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MATURIDADE DE GESTÃO HOSPITALAR E TRANSFORMAÇÃO DIGITAL OS CAMINHOS PARA O FUTURO DA SAÚDE PRODUÇÃOREALIZAÇÃO MATURIDADE DE GESTÃO HOSPITALAR E TRANSFORMAÇÃO DIGITAL OS CAMINHOS PARA O FUTURO DA SAÚDE ROBERTO GORDILHO © Roberto Gordilho, 2018 curadoria de conteúdo Fernando Teles Arruda Airton Viriato gestão editorial Adriele Marchesini textos Camila Galvez Renan Fonseca capa e diagramação Diógenes Lopes revisão Nathália Lippi Gordilho, Roberto. Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital – Os caminhos para o futuro da Saúde/Roberto Gordilho. – São Paulo: LEDRIPRINT EDITORA, 2018. 196 p. ISBN: 978-85-92505-48-6 1. Administração I. Título 2018, LEDRIPRINT EDITORA SÃO PAULO-SP – CNPJ 23.697.862/0001-10 Rua: Dom Vilares n.º 1.589 – Sala 4 Bairro: Vila das Mercês – São Paulo-SP – CEP: 04160-001 Fone: (11) 2359-6266 www.ledriprint.com.br contato@ledriprint.com.br Agradecimentos À minha mãe, Elzinha, por me ensinar a nunca desistir; ao meu pai, Joaquim, pelo DNA empreendedor; aos meus irmãos, Tina, André e Ana, grandes companheiros de caminhada. À toda a equipe GesSaúde e aos profissionais que emprestaram seu conhecimento e experiência para enriquecer nosso blog, que culminou neste livro. À minha esposa e companheira, Priscila Garrido, que está co- migo em todos os momentos, e aos meus filhos, Gabriel e Felipe, que me lembram sempre da obrigação de deixar um mundo me- lhor para as futuras gerações. CAPÍTULO 1: ESTRATÉGIA EMPRESARIAL Reflexão: Meu incômodo com a maturidade de gestão hospitalar ..... 19 1. A conquista ..................................................................................... 21 2. O porquê ......................................................................................... 22 3. O que esperar ................................................................................. 23 4. Ideologia ......................................................................................... 25 5. Planejamento estratégico ............................................................... 28 6. Primeiros passos ............................................................................ 30 7. Análise SWOT, Matriz BCG e Cinco Forças de Porter .................... 32 8. Orçamento empresarial .................................................................. 37 9. O BSC e o 5W2H ............................................................................ 40 10. O papel dos indicadores ............................................................... 44 11. A Remar ........................................................................................ 47 12. Estratégia colaborativa ................................................................. 50 13. Benchmarking .............................................................................. 51 14. Mercado aquecido ........................................................................ 54 15. Perfil do CEO ................................................................................ 57 Reflexão: Transformação digital e a revolução na Saúde .................. 59 SUMÁRIO CAPÍTULO 2: GOVERNANÇA CORPORATIVA Reflexão: A difícil tarefa de equilibrar resultados com assistência.....65 1. Redução de fraquezas ...................................................................67 2. Otimização gerencial ......................................................................68 3. Níveis de governança corporativa ..................................................70 4. Efeitos colaterais ............................................................................74 5. Conselho de administração ............................................................76 6. Conselho Fiscal ..............................................................................78 7. Compliance ....................................................................................80 8. Gestão de riscos .............................................................................83 9. Hospitais familiares e filantrópicos .................................................86 10. Case: Hospital São Vicente de Paulo ...........................................87 11. Identificação de falhas ..................................................................89 12. Suporte ao cuidado ......................................................................92 13. Pagamento por performance ........................................................94 14. Estruturação de incentivos ...........................................................96 15. Papel do gestor ..........................................................................101 16. Compartilhamento de metas ......................................................103 Reflexão: O impacto da transformação digital na governança corporativa ...............................................104 CAPÍTULO 3: GERENCIAMENTO DE PROCESSOS Reflexão: A relação entre maturidade de gerenciamento de processos e de gestão hospitalar ................................109 1. Business Process Management (BPM) ...................................... 111 2. Impacto na gestão ........................................................................ 114 3. Como implantar ............................................................................. 