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XI CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA 
1 a 5 de setembro de 2003, UNICAMP, SP 
Grupo de Trabalho: Religião e Sociedade 
 
 
 
 
 
MULHERES PASTORAS: 
Em busca de um espaço na hierarquia evangélica 
 
 
Maria Goreth Santos
1
 
 
 
 
“Deus opera através das mulheres. Se Deus não 
fosse de acordo não estaria operando. Essas leis 
que proibiam a mulher de falar, de ensinar, essas 
leis foram abolidas por Jesus, quando ele morreu 
na cruz, nisso foi rasgado o véu que separavam 
homens e mulheres de Deus.” 
 (Pastora Néia) 
 
Quando a questão é o pastorado feminino, o primeiro questionamento feito por 
pastores, e mesmo, pastoras é se tal reivindicação tem respaldo bíblico. Favoráveis ou não ao 
ministério feminino a Bíblia é a referência para a discussão. Não podia ser diferente na 
medida em que ela é para todos os grupos evangélicos a própria Palavra de Deus e, portanto, o 
livro de conduta, fé e ordem para todos os crentes, ainda que haja uma variada forma de 
interpretá-la entre os grupos religiosos. De acesso a todos, a partir da Reforma de Lutero e 
Calvino, a interpretação passa a ser livre e sujeita a várias versões. Sempre houve, no entanto, 
grupos religiosos cuja leitura da Bíblia foi mais literal, fundamentalista. Para estes a “Palavra 
de Deus” é imutável e, portanto, não está sujeita a atualizações. 
 
1
 Professora substituta do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCS/UFRJ) 
 Doutoranda da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) 
Através das “falas” das pastoras entrevistadas busquei perceber suas opiniões 
sobre a proibição ao ministério pastoral feminino por alguns líderes e denominações. Se elas 
percebem essa proibição como uma questão doutrinária, legitimada pelas Escrituras e pela 
interpretação strito sensu destas, ou se pelo contrário, a vêem marcada pela herança ou 
influência da hierarquia patriarcal presente na sociedade contemporânea, que parece estar 
sendo corroída e desafiada pela ascensão das mulheres. 
 
O lugar da mulher na hierarquia das igrejas evangélicas 
Em todas as igrejas evangélicas a hierarquização evidencia a pessoa do pastor
2
. 
Ele comumente é a autoridade máxima dentro da comunidade religiosa. É ele o responsável 
pelas almas de sua igreja. É ele quem aconselha, batiza, casa, faz culto fúnebre e toma as 
decisões mais importantes dentro da igreja. 
Nas igrejas de origem histórica a exigência por uma formação acadêmica em 
teologia faz com que o candidato a pastor curse quatro anos de teologia em uma instituição 
teológica reconhecida e mais tarde passe por um concílio, formado em sua maioria por 
pastores mais velhos e experientes. Neste concílio são avaliados conhecimento e capacidade 
do candidato para exercer o ministério. Muitas vezes é feito um levantamento rigoroso da sua 
vida pessoal para que não haja nenhum impedimento moral ou legal para que ele exerça o 
cargo a que está concorrendo. 
Nas igrejas neopentecostais a exigência por um preparo teológico é bem menor. 
Há, porém, um controle maior sobre a vida pessoal do candidato/a. Uma vida regrada, 
testemunhos que testifiquem uma mudança de vida e uma dedicação exclusiva à igreja são 
atributos importantes na seleção para exercer o pastorado. 
Com exceção do pastorado e presbiterado sempre houve mulheres ocupando os 
demais cargos. As nomenclaturas institucionais atribuídas aos líderes sempre tiveram a sua 
 
2
 Segundo um oficial da Igreja Batista, pastor, bispo e presbítero são três títulos para uma mesma função. 
“Quando o pastor preside os trabalhos da igreja, organiza e supervisiona tudo, ele está exercendo a função de 
bispo, que é a de superintender. Quando ele dá sábios conselhos, mostrando a dignidade do cargo que ocupa, ele 
está exercendo a função de presbítero, ancião. Quando ele apascenta com o amor o rebanho, oferece-lhe pastos 
verdejantes com sermões de poder espiritual, quando o guia e lhe dá um ambiente propício à sua vida espiritual, 
ele está exercendo a função de pastor”. (Ferreira, 2001). Há ainda, mais exclusivamente, nas igrejas 
neopentecostais a figura do obreiro, que são os auxiliares dos pastores e o primeiro estágio na hierarquia da 
igreja. Homens e mulheres podem ser obreiros, sem no entanto, receber qualquer remuneração pela função. É, 
portanto, uma atividade exclusivamente voluntária (Barros, 1995). Na igreja Cristo Vive os pastores auxiliares 
também exercem o trabalho voluntariamente, não recebendo qualquer remuneração para o cargo. 
versão na forma masculina. A feminização destas nomenclaturas muitas vezes é criada para 
se adaptarem a um novo contexto, uma vez que nunca houve o feminino de tais nomes. 
A terminologia pastora, presbítera e mesmo bispa começaram a fazer parte do 
discurso das igrejas há bem pouco tempo e muitas vezes são duvidosas quanto à legitimidade 
do termo quando ouvidas em sua forma feminizada, de acordo com alguns líderes contrários 
ao pastorado feminino
3
. As terminologias diácono, missionário e evangelista, ao contrário 
têm os seus opostos no feminino. São os primeiros cargos permitidos às mulheres, e não 
estão no topo da hierarquia evangélica, ao contrário, estão subordinados ao líder máximo e 
aqueles que os exercem não precisam de um conhecimento teológico reconhecido 
institucionalmente. 
Na medida em que as mulheres protestantes buscam o pastorado feminino, 
principalmente as de origem históricas e pentecostais mais tradicionais, elas precisam se 
adaptar ou transformar um contexto marcado por um processo histórico em que as igrejas 
cristãs são instituições sumamente patriarcais e que, portanto, sua doutrina, estrutura e liturgia 
colocam sempre os pastores superiores a elas. Precisam buscar no conhecimento a 
legitimação para exercer os papéis que são conferidos pelo cargo. 
Pierre Bourdieu (1998) é importante para nos apontar a significância que tem a 
legitimação deste conhecimento para que as mulheres alcancem o pastorado e estejam no 
mesmo patamar de autoridade de seus colegas homens. Segundo o autor há um poder 
simbólico que se apresenta na forma de um discurso institucional. No entanto, o discurso de 
autoridade só pode ser compreendido e principalmente reconhecido enquanto tal, se a pessoa 
está autorizada a fazê-lo. É preciso que haja receptores legítimos que respondam a esta 
autoridade. Para tanto algumas condições são necessárias. A primeira delas diz respeito ao 
saber institucional. É preciso que a legitimação do exercício pastoral esteja salvaguardada 
pelo conhecimento teológico superior reconhecido. Assim, o pastor seria um porta-voz 
autorizado, que dispõe de uma autoridade limitada pela própria instituição; ele tem, portanto, 
uma autoridade delegada. Assim sendo, para que as mulheres sejam institucionalmente 
reconhecidas enquanto pastoras, precisam também desta legitimidade. 
A segunda condição para o reconhecimento legítimo da autoridade pastoral refere-
se às condições litúrgicas. Na qualidade de pastor há um monopólio dos bens de salvação 
ritualizados que funciona como um elemento legítimo para justificar a sua autoridade 
institucional. Os “atributos simbólicos”, o cumprimento de uma liturgia, ou seja, os rituais 
litúrgicos, as palavras sacramentais tornam pastores e pastoras detentores deste monopólio. 
As mulheres protestantes que almejam o pastorado necessitam reconhecer estes 
rituais enquanto condições necessárias para que o seu ministério seja percebido como 
legitimo. As liturgias são condições necessárias para que uma determinada pessoa seja 
reconhecida por sua habilidade. 
A terceira e última condição seria o reconhecimento e a legitimação de quem 
discursa por parte dos seus receptores. Os pastores ou pastoras precisam da legitimidade da 
instituição para que seus discursos sejam autorizados.Um ritual só funciona se ele é 
percebido como legítimo por aqueles para os quais ele foi dirigido. Se ele é realizado pelo 
“agente” na qualidade de depositário de uma autoridade, ou mandato institucional. 
A igreja, neste sentido, é uma instituição investida de poder para controlar essas 
condições. Para os líderes protestantes, a igreja é formada pelos membros. São eles que 
detém o poder de aceitar ou não as novas condições. 
Nem sempre as mulheres protestantes que almejam o pastorado encontram 
receptividade em suas igrejas de origem. Estas, por manterem uma fidelidade à tradição 
negam a elas essa possibilidade. Muitas vezes são as próprias mulheres da denominação que 
não reconhecem enquanto legitima esta reivindicação, e mesmo em uma instituição que é 
formada em sua maioria por mulheres a aceitação é pequena. Desta forma, a saída para 
aquelas que almejam o pastorado está na possibilidade de fundar as suas próprias 
denominações e garantirem assim o seu público na tentativa de verem legitimado o seu 
ministério. E no espaço de suas congregações a força do dom, concedido pelo Espírito Santo, 
tem mais eficácia do que a institucionalização. 
Na medida em que a igreja está investida desse poder de controle e legitimação, 
uma perspectiva de mudanças em seus rituais, pode levá-la a perder a sua legitimidade. Os 
fieis sentem-se ameaçados de perder aquilo que os referencia enquanto um grupo social 
religioso. 
É possível perceber que para que as mulheres exerçam o seu ministério pastoral, 
não é possível de antemão a tentativa de uma mudança no caráter institucional onde está 
envolvido um certo número de rituais que garantem a eficácia da sua existência enquanto uma 
 
3
 Um pastor batista contrário ao pastorado feminino escreve: “Nenhum apóstolo escreveu um bilhete sequer a 
uma mulher, chamando-a de pastora!” (O Jornal Batista, 29/11 a 5/12/99, ano XCIX – 48) 
agência que se propõe o cuidado espiritual dos seus membros. Uma instituição que não 
garanta esses rituais não tem sentido em si mesma. 
Uma vez que foi aos homens garantido o direito do discurso na figura do pastor, 
garantido pela instituição religiosa patriarcal, ao apoderar-se desse discurso, faz-se necessário 
que as mulheres o repitam na condição de tornarem o seu discurso também reconhecido. Se 
não for desta forma correm o risco de não ter credibilidade em sua função. As pastoras não 
podem romper com essa liturgia “masculinizada”. Muitas vezes os líderes que condenam o 
pastorado feminino acusam a instituição religiosa de estar em crise, quando ela passa do 
ministério masculino para o ministério feminino. 
Eis a razão porque as pastoras não estão preocupadas com o rompimento de uma 
liturgia que tem o seu fundamento em “valores patriarcais”. As pastoras reconhecem sua 
eficácia, principalmente no reconhecimento por parte dos membros de suas igrejas. Assim, 
muitas vezes, apenas na medida em que repetem o discurso já proferido pelos pastores se 
tornam bem aceitas. Portanto, mudá-lo, torna-se perigoso, a não ser que proponham algo bem 
mais convincente. 
 
