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Acessibilidade Cultural Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Prof.ª Me. Suellen Leal Revisão Textual: Prof.ª Dr.ª Selma Aparecida Cesarin Regulamentações e Debates Sobre a Acessibilidade no Campo da Cultura • Introdução; • Aspectos da História da Pessoa com Deficiência; • A Pessoa com Deficiência no Brasil; • A Lei Brasileira da Inclusão (LBI), Nº 13.146/15; • Os Jogos Paralímpicos no Brasil (2016). • Compreender a evolução das Leis e das Regulamentações dirigidas à Acessibilidade Cultural; • Conhecer dispositivos vigentes e obrigações a serem atendidas em eventos e realizações culturais; • Apresentar debates e casos relacionados à aplicação e às funcionalidades dessas Leis. OBJETIVOS DE APRENDIZADO Regulamentações e Debates Sobre a Acessibilidade no Campo da Cultura Orientações de estudo Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua formação acadêmica e atuação profissional, siga algumas recomendações básicas: Assim: Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e horário fixos como seu “momento do estudo”; Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo; No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam- bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados; Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus- são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e de aprendizagem. Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Mantenha o foco! Evite se distrair com as redes sociais. Determine um horário fixo para estudar. Aproveite as indicações de Material Complementar. Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma Não se esqueça de se alimentar e de se manter hidratado. Aproveite as Conserve seu material e local de estudos sempre organizados. Procure manter contato com seus colegas e tutores para trocar ideias! Isso amplia a aprendizagem. Seja original! Nunca plagie trabalhos. UNIDADE Regulamentações e Debates Sobre a Acessibilidade no Campo da Cultura Introdução Nesta Unidade, refletiremos sobre os dispositivos legais que asseguram o direito à Acessibilidade e vamos observar as transformações culturais que ocorreram no pensamento sobre a pessoa com deficiência e seus direitos. Vamos assinalar, também, importantes marcos na luta pela garantia dos direitos da pessoa com deficiência: legislações e regulamentações que estabelecem parâme- tros para a garantia desses direitos e criação de medidas de Acessibilidade. Por fim, vamos conhecer a LBI – Lei Brasileira de Inclusão e refletir sobre como os Jogos Paralímpicos de 2016, realizados no Rio de Janeiro, mobilizaram discussões acerca da Acessibilidade no Brasil. Aspectos da História da Pessoa com Deficiência A relação entre pessoas com deficiência e a condição de exclusão, reclusão ou assistencialismo pode ser encontrada em diferentes culturas e períodos da História. Salvas as exceções, ao longo de séculos, essa é uma realidade recorrente, que precisou ser enfrentada e, ainda hoje, segue como um campo de luta e de conquis- tas graduais. Em algumas culturas, como exemplo, na da Grécia antiga, há registros de que o nascimento de uma criança com deficiência era motivo para o seu abandono. Tal criança poderia, também, ser considerada como estigma, castigo divino, ou encarada como um peso para a família, que teria em sua constituição um ser inca- paz, portanto, eternamente dependente: Em Esparta e Atenas crianças com deficiências física, sensorial e mental eram consideradas subumanas, o que legitimava sua eliminação e abando- no. Tal prática era coerente com os ideais atléticos, de beleza e classistas que serviam de base à organização sociocultural desses dois locais. Em Esparta eram lançados do alto dos rochedos e em Atenas eram rejeitados e abandonados nas praças públicas ou nos campos. (MINISTÉRIO DA EDU- CAÇÃO SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL, 2008, p. 7) Infelizmente, ainda hoje, por vezes, é necessário que se crie a dissociação entre deficiência e incapacidade e entre deficiência e doença. A atual Lei Brasileira de Inclusão define a pessoa com deficiência como: “Aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou senso- rial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas” (BRASIL, 2015). 