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<p>Merece Antigo Testamento ? Gleason L. Archer, Jr.</p><p>MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO propósito deste panorama de introdução ao Antigo Testamen- to é oferecer um livro didático simples e prático para instruir estudan- tes de colégios e seminários que não tiveram treinamento anterior na do Antigo Testamento. Ao mesmo tempo, foi planejado para oferecer matéria para discussão dentro deste campo, para ministros e outros estudiosos sérios da leitor perceberá que este livro adere consistentemente a um pon- to de vista conservador ou evangélico. autor não pede desculpas por isto, além de esclarecer que é sua convicção pessoal que só o ponto de vista ortodoxo no que diz respeito à faz justo juízo do testemu- nho dado no texto só este ponto de vista condiz com toda a evidência apresentada pelos dados relevantes na sua totalidade. Ao mesmo tempo, um esforço consistente tem sido feito para se tratar com imparcialidade pontos de vista e teorias diferentes, daqueles que optam pela posição liberal ou neo-ortodoxa, apresentando suas pre- missas e teorias de tal maneira que o leitor possa facilmente compre- endê-las e aquilatá-las. Gleason L. Archer, Jr.</p><p>Merece Confiança O ANTIGO TESTAMENTO ?</p><p>Merece Confiança O ANTIGO TESTAMENTO ? Panorama de Introdução Gleason L. Archer Jr. Com Apêndice Sobre: História da Teoria Documental do Pentateuco A Alta Crítica do Pentateuco no Século XX A Autoria do Pentateuco SOCIEDADE RELIGIOSA EDIÇÕES VIDA NOVA Caixa Postal 21486 - CEP 04698 São Paulo - SP</p><p>Título original: A SURVEY OF OLD TESTAMENT INTRODUCTION - -Revised Edition Publicado por Moody Press, Chicago-Illinois, U.S.A. 1964, 1974 Tradução e Revisão : Gordon Chown Primeira Edição em Português: 1974 Segunda Edição em Português: 1979 Terceira Edição em 1984 Quarta Edição em Português: 1986 Reimpressão: Outubro 1988 Reimpressão: Agosto 1991 Impresso nas oficinas da Associação Religiosa Imprensa da Fé MAZINHO RODRIGUES Direitos para a língua portuguesa adquiridos por SOCIEDADE RELIGIOSA EDIÇÕES VIDA NOVA Caixa Postal 21486 - CEP 04698 São Paulo - SP</p><p>PREFÁCIO O propósito deste PANORAMA DE INTRODUÇÃO AO ANTI- GO TESTAMENTO é oferecer um livro didático simples e prático para instruir estudantes de colégios e seminários que não tiveram treinamento anterior na crítica do Antigo Ao mesmo tempo, foi planejado para oferecer matéria para discussão dentro deste campo, para ministros e outros estudiosos sérios da Bíblia. Devido à necessidade de se conservar espaço, o autor não fez a tentativa de debater os mais recentes livros e artigos dentro do as- sunto, preferindo dar-se por satisfeito ao desenvolver aqui os pontos de vista mais representativos e influentes dos líderes reconhecidos no estudo da Introdução do Antigo Testamento. Visando maior clareza, fez-se a tentativa de limitar as discussões às questões prin- cipais, tratando destas questões de tal maneira que principiante possa compreendê-las e apreciá-las. O leitor perceberá que este livro adere consistentemente a um ponto de vista conservador ou evangélico. O autor não pede des- culpas por isto, além de esclarecer que é sua convicção pessoal que só o ponto de vista ortodoxo no que diz respeito à Bíblia faz justo juízo do testemunho dado no texto bíblico, só este ponto de vista se condiz com toda a evidência apresentada pelos dados re- levantes na sua Ao mesmo tempo, um esforço con- sistente tem sido feito para se tratar com imparcialidade pontos de vista e teorias diferentes, daqueles que optam pela posição libe- ral ou neo-ortodoxa, apresentando suas premissas e teorias de tal maneira que leitor possa facilmente compreendê-las e aquilatá-las. GLEASON ARCHER,</p><p>PREFÁCIO À QUARTA EDIÇÃO EM PORTUGUÊS Devido à necessidade sentida por algumas pessoas, Edições Vida Nova achou por bem reintroduzir três capítulos que faziam parte da edição original desta obra, colocando-os no final desta edição, sob o título "Apêndice 3". São eles: Histórico da Teoria Documental do Pentateuco, A Alta Crítica do Antigo Testamento no Século XX e A Autoria do Os Editores</p><p>ÍNDICE Prefácio 5 1. Introdução 9 2. A Inspiração do Antigo Testamento 14 PRIMEIRA PARTE Introdução Geral 3. Os Manuscritos Hebraicos e as Versões Antigas 35 4. A Baixa Crítica do Antigo Testamento 54 5. O Cânone do Antigo Testamento 69 SEGUNDA PARTE Introdução Específica 6. Gênesis (I) 88 7. Gênesis (II) 113 8. Exodo 135 9. Levítico e Números 156 10. Deuteronômio 170 11. Josué, Juízes, Rute 184 12. II Samuel, II Reis 207 13. Introdução aos Profetas Obadias, Joel e Jonas 222 14. Amós, Oséias e Miquéias 246 15. Isaías (I) 259 16. Isaías (II) 274</p><p>17. Naum, Sofonias e Habacuque 290 18. Jeremias e Lamentações 298 19. Ezequiel 308 20. Daniel (I) 319 21. Daniel (II) 337 22. Livros Históricos I e II Crônicas, Esdras, Neemias e Ester 348 23. Profetas Pós-Exílicos: Ageu, Zacarias e Malaquias 369 24. Introdução à Poesia Hebraica 382 25. Salmos 389 26. Os Livros de Sabedoria: Jó e Provérbios 407 27. Eclesiastes e Cantares de Salomão 432 Apêndice 1 457 2 460 3 465 Bibliografia Geral 509 Lista de Abreviaturas 512 Índice de Assuntos 513 ILUSTRAÇÕES Equipamento antigo de escrita do Egito 19 Rolo de Isaías 37 Professor Baker cortando o Rolo de Cobre 40 Fragmentos da Épica de Criação Babilônica 92 Um "Selo da Tentação" 114 Décima primeira placa da epopéia de Gilgamés 116 Estatuetas de soldados egípcios, de túmulos egípcios 140 O Código de Hamurabi 174 Duas das Cartas de Amarna 190 Touro de Pedra, do palácio de Sargão II 216 Relevo do palácio de Assurbanípal 239 Prisma de barro, do palácio de Senaqueribe 276 Uma das Cartas de Laquis 304 Leão em tijolo esmaltado, da Babilônia 322 Capitel em forma de touro, do palácio de 363</p><p>INTRODUÇÃO Escopo da Introdução. A BÍBLIA SAGRADA não se assemelha a nenhum outro livro no mundo inteiro. É único livro que se apresenta como sendo a re- velação escrita do único Deus verdadeiro, visando a salvação do homem, e que demonstra sua autoridade divina por meio de muitas provas infalíveis. Outros documentos religiosos, tais quais o Alco- rão maometano, podem se declarar ser a própria palavra de Deus, mas não contêm as provas de autenticidade que há na Bíblia (por exemplo, o fenômeno de profecias cumpridas). Sendo o registro da santa vontade de Deus para o homem, a Bíblia tem a máxima importância para esclarecer corretamente o sentido verdadeiro das revelações que ela mesma contém. Não seria certo interpretar as palavras das Escrituras como se tivessem sido dadas em nossa época moderna, endereçadas às pessoas da língua portuguesa enfrentan- do problemas do século vinte. Não há dúvida: a Bíblia de fato traz para nós hoje a mensagem de Deus, e é tão relevante para nós hoje como era relevante para os hebreus da antiguidade. Mas a forma de ser entregue aquela mensagem era uma forma hebraica antiga, e em primeira instância, a mensagem se dirigia a pessoas que en- frentavam as questões e circunstâncias específicas da sua própria época. Não podemos entender os princípios subjacentes e perma- nentes contidos nestas antigas declarações da parte de Deus, sem, em primeiro lugar, tomar conhecimento dos problemas e desafios com os quais se confrontava o povo de Deus na geração na qual Ele falou. A Introdução ao Antigo Testamento é termo que se aplica ao estudo sistemático do pano de fundo antigo dentro do qual se deve entender os primeiros trinta e nove livros da Bíblia de forma cor- 9</p><p>10 MERECE O ANTIGO TESTAMENTO reta. Trata de assuntos de linguagem, costumes e situações histó- ricas, trata das pessoas, dos lugares e dos acontecimentos aos quais os vários livros da Bíblia fazem alusões. No seu escopo total, abran- ge os seguintes ramos de estudo: 1. As línguas nas quais o Antigo Testamento originalmente foi escrito, a saber, o hebraico e o aramaico, juntamente com as línguas semíticas cognatas (tais como árabe, assírio, fenício, uga- rítico e siríaco), que nos ajudam a entender o significado das pa- lavras empregadas no texto bíblico. 2. A história do povo hebreu e dos países vizinhos com os quais tiveram contatos. 3. A religião e a cultura destas nações não-hebraicas, con- forme se nos revelam os antigos autores pagãos, e as descobertas da arqueologia moderna. 4. A autoria dos vários livros da Bíblia, sendo que a questão sobre quem escreveu o livro tem muito a ver com seu significado e com a confiança que se pode depositar nele. 5. A data, ou pelo menos o tempo aproximado, quando cada livro foi composto - sendo que isto frequentemente nos dá uma pista quanto às questões com as quais se confrontava o povo de Deus quando Ele lhes falou. 6. A situação histórica e os problemas contemporâneos com os quais tratavam os autores divinamente inspirados, como porta- vozes de Deus. 7. O texto original de cada livro, conforme existia antes que lapsos de pena ou outros erros de copistas pudessem ter sido intro- duzidos na forma do texto que foi preservada até nossos dias. (Isto é conhecido como: a crítica textual). 8. A integridade do texto, isto é, a questão se cada livro foi integralmente elaborado pelo autor que é considerado o do livro no seu todo, ou se as escritas de outros autores se combinavam com livro original. 9. A história da transmissão do texto, isto é, a maneira pela qual cada livro foi copiado e passado adiante nas várias famílias de manuscritos, e traduzido para as várias línguas antigas dos povos aos quais chegaram o judaísmo e o cristianismo no decurso dos séculos subseqüentes, até que finalmente o próprio texto he- braico (e suas várias traduções em grego, latim, siríaco etc.) che- gassem a ser colocados na forma impressa depois da invenção da máquina de impressão.</p><p>INTRODUÇÃO 11 Como regra geral, as primeiras três divisões da Introdução que acima se descrevem, são debatidas em cursos separados de língua e de história, enquanto a Introdução ao Antigo Testamento como matéria acadêmica se restringe às seis últimas divisões. Além disto, dentro desta Introdução propriamente dita existe duas subdivisões principais: a Introdução Geral e a Introdução Especial. A Introdução Geral trata de assuntos do texto (tanto na língua original na qual foi composto, como nas versões antigas às quais o texto primeiramente se traduzia). Trata também do Cânon, isto é, a questão sobre quais livros eram verdadeiramente inspirados e autoritativos, e período aproximado da história no qual foram reconhecidos como tais pelo povo de Deus. Dá contas da origem e do alcance do cânon, e da ordem e da preservação dos livros que o compõem. Sendo que a questão da data e da autoria do Pentateuco (os cinco livros de Moisés), é tão profundamente vinculada à teoria do cânon, usualmente se inclui no campo da Introdução Geral. Quanto à Introdução Especial, trata dos livros individuais do Antigo Testamento um por um, descrevendo sua autoria, sua data, seu propósito e sua integridade. Pode também debater a estrutura em geral, e a mensagem básica de cada livro, embora que um tra- tamento detalhado do seu conteúdo pertença mais a um curso de panorama bíblico do que à Introdução. Relacionamento entre o Antigo Testamento e Novo. Os autores do Novo Testamento consideravam os livros do Antigo Testamento ("a Lei e os Profetas") como sendo uma uni- dade composta única ("a Escritura"), em última análise sendo da autoria do próprio Deus, apesar de ter sido escrita por intermédio de autores humanos que registraram a verdade sob a infalível orientação divina (cf. GI 3:8; 2 Pe 1:20). Os apóstolos inspirados consideravam que a intenção do Autor divino das Escrituras he- braicas era o que mais importava; a intenção do autor humano era meramente algo subordinado. Poderia até acontecer que o autor humano de uma profecia do Antigo Testamento não entendesse pleno significado daquilo que escrevia, embora que suas palavras exprimissem literalmente o propósito do Autor divino que ins- pirou (veja 1 Pe 1:10,11). Os escritores do Novo Testamento viam as Escrituras hebraicas inteiras como sendo um testemunho a Cristo Jesus, o Homem que cumpriu toda a Lei; Sacrifício e Sumo Sacerdote das ordenanças rituais; Profeta, Sacerdote e Rei anunciado de antemão pelos profetas; e Esposo descrito nos</p><p>12 MERECE CONFIANÇA o ANTIGO TESTAMENTO livros poéticos. Perceberam o significado profético até nos acon- tecimentos históricos registrados no Antigo Testamento. Assim, a travessia do Mar Vermelho prenunciava o batismo cristão (1 