Entrevistando as pastoras 
Para as pastoras não há nenhum problema em exercer o ministério pastoral, basta 
que a mulher tenha o dom de pregar e assim até os homens perceberão a capacidade das 
mulheres para o serviço. Portanto, como diz a pastora Ana Cristina, corroborada pela sua 
irmã Sônia: 
 
“Aquela mulher que não pode ter autoridade sobre o homem, sobre a igreja, sobre 
qualquer cargo na igreja, pra mim, esta mulher não foi escolhida por Deus, não tem o dom 
de Deus, não tem o propósito de Deus e Deus não tem o propósito para ela. Essa mulher 
tem que ficar calada. Mas aquela que tem a unção, o poder, o chamado e o propósito, essa 
vai poder ser até presidente da república. Olha o exemplo da Heloisa Helena. Tem 
caráter para ser presidente do Senado, não aqueles homens. Eles perderam a autoridade, 
estão envergonhados, desmascarados, e no entanto, são homens. Pra mim a mulher que 
não tem autoridade é aquela que não está debaixo do plano de Deus, do propósito de Deus. 
Esta, tem mais é que ficar quieta, calar a boca. Passar oferta, cantar corinho, bater palma, 
cuidar de criança. Agora, a que Deus escolheu, deu visão, da qual não tem quem tire o 
que Deus deu, pra mim essa é uma escolhida de Deus. São poucas as mulheres escolhidas 
por Deus. A maioria é de homens, porque homens são mais corajosos. Mas Deus escolhe 
homens, homens. Mas o amor de Deus é infinito e tinha que demonstrar. A escolha dele 
através de mulheres serve também para demonstrar que ele não faz acepção, ele não 
excluiria de escolher as mulheres. Acho que Paulo aplicou essa palavra para este tipo de 
mulher, que realmente não é a escolhida de Deus. Eu acho que ele realmente falou, 
porque a gente sabe que há esse tipo de mulher, que acha que tem um ministério, mas que 
só fica de tititi.”
4
 
 
O discurso das pastoras demonstra o conhecimento que elas possuem da 
significativa diferença de funções entre as que chegaram ao poder exercendo as que são 
nacionalmente reconhecidas, e daquelas que não alcançaram o pastorado. Funções estas 
sempre definidas como atividades femininas e quase sempre uma extensão das atividades 
realizadas em casa. Vemos assim um grupo de mulheres que justificam as suas posições e 
que reconhecem que precisam reivindicar seu lugar também na hierarquia evangélica. 
Quem são estas mulheres? O que as faz diferentes umas das outras? 
Quando comecei a pesquisar sobre as pastoras pensava encontrar um grupo 
homogêneo de mulheres que se caracterizariam principalmente pela submissão de esposas-
pastoras aos seus maridos-pastores. Pensava encontrar mulheres que mesmo exercendo 
atividades de liderança estariam completamente sob a autoridade de seus superiores, sem 
qualquer autonomia de suas ações. Tinha principalmente como referência o trabalho 
realizado por Maria das Dores e Silvia Fernandes (2000) que suspeitavam que pelo menos 
80% das pastoras eram ordenadas pelos próprios maridos; o trabalho de Mônica Barros 
(1995), que faz uma breve colocação da posição da mulher na Igreja Universal do Reino de 
Deus, e o trabalho de Eliane Gouvêa (1998) que apresenta a Igreja Renascer em Cristo, e a 
representação do feminino na mídia televisiva evangélica, e, mais recentemente, a dissertação 
de Andréa Kelmer Barros (2001) que trata sobre o papel da mulher batista e sua sexualidade 
no âmbito da igreja.
5
 
O contato com as pastoras não foi uma tarefa fácil. Através de várias tentativas era 
possível marcar uma entrevista, e esta muitas vezes era adiada por diversos motivos, na 
maioria das vezes as agendas muito cheias das pastoras. Algumas vezes, assisti aos cultos 
inteiros para tentar a entrevista logo em seguida. Essa estratégia parecia mais difícil na 
medida em que após os cultos as pastoras ficavam rodeadas de fiéis que buscavam algum tipo 
de ajuda. Bastante solícitas no atendimento a todos, ocorreu, com freqüência ter de esperar 
algumas horas. 
 
4
 A referência é à senadora que teve grande influência no caso da violação do painel de votação pelos senadores 
Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda denunciados pela diretora do PRODASEN, na história recente 
do país. 
Em outros casos, a atenção da pastora se dividia com a família, representada nos 
filhos, ou quando por diversas vezes fomos interrompidas por chamadas telefônicas, que 
reivindicavam decisões importantes. 
Apesar dos contratempos a receptividade das pastoras sempre foi muito positiva. 
Imediatamente após a minha apresentação e sabedoras do objetivo das entrevistas queriam 
conhecer o porquê do meu interesse e os motivos queme levaram a estudar o assunto. 
Apresentar-me como pertencente a uma denominação evangélica facilitou o meu trânsito 
pelas igrejas e a marcação das entrevistas. Houve, no entanto, em algumas denominações a 
impossibilidade do contato com as pastoras, devido ao grande número de compromissos 
destas. 
Em um primeiro momento o meu objetivo era entrevistar o maior número de 
pastoras e traçar, assim, um “perfil sociológico” dessas mulheres esperando que ele indicasse 
quem eram as mulheres que ascendiam ao nível mais alto da hierarquia evangélica e porque 
estavam trazendo muitos questionamentos a respeito da validade doutrinária de um pastorado 
feminino. Que influências as transformações na sociedade tinham levado às igrejas 
evangélicas? Para tanto, era preciso uma amostra significativa do universo pastoral feminino 
que não foi possível obter em função da dificuldade do contato com as pastoras. 
Parti, então, para algo menor, mas não menos significativo que foi tentar analisar, 
através de um número menor desse universo, como as pastoras lidam com as questões 
levantadas quando o assunto é o ministério feminino. Através de quinze entrevistas em onze 
denominações diferentes foi possível perceber que as pastoras representam as claras 
mudanças que vêm ocorrendo nas igrejas evangélicas onde as mulheres lidam com a 
dicotomia autoridade e submissão sem romper com a fé que possuem nas Escrituras e que 
pregam em seus cultos semanais.
6
 
O quadro de entrevistas com as igrejas e posição das pastoras ficou, então, assim 
definido: 
 
NOME DENOMINAÇÂO CARG LINHA 
 
5
 Em nenhum destes trabalhos há uma análise mais profunda sobre o pastorado feminino recortando-o de forma 
mais destacada. 
6
 As 15 entrevistas foram feitas através de um questionário com perguntas fechadas e abertas, com a utilização 
de um microgravador. As entrevistas em seguida foram transcritas pela própria autora. Apenas uma pastora não 
quis gravar a entrevista, respondendo mais diretamente às perguntas fechadas e fazendo algumas colocações com 
relação às abertas. Em anexo encontra-se o questionário com as perguntas formuladas. 
O 
Leni Librelon * Igreja da Cruzada Mundial Titular Neopentecostal 
Néia Igreja Internacional da Graça de Deus Auxiliar Neopentecostal 
Neusa Igreja Internacional da Graça de Deus Auxiliar Neopentecostal 
Rita Igreja Cristã Internacional Ebenezer Auxiliar Neopentecostal 
Tânia Igreja Cristã Internacional Ebenezer Auxiliar Neopentecostal 
Bispa Regina * Igreja da Aliança com Deus Titular Neopentecostal 
Valnice Milhomens* Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo Titular Neopentecostal 
Márcia Igreja Cristo Vive Auxiliar Neopentecostal 
Lídia Igreja Cristo Vive Auxiliar Neopentecostal 
Antonieta Congregação Porta das Ovelhas (Igreja 
Assembléia de Deus) 
Auxiliar Pentecostal 
Sonia Igreja do Evangelho Quadrangular Auxiliar Pentecostal 
Ana Cristina Igreja do Evangelho Quadrangular Auxiliar Pentecostal 
Eunice Igreja Metodista Jardim Alvorada Titular Histórica 
Inamar Igreja Anglicana Titular Histórica 
Silvia Igreja Batista Titular Histórica 
* Fundadoras de suas igrejas 
 
Podemos ver assim que o total das igrejas cujas pastoras foram entrevistadas, 
totalizam 12 pentecostais e neopentecostais e 3 históricas. Das igrejas pentecostais, duas 
entrevistadas pertencem a Igreja do Evangelho Quadrangular que já tem em seu histórico no 
Brasil, a consagração de mulheres ao pastorado, e a Congregação Porta das Ovelhas, filial da 
Assembléia de Deus, que ainda não reconhece o pastorado feminino, mas tem o exercício 
ministerial da obreira Antonieta Rosa. O restante das igrejas pertence ao que Paul Freston 
(1994) chama de 3ª onda do pentecostalismo. 
A presença de um número maior de igrejas neopentecostal não foi proposital, mas 
a facilidade do contato com as líderes dessas igrejas acabou por potencializar este número. 
No entanto, o fato dessas igrejas terem suas origens no solo brasileiro as faz diferentes no que 
tange às transformações ocorridas no seu interior. 
As igrejas neopentecostais, com exceções das igrejas, Internacional da Graça de 
Deus e Cristo Vive têm anos de fundação bem recentes, o que nos mostra a facilidade do 
surgimento de uma nova igreja em tempos bastante curtos. A facilidade de implantar uma 
igreja tem sido demonstrada pelo crescimento vertiginoso delas, em razão da “flexibilização 
de critérios para abrir novos templos” (Mafra, 2001). 
As pastoras se dividem em auxiliares e titulares. Às pastoras auxiliares são sempre 
direcionadas as atividades complementares, ou do tipo administrativas. Seus apoios são 
sempre concentrados em tarefas que envolvam a ajuda e orientação para outras mulheres, 
direção da parte musical da igreja e preparação de liturgias dos cultos. Às pastoras titulares 
cabem as mesmas funções dos pastores titulares, ou seja: 
 
