ: A companheira, em união estável homoafetiva reconhecida, goza do mesmo status de cônjuge para o processo penal, possuindo legitimidade para ajuizar a ação penal privada. STJ. Corte Especial. APn 912-RJ, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 07/08/2019 (Info 654). Outrossim, se o ofendido for menor de 18 anos, ou mentalmente enfermo, e não tiver representante legal, ou colidirem os interesses deste com os daquele, o direito de queixa poderá ser exercido por curador especial, nomeado, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, pelo juiz competente para o processo penal (art. 33, do CPP). 4.2.1. TITULARIDADE Como adiantamos, de acordo com o Art. 30 do CPP, a titularidade é do ofendido ou de seu representante. Art. 30. Ao ofendido ou a quem tenha qualidade para representá-lo caberá intentar a ação privada. 4.2.2. PEÇA ACUSATÓRIA Conforme o Art. 100, §2º do CP: a ação de iniciativa privada é promovida mediante QUEIXA do ofendido ou de quem tenha qualidade para representá-lo. 4.2.3. ESPÉCIES 4.2.3.1. AÇÃO PENAL PRIVADA EXCLUSIVA A ação penal exclusivamente privada é aquela na qual se possibilita que tanto o ofendido quanto o seu representante legal (art. 31, do CPP) possam ajuizar a ação penal. É a regra nas ações penais de iniciativa privada. 17 4.2.3.2. AÇÃO PENAL PRIVADA PERSONALÍSSIMA A ação penal personalíssima, ao contrário da exclusivamente privada, prevê a legitimidade exclusiva do ofendido e de mais ninguém, não havendo, portanto, representante legal, curador, nem sucessão processual em caso de morte ou ausência. Segundo Norberto Avena, “trata-se de subtipo de ação penal privada em que a titularidade compete única e exclusivamente ao próprio ofendido, sendo o seu exercício vedado, até mesmo, ao seu representante legal, cônjuge, ascendente, descendente ou irmão. Destarte, falecendo a vítima, nada haverá a ser feito a não ser aguardar-se a extinção da punibilidade do réu.10” Atualmente, com a revogação do delito de adultério (art. 240 do CP) pela Lei n. 11.106/2005, persiste em nosso ordenamento apenas um delito de iniciativa personalíssima: o crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento, previsto no art. 236 do CP. Nesse crime, exige o parágrafo único do art. 236 que a ação penal somente poderá ser ajuizada pelo contraente enganado, de modo que não se opera a sucessão prevista no art. 31 do CPP e, por consequência, com a morte do ofendido, extinguem-se a punibilidade e a ação penal. Além disso, se o cônjuge enganado for menor de 18 anos, a queixa somente poderá ser prestada após cessada a menoridade. Lembrando que a emancipação pelo casamento não gera nenhum efeito no processo penal. 🚨 JÁ CAIU Na prova para o cargo de Delegado de Polícia do Estado de São Paulo (Ano: 2022 Banca: VUNESP), foi 10 Avena, Norberto. Processo Penal. Disponível em: Minha Biblioteca, (14th edição). Grupo GEN, 2022. considerada correta a seguinte afirmativa: “Nos termos do Código de Processo Penal, é correto afirmar que a ação penal privada personalíssima só pode ser intentada pela vítima e, em caso de falecimento antes ou depois do início da ação, não poderá haver substituição para sua propositura ou seu prosseguimento”. 4.2.3.3. AÇÃO PENAL PRIVADA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA OU AÇÃO PENAL ACIDENTALMENTE PRIVADA OU AÇÃO PENAL SUPLETIVA Seu cabimento está subordinado à inércia do Ministério Público. Ou seja, quando o parquet não observa o prazo legal para a propositura da ação, nasce para o particular o direito de apresentá-la através da ação penal privada subsidiária da pública, que também possui prazo decadencial de 6 meses, findo o qual se produz a decadência imprópria, assim chamada porque haverá a perda do direito de queixa, mas não haverá extinção da punibilidade – já que o MP segue legitimado para oferecer a denúncia. Para Avena, “corresponde a uma ação penal privada ajuizada em relação a crime de ação pública, justificando-se quando, esgotado o prazo do Ministério Público, este não ofereceu a competente denúncia. O início do processo criminal, neste caso, ocorrerá mediante a dedução de queixa-crime subsidiária11”. ⚠ ATENÇÃO Na ação penal privada subsidiária da pública, o Ministério Público atua como verdadeiro interveniente adesivo obrigatório (ou parte adjunta), 11 Avena, Norberto. Processo Penal. Disponível em: Minha Biblioteca, (14th edição). Grupo GEN, 2022. 