Co 10:1,2) a conquista de levada a efeito por Josué, prefi- gurava o descanso espiritual no qual os cristãos entram pela fé, (Hb caps. 3 e 4) a chamada de Israel para sair do Egito era uma sombra da experiência do Menino Jesus (Mt 2:15). Em geral, podemos dizer que o Antigo Testamento apresentava a preparação da qual o Novo Testamento foi o cumprimento; era a semente e a planta da qual Novo Testamento era o fruto glorioso. Precisamente porque Jesus de Nazaré cumpriu tudo aquilo que o Antigo Testamento predisse, Sua vida e seus atos possuíam uma finalidade absoluta, muito diferente do caso de ele ser um mero sábio religioso como muitos outros. Por este motivo também, Evangelho de Cristo possui uma validade que o distingue de todas as religiões feitas pelos homens. O Antigo Testamento demonstra que Jesus e sua Igreja eram providenciais, a concretização do pro- pósito de Deus; o Novo Testamento comprova que as Escrituras hebraicas constituíam um organismo coerente e integrado, focali- zando um único tema grandioso, e exibindo um programa único de redenção. A Família Semítica de Línguas. Assim como é verdade que a língua grega impôs seu carimbo sobre a revelação do Novo Testamento, e sobre a terminologia na qual a mensagem se exprimia, assim também é verdade que o gênio da língua hebraica determinou o modo de expressar a men- sagem do Antigo Testamento. Fazia muita diferença o fato que o grego era exato em exprimir valores em termos de tempo, e que o hebraico enfatiza, principalmente, modos de ação mais do que tempos do verbo. A interpretação adequada da revelação do Antigo Testamento exige um perfeito domínio destes traços peculiares do verbo hebraico e da sintaxe hebraica em geral; senão, surgirão mui- tos mal-entendimentos das Escrituras, e muitos textos distorcidos. A língua hebraica, de modo consideravelmente generalizado, tinha estas características gramaticais e sintáticas em comum com as demais línguas semíticas. É portanto, de grande examinar estas línguas relacionadas com o hebraico, para derivar delas a luz que lançam sobre o estilo hebraico. Além disso, no as- sunto de vocabulário o estudo das línguas semíticas comparadas é da máxima significação. acontece que uma pala-</p><p>INTRODUÇÃO 13 vra que só ocorre uma ou duas vezes na Bíblia hebraica, surge como palavra bem comum nalgumas das línguas relacionadas, e pode ser interpretada, com alto grau de exatidão, ao ser comparada com elas. A classificação tradicional das várias línguas semíticas as di- vide, de acordo com a situação geográfica das nações onde são fala- das, em norte, sul, leste e oeste. O Semítico Oriental inclui só uma língua principal, o acadiano, que se divide nos dialetos ligeiramente diferentes do babilônico e assírio. Semítico Meridional inclui o árabe (que se divide em árabe setentrional, a língua clássica e lite- rária, e árabe meridional com seus sub-dialetos: sabeano, mineano, catabaniano e hadramautiano) e o etiópico (ou Geez), com seu des- cendente moderno, o amarico. O Semítico Setentrional abrange a família do aramaico, que usualmente se divide entre duas rami- ficações, a oriental e a ocidental, sendo que a língua siríaca da era é oriental, e a ramificação ocidental é a base do aramaico bíblico que se acha em Daniel e Esdras. O Semítico Ocidental (freqüentemente classificado junto ao aramaico, numa divisão cha- mada Semítico do Noroeste pelos estudiosos modernos), inclui o ugarítico, o fenício e o cananítico (dialetos do qual são hebraico e moabítico). Línguas não-semíticas que exerceram alguma influência sobre a língua hebraica são a língua hamítica do Egito (há, porém, al- guns estudiosos que vêem até no egípcio algum relacionamento primitivo ao grupo semítico de línguas) ; o sumeriano, a fala aglu- tinativa (sem relacionamento com qualquer outra língua conhe- cida) da raça antiga, não-semítica, que conquistou e civilizou a Mesopotâmia Baixa, antes dos babilônios; e a língua persa, distan- temente relacionada com o grego, da família indo-iraniano. Todas estas línguas contribuíram com uma pequena porcentagem de vo- cabulário à língua</p><p>2 A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO Antes de começar um estudo do Antigo Testamento pela alta crítica, é-nos apropriado confrontar com a questão básica: que tipo de livro é? Se é meramente um produto do gênio humano, como muitos outros documentos nos quais têm-se fundamentado várias religiões, então os dados que apresenta precisam ser trata- dos de uma maneira específica. Isto é, estas escritas sagradas pre- cisam ser aquilatadas em termos puramente literários, e explicações naturalísticas precisam ser achadas para cada aspecto que parece ser sobrenatural (como por exemplo o cumprimento de profecias) Se, de outro lado, os trinta e nove livros do Antigo Testamento são inspirados por Deus, instrumentos humanos para re- gistrar a verdade que Ele revelou ao homem, então os dados pre- cisam ser tratados de maneira bem diferente. Isto quer dizer, que tudo aquilo que possa parecer inconsistente com aquele padrão de exatidão e de veracidade que a inspiração divina 1 precisa ser investigado com grande cuidado para se chegar a uma reconciliação satisfatória daquilo que parece ser discrepância. A linha inteira da investigação é, portanto, profundamente influen- ciada pela premissa com a qual começamos. Evidência em prol da Inspiração Sui-Gêneris da Bíblia Este não é lugar para iniciar-se uma discussão completa das evidências pois esta seria a área dos livros sobre a apolo- 1. Permanece porém, uma terceira possibilidade: que Deus determinou mani- festar Sua verdade através duma revelação imperfeita, na qual a verdade misturou-se com o erro. Mas este tipo de revelação seria inútil, porque exigiria um juízo humano infalível para distinguir a verdade do erro. Ver a seção intitulada "Inerrância dos Autógrafos Originais" neste capítulo. 14</p><p>A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO 15 gética. Não deixa porém de ser apropriado sugerir aqui, pelo menos de maneira superficial, por que é correto e razoável começar com a premissa de que o Antigo Testamento é uma coletânea de livros inspirados por Deus. Em primeiro lugar, há uma unidade significante que subjaz a coletânea inteira dos trinta e nove livros do Antigo Testamento, revelando uma interconexão orgânica que se impõe no decurso dos muitos séculos que sua composição levou. Estes livros exibem uma unidade marcante de propósito e de programa, que se explica da maneira mais satisfatória como sendo a operação de uma mente única, a mente do próprio Autor divino. (Um debate clássico deste aspecto das Escrituras se acha no segundo capítulo do livro de James Orr: The Problem of The Old Testament "O Problema do Antigo Testamento". Apesar de livro ser antigo, publicado em 1907, a linha de argumentação de Orr nunca foi refutada com sucesso, e permanece válida 2 Em segundo lugar, de todas as universais, só a hebréia- oferece uma epistemologia (ou ciência de conhecimentos re- ligiosos) logicamente defensível. O resultado final de quatro mil anos de investigação humana e pesquisa filosófica tem sido de de- sesperado desacordo e confusão na área inteira da religião, exceto na própria Bíblia. Alguns teoristas insistiram que se deve fabricar um sistema de ética com um vago teísmo, que chamaram de religião mundial. Mas o fato é que as tensões entre o cristianismo, ju- daísmo, hinduísmo, o budismo e o maometismo são tão marcantes como sempre têm sido, só que se emprega hoje maneiras mais bran- das de propagação e de defesa do que em épocas anteriores. Ainda dão respostas inteiramente diferentes à pergunta: Que preciso fazer para ser salvo? Contraste-se a situação que impera nos campos da medicina e da ciência. Os muitos séculos de experiências e pesquisas tiveram 2. Naturalmente, é possível tratar os escritos do Antigo Testamento de maneira disseccionista artificial, nos interesses duma teoria de fontes diversas e de autoria conglomerada. Quem se responsabilizou por tais teorias não tem a obrigação de inter- pretar textos à luz do seu contexto e pano de fundo gerais, mas pelo contrário, pode torcer a interpretação até achar discordâncias e discrepâncias entre as fontes. Pode descobrir assim, pontos de vista divergentes e inconsistências em qualquer obra, que nunca teriam ocorrido à mente dum leitor sem preconceitos, que apenas o livro para entender sua mensagem. Mas até o disseccionista dogmático precisa reco- nhecer afinal, que na forma das Escrituras hebraicas que chegaram até nós, há pouquís- sima diferença, se é que há alguma, entre o conceito de Deus e a aliança que aparece na última parte do Antigo Testamento, e o que aparece nas primeiras seções escritas. Não pode haver dúvida que, do ponto de vista de Cristo e dos Apóstolos do Novo Testamento, o Antigo Testamento inteiro representava uma unidade só, falando com uma única voz "A Escritura Sagrada".</p><p>16 MERECE CONFIANÇA ANTIGO TESTAMENTO como resultado o acordo geral entre todas as nações civilizadas quanto às leis básicas da física e da química. É verdade que a emer- gência de novos dados torna necessário a revisão constante das teorias e conclusões que os cientistas publicam ano após ano, mas de modo geral o mundo científico permanece substancialmente de acordo, no mundo inteiro. No caso da porém, que trata das questões que são da máxima importância para a raça humana, não apareceu nenhum consenso de Freqüentemente acontece que dois homens, criados como irmãos no mesmo ambiente do lar, gozando dos mes- mos privilégios educacionais, e possuindo o mesmo grau de inteli- gência, tenham pontos de vista religiosos que são diametralmente opostos entre si. Se fosse possível aos recursos do raciocínio hu- mano e da pesquisa científica levar a resultados válidos no campo da metafísica, então homens de igual educação e esclarecimento chegariam decerto a certa medida de concordância (como é caso da filologia ou da ciência). Nada, porém, estaria mais longe de ser a verdade no que diz respeito à religião. Dificilmente estaría- mos mais perto de um acordo hoje do que estavam nossos ante- passados há quatro mil anos; talvez estejamos ainda mais longe, pois naturalismo ateu não tinha sido inventado nos primórdios da antiguidade. A conclusão lógica é que a investigação humana, mesmo com a metodologia científica mais cuidadosa, chegará a nada mais sólido do que meras conjeturas quando se trata de assuntos da alma e do significado da vida. O homem com suas próprias buscas não consegue achar Deus; o melhor que pode fazer é Como, então, podemos conhecer a Deus, ou saber Sua vontade para nossas vidas? A menos que Ele próprio Se nos revele a nós! Se Ele próprio não nos informa, nunca poderemos saber com certeza as respostas às perguntas que a nós, como seres humanos, mais nos importam. Aqui é importante ressaltar que a Bíblia se nos apresenta como sendo a revelação escrita de Deus. Pretende ser o livro no qual Deus nos dá as respostas às grandes perguntas que preocupam nossa alma, questões que toda a sabedoria e a ciência dos homens é incompetente para solucionar com qualquer grau de certeza. A Bíblia declara acerca de si mesma que é a revelação especial de Deus; temos portanto que reconhecer que reivindica ser o verdadeiro tipo de fonte de onde se deriva um conhecimento de verdade religiosa digno de confiança. 3 Chega às nossas mãos com 3. Não há dúvida que há algumas outras escrituras religiosas que fazem a mesma reivindicação acerca de si mesmas, tais como o Corão e o Livro de Mórmon.