“Congregar e construir o corpo de Cristo pela proclamação e ensino da Palavra, pela 
celebração dos sacramentos e pela direção da vida comunitária na sua liturgia, missão e 
diaconia” (Sampaio, 1989 apud Rohden, 1995) 
 
 
Das 15 pastoras entrevistadas, 9 são auxiliares e 6 são titulares. Das auxiliares 
apenas duas eram auxiliares de seus próprios esposos. Das titulares, três tinham fundado a 
própria igreja e estavam no grupo das neopentecostais. 
Uma delas é a pastora Leni Librelon, consagrada pela Ordem de Pastores do 
Brasil. Outro exemplo é a Bispa Regina Nadir, que fundou a Igreja da Aliança com Deus em 
1994. E o terceiro exemplo é o da pastora Valnice Milhomens da Igreja Nacional do Senhor 
Jesus Cristo. 
O fato do total das pastoras auxiliares estar concentrado nas igrejas 
neopentecostais caracteriza que, apesar das grandes mudanças ocorridas, o lugar das mulheres 
ainda é nelas bastante definido. Mostra ainda a dificuldade que elas têm em permitir a 
liderança efetiva dessas mulheres. Estas igrejas possuem uma forte liderança centrada na 
pessoa do líder fundador. 
O discurso dessas pastoras exemplifica o lugar que ocupam nestas denominações e 
demonstra o conservadorismo de uma tradição hierárquica evangélica. Ainda que a presença 
de pastoras apareça em maior número nestas igrejas, não significa maior autonomia destas 
mulheres. São quase sempre auxiliares, mas, ao contrário dos pastores auxiliares, quase 
nunca pregam ou exercem as atividades permitidas a estes. Mônica Barros (1995) observou 
essa diferenciação na consagração de pastoras na Igreja Universal do Reino de Deus, onde as 
mulheres não podiam nem mesmo ser nomeadas auxiliares até que fossem consagradas, ou 
ainda como nos apontam Machado & Silvia (2000) as pastoras eram sempre auxiliares de seus 
maridos, titulares das igrejas onde são membros. 
A Cristo Vive, do Apostolo Miguel Ângelo, é a única igreja onde nem os pastores 
auxiliares têm permissão para substituir o líder pregando ou exercendo as demais atividades 
eclesiásticas. Quando há necessidade, os pastores fazem um estudo bíblico, mas não pregam. 
Pastores nem pastoras são remunerados, ambos têm negócios próprios. Exercem, portanto, 
um trabalho voluntário na igreja, e ambos são totalmente submissos ao líder máximo, como 
coloca a pastora Lídia, apontando para a submissão feminina: 
 
“A Palavra (Bíblia) diz que a mulher tem que ser submissa ao esposo e diante dessa situação 
não é ser Amélia, escrava, mas saber que dentro do seu lar você tem que saber que tem um 
líder, você tem que ouvir a voz do seu esposo e na igreja a mesma coisa. Você tem um líder 
espiritual. Aqui nos rendemos, estamos submissos, depois de Deus, ao anjo do Senhor. O 
Apostolo Miguel é um anjo, nós nos espelhamos nele” 
 
A autonomia só é percebida nas igrejas em que são fundadas pelas próprias 
pastoras.No entanto, a hierarquização destas igrejas não muda em nada daquelas em que os 
titulares são pastores homens. 
Como nas igrejas dirigidas por pastores, as pastoras também têm seus auxiliares 
em outras igrejas filiais, e embora não contem ainda com pastoras nos serviços eclesiásticos, 
dizem já estar preparando outras mulheres para o ministério. Até que ponto isso pode 
significar uma mudança na hierarquização dessas igrejas, em denominações mais 
especificamente femininas, ainda é cedo para dizer. 
 
Quem são as pastoras? 
A fim de facilitar a visualização deste grupo, e nos permitir conhecer melhor essas 
pastoras coloco em tabela as informações obtidas: 
 
Nome Idade Estado Civil Filhos Grau de instrução Fonte de renda 
Leni Librelon 50 Casada 3 Pedagoga/teóloga Igreja 
Néia 36 Casada 1 Primeiro grau/teologia Marido (pastor) 
Neusa Separada 2 Prof.História/teologia Igreja/aposenta-
doria 
Rita Casada Teologia Trabalho secular 
Tânia Casada 2 Psiquiatra/teologia Trabalho secular 
Bispa Regina Casada 2 Teologia Igreja 
Valnice 50 Solteira Teologia Igreja 
Márcia Casada 3 Teologia Trabalho secular 
Lídia 34 Casada 2 Teologia (curso 
básico) 
Trabalho secular 
Antonieta 60 Casada 2 Mestrado em Teologia Igreja/trabalho 
secular 
Sonia 48 Casada 3 Teologia Igreja 
Ana Cristina Solteira Teologia Igreja 
Eunice 42 Casada 2 Teologia Igreja 
Inamar 30 Casa da 1 Superior 
Incompleto/teologia 
Igreja 
Silvia 30 Solteira Superior 
Incompleto/Teologia 
Igreja 
 
As pastoras entrevistadas configuram um grupo de mulheres majoritariamente 
casadas e com filhos adultos. Apenas três são solteiras, uma é separada e quatro têm filhos 
pequenos. 
Cada pastora tem uma história diferente de como chegou ao pastorado. Conhecê-
las é importante para situá-las num contexto de amplas mudanças que tornaram as mulheres 
mais livres para tomar suas próprias decisões e partirem em busca de seus objetivos. 
Começarei com as pastoras que pertencem às igrejas tradicionais, em seguida 
veremos as pastoras das igrejas pentecostais e neopentecostais e por último as pastoras que 
fundaram suas próprias denominações, para percebermos em que momentos estas igrejas 
convergem ou não no que diz respeito à liderança feminina. 
Silvia Nogueira foi a pioneira na igreja batista a alcançar o pastorado. Alvo de 
muita discussão e ameaças venceu todas as controvérsias e aos 30 anos tornou-se pastora, 
segundo ela, inexistente até na nomenclatura. Solteira, com pais evangélicos, sem nenhum 
outro membro na família como pastor, sempre muito alegre, conta de suas conquistas com 
entusiasmo e com um discurso que tenta colocar o tradicionalismo nas igrejas batistas como 
razão para que outras mulheres não cheguem ao pastorado. Silvia passa a ser o ponto de 
partida para que a denominação questione a proibição ao ministério pastoral feminino. Em 
seguida a sua ordenação várias assembléias envolvendo todas as igrejas batistas brasileiras 
foram feitas para discutir a questão. 
Na Igreja Anglicana, embora em outros estados já haja um número maior de 
liderança feminina, no Rio de Janeiro é a reverenda Inamar a primeira a assumir o cargo de 
pastora. Quando marquei a entrevista com a reverenda pensava encontrar uma pessoa de mais 
idade, religiosa e austera, mas deparei-me com uma moça bonita, tranqüila, de fala mansa e 
muito firme. Casada com um presbítero e mãe de uma menina de sete anos, aos 30 anos é a 
primeira pastora anglicana no Rio de Janeiro. Como pastora, prega, dirige os cultos e os 
sacramentos, além de participar das reuniões administrativas. As mesmas atividades exercidas 
pelos seus colegas homens. 
E por último, para fechar as igrejas históricas, temos a Igreja Metodista Jardim 
Alvorada sob a direção da pastora Eunice. Negra, de estatura baixa e de aparência frágil, por 
ser acometida de uma enfermidade há vários anos, não aparenta a idade que tem. Aos 42 
anos, é casada com um caminhoneiro, mas que professa a mesma fé. Possui pais evangélicos, 
sem contudo, ter outros pastores na família; tem uma filha de 20 anos e um filho de 18 anos. 
Tem no apoio da família o estímulo para exercer o ministério. 
Estas igrejas têm em comum o rigor na preparação de seus pastores, e as pastoras 
não fogem à regra. Todas as pastoras precisam fazer o curso teológico de quatro anos que, 
embora ainda não seja reconhecido, pelo Ministério da Educação para os líderes tem a 
validade de um curso superior em teologia. Após a formação teológica é preciso passar pelo 
exame de qualificação ou concílio onde tanto pastores, quanto pastoras são sabatinados, o que 
os capacita ao ministério pastoral. 
Uma outra característica é a relação de submissão dessas igrejas para com as suas 
matrizes norte-americanas ou inglesas, ou em nível mais local, às convenções ou dioceses. A 
Igreja Metodista, por exemplo, mantém um vínculo denominacional com os seus fiéis, 
denominado por Rubens César Fernandes (1994), de representativo. Desta forma, no nível 
local, os fiéis são responsáveis por todos os acontecimentos e reuniões acontecidos na igreja, 
e estes são registrados em ata para controle de todos. Em nível denominacional elege-se 
periodicamente os dirigentes regionais e nacionais. 
Já a Igreja Anglicana possui uma prática litúrgica que fortalece o exercício da 
autoridade na igreja, fruto da administração dos sacramentos. 
Os Batistas, apesar da grande ênfase na autonomia da congregação local, possuem 
organismos transdenominacionais bem estruturados, as convenções, que reúnem todas as 
igrejas cujas doutrinas comuns são respeitadas. Quando uma igreja desrespeita alguma 
doutrina é punida com a exclusão de seu nome das convenções estaduais ou mesmo da 
convenção nacional. 
Assim, as pastoras que pertencem a essas denominações não diferem de seus 
colegas pastores com relação às prestações de conta que precisam dar às convenções que 
pertencem suas igrejas, como exemplifica a pastora Eunice: 
 
“Na Metodista quem manda na igreja é o corpo, a gente só administra. Chamamos de 
concílio. O concílio são todos os membros. Eu sou a presidente do concílio, mas quem 
manda é a igreja” 
 
