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ECONOMIA E MERCADO 2020 Ana Paula dos Santos Cardoso Tadeu Vaz Pinto Pereira Thiago André Guimarães ANA PAULA DOS SANTOS CARDOSO TADEU VAZ PINTO PEREIRA THIAGO ANDRÉ GUIMARÃES ECONOMIA E MERCADO ECONOMIA E MERCADO 2020 Ana Paula dos Santos Cardoso Tadeu Vaz Pinto Pereira Thiago André Guimarães PRESIDENTE Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM DIRETOR GERAL Jorge Apóstolos Siarcos REITOR Frei Gilberto Gonçalves Garcia, OFM VICE-REITOR Frei Thiago Alexandre Hayakawa, OFM PRÓ-REITOR DE ADMINISTRAÇÃO E PLANEJAMENTO Adriel de Moura Cabral PRÓ-REITOR DE ENSINO, PESQUISA E EXTENSÃO Dilnei Giseli Lorenzi COORDENADOR DO NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA - NEAD Renato Adriano Pezenti GESTOR DO CENTRO DE SOLUÇÕES EDUCACIONAIS - CSE Fernando Rodrigo Andrian DESIGNER INSTRUCIONAL Abner Pereira de Almeida REVISÃO ORTOGRÁFICA Carolina Bontorin Ceccon (FAE) Mayara Drobot da Silva Portela (FAE) PROJETO GRÁFICO Impulsa Comunicação DIAGRAMADORES Andréa Ercília Calegari CAPA Andréa Ercília Calegari © 2020 Universidade São Francisco Avenida São Francisco de Assis, 218 CEP 12916-900 – Bragança Paulista/SP CASA NOSSA SENHORA DA PAZ – AÇÃO SOCIAL FRANCISCANA, PROVÍNCIA FRANCISCANA DA IMACULADA CONCEIÇÃO DO BRASIL – ORDEM DOS FRADES MENORES ANA PAULA DOS SANTOS CARDOSO Mestre em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Graduada em Ciências Econômicas pela Fundação Universidade do Rio Grande (FURG). Atualmente é Professora Assistente da FAE Centro Universitário e Professora Adjunta das Faculdades Integradas Santa Cruz de Curitiba (FARESC). Experiência na área de Econo- mia, com ênfase em Mudança Tecnológica, atuando principalmente nos seguintes temas: Concorrência e Mercados e Política Monetária. TADEU VAZ PINTO PEREIRA Mestre em Ciências Humanas e Sociais pela Universidade Federal do ABC. Gradu- ado em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (CEA/PUCC) e em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas (IFCH/ UNICAMP). Atuou no Centro de Desenvolvimento Econômico da UNICAMP (CEDE/IE/ UNICAMP) e foi Chefe da Divisão de Indústria da Secretaria de Desenvolvimento Eco- nômico do município de Bragança Paulista. Atualmente, é servidor efetivo (Analista de Gestão) da Prefeitura da Estância de Atibaia e professor convidado na área de Teoria Econômica na Universidade São Francisco (USF). THIAGO ANDRÉ GUIMARÃES Mestre e Doutorando em Pesquisa Operacional pelo Programa de Pós-graduação em Métodos Numéricos em Engenharia, pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). En- genheiro de Produção Civil pela Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e Economista pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Atualmente é Professor Assistente da FAE Centro Universitário, lotado no Departamento de Economia e Pro- fessor Efetivo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Paraná (IFPR), lotado no Campus Curitiba, atuando na área de Gestão e Negócios. Atua também como Economista e Pesquisador junto ao grupo de pesquisa Desenvolvimento e Evolução de Sistemas Técnicos (DEST), vinculado ao Departamento de Economia do Setor de Ciências Sociais Aplicadas da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Sua pesquisa concentra-se na área de Engenharia de Produção, com particular interesse em Logística e Pesquisa Operacional. No âmbito das Ciências Econômicas, atua especifica- mente nos seguintes segmentos: Economia Industrial, Mudança Tecnológica, Agrotóxicos, Métodos Estatísticos, Matemáticos e Econométricos e Ensino em Ciências Econômicas. O AUTOR SUMÁRIO Caixas de destaque ........................................................................................................5 UNIDADE 01: A economia no nosso dia a dia................................................................6 1. Escolhas dos seres humanos .................................................................................6 2 Ciência econômica e suas metodologias ............................................................... 14 3 Comportamentos econômicos em sociedade ........................................................ 20 UNIDADE 02: Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a micro- economia ...................................................................................................................... 34 1. Fundamentos de microeconomia .......................................................................... 34 2. Elasticidade ........................................................................................................... 48 3. Estruturas do mercado .......................................................................................... 55 UNIDADE 03: A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana ............ 62 1. Mercado se Autoequilibra, pelo menos é o que pensam os liberais ..................... 62 2. Contabilidade social .............................................................................................. 73 UNIDADE 04: Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas ma- croeconômicas ............................................................................................................. 88 1. Moeda e mercado financeiro ................................................................................. 88 2. Inflação – causas e consequências ...................................................................... 99 3. Estado e políticas macroeconômicas ..................................................................109 Importante entender! É um espaço dedicado a entender os conceitos centrais do conteúdo. Para refletir Espaço para questionamento sobre o assunto. Situação hipotética para reflexão e compreensão sobre o tema estudado. Exemplo Momento para se apresentar uma situação real do assunto trabalhado. Leis Lei ou artigo de extrema importância para o aprofundamento do aluno. Leitura fundamental Livros e textos imprescindíveis para o desenvolvimento da aprendizagem do aluno. Sugestão de leitura Apresentação de leituras interessantes para o aluno, relacionadas ao tema. Relembre Pontos fundamentais que guiarão o aluno. São nortes que o ajudarão a interpretar o texto. Curiosidades Fato, acontecimento histórico ou ponto curioso relacionado ao tema abordado. Saiba mais Livros e textos imprescindíveis para o desenvolvimento da aprendizagem do aluno. Glossário Termos e siglas específicas sobre o tema tratado na unidade. Pesquise Apresentação de fontes para que o aluno explore mais o conteúdo abordado. Serão apresentados: livros, sites, reportagens, dissertações, vídeos, revistas, etc. significado das CAIXAS DE DESTAQUE A economia no nosso dia a dia 6 1 UNIDADE 1 A ECONOMIA NO NOSSO DIA A DIA INTRODUÇÃO Taxa de juros, valor do câmbio, superávit comercial, déficit público, inflação e gráficos e mais gráficos. Certamente, quando você escuta a palavra Economia, vem tudo isso na sua mente. Contudo, Economia é muito mais do que números, gráficos e quantificação de recursos financeiros. Noções de Economia estão no nosso dia a dia. Está quando você decide adquirir um produto em detrimento ao outro, quando planeja o que vai fazer daqui 4 ou 10 anos, ou até quando você desiste de sair com seus amigos no final de semana. O objetivo deste capítulo é discutir o papel da Economia na sociedade, seu lugar ao lado de outras ciências do conhecimento, assim como apresentar seus principais mo- delos e sua problemática. Seja bem-vindo à Economia! Certamente, ao longo de toda esta disciplina, você vai se surpreender e entender melhor a conjuntura e as relações que nos acercam. Vamos conhecê-la? Bons estudos! 1. ESCOLHAS DOS SERES HUMANOS A Economia é definida como as escolhas sobre as formas de vida em sociedade; com o processo decisório das organizações e com a busca pela sustentabilidade. A escolha resulta em um comportamento humano que faz parte do nosso dia a dia. A escolha não altera os fatos, mas implicana forma como direcionamos nossos comportamos com relação a eles. Nós respiramos e a Economia acontece naturalmente. Acordamos e dormimos Econo- mia. Ela não se restringe àquilo que é divulgado em noticiários, revistas e jornais. Por isso, não é possível dizer que não gostamos de Economia, porque ela faz parte do ser humano. Para entender melhor, pense também em nossas decisões diárias de sobrevi- vência na sociedade em que vivemos. Economia é simples assim. As compreensões sobre o comportamento econômico são importantes para as diver- sas áreas do conhecimento, como: a Administração, a Contabilidade, as Engenharias, a Psicologia, a Pedagogia, o Direito, a Biologia, a Medicina, as tecnologias dentre ou- 7Economia e mercado 1tras. Da mesma maneira, essas áreas do conhecimento fazem parte da compreensão sobre a Economia. Seja lá qual for a identidade ou a característica da instituição ou do setor em que você trabalhe, as lógicas da Economia estarão presentes. Você também pode uti- lizá-las para sua própria gestão ou gestão familiar, porque você é uma estrutura produtiva ou de consumo. Em negócios empresariais, a compreensão sobre esse comportamento facilita e amplia o entendimento e o aprofundamento das formas e das técnicas operacionais de gestão, além de dar mais consistência ao processo de tomada de decisão organizacional. Então, pensar Economia está relacionado às seguintes reflexões: ` Eu me conheço, conheço o mundo em que vivo e busco formas de sobrevivência; ` Uma empresa privada se conhece, conhece o mundo em que está inserida e busca formas de sobrevivência; ` O setor público e os demais entes da sociedade civil organizada se conhecem, conhecem o mundo em que vivem e buscam formas de sobrevivência... ...desde a pré-história. O que a sociedade quer da vida? Vida. O que as pessoas querem da vida? Vida. O que eu quero da vida? Vida. Por quê? Satisfação de Vida. Sonhos. Felicidade. Sobrevivência. Competitividade. Bem- -estar social. Como? Vivendo a dinâmica da Vida. Planejamento de curto, médio e longo prazo...Sobrevi- vência, competitividade... Posicionamento, escolhas, tomada de decisão... A economia no nosso dia a dia 8 1 Onde? No meio de vida. Vida em sociedade tem dinâ- mica própria do todo e das partes, com regras, normas e leis. Quando? De acordo com o momento de vida. Vida em sociedade tem dinâmica própria do todo composto pela identidade das partes, que são refletidas nos costumes, na cultura, nas regras, nas normas e nas leis. Por autoconhecimento você pode entender a reflexão sobre os valores, o respeito pró- prio, aquilo que lhe faz feliz e seus sonhos. Em uma organização, isto se reflete na ética organizacional, na missão, no negócio e nos objetivos. Por conhecimento do mundo você pode entender o tecido social, o seu entorno, o entorno da empresa, o meio de vida da sociedade em que as organizações atuam. Já por formas de sobrevivência, procure entender como as escolhas de comportamento que você faz em sua vida, nos setores em que trabalha, o que você desempenha para a busca da sua felicidade ou da sustentabilidade. Nas organizações são tomadas de decisão estratégicas, traçadas à competitividade de acordo com a missão e com os valores estabelecidos. Um processo de tomada de decisão pressupõe escolhas e tem como instrumentos a reflexão, o acompanhamento, o monitoramento, a avaliação e a adequação de com- portamentos estratégicos. Para isso é preciso: a coleta, o levantamento, o registro e a comunicação de dados e informações. Esses dados e essas informações são variáveis e indicadores utilizados na análise da opção a ser seguida. Variáveis são elementos que você dispõe para o seu próprio conhecimento, conhecimento organizacional e conheci- mento do mundo. Quem é você? Quais são seus comportamentos positivos? O que você pretende de sua vida? Ao refletir sobre essas questões você está pensando em variáveis do seu comporta- mento, que pode ser harmônico e conduzir ao equilíbrio, ou desarmônico e conduzir ao desequilíbrio. Isso também ocorre na vida organizacional. Qual é a empresa, a orga- nização ou o setor que eu trabalho? O que há de positivo? Como podemos utilizar os aspectos positivos para alcançar os objetivos organizacionais? 9Economia e mercado 1Essas reflexões dependem das análises de variáveis estratégicas e dos momentos da organização. A organização pode adotar caminhos para a qualidade, a produtividade e a otimização, mas precisa estar atenta ao momento em que se encontra, porque é dinâmica, tanto quanto a sociedade em que atua. Tanto você quanto a organização precisam estar de acordo com aquilo que a sociedade anseia. Quanto mais elaborada for a informação sobre o comportamento das variáveis qua- litativas e quantitativas relacionadas ao momento ou à situação com a qual você ou a organização se depara, maior a certeza sobre a sobrevivência no mercado. Assim, quanto maior o domínio sobre as variáveis do comportamento individual e organizacio- nal, menor a incerteza de sobrevivência sobre os resultados que serão obtidos por tal escolha. Melhor será sua satisfação e melhores serão os ganhos sobre os posiciona- mentos estratégicos. Desta forma, você pode estabelecer a relação desta disciplina de Economia com as demais cadeiras estudadas na graduação do curso de Administração, como gestão estratégica, análise de custos, gestão de pessoas, gestão da qualidade dentre outras, as quais também estão de acordo com essa lógica e abordam esses temas, mas com formas técnicas, sistemáticas, metodológicas e operacionais para que seja possível aplicar na prática. As lógicas da Ciência Econômica se refletem, mas são pouco exploradas no cotidiano. Trabalhos aprofundados com métodos quantitativos e estatísticos nos processos deci- sórios empresariais, sob o esclarecimento dos momentos das estruturas produtivas e de consumo, desmistificam dinâmicas organizacionais. Esse tipo de trabalho enriquece a base de tomada de decisões, o estabelecimento de estratégias e amplia os ganhos competitivos esperados. Terá melhor posicionamento estratégico a empresa e o profis- sional que conseguirem captar os momentos organizacionais e pessoais e relacioná-los com a dinâmica da sociedade. 1.1 CONCEITO DE ECONOMIA E SEU PAPEL COMO CIÊNCIA Economia é o uso de recursos disponíveis e escassos para atender às necessida- des ilimitadas das pessoas para a sobrevivência individual e a vida em sociedade. Costumo indicar aos alunos todas as vezes que, forem iniciar um trabalho ou um estu- do, para que haja entendimento pleno do conteúdo, que eles se baseiem no dicionário e na etimologia das palavras. A partir daí a compreensão sobre os conteúdos e suas aplicabilidades ficam mais claras, facilitando a compreensão dos conhecimentos e das técnicas disponíveis. Assim, começaremos compreendendo o significado da palavra Economia, que vem do grego: + ECO Vem de oikos, que signifi- ca casa. NOMIA Vem de nomos, que sig- nifica normas. A economia no nosso dia a dia 10 1 Portanto, pela etimologia: “Economia são as normas da casa”. Portanto, surgem as per- guntas: o que é necessário para o funcionamento de uma casa? Para que e para quem uma casa precisa funcionar? Como uma casa funciona? Uma casa usa recursos para atender às necessidades das pessoas. O que precisa (recursos) para uma casa estar em atividade e alcançar seus objetivos (neces- sidades)? Como usar o que dispomos para atender nos- sos anseios de vida? Que casa é essa? O que resulta das atividades desta casa? Contudo, você precisa contextualizar esse entendimento para as “diversas casas” que existem na sociedade. Você (parte) ou o mundo (todo) podem ser entendidos como uma casa. Veja as suposições do que seria uma casa: 1 Um indivíduo – que dorme todos os dias e utiliza pijama, cama e roupas de cama para ter a necessidade “sono, descanso ou repouso” atendida; 2 Uma família – que adquire alimentos ou utensílios domésticos para fazer suas refeições e tera necessidade “alimentação” atendida; 3 Uma empresa ou organização – que utiliza equipamentos, computadores, estrutura física e materiais de escritório para ter a necessidade “gestão organizacional” atendida; 4 O governo – que utiliza inúmeros fatores de produção para conseguir realizar a arrecadação do imposto de renda, ou que, por meio de seus funcionários, faz a prestação de serviços públicos para que a sociedade tenha as necessidades de “ensino, alimentação e saúde” atendidas; 5 Uma comunidade – que interage para ter a necessidade de “cultura” atendida; 6 Uma sociedade – que constitui regras, normas e leis para ter a necessidade de “política” ou de “consolidação de um Estado soberano” atendida; 7 Um Estado – que se organiza democraticamente para ter a necessidade de “sobrevivência” das pessoas, pelas pessoas e para as pessoas atendida; 8 Um País – que utiliza todos os fatores que dispõe ou busca fatores de produção em outros países para ter a necessidade de “produção de bens e serviços” atendida; 9 O Mundo – que pensa em como usar apenas “1 mundo” para atender às necessidades de todas as pessoas do mundo. Enquanto cada indivíduo age na parte, ele também determina a organização do todo. 11Economia e mercado 1De maneira geral, a Economia visa entender e analisar como “a casa funciona” do ponto de vista das suas decisões produtivas e seus desdobramentos. A ciência econômica responde, de maneira geral, às seguintes perguntas: O que produzir? A resposta significa identificar as necessidades e, consequentemente, o que irá sa- tisfazê-las. Desta maneira, a sociedade deve saber que precisa produzir, por exem- plo, alimentos, roupas, casas, estradas, escolas etc. Quanto produzir? Implica determinar quantitativamente o produto necessário à satisfação das neces- sidades. Se imaginarmos que todos os recursos disponíveis de uma Economia são utilizados no processo produtivo, atingiremos um limite na produção de bens e de serviços. Nesse caso, se quisermos aumentar a produção de um bem qualquer, teremos de diminuir a quantidade de produção de outro ou outros bens. Como produzir? Para que se obtenha um determinado bem ou serviço, é necessário empregar os fatores trabalho, capital e recursos naturais. Entretanto, a proporção em que esses recursos serão combinados vai depender da abundância ou da escassez de cada um deles. Para quem produzir? A resposta a essa pergunta resolve o último problema da questão da satisfação das necessidades humanas. Ela vai nos dizer de que forma será distribuído o produto do trabalho coletivo aos elementos da sociedade. A economia no nosso dia a dia 12 1 Percepção de si e do mundo, tomada de decisão, trade-off, posicionamento estraté- gico, custo de oportunidade são termos relativos às nossas escolhas de como utilizar recursos escassos para atender às necessidades ilimitadas. Na escolha de comportamento há relações sociais, conversas, soluções de problemas, reflexão sobre o comportamen- to, busca conjunta de alternativas. Escolhas para a sobrevivência e para a vida Os recursos são escassos As necessidades são ilimitadas. x ? Fonte: Elaborada pela autora (2015). Figura 01. Comportamento Econômico Sendo assim, a Economia pode, também, ser entendida como a “ciência das escolhas”. Diante das necessidades ilimitadas dos seres humanos, o agente econômico (que pode ser o Governo, a Família, as empresas etc.) precisa tomar uma decisão sobre o que produzir, como produzir, quanto produzir e para quem produzir. Esses são os dilemas da Economia: entender as escolhas dos agentes econômicos, dado uma conjuntura de recursos limitados e desejos e anseios ilimitados e infinitos. 1.2 VISÕES ESTRATÉGICAS DO COMPORTAMENTO ECONÔMICO Há algumas formas de conhecer o mundo. Você pode conhecê-lo por meio do entendi- mento filosófico, religioso ou do senso comum, que é aquele transmitido de geração em geração. Já ciência conhece o mundo por meio do método científico e ela se relaciona a sua forma de vida cotidiana. Diversas descobertas, estudos, conceitos, teorias, métodos, operacionalizações e práti- cas que fazem parte do nosso dia a dia já fizeram parte do meio acadêmico um dia. Di- ferentemente da pré-história, por causa da tecnologia, hoje a ciência tem forma própria de propagação e disseminação de técnicas e conhecimentos e ela possui argumentos, teorias, hipóteses e leis. Argumentos sobre comportamentos são frágeis porque podem ser normatizados ou modificados no decorrer do tempo, de acordo com o juízo de valor (opinião) de cada indivíduo. Teorias e hipóteses podem ser questionadas e refutadas no decorrer do tempo, de acor- do com as observações práticas. Porém, na ciência, leis são inquestionáveis. 13Economia e mercado 1Assim, é possível afirmar que a sustentabilidade não é utópica, porque o comportamen- to humano é imprevisível e todos podem mudar de opinião, ato ou ação e optar pela essencialidade da vida. Além disso, também podemos fazer uma série de afirmações sobre o comportamento econômico na vida em sociedade que estão baseadas nas leis do comportamento humano de que: a vida sempre encontra meios de sobrevivência; o comportamento humano ou organizacional apresenta ciclos de renovação em busca de equilíbrios; momentos de equilíbrio são construídos em meio a desequilíbrios, ou derivam de impulsos de superação aos desequilíbrios. Veja que a Física, a Química, a Biologia e a Psicologia podem auxiliar nessas compreensões. Você também pode des- mistificar esses entendimentos observando seu comportamento diário na sociedade. A forma do estudo e do conhecimento do mundo tem método e pressupõe um con- junto de aprendizados teóricos e práticos, de exploração dedutiva ou indutiva. Como todo conhecimento científico tem sua forma de propagação em veículos de informação científica como revistas, congressos e demais formas de publicação. A Economia é uma Ciência Social Aplicada baseada em uma construção teórica realizada a partir da observação cotidiana e prática das pessoas e das organizações, que possui raciocínios e obedece a leis relativas ao comportamento humano. Procure na internet sobre conhecimento do mundo por meio do conhecimento filosófico, religioso ou do senso comum. O senso comum é chamado de conhecimento popular. Um conjunto de códigos transmitidos de geração em geração ou pela própria experiência de vida das pessoas. Note a diferença entre conhecimento científico e senso comum: por que você sabe quando é primavera? Você já fez um trabalho de conclusão de curso para descobrir quando ela ocorre? Se tivesse feito, teria conhecido a primavera por meio do conhecimento científico. Quando você opta por realizar um curso de graduação, você se aproxima do conheci- mento do mundo pelo método científico, que tem regras e normas de transmissão, usa as normas da ABNT e faz trabalhos de iniciação científica ou de conclusão de curso. Por meio da aproximação da ciência com o senso comum e os demais conhecimen- tos, avançamos na curva de aprendizagem da sociedade e vivemos dessa forma e não em cavernas. Reunimos diversas formas de conhecimento de mundo, e a inteiramos e a comparti- lhamos como técnicas e conhecimentos entre as diversas formas de aproximação, ou revelação, do homem à sua realidade (tecnológica). Por que acontece isso na sociedade? Por causa da lei da vida. Porque nós, seres hu- manos, nos organizamos assim nesta “aldeia global”, em um tecido social que coexiste em um único planeta, pois buscamos alternativas para sobreviver. A história mostra que essa busca pela vida sempre encontrou novos equilíbrios em meio a desequilíbrios. Lembre-se das transições pelas quais passamos como aquela entre a idade média e a idade moderna. Crises da humanidade são alternativas a mudanças e a renovações do meio de vida. A economia no nosso dia a dia 14 1 2 CIÊNCIA ECONÔMICA E SUAS METODOLOGIAS A Economia, como ciência, baseia-se em modelos hipotéticos para explicar seus fenôme- nos e suas particularidades.Isto acontece porque, por depender de inúmeras variáveis que acontecem concomitantemente (ao mesmo tempo), é necessário isolarmos algumas variáveis para podermos explicar certas características do fenômeno econômico. Diferentemente das Ciências Naturais e Exatas, que muitas vezes podem contar com laboratórios para provar suas teorias, a Economia, como Ciência Social, precisa aplicar modelos hipotéticos para explicar algumas de suas particularidades. Para isso, adota- mos uma expressão latina coeteris paribus ou ceteris paribus. Ela quer dizer “mantidas as demais variáveis constantes”. Outro ponto que também merece destaque é que a Ciência Econômica, assim como qualquer outra ciência, analisa seus fatos e particularidades em diferentes níveis. Mankiw (2013) cita o exemplo da Biologia para comparar: a Biologia não se divide em biologia molecular, botânica, zoologia, dentre outros? A Economia também tem suas divisões. Podemos tentar analisar a decisão de uma família ao decidir pela compra de um bem de consumo em detrimento do outro, verificar por que os preços da gasolina estão au- mentando após elevação do preço do dólar, ou ainda verificar a tendência de poupança das famílias brasileiras em um ambiente de alta generalizada dos preços, por exemplo. De maneira geral, dividimos a Ciência Econômica em dois subcampos: micro e macro- Economia. Para entender a diferença entre microEconomia e macroEconomia, basta pensar em um tecido, uma borda ou uma renda. Da mesma forma que você é o fio de um tecido que tece no tecido social, por meio de seu trabalho, fazendo gerar renda, um fio pode ser entendido como apenas uma atividade econômica que compõe o todo das atividades econômicas de um sistema econômico. No decorrer do tempo, a trama do tecido conjunto da Economia se modifica, de acordo com a capacidade de geração de renda de cada fio (atividade econômica). Figura 02. Trama do tecido conjunto (renda) da atividade econômica Tec nol ogi a Novo Equilíbrio Tecido conjunto da Atividade Econômica Leis do Comportamento Humano Trama do Tecido Social e geração de renda Tempo Renda Impulso 1º 3º 2º 4º Impulso Equilíbrio Sat ura ção Otim izaç ão Fonte: Elaborado pela autora (2015). 15Economia e mercado 1A ideia de microEconomia e de macroEconomia não é relativa a territórios, mas ao conjunto ou às partes das atividades econômicas. Como a Economia estuda o com- portamento de indivíduos, famílias, empresas, governos, estados, países, nações e o mundo, ela precisa organizar a forma de estudá-los e observá-los. Além disso, utiliza a observação macroeconômica e microeconômica para relacionar os efeitos das ações de cada um desses agentes, de modo integrado ou isoladamente no tecido social. A microEconomia refere-se ao campo de estudo da Economia que estuda comporta- mentos individuais, setoriais, ou grupos de atividade econômicas e organizações. Tra- ta do equilíbrio de partes ou de mercados específicos. As partes ou o agregado dos mercados compõem um todo chamado de macroEconomia. Este campo de estudo da Economia trata do equilíbrio geral. Por exemplo: enquanto a microEconomia observa mercados específicos (encontro das forças de oferta e de demanda) ou o equilíbrio e a formação de preços em cada mer- cado, a macroeconomia ocupa-se do equilíbrio geral e das variações do nível geral de preços. Outros exemplos de macroEconomia são: o Produto Interno Bruto (PIB) de um Município ou País; o desemprego total, a inflação, os gastos totais do governo. A microEconomia observa a produção de apenas um bem ou conjunto de bens, como a agricultura, indústria, comércio e serviços e o desemprego de apenas um ou outro setor, como a indústria alimentícia, química, celulose e papel, dentre outras. Resumidamente, de acordo com Mankiw (2013), podemos entender que: MicroEconomia analisa como as pessoas, empresas e famílias tomam decisões e como se relacio- nam e interagem entre si em mercados específicos; MacroEconomia estuda fenômenos da Economia como um todo, como inflação, emprego, cresci- mento econômico e como estes “grandes agregados” influenciam na decisão do agente econômico. Agora, depois de conhecer um pouco sobre o conceito e o papel da Economia como ciência, vem uma dúvida: a Ciência Econômica é uma ciência que pertence ao grupo de Ciências Humanas ou Exatas? Esta é uma dúvida comum! Apesar dos muitos números, gráficos e valores que você já deve ter visto associado à Economia, esta é uma ciência das Ciências Humanas. Isto acontece porque a Economia, conforme já anteriormente discutido, visa entender como “como a casa funciona”, principalmente em questões básicas como “o que deverá ser produzido” ou “quem terá direito de consumir”. Estas decisões, apesar de serem correlacionadas e possíveis de serem explicadas e ex- plicitadas em expressões algébricas e estatística, são carregadas de muita subjetividade. A economia no nosso dia a dia 16 1 A maneira pela qual se decide produzir um produto em detrimento de outro passa por questões culturais e políticas; Economia nada mais é do que a observação do comporta- mento humano em relação às suas decisões produtivas no interior de suas sociedades. Figura 03. O caráter biunívoco das relações da Economia com outros ramos do conhecimento social Economia Antropologia Cultura PsicologiaDireito Filosofia Ética Sociologia Política Sendo assim, a Economia é uma ciência de humanidades. Entretanto, como metodo- logia de análise do comportamento de seus agentes demanda, não só da matemática e da Estatística, conhecimento de História, Sociologia, Psicologia, Ciência Política, dentre outros. Entender as mais diversas questões econômicas demanda multidisciplinaridade. Isto é, não existe um problema “exclusivamente econômico”, o que existe são questões políticas, so- ciais, psicológicas e antropológicas que muitas vezes se refletem no campo da Economia. Fonte: Rosseti (2016, p. 4). Você sabia que em 2017 o psicólogo Richard H. Thaler recebeu o Prêmio Nobel de Economia pelas suas contribuições no campo da Economia comportamental? Thaler é pioneiro no uso da Psicologia para entender o comportamento de como as pessoas tomam decisões econômicas, às vezes, rejeitando a racionalidade. Interessante, não?! Entendendo a Economia desta maneira, fica fácil entender porque os economistas di- vergem tanto! Certamente, ao ler uma notícia no jornal, ou até mesmo ver um comentá- rio em algum telejornal, você observou que economistas têm opiniões completamente distintas sobre o mesmo ponto analisado. 17Economia e mercado 1Tabela 01. Proposições com as quais a maioria dos economistas concorda PROPOSIÇÕES COM AS QUAIS A MAIORIA DOS ECONOMISTAS CONCORDA: 01. Estabelecer um teto para os aluguéis reduz a quantidade e a qualidade das moradias disponíveis (93%). 02. Tarifas e cotas de importação costumam reduzir o bem-estar econômico geral (93%). 03. Taxas de câmbio flexíveis e flutuantes permitem um arranjo monetário internacional eficaz (90%). 04. A política fiscal (por exemplo, cortes de impostos e/ou aumento dos gastos do governo) tem efeitos estimulantes significativos sobre uma Economia que esteja abaixo do pleno emprego (90%). 05. Os Estados Unidos não deveriam restringir a terceirização de outros países (90%). 06. O crescimento econômico em países desenvolvidos como os Estados Unidos leva a níveis mais ele- vados de bem-estar (88%). 07. Os Estados Unidos deveriam eliminar os subsídios agrícolas (85%). 08. Uma política fiscal apropriadamente desenvolvida pode aumentar a taxa de formação de capital no longo prazo (85%). 09. Os governos municipais e estaduais deveriam eliminar os subsídios para franquias de esportes pro- fissionais (85%). 10. O orçamento federal deve ser equilibrado durante o ciclo de negócios, não anualmente (85%). 11. A diferença entre os fundos da Seguridade Social e os gastos se tornará insustentável nos próximos 50 anos se as políticas atuais permanecerem inalteradas (85%). 12.Os pagamentos em dinheiro aumentam o bem-estar dos beneficiários mais do que as transferências em mercadorias de igual valor monetário (84%). 13. Um grande déficit orçamentário federal tem efeitos adversos sobre a Economia (83%). 14. A redistribuição de renda nos Estados Unidos é um papel legítimo do governo (83%). 