8 9 Foi a partir do século XIX, como reflexo das ideias de liberdade, igualdade e fraternidade difundidas pela Revolução Francesa, que começaram a se desen- volver novas formas de pensamento para o tratamento e o acolhimento da pessoa com deficiência. São criados asilos, abrigos, hospitais e centros de reabilitação para feridos de guerra. Nesse contexto, também tomam formas iniciativas que visam a repensar a pes- soa com deficiência na Sociedade e suas possibilidades de desenvolvimento. A par- tir de estudos e pesquisas realizados por diferentes pensadores, metodologias volta- das à Educação e ao desenvolvimento de linguagem são criadas. Desses trabalhos, destacam-se o trabalho precursor de Charles Michel de I’Épée (1712-1789) que, ainda no século XVIII (1755), foi responsável pela criação de uma metodologia de ensino e pela primeira escola pública para surdos. Também se evidencia o trabalho de Louis Braille (1809-1852), criador do siste- ma de escrita para cegos que até hoje tem seu nome, Braille. No entanto, foi somente a partir dos movimentos de reconhecimento e legitimação de direitos humanos, que ganham forças após o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), que foram conduzidos os processos que levariam à criação de dispositivos de regulamentação para a garantia da cidadania em condições igualitárias para todos os homens e, por consequência, da defesa dos direitos da pessoa com deficiência. Devemos lembrar ainda que a Segunda Guerra Mundial teve também como uma de suas consequências um grande número de mutilados: inúmeros soldados combatentes retornaram para casa com diferentes deficiências. De certo modo, tal fato trouxe visibilidade para a questão da deficiência e trouxe consigo a necessidade de medidas de adaptação, atendimento e integração dessas pessoas. Nessa época, desenvolveram-se muitos centros especializados em reabilitação, com destaque para os trabalhos do médico britânico Ludwig Guttmann, neurolo- gista e neurocirurgião inglês responsável pelo centro de reabilitação do Hospital Stoke Mandeville. Guttmann foi o responsável pela introdução do Esporte como meio de estimular e motivar seus pacientes, oferecendo-lhes meios de criação de trabalho motor, re- sistência física e autoconfiança. Nesse período, desenvolveram-se, também, as tecnologias de assistência e su- porte para a pessoa com deficiência e mecanismos antes já existentes foram aper- feiçoados, como, por exemplo, a tecnologia de próteses, a melhoria de bengalas e cadeiras de rodas. A associação entre Esporte e reabilitação evoluiu para pequenas competições desportivas e, em 1960, foram realizados os primeiros Jogos Paralímpicos da História, na cidade de Roma (Itália). Em sua primeira edição, participavam da competição apenas atletas cadeirantes, sendo que, somente a partir da edição de 1976, a participação de atletas com ou- tros tipos de deficiênciapassou a ser contemplada. 9 UNIDADE Regulamentações e Debates Sobre a Acessibilidade no Campo da Cultura Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo buscava modos de reconduzir as relações sociais e políticas em âmbito internacional. Nesse contexto, são criadas instituições internacionais como a ONU – Organização das Nações Unidas, a UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, o UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância e a OMS – Organização Mundial da Saúde. Essas Instituições foram responsáveis pelo encaminhamento de discussões e pela criação de dispositivos para a regulação das relações políticas e da garantia de direitos aos cidadãos. Em 1948, a publicação da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão apresenta os princípios que devem ser garantidos a todos os homens: Artigo VII – Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção con- tra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qual- quer incitamento a tal discriminação. (ONU, 1948, p. 6) Como vimos anteriormente, esse documento é um marco na história dos Direi- tos Humanos, e teve um impacto profundo nas políticas subsequentes que busca- vam a consolidação da cidadania, da democracia e dos direitos humanos. Seu advento abre uma janela para modificações profundas no tratamento de algu- mas questões, em especial, nas que tratam de comunidades historicamente excluídas. A Pessoa com Deficiência no Brasil Refletiremos, agora, sobre alguns processos, etapas e marcos importantes na história da pessoa com deficiência no Brasil, chegando às discussões atuais e, espe- cialmente, compreendendo a importância do conceito de Inclusão nesse contexto. Datam do século XIX as primeiras Instituições de Ensino voltadas à pessoa com deficiência. São elas: • O Imperial Instituto dos Meninos Cegos (Rio de Janeiro, 12/09/1854), atual Instituto Benjamin Constant (IBC); • O Instituto Imperial dos Surdos-Mudos (Rio de Janeiro, 26//09/1857), atual Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES). Importante! A surdez não impede ou cria restrições ao aparelho fonador. Assim, o termo surdo-mudo foi banido pois, em geral, a pessoa surda não fala apenas porque não ouve e não por possuir qualquer impedimento vocal. Desse modo, o correto é dizer apenas surdo. Você Sabia? 