</p><p>A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO 17 a asserção que as palavras vêm do próprio Deus: "Assim diz o Se- nhor". Se Deus existe, e se se preocupa pela nossa salvação, esta é a única maneira (fora de uma revelação divina direta a cada indi- víduo de cada geração sucessiva) que poderia, de maneira certeira, transmitir este conhecimento para nós. Tem que ser através de algum registro escrito, exatamente aquilo que a Bíblia é, segundo seu próprio 4 A Infalibilidade dos Autógrafos Originais Precisamos, como próximo passo, levantar a pergunta: que tipo de registro este há de ser? Um contendo erros de vários tipos, ou um registro livre de qualquer erro? Se esta revelação escrita con- tém erros, então dificilmente poderá cumprir seu próprio propó- sito, o de transmitir aos homens de maneira digna de confiança, a vontade de Deus para a sua salvação. Por que é assim? Porque um erro comprovado numa parte faz surgir a possibilidade de haver erros em outras partes da Bíblia. Se a Bíblia, sob exame, acaba sendo uma mistura de verdade e erro, então fica sendo um livro como qualquer outro. Sem dúvida, há verdades em todos os demais documentos reli- giosos conhecidos aos homens: o Alcorão, os Vedas, os Upanichades, os Analetas, a Ilíada e a Odisséia, muito embora que esta verdade possa coexistir com uma abundância de erros. que se deve fazer Deve-se reconhecer, porém, que estes documentos não possuem as credenciais que autenticam a Bíblia como registro verdadeiro da revelação divina. Mais notavelmente, falta-lhes a validez que se comprova pela profecia anterior e seu subseqüente cumpri- mento, e pela presença em todas as suas partes do Redentor humano e divino. Livro de Mórmon é enfraquecido por muitas inconsistências e inexatidões; o Corão, que alegadamente foi ditado de um arquétipo coeterno com Alá, exibe não somente os mais estranháveis erros históricos, mas também pontos de vista mutáveis dum autor humano (Maomé), à luz dos acontecimentos do seu dia. Não há comparação entre a Bíblia e estes outros livros quando se trata da grandeza e da clareza dos pensamentos que transmite, e do poder que exibe ao penetrar na alma humana com conseqüências que transformam vidas. 4. que se pode dizer acerca da tradição oral? Não há a possibilidade de a verdade infalível de Deus ter sido transmitida de boca a boca durante sucessivas gerações? Sim, pode ter acontecido assim, e não há dúvida que algumas porções da Bíblia foram conservadas assim até chegar à sua forma autoritativa e final, por Mas a tradição oral é necessariamente instável de natureza e sujeita a alte- rações por causa do fator subjetivo: a memória incerta do daquela tradição. O legado da fé foi transmitido oralmente durante os milênios desde Adão até Moisés, na sua maior parte, mas a forma final escrita, lavrada por Moisés, deve ter sido especialmente supervisionada pelo Espírito Santo, para assegurar sua divina veracidade. As próprias Escrituras dão considerável ênfase ao seu estado escrito, e raramente imputam divina veracidade a mera tradição oral. Embora seja verdade que as pala- vras pronunciadas por Moisés, os profetas, Jesus e os apóstolos fossem divinamente autorizadas desde o momento de terem sido pronunciadas, não havia outra maneira de conservá-las com exatidão a não ser pela escrituração (i.e., registrando-as por escrito sob a orientação do Espírito Santo).</p><p>18 MERECE CONFIANÇA ANTIGO TESTAMENTO com livros deste tipo, que contêm verdades e erros? A única coisa que se pode fazer é sujeitá-lo à faculdade crítica do raciocínio hu- mano. Dentro dos seus limites apropriados, bem entendido, o poder de raciocínio do ser humano tem uma função legítima e necessária em aquilatar as evidências apresentadas nestes documentos, para descobrir se são consistentes com a alegada origem divina. Neste caso, é uma questão de reconhecer a identidade daquilo que se apre- senta como sendo uma revelação, averiguando se é a palavra de Deus ou não. O raciocínio humano é competente, aplicando-se as regras de contradições internas e os demais cânones da lógica, para julgar as evidências, para determinar se os próprios textos e dados ali registrados se condizem com as reivindicações da sua ori- gem divina. (Já foi demonstrado na Nota 3 que só a Bíblia, em contraste com os demais documentos religiosos, contém evidências decisivas de inspiração e autoridade Mas é coisa bem diferente quando o raciocínio humano quer emitir seu julgamento sobre a revelação divina como tal, para de- terminar sua veracidade ou falsidade. Tais julgamentos só pode- riam ser válidos se quem julga possui um conhecimento de verdade metafísica que é superior da própria revelação. Noutras palavras, o homem precisaria saber mais sobre Deus e a alma e valores espirituais se quisesse emitir um juízo válido quanto às verdades da Bíblia. Mas isto obviamente não é o caso, conforme foi indicado previamente, e por isto mesmo, o homem depende totalmente da revelação divina para receber este conhecimento tão importante. Pcr este motivo, a única maneira pela qual esta revelação pode chegar ao homem numa forma que possa ser em- pregada e merecedora de confiança, sem ter que depender da exa- tidão do julgamento humano tão falível, seria como revelação Senão, não poderia cumprir seu propósito de ser a ma- nifestação, digna de confiança, da verdade divina. A Transmissão do Texto não é Necessariamente Infalível Neste ponto precisamos fazer uma distinção. A infalibilidade (ou a isenção de todo erro) só se reivindica necessariamente para os manuscritos originais (os autógrafos) dos livros bíblicos. Forço- samente, eram isentos de todo e qualquer erro, senão, não pode- riam ter sido inspirados por Deus, Deus da verdade, pois n'Ele não há treva nenhuma. Deus nunca poderia ter inspirado um autor humano das Escrituras a escrever algo errado ou falso. 5 5. Pode ser levantada a dúvida quanto à infalibilidade das fontes das quais foram copiadas as narrativas bíblicas (tais como as tabelas genealógicas em Gênesis e Crô-</p><p>A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO 19 Equipamento antigo de escrita do Egito. Escritores bíblicos podem ter empregado algo semelhante (Cortesia do Museu Britânico) Mas, que se pode dizer do texto da Bíblia, conforme o possuí- mos agora? Será que texto é necessariamente livre de todos os nicas). Se foram consultados arquivos dos templos e registros dos palácios (como era o caso, sem dúvida), e se estes registros foram feitos por homens não inspirados (que provavelmente era o caso), por que não podemos limitar a idéia da infalibilidade das Escrituras à mera exatidão em registrar o arquivo humano, seja sem erros, seja com erros? Noutras palavras, não é possível a presença de erros inspirados nas Escrituras? Esta pergunta deve ser respondida através duma outra: qual é a diferença entre o registro humano falível, e um ser humano que fala de maneira falível? Se as pala- vras escritas de homens podem ter sido recebidas nas Escrituras, apesar de serem erradas, então, certamente, é lógico que suas palavras faladas podem ter sido aceitas da mesma forma? Quem pode supor que tudo quanto foi falado por Moisés ou Isaías ou Malaquias foi livre de qualquer erro? Não é verdade que apenas ao pronunciar a Palavra do Senhor é que eram infalíveis? Enquanto Deus fazia uso das suas comu- nicações orais para revelar Sua verdade, salvaguardando-as do erro até serem registra- das por escrito, assim também Deus podia tomar os arquivos humanos, guiando o autor humano a evitar todos os seus erros e escolher apenas aquilo que era a perfeita verdade. Tudo quanto as Escrituras definem como sendo historicamente verdadeiro, sem levar em conta qual foi a fonte da informação, deve ser aceito como sendo digno de con- fiança. Não faz qualquer diferença essencial se a fonte foi oral ou escrita, vindo duma boca humana falível, ou duma pena humana falível; em qualquer caso, o Espírito Santo eliminava os erros e garantia que só a verdade fosse escriturada. Todas as discrepâncias que vieram até nós no texto tradicional das Escrituras hebraicas se explicam perfeitamente pelos erros na transmissão textual posterior. Não há qualquer necessidade de se apelar a uma teoria de erros já presentes dentro dos autógrafos origi- nais, e assim minar a doutrina da veracidade das Escrituras tomadas em conjunto.</p><p>20 MERECE CONFIANÇA ANTIGO TESTAMENTO erros, de qualquer tipo? Não quando se trata de erros de copistas, pois realmente descobrimos discrepâncias entre as cópias manus- critas que têm chegado até nós, mesmo entre aquelas que datam dos primeiros séculos. Alguns erros de pena decerto se introduziram nas primeiras cópias feitas dos manuscritos originais, e erros adi- cionais típicos da transmissão do texto conseguiram entrar nas cópias das cópias. É quase inevitável que isto tenha sido o caso. Não há nenhum homem que pode sentar-se e copiar o texto de um livro inteiro sem surgir algum erro de algum tipo. (Quem duvida desta declaração, pode fazer a experiência!). Seria nada menos do que um milagre, garantir a infalibilidade da cópia de um manus- crito original. Aceitando-se fato que erros se infiltraram em nossos textos conforme os temos em mãos, como podem servir como meio certeiro de desvendar a vontade de Deus? Será que não voltamos ao pro- blema dos livros que contêm uma mistura de verdade e de erro? De modo nenhum, pois há uma grande diferença entre um do- cumento que era errado desde o princípio, e um documento que começou correto mas que depois foi erroneamente copiado. Qual- quer pessoa pode ler uma carta de um amigo ou parente, e achar nela errinhos comuns como "em" no lugar de "um", no lugar de "para", e pode, por meio de um processo simples de correção à luz do contexto, facilmente chegar ao verdadeiro sentido daquilo que o autor queria dizer. Só se os erros que entraram no texto são tão sérios que pervertem totalmente o sentido, é que a men- sagem desvia-se da verdade. Mas se a carta chegou da parte de um correspondente, que estava confuso, errado ou desejando iludir, então os erros e as falsas informações que contém seriam irreme- diáveis, e o leitor seria prejudicado por ela. Isto levanta a questão da fidelidade da transmissão do texto bíblico. Há numerosos tipos de erros de manuscrito que crítico textual pode descobrir nos manuscritos antigos do Antigo Testa- mento. (Estes serão discutidos no capítulo quatro). Eles são de natureza tão séria que corrompem a própria mensagem, impossibi- litando-a de transmitir verdadeiro significado? Se são, então o propósito de Deus foi frustrado: não conseguiu transmitir Sua revelação de tal maneira que pessoas de gerações posteriores pu- dessem compreendê-la corretamente. Se não exerceu Sua influência restritiva sobre os escribas que escreveram as cópias normativas e autorativas das Escrituras, então corromperam e falsificaram a mensagem. Se a mensagem foi falsificada, o propósito inteiro de doar à humanidade uma revelação escrita deu em nada, pois Es-</p><p>A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO 21 crituras assim corrompidas seriam uma mera mistura de verdade e de erro, necessariamente sujeitas a julgamentos humanos (quando, de fato, devem julgar o homem). Temos alguma evidência objetiva que Deus não tenha permi- tido que os erros da transmissão do texto tenham corrompido e pervertido sua revelação? Sim, temos, pois um estudo cuidadoso das variações (ou leituras diferentes) dos vários manuscritos mais antigos, revela que nenhuma delas afeta uma única doutrina das Escrituras. O sistema de verdades espirituais, contido no texto geralmente aceito do Antigo Testamento em hebraico, não se al- tera nem se compromete por nenhuma das variações que têm sido achadas nos manuscritos hebraicos de data mais antiga que foram descobertos nas cavernas do Mar Morto ou em outros lugares. Para averiguar isto, basta examinar o registro das variações bem ates- tadas que constam na edição de Rudolfo Kittel da Bíblia hebraica. É muito evidente que a vasta maioria delas são tão insignifican- tes que o sentido da doutrina de cada frase não sofreu qualquer efeito. Deve ser claramente entendido que neste respeito Antigo Testamento é diferente de qualquer outra obra literária antes da era sobre as quais temos notícia. É verdade que normalmente não possuímos tantos manuscritos diferentes de produções pagãs, vindos de épocas tão separadas no tempo, como é O caso do Antigo Testamento. Mas quando temos muitos manuscritos, como é O caso do Livro dos Mortos, do Egito, então as variações são de na- tureza mais extensiva e séria. Diferenças bem marcantes aparecem, por exemplo, entre o capítulo 15 no Papiro de Ani, escrito durante a Dinastia, e o Papiro de Turino, da Dinastia ou posterior- mente. Cláusulas inteiras são inseridas ou omitidas, e sentido, em colunas correspondentes do texto, em certos casos é inteiramente diferente. Se não houvesse a superintendência divina da trans- missão do texto hebraico, não há nenhum motivo específico de não haver semelhantes discrepâncias e mudanças entre os manuscritos hebraicos que têm séculos de diferença entre eles. Posto que as duas cópias de Isaías descobertas na Caverna 1 de Qumran, perto do Mar Morto, em 1947 eram mil anos mais antigas do que o mais antigo manuscrito datado, previamente conhecido (980 d.C.), foi constatado que eram idênticos, palavra por palavra, à nossa conhecida Bíblia hebraica, em mais do que 95% do texto. As varia- ções, em 5%, consistem mormente de óbvios erros de pena e va- riações na ortografia. Mesmo aqueles fragmentos de Deuteronômio</p><p>22 MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO e de Samuel achados perto do Mar Morto, que apontam para uma outra família de manuscritos do que aquela que subjaz nosso texto hebraico aceito, não indicam qualquer diferença em doutrina ou em ensinamentos. Não afetam a mensagem da revelação de ma- neira nenhuma. Doutrina da Inspiração Afirmada pelas próprias Escrituras Reivindica a Bíblia infalibilidade para si mesma? Às vezes tem sido levantado argumento de que as próprias Escrituras não reivindicam sua própria infalibilidade. Mas a investigação cuida- dosa demonstra que quando O assunto é ventilado, assevera-se o fato de sua absoluta autoridade como sendo a infalível Palavra de Deus. Mateus 5:18: "Porque em verdade vos digo: Até que céu e a terra passem, nem um i (a letra menor do alfabeto hebraico) ou um til (um traço que faz a distinção entre certas letras hebraicas) jamais passará da lei (isto é, Antigo Testamento) até que tudo se cumpra" - palavras de Cristo. Isto indica que não somente os pensamentos transmitidos pelas Escrituras, mas as próprias pala- vras individuais, como veículos válidos destes pensamentos, e con- forme sua própria soletração, são dotadas de verdade infalível, e seguramente serão cumpridas e realizadas. João 10:35: e a Escritura não pode falhar", tem as mesmas implicações do versículo supra citado. 