15. A inflação é causada principalmente pelo crescimento excessivo da oferta de moeda (83%). 16. Os Estados Unidos não devem banir safras geneticamente modificadas (82%). 17. O salário mínimo aumenta o desemprego entre trabalhadores jovens e não qualificados (79%). 18. O governo deveria reestruturar o sistema de assistência social nos moldes de um “imposto de renda negativo” (79%). 19. Os impostos sobre efluentes e as permissões para poluição negociáveis são uma abordagem melhor no controle da poluição do que a imposição de tetos à poluição (78%). 20. Os subsídios do governo sobre o etanol nos Estados Unidos devem ser reduzidos ou eliminados (78%). Fonte: Mankiw (2013, p.34). Por que isso acontece? Segundo Mankiw (2013), os economistas possuem diferentes opiniões acerca da validade e aplicabilidade de algumas teorias. Têm diferentes “visões de mundo”, o que por si só dificulta na interpretação sobre o impacto de algumas vari- áveis econômicas (e suas dimensões) podem afetar o bem-estar econômico. Contudo, as divergências dos economistas não desvalorizam e tampouco desqualifi- cam a análise de questões econômicas. Como já anteriormente comentado, como o entendimento econômico é multidisciplinar, suas interpretações são distintas, com dife- rentes espectros, métodos e considerações, o que deixa a análise da Economia muito mais interessante e rica! A economia no nosso dia a dia 18 1 2.1 O PROBLEMA DO COMPORTAMENTO ECONÔMICO: A ESCASSEZ Um dos problemas fundamentais da Economia é a escassez. Os recursos são escas- sos porque temos apenas um planeta Terra. Em função disso, até que a sociedade encontre outra forma de mensuração da renda, de regeneração, de reconstrução e de reutilização da Terra, também dizemos que os custos são crescentes. Quanto mais se consumir, extrair e utilizar o planeta sem encontrar alternativas à sustentabilidade e à produtividade, maiores serão os custos. O problema da insustentabilidade fica evidente quando os custos crescem mais que a renda, pois isso caracteriza improdutividade das pessoas e do sistema econômico. No entanto, caso os custos aumentem e a renda aumente em uma proporção maior, haverá produtividade, eficiência e otimização sustentável, pois haverá qualidade, prudência e consciência individual e social. Conforme mencionado, temos inúmeras necessidades e precisamos pensar em como usar os recursos disponíveis em 1 mundo para satisfazer a essencialidade da vida. Chamamos de recursos econômicos ou fatores de produção aquilo que usamos para o atendimento dessas necessidades. Na Economia, nós os classificamos e os agrupamos da seguinte forma: Terra: dizem respeito a todos os insumos ou fatores in natura oriundos da atividade econô- mica de agropecuária, plantio e manejo florestal, extrativismo, dentre outras. Capital: pode ser físico ou financeiro. O capital físico são as máquinas, os equipamentos e as estruturas físicas produtivas, aquilo que é possível quantificar e medir contabil- mente e que também caracteriza os investimentos. Já o capital financeiro pode ser entendido como a moeda utilizada para financiar, em forma de crédito ou poupança, a atividade econômica. O crédito é uma antecipação de consumos e investimentos que possuem maior risco ou incerteza de pagamento, quando comparado ao uso de poupança, considerada mais prudente pela garantia de remuneração imediata do sistema produtivo de bens e serviços. Trabalho e capacidade empresarial: não são consumidos fisicamente no processo produtivo, pois são as pessoas e o que se utiliza para a produção de bens e serviços são suas técnicas e seus conhecimentos. Ainda não é medido ou contabilizado como investimento, mas sua produtividade é essencial à geração de renda. Está relacionado ao capital social, à inteligência emocional, à cultura organizacional e à vida das organizações. A forma de revelação do seu conhecimento e de suas técnicas determina a forma do funcionamento e de organização do sistema econômico. A curva de aprendizagem da sociedade depende das pessoas e da forma como trabalhamos pelas pessoas e para as pessoas continuarem trabalhando. Dar valor ao trabalho do outro é uma 19Economia e mercado 1 Tecnologia: é a interação de técnica e conhecimento. A tecnologia é abstrata e se revela por meio do comportamento das pessoas. Para entender a tecnologia, você precisa olhar para a forma de interação do conhecimento e das técnicas entre as pessoas e os objetos. Não confunda tecnologia com inovação. Há tecnologia no momento em que você está estudando, alimentando-se, tomando banho e realizando as demais atividades do dia a dia, aproprie-se, contudo, da tecnologia para escolher a forma como você vive e sobrevive em sociedade. Você é importante e pode construir al- ternativas em conjunto para a sustentabilidade. forma de garantir o seu próprio trabalho (renda), porque se os demais não estiverem trabalhando (renda para consumo), talvez você não tenha um motivo para trabalhar (renda e consumo). Quem irá adquirir o bem ou o serviço que você disponibiliza à sociedade, caso as pessoas não tenham como lhe remunerar? O papel da inovação tecnológica Segundo Joseph Schumpeter (1883 — 1950), economista austríaco, a inovação tecnológica promove a “destruição criativa do capital”. Para ele, a inovação tecnológica é o motor para o crescimento econômico sustentado da Economia, apesar da inovação destruir empresas já bem estabelecidas (SCHUMPETER, 1961). Ou seja, ao surgir um produto inovador, o anterior é substituído pelo novo, revolucionando todo o sistema anteriormente concebido. De acordo com Mankiw (2013), uma das formas de conhecer a trajetória econômica é por meio das tecnologias geradas pela humanidade no decorrer de sua história, como ferrovia, telégrafo, motor a combustão, informática, dentre outros. Você concorda com esta ideia? Qual o papel da inovação para toda sociedade? Não deixe de discutir! Pense que se as pessoas estivessem plenamente satisfeitas ou se houvesse abun- dância de recursos na Terra para atender a todas as necessidades, mesmo assim precisaríamos estudar Economia aplicada à sustentabilidade. Ou, ainda, mesmo que quiséssemos apenas ter lazer, utilizaríamos recursos para ter a necessidade “lazer” atendida e teríamos que trabalhar para isso. Economia é um comportamento humano que depende das escolhas que nós fazemos diariamente. Tanto os recursos utilizados quanto as necessidades das pessoas têm ca- racterísticas que fundamentam o estudo da Economia. O primeiro é caracterizado pela escassez, enquanto que o segundo caracteriza-se pela falta de limites. Por isso, nós pensamos, refletimos e fazemos escolhas. Na linguagem científica, utilizamos um ponto de interrogação para apresentar uma per- gunta ou um problema que será estudado, refletido e pesquisado. Dizemos que a es- cassez é o problema (?), ou a pergunta que motiva os estudos da Ciência Econômica. Mas cada pessoa enfrenta esse problema diariamente, por isso, estamos o tempo todo diante de situações decisórias e precisamos escolher como nos comportar entre as possibilidades que temos diante de cada caso cotidiano. A economia no nosso dia a dia 20 1 Nos livros de Economia, qualquer conceito ou definição que você encontre levará à ideia, resumida e sintética, de que “Economia é um comportamento das pessoas no uso de recursos escassos para atender às necessidades ilimitadas das pessoas”. 2.2 A NECESSIDADE DE SE TOMAR AS MELHORES DECISÕES – AS ESCOLHAS ÓTIMAS As necessidades humanas são inúmeras e infinitas. Diante de um contexto de escassez de recursos disponíveis, é de suma necessidade para o ser humano tomar as melhores decisões(escolhas ótimas), isto é, eleger quais são suas prioridades e quais os recur- sos serão utilizados pata atendê-las. Da mesma forma que as pessoas buscam soluções cotidianas nas organizações, a ciência também o faz. Isso fica evidente pelo aspecto multidisciplinar das organizações e da Economia, pois, para encontrar soluções conjuntas, ela precisa dialogar com as demais áreas do conhecimento científico para construir a sustentabilidade. A habilidade de conversar com outras áreas do conhecimento e reunir um conjunto de argumentos que conduza à decisão ótima caracteriza a multidisciplinaridade. Você se utiliza da Matemática, do Português, da História, da Biologia, da Química, da Física, da Psicologia, dentre outras ciências para viver em sociedade e tomar suas decisões diárias. Sobre a multidisciplinaridade para a solução de problemas comuns em sociedade, vale lembrar que: por um lado, a Ciência Econômica se utiliza de conhecimentos de outras áreas para explicar e estudar o comportamento econômico. Por outro, também contri- bui de modo multidisciplinar, em conjunto com as demais áreas de conhecimento, para solucionar problemas sociais e buscar a sustentabilidade. Solução é a alternativa encontrada que deriva do processo de tomada de decisão. So- lução ótima é o processo decisório feito da melhor forma envolvendo escolhas de com- portamentos que conduzam à sustentabilidade, isso quer dizer: equilibram relações, sa- tisfação e qualidade. Assim otimizamos tempo, processos e geração de renda, porque nos tornamos mais produtivos sem esquecer dos seres humanos e da felicidade, consi- derando que “o melhor plano de negócios é aquele que ‘remunera’ a sua felicidade”. O desafio está em como medir e, por isso, pensamos no custo de oportunidade. O diálogo entre as pessoas ou com as demais áreas do conhecimento auxilia a to- mada de decisão em meio a inúmeras variáveis do cotidiano. 3 COMPORTAMENTOS ECONÔMICOS EM SOCIEDADE Depois de estudar algumas lógicas e alguns raciocínios do comportamento econômico, é possível avançar na curva de aprendizagem da Economia e compreender como o comporta- mento econômico das partes se revela em sociedade e se organiza em sistemas econômicos. A forma como a sociedade se organiza para escolher o que produzir, para quem pro- duzir e como produzir configura os sistemas econômicos. Como o comportamento hu- mano é cíclico, há limites de produção e alternativas ao incremento da renda (Curva 21Economia e mercado 1de Possibilidade de Produção). No cotidiano, esses movimentos são expressos pela produção e pela remuneração de bens e serviços (Fluxo Circular da Renda). Para entender o comportamento cíclico na Economia, pense em você no dia a dia. Você acorda, ganha produtividade (impulso), atinge o melhor momento do trabalho (equilí- brio), depois cansa e necessita de repouso (saturação). Tanto o sistema econômico quanto as organizações funcionam da mesma forma com relação ao meio de vida e aos investimentos na produção. Quando este ritmo se rompe, há crises no sistema econômico ou nas empresas, que representam mudanças, novos investimentos e estra- tégias para construir o próximo equilíbrio. A ruptura deste ritmo pode ser expressa pela desconexão da produção e da remuneração de bens e serviços. Nas empresas, são momentos de perda de produtividade, mercado ou ineficiência produtiva. 3.1 COMPOSIÇÃO DOS SISTEMAS ECONÔMICOS E O FLUXO CIRCULAR DA RENDA Os sistemas econômicos se caracterizam pelos agentes que tomam a decisão sobre o que produzir, para quem produzir e como produzir. Para fins didáticos, apresentamos os três principais: Economia de mercado, Economia mista e Economia centralizada (VASCONCELLOS, 2016). ECONOMIA DE MERCADO Na Economia de mercado, que podemos conceber aqui como “sistema capitalista puro”, as decisões são tomadas pelo que conhecemos como “mercado”. De acordo com Mankiw (2013) é o mercado que escolhe o que vai ser produzido, qual tipo de trabalho será formado, quais são suas quantidades etc. Este sistema, também se baseia nos princípios da livre iniciativa e da propriedade privada. O Mercado decide. Então agentes (pessoas) da oferta e da demanda decidem o que produzir, como produzir e para quem produzir ECONOMIA MISTA Já na Economia mista, também capitalista, o mercado também escolhe o que deve- rá ser produzido, contudo com intervenção do governo neste processo. O governo atua diretamente na eleição de prioridades, agindo como uma espécie de “condutor do mercado”. O mercado (pessoas) e o governo decidem o que produzir, como pro- duzir e para quem produzir. ECONOMIA CENTRALIZADA Já no sistema de Economia Centralizada, as decisões sobre o que deverá ser pro- duzido, quanto será produzido e quem consumirá cabe um órgão central de plane- jamento controlado pelo seu governo. Neste sistema, diferentemente do Sistema Capitalista, não há a previsão de propriedade privada, mas sim propriedades de caráter coletivo. A economia no nosso dia a dia 22 1 Só o governo decide o que produzir, como produzir e para quem produzir. Os sistemas econômicos são compostos pelos agentes econômicos (famílias, em- presas e governo), fatores ou recursos de produção, bens e serviços e seus merca- dos (oferta e demanda). De acordo com Vasconcellos (2016), os fatores de produ- ção são: terra, capital, trabalho, capacidade empresarial e tecnologia. Tabela 02. Formas de ordenamento institucional CRITÉRIOS DIFERENCIADORES FORMAS DE ORDENAMENTO INSTITUCIONAL Economia de mercado Sistemas mistos Economia de comando central 1. LIBERDADE ECONÔMICA Ausência de restrições à liberdade econômica. Restrições seletivas à liberdade dos agentes econô- micos. Introdução do conceito de liberdades sociais. Amplas restrições às variadas formas de li- berdade: de ocupação, de empreendimento, de dispêndio e de acumulação. 2. PROPRIEDADE DOS MEIOS DE PRODUÇÃO Privada, individual ou societária. Coexistência de formas. Coletiva, socializada. Estatizada. 3. SISTEMA DE INCENTIVOS Busca do máximo benefício privado pelos agentes individuais. Submissão do interesse individual privado ao interesse social. Busca do bem comum: o solidarismo e a coo- peração em substitui- ção à competição. 4. COORDENAÇÃO E ALOCAÇÃO DOS RECURSOS Atribuída à livre mani- festação das forças do mercado. Atribuída à atuação conjugada de forças do mercado com planeja- mento público indicati- vo, não impositivo. Atribuída a ordens minuciosas emanadas de centrais de planifi- cação. 5. LOCUS DO PROCESSO DECISÓRIO Os mercados. Os mercados, sob o poder regulatório da autoridade pública. As centrais de plani- ficação, como última instância da organiza- ção burocrática. Fonte: Rosseti (2016, p. 182). Observe a TAB.1: ela demonstra algumas particularidades básicas dos diferentes sis- temas econômicos. Enquanto a Economia de mercado prevê a livre manifestação das forças de mercado, sem qualquer ação que atrapalhe a liberdade econômica do agente econômico em se decidir – livre iniciativa, e tem como sistema de incentivos o benefício privado pelos agentes individuais, a Economia de comando central o sistema de incen- tivos é baseado na busca do bem comum e da cooperação. Neste sistema não existe a propriedade privada, possuindo os meios de produção ca- ráter coletivado, socializado e estatizado, e a alocação dos fatores de produzir (o que será produzido e quem terá acesso ao que será produzido) é determinada por um órgão central de planejamento. 23Economia e mercado 1REFLEXÕES HISTÓRICAS SOBRE SISTEMAS ECONÔMICOS Em uma Economia de Mercado, famílias e empresas decidem o que produzir, para quem produzir e como produzir por meio das forças de oferta e de demanda. Em sua origem e forma mais pura, podemos observar o aspecto liberal das Revoluções Francesa, Burguesa, Inglesa e Industrial. À época, buscava-se o bem-estar econômico pelo livre comércio. Será que hoje em dia essa forma funcionaria para garantir a felicidade de todose, consequentemente, a sustentabilidade? Será que somos capazes de julgar o que é a felicidade do outro? No entanto, as crises do sistema capitalista, a concentração de mercado e a exclusão social mostraram que o bem-estar comum não seria possível por meio de uma competição dos mercados de trabalho e de bens e serviços. Mais adiante, principalmente com a Crise de 1929, a sociedade se conscientizou de que um agente intermediário, o governo, poderia equilibrar o sistema econômico, reduzindo a desigualdade social, de renda, problemas ambientais, dentre outros. Desta forma, constitui-se a economia mista, em que famílias, empresas e governo decidem o que produzir, para quem produzir e como produzir. Politicamente, essa organização da sociedade denomina-se neoliberalismo, ora tendendo a um governo mais centralizado e interventor, ora tendendo a um governo mais liberal. Será que funciona para atingirmos a felicidade e a sustentabilidade? Como cada um de nós se comporta desempenhando papéis que nos permitam alcançar a felicidade? Será que esse conjunto de agentes é capaz de pensar a sustentabilidade ou será que isso depende de cada um de nós? Na economia centralizada, apenas um agente da Economia decide o que será produzido, para quem será produzido e como será produzido. Esse agente é o governo. Aí surge a seguinte questão: será que apenas um agente tem a capacidade de decidir o que é necessário à felicidade de toda a população de um Município, Estado ou País? Será que todos estariam satisfeitos se alguém lhe dissesse o que deve produzir e como deve produzir? Será que apenas um agente consegue ser eficiente para atender a todos os anseios das pessoas de forma a conduzir os indivíduos à felicidade e à sustentabilidade? Politicamente, as formas mais conhecidas deste sistema econômico são o socialismo e o comunismo. Contudo, há também doações e solidariedade. Neste caso, o esforço e a dedicação do tempo podem ser considerados como fatores de produção e contabilizados pelo custo de oportunidade. O produto seria o benefício à sociedade. O simples fato de exercer a cidadania e a democracia é uma atividade que traz benefícios coletivos e contribui para a felicidade e para a sustentabilidade! No conjunto, podemos citar as ações de responsabilidade social, programas de instituições de caridade, religiões, pessoas que se doam sem esperar nada em troca, ONGs, organismos internacionais como ONU, FAO, CEPAL e demais exemplos de doações e ações que permitem equilibrar o bem-estar. O sistema econômico é o meio pelo qual ocorrem os fluxos, as relações e as interações entre os agentes da Economia: as famílias, as empresas e o governo. Tal conjunto de comportamentos o constituem para a produção, transação e remuneração dos bens e serviços. Disso resultam processos desde a origem, a extração dos recursos, até a comercialização e prestação de serviços dos bens. O conjunto de ações orientadas para a produção e remuneração de produtos finais determina a atividade que cada indivíduo exerce na sociedade. A economia no nosso dia a dia 24 1 As pessoas detêm os meios (fatores) de produção e, por isso, ofertam e demandam, em forma de organizações, os fatores de produção. Organizações de pessoas podem ser as famílias, as empresas ou o governo. Quando as organizações demandam os fatores de produção, elas são remuneradas. O nome da remuneração do fator terra é aluguel; do fator capital são juros; do fator traba- lho é salário; do fator capacidade empresarial é lucro; do fator tecnologia são royalties (VASCONCELLOS, 2016). Tabela 03. O nome da remuneração FATOR DE PRODUÇÃO REMUNERAÇÃO Trabalho Salário Capital Juros Terra Aluguel Tecnologia Licenças/Royalties Capacidade Intelectual Lucros Fonte: Vasconcellos (2016). Apesar de nos livros a visão da remuneração ainda ser classificada conforme o parágra- fo anterior, note que todas são formas de renda. O capital ainda pode ser tratado como lucro, de acordo com o comportamento das organizações, mas essa remuneração do processo produtivo pode ser entendida como renda. A renda é resultado de um esforço produtivo, seja de uma pessoa, do governo, de uma organização ou de uma empresa. O que são “remunerações”? Na sociedade em que vivemos há um meio de troca, a mo- eda, que nos garante a sobrevivência. Então, normalmente, toda atividade, toda oferta de fatores ou oferta da produção, bens e serviços deve ter remuneração. Fatores de produção ou recursos produtivos são os meios de produção de bens e ser- viços. Pessoas não são bens, no entanto, são fatores de produção. Pessoas trabalham e são classificadas como um fator humano de produção, tanto quanto a capacidade empresarial. As pessoas agem, realizam ações, comportam-se e, por isso, adquirem ou produzem bens e serviços. Uma boa alocação de fatores de produção é estratégia essencial para qualquer empresa. Veja a notícia a seguir e verifique os motivos que levaram empresas de aviação dos Estados Unidos a optarem por aviões mais velhos do que mais tecnológicos. COMPANHIAS AÉREAS RICAS AUMENTAM COMPRAS DE AVIÕES USADOS A Southwest e suas concorrentes americanas — agora cheias de dinheiro após obterem lucros recorde no ano passado — estão vasculhando os países em desenvolvimento atrás de aviões de segunda mão em um momento em que o combustível barato torna mais econômica a operação de aeronaves mais antigas e menos eficientes. Isto contraria o tradicional fluxo de aviões de segunda mão 25Economia e mercado 1das empresas aéreas norte-americanas para seus pares dos países emergentes e torna um mercado já volátil para a Boeing e a Airbus mais imprevisível. “Se você tem muitos aparelhos com asas, é provável que esteja tentando vendê-los nos EUA agora mesmo”, disse George Ferguson, analista sênior de transporte aéreo da Bloomberg Intelligence. O que impulsiona a mudança é o colapso dos preços do petróleo. Enquanto a queda das commodities prejudicou Economias como a Rússia e o Brasil, os custos mais baixos do combustível ajudaram as empresas aéreas dos EUA a arrecadarem quase US$ 19 bilhões no ano passado. De acordo com Mankiw (2013), quando as empresas ofertam bens e serviços, dese- jam receber uma remuneração. Um preço que será pago pelo bem ou pelo serviço. No conjunto, ou pela soma de todos os entrelaçamentos de cadeias produtivas de todas as atividades econômicas, forma-se o Fluxo Circular da Renda (ver figura a seguir). Ele é a complementaridade entre o processo de produção de bens e serviços, desde a origem dos fatores de produção até o bem ou serviço final, e suas respectivas remunerações. Figura 04. Fluxo circular da renda Receita Salários, aluguel e lucros = Fluxo real (bens e serviços) = Fluxo monetário Produtos e serviços MERCADO PARA BENS E SERVIÇOS • Empresas vendem; • Famílias compram; EMPRESAS • Produzem e vendem bens e serviços; • Demandam fatores de produção; FAMÍLIAS • Comparam e consu- mem bens e serviços; • Vendem seus fatores de produção; MERCADO PARA FATORES DE PRODUÇÃO • Famílias vendem; • Empresas compram; Fatores de produção Trabalho, terra e capital Produtos e serviços comprados Gastam Renda Nesse sentido, formam-se dois mercados: Fonte: Elaborado pelo autor (2019). Mercado de fatores de produção - Há a oferta e a demanda por terra, capital, tra- balho, capacidade empresarial e tecnologia. Mercado de bens e serviços - Ofertam-se os produtos e os serviços produzidos por meio do uso dos fatores de produção. A economia no nosso dia a dia 26 1 Essa organização composta por agentes, fatores de produção, bens e serviços e mer- cados determinam os sistemas econômicos. Eles conformam uma interação entre os agentes da Economia por meio dos mercados e de diretrizes políticas, determinando de qual forma será a atividade econômica. QUANDO O DINHEIRO CIRCULA, NÃO HÁ CRISE! Em uma pequena cidade do interior do Brasil, os habitantes estão endividados, e vivendo à custa de crédito. Por sorte chega umestrangeiro e entra no único hotel da cidade. O hóspede saca uma nota de R$ 100,00, põe no balcão e pede para ver um quar- to. Enquanto ele vê o quarto, o gerente do hotel sai correndo com a nota de R$ 100,00 e vai até o açougue pagar suas dívidas com o açougueiro. O açougueiro, por sua vez, pega a nota e vai até um criador de suínos a quem deve e paga toda sua dívida. O criador pega também a nota e corre ao veterinário para liquidar sua dívida. O veterinário, com a nota de R$ 100,00 em mãos agora, vai até o fornecedor de vacinas e paga tudo o que está devendo. O fornecedor, que estava devendo a hospedagem do representante da empresa fabricante de vacinas no único hotel do município, sai com o dinheiro em direção ao hotel e paga a conta de R$ 100,00. Nesse momento, o hóspede chega novamente ao balcão, pede sua nota de R$ 100,00 de volta, agradece, diz não ser o que esperava e sai do hotel e da cidade. Moral da história: ninguém ganhou um vintém, porém agora todos saldaram suas dí- vidas e começam a ver o futuro com confiança! Quando dinheiro circula, não há crise! Você participa diretamente do Fluxo Circular da Renda. Vamos a um exemplo? Imagine que você trabalha em alguma empresa do ramo alimentício que faz chocolates. Você diariamente oferece seu trabalho (que chamamos de Fator de Produção Trabalho) para esta fábrica. Seu empregador, por sua vez, para produzir os chocolates demanda (precisa) de seu trabalho. No final do mês, seu patrão lhe remunera por meio de seu salário, conforme contrato salarial. Com este salário, sabendo que a fábrica oferece descontos atrativos para seus funcionários, você adquire uma série de chocolates para você presentear seus parentes e seus amigos. Você viu como funciona o ciclo? Você vende seu Fator de Produção Trabalho no Mer- cado que Trabalho, que, por sua vez, é comprado pelo seu patrão. Você, mediante os 27Economia e mercado 1seus salários, satisfaz suas necessidades no mercado de bens e serviços, que são remunerados pela renda de seu salário. Você viu como é importante que a Economia siga esse fluxo? Algumas pessoas de- nominam esse fluxo como “giro”, isto é, quanto mais a “Economia gira” (mais o fluxo funciona), mais forte e mais dinâmica é esta Economia. 3.2 OS LIMITES DA PRODUÇÃO E ESTRATÉGIAS DE SUPERAÇÃO Tanto a Curva de Possibilidade de Produção (CPP ou FPP) quanto o Fluxo Circular da Renda podem expressar as saturações e os limites da atividade econômica. As estra- tégias de superação dos limites da produção estão relacionadas ao uso de técnicas e conhecimentos de modo interativo (tecnologia) para encontrar alternativas ao equilíbrio, também entendido como o ótimo de produção de um próximo período de tempo. Vamos a nosso exemplo de Curva de Possibilidade de Produção (CPP). Imagine que determinado país – País A – produz apenas dois produtos: alimentos e máquinas. Todos os seus fatores de produção (terra, capital, tecnologia, trabalho etc.) são destinados apenas para produzir esses dois produtos. Também consideramos que esse país não participa do comércio exterior (não compra e nem vende para nenhum outro país). Tabela 01. CPP do País A Fonte: Elaborado pelo autor (2019). Quantidade de máquinas (em mil unidades) 30 CPP D 15 9 0 20 28 40 Produção impossível Quantidade de alimentos (em t) Produção pos- sível, mas não eficiente! A C B Linha de produção possível Observe que o gráfico 1 demonstra a CPP do país A. Observe a linha de produção possível, linha na qual estão posicionados os pontos A e B. No decorrer desta linha, todos os fatores de produção estão sendo utilizados. Assim, não há ociosidade, ou seja, tudo o que estiver acima desta linha não gera máquina desligada ou mão de obra sem trabalho, por exemplo. Todos os pontos de produção que estiverem acima desta linha são considerados óti- mos, uma vez que todos os fatores de produção estão sendo alocados de maneira plena. Sendo assim, os pontos A e B são ótimos, isto é, eles são equivalentes do ponto de vista produtivo. A economia no nosso dia a dia 28 1 Nestes dois pontos estão sendo alocados todos os fatores de produção disponíveis na Economia do País A, alterando apenas a quantidade de produção de máquinas e alimentos. O ponto C do gráfico – que produz 9 mil máquinas e 20 toneladas de alimentos – não é eficiente, uma vez que gera ociosidade na Economia do País A. Neste nível de produção certamente alguém ficará sem trabalho ou alguma terra ficará ociosa (improdutiva). Custo de Oportunidade como Base de Decisão Ótima e a Necessidade do Crescimento Econômico Custo de oportunidade é aquilo que se deixa de fazer por causa de uma escolha que você realiza. Se você decidiu estudar, está deixando de fazer outras inúmeras coisas. Comparati- vamente, essa sua opção levou em consideração o custo de oportunidade. O uso do tempo implica em uma decisão ótima para o momento, e entre todas as alternativas que você tem para dedicar o seu tempo, preferiu estudar. Você tem seus próprios motivos para tomar essa decisão e ela lhe trará a maior satisfação, seja no momento em que estuda ou no momento que puder colher os frutos desse investimento. Nesse sentido, o custo de oportunidade pode ser medido em termos monetários. Utilizar recursos finan- ceiros para estudar é deixar de utilizar esse dinheiro para o consumo de outros bens, serviços ou poupança. A decisão de posicionamento no mercado de trabalho, escolha profissional, abertura de um negócio ou investimento de ampliação também envolve um custo de oportunidade. Em estudos de análise de viabilidade econômica e financeira, há o cálculo do retorno sobre o investimento Taxa Interna de Retorno (TIR), o tempo de retorno do investimento (payback) e o cálculo do ponto de equilíbrio. Para obter a decisão ótima, procure incluir o custo de oportunidade, também chamado de custo do capital investido em outra forma de poupança, projeto ou remuneração. Quando você inclui o custo de atratividade do capital nas suas decisões, você maximiza a satisfação propiciada pela escolha. Talvez a TIR seja um pouco inferior, o retorno sobre o investimento leve um pouco mais de tempo e o ponto de equilíbrio fique um pouco maior. Contudo, você estará realizando um investimento mais consistente, de modo mais prudente e, ainda, remunerando a sua qualidade de vida. Essa consideração tende a conduzir o seu investimento a momentos ótimos mais duradouros, pelos ganhos de produtividade oriundos da procedência do investimento, do bem-estar e da valorização da cultura organizacional. Normalmente, nas empresas, as demonstrações financeiras de resultado anseiam por necessidades imediatas de apresentação de “lucro” ou retornos sobre vendas e acabam sobrecarregando as organizações. Isso funciona como um “consumismo” organizacio- nal que tende a ter um retorno “efêmero” sobre o investimento realizado. Os momentos de equilíbrio e produtividade tendem a ter menor durabilidade e a rotatividade de pes- soal tende a ser maior. Os resultados dessa sobrecarga podem ser negativos ou gerar prejuízos às organizações. Nesse sentido, como contraposição ao risco e à incerteza, vale pensar no planejamento de longo prazo, observando os movimentos da sociedade. 