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<p>DESNUTRIÇÃO</p><p>1) Definir a desnutrição.</p><p>. A desnutrição energético-proteica é consequência de um</p><p>desequilíbrio entre a necessidade e a oferta de macro e</p><p>micronutrientes que ocasiona alterações no</p><p>crescimento e nas funções metabólicas.</p><p>. Esse desequilíbrio é responsável por alterações nos</p><p>sistemas endócrino, imunológico, nervoso, cardiovascular,</p><p>gastrointestinal e renal (multissistêmico).</p><p>. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a</p><p>expressão “desnutrição energético-proteica” abrange várias</p><p>condições patológicas resultantes da falta concomitante de</p><p>calorias e proteínas em proporções diversas, que</p><p>acometem, principalmente, os lactentes e pré-escolares.</p><p>. Observa-se que, atualmente, a desnutrição na infância é</p><p>predominantemente calórica e pode estar associada à</p><p>deficiência de vitaminas e minerais.</p><p>. A FOME OCULTA é caracterizada pela deficiência de</p><p>micronutrientes (vitaminas e minerais). É uma condição</p><p>silenciosa que é consequência do consumo insuficiente</p><p>de alimentos que contenham nutrientes essenciais,</p><p>como frutas, verduras, legumes, óleos vegetais, peixes,</p><p>leite e derivados. Ela pode ocorrer em crianças que</p><p>recebem um aporte adequado de calorias e até mesmo em</p><p>crianças obesas, pois o que causa a fome oculta é a má</p><p>qualidade da dieta.</p><p>FATORES DE RISCO: Apesar de ser uma doença</p><p>multifatorial, as causas da desnutrição em crianças</p><p>relacionam-se fortemente com o nível socioeconômico</p><p>em que essas estão inseridas. Os principais fatores</p><p>relacionados à desnutrição são:</p><p>- Interrupção rpecoce do aleitamento materno;</p><p>- Baixo nível de escolaridade dos pais;</p><p>- Doenças crônicas;</p><p>- Privação alimentar;</p><p>- Côdições precárias de moradia;</p><p>- Fraco vínculo mãe-filho;</p><p>-Baixo peso ao nascimento;</p><p>- Infecções de rapetição.</p><p>. O período crítico para a instalação da desnutrição vai</p><p>desde a concepção até o segundo ano de vida. A</p><p>instalação da desnutrição nessa fase da vida é responsável</p><p>por consequências graves e irreversíveis no crescimento e</p><p>desenvolvimento. Os efeitos dessa condição podem ser</p><p>observados até a vida adulta, e os principais são:</p><p>- Prejuízo global à sáude;</p><p>- Atraso intelectual;</p><p>- Rendimento escolar precário;</p><p>- Baixa produtividade no trabalho.</p><p>. O retardo de crescimento intrauterino relaciona-se, de</p><p>forma significativa, com a desnutrição na infância, na</p><p>medida em que a criança já nasce com reservas limitadas</p><p>de muitos nutrientes.</p><p>. As infecções recorrentes, as parasitoses intestinais e a</p><p>ingestão insuficiente de nutrientes pioram os efeitos do</p><p>retardo de crescimento intrauterino, pois depletam as</p><p>reservas do organismo.</p><p>. Assim, as infecções prolongadas e parasitoses</p><p>intestinais acarretam uma ingestão inadequada de</p><p>nutrientes por parte da criança, piorando a desnutrição.</p><p>Dessa forma, esses dois fatores fazem parte da</p><p>engrenagem de um círculo vicioso.</p><p>2) Conhecer as classificações da desnutrição.</p><p>De acordo com a causa a desnutrição pode ser</p><p>classificada como:</p><p>Primária: relacionada à insegurança alimentar, isto é,</p><p>falta de acesso a uma alimentação saudável e equilibrada</p><p>em macro e micronutrientes;</p><p>Secundária: associada a alguma doença que interfira na</p><p>ingestão e absorção de nutrientes e/ou por necessidades</p><p>metabólicas aumentadas.