2 Timóteo 3:16: "Toda Escritura é inspirada por Deus (theop- neustos) e útil para O ensino". Do contexto do Novo Testamento pode ser facilmente estabelecido que a palavra "escritura" se refere ao Cânon inteiro dos trinta e nove livros do Antigo Tes- tamento, conforme hoje os temos em mãos. 2 Pedro 3:16 dá a en- tender que as Epístolas neotestamentárias de Paulo também gozam da mesma situação de Escrituras inspiradas (graphai). Hebreus 1:1,2: "Havendo Deus falado pelos profetas nos falou pelo Filho". Estas palavras reivindicam para os escritos dos profetas do Antigo Testamento a mesma infalibilidade que pertence às mensagens do próprio Cristo, registradas no Novo Tes- tamento. 1 Pedro 1:10,11: "Foi a respeito desta salvação que os profetas (do Antigo Testamento) indagaram e inquiriram, os quais profe- tizaram acerca da graça a vós outros destinada, investigando aten- tamente qual a ocasião ou quais as circunstâncias oportunas, in-</p><p>A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO 23 dicadas pelo Espírito de Cristo, que neles estava, ao dar de antemão testemunho sobre os sofrimentos referentes a Cristo, e sobre as glórias que os seguiriam". Está implícito aqui que Espírito Santo estava nos autores do Antigo Testamento, e que Ele os guiou para que compusessem palavras de verdade infalível cujo cumprimento era garantido, ainda que os autores humanos não entendessem ple- namente tudo aquilo que as palavras divinamente orientadas real- mente significassem. Por causa de versículos como estes, precisa- mos, ao interpretar as Escrituras, procurar estabelecer não somente a intenção do autor humano que escreveu as palavras, mas também (e mais importante) a intenção do Autor divino que orientou a composição das mesmas. 2 Pedro 1:21: "Nunca jamais qualquer profecia (as Escrituras proféticas do Antigo Testamento) foi dada por vontade humana, entretanto homens falaram da parte de Deus movidos (literalmente, levados adiante, como a nau à vela é levada pelos ventos) pelo Es- pírito Santo". Naquilo que falavam (conforme está registrado por escrito), estes autores do Antigo Testamento que profetizavam sobre Cristo, foram "levados pela correnteza" à verdade infalível, verdade que não se podia sujeitar a mera interpretação particular (v. 20). Todas essas passagens vão formando a doutrina da inspi- ração: que a exatidão é inerente em cada parte do Antigo Testa- mento e também do Novo Testamento, de maneira que, como um todo, e em todas as suas partes, a Bíblia é infalível quanto à sua verdade, e final quanto à sua autoridade. Esta exatidão se estende até assuntos de história e de ciência, e não só à teologia e à ética. Alguns estudiosos, tais como Henry P. Smith e Charles A. Briggs, procuraram fazer uma distinção entre estes dois tipos de verdade, dando vazão à possibilidade de haver falsidade inerente em assuntos de mera história ou ciência. Há duas fatais a esta posição. Em primeiro lugar, Novo Testamento não admite semelhante dis- tinção: a historicidade de Adão e Eva se implica em 1 Timóteo 2:13,14, (senão, comentário de Paulo seria totalmente irrelevan- te), como também em 1 Coríntios 11:8,9; a experiência literal de Jonas, que ficou três dias no estômago do peixe grande é absolu- tamente essencial, se tem que servir como analogia verídica dos três dias que Cristo passou no túmulo, Mt 12:40. É impossível rejeitar a historicidade destes dois episódios cuja veracidade tem sido freqüentemente contestada, sem rejeitar a autoridade do Cristo dos Evangelhos e do Apóstolo Paulo nas Epístolas. Em segundo</p><p>24 MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO lugar, nem sempre é possível fazer uma nítida separação entre teo- logia e ética, e entre história e ciência. Há casos cruciais que envolvem ambos estes tipos de verdade, como é o caso do Adão lite- ral e histórico (pois o argumento teológico inteiro de Rm 5:14-19 depende da doutrina de ser Adão o pai da raça humana inteira). Não se pode conceder a presença de erros em matéria de história e de ciência sem acabar aceitando que há falsidade em matéria de doutrina. Pontos de Vista Sub-Bíblicos de Inspiração As pessoas que têm tendências a uma abordagem neo-ortodoxa ao tratar da inspiração das Escrituras usualmente (como é caso de H. H. Rowley de Manchester) colocam a assim-chamada "men- te de Cristo" como padrão de distinção entre verdades e erros de doutrina na Bíblia. Por exemplo, dizem que quando Josué e os israelitas mataram a população inteira de Jericó, era por causa das suas idéias primitivas ou selvagens de justiça, e não por causa do mandamento explícito de Deus conforme se registra em Deutero- nômio 20:16-18. Declarações ou julgamentos atribuídos a Deus no Antigo Testamento, mas que parecem por demais severos quando se comparam com os padrões de mansidão, paciência ou amor de Cristo conforme se registram no Novo Testamento, devem ser re- jeitados (segundo eles) como sendo meras invenções humanas com- postas pelos israelitas no seu estágio primitivo de desenvolvimento religioso. O critério da verdade é a "mente de Cristo". Não obstante, a investigação demonstrará que muitas das de- clarações de Cristo registradas no Novo Testamento entram em choque com esta suposta "mente de Cristo", de maneira assus- tadora. Nota-se, por exemplo, Mateus 23:33: "Serpentes, raça de víboras! como escapareis da condenação do inferno?" Outra vez, em Mateus 25:41: "Apartai-vos de mim, malditos, para fogo eter- no, preparado para o diabo e seus anjos". Não temos nenhum outro relatório acreditado daquilo que realmente era a mente de Cristo a não ser suas palavras registradas nos Evangelhos. É fatalmente inconsistente estabelecer um conceito filosófico de qual seria real- mente o ponto de vista de Cristo, na base de algumas das suas de- clarações registradas, e depois rejeitar a autenticidade de outras declarações registradas nas mesmas fontes, simplesmente porque pleiteiam com as preferências pessoais de quem está fazendo este juízo. Tal procedimento vem a ser realmente a imposição de jul- gamentos humanos sobre a Palavra de Deus escrita, aceitando como</p><p>A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO 25 verdadeira somente aquela porção da Palavra que a mente humana acha aceitável. Mas já temos mencionado que o raciocínio humano é um elemento inadequado e desacreditado quanto a atingir conhe- cimentos religiosos verdadeiros. A Bíblia sempre deve emitir juízos sobre o homem; o homem nunca poderá julgar a Bíblia. Seus po- deres de raciocínio devem ser empregados na tarefa de interpretar consistentemente a mensagem da Bíblia, para garantir sua própria compreensão daquilo que Deus quer dizer através das palavras da Escritura. Mas nunca poderia emitir seu juízo contrário aos ensi- namentos claros das Escrituras, estabelecidos pela exegese; se assim faz, rejeita ao mesmo tempo a autoridade das Escrituras como um todo. Mais tipicamente neo-ortodoxo é o ponto de vista que considera a Bíblia como sendo algo menos do que a Palavra de Deus escrita; seria meramente uma testemunha à Palavra de Deus. Segundo este ponto de vista, a Palavra de Deus seria um princípio dinâmico que opera somente quando há um encontro vivo ou "existencial" entre crente e Deus. Deus fala poderosamente através das páginas das Escrituras Sagradas, e estabelece um relacionamento pessoal, mais do que instilar uma verdade proposicional na mente do ("Proposicional" aqui significa tipo de verdade que pode ser de- clarada em proposições, assim como: "Deus é um Espírito eterno" Proposições podem ser assimiladas como meros objetos de conhe- cimento, como fórmulas matemáticas, mas a verdade divina, se- gundo se argumenta, nunca pode ser assimilada pela mente huma- na. A verdade divina chega ao homem num encontro íntimo de "Eu-Tu"; é como uma corrente elétrica com seu polo positivo e seu polo negativo como sendo condições para sua existência). Sendo que o texto bíblico foi escrito por autores humanos, e reconhecen- do-se que todos os homens são pecaminosos e sujeitos ao erro, deve haver, alegam, erro no texto bíblico. Mas, diz argumento, o Deus vivo tem a capacidade de falar, mesmo através deste texto parcial- mente errôneo, para atrair os crentes para um relacionamento vital com Ele, num encontro salvador. Tal ponto de vista da Bíblia deixa lugar para todos os tipos de erros científicos e históricos, e para todos os juízos adversos da alta crítica racionalista contra a auten- ticidade dos escritos de Moisés, Isaías, Daniel e todos os demais. Todas essas descobertas da crítica seriam sem dúvida verdadeiras como um relatório exato da origem humana da Bíblia. Apesar disso, Deus resolveu que estas Escrituras, eivadas de erros, seriam a testemunha única autoritativa da Sua revelação, e Ele pode usá- las de maneira dinâmica, para "salvar" os homens.</p><p>26 MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO Assim, nos seus esforços de evitar o efeito dos assaltos da alta crítica, contra a veracidade do registro bíblico, e de salvar o signi- ficado da mensagem cristã no meio das científicas contra aquilo que é sobrenatural, os teólogos do movimento neo-ortodoxo se refugiaram num ponto de vista paradoxal da natureza da própria revelação. Sustentam a posição que, pela sua própria natureza, a revelação divina não pode ser registrada em Escrituras. Logo que fica aprisionada em palavras, especialmente palavras que demons- tram proposições acerca de Deus e de verdades espirituais, torna-se um objeto das mentes humanas e dos seus poderes cognitivos. As- sim, cai sob o controle do homem, e se acha "aprisionada dentro das capas da palavra escrita" A revelação, portanto, não deve ser equacionada à doutrinas reveladas ou a proposições muito ao contrário, consiste num encontro direto entre Deus e o homem, como um sujeito se confrontando com outro sujeito. A revelação teria uma analogia com um encontro pessoal entre seres humanos, que se experimentam mutuamente como personalidades, mais do que uma lista de estatísticas ou ítens de informações num cartão de identificação. Dentro deste ponto de vista, pode até se argumentar que nem é matéria de importância se as narrativas registradas nas Escritu- ras são verazes ou não. Por exemplo, o registro do nascimento vir- ginal, ou da ressurreição corpórea de Cristo, que há nos Evange- lhos, muito bem pode deixar de ser fato histórico (pois a teoria científica moderna não deixa vazão para tais acontecimentos mi- raculosos), mas isto não faria nenhuma diferença significante. Através destas lendas piedosas da Igreja primitiva podemos fazer nosso encontro com Deus e com as realidades supra-históricas para as quais estas histórias apontam. Depender da exatidão infalível do registro escrito da Bíblia seria, segundo esta teoria, um obstá- culo à verdadeira fé. O dogma das Escrituras infalíveis operaria como uma muleta malsã para depender dela, pois a verdadeira fé voaria acima dos manifestos erros da Bíblia, para as alturas da verdade transcendental da qual a Bíblia dá testemunho