29Economia e mercado 1Uma empresa de sucesso é aquela que se adapta às mudanças sociais. Uma em- presa dinâmica capaz de pensar a sua sobrevivência em conjunto com as demais organizações públicas, privadas e da sociedade civil organizada. Por vezes, a alter- nativa de sobrevivência atrela-se à opção de estabelecer uma relação com órgãos de classe ou com a universidade para garantir pesquisa e estudos que conduzam à qualidade e à produtividade. Mas, decidir sobre o custo de oportunidade implica em trabalhar com inúmeras variá- veis e também com a elaboração de cenários. ` Quantas variáveis influenciam as nossas decisões diárias? ` Também imagine que as variáveis estão constantemente oscilando. ` Como tomar decisão com inúmeras variáveis que oscilamconstante e concomi- tantemente? Vamos voltar ao nosso modelo hipotético para entender melhor sobre o custo de oportu- nidade. Observe agora o gráfico 2: ele demonstra o custo de oportunidade em se decidir produzir as primeiras 20 toneladas de alimentos no país, se o País A desejar produzir apenas máquinas, ele poderá produzir 30 mil máquinas e nenhuma tonelada de alimento. Tabela 02. Custo de oportunidade de produção no país A Quantidade de máquinas (em mil unidades) Produzir as primeiras 20 toneladas de alimento... Custou a produ- ção de MENOS 5 mil máquinas Produzir MAIS 20 toneladas de alimentos... ...requer mais de 25 mil máquinas CPP 01 5 10 15 20 25 30 35 02 03 04 05 0 Quantidade de alimentos (em t) Contudo, caso deseje produzir as primeiras 20 toneladas de alimento, e coeteris paribus (os fatores de produção permanecendo constantes, sem mudança significativa, nem au- mentando e nem diminuindo), parte dos recursos produtivos que anteriormente estavam destinados para produção apenas de máquinas, como trabalhadores e máquinas, por exemplo, são destinados para produzir alimentos. Assim, neste caso, podemos conside- rar que a produção das 20 toneladas de alimento “custou produzir menos 5 mil máquinas”. Fonte: Elaborado pelo autor (2019). A economia no nosso dia a dia 30 1 Como já mencionado anteriormente neste capítulo, a Economia é a “ciência das esco- lhas”. A decisão entre o que produzir e quanto produzir depende da decisão dos agentes econômicos (famílias, governos e empresas). O modelo acima apresentado nos ajuda a entender a problemática da decisão econômica, isto é, a decisão de produzir deter- minado produto ou serviço gera um custo de oportunidade em não se produzir um ou mais produtos e serviços. Tabela 03. Crescimento econômico do país A Quantidade de máquinas (em mil unidades) Quantidade de alimentos (em t) Original CPP Nova CPP A E 01 5 10 15 20 25 30 35 02 03 35 40 500 Fonte: Elaborado pelo autor (2019). Entretanto, continuando com nosso modelo hipotético, como este país poderia pro- duzir as 20 toneladas de alimento, sem a necessidade de diminuir a quantidade de produção de máquinas? Isto aconteceria apenas por meio do aumento da capacidade produtiva, que acontece apenas com aumento dos fatores de produção. Voltemos ao nosso modelo hipotético do País A. Observe o gráfico 3. No ponto A do gráfico, o país consegue produzir 20 toneladas de alimento e 25 mil máquinas e, no ponto E, 25 toneladas de alimento e 30 mil máquinas. Contudo, o ponto E só será produzido se houver aumento na quantidade de fatores de produção disponíveis. Isto é, a produção no ponto E só será possível se a nova CPP for gerada, seja por meio de incremento de tecnologia ou pelo aumento no volume de capital disponível, por exemplo. 3.3 ARGUMENTO POSITIVO E NORMATIVO COMO PLANEJAMENTO DINÂMICO Argumentos positivos são aqueles que descrevem os fatos ou os comportamentos como eles são, como eles ocorreram ou como serão. Já os normativos são aqueles que 31Economia e mercado 1julgam os fatos ou os comportamentos que ocorrem, ocorreram ou ocorrerão. Exemplo: “Ocorreu isto (argumento positivo) mas isto deveria ter ocorrido de outra forma (argu- mento normativo)”; “Eu me comportei assim (argumento positivo), mas deveria ter me comportado de outra forma (argumento normativo)”. Ao pensar em argumentos para os fatos você aprende e melhora o seu processo de tomada decisão para o próximo período de tempo. Lembre-se de que não é possível alterar os fatos, mas a forma como você se comporta em relação a eles para seu apren- dizado e posicionamento em situações futuras pode ser alterado. O comportamento humano é imprevisível e você pode escolher sobre a adequação de comportamento futura em relação aos fatos, que ocorrerão. Isto é uma reflexão para o planejamento estratégico pessoal, profissional e organizacional. O processo de planejamento inicia-se com a descrição dos fatos, também chamado de diagnóstico (argumento positivo). Depois vêm as normatizações, os julgamentos de valor e a reflexão de como deveriam ter ocorrido (argumento normativo). Houve um aprendizado para a adequação do planejamento nos próximos períodos de tempo, que envolve adequação de instrumentos e de comportamentos que serão adotados para atingir as metas e os objetivos. Tanto os instrumentos quanto os comportamentos de- vem estar de acordo com a missão e com a visão organizacional. Quando alinhados aos anseios da sociedade, trarão otimização, qualidade, produtividade e um momento mais duradouro de sucesso na realização organizacional. Pensar sobre a Economia de modo geral também envolve planejamento. No Brasil, hoje, esse planejamento é realizado pelo governo, por meio do Plano Plurianual (PPA) e pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e pela Lei Orçamentária Anual (LOA). Con- tudo, o Planejamento Econômico, ou o Planejamento de Estado da Sustentabilidade, depende de todas as áreas do conhecimento e, na prática, do comportamento individual e organizacional de cada parte do tecido social. Os instrumentos de Política Macroeconômica e de Políticas Públicas podem sofrer adaptações de acordo com a percepção das pessoas sobre as mudanças do comporta- mento humano em sociedade (mudança social). Tanto o planejamento público, quanto o privado e o pessoal devem ser dinâmicos para acompanhar a dinâmica da sociedade. Isso implica em revisar constantemen- te: metas, objetivos, condutas, comportamentos e manter um alinhamento com os valores, os princípios e as diretrizes de comportamentos à sustentabilidade. CONCLUSÃO Economia é uma ciência e, como tal, tem suas metodologias e particularidades. Nesta Unidade você estudou os princípios fundamentais da Ciência Econômica, suas princi- pais questões e seus métodos. Lembre-se: Economia é uma Ciência Social que tem como grande desafio entender as decisões humanas acerca do que produzir, quanto produzir e para quem produzir. Nada mais do que entender o comportamento humano e de suas organizações acerca A economia no nosso dia a dia 32 1 de suas prioridades e de suas preferências, intermediado sempre por questões sociais, psicológicas e políticas. O problema econômico é sempre multidisciplinar e tem inúmeras variáveis e perspec- tivas. E, por mais complexo que pareça, deve ser sempre amplamente discutido por todos nós, independentemente da nossa formação e cultura. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. MANKIW, N. Gregory. Introdução à Economia. 6. ed. São Paulo: Cencage Learning, 2013. 2. PINHO, Diva Benevides; VASCONCELLOS, Mar- co Antonio Sandoval (Org.). Manual de Economia (Equipe dos professores da USP). 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. 3. ROSSETTI, José Paschoal. Introdução a Econo- mia. 20. ed. São Paulo: Atlas, 2011. 4. ________. Introdução à Economia. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2016. 5. SCHUMPETER, Joseph. Capitalismo, socialis- mo e democracia. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961. 6. VASCONCELLOS, Marco Antonio Sandoval. Eco- nomia: micro e macro: teoria e exercícios. São Paulo: Atlas, 2016. 33Economia e mercado 1 34 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia UNIDADE 2 COMO OS MERCADOS FUNCIONAM? FUNDAMENTOS E REFLEXÕES SOBRE A MICROECONOMIA Introdução Nesta Unidade, você aprenderá sobre alguns aspectos básicos do funcionamento dos mercados. Segundo Mankiw (2013) um mercado é um grupo de compradores e vende- dores de determinado bem ou serviço. “Os compradores, como grupo, determinam a demanda pelo produto e os vendedores, também como grupo, determinam a oferta do produto” (MANKIW, 2013, p. 64). De acordo com Vasconcellos (2013), a microeconomia é a parte da Ciência Econômica que tem como objetivo de estudo o comportamento das famílias e das empresas e os mercados nos quais operam. Neste primeiro tópico, serão abordados os elementos essenciais da oferta e da deman- da. Trataremos, portanto, das teorias que regem seu comportamento e deque forma se processa o equilíbrio de mercado. Vamos aprender um pouco mais sobre a microeconomia? Neste primeiro tópico, serão abordados os elementos essenciais da oferta e da demanda. Trataremos, portanto, das teorias que regem seu comportamento e de que forma se processa o equilíbrio de mercado. Vamos lá! 1. FUNDAMENTOS DE MICROECONOMIA O estudo da disciplina Economia e Mercado foca na interação dos agentes (famílias, empresas e governo) no mercado em que estão inseridos. A famosa premissa de que, no sistema econômico, os recursos são escassos e as necessidades, ilimitadas, é o elemen- to norteador para a necessidade de se compreender os conceitos de oferta e demanda. A escassez de uma determinada mercadoria está relacionada com o fato de que todos os recursos existentes no mundo, sejam eles recursos naturais, humanos ou o capital que será utilizado na produção, estão disponíveis em quantidade limitada, ou então seu uso está restrito em função de direitos de propriedade. Esta quantidade limitada de recursos acaba tendo como estabilizador o preço, fazendo com que seja a restrição, e não a necessidade, que determine o valor de um recurso. Vejamos alguns exemplos práticos: o ar e a água, dois elementos fundamentais para a sobrevivência humana. No atual contexto de crescente degradação ambiental, o ar ainda continua a ser um bem disponível em quantidade adequada a todos, mas a água, 2 Economia e mercado 35 que há algumas décadas era um bem considerado extremamente abundante e, por isso, de valor ínfimo, vem apresentando um crescente aumento em seu valor. No século XIX, bastava estar próximo a um rio que era possível obter água potável sufi- ciente para as necessidades da população, mas o incremento desta mesma população, associado ao uso inadequado dos recursos hídricos, faz com que, pouco a pouco, a água se torne um recurso escasso. Por outro lado, as necessidades humanas estão presentes no mundo em quantidade ilimitada. Nossas necessidades se modificam, aumentam e são criadas constantemente. No final do século XIX, a transmissão de cultura e as atividades de lazer consistiam em cultura oral, música ao vivo, teatro e literatura, quando, em 1895, surge o cinema para se aliar a estas atividades culturais. No início do século XXI, o cenário cultural incorpora ou- tras atividades, como internet, apresentações musicais gravadas e replicadas inúmeras vezes, jogos de videogame, entre muitas outras possibilidades. Em pouco mais de cem anos, houve uma mudança radical em termos de possibilidades de lazer, e estas possi- bilidades estão sempre em mutação para atender as preferências que os indivíduos têm em relação aos produtos. Este tipo de necessidade é chamado de necessidade individual. SÉCULO XIX SÉCULO XXI Cultura oral, música ao vivo, teatro, literatura e ci- nema. Internet, apresentações musicais gravadas e repli- cadas inúmeras vezes, jogos de videogame, entre muitas outras possibilidades. A abordagem microeconômica tem seus fundamentos na microeconomia clássica, de- senvolvida no século XIX. Envolve a análise do comportamento dos agentes econômicos que buscam sempre maximizar seus ganhos. As palavras de Adam Smith no livro que, pela primeira vez, sistematiza o pensamento econômico, “A Riqueza das Nações”, são extremamente im- portantes para nos mostrar os fundamentos do liberalismo econômico: Não é da benevolência do açougueiro, do cervejeiro e do padeiro que espe- ramos o nosso jantar, mas da consideração que eles têm pelos seus próprios interesses. Nós nos dirigimos, não à sua humanidade, mas ao autoamor, e falamos com eles não sobre nossas necessidades, mas sobre suas vantagens. SMITH (apud HIMA, 1990, p. 100) ADAM SMITH (1723 — 1790) Filósofo escocês considerado o fundador da Ciência Econômica ao publicar, em 1776, o livro “A Riqueza das Nações”. Antes da publicação deste livro, concentrou seus esforços em estudar os valores éticos e a filosofia moral. Segundo Smith, “o objetivo da filosofia moral é a felicidade e o bem-estar” (RIMA, 1990, p. 99). Assim, ao procurar o conhecimento a respeito do bem- estar, Smith desenvolveu seu estudo sobre o funcionamento da economia com ênfase em alguns aspectos, como: produção, produtividade, divisão do trabalho, uso da moeda e o argumento da liberdade econômica, no sentido de que o comércio exterior é benéfico ao ampliar o mercado consumidor para a produção (RIMA, 1990). 36 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia A visão microeconômica está ligada à noção de equilíbrio e maximização de ganhos. VISÃO MICROECONÔMICA ` Ligada à noção de equilíbrio e maximização de ganhos. ` Equilíbrio do consumidor, que ocorre quando o consumidor maximiza sua sa- tisfação. ` Equilíbrio do produtor, aquele no qual o produtor maximiza seu lucro. ` Análise de equilíbrio geral, em que os mercados são analisados simultanea- mente. Na análise microeconômica, os mercados são analisados a partir de uma visão parcial, setor a setor, agente a agente e na qual a eficiência econômi- ca do mercado prevalece sem que seja necessária a interferência do governo. A seguir iremos desenvolver os dois princípios econômicos fundamentais: a Demanda e a Oferta. 1.1 LEI DA DEMANDA A demanda está ligada ao desejo que o consumidor tem de satisfazer suas necessida- des, ou seja, é a relação entre as quantidades que o consumidor está disposto a adquirir e o preço que está disposto a pagar. Um sinônimo bastante comum para demanda é o termo “procura”. Portanto, sempre que estivermos analisando a demanda, estamos tratando da procura ou busca de um ou mais produtos por parte dos consumidores. Demanda: também pode ser definida como “um desejo de adquirir, […] um plano, e não sua realização” (MONTORO FILHO, 2011). Cesta de consumo: estão relacionadas com o conjunto de produtos capaz de atender da melhor maneira aos desejos e necessidades dos consumidores. Em outros termos, a análise da demanda ocorre a partir da busca que os consumidores fazem para satisfazer suas necessidades em um determinado período. Podemos perceber que existem alguns fatores que interferem de forma decisiva no processo de satisfação do consumidor ao comprar determinado produto. Sabemos que o consumidor irá realizar o processo de escolha de sua cesta de consumo, buscando atingir o maior nível de satisfação possível. As condições para a escolha de um bem e das respectivas quantidades a serem consu- midas dependerá de quatro fatores: 2 Economia e mercado 37 ` Preço do bem cujo mercado está sendo analisado; ` Renda do consumidor; ` Preço de outros bens que se relacionam, de alguma forma, com o bem analisado; ` Gostos e preferências individuais. Resumindo: Figura 01. Fatores relevantes para a escolha de um bem e sua respectiva quantidade ESCOLHA DO BEM QUANTIDADE INTERDEPENDÊNCIA * Preço de mercado; * Preço de produtos similares; * Renda do consumidor; * Gostos e preferências. Vejamos cada um destes fatores individualmente. Fonte: Elaborado pelos autores. PREÇO DO BEM De todos os fatores, talvez o preço seja o que possa ser melhor com- preendido, pois a própria experiência prática nos diz que os consumidores, em sua ampla maioria, escolhem a quantidade que irão consumir a partir do preço do seu produto. A relação entre quantidade e preço, na visão do consumidor, representa uma relação inversa, ou seja, quan- do o preço de um produto aumenta, a quantidade demandada deste produ- to diminui, e quando o preço do pro- duto cai, a quantidade demandada deste produto aumenta. Fonte: Elaborado pelos autores. P é o preço e QD é a quantidade demandada de um produto. ouP PQD QD Preço Quantidade Representado por: Representado por: P QD Figura 02. Relação entre quantidade e preço Vejamos como isto acontece na prática. Quando o preço do tomate aumenta, os con- sumidores evitam o consumo deste produto. Esta é a lógica da influência que o preço exerce sobre a quantidade demandada. Outro exemplo:quando o preço dos automó- veis diminui para o consumidor, existe um aumento da procura por este produto. 38 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia Para essa situação de mercado, utilizamos a seguinte fórmula: ( )PfQd = Portanto, podemos reafirmar a lógica de que a quantidade demandada de uma mer- cadoria aumenta quando o preço diminui. Esta relação inversamente proporcional en- tre estas duas variáveis é demonstrada graficamente por meio da curva de demanda negativamente inclinada (Fig.03). Figura 03. (Gráfico) curva de demanda 30 20 10 1 2 3 4 5 6 0 Fonte: Elaborado pelos autores (2014). Essa é a expressão da lei geral da demanda. O nível de preços pode ampliar ou reduzir a procura ou a venda de um determinado produto. RENDA DO CONSUMIDOR O segundo fator que influencia a demanda por um determinado produto é a ren- da, que funciona como um elemento limitador à satisfação das necessidades dos consumidores, pois podemos considerar que a renda é um dos recursos escassos que precisamos alocar de forma eficiente. De maneira geral, podemos verificar que, sendo a renda escassa, se houver um aumento nesta renda, o consumidor deverá aumentar a aquisição de mercadorias. Por exemplo, se uma pessoa é promovida no emprego, com impactos significativos em seus rendimentos, com certeza ela demonstrará isso por meio da mudança em seu estilo de vida, que refletirá nos bens que passará a consumir. Este efeito ocorre desta forma nos chamados bens normais. 2 Economia e mercado 39 Assim, os bens normais apresentam uma relação diretamente proporcional entre renda e quantidade demandada, como expresso no esquema abaixo: ↑R → ↑QD ou ↓R → ↓QD Bens Normais e Bens de Luxo Os bens normais são aqueles cujo consumo aumenta quando a renda aumenta, bem como a diminuição da renda provoca uma queda em seu consumo, ou seja, comportam-se normalmente em relação à renda. Os bens normais podem ser classificados em bens necessários e bens de luxo. Os bens necessários são aqueles cuja variação no consumo é proporcionalmente menor que a mudança na renda, como, por exemplo, no caso dos alimentos: quando aumenta a renda, temos um aumento no consumo de alimentos, mas este aumento é proporcionalmente menor que o aumento na renda. Os bens de luxo, por sua vez, apresentam comportamento distinto, pois se a renda aumenta o consumo deste bem, ela sofre um incremento proporcionalmente maior e vice-versa. Como exemplo de bens de luxo temos os automóveis, os eletrodomésticos, as viagens, entre outros. Graficamente, o efeito de um aumento da renda provoca um deslocamento da curva de demanda por um bem normal. Se for observado um aumento da renda, a curva de de- manda se desloca para cima e para a direita; se a renda diminuir, a demanda se desloca para baixo e para a esquerda, como demonstrado no Fig. 4. Figura 04. (Gráfico) Efeito da variação da renda sobre a curva de demanda: o caso dos bens normais QuantidadeDemandada Pr eç o D1 D1 D2 D2 D3 D3 No Fig. 2, a linha (D1) representa a demanda inicial. Quando o consumidor experimenta um aumento na sua renda, a demanda por este produto aumenta e a curva de deman- da desloca-se para cima, como na situação demonstrada pela curva (D2). Já quando ocorre uma situação contrária, ou seja, de queda na renda, o efeito é de deslocamento da demanda para baixo, como representado pela linha (D3). Entretanto, no caso dos bens normais existe uma limitação a esta expansão do consu- mo, pois se o produto já estiver sendo consumido no seu ponto de saturação, a mudan- ça na renda não afetará seu consumo. Fonte: Elaborado pelos autores (2014). 40 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia Esse é o caso dos alimentos. Se a pessoa já se alimenta com produtos na quantidade e com a qualidade adequada, dificilmente ela passará a consumir mais apenas porque isso dá uma “sensação de riqueza”, ou seja, isto é o que se costuma chamar de consumo saciado. É o caso, por exemplo, do transporte coletivo na nossa sociedade: sempre que o indivíduo tem possibilidades financeiras, abre mão de se locomover por meio do transporte coletivo. Outro exemplo é a redução do consumo de refresco em pó, em que o indivíduo passa a utilizar outro produto similar que irá lhe transmitir sensação de aumento do bem-estar. Outra situação que ocorre quando estamos analisando bens inferiores. Bens inferiores são aqueles que são considerados de menor qualidade ou com pos- sibilidades limitadas de satisfazer o consumidor. Quando existe um aumento na renda do consumidor, este deixa de consumir esta mercadoria. Sendo assim, sempre que o consumidor tem um aumento de renda que possibilite com- prar bens melhores, ele deixa de consumir este produto. O esquema a seguir mostra como a renda se relaciona com os bens inferiores: ↑R → ↓QD ou ↓R → ↑QD Convém enfatizar que esta classificação é relativa, pois o mesmo produto pode ser in- ferior ou normal, para diferentes indivíduos, dependendo de sua renda. A representação gráfica da relação entre renda e bens inferiores é semelhante ao que ocorre com os bens normais. Neste sentido, quando existe uma variação na renda do indivíduo, isso acarreta um deslocamento da curva de demanda. Contudo, o aumento da renda, ao provocar uma queda na demanda por um produto, irá fazer com que a curva de demanda se desloque para baixo e para a esquerda (da curva D1 para a Curva D3 - Fig. 4). Por outro lado, se houver uma queda na renda do consumidor, haverá um aumento na quantidade procurada de uma determinada mercadoria, provocando um deslocamento da curva de demanda de D1 para D2. Figura 04. Efeitos de variação da renda sobre a demanda: o caso dos bens inferiores QuantidadeDemandada Pr eç o D1 D2 D3 Fonte: Elaborado pelos autores (2014). 2 Economia e mercado 41 PREÇOS DE OUTROS BENS O terceiro fator que interfere na demanda do consumidor por um bem é o compor- tamento do preço de outros bens que podem afetar a demanda de duas formas, a partir da seguinte classificação: bens complementares e substitutos. Bens complementares: são aqueles que são consumidos conjunta e simultaneamente, assim, é necessária a presença de um deles para que o consumo se realize. Sendo assim, quando observamos que o preço de um produto complementar aumenta, a quantidade demandada do produto que estamos analisando diminui. Sendo assim, tanto quando tratamos dos bens normais quanto quando tratamos dos bens inferiores, a renda traz efeitos sobre a curva de demanda, alterando os hábitos de consumo da população em função do fato de que a demanda tem impacto de restrição no consumo da população. A renda, de acordo com a Teoria do Consumidor, pode ser chamada de restrição orçamentária, pois limita o consumidor na sua busca por satisfa- zer seus desejos e necessidades. Preço aumenta Quantidade demandada diminui Figura 06. (Gráfico) Curva de demanda do produto Y QuantidadeDemandada Pr eç o A B C D E F Considerando o Fig. 6, podemos perceber que o produto Y, quando apresenta um au- mento no seu preço, sofre uma queda da quantidade demandada do ponto C para o ponto B, por exemplo. Este aumento no preço de Y acaba por impactar na queda da quantidade demandada de X, de forma que serão consumidas menos unidades de X. Fonte: Elaborado pelos autores (2014). 42 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia Graficamente, isto significa que a curva de demanda de X irá se deslocar para baixo e para a esquerda (de D1 para D2), como demostrado no Fig. 7. Figura 07. (Gráfico) Efeito da variação de preço do produto Y na análise da curva de demanda do produto X QuantidadeDemandada Pr eç o D1 D1 D2 D2 Fonte: Elaborado pelos autores (2014). Em termos práticos, podemos identificar exemplos de bens complementares na relação entre o consumo de combustível e óleo de motor: quanto menor o preço do combustível, maior será a utilização doveículo e, consequentemente, do consumo de óleo de motor. Já na utilização de eletrodomésticos e de energia elétrica, quanto maior o preço da energia elétrica, maior a necessidade de se utilizar racionalmente os eletrodomésticos, evitando até mesmo a aquisição daqueles considerados desnecessários. Bens substitutos: produtos que, em termos de funcionalidade ou utilidade, podem ser facilmente trocados um pelo outro. Neste caso, quando o preço de um produto substituto cai, a quantidade do produto que estamos analisando aumenta. Consumo aumenta Preço cai De acordo com o Fig. 08, quando o preço do produto Y diminui, o consumidor aumenta o consumo de Y, expresso pela transição da posição B para o ponto C. Deste modo, este consumidor deixa de consumir X, já que a utilização dos dois é a mesma. 2 Economia e mercado 43 Como exemplos para bens substitutos temos os combustíveis etanol e gasolina que, nos automóveis com motor flex, são escolhidos basicamente a partir do fator preço. Outro exemplo é a escolha entre comprar um computador do tipo desktop ou do tipo laptop, visto que a escolha do preço é um importante fator de decisão, embora não seja o único determinante. A B C D E F QuantidadeDemandada Pr eç o Figura 08. (Gráfico) Curva de Demanda do Produto Y FONTE: Elaborado pelos autores (2014). Já na Fig. 9 vemos que a diminuição do consumo X é explicado pelo deslocamento da curva de demanda de D1 para D2. Figura 09. (Gráfico) Efeito da Variação de Preço do Produto Y na Análise da Curva de Demanda do Produto X QuantidadeDemandada Pr eç o D1 D1 D2 D2 Fonte: Elaborado pelos autores (2014). GOSTOS E PREFERÊNCIAS O último fator que afeta a curva de demanda são os gostos e preferências. Este é um fator subjetivo, que depende de como o consumidor é afetado por hábitos e tradições, como as novas informações a respeito de como um determinado produto pode ser importante 44 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia para melhorar o seu bem-estar. A utilização de propaganda por parte das empresas, por exemplo, pode afetar, e muito, a mudança de alguns hábitos dos consumidores. Todos estes elementos somados podem alterar ou não a demanda dos consumidores. Em outras palavras, esta situação pode ser expressa da seguinte forma: Suponhamos que seja feita uma grande campanha publicitária incentivando a população a beber mais leite. Nesta campanha se mostra o valor nutritivo do leite e os benefícios que ele traz para a saúde. O povo é despertado por esta propaganda e resolve tomar mais leite. O que ocorrerá com a curva de procura do leite? É fácil responder. A curva se deslocará para a direita. GREMAUD (2003, p. 138) A Fig.10 mostra que o desenvolvimento de novas necessidades ou preferências dos consumidores faz com que a curva de demanda se desloque de D2 para D1, ou seja, a propaganda estimula o aumento das quantidades consumidas de determinado produto. Figura 10. (Gráfico 10) Efeitos de variação dos gostos e preferências na análise da curva de demanda QuantidadeDemandada Pr eç o D2 D2 D1 D1 Assim, observa-se no exemplo como os consumidores são influenciados a consumir novos produtos por meio do estímulo e criação de necessidades. Inicialmente, toda a explicação a respeito do desenvolvimento da demanda aconteceu até aqui a partir da demanda individual, ou seja, da demanda de cada consumidor. En- tretanto, para a análise do mercado no processo de decisão das empresas, é importan- te que exista o conhecimento de como a totalidade dos consumidores reage ao estímulo de cada produto, ou seja, como, em média, os consumidores de determinado mercado se comportam. Neste sentido, a curva de demanda de mercado é obtida a partir do so- matório das demandas individuais dos consumidores. Na seção seguinte, discutiremos as características da curva de oferta. 1.2 LEI DA OFERTA A oferta representa o desejo que as empresas possuem de organizar os fatores de pro- dução para a geração de bens e serviços à sociedade. Assim, a transformação desse desejo em quantidade ofertada (Qs) implica em uma relação direta com o preço do bem. Veja, a seguir, a equação dessa relação: ( )PfQ =s Fonte: Elaborado pelos autores (2014). 2 Economia e mercado 45 A curva de oferta mostra a quantidade de uma mercadoria que os produtores estão dispostos a vender a um determinado preço, considerando constantes outros fatores que possam afetar a quantidade ofertada. Essa relação entre preço e quantidade pode ser demonstrada pela equação a seguir, cuja representação gráfica é demonstrada na sequência (Fig. 11): Figura 11. (Gráfico) Quantidade ofertada QuantidadeOfertada Pr eç o Assim, a curva de oferta é formada a partir dos seguintes elementos: Fonte: Elaborado pelos autores (2014). ` Preço do bem; ` Preço dos fatores de produção; ` Tecnologia disponível. Da mesma forma que na análise da demanda, o preço também é a variável-chave para a compreensão da formação da curva de oferta. Assim, a variação de preço acaba fun- cionando como estímulo (ou desestímulo) à produção na medida em que, se os custos permanecem inalterados quando há um aumento no preço, isso contribui para elevar a margem do empresário, fazendo com que aumente a produção desse bem. Na situação contrária, ou seja, quando o preço do produto cai, a empresa tende a reduzir sua oferta. A partir da análise da Fig.11, podemos identificar a evolução da quantidade ofertada a partir de modificações no preço. Os preços dos fatores de produção também são fundamentais para entender o com- portamento da oferta, pois são os elementos que compõem os custos de produção da empresa. Assim, quando os custos de produção se elevam, se os preços permanecem inalterados, temos como consequência a diminuição da margem do empresário, deses- timulando a produção. Imagine que um fator externo à empresa provoque uma eleva- ção no preço das matérias. Nesse caso, se o preço do produto se mantiver o mesmo, haverá uma diminuição da margem de lucro da empresa, desestimulando a produção, do ponto A para o ponto B na Fig. 12. Se, por outro lado, for possível uma elevação no preço, isso pode ocorrer mantendo-se o nível de produção no mesmo patamar, do ponto A para o ponto C na Fig. 12. 46 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia Figura 12. (Gráfico) Os efeitos que alterações nos custos provocam na curva de ofertas Quantidade Ofertada 01 AB C 01 02 02 03 03 Pr eç o De acordo com A Fig. 12, podemos observar que a curva de oferta inicial O1, ao sofrer um aumento em seus custos, sofre um deslocamento, tornando-se a curva O3. O terceiro fator responsável por possíveis alterações na oferta de um bem é o tipo de tecnologia adotado pela empresa. Se a empresa optar por utilizar uma tecnologia pou- padora de mão de obra ou capital, isto significa que, na prática, haverá uma redução dos custos de produção – e o efeito é o de um deslocamento da curva de oferta de O1 para O2 (Fig. 12). Fonte: Elaborado pelos autores (2014). Tecnologia: Neste caso, o “tipo de tecnologia” está relacionado com a escolha do tipo de processo de produção que será utilizado pela empresa. Em outros termos, pode-se dizer que a empresa precisa definir, a partir do que pretende produzir, se a produção acontece a partir de um processo artesanal ou se a produção terá incorporação de inovações que racionalizem a utilização dos recursos produzidos. Assim, após discutirmos as características das curvas de oferta e demanda, teremos condições de compreender como se processa o equilíbrio de mercado. 1.3 EQUILÍBRIO DE MERCADO O equilíbrio de mercado pode ser determinado quando a quantidade ofertada (Qs) se iguala à quantidade demandada (Qd). Nesse instante, o preço de equilíbrio é determinado. A existência de equilíbrio de mercado tem como pressuposto o mercado concorrencial. Deste modo, o equilíbrio é uma situação que atende tanto às necessidades da demandaquanto às exigências da oferta. A quantidade de equilíbrio é aquela que iguala a deman- da e a oferta a um preço aceito tanto por consumidores quanto por produtores (Fig. 13). 2 Economia e mercado 47 Figura 13. (Gráfico) Equilíbrio de mercado A lógica do Equilíbrio de Mercado pode ser facilmente compreendida quando pensamos nos mercados de produtos agrícolas. No caso da soja, por exemplo, seu preço é um preço internacional, definido a partir da oferta e demanda mundial de soja, ou seja, da existência de uma interação entre as informações sobre o total da safra mundial e a quantidade que está sendo demandada pelos consumidores em termos mundiais. Assim, qualquer dado que se apresente e que, de alguma forma, modifique as condições existentes, pode afetar o equilíbrio estabelecido. Este exemplo da soja é similar ao que acontece com o milho, café, minério de ferro, entre outros. Quantidade Pr eç o Demanda Oferta Quando o preço de mercado se situa em P1, acima do preço de equilíbrio (P0), isso im- plica em excesso de oferta. Nesse caso, os produtores tendem a reduzir os preços e a quantidade demandada começa a aumentar, de Q1 na direção de Q3 enquanto a quanti- dade ofertada começa a se reduzir, de Q2 na direção de Q3. Desta maneira, o mercado vai se ajustando até que o preço de equilíbrio seja alcançado. A Fig. 14 ilustra o pro- cesso. Pois a um determinado preço as empresas estão dispostas a ofertar no ponto B e a este mesmo preço, considerado alto pelos consumidores, eles estão dispostos a comprar apenas a quantidade assinalada pelo ponto A. Figura 14. (Gráfico) Excesso de oferta e excesso de demanda Fonte: Elaborado pelos autores (2014). Demanda Oferta Quantidade A B C D Pr eç o P1 P0 P2 Fonte: Elaborado pelos autores (2014). 