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5 A leitura e a interatividade Citação “No fundo, todos temos necessidade de dizer quem somos e o que é que estamos a fazer e a necessidade de deixar algo feito, porque esta vida não é eterna e deixar coisas feitas pode ser uma forma de eternidade.” (SARAMAGO, José) O que é leitura? O ato de ler é essencial para o ser humano, pois, por meio das leituras que fazemos sobre os signos do mundo, construímos o nosso próprio repertório de significados e significantes e, a partir dos conhecimentos adquiridos, interagimos socialmente. A ação de ler é inata ao ser humano, realizada de forma involuntária. Iniciamos o aprendizado antes mesmo de ir para a escola: os sujeitos começam o processo de leitura junto à família. Ao entrar na escola, o aprendizado sobre a leitura torna-se sistematizado e ocorre um novo ciclo para o aluno, ou seja, um aprendizado de leitura normalmente marcada por uma leitura obrigatória, com um conjunto de perguntas e respostas, e focada na construção de conhecimentos conteudistas, muitas vezes sem compreender o quê e por que se lê. Nem sempre nesse momento há uma leitura prazerosa, de descobertas. A história da humanidade nos mostra que o ato de ler foi registrado por nós seres humanos. E, a partir desses registros, aprendemos, construímos e percebemos as realidades que nos cercam. Podemos considerar, ainda, que a prática de escrita e de leitura parte de uma sociedade letrada, com cultura e aspectos sociais próprios. Para muitos, o ato de ler é apenas um passar de olhos, um decodificar palavras ou uma ação. No entanto, a leitura em si ultrapassa essas fronteiras em diversos momentos, trazendo o leitor para novas realidades, diversos mundos, vários conhecimentos e desdobramentos da mesma realidade. Kleiman (2013, p. 13) comenta que, ao lermos um texto, colocamos em ação todo o nosso sistema de valores, crenças e atitudes que refletem o grupo social em que se deu nossa sociabilização primária, isto é, o grupo social em que fomos criados. Segundo Kleiman (2013, p. 36), as práticas leitoras estão relacionadas às conversas acerca dos aspectos relevantes do texto. As discussões em sala de aula, por exemplo, podem ampliar as percepções iniciais acerca de um texto e em relação aos temas propostos. E, em muitos momentos, agregam conhecimentos, ora para o professor, ora para o aluno, e, na maioria das vezes, para ambos. Para Freire (2005), a dialogicidade é a essência da educação enquanto prática de liberdade, em que a palavra encarna uma dupla dimensão: ação e reflexão, que, articuladas, constituem a perspectiva do diálogo. Nas práticas dialógicas em sala de aula, ocorre a troca de informações e, nesse momento, amplia-se o conhecimento inicial. • A prática da leitura significativa em sala de aula permite ao aluno criar a sua autonomia em relação ao mundo que o cerca, uma vez que trará a esse experiências, vivências de mundo e posicionamento crítico em relação à sociedade. • A leitura, como um processo cognitivo, está ligada à relação entre o sujeito leitor e o texto enquanto objeto, entre linguagem escrita e compreensão, memória, inferência e pensamento. Para Kleiman (2011, p. 14), os mecanismos observáveis no leitor proficiente são um reflexo de estratégias de ordem superior e são essas estratégias que caracterizam o leitor competente. No ensino da leitura, muitas estratégias não permitem a construção significativa do conhecimento; ao contrário, inibem a percepção dos aspectos relevantes ao texto. Com os condicionamentos da leitura no ensino, formam-se leitores passivos, não havendo a construção do sentido do texto, acomodam-se facilmente a essa situação. O leitor proficiente/especialista é capaz de depreender do texto as informações de que necessita para entendê- lo, assim como absorver as informações para a construção do conhecimento. O leitor proficiente está em interação constante com o objeto de leitura, ocorrendo o inter-relacionamento de diversos conhecimentos do sujeito, desde o conhecimento gráfico até o conhecimento de mundo adquirido no meio social. Kleiman (2013, p.76) comenta que o leitor experiente tem duas características básicas que tornam sua atividade de leitura consciente, reflexiva e intencional. Num primeiro momento, ele lê porque tem algum objetivo em mente, isto é, sua leitura é realizada sabendo para que está lendo; e, segundo, ele compreende o que lê, o que seus olhos percebem seletivamente é interpretado, recorrendo a diversos procedimentos para tornar o texto inteligível quando não consegue compreender. A compreensão do conceito da leitura nos remete à importância dela no contexto social, observando que a leitura é uma ação/ato. Nela existe uma relação de interação entre sujeitos, assim como a (re)construção de conhecimentos. Koch e Elias (2014, p. 11) comentam que a leitura ultrapassa a barreira do receptor passivo, pois exigem-se do leitor outras competências, como a enciclopédica, a linguística, a textual e a prática. • A leitura é, assim, um processo interativo. O desvendamento do texto se dá