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V a l o r e s D iv in o s p a r a u m a S o c ie d a d e 
e m C o n s t a n t e M u d a n ç a
E s e q u ia s S o a r e s
V alores D ivinos para uma S ociedade 
em C onstante M udança
Esequias S oares
V alores D ivinos para uma S ociedade 
em C onstante M udança
Esequias S oares
1a Edição
C94D
Rio de Janeiro 
Outubro / 2014
Todos os direitos reservados. Copyright © 2014 para a língua portuguesa da Casa 
Publicadora das Assembleias de Deus. Aprovado pelo Conselho de Doutrina.
Capa: Wagner de Almeida
Projeto gráfico e editoração: Paulo Sérgio Primati
Revisão: Lettera Editorial
As citações biblicas foram extraídas da versão Almeida Revista e Corrigida, 
edição de 1995, da Sociedade Bíblica do Brasil, salvo indicação em contrário.
Para maiores informações sobre livros, revistas, periódicos e os últimos lançamentos 
da CPAD, visite nosso site: http://www.cpad.com.br.
SAC — Serviço de Atendimento ao Cliente: 0800-021-7373
Casa Publicadora das Assembleias de Deus
Av. Brasil, 34.401 - Bangu - Rio de Janeiro - RJ
CEP 21.852-002
1" edição: 0utubro/2014
Tiragem: 35.000
CDD 222.16 Silva, Esequias Soares da, 1955-
586s -Silv Os dez mandamentos: valores divinos para uma sociedade em cons­
tante mudança / Esequias Soares. — Rio de Janeiro: CPAD, 2014.
160p.; 21cm.
Bibliografia: p. 159-160.
ISBN 9788526312463
http://www.cpad.com.br
sumario
ABREVIATURAS.....................................................................................7
INTRODUÇÃO ........................................................................................9
1 OS DEZ MANDAMENTOS............................................................... 13
A lei de Moisés..................................................................................14
O decálogo ....................................................................................... 17
Os códigos........................................................................................21
2 NÃO TERÁS OUTROS DEUSES ..................................................... 27
Formas de adoração p agã ................................................................28
A idolatria do mundo antigo ............................................................ 29
O primeiro mandamento.................................................................. 31
3 NÃO FARÃS IMAGENS DE ESCULTURAS...................................... 39
Os ídolos e as imagens.....................................................................40
O segundo mandamento..................................................................42
O Deus ze loso ..................................................................................46
4 NÃO TOMARÁS O NOME DO SENHOR EM V Ã O ............ ...........49
O nome "Deus" ................................................................................ 50
Elion, Shadai e Adonai .....................................................................53
O que significa tomar o nome de Deus em vão?...............................58
5 SANTIFICARÁS O SÁBADO .............................................................61
O sábado ..........................................................................................62
O quarto mandamento.....................................................................66
O sábado no Novo Testamento........................................................ 69
O sábado cristão.............................................................................. 74
6 HONRARÁS PAI E M Ã E ................................................................... 77
Honra a teu pai e a tua m ãe ............................................................. 78
A promessa divina........................................................................... 83
7 NÃO MATARÁS.................................................................................87
O sexto mandamento....................................................................... 88
Guerra...............................................................................................92
Suicídio.............................................................................................93
Pena de morte...................................................................................94
8 NÃO ADULTERARÁS........................................................................99
O sétimo mandamento....................................................................100
O casamento...................................................................................104
O ensino de Jesus............................................................................ 106
9 NÃO FURTARÁS.............................................................................. 111
Propriedade e trabalho ....................................................................112
O oitavo mandamento.................................................................... 113
Legislação mosaica sobre o furto ................................................... 115
10 NÃO DARÁS FALSO TESTEMUNHO............................................121
O aspecto exegético ....................................................................... 123
O aspecto jurídico...........................................................................125
O aspecto da vida diária................................................................. 128
11 NÃO COBIÇARÁS......................................................................... 131
Exegese do décimo mandamento................................................... 133
Os fatos .......................................................................................... 135
O décimo mandamento no Novo Testamento ..................... 136
12 A IGREJA E A LEI DE DEUS.........................................................139
A lei de D eu s.................................................................................. 140
Os três tipos de lei .......................................................................... 141
Os reformadores do século 16 ........................................................142
Avaliação bíblica.............................................................................144
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................... 149
APÊNDICE HISTÓRICO........................................................................ 151
REFERÊNCIAS B IBLIOGRÁFICAS 159
abreviaturas
ARA Versão de João Ferreira de Almeida, Edição Revista e Atualizada 
no Brasil. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 1995.
ARC Versão de João Ferreira de Almeida, Edição Revista e Corrigida.
Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 1998.
LXX RAHLFS, Alfred; RANHART, Robert. Septuaginta, Editio Altera. 
Stuttgart, Germany: Deutsche Bibelgesellschaft, 2006.
NTLH Nova Tradução na Linguagem de Hoje. Barueri, SP: Sociedade 
Bíblica do Brasil, 2006.
NVI Nova Versão Internacional. São Paulo: Editora Vida, 2000.
TB Tradução Brasileira. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 
2011.
VR Versão Revisada da Tradução de João Ferreira de Almeida de 
Acordo com os Melhores Textos em Hebraico e Grego. Rio de 
Janeiro: Imprensa Bíblica Brasileira, 1994.
8 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
ANTIGO TESTAMENTO
Gn Gênesis
ÊX Êxodo
Lv Levítico
Nm Números
Dt Deuteronômio
Js Josué
Jz Juizes
Rt Rute
1 Sm 1 Samuel
2 Sm 2 Samuel
1 Rs 1 Reis
2 Rs 2 Reis
1 Cr 1 Crônicas
2 Cr 2 Crônicas
Ed Esdras
Ne Neemias
Et Ester
Jó Jó
Sl Salmos
Pv Provérbios
Ec Eclesiastes
Ct Cantares
Is Isaías
Jr Jeremias
Lm Lamentações de Jeremias
Ez Ezequiel
Dn Daniel
Os Oseias
J1 Joel
Am Amós
Ob Obadias
Jn Jonas
Mq Miqueias
Na Naum
Hc Habacuque
Sf Sofonias
Ag Ageu
Zc Zacarias
Ml Malaquias
NOVO TESTAMENTO
Mt Mateus
Mc Marcos
Lc Lucas
Jo João
At Atos
Rm Romanos
1 Co 1 Coríntios
2 Co 2 Coríntios
G1 Gálatas
Ef Efésios
Fp Filipenses
Cl Colossenses
1 Ts 1 Tessalonicenses
2 Ts 2 Tessalonicenses
1 Tm 1 Timóteo
2 Tm 2 Timóteo
Ttlugar ao diabo. 
Uma vez descoberta tal geração, pede-se perdão por ela, e, dessa 
forma, a maldição de família é desfeita. Uma espécie de perdão 
por procuração, muito parecido com o batismo pelos mortos, 
praticado pelos mórmons.
Tal pensamento não se sustenta biblicamente; é um erro 
crasso. A maldição está sobre quem continuar no pecado dos 
pais, sobre "aqueles que me aborrecem", pontua com clareza 
o mandamento. Não é o que acontece com o cristão que ama a 
Deus. Se fomos alvejados pela graça de Deus ainda no tempo da 
nossa ignorância, quanto mais agora que somos reconciliados 
com ele? (Rm 5.8-10). Quando alguém se converte a Cristo, torna- 
-se nova criatura: "as coisas velhas já passaram; eis que tudo se 
fez novo" (2 Co 5.17).
Para finalizar, convém ressaltar que, no discurso de Moisés em 
DeuteronÔmio, na revelação do Sinai nenhuma imagem, figura, 
forma ou representação foi vista pelos israelitas; eles ouviram a 
voz da Javé vindo do meio do fogo, mas nenhuma representação 
de figura foi manifestada, unicamente a Palavra (Dt 4.16,23,25). 
Os ídolos de madeira e de pedra dos cananeus são divindades 
falsas cuja adoração é terminantemente proibida (Êx 34.13; Dt 
12.3; 16.21-22); Javé, entretanto, é real, mesmo que invisível 
(Cl 1.15; 1 Tm 1.17). "Deus é espírito" (Jo 4.24). Cultuá-lo com 
a mediação de imagens é colocá-lo no mesmo nível das falsas 
divindades, uma afronta ao verdadeiro Deus.
I 4 8 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
/V
SENHOR EM VAO
A s informações sobre cada um dos dez manda­
mentos do Decálogo são fornecidas ao longo do Pen- 
tateuco e em muitos casos em toda a Bíblia, e aqui não 
é diferente. O texto não expressa de maneira explícita, 
mas deixa claro que diz respeito a tudo o que se refere 
ao nome de Deus. Há expositor que exagera ao dizer 
que não é possível saber o que este mandamento 
quer dizer com as palavras: "Não tomarás o nome do 
SENHOR, teu Deus, em vão; porque o SENHOR não 
terá por inocente o que tomar o seu nome em vão" 
(Êx 20.7; Dt 5.11). O contexto bíblico esclarece o que 
Deus está nos ensinando e mostra a abrangência do 
referido mandamento. Fala sobre o uso de modo trivial 
do nome divino, proibindo o perjúrio e toda a forma 
de profanação e blasfêmia do nome de Javé.
0 NOME "DEUS"
Os nomes de Deus não são apenas uma identificação pessoal, 
mas são inerentes à sua natureza e revelam suas obras e seus 
atributos. Não é meramente uma distinção dos deuses das nações 
pagãs. Quando a Bíblia faz menção do "nome de Deus", está re­
velando o poder, a grandeza e a glória do Deus Todo-Poderoso; 
além de mostrar seus atributos, o nome representa o próprio Deus. 
O nome de Deus está ligado à sua soberania e glória.
Há três diferentes palavras hebraicas no Antigo Testamento 
para "Deus": ’êl, ’elõahe ’èlõhím.AA A Septuaginta emprega o ter­
mo grego theos, "Deus", para esses três vocábulos. Eles aparecem 
como nome pessoal do Deus de Israel e também como apelativos 
quando se referem aos deuses nas nações, razão pela qual cos­
tumamos empregar a expressão "nomes genéricos".
O termo êl tem relação com ’il, ’ilu e palavras similares 
usadas para deidades dos antigos povos semitas. Aparecem 
com frequência ilu[m ], ’iltu (fem.), ’ilü (pl.) nos documentos 
da Mesopotâmia, em acádico,45 como nomes próprios e tam­
bém como apelativos de deidade. Diversas etimologias já foram 
apresentadas pelos estudiosos, mas a proposta que prevalece 
é que ’il se deriva de uma raiz que significa "ser forte" ou "ser 
proeminente". É um "termo semítico muito antigo para divin­
dade" (HOLADAY, 2010, p. 20), usado para identificar o Deus 
de Israel (Nm 23.8).
No Antigo Testamento, há 238 ocorrências de ’êl e ’êlim, 
(pl.) juntos, como nome alternativo de Javé (Êx 20.5; Dt 4.24;
I 5 0 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
44 e E -rtK .
O acádico é uma língua da antiga Mesopotâmia, falada desde o golfo Pérsico até Nínive,
no norte, e substituída aos poucos pelo aramaico a partir do neoimpério babilônico 
fundado pelo rei Nabucodonosor.
5.9); como o próprio Deus de Israel: ’êl 'êlõhêi ysrãêl,46 "Deus, 
o Deus de Israel" (Gn 33.20) ou "El-Elohei-Israel" (TB); ’ãnôchi 
hã - ’Rabino-mor de Florença, Itália, cidade onde nasceu, tornou-se professor de Hebraico
da Universidade de Roma em 1933 e professor de Bíblia na Universidade Hebraica
de Jerusalém a partir de 1939.
NÃO TOMARÁS 0 N O M E DO SENHOR EM VÃO I 5 3
para se referir à ideia obscura e mais abstrata da deidade, de um 
Deus universal e Criador do mundo, indicando a transcendência 
da natureza de Deus; ao passo que Javé aparece quando as ca­
racterísticas estão claras e concretas e sugere um Deus pessoal 
que se relaciona diretamente com o povo.
No capítulo um de Gênesis, Deus aparece como o 
Criador do universo físico e como o Senhor do mundo, 
exercendo domínio sobre todas as coisas. Tudo quanto 
existe veio à existência por causa exclusiva de Seu fiat, sem 
qualquer contato direto entre Ele e a natureza. Portanto, 
aplicando-se aquelas regras, aqui cabe o uso do nome 
Elohim (CASSUTO, 1961, p. 32).
Elohim é um dos nomes próprios de Deus, mas aparece como 
apelativo no Antigo Testamento quando se refere a divindades 
falsas, por exemplo os deuses do Egito (Êx 12.2) e de outras nações 
(Dt 13.7,8; Jz 6.10). A palavra é usada com relação às imagens 
dos cultos pagãos (Êx 20.23). As Escrituras fazem uso irregular 
de Elohim em referência a seres sobrenaturais (1 Sm 28.13) e 
juizes (SI 82.6). Aparece também, cerca de 20 vezes, com relação 
às divindades pagãs individuais.
ELION, SHADAI E ADONAI
O Antigo Testamento emprega outros nomes para identificar 
o Deus Javé de Israel. São eles: ‘elyôn, "Altíssimo"; shadday, 
"Todo-poderoso" e ’ãdhonãy,S3 "Senhor".
O nome composto ’êl ‘elyôn significa "Deus Altíssimo". Elion 
designa Deus como o Alto e Excelente, o Deus Glorioso. É um dos
nomes genéricos porque ele também é aplicado a governantes, 
mas nunca vem acompanhado de artigo quando se refere ao Deus 
de Israel. Abraão adorava a El Shadai, "Deus Todo-Poderoso" 
(Gn 17.1); e Melquisedeque, rei e sacerdote de Salém, era ado­
rador de El Elion (Gn 14.19-20). Quando Abraão se encontrou 
com Melquisedeque, descobriu que seu Deus era o mesmo 
de Melquisedeque, apenas conhecido por um nome diferente 
( ê x 6.3). Em Gênesis 14.19-20, esse nome vem acompanhado de 
"El", mas, às vezes, aparece sozinho (Is 14.14).
O Deus de Israel é também identificado como ’êl shadday, 
"Deus Todo-Poderoso". Shadai é o "nome de uma deidade" (KO- 
EHLER BAUMGARTNER, vol. II, 2001, p. 1420). Segundo Holaday, 
é o nome de deidade identificado com Javé (2010, p. 514); e, de 
acordo com Gesenius, "mais poderoso, Todo-poderoso, um epí- 
teto de Jeová, às vezes com El" (1982, p. 806). Aparece 48 vezes 
no texto hebraico das Escrituras, sete delas antecedido de El.
Esse era um nome apropriado para o período patriarcal, du­
rante o qual os patriarcas viviam numa terra estranha e estavam 
rodeados pelas nações hostis. Eles precisavam saber que o seu 
Deus era o Todo-poderoso (Gn 17.1). O termo aparece com frequ­
ência na era patriarcal; só no livro de Jó ocorre 31 vezes. Êxodo 
6.3 nos mostra que Deus era conhecido pelos patriarcas por esse 
nome. Deus se revelou primeiro aos patriarcas do Gênesis com 
nome El Shadai e, após o Sinai, os hebreus identificaram o seu 
libertador Javé com o El Shadai dos seus antepassados.
As duas formas do nome hebraico ’ãdhonay ou ’ãdhônay ,54 "o 
Senhor, Adonai", aparecem no Antigo Testamento com "o" breve 
e com "o" longo (Is 6.1; Jz 13.8). O termo ocorre quase 450 vezes 
no Antigo Testamento, 310 vezes em conexão com o tetragrama
I 5 4 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
54 ' J Í K OU ’3VtK .
e 134 vezes sozinho. É um nome próprio e significa literalmente 
"meu senhor" e, segundo Gesenius, é "somente usado para Deus" 
(1982, p. 12); forma "reservada como uma designação para Javé" 
(JENNI & WESTERMANN, vol. 1, 2001, p. 24). Adonai, "Senhor", 
é um nome divino e expressa a soberania de Deus no Univer­
so. A desinência -ay indica plural, como acontece com o nome 
Elohim; o judaísmo considera Adonai comopluralis excellentiae. 
É diferente de ’ãdhôn,S5 "senhor, dono", referindo-se geralmente 
a homens, ou com o sufixo ’ãdhõní, s 6 "meu senhor", forma pela 
qual Sara se dirigia a Abraão e Ana se dirigia a Eli (Gn 18.12; 1 
Sm 1.15, 26).
Javé, o nome pessoal do Deus de Israel, é escrito pelas quatro 
consoantes mrP (YHWH) — o tetragrama. A escrita hebraica foi 
usada durante todo o período do Antigo Testamento sem as vo­
gais. Elas nada mais são do que sinais gráficos diacríticos, criados 
pelos rabinos entre os séculos 5 e 9, e que são colocados sobre, 
sob e no meio de cada consoante. Até hoje, esses sinais ajudam 
muito na leitura de qualquer texto hebraico; todavia, quem já 
conhece a língua não precisa mais deles.
Êxodo 3.14 revela que Deus é o que tem existência própria, 
ou seja, existe por si mesmo. É o imutável, o que causa todas as 
coisas, é autoexistente, aquele que é, que era e o que há de vir, 
o eterno. Até hoje, os judeus religiosos preferem chamar Deus de 
"O ETERNO", como se encontra na edição de 1988 da Bíblia na 
Linguagem de Hoje e na edição da Sêfer da Bíblia Hebraica em 
lugar do tetragrama. Aqui, Deus explicou a Moisés o significado 
do nome Iavé.
Desde o patriarca Abraão até ao período do reino dividido, era 
costume invocar a Javé mediante o uso do seu nome (Gn 12.8;
NÃO TOMARÁS 0 N O M E DO SENHOR EM VÃO I 5 5 I
55 Tinit.
13.4; 21.33; 1 Rs 18.24). Era necessário conhecer o nome para 
que se pudesse estabelecer um relacionamento de comunhão. 
Veja que Jacó perguntou ao anjo com quem lutava o seu nome 
(Gn 32.29). Manoá, o pai de Sansão, fez a mesma pergunta com o 
propósito de estabelecer um relacionamento espiritual (Jz 13.11- 
17). Com Moisés, não foi diferente:
Então, disse Moisés a Deus: Eis que quando vier aos 
filhos de Israel e lhes disser: O Deus de vossos pais me 
enviou a vós; e eles me disserem: Qual é o seu nome? Que 
lhes direi? E disse Deus a Moisés: EU SOU O QUE SOU.
Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: EU SOU me 
enviou a vós. E Deus disse mais a Moisés: Assim dirás aos 
filhos de Israel: O SENHOR, o Deus de vossos pais, o Deus 
de Abraão, o Deus de Isaque e o Deus de Jacó, me enviou a 
vós; este é meu nome eternamente, e este é meu memorial 
de geração em geração (ê x 3.13-15).
Javé estabeleceu um memorial ao seu nome, anunciado aqui, 
mas concretizado por ocasião da promulgação da lei, quando foi 
oficializado o concerto do Sinai (Êx 20.24). Aqui está a base do 
tetragrama YHWH. No texto hebraico, encontramos a frase ’ehyeh 
asher 'ehyeh;57 "EU SOU O QUE SOU". A substituição do “y ” de 
‘ehyeh pelo w do tetragrama vem de hãwãh,58 forma arcaica e 
sinônimo de hãyâh,59 "ser, estar, existir, tornar-se, acontecer", 
cuja primeira pessoa do imperfeito60 é ‘ehweh, e cuja terceira 
pessoa é yhweh.
Na poesia hebraica, usa-se com frequência a forma reduzida
I 5 6 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDAN ÇA
57 r p r t K i B x r r n K . ^ r n n . * > r r n .
60 O verbo hebraico apresenta-se somente em dois tempos: o dà ação ou do estado per­
feito, terminado, que é o perfeito, e o da ação ou do estado não terminado, imperfeito, 
o qual serve ao mesmo tempo como futuro. Assim, o imperfeito aqui não é o mesmo 
que em nossa língua.
NÃO TOMARÁS 0 N O M E DO SENHOR EM VÃO I 5 7
Yah. "Já é o seu nome; exultai diante dele" (Sl 68.4, TB).61 Isso 
pode explicar a presença da letra "a" no nome Yahweh. "Parece 
provável que a pronúncia original tenha sido YaHWeH, tanto por 
causa da forma verbal correspondente, o imperfeito de hãwãh, 
arcaicamente escrito yahweh, como de representações mais re­
centes desse nome em grego pelas palavras iaoue e iabe" (HAR- 
RIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 346).
A partir de 300 a.C. o nome Adonai passou gradualmente a 
ser mais usado que o tetragrama até que o nome Javé tornou- 
-se completamente impronunciável pelosjudeus. Para evitar a 
vulgarização do nome e para que a forma não fosse tomada em 
vão, eles pronunciavam por reverência ’ãdhonãy cada vez que 
encontravam o tetragrama no texto sagrado, na leitura da sina­
goga. Na Idade Média, os rabinos inseriram no tetragrama as 
vogais de adhonay (HARRIS; ARCHER, JR.; WALTKE, 1998, p. 347).
As vogais de 'HS ( adõnãy) são ( , = « ) ; ( = o) e (., = ã). Elas 
foram inseridas no tetragrama sagrado, resultando na seguinte 
forma: nin\ O resultado disso é a pronúncia "YeHoWaH". Mas os 
judeus ainda hoje pronunciam "Adonai" para lembrar na leitura 
bíblica na sinagoga que esse nome é inefável. Esse enxerto no 
tetragrama resultou no nome híbrido YEHOWAH, que a partir de 
1520 os reformadores difundiram como "Jeová". A forma híbrida 
"Jeová" não é bíblica, mas foi assim que o nome passou para a 
cultura ocidental; aos poucos, contudo, esse nome vem sendo 
substituído pela forma Iavé ou Javé.
Os nomes Adonai e Javé são tão sagrados para os judeus que 
eles evitam pronunciá-los na rua ou no cotidiano. O segundo nem
61 A forma reduzida de Yahweh é Yah. Esta palavra aparece ligada ao verbo hebraico bbn 
(hillêt), "louvar" (BAUMGARTNER, 2001, vol. I, p. 248). O imperativo, halelü, juntado
ao Yah, forma a palavra m_y?n; (haleluyah), ou, em grego, àUriXouía, (allêlouia), 
"louvai a Yah!"; portanto, "louvai ao SENHOR!" ou, ainda, "Louvai a YAHWEH! .
mesmo nas sinagogas é pronunciado, e no dia a dia eles chamam 
Deus de há-shêm,62 "o Nome" (Lv 24.11, TB; 2 Sm 6.2).
Nos manuscritos da Septuaginta, encontramos kyrios,63 "dono, 
senhor, o Senhor" (BALZ & SCHNEIDER, 2001, vol. I, p. 2437), no 
lugar de ’ãdõnã(y) e yhvh. Alguns fragmentos gregos de origem 
judaica apresentam o tetragrama, mas outros usam kyrios. Isso 
não é novidade. Jerônimo (347-420) "conhece a prática de, em 
manuscritos gregos, inserir o nome de Deus (Yahweh) com ca­
racteres hebraicos" (WÜRTHWEIN, 2013, p. 262). A Septuaginta, 
como tradução, foi submetida a revisões e recensões e, por isso, 
até hoje ninguém sabe qual foi exatamente o texto original ou 
o que foi alterado no transcorrer dos séculos. Uns afirmam que 
o nome kyrios é original: "Assim, no contexto de uma revisão 
arcaizante e hebraizante, o tetragrama parece ter sido inserido 
na tradução antiga no lugar de Kyrios" (op. cit., p. 262). Mas, para 
outros, é de origem cristã ou teria vindo dos judeus. O certo é que 
ambos foram usados desde a origem da tradução.
0 QUE SIGNIFICA TOMAR 0 NOME DE DEUS EM VÃO?
Há diversas interpretações sobre o terceiro mandamento 
do Decálogo. Tomar o nome de Deus em vão, em hebraico, 
lashshãw‘,64 "em vão" (êx 20.7; Dt 5.11), fala sobre a honra e a 
santificação do nome de Deus. O termo shaw ‘ aparece 52 vezes 
no Antigo Testamento e seu significado é vasto: "fraude, engano, 
inutilidade, inútil, imprestável, falsidade, desonestidade, futili­
dade, vacuidade". Seguem alguns exemplos: sem valor, "trazer 
ofertas vãs” (Is 1.13, ARA); sem resultado, "De nada adiantou cas­
tigar" (Jr 2.30, NVI); palavras vazias, falsas, "confiam na vaidade"
I 5 8 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
“ d ®n. 63 Kúpioç.
NÃO TOMARÁS 0 N O M E DO SENHOR EM VÃO I 5 9
(Is 59.4) ou "confiam no que é nulo" (ARA); informação falsa, falsa 
testemunha (Êx 23.1; Dt 5.20); além de "vaidade" ür 18.15), usado 
em relação aos ídolos.
Alguns expositores afirmam que o significado original dessa 
palavra era a magia: "É possível de se imaginar que também em 
Israel houve épocas de propensão a fazer uso do nome de Javé 
para fins de práticas obscuras e nocivas à comunidade" (RAD, 
2006, p. 181). No entanto, parece que o cerne deste mandamento 
é proibir o costume de juramento falso, pois o verdadeiro jura­
mento se fazia mediante a invocação do nome de Deus (Lv 19.12). 
Era uma necessidade imperiosa que todos falassem a verdade, 
como o dever de cada um honrar o compromisso assumido com 
os homens e diante de Deus.
É dever de todos cumprir os votos feitos a Deus; a lei é clara 
sobre essa responsabilidade (Nm 30.2; Dt 23.21). Essa exigência 
divina se faz necessária por causa da inclinação humana à men­
tira. Era grande a falsidade no relacionamento entre familiares 
e amigos. Ninguém podia confiar em ninguém, já que a falta de 
sinceridade era a marca do povo. Não era uma questão de desvio 
ocasional, mas de estilo de vida (Jr 9.2-5). Uma sociedade não 
pode viver numa decadência dessa; a vida se torna insuportável.
Mas as autoridades religiosas de Israel classificaram os jura­
mentos em duas categorias: os que podiam ser descumpridos e 
os que não podiam. Há uma lista deles em Mateus 5.33-37; 23.16- 
22. O Senhor Jesus reprovou com veemência essa violação dos 
escribas e fariseus. A interpretação rabínica da época permitia 
violar o terceiro mandamento e fazer de conta que ele não havia 
sido violado.
O terceiro mandamento é um apelo à santificação do nome 
de Deus. Na oração "Pai Nosso", Jesus nos ensinou a abrir a ora­
ção santificando o nome de Deus: "Santificado seja o teu nome
I 60 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA UMA SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
(Mt 6.9). Isso nada tem que ver com a pronúncia do nome Javé. Os 
teólogos das testemunhas de Jeová estão equivocados ao defen­
derem a doutrina da vindicação do nome Jeová, pois o tetragrama 
nem mesmo aparece no texto grego do Novo Testamento. Deus 
é absolutamente santo, sua santidade é infinita e inigualável; 
ele é santo em si mesmo, em sua essência e natureza. Assim, as 
palavras de Jesus estão fundamentadas no Antigo Testamento 
(Sl 30.4; 97.12; 111.9; Is 29.23; Ez 36.20-23). Tal atributo é a ca­
racterística prima de Javé, e isso expressava o pensamento do 
povo. O mandamento não visa tornar o nome de Deus santo, 
pois ele já é santo, mas significa reconhecer e reverenciar a Deus 
pelo que ele é. Não se trata de uma petição para que o povo em 
geral reconheça isso, mas para que expresse a reverência que a 
sua santidade exige (Lv 11.44; 19.2; 20.7; 1 Pe 1.16).
0 SABADO
O quarto mandam ento é uma ponte que liga 
os m andam entos teológicos com os m andam entos 
éticos. Os três primeiros preceitos do Decálogo di­
zem respeito à responsabilidade do hom em com o 
Criador; os demais falam sobre o com prom isso do 
homem com o seu próximo. A guarda do sábado 
fica entre esse dois grupos, pois a lei é clara em 
mostrar seu caráter social e humanitário e também 
sua função religiosa.
As controvérsias em torno deste mandamento se referem à 
sua interpretação. O que acontece é que existe o sábado insti­
tucional e o sábado legal, e quem não consegue separar estas 
duas instituições terminam radicalizando indo aos extremos. Esse 
é o principal problema dos sabatistas da atualidade, como os 
adventistas do sétimo dia. Todos os mandamentos do Decálogo 
dependem de definições e de como aplicá-los na vida diária, e 
essas instruções são dadas no próprio sistema mosaico. Mas as 
definições nem sempre são conclusivas. Por exemplo, o que a 
Bíblia define como trabalho? O mandamento de santificar o sá­
bado é mais bem compreendido quando se analisa o propósito 
pelo qual ele foi dado.
0 SÁBADO
O substantivo hebraico shabbat,6B "sábado", ou sábbaton,66 em 
grego, "sábado, semana", indica no calendário de Israel o sétimo 
dia da semana marcado pelo descanso do trabalho para cerimô­
nias religiosas especiais, além de significar um período de sete 
dias, uma semana (BAUER, 2000, p. 909). O termo shabbãtôn67 
significa "sabatismo, guarda ou observância do sábado", pois 
a desinência -ôn é característica de substantivo abstrato. Ele 
aparece no relato da criação: "E, havendo Deus acabado no dia 
sétimo a sua obra, que tinha feito, descansou no sétimo dia de 
toda a sua obra, que tinha feito. E abençoou Deus o dia sétimo e 
o santificou; porque nele descansou de toda a sua obra, que Deus 
criara e fizera" (Gn 2.2,3).
Deus celebrou o sétimo dia após a criação e abençoou este 
dia e o santificou. Gênesis é o livro das origens de todas as coisas:
I 6 2 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
65naç. 66 DáppaTOv. 67 ]inatç.
SANTIFICARÁS 0 SÁBADO I 6 3
dos céus e da terra, do homem e do pecado, do sacrifício e da 
promessa de redenção, do casamento, da família, das nações, das 
línguas, da nação de Israel, do sábado e da semana. O sábado e 
a semana tiveram a sua origem em Deus. A divisão hebdomadá­
ria do tempo aparece desde os dias pré-diluvianos e no período 
patriarcal (Gn 7.4, 10; 8.10, 12; 29.27, 28). Mas a semana na Me- 
sopotâmia seguia as fases da lua, por isso nem sempre o sábado 
coincidia com o sétimo dia. A semana dos egípcios era de dez dias.
Aqui está a base do sábado institucional e do sábado legal. 
Deus completou a sua obra da criação no sétimo dia. Duas vezes 
o texto sagrado declara que Deus "descansou" ou seja, cessou, 
esse é o significado do verbo hebraico usado aqui, shãbat,è& ces­
sar, desistir, descansar" (Gn 8.22; Jó 32.1; Ez 16.41). Descansar é 
sinônimo de cessar de criar. Esse repouso indica a obra concluída 
e não ociosidade, pois Deus não para nem se cansa (Is 40.28; Jo 
5.17). Ele continua sustentando todas as coisas pela palavra do 
seu poder (Hb 1.3). O Senhor Jesus também assentou-se à destra 
de Deus depois de concluir a obra da redenção (Hb 8.1; 10.12). A 
expressão "acabado no sétimo dia” parece indicar que houve mais 
alguma atividade de Deus na criação nesse dia. É o que pensam 
muitos expositores da atualidade. Deus terminou a sua obra no 
dia sexto: segundo a Septuaginta, en tê hêméra tê hektê,69 "no dia 
sexto", e também no Pentateuco Samaritano, bayyôm hashishi,7 
"no dia sexto". A Peshita segue também essa linha, mas tudo 
indica que se trata de alguma emenda deliberada. Segundo Um- 
berto Cassuto, um estudo cuidadoso desse versículo mostra que 
"sétimo dia" é a forma correta (1998, p. 61).
O substantivo hebraico shabbat, "o dia de sábado", não apa­
rece aqui; sua primeira ocorrência acontece no relato do maná
69 ’Ev tfl Tl^épQI TTj 6KTfl. DV3.
(Êx 16.23). Mas este termo vem da raiz do verbo "descansar", 
shãbat. Há quem afirme que essa omissão foi intencional por­
que o shãbat é o término da semana e há fortes evidências da 
identificação filológica do termo aqui com o acádico shabatu[m] 
ou shapattu, que aparece nas inscrições babilônicas como o dia 
da lua cheia. Trata-se do 15° dia de um mês lunar, dedicado à 
adoração do deus lua, Sin-Nanar e a outros deuses. Este dia se 
chamava também üm nüch libbi, "dia de descanso do coração" 
(ORR, vol. IV, 1996, p. 2630). Outros afirmam que se trata mais 
de um dia de expiação ou pacificação, e não necessariamente 
de um dia de descanso. No entanto, foram descobertos table­
tes em que revelam o shabatu, como os dias 7o, 14°, 21° e 28°, 
que segundo o registro dessas inscrições ocupavam espaço 
destacado no calendário mesopotâmio. Neles havia restrições 
a diversos tipos de trabalho, já que o dia era dedicado aos deu­
ses (TENNEY, vol. 5, 2008, p. 267). O sábado dos israelitas era 
o dia de descanso reservado a cada seis dias de trabalho para 
todo o povo; entretanto, o shabatu era computado com base 
nas quatro fases da lua.
Há muitas discussões sobre a relação do shabatum com o 
sábado dos israelitas, e Umberto Cassuto explica o que está por 
trás de tudo isso. Os críticos liberais insistem em afirmar que 
os israelitas copiaram o sábado dos mesopotâmios e com isso 
querem associar o sábado de Israel com as quatro fases da lua. 