</p><p>. As doenças crônicas constituem as principais causas</p><p>secundárias de desnutrição; dentre elas destacam-se:</p><p>• Doenças neurológicas que cursam com disfagia, como</p><p>a encefalopatia hipóxico-isquêmica;</p><p>• Doenças renais que causam distúrbios metabólicos</p><p>como a acidose, que interfere no crescimento e ganho</p><p>ponderal;</p><p>• Cardiopatias: alto gasto energético;</p><p>• Malformações congênitas: principalmente do trato</p><p>digestivo;</p><p>• Doenças respiratórias com queda da oxigenação</p><p>tecidual e maior gasto energético;</p><p>• Síndrome de má absorção intestinal;</p><p>• Hipertireoidismo, devido à maior taxa de metabolismo.</p><p>linicamente, a desnutrição possui 4 formas, que podem</p><p>estar associadas entre si.</p><p>Wasting → comprometimento do peso.</p><p>Desnutrição aguda → consequência da rápida perda</p><p>de peso ou dificuldade em ganhá-lo</p><p>Stunting → comprometimento de peso e da estatura.</p><p>Baixo peso por idade</p><p>Deficiência de micronutrientes → fome oculta.</p><p>3) Compreender a fisiopatologia e manifestações</p><p>clínicas da desnutrição.</p><p>- A desnutrição é uma doença multissistêmica. Nosso</p><p>organismo tenta adaptar-se à escassez de nutrientes para</p><p>garantir sua sobrevivência. Assim, os diferentes sistemas</p><p>do organismo manifestam sinais de seus processos</p><p>adaptativos. Dentre as alterações, temos:</p><p>. Cardiovasculares - Crianças com desnutrição grave</p><p>apresentam equilíbrio hídrico precário. Além disso, as</p><p>crianças com marasmo têm débito cardíaco e volume</p><p>sistólico diminuídos. Tendência à hipotensão arterial.</p><p>Como consequências, O uso indiscriminado de solução</p><p>salina endovenosa pode aumentar a pressão venosa,</p><p>causando falência cardíaca. A desidratação pode</p><p>prejudicar a perfusão tecidual.</p><p>. Hepático - A esteatose hepática ocasiona</p><p>hepatomegalia, sobretudo no kwashiorkor. Observa-se</p><p>lesão de hepatócitos e comprometimento de todas as</p><p>funções hepáticas. A gliconeogênese hepática é diminuída</p><p>em crianças desnutridas com hipoalbuminemia. A</p><p>excreção hepática de toxinas encontra-se prejudicada,</p><p>assim como a síntese hepática de proteínas. Como</p><p>sonsequências, esses pacientes são mais predispostos a</p><p>desenvolverem hipoglicemia, hipoalbuminemia e edema.</p><p>. Gênito-urinário - A desnutrição acarreta diminuição da</p><p>filtração glomerular, da excreção de sódio e ácidos. Como</p><p>consequências, edema, acidose. Maior predisposição à</p><p>infecção de trato urinário.</p><p>. Gastrointestinal - A produção de ácidos pelo estômago</p><p>é comprometida em crianças desnutridas. A função</p><p>pancreática exócrina está diminuída, principalmente no</p><p>kwashiorkor. A mucosa do intestino delgado é atrofiada, e</p><p>a produção das enzimas digestivas é comprometida, entre</p><p>elas a da lactase. A motilidade intestinal é reduzida e a</p><p>deficiência de potássio e magnésio piora essa condição.</p><p>Além disso, observa-se atrofia vilositária, mucosa fina,</p><p>aumento da permeabilidade intestinal e infiltração</p><p>linfocitária. Como consequências, má-absorção Intestinal. A</p><p>proliferação bacteriana associada à maior permeabilidade</p><p>intestinal acarreta a translocação bacteriana, predispondo à</p><p>bacteremia e sepse. Intolerância à lactose.</p><p>. Imunológico - No marasmo observa-se perda da barreira</p><p>intestinal, alteração da flora intestinal e redução da</p><p>produção de citocinas pró-inflamatórias do tecido adiposo.</p><p>Os órgãos linfoides são atrofiados. Ocorre diminuição da</p><p>imunidade celular, da produção de imunoglobulina A das</p><p>secreções e da fagocitose. Por outro lado, os pacientes</p><p>com kwashiorkor podem apresentar elevação da</p><p>interleucina 6 e da proteína C reativa.Como consequências,</p><p>crianças desnutridas apresentam elevado risco de</p><p>infecções. Pacientes desnutridos podem não apresentar</p><p>leucocitose ou febre durante quadros infecciosos.</p><p>. Endocrinológico - Pacientes desnutridos cronicamente</p><p>têm redução dos níveis de insulina. O hormônio de</p><p>crescimento é aumentado, porém a IGF-1 está diminuída. O</p><p>nível de cortisol é aumentado.Consequência: Intolerância à</p><p>glicose. Atraso no crescimento.