uma verdade disponível ao crente na medida de haver um encontro pes- soal com Deus vivo. Este ponto de vista neo-ortodoxo se confronta, porém, com uma multidão de dificuldades lógicas. Coloca a autoridade das Escrituras no nível de uma fé que não se pode averiguar. Como poderemos ter a certeza que Deus não nos falou através da narra- tiva do Alcorão (demonstravelmente cheia de erros e anacronis- mos), ou do Livro dos Mortos do Egito, ou das Vedas hindus? Por</p><p>A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO 27 que só da Bíblia? A verificação objetiva não somente se rejeita como sendo impossível, mas próprio desejo da verificação seria condena- do como sendo repreensivelmente terreno e racionalístico. É neces- sário simplesmente crer! Crer em quem ou em quê? Bem, nas Es- crituras, é claro. Mas, lastimavelmente, as próprias Escrituras pa- recem ser totalmente ignorantes desta maneira dos neo-ortodoxos de se tratar de verdades religiosas. A Bíblia positivamente formiga com verdades proposicionais acerca de Deus, verdades que podem ser expressas em declarações credais que a mente humana pode captar intelectualmente. Talvez possa ser dada uma explicação que diz que isto resulta da falibilidade e fraqueza dos homens pecaminosos que escreveram a Bíblia. Mas como é que se chega, além da Bíblia, àquela verdade mais rarefeita, inefável, supra-histórica, de encon- tros pessoais, que, segundo dizem, jaz além? Bem, por meio de um encontro direto com Deus, é claro! Sim, mas por meio de qual destes encontros? O de Barth? O de Brunner? O de Niebuhr? O de Tillich? Estes gigantes do movimento neo-ortodoxo conservam en- tre si fortes diferenças de opinião em assuntos teológicos. Alguns, como Barth, chegam a discordar com suas próprias opiniões de década em década. É difícil perceber como a eterna e imutável verdade de Deus pode ser validamente interpretada no célebre Comentário sobre Romanos, quando os pontos de vista de Barth são modificados tão marcadamente como é caso entre cada edição desta obra de Barth. Quando se enfrenta os fatos, então, este ponto de vista neo- ortodoxo das Escrituras levanta dificuldades muito mais sérias do que aquelas que quer solucionar. É virtualmente impossível aos teólogos de Crise fazer qualquer afirmação sobre Deus, a fé ou qual- quer outro aspecto de verdade religiosa que não depende em última análise das declarações proposicionais da Palavra de Deus escrita. Por exemplo, citemos a máxima de William Temple no assunto das Escrituras Sagradas: "Nenhuma só frase pode ser citada como tendo a autoridade de um pronunciamento distinto do Deus santo". 6 Mas como é que Arcebispo Temple sabe que existe um único Deus, e não uma plêiade de deuses, conforme ensinam as religiões pagãs? Ou nenhum deus, conforme marxismo nos ensina? Só poderia saber isto, baseado na autoridade da Bíblia escrita, ou de uma Igreja confessante, que demonstravelmente tem confiado na auto- ridade infalível da Bíblia. Como, igualmente, pode saber que Deus único é "santo"? Só porque a Bíblia diz isto d'Ele uma 6. William Temple, Nature, Man and God "A Natureza, o Homem e Deus", (1953), p.</p><p>28 MERECE CONFIANÇA ANTIGO TESTAMENTO afirmação proposicional! Removendo-se a autoridade de um re- gistro escrito da revelação divina, e as declarações de Temple ou de Brunner ou de qualquer outro ensinador religioso acerca de ver- dades religiosas seriam reduzidas à condição de meras conjeturas, completamente destituídas de autoridade, alicerçadas nas mesmas bases questionáveis de todas as outras opiniões meramente huma- nas. Como poderíamos saber que a fé é um princípio importante e salvador, conforme insistem os ensinadores neo-ortodoxos? É só porque assim se nos ensina na Palavra de Deus escrita. Se não fosse assim, haveria a probabilidade de haver a salvação somente através das boas obras, conforme crê a maior parte do mundo Até a própria possibilidade de um encontro entre Deus e o homem só é garantida para nós pelas afirmações das Escrituras, e seus inú- meros relatórios de tais encontros. Senão, a "experiência" inteira de encontros divino-humanos pode ser simplesmente um assunto de alucinações e de auto-sugestões, destituídas de qualquer reali- dade metafísica. Fica assim demonstrado que cada afirmação religiosa dos ade- rentes desta escola, depende, em última análise, da veracidade da Palavra de Deus escrita, as Escrituras Se estas são errôneas em qualquer das suas porções, pode haver erros nas outras porções; não se poderia depositar nelas confiança alguma, nem mesmo as asseverações que os teólogos neo-ortodoxos derivaram delas - e de fato, todas as suas declarações doutrinárias acerca de Deus, de encontros, de fé, foram derivadas destas Escrituras. Em outras palavras, se a autoridade da Bíblia escrita não merece con- fiança, então nem o discernimento da teologia da Crise tem mais valor do que qualquer mera opinião humana a não ser que porventura estes teólogos gozem, nas suas próprias pessoas, do próprio atributo de infalibilidade que querem negar no que diz respeito às Escrituras. Isto nos leva para a questão da peculiaridade da fé neo-orto- doxa, aquela fé que levanta vôo até Deus sem os impecilhos do dogma da infalibilidade das Escrituras. O que é a fé, senão confiar em algo ou em alguém? Em que ou em quem descansa esta fé tão exaltada dos neo-ortodoxos? Ostensivamente esta fé é dedicada a Deus, ou nas introspecções derivadas da experiência religiosa quan- do o crente tem seu encontro com Deus, seja através das páginas das Escrituras, seja nalgum outro contexto. Mas como é que se julga a validez destas introspecções? Sendo que não podem ser averiguadas ao apelar para qualquer autoridade objetiva (seja as Escrituras, seja qualquer ensinador ou igreja infalível), crente</p><p>A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO 29 não pode apelar à nenhuma autoridade a não ser sua própria. Nem sequer pode ter certeza que Deus existe, se a Bíblia não é uma testemunha objetiva de confiança; só pode confiar na sua própria pessoa. Em outras palavras, o tipo de fé neo-ortodoxa é, em última análise, fé no próprio homem e não em Deus; isto é, a fé do crente se coloca nele mesmo. Sendo que a Bíblia não merece a confiança dele, e muito menos a autoridade humana (pois a própria huma- nidade implica em falibilidade), então o crente neo-ortodoxo não pode saber nada além da sua própria opinião, e esperar que esta seja correta. Senão, ele está perdido sem a possibilidade de re- cuperação. Está iludindo-se a si mesmo ao supor que sua fé depende de um Deus fora dele mesmo; destituído de qualquer autoridade objetiva, ele está à mercê de suas próprias impressões e opiniões subjetivas. Nunca pode ter certeza de que suas revelações não são meras alucinações. Enfrentando as Dificuldades na Bíblia Necessário é reconhecer que o texto das Escrituras, conforme foi transmitido até nós, contém dificuldades ocasionais que apa- rentemente desafiam a doutrina da infalibilidade da Bíblia. Algu- mas destas dificuldades se resolvem pelo emprego correto da ciên- cia bíblica. Outras, tais como discrepâncias nas estatísticas e na soletração de nomes, exigem uma emenda textual que vai além dos dados disponíveis da crítica textual. Outras, ainda, são dificuldades lógicas, tais como que parece ser a aprovação dada em 11 ao sacrifício da filha de Jefté, quando Deuteronômio 12:31 proibe qualquer sacrifício humano em Há dois métodos possíveis para se enfrentar estes problemas. 1) É possível conservar reservas quanto às reivindicações da própria Bíblia no que diz respeito à sua infalibilidade, até que cada difi- culdade seja Cada vez que surge uma nova di- ficuldade, a Bíblia é degradada a uma situação de suspeita, até que o assunto possa ser esclarecido de maneira satisfatória. No ínterim, crente bíblico fica ansioso, em doloroso suspense e an- gústia de alma, até que, mais uma vez, a Bíblia fica inocentada da nova acusação que surgiu contra ela. 2) É igualmente possível, mesmo quando confrontado por aquilo que parece ser uma dis- crepância, conservar a fé na infalibilidade do registro bíblico, es- perando com paciência a vindicação que investigações posteriores não deixariam de suprir. O crente, convicto de que só a origem divina explica o fenômeno das Escrituras, toma posição ao lado do</p><p>30 MERECE CONFIANÇA ANTIGO TESTAMENTO Jesus de Nazaré, ao crer na infalibilidade da Palavra de Deus es- crita, e espera confiantemente num esclarecimento final de todos os problemas que possam surgir. As pessoas que se atêm a este segundo modo de agir talvez pos- sam ser acusadas de subjetivismo ilógico, por agirem na base de uma convicção a priori. Mas esta acusação não é bem fundamen- tada, pois não se pode nem começar a estudar a Bíblia sem pro- ceder fundamentado nalguma de duas suposições a priori. É ne- cessário começar com a suposição a priori, ou que a Bíblia é um registro falível, ou que é infalível. Não há nenhum meio termo; não se pode ficar numa situação neutra de suspense, insistindo: "Deixe que a Bíblia fale por si mesma". Em primeiro lugar, pre- cisamos averiguar que tipo de livro é este que tem que falar. É a infalível Palavra de Deus, ou é produto do homem, passível de erros, possuindo elementos de verdade divina misturados com erros humanos? O procedimento mais lógico é determinar desde princípio que tipo de livro é a Bíblia. Se apresenta dados tais que obrigam a um reconhecimento que só pode ser de origem divina e de fato, a Bíblia apresenta tais dados em abundância - então único ca- minho razoável, seria tomar a sério as próprias reivindicações de infalibilidade que a Bíblia registra. Se as Escrituras constituem uma autêntica auto-revelação de Deus, as discrepâncias que apa- recem precisam ser reconhecidas como sendo só aparentes, e não reais. Ao se conseguir todos os fatos, comprovar-se-á que os ale- gados erros não são uma realidade concreta. Deve ser mencionado que tal procedimento comumente se segue no assunto das relações humanas, sem que haja quem o critique severamente. Por exemplo, um marido que chegou à con- clusão que sua esposa é uma mulher leal e virtuosa, será perse- verante em recusar a ter suspeitas contra ela, mesmo se ela tenha sido vista saindo com algum outro homem. Sem tirar conclusões precipitadas, simplesmente aguardará mais informações que escla- recerão a situação e explicarão de maneira satisfatória sua as- sociação com o referido homem. Ele seria estulto e indigno se abandonasse sua convicção da integridade dela até que tenha sido vindicada sua atuação. Só uma pressuposição desde o início, de de que ela é inconstante e indigna de confiança é que justificaria tal reação da parte Da mesma maneira, quem está convicto da autoridade divina da Bíblia seria estulto e indigno se fosse questionar sua infalibili-</p><p>A INSPIRAÇÃO DO ANTIGO TESTAMENTO 31 dade até que cada alegação contra ela que surge tenha sido escla- recida. Isto, longe de ser o procedimento científico e objetivo que muitos alegam que é, não é nada mais do que uma política de mudanças ilógicas de um a priori a outro, com vacilações próprias de mentes fracas. Uma contradição genuína e completa nas Es- crituras (mormente se pudesse ser demonstrada nos autógrafos originais), seria justo motivo para se abandonar a fé na infalibili- dade das Escrituras; mas até que isto tenha sido comprovado, ou, de acordo com as leis da evidência legal, algum erro sério de his- tória ou ciência tenha sido demonstrado, crente na Bíblia não precisa sentir embaraço ao conservar a suposição que é a infalível Palavra de Deus. É altamente significativo que nenhum erro deste tipo tenha sido comprovado até agora, de maneira que satisfizesse a um foro de justiça, embora que várias tentativas neste sentido tenham sido 7 7. Cf. Harry Rimmer, The Lawsuit against the Bible "O Processo Contra a Bíblia" (1940). Para mais matéria no assunto das dificuldades na Bíblia, consulte a defesa firme da Bíblia, quanto à sua autoridade e infalibilidade, em Wick Broomall, Biblical Criticism (1957), págs. 11-84.