simultaneamente com a percepção de diversos níveis ou fontes de informação, interagindo entre si. • Precisamos estabelecer objetivos para a leitura, desencadeando estratégias para o ato de ler que nos permitam desvendar o texto, ocorrendo uma relação entre leitor e autor. Nesse processo de interação, poderá ocorrer convergências ou divergências de opiniões. Concebemos a leitura como uma construção de (re)significados, antecipando informações, (re)formulação de hipóteses ou mesmo aceitação ou rejeição de ideias. De acordo com Chartier (2011, p.13), as apropriações dos textos pelo leitor implicam sempre a consciência de que a possibilidade de leitura efetua-se por um processo de aprendizado particular de que resultam competências muito diferentes. Para cada indivíduo, o ato da leitura apreende-se de forma única, pois desencadeia no sujeito uma percepção sobre a leitura. Isto é, o mesmo texto, lido por pessoas diferentes, terá significados diferentes, uma vez que cada leitor é individual e possui diferentes experiências individuais que serão agregadas à ação da leitura. E, esse mesmo texto, lido pela mesma pessoa, em tempos distintos, também terá outro resultado. Ou seja, nunca lemos o mesmo texto da mesma forma. A ação desencadeada pela leitura em ambiente virtual requer do leitor navegador uma modificação das habilidades iniciais para a leitura. As estratégias para a realização da leitura devem levar em conta não só o ato de ler, mas observar o manuseio e o formato de cada material (CHARTIER, 2011). Para ocorrer o ato da leitura, existe a necessidade do gênero discursivo estar materializado num determinado suporte. Os suportes são, ao mesmo tempo, modos de transporte e de fixação dos gêneros discursivos, e interferem na construção do discurso. Para que ocorra a circulação do gênero na sociedade, existe a necessidade do suporte. Assim, para a formação do leitor, torna-se necessário aprender as estratégias que cernem os conceitos da leitura. •Ao tratarmos sobre a questão da interatividade por meio das mídias híbridas, devemos nos ater ao fato de que existe uma reapropriação e uma recombinação da mensagem, ocorrendo a modificação do gênero discursivo. •Para Marcuschi (2008, p. 174), o gênero é sempre identificado na relação com o suporte. O suporte de um gênero é um “locus físico ou virtual com formato específico que serve de base ou ambiente de fixação do gênero materializado como texto”. O autor considera que o suporte possui três características básicas: é um lugar (físico ou virtual), tem formato específico e serve para fixar e mostrar o texto. Existem dois tipos de suportes a serem considerados, sendo estes os convencionais e os incidentais. Os primeiros foram criados em função de portarem ou fixarem textos. Os segundos, por sua vez, podem ser chamados também de ocasionais ou eventuais e trazem textos, apesar de não serem destinados para a atividade comunicativa. Assim, ao realizarmos a leitura, devemos consideraro suporte em que o mesmo está inserido, uma vez que interfere diretamente no entendimento dos enunciados. Outro fator que interfere no aprendizado está relacionado à mudança do suporte, pois a leitura realizada no suporte livro é diferente da leitura no suporte computador. Para Elias (2015, p. 55), o suporte favorece a discussão sobre traços característicos da produção do hipertexto como dinamicidade, plasticidade, volatilidade, fluidez, liquidez ou incapacidade de manter a forma. Para Santaella (2004), o suporte interfere diretamente no papel que o leitor realiza no processo de leitura, pois o processo leitor requer habilidades cognitivas. Para a autora, existem três tipos de leitores, o contemplativo, o movente e o imersivo. O leitor contemplativo é aquele que tem diante de si objetos e signos duráveis, imóveis, localizáveis e mensuráveis (exemplo: livros, gravuras). O segundo tipo de leitor, o movente, surge junto com a publicidade do jornal e dos grandes centros urbanos, é um leitor de fragmentos, tiras de jornal e fatias da realidade. Um leitor que foi se ajustando a novos ritmos da atenção, um leitor apressado, de linguagens efêmeras, híbridas, e misturadas. O terceiro leitor, o imersivo/navegador, surgiu com a linguagem da hipermídia num estado de prontidão, conectando-se entre nós e nexos, num roteiro multilinear, multisequencial e labiríntico. Santaella (2004) comenta ainda que esses três tipos de leitores convivem na sociedade nos dias atuais, assim como não estão estáticos, pois estão aprendendo com as outras gerações e adquirindo novas formas de leitura constantemente. Leitura Hipertextual Segundo Coscarelli (2009), o hipertexto consiste em um formato textual marcado linguisticamente por links e/ou hiperlinks, os quais agem como elos de conexão/união com outros textos. Isso está em consonância com Xavier (2003, p. 283), que conceitua hipertexto como “tecnologia enunciativa que se atualiza no suporte digital e se interconecta instantaneamente com outros hipertextos on-line”. Dessa forma, a natureza constitutiva do hipertexto tem como marca essa perspectiva de