115 4. Faturamento: área ou processo? .................................................. 117 5. Eficiência....................................................................................... 119 6. Identificação de falhas .................................................................. 120 7. Segurança do paciente ................................................................. 121 8. Redução de erros ......................................................................... 122 9. O papel da consultoria .................................................................. 124 10. Revisão de processos ................................................................. 125 11. Participação da TI ....................................................................... 127 12. Engajamento do time .................................................................. 128 13. Avaliação de desempenho ......................................................... 129 14. Atribuições do gestor .................................................................. 131 Reflexão: A era do paciente no gerenciamento de processos ......... 132 CAPÍTULO 4: GESTÃO DE PESSOAS Reflexão: Maturidade digital ...........................................................137 1. Papel do RH ...............................................................................139 2. Impacto nos resultados ..............................................................141 3. Apoio da TI .................................................................................143 4. Seleção de profissionais.............................................................145 5. Conhecimentos e competências ................................................147 6. Avaliação de desempenho .........................................................149 7. Treinamento e desenvolvimento .................................................151 8. Estímulo e motivação ................................................................154 9. Trabalho em equipe ...................................................................155 10. Papel do CEO ..........................................................................156 11. Desenvolvimento de lideranças ................................................158 12. Mudança com o digital ..............................................................161 Reflexão: Novo papel .....................................................................163 CAPÍTULO 5: TECNOLOGIAS DE GESTÃO Reflexão: TI, estratégia e maturidade de gestão hospitalar ............. 169 1. Além da TI .....................................................................................170 2. TI básica ....................................................................................... 172 3. TI subutilizada ............................................................................... 174 4. Maximização de investimentos ..................................................... 176 5. TI madura e HIMSS ...................................................................... 178 6. Transformação digital e TI ............................................................. 180 7. Atualização do parque .................................................................. 182 8. Novas tecnologias ......................................................................... 184 9. Computação cognitiva .................................................................. 186 10. Wearable devices ...................................................................... 187 11. Impressão 3D .............................................................................. 188 12. Big Data ...................................................................................... 189 13. Novo perfil do CIO ...................................................................... 191 Reflexão: Para surfar na onda da transformação digital ................... 193 11Roberto Gordilho Prefácio Uma visão diferente para resultados diferentes por Raphael Gordilho1 “Insanidade: fazer a mesma coisa várias vezes e esperar por resultados diferentes. ” Caro leitor, começo meu convite à leitura desta obra com a famosa frase de Albert Einstein pois acredito que esse seja um dos maiores problemas que en- frentamos na Saúde brasileira: a sistemática maneira de administrar serviços, o contínuo menosprezo pela educação em gestão e a frequente miopia quanto à função da tecnologia. Nosso País possui 6.787 hospitais, 70% deles são de administração priva- da. Essas estruturas são tipicamente menores, com menos leitos que hospitais públicos. Além disso, são administradas em sua maioria pelo fundador, famí- lias, entidades religiosas ou cooperativas2. Tais administradores tradicionalmente vieram de formações como medi- cina, enfermagem, odontologia, fisioterapia ou outras, que tipicamente não possuem uma disciplina de gestão em suas estruturas curriculares, mas que possuem grande foco na assistência e em sua qualidade. A história se repete em qualquer canto do País. Ao sair da faculdade de medicina, Dr. João abre uma clínica para praticar seu ofício e prestar assistên- cia. Sua clínica começa a ter mais pacientes e crescer, passa a aceitar diversos planos de Saúde e se junta a outros