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ORGANIZACIONAL E LUIZ CARLOS GONÇALVES L U I Z C A R L O S G O N Ç A L V E S P R O P Ó S I T O O R G A N I Z A C I O N A L E C A P I T A L S O C I A L ISBN 978-65-5821-172-3 9 786558 211723 Código Logístico I000618 Propósito organizacional e capital social Luiz Carlos Gonçalves IESDE BRASIL 2022 Todos os direitos reservados. IESDE BRASIL S/A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br © 2022 – IESDE BRASIL S/A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito do autor e do detentor dos direitos autorais. Projeto de capa: IESDE BRASIL S/A. Imagem da capa: Sudarsan Thobias/shutterstock/Shutterstock - HowLettery/shutterstock - wowomnom/shutterstock - radoma/shutterstock Luiz Carlos Gonçalves Mestre em Administração de Empresas pela Universidade Nove de Julho (Uninove). Pós-graduado em Administração de Empresas pela Universidade São Judas Tadeu (USJT). Graduado em Ciência da Informação pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). Atuou como diretor e gerente nas áreas financeira, administrativa e de recursos humanos e departamento de pessoal. Trabalhou nos diversos ramos da economia nacional (indústria, comércio e serviço público) e em empresas de terceirização de mão de obra. Tem experiência com bons resultados na formação de equipes para projetos de consultoria em serviços terceirizados e de recursos humanos. Atualmente, é o coordenador do MBA em Gestão Empresarial e dos cursos de Gestão e Negócios, Gestão de Marketing, Gestão de Logística e Gestão de Departamento de Pessoal e RH em instituição de ensino privada Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! SUMÁRIO 1 Propósito organizacional 9 1.1 Conceitos básicos 10 1.2 Motivação e propósito em organizações inovadoras 15 1.3 Novas estruturas hierárquicas e modelos de gestão 18 1.4 Governança corporativa e compliance 24 1.5 ESG: governança ambiental, social e corporativa 29 2 Capital social 35 2.1 Capital e responsabilidade social 36 2.2 Empreendedorismo social 41 2.3 Ética nos negócios 45 2.4 Negócios com propósito 50 2.5 Gestão de pessoas em negócios inovadores e com propósito 54 3 Propósito e cultura organizacional 62 3.1 Integração do propósito com a cultura organizacional 63 3.2 Assimilação do propósito organizacional pelos colaboradores 68 3.3 Diversidade e inovação 73 3.4 Equilíbrio entre trabalho e vida pessoal (QVT) 79 3.5 Benefícios para clientes, colaboradores e sociedade 83 4 Estratégias para negócios sociais 90 4.1 Planejamento e elaboração de projetos sociais 91 4.2 Financiamento de projetos sociais 97 4.3 Sustentabilidade e boas práticas de gestão 103 4.4 Gestão do voluntariado 108 5 Inclusão digital em negócios sociais 115 5.1 Direito de acesso das pessoas ao universo digital 116 5.2 Mundo digital e humanidade 121 5.3 Inteligência artificial como ferramenta de inclusão social 128 5.4 Casos de sucesso 133 Resolução das atividades 142 Agora é possível acessar os vídeos do livro por meio de QR codes (códigos de barras) presentes no início de cada seção de capítulo. Acesse os vídeos automaticamente, direcionando a câmera fotográ�ca de seu smartphone ou tablet para o QR code. Em alguns dispositivos é necessário ter instalado um leitor de QR code, que pode ser adquirido gratuitamente em lojas de aplicativos. Vídeos em QR code! Este livro divide-se em cinco capítulos sobre propósito organizacional e capital social, tendo o propósito organizacional a finalidade de identificar e declarar a razão pela qual uma corporação existe e qual o seu papel para a sociedade em que se encontra inserida, e o capital social entendido como um componente fundamental para a construção do relacionamento institucional com a comunidade. Tal relacionamento tem como base os valores sociais envolvidos, considerados importantes para a humanidade. São aspectos que vão além dos resultados financeiros e econômicos dos empreendimentos empresariais. Então, além da necessidade inerente de se obter lucro (resultados financeiros e econômicos), as organizações contemporâneas encontram-se também pressionadas pelo mercado consumidor, visto que seus clientes cada vez mais demonstram suas preocupações com os aspectos relacionados às questões sociais e ambientais. Como forma de responder a essas novas exigências, as corporações passaram a desenvolver ações visando atender aos anseios do público consumidor, e com o passar do tempo foram percebendo a importância de se ter um propósito alinhado com as expectativas do mercado relacionadas ao capital social e ambiental. É disso que se trata esta obra em que são abordados os conceitos, as ações e os impactos positivos da adoção de estratégias empresariais que englobam a declaração do propósito organizacional e o capital social. Para tanto, o Capítulo 1 trata sobre o propósito organizacional, apresentando os seus principais conceitos, os pontos de relação entre a motivação dos trabalhadores e o propósito organizacional, a evolução das estruturas hierárquicas e dos modelos de gestão para adequação aos mercados, à legislação, e ao atendimento das exigências dos trabalhadores. Também são descritos os conceitos sobre governança corporativa e o índice ESG, que engloba o respeito ao meio ambiente (environmental), as questões sociais (social) e a adoção do compliance (governance). APRESENTAÇÃOVídeo 8 Propósito organizacional e capital social No Capítulo 2 discorre-se sobre o capital social e os impactos que o surgimento da visão inovadora acerca da responsabilidade e capital social trouxeram para o ambiente de negócios. Depois se descreve os conceitos a respeito do empreendedorismo social, e na sequência são tratadas as questões relacionadas à ética e aos seus impactos sobre as estratégias empresariais e o ambiente interno de trabalho. Neste capítulo também se estuda os novos negócios com propósito social, bem como as ações envolvidas na gestão de pessoas dentro dos novos ambientes e filosofias de trabalho. Já o Capítulo 3 está relacionado ao propósito e cultura organizacional, em que se analisa as etapas de integração do propósito organizacional com relação à cultura organizacional, além de descrever o processo de assimilação pelos colaboradores do propósito da organização, conhecendo os aspectos atuais com relação à diversidade e às inovações nos ambientes empresariais e entendendo como o propósito colabora para a melhoria da qualidade de vida no trabalho. Ainda são identificados os principais benefícios que o propósito organizacional traz para determinados grupos de stakeholders (clientes, colaboradores e sociedade). O Capítulo 4 é dedicado às estratégias para negócios sociais, com a finalidade de compreender como eles podem ser planejados e executados por meio de projetos consistentes. Também se busca identificar as principais fontes para o financiamento de projetos sociais, além de conhecer as principais ações para a sustentabilidade dos negócios sociais, bem como boas práticas de gestão adotadas por organizações de sucesso. Ao final deste capítulo, são apresentadas as formas para a gestão dos voluntários que atuam ou pretendem atuar com esse tipo de atividade social. Finalizando, tem-se o Capítulo 5 que discorre sobre a inclusão digital em negócios sociais, com intuito de aprender acerca da legislação vigente que rege o acesso ao universo digital e entender os reflexos que as mudanças provocadas pela tecnologia têm causado na vida das pessoas, alémde estudar os principais usos da inteligência artificial (IA) e seus benefícios. Por último, são apresentados casos de organizações que atingiram o sucesso dentro do mundo dos negócios sociais. Os casos estudados demonstram o impacto positivo dos projetos que envolvem o propósito organizacional e o capital social, destacando-se que tais filosofias de trabalho devem ser compartilhadas pelas corporações, seus colaboradores e demais stakeholders visando ao crescimento e ao desenvolvimento de toda a nossa sociedade. Propósito organizacional 9 1 Propósito organizacional Toda organização, independentemente do seu tamanho (peque- na, média ou grande) ou da sua natureza (pública, privada, mista etc.), é criada com um propósito, cuja finalidade é concentrar o foco das ações corporativas para o alcance dos objetivos estratégicos, além de identificar o papel que a organização desempenha dentro da socieda- de, indicando a razão pela qual ela existe. Não é fácil, para uma organização, declarar de modo assertivo o propósito da sua atuação, pois para isso é preciso identificar os im- pactos que a corporação causa na sociedade, além de conhecer bem quais são os diferenciais que seu trabalho tem. Considera-se também importante que o propósito declarado não seja apenas uma peça de marketing, mas que esteja amparado nos reais valores e nas crenças defendidos e praticados pela organização no seu dia a dia. Todos esses elementos relacionados ao propósito organizacional constituem-se em uma forma contemporânea de atuação empresa- rial que acaba por impactar e transformar o ambiente de negócios no entorno da corporação. Essa nova visão no desenvolvimento das ações empresariais é discutida neste capítulo por meio da apresentação dos principais conceitos sobre o propósito organizacional e aqueles referentes aos pontos de relação entre a motivação dos trabalhadores e o propósito organizacional. Além disso, são discutidos a evolução das estruturas hierárquicas e dos modelos de gestão para adequação aos mercados, a legislação e o atendimento das exigências dos trabalhadores. Ao final do capítulo, são descritos os conceitos sobre governan- ça corporativa e os índices ESG, que englobam o respeito ao meio ambiente (Environmental), as questões sociais (Social) e a adoção do compliance (Governance). 10 Propósito organizacional e capital social Com o estudo deste capítulo, você será capaz de: • conhecer os principais conceitos sobre propósito organizacional; • reconhecer os pontos de relação entre a motivação dos trabalha- dores e o propósito organizacional; • estudar a evolução das estruturas hierárquicas e dos modelos de gestão para a adequação das empresas; • assimilar conceitos sobre governança corporativa e compliance; • compreender o funcionamento do índice ESG. Objetivos de aprendizagem 1.1 Conceitos básicos Vídeo Uma organização nasce a partir da idealização e do esforço de uma ou mais pessoas – os empreendedores –, cuja participação é es- sencial na definição inicial da proposta de valor que a organização apresenta ao mercado e de qual será a função social da companhia, que pode produzir bens (duráveis, de consumo etc.), prestar serviços sociais para empresas e famílias, entre outras. À medida que a organização se desenvolve, faz-se necessária a parti- cipação de novos colaboradores e gestores para atender às demandas do mercado, o que envolve a distribuição do poder de decisão interno. Surge, então, a distribuição das responsabilidades dentro da hierar- quia organizacional, com destaque para os cargos da alta direção, que detêm a maior poder de decisão e têm participação direta e decisiva nas diretrizes éticas e na confirmação dos valores e crenças da corpora- ção, os quais definem as normas e os procedimentos a serem seguidos nas ações da liderança, dos colaboradores e dos demais stakeholders (HITT; IRELAND; HOSKISSON, 2005). Todas as diretrizes definidas pela alta direção têm por base a cultu- ra organizacional, que, por meio dos seus valores e crenças, traduz a maneira peculiar pela qual a empresa conduz os seus negócios e que a diferencia dos demais concorrentes do mercado (GONÇALVES, 2021). Propósito organizacional 11 A cultura organizacional representa a identidade da organização e está diretamente ligada à sua imagem e ao modo como a corporação interage com o seu ambiente e todos os stakeholders (GONÇALVES, 2021). Uma das principais diretrizes definidas pela alta direção refere-se à adoção da filosofia de trabalho que validará o propósito organizacio- nal. Comumente se entende o propósito de uma corporação somente pela visão financeira, cuja finalidade é gerar valor expresso na forma de dinheiro ou ativos semelhantes, tanto para o custeio das operações quanto para reinvestir no próprio negócio, além do retorno aos acionis- tas como lucro sobre o seu investimento inicial. Entretanto, quando se fala sobre propósito organizacional na atua- lidade, existem outras preocupações relacionadas aos requisitos da responsabilidade social empresarial, que são os resultados sociais e ambientais, além dos já tradicionais resultados financeiros. Fazer com que a corporação atenda aos requisitos da respon- sabilidade social empresarial exige o envolvimento de toda a cadeia de valor da empresa, que, segundo Hitt, Ireland e Hoskisson (2005, p. 120), trata-se de “um modelo utilizado para se entender a posição da empresa em custos e também para se identificar quais meios serão An dr ii Ya la ns ky i/S hu tte rs to ck An dr ii Ya la ns ky i/S hu tte rs to ck 12 Propósito organizacional e capital social empregados para facilitar a implementação da estratégia comercial, segmentando-se em atividades primárias e atividades de apoio”. É a busca pelo desenvolvimento sustentável, que, conforme a des- crição do documento Nosso Futuro Comum, conhecido também como Relatório Brundtland (CMMAD, 1988, p. 46), “é aquele que atende às ne- cessidades do presente sem comprometer a possibilidade de gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades”. Essa definição é consagrada internacionalmente e reafirmada pelas lideranças que par- ticiparam da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (ECO-92), realizada no Rio de Janeiro, em 1992. Para Mackey e Sisodia (2018), as empresas devem exercer as suas atividades por meio do capitalismo consciente que pressupõe definir objetivos e metas considerando a evolução da humanidade, ou seja, a empresa se guia por um propósito maior combatendo a pobreza e gerando prosperidade para todos. Teixeira (2015) corrobora Mackey e Sisodia (2018) ao afirmar que existe um movimento no mundo empresarial de transformação da livre-iniciativa, no qual diversos empreendedores estão adotando práticas conciliatórias entre a obtenção de lucros e a justiça social, con- trabalanceando a competição com a espiritualidade e a eficiência com o bem-estar. A adoção de ações que equilibram a obtenção de lucros com a justi- ça social dentro das relações comerciais também é a base para a teoria do comércio justo, que se trata, fundamentalmente, da não exploração do produtor pelo comprador, pagando pela mercadoria um preço justo que possibilite a sustentabilidade de toda a cadeia de valor por meio de melhores condições comerciais e benefícios para todos, prevalecendo o equilíbrio entre os interesses do comprador e os do fornecedor. Essa maneira de agir das organizações traz em si a responsabilidade social objetivando a formação de uma consciência social e do dever cí- vico, constituindo-se não de uma ação individual (MELO NETO; FRÓES, 2001), mas sim de ações baseadas na ética, obedecendo a rigorosos valores morais. O propósito organizacional é a diretriz para as empresas que bus- cam sintonia com os mercados consumidores, pois expressa o real mo- tivo da existência da corporação e destaca a forma diferenciada com O livro Capitalismo cons- ciente: o espírito heroico dos negóciosobjetiva proporcionar conheci- mento sobre a teoria do capitalismo consciente e seus quatro princípios, que se baseiam no propó- sito maior, na integração com os stakeholders, em uma liderança consciente e, por último, na cultura e gestão consciente, tudo com o objetivo de que a humanidade tenha um futuro mais humano e las- treado pela cooperação. MACKEY, J.; SISODIA, R. Rio de Janeiro: Alta Books, 2018. Livro Propósito organizacional 13 que a companhia atua para criar valor para si e para seus clientes, co- laboradores, parceiros comerciais, investidores, comunidade e para o meio ambiente, agregando ainda mais valor para a marca (MACKEY; SISODIA, 2018). É o propósito que distingue uma empresa dos demais competidores dentro do seu mercado de atuação, e sua duração de longo prazo inde- pendente do ciclo estratégico pelo qual a corporação estiver passando. O propósito difere da missão, já que esta determina o que a corpora- ção faz e quais ações no nível tático serão empregadas para que os objetivos da atuação sejam atingidos. Assim, a missão pode mudar de- pendendo da necessidade estratégica momentânea, mas o propósito definido continua a ser válido. Também ouvimos falar sobre visão e valores. A visão contém a de- claração da companhia de aonde ela quer chegar no futuro, é a sua visão para os dias que virão, sendo geralmente definida para os próxi- mos cinco ou dez anos. Já os valores se relacionam com aquilo que a corporação defende e considera ideal sob o ponto de vista ético e mo- ral. São os valores que ditam quais são os comportamentos esperados dos seus representantes e colaboradores e que direcionam as decisões tomadas pela empresa. Sinek (2018) afirma que toda organização sabe o que faz (what) e que algumas sabem como fazem para compor a sua proposta de valor diferenciada para o mercado (how), mas poucas sabem o porquê da sua atuação (why), destacando que o porquê não se refere a ter lucro, o qual ele classifica como resultado, mas sim a saber qual é o seu propó- sito, a razão de a sua organização existir. Com base nessas afirmações, o autor criou o círculo dourado (Figura 1), no qual indica que a comunicação de uma corporação com o mercado deve ocorrer de dentro para fora, não como normalmen- te acontece – de fora para dentro. Para Sinek (2018), as companhias fazem negócios com pessoas que acreditam no seu propósito e não com pessoas que precisam dos seus produtos ou serviços. O autor afirma também que a comunicação sendo feita de dentro da organi- zação para fora, expressando o seu propósito, é mais efetiva para a compra, já que afeta a parte do cérebro humano que controla o com- portamento e as decisões intuitivas, além de envolver sentimentos como confiança e lealdade. No vídeo Simon Sinek: como grandes líderes inspiram ação, publicado no canal TED, Sinek apre- senta a sua ideia sobre como um propósito bem definido e comunicado ao mercado de modo eficien- te faz com que pessoas que acreditam nos valores e nas crenças de uma empresa se transformem em clientes. Disponível em: https:// www.youtube.com/ watch?v=qp0HIF3SfI4. Acesso em: 12 ago. 2022. Vídeo https://www.youtube.com/watch?v=qp0HIF3SfI4 https://www.youtube.com/watch?v=qp0HIF3SfI4 https://www.youtube.com/watch?v=qp0HIF3SfI4 14 Propósito organizacional e capital social Figura 1 Círculo dourado A comunicação sobre o propósito deve ser de dentro da organização para fora (mercado). Why: poucas corporações sabem o porquê da sua existência, a maioria desconhece o seu propósito. W ha le D es ig n/ Sh ut te rs to ck How: algumas organizações sabem como obter seus produtos ou serviços. What: toda organização sabe o que faz (produtos ou serviços). Fonte: Elaborada pelo autor com base em Sinek, 2018. Possuir um propósito organizacional traz benefícios para a corporação, uma vez que aumenta a aderência do consumidor à organização, fidelizan- do a marca. Outro público que se busca engajar são os colaboradores, cujo processo de adesão envolve o alinhamento das expectativas e dos propósi- tos pessoais aos da organização. A adesão dos colaboradores gera uma maior motivação, o que propi- cia um ambiente mais agradável e saudável, além de direcionar o foco das atividades da força de trabalho na busca por resultados acima da média do mercado, os quais se traduzirão em resultados financeiros sustentáveis para que a corporação possa planejar o seu futuro. Sensação de pertencimento, paixão pelo que faz, entusiasmo, encontrar sentido no trabalho, ter consciência coletiva sobre responsabilidades e ob- jetivos, disponibilidade para a colaboração e aumento da produtividade são itens comuns em processos que obtiveram sucesso quanto ao engajamen- to das pessoas com relação aos propósitos organizacionais. Propósito organizacional 15 1.2 Motivação e propósito em organizações inovadorasVídeo A motivação das pessoas que trabalham para uma organização con- siste em um dos mais complexos desafios que as corporações vêm en- frentando nas últimas décadas, pois influi diretamente na produtividade. Por isso, as companhias dão preferência a uma boa cultura organizacio- nal, com base em valores positivos, a fim de motivar os trabalhadores. A preocupação e os cuidados do relacionamento com os trabalhadores extrapolam os limites internos da organização, sendo causa de preocu- pação inclusive dos consumidores, fato confirmado pela pesquisa Global Marketing Trends (DELOITTE, 2020), realizada nos Estados Unidos, Reino Unido, China e Brasil. Ela aponta que 28% dos respondentes indicaram que a forma como uma empresa trata os seus colaboradores está entre os principais itens analisados ao se tomarem decisões sobre marcas. Existem diversas estratégias e ferramentas que podem ser usadas para a formulação de políticas e práticas que motivem a força de tra- balho, e as boas práticas conhecidas do mercado indicam que a parti- cipação ativa da alta gestão é necessária nessa etapa de definição das políticas para a gestão das pessoas. As decisões dos gestores devem levar em conta não só os aspectos que interessam à corporação, mas precisam incluir as necessidades e os desejos dos trabalhadores, pois um dos elos fortes da motivação se concentra no alinhamento das expectativas e dos propósitos pessoais dos trabalhadores aos propósitos da organização. A motivação da força de trabalho, influenciada pelo propósito organizacional e pelas demais políticas da corporação, necessita da percepção por parte dos colaboradores de que aquilo que a corpo- ração divulga e defende é verdadeiro, ou seja, os valores e crenças organizacionais estão presentes nas ações cotidianas desenvolvidas internamente, o que gera confiança e segurança para os trabalhadores. Muitas empresas conseguem transmitir aos seus colaboradores as normas e os procedimentos internos, assim como o seu posi- cionamento de mercado, ou quais serão os produtos e serviços a serem entregues, como será a negociação com os clientes, qual é o 16 Propósito organizacional e capital social conteúdo das campanhas publicitárias etc., mas nem todas obtêm sucesso quando se trata de transmitir o propósito organizacional. Para que o propósito esteja claro, tem de haver a identificação plena das pessoas com o que a empresa entende ser a sua razão de existir. Como define Sinek (2018), as pessoas que acreditam no propósito das empresas para as quais trabalham estão dispostas a entregar mais do que aquilo que são pagas para fazer, pois elas trabalham não só pela companhia, mas também por elas e pelas suas crenças e valores. A declaração do propósito organizacional motiva pessoas cujos ideais se assemelham aos da sua corporação. Por vezes, trabalhar em algo em que se acredita pode ser tão motivador quanto incentivos fi- nanceiros. Isso tem relação com a satisfação pessoal de cada um no que Maslow (2017) classifica como a necessidade humana de autoestima. Considerando a autoestima pessoal, quando a organização temuma boa reputação no mercado, seus trabalhadores se sentem orgulhosos de pertencer ao quadro funcional e de colaborar para que a imagem corporativa se fortaleça. Além disso, o orgulho de pertencer a uma cor- poração que também possui um propósito leva a uma maior produti- vidade, ao aumento do nível de performance e a uma maior qualidade de produtos e serviços, o que se reflete no ambiente externo da com- panhia, dando maior credibilidade aos negócios. O trabalhador se importa com os resultados obtidos, sabe da sua res- ponsabilidade e da importância da sua participação para o alcance dos objetivos organizacionais, e o reconhecimento da sua boa atuação por meio de liderança ou oferecimento de uma oportunidade para o cresci- mento profissional e pessoal lhe dá certo prestígio junto ao seu grupo de trabalho e grupo social, além de inspirá-lo para enfrentar novos desafios. Além da inspiração e do sentimento de orgulho, uma postura enga- jada do trabalhador envolve a paixão por uma causa; nesse caso, por aquilo faz, ou seja, quando se identifica e gosta das tarefas que execu- ta, tendo consciência da sua responsabilidade e da importância da sua função, ele encontrou o seu propósito no trabalho. Todos esses aspectos melhoram a percepção do trabalhador sobre o valor que a sua atuação tem, desenvolvendo, por meio desse ponto, vínculos internos baseados em confiança e colaboração, o que fortalece ainda mais o seu engajamento na empresa e aumenta a sua produtivida- de. Esse fato é constatado na pesquisa People on a mission (Pessoas em O vídeo Creating a sense of purpose in the workplace, publicado no canal de Jacob Morgan, aborda a origem e a criação do propósito organizacional, discursando sobre a responsabilidade com- partilhada por empresa e trabalhador atuando com uma nova maneira de pensar para chegarem a um propósito comum. O vídeo está em inglês, mas é possível automatizar as legendas para português nas configurações. Disponível em: https:// www.youtube.com/ watch?v=rDcygfKpWo8. Acesso em: 12 ago. 2022. Vídeo https://www.youtube.com/watch?v=rDcygfKpWo8 https://www.youtube.com/watch?v=rDcygfKpWo8 https://www.youtube.com/watch?v=rDcygfKpWo8 Propósito organizacional 17 uma missão) (KORN FERRY INSTITUTE, 2016), a qual mostra que 93% dos entrevistados estavam de acordo com a afirmação de que o engajamen- to com relação ao propósito de uma organização aumenta a produtivi- dade dos trabalhadores. De acordo com a pesquisa Sustainability Leaders (Líderes em susten- tabilidade) (GLOBESCAN, 2016), realizada nos cinco continentes, sobre o que impulsiona a reputação de uma corporação, foi constatado que, na opinião de 37% dos pesquisados, empresas que possuem um propósito integrado ao seu negócio também possuem as marcas mais reconheci- das pelo mercado, pois buscam alinhar suas estratégias a questões de sustentabilidade por meio da sua cultura (crenças e valores). Muitas organizações inovadoras declaram seus propósitos e aca- bam encontrando trabalhadores e consumidores que se identificam, de fato, com a razão de ser da corporação. Alguns exemplos disso são: • Amazon: oferecer aos clientes os menores preços possíveis, a melhor seleção disponível e o maior conforto; • Disney: fazer as pessoas felizes; • Google: organizar as informações do mundo e torná-las univer- salmente acessíveis e úteis; • iFood: alimentar o futuro do mundo, promovendo mudanças e impactando positivamente a sociedade. Kotter e Heskett (2011) alertam para o fato de que uma cultura organizacional forte precisa ser atualizada para evitar o risco de se tornar arrogante e isolada do contexto exterior. Empresas vence- doras em determinada época precisam inovar, eliminando culturas insalubres, adotando novas visões e estratégias mais adaptativas que atendam aos novos anseios do mercado consumidor e às de- mais exigências de ambientes de negócios altamente competitivos. Os autores destacam, ainda, a necessidade da preparação constan- te da liderança para que, por meio da atualização da sua cultura e da declaração de propósitos, possa adequadamente motivar os colabora- dores a fim de que conjuntamente atendam aos demais stakeholders (clientes, acionistas, fornecedores etc.). Morgan (2014) afirma que o mundo do trabalho está mudando ra- pidamente e que tais mudanças impactam tanto as lideranças quanto os demais colaboradores, bem como exigem adaptações nas estru- 18 Propósito organizacional e capital social turas das empresas que, para reagirem positivamente a tudo isso, necessitam se adaptar aos novos cenários construindo ambientes de trabalho que contem com pessoas leais, engajadas e inspiradas. Para o autor, o futuro do trabalho quebra paradigmas antigos, levando as organizações, seus gestores e colaboradores a analisar me- lhor qual o é impacto das atividades de cada um para a obtenção dos resultados corporativos. É preciso, portanto, que as pessoas tenham uma atuação relevante dentro das corporações que vivenciam esse ambiente de negócios em rápida transformação. Em suas palestras, Morgan (2022) discute a origem do senso de propósi- to, questionando se ele depende somente da empresa ou se o colaborador também tem responsabilidades nesse processo. A questão principal é se a empresa deve providenciar tudo para motivar o colaborador ou se ele deve já ter em si próprio um propósito definido. Para o autor, cabe à empresa conectar o que o funcionário faz com o impacto das ações na organização, na comunidade e nos demais entes que se relacionam com a corporação. Já o trabalhador não deve imaginar que a empresa irá mimá-lo ou providenciar tudo o que é necessário para realizar suas tarefas com impacto. É preciso saber que existirão problemas, situações inesperadas e desafios a serem vencidos. Segundo Morgan (2022), o colaborador deve ter uma nova for- ma de pensar, mais aberta e disposta, que inclua a disposição para colaborar e fazer a diferença no ambiente de trabalho. A combi- nação das ações positivas da empresa com a disponibilidade do colaborador possibilitará a conexão do trabalho realizado com os impactos que este causa, criando, assim, um propósito comum. 1.3 Novas estruturas hierárquicas e modelos de gestãoVídeo As transformações nas formas e nos modelos do trabalho não são novas. Durkheim (2010), em seus estudos sobre a Revolução Industrial, já observava as profundas reformulações na organização do trabalho ocorri- das em razão da grande quantidade de invenções que ampliaram as possi- bilidades da produção de bens. Essas inovações alteraram a estrutura social e empresarial, com reflexos ainda presentes hoje (CHIAVENATO, 2021). Propósito organizacional 19 Durkheim (2010) identificou que, quanto mais complexa era a corporação ou a sociedade, maior era também a divisão do traba- lho e a especialização das tarefas. Na atualidade, as transforma- ções ocorrem em um ritmo muito acelerado, aumentando a complexidade e, consequentemente, os desafios das corporações. Tais impactos oriundos do ambiente externo obrigam as empre- sas a se modernizar constantemente, e a estrutura organizacional faz parte dos itens a serem modernizados. Esse fator leva a novos mode- los de estruturas e de gestão, tudo visando à reorganização do tra- balho interno para que as corporações se mantenham competitivas. A estrutura organizacional inclui os processos desenvolvidos pela companhia, a distribuição das responsabilidades e a divisão das tarefas a serem executadas, podendo ser representada por um organograma. O modelo clássico de estrutura organizacional se caracteriza pela distribuição hierárquica das responsabilidades em departamentos, car- gos e tarefas. A gestão tem o trabalhador como um ser de ação individual e de motivação econômica, ou seja, que se motiva com incentivos mate- riais e salariais. Nessa gestão, os conflitos são ignorados, assim como os problemas e as necessidades das pessoas. O objetivo maior nesse tipo de estrutura é a obtenção de resultadoscom a máxima eficiência. fo to ge st oe be r/ Sh ut te rs to ck fo to ge st oe be r/ Sh ut te rs to ck 20 Propósito organizacional e capital social Chiavenato (2014, p. 19-20) destaca que, nesse modelo, gerir pessoas é uma responsabilidade de linha e uma função de staff. Trata-se de uma responsabilidade indelegável de cada executivo ou líder dentro da organização. [...] O presidente da organização é responsável pela equipe de diretores que se re- portam diretamente a ele; cada diretor é responsável pela equi- pe de gerentes que se reportam diretamente a ele; cada gerente é responsável pela equipe de supervisores que se reportam dire- tamente a ele, e assim por diante. A Figura 2 ilustra o organograma padrão que representa esse tipo de estrutura. Níveis hierárquicos Áreas de atuação Cargo Responsabilidade Autoridade Figura 2 Modelo clássico Fonte: Chiavenato, 2014, p. 175. Chiavenato (1983, p. 191) ressalta que “cada empresa tem a sua pró- pria organização em função dos seus objetivos, do seu tamanho, da conjuntura que atravessa e da natureza dos produtos que fabrica ou dos serviços que presta”, e assim existem outras formas de estruturas, como a funcional, ainda em formato linear e vertical, mas que se ca- racteriza pela divisão da empresa por áreas de especialização. Há também o modelo linear por responsabilidade, no qual a divi- são ocorre pela identificação de quem é o responsável por um determi- nado processo. Esse responsável pode acionar e dirigir trabalhadores de outras áreas que sejam necessários para a entrega do produto ou serviço sem estar preso à estrutura hierárquica. Propósito organizacional 21 Outro tipo de arranjo para a estrutura organizacional é o modelo ma- tricial, no qual predomina a divisão por grupos de trabalho definidos por suas qualificações técnicas e que são compostos por projeto ou por tempo determinado. Embora existam vantagens nos modelos apresentados, reforça-se que cada empresa necessita encontrar o que melhor lhe atenda sob o ponto de vista estratégico, já que nos modelos descritos até aqui estão presentes as dificuldades no fluxo das informações e na pouca flexibilidade que a es- trutura de comando linear permite, o que acarreta a demora em tomadas de decisões importantes para acompanhar o mercado. Atualmente, as empresas adotam estruturas mais flexíveis que focam os processos e os clientes, não as estruturas em si. Segundo Chiavenato (2014, p. 34), “os cargos e as funções passam a ser definidos e redefinidos em razão das mudanças no ambiente e na tecnologia, os produtos e serviços passam a ser continuamente ajustados às deman- das e às necessidades dos clientes”. Mintzberg (2010) afirma que a estrutura organizacional deve ser di- nâmica, indo além da hierarquia e do controle, evitando o excesso de formalização, descentralizando o processo de decisão e dando maior importância para as inter-relações das pessoas e foco no negócio. Para o autor, a estrutura organizacional é composta por seis forças: cúpu- la estratégica, linha intermediária, núcleo operacional, tecnoestrutura, assessoria de apoio e ideologia. A cúpula estratégica administra e define as diretrizes para o atingi- mento das metas e dos propósitos organizacionais, representando os acionistas (investidores). A linha intermediária trata-se do grupo de gerentes, coordenadores, supervisores etc. que compõem a liderança responsável por conectar as estratégias definidas pela cúpula estraté- gica com o núcleo operacional, que se refere às pessoas que realizam as operações de produção ou de entrega de um serviço. A tecnoestrutura é o nível que elabora regras e desenvolve processos a serem seguidos, inclusive os relacionados a tecnologias, tudo com a finalidade de fazer a empresa funcionar e alcançar os resul- tados positivos para poder prosperar e continuar a existir. A assessoria de apoio são todas as pessoas que colaboram com a empresa, mas não estão diretamente ligadas à produção/operação. Por fim, a ideolo- gia refere-se ao propósito, às crenças e aos valores que direcionam as 22 Propósito organizacional e capital social ações da corporação na condução dos seus negócios e que a diferen- ciam em seu mercado. Mintzberg (2010) descreve, ainda, alguns tipos de estruturas que existem nas corporações contemporâneas. A estrutura simples é mais comum em empresas de pequeno porte onde há pouca padronização, o comando é feito em obediência à hie- rarquia (proprietário, diretor, gerente etc.), a ênfase está no controle e, quando existe uma estratégia, esta é desenvolvida de maneira informal e pessoal pelo dono do negócio, sendo menos complexa. Sua principal vantagem está no comando direto da liderança sobre os colaboradores. A burocracia mecanizada foca a divisão do trabalho e a operação/ produção. Essa estrutura padroniza os processos de trabalho e as roti- nas, administra os conflitos internos, incentiva a interação entre a cúpula estratégica e o núcleo operacional – alimentando com informações a li- nha intermediária a fim de visar à melhoria contínua dos processos – e facilita a inter-relação entre a tecnoestrutura e o nível operacional. A estrutura missionária é baseada na ideologia e no envolvimento de que todos os integrantes da organização devem partilhar da mesma ideolo- gia. As principais características desse tipo de estrutura são o job rotation (ro- tatividade das pessoas pelas tarefas) e um processo de tomada de decisão compartilhado com a participação dos colaboradores. No entanto, é pouco utilizada nas empresas. A forma divisionalizada se assemelha à estrutura funcional em que departamentos autônomos respondem a uma administração cen- tral. As divisões podem ser geográficas, por tipo de negócio, por nicho de cliente, por linha de serviços ou produtos, entre outros aspectos. Na burocracia profissional, o foco está na capacitação profissional (trei- namento e desenvolvimento das capacidades) e na especialização para rea- lizar tarefas complexas. Também há a tomada de decisão descentralizada. A base da adhocracia está em saber lidar com projetos descentra- lizados e não permanentes conduzidos por equipes multidisciplinares que colaboram entre si. É muito usada em empresas que precisam lidar com produtos e serviços temporários que necessitam de mui- ta flexibilidade e adaptações. Requer trabalhadores com habilidades complementares preparados para lidar com problemas complexos, importantes ou urgentes. É um tipo de estrutura orgânica, com pouca O livro Estrutura dinâmica das organizações leva ao educando informações e análises realizadas pelo autor sobre como as empresas compõem suas estruturas organizacio- nais, que são dinâmicas e situacionais, ou seja, res- pondem aos estímulos do mercado e aos desafios que encontram. MINTZBERG, H. 4. ed. Lisboa: Dom Quixote, 2010. Livro Propósito organizacional 23 formalização, papéis pouco definidos, processos informais e ampla li- berdade para o trabalho. Além dos tipos de estruturas organizacionais já citados (modelos clássi- co, funcional, linear por responsabilidade e matricial), é possível categorizar outros conforme o modelo de gestão de pessoas adotado pela corporação. A gestão democrática/participativa/colaborativa facilita o acesso dos colaboradores aos gestores, incentivando a colaboração e a participa- ção das pessoas e equipes na melhoria dos processos, produtos e servi- ços. As estratégias e decisões são definidas de modo compartilhado entre liderança e trabalhadores. A gestão por conhecimento/desenvolvimento concentra seus esforços no desenvolvimento técnico e pessoal dos indivíduos e das equipes para que possam atuar com autonomia e assertividade. A gestão por meritocracia se baseia na análise e premiação das pes- soas pelos seus méritos (resultados obtidos e comportamento emocional- mente inteligente), que são obtidos em razão dos esforços empregados e das competências que possuem (conhecimento, habilidades e atitudes).Na gestão por empoderamento, a empresa motiva e fortalece seus trabalhadores delegando a eles autoridade para que tomem suas pró- prias decisões, pois assim dispõem de maior autonomia e participação na administração organizacional, assumindo maior responsabilidade. Dentro desse modelo, o trabalhador tem maior liberdade. A gestão por tecnologia/tecnológica busca o desenvolvimento de soluções com base em tecnologias de ponta e que exigem equipes mul- tidisciplinares e em constante aprendizado e desenvolvimento. Os rela- cionamentos são incentivados para que sejam transparentes, embora sejam competitivos e busquem sempre a alta performance. Os resulta- dos devem ser assertivos. Dificilmente se encontrará um modelo puro de gestão. O mais comum é que existam características de outros modelos naquele predominante. Embora as organizações vencedoras da atualidade trabalhem com uma estrutura que privilegia a formação de equipes colaborativas, au- tossuficientes, emponderadas e prontas para lidar com os desafios das inovações tecnológicas dentro de processos mais democráticos e participativos (CHIAVENATO, 2010), é importante considerar que são necessárias pessoas competentes para trabalhar nas organizações. 