</p><p>. Metabolismo - A taxa de metabolismo basal é</p><p>severamente diminuída, retornando ao normal no período</p><p>de recuperação. Tanto a geração de calor quanto a perda</p><p>de calor são comprometidas. Consequências: Labilidade da</p><p>temperatura corporal.</p><p>. Função celular - Ocorre diminuição da atividade da</p><p>bomba de sódio, o que torna as células mais permeáveis,</p><p>com aumento do sódio intracelular e diminuição do potássio</p><p>e magnésio intracelular. O potássio é excretado pelos rins.</p><p>Ocorre diminuição da síntese de proteínas.</p><p>Conseuquências: Alteração dos níveis plasmáticos de</p><p>eletrólitos. Hipopotassemia, hipomagnesemia, hiponatremia</p><p>e hipofosfatemia.</p><p>. Pele e glândulas - Observa-se atrofia da pele e tecido</p><p>subcutâneo. Ocorre atrofia de glândulas sudoríparas,</p><p>lacrimais e salivares. Consequências: Diminuição da</p><p>sudorese,</p><p>olhos secos e secura nos lábios. Os sinais de</p><p>desidratação não são confiáveis, devido à perda de gordura</p><p>subcutânea e orbitária.</p><p>. Muscular - Redução da massa muscular esquelética e</p><p>lisa. Consequência: Magreza, fraqueza muscular e</p><p>alterações miocárdicas.</p><p>Marasmo</p><p>O marasmo é considerado a forma de desnutrição</p><p>energético-proteica mais comum em nosso meio, sendo</p><p>causado pela baixa ingestão de todos os nutrientes. Seu</p><p>predomínio ocorre em regiões de escassez de todos os</p><p>alimentos. Essa condição afeta crianças menores de 2</p><p>anos e caracteriza-se por baixo peso em relação à estatura</p><p>e diminuição da circunferência do braço. Esse último reflete</p><p>a perda de massa muscular e das reservas de gordura.</p><p>A criança com marasmo é classicamente muito magra. A</p><p>gordura de Bichat, localizada na face, é absorvida, dando</p><p>à face um aspecto envelhecido, também denominado de</p><p>face simiesca. Devido à restrição global de nutrientes,</p><p>essas crianças se apresentam famintas e muito agitadas.</p><p>Os braços e pernas são finos, o abdome é saliente e</p><p>podem ser notadas pregas de pele nos glúteos e coxas. O</p><p>turgor dessas crianças é geralmente frouxo. Esses</p><p>pacientes apresentam muitas infecções gastrointestinais e</p><p>respiratórias. Observa-se também sinais clínicos de</p><p>deficiências vitamínica como:</p><p>• Vitamina A: xeroftalmia e manchas de Bitot nos olhos;</p><p>• Ferro: anemia ferropriva;</p><p>• Vitamina B12: parestesias, anemia megaloblástica,</p><p>glossite, pancitopenia;</p><p>• Zinco: alopecia, dermatite, diarreia, alterações na</p><p>imunidade.</p><p>As crianças marasmáticas apresentam olhar vivo e</p><p>tendência à hipotermia e bradicardia.</p><p>Pincipais manifestações clínicas do</p><p>marasmo:</p><p>. Aumento da cabeça em relação ao corpo e olhos fixos e</p><p>vivos.</p><p>. Aparência fraca.</p><p>.Irritabilidade.</p><p>. Bradicardia, hipotensão e hipotermia.</p><p>. Pele fina e seca.</p><p>. Braços e pernas finos e com excesso de pele, glúteos com</p><p>excesso de pele.</p><p>. Cabelos finos, esparsos e quebradiços.</p><p>KWASHIORKOR</p><p>Kwashiorkor vem de Gana e significa “doença do</p><p>primogênito”. Quando o filho mais velho deixa de ser</p><p>amamentado, devido ao nascimento do irmão mais novo,</p><p>passa a receber uma dieta à base de mingau e farinha,</p><p>assim como outros alimentos pobres em proteínas.</p><p>O kwashiorkor acomete, geralmente, crianças acima dos</p><p>2 anos de vida e é consequência da baixa ingestão de</p><p>proteínas. As principais manifestações clínicas do</p><p>kwashiorkor são retardo no crescimento, perda de massa</p><p>muscular menos intensa que no marasmo e edema</p><p>depressível. A gordura corporal no kwashiorkor é normal ou</p><p>aumentada.