Das pastoras pentecostais entrevistadas, duas são da Igreja do Evangelho 
Quadrangular, de origem norte-americana e pertencente, segundo Freston (1994), à segunda 
onda do pentecostalismo. 
As pastoras Sônia e Ana Cristina são irmãs. A primeira é casada e aos 48 anos 
tem três filhos adolescentes. Cursou teologia e tornou-se pastora há dois anos. Já a irmã é 
solteira e mora com os pais onde só a mãe é evangélica. Era bancária, mas deixou o trabalho 
(contra a vontade da família) para dedicar-se ao pastorado. Ambas são auxiliares, com tempo 
integral na igreja, por opção, pois acreditam que sendo titulares não poderiam pregar mais 
livremente em outras igrejas. 
A Assembléia de Deus, depois da Congregação Cristã (1910) é a igreja pentecostal 
mais antiga em solo brasileiro, fundada por suecos que chegaram aqui em 1911 (Freston, 
1996). Com grande autonomia local, que é articulada com uma forte identidade 
denominacional bem institucionalizada, organiza-se em ministérios. Freqüentemente envia 
missionários e obreiros para que abram novas congregações. Estas congregações “filiais” 
ficam vinculadas permanentemente ao ministério das igrejas “mães”, com total dependência. 
Filiais podem criar outras filiais, mas estarão sempre pertencendo ao primeiro ministério. 
Em uma dessas congregações está a obreira Antonieta Rosa. Aos 60 anos, casada e 
com dois filhos adultos, dirige uma igreja com cerca de 700 pessoas. A pastora Antonieta 
Rosa
7
 é um caso diferente das entrevistadas. Pertencente à Igreja Assembléia de Deus de Vila 
da Penha dirige uma congregação subordinada à matriz. Convertida desde a infância, filha de 
pastor jubilado pela Assembléia de Deus do mesmo bairro, é uma senhora de meia idade e em7
 Embora a Pra Antonieta não possa ser assim denominada pela sua congregação religiosa, utilizarei o termo 
pastora para identificá-la dentro do grupo das mulheres que assumem o pastorado de igrejas. 
nada parece com as mulheres que caracterizaram as tradicionais Assembléias de Deus.
8
 Bem 
vestida, maquiada, usando adornos femininos, além de muito comunicativa, sua pregação não 
difere das pregações dos seus colegas pastores. No entanto, a pastora Antonieta não pode ser 
assim denominada porque, como ela mesma justifica: 
 
“Pela Assembléia de Deus, a nossa convenção, ainda não consagra pastora. Eu posso 
exercer um ministério, mas eu estou debaixo da missão de um pastor convencional, que dá 
todos os ensinamentos, que dá a cobertura espiritual, estou sob a administração dele. Então, 
eu sou uma obreira do campo, exerço uma liderança espiritual dentro do Ministério da 
Assembléia de Deus da Penha, mas esse título, pastora, as assembléias de Deus não dá. Eles 
consagram missionárias, obreiras, mas não como pastoras. As pessoas (membros) me 
chamam de pastora por causa da função que eu exerço. Exerço praticamente todas as 
funções de um pastor. Só não batizo e não sirvo a Santa Ceia, porque não é autorizado. 
Servi ceia é uma tarefa só para os diáconos homens.” 
 
Vemos assim, na tradição das Assembléias de Deus, a divisão de funções 
estabelecida pelos líderes, que justificam na diferença entre os sexos a proibição às mulheres 
de determinadas funções. 
 
A Bíblia: A Palavra de Deus e autoridade absoluta. 
 
Rubens Alves (1979) em “Protestantismo e Repressão” mostra a importância da 
Bíblia para o fortalecimento da fé dos protestantes. A Bíblia é a “Palavra de Deus”. 
Imutável. Não é possível acrescentar, contradizer ou diminuir o que Ele já disse no passado. 
Assim, a vida de todo crente é controlada por este texto. O perceber, o querer, o pensar e o 
agir de cada fiel está subordinado ao que está escrito. Segundo o autor, a Confissão de 
Westminster feita por Lutero, confirma o poder absoluto da Sagrada Escritura. Os 
protestantes se vangloriam pelo fato de terem sido eles que inauguraram o direito ao “livre 
exame” das Escrituras Sagradas, pelos fiéis. 
 
“A leitura da Palavra de Deus, com livre crítica é privilégio de Protestantes, 
especialmente. O livre exame das Escrituras é fruto abençoado da Reforma. Deus, 
através do texto, fala diretamente ao coração. Por isso cada um tem o direito de examinar 
livremente a Bíblia Sagrada” (Alves, 1979:111) 
 
 
8
 A Assembléia de Deus pertence à primeira onda do pentecostalismo, na definição de Freston. Entre suas 
características, o rigor em áreas como vestuário e embelezamento feminino. Até pouco tempo, as mulheres das 
Contudo, Alves aponta para um problema do “livre exame”: a livre interpretação e 
a diversidade, em conseqüência, de interpretações, produzindo cismas entre os evangélicos. 
Daí a necessidade do Protestantismo criar um sistema de doutrina ensinado nas Sagradas 
Escrituras: As Confissões. Diz o autor: 
 
“O conhecimento, para o protestante, começa com o ato de submissão a um texto de 
proposições verdadeiras, absoluto, que contém a verdade do tempo e a verdade da 
eternidade. A fim de preservar o caráter absoluto do conhecimento, acima de toda a 
dúvida, interdita-se o exercício da consciência interpretativa e da razão crítica, por meio 
de uma confissão que se torna no critério final para a leitura do texto sagrado” (Alves, 
1999:112) 
 
Um mínimo de concordância, portanto, na interpretação das Escrituras, é preciso 
para que elas sejam referências para todos os grupos evangélicos. 
Sánchez & Ponche (1996) apontam a Bíblia como base para que religiosos como, 
São Tomás de Aquino, São Boaventura e São Alberto Magno encontrassem o substrato da 
natureza feminina, considerando a mulher como a própria encarnação da maldade e do 
pecado. 
Cecília Mariz & Maria das Dores Machado (1997) analisam a Bíblia como uma 
semente de institucionalização, na medida em que é considerada como única fonte de verdade 
e que define quem pode pertencer ou não ao grupo. Neste sentido não é possível romper 
com as verdades bíblicas, mas pelo contrário, deixá-las de lado é correr o risco de não estar 
devidamente legitimado para exercer qualquer tipo de atividade dentro do grupo. 
As mulheres, portanto, não podem abandonar as “verdades” e nem ignorar o peso 
que elas têm, mas tentam redefinir suas vidas e suas posições a partir de novas interpretações 
que fazem de passagens que consideram ambíguas. O exemplo disso é a própria carta do 
apóstolo Paulo quanto ao papel da mulher na igreja e a tentativa que as pastoras fazem, de 
contextualizar suas interpretações sem cair no risco de negá-las, pondo em perigo aquilo que 
as legitima enquanto uma líder religiosa. 
 
 
 
 
 
Igrejas Assembléias de Deus não podiam usar nenhum adorno ou tipo de pintura (Freston, 1996). 
O confronto com as Escrituras – A desigualdade legitimada 
 
A oposição ao ministério feminino é argumentada com base na Bíblia. 
Oponentes, freqüentemente, argumentam que a Bíblia impossibilita uma abertura para as 
mulheres assumirem o pastorado. Embora os reformadores tivessem afirmado um sacerdócio 
universal dos crentes e, portanto, estes não estando sujeitos a ninguém, as mulheres foram 
deixadas de fora e continuaram submissas ao homem, exercendo seus serviços domésticos, 
mantendo-se assim fora da liderança eclesiástica (Niemelä & Salonen, 2001 e Sánchez & 
Ponce,1996). 
 Embora considerem que alcançar o pastorado feminino é legitimo porque diz 
respeito à pregação do evangelho, as pastoras chamam a atenção para a questão da submissão 
no âmbito do casamento. A submissão ao marido é acatada por todas as pastoras. 
De acordo com as pastoras há na Bíblia uma certa desigualdade entre homens e 
mulheres que precisa ser acatada pelas mulheres. No entanto, o que elas reivindicam é um 
espaço que consideram seu, na medida em que Deus as capacita para exercerem o ministério, 
tanto quanto ao homem. Elas não pretendem um rompimento, muito menos um conflito entre 
seus pares. 
Biblicamente, as diferenças que opõem homens e mulheres identificam uma 
especificidade da mulher que, para algumas pastoras, é legitima. Por exemplo, cuidar da casa, 
dos filhos e do marido está em primeiro lugar porque é bíblico, e é um trabalho, segundo elas, 
caracteristicamente feminino. Essa aceitação demonstra acatamento a um discurso religioso, 
impregnado na prática cotidiana das mulheres, e de difícil rompimento. Às mulheres (mesmo 
pastoras) cabe a responsabilidade da casa, do cuidado dos filhos, da educação religiosa, da 
submissão, da docilidade, enquanto ao homem, o sustento material da família. 
O ministério pastoral, porém, de acordo com as pastoras é um dom de Deus 
concedido a todo e qualquer fiel. Segundo a pastora Tânia, da Igreja Cristã Internacional 
Ebenézer, Deus instituiu esses dons para quem ele quisesse e estivesse disponível. Para ela, 
as mulheres estão muito mais disponíveis do que os homens e por isso Deus está usando-as 
neste momento para pregar o evangelho. Revelando assim, que há uma permissão para que as 
mulheres exercem o pastorado, apenas na medida em que faltam homens para exerce-lo. 
 
“Temos pedido para que Deus levante mais liderança masculina. E acho que Deus tem 
levantado mulheres porque os homens têm se omitido. Muitos homens esqueceram de 
Deus, abandonaram Deus, você vê isso nas reuniões de oração, a maioria é mulher. 
Como Deus vê isso, não está nem aí para este tipo de coisa, está muito além, Ele usa 
quem tem se colocado à disposição. Então quando Deus viu que as mulheres estãomuito 
mais disponíveis para Ele, Ele levantou as mulheres para pregar. Jesus veio exatamente 
para isso, quando percebeu que a mulher estava apagada ele veio e levantou a mulher. Eu 
creio que hoje Deus está levantando as mulheres, o desejo de Deus era que os homens 
funcionassem.” 
 