48 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia Já quando o preço de mercado se situa em P2, abaixo do preço de equilíbrio (Fig. 15), isso implica em excesso de demanda ou escassez de oferta. Nesse caso, os produtores tendem a aumentar os preços e a quantidade demandada começa a reduzir, de Q2 na direção de Q3 enquanto a quantidade ofertada começa a aumentar, de Q1 na direção de Q3. Dessa forma, o mercado vai se ajustando até que o preço de equilíbrio seja alcança- do. A situação de excesso de demanda significa que, estando o preço abaixo do preço de equilíbrio, os consumidores desejam comprar uma quantidade maior do que as em- presas estão dispostas a ofertar, ou seja, os consumidores estão dispostos a consumir no ponto D e os produtores desejam apenas ofertar no ponto C. Continuaremos o estudo da disciplina, seguindo para o próximo tópico: Elasticidade. 2. ELASTICIDADE Vimos no tópico anterior os fatores que afetam a curva de demanda, mas como pode- mos saber o quanto a demanda é afetada por estes fatores? Como medir a influência destes fatores sobre as possibilidades de consumo dos indivíduos? Esta necessidade de procurar medir a influência dos fatores sobre a demanda é resol- vida por meio de um instrumento que é a elasticidade. A elasticidade é um conceito que relaciona duas variáveis: uma dependente e outra independente. Este é o conceito geral que se aplica em qualquer área da economia. O que nos inte- ressa neste momento é discutir as elasticidades que medem os impactos das variáveis na economia. São elas: Variável independente Variável dependente é a variável que motiva a mudança, é a causadora da mudança, e que não é determi- nada por nenhum dos fatores envolvidos na análise, é considerada um dado do mode- lo, isto é, a variável independente, não é gerada a partir de outras variáveis analisadas. por outro lado, é afetada pela variável independente, as mudanças na variável de- pendente são causadas diretamente pela variável independente. Exemplo: no caso da função-demanda o preço é a variável independente e a quan- tidade demandada é a variável dependente, ou seja, a quantidade demandada de uma mercadoria é definida a partir do preço vigente. ` Elasticidade-preço da demanda; ` Elasticidade-renda da demanda; ` Elasticidade-cruzada da demanda. 2 Economia e mercado 49 Vamos agora apresentar cada uma das elasticidades: 2.1 ELASTICIDADE-PREÇO DA DEMANDA A elasticidade-preço da demanda demonstra o quão sensível é a demanda quando observamos a mudança nos preços ou, dito de outra forma, qual é o impacto que uma variação de preços exerce sobre a quantidade demandada de determinado produto. Demanda: necessidade de algo. Em cada período do ano e em cada região, existem ciclos de produção de determinadas frutas. Quando existe muita produção e os supermercados conseguem manter suprimento constante e abundante, o preço diminui e as pessoas passam a consumir muito mais aquele produto (frutas, verduras, grãos etc.). Quando a produção diminui (por várias razões) os supermercados aumentam o preço para manter suprimento e, com isso, as pessoas diminuem o consumo do respectivo produto. A elasticidade-preço da demanda é um coeficiente, ou seja, um número, que expressa o tamanho da variação da quantidade resultante do aumento ou diminuição do preço em um por cento. Devemos ter em mente que como estas variações ocorrem em sentido oposto, quando aumenta o preço, a quantidade demandada diminui e vice-versa, a elasticidade-preço da demanda é sempre um número negativo. Essa lógica pode ser calculada e, para isso, temos uma equação específica para expli- car esse conceito que matematicamente é expressa da seguinte forma: % % P QE p ∆ ∆ = Em que ∆Q% representa a variação percentual da quantidade demandada, ou seja, a quantidade demandada no período final menos a quantidade demanda- da no período inicial. ∆P% representa a variação percentual do preço, ou seja, o preço final descon- tado o preço inicial. EXEMPLO Por exemplo, imagine que estamos tratando do consumo de gasolina, quando temos um aumento de vinte por cento (20%) na quantidade demandada de gasolina em resposta a uma diminuição de cinco por cento (5%) no preço da gasolina, podemos concluir que a elasticidade-preço da demanda deste produto é 4. Mas como nem sempre temos diretamente os valores percentuais das mudanças ocor- ridas nas quantidades e nos preços, precisamos calcular a elasticidade a partir dos valores disponíveis de preço e quantidade. Esse cálculo utiliza a fórmula da elastici- dade no ponto, que representa a elasticidade considerando a sensibilidade da demanda 50 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia em um determinado ponto representado por um par ordenado de preço e quantidade. A elasticidade preço da demanda no ponto é obtida da seguinte forma: Sabendo-se que a elasticidade-preço da demanda é P QE p ∆ ∆ = % E sabendo que ∆Q% = (Q1 – Q0)/Q0 e ∆P% = (P1 – P0)/P0 Podemos reescrever a equação da seguinte forma: Ep = [(Q1 – Q0)/Q0]/(P1 – P0)/P0 Chegando finalmente à fórmula da elasticidade-preço da demanda no ponto: ( ) ( ) 0 0 01 01 * Q P PP QQ Ep − − = Para exemplificar esse cálculo, vamos utilizar os seguintes dados: Tabela 01. Elasticidade-preço do ponto PONTO P QD A 1 75 B 2 60 C 3 48 D 4 39 E 5 33 F 6 30 Fonte: Elaborada pelos autores. Aplicando a fórmula acima, temos a seguinte estrutura de cálculo para os pontos A e B: EP = (60 – 75)/(2 – 1) * 1/75 EP = ( – 15)/(1) * 1/75 EP = – 0,2 2 Economia e mercado 51 Neste exemplo, podemos nos questionar sobre o significado do resultado e isto pode ser explicado pela classificação da elasticidade-preço. Podemos classificar a elasticida- de-preço da demanda em três tipos: ` Primeiro, quando a demanda por um bem é inelástica; ` Segundo, quando a demanda possui elasticidade uni- tária; ` Terceiro, quando a demanda é elástica. Ao conceituarmos elasticidade-preço da demanda, observamos que o coeficiente resultante é sempre um coeficiente negativo. Mas um detalhe importante se apresenta quando precisamos classificar elasticidade da demanda, que é o fato de queprecisamos aplicar o módulo para facilitar nossa análise. Matematicamente, quando utilizamos o módulo em um resultado, significa que estamos desconsiderando o sinal e usando apenas o algarismo ou coeficiente para elaborarmos uma conclusão do processo. Vamos agora explicar a classificação das categorias em que a demanda pode ser clas- sificada quanto à elasticidade-preço. A primeira categoria é a Demanda Inelástica, que ocorre quando o preço afeta de modo pouco significativo a quantidade demandada, ou seja, a variação nos preços não é capaz de alterar a demanda por um produto ou a mudança na quantidade demandada é proporcionalmente menor que a variação nos preços. ∆Q% ∆ ∆P% Neste caso, o módulo do valor da elasticidade-preço da demanda deve ser menor que um. EP < |–1| Ou seja, quando temos uma demanda inelástica, encontramos um valor entre zero e o módulo de menos um. 0 < EP < |–1| No exemplo anterior, quando realizamos o cálculo da elasticidade, obtivemos um resul- tado de EP = – 0,2. Aplicando o módulo, EP = |–0,2| EP = 0,2 52 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia A segunda categoria é a Demanda de Elasticidade Unitária. Neste caso, a variação nos preços de um determinado produto causa uma mudança de mesma proporção na quantidade demandada, mas em sentido oposto. ∆Q% = ∆P% Assim, o resultado encontrado é igual à unidade, ou seja, quando o resultado da elasti- cidade apresenta-se igual a 1, um aumento de 5% no preço de um produto causa uma queda de 5% na quantidade demandada. E P = |–1| A terceira categoria é a Demanda Elástica. A Demanda Elástica, ocorre quando o impac- to na variação da quantidade demandada é superior à mudança do preço que a causou. ∆Q% ∆∆P% Desse modo, quando a demanda por determinado bem for elástica o resultado encon- trado para o coeficiente é maior que o módulo de –1, observe: EP > |–1| Ou seja, quando o impacto do preço é, por exemplo, um valor igual a 5, significa que quando o preço aumenta, ou diminui, 1% causa uma diminuição, ou aumento, respecti- vamente, de 5% na demanda de determinado bem. Por exemplo, quando o preço de um pacote turístico internacional apresenta uma diminuição do preço da ordem de 5%, supõe-se que a quantidade da demanda apresente um aumento de 10%, configurando uma demanda elástica. 2.2 ELASTICIDADE-RENDA A Elasticidade-renda mensura o impacto que as mudanças na renda do consumidor causam na demanda por determinado produto. O coeficiente gerado pelo cálculo da elasticidade-renda nos indica o tipo de bem que estamos analisando, classificados a partir da influência da renda sobre ele. % % R QER ∆ ∆ = ou ( ) ( ) 0 0 01 21 * Q P PP QQEP − − = Esta classificação está estruturada nas seguintes categorias: 2 Economia e mercado 53 Bens normais e Bens inferiores Os bens normais, por sua vez, podem ser subdivididos em bens necessários e bens de luxo. Cada um deles será explicado, a seguir, a partir do viés da elasticidade-renda. Os bens normais são aqueles que guardam uma relação direta com a renda, ou seja, quando a renda aumenta, o consumo destes bens aumenta, ou quando a renda diminui, o consumo diminui. Com relação à elasticidade-renda, podemos identificar que um pro- duto é considerado um bem normal quando o coeficiente encontrado é positivo, assim: ER> 0 Os bens normais podem ser divididos em bens necessários e bens de luxo. Os bens ne- cessários são aqueles cujo impacto sobre a quantidade demandada, embora positivo, é proporcionalmente menor que a variação na renda, ou seja, 0 < ER < 1 Por sua vez, os bens de luxo são produtos cuja demanda é altamente influenciada por mudanças na renda, ou seja, a quantidade demandada varia em uma proporção maior que a renda. ER > 1 Na contramão dos bens normais, temos os bens inferiores, que são aqueles cuja de- manda diminui quando a renda aumenta e vice-versa. Os bens inferiores são considera- dos de qualidade menor, isto explica porque seu consumo cai quando a renda aumenta. Assim, o coeficiente da elasticidade-renda é um valor negativo: ER < 0 Temos, deste modo, que o cálculo da elasticidade-renda contribui para a identificação das categorias de bens descritas acima. Bens normais: alimentos em geral, automóveis, eletrodomésticos, vestuário, entre outros. Bens necessários: alimentos em geral, vestuário. Bens de luxo: automóveis, eletrodomésticos, viagens. Bens inferiores: transporte coletivo, entre outros bens que são avaliados como de baixa qualidade pelo consumidor. 2.3 ELASTICIDADE-CRUZADA DA DEMANDA A elasticidade-cruzada da demanda mensura o quanto o preço de outros bens afeta o consumo do produto que estamos analisando. Quando tratamos da elasticidade-cru- zada da demanda, estamos relacionando o comportamento de bens complementares e 54 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia substitutos. Assim, o coeficiente da elasticidade-cruzada da demanda mostra o quanto a variação no preço de uma mercadoria afeta a quantidade consumida de outra merca- doria. Em outros termos, podemos observar que: % % Py QxExy ∆ ∆ = ou ( ) ( ) 0 0 01 01 * x xx xy Q Py PyPy QQ E − − = Bens complementares: café com açúcar, goiabada com queijo, combustível e óleo de motor, xampu e condicionador. Bens substitutos: gasolina e etanol, ônibus e automóvel, óleo de soja e óleo de canola, queijo e requeijão. Quando o resultado do coeficiente for um valor negativo, podemos classificar este bem X como complementar, pois o aumento no preço do produto Y provoca uma redução no consumo de Y, e como X é consumido conjuntamente, a aquisição deste bem por parte dos consumidores também cai. Exy < 0 Em sentido oposto, quando o coeficiente apresentar um resultado positivo, este produto X pode ser classificado como bem substituto, pois uma expansão no preço do Pproduto Y causa uma diminuição na quantidade demandada do bem Y, resultando em um im- pacto positivo sobre o consumo de X, pois o bem X supre, como substituto, a queda do consumo de Y. Exy > 0 Estes são os tipos de elasticidades relacionados à demanda. A seção seguinte tratará das elasticidades de curto e longo prazo. 2.4 ELASTICIDADES DE CURTO PRAZO E ELASTICIDADES DE LONGO PRAZO Antes de começar a relacionar as elasticidades de curto e longo prazo, devemos de- finir o significado de curto prazo e longo prazo. Estes conceitos não são definidos em unidades de tempo, mas, de acordo com Alfred Marshall (1842—1924), economista inglês, dependem da capacidade de produção da empresa e dos novos investimentos realizados. Em outros termos: Durante o curto prazo, porém, pode-se variar a oferta de um produto alteran- do-se alguns, mas não todos os insumos de fator necessários à produção. O longo prazo é um período durante o qual se pode variar a oferta de um produto alterando-se todos os insumos do fator. Só não estão presentes as mudanças 2 Economia e mercado 55 em produção associadas a crescimento ou a declínio econômico. RIMA (1990, p. 344) Quando Rima (1990) menciona o termo insumo de fator, ele está se referindo à quanti- dade de fatores de produção, especialmente capital e trabalho, envolvidos no processo produtivo. Assim, quando ao menos um destes fatores permanece sendo utilizado no processo, mas sem alteração da quantidade aplicada, temos o curto prazo. Quando todos os insumos variam, temos o longo prazo. Podemos perceber que as curvas de demanda, tanto no curto quanto no longo prazo, apresentam diferentes inclinações, e como a inclinação é que define a elasticidade: curto e longo prazo de uma determinada mercadoria representam diferentes valores para a elasticidade. Para melhor identificar o comportamento da demanda em relação à elasticidade, temos que, em primeiro lugar, definir o que são: Bens duráveis: são aqueles que podem ser utilizados por longos períodos de tempo, mantendo intac- tas suas características, como veículos, móveis e equipamentos domésticos. Bens não duráveis:são aqueles que podem ser utilizados por curtos períodos de tempo e que apresentam desgaste em função do seu uso. Três exemplos que possibilitam entender claramente este conceito são os produtos descartáveis, a alimentação e a energia, que ao serem consumidos deixam de existir. Podemos considerar também como exemplos de bens não duráveis vestuário e calçados, pois ao serem utilizadas passam a se desgastar e em certo tempo acabam por ser descartados. Finalmente, vamos relacionar a demanda por bens duráveis e não duráveis às elastici- dades-preço de curto e de longo prazo. Quando analisamos os bens não duráveis, podemos perceber que a demanda é mais elástica no longo prazo que no curto prazo em função do fato que as pessoas demoram a modificar hábitos de consumo. No caso dos bens duráveis ocorre o oposto, a curva de demanda é mais elástica no curto prazo, pois uma queda de preço estimula a antecipação do consumo dos bens e, como estes bens demoram a se desgastarem, acaba por afetar a demanda de longo prazo tornando-a inelástica. 3. ESTRUTURAS DE MERCADO A tomada de decisões dos agentes econômicos, especialmente das empresas, é in- fluenciada pelas características do mercado no qual a mercadoria está inserida. Cha- mamos o conjunto destas características de estruturas de mercado. 56 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia Segundo Vasconcellos (2011), a caracterização de uma estrutura de mercado depende fundamentalmente de três fatores: ` Do número de empresas que concorrem no mercado; ` Do grau de diferenciação do bem (se as firmas fabricam produtos idênticos) ou diferenciados; e ` Se existem barreiras à entrada de novos concorrentes nesse mercado. As estruturas de mercado existentes para o mercado de bens e serviços: neste sentido, os bens representam os bens tangíveis que podemos ver e tocar e os serviços, os bens intangíveis (VASCONCELLOS, 2011). São eles: » Concorrência perfeita; » Monopólio; » Oligopólio; e » Concorrência monopolística. A seguir, trataremos de cada um desses modelos separadamente. 3.1 CONCORRÊNCIA PERFEITA Para uma estrutura de concorrência perfeita, Vasconcellos (2011) aponta as seguintes premissas que compõem o modelo teórico de análise: Mercado atomizado: Produtos homogêneos: mercado com infinitos produtores e compradores, de forma que um agente isolado não tem condições de afetar o preço de mercado. Assim, o preço de mercado é um dado exógeno para empresas e consumidores, sendo definido pela concorrência entre as firmas e os próprios consumidores, mas não influenciado isoladamente por nenhum deles (VASCONCELLOS, 2011). todas as firmas oferecem um produto com características e funcionalidades seme- lhantes. Não há diferenças de embalagem, qualidade, entre outros fatores, nesse mercado (VASCONCELLOS, 2011). O mercado de commodities agrícolas costuma ser um bom exemplo de mercado atomizado, na medida em que o preço da soja é definido internacionalmente. Temos uma grande quantidade de compradores e vendedores e, individualmente, nenhum deles consegue afetar o mercado. 2 Economia e mercado 57 Mobilidade de firmas (empresas): Racionalidade: Transparência do mercado: Não existem externalidades: não há barreiras para o ingresso de novos concorrentes no mercado (VASCONCELLOS, 2011). Esta premissa é importante porque significa que, em equilíbrio, o custo de oportu- nidade entre diferentes mercados de diferentes mercadorias deve se igualar. as firmas sempre maximizam o lucro e os consumidores maximizam satisfação ou utili- dade derivada do consumo de um bem, ou seja, os agentes agem racionalmente (VAS- CONCELLOS, 2011). consumidores e produtores “têm acesso a toda informação relevante, sem custos, isto é, conhecem os preços, qualidade, os custos, as receitas e os lucros dos concorrentes” (VASCONCELLOS, 2011, p. 144). o preço de determinado bem expressa todos os custos envolvidos no processo de produ- ção, sem presença de externalidades. Externalidades são efeitos do processo produtivo que transbordam, vazam desse processo. A soja citada acima é um bom exemplo, independente da fazenda, cidade ou país onde foi produzida, pois conserva as mesmas características biológicas, físicas, nutricionais e de funcionalidade. Na concorrência perfeita não existem diferenças de rentabilidade do capital entre diferentes setores, bem como não há dificuldades técnicas ou segredos para a fabricação dos produtos, não se exigem um montante de investimento inicial muito grande e, finalmente, não existe uma regulamentação que impeça a entrada de concorrentes. Ao agir racionalmente, uma empresa busca sempre lucrar o máximo com a venda de um produto. Se estiver praticando um preço abaixo do preço de mercado, apenas conseguiria diminuir seu lucro agindo de forma irracional. Para facilitar o entendimento do conceito de externalidade, podemos utilizar “a poluição”, pois a poluição é um resultado do processo produtivo que não está presente nos custos da empresa, visto que a empresa “exporta” esse custo para a sociedade. Ao contrário, quando a empresa faz o tratamento dos resíduos de 58 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia produção, acaba por arcar com estes custos que contribuirão para a formação de preços sem que a sociedade sofra com esses efeitos. 3.2 MONOPÓLIO As características básicas de um monopólio são dadas pela existência de apenas uma firma (empresa) produtora atuando no mercado, não havendo bens substitutos próxi- mos e com barreiras à entrada de novos produtores (VASCONCELLOS, 2011). Em outros termos, “o monopolista é o mercado e controla totalmente a quantidade de produto que será colocada à venda” (PINDYCK; RUBINFELD, 2013, p. 352). Quando tratamos de estruturas de mercado imperfeitas, isso significa que estamos ana- lisando empresas com poder de monopólio ou poder de mercado, o que implica em verificar o quanto a empresa pode afetar a formação do preço de mercado do produto (PINDYCK; RUBINFELD, 2013). Conforme apontado por Vasconcellos (2011), as barreiras à entrada de novos concor- rentes podem ocorrer de várias formas, dentre as quais destacamos: Exemplos: são monopólios naturais o fornecimento de energia elétrica, água, esgoto e transporte ferroviário. A. Monopólio puro ou natural: “devido à alta escala de produção requerida, exige um elevado montante de inves- timento. A empresa monopolística já está estabelecida em grandes dimensões e tem condições de operar com baixos custos. Torna-se muito difícil alguma empresa conseguir oferecer o produto a um preço equivalente à firma monopo- lista”. (VASCONCELLOS, 2011, p. 161). Exemplo: a fabricação de medicamentos é um exemplo bastante difundido da proteção de patentes. B. Proteção de patentes: “direito único de produzir o bem”. (VASCONCELLOS, 2011, p. 161). Neste caso, o inventor tem a possibilidade de produzir a mercadoria de forma pro- tegida para que possa recuperar o investimento realizado durante o período de pesquisa e desenvolvimento. No Bra- sil, o prazo de patentes de invenção é de 20 anos, de acordo com o INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial). Exemplo: podemos exemplificar esta bar- reira citando “o controle das minas de bauxi- ta pelas empresas produtoras de alumínio”. (VASCONCELLOS, 2011, p. 161). C. Controle de matérias-primas chaves: a fonte das matérias-- primas é considerada uma forma de barreira à entrada, pois se a empresa monopolista é proprietária das jazidas, porque ela forneceria esta matéria-prima ao seu concorrente, quando poderia auferir um ganho maior bene- ficiando o produto ela mesma? Exemplo: as concessões rodoviárias são um exemplo deste tipo de barreira. D. Monopólio estatal ou institucional: este tipo de bar- reira ocorre quando o setor é protegido pela legislação e normalmente em setores estratégicos ou de infraestrutura. A partir do conhecimento a respeito da existência de barrei- ras, poderíamos suporque a empresa monopolista poderia cobrar qualquer valor que julgasse conveniente pelo produ- to que estivesse fabricando. Porém, isto não acontecerá 2 Economia e mercado 59 Exemplo: as concessões rodoviárias são um exemplo deste tipo de barreira. porque a empresa conhece o mercado consumidor e sabe que existe um limite para o preço que o consumidor está disposto a pagar por determinada mercadoria. Assim, o fato de existir apenas uma empresa no mercado aumenta o lucro; acima do lucro concorrencial, temos então lucros extraordinários. O preço no mercado monopolista é definido, então, pela quantidade produzida que ma- ximize os ganhos da empresa. Esta quantidade é definida pela condição de maximiza- ção em monopólio, ou seja, o ponto em que o Custo Marginal iguala à Receita Marginal. RMg = CMg Definida a quantidade de monopólio, o preço unitário recebido pelo monopolista é de- finido diretamente a partir da curva de demanda de mercado (PINDYCK; RUBINFELD, 2013, p. 352). 3.3 CONCORRÊNCIA MONOPOLÍSTICA Já a estrutura de concorrência monopolística é um “meio termo” entre a estrutura de concorrência perfeita e o monopólio. Em comum com a estrutura concorrência perfeita, existem muitas empresas, entretanto, os bens produzidos são diferenciados, mas com substitutos próximos. Desta maneira, cada empresa tem um certo poder sobre os pre- ços, dado que os produtos são diferenciados, e o consumidor tem opções de escolha, de acordo com sua preferência (VASCONCELLOS, 2011). Conforme apontado por Vasconcellos (2011), como não existem barreiras para a entra- da de empresas, em longo prazo não há tendência para lucros extraordinários, “como em concorrência perfeita, ou seja, os lucros extraordinários a curto prazo atraem novas firmas para o mercado, aumentando a oferta do produto, até chegar-se a um ponto em que persistirão lucros normais, quando então cessa a entrada de concorrentes” (VAS- CONCELLOS, 2011, p. 173). Assim, no longo prazo, temos a coexistência de lucros normais e poder de monopólio. Este poder de monopólio seria grande o suficiente para prejudicar os consumidores? Para Pindyck e Rubinfeld (2013), este poder de monopólio não seria significativo, e teria como atenuante o fato de existir uma ampla variedade de produtos substitutos próxi- mos, que conferem ao consumidor a sensação de terem livre escolha. Exemplos de mercados em concorrência monopolística: salões de beleza, serviços médicos e odontológicos, estacionamento de veículos, produtos de higiene pessoal. 3.4 OLIGOPÓLIO O oligopólio é a estrutura de mercado que apresenta maior dinamismo na economia. 60 2 Como os mercados funcionam? Fundamentos e reflexões sobre a microeconomia É a partir do oligopólio que presenciamos a existência de grandes empresas, as quais operam com grande volume de investimentos em pesquisa e desenvolvimento de produtos. Essa estrutura utiliza as barreiras à entrada de forma intensiva, com a finalidade de manter seu poder de mercado. Os mercados oligopolizados possuem algumas peculiaridades importantes: ` Com relação ao número de empresas, podem ser classificados em oligopólios concentrados ou oligopólios competitivos. Os oligopólios concentrados são aque- les nos quais existe um pequeno número de empresas concorrendo no mercado, como no caso da indústria automobilística e da indústria siderúrgica. Os oligopó- lios competitivos são aqueles nos quais “um pequeno número de empresas domi- na um setor com muitas empresas” (VANCONCELLOS, 2011, p. 173). Exemplos: indústria de laticínios, indústria de bebidas, indústria farmacêutica. ` Com relação ao tipo de produto, temos os oligopólios puros e os oligopólios diferenciados. Os oligopólios puros são aqueles cujos produtos são homogê- neos, ou seja, possuem as mesmas características. Como exemplo de oli- gopólio puro temos a indústria do cimento. Os oligopólios diferenciados são aqueles que produzem mercadorias diferenciadas, como na indústria automo- tiva e na indústria eletroeletrônica. ` Existem barreiras à entrada. Neste sentido, Vasconcellos (2011) aponta as seguintes características básicas: devido à existência de empresas dominan- tes, essas têm o poder de fixar os preços de venda em seus termos, defron- tando-se normalmente com demandas relativamente inelásticas em que os consumidores têm baixo poder de reação a alterações de preços. Um dos fatores que diferencia a estrutura de oligopólio das demais é a interdependên- cia entre as firmas atuantes no mercado. Essa interdependência faz com que a estraté- gia de atuação de uma empresa influencie as demais firmas do mercado e, ao mesmo tempo, é influenciada pela estratégia das outras empresas. A atuação pode acontecer via concorrência, onde as firmas travam guerras de preços, ou através de cooperação, através de cartéis (VASCONCELLOS, 2011). Quando falamos de oligopólios e cartéis, o grande exemplo que temos no mercado é o da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo), que ficou famosa nos anos de 1970 ao promover uma diminuição na oferta de petróleo, levando a um aumento no preço do produto em escala mundial. Em relação aos oligopólios que competem travando até mesmo guerra de preços, temos o mercado de bebidas, especialmente o mercado de cervejas. A formação de preços em oligopólios está relacionada com o grau de interdependência das empresas no mercado, mas existe uma regra prática para a formação de preços que é conhecida como regra de mark-up. 2 Economia e mercado 61 O mark-up representa a margem que a empresa aplica sobre o custo direto de produção com a finalidade de estabelecer o preço de venda (VASCONCELLOS, 2011). Assim, temos que: p = C (1 + m) Onde: p é o preço, C é o custo unitário direto ou variável e m é a taxa de mark-up. O mark-up pode ser usado como uma forma de avaliar o grau de poder de monopólio de uma determinada empresa, o qual é chamado de Índice de Lerner. Sendo assim, quanto maior o Índice de Lerner, o coeficiente encontrado, maior o poder de monopólio da firma. Conclusão Nesta Unidade, você aprendeu sobre alguns fundamentos que regem os mercados. Aprendeu mais sobre as características e particularidades da oferta e demanda, e refle- tiu sobre alguns fatores que podem influenciá-las. Você também viu as características de alguns produtos como os bens normais e inferiores, assim como analisou que alguns produtos podem ser substitutos ou complementares entre si. Por fim, observou como funcionam algumas estruturas de mercados, conhecendo não apenas o mercado mais livre e competitivo, como o caso da concorrência perfeita, mas também observou que alguns mercados tendem a ser concentrados e gerar custos e consequências para toda sociedade. Não se assuste com as fórmulas, tampouco com algumas expressões matemáticas: elas podem te ajudar a entender o conceito abordado. As releia e tente entender quais conceitos estas fórmulas querem te ajudar a entender. E lembre-se: o grande objetivo desta Unidade é ajudá-lo a entender como o mercado funciona, e como você, como futuro profissional, pode se antecipar às possíveis conse- quências ou gerar e criar novas oportunidades. Bons estudos! Referências Bibliográficas 1. GREMAUD, Amaury Patrick. Manual de econo- mia. São Paulo: Saraiva, 2003. MONTORO FILHO, André Franco. Teoria elementar do funcionamento do mercado. In: 2. Manual de economia. Equipe de professores da USP. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2011. RIMA, Ingrid Hahne. História do pensamento econômico. São Paulo: Atlas, 1990. 3. VASCONCELLOS, Marco Antonio Sandoval de; GARCIA, Manuel Enriquez. Fundamentos de econo- mia. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2004. 240 p. 4. PINDYCK, R.; RUBINFELD, D. Microeconomia. 7. ed. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2013. 5. _____. Microeconomia. 8. ed. São Paulo: Pear- son Education do Brasil, 2013. VASCONCELLOS, M. A. S. Economia: micro e macro. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. 62 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana UNIDADE 3 A MACROECONOMIA:DA CRISE DE 1929 À REVOLUÇÃO KEYNESIANA INTRODUÇÃO Como já discutido em nossa disciplina, o problema econômico durante muito tempo foi analisado e estudado nas suas relações micro, além de se acreditar que a econo- mia por si, sem interferência do Governo, conseguiria atingir seu próprio equilíbrio e melhor desenvolvimento. Contudo, a partir da primeira metade do século XX tudo muda: a análise econômica passa do micro, da análise e estudo de mercado e agentes específicos, para análise macro, ou seja, indicadores agregados e que influenciam a economia como todo – como crescimento econômico, taxa de emprego, inflação etc. – passam a ter destaque na discussão do bem-estar econômico. Outro ponto de inflexão é o papel do Poder Público na economia. Este, que até então deveria ficar afastado porque “atrapalhava” o desenvolvimento econômico, passa a ter papel de destaque e decisivo no combate dos efeitos das grandes crises do sistema econômico. Tudo isso pode parecer um pouco confuso agora, não é? Fique tranquilo! Objetivo desta Unidade é entender os motivos que levaram a estas mudanças no paradigma econômi- co, bem como conhecer as principais metas e instrumentos da macroeconomia. 