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Uma Introdução à
Criminalística
Um Guia para Perícia Criminal
3ª Edição
Paulo Frank
Perito Criminal, IGP-RS
2022
Frank, P. R. O. (2022). Uma Introdução à Criminalística - Um Guia para
Perícia Criminal. Porto Alegre. Editora Ruta, terceira edição.
ISBN-13 : 9798417752919
Selo editorial: Editora Ruta
Disponível em www.amazon.com
 
Frank, Paulo Ricardo Ost.
Uma Introdução à Criminalística / Paulo Ricardo Ost Frank; 3ª Edição; Porto
Alegre; Ruta; 2022.
Literatura Técnica
 
http://www.amazon.com.br/
Prólogo
Este trabalho traz informações para que agentes de segurança pública policial,
ou outro operador de direito, saiba solicitar, interpretar e avaliar os Laudos sobre
ocorrências criminais que irá receber de algum órgão de perícia criminal ou polícia
técnica ou polícia científica. Este documento também poderá ser útil como material de
orientação e de apoio para os profissionais da perícia no seu trabalho.
Antes de Começar
Antes de começar a leitura seria oportuno baixar em seu celular o apêndice
com as figuras coloridas desta obra.
 
ÍNDICE
Prólogo
ÍNDICE
1.DEFINIÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
Vestígio, Evidência e Indício
O crime e a prova técnica
O Método Científico
Apriorismo
Princípios aplicáveis a Criminalística
Fundamentos Legais
Local de Crime
Classificação de Locais de Crime
O Corpo de Delito
Cadeia de Custódia
2.MEDICINA LEGAL APLICADA À LOCAL DE CRIME
Morte
Morte por Causas Internas
Morte por Causa Externa
Aspectos Técnicos sobre a Morte
Acompanhamento de Autópsia
O Cadáver
Posição
Marcas de arraste
Ferimentos e Danos por Armas de Fogo
Arma Branca
Quesitos Usuais para Locais de Morte
3.VESTÍGIOS DE BALÍSTICA
Balística Interna
Armas de Fogo
Tiro Acidental
Balística Exterior
Balística Terminal
4.PÓLVORAS, ESPOLETAS E RESÍDUOS
Espoletas e Primers
Pólvora
Pólvora Negra
Pólvoras Modernas
Gunshot Residue - GSR
5.VESTÍGIOS ORGÂNICOS
Genética, DNA e Correlatos
DNA Nucléico (nuDNA)
DNA de Contato (Touch DNA)
DNA Mitocondrial (mDNA)
Fontes de Evidência Biológica
DNA Databases
Sangue
Quimiluminescência e Luminol
Benzidina
Imunocromatográfico
Cabelos, Pelos e Unhas
Cuidados com as evidências do tipo DNA
6.VESTÍGIOS PAPILOSCÓPICOS
Antes da Introdução: A Pele em que habito
Adermatoglifia
Secreções e Glândulas
Definições e Conceitos Uteis
Datiloscopia
A Impressão Digital, Datilograma e Papilograma
Datilograma digital
Papilograma
Impressão digital
O Sistema Argentino de Juan Vucetich
Tipos Fundamentais
Classificação Secundária
Classificação das Impressões quanto a Visibilidade
Técnicas de Detecção
Superfícies Não Porosas
Superfícies Porosas
Confronto de Impressões Digitais
AFIS – Automated Fingerprint Identification System
7.VESTÍGIOS DIVERSOS
Os Efeitos do Tiro em Anteparos
Chapas Metálicas
Vidros
Fratura em Vidros
Fratura Hertziana
Vidro Temperado ou Endurecido
Fraturas de vidro produzidas por armas de fogo
Sequência de Tiros
Efeito do vidro nas trajetórias do projétil
Propagação retrógrada de fragmentos de vidro
Fratura e correspondências físicas
Identificação por Armas, Projéteis e Estojos
Componentes de Munição
Vestígios de Luta no Ambiente
Modificações no Corpo
Tatuagem
Rastros
Pés e Calçados
Pegada com Calçado
Impressões Auriculares
Vestes
Cobertores, Plásticos e Lençóis
Próteses
Carteira, documentos e dinheiro
Objetos Pessoais: Pingentes, Colares, Brincos, Pulseiras, Anéis
Carteiras de Cigarro e Bebidas
8.ASFIXIA
Sinais Clássicos
Classificação
Sufocamento
Confinamento
Sufocamento Propriamente Dito
Sufocamento por Oclusão Interna
Sufocamento por gases
Asfixia por Compressão
Asfixia Traumática
Asfixia Posicional
Crucificação
Esmagamento por Pessoas
Asfixia por Compressão Mecânica Combinada com Sufocamento
Estrangulamento
Estrangulamento com laço
Estrangulamento manual (esganadura)
Lesões no Autores
Enforcamento
Aspectos Externos do Enforcamento
Nós e Cordas
Aspectos Internos do Enforcamento
Enforcamentos Judiciais
Tópicos Especiais
Asfixia Química
Monóxido de Carbono
Ácido Sulfídrico, Cianetos e Outros
9.CORPOS SUBMETIDOS AO CALOR OU A INCÊNDIOS
10.IMERSOS E AFOGADOS
Vestígios no Corpo
Achados Externos
Achados Internos
Afogamento “Seco”
Afogamento Tardio
Afogamento Secundário
Águas Frias e Hipotermia
Algas e Testes de Laboratório
Suicídios e Homicídios por Afogamento
Grupos de Risco
11.EXAMES DIVERSOS
Queda de Altura ou Precipitação
Lesões por morte de queda de altura
Acidente de trabalho ou homicídio culposo?
Exame em Discos de Tacógrafo
Disco-diagrama de tacógrafo
Registros
Sobreposição de Registro
Fraude Processual
Intervalos de Descanso
Certificação
Tacógrafo e Alteração no Diâmetro Externo da Roda
Eletroplessão
12.DROGAS
O que é Droga?
Droga sob o aspecto legal no Brasil
Plantas
Cannabis sativa L
Claviceps paspali
Datura suaveolens
Erythroxylum coca
Lophophora williamsii
Papaver somniferum L.
Prestonia amazonica
Salvia divinorum
Substâncias Proscritas
13.HISTÓRICO
Arquimedes de Siracusa e a Coroa de Ouro
A Necropsia de Júlio Cesar
Constitutio Criminalis Carolina
Johannes Bohn
Juan Fernández del Valle
Marthieu Orfila
Gregor Johann Mendel
O Sistema Fotográfico Alphonse Bertillon
Alphonse Bertillon
Hans Gross
Eduard Piotrowski e as manchas de sangue
Passos Iniciais da Papiloscopia
Purkinje
O Sistema Silábico de Henry Faulds de Impressões Digitais
Sir Francis Galton e a Classificação Tripartida para Digitais
Juan Vucetich
O DNA
Edmond Locard
Testes de Resíduos de Tiro
Teste da Parafina
Harrison e Gilroy
O Luminol
Kirk e o Princípio da Individualidade
Surge o AFIS – Automated Fingerprint Identification System
O caso do FBI
O Caso de São Francisco
BIBLIOGRAFIA
TABELAS
FIGURAS
DIVERSOS
Sobre o Autor
1. DEFINIÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
Antes de sair para o campo de prancheta em punho e ultrapassar aquela famosa
fita plástica zebrada amarela e preta que segrega um local de crime, é necessário que o
perito saiba exatamente o que vai fazer e os fins aos quais se destina o seu trabalho.
Assim, é importante um bom embasamento sobre o papel da perícia criminal no amplo
quadro da persecução penal.
No Brasil, é bastante popular a definição proposta por Eraldo Rabello
(Mallmith, 2002), que explica a Criminalística como uma disciplina autônoma,
integrada pelos diferentes ramos do conhecimento técnico-científico, auxiliar e
informativa das atividades policiais e judiciárias de investigação criminal, que tem
por objeto o estudo dos vestígios materiais extrínsecos à pessoa física, no que tiver de
útil à elucidação e à prova das infrações penais e, ainda, à identificação dos autores
respectivos.
Os exames dos vestígios intrínsecos ao corpo humano são, no Brasil, da alçada
da Medicina Legal, que normalmente trabalha no interior dos Departamentos de
Medicina Legal (DML), nada impedindo, entretanto, que os Médicos Legistas também
atuem nos locais de achados, sendo atribuição do Legista “Comparecer a locais de
morte, para examinar cadáveres in locu”.
Existe alguma confusão entre Criminalística e Criminologia, pois tem nomes
muito semelhantes e estudam situações complementares uma à outra, entretanto são
diferentes, pois Criminologia é a ciência que tem por objeto a criminalidade, isto é, os
crimes e os criminosos, e cujo objetivo é montar esquemas de prevenção, formular
terapias para tratamento dos delinquentes, evitando a reincidência (Mallmith, 2002).
Uma definição alternativa, mais moderna e pragmática, ao gosto da escola de
língua inglesa, mais preocupada com resultados do que com elegância, seria “a
aplicação da ciência a serviço da Lei” (Horswell). A matéria é dividida em várias
subdisciplinas; as mais comumente encontradas são: levantamento de locais de crime,
biologia forense, balística forense, química forense, toxicologia, documentoscopia
forense, trânsito, meio-ambiente, informática, papiloscopia e engenharia.
A Criminalística é baseada em apenas duas premissas:
1) Não existem dois corpos (estruturas materiais) idênticos (Postulado de
Kirk).
2) Na prática do crime existe contato e, portanto, trocas entre os corpos
(estruturas materiais). Estas trocas são osfamosos vestígios (Principio das Trocas de
Locard).
Não existindo dois corpos idênticos, seus vestígios também não serão
idênticos. Assim, cabe ao perito criminal coletar, preservar e analisar estes vestígios
com a técnica cientifica disponível.
Vestígio, Evidência e Indício
No prefácio de seu livro clássico de 1953, Crime Investigation, Paul L. Kirk
(Kirk 4) tinha isso a dizer sobre evidências físicas:
Onde quer que ele pise, o que quer que ele toque, o que quer que ele
deixe, mesmo inconscientemente, servirá como prova silenciosa contra ele. Não
só suas impressões digitais ou suas pegadas, mas seu cabelo, as fibras de suas
roupas, o vidro que ele quebra, a marca de ferramenta que ele deixa, a tinta que
ele arranha, o sangue ou sêmen que ele deposita ou coleta – tudo isso e mais
testemunha mudo contra ele. Esta é uma evidência que não se esquece. Não está
confusa com a emoção do momento. Não está ausente porque testemunhas
humanas estão. É uma evidência factual. A evidência física não pode estar
errada; não pode perjúrio em si; não pode estar totalmente ausente. Só sua
interpretação pode errar. Só a falha humana em encontrá-la, estudá-la e entendê-
la, pode diminuir seu valor.
Os vestígios constituem-se em qualquer marca, objeto ou sinal sensível que
possa ajudar a esclarecer a dinâmica ou a autoria ou a identidade da vítima em um
crime, ou, conforme definição legal dada pelo Código de Processo Penal, Art. 158-A.
§ 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou
recolhido, que se relaciona à infração penal. (CPP)
Cada tipo de vestígio requer uma técnica específica com suas etapas rigorosas
para a sua produção ou para a sua disposição em determinada configuração, forma ou
estado.
A existência do vestígio material pressupõe a existência de um agente
provocador (que o causou ou contribuiu para tanto) e de um suporte adequado (local
em que o vestígio se materializou). Num local de morte por arma de fogo, o agente
provocador é, na prática, sempre o homem, pois é virtualmente impossível um animal
ou uma força da natureza provocar um disparo de arma de fogo ou de uma munição
acondicionada de forma normal.
Aplicando a teoria, o vestígio no local de crime seria simplesmente o produto
físico da aplicação do Princípio das Trocas de Locard, com a ressalva de que existem
vestígios oriundos de transferências de material sem contato direto, por exemplo,
transferência de vidro, transferência de sangue, ou de qualquer líquido ou pó. Um
assaltante que quebra uma janela pode ter numerosos pedaços microscópicos de vidro
em sua roupa, mesmo que suas roupas não tenham entrado em contato direto com a
janela. Durante o ato pequenos fragmentos de vidro são projetados a partir da área de
impacto. Aqueles projetados de forma retrógrada em relação à direção da força
aplicada podem ser depositados e retidos como evidência no cabelo e roupas do
assaltante. As manchas produzidas por gotículas de sangue no ar e depósitos de
resíduos de descarga de pólvora fornecem exemplos adicionais (Thornton 24).
Em Criminalística, constitui uma evidência o vestígio que, após analisado pelos
peritos, se mostrar diretamente relacionado com o delito investigado. As evidências
são, portanto, os vestígios materiais depurados pelos peritos. Exemplo: uma impressão
digital latente do dono de uma loja é um simples vestígio; já uma impressão digital de
suspeito de arrombamento coletada no caixa é uma evidência (Mallmith).
Indício é termo jurídico explicitamente definido no artigo 239 do Código de
Processo Penal: “Considera-se indício a circunstância conhecida e provada que, tendo
relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras
circunstâncias.”
Num primeiro momento, o termo definido pelo art. 239 do CPP parece
sinônimo do conceito de evidência. Contudo, a expressão “indício” foi definida para a
fase processual, portanto para um momento pós-perícia, o que quer dizer que a palavra
“indício” carreia consigo, além dos elementos materiais de que trata a perícia, outros
de natureza subjetiva, próprios da esfera da polícia judiciária (Mallmith).
O crime e a prova técnica
O andamento de um expediente criminal brasileiro tem duas etapas: a
investigação criminal e o processo penal.
A investigação criminal é uma etapa preliminar, de caráter administrativo, que
busca reunir provas capazes de formar convicção do Ministério Público sobre a
existência de causa para o início da ação penal. É normalmente desenvolvida pela
Polícia Civil, a polícia judiciária brasileira, com o concurso dos órgãos de perícias,
quando estes não fazem parte da mesma estrutura policial. O processo penal é o
caráter jurisdicional, que termina com um procedimento judicial que resolve se o
acusado deverá ser condenado ou absolvido. Ao conjunto dessas duas fases, dá-se o
nome de persecução penal.
Persecução Penal = Investigação Criminal + Processo Penal
A persecução penal contra os autores de delitos começa, via de regra, com um
trabalho preliminar de investigação, através do qual se procura apurar o fato e suas
circunstâncias, a autoria da infração e os elementos de convicção, suficientes para
provocar e justificar instauração do processo crime contra o(s) infrator(es). Entretanto,
é necessário pontuar que a justiça não julga de acordo com a verdade, mas, sim, de
acordo com uma representação da verdade, ou seja, os autos do processo. Cabe aos
peritos, policiais e promotores construírem esta representação a mais fidedigna
possível (Mallmith, 2002), muitas vezes de maneira antecipada. Aqui usamos
representação como aquilo que está no lugar de um ausente.
Cabe à Polícia Civil investigar o fato para verificar se efetivamente trata-se de um
crime, descobrir e identificar os possíveis autores e enquadrá-los no artigo penal
correspondente. O conjunto destas diligências vem a constituir o inquérito policial
(IP), peça fundamental, embora prescindível, na qual se alicerçará a ação penal a ser
instaurada. Os resultados e conclusões a que chega o IP chama-se relatório (Mallmith,
2002). Como auxiliar imediato da Justiça na tarefa de repressão aos ilícitos penais,
teve a Polícia de se valer cada vez mais dos conhecimentos e recursos da ciência e da
técnica para esclarecer e provar à Justiça os fatos que investiga. Em sentido amplo, a
especialização e a sistematização destes conhecimentos, recursos e procedimentos e a
efetiva aplicação dos mesmos à finalidade especificamente judiciária de investigação
criminal vieram a se constituir na disciplina hoje denominada de Criminalística. A
Criminalística é, pois, uma disciplina técnico-científica por natureza e jurídico-penal
por destinação, sendo chamada já nas fases mais preliminares, inclusive para ajudar a
esclarecer se houve ou não crime, por exemplo: diferenciar entre acidente, homicídio e
suicídio (Figura 1).
O endereçamento do relatório policial ao Judiciário, com os resultados e
conclusões expostos e fundamentados pela autoridade policial no inquérito policial,
inaugura a fase processual propriamente dita da persecução penal. Jurisdicionalizado o
relatório, reserva-se ao ministério público apresentar, ou não, a denúncia. Ao juiz,
uma vez apresentada a denúncia, caberá julgar o feito. Observe que o magistrado não
participa da investigação ou de qualquer outro ato da persecução penal, tomando
conhecimento dos fatos somente através do constante na denúncia, a qual, por seu
turno, alicerça-se no relatório advindo do inquérito policial. Portanto, para que a
conclusão do inquérito policial, constante no relatório, atinja a solidez e a força
suficiente para embasar adequadamente a ação penal a ser instaurada, é necessário que
as circunstâncias nas quais a dita autoridade se fundamentou para as suas conclusões
sejam convincentemente provadas nos autos como verdadeiras (Mallmith, 2002).
Na fase judicial da persecução penal todas as provas serão revisadas, sendo
alvo de severos ataques por parte da defesa ou do réu, no sentido de contestar a
procedência e o valordelas. Genericamente, podemos dividir as provas em históricas
e críticas. As primeiras são aquelas constituídas por documentos, testemunho e a
confissão, enquanto as segundas encerram aquelas baseadas em indícios e evidências.
A utilização de recursos da ciência e da técnica para a realização da perícia, bem como
a sistematização destes conhecimentos, recursos e procedimentos, e a efetiva aplicação
deles na execução de trabalhos periciais, constitui, em síntese, a atividade do perito
criminal.
O Método Científico
Se Criminalística é ciência, então a Criminalística deve ter como ferramenta
essencial o Método Científico; ou seja, conclusões baseadas apenas no renome de um
profissional devem ser tratadas com bastante desconfiança.
As raízes do método científico moderno estão na Grécia Clássica, com
Aristóteles e a utilização do método indutivo. Neste método, uma regra geral ou
conclusão é estabelecida com base no acúmulo de evidências obtidas por fazer
observações e coleta de fatos comprobatórios. Na avaliação destas observações e fatos,
uma uniformização subjacente é mostrada, o que demonstraria existir uma regra geral. 
Este método apresenta bons resultados, entretanto, uma possível armadilha do método
indutivo é que o número de observações pode ser muito pequeno ou muito seletivo
para uma efetiva produção de conhecimento. Uma conclusão falsa pode ser alcançada
se as observações ou fatos são representativos de apenas um subconjunto especial ao
invés do conjunto geral. Exemplo: Um perito que estudasse a ocorrência de acidentes
de trânsito, tendo apenas como amostras as ocorrências de Porto Alegre (ainda que
sejam muitas), onde não existe virtualmente tráfego de caminhões a alta velocidade, 
poderia cair na tentação de generalizar para todo o Estado do Rio Grande do Sul e
concluir que acidentes com caminhões de carga são um problema bastante secundário
no estado.
Apesar dos grandes avanços dos gregos e dos que os sucederam, o
desenvolvimento do Método Científico moderno é creditado a Roger Bacon (Noon),
um monge franciscano inglês do século 13. Ele propôs e defendeu a ideia de que o
conhecimento científico necessitava de observação, experimentação e ainda
divulgação dos experimentos, para que outros os testassem de maneira independente.
O Método Científico, quando aplicado a eventos, pode ser resumido assim
(Noon):
• uma hipótese inicial de trabalho é proposta, baseada na interpretação inicial
dos vestígios;
• à medida em que mais informação é recolhida, a hipótese inicial de trabalho
pode ser modificada para incluir o número crescente de observações;
• após certo tempo, a hipótese poderá ser testada, usando-a inclusive para
predizer a presença de indícios não óbvios ou que foram negligenciados no exame
inicial;
Uma hipótese será considerada uma explicação (ou conclusão) satisfatória
quando os quesitos seguintes forem satisfeitos:
• quando possível, a hipótese é capaz de predizer a existência de evidências
adicionais não conhecidas previamente;
• a hipótese é consistente com princípios científicos aceitos, com o
conhecimento de Criminalística, com as metodologias adequadas ao caso e,
evidentemente, explicarem os vestígios encontrados.
Apriorismo
O Apriorismo é a crença de que as causas subjacentes para os efeitos
observados são já conhecidas ou, pelo menos, podem ser deduzidas a partir de alguns
princípios básicos. Em um apriorismo, se as observações e os experimentos de uma
pessoa se chocam com a teoria aceita é evidente que a observação está incorreta.
Princípios aplicáveis a Criminalística
Lei de Individualidade ou Lei de Kirk: Cada objeto natural ou feito pelo
homem é único, tendo diferenças de qualquer outro similar. Pelo menos para corpos
macroscópicos esta lei pode ser assumida como verdadeira, entretanto, em muitos
casos nos faltam técnicas para examinar e explorar estas diferenças. A lei da
individualidade é de importância fundamental na ciência forense.
Princípio da Troca, ou de Locard. De acordo com isso, quando um
criminoso ou seu instrumento de crime entram em contato com a vítima ou
os objetos que o cercam, eles deixam vestígios, e o criminoso ou seu
instrumento capta vestígios do mesmo contato. Cumpre observar que se cada
corpo é único, seus vestígios também devem ser únicos.
Lei da Mudança Progressiva, que diz que “Tudo muda com o passar do
tempo". Foi adaptado do Panta rei os potamós de Heráclito de Éfeso, que na
sua versão mais popular diz que não se pode atravessar o mesmo rio duas
vezes, pois a água terá mudado. Seu impacto na ciência forense é imenso. O
criminoso, a cena do crime e os objetos envolvidos no crime passam por
mudanças, portanto, podem ficar irreconhecíveis.
Lei de Comparação " Só os semelhantes podem ser comparados", é a lei
de comparação. Enfatiza a necessidade de fornecer padrões, amostras e
espécimes para comparação.
Lei de Análise "A análise não pode ser melhor do que a amostra
analisada" ou “lixo que entra, lixo que sai”, o princípio enfatiza a
necessidade de amostragem correta e embalagem para uso efetivo de
especialistas.
Lei da Probabilidade, diz que todas as identificações, definitivas ou
indefinidas, são feitas, consciente ou inconscientemente, com base na
probabilidade.
Lei dos Fatos Circunstanciais "Fatos não mentem, os homens podem
mentir e o fazem", daí a importância da evidência circunstancial é tão boa
quanto a evidência oral. As evidências orais dependem de tantos fatores,
como poder de observação, assimilação, sugestão automática.
Fundamentos Legais
No Brasil, os principais aspectos da atividade do perito criminal estão
explicitados de forma bastante clara no Código de Processo Penal, Decreto-Lei Nº
3.689, de 3 de outubro de 1941, redigido por Francisco Campos e assinado pelo então
Presidente Getúlio Vargas. Entrou em vigor na data de 1º de janeiro de 1942, cujos
principais aspectos relativos à Perícia Criminal serão comentados, sem, porém,
qualquer pretensão de esgotar o assunto.
Art. 6º. Logo que tiver conhecimento da prática da infração penal, a autoridade
policial deverá:
I - Dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e
conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº
8.862, de 28.3.1994).
II - Apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos
peritos criminais; (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994).
...
VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a
quaisquer outras perícias.
O entendimento usual deste inciso I é que, na ausência ou no deslocamento da
autoridade policial, esta tarefe deve ser assumida pelo primeiro agente público que
estiver presente no local, na medida das possibilidades, não sendo a mera ausência
causa de nulidade, desde que sanada por outro agente público. Entretanto, poderá ser
causa de nulidade a não realização do exame ou a não apreensão dos objetos
relacionados.
Deve-se notar que a apreensão de objetos se dará somente após a sua liberação
pelos peritos. Em havendo necessidades especiais de transporte e conservação (DNA)
ou necessidade de tratamento dos vestígios imediatamente após a coleta (digitais
latentes), os peritos poderão assumir temporiamente a custódia destes materiais,
comunicando o fato à autoridade.
No momento do exame do local de crime, a autoridade deve já ir
providenciando a solicitação de outros exames relacionados ao fato e não cobertos pela
equipe de exame de local, por exemplo: necropsias, funcionamento de armas de fogo,
perícia mecânica em veículos envolvido e outros.
Art. 7º. Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de
determinado modo, a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos
fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública.
Embora a reprodução simulada dos fatos não é expressamente atribuída para
peritos é usual, pela especialização do conhecimento e objetivando o melhor para a
sociedade que a autoridade solicite este tipo trabalho para o órgão de perícia
criminalística.Art. 20. A autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à
elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade.
Aqui temos que o sigilo necessário, aqui no sentido de suficiente, faz parte da
fase do inquérito, tendo o CPP apontado à autoridade presidente do inquérito o dever
de zelar por este sigilo, assim entendemos que o perito deve manter a necessária
discrição, deixando para a autoridade decidir o que deve ser informado à imprensa ou
às partes interessadas em cada momento.
Art. 105. As partes poderão também arguir de suspeitos os peritos, os
intérpretes e os serventuários ou funcionários de justiça, decidindo o juiz de plano e
sem recurso, à vista da matéria alegada e prova imediata.
Art. 112. O juiz, o órgão do Ministério Público, os serventuários ou
funcionários de justiça e os peritos ou intérpretes abster-se-ão de servir no processo,
quando houver incompatibilidade ou impedimento legal, que declararão nos autos. Se
não se der a abstenção, a incompatibilidade ou impedimento poderá ser arguido pelas
partes, seguindo-se o processo estabelecido para a exceção de suspeição.
Devemos entender que, como o juiz, também os peritos podem apresentar
conflito de interesse.
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova
produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão
exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as
provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de
2008).
O artigo 155 aponta para um caráter informativo do inquérito policial, pelo
menos para efeitos de julgamento da ação penal, abrindo exceção, entretanto, para as
provas cautelares, não repetíveis e antecipadas, onde se enquadram os exames
periciais, visto que muitos exames não podem absolutamente serem repetidos, como as
necropsias e os levantamentos de cenas de crime.
Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de
corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.
Parágrafo único. Dar-se-á prioridade à realização do exame de corpo de delito
quando se tratar de crime que envolva: (Incluído pela Lei nº 13.721, de 2018)
I - Violência doméstica e familiar contra mulher; (Incluído pela Lei nº 13.721,
de 2018)
II - Violência contra criança, adolescente, idoso ou pessoa com
deficiência. (Incluído pela Lei nº 13.721, de 2018).
Observa-se que o exame é mandatório, não podendo ser negligenciado nem
mesmo com a confissão do acusado.
Pela norma legal é necessário que exames, inclusive os de natureza médico-
legal, demandados por ação do tipo “Maria da Penha”, gozam de prioridade na
realização, como também da entrega do laudo que é parte integrante do exame.
A prioridade dada às crianças, nada mais é do que aplicação do artigo 227 da
Constituição Federal, tanto no caput: É dever da família, da sociedade e do Estado
assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de
colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010),
quanto no seu § 4º: A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração
sexual da criança e do adolescente.
Para ser perito oficial é necessário ter diploma de curso superior e, desde 2008,
apenas um perito, e não dois como antes, é necessário para exame de corpo de delito e
outras pericias. Do nosso ponto de vista tal providência veio no sentido de se adequar a
realidade, visto o aumento gradativo de crimes a partir da década de 1990 e as
crescentes dificuldades para os entes federativos manterem quadros sempre crescentes
de servidores públicos nas mais diversas áreas de atuação, sendo, portanto, bem-vinda
à medida que possibilitou uma otimização nos recursos, não impedindo, todavia, que,
para exames mais complexos sejam designados mais de um perito.
Igualmente prevê o legislador que, na falta de perito oficial, poderão ser
nomeados peritos ad hoc[1] em substituição ao perito oficial. Ora, no que consiste
afinal esta falta se a perícia de natureza criminal está estrutura em todo o país? ora esta
falta somente pode ser explicada por alguma situação extraordinária, como, por
exemplo, a exigência de conhecimento especialíssimo e não disponível nos órgãos de
perícia, ou um grande e momentâneo pico de trabalho provocado por catástrofe de
grandes proporções. Entendemos que a possibilidade de se contar com peritos “ad
hoc” é previsão sábia do legislador, mas não pode vir a ser rotina em trabalho,
conforme CPP, Art. 159. O exame de corpo de delito e outras perícias serão
realizados por perito oficial, portador de diploma de curso superior. (Redação dada
pela Lei nº 11.690, de 2008).
§ 1o Na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas
idôneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área específica,
dentre as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza do
exame. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008).
...
§ 3o Serão facultadas ao Ministério Público, ao assistente de acusação, ao
ofendido, ao querelante e ao acusado a formulação de quesitos e indicação de
assistente técnico. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
§ 4o O assistente técnico atuará a partir de sua admissão pelo juiz e após a
conclusão dos exames e elaboração do laudo pelos peritos oficiais, sendo as partes
intimadas desta decisão. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008).
§ 5o Durante o curso do processo judicial, é permitido às partes, quanto à
perícia: (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008).
I – Requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou para
responderem a quesitos, desde que o mandado de intimação e os quesitos ou questões
a serem esclarecidas sejam encaminhados com antecedência mínima de 10 (dez) dias,
podendo apresentar as respostas em laudo complementar; (Incluído pela Lei nº 11.690,
de 2008).
II – Indicar assistentes técnicos que poderão apresentar pareceres em prazo a
ser fixado pelo juiz ou ser inquiridos em audiência. (Incluído pela Lei nº 11.690, de
2008).
§ 6o Havendo requerimento das partes, o material probatório que serviu de base
à perícia será disponibilizado no ambiente do órgão oficial, que manterá sempre sua
guarda, e na presença de perito oficial, para exame pelos assistentes, salvo se for
impossível a sua conservação. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008).
§ 7o Tratando-se de perícia complexa que abranja mais de uma área de
conhecimento especializado, poder-se-á designar a atuação de mais de um perito
oficial, e a parte indicar mais de um assistente técnico. 
Aos mencionados no parágrafo 3º é permitida a indicação de assistente técnico,
entretanto, em locais de crime, normalmente as partes não têm tempo hábil para
indicar seus assistentes dada a necessidade de celeridade nos exames.
A norma determina que o assistente técnico inclusive o do Ministério Público,
execute seus trabalhos somente após o trabalho do perito oficial, entretanto, em função
da razoabilidade, exames mais complexos e detalhados podem ser divididos em várias
etapas pelo perito oficial, visando melhor organizar os trabalhos e facilitar o exame
para o assistente, em acordo com a ideia de que, se a lei prevê assistentes para garantir
a ampla defesa e a ampla aplicação da justiça, o serviço dos assistentes deve ser bem
acolhido e, no que for possível, facilitado pelo perito oficial.
É bom observar que não existe a figura de “perito da parte” ou “laudo da parte”
e sim “assistente técnico” e “parecer”. Acreditamos que o legislador escolheu esta
forma para frisar que o perito oficial deve ser neutro, enquanto o assistente técnico tem
mais liberdade para salientar os aspectos técnicos mais favoráveis à defesa ou à
acusação.
A norma prevê que, na fase judicial, aspartes possam pedir esclarecimentos ou
quesitos adicionais em oitivas, desde que por escrito ao perito e com prazo de dez dias
de antecedência. Também dá a previsão legal para que a mesma providência possa ser
encaminhada através de laudo complementar.
Infelizmente a aplicação deste parágrafo 6º do artigo 159 requer uma estrutura
material e pessoal que a grande maioria dos Institutos de Criminalística não possuem.
É igualmente questão de bom-senso dividir o exame do corpo de delito em
partes menores para que cada uma delas tenha um perito com conhecimento mais
especializado possível para responder a cada quesito particular formulado.
Art. 160. Os peritos elaborarão o laudo pericial, onde descreverão
minuciosamente o que examinarem, e responderão aos quesitos formulados. (Redação
dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)
Parágrafo único. O laudo pericial será elaborado no prazo máximo de 10 dias,
podendo este prazo ser prorrogado, em casos excepcionais, a requerimento dos
peritos. (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)
O artigo define em síntese a atividade do perito, que consiste e, examinar,
descrever e responder ao que foi perguntado, sendo este examinar e descrever dentro
do fim a que se destina: apontar elementos para apurar os fatos e a autoria.
Dados as condições reais de trabalho, onde cada perito trabalha
simultaneamente em vários casos, o prazo de dez dias é quimérico, sendo mais
razoável uma estimativa de cerca de um mês para a entrega de trabalhos mais
complexos.
Art. 169. Para o efeito de exame do local onde houver sido praticada a
infração, a autoridade providenciará imediatamente para que não se altere o estado das
coisas até a chegada dos peritos, que poderão instruir seus laudos com fotografias,
desenhos ou esquemas elucidativos. (Vide Lei nº 5.970, de 1973)
Parágrafo único. Os peritos registrarão, no laudo, as alterações do estado das
coisas e discutirão, no relatório, as consequências dessas alterações na dinâmica dos
fatos. (Incluído pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994).
É bem claro que a reponsabilidade pela preservação e isolamento do local é de
responsabilidade da autoridade policial e, havendo alterações no local, pois
dificilmente não as há, os peritos mesmo assim farão o exame, esclarecendo se alguma
delas causou prejuízo e qual prejuízo ao exame. Isto implica também que a alegação
de alteração não justifica o não comparecimento dos peritos, sendo estes os únicos
elencados pela norma para discutir sobre as consequências das alterações.
Art. 170. Nas perícias de laboratório, os peritos guardarão material suficiente
para a eventualidade de nova perícia. Sempre que conveniente, os laudos serão
ilustrados com provas fotográficas, ou microfotográficas, desenhos ou esquemas. 
Trata-se de mais uma garantia para o contraditório e da ampla defesa,
princípios universais nos estados de direito.
Art. 171. Nos crimes cometidos com destruição ou rompimento de
obstáculo a subtração da coisa, ou por meio de escalada, os peritos, além de descrever
os vestígios, indicarão com que instrumentos, por que meios e em que época
presumem ter sido o fato praticado.
É necessário que o perito dê uma indicação de como o criminoso teve acesso à
coisa, nos casos de crimes patrimoniais, ou à vítima, no caso de crimes contra a vida.
Podemos inferir também que obstáculo, modernamente sejam senhas e esquemas de
proteção cibernética.
Art. 200. A confissão será divisível e retratável, sem prejuízo do livre
convencimento do juiz, fundado no exame das provas em conjunto.
Apesar deste artigo não tratar diretamente de perícia, mas sim da confissão,
temos, por nossa experiência na área, que observar que em casos de crime flagrante, é
comum relativizar a necessidade de exames periciais e outras diligências, pois o
acusado já confessou seus atos, e, pelo senso comum, a confissão é a prova cabal e
definitiva, mas isto não é verdade, pois, conforme o Art. 200, a confissão pode ser
retratada a qualquer momento, tornando essenciais agora perícias e diligências que não
foram efetuados no devido tempo.
Art. 235. A letra e firma dos documentos particulares serão submetidas a
exame pericial, quando contestada a sua autenticidade.
O artigo mostra a importância que se dá a documentoscopia, tanto aos
manuscritos, hoje menos utilizados devido aos meios eletrônicos.
No Livro III do CPP, Das Nulidades e dos Recursos em Geral, Capítulo Das
Nulidades temos que: Art. 564. A nulidade (de um ato) ocorrerá nos seguintes casos:
…
III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes: …
b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o
disposto no Art. 167; …
Em se faltando o exame do corpo de delito, é previsão legal termos a nulidade
do processo, mas o exame de corpo de delito pode ser suprido por outro meio que
aponte a materialidade do crime. Igualmente, como qualquer nulidade, deve-se
comprovar que ausência de exame de corpo de delito cause prejuízos à defesa ou à
acusação, afinal, conforme CPP, Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da
nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa.
Art. 275. O perito, ainda quando não oficial, estará sujeito à disciplina
judiciária.
Art. 276. As partes não intervirão na nomeação do perito.
Art. 280. É extensivo aos peritos, no que Ihes for aplicável, o disposto sobre
suspeição dos juízes.
O perito, mesmo o ad hoc, é claramente um auxiliar do juízo, apesar de seu
trabalho, num primeiro momento, servir de suporte para a investigação policial
Local de Crime
Crime é tudo aquilo que uma determinada sociedade define como tal.
Assim, o crime é algo que é relativo e variável, dependendo da época, do lugar ou
mesmo da condição pessoal do autor ou da vítima. O crime é variável, pois depende da
opinião humana. Já a perícia criminal deve apresentar, dentro da mesma técnica, seus
resultados uniformes e de maneira independente da norma jurídica de cada região, pois
se baseia em conhecimentos técnico-científicos. Por exemplo, um exame sobre o
sistema de sorteio de uma máquina caça-níqueis deve dar o mesmo resultado, seja no
Brasil, seja no Uruguai, onde cassinos podem ser legalizados.
Conforme Edmond Locard, a existência de um crime pressupõe três elementos: a
vítima, o criminoso e o local em que se desenrolaram os acontecimentos. É o que ele
denominou de triângulo do crime. Aqui, nossa intenção é tratar deste último ponto, isto
é, o “local de crime”.
Convém salientar ainda, conforme Locard, que, quando da consecução de um
crime, “É impossível ao malfeitor agir com a intensidade que supõe a ação criminal
sem deixar traços de sua passagem. É impossível que um criminoso atue,
especialmente na tensão da ação criminal, sem deixar rastros de sua presença”. Este
importante conceito, chamado de Princípio da Troca de Locard, Princípio da Inter
Comunicabilidade, ou ainda, Princípio da Reciprocidade dos Contatos, permeia todo o
trabalho de investigação técnica em locais de crime. Seguindo o raciocínio de Locard
temos que todo criminoso deixa vestígios. Como não há crime sem criminoso, todo
crime deixa vestígios.
Entendemos por “local de crime” (Figura 2) a região do espaço em que ocorreu
um evento delituoso. Carlos Kehdy (Kehdy), nos diz que local de crime é “toda área
onde tenha ocorrido qualquer fato que reclame as providências da polícia”. Por fim,
na acepção de Eraldo Rabello (Mallmith), “Local de crime é a porção do espaço
compreendida num raio que, tendo por origem o ponto no qual é constatado o fato, se
estenda de modo a abranger todos os lugares em que, aparente, necessária ou
presumivelmente, hajam sido praticados, pelo criminoso, ou criminosos, os atos
materiais, preliminares ou posteriores, à consumação do delito, e com este
diretamente relacionados.”
A expressão “local de crime”, apesar de admitir alguns sinônimos, como “sítio
da ocorrência”, “cena do crime”, “sede da ocorrência” e “local da ocorrência”, entre
outros, tornou-se, na visão da Criminalística atual, um termo técnico e, como tal, deve
ser interpretada.Classificação de Locais de Crime
Tradicional Brasileira
Tradicionalmente, a Escola Criminalística Brasileira divide e classifica os
locais de crime quanto à porção geográfica e a natureza dos vestígios encontrados,
usando a terminologia de Local Imediato, Mediato e Relacionado (Mallmith).
Local Imediato
É aquele abrangido pelo corpo de delito e o seu entorno, local em que estarão,
também, a maior parte dos vestígios materiais. Em geral, a maioria dos vestígios que
servirão de base para os peritos esclarecerem a dinâmica dos fatos, mas não
necessariamente da autoria, concentram-se no local imediato.
Local Mediato
É a área adjacente ao local imediato. É toda a região espacialmente próxima ao
local imediato e a ele geograficamente ligada, passível de conter vestígios relacionados
com a perícia em execução.
Como exemplo prático deste conceito, podemos dizer que é bastante comum
que um perito comece a realizar seus exames e, no decorrer deles, se tornam
perceptíveis outros vestígios além dos até então detectados pelos demais agentes
públicos. O perito deve, então, ampliar a área de isolamento e apontar isto em seu
laudo. Respeitamos opiniões contrárias, mas acreditamos que nossa formulação é a
mais adequada, numa perspectiva que o objetivo visado é esclarecer os fatos.
Local Relacionado
É todo e qualquer lugar sem ligação geográfica direta com o local do crime e
que possa conter algum vestígio ou informação que propicie ser relacionado ou venha
a auxiliar no contexto do exame pericial.
Como exemplo, podemos citar locais aonde foram depositados o cadáver após
a morte, locais onde foram preparados os explosivos para um atentado contra bancos e
outros similares, ou os veículos utilizados para fugas e deslocamentos (Figura 3).
Conforme Literatura de Língua Inglesa
Nos países de língua inglesa é utilizado um sistema de classificação mais
simples e, do nosso ponto de vista, mais adequado. Nesta classificação, os locais
imediatos e mediatos são chamados, conforme John Horswell (Horswell),
simplesmente de local primário (Primary Crime Scene) e o que se chama de local
relacionado, o autor consultado chama de local secundário ou locais secundários
(Secondary Crime Scene or Scenes). Entretanto, recomendamos utilizar a
nomenclatura brasileira, por esta ser a de uso corrente.
Local Primário
O local primário é o espaço, lugar ou coisa onde o incidente ocorreu, onde a
maioria ou, pelo menos, uma grande concentração de evidências serão encontradas,
por exemplo, onde houve uma morte súbita suspeita.
Local Secundário
O(s) local(is) secundária(s) é(são) o(s) lugar(es) ou coisa(s) onde evidências
relacionadas ao incidente podem ser encontradas. É a expressão da ideia de que
vestígios podem ser trazidos ou levados para o local de crime.
Alguns exemplos incluem, sem a pretensão de esgotar a lista:
• o corpo e as vestes do falecido, quando ausentes do local de crime;
• veículos usados para transporte ou a fuga de criminosos;
• o corpo e as vestes do suspeito;
• o ambiente de moradia ou trabalho do suspeito;
• o veículo do suspeito;
• a arma utilizada no crime;
• os locais onde o crime foi preparado.
Já pedindo apologias pela generalização, podemos afirmar que o exame do
local primário é o que dará maiores elementos para se trabalhar com a dinâmica do
evento, mas o exame detalhado do local secundário é o que tem maiores possibilidades
de apontar autoria. Nossa experiência nos leva a suspeitar que o exame do local
secundário seja negligenciado na cultura criminalística brasileira.
Relacionamento entre os Tipos de Locais
Por exemplo, considere um latrocínio relacionado ao roubo de um veículo da
marca “x”, onde a condutora é morta e atirada para fora do carro e, a seguir, os
criminosos fogem com o veículo, levando um bebê que estava na cadeirinha do banco
traseiro. Alguns quarteirões adiante o veículo é abordado por viatura com policiais,
que não sabem da presença do bebê e ocorre tiroteio. O veículo consegue se
desvencilhar da abordagem e foge. Dois dias depois, o veículo é encontrado em
descampado de outra cidade, incendiado com o corpo da criança semicarbonizado.
No caso em tela, temos como local primário o local onde foi feito o assalto e
abandonado o corpo da mãe e, como locais secundários, o local do tiroteio e o local
onde foi encontrado o carro com a criança. Também existe a possibilidade de os dois
locais de morte serem tratados, inicialmente, como não relacionados e serem, portanto,
dois locais primários. Entretanto, neste caso, a boa técnica e o bom senso recomendam
que o exame de ambos seja feito pelo mesmo perito, ressalvando as hipóteses de
cansaço da equipe, limite do tempo de plantão ou envolvimento com alguma outra
ocorrência.
O Corpo de Delito
Originalmente, como aparece no Código de Processo Penal, a expressão
referia-se, com certeza, apenas ao ser humano. Todavia, do ponto de vista técnico-
pericial atual, entende-se corpo de delito como qualquer ente material relacionado a
um crime e no qual é possível efetuar um exame pericial.
“É o delito em sua corporação física.” (Mallmith)
“Corpo de delito” (art. 158), por conceito, é o conjunto de vestígios materiais
deixados pela infração ao acontecer, ou seja, o conjunto das alterações da realidade
objetiva que guardam relação de causa e efeito com o fato ilícito. Em regra, esses
vestígios são encontrados no local do crime. Não é o corpo da vítima, nem os
vestígios deixados nele, embora estes se insiram nesse conjunto. A partir dessa
premissa, cabe indagar o que a instrução normativa pretendeu significar ao substituir a
expressão original “vítima” por “corpo de delito”. (Tovo)
“Corpo de delito”, por conceito, é o conjunto de vestígios materiais deixados pela
infração ao acontecer, ou seja, o conjunto das alterações da realidade objetiva que
guardam relação de causa e efeito com o fato ilícito. Em regra, esses vestígios são
encontrados no local do crime. Não é o corpo da vítima, nem os vestígios deixados
nele, embora estes se insiram nesse conjunto, o corpo de delito.
O corpo de delito é o elemento principal de um local de crime, em torno do
qual gravitam os vestígios e para o qual convergem as evidências. É o elemento
desencadeador da perícia e o motivo e a razão última de sua realização.
Não se pode confundir o exame de corpo de delito com as perícias em geral. O
exame de corpo de delito é a perícia feita sobre os elementos que constituem a própria
materialidade do crime, enquanto as demais perícias são realizadas em outros
elementos que afetam apenas o convencimento do juiz (LOPES JR.).
Resumindo, podemos dizer que o corpo de delito é aquele objeto, ou conjunto
material, que, removido do crime, descaracterizaria por completo a ocorrência,
tornando-a até, em alguns casos, inexistente (Mallmith), daí o porquê da ausência do
exame de corpo de delito pode implicar na nulidade do processo.
A falta de comprovação da materialidade da infração, quando indispensável o
exame do corpo de delito (direto ou indireto), leva à nulidade do processo ou, ainda, à
absolvição, em razão da presunção de inocência. Ora, se não há provas suficientes para
a condenação, a absolvição é medida que se impõe, com fulcro no art. 386, VII, do
CPP.
Sobre essa nulidade, cita-se uma decisão do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal:
[…] 1. O crime de lesões corporais, por se inserir dentre aqueles que
deixam vestígios, tem sua materialidade submetida à comprovação por meio de
exame de corpo de delito, conforme o regramento inserto no artigo 158, do CPP.
2. O suprimento de tal requisito, na forma do art. 167, CPP, somente é admitido
em caráter excepcional e desde que, por razões naturais, tenham desaparecido os
vestígios. Portanto, a inércia do Estado ou o não comparecimento da vítima ao
local do exame, tempestivamente, não suprem a exigência legal, máxime quando
vacilante a prova testemunhal coligida e não encontrada a Guia do mencionado
atendimento em nosocômio público. […] (TJ/DF, Primeira Turma Recursal dos
Juizados Especiais, Acórdão n.288647, 20040910095173APJ,Rel. Sandoval
Oliveira, julgado em 16/10/2007)
Exame em Locais de Crime
“Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de
delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.” (CPP).
A análise preliminar da existência de vestígios materiais que justifiquem a
necessidade da solicitação de levantamento pericial em local de crime deve ser feita de
forma criteriosa e baseada no conhecimento de Criminalística. Entretanto, se formos
aplicar (e deveríamos) o princípio da troca de Locard, chegaremos a conclusão que
todo o crime deixa vestígios e, portanto, haveria a necessidade de sempre solicitar
perícia. Também devemos considerar que o perito é o profissional adequado para a
identificação de vestígios; em especial, os não perceptíveis a olho nu. Em suma:
exames periciais são um direito – dever, pois as vítimas têm o direito de receber justiça
e a sociedade, de dá-la.
Constatada a existência da ocorrência, deverá o policial comunicá-la à
autoridade competente para o devido encaminhamento. A função do primeiro agente
policial, entretanto, ainda não acabou. Ele deverá tomar as primeiras providências para
o isolamento do local de crime com a finalidade de preservar os vestígios lá existentes.
Portanto, não permitirá que ninguém adentre ao local do local do crime e aguardará até
a chegada de outros policiais que o substituam nesta tarefa. Observamos que a
responsabilidade dos policiais pela preservação dos vestígios existentes no local
estende-se até a chegada da autoridade policial.
Tais procedimentos, também, estão consignados como uma exigência legal no
Código de Processo Penal.
Portanto, a autoridade policial, constatada a existência do fato criminoso, irá
iniciar os trabalhos de investigação e isolar a área e preservar os vestígios do local do
crime, a fim de que os peritos possam examinar todo o conjunto de vestígios ali
dispostos. Entretanto, o entendimento tem evoluído no sentido de a autoridade enviar,
muitas vezes, os seus representantes.
Caso estes procedimentos não sejam, por alguma razão, efetuados, o exame
pericial deverá ser feito da mesma maneira, mas os peritos deverão discutir as
consequências das alterações havidas, conforme Código de Processo Penal (CCP)
artigo 169, parágrafo único: “Os peritos registrarão, no laudo, as alterações do estado
das coisas e discutirão, no relatório, as consequências dessas alterações na dinâmica
dos fatos”. (Incluído pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994) (CPP). 
A presença dos peritos no local do delito, todavia, não substitui as ações da
autoridade policial, à qual caberá, além dos procedimentos para isolar o local de crime
e impedir o acesso de qualquer elemento alheio à equipe da perícia, ações que
possibilitem a segurança dos peritos e sua equipe, viabilizando deste modo a conclusão
do trabalho pericial.
Os trabalhos periciais no local de uma ocorrência findam quando o perito
esgotar todas as possibilidades de exames e se der por satisfeito com eles, momento
em que ele autorizará à autoridade policial a remover a interdição do sítio do delito. A
autoridade policial, entretanto, em acordo com os peritos, ou não, poderá optar por
manter o local isolado, quando a interdição se mostrar imprescindível para os trabalhos
preliminares de investigação, ou para novos exames periciais. Por exemplo: um local
de crime examinado à noite, pode ficar “congelado” até o surgimento da luz do sol
para a realização de exames e procura de novos vestígios, sempre que isto for julgado
adequado. Esta é a situação real do estado da arte e das capacidades dos órgãos de
segurança no momento, mas o ideal seria que o local ficasse preservado por alguns
dias, até que os exames dos primeiros vestígios em laboratório e as primeiras
diligências policiais apresentem linhas de investigação, o que poderia demandar novas
perícias no local.