</p><p>Primeira Parte INTRODUÇÃO GERAL</p><p>3 MANUSCRITOS HEBRAICOS E AS VERSOES ANTIGAS Já não temos acesso aos originais infalíveis dos vários livros das Escrituras hebraicas. As cópias mais antigas que vieram até nós, em certos casos, não chegam dentro de mil anos da data na qual foram originalmente compostas. Não obstante, constituem nossa autoridade primária nos dias atuais, como sendo a inspirada Palavra de Deus, e todas as nossas cópias e traduções das Sagradas Escrituras dependem necessariamente dos manuscritos dos origi- nais hebraicos e aramaicos os mais antigos e melhores que temos disponíveis. Precisamos, pois, passar em revista a evidência escrita na qual se baseiam nossas edições modernas impressas da Bíblia hebraica, para termos alguma idéia do grande e variado corpo de evidências com o qual lida a crítica textual do Antigo Testamento. Os manuscritos hebraicos têm prioridade na escala de valo- res, é claro, sendo que a revelação divina chegou originalmente a Israel na língua hebraica, e há muito menos probabilidade de corrupção ao copiar manuscritos dentro da mesma língua, do que quando se trata de uma tradução para uma outra língua. Nos casos de ter havido erros de cópia nos manuscritos copiados do hebraico, surge então a possibilidade que as traduções antigas para o grego, o aramaico e o latim nos forneçam uma indicação de qual frase ou palavra hebraica original possa ter sido deturpada nos próprios manuscritos hebraicos. Isto nos leva à necessidade de passar em revista, não somente os manuscritos hebraicos, os melhores e mais antigos, mas também as cópias, as melhores e mais antigas, das antigas traduções e 35</p><p>36 MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO Os Manuscritos Hebraicos Mais Antigos A. OS MANUSCRITOS Principalmente, são as notáveis descobertas nas cavernas do Mar Morto que compõe esta classe de manuscritos. Tecnicamente, são chamadas matéria de sendo que as várias cavernas nas quais foram descobertas se localizam ao longo do leito de Uádi na praia do nordeste do Mar Morto. A identificação téc- nica destes documentos do Mar Morto consiste de um número que indica a caverna na qual a descoberta foi feita, seguido por uma abreviação do nome do livro propriamente dito, mais uma letra supralinear que indica a ordem na qual manuscrito específico foi descoberto, em contraste com outras cópias do mesmo livro. Por exemplo, famoso Rolo do Mar Morto de Isaías que ainda per- manece sendo a única cópia de um livro do Antigo Testamento até agora descoberta e publicada - tem nome técnico de que quer dizer: primeiro manuscrito (ou mais importante) de Isaías descoberto na Caverna N.° 1 de Uádi Cunrã. O assim-chamado Rolo de Isaías da Universidade Hebraica (embora que também tenha passado a pertencer à Universidade Hebraica, mediante com- pra do Mosteiro de São Marcos) tem nome técnico de Regra geral, os únicos fragmentos bíblicos que até agora têm sido publicados foram descobertos na Caverna 1 e na Caverna 4. Milhares de fragmentos têm sido retirados da Caverna 4, e mais do que 380 manuscritos diferentes têm sido identificados, entre os quais talvez uma centena são do Antigo Testamento. 1 Até agora, nada tem sido publicado da Caverna 2, embora que tenha havido ali descobertas de mais do que 180 fragmentos legíveis (um quarto deles sendo fragmentos bíblicos). As matérias bíblicas da Caverna 3 (famosa pelo Rolo de cobre, um inventário de tesouros sagrados escondidos para protegê-los) que ainda não foram publicadas, e as das Cavernas 5 e 6 são parcas e de mínima importância, se- gundo se nos infoma. Até agora, tem havido pouca notícia sobre conteúdo das Cavernas 7, 8, 9 e 10. Quanto à Caverna 11, decla- ra-se que ali se descobriram cinco rolos relativamente completos: uma porção de Levítico, uma seleção dos Salmos, um Targum ara- maico de Jó, e um Apocalipse não canônico da Nova 1. Ver F. M. Cross em BASOR 141, Fev. 1956, e The Ancient Library of Qumran, (1958), págs. 39, 40. 2. Millar Burrows, More Light on the Dead Sea Scrolls (1958), págs. 14, 28-30.</p><p>OS MANUSCRITOS HEBRAICOS E AS VERSÕES ANTIGAS 37 As publicações mais importantes das matérias de Cunrã são: "The Dead Sea Scrolls of St. Mark's Monastery" (Os Rolos do Mar Morto do Mosteiro de São Marcos), 1950, editado por Millar Bur- rows, que contém o texto fotografado de e o Comentário de Habacuque, 1QpHb; "Discoveries in the Judean Desert: Qumran Cave 1" (1955) - (Descobertas no Deserto da Judéia: Caverna 1 de de Barthelemy e J. T. Milik, contendo curtos frag- mentos de Gênesis, Exodo, Levítico, Deuteronômio, Juízes, Samuel, Isaías, Ezequiel, Salmos; 'WSR HMGYLWT HGNWZWT" (em he- braico, "O Tesouro dos Rolos Escondidos") (1954), que contém Manuscrito de Isaías da Universidade Hebraica, 1QIsb. Segue-se uma lista dos manuscritos, publicados ou não, que têm sido men- cionados em notícias publicadas nos jornais dos 1. O Rolo do Mar Morto de Isaías - todos os ses- senta e seis capítulos (150-100 a.C.). Este texto importante perten- ce à mesma família de manuscritos que é representada pelo Texto Massorético (TM). Só ocasionalmente favorece a leitura da Sep- tuaginta (LXX), e a maioria das suas deviações do TM são pro- venientes de lapsos escribais óbvios, pois texto foi copiado com certo descuido. Mas alguns dos nomes pessoais indicam uma voca- Um dos Rolos do Mar Morto da maior importância é o manuscrito completo de Isaías de antes de 100 a.C. (Cortesia de The Biblical Archaeologist) lização anterior e mais digna de confiança do que a do TM; por exemplo, indica a vocalização (cf. o acadiano, tur-</p><p>38 MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO tannu), que é certamente mais exato do que o do TM (Is 2. O Comentário de Habacuque (1QpHb) - somente tulos 1 e 2, com notas intercaladas entre os versículos (100-50 a.C.). Aqui também, O texto citado de Habacuque se relaciona estreita- mente com TM. As variações são relativamente numerosas, em- bora que de importância mínima, e se explicam freqüentemente como sendo simples erros escribais. Raras vezes uma variação tem apoio na LXX e em outras versões. Incidentalmente, o comen- tário (ou pesher) é de um tipo muito especial: preocupa-se usual- mente com o cumprimento de cada versículo na história recente dos hasmoneanos e nos eventos da época. 4 3. O Rolo de Isaías da Universidade de Jerusalém porções substanciais dos capítulos 41-66 (50 a.C.?). Este tem uma fidelidade ao TM muito mais estreita do que 4. Fragmentos de 1Q Levítico capítulos 19-22, represen- tados por alguns poucos versículos de cada capítulo (talvez do quarto século a.C., conforme Vaux, e Burrows concorda com re- servas, enquanto Cross prefere segundo século a.C.). Publica- do em Barthelemy, p. 51, placas 8 e 9. Textualmente, este manus- crito concorda notavelmente com o TM. É escrito na letra paleo- hebraica. 5. 4Q Deuteronômio-B - 32:41-43, escrito em hemistíquios como poesia, e não como prosa. Favorece a LXX contra TM em três instâncias. Publicado por Skehan em BASOR 136, Dezembro 1954; não sugeriu nenhuma data para documento. 6. 4Q Samuel-A 1 Samuel caps. 1 e 2, vinte e sete frag- mentos (primeiro século a.C.). Concorda com a LXX contra TM em vários lugares; há outros lugares onde é diferente de ambos. Publicado por Cross em BASOR 132, Dezembro 1953. 7. 4Q Samuel-B 1 Samuel caps. 16, 19, 21, 23 (225 a.C., ou antes). Usa ainda mais esparsamente as matres lectionis (ou letras que indicam a presença de vogais) do que O TM. É um texto que concorda consistentemente com a LXX contra TM. Publi- cado por Cross em JBL 74, Set. 1955. 3. Beegle discute estas vocalizações em BASOR 123, out. 1951. Para uma dis- cussão das variações textuais em geral, veja Millar Burrows em BASOR 111, out. 1948, "Variant Readings in the Isaiah Manuscript". 4. Uma excelente discussão deste comentário se acha em F. F. Bruce, Biblical Exegesis in the Qumran Texts (1959), págs. 7-17.</p><p>MANUSCRITOS HEBRAICOS E AS VERSÕES ANTIGAS 39 8. 4Q Jeremias-A - igualmente arcaico, e pelo mesmo mo- tivo, segundo (Ibid). Ainda não foi publicado. 9. 4Q XII-A (XII é a denominação de um ms. dos Profetas Menores). No artigo acima mencionado, Cross mencionou o ma- nuscrito como sendo um cursivo do terceiro século a.C. 10. 4Q Eclesiastes outro ms. cursivo do terceiro século a.C., segundo Cross 11. 4Q Exodo - um fragmento do capítulo 1 com uma va- riação que favorece a LXX (1:5 diz "setenta e cinco" onde o TM diz "setenta"). 12. 4Q porções dos capítulos 7, 29, 30 e 32 (e talvez outros), escrito na letra paleo-hebraica. Este ms. favorece o Pen- tateuco Samaritano contra o TM em significante número de casos. 13. 4Q Números escrito em hebraico quadrático, mas com expansões do tipo do texto samaritano; e.g., depois de 27:23 vem uma interpolação derivada de Deuteronômio 3:21. Mas em outros casos, concorda com a LXX contra o texto Samaritano e o TM (como em 35:21). 14. 4Q Deuteronômio-A - capítulo 32 ("O Cântico de Moi- sés"). Tende à LXX contra o TM em 32:43 (sem porém incluir algumas das expansões da LXX) 5 15. 11Q Salmos - um manuscrito dos Salmos, da Caver- na 11, copiado no estilo formal de letra para livros, do período herodiano. Um terço de cada página, na parte inferior, se per- deu. Trinta e três Salmos foram conservados, incluindo-se o Sal- mo 151 da LXX. Quatro fragmentos separados contêm porções de mais quatro Salmos, perfazendo um total de trinta e sete. Re- presentam-se os Salmos 93, 101-103, 105, 109, 118, 119, 121-130, 132-146, 148-151, embora que nem sempre sigam a seqüência do TM (e.g. 105 é seguido pelos Salmos 146, 148, 121-130 etc.). Há também uma meia dúzia de poemas não-canônicos (dois dos quais são conhecidos numa tradução siríaca) e uma porção de prosa, que registra quais Salmos escritos por Davi (cf. BASOR 165, págs. 13-15). 5. Manuscritos 11-14 são discutidos por Burrows em MLDSS 135 e segs. 14 é debatido brevemente por Skehan em BASOR 136, Dez. 1954. Traduções têm sido publicadas de "comentários" ou pesharim da caverna 4, comentando Naum, Salmo 37, Isaías e Oséias (como também as obras pseudepigráficas "Bênçãos dos Patriarcas", "Testemunhos dos Doze Patriarcas", e um Florilegium ou Antologia de Midraxim escatológicos). Cf. Johann Maier, Die Texte vom Toten Meer (2 vols., 1960), I, págs. 180-189; II, págs. 162-167.</p><p>40 MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO Torna-se aparente, pelas descrições acima, que as matérias de Cunrã indicam a presença de três ou possivelmente quatro fa- mílias de manuscritos: 1) a proto-massorética, família da qual se deriva o texto hebraico que hoje conhecemos; 2) a proto-septua- ginta, o Vorlage ("modelo anterior") das primeiras traduções gre- gas que finalmente contribuíram para a formação posterior da Septuaginta; 3) a proto-samaritana, formando a base do texto pos- terior do Pentateuco Hebraico Samaritano (decerto não continha as adições posteriores que os samaritanos fizeram por motivos sectários) ; 4) uma família neutra, situada entre as tradições con- flitantes das três famílias já Deve-se entender, porém, que a existência destas famílias não- massoréticas de manuscritos não indica necessariamente que a proto-massorética não seja a tradição textual mais pura de todas. Nada há nas descobertas novas nas cavernas de Cunrã que seja Professor H. Wright Baker do Colégio de Tecnologia de Manchester cortando o Rolo de Cobre da Caverna 3. (Cortesia de John M. Allegro)</p><p>MANUSCRITOS HEBRAICOS E AS VERSÕES ANTIGAS 41 um desafio contra a exatidão essencial e a autoridade do nosso texto aceito da Bíblia Hebraica, conforme se representa, por exem- plo, nas edições de Kittel da Bíblia Hebraica. Não há nenhuma indicação que a Septuaginta deva ser necessariamente exaltada a uma posição mais respeitável do que antes, como testemunha do texto original, a não ser talvez no caso de livros como 1 e 2 Samuel, que por algum motivo apresentam um texto hebraico excepcional- mente defeituoso no TM. Certamente, podemos aguardar mais e mais luzes das fontes de no que diz respeito a Samuel, e talvez também em certas porções de Deuteronômio (especialmente naquelas instâncias de um autor do Novo Testamento ter citado um versículo de acordo com as palavras da LXX mais do que com o TM). Há mais uma observação a ser feita no que diz respeito ao TM consoantal. Quando é comparado com exemplos da tradição tais como (que contém muitas matres lec- tionis "a mais"), o TM obviamente remonta a uma recensão pré- Macabéia da Bíblia hebraica, e indica a atividade de um comitê de revisão para padronizar texto, sob auspícios oficiais, consultan- do os melhores e mais antigos manuscritos então disponíveis (in- cluindo-se, sem dúvida, as cópias oficiais nos arquivos do Templo), produzindo-se um texto final como resultado, com um trabalho semelhante àquele de Westcott e Hort ou Eberhard Nestle nas suas edições do Novo Testamento. Diferentemente de Westcott e Hort, porém, os estudiosos judeus nunca se deram ao trabalho de regis- trar os manuscritos anteriores que empregaram nas suas pesqui- sas, mas simplesmente os deixaram de lado, achando que o texto novo e oficial supria todas as necessidades práticas. Quando é que este postulado comitê teria feito seu trabalho? Alguns sugeriram que seria na época do Concílio de Jamnia, em 90 d.C., mas isto difi- cilmente concorda com a evidência de textos tais como O Rolo de Isaías da Universidade Hebraica que corresponde quase letra por letra com TM, e tem uma data de aproximadamente 50 a.C. Uma suposição mais provável é que a padronização do texto con- sonantal do Antigo Testamento ocorreu cerca de 100 A.C. 6 6. Moshe Greenberg (cf. Burrows, MLDSS 161) chega a conclusões algo seme- lhantes como resultado dos dados de Cunrã. Crê que os escribas de Jerusalém come- a corrigir e editar o texto do Antigo Testamento de maneira sistemática, já no terceiro século a.C., e que esta atividade recebeu um novo impulso sob o reinado dos hasmoneanos (macabeus) no segundo século. Embora seja possível que o texto padronizado não tenha prevalecido até depois da queda de Jerusalém, é justo dizer que a "prevalência do padrão, e não sua criação, surgiu depois de 70 d.C."