1. MERCADO SE AUTOEQUILIBRA, PELO MENOS É O QUE PENSAM OS LIBERAIS Conforme já discutido nesta disciplina, o paradigma que a economia tende ao equilíbrio, desde que livre e sem qualquer interferência exagerada do Estado, tal como defendia o pai do liberalismo, Adam Smith (1723 — 1790), que inovou muito na concepção sobre onde de fato estaria o valor das mercadorias e contrapôs fortemente os pilares do mercantilismo. Para o filósofo, sem a exagerada interferência do Estado, a economia tenderia ao equilí- brio e a sociedade atingiria seu melhor bem-estar, isto é, a plena liberdade (daí a origem do termo liberalismo) do agente econômico propiciaria que toda a sociedade atingisse seu melhor desenvolvimento e bem-estar econômico. Para os pensadores liberais, a economia tende ao equilíbrio decorrente das relações microeconômicas, isto é, específicas de cada mercado. Por exemplo, se o mercado Visão Microeconômica 63 3 Economia e mercado específico de trigo se equilibrar através das forças de mercado (oferta x deman- da), os fatores de produção se alocarem livremente e obtiverem o melhor ganho/ remuneração possível, a economia como um todo atingirá seu bem-estar. Com cada mercado específico funcionando plenamente (por isso “visão microeconômica”), a economia como um todo se beneficiará. Ou seja, é do bom funcionamento específico de cada mercado, que a economia como um todo se desenvolverá. Adam Smith traz uma concepção interessante acerca do que ele denomina “mão invi- sível”, ou seja, a capacidade de o mercado alocar sua capacidade produtiva da melhor maneira possível, visando o melhor bem-estar de seus agentes econômicos. Até as obras de Adam Smith, o valor residia no metalismo, isto é, na aquisição do ouro e da prata. Até o surgimento de suas ideias, uma nação rica era aquela que conseguia ter o máximo de ouro e prata. Pesquise: Teoria do Valor-trabalho. Vamos a um exemplo para você entender melhor acerca do que seria esta “mão invisível”: imagine que em determinado momento o preço do milho aumentou devido a um aumento da exportação do grão para o mercado exterior. Desse modo, se o preço subiu e os pro- dutores estão tendo um lucro superior ao da soja, o que você cultiva no momento? Observando que o preço do milho está mais atrativo do que o da soja, o que você vai fazer? Já conhecendo a técnica da plantação do milho e analisando as possibi- lidades futuras de ganho devido à perspectiva da abertura de novos mercados, vai decidir permanecer cultivando a soja ou se aventurar na cultura do milho? Com certeza, a maioria dos produtores escolheriam se aventurar no cultivo do milho em busca de melhores ganhos. E por que neste momento o milho apresenta melhores ganhos do que a soja? Porque a sociedade demanda (precisa) mais de milho que de soja no momento. No longo prazo, com a entrada de novos produtores de milho, o preço cairá devido a um aumento da oferta e seu mercado atingirá um novo equilíbrio. Ou seja, em busca de seus próprios ganhos, no seu egoísmo de poder lucrar mais, a so- ciedade atingirá o seu melhor bem-estar, isto é, vai ter a sua disposição uma quantidade maior do produto, fazendo com que o problema da escassez do produto seja resolvido. Em tese, eram características como essas que Adam Smith defendia. Se o Estado não “atrapalhasse” o desempenho do mercado, se não interferisse no seu equilíbrio, se não praticasse atividades abusivas como cobrança excessiva de impostos, se não prevale- cessem alguns grupos econômicos (práticas como autorizar que apenas uma empresa ou indivíduo forneça um tipo de produto, por exemplo, formação de monopólios) a eco- nomia atingiria por si só seu equilíbrio, e por consequência, seu melhor bem-estar. 64 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana Para Adam Smith, o Estado deveria continuar existindo sim, apenas para garantir com que as falhas de mercado não atrapalhassem a eficiência e equidade do mercado. Entre as falhas do mercado descritas por Adam Smith, destacamos: o Estado tem a obrigação de garantir que a propriedade privada seja defendida e que seu detentor seja sempre protegido e que possa fazer valer seu direito de propriedade; Proteção da propriedade privada: atuar para que o mercado não se concentre demais, isto é, que poucas empresas controlem a oferta de determinado produto, o que prejudicaria em muito a eficiência e equidade do mercado; Atenuar o poder de mercado: isto é, o Estado deve regular/legislar acerca das “regras do jogo”, punindo aquele agente que por acaso obtenha vantagens por meios ilícitos, ou que sua atividade atrapalhe a atividade econômica de outro agente, por exemplo. Regular as externalidades: O Estado deve atuar fortemente para que as atividades dos agentes não atrapalhem a “liberdade do outro”. Por exemplo, a fixação de uma empresa poluidora em de- terminado município pode prejudicar a atividade econômica de outro agente (agricultores ou pescadores, por exemplo) e a vida da população como um todo. Diante das características apresentadas, surgem os pilares do que concebemos como liberalismo, escola econômica que, segundo Sandroni (1999), serviu de pano de fundo ideológico para os movimentos contra as monarquias absolutistas (Revolução Francesa e Independência dos Estados Unidos, por exemplo). De acordo com o mesmo autor, o liberalismo defendia: ` A mais ampla liberdade individual; ` A democracia representativa com separação e independência entre três poderes (executivo, legislativo e judiciário); e ` O direito inalienável à propriedade; ` A livre iniciativa e a concorrência como princípios básicos capazes de harmonizar os interesses individuais e coletivos e gerar o progresso social. Sendo assim, o liberalismo se baseava em princípios já defendidos pelos fisiocratas franceses, o “laissez faire, laissez passer”, isto é, “deixe fazer, deixe passar”: a livre iniciativa, bem como o livre trânsito e alocação dos fatores de produção, por si só faria com que a economia como um todo atingisse seu melhor bem-estar. 65 3 Economia e mercado Diante de tal concepção acerca do movimento e do desenvolvimento econômico, não precisaria nenhum agente se preocupar com o planejamento das atividades produtivas, uma vez que as forças do mercado por si só eram suficientes para que a economia atingisse sua plena produtividade e ponto ótimo produtivo. 1.1 MUNDO MUDA: A TENDÊNCIA DO EQUILÍBRIO COLOCADA EM XEQUE A concepção de que a economia livre e sem a interferência do Estado, e de que o mercado por si só atingiria o equilíbrio e o bem-estar, foi seguida por séculos: os ideais liberais estavam na mesa de cabeceira de qualquer governante e presente como mo- delo ideal a ser seguido. As ideias econômicas evoluíram muito desde as obras de Adam Smith: partindodo liberalismo e da visão microeconômica, a economia havia evoluído muito em modelos econométricos, o que desenvolvia ainda mais a ideia que as relações mi- croeconômicas eram as que de fato importavam e tinham relevância econômica. Com o passar do tempo, a Ciência Econômica desenvolveu ainda mais a Teoria do Valor-trabalho, da mesma maneira, já havia surgido a Teoria de Valor-utilidade, que veio complementar ainda mais os pressupostos da Teoria Econômica Liberal, dando melho- res significados à visão microeconômica. Contudo, o mundo não era mais o mesmo que Adam Smith havia presenciado: além dos desdobramentos produtivos decorrentes das duas fases da Revolução Industrial, bem como da difusão do poder da burguesia por todo o mundo, o capitalismo sofreu importantes modificações do século XVIII até meados do século XX. O capitalismo que nos anos de Adam Smith ainda era comercial, de uma industriali- zação que previa um capital inicial ainda não tão volumoso, onde os grandes capitais ainda não eram tão significativos assim, mudou muito: o capitalismo havia passado de comercial para industrial, e já entrava numa nova fase, do capitalismo financeiro. [...] em fins do século XIX, o desenvolvimento de mercados de capitais mun- diais e os progressos na produção e nos transportes provocaram imensas con- centrações de poder industrial em corporações gigantescas, trustes e cartéis. Houve duas consequências importantes dessa maior concentração industrial: primeiro, a concorrência não regulamentada tornou-se extremamente custosa e prejudicial para essas empresas gigantescas. Segundo, a anarquia do mer- cado ficou mais grave, porque as corporações gigantescas reduziram significa- tivamente qualquer grau de flexibilidade e capacidade de ajuste que o mercado apresentava anteriormente (HUNT, 2005, p. 382). O capital se concentrou muito e a sonhada concorrência defendida por Adam Smith como mecanismo de equilíbrio econômico começou a ser prejudicada pelas fusões e incorporações, surgindo cada vez mais monopólios e oligopólios por toda a parte. O sonhado bem-estar econômico a cada dia era mais distante: sucessivas crises eco- nômicas, empobrecimento da classe trabalhadora e conflitos internacionais decorrentes 66 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana do expansionismo imperial em busca de novos mercados. Enfim, o bem-estar econômi- co decorrente do livre movimento do capital estava cada vez mais comprometido. A crise de 1929 Considerada por muitos como a pior crise do capitalismo mundial até os dias de hoje, a Crise de 1929 colocou em xeque o modelo liberal perseguido até então. O modelo liberal e a crença do autoajuste econômico já vinham sendo contestados décadas antes de 1929. Hunt (2005) comenta que cada vez mais empresas e grandes corporações recorriam ao Estado com intuito de tentar frear as consequências maléfi- cas da “anarquia do mercado” e da concorrência desenfreada. Contudo, a situação ficou mais grave no episódio conhecido como “quinta-feira negra”: [...] a Bolsa de Valores de Nova York teve uma queda brusca nas cotações dos títulos, fenômeno que acabou destruindo toda a confiança na economia. Com isso, os empresários reduziram a produção e os investimentos, o que causou a diminuição da renda nacional e do número de empregos, diminuindo mais ainda a confiança na economia. Antes de encerrado o processo, milhares de empresas tinham ido à falência, milhões de pessoas tinham ficado sem empre- go e tinha início uma das maiores catástrofes da História dos Estados Unidos (HUNT, 2005, p. 383). Hobsbawn (2008) afirma que a consequência básica da Depressão foi o desemprego em escala inimaginável e sem precedentes, e por um tempo que as economias não haviam experimentado até então. No pior período da Depressão, 22% a 23% da força de trabalho britânica e belga, 24% da sueca, 27% da americana, 29% da austríaca, 31% da norueguesa, 32% da dinamarquesa e nada menos que 44% da alemã não tinha emprego, segundo Hobsbawn (2008). 1.2 A VIRADA MACROECONÔMICA: A REVOLUÇÃO KEYNESIANA Como já discutido anteriormente, a concepção de que a economia atingiria por si só o equilíbrio foi muito contestada pelos efeitos decorrentes da Crise de 1929. Para os adeptos liberais, a economia estava apenas em desequilíbrio, ou seja, o de- semprego era apenas tido como temporário, e, no longo prazo, pelas forças próprias do mercado, a economia atingiria novamente seu bem-estar e pleno emprego (ou seja, todas as pessoas que desejariam trabalhar estariam empregadas). Keynes (1996) iria contrapor fortemente a noção defendida pelos liberais de que o mer- cado se autoajustava. Para ele, a economia não tende automaticamente ao equilíbrio e precisa que um agente (no caso, o Estado) promova ações e políticas que façam com que a economia atinja o pleno emprego novamente. “A longo prazo, estaremos todos mortos”: esta frase é atribuída a John Maynard Keynes (1883 — 1946), que revolucio- naria consideravelmente o que se esperava do movimento econômico até então. Ele inverte uma ideia defendida pelos liberais, conhecida como Lei de Say, na qual a oferta cria sua própria demanda. Para os liberais, ao ofertar determinado produto ou 67 3 Economia e mercado serviço, acreditava-se que a produção de mercadorias geraria demanda suficiente para outras mercadorias, criando assim um círculo virtuoso. A ideia de Say era mais ou menos essa: um investidor, ao decidir construir uma nova fábrica, demanda (precisa) contratar novos trabalhadores, comprar matéria-prima de seus fornecedores, pagar impostos de sua produção etc. A renda gerada por essa nova atividade econômica (o salário dos trabalhadores, renda dos fornecedores etc.) seria o suficiente para criar demanda em outros setores econômicos, que, no final, geraria renda para consumir/demandar os produtos da própria nova fábrica. Contudo, Keynes (1996) analisa que a Lei de Say não previa crises de superprodução ou baixa expectativa do produtor em tempos de crise, isto é, a preferência do produtor/ empresário em reter seu capital (em moeda) por acreditar que no período seguinte a economia não cresceria ou entraria na recessão – o que o próprio Keynes (1996) deno- minou como “preferência pela liquidez”. Sendo assim, Keynes (1996) inverte a Ley de Say: não é a oferta que cria sua própria demanda, mas sim a demanda que cria sua oferta: isto é, o produtor (empresário), ao analisar e perceber que existe demanda (aumento de vendas) para seus produtos e serviços, decide realizar novos investimentos, que, por conseguinte, vão demandar a contratação de novos trabalhadores, bem como a compra de mais matérias-primas, criando assim um círculo virtuoso. Figura 01. Círculo Virtuoso de Keynes: a demanda cria sua própria oferta Criação da nova demanda Contratação de trabalhadores, fornecedores etc. Aumento da renda em circulação Surgimento de novos investimen- tos para atender a nova demanda A obra de Keynes, ou Revolução Keynesiana como alguns concebem, vai dar um rumo totalmente novo ao manejo econômico: agora cabe ao Estado, ao agente governamental, Fonte: Elaborado pelo autor (2017). 68 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana ser indutor e promotor da demanda agregada, e, consequentemente, da retomada do crescimento econômico. Ao promover o gasto, principalmente o investimento, o agente Estado dá um novo im- pulso à atividade econômica, que faz com que o agente produtor, prevendo aumento da demanda para seus produtos, realize novos investimentos na economia, que, por fim, aumenta a geração de novos postos de trabalho, alcançando novamente o ponto de pleno emprego. Por ora, é necessário deixar bem claro para você que a ideia econômica mudou e muito: a liberdade, a não interferência do Estado pela economia, inverte-se, e o Estado de apenas coadjuvante passa a ter um papel muito importante na promoção do emprego e do desenvolvimento econômico. Os déficits governamentais (istoé, os gastos do governo) passam a ser justificáveis para tirar a economia da crise econômica. Prova disso, foi o que os Estados Unidos fizeram para tirar o país da Crise de 1929, que ficou conhecido como New Deal (Novo Acordo, tradução literal). E por falar em gasto, Keynes (1996) não se limita a qualquer tipo de gasto, mas dá ên- fase a um tipo de gasto especial já mencionado anteriormente: o investimento. Para ele, é o nível de investimento da economia que vai determinar o seu volume de emprego. O trabalhador contratado para construir novas fábricas, casas, prédios, pontes, obras diversas de infraestrutura, vai destinar parte de sua nova renda pessoal para consumir produtos produzidos por fábricas já instaladas e comercializadas por lojas já existentes e em funcionamento. Assim, formará um círculo virtuoso do crescimento econômico, gerando novos postos de trabalho. O New Deal, colocado em prática pelo presidente americano Franklin Roosevelt (1882 — 1945) e influenciado pelas ideias de Keynes, tinha como suas principais medidas: ` Desvalorização do dólar para tornar as exportações mais competitivas; ` Empréstimos aos bancos para evitar falências no sistema financeiro; ` Criação do sistema de seguridade social, com destaque para o seguro desempre- go e a Lei De Seguridade de 1935; ` Direito de organização sindical; ` Estímulo à produção agrícola; ` Construção de uma grande quantidade de obras públicas, com destaque às hi- drelétricas e rodovias. Com essas medidas, o New Deal tinha como principal objetivo o fomento da demanda agregada americana e, por consequência, elevação na geração de novos postos de trabalhos, o que de fato aconteceu muito bem. 69 3 Economia e mercado O New Deal teve muito sucesso e efetividade em suas políticas e ações, revigorando novamente o capitalismo americano, e levando a produção e alguns indicadores econô- micos americanos a pontos anteriores aos da crise de 1929. O sucesso da medida foi tão grande que o New Deal inspirou outros Estados e Go- vernos a realizarem medidas semelhantes, o que ficou conhecida posteriormente à II Guerra Mundial como Welfare State que, em suma, são políticas de bem-estar social que proporcionaram o boom econômico do pós-guerra. O Estado garantia uma distribuição menos desigual de renda e criava infraestruturas necessárias a uma vida digna para a maioria da população, investindo em saúde, edu- cação e transporte. Este Estado do Bem-estar Social (ou Welfare State) liderou as políticas econômicas até meados da década de 1970, quando foi contestado por uma nova onda liberal, que ficou conhecida como neoliberalismo. A Macroeconomia – Objetivos e metas Com a inversão da Teoria Liberal, a necessidade de haver estímulos para que a eco- nomia atinja novamente o pleno emprego, bem como o Estado tendo um papel de suma importância, analisar a economia apenas pela visão microeconômica não é mais suficiente. Segundo Vasconcellos (2011), a macroeconomia trata da economia “como um todo”, isto é, dos grandes agregados econômicos, tais como PIB, emprego, inflação, taxa de juros, balança comercial, dentre outros. Segundo o mesmo autor, são metas de política macroeconômica: ` Alto nível de emprego; ` Estabilidade de preços; ` Distribuição de renda socialmente justa; ` Crescimento econômico. Vou fazer a seguinte analogia para você entender melhor essas metas da política ma- croeconômica: você já precisou de comparecer a um pronto socorro porque você ou seu acompanhante não estava se sentindo muito bem? O que a equipe médica fez de imediato? No momento do atendimento, a equipe come- çou a verificar alguns indicadores de seu corpo, tais como temperatura, pressão arterial, Para Sandroni (1999, p 160), é a “[...] quantidade de bens ou serviços que a totalidade dos consumidores deseja e está disposta a adquirir em determinado período de tempo e por determinado preço. [...] É a soma das despesas das famílias, do governo e os investimentos das empresas, consistindo na medida da demanda total de bens e serviços numa economia”. 70 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana assim como escutou os pulmões, dentre outros exames, com intuito de tirar a melhor conclusão sobre o diagnóstico do paciente, visando o melhor tratamento a ser seguido para corrigir o problema verificado. A mesma coisa acontece na economia: a equipe econômica do governo deve estar atenta para verificar se os indicadores acima descritos estão funcionando bem e se a economia está no caminho certo. Verificar se a economia está no pleno emprego ou próxima a ele é de suma importância, pois a população precisa ter acesso ao trabalho e aumentar sua renda, para garantir, acima de tudo, a subsistência de suas famílias. Já o nível dos preços precisa ser controlado com intuito de evitar a inflação, o que nada mais é do que o aumento generalizado dos preços. A inflação é nociva ao ambiente econômico, pois acarreta distorções principalmente sobre a distribuição de renda, as expectativas empresariais, mercado de capitais e sobre o balanço de pagamentos, den- tre outros. No decorrer da nossa disciplina, voltaremos a discutir com mais propriedade os efeitos da inflação e seus desdobramentos. Por fim, é necessária a manutenção do crescimento da economia e de sua distribuição equitativa, isto é, da distribuição de renda socialmente justa. O Brasil é um caso específi- co e bem peculiar: foi um dos países que mais viu seu Produto Interno Bruto (PIB) crescer no século XX, contudo, desenvolveu uma sociedade com alta concentração de renda e socialmente muito injusta: não adianta apenas crescer, é necessário haver políticas que promovam uma distribuição de renda justa, promovendo assim condições para o surgi- mento de uma sociedade mais desenvolvida no sentido mais lato de sua palavra. Os instrumentos macroeconômicos Voltando à analogia que fizemos acerca da ida ao pronto socorro, após a equipe médica diagnosticar o paciente, ela começa a medicá-lo, visando a correção dos indicadores examinados quando o paciente deu entrada no pronto socorro. A macroeconomia também tem à sua disposição remédios, ou seja, instrumentos ma- croeconômicos que podem ser utilizados visando o aumento do número de empregos, ou então, a estabilidades dos preços, por exemplo. Entre os instrumentos macroeconômicos, destacamos: A Política Fiscal; A Política Monetária; A Política Cambial e Comercial; A Política de Rendas (controle de preços e salários). 71 3 Economia e mercado A Política Fiscal Definindo de forma resumida, a Política Fiscal trata dos mecanismos dos quais o gover- no possui para arrecadar tributos (Política Tributária) e controlar suas despesas (Políti- ca de Gastos). As autoridades se utilizam da Política Fiscal para remediar problemas macroeconômicos, como o desemprego e a inflação. Caso o governo decida aumentar o nível de emprego, pode optar a aumentar seus gastos, o que gerará um aumento na demanda agregada da economia e, por consequência, gerará novos postos de trabalho, por exemplo. Já se o problema é aumento da inflação, decorrente do aumento da demanda, o go- verno pode reduzir seus gastos ou aumentar os seus impostos, o que ocasionará uma diminuição na renda disponível para consumo, e assim, os preços sofrerão menos pres- são inflacionária. São exemplos de Política Fiscal: de automóveis, visando aumento de suas vendas. Diminuição do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI): redução de impostos incidentes sobre a folha, diminuindo o custo na contratação de funcionários, estimulando assim novas contratações. Desoneração da Folha de Pagamento: projeto do governo na realização de obras de infraestrutura (política de gastos), o que acarretará no aumento da demanda agregada da economia. Programa de Aceleração do Crescimento (PAC): Política Monetária A Política Monetária trata das decisões do governo sobre a quantidade de moeda, de crédito e das taxas de juros. Os instrumentos disponíveispara tal são: ` Emissões (impressão) de moeda; ` Reservas Compulsórias (percentual sobre os depósitos que os bancos comerciais devem reter junto ao Banco Central); ` Open Market (compra e venda de títulos públicos); ` Redescontos (empréstimos do Banco Central aos bancos comerciais); ` Regulamentação sobre crédito e taxa de juros. Vale ressaltar aqui o peso maior que Keynes deu à moeda. Antes de Keynes, para os liberais, a moeda servia apenas de “meio de troca”. Para Keynes, a moeda além de ser 72 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana utilizada como meio de troca, serve também como unidade de conta e reserva de valor, sua característica mais importante. Sendo assim, a Política Monetária pode ser utilizada para elevação do produto e redu- ção do desemprego, por exemplo. No decorrer de nossa disciplina, iremos analisar com mais detalhe as caraterísticas da Política Monetária. Por ora, cabe a você ter a noção que tanto a Política Monetária quanto a Fiscal são ins- trumentos importantes e que podem e devem ser utilizadas pelas autoridades visando alcançar as metas da política macroeconômica. Segundo Vasconcellos (2011), a Política Fiscal consegue atuar na distribuição de renda de maneira mais eficaz do que a Monetária. Contudo, esta tem ação mais imediata que a outra, uma vez que a Política Monetária depende apenas de uma simples autorização das autoridades monetárias. Uma vantagem frequentemente apontada da política monetária sobre a fiscal é que a primeira tem efeitos imediatos, dado que depende apenas de decisões diretas das autoridades monetárias, enquanto a implementação de políticas fiscais depende de votação do Congresso, o que aumenta a defasagem entre a tomada de decisão e a implementação das medidas fiscais. Ademais, as políticas fiscais só podem ser efetivadas no próximo exercício fiscal (ou seja, no ano seguinte a sua aprovação legal), conforme o chamado princípio da an- terioridade ou anualidade (VASCONCELLOS, 2011, p. 194). Alguns exemplos de Política Monetária: Aumento da taxa básica de juros, visando o controle do nível de preços; Diminuição da taxa de juros, visando o aumento do investimento no lado real da economia e, por consequência, gerando novos empregos; Aumento na taxa de redesconto, visando diminuir o nível de preços. Política Cambial e Comercial As políticas cambial e comercial tratam da relação da economia doméstica e do setor externo da economia. A Política Cambial se refere ao câmbio, ao controle das autorida- des em relação à moeda estrangeira (câmbio flutuante, fixo etc.). Já a política comercial analisa as políticas de incentivo à exportação de produtos na- cionais, bem como a fixação de limites em relação a remessas de lucros ao exterior, Balança Comercial, desestímulo das importações, dentre outros. Tipos de Câmbio: o Governo estabelece um valor fixo para a conversão da moeda nacional pela estran- geira. Ex.: US$ 1,00 = R$ 1,00. Câmbio fixo: 73 3 Economia e mercado Política de Rendas Ao lado dos outros instrumentos macroeconômicos, a Política de Rendas visa a redis- tribuição de renda e justiça social. A Política de Rendas tem como objetivo ainda de controlar a remuneração dos fatores de produção, tais como salários, depreciações, lucros, dividendos e preços dos produtos intermediários e finais. A característica especial é a de que, nesses controles, os agentes econômicos ficam proibidos de fixar seus preços e tomar decisões produtivas, levando em consideração apenas as influências econômicas normais do mercado. Exemplo de Política de Rendas: o Governo garante ao produtor uma remuneração mínima de sua produção agrícola, visando o fornecimento de alimentos, bem como a fixação do agricultor no campo. o preço da moeda estrangeira é negociado livremente e seu preço é estabelecido por meio das forças do mercado (oferta versus demanda). Preços mínimos: Câmbio flutuante: Neste tópico, você foi apresentado ao panorama histórico e social que permitiu o sur- gimento da macroeconomia, assim como aos principais instrumentos e objetivos dela. A macroeconomia é o resultado da confrontação das ideias liberais, as quais previam que o mercado tenderia por si só ao equilíbrio e que o Estado apenas existiria no mí- nimo possível. Keynes confronta essas ideias e dá um novo significado ao papel do Estado: de apenas coadjuvante, passa a ter papel principal para retomada da demanda agregada e, por conseguinte, do crescimento econômico e Pleno Emprego. Daremos seguimento ao nosso estudo com o tópico Contabilidade Social. 2. CONTABILIDADE SOCIAL Para que a economia consiga atingir seus macro-objetivos, como discutido anterior- mente, você precisa aprender a avaliar, isto é, identificar quais os instrumentos e aná- lises existentes para verificar se uma economia está com bom nível de crescimento econômico, inflação controlada, gerando empregos, dentre outros. Quem pode nos auxiliar nesta tarefa é a Contabilidade Social. Segundo Paulani (2013, p. 1), a Contabilidade Social: [...] congrega instrumentos de mensuração capazes de aferir o movimento da economia de um país num determinado período de tempo: quanto se produziu, quanto se consumiu, quanto se investiu, quanto se vendeu para o exterior, quanto se comprou do exterior. 74 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana Os instrumentos e análises são muitos e os conceitos os mais diversos e distintos possí- veis: tudo depende da “pergunta”, ou melhor, da análise que você quer fazer da economia. Assim como o médico solicita exames de imagens ou laboratoriais para dar o melhor diagnóstico ao seu paciente, a macroeconomia nos disponibiliza uma infindável lista de relatórios, abordagens e análises dos agregados econômicos e de seus movimentos, com o intuito de analisar o movimento econômico da melhor maneira e alcançar o diag- nóstico mais adequado para o problema econômico a ser estudado e analisado. Lembre-se: a macroeconomia tem como objetivo analisar as variáveis macroscópicas, sempre analisando os denominados agregados econômicos, tais como o consumo agregado, o investimento agregado, o produto nacional e a renda nacional, dentre outros. 2.1 A CRIAÇÃO DO PRODUTO – O QUE É PRODUZIDO TOTALMENTE PELA ECONOMIA Como bem demonstra Paulani (2013), a partir do final do século XVIII, questões acerca do crescimento econômico e da repartição do produto social começaram a ser discuti- das, tanto pela produção acadêmica do período como pela sociedade em geral. Afinal, em tese, a economia deveria atingir o bem-estar da sociedade, isto é, promover o de- senvolvimento econômico e social de toda a população. Diante dos questionamentos sobre a economia e sua relação com a sociedade, foi constatada a necessidade de haver formas e metodologias que permitissem o cálculo do produto produzido, assim como se fizesse a previsão se tal riqueza estava sendo apropriada por toda a população. De acordo com Vasconcellos (2011), é a partir de um sistema contábil que o país mede tudo o que foi produzido em determinado período de tempo, muito parecido com o total produzido por uma empresa, por exemplo. O nome dado para esta medida é Produto Nacional Bruto (PNB), que, ainda segundo Vasconcellos (2011), é o agregado de tudo que é produzido em determinado país em um período de tempo. O Produto Nacional Bruto (PNB), assim como os outros agregados macroeconômicos mensurados economicamente, é registrado através do princípio contábil também utiliza- do pelas empresas privadas, conhecido como Método das Partidas Dobradas, isto é, em cada lançamento contábil, o valor total lançado nas contas a débito deve ser sempre igual ao total do valor lançado nas contas a crédito. A produção econômica é bem complexa: uma economia produz uma série de produtos e serviços muito distintos entre si (desde a produção de um grão agrícola até a produ- ção de um sofisticado satélite espacial, por exemplo) e todos estes produtos e serviços devem ser devidamentecontabilizados para que a economia consiga, com a melhor precisão possível, saber quanto ela produz em um determinado período. 75 3 Economia e mercado No Brasil, para que a contabilização de todo o produto produzido seja registrada da melhor maneira, existe o que denominamos de Sistema de Contas Nacionais, gerido e mensurado pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Vasconcellos (2011) analisa que os produtos e serviços gerados por uma economia são produzidos através de um fluxo contínuo que se estabelece entre os chamados agentes econômicos (governo, famílias e empresas). Um ponto muito bem assinalado por Paulani (2013) diz respeito ao papel da moeda: através de uma economia monetizada, conseguimos equiparar os mais distintos e com- plexos produtos produzidos por uma economia em determinado período de tempo. A moeda, segundo Paulani (2013), consegue avaliar e equiparar tudo o que é produzido na economia. Afinal, seja um serviço simples de capinação ou um conserto de uma son- da petrolífera a milhares de metros na profundeza do oceano, tudo deve ser mensurado monetariamente, isto é, ter o valor em dinheiro determinado. Diante desta característica das economias monetizadas, onde tudo pode ser avaliado através da moeda e do dinheiro, temos um importante princípio: o da identidade. Ou seja, toda vez que você sai para comprar um produto num shopping ou mercado próximo de sua residência, automaticamente, alguém tem que estar vendendo este pro- duto. Ou seja, muito simplificadamente, podemos conceber que uma compra = venda. Apesar desta ideia ser simples e muito intuitiva, Paulani (2013) afirma que este mesmo princípio, o da identidade, é o que o Sistema de Contas Nacionais leva em consideração no momento da mensuração do PNB, por exemplo. Sendo assim, da mesma maneira que você não pode comprar algum produto que não esteja à venda, a economia não pode produzir um produto que não gere um dispêndio, uma despesa, assim como não gere automaticamente uma renda. PRODUTO ≡ DESPESA ≡ RENDA Quando se analisa os agregados econômicos, a noção é a mesma: é natural esperar que a efetivação de um investimento seja decorrente da criação de uma poupança a priori, e que uma poupança gere um investimento, por exemplo. Agregados econômicos: Termo empregado para designar os resultados da mensuração da atividade econômica considerada como um todo. A referência básica é a soma de todas as transações, realizadas por todos os agentes, na totalidade dos mercados. É a dimensão total, o todo, não as partes isoladamente consideradas. Ex.: PIB, renda nacional, inflação, dentre outros. Nota-se que o princípio da identidade não é identificado pelo sinal de =, mas sim pelo ≡. A identidade, como bem aponta Paulani (2013), não gera uma noção de causa ou efeito, mas apenas uma existência de identidade. Contudo, é a partir da identidade produto ≡ despesa ≡ renda que se deriva a ideia intuitiva de Fluxo Circular da Renda. 