Machado & Mariz (1997) já haviam percebido isto em um estudo realizado sobre 
as mulheres e as práticas religiosas. Segundo as autoras, ainda que as mulheres sejam em 
maior número, na maioria dos grupos religiosos não alcançam postos de liderança com 
facilidade, e quando os alcançam é quase sempre pela ausência de homens para fazê-lo. 
Segundo as mulheres entrevistadas por elas, os homens estariam muito mais preocupados com 
outras questões do que com os trabalhos da igreja, e desta forma Deus estaria levantando as 
mulheres para fazer o trabalho dos homens. 
Assumir o pastorado de uma igreja acrescenta mais uma jornada de trabalho às 
atividades das mulheres. Além do cuidado da família soma-se agora o cuidado da igreja, 
como nos revela o exemplo a seguir: 
 
“Sobrecarrega. Fico ligada 24 horas na igreja. Fico na igreja até meia noite e depois da 
meia noite nem consigo dormir direito. Porque tem a parte sua, pessoal, família e ainda 
outras coisas da igreja, porque você fica ligada. Tem muitas campanhas, atividades nos 
fins de semana. Nunca pára. É uma luta constante com as trevas, luta espiritual. Porque 
tem muito ataque espiritual. Nós somos a coluna dentro de uma casa, e o inimigo quer 
derrubar essa coluna, abalando a coluna, ele consegue afetar o casal. Tem sempre que 
estar orando, jejuando para poder continuar todo tempo fazendo o melhor e feliz. Não 
existe algo de ruim, mas existe essa vida que a pessoa tem que estar preparada para 
assumir” (pra Néia) 
 
As mulheres sempre se colocaram como responsáveis pelo cuidado da família. 
Mas além da obrigação de cuidar da casa, se vêem na obrigação das iniciativas religiosas dos 
filhos, principalmente os homens, que poderão se tornar novos pregadores (Novaes, 1985; 
Burdick, 1998). 
Segundo a autora Rocha-Coutinho (1994) a educação foi uma função 
acrescentada pelos teóricos do século XVIII, e principalmente do século XIX, a partir das 
idéias de Rousseau. É este mesmo que escreve em Émile (1762): 
 
“Do cuidado das mulheres depende a primeira educação dos homens; das mulheres 
dependem ainda os seus costumes... Assim, educar os homens quando são jovens, cuidar 
deles quando grandes, aconselhá-los, consolá-los... eis os deveres das mulheres em todos 
os tempos” (Badinter, 1985 apud Rocha-Coutinho, 1994) 
 
A identidade da mulher com a maternidade a torna responsável pela geração e 
preparação de grandes homens para a liderança. As pastoras consideram uma dádiva e se 
sentem grandemente recompensadas por essa responsabilidade. 
Fernandes (1999) também verificou essa preocupação entre as católicas. “Ser mulher 
para as religiosas significa também contribuir para que os homens descubram o próprio 
lugar” (p.110), como coloca uma entrevistada por ela: 
 
“Se nós mulheres hoje, não ajudarmos os nossos companheiros a redescobrir o seu papel, 
o seu dom, o seu carisma, a sua vocação, a gente vai deixar escapar um momento muito 
importante de construção, juntos, da história. Porque eu acho que nós descobrimos, não 
sei, eu como mulher sinto que descobri. E é tão bom descobrir, o que sinto que não me 
incomoda o meu companheiro (padre) estar com ciúme de mim. Eu vou pra Comunidade 
e pra mim, estou livre diante dele, agora ele não está livre diante de mim. Então eu tenho 
que ajudá-lo a descobrir o caminho dele para que ele se sinta livre também e a gente 
possa trabalhar juntos como companheiros, não como...disputando espaço. Eu acho que 
não cabe mais nesse momento da História, uma disputa de espaço, sabe?” (Fernandes, 
1999:110) 
 
Esta seria uma compensação pela não possibilidade de exercer uma atividade que 
ainda é proibida às mulheres católicas. Sentir-se responsáveis pelos seus colegas padres seria 
uma tentativa de suprir essa ambição. Evitar um conflito entre companheiros e ajudá-los na 
execução de seus ministérios aproximam freiras, que não podem exercer o sacerdócio, de 
pastoras que ainda não são reconhecidas como tal em suas denominações. No caso das 
últimas temos um exemplo, que assim como as freiras justificam o seu ministério como algo 
que está para além da posse de um título. 
A pastora Antonieta, líder da Assembléia de Deus que, apesar de exercer uma 
liderança pastoral, não é considerada pastora, pela liderança da Igreja, coloca que o fato de 
não ser considerada como tal pelos seus líderes não tira dela o direito de exercer o ministério 
através do cuidado e preparação de seus líderes. Ela diz ter recebido uma revelação na qual 
Deus a chama para exercer um ministério com mulheres. Desde então, capacita mulheres 
para que estejam preparadas para educar homens. Segundo ela, cabe às mulheres preparar os 
homens “desde o ventre materno”. Deus teria dado às mulheres o privilégio da concepção, 
para que estas pudessem conceber e preparar os grandes líderes, que pregariam o 
Cristianismo. 
Esta postura também é seguida por muitas outras mulheres que não vêem no 
pastorado a única opção para as líderes religiosas. Vemos no exemplo a seguir a posição de 
uma líder batista contrária à ordenação feminina: 
 
“Enquanto os pastores cuidam do rebanho, nós mulheres, cuidamos deles e do rebanho 
também, exercendo uma firme e forte liderança, estando sempre alertas aos ataques e 
prontas para a defesa, sendo oásis de paz no deserto da vida (....). Não é desonra para a 
mulher, nem motivo de se envergonhar, o fato de reconhecer a autoridade masculina” 
(Vida Cristã, 4T/98:41) 
 
Igualdade X submissão 
 
As conquistas que vieram graças aos movimentos feministas não deixaram as 
igrejas imunes, mas as mulheres evangélicas precisam lidar com outro problema que é 
conciliar autonomia fruto da igualdade conquistada pelas mulheres nos movimentos 
feministas, e a desigualdade legitimada pelas Escrituras baseada, fundamentalmente, nos 
valores tradicionais religiosos que ainda são os fundamentos de fé dessas mulheres. O 
principal obstáculo que enfrentam é uma instituição fundamentalmente patriarcal cuja 
hierarquia não abre espaço, ou impossibilita que muitas mulheres alcancem a liderança 
máxima dentro das igrejas. 
E mesmo as que já conquistaram este espaço ainda são minoria na liderança de 
suas igrejas. Nas igrejas metodistas e anglicanas, por exemplo, ainda não há mulheres nos 
cargos mais altos da hierarquia da igreja, como o episcopado. Segundo as pastoras 
entrevistadas, das respectivas denominações, já houve candidatas, mas elas nunca 
conseguiram o número de votos suficientes para que assumissem o posto. 
Em pesquisas realizadas sobre os ministérios femininos
9
, em diferentes países, é 
possível perceber o mesmo impasse para a ascensão das mulheres. Uma hierarquia 
centralizada na figura masculina do pastor cristaliza o lugar e os papéis definidos para cada 
um. Assim, mesmo, quando há apenas um pequeno grupo contrário ao pastorado feminino, 
no exemplo da Finlândia
10
, os serviços eclesiásticos majoritariamente dirigidos pelas 
mulheres são aqueles em que são conselheiras ou professoras ou ainda, líderes de mulheres. 
Quanto aos pastores, os fiéis preferem que eles preguem, realizem casamentos, serviços 
 
9
 Ver também Niemelä e Salonen (2001), Sánchez e Ponce (1996), Tarducci (1994). 
10
 Em pesquisa realizada pelo casal Niemelä e Salonen, na Finlândia, a percentagem de opositores ao ministério 
feminino é de apenas 5%. 
funerais e mesmo batizem. Revelando assim, a força que tem a presença masculina nestes 
serviços. 
Apesar dos argumentos bem articulados apresentados pelas pastoras como formas 
de legitimarem a sua posiçãona hierarquia evangélica, permanece uma questão de difícil 
solução proporcionada pela dicotomia submissão e autoridade, na forma de antigos valores e 
crenças que levam em conta posições bem definidas para homens e mulheres no “trabalho de 
Deus”. Há um consenso por parte das mulheres evangélicas de que a mulher tem na 
hierarquia evangélica um lugar de submissão, principalmente ao marido. Essa submissão 
seria fruto da autoridade divina e, portanto, não questionada. Percebem uma diferenciação 
clara entre homens e mulheres e, portanto, ao reivindicarem o pastorado, sabem que 
encontrarão dificuldades por este motivo. 
Argumentam, no entanto, que quando se trata do ministério o que buscam não é 
autoridade sobre os homens. Querem exercer um trabalho que é delas também e de qualquer 
um que se envolve com o evangelho. Para elas Deus não faz acepção de sexo quando se trata 
de “salvar almas”. Chama quem está disponível. Portanto, quando estão em casa a submissão 
é ao marido, quando estão na igreja e são pastoras, possuem a autoridade ministerial que lhes 
é autorizada. 
Essas dificuldades nas igrejas com relação à liderança pastoral feminina não são 
diferentes das encontradas por todas as mulheres que buscam seus espaços em atividades só 
permitidas aos homens. No caso das pastoras, há uma tensão ainda maior quando passamos 
para o domínio do privado. Nos seus lares as pastoras não só se rendem à submissão aos seus 
maridos, como a aceitam enquanto mandamento presente nas cartas paulinas. 
Situação esta, porém, muito mais um problema da própria sociedade do que um 
argumento bíblico, segundo a pastora Eunice de uma igreja da denominação Metodista no Rio 
de Janeiro: 
 
“Somos submissas até hoje por causa da nossa própria sociedade. É mais cultural do que 
bíblico. Até hoje é o homem que manda nas casas; agora é que temos a liberdade de 
comprar e de vender coisas que até então não podíamos. Votar, por exemplo. Fazer 
crediário não podia porque tinha que ter assinatura do marido. Agora eu posso ter uma 
casa, a casa é minha, o carro é meu. Acho que é cultural, tanto na Bíblia quanto na 
sociedade” 
 