18 devendo intervir em todos os termos do processo, sob pena de nulidade (art. 564, III, “d”, do CPP). Sobre o tema, confira as disposições do CPP: Art. 29. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte principal (AÇÃO PENAL INDIRETA) Finalmente, quanto ao prazo, importa acrescentar que as peças acusatórias nas ações penais públicas e privadas possuem prazos. De acordo com o art. 40, do CPP, o prazo para oferecimento da denúncia (peça acusatória da ação penal pública), estando o réu preso, será de 5 dias, contado da data em que o órgão do Ministério Público receber os autos do inquérito policial, e de 15 dias, se o réu estiver solto ou afiançado. No último caso, se houver devolução do inquérito à autoridade policial (art. 16), contar-se-á o prazo da data em que o órgão do Ministério Público receber novamente os autos. Mas, quando o Ministério Público dispensar o inquérito policial, o prazo para o oferecimento da denúncia contar-se-á da data em que tiver recebido as peças de informações ou a representação. Já no caso da queixa (peça acusatória da ação penal privada) e da ação penal pública condicionada à representação, salvo disposição em contrário, o ofendido, ou seu representante legal, decairá no direito de queixaou de representação, se não o exercer dentro do prazo de seis meses, contado do dia em que vier a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do art. 29, do dia em que se esgotar o prazo para o oferecimento da denúncia (art. 38, CPP). No entanto, no caso da ação penal pública condicionada à representação, se o ofendido representar dentro do prazo legal, não haverá decadência para buscar apuração do delito, pois é irrelevante que a denúncia do órgão do Ministério Público tenha sido apresentada após os seis meses fatais. A inobservância do prazo acima acarreta a extinção da punibilidade do agente (art. 107, IV, do CP). Tendo natureza jurídica de direito material, o prazo para representar inclui o dia do começo e exclui o dia do vencimento, nos termos da regra do art. 10 do CP. VOCÊ JÁ OUVIU FALAR NA AÇÃO PENAL PÚBLICA SUBSIDIÁRIA DA PÚBLICA? Pois é. Segundo o professor e promotor de justiça Márcio Gondim: “A classificação mais comum das ações penais leva-se em consideração a legitimidade, ou seja, a pertinência subjetiva do direito de ação e, desse modo, as ações penais são classificadas em públicas e privadas, com as respectivas subdivisões. A ação pública é subdividida em incondicionada e condicionada, consoante a necessidade ou não da condição de procedibilidade para que o membro do Ministério Público possa pedir ao Estado-juiz a aplicação da reprimenda penal. De outra banda, a ação penal privada pode ser classificada em exclusiva (ou propriamente dita), personalíssima e subsidiária da pública, esta última quando há inércia no 19 representante do ‘parquet’ deixando escoar ‘in albis’ seu prazo para o oferecimento da denúncia. Pois bem, afora as mencionadas classificações surge a classificação da ação penal pública subsidiária da pública, quando em corolário da inação do membro do membro do Ministério Público a titularidade da ação passa a outro órgão, entrementes, ainda pertencente à instituição, como ocorre no art. 2°, § 2° do Decreto-lei n° 201/06, que trata dos crimes de responsabilidade de prefeitos e vereadores. Ademais, também entendo se enquadrar na referenciada classificação o incidente de deslocamento de competência, anunciado no art. 109, § 5° da Carta da República, pois o deslocamento de competência/atribuição tem por base grave violação de direitos humanos em corolário da inação ou deficiência dos órgãos Estaduais a fim de assegurar o cumprimento de tratados de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte. Destaque-se, todavia, que a precitada classificação e mecanismos de controle de atribuição do Ministério Público Estadual, ao meu sentir, viola a atribuição bem como a independência de cada órgão, pois é cediço não haver hierarquia entre os Ministérios Públicos e, portanto, sem razão a remessa dos autos e/ou modificação de titularidade na ação penal em tais casos.” A doutrina aponta que o deslocamento da competência está subordinado à presença de dois requisitos: i) crime com grave violação aos direitos humanos e ii) risco de descumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, em virtude da inércia do Estado-membro em proceder à persecução penal. Registre-se, no entanto, que o STJ acrescentou um terceiro requisito, consistente na incapacidade – oriunda de inércia, omissão, ineficácia, negligência, falta de vontade política, de condições pessoais e/ou materiais etc. – de o Estado-membro, por suas instituições e autoridades, levar a cabo, em toda a sua extensão, a persecução penal. Assim, portanto, como o IDC importa em deslocamento da competência da Justiça Estadual, onde atua o Ministério Público dos Estados, para a Justiça Federal, onde funciona o Ministério Público Federal, tem-se aí uma espécie de ação penal pública subsidiária da pública. 