76 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana 2.2 ÓTICA DE PRODUTO, RENDA E DESPESA Devido ao princípio de identidade entre produto ≡ despesa ≡ renda, é possível analisar a produção de uma economia de três maneiras distintas, procurando entender, em cada uma delas, como cada variável contribuiu para o desenvolvimento e formação de todo o produto produzido no interior da economia: indica quanto cada setor ou etapa produtiva adicionou de valor ao produto; ótima maneira para identificar qual setor econômico (primário, secundário ou terciário, por exemplo) adicionou na etapa produtiva de um produto, ou o PIB inteiro de uma eco- nomia em determinado período, por exemplo. Ótica do Produto: indica como está sendo distribuída a renda através de salários, ou então, remunera- ção de capital, por exemplo. Excelente para analisar quais fatores de produção que se apropriaram do que foi produzido na economia naquele período e verificar como a renda de uma economia foi distribuída. Ótica da Renda: mostra a soma dos valores de todos os bens e serviços que foram produzidos em um determinado período e a maneira pela qual foram consumidos. Através dessa ótica, podemos analisar, por exemplo, quanto a economia investiu e quanto o Governo consumiu em determinado período. Ótica do Dispêndio ou da Despesa: Ficou um pouco confuso? Vamos discutir mais amplamente as três maneiras de se ana- lisar a produção de uma economia. Para entendermos melhor como podemos analisar a produção econômica de três maneiras distintas, vamos imaginar que exista um país hipotético, o País A, com apenas três setores econômicos (primário, secundário e terci- ário), que não estabeleça nenhuma relação com o mercado exterior, e que cada setor possua apenas uma empresa. Imagine que você queira analisar quanto o setor primário deste país produziu em de- terminando período, ou então, quer entender como se comportou o investimento da economia do País A no ano 01, na tentativa de analisar a expectativa do empresariado para o médio e longo prazo, por exemplo. Figura 02. Produto do País A no ano 01 SETOR ECONÔMICO VALOR BRUTO DA PRODUÇÃO VALOR ADICIONADO NA ETAPA PRODUTIVA Setor Primário – Produção de Cacau 100,00 100,00 Setor Secundário – Fábrica de Chocolate 150,00 50,00 Setor Terciário – Loja de Chocolate 200,00 50,00 77 3 Economia e mercado SETOR ECONÔMICO VALOR BRUTO DA PRODUÇÃO VALOR ADICIONADO NA ETAPA PRODUTIVA Total do Produto 200,00 200,00 Fonte: Elaborado pelo autor (2016). Observe a TAB. 1 nesta economia, o setor primário produz cacau, e todo ele é vendido para o setor secundário que fabrica o chocolate, que, por fim, vende ao setor terciário, que o comercializa. A maneira mais fácil e prática de verificar quanto foi produzido por esta economia é ve- rificar o produto final (a venda do chocolate), no caso da economia do país no ano 01, foi de $ 200,00. Sendo assim, se o desejo é perguntar quanto a economia produziu no respectivo ano (o PIB, por exemplo), devemos responder, portanto, $ 200,00. Isso acontece devido ao fato de que, até chegar o momento de se comercializar o cho- colate, foi necessário que o setor primário produzisse o cacau e que o setor secundário fabricasse o chocolate através da matéria-prima cacau. Neste exemplo, não há sobras. Sendo assim, tudo o que foi produzido pelo setor primá- rio e secundário desta economia não existe mais, já foi consumido, uma vez que tudo foi comercializado através da loja de chocolates. Observe agora a coluna “Valor Adicionado” da TAB. 1. Ela indica quanto cada setor adi- cionou ao produto. No caso, o setor primário foi responsável por adicionar $ 100,00, o setor secundário, assim como o setor terciário, adicionou $ 50,00, atingindo um produto total nesta economia de $ 200,00. Esta maneira de olhar a produção da economia é a ótica do produto, que nos indica quanto cada setor ou etapa produtiva adicionou ao produto. Contudo, às vezes, você, como tecnólogo, pode ter mais perguntas: quanto o País A distribuiu de salários ou lucros, por exemplo? E aluguéis, será que a economia do país A pagou alguma coisa? De acordo com a disciplina Economia e Mercado, para se produzir qualquer bem na economia, é necessário remunerar os fatores de produção (terra, capital, tecnologia, lucro e trabalho). Vamos retomar ao nosso exemplo: o País A no ano 01 produziu $ 200,00. Para chegar a este valor, sabemos intuitivamente que o setor primário, para adicionar $ 100,00, precisou pagar salários para os seus trabalhadores, bem como a fábrica foi obrigada a distribuir seus lucros para os acionistas, e assim por diante. Tabela 02. Renda do País A no ano 01 FATOR DE PRODUÇÃO VALORES ($) Salários 80,00 Aluguéis 20,00 Royalties/Licenças de Uso 30,00 78 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana FATOR DE PRODUÇÃO VALORES ($) Juros 40,00 Lucros 30,00 TOTAL 200,00 Fonte: Elaborado pelo autor (2016). Conforme demonstra a TAB. 2, o País A no ano 01 pagou em salários (somando todosos setores econômicos) $ 80,00 e distribuiu de lucros $ 30,00, por exemplo. Esta maneira de se analisar o que um país produziu em um determinado período de tempo é denominada de ótica da renda. Com ela, podemos verificar como está sendo distribuída a renda através de salários, ou então, remuneração de capital, por exemplo. Por fim, temos a ótica do dispêndio ou da despesa. Neste modo de análise, podemos verificar a soma dos valores de todos os bens e serviços que foram produzidos no perí- odo e a maneira pela qual foram consumidos. Nesta forma de análise, podemos verificar o que foi consumido pelas famílias e empre- sas, ou então, o que esta economia gastou de investimento. Voltando ao nosso exemplo do país A no ano 01: levando em consideração que este país não possui relação com o mercado externo e o setor público é inexistente, observe a tabela a seguir: Tabela 03. Despesa do País A no ano 01 FATOR DE PRODUÇÃO VALORES ($) (A) Consumo Total 150,00 Famílias 50,00 Empresas 100,00 (B) Investimento Total 50,00 Formação Bruta de Capital Fixo 50,00 Formação de Estoques - TOTAL (A + B) 200,00 Fonte: Elaborada pelo autor (2016). De acordo com a TAB. 3, o País A no ano 01 consumiu (famílias + empresas) $ 150,00 e investiu $ 50,00 através da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) e não gerou ne- nhum tipo de estoque. 2.3 INVESTIMENTO E DEPRECIAÇÃO: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES Antes de continuarmos com nosso estudo sobre os agregados macroeconômicos, é necessário realizar algumas observações sobre o que a contabilidade social conceitua como investimentos, seu papel no processo produtivo, bem como a depreciação. 79 3 Economia e mercado Depreciação é “[...] a redução do valor ativo em consequência de desgaste pelo uso, obsolescência tecnológica ou queda no preço de mercado — geralmente de máquinas, equipamentos e edificações [...]” (SANDRONI, 1999, p. 165). De acordo com Paulani (2013), investimento é tudo aquilo que é produzido e não é consumido num dado período de tempo. Ou seja, tudo aquilo que a economia produziu e será, em tese, consumido no período seguinte, ou melhor dizendo, no futuro. A mesma autora define o investimento em dois tipos: produtos e bens que o consumo se dará no tempo seguinte, futuro, de uma única vez. Variação de estoques: bens que não desaparecem após o consumo realizado uma única vez (única utiliza- ção) e possibilitam a produção ao longo de um determinado período de tempo. Ex.: bens de capital em geral: máquinas, equipamentos, ferramentas etc. Formação bruta de capital fixo: Contudo, as empresas, em tese, realizam investimentos continuamente para poder manter suas produções. Realizam reposição de máquinas e equipamentos, manuten- ção de seus prédios, dentre outros. Os investimentos, bens de capital em sua maioria, são produtos que demandam uma quantia considerável (são caros na sua grande maioria) e devem ser muito bem plane- jados: não é razoável que a empresa substitua sua linha de montagem mensalmente ou destrua seus prédios civis anualmente, por exemplo. Ou seja, os bens de capital, investimentos, são consumidos no futuro e isso nos gera um problema: um automóvel, por exemplo, após 1 mês de uso, por mais que tenha sido muito pouco usado, não tem o mesmo valor de um carro novo. Por quê? Porque neste curto espaço de tempo, ele foi depreciado. A depreciação acontece em todos os setores econômicos e deve ser considerada após mensurar o total produzido naquele país em um determinado período. É necessário considerar o total que esta economia perdeu com seus bens de capital (máquinas e equipamentos). Afinal de contas, não podemos esperar que uma máquina de 5 anos de uso tenha a mesma produtividade de uma nova, ou então, que um prédio de 10 anos de construção apresente o mesmo custo de manutenção que um recém edificado. Deste modo, obtemos o Produto Líquido, isto é, em um determinado período, é neces- sário deduzir do Valor Bruto da Produção a parcela destinada à reposição dos bens de capital desgastados no respectivo período. 80 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana Voltemos ao nosso exemplo hipotético: a economia do País A no ano 01 produziu um PIB de $ 200,00. Imagine que a mesma economia apresentou as seguintes deprecia- ções por setor: Tabela 04. Depreciação do País A no ano 01 SETOR ECONÔMICO VALOR BRUTO PRODUÇÃO (VBP) $ DEPRECIAÇÃO Setor Primário – Produção de Cacau 100,00 20,00 Setor Secundário – Fábrica de Chocolate 150,00 10,00 Setor Terciário – Loja de Chocolate 200,00 5,00 Total do Produto 450,00 35,00 Fonte: Elaborado pelo autor (2016). Ao deduzir a depreciação acumulada no ano 01 de $ 35,00 com o total de depreciação registrada no período, obtemos o Produto Líquido, isto é, o total que aquela economia produziu num determinado período de tempo, já deduzindo o total de máquinas e equi- pamentos (bens de capital) que foram substituídos no respectivo período. Produto Líquido = Produto - Depreciação 2.4 IDENTIDADE CONTÁBIL: POUPANÇA ≡ INVESTIMENTO Você pode estar se perguntando: se o princípio das partidas dobradas sugere que para comprar é necessário haver alguém que queira vender, como fica a questão do investimento? Vamos lá: como você viu anteriormente, investimento é concebido por tudo aquilo que produzimos e não foi consumido num determinado período de tempo. Ou seja, o Inves- timento Total realizado em um país em determinado período, por exemplo. INVESTIMENTO (I) = Produto Nacional (PN) - Consumo (C) Já a Poupança, segundo Sandroni (1999, p. 485), é “[...] parte da renda nacional ou individual que não é utilizada em despesas [...]”. Ou seja: POUPANÇA (S) = Renda Nacional (RN) - Consumo (C) Como já vimos, o total produzido pela economia pode ser analisado pela ótica do pro- duto, renda e despesa (produto ≡ despesa ≡ renda), temos que Renda Nacional = Produto Nacional. Logo: PN – C = RN – C PN = RN 81 3 Economia e mercado Sendo assim, temos: INVESTIMENTO = POUPANÇA Contudo, Vasconcellos (2011) alerta que esta ideia de Investimento = Poupança é uma notação apenas contábil. O autor comenta que o investimento de uma economia pode ser financiado por poupanças passadas, empréstimos exteriores etc., assim como a pou- pança do período pode ficar depositada no banco, sem ser necessariamente investida. 2.5 O SETOR PÚBLICO E SEUS AGREGADOS O Setor Público é essencial para manutenção da ordem e do desenvolvimento social. Disponibiliza para seus cidadãos serviços públicos, como educação, saúde e cultura, segurança, manutenção dos bens públicos, dentre outros. O Setor Público também é o que detém o maior número de funcionários (servidores pú- blicos), realiza os maiores investimentos (construção de estradas, portos, metrô, esco- las, dentre outros) e sua despesa (consumo) é muito relevante para o desenvolvimento e desempenho de toda economia. Neste momento de nossa disciplina, não vamos analisar se o Governo gasta muito ou não, esta análise será feita posteriormente, por ora, vamos analisar como devemos mensurar na Contabilidade Social e entender seus principais indicadores (agregados). Segundo Vasconcellos (2011), devemos analisar o Governo através de suas Re- ceitas e Despesas. Vejamos: Receitas Públicas: obtidas através da cobrança de impostos, contribuições, taxas, dentre outros. Visa financiar as despesas públicas. Gastos do Governo: despesa para manutenção dos custeios dos órgãos públicos (despesa com salário de professores, manutenção de hospitais, dentre outros), despe- sa das empresas públicas ou de economia mista (Petrobras, Eletrobras, por exemplo) e gasto com transferências e subsídios (bolsas de estudo, Bolsa Família etc.). Pela ótica da despesa, inserindo agora o Setor Público, podemos mensurar o produto de toda a economia por meio da seguinte equação: Y = P = C + I + G + XL Onde: Y = Renda P = Produto C = Consumo das famílias e empresas I = Investimento 82 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana G =Gastos do Governo XL = Exportações líquidas (exportações - importações) 2.6 AGREGADOS DO SETOR PÚBLICO O Setor Público possui alguns agregados (indicadores) que devem ser considerados quando analisamos seu papel em determinada economia (responder como o setor pú- blico se comporta em certo país, por exemplo). Não vamos, neste momento, analisar profundamente estes indicadores: você deve ape- nas entender tais conceitos e reflexos na sua vida profissional e particular. Conforme anteriormente dito, o Governo, para financiar seus gastos, bem como conce- der subsídios e transferências, lança mão dos tributos. Sendo assim, temos o que de- nominamos de Renda Pessoal Disponível (RPD), isto é, de acordo com Vasconcellos (2011), mensurar o quanto do produto e renda produzido e gerado por um país fica em poder das famílias. Este conceito é importante porque mede quanto fica disponível para as famílias con- sumirem: quanto maior os impostos e taxas cobrados pelo Governo, menos recursos ficam disponíveis para consumir e vice-versa. Este conceito fica fácil de entender quando recebemos nosso salário: o holerite, do- cumento que registra o salário bruto com os respectivos descontos, traz relacionados, além de quanto você ganha, os descontos referentes às contribuições previdenciárias (INSS) e ao Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). Quando é o caso, o holerite mos- tra também outras contribuições confederativas e descontos diversos de sua empresa (vale transporte, ticket refeição, dentre outros). Após contabilizar todos os descontos, chega-se ao salário líquido, isto é, quanto de fato é depositado em sua conta salário, que você usará para comprar as mercadorias de sua necessidade e pagar suas contas, dentre outros usos de sua escolha. Agora imagine que o Governo decida acabar com o IRPF. O que vai acontecer com seu salário líquido? Vai aumentar! E por quê? Porque não vai ser mais descontada a parcela correspondente a este imposto, permitindo assim que seu salário líquido fique maior. O recurso que serviria para pagar imposto poderia ser utilizado para consumo, ou seja, haveria mais dinheiro na sua conta, aumentando assim sua RPD. É assim que funciona na economia: quanto menos impostos, mais renda ficará dis- ponível para consumo. E o contrário também é verdade: quanto mais impostos são cobrados, menos recursos as famílias terão para consumir. Lembre-se que a RPD leva em consideração também os subsídios e transferências de renda destinadas às famílias (bolsas de estudos e programas sociais, como o Bolsa Família, por exemplo). Outro indicador importante é a Carga Tributária Líquida (CTL), que mede o peso dos tribu- tos descontado dos subsídios e transferências governamentais realizadas ao setor privado. 83 3 Economia e mercado 2.7 O SETOR EXTERNO Dificilmente, um país produz tudo o que precisa: sempre há a necessidade de se impor- tar algum insumo para produção interna (petróleo, fertilizantes etc.) e também máquinas e equipamentos para aumento de sua capacidade produtiva, por exemplo. Além da necessidade de importar, os países também exportam, isto é, vendem suas mercadorias para outras economias externas, sendo o mercado externo uma grande fonte de receitas e lucros, gerando emprego e renda. Sendo assim, a demanda e a oferta de uma economia não se resumem apenas ao mer- cado interno (doméstico), mas também ao externo: as relações econômicas cada vez mais estão voltadas ao movimento do capital externo, além das fronteiras nacionais, o que obriga que cada vez mais as economias se voltem ao mercado exterior. Por ora, não vamos entrar em detalhes sobre o papel do Setor Externo para o desenvolvi- mento econômico, mas entender como o país registra suas relações com o resto do mundo. O mais importante instrumento que realiza o registro entre as relações econômicas in- ternacionais é o Balanço de Pagamentos (BP). Segundo Paulani (2013, p. 173): No balanço de pagamentos são registradas todas as transações econômicas que o país realiza com o resto do mundo, em um determinado período de tempo, permitindo avaliar sua situação econômica em relação às transações internacio- nais. [...] Podemos avaliar quantitativamente, ou qualitativamente, as diversas transações que o país mantém com outros países, como a compra ou venda de mercadorias, a remessa de lucros para o exterior por parte de empresas estran- geiras instaladas no país, a atividade de turismo, os empréstimos internacionais, os fluxos financeiros e os movimentos de capitais especulativos dentre outros. Tabela 05. Estrutura balanço de pagamentos A. BALANÇA COMERCIAL ` Importações FOB (free on board) (débito); ` Exportações FOB (crédito). B. BALANÇO DE SERVIÇOS E RENDAS (SALDOS DE CONTAS: PODEM APRESENTAR TANTO DÉBITOS COMO CRÉDITOS) ` Viagens internacionais (turismo, negócios); ` Transportes (fretes); ` Seguros; ` Juros; ` Lucros e dividendos (inclusive lucros reinvestidos pelas multinacionais instaladas no país); ` Royalties e licenças; ` Serviços governamentais (embaixadas, consulados, representações no exterior); ` Outros serviços. 84 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana C. TRANSFERÊNCIAS UNILATERAIS CORRENTES D. BALANÇO DE TRANSAÇÕES CORRENTES (OU SALDO EM CONTA CORRENTE DO BALANÇO DE PAGAMENTOS) (RESULTADO LÍQUIDO DE A + B + C) E.CONTA CAPITAL E FINANCEIRA ` Investimento direto líquido (instalação e participação no capital de firmas estrangeiras no país); ` Reinvestimentos (reinvestimentos de uma firma estrangeira já instalada no país); ` Financiamentos (financiamentos de bancos oficiais, como o Banco Mundial, para promover o cres- cimento); ` Empréstimos (para promover o comércio exterior); ` Amortizações de empréstimos e financiamentos; ` Empréstimos de Regularização do FMI (para resolver problemas de liquidez); ` Capitais de curto prazo (aplicações no mercado financeiro); F. ERROS E OMISSÕES G. SALDO DO BALANÇO DE PAGAMENTOS (RESULTADO LÍQUIDO DE D + E + F) Fonte: Elaborado pelo autor (2016). Todo registro realizado no BP é em dólar americano (US$), por ser a moeda estrangeira mais utilizada e aceita como meio de pagamento em todo o mundo. Conforme demonstra o TAB. 5, a estrutura do BP possui as seguintes contas: Conta Corrente, Capital e Financeira. registra toda transação comercial de bens e serviços, os pagamentos e os recebi- mentos de rendas de capital e trabalho e transferências unilaterais entre os países e o resto do mundo. Conta corrente: registra as transferências de ativos reais e ativos financeiros ou ativos intangíveis; traz o registro dos fluxos de capitais entre o país e o resto do mundo. Conta capital e financeira: conta que traz os ajustes contábeis em relação a erros e omissões. A conta corrente possui basicamente 4 subcontas: Omissões e erros: 85 3 Economia e mercado Balança comercial: mensura a compra de mercadorias (importações – débito) e a venda de mercadorias (exportações – crédito). Não leva em conta o valor dos fretes e seguros. As mercadorias são registradas em FOB – Free on Board. Balanço de serviços e rendas: registra toda compra e venda de serviços entre o país e o resto do mundo. Transferências unilaterais correntes: registram as doações interpaíses. Balanço das transações correntes: corresponde ao saldo líquido entre os grupos 1 + 2 + 3. Se positivo, indica que enviamos mais bens e serviços para o exterior, do que recebemos. Se o resultado for negativo, demonstra que o país aumentou seu endividamento externo, em termos financeiros, decorrente da aquisição de bens e serviços oriundos do exterior. Segundo Paulani (2013), a conta corrente possibilita importantes análises econômicas para a economia de um país. Por exemplo, se o país envia mais recursos do que recebe, estes relacionados com as transações das quatro contas da conta corrente, temos um déficit em transações correntes. Evidentemente, o contrário representa um superávit. Já conta capital e financeira mensura todomovimento capital e financeiro entre a eco- nomia e o resto do mundo, tais como aquisição de empréstimos, financiamentos, inves- timento direto externo, dentre outros. Ficou um pouco confuso? O BP é um tanto complexo, mas, por ora, cabe a você en- tender o que ele representa. Caso o saldo do BP seja negativo, isso indica que o país naquele período perdeu divisas (moeda estrangeira). O contrário também é verdade: caso o país apresente saldo positivo no BP, significa que o país recebeu mais divisas que enviou ao exterior. CONCLUSÃO Nesta Unidade, você foi apresentado ao panorama histórico e social que permitiu o sur- gimento da macroeconomia, assim como aos principais instrumentos e objetivos dela. A macroeconomia é o resultado da confrontação das ideias liberais, as quais previam que o mercado tenderia por si só ao equilíbrio e que o Estado apenas existiria no mí- nimo possível. Keynes confronta essas ideias e dá um novo significado ao papel do Estado: de apenas coadjuvante, passa a ter papel principal para retomada da demanda agregada e, por conseguinte, do crescimento econômico e Pleno Emprego. Na Unidade discutimos ainda a importância de se mensurar o produto total da econo- mia, como também os conceitos macroeconômicos importantes, tais como investimento e depreciação, renda disponível, dentre outros. Analisamos como se mensura as rela- ções econômicas entre um país e o resto do mundo. 86 3 A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. HOBSBAWN, Eric. A era dos extremos. São Pau- lo: Cia das Letras, 2008. HUNT, E. K. História do pen- samento econômico. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005. 2. KEYNES, John Maynard. A teoria geral do empre- go, do juro e da moeda. São Paulo: Nova Cultural, 1996. 3. MANKIW, N. Gregory. Macroeconomia. 8. ed. Rio de Janeiro: Grupo GEN, 2014. 4. PAULANI, Leda Maria. A nova contabilidade so- cial: uma introdução à macroeconomia. 4. ed. São Paulo: Saraiva ,2013. 5. PINHO, Diva Benevides (Org.). Manual de Eco- nomia: Equipe de professores da USP. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. 6. SANDRONI, Paulo. Novíssimo dicionário de Eco- nomia. São Paulo: Best Seller, 1999. 7. VASCONCELLOS, Marco Antonio S. Economia: micro e macro. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2011. 87 3 Economia e mercado 88 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas UNIDADE 4 MOEDA E MERCADO FINANCEIRO: INFLAÇÃO E EMPREGO, ESTADO E POLÍTICAS MACROECONÔMICAS INTRODUÇÃO A moeda faz parte de vários aspectos da sua vida: seja para adquirir uma mercadoria e serviço, medir o valor de uma apólice de seguro, ou mesmo para tentar comparar o valor de uma mercadoria em relação a outra. A moeda é uma maneira muito eficaz de se quantificar riquezas e transacionar mercadorias. Nesta Unidade, iremos estudar o que é moeda, explorar algumas de suas característi- cas importantes, assim como entender alguns aspectos básicos, mas de suma impor- tância, que regulamentam e estruturam o Mercado Monetário Brasileiro. Não só isso! Exploraremos ainda o conceito da inflação, do aumento generalizados dos preços, na economia e seu impacto no bem-estar econômico. Discutiremos seus dife- rentes tipos e causas, bem como suas particularidades e consequências. A Unidade analisa também questões acerca do mercado de trabalho, apresentando seus principais conceitos e indicadores. Por fim, a Unidade trata das políticas macro- econômicas implementadas pelo Governo, além de pensar e repensar o real papel do Poder Público na economia nos dias de hoje. O tema é vasto, mas também muito importante para você entender o ambiente e con- juntura econômica. 1. MOEDA E MERCADO FINANCEIRO A moeda faz parte de vários aspectos da sua vida: seja para adquirir uma mercadoria e serviço, medir o valor de uma apólice de seguro, ou mesmo para tentar comparar o valor de uma mercadoria em relação a outra. A moeda é uma maneira muito eficaz de se quantificar riquezas e transacionar mercadorias. Neste primeiro tópico, iremos estudar o que é moeda, explorar algumas de suas carac- terísticas importantes, assim como entender alguns aspectos básicos, mas de suma importância, que regulamentam e estruturam o Mercado Monetário Brasileiro. 1.1 A MOEDA A necessidade de se estabelecer meios mais eficientes para facilitar a troca é muito an- tiga e cada vez mais necessária entre os homens. Na Antiguidade, as diferentes socie- 89 4 Economia e mercado dades escolheram várias maneiras de estabelecer trocas entre si: há relatos que, entre 9.000 e 6.000 a.C., existiam civilizações que utilizavam ovelhas, gado e até camelos para efetivarem suas trocas. Talvez a mercadoria mais famosa utilizada para troca seja o sal: o sal marinho sempre foi muito requisitado pelas civilizações, seja pela sua característica mais geral de servir como tempero para alimentação ou pela sua propriedade de conservar alimentos. A História da Moeda - Não deixe de pesquisar sobre a história da moeda tanto no Brasil quanto no mundo! Conheça a Casa da Moeda, instituição pública responsável pela fabricação da moeda no Brasil. Com o passar do tempo, as civilizações passaram a realizar suas trocas com o que conhecemos hoje como moeda, isto é, geralmente metais (na sua grande maioria pre- ciosos), de fácil aceitação pelas sociedades em geral e de grande durabilidade. As moedas eram produzidas (cunhadas) através de metais nobres como ouro e prata e, com o passar do tempo, passaram a ser produzidas por metais de menor valor, até chegar no papel-moeda, as cédulas que conhecemos hoje, impressas pelos Bancos Centrais dos mais distintos países. Cada país e/ou sociedade possui uma moeda utilizada para efetivação das trocas. En- tretanto, seja qual for a moeda em questão, ela deve possuir as seguintes funções: Meio de troca: as moedas devem servir para facilitar as trocas no interior da sociedade. Unidade de conta: capacidade de a moeda servir para determinar o valor das mercadorias e serviços. Exemplo: quanto custa o quadro da Monalisa, de Leonardo da Vinci? E a apólice do seu seguro de vida? Tudo, praticamente, tem um valor monetário, isto é, capacidade de determinada mercadoria ou serviço ser mensurada em uma determinada moeda. Reserva de valor: atributo da moeda em armazenar poder aquisitivo no futuro. Exemplo: você poupa um recurso cada mês para adquirir um automóvel ou casa no futuro, por exemplo. Seja a moeda que for, em tese, ela deve possuir as três funções anteriormente descritas para ter sua funcionalidade plena. Nem sempre as moedas possuem estas caracterís- ticas ao mesmo tempo. Contudo, além das três funções acima destacadas, a moeda é um ativo de maior liqui- dez no mercado. Por liquidez da moeda, entende-se a capacidade desse ativo em ser trocado por outra mercadoria. 90 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas O ouro, a prata e metais preciosos também são ativos que são facilmente trocados por moeda ou outras mercadorias. Contudo, assim como qualquer ativo, a moeda precisa possuir liquidez. 1.2 OS BANCOS E A INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA Os bancos surgiram com a finalidade de garantir a segurança dos detentores das mo- edas. Por elas serem fáceis de carregar e possuir valor, a segurança sempre foi peça- -chave para efetivação das trocas comerciais. É muito mais seguro para um comerciante guardar parte de suas moedas em uma instituição que garanta sua segurança, como no caso dos bancos, por exemplo, do que guardar consigo mesmo grande quantidade de moeda e ficar mais suscetível a roubos e furtos. Com o passar do tempo, os bancos foram adquirindo um papel muito mais complexo e importante do que simplesmente “guardar moeda”: passaram a ser meios seguros e de grande confiabilidade para servir como meio de pagamento. Por exemplo, para realização de pagamentos, basta apenas emitir uma ordem de pa- gamento ou transferência de valores entre uma conta corrente e outra. Seja através da emissão de um chequeou, no caso dos dias atuais, de uma autorização de débito, a transação é realizada entre o consumidor e o comerciante de maneira segurança e eficaz, sem nenhuma das partes precisar recorrer, pessoal e diretamente, aos bancos. Figura 01. Fluxo monetário $$$ $$$ Produtos de investimentos Pessoas físicas e jurídicas Superavitárias Pessoas físicas e jurídicas Deficitárias Instituições financeiras Empréstimos e financiamentos Além da questão de segurança e da contribuição para facilitar e promover meios de pagamentos confiáveis e sólidos, talvez o papel mais virtuoso dos bancos seja atuar como intermediário financeiro. Em tese, os bancos atuam como intermediários entre os poupadores (aqueles que não utilizam totalmente seus recursos) e os deficitários (aquelas pessoas físicas ou jurídicas que necessitam de recursos de outrem para financiar ou fechar suas contas, por exemplo). Fonte: Elaborada pelo autor (2016). Spread Bancário - Spread bancário é a diferença entre os juros que o banco cobra ao emprestar e a taxa que ele mesmo paga ao captar dinheiro. O Brasil é famoso por ter um dos maiores spreads bancários do mundo. Um pouco de atenção: não apenas os bancos atuam como intermediários financeiros, outras estruturas do Sistema Financeiro também atuam na intermediação entre poupares e deficitários. 91 4 Economia e mercado Atente-se ao fato de que nem toda dívida pode ser tida como ruim, as empresas e até mesmo as pessoas físicas necessitam de recursos para financiar seus gastos. Por exemplo, a grande maioria das pessoas recorre ao Sistema Financeiro para financiar a casa própria, assim como uma pessoa jurídica (empresa) pode demandar crédito para pagar parte de seus fornecedores ou aumentar sua produção por meio da compra de novas máquinas e equipamentos. Um Sistema Financeiro, quanto mais desenvolvido e eficiente, consegue colocar à dis- posição daquele que desejar investir/consumir os recursos daqueles que, por algum motivo, não querem consumir naquele momento e optam por consumir no futuro. Assim, tanto o investidor quanto o poupador ganham, visto que o primeiro consegue re- cursos suficientes para realizar seus investimentos e consumo, e o segundo consegue que seu recurso (que iria ficar “parado”) lhe renda juros. Concebemos a diferença da taxa que o banco paga ao poupador e cobra do tomador do crédito como spread bancário, que, em suma, nada mais é do que a remuneração do banco por este realizar a intermediação financeira. Imagine o problema: se não houvesse um Sistema Financeiro eficiente, o recurso daquele que poupa ficaria parado, sem uso e sem render os juros da poupança; em contrapartida, a empresa da formatura não teria recursos suficientes para realizar a formatura a tempo. 