Posteriormente à perícia, os peritos lavrarão um documento no qual constarão
todas as informações circunstanciais ao evento, bem como, se possível, as conclusões
a que chegaram. Este documento poderá se constituir num Laudo ou numa simples
Informação, técnica ou de ordem administrativa, à autoridade solicitante.
Aqui cabe esclarecer que o exame pericial constitui meio de prova não
repetível, produzido em regra antes da instauração do processo criminal devido à
provisoriedade dos vestígios, configurando nesse caso produção antecipada de
prova, submetida às regras judiciárias, ainda que não sob tutela judicial. (Tovo)
O procedimento padrão, conforme antes apregoado, pode ser assim resumido:
Primeiro policial ou agente público: Verificar a existência da
ocorrência; isolar o local do crime;
Demais policiais ou agentes públicos: Isolar e preservar o local do
crime;
Autoridade policial, ou seus representantes: Comparecer ao local;
solicitar a perícia a ser realizada; garantir a segurança dos peritos e sua
equipe; apreender os objetos relacionados com o fato;
Peritos: Atender à solicitação da autoridade policial, realizar a perícia e
consignar em documento todas as informações relativas ao trabalho
desenvolvido.
Essa especial função dos peritos oficiais recebe o nome de polícia técnico-
científica, embora nada tenha de policial no sentido coloquial[2]. Aliás, essa a razão
de o papel da persecutio criminis extrajudicial ser designado como polícia judiciária,
única que se cogita adequada para o adjetivo judiciário. Claro, seus achados orientam
a investigação e preparam a persecutio criminis judicial, mas destinam-se à cognição
judicial. (Tovo)
Podemos ainda dizer sobre local de crime que os vestígios podem ser
Da Fotografia
Art. 164. Os cadáveres serão sempre fotografados na posição em que forem
encontrados, bem como, na medida do possível, todas as lesões externas e vestígios
deixados no local do crime. (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994).
Art. 165. Para representar as lesões encontradas no cadáver, os peritos,
quando possível, juntarão ao laudo do exame provas fotográficas, esquemas ou
desenhos, devidamente rubricados.
O mandamento legal implica que mesmo quando a morte ocorreu em
condições grotescas, a perícia deve executar o levantamento fotográfico. Igualmente, o
cadáver deve ser despido, se for o caso, para a fotografia das lesões aparentes. Não
cabe aqui invocar a proteção à intimidade da família da vítima, pois um bem maior se
levanta, no caso a necessidade de se fazer justiça. Por outro lado, cabe sim a todos os
envolvidos que seja evitada a circulação destes materiais em redes sociais, por
exemplo.
O Legislador não atribui expressamente quem deve ser responsável pela
produção de fotografias, mas expressa que as mesmas, para terem validade, devem ser
rubricadas pelo perito, assim, mesmo quando as fotografias são produzidas por outros
que não o perito, o mesmo é o responsável último por quais delas irão ser juntadas ao
laudo, o mesmo valendo para esquemas, ou seja, o perito pode se valer da arte de outra
pessoa para fazer esquemas e gráficos, mas deve com sua rubrica se responsabilizar
por estes trabalhos. Observa-se que servidor do órgão de perícia não é sinônimo de
perito oficial. Grifa-se que perito oficial é aquele a quem a Lei assim o denomina.
A pretensão de ser a fotografia de locais de crime atribuição exclusiva do cargo
de fotógrafo criminalístico já foi afastada por decisão judicial.
APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA. DETERMINAÇÃO
DO DIRETOR DO DEPARTAMENTO DE CRIMINALÍSTICA DO IGP
FACULTANDO AOS PERITOS A CONVOCAÇÃO DE FOTÓGRAFOS
CRIMINALISTAS. ATO QUE NÃO CONFIGURA ILEGALIDADE. Inexiste
ilegalidade na determinação do Diretor do Departamento de Criminalística do
Instituto Geral de Perícias, que faculta aos peritos a convocação de fotógrafos
criminalistas. A execução de fotografias insere-se, também, nas atribuições dos
peritos criminais, conforme prevê a Lei Estadual 11.770/2002. A determinação
não afronta a legislação nem inviabiliza a função dos fotógrafos criminalistas
porque estes detêm outras atribuições especializadas que poderão ser requeridas
inclusivequando necessário para a confecção de laudos periciais.
À UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DE
APELAÇÃO.
(TJ-RS - AC: 70034126995 RS, Relator: José Luiz Reis de Azambuja,
Data de Julgamento: 23/02/2011, Quarta Câmara Cível, Data de Publicação:
09/03/2011)
Isolamento em Locais de Crime
O primeiro policial a chegar ao local deve averiguar se de fato existe a
ocorrência que lhe foi comunicada. Para tanto, deve o policial penetrar no local do
crime e dirigir-se até o corpo de delito. O deslocamento no local imediato/mediato até
o corpo de delito deve ser feita pelo ponto acessível mais próximo a este, de tal forma
que a trajetória até ele seja uma reta. Constatado o delito, o policial deverá retornar
para a periferia do local do crime, percorrendo a mesma trajetória que o levou até o
corpo de delito no sentido inverso. O percurso deverá ser memorizado pelo policial,
visto que posteriormente deverá ser comunicado aos peritos. Toda a movimentação dos
policiais para averiguar o ocorrido deve ser meticulosa e absolutamente nada deve ser
removido das posições que ocupavam quando da configuração final do crime.
Evidentemente nada é absoluto e, para evitar mal maior, como perdas de vidas,
por exemplo, esta regra admite várias exceções, tais como, socorro à vítima. A vida é o
principal valor da nossa sociedade, a justiça é o segundo. Logo um local de crime pode
ser prejudicado para prestar socorro a qualquer pessoa.
Boas práticas que podem causar algum prejuízo a preservação:
Para conhecimento do fato (forçamento de janelas e portas (Figura 5);
Verificar se houve mesmo óbito;
Varrimento do local a procura de vítimas com vida ou autores;
Prisão em flagrante do autor;
Extinção de incêndios e neutralização de explosivos;
Iniciar de imediato os primeiros socorros se há qualquer pessoa que deles
necessite;
Permitir a ajuda de populares profissionais de saúde ou habilitados, nos
socorros, pondo isto à termo;
Priorizar o trabalho de paramédicos e outros e reportar as alterações
feitas no local;
Permitir a passagem de ambulâncias, carros de bombeiros e outras
viaturas, mesmo que não relacionadas com o fato em lide;
Remover veículos em caso de eventos envolvendo veículos para evitar
um mal maior, por exemplo: caos na circulação viária.
A realização de um isolamento adequado é um dos elementos mais importantes
a serem observados pelos agentes da lei que primeiro chegarem ao local de crime.
Qualquer alteração, por mínima que seja, deve ser evitada, porque a priori não se pode
saber qual delas pode prejudicar (ou impedir) que os peritos cheguem a uma conclusão
sobre o que ocorreu no local.
Com relação à sua abrangência, deve-se tentar isolar a maior área possível em
torno do evento. Por exemplo: em um local de homicídio, com uma vítima caída no
chão de um dormitório, não basta isolar apenas o quarto. O “local do crime” deve ser
considerado como a casa inteira, já que não se sabe em que locais serão encontrados
vestígios relativos ao homicídio. Desse modo, ainda que seja difícil, na prática,
impedir totalmente o acesso de familiares ao interior do prédio, ou retirá-los para
algum ponto mais afastado do centro do local de crime, não devem ser poupados
esforços nesse sentido.
Lembramos, por fim, que o isolamento do local, mesmo após a perícia, poderá
ser mantido, a pedido do perito, caso ele julgue necessários exames complementares
no sítio da ocorrência com equipamentos especiais ou indisponíveis no momento, ou
ainda, por razões como falta de luminosidade, difícil acesso, et cetera.
Por que isolar o local de crime?
Os vestígios de uma cena de crime podem ser classificados em examináveis em
in situ ou examináveis ex situ.
Conforme Tovo (Tovo), há vestígios que só podem ser inspecionados e
avaliados no local do crime (in situ), por não terem “materialidade” ou não serem
coletáveis e transportáveis a outro local, e outros que podem sê-lo em sítio diverso, um
laboratório, por exemplo (ex situ). Quase que invariavelmente, locais de crimes
ostentam vestígios das duas espécies, e, muitas vezes o mesmo objeto examinando
reúne uns e outros. Por exemplo, a posição do cadáver e as circunstâncias em que é
encontrado só podem ser verificadas in situ, mas a necrópsia é feita em sala da
Medicina Legal e os exames de teor etílico são feitos em laboratório apropriado. 
O isolamento e a preservação do local do crime são imprescindíveis para
conservar os vestígios periciáveis exclusivamente in situ. O desfazimento da cena do
evento prejudica a realização deste tipo de exame. Quando a alteração é parcial, ainda
permite que o perito perceba o que foi alterado ou contaminado por terceiros. Quando
o desfazimento é integral, sobram apenas vestígios periciáveis ex situ e para estes, a
tradicional providência policial de apreensão e encaminhamento do objeto para a
perícia está de bom tamanho, o mesmo valendo para objetos e substâncias oriundas de
busca e apreensão policial em indivíduos, veículos ou estabelecimentos.
Em suma, a preservação e o isolamento visam:
Analisar os vestígios materiais que qualificam uma infração penal;
Preservar os vestígios materiais que auxiliem na identificação do
criminoso;
Perpetuação e legalização das provas materiais;
Descartar uma falsa comunicação de ocorrência.
O Trabalho do Perito e os Fins da Perícia
Trata o trabalho do perito (a perícia), em síntese, de uma descrição do local do
crime e dos vestígios materiais e evidências lá constatadas, ilustradas com fotografias
e, se necessários, desenhos e esquemas que facilitem a compreensão dos exames
realizados. A partir da perícia, o perito poderá, quando os vestígios e evidências
verificados no local assim o permitirem, inferir e discorrer sobre a dinâmica do evento
e determinar ou excluir alguma circunstância, hipótese ou particularidade associada ao
local examinado ou à ação que ali teria ocorrido.
A perícia objetiva, sumarizando:
Analisar todos os vestígios materiais existentes para constatar a
materialidade do fato, ou seja, a efetiva ocorrência do fato que foi informado
à Autoridade policial;
Possibilitar, pela análise dos vestígios materiais encontrados, a
qualificação da infração penal;
Buscar, nas evidências, a identificação da autoria;
Perpetuação do local de crime e de todos os elementos nela constantes;
Apontar para a ocorrência de uma falsa comunicação de crime.
Por fim, é interessante informar que o trabalho do perito apenas começa no
local do crime. O atendimento ao local é somente a ponta do iceberg da práxis pericial.
O estudo do caso, a tarefa de transformar vestígios em evidências, a reconstituição da
lógica dos eventos que culminaram com a local do ilícito verificado e a confecção do
Laudo Pericial consomem substancialmente muito mais tempo que o atendimento em
si, numa proporção aproximada de 1/10.
Quesitos
A perícia criminal deve ser provocada pela autoridade interessada em elucidar
fatos relativos ao corpo de delito e à coisa apreendida. A forma clássica dessa
provocação é a formalização de quesitos, conforme o art. 160 do Código de Processo
Penal, tarefa frequentemente complexa devido à vasta gama de materiais e modus
operandi da criminalidade. O CPP determina que os peritos responderão aos quesitos
formulados, mas o que é um quesito? Consultando a legislação, somos por entender
que quesitos são perguntas ou questões feitas aos peritos numa ação. Podem ser
normais, quando o assunto é tratado pela primeira vez naquela lide, ou
complementares, quando visam elucidar detalhes a respostas já dadas, ou adendar
novos quesitos aos já formulados.
Entretanto, existe a necessidade de uma certa cautela, pois o CPP também
chama de quesitos às questões formuladas aos jurados de tribunal de júri (ver CPP, art.
484). Trata-se de institutos diferentes, mesmo tempo o mesmo nome, não podendo
haver confusão entre o que se aplica a um e a outro.
Temos algumas respostas que são de exigência do próprio CPP, são os quesitos
obrigatórios, pois são exigência da própria legislação.
Art. 171. Nos crimes cometidoscom destruição ou rompimento de obstáculo a
subtração da coisa, ou por meio de escalada, os peritos, além de descrever os vestígios,
indicarão com que instrumentos, por que meios e em que época presumem ter sido o
fato praticado. 
Em uma situação típica de crime patrimonial, pois a legislação cota substrução
da coisa, os peritos devem esclarecer, se possível, se houve destruição ou rompimento
de obstáculo, se houve escalada. Em havendo qual seria o instrumento e o tempo
decorrido desde o fato praticado.
Por evidente, os quesitos não devem se restringir aos já previstos na legislação,
constituindo estes, uma pequeníssima fração dos quesitos possíveis e úteis para a
elucidação dos fatos, porém quando não se tem uma forte linha de investigação, o
normal para todo começo de persecução penal, nos são oferecidos os quesitos
recomendados pelos diversos órgão de perícia para os casos mais típicos. A Polícia
Federal (Polícia Federal 60, 63), por exemplo, recomenda para crimes contra o
patrimônio os quesitos abaixo, aplicáveis conforme do tipo de crime:
Houve escalada para ter acesso ao local? Caso positivo, qual o meio
empregado?
Quais os sinais de arrombamento ou destruição de obstáculos externos
para acesso ao local?
Internamente há vestígios de destruição ou rompimento de obstáculos
para subtração de coisas?
Existem marcas de instrumentos utilizados para destruir ou romper os
obstáculos internos? 
É possível identificar o instrumento e/ou substância (inflamável,
explosivo etc.) empregados no evento? Em caso positivo, qual?
É possível identificar o número de pessoas que participaram do evento?
No local existem vestígios de coisas subtraídas? Pelas marcas existentes
no local seria possível identificar o que fora subtraído, tendo por base a lista
das coisas faltosas com as respectivas características? Caso positivo, quais?
É possível comprovar a ocorrência da subtração e quais bens foram
subtraídos?
Qual é o valor estimado da coisa subtraída?
É possível identificar o horário em que se deu o evento?
Qual é o valor estimado da coisa subtraída?
Existem vestígios no local que possam indicar a autoria do delito? Caso
positivo, quais?
Para consecução do evento houve violência ou ameaça à vítima por meio
de arma?
A violência empregada pelo agente deu causa a lesão corporal ou morte
da vítima?
Durante o evento o agente manteve a vítima em seu poder, restringindo
sua liberdade?
É possível identificar como foi a dinâmica do evento?
Art. 173. No caso de incêndio, os peritos verificarão a causa e o lugar em que
houver começado, o perigo que dele tiver resultado para a vida ou para o patrimônio
alheio, a extensão do dano e o seu valor e as demais circunstâncias que interessarem à
elucidação do fato.
Nas pericias de incêndio é obrigatório responder sobre a causa, o lugar onde
começou (o foco do incêndio) e se dele tiver resultado perigo para a vida ou
património alheio, aí entendemos como risco de propagação para mais de um
domicilio ou propriedade, além das questões ligadas à merceologia.
Estes e mais alguns outros aqui não mencionados são os quesitos já
determinados pela legislação, mas o ato de elaborar quesitos para a criminalística não
deve ser resumido ao uso de uma lista de perguntas pré-processadas – isto seria
engessar o presidente do inquérito, mas sim, os quesitos devem ser pensados para cada
caso concreto, levando em conta as inovações peculiares do crime (Polícia Federal 9).
Cadeia de Custódia
Cadeia de custódia nada mais vem a ser que o conjunto de práticas e métodos
que visam garantir que um vestígio, desde a sua coleta até o final do processo, seja
preservado e inviolado, com os devidos mecanismos para que isto possa ser auditado.
No mínimo, se deve ter documentado e certificado as pessoas que de alguma forma
manipularam a evidência, a razão da manipulação, a data e o local.
Conforme CPP, Art. 158-A, considera-se cadeia de custódia o conjunto de
todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do
vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e
manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte. (Incluído pela Lei nº 13.964,
de 2019).
A cadeia de custódia se inicia com o primeiro agente público chega ao local e
reconhece a existência de vestígios, dando início a sua preservação, conforme CPP,
Art. 158-A… § 1º O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de
crime ou com procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a
existência de vestígio. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) …§ 2º O agente público
que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a produção da prova
pericial fica responsável por sua preservação. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019).
A cadeia de custódia, segundo a doutrina brasileira (SNSP - Secretaria
Nacional de Segurança Pública), compreende o rastreamento do vestígio nas etapas
que foram fixadas no CPP, Art. 158-B. A cadeia de custódia compreende o
rastreamento do vestígio nas seguintes etapas: (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
I - reconhecimento: ato de distinguir um elemento como de potencial interesse
para a produção da prova pericial; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
II - isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e
preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime;
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
III - fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de
crime ou no corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser ilustrada
por fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição no laudo
pericial produzido pelo perito responsável pelo atendimento; (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
IV - coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial,
respeitando suas características e natureza; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
V - acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é
embalado de forma individualizada, de acordo com suas características físicas,
químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de
quem realizou a coleta e o acondicionamento; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VI - transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando
as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a
garantir a manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua
posse; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VII - recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve
ser documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento
e unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou
o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo,
assinatura e identificação de quem o recebeu; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
VIII - processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo
com a metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a
fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido
por perito; (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
IX - armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições
adequadas, do material a ser processado, guardado para realização de contra perícia,
descartado ou transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente;
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
X - descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a
legislação vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial. (Incluído pela
Lei nº 13.964, de 2019)
Igualmente o CPP prevê que, em locais isolados, é proibida a entrada, bem
como a remoção de vestígios antes da liberação pelo perito responsável, porém em
locais não isolados, como por exemplo, busca e apreensão, operações policiais em
geral, é possível a apreensão de objetos aserem encaminhados à perícia, observando
que, mesmo nestes casos recomenda-se a presença do perito, o que é correto visto que
o perito é o profissional que domina as técnicas de identificar e coletar vestígios, de
modo especial os latentes, conforme Art. 158-C. A coleta dos vestígios deverá ser
realizada preferencialmente por perito oficial, que dará o encaminhamento necessário
para a central de custódia, mesmo quando for necessária a realização de exames
complementares. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º Todos vestígios coletados no decurso do inquérito ou processo devem ser
tratados como descrito nesta Lei, ficando órgão central de perícia oficial de natureza
criminal responsável por detalhar a forma do seu cumprimento. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019) 
§ 2º É proibida a entrada em locais isolados bem como a remoção de quaisquer
vestígios de locais de crime antes da liberação por parte do perito responsável, sendo
tipificada como fraude processual a sua realização. (Incluído pela Lei nº 13.964, de
2019) 
Para garantir a rastreabilidade do vestígio e a inviolabilidade a Lei determina
que todos os vestígios devem ser acondicionados em embalagens adequadas, com
numeração individualizada, com lacre e com identificação de quem fez o devido
manuseio, determinando que a embalagem seja aberta somente pelo perito que irá
manipular o material e, nestes casos, o material deve ser armazenado em nova
embalagem lacrada e numerada, com a colocação da embalagem antiga dentro desta
última, conforme CPP, Art. 158-D. O recipiente para acondicionamento do vestígio
será determinado pela natureza do material. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) 
§ 1º Todos os recipientes deverão ser selados com lacres, com numeração
individualizada, de forma a garantir a inviolabilidade e a idoneidade do vestígio
durante o transporte. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019
§ 2º O recipiente deverá individualizar o vestígio, preservar suas
características, impedir contaminação e vazamento, ter grau de resistência adequado e
espaço para registro de informações sobre seu conteúdo. (Incluído pela Lei nº 13.964,
de 2019) 
§ 3º O recipiente só poderá ser aberto pelo perito que vai proceder à análise e,
motivadamente, por pessoa autorizada. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) 
§ 4º Após cada rompimento de lacre, deve se fazer constar na ficha de
acompanhamento de vestígio o nome e a matrícula do responsável, a data, o local, a
finalidade, bem como as informações referentes ao novo lacre utilizado. (Incluído
pela Lei nº 13.964, de 2019) 
§ 5º O lacre rompido deverá ser acondicionado no interior do novo
recipiente. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) 
Central de Custódia
Determina o CPP que todos os Institutos de Criminalística deverão ter uma
central de custódia destinada à guarda e controle dos vestígios, com sua gestão
vinculada diretamente órgão central de perícia de natureza criminal e dá outras
providências, entretanto, entendemos que por um bom tempo e por largo espaço
geográfico no Brasil este mandamento legal será programa a ser um dia alcançado,
dado o nível da exigência e da precariedade de recursos financeiros e humanos
disponíveis , conforme CPP, Art. 158-E, todos os Institutos de Criminalística
deverão ter uma central de custódia destinada à guarda e controle dos vestígios, e sua
gestão deve ser vinculada diretamente ao órgão central de perícia oficial de natureza
criminal. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 1º Toda central de custódia deve possuir os serviços de protocolo, com local
para conferência, recepção, devolução de materiais e documentos, possibilitando a
seleção, a classificação e a distribuição de materiais, devendo ser um espaço seguro e
apresentar condições ambientais que não interfiram nas características do vestígio.
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 2º Na central de custódia, a entrada e a saída de vestígio deverão ser
protocoladas, consignando-se informações sobre a ocorrência no inquérito que a eles
se relacionam. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
§ 3º Todas as pessoas que tiverem acesso ao vestígio armazenado deverão ser
identificadas e deverão ser registradas a data e a hora do acesso. (Incluído pela Lei
nº 13.964, de 2019)
§ 4º Por ocasião da tramitação do vestígio armazenado, todas as ações deverão
ser registradas, consignando-se a identificação do responsável pela tramitação, a
destinação, a data e horário da ação. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) 
Art. 158-F. Após a realização da perícia, o material deverá ser devolvido à
central de custódia, devendo nela permanecer. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)
Parágrafo único. Caso a central de custódia não possua espaço ou condições de
armazenar determinado material, deverá a autoridade policial ou judiciária determinar
as condições de depósito do referido material em local diverso, mediante requerimento
do diretor do órgão central de perícia oficial de natureza criminal. (Incluído pela Lei nº
13.964, de 2019)
No parágrafo único do artigo 158-F, o legislador vendo a dificuldade a curto e
médio prazo para implantação das centrais de custódia pelo país, prevê a alternativa de
armazenar os vestígios em local diverso, sem especificar quais, e devolvendo a
incumbência da guarda de vestígios para as delegacias de polícia, e seguir com os
depósitos em Delegacias de Polícia, Foros e em outros locais.
2. MEDICINA LEGAL APLICADA À LOCAL DE
CRIME
Morte
A vida é o intervalo de tempo entre o nascimento e a morte. Assim como não
há consenso sobre o que se deve considerar como o marco do início da vida, também
não há acordo geral sobre o exato momento em que se dá a morte.
Por outro lado, se morte legal é um momento, a morte técnica, para fins de
criminalística, é um processo a ser estudado para se explicar as circunstâncias de um
evento que está sob a investigação do estado. O processo da morte se inicia com a
morte cerebral e termina em tempo indefinido, ao fim do qual o corpo ou terá deixado
de existir ou será transformado em restos. A morte cerebral é dada, segundo o CFM –
Resolução 2.173/2017 (Conselho Federal de Medicina - Brasil), quando se apresentar
coma aperceptivo com ausência de atividade motora supra espinal e apneia, sendo
indicados exames complementares que demonstrem:
ausência de atividade elétrica cerebral;
ausência de atividade metabólica cerebral;
ausência de perfusão sanguínea cerebral.
a norma também prevê a realização de exames complementares para se
comprovar de forma inequívoca uma das condições:
ausência de perfusão sanguínea encefálica;
ausência de atividade metabólica encefálica;
ausência de atividade elétrica encefálica.
Do ponto de vista da criminalística as mortes podem ser separadas em dois
grandes grupos: morte por causas internas ou morte por causas externas.
Morte por Causas Internas
É aquela, conforme a Classificação Estatística Internacional de Doenças e
Problemas Relacionados com a Saúde, versão 10 (CID-10) (World Health
Organization (WHO) - OMS), que pode ser atribuída à velhice ou à decorrência de
doenças. Normalmente, o estado não tem interesse criminal na morte natural, mas,
para que uma morte seja entendida pacificamente como tal, deve existir uma
declaração de óbito emitida por médico e nenhuma suspeita fundamentada sobre sua
natureza. Sempre que a morte ocorrer em circunstâncias em que não houver um
médico para declarar o óbito da vítima, temos que pensar em morte suspeita e o
cadáver deverá ser submetido à autópsia no Departamento Médico-Legal. Havendo
confirmação de suspeitas, pela autópsia, de que o óbito pode não ser de uma morte
natural, os locais relacionados a esta morte deverão, caso preservados, ser objeto de
perícia. Também existem situações em que, mesmo a morte sendo de causa interna, a
perícia Criminal pode vir a ser chamada para verificar possíveis omissões de socorro,
abandono de incapaz ou negligência por parte de quem deveria tem tido a obrigação de
agir. Apenas a títulode estatística, houve 168 mortes oficiais por negligência e
abandono (CID-10 Y06) e 1303 por outros maus tratos (CID-10 Y07) no Brasil na
década de 2008-2017 (Ministério da Saúde, Brasil). Salientamos que, como tudo o que
se refere a crime, podemos ter cifras escondidas, ou seja, casos de mortes criminosas
que não são tratadas como tais.
Igualmente, temos os casos de contaminação intencional por agente infeccioso,
notadamente AIDS, que a justiça brasileira tem tratado como homicídio doloso tentado
ou consumado. Trata-se de agressão não usual, porém, no Brasil de 2008 até 2017,
tivemos 114 casos reportados do código CID-10 X85 (Agressão meio drogas,
medicamentos e substâncias biológicas) (Ministério da Saúde, Brasil).
Morte por Causa Externa 
É aquela, conforme Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados com a Saúde, versão 10 (CID-10) (World Health Organization (WHO) -
OMS), que pode ser decorrente de fator externo claramente tipificado.
Tradicionalmente, as mortes violentas são classificadas de maneira popular em
homicídios, suicídios ou acidentes, com a expressão homicídios englobando
homicídios, feminicídios, latrocínios, infanticídios, nas suas modalidades dolosas ou
culposas, mortes no exercício do dever, legítima defesa e mortes por necessidade
(Figura 6).
No Brasil, no período de 1996 – 2017, apesar de o número de mortes por
causas externas, devido ao aumento da violência, ter aumentado em valores absolutos,
em termos relativos verifica-se leve queda de percentual em relação ao número total de
óbitos, em uma oscilação de 13% para 12%. Atribuímos tal fato ao envelhecimento da
população e o natural aumento do número de morte por causas internas.
Aspectos Técnicos sobre a Morte
As equipes que trabalham em locais de crime devem conhecer bem os aspectos
exteriores da morte no corpo e tratá-los como vestígios importantes para estudo do
local de crime, com o objetivo de estabelecer dinâmicas e avaliações de tempo de
morte. Sem pretender avançar sobre a área da Medicina Legal, iremos elencar alguns
conhecimentos necessários para a análise de um local de crime com corpo presente.
Rigor Mortis
Rigor mortis, ou rigidez cadavérica, é uma reação química que envolve a
adenosina e a miosina das fibras musculares. Esta reação se estabelece e, depois de
algum tempo, se dissipa. Num local de crime, o rigor mortis é geralmente verificado
no queixo, nos braços e nas pernas e pode ser expresso, com pequenas variações de
autor para autor, na seguinte gradação (S. A. Wagner, Color Atlas of Autopsy 16):
Ainda não presente;
Estabelecendo-se na mandíbula;
Estabelecendo-se nas extremidades dos membros;
Rigidez completa;
Em processo de dissipação;
Não mais presente.
Na temperatura ambiente, de cerca de 21ºC, o corpo permanecerá por 24 até 36
horas, segundo Wagner (S. A. Wagner, Color Atlas of Autopsy 16), ou 48 h, conforme
Lee (Lee 232), após a morte, em rigidez. Neste período, os músculos relaxam,
normalmente, na mesma ordem em que ficaram rígidos; Pickering (Pickering 114)
fornece uma tabela prática para estimar o intervalo de morte a partir do rigor mortis
(Tabela 1).
Tabela 1 Intervalo de Rigor Mortis
Estimativa de tempo após a morte, baseada no Rigor Mortis.
Exame Intervalo Variação
Sem rigor mortis (corpo quente) 0 – 2 h 0 – 5 h
Rigor mortis progressivo (corpo
quente) 2 – 6 h 1 – 8 h
Rigor mortis estabelecido 6 – 12 h 1 – 24 h
Rigor mortis dissipado 18 – 36 h oumais.
12 – 48 ou
mais.
Conforme Eckert (Eckert 107), para fins de informação sobre as circunstâncias
da morte, é mais importante examinar este aspecto quando o corpo for encontrado do
que, horas mais tarde, na sala de autópsia. Como o rigor mortis é uma reação química,
há muitas variáveis em relação à sua taxa de formação, as quais dependem do
ambiente, do tamanho da pessoa e da condição do indivíduo no momento da morte.
Entretanto, apesar da falta de critérios uniformes das informações, alguns fatos
observados de forma consistente na realidade são aceitos como verdade (Eckert 323):
Os músculos começam a endurecer depois do intervalo de 1 a 3 horas
após a morte, segundo Wagner (S. A. Wagner, Color Atlas of Autopsy 33),
ou 3 a 4 horas, segundo Wilkinson (Wilkinson 249), na temperatura
ambiente no entorno de 21ºC;
A rigidez irá se estabelecer plenamente entre 9 a 12 horas após a morte;
Febre alta ou alta temperatura do ambiente fará com que a rigidez se
manifeste mais cedo, pois as reações químicas são, geralmente, mais rápidas
em temperaturas maiores;
O rigor mortis ocorre mais rapidamente se o morto esteve envolvido em
atividade física extenuante, pouco antes da morte, como por exemplo, uma
luta corporal intensa ou afogamento;
Rigor mortis é detectado, normalmente, na seguinte ordem: mandíbula,
face, membros superiores e membros inferiores;
O corpo pode ser considerado em rigidez completa quando o maxilar, os
cotovelos e articulações do joelho são inamovíveis;
A força da gravidade não é suficiente para desfazer a rigidez; então, a
observação da forma que tomou o corpo, em conjunto com os livores de
hipóstase, podem indicar se ele foi movido após a morte.
Na Figura 8, temos um caso em que as mãos indicam que esta não foi a posição
original do cadáver. Também se observa que as vítimas muito jovens ou as muito
idosas apresentam rigidez menos caracterizada devido ao menor desenvolvimento da
massa muscular (Fisher 429). 
Livor Mortis
Livor Mortis, ou livores de hipóstase (Figura 7), é apenas o resultado da ação da
gravidade sobre o tecido sanguíneo, pois, com a morte, a pressão arterial cai para zero
e o sangue passa a se depositar livremente nos capilares e pequenos vasos das áreas do
corpo que estejam em menor altura que as demais, assumindo estas regiões a coloração
púrpura. Nas áreas inferiores dos corpos que estejam diretamente em contado com o
solo, colchão, piso ou outro substrato, o livor não se desenvolve, devido à pressão
sobre a pele, restando estas áreas com uma coloração esbranquiçada; assim, o livor,
que seria a palidez do cadáver, está sempre associado às áreas de coloração púrpura,
onde o sangue se depositou. O mesmo acontece com o corpo depositado em um
caixão, com o rosto ficando lívido pela deposição do sangue nas áreas dependentes
(Wilkinson 249, 250).
Após a morte, com a parada do coração, o sangue se instala na parte mais baixa do
corpo. Se essas áreas forem pressionadas, a coloração purpura irá refluir e ocasionar o
“branqueamento” temporário da zona sob pressão. Se um corpo é movido antes do
livor mortis se estabilizar, a área da lividez irá mudar, podendo gerar dois padrões de
lividez. Numa segunda fase, a coloração se torna fixa e a mudança de posição do
cadáver não irá ocasionar mudança no padrão dos livores. Este fenômeno pode ser útil
para se determinar se um corpo foi movido.
O livor mortis normalmente se apresenta nas seguintes manifestações:
Ausente;
Não fixo nas áreas inferiores;
Parcialmente fixo nas áreas inferiores;
Fixo nas áreas inferiores;
Cobrindo a maior parte ou todo o corpo, por exemplo, nas vítimas
encontradas na água, onde o corpo vai assumindo diversas posições ao longo
do processo (Figura 9).
Olhos sem experiência podem confundir lividez intensa com contusão, mas
qualquer dúvida sobre este aspecto pode ser esclarecida na necropsia, uma vez que o
livor mortis não produz hemorragia na pele, ao contrário da contusão.
Listaremos abaixo os principais fatos sobre livor mortis que devem ser levados
em consideração para o exame do corpo no local de crime (S. A. Wagner, Color Atlas
of Autopsy):
A coloração vermelho-arroxeadas nos tecidos já pode ser observada a
partir de 30 minutos a 4 horas, conforme Pickering (Pickering 114), após a
morte e se torna cada vez mais visível ao longo do tempo;
O sangue vai primeiramente se depositar por gravidade nos vasos e, em
seguida, nos tecidos, mas as áreas do corpo que servem de apoio para ele
sofrem compressão, não havendo nelas deposição de sangue, o que lhes
confere uma coloração esbranquiçada (o livorpropriamente dito), o mesmo
ocorrendo com áreas próximas a ossos;
Cerca de 1 hora ou de 1 a 4 h, conforme Pickering, após a morte o livor
já está visível e torna-se fixo entre 8 a 10 horas, 12 horas, conforme
Wilkinson (Wilkinson 244), 6 a 12 h, conforme Pickering (Pickering 114),
depois do fim dos batimentos cardíacos;
Quando o livor é fixo, as porções de cor púrpura não irão se descolorir
sob pressão e a coloração típica permanecerá nestas áreas, mesmo que o
corpo seja reposicionado;
Se o corpo for movido após o livor ter se fixado, as novas áreas
inferiores continuarão descoloridas;
Livor fixo observado em área não inferior significa, com certeza, que o
corpo teve a sua posição alterada após o intervalo de fixação dos livores;
O livor mortis será visível até que o corpo se torne completamente
descolorido pela decomposição;
O envenenamento por monóxido de carbono fará com que o livor seja de
um vermelho mais brilhante, tendendo para a cor cereja, devido à
modificação da coloração da hemoglobina aderida a este gás. Já o
resfriamento do corpo e o envenenamento por cianeto produzem coloração
de um vermelho tendendo ao róseo;
O livor mortis pode ser difícil de perceber e avaliar em indivíduos de
pele escura;
Lividez intensa em áreas baixas, como a cabeça ou as extremidades dos
membros inferiores, pode causar ruptura dos capilares e petéquias
hemorrágicas post-mortem.
Conforme Pickering, não se deve fazer avaliação do tempo de morte apenas
através dos livores, pois existem muitas variáveis envolvidas. “Livor should never be
used by itself to make a time of death determination; there are too many variables that
affect the times of this settling.” (Pickering 114). Ainda assim, apesar das dificuldades
do uso dos livores para determinar o período da morte, o uso destes para verificar
modificações no local de crime é extremamente importante, não podendo ser
desprezado.
Algor Mortis
Algor mortis é o resfriamento natural da temperatura do corpo após a morte
(Wilkinson 249). Este conceito parte do pressuposto que a temperatura do meio
ambiente é inferior à temperatura de 37ºC, o que nem sempre é correto. Na verdade,
após a morte os mecanismos de geração de calor do ser humano começam a deixar de
existir e a temperatura do corpo tende a se equilibrar com a do meio-ambiente, seja ela
qual for.
O decréscimo de temperatura é o método científico mais comum para estimar a
hora da morte (S. A. Wagner, Death Scene Investigation: A Field Guide 39), mas há
muitas variáveis que complicam esta estimativa, pois toda e qualquer transferência de
temperatura se dá por convecção, radiação, evaporação e condução e o processo não se
dá de maneira linear, mas de acordo com uma parábola, tendo taxas maiores no seu
início e, à medida em que as temperaturas vão se equilibrando, menores. Em um corpo
humano não é diferente, pois:
A velocidade deste equilíbrio depende de uma série de fatores, a começar
pela temperatura ambiente, onde a temperatura do corpo vai diminuir mais
rapidamente num ambiente frio do que num ambiente quente ou com
ventilação ou vento do que num com ar parado;
Em ambientes secos, a perda de calor é mais rápida do que em ambientes
úmidos, pois o ressecamento (vaporização da água) é uma reação
endotérmica;
Corpos menores, esbeltos, velhos ou de menor estatura tendem a perder
calor mais rapidamente, pois têm maior quantidade de superfície de troca por
massa, pois, o volume aumenta ao cubo, enquanto a superfície aumenta ao
quadrado;
Além disso, um corpo com maior teor de gordura ou com roupas vai
demorar mais tempo para esfriar, devido ao isolamento térmico
proporcionado pela gordura subcutânea ou pelas roupas; assim, corpos
obesos ou abrigados por roupas irão esfriar de maneira mais vagarosa;
A realização de exercício físico anterior à morte pode aumentar o tempo
de esfriamento;
Infecções generalizadas retardam o algor mortis e podem, até mesmo,
proporcionar súbita elevação da temperatura do corpo para além de 37ºC
após a morte (Wilkinson 249).
Pelas razões acima mencionadas, a mensuração da temperatura post-mortem do
corpo permanece até hoje como um ponto controverso. No estado da arte atual, usa-se
desde a técnica mais simples, de verificar com um toque se o corpo está quente (acima
da temperatura ambiente) ou frio (na temperatura ambiente). Outros já usam até
instrumentos mais precisos, como termômetros de bulbo para verificar a temperatura
no reto ou no ouvido, ou ainda, no fígado, através de uma pequena incisão no
abdômen.
Segundo Wagner (S. A. Wagner, Death Scene Investigation: A Field Guide 41), a
temperatura retal ou a hepática são mais exatas e, como regra prática para estimar a
temperatura, temos que, na temperatura ambiente de 21°C, o corpo esfria com a taxa
de, aproximadamente, 1,5°F (0,83ºC) por hora logo após a morte, sendo aconselhável,
segundo o autor, que se realize duas tomadas de temperatura: uma no início dos
trabalhos e outra no final. Obviamente esta formulação é apenas uma estimativa a ser
utilizada na ausência de possibilidade de cálculo mais preciso.
No caso do Rio Grande do Sul, é pouco prático, pelos nossos hábitos culturais,
verificar a temperatura retal ou a do fígado em muitos locais de crime e alguns peritos
têm obtido a temperatura do corpo através da mensuração da temperatura da pele com
termômetros à laser.
Decomposição
A decomposição é o quarto vestígio da morte (S. A. Wagner, Death Scene
Investigation: A Field Guide 43), após o rigor, o livor e o algor mortis. O tempo de
decomposição pode variar amplamente, dependendo basicamente do clima.
Temperaturas quentes de verão ou de clima tropical podem produzir decomposição
avançada em menos de 24 horas; entretanto, no clima do inverno de algumas regiões
do Sul, esse mesmo grau de decomposição pode demorar até uma semana para se
manifestar.
A decomposição começa quando um odor rançoso, o cheiro de “podre”, aparece
pela primeira vez. Este odor, uma vez sentido pelo 
profissional da área, não
é facilmente esquecido. A fenômeno é produzido a partir de um processo chamado
autólise, onde a membrana dos lisossomas se rompe e as enzimas presentes passam a
digerir a própria célula, com a putrefação sendo realizada, em grande parte, pelas
bactérias do próprio organismo.
A decomposição já começa imediatamente após a morte; por exemplo, se os
olhos permanecem abertos quando a pessoa falecer, as córneas se tornam enevoadas
dentro de 2 a 3 horas. Se os olhos estiverem fechados, esta nebulosidade pode levar até
24 horas. Em olhos que permanecem abertos em um ambiente seco, a esclera
(membrana que recobre a parte branca do olho) irá tornar-se enegrecida e isto, às
vezes, pode ser confundido com ferimento.
Se o tempo entre a morte e o encontro do corpo é curto, os 
tecidos musculares fornecem uma rica fonte de DNA (Bar, Kratzer e Mächler);
contudo, se os tecidos moles estiverem exibindo um estado mais avançado de
decomposição, poderá ficar prejudicada a extração de DNA pela perícia, pois este é
destruído pelo processo de autólise já descrito. Assim, os tecidos moles poderão deixar
de fornecer, após avançado processo de decomposição, qualquer amostra de DNA
nucleico viável. Esse processo de degradação é acelerado pela colonização por
bactérias e fungos. Entretanto, nos ossos (osteócitos) e nos dentes (odontoblastos e
fibroblastos), o DNA ficará mais bem preservado, o mesmo ocorrendo com unhas e
pelos, com a ressalva acerca da ação da queratina sobre o DNA.
Aliadas às bactérias do próprio organismo para a decomposição, temos que a
carcaça de alvo de ataques da fauna presente, sendo um dos primeiros acontecimentos
a colonização por dipteros, em especial a mosca varejeira saprófaga, da família
Calliphoridae, quando em ambientes urbanos. Esta mosca, de cor verde azulada,
deposita suas larvas, as varejas, nos cadáveres em putrefação e o estágio de
desenvolvimento das larvas pode ser utilizado para estimativa do tempo de morte
(Figura 13).
A decomposição inicia logo após a morte e avança até à esqueletização
completado cadáver. A progressão das alterações durante a decomposição inclui:
A primeira mudança é o estabelecimento de uma mancha de coloração
esverdeada no abdômen e, em seguida, um processo de descoloração se
espalha pelo corpo;
Junto com a descoloração, o corpo começará a inchar devido à formação
de gases pela atividade bacteriana, que é bem mais rápida na temperatura
quente do que na fria. Com o inchaço pelos gases, os olhos ficam salientes e
língua protusa;
Junto com o corpo inchado, a epiderme começa a descamar, formando
bolhas, e o sangue começa a se degradar;
A degradação do sangue produz a chamada “circulação póstuma”, que
nada mais é do que o sangue hemolisado nos vasos sanguíneos;
Desenvolvimento de purga, onde o sangue decomposto, com cor marrom
escura e cheiro fétido, purga através dos orifícios do corpo, devido à pressão
dos gases internos. Esta purga se dá pelos caminhos de menor resistência,
devendo se tomar cuidado para não confundir a purga com sangue de
ferimentos;
Finalmente, a fase da esqueletização (Figura 12), que pode levar semanas
ou meses, ocorrendo, muitas vezes, de maneira parcial.
As partes expostas do corpo, sem roupas, se decompõem mais rapidamente. A
parte visceral do corpo (abdômen, tórax e cabeça) também tende a se decompor mais
rápido e, quando existem ferimentos, a porção ferida também apresenta maior
velocidade de decomposição, devido, entre outros fatores, à ação de insetos. A
velocidade da decomposição depende de fatores ainda como a umidade, a temperatura,
a ação de insetos e a condição do corpo na morte (por exemplo, pacientes com
infecções podem se decompor mais rapidamente ou, mesmo, de maneira mais devagar,
no caso de tratamento com antibióticos). A título de exemplo, na temperatura ambiente
de 21ºC, não é incomum que os primeiros sinais de mudanças de decomposição
comecem a aparecer entre 24 a 36 horas.
O ambiente é essencial para definir a velocidade e os fenômenos da
decomposição, que podem ser bastante diferenciados. Por exemplo, quando um corpo
é enterrado em uma cova rasa, com terra solta, em 1 ou 3 anos todos os tecidos moles
terão desaparecido, mas o esqueleto irá permanecer por muito mais tempo. A duração
do tempo de consumo dos tecidos moles irá variar muito de acordo com o tipo de solo,
quantidade de drenagem, água e outros fatores. Nos pântanos, por exemplo, o
organismo vai manter-se relativamente bem preservado por muitos anos (Figura 11).
Igualmente, corpos enterrados em solo argiloso são decompostos em um ritmo mais
lento do que em outros solos.
Acompanhamento de Autópsia
Terminado o trabalho pericial no local do delito, o perito responsável pelo
levantamento técnico autorizará a remoção da vítima, se houver, para a Medicina
Legal, para que lá se programe os trabalhos de autópsia. Poderá o perito, se o desejar,
acompanhar o trabalho do médico legista. Este procedimento pode ser imprescindível
em algumas situações para sanar dúvidas que porventura ocorram no momento do
levantamento técnico no local de crime.
Para que se faça o acompanhamento do trabalho do legista é necessário o
conhecimento de algumas práticas usadas de maneira quase universal pelos
especialistas em necropsia. Uma importante observação é que os legistas descrevem os
ferimentos e os trajetos de projetis considerando a vítima em posição anatômica, que é
a posição que o cadáver é colocado na mesa de necropsia, e o perito de local tem a
tendência a trabalhar tomando como referência a posição em que a vítima foi
encontrada no local. A posição anatômica pressupõe que o indivíduo esteja ereto,
apesar de estar sobre uma mesa, com o olhar à frente, com os membros alinhados com
o tronco, porém os membros superiores além de alinhados devem estar com as palmas
das mãos à frente (Figura 14) (dos Santos).
Nos seus laudos, os peritos, quando descrevem uma estrutura, devem também
indicar a sua posição no corpo. Considerando-se a posição anatômica, temos as
seguintes direções:
Superior ou cranial: parte superior do corpo.
Inferior ou caudal: parte inferior do corpo.
Anterior, ventral ou frontal: frente do corpo.
Posterior ou dorsal: parte de trás do corpo.
Medial: mais perto da linha mediana do corpo.
Lateral: mais perto da lateral do corpo e mais afastada da linha mediana.
Proximal: próxima da raiz do membro.
Distal: longe da raiz do membro.
Assim, quando lemos que um ferimento está na proximal no braço, significa
que ele está próximo do ombro.
Nos documentos emitidos pelos peritos criminais esta metodologia não é
obrigatória, mas, sem dúvida, se constituí numa boa prática.
Também é possível que legistas façam referência aos planos anatômicos (Figura
15), que são planos hipotéticos usados para dividir o corpo humano de forma a
descrever a localização de estruturas ou a direção dos movimentos. Em anatomia
humana e animal são usados três planos elementares:
O plano sagital é um plano paralelo à linha sagital. Divide o corpo nas
porções esquerda e direita.
O plano frontal ou coronal divide o corpo nas porções anterior (frente) e
posterior (costas).
O plano transversal, ou transverso, divide o corpo nas porções cranial
(superior) e caudal (inferior).
Mapas Anatômicos
Para facilitar o trabalho dos peritos criminais e mesmo legistas em identificar
claramente a região anatômica do corpo onde está localizado um determinado
ferimento ou lesão, foram criados os mapas anatômicos, que podem ser utilizados
apenas para orientar o perito ou também para que sejam feitas marcações no próprio
mapa durante o exame e posteriormente anexados ao laudo. Os manuais de medicina
legal costumam fornecer mapas mais ou menos detalhados e bons para o uso mesmo
para os ferimentos mais complexos e pelos peritos mais exigentes. Entretanto, uma
certa normatização é sempre bem-vinda e a SENASP, no seu procedimento de
medicina legal (SENASP), apresenta mapas anatômicos, os quais recomendamos o uso
por questões de padronização.
É usual que se tenha às mãos estes mapas em formato A4 para serem usados no
local de crime ou em local de necropsia, assim eles estão disponíveis neste formato
acessado o QR Code 1.
O Cadáver
O cadáver é sempre um dos principais vestígios no local de crime e, igualmente,
um dos principais causadores de vestígios. Assim, uma boa estratégia para o exame de
um local de crime pode ser partir do cadáver, ou melhor da sua pele e das suas roupas,
para procurar ao seu redor, ou no seu perímetro, todos os vestígios que possam
explicar o local de crime. Este trabalho é chamado por muitos de Perinecroscopia.
Posição
Em exame de local de crime que envolva morte, o código de processo penal
(art. 164) menciona expressamente a importância da posição do cadáver, obrigando,
inclusive, (serão sempre fotografados) que ele seja fotografado na posição em que for
encontrado. Assim entendemos que tudo o que diz respeito a este assunto deva ser
tratado com bastante rigor no exame e no Laudo.
Em termos de descrição e classificação temos as posições usuais a seguir
listadas:
Sentado - É a posição mais comum para quem morre dentro de um
automóvel.
Suspenso - É a posição de quase todos os enforcamentos não alterados e
é, também, virtualmente, somente encontrada neste tipo de morte. Pode ser
dividida em suspensão completa e incompleta.
Na suspensão completa nenhuma área do corpo toca o solo ou outro apoio.
Já na suspensão incompleta pelo menos uma parte do corpo toca o solo. Neste
tipo de situação é boa prática descrever com clareza a região, ou as regiões do
corpo que estão apoiadas.
Jacente - É a posição mais comum, com o cadáver caído sobre o solo.
Decúbito, também usado, é um termo da medicina para se referir a uma
pessoa que está deitada, a qual pode ser dividida em:
Decúbito Dorsal ou Supino - O cadáver está com o ventre para cima.
Decúbito Ventral ou Prona - O cadáver está com o ventre para baixo.
Decúbito Lateral (Esquerdo ou Direito) - O cadáver está com um dos flancos
(laterais) para baixo e outro para cima.
Posição de Sims - 
Similar a
posição lateral, mas o peso do pacienteé colocado no ilíaco anterior, úmero e
clavícula). Apesar de ser comum em vítimas que morrem no leito, não é muito
utilizada pelos peritos criminais, que preferem se referir a ela simplesmente como
decúbito lateral (Figura 18).
Entretanto, nem sempre as posições são tão simples de descrever, pois podem
se apresentar os mais diversos estágios intermediários entre as diferentes
classificações, como por exemplo, o caso de um cadáver encontrado preso a uma cerca
de arame farpado (Figura 19).