Cassuto questiona a existência da proibição de trabalho nos 
dias 7o, 14o, 21o e 28o do mês do luna na Babilônia e na As­
síria. Segundo esse autor, o pensamento da Torá é justamente 
o oposto ao sistema babilônico e desvincula completamente o 
sábado da adoração aos astros: "O dia de sábado de Israel não 
será como o sábado das nações pagãs; não será o dia da lua 
cheia, ou outro dia conectado com as fases da lua, nem ligado,
I 6 4 ! OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
SANTIFICARÁS 0 SÁBADO I 6 5
em conseqüência, com a adoração da lua, mas será o sétimo 
dia" (1998, p. 68). É um sábado completamente desassociado 
de sinais nos céus, das hostes celestiais e de qualquer conceito 
astrológico, "mas o sétimo dia é o sábado do SENHOR teu Deus" 
(Êx 20.10). Assim, o propósito da omissão do termo hebraico 
shabbat, "sábado", no relato da criação é evitar sua identificação 
com o shabatu dos mesopotâmios.
O sétimo dia da criação não era mandamento, mas revela 
a necessidade natural do descanso de toda natureza, homem, 
animal, máquina, agricultura. O repouso noturno de cada dia não 
é suficiente para isso. Deus abençoou e santificou esse dia não 
somente para comemorar a obra da criação, mas para que nesse 
dia todos cessem o trabalho tendo em vista o descanso físico e 
mental e também o culto de adoração a Deus. É importante que 
todos os seres humanos possam refletir que o universo foi criado 
por um Deus pessoal, Todo-poderoso, sábio e transcendente, que 
planejou todas as coisas que foram criadas. Parece que esse dia 
foi logo esquecido pelo gênero humano, mas há resquício dele 
em muitos povos da antiguidade.
Deus abençoou e santificou o sétimo dia como um repouso 
contínuo, a dispensação da inocência, interrompido por causa 
do pecado. Agostinho de Hipona lembra que não houve tarde 
no dia sétimo, pois Deus o santificou para que ele permanecesse 
para sempre: "Ora o sétimo dia não tem crepúsculo. Não possui 
ocaso porque Vós o santificastes para permanecer eternamente" 
[Confissões, Livro XIII.36). Adão e Eva viveram esse repouso du­
rante a inocência até a Queda: "Foi o princípio e o tipo de repouso 
ao que a criação, depois que caiu da comunhão com Deus pelo 
pecado do homem, recebeu a promessa de que uma vez mais 
seria restaurada pela redenção, em sua consumação final" (KEIL 
& DELITZSCH, tomo 1, 2008, p. 41). O sábado da criação aponta
para o descanso de Deus para o mundo inteiro no fim dos tempos: 
"Portanto, resta ainda um repouso para o povo de Deus" (Hb 4.9).
O sábado legal não foi instituído aqui. Isso só aconteceu com 
a promulgação da lei. O sétimo dia é o fundamento da guarda 
do sábado dada aos israelitas, visto que este dia foi santificado 
desde o princípio do mundo. O sábado institucional é para toda 
a humanidade e por isso Deus o santificou antes de estabelecê- 
-lo como mandamento para Israel. "A santificação do sábado 
institui uma ordem para a humanidade segundo a qual o tempo 
é dividido em tempo e tempo sagrado... Por santificar o sétimo 
dia, Deus instituiu uma polaridade entre o dia a dia e o solene, 
entre dias de trabalho e dias de descanso, a qual deveria ser de­
terminante para a existência humana" (WESTERMANN, 1994, p. 
171). O sábado institucional não é necessariamente o sétimo dia 
da semana, mas um a cada seis dias.
0 QUARTO MANDAMENTO
A instituição do sábado legal no Decálogo tinha o propósito 
duplo, social e espiritual, de cessar os trabalhos a cada seis dias 
de labor para dar descanso aos seres humanos e aos animais e 
dedicar um dia inteiro para adoração a Deus:
8 Lembra-te do dia do sábado, para o santificar. 9 Seis 
dias trabalharás e farás toda a tua obra, 10 mas o sétimo dia 
é o sábado do SENHOR, teu Deus; não farás nenhuma obra, 
nem tu, nem o teu filho, nem a tua filha, nem o teu servo, 
nem a tua serva, nem o teu animal, nem o teu estrangeiro 
que está dentro das tuas portas. 11 Porque em seis dias fez 
o SENHOR os céus e a terra, o mar e tudo que neles há e 
ao sétimo dia descansou; portanto, abençoou o SENHOR
o dia do sábado e o santificou (Êx 20.8-11).
I 6 6 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDAN ÇA
SANTIFICARÁS 0 SÁBADO I 6 7
O quarto mandamento é o mais longo do Decálogoe difere dos 
três primeiros, cuja formulação é negativa. O versículo 8 introduz o 
mandamento positivo que impõe a obrigação de santificar o sába­
do, e o versículo 9 fala sobre a obrigação de trabalhar seis dias. Isso 
se repete no sistema mosaico (Êx23.12; 31.13-17; 34.21; Lv 23.3), 
mas aqui aparece também a formulação negativa. Quando Moisés 
no seu discurso em Deuteronômio repete o Decálogo substitui o 
verbo hebraico usado para "lembrar" zãchor,n "recordar, lembrar", 
por outro, "guardar", shãmôr,72 "guardar, cuidar, vigiar", quando 
diz: "Guarda o dia de sábado" (Dt 5.12). Os dois verbos estão no 
infinitivo absoluto, que tem função de um forte imperativo, bas­
tante comum em leis e mais próximo de um futuro cominatório, 
ameaçador. O propósito do uso deste verbo "lembrar" aqui em 
Êxodo é manter o sábado como dia santo. Isso mostra que o povo 
já conhecia esse dia, mas parece que a sua observância não era 
levada a sério antes da revelação do Sinai. As palavras "como te 
ordenou o SENHOR, teu Deus" (Dt 5.12b) não aparecem em Êxodo 
e são uma referência ao Sinai, quando a lei foi promulgada, visto 
que Moisés está relatando um fato acontecido no passado.
Fica evidente que houve um sábado antes da promulgação da 
lei. Muitos acreditam que o verbo "lembrar" se refere ao relato do 
maná no deserto (Êx 16.22-30). Isto fica claro pelo fato de que "a 
maneira incidental em que a matéria é introduzida e a repreensão 
do Senhor pela desobediência do povo sugerem que o sábado já 
era previamente conhecido" (TENNEY, vol. 5, 2008, p. 267). No 
entanto, segundo o rabino Benno Jacob, "lembrar" aqui não tem 
conotação de "não esquecer", como aconteceu com o evento do 
maná, mas de um "memorial do passado para estabelecer um 
relacionamento especial para o futuro" (1992, p. 563).
711Í3T. 72 ninai.
O livro de Gênesis não menciona os patriarcas Abraão, Isaque 
e Jacó observando o sábado. Segundo Justino, o Mártir, Abraão e 
seus descendentes até o Sinai agradaram a Deus sem o sábado 
(Diálogo com Trifão 19.5). Irineu de Lião diz que Abraão, "sem 
circuncisão e sem observância do*sábado, acreditou em Deus e 
lhe foi imputado a justiça e foi chamado amigo de Deus" (Contra 
as Heresias, Livro IV, 16.2). O sábado institucional não era man­
damento nem havia imposição sobre a sua observância; talvez, 
seja essa a razão de aos poucos ter caído no esquecimento. A 
linguagem do quarto mandamento "Lembra-te do dia de sábado" 
(Êx 20.8) reforça a ideia de que não se trata de uma instituição 
nova, mas existente desde a criação.
O mandamento consiste em parar de trabalhar a cada seis 
dias e é extensivo a todos os israelitas, seus familiares e também 
servos, animais de carga, convidados, imigrantes estrangeiros e 
qualquer um que esteja dentro de seus portões (v. 10). Mas aqui 
se omite uma informação que aparece em Deuteronômio e revela 
o aspecto humanitário do mandamento: "para que o teu servo e a 
tua serva descansem como tu" (Dt 5.14b). Em Êxodo, é revelado 
o caráter espiritual, pois se mostra que a lei do sábado deriva da 
criação e se refere ao sétimo dia em que Deus descansou (v. 11). 
O sábado do Decálogo é semanal e uma amostra do descanso 
eterno de Deus (Sl 95.11; Hb 4.3-6).
O sábado legal é exclusividade dos israelitas e nenhum povo da 
terra recebeu tal responsabilidade, nem mesmo a Igreja (Êx 31.13- 
17). A adoração no tabemáculo acontecia semanalmente e isso 
justifica a instrução da lei do sábado na presente seção que aborda a 
ordem do culto e demais serviços no tabemáculo. O tema do sábado 
havia sido tratado por ocasião do maná (Êx 16.23-30) e no quarto 
mandamento (Êx 20.8-11); no entanto, Javé retoma o assunto aqui 
para que o presente preceito seja observado de maneira apropriada.
I 6 8 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
SANTIFICARÁS 0 SÁBADO I 6 9
A observância do sábado legal é perpétua, sob pena de morte 
para quem violar (vv. 14-6) e isso por se tratar de um sinal entre 
Javé e Israel (Êx 31.13, 17). Não é mandamento para todos os 
povos nem para a Igreja. É o segundo sinal para os israelitas, 
que já tinham a circuncisão como primeiro sinal desse concerto 
(Gn 17.10-14). Ao longo dos séculos, os judeus trataram esses 
dois preceitos com a mesma atenção. O Decálogo registrado em 
Deuteronômio apresenta o sábado como memorial da saída dos 
israelitas do Egito: "Porque te lembrarás que foste servo na terra 
do Egito e que o SENHOR, teu Deus, te tirou dali com mão forte 
e braço estendido; pelo que o SENHOR, teu Deus, te ordenou que 
guardasses o dia de sábado" (Dt 5.15). O sábado legal é manda­
mento exclusivo para o povo de Israel.
0 SÁBADO NO NOVO TESTAMENTO
A observância do sábado nos dias do ministério terreno de 
Jesus havia se tornado externa e formal. As autoridades religiosas 
de Israel haviam criado muitas restrições e estabeleceram regras 
meticulosas. A Mishnah, antiga literatura religiosa dos judeus, 
nos tratados Shabbat e Erub, registra minúcias de como o sábado 
deve ser observado. A tradição dos anciãos criou 39 proibições 
concernentes ao sábado. Por essa razão, o Senhor Jesus entrou 
diversas vezes em conflito com os escribas e fariseus. Uma delas 
aconteceu quando ele defende os seus discípulos por colherem 
espigas no sábado (Mt 12.1-5).
1 Naquele tempo, passou Jesus pelas searas, em um 
sábado; e os seus discípulos, tendo fome, começaram 
a colher espigas e a comer. 2 E os fariseus, vendo isso, 
disseram-lhe: Eis que os teus discípulos fazem o que não é
lícito fazer num sábado. 3 Ele, porém, lhes disse: Não tendes 
lido o que fez Davi, quando teve fome, ele e os que com 
ele estavam? 4 Como entrou na Casa de Deus e comeu os 
pães da proposição, que não lhe era lícito comer, nem aos 
que com ele estavam, mas só aos sacerdotes? (Mt 12.1-4).
A passagem paralela aparece em Marcos 2.23-26 e Lucas 
6.1-4. Em todas elas, o Senhor Jesus mencionou um trecho do 
Antigo Testamento em que Davi comeu o pão da proposição na 
casa do sacerdote Abiatar, quando estava sob a perseguição de 
Saul (1 Sm 21.6). Assim, ele colocou a guarda do sábado na mes­
ma categoria do preceito cerimonial. A lei proibia que estranhos 
comessem do pão sagrado da proposição, o qual era restrito aos 
sacerdotes (Êx 29.33; Lv 22.10). Jesus foi além e disse que os 
sacerdotes no templo podiam violar o sábado e ficar sem culpa 
(Mt 12.5). Um mandamento moral é obrigatório por sua própria 
natureza. Não existe concessão para preceitos morais; aqui, a 
vida está acima do sábado.
Em outra ocasião, o Senhor Jesus torna a considerar o sábado 
um preceito cerimonial com base na própria lei de Moisés. Ele nem 
precisou reivindicar a sua autoridade de Filho de Deus e Messias, 
ao lembrar às autoridades religiosas que a circuncisão de uma 
criança pode ser feita num dia de sábado. A lei prescreve que o 
menino deve ser circuncidado no oitavo dia de seu nascimento 
(Lv 12.3). Jesus disse que a circuncisão pode ser feita mesmo 
quando o oitavo dia coincide com sábado (Jo 7.22, 23).
Jesus declarou: "O sábado foi feito por causa do homem, e 
não o homem, por causa do sábado" (Mc 2.27). Muitos compa­
ram essas palavras a uma frase do Talmude creditada ao rabi 
Simeon ben Menasya, cerca de 180 d.C.: "O sábado foi dado a 
vocês, não vocês entregues a ele". A interpretação judaica diz
7 0 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
SANTIFICARÁS 0 SÁBADO I 7 1
respeito à permissão da quebra do sábado em casos especiais, 
como a vida em perigo. Mas o que Jesus disse significa que os 
seres humanos não foram criados para observar o sábado, mas 
que o sábado foi criado para o benefício humano. Ele não disse 
que o sábado foi feito por causa dos judeus ou de Israel, mas por 
causa de todos os seres humanos. O sábado legal, do Decálogo, 
foi dado a Israel como sinal entre Javé e os israelitas (Êx 31.13,17; Dt 5.15; Ez 20.12). Aqui, o Senhor Jesus se refere ao sábado 
institucional que Deus estabeleceu para o bem-estar e gozo 
de todos os seres humanos, e isto está acima de observância 
meticulosa do sábado.
A frase "Assim, o Filho do Homem até do sábado é senhor" 
(Mc 2.28) e as passagens paralelas (Mt 12.8; Lc 6.5) são disputadas 
pelos expositores do Novo Testamento. Há duas linhas principais 
de interpretação: a) a autoridade sobre o sábado foi conferida aos 
seres humanos, e b) trata-se do próprio Senhor Jesus. A primeira 
nos parece menos aceitável porque Deus nunca delegou autori­
dade sem limites aos humanos e, também, porque a expressão 
grega ho huios tou anthrõpos,73 "o Filho do Homem", no singular, 
é título messiânico e não relativo a humanos. Está claro que 
Jesus se referia a si mesmo. Esta é a melhor interpretação. Ele 
revelou seu poder e sua autoridade sobre as enfermidades, sobre 
a natureza, sobre todos os poderes das trevas, sobre a morte e o 
inferno; assim, nada mais natural ser mesmo o Senhor do sába­
do. O sábado veio de Javé e somente ele tem autoridade sobre a 
instituição. Então, não há outro no universo investido de tamanha 
autoridade, senão o Filho de Deus.
Mais uma vez, o Senhor Jesus Cristo apresenta o profeta 
Oseias como autoridade para fundamentar seu ensino (Mt 12.7;
73 ' O u l ò ç TOÜ ávG pÚ lT O U .
Os 6,6). Ele acrescentou ainda que é "lícito fazer bem nos sába­
dos" (Mt 12.12). Isso o próprio Jesus o fez (Mc 3.1-5; Lc 13.10- 
13; 14.1-6; Jo 5.8-18; 9.6, 7, 16), e nós também devemos fazer 
o bem, não importa qual seja o dia da semana. Como o sábado 
do relato da criação, não é regra legal opressiva; é chamado de 
sábado institucional que se transferiu para o domingo por causa 
da ressurreição de Jesus, mas não como mandamento.
Assim, como nada há no Novo Testamento que indique a 
sua observância, isso por si só mostra que o quarto mandamen­
to não é um preceito moral. Esta interpretação é corroborada 
pelo fato de nem Jesus nem os apóstolos ensinarem a guarda 
do sábado. O sábado não foi mencionado quando Jesus citou 
os mandamentos para o moço rico (Mt 19.17-19). Toda a lei 
se resume no amor a Deus e ao próximo (Mt 7.12; 22.40; Mc 
12.31; Rm 13.10).
O apóstolo Paulo omitiu o quarto mandamento (Rm 13.9). 
Ele considerava retrocesso espiritual guardar dias, meses e anos 
(G1 4.10, 11). Os primeiros cristãos eram judeus de origem e era 
natural para eles observar os serviços da sinagoga; ainda hoje, 
muitos judeus que são convertidos à fé cristã preferem não 
abrir mão de sua identidade judaica, principalmente aqueles 
que residem em Israel. É mais uma questão cultural. Paulo via 
o sábado e os preceitos dietéticos, o kashrut, como mera op­
ção pessoal. E, mesmo não havendo prova de que o apóstolo 
distinguisse preceitos morais e cerimoniais, aqui ele coloca o 
sábado e o kashrut na mesma categoria (Rm 14.1-6). Segundo 
Paulo, o antigo concerto foi abolido (2 Co 3.7-14) , incluindo o 
sábado (Os 2.11). De fato, isso já era anunciado desde o Antigo 
Testamento (Jr 31.31-34).
Paulo disse que Jesus riscou na cruz "a cédula que era contra 
nós nas suas ordenanças" (Cl 2.14). O substantivo grego para
I 7 2 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDAN ÇA
SANTIFICARÁS 0 SÁBADO I 7 3
"cédula" é cheirgraphon,74 um hapax legomenon,75 literalmente, 
"escrito à mão”. É um documento escrito à mão usado aqui me­
taforicamente. O termo aparece na literatura grega extrabíblica 
com vários significados: "lei mosaica, obrigação escrita, contrato 
(ROBINSON, 2012, p. 984); "registro de uma conta financeira, 
conta, registro de dívida" (LOUW & NIDA, 2013, pp. 352, 353). É 
um certificado de dívida, uma nota promissória. A ordenança, ou 
dogma16, significa "decreto, ordenança, edito", um termo usado 
também em referencia à lei de Moisés (Ef 2.15). É esse o sentido 
aqui, pois Jesus disse que a lei nos acusa (Jo 5.45). O pensamento 
paulino revela o aspecto condenatório da lei mosaica (Dt 27.26; 1 
Co 15.56; Gl 3.10) e também o padrão divino para a vida humana 
(Rm 7.13, 14).
A acusação da lei contra nós foi cancelada na cruz do Calvá­
rio, e aí o apóstolo inclui o sábado. O apóstolo emprega os dois 
termos "cédula" e "ordenança" metaforicamente para dizer que 
fomos perdoados e estamos livres de legalismo: "Portanto, nin­
guém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou por causa dos dias 
de festa, ou da lua nova, ou dos sábados, que são sombras das 
coisas futuras, mas o corpo é de Cristo" (Cl 2.16, 17). Com exce­
ção do sangue (At 15.20, 28), as restrições dietéticas de Levítico 
foram removidas, pois Deus purificou os animais cerimonialmente 
imundos (At 10.12 -15). Nenhum alimento é imundo por si mesmo 
(Rm 14.14, 20; 1 Tm 4.3, 4). O que contamina o ser humano é o 
que sai dele, não o que entra (Mt 15.11-20).
O sábado cerimonial é um termo para designar os festivais 
de Israel que englobam as festas anuais, mensais e semanais
74 Xeipóypaij)oy.
75 Hapax legomenon: termo técnico usado para as palavras que aparecem uma so vez 
no Antigo ou no Novo Testamento.
76 ôóynoc.
(1 Cr 23.31; 2 Cr 2.4; 8.13; 31.3; Ez 45.17). O sábado cerimonial 
já está incluído na expressão "dias de festa". Assim, a "lua nova", 
refere-se à festa mensal e a expressão "dos sábados" diz respeito 
aos sábados semanais. O novo concerto nos isenta de todas essas 
coisas. Paulo parece empregar uma linguagem platônica no tocante 
ao mundo real e ao mundo das ideias no v. 17. A sombra é tempo­
rária e identifica com imperfeição o objeto que a projetou, sendo 
portanto inferior a ele. O apóstolo afirma nesta metáfora que a lei 
é uma projeção, uma sombra da realidade, que é o corpo de Cristo.
0 SÁBADO CRISTÃO
O sábado legal do Decálogo foi estabelecido para Israel se 
lembrar da escravidão no Egito (Dt 5.15). Há certa analogia 
com o sábado cristão, o domingo, que, sem precisar de impo­
sição legal, passou a ser o dia de adoração cristã coletiva em 
memória à ressurreição de Cristo que ocorreu num domingo 
(Mc 16.1-6; Lc24.1-6). Éosábado institucional. Isso está claro 
em três passagens do Novo Testamento: "No primeiro dia da 
semana, ajuntando os discípulos para o partir do pão" (At 20.7). 
Era um domingo, "talvez 24 de abril de 57 d.C.", segundo F. F. 
Bruce (apud STOTT, 1994, p. 360). O "partir do pão" é um termo 
usado para a Ceia do Senhor (At 2.42; 1 Co 10.16; 11.20-26). 
Segundo o autor citado, essa passagem "é a evidência inequí­
voca mais primitiva que temos da prática cristã de reunir-se 
para a adoração nesse dia". Isso se confirma mais adiante no 
Novo Testamento: "No primeiro dia da semana, cada um de 
vós ponha de parte o que puder ajuntar, conforme a sua pros­
peridade, para que se não façam as coletas quando eu chegar" 
(1 Co 16.2). Temos aqui outra prova de que o primeiro dia da 
semana era o dia de culto regular. O apóstolo recomendou
I 7 4 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA UM A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
S A N m C A R Á S O SÁBADO \ 7 5
que nessas reuniões se levantasse uma coleta para socorrer 
os irmãos pobres de Jerusalém.
O apóstolo João foi arrebatado no dia do Senhor: Eu fui 
arrebatado em espírito, no dia do Senhor, e ouvi detrás de mim 
uma grande voz, como de trombeta" (Ap 1.10). A expressão dia 
do Senhor" não é escatológica, pois a construção grega aqui, 
en tê kyriakê hêmera, 7 7 se refere ao domingo. Versões católicas 
como Figueiredo, Matos Soares e a Bíblia do Peregrino empre­
gam "num dia de domingo" para traduzir a referida frase. Esta 
tradução é aceitável porque está de acordo com o contexto
bíblico e histórico.
A palavra kyriakê significa "domingo" ainda hoje na Grécia. 
O termo "domingo", literalmente quer dizer, "dia do senhor , do 
latim, dominus, "senhor", e dies, "dia". Inácio de Antioquia usa a 
mesma frase grega do apóstolo João em Apocalipse, para indicar 
o primeiro dia dasemana: "Aqueles que viviam na antiga ordem 
de coisas chegaram à nova esperança, e não observam mais o 
sábado, mas o dia do Senhor™ em que a nossa vida se levantou 
por meio dele e da sua morte" (Magnésios 9-1, Coleção Patrística 1, 
Padres Apostólicos). Inácio foi o terceiro bispo de Antioquia e 
conheceu os apóstolos Paulo e João. Preso em 110 no reinado de 
Trajano, foi levado a Roma e atirado às feras. Trata-se de alguém 
da segunda geração dos apóstolos.
Outra razão que confirma essa interpretação é o fato de a 
Septuaginta usar uma forma diferente para o "dia do Senhor 
escatológico, hêmera tou kyriou ou hêmera kyriou.79 E o mesmo 
acontece nas cinco vezes que a frase aparece no Novo Testamento 
grego (At 2.20; 1 Co 5.5; 2 Co 1.14; 1 Ts 5.2; 2 Pe 3.10).
77’E v rfj K u p ia K Íj r^ e p ç . ̂ 78 G rifo n o s so .
79'H n e p a t o ü icup íou o u rinépa Kupíoi).
I 76 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA UMA SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
Os primeiros pais da Igreja mostram que nos três primeiros 
séculos da história da Igreja o domingo continuava sendo o dia 
de reunião dos cristãos. Além de Inácio de Antioquia, isso pode 
ser ainda visto na Epístola de Barnabé (que não era o Barnabé 
citado do Novo Testamento). Trata-se de um documento da pri­
meira metade do século 2, que declara: "Eis por que celebramos 
como festa alegre o oitavo dia, no qual Jesus ressuscitou dos 
mortos e, depois de se manifestar, subiu aos céus" (Epístola de 
Barnabé, 15.9).
Herdamos dos dias apostólicos essa prática que foi perpe­
tuada pelo tempo. Os preceitos cerimoniais não desobrigam os 
seres humanos de cultuarem a Deus, mas estes não precisam de 
rituais e nem lhes é exigido irem a Jerusalém. Da mesma forma, 
o sábado não precisa ser o sétimo dia da semana. Os adventistas 
do sétimo estão equivocados quando afirmam que o imperador 
Constantino substituiu o sábado pelo domingo, e sua doutrina 
não tem sustentação bíblica. É um erro teológico e histórico.
v
PAI E MÃE
O m andam ento "Honra a teu pai e a tua m ãe" 
(Êx 20.12) se referia originalmente aos pais numa 
estrutura familiar, m as com o desenvolvimento da 
revelação se torna claro que se refere também aos 
pais espirituais e às autoridades constituídas. O 
preceito instrui no tocante ao nosso relacionamento 
com os superiores segundo idade, hierarquia social 
e espiritual, e conhecimento. O mundo está hoje 
às avessas, e o quinto m andam ento nunca foi tão 
necessário quanto é agora no século 21.
Oito dos dez mandamentos do Decálogo são proibições cuja 
formulação é negativa, e dois são positivos: o quarto e o quinto 
mandamentos.
O quinto mandamento fala sobre o princípio da autoridade, a 
estrutura familiar e a necessidade da organização social. Os pais 
são os representantes de Deus na família. Eles geram os filhos 
e são responsáveis por seu bem-estar, sustento, alimentação, 
vestimentas, saúde, educação e segurança. Essa manifestação de 
afeto e carinho acontece de maneira natural e ao mesmo tempo 
misteriosa. É a melhor e a mais perfeita maneira de ilustrar e 
explicar o grande amor de Deus pelo ser humano. Os filhos lhes 
devem respeito, honra, obediência e amor.
Todos os seres humanos prestam conta de seus atos a alguém, 
todos estão sobre e sob autoridade. O próprio Senhor Jesus Cristo, 
a maior autoridade no céu e na terra, disse: "Porque não busco a 
minha vontade, mas a vontade do Pai, que me enviou" (Jo 5.30); 
"Porque eu desci do céu não para fazer a minha vontade, mas 
a vontade daquele que me enviou" (Jo 6.38). Quem não quer se 
submeter às autoridades está alinhado com o diabo. O anticristo 
pretende fazer a sua própria vontade sem se submeter a ninguém 
(Dn 8.24; 11.3, 17, 28).
HONRA A TEU PAI E A TUA MÃE
O quinto mandamento é construído de forma positiva: "Hon­
ra a teu pai e a tua mãe, para que se prolonguem os teus dias 
na terra que o SENHOR, teu Deus, te dá" (Êx 20.12). O preceito 
começa com o verbo no imperativo intensivo kabbêd,80 "honra", 
do verbo kãbêd,81 "ser pesado, rico, honrado, glorioso". A cons-
I 7 8 I OS DEZ M A N DA M ENTO S - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDAN ÇA
80 na?. 81133.** T
HONRARÁS PAI E M Ã E I 7 9
trução intensiva hebraica traz a nuança de curvar-se em honra 
ou respeito. A segunda parte esclarece e especifica o significado 
do mandamento, que aparece de forma expandida em Deutero- 
nômio: "Honra a teu pai e a tua mãe, como o SENHOR, teu Deus, 
te ordenou, para que se prolonguem os teus dias e para que te 
vá bem na terra que te dá o SENHOR, teu Deus" (Dt 5.16). Esta 
forma diferenciada será analisada mais adiante.
A raiz do verbo kãbêd aparece em todas as línguas semíticas, 
com exceção do aramaico. O significado é de "ser pesado", com 
o sentido figurado de ser importante. O adjetivo derivado desse 
termo aparece duas vezes no Antigo Testamento com sentido 
literal para designar o peso do sacerdote Eli e o peso do cabelo 
de Absalão, filho de Davi (1 Sm 4.18; 2 Sm 14.26). A Septuaginta 
traduz esse verbo por diversos termos gregos que não é possível 
enumerar aqui, mas entre eles podem ser destacados doxazõ,82 "ser 
de opinião, pensar, honrar, glorificar", e seus derivados; e timaõ,83 
"dar valor a, considerar digno, estimar, honrar, reverenciar", e 
seus derivados. Em ambos os verbos e seus respectivos derivados, 
como doxa e timê,m "glória" e "honra", o peso é figurado. Uma 
pessoa de peso significava alguém honrado, digno, importante, 
respeitado (Nm 22.15). Esses termos hebraico e grego lançam luz 
sobre a abrangência do quinto mandamento. A Bíblia aplica-os a 
Deus (Sl 79.9; Is 40.5), que é "o rei da glória" (Sl 24.7-10), mesmo 
título dado ao Senhor Jesus Cristo no Novo Testamento (1 Co 2.8).
Não existe na vida alguém mais importante para o filho do que 
o pai e a mãe; eles são seus heróis. Esse relacionamento é análogo 
ao de Javé com o seu povo Israel (Dt 1.31). O profeta Malaquias 
apresenta uma analogia ainda mais profunda comparando o dever 
do homem honrar a Deus com o do filho de honrar o pai (Ml 1.6).
82 AoÇáÇco. 83 TL|i.áw. 84 AóÇa e TLjj.tí.
Há certo vínculo entre o quinto mandamento e os três pri­
meiros pela natureza desse relacionamento. O termo "a teu 
pai e a tua mãe" é amplo: certamente diz respeito aos nossos 
genitores, àqueles que nos geraram, mas não fica apenas nisso. 
O mandamento se refere também aos pais espirituais. É como 
Eliseu se dirigia ao profeta Elias: "Meu pai, meu pai, carros 
de Israel e seus cavaleiros!" (2 Rs 2.12). Isso aponta para um 
relacionamento íntimo entre o profeta e o discípulo que jus­
tifica uma linguagem familiar. Era uma maneira honrosa de 
tratar o mestre. O rei de Israel também se dirigiu ao profeta 
Eliseu com as mesmas palavras (2 Rs 13.14). Era algo atípico 
para um rei; no entanto, revela o reconhecimento por parte 
do rei Jeoás quanto à autoridade profética de Eliseu, que se 
encontrava moribundo. O profeta representava uma segurança 
para a nação. O relacionamento entre o rei e o profeta era de 
intimidade. Esse tipo de relacionamento entre Elias e Eliseu é 
visto também no Novo Testamento, pois Timóteo e Tito são 
reconhecidos também como filhos na fé do apóstolo Paulo 
(1 Tm 1.2; 2.1; Tt 1.4). Esses exemplos nos ensinam a amar, 
respeitar e honrar aqueles a quem Deus constituiu autoridade 
espiritual sobre nossa vida.
O quinto mandamento se aplica também ao relacionamento 
secular, pois a figura do governante se assemelha à de um pai. 
Débora se considera mãe de Israel (Jz 5.7). O respeito e a honra 
se devem também a quem se destaca pelo conhecimento em 
qualquer área. Embora Faraó fosse a maior autoridade no Egito, 
ele honrou e respeitou um escravo hebreu simplesmente porque 
este tinha o conhecimento da vontade de Deus: "senão Deus, 
que me tem posto por pai de Faraó, e por senhor de toda a sua 
casa" (Gn 45.8). O rei do Egito nos dá o exemplo mesmo séculosantes da promulgação da lei. Isso deve servir como exemplo
I 8 0 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTA»NTE MUDANÇA
hoje nas igrejas. Esse respeito e essa consideração não se res­
tringem apenas aos membros da Igreja e a seu pastor, mas vale 
também entre os próprios pares e companheiros de ministério. 
A hierarquia, portanto, é esta: Deus, os pais e as autoridades 
eclesiásticas e civis.
Os judeus colocam o quinto mandamento como dever do 
homem para com Deus. Os mandamentos de caráter vertical, do 
compromisso do israelita com Deus, de amar a Deus acima de 
todas as coisas, de acordo com o ensino de Jesus, são teológicos 
e estão registrados na primeira tábua; os outros são de caráter 
horizontal, são preceitos éticos que constam da segunda tábua, 
resumidos no segundo mandamento de amar o próximo como 
a si mesmo. Esta é a interpretação judaica. Esta linha de pensa­
mento mostra a relevância de honrar os pais, os quais são repre­
sentantes de Deus. Honrar pai e mãe ocupa um lugar de elevada 
consideração na lei porque a autoridade deles foi delegada por 
Deus. Desobedecer a eles, portanto, é desobedecer a Deus, pois 
eles estão investidos de autoridade sobre a vida e receberam a 
responsabilidade do bem-estar dos filhos.
O apóstolo Paulo ensina obedecer aos pais e explica, "porque 
isto é justo" (Ef 6.1). Ele está falando a respeito de uma lei natural 
que existe desde o princípio do mundo. Deus já havia colocado 
a sua lei no coração de todos os homens, mesmo antes de se 
revelar a Moisés no Sinai (Rm 1.19; 2.14, 15). Essa prática existe 
em todas as civilizações antes e depois de Moisés. Todos esses 
povos já reconheciam a importância de obedecer e respeitar aos 
pais como fundamento para uma sociedade estável. Sua inobser­
vância sinaliza a decadência da estrutura social. Infelizmente, o 
que se vê na atualidade é inversão desses valores; os pais estão 
perdendo o direito de opinar e decidir sobre a vida dos filhos 
adolescentes por imposição até do Estado.