</p><p>O edema é marcante no kwashiorkor e localiza-se</p><p>predominantemente nas pernas, região genital e sacral,</p><p>podendo evoluir com anasarca. A face é arredondada,</p><p>com aspecto de lua cheia, e a hepatomegalia pode ser</p><p>observada nessas crianças e é consequência da esteatose</p><p>hepática. O estado mental é mais apático do que no</p><p>marasmo.</p><p>A pele sofre inicialmente um processo de</p><p>hiperpigmentação que é seguido por rachaduras e</p><p>descamação de suas camadas superficiais. Posteriormente,</p><p>observam-se áreas hipopigmentadas, friáveis e com</p><p>queratose. O cabelo desses pacientes também sofre</p><p>despigmentação, solta-se facilmente do couro cabeludo e</p><p>tende a ser mais liso.</p><p>Caso a criança com kwashiorkor apresente períodos de</p><p>ingestão dietética adequada, o sinal da bandeira pode ser</p><p>notado nos cabelos. Esse sinal é caracterizado por faixas</p><p>de hipocromia entremeadas por faixas de cabelo</p><p>normalmente pigmentado.</p><p>Pincipais achados clínicos do kwashiorkor:</p><p>. Apatia.</p><p>. Bochechas redondas e proeminentes (face de lua cheia).</p><p>. Boca franzida.</p><p>. Pele fina, seca e descamativa, com áreas confluentes de</p><p>hiperqueratose e hiperpigmentação.</p><p>. Cabelos secos, quebradiços, sem brilho e</p><p>hipopigmentados.</p><p>. Hepatomegalia (esteatose hepática).</p><p>. Abdômen distendido com dilatação de alças intestinais.</p><p>. Bradicardia, hipotensão, hipotermia.</p><p>FORMAS MISTAS:</p><p>• Marasmo inicial que passou a sofrer privação da oferta de</p><p>proteínas.</p><p>• Kwashiorkor inicial que foi submetido a um déficit calórico.</p><p>A fisiopatologia do edema na desnutrição grave: No</p><p>passado, o edema encontrado em crianças desnutridas era</p><p>atribuído à hipoalbuminemia, contudo, algumas crianças</p><p>desnutridas e com edema não apresentam essa carência.</p><p>Entretanto, acredita-se que a hipoalbuminemia possa</p><p>contribuir para o edema associado. A retenção de sódio e</p><p>água pelos rins pode piorar essa sintomatologia. Atualmente,</p><p>atribui-se ao estresse oxidativo e à diminuição da defesa</p><p>antioxidante as causas do edema nessas crianças,</p><p>contudo, o uso de complementos antioxidantes não foi eficaz</p><p>na sua prevenção.</p><p>4) Listar os métodos diagnósticos para a desnutrição.</p><p>Devemos nos baser nos seguintes dados:</p><p>. Antropometria: peso, estatura, perímetro cefálico,</p><p>circunferência do braço, pregas cutâneas;</p><p>• Inquérito alimentar;</p><p>• Exame clínico;</p><p>• Investigação laboratorial;</p><p>• Análise das condições socioeconômicas;</p><p>• Avaliação do desenvolvimento neuropsicomotor.</p><p>PORCENTAGEM DE ADEQUAÇÃO</p><p>A porcentagem de adequação pode ser obtida por meio da</p><p>divisão de uma medida observada (peso ou estatura) por</p><p>uma medida esperada, ou seja, a mediana da medida de</p><p>acordo com o sexo e idade. As duas classificações que</p><p>utilizam essa abordagem são a de Gomes e Waterlow.</p><p>GOMEZ - Criada em 1956, de acordo com essa</p><p>classificação de Gomez, que pode ser utilizada até os</p><p>dois anos de idade, há três níveis de corte para classificar</p><p>a desnutrição em termos de risco de mortalidade. O</p><p>primeiro passo é avaliar a porcentagem de adequação do</p><p>peso para a idade observado da seguinte</p><p>forma:</p><p>Após o cálculo, podemos avaliar qual a porcentagem de</p><p>adequação do peso da criança em relação à mediana da</p><p>população e classificar o seu estado nutricional.</p><p>Na presença de edema de origem nutricional,</p><p>independentemente do resultado obtido, o diagnóstico é</p><p>de desnutrição de terceiro grau.</p><p>CLASSIFICAÇÃO DE WATERLOW MODIFICADA POR</p><p>BATISTA</p><p>A classificação de desnutrição de WATERLOW modificada</p><p>por Batista leva em conta a estatura para a idade e o</p><p>peso para a estatura. É utilizada para crianças entre 2 e</p><p>10 anos de idade. Nessa fase, observa-se um crescimento</p><p>mais lento e constante.