</p><p>42 MERECE CONFIANÇA ANTIGO TESTAMENTO Agora falta registrar só mais um manuscrito pré-Cristão, um que não foi achado nas cavernas de Cunrã: 16. O Papiro Nash contendo o Decálogo e o shema', isto é, Exodo 20:1-17 e Deuteronômio 6:4-9 (ao qual Cross dá a data de 100 a.C., e Albright 50 a.C.). Este texto está perto da tradição massorética. (Foi comprado por W. L. Nash de um negociante de antiguidades egípcio, que disse que foi descoberto no B. MANUSCRITOS 1. Museu Britânico Oriental 4445 - uma cópia do Penta- teuco, cujo texto consoantal remonta até de 850 d.C., sendo que os pontos de vocalização foram acrescidos um século mais tarde. (Falta a maior parte de Gênesis e de Deuteronômio). 2. O Manuscrito de Leningrado dos Profetas Posteriores (data 916 d.C. de acordo com a maioria dos peritos, e.g. Bentzen, mas é de 930 segundo Würthwein). Foi descoberto por Firkowitsch em Tschufutkele na Criméia. Um códice com pontuação babilônica. 3. O Manuscrito de Leningrado B-19A - Antigo Testamen- to inteiro, contendo O texto de Ben Asher A data atribuída é de 1010 d.C., como cópia fiel de um ms. de 980 d.C. (que depois foi perdido). Este ms. fornece a base da Bíblia Hebraica de Kittel, edição (e todas as edições subseqüentes), sendo que é texto padrão para os modernos estudiosos do hebraico. Até 1929, O texto padrão tinha sido a edição de Ben Hayyim, de 1525. (O Códice C, modelo para o texto de Ben Asher, até recentemente tinha sido zelosamente guardado pela sinagoga sefárdica de Alepo, e seus não tinham dado permissão de se tirar fotografias dele, muito menos de se usar o texto na Bíblia Hebraica de Kittel. Ago- ra, entretanto, foi adquirido pelo Estado de Israel, e sem dúvida vai tomar o lugar do ms. de Leningrado como base das edições cri- ticas da Bíblia 4. O Pentateuco Samaritano. Os manuscritos mais anti- gos desta versão ainda estão em Nablus, e os sectários samaritanos proíbem sua publicação. Pietro della Valle foi o primeiro a des- cobrir uma forma deste texto samaritano, em Damasco, em 1616 d.C., e o texto foi então publicado na Bíblia Poliglota de Paris, em 1645. (Um interessante descoberto mais recentemente é Torá Finchasie, copiado em 1204 d.C., que contém o hebraico, um targum aramaico, e uma tradução árabe, em colunas parale- las, todas escritas em letras samaritanas). Esta Versão Samaritana contém umas 6.000 variações do TM, sendo que a maioria são meras</p><p>OS MANUSCRITOS HEBRAICOS E AS VERSÕES ANTIGAS 43 diferenças de ortografia. Mas em 1.900 instâncias concorda com LXX contra TM (e.g. no registro da idade dos patriarcas). Contém interpolações sectárias tendenciosas, procurando demonstrar que Deus escolheu Gerizim e não Sião, e Siquém no lugar de Jerusalém. Tem um tipo popularizante de texto, modernizando formas anti- quadas e simplificando construções difíceis de frases. Em 1815 Wilhelm Gesenius a condenou como sendo quase sem valor para a crítica textual. Mais recentemente, tanto Geiger como Kahle argumentaram que este juízo foi injusto. Kenyon (BAM 49,50) emitiu um parecer que apóia seu valor. A edição padrão foi pro- duzida por A. von Gall. (Pode-se acrescentar que os samaritanos escreveram o texto com letras muito diferentes do hebraico qua- drático, mas desenvolvidas das letras paleo-hebraicas). Nenhum manuscrito do Pentateuco Samaritano é antes do décimo século d.C., até onde vai nosso conhecimento. C. AS EDIÇÕES ANTIGAS IMPRESSAS DA BÍBLIA HEBRAICA MAIS IMPORTANTES 1. A Edição Bolonha do Saltério, 1477 d.C. 2. A Edição Soncino do Antigo Testamento (com os pontos vocálicos), 1488. 3. A segunda Edição Bomberg do Antigo Testamento (texto de Jacob ben Hayyim, com Massora e notas rabínicas, patrocinado por Daniel Bomberg), 1525-6. Esta edição era a base de todas as edições modernas até Versões Antigas do Antigo Testamento A. AS VERSÕES GREGAS 1. A Septuaginta (traduzida em Alexandria, 250-150 a.C.) A narrativa tradicional quanto à origem desta versão se re- gistra na Carta de Aristeu a Filócrates, cuja origem remonta a um período entre 130 e 100 a.C. Apesar dos traços de cunha fabulosa, a carta reflete um acontecimento histórico real, quando a Torá pelo menos, senão outras partes do Antigo Testamento também, foi traduzida para grego visando a conveniência dos judeus de fala grega que não conheciam hebraico. Paul Kahle tirou desta carta a inferência que já existiam traduções anteriores da Torá, que foram revistas pelo comitê do reinado do Ptolomeu II (e que não era uma tradução completamente nova feita naquela época)</p><p>44 MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO Mas Kahle duvida que tenha havido, além da Torá, qualquer ver- são antiga do grego que fosse padrão único, e se inclina à opinião que foi a Igreja primitiva que coligiu um texto padrão das várias versões gregas antigas que já existiam. P. de Lagarde, de outro lado (nisto foi seguido por A. Rahlfs), crê que existia um texto padrão da LXX original para Antigo Testamento inteiro, mesmo nos tempos pré-cristãos, e empregou uma metodologia cuidado- síssima no preparo de um texto crítico para publicação. (A edição de Rahlfs é aquela que mais facilmente se pode obter para finalida- des de estudo, hoje em dia). Segue-se uma lista dos manuscritos ou fragmentos de manuscritos dos mais importantes da Septuaginta. a. Papiro Rylands 458, contendo porções de Deuteronômio 23-28 (150 a.C.) (Veio a nós na forma de um embrulho de uma múmia). Kenyon (BAM 63) declara que tende a favorecer A e Theta (Codex Washingtoniensis I, um ms. do sexto século d.C.) contra B. b. Fragmentos da Caverna 4 de Fragmento de Levítico em papiro; concorda bem com texto LXX padrão, mas emprega no lugar de kyrios para represen- tar "Jeová". Fragmento de Levítico em couro, contendo 26:1-16. Há dez variações da LXX posterior, e cinco outras variações onde os pró- prios mss. da LXX não concordam entre Fragmento de Números em couro, contendo 3:30-4:14. Em várias instâncias emprega uma palavra grega diferente da LXX, mas parece que está traduzindo a mesma palavra hebraica do original. (Estes fragmentos são discutidos por Burrows, MLDSS 136, 137, e aparentemente os atribui ao primeiro século a.C.) C. Papiros Chester Beatty, achados em Oxirinco, no Egito. N.° VI, de 150 d.C., um códice de papiro contendo porções de Números e Deuteronômio, com tendências de concordar com A e Theta contra B. VII, de 230 d.C., contendo porções de Isaías com glosas em cóptico faiúmico. V, C. de 270 d.C., contendo porções de Gênesis (caps. 8, 24, 25, 30-46). IV, de 350 d.C., contendo Gênesis d. Papiro 911, do Egito, cerca do fim do terceiro século d.C., escrito numa letra cursiva uncial, que contém fragmentos de Gê- nesis caps. 1 - 35, um texto pré-hexaplárico demonstrando afini-</p><p>MANUSCRITOS HEBRAICOS E AS VERSÕES ANTIGAS 45 dades com os mss. E e D o Gênesis bodleano do décimo século, em Oxford, e Gênesis de Cotton, do quinto século, no Museu Britânico). e. Manuscrito Grego V Freer, dos Profetas Menores, ("W"), em Washington, perfazendo 33 felhas de papiro, datando da se- gunda metade do terceiro século d.C., escrito numa letra egípcia, contendo um texto quase completo de todos os profetas, menos O texto é do tipo pré-hexaplárico, e entre os manuscritos unciais está um pouco mais perto de Q e de Alef do que dos demais. Tem, porém, afinidades marcantes com manuscritos minúsculos como 407, 198, 534 e 410 - que também demonstram um tipo de texto pré-hexaplárico. f. A Hexapla de Orígines, cerca de 240 d.C. Orígines viveu entre 185-245 d.C. Por causa das muitas divergências nos mss. da LXX que então havia, e porque notara que certas porções do texto hebraico faltavam na LXX, Orígenes resolveu fazer uma recensão do Antigo Testamento Grego da seguinte maneira: Copiou seis colunas paralelas (hexapla significa sêxtuplo), consistindo em: 1) o original hebraico, 2) hebraico transliterado em letras gre- gas, 3) a tradução grega literal de Aquila, 4) a tradução grega idiomática de Símaco, 5) a Septuaginta propriamente dita, 6) a tradução grega de Teodócio. Nos casos de haver seções da LXX que não existiam no hebraico, colocava um óbelo (traço diacrítico horizontal) no começo, e um metóbelo (traço com um ponto ou traço menor) no fim. Nos casos de haver porções do hebraico que não constavam na Septuaginta, completava-a com uma tradução grega duma outra coluna, distinguindo-a por meio dum asterisco (uma cruz com pontos entre os braços) e um metóbelo. Aparentemente, esta Hexapla original de Orígenes nunca foi copiada para publicação; era por demais volumosa para haver um mercado para ela. Mas o conteúdo da quinta coluna (LXX mais acréscimos), foi posteriormente publicado por Eusébio e Panfílio, incluindo-se cuidadosamente os símbolos diacríticos. Uma cópia desta obra foi conservada para nós no Códice Sarraviano (G), tando do quarto ou quinto século, e contendo porções de Gênesis até Juízes. Desta edição grega não sobreviveu nenhuma outra seção considerável, mas felizmente foi traduzida para siríaco por ordem do Bispo Paulo de Tela em 616 d.C. (cf. as "Versões Siríacas" mencionadas adiante) e alguns manuscritos da tradução foram conservados, com as tão importantes marcas diacríticas aparecen- do no texto siríaco.</p><p>46 MERECE CONFIANÇA o ANTIGO TESTAMENTO g. A Recensão Hesiquiana (uma revisão do texto da Septua- ginta feita no Egito pelo Bispo Hesíquio, martirizado em 311 d.C.), não sobrevive em nenhum ms. antigo, a não ser possivelmente o Códice Marcaliano (Q) dos Profetas (do sexto século d.C.) mas pensa-se que foi conservada numa forma posterior, nos Minúsculos 49 e 68, e alguns outros, como também nas versões cópticas e etió- picas em geral, e nas Itala ou "Latim Antigo". h. A Recensão Luciânica (feita por Luciano de Samosata e Antioquia, também martirizado em 311 d.C.) sobreviveu somente em mss. posteriores, notavelmente o Códice Veneto (N), um ms do oitavo século, contendo porções de Exodo e de Levítico. Kahle acha que o aparecimento de certas leituras caracteristicamente "Luciânicas" em mss. anteriores à vida de Luciano especial- mente em certos mss. do Latim Antigo indica a existência ante- rior do texto "proto-Luciano" (Handschriften aus der Höhle, "Manuscritos da Caverna", p. 34). i. Códice Vaticano (B) (325-350 d.C.) um ms. magnífico que contém a maior parte do Novo Testamento além do Antigo Testamento. Representa um texto anterior ao de Orígenes (embora que tenha sido copiado numa data posterior à da Hexapla) da Um livro (Daniel) porém, não é da LXX mas de j. Códice Sinaítico (Alef) (ca. de 375-400 d.C.) outro ms. esplêndido, que também contém o Novo Testamento completo, em- bora faltem porções do Antigo Testamento. Parcialmente asseme- lha-se ao Códice Vaticano, e parcialmente ao Códice Alexandrino. k. Códice Alexandrino (A) (ca. 450), que também é um texto importante do Novo Testamento. Mostra algumas afinidades com a LXX da Hexapla, apesar de ser basicamente um tipo egípcio de texto. A LXX tem grandes diferenças de qualidade e de valor, de um livro para outro. O Pentateuco foi traduzido com maior exatidão, de modo geral, do que os demais livros do Antigo Tes- tamento, indubitavelmente porque tinha que servir como um tipo de Targum Grego nos cultos nas sinagogas das congregações ju- daicas no Egito. Os Profetas Anteriores (i.