HONRARÁS PAI E M ÃE I 8 1 I
O mandamento de honrar pai e mãe não se restringe à infân­
cia e adolescência. Em nenhum lugar, a Bíblia ensina ser essa 
ordem somente para esta fase da vida. Quando o moço e a moça 
chegam à maioridade ou mesmo se casam, seus pais continu­
am sendo seus pais, e os filhos devem honrá-los e respeitá-los 
enquanto eles viverem. O apóstolo Paulo fala sobre a família e 
sobre a submissão da mulher ao marido (Ef 5.22ss). Isso faz al­
guns pensarem que a obediência dos filhos aos pais é um discurso 
dirigido apenas aos filhos menores. Mas tal linha de pensamento 
não se sustenta nem no Antigo Testamento nem no pensamen­
to paulino aqui analisado. O texto traz o termo grego tekna,ss 
"filhos", plural de teknon86. A ideia é de "descendente imediato 
ou direto de alguém, sem referência específica a sexo ou idade" 
(LOUW & NIDA, 2013, p. 106). Das cinco ocorrências do termo 
em Efésios, o contexto mostra que pelo menos três delas dizem 
respeito de forma inconfundível a adultos: "filhos da ira" (2.3); "fi­
lhos amados" (5.1); "filhos da luz" (5.8). Apenas uma delas sugere 
criança ou adolescente (6.4). Em 6.1, o termo parece ambíguo, 
mas seria precipitação aplicar esse ensino apenas a crianças e 
adolescentes. O verbo "obedecer" está na voz ativa, mostrando 
que se trata de pessoas moralmente livres para assumirem uma 
responsabilidade diante de Deus. Todas as pessoas vivem sob e 
sobre autoridade; ninguém escapa dessa responsabilidade. Jesus 
disse: "Porque eu desci do céu não para fazer a minha vontade, 
mas a vontade daquele que me enviou" (Jo 6.38). Se aquele que 
é a maior autoridade no céu e na terra faz uma declaração como 
essa, o que não diremos nós?
Honrar pai e mãe é muito abrangente e envolve cuidar dos 
pais, principalmente na velhice: "Ouve a teu pai, que te gerou, e
I 8 2 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
85 TéKva. 86 T 6KVOV.
HONRARÁS PAI E M ÃE I 8 3
não desprezes a tua mãe, quando vier a envelhecer” (Pv 23.22). O 
termo "filho meu", frequentemente empregado em Provérbios, em 
geral se aponta para o aconselhamento de um mestre a seus dis­
cípulos, mas aqui ambos são mencionados, pai e mãe, referindo- 
-se, portanto, aos pais naturais. O quinto mandamento vai além 
do sustento dos pais na velhice. É dever dos filhos proteger os 
pais, a sanção da lei é dura contra os que descumprem o quinto 
mandamento: "O que ferir a seu pai ou a sua mãe certamente 
morrerá... E quem amaldiçoar a seu pai ou a sua mãe certamente 
morrerá" (Êx 21.15, 17). O v. 15 fala sobre violência fisica, e o v. 
17, que é reiterado mais adiante de forma expandida (Lv 20.9), 
vai além do desprezo e do abandono. Amaldiçoar aqui significa 
depreciar e repudiar a autoridade dos pais. Além da agressão e 
do menosprezo em relação aos progenitores, a lei estabelecia a 
pena capital para o filho desobediente, o rebelde contumaz (Dt 
21.18-21). Qualquer atitude de desonra era um grave insulto, e 
a punição da lei era a mesma para ambos os casos: agressão 
física e moral, violência e desrespeito. Por isso, a lei impõe res­
peito e honra aos pais (Êx 20.12; Dt 5.16). Desonrar a pai e mãe 
é desonrar a Deus.
A PROMESSA DIVINA
Originalmente, este mandamento era exclusividade de Israel, 
pois menciona a herança da terra de Canaã. A segunda parte do 
quinto mandamento traz a promessa divina de vida longa aos 
que honrarem aos pais: "para que se prolonguem os teus dias na 
terra que o SENHOR, teu Deus, te dá" (Êx 20.12). Deuteronômio 
diz a mesma coisa, mas de forma ampliada: "como o SENHOR, 
teu Deus, te ordenou, para que se prolonguem os teus dias e para 
que te vá bem na terra que te dá o SENHOR, teu Deus" (Dt 5.16).
A frase "como o SENHOR, teu Deus, te ordenou" mostra que 
Moisés está se referindo à revelação no Sinai que ocorreu cerca 
de 40 anos antes. Em seguida, vem a dupla promessa de vida 
longa e sucesso na terra prometida. Essa promessa é específica e 
indica que o quinto mandamento originalmente se restringia aos 
israelitas durante o tempo da teocracia. Isso está claro e explícito 
no texto, que afirma que tais bênçãos hão de vir "na terra que te 
dá o SENHOR, teu Deus", uma referência inequívoca à terra dos 
cananeus, a Terra Prometida. Fazia parte do concerto a segurança 
e o bem-estar da nação, a longevidade e o sucesso (Dt 5.33; 6.2, 
3; 22.7). Essas bênçãos são as mesmas que se tornaram promes­
sa padrão para quem amar a Javé e permanecer no concerto do 
Sinai (Lv 26.3-13; Dt 7.12-16; 28.1-14). E a promessa reaparece 
no período do reinado de Salomão (1 Rs 3.14).
Como Israel violou o concerto do Sinai, o profeta Jeremias 
anunciou a vinda de um novo concerto (Jr 31.31-34). Deus 
cumpriu a promessa (Hb 8.8-12). Isso muda muita coisa. O 
apóstolo Paulo deliberadamente combina as palavras do quinto 
mandamento nos textos do Decálogo, Êxodo e Deuteronômio: 
"Honra a teu pai e a tua mãe, que é o primeiro mandamento 
com promessa, para que te vá bem, e vivas muito tempo sobre 
a terra" (Ef 6.2, 3). Aqui, a terra prometida desaparece; trata-se 
da terra não especificada no Decálogo, "que te dá o SENHOR, 
teu Deus". A Igreja, o povo de Deus do novo concerto, é uma 
comunidade internacional, uma congregação supranacional de 
estrangeiros e peregrinos (1 Pe 2.11). O nosso lar não é aqui (Fp
3.20). Hoje essa promessa é abrangente.
A discussão do ensino apostólico é sobre o significado de 
"primeiro mandamento com promessa". A dificuldade reside no 
fato de a promessa de Deus conceder misericórdia a milhares de 
gerações dos que o amam constar do segundo mandamento (Êx
I 8 4 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
HONRARÁS PAI E M Ã E I 8 5
20.6; Dt 5.10). Há quem afirme que a frase "primeiro mandamento 
com promessa" tem o sentido de importância, assim como Jesus 
chamou"primeiro mandamento" amar a Deus acima de todas as 
coisas. Isso nos parece pouco provável, pois o Senhor Jesus disse: 
"Este é o primeiro e grande mandamento" (Mt 22.38). Uma expli­
cação mais ou menos aceitável é que o apóstolo Paulo se referia 
ao primeiro mandamento de todo sistema mosaico encabeçado 
pelo Decálogo. Mas a melhor interpretação é de que se trata do 
primeiro mandamento da segunda tábua (conforme a divisão dos 
Dez Mandamentos explorada no Capítulo 1). O Senhor Jesus citou 
este mandamento para o jovem rico (Mt 19.19).
Nós vivemos essas coisas como resultado da nossa nova vida 
em Cristo e não por coerção da lei, que condena à morte os filhos 
rebeldes (Êx 21.15,17; Lv20.9; Dt 21.18-21). O cristão está debaixo 
da graça e é guiado pelo Espírito Santo para as boas obras que 
"Deus preparou para que andássemos nelas" (Ef 2.10). Cabe a 
cada um de nós não desperdiçarmos o privilégio e a oportunidade 
de honrar pai e mãe para não perdermos as bênçãos de Deus.
O homicídio é o maior crime que um ser humano 
pode cometer. A proibição do assassinato, apesar de 
constar dos códigos de leis anteriores ao sistema m o­
saico, contudo, já havia sido estabelecida pelo pró­
prio Criador desde o limiar da raça humana: "Quem 
derramar o sangue do homem, pelo homem o seu 
sangue será derramado; porque Deus fez o homem 
conforme a sua imagem" (Gn 9.6). É contra Deus 
que o assassino está desferindo seu golpe ao tirar a 
vida de alguém. A imagem é a representação de uma 
pessoa ou coisa. Quando os iraquianos derrubaram, 
destruíram e esmiuçaram a estátua de Saddam Hus- 
sein em Bagdá, em 2003, não estavam simplesmente 
atacando um bloco trabalhado de pedra; era a im a­
gem do ditador que estava ali representada.
O homem foi feito à imagem e semelhança de Deus, é a coroa 
da criação e o representante de Deus na terra investido de au­
toridade sobre as demais criaturas (Gn 1.26, 27; SI 8.5, 6). Todos 
os seres humanos são irmãos porque vieram de um só casal e 
têm o mesmo sangue (At 17.26). O respeito à vida é o respeito 
a Deus. A primeira tábua do Decálogo se refere à santidade de 
Deus, e a segunda, à santidade da vida. O sexto mandamento 
inicia a série de proibições absolutas expressas com duas palavras 
num ritmo lógico. Começa com a proteção da vida, o bem maior 
e inalienável, em seguida vem a proteção da família, a célula 
mater da sociedade; depois aparece a proteção da propriedade, 
dos bens e da honra.
O respeito à vida é o princípio dos deveres para com o próxi­
mo, a ordem divina de amar o próximo como Jesus nos amou (Jo 
13.34). "Não matarás” proíbe o homicídio e os pecados vinculados 
à violência, tais como "o tirar a nossa vida ou a de outrem, exceto 
no caso de justiça pública, guerra legítima, ou defesa necessária; 
a negligência ou retirada dos meios lícitos ou necessários para a 
preservação da vida; a ira pecaminosa, o ódio, a inveja, o desejo 
de vingança" (Catecismo Maior de Westminster, 136).
0 SEXTO MANDAMENTO
Para um leitor desatento ou menos avisado da Bíblia pode 
parecer haver uma contradição entre o mandamento "Não ma­
tarás" (Êx 20.13; Dt 5.17) e a guerra justa prescrita no capítulo 
20 de Deuteronômio ou ainda a pena capital estabelecida na lei 
de Moisés por diversos tipos de crimes e pecados, tema discuti­
do mais adiante. Ninguém pode afirmar e negar algo ao mesmo 
tempo. O que acontece é que "Não matarás" se trata de um termo 
genérico que não expressa com precisão o pensamento do sexto
I 8 8 t OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
mandamento, pois no hebraico, língua original em que o texto foi 
produzido, está registrado lô tirtsãh,87 literalmente "não assassi- 
narás" ou "não cometerás assassinato". A proibição, portanto, diz 
respeito ao homicídio premeditado, à violência, ao assassinato 
de um inimigo pessoal.
O Senhor Jesus Cristo discordou das autoridades religiosas 
de sua geração, dos escribas e fariseus que restringiam o sexto 
mandamento ao derramamento de sangue: "Ouvistes que foi 
dito aos antigos: Não matarás; mas qualquer que matar será réu 
de juízo. Eu, porém, vos digo que qualquer que, sem motivo, se 
encolerizar contra seu irmão será réu de juízo, e qualquer que 
chamar a seu irmão de raca será réu do Sinédrio; e qualquer que 
lhe chamar de louco será réu do fogo do inferno" (Mt 5.21, 22). 
Jesus não está aqui contrapondo o preceito da lei, mas a interpre­
tação rabínica desse preceito, pois ao longo dos anos a tradição 
havia despido o sexto mandamento de seu real significado. É 
verdade que o sexto mandamento diz: "Não matarás" (Êx 20.13; 
Dt 5.17); é também verdade que o homicida será submetido a 
julgamento (Nm 35.30, 31). Mas a questão é que "Não matarás" 
não se restringe somente a isso; inclui pensamentos e palavras, 
ira e insultos. O mais grave é que as autoridades religiosas de 
Israel nada ensinavam sobre a condenação divina ao homicídio, 
como se o castigo fosse restrito aos tribunais civis. Jesus trouxe 
à tona o espírito do sexto mandamento.
Dessa forma, "Não matarás" é ratificado no Novo Testamento 
pelo Senhor Jesus Cristo e seus apóstolos (Tg 2.11; 1 Jo 3.15). Jesus 
citou este mandamento juntamente com aqueles que dizem respei­
to aos deveres do homem para com seu próximo: "Não matarás, 
não cometerás adultério, não furtarás, não dirás falso testemunho;
NÃO MATARÁS I 8 9 í
87ninn vb.
honra teu pai e tua mãe, e amarás o teu próximo como a ti mesmo" 
(Mt 19.18,19). O apóstolo Paulo elencou esses mandamentos numa 
ordem e forma levemente modificadas (Rm 13.9).
O verbo hebraico rãtsah,ss "assassinar, matar", cuja ideia é 
matar com violência e matar de maneira injusta. Aparece aqui, 
no Decálogo, pela primeira vez (Êx 20.13). Foi encontrado um 
só cognato nas línguas semíticas, no antigo árabe do norte, que 
indica "quebrar em pedaço, estilhaçar, golpear". Apesar de sua 
predominância como termo legal nas 47 ocorrências no Antigo 
Testamento, e de ser usado na linguagem cotidiana, nenhuma 
raiz foi encontrada nos códigos de lei do Antigo Oriente Médio.
Há mais oito verbos hebraicos no Antigo Testamento para 
designar a matança: hãrag, 8 9 "destruir, matar, assassinar, ferir, 
golpear" (Gn 4.8); zãvah,'90 "sacrificar, abater", que diz respeito ao 
abate de animal para sacrifício, mas se aplica também ao abate 
de seres humanos (2 Rs 23.20); tãvah,91 "abater, trucidar, matar, 
massacrar", empregado para o abate de animais ou de pessoas 
numa guerra (Is 34.2, 6; Jr 48.15); müt92 "morrer, matar, mandar 
executar" (Gn 2.17; 18.25; 1 Rs 17.18); nãchãh,93 "ferir, golpear, 
abater, matar" (Êx 21.12; Nm 22.23; Êx 7.17; 17.6.); nqph94 "pôr 
abaixo, derrubar, cortar" (Jó 19.26); qãtal,9S "matar" (Jó 13.15; 
24.14; SI 139.19)-,shãhat,96 "executar, matar, abater", que aparece 
84 vezes no Antigo Testamento, indicando o ato de matar animais 
(Gn 37.31) e pessoas (Is 57.5; Ez 16.21). No entanto, na maioria 
das vezes, o termo diz respeito ao abate de animais no ritual de 
sacrifício (1 Sm 1.25).
Parece que os verbos hãrag, müt e qãtal estão no mesmo 
contexto de rãtsah. Esta é a conclusão apresentada no The Theolo-
I 9 0 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA UM A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
88 nsn. 
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NÃO MATARÁS I 9 1
gical Dictionary o f the Old Testament [O Dicionário Teológico do 
Antigo Testamento] que apresenta como argumento o paralelismo 
entre "matar" [hãrag] a viúva e "tirar a vida" [rãtsah] (Sl 94.6) e da 
mesma forma o paralelismo entre rãtsah e qãtal. "De madrugada 
levanta o homicida, [rôtsêah] mata \yiqtãl] o pobre e necessitado 
e de noite é como o ladrão" (Jó 24.14). Apresenta também o uso 
alternativo de müt, qãtal e rãtsah na instrução jurídica da pena 
capital (Nm 35.19, 21, 27, 30). Assim, esses três verbos parecem 
indicar o assassinato no sentido vasto, sem detalhes adicionaissobre a maneira de praticar o homicídio. Com isso, o referido 
dicionário conclui:
Estes sinônimos têm ajudado a definir o significado 
de rãtsah e como assassinato culpável pelo uso da força.
A natureza do ato é deixada completamente indefinida. 
Negativamente, é digno de nota que rãtsah nunca é usado 
para assassinato em batalha nem em autodefesa. Nunca é 
usado para suicídio. Afirma-se frequentemente que também 
não é empregado para a execução da pena de morte; no 
entanto, é contraditado por Nm 35.30, em que a raiz denota 
que a execução de um assassino pelo vingador do sangue 
é devidamente autorizada (BOTTERWECK, RINGGREN,
FABRY, vol. XIII, 2004, p. 632).
Cada ponto apresentado aqui será analisado juntamente 
com outros temas pertinentes ao sexto mandamento. Não há 
necessidade de discutir sobre o aborto e a eutanásia porque 
"Não matarás" inclui de maneira direta a proibição dos referidos 
crimes. Isso é visto em toda a Bíblia com clareza meridiana. A 
polêmica existe para quem procura desafiar o sexto mandamen­
to, principalmente por quem adota um estilo de vida contrário 
à vontade de Deus.
GUERRA
A guerra é "o recurso das nações para tratar de resolver dife­
renças pela força das armas. As guerras sempre são produtos da 
pecaminosidade humana, seja por instigação imediata ou causa 
indireta" (TAYLOR, 1995, p. 318). A guerra é algo indescritível. Não 
existe desastre humanitário maior do que a guerra, pois envolve 
destruição de vidas humanas, culpados e inocentes, homens 
e mulheres de todas as idades, propriedades rurais e urbanas, 
cidades e nações. Os horrores são indescritíveis. O Senhor Jesus 
predisse guerras e rumores de guerra (Mt 24.4-8). As nações vivem 
a expectativa de um holocausto nuclear.
Os antigos encaravam a guerra como algo sagrado. Era usual 
oferecer sacrifícios antes da partida das tropas militares para a 
batalha a fim de invocar às divindades proteção e vitória (1 Sm 13.8- 
12; Is 13.3; Jr 51.27; Sf 1.7). A lei prescreve normas para a guerra 
no capítulo 20 de Deuteronômio. Mas a legitimidade da guerra 
depende de sua motivação. Deus permitiu e até ordenou a guerra 
por diversas vezes no período do Antigo Testamento (Jz 20.27,28;
1 Sm 14.37;23.2-4; 1 Rs 22.6-12). Mas hoje existem grupos ativistas 
que são favoráveis a ela; grupos pacifistas que são contrários, e os 
seletivistas, que são favoráveis em caso de guerra justa.
A guerra é em si mesma incompatível com o espírito do cris­
tianismo. É verdade que estamos na dispensação da graça e que 
o cristianismo é pacifista (Mt 5.9). No entanto, até que todos se 
convertam ao evangelho, é necessária a manutenção da ordem 
pública e da segurança nacional. As forças armadas e as polícias 
civil e militar ou qualquer corporação afim não são figuras deco­
rativas. Essas instituições existem para manter a ordem pública e 
defender o país de agressões externas. Todo mundo tem o direito 
de defender o que é seu e, nesse caso, o cristão não está pecando.
I 9 2 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
Isso vale também para defesa pessoal: "Se um ladrão for achado 
arrombando uma casa e, sendo ferido, morrer, quem o feriu não 
será culpado do sangue" (Êx22.2, ARA). Não se trata, pois, de um 
assassinato premeditado, mas de legítima defesa.
O tema não aparece no Novo Testamento. O Senhor Jesus 
nada disse na parábola sobre o planejamento quando menciona 
o rei que faz guerra a outra nação (Lc 14.31, 32). De igual modo, 
não recomendou que o centurião de Cafarnaum renunciasse a seu 
posto militar; antes, elogiou a analogia da fé com estrutura militar 
(Mt 8.8-13). Visto que não houve nova revelação sobre a guerra, 
isso significa que permanece o que está no Antigo Testamento.
Martinho Lutero entendia que o Sermão do Monte acompanha­
va a orientação de Cristo "Dai a César o que é de César", separando 
aí Igreja e Estado, o que é de ordem pessoal e o que é de ordem 
jurídica. E, ainda segundo Lutero, o ensino "Amai a vossos inimi­
gos" (Mt 5.44) não se aplica ao Estado a fim de evitar a anarquia. 
Isso não viola o ensino de Jesus sobre a paz e o amor ao próximo.
SUICÍDIO
Não encontramos nenhum ensino direto sobre o suicídio na 
Bíblia, a não ser o "Não matarás". Existem apenas três casos de 
suicídio no Antigo Testamento, e o verbo "suicidar" não aparece 
nenhuma vez na Bíblia. Saul "se lançou sobre a sua espada e 
morreu [wayyãmãt,97 de müí) com ele" (1 Sm 31.5). Aitofel "se 
enforcou: e morreu [ wayyãmãt\ e foi sepultado na sepultura de seu 
pai" (2 Sm 17.23). Zinri "queimou sobre si a casa do rei, e morreu 
[wayyãmot, de müt] "98 (1 Rs 16.18). Além desses três breves relatos 
que mencionam suicídios, há mais um no Novo Testamento, o de
NÃO MATARÁS I 9 3 I
Judas Iscariotes (Mt 27.3-5). Não há unanimidade sobre a morte 
de Sansão, muitos não consideram suicídio
Os estoicos e epicureus viam o suicídio como saída honrosa da 
vida. O hinduísmo e o budismo aprovam o suicídio, encarando-o 
como uma "peça das rodas do carma".99 Na verdade, é o resultado 
do fracasso espiritual na maioria dos casos atuais tanto quanto 
nos casos registrados na Bíblia. O suicídio é autoassassinato, 
uma vez que a nossa vida não nos pertence. Quem não crê em 
Deus e perdeu a esperança da vida futura, às vezes, procura na 
autoaniquilação refúgio para escapar de suas misérias e das 
intempéries e dos açoites da vida. É, no entanto, inconcebível 
que um cristão chegue a tal extremo: "É o abandono do posto ao 
qual Deus nos destinou. É uma recusa deliberada de submeter- 
-nos à sua vontade. É um crime que não admite arrependimento 
e, consequentemente, envolve a perda da alma" (HODGE, 2001, 
p. 1294). A vida é um dom de Deus, e ninguém tem o direito de 
tirá-la (Gn 9.6; Jó 33.4). Isso vale para a nossa vida e também 
para a vida dos outros. Moisés, Elias e Jonas pediram a morte, 
mas Deus não os atendeu (Nm 11.15; 1 Rs 19.4; Jn 4.3). O fim da 
vida é prerrogativa exclusiva de Deus (SI 31.15; Ec 8.8). Ele sabe 
a hora em que a vida humana deve cessar e é o soberano de toda 
a existência e de todo o universo (Dt 32.29; 1 Sm 2.6; 2 Rs 5.7).
PENA DE MORTE
A maior dificuldade do sexto mandamento é a suposta con­
tradição entre "Não matarás" e a guerra e a pena capital. Mas
I 9 4 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDAN ÇA
99 Carma: termo sânscrito usado nas religiões transcendentais do Extremo Oriente para 
designar o princípio hindu de causa e efeito; lei que determina o lugar de um indiví­
duo na reencamação, ou seja, a pessoa colherá aquilo que semeou em uma suposta 
encarnação anterior.
o verbo rãtsah nunca é usado em referência a assassinatos em 
batalha ou autodefesa. O seu emprego uma única vez na execução 
da pena de morte (Nm 35.30) é uma exceção; segundo Koehler & 
Baumgartner (vol. II, 2001, p. 1283), tal uso parece ser a causa da 
maior dificuldade. No entanto, considerando que originalmente 
a ideia do referido verbo era de vingança de sangue (CHILDS, 
1976, p. 420), a exceção do seu uso na pena capital não muda o 
objetivo do mandamento em tela, que é a preservação da vida 
e a proibição do assassinato premeditado, ou seja, o homicídio 
com malícia.
A pena de morte é um dos temas mais controvertidos da atu­
alidade, mas ela é bíblica e foi o próprio Deus quem a instituiu 
logo após o Dilúvio (Gn 9.6). Deus não permitiu que ela fosse 
executada no caso de Caim (Gn 4.15). A lei de Moisés traz ins­
truções específicas sobre o procedimento jurídico do homicídio 
doloso, quando há intenção de matar, e do homicídio culposo, 
quando não há intenção de matar. O capítulo 35 de Números 
aborda exclusivamente esse tema. A pena capital não viola o 
sexto mandamento porque não se trata de assassinato malicio­
so e violento de um inimigo pessoal. É uma exigência da justiça 
para manter o bem-estar e a segurança do povo e preservar a 
sociedade.Tito
Fm Filemon
Hb Hebreus
Tg Tiago
1 Pe 1 Pedro
2 Pe 2 Pedro
1 Jo 1 João
2 Jo 2 João
3 Jo 3 João
Jd Judas
Ap Apocalipse
introdução
A obra Os Dez Mandamentos - Valores Divinos para uma 
Sociedade em Constante Mudança é um comentário exegético e 
explicativo apresentado de forma prática para facilitar a compre­
ensão dessa parte da lei de Moisés. A lei foi dada a Israel como 
legislação para o povo antes de conquistar a terra de Canaã. 
Inúmeros preceitos permanecem ainda hoje na legislação de 
praticamente todos os países do planeta. Sua origem divina é 
indiscutível, pois aparece no relato dessa comunicação de Deus 
a Moisés desde Êxodo 20.1 até Levítico 27.34. Além disso, a Bíblia 
declara esse fato de maneira direta. O presente trabalho tem por 
objetivo ajudar o povo de Deus a distinguir entre lei e evangelho, 
lembrando que os Dez Mandamentos não são a lei, mas parte 
dela, que introduz o sistema legal de Moisés.
A estrutura dos Dez Mandamentos se resumem no amor a 
Deus e ao próximo, diz respeito a Deus e à sociedade, que en­
volve pensamento, palavras e obras. O primeiro mandamento 
foi promulgado numa época que a idolatria norteava as nações, 
e a ordem "Não terás outros deuses diante de mim" era algo 
novo num código de leis. Trata-se do monoteísmo revelado que 
influenciou o mundo inteiro com a expansão do cristianismo.
O segundo mandamento revela que esse único Deus deve 
ser entendido e adorado em termos espirituais e imateriais e 
que o culto e o louvor a ele com uso de representações visuais
são ofensivos e provocam a ira divina até a terceira e a quarta 
geração. Deus é espírito (Jo 4.24). É, pois, todo-importante que 
aquele que adora a Deus tenha a sua mente e o coração cen­
trados nesse Deus que transcende a matéria e todas as coisas 
criadas. É grande o risco de inverter o objeto de adoração pelas 
representações visuais. Por isso, a adoração cristã genuína é 
completamente despida de toda representação visual, como 
imagens de escultura (Cl 3.16).
O terceiro mandamento trata daquilo que falamos com res­
peito a Deus e ao próximo e da forma pela qual usamos o nome 
de Deus. O quarto mandamento é de caráter social e espiritual: 
abrange a necessidade de descanso do trabalho para o ser hu­
mano, já que o descanso do sono noturno não é suficiente. A 
lei estabeleceu para Israel o sétimo dia da semana e, na graça, 
o sábado foi substituído pelo primeiro dia da semana, o dia da 
ressurreição de Jesus, e deixou de ser mandamento para ser pra­
ticado naturalmente, sem coerção alguma (At 20.7; Rm 14.2-6; 
Cl 2.16, 17).
O mandamento de honrar pai e mãe pode servir como ponte 
que conecta os dois grupos de mandamentos: o compromisso do 
ser humano com Deus e o compromisso do ser humano com o 
próximo. A observação desse preceito contribui para o bem-estar 
da sociedade e da igreja. Os pais são representantes de Deus na 
vida dos filhos, pois além de terem gerado os filhos, eles os cer­
cam de cuidados especiais, provendo-os de alimentos, educação, 
saúde, roupa, afetos. Isso é um mistério. Desonrar e desobedecer, 
pois, aos pais é afrontar a Deus. Esse mandamento é extensivo 
às autoridades espirituais e civis.
O "Não matarás" é a proteção da vida; assassinar alguém é 
o pior crime que uma pessoa pode cometer, e isso é um golpe 
contra o próprio Deus, visto que o ser humano foi feito à sua
I 1 0 I OS DEZ M A N D A M E N TO S -V A LO R E S DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M U D A N Ç A
imagem (Gn 9.6). A proibição contra o adultério é um apelo à 
pureza sexual e à proteção da família. É o compromisso de fide­
lidade entre os casais.
O mandamento seguinte proíbe o furto, remete à proteção da 
propriedade e de maneira indireta fala a respeito da necessidade 
do trabalho. Ninguém deve viver sem uma atividade; como diz o 
ditado, "mente desocupada é oficina de Satanás".
O nono mandamento é a proteção da honra, pois dizer fal­
so testemunho contra o próximo aqui aplica-se não apenas ao 
perjúrio nos tribunais para prejudicar alguém, mas também à 
divulgação de boatos falsos e mexericos.
E, finalmente, o décimo mandamento é contra o pecado do 
pensamento para ajudar o israelita a não violar os mandamentos 
anteriores do Decálogo.
A ordem natural dos Dez Mandamentos é a seguinte: Deus, 
família e sociedade. O estudo detalhado de cada um dos manda­
mentos do Decálogo mostra de maneira inequívoca o seu valor 
para Israel, principalmente por ocasião de sua saída do Egito. 
Sua influência está por toda parte ainda hoje, no Estado e na 
religião, nos manuais jurídicos e teológicos. Por essa razão, o 
Novo Testamento não impõe sanção jurídica, mas a graça trata 
essas coisas no campo espiritual, implicando a comunhão com a 
Igreja e com Deus. A ministração da justiça é assunto do Estado. 
A função da lei não é salvar, mas mostrar o pecado humano, 
restringir o perverso e nos conduzir a Cristo, lembrando que o 
Decálogo é parte da lei. Esta é santa porque é de origem divina, 
mas a sua função deve ser compreendida por todos os cristãos.
O livro Os Dez Mandamentos — Valores Divinos para uma 
Sociedade em Constante Mudança enfoca cada um desses pre­
ceitos com abundância de detalhes. O primeiro capítulo é uma 
visão panorâmica dos Dez Mandamentos. Os dez capítulos
INTRODUÇÃO \ 1 1 I
OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
seguintes tratam dos dez preceitos do Decálogo e de sua apli­
cação na vida diária, família, igreja, sociedade e trabalho. Em 
cada estudo são apresentados os significados de cada palavra- 
-chave, em hebraico e grego, os comentários dos versículos do 
Pentateuco vinculados ao mandamento em foco e, finalmente, a 
sua interpretação no Novo Testamento. É importante conhecer 
o sentido de cada mandamento no Novo Testamento e como 
eles foram adaptados à graça.
O capítulo final mostra que obra de Deus para o cristão é 
a fé em Jesus, e não a prática dos Dez Mandamentos. Estes já 
estão incluídos nos dois grandes mandamentos de amar a Deus 
acima de todas as coisas e ao próximo como a nós mesmos. 
Estar debaixo da graça e não debaixo da lei significa que somos 
livres para servir ao Senhor Jesus Cristo, mas não para pecar, 
visto que o cristianismo é a única religião do planeta que tem o 
Espírito Santo. A terceira Pessoa da Trindade guia a vida cristã 
e controla nossos desejos.
A lei de Moisés não consiste apenas num com­
pêndio religioso; trata de profecias, histórias, regis­
tros genealógicos e cronológicos, regulamentos, 
ritos, cerimônias, exortações, preceitos morais, civis 
e cerimoniais, instrução para sacerdotes, sacrifícios, 
ofertas, festas e o tabernáculo. A grande diversidade 
de conteúdo e suas várias formas de apresentação 
dos dados da revelação têm impressionado o espírito 
humano até hoje. A estrutura literária dessa parte das 
Escrituras Sagradas é complexa e sobre ela muitas 
interpretações e especulações têm sido levantadas 
ao longo dos séculos.
O Decálogo é o exemplo mais conhecido da forma categórica 
ou absoluta que se caracteriza pelo comando absoluto, geral­
mente pelo uso da segunda pessoa do singular no futuro ou no 
imperativo, e algumas vezes no plural. Isso aparece nos manda­
mentos negativos ou positivos. O mandamento com o verbo no 
particípio hebraico também é considerado categórico ou absoluto 
por muitos, como em: "Quem derramar o sangue do homem, 
pelo homem seu sangue será derramado" (Gn 9.6); ou: "Quem 
ferir alguém, que morra, ele também certamente morrerá" (Êx
21.12). As expressões "quem derramar" e "quem ferir" estão no 
particípio, na língua original. Mas há quem afirme que a referida 
forma é casuística.
ALEI DE MOISÉS
A lei de Moisés não é a mais antiga da história, porém é a 
mais importante, pois se distingue das demais na antiguidade por 
seu caráter espiritual e sua autoridade divina. Sobretudo, por ter 
chegado aos israelitas por revelação celestial. Mas sua grandezaSeu objetivo não era restaurar a vida do assassinado 
ou reparar o prejuízo, pois somente Deus pode dar a vida; era 
conter o crime. Deus delegou aos governantes a autoridade de 
dirigir legitimamente o Estado. A execução de uma pena capital 
é determinada pelo Estado, depois de julgamentos e de todo pro­
cesso legal, tendo o réu amplos direitos de defesa. A lei de Moisés 
exige pelo menos duas testemunhas, sem as quais o processo 
não terá validade legal (Nm 35.30; Dt 17.6).
A lei de Moisés traz a lista de crimes e pecados punidos com 
a morte: assassinato premeditado (Êx 21.12, 13), invocação de
NÃO MATARÁS I 9 5 I
mortos (Lv 20.27), seqüestro (ê x 21.16), blasfêmia (Lv 24.10-13), 
falsos profetas (Dt 13.5-10), sacrifício a falsos deuses (Êx 22.20), 
filhos rebeldes (Dt 21.8-21), ferir e amaldiçoar o pai ou a mãe 
(Êx 21.15, 17, Lv 20.9), adultério e estupro (Lv 20.10-21; Dt 22.22- 
24), bestialidade (Êx 22.19; Lv 20.15, 16), homossexualismo 
(Lv 20.13), incesto (Lv 20. 11, 12, 14) e a profanação do sábado 
(Êx 31.14, 15; 35.2).
O Novo Testamento reconhece a pena de morte, mas não 
se trata de um mandamento cristão. O Senhor Jesus se referiu 
a ela de maneira indireta quando disse que não veio destruir e 
nem ab-rogar a lei, mas cumpri-la na sua íntegra (Mt 5.17, 18). 