24 Propósito organizacional e capital social Para Chiavenato (2014, p. 375), é preciso executar o trabalho, atender ao cliente, focar metas e resultados a alcançar e, sobretudo, aculturar-se e seguir as regras da orga- nização. Isso significa uma considerável dose de adaptação e in- tegração das pessoas ao contexto da organização, à arquitetura organizacional, cultural, ao estilo de gestão e ao tipo de trabalho. O que não costuma ser fácil. Se cada pessoa é única e singular, tam- bém cada organização o é. Cada organização tem um estilo pró- prio de gestão e pressuposições a respeito da natureza humana. A adoção de um propósito ajuda as organizações a unir sua força de tra- balho focando seus esforços no atendimento do cliente, nos demais aspec- tos importantes e, consequentemente, na obtenção de resultados positivos e acima da média. 1.4 Governança corporativa e complianceVídeo A princípio, a atividade empresarial tem a finalidade básica de gerar resultados financeiros por meio da eficiência dos seus processos e da redução dos custos para maximizar a sua margem de lucro. Essa parece ser uma função simples, mas na verdade requer conheci- mento do negócio e uma gestão eficaz, que, por sua importância para a sobrevivência e imagem da organização, deve incluir ferramentas e boas práticas de controle. O conjunto de boas práticas pode ser chamado de governança corpo- rativa, que se refere à filosofia adotada pela empresa com base na sua cultura organizacional. É a maneira pela qual a corporação prepara a sua estrutura para realizar a parte prática dos con- troles e das adequações à legislação e aos demais regulamentos. A governança também cuida da relação com os stakeholders internos – acionistas, conselho administrativo, diretores etc. – e externos – órgãos governamentais de fiscalização e controle e agentes privados de certificação ou controle de terceira parte. th od on al 88 /S hu tte rs to ck Propósito organizacional 25 Para Silveira (2021), a governança representa o conjunto de princí- pios, regras e normas que regem as práticas diárias das companhias de acordo com o seu propósito, incluindo os valores e as crenças expressos pela cultura organizacional. Dentro da governança corporativa estão os controles e a mensuração sobre desempenho e resultados relativos ao acompanhamento sobre a evolução da organização e às demonstra- ções aos stakeholders. Não existe um modelo padrão para a implantação da governan- ça corporativa, mas sim uma ampla variedade de conceitos e técni- cas para a sua adoção, a qual envolve planejamento e estratégias que considerem as questões legais, econômicas-financeiras e de relacionamento com as comunidades internas e externas ao am- biente de trabalho. Por essa razão, além de questões regulatórias e legais, a governan- ça passou “a englobar ética, sustentabilidade, cultura corporativa, risco cibernético, gerenciamento de dados e informações de clientes, cadeia de suprimentos, trabalho remoto, entre outros riscos emergentes” (KPMG BUSINESS SCHOOL, 2020, p. 10). O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), em seu código sobre as melhores práticas de governança corporativa, inicia a descrição de um modelo de estrutura com base na assembleia geral, em que, por meio de votação realizada pelos sócios da empresa, são escolhidos os representantes do conselho de administração. Esse con- selho tem ascendência (poder) sobre o diretor-presidente e o grupo de diretores nos processos de tomada das principais decisões. A gestão, o acompanhamento dos riscos, os controles e as métricas são funções da secretaria de governança, que responde direto ao con- selho de administração ou ao diretor-presidente. Na sequência, tem-se os órgãos internos de fiscalização e controle, nos quais se encontram o comitê de auditoria, o conselho fiscal, a auditoria independente e a auditoria interna, todos sob o acompanha- mento do setor que cuida do gerenciamento de riscos, dos controles internos e das conformidades, o compliance (IBGC, 2015). A figura a seguir ilustra a estrutura básica citada. O livro Governança corporativa: fundamentos, desenvolvimento e tendên- cias traz uma visão sobre a governança corporativa em nosso país, avaliando seu estágio e as questões principais que envolvem os problemas da gestão de organizações nacio- nais. A leitura dessa obra ajuda o aluno entender o papel da governança corporativa dentro de uma empresa. ROSSETTI, J. P.; ANDRADE, A. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2014. Livro 26 Propósito organizacional e capital social Sócios/acionistas Conselho de administraçãoAuditoria independente Auditoria interna Conselho fiscal Secretaria de governança Comitê de auditoria Comitês Diretor- -presidente Diretores Administradores Figura 3 Estrutura do sistema de governança corporativa Fonte: Elaborada pelo autor com base em IBGC, 2015. A governança corporativa tem como seu maior objetivo alinhar os interesses e as práticas dos gestores aos dos acionistas por meio das normas e dos procedimentos adotados para guiar as decisões e as ações diárias dos integrantes da corporação e da sua cadeia de valor. A adoção da governança corporativa vem crescendo junto às empresas que têm se destacado no mercado, pois essa filosofia de trabalho se baseia nos bons princípios de gestão que elevam o valor da companhia e protegem os investimentos realizados pelos seus acionistas (proprietários). Um dos principais males que a governança corporativa ajuda a combater e eliminar são situações de corrupção e desvio de recursos. No Brasil, as ações nesse sentido se solidificaram ainda mais depois da promulgação da Lei Anticorrupção (Lei n. 12.846), que trata da O compliance representa as ações de acompanhamento da conformidade de todas as atividades da organização Propósito organizacional 27 responsabilidade civil das pessoas jurídicas (empresas) e dos seus administradores quanto às ações que prejudiquem a administração pública (BRASIL, 2013) incentivando a adoção de sistemas internos para a identificação e eliminação das não conformidades legais. Também é objeto da governança corporativa a proteção dos investidores com relação aos conflitos de interesse, caracterizados por decisões tomadas por um gestor (presidente, diretor e outros) que tem interesses secundários, os quais são favorecidos em detrimento aos interesses da corporação e dos acionistas. Entretanto, esse tipo de pro- teção é um caminho de mão dupla, pois também é preciso proteger os acionistas menores e os gestores das ações dos acionistas majoritários, caso estes favoreçam apenas os seus interesses individuais em detri- mento dos demais (ROSSETTI; ANDRADE, 2014). Outro risco observado é a possibilidade deuma tomada repenti- na do controle da companhia motivada pela aquisição de ações com preços em baixa em um determinado e curto intervalo de tempo. Esse tipo de proteção é conhecido como poison pills ou aquisição hostil. A saúde financeira da corporação não pode ser deixada de lado, e os controles sobre os investimentos e o endividamento devem ser muito bem acompanhados, assim como os seus efetivos retornos. De acordo com o IBGC (2015), existem alguns princípios básicos da governança corporativa, que são: transparência, equidade, pres- tação de contas e responsabilidade corporativa. Intenção de disponibilizar aos interessados as informações relativas às exigências legais, à parte econômico-financeira e aos ativos intangíveis que geram valor para a corporação. Transparência Forma de tratamento igualitário a todos os acionistas e demais stakeholders, respeitando seus direitos, deveres, necessidades, interesses e expectativas. Equidade An dr ew K ra so vit ck ii/ Sh ut te rs to ck A leitura do Código das melhores práticas de governança corporativa permite ao aluno uma melhor compreensão sobre os detalhes que envolvem a estruturação e a implantação de uma estrutura destinada à governança corporativa. IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. 5. ed. São Paulo: IBGC, 2015. Disponível em: https://conhecimento. ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/ Attachments/21138/ Publicacao-IBGCCodigo- CodigodasMelhoresPraticasdeGC- 5aEdicao.pdf. Acesso em: 15 ago. 2022. Leitura (Continua) https://conhecimento.ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/Attachments/21138/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf https://conhecimento.ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/Attachments/21138/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf https://conhecimento.ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/Attachments/21138/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf https://conhecimento.ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/Attachments/21138/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf https://conhecimento.ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/Attachments/21138/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf https://conhecimento.ibgc.org.br/Lists/Publicacoes/Attachments/21138/Publicacao-IBGCCodigo-CodigodasMelhoresPraticasdeGC-5aEdicao.pdf 28 Propósito organizacional e capital social Ou accountability, é a demonstração transparente e de fácil compreensão sobre os números/indicadores para a devida prestação de contas e divisão das responsabilidades de cada um nos resultados. Prestação de contas Cuidado da saúde econômica e financeira da corporação, identificação e redução ou eliminação dos riscos externos, de reputação (imagem corporativa) e de operação, além do cuidado com o capital intelectual e humano e com os itens que afetam os resultados sociais e ambientais Responsabilidade corporativa Os resultados positivos que a governança corporativa pode trazer para uma corporação são muitos. Entre eles se destacam o desen- volvimento econômico-financeiro e os aspectos relacionados às boas práticas sociais calcadas em padrões éticos que melhoram substancial- mente a imagem da organização junto ao público consumidor e aos demais componentes da sociedade. Embora sejam complementares, governança corporativa e compliance não são a mesma coisa. O compliance tem relação com a execução das tarefas e demais ações apoiadas nas diretrizes e normas definidas pela gestão corpo- rativa para o atendimento às leis, representando na prática como a empresa aplica sua filosofia com transparência e por meio de ações éticas. É uma dessas boas práticas existentes que objetiva o controle e a adequação da corporação, provendo maior confiança por meio da regularidade e transparência sobre as suas relações comerciais. Normalmente, as corporações dispõem de um departamento ou um responsável pelo compliance, que cuida do monitoramento das ativida- des para a prevenção de problemas e conflitos causados por não confor- midades ou não aderência a alguma lei ou norma específica. Portanto, é necessário que os colaboradores dessa área tenham conhecimento a respeito de questões administrativas, financeiras e também jurídicas. Segundo Chiavenato (2014, p. 402): Compliance (do inglês comply = agir de acordo com uma regra, padrão, especificação ou instrução interna), conformidade ou Propósito organizacional 29 obediência é um conjunto de disciplinas que servem para executar normas legais ou regulamentares e políticas ou diretrizes definidas para o negócio e detectar e evitar qualquer desvio ou inconformida- de que venha a acontecer. A expressão surgiu no mercado financeiro em termos de regulamentação e controle das atividades das empre- sas no sentido de proporcionar fiscalização e maior segurança aos investidores. Rapidamente, as organizações passaram a adotar este conceito em regras de funcionamento para mostrar respeito às leis, transparência e credibilidade em relação aos stakeholders. O ambiente das organizações que aderem às práticas de governan- ça corporativa e compliance envolvem ainda itens, como os códigos de conduta; canais de denúncias; comitê de conduta; políticas para a ges- tão de conflitos de interesses; regulamentos sobre as transações entre as partes relacionadas; acordos de confidencialidade sobre o uso de informações privilegiadas; e políticas de negociação de ações, de divul- gação de informações, de contribuições, de doações, de prevenção e de detecção de atos de natureza ilícita (IBGC, 2015). 1.5 ESG: governança ambiental, social e corporativa Vídeo O capitalismo é inerentemente instável. A raiz dessa instabilidade manifesta-se de várias formas, seja por meio da inovação tecnológica – que, por sua capacidade de modificar bruscamente a demanda, arruína algumas empresas, substituindo-as por outras –, seja pela constante e, muitas vezes, selvagem concorrência assinalada pela pressão por lucros acima da média. Essa instabilidade desafia as organizações. Entre os inúmeros de- safios às empresas está o de responder aos anseios da sociedade contemporânea relacionados à responsabilidade social (RS) e ao de- senvolvimento sustentável (DS). A preocupação das empresas com a responsabilidade social não é nova, mas recentemente o assunto vem ganhando cada vez mais im- portância em função da percepção acentuada sobre os reflexos das ações das organizações no ambiente como um todo, inclusive no meio social, visto que é conhecida a influência das empresas dentro do con- texto social, bem como o quanto suas ações interferem diretamente na vida das comunidades. 30 Propósito organizacional e capital social A opinião da sociedade sobre a reputação de uma organização é for- mada pelas informações que as pessoas recebem por meio dos meios de comunicação disponíveis, que, em geral, não destacam somente a força econômico-financeira de uma corporação, mas também as con- sequências causadas por ela ao meio ambiente e à sociedade, assim como a aderência da companhia às boas práticas de gestão baseadas na governança corporativa. Surge, então, o conceito para a filosofia de trabalho denominada ESG – sigla no idioma inglês, ou ASG em português – e que se refere ao ambiente (environment), ao social (social) e à governança (governance). Alguns itens são elencados na figura a seguir. Environmental (Ambiental) • Uso de recursos naturais • Emissão de carbono • Eficiência energética • Poluição • Tecnologia limpa • Preservação da biodiversidade • Aquecimento global • Gestão de resíduos • Desmatamento • Políticas e relações de trabalho • Política de inclusão e diversidade • Treinamento da força de trabalho • Direitos humanos • Privacidade e segurança de dados • Engajamento das pessoas • Relacionamento com os stakeholders Social (Social) • Independência do conselho • Diversidade na composição do conselho de administração • Remuneração do conselho de administração• Ética e transparência • Canais de denúncia • Relações com entidades governamentais e políticas Governance (Governança) An dr ew K ra so vit ck ii/ Sh ut te rs to ck Figura 4 Principais itens relacionados aos fatores ESG Fonte: Elaborada pelo autor com base em Anbima, 2020. Com especial atenção, os investidores também acompanham ativa- mente as informações que podem impactar o mercado financeiro de modo positivo ou negativo. Para Gonçalves (2021, p. 92): Além dos consumidores, o público investidor também está atento às práticas éticas e responsáveis das empresas, o que é comprovado pela existência dos índices sobre gestão ambiental, social e de governança corporativa [...] e que estão disponíveis em diversas bolsas de valores pelo mundo. No Brasil, a bolsa Propósito organizacional 31 de valores B3 dispõe do índice S&P/B3 Brasil ESG, que mede a performance dos títulos negociados por empresas que seguem os critérios de sustentabilidade fundamentados no pacto Global das Organizações das Nações Unidas (ONU). Por meio de índices dessa natureza, o investidor tem indicadores para analisar se a empresa tem aderência às políticas de responsabili- dade social empresarial, o que, de certa forma, gera boas expectativas sobre os possíveis resultados positivos para a corporação no futuro. Uma das razões para a visão positiva dos investidores quanto a em- presas que adotam a filosofia ESG em seu dia a dia relaciona-se ao fato de que a revisão dos processos necessária para transformar a empresa acaba gerando reduções de custos e melhorias na prática de gestão, o que culmina na obtenção de melhores resultados, inclusive financeiros, devido ao aumento da produtividade. Tudo isso aumenta o valor que a companhia passa a ter para o mercado, aumentando, também, o inte- resse dos investidores. Após a análise, considerando os indicadores relacionados aos fatores de sustentabilidade, os investimentos em empresas ESG podem ser realizados de diversas formas: fundos ESG ou fundos verdes (green bonds); ETF (exchange trade fund, ou fundo de índice), Índice de Carbono, S&P/B3 Brasil ESG, entre outros. Os fundos são caracterizados pela emissão de ações ou títulos ad- quiridos em formato de cotas por investidores que acreditam em uma determinada causa, por exemplo, a da responsabilidade social, com o objetivo de melhorar a vida em sociedade por meio do desenvolvimen- to econômico, mas preservando o meio ambiente. Entretanto, não é porque estão relacionados a ações positivas das em- presas que esse tipo de investimento não representa risco. Pelo contrá- rio, trata-se de uma operação de investimento como outras de mercado, tanto que os investidores de maior porte tomam muito cuidado antes de direcionar seus recursos para essa categoria de aplicação financeira. Não basta que uma organização se defina como responsável so- cialmente, é preciso que os investidores e os consumidores tenham a percepção de que o que a empresa afirma ser é mesmo a realidade no seu dia a dia. Suas ações devem demonstrar que existe, de fato, a preocupação com o planeta, com a preservação dos recursos naturais, Além dos termos ESG e ASG, usados para identifi- car as organizações que aderem a essa filosofia de gestão baseada no compromisso ambiental e social, também são utilizadas as seguintes denominações: “inves- timento responsável, investimento sustentável, investimento de impacto social, investimento ético, títulos verdes (conhecidos lá fora como green bonds), investimentos na área de infraestrutura, entre ou- tros” (ANBIMA, 2020, p. 7). Saiba mais 32 Propósito organizacional e capital social 3r dt im el uc ky st ud io /S hu tte rs to ck 3r dt im el uc ky st ud io /S hu tte rs to ck que os seus processos fabris ou de serviços não poluem o ambiente ou que estão preparados para minimizar os efeitos nocivos ao meio ambiente. Também são importantes as ações sociais, éticas e trans- parentes relacionadas à governança corporativa, assim como a relação das atividades realizadas com o propósito organizacional. A participação dos investimentos em organizações ou fundos ESG tem crescido ano a ano dentro do mercado de capitais no Brasil e no mundo, muito devido ao novo arcabouço legal que historicamente vem sendo aprimorado no sentido de dar maior proteção e incentivo às questões ambientais e sociais. Outro fator importante tem sido a conscientização das no- vas gerações sobre as mesmas questões e os problemas que o modelo de desenvolvimento vigente até meados dos anos 1990 representava, já que a estrutura de produção e exploração dos recursos naturais é extrema- mente prejudicial ao nosso planeta. Como historicamente nada acontece por acaso, a mudança no com- portamento das organizações acabou sendo motivada pelas novas gera- ções de consumidores que surgiram com diferentes visões e expectativas sobre a atuação empresarial, além de um novo comportamento dos clien- tes, com mais disposição a reduzir os impactos sobre o meio ambiente. Atualmente, existem autores, como Weetman (2019), que defendem o conceito da economia circular, na qual novas estratégias empresariais podem ser adotadas com base em negócios sustentáveis inovadores, como a reciclagem, a reutilização, a renovação ou o compartilhamento de bens (automóveis, casas, bicicletas, produtos eletrônicos, entre outros). É importante que as corporações tradicionais passem a analisar como empresas criativas e inovadoras como Uber, Airbnb, Tesla, Goo- gle, entre outras, que estão aproveitando muitas dessas novas oportu- nidades com sucesso incontestável. CONSIDERAÇÕES FINAIS As organizações que definiram seu propósito organizacional estão obtendo sucesso no mercado e se diferenciam dos seus concorrentes ao ampliarem o seu relacionamento institucional com o público consumidor e as demais pes- No livro Economia circular: conceitos e estratégias para fazer negócios de forma mais inteligente, susten- tável e lucrativa, a autora apresenta o conceito da economia circular, em que a produção e o consumo envolvem o compartilha- mento ou aluguel de bens, a defesa de práticas como a reciclagem, a reparação e o reaproveitamento de itens de consumo, tudo com o intuito de propor novas formas de realizar negócios destinados a atender aos anseios dos novos consumidores. WEETMAN, C. São Paulo: Autêntica Business, 2019. Livro Propósito organizacional 33 soas e entidades com as quais interagem, principalmente no atual ambiente de negócios, em que novas formas criativas de empreender estão surgindo. São negócios diferentes dos modelos tradicionais, por exemplo, os ba- seados na economia verde, na economia de funcionalidade, na ecologia in- dustrial ou na economia circular etc., e que já são uma realidade. Esses negócios inovadores incentivam o compartilhamento de bens, a reciclagem e o reaproveitamento de produtos, entre outras formas de agir, tudo com o objetivo de melhorar a nossa vida em sociedade preser- vando o nosso ambiente. Agindo dessa forma, tais corporações estão respondendo às deman- das sobre o desenvolvimento sustentável e outros problemas socioam- bientais sem deixar de lado a importância de obter resultados financeiros que viabilizam as demais operações corporativas. O que se observa é que, ao declarar qual é o seu papel no mundo, as organizações estão conseguindo demonstrar para a sociedade o quanto estão comprometidas em desenvolver um capital social que inclua ques- tões importantes para a humanidade e para o nosso planeta. ATIVIDADES Atividade 1 Defina conceitualmente o propósito organizacional. Atividade 2 O propósito organizacional de uma empresa tem a mesma função da missão? Explique. Atividade 3 Com base no círculo dourado criado por Sinek, quais são as três situações em que as empresas se encontram quanto ao seu pro- pósito organizacional? 34 Propósito organizacional e capital social REFERÊNCIAS ANBIMA – Associação Brasileira das Entidadesdos Mercados Financeiro e de Capitais. Guia ASG: Incorporação dos aspectos ASG nas análises de investimento. São Paulo: 2020. BRASIL. Lei n. 12.846, de 1º de agosto de 2013. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 2 ago. 2013. 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Também são apresentados os conceitos sobre o empreendedorismo social, entendendo como as questões relacionadas à ética impactam as empresas em suas decisões estratégicas e a composição do seu ambiente interno de trabalho. São analisados os novos negócios com propósito social e, por último, são discutidas as ações envolvidas na gestão de pessoas dentro desses novos ambientes e filosofias de trabalho. Com o estudo deste capítulo, você será capaz de: • compreender os impactos que a responsabilidade social e o capi- tal social trouxeram para os negócios; • assimilar conceitos sobre o empreendedorismo social; • entender como as questões relacionadas à ética impactam as empresas em suas decisões estratégicas e a composição do seu ambiente interno de trabalho; • estudar os novos negócios com propósito social; • conhecer as ações envolvidas na gestão de pessoas dentro desses novos ambientes e filosofias de trabalho. Objetivos de aprendizagem 36 Propósito organizacional e capital social 2.1 Capital e responsabilidade social Vídeo Uma organização define seus objetivos e usa suas habilidades para maximizar seus resultados por meio da otimização dos recursos e dos seus processos visando acumular ativos, que normalmente chamamos de capital. Entretanto, o termo capital não se refere apenas aos retornos fi- nanceiros, podendo ser usado com diversos significados relacionados, como as pessoas que trabalham em uma organização, a imagem da corporação, o reconhecimento da marca, as capacidades técnicas, o co- nhecimento acumulado pela companhia (know-how), entre outros. Isso significa que todo recurso utilizado por uma organização para entregar a sua proposta de valor para o mercado, assim como os resultados acumulados, pode ser considerado como capital (ativos). Capital é, portanto, o conjunto de bens que uma entidade – seja uma pessoa ou uma organização – possui. Existem diversos tipos de capital, que serão vistos a seguir. O capital financeiro é normalmente relacionado a dinheiro ou a ativos que podem ser revertidos em dinheiro, como os títulos do tesou- ro direto, as ações, certificados de depósito bancário (CDB), recibo de depósito bancário (RDB), debêntures 1 , materiais destinados à produ- ção ou à entrega de serviços etc. O capital econômico se relaciona aos ativos que são usados para gerar algum lucro ou valor, ou seja, são valores investidos que têm a capa- cidade de gerar um fluxo financeiro em alguma atividade e que geram lu- cro. Os bens usados na produção ou entrega de serviços como máquinas e equipamentos são denominados bens de produção ou bens de capital. O capital humano tem relação com as pessoas que trabalham em uma organização e detêm o conhecimento possuindo competências e atitudes que são usadas na produção de bens e serviços. O capital intelectual, de maneira simplificada, representa a soma do conhecimento e das competências que as pessoas possuem e que se destinam à produção ou à entrega de serviços. Título mobiliário de dívida de médio ou longo prazo emitido por empresas e negociados no mercado financeiro no segmento de renda fixa, que ofere- cem direito de crédito ao investidor. 1 Capital social 37 O capital social simboliza o reconhecimento da empresa pela so- ciedade como uma organização que atua com responsabilidade social envolvendo a sua cadeia de valor (stakeholders). O capital ambiental, também chamado de capital natural, se refere aos recursos naturais renováveis/não renováveis que sofrem os impac- tos das ações corporativas classificadas em organizações sustentáveis/ não sustentáveis, dependendo dos cuidados que a empresa tem com a preservação ou não de tais recursos. Também é definido pelo reconhe- cimento da sociedade sobre o comportamento ético e transparente de uma corporação na realização das suas atividades, de modo a cuidar e contribuircom o desenvolvimento sustentável, além de seguir dentro da legalidade e visando ao bem-estar social. O capital ambiental e o social têm direta ligação com o conceito de responsabilidade social empresarial (RSE), que se define como a responsabilidade de uma organização pelos impactos de suas decisões e atividades (produtos, serviços e processos) na socie- dade e no meio ambiente, por meio de um comportamento ético e transparente que: contribua para o desenvolvimento susten- tável, inclusive a saúde e bem-estar da sociedade; leve em con- sideração as expectativas das partes interessadas; esteja em conformidade com a legislação aplicável e seja consistente com as normas internacionais de comportamento; e esteja integrada em toda a organização e seja praticada em suas relações [...] den- tro da sua esfera de influência. (ABNT, 2010, p. 4) Percebe-se que o conceito de responsabilidade social empresarial vem se ampliando, envolvendo a transparência de uma corporação que demonstra a sua preocupação com os seus colaboradores, os demais stakeholders (acionistas, fornecedores, consumidores etc.), a sociedade e o ambiente por meio de iniciativas sociais cujo foco está nas questões ambientais, no desenvolvimento de um novo modelo de consumo, no descarte dos resíduos, na preservação das reservas de recursos natu- rais e nas questões também concernentes à diminuição da concentra- ção de renda e da redução da pobreza. A adoção dessa filosofia de trabalho, em razão dos fatores expos- tos, exige mudanças internas nas empresas que incluem a revisão do seu processo de tomada de decisão e o realinhamento das estratégias No Brasil, existe outra utilização para o termo ca- pital social, que na esfera fiscal e contábil represen- ta o dinheiro inicialmente aplicado pelos investido- res (sócios, acionistas etc.) para constituir a empresa e dar início às suas opera- ções. Essa consideração é necessária para que não se confundam os significados de capital social fiscal e contábil com o capital social no âmbito da responsabilidade social empresarial que tem a ver com a reputação de uma empresa junto a suas conexões sociais. Saiba mais A pesquisa e leitura dessa norma propicia ao educando conhecer os conceitos, termos, defini- ções e todas as questões referentes à responsabi- lidade social e ao desen- volvimento sustentável, bem como entender como implementar essa filosofia de trabalho nas organizações. ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR ISO 26000: diretrizes sobre responsabilidade social. Rio de Janeiro, 2010. Leitura 38 Propósito organizacional e capital social empresariais que, além da busca por resultados financeiros acima da média de mercado, devem incentivar também a obtenção de lucros so- ciais e ambientais. Ao assumir essa nova forma de agir, a corporação acaba por influen- ciar toda a sua cadeia de valor passando a cobrar dos seus parceiros co- merciais posturas também identificadas com a responsabilidade social empresarial. As estratégias e diretrizes divulgadas pela alta gestão pas- sam a englobar tópicos diferenciados como: sustentabilidade, iniciati- vas pró-ambiente, políticas inclusivas etc. Tais preocupações passaram a ter maior destaque a partir de 1972, quando a ONU realizou a Confe- rência de Estocolmo, se envolvendo efetivamente nos debates globais sobre as alternativas para o desenvolvimento futuro. Em um de seus resultados, foram apresentadas propostas sugerindo novas maneiras de usar os meios de produção para geração de riqueza e crescimento econômico, que devem ser a base do desenvolvimento econômico que melhore a qualidade de vida das pessoas e a sociedade em geral. A proposta culminou no conceito denominado desenvolvimento sus- tentável, que defende um maior equilíbrio na distribuição da riqueza gerada pelo trabalho e o fortalecimento de relações em que todos saiam ganhando. O desenvolvimento sustentável, embora seja um desejo da socieda- de, exige um esforço imenso para ser alcançado, já que a realidade do mundo globalizado é muito diferente, pois o processo de globalização agravou o problema da concentração de renda (FURTADO, 2002). Como consequência, a concentração de renda aumenta a desi- gualdade socioeconômica, fato que não foi atenuado mesmo com o surgimento de negócios inovadores baseados em novas tecnologias (PIKETTY, 2014). A formulação da economia globalizada se caracteriza pela não concentração física dos processos produtivos, pela desvinculação das organizações com os locais de produção e suas comunidades, pela ex- ploração dos países menos desenvolvidos por meio da mão de obra mais barata, pela extração de matérias primas, e pela transferência de processos de fabricação poluidores para esses países, além da concen- tração de renda. Assim, a formulação acaba por transferir o centro do poder das mãos do governo, antes o gerenciador da racionalidade eco- nômica, para grupos transnacionais e multinacionais. Capital social 39 Esses grupos, por sua vez, concentram seus esforços na busca de vantagens de custos (inovações tecnológicas, mão de obra, insumos, serviços etc.), e não nos problemas sociais gerados pelo novo siste- ma globalizado, sobre os quais durante muito tempo não se sentiram responsáveis, mas deveriam estar comprometidos com a solução de tais problemas. Entre os reflexos negativos do novo sistema está o enfraquecimen- to da coesão social, identificada pelas elevadas taxas de desemprego e pelos processos de reestruturação marcados por substancial redução do quadro de funcionários. Devido ao elevado índice de desemprego, subemprego e baixa ren- da, os integrantes das classes menos favorecidas não têm acesso a in- fraestruturas, serviços adequados e moradias dignas, representando de modo claro o desequilíbrio social advindo do modelo predominante de crescimento. O equilíbrio social depende de três fatores: governo, família e em- presa. As ações governamentais devem priorizar a regulamentação das atividades de todos, e cabe à sociedade manifestar seus desejos e expectativas, bem como acompanhar e cobrar as ações do governo e das empresas que devem responder aos anseios sociais e às exigências legais (ASHLEY, 2019). Conciliar a obtenção e a maximização dos lucros de modo social- mente responsável não é uma tarefa fácil; muito pelo contrário, trata- -se de quebrar o paradigma vigente denominado economicismo, que constitui a corrente dominante do pensamento econômico mundial e está baseado na teoria da percolação (trickle down theory), que priori- za as questões econômicas em detrimento das demais (sociais e am- bientais). Seu principal fundamento “consiste em garantir os controles macroeconômicos que permitam um crescimento razoável e o resto se fará por si mesmo” (SACHS, 1995, p. 40). Os autores que defendem o economicismo – amplamente propa- gado pelos princípios do liberalismo defendido por Adam Smith e pelo pensamento neoliberal de Alfred Marshall – acreditam em um ciclo virtuoso de crescimento que leva ao consumo que, por sua vez, gera novas riquezas. Assim, o reinvestimento dessas novas riquezas deveria criar mais oportunidades de crescimento e de trabalho, com a conse- quente livre distribuição dos benefícios alcançados para toda a teia so- Alfred Marshall (1842- 1924) foi um renomado professor da Universidade de Cambridge e diretor da University College em Bristol especializado em economia que, entre outras obras, escreveu o livro Princípios de economia. Biografia Adam Smith (1723-1790) é considerado o patrono da economia moderna, ou seja, aquela que surgiu após a Revolução Indus- trial (século XVIII), por seus estudos sobre a origem da riqueza das nações a qual, segundo o autor, depende da atuação de cada cidadão. Biografia 40 Propósito organizacional e capital social cial. O que de fato não ocorre, pois as ideias liberais e neoliberais não abarcam preocupações sobre questões sociais, uma vez que o merca- do tem seu crescimentoimpulsionado por forças sociais que atuam em conflito com os interesses do capital (FURTADO, 2002). Apesar dos muitos fatores negativos da globalização, o processo tem como um dos seus efeitos positivos os padrões éticos e morais adotados pelas organizações que passaram a se preocupar com os ris- cos que a sua imagem sofre junto aos consumidores, pois, atualmente, eles cobram uma postura mais socialmente responsável por parte das corporações (ASHLEY, 2019). Considerando que as companhias buscam, de fato, cuidar da sua imagem junto aos consumidores, a inclusão do conceito de desenvol- vimento sustentável na estratégia empresarial pode representar uma forma de atender ao desejo desse público. Isso é possível por meio do reconhecimento da sociedade de que a organização está alinhada na busca de um grau mais elevado de homogeneidade social. Ressalta-se que o desenvolvimento sustentável é caracterizado pela defesa do equilíbrio da distribuição das riquezas e pela execução de atividades sem causar danos para a sociedade e o ambiente, e inclui o desenvolvimento de negócios que não esgotem os recursos inter- nos, financeiros e os da natureza que possibilitam a existência desses negócios. Já a responsabilidade social empresarial tem a ver com a adoção de uma filosofia comprometida em desenvolver suas decisões e ativi- dades medindo e controlando os impactos que irão causar. É saber o que precisa ser feito e fazê-lo, o que compreende as diretrizes que irão influenciar os comportamentos éticos e preocupados com a qualidade de vida e a segurança de todos os envolvidos, contribuindo para o de- senvolvimento sustentável. O desenvolvimento sustentável e a responsabilidade social empre- sarial estão relacionados em razão de compartilharem princípios volta- dos para o crescimento e desenvolvimento econômico, eliminando ou diminuindo os impactos das suas ações organizacionais. O fundamental é que as organizações estejam conscientes de que necessitam desenvolver ações que as identifiquem como socialmen- te responsáveis e que todos os seus stakeholders (partes interessadas) Capital social 41 acreditem e incentivem a transição do modelo tradicional focado ape- nas no crescimento financeiro-econômico para o desenvolvimento sustentável, apoiado por posturas responsáveis socialmente que res- peitem a obtenção de lucro financeiro para sustentar a sua continuida- de, a preservação do meio ambiente e o real desenvolvimento social. 