Se, por um lado, a submissão ao marido aparece como uma atitude que deve ser 
contextualizada culturalmente, o que podemos perceber é uma linha tênue e tensa que situa 
pastoras numa posição semelhante às de não pastoras. Elas parecem não dar conta de exercer 
na prática o que parecem não concordar na teoria, ou seja, há uma grande dificuldade em ser 
pastoras, autoridades máximas em suas igrejas e esposas obedientes aos seus maridos. 
No entanto, ao assumirem a posição de pastora, tentam estabelecer uma 
diferenciação entre os papéis a elas designados como os de mãe, esposa, e dona de casa e o de 
liderança pastoral, um novo papel que ainda está se ajustando às demais reivindicações 
femininas. 
Para as mulheres evangélicas, submissão é antes de tudo obediência, obediência a 
uma autoridade superior. Dentro de casa ao marido, fora de casa, ao pastor, a autoridade 
máxima dentro da igreja. Neste sentido, poderíamos perceber que, ainda hoje, muitas 
denominações continuam repetindo um discurso tradicional de uma diferenciação hierárquica, 
onde aos homens cabem os papéis de esposo, provedor e protetor, enquanto as mulheres 
devem ser frágeis, intuitivas, sensíveis, esposas e mães. 
Algumas igrejas continuam demarcando um espaço para as mulheres definido, a 
partir de uma identidade feminina construída ao longo do tempo. Essa identidade, como 
coloca a autora Rocha-Coutinho (1994), vem sendo marcada sempre pela fala masculina. 
Desde a infância as mulheres foram educadas para serem donas de casa, enquanto que os 
meninos são educados para serem maridos que sustentarão seus lares. Desde o início, homens 
e mulheres são criados de forma diferente e, portanto, passaram a agir, pensar, se comportar, 
falar e até discutir de forma diferente. Às meninas a docilidade, aos meninos a competição. À 
mulher foi determinado o espaço privado, a casa. É, portanto, benefício para a sociedade 
inteira quando ela assume os seus papéis de mãe, esposa e dona de casa. Para a autora foram 
as instituições do sexo e da família que teceram as malhas da dominação entre os sexos mais 
adequadas aos modos de produção e organização social específicos a determinado tempo da 
sociedade. Sendo assim, as formas de subordinação das mulheres foram mudadas ao longo do 
tempo, não sendo, no entanto supridas as diferenças, onde ainda se coloca a mulher sempre 
em atividades e posições inferiores em relação aos homens. 
Este mesmo argumento é compartilhado pela historiadora Michelle Perrot (1998). 
Para ela, as mulheres do século XIX tinham um relativo consentimento de que os homens 
deveriam ocupar os espaços públicos, da política, do discurso, enquanto a elas caberia o 
espaço privado, mais compatível com sua sensibilidade e docilidade. Quando, porém, as 
mulheres começam a ter acesso ao espaço público percebe-se imediatamente uma clara 
distinção entre os sexos definindo papéis femininos e masculinos. Disciplinas na área da 
saúde e da educação foram mais acessíveis do que arquitetura, filosofia e matemática, 
consideradas carreiras de domínio masculino e, portanto, hostis às mulheres. 
Percebemos, então, que de um modo geral as pastoras aceitam a submissão apenas 
aos maridos. Nesta forma é uma submissão considerada bíblica e deve ser seguida, embora 
através dos seus discursos percebamos uma tentativa de equilibrar essa submissão com a 
autoridade pastoral, principalmente quando o seu cônjuge não é pastor ou mesmo evangélico, 
como vemos nos depoimentos a seguir: 
 
“Submissão, nisto eu concordo. Aqui o meu pastor é o meu marido. Eu sou pastora 
auxiliar dele, não sou titular. Se eu for fazer algo que eu sei que é bom para a igreja, que 
eu sei que vai dar certo e levo até ele, e ele diz que não vai dar certo, não é bom. Mesmo 
que seja bom, que vai dar certo, eu ouço o que ele está dizendo. Então eu não vou fazer 
porque ele é o meu pastor, se eu fizer vou estar desobedecendo ao meu pastor e não ao 
meu marido, mas ao meu pastor, que depois também é meu marido, mas meu marido ele é 
lá em casa, aqui ele é meu pastor. Temos que ser obedientes? Sim tem que ter autoridade. 
Submissão, deve ter com comunhão.” (Pra Néia) 
 
“Submissão, eu acredito na submissão, uma submissão com raciocínio, não cega. A 
submissão cega traz a destruição. A submissão, desde que seja no Senhor, desde que o 
homem esteja com Deus. Submissão, só no Senhor. Sou submissa ao meu marido 
enquanto ele está de acordo com a palavra de Deus, porque está escrito amai a Deus sobre 
todas as coisas, e se eu vou deixar de servir a Deus para obedecer a uma coisa que está 
contrária à vontade de Deus, então eu estou desobedecendo a Deus, e não se pode servir a 
dois senhores” (Pra Leni) 
 
Para dar maior consistência às suas reivindicações a maioria das pastoras 
entrevistadas citou uma personagem do Antigo Testamento chamada Débora como ícone da 
liderança feminina e representante, para as pastoras, de uma mulher escolhida por Deus para 
liderar os homens de sua época. 
A época é o período dos Juízes, dias em que Jeová suscitava homens, os chamados 
juízes, para reinar sobre os Israelitas. Cada vez que havia pecado, castigo e desobediência, 
um juiz se levantava para redimir o povo e manter a paz. Os povos inimigos haviam invadido 
Israel e mantinham em seu poder os filhos de Israel. Surge, então, Débora, juíza e profetisa, 
usada por Deus para avisar a Baraque, líder local, sobre a guerra contra o inimigo. Dizem as 
Escrituras que Baraque se manifestou contra ir ao front de batalha sem o auxílio de Débora, 
que por sua vez consentiu em acompanhá-lo, mas reivindicando a honra da ocasião para si, 
enquanto mulher e “mãe de Israel”. Débora saiu vitoriosa, e tornou-se, assim, o exemplo de 
uma autoridade feminina presente naBíblia e que demonstra que Deus não faz acepção de 
sexo, como nos colocam as pastoras Antonieta e Rita: 
 
“Porque mulher não pode usar de autoridade sobre o homem” se ela não estiver na posição 
de autoridade. Porque no Antigo Testamento, Débora estava na posição de autoridade e 
exerceu autoridade como homem e disse para ele, ainda que você não creu, eu irei contigo 
para a batalha. Mas a vitória não virá pela mão do homem, mas pela mão da mulher, e no 
caso a honra será da mulher, quer dizer ela exerceu autoridade, certo? No Antigo 
Testamento um período, aonde, nós vimos, não havia tanta abertura para isso.” (Pra 
Antonieta) 
 
“No Velho Testamento Deus colocou a Débora, 4ª juíza para julgar Israel. Que coisa 
tremenda. Até os homens daquela época concordaram, que se Débora não fizesse eles não 
fariam. (Juizes 4). O que acontece, então? Deus é o mesmo Deus de ontem e de 
eternamente. Se ele naquela época colocou uma mulher para julgar a Israel, ele hoje não 
discriminaria uma mulher também. Portanto, há homens espirituais e mulheres 
espirituais. 
A nossa vida é diferente do mundo. No mundo todo mundo decora para falar. Aqui não, 
aqui nós temos unção. Quantas mulheres você vê com unção. Quem dá unção para falar 
é Deus. Então se Deus derrama unção sobre quem está pregando, quem somos nós para 
dizer não, porque não deve? Então, o homem tem muito isso de machismo. Deus não 
diz em nenhuma parte que mulher não pode pregar, nenhuma parte.” (Pra Rita) 
 
O ministério pastoral então, tanto para homens quanto para as mulheres seria uma 
resposta a um “chamado” divino. Mas no discurso da pastora Tânia aparece como uma 
responsabilidade muito mais masculina. Deus estaria dando muito mais preferência aos 
homens, optando pelas mulheres apenas quando aqueles não fizessem o trabalho. 
 
“Temos pedido para que Deus levante mais liderança masculina. E acho que Deus tem 
levantado mulheres porque os homens têm se omitido. Muitos homens esqueceram de 
Deus, abandonaram Deus, você vê isso nas reuniões de oração, a maioria é mulher. Como 
Deus vê isso, não está nem aí para este tipo de coisa, está muito além, Ele usa quem tem 
se colocado à disposição. Então quando Deus viu que as mulheres estão muito mais 
disponíveis para Ele, Ele levantou as mulheres para pregar. Jesus veio exatamente para 
isso, quando percebeu que a mulher estava apagada ele veio e levantou a mulher. Eu creio 
que hoje Deus está levantando as mulheres, o desejo de Deus era que os homens 
funcionassem.” (Pra Tânia) 
 
“Então, essa irmã que tem um chamado, mas está em um lugar onde não está 
correspondendo com aquele chamado, ela tem que orar a Deus e procurar se identificar 
nesse chamado. É lícito que a mulher pregue, se não fosse assim tantas mulheres cristãs 
hoje não estariam à frente do trabalho, como grandes nomes que nós temos, como a bispa 
Sonia, e muitas outras que ficam a frente do trabalho, porque o marido está doente. 
Outras que estão à frente de um trabalho mundial porque tem um chamado mundial. Deus 
opera através das mulheres. Se Deus não fosse de acordo, não estaria operando, ele se 
ausentaria ali no momento da oração. Então, é assim, essas leis que proibiam a mulher de 
falar, de ensinar, essas leis foram abolidas por Jesus, quando ele morreu na cruz, nisso foi 
rasgado o véu que separavam homens e mulheres de Deus.” (Pra Néia) 
 
No segundo exemplo temos uma posição mais decisiva de que homens e mulheres 
foram chamados para o mesmo ministério. E deixa claro que é a partir de Jesus Cristo que 
este mandato é mais evidente. 
As pastoras tentam justificar e encontrar uma base bíblica para que possam 
assumir as lideranças de suas igrejas demonstrando claramente o preconceito que permeia o 
ambiente de disputa entre homens e mulheres ao ministério pastoral. E a conquista deste 
espaço parece se dá na capacidade de negociação entre os atores desta relação. 
Guacira Lopes Louro (1999) percebe na análise de Foucault sobre o poder, um 
referencial teórico onde é possível analisar que os sujeitos exercem o poder como “manobra”, 
“técnica” e “disposição” para resistir ao dominador, assumindo a perspectiva de que precisa 
haver liberdade para que se exerça o poder e a revolta a esse poder. Utilizar o poder numa 
perspectiva de negociação não significa que não haja um poder hegemônico (do masculino e 
patriarcal) que subordina o outro, mas que este também, através de manobras não se anulam 
enquanto sujeitos, pelo contrário, através de negociações resistem a este poder. 
O pastorado conquistado pelas mulheres se não aparece como uma conquista 
efetiva (o domínio total do exercício do ministério), pode ser visto como uma conquista na 
base da negociação entre aquele que tem o poder (a igreja enquanto instituição) e entre 
aqueles que exercem o poder (os pastores), ou seja, a forma como se exerce o ministério 
pastoral é menos importante do que exercê-lo. Isto quer dizer, por exemplo, que se uma 
mulher pode chegar ao pastorado, mas não pode exercer o ministério reconhecidamente pela 
denominação, como é o caso da pastora Antonieta, não significa que ela não esteja exercendo 
um poder (conferido pelo cargo), mas que este é plenamente negociado, como podemos ver 
em seu argumento: 
 
“Olha, eu sou considerada, não sou consagrada, não sou ordenada. Eu sou considerada 
pastora, todos me respeitam como tal. Eu compreendo, porque nasci dentro das 
Assembléias de Deus. Existem regras que foram passadas desde o principio da 
congregação e que ainda não foram desfeitas. Então, os pastores vêm respeitando isso, 
embora já haja uma abertura para as mulheres em todos os estados, em todas as 
convenções. Se alguns fecham um pouco a porta por outro lado a porta está aberta para as 
mulheres, ela pode ser uma missionária, ela pode cantar, orar, dirigir circulo de oração, 
pode evangelizar, ungir, existe um trabalho para as mulheres dentro das Assembléias de 
Deus que título, rótulo pastora não faz diferença se ela for sábia, humilde, espiritual, 
obediente.” 
 