Ele também se referiu à lei de maneira direta: "Porque Deus or­
denou, dizendo: Honra a teu pai e a tua mãe; e: Quem maldisser 
ao pai ou à mãe, que morra de morte" (Mt 15.4). Esses dados 
reaparecem na passagem paralela (Mc 7.10). Jesus combinou o 
sexto mandamento (Êx 20.12; Dt 5.16) com a pena estabelecida 
no sistema mosaico contra seus infratores (Êx 21.17; Lv 20.9), 
mas não fez nenhuma observação contrária à pena de morte. Em 
Marcos, Jesus afirma que "Moisés disse" (Mc 7.10); no entanto, 
aqui o texto declara: "Deus ordenou". É evidente que toda a lei 
procede de Deus, e Moisés, como mediador entre Deus e Israel, 
foi o promulgador da lei. O apóstolo Paulo segue a mesma linha 
de pensamento. Ele reconhece a legitimidade da lei e admite a 
pena capital na legislação de um país (Rm 13.1-6).
Não há no Novo Testamento revelação contrária. O Espírito 
Santo permitiu que essa lei permanecesse para proteger a vida 
de inocentes. Os grupos de direitos humanos devem se preocupar 
também com os humanos direitos. Eles devem pensar no valor da 
vida da vítima dos homicidas. A inaplicabilidade da pena capital se 
deve ao mau uso que as autoridades vêm fazendo desse preceito 
ao longo dos séculos, desde os tempos bíblicos (1 Rs 21.1-16;
! 9 6 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
Mc 6.16-29; At 7.55-60). O maior exemplo está na morte de Jesus, 
que prova não haver justiça na terra. Isso é condenável à luz do 
Novo Testamento.
Todos reconhecem que a pena de morte é uma lei que fere o 
espírito de perdão, amor e misericórdia, que formam a essência do 
cristianismo; no entanto, ela está presente no Novo Testamento. 
A diferença do Antigo Testamento é que ali a lei prescreve como 
parte de um sistema legal, e aqui não é mandamento, conselho 
ou incentivo. O Novo Testamento apenas reconhece que a pena 
capital existe. É como a bomba atômica: existe mas não é para 
ser usada. Ela não vai resolver, como nunca resolveu, o problema 
da violência e da criminalidade, e serve para satisfazer caprichos 
de ditadores cruéis, muitos deles considerados fora da lei pela 
comunidade internacional. Em resumo, a pena de morte combate 
a violência com outra violência. A solução está na mensagem 
transformadora do Calvário. Jesus deu o exemplo ao absolver a 
mulher adúltera dessa sentença 0o 8.1-11).
O presente estudo não busca trazer soluções para questões 
complexas como a guerra e a pena de morte. O assunto também 
não se esgota aqui. Essas coisas não se resolvem com um simples 
discurso baseado em "Não matarás". É uma reflexão sobre a dig­
nidade do indivíduo, como ser humano, e sobretudo por ser a vida 
um dom de Deus e somente o Criador ter o direito de tirá-la. O 
direito à vida é natural e inalienável e é parte da responsabilidade 
do homem, como seu administrador. O verbo rãtsah, na legislação 
mosaica, tem o sentido de proibir o homicídio premeditado, ou 
seja, o assassinato violento de um inimigo pessoal.
NÃO MATARÁS I 9 7 I
O sétimo mandamento continua atual porque o 
mundo está às avessas, dizendo "não" a tudo aquilo 
que Deus diz "sim” na sua Palavra, e "sim" a tudo o 
que a Bíblia diz "não". O resultado é o caos na família 
e na sociedade.
O adultério é a relação sexual de um homem casado com 
uma mulher que não é sua esposa e vice-versa. Para muitos, tal 
prática pode parecer normal, mas a Palavra de Deus declara: "Não 
adulterarás" (Êx 20.14; Dt 5.18). Isso vai muito além da cópula 
extraconjugal. É a proibição de toda a forma de prostituição; 
é Deus dizendo "não" a todas as concupiscências desnaturais, 
imaginações e pensamentos impuros e lascivos (Mt 5.27, 28).
O quinto mandamento resguarda a vida familiar de ruptura 
interna. Mas aqui o sétimo mandamento requer um relacionamen­
to de amor e fidelidade entre marido e mulher. É isso o que Deus 
espera de todos os casais. Na verdade, são ideais provenientes 
da criação (Gn 2.24). O objetivo deste mandamento é conservar 
a sacralidade da família que foi instituída por Deus por meio do 
casamento no jardim do Éden (Gn 2.18-24). A santidade desse 
relacionamento familiar deve ser mantida. Esta lei servia também 
para Israel manter a pureza sexual e evitar as práticas da cultura 
egípcia, de onde os israelitas saíram, e da cultura cananeia, para 
onde o povo se dirigia. Os preceitos pertinentes estão descritos 
com abundância de detalhes no sistema mosaico (Lv 18.6-30; 
20 .10-21 ).
0 SÉTIMO MANDAMENTO
O verbo hebraico nã ’ph,'00 "adulterar, cometer adultério", não 
apresenta problema lingüístico neste mandamento, diferentemen­
te do que pensam alguns expositores bíblicos. O termo aparece 
trinta e quatro vezes no Antigo Testamento, nove vezes em Je­
remias, sete em Ezequiel, seis em Oseias, seis no Pentateuco e 
quatro na literatura sapiencial. O verbo ocorre no Decálogo, em
I 1 0 0 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
100e]N3.
NÃO ADULTERARÁS 1 1 0 1
Êxodo e em Deuteronômio como lo ’ tinã ’ph,'m "Não adulterarás" 
(Êx 20.14; Dt 5.18). As outras quatro vezes aparece em Levítico, 
que traz de maneira clara e inconfundível a definição de adul­
tério no contexto da época: "Também o homem que adulterar 
com a mulher de outro, havendo adulterado com a mulher do 
seu próximo, certamente morrerá o adúltero e a adúltera" (Lv 
20.10). Esse conceito é aprofundado no Novo Testamento. O 
cristianismo restaura a monogamia originalmente estabeleci­
da pelo Criador, visto que a estrutura da sociedade do Antigo 
Testamento era polígama. A lei se aplica se o ato envolver uma 
mulher casada ou comprometida (Dt 22.22-26). Mas, se a mulher 
for solteira, o homem será obrigado a se casar com ela e nunca 
mais poderá se divorciar, além de pagar uma indenização ao pai 
da moça (Dt 22.28, 29). Na nova aliança, não há nada disso; o 
sétimo mandamento é adaptado à graça, e o assunto é levado à 
esfera espiritual e não jurídica ou legal (Jo 8.1-11). Os adúlteros 
contumazes e inveterados perdem o direito à vida eterna no céu 
(1 Co 6.10; Ef5.5;Ap 22.15).
Os termos hebraicos para adultério são n i’uph,w2 que só 
aparece duas vezes no Antigo Testamento (Jr 13.27; Ez 23.43) 
e na’ãphüph,103 que só aparece uma vez (Os 2.2 [4]). Essas três 
ocorrências estão no plural. A Septuaginta traduz as duas pala­
vras por moicheia,M o mesmo termo usado no Novo Testamento 
grego, onde só aparece três vezes (Mt 15.19; Mc 7.22; Jo 8.3).
O verbo hebraico zãnãh,ws "cometer fornicação, praticar pros­
tituição", designa primariamente um relacionamento sexual fora 
de uma união formal. O particípio do verbozãnãh é zonãh, e se 
refere à mulher que se entrega a tal prática. A isso comumente
101 *]í«n tò.
104 Moixeía.
102 '1̂3.
105 nír.
103
se chama "fornicação", mas se um dos envolvidos tiver já assu­
mido união formal com outra pessoa este ato será considerado 
adultério. O verbo zãnãh e os substantivos derivados zenümm,106 
zenüt107 e taznüt,108 "fornicação, prostituição", são sinônimos quase 
perfeitos. Zenüním aparece onze vezes (Gn 38.24; 2 Rs 9.22; Ez 
23.11 [duas vezes]; 23.29; Os 1.2 [duas vezes]; 2.3[4], 4[6]; 4.12; 
5.4; Na 3.4 [duas vezes]; zenüt ocorre nove vezes (Nm 14.33; Jr 
3.2, 9; 13.27; Ez 23.27; 43.7, 9; Os 4.11; 6.10) e taznüt só aparece 
em dois capítulos de Ezequiel: no capítulo 16, nove vezes, e, no 
capítulo 23, onze vezes. A Septuaginta emprega o termopornê,m 
"prostituta, meretriz".
O substantivo porneia e o verboporneuõU0 aparecem na Bí­
blia para designar orgia (Nm25.1; 1 Co 10.8), incesto (1 Co5.1) e 
práticas homossexuais (Jd 7). O termo porneia, às vezes, aparece 
junto com adultério e, outras vezes, como sinônimo, mas é um 
termo genérico e indica "prostituição, incastidade, fornicação, 
adultério, imoralidade, práticas homossexuais", ao passo que 
moicheia é usado especificamente para adultério e nunca se 
aplica à prostituição.
O Antigo Testamento emprega todos esses termos também 
de forma metafórica para descrever a apostasia de Israel e sua 
infidelidade a Javé, seu Deus. O profeta Ezequiel, no capítulo 16, 
descreve a apostasia de Israel como prostituição e revela a dife­
rença entre nã ’ph e zãnãh.
A "meretriz", zonãh, substantivo derivado do verbo zãnãh, é 
a mulher que recebe pagamento por favores sexuais (Ez 16.31b). 
Esse conceito é reiterado nos versículos 33 e 34. A "mulher adúl­
tera", hã-ishãh ham-mnã’ãphet,ul é a que recebe estranhos em
I 1 0 2 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
106 D’MT. 
109 nopvií.
107 rar. 
““Ilopveúu.
108 mm.
" ‘naóan nsíxn.
NÃO ADULTERARÁS I 1 0 3
vez do marido (Ez 16.32). O Antigo Testamento nunca emprega 
naph para designar a prostituta profissional. Essa diferença é 
verificada em Provérbios, quando afirma que a zonãh é a mulher 
que se oferece por um pedaço de pão, "prostituta" (Pv 6.26), ao 
passo que no ’êph, "adúltera", é a mulher que tem marido mas se
entrega a outro homem (Pv 6.32-34).
O sétimo mandamento inclui também a proibição da prática 
homossexual. É o próprio Deus quem chama o comportamento 
homossexual de abominação, e a lei aplica a pena de morte 
contra os que cometerem tal pecado (Lv 18.22; 20.13). Era a 
prática do culto cananeu que envolvia a chamada "prostituição 
sagrada" (1 Rs 24.24; 15.12). O sodomita e a rameira são colo­
cados na mesma categoria (Dt 23.17). A prática é proibida em 
toda a Bíblia (Rm 1.24-28; 1 Tm 1.10), mas a nova aliança leva 
o assunto para a esfera espiritual, implicando a salvação e não 
a pena capital (1 Co 6.10). O ensino de Jesus é: "Vai-te e não
peques mais" (Jo 8.11).
O apóstolo Paulo afirma que o poder do evangelho resultou 
em uma mudança desse estilo de vida especificamente na cidade 
de Corinto (1 Co 6.11). No Brasil, o homossexual que precisar de 
ajuda para abandonar esse estilo de vida não poderá contar com 
ajuda de psicólogos. Estes são autorizados a ajudar a quem dese­
ja ser homossexual, mas são constantemente ameaçados pelas 
autoridades se ajudarem quem pretende abandonar tal prática. 
São leis iníquas como essas que afrontam a Deus e ameaçam os 
fundamentos da família. Jesus e Paulo estariam hoje em dificul­
dades diante da justiça brasileira.
O Senhor Jesus anunciou de antemão os dias de Sodoma e 
Gomorra para o fim dos tempos, antes da sua vinda (Lc 17.28-30). 
Atualmente, é grande a pressão das autoridades civis e da mídia 
contra a Igreja, pois elas estão institucionalizando a iniqüidade
como já tem acontecido em alguns países. Devemos tomar cui­
dado, pois o alvo desse movimento está mais além: cercear a 
liberdade religiosa. A solução é orar a Deus para que o Estado 
respeite nossas crenças, princípios e tradições, razão pela qual 
devemos respeitar o direito dos outros. É o mínimo que se espe­
ra num estado democrático de direito, pois os direitos de César 
terminam onde começam os de Deus (Mt 22.21; At 5.29).
Igreja não é Estado: a Igreja é regida pelo Espírito Santo por 
meio da Palavra de Deus, e o Estado é regido por sua constituição. 
Não somos um Estado teocrático nem é papel do cristão impor a 
Bíblia à legislação do país. "O mundo inteiro jaz no Maligno" (1 
Jo 5.19, ARA). Nosso dever é pregar o evangelho para a salvação 
de toda a sorte de pecadores e não nos envolver em passeatas e 
manifestos (Mt 28.19, 20).
0 CASAMENTO
O casamento é um projeto divino, pois Deus disse: "Não é bom 
que o homem esteja só; far-lhe-ei uma adjutora que esteja como 
diante dele" (Gn 2.18). A instituição foi sancionada pelo Senhor 
Jesus com sua honrosa presença nas bodas de Caná da Galileia 
(Jo 2.1-11). Está escrito: "Venerado seja entre todos o matrimô­
nio" (Hb 13.4). A frase "Bom seria que o homem não tocasse em 
mulher" (1 Co 7.1) é uma citação da carta que o apóstolo recebeu 
dos irmãos da Igreja de Corinto. Essas palavras não são ensinos 
paulinos, senão o apóstolo estaria contrariando o princípio da 
procriação (Gn 1.12) e o Deus que declarou: "Não é bom que o 
homem esteja só" (Gn 2.18); além, disso, estaria também defen­
dendo o celibato para todos os homens. Os rabinos ensinavam 
que o casamento era uma obrigação do homem e outros diziam 
ainda que era um dever da mulher.
I 1 0 4 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
NÃO ADULTERARÃS I 1 0 5
O casamento é reconhecido em todas as civilizações e não há 
como ficar fora das relações sociais e civis. É um contrato jurídico 
de uma união espiritual, como disse Myer Pearlman em seu Ma­
nual do Ministro. O Estado, como guardião desses direitos, tem 
legitimidade para legislar sobre o tema, e isso envolve herança, 
propriedade, filhos. Mas vivemos em um tempo que nem sempre o 
que é legítimo para o Estado é aceitável a Deus. O mundo está às 
avessas, como disse Jeremias: "Coisa espantosa e horrenda se anda 
fazendo na terra" (Jr 5.30). Este sistema não é padrão para a Igreja 
(Rm 12.2). A Palavra de Deus está acima de qualquer lei terrena.
A natureza do casamento está fundamentada nas palavras: 
"Portanto, deixará o varão o seu pai e a sua mãe e apegar-se-á à 
sua mulher, e serão ambos uma carne” (Gn 2.24). O homem e a 
sua esposa formam "uma só carne" e ambos juntos formam o ser 
humano completo. A expressão "uma carne" ou "uma só carne" 
(ARA e TB) se refere à comunhão, à unidade física, intelectual 
e espiritual. A unidade física é o relacionamento sexual dentro 
do casamento, que tem o aval divino por ser uma prática pura e 
santa aos olhos de Deus. A Bíblia chega a comparar a intimidade 
conjugal com o relacionamento entre Deus e Israel (Is 54.5; Os
2.19,20) e da mesma forma com o relacionamento místico entre 
Cristo e a Igreja (2 Co 11.2).
Assim, a relação sexual com alguém que não é o cônjuge 
representa a ruptura desse vínculo sagrado que Deus estabele­
ceu no Éden desde o princípio. Segundo o Handy Commentary, 
o adultério "é uma invasão da vida doméstica, a destruição da 
família, a dissolução do contrato fundamental da ordem social" 
(apud MESQUITA, 1979, p. 189). Não se trata meramente de uma 
desonra ou de um ato vergonhoso, mas de algo com profundas 
implicações na vida humana. Mesmo depois da cura, ficam as 
cicatrizes. A lei contra o adultério e sua respectiva sentença aos
infratores valiam tanto para o homem como a mulher em Israel 
(Lv 20.10; Dt 22.22).
As palavras "Deixará o varão o seu pai e a sua mãe e apegar- 
-se-á à sua mulher" (Gn 2.24) revelam o princípio original da mo- 
nogamia, pois o texto não diz: "e apegar-se-á às suas mulheres". 
A monogamia foi instituídapelo Criador, porém a poligamia foi 
adotada pelos homens. O primeiro polígamo da história foi Lame- 
que (Gn 4.19). A poligamia era tolerada na época de Moisés (Êx 
21.7-11; Dt 21.15), mas ela é pecaminosa porque viola o princípio 
original e permanente do matrimônio. O Novo Testamento ensina 
a monogamia: "Cada um tenha a sua própria mulher, e cada uma 
tenha o seu próprio marido" (1 Co 7.2). Qualquer relação sexual 
fora do casamento é adultério no Novo Testamento. Não existe 
o sistema de concubinato na fé cristã (Mc 10.11,12).
Ao longo da história da interpretação, expositores judeus e 
cristãos reconheceram como pertinentes ao sétimo mandamento 
as proibições concernentes a toda sorte de incastidade e aberra­
ções sexuais. O livro Casamento, Divórcio & Sexo à Luz da Bíblia, 
de minha autoria e publicado pela CPAD, enfoca o casamento, o 
concubinato e a união estável, o homossexualismo e a prostitui­
ção, o divórcio e o papel da Igreja, cuja leitura recomendo. O tema 
é atual e de grande importância para o fortalecimento da família.
0 ENSINO DE JESUS
O Senhor Jesus, no Sermão do Monte, depois de falar sobre o 
sexto mandamento, seguiu a mesma ordem do Decálogo, mencio­
nando a proteção da vida e a preservação da família. Ele reiterou 
o que Deus disse no princípio da criação sobre o casamento, que 
se trata de uma instituição divina, uma união estabelecida pelo 
próprio Deus (Mt 19.4-6).
I 1 0 6 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
NÃO ADULTERARÁS I 1 0 7
"Não adulterarás" é citado no Sermão do Monte e para o 
moço rico (Mt 5.27; 19.18; Mc 10.19; Lc 18.20). Jesus corrigiu 
com autoridade e muita propriedade o pensamento equivocado 
dos líderes religiosos dos seus dias. Os escribas e fariseus ha­
viam reduzido o mandamento "Não adulterarás” ao próprio ato 
físico e, desconhecendo o espírito da lei, apegavam-se à letra 
da lei (2 Co 3.6). Assim, como é possível cometer assassinato 
sem o ato concreto, mas apenas com a cólera ou palavras in­
sultuosas, da mesma forma é possível cometer adultério só no 
pensamento. Parece que os rabis daquela época não davam a 
devida atenção ao décimo mandamento que ordena não cobiçar 
a mulher do próximo.
O adultério começa na mente contaminada pela cobiça e ter­
mina no corpo pela prática física (Mt 15.34; Tg 1.15). O ensino de 
Jesus é mais profundo e vai à raiz do problema. Ele disse que nem 
é preciso o homem se deitar com uma mulher para cometer adul­
tério; basta olhar e cobiçar uma mulher que não seja sua esposa, 
e já cometeu adultério com ela (Mt 5.28). É o adultério da mente 
que é consumado no corpo; não se restringe somente à prática 
do ato, mas também ao pensamento. E a sanção contra o referido 
pecado é de caráter espiritual e se distingue do sistema mosaico.
Não é proibido olhar para uma mulher e vice-versa, pois há 
diferença entre olhar e cobiçar. O pecado é o olhar concupiscente. 
O sexo é santo aos olhos de Deus, desde que dentro do casamento, 
nunca fora dele. A Palavra de Deus ressalta: "Venerado seja entre 
todos o matrimônio e o leito sem mácula" (Hb 13.4). O termo 
grego para "venerado" é tímios,112 "honrado". A Versão Almeida 
Atualizada traduz por: "Digno de honra"; e a Tradução Brasileira 
por: "Seja honrado". Que os votos de fidelidade do casamento
112 Tl|íioç.
sejam mantidos e da mesma maneira seja puro o relacionamento 
matrimonial. O livro de Cantares de Salomão mostra que o sexo 
não é apenas para procriação, mas também para o prazer e a 
felicidade dos seres humanos. Jesus não está tratando disso, não 
está questionando o sexo, mas combatendo a impureza sexual e 
o sexo ilícito, a prostituição. O ensino dele é que qualquer prática 
imoral no ato é igualmente condenada no olhar, no pensamento e 
na imaginação (Mt 5.27). Jesus disse que os adultérios procedem 
do coração humano (Mt 15.19).
Cabe aqui uma breve reflexão sobre o divórcio. Trata-se de 
um dos temas mais polêmicos da Igreja. Essas controvérsias já 
existiam mesmo antes do nascimento de Jesus. O divórcio na lei 
de Moisés previa novas núpcias, e a base para a sua legitimidade 
nunca ficou clara no Antigo Testamento:
Quando um homem tomar uma mulher e se casar com 
ela, então, será que, se não achar graça em seus olhos, por 
nela achar coisa feia, ele lhe fará escrito de repúdio, e lho 
dará na sua mão, e a despedirá da sua casa. Se ela, pois, 
saindo da sua casa, for e se casar com outro homem...
(Dt 24.1,2).
O "escrito de repúdio" significa "termo de divórcio" (ARA). A 
mulher não era considerada adúltera se contraísse novo casamen­
to, mesmo tendo o seu primeiro marido encontrado nela "coisa 
feia". Não se sabia o que a lei queria dizer com tal expressão 
"coisa feia" ou "indecente" (ARA). Havia muita discussão entre 
as principais escolas rabínicas no período de Herodes, o Grande, 
Hillel e Shammai. O primeiro era liberal, e o segundo, conserva­
dor. Para Hillel e seus seguidores, "coisa feia" era qualquer coisa 
que o marido considerasse como tal. Mas, para Shammai e seus 
discípulos, o termo se referia aos pecados sexuais.
I 1 0 8 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
NÃO ADULTERARÁS I 1 0 9
Os fariseus levaram o assunto a Jesus. Eles não perguntaram 
sobre o divórcio, mas sobre as bases para a sua legitimidade: "É 
lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo?" (Mt 
19.3). Essa era a escola de Hillel. Os fariseus queriam saber qual 
escola Jesus apoiava. Mas o Senhor Jesus se dirigiu à Palavra. 
O casamento é indissolúvel, foi a sua conclusão sobre Gênesis 
2.24, "o que Deus ajuntou não separe o homem" (Mt 19.6). O que 
fazer com o mandamento de Moisés?, perguntaram a Jesus (Mt
19.7). Moisés não deu esse mandamento; era uma interpretação 
precipitada, pois uma leitura cuidadosa em Deuteronômio 24.1 -4 
mostra que não se trata de uma ordem. Por isso, Jesus disse que 
Moisés "permitiu", e isso "por causa da dureza do vosso cora­
ção" (Mt 19.8). Deus só permitiu o divórcio por causa do pecado 
humano; portanto, trata-se de um instituto contrário à vontade 
de Deus. A Bíblia não ensina, não encoraja, não aconselha nem 
incentiva o divórcio. É um remédio extremamente amargo para 
uma solução inglória.
Quando o Senhor Jesus fez menção do divórcio no Sermão do 
Monte, referia-se ao mencionado em Moisés (Dt 24.1 -4) e deixou 
claro que a única base que pode legitimar o divórcio é a infidelida­
de conjugal: "Eu, porém, vos digo que qualquer que repudiar sua 
mulher, a não ser por causa de prostituição, faz que ela cometa 
adultério; e qualquer que casar com a repudiada comete adultério" 
(Mt 5.32) e fraseologia similar (Mt 19.9). A prostituição é a "coisa 
feia" que ninguém sabia, talvez porque tal pecado podia implicar 
na pena capital. Mas agora tudo se esclarece e a "coisa feia" vale 
também para o homem.
O apóstolo Paulo acrescentou mais um elemento que pode 
legitimar o abandono: "Mas, se o descrente se apartar, aparte-se; 
porque neste caso o irmão, ou irmã, não está sujeito à servidão; 
mas Deus chamou-nos para a paz" (1 Co 7.15). A NTLH emprega
"quiser o divórcio" no lugar de "se apartar". A voz do verbo grego 
mostra que a iniciativa é da parte incrédula que se aparta. Assim, 
a deserção deve ser considerada se for por causa da fé cristã e 
por iniciativa do cônjuge descrente.
Entendemos, portanto, como divórcio a dissolução do vínculo 
matrimonial por infidelidade conjugal, que viola a instrução di­
vina de "uma só carne" (Gn 2.24; Mt 19.5) ou, por deserção, que 
viola a instrução de "apegar-se" (Gn 2.24). Em qualquer dessas 
duas situações, o cônjuge inocente tem direito a novas núpcias.
Deus é sábio e perfeito. Ele conhece todas as coisas, pois é 
onisciente. "Deus é amor" (1 Jo 4.8) e deseja o bem-estar de todas 
as pessoas. Somente ele sabe o que é bom e salutar para a vida 
humana. É insensatez confiar o destino eternoà lógica e à razão, 
pois a Bíblia é a Palavra de Deus, o manual divino do fabrican­
te para todos os seres humanos. A vontade de Deus resumida 
no sétimo mandamento diz respeito à castidade do corpo e da 
mente, visando a preservação do casamento de um só homem 
com uma só mulher (1 Ts 4.3-7). A felicidade humana está em 
se deleitar em Deus.
I 1 1 0 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
4 ^ / - >
N ã o haverá paz numa sociedade se não houver 
proteção da propriedade. Isso inclui o compromisso 
de cada um na construção de uma sociedade justa e 
saudável. Deus concedeu a todos os seres humanos 
o direito de adquirir bens materiais, desde que essa 
aquisição seja de maneira honesta e envolva o tra­
balho. O oitavo mandamento foi dado a Israel como 
preceito jurídico e religioso, mas no Novo Testamento 
o tema é espiritual, pois os ladrões e roubadores não 
herdarão o Reino de Deus (1 Co 6.10).
112 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
Adquirir legitimamente a propriedade é direito sagrado. Ninguém 
tem o direito de subtrair o que não lhe pertence. Nem mesmo o Esta­
do pode lançar mão da propriedade alheia. O rei Acabe se apoderou 
ilegitimamente do campo de Nabote e tal atitude deixou Deus irado, 
por isso mandou o profeta Elias ditar o destino desse monarca com 
sua esposa Jezabel (1 Rs 21.17-19). Essa garantia vem de Deus.
PROPRIEDADE E TRABALHO
As informações bíblicas mais antigas de que dispomos sobre o 
regime de propriedade retrocedem ao período patriarcal. Abraão 
comprou de um heteu chamado Efrom parte de uma propriedade 
que se localizava no fim de seu campo, para o sepultamento de 
Sara (Gn 23.17-20). No Egito, durante o período das vacas magras, 
José comprou para o Faraó todas as terras do Egito, exceto aque­
las que pertenciam aos sacerdotes egípcios. Assim, os antigos 
proprietários arrendaram essas terras e passaram a pagar ao rei 
do Egito 20% de sua produção (Gn 47.20-26). Textos antigos de 
autores profanos confirmam essa reforma administrativa de José 
no Egito. Heródoto diz que o Faraó Sisóstris "repartiu o país entre 
todos os egípcios, concedendo a cada um uma parte quadrada e, 
conforme esta partilha, estabeleceu a eles o pagamento de um 
tributo anual" (História II. 109). Os sacerdotes eram isentos desse 
tributo. Relato similar aparece em Diodoro Sículo, historiador da 
Sicília, contemporâneo de Júlio César e Augusto, em sua Biblio­
teca Histórica, afirma que toda a terra do Egito pertencia aos 
sacerdotes, ao rei e aos guerreiros (1.73); e, segundo o estoico 
Estrabão, historiador e geógrafo grego (64 a.C.-19 d.C.), autor 
da obra Geografia, os camponeses e mercadores arrendaram as 
terras do Egito de modo que elas não lhes pertenciam (Livro 17). 
São documentos extrabíblicos confirmando o relato da Bíblia. Na
Mesopotâmia, as propriedades eram familiares e individuais, e o 
rei só podia dispor delas se as comprasse.
No sistema mosaico, toda a terra pertencia a Javé (Êx 19.5; 
Dt 10.14). Deus autorizou a partilha da terra dos cananeus entre 
as famílias israelitas, o que aconteceu durante as conquistas de 
Josué. A partir do capítulo 13 de Josué, há o registro da divisão da 
terra entre as tribos de Israel. Cada propriedade estava limitada 
por marcos cuja remoção a lei proibia severamente (Dt 19.14; 
27.17), e essa ordem se estende ao longo do Antigo Testamento 
(Jó 24.2; Pv 22.28; 23.20; Os 5.10). A lei garantia o direito de posse 
da propriedade, que era patrimônio familiar, e o rei não tinha o 
direito de se apossar dela, exceto pela compra se o proprietário 
quisesse vendê-la. O episódio do rei Acabe é um exemplo clás­
sico do direito sagrado de propriedade, como se vê em 1 Reis 21.
Deus não criou o homem para a ociosidade. Adão recebeu ta­
refas para serem feitas mesmo antes da Queda do Éden: "E tomou 
o SENHOR Deus o homem e o pôs no jardim do Éden para o lavrar 
e o guardar" (Gn 2.15). A Bíblia mostra o trabalho como bênção de 
Deus e não como maldição (Sl 128.1,2). Todos devem trabalhar e 
isso é honroso. O apóstolo Paulo disse que, "se alguém não quiser 
trabalhar, não coma também" (2 Ts 3.10). Não existe trabalho baixo 
e alto, desde que seja honesto. Até os ricos trabalham. Certamente 
produzir e enriquecer é trabalhar. Talento, habilidade, esforço são 
elementos do trabalho. Os bens e propriedades adquiridos por meio 
de trabalho honesto ou por herança são opostos ao furto e roubo.
0 OITAVO MANDAMENTO
O mandamento "Não furtarás" se dirigia originalmente a 
seqüestradores, segundo a maioria dos exegetas do Antigo Tes­
tamento, mas o contexto revela sua aplicação contra tudo o que
NÃO FURTARÁS I 1 1 3 1
é apropriação indébita, de coisas ou pessoas. A ligação com o 
tráfico de pessoas é uma conclusão e se baseia na inferência de 
Êxodo 21.16: "E quem furtar algum homem e o vender; ou for 
achado na mão, certamente morrerá". Este preceito reaparece 
mais adiante (Dt 24.7). E o verbo hebraico gãnav,m "roubar, 
furtar", que aparece no oitavo mandamento lo ’ tignov,114 "Não 
furtarás", é o mesmo usado nesses dois versículos (Êx 21.16; Dt
24.7). Pessoas eram roubadas na antiguidade para serem vendi­
das como escravas, como aconteceu com José do Egito, que foi 
vendido pelos próprios irmãos (Gn 37.22-28). Ele mesmo disse: 
"De fato, fui roubado da terra dos hebreus" (Gn 40.35). Esse tipo 
de crime era comum também no período do Novo Testamento (1 
Tm 1.10). Mas o preceito se refere também a furto de objetos (Gn
44.8). O campo semântico da raiz gnb,us se estende de "remover 
(secretamente)” a "trapacear" (Gn 31.20, 26, 27).
O furto se distingue do roubo, já que o primeiro é a subtração 
do objeto sem violência e às esconsas, pois o dono está ausente; 
o roubo é a subtração da coisa na presença da vítima, também 
sem violência, como fazem os batedores de carteira nas grandes 
cidades. O assalto é o ataque súbito a alguém com ameaça e vio­
lência para subtrair alguma coisa. O latrocínio é o roubo seguido 
de morte da vítima. O mandamento "Não furtarás" é um dispo­
sitivo contra o roubo: "Não confiem na violência, nem esperem 
ganhar alguma coisa com o roubo" (Sl 62.10, NTLH) e contra o 
furto: "Aquele que furtava não furte mais" (Ef 4.28). Mas o oitavo 
mandamento não se restringe a isso, havendo muitas atividades 
desonestas condenadas na presente ordem.
O sistema mosaico aplica a pena capital a quem violar o 
oitavo mandamento no crime de tráfego de seres humanos (Êx
I 1 1 4 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
1143i;n tò. 115 333 .
NÃO FURTARÁS I 1 1 5
21.16; Dt 24.7). A sanção contra os demais tipos de pecados e 
crimes previstos no presente mandamento é a restituição da coisa 
roubada ao dono. O receptador de bens roubados ou furtados é 
igualmente culpado com o autor do crime (Sl 50.18; Pv 29.24). O 
sistema mosaico condena também as transações fraudulentas (Lv 
19.35, 36; Dt 25.13-16). Essa proibição reaparece mais adiante 
na história de Israel (Pv 11.1). É o que Deus espera de cada um 
de nós: "Ninguém oprima ou engane a seu irmão em negócio 
algum, porque o Senhor é vingador de todas estas coisas" (1 Ts
4.6). Isso envolve a opressão, a extorsão, o suborno e a usura (Lv 
25.17,36; Dt 19.16; 23.29). Quem toma emprestado deve pagar (Sl 
37.21). Os moradores de Judá estavam envolvidos nestes pecados 
nos dias da apostasia que precederam a queda de Jerusalém (Ez 
22.12). É também violação do preceito em foco a remoção de 
marcos para aumentar a extensão da área de uma propriedade 
(Dt 19.14; 27.17; Pv 22.28).
LEGISLAÇÃO MOSAICA SOBRE 0 FURTO
A legislação mosaica traz mais adiante o modus operandi, 
a instrução para que as autoridades de Israel possam julgar os 
casos pertinentes ao sétimo mandamento (Êx 22.1-15). O tema 
é de caráter jurídico a ser administrado peloEstado e não neces­
sariamente pela Igreja.
O primeiro preceito desta seção dispõe sobre a pena apli­
cada ao ladrão (Êx 22.1-4). O v. 3b seria a seqüência lógica do 
v. 1, ficando assim: "Se alguém furtar boi ou ovelha e o degolar 
ou vender, por um boi pagará cinco bois; e pela ovelha, quatro 
ovelhas.... O ladrão fará restituição total; e se não tiver com que 
pagar, será vendido por seu furto". Teria sido da lavra de Moisés 
ou de editores posteriores, igualmente inspirados, o deslocamento
dessa cláusula? No segundo caso, qual teria sido o propósito des­
sa mudança? Há muitas explicações que não são dadas aqui por 
absoluta falta de espaço, mas merece destaque a interpretação de 
Cassuto, segundo o qual os vv. 2 e 3a devem ser o tópico central 
porque o foco é a vida humana, (apud DOZEMAN, 2009, p. 539).