é., Josué até 2 Reis) e os Salmos são traduzidos com considerável fidelidade ao original hebraico, de modo geral. No caso dos Profetas Posteriores (Isaías até Malaquias), a tendência à paráfrase é mais definida, e as pas- sagens hebraicas mais difíceis muitas vezes recebem um trata-</p><p>MANUSCRITOS HEBRAICOS E AS VERSÕES ANTIGAS 47 mento inexperiente. Os demais livros, os Poéticos (não os Salmos neste caso) demonstram uma tendência semelhante à liberdade na interpretação. Ao aquilatar o valor da LXX para as emendas textuais de qualquer livro específico, precisamos em primeiro lugar estudar como o livro foi traduzido como um todo, para saber o valor da tradução no caso específico daquele livro. Se aparentemente a técnica da tradução do livro é parafrástica, sua utilidade para emendas textuais seria muito menos do que quando a tendência geral é uma tradução literal. Se porém, o livro inteiro demonstra um sentido consistentemente compreensível, e evidencia que sur- giu de uma boa compreensão do hebraico, merece respeito. Mesmo assim, deve ser lembrado que texto da LXX veio até nós através de várias formas divergentes (ao ponto de levantar suspeitas de ter havido origens heterogêneas) e que dá sinais de baixos padrões de fidelidade de cópia na sua própria transmissão. Os escribas gregos não aderiram às mesmas regras estritas de exatidão literal e meticulosa que foram adotadas pelos escribas judeus do período dos Soferim (vd. cap. 4, seção intitulada "A Obra dos Soferim"). Um exemplo significante dos perigos de se reconstruir um ori- ginal hebraico na base da tradução da LXX veio a lume com a descoberta de uma porção considerável do original hebraico de Eclesiástico (ou a Sabedoria de Jesus ben Sira), livro apócrifo. Antes desta descoberta (em 1897) os críticos textuais tinham con- jeturado várias emendas do texto grego para harmonizá-lo com o que se supunha ser o original hebraico. Mas quando esta porção do original hebraico que foi descoberta foi publicada (por Cowley e Neubauer), revelou-se que o tradutor tinha tomado poucos cui- dados com seu original, e, para produzir um ponto de vista mais helenístico, se permitiu consideráveis liberdades (apesar de o ori- ginal hebraico ter sido composto por seu próprio avô). Kenyon, (BAM 95) observa: "A moral que se deve tirar desta descoberta é conseqüentemente que deve-se adotar cautela ao pressupor que variações (mesmo que sejam consideráveis) na LXX indiquem ne- cessariamente que a tradução foi feita dum texto massorético he- braico diferente. Sem dúvida, isto pode ser o caso, mas precisamos nos dispor a deixar ampla margem pelas liberdades de paráfrase e de erro mesmo, especialmente no caso de livros que provavelmente foram os últimos a serem traduzidos". 7a 7a. Kenyon, BAM, pág. 95.</p><p>48 MERECE CONFIANÇA O ANTIGO TESTAMENTO 2. As Versões Gregas posteriores a. A Versão de Áquila. Áquila, nativo do Ponto, veio a ser um prosélito ao judaísmo, segundo se informa, e um aluno do Ra- bino Aqibá. Sua obra foi publicada cerca de 130 d.C., aparente- mente, e seu caráter estritamente literal foi demonstrado. Pro- curou aderir a um único padrão grego equivalente para cada palavra hebraica, sem levar em consideração se isto fazia bom sen- tido no grego em cada contexto. (Por exemplo, a partícula do acusativo, 'eth foi traduzida por ela pela preposição grega syn "com"). A tradução de Áquila só sobreviveu em citações e frag- mentos, especialmente de Reis e Salmos 90-103. 7 b. A Versão de Símaco (talvez 170 d.C.) traduziu Antigo Testamento para grego bom e idiomático, sem porém deixar de aderir a altos padrões de exatidão. Símaco era um ebionita, se- gundo Jerônimo, mas Epifânio relata que era um samaritano con- vertido ao judaísmo. Infelizmente, sobreviveram poucos fragmen- tos; são colecionados na edição de Field (vd. a Nota 7). A Versão de Teodócio (cerca de 180 ou 190 d.C.) não era real- mente uma tradução totalmente nova, mas a revisão duma versão grega anterior, seja da LXX ou de alguma outra ponto ainda disputado. O fato consta que há leituras do tipo "Teodócio" em mss. anteriores ao tempo de Teodócio, (e.g., nalgumas citações no Novo Testamento e do Antigo Testamento, na Epístola de Barnabé, as Epístolas de Clemente, Hermas, etc.). Kenyon e Kahle inclinam- se ao ponto de vista de que O que Teodócio revisou era um texto que não era da LXX. No caso de Daniel, a tradução de Teodócio tomou o lugar da versão LXX original daquele livro, pelo motivo muito justo que Teodócio seguiu fielmente a forma do texto he- braico corrente nos primeiros séculos da era cristã. (A versão ori- ginal LXX de Daniel só tem sido conservada num único minúsculo, Ms. 88, e nos Papiros Chester Beatty, recentemente descobertos, n.°s IX e X. B. TARGUNS ARAMAICOS Durante Exílio Babilônico povo judeu começou a abandonar mais e mais hebraico dos seus ancestrais, optando pela língua aramaica, que se tornara a língua internacional para diplomacia 7. Estes fragmentos têm sido colecionados na edição Field dos fragmentos hexapláricos, Originis Hexaplorum quae supersunt, 1875. Os fragmentos de Áquila descobertos na Genizá de Cairo foram publicados por F. C. Burkitt em 1897. Exemplos da tradução de Áquila são citados na Introdução da Septuaginta de Rahlf, págs. viii-x.</p><p>OS MANUSCRITOS HEBRAICOS E AS VERSÕES ANTIGAS 49 e comércio, e o veículo principal de comunicações entre o governo persa e seus súditos depois de ter sido estabelecido o Império Persa. Enquanto as congregações judaicas ficavam sendo mais inseguras do seu hebraico (apesar de que a classe culta da Palestina nunca deixou de estudar e de falar o hebraico até o segundo século depois de Cristo), surgiu a necessidade de haver um intérprete para re- petir perante elas em aramaico a mensagem que tinha sido lida no culto da sinagoga, da Bíblia hebraica. Mas este intérprete (Aramaico não se restringia sempre a uma mera tradução, mas especialmente no caso dos Profe- tas, explicava a mensagem por meio duma paráfrase para demons- trar qual o modo certo de se entender a leitura do original. De- pois de séculos de tradição oral, especialmente depois do banimento dos judeus da Palestina em 138 d.C., achou-se aconselhável regis- trar esta paráfrase aramaica por escrito como targum ("interpre- tação"). Havia uma tradição que o Targum oral começou na época de Esdras (Ne 8:7,8), mas não há evidência de ter existido um Targum escrito antes de 200 d.C. mais ou menos. O valor dos Targuns para a crítica textual é limitado pelo fato de que seu original hebraico era quase idêntico ao nosso texto aceito (i.e., a Segunda Edição Bomberg). Só ocasionalmente revelam quaisquer divergên- cias que se explicam somente na base de alguma palavra diferente no original hebraico. Sendo esse o caso, seu valor é maior para a interpretação do que para a crítica textual como tal. 1. O Targum de Onquelos da Torá (do terceiro século d.C., possivelmente como uma recensão duma paráfrase anterior) pro- duzido pelos círculos judaicos estudiosos da Babilônia. (Escritos palestinianos que ainda existem, de antes de 1.000 d.C., não ci- tam). Tradicionalmente, se atribuía a um certo Onquelos, que, segundo se supunha, era o mesmo nativo do Ponto que compôs a tradução Áquila para o grego (em outras palavras, Onquelos é Áquila). Mas a origem oriental e a data posterior da composição deste Targum militam contra esta tradição. De qualquer maneira, Onquelos, seja quem tenha sido, adere estreitamente ao original hebraico em quase todas as passagens menos os capítulos poéticos do Pentateuco, 2. O Targum de ben Uzziel dos Profetas (i.é., Josué até Reis, e Isaías até Malaquias) foi composto no quarto século d.C., também em círculos babilônicos. É muito mais perifrástico e livre na sua interpretação do texto hebraico do que Onquelos.</p><p>50 MERECE CONFIANÇA ANTIGO TESTAMENTO 3. O Targum de da Torá, provém de ca. de 650 d.C., e se compõe duma mistura de Onquelos com materiais do Midraxe. 8 Tem pouco valor crítico. 4. O Targum de Jerusalém, da Torá, é de ca. de 700 d.C. Este também é de pouco valor crítico. C. AS VERSÕES LATINAS 1. A Versão do Latim Antigo, ou Itala (composta durante O segundo século, completada ca. de 200 d.C.) não era uma tradução direta do hebraico, era meramente uma tradução latina da Sep- tuaginta. Daí valor da Itala como apenas uma "tradução-filha"; só ajuda a averiguar o texto anterior da LXX. Parece que esta versão, que existe em muitas formas divergentes, surgiu na África do Norte. ao surgimento das traduções de Jerônimo, caiu no desuso, e finalmente foi abandonada, a não ser no caso do Saltério (conforme se esclarece no próximo Só sobre- viveu em pequenos fragmentos (exceto os Salmos, que sobrevive- ram), e estes foram colecionados e publicados por Sabatier em 1739. Entre os manuscritos estão: a. Códice Palimpsesto Würzburg, ca. de 450 d.C., contendo fragmentos da Torá e dos profetas. b. Códice de Lião, ca. de 650 d.C., contendo fragmentos de Gênesis até Juízes. 2. A Vulgata de Jerônimo (390-404 d.C.). Em 382, Jerônimo foi comissionado pelo Papa Damaso para revisar a Itala em confron- to com a Septuaginta Grega (embora que Jerônimo já conhecesse bem hebraico, Damaso não tinha pretendido originalmente nada tão radical como seria uma nova tradução latina do hebraico ori- ginal). Mais ou menos na mesma época na qual completou sua tradução dos Evangelhos (pois trabalhava também com a revisão do Novo Téstamento), produziu seu primeiro Saltério, que veio a ser chamado Saltério Romano (por causa de ter sido adotado para o uso na Igreja de São Pedro, em Roma). Consistia apenas numa ligeira revisão da Itala, harmonizando-a mais com a Mais tarde, (387-390), Jerônimo produziu uma segunda tradução, chamada O Saltério Galiciano, baseada da quinta coluna da Hé- xapla de Orígenes. Originalmente foi publicada com as marcas diacríticas, mas estas foram finalmente omitidas, e a tradução veio a ser para a igreja latina a tradução padrão, desde então e até hoje. 8. Ver o parágrafo sobre o Midraxe, cap. 4, pág. 64.</p><p>OS MANUSCRITOS HEBRAICOS E AS VERSÕES ANTIGAS 51 Nos anos posteriores das atividades de Jerônimo no assunto das traduções, aperfeiçoou seu hebraico por meio duma residência pro- longada em Belém, estudando com rabinos judeus. O resultado foi seu Saltério Hebraico, que era uma novíssima e acuradíssima in- terpretação do texto hebraico que então se usava na Entre 390 e 404, Jerônimo produziu o restante do Antigo Testamen- to (incluindo os livros apócrifos, apesar de questionar sua canoni- cidade). O resultado recebeu aceitação mais ou menos oficial como sendo a nova e autoritativa Bíblia Latina para a Igreja Ocidental. No decurso dos séculos foi publicada em colunas pa- ralelas com a Itala (da qual recebeu algumas corrupções). Final- mente, em meados do século dezesseis, Concílio de Trento nomeou uma comissão incumbida de produzir uma edição expurgada da Vulgata, e o resultado indireto foi a Edição Sistina, que foi publi- cada em 1590, seguida pela Edição Clementina, emendada, em 1592. D. AS VERSÕES SIRÍACAS Contemporaneamente com a formação do Targum aramaico de Onquelos, os cristãos siríacos estavam começando a produzir uma tradução mais ou menos padronizada da Bíblia, no seu dialeto aramaico oriental. (O aramaico dos judeus da Palestina e da Babilônia era do tipo ocidental, e se escrevia nas mesmas letras quadráticas hebraicas que foram empregadas para a Bíblia he- braica. Mas os cristãos de fala aramaica adotaram um alfabeto próprio, bem diferente, com algumas semelhanças superficiais à es- crita árabe). No caso das traduções do Novo Testamento, é óbvio que foram derivadas do grego original; até têm abundantes palavras helenísticas que foram adotadas do texto grego. Foi só mais tarde que surgiu a tradição entre os cristãos siríacos que seus Evangelhos eram os originais dos quais a versão grega foi derivada (com argumento especioso que a língua de Cristo e dos Apóstolos era aramaico). 1. O Antigo Testamento Siríaco Pesita "Simples") deve ter sido composto no segundo ou terceiro século d.C., já que foi citado em escritos siríacos do quarto século. Originalmente, a parte do Antigo Testamento foi traduzida do original hebraico, mas de- pois sofreu algumas revisões para conformá-lo mais estreitamente à Septuaginta. Seu testemunho textual é ambíguo e deve ser usado- com cuidado e discriminação para finalidades de crítica textual. A Versão Pesita galgou a posição oficial na igreja de fala siríaca</p>

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