</p><p>Dessa forma, o comprometimento isolado do peso</p><p>indica desnutrição atual, o comprometimento de peso e</p><p>estatura indica desnutrição crônica e o</p><p>comprometimento isolado de estatura reflete a</p><p>desnutrição pregressa.</p><p>CLASSIFICAÇÃO DA OMS</p><p>A classificação de desnutrição utilizada pela OMS de 1995</p><p>leva em conta o peso para estatura, estatura e</p><p>circunferência do braço. Ela pode ser aplicada a lactentes</p><p>e pré-escolares.</p><p>Além do peso e da estatura, a medida da circunferência</p><p>do braço é um método de triagem eficaz e de alta</p><p>acurácia no diagnóstico da desnutrição em crianças. Esse</p><p>método tem sido muito utilizado em países pobres, onde a</p><p>prevalência de desnutrição é extremamente elevada. Essa</p><p>medida apresenta um ponto de corte único para a</p><p>desnutrição severa, que é de 115 mm. Ela consiste em</p><p>um melhor preditor de mortalidade que o peso para a</p><p>estatura, sendo fácil de ser realizada e, além disso, não</p><p>sendo afetada pela desidratação. Pode ser utilizada</p><p>até os 5 anos de vida.</p><p>Os critérios diagnósticos para a desnutrição infantil foram</p><p>estabelecidos pela OMS e revisados em 2009. Eles levam</p><p>em conta o peso, estatura, medida da circunferência do</p><p>braço e a presença de edema.</p><p>AVALIAÇÃO LABORATORIAL</p><p>As principais alterações laboratoriais encontradas em</p><p>crianças desnutridas são resultado do déficit de nutrientes,</p><p>das adaptações do organismo e das doenças associadas</p><p>à desnutrição. A investigação laboratorial deve abranger:</p><p>• Hemograma e esfregaço sanguíneo (avaliar presença de</p><p>anemia e sinais de processo infeccioso);</p><p>• Dosagem de vitaminas, ferro e zinco;</p><p>• Glicemia;</p><p>• Exame sumário de urina e urocultura;</p><p>• Eletrólitos;</p><p>• Gasometria;</p><p>• Pesquisa de foco infeccioso dirigida (inclui coleta de</p><p>culturas);</p><p>• Radiografia de tórax;</p><p>• Pesquisa de parasitoses intestinais;</p><p>• PPD (tuberculose) ;</p><p>• Avaliação da imunidade celular e humoral;</p><p>• Sorologias.</p><p>O exame de proteínas séricas não é considerado útil</p><p>para o diagnóstico da criança desnutrida grave, contudo</p><p>ele pode ser útil para orientar o prognóstico. Observe:</p><p>• Albumina: como tem vida média de 20 dias, sua</p><p>aplicação fica restrita para a avaliação da gravidade da</p><p>desnutrição crônica e do prognóstico;</p><p>• Transferrina: vida média de 8 dias, pode ser útil para o</p><p>diagnóstico da desnutrição subclínica;</p><p>• Pré-albumina: vida média de dois dias. Pode ser</p><p>utilizada como marcador da recuperação nutricional.</p><p>TRATAMENTO</p><p>Em 1999, a Organização Mundial de Saúde lançou o</p><p>manual de tratamento para crianças com desnutrição grave</p><p>que incluía os “10 passos para o manejo da criança com</p><p>Desnutrição Grave em Nível Hospitalar”. Atualmente as</p><p>crianças desnutridas são divididas em grupos de acordo</p><p>com a presença de complicações.</p><p>DESNUTRIÇÃO AGUDA GRAVE SEM COMPLICAÇÃO</p><p>Dentre as crianças gravemente desnutridas, a maioria não</p><p>apresenta complicações e costuma apresentar bom apetite</p><p>e ausência de complicações clínicas evidentes. Esses</p><p>pacientes devem ser tratados em ambulatórios, mediante</p><p>um programa comunitário de alimentação supervisionado e</p><p>com acompanhamento constante.</p><p>Na modalidade de tratamento ambulatorial, a assistência</p><p>da equipe multiprofissional é fundamental e inclui o</p><p>médico, nutricionista, assistente social, pedagogo e</p><p>educador, enfermeiro e psicólogo. A família deve estar</p><p>inserida no tratamento de modo a aplicar as orientações</p><p>fornecidas assim como, para que se evite o retorno à</p><p>situação prévia ao tratamento.</p><p>O atendimento ambulatorial deve ser regular a cada uma a</p><p>duas semanas. Nestas situações são fornecidos os</p><p>alimentos, as medidas antropométricas são avaliadas e as</p><p>famílias são encorajadas a manter o tratamento. A maior</p><p>parte delas apresenta recuperação entre seis e oito</p><p>semanas. Caso não haja resposta parcial em 2 semanas,</p><p>deve ser feita uma reavaliação e ponderar a</p><p>necessidade de hospitalização.