1.3 O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL O Sistema Financeiro Na- cional (SFN) é um conjunto de instituições responsáveis pela gestão da Política Mo- netária Nacional. Nada mais é do que a maneira pela qual as instituições brasileiras se organizam para efetivar a in- termediação financeira, como mencionado anteriormente. No Brasil, o SFN é dividido de acordo com o mercado fi- nanceiro que cada um atua, e cada um destes mercados tem para sua regulação e funcio- namento órgãos normativos, supervisores e operadores. Observe a FIG. 2, que mostra a estrutura do SFN disponibi- lizada no website do Banco Central do Brasil (BACEN). Como bem demonstrado na FIG. 2, os mercados do SFN são: (I) Moeda, Crédito, Capitais e Câmbio; (II) Seguros Privados; e (III) Previdência Fechada. Figura 02. Sistema Financeiro Nacional Fo nt e: B A C E N (2 01 6) . 92 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas O mercado (I), Moeda, Crédito, Capitais e Câmbio, é o principal e mais complexo mer- cado do SFN. Ele é responsável pelos seguintes mercados: Mercado monetário: responsável pelo fornecimento da moeda na sua forma de papel e escriturária, aque- la disponível (registrada) na conta corrente dos bancos. Mercado de crédito: responsável pela disponibilização de recursos financeiros voltados ao financiamento do consumo de pessoas jurídicas e físicas. Mercado de capitais: sistema que permite que empresas captem recursos de terceiros, compartilhando seus ganhos e também riscos. Mercado de câmbio: sistema responsável pela compra e venda de moeda estrangeira. Como demonstra a FIG. 2, o SFN também é responsável pelo ramo de Seguros Pri- vados, instituições financeiras para quem busca a aquisição de seguros, previdência complementar e contratos de capitalização, e também pelo ramo de Previdência Fecha- da, voltado às regras e gestão dos chamados Fundos de Pensão privados, voltados a funcionários e servidores de empresas específicas. Este trabalho explorará apenas o ramo (I) Moeda, Crédito, Capitais e Câmbio, pois é o principal e mais complexo do SFN (divido entre os órgãos normativos e supervisores). O órgão normativo e principal estrutura do SFN é o Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão superior do Sistema Financeiro Nacional e que tem a responsabilidade de formular a política da moeda e do crédito, objetivando a estabilidade da moeda e o desenvolvimento econômico e social do País. Banco Central (BACEN) e Mercado Monetário, Cambial e de Crédito O SFN conta, além dos órgãos normativos, também com os supervisores, que, em suma, têm as funções de fiscalizar e gerir seus respectivos mercados. Entre os supervisores, temos o BACEN (Banco Central do Brasil), que tem como suas principais funções, de acordo com Troster (2011): Banco dos bancos: os bancos comerciais depositam recursos no BACEN, que também tem a função de transferir recursos de um banco para o outro, para com- pensação dos pagamentos interbancários. 93 4 Economia e mercado Dentre os agentes operativos, supervisionados pelo BACEN, existem as instituições bancárias e não bancárias, sendo que ambas têm a função principal de atuar na inter- mediação financeira. A diferença entre as instituições bancárias e não bancárias é que as primeiras podem receber depósitos à vista e podem realizar o multiplicador bancário. Já as não ban- cárias não podem receber depósitos à vista e operam com ativos não monetários, tais como ações, CDB (Certificado de Depósito Bancário), títulos etc. Veja alguns exemplos: Instituições bancárias (podem captar depósitos à vista e realizar o multiplicador bancário): ` Bancos comerciais: responsáveis pela captação dos depósitos à vista, têm como tarefa atuar no mercado de crédito de curto prazo, com base na captação dos depósitos à vista. ` Bancos múltiplos: bem como seu nome diz, realizam operações de um ban- co comercial, de investimento e/ou de desenvolvimento, de crédito imobiliário, de arrendamento mercantil e de crédito, financiamento e investimento. O banco múltiplo deve ser constituído por, no mínimo, duas carteiras, sendo uma delas, obrigatoriamente, comercial ou de investimento, e ser organizado sob a forma de sociedade anônima. Não bancárias (não podem receber depósitos à vista e nem realizar o multiplicador bancário). ` Financeiras: atuam no financiamento de crédito ao consumidor direto (pessoa física) e pequenas e médias empresas. Suas fontes de financiamento são a venda de Letras de Câmbio (LTN) e empréstimos. ` Bancos de investimento: sua função é ofertar de médio a longo prazo a aquisi- ção de capital fixo ou de giro de empresas. Suas fontes de recursos são a emissão de CDBs e recursos externos. ` Sociedades de crédito imobiliários: têm como objetivo disponibilizar recursos fi- nanceiros diretamente ao tomador do crédito imobiliário, ou então para os empre- sários do ramo. Suas fontes de recursos são as Letras Imobiliárias, depósitos de poupança, repasses da Caixa Econômica Federal (CEF) e empréstimos externos. Banco do Governo: grande parte dos recursos financeiros públicos são deposita- dos no BACEN. Ele também é responsável por captar recursos através dos Títulos Públicos; é o agentefinanceiro do governo. Executor da política monetária: responsável pelo controle da oferta de moeda através dos instrumentos da política monetária. Executor da política cambial: depositário das reservas cambiais de moeda es- trangeira. 94 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas ` Bancos de desenvolvimento: exclusivamente estatais, financiam operações espe- ciais de fomento pelo repasse de fundos fiscais e de recursos captados no exterior. ` Sociedades corretoras e distribuidoras: instituições auxiliares do SFN que operam com a compra, venda de derivativos e títulos e valores mobiliários. O Multiplicador Bancário Acredito que você possa estar com dúvida sobre o que é afinal este “multiplicador bancário”. Pois bem, vamos lá: é a capacidade dos bancos comerciais em criar moeda escritural. Ficou com mais dúvidas? Vamos explicar melhor: com o desenvolvimento das instituições bancárias, e pelo anseio de “mais segurança” na movimentação dos recursos financeiros e rapidez nas transações comerciais, a cada dia mais os agentes econômicos não precisam estar com a moeda em espécie em mãos para comprar um bem ou adquirir um serviço. Cada vez menos você precisa ter dinheiro em mãos para realizar suas transações. Afinal de contas, realizar os pagamentos através de uma rede bancária é mais seguro e muito mais eficiente. Pois bem, o que o banco comercial faz com seu salário quando seu patrão deposita? Registra em seu nome aquele montante devido e destina parte daquele recurso a ou- tros agentes, que naquele momento estão deficitários, fazendo assim com que o banco comercial realize seu papel de intermediário financeiro. Vamos dar um exemplo para facilitar a compreensão: imagine que você ganha mensal- mente um salário de $ 100 e seu patrão o deposita no Banco A. Figura 03. Multiplicador bancário DEPÓSITO $ 100 RESERVAS $ 10 DISPONÍVEL PARA EMPRÉSTIMOS $ 90 Banco A DEPÓSITO $ 90 RESERVAS $ 9 DISPONÍVEL PARA EMPRÉSTIMOS $ 81 Banco B DEPÓSITO $ 81 RESERVAS $ 8,10 DISPONÍVEL PARA EMPRÉSTIMOS $ 72,90 Banco C Fonte: Elaborada pelo autor (2016). O Banco A, no momento em que o depósito é realizado, registra esse valor em seu nome, vinculado à sua conta corrente, e reserva 10% do montante para as Reservas Compulsó- rias que o Banco Central exige e coloca à disposição de empréstimos um total de $ 90. O Banco A emprestou esse montante para uma pessoa física que estava querendo comprar um automóvel. Após tomar o empréstimo no Banco A, fez-se uma transferência eletrônica para o Banco B, banco no qual a concessionária tem sua conta corrente pessoa jurídica. 95 4 Economia e mercado O Banco B registra os $ 90 em nome da concessionária, reserva os mesmos 10% que o Banco Central exige naquele momento de Reservas Compulsórias e, por sua vez, destina um montante de $ 81 para empréstimo de seus clientes. Por fim, o Banco B empresta essa quantia para uma outra pessoa física que tomou crédito para financiar sua casa própria. Esta pessoa, ao receber essa quantia pelo em- préstimo, transfere eletronicamente o montante para a conta corrente do vendedor do imóvel, que é o Banco C, que inicia o mesmo processo realizado pelos demais bancos. Percebeu como a moeda se “multiplicou”? Um depósito de seu salário foi transferi- do para financiar uma série de bens e movimentou (e muito) a economia. É dessa maneira que os bancos comerciais têm suas principais fontes para realização dos empréstimos e financiamentos. A Política Monetária Segundo Troster (2011, p. 374), “a política monetária se refere aos processos de oferta de moeda, aos instrumentos utilizados e aos mecanismos de transmissão de seus efeitos”. Ficou um pouco confuso? Vamos tentar melhorar a explicação: a política monetária é composta por instrumentos que a autoridade monetária (no caso brasileiro, o BACEN) tem a sua disposição para ampliar ou reduzir a oferta de moeda (que podemos tam- bém entender como meios de pagamento) dentro de uma economia. Quando se amplia os meios de pagamento, entendemos que aquela política monetária é expansionista. Já o contrário, quando se restringe os meios de pagamento, entende- mos que aquele tipo de política monetária é reducionista. O que a economia faz com mais oferta de moeda a sua disposição? Gasta! E como? Na aquisição de bens e serviços, que, por sua vez, precisam ser produzidos nessa economia, gerando emprego e renda e criando, assim, um efeito virtuoso no interior dessa economia. E quando a oferta de moeda reduz? A economia não gasta! Ou melhor, com a oferta de moeda reduzida, o custo para aquisição de recursos financeiros aumenta (aumen- to da taxa de juros de um empréstimo, por exemplo), o que faz com que o consumo, em tese, diminua. Diminuindo a demanda por bens e serviços, provoca-se a queda da demanda dessa economia e, sem demanda, o trabalho e o investimento do lado produtivo fica inviável, gerando perda nos postos de trabalho e, por consequência, queda na renda. Ufa! Viu como a oferta de moeda influencia no lado produtivo da economia e ela é es- sencial para que uma economia consiga se desenvolver e gerar emprego e renda para sua população? O governo tem à sua disposição uma série de instrumentos para regular a oferta de moeda da economia. Vamos verificar um pouco destes instrumentos e consequências esperadas a seguir. 96 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas A Emissão de Moeda O BACEN é o único órgão que pode imprimir moeda em território nacional. Caso al- guma nota ou moeda circule na economia e não tenha sido produzida pela Casa da Moeda, a moeda é falsa – algo que é tratado como crime contra o SFN. O governo decide o quanto de moeda vai colocar à disposição da população. Em tese, como foi mencionado anteriormente, quanto mais moeda em circulação, mais a popula- ção adquire bens e serviços. A moeda é fundamental para que a economia consiga se estabelecer e se desenvolver da melhor maneira possível. Afinal de contas, tudo dentro da economia é comerciali- zado através das moedas e estas devem estar à disposição da população para que o desenvolvimento econômico aconteça. Se a oferta de moeda é tão importante, por que o governo não pode imprimir muita moeda e colocar à disposição da sua população o maior número de dinheiro possível? Por causa da inflação, que nada mais é do que o aumento generalizado dos preços. Você precisa entender que quanto mais oferta de moeda numa economia, mais os agentes econômicos irão adquirir bens e serviços. E o que acontece quando aumenta a demanda? O preço aumenta! Se mais pessoas desejam consumir certo produto, e a quantidade ofertada é limitada, apenas aqueles que destinarem mais recursos para a aquisição daquele bem poderão adquiri-lo. Esta relação entre oferta x demanda não é novidade para você. O mesmo acontece quando analisamos a economia de maneira macroeconômica: quando a demanda aumenta (provocada pelo aumento da oferta de moeda, no nosso caso), o efeito nocivo desta medida, na grande maioria das vezes, resulta no aumento generalizado dos preços, que nada mais é do que a inflação. Segundo Sandroni (1999, p. 604): “Título emitido e garantido pelo governo (União, Estado, município). É um instrumento de política econômica e monetária que pode servir para financiar um déficit do orçamento público, antecipar a receita ou garantir o equilíbrio do mercado do dinheiro. De acordo com suas características, pode ter a forma de apólice, bônus ou Obrigação do Tesouro Nacional”. Operações de Mercado Aberto (Open Market) Outro instrumento importante para o governo que influencia na oferta de moeda são as Operações de Mercado Aberto (Open Market). Essas operações são nada mais do que os Títulos Públicos que o governo coloca à disposição do público para financiar suas atividades e para regular a oferta de moeda disponível para economia. Vamos, por ora, apenas analisar como os Títulos Públicos regulama oferta de moeda numa economia. De acordo com Troster (2011), o BACEN compra e vende títulos públi- cos diariamente com o objetivo de regular a oferta de moeda. 97 4 Economia e mercado Como isso acontece? Simples! Vamos imaginar que o objetivo do BACEN seja aumen- tar a oferta de moeda, visando aquecer a demanda. A ordem do BACEN é comprar naquele dia um certo volume de recursos públicos. Ao comprar os títulos, o BACEN entrega ao seu dono um “cheque” correspondente ao valor devido. E o que o detentor do título vai fazer? Depositar a quantia no banco. O banco, por sua vez, realizará o procedimento do multiplicador bancário, explicado anteriormente, que disponibilizará um volume maior de recursos financeiros para reali- zação de empréstimos, por exemplo. O contrário também é verdade: imagine que no dia seguinte o governo tenha o diagnóstico de que a economia está inflacionada, isto é, os níveis de preço estão acima do desejado. Uma das medidas que o governo pode tomar para remediar a inflação é vender títulos. Com essa medida, o BACEN recebe/recolhe certo volume de dinheiro, que, por sua vez, diminuirá o volume de moeda destinado para financiar empréstimos e novos in- vestimentos. Isso diminuirá, em tese, a demanda desta economia e, assim, reduzirá o nível de preços. A SELIC – Taxa Básica de Juros No Brasil, a SELIC é a taxa básica de juros, isto é, a remuneração dos Títulos da Dívida Pública Brasileira. Em tese, nada nessa economia deve ter uma rentabilidade menor que essa taxa. Conheça mais sobre a SELIC e como ela afeta os negócios de toda a economia. Não deixe de pesquisar mais na internet sobre ela! Política de Redesconto A Política de Redesconto é outro instrumento que os agentes monetários têm à sua disposição para controlar a oferta de moeda numa economia. Por ser o banco dos bancos, o próprio BACEN pode disponibilizar recursos aos bancos comerciais para que eles próprios disponibilizem aos seus clientes recursos financeiros para realização de empréstimos e financiamentos. Se, por algum motivo, o desejo do BACEN for ampliar os meios de pagamento (au- mentar a oferta de moeda na economia), este disponibilizará aos bancos comerciais recursos financeiros a uma taxa de juros de redesconto atrativa, para que os bancos comerciais disponibilizem aos seus clientes. Já se a intenção for diminuir a oferta de moeda, o BACEN aumentará a taxa de juros do redesconto, que implicará no aumento de juros do tomador do empréstimo no banco comercial, que, por sua vez, se sentirá desmotivado a tomar um financiamento para realizar um investimento, por exemplo. Reservas Compulsórias As Reservas Compulsórias constituem um outro instrumento que o BACEN tem à sua disposição para controlar a oferta de moeda. O BACEN determina que parte dos 98 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas depósitos à vista sejam destinados às reservas compulsórias, que nada mais são do que parte dos depósitos à vista que não poderão ser destinados para a realização de empréstimos e financiamentos. O mecanismo é simples: se o desejo do BACEN é aumentar a oferta de moeda na economia, ele diminui a percentagem dos depósitos à vista que os bancos comerciais deverão destinar às reservas e, assim, aumenta a oferta de moeda. O contrário também é verdade: se a orientação da autoridade monetária é diminuir a oferta de moeda, o BACEN aumenta a percentagem obrigatória das reservas, diminuin- do a oferta monetária. Considerações Acerca da Política Monetária Até o momento, foram apresentados os principais instrumentos da política monetária, bem como suas principais ações e consequências esperadas, previstas e bem consoli- dadas na Teoria Econômica de qualquer manual de macroeconomia. Tabela 01. Instrumentos da política monetária – ações e consequências esperadas Fonte: Elaborado pelo autor (2016). INSTRUMENTOS AÇÃO OFERTA DE MOEDA/TIPO CONSEQUÊNCIAS ESPERADAS Emissão de moeda Impressão/ cunhagem de moeda Aumento/ expansionista Aumento da demanda agregada/renda/ aumento no nível de preços (inflação) Reservas compulsórias Aumento na obrigatoriedade Diminuição/ reducionista Diminuição na demanda/renda/controle dos preços Diminuição na obrigatoriedade Aumento/ expansionista Aumento da demanda agregada/ renda/aumento no nível de preços (inflação) Open market Compra de títulos Aumento/ expansionista Aumento da demanda agregada/ renda/aumento no nível de preços (inflação) Venda de títulos Diminuição/ reducionista Diminuição na demanda/renda/controle dos preços Taxa de redesconto Aumento dos juros do redesconto Diminuição/ reducionista Diminuição na demanda/renda/controle dos preços Diminuição dos juros do redesconto Aumento/ expansionista Aumento da demanda agregada/ renda/aumento no nível de preços (inflação) A Tabela. 01 traz de maneira resumida as principais ações e consequências esperadas da implementação de certas ações da política monetária. Observe o que a autoridade monetária pode utilizar para atingir os resultados esperados. Existem ocasiões em que por mais que a autoridade monetária diminua a taxa de juros e aumente consideravelmente a oferta de moeda na economia, a economia não se desenvolve e reaquece como o esperado, uma vez que os agentes econômicos, por mais que sejam influenciados a investir, não o fazem devido a uma baixa expectativa em relação ao futuro desta economia, por exemplo. Sendo assim, cabe mencionar que a política monetária é mais um instrumento que pode se utilizar para que as metas da política macroeconômica sejam alcançadas. Continuaremos o estudo da disciplina, seguindo para o próximo tópico Inflação — Causas e Consequências. 99 4 Economia e mercado 2. INFLAÇÃO – CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS Inflação: com certeza você já escutou essa palavra. Seja nos noticiários, nos portais de notícias, ou nas conversas com seus amigos e parentes. Afinal de contas, quando você contesta alguém sobre o aumento de determinado produto ou serviço, a pessoa sempre te responde: o preço aumentou por causa da inflação! Então, afinal de contas, o que é inflação? Podemos conceber que inflação é o aumento generalizado dos preços. Preste atenção: aumento generalizado, que nos indica que o processo inflacionário não é apenas quan- do determinado produto aumenta, mas sim quando se verifica que o preço de vários produtos e serviços aumentaram em toda economia, por isso o termo geral. E qual o problema da inflação? Ela prejudica as funções da moeda. As funções reserva de valor, unidade de conta e meio de troca, ficam severamente prejudicadas com a infla- ção; resumidamente, a moeda perde seu poder aquisitivo, isto é, capacidade da moeda em ser trocada por bens e serviços. Vasconcellos (2011) faz algumas considerações importantes acerca do problema in- flacionário: De início, podemos conceber que a inflação representa um problema distributi- vo existente na economia mal administrada. Em outras palavras, a disputa dos diversos agentes econômicos pela distribuição de renda representa a questão básica no fenômeno inflacionário (VASCONCELLOS, 2011, p. 385). É esta análise que Vasconcellos (2011) faz. Os preços tendem a aumentar devido, também, à atuação dos agentes econômicos ao disputarem a distribuição de renda (acesso aos produtos e serviços). Apenas o agente que destinar mais recursos financeiros para aquisição de um bem ou serviço poderá adquiri-lo. Nesse caso, a oferta desse bem ou serviço é limitada no curto prazo. Sendo assim, de maneira geral, podemos conceber que a inflação é um indicador que algo não vai bem nesta economia. De maneira geral, uma economia com processo de inflação acima do desejado apresenta um problema de desequilíbrio. A inflação também acarreta outras distorções na economia. Verifique, resumidamente, alguns deles: Distribuição de renda O agente econômico, em um processo inflacionário, tem cada vez mais dificuldade em trocar moeda por bens e serviços, uma vez que estes ficam mais caros,devido ao fato de que o poder aquisitivo da moeda diminuiu. Diferentemente dos capitalistas, que têm condições de repassar a inflação, temos os assalariados entre os mais prejudicados com esse processo, em especial os de bai- xa renda, que gastam quase a totalidade de seus salários com despesas pessoais (alimentação, habitação, transporte, dentre outros), uma vez que o reajuste do salário dificilmente acompanha a evolução dos preços. Costuma-se afirmar que a inflação é um imposto sobre o pobre. 100 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas Balanço de pagamentos Se em um país o processo inflacionário está acima da média verificada internacional- mente, os produtos deste país tendem a se tornar menos atrativos que os produzidos internacionalmente: os produtos importados ficam mais baratos que os nacionais, pro- vocando aumento das importações, prejudicando, assim, o saldo da Balança Comercial e das Reservas Cambiais. O problema pode se tornar mais complicado se esta economia estiver vivenciando um déficit cambial, isto é, se o país estiver com problema de manter reservas seguras de moeda estrangeira. Na tentativa de frear as importações e assim frear a “fuga de dólares” para o pagamento dos produtos importados, o Governo decide forçar a desvalorização da moeda, isto é, a moeda nacional passa a “valer menos”, fazendo assim com que o produto importado fique mais caro e o nacional mais barato, aumentando, em tese, o consumo deste. Contudo, com essa medida adotada, o processo inflacionário fica mais grave: com o aumento da demanda dos produtos nacionais para exportação e substituição de impor- tações, a demanda aumenta, aumentando o nível de preços desta economia. Além disso, há outro problema: dificilmente um país consegue produzir todos os produ- tos e insumos que necessita: petróleo, fertilizantes, máquinas e equipamentos precisam ser importados visando abastecimento desta economia. Com a moeda estrangeira mais cara, mais caro será importar estes produtos, e, portanto, mais caros serão os produtos produzidos com os insumos e equipamentos importados, prejudicando ainda mais o processo inflacionário. Mercado de capitais A inflação corrói o poder aquisitivo da moeda, fazendo com que esta se torne um ativo desvalorizado. Com isso, os investidores, com receio de perder sua riqueza com a des- valorização da moeda, decidem aplicar seus recursos em outros bens no lado real da economia, tais como aquisição de residências, terrenos e imóveis em geral. A correção deste problema tende a afetar ainda mais a economia: com o objetivo de frear a fuga de capitais, o mercado de capitais tende a oferecer aos seus investidores a correção monetária, isto é, indexação das aplicações financeiras aos índices de infla- ção, visando assim corrigir o problema da inflação. É simples: ao aplicar seu dinheiro no mercado de capitais, o aplicador terá direito aos juros da aplicação, mais a percentagem decorrente da inflação. A correção monetária parece ser até justa, uma vez que corrige a desvalorização da moeda, mas tem um efeito nocivo: ao garantir a correção monetária, os inves- tidores tendem a destinar seus recursos financeiros mais ao mercado de capitais que aos investimentos do lado real da economia (tais como construção de uma fábrica e loja, por exemplo). O processo inflacionário também tem outros efeitos importantes na economia. Entre eles, podemos citar a expectativa do futuro dos agentes em relação à própria inflação. Numa 101 4 Economia e mercado economia inflacionada, o setor empresarial tende a aguardar a decisão de novos inves- timentos, visando expansão da capacidade produtiva, mas, com a inflação, tende-se a diminuir a taxa de emprego desta economia, diminuindo assim a renda, inviabilizando, portanto, a justificativa de novos investimentos. Outro problema é que a inflação provoca, num primeiro momento, um ganho aos to- madores de empréstimos. Os credores, aqueles que emprestaram os recursos, serão remunerados com valores que, em tese, não recuperarão a perda decorrente da desva- lorização da inflação, prejudicando seus ganhos reais. Contudo, no longo prazo nem o tomador nem o credor ganham: a inflação desarticula todo o sistema produtivo. Com o poder aquisitivo do trabalhador diminuído, ele tende a consumir menos, diminuindo, portanto, os lucros dos vendedores. Sem vendas, não há arrecadação de impostos, diminuindo assim os investimentos e os gastos do Governo, em saúde e educação, por exemplo, afetando assim todo sistema produtivo. 2.1 OS DIFERENTES TIPOS DE INFLAÇÃO O processo inflacionário possui características distintas: existem, basicamente, três ti- pos básicos de inflação. Vamos explorar um pouco o conceito de cada um deles. Inflação de Demanda Podemos considerar que a inflação de demanda é a do tipo mais comum: está relacio- nada ao aumento da demanda agregada no curto prazo: toda vez que a demanda de certo produto aumenta e a oferta se mantém constante (no curto prazo), apenas aquele agente econômico que disponibilizar de mais recursos financeiros para sua aquisição poderá adquiri-lo (o produto fica mais caro). Este tipo de inflação está muito relacionado ao uso da capacidade instalada da econo- mia, isto é, tudo o que esta economia consegue produzir com os fatores de produção disponíveis naquele período. Em tese, em momentos de pleno emprego dos recursos (quando os recursos estão sendo utilizados em quase sua totalidade), um aumento da demanda agregada provocada por uma política fiscal expansionista provoca, em linhas gerais, um aumento no nível geral dos preços. A Figura. 1 traz o indicador da utilização da capacidade instalada, mensurado pela Funda- ção Getúlio Vargas (FGV), que serve de indicador para analisarmos se a economia está de fato utilizando amplamente seus recursos. De acordo com os dados disponibilizados, observa-se uma queda considerável da capacidade instalada a partir do último trimestre de 2014, atingindo o menor índice no quarto semestre de 2015, quando se verificou a utili- zação de aproximadamente 77% da capacidade instalada, o que, em tese, não justificaria no terceiro trimestre de 2015 uma inflação do tipo de demanda, por exemplo. Vasconcellos (2011) analisa que este tipo de inflação é combatido com Políticas Fiscais e Monetárias restritivas, ações que tenham como objetivo de conter a demanda agregada. 102 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas Figura 01. (Gráfico 1) Utilização da capacidade instalada geral (FGV) % U til iz ad a - M éd ia G er al 88,0 86,0 84,0 82,0 - % 80,0 78,0 76,0 74,0 72,0 1º Tri m. 20 10 3º Tri m. 20 10 1º Tri m. 20 11 3º Tri m. 20 11 1º Tri m. 20 12 3º Tri m. 20 12 1º Tri m. 20 13 3º Tri m. 20 13 1º Tri m. 20 14 3º Tri m. 20 14 1º Tri m. 20 15 3º Tri m. 20 15 Fo nt e: B A C E N (2 01 6, a da pt ad o) . Inflação de Custo Inflação de custos é um tipo de inflação mais relacionada à oferta, isto é, relacionada aos custos de produção: os preços aumentam sem um aumento na demanda dos pro- dutos, provocando, também, diminuição na oferta. Vasconcellos (2011) apresenta as causas mais comuns: Aumento salarial: por ser um fator de produção, aumentos salariais provocam o aumento do custo de produção, que são geralmente repassados ao preço do pro- duto final. Aumento do custo dos insumos: aumento provocado quando o custo de algum insumo encarece. Entre o exemplo mais claro deste tipo de inflação, podemos citar a desvalorização cambial (quando a moeda nacional perde valor). Como parte dos insumos são importados, uma desvalorização cambial provoca aumento nos custos de produção, uma vez que, com a moeda nacional desvalorizada, haverá necessi- dade de mais moeda nacional para adquirir um insumo importado, o que faz com que aumente o custo do produto final. Estrutura de mercado: relacionado à estruturado mercado no qual a empresa está inserida. Mercados oligopolizados e monopolizados tendem a elevar seus pre- ços acima do custo de produção (empresas e corporações que controlam parte da oferta de seus produtos têm mais condições de fixar o preço destes e, assim, manter o aumento de seus lucros). Vasconcellos (2011) ressalta que este tipo de in- flação também está relacionado aos lucros das empresas e ao fenômeno conhecido como estagflação, isto é, recessão econômica com inflação. A estagflação ocorre quando se tem paralelamente taxas significativas de inflação e recessão econômica com desemprego. Isso pode ser devido ao fato de, em períodos de queda de atividade produtiva, as firmas com poder oligopolista terem condições de manter suas margens de lucros sobre custos 103 4 Economia e mercado (ou mark-up), ao aumentarem o preço de seus produtos finais. O nível de produto e de emprego está caindo e, mesmo assim, os preços estão subindo (VASCONCELLOS, 2011, p. 390). Outros Tipos de Inflação Além dos dois tipos mencionados, cabe lembrar que a Teoria Econômica conceitua também outros tipos de inflação, principalmente relacionados à experiência brasileira. A inflação inercial leva em conta a memória inflacionária que os agentes econômicos possuem em relação ao processo inflacionário. Pelo fato de a economia estar indexada (correção monetária), os agentes reajustam seus preços simplesmente porque o índice de pre- ços aumentou, mesmo que seu produto não tenha apresentado aumento no custo ou na demanda. A inflação de expectativas é o aumento dos preços que acontece simplesmente porque os agentes acreditam que no futuro os preços vão aumentar, fazendo com que aumentem seus preços na tentativa de proteger seu negócio. A inflação estrutural diagnostica se a inflação brasileira é decorrente das tensões de custo da estrutura econômica brasileira. Luque e Vasconcellos (2011, p. 393) analisam que esta con- cepção sobre inflação leva em conta a estrutura econômica brasileira. [...] a inflação [estrutural] seria explicada principalmente por questões estrutu- rais, como estrutura agrária, estrutura oligopólica de mercado e estrutura do comércio internacional. A agricultura não responderia ao crescimento da de- manda de alimentos, devido à exigência de latifúndios pouco preocupados com questões de produtividade (oferta de produtos agrícolas inelástica a estímulos de preços de mercado). Isso levaria ao aumento de preços dos alimentos. Por seu turno, grandes oligopólios têm condições de sempre manter suas margens de lucro, repassando todos os aumentos de custos a seus preços. Finalmente, a inflação seria provocada pelas desvalorizações cambiais que os países sub- desenvolvidos são obrigados a promover, para compensar o déficit crônico da balança comercial, gerado pela deterioração dos termos de troca no comércio internacional, contra países subdesenvolvidos, por exportarem produtos primá- rios e importarem produtos manufaturados. A concepção sobre inflação estrutural é explicada através da Escola Cepalina, criada pela CEPAL – Comissão Econômica para a América Latina e Caribe, organismo da ONU sediada no Chile, criada no pós-guerra com objetivo de repensar o subdesenvolvimento latino americano. 