2.2 Empreendedorismo social Vídeo Os impactos sociais negativos proporcionados pelo processo de glo- balização que realocou as atividades produtivas, aumentando a con- centração da renda, transferiram o centro de decisão e poder das mãos dos governos para as organizações transnacionais e multinacionais, as quais, por sua vez, em geral concentram seus esforços na busca de re- sultados financeiros acima da média de mercado e não na solução dos problemas sociais. Como consequência desse processo ocorreu o esgarçamento do teci- do social e o surgimento de empreendedores sociais liderando movimen- tos ou instituições com uma nova visão sobre como a sociedade deveria se estruturar. Em comum, os empreendedores sociais possuem o objetivo de su- prirem as lacunas deixadas pelos representantes governamentais em todas as suas instâncias: municipal, estadual ou federal. O empreendedorismo social começou a ganhar impulso a partir dos anos 1990, época em que se registrou o surgimento expressivo de organi- zações, tais como organizações não governamentais (ONGs) ou empresas de serviços sociais. Umas das principais diferenças entre o modelo tradicional de negócios e o empreendedorismo social está no seu foco de ação, pois ao invés de lucros financeiros, o empreendedorismo social tem como principal obje- tivo explorar oportunidades de negócios que produzam bens e serviços a fim de solucionar ou mitigar problemas de ordem social/ambiental. Para que se obtenha sucesso em empreendimentos sociais, é fun- damental a participação da comunidade que será beneficiada, já que esta pode colaborar com discussões e sugestões para implantar solu- ções assertivas para os problemas abordados. Sem a participação da sociedade, as melhorias pretendidas podem não ser alcançadas. mitigar: aliviar, suavizar, aplacar. Glossário 42 Propósito organizacional e capital social As melhorias citadas podem envolver questões financeiras e econô- micas relacionadas à habitação, estrutura de esgoto, fornecimento de água e energia, utilização dos recursos naturais disponíveis com menor ou nenhum impacto ambiental, criação de moedas de troca para habi- litar o acesso de pessoas e pequenos produtores a bens de consumo, acesso à cultura, informação, saúde, alimentos e lazer, desenvolvimen- to pessoal e profissional, entre outras necessidades que surjam em ra- zão das dinâmicas sociais. Independente da finalidade a que se destina, nota-se que a es- sência do empreendedorismo social está na busca de soluções inovadoras para problemas sociais e ambientais provocados pelo sistema responsável pela produção de bens e serviços, geração e distribuição de renda. Visando melhorar a sua reputação junto ao público consumidor e passar a atender as novas demandas do mercado, muitas organizações de negócios tradicionais passaram a aderir às práticas de responsabi- lidade social adotando padrões éticos e morais mais severos (ASHLEY, 2019). Entretanto, isso ainda não resolve completamente os problemas sociais e ambientais causados pelo processo de geração e distribuição da riqueza que acaba por ser apropriada pelo empreendedor. Um empreendedor pode ser definido como o ator que no cenário dos negócios introduz novas maneiras de exploração dos recursos para a produção de bens e serviços, modificando ou destruindo a ordem econômica até então existente com suas inovações que causam des- continuidade em algum segmento em razão dos processos inovadores implementados (SCHUMPETER, 1985). Já Filion (1999) considera que o empreendedor é o motor do sistema econômico sendo o detector das oportunidades impulsionadoras dos novos negócios. No caso dos empreendedores sociais, a inovação está na forma como eles realizam suas atividades e no foco que dão para a geração de valor para o capital social ou o ambiental, sendo fundamental a gestão do negó- cio social por meio de boas práticas similares as de um empreendimento tradicional. Isso preserva os recursos financeiros e alia as práticas de mer- cado com o desenvolvimento humano, social, econômico e comunitário, acrescentando características que envolvam ações cooperativas e éticas, visão social, boa comunicação, empatia, criatividade para a busca de alter- nativas diferenciadas para problemas e pragmatismo. Capital social 43 Nesse caso, ser pragmático tem relação com a necessidade de um negócio social também gerar lucro, mesmo que esse não seja o objeti- vo principal, e o lucro não se destina ao repasse para algum acionista ou proprietário, mas é utilizado para manter as atividades do empreen- dimento social funcionando ou ainda para ampliá-lo. É comum a confusão entre o empreendimento social com a filantro- pia. O primeiro traz soluções de negócios que impactam positivamente a comunidade ou trazem benefícios para o ambiente, diferentemente da filantropia que se define por doações e ajuda realizadas por entida- des ou pessoas a outras pessoas em situação de dificuldade ou vulne- rabilidade por dedicação e amor à humanidade. Os estudos sobre sociopolítica definem uma classificação para as or- ganizações que atuam na sociedade. As organizações do primeiro setor englobam as corporações do poder público (prefeituras, governos esta- dual e federal com todos os seus órgãos e autarquias) com o objetivo de suprir as necessidades sociais relacionadas à saúde, segurança, educa- ção, cultura, entre outras. Nas organizações do segundo setor se encai- xam as iniciativas privadas (empresas com a finalidade de obtenção de lucro). Por último, as entidadesdo terceiro setor desenvolvem serviços de caráter assistencial e público buscando principalmente o bem-estar de todos por meio do lucro social e ambiental; são organizações da so- ciedade civil, tais como ONGs, organizações da sociedade civil de interes- se público (OSCIPs), fundações, associações de voluntariado, instituições religiosas, sociedades cooperativas, centros sociais e entidades de filan- tropia e beneficência, cuja atuação compreende atividades voltadas para a cultura, a educação, o esporte, a saúde etc. No Brasil, o espaço de atuação do empreendedor social é o terceiro setor, que não se contrapõe ao governo ou ao mercado tradicional, mas se apresenta como alternativa para a falta de resposta do Estado às demandas crescentes da sociedade. Esse setor está em crescimento no país, de acordo com o Instituto Bra- sileiro de Geografia e Estatística (IBGE), visto que já em 2006 o setor re- presentava 1,4% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, movimentando R$ 32 bilhões anualmente (MEREGE, 2022). Após a promulgação da Lei n. 13.019 pelo Governo Federal, o terceiro setor continuou em expansão. Em seu artigo 1º, a Lei n. 13.019 institui diversas normas regula- mentando a parceria, o fomento e a cooperação entre organizações da 44 Propósito organizacional e capital social sociedade civil com a administração pública para a execução de ativi- dades ou realização de projetos visando questões de interesse social. A mesma lei, em seu artigo 2º, oficializou a denominação de organi- zação da sociedade civil (OSC) para englobar todas as corporações que se caracterizam por sua atuação organizacional sem fins lucrativos, de- finindo que assim é considerada qualquer: entidade privada sem fins lucrativos que não distribua entre os seus sócios ou associados, conselheiros, diretores, empregados, doadores ou terceiros eventuais resultados, sobras, excedentes operacionais, brutos ou líquidos, dividendos, isenções de qualquer natureza, parti- cipações ou parcelas do seu patrimônio, auferidos mediante o exercí- cio de suas atividades, e que os aplique integralmente na consecução do respectivo objeto social, de forma imediata ou por meio da consti- tuição de fundo patrimonial ou fundo de reserva. (BRASIL, 2014) O reflexo do incentivo legal pode ser constatado por meio dos dados coletados pelo mapa das organizações da sociedade civil, desenvolvido e mantido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que demons- tra existir atualmente 815.676 OSCs em nosso país. Em 2020, essas OSCs empregavam 2.338.407 pessoas atuando nas seguintes áreas (IPEA, 2022): Meio ambiente e proteção animal (3,0%) Outros tipos de atividade (8,9%) Cultura e recreação (11,9%) Religião (20,4%) Assistência social (4,3%) Desenvolvimento e defesa de direitos (45,5%) Habitação (0,05%) Saúde (0,05%) Educação e pesquisa (2,9%) Associações patronais, profissionais e de produtores rurais (3,0%) Capital social 45 Empreender socialmente é tão inspirador como qualquer outro tipo de empreendedorismo. O que se ressalta são a criatividade e o propósi- to bem definidos para a solução de algum problema social ou ambiental. Uma grande diferença entre os dois tipos de empreendedorismo (tradicional e social) concentra-se no fato de que o empreendedorismo social não necessariamente depende dos valores monetários acumula- dos como um parâmetro de sucesso. Esse indicador pode ser substituí- do por um valor social explícito em relações comunitárias, reputação, sinceridade, clareza e transparência. Dessa forma, constata-se que é possível para uma organização li- dar com problemas sociais de maneira criativa, organizada e produtiva, desde que o propósito declarado venha ao encontro da necessidade do seu público consumidor e demais stakeholders, patrocinadores ou par- ceiros que percebem o valor que adquirem ao se associar a um projeto bem-sucedido no campo social ou ambiental. Uma OSC tem grande possibilidade de alcançar sucesso em seu projeto se identificar adequadamente uma oportunidade relevante do ponto de vista social que, ao mesmo tempo, tenha um profundo e posi- tivo impacto na opinião pública (GONÇALVES; RIMOLI, 2005). Tanto é assim, que muitas organizações se interessam em associar sua marca aos resultados positivos de projetos sociais e ambientais capitanea- dos por OSCs, que em troca recebem recursos financeiros de outros tipos destinados à manutenção e subsistência da organização social. No livro Empreendedoris- mo social: a transição para a sociedade sustentável, os autores buscam descrever os aspectos que envolvem os empreendimentos sociais que têm seu foco voltado para a busca da solução de problemas sociais da comunidade, do governo e do setor privado, os quais devem agir emanados pelo pro- pósito de melhorar a vida de todos. MELO NETO, F. P.; FROES, C. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2002. Livro 2.3 Ética nos negócios Vídeo A forma como uma organização conduz os seus negócios no mercado em que atua e como ela se relaciona com os seus clientes e demais partes interessadas (stakeholders) define a sua identidade e a sua reputação. A busca pelo reconhecimento do mercado consumidor envolve uma postura transparente, correta e honesta por parte das corporações que querem “a continuidade e o crescimento dos seus negócios” (GONÇALVES, 2021, p. 91). Assim, a reputação de uma corporação está intimamente relacio- nada aos valores e crenças que ela defende, os quais estão presentes 46 Propósito organizacional e capital social em sua cultura organizacional, que é diretamente influenciada em sua composição pelas ações dos proprietários e dos gestores que ocupam cargos na alta direção corporativa. A alta administração de uma corporação, por meio das diretrizes que formula e divulga para o restante da organização, define as fron- teiras éticas e os valores comerciais que serão seguidos pela liderança, colaboradores e demais stakeholders. Além disso, na maioria dos casos, também parte da alta direção a declaração do propósito de uma empresa que serve como diretriz guia corporativa durante o processo de sintonia com os mercados consu- midores. No propósito está descrito o real motivo da existência da em- presa e como ela se diferencia das demais na sua maneira de gerar valor para si e para seus clientes, colaboradores, parceiros comerciais, investidores, comunidade e para o meio ambiente, o que agrega ainda mais valor para a marca (MACKEY; SISODIA, 2018). Essas definições influem diretamente nas decisões sobre ser ou não uma corporação com políticas sustentáveis e que atua dentro dos re- quisitos da responsabilidade social empresarial, gerando não somente resultados financeiros, mas também sociais e ambientais. Mas afinal o que é a ética? E o que é a ética empresarial ou a ética nos negócios? Antes da definição de ética, é preciso definir o que é moral, ou seja, o conjunto de hábitos e costumes aceitos por uma sociedade. Assim a ética, por sua vez, representa o comportamento racional e individual que obedece a essa moral por meio de ações, seguindo o conjunto de normas e regras sociais para mediar o comportamento e inter-relacionamentos. Assim, agir eticamente é escolher realizar ações que propiciem o bem para a sociedade e que também tragam satisfação pessoal. Valls (2008) destaca que os costumes se alteram e o que antes era visto como errado pode ser aceito agora ou vice-versa, portanto os va- lores éticos podem ser transformados tanto quanto a sociedade. De acordo com Gonçalves (2021, p. 90), os “valores, seja para um indivíduo, instituição ou sociedade, representam os princípios, os fun- damentos e as normas que regulam o nosso comportamento, assim como as interações que temos com os demais membros da sociedade”. Capital social 47 Se para um indivíduo agir eticamente, a relação está na obediência de padrões e regras moralmente aceitas, para uma empresa não é diferente, ou seja, significa que suas ações devem objetivar o bemde to- dos causando impactos positivos sobre o meio social e ambiental. Qualquer empresa que pretenda ser considerada confiável, transparente e reconhecida como responsá- vel socialmente deve ter na ética um dos pilares da sua forma de agir. A ética empresarial envolve consciência moral, conhecimento e responsabilidade sobre os seus deveres e ações, principalmente no que tange ao respeito à legislação, redução ou eliminação dos impactos causados na sociedade e no ambiente, bem como a sua re- lação com os colaboradores e seus direitos. A ética empresarial, portanto, é formada pelo conjunto de valores e crenças contidos e disseminados na cultura organizacional, que fo- cam as ações da companhia na melhoria dos resultados sem se es- quecer do cuidado com a relação com os seus trabalhadores e demais partes interessadas, afinal o pensamento ético também cria limites sobre as decisões de não ultrapassar ou romper certas fronteiras le- gais, financeiras, sociais e ambientais. Para conseguir atingir os objetivos propostos dentro dessa filosofia de trabalho ético e moralmente aceito, as companhias estão indo além das suas já tradicionais normas e procedimentos, e têm desenvolvido códigos de ética visando direcionar adequadamente a conduta dos seus componentes e parceiros comerciais. Na atualidade, muitas empresas atendem aos anseios dos clientes re- lacionados aos seus produtos ou serviços e se envolvem em questões que buscam soluções de problemas mais abrangentes, o que atinge a todos. São problemas relacionados ao ambiente ou à sociedade, que a princípio nada teriam a ver com a empresa, mas que pela ótica da responsabilidade social empresarial estão diretamente ligados à atividade empresarial. Assim, existem programas desenvolvidos por corporações que envolvem questões de educação, profissionalização, bancarização, combate à fome, assistência social, controle ambiental, redução do 3r dt im el uc ky st ud io /S hu tte rs to ck 48 Propósito organizacional e capital social consumo energético, energia limpa, entre outros. Alguns autores clas- sificam essas iniciativas como criação de valor compartilhado (entre a empresa e a sociedade). As iniciativas humanas por relações éticas, mais transparentes e con- fiáveis não são novas, existindo diversos exemplos de códigos objetivan- do disciplinar alguma área de atuação social, mas as ações relacionadas à postura empresarial com viés ético têm seu início marcado a partir do Relatório Cadbury, em 1992 na Inglaterra, que pode ser considerado um marco em prol das boas práticas de governança corporativa. Outro exemplo trata-se do Pacto Global publicado em 2000 pela Organi- zação das Nações Unidas (ONU) que surgiu em razão da crescente preocu- pação com os efeitos negativos da globalização. O objetivo do documento é fornecer bases para o desenvolvimento das empresas de uma economia mundial mais sustentável e socialmente responsável (ONU, 2022). O Pacto Global se apoia em três eixos: os direitos humanos, os direi- tos do trabalho e os princípios de proteção ambiental (Figura 1). Cada eixo apresenta um grupo de princípios norteadores das diretrizes empresariais a serem adotados. Recentemente o Pacto Global incluiu mais um princípio, destinado ao combate da corrupção no âmbito dos ambientes corporativos. Figura 1 Princípios do Pacto Global (ONU) (Continua) conhecer, respeitar e proteger os direitos humanos; não violar e colaborar para impedir que os direitos humanos sejam violados. Direitos humanos permitir e apoiar a liberdade de livre associação e negociação representativa (sindical ou outra forma) no ambiente de trabalho; abolir o trabalho forçado, isto é, em condições análogas a escravidão; abolir e ajudar a combater o trabalho infantil; eliminar todo e qualquer tipo de discriminação no ambiente de trabalho. Equidade An dr ew K ra so vit ck ii/ Sh ut te rs to ck O Relatório Cadbury apresentou de maneira pioneira propostas para a governança corporativa das empresas britânicas considerando os prin- cípios da prestação de contas responsável e da transparência para com os acionistas e demais partes interessadas (stakeholders) sobre o desempenho de uma organização. Saiba mais Capital social 49 apoiar uma abordagem preventiva aos desafios ambientais; trabalhar na promoção da responsabilidade ambiental; encorajar tecnologias sustentáveis e que não agridam o meio ambiente. Proteção ambiental forma de tratamento igualitário a todos os acionistas e demais stakeholders respeitando seus direitos, deveres, necessidades, interesses e expectativas. Combate à corrupção An dr ew K ra so vit ck ii/ Sh ut te rs to ck Fonte: Elaborada pelo autor com base em ONU, 2022. Destaca-se que nenhum desses documentos é lei ou tem força de lei, mas são compromissos que podem ser assumidos por organizações que pretendem assumir posturas cada vez mais comprometidas com a responsabilidade social empresarial. Tanto é assim que por meio de do- cumentos orientadores, como os já citados, as corporações passaram a desenvolver seus próprios códigos de conduta, criando um conjunto de regras que se estendem a toda a sua cadeia de valor ou cadeia produtiva. Afinal, como afirmam Lauretti e Solé (2019), são as empresas que estão promovendo as mudanças sociais no mundo de hoje, e que por meio de suas novas formas de fazer negócios influenciam as pessoas a se comportarem de modo diferenciado e a agirem com o compromisso ético na busca do bem-estar comum. Isso, ainda segundo os autores, acontece pelo fato de o código de conduta ser a base para a melhoria da cultura ética empresarial, sendo fundamental para a implantação e gestão da governança corporativa e das ações de compliance, os quais agregam transparência, confor- midade legal, confiança e relações mais equilibradas com todos os envolvidos e interessados, fazendo com que uma empresa possa ser reconhecida como responsável socialmente. Esse reconhecimento deriva do comportamento ético, pois o públi- co consumidor pode constatar que a empresa, além de estar integrada na sociedade, assume a sua responsabilidade no que tange a contribuir para a melhoria do mundo em que vivemos sem deixar de desenvolver novos negócios, de crescer e se desenvolver de modo sustentável. O livro Código de conduta: evolução, essência e elaboração – A ponte entre a ética e a organização traz uma visão bem prática e interessante, pois aborda não só os aspectos da evolução do comportamento e dos códigos de conduta, mas também apresenta os aspectos relacionados à adoção desse tipo de filosofia de trabalho dentro das organizações e as ações que passam a ser desenvolvidas para se alcançar um desempenho superior e contribuir com a melhoria da sociedade e do ambiente, visando ao bem-estar social por meio de uma postura ética. LAURETTI, L.; SOLÉ, A. de A. Belo Horizonte: Fórum, 2019. Livro O livro traz uma visão bem prática e interessan- te, pois aborda não só os aspectos da evolução do comportamento e dos códigos de conduta, mas também apresenta os aspectos relaciona- dos à adoção desse tipo de filosofia de trabalho dentro das organizações e as ações que passam a ser desenvolvidas para se alcançar um desempenho superior e contribuir com a melhoria da sociedade e do ambiente, visando o bem-estar social por meio de uma postura ética. LAURETTI, L.; SOLÉ, A. de A. Código de conduta: evolução, essência e elaboração a ponte entre a ética e a organização. Belo Horizonte: Fórum, 2019. Livro 50 Propósito organizacional e capital social 2.4 Negócios com propósito Vídeo O desenvolvimento industrial, inicialmente ocorrido no hemisfério norte do planeta, e que depois se consolidou no hemisfério sul por meio das multinacionais, acabou por gerar muitos problemas relacio- nados à poluição ambiental e ao desequilíbrio social em razão da con- centração de renda apontada por muitos autores como um dosfatores de agravamento da pobreza em várias partes do mundo. Com o final da Segunda Guerra Mundial, em 1945, ocorreu um maior desenvolvimento científico sobre esses temas levando a uma ampliação nos governos e na sociedade da consciência ambiental e so- cial sobre as ações das empresas e os seus reflexos negativos ao futuro da humanidade e do planeta. Esse fato acabou por mudar o pensamento sobre o processo produ- tivo até então vigente. Como resultado, verificou-se a partir da segunda metade do século XX uma série de iniciativas da sociedade organizada na forma de documentos e eventos visando reformular o modelo de geração de riquezas. São exemplos disso o documento Nosso Futuro Comum 2 , denomina- do também como Relatório Brundtland (CMMAD, 1988), que apresentou uma nova definição sobre desenvolvimento sustentável e as diversas con- ferências da ONU, tais como: a Conferência de Estocolmo sobre meio am- biente humano em 1972; a ECO-92, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, e que lançou a Agenda 21 com os compromissos para melhoria da vida no planeta; a Conferência sobre o combate à desertificação em 1994; a Con- ferência sobre desenvolvimento sustentável em 1994 e 2002; a Cúpula da Terra +5 em 1997; o Protocolo de Kyoto em 1997; o Pacto Global em 2000; a Rio+10 em 2002; a Rio+20 em 2012; a Assembleia Ambiental em 2014 e 2016; a Cúpula de Desenvolvimento Sustentável e a publicação da Agenda 2030 em 2015, entre outras ações e eventos. Toda essa movimentação se deve ao fato de que um novo pensar sobre negócios com propósito, que podem ser enquadrados dentro da linha de pensamento da escola socioeconômica, envolve a modificação na raiz do pensamento econômico clássico. Milton Friedman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 1975, declara-se contrário ao pensamento da escola socioeconômica e reforça Publicado em 1987, o documento Nosso Futuro Comum trouxe uma nova visão para o termo desenvolvimento, definin- do-o como um processo capaz de satisfazer as necessidades do futuro, sem comprometer a capacidade das gerações futuras em suprir as suas próprias necessidades. Tal pensamento modificou a forma como a sociedade entende a relação de produção e consumo de bens, chamando a atenção para a necessidade de se ter atividades baseadas no desenvolvimento sustentá- vel e na responsabilidade social estabelecendo-se uma nova relação do ser humano com o meio-am- biente. A presidente da Comissão que publicou o relatório chama-se Gro Harlem Brundtland, por isso o citado documento também é conhecido como Relatório Brundtland. 2 Capital social 51 o pensamento econômico clássico com o argumento de que a responsa- bilidade social da empresa é gerar lucros aos acionistas, pois o desempe- nho econômico é a principal responsabilidade social em uma sociedade capitalista. Sua argumentação limitava a participação dos trabalhadores a só contribuírem para a riqueza dos acionistas e, em havendo cresci- mento dos lucros da organização, consequentemente haveria a melhora da qualidade de vida dos empregados (XAVIER; SOUZA, 2004). Por meio de artigo publicado no New York Times Magazine, em 1970, Friedman afirmou que a responsabilidade social faz com que a organização perca o foco do seu principal objetivo: a geração de lucros, podendo influir inclusive sobre sua competitividade (FRIEDMAN, 1970 apud MAKOWER, 1994). O pensamento de Friedman alicerça-se na doutrina clássica do re- gime da livre empresa, que defende a liberdade para o exercício de qualquer atividade econômica, assim como a disposição dos meios de produção do modo mais eficiente para atingir o lucro. Assim, uma em- presa pode contratar novos funcionários, produzir e determinar o me- lhor preço, com o controle sendo exercido pelas leis do livre mercado e da livre concorrência sem a intervenção do Estado. Dessa forma, presume-se que o bom senso guia as decisões do mer- cado, prevenindo o abuso e promovendo o bem-estar social de modo equilibrado por meio do fluxo adequado das riquezas. Os pensadores que são contrários à responsabilidade social empre- sarial apoiam-se nos direitos da propriedade declarados por Friedman. Neles, o autor defende que os representantes da alta direção devem representar os interesses dos acionistas e investidores, jamais agin- do contra o objetivo de maximizar os lucros dentro dos limites legais, acreditando, em primeiro lugar, que não é especialidade dos adminis- tradores tratarem de questões sociais, para as quais existem outras instituições já estabelecidas pela sociedade: governo, Igrejas, sindica- tos e organizações sem fins lucrativos. Porém, contrariando Friedman, em 1985 Robert Ackerman, defen- dendo a Teoria da Reatividade, afirmou que ao invés da forma proativa, a responsabilidade social deveria ser compreendida como a capacidade da empresa de responder aos problemas sociais, o que se chamou de responsividade (reposta social). Com isso, Ackerman colocou-se como A Teoria da Reatividade, defendida por Robert Ac- kerman se baseia na cren- ça de que uma empresa reage às demandas sociais em três fases: a primeira é o reconhecimento de que existe um problema social; a segunda é a contrata- ção de especialistas para auxiliar a corporação na resolução do problema encontrado, e a terceira é a adoção de ações da organi- zação para a resolução do problema. Observa-se que a teoria assim apresen- tada se limita a tratar o problema social por uma visão de microambiente, ou seja, como uma questão interna e pertinente à gestão empresarial. Saiba mais 52 Propósito organizacional e capital social um importante defensor da escola socioeconômica (ACKERMAN, 1985 apud XAVIER; SOUZA, 2004). O posicionamento de Ackerman confronta-se com o dos liberais no sentido de que, para eles, os problemas éticos estão a cargo de cada indivíduo, que deve saber o que fazer com sua liberdade de ação, ten- do sua conduta regulada pelas leis e pelo Poder Judiciário. Existindo a transgressão das leis, as entidades definidas pela sociedade devem agir no sentido de se fazer cumprir as regras e os padrões legais. Para Moreira (1999), a moral não se contrapõe ao lucro, assim como os aspectos técnicos não se opõem ao humanismo nem a eficácia é contrária à cultura. Desse modo, a empresa deve ser vista como parte integrante da comunidade, conciliando seus objetivos econômicos com a realização da pessoa (humanismo empresarial). O conceito de responsabilidade social não se alterou com o tem- po; o que mudou foram as “questões enfrentadas pelas empresas e as práticas de responsabilidade social, principalmente porque a socieda- de mudou e as empresas mudaram, e, consequentemente, as relações entre a sociedade e as empresas” (BORGER, 2001, p. 15). A contradição existente entre a busca pelo lucro e a preocupação com os problemas sociais apresenta-se como um problema a ser venci- do e que só pode ser resolvido quando se consegue equilibrar a gestão do negócio com as necessidades da sociedade. Isso exige uma prepa- ração dos administradores e demais profissionais para que, ao mesmo tempo que mantêm o foco nas exigências da competitividade, na bus- ca por baixos custos e na manutenção de altos padrões de qualidade, também consigam concretizar ações socialmente responsáveis que vão além dos discursos realizados pelo marketing. Nesse mesmo sentido, Ashley (2019, p. 18) apresenta um dilema que ocorre no atual ambiente globalizado: os interesses dos acionistas ou proprietários do capital das em- presas disputariam espaço com as demandas da comunidade, dos clientes, da mídia, dos funcionários, dos fornecedores e do Estado. Estamos, de fato, na busca por um modelo de gestão que inclua uma nova racionalidade para as estratégias empresariais. O atual ambiente global de negócios é formado por organizações de diversos tipos, desde as mais tradicionais que ainda objetivam somen- te os lucros financeiros, passando por empresas que já conseguiram Capital social 53 definirum propósito contendo uma nova visão no desenvolvimento das ações empresariais, e empresas que além de possuírem um propó- sito objetivam causar impactos sociais positivos. Esse último tipo de empresa que gera impacto social se apresenta como uma solução, pois geralmente é capitaneada por um empreende- dor social buscando alternativas inovadoras para problemas socioam- bientais causados pelo tradicional sistema de produção de produtos e serviços, tais como os reflexos negativos da concentração de riqueza e da má distribuição de renda. Em síntese, negócios que causam impactos sociais geram valor de maneira diferente do modelo tradicional, já que possuem um propó- sito socioambiental, mas não se confundem com instituições filantró- picas ou com a formação de uma OSC, em que se incluem as ONGs, fundações, associações de voluntariado, instituições religiosas etc. Os negócios com impacto social, também chamados de negócios sociais, são pessoas jurídicas (empresas) que precisam gerar lucro. En- tretanto, a destinação do lucro é que as diferencia dos negócios tradi- cionais, pois os lucros não vão para um proprietário, e sim se destinam a sustentar o negócio e, também, aos investimentos para ampliar a em- presa e o seu potencial de atendimento às demandas socioambientais. Para Yunus (2010), um negócio social serve para auxiliar outras pes- soas ou uma comunidade, e não o seu idealizador ou proprietário; para o seu criador, o sentido em abrir um negócio social está em obter satis- fação ao servir a uma causa nobre. Além disso, o autor destaca que o negócio social deve ser autossustentável gerando renda suficiente para cobrir as suas despesas e reinvestir o seu excedente financeiro na ex- pansão do negócio. Cabe ressalvar que, para o idealizador ou proprie- tário, há a possibilidade de recuperação do investimento inicial para que possa resgatar todo o valor aplicado no negócio. Entretanto, existem autores que defendem a distribuição dos lucros de um negócio social, já que esse movimento atrairia novos investido- res que com seus novos aportes criariam a possibilidade da geração de novos empreendimentos sociais. Independente do modelo de distribuição dos resultados obtidos, um negócio social bem-sucedido geralmente está baseado no plane- jamento e desenvolvimento de estratégias que viabilizam o empreen- dimento, possuindo indicadores que possibilitam medir e ampliar o 54 Propósito organizacional e capital social impacto positivo em determinada comunidade ou ambiente, o que se constata pela mudança na vida das pessoas, no compartilhamento da riqueza gerada, na melhoria das condições de moradia, higiene e saú- de, desenvolvimento educacional e profissional etc. Para citar um exemplo de um negócio com propósito ou um negócio social, trazemos o caso da TOMS, uma empresa norte americana que comercializa calçados e que a cada par vendido doa outro para uma co- munidade sem recursos. O propósito da empresa é declarado como me- lhorar vidas, e, de fato, ela vem investindo 1/3 dos seus lucros para esse fim. O processo teve início em 2006 unindo lucro com propósito e até hoje está vigente, o que demonstra que ter um negócio social não signifi- ca depender de doações ou ter uma empresa deficitária; pelo contrário. Outro negócio social de sucesso é o Grameen Bank, fundado por Muhammad Yunus, ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 2006, cujo objetivo é o de fornecer microcrédito e apoiar outros negócios sociais em seu desenvolvimento. A iniciativa deu tão certo que hoje o empre- sário e autor sobre o tema possui mais de 50 empresas e instituições de suporte a novos empreendedores sociais em projetos de inovação em serviços sociais que trabalhem com problemas reais da sociedade e do ambiente, inclusive no Brasil (Yunus Investimentos). 2.5 Gestão de pessoas em negócios inovadores e com propósito Vídeo Atualmente empresas inovadoras e de sucesso dão preferência à organização do trabalho dentro de uma estrutura mais flexível, sem tanta burocracia e que valorize o trabalho em equipes colaborativas que lidam com projetos voltados a produtos e serviços que não têm duração de longo prazo e, por atenderem a diversos tipos de públicos, dependem de times multidisciplinares trabalhando em conjunto. São estruturas similares ao modelo da Adhocracia, cujo foco está nos negócios, na valorização dos inter-relacionamentos e na busca em dar maior autonomia aos colaboradores (MINTZBERG, 2010). Organizações que entendem e declaram o seu propósito amparado nos reais valores e crenças que compõem a sua cultura organizacio- nal e que são praticados no seu dia a dia procuram agregar aos seus O autor de Criando um negócio social é um dos mais proeminentes defensores da linha de negócios sociais, tendo fundado um banco para prover microcrédito a pessoas pobres para que pudessem iniciar seus empreendimentos. Nesta obra se encontram considerações sobre a forma de se viabili- zar um negócio social com possibilidade de erradicação da pobreza e melhoria dos padrões de qualidade de vida, descrevendo exemplos que envolvem, inclusive, grandes empresas. YUNUS, M. São Paulo: Elsevier, 2010. Livro Capital social 55 quadros funcionais pessoas que se identifiquem e acreditem nas suas filosofias e objetivos de trabalho. Isso se difere do modelo clássico de administração de pessoas que leva em consideração apenas a estrutura hierárquica, os cargos e a efi- ciência operacional dos seus recursos humanos, dificultando o engaja- mento dos colaboradores às estratégias organizacionais. As corporações com negócios sociais, em oposição ao modelo clás- sico, oferecem aos seus colaboradores a oportunidade de atuarem em funções mais interessantes e nobres em substituição a tarefas repetiti- vas e que muitas vezes não fazem sentido para o trabalhador. O Quadro 1 dá um panorama sobre as filosofias de trabalho que dife- renciam as organizações com propósito das corporações convencionais. Quadro 1 Tipos de organizações e seus principais objetivos Tipo Objetivos principais Corporações do Modelo Clássico - Maximização e geração de lucros para os acionistas; - Estruturas hierárquicas lineares (cargos e responsabi- lidades); - Livre mercado e livre concorrência sem intervenção do Estado; - Liberdade para o exercício da atividade econômica. Organizações da Sociedade Civil - Respeito ao indivíduo e às questões socioambientais; - Deixar um legado positivo para as futuras gerações; - Ética empresarial; - Propósito organizacional definido e declarado; - Lucros financeiros, sociais e ambientais; - Governança corporativa e compliance; - Responsabilidade social: desenvolvimento sustentável e ética empresarial (código de conduta, valores e crenças); - Soluções de problemas socioambientais reais; - Pacto Global: direitos humanos, direitos do trabalho, proteção ambiental, combate à corrupção. Empresas com propósito Negócios sociais ou com impacto social Capitalismo consciente Empresas do sistema B Negócio Justo Fonte: Elaborado pelo autor. Naisbitt e Aburdene (1990) sinalizam que a partir dos anos 1950, mais pessoas passaram a realizar trabalhos intelectuais em substitui- ção às tarefas mecânicas e repetitivas. As novas atividades envolviam funções que lidavam com um maior volume de informações do que na produção direta de bens. 56 Propósito organizacional e capital social Os autores ainda destacam que o desenvolvimento tecnológico possi- bilitou uma maior produção agrícola e industrial com menor número de trabalhadores, que acabaram por se deslocar para empregos na área de prestação de serviços, onde a tecnologia dá suporte essencial para a inova- ção, aumento da produtividade, crescimento e desenvolvimento do setor. Apoiados nessa análise, Naisbitt e Aburdene (1990) identificam a mudança da sociedade industrial para a sociedade da informação; da economia local para a economia global; de negócios com visão de resultados em curto prazo para negócios com visão para resultadosmais positivos a longo prazo; das estruturas com processos e decisões centralizadas para descentralizadas; da hierarquia para o inter-relacio- namento (network); do desenvolvimento dependente unicamente das instituições para o auto desenvolvimento; e da sociedade do poder para uma sociedade que se beneficia da tecnologia (high-tech) equi- librada com a interação e os aspectos humanos (high-touch) em um mundo que oferece múltiplas opções de escolha. As estratégias e diretrizes para os empreendimentos com impacto social são definidas por sua cúpula estratégica (alta gestão), contando com o suporte de uma liderança (linha intermediária) mais humanizada e menos centralizadora que trabalha no sentido de unificar os esfor- ços dos colaboradores de apoio e os ligados ao núcleo operacional por meio do propósito organizacional (ideologia). São corporações que atuam de modo holístico, ou seja, partem da vi- são do todo organizacional, mas sem perder a gestão das partes em razão de conhecerem a sua importância nos processos, já que a sustentabilida- de do negócio se baseia na coordenação e colaboração entre as equipes. Os negócios com propósito que causam impactos sociais são empresas como qualquer outra, portanto precisam de profissionais competentes com as atitudes, as habilidades e o conhecimento neces- sários para garantir a estabilidade financeira do empreendimento ao mesmo tempo que gera benefícios para a sociedade. Tais profissionais, assim como os das organizações tradicionais, tam- bém lidam com o cenário volátil, incerto, ambíguo e complexo dentro de mercados cada vez mais conectados e que se renovam por meio das inovações tecnológicas, levando a ciclos de vida de produtos e serviços cada vez mais curtos e que exigem estruturas que possam vencer os obstáculos impostos por esse modelo de ambiente (WHITEMAN, 1998). Assim como os demais atores econômicos, esse tipo de organização e os seus colaboradores sofrem os reflexos dos eventos tais como as crises econômicas, as guerras, as pandemias entre outros que modifi- cam significativa e inesperadamente a nossa vida em sociedade. Isso exige que a corporação conte com pessoas habituadas a ge- rirem os recursos institucionais de modo flexível para que consigam adaptar facilmente os processos às novas exigências. Os recursos incluem o compartilhamento ágil das informações e um processo di- nâmico de tomada de decisões, as quais muitas vezes contam com a participação dos colaboradores de qualquer nível não se restringindo à liderança ou à alta gestão, o que exige profissionais menos vaidosos e menos centralizadores. Assim, a descentralização e a autonomia das equipes se constituem em temas fundamentais nesse tipo de estrutura. O conhecimento dos times que trabalham para organizações dessa na- tureza é resultado de uma composição multidisciplinar, ou seja, conta com as mais diversas expertises que possam auxiliar na geração de valor para o negócio social. São pessoas acostumadas a trabalhar com a máxima pro- dutividade para ampliar os seus resultados por meio de recursos limitados, assim como se empenham na obtenção de mais insumos quando se faz ne- cessário escalar as estruturas e processos para atender novas demandas. Outra característica que se destaca nos colaboradores de empresas de sucesso no mercado atual é o conhecimento e domínio de tecnolo- gias que melhoram o negócio, considerando que o uso da tecnologia deve ser empregado com criatividade e responsabilidade na busca de soluções reais para problemas socioambientais. As corporações que atuam com negócios sociais va- lorizam, e muito, as parcerias de mercado, sendo essa uma característica comum em empresas de sucesso, pois como a inovação depende de investimento, nem sempre é possível para uma única empresa prover todas as soluções de que ela precisa. Como solução para esse problema, entra em cena o uso de inovações desenvolvidas por terceiros (outsourcing), e que mesmo tendo um determinado custo, acaba por ser menor do que o investimento necessário para se chegar a um novo processo, pro duto ou serviço. 