</p><p>Os pacientes recebem alta quando atingem seu alvo</p><p>antropométrico, sem evidências de complicações ou</p><p>infecções e com apoio social para evitar recidivas.</p><p>DESNUTRIÇÃO AGUDA GRAVE COM COMPLICAÇÕES</p><p>A minoria das crianças com desnutrição aguda grave</p><p>apresenta complicações. Essas crianças devem receber</p><p>seu tratamento inicial em ambiente hospitalar. Ao</p><p>internarmos uma criança com desnutrição grave, nosso</p><p>principal objetivo é tirá-la do risco de vida.</p><p>Devemos priorizar internações curtas com o intuito de</p><p>minimizarmos os riscos inerentes à internação. Essa é</p><p>denominada fase de estabilização.</p><p>A recuperação nutricional completa não é o objetivo nesse</p><p>momento. É necessário que a dieta seja introduzida de</p><p>forma gradual, respeitando as condições metabólicas</p><p>adversas da criança. Essa recuperação nutricional</p><p>ocorrerá de forma paulatina na etapa subsequente, que é</p><p>denominada fase de reabilitação. Já a fase de</p><p>acompanhamento ambulatorial tem como objetivo evitar</p><p>que a criança volte a apresentar a desnutrição, além de</p><p>estimular o seu desenvolvimento neurológico completo.</p><p>FASE DE ESTABILIZAÇÃO - Essa fase é a mais crítica,</p><p>pois inclui o tratamento de condições graves como</p><p>hipoglicemia, hipotermia, distúrbios eletrolíticos,</p><p>desidratação e infecção. A duração dessa fase é de 7</p><p>dias. É fundamental que as infecções, parasitoses,</p><p>distúrbios metabólicos, eletrolíticos e ácidobásicos</p><p>associados sejam adequadamente tratados. O objetivo</p><p>dessa fase não é a recuperação nutricional, e sim sua</p><p>conservação, assim como a estabilização clínico-</p><p>metabólica. As prioridades do tratamento são: suporte</p><p>respiratório; controle de temperatura;</p><p>antibioticoterapia empírica para infecções; reidratação.</p><p>HIPOGLICEMIA (PASSO 1)</p><p>Hipoglicemia e hipotermia são duas condições que</p><p>aumentam o risco de óbito em crianças desnutridas! O</p><p>diagnóstico da hipoglicemia é realizado quando a glicemia</p><p>é menor que 54 mg/dl em qualquer faixa etária. A</p><p>avaliação da glicemia é fundamental nesta fase, e caso</p><p>seja detectada a hipoglicemia, a administração oral da</p><p>glicose é preferida. Em casos graves, quando não é</p><p>possível utilizar a via oral, pode ser realizada a correção</p><p>da hipoglicemia por via intravenosa ou por sonda</p><p>nasogástrica. Além disso, recomenda-se evitar longos</p><p>períodos de jejum em crianças desnutridas. Em crianças</p><p>desnutridas, os sinais clínicos de hipoglicemia, como</p><p>sudorese, tontura, letargia, palidez, tremores e taquicardia,</p><p>não são evidentes.</p><p>HIPOTERMIA (PASSO 2)</p><p>A hipotermia é outra condição que pode levar a criança</p><p>gravemente desnutrida ao óbito. Ela pode estar associada</p><p>às seguintes situações: • Infecções graves, • Marasmo,</p><p>• Presença de áreas extensas de pele lesada, • Idade</p><p>menor do que 12 meses. O diagnóstico da hipotermia é</p><p>feito pela constatação de temperatura axilar menor do</p><p>que 35° ou temperatura retal</p><p>da frequência</p><p>respiratória ou cardíaca, ingurgitamento de veias jugulares,</p><p>aumento do fígado ou piora do edema, ou seja, sinais de</p><p>descompensação cardíaca.