médicos e outras clínicas para prestar um serviço mais completo e holístico. Com a qualidade do tratamento e a cura das patologias em foco, migra para uma propriedade maior, onde implantou alguns leitos para praticar proce- 1 Raphael Gordilho é médico formado pela Faculdade de Ciências Médicas de Santos, com MBA em Marketing pelas ESPM; é cofundador e CDO (Chief Digital Officer) na empresa Live Healthcare, respon- sável pelo site www.saudebusiness.com.br. Em 2016, participou do mediaX Executive Workshop de Stanford, onde discutiu insights na intersecção do comportamento humano e da TI. Também naquele ano cursou o programa de organizações exponenciais realizado pela FIAP em parceria com a Singula- rity University e Hyper Island. Em 2017, ingressou no curso intensivo da Perestroika chamado Cripto, com o objetivo de se aprofundar nos conhecimentos sobre Blockchain, Bitcoin e Criptoeconomia. 2 CNES. Disponível em: <http://www.cns.org.br/links/DADOS_DO_SETOR.htm>. Acesso em: out. 2017. 12 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital dimentos que aproximassem os pacientes da recuperação. Essa estrutura cres- ceu e, de repente, Dr. João se dá conta que construiu um hospital. Glosas, gestão de recursos humanos, rotatividade de médicos, compra de novos aparelhos, expansão, tempo de internação, infecção hospitalar, gestão de farmácia e medicamentos, tabela SUS, acreditações de qualidade, sustentabilidade financeira e muitos outros temas e terminologias passam a ser a rotina de Dr. João. Mas Dr. João não teve aulas de gestão e não encontrou tempo na sua ro- tina para se preparar para esse cenário. Sua formação sem conhecimentos em gestão levou à criação de uma estrutura com vícios de administração, insus- tentável financeiramente e que sofre na relação com as operadoras de Saúde e outros atores do setor. Talvez você tenha se identificado com a história ou conheça alguém que trilhou esse caminho. Fato é que a maioria dos casos repete modelos defasados e viciados de administração, comete os mesmos erros e não consegue encontrar as soluções necessárias para as melhorias. Buscar a educação em gestão é fundamental para mudar a Saúde no País, principalmente em um mundo que muda cada vez mais rápido, com novas tecnologias sendo apresentadas quase que diariamente e com choques de ge- rações, um grupo formado pelos baby boomers e geração X – hoje em cargos administrativos e de gestão – e outro pelas pessoas da geração Y e Z, já tecno- logicamente nativas. Esta obra, escrita por Roberto Gordilho, com quem tive o prazer de discutir sobre esse cenário, é um chamado a fundadores e administradores que buscam sobreviver, florescer e crescer prestando uma melhor assistência em um novo mundo, rápido, maduro, complexo e que não para de crescer e mudar. Você terá acesso a uma grande coletânea de textos focados em estratégia empresarial, governança corporativa, gerenciamento de processos, gestão de pessoas e tecnologias focadas na gestão. Reforço aqui meu convite e destaco a importância da leitura com a frase de um mentor, professor e amigo Gil Giardelli, web ativista, difusor de concei- tos e atividades ligados à sociedade em rede, colaboração humana, economia criativa e inovação. “Não podemos usar velhos mapas para descobrir novas terras.” Boa leitura! 13Roberto Gordilho Editorial Maturidade para um voo seguro por Roberto Gordilho3 O setor de Saúde brasileiro está em turbulência. Essa aeronave enfrenta uma tempestade que promete mudar a forma como os hospitais funcionam e propor um novo modelo de cuidado, em um futuro que já começou. E como esse amanhã é agora, a decisão está em evoluir ou morrer na queda. Há quatro principais desafios externos que os hospitais enfrentam. O primeiro deles é a mudança do modelo de remuneração. Desapegar do pagamento por serviço (fee for service), por si só, já é um desafio enorme, mas não há como voltar atrás. O motivo é simples: a conta não fecha. No formato atual, o risco pelo pa- gamento dos procedimentos é totalmente assumido pela operadora de Saú- de – é ela quem arca com os gastos, mesmo que o hospital gaste “errado” ou em demasia. Com a remuneração por performance, o risco é compartilhado entre hospital e operadora, pois está vinculada à efetividade do tratamento. Essa mudança tem impacto em toda a cadeia de Saúde e acaba por tra- zer o segundo desafio: o esgotamento do modelo de monetização. Atual- mente, a maior parte da receita e do resultado é obtida pela “venda” de materiais, medicamentos e OPMEs (Órteses, Próteses e Materiais Especiais), o que torna as organizações grandes distribuidoras. O terceiro desafio está em fazer tudo isso em meio à transformação digital. Assim como piloto automático não garante que o voo esteja a salvo, o hospital não deve apenas investir em hardware e software e achar que, as- 3 Roberto Gordilho é fundador e CEO da GesSaúde, além de mestrando em administração com especializações em sistemas de informação, engenharia de software, desenvolvimento web, e finanças, contabilidade e auditoria. Já fez cursos de extensão na Kellogg Business School, em Chicago, e na Universidade da California (University of California Irvine, UCI). Em 2017, participou do programa Learning Experience, da StarteSe, com imersão em inovação e negócios em São Francisco no Vale do Silício. Gordilho foi diretor das empresas EXESistemas e Extreme Tecnologia. Também atuou como diretor de sistemas de saúde pública e diretor corporativo de serviços da MV - empresa líder em tecnologia de gestão para Saúde no Brasil--, onde, entre 2011 e 2016, coordenou direta e indiretamente a implantação do sistema de gestão em mais de 300 hospitais de pequeno, mé- dio e grande portes, públicos, privados e filantrópicos em várias partes do País e alguns países da América Latina. 