10 11 Esses dois institutos tiveram um papel importante na educação de cegos e surdos no Brasil, pois se trata das primeiras iniciativas de integração deles na Sociedade brasileira por meio da Educação. Ambos seguem em atividade até os dias atuais. Ao longo dos séculos XX e XXI, diversas outras Instituições foram criadas para atender, dar acolhimento, criar contextos de socialização e educação a diferentes tipos de pessoas com deficiência em suas especificidades. Podemos, como exemplo, mencionar algumas Instituições bastante conhecidas e de relevância no Brasil: • Instituto Pestalozzi (1932); • Fundação Dorina Nowill para Cegos (1946); • AACD – Associação de Assistência à Criança Deficiente (1950); • APAE – Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (1954); • ABPC – Associação Brasileira de Paralisia Cerebral (1962); • ADEVA – Associação de Deficientes Visuais e Amigos (1978); • AMA – Associação dos Amigos do Autista (1983); • FENEIS – Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (1987); • IBDD – Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência (1988). Em meados do século XXI, podemos considerar que, em razão da grande inci- dência de casos de poliomielite no Brasil, foram criados muitos locais voltados ao tratamento, preparação e reintegração do indivíduo a Sociedade. Mas, apesar das medidas tomadas ao longo dos séculos XIX e XX, a manuten- ção da lógica de inferioridade da pessoa com deficiência e sua sujeição, como indi- víduo, as estruturas que determinavam sua condição de vida – negando autonomia e participação ativa – alimentavam a insatisfação e o desejo por mudança por parte das pessoas com deficiência. Nesse contexto, tem início no final da década de 1970 e início da década de 1980, a organização de um movimento pró direitos da pessoa com deficiência. Dentre as reivindicações desse movimento, constavam: o fim da condição de inferioridade, do tratamento assistencialista e a garantia da cidadania, conferindo à pessoa com deficiência direito à visibilidade, à voz e à igualdade de direitos. No centro de tais discussões e lutas, surge, no ano de 1979, o Movimento da Pessoa com Deficiência, a partir da criação da Coalizão Pró-Federação Nacio- nal de Entidades de Pessoas Deficientes. Acompanhando o processo de redemocratização do país e uma série de movi- mentos e lutas sociais por direitos, o Movimento da Pessoa com Deficiência desen- cadeia um processo de protagonismo e de atuação direta na criação de contextos políticos favoráveis à cidadania da pessoa com deficiência. 11 UNIDADE Regulamentações e Debates Sobre a Acessibilidade no Campo da Cultura Dessa forma, o Movimento das Pessoas com Deficiência foi de extrema impor- tância na luta da constituição de direitos e da cidadania da pessoa com deficiência. A opressão contra as pessoas com deficiência tanto se manifestava em relação à restrição de seus direitos civis quanto, especificamente, à que era imposta pela tutela da família e de instituições. Havia pouco ou ne- nhum espaço para que elas participassem das decisões em assuntos que lhes diziam respeito. Embora durante todo o século XX surgissem ini- ciativas voltadas para as pessoas com deficiência, foi a partir do final da década de 1970 que o movimento das pessoas com deficiência surgiu, tendo em vista que, pela primeira vez, elas mesmas protagonizaram suas lutas e buscaram ser agentes da própria história. (BRASIL, 2010, p. 14) Em 1981, ocorreram, também, alguns fatos importantes para a história da pes- soa com deficiência no Brasil e no Mundo. Esse foi o Ano Internacional das Pessoas Deficientes – AIDP, proclamado na Assembleia Internacional da ONU de 1976, que estabeleceu bases, metas, prioridades e objetivos internacionais para o tratamento desse tema entre os anos de 1981 e 1991. Assim, o ano de 1981 constituiu-se em excelente oportunidade para