A pena para quem violasse o oitavo mandamento não era a 
morte, exceto no caso de rapto de pessoas para serem vendidas 
como escravos. A pena era a restituição de cinco para cada boi e 
de quatro para cada ovelha (Êx 22.1), mas, se o animal estivesse 
ainda vivo, a restituição seria o dobro (Êx 22.4) ou 20% se o ladrão 
confessasse voluntariamente o furto (Lv 6.4, 5). Essa restituição 
não era uma simples multa pecuniária, mas o resgate pela vida 
do ladrão, porque a invasão da propriedade da vítima para roubar 
era um crime de violência que devia ser punido com a morte. 
Aqui está uma diferença significativa entre os demais códigos 
antigos, como o de Hamurabi e o Hitita. No entanto, se o ladrão 
capturado não tivesse como restituir o roubo, como mandava a 
lei, seria vendido como escravo (Êx 22.3b). É preciso lembrar que 
a lei do escravo para os hebreus era diferenciada em Israel. O 
escravo israelita nesse caso seguia o padrão mosaico (Êx 21.2).
A lei dispõe ainda sobre o ladrão arrombador, caso fosse 
morto dentro de casa pelo seu proprietário. Se o ato acontecesse 
durante a noite, o dono da casa que matou o ladrão não seria 
culpado de sangue, mas, se o caso ocorreu de dia, o dono seria 
culpado de sangue pela morte do ladrão (vv. 2, 3b).
Há certo paralelismo entre o sistema mosaico e o Código de 
Hamurabi, com diferenças e semelhanças além do aspecto espi­
ritual que faz da lei de Moisés um código sui generis. O seqüestro 
e o furto de qualquer objeto do templo dos deuses ou do palácio 
real eram crimes punidos com a pena capital (§ 6, 14), mas, se o 
objeto do furto fosse animal ou barco, a pena poderia ser pecuni­
I 1 1 6 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
NÃO FURTARÁS I 1 1 7
ária, equivalente a 30 vezes o valor do furto, e, se a vítima fosse 
um cidadão comum, a pena seria reduzida para dez vezes. Se o 
ladrão não tivesse com que pagar, seria morto (§ 8). A legislação 
mesopotâmica aqui é mais dura quanto à pena pecuniária e mais 
dura se o ladrão não tivesse como pagar a multa.
O segundo e o terceiro preceitos dizem respeito à negligên­
cia (Êx 22.5, 6). A pena aqui é diferenciada. No primeiro caso, o 
responsável pelo estrago na safra do campo e da vinha da vítima 
teria de retribuir os prejuízos com o melhor do seu próprio campo. 
No segundo caso, o culpado pelo incêndio teria de fazer a resti­
tuição com o pagamento total dos danos causados pela queima.
O sistema mosaico revela nesse oitavo mandamento o cuida­
do individual de evitar danos e prejuízos alheios. Esses princípios 
estão presentes em todas as civilizações antigas e permanecem 
ainda hoje em todas as nações. O contexto histórico social é outro, 
mas o princípio é o mesmo. Não há bois nem ovelhas nas cidades, 
mas há cães e gatos nas residências, e nem sempre seus donos 
se dão conta dos incômodos que causam aos vizinhos, ruídos e 
também dejetos em terrenos alheios, às vezes, nas próprias ruas. 
A intenção do Espírito Santo aqui é nos ensinar a amar e respeitar 
ao próximo e a não lhes causar nenhum prejuízo. A lei fala sobre 
animais, porém no contexto atual muitas outras coisas podem 
ser adicionadas, por exemplo, acidentes de carros, problemas 
em construção de casa, barulhos etc. Aí está, mais uma vez, a 
grandeza e a importância da lei dada a Israel no concerto do Sinai, 
que serve como inspiração e instrução para todos os povos e em 
todas as épocas para o bem-estar de todas as pessoas.
A lei apresenta ainda na presente seção alguns preceitos adi­
cionais sobre o ladrão (Êx 22.7-9). Aqui a lei trata de alguém que 
tem objeto roubado sob a sua guarda. Se o ladrão for encontrado, 
ele retribuirá o dobro (v. 7). Mas, se o autor do roubo não for en­
118 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA UM A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
contrado, o responsável pela custódia terá de provar que o objeto 
não foi de fato roubado, confirmando assim sua inocência (v. 8). 
Isso é para ser feito num julgamento, razão pela qual o assunto é 
levado perante os juizes (v. 9). A lei constituiu juizes para julgar 
os réus como também deliberar sobre os litígios.
O termo juizes , em hebraico aqui ’el-hã-’êlohim,116 significa 
literalmente "diante de Deus", embora o termo plural, 'èlohim, 
de forma isolada, signifique também "deuses". O termo aparece 
duas vezes na presente seção (vv. 8, 9). A tradução literal se­
ria "perante Deus" como aparece na Septuaginta e na Vulgata 
Latina. Este uso é padrão para o verdadeiro Deus no Antigo 
Testamento e não deve ser traduzido como "deuses" por causa 
do artigo. O emprego de "juizes" aqui é legítimo e ninguém ques­
tiona essa tradução. As versões rabínicas empregam "perante a 
corte . A passagem paralela em Deuteronômio lança luz sobre 
o assunto, pois aparece liphnê hã-kohãnim we-ha-shshophe- 
tim,ul "diante dos sacerdotes e dos juizes" (Dt 19.17). O termo 
shophetim, plural de shophet, significa "juiz, árbitro, conselhei­
ro jurídico; governante" (Dt 19.17). Os juizes representavam o 
Deus de Israel nos julgamentos, pois a sentença judicial vinha 
investida de legitimidade divina.
A presente seção dispõe também sobre a apropriação indé­
bita (Êx 22.10-13). O preceito aqui é a continuação do anterior, 
é que lá trata de "prata ou objetos" (v. 7), em hebraico é kesseph 
’ô-kêlim.118 Kesseph se usa para "prata", mas ainda hoje significa 
também dinheiro" em Israel; kêlim, plural de keli, significa "objeto, 
artigo, utensílio, vaso", que as nossas versões traduzem também 
por "roupa, traje, veste" em Deuteronômio 22.5. Mas os versículos 
10-13 tratam agora de animais sob a custódia de alguém. Se o
l l 7 n ’ p ç i ! s ' n i D ^ n s n ' : s S . " s d ^ - í n « ] d s .
animal fugir, morrer ou for dilacerado sem que haja testemunha 
disso, o responsável pela guarda fará um juramento perante Deus 
de que não subtraiu os animais em questão e seu dono deve 
aceitar esse juramento. Isso significa que ele não tem direito à 
restituição. Se o animal for furtado, o que tinha a custódia fará 
restituição ao dono, e, se for dilacerado, não haverá restituição, 
mas o dono precisa ver essa dilaceração.
A seção se encerra com instruções sobre empréstimo, aluguel 
e arrendamento: "Se um homem pedir emprestado ao seu pró­
ximo, e aquilo que for emprestado vier a danificar-se ou morrer 
em ausência do dono, certamente fará ele restituição. Se o dono 
estiver presente, o outro não fará restituição; se a coisa for alu­
gada, o preço do seu aluguel já respondeu por ela" (w . 14, 15). 
Se a coisa emprestada for danificada ou o animal arrendado for 
morto, estando o dono presente não haverá restituição, mas, se 
ele estiver ausente, o que tomou o objeto emprestado ou o que 
arrendou o animal terá de restituí-lo.
Diante do exposto, fica evidente que o oitavo mandamento é 
uma proibição que envolve toda a forma de apropriação indébita: 
o furto, o roubo, o tráfico de seres humanos e a recepção de qual­
quer coisa roubada, as transações fraudulentas e os pesos e as 
medidas falsos, a remoção de marcos de propriedade, a injustiçae a infidelidade em contratos entre os homens ou em questões 
de confiabilidade, patrão e empregado e vice-versa, a opressão, 
a extorsão, a usura e o suborno.
NÃO FURTARÁS I 1 1 9 I
V
10 \
FALSO TESTEMUNHO
ceiro, visto que am bos enfocam o falar a verdade. 
A proibição primária aqui diz respeito a uma decla­
ração falsa num processo legal. Isso pode ser visto 
tanto na linguagem e de maneira mais enfática em 
alguns dispositivos legais do sistema mosaico, como 
veremos no presente estudo. A construção "Não dirás 
falso testemunho contra o teu próximo" é exatamente 
a mesma nos textos de Êxodo e Deuteronômio (ê x 
20.16; Dt 5.20); no entanto, essas palavras no texto 
hebraico apresentam diferença, mas nada que mude o 
sentido da mensagem que o mandamento transmite.
O nono mandamento tem conexão com o ter-
J
Em linhas gerais, temos aqui a defesa da honra. Falar a verda­
de é para todos os povos e em todas as épocas. Mas, no sistema 
mosaico, o mandamento se distingue por ser revelação e por isso 
mesmo se reveste de autoridade divina. O mandamento é citado 
no Novo Testamento e foi resgatado pela graça e adaptado à graça. 
A fé cristã leva o tema para além dos tribunais, pois pertence à 
esfera espiritual, envolvendo a salvação, ao passo que na lei o seu 
aspecto é mais jurídico visando manter o equilíbrio na sociedade.
O mandamento não se restringe apenas aos tribunais. O con­
texto mostra que ele se refere também às palavras que usamos. 
Trata-se da responsabilidade pessoal de cada um falar a verdade. 
Disse John Stott:
Este mandamento não é somente válido nas cortes de 
justiça. Se bem que inclui o perjúrio, também estão implí­
citas todas as formas de escândalo e maledicência, toda a 
conversação ociosa e charlatanice, todas as mentiras e os 
exageros deliberados e as meias verdades que distorcem 
a verdade. Estamos proferindo falso testemunho quando 
aceitamos certos rumores maliciosos e logo os transmiti­
mos, ou quando os usamos para outra pessoa para a preju­
dicar criando impressões falsas, ou quando não corrigimos 
afirmações falsas, tanto por nosso silêncio como por nosso 
discurso (B a s ic C h r is t ia n ity , p. 69; apud NYENHUIS, Gerald 
& ECKMAN, James P., 2002, p. 448).
O mandamento condena pelo menos quatro aspectos na vida 
humana: o falso testemunho no tribunal, a calúnia pessoal, o falar 
da vida alheia e a bajulação. Israel era um estado teocrático e, por 
não haver separação entre estado e religião, a ordem "Não dirás 
falso testemunho contra o teu próximo" envolvia todo o aspecto 
da vida do israelita. Trata-se da necessidade de cada um falar a
I 1 2 2 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
NÃO DARÁS FALSO TESTEMUNHO I 1 2 3
verdade (Lv 19.11), pois o Senhor Jesus disse que o diabo é o pai 
da mentira (Jo 8.44).
0 ASPECTO EXEGÉTICO
O verbo "dizer" em "Não dirás falso testemunho contra o teu 
próximo" (Êx 20.16; Dt 5.20) no Antigo Testamento hebraico é 
‘ãnãh,n9 "responder, testemunhar, falar", usado também em um 
processo jurídico, tanto nos tribunais humanos (Dt 19.16) como 
no tribunal divino (Is 3.9; 59.12; Jr 14.7). O termo hebraico ‘êd 
shãqer,120 "falso testemunho, falsa acusação", reaparece na lite­
ratura sapiencial (S127.12; Pv 6.19; 14.5; 19.5,9; 25.18). A palavra 
‘êd, "declaração, testemunho", indica "alguém com conhecimento 
de primeira mão acerca de um acontecimento ou que pode teste­
munhar com base num relato que ouviu" (HARRIS; ARCHER, JR.; 
WALTKE, 1998, p. 1083). Tal pessoa está obrigada a testemunhar 
(Lv 5.1). E sheqer, "mentira, falsidade, engano", diz respeito a 
qualquer atividade falsa, tudo aquilo que não se baseia em fatos 
ou realidades. Aqui é a testemunha na qual não se pode confiar.
Entretanto, no texto paralelo em Deuteronômio, sheqer é subs­
tituído pelo substantivo hebraico shãw‘,m que significa "fraude, 
engano, inutilidade, inútil, imprestável, falsidade, desonestidade, 
futilidade, vacuidade" (Dt 5.20). É o mesmo termo empregado 
no terceiro mandamento para "vão" em "Não tomarás o nome 
do SENHOR, teu Deus, em vão, porque o SENHOR não terá por 
inocente ao que tomar o seu nome em vão" (Êx 20.7; Dt 5.11). Na 
verdade, há uma relação entre estes dois mandamentos, como 
exploramos no Capítulo 4. Muitos expositores do Antigo Testa­
mento não consideram isso uma diferença, mas uma forma de
119 rua. 120 -ij?o -w. 121 XI®.
ampliar o sentido do mandamento, podendo aplicar-se tanto no 
campo jurídico como nos vários aspectos da vida diária. Sheqer é 
um termo específico, e shãw ‘ é genérico. As versões antigas não 
apresentam também essa diferença. A LXX empregapseudomar- 
tyrêseis,122 "falso testemunho", nas duas versões do Decálogo. 
Isso acontece ainda em outras versões antigas como a Vulgata 
Latina, que traduz essas palavras por falsum testimonium, além 
do Pentateuco Samaritano e o Targum de Ônquelos.
É no nono mandamento em que o termo "próximo" aparece 
pela primeira vez no texto hebraico do Decálogo como berèã ‘chã,123 
"contra teu próximo". A palavra rêa‘,[24 "amigo, companheiro, 
outra pessoa", é usada para designar "vizinho, parceiro". O ami­
go pode ser íntimo ou ocasional. O termo ocorre mais três vezes 
no décimo mandamento: "... a casa do teu próximo; ... a mulher 
do teu próximo,... nem coisa alguma do teu próximo" (Êx 20.17; 
Dt 5.21)125 e faz parte do vocabulário jurídico (Êx 21.14, 35; 22.7- 
10; Dt 15.2; 19.4, 5). É a mesma palavra de "Amarás o teu próximo 
como a ti mesmo" (Lv 19.18) citada pelo Senhor Jesus (Mt 19.19). 
A LXX traduz pela palavra grega plêsíon,126 "perto, próximo" ou 
"perto de, próximo de", que no Novo Testamento grego aparece 
como preposição na passagem da mulher samaritana, quando o 
texto diz que Sicar era perto da herdade que Jacó tinha dado a José 
(Jo 4.5). Como advérbio substantivado, ocorre 12 vezes em relação 
aos mandamentos do Decálogo (Mt 5.43; 19.19; 22.39; Mc 12.31, 
33; Lc 10.27,29,36; Rm 13.9, 10; G1 5.14; Tg 2.8).
A expressão "teu próximo" era conhecida por qualquer ju­
deu familiarizado com as Escrituras no período do ministério
122’P 6 u ô o | i a p T O p i í o ê i ; . 123 ^ i n a . 124 j n .
125 Em Deuteronômio, o mandamento começa em não cobiçar "a mulher do teu pró­
ximo" (Dt 5.21), ao passo que em Êxodo se inicia com "Não cobiçarás a casa do teu
próximo" (êx 20.17).
l26IIA.r|oíov.
I 1 2 4 I 0 5 DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
terreno do Senhor Jesus, mas parece que havia incerteza quanto 
a seu exato significado: "E quem é o meu próximo?"(Lc 10.29), 
perguntou um doutor da lei a Jesus. O contexto dos evangelhos 
deixa claro que os judeus daquela época consideravam como 
seus "próximos" apenas os amigos da mesma etnia, tribo e classe 
com quem matinha uma relação mútua de afinidade e intimidade. 
Mas não é esse o pensamento do Antigo Testamento, que inclui 
também os estrangeiros além dos israelitas (Êx 3.22; Lv 19.34). 
O segundo e grande mandamento, "Amarás o teu próximo como 
a ti mesmo", é a palavra final sobre o assunto. O próximo é qual­
quer pessoa, independentemente de sua etnia, status, confissão 
religiosa ou convicção política e filosófica.
0 ASPECTO JURÍDICO
O nono mandamento apresenta pelo menos três termos hebrai­
cos do vocabulário jurídico: ‘ãnãh, sheqer e r ê a O mandamento 
original aqui não é uma proibição geral contra a mentira, pois isso 
é assunto do terceiro mandamento, mas condena aquela mentira 
que prejudica o outro. Assim, o mandamento se dirige primaria­
mente para resguardar o direito básico do cidadão israelita contra 
a ameaça de falsa acusação. O sistema mosaico trata a questão 
da falsa testemunha com a seriedade que o assunto exige. Moisés 
instrui os juizes de Israel tanto na esfera criminal (Nm 35.9-34) 
como também na esfera religiosa (Dt 17.2-7) e civil (Dt 19.14-21).
O capítulo 35 de Númerostraz as instruções acerca do 
procedimento jurídico sobre os homicídios doloso e culposo. É 
natural envolver testemunhas em processos dessa natureza. O 
julgamento de homicídio resultava em morte do culpado, por 
isso não podia haver erro. Era imperiosa a necessidade da im­
parcialidade, por isso não podia ser apenas uma só testemunha
NÃO DARÁS FALSO TESTEMUNHO 1 1 2 5 1
para depor contra o réu: "Todo aquele que ferir a alguma pessoa, 
conforme o dito das testemunhas, matarão o homicida; mas 
uma só testemunha não testemunhará contra alguém para que 
morra" (Nm 35.30). A palavra de um israelita contra a de outro 
não poderia ser válida para se estabelecer um julgamento. O 
processo religioso estabelece: "Por boca de duas ou três teste­
munhas, será morto o que houver de morrer; por boca de uma 
só testemunha, não morrerá" (Dt 17.6). Nem mesmo um pro­
cesso civil que não envolvia pena capital deveria aceitar uma só 
testemunha: "Uma só testemunha contra ninguém se levantará 
por qualquer iniqüidade ou por qualquer pecado, seja qual for o 
pecado que pecasse; pela boca de duas ou três testemunhas, se 
estabelecerá o negócio" (Dt 19.15). Dessa maneira, esperava-se 
um julgamento justo e transparente, mas nem sempre essas 
testemunhas eram idôneas e honradas.
Uma falsa testemunha estaria cometendo o crime em nada 
inferior ao crime objeto do julgamento, por isso a sentença deve­
ria ser a mesma que se destinava ao acusado: "será condenado, 
e o castigo dele será o mesmo que ele queria para o outro" (Dt
19.19). Se a acusação exigia a pena de morte, ela deveria ser 
transferida do réu para a falsa testemunha: "vida por vida, olho 
por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé" (Dt 19.21). É 
a lexis talionis,™ a "lei de talião", estabelecida em Êxodo 21.23-25 
e Levítico 24.17-20). O Código de Hamurabi condena também as 
falsas testemunhas à morte (§ 9-13). Mesmo conhecendo o rigor 
da lei, a história registra um número considerável de personagens 
que não levaram em consideração o nono mandamento.
Mesmo com todos os esses recursos legais, muitos não le­
varam em conta o amor à verdade e à honra e, ao arrepio da
I 1 2 6 ! OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
127 Talionis, forma flexionada da palavra latina, talis, "tal, qual, semelhante". É a pena 
que consiste em aplicar ao agressor o mesmo dano que causou à vítima (Mt 5.38).
lei, cometeram barbaridades. As freqüentes queixas do salmista 
mostram que era grande o número de pessoas que descumpriam 
o nono mandamento (Sl 27.12; 35.11). Quem não conhece o relato 
da vinha de Nabote? (1 Rs 21.1-16). Todo o protocolo da lei foi 
cumprido, mas faltava gente honrada e temente a Deus nesse 
julgamento orquestrado pela ímpia Jezabel, que levou Nabote à 
morte e sua propriedade confiscada pelo rei Acabe. Os profetas 
apresentaram diversas denúncias nesse sentido ao longo da 
história do Antigo Testamento (Jr 7.9; Os 4.2).
O Senhor Jesus Cristo foi a principal vítima de falso testemu­
nho. O sistema legal de Jerusalém foi arranjado por represen­
tantes da lei cujo propósito era fazer o linchamento parecer um 
julgamento justo conforme determina o sistema mosaico. Seus 
acusadores eram as autoridades políticas e religiosas: "Os prín­
cipes dos sacerdotes, e os anciãos, e todo o conselho buscavam 
falso testemunho contra Jesus, para poderem dar-lhe a morte, e 
não o achavam, apesar de se apresentarem muitas testemunhas 
falsas" (Mt 26.59, 60). A passagem paralela de Marcos 14.55, 56 
afirma que as acusações dessas falsas testemunhas da elite do 
Sinédrio "não eram coerentes". Estêvão foi também vítima de 
falsas testemunhas. Essas pessoas foram subornadas para falarem 
mentiras contra um homem justo; a acusação era de blasfêmia 
contra Deus, contra Moisés, contra o templo e contra a lei (At 
6.11-14). Assim como o Senhor Jesus, Estêvão foi condenado à 
morte (At 7.58-60). O apóstolo Paulo foi acusado, além das demais 
acusações falsas de introduzir gentios no templo de Jerusalém 
(At 21.27-33). Os romanos o prenderam para livrá-lo de um lin­
chamento por parte dos judeus radicais, mas este episódio foi o 
início do fim da carreira apostólica de Paulo.
O nono mandamento não somente defende a honra, mas 
também a vida. A pena era a mesma destinada ao réu, caso
NÃO DARÁS FALSO TESTEMUNHO I 1 2 7 !
1 2 8 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
sua culpa fosse real. Um falso testemunho pode resultar num 
julgamento injusto e comprometer a idoneidade da corte. Não é 
possível a vida numa sociedade corrompida em que o cidadão 
de bem não se sente seguro diante de uma corte que não oferece 
confiança e de um modus operandi em conluio com os corruptos 
(Hc 1.4). O Código de Hamurabi prevê a pena de morte para esse 
tipo de crime. O sistema mosaico coloca a testemunha falsa 
sujeita à mesma pena que ela esperava ser aplicada ao acusado 
(Dt 19.16-21). Mesmo assim, nunca faltou quem se apresentasse 
como falsa testemunha.
0 ASPECTO DA VIDA DIÁRIA
O nono mandamento não se restringe apenas ao aspecto jurí­
dico, ao perjúrio num tribunal civil ou criminal, mas se aplica tam­
bém à vida diária, como o boato e o mexerico (Êx 23.1; Lv 19.16). 
Estes envolvem a mentira e trazem implicações profundas na vida 
humana. Deus condena tais práticas, e o ensino bíblico sobre o 
assunto começa em Moisés e se estende até o Novo Testamento.
"Não admitirás falso rumor e não porás a tua mão com o 
ímpio, para seres testemunha falsa" (Êx 23.1). A TB traz "Não 
levantarás um boato falso"; a ARA e NTLH empregam "notícias 
falsas". A expressão hebraica para "falso rumor" aqui é shêma ’ 
shãw ‘.12S O termo shêma ’, "informação, notícia, fama, boato", é um 
substantivo derivado do verbo Vtpüi (shãma ‘), "ouvir, escutar, pres­
tar atenção, obedecer". Essa informação, notícia ou fama pode 
ser boa ou ruim e diz respeito ao que se ouve dizer (1 Rs 10.1), 
diferentemente de um conhecimento pessoal, de uma experiência 
direta: "Antes eu te conhecia só por ouvir falar, mas agora eu te
NÃO DARÁS FALSO TESTEMUNHO I 1 2 9
vejo com os meus próprios olhos" (Jó 42.5). E o termo s h ã w que 
significa "fraude, engano, inutilidade, inútil, imprestável, falsidade, 
desonestidade, futilidade, vacuidade", aparece no terceiro man­
damento (Êx 20.7; Dt 5.11) e no nono mandamento na versão de 
Deuteronômio (Dt 5.20). O falso boato é a propagação de uma 
notícia infundada, não oficial e de fonte desconhecida. O contexto 
mostra que divulgar informação enganosa é associação com o 
ímpio para se tornar falsa testemunha: "E não porás a tua mão 
com o ímpio, para seres testemunha falsa" (Êx 23.1b). Mesmo as 
coisas triviais do dia a dia podem terminar na justiça, pois elas 
destroem a reputação de qualquer pessoa.
"Não andarás como mexeriqueiro entre o teu povo; não te 
porás contra o sangue do teu próximo. Eu sou o SENHOR" (Lv 
19.16). A proibição consiste em dois preceitos paralelos que 
expressam a mesma ideia. O termo hebraico usado aqui como 
"mexeriqueiro" é rãkTl,129 "caluniador, difamador", e aparece 
apenas seis vezes no Antigo Testamento, indicando alguém que 
calunia e revela segredos (Pv 11.13; 20.19; Jr 6.28; 9.4 [3]; Ez
22.9). Com exceção de Ezequiel, em todas elas o substantivo vem 
acompanhado do verbo hãlach,!30 "andar, caminhar"; isso indica 
tratar-se de uma expressão idiomática para o ato de caluniar. 
Os léxicos geralmente informam que rãkil é um termo obscuro. 
A Septuaginta revela nele nuances que indicam desonestidade, 
decepção, duplicidade e falsidade. Assim, o mexeriqueiro aqui é 
muito mais que a simples fofoca ou fuxico. Isso se confirma na 
segunda cláusula: "Não te porás contra o sangue do teu próximo. 
O "sangue" diz respeito à vida: "Não atentarás contra a vida do 
teu próximo" (ARA). A proibição nessa segunda parte significa 
a responsabilidade pessoal denão colocar em perigo a vida do
>» ‘ron.
próximo com o falso testemunho a fim de declarar o inocente 
como culpado.
O mexerico corriqueiro é também condenado pela Palavra de 
Deus (2 Co 12.20). O cristão nunca deve falar mal de um irmão 
na igreja (Tg 4.11). o nono mandamento proíbe toda forma de 
mentira, tanto aquela que se diz deliberadamente na vida diária 
como também sob juramento num tribunal. Tudo aquilo que se 
fala com o propósito de prejudicar o bom nome de alguém é pe­
cado e violação desse mandamento. O Senhor Jesus Cristo citou 
este mandamento para o moço rico, juntamente com outros do 
Decálogo (Mt 19.18; Mc 10.19; Lc 18.20). Da mesma maneira, 
fez o apóstolo Paulo (Rm 13.9). Mas na graça este mandamento 
aparece na esfera espiritual e não jurídica (Ef 4.25; Cl 3.9).
Pelo que deixai a mentira e falai a verdade cada um com o seu 
próximo; porque somos membros uns dos outros" (Ef 4.25). O após­
tolo Paulo mostra que engendrar pensamento falso, falar mentira, 
propalar falsos rumores faz parte do estilo de vida do mundo pagão. 
Os gentios convertidos à fé cristã tinham pela frente o desafio de 
mudar o seu padrão de vida; precisavam agora viver como discípulos 
de Cristo. Verdade é aquilo que corresponde aos fatos, em contraste 
com qualquer coisa enganosa, a mentira (Dt 13.14; 17.4; is 43.9).
A mentira é o oposto à verdade; trata-se da prática do engano, da 
falsidade e da traição. No contexto bíblico, a mentira vai além da 
prática intelectual da desonestidade; é uma distorção do verdadeiro 
eu e da nossa relação com Deus e com o próximo (1 Jo 2.4; 4.20).
A proibição aqui é a divulgação não oficial e de fonte desco­
nhecida de informação ou notícia no meio do povo de Deus. A 
lei que manda amar o próximo proíbe o discurso nocivo, ainda 
mais quando o objetivo é destruir a vida ou a reputação do outro.
A pessoa confiável e de bem guarda segredo e não divulga o que 
ouve para não prejudicar o próximo.
I 1 3 0 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
O Decálogo conclui com um mandamento que 
proíbe o desejo ilícito, a cobiça sem sugestão alguma 
de ato, pois diz respeito primariamente à motivação, 
e não à ação concreta. A cobiça é um mal devastador 
muito comum ainda hoje em nossa cultura ocidental 
materialista. Trata-se de uma atitude de natureza in­
terna que pode expressar-se em ato real. Toda ação 
boa ou ruim começa no pensamento. Os outros m an­
damentos proíbem atos; aqui, a proibição diz respeito 
ao desejo, não ao desejo em si, mas ao desejo daquilo 
que pertence a outro. Não é pecado desejar bens e 
conforto, as coisas boas de que necessitamos na vida.
O décimo mandamento aborda a responsabilidade do 
israelita sobre o pecado do pensamento. É um recurso divi­
no que Deus proveu para habilitar o israelita a obedecer os 
mandamentos anteriores. A cobiça é um dos piores pecados, 
o pecado que não se vê. Essa é a sua característica distintiva 
em relação aos outros, pois não é possível ser conhecido. Isso 
mostra que o Legislador divino é onisciente, pois ele conhece 
o mais íntimo do coração humano, nossos desejos e intenções 
(1 Rs 8.39; 1 Cr 28.9; Jr 17.10; At 1.24). Deus se interessa não só 
pelos corretos atos concretos, não apenas pelo cerimonialismo 
na adoração, mas principalmente pela pureza de um coração 
sincero. Isso mostra o lado espiritual do Decálogo; nem tudo 
é apenas jurídico. A ideia central é não desejar aquilo que 
pertence ao outro.
Já vimos que o Decálogo está estruturado em duas seções 
identificadas com a primeira e a segunda tábuas, as tábuas 
de pedra em que foram escritos os Dez Mandamentos, literal­
mente as dez palavras. A primeira contém os compromissos 
do israelita diante de Deus, e a segunda de sua responsabi­
lidade para com o próximo. Os dois grandes mandamentos 
citados por Jesus podem ser um resumo dessas duas tábuas. 
Esses mandamentos estão dispostos numa seqüência lógica. O 
quinto mandamento é uma ponte que une o conteúdo das duas 
tábuas. Em seguida vem a proteção da vida: “Não matarás"; 
depois a proteção da família: "Não adulterarás"; a proteção da 
propriedade: "Não furtarás"; a proteção da honra: "Não dirás 
falso testemunho contra o teu próximo"; e o último protege o 
israelita de ambições erradas.
I 1 3 2 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDAN ÇA
NÃOCOBIÇARÁS I 1 3 3
EXEGESE DO DÉCIMO MANDAMENTO
O verbo hebraico hãmad,131 "desejar, ter prazer em, cobiçar, 
ter concupiscência de", aparece 14 vezes no Antigo Testamen­
to. O termo em si é neutro e se aplica também a coisas boas 
(SI 19.10 [11]; 68.16 [17]). Essa palavra é repetida no décimo 
mandamento no texto de Êxodo 20.17 e uma só vez no registro 
do Decálogo, em Deuteronômio 5.21: "E não cobiçarás a mulher 
do teu próximo". Na segunda cláusula, "e não desejarás a casa 
do teu próximo", aparece outro verbo ’ãwãh,'32 "desejar arden­
temente, ansiar, cobiçar, anelar". Ambos os verbos aparecem 
como sinônimos no relato da tentação do Éden: "agradável 
aos olhos... e desejável para dar entendimento" (Gn 3.6). A 
Septuaginta traduz pelo verbo epithyméõ,133 literalmente "fixar 
desejo sobre", da preposição epí,]34 "sobre", e do substantivo 
thymós,135 "paixão, ira, furor".
Esse verbo grego aparece no Novo Testamento para se referir 
ao décimo mandamento (Rm 7.7; 13.9) e também para expressar 
desejo por tudo o que é proibido (Mt 5.28; 1 Co 10.6). O substantivo 
derivado dele, epithymia, 136 é usado para "concupiscência" em 1 
João 2.16: "Porque tudo o que há no mundo, a concupiscência da 
carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não é do 
Pai, mas do mundo". Concupiscência é desejo desordenado; trata- 
-se do "forte e continuado desejo de fazer ou de ter o que Deus 
não quer que façamos ou tenhamos" (KASCHEL & ZIMMER, 2006, 
p. 45). Mas todos esses termos, hebraicos e gregos, são neutros, 
podendo se referir a coisas boas ou a coisas más, dependendo 
do contexto (Mt5.28; 13.17).
131 nan.
134 ’Éuí.
132 nix.
135 ©unóç.
133 'ETuOunéco. 
136 ’Etri.9u|iía.
O formato textual do décimo mandamento de Êxodo 20.17 é 
diferente do registro de DeuteronÔmio 5.21, mas não divergente:
I 1 3 4 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
Os católicos romanos e os luteranos mantiveram a tradição 
catequética medieval do Decálogo esboçada por Agostinho de 
Hipona e que predominou durante a Idade Média. Os dois pri­
meiros mandamentos são considerados um só, e o décimo é di­
vidido em dois. "Não cobiçarás a casa do teu próximo" é o nono, 
e Não cobiçarás a mulher do teu próximo" (Êx 20.17), o décimo. 
Qualquer pessoa pode observar sem muito esforço que tal arranjo 
e uma camisa de força, pois não corresponde à divisão natural 
(Êx 20.1-17; Dt 5.7-21). Além disso, o Decálogo do catolicismo 
romano não é bíblico, trata-se de uma interpretação com lentes 
papistas. Nós seguimos o arranjo das igrejas ortodoxas e protes­
tantes reformadas, que vem desde os antigos judeus (JOSEFO, 
Antiguidades Judaicas, Livro 3, 4.113, edição CPAD).
O décimo mandamento aparece expandido em DeuteronÔmio 
em relação ao texto de Êxodo e inclui o campo do próximo na 
lista das coisas que não devem ser cobiçadas. Alguns críticos 
estranham a inversão das cláusulas, pois a fraseologia de Êxodo 
começa por não cobiçar a casa do próximo e em seguida vem a
"Não cobiçarás a casa 
do teu próximo; não co­
biçarás a mulher do teu 
próximo, nem o seu ser­
vo, nem a sua serva, 
nem o seu boi, nem o 
seu jumento, nem coisa 
alguma do teu próximo" 
(Êx 20.17).