5. PRINCÍPIOS APLICÁVEIS À AÇÃO PENAL Há princípios que são exclusivos da ação penal pública e outros exclusivos da ação penal privada, bem como há princípios que são comuns a ambas. 5.1. PRINCÍPIOS APLICÁVEIS À AÇÃO PENAL PÚBLICA E À AÇÃO PENAL PRIVADA 5.1.1. PRINCÍPIO DA INÉRCIA DA JURISDIÇÃO (NE PROCEDAT IUDEX EX OFFICIO) Ao juiz não é dado iniciar uma ação de ofício. Não poderá o magistrado deflagrar uma ação penal sem que ele tenha sido provocado pela parte legítima. Ao adotar o sistema acusatório, a Constituição não permite que o juiz dê início à ação penal de ofício, sem provocação da parte. 20 📌 OBSERVAÇÃO ■ PROCEDIMENTO JUDICIALIFORME: Não recepção pela CF/88. Art. 26. A ação penal, nas contravenções, será iniciada com o auto de prisão em flagrante ou por meio de portaria expedida pela autoridade judiciária ou policial Trata-se de norma materialmente incompatível com a Constituição Federal. Isso pelo fato de que a titularidade da ação penal pública é do MP. ■ O juiz não pode iniciar ação penal de CONHECIMENTO de ofício, mas a fase de EXECUÇÃO pode ser iniciada de ofício, conforme o art. 195, LEP: Art. 195. O procedimento judicial iniciar-se-á de ofício, a requerimento do Ministério Público, do interessado, de quem o represente, de seu cônjuge, parente ou descendente, mediante proposta do Conselho Penitenciário, ou, ainda, da autoridade administrativa. 5.1.2. PRINCÍPIO DO NE BIS IN IDEM PROCESSUAL OU INADMISSIBILIDADE DA PERSECUÇÃO PENAL MÚLTIPLA Ninguém pode ser processado mais de uma vez pela mesma imputação. Apesar de não constar expressamente da Constituição Federal, o princípio do ne bis in idem consta da Convenção Americana sobre Direitos Humanos: Art. 8, item 4 do pacto de São José da Costa Rica: “O acusado absolvido por sentença passada em julgado não poderá ser submetido a novo processo pelos mesmos fatos”. Assim, ainda que novas provas sejam colhidas, não poderá ser novamente processado. Segundo Renato Brasileiro (2020, p. 321), o bis in idem só pode ser aplicado se o fato delituoso atribuído ao agente for idêntico em ambos processos. Em caso de imputações idênticas contra o mesmo acusado tramitando em países diversos, não há o que se falar no princípio do bis in idem se o julgamento do litígio no exterior estiver pendente. Ou seja, apenas sentença definitiva oriunda de países distintos pode obstar a formação, continuação ou sobrevivência da relação jurídica processual que configuraria a litispendência. 5.1.3. PRINCÍPIO DA INTRANSCENDÊNCIA A ação penal só pode ser oferecida contra o suposto autor do fato delituoso, não podendo alcançar terceiros não relacionados ao fato. Trata-se de um princípio consectário do princípio da pessoalidade da pena, previsto no art. 5º, XLV, da Constituição Federal. Art. 5º (...) XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; 21 ⚠ ATENÇÃO O presente princípio somente se aplica quanto às consequências penais do fato típico, de modo que, diante de uma responsabilidade não penal, é possível que haja sua transferência aos sucessores na hipótese de morte do condenado, respondendo eles até as forças da herança. Ex.: Reparação de dano. 5.2. PRINCÍPIOS DA AÇÃO PENAL PÚBLICA 5.2.1. PRINCÍPIO DA OBRIGATORIEDADE OU LEGALIDADE PROCESSUAL Havendo justa causa, o MP está obrigado a oferecer denúncia, não havendo nenhuma discricionariedade para decidir se irá ou não atuar, conforme o Art. 24, CPP: Art. 24. Nos crimes de ação pública, esta SERÁ promovida por denúncia do Ministério Público, (...). EXCEÇÕES: OBRIGATORIEDADE MITIGADA ou DISCRICIONARIEDADE REGRADA a) TRANSAÇÃO PENAL (infrações penais de menor potencial ofensivo – Art. 76, Lei 9.099/95): preenchidos os requisitos e aceito os termos da transação penal, haverá imediata aplicação das penas restritivas de direito ou multa. b) ACORDO DE LENIÊNCIA, BRANDURA OU DOÇURA (crimes contra a ordemtributária econômica – Lei 12.529/11): celebrado pelo CADE com pessoas físicas ou jurídicas autoras