ana- lisar e ativar as bases de cuidadosas medidas que merecem e requerem os portadores de deficiências sejam físicas, sensoriais ou mentais, uma vez que a conscientização de seus problemas, por parte de órgãos públi- cos, privados e de toda a sociedade, evidencia a urgente necessidade de atendê-los de modo mais digno e sistematizado. (BRASIL, 1981, p. 4) No Brasil, os Decretos nº 84.919/80 e n° 85.123/80 instituíram a Comissão Nacional do Ano Internacional das Pessoas Deficientes, que foi responsável pelo encaminhamento dos trabalhos em nível nacional. Ainda em 1981, foram realizados o 1° Congresso Brasileiro de Pessoas Defi- cientes e o 2º Encontro Nacional de Entidades de Pessoas Deficientes. Ganhava forças o reconhecimento da pessoa com deficiência em sua subjetivida- de e seu direito a condições igualitárias de vida em Sociedade. No contexto dessas mudanças, o termo “pessoa com deficiência” substitui o ter- mo “deficiente” ou “portador de deficiência”: “Pessoa com deficiência” passou a ser a expressão adotada contemporane- amente para designar esse grupo social. Em oposição à expressão “pessoa portadora”, “pessoa com deficiência” demonstra que a deficiência faz parte do corpo e, principalmente, humaniza a denominação. Ser “pessoa com deficiência” é, antes de tudo, ser pessoa humana. É também uma tentativa de diminuir o estigma causado pela deficiência. (BRASIL, 2010, p. 17) 12 13 Essa abordagem possibilita tratar a pessoa com deficiência de forma mais inte- gral, considerando sua experiência específica de vida que, para fruir em condições igualitárias, precisa que as barreiras que a impedem de exercer plenamente seus direitos sejam erradicadas. Nessesentido, não é mais o indivíduo que precisa ser adaptado para pertencer, mas os meios é que precisam se adequar oferecendo condições de Acessibilidade para diferen- tes pessoas, quer sejam pessoas com dificuldade de mobilidade, paralisia cerebral, cegos, surdos ou qualquer outro cidadão em seu direito de condições igualitárias de acesso. O Movimento da Pessoa com Deficiência também teve importante papel na cobrança por medidas legais para a garantia dos direitos da pessoa com deficiência. Em suas conquistas, como exemplo, encontramos, na Constituição Federal de 1988, considerações à pessoa com deficiência em diversos de seus capítulos: direi- to ao trabalho, à proibição da discriminação salarial e direito à educação e saúde pública, entre outras garantias, estão prescritas nesta Lei. Nas últimas décadas, a militância de Entidades, Instituições e pessoas com defi- ciência promoveu a criação de uma série de dispositivos (Decretos e Leis). Como exemplo, em 2002, a Língua Brasileira de Sinais, utilizada pela comu- nidade surda, foi finalmente reconhecida como língua oficial do país por meio da Lei 10.436/2002. Essa lei apresenta pontos importantes para a comunidade surda, como a obriga- toriedade de atendimento em LIBRAS em serviços públicos, o compromisso com a difusão da LIBRAS e sua inclusão no Parâmetro Curricular Nacional – PCN para os cursos de Educação Especial, Fonoaudiologia e de Magistério. Importante! As línguas de sinais são utilizadas em todo o mundo, porém, não são universais, ou seja, cada país e cada cultura possui sua própria língua. A LIBRAS é uma LÍNGUA e não uma lin- guagem e tem sua origem na Língua Francesa de Sinais. Assim como as demais línguas de sinais existentes, a LIBRAS é um sistema visual-motor de comunicação, com estrutura e regras gramaticais próprias. Você Sabia? Entretanto, sentia-se, ainda, a ausência de um instrumento legal que tratasse o direito da pessoa com deficiência de forma mais abrangente, que reunisse em seu texto diversos pontos, tratando a questão de forma mais integral e complexa, e não mais apenas por meio de diferentes Leis de atuação isoladas. Assim, no ano de 2000, foi apresentado pela primeira vez o texto do Estatuto da Pessoa com Deficiência, que tramitou por cerca de 15 anos até sua promulgação no ano de 2015. 