articulação e junção com outros textos relacionados por algum aspecto. Na maior parte dos casos, essa relação é de cunho temático. No texto hipertextual, a distribuição da informação e o acesso do leitor ao texto irão adquirir novos formatos. Isto é, a informação não é materializada em um único texto. Com isso, o leitor sempre terá opção de outro construto textual (leia-se texto) relacionado à temática em tela. Ora, o leitor adentra em um dado texto, podendo a qualquer momento adentrar em outro construto textual subsequente, como defende Xavier (2003; 2010). Nesse ato, os links e/ou hiperlinks assumem papel de substancial relevância: os links instigam a passagem do leitor para uma sucessão de textos subsequentes. Os hiperlinks são estrategicamente construídos para levar o hiperleitor a lugares outros na rede. Lê-se um hipertexto navegando pelos textos verbais, imagens e figuras estáticas e dinâmicas nele ancorados. Ao abordá-lo, o hiperleitor pode lê-lo linearmente do início ao fim dentro de um mesmo site ou pode realizar desvios pelos hiperlinks, explorando as digressões. Os hiperlinks, espalhados pela superfície das páginas eletrônicas, estão prontos para serem acionados. Uma vez postos em operação, abre-se espaço virtual para o encadeamento da hiperintertextualidade que vai se enovelando até o infinito virtual (XAVIER, 2003, p. 285-286). Na ótica de Xavier (2003; 2010), o hipertexto traz consigo a diversidade de registros da linguagem. Ou seja, a linguagem verbal escrita, a sonora e a visual. Essa união/soma de formas da linguagem recebe o nome de multissemiose e/ou pluritextualidade. Diante dessa perspectiva, o hipertexto é um texto construído não só por intermédio de elementos alfabéticos como também de animações, arquivos de áudio e vídeos, galerias de imagens, ilustrações marcadas pela inércia e movimentação, gráficos, músicas e sons, entre outros elementos textual-discursivos. Para Xavier, essas novas marcas discursivas carreiam alterações no processamento textual e, por conseguinte, nos processos cognitivos de leitura. Aprofundando a discussão sobre o novo formato adquirido pela leitura em virtude do suporte hipertextual, Xavier (2010) evidencia que o texto hipertextual erradica a perspectiva da linearidade e da hierarquia textual. Isso se dá porque, durante o decorrer da leitura, o leitor irá se deparar com caminhos que o levarão a outros construtos textuais (leia-se textos). A leitura do texto impresso faz com que o leitor, na maior parte dos casos, siga a sequência e a hierarquia das informações, isto é, leia do início até o final do texto. No hipertexto, essa linearidade é erradicada, na medida em que o leitor pode a qualquer momento sair do texto e da leitura inicial, partindo para outra subsequente. E, para tal, é necessário apenas clicar em um dado link. Tal postura é o que Xavier (2010) conceitua como “leitura self-service”. Nesse ponto, é necessário abordar o papel do leitor na continuidade da leitura. Silva (2009) mostra que a condução da leitura é reflexo das escolhas e das opções efetuadas pelo leitor. Este irá especificar o roteiro e a trajetória da sua leitura. Ou seja, ao se deparar com a multiplicidade de links presentes na superfície do texto hipertextual, o leitor vai decidir como será o transcurso da sua leitura. Em um dado momento da leitura do texto inicial, o leitor opta por clicar em um link, o que vai propiciar sua passagem para outro texto e, consequentemente, para outra leitura. Essa escolha do leitor por clicar em determinado link especifica o percurso da sua leitura. Assim, o roteiro e a trajetória da leitura no suporte hipertextual é atribuição do leitor. Isso está em sintonia com Saldanha (2006), que conceitua essa perspectiva como “leitura eletiva”. Dalmaso e Mielniczuk (2012) aprofundam ainda mais o debate teórico acerca da leitura tendo como base o texto no formato hipertextual. As autoras demonstram que, em função do formato hipertextual, as informações materializadas no corpo do texto serão alongadas e ampliadas. Ainda que essa ampliação do fluxo informacional não aconteça em uma mesma página, a leitura do texto no suporte hipertextual é marcada por uma perspectiva de não fechamento e não finalização textual. Sendo assim, a leitura do texto hipertextual é pautada na “continuidade temática e textual”, em face das leituras subsequentes. Referências Bibliográficas CEREJA, W. R.; COCHAR, T. Texto e interação: uma proposta de produção textual a partir de gêneros e projetos. São Paulo: Atual, 2009. COSCARELLI, C. V. Textos e hipertextos: procurando o equilíbrio. In: Revista Linguagem em (Dis)curso, Palhoça-SC, v. 9, n. 3, p. 549- 564, 2009. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ld/v9n3/06.pdf. Acesso em: 16 set. 2017. DALMASO, S. C.; MIELNICZUK, L.. Hipertexto e linkagem: apontamentos sobre aspectos constituintes de uma linguagem digital. In: PERUZZOLO, A. C.; MAGGIONI, F.; PERSIGO, P. M.; WOTTRICH, L. H. (org.). Práticas e discursos midiáticos: representação, sociedade e tecnologia. 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