3r dt im el uc ky st ud io /S hu tte rs to ck Capital socialCapital social 5757 58 Propósito organizacional e capital social Esse cenário leva em consideração o fato de que os colaboradores de empresas com propósito também devem ter como competência o relacio- namento com o ambiente dinâmico dos negócios à sua volta para que pos- sam pesquisar e encontrar novas alternativas tecnológicas que favoreçam o negócio social, uma vez que trabalham em empresas que “se reinventam, adotam diferentes formas de se estruturar, ganham novos sócios, passam a ter outros desejos e aspirações em ritmo acelerado” (CASTRO, 2014, p. 75). É importante destacar que os colaboradores de uma organização com propósito possuem um diferencial em relação a muitos outros do mercado: eles partilham do ideal da companhia que, por sua vez, se vale disso para amplificar o potencial e a produtividade dos seus colabora- dores a fim de atender as demandas socioambientais a que se propôs. São pessoas que não buscam conforto dentro de uma estrutura orgânica formal com papéis exatamente definidos e processos hie- rárquicos com uma linha de comando e decisão tradicionais; pelo contrário, sabem e conseguem lidar com processos informais pos- suindo maior autonomia para a realização das suas tarefas. Outras competências identificadas em colaboradores de orga- nizações com propósito e negócios sociais são a inteligência e a paixão que se dispõem a empregar a favor da causa defendida. Todas essas características colaboram para um maior engaja- mento da força de trabalho aos propósitos e estratégias organizacio- nais, que nesse tipo de corporação possuem sentimentos positivos compartilhados entre a empresa social e os seus trabalhadores. As filosofias propagadas pela companhia são confirmadas por suas ações diárias e por um tipo de gestão democrática que facilita o acesso e a participação dos seus colaboradores ao grupo de ges- tores para a melhoria dos processos, produtos e serviços sociais. Os colaboradores são incentivados a desenvolver o seu conheci- mento técnico e pessoal com vistas a obter maior autonomia e asser- tividade. Como resultado, surgem equipes e pessoas empoderadas e motivadas a assumirem maiores responsabilidades e a aumentarem a sua produtividade, o que inclui o desenvolvimento de soluções basea- das em tecnologias de ponta. Além disso, existe o reconhecimento e a premiação dos méritos de cada indivíduo e das equipes. Castro (2014, p. 57), identificou que os integrantes desse tipo de empresa: O livro trata de inovação e criatividade de empreen- dedores brasileiros que não atuam em empresas de tecnologia, mas que encabeçam empresas diferenciadas na sua forma estrutural e de gerir pessoas com relação à contratação, à remune- ração e ao modelo de negócios. A leitura da obra possibilita pensar em formulações criativas de negócios que possam trazer maior benefício para a sociedade e maior satisfação pessoal aos seus empreendedores e colaboradores. CASTRO, M. Empreendedorismo criativo: como a nova geração de empreendedores brasileiros está revolucionando a forma de pensar conhecimento, criatividade e inovação. São Paulo: Portfolio- Penguin (Companhia das Letras), 2014. Livro Capital social 59 na maioria dos casos, se conhecem, se relacionam, compartilham ideias e projetos e têm traços em comum. Além de revolucionar as relações entre pessoas e trabalho e de derreter formas con- vencionais de estruturar uma empresa, elas estão criando para si um tipo de negócio ideal (ou algo muito próximo a isso). Parecem estar em busca de um trabalho que dê sentido para a vida. Que tem a ver com propósito. Em que podem construir relações com pessoas pelas quais se interessam e admiram. Por isso trocam cargo e estabilidade por motivação, prazer e diversão. Sem ja- mais abrir mão do reconhecimento. É comum muitos profissionaisse perguntarem quando e se realizarão alguma coisa relevante em suas vidas, no sentido profissional, mas para isso é importante que eles encontrem sentido em seus trabalhos e façam a diferença na vida de outras pessoas. CONSIDERAÇÕES FINAIS Um dos sintomas mais positivos percebidos no atual ambiente de ne- gócios global é a disposição de muitas organizações em modificar a sua forma de agir buscando uma atuação que cause menor ou nenhum refle- xo negativo na sociedade e no ambiente, isso sem deixar de lado as suas preocupações com a lucratividade que sustenta os seus negócios. Essas corporações buscam acumular capital social por meio do reconhe- cimento de que atuam com responsabilidade social em conjunto com toda a sua cadeia de valor. O que antes era visto como modismo hoje é fator inspirador para o surgimento de negócios inovadores e que focam na solução dos proble- mas reais da nossa sociedade e do nosso planeta. Isso se confirma por meio do crescente número de empreendedores sociais que a partir dos anos 1990 criaram diversas OSCs e empresas de serviços sociais, produzindo bens e serviços diferentes dos tradicionais mo- delos de negócios que visam somente à maximização do lucro financeiro. São iniciativas que valorizam a ética nos negócios, a governança cor- porativa, o combate à corrupção e respeitam os direitos humanos e trabalhistas, o que melhora e muito a motivação da força de trabalho e aumenta o orgulho dos seus colaboradores. Motivadas a encontrarem o seu papel social, diversas corporações passaram a entender e a declarar o seu propósito, conseguindo agregar profissionais em seus quadros que se identificam e lutam pelas mesmas 60 Propósito organizacional e capital social crenças e valores, se automotivando para o aumento da produtividade e para realizarem suas tarefas em um ambiente capitalista mais consciente das suas responsabilidades junto à sociedade e ao meio ambiente. Além de todo benefício que empresas com um bom propósito defi- nido trazem para a sociedade, suas ações também inovam na forma de acolher, desenvolver, gerir e tratar as pessoas, pois consideram acima de tudo as questões humanas dentro dos ambientes de negócio. ATIVIDADES Atividade 1 Defina conceitualmente a responsabilidade social. Atividade 2 Existem diversos tipos de capital que uma organização pode ter. Como se define o capital social? Atividade 3 Empresas inovadoras não se adaptam com estruturas hierárquicas que não sejam flexíveis. Qual o tipo de estrutura organizacional que mais se adapta às empresas com propósito e que atuam em negócios sociais? Explique. REFERÊNCIAS ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR ISO 26000: diretrizes sobre responsabilidade social. Rio de Janeiro, 2010. ASHLEY, P. A. Ética e responsabilidade social nos negócios. São Paulo: Saraiva, 2019. BORGER, F. G. Responsabilidade social: efeitos da atuação social na dinâmica empresarial. 2001. Tese (Doutorado em Administração) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2001. BRASIL. Lei n. 13.019, de 31 de julho de 2014. Diário Oficial da União. Poder Legislativo, Brasília, DF, 1 ago. 2014. 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Se antes objetivavam puramente a maximização dos seus lucros, atualmente pro- curam desenvolver um propósito maior para equilibrarem os resultados financeiros com as conquistas socioambientais. O processo de definição do propósito possibilita que as organizações tenham maior clareza do papel que exercem dentro da nossa sociedade, fator que as auxilia a direcionar suas ações levando em consideração as necessidades humanas. Por sua natureza, os negócios sociais e aqueles que se baseiam na filosofia do capitalismo consciente têm maior facilidade em administrar estruturas mais humanizadas que motivam o seu capital humano e inte- lectual a ampliar a sua produtividade em razão da satisfação pessoal que têm ao trabalhar para empresas que causam impacto social positivo. Esses assuntos serão tratados neste capítulo, iniciando-se pela análise sobre as etapas da integração do propósito organizacional com a cultura organizacional. Na sequência, descreve-se o processo de assimilação pelos colabora-dores do propósito da organização e depois se apresentam os aspectos atuais sobre diversidade e inovações nos ambientes empresariais. Também se discute como o propósito colabora para a melhoria da qualidade de vida no trabalho. Para finalizar o capítulo, busca-se identificar os principais benefícios que o propósito organizacional traz para determinados grupos de sta- keholders (clientes, colaboradores e sociedade). Propósito e cultura organizacional 63 Com o estudo deste capítulo, você será capaz de: • analisar as etapas da integração do propósito organizacional com relação à cultura organizacional; • descrever o processo de assimilação pelos colaboradores do pro- pósito da organização; • conhecer os aspectos atuais sobre diversidade e inovações nos ambientes empresariais; • entender como o propósito colabora para a melhoria da qualidade de vida no trabalho; • identificar os benefícios que o propósito organizacional traz para os stakeholders. Objetivos de aprendizagem 3.1 Integração do propósito com a cultura organizacional Vídeo A definição do propósito organizacional não é um ato isolado; pelo contrário, é necessário que o propósito e a cultura organiza- cional estejam integrados, pois ambos impactam diretamente as reações da força de trabalho (capital humano) e dos demais inte- ressados (stakeholders), tais como: clientes, parceiros comerciais, investidores, comunidade etc. As empresas devem incluir em sua cultura uma nova forma de pensar os seus negócios, tendo consciência de qual é o seu propó- sito e direcionando suas ações pelos princípios do capitalismo cons- ciente. Esse capitalismo é caracterizado por ser “um paradigma em desenvolvimento para os negócios que simultaneamente cria vários tipos de valor e bem-estar para todas as partes interessadas: finan- ceiro, intelectual, físico, ecológico, social, cultural, emocional, ético e até mesmo espiritual” (MACKEY; SISODIA, 2018, p. 35). Ainda segundo Mackey e Sisodia (2018), o número de organizações que estão aderindo aos princípios do capitalismo consciente está em pleno crescimento. Tais princípios são interligados e se reforçam mu- tuamente, e são vistos a seguir: 64 Propósito organizacional e capital social O propósito maior se caracteriza pela constante busca da definição de por que e para que o negócio existe, questionando até a própria necessidade de sua existência. Ao encontrar as respostas para esses questio- namentos, uma corporação se prepara para superar o objetivo de gerar lucro e criar valor maior para os acionistas, por meio do engajamento de toda a sua cadeia de valor que, por sua vez, deve estar comprometida a canalizar e empregar a sua energia criativa em ações inovadoras direcionadas pelos valores centrais da sua cul- tura organizacional. Todo esse conjunto de ações eleva o moral e a motivação, melhorando o desempenho corporativo e au- mentando o compromisso ético. O propósito maior é o centro de interligação da empresa com os demais princípios. A integração de stakeholders considera o envolvimento de todos os interessados de modo conectado e interdependente, sendo fator de motivação comum o senso de propósito maior. Em caso de possí- veis divergências de interesses entre os stakeholders, os autores citam a criatividade humana como a fonte de soluções em que todos ganham, soluções essas que conseguem fazer com que o status do ambiente retorne para uma condição de harmonia. Uma liderança consciente tem como objetivos principais servir ao propósito definido pela organização e criar valor para todos os stakeholders. São líderes preparados para gerar múltiplos valores para todos evitando situações em que as pessoas tenham de tomar deci- sões que necessitem renunciar a um benefício para ter outro (trade-off) ou ainda em que só um lado leve vantagem e o outro perca (pay-off). Os gestores que exercem a liderança consciente são pessoas analíti- cas, que se permitem vivenciar suas emoções, bem como respeitam as questões relacionadas ao espírito humano, características que os auxi- liam a compreender e interagir de modo sistêmico nas relações com os demais stakeholders. Sua atuação evita a administração por conflitos, a discriminação das diferenças e as análises sem profundidade. A cultura e gestão consciente tem o objetivo de, ao longo do tempo, proporcionar força e estabilidade para o tecido organizacio- nal, garantindo que os valores centrais e o propósito da corporação se mantenham válidos e atualizados mesmo com todas as transfor- Fi da O lg a/ Sh ut te rs to ck Fi da O lg a/ Sh ut te rs to ck Propósito e cultura organizacional 65 mações do mercado e com a natural troca das lideranças corporati- vas. A aderência dos stakeholders ao propósito maior deve considerar a necessidade constante de evolução da cultura organizacional e da existência de características fundamentais para empresas que atuam pela filosofia do capitalismo consciente, tais como: responsabilidade, transparência e lealdade. O propósito maior da organização é o elemento central da filosofia do capitalismo consciente com o qual se integram os demais princípios dessa nova forma de se empreender, como se pode observar na Figura 1. Integração de stakeholders Propósito maior e valores centrais Liderança consciente Cultura e gestão consciente Figura 1 Princípios do capitalismo consciente Fonte: Mackey; Sisodia, 2018, p. 35. A integração do propósito organizacional (propósito maior) com a cultura organizacional passa a ser fundamental, já que ambos impac- tam diretamente a produtividade e os resultados de uma empresa por meio das reações que provocam nas pessoas (capital humano). Quando se trata do capital humano, “as organizações têm de ver as pessoas não como recursos, mas como fontes. Recurso é como o pe- daço de carvão que você queima e se extingue. Fonte é como a energia inesgotável do sol gerando continuamente luz e calor. Não há fonte de energia criativa mais poderosa no mundo do que o ser humano” ( MACKEY; SISODIA, 2018, p. 42). As pessoas são a chave inicial do processo para que o propósito esteja integrado à cultura organizacional. Suas etapas estão descritas a seguir. 66 Propósito organizacional e capital social A participação efetiva da cúpula estratégica (alta gestão) é ne- cessária, pois são essas pessoas que patrocinam e incentivam a im- plantação de novos valores dentro das corporações. De acordo com Mintzberg (2010), são elas que administram e definem as diretrizes para o atingimento de metas e propósitos organizacionais, represen- tando os acionistas (investidores), e, portanto, seu envolvimento real é indispensável para o sucesso do propósito desejado. É preciso avaliar, definir e fazer a revisão da ideologia que será im- plementada, a qual se refere ao propósito, às crenças e aos valores que direcionam as ações da corporação na condução dos seus negócios e que a diferenciam em seu mercado (MINTZBERG, 2010). A atualização da estrutura organizacional é importante, pois Mintzberg (2010) afirma que ela deve ser dinâmica, indo além da hie- rarquia e do controle, evitando o excesso de formalização, descen- tralizando o processo de decisão e dando maior importância para as inter-relações das pessoas e maior foco no negócio. É preciso que os colaboradores (núcleo operacional, tecnoestrutura e assessoria de apoio) tenham engajamento e compartilhem a cultura organizacional de modo consciente, ou seja, que aceitem e vivenciem os valores centrais dessa cultura para que o propósito (ideologia) não seja apenas um discurso da cúpula estratégica (alta gestão), mas real- mente o que norteia os negócios da empresa. Chiavenato (2014) afirma que para ocorrer o comprometimento das pessoas é preciso incrementar cinco ações ativadoras do engajamento, que são: escutar, reconhecer e comemorar as realizações; investir o tempo que for necessário para selecionar bem os novos colaborado- res; treinar e desenvolver todos constantemente; desenvolvere prati- car programas de incentivos a todas as pessoas; e proporcionar melhor qualidade de vida no trabalho às pessoas. Ainda é necessário eliminar todos os itens que podem inibir o en- gajamento, ou seja, processos complexos e desnecessários que dificul- tem a vida dos colaboradores; implementar estruturas organizacionais mais funcionais com o redesenho dos papéis e dos cargos; e, por últi- mo, eliminar regras burocráticas e condições humilhantes às pessoas (CHIAVENATO, 2014). Além disso, destaca-se que o processo de engajamento se inicia já na seleção de pessoas que se identifiquem com a empresa e partilhem Propósito e cultura organizacional 67 do seu propósito maior, e para isso é necessária a utilização de ferra- mentas que possam indicar o grau de aderência dos candidatos aos valores centrais da organização. Outro item complementar trata-se do processo de integração dos colaboradores que também deve cuidar do alinhamento dos objetivos individuais aos corporativos. Citam-se ainda mais alguns itens que auxiliam no engajamento da força de trabalho, tais como: um bom clima organizacional, condições adequadas de trabalho, respeito aos direitos trabalhistas e humanos, entre outros. As políticas de gestão de pessoas devem orientar e preparar as lideranças (gerentes, coordenadores, supervisores etc.) para que pos- sam conectar as estratégias definidas pela cúpula estratégica com o nú- cleo operacional de modo mais humanizado, inspirando e motivando seus liderados a agirem positivamente, o que inclui a disseminação do propósito e da cultura organizacional a todos os demais stakeholders. É fundamental a decisão sobre aderir à filosofia do capitalismo consciente considerando que isso envolve defender um propósito maior, em que existe o respeito à interdependência dos participantes, que devem ser engajados e liderados por gestores também conscien- tes (MACKEY; SISODIA, 2018). A relação com os proprietários, acionistas e investidores deve ser pautada pelo respeito ao capital que foi por eles investido na or- ganização e para o qual deve haver retorno. Entretanto, é nessa etapa que se trabalha a conscientização desses stakeholders com relação ao propósito maior da companhia e às mudanças para melhorar sua cul- tura corporativa, e tal grupo necessita ter informações transparentes sobre o negócio da empresa e como serão obtidos os seus retornos ao longo do tempo. Empresas que atuam dentro da filosofia do capita- lismo consciente, assim como os negócios sociais, não são instituições sem fins lucrativos; pelo contrário, precisam objetivar lucros, mas com um propósito maior e com consciência social. É necessário o envolvimento da cadeia de fornecedores, tratando-os como verdadeiros parceiros do negócio e que devem par- tilhar os valores centrais da cultura organizacional e o propósito da empresa ou pelo menos se identificar com eles. As transações entre comprador e fornecedor precisam ser balizadas por uma relação em que todos ganhem. Esse grupo de stakeholders merece atenção espe- No vídeo Capitalismo consciente: uma nova era econômica, Thomas Eckschmidt apresenta os conceitos básicos do capitalismo consciente, utilizando exemplos práti- cos e didáticos, por meio dos quais o aluno pode compreender como esse movimento tem crescido no mundo dos negócios como consequência do en- gajamento dos stakeholders e de ações que ao mesmo tempo que trabalham pelo lucro causam impactos po- sitivos na sociedade. Tudo tendo como princípio a definição de um propósito por parte das organizações integrado à sua cultura organizacional. Disponível em: https://www.youtube. com/watch?v=_UlZoxQuIzQ. Acesso em: 17 ago. 2022. Vídeo https://www.youtube.com/watch?v=_UlZoxQuIzQ https://www.youtube.com/watch?v=_UlZoxQuIzQ cial, pois são responsáveis pela qualidade dos componentes dos pro- dutos ou serviços que serão entregues aos clientes finais e, assim, têm relação direta com a nossa proposta de valor para o mercado. Já a percepção do público consumidor significa que todos os es- forços empregados pela companhia e por seus stakeholders devem re- sultar na boa reputação da corporação junto aos seus consumidores e da sociedade como um todo. Reforça-se que isso não se dá por meio de campanhas publicitárias, mas pelas ações captadas pela sociedade a respeito da condução dos negócios pela empresa. 3.2 Assimilação do propósito organizacional pelos colaboradores Vídeo Pode-se definir uma organização como a junção de pessoas dis- postas a cooperar mutuamente para que possam alcançar objetivos comuns, o que se torna possível quando há inter-relação e comuni- cação entre elas (CHIAVENATO, 2008). Dentro de uma corporação, existem os mais variados tipos de pessoas com diferentes origens, religiões, crenças, valores, sexo, raça, opções pessoais, políticas etc. Porter, Lawler e Hackman (1975) nos trazem algumas das ca- racterísticas e definições sobre o comportamento das pessoas nas organizações. O ser humano pode ser proativo, ao direcio- nar o seu comportamento para obter a sua satis- fação pessoal alcançando objetivos e aspirações, reagindo ao ambiente e podendo resistir negati- vamente ou colaborar positivamente. O envolvimento com outras pessoas no trabalho é importante para o ser humano, por isso pode ser definido como social. A aceitação da pessoa por um grupo reafirma a sua identidade e mantém a sua sen- sação de bem-estar que lhe possibilita chegar a um autoconceito. Com base nesse relacionamento, cria- -se uma realidade social para comparar a suas com- petências, ideias e concepções. An dr ii Ya la ns ky i/S hu tte rs to ck An dr ii Ya la ns ky i/S hu tte rs to ck 6868 Propósito organizacional e capital socialPropósito organizacional e capital social Propósito e cultura organizacional 69 As pessoas são seres com diferentes necessidades. As necessida- des de hoje podem não ser as mesmas de amanhã, assim como as de um indivíduo são diferentes das de um grupo. As necessidades também variam em quantidade e valência (emoções positivas ou negativas). Com base nas experiências vividas e no que se passa no ambiente, é preciso ter percepção e saber avaliar, além de ser capaz de selecionar e analisar os fatos, o que pode redirecionar ou não as suas necessidades. É preciso saber pensar e escolher, e quando há um sentimento de que a recompensa pelo esforço é real, o colaborador emprega um es- forço maior para melhorar o seu desempenho, e assim consegue atingir os seus objetivos, com a possibilidade de continuar a obter recompen- sas. As escolhas pelo maior esforço se baseiam em três parâmetros: • meu esforço melhora o desempenho (expectativa); • meu desempenho traz recompensas (instrumentalidade); • as recompensas são atraentes e valiosas (valência). O ser humano também é um ser com limitada capacidade de res- posta, e essa limitação se dá em razão do que cada indivíduo pretende ou ambiciona. Aqui prevalecem as diferenças individuais de produtividade, en- trega e comportamentos variados, que também dependem das aptidões (que são inatas) e da aprendizagem (que pode ser adquirida), além dos as- pectos relacionados à capacidade mental e física de cada um. Alguns estudiosos acrescentam aos fatores descritos outras diferen- ças baseadas nos conflitos de gerações que classificam os colaborado- res em grupos com diferentes períodos de nascimento, o que os levaria a compartilhar as mesmas experiências históricas, ideais e ambientes sociais. Os grupos se dividem em: baby boomers (nascidos entre 1946 e 1964), geração X (nascidos entre 1965 e 1977), geração Y ou millennials (nascidos entre 1978 e 1995) e geração Z (nascidos de 1996 em diante). Todas essas diferenças poderiam influenciar suas decisões, valo- res e crenças, como a visão do que seria um bom emprego ou o que caracterizaria o sucesso para um trabalhador. Para os baby boomers eram importantes questões relacionadas à carreira e ao sucesso financeiro; já a partirda geração Y passa a existir uma maior preocupação com a qualidade de vida, e o sucesso no tra- 70 Propósito organizacional e capital social balho não estava mais vinculado a uma carreira estável e a um vínculo de longuíssimo prazo dentro de uma mesma organização. As novas gerações vislumbram atuar em um bom ambiente de tra- balho, em uma função que tenha sentido, ou seja, realizando tarefas que tenham significado para eles. Além disso, tudo dentro de uma cor- poração que possua uma cultura em que esteja presente um propósito com valores socioambientais com os quais se identifiquem e que além do lucro beneficiem a comunidade é importante. Os grandes impactos causados pelas últimas crises mundiais tam- bém contribuíram para inovações na organização do trabalho com práticas como o home office, o trabalho por demanda e o trabalho de meio período, que acabaram por despertar em muitas pessoas preocu- pações com o equilíbrio entre trabalho e qualidade de vida, e entre as ações empresariais e o reflexo na sociedade. Conhecer e administrar todas as diferentes características humanas passa a ser importante para uma organização que pretende dissemi- nar o seu propósito, pois é necessário saber como proceder para con- quistar a adesão de toda a sua força de trabalho. O processo de assimilação do propósito pelos colaboradores se ini- cia em como os trabalhadores entendem o que a empresa comunica. Destaca-se aqui que a percepção das pessoas que trabalham para a em- presa com base nos valores centrais que ela dissemina é um indicador de qualidade e da veracidade do discurso versus a realidade das ações. Isso pode ser medido por meio da avaliação do clima organizacio- nal, o que, para Nacife (2018), dá suporte à gestão, permitindo uma visão mais precisa sobre os processos e relacionamentos que determi- nam os comportamentos dos colaboradores, inclusive como se portam os responsáveis pela liderança. Existem diversas metodologias e ferramentas disponíveis para esse trabalho: conversas informais entre colaboradores e liderança; canais de comunicação com a administração para o registro de queixas e reclama- ções, bem como para o envio de sugestões; oportunidades para conver- sas diretas com os representantes da alta direção; reuniões de grupo; eventos sociais (almoços, jantares, jogos, entre outros) promovidos com esse intuito; questionário de desligamento e pesquisa de clima. Propósito e cultura organizacional 71 Para Quinn e Thakor (2019), o propósito de uma organização já exis- te, mesmo antes de estar descrito, e é representado por suas decisões e ações. Ao medir o clima organizacional, consegue-se identificar o grau de adesão dos colaboradores ao propósito. Os autores ainda afirmam que os trabalhadores buscam um pro- pósito em suas atividades, e que a organização precisa inspirá-los e engajá-los para que sejam alcançados resultados positivos. Isso difere da gestão clássica, na qual as pessoas orientam suas ações por seus próprios interesses empregando sempre o menor esforço possível para obterem uma recompensa melhor, situação em que se faz presen- te uma forte supervisão dos trabalhadores e um sistema de punição. Quinn e Thakor (2019) descrevem oito passos importantes para que os colaboradores assimilem o propósito organizacional, que es- tão descritos a seguir. A definição da visão que a empresa orientada ao propósito possui pode ser obtida por meio da coleta de opiniões ou ideias, e até de sugestões para a melhoria da corporação. A participação pode ser de todos os interessados ou pelo menos das lideranças mais significativas da companhia. O que se pretende é idealizar a empresa que se quer orientada a um propósito. A descoberta do propósito, somada aos dados obtidos pela co- laboração dos stakeholders, é necessária, além da análise do que é a empresa visando descobrir qual é, de fato, o propósito que reflita a corporação percebida por todos. Em conjunto, os colaboradores de- vem ser orientados a verificar se estão identificados com o propósito encontrado e se precisam definir os seus propósitos pessoais. O tratamento autêntico dos colaboradores (autenticidade) envol- ve a eliminação das pressões sobre as opiniões e os comportamentos dos trabalhadores para que permitam uma comunicação de mão dupla não havendo tantas reservas entre a gestão e a operação. A reserva e o ambiente sem liberdade levam a comportamentos contidos e não autên- ticos e eliminam a apresentação de ideias, reduzindo a criatividade. Não deve haver receio por parte das lideranças de ouvir o que não querem, e é preciso transformar os erros honestos em oportunidades de aprendi- zagem. O propósito autêntico abrange todas as ações e decisões da cor- poração, o que fortalece a sua autenticidade e a cultura organizacional. No vídeo How to live life to the fullest with a purpose, Robert E. Quinn fala sobre a influência do propósito na vida das pessoas e o quanto a adesão a um propósito maior beneficia um indivíduo em todos os sentidos, principalmente no profissional. Ao visua- lizar o vídeo, o educando tem a oportunidade de encontrar indicações para melhorar a sua perfor- mance como um todo. Disponível em: https://www.youtube. com/watch?v=fG4PCH 5TaQ4&list=PLkbMsWCOW Mdvlp9vr9ZtlCNGuOhvTQ4ts &index=10. Acesso em: 17 ago. 2022. Vídeo https://www.youtube.com/watch?v=fG4PCH5TaQ4&list=PLkbMsWCOWMdvlp9vr9ZtlCNGuOhvTQ4ts&index=11 https://www.youtube.com/watch?v=fG4PCH5TaQ4&list=PLkbMsWCOWMdvlp9vr9ZtlCNGuOhvTQ4ts&index=11 https://www.youtube.com/watch?v=fG4PCH5TaQ4&list=PLkbMsWCOWMdvlp9vr9ZtlCNGuOhvTQ4ts&index=11 https://www.youtube.com/watch?v=fG4PCH5TaQ4&list=PLkbMsWCOWMdvlp9vr9ZtlCNGuOhvTQ4ts&index=11 https://www.youtube.com/watch?v=fG4PCH5TaQ4&list=PLkbMsWCOWMdvlp9vr9ZtlCNGuOhvTQ4ts&index=11 72 Propósito organizacional e capital social A tomada de decisões baseada no propósito maior é importante, pois esse propósito deve servir de referência para todas as decisões corpora- tivas, considerando-o como argumento final durante o processo decisivo. O estímulo e apoio ao aprendizado contínuo consiste em aproveitar o desejo dos colaboradores para aprender e se desenvolver sempre, já que as corporações que investem no desenvolvimento das suas pessoas são as que estão obtendo sucesso no atual mercado. O desenvolvimento das pessoas possibilita o desenvolvimento da organização como um todo. É preciso permitir que a liderança consciente conduza as equipes com base em seu senso de propósito. A liderança consciente (linha intermediá- ria: gerentes, coordenadores, supervisores etc.) atua realizando a conexão da alta gestão com os colaboradores (núcleo operacional). Essa liderança é responsável pela disseminação dos valores centrais e do propósito da cor- poração junto aos trabalhadores, explicando a esse grupo como o propósito orienta a tomada de decisão da companhia, o que aumenta o engajamento da força de trabalho. A organização deve preparar seus líderes para que possam inspirar os demais interessados a aderirem ao propósito maior. Conectar os colaboradores e demais stakeholders ao propósito organizacional consiste em convencer a força de trabalho a aderir ao propósito organizacional. E não basta só definir um propósito, deve existir um trabalho de comunicação eficiente que o reforce continua- mente, e esse propósito precisa deixar a sua marca em tudo o que a organização faz. Colaboradores talentosos são atraídos e manti- dos por um bom propósito, já que se envolvem emocionalmente nos objetivos da corporação, e as pessoas se sentem bem ao colaborar para a melhoria do ambiente, dos resultados, da sociedade etc., o que é ampliado quando a organização estimula a visão pelo propósito. É necessário deixar claras as responsabilidades dos líderes e das equipes que assumem o propósito, pois eles devem ser cons- cientizados das suas responsabilidades com as atividades, existin- do transparência quanto à importância da sua colaboração para os resultados atuaise futuros para a empresa e a sociedade, o que também faz parte da responsabilidade dos colaboradores e líderes. Destaca-se que uma empresa que adota esses princípios não deixa de acreditar no capitalismo. O que se faz é pensar de modo diferente tendo foco na geração de lucro, mas com uma consciência ampliada sobre o real propósito da corporação objetivando o bem-estar social. Propósito e cultura organizacional 73 3.3 Diversidade e inovação Vídeo Empreender é, antes de tudo, estar pronto para enfrentar os mais diversos desafios que se apresentam ao erguer e manter um negócio em funcionamento. Entre esses desafios, destaca-se a complexidade de construir práticas corporativas baseadas na ética organizacional e que in- cluam questões relacionadas à diversidade cultural, étnica, orien- tações sexuais, credos e princípios, assuntos que antes não eram abordados dentro das corporações, mas que na atualidade, de modo positivo, vêm sendo tratados pelas organizações. Afinal, a própria maneira como organizamos o trabalho concen- tra pessoas distintas em um mesmo ambiente, o que leva a convi- vência do colaborador com uma ampla: diversidade de pensamentos, princípios, crenças, valores, credos, opiniões, culturas e visões de vida diferentes da sua. Mesmo em atividades no estilo home-office, a coexistência de visões diferentes sobre os mais diversos assuntos se faz presente, uma vez que o ser humano parte da sua individualidade para o coletivo, portanto se caracteriza por suas particularidades. (GONÇALVES, 2021, p. 78) Thomas Jr. (1992) aborda a questão da diversidade sob dois prismas, e o primeiro se relaciona com a ação afirmativa, que se trata de uma pers- pectiva direcionada a grupos excluídos ou discriminados socialmente e que deveriam ter oportunidades iguais aos demais membros da sociedade. A ação afirmativa se fundamenta na responsabilidade social, legal, moral e social, já que para o autor a diversidade acaba atingindo to- das as pessoas, independentemente de raça, gênero, tipo de trabalho (função), idade, experiência de vida ou profissional, tempo de traba- lho para uma empresa, estilo de vida, status social, educação, origem, orientação sexual etc. O segundo prisma se relaciona com a gestão da diversidade, ou seja, a prática dos gestores sobre a diversidade dentro das organizações, que se difere da ação afirmativa por tratar da situação de determinado grupo de pessoas diferentes inseridas dentro de um sistema social ou organizacional e interagindo para a obtenção de resultados. O autor afir- ma que não se deve ignorar as questões da diversidade abordadas pela 74 Propósito organizacional e capital social ação afirmativa, mas que elas não devem ser fator decisivo na escolha ou no desenvolvimento dos colaboradores, pois um grupo heterogêneo quando é capacitado, influenciado e empoderado chega a resultados di- ferenciados ou tão bons quanto qualquer outro (homogêneo). Negócios sustentáveis, responsáveis socialmente e que objetivam a formação de uma sociedade mais justa desenvolvem ações dentro das seguintes dimensões: “visão e estratégia; governança e gestão; social; e ambiental” (INSTITUTO ETHOS, 2018, p. 91). A diversidade se encaixa na dimensão social, abarcando uma série de outros assuntos que indicam o grau de aderência da corporação a itens relacionados à sua responsabilidade social, tais como o respeito aos direitos humanos e às relações e práticas de trabalho que evitem o trabalho forçado, infantil ou escravo e que incentivem a diversidade, a política de remuneração e o desenvolvimento profissional, além de condições adequadas de trabalho, desenvolvimento de fornecedores, relações com o consumidor e com a comunidade em geral. Nesse contexto, o processo de promoção da diversidade envolve a mudança da cultura organizacional e, consequentemente, das diretri- zes que nortearão o ambiente de trabalho, processos geralmente len- tos e que dependem essencialmente da adesão e do patrocínio da alta gestão. Portanto, não é possível alterar a estratégia corporativa sem mudar primeiro a cultura organizacional (PAULA..., 2016). As ações precisam ser pensadas e planejadas para atingir o sucesso, pois uma empresa que respeita a diversidade não é aquela que contrata algumas pessoas com características diferentes das demais, mas sim a que seleciona colaboradores por suas competências, talento e potencial, oferecendo oportunidades justas e iguais para todos, assim como pre- para seus líderes para respeitarem as experiências, o conhecimento, os valores e as crenças individuais de cada funcionário. A linha intermediária de comando será a responsável pela difusão, treinamento e desenvolvimento e pela fiscalização e reorientação dos colaboradores sobre as políticas de gestão de pessoas e diversidade. Sem a efetiva participação desse nível de liderança, é muito difícil que o que foi planejado pela alta gestão chegue aos colaboradores. Ressalta-se que cada corporação é um universo particular, e assim cada uma deve encontrar uma maneira de garantir que isso seja im- plementado para que se atinja o bem-estar coletivo, coibindo abuso Propósito e cultura organizacional 75 de poder, situações de desrespeito e assédio aos colaboradores. Um ambiente interno que assegura o bem-estar físico e mental dos traba- lhadores melhora a qualidade de vida no trabalho, aumenta a produti- vidade e impulsiona os resultados corporativos. Nas empresas, a diversidade é, de fato, uma questão de negócios, por- tanto as corporações deveriam ter em seus quadros uma representação da sociedade composta dos mais diferentes tipos de pessoas (PAULA..., 2016). A maior diversidade dentro do ambiente de trabalho possibilita a convi- vência com ideais e vivências diferentes, abrindo espaço para a criatividade. Então, seria razoável considerar que a simples existência da diversidade levaria à inovação, mas nem sempre isso ocorre espontaneamente. Então, como a diversidade se relaciona com a inovação? Considerando que as pessoas são o diferencial de qualquer orga- nização de sucesso e que as inter-relações são inerentes ao ambiente de trabalho, verifica-se que as corporações que se preocupam com a qualidade desses relacionamentos e com a satisfação dos colabora- dores com o ambiente interno conseguem liberar o potencial criativo dos seus trabalhadores e, como também incentivam a participação dos trabalhadores nas soluções e na obtenção de resultados, acabam por aproveitar melhor as oportunidades de melhoria e inovação. O incentivo ao uso da criatividade e o empoderamento dos co- laboradores é uma maneira bastante eficiente de atualizar a or- ganização e de torná-la inovadora, contando com pessoas mais motivadas e preparadas para tomar decisões, assim como ficam mais dispostas a aderir às causas defendidas pela empresa e a assumir maiores responsabilidades (CASTRO, 2014). A interação dos trabalhadores em equipes ou times de trabalho e o apoio e o incentivo à colaboração de pessoas heterogêneas pro- movem mais diálogos, maior troca de conhecimento e surgimento de inúmeras propostas baseadas em pontos de vista diferentes que acabam por originar a inovação, que aqui não se trata apenas de tecnologia, mas sim de todo tipo de ação inovadora ( OLIVEIRA; RODRIGUEZ y RODRIGUEZ, 2004). Verifica-se que abrir espaço para a opinião dos colaboradores tem forte impacto positivo no engajamento da força de trabalho aos objeti- vos organizacionais quando há a percepção dos trabalhadores de que a sua colaboração está sendo bem aproveitada. No vídeo Diversidade, fator decisivo de inovação, do canal Ideia Sustentável, a CEO da Microsoft, Paula Bellizia, descreve a experiência da gigante do mercado de TI, apre- sentando alguns pontos que hoje são tratados no mundo corporativo a respeito da formação de novos ambientes de trabalho que contenham um extrato representativo da sociedade. Assim, o aluno tem conta- to com o que está sendo abordado pelas grandesempresas no mercado atual e no mundo dos negócios, que busca lucros para os acionistas, mas também considera importante a inclusão dos aspectos humanos e diversos nas estratégias corporativas. Disponível em: https:// www.youtube.com/ watch?v=o2jakug2fC0. Acesso em: 17 ago. 2022. Vídeo https://www.youtube.com/watch?v=o2jakug2fC0 https://www.youtube.com/watch?v=o2jakug2fC0 https://www.youtube.com/watch?v=o2jakug2fC0 76 Propósito organizacional e capital social Isso tem relação com a percepção do colaborador sobre executar um trabalho que lhe faz sentido, além do orgulho em realizar tare- fas complexas e de maior responsabilidade que lhe conferem “um