de crime contra a ordem econômica, o acordo de leniência impede o oferecimento da denúncia e, cumprido, extingue a punibilidade. c) PARCELAMENTO DO DÉBITO TRIBUTÁRIO (Art. 83, §§1º e 2º, Lei 9.430/96): é previsto como causa de suspensão da pretensão punitiva, desde que o parcelamento tenha sido formalizado antes do recebimento da denúncia. Haverá também a suspensão da prescrição criminal, extinguindo-se a punibilidade dos crimes quando houver o pagamento integral dos débitos tributários. d) COLABORAÇÃO PREMIADA (organizações criminosas – Art. 4º, §4º, Lei 12.850/12): celebrado o acordo de colaboração premiada, o MP pode deixar de oferecer a denúncia e, cumprido, extingue a punibilidade. e) ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (Art. 28-A, CPP): preenchidos os requisitos, aceito os termos do acordo e homologado pelo juiz, o MP deixa de oferecer a denúncia. Jurisprudência em Teses do STJ, Ed. 185 Tese 1: O acordo de não persecução penal – ANPP, previsto no art. 28-A do Código de Processo Penal, aplica-se a fatos ocorridos antes da Lei n. 13.964/2019, desde que não recebida a denúncia. Tese 2: O acordo de não persecução penal - ANPP não constitui direito subjetivo do investigado, assim pode ser proposto pelo Ministério Público conforme as peculiaridades do caso concreto, quando considerado necessário e suficiente para reprovar e prevenir infrações penais. Tese 3: O controle do Poder Judiciário quanto ao pedido de revisão do não oferecimento do acordo de não persecução penal - ANPP deve se limitar a questões relacionadas aos requisitos objetivos, não é, portanto, legítimo 22 o exame do mérito a fim de impedir a remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público. Tese 4: O Ministério Público não é obrigado a notificar o investigado no caso de recusa de oferecimento de acordo de não persecução penal - ANPP. O Poder Judiciário não pode impor ao Ministério Público (MP) a obrigação de ofertar acordo de não persecução penal (ANPP). Não cabe ao Poder Judiciário, que não detém atribuição para participar de negociações na seara investigatória, impor ao MP a celebração de acordos. Ademais, o acordo de persecução penal não constitui direito subjetivo do investigado. STJ. AgRg no RHC 152.756/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 14/09/2021, DJe 20/09/2021. 📌 OBSERVAÇÕES A assinatura de TAC impede a instauração de ação penal? Não. Impende ressaltar entendimento desta Superior Corte de Justiça no sentido de que a assinatura de termo de ajustamento de conduta, com a reparação do dano ambiental, são circunstâncias que possuem relevo para a seara penal, a serem consideradas na hipótese de eventual condenação, não se prestando para elidir a tipicidade penal. Outrossim, a lavratura do referido termo, com a extinção de ação civil pública, não implica a extinção da ação penal correspondente, haja vista a independência da esfera penal em relação às esferas cível e administrativa. Precedentes. (STJ, AgRg no RHC n. 121.611/SP, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 5/3/2020, DJe de 13/3/2020.) A assinatura do termo de ajustamento de conduta, firmado entre o Ministério Público estadual e o suposto autor de crime ambiental, não impede a instauração da ação penal, pois não elide a tipicidade penal. Ademais, há independência entre as esferas administrativa, cível e penal. (STJ, REsp n. 1.154.405/MG, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 18/5/2017, DJe de 25/5/2017.) A existência de excludente de ilicitude pode justificar o não oferecimento da denúncia? Tecnicamente não impede o oferecimento de denúncia, mas em havendo juízo de certeza quanto às excludentes de de ilicitude, o Ministério Público pode requerer o arquivamento do inquérito policial. 1. A par da atipicidade da conduta e da presença de causa extintiva da punibilidade, o arquivamento de inquérito policial lastreado em circunstância excludente de ilicitude também produz coisa julgada material. 2. Levando-se em consideração que o arquivamento com base na atipicidade do fato faz coisa julgada formal e material, a decisão que arquiva o inquérito por considerar a conduta lícita também o faz, isso porque nas duas situações não existe crime e há manifestação a respeito da matéria de mérito. (STJ, RHC n. 46.666/MS, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 5/2/2015, DJe de 28/4/2015.) 