Marcas de arraste
As marcas de arrasto (Figura 20, Figura 21), quando de natureza post-mortem
são indicativos quase que inequívocos de mudança da posição do cadáver no local de
crime. Pelo princípio das trocas de Locard, devemos ter vestígios do arraste tanto no
cadáver quanto no solo – aqui solo é qualquer substrato, incluindo pisos, assoalhos e
congêneres. Assim, a existência de marcas de arraste apenas no corpo e nenhuma
contrafação deste vestígio no piso ou solo é um indicativo de que o cadáver faleceu em
lugar alheio ao que foi descoberto, devendo ser aberta a possibilidade da existência de
um local relacionado para exame.
No piso, as marcas de arraste mais comum são as produzidas pelo próprio sangue
da vítima ou pelas sujidades já existentes no ambiente. No caso de outros substratos,
como solo ou vegetação as marcas serão representadas por sulcos característicos ou
danos superficiais na vegetação. Em se tratando de local com sangue sobre o piso, as
marcas de arraste são inequívocas (Figura 22 Arraste em sangue).
No cadáver, as marcas de arraste são bem caracterizadas pela impregnação de
sujidade do solo no corpo em áreas dependentes como a região glútea ou o dorso. Com
as roupas desalinhadas nesta região, indicando a direção e o sentido do arraste. O
arraste também deixará lesões na pele, os populares arranhões. Se pudermos
caracterizar estas lesões como lesões antemortem temos que a vítima foi arrastada
ainda em vida, por outro lado, se as lesões do arraste foram caracterizadas como lesões
post-mortem, temos, por óbvio que a vítima foi arrastada depois de morta. Vale a pena
aqui lembrar que, como um cadáver tem pressão arterial igual a zero, portanto, lesão
post-mortem somente tem sangramento por ação da força da gravidade.
Ferimentos e Danos por Armas de Fogo
Os Efeitos do Tiro em Corpos
Um projétil em movimento possui energia cinética. Esta energia é determinada
pelo seu peso e velocidade:
Onde m é a massa do projétil em quilogramas e v é velocidade do mesmo em
metros por segundo, resultando a energia cinética em Joules. Como regra geral, temos
que quanto maior a energia cinética, maior será o dano causado pelo impacto do
projétil.
A partir deste conceito, pode-se ver que a velocidade desempenha um papel
mais importante na determinação da quantidade de energia de um projétil do que a
massa. Dobrar o peso duplica a energia cinética, mas a duplicação da velocidade
quadruplica a mesma. É também evidente, para tiros desferidos na horizontal, que
quanto maior a distância a partir do cano, menor será a velocidade do projétil e,
portanto, menor a sua energia cinética devido à perda de velocidade pela resistência do
ar.
É comum pensar que o ferimento de uma arma de fogo é apenas uma
perfuração de um orifício de diâmetro assemelhado ao do projétil, através dos tecidos
transfixados por ele. Na verdade, na medida em que o projétil se move no interior do
corpo, ele esmaga e tritura o tecido em seu caminho, mas vai também produzindo uma
cavidade temporária consideravelmente maior que o diâmetro do projétil. Esta
cavidade, provocada pela onda de choque, passa por uma série gradual de pulsações e
contrações até se estabilizar. É a combinação dos tecidos lacerados e os efeitos da
cavidade temporária (cisalhamento, compressão e alongamento), que determina,
efetivamente, a gravidade do ferimento (Figura 24).
Os efeitos do tiro podem ser classificados em primários e secundários.
Efeitos Primários
Resultam da ação do projétil no ponto de impacto; na pele: zona de enxugo e
de contusão (ao redor do orifício de entrada), formando uma mancha vermelha ou
amarelada (auréola equimótica) (Figura 25, Figura 26), formada devido a elasticidade
da pele, que acompanha a entrada do projétil antes de romper-se.; em metal e vidro:
afundamento e estriamento para dentro e perfuração.
Efeitos Secundários
Característicos da ação dos gases e seus efeitos explosivos, resíduos da
combustão da pólvora e de micro projéteis, os efeitos observados podem ser
didaticamente divididos em três grupos principais (Heard 220): a queima, o
esfumaçamento e a tatuagem. Os efeitos secundários estão entre os vestígios que tem
algo a dizer sobre a distância que foi dado o tiro.
Zona de Queima
Zona de queima, chama (chamuscamento ou queimadura): acontece nos tiros
encostados ou quase (ex. suicida), provocando queimadura da pele, dos pelos e das
vestes. Circunda o orifício de entrada. O tamanho da chama depende do comprimento
do cano e tipo de munição usada. A queima é causada pelos gases e resíduos sólidos
incandescentes que saem pela boca do cano. Embora a temperatura destes gases, ao
deixar o cano, seja da ordem de 2000ºC, eles arrefecem rapidamente e não produzem
qualquer efeito a uma distância maior de 2,5cm. A área afetada também é muito
reduzida, sendo localizada a menos de 0.7cm da borda do ferimento de entrada. Os
efeitos destes gases geralmente não são visíveis na pele, devido ao elevado grau de
umidade da mesma e, mesmo quando estão presentes, são encobertos por uma camada
de fuligem.
Os cabelos podem apresentar os efeitos da queima, assumindo o aspecto
característico de cabelo exposto à chama, o mesmo ocorrendo com as fibras mais finas
das roupas feitas de lã natural que, pela ação do calor, se encolhem até uma fração do
seu tamanho original e assumem uma cor enegrecida. Nas roupas de fibras sintéticas, o
efeito do calor é bem mais perceptível (Heard, 2008, p. 220).
O grau da queima é dependente:
do estado da superfície do alvo; por exemplo, se for uma superfície
molhada, o grau de queima será muito reduzido;
do tipo da pólvora, o que é evidente, pois diferentes composições de
pólvora irão liberar diferentes quantidades de calor pela boca do cano;
da pressão produzida; por exemplo, que um cartucho do tipo Magnum irá
produzir uma queima significativamente maior do que a produzida por um
comum;
da quantidade de propelente (pólvora), pois é esperado que um cartucho
com mais propelente produza uma queima bem maior do que a produzida
por um cartucho de calibre semelhante, mas com menor carga de propelente
(Heard 222).
Zona de Esfumaçamento
A zona de esfumaçamento está presente nos tiros a curta distância; consiste no
depósito de fuligem oriunda da combustão da pólvora ao redor do orifício de entrada e
de resíduos finos facilmente removíveis com lavagem. O esfumaçamento é causado
por material carbonáceo proveniente de resíduos da queima incompleta do propelente,
tendo como contribuição auxiliar os lubrificantes do projétil e o selante colocado entre
o projétil e o propelente. O componente principal é o carbono amorfo com adição de
partículas finas de propelente parcialmente queimadas (Heard 222).
O esfumaçamento pode ser produzido em tiros efetuados com distâncias
menores que 25cm para armas de cano longo e menores que 12,5cm para pistolas e
revólveres (Heard 220-223).
A quantidade de propelente, obviamente, afeta o grau de enegrecimento da
superfície do alvo, produzindo enegrecimento de forma diretamente proporcional ao
aumento da carga. Por outro lado, os cartuchos do tipo +P ou +P+ ou Magnum tem
efeito inverso, pois quanto maior a eficácia do propelente, menor será a zona de
esfumaçamento (Heard 220-223).
O esfumaçamento é, fisicamente, uma pequena camada de resíduos, que pode
ser facilmente removida por gaze de socorristas ou pela água da chuva, por exemplo.
Assim, a ausência de zona de esfumaçamento não deve ser tomada como indicador
conclusivo para distância de tiro (Heard 220-223).
Zona de Tatuagem
A zona detatuagem é formada pelos grãos de pólvora combusta e incombusta que
se incrustam ao redor do orifício de entrada. Ocorrem em tiros de curta distância (até
1,5m de distância do alvo). Como as partículas de propelente são bem mais densas que
o material que produz a zona de esfumaçamento, elas são arremessadas a distâncias
maiores do que aquelas, a partir da boca do cano. Com auxílio de uma lupa é possível
observar estas partículas e os seus efeitos no alvo em distâncias de tiro menores do que
75cm, para o caso de armas de cano curto. Para armas de cano longo, essa distância é
de aproximadamente, de 120cm (Heard 223).
Os fatores que influenciam a quantidade das partículas de propelentes são
muito semelhantes aos que influenciam o tamanho das zonas de esfumaçamento.
Logo, para uma mesma munição, quanto maior for o tamanho do cano e maior a
eficácia do propelente, menor será a presença desses resíduos. Ao contrário dos
resíduos que produzem a zona de esfumaçamento, as partículas incombustas não são
facilmente removíveis. Na pele humana viva, elas irão entrar na epiderme e formar
estigmas semelhantes aos produzidos pelas técnicas de tatuagem (Heard 223).
Ferimentos por Armas de Cano Raiado
As lesões provocadas por projeteis de arma de fogo são geralmente
classificadas como lesões perfuro-contusas, da mesma família das provocadas por
chairas, picadores de gelo e assemelhados, pois a ação do projétil perfura e contunde
ao mesmo tempo - instrumento perfuro-contundente. Normalmente, é possível fazer a
diferenciação entre os ferimentos de entrada e de saída do projétil na própria local de
morte, pois, apesar do exame de necropsia ser lavrado pelo legista, o perito do local
deve ser capaz de fazer esta diferenciação para ir construindo e testando suas hipóteses
da dinâmica no próprio local do exame.
Entrada
A maioria dos ferimentos de entrada (Figura 27), não importa a escala, está
rodeada por uma auréola avermelhada ou marrom-avermelhada de pele ferida – a
auréola equimótica, que forma um aro ao redor do orifício. Trata-se de uma lesão
antemortem e, não, post-mortem. A auréola equimótica ocorre pelo cisalhamento
produzido através do contato do projétil com a pele das bordas do orifício de
penetração.
O anel também não é uma lesão de queimadura, pois, apesar de o projétil
atingir temperaturas superiores a 100°C na saída do cano, o seu tempo de contato com
a pele é muito curto.
Ao contrário do que se pensa, este anel não é formado pelo movimento de
rotação do projétil, pois esta rotação não teria energia suficiente para romper o tecido,
uma vez que sua velocidade de rotação é relativamente baixa. Por exemplo, até mesmo
a munição do fuzil M-16A2, considerado uma arma de rotação rápida, leva 178 mm de
deslocamento horizontal para dar uma volta completa ao redor do seu eixo.
Boca de Mina (Hoffmann)
Nos tiros encostados e com pressão, os FDR seguem junto com o projétil,
entrando no tecido, não deixando muitas vezes, qualquer vestígio nas bordas do
ferimento de entrada. Nas áreas do corpo onde pele e tecido subcutâneo recobrem
diretamente o osso, como, por exemplo, o crânio, a escápula ou o esterno, os gases da
expansão ficam presos entre o tecido subcutâneo e osso. Deve-se notar que, quando sai
do cano, parte da pólvora ainda está se comburindo; desta forma, os gases se
expandem com grande rapidez e violência entre o osso e a pele, não tendo por onde
sair, senão pelo orifício de entrada, arrebentando as suas bordas. Isto resulta em um
ferimento com bordas estreladas e evertidas, com alguma semelhança com ferimentos
provocados por instrumento contundente. Nesta situação, é de se esperar que sangue,
pele e tecido ósseo sejam devolvidos na direção do atirador (efeito boca de mina). Este
fenômeno, segundo Heard, também pode se produzir caso a área atingida possua uma
razoável camada de gordura subcutânea (Heard 219).
Neste tipo de disparo, o grau de dilaceração do tecido vai depender do calibre da
munição, do tipo de pólvora e do comprimento do cano. É de se esperar que uma
munição .38 SPL+P+ produza mais rasgos do que uma de calibre .38 SPL. Também é
esperado que um revólver de cano de 2’’ e munição +P+ produza mais rasgos do que a
mesma munição utilizada em um revólver de cano de 5’’, pois, na primeira situação,
teremos mais pólvora ainda em combustão saindo pelo cano e, portanto, maior
expansão de gases dentro da pele. Um exame cuidadoso é necessário no sentido de se
encontrar partículas de resíduos de tiro dentro da ferida, especialmente grãos de
pólvora não comburidos, sob pena de termos um erro de classificação da ferida (Heard
219).
Desta forma temos um tipo particularmente interessante de ferimento de entrada é
o que se chama de “boca-de-mina” ou “sinal de Hoffmann”, que é encontrado
normalmente nas regiões temporal, parietal, frontal e occipital do crânio. Neste tipo de
ferimento, os gases oriundos do cano da arma de fogo penetram para dentro do corpo e
são expulsos pelo orifício de entrada, provocando bordas invertidas, formato irregular
ou de estrela, saída de massa encefálica e outras características típicas de ferimento de
saída de projétil ou por instrumento contundente. Virtualmente, quando temos dois
ferimentos por arma de fogo nestas regiões, apenas o primeiro ferimento apresentará
as características de “boca-de-mina”.
Saída
Ferimentos de saída são, normalmente, maiores e mais irregulares que as
feridas de entrada e, com raras exceções, não possuem auréola equimótica. Podem ser
estrelados, em forma de crescente, circulares ou, mesmo, completamente irregulares,
tendo, normalmente, as suas bordas evertidas (Figura 29).
Outro fenômeno comum em mortos por disparo de arma de fogo são os
projéteis subcutâneos, visíveis e sensíveis ao toque. Tal ocorre, porque o projétil
perdeu energia no seu trajeto pelo corpo e não ocorre a perfuração da derme para a
saída do mesmo (Figura 28).
Entrada, Saída e Reentrada
Não são incomuns os ferimentos ocasionados por reentrada de projétil na
mesma vítima. Eles ocorrem principalmente nos membros superiores, quando estes
estão em posição de ataque ou defesa e, mais particularmente, nos braços. Nada
impede, entretanto, que o mesmo ocorra com maior ou menor grau de probabilidade
em qualquer outra região do corpo, como orelhas, pênis, coxas, et cetera. Este tipo de
ocorrência, quando encontrado, tem muito a dizer sobre a dinâmica da morte (Figura
30).
Ferimentos por Armas de Cano Liso
Ferimentos produzidos por espingardas - arma de cano liso, são altamente
destrutivos quando disparados a curta distância. Entretanto, esse poder de destruição
diminui consideravelmente com o aumento da distância de tiro devido à maior
dispersão dos bagos e pela penetração superficial dos mesmos (Dolinak, Matshes e
Lew 118). Em contraste com os projéteis do tipo “full-metal-jacked” para uso militar e
com os projéteis de chumbo não encamisados, os bagos produzem uma área de
formato cônico de desorganização de tecidos. O diâmetro desta cavidade se reduz
rapidamente devido à perda de velocidade dos bagos e devido às suas propriedades
balísticas desfavoráveis (área transversal grande em relação à sua massa). Na Figura
23, temos uma representação destas diferenças obtidas com gelatina balística.
Nos tiros de espingardas com menos de 3 metros de distância
comumente apresentam-se fragmentos de bucha, ou a bucha inteira, no túnel do
ferimento. Com o aumento da distância, entretanto, o esperado é que o tiro, exceto os
de balote, já não seja fatal (20 - 50 metros) (Gunn 197).
No momento do tiro, os bagos saem agrupados na boca do cano e assim
permanecem por alguma distância. Este agrupamento é responsável pela produção de
ferimentos com aparência de serem produzidos por um único projétil (Dolinak,
Matshes e Lew 191).
Contato
Quando o tiro for produzido em contado ou próximo, as espingardas têm uma
grande quantidade de energia transferida para o alvo. Particularmente, se o tiro foi
produzido em contato ou próximo. No caso de gauge 12, este tipo de ferimento pode
produzirresultados tão devastadores, que fica, às vezes, difícil de se saber o que é
entrada e o que é saída, sendo, para isto, necessária até a remontagem dos tecidos
(Dolinak, Matshes e Lew 193). Em casos de tiro com o cano dentro da boca, a pressão
dos gases resultantes da queima da pólvora pode provocar lacerações no entorno da
boca (Figura 33).
Em contraste com a cabeça, ferimentos de contato no tórax ou no abdômen têm
aspecto bem menos dramático, pois há espaço e elasticidade suficiente para absorver a
expansão súbita dos gases da queima. O padrão é sempre a aparência, à primeira vista,
de ter sido provocada por um único projétil (Dolinak, Matshes e Lew 193).
Como qualquer outro ferimento de tiro, os produzidos por espingardas com
bagos também podem ser tangenciais. Em casos deste tipo, pode haver grande
laceração dos tecidos (Dolinak, Matshes e Lew 194).
Gardner entende que estas características de contato se estendem até à distância
de 2 pés (60 cm) e apresenta, como característica adicional que outros elementos do
cartucho, como buchas, por exemplo, entram para dentro do carpo da vítima (Gardner
e Bevel 218).
Distância Intermediária e Indeterminada
Em um tiro de contato, o ferimento é geralmente circular, mas, com o
aumento da distância, os bagos começam a se espalhar (Figura 32), produzindo
características diferenciadas no ferimento (Dolinak, Matshes e Lew 194):
Ferimento circular com bordas agudas e bucha dentro do ferimento (contato);
Ferimento circular com bordas recortadas e com zona de tatuagem (2 a 4 pés –
0,61 a 1,22 m). Na literatura de língua inglesa, este tipo de ferimento é chamado de
“buraco de rato” e se espera que todos os bagos e buchas também entrem no ferimento
(Gardner e Bevel 218) ;
Com o aumento da distância (3 a 5 pés – 0,91 a 1,52 m), formam-se ferimentos
satélites em torno de um ferimento principal;
Na distância de 8 a 10 pés (2,44 a 3,05 m), temos um ferimento central, mas
com uma dispersão generalizada de pequenos ferimentos. Para Gardner, de 4 até 10
pés (1,22 até 3,05 m) temos a ocorrência de ferimento central com satélites ao redor.
Nesta distância, a bucha não estará dentro do ferimento, mas poderá provocar
equimoses ao atingir a pele;
A partir daí, temos uma maior dispersão dos ferimentos como característica de
distância indeterminada e não haverá um ferimento central, pois cada bago irá produzir
o seu próprio ferimento (Gardner e Bevel 219).
Ferimentos de Saída
Normalmente, devido à sua menor energia cinética, os tiros de espingardas
com balins têm uma probabilidade bem menor de produzirem ferimentos de saída,
quando comparados com tiros de munição convencional (Gardner e Bevel 219).
Raio X
O uso de raios–X na investigação de ferimentos por projétil pode ser de valor
inestimável para o investigador forense em uma variedade de situações, como por
exemplo:
determinar se parte ou a totalidade do projétil ainda está dentro do corpo;
localizar a posição exata do projétil;
localizar e determinar o tipo e o calibre do projétil que não pode ser
removido cirurgicamente;
determinar a trajetória do projétil;
determinar a posição de todos os aglomerados e balins em feridas de
espingarda.
As imagens de raio-x podem ser utilizadas para localizar a posição de um
projétil no corpo. Entretanto, apresentam dificuldade para se fazer a estimativa do
calibre, pois todas as tomadas de raio-x produzem algum tipo de distorção. Tal
problema pode ser melhorado se forem feitas duas tomadas, uma frontal e outra lateral.
Também é possível que projéteis padrões sejam colocados ao lado do corpo, em uma
posição adequada, para se fazer comparações, estimando, assim, o calibre da munição
utilizada (Heard 212).
Alternativamente, um paquímetro pode ser utilizado para estimar o calibre do
projétil, com a devida ressalva de que a imagem medida sempre será maior que a real.
Assim, se o paquímetro indicar 0,25’’, significa que o calibre real será igual ou menor
do que 0,25’’, mas nunca maior (Heard 212).
Quesitos Usuais para Local de Disparo de Arma de Fogo
A Polícia Federal sugere como quesitos a serem respondidos pelo perito, a lista
abaixo (Polícia Federal 56):
Defina a natureza e as características da(s) marca(s) do(s) impacto(s).
No local foi encontrado o objeto que deu origem ao impacto?
É possível saber se esse objeto é proveniente de arma de fogo, de arma
de pressão, de arma de arremesso ou outro?
No local foi(ram) encontrado(s) outro(s) vestígio(s) (encamisamento,
estojo, espoleta) de que tenha(m) ocorrido disparo(s) no local?
Pelas características dos vestígios encontrados, é possível estabelecer o
calibre da munição utilizada no evento?
É possível estabelecer o número de disparos que ocorreram no local?
É possível estabelecer a trajetória do objeto que deu origem ao impacto?
Arma Branca
Arma branca é todo e qualquer instrumento cortante, perfurante ou
contundente, operado por uma só pessoa, com finalidade de defesa ou ataque. A
característica principal desse tipo de amamento é produzir ferimentos através de uma
lâmina, pontiaguda ou não. Estas armas possuem esse nome, muito provavelmente,
devido a sua comparação com as armas de fogo, que são normalmente de cor
enegrecida, ao contrário de sabres e semelhantes que são feitos em aço de coloração
mais clara. Para efeitos de sistematização, iremos, entretanto, considerar também como
armas brancas todos os instrumentos causadores de ofensas, que não de arremesso.
Como toda arma, as armas brancas podem ser divididas em armas brancas
próprias e armas brancas impróprias
Armas brancas próprias
Armas brancas próprias são aquelas feitas para finalidade de ataque e defesa.
São os punhais, as espadas, os sabres, as alabardas, os piques, os espadins, as adagas e
outros. Estas armas são hoje virtualmente obsoletas, normalmente usadas apenas para
fins cerimoniais.
Armas brancas impróprias
Virtualmente, quase todos os crimes cometidos com o uso de armas brancas
são feitos com armas impróprias, ou seja, são artefatos produzidos para outros fins,
mas que também servem como arma. São ferramentas como facas, facões, foices,
machados, machadinhas, machetes, que acabam sendo utilizados para defesa ou
agressão.
Armas Brancas e seus Ferimentos
De um modo geral os ferimentos produzidos por armas brancas podem ser
classificados, de acordo com o instrumento que os produziu e como foi manejado o
mesmo, em:
Perfurantes.
Cortantes.
Contundentes
Perfurocortantes.
Corto contundentes.
Perfuro contundente.
Perfurantes
Os ferimentos perfurantes são àqueles produzidos por instrumentos de forma
alongada, de diâmetro variável, mas nunca muito consideráveis, de seção circular ou
elíptica, que terminam em uma ponta mais ou menos aguda. Em suma, são corpos
cilíndricos alongados na forma de uma ponta afiada. Esses instrumentos podem ser
naturais ou artificiais. Entre os primeiros estão espinhos, aguilhões, chifres e outras
defesas animais e vegetais. Mais frequentes, na casuística, no entanto, são os
artificiais, entre os quais devem ser citados; pinos, agulhas, pregos, ponteiros, flechas
(Figura 35), lanças, punhais, etc.
Estes instrumentos penetram nos tecidos agindo como uma cunha, separando os
elementos anatômicos do tecido penetrado. Mas quando o instrumento tem uma certa
espessura há, além disso, um eventual rasgo produzido pelo rompimento da
elasticidade da pele. A ação fundamental destes instrumentos é dada pela ponta, que
concentra a energia em uma superfície muito limitada.
As feridas por instrumentos perfurantes são caracterizadas pela existência de um
orifício de entrada, de um trajeto mais ou menos longo e, quando traspassam
completamente uma área do corpo, através de um orifício de saída.
O orifício de entrada normalmente está na pele; mas nada impede a sua
localização em uma das aberturas naturais do corpo: olhos, narinas, orifício auricular,
boca, ânus, vagina e até mesmo na uretra. Quando o instrumento é tão fino que ao
seccionar os tecidos não excede seu limite de elasticidade, ele é reduzido a um ponto
avermelhadoou rosado. A insignificância do achado externo não significa que o
ferimento não possa produzir sérias consequências, se atingir órgãos profundos.
Complicações infecciosas também podem agravar o quadro. Por fim, às vezes, o
instrumento quebra, se for muito fino, e partes dele permanecem no interior do corpo.
Se o instrumento for mais espesso, ou seja, com maior diâmetro, de modo que
este exceda o limite de elasticidade da pele, o orifício toma a forma de uma lesão de
ângulos ligeiramente arredondados, ou mais graficamente, semelhante a casa de um
botão, a botoeira. Quando os ângulos são agudos e iguais, temos que a direção do eixo
principal da lesão está alinhada à das fibras elásticas – fibras de Langer, da região em
que a ferida se encontra.
A forma e a direção do ferimento de entrada são de grande importância, uma
vez que, em grande parte, apontam para o instrumento responsável. Assim, há
tradicional pesquisa na área, e cujos resultados são sintetizados nas já clássicas leis de
Filhos e Langer:
Leis de Filhos: As lesões produzidas por instrumento perfurante de médio
calibre em uma mesma região do corpo têm a mesma direção, devido às fibras (de
colágeno), que são perfuradas. Desta forma, a lesão produzida por uma arma de forma
cilíndrica simula aquela produzida por uma arma achatada com duas bordas. Em uma
determinada região, os ferimentos causados por esse tipo de arma sempre têm a mesma
direção, enquanto aqueles produzidos por armas curtas afiadas com um ou duas bordas
podem apresentar as mais diversas direções.
Lei de Langer: Dependendo da área, a perfuração será em ponta de flecha,
quadrada ou estrelar, assim, quando um instrumento afiado fere um ponto em que
vários sistemas de fibras de direção divergente convergem, a 
ferida
assume uma forma triangular ou de ponta de flecha. Os esquemas de Langer (Figura
36), resultantes de experimentos feitos por este autor em 1881, determinaram as
direções das fibras elásticas nas diferentes regiões anatômicas. Se a direção do
ferimento coincidir com as linhas de Langer previstas para uma dada região
anatômica, então é possível, e até provável, que o ferimento, foi produzido por um
instrumento perfurante. Por outro lado, se não houver esta coincidência, o indicativo é
de ferimento produzido por um instrumento cortante ou perfurocortante com
secionamento destas linhas.
O ferimento de saída, quando existe, é mais irregular do que o de entrada,
porque a pele quando perfurada de dentro para fora produz fissuras e quebras atípicas.
Seu tamanho é geralmente menor do que o buraco de entrada devido à forma afilada
do instrumento (Sang e Mendoza).
Cortantes
Os instrumentos cortantes são definidos pela existência de uma lâmina e virtual
ausência de pontas, o que resulta em atuação apenas pelo fio de corte. Certos objetos
atuam acidentalmente como instrumentos de corte: folhas finas de metal ou pedaços de
vidro, porém os verdadeiros cortantes são representados por facas sem pontas, lâminas
de barbear, navalhas de barbeiro, etc.
Esses instrumentos atuam pela lâmina (fio) que penetra os tecidos como uma
cunha e os divide produzindo soluções de continuidade. O corte é facilitado quando a
lâmina se aproxima obliquamente da superfície, produzindo um ângulo de corte agudo.
A ação do instrumento pode ser realizada por simples pressão ou por pressão e
deslizamento; neste último caso, sendo os efeitos bem mais graves.
Ferimentos de instrumentos cortantes, ou incisos – de incisão, geralmente podem
ser classificadas em três tipos: feridas lineares, feridas de retalho e feridas mutilantes.
Os ferimentos lineares (Figura 37) ocorrem quando o instrumento penetra
perpendicularmente, produzindo uma solução de continuidade simples. Devido à
elasticidade dos tecidos seccionados, a ferida tende a abrir-se, adquirindo a forma oval
alongada, cujas extremidades são superficiais, podendo se confundir com um simples
arranhão, as chamadas caudas. As bordas das feridas incisivas são caracterizadas pela
regularidade e limpeza. As bordas são separadas mais ou menos de acordo com a
direção do trauma e da área em questão. A separação é máxima quando o corte é
perpendicular a uma linha de Langer. Também influencia, no formato, a posição da
região no momento da ferida, por isso, a movimentação da vítima, pode aumentar ou
diminuir a separação das bordas, como acontece nos ferimentos nos joelhos, cotovelos,
axilas, etc. Também depende da existência de aderências a tecidos profundos, como é
o caso da pele do crânio, que separa pouco nas feridas superficiais, porém muito,
quando a aponeurose subjacente é ferida.
As extremidades dos ferimentos lineares são, geralmente, superficiais,
formando as chamadas caudas, as quais, são mais aparentes quando o mecanismo de
deslizamento predomina no corte da pele. Há uma cauda de ataque, que corresponde
ao início do corte, e uma cauda terminal. Ambas podem ser iguais ou irregulares e até
mesmo uma delas pode ser ausente, mas, sempre a cauda mais longa é a última
produzida no corte e, esta característica, pode ser usada para indicar a direção em que
o ferimento foi produzido.
As paredes deste tipo de ferimento, às vezes, têm boa profundidade, sendo lisas
e regulares, entretanto, mesmo mantendo esta característica, quando a incisão atinge
camadas sobrepostas de diferentes estruturas, como, por exemplo, pele, gordura
subcutânea e músculo, as diferentes elasticidades desses tecidos podem dar uma certa
desigualdade à parede. Nunca há pontes, ou ligações, de tecidos entre as paredes.
Finalmente, quando na área atingida existem um osso, a incisão nela para, formando o
fundo da ferida.
As feridas de retalho ocorrem quando o instrumento de corte penetra
obliquamente, como se fosse tirar um naco ou retalho da pele. Já as feridas de
mutilação são as que amputam extremidades de dedos, orelhas, narizes e mamilos.
Contundentes
Contusões são lesões causadas por choque ou esmagamento do corpo humano
contra um corpo de estrutura rígida. Como exemplo deste tipo de instrumentos temos
as soqueiras (soco-inglês), órgãos naturais: mãos, pés, dentes, armas como martelos,
clavas, porretes, bastões, empunhaduras de armas de cano longo e assemelhados
(Figura 38). Às lesões produzidas por estes instrumentos dá-se o nome de contusão ou
lesão contusa. Todo agente mecânico que atuando por violentamente por pressão,
explosão, flexão, torção, sucção, percussão, distensão, compressão, descompressão,
arrastamento, deslizamento, contragolpe, ou de forma mista, traumatiza o organismo.
Superfícies duras, como o solo ou pavimentos, são chamados de corpos contundentes.
Se pode agir de forma ativa (o 
objeto se
move em direção à vítima), passiva (o corpo da vítima se projeta em direção do corpo
contundente; como nas quedas), ou de modo misto.
As contusões provocadas por acidentes de trânsito ou queda de altura são
chamadas também de contusões de grande energia.
Perfurocortantes
A parte nociva dos instrumentos de perfurocortante é constituída por lâminas
mais ou menos estreitas terminando em ponto e atravessada por uma, duas ou mais
bordas afiadas. De acordo com o número dessas bordas, os instrumentos são chamados
de monocortantes, bi cortantes ou pluricortantes.
Estes instrumentos, quando utilizados como estoques, ou seja, golpe de ponta,
produzem ferimentos que tem características parcialmente perfurantes e parcialmente
incisas, existindo um orifício de entrada, um trajeto e, eventualmente, um orifício de
saída.
A morfologia do orifício de entrada é, tipicamente, dependente da forma do
instrumento.
Quando o instrumento tem uma lâmina plana e dois gumes, a ferida que produz
tem a forma externa de uma incisão, semelhante à de um instrumento cortante, porém,
mais profunda. Sua forma segue a do diâmetro transversal do instrumento e, portanto,
muda de acordo com a posição do ferimento, independentemente da orientação das
linhas de Langer. Normalmente tem duas caudas, mas pode não ter nenhuma se o
instrumento entrou e saiu com um ângulo de 90 graus com o tecido; podeter apenas
uma cauda se o ângulo foi agudo (menos que 30 graus), ou ter as duas caudas, caso
mais comum, se o ângulo for entre 30 e 90 graus. É também conhecida como
ferimento em botoeira, por lembrar a casa de um botão.
Se a lâmina é plana e com apenas um gume, caso da maioria das facas,
também forma uma botoeira, mas apenas uma das extremidades forma uma cauda
nítida, a da face afiada, enquanto a outra é mais contundente, quase arredondada
(Figura 40).
A lâmina grossa com um gume é o instrumento que tem um reforço no lado
oposto ao fio, como consequência, a ferida forma tem forma de botoeira com cauda em
uma das extremidades e a outra assumindo uma forma quase reta e perpendicular ao
cumprimento maior.
Os instrumentos com mais de dois gumes produzem ferimentos de forma
estrelada, com as pontas da estrela imitando o número de gumes.
O sabre é uma arma branca perfurocortante, ou seja, de estocada e corte.
Caracteriza-se pela sua lâmina longa, com fio em apenas um lado, normalmente curva,
normalmente empunhado por uma mão, mas com variações para uso de ambas. Foi
arma popularizada pelas tropas de cavalaria ligeira e o fato de ter um lado cego (sem
fio) o tornava adequado para reprimir manifestações populares com menor violência.
Ainda é utilizada com este propósito por algumas polícias ostensivas ao redor do
mundo, por exemplo, a Brigada Militar do estado do Rio Grande do Sul, com suas
tradicionais unidades de cavalaria (Figura 41). Quando é utilizado o lado “cego” do
sabre, o ferimento produzido terá características contusas.
Espada é uma arma branca similar ao sabre, porém possui gume nos dois
lados. Ao longo da história o seu tamanho tem variado, desde os 50 - 60 cm do gládio
Romano, até 2 m e 10 de algumas espadas germânicas de manejo com ambas as mãos.
Espadim era originariamente uma arma branca curta com fio triangular, utilizada
com mais eficácia para perfurar, e próprio para auto defesa. No Brasil o termo se refere
a armas cerimoniais dadas a cadetes.
Adaga é termo muito utilizado no Rio Grande do Sul para se referir a um
punhal largo com lâmina com dois gumes, pelo menos na extremidade final. Já foi
bastante utilizada como arma de defesa pessoal, mas hoje se resume a grupos rurais
mais restritos.
Faca, em princípio é qualquer objeto cortante capaz de ser empunhado (Figura
42). São universais na cozinha e mesa, ou seja, não há habitação que não tenha uma
faca. Elas têm pelo menos uma lâmina, podendo ser pontiaguda ou não. A lâmina pode
ser lisa, serrilhada ou ondulada, como nas facas de pão. Podem ser afiadas em um ou
ambos os lados
As facas culinárias apresentam os seguintes tipos principais, indicadas em
ordem decrescente de tamanho médio de cada tipo:
Faca de "chef" - Serve para quase tudo, lâmina longa (20 a 30 cm) e
larga, ponta ligeiramente curva.
Faca para filetar - Com pequenas ranhuras (alvéolos), longa, para cortar
lâminas finas de presunto cru ou salmão.
Faca para pão - Serrilhada e longa.
Faca lisa - lâmina mais fina, para cortar peixes, frios, massas folhadas.
Faca para desossa - para desossar carnes, aves, peixes, também descascar
frutas e legumes, Lâmina longa, fina, pontiaguda.
Faca para legumes - semelhante à do "chef", porém bem menor (10 a 12
cm).
Entre os instrumentos mais frequentes, na prática de crimes, devem ser citados
facas, facas de ponta, punhais, estoques, etc.
O modo de ação dos instrumentos perfurocortantes pode ser considerado como
a soma ou o termo médio dos instrumentos afilados e os afiados, uma vez que agem
simultaneamente pela ponta e pela lâmina ou lâminas. De fato, ao se aproximar do
corpo pela ponta eles exercem uma ação de cunha, mas, ao mesmo tempo, a lâmina é
colocada em uma posição inclinada ideal para cortar.
Quando se trata de instrumentos de mais de um fio, à medida que o número de
fios aumenta, o ângulo formado por cada um deles diminui, o que torna sua lâmina
menos aguda. Se seu número for multiplicado excessivamente, ele se confundirá com
o instrumento cilíndrico típico de instrumentos tipicamente perfurantes.
Corto contundentes
São instrumentos com lâmina afiada, porém com peso considerável, de maneira
que ao efeito do corte é adicionado o de uma grande energia. Exemplos representativos
dessa variedade de instrumentos são os sabres pesados, as facas pesadas ou facões de
mato, machetes, foices, machados.
Os instrumentos corto contundentes reúnem a ação contusa e a cortante,
predominando um ou outro de acordo com as características da arma. Quanto maior a
massa, maior a energia e prevalece a ação contusa sobre a incisiva. Com este tipo de
arma, a ação do deslizamento, para se usar exclusivamente o fio, pode ser executada,
mas não costuma ocorrer.
As feridas produzidas por estes instrumentos (Figura 47), também chamadas de
inciso-contundentes, reúnem as características das feridas afiadas às produzidas por
certos tipos de armas cegas, como pode ser visto a partir de seu mecanismo de ação.
Um ou outro prevalecerá dependendo da espessura da lâmina e do estado da borda de
corte. Mas, de qualquer forma, a profundidade da ferida excede significativamente as
produzidas por instrumentos de corte e há o fenômeno de não respeitar, em geral,
devido a ação contundente, os tecidos mais duros, que é uma característica típica de
feridas incisas.
Ferimentos antemortem e post-mortem
Diagnóstico da origem vital ou pós-morte da ferida é tarefa do médico legista,
entretanto, no momento do exame do local, o perito deve ter conhecimento suficiente
para ir tecendo as suas hipóteses, se apoiando, entre outros, na consideração que um
cadáver possui pressão arterial zero, o que implica em ausência de sinais de
hemorragia interna ou externa, bem como ausência de coágulos impregnados aos
tecidos, o que pode servir de diagnóstico preliminar para explicar a natureza de uma
ferida (Sang e Mendoza).
Suicídio, Homicídio ou Acidente
Não há regra geral que permita estabelecer com certeza a etiologia de um
ferimento por arma branca, mais uma vez, o conjunto de vestígios é que irá determinar,
muitas vezes por exclusão, se houve morte por acidente, agressão ou autoagressão.
Essa conclusão é, de fato, um julgamento avaliativo das características apresentadas
pelas feridas em cada caso específico, junto com os achados no local, as manchas de
sangue, a presença de terceiros, documentos de despedida e outros.
No caso de ferimentos perfurantes, cortantes ou perfurocortantes, a
localização da ferida fornece apenas probabilidades, embora, às vezes, estas sejam
altamente significativas. Na verdade, o suicida opta por se ferir em determinadas áreas
visando atingir órgãos vitais. Isso, no entanto, não é absoluto, pois as mesmas áreas
podem ter sido atacadas pelo agressor, mas há uma questão de probabilidade nisto. Por
outro lado, o agressor nem sempre pode escolher a área para ser lesada, especialmente
se houver defesa, caso em que a ferida pode atingir qualquer região. Um fato muito
importante é a acessibilidade da região ferida, o que exclui o suicídio se os ferimentos
estiverem localizados em pontos, que a vítima não pode alcançar sozinho. Igualmente
a hipótese de suicídio tende a se afastar quando são feridos pontos que, embora a
vítima possa alcançar, não produziriam a morte: objetivo do suicida. Assim, feridas na
palma das mãos ou na região posterior dos antebraços, as chamadas lesões de defesa,
pois ocorrem ao tentar proteger-se dos golpes ou de desarmar o agressor, são bons
indicativos de homicídio (Figura 45).
Múltiplos golpes são mais frequentes em homicídios do que em suicídio. No
entanto, neste último caso, a possibilidade de várias feridas não pode ser, de todo,
excluída, mesmo que, devido à sua localização e profundidade, elas devem ser
consideradas fatais, quando todas elas se encontram na mesma área. Entretanto, a
multiplicidade de feridas, especialmente quando graves, localizadas em várias regiões
corporais, exclui o suicídio e indica o homicídio (Sang e Mendoza).
O exame das vestes pode trazer informações de extrema importância,pois, o
suicida, geralmente, abre suas vestes ou as retira para chegar à região nua com o
instrumento. No homicídio, por outro lado, as roupas não são removidas e nelas
também há cortes e rasgos produzidos pela arma em áreas correspondentes às feridas
na pele.
Quanto ao diagnóstico de origem acidental, pode haver muito poucas regras de
natureza geral e, na prática, perfurações e perfurações curtas de origem acidental
ocorrem em circunstâncias tão variadas, que esse diagnóstico só pode ser deduzido do
estudo especial e circunstancial de cada caso (Sang e Mendoza).
Seccionamento de veias
Uma das formas populares de tentativa e realização de suicídio, notadamente
feminino, é através do seccionamento de vasos, normalmente na face interna do
punho, o popular “cortar os pulsos” (Figura 49), nome assim dado por provavelmente,
ser a região do punho onde se mede a pulsação. Nesta região o ferimento se dá no
punho esquerdo para os destros, com ferimento geralmente da esquerda para a direita
de baixo para cima (considerando a posição anatômica). Nos canhotos, por óbvio, o
ferimento tem a tendência de estar localizado no punho direito e com sentido da direita
para a esquerda. En geral, os ferimentos são pouco profundos, sem secionamento dos
tendões e não costumam produzir hemorragia que cause morte rápida, dando tempo ao
suicida de executar mais de um corte, inclusive no outro punho. Em havendo socorro
rápido, a morte é facilmente evitável. Outro local de uso dos suicidas, mas com um
número bem menor na casuística, é a face anterior do cotovelo. Apesar de ser um
típico ferimento de suicídio, nada impede que sejam produzidos por homicidas.
Decapitação
Decapitar consiste em separar a cabeça do corpo. Era uma antiga forma de
aplicação da pena de morte, mas voltou a evidência através dos seu uso por grupos de
narcotraficantes e extremistas de discurso islâmico, os quais filmam e divulgam seus
atos com objetivos terroristas. Da maneira criminosa é realizada por instrumentos
corto contundentes como machados e facões pesados ou mesmo por facas. A prática é
também utilizada para dificultar a identificação, com o corpo sendo separado, após a
morte, da cabeça e das mãos (Figura 48). No Brasil, ocorrem casos de decapitação
com a prática de deixar a cabeça em algum lugar com simbolismo para marcar
território ou intimidar rivais. Também ocorrem as decapitações devido a acidentes, de
trânsito inclusive, e, muito raras, as decapitações por suicídio, devendo, neste caso, a
vítima utilizar algum equipamento ou improvisar alguma forma de guilhotina.
No caso de decapitação por instrumentos cortantes, como facas, é virtualmente
impossível a realização através de um único golpe, salvo em casos de recém-nascidos
e bebês (Sang e Mendoza).
Ferimentos de Automutilação
Os ferimentos de automutilação são, normalmente, produzidos por
instrumentos cortantes de pequeno porte, tais como: lâminas de barbear, estiletes,
canivetes e pequenas facas. Estes ferimentos têm como característica principal a sua
profundidade uniforme, provocada pela ação consciente ou inconsciente do autor em
diminuir o dano e a dor. Estão normalmente associados a quadros depressivos, mas
existem casos em que pessoa os produz para acusar terceiro ou terceiros (Figura 46).
Quesitos Usuais para Locais de Morte
Conforme a Polícia Federal (Polícia Federal 58), são usuais e necessários, sem
prejuízo de outros, os quesitos:
É possível identificar a data e o horário em que se deu o evento?
É possível identificar o número de pessoas que participaram do evento?
É possível identificar como foi a dinâmica do evento? Em caso positivo,
qual foi o tipo da morte?
Existem vestígios no local que possam indicar a autoria do delito? Caso
positivo, quais?
É possível identificar, pelo exame do local do fato, o provável emprego
de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel,
ou de que possa resultar perigo comum?
Pelas características das lesões encontradas no cadáver, é possível inferir
o(s) instrumento(s) empregado(s)?
3. VESTÍGIOS DE BALÍSTICA
Para examinar um local de morte por disparo de arma de fogo, o perito
encarregado deve possuir sólidos conhecimentos de balística nos aspectos práticos
relacionados com o objetivo sempre perseguido: dizer a dinâmica e apontar a autoria.
A Balística é o ramo da física que estuda o movimento dos projéteis, que são
quaisquer corpos que se deslocam no espaço sofrendo a ação de um impulso inicial e
de um campo gravitacional. Esta tem destacada importância para as armas de artilharia
em particular e para as demais armas em geral. Por extensão, o estudo das armas de
arremesso, das munições e de seus efeitos tornou-se parte da Balística.
Arma é todo objeto concebido e executado com a finalidade específica ou
predominante de ser utilizada pelo homem para o ataque ou a defesa (Rabello).
As armas podem ser divididas em (Rabello):
 
Impróprias: quando concebidas para outros fins.
Próprias: quando concebidas para este fim.
Manuais: quando são uma extensão da mão.
Arremesso: quando possuem efeito à distância.
Simples: arremesso com a mão.
Complexas: arremesso com o uso de artefato.
As armas de arremesso podem ser simples, quando o impulso inicial é dado
exclusivamente pelo ser humano sem auxílio de qualquer apetrecho, por exemplo, o
dardo; ou complexas, quando um apetrecho auxiliar no lançamento, por exemplo, a
zarabatana, o arco, a besta, o onagro, a catapulta, o trabuco e as armas de fogo.
Armas de fogo são máquinas térmicas onde o projétil é expelido pela súbita
expansão dos gases resultantes da queima de pólvora, ou seja, quando ocorre o
disparo, a arma produz tiro se houver munição eficaz adequadamente alojada em seu
interior.
Apesar de tiro e disparo serem quase sinônimos, a Criminalística, como
qualquer outra disciplina, usa termos específicos e restritos. Assim, disparo é a ação
eficaz dos mecanismos da arma no sentido de acionar a munição para que a pólvora se
expanda; tiro é a efetiva saída de projétil pelo cano.
Modernamente, a Balística se ocupa quase que exclusivamente das armas de
fogo.
A Criminalística buscou na Balística o apoio necessário para a elucidação dos
crimes feitos por armas de arremesso, criando, assim, a Balística Forense, que,
segundo Rabello (Rabello), “é aquela parte do conhecimento criminalístico e médico
legal que tem por objeto especial o estudo das armas de fogo, da munição e dos
fenômenos e efeitos próprios dos tiros destas armas no que tiverem de útil ao
esclarecimento e à prova de questões de fato, no interesse da justiça tanto penal como
civil.”
A Balística Forense pode ser dividida em:
Balística Interna, que trata das armas de fogo, das munições, do
mecanismo do disparo e do movimento do projétil dentro do cano, ou seja,
até o projétil sair da boca do cano;
Balística Externa, que trata do movimento do projétil no ar, sofrendo a
ação da força da gravidade, ou seja, da boca do cano até o anteparo;
Balística Terminal, que trata dos efeitos do projétil a partir do momento
em que ele impacta contra uma estrutura material.
Balística Interna
Alguns macacos atiram galhos, pedras ou até mesmo fezes contra predadores
quando estão em perigo. Entretanto, apenas o homem faz armas. De uma maneira
grotesca, o homem poderia ser definido como o animal que faz armas. E o homem
faz armas desde a aurora da humanidade. Um dos primeiros povos que colonizaram o
que hoje nós chamamos de América, a cultura Clóvis, tem este nome pelas lanças que
fabricavam: lascas de pedra amarradas com tiras de couro na ponta de paus. Por muito
tempo se pensou, talvez, na ilusão do mito do bom selvagem de Rousseau, que essas
armas rudimentares eram utilizadas apenas para caçar, mas alguns esqueletos com
lesões nos ossos, semelhantes às que seriam produzidas por estas pontas, sugerem que
elas também eram utilizadas contra o semelhante. Em termos técnicos de balística, a
lança do povo Clóvis era uma arma de arremesso, ou seja, matava à distância. Com
uma arma deste tipo, o maisfraco fisicamente poderia derrotar o mais forte. Para o
fraco homo sapiens, esta possibilidade foi um grande impulso para a sobrevivência da
nossa espécie.
Para Wallace, as armas de arremesso foram concebidas para matar ou
incapacitar à distância. Essas armas incluem qualquer coisa suficientemente leve para
ser arremessada e suficientemente pesada, ou aguda, para produzir ferimento. Nesta
categoria estão incluídos bastões, varas pontiagudas, lanças feitas de pedra, facas,
punhais, machadinhas e espadas feitas de madeira ou pedra. O desejo de impulsionar a
algum tipo de projétil para matar ou ferir deve ter se originado da necessidade de
caçar. Por razões óbvias, matar à distância é mais prático e mais seguro.
Primeiramente, os projéteis eram lançados com a mão e mais tarde foram inventados
as fundas, arcos, catapultas, onagros e outros. Os projéteis ganharam maior peso,
velocidade, maior distância de arremesso e maior precisão; consequentemente, maior
poder de matar ou de ferir (J. S. Wallace 3-12).
Um dos principais desenvolvimentos no armamento humano foi a descoberta
dos metais e da capacidade de trabalhar com eles. Não é por acaso que historiadores
antigos dividiam a pré-história em “Idade da Pedra” e “Idade do Bronze”. Facas,
espadas, pontas de flechas e de lanças, couraças e outros deram grande vantagem sobre
as armas de pedras e paus. Povos, como os espanhóis, armados de adagas, lanças,
capacetes e couraças tiveram enorme facilidade em derrotar povos armados de
porretes, como os astecas e os incas. Estas armas foram utilizadas por muitos séculos
até serem rapidamente substituídas por armas de fogo, as quais mudaram radicalmente
a história. Com armas deste tipo, qualquer povoado poderia se defender de tribos
nômades montadas, desde que possuísse espingardas e uma cerca para disparar de trás
dela (J. S. Wallace). Foi o fim da milenar luta entre pastores e agricultores, com a
vitória destes últimos.
Armas de Fogo
É provável que o nome “arma de fogo” venha da chama produzida na boca do
cano por ocasião do disparo. Existem armas de fogo pesadas e fixas em uma estrutura.
Como são fixas e pesadas, elas não são práticas para execução de crimes civis. Desta
forma, estas armas, objeto de estudo da artilharia, serão apenas citadas, mas não
estudadas neste trabalho, pois, normalmente, o criminoso utiliza armas que podem ser
facilmente transportadas por um único indivíduo e de maneira discreta (J. S. Wallace
3-12).