certo status social pelo reconhecimento da capacitação envolvida, pelos resultados e pelas promoções obtidas, o que gera respeito e prestígio junto aos demais atores sociais” (GONÇALVES, 2021, p. 21). Alguns autores denominam gestão participativa os processos que contam com a colaboração dos trabalhadores, que podem ser im- plementados com o uso de diversas ferramentas, tais como design thinking, pesquisas, conversas informais, círculo dourado (golden circle), caixas de sugestões, benchmarking e eventos como: almoço, café da manhã, brainstorms, salas de guerra (war rooms), cocriação de projetos (participação efetiva em projetos), hackathons (eventos voltados para a inovação) etc. A adesão a esse tipo de participação também pode ser classi- ficada como uma inovação na gestão de pessoas e dos negócios. E, em razão da velocidade e da incerteza existentes nos mercados, ino- var passou a ser um fator imprescindível para as empresas que necessitam de reinvenção constante dos seus modelos, estruturas, produtos e serviços. Inovar significa apresentar ao mercado, com sucesso, um pro- duto, serviço ou processo até então inexistente ou que apresente alguma nova característica diferente daquilo que existia como pa- drão. Tal novidade deve trazer uma vantagem sobre a concorrência (CARVALHO; REIS; CAVALCANTE, 2011). Trata-se da junção de uma nova ideia com ações produtivas que tragam resultados satisfatórios, podendo ser traduzida na seguinte fórmula: inovação = ideia + implementação de ações + resultado (MATTOS; STOFFEL; TEIXEIRA, 2010). Tigre (2006) alerta sobre a necessidade de diferenciar a inovação da invenção, já que a invenção tem o sentido de criar algo inédito, seja processo, produto ou técnica, podendo não ter um resultado comercial efetivo, e a inovação é a invenção na prática. Carvalho, Reis e Cavalcante (2011) complementam esse pensa- mento incluindo a necessidade de diferenciar a inovação da simples mudança, representada por pequenas melhorias que não agregam valor de modo efetivo ao produto, serviço ou processo afetado. Propósito e cultura organizacional 77 Na Figura 2, pode-se observar os diferentes graus entre invenção, melhoria (mudança) e inovação. Novidade da ideia Resultado esperado Algo inexistente no mundo Algo inexistente no setor ou no mercado Pequeno ajuste no que fazemos Alto Alto Médio Médio Baixo Baixo Invenção Melhoria Melhoria Melhoria Inovação Inovação Inovação Inovação Inovação Figura 2 Matriz invenção, melhoria e inovação Fonte: Carvalho; Reis; Cavalcante, 2011, p. 34. A inovação pode ser classificada de várias formas. A mais comum é a que a divide em inovações disruptivas, caracterizadas por criar uma ruptura em um mercado ou segmento tecnológico, envolvendo altos riscos, mas proporcionando também elevados potenciais de ganhos, e inovações sustentadas, aquelas nas quais ocorrem mudanças meno- res e que envolvem baixo risco. As inovações sustentadas são de dois tipos: incrementais ou radicais. As incrementais se caracterizam por pequenas alterações ou evoluções que dão sobrevida a determinado produto, serviço, processo ou orga- nização. Incluem os melhoramentos e as modificações realizadas conti- nuamente ou de modo cotidiano (FREEMAN; SOETE, 2009). A melhoria dos navegadores de internet é um exemplo de inovação incremental, já que os atuais líderes de mercado surgiram quando exis- tiam outros serviços semelhantes, entretanto suas melhorias os fize- ram alcançar a liderança entre os usuários. Já as inovações radicais criam funcionalidades ou conceitos no- vos em um produto/serviço já existentes e passam a atender a um novo público ou mercado. São melhorias implementadas ou saltos descontínuos na tecnologia de produtos e processos existentes (FREEMAN; SOETE, 2009). A obra Gestão da inovação destaca, de maneira didática, a importância da inovação como item que diferencia as corporações e as possibilita alcan- çar resultados acima da média de mercado, transformando-se em companhias competitivas e que conseguem van- tagens sobre as demais. A leitura desse livro possibilita ao educando o conhecimento sobre os aspectos acadêmicos e práticos da inovação e da sua aplicação no ramo dos negócios. CARVALHO, H. G. de; REIS, R. dos; CAVALCANTE, M. B. Curitiba: Aymara, 2011. Livro 78 Propósito organizacional e capital social O melhor exemplo nesse caso é o do mercado de celulares, em que a marca líder apresenta características diferenciadas que a fazem ter uma margem de lucro maior em seu produto, atendendo a um público consumidor que busca esses diferenciais. Carvalho, Reis e Cavalcante (2011) classificam as inovações por tipo de aplicação: Inovação de produto: produto novo ou muito melhorado. Inovação de serviço: novos serviços ou serviços bastante diferenciados do que eram prestados até então. Inovação em processos: redução de custos, melhoria na entrega e aumento de qualidade. Inovação em marketing: novos métodos de marketing, produto/serviço, embalagem, posicionamento de mercado, promoção/preços. Inovação organizacional: novo método, novo tipo de estrutura organizacional, prática de negócio ou formas de relacionamentos com stakeholders diferenciada etc. A adesão da empresa a uma política de inclusão e diversidade traz como benefício imediato a melhoria da imagem corporativa ao mesmo tempo que aumenta o poder da inovação organizacional em razão da variedade de culturas, pensamentos, opções, crenças e valores que passam a existir na companhia. É a criatividade oriunda de diferentes matizes levando a novas e diferentes ideias, que por sua vez possibilitam a adoção de novas es- bb gr eg /S hu tte rs to ck Propósito e cultura organizacional 79 tratégias de crescimento e competição ao possibilitarem a criação de produtos e serviços que trazem vantagem sobre a concorrência. Pessoas de diferentes pensamentos conseguem entender me- lhor as necessidades dos clientes e acabam por encontrar soluções bem-sucedidas para os mais diversos tipos de problemas atendendo às expectativas do mercado, o que melhora significativamente os re- sultados da organização. 3.4 Equilíbrio entre trabalho e vida pessoal (QVT) Vídeo A atual competitividade do mercado exige que as empresas ado- tem ações focadas na gestão de pessoas em razão da importância que o capital humano e intelectual tem representado para a dife- renciação das companhias nos mercados consumidores. Assim, é importante que as corporações compreendam que quando admitem um colaborador não estão contratando apenas a parte profissional, mas sim uma pessoa como um todo, o que, em conformidade com o pensamento de Wilber (2008), se trata de considerar o ser humano como completo e complexo, cuja vivência social deve considerar todos os fatores internos e externos que influem os relacionamentos pessoais e profissionais desse indiví- duo que lida com diferentes conflitos durante a sua vida. Um dos conflitos está na busca do equilíbrio do trabalho com a obrigações sociais e os desejos e as necessidades pessoais (saúde, segurança, família, comunidade, status social etc.). Atualmente, com relação à saúde e à segurança dos colaboradores dentro dos ambientes de trabalho, as corporações têm focado a elimina- ção ou a mitigação das doençasprofissionais que levam a afastamentos. Tal preocupação faz sentido, já que segundo dados divulga- dos pelo governo brasileiro, publicados pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho (SEPRT), houve aumento no número de benefícios de auxílio-doença e aposentadorias concedidas a traba- lhadores, ocasionados por doenças mentais e comportamentais como depressão e ansiedade, que em 2020 representaram 576,6 No Japão, o termo karoshi é usado para classificar os casos de mortes provocadas pelo excesso de trabalho em razão de fadiga, elevado estresse, derrames e problemas cardíacos (SANDRONI, 2010). Curiosidade 80 Propósito organizacional e capital social mil afastamentos (TST, 2021). Como causas das doenças profissio- nais aparecem o excesso de trabalho, as pressões da organização, o medo de demissão, o receio em não atender às expectativas da empresa, entre outras. Alguém que trabalha de modo excessivo e que extrapola os limites saudáveis do trabalho pode ser considerado um: workaholic, alguém que, por diversos motivos, não se sente bem se não estiver trabalhando, desenvolvendo uma espécie de dependência das atividades profissionais, o que é diferente de estar motivado com o trabalho. A condição de workaholic faz com que a pessoa, mesmo no tempo fora da empresa, prefira cuidar de assuntos profissionais em vez de questões familiares, do seu lazer, da sua vida pessoal com a comunidade e amigos etc. (GONÇALVES, 2021, p. 129) Já uma pessoa motivada com o seu trabalho e que gosta da sua função pode ser considerada como worklover. De acordo com Pfeffer (2019), os reflexos de trabalhos que não respeitam os limites humanos gerando problemas de saúde por excesso de carga horária são sentidos em todo o mundo. Em pes- quisas realizadas nos Estados Unidos, o autor constatou que 7% dos entrevistados já passaram algum tempo hospitalizados por doenças profissionais e 61% disseram estar estressados em razão das suas tarefas e de pressões profissionais. O autor constatou ain- da que 50% das faltas e licenças médicas nos Estados Unidos e no Reino Unido têm sua origem no estresse elevado. Situações estressantes, excesso de trabalho e pressões eleva- das por resultados levam a alterações de comportamento, mau hu- mor, nervosismo, insônia, falta de concentração, dores de cabeça etc., e esses são os sintomas mais expressivos do que se deno- mina síndrome de burnout, uma doença que pode levar a proble- mas mentais graves, tal como a depressão. Nessas situações, é necessário o acompanhamento médico, psiquiátrico ou psicológico ( GONÇALVES, 2021). Dejours (2018) apresentou em sua obra o conceito da psicodi- nâmica do trabalho, analisando a oscilação do colaborador entre o prazer e o sofrimento psíquico durante o período em que executa suas atividades profissionais. Esses sentimentos são responsáveis por insegurança e medo, ambos motivados pela falta de comunica- Propósito e cultura organizacional 81 ção por parte da empresa a respeito do significado e da importân- cia das tarefas e pela maneira como o trabalho é organizado. Além de estar presente em nosso meio há muito tempo, o traba- lho também é importante para as pessoas em razão dos impactos socioeconômicos que provoca, e, como qualquer outro elemen- to existente na nossa história, vem sofrendo transformações em razão da ampliação dos direitos trabalhistas, da percepção dos problemas de saúde e segurança ocasionados por condições des- favoráveis aos trabalhadores, da evolução na relação entre capital e força de trabalho, da percepção da importância das pessoas (ca- pital humano e intelectual), de mudanças culturais na sociedade, de novas tecnologias etc. Os objetivos pessoais dos trabalhadores vêm se modificando ao lon- go do tempo, apresentando uma nova percepção sobre trabalho e vida pessoal, muito em razão das diferenças culturais das gerações. Se os baby boomers buscavam uma carreira longa, dedicada a uma mesma empresa visando ao sucesso financeiro, a geração Y, por sua vez, se preocupa em ter uma maior qualidade de vida com mais tempo para conviver com a sua comunidade, busca mais diversão e lazer e quer acesso e controle sobre os seus relacionamentos. Já a geração Z tem como foco trabalhar em algo que faça sentido, isso dentro de um bom ambiente com valores éticos e morais onde possa confiar na reputação das corporações e atuar em prol de causas que considere justas e com as quais se identifique. A definição de um propósito por parte da organização facilita a adesão aos quadros funcionais de pessoas que se identificam com suas causas, o que ajuda na melhoria do ambiente interno, na qualidade do clima or- ganizacional, no aumento da produtividade e na satisfação e retenção de pessoas com talento, o que incentiva as práticas criativas e inovadoras. Salvi (2020) afirma que o sucesso profissional não está condi- cionado ao funcionário trabalhar muito ou comportar-se como um workaholic; pelo contrário, as pessoas que encontram o sucesso são as que trabalham com um propósito e buscam o equilíbrio en- tre a vida particular e a profissional. Essas pessoas são os worklovers e usam a criatividade e o au- toconhecimento para ajustar os dois lados da vida (profissional e pessoal), e em razão disso desfrutam de sentimentos positivos, tais como: satisfação, prosperidade e saúde física e mental. No livro Viva a sua melhor versão: conquiste o sucesso e equilíbrio na vida pessoal e profissional com o método que já impactou milhares de pessoas a autora apresenta uma visão sobre a importância de se ter um propósito individual e de conseguir equilíbrio entre vida pro- fissional e pessoal para alcançar o sucesso na carreira ou em outras ati- vidades. A leitura propicia ao aluno a necessidade de refletir sobre o modelo de trabalho exaustivo com excesso de esforços em prol do trabalho sem o adequado equilíbrio com o lado pessoal. SALVI, A. São Paulo: Gente, 2020. Livro 82 Propósito organizacional e capital social Outro fator que tem modificado o ambiente de trabalho é o de- senvolvimento tecnológico, que possibilitou a introdução do traba- lho remoto (home office), situação ampliada em razão da Pandemia de Covid-19 que atingiu o mundo. Entretanto, é preciso fazer um alerta a respeito do risco de o home office incentivar o trabalhador a exceder seus horários. Mesmo que as facilidades tecnológicas quebrem os limites entre o trabalho e a vida pessoal do colabora- dor, no momento do trabalho ele deve concentrar-se apenas nas tarefas profissionais, ainda que esteja em seu ambiente familiar, e não trabalhar além desse horário, focando sua vida pessoal após o expediente. No sentido positivo, as atividades profissionais de home office aproxima- ram o trabalhador do seu ambiente familiar e social, possibilitando o resga- te dos seus relacionamentos e de outros aspectos da sua vida pessoal. Assim, os efeitos da pandemia acabaram por interferir no con- flito existente entre trabalho e família, que coloca o trabalhador sob pressão uma vez que para atender a um lado (trabalho) deixa de atender ao outro (família) ou vice-versa. De acordo com Gree- nhaus, Callanan e Godshalk (2018), o trabalhador necessita encon- trar um equilíbrio satisfatório entre suas atividades profissionais e as obrigações com o seu núcleo familiar, a sua comunidade e os seus demais interesses particulares. Para os autores, essa situação acaba por aumentar a pressão e o estresse sobre o trabalhador que precisa dividir seu escasso tempo entre os dois lados, o que gera tensão nas partes envolvidas e influi no comportamento do indivíduo. Diante desse contexto, as corporações têm criado programas de qualidade de vida no trabalho (QVT), visando promover melhorias e proporcionar um equilíbrio entre a vida profissional e a individual fora do trabalho para o bem-estar geral, distribuindo o tempo adequada- mente entre elas, o que é conhecido também como work-life ballance. Entretanto, alguns estudos observamque há uma diferenciação en- tre trabalhadores de diferentes níveis socioeconômicos, indicando que os ocupantes de posições ligadas aos extratos mais baixos dentro de uma hierarquia têm menos possibilidades e oportunidades para equili- brarem sua vida pessoal com o trabalho. Propósito e cultura organizacional 83 Para Bourdieu (2007), as opções de um indivíduo são determinadas pela sua condição socioeconômica, criando uma representação dos espaços e estilos de vida das pessoas, o que caracteriza os traços dis- tintivos, os denominados espaços homólogos. Nesses espaços, cada par- ticipante tem acesso a elementos iguais aos seus pares, ou seja, existe uma relação de correspondência com outro elemento, mesmo estando em situações ou locais diferentes. São possibilidades de escolhas prede- terminadas baseadas em tradições e padrões socialmente aceitos. Estão presentes na teoria de Bourdieu (2007) três principais elementos: o campo, que representa o espaço simbólico no qual ocorrem as ações dos indivíduos; o habitus, que se trata do capital cultural incorporado composto da realidade da vida refletida nas experiências e na socialização de cada um e que são percebidas pelo indivíduo, e nele estão contidos o conjunto de regras sociais, os elementos da cultura dos grupos e a história pessoal dos indivíduos; e, por último, o capital, que representa o poder econômico, social ou cultural e que se constitui no propulsor ou não da mobilidade social dentro de uma sociedade estratificada. Destaca-se que o trabalho tanto gera efeitos negativos nas pessoas (pressão, estresse, conflitos familiares, doenças profissionais etc.) quanto traz impactos positivos em suas vidas (melhorias sociais e financeiras, au- mento do status social, realização pessoal etc.). O que se entende como ne- cessária é a busca por uma integração entre os dois universos, que deve ser pautada pela conquista de situações que propiciem harmonia e equilíbrio. Pierre Félix Bourdieu (1930-2002) é um dos mais conhecidos e lidos autores de sociologia e antropologia. Seu trabalho abrange questões sobre estratificação da sociedade, educação, cultura, artes, política etc., e é destacado como um dos críticos dos aspectos negativos causados pelo processo de dominação social, da globalização e do libera- lismo. Entre suas obras mais famosas destaca-se A distinção: crítica social do julgamento, publicada no Brasil em 2007. Biografia 3.5 Benefícios para clientes, colaboradores e sociedade Vídeo Períodos de transição e de adaptações não são novidades no mundo dos negócios. Atualmente, as preocupações com os assun- tos sociais e ambientais têm dominado a pauta de diversas corpo- rações, tudo para atender aos anseios dos consumidores cada vez mais preocupados com as ações das empresas e os seus impactos. As transições atuais envolvem a passagem de um modelo tradicio- nal de empresa, com foco apenas na maximização dos lucros, para um modelo que contemple as questões da escola socioeconômica 84 Propósito organizacional e capital social incluindo em seus propósitos a geração de benefícios e impactos so- cioambientais positivos (XAVIER; SOUZA, 2004), o que exige uma mu- dança na cultura organizacional transformando-a em um elemento mais consciente e alinhado com os novos rumos do capitalismo. Para Mackey e Sisodia (2018), o sistema capitalista tem sido visto como um mal para a nossa sociedade em razão dos problemas so- cioambientais que as organizações geram, tais como desgaste am- biental, consumo excessivo de recursos naturais, problemas de saúde físicos e mentais nos trabalhadores, concentração de renda etc. Os autores defendem que a adoção dos princípios do capitalismo consciente pelas organizações pode modificar essa perspectiva nega- tiva em razão dos benefícios que o sistema proposto gera para todos os stakeholders. Por exemplo: a geração de lucro traz longevidade para as empresas, com maior segurança aos trabalhadores; as pesquisas realizadas na busca de novas formas de negócios geram novos conhe- cimentos e desenvolvimento intelectual; as ações de prevenção e se- gurança física melhoram a saúde dos colaboradores proporcionando bem-estar no ambiente de trabalho; a introdução da liderança huma- nizada privilegia o respeito e a dignidade das pessoas, contendo ques- tões de inclusão e diversidade; as ações culturais são incentivadas e patrocinadas; os programas de qualidade de vida no trabalho passam a ser implantados; as ações de prevenção e preservação ambiental in- tegram as estratégias das empresas, entre outros. O próprio sistema capitalista é beneficiado pela adoção do propó- sito maior pelas organizações que passam a se preocupar e trabalhar também pela sociedade. Além disso, existem diversos outros benefí- cios que o capitalismo consciente reforçado por um propósito maior pode proporcionar; por exemplo, a empresa pode se beneficiar da pos- tura e filosofia de trabalho inovadora, pois ao demonstrar por meio da sua cultura organizacional a preocupação com a sociedade e o meio ambiente, amplia o engajamento dos colaboradores. De acordo com a pesquisa Pessoas em uma missão (KORN FERRY INSTITUTE, 2016), 100% das empresas pesquisadas que possuem uma declaração de propósito conseguiram atrair profissionais re- conhecidamente talentosos, e 89% atraíram clientes e trabalhado- res jovens que se identificaram com a sua ideologia. Propósito e cultura organizacional 85 Destaca-se que o engajamento da força de trabalho se constitui em um dos maiores desafios das corporações, já que por sua natu- reza o ser humano primeiro procura suprir suas necessidades indi- viduais e só depois passa a considerar os aspectos da coletividade, o que torna a missão da liderança bastante trabalhosa para harmo- nizar os interesses dos indivíduos com os interesses da companhia. Esse fato acaba por aumentar a produtividade melhorando o de- sempenho geral, e tudo isso colabora para a sustentabilidade dos negócios e o aumento do seu valor e fortalecimento da confiança dos stakeholders na instituição. Como consequência disso também ocorre o fortalecimento da marca diante do público consumidor. O propósito da organização é comprovadamente uma ferramenta eficiente para engajar liderança, equipes, fornecedores e clientes nos ob- jetivos de uma empresa que se diferencia dos concorrentes no mercado de maneira que esses não podem copiar a sua vantagem competitiva. Os colaboradores têm como benefícios imediatos poder traba- lhar em um local com o qual se identificam pela ideologia expressa no propósito; encontrar sentido em um trabalho que colabora com a sociedade e com o meio ambiente; melhorar o ambiente de tra- balho; tratar com respeito à sua humanidade e dignidade; e com- partilhar ideias e opiniões participando dos processos de decisão e inovação, o que melhora a sua autoestima e satisfação e aproxima os membros das equipes para um trabalho colaborativo, sem con- tar com o desenvolvimento profissional e pessoal. Para Mackey e Sisodia (2018, p. 91): o anseio geral [...] é trabalhar por mais do que o pagamento no fim do mês. Aspira-se a um trabalho que seja estimulante e agra- dável e que tenha significado: a ideia é fazer a diferença para tornar o mundo um lugar melhor. As pessoas estão à procura de uma comunidade de amigos. Desejam oportunidades para aprender, crescer e se divertir. Para os consumidores, os benefícios estão na qualidade dos produtos/serviços oferecidos com uma clara mensagem sobre os aspectos éticos e morais sob os quais foram produzidos, pois as empresas têm como propósito deixar os clientes satisfeitos, assim eles terão fidelidade por se identificarem com os valores centrais da cultura da organização. https://www.poderdaescuta.com/6-maneiras-de-melhorar-a-produtividade-de-sua-equipe/ 86 Propósito organizacional e capital social As empresas conscientes sabem que é importante serem trans- parentes e autênticas durante a comunicação com os clientes, a fim de auxiliara encontrar os produtos adequados às necessidades de cada um, mesmo que esse produto seja de um concorrente, o que fortalece o relacionamento cliente x empresa. Já os fornecedores passam a fazer parte de uma cadeia de valor de corporações que gozam de prestígio social sendo reconhecidas pelo seu propósito e passam a ter acesso ao conhecimento sobre o capitalismo consciente entre outras novas formas e filosofias de trabalho, o que ala- vanca o desenvolvimento interno, projetando as empresas para o mer- cado. Relações mais colaborativas baseadas na filosofia do ganha-ganha aumentam a confiança tanto do fornecedor quanto da empresa compra- dora, o que beneficia a ambos (MACKEY; SISODIA, 2018). Os investidores, que com seu trabalho e capital propiciam o surgi- mento e desenvolvimento das empresas, se beneficiam com o reco- nhecimento da comunidade sobre o valor que suas ações responsáveis e conscientes criam para a sociedade e o ambiente, o que difere do pensamento de que as empresas visam apenas à lucratividade. Quando o assunto é consciência e responsabilidade, não se pode deixar de citar a relação das empresas com o ambiente, já que até recentemente o sistema produtivo não incluía a preocu- pação com a preservação ambiental. Entretanto, é perceptível que novas formas de pensar e agir estão presentes nas estratégias de muitas organizações visando à recuperação do nosso planeta e pensando nas futuras gerações. Por meio de pesquisas e ações efetivas, diversas empresas es- tão identificando os impactos negativos que causam ao ambiente para que possam desenvolver produtos/serviços por meio de pro- cessos menos agressivos ou ainda que possam reverter situações críticas de recursos naturais. Já existe a noção de que, da mesma forma que podem criar pro- blemas para o ambiente, as organizações têm a possibilidade de minimizar, eliminar ou recuperar os impactos negativos provoca- dos auxiliando na recuperação das condições naturais do planeta. Uma organização responsável e consciente deve beneficiar a todos os stakeholders, ajudando “a resolver alguns problemas que a sociedade enfrenta nos níveis local, nacional e potencialmente No livro Propósito: por que ele engaja colaboradores, constrói marcas fortes e empresas poderosas o autor descreve a sua visão sobre como o propósito organizacio- nal é um dos principais patrimônios de uma empresa, baseando-se em exemplos de grandes empresas que possuem propósito e trabalham por ele e como elas conse- guem engajar a liderança, a força de trabalho, os fornecedores e os clientes aos objetivos maiores da companhia, que passa a ser reconhecida pelos seus diferenciais diante da concorrência. REIMAN, J. Rio de Janeiro: Alta Books, 2018. Livro Propósito e cultura organizacional 87 global. Em sua maioria, as companhias têm infraestrutura e capital intelectual que podem ser aproveitados em favor das comunidades onde elas atuam” (MACKEY; SISODIA, 2018, p. 133). Entretanto, apesar de todas as vantagens e benefícios de se ter um propósito maior, é preciso considerar que existem empresas de todos os tamanhos e formas, o que possibilita a coexistência dos mais diversos tipos de estruturas. Isso cria uma linha na qual em uma extremidade estão as corporações que utilizam as práti- cas mais atuais de mercado e na outra estão empresas que ainda trabalham com conceitos clássicos da gestão administrativa e do sistema de produção. CONSIDERAÇÕES FINAIS Embora uma empresa tenha como foco principal os seus clientes e suas atividades, ela não está isolada do mundo. Suas ações causam impactos sociais e ambientais, gerando percepções a respeito da sua imagem. Recentemente, tem-se percebido uma transformação no mundo cor- porativo envolvendo uma nova postura mais preocupada com os benefí- cios que uma companhia pode trazer para a sociedade e não só com os seus ganhos financeiros. Um dos fatores motivadores disso é a adoção por parte das corpora- ções de uma nova filosofia de trabalho que envolve encontrar um propó- sito maior para a sua existência. Esse propósito atua como um elo entre as pessoas e entidades que se inter-relacionam com a organização (inves- tidores, colaboradores, clientes, parceiros comerciais, comunidade etc.). Para que seja assimilado por todos, é necessário que o propósito esteja integrado com a cultura organizacional, em que se encontram os valores e as crenças que norteiam as ações da companhia e a dife- renciam no mercado. Tais valores devem incluir temas como a melhoria da qualidade de vida, a valorização das pessoas, o respeito e o tratamento humanizado dos colaboradores, a inovação, a inclusão, a diversidade, entre outros. Tudo para estimular a participação de todas as partes interessadas (stakeholders) nessa nova forma de gerir os negócios, uma vez que as pes- soas buscam sentido naquilo que fazem e se sentem felizes e satisfeitas quando atuam junto a uma empresa que procura ajudar na construção de uma sociedade melhor. 88 Propósito organizacional e capital social ATIVIDADES Atividade 1 Defina conceitualmente o capitalismo consciente. Atividade 2 Defina a inovação. Atividade 3 A ação de empresas que possuem um propósito maior traz be- nefícios para a sociedade como um todo, mas com relação aos consumidores, quais são os benefícios que eles têm ao serem clientes de empresas que atuam com a nova forma de pensar os negócios? REFERÊNCIAS BOURDIEU, P. F. A distribuição crítica social do julgamento. Porto Alegre: Edusp, 2007. CARVALHO, H. G. de; REIS, R. dos; CAVALCANTE, M. B. Gestão da inovação. Curitiba: Aymara, 2011. CASTRO, M. 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Miami: Korn Ferry Institute, 2016. Propósito e cultura organizacional 89 MATTOS, J. F.; STOFFEL, H. R.; TEIXEIRA, R. de A. Mobilização empresarial pela inovação: cartilha: gestão da inovação. Brasília: CNI, 2010. MACKEY, J.; SISODIA, R. Capitalismo consciente: como liberar o espírito heroico dos negócios. Rio de Janeiro: Alta Books, 2018. MINTZBERG, H. Estrutura dinâmica das organizações. 4. ed. Lisboa: Dom Quixote, 2010. NACIFE, J. M. A pesquisa de clima organizacional na prática. São Paulo: Simplíssimo, 2018. OLIVEIRA, U. R. de; RODRIGUEZ y RODRIGUES, M. V. Gestão da diversidade: além de responsabilidade social, uma estratégia competitiva. In: 24º ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO. Anais. Florianópolis: Abepro, 2004. PAULA Bellizia - Diversidade, fator decisivo de inovação. 2016. 1 vídeo (14 min.) Publicado pelo canal Ideia Sustentável. Disponível em: https://www.youtube.com/ watch?v=o2jakug2fC0. Acesso em: 17 ago. 2022. PFEFFER, J. 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Nessa linha, os negócios sociais ou de impacto social que visam as reduções de desigualdades têm surgido e se desenvolvido, ganhando dimensões de mercado em áreas relacionadas à educação, à saúde, ao empreendedorismo social, aos financiamentos para pequenos em- preendedores, à habitação entre outros. Neste capítulo são apresentados pontos sobre como negócios sociais podem ser planejados e executados por meio de projetos consistentes. São identificadas as principais fontes de financiamento para esses projetos sociais, com diversas possibilidades dependendo do foco ou da composição da organização social. Além disso, são apresentadas as principais ações para a sustenta- bilidade dos negócios sociais, bem como as boas práticas de gestão adotadas por organizações desse setor que obtiveram sucesso. Por último, fechando o capítulo, são abordadas as formas para a gestão dos voluntários que atuam ou pretendem atuar com esse tipo de atividade social. Estratégias para negócios sociais 91 Com o estudo deste capítulo, você será capaz de: • compreender como negócios sociais podem ser planejados e exe- cutados por meio de projetos consistentes; • identificar as principais fontes para o financiamento de projetos sociais; • conhecer as principais ações para a sustentabilidade dos negócios sociais, bem como as boas práticas de gestão adotadas por orga- nizações de sucesso; • aprender sobre as formas para a gestão dos voluntários que atuam com esse tipo de atividade social. Objetivos de aprendizagem 4.1 Planejamento e elaboração de projetos sociais Vídeo Planejar tem como objetivo alinhar e otimizar todos os recursos que se destinam a atingir um objetivo a médio e longo prazo. Quando se trata de um negócio, não basta ao empreendedor apenas a sua vontade de trabalhar e gerar riquezas ou benefícios aos seus clientes. Além de todos os detalhes e capacidades da organização, é preciso ana- lisar o ambiente externo e os riscos envolvidos na operação corporativa. O planejamento é essencial para direcionar as ações de qualquer atividade, inclusive a dos negócios sociais ou de impacto social. De acordo com Yunus (2010), um negócio social, embora objetive a solu- ção de problemas socioambientais, deve ser autossustentável assim como qualquer outra organização com personalidade jurídica. Dessa forma, recomenda-se que na sua criação seja definido o seu propósito, que para Sinek (2018), em sua teoria sobre o Círculo Dourado, trata-se de identificar e comunicar claramente para todos os interessados o porquê da existência e da atuação da organização, agre- gando pessoas que se identifiquem com a mensagem. Após a definição do propósito do negócio social, é preciso pensar na estratégia a ser adotada, ou seja, um comportamento constante a longo prazo que envolve a elaboração de planos para o futuro e extrai padrões do passado. A estratégia inicialmente traçada, denominada de 92 Propósito organizacional e capital social estratégia deliberada, vai sendo alterada e complementada por estraté- gias emergentes, adaptando os passos da corporação na medida em que situações inesperadas surgem no transcorrer da sua trajetória. Para Mintzberg (2000), a estratégia abrange tanto o ambiente in- terno quanto o externo, afetando o bem-estar de toda a organização. O autor ressalta ainda a essência complexa dessa tarefa, que dará as diretrizes para o crescimento sustentável da corporação, influencian- do o processo de decisão sobre os mais diversos assuntos, como por exemplo, o que se vai realizar, como se manterá, quais serão os inves- timentos a serem feitos ou recebidos, quais os riscos envolvidos e que podem ser aceitos, entre outros. Definida a estratégia, inicia-se o desenvolvimento do planejamento estratégico, que transformará a ideia em algo palpável, desdobrando a estratégia em objetivos e metas. Os objetivos devem ser claros e concretos, visto que representam o que a organização quer produzir ou entregar como valor ao seu bene- ficiado. É preciso que eles tenham significado para quem vai executar as tarefas, pois são eles que orientam e inspiram as ações que levam uma organização a obter um resultado satisfatório. Já uma meta é a conversão de um objetivo em ações práticas de uma determinada área, departamento, seção etc. Por exemplo, uma empresa adota como estratégia melhorar seu posicionamento de mercado aumentando seu marketshare, para isso precisa incrementar o seu volume de vendas em 10%. O objetivo, ex- presso em percentual, passa a ser, então, aumentar as vendas em 10%. Como no momento ela tem R$10 milhões em vendas mensais, a meta para o departamento de vendas é vender mais R$1 milhão ao mês. Note que a meta foi expressa em números. Além do que será produzido ou entregue pela organização (produto/ serviço), o planejamento precisa considerar fatores tais como: as fontes de receitas, as suas despesas, o público ao qual atenderá (pessoas ou comunidades que serão beneficiadas), entre outros itens importantes que definirão o modelo de negócios a ser adotado e constituirão a sua proposta de valor para o mercado. O planejamento permite a visualização de como o negócio se desen- volverá e quais são as bases que lhe darão sustentação, dados impres- No vídeo 3 Pilares Para Construção de Negócios de Impacto, do canal TEDx Talks, Tales Gomes des- creve o desenvolvimento do seu negócio social, destacando a importância do propósito da organiza- ção, para, assim, prestar um serviço ou entregar um produto que traga um impacto positivo, além de abordar a equidade e a postura de protagonista que as pessoas devem ter para que possam assumir a responsabilidade sobre a sua vida. Disponível em: https://www.youtu- be.com/watch?v=dmwW9UaTY1s. Acesso em: 19 ago. 2022. Vídeo https://www.youtube.com/watch?v=dmwW9UaTY1s https://www.youtube.com/watch?v=dmwW9UaTY1sEstratégias para negócios sociais 93 cindíveis para a busca de parcerias e fontes de financiamentos para o empreendimento. Uma das metodologias que se pode utilizar para isso é a matriz Can- vas, que descreve um modelo de negócios dividido em nove componentes básicos respondendo as principais questões envolvidas na composição de uma organização (OSTERWALDER, 2011), que serão vistas a seguir. Modelo Canvas Segmento de clientes Fl uk e Ch a/ Sh ut te rs to ckRelacionamento com beneficiados (clientes) Canais de distribuição Proposta de valor Atividades- chave Recursos principais Parceiros principais Estrutura de custos Fontes de receita A corporação pode atender a um ou a diversos tipos de beneficiados (clientes), pois eles são a base de qualquer modelo de negócios. São descritos os tipos de relação que a organização terá com os seus beneficiados. Os produtos ou serviços de um negócio são levados aos seus beneficiários por meio de canais de comunicação, distribuição e vendas. Um negócio deve resolver os problemas dos seus beneficiados satisfazendo as suas necessidades. Trata-se das ações mais importantes de uma empresa para que seu modelo de negócios funcione. São os recursos mais importantes para fazer com que um modelo de negócios funcione. Descrevem-se as principais parcerias necessárias para que o negócio funcione bem e atenda aos seus beneficiados (fornecedores e outros parceiros: aliança com entidades concorrentes, associações para novos empreendimentos, patrocínios etc.). São descritos todos os custos envolvidos na operação e sustentação do negócio social. São definidas as formas de obtenção dos recursos financeiros que sustentarão o negócio social. Para cada componente, são necessários alguns questionamentos: Segmento de clientes: a quem a sua organização ajuda? Para que grupo ou segmento de pessoas, comunidade ou ambiente sua corpo- ração trabalhará? Quais serviços ou produtos atenderão determinados segmentos de beneficiados? Proposta de valor: qual será a sua proposta de valor? Como aju- dará a sociedade? Quais benefícios serão oferecidos aos beneficiados? Como gostaria que a sua corporação fosse reconhecida? Como os seus produtos ou serviços criam valor para o seu beneficiado? Canais de distribuição: como o seu negócio social entregará a pro- posta de valor ao beneficiado? Como será feita a comunicação? Qual será o canal de comunicação? E o de distribuição? Haverá venda de produtos 94 Propósito organizacional e capital social para o levantamento de recursos financeiros? Como será feita? Caso se- jam apenas serviços, como, por quem, quando e onde serão prestados? Relacionamento com beneficiados (clientes): como será a relação com os beneficiados? Qual será a rede de contatos? E a frequência? Haverá uso de metodologias como um Customer Relationship Management (CRM)? Fontes de receita: como será sustentado cada projeto? Existirão re- cursos recorrentes? Por quanto tempo? Os recursos obtidos cobrem to- das as despesas? Existe saldo positivo para que sejam feitos investimentos no negócio? De onde virão os recursos financeiros: venda de produtos, re- ceita de serviços prestados, verbas governamentais (municipais, estaduais ou federais), doações, patrocinadores regulares, eventos etc.? Recursos principais: quais e que tipo de instalação será necessário? Qual montante de recursos financeiros será necessário? Qual o capital hu- mano e intelectual necessário? Quais são os seus recursos ou serviços dife- renciais? Por que as pessoas se engajariam nessa proposta e não em outra? Atividades-chave: quais são as atividades principais da corporação que ajudam a entregar a proposta de valor? Como elas devem ser organizadas para que se possa atingir os objetivos propostos? De quem dependem? Parceiros principais: quem ou quais empresas ou entidades aju- darão na entrega de valor? Como essas entidades complementarão as competências da corporação? Quem são essas pessoas ou firmas? O que adquirimos dessas organizações? Por quanto? Eles executam ativi- dades-chave (estratégicas) para o nosso negócio? Estrutura de custos: quais serão os custos envolvidos? Quanto se está disposto a gastar? (custos financeiros, tempo, formação, adapta- ção a cultura etc.). Quais são as