🗯 TRANSAÇÃO PENAL – APROFUNDAMENTO 23 O instituto da transação penal é cabível nas infrações de menor potencial ofensivo – que são as contravenções penais e os crimes com pena de até dois anos, quando não for o caso de arquivamento e ressalvadas as hipóteses da Lei Maria da Penha, hipóteses nas quais a aplicação do instituto é vedada. Nos termos do art. 76, da Lei nº 9.099/95: havendo representação ou tratando-se de crime de ação penal pública incondicionada, não sendo caso de arquivamento, o Ministério Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou multas, a ser especificada na proposta. De acordo com o §1º: Nas hipóteses de ser a pena de multa a única aplicável, o Juiz poderá reduzi-la até a metade. Ademais, nos termos do art. 76, §2º, da Lei 9099/95, não se admitirá a proposta se ficar comprovado: ● ter sido o autor da infração condenado, pela prática de crime, à pena privativa de liberdade, por sentença definitiva; ● ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos com o instituto da transação penal ou ● não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e suficiente a adoção da medida. O descumprimento da transação penal tem como consequência a possibilidade do MP poder oferecer a denúncia, isso porque, a sua homologação não faz coisa julgada material. Neste sentido, a Súmula Vinculante 35: a homologação da transação penal prevista no artigo 76 da Lei 9.099/1995 não faz coisa julgada material e, descumpridas suas cláusulas, retoma-se a situação anterior, possibilitando-se ao Ministério Público a continuidade da persecução penal mediante oferecimento de denúncia ou requisição de inquérito policial. Outro ponto relevante neste tema diz respeito ao fato de que a transação penal não suspende nem interrompe o lapso prescricional, por ausência de previsão legal. Nas palavras do professor Marcio André Lopes: o prazo prescricional iniciou-se com a consumação do crime e continuou correndo normalmente, mesmo o autor tendo aceitado a transação. Enquanto se aguarda que ele cumpra as obrigações assumidas na transação, o prazo permanece fluindo regularmente. Mesmo que ele descumpra as condições, o prazo está tramitando12. 🗯 ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL – APROFUNDAMENTO Até a edição da Lei 13.964/2019 (“Pacote Anticrime”), o Acordo de Não-Persecução Penal (ANPP) estava previsto apenas no art. 18 da Resolução 181 do Conselho Nacional do Ministério Público. Assim, muito se questionava a respeito da sua legitimidade como instrumento jurídico capaz de ocasionar a extinção da punibilidade do agente. Com a Lei 13.964/2019, grande parte do conteúdo da resolução foi transformado em lei (art. 28-A do CPP). Vejamos: Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 anos, o Ministério Público poderá propor ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL, desde que necessário e suficiente para reprovação e 12 CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Homologação da transação penal não faz coisa julgada material. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: . Acesso em: 08/12/202224 prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente: (LEI 13964/19) I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo; (LEI 13964/19) II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; (LEI 13964/19) III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de 1/3 a 2/3, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); (LEI 13964/19) IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou (LEI 13964/19) V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada. (LEI 13964/19) § 1º Para aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o caput deste artigo, serão consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto. (LEI 13964/19) § 2º O disposto no caput deste artigo NÃO SE APLICA nas seguintes hipóteses: (LEI 13964/19) I - se for cabível transação penal de competência dos Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei; (LEI 13964/19) II - se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas; (LEI 13964/19) III - ter sido o agente beneficiado nos 5 anos anteriores ao cometimento da infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou suspensão condicional do processo; e (LEI 13964/19) 🚨 JÁ CAIU Na prova de Defensor Público da DPE-CE (Ano: 2022 Banca: FCC), foi considerada correta a seguinte afirmação: O acordo de não persecução penal não será cabível se o agente tiver realizado outro acordo de não persecução penal no período de 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da