Uma arma de fogo é uma ferramenta desenhada para ejetar projéteis letais a
partir de um cano contra alvos selecionados. Para isto, é preciso apontar, disparar,
produzir tiro e dar estabilidade à trajetória do projétil, usando para isto um propelente
que produz expansão de gases através da queima. Existem outros meios de fornecer
energia para o projétil sair do cano; por exemplo, por ar comprimido, gás ou por
molas, normalmente utilizadas para esporte ou caça leve. Entretanto, o meio quase
universal para propelir o projétil é a pólvora. Ora, pólvora não é uma substância pura,
mas, sim, um nome genérico para centenas de misturas diferentes utilizadas como
propelente para projétil (J. S. Wallace).
Armas de fogo podem ter características diferentes, tais como a capacidade de
carregar mais de um cartucho, melhor capacidade de recarga, carregamento e ejeção
automática ou mais de um tiro no mesmo pressionar do gatilho. Isto tudo são apenas
refinamentos do projeto básico. Na sua forma mais simples, uma arma de fogo pode
ser um tubo de metal com uma extremidade fechada, com algum propelente, que, com
a queima, produz pressão de gás o suficiente para expelir um projétil, ou projéteis,
para fora do cano, devendo este ter energia suficiente para matar um ser humano ou
animal ao qual se destina, no caso de armas de caça. Após sete séculos de
aperfeiçoamento, hoje existem armas capazes de produzir até 1.500 tiros por minuto
ou, com o auxílio de uma mira telescópica, capazes de matar uma vítima selecionada a
uma distância de 2.000 m ou mais (J. S. Wallace 3-12).
Armas de fogo são relativamente baratas, confiáveis, mortais e possuem muitos
usos: esporte, guerra, defesa pessoal, caça, policiamento, mas também para crimes.
Além disso, são encontradas em abundância na maior parte do mundo. Em alguns
países, o armamento chega a ser geral e compulsório, pela necessidade das políticas
vigentes de defesa nacional, como, por exemplo, Israel e Suíça. Entretanto,
normalmente, as armas para a prática do crime são ilegais ou estão em situação ilegal
(J. S. Wallace).
O mecanismo de disparo de arma de fogo consiste em um dispositivo mecânico
que libera um golpe do martelo (também chamado cão) para frente e contra um pino
que percute o primer. Em algumas armas de fogo, o martelo e o percutor formam uma
única peça.
Na base do cartucho temos uma mistura de substâncias químicas, o primer, que
tem a propriedade de entrar em rápida queima, quando é impactado. A queima de
primer produz muitas partículas quentes ou em chama que entram em contato com o
propelente que queima e produz um grande volume de gases que, no espaço confinado
do estojo, resulta em enorme pressão sobre a base do projétil que é então expelido para
fora do cano. A alta temperatura e a pressão também dilatam o diâmetro do estojo, que
é pressionado contra as paredes da câmara, selando a mesma e evitando fuga dos gases
da queima, e perda de velocidade do projétil (J. S. Wallace 10).
A arma de fogo é uma máquina térmica que converte a energia química do
propelente em energia cinética do projetil, o qual é montado na extremidade aberta de
um cartucho, com o propelente e a mistura iniciadora na extremidade oposta. Quanto o
percutor atinge a mistura iniciadora, esta é detonada, fornecendo energia para iniciar a
combustão do propelente, o qual libera uma grande quantidade de gases quentes
responsáveis pela tarefa de pressionar o projétil desde o cartucho até a sua saída pela
boca do cano. A quantidade de propelente, a sua velocidade de queima, o tamanho do
espaço de combustão (que inclui também o cano), o comprimento do cano e o peso do
projétil são os principais fatores que determinam a velocidade de saída pela boca do
cano (Jussila 18).
Uma arma de fogo deve ser de construção robusta, pois o tempo entre o
percutor atingir o primer e o projétil sair pela boca do cano na ordem de 0,01-0,03
segundos. Na boca do cano, a velocidade do projétil varia desde 180m/s (650km/h)
para revólveres com munição de baixa energia, até 1000m/s (3800km/h) para algumas
armas de cano longo mais poderosas. As temperaturas envolvidas estão na ordem de
3.000ºC e as pressões internas no cano são da ordem de 2,4MegaPascal (Hatcher 198).
Os estojos devem estar também aptos a trabalharem nestas condições (Basu) (J. S.
Wallace 10).
Como armas de fogo são máquinas térmicas que utilizam a força expansiva dos
gases resultantes da combustão de algum tipo de pólvora para expelir projéteis, assim,
para serem efetivas, são necessários três elementos: o aparelho arremessador, a carga
de projeção e o projétil.
No exame do local de crime, a equipe deve deixar anotada e fotografada a
posição em que a arma e os demais componentes de munição foram encontrados, algo
essencial para identificar a dinâmica dos acontecimentos e eventuais alterações no
local de crime (Figura 52).
Na balística forense é prática usual classificar as armas de fogo, com o objetivo
de identificá-las e melhor vincular os diferentes componentes de munição encontrados
em um local de crime entre si, por exemplo: projétil e tipo de arma (Rabello).
Raias
O cano de uma arma de fogo de alma raiada é um tubo construído em ferro ou
aço. A superfície interna do cano de revólveres, pistolas, carabinas, fuzis, rifles e
metralhadores possuem um número de sulcos em espiral, conhecidos como raias (J. S.
Wallace).
Se o cano da arma de fogo possui raias ela é dita de cano de alma raiada, pelo
contrário, se não as possui, é dita de cano de alma lisa.
A área entre duas raias é chamada de cheio e a finalidade destes é produzirsulcos helicoidais no projétil, os cavados, que fazem com o que o projétil gire em
torno do seu eixo longitudinal, pois este movimento mantém a direção do projétil (J. S.
Wallace).
As armas de alma lisa são usadas para expelir projéteis esféricos ou balotes, os
quais tem seus cavados produzidos durante o processo de fabricação.
As raias do cano imprimem ressaltos nos projéteis e os cheios produzem
cavados nos projéteis.
O projétil, ao transpor o cano da arma, deixa marcado em sua superfície
características (microelementos) da superfície interna desse cano, o que permite a
identificação indireta da arma.
O número de raias depende de cada fabricante e de cada tipo de arma, variando
deste duas até mais de vinte em peças de artilharia de grande calibre. Também podem
ser em número par ou em número ímpar, ou também ser orientadas para a direita: as
dextrogiras, ou orientadas para a esquerda: as sinistrogiras.
Classificações mais sistemáticas de armas de fogo podem ser encontradas em
literatura específica sobre balística forense, como, por exemplo, na obra de Eraldo
Rabello (Rabello). Para efeitos deste trabalho, nós as classificaremos, entretanto,
segundo os tipos mais comumente encontrados na prática pericial.
Micro comparação Balística
Este exame se caracteriza, com frequência, como prova técnica de valor
suficiente na determinação da culpa do indiciado por parte da autoridade judiciária.
Embora os micros estriamentos presentes nos estojos e projetis sejam às vezes
visíveis macroscopicamente, somente são analisáveis a nível microscópico. Para este
fim utiliza-se um micro comparador balístico, que nada mais é do que um dispositivo
ótico composto de dois microscópios conjugados em uma armação, permitindo a
visualização simultânea de duas peças e o estudo das convergências dos seus
microelementos.
As convergências de microelementos podem ser tanto de ordem qualitativa
(poucos elementos, mas muito marcantes e individualizadores) ou quantitativa (muitas
convergências tênues).
Os padrões obtidos na arma incriminada devem ser obtidos, preferencialmente,
a partir da munição de mesmo calibre, marca, constituição, formato e idade. Os
padrões de projétil devem ser obtidos realizando-se tiro em algum meio denso que seja
capaz de deter o projétil sem danificá-lo (por exemplo, uma caixa com algodão ou um
tanque).
Graus de identificação
Negativo: quando o projétil não foi expelido pelo cano de uma determinada
arma ou quando o estojo não foi percutido por uma determinada arma.
Positivo: quando o projétil foi expelido pelo cano da arma questionada, ou
quando o estojo foi percutido na arma examinada ou questionada.
Projétil sem condições: são os casos que dado o grau de deformações
acidentais sofridas pelo projétil questionado ou pela exiguidade de elementos
remanescente, não há como identificar o cano pelo qual o projétil foi expelido.
Há probabilidade ou é provável: Neste caso além dos elementos observados
no grau acima (sem condições), temos microelementos em maior número, o que nos
permite inclusive fotografar os campos convergentes admitindo algum grau de
probabilidade de comparação positiva (Machado, Ferreira e Ferreira).
Sistema de Carregamento e Inflamação
Quanto ao sistema de carregamento as armas podem ser classificadas como de
antecarga e de retrocarga. As primeiras são todas as armas primitivas ou já obsoletas
que eram carregadas pela boca do cano. As segundas são as mais modernas, que já
permitem o carregamento pela culatra e representaram grandes mudanças nas técnicas
de combate, pois não era mais necessário que o soldado se posicionasse em pé para
fazer o carregamento. Virtualmente todas as armas modernas de cano longo ou cano
curto são de retrocarga com as notáveis exceções do morteiro e da bazuca, mas foi
somente em 1829 que Clemente Pottet patenteou um cartucho de retrocarga, e em
1835 Casemir Lefaucheux produziu um cartucho de pino. Este cartucho de pino
possuía, na base, um pino metálico que se comunicava com a espoleta existente dentro
do cartucho. Este pino, ao sofrer o impacto do percussor da arma, detonava a espoleta
a que nos referimos, provocando a deflagração da carga de projeção e a consequente
projeção do projetil.
Carregar uma arma é o ato de pôr carga na mesma, ou seja, colocar a munição
em posição tal que, ao se acionar o gatilho, ocorra o tiro. Neste caso, podemos dizer
que a arma está carregada. Agora, municiar ou alimentar uma arma, é colocar na
mesma a munição. Nem sempre uma arma municiada ou alimentada está carregada.
No caso, por exemplo, de uma pistola, se colocarmos os cartuchos no carregador, e
recolocarmos o carregador na arma, dizemos que a arma se encontra municiada,
porém, não carregada. Para carregá-la, é necessário que se introduza um cartucho na
antecâmara do cano. São comuns os acidentes com pistolas, pois o leigo pensa que, ao
se retirar o carregador, a arma está descarregada, o que nem sempre é verdadeiro, pois
pode haver um cartucho alojado na antecâmara 
do cano.
Já em um revólver, se colocarmos cartuchos em todas as câmaras do tambor ele estará
municiado e carregado. Agora, se, por exemplo, o movimento do tambor for
sinistrogiro, isto é, girar para a esquerda, e deixarmos apenas a primeira câmara à
direita sem cartucho, ele estará municiado, porém não carregado.
Quanto ao sistema de inflamação: modernamente usam-se os sistemas direto ou
indireto de percussão (note-se que a percussão é sempre direta, mas o sistema é que
pode ser direto ou indireto). No sistema direto de percussão, o percussor ou
percutor está acoplado ao cão (no caso dos revólveres), podendo ser fixo ou
oscilante, ou ainda, esculpido no ferrolho, como no caso de algumas submetralhadoras,
por exemplo. No sistema indireto de percussão, o percussor é dito flutuante e
normalmente está inserido no ferrolho (no caso das pistolas semiautomáticas) ou na
armação (no caso dos revólveres ou no corpo das espingardas). Atualmente, em
algumas armas, os percussores flutuantes, por razões de segurança, funcionam por
inércia, sendo em razão disto denominados inerciais. No sistema inercial, não pode
haver contato simultâneo entre o cão, o percussor e a cápsula de espoletamento do
cartucho, pois o alojamento do percussor tem comprimento maior do que o próprio
percutor. A energia do cão é transmitida ao percussor inercial por choque na sua
extremidade posterior, projetando o mesmo contra a cápsula de espoletamento ou
espoleta do cartucho, fazendo com que a sua extremidade anterior (ponta do percutor)
o percuta, retornando posteriormente à sua posição de repouso. Este sistema dota a
arma de uma segurança adicional contra os chamados tiros acidentais, pois estando a
arma desengatilhada, uma batida ou queda cujo impacto se transmita ao percutor, não
lhe comunicará energia suficiente para que ele projete o percussor contra a cápsula de
espoletamento do cartucho alojado na câmara do cano.
Com o advento dos cartuchos de munição, criaram-se as armas de retrocarga
com canos de alma raiada ou lisa. Ainda, dois tipos principais de cartuchos foram
criados, os de percussão central e os de percussão radial. Na percussão central, a
cápsula de espoletamento ou espoleta situa-se no centro da base do cartucho e, na
percussão radial (ou ditas de fogo circular), o material detonante situa-se,
internamente, nos bordos da base do cartucho (Machado, Ferreira e Ferreira).
Calibre
O calibre de uma arma de fogo é baseado no diâmetro interno do seu cano, medido
entre dois cheios opostos. Esta é uma definição simplificada e dá apenas uma
aproximação do diâmetro do projétil. Este, normalmente, é um pouco maior que o
diâmetro interno do cano. O calibre, quando a munição é de origem norte-americana, é
dado em polegadas; quando é de origem alemã, russa ou, mais recentemente, da
OTAN, é dado em milímetros. Os calibres usuais para revólveres (uma invenção norte-
americana) são 0,22" (6mm), 0,25" (6,35mm), 0,32" (7,65mm), .38" / 0,357" (9mm),
0,45" / 0,455". Os fuzis têm normalmente calibre de 0,22" (6 mm), 0,223"e 0,30"
(7,62mm). Há muitos outros calibres existentes.
Na verdade, calibre é um termo confuso, com os diversos calibres representando
mais tradição histórica do que propriamente uma metodologia rigorosa. Por exemplo,
sem pretender esgotar a lista, a seguir alguns exemplos ilustrativos: 0,22 L e 0,22 LR
podem ser usados nos revólveres .22’’, apenas o peso do projétil é diferente; o .308’’
Winchester foi originalmente concebido para caça, mas foi adotado pela OTAN e é
também conhecido como 7,62 × 51 NATO; o 0,45 ACP e .45 Auto Rim tem o mesmo
projétil, mas o .45 ACP é para pistolas e o 0,45 Auto Rim é para uso em revólveres; o 
0,380 Rev, o 0,38 S & W, o .38 Special e o .357 Magnum tem diâmetro aproximado de
0,35’’, mas as dimensões do cartucho, os pesos do projétil e a carga do propelente são
diferentes e cada um é projetado para uma arma de fogo diferente, embora algum
intercâmbio seja possível (J. S. Wallace 3-14). Muitos modelos de revolveres Taurus
calibre 38 são montados com o mesmo tambor usado no .357 Magnum, com o os
destinados ao 38 tendo uma pequena restrição de diâmetro no final do tambor, para
impedir a alimentação com o cartucho .357, assim uma alteração comum no Brasil é a
usinagem deste tipo de tambor por armeiros, o que transforma o 38 Taurus em uma
arma capaz de produzir tiro também com a munição .357 Magnum.
Uma notável exceção é a espingarda, onde calibre ou gauge se refere ao
número de esferas de chumbo, de diâmetro igual ao diâmetro interno do cano, que
podem ser feitas com uma libra de chumbo. Os calibres mais populares são 12, 16 e
20. Desta forma, quanto menor o calibre, maior é o diâmetro interno do cano. Por
outro lado, a exceção da exceção, algumas espingardas de diâmetro menor têm calibre
assinalado pelo diâmetro interno do cano, como, por exemplo, a 0,410’’ (Burrard).
Armas de Maior Interesse
Pistolas de Tiro Unitário
Uma pistola de tiro único possui a câmara integralizada com o cano e deve ser
carregada novamente a cada tiro produzido. Trata-se do tipo mais primitivo de pistola.
Já não é mais fabricada em escala industrial, mas ainda é confeccionada por armeiros
amadores ou no interior dos presídios. São os chamados “trabucos”.
Pistolas de Múltiplos Canos (Garruchas ou Derringers)
As garruchas são uma variante de pistolas de um único tiro. Elas têm vários
canos, cada um com o seu mecanismo de disparo. As garruchas típicas possuem dois
canos justapostos. No Brasil, elas ainda têm forte interesse criminalístico devido ao
sucesso das garruchas produzidas pelo antigo fabricante Amadeo Rossi em São
Leopoldo, RS.
Revólveres
O revólver é ainda um tipo de arma de fogo muito comum no Brasil. Revólveres
nada mais são do que uma pistola de tiro unitário, na qual a câmara foi separada do
cano e substituída por um cilindro (o tambor) com várias câmaras, cada uma das quais
municiada e produzindo tiro separadamente e sucessivamente. O tambor é girado
mecanicamente, alinhando cada câmara com o cano. O primeiro revólver conhecido
foi produzido por Samuel Colt em 1835-1836, nos Estados Unidos. O revólver tem
como característica fundamental possuir um único cano e várias câmaras de
combustão dispostas paralelamente a um eixo comum em um cilindro, sendo, hoje, a
única arma de fogo que cujo cano não contém uma câmara de combustão. Outra
característica notável é a sua rusticidade, suportando maus tratos bem melhor que uma
pistola semiautomática.
Podemos definir o revólver como uma arma de fogo curta, de repetição não
automática, dotada de um só cano com várias câmaras de combustão existentes em um
corpo cilíndrico denominado tambor. Um revólver apresenta as seguintes partes
constituintes: armação, tambor, cano e mecanismos (Machado, Ferreira e Ferreira).
A armação constitui o corpo da arma, pois ela serve de suporte para as demais
partes, como tambor e cano e, ainda, para as peças constituintes dos demais
mecanismos.
O tambor é uma peça cilíndrica onde se situam as câmaras, cujo número varia de
acordo com o fabricante, podendo ser cinco, seis, sete, oito, dez etc. O tambor pode
movimentar-se para a direita ou para a esquerda, de acordo com a marca e modelo da
arma. Diz-se que o tambor é de movimentação sinistrogira quando girar para a
esquerda e dextrogira quando girar para a direita.
O cano é confeccionado em aço, ou, excepcionalmente de alguma outra liga
metálica, como os revolveres Bagual de fabricação argentina, que eram fabricados com
uma liga de zinco, alumínio, cobre e magnésio (ZAMAK). O comprimento do cano é
variável, normalmente de 2”, 3”, 4” ou 5” e, portanto, também é variável a energia do
projétil para uma mesma munição. É dotado de alma raiada, com número par ou ímpar
de raias, cuja orientação pode ser sinistrogiras ou dextrogira. Junto ao tambor
apresenta sensível aumento do diâmetro do cano, sem raias, constituindo o chamado
cone de forçamento. Este cone de forçamento redireciona a trajetória do projétil nos
casos de pequenos desalinhamentos do tambor (Machado, Ferreira e Ferreira).
Existem três tipos de montagem de tambores em revólveres. O mais comum é o
tambor reversível, onde, ao se pressionar a trava do tambor, normalmente encontrada
no lado esquerdo do corpo, e empurrar o tambor para a esquerda, este se move,
expondo as câmaras. Cada câmara pode, então, ser carregada com um cartucho e, após
retornar o tambor para a posição inicial, o revólver estará pronto para ser utilizado
(Figura 58).
Nos revólveres de cano basculante, o conjunto do cano e do tambor são
articulados e, pressionando-se a ponta do cano para baixo, a parte traseira do tambor é
exposta, podendo-se assim municiar a arma. A ação de abertura também serve para se
ejetar os estojos resultantes dos cartuchos já disparados. Este tipo de revólver é raro no
Brasil, mas era o tipo preferido dos fabricantes da Inglaterra (Figura 59).
O revólver de tambor fixo é a mais antiga forma de revólver. Nesta arma, o
tambor é preso no quadro por um pino central, em torno do qual gira. A parte de trás
de uma das câmaras, à direita ou à esquerda, pode ser exposta, municiando-se desta
forma o revólver, uma câmara de cada vez. No Brasil, ainda são encontrados alguns
modelos fabricados pela Ítalo GRA, na Argentina, com estas características.
Os revólveres podem ser classificados em ação simples ou em ação dupla, de
acordo com o seu mecanismo de disparo. Em ação simples, o cão deve ser armado
manualmente cada vez que a arma for produzir disparo. Ao armar o cão, o tambor gira,
fazendo o alinhamento da câmara com o cano e o percutor. A pressão aplicada ao
gatilho libera o cão, produzindo disparo. Já nos revólveres de dupla ação, a pressão
sobre o gatilho gira o tambor, alinhando uma câmara com o cano, move o cão para trás
e o libera, disparando a arma. A maioria dos revólveres de dupla ação pode ser
acionada também em ação simples, com exceção dos modelos “hammerless”, onde o
cão (martelo, na terminologia inglesa) é oculto no corpo da arma, impossibilitando a
ação simples. A vantagem do hammerless é facilitar o porte discreto em bolsos e sob
as vestes, evitando que o cão exposto se prenda na roupa, tendo sido bastante usado
por agentes oficiais antes da generalização das pistol
Os revólveres primitivos eram todos de ação simples. Atualmente, apenas alguns
modelos deste tipo são ainda fabricados, normalmente para finalidade de tiro esportivo
ou caça.
O montante da pressão no gatilho, necessário para disparar um bom revólver de
dupla ação, varia de 12 a 15£. Se estas armas são engatilhadas (ação simples), a
pressão necessária é de 2 a 4£, o que explica a melhor precisão do tiro produzido em
ação simples.
Na grande maioria dos revólveres fabricados no mundo, o tambor é
sinistrogiro, ou seja, gira para a esquerda, no sentido contrário aos dos ponteiros de um
relógio (Taurus, Smith & Wesson e outros). Entretanto, existem armas, como as do
fabricante Colt, em que a rotação é para a direita. São os tambores dextrogiros. Esta
informação às vezes não é considerada por praticantes de roleta russa.
ClassificaçãoUma das tarefas demandadas aos peritos é o exame de funcionamento ou de
potencial lesivo de uma arma de fogo apreendida, para tanto é comum os revólveres
serem classificados segundo a armação, o mecanismo, a percussão, a extração e o
funcionamento, permitindo a sistematização do laudo pericial.
Quanto a armação, temos as rígidas (inteiriça e desmontável); a articulada
(armação de junta e tambor reversível.
Os de armação rígida são aqueles em que o tambor é fixo na armação, sendo o
municiamento efetuado por uma abertura a direita ou a esquerda da culatra. Trata-se de
um tipo de armação já fora de uso.
Os com armação articulada de junta são aqueles em que o conjunto do cano e
do tambor pode ser movimentado de maneira a expor todo o setor posterior do tambor
para municiamento.
Em se tratando da função exercida pelo gatilho temos os revólveres de ação
simples ou ação dupla. Como ação se entende o tipo de ação mecânica necessária para
ativação do disparo. Na ação simples o gatilho apenas libera o cão já armado e assim
produz o disparo, ou seja, é necessário que o cão seja previamente armado para a arma
ser utilizada de forma efetiva. Nas armas de ação dupla o acionamento do gatilho
provoca o movimento de recuo do cão para armá-lo e prosseguindo o movimento,
libera o mesmo para acionar o percutor, fazendo o cão dois movimentos: um para se
afastar da espoleta e outro para aproximar-se.
Em relação a percussão, temos a percussão direta, quando o percutor e o cão
formam uma única peça, ou indireta, quando o cão, ao ser acionado, bate no percutor,
que irá percutir a espoleta. Em princípio o segundo sistema apresenta-se sem utilidade,
entretanto esta disposição permite que se introduza um mecanismo de segurança entre
os dois componentes no sentido de evitar o disparo acidental.
Mecanismos de segurança
Uma das preocupações em qualquer arma de fogo é diminuir a probabilidade
de tiro acidental, a qual, nos revólveres antigos, era alta. Desta forma os armeiros
sempre investiram na pesquisa de mecanismos de segurança mais efetivos, cuja
evolução s mecanismos podemos distinguir dois tipos (Machado, Ferreira e Ferreira):
Calços ou travas: mecanismos dotados de calços de segurança ou travas, os quais
funcionam em sincronia direta ou indireta com o movimento do gatilho, interpondo ou
não o calço entre o cão e a armação, impedindo ou não que o percutor atinja a cápsula
de espoletamento do cartucho alojado na câmara do tambor, ou seja, gatilho recuado,
percussão livre, gatilho protraído, percussão impedida.
Barra de percussão: consiste numa barra que se interpõe entre o cão e a
armação, no instante do disparo, aumentando o curso do percussor, alojado na
armação, a fim de que ele alcance a cápsula de espoletamento do cartucho alojado nas
câmaras do tambor. No repouso, o cão fica em contato permanente com a armação,
não havendo, pois, possibilidade para que ele impulsione o percutor. Assim, para que
ocorra o tiro é necessário que o gatilho seja acionado e a barra de percussão se
interponha entre o cão e o percutor, permitindo ao mesmo alcançar a cápsula de
espoletamento do cartucho, nunca ocorrendo, em tese, o tiro sem o acionamento do
gatilho.
Pistolas Semiautomáticas ou Parabellum
Pistolas semiautomáticas são aquelas em que se usa parte da força do cartucho
deflagrado para remuniciar e engatilhar novamente a arma. Assim, após a produção de
um tiro, o sistema se encarrega de ejetar o estojo deflagrado, posicionar um novo
cartucho na câmara e recuar o cão. Basta, então, pressionar o gatilho para a produção
de um novo tiro. Estas armas são, às vezes, chamadas impropriamente de
“automáticas”. Outro termo encontrado na literatura é “Parabellum”, nome de marca
de um modelo muito popular do fabricante Luger. Usualmente, entretanto, este tipo de
pistola é chamado simplesmente “Pistola” (Figura 63).
A primeira pistola produzida comercialmente, a C-3, foi idealizada por Hugo
Borchardt, em 1893 e fabricada por Ludwig Löewe Cie, em Karlsruhe em 1893
(Figura 64). Esta arma foi antecessora direta da Mauser e da Luger.
Atualmente, as pistolas são fabricadas desde o calibre .22” até o .45”.
Os cartuchos são normalmente armazenados em um compartimento removível, o
carregador, na empunhadura da arma, com exceção da pistola Mauser M1896 e suas
similares, onde o carregador ficava na frente do guarda-mato. Os carregadores usais
podem ser monofilares ou bifilares, de acordo com a disposição dos cartuchos em seu
interior. Entretanto, a necessidade de maior poder de fogo nos conflitos entre facções
criminosas tem introduzido os carregadores cilíndricos no mundo do crime brasileiro.
Alguns destes carregadores podem ter até cem cartuchos em seu interior.
No Brasil, a grande maioria das pistolas de interesse criminalístico é a
fabricada pela Taurus, nos seus diversos modelos, derivada da Beretta italiana, por ser
durante largo tempo a arma padrão das forças policiais (calibre .40”), do Exército e da
Polícia Federal (9 mm) e encontrada no mercado para defesa pessoal (calibre .380” e
9mm).
Rifles, Fuzis, Fuzis de Assalto, Carabinas
Rifle é apenas o nome inglês para arma de cano longo raiado (rifled em inglês).
Fuzil é o nome português brasileiro para este tipo de arma, quando de uso militar.
Fuzil de assalto é o nome que se dá para fuzis, semiautomáticos ou automáticos que
funcionam com rajadas, ou seja, quando o acionamento do gatilho produz um número
pré-determinado de disparos, por exemplo, três. Carabina é um nome brasileiro para
uma arma de cano raiado, tanto para uso militar quanto para uso civil, porém com
comprimento de cano menor que o fuzil. Existem variações nesta nomenclatura e aqui
colocaremos as definições de uso corrente na perícia do Rio Grande do Sul (Machado,
Ferreira e Ferreira):
Mosquetão: é uma arma de fogo longa, portátil, de repetição, não automática,
com cano de alma raiada que mede aproximadamente 30 polegadas, ou seja, 76,2 cm.
É também dotado de munição potente. No Brasil uma destas armas, derivada do
mosquetão Mauser 1908, foi fabricada até 1968 em Itajubá – Minas Gerais, e equipou
as forças brasileiras desde 1910 até a década de 1970, quando ainda foi utilizado na
guerrilha do Araguaia. Hoje é usada apenas como arma cerimonial em unidades
militares e de polícias militares (Figura 65).
Fuzil: é uma arma de fogo longa, portátil, automática, com cano de alma
raiada, normalmente de calibre potente. No funcionamento automático, a cadência de
tiro dos fuzis gira em torno de 700 ou mais tiros por minuto.
Carabina: é longa, portátil, de repetição, não automática ou semiautomática,
possuidora de cano de alma raiada (normalmente o cano das carabinas possui
comprimento compreendido entre 18 e 20 polegadas). As carabinas diferem dos rifles
por possuírem o cano mais curto, facilitando, assim, o seu transporte e uso. As
carabinas são dotadas de um tubo carregador onde são alojados os cartuchos. Nas
carabinas alimentadas pelo sistema “pump action", os cartuchos são introduzidos
diretamente no tubo carregador, como no caso das carabinas de calibre .22, fabricadas
pela Rossi. No carregamento pelo sistema "lever action", os cartuchos são
introduzidos no tubo carregador através de uma janela lateral existente no lado direito
da caixa dos mecanismos da arma (corpo), como no caso da carabina Puma da Rossi.
As carabinas de pressão, de calibre 4,5mm ou 5,5mm, apesar de não serem
consideradas armas de fogo (uma vez que utilizam pressão de ar comprimido),
expelem projetis que causam lesões as mais variadas, podendo inclusive causar a
morte da pessoa atingida, sendo também bastante comum sua transformação em
carabinas de calibre 22.
Rifle: difere da carabina apenas no comprimento do cano. O comprimento dos
canos dos rifles gira em torno de 24 polegadas, ou seja, aproximadamente 61
centímetros. É, como a carabina, uma arma de fogo longa, portátil, de repetição,
portadora de cano de alma raiada. Os rifles podem ser de repetição não automática ou
semiautomática.
Espingardas e Pistolões (Alma Lisa)
Umaespingarda é uma arma projetada para ser utilizada com o ombro como
apoio. Possui cano internamente liso (alma lisa) e é própria para disparar vários
projéteis esféricos ao mesmo tempo, os chamados balins, ou um único projétil
previamente raiado, o chamado balote. O comprimento do cano é variável, não
havendo, a rigor, um tamanho mínimo ou máximo. Quanto uma arma de alma lisa é
feita para não ser apoiada no ombro e tem o cano mais curto, ela é geralmente
chamada de pistolão (Figura 66); assim, pistolões são armas semelhantes às
espingardas, porém têm o cano curto e são feitas para serem portadas com as mãos.
Devido à simplicidade de sua fabricação (não é necessário fazer raias no cano), são,
muitas vezes, fabricadas por artesãos e até mesmo de forma bastante rudimentar, por
presidiários
O uso tradicional da espingarda era a caça; mas, por razões de quase
extermínio da caça disponível, este uso vem decaindo, entretanto preservou-se o seu
uso para defesa pessoal, para forças policiais e, mesmo, para uso militar. No caso de
forças policiais e militares, as espingardas têm voltado à ativa em situações em que
está claro que o grupo armado hostil não irá se render. Nesta situação, a espingarda,
com munição adequada, passa a ser utilizada em interiores de edificações (Bolz, Jr.,
Dudonis e Schulz 258). O uso da espingarda determina a sua munição. Para caça
miúda, como aves, são usados bagos pequenos, o “chumbinho”. Para caça de maior
porte e defesa pessoal, usa-se bagos maiores, o “chumbo grosso”, ou um único projétil,
muitas vezes com vazados pré-formatados, o “balote” ou “baletão”. A principal
característica operacional desta arma é o fato de sua munição se espalhar, no caso de
bagos, diminuindo a necessidade de mira.
Existe espingardas de dois canos, um ao lado do outro, mais comum no Brasil,
ou um sobre o outro. Nestes casos, cada cano pode apresentar um choque diferente (Di
Maio & Di Maio, 2001, p. 34).
Deve-se salientar que esta nomenclatura é confusa e não padronizada. Por
exemplo, a literatura portuguesa chama também de espingardas as armas de cano
longo raiado, as que chamamos de fuzil, tanto para uso militar, como para civil.
A espingarda, o rifle, a carabina e o fuzil são armas de cano longo. As
diferenças ficam por conta da alma do cano, que é lisa, sem as raias, e o calibre real,
que é, geralmente, maior que o das armas longas de alma raiada. Outra grande
diferença é o tipo de munição usada, que é composta geralmente por pelotas de
chumbo, os chamados bagos, balins, chumbos ou chumbinhos, ao invés de um único
projétil (Schwoeble & Exline, 2000, p. 91).
Quanto ao carregamento, o tipo mais comum é o de retrocarga, com o cano
basculante, devendo cada cartucho ser alimentado e retirado manualmente. Contudo,
existem espingardas com mecanismos mais sofisticados de alimentação (Wallace,
2008, p. 8). Também podem ser classificadas em tiro único, dois canos sobrepostos,
dois canos paralelos, “bolt-action”, “pump-action” ou “auto-loading”.
Existe ainda as armas mistas, com combinações de espingarda e carabina, as
quais são populares na Europa. A construção é de dois a quatro canos, com um cano de
carabina e um cano de espingarda, até a “vierling”, com dois canos de carabina e dois
canos de espingarda (Figura 68) (Heard 27). No Rio Grande do Sul, não temos notícia
deste tipo de encontro, mas nada impede que elas possam aparecer por aqui também.
Neste tipo de armamento, é possível o erro de entendimento de inferir a presença de
dois atiradores no local de crime e não apenas um.
Na prática criminosa, pode existir a modificação no sentido de encurtar o cano, o
famoso “cano serrado”, que torna a arma mais fácil de ser ocultada e tem um forte
impacto psicológico sobre as vítimas de assalto. Outro aspecto crucial da espingarda é
a impossibilidade do exame para comparar cheios com vazados (Gunn 193).
O comprimento do cano de uma espingarda varia na faixa de 18’’ (46cm) a 36’’
(91cm), com os 26’’ (66cm) ou 28’’ (71cm) sendo os mais comuns. As armas
projetadas para uso policial têm canos de 18’’ (46cm) e de 20’’ (51cm). Com as
pólvoras modernas, o ganho de velocidade em canos de mais de 20’’ (51cm) é
insignificante e o uso de espingardas com canos longos é mais uma questão de
tradição, equilíbrio na empunhadura, estilo ou desejo de obter uma mira mais precisa
para distâncias maiores (Di Maio e Di Maio 219).
O cano de uma espingarda tem três seções: a câmara, o cone e o cano propriamente
dito. A câmara é a parte do cano onde se posiciona o cartucho e tem um diâmetro
interno ligeiramente maior que o resto do cano. Boas espingardas têm uma câmara de
comprimento igual à da munição padrão para o gauge da arma. Entre a câmara e o
cano propriamente dito há um afunilamento do diâmetro interno, que permite uma
transição suave entre essas duas peças.
Ao contrário dos rifles ou das pistolas, muitas espingardas possuem cano
facilmente removível, de maneira que é possível a um indivíduo ter uma única
espingarda e vários canos com choques diferentes. Alguns “experts” em armas de fogo
chegam a entender o cano como apenas um acessório da espingarda (Di Maio e Di
Maio 218-221).
Gauge
Gauge, ou gage (Brenner 125), é o termo utilizado para se referir ao diâmetro
do cano de uma arma de alma lisa. Corresponde ao número de projéteis esféricos de
chumbo metálico, com o mesmo diâmetro do início do cano, necessários para formar
uma libra (453,6 g) de chumbo. Assim, gauge 12 significa que, se forem feitas 12
esferas de chumbo do diâmetro interno do cano de uma espingarda 12, a massa total
destas esferas será de uma libra (Schwoeble e Exline 147). Os gauges das espingardas
comerciais variam desde 8, o maior conhecido, até 36, o menor conhecido, existindo a
exceção da espingarda de calibre 0,410, onde o diâmetro interno nominal do cano é de
0.410’’ (Dolinak, Matshes e Lew 214). Tal maneira de medir um calibre vem dos
tempos da munição artesanal, onde atiradores, caçadores e armeiros possuíam várias
medidas (gauges), expressas em frações de libras, que os permitiam rapidamente dosar
o peso de bagos (“chumbos”) para cada cartucho a ser preparado, de maneira
semelhante como se prepara uma receita culinária. Esta forma de medir o diâmetro
interno de uma arma já era utilizada desde os primeiros dias dos mosquetes carregados
pela boca (antecarga) (Wallace e Beavis).
Abaixo, uma tabela (Tabela 2) com os gauges e calibres conhecidos de armas de
alma lisa. (Heard 57), (CBC - Companhia Brasileira de Cartuchos), (Forjas Taurus
S.A.), (E. R. Amantino & Cia Ltda).
Tabela 2 Gauges.
Gauge
Diâmetro do Cano Fabricantes Usuais
pol. mm
1½* 1,459 37,06
2* 1,325 33,66
3* 1,158 29,41
8** 0,835 21,21
10** 0,775 19,69
12 0,729 18,19 CBC, Boito, Taurus
13**** 0,71 18,03
14**** 0,693 17,60
16 0,663 16,84 CBC, Boito
20 0,615 15,62 CBC, Boito
24**** 0,579 14,71
28 0,55 13,97 CBC, Boito
32**** 0,526 13,36
0,410'' (36) *** 0,41 10,41 CBC, Boito, Taurus
9mm 0,3543 9,00
0,22'' 0,22 5,59 Taurus
* Armas hoje já históricas. Eram semifixas em amuradas de barcos ou
fortificações.
** Gauges raros.
*** A Taurus fabrica um revólver com este calibre.
**** Gauges não usuais.
Os diâmetros mostrados na Tabela 2 são nominais, havendo variações entre os
fabricantes, ou, mesmo, devido ao processo de fabricação. O gauge mais popular nos
Estados Unidos (e no Brasil) é o 12 (Di Maio e Di Maio 220).
Como nada é simples na área de criminalística, existem algumas espingardas,
citadas na literatura, destinadas à caça de veados, que têm o cano raiado e se destinam
a produzir tiros com balotes. Na verdade, são armas de cano raiado, mas com o
“calibre” expresso em gauges e nas mesmas seriações que as espingardas (S. A.
Wagner, Death Scene Investigation: A Field Guide).
Uma prática necessária, em casos de morte por espingarda, ou por qualquer
arma de cano longo, é anotar as dimensões da arma, especialmente a distância entre o
gatilho e a boca do cano, bem como o tamanho do braço da vítima. Esta providência é
necessária para evitar possível alegação de auto ferimento(Dolinak, Matshes e Lew
81-83). Entretanto, é necessário lembrar que existem outras maneiras de se acionar um
gatilho; por exemplo, pés, bastões ou cordões (Dolinak, Matshes e Lew 198).
Choke (Choque)
O choque consiste na diminuição do diâmetro interno do cano de uma
espingarda, da câmara para boca, com o objetivo de concentrar os bagos de chumbo
disparados (Schwoeble e Exline 146) e, assim, aumentar o seu alcance efetivo
(Brenner 66).
Diferentes choques produzirão uma dispersão diferente para uma mesma arma
e para o mesmo tipo de munição. Os diversos graus de choque são tradicionalmente
medidos com base no percentual de bagos que restam dentro de um círculo de 30”
(76cm), posicionado a 40 jardas (36,5m) da arma. Entretanto, nas espingardas de
calibre 0.410, o padrão é diferente, sendo dado por um círculo de 25’’ (64cm),
posicionado a 25 jardas (22,9m). Quanto maior a restrição na boca do cano, menor
será a dispersão dos bagos para a mesma distância do alvo. Os choques tradicionais
são referidos na Tabela 3. Estes valores da tabela foram “melhorados” pelas munições
modernas, que, com aperfeiçoamentos em seus projetos, tendem a produzir tiro mais
agrupado (Di Maio e Di Maio 220-222).
O choque pode ser implementado de forma permanente no próprio cano (opção
mais comum) ou pode ser temporário, com a adaptação de canos com diversos
choques na boca da espingarda (opção menos comum)). Canos com choque
permanente são construídos entre 1’’ (2,54cm) até 6’’ (15,24cm) a partir da boca do
cano e acabam com ½’’ (13mm) até 1’’ (25,4mm) da mesma. A constrição do diâmetro
interno pode variar. Por exemplo, em gauge 12, full choke, o diâmetro interno da boca
do cano pode variar de 0,725” (18,4mm) até 0,694” (17,6mm) (Di Maio e Di Maio
220-222).
Em teoria, as espingardas sem choque, as “true cylinders”, não teriam nenhuma
restrição no diâmetro interno; entretanto; os fabricantes costumam utilizar pequenas
restrições de 0,003’’ a 0,005’’ para obter uma distribuição mais uniforme dos bagos no
alvo, sem a presença de “claros” característicos dos canos em forma completamente
cilíndrica.
Tabela 3 Choques (Di Maio e Di Maio 221,222).
Choque
Restrição Dispersão (30’’ em 40 jardas – 76cm em 36,5 m)Português Inglês
Choque
Full ou
Full Choke 0,04’’ 65 – 75 %
Choque
Pleno
Três
quartos
Three -
quarters
Modified
Choke 45 – 55%
Meio
Choque Half-choked 0,02’’
Um quarto Quarter
Improved
Cylinder 0,005’’ 35 – 45%
True
Cylinder 25 – 35 %
Outro ponto importante para esclarecer, pois trata-se de confusão frequente, é
que não importa o gauge, com um mesmo choque, uma 12 e uma 20 produzirão os
mesmos padrões de dispersão no mesmo intervalo, quando expressos em percentagem,
ou seja, a relação entre tantos por cento dentro e tantos por cento fora de um círculo
imaginário é a mesma. O que vai mudar é o número de bagos de cada munição, pois as
munições possuem, para o mesmo tamanho de bago, quantidades diferentes destes (Di
Maio e Di Maio 220-223).
Nas armas de um cano, o choque é geralmente pleno. Nas armas de dois canos,
monogatilho, se os canos são superpostos, o choque do cano superior é pleno e o do
inferior é modificado. Se os canos são paralelos, no cano esquerdo o choque é pleno e
no da direita, modificado. Nas armas bigatilho, no cano relativo ao gatilho protraído o
choque é modificado e no outro, pleno. Nas pistolas, na verdade pistolões, cujos canos
são dotados de choque, o choque é o modificado (Modified Choke) (Machado, Ferreira
e Ferreira).
Em balística terminal um dado que não pode ser esquecido é que nas armas
dotadas de choque, existe um certo momento e uma certa distância da boca do cano em
que os balins estão agrupados e se a vítima estiver neste ponto ou aproximado, os
balins formarão apenas um ferimento de entrada (Figura 71) dando, à primeira vista, a
impressão de impacto de um único projétil, mas existem diferenças bem marcantes,
como, por exemplo, bordas irregulares e evertidas devido a ação dos balins, e mesmo
uma lesão equimótica pelo impacto da bucha.
Em tiros de espingardas a distância de tiro pode ser avaliada a partir da
dispersão dos bagos. Com tiro próximo, os bagos têm pouco tempo para se espalhar e
a dispersão é pequena, com tiro a distância a dispersão é grande. Teste práticos
mostram também uma grande influência do tipo de arma e do tipo de munição na
dispersão dos projéteis. De um modo geral, uma arma de cano curto apresenta maior
dispersão que uma arma de cano longo, para um mesmo tipo de munição (Gardner e
Bevel 148). Assim a distância de tiro pode ser estimada mais facilmente com munições
de bagos do que os casos de projétil singular. No entanto, como são muitos os fatores a
influenciar na dispersão dos bagos, continua sendo necessário o teste com o mesmo
tipo de arma e com o mesmo tipo de munição para se chegar a uma conclusão mais
apurada (Dix 90).
Se a arma do crime é recuperada e se a munição é conhecida, é possível estimar
com maior acerto a distância de tiro através de testes de tiro com a arma aprendida
(Figura 72) (Dolinak, Matshes e Lew 196), mas se deve lembrar que, como qualquer
outro projétil, os bagos de uma espingarda podem apresentar padrões elípticos nos
seus danos, devido aos seus diferentes ângulos de impacto (Gardner e Bevel 148, 149)
(Figura 73).
Espingardas e armas de fogo de alta potência têm a característica de
produzirem respingos de sangue para frente da vítima, ou seja, em direção ao atirador.
Este fenômeno é mais bem observado em tiros a curta distância, entretanto, roupas,
bonés, chapéus e cabelos da vítima, podem bloquear em todo ou em boa parte este
retorno de sangue (Pex e Vaughn). Este fenômeno é de ocorrência bastante provável no
caso de ferimentos na cabeça, podendo ser observados respingos de retorno até a
distância de 1 m, no corpo ou nas roupas do atirador (Wallace e Beavis 126).
Em 1977, MacDonell e Brooks (MacDonell e Brooks) encontraram certa
correlação entre a profundidade de sangue que retorna para dentro do cano de uma
arma em caso de ferimento. Para espingardas, os autores fizeram as seguintes
constatações:
Quanto maior o gauge da espingarda, maior a penetração de sangue para
dentro do cano;
Foram observadas penetrações de até 5’’ para canos de gauge 12, 16 e
20;
Quando se usa uma espingarda de cano duplo, a penetração de sangue
pode chegar até 12 cm no cano que não efetuou tiro.
Identificação das Armas de Fogo
Conceito de identidade: o conjunto de características únicas de uma arma de
fogo.
Conceito de identificação: verificação das características próprias da arma que
permitam estabelecer sua identidade.
A identificação pode ser de ordem genérica, específica ou individual, ou seja, é
possível identificar uma arma tanto relativamente a um critério amplo (espécie), a um
critério específico (marca e modelo) e a um item em particular (uma arma de fogo
específica).
Existem duas formas de se identificar uma arma de fogo. Podemos realizar
uma identificação direta ou imediata da arma, determinando pelo exame da arma a sua
procedência e a sua identidade civil e física. Podemos realizar também uma
identificação indireta ou mediata, mediante a análise das características gerais e
particulares de uma arma.
Para a identificação direta, em armas que tiveram suprimidas características
como marca ou numerações identificadoras, é possível, em alguns casos, revelar as
características originais através de exame químico-metalográfico (Machado, Ferreira e
Ferreira).
Como qualquer outro item de produção industrial, as armas de fogo recebem
identificações no momento de sua fabricação e mais tarde por proprietários e
organismos de teste e certificação. Os principais elementos de identificação são as
logomarcas do fabricante e modelo da arma, bem como o número de série. Além disso,
as armas destinadas às forças armadas e forças de segurança, recebem identificação
própria da corporação a qual se destinam. Também é possível, principalmente em
equipamentos mais antigos, encontrar marcas de homologação de organismos de teste
e certificação.Por motivos óbvios os criminosos desejam ocultar suas ações, seus métodos e suas
identidades. Desta forma é comum o que os elementos de identificação das armas de
fogo sejam suprimidos ou adulterados para diminuir a possibilidade de rastreamento
por parte dos organismos policiais ou de inteligência. O método mais comum consiste
em remover o material da área identificada junto com a identificação, através abrasão
ou broqueamento da área desejada.
As diversas polícias mantêm cadastros com a identificação da arma e do seu
proprietário, no caso das legalizadas. A primeira providência é identificar claramente o
tipo de arma, o fabricante, o modelo, o calibre, a capacidade de municiamento, o
acabamento, o número de série e outras marcações, como emblemas de forças armadas
e outras instituições.
Como qualquer arma, os revólveres possuem marcações como o número de
série e o número de montagem, as quais são também referenciadas como “infra
tambores”, devido à sua posição. Estes números devem ser anotados já no local de
crime (Figura 75).
Toda vez que existe a necessidade de identificar com a maior precisão possível
uma arma adulterada ou “raspada”, a perícia é acionada. Como as partes essenciais de
uma arma de fogo são produzidas com aço ou outro metal é necessário termos algum
conhecimento de metalografia para entender o processo de recuperação da numeração.
O aço
O aço é uma liga metálica dos elementos ferro e carbono com outros em menor
proporção. Na temperatura ambiente o aço possui uma estrutura cristalina onde os
átomos de carbono, de menor raio atômico, ficam posicionados entre os átomos de
ferro, formando uma estrutura cúbica com os átomos de carbono ocupando o centro do
cubo ou o centro de cada uma das faces. Ocorre que, no processo de cristalização, não
existe uma uniformidade de direções, pois normalmente se formam vários núcleos com
estruturas desalinhadas. Cada uma destas estruturas recebe o nome de grão (Figura 74)
e o tamanho do grão é uma das principais características de cada peça, com grãos
menores produzindo uma peça de maior dureza e maior resistência mecânica, porém
mais frágil. Já as peças com o tamanho de grão maior são menos frágeis e mais
dúcteis, porém mais moles. Quando uma peça de aço é martelada, ocorre a diminuição
do tamanho do grão pela deformação plástica dos mesmos na região afetada. Assim
quando o fabricante introduz a numeração de uma arma através de puncionamento, a
área atingida é deformada e na região no entorno do entalhe da numeração o tamanho
do grão diminui. Ocorre que a fronteira entre os grãos é uma área com maior energia
livre. Quando a numeração é raspada de maneira não muito profunda, permanecem as
áreas com grãos menores.
Esta técnica é similar a utilizada para revelar chassi de carros adulterados
(Figura 76).
A técnica de revelação consiste em polir a superfície e atacar a mesma com
algum ácido, normalmente uma mistura da qual fazem parte o ácido fluorídrico e o
clorídrico. Como o ácido vai atingir de maneira mais intensa a área com maior energia
livre (o contorno do grão), quando o exame tem sucesso, a numeração antiga é
revelada. Porém, quando a técnica utilizada para suprimir a numeração é através do
uso de uma broca, ou seja, bloqueamento, a retirada de material é bem maior, podendo
prejudicar a análise. Um dos pontos negativos desta técnica é que a peça pode ser
danificada pelo menos na sua aparência pelo processo de lixamento, polimento e
subsequente ataque ácido.