"E não cobiçarás a 
mulher do teu próximo; e 
não desejarás a casa do 
teu próximo, nem o seu 
campo, nem o seu servo, 
nem a sua serva, nem o 
seu boi, nem o seu jumen­
to, nem coisa alguma do 
teu próximo" (Dt5.21).
NÃO COBIÇARÁS í 1 3 5
proibição de não cobiçar a mulher do próximo, mas emDeutero- 
nômio essa ordem é invertida: primeiro vem a mulher e depois a 
casa. Ambos textos, contudo, proíbem a cobiça de bens epessoas-, 
além da mulher ou do esposo, pois a mulher pode também cobiçar 
o marido alheio, o servo e a serva do próximo;propriedades-, casa 
e campo; o termo "casa" aparece muitas vezes na Bíblia com o 
sentido de "família" (Js 24.15; At 16.31), mas parece não ser essa 
a ideia aqui; e semoventes: boi, jumento ou qualquer outra coisa. 
A frase final "nem coisa alguma do teu próximo" inclui posição 
social ou ascensão no trabalho.
Há discussão sobre a substituição de hãmad por ’ãwãh na segun­
da cláusula do décimo mandamento (Dt 5.21). O verbo hãmad aqui 
aparece com a esposa do próximo e ’ãwãh com as demais coisas. 
Isso pode levar alguém a pensar em hãmad como um tipo sensual de 
desejo, mas isso não procede por duas razões principais: a) é usado 
para bens móveis e imóveis (Js 7.21; Mq 2.2); b) ambos os termos 
aparecem como sinônimos (Gn 3.6; Pv 6.25; Sl 68.17). Parece que 
'ãwãh diz respeito a um tipo de desejo casual. O formato textual de 
Êxodo está adaptado ao estilo nômade de vida de Israel no deserto, 
ao passo que Deuteronômio, quase 40 anos depois, é o modelo 
para o povo prestes a ser estabelecido na terra de Canaã como país.
OS FATOS
Os relatos bíblicos estão repletos de cobiças destruidoras, a 
começar pelo primeiro casal. "E vendo a mulher que aquela árvore 
era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável 
para dar entendimento, tomou do seu fruto, e comeu, e deu tam­
bém a seu marido, e ele comeu com ela" (Gn 3.6). Aqui se expressa 
exatamente o que afirma o Novo Testamento: "a concupiscência da 
carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida" (1 Jo 2.16).
Os irmãos de José desejavam a posição dele no coração de seu 
pai, Jacó (Gn 37.4). A cobiça causou a ruína de Acã: "Quando vi 
entre os despojos uma boa capa babilônica, e duzentos siclos de 
prata e, uma cunha de ouro do peso de cinqüenta siclos, cobicei- 
-os e tomei-os; e eis que estão escondidos na terra, no meio da 
minha tenda, e a prata, debaixo dela" Os 7.21). O verbo "cobiçar" 
aqui é hãmad, o mesmo usado no Decálogo (Êx 20.17; Dt 5.21). 
Acã cobiçou e se apropriou dos despojos de Jericó, objetos que 
não lhes pertencia (Js 6.19).
O rei Acabe cobiçou vinha de Nabote e isso resultou num 
escândalo nacional que levou à ruína a casa real (1 Rs 21.1-16). 
Ele e sua esposa, Jezabel, violaram o sexto mandamento: "Não 
matarás"; o oitavo: "Não furtarás"; o nono: "Não dirás falso teste­
munho contra o teu próximo"; e o décimo: "Não cobiçarás". Dois 
outros casos de cobiça aconteceram na casa de Davi: seu filho 
Amnom violentou a própria irmã, Tamar, movido pela lascívia (2 
Sm 13.15), e Absalão desejou ocupar o trono de seu pai enquanto 
Davi ainda era vivo e reinava em Israel (2 Sm 15.16).
No Novo Testamento, encontramos Ananias e Safira, que 
desejavam prestígio na Igreja, mas tentaram consegui-lo de ma­
neira pecaminosa (At 5.1-11). Simão Mago, de Samaria, tentou 
comprar os dons de Deus com dinheiro, pois almejava poderes 
sobrenaturais para ostentação pessoal (At 8.18). Diótrefes, perso­
nagem desconhecida, cuja única menção no Novo Testamento é 
desabonadora, já que ele procurava ter o primado na Igreja (3 Jo 9).
0 DÉCIMO MANDAMENTO NO NOVO TESTAMENTO
O mandamento "Não cobiçarás..." se distingue dos outros 
nove por se tratar da motivação, e não do ato. Assim, é possível 
violar esse preceito sem que haja comprovação concreta. É o
I 1 3 6 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
NÃO COBIÇARÁS I 1 3 7
décimo mandamento que golpeia a própria raiz do pecado, o 
coração pecaminoso e o desejo perverso. O Senhor Jesus disse 
que é do mais íntimo do ser humano que procede todo o tipo de 
pecado: "Porque do interior do coração dos homens saem os maus 
pensamentos, os adultérios, as prostituições, os homicídios, os 
furtos, a avareza, as maldades, o engano, a dissolução, a inveja, 
a blasfêmia, a soberba, a loucura. Todos estes males procedem de 
dentro e contaminam o homem" (Mc 7.21 -23). A lista de Mateus é 
mais curta (Mt 15.19). Essas palavras mostram a dura realidade: o 
que o ser humano realmente é, isso afeta o que ele diz (Mt 12.34, 
35). Toda ação humana começa no seu coração (Tg 1.14, 15).
O décimo mandamento era o recurso divino para o israelita se 
proteger de não violar nenhum dos mandamentos do Decálogo. 
Mas, na graça, somos guiados pelo Espírito Santo, o qual controla 
os nossos desejos. Assim, o preceito aqui em foco foi adaptado 
pela graça. Cabe a cada um vigiar e orar para não entrar pelo 
caminho da cobiça. Jesus disse: "Acautelai-vos e guardai-vos da 
avareza, porque a vida de qualquer não consiste na abundância do 
que possui" (Lc 12.15). A avareza é o apego demasiado e sórdido 
ao dinheiro, é o desejo de adquirir e acumular riquezas. Desse 
modo, os bens materiais se transformam em deus para os tais 
avarentos. A Bíblia afirma que a avareza é idolatria: "Mortificai, 
pois, os vossos membros que estão sobre a terra: a prostituição, 
a impureza, o apetite desordenado, a vil concupiscência e a ava­
reza, que é idolatria" (Cl 3.5).
A avareza e a cobiça caminham juntas. Ambas são impróprias 
para quem busca o reino de Deus (1 Tm 6.9, 10). Essas coisas 
são próprias para quem teme o futuro, desconfia de Deus e da 
sua providência. Não somente a avareza, mas também a inveja, 
pertence a esse grupo de pecados. A inveja é o "sentimento de 
pesar pelo bem e pela felicidade de outra pessoa, junto com o
desejo de ter isso para si" (KASCHEL & ZIMMER, 2006, p. 90). 
Todas essas coisas envolvem a cobiça, e a Palavra de Deus afirma 
com todas as letras que a cobiça é pecado (Rm 7.7).
A vontade de Deus expressa nesse último mandamento do 
Decálogo é que haja pleno contentamento com aquilo que temos 
e com a nossa condição: "Contentai-vos com o vosso soldo" (Lc 
3.14), ensino de João Batista para os militares. "Mas é grande 
ganho a piedade com contentamento" (1 Tm 6.6). Quem tem 
Jesus não está obcecado pelas riquezas materiais, pois tem em 
seu interior algo muito mais valioso que os tesouros do mundo. 
A NTLH traduz esse versículo da seguinte forma: "É claro que 
a religião é uma fonte de muita riqueza, mas só para a pessoa 
que se contenta com o que tem”. A Bíblia nos exorta ainda: 
"contentando-vos com o que tendes" (Hb 13.5). Há aqui certo 
paralelo com Filipenses 4.11. Mas convém ressaltar que todas 
essas exortações não são uma apologia à pobreza nem uma 
defesa do status quo econômico; é uma recomendação para que 
nossos desejos não vendam desagradar a Deus nem causar danos
I
ao nosso próximo (Rm 12.15).
A conduta do cristão deve ser a de se alegrar com que os se 
alegram e chorar com os que choram (Rm 12.15). Ninguém deve 
ser dominado pela inveja (G1 5.26; Tg 4.14-16) nem alimentar o 
sentimento de tristeza pelo sucesso alheio (Ne2.10;Sl 112.9,10). 
Glorifique a Deus pelas bênçãos e pelo sucesso do seu irmão, e 
você será abençoado também, a seu tempo (Ec 3.1-8).
I 1 3 8 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
A IGREJA E A
O enfoque do presente capítulo é a compreensão 
da lei de Moisés e a sua relação com o evangelho. Trata- 
-se de um tema de grande complexidade. Disse Lutero: 
"Quem sabe distinguir corretamente o evangelho da lei 
deve agradecer a Deus e pode estar certo de que é um 
teólogo". Os três principais reformadores do século 16 
debateram o assunto. Depois dessa série de estudos 
sobre o Decálogo e cada um dos seus preceitos, resta 
responder a duas questões: se a moral cristã está fun­
damentada nas dez palavras ou nos Dez Mandamentos 
(como aparece em nossas versões da Bíblia) e qual a 
sua relevância para a Igreja de Cristo na atualidade.
Já havia animosidades sobre o papel da lei de Moisés nos 
dias apostólicos.Esses debates ajudam a elucidar a questão, mas 
nem por isso a solucionaram definitivamente. Isso vem desde 
os galacionistas que se opunham ao apóstolo Paulo e também, 
em parte, desde os ebionitas, que defendiam a guarda da lei de 
Moisés. Mas os discípulos desses legalistas ainda estão por aí.
A LEI DE DEUS
A lei de Deus e os Dez Mandamentos não são a mesma coisa. 
Os Dez Mandamentos encabeçam os demais preceitos entre­
gues por Deus a Moisés no monte Sinai desde Êxodo 19.16-19 
até Levítico 26.46; 27.34. Esses preceitos são identificados com 
frequência como estatutos, juízos, leis e mandamentos. Muitos 
deles são repetidos nos livros de Números e DeuteronÔmio. Todo 
esse sistema legal integra o Pentateuco, que aparece na Bíblia 
como lei, livro da lei, lei de Moisés, lei de Deus, lei do Senhor.
É oportuno aqui esclarecer o que a Bíblia quer dizer quando usa 
as palavras "lei de Deus". O termo aparece sete vezes nas Escrituras, 
quatro no Antigo Testamento e três no Novo, e em nenhum lugar diz 
respeito ao Decálogo. As quatro primeiras ocorrências se referem a 
toda a lei de Moisés, ao Pentateuco, como livro: "Josué escreveu estas 
palavras no livro da Lei de Deus" Os 24.26); "E leram o livro, na Lei de 
Deus... ele lia o livro da Lei de Deus" (Ne 8.8,18); "e convieram num 
anátema e num juramento, de que andariam na Lei de Deus, que foi 
dada pelo ministério de Moisés, servo de Deus; e de que guardariam 
e cumpririam todos os mandamentos do SENHOR, nosso Senhor, e 
os seus juízos e os seus estatutos" (Ne 10.29). Assim, as expressões 
"lei de Deus", "lei do Senhor" e "lei de Moisés" dizem respeito à mes­
ma coisa (Ne 8.1, 8, 18; Lc 2.22, 23). Trata-se do Pentateuco no seu 
todo, e não apenas do Decálogo, do livro, e não das tábuas de pedra.
I 1 4 0 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
As outras três aparecem somente em Romanos, e nenhuma 
delas diz respeito ao Decálogo: "Porque, segundo o homem inte­
rior, tenho prazer na lei de Deus... Dou graças a Deus por Jesus 
Cristo, nosso Senhor. Assim que eu mesmo, com o entendimento, 
sirvo à lei de Deus, mas, com a carne, à lei do pecado" (Rm 7.22, 
25). O termo "lei" aparece cerca de 70 vezes nesta epístola com 
amplo significado, cuja explanação não cabe aqui. A "lei de Deus" 
neste contexto contrasta a "lei do pecado", mostrando tratar-se 
de um princípio. A outra ocorrência é no capítulo seguinte: "Por­
quanto a inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não 
é sujeita à lei de Deus, nem, em verdade, o pode ser" (Rm 8.7). O 
homem carnal não tem lei nem se submete à vontade de Deus 
que o apóstolo chama de "lei de Deus".
OS TRÊS TIPOS DE LEI
É comum ouvir falar de lei moral, lei cerimonial e lei civil. Os 
preceitos morais estão resumidos nos Dez Mandamentos. São os 
que tratam dos princípios básicos morais (alguns chegam a consi­
derar erroneamente o sábado como preceito moral, ver Capítulo 5). 
É única porção do Pentateuco escrita pelo dedo de Deus em duas 
tábuas de pedra. A própria nação de Israel viu e ouviu Deus entre­
gando essa parte da lei a Moisés. Essa é outra característica distintiva 
do Decálogo. A lei cerimonial é a parte que trata das festividades 
religiosas, do sistema de sacrifício e da adoração no santuário, dos 
alimentos limpos e imundos e das instruções sobre a pureza ritual, 
entre outros. A lei civil diz respeito à responsabilidade do israelita 
como cidadão; são regulamentos jurídicos e instruções que regiam 
a nação de Israel. Convém salientar o que já foi dito no Capítulo 1: 
"Embora essa distinção tripartite seja antiga, seu uso como funda­
mento para explicar a relação entre os testamentos não é demons-
A IGREJA E A LEI DE DEUS I 1 4 1 1
travelmente derivada do Novo Testamento e provavelmente não é 
anterior a Tomás de Aquino" (CARSON, 2011, p. 179). Os preceitos 
cerimoniais e civis derivam dos preceitos morais. Esses três tipos de 
lei estão presentes no Pentateuco, entretanto, tudo é a lei de Moisés.
Há uma interpretação entre os cristãos de que a lei moral é 
eterna, portanto, para a atualidade. A lei cerimonial se cumpriu 
na vida e na obra de Jesus Cristo. A lei civil cumpriu sua função 
até que Israel deixou de ser um estado teocrático, e a Igreja não 
é um estado. Tudo isso são interpretações. É verdade que a lei 
cerimonial se cumpriu em Jesus, pois todo o sistema e ritos do 
tabernáculo apontavam para o Messias. Israel perdeu a condição 
de estado teocrático (Mt 21.43), e os privilégios de Israel foram 
transferidos para a Igreja (Êx 19.6, 7; 1 Pe2.9, 10). O Senhor Jesus 
cumpriu todos os preceitos morais durante sua vida terrena. Em 
nenhum lugar o Novo Testamento diz que a lei moral se resume 
a amar a Deus e ao próximo, mas abrange toda a lei: "Desses dois 
mandamentos dependem toda a lei e os profetas" (Mt 22.40). O 
apóstolo Paulo afirma: "Porque quem ama aos outros cumpriu a 
lei" (Rm 13.8). Em seguida, ele cita cinco mandamentos do Decá- 
logo, mas não na seqüência canônica, e depois volta a enfatizar 
que "o cumprimento da lei é o amor" (Rm 13.10).
OS REFORMADORES DO SÉCULO 16
Lutero entendia as ações de Deus em termos dialéticos e nisso 
via contraste entre a lei e o evangelho. A lei é a expressão máxi­
ma da vontade de Deus. Esse conceito é também defendido pelos 
judeus, e Calvino segue a mesma linha de pensamento. Segundo 
Lutero, a lei tem duas funções primárias. A primeira é coercitiva, 
restringe o perverso e mantém a ordem na sociedade, essa é a lei 
civil. A outra função da lei é teológica. A lei é santa e perfeita, foi
I 1 4 2 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDAN ÇA
dada para a vida, mas a distância entre sua santidade e a incapaci­
dade humana de cumpri-la faz da lei uma palavra de julgamento. O 
que era para a vida transformou-se em morte. A função teológica 
exige do homem algo que lhe é impossível: cumprir a lei totalmen­
te. Mas a lei permite ao homem conhecer o seu pecado, obter o 
conhecimento de si mesmo com a ajuda do Espírito Santo e em 
seguida obter o conhecimento de Deus. A lei não salva, mas é um 
meio de nos levar a Cristo; só é conhecida a partir do evangelho, 
e o evangelho se torna incompreensível sem ela.
Zuínglio classificava os preceitos da lei em morais, civis e ce­
rimoniais. Os preceitos civis tratam de questões humanas particu­
lares, os cerimoniais foram dados para o período antes de Cristo, 
e os preceitos morais foram resumidos no Novo Testamento na 
lei do amor. Para Zuínglio, a lei moral expressa a vontade eterna 
de Deus e por essa razão não pode ser abolida. Os cristãos estão 
sujeitos à lei do amor. Assim, a lei e o evangelho têm a mesma 
essência, são praticamente os mesmos. Zuínglio discordava de 
Lutero nesse ponto e também da ideia de que a função da lei era 
ser uma palavra de julgamento de Deus sobre o ser humano, 
mas dizia que ela estabelece a vontade e a natureza da Deidade.
Calvino trata o assunto no volume 2 de suas Institutas. A 
redenção prometida em Cristo está presente na lei cerimonial. 
O valor de todo o ritual do tabernáculo está na sua presença 
messiânica; o sacrifício e todo o serviço sagrado dos sacerdotes 
são aceitáveis diante de Deus porque tudo isso aponta para a 
pessoa e a obra de Cristo. Todos esses preceitos cerimoniais já 
se cumpriram. Calvino via um tríplice propósito na lei moral, a 
saber: mostrar o pecado, restringir o perverso e revelar a vontade 
de Deus. Na sua interpretação, Cristo aboliu a lei cerimonial. A 
lei moral é a expressão da vontade de Deus; essa vontade jamais 
pode ser mudada, de modo que a lei nunca pode ser abolida. Cristo
A IGREJA E A LEI DE DEUS \ 1 4 3 í
1 4 4 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
aboliu a maldição da lei, e não a sua validade. Assim, Calvino 
considera a ideia de os cristãos não estarem sujeitosvai além de tudo isso, pois nela Deus esboça o plano da redenção 
humana em Cristo. É o limiar da história do plano da salvação de 
toda a humanidade. A obra se inicia com a origem dos céus e da 
terra e vai até a morte do grande legislador dos hebreus.
A lei ocupa a primeira parte do Antigo Testamento por ser a 
parte mais antiga das Escrituras Sagradas e devido a seu caráter 
peculiar como fundamento de toda a literatura bíblica. Todos 
os livros históricos, proféticos e poéticos do Antigo Testamento 
apontam retrospectivamente para a lei de Moisés "como tipo de 
fonte principal [que] assume a existência não meramente da lei 
em si, senão de um livro da lei, com o caráter e forma precisos 
dos cinco livros de Moisés" (KEIL & DELITZSCH, 2008). Aqui,
í 1 4 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
OS DEZ MANDAM ENTOS I 1 5
história é também lei e profecia, com implicações teológicas e 
significados espirituais profundos.
Deus manda Moisés ficar no monte para ali lhe dar as "tábuas 
de pedra, e a lei, e os mandamentos que tenho escrito, para os 
ensinares" (Êx 24.12). Uns acreditam que os termos "lei" e "manda­
mentos" sejam sinônimos que indicam o conteúdo das tábuas de 
pedra. Uma tradição rabínica interpreta que se trata do Decálogo e 
de leis adicionais. Mas só os Dez Mandamentos foram escritos em 
duas tábuas de pedra pelo próprio Deus (Dt 4.13; 5.22; 10.2-4). As 
outras partes da lei foram ditadas por Deus e escritas por Moisés 
(Êx 17.14; 24.4; 34.27; Dt 27.3, 8; 31.9). Aqui temos os primeiros 
escritos da lei que envolvem os Dez Mandamentos e a instrução 
sobre a construção do tabemáculo (Êx 31.18), bem como sua 
execução até o final do livro, incluindo a interrupção dos capítulos 
32-34, que relata o culto do bezerro e a restauração do povo. Mas, 
a revelação prossegue até o livro de Levítico (Lv 27.34).
A lei é identificada na Bíblia Hebraica como sêpher ha-torãh,' 
"o livro da lei" (Dt 31.16; Js 1.8); ou simplesmente ha-tôrãh,2 "a lei" 
(Ne 8.2, 7,13). A palavra "Torá" significa basicamente, "instrução, 
ensino, lei" e aparece no Antigo Testamento com o sentido mais 
amplo de coleção ou sumário de instrução, código de lei (Êx 24.12; 
Dt 1.5) ou regra particular (Êx 16.4). O termo se aplica também 
a norma ou instrução meramente humana (2 Sm 7.19) e ainda 
como instrução dada por humanos para a educação na literatura 
sapiencial (Pv 1.8; 3.1; 6.20). Esse vocábulo é usado no plural: 
"Estes são os estatutos, e os juízos, e as leis que deu o SENHOR 
entre si e os filhos de Israel, no monte Sinai, pela mão de Moi­
sés" (Lv 26.46). O plural, tôroth, "leis", aparece aqui em relação 
à lei de Moisés. A lei é uma só; não existe mais que uma lei. O
1 rninn iso. 2 rninn.
plural aqui diz respeito às várias prescrições rituais: Esta é a lei 
do holocausto (Lv 6.9 [2]);3 "E esta é a lei da oferta de manjares" 
(Lv 6.14, [7]); "Esta é a lei da expiação do pecado" (Lv 6.25 [18]); 
"E esta é a lei da expiação da culpa" (Lv 7.1). Veja ainda Lv 7.11; 
11.46; 12.7; 13.59; 14.57; 15. 32; 18.4.
O termo torah vem do verbo (ÍTT - yrh) ou hôrãh,4 na sua 
forma flexionada, que indica "instruir, demonstrar, ensinar" (Êx
24.12). Trata-se, portanto, da instrução de Javé para o seu povo 
Israel, do guia para o bem-estar de toda nação. Ainda hoje a Torá 
está adaptada para ensinar a Igreja e os povos. Ela é chamada de 
"lei do SENHOR" ou de Javé (2 Cr 17.9; 34.14; Ne 9.3) e também 
de "lei de Moisés" (Js 8.31; 2 Rs 14.6; Ne 8.1), pois foi o grande 
legislador dos hebreus quem promulgou a lei como mediador 
entre Deus e o povo.
Segundo Keil & Delitzsch, a divisão da lei em cinco partes, 
Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio, não foi obra 
de algum editor realizada posteriormente, mas está fundamen­
tada no plano completo do Pentateuco que deve ser considerado 
original. O waw conjuntivo, ou seja, a conjunção "e" em we’êleh 
shemôth,5 "e estes são os nomes" (Êx 1.1), e em wayyiqrã’,6 "e 
chamou" (Lv 1.1), une esses livros um ao outro, formando uma 
unidade literária. Os três primeiros livros mantêm a seqüência 
histórica linear. A revelação do Sinai termina em Levítico 27.34. 
Os relatos do livro de Gênesis são de natureza teológica e profé­
tica, e sua história é considerada "Torá", instrução.
A estrutura essencialmente legal se concentra entre Êxodo 
20 e Levítico 27, que Moisés sumariou da seguinte forma: "Estes 
são os mandamentos que o SENHOR ordenou a Moisés, para os
I 1 6 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
3 O número entre colchetes [ ] indica o versículo na Bíblia Hebraica.
4 rnin. 5 nino nWi. 6
OS DEZ MANDAMENTOS I 1 7
filhos de Israel, no monte Sinai" (Lv 27.34). O livro de Números é 
o registro das jornadas no deserto, e Deuteronômio é o discurso 
de recapitulação sobre os quarenta anos de peregrinação no 
deserto que Moisés apresentou quando estava na fronteira da 
Terra Prometida. R. K. Harrison afirma que o termo "Torá" passou 
a designar todo o Pentateuco posteriormente ao exílio.
Pentateuco é o termo alternativo empregado para identificar 
a Torá como os cinco livros de Moisés. O termo vem de duas 
palavras gregas: pente,7 "cinco", e teuchos,s de significado amplo, 
como "vasilha, recipiente, urna para voto, livro". A ideia original 
era de instrumento, e com o tempo veio a ser usado para desig­
nar o estojo de levar rolos de papiros. Acredita-se que os judeus 
helenistas de Alexandria, no primeiro século d.C. empregavam 
o termo pentáteuchos, 9 que corresponde a expressão talmúdica 
chãmishãh chumeshêy-torãh,w "os cinco quintos da lei". O vocá­
bulo "Pentateuco" aparece em Tertuliano (Contra Marcião, Livro
1, 10.7) e em Orígenes, em seu comentário sobre o evangelho de 
João, mas logo depois disso se tornou usual entre os cristãos para 
designar os escritos de Moisés.
0 DECÁLOGO
O Decálogo é identificado no Antigo Testamento pela expres­
são hebraica ‘ãsseret haddevãrim,11 literalmente "as dez palavras". 
O termo só aparece três vezes na Bíblia, no Pentateuco (Êx 34.28; 
Dt 4.13; 10.4), traduzido por "dez mandamentos" em nossas 
versões, exceto na ARA (Êx 34.28). É identificado também como 
"estas palavras" que Javé falou (Êx 20.1; 34.27; Dt 5.22) ou ainda
r néme. 8 Tfcüxoç. 9 neviáxtuxoç.
10 r n l r r t í n n nston. ‘•□■nrnn rn toJ.
"as palavras do concerto" (Êx 34.28). Estas dez palavras estão 
esboçadas em somente dois lugares na Bíblia, no Pentateuco (Êx 
20.1-17; Dt 5.6-21). Há 17 variações no texto de Deuteronômio 
em relação ao Decálogo do livro de Êxodo, mas isso não altera o 
sentido da mensagem. Muitas delas serão explicadas no estudo 
específico de cada um desses mandamentos.
A Septuaginta optou por traduzir dekalogos,12 “decálogo", a 
partir de dois termos gregos: deka,13 "dez", e logos,14 "palavra". 
O termo nunca é citado no Novo Testamento em sua totalidade 
e os mandamentos não aparecem de acordo com a seqüência 
canônica (Mt 19.18, 19; Mc 10.19; Lc 18.20; Rm 13.9). O Novo 
Testamento, às vezes, se refere a ele como "mandamentos" (Mt 
19.17; Ef 6.2). Após a Septuaginta, o termo "decálogo" só aparece 
no período da patrística, na Epístola a Flora, de um autor gnóstico 
chamado Ptolomeu, que viveu na segunda metade do séc. II., e 
depois em Irineu de Lião, na forma latina (Contra as Heresias, 
Livro IV. 15.1; 16.4), e também em Clemente de Alexandria (em 
sua obra Pedagogos III. 12). Depois disso, o termo se popularizou 
entre os cristãos.
O Decálogo é a única parte do Pentateuco escrita "pelo dedo 
de Deus" (êx 31.18), linguagem figurada que, segundo Agostinho 
de Hipona, indica "pelo Espírito de Deus" e, de acordo com Cle­
mente de Alexandria, "pelo poder de Deus". É também a única 
porção da lei que Israel ouviu partir da voz do próprio Deus no 
monte quando ele transmitia essas dez palavras (Êx 19.24, 25; 
20.18-20). Os demais preceitos foram transmitidos por Javéà lei como 
doutrina antinomianista. O Senhor Jesus tornou explícito o que 
estava implícito no discurso do Sermão do Monte, e isso significa 
que a lei de Cristo não é outra senão a lei de Moisés. Assim como 
Cristo é o centro do Antigo Testamento e o Novo é a consumação 
desse fato, há entre ambos testamentos uma sólida continuidade. 
Trata-se de um relacionamento de promessa e cumprimento.
AVALIAÇÃO BÍBLICA
Parece que a ideia de lei moral, lei cerimonial e lei civil é usada 
como permissão para que cada um interprete o termo "lei" conforme 
seu entendimento e conveniência. Uns afirmam que a abolição foi 
da lei cerimonial e civil, mas que a lei moral é eterna e nunca pode 
ser abolida. Convém ressaltar que a visão tripartida da lei não deriva 
do Novo Testamento. É verdade que existem preceitos de caráter 
moral que são para todos os povos e em todas as épocas, e que 
outros são para um povo e uma época. Mas em nenhum lugar do 
Novo Testamento no qual aparece o termo "lei" afirma-se que essa 
lei é moral, cerimonial ou civil. O que significa quando o Senhor 
Jesus declara que não veio destruir a lei, mas a cumprir? Ou quando 
o apóstolo Paulo afirma que não estamos debaixo da lei, mas da 
graça? Ou ainda quando diz que a lei foi abolida por Cristo?
Jesus disse que veio cumprir a lei: "Não cuideis que vim des­
truir a lei ou os profetas; não vim ab-rogar, mas cumprir. Porque 
em verdade vos digo que, até que o céu e a terra passem, nem 
um jota ou um til se omitirá da lei sem que tudo seja cumprido" 
(Mt 5.17, 18). Ainda há muitos expositores do Novo Testamento 
que tropeçam nessa passagem. A ideia aqui não é confirmar ou 
estabelecer a lei ou os profetas por meio da vida e do ensino de
Jesus. O verbo grego para "destruir" é katalyo,m "destruir, revogar, 
invalidar". A antítese é "destruir" e "cumprir". O Senhor Jesus não 
fala em "observar ou guardar", mas em cumprir a lei ou os profetas.
O verbo grego usado aqui para "cumprir" é plêroõ , 138 que significa 
"encher, preencher, completar", cuja ideia original é espacial (Mt 
13.48; At 2.2). Esse verbo aparece 87 vezes no Novo Testamento 
como "finalizar, terminar, tomar algo completo, pleno” e nunca 
como "estabelecer" ou "confirmar". O Léxico Grego-Português do 
Novo Testamento de Louw & Nida traduz esse verbo em Mateus 5.17 
como "dar o sentido completo": "Não vim para destruir, mas para 
dar o seu sentido completo" (2013, p. 362 [33.144]). Se o sentido 
de plêroõ aqui for de "completar", então Jesus está afirmando ser 
a plenitude da revelação. De fato, a revelação divina se consumou 
nele (Hb 1.1,2). Mas a interpretação mais aceita é de que se trata 
do cumprimento das profecias do Antigo Testamento na vida e no 
ministério do Senhor Jesus (Mt 1.22; 2.17,19; 4.14; Lc 4,21; Jo 19.36).
A ideia cristológica não se restringe a esses vaticínios e ocupa 
todo o pensamento das Escrituras hebraicas. A provisão do Antigo 
Testamento sobre a obra redentora de Deus em Cristo é muito rica 
de detalhes. Os escritores do Novo Testamento reconhecem a pre­
sença e a obra de Cristo na história da redenção (Os 11.1; Mt 2.15) e 
nas suas instituiçõese festas (Êx25.8; Jo l.l4;Hb5.4,5;Êx 12.3-13; 
Lc 22.15; 1 Co 5.7). A lei e os profetas convergem para Jesus; ele é o 
cumprimento das Escrituras do Antigo Testamento (Lc 24.26,27,44).
A expressão "a lei e os profetas" aparece com frequência no Novo 
Testamento para designar as Escrituras do Antigo Testamento (Mt 
7.12; 22.40; At 13.15; Rm 13.21) ou fraseologia similar (Mt 11.13; Jo 
1.45; At 28.23). Mas a presença do "ou" disjuntivo aqui mostra duas 
partes distintivas, em que nem uma e nem outra é para ser abolida (Jo
A IGREJA E A LEI DE DEUS I 1 4 5 I
137 K a x a X ú u . 138 ITXripóu.
10.35). Aqui não se trata apenas dos preceitos morais, e o Decálogo 
nem sequer é mencionado no Novo Testamento como tal. Jesus fala 
ainda a respeito da existência de mandamentos menores: "Qualquer, 
pois, que violar um destes menores mandamentos" (Mt 5.19). Isso 
por si só invalida a interpretação de que a lei é uma referência aos 
preceitos morais. Existem mandamentos menores entre os preceitos 
morais? A resposta é não. Jesus, portanto, está se referindo a todo 
o sistema mosaico e às demais Escrituras do Antigo Testamento.
O jota se refere ao yõd ( ’ ),a menor letra do alfabeto hebraico; 
ocupa a metade da linha na escrita. O til, keraia,139 em grego, "tra- 
cinho, parte de uma letra, acento" (Lc 16.17), é um sinal diacrítico 
para distinguir uma letra da outra, por exemplo D/n; ~l/7; PI/D. 
A autoridade da lei permanece mantida até no "menor traço." E 
o termo "lei" no Novo Testamento, às vezes, se estende a todo o 
Antigo Testamento (Jo 10.34; Rm 3.19; 1 Co 14.21). Parece que 
o Senhor Jesus se refere aqui às Escrituras, de qualquer forma, 
seja a lei ou todo o Antigo Testamento, o certo é que não se trata 
apenas da lei moral. Sua validade se estenderá até o fim das eras. 
Isso significa até "que tudo seja cumprido". O verbo grego usado 
aqui para "cumprir" não é o mesmo do versículo 17, mas gínomai, 
"ser, tornar, vir a ser, acontecer", eõs panta genêtai,140 "até que 
todas essas coisas aconteçam" (Mt 5.18b). Logo, não se trata aqui 
de obediência aos mandamentos; essas palavras não significam 
obedecer à lei. A ideia é até que todas essas coisas aconteçam. A 
lei aqui, portanto, não se refere à Torá nem aos mandamentos, 
mas a todo o Antigo Testamento, que é a base do Novo, e seus 
ensinos perduram enquanto existirem os céus e a terra.
Voltando ao "menor dos mandamentos", ele é muito impor­
tante porque é parte da lei de Deus. O discípulo que declarar in­
I 1 4 6 I OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDAN ÇA
139 Kepaía. l40"Ecoç â v irávta yivr\z(NTLH), apesar de ser ela santa "e o 
mandamento santo, justo e bom" (Rm 7.12). Contudo, a lei não podia 
ajudar o israelita a praticar a justiça. Stanley M. Horton a compara a 
um termômetro que pode medir a temperatura mas não gera nem 
calor nem frio. A lei mensura a justiça e a injustiça, mas não ajuda a 
tomar alguém justo ou injusto. O problema está no pecado humano.