104 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas 2.2 INFLAÇÃO E POLÍTICA MONETÁRIA: O CASO BRASILEIRO Como já vimos, uma das metas da política macroeconômica é o controle do nível de preços. Entre os métodos utilizados atualmente, destaca-se o Sistema de Metas de Inflação, implantado no Brasil desde 1999. Este Sistema de Metas de Inflação é um sistema de controle dos preços desenvolvido e colocado em prática primeiramente através da Política Monetária criada na Nova Ze- lândia e difundido posteriormente em diversos países por todo o mundo. Esse sistema funciona no Brasil da seguinte forma: o Banco Central estipula uma meta a cada dois anos e um limite mínimo e máximo que a inflação pode atingir em determinado período. Este sistema leva em conta o Núcleo de Inflação, isto é, uma medida que o BACEN procura captar a tendência de evolução dos preços da economia brasileira, desconside- rando distúrbios resultantes de choques temporários de oferta, tais como sazonalidade na agricultura decorrente da seca, por exemplo. Caso o Núcleo de Inflação apresente aumentos consideráveis, acima da meta, a au- toridade monetária pode se utilizar do aumento da taxa básica de juros e de outras medidas monetárias para controlar a demanda agregada e, assim, o nível de preços. Figura 02. (Gráfico 2) Sistema de meta de inflação (1999 — 2005) Fo nt e: B A C E N (2 01 6, a da pt ad o) .14 IPCA LIMITE MIN LIMITE MAX CENTRO META 12 10 % 9 6 4 2 0 19 99 20 00 20 01 20 02 20 03 20 04 20 05 20 06 20 07 20 08 20 09 20 10 20 11 20 12 20 13 20 14 20 15 No Brasil, o diagnóstico da inflação é realizado pelo Copom – Comitê da Política Mone- tária, instituído em 1996, com o objetivo de estabelecer as diretrizes da política monetá- ria e de definir a taxa de juros. Os componentes do Copom se reúnem ordinariamente 8 vezes por ano e o resultado e as medidas acordadas pelo Comitê são divulgados através das Atas de Reunião. Observe na Figura. 2 as metas de inflação brasileira estipuladas pelo BACEN no pe- ríodo correspondente e os resultados reais de inflação mensurados. De acordo com o gráfico, durante a vigência do sistema, a inflação oficial brasileira esteve dentro do limite máximo da meta, contudo, observa-se que, no ano de 2015, a inflação registrada supera o teto máximo da meta estipulada para o ano, que é de 6,5% a.a. 105 4 Economia e mercado Agora, observe no Figura. 03 a taxa SELIC de outubro de 2012 até a última reunião em dezembro de 2015. Neste período, observamos uma tendência de alta da SELIC, que passou de cerca de 7,25% para 14,25% a.a. Figura 03. (Gráfico 3)Taxa SELIC – % a.a. 15,00 14,00 13,00 12,00 11,00 10,00 9,00 8,00 7,00 6,00 outubro - 12 maio - 13 novembro - 13 % A .A . junho - 14 dezembro - 14 julho - 15 janeiro - 16 Se você analisar a inflação mensurada e a taxa SELIC, poderá observar uma relação quase direta: o BACEN lançou mão, no período de alta, na taxa de juros SELIC, para conter a inflação e tentar manter os preços nos limites fixados pela meta. 2.3 CALCULANDO A INFLAÇÃO – OS ÍNDICES DE PREÇO A inflação é mensurada através dos índices de preços, isto é, números que represen- tam os preços de determinada cesta de produtos. Cada índice de preços possui sua metodologia própria, bem como cada um possui uma cesta de produtos e ponderação, o que impossibilita, portanto, a simples comparação entre os diversos índices de preço. Você já deve ter se perguntado várias vezes ao escutar a divulgação da inflação oficial: como a inflação subiu apenas 0,5% no mês se a energia elétrica subiu 8% e a gasolina subiu 5% no mesmo período, por exemplo? Isso acontece porque os índices de preços possuem uma cesta de produtos, um con- junto de itens que são observados com objetivo de se construir um índice geral. Cada item tem uma ponderação diferente, de acordo com a metodologia de tal índice e seu objetivo, o que permite que cada índice geral possua um resultado. Existem índices com objetivos específicos, por exemplo: índice da Construção Civil, que visa apenas mensurar a evolução de preços deste setor econômico; índices que levam em consideração apenas a região de coleta dos dados (Regiões Metropolitanas), di- vergindo também das fontes de coleta, tais como tipo e tamanho de pontos comerciais, setores pesquisados, além do período da pesquisa (mensal, quinzenal, trimestral). Fo nt e: B A C E N (2 01 6, a da pt ad o) . 106 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas No que se refere ao índice que orienta a política monetária, bem como traz um diagnóstico geral do processo inflacionário, temos os índices de Preços aoConsu- midor e os Índices Gerais de Preço. No Brasil, o indicador de referência é o IPCA – Índice de Preço ao Consumidor Amplo, calculado pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. É através do IPCA que o governo orienta seu Sistema de Metas de Inflação, bem como orienta a taxa de juros SELIC para combatê-la, conforme anteriormente visto. No Brasil, existem outras instituições que mensuram a inflação além do IBGE, tais como a FGV – Fundação Getúlio Vargas, e a FIPE – Fundação Instituto de Pesquisas Econô- micas, dentre outras. 2.4 MERCADO DE TRABALHO Com certeza a mais virtuosa meta da política macroeconômica é a geração de postos de trabalho. É com ela que grande parte da população consegue sua renda para aqui- sição de produtos e serviços de sua necessidade. Para a macroeconomia, as características do mercado de trabalho são de suma impor- tância para melhor entendimento acerca da geração de renda, da potencialidade da demanda agregada e do nível de preços. A geração de novos postos de trabalho está diretamente relacionada ao desempenho econômico: economias com altas taxas de crescimento de seus produtos tendem a gerar mais empregos do que aquelas que crescem mais lentamente, ou outras que es- tejam vivenciando um período de recessão econômica, isto é, quando o produto desta economia encolhe. Tabela 02. Rendimento, produção e consumo das famílias (2002 — 2010) Fonte: IPEADATA (2016, adaptado). ANO SALÁRIOMÍNIMO REAL MERCADO DE TRABALHO FORMAL PIB RENDIMENTO MÉDIO CONSUMO FINAL - FAMÍLIAS 2002 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 2003 100,7 84,7 101,1 90,8 100,7 2004 104,4 199,8 106,9 94,2 107,8 2005 111,7 164,5 110,3 96,1 111,5 2006 127,4 161,2 114,7 103,5 117,1 2007 135,1 212,1 121,7 110,5 124,8 2008 139,3 190,5 127,9 115,7 128,1 2009 149,3 130,5 127,5 114,7 137,8 2010 157,3 280,3 137,1 121,3 147,9 A Tabela. 02 confirma a relação entre mercado de trabalho, renda e crescimento do PIB: de 2002 a 2010, observa-se um crescimento de aproximadamente 180% dos postos de trabalho formais e do salário mínimo real de 57,3%, ou seja, já descontada a perda inflacionária do período. 107 4 Economia e mercado Melhores indicadores do mercado de trabalho são responsáveis também diretamente pelo aumento do consumo e, consequentemente, do PIB: o consumo expandiu aproxi- madamente 48%, enquanto o PIB cresceu no mesmo período em cerca de 37%. Na sociedade capitalista, o fator de produção trabalho, assim como outros fatores de produção, é disponibilizado através do mercado. No caso específico do fator trabalho, os trabalhadores vendem sua força de trabalho aos empresários, sendo que estes re- muneram os trabalhadores através dos salários a preços do mercado. O mercado de trabalho pode ser dividido em dois tipos: Mercado de trabalho formal onde existe um contrato formal entre trabalhador e empregador, com garantias e deveres de ambas as partes (conhecido também como trabalho de carteira assinada e regido pela CLT – Consolidação das Leis do Trabalho). Mercado de trabalho informal onde não existe uma relação específica, tampouco existem garantias legais para o trabalhador. Fator Trabalho – Alguns Indicadores e Conceitos Para uma melhor análise acerca do mercado de trabalho, é necessário explorar alguns conceitos sobre ele. Afinal de contas, o mercado de trabalho é muito distinto e complexo: existem trabalhadores com várias habilidades, inseridos em distintos mercados de trabalho. Alguns conceitos acerca do mercado de trabalho: População em idade ativa: divide-se em população economicamente ativa e popula- ção não economicamente ativa. População economicamente ativa: compreende o potencial de mão de obra com que pode contar o setor produtivo, isto é, a população ocupada e a população desocupada, assim definidas: População ocupada: aquelas pessoas que num determinado período trabalharam ou tinham trabalho, mas não trabalharam (por exemplo, pessoas em férias). As pessoas ocupadas são classificadas em: ` Empregados: pessoas que trabalham para um empregador ou mais, cumprem uma jornada de trabalho e recebem em contrapartida uma remuneração em dinheiro ou outra forma de pagamento (moradia, alimentação, vestuário etc.). Incluem-se entre as pesso- as empregadas aquelas que prestam serviço militar obrigatório e os clérigos. Os empre- gados são classificados segundo a existência ou não de carteira de trabalho assinada. ` Conta própria: pessoas que exploram uma atividade econômica ou exercem uma profissão ou ofício, realizando seu trabalho individualmente. 108 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas População desocupada: pessoas que não tinham trabalho no determinado período de referência da pesquisa, mas gostariam de trabalhar e procuraram trabalho de alguma maneira. No que se refere aos indicadores do mercado de trabalho, temos, segundo Chahad (2011): ` Taxa de participação na força de trabalho: mensura o tamanho relativo da força de trabalho, fornecendo uma relação entre oferta de emprego imediatamente dis- ponível na economia. ` Desemprego involuntário: ocorre quando o cidadão deseja trabalhar, mas não encontra trabalho. É também conhecido desemprego cíclico ou desemprego con- juntural. ` Desemprego estrutural: acontece quando o padrão de desenvolvimento econô- mico adotado exclui uma parcela dos trabalhadores do mercado de trabalho. ` Desemprego friccional: surge em decorrência do processo dinâmico que carac- teriza o mercado de trabalho, no qual o sistema de informações sobre a oferta de vagas disponíveis no sistema produtivo é imperfeito. ` Desemprego sazonal: ocorre devido à sazonalidade de determinados tipos de atividade econômica. Você já deve ter percebido que existe uma relação quase direta entre inflação e geração de empregos. Se você acha que sim, saiba que a ciência econômica já se desdobrou sobre o tema, com destaque para a Curva de Philips, que mostra uma relação inversa (um trade-off) entre inflação e desemprego. Não deixe de pesquisar mais sobre o tema em nossa bibliografia básica disponibilizada em nossa Biblioteca Virtual. A Tabela. 03 traz dados recentes sobre alguns indicadores do mercado de trabalho brasileiro. De dezembro de 2010 a novembro de 2015, observamos que a taxa de par- ticipação se mantém quase constante, oscilando entre 57 e 55,4%, e a informalidade caiu, passando de 23,4% do total de ocupados em dezembro de 2010 para 17,3% em novembro de 2015. Tabela 03. Indicadores do mercado de trabalho no Brasil DATA TAXA DE PARTICIPAÇÃO FORMAL INFORMAL DESOCUPADOS1 OCUPADOS1 Dez./2010 57,0% 66,3% 23,4% 100,0 100,0 Dez./2011 56,7% 69,1% 20,9% 90,6 101,3 Dez./2012 57,8% 69,6% 20,5% 90,8 104,4 Dez./2013 56,7% 71,4% 18,0% 84,8 103,9 Dez./2014 55,7% 71,8% 17,3% 84,0 103,4 Jan./2015 55,8% 71,8% 17,3% 103,0 102,5 Fev./2015 55,5% 71,8% 17,4% 113,4 101,4 109 4 Economia e mercado DATA TAXA DE PARTICIPAÇÃO FORMAL INFORMAL DESOCUPADOS1 OCUPADOS1 Mar./2015 55,6% 71,7% 17,8% 119,4 101,2 Abr./2015 55,8% 71,8% 17,6% 124,5 101,4 Mai./2015 55,9% 71,8% 17,4% 130,5 101,5 Jun./2015 55,9% 71,7% 17,3% 134,8 101,4 Jul./2015 56,1% 71,6% 17,4% 147,4 101,4 Ago./2015 56,0% 71,5% 17,2% 148,4 101,2 Set./2015 55,9% 70,8% 17,6% 148,1 101,0 Out./2015 55,4% 71,2% 17,5% 152,9 100,0 Nov./2015 55,4% 71,3% 17,3% 146,5 100,3 ¹ 100= Dez/2010 Fonte: IBGE (2016, adaptado). Contudo, observa-se também o crescimento do desemprego, principalmente nos últi- mos meses de 2015, apresentando em novembro um crescimento de aproximadamente 46,5% em relação a dezembro de 2010. Outra análise importante que deve ser levada em conta quando se analisa o mercado de trabalho é o ganho real da massa salarial. Isto é, verificar se os salários dos tra- balhadores estão sendo repostos e se seu poder de compra (aquele que influencia a demanda agregada) estão sendo preservados e/ ou ampliados. Daremos seguimento ao nosso estudo com o tópico Estado e Políticas Macroeconômi-cas. 3. ESTADO E POLÍTICAS MACROECONÔMICAS Qual o papel do Estado na economia? O que o Estado deve fazer para que as metas de emprego, crescimento e nível de preços seja o mais adequado, visando sempre o desenvolvimento econômico e social de seus cidadãos? Pois bem, só de ler estas perguntas, você já deve ter uma noção que elas não são tão simples de se responder. Ou melhor, suas respostas dependem muito de como os cida- dãos veem o papel de seus governos e sua influência econômica. 3.1 SETOR PÚBLICO No decorrer de nossa disciplina, você foi convidado a refletir acerca de algumas ações públicas: seja para conceituar o papel de Estado previsto por Adam Smith, que delimitava seu poder de atuação em assuntos específicos, seja para analisar a justificativa histórica da macroeconomia e o papel do Estado como condutor do desenvolvimento econômico. Cano (1998) recorda que as sociedades humanas sempre tiveram, desde os primór- dios, decisões superiores acerca de ordem, justiça, guerra, organização tomadas fun- damentalmente por um chefe, que possuía um conjunto de atributos. Este poder do chefe era obtido através de consenso dos membros da comunidade, ou pelo uso da força ou transferidos pela hereditariedade. 110 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas Vasconcellos (2011) elenca uma série de fatores que contribuíram para o aumento da presença do Estado na economia: crescimento da renda per capita, mudanças tecno- lógicas, mudanças populacionais, fatores políticos e sociais, mudanças da Previdência Social, dentre outros. O autor destaca ainda algumas funções do Setor Público: Função alocativa: está relacionado ao papel do Estado em fornecer bens e servi- ços não oferecidos pelo sistema de mercado e à correção de externalidades (positi- vas ou negativas) na produção ou consumo de alguns bens e serviços. Função distributiva: capacidade do Estado em distribuir renda entre os fatores de produção através de tributos, retirando a renda dos mais abastados e transferindo aos menos favorecidos. Esta distribuição também acontece em relação a regiões de um país, isto é, regiões mais desenvolvidas transferem recursos para locais menos desenvolvidos e mais carentes da atenção pública. Além disso, o Estado deve se preocupar na educação e na formação de seus cidadãos, aumentando assim sua produtividade e, consequentemente, sua renda. Função estabilizadora: corresponde à capacidade do Estado em agir na econo- mia com intuito de elevar a geração de empregos ou então controlar os níveis de preço. Esta função está muito relacionada ao que você estudou até o momento nesta disciplina, através dos efeitos das políticas fiscais e monetárias, por exemplo. Vasconcellos (2011) destaca ainda o papel Função de Crescimento Econômico, que se refere ao investimento do Setor Público, isto é, o papel que este assume na condução do desenvolvimento econômico de seus países. Ex.: fornecimento de bens públicos, infraestrutura básica, visando o desenvolvimento de novos negócios (rodovias, portos, aeroportos etc.), subsídios fiscais e disponibilização de crédito para estimular os investimentos do setor privado, visando o crescimento econômico de longo prazo. Giambiagi (2000) comenta que o Setor Público tem a importante tarefa de disponibilizar aos seus cidadãos bens e serviços que não seriam supridos pelo Setor Privado, por se tratar da oferta de bens públicos. Entre os mais importantes, destacados pelo autor, te- mos os serviços de saúde, educação, defesa nacional, policiamento, regulação, justiça, assistência social, dentre outros. Os Diferentes Papéis do Estado Assim como analisa Cano (1998), o Estado, com o passar do tempo e com avanço das sociedades e aumento considerável da complexidade econômica e social, passou a ter diferentes papéis. De acordo com Giambiagi (2000), o Estado passou a exercer os seguintes papéis: Estado condutor: verifica-se a capacidade do Estado em promover políticas eco- nômicas com intuito de se chegar a um certo objetivo. Ele se utiliza de ferramen- tas de intervenção econômica como contingenciamento de divisas, existências de 111 4 Economia e mercado câmbio múltiplo, isenções de tarifas aduaneiras, créditos subsidiados etc., medidas associadas e submissas a objetivos predefinidos. Aqui o Estado tem a capacidade de “ditar as regras”, ser o “comandante do jogo”; o Estado sabe o que quer e aonde quer chegar com suas políticas. Estado regulador: papel do Estado está na sua capacidade de conciliar interesses da Sociedade Civil. O Estado regula questões como o Código Tributário, delibera sobre o grau de concentração econômica aceitável, delibera normas trabalhistas a serem atingidas, enfim, atua como um “atenuador de conflitos” da sociedade. Estado produtor: nesse caso específico, o Estado atua como produtor e forne- cedor de certos produtos e serviços. No caso brasileiro, destacamos a criação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), da Companhia Vale do Rio Doce, criação da central elétrica de Furnas, da Petrobras etc. A atuação do Estado na prestação destes serviços e produtos acontece principalmente quando o setor privado se torna ineficiente e incapaz de assumir certos compromissos. Estado financiador: aqui o Estado atua como centralizador e direcionador de re- cursos da sociedade para a promoção de certos objetivos a serem atingidos. Des- taca-se o grande papel que o Banco do Brasil e o BNDES exercem como agentes fomentadores e disponibilizadores de aportes orçamentários e fundos parafiscais para concessão de empréstimos de longo prazo. A Estrutura Tributária O Estado demanda recursos financeiros para a manutenção de suas atividades, assim como utiliza os tributos para fazer valer suas funções econômicas, como anteriormente descrito. Para que atinjam os resultados da melhor maneira, Vasconcellos (2011) analisa que é necessária a existência de princípios tributários, dentre eles: Princípio da neutralidade: princípio pelo qual os tributos não devem, ou melhor, devem impactar o mínimo pos- sível, não alterando os preços relativos da economia e a eficiência do mercado, tam- pouco interferindo nas decisões econômicas dos agentes de mercado. Princípio da equidade: os tributos devem ser formulados com o intuito de distribuir o seu ônus de maneira justa entre os indivíduos. A equidade leva em conta mais dois princípios, o Princípio do Benefício, que se relaciona ao fato de que o contribuinte paga ao Estado um valor correspondente aos benefícios que recebe do governo, e o Princípio da Capacidade de Pagamento, que considera que o valor pago pelo contribuinte deve levar em con- ta sua capacidade de pagamento. 112 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas Giambiagi (2000) define a existência de dois tipos de impostos: diretos, aqueles que in- cidem sobre indivíduo e estão associados à capacidade de pagamento de cada um dos contribuinte e indiretos, impostos que incidem sobre consumo, vendas ou posse de pro- priedade, independente da característica e capacidade de pagamento do contribuinte. Vasconcellos (2011) comenta que a estrutura tributária pode ser classificada regressiva quando os impostos são proporcionalmente menores que a renda dos contribuintes, ou seja, quando os tributos aplicados não levam em consideração a capacidade de paga- mento do contribuinte. Já a estrutura proporcional ou neutra é o contrário, o sistema tributário leva em conta a renda do contribuinte e as alíquotas do imposto são propor- cionais à renda do cidadão que o paga. 3.2 POLÍTICA ECONÔMICA De acordo com Sandroni (1999), política econômica pode ser entendida como um: Conjunto de medidas tomadas pelo governo de um país com o objetivo de atuar e influir sobre os mecanismos de produção, distribuição e consumo de bens e serviços. Embora dirigidas ao campo da economia, essas medidas obe- decem também a critérios de ordem política e social — na medida em que determinam,por exemplo, quais segmentos da sociedade se beneficiarão com as diretrizes econômicas emanadas do Estado. O alcance e o conteúdo de uma política econômica variam de um país para outro, dependendo do grau de diversificação de sua economia, da natureza do regime social, do nível de atuação dos grupos de pressão (partidos, sindicatos, associações de classe e movimentos de opinião pública). Finalmente, a política econômica depende da própria visão que os governantes têm do papel do Estado no conjunto da sociedade (SANDRONI, 1999, p. 477), grifo nosso. Sandroni (1999) afirma que os objetivos e medidas que as políticas econômicas pos- suem dependem de país para país, de economia para economia, tudo dependendo de como os formuladores da política econômica pensam acerca do processo de desenvol- vimento econômico. No início desta disciplina, foram apresentadas a você discussões ainda na época de Adam Smith sobre quais seriam os papéis do Estado frente a economia: para Adam Smith, o Estado deveria atuar em questões mínimas e bem delimitadas. Com a publica- ção da obra A riqueza das nações e a adoção da Teoria da Mão Invisível, onde a econo- mia deixada por ela mesma (o famoso termo do laissez-faire) se conduz e se equilibra da melhor forma possível, a aplicação de política econômica foi deixada de lado. Partindo desta concepção liberal, o uso de uma política econômica é desnecessário, uma vez que a própria economia traça seus próprios objetivos e encontra seus melho- res caminhos. Porém, após os anos 1930 e as consequências da Grande Crise da Bol- sa de Nova Iorque em 1929, a questão da adoção de medidas de intervenção do Estado na economia voltou a ser repensada e se tornou necessária para enfrentar a crise. Após os trabalhos de Keynes (1996), como já visto anteriormente nesta disciplina, a política econômica começou a ser um meio para que os Governos tirassem suas eco- nomias do caos e da crise implantada após a Crise de 1929. Keynes mudou o enfoque sobre a questão da intervenção do Estado na economia. 113 4 Economia e mercado Políticas Econômicas: Objetivos, Limites e Considerações A Política Econômica, bem como assinado por Sandroni (1999), busca encontrar a fór- mula para que o bem-estar geral da população se estabeleça e aconteça. Contudo, como afirma Lessa (1998), existe um problema metodológico ao conceber a ideia de bem-estar geral da população, pois como podemos chegar a ela através da somatória do bem-estar de cada indivíduo? Como a somatória do bem-estar individual (uma variável) pode criar o bem-estar geral (outra variável)? Assim, como denunciava Adam Smith (1996, p. 172), a grande capacidade do capitalismo é fazer com que “[...] o interesse particular de um partido — aliás, uma parcela subordinada da sociedade — represente o interesse geral da nação”. Cardoso (2005, p. 577), ao analisar a intervenção estatal na economia, afirma que: [...] só liberais antiquados e alguns neoliberais exaltados deixam de perceber que sem um Estado competente na regulação e no controle, embora não inter- ferente na seara própria do mercado, o bom desempenho da economia não se sustenta no longo prazo [...]. Portanto, o papel do Estado neste processo de formulação da política econômica é de fundamental importância. O Governo tem como tarefa escolher os melhores objetivos e analisar os melhores instrumentos a serem utilizados para que tais objetivos sejam alcançados. Assim, temos de um lado a necessidade de encontrar os objetivos que a economia pre- cisa alcançar (objetivos “filtrados” por muitas variáveis não só econômicas, mas muito mais políticas e sociais) e analisar, com muito cuidado, quais os instrumentos a serem adotados, porque eles muitas vezes podem se chocar entre si e se exclui, mutuamente. Vamos agora esquematizar, a partir da FIG. 4, o processo de formulação da política econômica: Figura 04. Processo de formulação da política econômica Fonte: Elaborado pelo autor (2016). METAS GERAIS OBJETIVOS INSTRUMENTOS PROVIDÊNCIAS Segundo Mankiw (2014), economistas divergem acerca de como o Estado deve agir para conseguir alcançar seus objetivos. Para o autor, alguns economistas, tais como Willian McChesney Martin, consideram a economia como inerentemente instável, isto é, a economia convive com frequentes choques, tanto na demanda quanto na oferta agregada, o que obriga os formuladores das políticas econômicas a atuar através dos instrumentos das políticas monetárias (política fiscal e monetária, por exemplo) para que a economia alcance o nível de emprego e de preços (inflação) desejado. Mankiw (2014) também apresenta as ideias de outros economistas que pensam o con- trário, isto é, que a economia é estável por sua natureza. Entre eles, destaca Milton Friedman, que analisa que as oscilações ineficientes pelas quais as economias as ve- 114 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas zes passam, tais como inflação e desemprego, por exemplo, devem-se à atuação “exa- gerada” das políticas econômicas mal formuladas. Este debate de como o Estado deve atuar ou não na economia é longo e ocorre há décadas. Por ora, os objetivos da política macroeconômica são, em termos gerais, de acordo com Vasconcellos (2011): ` Alto nível de emprego; ` Estabilidade dos preços; ` Distribuição da renda socialmente justa; ` Crescimento econômico. Contudo, o que os formuladores, responsáveis pela formulação das políticas econô- micas, devem fazer/praticar para que as suas economias atinjam os resultados acima descritos? Durante esta disciplina, discutimos algumas ações de política fiscal e mo- netária que podem contribuir para que os objetivos da política macroeconômica sejam alcançados (por exemplo, diminuir a taxa de juros e ampliar os gastos do governo, se o desejo é ampliar a oferta de emprego no curto prazo). Cabe atentar que existem outros importantes objetivos da política econômica. Kirschen (1975) levantou uma série de objetivos que as políticas econômicas têm tentado alcançar, tais como expansão da produção, satisfação das necessidades coletivas, melhoria na distribuição da renda e da riqueza, proteção e prioridades para determinadas regiões ou indústrias, dentre outros. Não obstante, as consequências esperadas das políticas econômicas não são tão fá- ceis e previsíveis como apresentado na Teoria Econômica. Mankiw (2014) elenca uma série de fatores que influenciam e dificultam, em certa medida, as ações previstas das políticas macroeconômicas: Hiato de tempo entre implementação das políticas econômicas e seus efeitos: as políticas econômicas levam um tempo para serem formuladas e implementadas. Seus instrumentos possuem tempo de ação mais longos (política fiscal depende de autorização legislativa, o que a torna mais lenta que a política fiscal, por exemplo). Difícil tarefa de Previsão Econômica: tendo em vista que as políticas econômicas demandam tempo para que seus efeitos sejam alcançados, quando se coloca em prática certa medida econômica, é de suma importância que seus implementadores tenham em mente como estará o nível de preços ou o saldo de emprego depois de passado 6 meses, por exemplo. Ou seja, o formulador da política econômica deve se antecipar aos acontecimentos, uma vez que os “remédios econômicos” não são tão rápidos assim e as consequências não tão simples de se prever. Falta de conhecimento e o problema das expectativas: Mankiw (2014) comenta a dificuldade que a ciência econômica tem em “prever” o seu futuro. Para o autor, 115 4 Economia e mercado a economia é uma ciência econômica muito nova e existem muitos fatores econô- micos que são desconhecidos, o que prejudica muito a formulação das políticas econômicas. Entre esses fatores desconhecidos, destaque para “expectativa dos agentes econômicos em relação ao futuro”, isto é, como as empresas e famílias se comportarão após a implementação de certas políticas econômicas: por mais que o Governo deseje e realize açõesvisando o aumento do consumo, por exemplo, as medidas por si só não são suficientes. É necessário tentar prever quais serão as expectativas dos agentes após as políticas econômicas implementadas, tarefa não muito fácil. Outro debate macroeconômico é analisar se as políticas econômicas devem seguir regras pré-determinadas, ou então, ficar à disposição dos critérios de seus formulado- res, isto é, das ações e objetivos de seus governos. Mankiw (2014) traz que as políticas econômicas são conduzidas por regras, caso seus formuladores anunciem antecipadamente como reagirão a várias situações e se com- prometam a seguir aquilo que foi acordado. Exemplo: as autoridades anunciam que aumentarão a taxa básica de juros caso a inflação atinja certo ponto percentual acima da meta estipulada pelo governo. As políticas econômicas podem ficar à mercê do interesse de suas autoridades e formu- ladores, isto é, as ações seguem os desígnios e intenções de seus criadores. Este po- der discricionário, de se decidir o rumo das políticas econômicas se baseando em crité- rios meramente políticos de seus formuladores, tem suas críticas na ciência econômica. Os políticos, sabendo que serão reeleitos caso a economia esteja com bons índices, podem, artificialmente, promover políticas econômicas que terão efeitos positivos no curto prazo, con- tribuindo para sua reeleição, mas, contudo, serão extremamente nocivas no longo prazo. CONCLUSÃO Analisamos nesta Unidade os conceitos básicos sobre moeda e seu papel no desenvol- vimento econômico, além de termos refletido sobre a estrutura do Sistema Financeiro Nacional e seus principais órgãos. Estudamos o papel de cada instituição financeira no mercado monetário, bem como analisamos como a política monetária pode atuar para que o cumprimento das políticas macroeconômicas seja alcançado. Entendemos o que é inflação, suas principais causas, tipos e seus efeitos e consequ- ências na economia. Conhecemos os índices de preço, indicadores que têm como ob- jetivo avaliar a evolução dos preços. Discutimos mercado de trabalho, sua importância econômica, analisando e conhecendo alguns conceitos e indicadores. Por fim, você foi convidado a refletir acerca do papel do Setor Público na seara econômica, assim como seus diferentes papéis assumidos pelo Estado na condução do sistema econômico e social. Conheceu de suas políticas econômicas, bem como atentou sobre os limites e possibilidades na sua execução e efetividades. 116 4 Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. BRESSER PEREIRA, Luiz Carlos. A reforma do aparelho do Estado e a Constituição Brasileira. Bra- sília: ENAP, 1995. 2. _____. Administração pública gerencial: estraté- gia e estrutura para um novo Estado. Brasília: MARE/ ENAP, 1996. 3. _____. Reconstruindo um novo Estado na Améri- ca Latina. Brasília: ENAP, 1998a. 4. _____. Sociedade civil: sua democratização para a reforma do Estado. Brasília: ENAP, 1998b. CANO, Wilson. 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ESTADO E POLÍTICAS MACROECONÔMICAS _GoBack _GoBack unidades_capa.pdf CAixas de destaque A economia no nosso dia a dia 1. ESCOLHAS DOS SERES HUMANOS 2 CIÊNCIA ECONÔMICA E SUAS METODOLOGIAS 3 COMPORTAMENTOS ECONÔMICOS EM SOCIEDADE COMO OS MERCADOS FUNCIONAM? FUNDAMENTOS E REFLEXÕES SOBRE A MICROECONOMIA 1. FUNDAMENTOS DE MICROECONOMIA 2. ELASTICIDADE 3. ESTRUTURAS DE MERCADO A Macroeconomia: da crise de 1929 à Revolução Keynesiana 1. MERCADO SE AUTOEQUILIBRA, PELO MENOS É O QUE PENSAM OS LIBERAIS 2. CONTABILIDADE SOCIAL Moeda e mercado financeiro: Inflação e emprego, estado e políticas macroeconômicas 1. MOEDA E MERCADO FINANCEIRO 2. INFLAÇÃO – CAUSAS E CONSEQUÊNCIAS 3. ESTADO E POLÍTICAS MACROECONÔMICAS