A relação com a família na divisão das tarefas 
 
Max Weber, em Psicologia das religiões (1991) considera que “é uma 
característica da religiosidade dos negativamente privilegiados a admissão das mulheres 
com os mesmos direitos” (p.333). Desta forma aponta para a impossibilidade das mulheres 
exercerem os postos mais altos, na hierarquia religiosa, a não ser que pudessem ser tão 
qualificadas quantos os homens para os cargos. Esta dificuldade era encontrada na medida 
em que apenas os homens podiam tornar-se sacerdotes legítimos na intermediação entre fiéis 
e Deus e para tanto buscavam o conhecimento nas instituições de ensino religioso negado às 
mulheres. 
Ainda nos escritos de Weber podemos perceber o lugar da mulher na religião: 
 
“A influência feminina costuma intensificar somente os aspectos emocionais, 
histericamente condicionados, da religiosidade. Mas certamente não é indiferente que a 
religiosidade de salvação costume glorificar as virtudes não-militares e antimilitares, o que 
constitui uma tendência natural das camadas negativamente privilegiadas e das mulheres.” 
(p.334) 
 
 
Corroborando com a tese de Weber, alguns estudos apresentam a mulher mais 
sensível à religião em função da “natureza feminina” de docilidade e fragilidade. Dedicadas 
aos mais frágeis e aos trabalhos sociais, as mulheres sempre exerceram na igreja atividades 
realizadas em casa. 
Nas últimas décadas, no entanto, as mulheres, principalmente aquelas mais 
envolvidas com o seu grupo religioso, começaram a reivindicar mais autonomia e poder para 
exercer suas atividades, até então limitadas pela hierarquia de suas instituições. 
Sendo assim, identificar as pastoras com as mulheres das quais fala Max Weber 
talvez não seja mais possível, embora se possa perceber certos traços que possam 
correlacionar algumas denominações com as declarações dealgumas mulheres e a diferença 
no modo de negociar liderança pastoral e serviços domésticos. Consideradas como igrejas 
dos pobres e das mulheres, pela ênfase, principalmente ao emocional, são nas igrejas 
pentecostais e neopentecostais onde se encontra a maior concentração de pastoras auxiliares e 
submissas a algum tipo de liderança, seja ao marido pastor, seja ao pastor líder da 
denominação o que pode corroborar a perspectiva de Weber de uma igreja mais voltada para 
as camadas desprivilegiadas e mais femininas. 
As pastoras neopentecostais titulares, no entanto, possuem uma postura 
diferenciada de suas colegas auxiliares das igrejas da mesma linha. A desenvoltura para lidar 
com essa dicotomia parece estar na própria diferenciação entre os dois grupos. A titularidade 
conquistada pela fundação das próprias igrejas e a dedicação exclusiva a estas, os filhos já 
adultos e casados, fazem com que as pastoras líderes negociem com suas famílias a divisão 
dos afazeres domésticos. O mesmo acontecendo com as pastoras líderes das igrejas 
históricas, que com a exceção da Igreja Batista, já têm uma tradição mais antiga de ministério 
feminino, como vemos nos exemplos a seguir, onde ambas as pastoras são casadas: 
 
 “Dentro da igreja eu sou a pastora, cuido do rebanho, prego a palavra, oriento, o lado bem 
espiritual mesmo. Quando eu vou para a minha casa, aí eu sou dona de casa. Cuidar da 
roupa....Quando eu vou para casa tenho que ser uma dona de casa, mãe, esposa, cuidar da 
casa, uma mulher normal como as outras. Só que não deixo de ser uma pastora dentro de 
casa, tenho que estar falando de Jesus, sempre dando força. Eu considero que nós somos a 
coluna de um lar, porque se você não está bem, o esposo também não está bem, a filha 
também não, então temos que sempre estar fortes, mesmo quando não estou bem, tenho 
que demonstrar que estou bem. Porque eu sou a que segura mais, a que mais fica a frente 
deles com relação a transmitir uma palavra de confiança, eu que puxo para que todos 
venham atrás de mim, então dentro de casa, é este o tipo de pastora. E na igreja eu 
procuro orientar mais as mulheres, atendimento mais com as mulheres, estou procurando 
passar sobre isto, que elas são uma coluna que sustenta a família, tanto é que Deus deixou 
bem classificado isto: que a mulher sábia edifica a sua casa, e edifica tudo. Então, esta é a 
minha missão que eu tenho tentado passar para as pessoas, principalmente em relação às 
mulheres” (Pra Neia, auxiliar neopentecostal) 
 
Embora a preocupação com a família esteja presente em todas as falas das 
pastoras, uma dedicação mais exclusiva aparece quando os filhos são menores e quando estas 
pastoras são auxiliares, não dedicando todo o tempo aos trabalhos religiosos. Um tempo mais 
integral aos trabalhos da igreja faz com que as pastoras busquem o auxílio da família e mesmo 
de outros amigos, vizinhos ou ainda, dos “irmãos” em Cristo. 
 
“Eu concordo com a divisão de tarefas. É o que eu prego na igreja. Se você é sustentada 
pelo seu marido, você tem que fazer as coisas pra ele. Não pode ficar sentada. Ele 
trabalha lá, providencia o dinheiro, o sustento pra sua família, e você fica em casa 
administrando, cuidando da casa, economizando. E se os dois trabalham? De repente tem 
(o homem) que ajudar a lavar as louças, cuidar do neném, porque ela está ajudando a 
pagar as contas, eu acho que tudo isso tem que ser juntos. Quando Paulo fala das 
obrigações do marido, fala que ele tem que amar a esposa igual Cristo amou a Igreja, 
morrer por ela. Se o meu marido “morre” por mim, eu vou obedecer, se não...Se ele está 
morrendo por mim, faço tudo que ele quer, ta morrendo por mim. É uma norma” (Pra 
Eunice, metodista) 
 
A conscientização de que o marido deve ajudar em casa está mais presente no 
segundo exemplo e aponta para o reconhecimento pelas mulheres da necessidade de divisão 
de tarefas quando o casal precisa trabalhar e dividir as contas. Além desta concepção há a de 
que a hierarquia entre homens e mulheres, existente na Bíblia, deve ser respeitada embora 
com a colaboração de ambos. Posturas estas, cada vez mais presentes na sociedade e que 
caracterizam as conquistas feministas do último século, mas que trouxeram uma sobrecarga às 
mulheres, uma vez que precisam conciliar trabalho e família. E, portanto, não é diferente para 
as pastoras como podemos ver no exemplo a seguir: 
 
“A gente tem que contar com a ajuda de várias pessoas. Quando eu vou para alguma 
reunião eu tenho que levar a filha, ou se dependendo do horário, eu tenho que buscá-la na 
escola, sair da reunião e depois voltar. Eu tenho que contar com as pessoas que ficam 
com ela, que tomam conta; temos que contar com a boa vontade, porque o ministério da 
igreja é integral, mas a gente não deixa de ser mãe, mulher, nem esposa. Nós temos 
compromissos juntos. Ás vezes ele fica com ela, eu fico quando ele tem compromisso. 
Tanto o marido como outras pessoas ajudam. Dando atenção à família, a gente também 
testemunha” (Pra Inamar, Anglicana) 
 
Todos esses contratempos indicavam o universo das pastoras. Conciliar ministério 
e vida familiar. Ser uma líder espiritual e estar atenta à família ao mesmo tempo. Tarefa nem 
sempre fácil, mas possível de ser realizada quando se coloca o “amor à obra de Deus” em 
primeiro lugar, como várias pastoras justificaram. E para que tudo saia perfeito é preciso 
antes de tudo, administrar o tempo, como nos coloca a pastora Antonieta: 
 
“Tudo na vida depende de administração. O tempo é igual para todos, a diferença está em 
você administrar esse tempo, para que você tenha tudo realizado no tempo próprio, e para 
a glória de Deus. Eu sirvo a Deus desde antes de me casar, e já estou com mais de trinta 
anos de casada, e os meus filhos não foram embaraços para mim, servir a Deus e nem para 
a minha vida profissional; nem vida profissional, nem vida espiritual. Sou professora de 
seminário, no momento não estou exercendo, porque ano passado eu pedi o meu 
afastamento uma vez que a igreja me absorve muito, com os trabalhos. Mas eu sou uma 
empresaria, tenho uma firma, tenho casa, tenho filhos, tenho marido e eu divido o tempo 
para cada coisa. Eu tenho tempo para o meu marido, para a minha casa, para o meu 
trabalho, para a minha igreja. Eu tenho tempo para o servo de Deus, e tenho tempo para 
responder uma entrevista com você que está aqui. Eu penso que tudo é uma questão de 
administração. Quem dorme até meio-dia, não tem condições de dar conta dos seus 
compromissos, mas se você tem uma vida regulada, levanta na hora certa e põe a vida em 
ordem numa agenda, você vai cumprir aquilo que você tem vontade, força de vontade para 
fazê-lo e saber exatamente aonde quer chegar.” 
 
Quando a família compartilha a mesma fé, pode colaborar e assim as atividades 
eclesiásticas e domésticas recebem o apoio e ajuda de todos. 
 