</p><p>DISTÚRBIOS HIDROELETROLÍTICOS (PASSO 4)</p><p>Os distúrbios mais encontrados são a hipomagnesemia e</p><p>hipopotassemia. A hipofosfatemia pode ocorrer na</p><p>síndrome da realimentação. A hiponatremia é outro</p><p>distúrbio frequentemente encontrado em desnutridos</p><p>graves. A hiponatremia decorre da falha no</p><p>funcionamento da bomba de sódio devido ao déficit de</p><p>energia. Nessa situação, o potássio no sangue é eliminado</p><p>pelo rim, causando hipocalemia. A hipofosfatemia e a</p><p>hipocalcemia decorrem de baixa oferta oral e por déficit</p><p>de vitamina D, que é responsável pela absorção de cálcio</p><p>e fósforo no intestino. Já a hipomagnesemia é consequente</p><p>à baixa ingestão oral desse eletrólito. Os distúrbios do</p><p>potássio e magnésio podem demorar duas ou mais</p><p>semanas para serem corrigidos. A OMS indica a adição de</p><p>potássio e magnésio nos preparados alimentares</p><p>dessas crianças.</p><p>O edema da desnutrição nunca deve ser tratado com</p><p>diuréticos. A correção desses distúrbios é realizada da</p><p>seguinte forma:</p><p>INFECÇÃO (PASSO 5)</p><p>Crianças desnutridas têm comprometimento de seu</p><p>sistema imunológico e são mais predispostas a quadros</p><p>infecciosos. Alguns sinais indicativos de infecção são:</p><p>hipoglicemia, hipotermia, apatia, letargia, inconsciência,</p><p>inabilidade de ingerir líquidos e até mesmo a aparência doente.</p><p>Presume-se que todas as crianças gravemente</p><p>desnutridas tenham infecção subclínica e devem ser</p><p>tratadas desde o início. Assim, é recomendado o uso</p><p>empírico de antibióticos de amplo espectro. A coleta de</p><p>exames e culturas pode nortear a escolha do antibiótico mais</p><p>apropriado para cada caso. Esquemas contendo ampicilina e</p><p>aminoglicosídeo ou cefalosporina de terceira geração são</p><p>opções recomendadas. Em casos de diarreia prolongada, a</p><p>associação com metronidazol é aconselhada.</p><p>REPOSIÇÃO DE MICRONUTRIENTES (PASSO 6)</p><p>Durante a fase de estabilização e recuperação</p><p>nutricional deve ser dada especial atenção à reposição de</p><p>micronutrientes. Os principais micronutrientes a serem</p><p>repostos são: zinco, cobre, ácido fólico, vitamina A, ferro</p><p>tiamina.As fórmulas alimentares mais utilizadas são a F-75 e</p><p>F-100 e a alimentação terapêutica pronta para uso. Essas três</p><p>formulações são utilizadas em regiões carentes e contêm</p><p>todas as vitaminas e sais minerais necessários para essa fase</p><p>do tratamento. FERRO - Quase todas as crianças com</p><p>desnutrição grave apresentam anemia por deficiência de ferro.</p><p>Contudo, não devemos repor o ferro durante a fase de</p><p>estabilização, pois a diminuição da transferrina observada em</p><p>desnutridos pode ocasionar toxicidade por esse elemento e</p><p>maior risco de infecções. VITAMINA A - Se o paciente</p><p>desnutrido apresentar sinais de deficiência de vitamina A,</p><p>como secura nos olhos, cegueira noturna e manchas de Bitot,</p><p>altas doses de vitamina A devem ser utilizadas. TIAMINA - A</p><p>deficiência de vitamina B1 ocasiona o beribéri, que se</p><p>manifesta por encefalopatia aguda com confusão mental,</p><p>nistagmo, oftalmoplegia e ataxia. Além das manifestações</p><p>neurológicas, a cardiomiopatia pode ser encontrada. Em áreas</p><p>de alta incidência de deficiência de tiamina, sua reposição</p><p>torna-se necessária. A dose preconizada de tiamina em casos</p><p>de deficiência é de 100 a 150 mg por via parenteral.</p><p>ALIMENTAÇÃO (PASSO 7)</p><p>É necessário muito cuidado ao alimentar crianças</p><p>desnutridas graves durante a fase de estabilização pois, como</p><p>dissemos, essas crianças apresentam um prejuízo no</p><p>funcionamento da bomba de sódio. A oferta de alimentação</p><p>hipercalórica de forma súbita pode determinar o funcionamento</p><p>súbito desta bomba e causar distúrbios eletrolíticos graves,</p><p>que são potencialmente fatais.</p><p>Devemos priorizar a via oral para a administração</p><p>da alimentação. A oferta total de líquidos não deve</p><p>ultrapassar 120 a 140 ml/Kg de peso/dia fracionados a cada</p><p>2 horas. Os preparados alimentares devem oferecer de 80</p><p>a 100 Kcal/ Kg de peso/dia e 1 a 1,5 g de proteína/Kg de</p><p>peso/dia. Quanto à osmolaridade, o máximo preconizado é</p><p>de 280 mmol/litro com baixo teor de lactose, ou seja, até</p><p>13g/l. Pacientes desnutridos graves em regime de</p><p>internação, são classicamente alimentados com fórmula</p><p>láctea terapêutica (F-75 e F-100). Essas fórmulas</p><p>apresentam menor teor de proteínas, lipídios, lactose e</p><p>sódio. Inicialmente é ofertada a fórmula F-75 que contém</p><p>menor teor de calorias e, após 7 dias, a fórmula F-100 pode</p><p>ser iniciada. Se a criança estiver recebendo o aleitamento</p><p>materno, ele deve ser continuado.