O código escrito é externo, a obediência a ele pode ser artificial, 
mas a obra do Espírito é interna, transforma o coração humano e 
provoca no cristão o desejo de fazer a vontade de Deus. Assim, ex­
plica o apóstolo, esse ministério era transitório. Por isso o apóstolo 
fala dessa antítese: "a letra mata, e o Espírito vivifica" (2 Co 3.6). A 
lei veio em glória; mas, sendo ela transitória, "como não será de 
maior glória o ministério do Espírito?" (2 Co 3.8). Isso mostra que os 
mandamentos ensinados por Jesus no Novo Testamento superam 
com larga vantagem os preceitos do Decálogo e de todo o Antigo 
Testamento (2 Co 3.8, 9).
"Porque o pecado não terá domínio sobre vós, pois não estais 
debaixo da lei, mas debaixo da graça. Pois quê? Pecaremos porque 
não estamos debaixo da lei, mas debaixo da graça? De modo ne­
nhum!" (Rm 6.14, 15). Todos nós sabemos que a lei e a graça são 
princípios opostos (Jo 1.17). Estar debaixo da lei significa aceitar a 
obrigação de guardá-la e isso implica maldição ou condenação. O 
apóstolo Paulo declara: "Todos aqueles, pois, que são das obras da 
lei estão debaixo da maldição; porque escrito está: Maldito todo 
aquele que não permanecer em todas as coisas que estão escritas 
no livro da lei, para fazê-las" (Gl 3.10). A lei de Moisés é um livro 
e não duas tábuas de pedra, então o apóstolo está se referindo a 
todo o Pentateuco. Dizer que se trata aqui da lei cerimonial ou civil 
nos parece uma camisa de força. Estar debaixo da graça significa 
reconhecer a dependência exclusiva de Cristo para a salvação.
I 1 4 8 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
considerações finais
N em o Senhor Jesus nem os seus apóstolos ensinaram o 
Decálogo. Jesus teve oportunidade em mais de uma ocasião 
de mencionar os Dez Mandamentos, mas não o fez. Não há tal 
menção no Novo Testamento, a não ser a citação de preceitos 
nele contidos. O seu reconhecimento como revelação de Deus 
e Escritura divinamente inspirada, como expressão máxima da 
vontade de Deus, é indiscutível. Jamais devemos nos esquecer 
de que o Antigo e o Novo Testamento vieram do mesmo Deus. 
Mas sua função na história da redenção humana não deve ser 
confundida. Assim, o Decálogo tem o mesmo valor das outras 
partes do Antigo Testamento para o cristianismo.
Devemos obedecer à lei? Tem ela domínio sobre nós? O apóstolo 
Paulo responde a essas duas perguntas: "Mas, agora, estamos livres 
da lei, pois morremos para aquilo em que estávamos retidos; para 
que sirvamos em novidade de espírito, e não na velhice da letra" (Rm
7.6). O cristão jamais deve praticar o que a lei proíbe, pois, apesar 
de estarmos libertos dela, essa liberdade significa que estamos livres 
para servir, e não para pecar. Somos servos de Cristo e não da lei, e 
queremos servir a ele, visto que estamos debaixo da graça não para 
produzir a salvação, mas porque o Espírito nos guia na obediência.
apêndice histórico
OS FARAÓS DA ERA MOISÉS
O Egito é um país que desde a antiguidade impressiona o 
espírito humano pelas suas artes, conhecimentos, administração 
e poderio militar. É o povo que mais aparece na Bíblia depois de 
Israel. É a terra do nascimento de Moisés que na época atingiu o 
apogeu de sua glória. Foi essa a nação que Deus escolheu para 
servir como berço do seu povo Israel.
0 EGITO
A principal fonte de sua história antiga vem de Manetão. Quem 
foi ele? Sacerdote e historiador egípcio da corte de Ptolomeu II 
Filadelfo, cerca de 280 a.C., autor da compilação em grego da 
chamada Aegyptiaca, que traz a cronologia dos monarcas das 30 
dinastias dos Faraós do Egito. Apesar da grande contribuição à 
egiptologia, sua obra não sobreviveu ao tempo, mas alguns frag­
mentos chegaram aos nossos dias por meio de outros autores, 
como Estrabão, Josefo e Eusébio de Cesareia entre outros.
Manetão catalogou 30 dinastias dos Faraós do Egito desde 
Menés I, em cerca de 3200 a.C., fundador da primeira dinastia, 
até a trigésima, a dinastia sebenítica (380-343 a.C.). Sua história 
compreende cinco grandes períodos: Período Arcaico ou Antigo 
Reinado (cerca de 3200-2130 a.C.), Médio Reinado (cerca de 2130-
1580 a.C.), Novo Império ou Reinado (cerca de 1580-1070 a.C.), 
Último Império dos Faraós (cerca de 1070-343 a.C.) e, por fim, o 
Período Ptoleimaco, que termina com o suicídio da rainha egípcia 
Cleópatra em 30 a.C., quando o Egito se torna província romana.
O Egito é o berço da nação de Israel, e o êxodo ocorreu no pe­
ríodo no Novo Império, que abrange as dinastias 18, 19 e 20 entre 
1580 e 1070 a.C. O nome "Egito" vem da transcrição grega Aíyuinoç 
(Aigyptos), corruptela da palavra egípcia Ha-K-Ptah, transcrita tam­
bém como Haíkouptah ou Hikuptah, que significa "morada de Ptah". 
Era o primitivo nome de Mênfis, primeira capital do Egito fundada 
por Menés I, que deu início à primeira dinastia egípcia por volta 
de 3200 a.C. Ptah era o nome da divindade protetora da cidade.
Os hebreus foram habitar no Egito durante o período em que 
José se tornou primeiro-ministro do Faraó. Isso aconteceu no perí­
odo dos hicsos, palavra grega derivada do egípcio heqakhasut, que 
significa "governantes estrangeiros". São eles os conquistadores 
asiáticos que governaram o Egito durante cerca de 150 anos. Os 
Faraós do período são os monarcas da 15a e 16a dinastias a quem 
Manetão se refere como "reis pastores".
O termo "faraó" é uma deformação grega de cjxxpacó (pharao) 
vinda da palavra egípcia per aa "a grande casa", empregada para 
indicar o palácio real. A partir de 1580 a.C., veio a ser usada para 
designar o próprio soberano. O Egito foi sempre uma monar­
quia absoluta, cujo topo era ocupado pelo Faraó, que detinha o 
poder político, religioso e militar. Considerado deus, ostentava 
o título de Filho do Sol.
0 NOVO IMPÉRIO
A Era Moisés se situa no Novo Império Egípcio, mais preci­
samente na 18a dinastia, fundada por Amósis I. É o período do
I 1 5 2 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
apogeu militar e econômico do Egito. Esta dinastia teve 14 mo­
narcas que governaram entre 1580 e 1308 a.C. Amósis 1, vindo 
de Tebas, sul do Egito, atual Carnaque, unificou o Alto e o Baixo 
Egito e expulsou os hicsos do país, perseguindo-os até o Eufrates. 
Esse mesmo Faraó fez de Canaã tributário do Egito.
Tebas, que veio a ser cidade real nas 1 Ia e 12a dinastias, chegou 
ao apogeu como capital do Alto Egito durante o período da 18a di­
nastia. Era a cidade do deus Amom-Rá, chamada pelo nome do seu 
deus, Amom de Nô; mas na Bíblia Hebraica é Nô ou Nô-Amom (Jr 
46.25; Ez 30.14-16; Na 3.8). Amom de Tebas é o nome usado pelos 
gregos e aparece também na NV1 e NTLH. Era o centro religioso 
da tríade Amom, Mut e Khonsu, adorada no templo de Carnaque.
As evidências históricas e arqueológicas apontam um monar­
ca da casa de Amósis I como o Faraó mencionado em Êxodo 1.8. 
Isso leva o êxodo para 1440-1400 a.C. e se harmoniza com os 480 
anos de 1 Reis 6.1, além de lançar luz sobre as Cartas de Amarna 
enviadas pelos reis cananeus ao Faraó, Akhenaton, conhecido 
também como Amenotepe IV.
Durante muito tempo acreditou-se que Moisés viveu no pe­
ríodo da 19a dinastia, e nesse caso o Faraó opressor de Êxodo
1.8 ("Depois, levantou-se um novo rei sobre o Egito, que não 
conhecera a José) teria sido Seti I ou Ramessés II e o Faraó do 
êxodo Merneptá. Ramessés II reinou entre 1290 e 1224 a.C., 
período em que os israelitas já estavam estabelecidos em Ca­
naã (Jz 11.16; 1 Rs 6.1). Os argumentosem favor de Ramessés
II podem facilmente ser refutados. As cidades de Pitom e Ra­
messés, construídas pelos hebreus no Egito (Êx 1.11), poderiam 
parecer um argumento irrefutável se Ramessés não fosse um 
nome comum na época. O arqueólogo Naville identificou em 
1883 o local de Pitom, onde encontrou a seguinte inscrição de 
Ramessés II no portão de entrada: "Eu construí Pitom na foz do
APÊNDICE HISTÓRICO I 1 5 3 I
Oriente". Em 1922, o arqueólogo Fisher, do museu Britânico, 
encontrou a Esteia de Ramessés II, em Bete-Seã, no atual Israel, 
que diz: "Construí Ramessés com escravos asiático-semitas". 
Tudo isso levou muita gente a pensar em Ramessés II como o 
Faraó opressor mencionado em Êxodo 1.8, até que se descobriu 
que ele foi um grande plagiador.
Segundo Manetão, Amósis I teve morte prematura após 25 
anos de reinado. Amenotepe I deu continuidade a política do seu 
antecessor e, quando morreu em 1510 a.C., deixou o Egito como 
o país mais rico e mais poderoso do mundo. Ele não tinha filhos 
do sexo masculino para sucedê-lo no trono, por isso seu genro, 
Tutmósis I, um militar casado com sua filha primogênita chamada 
Amósis, herdou o trono. As evidências apontam Tutmósis I como 
o Faraó opressor dos hebreus (Êx 1.8). Ele não tinha filho varão 
com sua esposa legítima para herdar o trono quando morreu. 
Assim, a filha do casal, Hatshepsut, foi destinada a se casar com 
o meio-irmão, Tutmósis II, filho de seu pai Tutmósis I com uma 
mulher do harém, chamada Mutnofre. Hatshepsut é a filha do 
Faraó que salvou Moisés das águas do Nilo (Êx 2.5-10).
Hatshepsut e Tutmósis II governaram juntos o país, mas ele 
sofreu morte prematura. O casal teve só uma menina, mas ele, 
moribundo, se apressou em legitimar um filho que havia tido com 
uma concubina do harém, para que herdasse o trono como Faraó. 
Esse futuro Tutmósis III era enteado e ao mesmo tempo sobrinho 
de Hatshepsut. Era ainda criança quando ela assumiu o trono. De 
fato, foi ela quem governou o Egito. Embora ela não quisesse ser 
a rainha, mas o próprio Faraó e conseguiu isso com o apoio dos 
sacerdotes do deus Amom, de Tebas. Ela assumiu características 
e atributos masculinos, usou vestes reais masculinas e barbas 
postiças comum ao Faraó.
Enquanto viveu, Hatshepsut conseguiu inutilizar Tutmósis III.
I 1 5 4 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
APÊNDICE HISTÓRICO \ 1 5 5
Parece que Moisés representava uma ameaça para o enteado e 
sobrinho da rainha. É estranho que o Faraó estivesse procurando 
matar Moisés, um príncipe do Egito, por causa da morte de um egíp­
cio, a ponto de fazê-lo fugir para Midiã (Êx 2.15). Era algo pessoal, 
pois o Faraó tentava se livrar de Moisés. A essa altura, Hatshepsut 
era a única pessoa do Egito capaz de quebrar as regras e colocar 
o trono do Egito ao alcance de Moisés: "Pela fé, Moisés, sendo já 
grande, recusou ser chamado filho da filha de Faraó" (Hb 11.24). 
Só depois da morte de Hatshepsut é que Tutmósis III finalmente 
conseguiu assumir o governo do Egito. Ele morreu em 1436 a.C., 
quando já fazia quarenta anos que Moisés estava em Midiã (At 
7.30). Deus manda Moisés de volta ao Egito para libertar o povo 
das garras do Faraó e comunica-lhe que todos os que buscavam 
matá-lo já haviam morrido (Êx 4.19). Tutmósis III é o único Faraó 
do período que reinou tanto tempo desde a fuga de Moisés do Egito 
até a teofania do Sinai. O Faraó do êxodo, que experimentou as dez 
pragas e mais a derrota no mar Vermelho, foi seu filho, Amenotepe
II, cuja múmia se encontra ainda hoje no Museu do Cairo, Egito.
As Cartas de Amarna, descobertas em 1888, em Tel-el-Amar- 
na, Egito, hoje parcialmente encontradas no Museu do Cairo e 
parcialmente no Museu Britânico, foram dirigidas a Amenotepe
III e Amenotepe IV. O período desses monarcas coincide com a 
chegada de Israel em Canaã. Algumas delas afirmam: "Os habiri 
estão capturando nossas fortalezas, estão tomando nossas ci­
dades; estão destruindo nossos governadores. Saqueiam todo o 
país do rei. O rei mande soldados depressa. Se não vierem tropas 
neste ano, o rei perderá todo o país". Eram pedidos de ajuda ao 
Faraó para o envio de reforço militar, pois as províncias egípcias 
de Canaã estavam sendo atacadas pelos habiri.
Alguns pesquisadores não veem ligações dos habiri nas Cartas 
de Amarna com as conquistas de Josué, mas faltam a eles maiores
fundamentos para essa interpretação. Habirí é plural de habiru e 
designa "hebreu", segundo o prof. dr. Frederick Pinkuss, fundador 
do Curso de Hebraico da Universidade de São Paulo. Ele declarou 
num artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo, em 1946.
"Encontra-se pela primeira vez a raiz HEBREU, na forma 
de HABIRU, naquela famosa biblioteca de cilindros feitos de 
barro queimado, com inscrições cuneiformes, que datam 
do século 15 antes da era cristã, e que se descobriram em 
TEL EL AMARNA no Egito. Nestes textos, significa HABIRU 
- HEBREU, 'gentes que vêm do além’, referindo-se, sem 
dúvida alguma, a tribos semíticas que invadiram Canaã e 
seus arredores" (PINKUSS, 1946, p. 10).
As cartas falam sobre a conquista de Canaã pelos israelitas 
sob a liderança de Josué. A dificuldade de muitos expositores da 
Bíblia em identificar os habiru com os hebreus liderados por Josué 
reside numa interpretação muito antiga, mas sobre a qual hoje 
não há mais consenso: é a teoria de que Ramessés II teria sido o 
Faraó da opressão mencionado em Êxodo 1.8. Essa dificuldade 
poderia existir se a Bíblia dissesse explicitamente que o Faraó 
opressor era Ramessés II, mas ela apenas menciona os gover­
nantes do Egito pelo título.
A XIX dinastia, à qual pertenceu Ramessés II, não sobreviveu 
mais que 20 anos após a morte de Memeptá. O país entrou em crise 
e a anarquia tomou conta do Egito. Amnés usurpou o trono, mas 
não conseguiu se manter no poder e foi deposto por Memeptá Siptá, 
casado com uma princesa da casa de Ramessés. Seti II reinou cinco 
anos. A dinastia se finda com Larsu, um usurpador da Palestina.
Assim, Deus escolheu a nação mais poderosa e mais adian­
tada do mundo de então para servir como berço do seu povo 
Israel. Depois do êxodo, o Egito nunca mais conseguiu manter
1 5 6 I 05 DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDANÇA
APÊNDICE HISTÓRICO I 1 5 7
a sua glória passando a ser um potência de segunda categoria. 
Neste país Deus fez o concerto com Israel no monte Sinai ocasião 
em que Moisés promulgou a lei. O profeta Elias esteve em terras 
egípcias, Jeremias viveu seus últimos dias neste país, segundo a 
tradição judaica. O Egito acolheu ainda o Filho de Deus, quando 
José e Maria fugiam da perseguição de Herodes.
DÉCIMA OITAVA DINASTIA 
(1580-1308 a.C.)
Amósis I ................................................................................ (1580-1550 a.C.)
Amenotepe I ........................................................................ (1550-1528 a.C.)
T u tm ó s is l............................................................................. (1528-1510 a.C.)
Tutmósis I I ............................................................................ (1510-1490 a.C.)
H a tsh ep su t.......................................................................... (1490-1468 a.C.)
Tutmósis I I I .......................................................................... (1490-1436 a.C.)
Amenotepe I I ...................................................................... (1436-1413 a.C.)
Tutmósis I V .......................................................................... (1413-1405 a.C.)
Amenotepe I I I ..................................................................... (1405-1367 a.C.)
Amenotepe IV - A kh en ato n ........................................... (1367-1350 a.C.)
S m enekhare...................................................................................... 0 3 4 7 a.C.)
Tutancâmon........................................................................ (1347-1339 a.C.)
E je ........................................................................................... (1339-1335 a.C.)
H orem h eb ............................................................................. (1335-1308 a.C.)
I
OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
DECIMA NONA DINASTIA 
(1308-1186 a.C.)
Ramessés I ............................................................................ (1308-1307 a.C.)
S etil ...................................................................................... (1307-1291 a.C)
Ramessés II ......................................................................... (1290-1224 a.C)
M e rn e p tá .............................................................................. (1224-1214 a.C.)
Am enm esés........................................................................ (1012-1199 a. C.)
Merneptá Siptá .................................................................... (1193-1187 a.C)
S etill ...................................................................................... (1199-1193 a.C.)
larsu ....................................................................................... (1187-1186 a.C.)
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A lei de Moisés não consiste apenas num compêndio religioso; 
trata de profecias, histórias, registros genealógicos e cronológicos, 
regulamentos, ritos, cerimônias, exortações, preceitos morais, civis e 
cerimoniais, instrução para sacerdotes, sacrifícios, ofertas, festas e o 
tabernáculo. A grande diversidade de conteúdo e suas várias formas 
de apresentação dos dados da revelação têm impressionado o espíri­
to humano até hoje. A estrutura literária dessa parte das Escrituras 
Sagradas é complexa e sobre ela muitas interpretações e especula­
ções têm sido levantadas ao longo dos séculos.
A obra Os Dez Mandamentos — Valores Divinos para uma Socie­
dade em Constante Mudança é um comentário exegético e explicati­
vo apresentado de forma prática para facilitar a compreensão dessa 
parte da lei de Moisés, ajudando o povo de Deus a distinguir entre 
lei e evangelho.
m Líder da AD em Jundiaí-SP, graduado em Le-
tras (Hebraico) pela Universidade de São Paulo, 
* Mestre em Ciências da Religião pela Universidade 
Presbiteriana Mackenzie, professor de Hebraico, 
Grego e Apologia Cristã, bem como comentarista 
H de Lições Bíblicas e autor de diversos livros, entre
I eles l Isão Panorâmica do Antigo Testamento, Herc- 
■ sias e Modismos, Comentário Bíblico de Oseias, O 
Ministério Profético na Bíblia e coautor de Teologia Sistemática Pen- 
tecostal, editados pela CPAD.
ISBN 8Sab31S4b-4
=1 7 A A 5 2 b 3 i a 4 b 3
	Esequias Soares
	Esequias Soares
	abreviaturas
	introdução
	ALEI DE MOISÉS
	0 DECÁLOGO
	OS CÓDIGOS
	OUTROS DEUSES
	FORMAS DE ADORAÇÃO PAGÃ
	A IDOLATRIA DO MUNDO ANTIGO
	0 PRIMEIRO MANDAMENTO
	mà
	IMAGENS DE ESCULTURAS
	OS ÍDOLOS E AS IMAGENS
	0 SEGUNDO MANDAMENTO
	0 DEUS ZELOSO
	SENHOR EM VAO
	0 NOME "DEUS"
	ELION, SHADAI E ADONAI
	0 QUE SIGNIFICA TOMAR 0 NOME DE DEUS EM VÃO?
	0 SABADO
	0 SÁBADO
	0 QUARTO MANDAMENTO
	0 SÁBADO NO NOVO TESTAMENTO
	0 SÁBADO CRISTÃO
	PAI E MÃE
	HONRA A TEU PAI EA TUA MÃE
	A PROMESSA DIVINA
	0 SEXTO MANDAMENTO
	GUERRA
	SUICÍDIO
	PENA DE MORTE
	0 SÉTIMO MANDAMENTO
	0 CASAMENTO
	0 ENSINO DE JESUS
	PROPRIEDADE E TRABALHO
	0 OITAVO MANDAMENTO
	LEGISLAÇÃO MOSAICA SOBRE 0 FURTO
	FALSO TESTEMUNHO
	0 ASPECTO EXEGÉTICO
	0 ASPECTO JURÍDICO0 ASPECTO DA VIDA DIÁRIA
	EXEGESE DO DÉCIMO MANDAMENTO
	OS FATOS
	0 DÉCIMO MANDAMENTO NO NOVO TESTAMENTO
	A LEI DE DEUS
	OS TRÊS TIPOS DE LEI
	OS REFORMADORES DO SÉCULO 16
	AVALIAÇÃO BÍBLICA
	considerações finais
	apêndice histórico
	OS FARAÓS DA ERA MOISÉS
	0 EGITO
	0 NOVO IMPÉRIO
	referências bibliográficasex­
clusivamente a Moisés.
Existe uma discussão acalorada sobre Êxodo 34.28: "E esteve 
Moisés ali com o SENHOR quarenta dias e quarenta noites; não
I 1 8 I OS DEZ M A N D A M E N TO S - VALORES DIVIN O S PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M U D A N Ç A
12 AeicáA.OYO2 2 I OS DEZ M AN D A M EN TO S - VALORES DIVIN O S PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M U D A N Ç A
dental. A narrativa da Torre de Babel (Gn 11.1-7), por exemplo, 
precede cronologicamente a tabela das nações registrada em 
Gênesis 10; no entanto, aparece posteriormente no relato das 
Escrituras. Isso explica, muitas vezes, as repetições presentes 
nos textos bíblicos. Não se deve, portanto, fragmentar o texto 
atribuindo-o a diversos autores e a diversas épocas, ainda mais 
quando a Bíblia afirma ao longo de suas páginas a autoria mo­
saica do Pentateuco. Deus mandou Moisés escrever essas coisas 
num livro (Êx 17.14; 24.4-8; 34.27). A essa altura da história, os 
escritos eram parciais, pois a produção do texto estava ainda em 
andamento. Moisés escreveu as jornadas dos filhos de Israel no 
deserto (Nm 33.1 -49). Mas ainda está escrito que Moisés acabou 
de "escrever as palavras desta Lei num livro, até de todo as acabar" 
(Dt 31.24). Isso é ratificado em toda a Bíblia a partir da própria 
Torá até o Novo Testamento (Dt 31.9, 25, 26; Js 8.32-35; Jz 3.4;
1 RS 8.53, 56; Dn 9.11-13; Ml 4.4; Mt 19.7, 8; Mc 10.4, 5; Lc 5.14; 
Jo 1.17; 5.45-47; Rm 10.5; 1 Co.9.8, 9; 2 Co 3.15). Não há como 
mudar essa verdade, ainda mais com base em especulações ou 
interpretações sob o argumento de método científico. Assim, as 
sessões do Pentateuco às quais os críticos chamam de códigos 
são realmente detectáveis; isso não implica, contudo, a autoria 
de diversos autores e nem em datas posteriores.
É verdade que há no Pentateuco extratos de escritores des­
conhecidos ou uma coletânea de diversos documentos, como as 
genealogias do Gênesis, e outros que sofreram revisão posterior 
por escribas e profetas igualmente inspirados, como algumas 
glosas, por exemplo, "e estavam, então, os cananeus na terra" 
(Gn 12.6); o nome "Dã" antes da formação da família de Jacó (Gn
14.14); a menção de reis em Israel, antes mesmo da conquista de 
Canaã (Gn 36.31); a expressão "dalém do Jordão" (Dt 1.1) enquanto 
Moisés nem mesmo atravessou o rio. Nada disso descaracteriza
C S DEZ M ANDA M EN TO S \ 2 3 I
sua paternidade literária. A revelação divina foi gradativa. A au­
toridade dos massoretas posteriores do judaísmo rabínico não é a 
mesma dos sopherim,15 "escribas", que trabalharam nas cópias e 
na edição dos livros no período pré-cristão. Esdras era um deles e 
é chamado de "escriba", sophêr16 (Ed 7.6). Os massoretas jamais 
ousaram modificar uma palavra das Escrituras, pois o cânon já 
estava fixado, uma postura diferente da dos sopherim, que eram 
encarregados de padronizar e revisar textos.
Os livros do Antigo Testamento foram produzidos por profe­
tas, sacerdotes e sábios de Israel (Jr 18.18). Deus confiou a eles 
a sua revelação. A continuidade do texto, como a narrativa da 
morte de Moisés em Deuteronômio 34, era realizada por alguém 
divinamente autorizado. As glosas editoriais foram inseridas no 
texto sagrado por pessoas autorizadas, profetas, sacerdotes e 
sábios num período em que o cânon ainda estava aberto. Isso 
não compromete a paternidade mosaica do Pentateuco. Esses 
detalhes editoriais são reconhecidos pela tradição desde a antigui­
dade. Logo, não se sustentam as ideias defendidas pelos críticos 
liberais sobre os supostos autores do Pentateuco e as diversas 
datas sugeridas para a composição de cada código.
Israel se rebelou contra Deus, ainda no Sinai, com o culto do 
bezerro de ouro. Deus renovou o concerto com os israelitas, e 
"estas palavras" (ê x 34.27) são as palavras do concerto descritas 
nos versículos 10-26. Referem-se a preceitos morais e cerimoniais 
do Decálogo e de outros códigos do sistema mosaico. O primeiro, 
o segundo e o quarto mandamentos do Decálogo reaparecem 
nessa renovação do concerto (Êx 34.14, 17, 21; cp. ê x 20.2-5, 
8-11; Dt 5.7-19, 12-15). A guarda do sábado é o único preceito 
cerimonial do Decálogo, pois os sacerdotes podiam violar o sába-
I 2 4 I OS DEZ M A NDA M ENTO S - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M U D A N Ç A
is D-nab. 16 ISO.
do e ficar sem culpa (Mt 12.5). Mas outros preceitos cerimoniais 
estão incluídos aqui: as festividades e o ritual da consagração dos 
primogênitos. Os críticos chamam Êxodo 34.10-26 de "Decálogo 
Cúltico"17 e Êxodo 20.1 -17 de "Decálogo Ético". Aqui se resumem 
preceitos de todos os códigos da lei de Moisés. Logo, não faz sen­
tido a ideia de um texto produzido por autores diferentes durante 
um longo intervalo de tempo.
Quanto à lei, algo precisa ser dito sobre a alegada divisão em 
lei moral, lei cerimonial e lei civil. Desde muito tempo qualifica- 
-se o Decálogo como lei moral, enquanto a parte da legislação 
mosaica que trata das cerimônias de sacrifícios e festas religio­
sas, entre outras, é chamada de lei cerimonial, e os preceitos de 
caráter jurídico são considerados lei civil. A visão tripartite da lei 
em preceitos morais, cerimoniais e civis não vem das Escritu­
ras. "Embora essa distinção tripartite seja antiga, seu uso como 
fundamento para explicar a relação entre os testamentos não é 
demonstravelmente derivada do Novo Testamento e provavel­
mente não é anterior a Tomás de Aquino" (CARSON, 2011, p. 
179). Os judeus jamais dividiram sua lei em moral e cerimonial. 
Ao longo da história, eles observaram o sábado e a circuncisão 
com o mesmo cuidado. Jesus disse que a circuncisão está acima 
do sábado (Jo 7.22, 23).
OS DEZ M AN D A M EN TO S I 2 5 1
17 Decálogo Cúltico:
1 Não farás aliança com os cananeus e nem aos seus deuses;
2 Guardarás as festas dos pães asmos;
3 Todo o primogênito é de Javé;
4 Redimirás os teus primogênitos e teus filhos;
5 Descansarás o sétimo dia da semana;
6 Três vezes no ano te apresentarás diante de Javé;
7 Não temerás a nenhum dos teus inimigos;
8 Não oferecerás coisa levedada nem deixarás para o dia seguinte o sacrifício da páscoa;
9 Oferecerás a Javé as primícias do teu fruto;
10 Não cozerás o cabrito no leite de sua mãe.
OUTROS DEUSES
O Decálogo é monoteísta e introduz essa doutri­
na no sistema mosaico que influenciou o pensamento 
teológico dos antigos hebreus, vindo a se culminar 
com a manifestação do Filho de Deus. O monoteís­
mo aqui era uma inovação, visto que as nações da 
época eram politeístas. A Mesopotâmia é o berço da 
civilização humana e o centro irradiador da idolatria. 
A terra do Nilo foi grandemente afetada por essa 
idolatria. E Israel e seus ancestrais tiveram vínculos 
com as culturas mesopotâmica e egípcia.
Abraão veio da Mesopotâmia e a nação de Israel se formou 
no Egito. Como nação, Israel seguia em direção à Terra Prome­
tida, onde estavam os cananeus, idólatras como todos os seus 
vizinhos. A idolatria era a cultura predominante na época. Esse 
era o mundo religioso do Oriente Médio de então, com cultos 
envolvendo sacrifício de crianças e prostituição.
FORMAS DE ADORAÇÃO PAGÃ
São três as principais formas de adoração no paganismo do 
Antigo Oriente Médio: politeísmo, henoteísmo e monolatria. Foi 
nesse contexto que viveram os patriarcas do Gênesis e em que 
a nação de Israel foi formada.
O politeísmo é a crença em muitos deuses. O termo deriva 
de duas palavras gregas, polys,18 "muito", e theos,19 "Deus". Era 
a religião dos antigos mesopotâmios, egípcios, gregos, romanos 
e do atual hinduísmo. O henoteísmo é uma forma primitiva de 
religião que admite a existência de muitos deuses; no entanto, 
apenas um deles tem a supremacia. O termo, aplicado em 1881 
por F. Max Müller, historiador alemão das religiões, significa lite­
ralmente "um Deus", do grego heis/hen,20 o numeral "um", e theos, 
"Deus". A forma henoteísta deve ser definida como uma crença 
em um Deus, mas admitindo a existência de outros deuses, como 
ocorre à doutrina das atuais testemunhas de Jeová.
A palavra monolatria vem de monos, "único",21 e latreia,22 
"serviço sagrado, culto". O termo surgiu com o orientalista ale­
mão Julius Wellhausen (1844-1918). Define-se comoadoração 
ou culto "de uma deidade única para cada grupo étnico-político
I 2 8 I OS DEZ M A N D A M E N T O S -V A L O R E S DIVIN OS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M U D A N Ç A
18 IIoA.úç. 
21 Movóç.
190eóç.
22 Aatpeía.
20 Eiç/év.
(clã, tribo, povo), não para toda a humanidade, de sorte que se 
admitem tantos deuses legítimos como povos" (GUERRA, 2001, 
p. 613). Assim, o henoteísmo deve ser entendido como uma 
forma de crença do qual a monolatria é o tipo correspondente 
de adoração. A ideia de henoteísmo e monolatria formarem um 
estágio intermediário entre politeísmo e monoteísmo não tem 
sustentação bíblica, visto que a religião original da raça humana 
era monoteísta. Não se conhecia a idolatria antes do dilúvio. A 
Bíblia afirma que todas essas formas falsas de adoração são uma 
degeneração do monoteísmo original (Rm 1.21-25).
A IDOLATRIA DO M UNDO ANTIGO
Abraão nasceu em Ur dos caldeus, cidade da Mesopotâmia (Gn
11.27-31). Seus ancestrais serviam a outros deuses (Js 24.2,15). A 
localização geográfica é a Mesopotâmia, entre os rios Tigre e Eu- 
frates, no atual Iraque. Os babilônios adoravam a diversos deuses, 
que eram personificações da natureza, como Sin, o deus-sol de Ur 
e Harã; Istar, a deusa do amor e da guerra; e Enlil, deus do vento 
e da terra. Bel era o nome de outra divindade (do acádico, belo, 
"senhor"), equivalente a Baal, deus dos cananeus. Com o tempo, Bel 
veio a ser identificado como Marduque ou Merodaque, o patrono 
da cidade de Babilônia, que se tornou o principal deus no panteão 
babilônico (Is 46.1; Jr 51.44). Os assírios adoravam, entre outros 
deuses, a Adrameleque e a Nisroque (2 Rs 17.31; 19.37; Is 37.38).
Os textos hieroglíficos das pirâmides enumeram cerca de 
duzentos deuses e relatos mitológicos. Os antigos egípcios em­
pregavam o termo Ta Neteru, "terra dos deuses", para o seu país. 
Havia uma proliferação de deuses e templos no Egito, e cada 
grande cidade contava com suas tríades de acordo com as dinas­
tias: em Ábidos, Osíris, ísis e Hórus; em Mênfis, Ptah, Sekhmet e
N Ã O TERÁS OUTROS DEUSES í 2 9 I
Nefertum, e, em Tebas, Amom, Mut e Khonsu. O templo do sol, 
bêth shemeshp em hebraico, "casa do sol" ür 43.13), é termo tra­
duzido por "Heliópolis" na LXX, vindo do grego, hêliou póleõs,24 
"cidade do sol". Não confundir com a cidade de Bete-Semes, em 
judá (2 Rs 14.11). Aqui se trata da antiga cidade egípcia de Om, 
seu nome hebraico, ou Heliópolis, em grego (Gn 41.45, 50 LXX). 
A cidade era dedicada ao deus-sol, conhecido também como Rá; 
é a atual Tell el Hisn, 16 km ao nordeste do Cairo.