13 UNIDADE Regulamentações e Debates Sobre a Acessibilidade no Campo da Cultura A Lei Brasileira da Inclusão (LBI), Nº 13.146/15 Também conhecida como Estatuto da Pessoa com Deficiência, essa Lei tem como objetivo principal estabelecer as condições de igualdade para a pessoa com deficiência e promover a garantia de sua cidadania. Figura 1 Fonte: Getty Images A LDB está fundamentada na Conven- ção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (ONU, 2006), que foi ratificada pelo Brasil no ano de 2008, em caráter de Emenda Constitucional. Cerca de 20 anos antes da promulgação do Estatuto da Pessoa com Deficiência, já existiam princípios legais que visavam a garantir os direitos da pessoa com deficiência. Porém, com a nova Lei, visa-se a consolidar de forma mais ampla a adoção de medidas que garantam efetivamente a cidadania e o direito de acesso às pessoas com deficiência. O Estatuto teve ampla participação popular e traz em seu texto regras voltadas a: “[…] assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania” (BRASIL, 2105, Art. 1). Além de constar em seu título, a palavra inclusão aparece mais de 20 vezes no texto da Lei, sendo a tônica para o tratamento da pessoa com deficiência. Para além dos conceitos de reabilitação e integração, que visam a preparar, a “adequar” um sujeito para sua vida em Sociedade, o conceito de inclusão considera a igualdade de direitos nas diferenças. Nesse sentido, são consideradas as especificidades de todas as pessoas na ade- quação de espaços, serviços e modelos, com a criação de medidas para a exclusão de barreiras que possam impedir condições igualitárias de acesso. A Emenda Constitucional é uma ação que modifica o texto da Cons- tituição Federal. No caso mencio- nado, temos a inclusão dos prin- cípios da Convenção sobre os Direitos da Pessoas com Defi- ciência em nossa Constituição. 14 15 Com o conceito de Inclusão, damos um passo além da ideia de integração: não se trata mais de fazer com que a pessoa se adapte a um contexto compreendido como padrão ou “normal”, mas sim, considerar as diferenças na criação de modelos, mé- todos e meios mais democráticos e adequados à diversidade existente na Sociedade. A criação e a aplicação das medidas de Acessibilidade são o meio para que essas condições igualitárias de acesso sejam implementadas. Você já pensou que, tradicionalmente em sua produção, a Arquitetura, o Design, a Comuni- cação e diversas outras áreas do Conhecimento e das Ciências aplicadas tomam por base um modelo padrão? Mas existe um modelo padrão de homem? É possível encontrar diversas situações cotidianas em que “modelos padrão” criam dificuldades para sua utilização por parte de algumas pessoas; afinal, somos todos diferentes. Você consegue pensar em alguma situação na qual esteve diante de dificuldades ou em que se sentiu fora do padrão? Ex pl or A acessibilidade visa a transpor as condições de acesso que possam limitar ou criar constrangimento. É um meio de proporcionar acesso seguro, confortável e autônomo para diferentes pessoas com diferentes características físicas, motoras e de comunicação. Essas condições facilitam e criam condições para que a pessoa com deficiência possa participar da vida em Sociedade, mas também beneficia outras pessoas com condições específicas: idosos, obesos (incluídos na LDB como pessoas com mobi- lidade reduzida), pessoas que estejam temporariamente impedidas de suas capaci- dades físicas (acidentados, pessoas em tratamento de saúde…) ou mesmo gestantes e crianças. Vamos ver um quadrinho da Turma da Mônica sobre o tema Acessibilidade? Quadrinho - Turma da Mônica: ACESSIBILIDADE: http://bit.ly/2NXDLe9 Ex pl or A história do Luca é a história de muitas pessoas que são impedidas ou possuem muitas dificuldades para estudar, frequentar espaços públicos e privados ou usufruir de serviços, pois, em seu caminho, encontram muitas barreiras e a quase total ausência de condições adequadas para que possam gozar de seus direitos como qualquer outro cidadão. Nesse sentido, o Estatuto da Pessoa com Deficiência é enfático: “Toda pessoa com deficiência tem direito à igualdade de oportunidades com as demais pessoas e não sofrerá nenhuma espécie de discriminação” (BRASIL, 2105, Art. 4). Nos capítulos dessa Lei, constam a prescrição de garantias amplas ao exercício do direito à saúde, à educação, ao trabalho, ao transporte e à mobilidade e, tam- bém, à cultura, ao esporte, ao turismo e ao lazer: 15 UNIDADE Regulamentações e Debates Sobre a Acessibilidade no Campo da Cultura Art. 43. O poder público deve promover a participação da pessoa com deficiência em atividades artísticas, intelectuais, culturais, esportivas e recreativas, com vistas ao seu protagonismo, devendo: I - incentivar a provisão de instrução, de treinamento e de recursos ade- quados, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas; II - assegurar acessibilidade nos locais