</p><p>FASE DE REABILITAÇÃO (PASSOS 8 E 9)</p><p>Os principais sinais necessários para que a criança</p><p>avance para a fase de reabilitação são: retorno do apetite</p><p>e melhora significativa do edema.</p><p>O que acontece nessa fase? Oferta de alimentos</p><p>com maior teor de calorias; Introdução do ferro; Cuidados</p><p>com estimulação motora e sensorial, afetividade e ambiente</p><p>lúdico; Orientação de pais e cuidadores.</p><p>FASE DE ACAMPANHAMENTO AMBULATORIAL</p><p>(PASSO 10)</p><p>Agora, é necessário cuidar para que a criança não</p><p>retorne à sua condição inicial e apresente recuperação</p><p>completa do seu desenvolvimento. Nesta fase, as</p><p>atribuições são: Orientação de pais e cuidadores; •</p><p>Monitoração do crescimento; • Avaliação do</p><p>desenvolvimento; • Intensificação e fortalecimento do</p><p>trabalho da equipe multiprofissional.</p><p>SÍNDROME DA REALIMENTAÇÃO (REFEEDING)</p><p>A síndrome da realimentação pode ocorrer caso uma</p><p>alimentação de alto valor calórico seja iniciada,</p><p>precocemente e vigorosamente, em pacientes gravemente</p><p>desnutridos. Essa condição pode levar à morte súbita e a</p><p>sintomas de falência cardíaca. A hipofosfatemia</p><p>observada nessa situação é marcante, além de outros</p><p>distúrbios eletrolíticos.</p><p>A oferta súbita de energia ocasiona um aumento da</p><p>atividade da bomba de sódio. O sódio acumulado é</p><p>liberado rapidamente das células, causando um rápido</p><p>aumento do volume extracelular e do plasma. Ao mesmo</p><p>tempo, observa-se um aumento da captação celular de</p><p>glicose, potássio, magnésio e fosfato. Todos esses íons</p><p>sofrem uma queda abrupta de seus níveis no soro. O</p><p>fosfato é um íon intracelular. Na criança desnutrida</p><p>observa-se perda importante do fosfato intracelular e,</p><p>quando o paciente é realimentado, há um estímulo para a</p><p>migração do fósforo e potássio para dentro da célula,</p><p>causando os distúrbios eletrolíticos encontrados na</p><p>síndrome da realimentação.</p><p>O distúrbio hidroeletrolítico mais característico da</p><p>síndrome e das provas é a HIPOFOSFATEMIA!</p><p>SÍNDROME DA RECUPERAÇÃO NUTRICIONAL</p><p>A síndrome de recuperação nutricional pode ocorrer entre</p><p>o 20º e o 40º dia de tratamento de pacientes desnutridos</p><p>graves, principalmente em portadores de Kwashiorkor. A causa</p><p>dessas manifestações permanece desconhecida. Suas</p><p>principais manifestações são:</p><p>• Hepatomegalia;</p><p>• Distensão abdominal e presença de circulação venosa</p><p>colateral;</p><p>• Fácies de lua cheia;</p><p>• Ascite;</p><p>• Alterações de pele e fâneros: hipertricose, sudorese</p><p>aumentada em segmento cefálico, unhas com desnível</p><p>transversal, cabelos com pontas mais claras;</p><p>• Telangiectasias na face.</p><p>PROGNÓSTICO - Os protocolos recomendados pela</p><p>OMS oferecem segurança e bons resultados desde que</p><p>seguidos adequadamente. As crianças com kwashiorkor</p><p>tendem a recuperar-se mais rapidamente que as crianças com</p><p>marasmo. Contudo, os efeitos da desnutrição a longo prazo</p><p>não são completamente conhecidos. Sabe-se que o</p><p>comprometimento neurológico pode ser permanente tanto em</p><p>crianças com retardo de crescimento intrauterino quanto em</p><p>crianças que apresentam agravo nutricional pós-natal. O grau</p><p>de comprometimento neurológico está diretamente relacionado</p><p>ao tempo em que a criança permaneceu desnutrida, à</p><p>severidade dessa condição e à idade de sua manifestação.</p>