atividades-chave mais custosas? Quais os custos mais impactantes dentro do nosso negócio? A metodologia Canvas pode ser complementada pela ferramenta analítica denominada modelo das quatro ações apresentada por Kim e Mauborgne (2019), que consiste em quatro perguntas com a finalidade de criar um negócio diferenciado da concorrência: • Quais fatores considerados fundamentais podem ser eliminados? • Que fatores devem ser reduzidos bem abaixo do padrão atual? • Que fatores devem ser elevados bem acima do padrão atual? • Que fatores devem ser criados e que nunca foram oferecidos? No livro Business model generation: inovação em modelos de negócios – Um guia para visionários, inovadores e revolucioná- rios, o autor apresenta sua metodologia para a estruturação e desenvol- vimento de modelos de negócios, denominada Canvas, baseando-se em uma visão inovadora e mais direta que foca no cliente e na proposta de valor. A formulação apresentada é inovadora e vem acompanhada de diversos exemplos práticos que facilitam o entendimento e o apren- dizado da metodologia. OSTERWALDER, A. Rio de Janeiro: Alta Books, 2011. Livro Estratégias para negócios sociais 95 Kim e Mauborgne (2019) são os criadores da filosofia denominada Oceano Azul, que embora seja destinada a aumentar o valor e reduzir custos dos negócios atuantes em mercados tradicionais, tem alguns pontos levantados que podem ser adaptados aos negócios sociais que, na sua maioria, são empreendimentos que procuram atuar em ativida- des diferenciadas e ainda não ocupadas pelas indústrias tradicionais. Dessa forma, criam novos nichos para explorar no mercado, assim a inovação de valor é gerada por meio de novos serviços e benefícios com baixos custos em razão da eliminação de características e serviços – chamados de fatores na filosofia do Oceano Azul – de menor valor. Outra forma de se desenvolver o planejamento ou o modelo de negó- cio de uma organização é o plano de negócios, que, para Wildauer (2012), contém as principais características da corporação, ou seja, os objetivos e os planos operacional, de marketing, financeiro e jurídico, facilitando o entendimento e a aceitação por parte dos interessados (stakeholders). Existe uma infinidade de modelos para a formulação do plano de negócios, mas em geral o documento contém no mínimo um sumário executivo; as linhas gerais do negócio; a estrutura operacional e de ges- tão; as análises das oportunidades e ameaças dos ambientes internos e externos; as estratégias adotadas; o plano de marketing e negociação; o planejamento financeiro destacando os investimentos necessários, os custos e as fontes de receita; quais serão os mecanismos de controle; e, finalmente, quais serão os impactos positivos que as atividades trarão. Para situações que envolvam um determinado tema ou um fim es- pecífico a ser concluído dentro de um tempo delimitado, utiliza-se um projeto descrevendo todos os recursos que serão necessários para a sua conclusão. A questão do tempo de execução é uma das principais diferenças entre um projeto e um planejamento estratégico, uma vez que esse tem maior amplitude e visão de longo prazo. De acordo com Clemente (2002), um projeto engloba o trabalho de avaliar qualquer problema relevante que o planejamento apontou, en- volvendo um objetivo em particular, por exemplo: obter recursos finan- ceiros, materiais, humanos, intelectuais etc. Para isso deve ser descrito contendo, no mínimo, alguns elementos. A introdução é a parte responsável por despertar o interesse do lei- tor para que continue a ler o projeto e por ele se interesse. Deve trazer uma visão geral contextualizando o assuntodentro do ambiente no qual Pesquise mais sobre essas duas formas para formular o planejamento e modelagem do seu ne- gócio social. Existe vasto material na internet e em sites como os do Sebrae, que você pode consultar nos links a seguir. Canvas Disponível em: https://www.sebrae. com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/ UFs/MS/Anexos/2021/Canvas.pdf. Acesso em: 19 ago. 2022. Plano de negócios Disponível em: https://www. sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/ conteudos/planodeneg%C3%B3cio. Acesso em: 19 ago. 2022. Dica https://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/UFs/MS/Anexos/2021/Canvas.pdf https://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/UFs/MS/Anexos/2021/Canvas.pdf https://www.sebrae.com.br/Sebrae/Portal%20Sebrae/UFs/MS/Anexos/2021/Canvas.pdf https://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/conteudos/planodeneg%C3%B3cio https://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/conteudos/planodeneg%C3%B3cio https://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/conteudos/planodeneg%C3%B3cio 96 Propósito organizacional e capital social será desenvolvida a ação. Aqui se utilizam números e dados estatísticos que estejam relacionados ao tema e que causem impacto no leitor. A introdução também pode conter a descrição do objetivo ou a fi- nalidade do projeto, deixando claro o propósito daquilo que se busca alcançar, transformar ou melhorar; o público-alvo a ser atingido; o ni- cho da sociedade a ser auxiliado; e, se existirem, as estratégias e ferra- mentas de marketing para a divulgação. Em seguida, apresenta-se a justificativa para a realização do traba- lho proposto, que será amparada por argumentos válidos demonstran- do a necessidade daquele projeto por sua relevância e impacto, bem como explicando os porquês de executar aquela ação. A etapa seguinte consiste na exposição das metas a serem alcança- das acompanhadas dos seus respectivos prazos (curto, médio ou lon- go). Essa parte pode ser no formato de uma tabela, lista ou cronograma (gráfico de Gantt 1 ). Na sequência, são citados os recursos necessários para a execução do projeto, informando suas características e especificações, sua importância (impacto), onde consegui-los, e, se possível, os seus custos e os prazos para que sejam obtidos. Uma visão geral e detalhada sobre os aspectos financeiros do projeto é importante para que as pessoas possam aderir ao que se propõe e concordem em contribuir com o seu financiamento. Havendo a possibilidade, um projeto deve incluir um item sobre a visão do seu futuro (expansão, reflexos, ajustes, ampliação dos resul- tados pretendidos etc.), bem como das suas restrições (constraints) em que são citados todos os itens ou fatores que possam impossibilitar ou limitar a realização de uma tarefa ou de algum item. O projeto deve ser acompanhado de um plano de ação descrevendo as atividades que serão realizadas, os responsáveis por elas, o prazo para o seu início e término, e o seu estágio evolutivo de realização (status da tarefa). De maneira geral, um plano de ação procura responder as ques- tões da ferramenta conhecida como 5W2H por meio de sete perguntas que indicam: o que será feito (what), o porquê (why), onde (where), quando (when), quem fará (who), como (how) e quanto custará (how much). A Figura 1 demonstra a hierarquia envolvendo os termos apresenta- dos nesse item do capítulo: O gráfico de Gantt, foi criado no início do século XX pelo engenheiro americano Henry Gantt e tem como finalidade apre- sentar visualmente como está o andamento de um grupo de atividades distri- buídas em um cronogra- ma. Também pode incluir em um único diagrama visual a descrição de recursos, responsabili- dades e prazos de um determinado projeto. 1 Estratégias para negócios sociais 97 Propósito (declaração do porquê a organização existe) Estratégia (indica o que a organização fará / diretrizes) Planejamento (detalha o como fará para realizar a estratégia) Objetivos (detalham o que deve ser feito em percentuais %) Metas (detalham o que deve ser feito em números) Projetos (indica o que será feito em determinado tempo) Plano de ação operacional (execução das tarefas) Resultados-chave/Key-Results (Monitoramento) Planos de emergência e contingência para a correção de não conformidades Figura 1 Hierarquia dos termos Fonte: Elaborada pelo autor. A elaboração de um bom projeto realista e de um bom plano de ação é parte fundamental para a obtenção de recursos junto aos inte- ressados em patrocinar ou alavancar uma ação ou negócio social. Independente do formato em que são expressos, a estratégia, o plane- jamento e os demais projetos e planos devem ser dinâmicos e adaptativos para que possam se ajustar na medida em que a organização evolui ou enfrenta dificuldades. O fundamental é que sejam previstos todos os fatores que farão com que o negócio social tenha sustentabilidade ao longo do tempo, possuin- do instrumentos de controle e indicadores de desempenho (KPIs) para que se meça verdadeiramente o quanto do objetivo foi atingido. 4.2 Financiamento de projetos sociais Vídeo O artigo 2º. da Lei n. 13.019/2014 (BRASIL, 2014) caracteriza as Orga- nizações da Sociedade Civil (OSC) como entidades sem fins lucrativos, como ONGs, fundações, associações de voluntariado, instituições re- ligiosas, sociedades cooperativas, centros sociais, entidades de filan- tropia, beneficência etc., o que as difere dos negócios sociais, porque mesmo não pagando dividendos precisam gerar lucro para a sua sus- tentação e para o reinvestimento no próprio negócio (YUNUS, 2010). Independente disso, todos os tipos de organização precisam de recur- sos financeiros para que possam realizar as suas tarefas operacionais, produzir bens ou entregar serviços. 98 Propósito organizacional e capital social A primeira e mais fácil opção para financiar um empreendimento de qualquer natureza sempre é investir o capital próprio, desde que exista e es- teja disponível. Nesse caso, um cuidado a ser tomado é o de não confundir as finanças pessoais com as do negócio, que se trata de uma pessoa jurídica diferente da pessoa física. Não existindo tais reservas financeiras, o capital necessário pode ser obtido com a venda de bens: imóveis, veículos etc. Uma alternativa é conseguir a verba necessária junto a familiares e amigos que estejam dispostos a compartilhar o risco do empreendimen- to. Destaca-se que os acordos financeiros dessa natureza precisam ser documentados para evitar o desencontro de informações no futuro. Entretanto, o melhor caminho para dar sustentabilidade a um negó- cio é a sua capacidade em gerar renda por meio da venda de produtos próprios ou licenciados, ou com a prestação de serviços, acompanhada de uma gestão que garanta a sua rentabilidade. Além das formas citadas, existem diversas outras modalidades de fi- nanciamento, as quais por sua origem podem ser divididas em públicas e privadas, nacionais ou internacionais. Atualmente, os editais (chamadas públicas) têm se destacado entre as fontes para obtenção de recursos destinados a trabalhos socioam- bientais. São processos abertos pelo setor público ou por corporações privadas que selecionam organizações para receberem recursos finan- ceiros destinados aos seus projetos ou negócios sociais. Muitos des- ses editais são realizados por entidades internacionais como governos, bancos de fomento e desenvolvimento, entidades bilaterais envolvidas com as questões ambientais e humanas etc. Existe também a possibilidade de receber doações voluntárias realizadas por diversas entidades, empresas, filantropos e demais pessoas físicas motivadas pela identificação com a causa defendida, contribuindo para eliminar ou melhorar um problema existente em uma situação social ou ambiental. As doações também podem ser obtidas por meio de relacionamento direto utilizando o marketing digital apoiado por tecnologia, o que significa o uso de ferramentas de tecnologia da informação (chatbot,SMS, WhatsA- pp, atendimento multicanal ou omnichannel etc.) ou ainda por humanos em contatos telefônicos efetuados por uma central de telemarketing. Os contatos diretos também podem ser feitos por abordagens realiza- das por representantes do projeto a pessoas que estão circulando em locais públicos (estratégia face-to-face), durante a promoção de eventos (jantares, feiras, bazares, festas típicas etc.) e em campanhas de arrecadação. As campanhas de arrecadação, além da modalidade presencial, con- tam ainda com a alternativa das plataformas on-line denominadas cro- wdfundings (financiamentos coletivos ou vaquinhas), e estão disponíveis em sites especializados que determinam as regras e o tempo de duração da ação de arrecadação cobrando uma taxa de administração sobre o va- lor arrecadado. Existem sites que pedem algum tipo de benefício como retorno para os doadores dependendo do volume da sua contribuição. Ações de arrecadação mais atuais têm envolvido o uso de mídias sociais com o apoio de influenciadores digitais. Por ser ainda um recur- so bastante novo nesse mercado, essa ação requer muito cuidado na seleção do tema, do conteúdo da campanha e da pessoa que represen- tará a instituição arrecadadora, porque além de atingir o público certo é preciso manter a seriedade e transparência da ação. Outro tipo de modalidade de obtenção de recursos bastante recen- te trata-se dos fundos patrimoniais que foram regulamentados pela Lei n. 13.800/2019 (BRASIL, 2019) e que se destinam a gerar resultados fi- nanceiros para serem investidos a longo prazo em ações socioambien- tais. Entretanto, sua operação é bastante complexa envolvendo um volume de recursos muito altos para a maioria das instituições sociais. Para a existência de tais fundos, exige-se a composição de uma orga- nização específica para a sua gestão que disponha de um conselho de ad- ministração, um conselho fiscal e um comitê de investimentos, que farão a gestão dos altos volumes financeiros a serem investidos em ativos finan- ceiros para que depois de algum tempo, e se bem aplicados, os recursos possam gerar rendimentos. O dinheiro que formará o fundo patrimonial pode ser arrecadado por meio de doações de pessoas físicas e jurídicas. th od on al 88 /S hu tte rs to ck Estratégias para negócios sociaisEstratégias para negócios sociais 9999 100 Propósito organizacional e capital social As organizações e os negócios sociais também podem incrementar sua renda por meio de ações de marketing relacionadas a uma causa, em que uma marca se associa a outra de uma instituição social ou a sua causa desenvolvendo uma campanha incluindo a venda de um produto ou serviço (camisetas, lanches, curso, lazer etc.) tendo parte ou a totali- dade do que for arrecado revertido para o projeto social. Já na área pública, as organizações do terceiro setor podem ter acesso às verbas governamentais com emendas parlamentares (artigo 166-A da Constituição Federal de 1988), que permitem aos deputados e senadores incluir no Orçamento da União verbas a serem alocadas a diversos entes federativos, organizações sociais ou serviço social au- tônomo. Desse modo, a autoridade legislativa indica a entidade a ser beneficiada, a qual, por sua vez, terá que assinar um convênio ou um instrumento semelhante com os órgãos governamentais. As parcerias de órgãos públicos com entidades privadas como as OSCs também podem ser firmadas por meio de um termo de colabo- ração, que se trata de um acordo de cooperação formalizado para que um objetivo definido pela administração pública seja executado por uma entidade privada. As condições de operação, prazos e demais itens relacionados à finalidade do projeto são definidos pelo órgão público. Outro instrumento para transferência de recursos governamentais para o terceiro setor é o termo de fomento, sendo que o pedido é originado pela OSC a partir de um projeto (plano de trabalho) detalhado visando um bem para a sociedade que seja considerado uma prioridade pelo ente público. Há também as leis de incentivo fiscal que se caracterizam por pro- porcionar benefícios tributários àqueles que desejarem colaborar com projetos sociais, esportivos e culturais. Para ter acesso aos valores, a instituição precisa cadastrar o seu projeto ou atender a determinadas regras em conformidade com cada uma das leis existentes. A modalidade de atuação e de formalização das entidades do terceiro setor vem se transformando e evoluindo da visão inicial da pura doação para a composição de negócios sociais, que oferecem acesso a produtos ou serviços para populações vulneráveis e de baixa renda, tendo como diferencial a apresentação de soluções inovadoras, criativas e lucrativas financeira, social e ambientalmente. Entretanto, sempre é importante atentar para o que defendem Chaves e Mezzari (2016) sobre a necessida- Algumas leis que se desti- nam a oferecer incentivos fiscais para doações são: Lei n. 12.715 – PRONAS/ PCD (saúde da pessoa com deficiência), Lei n. 8.313 (Rouanet/cultura), Lei n. 8.685 (audiovisual), Lei n. 8.069 (direitos da criança e do adolescente), Lei n. 11.438 (esporte), Lei n. 12.213 (idoso), entre outras. Saiba mais Estratégias para negócios sociais 101 de desses negócios serem viáveis financeiramente e eficientes em obter escala garantindo o sucesso nos mercados em que atuam. Isso tem atraído o interesse de diversas empresas de grande porte pelo mundo que estão implantando iniciativas de negócios sociais ba- seados nas regras de mercado, e a atenção de investidores tradicionais que antes só aplicavam seus recursos em negócios que seguem as re- gras tradicionais de mercados competitivos. Dessa forma, dependendo da estruturação, do objetivo, do poten- cial de crescimento e geração de renda operacional do negócio social, e se ele estiver dentro dos padrões de inovação e criatividade exigidos para as startups que são referência no mercado – como as chamadas de unicórnios –, passa a ser possível levantar recursos financeiros de terceiros por meio de capital de risco, que, segundo Gonçalves (2021a), são disponibilizados nas seguintes modalidades. Capital semente: destina-se a financiar startups inovadoras e basea- das em projetos criativos, que estejam em estado inicial e necessitem de um pequeno montante de recursos financeiros para dar início ao negócio. Investidores anjos: são grupos de pessoas em busca de negócios com alto risco, mas que propiciem altos retornos para maximizar os seus investimentos, já que desejam atuar em mercados novos e promissores. Venture capital: são empresas que procuram investir um volume expressivo de capital em startups que já estão mais maduras, ou seja, já passaram da sua fase inicial e possuem mercado, mas necessitam de in- vestimentos para alavancar o negócio para um patamar superior. Nesse tipo de investimento, os investidores se tornam sócios da organização. Privaty equality: são fundos que buscam investimento em empresas já estabelecidas no mercado (grande porte), mas que precisam expandir ou reestruturar seus negócios. Uma das características que o negócio deve ter para atrair esse tipo de investimento está na capacidade de expansão e de maximização do retorno aos investidores no médio e longo prazo. Nessa modalidade, o fundo vira sócio do negócio e passa a participar di- retamente das decisões do empreendimento, com o objetivo de vender o negócio depois de atingir os resultados desejados para que haja lucro. Projetos que possuem essa característica de inovação ainda podem ser incorporados a uma incubadora ou aceleradora de negócios para dar início às atividades. O acesso a essas entidades geralmente se dá por meio 102 Propósito organizacional e capital social de Universidades ou Associações de classe, e propiciam uma “estrutura compartilhada de serviços administrativos e financeiros, contabilidade, jurídico, recepção, internet, marketing etc., além do suporte para o desen- volvimento do negócio em si e depesquisas voltadas a área de interesse” (GONÇALVES, 2021a, p. 43). A participação em uma incubadora ou acelera- dora facilita o acesso aos investidores de capital de risco independente da questão física, podendo ser realizada na modalidade virtual. Tanto para se candidatar aos recursos financeiros já descritos quan- to para obter empréstimos bancários, que é outra fonte de recursos, o passo inicial é definir a destinação do valor desejado, ou seja, é preciso deixar claro para qual objetivo a verba será usada, como por exemplo: financiamento ou alavancagem do projeto, investimento em equipa- mentos, capital de giro etc. As organizações financeiras dispõem de diversos tipos de linhas de crédito, e para cada situação existem fatores que são mais atrativos que os outros, tais como: o prazo de pagamento, as taxas de juros e outras despesas financeiras envolvidas na transação e que compõem o custo real daquele recurso. Depois vem a etapa de quantificar a necessidade de capital ou o quanto será solicitado, sendo também recomendável indicar se o pro- jeto será patrocinado somente com o capital de terceiros ou se haverá alguma contrapartida da organização solicitante, bem como, se for um empréstimo e não um patrocínio ou doação, é preciso descrever as for- mas e a origem dos recursos para o pagamento das parcelas. Todos esses processos envolvem um ciclo longo de negociação e de relacionamento com as instituições que liberarão a verba, as quais se preocupam em garantir que o recurso liberado terá uma destinação adequada e trará retorno para as partes interessadas. Logo, um plano de negócios bem estruturado com demonstrativos financeiros reais e atualizados apoiado por um projeto claro se consti- tuem em valiosos instrumentos para demonstração da viabilidade do seu negócio junto aos investidores (GONÇALVES, 2021a). Além disso, os investidores ou financiadores exigem que o solicitante esteja em ordem com a sua parte formal, o que pode envolver a apresen- tação de estatutos; ata de fundação; contrato social; CNPJ; certidões de regularidade com órgãos municipais, estaduais e federais; registros em juntas comerciais, se for o caso; contabilidade organizada e atualizada etc. No livro Guia prático para negócios de impacto social o autor apresenta formas para criar um negócio social baseado em ações inovadoras e criativas para as soluções de diversos problemas socioambientais, que tam- bém obtenha resultados financeiros positivos para os investidores. A leitura desse livro proporciona ao educando o contato com experiências vence- doras na área. CHAVES, T. J.; MEZZARI, L. Jundiai: Paco Editorial, 2016. Livro Estratégias para negócios sociais 103 Para negócios sociais são exigidos ainda dados sobre o seu fatu- ramento, indicadores de resultados operacionais (Ebitda) que com- provem a sua capacidade para pagar os compromissos assumidos, informações pessoais e fiscais dos principais responsáveis pelo negó- cio, garantias reais (investimentos, imóveis, veículos etc.), entre outros. Groppelli e Nikbakht (2002) destacam a necessidade de se equilibrar a obtenção de recursos de terceiros com o uso de recursos próprios da organização para mantê-la funcional, e principalmente para que não comprometa o negócio, pois muitas dívidas podem fazer com que a empresa se torne insolvente. 4.3 Sustentabilidade e boas práticas de gestão Vídeo As organizações objetivam manter a sua existência sendo sustentá- veis a longo prazo. Para isso dependem de um bom processo de gestão que inclua o cuidado com os seus processos, a qualidade na execução das tarefas e as diretrizes assertivas para a sua governança. Um dos representantes mais destacados da teoria clássica da admi- nistração foi Henri Fayol. Ele defendia que a gestão como uma função da administração deveria se concentrar em cinco pilares: planejar, or- ganizar, comandar, coordenar e controlar. Outros autores discordam de Fayol por considerar sua divisão mui- to simplificada. Entretanto, mesmo na atualidade, muitas organizações não possuem um sistema de gestão com todos os elementos neces- sários para o seu pleno funcionamento dentro de um ambiente global cada vez mais complexo e dinâmico (GONÇALVES, 2021a). As organizações sem fins lucrativos ou os negócios sociais têm au- mentado a sua participação na sociedade, o que exige uma profissio- nalização maior em sua gestão, o que nem sempre se verifica, já que existem muitas “iniciativas que buscam sanar uma carência social, po- rém sem um objetivo, escopo, prazo ou custos definidos” (NEMOTO; SILVA; PINOCHET, 2018, p. 68). Destaca-se que um projeto social representa um esforço planejado e coordenado para resolver um problema ou atender a determinadas carências Jules Henri Fayol (1841- 1925) fundou o Centro de Estudos Administra- tivos. Na sua visão, a administração se dava de cima para baixo, ou seja, da direção para a operação/produção. Fayol considerava que o trabalho gerencial era distinto da produção que envolvia as áreas técnicas da empresa. Biografia 104 Propósito organizacional e capital social [...] ter seus resultados avaliados para verificar se os recursos estão sendo efetivamente gerenciados a fim de buscar atingir os objetivos definidos, possibilitando a prestação de contas às partes interessadas no projeto. (NEMOTO; SILVA; PINOCHET, 2018, p. 68) Em contraposição também há corporações que se destacam den- tro do terceiro setor justamente por terem aderido às boas práticas de gestão que as levaram à obtenção de bons resultados. O International Committee on Fundraising Organizations (ICFO) monitora instituições voltadas para causas sociais com a finalidade de promover a transparência e a integridade desse setor para gerar maior confiança no grupo de potenciais doadores. De acordo com o ICFO (2022), existem sete critérios ou grupos de boas práticas que devem ser observados para que uma organização seja considerada confiável, que serão vistos a seguir. O primeiro critério é o benefício público que uma instituição se propõe a fazer por meio das suas atividades. Nesse sentido, a definição do propósito organizacional declarando claramente a razão para qual a corporação existe, no que ela colabora com a sociedade e a formulação da sua missão, visão e valores corporativos auxilia no direcionamento das ações do dia a dia e na adesão de pessoas que compartilham das mesmas crenças e valores. Tais definições se baseiam na cultura organizacional vigente, que representa a identidade da corporação, identificando como conduz os negócios e o relacionamento com seus stakeholders. É ela que deter- mina as normas e os procedimentos internos que medem os compor- tamentos dos colaboradores, o respeito às pessoas, e a legislação e o atendimento das necessidades socioambientais (GONÇALVES, 2021b). O segundo critério é a governança que deve garantir o cumprimen- to das normas e regulamentos aos quais as instituições do terceiro se- tor estão subordinadas, devendo ser observadas pelo corpo diretivo e por sua estrutura para cumprir o seu propósito com independência e responsabilidade. O corpo diretivo é o responsável pela elaboração das estratégias a serem adotadas, as quais terão seus detalhes de execução definidos dentro do planejamento que conterá também os objetivos e as metas a serem alcançados, que devem ser significativos, concretos e orien- tados para a ação, demonstrando o seu potencial de impacto para a Estratégias para negócios sociais 105 sociedade. Os objetivos e metas podem ser agressivos, mas precisam ser factíveis de serem alcançados, ou seja, realistas. A execução e os respectivos fatores para que os processos acon- teçam são tratados no plano de ação operacional elaborado com a fi- nalidade de orientar o efetivo trabalho para execução pelas áreas e colaboradores da instituição, cujos resultados são acompanhados por indicadores (KPIs) sobre os resultados-chave previamente definidos. Como resultados-chave,deve-se selecionar aqueles que trazem im- pacto para o negócio social e podem ser medidos, devendo ser especí- ficos e acompanhados em intervalos de tempo regulares. No caso de constatação de alguma não-conformidade, são aplica- dos os planos de contingência e emergência, dependendo da gravidade da ocorrência. O plano de emergência se trata de um planejamento detalhado que descreve as responsabilidades e as ações a serem realizadas no momento seguinte à ocorrência de um evento inesperado que traga efeitos negati- vos para qualquer operação. Seu objetivo é atender as situações no mo- mento imediato ao da ocorrência, prestando assistência aos envolvidos, realizando a avaliação de possíveis danos causados pelo fato ocorrido. Já o plano de contingência visa o retorno a uma condição em que a operação possa ser reestabelecida. O seu planejamento e a execução objetivam mitigar ou eliminar os impactos negativos possibilitando o re- torno das atividades; sua aplicação, em tese, acontece na sequência do atendimento de emergência. Resumidamente o plano de contingência deve ser capaz de apresentar respostas em relação à intervenção, ao controle e ao combate dos impactos provocados pelo evento inesperado. Para que toda essa ação ocorra, independentemente do seu tama- nho, qualquer instituição necessita de uma estrutura organizacional que viabilize a entrega do serviço ou do produto que materializa a sua pro- posta de valor. Tal estrutura deve favorecer o trabalho colaborativo por meio de equipes autossuficientes, emponderadas e prontas para lidar com am- bientes desafiadores. O pensamento é corroborado por Mintzberg (2010), que defende estruturas organizacionais dinâmicas e flexíveis com processos que evi- 106 Propósito organizacional e capital social tem o excesso de burocracia e de controles, e que possuam processos descentralizados de decisão. As organizações que obtêm sucesso no terceiro setor são aquelas que entendem não ser possível a existência de modelos estruturais pu- ros que possuem a mística de que uma vez adotados são a solução de todos os problemas. Pelo contrário, elas conseguiram moldar suas estruturas combinando a orientação para projetos com a busca por maior eficiência com custos mais baixos, mas com a garantia da inte- gração de todas as partes necessárias e interessadas (stakeholders). O terceiro grupo de critérios se relaciona com as finanças. A regula- ridade e transparência das informações financeiras devem ser comple- tas e precisas para ter uma real visão de como se sustenta a instituição e quais resultados ela vem conquistando. A qualidade da administração financeira é a espinha dorsal para a perenidade de qualquer empreendimento ao proporcionar susten- tabilidade aos projetos, o que também atende ao quarto grupo de critérios que trata da eficiência ao possuir padrões de transparência para os seus custos e despesas. Assim como o quinto grupo de critérios relativo à eficácia, em que se avalia o desempenho da instituição no uso dos recursos captados por meio dos resultados socioambientais proporcionados. O sexto critério é a integridade, que corresponde às ações éticas baseadas na moral exigida para o uso dos recursos financeiros obtidos e no comportamento da organização. Isso envolve a relação com a co- munidade, já que a adesão da sociedade ajuda os projetos a ganharem o respeito necessário para que possam ser ampliados alavancando o crescimento da organização. Parte dessa relação é sustentada por um bom processo de co- municação, desde que seja verdadeira, sem intenção de enganar nem agredir as pessoas, e que sirva para esclarecer ao público inte- ressado (stakeholders) sobre as ações em andamento e os resulta- dos alcançados, dando transparência à corporação e colaborando com o fortalecimento da imagem e da ideologia social que defende. Nos dias atuais, o processo de comunicação ganha amplitude com o uso de redes sociais e de ferramentas tecnológicas que aumentam o poder de alcance das instituições. A obra ONG sustentável: o guia para organizações do terceiro setor economica- mente prósperas trata de processos de captação e do gerenciamento adequado de recursos para a sustentabilidade de instituições do terceiro setor, descrevendo a re- lação com os provedores e as maneiras inovadoras para transformar qualquer organização sem fins lucrativos em um negócio que sobreviva por seus próprios meios pela venda de produtos ou a entrega de serviços sociais. TOZZI, J. A. São Paulo: Gente, 2017. Livro Estratégias para negócios sociais 107 Para Bueno (2011), a comunicação promove a imagem institucional engajando os stakeholders em favor dos objetivos traçados provendo uma interação entre todas as hierarquias e democratizando a informa- ção em sentidos internos e externos. Silveira (2003) complementa, declarando que a comunicação dá visi- bilidade para a instituição junto às pessoas formando opiniões ao colo- car temas para serem debatidos, além de influenciar na constituição de juízos e sobre eles, o que auxilia o negócio social no alinhamento dos seus projetos futuros ou os que estão em andamento, bem como na prestação das suas contas para a sociedade. Nesse grupo também se incluem os aspectos jurídicos relativos à composição regular da instituição, aos tributos, e da obediência e ade- quação a toda a legislação vigente, com destaque para a maneira como a empresa trata e administra o vínculo dos seus colaboradores. O sétimo grupo de critérios tem a ver com a transparência, em que se inclui a divulgação de informações abrangentes e úteis sobre seus projetos, ações, finanças e resultados. Para que isso seja possível, é preciso considerar a questão contábil que dá suporte real às ações de transparência sobre os resultados, além de ser nesse item que se define o tipo de entidade estabelecida (sem fins lucrativos ou um negócio social); se há imunidade ou isenção tributária ou se foi necessária a adesão a um sistema tributário (simples, lucro real, lucro presumido); como é feita a contabilização das receitas e despesas; como funciona o plano de contas e os centros de custos e receitas; os processos para gestão e guarda da documentação contábil; a escritura- ção dos valores que compõem as demonstrações financeiras e econômi- cas tais como o balanço patrimonial e a DRE, entre outras. Tozzi (2017) lembra que as instituições do terceiro setor, em geral, de- pendem de recursos de terceiros que se interessam e aceitam investir nos projetos da entidade. Isso traz bastante responsabilidade aos gestores que administram o dinheiro de terceiros e criam expectativas em grupos sociais que aguardam as melhorias propostas pelo seu trabalho. Entre- tanto, também colocam as instituições em uma postura de menor poder de barganha durante os processos de negociação junto aos seus prove- dores. Nesse ponto o autor destaca ainda mais a importância de se ter uma gestão que dê sustentabilidade e crie alternativas de autossustento 108 Propósito organizacional e capital social ao empreendimento social, que deve ser gerido como um negócio mesmo que não objetive a distribuição de lucros financeiros. Como em todo empreendimento, é preciso que os gestores de ins- tituições do terceiro setor e de negócios sociais estejam aptos para enfrentar os diversos desafios com os quais se defrontarão na admi- nistração da sua organização. 