Os cananeus adoravam a Baal (Jz 6.31), Baal-Berite (Jz 8.33). 
Seu plural é baalim. Baal era também conhecido pelas cidades onde 
eram cultuados: Baal-Peor, da cidade de Peor (Dt 4.3; Os 9.10), Baal- 
-Meom, da cidade de Meom (Nm 32.38; Ez 25.9) e Baal-Zefom (Nm 
33.7). Astarote ou Astarte (Jz 10.6), identificada em nossas versões 
como "postes sagrados", deusa cananeia da fertilidade" era deusa 
nacional dos sidônios (1 Rs 11.5, 33). Aparece como "bosque" na 
Versão Almeida Corrigida, "poste-ídolo" na Atualizada, e "Aserins" 
na Tradução Brasileira. São os ídolos de madeira e de pedras 
(Jr 3.9; Dt 4.28). A madeira simbolizava a fertilidade feminina, a 
deusa Aserá, mãe dos deuses cananeus; e a pedra representava a 
fertilidade masculina na religião dos cananeus.
Quemos ou Camos era o deus nacional dos moabitas (Nm 
21.29; Jz 11.24; 1 Rs 11.7, 33; 2 Rs 23.13; Jr 48.7, 13, 46). Malcam 
ou Milcom (1 Rs 11.33) era o deus nacional dos amonitas. Mil- 
com, em hebraico milkom,25 e Moloque, molech,26 em hebraico, 
seriam dois deuses ou nomes diferentes do mesmo deus? (1 Rs
11.5, 7, 33). Parecem ser nomes alternativos. O termo malkãm27 
significa "seu rei", mas a Septuaginta, a Vulgata Latina e a Peshi- 
ta traduzem esta palavra como nome próprio. É uma questão
I 3 0 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UDAN ÇA
23 !T2.
2 6 1 ^ -
24'HÀÍou TTÓÂeuç. 
27 D31?!?.
25 D 3 * ? p .
NÃO TERÁS OUTROS DEUSES I 31 I
de vocalização da palavra. As consoantes hebraicas aqui são 
exatamente as mesmas - mlkm) e o texto antigo era
consonantal. Dagom e Baal-Zebube eram deuses dos filisteus 
(Jz 16.23-24; 2 Rs 1.2-3, 6,16).
Os gregos do período do Novo Testamento tinham vários 
deuses: Zeus, o pai dos deuses; Hermes, o deus mensageiro; Afro- 
dite, a deusa do amor; Dionísio, o deus do vinho; Atenas, ou Pala 
Atenas, nascida da cabeça de Zeus, deusa padroeira da cidade de 
Atenas. Hesíodo, em sua obra Teogonia, a Origem dos Deuses, 
apresenta uma lista interminável deles. Para os romanos, o pai dos 
deuses era Júpiter; o deus correspondente a Hermes era Mercúrio 
(At 14.11-13); Afrodite era similar a Vênus e assim por diante.
Esses deuses da mitologia greco-romana apresentavam os 
mesmos vícios e as mesmas características dos humanos: ódio, 
inveja, ciúme, imperfeições... eles comiam, bebiam etc. Era muito 
comum um homem ter o seu deus devocional, prestando-lhes 
cultos em particular, além de oferecer libações a outros deuses. 
Por isso havia nas casas romanas os penates ou nichos, espécies 
de altar com uma representação do deus adorado naquele lar. 
Em Éfeso, a deusa Diana, Ártemis para os romanos, era cultuada 
no templo daquela cidade, que era uma das sete maravilhas do 
mundo antigo. Mas os seus adoradores também tinham minia­
turas da imagem de Diana em seus penates. Demétrio, de Éfeso, 
era fabricante de nichos (At 19.24). Os mesmos adoradores desses 
deuses participavam também do culto do imperador.
0 PRIMEIRO MANDAMENTO
A fórmula introdutória "Então, falou Deus todas estas pala­
vras, dizendo..." (ê x 20.1) é característica única do Decálogo, 
como explicou o rabino e erudito bíblico Benno Jacob: "Nós
não temos um segundo exemplo de tal sentença introdutória" 
(JACOB, 1992, p. 543). Nem mesmo na passagem paralela, 
a fórmula é repetida, mas aparece de maneira reduzida ao 
"mínimo absoluto" (CHILDS, 1976, p. 593) para se ajustar à es­
trutura da narrativa (Dt 5.5). No entanto, os outros códigos do 
sistema mosaico são introduzidos com um discurso de Deus a 
Moisés como no Código da Aliança: "Então, disse o SENHOR 
a Moisés"(Êx 20.22). Veja também Êxodo 34.32; Levítico 17.1; 
Deuteronômio 6.1. Fraseologia similar é usada para designar os 
Dez Mandamentos: "Estas palavras falou o SENHOR a toda a 
vossa congregação no monte, do meio do fogo, da nuvem e da 
escuridade, com grande voz, e nada acrescentou; e as escreveu 
em duas tábuas de pedra e a mim mas deu"(Dt 5.22), mas ela 
não introduz o Decálogo. Tudo isso revela a origem e a autori­
dade divina da lei.
Após a fórmula introdutória, vem o que é considerado o 
prefácio de toda a lei: "Eu sou o SENHOR, teu Deus, que te tirei 
da terra do Egito, da casa da servidão" (Êx 20.2). Alguns críticos 
liberais, com base numa premissa falsa sobre a composição dos 
diversos códigos do sistema mosaico, querem sustentar a ideia de 
um Deus tribal ou nacional na presente declaração. São teorias 
subjetivas que eles procuram submeter a métodos sistemáticos 
para dar uma forma acadêmica a seus pressupostos. Mas o relato 
da criação em Gênesis e o relato do dilúvio, por exemplo, falam 
por si sós sobre a soberania de Javé em todo o universo como 
Senhor do céu e da terra, reduzindo tais ideias a cinzas.
Desde os tempos antigos, discute-se se esta declaração faz 
parte do primeiro mandamento. A autorrevelação de Deus aqui é 
significativa. Javé já se havia revelado a Moisés antes (Êx 3.14,15; 
6.2, 3), mas aqui se trata de um relacionamento entre o humano 
e o divino, Deus e Israel. Na declaração "Eu sou o SENHOR, teu
I 3 2 I OS DEZ M A N DA M ENTO S - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M U D A N Ç A
Deus", apesar do uso na segunda pessoa, ele se dirige à nação 
inteira de Israel. O nome divino está vinculado ao resgate dos 
israelitas da terra do Egito, a grande libertaçãodas garras de 
Faraó. Esta redenção é o tema do livro de Êxodo. A "casa da 
servidão" é o símbolo da opressão social. O Egito era uma terra 
boa e abençoada, como o jardim do Éden (Gn 13.10; Dt 10.11); 
no entanto, passou para a história como uma caserna ou quartel 
de escravos. Por isso, é lembrado nas páginas da Bíblia como a 
"casa da servidão" (Dt5.6; 6.12; 7.8; 8.14; 13.5, 10; Js 24.17; Jz 6.8; 
Mq 6.4). Os judeus consideram Êxodo 20.2 ou Deuteronômio 5.6 
como parte do primeiro mandamento.
Os três primeiros mandamentos do Decálogo dizem respeito 
à teologia e os demais se referem à ética. Os hebreus herdaram 
dos patriarcas Abraão, Isaque e Jacó o conhecimento da exis­
tência de um só Deus. O núcleo do primeiro mandamento é: 
"Não terás outros deuses diante de mim" (Êx 20.3; Dt 5.7). Isso 
aponta para o monoteísmo, apesar de alguns críticos contes­
tarem essa verdade, pois uma linha de interpretação sustenta 
a ideia de sistema henoteísta ou monolatria nestas palavras. 
Gerhard von Rad ocupa oito páginas em sua obra Teologia do 
Antigo Testamento para justificar esta interpretação. Ele diz: "O 
primeiro mandamento nada tem a ver com monoteísmo... A au- 
toapresentação cúltica: 'Eu sou Javé, teu Deus', pressupõe uma 
situação politeísta" (2006, p. 207). Assim, sua interpretação se 
baseia numa suposição. Von Rad considera o culto dos patriar­
cas a Javé no padrão do primeiro mandamento, mas nega ser 
monoteísta esta forma de adoração. Diz ainda que há inúmeros 
exemplos bíblicos desse suposto henoteísmo ou monolatria (Gn 
31.53; Jz 11.24; 1 Sm 26.19).
"O Deus de Abraão e o Deus de Naor, o Deus de seu pai, 
julguem entre nós. E jurou Jacó pelo Temor de Isaque, seu pai"
NÃO TERÁS OUTROS DEUSES I 3 3 1
(Gn 31.53). O verbo "julgar", no plural yishpetü,28 "julguem" 
entre nós, mostra diferença entre essas divindades: o Deus de 
Abraão não é o mesmo de Naor. Mas no Pentateuco Samaritano 
o verbo está no singular yishpot,29 "julgue", e da mesma forma a 
Septuaginta, krinei,30 "julgará"; isso indica o mesmo Deus. Quem 
pronuncia estas palavras é Labão, de acordo com sua perspectiva 
politeísta que coloca o Deus de Abraão no mesmo nível da sua 
divindade. Naor era politeísta (Js 24.2) e jurou por seus deuses, 
Jacó no entanto, como monoteísta, jurou pelo Deus de Isaque, 
seu pai. Isso não significa que Jacó reconhecia as divindades 
da casa de Labão. Parece-nos forçado afirmar com base nesse 
relato Jacó como henoteísta ou monolátrico.
"Não possuirias tu aquele que Quemos, teu deus, desapos- 
sasse de diante de ti? Assim possuiremos nós todos quantos o 
SENHOR, nosso Deus, desapossar de diante de nós" (Jz 11.24). 
A ignorância religiosa grassava nos dias obscuros dos juizes de 
Israel, um período em que não havia reis em Israel e "cada qual 
fazia o que parecia direito aos seus olhos" (Jz 17.6) e fraseologia 
similar (Jz 21.25). Foi um período de apostasia generalizada; os 
israelitas violavam com frequência o primeiro mandamento. 
Havia de tudo nessas tribos desorientadas - monolatria, heno- 
teísmo, politeísmo -, menos o monoteísmo do Sinai 0z 17.1-6; 
18.31). Assim, a teologia sincrética de Jafé não deve surpreender 
a ninguém. Parece haver também uma confusão na teologia de 
Jefté, pois Quemos ou Camos é divindade nacional dos moabitas 
e não dos amonitas. Mas o território em questão era originai 
mente moabita é possível que o texto se refira ao período de 
Seom (Jz 11.18-20).
I 3 4 I OS DEZ M A N D A M EN TO S-V A LO R ES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
2 8 1D S 0 \
“ KpiveX.
29 B s a í \
NÃO TERÁS OUTROS DEUSES I 3 5
"Ouve, pois, agora, te rogo, ó rei, meu senhor, as palavras de 
teu servo: Se o SENHOR te incita contra mim, cheire ele a oferta 
de manjares; porém, se são os filhos dos homens, malditos sejam 
perante o SENHOR; pois eles me têm repelido hoje, para que eu 
não fique apegado à herança do SENHOR, dizendo: Vai, serve 
a outros deuses" (1 Sm 26.19). Davi pede ao rei Saul que pare 
com suas perseguições. Argumenta ainda que há duas razões 
possíveis para a inimizade entre ele e o rei: 1) Javé é quem incita 
Davi contra Saul; ou 2) isso vem dos homens. No primeiro caso, 
o problema poderia ser resolvido com uma oferta de manjares. 
No segundo caso, que os responsáveis sejam amaldiçoados. 
Davi roga a Saul "para que eu não fique apegado à herança do 
SENHOR, dizendo: Vai, serve a outros deuses". Em outras pala­
vras, que não o obrigue a deixar sua terra forçando-o a adorar 
a Dagom, pois somente Javé é o seu Deus. Israel é a sua terra, a 
sua herança, e ele não pretendia deixar o país. Afirmar com base 
nessa passagem bíblica que Javé é um Deus tribal, uma divindade 
nacional, é forçar a exegese. Davi mesmo declara que Javé é o 
Deus de toda a terra (Sl 24.1, 2).
Estudos de críticos conservadores mostram que a ideia de 
henoteísmo no primeiro mandamento não se sustenta. Esse 
mandamento é considerado o mais genérico e o menos deta­
lhado do Decálogo. O rabino Benno Jacob se pronunciou sobre 
o assunto da seguinte forma: "Nós não podemos ajudar, mas 
responder porque este mandamento não era usado para prover 
uma lição dogmática final acerca das falsas deidades, mas isto foi 
precisamente o que o Decálogo procurou evitar"31 (JACOB, 1992, 
p. 546). Ele explica. É que no Sinai só existiam Javé e Israel, e 
nada havia a ser dito sobre as nações e seus deuses, portanto o
31 G r i f o s o r i g i n a i s d o a u t o r .
rabino acrescenta: "Não existia outro deus para o Decálogo". A 
mais rudimentar regra da hermenêutica diz que nunca se deve 
interpretar um texto isoladamente, fora do seu contexto. Aqui, 
esse contexto mostra a proibição de sacrificar e servir a outros 
deuses é absoluta e sem concessão, o que remete ao monoteísmo 
(Êx 22.20; 23.13; 34.14; Dt 6.4, 14; 13.2). É assim que essas e ou­
tras passagens do Pentateuco explicam o primeiro mandamento. 
Existe um só Deus e Deus é um só; esse pensamento permeia a 
Bíblia inteira (2 Rs 19.15; Jo 17.3).
Os ídolos, de fato, não são deuses (Dt 32.21; Gl 4.8). Apenas 
são chamados assim por existirem na mente dos seus adoradores 
(1 Co 8.5), mas não reais de fato. O objeto de adoração dos gentios 
são representações demoníacas; os pagãos adoram os próprios 
demônios (Lv 17.7; Dt 32.17; 1 Co 10.20). Não existe Deus além 
de Javé (Is 44.6; 45.5, 6). Os cristãos devem manter distância dos 
ídolos (1 Co 10.14; 1 Jo 5.21).
O monoteísmo é instituído como confissão de fé na lei de 
Moisés, e o Decálogo introduz esta doutrina. O monoteísmo é a 
crença em um só Deus, como sugere a própria palavra: monos, 
"único", e theos, "Deus". O termo é usado para designar a crença 
em um e somente um Deus. A ênfase nesta unidade contrasta 
de maneira visível com o henoteísmo e a monolatria, além do 
politeísmo. Os patriarcas do Gênesis, Abraão, Isaque e Jacó, eram 
monoteístas e instruíram seus descendentes nessa crença (Dt 
13.6; 28.64; Jr 19.4).
O Deus de Israel revelado no Antigo Testamento é o mesmo 
Deus do cristianismo (Mc 12.29-32). O Senhor Jesus não somente 
ratificou o monoteísmo judaico do Antigo Testamento, como tam­
bém afirmou que o Deus Javé de Israel, mencionado em Deutero- 
nômio 6.4-6, é o mesmo Deus que ele veio revelar à humanidade 
(Jo 1.18). O monoteísmo cristão é trinitário porque a sua base é
I 3 6 I OS DEZ M A N DA M ENTO S - VALORES D IVIN O S PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE M UD A N Ç A
NÃO TERÃS OUTROS DEUSES I 37
de um só Deus que subsiste em três pessoas distintas: o Pai, o 
Filho e o Espírito Santo (Mt 28.19). O monoteísmo judaico é cha­
mado de monoteísmo ético, pois Javé é um Deus com propósito 
ético e a afirmação de um só Deus é feita com base ética. Os Dez 
Mandamentos são chamados de "Decálogo Ético". A doutrina de 
Deus é uma "questão de vida ou morte", pois, Jesus disse: "E a vida 
eterna é esta: que conheçam a ti só por único Deus verdadeiro e 
a Jesus Cristo, a quem enviaste"(Jo 17.3).
O apóstolo Paulo anunciava aos gentios o mesmo Deus de 
seus antepassados: "O Deus de nossos pais de antemão te de­
signou para que conheças a sua vontade, e vejas aquele Justo, e 
ouças a voz da sua boca" (At 22.14). Veja o que ele ensina nas 
epístolas: "Todavia para nós há um só Deus, o Pai, de quem é tudo 
e para quem nós vivemos; e um só Senhor, Jesus Cristo, pelo qual 
são todas as coisas, e nós por ele" (1 Co 8.6); "Ora, o medianeiro 
não o é de um só, mas Deus é um" (Gl 3.20); "Um só Deus e Pai 
de todos, o qual é sobre todos, e por todos, e em todos vós" (Ef 
4.6). A fé cristã não admite a existência de outro Deus além do 
Deus de Israel (Mc 12.32). É o monoteísmo judaico-cristão.
m à
IMAGENS 
DE ESCULTURAS
N o preâmbulo do primeiro mandamento Deus se 
identifica. O segundo mandamento é muito próximo 
do primeiro, ambos são de ordem espiritual e afirmam 
a existência de um Deus vivo, o único que deve ser 
adorado. Aqui Javé proíbe a adoração aos ídolos e o 
culto a qualquer imagem de escultura ou de pintura 
como objeto de adoração. É nesta forma de idolatria 
que o presente capítulo pretende focar.
Os patriarcas do Gênesis e os israelitas do deserto sabiam 
muito pouco sobre os atributos de Deus. A revelação divina acon­
teceu de forma gradual ao longo dos séculos, até a manifestação 
do Filho de Deus (Hb 1.1). Os dois primeiros mandamentos do 
Decálogo são os que maior impacto causaram em Israel. Deus 
é espírito e invisível (Jo 4.24; Cl 1.15; 1 Tm 1.17) e hoje qualquer 
cristão sabe disso. Essa verdade é declarada na Confissão de 
Westminster. No entanto, foi o próprio Deus que se revelou a si 
mesmo sobre o seu ser e a sua natureza e nesses mandamentos 
temos o esboço dessa doutrina.
No primeiro mandamento, Javé se identifica ao seu povo como 
o Deus soberano que remiu a Israel da escravidão do Egito. Aqui 
e no segundo mandamento, Deus revela a sua espiritualidade e 
ordena que somente ele deve ser adorado. Javé proíbe o uso de 
imagem e de qualquer representação, semelhança ou figura do 
próprio Deus na adoração. Essa proibição se estende também a 
toda e qualquer divindade falsa dos pagãos.
OS ÍDOLOS E AS IMAGENS
A revelação do Sinai aconteceu três meses após a saída dos 
israelitas do Egito. Aquela geração havia nascido e vivido na terra 
do Nilo até aquele momento. O Egito era um dos maiores centros 
de idolatria do mundo. Suas imagens de escultura e seus obeliscos 
impressionam o espírito humano até hoje. Esse país foi o berço 
da civilização de Israel, e os hebreus conviveram com a cultura 
dos egípcios durante muito tempo, razão pela qual deviam estar 
bem familiarizados com suas práticas religiosas.
O profeta Jeremias menciona os obeliscos e as casas dos deuses 
do Egito em Heliópolis muitos séculos após a promulgação da lei: 
"E quebrará as estátuas de Bete-Semes, que está na terra do Egito;
I 4 0 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
NÃO FARÁS IMAGENS DE ESCULTURA I 41
e as casas dos deuses do Egito queimará" (Jr 43.13). O principal 
templo de Heliópolis era o de Rá, deus representado por um ho­
mem com cabeça de falcão, cuja supremacia no Egito durou mais 
de mil anos. Segundo os egípcios, Rá era o pai de uma família de 
nove deuses. Implícita estava a zoolatria - adoração aos animais 
pois os egípcios viam neles mais que símbolos ou emblemas; 
eles os consideravam receptáculos das formas do poder divino.
Bete-Semes aqui é Heliópolis, uma antiga cidade egípcia de 
Om, seu nome hebraico, e Heliópolis, seu nome grego (Gn 41.45, 
50, LXX). Situa-se atualmente 16 km a noroeste do Cairo, onde se 
localiza o aeroporto internacional. O nome hebraico bêth shemesh 
significa "casa do sol", e a Septuaginta emprega hêliou póleõs, 
"cidade do sol" [50.13]. A Nova Tradução na Linguagem de Hoje 
traduz como "Heliópolis". Jeremias emprega o termo hebraico 
matstsêbãh32 para designar "estátua", que significa "alguma coisa 
colocada verticalmente, coluna, pilar, estátua". O profeta se refere 
aos obeliscos, que são próprios do Egito (KOEHLER & BAUMGAR- 
TNER, vol. 1,2001, p. 621). Trata-se de um bloco de pedra postado 
para fins memoriais (2 Sm 18.18) ou religiosos (2 Rs 3.2; 10.26; 18.4; 
23.14; Os 10.1; Mq 5.13 [12]). Os obeliscos egípcios eram ídolose 
também memoriais. Essa prática era proibida em Israel (Dt 16.22).
Hoje, apenas oito desses obeliscos continuam de pé no Egi­
to: três no templo de Carnaque (originalmente, eram dez); um 
no templo de Luxor (mas havia dois, o outro está na praça da 
Concórdia); um no Aeroporto Internacional do Cairo, trazido de 
Ramessés, sua localidade original; um posto em um jardim ao 
lado da Torre do Cairo, trazido também de Ramessés; um na praça 
Matariya, no centro do Cairo, trazido das ruínas do templo do sol 
de Heliópolis; e o último, da 12a dinastia, está em Fayum, local
32 naan.
em que, segundo se diz, Jacó viveu com toda a família, durante a 
administração de José do Egito. Existem ainda mais de dez obelis­
cos egípcios espalhados por locais variados na Europa, Vaticano, 
Istambul, Londres, Paris e em Nova Iorque, nos Estados Unidos, 
resgatados desde os romanos a partir do ano 31 a.C.
0 SEGUNDO MANDAMENTO
O grande desafio de Israel era vencer a idolatria e manter a 
fidelidade a Javé, cumprindo o concerto do Sinai. O povo estava 
saindo de um contexto sociocultural completamente politeísta. 
Seus ancestrais lhes haviam falado sobre o Deus de Abraão, de 
Isaque e de Jacó, mas agora eles mesmos precisavam saber o que 
significava o compromisso de servir e adorar exclusivamente o 
Deus que os libertara da escravidão do Egito. A adoração a Javé 
devia ser algo completamente diferente dos rituais idólatras. O 
segundo mandamento declara:
Não farás para ti imagem de escultura, nem alguma 
semelhança do que há em cima nos céus, nem em baixo na 
terra, nem nas águas debaixo da terra. Não te encurvarás a 
elas nem as servirás; porque eu, o SENHOR, teu Deus, sou 
Deus zeloso, que visito a maldade dos pais nos filhos até 
à terceira e quarta geração daqueles que me aborrecem e 
faço misericórdia em milhares aos que me amam e guardam 
os meus mandamentos ( ê x 20.4-6; Dt 5.8-10).
Os dois termos hebraicos pessel e temunãh33 dizem respeito 
à falsa adoração. Da palavra pessel, "imagem", deriva o verbo 
pãssal,34 "esculpir, entalhar, lavrar" pedra ou madeira para cons­
I 4 2 I OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
33 b o ? e r m n n .
NÃO FARÁS IMAGENS DE ESCULTURA í 4 3
truir (1 Rs 5.18 [32]), escrever (Êx 34.1, 4; Dt 10.1, 3) e esculpir 
imagem de divindades (Hc 2.18). A Septuaginta traduziu o termo 
por eidõlon,35 "ídolo". O termo temunãh, "forma, aparência, figura, 
representação, semelhança", só aparece dez vezes no Antigo 
Testamento (Êx20.4; Dt4.12,15,16,23,25; 5.8; Nm 12.8; Jó 4.16; 
Sl 17.15). Cinco vezes aparece em conexão ou paralelamente 
a pessel e diz respeito à proibição do uso de imagens (Êx 20.4; 
Dt 4.16, 23, 25; 5.8). Duas vezes é usada para esclarecer que 
os israelitas ouviram a voz de Javé que falava do meio do fogo 
no monte Sinai, mas eles só ouviram as palavras por ocasião 
da revelação do Sinai (Dt 4.12, 15). Três vezes é empregada de 
maneira independente: Moisés era o único que via a temunat 
YHWH,36 a "semelhança de Javé" (Nm 12.8). Deus falava com ele 
como alguém fala a um amigo, face a face (Êx 33.11); Elifaz usa 
o termo para descrever uma revelação noturna (Jó 4.16) e, num 
paralelismo poético, a palavra é empregada de forma metafórica 
numa visão de Davi (Sl 17.15).
O segundo mandamento diz que não se deve fazer imagem 
ou figura de tudo o "que há em cima nos céus, nem em baixo 
na terra, nem nas águas debaixo da terra” (Êx 20.4; Dt 5.8). Isso 
envolve todas as espécies de animais, aves, répteis, peixes, aves, 
corpos celestes, e inclui a imagem do próprio Deus (Dt 4.12-19). 
Amenção das estátuas de macho e fêmea, "alguma escultura, 
semelhança de imagem, figura de macho ou de fêmea" (Dt 4.16), 
diz respeito às divindades masculinas e femininas. Os cananeus 
chamavam à madeira de pai e à pedra de mãe (Jr 2.27). A madeira 
era o símbolo da fertilidade feminina; a deusa Aserá era a mãe dos 
deuses; e a pedra simbolizava a fertilidade masculina na religião 
dos cananeus (Dt 4.28; Jr 3.9).
35 EiôwÀov. ^rnrr njan.
OS DEZ MANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
As espécies de animais mencionadas aqui (Dt 4.17-19) re­
presentavam os deuses na antiguidade (Ez 8.10). Dagom era o 
deus dos filisteus (Jz 16.23; 1 Sm 5.7), e sua imagem consistia em 
metade forma de homem e metade forma de peixe. Rá era o deus- 
-sol, dos egípcios, e Sin, o deus-sol dos babilônios. O touro, por 
exemplo, era um símbolo do Egito: "Por que o deus Ápis fugiu? 
O seu touro não resistiu" (Jr 46.13, NVI); "Por que foi derribado o 
teu Touro?" (ARA). Ápis era o boi sagrado do Egito, representa­
ção de Ptah, deus da fertilidade de Mênfis. O culto do bezerro no 
deserto mostra que essa forma de adoração dos egípcios ainda 
estava no coração do povo (Êx 32.4-6; Sl 106.19, 20). As estátu­
as de Baal eram colocadas sobre touros. Esse animal era ideal 
para esses deuses, pois simbolizava força e fertilidade. O touro 
representava também outros deuses, como Baal. E, durante muito 
tempo, o povo judeu também se deixou influenciar pelo culto do 
bezerro (1 Rs 12.28-30; Os 8.5). Esses são alguns dos exemplos 
de divinização pagã de animais e corpos celestes.
O segundo mandamento divide opiniões ainda hoje, e as 
interpretações são diversificadas. Os templos católicos romanos 
estão cheios de imagens de escultura, com fins cúlticos; por outro 
lado, a comunidade Amish não permite o uso de fotografia nem se 
deixa fotografar, pois seus membros a interpretam como produção 
de imagem, o que violaria o segundo mandamento. Contudo, o 
mandamento aqui não se refere à arte como tal. Essa proibição 
é específica; refere-se imagem de madeira, pedra ou metal ou 
forma de algum deus ou deuses das nações: "Não te encurvarás 
a elas nem as servirás" (Êx 20.5; Dt 5.9).
Essa maneira de entender o segundo mandamento é con­
firmada ao longo do Antigo Testamento (2 Rs 21.7; Is 40.19, 20; 
Jr 10.14). Aqui, é uma referência à adoração (Êx 34.13, 17; Dt
27.15). O primeiro verbo tem o sentido de adorar tishthaheweh,
NÃO FARÁS IMAGENS DE ESCULTURA I 4 5
ou tishthahãweh,37 "prostrar-se, encurvar, adorar". A Septuaginta 
traduz por proskyneo "adorar”,38 e o termo aparece 60 vezes no 
Novo Testamento. O segundo verbo é ‘ãvad,39 "trabalhar, servir". 
A Septuaginta traduziu por latreuõ,40 "prestar serviço sagrado, 
servir, adorar", e é o termo que aparece em Mateus 4.10.
O contexto é religioso e remete à proibição de fazer imagens 
de escultura ou quaisquer figuras e se prostrar diante delas para 
as adorar. Este mandamento causou profundo impacto em Israel, 
de modo que a escultura é uma arte que não se desenvolveu entre 
os israelitas, mesmo para fins meramente culturais. Os grandes 
museus, como Louvre em Paris, o museu Britânico em Londres, 
o Neues em Berlim o Metropolitan em Nova Iorque; o museu do 
Cairo, entre outros, estão repletos de artes de escultura artística 
e religiosa, bustos de artistas, pensadores e estadistas do Egito, 
Mesopotâmia, Pérsia, Grécia, Fenícia e Roma, além de estátuas e 
estatuetas de deuses. No entanto, não existe praticamente nada 
nos acervos judaicos dessa natureza nesses museus.
As galerias de arte estão completamente fora deste contex­
to. Trata-se de coleções de manifestações artísticas, e não é a 
respeito disso que fala o segundo mandamento. Os expositores 
da Bíblia são praticamente unânimes quanto a esta questão. Há 
no Antigo Testamento diversos indícios que confirmam esta in­
terpretação. Deus mesmo inspirou artistas entre os israelitas no 
deserto (Êx 35.30-35) e mandou Moisés levantar uma serpente 
de metal no deserto (Nm 21.8). O rei Salomão não encontrava 
artistas em Israel para a decoração do templo e do seu palácio, 
de modo que contratou escultores e pintores dentre os fenícios 
(2 Cr 2.13, 14). Ele mandou esculpir querubins na parede e tou­
37 n innrçn (êx 20.5) ou rn n rm n (Dt 5.9). 38 ripooKwéu.
39-12SJ. “ Atrtpeúu.
ros e leões para decorar o templo (1 Rs 6.29; 7.29) e o palácio 
real (1 Rs 10.19, 20). E, quando a serpente de metal que Moisés 
levantou no deserto veio a ser objeto de culto com o passar do 
tempo, o rei Ezequias mandou destruí-la (2 Rs 18.4).
0 DEUS ZELOSO
"Porque eu, o SENHOR, teu Deus, sou Deus zeloso, que visi­
to a maldade dos pais nos filhos até à terceira e quarta geração 
daqueles que me aborrecem e faço misericórdia em milhares aos 
que me amam e guardam os meus mandamentos" (Êx 20.5b-6; Dt 
5.9b-10). O adjetivo hebraico qannã’,41 "zeloso", aparece apenas 
cinco vezes no Antigo Testamento (Êx 20.5; 34.14; Dt 4.24; 5.9;
6.15), associado ao nome divino e/,42 "Deus". As formulações nas 
cinco passagens diferem em detalhes. Nos dois textos do Decálogo 
e em Êxodo 34.14, as palavras ’êl qannã ’ são atributos de Javé. A 
menção dos deuses não acontece em Deuteronômio 4.24; 6.15.
O zelo de Javé consiste no fato de ser ele o único para Israel e 
não compartilhar o amor e a adoração com nenhuma divindade 
das nações. Esse direito de exclusividade era algo inusitado na 
época e único na história das religiões, pois os cultos pagãos anti­
gos eram tolerantes em relação a outros deuses. O termo "zeloso" 
contém noções de paixão e intolerância; exprime a disposição de 
Javé abençoar Israel e fazê-lo prosperar, não aceitando um cora­
ção dividido. Essa linguagem é representada no relacionamento 
entre marido e esposa no casamento, na fidelidade (Ct 8.6) e na 
infidelidade (Os 1.2).
As ameaças sobre as gerações daqueles que aborrecem Javé 
são para os descendentes que continuam envolvidos no pecado
I 4 6 í OS DEZ M ANDAMENTOS - VALORES DIVINOS PARA U M A SOCIEDADE EM CONSTANTE MUDANÇA
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N Ã O FARÁS IMAGENS DE ESCULTURA I 4 7
dos pais, as sucessivas gerações que aprenderam os pecados 
dos seus ancestrais e vivem ainda neles. Este princípio aparece 
outras vezes no Antigo Testamento além das duas passagens 
do Decálogo (ÊX34.7; Nm 14.18; Jr 32.18). Deus não permite que 
filhos inocentes sejam responsabilizados pela maldade dos pais 
(Dt 24.16; 2 Rs 14.6; Ez 18.2, 3, 20). O verbo "visitar",pãqad,4i 
em hebraico, indica uma visita, no sentido de cuidar e também 
de castigar. O profeta Jeremias emprega esse verbo em ambos
os sentidos (Jr 23.2).
A expressão "terceira e quarta geração" indica qualquer nú­
mero ou plenitude e não se refere necessariamente à numeração 
matemática, pois se trata de máxima comum na literatura semí- 
tica (Am 1.3, 6, 11, 13; 2 .1, 4, 6; Pv 30.15., 18, 21, 29). O objetivo 
aqui é contrastar o castigo para a "terceira e quarta geração" 
com o propósito de Deus de abençoar a milhares de gerações. 
Outras máximas aparecem no Antigo Testamento com números 
diferentes: "dois e três” (Jó 33.29); "seis e sete" (Jó 5.19; Pv 6.16); 
"sete e oito" (Ec 11.2; Mq 6.5), para expressar que a medida da 
iniqüidade está cheia e não há como suspender a ira divina ou a 
plenitude de algo positivo.
Os expositores da doutrina conhecida como maldição he­
reditária costumam usar de maneira isolada uma parte deste 
mandamento, "visito a maldade dos pais nos filhos até à terceira 
e quarta geração daqueles que me aborrecem", para fundamentar 
a sua teoria. Afirmam que, se alguém tem problemas com adul­
tério, pornografia, divórcio, alcoolismo ou tendências suicidas é 
porque alguém de sua família, no passado, não importa se avós, 
bisavós ou tataravós, teve esse problema. Nesse caso, a pessoa 
afetada pela maldição hereditária deve, em primeiro lugar, des­
cobrir em que geração seus ancestrais deram

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