de eventos e nos serviços prestados por pessoa ou entidade envolvida na organização das atividades de que trata este artigo; e III - assegurar a participação da pessoa com deficiência em jogos e ati- vidades recreativas, esportivas, de lazer, culturais e artísticas, inclusive no sistema escolar, em igualdade de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2105, Art. 43) Importante! A Acessibilidade deve garantir autonomia, total ou assistida, conforto e segurança para que qualquer pessoa possa ter acesso, ou seja, entrar, sair, usufruir de determinado es- paço ou serviço. Seu atendimento e aplicação é fundamentalpara algumas pessoas, mas beneficia a Sociedade como um todo. Importante! Um conceito importante ligado a esse tema é o do Desenho Universal, que surgiu da ideia de agregar pessoas e suas diferenças em um mundo sem barreiras de acesso para qualquer pessoa. A aplicação do desenho universal em projetos, serviços, produtos e ambientes visa a que eles sejam de uso fácil, intuitivo e ofereça as mesmas condições a pesso- as com diferentes idades, tamanho ou deficiências. Como exemplos de fácil identificação, temos: portas com sensores que se abrem sem exigir manuseio ou força física, torneiras acionadas por sensores que indepen- dem de movimentos de abertura e fechamento para seu uso etc. Os Jogos Paralímpicos no Brasil (2016) Podemos dizer que os Jogos Paralímpicos do Rio de Janeiro, realizados de 1 a 18 de setembro de 2016, trouxeram recentemente o tema da acessibilidade para o centro dos debates públicos. Eleito em 2009 como sede dos jogos de 2016, o Brasil teve aproximadamen- te 7 anos para se preparar para o evento, período em que também ocorriam as discussões para a aprovação do Estatuto da Pessoa com Deficiência, aprovado apenas um ano antes da realização das Paralimpíadas. Foi necessário o planejamento e a criação de uma infraestrutura específica para sediar um evento internacional de grande porte, voltado a atletas com diferentes especificidades de acesso. 16 17 Com a finalização dos jogos, iniciaram-se os debates sobre o real legado das Pa- ralimpíadas e das medidas tomadas por parte do Poder Público para sua realização. Podemos elencar como críticas relevantes a falta de abrangência do projeto de acessibilidade (que se restringia às áreas diretamente envolvidas no evento), a des- continuidade das ações que foram praticadas no período de preparação e realiza- ção dos jogos e, também, a não aplicação dos princípios do desenho universal no projeto de acessibilidade. Conheça o Conceito de Desenho Universal Voltado Para Atividades Físicas, disponível em: http://bit.ly/30gv6Z3Ex pl or Ainda assim, podemos considerar que os anos de 2015 e 2016 foram importan- tes para esse tema no Brasil, pois, os Jogos Paralímpicos mobilizaram atenção para o tema no país. Parte da imprensa nacional passou a contemplar os atletas paralímpicos, as me- didas de acessibilidade que estavam sendo tomadas na cidade do Rio de Janeiro e, também, para a importância dos jogos e sua história. A movimentação gerada pelo evento possibilitou maior visibilidade para a ques- tão da pessoa com deficiência e a criação de algumas medidas que ampliaram a acessibilidade em transportes, espaços públicos e pontos turísticos na cidade do Rio de Janeiro. Com a visibilidade alcançada por meio das Paralimpíadas, das discussões so- bre a promulgação da Lei Brasileira de Inclusão e das conquistas já alcançadas, esperava-se que os diferentes setores da Sociedade fossem sensibilizados para a necessidade da inclusão e da transformação de espaços, atitudes e ideias, criando condições para que todos possam usufruir de seus direitos igualitariamente. Porém, a aplicação prática das Leis em sua integridade ainda encontra entraves de inúmeras ordens, seja na atitude de pessoas e Instituições, seja na ausência de condições amplas (financeiras, estruturais e de fiscalização) que possam garantir sua implementação. No campo específico da cultura, equipamentos públicos e privados vêm buscan- do se adaptar a esta nova realidade e, em muitos eventos, já podemos nos deparar com a aplicação de uma ou outra medida de acessibilidade, ações que estudaremos detalhadamente posteriormente. Ainda há um longo caminho para que possamos ter aplicação efetiva de todas as medidas que se fazem necessárias e, assim, ter uma Sociedade mais preparada para oferecer melhores condições de vida a todas as pessoas. Porém, há uma