4.4 Gestão do voluntariado Vídeo O voluntariado depende do interesse e do empenho de cada indiví- duo que, uma vez identificado com uma causa, passa dedicar parte do seu tempo atuando em atividades que visam ao bem-estar de outras pessoas. Quando observamos o ambiente das organizações, percebe-se na atualidade o crescimento do voluntariado empresarial, que tem se cons- tituído em uma das ferramentas de responsabilidade social empresarial, funcionando como um elemento para o engajamento dos colaboradores em ações selecionadas pelas corporações e que beneficiam a coletividade. O voluntariadoempresarial se diferencia do voluntariado pessoal em razão do direcionamento organizado das ações e pelo vínculo que as pessoas envolvidas têm com a empresa. O serviço de voluntariado no Brasil é regulamentado pela Lei n. 9.608/1998, que em seu artigo 1º. o define como uma atividade que não é remunerada e que a pessoa pode prestar para qualquer tipo de organiza- ção (pública ou privada) sem fins lucrativos (BRASIL, 1998). A lei ainda cita que os objetivos de tais organizações podem ser cívicos, culturais, educa- cionais, científicos, recreativos ou de assistência à pessoa. Ademais, ela destaca que o serviço voluntário não gera vínculo empregatício ou implica em obrigações trabalhistas como a previdenciária, por exemplo. Não há um limite de tempo ou de idade para que uma pessoa traba- lhe como voluntário, mas se deve observar a proibição em nosso país do trabalho infantil, salientando que “crianças e jovens só podem fazer parte de programas de voluntariado educativos e formativos” (IDIS, 2021, p. 32). A relação do voluntário com a instituição para a qual ele se comprome- te a prestar um trabalho sem remuneração assumindo a responsabilidade de realizar tarefas de maneira espontânea em datas e horários facultativos não significa que seja realizada sem nenhum direcionamento ou controle. Estratégias para negócios sociais 109 Nesse sentido de organização o artigo 2º. da Lei n. 9.608/1998 deter- mina que seja formalizado um termo de adesão entre a organização e o voluntário, em que se descreva o objeto e as condições de como esse serviço será realizado. Ressalta também que, embora não haja remu- neração pelo serviço, caso o voluntário venha a ter algumas despesas comprovadas, pode haver o ressarcimento por parte da entidade para a qual ele presta serviço, desde que haja a devida autorização para o gasto (Lei 9.608, art. 3º.). No termo de adesão, define-se o escopo do trabalho a ser realizado; detalhando se a atividade será desenvolvida na modalidade presencial ou virtual (home-office); em qual horário; qual a quantidade de horas a serem doadas pelo voluntário; as cláusulas sobre sigilo, confidencialida- de e uso das informações que lhe serão dadas; os compromissos da ins- tituição e do voluntário; e a autorização para uso da sua imagem e voz. Quanto às horas doadas, é preciso que sejam registradas contabil- mente por estimativa dos seus valores nos registros da entidade bene- ficiada como seria feito com um profissional remunerado na mesma função, sendo que um voluntário pode exercer qualquer cargo dentro de uma instituição (IDIS, 2021). E quem são as pessoas que trabalham como voluntários? De acordo com Goldberg (2001), o perfil do voluntário foi se modificando ao longo do tempo, visto que, se antes era definido como pessoas que possuem solidariedade, amor, caridade e compaixão pelo próximo somados a outros fatores religiosos, hoje os voluntários sabem que o seu papel vai mais além, visto que se trata também de um ato de cidadania que auxilia na construção de uma sociedade melhor, além de ser um modo de encontrar e conhecer pessoas diferentes, para juntos causarem im- pactos positivos e transformarem a sociedade. Cunha (2010) afirma que a partir dos anos 1990 ocorreu a constru- ção de um novo voluntariado que passou a dar maior sustentação e visibilidade às ações das instituições socioambientais, e qualquer ins- tituição que pretenda contar com o trabalho de voluntários necessita considerar alguns pontos para estruturar essas ações. A gestão dos voluntários se inicia na análise das necessidades da insti- tuição para realizar as tarefas a que se propôs, dessa forma é preciso identifi- car que tipo de voluntário será necessário para cada uma das ações a serem implementadas e em que área de trabalho eles serão úteis e produtivos. No livro Os andaimes do novo voluntariado a autora descreve o desenvolvimento do voluntariado tratando da sua transformação a partir dos anos 1990, no que ela denomina de construção baseada na relação com os demais atores sociais que sustentam o trabalho voluntário e um novo discurso institucional. CUNHA, M. P. São Paulo: Cortêz, 2010. Livro 110 Propósito organizacional e capital social Normalmente as instituições contam com uma estrutura fixa mínima e com os voluntários a fim de operacionalizar as ações em prol da sociedade e do ambiente, assim como realizar o atendimento do público beneficiado. Definidas as necessidades, parte-se para a descrição do perfil dos voluntários considerando as características técnicas e pessoais de cada um, o que inclui o seu conhecimento, as suas habilidades e ati- tudes. No perfil estarão descritos o trabalho a ser realizado, o local, o horário, o nível educacional desejado, os resultados esperados, a perio- dicidade das tarefas, e, se possível, com quem o voluntário se relacio- nará dentro da organização, entre outras. Da mesma forma que qualquer organização privada, a instituição do ter- ceiro setor deve realizar o recrutamento e a seleção dos candidatos a prestar o serviço voluntário identificando e agregando ao corpo de colaboradores pessoas que possam desempenhar suas tarefas de maneira diferenciada. Recrutar é chamar todas as pessoas que possam se interessar pela oportunidade. Existem sites especializados no recrutamento de voluntá- rios, mas ainda valem ações junto a softwares Applicant Tracking System ou Sistema de Rastreamento de Candidatos (ATS), jornais, comunidades organizadas, escolas, indicação de colaboradores, blogs, redes sociais, programas de voluntariado empresariais etc. (GONÇALVES, 2021a). Já selecionar significa definir quem irá compor o quadro de voluntários da instituição por meio do uso de ferramentas (entrevistas, testes etc.). Nesse processo é preciso identificar o alinhamento da cultura organizacional e de valores e crenças dos novos integrantes, além de considerar características muito próprias de voluntários, tais como o entusiasmo e a disponibilidade. Durante o processo de seleção, são analisadas as habilidades técnicas (hard skills) e as habilidades pessoais (soft skills) dos candidatos objetivando o processo de integração do voluntário com a cultura e os objetivos da insti- tuição, facilitando o relacionamento interpessoal, pois incluem uma boa co- municação, empatia, poder de convencimento, entre outras características positivas para o ambiente interno da organização (ANTUNES, 2020). A integração dos voluntários aos demais colaboradores muito depen- de da identificação do candidato com os valores e crenças defendidos pela instituição que está o selecionando. Chiavenato (2014) considera que cada indivíduo se sente bem em determinadas situações que atendem às suas perspectivas de vida, dessa forma, o colaborador também avalia se a cul- tura organizacional se encaixa com os seus traços particulares. Estratégias para negócios sociais 111 A completa integração de um novo voluntário ao ambiente da organi- zação exige tempo, já que existe a necessidade de prepará-lo devidamente para as suas tarefas, começando pelo alinhamento dos seus valores e cren- ças ao da organização, além do esclarecimento sobre a causa defendida. Nesse processo, o voluntário ainda precisa ser orientado sobre quem são as pessoas-chave na corporação e como a cultura organiza- cional enxerga as relações interpessoais e afetivas, bem como sobre quais são as ações e resultados que a corporação valoriza. Além de se preocupar em atrair para a instituição os melhores ta- lentos, é necessário se preocupar com o treinamento e o desenvolvi- mento dos colaboradores, pois não basta que o voluntário tenha boa vontade e seja uma boa pessoa, é preciso que ele esteja capacitado e devidamente orientado sobre suas ações. A instituição é quem deve se responsabilizar pelo conteúdo sobre o qual o voluntário deve ser pre- parado para que possa executar suas tarefas com sucesso. Treinar é diferente de desenvolver, quando se treina está se prepa- rando uma pessoa paraexecutar uma ação mais específica de curto prazo, ensina-se a ela a fazer algo, por exemplo usar uma ferramen- ta ou um determinado sistema informatizado. Já desenvolver trata-se de uma ação de longo prazo que envolve a transformação da pessoa que passa a pensar e a agir de maneira diferenciada, transformando-a como um todo em seu comportamento pessoal e profissional. É importante que exista um bom ambiente interno na insti- tuição para acolher os voluntários e os direcionar adequadamente para os trabalhos, que são coordenados pela liderança, a qual prefe- rencialmente deve ser humanizada e transparente e saber motivar a todos para que empreguem toda a sua capacidade em prol dos objetivos da organização. Uma liderança humanizada atua principalmente por interações so- ciais exercendo forte influência no ambiente interno das organizações. Suas atitudes e comportamentos são sempre observados pelos demais integrantes do ambiente de trabalho, que se baseiam no comportamen- to adotado pelo gestor como exemplo para a sua própria forma de agir. Além de orientar, coordenar e monitorar os trabalhos dos volun- tários, a liderança precisa orientar os indivíduos sobre os papéis que desempenham nos grupos e quais são as expectativas da organização com relação ao equilíbrio das relações pessoais. A liderança é a res- 112 Propósito organizacional e capital social ponsável por gerar e incentivar os relacionamentos positivos dentro dos grupos de trabalho garantindo a aceitação dos novos integrantes. Mesmo não havendo uma remuneração, os voluntários precisam de um sistema que lhes traga o devido reconhecimento pelas boas ações realizadas, e sempre é indicado reconhecer o bom desempenho. Do mesmo modo que a comunicação é uma parte importante no processo de integração da instituição com a sociedade, ela também é ponto crucial na gestão dos voluntários, pois por seu intermédio é que se divulgam os objetivos, metas e resultados, também é possível utilizá-la para a propagação das normas e regulamentos e de ações motivacionais que orientam o trabalho dos colaboradores. São diversas as ferramentas à disposição para agilizar e dar qualidade ao processo de comunicação, que pode contar com ferramentas digitais (redes sociais, SMS, e-mails etc.), painéis, quadros de aviso, treinamentos gravados, reuniões diárias ou semanais, entre outros. Como forma de verificar a eficácia da gestão, a instituição deve de- senvolver um sistema de avaliação para medir o desempenho do tra- balho do voluntário observando itens como a sua conduta, a postura ética e moral, se ele se dedica e se é confiável e responsável, como é a sua relação com os horários e os compromissos, se pode ter acesso a assuntos confidenciais ou estratégicos etc. Um sistema de gestão de voluntários eficiente consegue agregar boas pessoas para a sua estrutura, mas também é capaz de mantê-las trabalhando em equipe e com bom desempenho. CONSIDERAÇÕES FINAIS Como forma de responder aos desejos da sociedade, as organizações têm buscado inovar não só em seus produtos e serviços, mas também na sua gestão. Muitos dos empreendedores dos nossos tempos procuram realizar seus sonhos indo além do dinheiro. A satisfação dessas pessoas está em causar impacto positivo para a socie- dade em que vivem, por meio da concretização de suas ideias transforman- do-as em projetos socioambientais, que além de atender as necessidades da comunidade também geram renda para a sua sustentabilidade. Estratégias para negócios sociais 113 Tais projetos precisam ser bem elaborados para que possam atingir os seus objetivos, o que exige a capacidade de planejar e executar. Se antes as instituições envolvidas com o terceiro setor eram vistas apenas pelo lado da filantropia, isso mudou, e muitos empreendedores junto com seus colaboradores apresentam um grau elevado de profissionalização, o que gera confiança e inspira novos investidores que possam financiar as ações que alavancam os negócios sociais. Essa modalidade de negócio também se caracteriza por desenvolver produtos e serviços que gerem renda suficiente para a sua sustentabili- dade, demonstrando maturidade e boas práticas de gestão que incluem a gestão de voluntários, pessoas comprometidas e responsáveis que se de- dicam para um trabalho não remunerado e valoroso, pois se identificam com as causas defendidas pelas ações de impacto social. ATIVIDADES Atividade 1 Qual é a função do planejamento estratégico? Explique. Atividade 2 Como podem ser descritas as ações de marketing relacionados a uma causa para instituições do terceiro setor? Atividade 3 O trabalho do voluntariado é regulamentado no Brasil pela Lei n. 9.608/1998. Como é formalizada a relação entre o voluntário e a instituição para a qual ele vai doar as suas horas de trabalho? 114 Propósito organizacional e capital social REFERÊNCIAS ANTUNES, L. (org.). Soft Skills: competências essenciais para os novos tempos. São Paulo: Literare Books International, 2020. BRASIL. Lei n. 9.608, de 18 de fevereiro de 1998. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 19 fev. 1998. Disponível em: https://legislacao.presidencia.gov.br/ atos/?tipo=LEI&numero=9608&ano=1998&ato=7e2ETRE1EeNpWT0b3. Acesso em: 19 ago. 2022. BRASIL. Lei n. 13.019, de 31 de julho de 2014. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 1 ago. 2014. Disponível em: https://legislacao.presidencia.gov.br/ atos/?tipo=LEI&numero=13019&ano=2014&ato=9f0EzYE9ENVpWTdfd. Acesso em: 19 ago. 2022. BRASIL. Lei n. 13.800, de 4 de junho de 2019. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, 7 jan. 2019. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019- 2022/2019/lei/l13800.htm. Acesso em: 29 jul. 2022. BUENO, W. C. Comunicação empresarial: planejamento e gestão. São Paulo: All Print, 2011. CHAVES, T. J. de; MEZZARI, L. Guia prático para negócios de impacto social. Jundiai: Paco Editorial, 2016. CHIAVENATO, I. 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Muitos desses impactos foram e são ainda benéficos, possi- bilitando a melhoria de nossa saúde, educação, sistema de produção de riquezas (bens e serviços) etc. A partir de um determinado período, a sociedade passou a vivenciar uma maior aceleração das inovações tecnológicas, bem como começou a detectar alguns males oriundos do uso desenfreado de equipamentos e itens tecno- lógicos levando-nos a refletir sobre o futuro e os possíveis impactos que a tecnologia terá no nosso ambiente. Neste capítulo é tratado exatamente sobre essas preocupações, iniciando pela apresentação da legislação básica vigente que rege o acesso ao universo digital. Em seguida, busca-se entender os reflexos que as mudanças provoca- das pela tecnologia têm causado na vida das pessoas, destaca-se os principais usos da inteligência artificial (IA) e seus benefícios e são apresentados casos de organizações que atingiram o sucesso dentro do mundo dos negócios sociais. Com o estudo deste capítulo, você será capaz de: • aprender sobre a legislação vigente que rege o acesso ao universo digital; • entender os reflexos que as mudanças provocadas pela tecnologia têm causado na vida das pessoas; • estudar os principais usos da inteligência artificial (IA) e os seus benefícios; • conhecer casos de organizações que atingiram o sucesso dentro do mundo dos negócios sociais. Objetivos de aprendizagem 116 Propósito organizacional e capital social 5.1 Direito de acesso das pessoas ao universo digital Vídeo O desenvolvimento tecnológico encontra-se em um ritmo bas- tante acelerado nas últimas décadas, tendo como uma das suas consequências o surgimento de muitas inovações principalmente nas áreas de tecnologia da informação (TI) e comunicações, afetan- do significativamente também a forma de vida da nossa sociedade. Embora as inovações tragam benefícios visíveis ao se incorpora- rem na vida dos seres humanos nas áreas de educação, financeira, social, negócios entre outras, elas não estão acessíveis a todas as pessoas em razão das desigualdades existentes no mundo. Entretanto, se no passado se dava pouco destaque para esse tema, atualmente ele tem sido foco de diversas discussões e ações de entidades globais para que se garanta, na forma de direito, o acesso a itens que hoje são fundamentais para o desenvolvimento humano. Para Souza e Felipe (2017), as pessoas excluídas desse processo de desenvolvimento que nos levou à sociedade da informação e do conhecimento são denominadas de infoexcluídos, visto que não têm acesso tecnológico, o que acaba por afetar o seu desenvolvi- mento social, educacional e profissional. A sociedade, em seu todo, é responsável por identificar as restri- ções existentes e agir no sentido de que todos possam ter acesso aos serviços, aos lugares, às informações e aos bens necessários ao seu desenvolvimento, seja ele pessoal ou profissional (SASSAKI, 2010). Entre os fundamentos da Constituição Federal Brasileira promulgada em 1988, encontram-se, em seu artigo 1º, incisos II e III a cidadania e a dignidade da pessoa humana. No artigo 3º são declarados como objetivos fundamentais da nos- sa República: construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desen- volvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (BRASIL, 1988) Os autores propiciam ao educando a oportunidade de conhecer e analisar o novo panorama social onde existem conflitos com relação ao acesso às novas tecnologias e inovações nas áreas de Tecnologia da informação e Comunicação (TIC). Também abordam as iniciativas governamentais para a inclusão da grande parcela da população sem acesso tecnológico. SOUZA, A.; FELIPE, R. A informática e a exclusão digital. 2. ed. São Paulo: Kindle, 2017. [e-book]. Livro Inclusão digital em negócios sociais 117 Em seu artigo 5º consta a declaração de igualdade sem distinção de todas as pessoas perante a lei, com o intuito de garantir o direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (BRA- SIL, 1988). Ainda figuram diversos outros artigos que objetivam a redução das desi- gualdades sociais, por exemplo: o art. 170, que trata da dignidade dos bra- sileiros; do trabalho; do bem-estar e da justiça (art. 193); da educação, tudo visando o pleno desenvolvimento da pessoa para que possa exercer a sua cidadania e estar qualificada para o trabalho (art. 205) entre outros. No âmbito global, em 2015, como resultado da Assembleia Geral das Nações Unidas, foi divulgada a Agenda 2030, um documento aceito por 193 países com 17 objetivos de desenvolvimento sustentáveis (ODS) que preveem a adoção de medidas voltadas à promoção do estado de direi- to, aos direitos humanos e à responsividade das instituições políticas. Entre esses objetivos, destaca-se os seguintes (ONU, 2022): 9. Construir infraestruturas resilientes, promover a industria- lização inclusiva e sustentável e fomentar a inovação [...] 9.c Aumentar significativamente o acesso às tecnologias de in- formação e comunicação e se empenhar para oferecer acesso universal e a preços acessíveis à internet nos países menos de- senvolvidos [...]. 10. Reduzir as desigualdades no interior dos países e entre países. [...] 10.2 Até 2030, empoderar e promover a inclusão social, eco- nômica e política de todos, independentemente da idade, gênero, deficiência, raça, etnia, origem, religião, condição eco- nômica ou outra. Como inclusão social entende-se o conjunto de ações para redução da pobreza e desigualdades, também para integração daquelas pes- soas excluídas ao longo do processo de desenvolvimento social (indiví- duos em situação de vulnerabilidade, mulheres, crianças, pessoas com deficiência, idosos, indígenas, negros, cidadãos LGBTQIA+ etc.). A inclusão social engloba também a inclusão digital, que se de- fine como a disponibilização de acesso a todas as pessoas às ferra- mentas digitais, ou seja, são os atos que democratizam e popularizam o uso da tecnologia e das suas inovações em hardwares e softwares. Para que essa inclusão seja possível, um dos pontos a serem combatidos é o analfabetismo funcional, definido pelo fato de uma 118 Propósito organizacional e capital social pessoa não conseguir se desenvolver por ser incapaz de compreen- der e utilizar a leitura, escrita e cálculos, estando impossibilitada de realizar atividades em que a alfabetização é essencial para colabo- rar com a sua comunidade (UNESCO, 1978). Tal definição pode ser estendida para o mundo cibernético por meio do termo analfabetismo digital, quando o cidadão não é capaz de acessar, entender ou utilizar para o seu desenvolvimento as tec- nologias da informação e comunicação (TIC) existentes, bem como o conteúdo disponívelna internet e nos demais itens tecnológicos, tais como: softwares de edição de texto, gestão de dados, elabo- ração de gráficos e planilhas, redes sociais, animação, material de propaganda e marketing etc. Vencer a barreira do analfabetismo digital com relação às tec- nologias atuais significa possibilitar e melhorar os meios de comu- nicação; de expressão; de produção de bens e serviços; de acesso, de criação e divulgação do conhecimento por toda a sociedade. Com esse foco e seguindo as diretrizes da Agenda 2030 (ONU, 2022) para o atingimento dos ODS citados, o Brasil publicou o De- creto n. 9.319/2018 e suas alterações, instituindo o Sistema Nacio- nal para a Transformação Digital (SinDigital), que se divide em duas partes: a Estratégia Brasileira para a Transformação Digital (E-Digi- tal) e a estrutura de governança do SinDigital (BRASIL, 2018a). O E-Digital objetiva a promoção do desenvolvimento econômico e social de modo sustentável e inclusivo, para tanto orienta o investimen- to em infraestrutura e acesso a tecnologias; à pesquisa, ao desenvolvi- mento e à inovação; à confiança e à segurança dos ambientes digitais; à educação e à capacitação profissional; à integração regional e global; à transformação digital da economia; à disseminação da informatização; e à transformação digital do governo e seus serviços (Governo Digital). Para que seja possível a sua implementação, esses temas en- contram-se agrupados em dois grupos de eixos – habilitadores e de transformação digital – que se interrelacionam e podem ser vi- sualizados na Figura 1. Inclusão digital em negócios sociais 119 Eixos de transformação digital In fr ae st ru tu ra e a ce ss o às T IC Pe sq ui sa , d es en vo lv im en to e in ov aç ão Co nfi an ça n o am bi en te d ig it al Ed uc aç ão e c ap ac it aç ão p ro fi ss io na l D im en sã o in te rn ac io na l Economia baseada em dados Um mundo com dispositivos conectados Novos modelos de negócios Cidadania e governo Eixos habilitadores Figura 1 SinDigital: eixos habilitadores e de transformação digital Fonte: Elaborado pelo autor com base em Brasil, 2018b. Os eixos habilitadores se destinam à criação do ambiente necessário para que a transformação digital ocorra (infraestrutura e acesso às TIC; pesquisa, desenvolvimento e inovação; confiança no ambiente digital; educação e capa- citação profissional; e dimensão internacional). Já os eixos de transformação digital da economia englobam os atores ou ramos de atividade responsáveis pela transformação (agentes da economia baseada em dados; internet das coisas (IoT); e novos modelos de negócio e governo digital). Embora a transformação e a inclusão digital visem o desenvolvimen- to social como um todo, oferecendo oportunidades iguais, assim como a justiça e a equidade dos direitos entre as pessoas, isso não acontece naturalmente. É preciso incentivar as ações de acessibilidade, educação 120 Propósito organizacional e capital social inclusiva, inclusão econômica e financeira, participação social, saúde e serviços governamentais para que a transformação da sociedade ocorra, potencializando o acesso e a participação de todos aos benefícios finan- ceiros, sociais e ambientais produzidos pela nossa sociedade. Nesse sentido, complementando os artigos da Constituição Federal e as diretrizes da ONU das quais o Brasil é signatário, em nosso país existe uma ampla legislação que trata sobre inclusão digital. De acordo com o mapa da inclusão digital no Brasil, publicado pelo Ins- tituto Brasileiro de Informação em Ciência da Informação (IBICT, 2022), do Ministério da Ciência, Tecnologia, Informações e Comunicações, existem diversos decretos, leis, medidas provisórias, projetos de leis e portarias que tratam sobre projetos de inclusão digital, possibilidade de acesso a computadores, a serviços, a conexões, a banda larga, a inovações tecnoló- gicas entre outros itens necessários para a participação social. Decretos: n. 5.542/2005 (Projeto cidadão conectado – computador para todos); n. 5.602/2005 (regulamenta o Programa de inclusão digital); n. 6.023/2007 (altera o Programa de inclusão digital); n. 6.424/2008 (altera e acrescenta dispositivos ao Plano geral de metas para universalização do serviço telefone fixo comutado e banda larga); n. 6.504/2008 (Projeto com- putador para professores); n. 6.948/2009 (Comitê gestor do programa de inclusão digital); n. 6.991/2009 (Programa nacional de apoio à inclusão digi- tal nas comunidades); n. 7.715/2012 (altera o Programa de inclusão digital). Leis: n. 4.769/2003 (Plano geral de metas para universalização do serviço telefone fixo comutado e banda larga); n. 11.012/2004 (altera o Programa de inclusão digital); Lei n. 11.196/2005 (Programa de inclusão digital); n. 12.715/2012 (Banda larga, inovação tecnológica); n. 12.507/2011 (Programa de inclusão digital tablet PC); n. 12.249/2010 (Programa um computador por aluno); n. 12.965/2014 (Marco civil da internet). Medidas provisórias: n. 252/2005 (Programa de inclusão digital, inova- ção e tecnologia); n. 534/2011 (Programa de inclusão digital tablet PC). Projetos de Lei do Senado: n. 427/2014 (acesso à internet); n. 429/2014 (subsídio para o serviço de banda larga); n. 431/2014 (reconhece a es- sencialidade do acesso à internet em banda larga). Projeto de Lei: n. 4.534/2012 (Livro e texto digital, leitura e audição). Portarias: MC n. 87/2013 (Telefones portáteis, celulares, internet); n. 13/2012 (Telecentros); n. 16/2012 (Programa nacional de apoio à inclu- são digital nas comunidades – Telecentro BR); n. 520/2012 (Programa governo eletrônico); n. 13/2013 (Inclusão digital, projeto cidades digi- tais); n. 2.662/2014 (Governo eletrônico – atendimento ao cidadão). Inclusão digital em negócios sociaisInclusão digital em negócios sociais 121121 As atuais dificuldades sobre a inclusão digital constituem-se num vasto universo de oportunidades para negócios sociais de impacto ou ainda das organizações com propósito, que podem desenvolver novos serviços que supram essa necessidade, uma vez que mesmo com a preocupação dos governantes sobre o direito de acesso das pessoas ao universo digital, comprovada pelo expressivo número de projetos, decretos, leis, medidas provisórias, projetos de lei e portarias, ainda há muitas ações a serem desenvolvidas para que seja possível atingir os efeitos positivos desejados para a população do nosso país, relativos ao acesso e utilização dos meios digitais e outras tecnologias inovadoras. 5.2 Mundo digital e humanidade Vídeo Como tecnologia, entende-se o uso do conhecimento adquirido transformado em algo prático para a realização e a facilitação de tare- fas. Na medida em que uma tecnologia é empregada, ela propicia o de- senvolvimento de outras acelerando o desenvolvimento tecnológico por meio das inovações. Tudo isso graças ao desenvolvimento cognitivo do ser humano e da sociedade. Arquimedes, baseado em seus estudos, afirmava que se lhe dessem um ponto de apoio e uma alavanca seria possível mover o globo terrestre. A alavanca do nosso desenvolvimento tem sido a tecnologia na medi- da em que ela é utilizada para a geração de riquezas por meio de novos processos, produtos e serviços. Atualmente, vive-se o que se convencio- nou chamar de era do conhecimento, ou ainda de Quarta Revolução Industrial, em que estão presentes tecnologias avançadas em robótica, internet das coisas (IoT), inteligência artificial (IA), computação em nuvem, entre outras conectadas em rede e interligando o mundo real (físico) com o mundo digi- tal (virtual). Todos esses elementos influen- ciam fortemente o ser humano e a sua vida em comunidade, tanto que é muito difícil apontar algum Arquimedes (287-212 a.C), considerado um dos maiores matemáticos da antiguidade, desenvolveu trabalhos também no estudo da física e da me- cânica. Algumas das suas criações mais famosas são: o Princípio de Ar- quimedes; o Parafusode Arquimedes; os Espelhos Gigantes; e a Alavanca. Biografia th od on al 88 /S hu tte rs to ck th od on al 88 /S hu tte rs to ck 122 Propósito organizacional e capital social setor que não tenha sofrido impactos positivos ou negativos oriundos do desenvolvimento tecnológico. Carr (2019) destaca que as pessoas são transformadas quando têm contato com a tecnologia, porque seus avanços e artefatos tecnológi- cos mudam a percepção, a memória e o conhecimento possuídos de- las mesmas e da sociedade, levando-as a um novo modo de agir. Para exemplificar, o autor cita tecnologias que impactam o modo de vida das pessoas desde o seu surgimento até os dias atuais, tais como o mapa, os livros e o relógio. Para Harari (2018), a tecnologia alterou de modo irreversível a nossa vida, e deve-se tê-la como um forte instrumento de progresso e desenvolvi- mento, já que toda tecnologia pode ser usada de uma forma adequada ou não. Para isso é preciso educar a nós e aos nossos filhos para o seu uso ra- cional, estratégico e a nosso favor, pois ainda, segundo o autor, a tecnologia tem provocado mudanças em nossa vida nos seguintes pontos: Tecnologia (expectativa x realidade): No estado atual, a tecnologia possibilita ter um maior conhecimento das pessoas em razão do recolhi- mento, armazenamento, gerenciamento e análise de dados, tanto de gru- pos sociais quanto de indivíduos, fato que possibilita o desenvolvimento de soluções mais diretas e práticas para problemas atuais e futuros. En- tretanto, deve-se eliminar ou reduzir o mau uso da tecnologia, evitando a centralização de poder das decisões nas mãos dos poucos que dominam as inovações tecnológicas que são base para o novo mundo digital em ascensão (comércio eletrônico, comunicações, serviços de streaming, ser- viços bancários e financeiros, educação a distância, autodesenvolvimento profissional, aprendizagem de idiomas, redes sociais, jogos etc.). Mercado de trabalho: A substituição do trabalho humano por máqui- nas não é novidade, em um passado recente viveu-se a substituição de trabalhadores por máquinas em tarefas repetitivas e mecanizadas, ago- ra assistimos também à substituição de trabalhadores mais qualificados pela inteligência artificial, obrigando a classe trabalhadora a se adaptar às novas tecnologias. Entretanto, esse processo tem velocidades dife- rentes: primeiro ocorre a desmobilização de muitos postos de trabalho substituídos por inovações tecnológicas para que depois, gradativamen- te, parte dos trabalhadores se requalifique e esteja pronta para atuar dentro dos novos padrões. Entretanto, muitos não conseguem acompa- Inclusão digital em negócios sociais 123 nhar essa evolução e ficam desempregados, sem desempenhar nenhum papel na economia, surgindo uma nova classe que o autor denomina de useless class (em português, classe sem ocupação). Harari (2018) chama a atenção para o ponto de que toda tarefa repe- titiva será automatizada, fazendo com que as pessoas possam se sentir irrelevantes por não serem mais necessárias no processo social de ge- ração de riquezas, o que pode se estender às gerações futuras, que já nasceriam sem uma possibilidade de ocupação profissional. Liberdade: Na medida em que o volume, a análise e o uso de dados vão crescendo em razão do aumento da capacidade de processamento das máquinas (hardware) e da utilização de algoritmos e outras ferra- mentas (software), aumenta também o poder daqueles que têm o domí- nio das decisões políticas, econômicas e empresariais sobre as pessoas comuns. O conceito de liberdade pode ser afetado pela concentração dos dados nas mãos de poucos que se tornarão os “donos do futuro” podendo usar tais informações a seu favor e não das demais pessoas. Tais dados formam o que se chama de Big Data, que dentro da economia do conhecimento se constitui em um capital de valor para quem os detém e controla. Por isso, é preciso criar regras para que o uso das informações seja realizado de modo democrático respei- tando a diversidade e a individualidade das escolhas dos cidadãos. Igualdade: Na medida em que algumas tecnologias essenciais são dominadas por pessoas ou por nações, no que o autor chama de ditadura digital, corre-se o risco de agravamento da desigualdade, piorando os índices de vulnerabilidade socioeconômica. Esse domí- nio das informações por uma elite digital possibilita a manipulação das informações, o controle de acesso a serviços médicos, empregos, educação etc. Comunidade: O acesso e o alcance das redes sociais, assim como o avanço dos meios de comunicação, têm possibilitado a conexão entre mais pessoas que compartilham experiências de consumo, tu- rismo e lazer, por exemplo. No entanto, vive-se uma contradição, pois são dedicadas muitas horas à visualização dessas experiências nos meios eletrônicos, mas poucas horas a experimentá-las em nos- sa vida real, o que reforça a tendência de individualização e isola- mento das pessoas. 124 Propósito organizacional e capital social Além disso, a expectativa gerada pelas imagens e relatos postados nas redes sociais nem sempre se concretiza na experiência real com os mes- mos níveis de qualidade, emoção, sabor etc. Civilização ou choque de civilização: As tecnologias possibilitaram o acesso de mais pessoas às informações, porém existe um excesso de versões e de discursos radicais nos meios eletrônicos, o que, se por um lado atende aos anseios de muitos, por outro cria um ambiente de apreensão em relação ao futuro dos relacionamentos interpessoais e do que, de fato, é verdade. Fato é que as relações humanas estão em transformação em razão do uso de redes sociais, aplicativos, celulares etc. Em relação às políticas públicas, o debate sobre elas deve se voltar para o atendimento dos desafios globais centrados nas questões do uso da energia e de armamentos nucleares e da pre- servação do meio ambiente, por exemplo. Nacionalismo: As inovações tecnológicas deveriam beneficiar o mundo como um todo, entretanto a tendência verificada por Harari (2018) é de que as novas tecnologias e soluções criativas são geral- mente utilizadas no ambiente nacional para o benefício apenas de comunidades específicas, quando deveriam ser globais. Imigração: Grandes movimentações de pessoas em busca de me- lhores condições de vida têm ocorrido nesse início do século XXI, o que tende a gerar instabilidade nos países que recebem esses imi- grantes, com destaque para a crise migratória ocorrida na Europa a partir de 2015. A tecnologia vem sendo utilizada para a propagação de ideias ultranacionalistas, anti-imigração e preconceituosas, geran- do ainda mais instabilidade social e aumentando o debate sobre o dilema entre globalismo e nacionalismo, quando o correto seria a sua utilização para o combate do racismo, do preconceito e da xenofobia. Terrorismo: Enquanto entidades terroristas utilizam a tecnologia para a propagação de seus ideais e das suas ações buscando maior visi- bilidade ao mesmo tempo em que causam pânico e medo nas pessoas, as redes sociais e outras ferramentas digitais são usadas para captar e analisar dados para políticas governamentais e policiais antiterroristas. Guerra: Para Harari (2018), no passado os três maiores temores da humanidade eram a fome, as pragas e as guerras usadas como forma Inclusão digital em negócios sociais 125 de aumentar a riqueza de uma nação. O autor destaca que a guerra na atualidade se destina ao jogo do poder, em que os interesses estão mais centrados no controle das inovações e patentes que são as fontes atuais da geração de riqueza, tais como as descobertas no campo da biotecnologia e da tecnologia da informação, que direcionam o nosso desenvolvimento cada vez mais para um ambiente digital. Humildade: O uso da tecnologia como forma de se perceber que não somos o centro de tudo, assim como nossa nação também não o é. Religião: Para Harari (2018), as religiões devem usar a tecnolo- gia com parcimônia para que seus discursosnão sejam utilizados no sentido de reforçar decisões ou opiniões ultranacionalistas. Deus: Divulgação e uso do nome de Deus e de rituais religiosos para professar preconceitos e segregações, o que deve ser evitado, pois se deve agir de maneira ética e moral no que tange à identida- de religiosa. A atuação das religiões precisa voltar-se para o trabalho cooperativo e para a integração das diferentes identidades nacionais. Secularismo: A manutenção dos bons valores morais e o compromisso com a verdade baseada em observações e evidências e não somente na fé. Ignorância: O conhecimento disponível é vasto, não sendo possível o domínio de todo o seu conteúdo e verdades por uma única pessoa. Além disso, recomenda-se atenção para com os discursos falsos e men- tirosos verificando sempre todos os lados daquilo que foi divulgado. Outro conceito defendido pelo autor é o Lifelong Learning (aprendizado contínuo durante a vida toda), que segundo ele é necessário para a atualização do indivíduo e para a sua inserção dentro dos contextos sociais em constante transformação. Nesse sentido não se está falando do ensino formal, mas da investigação e aquisição dos conhecimentos necessários pelo próprio indivíduo e por diversos meios e formas. Justiça: Interpretação da situação e noções sobre a moral basea- das no que é certo e errado, para poder identificar o que é a justiça e a injustiça sem a interferência de informações contaminadas pela pós-verdade. Pós-verdade: Surgimento de teorias da conspiração e de fake news que contrariam ou negam a realidade do mundo, e que devem ser combatidas pela dúvida e pesquisa por informações em mídias diferen- 126 Propósito organizacional e capital social tes, reunindo dados confiáveis e, se possível, cruzando-os com teorias científicas reconhecidas. Ficção científica: Sugestão ou entendimento de soluções para pro- blemas tecnológicos atuais que podem nos dar um futuro melhor e que deveriam ser abordados com maior realidade nas obras desse gê- nero, seja na literatura ou em filmes, com destaque para o uso da inte- ligência artificial e da robótica que são exagerados na ficção. É preciso considerar a ficção como um fator que mexe com o imaginário popular e, portanto, merece ser analisado. Educação: Em razão do expressivo volume de informações dispo- níveis nos meios eletrônicos, o mais importante é que os estudantes aprendam a interpretar os dados e não simplesmente os acessem, sem compreender o que significam. Dessa forma, reforça-se a afirmativa de que o importante não é o volume de informações a serem transmitidas aos educandos, mas sim a sua qualidade e o incentivo ao comportamen- to analítico a ser realizado pelo próprio indivíduo baseado em seu pensa- mento crítico, sua comunicação, sua disponibilidade para dar e receber colaboração e sua criatividade, no que Harari (2018) chama de quatro Cs. Sentido da vida: O autoconhecimento propicia o desenvolvimen- to de uma identidade própria do indivíduo e pode prepará-lo para uma vida em harmonia com sua comunidade e consigo mesmo den- tro de um ambiente em constante transformação. Tal ambiente exige uma mente aberta que possa aprender e adaptar-se continuamente, inclusive no que tange aos seus relacionamentos pessoais mantidos em grande parte na atualidade por meio de ferramentas tecnológicas (smartphones, redes sociais etc.). Meditação: Meditar leva as pessoas a uma melhor compreensão de si mesmas e do contexto em que vivem, por meio de uma visão mais clara sobre os fatos reais. Assim, de uma maneira bastante prática, elas passam a ser capazes de observar o seu entorno e os impactos das ações que estão ocorrendo ao seu redor, sem tentar criar uma narrati- va irreal sobre os acontecimentos. Dessa forma, conseguem entender e interagir com a realidade e com as mudanças que as ações acarretam em nossas vidas. As inovações tecnológicas são uma realidade e não acabarão, pelo contrário as previsões de diversos pesquisadores indicam que além de aumentarem elas ocorrerão em intervalos menores de tempo. A tecnolo- O autor apresenta uma visão ampla sobre as tendências da tecnologia e seus impactos sobre a sociedade humana no século XXI, propiciando aos alunos a oportunida- de de refletirem sobre o uso apropriado das tecno- logias inovadoras e impac- tantes, bem como do seu papel dentro desse novo ambiente global. HARARI, Y. N. 21 lições para o século 21. São Paulo: Companhia das Letras, 2018. Livro Inclusão digital em negócios sociais 127 gia é considerada a alavanca do desenvolvimento, e o ponto de apoio ne- cessário encontra-se ancorado em dois pilares: as pessoas e a sociedade. Para as pessoas é essencial saber lidar com tais mudanças aprovei- tando-as para melhorar o seu dia a dia por meio de seu uso controlado e consciente. Também é necessário identificar o grau de benefício que uma nova tecnologia traz. Carr (2019) faz uma comparação entre uma vantagem e uma desvantagem com o uso de uma tecnologia mais antiga e uma mais atual, referindo-se à diferença causada no processo cognitivo entre a lei- tura mais profunda propiciada por livro tradicional, em comparação com a leitura superficial proporcionada pelas matérias existentes na internet, o que para ele impacta negativamente nossa “capacidade de saber em profundidade, um assunto por nós mesmos” (CARR, 2019, p. 51). Além dos aspectos cognitivos, uma das discussões sempre em pau- ta relaciona-se aos impactos das tecnologias na saúde das pessoas, já que muitos dispositivos trazem problemas relacionados à tendinite, ao sedentarismo, à ansiedade, ao estresse, à insônia etc. Já para a sociedade é preciso pensar nas questões relacionadas à inclusão digital das pessoas, além dos objetivos específicos sobre as tec- nologias da informação e comunicação (TIC). O acesso e a transformação digital da sociedade têm impactos sobre muitos outros aspectos do de- senvolvimento humano, previstos nos 17 ODS divulgados pela ONU, em seus objetivos e que constam na “Estratégia brasileira para a transforma- ção digital” (BRASIL, 2018b, p. 5). Alguns desses itens são: 1. Erradicação da pobreza: inclusão financeira dos mais pobres, ou bancarização, combinando tecnologias móveis e acesso à internet via- bilizando a realização de transações de pagamentos e demais serviços bancários digitais. Isso inclui um maior acesso e utilização de meios de pagamento e transferência digitais similares ao PIX, cartões de débito e crédito, car- teiras digitais e aplicativos de pagamento em substituição ao dinheiro em papel ou moedas, no que se convencionou chamar de cashless so- ciety, ou seja, uma sociedade sem dinheiro ou com menor circulação do papel ou moeda convencionais, que são substituídos por moedas digitais, aumentando a segurança física e incentivando o surgimento de novos negócios em razão dos menores prazos de recebimento e custos de transação. 128 Propósito organizacional e capital social 2. Fome zero: aumento da produtividade e redução de perdas no agronegócio, bem como melhora nas condições logísticas de transporte e distribuição com o uso da interconexão digital de objetos, máquinas e equipamentos, ou seja, a denominada internet das coisas (IoT) que reúne, trata, transmite e melhora dados para o melhor desempenho operacional. 3. Saúde e bem-estar: facilitação do acesso da população a serviços e bases médicas para consulta; montagem e visualização de prontuá- rios médicos; emissão, monitoramento e diagnósticos remotos. 4. Educação de qualidade: incremento do uso de computadores para consultas e análises de conteúdos digitais, além do ensino a dis- tância, treinamento de professores e capacitação profissional. 