“E mais fácil quando o outro é pastor, pois sempre estão em consagração, sempre com o 
mesmo propósito de estar na igreja, a programação é sempre a mesma. Quando vamos 
sair, sair sempre é ir para a própria igreja. Tudo é evento de igreja. Quando acontece de 
algum não ser. A esposa que ir para algum lugar e o marido quer ir para igreja, há sempre 
briga. Quando os dois são da obra, é tudo mais tranqüilo, mais feliz. Há sempre um 
namoro, voltamos para casa juntos.” (Pra Néia) 
 
“Eu e meu marido temos uma afinidade. Geralmente o que a gente faz é sempre em 
conjunto, tudo. Às vezes eu estou procurando um hino para o conjunto e ele está 
preparando uma mensagem com o mesmo tema. Espiritualmente estamos ligados, por 
isso é que dá certo. O espírito fala aos dois. E inclusive eu trabalho com ele. Ele tem um 
escritório em casa, é autônomo, então eu trabalho com ele. Passamos o dia juntos”. (Pra 
Lídia) 
 
As pastoras mostraram pouca diferença em relação às demais mulheres que tentam 
conciliaratividades domésticas com o trabalho profissional, o que indica a continuidade 
histórica que coloca a mulher como a única responsável pelo lar, exercendo o seu papel de 
dona-de-casa, onde o homem se coloca sempre como um ajudante e nunca também 
responsável pelos afazeres domésticos, como nos aponta Rocha-Coutinho (1994). 
 
“Na prática (....) o que se pode observar é que a „nova‟ identidade atribuída à mulher 
apenas se ampliou para incluir, também seus novos interesses com a carreira e a profissão. 
Ainda hoje continuam a ser enfatizadas, com o amplo reforço dos meios de comunicação, 
suas funções de esposa, mãe e dona-de-casa.” (p.119) 
 
Ser mulher e ser pastora 
 
A identificação da mulher com a religião cristã foi sempre considerada como fazendo 
parte da subjetividade feminina. Fragilidade e docilidade identificam a mulher como 
propensa a abraçar uma determinada doutrina e passá-la à toda família. A educação religiosa 
dos filhos, por exemplo, era tarefa exclusiva da mãe. E considerando os estudos já realizados 
sobre este tema, podemos perceber que esta dedicação nem sempre é uma opção subjetiva, 
mas muitas vezes uma resposta a um apelo divino que se traduz em um “fazer a vontade de 
Deus” a uma chamada específica seja para qual for o ministério dentro da igreja (Burdick, 
1998; Novaes, 1985; Mariz & Machado, 1996). 
Segundo Silvia Fernandes (1999) a identidade feminina para as religiosas católicas 
é o ser mãe. Mesmo celibatárias, para essas religiosas, ser mãe se traduz em mulheres que 
amam e fazem o bem, que se dedicam de corpo e alma, abrindo mão de suas individualidade 
para cuidar dos outros. É estabelecido assim, um lugar para as mulheres. No caso do 
catolicismo, o exemplo para a dedicação ao celibato feminino é a Virgem Maria. Maria é o 
exemplo da obediência, na negação de si mesma e de dedicação exclusiva à vontade de Deus. 
O ideal católico transforma Maria em uma mulher desumanizada, que nega a própria 
sexualidade e na dedicação exclusiva aos outros passa a “ser mãe de todos” (Fernandes, 1999; 
Gebara, 1990/ 2000). 
O fato de as protestantes não terem por Maria a mesma devoção das católicas, 
talvez nos aponte para a diferenciação entre os dois grupos. Ao contrário das mulheres que 
entram para o Convento e têm que esconder ou cortar os cabelos, esconder as formas 
femininas, na adoção de novas formas de se vestir (Fernandes, 1999), as pastoras cada vez 
mais se apresentam muito bem vestidas, adornadas e expressam estar completamente à 
vontade com a sua feminilidade. Muitas, inclusive, apresentam programas ou têm dias 
específicos para falarem às mulheres de suas congregações assuntos diretamente ligados aos 
interesses femininos, principalmente com relação à família. Muitas igrejas inclusive já 
possuem em seus sites, páginas dedicadas apenas às mulheres, com dicas de beleza, saúde, 
sexualidade e vida espiritual. 
A Bispa Regina, da Igreja Aliança é um desses exemplos. Em seu jornal “A Hora 
da Aliança com Deus”, de maio de 2001, é feita uma chamada para o seu programa Aliança 
com Deus, de um dia especial dedicado a “transformação e salvação da família”: 
 
“Atualmente a mulher além de ser mãe, esposa, dona de casa, consegue também dedicar-
se à obra de Deus e com esse proceder, está ganhando almas para o Reino de Deu, pois 
desfrutando de tempos de liberdade e de atuação do Espírito Santo. Tempo esse que a 
Bíblia previu mas não teve como descrever. Isso significa que Deus não pára no tempo e 
a sua palavra acompanha a evolução do mundo. Se antes as mulheres não tinham uma 
posição em relação a obra de Deus, hoje o Espírito Santo vê nelas ganhadoras de almas e é 
nessa fé que a „Bispa‟ Regina e a Missionária Dircelene têm levado através do programa 
Aliança com Deus essa mensagem de fé e o Senhor Jesus tem feito maravilhas a todos o 
quanto ele tem alçando (sic).
11 
 
A questão da feminilidade não aparece como empecilho na reivindicação pelo 
pastorado, embora às vezes dificulte no contato com os fiéis, principalmente na hora do 
aconselhamento aos homens. As pastoras dizem ter preocupação quando os homens a 
“cantam”. Portanto, quando há outros pastores, elas preferem direcionar para que eles as 
ajudem. Já com as mulheres ocorre o contrário. Aquelas que vão na busca de um 
aconselhamento sentem-se mais à vontade em conversar com alguém que compartilhem das 
mesmas experiências, tais como questões sobre o casamento, namoro, sexualidade e educação 
dos filhos. 
Maria das Dores Machado (1997) já havia percebido isto em sua reflexão sobre as 
mulheres pentecostais e sua relação com a sexualidade. Segundo a autora, geralmente as 
mulheres buscam aconselhamento com os pastores e as questões mais ligadas à sexualidade e 
com problemas ginecológicos com as esposas dos pastores. 
Nos dois exemplos a seguir, as pastoras exemplificam o preconceito que parte dos 
próprios membros e que ainda não vêem nas mulheres a mesma autoridade eclesiástica dos 
pastores homens. Para as pastoras esta é uma situação que será revertida em pouco tempo, 
quando todos se “acostumarem” em ver nos púlpitos mais mulheres pregando. 
 
Existe sim (preconceito). A figura pastor homem é mais, vamos dizer o santo é maior (ri). 
Faz mais milagre, é mais milagroso. Mas isso também vai do entendimento do membro. 
Pois o membro que já está com o coração mais aberto, já está em Jesus, já é uma pessoa 
convertida, ele já não vê desta maneira, vê a pessoa como uma pessoa de Deus. Esta 
pessoa, quando o pastor está ocupado, aceita conversar comigo normalmente e acredita 
que Deus vai operar da mesma forma. Mas existem aquelas pessoas, bebês na fé, que 
chegam e vê o homem como um Deus, ele é poderoso, é ele que vai ensinar, ele que tem 
o milagre. Mas isso é normal para os que são pequenos na fé. Os fiéis já firmados não 
vêem assim. Ele te vê como uma mulher de Deus, e como eles já conhecem você, sabe da 
autoridade que você tem pregando, então ele respeita igualmente. Existem homens com 
más intenções que vem te pedir uma oração. Mas já é dito em microfone que procurem ao 
pastor. Quando homens me procuram, procuro passar para um auxiliar que seja homem 
também, porque muitas vezes essa pessoa vai se abrir, contar coisas íntimas e isso nunca é 
bom uma mulher tratar isso com os homens. A mesma coisa é o pastor homem com a 
mulher. Pede-se sempre, tratar-se com portas abertas, em ambiente que outras pessoas 
tenham acesso para que não haja comentários, tentações (Pra Néia). 
 
 
 
11
 O Programa Aliança Com Deus vai ao ar de segunda à sexta, às 15h30m na C.N.T. E a quinta-feira é um dia 
dedicado à família. 
O instinto materno da gente dá mais paciência, mais carinho. Somos mais detalhistas, as 
mulheres são mais detalhistas. Por exemplo, a igreja está enchendo de adolescentes, e eles 
me vêm como mãe, às vezes choram com questões como namoricos, me procuram como 
uma mãe. Recebo homenagens como mãe. E com os mais velhos, coroas, eu me vejo 
como filha. Elas me colocam como filhas delas, e digo que sou mulher igual a elas. Em 
vez em quando eu tenho de dizer “meu marido também é chato, aquela coisa de que eu 
faço as coisas que vocês fazem, eu também passo esses problemas com meu marido”. Aí 
eu consigo chegar próximo. Eu uso a doença (pólioartrite) quando os velhos vêm dizendo 
que estão com reumatismo; eu me identifico com eles, pois eu também tenho reumatismo. 
Às vezes ficam cuidando de mim, e não deixam eu fazer aquilo ou aquilo outro. Por causa 
desse instinto, você sempre chora junto, o homem é mais bruto. A vida dedicada ao 
ministério vale tudo: ver jovens animados, longe das drogas; ver as pessoas ajudando 
umas às outras. Quando eu não tenho dinheiro da gasolina vou de bicicleta porque eu sei 
que aquelas pessoas estão lá me esperando (Pra Eunice) 
 
Assim, na medida em queo movimento feminista deu às mulheres uma maior 
autonomia e reforçou a sua auto-estima, o estímulo a que as mulheres buscassem alcançar 
maior liderança e ascendesse aos cargos executivos só acessíveis aos homens, também chegou 
às igrejas. E embora, possamos verificar um certo conservadorismo (facilitado pela 
dificuldade em romper totalmente com ordem patriarcal ainda presente nas igrejas), o 
pastorado feminino é, para essas mulheres, um exemplo de conquista que já tinham um lugar 
demarcado e de difícil negociação, com uma hierarquia estabelecida pela liderança masculina 
dentro das igrejas. 
E é no discurso da pastora Valnice, da Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo que 
se funda e se legitima o pastorado feminino. 
 
“Deus criou primeiro o homem e depois a mulher que o completava, ordenando-lhes que 
se multiplicassem. Não existe, porém, qualquer palavra no relato da criação que insinue a 
superioridade ou governo masculino sobre a mulher. Toda a idéia é de dois parceiros que 
se completam, em pé de igualdade. Os dois são a imagem de Deus; os dois devem exercer 
domínio e autoridade e os dois devem obediência ao seu Criador” (pra Valnice, INSJC) 
 
Na sua fala é possível perceber uma semente de “rompimento” com a submissão 
apoiada na própria Bíblia, e assim abrir espaço para que as mulheres evangélicas assumam o 
pastorado de suas igrejas. 
 
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