infração. IV - nos crimes praticados no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do agressor. (LEI 13964/19) 🚨 JÁ CAIU Na prova de Promotor de Justiça do MPE-PE (Ano: 2022 Banca: FCC), foi considerada correta a seguinte afirmação: são causas que impedem o acordo de não persecução penal: II. Se o investigado for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se insignificantes as infrações penais pretéritas. IV. Crimes praticados no âmbito de 25 violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a mulher por razões da condição de sexo feminino. § 3º O acordo de não persecução penal será formalizado por escrito e será firmado pelo membro do Ministério Público, pelo investigado e por seu defensor. (LEI 13964/19) § 4º Para a homologação do acordo de não persecução penal, será realizada audiência na qual o juiz deverá verificar a sua voluntariedade, por meio da oitiva do investigado na presença do seu defensor, e sua legalidade. (LEI 13964/19) § 5º Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta de acordo, com concordância do investigado e seu defensor. (LEI 13964/19) § 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua execução perante o juízo de execução penal. (LEI 13964/19) § 7º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais ou quando não for realizada a adequação a que se refere o § 5º deste artigo. § 8º Recusada a homologação, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para a análise da necessidade de complementação das investigações ou o oferecimento da denúncia. (LEI 13964/19) § 9º A vítima será intimada da homologação do acordo de não persecução penal e de seu descumprimento. (LEI 13964/19) § 10. Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não persecução penal, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia. (LEI 13964/19) § 11. O descumprimento do acordo de não persecução penal pelo investigado também poderá ser utilizado pelo Ministério Público como justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo. (LEI 13964/19) 🚨 JÁ CAIU Na prova de juiz do TJ-SC (Ano: 2022 Banca: FGV), foi considerada correta a seguinte afirmação: Relativamente aos acordos no processo penal, segundo a jurisprudência predominante nos Tribunais Superiores, é correto afirmar que poderá o descumprimento do acordo de não persecução penal ser utilizado pelo Ministério Público como justificativa para o não oferecimento de suspensão condicional do processo. § 12. A celebração e o cumprimento do acordo de não persecução penal não constarão de certidão de antecedentes criminais, exceto para os fins previstos no inciso III do § 2º deste artigo. (LEI 13964/19) § 13. Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção de punibilidade. (LEI 13964/19) § 14. No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior, na forma do art. 28 deste Código. (LEI 13964/19) Assim, na sistemática adotada pelo art. 28-A, 26 do CPP, tem-se que o ANPP é negócio jurídico de natureza extrajudicial, necessariamente homologado pelo juiz, celebrado entre o Ministério Público e o autor do fato delituoso – devidamente assistido por seu defensor –, que confessa formal e circunstancialmente a prática do delito, sujeitando-se ao cumprimento de certas condições não privativas de liberdade, em troca do compromisso do parquet de não perseguir judicialmente o caso penal extraído da investigação penal, leia-se, não oferecer denúncia, declarando-se a extinção da punibilidade caso a avença seja integralmente cumprida. Trata-se de um instrumento que mitiga a obrigatoriedade da ação penal e revela o caráter cada vez mais tendencioso do ordenamento jurídico brasileiro em privilegiar a justiça penal negociada/consensual, como a transação penal, o sursis processual e a colaboração premiada, otimizando recursos públicos e efetivando o conceito da Justiça Multiportas. Como vimos, nos termos do art. 28-A, do CPP: não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Para a aferição da pena mínima cominada ao delito a que se refere o caput do artigo 28-A, do CPP, devem ser consideradas as causas de aumento e diminuição aplicáveis ao caso concreto. As seguintes condições podem ser ajustadas isolada ou cumulativamente no acordo de não persecução: i) reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo; ii) renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; iii) prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Código Penal;