9. Indústria, inovação e infraestrutura: implantação, melhoria e ampliação da infraestrutura para o acesso à internet; empreendedoris- mo digital e IoT. 13. Combate às alterações climáticas: instalação e monitoramento de redes de sensores combinadas com terminais de acesso à internet, que possibilitamuma ação rápida para prevenir e mitigar desastres naturais. Ações dessa natureza, além de favorecerem as populações mais po- bres diminuindo a desigualdade social, também aumentam o padrão de competitividade nacional, o que atrai a atenção de investidores internacio- nais, habilitando nosso país a se beneficiar do crescimento da economia baseada em negócios digitais no mundo, que antes da pandemia estavam estimados para chegar a US$ 23 trilhões em 2025 (BRASIL, 2018b). 5.3 Inteligência artificial como ferramenta de inclusão social Vídeo Os benefícios mais perceptíveis da inteligência artificial (IA ou AI do termo em inglês Artificial Intelligence) estão na melhoria do de- sempenho e no aumento da produtividade ao automatizar proces- sos e atividades que antes dependiam apenas do ser humano e da sua disponibilidade e/ou capacidade. Como IA são considerados os sistemas (softwares, códigos de programação, algoritmos etc.) que possibilitam a um computador, dispositivo, equipamento, máquina ou robô executar tarefas imitando Inclusão digital em negócios sociais 129 a capacidade da inteligência humana no que tange ao aprendizado, raciocínio, entendimento de significados e outras generalizações. Para se desenvolver, a IA é programada para realizar o seu au- toaprendizado por meio de técnicas de programação conhecidas como aprendizado de máquina (machine learning) e aprendizado profundo (deep learning). Mesmo assim, tais sistemas digitais ainda estão muito longe de igualar-se à capacidade humana de processamento, análise, aprendizado, combinação e adaptação de ações e reações para as va- riações e imprevistos existentes em nosso dia a dia. Os estudos para o desenvolvimento da IA na atualidade se dedi- cam mais à ampliação da sua capacidade de análise, ao uso dos da- dos coletados para fins produtivos e à busca pelo aumento das suas possibilidades de aprendizado para a realização de tarefas complexas do que propriamente à disponibilidade de dispositivos como robôs ou androides para substituição do ser humano em sua totalidade, como é comum encontrar nas obras de ficção científica. Entretanto, não é possível para qualquer pessoa prever o futuro, e, na medida em que a IA consegue reproduzir a percepção e a reação so- bre algum item da mesma forma que um ser humano, os processos de autoaprendizado contidos no código de programação buscam encon- trar alternativas para ultrapassar a possibilidade do resultado obtido pelos humanos. Isso significa que esses processos têm o intuito de ex- ceder o que poderia ser o resultado final de uma pessoa, propiciando ganhos em tempo, qualidade, quantidade, melhor aproveitamento de insumos, redução de desperdícios, inovações etc. O objetivo dos pesquisadores desse tema é tornar a IA um sistema capaz de coletar, armazenar, analisar e processar dados e que tam- bém possa tomar decisões plenas e assertivas (precisas) de maneira autônoma e automatizada. O aumento de produtividade gerado pela IA e o valor que ela vem agregando aos negócios têm motivado cada vez mais as corporações e governos a investirem na ciência dos dados como um ativo de valor por meio da extração, análise, compreensão e uso de informações que impactem positivamente em seus resultados. Schwab (2018) destaca que as novas tecnologias estão integrando os ambientes físicos, digitais e biológicos de uma maneira acelerada levan- do o mundo a um novo período de revolução não só na indústria, mas O autor apresenta argumentos de que as transformações tecno- lógicas na atualidade afetam não somente os ambientes empresariais, mas sim toda a sociedade representando uma nova revolução nos sistemas sociais, econômicos e am- bientais por meio da fu- são dos ambientes físicos, digitais e biológicos, para os quais existem grandes possibilidades de benefí- cios, mas necessitam de extrema atenção para os riscos envolvidos, inclusive o da exclusão social. SCHAWB, K. A quarta revolução industrial. São Paulo: Edipro, 2018. Livro 130 Propósito organizacional e capital social em todos os setores da sociedade. Para o autor, o crescimento do uso de ferramentas baseadas em IA já afeta diversas categorias profissionais ao realizar tarefas repetitivas com maior precisão, rapidez e a custos mais baixos e não somente os trabalhadores braçais como ocorreu na Era In- dustrial, mas mesmo em posições que exigem maior conhecimento téc- nico, tais como na medicina, no direito, nas comunicações, entre outros. Para Mont et al. (2020, p. 6), “é essencial promover o uso responsá- vel da IA não apenas em grandes empresas de tecnologia, mas também em empresas emergentes (startups) e inovadoras em setores como saúde, educação e previdência social, para que projetem soluções vol- tadas para os setores público e privado”. No Brasil, de acordo com a pesquisa Conectividade e indústria: aplica- ção de tecnologias e isenção digital (ABDI, 2021), apenas 10% das indús- trias contam com a IA em seu sistema produtivo, embora 62% utilizem ferramentas de automação, 52% usem a computação em nuvem e 19% possuam soluções de Big Data. Também no âmbito público, ainda que existam diversas iniciativas de governos municipais, estaduais e federal para a implantação de serviços públicos digitais, inclusive com base na IA, ainda há muito o que se fazer. Uma das causas para não ocorrer uma maior aceleração na imple- mentação da IA em todos os setores está na falta de profissionais qua- lificados necessários para essa transformação, fato que de certa forma atrasa o processo de implantação de soluções que melhorariam nossa produtividade e competitividade perante o mercado mundial. Além disso, por mais que a IA seja uma realidade e apresente mui- tos benefícios, sua implantação requer investimento financeiro, exige tempo para dar resultados e mudanças na estruturação das empresas, na organização do trabalho, na cultura e no ambiente interno. Por es- ses motivos, a implantação da IA não ocorre de maneira linear, mas sim na medida em que cada corporação consegue criar as condições propícias para a atualização dos seus meios produtivos. Existem também questões relacionadas à ética e à moral, pois como os sistemas de IA se autoalimentam de informações para o seu apren- dizado, não há muito controle sobre quais itens serão aprendidos e quais serão as decisões tomadas pelo sistema com base nesse apren- dizado, o que requer ações para ajustes necessários antes que sejam causados prejuízos à sociedade. Inclusão digital em negócios sociais 131 Outra questão é a da exclusão social e digital agravada pela excessiva concentração da renda em crescimento nas últimas décadas, e que, de acordo com Piketty (2014), tende a permanecer e continuar intensifican- do a desigualdade socioeconômica que se reflete no ambiente digital. Por ser fundamental para a transformação digital, a IA se apresenta como uma valiosa ferramenta no processo de redução das desigualdades sociais ao possibilitar o acesso das pessoas ao mundo digital e aos seus benefícios visando à erradicação da pobreza, às melhorias climáticas, ao aumento da produtividade agrícola no combate à fome, à saúde e bem- -estar, à educação, aos sistemas de produção, à segurança, ao lazer etc. Uma das barreiras a ser vencida está no alto custo de desenvolvi- mento das soluções de IA, entretanto, uma vez desenvolvidas, diferen- ciam-se das alternativas tradicionais em razão dos menores custos na sua aplicação e por serem escaláveis, ou seja, podem ser rapidamente levadas a muitas pessoas ao mesmo tempo. Quando isso é possível, os benefícios são vários, como pode-se ver a seguir: Na educação, há vantagem ao disponibilizar o acesso de mais alu- nos, mesmo os que moram em áreas isoladas, aos sistemas de educa- ção a distância (EAD) e à pesquisa. A IA viabiliza o desenvolvimento de conteúdo mais adequado respeitando as características regionais e dá visibilidade sobre os educandos para um melhor acompanhamento do desenvolvimento educacional individuale coletivo. Quando se trata de saúde, é possível acessar o atendimento médico por sistemas de telemedicina; realizar a análise de dados socioeconô- micos para antecipação de ações de melhoria da saúde de populações e indivíduos; obter redução dos custos com os itens de saúde; fazer o acompanhamento detalhado de cada paciente; trazer economia de re- cursos com o armazenamento, a gestão e a disponibilização de exames realizados; oferecer maior precisão em diagnósticos e a consequente indicação assertiva de medicamentos, exames e tratamentos; viabilizar a identificação ágil de possíveis enfermidades etc. Como forma de inclusão social e digital das pessoas com deficiên- cia de qualquer natureza, a IA disponibiliza tecnologias assistivas por meio de softwares de acessibilidade (voz, leitura, digitação, painéis in- terativos, tradutores da linguagem Libra etc.) A IA pode auxiliar também na preservação e recuperação dos sistemas ambientais melhorando as condições de vida em comunidades; monito- 132 Propósito organizacional e capital social rando regiões por meio de sensores inteligentes; e realizando a análise dos dados coletados e de dados históricos de localidades que possibilitam a orientação de ações de replantio e conservação do patrimônio natural das comunidades. Sem contar o direcionamento para a redução da emissão de gases que influenciam no efeito estufa, além de outras atividades que ne- cessitem de um novo modo de execução para evitar a poluição planetária. Quando o tema é diversidade, existem diversas ações nas empre- sas de tecnologia relacionadas ao desenvolvimento de melhores soft- wares para a captação e processamento de imagem e voz. Assim, esses softwares podem trabalhar com um espectro maior de tonalidades de pele, tons de voz, pronúncias e sotaques diferentes, por meio de bases de dados mais inclusivas e que considerem as mais diversas naturezas humanas existentes em nosso planeta. Ações dessa natureza têm por objetivo o combate ao racismo, ao ultranacionalismo, à xenofobia e à propagação da violência contra a mulher e a criança. Quanto à qualidade de vida das comunidades, a IA pode contribuir com questões relacionadas à segurança gerindo e atualizando dados sobre ocorrências e infratores, utilizando câmeras de segurança e ou- tros dispositivos para monitorar atividades suspeitas que possibilitam o direcionamento das ações das forças de segurança e da população, além do combate ao tráfico de drogas e ao aumento da violência em geral. Considera-se também nessa questão a cyber proteção sobre os dados dos usuários de serviços comunitários e o impedimento de ata- ques hackers visando à paralisação ou ao sequestro de tais serviços. A partir da IA e da análise de dados sobre o comportamento e as preferências da população, é possível identificar as necessidades e o desenvolvimento de serviços e produtos sociais personalizados que atendam as pessoas dentro das suas capacidades econômicas. Os pro- dutos e serviços podem ser nas mais diversas áreas, tais como: vestuá- rio, entretenimento, comunicação, transporte, beleza, saúde, educação, alimentação, comércio etc. Os serviços financeiros, cujo objetivo é fornecer microcrédito e apoiar outros negócios sociais em seu desenvolvimento, podem ser apoiados pela IA quanto à identificação e à análise dos possíveis to- madores de recursos financeiros, ou seja, quem toma o empréstimo, dentro das comunidades objetivando o financiamento de pequenos negócios que as beneficiem como um todo. Inclusão digital em negócios sociais 133 As indústrias se beneficiam da IA eliminando desperdícios; redu- zindo custos e impactos ambientais; atingindo maior qualidade; redu- zindo os prazos necessários para a pesquisa e o desenvolvimento de produtos etc., sendo que tais benefícios também favorecem a socieda- de nas relações de consumo. Porém, a IA também gera a substituição de trabalhadores por dis- positivos inteligentes. Tal malefício deveria ser compensado com a reo- rientação e a qualificação profissional das pessoas que perderam ou perderão seus empregos para que possam ser incluídas novamente no mercado de trabalho ocupando cargos de maior complexidade e alinhados com as tendências digitais da sociedade. Destaca-se que a presença da IA no dia a dia da humanidade já é uma realidade, entretanto ainda há um vasto campo para crescimento dessa tecnologia e não se sabe ao certo se há um limite para a sua aplicação, apesar de parecer que não. Quando se trata da inclusão social, é clara a necessidade de mais soluções inovadoras para melhorar a qualidade de vida das pessoas e reduzir as desigualdades, o que pode ser feito pela oferta de produtos e serviços sociais eficientes, eficazes e sustentáveis. Outro ponto que sempre salta aos olhos quando se aborda o de- senvolvimento tecnológico é a necessidade das pessoas dentro dos processos. Por mais progresso que se tenha alcançado até o momen- to, e mesmo que haja uma substituição por tecnologias em diversas atividades, o ser humano é indispensável quando se refere a tratar de outro ser humano. As tecnologias nos apoiam e melhoram nossos re- sultados, mas ainda somos essenciais. 5.4 Casos de sucesso Vídeo O empreendedorismo social tornou-se uma realidade global e está em pleno crescimento, buscando novos modelos de desenvolvimen- to, pois, mesmo tendo suas bases no capitalismo, apresenta soluções inovadoras e abrangentes para os problemas da humanidade. Assim, surgem novos negócios que movem uma economia criativa e inclusiva, dentro de um modelo mais consciente em que se desenvolvem negó- cios sociais das mais diversas naturezas e finalidades que não contam apenas com um sonho do seu fundador ou dependem somente de doações ou verbas governamentais. 134 Propósito organizacional e capital social Tudo objetivando um futuro melhor para todos por meio de lucros financeiros, sociais e ambientais, visto que um negócio social precisa, an- tes de tudo, ser viável e sustentável por si mesmo. Como o primeiro caso de sucesso desse tipo de empreendimento não se pode deixar de citar o Grameen Bank, fundado por Muhammad Yunus, que foi o banco pioneiro no mundo a ter como propósito a erra- dicação da pobreza, e para isso viabilizou a concessão de microcrédito para as pessoas de baixa renda. O Grameen Bank tem em sua marca a seguinte frase: bank for the poor, ou seja, banco para os pobres. Ele possui 2.100 agências e já emprestou aproximadamente 6 bilhões de dólares para cerca de 6,6 milhões de clien- tes, entre os quais 97% são mulheres. Um dos fatores de sucesso do banco é sua taxa de inadimplência a qual é mais baixa do que a maioria das insti- tuições financeiras do mercado tradicional. Além do benefício aos tomado- res de crédito, a corporação emprega mais de 18 mil trabalhadores. Por sua atuação e resultados, a instituição recebeu vários prêmios, sendo que o de maior destaque foi o Nobel da Paz de 2006 (GRAMEEN BANK, 2022). No Brasil, o Banco Pérola se propõe a ser uma instituição financei- ra de impacto social ao atuar concedendo crédito a microempreende- dores e empresas de pequeno porte. Seu bom desempenho está na análise de crédito que leva em conta a paixão que o empreendedor tem pelo seu negócio, a situação atual e o projeto futuro do empreendi- mento. Além disso, a instituição financeira dá orientações ao microem- preendedor para o uso correto dos recursos tomados. Há também o IOUU, que como instituição financeira nacional criou um marketplace viabilizando empréstimos diretos de empresas ou pessoas para os micros e pequenos empreendedores, no processo conhecido como peer-to-peer (P2P). Na plataforma, de um lado o empreendedor que necessita de crédito se candidata e passa por uma análise para verificar a viabilidade do negócio ou do projeto que precisa de investimento, e do outro lado estão os investidores que se cadastram a fim de encontrar pro- jetos para investir. Como resultado, tem-se um crédito a custos menores e com menos burocracia.O IOUU é uma empresa certificada do sistema B e compactua com os princípios do capitalismo consciente. Projetos como o do Grameen Bank, do Banco Pérola e do IOUU, con- tribuem para a erradicação da pobreza atendendo a um dos objetivos da Agenda 2030 (ONU, 2022). O sistema B se trata de um selo que certifica e identifica empresas com um novo conceito sobre sucesso nos negócios e que focam na solução de assuntos socioambientais. São organizações que desenvolvem um novo modelo de negócios com equilíbrio entre a obten- ção de lucro e o propósito para o qual foram criadas, ou seja, avaliam e se preo- cupam com os impactos que suas ações causam aos seus colaboradores, fornecedores, clientes, a comunidade em que está inserida, sem deixar de lado o cuidado com o ambiente. Saiba mais Inclusão digital em negócios sociais 135 A exitosa experiência de Yunus (2010) no sistema financeiro o mo- tivou a empreender em outros segmentos, tal como na batalha contra a fome, inclusa no objetivo denominado fome zero (Agenda 2030). As- sim surgiu a Grameen Danone Foods, que fabrica um iogurte de baixo custo, mas com alto valor nutricional contendo minerais e vitaminas essenciais para eliminar a desnutrição. Além da alimentação, a empre- sa busca beneficiar a sociedade de outras formas, seja pela criação de empregos, pela aquisição das matérias primas junto aos agricultores da região próxima da fábrica ou ainda pelo uso de embalagens biode- gradáveis e energia solar na fabricação de produtos. No Brasil, existem diversas iniciativas contra a fome, com investi- mentos em modalidades como a agricultura familiar, venda de produtos e/ou máquinas agrícolas, desenvolvimento de tecnologias inovadoras para o campo (uso de drones, sistemas de gestão, controles e análise para aumento da produtividade, novas e mais resistentes sementes en- tre outros), fabricação de biocombustíveis etc. Um dos negócios sociais de sucesso nesse segmento se trata da Sumá que desenvolveu um marketplace baseado nos conceitos do co- mércio justo para conectar os possíveis compradores de alimentos aos pequenos produtores rurais, cujo diferencial deve ser a qualidade dos produtos e não o menor preço. A plataforma amplia o acesso dos pe- quenos produtores aos mercados, reduz custos de quem compra, dispo- nibiliza treinamento aos pequenos produtores entre outros benefícios. A Solidarium também atua fazendo a ponte entre o produtor e as grandes redes varejistas ou com o consumidor final, mas trabalha com pequenos produtores de artesanato para os quais possibilita serviços on-line de divulgação e acesso a canais de distribuição dos produtos. Quando o assunto é a saúde e o bem-estar, destaca-se a iniciativa da Aravind Eye Hospital, empresa indiana que, segundo Teixeira (2015, p. 111), “com um modelo de franquias inspirado pelo McDonald’s, tor- nou-se o maior hospital oftalmológico do mundo, com quase três mil leitos, e reduziu o custo das cirurgias de catarata e glaucoma dos dois mil dólares usuais para algo entre zero e 150 dólares”. Em seus atendi- mentos, o paciente de baixa renda paga o quanto pode pelo seu trata- mento, mas se puder pagar o tratamento pelo seu custo total, a verba excedente será direcionada para cobrir os custos de consultas e até cirurgias de outras pessoas pobres. O livro De dentro para fora: como uma geração de ativistas está injetando propósito nos negócios e reinventando o capitalismo apresenta considerações sobre empreendedores que integram movimentos que visam a transforma- ção do capitalismo para além do lucro. Discutem- -se a distribuição das riquezas geradas pelo trabalho, as bases do capitalismo, as estratégias das empresas vencedoras no mundo atual de negó- cios, os negócios sociais, as empresas do sistema B, o capitalismo conscien- te e o empreendedorismo social de modo didático e por meio de exemplos. TEIXEIRA, A. Porto Alegre: Arquipélago editorial, 2015. Livro 136 Propósito organizacional e capital social No Brasil ainda não existem serviços similares a esse, mas como uma alternativa aos altos preços das mensalidades dos planos e se- guros de saúde surgiram muitas clínicas e clubes de benefícios que oferecem consultas com especialistas e exames médicos a baixo custo visando o atendimento da população de baixa renda. Tais serviços são prestados de maneira pontual, ou seja, somente quando o beneficiário tem a necessidade de usá-lo, o que reduz seus custos. Alguns exemplos de empresas desse ramo de serviços são: o Dr. Consulta, Dr. Atende, Dr. Família, Clínica IMEV, Clínica Fares, Dr. Agora, entre outras. Cita-se ainda a Sautil, que trabalha na divulgação on-line de informa- ções sobre tratamentos médicos e remédios gratuitos para a população. Na área educacional, as iniciativas são várias, tais como a Quíron Educação, um negócio social que pretende complementar a grade es- colar com temas voltados para o dia a dia e que tem aplicação prática nos ambientes de negócios, tais como: modelagem de negócios, criati- vidade, gestão financeira, design thinking etc. A Quíron está presente em 22 cidades brasileiras e seu conteúdo aten- de aos mais diversos públicos: crianças, adolescentes e adultos, sendo desenvolvido em parceria com as equipes das escolas e até de empresas. Outra iniciativa interessante é o Geekie One, uma plataforma de edu- cação on-line que ajuda as escolas na preparação dos estudantes que prestarão vestibular. O ensino é individualizado e cada escola seleciona o conteúdo de acordo com as suas necessidades, tendo acesso a material atualizado e universal como vídeos, animações, jogos etc. O software auto- matiza as tarefas rotineiras dos professores e coordenadores e permite um acompanhamento em menor tempo do desenvolvimento de cada aluno. Percebe-se que a tecnologia tem um papel importante na renovação das práticas de ensino e na evolução do aprendizado, tornando-o mais dinâmico. Na educação especial também há iniciativas, que na perspecti- va inclusiva asseguram o direito das pessoas ao mesmo padrão de apren- dizado independentemente das diferenças e características individuais. O CPqD Alcance foi desenvolvido para atender aos deficientes vi- suais, sendo uma plataforma acessível que narra automaticamente o conteúdo das telas em síntese de voz, possibilitando o uso pleno das funções básicas de smartphones com o sistema Android. Também existem empresas que desenvolveram ferramentas para auxiliar na geolocalização de pessoas com deficiência, como por exem- Inclusão digital em negócios sociais 137 plo a BlindTool e a Ariadne GPS, e outras que identificam cores de ob- jetos como a Color ID. Outros programas são voltados para uso em computadores ou tablets, como os que transformam textos impressos ou digitais em Braille (Braille Fácil do MEC) ou que as permitem utilizar sozinhas um computador comum (Orca e Dosvox). Além dos softwares que fazem a leitura da tela do computador dis- ponibilizando o texto em voz ou em Braille (NVDA, Virtual Vision e Jaws), alguns desses programas têm possibilitado o acesso de deficientes vi- suais a aulas na modalidade EAD (ensino a distância). Para os deficientes auditivos foram desenvolvidos conversores de textos em Libras, sintetizadores de voz, substituição de voz por imagens, formuladores de sentenças e substitutos de voz por texto. Os exemplos desse tipo de software são: Vídeo Prova utilizado pelo ENEM, Player Rybe- ná, Plaphoons e EVOC. Pessoas com deficiência na fala podem utilizar softwares de comunicação que convertem textos em símbolos, ou ainda em falas mais compreensíveis (Communicator 5 e Snap Core First). Deficientes físicos são auxiliados por aplicativos que permitem uso de computadores que emulam o movimento do cursor do mouse por meio do movimento dos olhos ou por toques realizados por sensores dispensando o teclado (Tobii Gaze Interaction, e Motrix). Outros tipos de deficiência também contam com ferramentas tec- nológicas para auxílio nas suas atividadesdiárias, como por exemplo os softwares gratuitos Organizar e Somar da Universidade de Brasília (UNB), que também disponibiliza ferramentas para alfabetização de deficientes em seu site por meio do Projeto Participar. Abordando problemas sociais e ambientais, a Papel Pinel é uma fábrica terapêutica que vende produtos feitos de papel reciclado e que fica dentro do ambulatório do Instituto Psiquiátrico Philippe Pinel, rea- lizando um trabalho ocupacional com os pacientes, assim ao mesmo tempo que produz colabora com o meio ambiente e com o meio social. Seu lema é: recicle ideias, jogue fora preconceitos. A Rede Asta fabrica e vende brindes corporativos feitos com o reaproveitamento de resíduos sólidos oriundos da fabricação de ar- tesanato desenvolvido em comunidades de baixa renda. A empresa também divulga e comercializa o artesanato das comunidades be- neficiando seus artesãos e o meio ambiente ao dar um destino mais adequado aos resíduos da produção. 138 Propósito organizacional e capital social Outro exemplo de negócio social voltado para o meio ambiente é o Litro de Luz, iniciativa presente em 15 países e que oferece soluções simples com baixo custo de iluminação para comunidades e pessoas sem energia elétrica. Os materiais utilizados são PVC, garrafas PET e energia solar. Além dos equipamentos, a instituição oferece capacita- ção aos beneficiados para a instalação e manutenção das luminárias. Nesse segmento de energia, tem-se a D.light, que produz itens com consumo de energia solar a preços baixos, mas que possuem qualidade e design inovadores e atrativos, tudo voltado para as populações que ainda não dispõem de atendimento de uma rede de energia elétrica. A empresa já atendeu mais de 120 milhões de pessoas no mundo. Ao utilizar ener- gia solar estimula uma mudança de hábito na humanidade, conseguindo substituir a necessidade da queima de madeira, do uso de combustíveis fósseis, da utilização de lâmpadas de querosene entre outros acessórios poluentes. Com esse trabalho, a corporação estima já ter evitado a emis- são de aproximadamente 26 milhões de toneladas de carbono reduzindo os danos que esse gás causaria à atmosfera e aos oceanos. Ações que possibilitam o acesso aos meios para um consumo de energia que seja benéfico ou neutro ao nosso meio ambiente melhoram a saúde das pessoas proporcionando-lhes condições dignas de vida. Nesse sentido, destaca-se a empresa brasileira Moradigna que atua na melhoria das condições de moradia para as pessoas de baixa renda ao possibilitar uma reforma de um cômodo ou de uma casa simples com qualidade, a baixo custo e com financiamento facilitado. Já foram reformados mais de 800 imóveis pela Moradigna. Motivados por negócios sociais de sucesso que causam realmente impacto nas comunidades e que alcançam lucro, muitos investidores e empresas tradicionais estão buscando oportunidade nesse novo mer- cado por meio de associação ou aquisição de parte de organizações já consolidadas no seu novo modelo de negócios. As preocupações desses investidores é de que o negócio social con- siga definir o que de fato vai vender ou qual serviço prestará, também se o empreendimento já conseguiu definir e alcançar o seu público con- sumidor, o que viabiliza o negócio. Os passos seguintes consistem em saber como levar o produto ou serviço até o cliente e como monetizar o projeto de modo sustentável e escalável, ou seja, que possa crescer e juntar resultado financeiro com impacto social positivo. Inclusão digital em negócios sociais 139 Corroborando o que foi afirmado, o BNDES (GANDRA, 2022), por meio de uma chamada pública, selecionou o Lightrock Growth Equity Fund II Brasil FIP Multiestratégia (LGEF II) para viabilizar o aporte de R$1 bilhão em investimentos nas empresas inovadoras e que oferecem produtos e serviços que promovem impactos socioambientais positivos. Para ter acesso aos recursos, o negócio social deve estar consolidado e em fase de crescimento, bem como precisa ser escalável e ter metodologia de medição que comprove os reais impactos causados pelo empreendi- mento. São aceitos projetos nas áreas da saúde, educação, energia re- novável, agricultura e alimentação sustentável, mobilidade e transporte eficiente, transformação do sistema financeiro e infraestrutura digital. Destaca-se que as oportunidades nesse novo mercado são inúme- ras, ainda não havendo limites definidos para o crescimento de iniciati- vas responsáveis socialmente. Para aproveitá-las, é preciso ter empatia, criatividade, preocupação social e paixão pelo empreendimento social. CONSIDERAÇÕES FINAIS Incluir digitalmente as pessoas possibilita o acesso ao conhecimento e a ferramentas digitais que ajudam no desenvolvimento de indivíduos até então excluídos dos benefícios oriundos da era da informação na qual vivemos. Incentivada por uma legislação abundante e pelas diretrizes básicas promovidas por entidades internacionais e por governos locais, e aliada a movimentos que buscam renovar a finalidade da atividade empreendedora – como o capitalismo consciente, o comércio justo, o empreendedorismo social e os negócios sociais –, a inclusão digital se transforma em instrumen- to para a melhoria da qualidade de vida em comunidades e para pessoas de baixa renda. Em um mundo onde não se imagina viver mais sem a pre- sença da tecnologia, também é preciso lidar com os reflexos causados pelo universo digital e as mudanças que ele causou em nossa sociedade. Nessa esteira surgiram vários negócios sociais atuando justamente nas lacunas deixadas pelas empresas tradicionais, que por não atenderem to- das as pessoas, abrem espaço e criam oportunidades para que empreende- dores sociais criativos e apaixonados pelo que fazem possam propor novos modelos de negócios contribuindo com alguma causa socioambiental. Os exemplos de empreendimentos dessa nova modalidade existem nos mais diversos setores da nossa economia, mas uma das carac- terísticas mais marcantes dos novos empreendimentos é o de serem startups voltadas para negócios sociais. 140 Propósito organizacional e capital social Conseguir investidores e obter capital para o desenvolvimento e o cres- cimento desse tipo de negócio tem se constituído o grande desafio para esses empreendedores, muito em razão da maioria dos empreendimen- tos ainda não se encontrarem maduros com sua viabilidade comprovada. Entretanto, tal dificuldade não é muito diferente da que ocorre com as empresas tradicionais, e se é possível vencer com atividades conservado- ras, também o é em novos negócios, ainda mais em um país como o nosso em que as necessidades da população são grandes constituindo-se em um fértil cenário para negócios sociais inovadores. ATIVIDADES Atividade 1 Defina a inclusão digital. Atividade 2 Defina o analfabetismo digital. Atividade 3 O que é tecnologia? REFERÊNCIAS ABDI – Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial. Conectividade e indústria: aplicação de tecnologias e isenção digital. Brasília: ABDI, 2021. BRASIL. Constituição Federal (1988). Diário Oficial da União. Poder Legislativo, Brasília, DF, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao. htm. Acesso em: 22 ago. 2022. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm Inclusão digital em negócios sociais 141 BRASIL. Decreto n. 9.319, de 21 de março de 2018. Diário Oficial da União. Poder Executivo, Brasília, 22 mar. 2018a. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2018/decreto/D9319.htm. Acesso em: 22 ago. 2022. BRASIL. Estratégia brasileira para a transformação digital. Brasília: Departamento de Políticas e Programas Setoriais em TICs - Secretaria de Política de Informática do Ministério da ciência, tecnologia, inovações e comunicação, 2018b. Disponível em: https://www. gov.br/mcti/pt-br/centrais-de-conteudo/comunicados-mcti/estrategia-digital-brasileira/ estrategiadigital.pdf.Acesso em: 22 ago. 2022. CARR, N. A geração superficial: o que a internet está fazendo com os nossos cérebros. Rio de Janeiro: Agir, 2019. GANDRA, A. 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O propósito organizacional diferencia a empresa dos seus concorrentes por expressar o real motivo da existência de uma corporação, além de alinhar o papel da organização com os novos anseios dos consumidores. Também destaca a forma como a companhia trabalha para criar valor para si e para seus clientes, colaboradores, parceiros comerciais, investidores, comunidade e para o meio ambiente, o que agrega ainda mais valor para a marca (MACKEY; SISODIA, 2018). 2. O propósito organizacional de uma empresa tem a mesma função da missão? Explique. O propósito organizacional e a missão são diferentes, pois enquanto a missão determina o que a companhia faz e quais serão as ações táticas utilizadas para atingir os objetivos por ela definidos que podem mudar ao longo do tempo, o propósito é mais duradouro trazendo em si a expressão da razão pela qual a organização existe. 3. Baseado no círculo dourado criado por Sinek (2018), quais são as três situações que as empresas se encontram em relação ao seu propósito organizacional? Para o autor, as corporações se situam em três categorias, sendo que todas sabem o que fazer, ou seja, conhecem seus produtos e serviços, essa categoria foi denominada por Sinek (2018) como What. Outras organizações sabem comunicar ao mercado a sua proposta diferenciada de valor e são classificadas na categoria How. Por último, poucas companhias entendem o porquê da sua atuação ou existência, ou seja, sabem qual é o seu propósito organizacional, essas estão na categoria Why. 2 Capital social 1. Defina conceitualmente a responsabilidade social. A responsabilidade social é a responsabilidade de uma organização pelos impactos que as suas decisões e ações causam na sociedade 142 Propósito organizacional e capital social e no meio ambiente, podendo ser mitigadas ou eliminadas por meio da conscientização e da adoção de uma postura ética e transparente. Essa postura contribui para a adoção de políticas voltadas ao desenvolvimento sustentável e ao bem-estar da sociedade, envolve os seus stakeholders e atende aos requisitos legais e demais normas de comportamento. Tais ações devem integrar toda a cadeia de valor da organização. 2. Existem diversos tipos de capital que uma organização pode ter. Como se define o capital social? O capital social, dentro do universo da responsabilidade social, envolve a percepção e o reconhecimento pelo público de que a organização é responsável socialmente e que engaja todos os que com ela se relacionam em suas ações éticas e sustentáveis, ou seja, é transparente para o mercado e os demais entes sociais que os temas e questões centrais de responsabilidade social são respeitados por ela e por todo o espectro de influência da organização. 3. Empresas inovadoras não se adaptam com estruturas hierárquicas que não sejam flexíveis. Qual o tipo de estrutura organizacional que mais se adapta às empresas com propósito e que atuam em negócios sociais? Explique. As empresas inovadoras e de sucesso dão preferência à organização do trabalho dentro de uma estrutura mais flexível, sem tanta burocracia e que valorize o trabalho em equipes colaborativas que lidam com projetos voltados a produtos e serviços que não têm duração de longo prazo e, por atenderem a diversos tipos de públicos, dependem de times multidisciplinares trabalhando em conjunto. Esse tipo de empresa se adapta melhor a estruturas como Adhocracia, focando nos negócios e atuando para dar maior autonomia aos seus colaboradores. 3 Propósito e cultura organizacional 1. Defina conceitualmente o capitalismo consciente. É uma nova forma de pensar os negócios, atuando dentro do paradigma de desenvolvimento das empresas, mas simultaneamente criando valores diferenciados e bem-estar para todos os stakeholders (partes interessadas), tais como: financeiro, intelectual, físico, ecológico, social, cultural, emocional, ético e até mesmo espiritual. Resolução das atividades 143 2. Defina a inovação. A inovação é caracterizada por introduzir, com sucesso, um produto, serviço, processo, método ou sistema organizacional que ainda não existia em um determinado mercado, possuindo alguma característica nova ou um padrão diferente do que existia até então. 3. A ação de empresas que possuem um propósito maior traz benefícios para a sociedade como um todo, mas em relação aos consumidores, quais são os benefícios que eles têm ao serem clientes de empresas que atuam com a nova forma de pensar os negócios? Além da qualidade dos produtos/serviços produzidos dentro de condições éticas e morais em ambientes de respeito aos trabalhadores e ao meio-ambiente, os consumidores são beneficiados também com uma relação de maior transparência e autenticidade na comunicação, recebendo até ajuda para encontrar os produtos que melhor lhe atendam. 4 Estratégias para negócios sociais 1. Qual é a função do planejamento estratégico? Explique. O planejamento estratégico representa fisicamente a ideia da estratégia, ou seja, transforma-a em algopalpável desdobrando a estratégia em objetivos e metas para que uma organização possa entregar a sua proposta de valor para o mercado. Ele considera o produto ou serviço a ser entregue, as fontes de receitas, as despesas, o público ao qual atenderá etc. 2. Como podem ser descritas as ações de marketing relacionados a uma causa para instituições do terceiro setor? São ações que envolvem a associação da instituição com uma marca por meio de uma campanha que inclui a venda de um produto ou serviço (camisetas, lanches, curso, lazer etc.) tendo parte ou a totalidade do que for arrecado revertido para o projeto social. 3. O trabalho do voluntariado é regulamentado no Brasil pela Lei n. 9.608/98. Como é formalizada a relação entre o voluntário e a instituição para a qual ele vai doar as suas horas de trabalho? O trabalho voluntário é uma atividade não remunerada formalizada por um termo de adesão entre a entidade, pública ou privada, e o prestador do serviço voluntário. Nesse termo deve constar o objeto 144 Propósito organizacional e capital social e as condições de seu exercício, assim esse documento é equivalente à formalização de um contrato de compromisso entre as partes envolvidas. 5 Inclusão digital em negócios sociais 1. Defina a inclusão digital. A inclusão digital se trata do conjunto de ações criadas com intuito de possibilitar o acesso de todas as pessoas às ferramentas digitais, ou seja, são os atos que democratizam e popularizam o uso da tecnologia e das suas inovações em hardwares e softwares. Significa possibilitar o uso das tecnologias atuais pelas pessoas para que elas possam melhorar os seus meios de comunicação; de expressão; de produção de bens e serviços; de acesso, de criação e divulgação do conhecimento por toda a sociedade. 2. Defina o analfabetismo digital. O analfabetismo digital ocorre quando o cidadão não é capaz de acessar, entender ou utilizar para o seu desenvolvimento as tecnologias da informação e comunicação (TIC) existentes, bem como o conteúdo disponível na internet e nos demais itens tecnológicos, tais como: softwares de edição de texto, gestão de dados, elaboração de gráficos e planilhas, redes sociais, animação, material de propaganda e marketing etc. 3. O que é tecnologia? Tecnologia se trata do uso do conhecimento adquirido transformado em algo prático para a realização e facilitação de tarefas, e que acaba por gerar novas possibilidades de inovação. Resolução das atividades 145 ORGANIZACIONAL E LUIZ CARLOS GONÇALVES L U I Z C A R L O S G O N Ç A L V E S P R O P Ó S I T O O R G A N I Z A C I O N A L E C A P I T A L S O C I A L ISBN 978-65-5821-177-8 9 786558 211778 Código Logístico I000618 Página em branco Página em branco