Uma maneira de burlar este exame seria aplicar um tratamento térmico chamado
recozimento do aço para aumentar o tamanho do grão, entretanto, este procedimento
raramente é executado.
Igualmente, com o passar do tempo as tensões no interior de uma peça de aço
vão se reduzindo naturalmente e o tamanho do grão tende a ficar uniforme, assim após
20 ou 30 anos depois a falsificação temos uma menor probabilidade de sucesso no
exame pelo ataque químico.
As formulações tipicamente utilizadas são o reativo de Fry (90 g de cloreto de
cobre, 120 ml de ácido clorídrico concentrado, 100 ml de água destilada) e o reativo de
Tuckers (15 ml de ácido fluorídrico concentrado, 45 ml de ácido clorídrico, 15 ml de
ácido nítrico concentrado, 25 ml de água destilada).
Existem outras abordagens que exploram as alterações das propriedades
eletromagnéticas no contorno do grão para reproduzir a numeração original com
algum pó baseado em limalha de ferro.
No Rio Grande do Sul cerca de um terço das armas que dão entrada para
perícia são encaminhadas para a seção e de identificação de armas de fogo, com o
sucesso da revelação variando bastante com o estado da arma e com a maior ou menor
habilidade do perito.
Munição
O cartucho é a unidade de munição das armas de fogo. Os cartuchos das armas
raiadas (revólveres, pistolas, carabinas, rifles e fuzis) são constituídos de quatro partes
fundamentais: estojo, espoleta, pólvora ou carga de projeção e projétil, com a
ressalva que as munições de calibre .22 não possuem espoleta propriamente dita, como
será visto mais tarde. Nas munições para armas de alma lisa, além destes, são
encontradas buchas.
Na maioria das munições, as misturas iniciadoras são compostas de estifnato de
chumbo, nitrato de bário e sulfeto de antimônio.
O propelente atualmente usado é a chamada pólvora sem fumaça, à base de
nitrocelulose ou nitrocelulose e nitroglicerina.
Os projéteis mais comuns são aqueles de liga de chumbo com antimônio,
utilizado para aumentar a dureza, ou de liga de chumbo e antimônio, revestidos com
liga de cobre (encamisados ou jaquetados). De um modo geral, os projéteis para
pistolas são encamisados, com exceção dos de calibre .22”, mas os projéteis para
revólveres tendem a serem produzidos sem a camisa. A função da camisa é evitar
incrustações de chumbo no cano ou nas câmaras. Mesmo projéteis sem camisa são
lubrificados pelo fabricante para tentar diminuir estas incrustações.
É obrigatório que nos locais de crime a posição dos diversos componentes de
munição deva ser preservada através de registro, inclusive fotográfico, e que isto seja
associado com a identificação ou caracterização deles (Figura 80).
Em praticamente 100% dos casos, a munição das armas de fogo modernas são
cartuchos, com exceção conhecida sendo um tipo especial de munição experimental
alemã sem estojo.
A diferença básica entre cartucho e estojo é que o cartucho é um estojo que
contém primer, propelente e projétil.
O termo “bala” que vem do alemão “ball”, que quer dizer bola, é uma
referência aos primeiros projéteis esféricos de chumbo; nada, portanto tem de errado,
pois os termos “balística”, “baleado” e “balim” daí vêm. Entretanto, no coloquial, bala
tanto pode se referir ao projetil, quanto ao cartucho, sendo assim um termo ambíguo, e,
portanto, a ser evitado na linguagem técnica, salvo em oitivas ou citados destas (J. S.
Wallace 9-13).
Os cartuchos modernos para espingardas são normalmente feitos de plástico
com uma base de metal; entretanto, ainda são encontrados os com estojo totalmente
metálico, próprios para recargas, e, em alguns casos, velhos cartuchos de papelão (J. S.
Wallace).
Apesar da arma de fogo já existir há uns 700 anos, o cartucho metálico é
relativamente recente, tendo apenas uns 160 de história em seus tipos primitivos. O
cartucho metálico atual somente foi aperfeiçoado há cerca de 120 anos e as munições
de alta velocidade, com pólvora sem fumaça, são do começo do século XX.
Antes da invenção do cartucho, as armas eram carregadas pela boca, com cada um dos
componentes da munição e suas respectivas buchas carregadas separadamente, com a
evidente demanda de precioso tempo e posicionamento do atirador em pé para realizar
esta operação. Outro aspecto a considerar é que o carregamento da arma era
prejudicado pela ocorrência de chuvas (J. S. Wallace 24-30).
O primeiro cartucho (Guerra dos Trinta Anos) era uma espécie de “refil”, com
um pacote de papel, já com a medida certa de pólvora, atado ao projétil. O atirador
rasgava o papel com os dentes e municiava a armade maneira habitual. Logo o papel
comum foi substituído por papel tratado com nitratos para queima completa e contra
absorção de umidade. Também foram utilizados tripa e outros materiais. Entretanto, o
primeiro “cartucho completo” somente surgiria com a invenção de Pauly (Figura 79),
em 1808, que consistia num cartucho com base de latão, espoleta na base e estojo de
papel. Este foi um dos desenvolvimentos mais importantes da história das armas de
fogo. No entanto, o sistema de cartucho, talvez por necessitar de armas específicas
para o seu uso, ou porque o exército prussiano passou a utilizar outro modelo na
época, não teve aceitação imediata (J. S. Wallace 24-30).
O próximo cartucho popular inventado foi o de Dreyse, em 1831, de papel (Figura
81), onde o fulminante era colocado no “meio” do cartucho e não em sua extremidade
posterior. Para acionar o fulminante era necessário um longo percutor em forma de
agulha. Tinha a vantagem de utilizar o próprio projétil como bigorna. Daí o nome
“fuzil de agulha”. As armas do exército prussiano utilizavam esta munição até a guerra
de 1870 (J. S. Wallace 26).
Até 1846, todos os cartuchos apresentavam o problema de retorno de uma
quantidade grande de gases pela culatra. Este problema foi resolvido com a
substituição dos estojos de papel por estojos de metal (cobre, latão ou bronze), que se
expandem rapidamente no momento da explosão e vedam as paredes laterais da
câmara, o que contribui para melhorar o alcance do tiro (J. S. Wallace 25).
Outro passo foram os cartuchos com primer radial, ainda hoje utilizados em
munição .22’’ e nas raras 0.17’’, desenvolvidos por Houllier, em 1846, os quais se
tornaram populares a partir de 1854 com a produção em massa de variedades destes
calibres pela Smith & Wesson. Entretanto, o uso de pólvora cada vez mais potente
passou a inviabilizar este tipo de munição, pois a parede posterior do cartucho tinha
que ser necessariamente fina para permitir a percussão e, assim, não resistia às altas
pressões das novas pólvoras. A partir de 1854, a mesma Smith & Wesson ressuscitou o
velho projeto de Pauly e passou a fabricar sua própria versão de cartuchos com primer
central, dando sequência aos cartuchos atuais (J. S. Wallace).
Energia e poder de parada
A energia cinética de um projétil depende do módulo da sua velocidade e da
sua massa (Ec=mv2/2). Enquanto a massa do projétil é dada pela especificação do
fabricante, a velocidade depende de todo o conjunto de variáveis físicas que atuam no
movimento do projetil, da ocorrência do tiro ao instante de repouso. Pode-se, no
entanto, determinar a energia cinética de um projétil na boca do cano de uma dada
arma. A máxima velocidade de um projétil ocorre na boca do cano; a energia cinética
associada a essa velocidade é chamada, às vezes, de força viva. Essa energia, medida
em Joules, pode ser usada como parâmetro principal de capacidade do projétil para
produzir danos a um anteparo ou a um alvo humano, e é usada como parâmetro para
dividir os armamentos em uso permitido, restrito e proibido. No entanto, a
capacidade de produzir dano não depende só da energia do projetil; depende também
de variáveis extrínsecas ao projetil, como a região do corpo atingida, e variáveis
intrínsecas como a constituição e o formato do projétil (Machado, Ferreira e Ferreira).
O Poder de Parada, ou “Stopping Power”, é a capacidade de determinada munição
de interromper uma ação ofensiva, ou neutralizar um atacante ou oponente com apenas
um tiro, pondo-o fora de combate. Não há a intenção de matar o agressor, no caso de
defesa pessoal, apenas busca-se a sua momentânea e imediata incapacitação. A morte
ocorre em muitos casos, mas não é o objetivo final ao se determinar o poder de parada
de uma munição.
Conforme Marshall e Sanow, a incapacitação da vítima se dá quando a mesma,
após ser atingida, entra em colapso antes de fazer algum disparo ou expressar uma
outra reação de ataque ou fuga; igualmente a vítima/oponente, quando atingido, não
poderia se deslocar mais do que três metros antes de colapsar (Marshall e Sanow ).
Nos mesmos levantamentos o .357 Magnum é a melhor arma neste critério,
com 96% de stopping power, mas dependendo da munição pode diminuir para até
73%; a .40 S&W dependendo do projétil variou entre 89% a 94%, o .45 ACP com
Hidra Shock ficou com 89%, já o .45 ACP FMJ apenas 64%, o .44 Magnum variou de
81% a 89% dependendo da munição, o 9 mm Luger de 62% a 89%, já o .38 SPL
variou de 49% a 75% dependendo da munição, e o .380 ACP variou de 51% a 65% de
stopping power dependendo da munição.
O uso de munição 9 mm por algumas forças policiais, como, por exemplo, a
Polícia Federal e outras, leva em consideração outros aspectos como a maior
capacidade em perfurar veículos e a menor perda de direção quando passa por um
anteparo, além da tradição de prestígio que este calibre possui.
Estojo
Um estojo é projetado para abrigar de forma segura o projétil, o propelente e o
primer. O design do estojo é afetado por vários fatores, sendo os mais importantes: o
uso para a munição, o tipo de arma, o tipo de ignição (Boxer ou Berdan). A grande
maioria dos estojos é feita de alguma liga de cobre, 70% (com variação encontrada de
65% a 74%) de cobre e 30% de zinco (latão), 80% de cobre e 20% de níquel, mas
também são encontrados estojos de aço revestidos com latão, cobre ou laca, alumínio,
alumínio revestido de teflon e estojos de papelão e plástico. Estes últimos são muito
comuns em armas de caça.
Quando um tiro é produzido, a pressão interna e o aumento da temperatura
fazem a expansão do estojo contra a câmara. Esta função (obturação) é
extremamente importante, pois impede a perda de pressão e, portanto, perda de energia
do projétil. No caso de armas automáticas, o latão utilizado deve ser elástico o
suficiente para voltar ao tamanho original rapidamente, facilitando assim a retirada do
estojo da câmara.
Existem também os estojos de aço. Uma especificação típica de aço para estojo é o
carbono de 0,08% a 0,12%, 0,25% de cobre, 0,6% de manganês, 0,035% de fósforo,
0,03% de enxofre e 0,39% a 0,12% de silício (J. S. Wallace 35).
Outro aspecto de grande interesse são as marcas do fabricante estampadas na
base do estojo (Figura 82). Entretanto, elas não têm valor absoluto, pois munição sem
estampa é encontrada quando um governo, por razões políticas ou econômicas, está
apoiando a causa de rebeldes em outro país e fornecendo munições. Por razões óbvias,
a fonte de abastecimento é dissimulada, com ausência de estampas ou usando
estampas falsas para comprometer terceiros (Labbett).
Uma boa prática em um levantamento de local de crime é o registo da posição
dos estojos e dos demais componentes na posição em que foram encontrados, com a
marcação de etiquetas numeradas nos estojos percutidos ou não, das suas marcas de
estampa e outras numerações, como, por exemplo, o número do lote, quando este
existe, normalmente está estampado no culote de munições destinadas para uso militar
ou policial.
O registo do número de lote tem utilidade para se saber a origem da munição
desviada para finalidade criminosa, da interconexão entre crimes onde foi utilizado o
mesmo lote e do desvio de estojos usados para remanufatura ilegal.
Estojos para Espingardas
Os estojos de espingardas são, geralmente, de plástico, com base de latão ou aço
revestido. Papel também é utilizado. Munição de caça mais antiga usava estojos
totalmente de latão com a finalidade de recarga artesanal por parte de caçadores (J. S.
Wallace 35). Cartuchos inteiramente de plástico já foram fabricados, mas não
obtiveram grande sucesso comercial (Heard 52). O papelão já foi muito utilizado, mas
começou a ser substituído por plástico a partir de 1960, com um lançamento da
americana Remington, no que foi seguida pelos demais fabricantes mundiais (Di Maio
e Di Maio 223).
As câmaras das espingardas de gauge 12, 16 e 20 têm 70 mm de comprimento.
As de gauge 24 têm comprimento de 65 mm e as 28, 32 e 0.410 tem comprimento de
63,5 mm. Os cartuchos para estas espingardasdevem seguir estas medidas. Entretanto,
existe um tipo de cartucho, chamado magnum, que tem o comprimento de 3’’ (75 mm)
e que possui pólvora mais potente e mais bagos, com o objetivo de propiciar maior
carga e não maior velocidade. Estes cartuchos somente devem ser utilizados em
espingardas construídas para este fim, com a câmara de tamanho apropriado e cano
reforçado (Di Maio e Di Maio 224).
Em 1961, o fabricante norte-americano Federal passou a introduzir uma
codificação de cores em seus cartuchos para espingardas. A munição 12 ganhou cor
vermelha, a 16 passou a ser produzido na cor roxa e a munição para 20 passou a ser
produzida em cor amarela. Desde esta época, os principais fabricantes mundiais têm
utilizado padrões de cores diferentes para as suas munições. No caso de municiamento
errôneo, uma combinação particularmente infeliz é a introdução de um cartucho 20 em
uma arma 12. Neste caso, o cartucho inteiro pode se deslocar da câmara para ir se
alojar no interior do cano, obstruindo-o e causando risco de explosão no próximo tiro a
ser produzido (Di Maio e Di Maio 224). Aparentemente para evitar este problema, a
CBC fornece todos os seus cartuchos para espingardas de caça nas cores vermelha,
verde, branca ou cinza, porém abre uma exceção para os cartuchos 20, nos quais o
plástico é sempre amarelo (CBC - Companhia Brasileira de Cartuchos).
Em virtude do seu próprio projeto e pela necessidade de se utilizar pólvoras
rápidas, os cartuchos com bagos têm vários problemas. Um deles é que a rápida
queima da pólvora e a alta pressão contra a parede do cano atuam diretamente sobre os
bagos de chumbo, derretendo-os, deformando-os ou soldando-os. Estes bagos não
esféricos não mantém a trajetória dos demais, saindo do padrão normal de dispersão.
São o que a literatura de língua inglesa chama de “fliers”. Estas características tem
sido minoradas com o uso quase universal de buchas de separação de bom
comprimento, que deixam um “vazio” entre o propelente e os bagos (Di Maio e Di
Maio 225).
Outro aspecto a considerar é que, apesar de o interesse maior estar em estojos
modernos, munições fabricadas em décadas passadas ainda estão estocadas por
particulares, podendo surgir em algum local de crime. Di Maio coloca que munições
de mais de 50 anos podem ainda produzir tiro, desde que não tenham sido expostas a
extremos de temperatura ou umidade (Di Maio e Di Maio 229).
Estojos de plástico às vezes são reutilizados de forma artesanal notadamente
em áreas rurais e, quando vedados com buchas de papel ou similar, podem ter sua
carga de propelente e bagos aumentada, ou diminuída, a critério do usuário,
produzindo um produto final que pode guardar pouca relação com o produto original
além do calibre.
Igualmente, os estojos de espingardas, especialmente os de gauge 12, são
grandes o suficiente para oferecerem suporte para fragmentos úteis de impressões
digitais latentes, não devendo este aspecto ser menosprezado (Figura 83) (Geberth,
Practical homicide investigation: tactics, procedures, and forensic techniques 139).
Projéteis
Para a Física, projétil é qualquer corpo que se desloca no espaço, sofrendo a
ação de um impulso inicial e do campo gravitacional. Entretanto, neste nosso estudo,
iremos tratar como projétil, somente aquele oriundo de uma arma de fogo.
As armas de fogo portáteis foram criadas depois dos canhões e, no começo,
eram adaptações mais leves destes. Os primeiros projéteis usados em armas de fogo
foram pedras, flechas de ferro e esferas de ferro. Os primeiros calibres variavam de
3cm a 5cm e eram todos de cano liso, o que pedia projéteis de forma esférica. De lá
para cá, houve um constante processo para diminuir o peso e o calibre. O chumbo
passou a ser usado já a partir de 1340 devido à sua maior densidade e maleabilidade
que o ferro, resultando projéteis com maior energia e que causassem menor desgaste
no cano (J. S. Wallace 14).
O uso de movimento rotatório para melhorar a precisão de flechas já era
conhecida deste a Antiguidade. Em 1520, Augustin Kutler, conseguiu o mesmo efeito
em projéteis através da introdução de raias internas nos canos das armas de fogo.
Estava aberto o campo para o desenvolvimento de novas formas de projéteis que não a
esférica. A experimentação de diversos tipos logo demonstrou que os de forma
alongada eram bem melhores que os de forma esférica (Dowell 198).
Em 1863, William Ellis Metford, entendendo que o chumbo era mais maleável
que o necessário, pois deixava deposições de chumbo por todo o cano, criou o projétil
de chumbo endurecido com antimônio, tal como é utilizado até hoje. O uso de chumbo
endurecido diminuiu, mas não eliminou o problema, e data desta época a utilização de
lubrificantes com sebos animais, depositados em ranhuras anulares na base do projétil,
com o objetivo de diminuir a deposição de chumbo fundido pelo calor gerado pelo
atrito do projétil com o cano (J. S. Wallace 13).
Os problemas de incrustação de chumbo somente foram resolvidos em 1883,
por Rubin, que introduziu o encamisamento do projétil com cobre sobre um núcleo de
chumbo macio, o que tornou também viável a fabricação de pistolas de outras armas
de mecanismos mais complexos.
Desde esta época é usual a procura por resíduos de cobre ou chumbo em
orifícios suspeitos de passagem de projétil.
As camisas ditas de cobre são, na verdade, ligas onde o cobre entra em
proporções majoritárias, como o cuproníquel (80% cobre, 20% de níquel em peso) ou
uma composição de 90% a 95% de cobre e 10% a 5% de zinco. Também é possível a
adição de 1% a 2% de estanho para melhorar a capacidade lubrificante da liga (J. S.
Wallace 14).
Modernamente o uso de munição não encamisada está restrita, de um modo
geral, a revólveres de todos os calibres e armas de calibre .22’’.
Existe uma vasta gama de armas de fogo e uma variedade também bastante
grande de munição disponível. A razão de tal variedade é de ordem ampla, desde o
porte da arma até o efeito que se deseja no ferimento. Cada tipo de projétil é projetado
para uma finalidade específica e a gama de projéteis disponíveis para uma mesma
arma pode ser bastante grande.
De um modo geral, os projéteis são não encamisados, encamisados ou semi-
encamisados. Os não encamisados podem ter uma fina película de cobre, de latão ou
outro material colorido, com funções cosméticas e lubrificantes. Este material é, às
vezes, referido como casaco e não é uma camisa propriamente dita, pois é removido
pelo atrito com os cheios do cano raiado. Os projéteis não encamisados também são,
frequentemente, lubrificados com alguma cera ou graxa para impedir a incrustação de
chumbo (J. S. Wallace 68).
Projéteis projetados para altas velocidades devem ser encamisados ou semi-
encamisados, pois o chumbo se deforma dentro do cano, o que prejudica a pontaria,
pela assimetria provocada, além do fato de que o citado enchumbamento do cano irá
prejudicar os disparos subsequentes. Os não encamisados também são suscetíveis de
prejudicar o mecanismo de alimentação das armas automáticas e semiautomáticas.
Os projéteis de chumbo têm sua base exposta às altas temperaturas de queima
do propelente. Isto inclui as não encamisadas e as encamisadas, excluindo apenas as
totalmente encamisadas (total metal jacketed bullets - TMJ), o que causa erosão na
base, podendo provocar assimetria no projétil e prejudicar a precisão do tiro. Para
minimizar tal problema, a base pode ser preenchida com lubrificantes especiais para a
tarefa. Outra alternativa é colocar uma camisa de cobre na base dele. Também é
utilizado o encamisamento por eletrodeposição (galvanoplastia).
O material do revestimento do projétil é sempre mais duro que o seu núcleo,
com exceção dos projéteis antiblindados. O encamisamento é feito através de
galvanoplastia, separadamente, e depois prensado, ou com o derramamento de chumbo
dentro da camisa, que, no caso, é usada como molde (J. S. Wallace 68-78).
Sempre que um projétil encamisado atinge o alvo, é possível que a camisa se
separe do núcleo, reduzindo o poder de penetração. Para evitartal ocorrência, uma
variedade de dobras, pregas e geometrias distintas são empregadas, tanto na camisa
quanto no núcleo. Outros métodos incluem colas e soldas para melhor fixar a camisa
ao núcleo de chumbo (Finn).
O cobre e suas ligas, por exemplo, o latão, são, de longe, os materiais mais
utilizados para a confecção de camisas, mas alumínio, náilon, teflon e aço são também
utilizados.
A espessura e a dureza da camisa podem variar desde a base até o nariz do
projétil. Quanto mais fino e mole o nariz, maior o impacto; quanto mais espesso e mais
duro o nariz, maior a penetração.
O núcleo do projétil é geralmente feito de chumbo, pois ele tem alta densidade,
é barato, facilmente obtido e fácil de moldar. Mas, cobre, latão, bronze, aço, alumínio,
urânio empobrecido, zinco, plásticos, tungstênio e borrachas também podem ser
encontrados. O urânio empobrecido é subproduto do processamento de urânio físsil e é
67% mais denso do que o chumbo, o que o torna mais adequado para perfurar
blindagens. Apesar destas alternativas para usos específicos, o tradicional projétil de
chumbo, ou chumbo encamisado com cobre, é, de longe, o mais encontrado em locais
de crime.
Às vezes, um núcleo composto por mais de um material é utilizado para dar
uma diferença de dureza entre base e nariz (núcleo duplo); por exemplo, chumbo
endurecido na base e chumbo mole no nariz, ou, então, aço na base e chumbo no nariz,
ou o contrário, dependendo do efeito que o fabricante deseja dar à sua munição.
Os projéteis de chumbo são normalmente endurecidos, mas nada impede que
chumbo macio seja utilizado. Para o endurecimento, antigamente usava-se mercúrio;
mas hoje, as ligas usadas são o antimônio e o estanho. A liga pode variar
consideravelmente. No caso do antimônio, pode-se ir de 05% até 12%; entretanto, o
usual é na faixa de 2% a 5%. No caso do estanho, utiliza-se desde 0,5% até 10%, mas
o normal é na faixa de 3% a 5%. Uma maior quantidade de estanho é necessária para
se obter a mesma dureza que seria obtida com antimônio. Desta forma, sempre que há
antimônio barato disponível, este é utilizado (J. S. Wallace 69-71).
Alguns projéteis encamisados têm uma pequena cavidade na ponta do nariz
que pode ser vazia, mas geralmente é preenchida com material mais leve que o núcleo,
por exemplo, plástico, alumínio, fibra, carbonato de sódio, policarbonato, nylon, papel,
aço carbono. Em outros projéteis, existe um revestimento sobre a ponta do nariz,
geralmente cobre, aço, alumínio ou plástico. O objetivo é variável; por exemplo,
proteger o nariz de dano, aumentar o poder de penetração ou melhorar a alimentação
nas automáticas ou semiautomáticas (J. S. Wallace 71).
Num crime real, nem todos os projéteis atingem o alvo e, nos casos usuais de
tiroteios entre facções armadas de pistolas, a maior parte dos projéteis atingem
paredes, móveis ou outros anteparos, restando deformados.
Projéteis mais comuns para arma de fogo de cano curto
Ogival de chumbo.
Largamente empregado nas munições de revólver, principalmente nos calibres
de uso permitido. Tem a desvantagem de ser facilmente deformável, antes e depois do
tiro. Trata-se do projétil mais barato, mas desaconselhável o seu emprego em pistolas
pelo risco de enchumbamento dos mecanismos, o que pode ocasionar falhas na
alimentação (Figura 84).
Canto-Vivo de chumbo
Uma opção para o tiro desportivo, provoca um recorte extremamente visível
quando no alvo. Embora de baixa velocidade, se constitui numa válida opção como
munição de defesa em revólveres de canos reduzidos. O vazado na base serve para
deslocar o centro de massa para a região frontal do projetil, contribuindo para a
estabilidade dele.
Semi-Canto-Vivo de chumbo
Empregada tanto no tiro desportivo quanto na defesa possui mais aerodinâmica
que as pontas canto-vivo (maior velocidade), mantém o poder traumático das
munições de grande área frontal. Constitui uma solução intermediária e barata, por não
ter camisa, entre os projéteis ogivais e os de ponta oca.
Ogival Encamisada
O núcleo (normalmente de chumbo) fica completamente revestido. Facilita a
alimentação na câmara e possuindo mais velocidade é largamente empregado nas
munições de pistola. Evita o acúmulo de resíduos de chumbo no raiamento. Munição
penetrante por excelência, ideal para emprego contra alvos protegidos.
Encamisada de ponta achatada
Um projétil penetrante e não-expansivo, mantém o poder traumático das
munições de grande área frontal.
Semi Encamisada de Ponta Macia (Soft-Point)
Agrupa os benefícios das munições encamisadas quanto à alimentação,
velocidade e a limpeza, conciliando penetração e expansão.
Semi Encamisada Ponta Oca
Agrupa os benefícios das munições encamisadas quanto à alimentação,
velocidade e a limpeza. O orifício central aumenta a perspectiva de expansão e a
transferência de energia sobre tecido corporal.
NYCLAD ® Hollow-Point
Munição originalmente produzida pela Federal (USA) e hoje descontinuada,
consistia em projéteis de chumbo de média dureza revestidos de uma camada de teflon
que evitava o atrito com o raiamento e garantia uma maior velocidade. Possuía bom
índice de transferência de energia e sua deformação às vezes chegava a dificultar os
exames de comparação balística. No Brasil, projéteis para recarga nos principais
calibres são facilmente encontrados, tanto no formato ogival, quanto no de ponta-oca.
POWER-BALL®
Hollow-Points encamisadas, tem sua expansão associada a uma esfera de
plástico colocada na cavidade do projétil. A esfera força a cavidade, provocando a
expansão e a transferência de energia.
Encamisada de Ponta-Oca (Hollow-Point)
Munições de defesa mais largamente empregadas atualmente, tanto em
revólveres quanto em pistolas. Contam com uma cavidade na ponta do projétil a qual
provoca sua expansão quando atinge corpos hídricos, como, por exemplo, o corpo
humano. Possuem excelente balanceamento entre a carga propelente, o peso e o
desenho do projétil, objetivando maximizar os efeitos de deformação/expansão e
transferência de energia sobre o alvo. Inúmeras marcas oferecem diferentes tipos de
projéteis com variações de desenhos, os quais expandem e apresentam notáveis efeitos
traumáticos, mesmo em baixa velocidade. Ex: GOLDEN SABER, BLACK TALON,
SUPREME SXT, COR-BON DPX, FEDERAL HST, GOLD DOT, etc.
HYDRA-SHOK®
Munição encamisada de ponta-oca (hollow-point) fabricada pela Federal
(USA) e copiada em outros países, se notabiliza pela adoção de um pino no interior da
cavidade oca. O pino direciona o fluxo de tecido do alvo para o fundo e para as
laterais, proporcionando expansão violenta e uniforme em corpos hídricos ou
gelatinosos.
SILVERTIP®
Encamisada de ponta-oca (hollow-point) fabricada pela Winchester (USA). A
composição de sua camisa de alumínio/ manganês e o desenho do projétil facilitam a
expansão e a transferência de energia.
STARFIRE®
Munições hollow-points encamisadas fabricadas pela PMC coreana, tem sua
expansão associada ao desenho de cânulas nas paredes internas da sua cavidade. O
fluxo de tecido força as canaletas, provocando a expansão em forma de flor. O objetivo
é aumentar o poder de parada, porém prejudica a capacidade de penetração.
SHOTSHELL®
Embora muito confundidos com as poderosas munições Glaser, os projéteis
shotshell destinam-se à caça de pequenos animais ou para propósitos não-letais como
“espanta-ladrões”. No interior da camisa de plástico transparente estão esferas
pequenas de chumbo, as quais, com o tiro, são projetadas contra o alvo com baixa
velocidade e pouca precisão.
GLASER SAFETY SLUG®
A primeira dentre as munições fragmentáveis de alto desempenho, é composta
por uma camisa fina cujo interior é preenchido com pequenas esferas de chumbo e
tampada com uma ponta plástica, a fim de facilitar a alimentação. O projétil, muito
mais leve que o de outras munições hollow-points, é lançado a grande velocidade e se
fragmenta completamente quando atinge o alvo. As esferinhas de chumbo continuam
sua trajetória, causando ferimento grave. A Glaser transfere sobre ele toda a energia
cinética, porémjamais o transfixa. Este tipo de projétil não transpassa o alvo e nem
ricocheteia, pois, sua camisa se rompe ao primeiro impacto, mesmo em superfícies que
seriam facilmente penetradas por outras munições. É produzida para todos os calibres
mais usuais a partir do 6,35mm e possui versões especiais para o emprego
policial/militar (ponta preta) que não são azul). É uma munição tida como cara nos
Estados Unidos e sua comercialização é feita em cartelas com seis cartuchos.
MAGSAFE®
Munição fragmentária de alto desempenho obedece ao mesmo princípio da
Glaser, utilizando um projétil leve, de altíssima velocidade, com chumbinhos na
cavidade. A Magsafe emprega esferas de chumbo de diâmetro maior e preenche o
espaço interno entre o núcleo com uma espécie de cola. As esferas mantêm-se unidas
até atingirem o alvo, e lá se desagregam causando ótima transferência de energia
impactante e ferimentos que são difíceis de tratar.
KTW
Trata-se de um projétil usinado, de bronze ou outro metal duro, revestido de
uma camisa de teflon, a fim de diminui o atrito com o raiamento, reduzir o desgaste e
aumentar a velocidade. Dotado de grande capacidade de penetração de anteparos,
notabilizou-se pela capacidade de penetrar coletes balísticos.
Munições Explosivas
Munições remanufaturadas, a partir de hollow-points comerciais (como a
SILVERTIP da Winchester), possuem a cavidade do projétil preenchida com pólvora
de queima rápida, tampada por uma espoleta especialmente sensibilizada para detonar
quando do impacto em superfícies de pouca dureza. Embora com efeito devastador
contra alvos humanos, são munições altamente instáveis, com notável histórico de
acidentes.
B.A.T. (Blitz Action Trauma)
Desenvolvido na Alemanha para emprego forças governamentais, trata-se de
um projétil Hollow-Point leve (86 grains para o calibre 9x19mm) usinado em latão,
com um pino plástico na extremidade da ogiva, facilitando a alimentação em armas
automáticas. Concilia elevado índice de transferência de energia, deformação uniforme
e boa capacidade de penetração de anteparos. Produzida pela Geco é bastante usada
pelas agências de segurança da Europa. Não possui camisa, sendo um único corpo de
latão bastante duro. Na ponta oca é adaptado um cone de plástico que possibilita o seu
uso em qualquer arma 9 mm. Este cone é ejetado para trás no momento do tiro por um
orifício central existente no projétil, garantindo uma boa estabilidade na trajetória. O
poder de parada desta munição é da ordem de 90%.
Hollow-Point, Copper Bullet
Munição cujo projétil usinado em latão e projetado para expandir-se
radialmente, transferindo muita energia contra os alvos, ao mesmo tempo que permite
um emprego útil contra anteparos. Hoje existem no mercado internacional diversos
fabricantes produzindo munições semelhantes como a COR-BON COPPER DPX ou a
fabricada pela CBC.
Projéteis Frangíveis
Projéteis ogivais ou hollow-points produzidos a partir da prensagem de
materiais granulados os quais mantém sua forma durante o disparo, mas que se
desintegram por ocasião do impacto na primeira superfície que lhes ofereça oposição.
São normalmente pontas leves e velozes, que apresentam a vantagem de não
ricochetear e nem transfixar o alvo.
QUICK-SHOK®
Munição com projéteis hollow-points encamisados, especialmente desenhada
para, quando, do impacto no alvo, expandir violentamente, fragmentando seu núcleo
de chumbo em três grandes fragmentos que produziam maior dilaceração de tecidos e
dificultavam o tratamento do ferimento. Com a absorção da fábrica Triton pela CCI, a
munição deixou de ser fabricada. O conceito da Quick-Shok foi revivido pela fábrica
mexicana Aquila, que produz hollow-points com projéteis de alumínio especialmente
desenhados para facilitar sua fragmentação quando da impactação no alvo.
EXTREME SHOCK®
Munição de alta velocidade, com projéteis ogivais encamisados, de ponta
macia ou hollow-points, bastante leves, que combinam materiais frangíveis e um
núcleo de polímero. Conseguem expansão muitíssimo violente e são extremamente
letais contra alvos humanos. Assim como as demais munições frangíveis, apresentam a
vantagem de não ricochetear e nem transfixar o alvo.
EXPANDING FULL METAL JACKET®
Constatando que muitas munições de ponta oca falham em sua expansão ao
terem sua cavidade obstruída por materiais dos mais diversos. A Federal produziu essa
munição com projéteis encamisados de ponta achatada os quais combinam em sua
construção o chumbo e material plástico. Quando do impacto, o núcleo de chumbo,
posicionado na base da ponta, força o polímero de encontro à camisa e ao alvo,
provocando uma expansão uniforme e uma transferência de energia jamais alcançada
numa munição encamisada normal. O desenho de tais projéteis busca conciliar uma
capacidade superior de penetração de anteparos, própria das munições encamisadas,
com uma expansão consistente e transferência de energia contra alvos de menor dureza
(V. D. Cavalcante).
Projéteis Perfurantes
As munições perfurantes (Armor - Piercing - AP) são pensados para perfurar
carrocerias e blindagens leves. São geralmente utilizadas em armas de cano longo,
porque velocidade e alcance são quesitos necessários neste uso. Entretanto, existem
algumas munições deste tipo para cano curto, mas estas têm poder de perfuração mais
limitado. Com algumas poucas exceções, as APs são encamisadas.
Os projéteis AP, geralmente, têm um enchimento de chumbo ou outro material
mole na ponta do nariz para dar uma pequena amortecida no impacto e evitar a
indesejada fratura no núcleo duro, que, como todo material duro, é também
quebradiço. Também é encontrada uma fina bainha de chumbo entre a camisa e o
núcleo, que, geralmente, é feito de aço com adições do tipo: tungstênio-carbono,
tungstênio-cromo, manganês-molibdênio, cromo-vanádio ou cromo-molibdênio.
Duas especificações usuais para núcleo de projétil são:
Aço com 2% a 3% de tungstênio e 1,25% de carbono;
Aço com 3% a 4% de tungstênio, 1,1% de carbono e traços de manganês.
Carboneto de tungstênio também é utilizado como núcleo de munição
AP e oferece resultado bem melhor que o aço no quesito penetração. Sua
densidade é o dobro da densidade do aço e 1,4 vezes mais denso que o
chumbo.
Alguns projéteis deste tipo também incorporam um agente produtor de gás
lacrimogênio com a ideia de obrigar os ocupantes do blindado a abrirem as portas (J.
S. Wallace 70-72).
Munição Traçante
Os projéteis traçantes são aqueles que, quando disparados, deixam um
marcador visível, de maneira que a trajetória possa ser vista e corrigida. Projéteis deste
tipo tem uma cavidade na base, a qual é preenchida com uma mistura de substâncias
que são inflamadas pela queima do propulsor. Este tipo de munição está disponível
para uma ampla gama de calibres, embora sejam mais comuns para fuzis.
O marcador é frequentemente alojado em um recipiente de latão ou alguma
outra liga de cobre ou aço, que por sua vez é introduzido na cavidade oca da base do
projétil. Já outros fabricantes optam por colocar o marcador diretamente na base oca e
selar o culote com discos de papel, aço, bronze ou mesmo verniz (J. S. Wallace 71-73).
Abaixo temos três exemplos de composição traçante:
Peróxido de bário a 86% (oxidante e corantes), magnésio em pó a 12%
(combustível), resina Acaroid a 2% (aglutinante), nitrato de estrôncio a
51,7% (oxidante e corantes), magnésio a 33,3% (combustível),
Polivinilclorido a 5,4% e fenol formaldeído a 9,6%; com traço amarelo;
Magnésio em pó a 38,0% (material combustível), cera de abelha a ,8%,
nitrato de estrôncio a 42,8% (oxidante e corante), goma laca natural a 4,8%,
borracha clorada a 4,8% e carbonato de magnésio a 4,8%;
Magnésio a 13% (combustível), alumínio a 3%, nitrato de estrôncio a
73% (oxidante e corante), ferro a 6% e resinas a 5% (aglutinante).
A munição traçante tem o inconveniente de mostrar a posição do atirador. Para
evitar este problema, existem algumas munições deste tipo que são retardadas, ou seja,
o traço somente entra em combustão quando o projétil já está a alguma distânciada
boca do cano. A mistura nestes traços contém permanganato de potássio e ou titânio
(Kent).
Há munição traçante em diversas luminosidades para uso diurno ou noturno e,
usualmente, são fornecidas na cor amarelo, verde, laranja, vermelho ou branca.
Existem também combinações de munição traçante com munição explosiva. Projéteis
traçantes também são utilizados para indicar quando a munição do carregador ou do
cinto já está perto de se esgotar, desde que colocadas em uma sequência conhecida.
Apesar de que tal procedimento também pode informar ao oponente do esgotamento
da munição.
Munição Incendiária
Projéteis incendiários são substitutos modernos da flecha com palha e óleo. São
usados contra alvos inflamáveis e têm um composto incendiário no nariz, que entra em
ignição, no momento do impacto. Este tipo de munição é normalmente oferecida para
armas de cano longo. O agente incendiário mais conhecido é o magnésio, que tem
ponto de fusão a 650ºC e, uma vez derretido, entra facilmente em combustão. Outro
elemento utilizado é o alumínio em pó. Abaixo temos algumas formulações comuns
para este tipo de componente de munição:
Alumínio em pó a 20%; óxido de ferro a 40%, nitrato de bário a 35% e
ácido bórico a 5%;
Liga de alumínio com magnésio a 50% e nitrato de bário a 50%;
Nitrato de bário a 32%, peróxido de bário a 53,3% e magnésio a 9,8%.
O fósforo, ou seus compostos e misturas, é outro agente incendiário conhecido
e já foi a base deste tipo de munição e para munição traçante; entretanto, devido aos
riscos no processo de fabricação, o fósforo foi substituído pelo magnésio ou pelo
alumínio. Apesar das dificuldades, alguns fabricantes oferecem este tipo de munição,
tanto para incêndio, quanto para traço. Também existem as combinações de
incendiária com traçante e com perfurante. (Wallace, 2008, pp. 73-74).
Balins ou Bagos
Balins, ou bagos, são projéteis pequenos e esféricos, disponíveis, em função da
sua utilização, em vários tamanhos, graus de dureza e materiais e são destinados,
geralmente, para espingardas ou pistolões. Existem, porém, exemplos de munições de
balins para revólveres (Figura 85). Em geral, os balins de um mesmo cartucho têm o
mesmo tamanho e composição. Entretanto, existem os chamados “duplex”, que
contém dois tipos de balins no mesmo cartucho (Schwoeble e Exline 150) (Heard
150).
Os balins podem ser de chumbo macio (menos de 0,5% de antimônio ou
estanho), endurecidos (de 0,5% a 2,0% de liga com antimônio ou estanho) ou extra
duros (mais de 2% de liga). Usa-se antimônio, geralmente de 0% até 6%, pois é mais
barato que estanho, mas somente até 12% de liga é possível. Além de chumbo,
também são feitos balins de aço, de bismuto e de tungstênio embutido em polímero
plástico (J. S. Wallace 36-40). Existem também os balins de chumbo banhados com
uma fina camada de cobre ou níquel, com o objetivo de minimizar a deformação
durante o disparo, mantendo, assim, a sua forma aerodinâmica (Di Maio e Di Maio
231).
Legislação mundial cada vez mais repressiva e a preocupação com a saúde de
pessoas que comem animais caçados (comer balins de chumbo junto com a caça pode
causar saturnismo), ou com predadores de animais feridos, tem sido invocada para
produção de bagos alternativos aos de chumbo com antimônio, estimulando a
produção de uma quarta categoria de bagos, onde se incluem os de aço mole (revestido
ou não com cobre), bismuto em liga com aço ou tungstênio em liga com aço ou com
polímero (Di Maio e Di Maio) (Heard 59). Entretanto, como estes materiais têm
densidade menor que a do chumbo, suas propriedades aerodinâmicas são inferiores,
reduzindo o seu poder de alcance.
Existem diversos diâmetros de bagos (Tabela 4), destinados a diversos usos.
Como regra geral, quanto menor é o bago, menor é o animal ao qual se destina.
Entretanto, todos podem ser fatais para um ser humano.
Tabela 4 Bagos da CBC (CBC - Companhia Brasileira de Cartuchos)
Notação Diâmetro mm Quantidade de bagos por 10g
SG 8,4 2,8
TTT e T 5,5 10
T 5,0 14
1 4 27
3 3,5 40
5 3 64
6 2,75 83
7 2,5 110
7½ 2,38 130
8 2,25 151
9 2 216
11 1,5 457
12 1,25 870
Balotes
Às vezes, as espingardas são municiadas com um único projétil, que pode ser
esférico ou alongado. Quando for alongado, raias devem ser providenciadas no seu
molde para garantir um bom desempenho. Este tipo de munição tem um bom poder de
parada e de penetração para tiro curto, mas são ineficazes para tiro longo. São
normalmente utilizadas por forças policiais e, conforme a quantidade e qualidade do
propelente e o tamanho do balote ou baletão, podem ser utilizadas para ataque a
veículo em fuga, rompimento de portas, quebra de dobradiças e atividades
assemelhadas. Projéteis de borracha e para carregamento de dispositivos especiais e
agentes químicos também são encontrados.
No balote cilíndrico, a ideia do vazado pré-formatado é a mesma de se prover
raias nos canos de armas raiadas, ou seja, fazer o projétil girar em torno do seu eixo
longitudinal e atingir o alvo com maior precisão (Brenner 224). Assim, balote é um
projétil único projetado para ser usado em arma de cano de alma lisa. Este tipo de
munição está disponível para os principais calibres destas armas.
A forma mais simples de um balote é uma esfera, que sendo uma forma
simétrica, não irá se desviar muito do seu alvo se começar a girar em torno de si. Isto
funciona a curta distância, entretanto, a distância maior, esta combinação espingarda /
balote esférico é apena uma forma mais moderna do antigo mosquete, com seus
inerentes problemas de precisão. Para melhorar o desempenho dos balotes, tanto nos
aspectos de balística externa, quanto terminal, foi necessário alongar o mesmo, criando
a necessidade de alguma forma de aleta para forçar o giro em torno do eixo
longitudinal, como qualquer projétil não esférico de arma de fogo (Heard 59).
Nada impede que um balote seja adaptado a uma arma de cano raiado, desde
que de diâmetro compatível. Tal prática irá produzir enchumbamento do cano, mas isto
não quer dizer que esta não seja utilizada em locais de crime (Heard 61). Algo
semelhante se dá com espingardas com cano de choque pleno, mas é possível, porém a
prática acabará deformando o cano e alterando as suas características (Heard 59).
Desta forma, foram projetados diversos tipos de balotes para atender estas
necessidades.
Balotes Brenneke
Os balotes do tipo Brenneke (Figura 86) foram desenvolvidos pelo projetista
alemão Wilhelm Brenneke em 1898. O projeto original era de chumbo com aletas
simulando os vazados produzidos pelos cheios de um cano raiado. Na parte de trás do
projétil há uma bucha de plástico (hoje), de feltro ou papelão que permanece aderida
ao projétil, fazendo com que seu centro de gravidade fique na porção dianteira do
projétil (efeito peteca) e mantendo o projétil na posição desejada. Os vazados pré-
formatados normalmente se deformam pelo atrito com o cano e não dão giro
significativo para o projétil. Na prática se trata de um projétil para pequenas distâncias
e grandes alvos (Heard).(Figura 86)
Balotes Foster
Este tipo de balote foi desenvolvido por Karl Foster, nos Estados Unidos, em
1931. O que define este tipo de projétil é uma depressão profunda na base, colocando
seu centro da gravidade muito próximo da ponta do projétil, provocando o “efeito
peteca” sem a necessidade de buchas. Este efeito faz que que a trajetória do projétil
seja mantida com mais facilidade, tornando a arma útil até cerca de 50 a 70 jardas (46
– 64 m). Este tipo de balote também pode ser aletado, mas elas transmitem pouco ou
nenhum giro ao mesmo, servindo mais para contrair seu diâmetro de forma segura
quando eles são usados em armas com choque. Neste caso, entretanto irá ocorrer uma
certa perda de precisão (Heard 61).
Balotes Usuais No Brasil
A munição usada legalmente no Brasil é, quase sempre, proveniente da
empresa CBC – Companhia Brasileira de Cartuchos. Consultando os catálogos
disponíveis das mesmas temos dois tipos de balotes fabricados pela CBC (CBC -
Companhia Brasileira de Cartuchos): o balotealetado), fornecido no gauge 12 e o
balote do tipo “Knock Down”), fornecido nos gauge 12, 16 e 20. Trata-se de balotes
do tipo Foster modificados (Figura 87).
Munição de recarga ou artesanais
Nem toda a munição artesanal é de recarga, pois algumas pessoas gostam de
fazer sua própria munição para fins esportivos, de caça, de defesa pessoal ou para a
prática criminosa. No nosso caso, a companhia CBC, vende os componentes à granel,
desde espoletas até projéteis. Para quem quiser fugir do controle oficial, basta usar os
préstimos de alguns dos nossos vizinhos, onde os produtos da CBC, ou de outros
fabricantes, são internados e depois reintroduzidos no nosso país.
O mais comum, no caso de remanufatura, é o reaproveitamento do estojo e a
fabricação artesanal de projéteis de chumbo. Nestas duas hipóteses, a munição pode
ser bastante barateada e ainda abre a possibilidade para o fabrico de munição para
armas de fogo incomuns ou obsoletas. De um modo geral, os fabricantes de munição
alertam para o uso deste tipo de processo, mas, por outro lado, não se negam a vender
os componentes avulsos (J. S. Wallace 77-80).
Apesar de não existir levantamentos sobre o assunto, é correto afirmar que uma
parte significativa das munições utilizadas para o crime são remanufaturas em nosso
país, sendo observados até o uso de estojos controlados com numeração de lote para
esta prática.
Munição Explosiva
Projéteis explosivos não são uma ideia recente, pois existem desde meados do
século XIX, quando eram utilizados fulminato de mercúrio e pólvora negra.
Durante a Segunda Guerra Mundial, vários tipos de munição explosiva foram
desenvolvidos. Um tipo mais comum continha um pino percutor que era acionado pela
força de inércia do núcleo de chumbo na base. A carga explosiva ficava no nariz
(Figura 88).
Nos Estados Unidos, munição explosiva é fabricada, tanto para fuzis, como para
pistolas e revólveres. Alguns fabricantes utilizam pólvora negra, ou seu similar
moderno, o Pyrodex, ou fulminato de mercúrio, como explosivo (J. S. Wallace 77-80).
Apenas a título de ilustração, na tentativa de assassinato contra o presidente
Reagan (30/03/1981) foi utilizada munição explosiva da marca “Devastator”, norte-
americana, calibre 0,22’’ LR, camisas com cobre, com uma perfuração no nariz,
contendo cerca de 24mg de azida de chumbo e nitrocelulose (Tate, DiMaio e Davis).
Sinalizadores
Este tipo de munição contém alguma carga de composição pirotécnica e pode
ser utilizada para sinalização ou para proporcionar uma fonte de iluminação por um
período breve. Estão, normalmente, disponíveis em calibres .38’’, 9mm Parabellum ou
espingarda de calibre (gauge) 12 e 16.
Sabot
Munição do tipo sabot (tamanco) é a munição utilizada quando se deseja
hipervelocidade para projéteis pequenos, usando o artifício de produzir tiro em um
calibre maior. O sabot propriamente dito é uma bucha, geralmente de plástico, de
calibre compatível com a arma utilizada, no centro da qual se aloja o projétil de menor
calibre (J. S. Wallace 81).
O sabot entra em rotação devido às raias do cano e, quando aletado, abre as aletas
devido à força centrífuga, transmitindo a rotação ao projétil de menor calibre. A
resistência do ar desprende o sabot do projétil a cerca de 18 centímetros a partir do
cano. O sabot pode seguir uma trajetória de até 100 metros e pode produzir ferimento
grave se encontrar alguém no caminho. Uma grave implicação do uso de sabots é que
não haverá ressaltos e cavados no projétil e não se saberá o calibre real da arma
utilizada se o sabot não for encontrado (Forker).
Múltipla carga
Um único projétil para arma de cano raiado é a possibilidade mais comum, mas
não é a única. Já foram fabricadas munições com mais de um projétil colocados de
forma paralela ou em fila dento do cartucho. São conhecidas munições com até quatro
projéteis. A ideia é aumentar o poder de parada. Se o tiro for próximo teremos a
possibilidade de um orifício de entrada e mais de um orifício de saída. Se o tiro for de
maior distância irá parecer que houve mais de um disparo. Este tipo de munição é
raríssimo e um exemplo de interesse apenas histórico é uma munição de 7,62mm,
fabricada pela Nagant para revolveres (J. S. Wallace 82).