trans- formação que independe de agentes externos e é imprescindível para a mudança: nossa visão e atitude, nos ambientes sociais, no trabalho, nas conversas etc. 17 UNIDADE Regulamentações e Debates Sobre a Acessibilidade no Campo da Cultura A inclusão pode começar no conhecimento sobre a realidade das outras pessoas e na consideração por suas vidas, opiniões e direitos e, sobretudo, pelo diálogo. Importante! O lema das pessoas com deficiência é “Nada de nós, sem nós”. E o que isso quer dizer? Que nenhuma decisão sobre suas vidas, deve ser tomada sem considerar suas opiniões: Do modelo de integração até a sociedade inclusiva, o movimento político das pessoas com deficiência vem trabalhando, intensamente, para alcançar um novo patamar de dignidade humana. Ainda convive com resquícios de segregação, muito de integração, e são incipientes as práticas de inclusão, as quais apresen- tam a diversidade humana como regra e, por conseguinte, tem como princípios norteadores da sociedade o respeito e a valorização das diferenças. Autonomia, direito a fazer sua própria escolha, vida independente e não discriminação pode ser sumarizados pelo lema “Nada sobre nós sem nós” (BRASIL, 2010, p. 108). Você Sabia? Importante! Recapitulando, traçamos um breve percurso histórico das políticas voltadas à pessoa com deficiência em sociedade e alguns dispositivos legais que visam a criar normas para garantir o direito de cidadania. Também tomamos contato com Leis que regem o tratamento do tema no Brasil, com medidas de Acessibilidade e Inclusão, com ênfase na Lei nº 13.146/15 – Lei Brasileira de Inclusão ou Estatuto da Pessoa com Deficiência. Como vimos, houve muitas conquistas nas últimas décadas com relação ao respeito à Diversidade e à garantia de direitos cidadão. Sabemos, no entanto que, na prática, a aplicação de algumas dessas Leis e de alguns de seus princípios ainda patinam. Para que possamos continuar em uma trajetória crescente de avanço em relação a esses temas, é fundamental que os dispositivos normativos, com seus direitos e deveres, sejam conhecidos e aplicados em nosso trabalho e, quando não atendidos, possam ser requeri- dos por parte dos diversos agentes sociais. Em Síntese 18 19 Material Complementar Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade: Vídeos História do Movimento Político das Pessoas com Deficiência no Brasil https://youtu.be/oxscYK9Xr4M Conversando para Entender: Dois anos da Lei Brasileira de Inclusão https://youtu.be/wFqZrqyYw_w Filmes Colegas Filme de 2013. Trailer oficial. https://youtu.be/olRt1b2puGc Leitura Como Criar Projeto de Acessibilidade nas Cidades – Sebrae-MG http://bit.ly/35PXfau Turma da Mônica – Inclusão http://bit.ly/2FNXf0c Lançamento do Caderno Acessibilidades no Rio http://bit.ly/2tSz51M 19 UNIDADE Regulamentações e Debates Sobre a Acessibilidade no Campo da Cultura Referências BRASIL. Relatório de Atividades da Comissão Nacional do Ano Internacional das Pessoas Deficientes. 1981. ONU. Disponível em: http://www.dominiopubli- co.gov.br/download/texto/me002911.pdf>. Acesso em: jul./2019 HISTÓRIA do Movimento Político das Pessoas com Deficiência no Brasil (compilado por Mário Cléber Martins Lanna Júnior). Brasília: Secretaria de Direitos Humanos/Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência, 2010. Disponível em: <http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/ documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/BibliotecaDi- gital/BibDigitalLivros/TodosOsLivros/historia_movimento_pcd_brasil.pdf>. Aces- so em: jul. 2019. LBI – Lei Brasileira de Inclusão: Conteúdo em Fácil Leitura. Rio de Janeiro/ Vitória: Movimento de Ação e Inovação Social – MAIS/Procuradoria Regional do Trabalho da 17ª Região/ES. 2016. Disponível em: <http://www.pcdlegal.com.br>. Acesso em: jul. 2019. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO – SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL. Educação Especial: História, Etiologia, Conceitos e Legislação Vigente. Bauru: MEC. 2008. Disponível em: <http://www2.fc.unesp.br/educacaoespecial/mate- rial/Livro2.pdf>. Acesso em: jul. 2019. ONU – Organização das Nações Unidas.Declaração Universal dos Direitos do Homem. 1948. Disponível em: <https://nacoesunidas.org/wp-content/uploa- ds/2018/10/DUDH.pdf>. Acesso em: jul. 2019. SILVA, O. M. A Epopeia Ignorada, Uma Questão de Competência. A Integra- ção das Pessoas com Deficiência no Trabalho. São Paulo: Cedas, 1987. 20