Buchas
Em certos casos, material para amortecer, geralmente polietileno granulado na
coloração branca, é misturado com os balins para evitar distorções durante a descarga.
Este material pode ser encontrado nos ferimentos, quando o tiro é de curta distância.
Outros fabricantes usam uma bucha em forma de taça como receptáculo dos balins.
Após sair do cano, este receptáculo, de plástico, com baixa densidade, logo se separa
dos balins, que seguem então, livres, em sua trajetória. Até quatro ou cinco buchas
podem estar presentes em um cartucho de espingarda, embora dois ou três sejam as
mais comuns. As buchas são utilizadas para separar o propelente dos balins e para
fechar a boca do cartucho. As buchas são normalmente feitas de papel ou papelão,
plástico em diversas cores, de feltro (o qual pode ser encerrado ou untado com óleo) e
tecidos. Alguns fabricantes colocam uma etiqueta de papel aderida à bucha, com
informações sobre a munição (J. S. Wallace 76).
Após o tiro, as buchas são lançadas pela boca do cano, mas, devido à sua forma
e à sua baixa densidade, são logo paradas pela resistência do ar. A distância percorrida
pela bucha, normalmente, é inferior a 2 metros, mas em alguns casos, a mesma pode
ser encontrada dentro do ferimento.
Buchas encontradas no local de crime podem fornecer informações valiosas sobre
o primer e sobre o tipo de propelente, se analisadas quimicamente. O exame físico
também pode dar informações sobre o calibre e sobre o fabricante (J. S. Wallace 73-
78).
As buchas e outros elementos da munição são expelidos pela boca do cano e
devem ser procurados e registrados no local de crime, com a finalidade de identificar o
armamento utilizado e apontar a dinâmica do evento (Gardner e Bevel 147). Em raras
ocasiões, as buchas e os estojos podem identificar, através de marcas especificas no
cano, de qual arma foi produzido o tiro (Wallace e Beavis 283, 287).
Um elemento adicional para estimar a posição do atirador é a presença de buchas,
pois elas são expelidas à uma distância entre 30 a 50 pés (9,14 a 15,2m). Assim, para
efeitos de localizar a posição do atirador se deve ter em mente que ele estava antes da
bucha não depois (Gardner e Bevel 149).
Bagos, buchas e fragmentos de estojo devem ser recolhidos para comparações
e exames pertinentes e os bagos existentes devem ser recolhidos. No caso de bagos de
pequeno tamanho apenas uma amostra significativa pode ser feita. A necessidade de
recolher os bagos se dá pela oportunidade de comparar cos mesmos com os que forem
retirados do corpo da vítima ou com munição em poder de suspeito (Dolinak, Matshes
e Lew 93). É necessário lembrar que todo o vestígio que pode ajudar a formar juízo de
valor sobre o ocorrido em local de crime deve ser preservado. Sobre este tópico,
Geberth afirma que os estojos podem proporcionar ao perito informações sobre o tipo
de bagos, o gauge da arma e até elementos que para identificação da mesma (Geberth,
Practical homicide investigation: tactics, procedures, and forensic techniques 325).
Em munições “caseiras” ou remanufaturas podem ser encontrados todos os
tipos de materiais improvisados como buchas, sendo os mais comuns o papel, o
papelão ou pedaços de tecidos.
Acessórios
Os acessórios para armas de fogo são cada vez mais comuns para realização de
perícias. Alguns podem mudar as características da arma quanto a capacidade e
facilitar o emprego da arma pelo atirador. Exemplos:
Adaptadores de pistolas de semiautomáticas para automática
Lunetas.
Silenciadores.
Miras laser.
Carregadores de grande capacidade (Figura 91).
Tiro Acidental
Tiro acidental é todo tiro resultante de disparo produzido por uma arma de fogo
que não teve como causa o normal acionamento, por ato humano, do mecanismo de
disparo da arma. Tiro acidental, portanto, difere de tiroinvoluntário (tiro produzido
com o normal acionamento dos mecanismos de disparo da arma, porém sem a intenção
do atirador), de acidente de tiro (tiro produzido com anormalidade, resultando em
dano para a arma e/ou para o atirador) e de incidente de tiro (tiro produzido com
anormalidade corrigível, sem danos permanente para a arma ou para o atirador).
Juridicamente, tiro acidental pressupõe tiro involuntário, porém a recíproca 
não é
verdadeira (Machado, Ferreira e Ferreira).
Uma das atividades de perícia de balística é a realização de testes de tiro
acidental nas hipóteses em que esta alegação é apresentada. Idealmente, deve-se
realizar os testes de tiro acidental submetendo a arma à mesma situação na qual se
alega ter ocorrido o tiro, sempre usando munição desprovida de pólvora e de projetil.
Balística Exterior
Balística Externa é o ramo da Balística que trata do movimento do projétil no
ar, sofrendo a ação da força da gravidade, ou seja, da boca do cano até o anteparo.
Entretanto, o tiroteio de interesse policial, normalmente, é efetuado à distância inferior
a dez metros. Nesta distância, é possível desprezar a resistência do ar e a ação da
gravidade sobre o projétil. Entretanto, existe um subgrupo de ocorrências, as “balas
perdidas”, os assassinatos através de “snipers” e os confronto com facções, que
utilizam armas de maior energia com técnica de fogo de barragem, onde tal
generalização não pode ser feita. Entretanto, por serem de bem menor número estas
ocorrências, nosso trabalho não irá tecer considerações sobre o tiro de longa distância.
Balística Terminal
Balística terminal é o ramo da Balística Forense que trata das consequências de
um tiro de arma de fogo contra algum corpo material, o qual pode ser um ser humano,
uma vidraça, um automóvel, uma vestimenta, uma parede ou qualquer outro corpo
rígido ou semirrígido. Este, sem dúvida, é o ramo que o perito, que se dedique a
examinar um local de crime por disparo de arma de fogo, deve ter o maior
conhecimento possível.
4. PÓLVORAS, ESPOLETAS E RESÍDUOS
Espoletas e Primers
Apesar de os termos espoleta, primer e mistura iniciadora serem utilizados
como equivalentes para se referir à mistura iniciadora, espoleta é, a rigor, apenas o
container, geralmente de metal, que contém a mistura iniciadora.
De um modo bastante geral, podemos dizer que o primer deixa resíduos de
chumbo, bário e antimônio nas mãos do atirador. A razão disto é a presença destes
componentes nas misturas iniciadoras comuns, pois as misturas necessitam da ação de
três componentes:
• O iniciador – comumente estifnato de chumbo, que detona quando é
percutido pelo percutor;
• O oxidante – comumente nitrato de bário, que fornece o oxigênio necessário
para a queima do combustível; 
• O combustível – comumente sulfeto de antimônio, que queima (se oxida) a
uma taxa muito elevada, fornecendo energia para inflamar o propelente (pólvora), um
componente bem mais estável, que vai fornecer gases em expansão súbita para
impulsionar o projétil.
Entretanto, como veremos abaixo, qualquer conclusão acerca de GSR para fins
judiciais deve ir muito além destas breves colocações.
Os primers são misturas, que, quando submetidas à percussão, fornecem uma
súbita explosão de chama, que serve para inflamar o propelente do cartucho (pólvora).
O primer deve produzir um volume grande de gases quentes e partículas sólidas
quentes (J. S. Wallace 39).
O primer ideal deve ser barato, fácil de obter, relativamente seguro de usar,
granulação uniforme e deve desencadear uma reação altamente exotérmica quando
sofre o choque de um percutor. A sustância mais parecida com isto é o
dinitroresorcinato de chumbo, mas este é muito sensível. Na prática, não há substância
pura que possa preencher os requisitos de um primer e, desta forma, os armeiros
necessitaram experimentar misturas e granulações diversas (J. S. Wallace 39).
A taxa de queima, o volume dos gases gerados, o peso das partículas
produzidas e a duração da chama são os fatores mais importantes. Em uma
composição típica, com 0,15g de primer, teríamos 1,5cm3 de gases e o volume de
partículas incandescentes transportadas por este gás quente chegaria a ser até 70% do
primer. A função destas partículas é ir promovendo a ignição do propelente que
encontrar pelo caminho. Os primers típicos têm um tempo de rajada efetiva na ordem
de 400 a 750 microssegundos e com duração total de 650 a 1500 microssegundos (J. S.
Wallace 39).
De um modo geral, primers de armas pequenas consistem na mistura
equilibrada de um iniciador, um oxidante para fornecer oxigênio, um
combustível, um atritante, para melhorar as qualidades mecânicas da mistura, um
catalizador e um aglomerante.
Iniciadores utilizados incluem azidas, fulminatos, compostos nitrosos, azida de
prata, azida de chumbo, fulminato de mercúrio, estifnato de chumbo, TNT e PETN
(que também funcionam como catalizadores). Todo o iniciador deve ter a característica
de se desestabilizar quando impactado (detonar).
Oxidantes, com a função de fornecer oxigênio para a reação, incluem o nitrato
de bário, o cloreto de potássio, o dióxido de chumbo e o nitrato de bário.
Os combustíveis utilizados incluem sulfeto de antimônio (que também atua
como atritante), goma arábica (que também atua como aglomerante), siliceto de cálcio
(que também atua como atritante), nitrocelulose, tiocianato de carbono e metais em pó,
tais como alumínio, magnésio, zircônio, ou as suas ligas.
Atritantes incluem o vidro em pó, o alumínio em pó (que também atua como
combustível).
Catalizadores abrangem substâncias como o TNT e o PETN, que também
funcionam como iniciadores.
Aglomerantes abarcam ingredientes como a goma arábica e outras gomas,
colas, alginato de sódio, cimento e borracha (J. S. Wallace 35-42).
Em 1805, o reverendo Alexander Forsyth criou o primeiro primer, baseado em
fulminato de mercúrio. Desde lá, tem havido uma evolução que continua em
andamento, mas os fabricantes de munição em qualquer parte do mundo são muito
relutantes em revelar suas formulações ou mesmo quaisquer aspectos dos seus
negócios; consequentemente, as informações sobre o assunto e, portanto, sobre os
resíduos de tiro, são escassas e fragmentadas na literatura (J. S. Wallace 35-42).
Até 1806, todas as armas de fogo eram descarregadas com a ação de uma
chama diretamente na pólvora ou usavam pederneira, que nada mais é do que uma
pedra de sílex, o sílex pirômaco, que produz uma faísca ao ser batida com uma peça de
ferro. Antes da invenção do fósforo, esta era a forma mais prática de se obter fogo e a
peça de ferro ou aço que batia na pedra era chamada de fuzil; daí pensamos ser essa a
origem do nome consagrado, no português na América do Sul, para certas armas de
cano longo.
Em 1806, apareceram as primitivas misturas iniciadoras feitas de fulminato de
mercúrio, introduzidas por Forsythe, onde o fulminato de mercúrio era acondicionado
em frascos pequenos de vidro. O sistema não teve grande aceitação por ser muito
instável. Em 1807, Forsythe introduziu uma fórmula de mistura iniciadora, que
consistia em 70,6 partes de clorato de potássio, 17,6 partes de enxofre e 11,8 partes de
carvão vegetal, havendo, inclusive, autores que duvidam do uso de fulminato de
mercúrio por este inventor. Embora fosse mais estável que a anterior, essa nova
fórmula mostrou-se muito corrosiva (Heard 87) (J. S. Wallace 43).
A primeira espoleta, um corpo com o primer dentro, instalado na região
posterior do cartucho, foi produzida por Joshua Shaw em 1814, utilizando fulminato
de mercúrio, que, em 1818, foi substituído por uma mistura de fulminato de mercúrio,
cloreto de potássio, enxofre e carvão. A novidade agradou, mas, por ser muito
corrosiva, exigia a limpeza da arma logo após o tiro (Heard 87).
Em 1828, von Dreyse patenteou o “fuzil de agulha”, uma arma eficaz de
retrocarga, onde a munição tinha a seguinte ordem de montagem: papel, pólvora,
espoleta e projétil. Um longo percutor, na forma de uma agulha, perfurava o papel e a
pólvora para então atingir a mistura iniciadora,que era uma mistura de clorato de
potássio e sulfeto de antimônio. A arma fez sucesso no exército prussiano, pois, apesar
de complicada e sensível, podia ser carregada com o atirador agachado ou deitado, ao
contrário das armas de antecarga de então, que exigiam que o soldado ficasse em pé,
ou pelo menos ajoelhado, para carregar a arma de tiro unitário (Heard 87).
Com a introdução do cartucho de metal (latão) por volta de cerca de 1850,
verificou-se que o mercúrio fazia uma amálgama com o zinco do latão, destruindo o
estojo, o que inviabilizava a recarga, essencial, na época, por razões econômicas. Uma
alternativa foi o uso de estojos de cobre e outra, foi o envernizamento interno do estojo
a partir de 1869, com o trabalho de Hobbs (J. S. Wallace 43).
Na época da pólvora negra, uma grande quantidade de resíduos era depositada
no interior do cano, pois na combustão resultava 44% do peso original em gases
quentes e 56% em resíduos sólidos, provocando uma densa nuvem de fumaça branca
em qualquer lugar de tiroteio (T. L. Davis). Quando as pólvoras sem fumaça foram
introduzidas entre 1870 e 1890, outro grande problema foi verificado: estas pólvoras
eram bem mais difíceis de inflamar que a tradicional pólvora negra;
consequentemente, maiores cargas de mistura iniciadora se faziam necessárias. Mesmo
com o cano limpo, este “enferrujava”, devido à ação do fulminato de mercúrio
presente na mistura iniciadora (J. S. Wallace 43).
Em 1891, foi dado um passo adiante neste sentido , quando a Rheinische-
Westfälische Sprengstoff-AG passou a substituir o clorato de potássio pelo nitrato de
bário, formulando um primer com a seguinte composição: 39% de fulminato de
mercúrio, 41% de nitrato de bário; 9% de sulfeto de antimônio, 5% de ácido pícrico e
6% de pós de vidro (T. L. Davis) (J. S. Wallace 46).
A partir de 1928, o estifnato de chumbo passou a ser utilizado como o principal
componente explosivo do primer, estando consolidada a era do “tiro sem ferrugem”, o
que resolvia os problemas tanto da corrosão dos estojos, quanto da corrosão do cano
das armas (Heard 88). A patente, pela mesma RWS, em 1928, do "Sinoxyd" (Sinoxide
/ Sinoxid), tinha a seguinte composição:
Estifnato de Chumbo - 25% a 55%;
Nitrato de bário - 24% a 25%;
Sulfeto de antimônio - 0% a 10%;
Dióxido de chumbo - 5% a 10%;
Tetraceno - 0,5% a 5%;
Siliceto de Cálcio - 3% a 15%;
Vidro em pó - 0% a 5% (J. S. Wallace 46-48).
Nos Estados Unidos, os primeiros primers não corrosivos e sem mercúrio foram
comercializados a partir de 1935; entretanto, não foram aprovados pelas especificações
militares acerca de segurança, de eficácia e de prazos de validade para munição
estocada. Assim, as corrosivas misturas de clorato continuaram a ser utilizadas durante
a II Guerra Mundial nos Estados Unidos (J. S. Wallace 46-48). No Reino Unido, a
mudança para estifnato de chumbo somente se deu na década de 1960. Estes tipos
mais antigos de primer talvez sejam a origem do costume de nossos pais e avós de
fazerem periódicas e metódicas limpezas nas armas (Heard 88) (J. S. Wallace 57).
Atualmente, existem centenas de patentes para composições de primers,
entretanto, nos Estados Unidos e no Reino Unido, a grande maioria das munições
modernas ainda mantém o padrão Sinoxyd, com estifnato de chumbo e nitrato de bário
perfazendo de 60% a 80% do peso total do primer (J. S. Wallace 53).
Também ocorre que algumas nações do antigo bloco soviético ainda fabricam
primers baseados em fulminato de mercúrio e cloreto de potássio (J. S. Wallace 53),
podendo elas chegarem em nosso país através de contrabando.
No início da década de 2000, a composição de primers mais comumente
encontrada é uma composição de estifnato de chumbo, de nitrato de bário, de sulfeto
de antimônio e de tetrazina. Nesta composição, estifnato de chumbo e sulfeto de
antimônio são detonantes, isto é, explodem quando lhes é aplicada pressão. O nitrato
de bário fornece oxigênio adicional para a queima e o sulfeto de antimônio age
também como um combustível para prolongar a mesma. Alumínio e, ocasionalmente,
o magnésio, metais com grande afinidade com o oxigênio, também podem ser
encontrados, principalmente em munições do tipo magnum ou para fuzis e nas
munições brasileiras da Companhia Brasileira de Cartuchos – CBC (Frank). Vidro em
pó também pode ser adicionado por existirem fabricantes que acreditam que isto pode
ajudar na detonação. Modernas munições de calibre 22 (primer radial) têm composição
ligeiramente diferente das demais, sendo, normalmente, compostas de estifnato de
chumbo, nitrato de bário, tetrazina e pó de vidro. São os chamados primers de dois
componentes (chumbo e bário), mas primers com três componentes (chumbo, bário e
antimônio) também são encontradas para este tipo de munição (Heard 85-88).
Primers sem chumbo começaram a se tornar necessários a partir da década de
1970, com relatos de saturnismo em pessoal ligado a instalações de treinamento.
Embora uma grande proporção do chumbo contaminante deva vir dos projéteis, uma
parte, com certeza, era proveniente dos primers que continham estifnato de chumbo
(Heard 80-90).
O US National Bureau of Standards, após estudos, concluiu que, no caso de
uso de primers com chumbo, 80% de chumbo no ar, em locais de treinamento, era
proveniente do projétil não encamisado e apenas 20% seria proveniente dos primers. A
abrasão do projétil, provocada pelos ressaltos, foi apontada como a grande produtora
de chumbo atmosférico. Entretanto, é necessário dizer que o ar não é a única forma de
entrada de chumbo no organismo, pois a deposição de GSR com chumbo nas mãos
pode também ser contaminante. A mudança para um projétil com camisa de cobre ou
zinco foi fácil para reduzir o chumbo atmosférico, mas encontrar um primer sem
chumbo, sem mercúrio e não corrosivo foi mais difícil (Heard 85-90).
O problema do primer começou a ser resolvido no início da década de 1980,
quando a Geco (Gustav Genschow & Co) e a Dynamit Nobel AG lançaram primers
com composição de tetraceno, peróxido de zinco, diazole, titânio em pó e
nitrocelulose, o chamado Sintox (Hagel e Redecker) (marca registrada da Nobel). A
partir daí, houve uma série de primers isentos de chumbo, fornecidos pelas empresas
CCI, Blazer, Fiocchi, Speer, Federal e Winchester (Haag). A composição exata destes
primers não é conhecida, pois trata-se de propriedade industrial, mas estudos com
MEV indicam a presença de estrôncio na munição Speer e Blazer, potássio na munição
Winchester e cálcio e silício nos cartuchos Federal. A maioria das formulações mais
recentes de primer contém um iniciador (detonante) composto de um explosivo
chamado Dinol, nome comercial do DDNP (diazodinitrofenol) (Heard 85-90).
Na atualidade, os primers sem chumbo são tão eficientes quanto os tradicionais
e é provável que venham a substituir estes no futuro (J. S. Wallace 55).
Atualmente, temos como iniciadores, além dos já citados, diazinate, potássio,
dinitrobenzofuroxan, diversos compostos diazo, triazos e tetrazaole, percloratos,
nitratos ou hidrazina. Os fornecedores de oxigênio incluem: óxido de zinco, nitrato de
potássio, nitrato de estrôncio, peróxido de zinco. Os combustíveis incluem boro
amorfo, pós metálicos, como alumínio, zircônio, titânio, níquel e zinco, carbono,
silício, sulfetos metálicos, como sulfeto de antimônio, sulfeto de bismuto, sulfeto de
ferro e sulfeto de zinco, composto de silício e cálcio e silício e cobre. (Heard).
Uma das razões para a variação na composição de primers é a diversidade nas
especificações acerca da sensibilidade, ou seja, o quanto de pressão é necessário
aplicar para “espoletar” o cartucho, havendo diferenças entre os padrões militares e
comerciais. Por exemplo, no Reino Unido, o padrão comercial para a 9mm
Parabellum define que o primer deve detonar quando é impactado por uma esfera de
57g de aço em queda livre de uma altura de 330mm a 203mm; ou seja, se espoletar
com altura superior a 330mm, então é considerado de pouca sensibilidade e sujeito a
falhas; por outro lado, se detonar com uma alturamenor que 203mm, será considerado
muito sensível e, portanto, sujeito a acidentes. Já o padrão militar da OTAN para
munição de mesmo calibre diz que os primers devem ser acionados quando um pino de
disparo é impactado por uma esfera de aço de 1,94 onças em queda livre de uma altura
entre 3 e 12 polegadas, sendo fora de especificação os que se encontram fora desta
faixa. Deve-se notar que a sensibilidade do primer militar será sempre mais severa do
que a do primer para defesa pessoal, dadas as condições mais rígidas dos parâmetros
militares utilização da arma por militares (Heard 89).
Nas munições de fogo radial, o primer está acondicionado dentro do estojo nas
bordas da base. Porém, nas munições de fogo central, o primer está posto dentro de um
pequeno estojo encaixado. Este “estojo” é chamado de espoleta em português e, por
extensão, é também chamado de espoleta o seu conteúdo, embora isto esteja em
desacordo com o rigor da técnica.
O corpo da espoleta é geralmente feito em latão, como o dos estojos. Mas, são
também encontrados em cobre, cuproníquel (70% Cu, 30% Zn), outras ligas de cobre e
aço revestido com zinco, com a ressalva de que o uso de propelentes com pressão cada
vez maior, tornam o cobre macio adequado apenas para munição de baixa pressão (J.
S. Wallace 35).
Quanto ao aspecto construtivo, existem dois tipos principais de espoletas: o
Berdan e o Boxer (Figura 95). O Berdan é mais utilizado nos países europeus e o
Boxer é mais utilizado nos Estados Unidos e no Brasil. A única diferença é a bigorna.
No Berdan, a bigorna faz parte do estojo e, no Boxer, a bigorna é parte integral da
espoleta. O Boxer apresenta a vantagem de ser mais prático para substituição e
remanufatura do cartucho, o que pode ser útil no caso de munição militar (J. S.
Wallace 39).
De um modo geral, as espoletas para armas de cano curto e as para de cano longo
diferem no tamanho, na estrutura, na quantidade e na composição do primer. Espoletas
para revólveres e pistolas variam entre 0.175’’ e 0.210’’ (4,44mm e 5,33mm) e os para
cano longo variam entre 0,240’’ e 0,245’’ (6,1mm e 6,22 mm) de diâmetro. Nada,
entretanto, impede a exceção (J. S. Wallace 39-40). Normalmente são agrupadas em
cinco tamanhos: “large rifle”, “small rifle”, “large pistol”, “small pistol” e “shotgun”.
As espoletas classificadas como “large” têm diâmetro de 0,210’’, as classificadas
como “small” tem diâmetro de 0,175’’ e as “shotgun” de 0,243’’. Sendo o diâmetro
uma maneira prática de distinguir umas das outras para profissionais sem muita
experiência com munições (Di Maio e Di Maio 41).
Embora as espoletas para pistolas e revólveres possam ter o mesmo diâmetro
que as para armas de cano longo, estas têm maior espessura da parede para resistir à
maior pressão gerada pela maior quantidade de primer necessária para as armas de
cano longo. A massa de primer pode variar desde 0,013g até 0,352g, mas o corriqueiro
é na faixa de 0,05g até 0,12g (J. S. Wallace 40).
Em espingarda, normalmente não se usam espoletas do tipo Boxer ou Berdan,
mas sim, o sistema de bateria, o qual consiste em um receptáculo que se encaixa em
outro, um pouco maior e invertido, que contém a sua própria bigorna (Figura 97). A
construção é mais complexa, mas facilita a operação de remanufatura, ainda muito
apreciada pelos aficionados pela caça, tanto por questões de custo, como o desejo de
produzir uma munição diferenciada ou mesmo por se acreditar que fazer sua própria
munição faz parte do esporte ou da atividade da caça (Heard 52).
Pólvora
A não ser para os estudiosos mais puristas da Balística, pólvora e propelente
são palavras intercambiáveis, pois propelente é a mistura química que, ao queimar,
produz gases o suficiente para produzir o tiro. Existem e existiram muitos tipos de
propelente, mas todos acabam sendo referidos como pólvora.
Pólvora Negra
Uma mistura conhecida como pólvora virou de cima para baixo a arte da
guerra. Até então, o guerreiro de contato, armado com espada, lança, martelo, clava, e
protegido com elmo, escudo e couraça, montado em um cavalo ou não, era o elemento
que, efetivamente, decidia as batalhas e ocupava o terreno. Os que atiravam projéteis
com arcos, fundas ou mãos, ou seja, pedras, setas e lanças de arremesso, eram
auxiliares, devendo fugir sempre que atacados pelos primeiros. A partir da pólvora
negra e da arma de fogo, o guerreiro de contato passou a perder importância e o
guerreiro capaz de matar à distância tornou-se o elemento essencial da batalha. Os
últimos estertores do combate de contato foram as cargas de baionetas da I Primeira
Guerra Mundial.
A pólvora negra é uma mistura de nitrato de potássio (salitre), carvão e enxofre
em variadas proporções, granulações e purezas. Uma composição típica moderna é
75% de salitre, 15% do carvão vegetal e 10% de enxofre (T. L. Davis 39). Misturas de
salitre, carvão e enxofre já eram usadas na China e na Índia desde a Antiguidade para
fins incendiários e pirotécnicos, muito antes da pólvora ter sido utilizado no Ocidente,
onde o primeiro a fazer experiências nessa área foi o monge Roger Bacon, que,
entretanto, não associou a pólvora com o armamento. O uso da pólvora para a arma de
arremesso é, geralmente, creditado a outro monge, Berthold Schwartz, no início do
século XIV (Dowell 179). Com a pólvora negra, nasceu a artilharia moderna e os
castelos e muralhas medievais perderam grande parte da sua utilidade.
No século XIX, a pólvora negra começou a ser gradativamente substituída por
outros propelentes, podendo ser encontrada ainda em locais onde existe a fabricação
artesanal de munição.
Pólvoras Modernas
Como explosão é uma expansão súbita de gases, o propelente para armas de
uso individual pode ser definido como um “material explosivo que é formulado,
projetado, fabricado e comburido de tal forma a permitir a geração de grandes volumes
de gases quentes com taxas controladas e pré-determinadas” (J. S. Wallace 57).
O propelente ideal deveria ser uma substância pura, sólida, não tóxica, estável,
fácil de armazenar, de fácil ignição, de massa compacta, barata, fácil de preparar, a
partir de materiais facilmente disponíveis, sem produção de fumaça ou resíduos,
completamente convertido em gases. Deve conter seu próprio suprimento de oxigênio
para poder queimar confinado na câmara; deve queimar muito rapidamente, mas não
detonar e deve ter uma boa relação energia liberada por massa (J. S. Wallace 57).
Desta forma, não é de se estranhar que nenhuma substância química preencha
todas estas especificações. Na prática, os propelentes são o que sempre foram: uma
mistura de várias substâncias (J. S. Wallace 57).
Em qualquer lugar do mundo, os militares têm enorme peso nas decisões de
fabricação de munições e armas. Isto, quando o exército não mantém suas próprias
fábricas. Assim, as especificações de propelentes seguem, em muitos aspectos,
necessidades militares (J. S. Wallace 58).
De modo geral, o propelente real deve cumprir as especificações abaixo (J. S.
Wallace 58):
Deve ser capaz de ser fabricado de forma simples, rápida, com relativa
segurança, a um custo razoável e com matéria-prima facilmente obtida em
tempo de guerra;
Deve ser fácil e seguro de transportar, não higroscópico, sem
possibilidade de autocombustão, sem produtos de queima que sejam difíceis
de remover ou prejudiciais à arma de fogo ou ao cartucho;
Deve ter um desempenho apropriado em diferentes condições de
armazenamento e clima e deve ter um prazo de validade longo para ser
armazenado para tempo de guerra;
Também não deve entrar em combustão quando colocado em uma arma
já bastante quente pelos tiros anteriores (o que se aplica também aos
primers).
A relação energia liberada por peso/volume e taxa de produção desta energia
deve ser compatíveis com o sistema da arma (espaço disponível, tamanho do cano) e
da munição (tamanho do projétil e velocidade na saída do cano). Consequentemente,
existe uma vasta gama de propulsores para os diferentes tipos de munições existentes
(J. S. Wallace 58).
A taxa de queima é extremamenteimportante, porque, se o propelente liberar
gases com muita velocidade, ele irá explodir a câmara ou o cano da arma. Se a queima
for muito lenta, será ineficiente e o projétil irá sair do cano com pouca energia. A
velocidade de combustão é controlada pelo tamanho e pela geometria dos seus
grânulos individuais. Desta forma, o propelente raramente é um pó, sendo fornecido,
normalmente, em grânulos. Em alguns propelentes, os grãos são revestidos com
moderadores para diminuir a taxa de queima (J. S. Wallace 58).
Propelentes modernos, para armas individuais, normalmente contêm nitrato de
celulose plastificado (nitrocelulose) como principal oxidante e vários outros produtos
químicos são adicionados para fins específicos, como a nitroglicerina e estabilizantes
para ela. Os propelentes que contêm apenas nitrocelulose como oxidante são chamados
de base única; os que contêm nitrocelulose e nitroglicerina (ou algum outro explosivo
plastificante) são de base dupla. Base tripla são aqueles propelentes que têm adição de
grande quantidade de nitroguanidina, ou outra substância adicionada aos propelentes
de base dupla, porém este tipo de propelente não é, normalmente, encontrado em
armas pequenas (J. S. Wallace 61).
Estabilizadores ou conservantes são necessários, pois a nitrocelulose se
decompõe com o tempo. Um produto usado para este fim em propelentes de base
simples é a difenilamina ou seus derivados. Para propelentes de base dupla ou tripla é
comum utilizar a nitrodifenilamina, pois a difenilamina é suspeita de hidrolisar a
nitroglicerina (Urbanski 554).
Os propelentes modernos produzem relativamente pouco resíduo sólido e
pouca fumaça na combustão. Os gases resultantes desta são, principalmente,
nitrogênio, monóxido de carbono, dióxido de carbono, hidrogênio e vapor de água. A
quantidade de pólvora "sem fumaça” varia de acordo com o calibre, o peso do projétil,
a pressão necessária, espaço disponível no cartucho e assim por diante (J. S. Wallace
63).
A percentagem de nitroglicerina, em propelentes de base dupla, pode variar de
5% até 44% (J. S. Wallace 66).
Geralmente, cerca de 700 a 1.100cm3 de gases por grama de propelente é
produzido e a temperatura no interior do cartucho varia de 1700ºC para propulsores
“frios” até 3700ºC para propelentes muito “quentes”. Uma composição típica da
descarga para propulsores de dupla base é 28% de dióxido de carbono, 23% de
monóxido de carbono, 8% de hidrogênio, 15% de nitrogênio e 26% de vapor d’água
(J. S. Wallace 13). Estas altas temperaturas têm, como consequência muito importante
para a Criminalística, o fato de fundirem e vaporizarem parte da superfície da base do
projétil, ejetando vapores de chumbo ou de cobre pela boca do cano.
Gunshot Residue - GSR
 
Quando uma arma de fogo é descarregada, são expelidos resíduos na forma de
vapor e de partículas. Quando uma pessoa é suspeita de ter participado de um tiroteio,
estes resíduos podem permanecer por algum tempo na mão da mesma e, normalmente,
são coletados por alguma das técnicas em voga na Criminalística. O principal objetivo
disto é determinar se a pessoa esteve em contato com este tipo de resíduo (Federal
Bureau of Investigation 61-68).
Consistem no exame dos resíduos provenientes de tiro de armas de fogo, com o
objetivo principal de verificar se um dano foi causado por projétil de arma de fogo,
estimar a distância do disparo e pesquisar a presença de resíduos de tiro nas mãos de
um possível atirador.
Segundo Schwoeble (Schwoeble e Exline), os exames residuográficos são um
dos tipos de evidência mais subutilizados nos Estados Unidos da América. Em
relatório do FBI, temos que a arma de fogo está presente em mais de 30% dos 1,7
milhões de crimes que envolveram violência registrados em 1997 nos EUA (Federal
Bureau of Investigation).
Os resíduos de tiro - Gunshot Residue (GSR) – são produzidos em todo o crime
que tenha tido pelo menos um disparo de arma de fogo; ou seja, pode até não existir
sangue, como nos casos de muitas tentativas, mas o GSR irá existir. Talvez, a maior
dificuldade com o GSR é que ele, normalmente, não pode ser observado a olho nu,
necessitando de alguma técnica de laboratório para revelar a sua presença. Outra
característica deste tipo de vestígios é que os resíduos são coletados por diversos tipos
de profissionais da perícia e em situações diversas, desde o exame recente no local de
crime até uma possível necropsia, sendo utilizadas as mais diversas técnicas de
processamento, desde a rudimentar coleta úmida com papel filtro, ainda utilizada, até
técnicas sofisticadas de microscopia eletrônica de varredura.
Os responsáveis pelo inquérito normalmente desejam saber quem produziu o
tiro com a arma de fogo e se a vítima se auto feriu ou não. Apesar destas respostas
nem sempre serem taxativas, o exame dos resíduos sempre produz elementos
importantes para o convencimento das autoridades.
Os resíduos de tiro – GSR – podem permanecer por tempo indeterminado em
vários substratos, por se tratar de partículas inorgânicas; mas, no caso das mãos, elas
podem sair por escovação ou por renovação do epitélio.
Quando a espoleta é detonada, seus resíduos escapam da arma sob a forma de
uma nuvem de vapor, através das aberturas disponíveis. Em seguida, a temperatura
ambiente resfria estes vapores e eles se solidificam na forma de partículas finas (de 1 a
10micra, com possibilidade de ir até 100micra) nos substratos próximos.
Os resíduos produzidos saem da arma na forma gasosa, com temperatura de
cerca de 2000ºC. Este material gasoso é composto principalmente de produtos da
combustão do propelente e consiste em dióxido de carbono, monóxido de carbono,
água na forma de vapor e óxidos de nitrogênio. Junto com esta nuvem, são lançadas
partículas parcialmente queimadas e não queimadas do propelente e produtos da
combustão do primer. Estes resíduos, após solidificados, são chamados genericamente
de GSR, havendo autores que se referem a eles como firearms discharge residues
(FDR) (Heard).
Como cada tipo de arma possui seu próprio padrão de aberturas, a descarga de
GSR irá possuir nuances diferenciadas no seu padrão de depósito.
Observe-se que condições externas, como o vento, por exemplo, podem influir
na distribuição do GSR.
Tipicamente, mas não necessariamente, esta nuvem de vapores é composta de
partículas de chumbo (Pb), bário (Ba) e antimônio (Sb), havendo outros elementos,
dependendo do fabricante da espoleta.
Mecanismo de Formação
No momento em que o percutor atinge o primer, este irá explodir
violentamente e elevar a temperatura da espoleta para cerca de 2500ºC. Nesta
temperatura, os seus componentes metálicos são volatilizados, formando uma nuvem
que condensará rapidamente, formando partículas esféricas bastante pequenas, na faixa
de 0,1-5 μ. Estas partículas poderão conter várias combinações dos elementos
presentes. Algumas, obviamente, podem conter apenas um elemento, enquanto outras,
todos os elementos presentes no primer. O fato de existirem partículas que
contenham, ao mesmo tempo, Chumbo, Bário e Antimônio conjuntamente, com
uma forma específica, dão certeza de terem sido produzidos por descarga de
arma de fogo (Heard 242).
A grande maioria dos GSR formada durante o tiro é composta de partículas de
propelente não queimadas ou parcialmente queimadas e é de natureza orgânica. O
resto consiste em compostos metálicos provenientes do primer, além de partículas de
chumbo puro, que se volatizaram na base do projétil, o mesmo ocorrendo com cobre e
zinco oriundos da camisa do projétil (Heard 242).
Conforme Basu (Basu), o rápido esfriamento dos vapores de GSR faz as
partículas deste resíduo assumirem formas características:
1. Esferoides, espalhadas de maneira regular, que variam em tamanho de 1-
10μm;
2. Partículas de forma irregulares, que são formadas pela fusão entre duas
partículas maiores, com tamanhos geralmente superiores a 10μm;
3. Partículas maiores, que se formam com uma camada de chumbo ao redor de
um núcleo de bário e antimônio.
Quando chumbo (Pb), antimônio (Sb) e bário(Ba) estão combinados na mesma
partícula, há quase certeza de que ela foi proveniente de resíduo de espoletamento,
pois não existe registro de outros produtos comerciais que possam produzir tal tipo de
partícula.
As partículas formadas no interior do cano, ou no interior do próprio cartucho,
têm formatos diferentes daquelas formadas pelo vapor da espoleta. Como as diversas
armas de fogo possuem padrões diferentes de formação de partículas, esta pode ser
uma informação importante para estabelecer considerações sobre o tipo de arma
utilizada. Como em revólveres a formação de vapores da espoleta é mais livre do que
em pistolas semiautomáticas, estudos de Schwoeble sugerem que:
1. Para os revólveres, 74% das partículas tinham estrutura esférica e 26% eram
irregulares;
2. Para as armas semiautomáticas, 59% das partículas tinham o formato
esférico e 41% eram irregulares;
3. No aspecto do tamanho, no caso de revólveres, 65% das partículas eram
inferiores a 3μm, 28% estavam na faixa de 3-6μm, 5% na de 6-10 μm e apenas 2%
eram maiores que 10μm;
4. Para as armas semiautomáticas, 48% das partículas foram inferiores a 3μm,
29% estavam na faixa de 3-6μm, 9% na de 6-10micrômetros, além de 14% maiores de
10μm.
Estes estudam indicam que há um padrão claro para auxiliar na formação de
convicção sobre o tipo da arma utilizada em apoio ou mesmo suprindo a falta de
projéteis e cartuchos encontrados no local.
Abaixo temos exemplos de alguns dos principais usos comerciais ou industriais
de Pb, Sb e Ba:
Chumbo (Pb), ponto de fusão, 621ºC, encontrado em baterias de
veículos, solda rápidas, ligas de aço para rolamentos, gasolinas
contrabandeadas ou falsificadas, projéteis, balins, tintas, revestimentos de
cabos, vidros, fósforos e material pirotécnico;
Antimônio (Sb), ponto de fusão 440°C, é utilizado em endurecimento de
ligas metálicas, projéteis, balins, pigmentos, aços de rolamentos, utensílios
de estanho, pastilhas de freio e material pirotécnico;
Bário (Ba), ponto de fusão 850°C, é encontrado em ligas metálicas,
filmes de radiografia, banhos de tratamento térmico para têmpera de aços,
cristais usados em dispositivos à laser diversos, aí incluindo até brinquedos,
corantes, tintas prontas; em preparados para curtimento de couro e no
resultado final, produtos químicos para fotografia analógica, inseticidas,
produtos pirotécnicos e papel.
Os produtos acima listados contêm ou chumbo ou antimônio ou bário ou
qualquer combinação dos três; assim, a simples presença destes elementos não afirma,
com certeza, que se trata de GSR, pois os fatores decisivos na identificação de GSR
são a composição química e morfológica da partícula, bem como a caracterização
da população total de partículas detectadas na mesma amostra.
A necessidade de determinar se um indivíduo disparou uma arma de fogo
sempre foi crucial para crime cometido por arma desta natureza. Assim, ao longo dos
anos vários testes foram propostos e aplicados na tentativa de responder se uma
determinada mão teria produzido tiro (Di Maio e Di Maio 342).
Rodizonato de Sódio
Este teste é uma variação do teste anterior e é muito utilizado para testar a
presença de chumbo em orifícios suspeitos de terem sido produzidos por projéteis
oriundos de armas de fogo. Em uma modificação proposta por Bashinski (Bashinski),
o material a ser testado pode ser pré-tratado com uma solução de 10% de ácido
acético, com o objetivo de melhorar a sensibilidade do teste. Em seguida, o material é
borrifado com uma solução tampão de ácido tartárico com pH de 2,8 e, para finalizar,
é pulverizado com rodizonato de sódio. Manchas de coloração rosa brilhante vão
apontar as partículas de chumbo e manchas de coloração laranja vão acusar as
partículas de bário. O teste é rápido e barato, mas aponta apenas da presença destes
metais, nada falando sobre a sua quantidade (Di Maio e Di Maio 349-356).
Por se tratar de um teste de baixa sensibilidade, o fato de o resultado ser
negativo não significa ausência de tiro.
Entretanto, se este teste é pouco confiável para um atirador, ele pode ser
bastante útil como elemento complementar para pesquisar se orifícios em algum
anteparo foram produzidos por projétil contendo chumbo ou oriundo de cano
enchumbado.
Os projéteis mais comuns são aqueles que produzidos com chumbo ou, então,
com um núcleo de chumbo e revestimento externo de cobre ou uma de suas ligas.
Entendendo a construção e a composição dos projéteis é bastante razoável
imaginar a existência de chumbo e/ou de cobre metálico nos pontos de impacto destes
projéteis. Mesmo nos projéteis completamente encamisados (“full-metal jacked”), é
esperada a presença de chumbo, o qual teria origem em depósitos no interior do cano,
ou seja, provenientes de tiro anterior e do chumbo existente na espoleta e carregado
pelo projétil (Di Maio e Di Maio 357).
Em testes realizados na Irlanda do Norte, concluiu-se pela alta efetividade de testes
com rodizonato de sódio em anteparos para diversos tipos de munição com índices de
acerto de 99% para armas de cano curto e 94% para armas de cano longo. Isto em tiros
de curta distância (J. S. Wallace 173) ().
Em trabalho feito em Porto Alegre, Frank (Frank) avaliou que, em um orifício
de impacto de projétil, há chumbo o suficiente para ser removido de maneira mecânica
com um suabe seco e propôs um método mais simples e, portanto, mais prático, para
local de crime, que consiste em simplesmente atritar um suabe seco nos orifícios no
local e, posteriormente, em ambiente de laboratório, borrifar cada suabe com uma
solução tampão de ácido tartárico e tartarato de sódio e potássio (pH 2,8). Essa solução
tem como objetivo ionizar o chumbo que adere ao suabe durante a fricção; a coloração
rosa que surge no suabe indica o resultado positivo para a presença do chumbo (Figura
99, Figura 100, Figura 101).
Década de 1980
Na década de 1980, foram difundidos três métodos para análise de resíduos de
tiro: a ativação de nêutrons (abandonado na década de 1990), a espectrometria de
absorção atômica sem chama (FAAS) e a microscopia eletrônica de varredura, com
espectrometria de raio-x (MEV-EDX) (Germani). Todos os três métodos eram
baseados na detecção de elementos metálicos (principalmente de bário, antimônio e
chumbo) originários de primers e expelidos pelas aberturas das armas. Na época, os
três compostos eram encontrados nas mistura iniciadoras de praticamente todos os
cartuchos vendidos nos Estados Unidos, mas isso não era, necessariamente, verdade
para as munições com primers radiais (por exemplo, calibres .22’’), pois, desde
meados dos anos 80, os cartuchos Remington de fogo radial continham apenas
chumbo em seus iniciadores e, mais tarde, a composição mudou para chumbo e bário;
os da CCI contém chumbo e bário e, os da Federal, estes, sim, contêm chumbo, bário e
antimônio.
Década de 1990
A partir de meados da década de 1980, na Europa, e, em meados da década de
90, nos Estados Unidos, começaram a ser introduzidos primers livres de chumbo, os
quais também poderiam não conter antimônio ou bário. Análises de laboratório
mostraram estrôncio nos primers da CCI, potássio nos fabricados pela Winchester,
cálcio e silício nos produzidos pela Federal e titânio e zinco nos europeus Sintox.
Também houve modificação nas técnicas de manufatura dos projéteis, tendendo a
evitar a vaporização da base do projétil no momento da queima do propelente.
Flameless Atomic Absorption Spectrometry (FAAS)
A espectrometria de absorção atômica é, segundo Di Maio, muito popular em
laboratórios de criminalística nos Estados Unidos devido a uma combinação de
simplicidade, sensibilidade adequada e baixo custo. É utilizada para a detecção de
bário, antimônio e chumbo, oriundos do primer, como de cobre oriundo do
encamisamento do projétil ou do cartucho. Para a coleta, são geralmente utilizados
quatro suabes previamente umedecidos com ou ácido nítrico ou clorídrico. São usados
um para a palma da mão direita, outro para a palma da mão esquerda; um para o dorso
da mão direita, um para o dorso da mão esquerda;e um quinto é utilizado como
controle. Com base na quantidade de bário, antimônio e chumbo detectados nas quatro
faces das mãos, são estabelecidas correlações, que indicam se os depósitos são
compatíveis ou não com a hipótese de produção de tiro (Di Maio e Di Maio 344).
Normalmente, quando uma arma de cano curto é descarregada, são esperados GSR
no dorso da mão. GSR na palma da mão tende a ser compatíveis com gesto de defesa,
manuseio de objeto com GSR ou com o apoio do cano da arma, no caso de suicídios.
Entretanto, como veremos mais adiante isto não passa de grosseira generalização (Di
Maio e Di Maio 344).
Segundo Di Maio, a dificuldade com a análise FAAS é que nunca se pode ter
certeza de que se trata de resíduos de armas de fogo, pois o sistema mede apenas uma
quantidade total de resíduos metálicos removidos pelo suabe, não se podendo
distinguir com certeza a origem deles. Além disso, esta técnica tem alta porcentagem
de falsos negativos. Stone mostrou que, numa série de indivíduos que se suicidaram
com revólveres com munição com espoleta, apenas 50% dos casos deram resultados
positivos com a aplicação desta técnica (Stone). Quando pistolas foram utilizadas, o
número caiu para 32%. E, no caso de munição 0,22’’, o valor encontrado foi de apenas
23%, o que sugere que não tem sentido falar em resultado negativo para este tipo de
exame, ou seja, o resultado negativo não prova que o indivíduo não disparou uma arma
(Di Maio e Di Maio 348).
Um resultado positivo para este teste também pode ser obtido em pessoas que
manipulam armas recentemente descarregadas. Neste caso, os resíduos estarão
depositados nas palmas das mãos. Em um estudo limitado (66 testes), Stone reportou
43% de positivos para revólveres nesta situação e 29% para pistolas, ou seja, números
semelhantes aos encontrados em atiradores (Stone).
SEM/EDS - MEV
O “Scanning Electron Microscopy/Energy Dispersive Spectroscopy”
(SEM/EDS), ou Microscópio Eletrônico de Varredura (MEV) em português, é um
aparelho que produz imagens em alta ampliação (até 300.000 x) e resolução. As
imagens fornecidas são virtuais, pois o que é exibido no monitor do aparelho é a
transcodificação de ondas energéticas emitidas e não as radiações luminosas que
formam o nosso dia a dia.
O princípio de funcionamento do MEV é baseado na emissão de elétrons por
um filamento capilar de tungstênio (eletrodo negativo), produzidos pela aplicação de
uma diferença de potencial que pode variar de 0,5 a 30kV. Esta faixa de voltagem
permite a variação da aceleração dos elétrons. A relação positiva para o filamento do
microscópio (eletrodo positivo) atrai fortemente os elétrons gerados, resultando numa
aceleração em direção ao eletrodo positivo. A correção da trajetória dos feixes é
realizada pelas lentes condensadoras, que alinham os feixes em direção à abertura. A
lente ajusta o foco de feixes de elétrons antes de atingir a amostra. Ao atingir a
superfície examinada, este feixe de elétrons provoca a emissão de elétrons secundários
e outras ondas, os quais são processados e formam a imagem observada.
O EDS (energy dispersive x-ray detector, EDX ou EDS) é um acessório
essencial no estudo de caracterização microscópica de materiais. Quando o feixe de
elétrons incide sobre um mineral, os elétrons mais externos dos átomos e os íons
constituintes são excitados, mudando de níveis energéticos. Ao retornarem para sua
posição inicial, liberam a energia adquirida, a qual é emitida em comprimento de onda
no espectro de raio-x. Um detector instalado na câmara de vácuo do MEV mede a
energia associada a esse elétron. Como os elétrons de um determinado átomo possuem
energias distintas, é possível, no ponto de incidência do feixe, determinar quais
elementos químicos estão presentes naquele local e, assim, identificar em instantes que
mineral está sendo observado. O diâmetro reduzido do feixe permite a determinação
da composição mineral em amostras de tamanhos muito reduzidos (< 5µm),
permitindo uma análise quase que pontual.
O uso em conjunto do EDX com o MEV é de grande importância na
caracterização de GSR. Enquanto o MEV proporciona nítidas imagens (ainda que
virtuais, pois o que se vê no monitor do computador é a transcodificação da energia
emitida pelas partículas, ao invés da radiação emitida pela luz, ao qual estamos
acostumados), o EDX permite sua imediata identificação. Além da identificação
mineral, o equipamento ainda permite o mapeamento da distribuição de elementos
químicos por partícula, gerando mapas composicionais de elementos desejados.
Uma análise química de uma evidência pode detectar vestígios de chumbo
(Pb), bário (Ba) e antimônio (Sb), dentro de um intervalo de nanogramas, assim, a
detecção desses elementos sugere que a evidência pode ser oriunda de GSR. No
entanto, isto somente prova que Pb, Ba e Sb estão presentes, mas sem correlacioná-los
a uma única fonte. Em princípio, cada elemento da amostra pode ter sido gerado de
maneira independente. Estes resultados, por natureza, são inespecíficos. Com o MEV,
entretanto, é possível fazer uma análise partícula por partícula, determinando a
presença de Pb, Ba e Sb na mesma partícula, registro quase definitivo da presença de
GSR. Isto faz com que o MEV seja a técnica mais adequada do ponto de vista da
especificidade. (De Gaetano e Siegel).
O uso do microscópio eletrônico de varredura (MEV) apresenta tantas
vantagens, que Heard diz que ele é o mais importante avanço no campo da análise
forense de armas de fogo desde a invenção do microscópio comparador (Heard 241).
Com o MEV-EDX, partículas de GSR são retiradas da mão utilizando-se
adesivos. O material removido é “varrido” automaticamente à procura de partículas
pré-identificadas como GSR. Estas são partículas de tamanho micrométrico, muitas
vezes de uma forma característica, envolvendo a análise automatizada das partículas
que possuem determinadas características físicas, como por exemplo, o tamanho e a
composição de partículas, onde partículas como PbSbBa ou SbBa, que são
consideradas únicas de GSR (Wolten, Nesbitt e Loper) (Germani).
Com base em testes (não casos reais de crime), verificou-se que deu resultado
positivo em 90% de indivíduos que dispararam armas de fogo de cano curto e 50% nos
que usaram armas de cano longo (Wolten, Nesbitt e Loper). No caso da munição
Sintox, as partículas de resíduos de pólvora são esféricas na forma e se constituem,
principalmente, de titânio e zinco (Gunaratnam e Himberg).
Como, usando o MEV, as partículas podem ser identificadas individualmente
como GSR, a análise não é tão dependente do tempo como no FAAS. O estudo de
Stone informa achados positivos até 12 anos após o disparo (Wolten, Nesbitt e Loper). 
Outro estudo colocou o MEV como ferramenta bem mais eficaz em pesquisa com
séries de tiro real, encontrando 31,6% de resultados positivos com MEV (Di Maio e Di
Maio 350).
Embora existam diversas técnicas para a análise destas coletas, entidades como
o FBI americano utilizam somente o microscópico eletrônico de varredura, tornando-
se uma tendência mundial o abandono de outras técnicas (Federal Bureau of
Investigation).
O uso do MEV para a investigação da presença do GSR requer do profissional
o entendimento aprofundado dos mecanismos de formação destas partículas (Heard
242), assim trata-se de técnica exigente para o pessoal de laboratório.
Coleta de GSR
Em geral, os GSR permanecem um bom tempo nas superfícies secas. Exceção
importantíssima são, porém, os tecidos vivos, onde a literatura tem sugerido que a
coleta se faça num prazo de 3 a 6 horas após o tiroteio (Federal Bureau of
Investigation). No momento da coleta é sempre muito importante usar luvas; mas no
caso do GSR, as luvas não servem apenas para proteger quem as está coletando. As
luvas também servem para não contaminar a amostra com eventuais resíduos pré-
existentes na mão do coletor. É fundamental, e isto é muito negligenciado, trocar de
luvas a cada ponto de coleta, para eliminar o risco de “levar” GSR de um ponto para o
outro do local de crime.
Como osresíduos de tiro têm tamanho pequeno, variando geralmente, entre 1 -
10micra, podendo, em alguns casos, atingir até 100micra, não são formadas
aglomerações visíveis a olho nu. Por outro lado, sujidades negras na pele ou em outro
substrato também podem ter origem em uma série de outras substâncias e, não
necessariamente, resíduos de tiro. Nunca é demais lembrar que os colegas do
Laboratório trabalham com o que foi coletado no local de crime ou, posteriormente, no
corpo de delito e para que a evidência de GSR seja realmente eficaz é necessário que
fique bem documentada a exata localização da coleta e outros aspectos triviais, como
data e horário e a seqüência na coleta.
Segundo Heard, as partículas de GSR depositadas nas mãos não são “cola
mágica” e tampouco penetram na pele. Estão apenas aderidas à superfície e às dobras
da pele como qualquer outra sujidade. Desta forma, elas são facilmente removidas
pelas atividades rotineiras de um ser humano. Se existe algo a favor da permanência
destas partículas, é o fato do seu tamanho ser extremamente pequeno, situado na faixa
de 0,1-5μm, que os deixa presos nas dobras microscópicas da pele ou aderidos aos
folículos pilosos (observação importante: a palma da mão não tem pelos). Contudo,
apesar disto, para todos os efeitos práticos, geralmente todas as partículas de GSR
serão retiradas das mãos dentro de um prazo de 3 a 4h, após o tiro (Heard 249-252).
O ato de lavar as mãos irá remover praticamente todos os grãos de GSR e
muito cuidado se deve tomar com a pessoa a quem está sendo investigada que pedir
para ir ao banheiro, pois lavar as mãos com urina também irá remover os resíduos da
mesma forma que a lavagem com água. Igualmente, é de pouca valia o exame
residuográfico em internos em hospital após os enfermeiros terem providenciado a
higiene do paciente (Heard 251).
Se estiver chovendo e a local for na rua, evidentemente, ou se o suspeito for
acometido por sudorese, o resultado dos exames, mais uma vez, poderá ser negativo
(Heard 251).
Para Wallace, a persistência dos GSR nas mãos foi estudada por muitos, mas
existem grandes variações na literatura (desde 1h até 24h). Entretanto, a maioria dos
autores é da opinião que estes resíduos persistam por 1 - 3h; além deste prazo, é muito
pouco provável que sejam ainda detectados nas mãos (J. S. Wallace 131).
Para Fisher, as partículas podem ser removidas por lavagem ou mesmo por
colocação da mão nos bolsos. Algemar um suspeito pelas costas contribuiria para a
perda de resíduos, pois este tipo de contenção possibilita que as mãos sejam esfregadas
nas costas. O mesmo autor fixa um tempo de, no máximo, 6 horas para a retenção dos
resíduos de chumbo nas mãos dos suspeitos e recomenda que as amostras sejam
recolhidas o mais rapidamente possível. Fisher também observa que, devido à
ambiguidade dos resultados da coleta de GSR, muitos órgãos de segurança optaram,
no passado, pela descontinuidade deste serviço (Fisher 281).
Schwoeble considera que o fator tempo é a primeira e a mais importante
questão para se lidar com vestígios do tipo GSR, sendo fundamental coletar as
amostras o mais rapidamente possível após o tiroteio. Para este autor, o prazo padrão
sugerido na literatura é de 3 a 6h após o incidente (Schwoeble e Exline 19).
A persistência de GSR no rosto, no cabelo, na cabeça e nas roupas não foi
muito estudada, mas é altamente provável que os resíduos irão permanecer nestas
áreas por períodos bem maiores do que nas mãos (J. S. Wallace 131), com a mesma
fonte relatando resultados positivos para o rosto e para a cabeça até 5h depois do
incidente e de 7h para os cabelos (J. S. Wallace 179).
Para Schwoeble, a preservação das roupas obtidas no local de crime é algo de
grande importância, sendo adequado não as lavar ou agitá-las de maneira excessiva
(Schwoeble e Exline).
No caso de coleta em cadáver, o problema da remoção do GSR é bem menos
relevante, pois, se as mãos não forem lavadas, os resíduos irão ficar presentes até o
começo da decomposição. Entretanto, se o morto for colocado em refrigeração no
necrotério, a pele irá se tornar úmida quando trazido para temperatura ambiente, o que
dificultará a coleta, segundo Heard. O mesmo autor também recomenda que a coleta
seja feita no próprio local de crime (Heard 251).
Em armas de cano longo, é muito difícil encontrar-se GSR nas mãos do
atirador utilizando-se do FAAS. E, quando for encontrado, está tanto na palma, quanto
no dorso das mãos. No caso de suicidas, temos um alto nível de chumbo na mão que
ajusta o cano contra o corpo, o que pode ser explicado pela precipitação das partículas
de bário e antimônio, menos densos que o chumbo, para dentro do cano (Di Maio e Di
Maio 344).
Conforme Schwoeble, a produção de tiro com uma espingarda, com a posição
usual desta arma, produz a deposição de uma grande de GSR no peito, no rosto e no
cabelo (Schwoeble e Exline 16), porém a concentração maior é encontrada na face
anterior do cotovelo do membro superior que apoia a arma (normalmente o esquerdo)
(Schwoeble e Exline 85). O mesmo autor apresenta fotografias, produzidas em
condições controladas, que ilustram a deposição destes resíduos no corpo do atirador.
Na descarga de uma arma de fogo, uma grande quantidade de "fumaça" ou, mais
corretamente, resíduos de tiro (GSR), são expelidos pelo cano. Para diferenciá-los dos
resíduos que saem pela culatra, devido ao “espoletamento” do primer, alguns autores
se referem aos resíduos do cano, como firearms discharge residue (FDR), o que nos
parece apropriado, pois são resíduos de natureza diferente dos GSR. O FDR consiste
em uma mistura de pólvora não comburida ou parcialmente comburida, fuligem, uma
mistura de gases incandescentes, resíduos do primer e, dependendo do tipo de munição
utilizada, chumbo volatizado da base do projétil (Heard 212).
Um exame com MEV poderá ser útil para esclarecer qual orifício é o de
entrada e qual é o de saída sempre que houver dúvida, pois, quando um projétil
atravessa um corpo qualquer (corpo humano, vidro, parede etc.) irá necessariamente,
ocorrer atrito entre o projétil e as paredes deste corpo; e chumbo, ou material da
camisa, os quais irão impregnar o orifício, sendo o projétil limpo durante o caminho. 
Desta forma, é esperado que o orifício de entrada contenha bem mais resíduos que o
orifício de saída do projétil. (Heard 212).
Segundo Heard, durante a descarga de uma arma de fogo, a grande maioria dos
GSR sai em grande velocidade pela boca do cano e se projeta para longe do atirador.
Nas pistolas, ocorre alguma fuga de GSR durante a ejeção do estojo, contaminando a
mão, ou as mãos, que segurava a arma. Em revólveres, a situação é diferente, pois
muitas partículas escapam pelas aberturas situadas atrás e na frente do tambor e com
uma pressão substancialmente maior do que no caso das pistolas. Em armas clássicas
de cano longo (com ferrolho aberto), o GSR escapa entre o ferrolho e o cano. Se a
arma for de repetição automática, ele escapa junto com o estojo, à semelhança das
pistolas. Se a arma for do tipo ferrolho fechado, com abertura manual, então o atirador
somente irá contaminar a mão se abrir o ferrolho imediatamente após o disparo (Heard
242).
Outro aspecto a considerar é que nem todos os GSR escapam da arma, pois
parte dos resíduos irá ficar incrustada no cano, nas câmaras ou no tambor da arma
(Heard 242).
Resumindo: a formação do resíduo de tiro se dá, normalmente, de duas
maneiras. A primeira é quando o percutor atinge a espoleta e provoca a sua detonação,
espalhando os componentes desta no meio ambiente. A segunda se dá pelas partículas
que saem junto com o projétil pelo cano, assim as áreas onde há maior probabilidade
de se encontrar resíduos são:
Mãos - as mãos são os lugares mais comuns onde GSR é recolhido de
suspeitos. Cada tipo de arma de fogo, como revólveres ou pistolas, possui
seu próprio padrão de deposição de resíduos, os quais normalmente se
concentram na parte posterior do dorso, na prega entre o polegar e o
indicador e na palma da mão;
Face - o rosto do atiradorpode ser contaminado nas ocasiões em que
armas de fogo, como espingardas ou outras armas de cano longo são usadas
no tiroteio. Testes de emissões (Schwoeble e Exline) têm mostrado que
grandes quantidades de GSR podem ser depositadas nestas áreas;
Vestuário - roupas frequentemente preservam evidências de GSR por
mais tempo do que as mãos de um atirador. A descarga de uma arma de fogo
à curta distância deixa grande quantidade de resíduos de pólvora incombusta
nas vestes da vítima. Também pode ocorrer de o atirador passar resíduos da
sua mão para bolsos e outras partes da vestimenta;
Objetos no ambiente de tiro – este é um dos exames mais
negligenciados pela perícia, mas outros objetos e mesmo mobília do local de
crime podem fornecer vestígios valiosos sobre a dinâmica dos disparos de
arma de fogo ocorridos em um local de crime. Exame de quadros, cadeiras,
paredes, cortinas, pisos, camas, colchões, artigos de móveis e outros itens
podem ajudar a determinar como um tiro ocorreu;
Carros – os tiroteios com algum dos participantes no interior de um
veículo são comuns e, portanto, deve-se fazer uma pesquisa apurada na
forração, nos bancos, na face interna das portas, no painel e outros pontos no
interior do veículo questionado.
Distância de Tiro
No caso de uma arma de cano curto, é possível estimar a distância de tiro
através dos FDR, desde que o tiro tenha sido dado a uma distância menor que 60cm. Já
numa arma raiada de cano longo, este trabalho pode ser efetuado em distâncias de até
2m. No entanto, quando o cano da arma é encostado com aperto na pele, estes resíduos
podem estar completamente ausentes (Heard 218).
De uma maneira geral, admite-se que a análise de resíduos em testes de
distância de tiros produzidos por munição sem chumbo é diferente dos tiros obtidos
com primers convencionais (Gundry e Rockoff). As causas prováveis são a menor
quantidade de materiais com combustão incompleta, o maior teor de matéria orgânica
e o fato de se utilizar materiais com densidade menor que a do chumbo nestas
munições. Em termos muito gerais, a propagação e a descarga de resíduos de primers
sem chumbo será menor do que nos de primers com chumbo (Heard 230).
Como existem muitos tipos diferentes de primers e propelentes no mercado,
com ou sem chumbo, esta é mais uma observação no sentido de reforçar a ideia de que
as estimativas de distância de tiro somente podem ser efetuadas com arma e munição
idênticas às utilizadas no local de crime, o que torna o problema frustrante, pois,
normalmente, é justamente este um dos aspectos que estão sendo investigados (Heard
230).
No caso de corpos mortos, para estimar a distância de tiro, segue-se a mesma
metodologia; entretanto, estimar a distância de tiro em um corpo decomposto, salvo
tiros de espingarda, é algo que pode se tornar bastante difícil, pois os resíduos de tiro
são removidos junto com as camadas externas da pele.
Com exceção dos tiros de contato com pressão, os FDR, presentes ao redor do
orifício de entrada poderão ser utilizados para estimar a distância da arma em relação
ao alvo (Heard 219).
O método geralmente utilizado para a detecção destes componentes é um simples
exame visual, com ou sem uma lupa, às vezes, usando um microscópio. A distribuição
observada pode ser comparada com amostras padrão produzidas em estantes de tiro.
Ressalte-se que este tipo de teste, para ter alguma validade, no caso de arma e
munição conhecida, deve ser feito com arma e munição similar à que teria sido
utilizada, pois canos mais longos tendem a produzir menos resíduos que canos mais
curtos, devido à queima mais completa do propelente. Também seria adequado que os
disparos fossem feitos contra superfícies semelhantes às investigadas. No caso de
disparo contra um corpo humano, o recomendado seria o disparo contra pele suína. No
caso de roupas, os testes devem ser feitos com tecido semelhante ao vestido pela
vítima (Heard 220).
Pesquisas mais recentes tratam da possibilidade de estimar distâncias de tiro
em até 5m, mas baseadas em resíduos do primer e não do propelente, com análise
destes resíduos através de MEV (Heard 220).
5. VESTÍGIOS ORGÂNICOS
Genética, DNA e Correlatos
DNA Nucléico (nuDNA)
Nos últimos 35 anos, o desenvolvimento e a aplicação da genética tem
revolucionado a ciência forense. Em 1984, a análise das regiões polimórficas do
nuDNA humano produziram a chamada "impressão digital do nuDNA". No ano
seguinte, conforme Goodwin, a pedido do United Kingdom Home Office, padrões de
nuDNA foram aplicados em um caso real, envolvendo uma disputa de imigração. Na
sequência, em 1986, o nuDNA foi utilizada pela primeira vez como prova em um caso
criminal e Colin Pitchfork foi indiciado e condenado (em 1988) pelo ataque de
natureza sexual e morte de duas meninas escolares em Leicestershire, Reino Unido
(Goodwin, Linacre e Hadi).
As chamadas técnicas de DNA nucléico (ácido desoxirribonucleico (ADN -
ácido desoxirribonucleico, em português, ou DNA - deoxyribonucleic acid, em inglês)
têm provocado uma verdadeira revolução na Criminalística, no sentido de apontar
autoria. A razão disto é que qualquer tecido humano deixado no local de crime
(sangue, saliva, pelo, sêmen, secreções vaginais) é capaz de, mesmo em pequena
quantidade, identificar positivamente um ser humano. O nuDNA é uma molécula
longa em forma de espiral, presente nos cromossomas (Riffiths, Wessler e Lewontin).
É o nuDNA que transmite as informações genéticas do ascendente para o descendente.
A carga genética está fisicamente localizada em estruturas, chamadas cromossomas,
existentes dentro do núcleo das células, que são em número de 56 no ser humano
normal. Desses, merecem especial atenção os pares de cromossomas sexuais, XX para
a mulher e XY para o homem (salvo raras anomalias como X0, XXX, XXY, XYY ou
mesmo XYYY e XXYY), responsáveis por determinar o sexo do indivíduo.
O trabalho do perito na área de genética pode variar muito, dependendo dos
recursos do laboratório em que atua, mas normalmente envolve a análise do material
recuperado em um local de crime, análise de material coletado em suspeitos ou
familiares de vítimas, testes de paternidade e identificação de restos humanos. Em
alguns casos, o perito pode até mesmo ser chamado para identificar restos de plantas
ou de animais.
Dentro de cada célula nucleada humana há duas cópias completas do genoma.
Um genoma é um conjunto haploide da genética de um organismo vivo e, nos seres
humanos, contém cerca de 3.200.000.000 pares de bases (bp) de informação, que é
organizado em 23 cromossomos. Os seres humanos contêm dois conjuntos de
cromossomos – um destes conjuntos herdados do pai, outro herdado da mãe, mas, bem
entendido, não igual ao do pai ou da mãe – o que dá um total de 46 cromossomos.
Cada cromossomo é uma cadeia contínua de nuDNA; o maior, o 1º, tem,
aproximadamente, 250.000.000 bp, enquanto o menor, o 22º, tem cerca de 50.000.000
bp.
Todas as células humanas possuem nuDNA em seu núcleo (Figura 107), com a
exceção marcante das hemácias (glóbulos vermelhos), que não possuem núcleo. E o
material genético é idêntico em todas as células, com exceção dos espermatozoides e
dos óvulos, que possuem meia-carga genética e cada uma delas diferenciada entre si,
mas, evidentemente, compatíveis com a carga genética do organismo que os produziu.
Esta diferenciação nos espermatozoides e nos óvulos determina que os irmãos, exceto
gêmeos univitelinos, sejam uns diferentes dos outros.
Temos, então, que o DNA nucléico individualiza uma pessoa, com a evidente
exceção dos já citados gêmeos univitelinos.
O conhecimento sobre a estrutura do nosso genoma teve um avanço
significativo com o Projeto Genoma Humano, onde 20 diferentes centros de pesquisas,
trabalhando de forma cooperada na Alemanha, China, Estados Unidos, França, Grã-
Bretanha e Japão, entregaram, a partir de 2001, o mapeamento de mais de 99% do
DNA nucléico do ser humano.
Atualmente, as regiões do nuDNA que codificam e regulam a síntese de
alguma proteína são chamadas de genes. A estimativa maisrecente do genoma
humano diz que ele contém apenas 20.000 – 25.000 genes e apenas cerca de 1,5% do
genoma está diretamente envolvido na produção de proteínas.
Para ter valor como evidência, a análise genética necessita produzir um perfil
único para cada indivíduo questionado e confrontar o material genético retirado do
local de crime ou de um corpo de delito com este perfil, respondendo se as
semelhanças encontradas são capazes de caracterizar inequivocamente um único
indivíduo.
A capacidade de produzir perfis eficazes depende de as pessoas serem
geneticamente diferentes, o que de fato ocorre, pois, com a exceção de gêmeos
univitelinos, não existem dois indivíduos humanos com idêntico nuDNA. Entretanto,
duas pessoas, mesmo com aparência muito diversa, são muito parecidas
geneticamente. Na verdade, se compararmos o genoma do ser humano com o do primo
chimpanzé, com o qual compartilhamos um ancestral comum há 6 milhões de anos
atrás, vamos descobrir que apenas 5% do nosso nuDNA é diferente. Isto significa que
nós compartilhamos 95% de nosso nuDNA com os chimpanzés.
Os seres humanos modernos (homo sapiens) têm uma história em comum
bastante recente, que foi datada com dados genéticos e fósseis em cerca de 150.000
anos atrás (Goodwin, Linacre e Hadi). Neste período limitado não houve tempo para
produzir maiores modificações no genoma humano, o que significa que nós
compartilhamos cerca de 99,9% do nosso código genético com os nossos semelhantes.
Esta constatação de que 99,9% do nuDNA humano é comum seria uma notícia
trágica para qualquer especulação sobre o uso da genética para fins forenses, mas,
felizmente, existem regiões bem caracterizadas dentro do genoma que são bastante
variáveis entre os indivíduos e estas regiões tornaram-se o foco do interesse da
genética forense.
Apesar de as técnicas de biologia molecular analisarem qualquer região
(locusi) dos 3.200 milhões de bases que compõem o genoma, os loci apropriados para
genética forense devem ter algumas características básicas:
a) serem altamente polimórficos (variando amplamente entre os indivíduos de
uma mesma população);
b) serem fáceis e baratos para a caracterização;
c) darem perfis que sejam simples de interpretar;
d) terem uma baixa taxa de mutação
Para efeitos de rigor da técnica, temos que considerar que apesar de o DNA
nucléico ser único, uma pessoa pode “carregar” DNA alheio em seu corpo, seja
externamente, com impregnações de saliva, sangue, pelo ou sêmen alheios, ou mesmo
internamente, nos casos de transfusão sanguínea ou de transplante de órgãos, onde o
DNA do doador permanece no tecido doado. Estas situações podem, em tese, não
importar em erro no exame, mas, sim, na interpretação final dos resultados.
DNA de Contato (Touch DNA)
 
Com a melhoria das técnicas de processamento de DNA o foco de procura de
vestígios biológicos em cena de crime, antes voltado para materiais como esperma e
sangue, evoluiu para a coleta de também muito pequenas quantidades de DNA de
natureza epitelial. Com a tecnologia disponível hoje, o simples ato de pegar um objeto
ou tocar uma superfície pode levar à identificação de um criminoso. A expressão DNA
de contato, geralmente se refere, ao DNA recuperado das células da pele (epitelial) que
são deixadas para trás quando uma pessoa toca ou entra em contato com itens como
roupas, armas, maçanetas, facas, copos ou outros objetos. Uma pessoa perde cerca de
400.000 células da pele por dia, mas, infelizmente para a pesquisa, são as células mais
inferiores da pele que fornecerão os melhores perfis de DNA, pois a as células mais
externas da epiderme sofrem processo de queratinização e morte, prejudicando a
quantidade e a qualidade do DNA coletado. Essas células profundas são normalmente
recuperadas quando a força é usada, como nas roupas da vítima ou em uma cena de
crime após uma luta ter ocorrido. O número de células transferidas para objetos
tocados é altamente variável, e muitas vezes resulta em menos de 300 picogramas de
DNA, mas com as técnicas atuais, um criminoso pode depositar número suficiente de
células da pele em itens encontrados na cena do crime como armas, roupas, vítima,
documentos questionados. Isso abriu possibilidades e levou à coleta de DNA de uma
ampla gama de exposições (incluindo: ferramentas, facas de vestuário, veículos, armas
de fogo, alimentos, roupas de cama, preservativos, cosméticos labiais, carteiras, joias,
vidro, pele, papel, cabos, janelas, portas e pedras). Aliás, qualquer objeto que foi
tocado com uma certa força pode ser fonte de DNA de contato. Abaixo iremos apenas
para efeito de orientação listar os objetos mais comuns que podem ser fontes de DNA
de contato (Sankhla e Kumar).
Objetos comuns para serem tocados com os pés: Calçados, pisos e meias.
Objetos comuns para serem tocados com as pernas: Assento de cadeiras e
bancos, calças, saias e bermudas.
Objetos comuns para serem tocados com a pélvis: Roupas íntimas, assentos de
vasos sanitários, assentos de cadeiras e bancos, papel higiênico, preservativos,
brinquedos sexuais, absorventes íntimos, fraldas de adultos e aplicadores de cremes e
pomadas.
Objetos comuns para serem tocados com o tronco: Roupas, encosto de bancos
e cadeiras, medicamentos aplicados na forma de adesivos.
Objetos comuns para serem tocados com a cabeça: Bonés, toucas, chapéus,
máscaras de proteção ou de ocultação do rosto, óculos de grau ou de sol, fitas para
cabelo, tiaras, “piranhas”, laços de cabelo, barbeadores e lâminas de barbear, fones de
ouvido.
Objetos comuns para serem tocados com a boca: Escovas de dente, fio dental,
copos, xícaras, canudos, garrafas, alimentos semi consumidos, palitos de dentes.
Objetos comuns para serem tocados com as mãos: qualquer objeto, em especial
armas, botões de roupas, botões de campainha, cabos usb e similares, cadarços,
carteiras, chaves, copos, cordas, espelhos (em especial o retrovisor central do
veículo), ferramentas, fivelas de cintos de segurança, fogões, garrafas, interruptores de
luz, louça, mouses, pedras, porretes, maçanetas, gavetas, papéis, roupas, embalagens
de alimentos, geladeiras, embalagens de medicamentos e cosméticos, joias, joysticks, 
vidros, pele da vítima, tampos de mesas, talheres, telefones, tomadas, touch screens,
válvulas de torneiras, vidros, utensílios domésticos, xícaras.
O DNA de contato tem se mostrado bastante útil para ajudar a esclarecer
crimes nos quais se faça uso de um automóvel pelo autor, com este conduzindo o
veículo. Ocorre que para se dirigir é necessário um contato prolongado com diversos
componente, com volante da direção, alavanca de câmbio e contatos diversos com
alavanca do freio de mão e maçanetas de portas, além de outros contatos prováreis
com painéis, botões de ar condicionado, botões de faróis e outros (Figura 109).
DNA Mitocondrial (mDNA)
As mitocôndrias são organelas que existem no citoplasma das células. Elas são
as responsáveis pela produção de, aproximadamente, 90% da energia para a célula.
A mitocôndria contém seu próprio genoma, o DNA mitocondrial (mDNA), que
é herdado apenas da mãe. Isto foi descoberto em 1950 (Goodwin, Linacre e Hadi),
após observações de padrões de herança que não obedeciam às leis de Mendel, as
quais foram explicadas pela existência de genomas extra nucleares.
O que ocorre na prática, durante a fusão do óvulo com o espermatozoide para a
produção da célula ovo, é que, quando o espermatozoide humano penetra no óvulo, ele
leva junto as suas 50 - 70 mitocôndrias, mas o óvulo tem cerca de 1000 vezes mais
mitocôndrias do que o espermatozoide (Goodwin, Linacre e Hadi). Ocorre também
que o mDNA do pai é ativamente 
removido da célula ovo. Este processo pode não ser perfeito e já foram observados
alguns casos de herança paterna de mDNA.
O genoma mitocondrial está presente em múltiplas cópias. Células individuais
podem conter centenas de mitocôndrias e uma única mitocôndria humana pode conter
várias cópias do seu genoma. Células somáticas, portanto, podem ter até milhares de
cópias do mDNA. Isto é muito importantequando se compara com o nuDNA, o qual
contém apenas duas cópias por célula, assim em evidências degradadas é muitíssimo
mais provável encontrar o DNA das mitocôndrias que o do núcleo. O mDNA, pela sua
condição singular de ser comum a todos os descendentes de uma mesma mulher, não
pode apontar o “dono” do vestígio, mas pode eliminar suspeitos e indicar elementos
preciosos para a dinâmica do local de crime, por exemplo, se existia mais de uma
pessoa no local.
O genoma mitocondrial humano é de forma circular, possui 16 569 bp e é
usado de forma bastante econômica e compacta, com a maior parte do perímetro sendo
utilizado efetivamente na produção de proteínas.
O mDNA produz mutações em velocidades relativamente rápidas, quando
comparado com o nuDNA (Goodwin, Linacre e Hadi). É possível que a alta taxa de
mutação seja devido ao contato com o oxigênio na reação de produção de energia.
Pesquisas nas regiões mais variáveis mostraram que a mutação, tem uma taxa de uma
a cada 30 – 40 concepções. Este dado tem sido utilizado para se estimar datas de
migrações remotas, como, por exemplo, a primeira colonização das Américas.
Como já foi dito, o mDNA pode ser encontrado em material bastante
degradado como ossos enterrados há décadas ou mesmo milhares de anos, com alguma
sorte. Um dos casos famosos de uso de mDNA foi na identificação dos restos dos
Romanov, mortos pelos bolcheviques em Ekarinburgo. O exame confirmou que os
achados possuíam o mesmo mDNA do príncipe Felipe, marido da atual Rainha da
Inglaterra. No caso os Romanov e os Battemberg, família do Duque de Edimburgo,
possuíam uma ancestral comum, a Princesa Alice, segunda filha da Rainha Vitória,
casada com o Grão-Duque de Hesse.
Fontes de Evidência Biológica
A sensibilidade e o potencial dos vestígios de DNA têm causado um impacto
muito grande sobre como as locais de crime são periciadas, pois, como apenas
algumas células são necessárias para estabelecer perfis de DNA, os peritos no local de
crime agora têm uma variedade maior de vestígios biológicos para coletar (Figura 110)
e também têm uma chance maior de contaminar a local com seu próprio DNA ou de
recebê-la já contaminada por agentes policiais.
O corpo humano é composto de trilhões de células e a maioria delas contém um
núcleo (Goodwin, Linacre e Hadi). Uma grande variedade de material genético pode
ser recuperada a partir do local de crime e do corpo de delito. Cada célula nucleada,
com exceção do espermatozoide, do óvulo e das células cancerígenas, contém cópia do
genoma de um indivíduo e pode ser usada para estabelecer um perfil único de
identificação. Em teoria, para gerar um perfil de DNA seriam necessárias apenas 15
células. Amostras forenses, entretanto, geralmente apresentam alguma degradação e,
se o material for altamente degradado, mesmo com toda a sensibilidade da técnica,
poderá não se obter perfil algum.
O material biológico mais encontrado no local de crime é o sangue, devido à
natureza do evento e por ser de fácil visualização. Sangue é ótimo para produzir perfis
de DNA, mas apresenta um grande incômodo para a perícia Forense: o sangue na cena
de crime é geralmente da vítima; portanto, é urgente que as práticas de exame pericial
em local de crime sejam recicladas.
Conforme Goodwin, DNA pode ser retirado de fluido seminal, de saliva em
copos, de baganas de cigarro, de mordidas, de células epiteliais deixadas em pontos de
abrasão, em fezes (onde também pode haver sangue), em caspa, em urina, em cabelos.
Desta forma, um perito especializado em levantamento de locais deve entender que
agora faz parte essencial do seu trabalho passar suabes em material antes desprezado.
Bonés, Máscaras e Chapéus
Como muitas pessoas usam bonés (e alguns usam chapéus ou máscaras), é
bastante comum o encontro desses vestígios caídos no local de crime ou sobre bancos
de veículos. A primeira providência é verificar se o boné não é da vítima e, havendo a
possibilidade de ser do agressor, o boné deve ser enviado para o laboratório de
genética; ou o próprio perito deve providenciar a coleta de material, normalmente na
sua superfície interna, através de suabes umedecidos com água destilada ou estéril,
para que se possa identificar quem o estava usando (Figura 111).
Armas de Fogo
Em armas de fogo são comuns os respingos de sangue da vítima no cano, nos
casos de tiro a curta distância.
Resumindo, em um local de crime qualquer ponto ou substrato pode fornecer
DNA dos envolvidos. Abaixo, uma tabela (Tabela 5) de autoria desconhecida, usada
no IGP de Porto Alegre, exemplifica os principais pontos de coleta de DNA.
Igualmente a partir da pandemia do COVID-19, com a mudança de hábitos da
população, as máscaras de proteção podem vir a ser boa fonte de material genético
(Figura 106).
Tabela 5 Locais para coleta de vestígios orgânicos
Vestígio Fonte de DNA Possível Localização
Camisas Suor, cabelo Axilas, gola
Projéteis Sangue, tecidos Superfície externa
Preservativos, roupas
íntimas
Sêmen, células
vaginais e anais Superfície interna e externa
Luvas Suor Superfície interna
Unhas Sangue, tecido Entre a unha e a derme
Baganas de cigarros Saliva Filtro, extremidade
Óculos Suor, tecidos Lentes, hastes
Envelopes, selos Saliva Áreas de colagem
Pentes e escovas Cabelo e pele Superfícies e cerdas
Escova dental Saliva, sangue Cerdas
Colchão, sofás,
poltronas
Sêmen, cabelo,
suor Superfícies
Travesseiro Cabelo, pele, suor,saliva, sêmen Superfícies
Curativos Sangue, tecidos Superfície
Armas de fogo Suor, sangue Cabo, lâmina
Relógio e maçaneta Suor Pulseira e superfície
Telefone, talheres Suor, saliva Fones e superfície
Frutas Saliva Marcas e mordidas
Guardanapo, goma de
mascar Saliva Superfície
Papel higiênico Células vaginais,anais, sêmen, sangue Superfície
Solados de calçados Sangue, cabelos Superfície da sola
Palmilha de calçado
(Figura 112, Figura 113) Epitélio
Região frontal, onde há o
atrito dos dedos
Biqueira de calçado
(parte interna) Epitélio
Região frontal, com mais
chance nas pontas dos dedos
Palito de dentes e fio
dental Saliva, sangue Extremidades
Máscaras Covid Saliva Tecido e cordéis
DNA Databases
Em 1995, o primeiro banco de dados de nuDNA nacional foi estabelecido no
Reino Unido (NDNAD). Este banco de dados foi possível graças a mudanças na
legislação e a avanços na tecnologia do DNA. A partir desta implantação, as
evidências biológicas coletadas no local de crime ou em corpos de delito puderam ser
submetidas à análise do nuDNA e os perfis gerados puderam ser comparados aos
perfis armazenados no banco de dados. Além de encontrar perfis idênticos aos
questionados, a pesquisa também oferece resultados de pessoas que sejam relacionadas
com o perfil encontrado no local de crime. É a chamada pesquisa familiar.
Após o sucesso do banco de dados do Reino Unido, muitos outros países criaram
suas próprias bases de dados nacionais. Muitas diferenças existem, 
entretanto, entre as diversas aplicações no tocante ao que pode ser arquivado. Na
Inglaterra e no País de Gales, qualquer pessoa detida pode ter seu perfil introduzido no
banco e ele aí permanece indefinidamente. Já na Europa continental (Thompson e
Black), como por exemplo, Países Baixos, Suécia, Bélgica e França, os dados somente
podem ser arquivados após sentença condenatória e o perfil tem prazo de validade de
cinco até quarenta anos. No caso dos apenados a coleta é feita por Perito Oficial em
“kit” procedimento padrão nacional, com coleta pelo mesmo Perito das impressões
digitais do individuo visando uma dupla identificação com o intuito de minimizar
fraudes (Figura 114).
No Rio Grande do Sul, em junho de 2019, a perícia comemorou a abertura do caso
número 10.000 evolvendo análise de DNA, cada caso podendo ter mais de uma análise
de amostra, entretanto não foi divulgado a quantidade de resultados positivos na
matéria distribuída para a imprensa (IGP-RS).
O Brasil utiliza o sistema CODIS (Combined DNA Index System), o mesmo
utilizado pelo FBI, integrando os perfis genéticos dos laboratórios estaduais numa base
de dadosfederal. Atualmente (2020), 18 estados, o Distrito Federal e a União, através
do Laboratório da Polícia Federal formam a Rede Integrada de Bancos de Perfis
Genéticos (RIBPG), instituída pelo Decreto nº 7950/2013. O software possibilita o
confronto de perfis para relacionar pessoa com local de crime ou local de crime com
outro local de crime. A legislação (Lei 12.654/ 2012) proporciona regras para, entre
outros, coleta compulsória para indivíduos condenados por crimes hediondos (art. 1º
da Lei nº 8.072/1990) ou por crime doloso e violento contra a pessoa (IGP-RS).
Outra utilização do banco é para a identificação de pessoas desaparecidas. É
garantido pela legislação vigente que a comparação de amostras e perfis genéticos
doados voluntariamente por parentes de pessoas desaparecidas será utilizada
exclusivamente para a identificação da pessoa desaparecida, sendo vedado seu uso
para outras finalidades (Rede Integrada de Bancos de Perfis Genéticos).
Atualmente o banco conta com mais de 82.000 perfis genéticos, entretanto, de
amostras biológicas oriundas de crimes de natureza sexual, existem mais de 150.000
esperando processamento nos diversos órgãos do Brasil, de restos mortais não
identificados são 18.000 amostras. Tendo-se como base a data de 28 de maio de 2020,
o estado com maior contribuição absoluta de perfis genéticos no BNPG é São Paulo
(14.457 perfis), seguido por Pernambuco (13.516 perfis), Rio Grande do Sul (5.658
perfis) e Goiás (5.531 perfis), nesta ordem. Levando-se em conta também o tamanho
da população, o maior destaque é o estado do Amapá (202,52 perfis/100.000
habitantes), seguido de Pernambuco (140,61 perfis/100.000 habitantes), Goiás (77,83
perfis/100.000 habitantes) e Distrito Federal (77,71 perfis/100.000 habitantes). (Rede
Integrada de Bancos de Perfis Genéticos).
Os indicadores de desempenho utilizados são a mensuração do número de
coincidências confirmadas e o número de investigações auxiliadas. O conceito de
investigação auxiliada é definido como um procedimento de investigação criminal no
qual o banco de perfis genéticos adiciona valor ao processo investigativo. Já as
coincidências confirmadas são aquelas observadas entre vestígios ou entre vestígio e
indivíduo identificado criminalmente.
Até o dia 28 de maio de 2020, a RIPBG apresentou ao poder público 1928
coincidências confirmadas, sendo 1508 entre vestígios e 420 entre vestígio e indivíduo
cadastrado criminalmente, e auxiliou 1406 investigações (Rede Integrada de Bancos
de Perfis Genéticos), o que é um número ainda bastante baixo perto do potencial da
ferramenta.
Sangue
Em um local de crime contra a vida é normal se esperar que exista bastante
sangue e de fato, na maioria dos casos, é isto mesmo que ocorre. Em caso de morte por
disparo de arma de fogo ou por arma branca sugerem normalmente a presença de boas
quantidades de sangue no local. A inexistência de sangue nestes locais são indicativos
que devem fazer o perito considerar seriamente a possibilidade de a vítima ter sido
morta em outro local e transportada post-mortem.
O sangue pode ser caracterizado como uma mistura de fluidos, consistindo em
células sanguíneas e plasma que circulam por todo o corpo através dos sistemas
arterial, venoso e capilar. O sangue representa aproximadamente 8% do peso corporal
humano. Para um adulto normal, o volume sanguíneo total pode variar de 4,5 a 6
litros. Os componentes celulares do sangue compreendem aproximadamente 45% do
volume sanguíneo total. Existem quatro categorias de componentes celulares do
sangue:
Glóbulos vermelhos, também referidos como eritrócitos, contêm
hemoglobina, que transporta oxigênio dos pulmões para todo o corpo através
do sistema arterial e retornam, através do sistema venoso, com dióxido de
carbono para expiração. Fato notável para a criminalística é que os glóbulos
vermelhos não possuem núcleo e, portanto, não são portadores de nuDNA.
Glóbulos brancos, igualmente referidos como leucócitos, executam
funções vitais relativas à resposta imunológica do corpo contra as infecções.
Plaquetas, parte integrante do mecanismo de coagulação do sangue.
Plasma, a porção líquida do sangue constitui aproximadamente 55% do
volume sanguíneo total. É um meio para a circulação dos glóbulos e para
carregar nutrientes, hormônios, eletrólitos e anticorpos pelo corpo, além de
auxiliar na remoção dos resíduos do metabolismo. O termo plasma
propriamente dito descreve a porção líquida do sangue quando este está livre
de coagulação. Uma vez que o sangue tenha coagulado, a porção líquida é
referido como soro (Figura 117), que é um líquido amarelado que surge, nos
locais de crime, em torno de um coágulo de sangue exposto.
Quando o sangue está em ambiente externo como resultado de um ferimento,
ele se comportará de forma previsível de acordo com os princípios da física. As
manchas de sangue em um local de crime são o resultado tanto dos mecanismos de
deposição como de degradação do sangue. A aplicação das propriedades físicas do
sangue e dos princípios da mecânica dos fluidos formam a base para o estudo e
interpretação da localização, forma, tamanho e direcionalidade de manchas de sangue
em relação às forças que as produziram. É importante adquirir uma compreensão
básica dos princípios físicos que regem o comportamento dos líquidos em movimento.
A viscosidade de um líquido é definida como sua resistência à mudança de
forma ou ao fluxo de corrente, devido à atração entre as suas moléculas. Quanto mais
viscoso é um fluido, mais lentamente ele fluirá. A membrana dos glóbulos vermelhos
possui uma alta concentração de ácido siálico, que fornece uma grande carga
eletronegativa na superfície das células vermelhas, a qual ocasiona a viscosidade do
sangue. A viscosidade do sangue é bastante aumentada pela coagulação.
A gravidade específica é definida como o peso de uma substância em
comparação com o mesmo volume de água. A gravidade específica da água é, por
definição, 1,0 e a do sangue 1,06. O sangue é seis vezes mais viscoso do que a água,
porém sua gravidade específica é apenas ligeiramente maior.
A tensão superficial é definida como a força que agrega as moléculas em direção
ao interior de um fluido e tende a diminuir a área de superfície, causando resistência à
penetração por um corpo sólido. É a tensão superficial que dá causa ao formato
esférico de uma gota de água. É medida em unidade de força por unidade de
comprimento, por exemplo: Newton por metro.
As propriedades físicas do sangue, incluindo a gravidade específica, a
viscosidade e a tensão superficial, tendem a manter a estabilidade da forma dos
acúmulos de sangue ou das suas gotas, mas outras forças, como, por exemplo, a
gravitacional, a inércia e a força dos impactos, podem superar a resistência da
viscosidade e da tensão superficial e criar uma grande variedade de formações, como
gotas, gotículas ou respingos de sangue e fazer com que eles sejam resistentes à
alteração ou rompimento. Isso resulta na produção de inúmeros tipos de manchas que
exibirão direcionalidade e diferenças observáveis em seu tamanho e distribuição nas
superfícies que eles contatam ou impactam, dando uma grande quantidade de vestígios
para avaliar a dinâmica do local de crime.
Quando uma fonte de sangue exposto é submetida a uma força externa, a
energia é transferida para o sangue, o que faz com que ele se quebre em gotas menores
referidas como respingos. Forças externas mais fracas resultam em gotas maiores,
enquanto forças externas mais fortes resultam em gotas menores. As gotas ou
respingos com maior massa irão percorrer distâncias maiores que as menores, as quais
serão mais afetadas pela resistência do ar.
Tradicionalmente, as manchas de sangue são classificadas em três categorias
principais, com base na quantidade de energia cinética necessária para produzi-las, e,
por consequência, seu tamanho relativo. Deve-se ressalvar que as forças aplicadas à
fonte de sangue, assim como o tamanho das manchas e dos salpicos resultantes, são
expressas em escalas relativas, com um certo graude superposição. As interpretações
têm certo grau de subjetividade e devem basear-se nas manchas predominantes de cada
categoria.
O impacto de sangue à baixa velocidade é caracterizado por velocidades de até
5 pés/s (1,5 m/s) para a fonte do líquido. Isso inclui as velocidades geradas pela força
gravitacional em situação normal do dia a dia. O tamanho típico das manchas de
sangue produzidos é de aproximadamente, 3 mm de diâmetro. Uma variedade de
direcionalidades pode ser produzida. Exemplos nesta categoria são:
Gotas de sangue em queda livre;
Sangue pingando no sangue (gotas satélites);
Gotas caindo através de corpo em movimento horizontal (andando ou
correndo);
Respingos e projeções de sangue;
Pisadas no sangue líquido;
Escorrimentos de sangue.
O impacto de média velocidade é caracterizado por movimentos entre 5 e 25
pés/segundo (1,52 e 7,62m/s). O tamanho típico das manchas de sangue produzidas é 1
a 3 milímetros no diâmetro, embora manchas maiores e menores também estejam
presentes. Como nos demais casos, uma variedade de direções pode ser produzida.
Exemplos de atividades produzindo manchas de sangue nesta categoria são:
Trauma de força contundente (espancamentos com os punhos ou pés,
pauladas, marretadas, pedradas, et cetera);
Lesões provocadas por instrumentos cortantes ou corto-contundentes de
um modo geral.
O impacto de alta velocidade é caracterizado pela força externa aplicada
à fonte de sangue com velocidades maiores que 100 pés/segundo (30,5 m/s).
O tamanho típico das manchas de sangue produzidas é menos de 1 milímetro
de diâmetro, embora algumas manchas maiores e menores possam estar
presentes.
Exemplos de atividades produzindo manchas de sangue nesta categoria
são:
Trauma de tiro (Figura 118 Impacto de sangue em alta velocidade,
produzido por tiro dado por ocupante do banco traseiro contra o condutor.);
Explosões;
Maquinaria de alta velocidade do traumatismo.
Convém sempre lembrar que velocidades de até 100 pés/segundo (30,5 m/s)
também podem ser produzidas por golpes de chicotes, tacos de golfe e armas de
esgrima ou artes marciais.
A gota se forma quando o peso (massa vezes aceleração da gravidade) se torna
maior do que as forças relacionadas à tensão superficial que mantinham o volume.
Uma gota de sangue em queda livre é esférica devido aos efeitos da tensão
superficial. Quando a gota inicia a sua queda, ela é ligeiramente alongada, mas assume
a forma esférica durante o seu deslocamento. Isto é contrário à forma de lágrima
vulgarmente aceita. A gota não perderá a forma, a não ser que exista uma outra força
agindo. Pode, no entanto, oscilar, criando uma cauda, devido aos efeitos da resistência
do ar. Quanto maior uma gota, mais ela tenderá a oscilar.
O volume de uma única gota de sangue em queda livre foi estudado por
MacDonell em 1971, Laber em 1985 e White em 1986. Os experimentos originais
conduzidos por MacDonell mediram o volume médio de uma gota de sangue em
aproximadamente 0,5 ml, que corresponde a um padrão amplamente aceito de 20 gotas
de sangue por mililitro. Laber, porém, demonstrou variações nos volumes de queda de
sangue entre 0,13 e 0,16 ml para gotas de sangue caindo de diferentes fontes, incluindo
ponta do dedo, lâmina de faca, ponta da chave de fenda e pano. Enquanto a tensão de
superfície aumenta, mais volume do sangue e, portanto, peso é exigido para a queda
livre. Quanto maior for a área superficial de uma gota de sangue, maior será o efeito da
tensão superficial. Na prática, gotas de sangue de diferentes volumes podem ser
produzidas a partir de uma variedade de superfícies. As diferenças no volume de uma
gota do sangue que caem de um local da ferida, de uma roupa, de dedos ou de um
cabelo são esperadas devido às diferenças na área de superfície e na tensão de
superfície da fonte preliminar de sangue.
Fora do organismo, o sangue está sujeito a uma série de processos de degradação
pelo passar do tempo e a consequente oxidação da hemoglobina. Este processo
ocasiona a alteração da cor da mancha de sangue de vermelha para marrom (de
Almeida 14). Isto faz com que o sangue não seja tão facilmente reconhecido depois de
algumas horas fora do corpo humano e exposto à oxidação. Assim, se a autoridade
policial ou o perito têm elementos suficientes para entender que um determinado local
pode ter sido palco de crime contra a vida ou de transporte de cadáver ou ferido, mas
não apresenta mais manchas evidentes de sangue, deve ser providenciado o chamado
exame de luminol, que se baseia no fenômeno da quimiluminescência, para que se
confirme ou não a presença de sangue latente no local. O exame consiste em aspergir
com luminol a superfície questionada, em escuridão quase total, e observar e
fotografar a formação de manchas ou pontos luminescentes que indicam a reação do
luminol com a hemoglobina.
As amostras de tecido enviadas para testes de DNA, por razões diversas,
inclusive custo e limitação de equipamentos e reagentes, passam por testes de triagem
para se saber se existe mesmo material biológico (sangue, por exemplo) e, em
existindo, se é humano. Assim são providenciados testes pré-DNA, que são embasados
em técnicas de imunologia e testes químicos de colorimetria. Como uma grande
percentagem das amostras biológicas de local de crime são compostas por suposto
sangue, temos que testes que confirmem ou não sobre a presença de sangue humano
são úteis.
A pesquisa de sangue humano consiste em duas etapas: realização de testes
indicativos (presuntivos) e testes confirmatórios.
Os testes indicativos são teste de elevada sensibilidade e baixa especificidade.
Resultados negativos informam que não há a presença de sangue no material
analisado. Já um resultado positivo é apenas indicativo da presença de sangue humano
e o resultado deve ser confirmado com a utilização do teste confirmatório. Os testes
presuntivos são utilizados antes dos testes confirmatórios.
Quimiluminescência e Luminol
É usual que o criminoso procure ocultar os vestígios do seu crime, como, por
exemplo, tentar lavar o sangue, assim existem casos em que o perito se depara com
locais em que não se pode afirmar visualmente se há sangue.
A quimiluminescência é a emissão de luz não acompanhada da emissão de
calor, em consequência de uma reação química. Ocorre quando os elétrons de um
átomo recebem energia, saltam para as orbitais mais externas e, depois, ao voltarem
para as camadas mais internas, emitem um fóton característico. Poucas reações
químicas produzem luz desta forma. Um exemplo é a que ocorre entre o luminol, o
peróxido de hidrogénio e a hemoglobina.
O luminol é um composto lábil, necessitando de refrigeração, e o preparo da
solução deve ser feito no momento do uso, o que, muitas vezes, dificulta a utilização
em local de crime. Seus efeitos sobre testes subsequentes têm sido bastante discutidos,
com o luminol prejudicando a realização de testes de cor que utilizam como
indicadores fenolftaleína e tetrametilbenzidina. Além disso, certas preparações de
luminol podem comprometer os resultados obtidos nos testes imunológicos
confirmatórios para sangue. Soluções de luminol contendo hidróxido de sódio
afetaram a realização do teste imunocromatográfico para hemoglobina humana após
72 horas de contato com o reagente e de métodos sorológicos tradicionais para
tipagem sanguínea. Por outro lado, não tem efeito deletério sobre o exame de DNA
quando extraído com a reação em cadeia da polimerase (PCR) e a genotipagem
realizada utilizando loci de STRs (Short Tandem Repeat) (de Almeida).
Benzidina
A benzidina é um reagente utilizado para triagem de manchas avermelhadas
visíveis, de amostras colhidas com auxílio de suabe e para análise de manchas que
apresentaram luminescência após a aplicação do luminol. A reação química é de maior
especificidade que a aplicação de luminol e consiste na catálise da decomposição do
peróxido de hidrogênio (H202) em água e oxigênio pela hemoglobina presente no
sangue. O oxigênio formado desta reação irá oxidar a benzidina, alterando a sua
estrutura, fenômeno que éperceptível, sob o ponto de vista experimental, com o
aparecimento da coloração azul da solução. Cabe ressaltar que o resultado positivo é
apenas indicativo da presença de sangue, e essa reação também pode gerar resultados
falso-positivos (sangue de outras espécies animais, materiais enferrujados, fragmentos
de plantas e frutas etc.), mas o resultado negativo (ausência da geração de coloração
azul) indica ausência de sangue na amostra testada (IGP-RS).
Imunocromatográfico
O teste imunocromatográfico para sangue humano é o um teste específico para
detecção de hemoglobina humana. A reação se dá através da presença de anticorpos
antihemoglobina humana.
Cabelos, Pelos e Unhas
Como cabelos, pelos e unhas são facilmente encontrados em locais crimes,
faremos um parágrafo especial sobre o assunto. Apesar de ser possível recuperar o
nuDNA de cabelos, o sucesso é limitado, pois durante a queratinização, o nuDNA é
rapidamente degradado, tornando difícil a recuperação do nuDNA; devido a isso, esse
tipo de análise requer grandes quantidades de fios. Em contraste, o mDNA parece
sobreviver ao processo de queratinização nos fios de cabelo (incluindo aí axilas, couro
cabeludo, púbis e sobrancelhas), talvez até pela grande quantidade de mitocôndrias
existentes em cada célula (Thompson e Black), o que torna a análise do mDNA uma
alternativa viável para a identificação humana nos locais de crime.
Cabelos, pelos e unhas são tecidos importantes para a identificação humana,
seja através das suas características morfológicas, seja através de suas informações
biomoleculares. A natureza peculiar do crescimento destes tecidos também fornece
informações únicas de natureza cronológica ao longo do seu comprimento, o que é de
grande utilidade na reconstrução da história recente do indivíduo (Wilson e Tobin 321-
345). Outra grande vantagem da utilização destes tecidos é a sua característica não
invasiva, afinal, cabelos, pelos e também pedaços de unhas são deixados para trás com
relativa frequência (Daniel, Piraccini e Tosti), sendo possível obter um registro sobre a
herança genética, o uso de drogas, patologias, dieta ou mesmo exposição a resíduos de
explosivos ou outros poluentes.
Identificações com base em comparações morfológicas dos cabelos estão entre
os primeiros exames utilizados pelas ciências forenses (Sachs).
O couro cabeludo humano médio tem cerca de 100.000 folículos pilosos, uma
maior densidade de folículos pilosos por área do que nos outros primatas e o cabelo é
fonte abundante de vestígios, pois cada adulto perde, em média, cerca de 100 fios de
cabelo a cada dia (Linch, Smith e Prahlow). Cabelos e pelos são também transferidos
de uma pessoa para outra na agressão e durante a relação sexual e persistem nas roupas
usadas por um indivíduo, nos seus pentes, nas suas escovas e nos locais onde o
indivíduo tenha se banhado (Dachs, McNaught e Robertson).
Deve ser ressaltado que pelos de animais domésticos, como cães e gatos,
também podem ter valor como evidência de identificação de seus donos ou, mesmo,
pelos podem ser transferidos do “pet” da vítima para o agressor.
Os cabelos, os pelos pubianos, axilares, da barba, os cílios, as sobrancelhas e os
pelos do nariz resumidamente são compostos pela cutícula externa, que são células 
dispostas em camadas de até dez células de espessura, que têm uma função protetora e
influenciam na cor da fibra e são hidrófobas; pelo córtex subjacente, que compõem o
corpo principal da fibra capilar e é composto por células alongadas, que dão força e
flexibilidade à fibra e são responsáveis pelas propriedades mecânicas como a
resistência à tração; a medula central, que é uma estrutura oca ou com líquidos, que
pode ser descontínua ou não ao longo o comprimento da fibra (Swift, Jolles e Zahn
149-175).
Cabelo e unhas compartilham de uma química estrutural comum. A maior parte
de cada um é composto de queratina, que tem 65-95% de proteínas, em peso.
A maioria dos trabalhos de identificação de cabelo, até recentemente, envolvia
o uso de microscopia comum e, ocasionalmente, microscopia eletrônica para analisar e
comparar as características morfológicas do fio (Thompson e Black).
Tradicionalmente, o cabelo foi classificado usando variações morfológicas de
acordo com três grandes grupos raciais - caucasianos, africanos e mongólicos. O
cabelo dos orientais tem, geralmente, a secção transversal arredondada, diferente do
caucasiano, que é ovoide. Já o tipo africano tem as fibras bastante torcidas, lembrando
fios de lã e, normalmente, é preto. Literatura mais recente discute também a existência
dos padrões australoide, afro-caribenhos e polinésio. Da mesma forma, características
morfológicas são também utilizadas para distinguir pelos humanos de pelos animais
(Thompson e Black).
A cor do cabelo, atualmente, pode ser uma característica difícil de quantificar,
devido ao uso de tinturas de cabelo e outros cosméticos ou produtos químicos que
podem alterar a sua coloração, além de mudanças naturais relacionadas com maior ou
menor insolação e tempo mais seco ou mais úmido (Thompson e Black).
Da mesma forma, sob condições extremas de aquecimento, o cabelo pode
mudar de cor antes da carbonização; cabelos grisalhos ficam aloirados a cerca de
120°C, enquanto o cabelo castanho pode assumir uma tonalidade avermelhada perto
dos 200°C (Spitz).
A identificação pode ser auxiliada por práticas culturais e tendências da moda,
que modificam a aparência tanto dos cabelos quanto das unhas, mudanças estas que
podem sugerir quais os grupos sociais com quem o indivíduo tem afinidade. Essas
modificações podem incluir pinturas, polimentos, unhas, cabelos e pelos postiços,
cirurgias de implantes, implantes de fibras naturais ou artificiais, técnicas de
alisamento e estilos de corte (Thompson e Black). É importante salientar que o cabelo,
apesar de muito resistente, pode ser danificado por práticas, como excessos de
escovações e as populares “chapinhas”, gerando uma situação que pode ajudar ou
prejudicar um processo de identificação. Também infecções fúngicas, como parasitos
que se nutrem da queratina da unha, podem produzir deformações permanentes,
principalmente nas unhas dos pés (Sinski).
Cabelo e unhas funcionam como portadores de informação sobre resíduos
diversos com os quais o indivíduo teve contato, pois o fio do cabelo é naturalmente
impregnado com óleos derivados dos diversos tipos de glândulas sebáceas ou
sudoríparas que o ser humano possui. Essas secreções são fonte de informações
endógenas e funcionam como uma espécie de “cola” para materiais exógenos. Da
mesma forma, as unhas também podem ser uma fonte útil de resíduos presos no sulco
distal abaixo da lâmina ungueal ou ao redor da cutícula.
Quanto a contaminantes químicos, temos que existe uma gama diversificada de
produtos cosméticos, projetados especificamente para uso com o cabelo ou unhas, que
podem deixar evidências de seu uso pessoal e podem indicar várias características do
indivíduo, que permitem ilações quanto à idade, sexo e raça (Nelson e De Forest,
Forensic Examination of Hair) ou mesmo a mera presença de um indivíduo no local de
crime.
Fibras têxteis e resíduos fibrosos também são frequentemente encontrados
presos no couro cabeludo (Cook, Webb-Salter e Marshall) ou nos pelos pubianos.
Mesmo os cabelos podem ser impregnados com sêmen, sangue ou fezes, o que poderá
ser útil no caso de crimes de natureza sexual; quanto às unhas, estas sempre podem
conter pele ou sangue do assaltante (Thompson e Black).
Além disso, o couro cabeludo e os cabelos de dentro da cavidade nasal são
depósitos para pólen ou poeiras do solo, o que pode trazer algum conhecimento sobre
onde uma pessoa andou (Coyle). Da mesma forma, as diatomáceas podem ser
recuperadas nas vítimas de afogamento, nas pessoas que foram atiradas na água e,
muito importante, também de quem entrou em banhados para ocultar um corpo
(Thompson e Black).
A presença de resíduos de explosivos e de tiros (GSR) no cabelo ou sob as
unhas podem ser usados para estabelecer correlaçõesentre indivíduos e um crime e
fornecer informações sobre o autor (Thompson e Black).
Os cabelos e as unhas são tecidos permanentes. Uma vez formados, apenas
caem, desgastam-se ou são aparados, não recebendo novas moléculas a partir do
processo de queratização. Também têm a característica de crescimento contínuo, com
velocidades relativamente conhecidas (ver tabela abaixo).
As taxas de crescimento de pelos são admitidas como constantes dentro de um
mesmo grupo étnico, mas com um discreto aumento durante o verão e a primavera,
durante a gravidez e durante a adolescência.
O uso do fio de cabelo para encontrar vestígios de uso de drogas ou exposição
a poluentes teve um interesse generalizado após a aceitação destes testes como prova
judicial nos Estados Unidos (Thompson e Black), já com registro de mais de 100 tipos
de produtos farmacêuticos documentados.
Tabela 6 Taxa de crescimento de pelos
Taxas de Crescimento para Cabelos, Pelos e Unhas Humanos (Thompson e
Black)
Tecido Taxa diária (mm) Taxa Mensal (mm)
Cabelo (caucasiano) 0,33 – 0,35 9,9 – 10,5
Cabelo (africano) 0,26 7,7
Barba 0,38 11,4
Axilas 0,3 9
Púbico 0,2 6
Sobrancelha 0,16 4,8
Unha da mão 0,1 3
Unha do pé 0,03 1
No caso da exposição aos poluentes, a análise da dosagem de vários elementos,
incluindo arsênico, cádmio, cobalto, germânio, chumbo, lítio, manganês, níquel,
mercúrio e tálio, pode mostrar uma exposição mais acentuada a produtos que tenham
estes elementos na sua composição (Thompson e Black).
Cuidados com as evidências do tipo DNA
Degradação e contaminação são duas grandes preocupações no manuseio de
possíveis evidências de DNA. Degradação é a quebra do DNA em fragmentos
menores por processos químicos ou físicos, enquanto a contaminação é a introdução
de material estranho à amostra. As causas potenciais de degradação são a
superexposição ao calor e à umidade, levando ao crescimento de bactérias, em uma
amostra. A contaminação pode ser a mistura de duas amostras de DNA juntas, ou
quando uma pessoa estranha aos fatos investigados deixa inadvertidamente DNA na
evidência coletada. A degradação ou a contaminação podem levar a resultados falsos
ou inservíveis (Krishnamurthy, Manoj e Pagare).
Para evitar a contaminação se deve seguir de maneira rigorosa os
procedimentos padrões para a técnica de coleta utilizada. Estes procedimentos
incluem, minimamente, uso de água destilada como diluente, luvas de procedimento
trocadas de amostra para amostra, toucas, máscaras e isolamento radical do local. Para
evitar a degradação se deve coletar e entregar a evidência coletada o mais rápido
possível para processamento em laboratório, conservando-a no frio e nas embalagens
recomendadas pelos procedimentos para a técnica, os quais podem variar de um
órgão de perícia para outro.
6. VESTÍGIOS PAPILOSCÓPICOS
Antes da Introdução: A Pele em que habito
 
Em princípio, as cristas papilares, de onde saem as impressões digitais, são uma
modificação evolucionária que aprimorou as nossas mãos e pés através da melhora na
aderência, no tato e no ajuste da motricidade fina destas áreas.
Os pilares para o uso de impressões digitais como meio de identificação
pessoal são a sua permanência (persistência ou durabilidade) e a sua singularidade.
Ambas as proposições foram várias vezes refutadas e várias vezes confirmadas por
pesquisas nos últimos 120 anos, mas a doutrina dominante tem apontado a validade
delas. Entretanto, a menos que se tenha uma ideia da morfogênese da pele nas regiões
onde existem as “fingerprints”, o princípio básico da individualidade é frequentemente
explicado usando declarações rasteiras como “a natureza nunca se repete”. Não
podemos aceitar que a justificativa para a individualização gira essencialmente em
torno do argumento tautológico de que toda entidade na natureza é única. A
seletividade da pele de crista de fricção deve ser totalmente compreendida a partir de
uma perspectiva biológica e, em seguida, aplicada na avaliação de comparações de
digitais latentes.
A pele dos dedos, da palma da mão e sola dos pés exibe uma série de sulcos e
cristas, formando desenhos de vários formatos. Normalmente nos referimos a eles
como impressões digitais, impressões de palmares e impressões plantares (Champod,
Lennard e Margot 19).
A pele é dividida em duas camadas distintas. A camada externa, a epiderme, é
um epitélio estratificado de cinco subcamadas, listado da seguinte forma, de baixo para
cima (Figura 122, Figura 123):
• stratum germinativum
• stratum spinosum
• stratum granulosum
• stratum lucidum
• stratum corneum
A camada sob a epiderme é chamada derme e é 15 a 40 vezes mais espessa que
a epiderme e constitui a massa primária da pele.
A camada de pele cornificada exposta ao meio ambiente é composta por 15 a 20
camadas de células planas mortas que são eliminadas regularmente por abrasão e
substituídas por queratinização de outras células, as quais se originam de células
cuboides formadas na camada basal, que migram pelas camadas epidérmicas até a
camada córnea. As células se movem para cima simultaneamente com as células
circundantes e durante esse processo, as células mudam de forma, reduzem sua
atividade e absorvem a queratina (uma proteína repelente à água). Todas as células da
epiderme, portanto, se originam da camada basal no interstício entre a derme e a
epiderme. A permanência do padrão da crista papiloscópica é devido a esse processo
gerador, pelo qual as células que constituem a epiderme (e, portanto, sua forma) são
produzidas na camada basal interna protegida. Assim, somente danos à camada basal
resultarão em cicatrizes permanentes na epiderme e, portanto, mudanças na impressão
digital (Champod, Lennard e Margot).
A mão começa a se desenvolver entre a 5ª e 6ª semana de gestação. Os
primeiros dedos aparecem por volta de 6 a 7 semanas. Entre a 11ª e 20ª semanas a área
onde vão aparecer as cristas já estão diferenciadas no feto e as cristas em formação
podem ser visíveis (Figura 124).
Adermatoglifia
Existe uma condição particular e extremamente rara de indivíduos que não
possuem impressões digitais: adermatoglifia. Até o momento, apenas quatro famílias
com ausência congênita de impressões digitais foram encontradas. Em três dessas
famílias, foram relatadas características adicionais, como milia facial congênita, bolhas
de pele e fissuras. Uma destas família, a com residência na Suíça, foi investigada e se
apresentou causa genética para a característica, apontando-se inclusive o “gene
responsável” (Nousbeck, Burger e Fuchs-Telem) (Figura 125).
Secreções e Glândulas
Se as cristas papiloscópicas podem ser explicadas como sendo uma espécie de
carimbo natural, as secreções da pele seriam as tintas deste carimbo. Três tipos de
glândulas são responsáveis pelas secreções da pele: as glândulas sudoríferas écrinas
e apócrinas e as glândulas sebáceas. Esses três tipos de glândulas têm funções bem
definidas, e a composição de sua secreção varia em consequência.
As glândulas sudoríferas são distribuídas por todo o corpo e produzem o suor
com mais de 98% de água. O corpo secretor de cada glândula tem a forma de um
longo tubo enrolado localizado nas camadas subcutâneas da pele. Estes tubos
atravessam as camadas epidérmicas para abrir nos cumes das cristas papilares e formar
poros de sudorese ou sudoríferos. O suor é produzido pelas células secretoras do
corpo, sem perda do citoplasma celular no caso das glândulas écrinas, em contraste
com as glândulas apócrinas, que secretam também citoplasma. Isso explica a diferença
na composição química entre esses dois tipos de secreção. As palmas das mãos e as
plantas dos pés produzem apenas secreções das glândulas écrinas, enquanto as
glândulas apócrinas estão localizadas na virilha, nas axilas, na região perianal, junto
aos lábios da vagina, no pênis e na auréola mamária. A presença de citoplasma na
secreção também explica o cheiro desagradável nestas regiões quando há falha de
higiene. Outro tipo de glândulas, as sebáceas, são bastante encontradas no peito e nas
costas (ondeestão associadas às raízes do cabelo) e na testa. Essas glândulas secretam
um óleo (ou sebo) que serve para proteger a pele e os cabelos da água, para atuar como
lubrificante e para absorver substâncias lipossolúveis (Champod, Lennard e Margot).
As palmas das mãos são cobertas exclusivamente por glândulas écrinas, mas
contaminação por secreções sebáceas é muito comum, devido a atividades como
pentear o cabelo e tocar o rosto, enquanto a contaminação pelas glândulas apócrinas é
pouco frequente, mas pode ser importante em certos crimes (por exemplo, crimes de
natureza sexual) ou m pessoas que tenham o hábito de tocar, ou coçar, com certa
frequência os genitais.
Os principais componentes químicos das secreções naturais são dados na Tabela 7.
As secreções de glândulas écrinas e apócrinas são solúveis em água, porém não
as secreções das glândulas sebáceas, as quais são mistura viscosa de gorduras, ceras e
álcoois de cadeia longa que resultam em um depósito mais permanente, solúvel apenas
por solventes apolares. Não existem diferenças significativas na natureza química
entre as impressões produzidas por homens e as produzidas por mulheres, porém
verificou-se que impressões digitais latentes depositadas por crianças têm uma
composição química diferente dos depósitos de adultos. As crianças deixam
consideravelmente menos resíduos na superfície, menos de 1/20 dos adultos, e a
porção lipídica de suas impressões latentes é de natureza mais volátil. Como resultado,
digitais latentes de crianças tendem a se degradar mais rapidamente do que as
impressões deixadas pelos adultos. Outra explicação para isto é que o auge de
atividade das glândulas apócrinas se concentra na puberdade, tendo pouca atividade na
infância (Champod, Lennard e Margot).
Tabela 7 Constituição das impressões digitais
Fonte Localização Constituição
Inorgânicos Orgânicos
Glândulas
Écrinas
Em todo o corpo, mas é o
único tipo encontrado nas
palmas das mãos e nas solas dos
pés
Íons de
cloretos (Na +,
K +, Ca2 +).
Sulfatos.
Fosfatos
Bicarbonatos
Amônia
Água (>
98%)
Aminoácidos,
proteína, ureia.
ácido úrico, ácido
lático, açúcares,
creatinina, colina
Glândulas
Apócrinas
Na virilha e nas axilas;
associadas com folículos pilosos
ao redor dos órgãos genitais e
nas glândulas mamárias
Ferro e água
(>98%)
Proteína,
Carboidratos,
Esteróis.
Glândulas
Sebáceas Testa, peito e dorso e outros
Sebos e
gorduras
Definições e Conceitos Uteis
Datiloscopia
Datiloscopia é ciência que se propõe a identificar as pessoas fisicamente
consideradas, por meio da impressão digital ou a reprodução física dos desenhos
formados pelas cristas papilares das extremidades digitais (Vucetich).
A identificação pelas impressões digitais é bastante útil na Criminalística por
alguns aspectos que o diferenciam dos outros métodos, podendo se afirmar que, sendo
possível, a abordagem papiloscópica não deve ser descartada no local de crime. Estes
aspectos (os três primeiros são chamados de postulados) são:
Perenidade: as impressões digitais surgem no indivíduo a partir do
sexto mês de vida intrauterina, permanecendo por toda a sua vida e, após a
morte, até a putrefação cadavérica.
Imutabilidade: os desenhos digitais, com suas peculiaridades jamais se
alteram de forma natural, exceto seu tamanho, conservando-se desde o seu
surgimento até a decomposição cadavérica.
Variabilidade: desde a implantação do sistema datiloscópico no Brasil,
a partir de 1905, não surgiram duas impressões digitais idênticas, nem em
gêmeos univitelinos, nem em dois dedos da mesma pessoa, face a uma
infindável variação de detalhes e minúcias de pessoa para pessoa e de dedo
para dedo de uma mesma pessoa.
Baixo Custo: é um exame relativamente barato.
Banco de Dados: ao contrário de outras técnicas, como o DNA, os
bancos de dados de impressões digitais – normalmente pelo sistema
decadatilar, que contempla os dez dedos das mãos - estão consolidados e em
funcionamento.
A Criminalística visa apontar elementos para esclarecer a dinâmica dos fatos e
a autoria. Como os crimes que envolvem penetração em um recinto ou veículo, entre
outros, requerem o amplo emprego das mãos, a papiloscopia é muito importante para a
identificação dos autores, sem deméritos para outras técnicas, como o DNA e a
produção de imagens.
É importante aqui salientar que no exame do local de crime não cabe elencar
qual a técnica é a “melhor”, pois se deve trabalhar com o que o criminoso deixou de
vestígios no local. Disputas sobre “quem identifica mais” são estranhas a uma boa
prática em exame de local de crime. 
A Impressão Digital, Datilograma e Papilograma
Datilograma digital
Datilograma digital, conhecido também como “Desenho digital” (Figura 126), é o
desenho formado pelo conjunto de cristas e sulcos, os quais projetam desenhos ou
arabescos; localizados na 3ª falange dos dedos (Issberner). É composto pelas cristas
papilares ou linhas de fricção, que são as linhas da formação linear e saliente, e, pelos
sulcos interpapilares, que são os espaços que separam as cristas entre si.
Papilograma
Papilograma é a impressão digital que não se pode afirmar se pertence às
polpas digitais, das palmas das mãos ou das plantas dos pés (Issberner).
Impressão digital
Impressão digital é a reprodução digital num suporte qualquer desde que
apresente condições favoráveis à sua retenção. A impressão digital é a réplica invertida
do desenho digital (Issberner).
A impressão digital, para fins de seu estudo costuma ser dividida nos seguintes
elementos: linhas pretas, linhas brancas, pontos brancos sobre as linhas pretas, linhas
albodatiloscópicas, linhas diretrizes, sistema de linhas, sistema nuclear, núcleo, campo
digital e delta.
Linhas e Sistemas de Linhas
As linhas pretas retratam as cristas papilares dos desenhos digitais. Já as
linhas brancas representam os sulcos interpapilares dos desenhos digitais. Os pontos
brancos sobre as linhas pretas representam os poros sudoríparos presentes nas cristas
papilares.
As linhas albodatiloscópicas são linhas brancas que não acompanham as
linhas pretas das cristas papilares (como acontece com linhas dos sulcos
interpapilares), ao contrário provocam interrupções das cristas em vários sentidos.
As linhas diretrizes são as linhas datilares que separam os três sistemas de
linhas de uma impressão digital, e tendem a envolver a região nuclear. São duas linhas
que iniciam suas trajetórias paralelas, se desviam bruscamente em forma de recurva e
envolvem ou tendem a envolver a região nuclear de uma impressão. As linhas
diretrizes nem sempre são linhas contínuas, frequentemente são formadas por uma
sucessão de linhas curtas. Desta forma, cada segmento da diretriz basilar terá
prosseguimento na linha imediatamente inferior, e cada segmento da diretriz marginal
terá prosseguimento na linha imediatamente superior (Figura 127).
Sistema de linhas é o conjunto de linhas papilares que formam um
agrupamento numa impressão digital. O datilograma apresenta três sistemas de linhas -
o nuclear, o marginal e o basilar, perfeitamente caracterizados e limitados pelas linhas
diretrizes, excetuando-se o arco, que não apresenta o sistema nuclear:
Sistema nuclear é formado pelas linhas centrais de uma impressão de que são
envolvidos pelas linhas diretrizes. O tipo arco, por não possuir núcleo, não possui o
sistema nuclear.
Sistema marginal é o sistema de linhas situado na parte superior da impressão.
Sistema basilar é o conjunto de linhas situado na parte inferior da impressão,
limitando-se com a prega interfalangiana do dedo.
Núcleo
O núcleo é a área circunscrita pelo prolongamento dos braços do delta ou
deltas, ou seja, pelas linhas diretrizes. O núcleo é sempre formado por linhas que,
embora tendo parte do seu curso paralelo ao das linhas formadoras dos demais
sistemas, delas divergindo, encurvando-se sobre si mesmas, em um ou ambos os lados
do desenho.
O núcleo desempenha papel importante na determinação de subtipos dos
verticilos e contagem de linhas nas presilhas. São vários os critérios adotados nadeterminação do núcleo das presilhas, sendo que, de sua correta determinação resultará
a contagem de linhas.
Campo Digital
Campo digital é o espaço tomado na impressão digital dentro do qual se
encontram todos os elementos e características necessárias à classificação e
subclassificação do datilograma. É a região onde se define o tipo de datilograma.
O Delta
Delta é uma letra do alfabeto grego representado por um triângulo. Em
geografia, é uma ilha triangular compreendida entre os braços com que alguns rios
desembocam no mar, chamada assim pela semelhança com a figura da quarta letra do
alfabeto grego. Em datiloscopia, delta é o primeiro obstáculo diante ou o mais próximo
da área de divergência das linhas diretrizes. Encontra-se, quase sempre, entre os três
sistemas, uma linha, um ponto, um pequeno agrupamento de linhas neutras, isto é, de
linhas que a rigor, não se incluem perfeitamente em nenhum dos sistemas (Figura
128).
Quando houver possibilidade de se escolher dois ou mais possíveis deltas para
classificar a impressão, deve-se adotar as seguintes regras:
• O delta não pode ser localizado numa bifurcação que não se abra para o
centro do núcleo.
• Quando houver possibilidade de se escolher entre uma bifurcação e um outro
tipo de delta, deve-se escolher a bifurcação.
• Quando houver mais de um delta que esteja de acordo com esta definição se
deve escolher o que estiver mais próximo do núcleo.
Delta é, portanto, o ponto de encontro de três sistemas de linhas: basilar, nuclear e
marginal.
O mais frequente dos deltas é o “trípode”, que é formado pelo encontro de
três linhas em equilíbrio. Nos deltas trípodes os desenhos podem variar conforme suas
características, na parte superior, na parte interna e na parte externa ou em ambos os
lados.
Laçada
A Laçada é uma linha que entra por um lado da impressão, desenvolve uma
recurva com perfeita inflexão ao centro do campo digital e retorna ou tende a retornar
ao lado onde iniciou sua trajetória. Caracteriza-se uma laçada com perfeita inflexão
quando ao retornar à sua trajetória de origem seja tocada ou cortada pela linha de
Galton, traçada do centro do delta ao ombro mais afastado da laçada central da
impressão.
Ombro da laçada são os pontos onde a linha central começa a girar formando
a curvatura da laçada e retornando, ao ponto de origem.
Apêndices são pedaços ou pontas de linhas que danificam ou ligam a recurva
das laçadas nas presilhas e verticilos.
Pontos característicos
São particularidades morfológicas que permitem distinguir, entre si, as
impressões papilares. Também conhecidos como minúcias ou caracteres
individualizadores (Muller) (Figura 129, Figura 130).
Os desenhos digitais não são formados por linhas contínuas. As cristas
papilares apresentam, em seu curso, acidentes mais ou menos ponderáveis,
denominados pontos característicos, cuja formação e disposição no desenho digital lhe
conferem a individualidade.
Por meio da comparação do tipo primário podemos afirmar a não identidade
entre duas impressões papilares (digitais), porém somente pela comparação dos
pontos característicos é que se pode realmente confirmar a identidade delas.
Mesmo não existindo base científica na determinação de um número mínimo
de pontos característicos, para fins de padronização, recomenda-se o assinalamento de,
pelo menos 12 (doze) pontos característicos coincidentes entre o padrão e a
questionada (Issberner). Entretanto, pode-se confirmar a identidade com menor
número de pontos característicos, desde que se encontrem pontos considerados raros
(de difícil incidência) entre os localizados nas impressões comparadas (Issberner).
Assinalamento de Pontos Característicos
É usual proceder-se da seguinte forma (Issberner):
As impressões após serem ampliadas são colocadas lado a lado,
delineando em seguida as linhas partindo dos pontos similares de cada
impressão.
Essas linhas radiam a impressão sempre em sentido horário, iniciando-se
na parte superior da impressão.
Na extremidade de cada linha é colocado um número, de forma que cada
impressão tenha linhas se radiando em ângulos similares e com a mesma
designação numérica. Com tal amostra, o observador poderá verificar que
cada número corresponde a um ponto característico coincidente em ambas as
impressões.
O Sistema Argentino de Juan Vucetich
É o sistema, com algumas modificações, utilizado no Brasil. A classificação
consiste em quatro letras, representando o padrão no polegar, e quatro números,
representando os padrões nos dedos restantes. Como o sistema de classificação de
Galton, o sistema de Vucetich começa com o polegar direito e termina com o dedo
mínimo esquerdo (Tabela 8). Além dos símbolos mencionados, modernamente, são
utilizados ainda os seguintes: X, para indicar a ocorrência de cicatriz; Ǿ, para indicar a
ocorrência de amputação (Issberner).
Tabela 8 Sistema de Vucetich
Polegares Outros dedos
Arco A 1
Presilha Interna I 2
Presilha Externa E 3
Verticilo C 4
O sistema tem uma classificação básica (chamada primária ou fundamental) e
uma classificação secundária mais descritiva usando extensões. A classificação
primária foi dividida em dois grupos: o numerador e o denominador. O numerador foi
denominado série e representa a mão direita. O denominador foi denominado seção e
representa a mão esquerda.
O polegar direito (chamado de fundamental) e os dedos restantes da mão direita
(chamados de divisão) representam a série. O polegar esquerdo (chamado de
subclassificação) e os dedos restantes da mão esquerda (chamados de subdivisão)
representam a seção. Por exemplo, se o numerador e o denominador fossem A1141, a
mão direita e a esquerda teriam arcos em todos os dedos, exceto nos dedos anelares,
que apresentam verticilos (Hutchins).
Tipos Fundamentais
No sistema de Vucetich, é pela presença ou ausência do delta em uma
impressão digital, que são determinados os quatro tipos fundamentais.
Ausência de delta classifica a impressão como “Arco” que é constituído de
linhas paralelas mais ou menos abauladas ligando uma à outra extremidade do campo
digital. A presença de um delta à direita do observador define a “Presilha interna”. A
presença de um delta à esquerda forma a “Presilha externa”, tendo pelo menos uma
laçada livre e curva à frente do delta. A presença de dois deltas, um à direita e outro à
esquerda determina o “Verticilo”, tendo pelo menos uma laçada livre e curva à frente
de cada delta (Figura 131).
As denominações presilha interna e presilha externa se reportam ao fato que no
polegar direito, o dedo fundamental, a presilha à direita é a que fica mais próxima da
prega interdigital, ou seja, em direção à porção interna da mão, e a presilha à esquerda
fica na direção externa.
Diferença entre arco e presilha: A presilha se caracteriza, além do delta, por
uma laçada livre e de perfeita inflexão, em seu ramo ascendente e a partir do nível do
delta. Quando a laçada se constituir da linha diretriz superior, ou a ela estiver ligada,
no seu ramo ascendente, bem como a qualquer linha do sistema marginal, caracteriza-
se o “Arco”. Ressalve-se que a invasão da linha diretriz superior ou de outra linha do
sistema marginal sobre o ramo descendente da laçada, abaixo de sua inflexão, não
prejudicará a configuração de “Presilha”.
O núcleo nas Presilhas será localizado no ápice da laçada mais central e livre
de apêndices. Quando aparecerem na região central duas laçadas da mesma altura, será
reconhecido como núcleo o ápice da laçada mais próxima do delta. Quando
aparecerem duas laçadas na região central, de alturas diferentes, será reconhecido
como núcleo o ápice da laçada mais alta. Quando houver duas laçadas entrelaçadas
assinalaremos como núcleo a intercessão destas, desde que esta ocorra até a altura do
ombro da laçada mais alta (Issberner). 
Além dos quatro tipos fundamentais, podemos incluir outros dois: o tipo
“Cicatriz”, que é o datilograma inclassificável em virtude de cicatriz de corte,
queimadura, esmagamento, pústula, que impede a determinação do tipo fundamental, e
o “Anômalo”,que é o datilograma que não se enquadra dentro da classificação dos
tipos fundamentais.
Classificação Secundária
A classificação secundária subdivide ainda mais as impressões digitais em cinco
subtipos: 5, 6, 7, 8 e 9. Cada número representa uma descrição adicional do padrão,
aplicado a qualquer mão, e foi colocado como sobrescrito entre parênteses (Tabela 9).
Quando o tipo de padrão é uma variedade de presilha, o sobrescrito padroniza os
valores da contagem de cristas (Tabela 10).
Tabela 9 Classificação Secundária de Vucetich
Primária Secundária Descrição
Arco 5 Abobado (Normal)
6 Inclinado para a esquerda
7 Inclinado para a direita
8 Tenda
9 Outros
Presilhas
5 Normal
6 Invadido
7 Interrogação
8 Gancho
9 Outros
Verticilo
5 Normal
6 Sinuoso
7 Ovoide
8 Gancho
9 Outros
Tabela 10 Valor da contagem de cristas. Sistema Vucetich
Contagem de Cristas Valor
1–5 5
6–10 10
11–15 15
16–20 20
Over 20 25
Por exemplo, uma pessoa cujos dedos da mão direita possuem presilhas
externas (inclinação direita) e cujos dedos da mão esquerda possuem presilhas internas
(inclinação esquerda) teriam uma classificação Vucetich conforme Figura 132 .
Entretanto, a evolução do conhecimento levou a modificações no sistema de
classificação secundária como, por exemplo, a utilizada no estado do Paraná (
Tabela 11).
Tabela 11 Classificação e subclassificação usada no Paraná
Primária Descrição Subclassificação
Arco (A, 1) Simples sp
Tenda t
Bifurcado à direita bd
Bifurcado à esquerda be
Destro apresilhado da
Sinistro apresilhado sa
Bifurcado duplo bdu
Presilha Interna (I,
2)
Presilha Externa (E,
2)
Normal (marca-se o número de
linhas
1 a 5 a
6 a 10 b
11 a 15 c
16 a 20 d
21 a 25 e
26 a 30 f
Mais de 30 g
Invadida iv
Dupla dp
Ganchosa ga
Verticilo (V, 4)
Espiral es
Circular ci
Sinuoso si
Ovoidal ov
Duvidoso dv
De bolsa central bc
De bolsa direita bcd
De bolsa esquerda bce
Ganchoso go
Subtipos: Arco
Arco simples: são os datilogramas que não apresentarem delta e que as linhas
centrais atravessem paralelamente o campo da impressão de forma abaulada.
Arco em tenda: As linhas se elevam na parte mais ou menos central da
impressão digital, assumindo a forma de um ângulo agudo ou tenda.
Arco bifurcado à direita: apresenta nas linhas centrais duas ou mais
bifurcações, desenvolvendo-se da esquerda para a direita do observador.
Arco bifurcado à esquerda: apresenta nas linhas centrais duas ou mais
bifurcações, desenvolvendo-se da direita para a esquerda do observador.
Arco bifurcado duplo: É o subtipo que apresenta em suas linhas centrais
simultaneamente bifurcações à direita e à esquerda.
Arco destro apresilhado: caracterizado pela presença de uma laçada que
ocorre à direita do observador, assumindo certa semelhança com a “presilha externa”.
Algumas vezes, encontra-se o delta à esquerda do observador, não existindo, porém,
linha interposta entre o delta e a laçada, normalmente esta pseudo laçada está anulada
por um apêndice, não importa a angulação da laçada anulada por um apêndice desde
que tenha uma inflexão perfeita, será considerado sempre um arco apresilhado.
Arco
sinistro apresilhado: Apresenta uma laçada que ocorre à esquerda do observador,
assumindo semelhança com a “presilha interna”. Algumas vezes, encontra-se um delta
à direita do observador, não existindo, porém, linha interposta entre o delta e a laçada
(recurva) (Figura 133).
Subtipos: Presilha Interna
Presilha interna normal: Apresenta um delta à direita do observador. As
laçadas nascem na extremidade esquerda voltando ao lado de origem, sendo mais ou
menos regulares em todo o seu trajeto.
Presilha interna invadida: Apresenta um delta à direita. As laçadas nascem
na extremidade esquerda e, ao atingirem o centro do núcleo, retornam para a origem,
desviando-se da sua trajetória normal, invadindo o seu próprio ramo ascendente.
Presilha interna ganchosa: Apresenta um delta à direita e o núcleo forma uma
curvatura acentuada, voltada para o lado do delta, ou seja, as linhas nucleares
processam uma invasão pela parte inferior do núcleo.
Presilha interna dupla: Apresenta um delta à direita do observador, com dois
núcleos dominados pelo mesmo delta. O núcleo superior assume, geralmente, a
configuração de presilha interna ganchosa (Figura 134).
Subtipos: Presilha Externa
Presilha externa normal: Apresenta um delta à esquerda do observador. As
laçadas nascem na extremidade direita, voltando ao lado de origem, sendo mais ou
menos regulares em todo o seu trajeto.
Presilha externa invadida: Apresenta um delta à esquerda. As laçadas nascem na
extremidade direita e, ao atingirem o centro do núcleo, retornam ao lado de origem,
desviando-se da sua trajetória normal, invadindo o seu próprio ramo ascendente.
Presilha externa ganchosa: Apresenta um delta à esquerda do observador e as
linhas nucleares assumem a configuração descrita para a presilha externa ganchosa,
com a única diferença da direção dessas linhas.
Presilha externa dupla: Apresenta um delta à esquerda do observador e as
linhas nucleares assumem a configuração de dois conjuntos de laçadas com trajetórias
para a direita (Figura 135).
Subtipos: Verticilo
Verticilo circular: É o verticilo que além de possuir dois deltas, à direita e à
esquerda do observador, apresenta no núcleo, um ou mais círculos, completamente
fechado e livre. Não é necessário que a configuração geométrica seja perfeita, tolera-se
no círculo um alongamento máximo de até duas vezes a sua largura. Um alongamento
maior será caracterizado como verticilo ovoide. Não admite apêndices.
Verticilo espiral: É o verticilo em que o núcleo é formado por linhas mais ou
menos regulares, apresentando no núcleo uma ou mais linhas que se desenvolvem em
espiras, considerando-se fundamentalmente a configuração do desenho,
desconsiderando-se a existência de quaisquer apêndices. Permite um alongamento
máximo equivalente a quatro vezes a sua largura, um alongamento maior irá
caracterizar como verticilo ovoidal.
Verticilo ovoidal: É o verticilo que além de apresentar dois deltas, ã direita e à
esquerda do observador, seu núcleo pode ser formado: por uma ou mais linhas ovais
fechadas, e por uma linha que se desenvolve do centro para a periferia dando a
configuração oval. Deverá ser observado um alongamento “maior” que duas vezes a
sua largura.
Verticilo sinuoso: É o verticilo que além de possuir dois deltas, à direita e à
esquerda do observador, o centro de impressão apresenta um núcleo duplo com
prolongamento das linhas entre si, formando a configu
ração de
um “S” que poderá ser perpendicular à prega interfalangiana, inclinado à direita ou a
esquerda ou então na posição mais ou menos horizontal. Deverá ser observada a
configuração do desenho no núcleo, desconsiderando-se os apêndices.
Verticilo duvidoso: É o subtipo de verticilo que não poderá ser incluído nos
demais; não sendo possível descrever o centro do núcleo com exatidão devido a vários
apêndices que anulam a característica do desenho.
Verticilo de bolsa central: É o subtipo de verticilo em que os braços internos
dos deltas não evoluem para o núcleo e traçando uma linha imaginária na direção dos
dois deltas, esta não deve cortar nenhuma das linhas que compõe a região nuclear.
Verticilo de bolsas central direita: É o subtipo de verticilo que possui o delta
direito próximo ao núcleo. Para se distinguir um verticilo de bolsa central direita de
um verticilo simples, basta traçar uma linha imaginária no centro de um delta a outro,
sendo que, o ramo esquerdo do delta que se dirige o núcleo não deve cruzar nem
acompanhar a linha imaginária que pode ser representada pela linha de Galton.
Verticilo de bolsa central esquerda: É o subtipo de verticilo que possui o
delta esquerdo bem próximo ao núcleo e o delta direito bem afastado da zona nuclear.
Para distinguir um verticilo de bolsa central a esquerda, basta traçar uma linha
imaginária no centro de um delta ao outro, sendo que, o ramo direito do delta esquerdo
que se dirige para o núcleo não deve cruzar nem acompanhar a linha imagináriacaracterizada pela linha de Galton da lupa datiloscópica.
Verticilo Ganchoso: Apresenta dois deltas, à direita e à esquerda do
observador e as linhas, nas proximidades do centro do núcleo, formam uma entrada,
dando ao centro desse núcleo a configuração de um grão de feijão. Outras vezes,
encontra-se um terceiro delta ou pseudodelta, onde ocorre a entrada das linhas
nucleares, nas imediações do centro do núcleo.
Classificação das Impressões quanto a Visibilidade
Impressões visíveis
São as impressões ocasionadas pelas cristas papilares untadas de substâncias
corantes, como pós, tintas, sangue, graxa ou outro material que se depositam sobre as
cristas papilares, por exemplo, a tomada dos desenhos digitais sobre papel com tinta
preta, própria para este fim, tendo como objeto a identificação individual civil ou
criminal (Issberner).
Essas impressões podem ser:
• Positivas, onde uma imagem é formada por sulcos de impressões digitais
contaminados com uma substância colorida como sangue ou tinta;
• Negativas, onde as impressões digitais removem o material da superfície,
como poeira e fuligem. É notável que neste tipo de impressão as linhas pretas e as
linhas brancas estarão invertidas;
• Moldadas ou modeladas, criadas pelo contato do dedo com uma substância
maleável (massa de vidraceiro, cera de vela, tinta úmida etc.) que retém uma imagem
tridimensional da impressão.
A impressão é visível desde que haja contraste suficiente entre ela e seu
suporte; pode ser necessário usar iluminação colorida ou indireta para observar
impressões pouco visíveis, bem como algum procedimento de coloração ou tratamento
químico apropriado. Em algumas superfícies de metal, como alumínio e latão (por
exemplo, estojos de cartucho), processos de corrosão podem ocorrer entre o metal e
alguns sais e ácidos no resíduo da impressão digital para produzir uma marca visível.
Impressões moldadas podem ser difíceis de visualizar ou gravar
fotograficamente, e geralmente são necessárias boas técnicas de iluminação
(iluminação oblíqua, por exemplo); pulverização (para melhorar o contraste) ou
enchimento. Silicone fundido, usado para gravar marcas de ferramentas, desde que de
boa qualidade, e executado com habilidade, pode ser empregado com sucesso em
alguns casos (Champod, Lennard e Margot).
Impressões invisíveis ou latentes
São as impressões produzidas pelas secreções dos poros sudoríparos ou das
glândulas sebáceas que umedecendo ou untando as cristas papilares produzem as
impressões invisíveis ou latentes. Para serem analisadas precisam ser submetidas a
processos de revelação com reagentes apropriados, que muito dependem do suporte
onde estão estas impressões. São encontradas frequentemente em locais de crimes,
localizadas em suportes como: vidros, metais polidos, porcelanas, armas e papeis
(Issberner).
A impressão latente é a forma mais comum de evidência de impressão digital e
a que apresenta mais problemas: está presente, mas é invisível. A aplicação de um
tratamento óptico (por exemplo, radiação ultravioleta), físico (por exemplo,
pulverização) ou químico (por exemplo, ninidrina) é necessária para visualizá-la. Aqui
é onde um conhecimento detalhado da secreção humana e do suporte é essencial para
escolher as melhores técnicas para a revelação das impressões digitais, ou seja, as
técnicas que darão a melhor chance de algum resultado positivo (Champod, Lennard e
Margot).
A latente é uma mistura de secreções naturais e contaminantes do meio
ambiente.
Suporte
É a superfície onde a impressão papilar se encontra. Suporte primário é a
superfície onde originalmente se encontrou uma impressão. Suporte secundário é
aquele preparado para receber a impressão transportada do suporte original (Muller).
Poucos estudos consideraram a interação entre a pele, as secreções e o suporte
primário no momento da deposição, ou a interação posterior entre o material
depositado e o suporte, mas os estudos consultados mostram que, quando os dedos
tocam uma superfície sólida, as secreções são transferidas, dependendo de vários
fatores, entre eles:
• Temperatura do suporte, pois o material sebáceo adere melhor a uma
superfície mais fria que o corpo humano;
• Estrutura da superfície;
• Forças eletrostáticas no receptor de impressão.
Os suportes desempenham um papel importante, e, em geral são divididos em
três grupos: poroso, semi poroso e não poroso (Tabela 12). Isto deve ser considerado
antes de se desenvolver qualquer tentativa de revelação de impressões latentes.
Superfícies Não Porosas
Qualquer superfície que não absorva nenhum componente das secreções da
pele é classificada como superfície não porosa. Exemplos clássicos de superfícies não
porosas são sacolas plásticas de polietileno, vidro e superfícies metálicas brilhantes. O
depósito de impressão digital latente permanece no topo da superfície por um período
significativo, a menos que seja removida por limpeza ou tenha se degradado através de
efeitos ambientais. Todas as latentes em substratos não porosa são muito frágeis e
deve-se tomar cuidado ao manusear ou embalar esses itens. Além disso, essas marcas
são prontamente removidas pela ação de solventes orgânicos. Enquanto a água tenderá
a remover qualquer material solúvel em água, o componente insolúvel em água não
será afetado, o que explica, por exemplo, que a umidade, ou mesmo a chuva leve, não
remove totalmente as impressões digitais nas partes externas de um veículo.
Superfícies Porosas
Qualquer superfície que tende a absorver o depósito de impressão digital
latente rapidamente pode ser classificada como uma superfície porosa (por exemplo,
papel). O depósito solúvel em água é absorvido pelas primeiras camadas da superfície
poucos segundos após a deposição, mas a água evapora e deixa um rastro de
aminoácidos, proteínas, gorduras, ureia e cloretos (cloreto de sódio em particular), que
irão produzir a impressão.
A profundidade da penetração do depósito de digitais latentes na superfície
depende muito das condições ambientais, em particular da umidade relativa e do grau
de porosidade da superfície. Uma vez absorvida na superfície, a imagem latente será
relativamente bem preservada em condições normais, não pode ser removida, mas
pode ser facilmente destruída (lavada ou difundida) com água.
À medida que a impressão envelhece, os aminoácidos permanecerão
relativamente estáveis, desde que o substrato poroso seja armazenado em condições
ambientais normais (umidade relativa <80%), entretanto, outros componentes, como a
ureia e o cloreto de sódio, tendem a migrar continuamente, dependendo das condições
ambientais (umidade relativa do ar em primeira instância). Quanto maior a umidade
relativa, mais rápida é a migração. Sob condições normais (umidade relativa <80%), a
difusão mínima será evidente durante a primeira semana após a deposição. Marcas
mais antigas tendem a mostrar difusão significativa de ureia e cloretos, produzindo
imagens borradas com relação a esses componentes.
O depósito não solúvel em água é uma mistura semissólida de gorduras, ceras e
álcoois e permanece mais tempo na superfície do substrato do que os depósitos
solúveis em água. A mobilidade do NWSD (No Water Soluble Deposit) depende
principalmente da temperatura ambiente. A cerca de 20 ° C, a mobilidade é
relativamente lenta e o NWSD permanece no topo da superfície por vários dias. Acima
de 35 ° C, no entanto, a mobilidade aumenta significativamente e o NWSD é
rapidamente difundido. Sob condições normais, uma pequena quantidade de NWSD
permanecerá no topo da superfície por um período significativo (anos). Essa pequena
quantidade não atrai pós de impressão digital, mas pode ser detectada usando técnicas
mais sensíveis, como o uso de reagentes.
Superfícies Semi Porosas
Qualquer suporte com características intermediárias que não se encaixa bem
nos grupos poroso ou não poroso é geralmente classificado como superfície semi
porosa. Exemplos típicos desse tipo de superfície são algumas pinturas, polímeros e
papel encerado. A superfície absorve o componente solúvel

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