14 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital sim, todos os problemas estarão resolvidos. Transformação digital vai muito além de implantar novas tecnologias – estamos falando de impressoras 3D, computação cognitiva, mas também de mudança do perfil do consumidor e necessidade de uma gestão muito mais profissionalizada. A inovação deve trabalhar a favor dos processos com finalidades que são a principal preocu- pação de todo o hospital: melhorar a qualidade do atendimento e a segu- rança do paciente. O quarto desafio é se manter vivo e relevante no cenário de consoli- dação atual do mercado, com grandes redes comprando hospitais por todo o Brasil. As perguntas que ficam são: o que acontecerá com meu hospital? Será comprado? Terá uma forte concorrência? Como ficará meu negócio? Além dos desafios do cenário externo, muitos hospitais possuem pro- blemas internos que passam pela falta de planejamento, falta de proces- sos claros e responsabilidades definidas (muitos bombeiros e heróis), alto turnover, equipes desmotivadas, existência de feudos dentro da instituição, ineficiência no processo de faturamento, falta de gestão de custos, proble- mas de fluxo de caixa, entre muitos outros vividos no dia a dia, que somados aos problemas externos e à mudança no mercado estão gerando a tempes- tade perfeita na Saúde. Esta obra tem o objetivo de facilitar a transposição dessas dificuldades. O conceito e a prática da maturidade de gestão são essenciais para um voo seguro. Não há como fugir das mudanças externas, mas há como solucionar os problemas internos e preparar o hospital para enfrentar a tempestade. O piloto que vai sobreviver é aquele que conseguir seguir em frente mesmo com as adversidades. 15Roberto Gordilho Colaboradores Esta obra não seria possível sem que os profissionais abaixo listados tives- sem concedido entrevistas ao longo de 2017 para o blog da GesSaúde: Entrevistado Empresa Fernando Teles de Arruda Universidade Municipal de São Caetano do Sul Ernani Mercadante Pactor Finanças Corporativas Celso Poderoso Fiap Alessandra Rossi Stato Claudia Raffa Centro Universitário São Camilo Claudio Tafla Centro Universitário São Camilo Elizabeth de Oliveira Universidade Metodista de São Paulo Marinete Tibério Hospital São Vicente de Paulo Claudio Giulliano Folks Aimar Martins Centro Universitário São Camilo Jaime Gama Hospital São Rafael Celso Baldesin Hospital Emílio Ribas Airton Viriato Instituto de Infectologia Emílio Ribas Cristina de Araujo Lasevicius Senac Tiradentes Ricardo Ayache Caixa de Assistência dos Servidores do Estado do Mato Grosso do Sul (Cassems) Marcelo Esteves Centro Universitário São Camilo Vaneça Moura Consultor de Recursos Humanos Fernando Vincenzo Consultor de Recursos Humanos Klaus Suppion Universidade Metodista de São Paulo Hélder Uzêda Oficina de Empresas C A P Í T U L O 1 CAPÍTULO 1: ESTRATÉGIA EMPRESARIAL ESTRATÉGIA EMPRESARIAL 19Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL Reflexão: Meu incômodo com a maturidade de gestão hospitalar Em 2017 completo 30 anos de experiência no mercado corporativo, sen- do que metade deles estive mergulhado no setor de Saúde, trabalhando, especificamente, com projetos de tecnologia da informação em hospitais. Em todo esse tempo, um tema vem à minha mente – como se uma peça central estivesse faltando em um quebra-cabeça –, o que me gera um nível de incômodo que lembra aquelas coceiras insistentes, que remédio nenhum consegue curar. Falo da ausência de uma administração completamente in- tegrada, que permita evoluir a maturidade de gestão hospitalar. O incômodo foi tanto que mergulhei em um mestrado para buscar a teo- ria que a prática me mostrava todo o tempo, o quão importante é essa visão integrada – e, mais importante, como tocar esse processo. Esse trabalho não é simples. Por dois motivos principais. O primeiro deles é que a gestão de grande parte dos hospitais hoje ainda é departamental. Há feudos dentro da organização, que impedem uma visão e gestão integral e mais efetiva da organização como um todo. O segundo vem da ideia de que informatizar é o único caminho para se elevar os níveis de gestão. Como resultado desse último equívoco, há diversas instituições de Saúde equipadas com carros com tração nas quatro rodas, rodando na pavimentação lisa da cidade. Depois de coordenar a implantação de siste- mas de gestão em centenas hospitais nos últimos anos, constatei que 90% deles utilizam, apenas, de 30% a 40% da potência dos sistemas de gestão que possuem. Por falta de conhecimento, de processos, de capacitação, de estratégia, de disciplina, entre outros tantos motivos. A situação é ainda mais grave quando repousamos as vistas sobre os hospitais de pequeno e médio portes ou nos afastamos um pouco dos gran- des centros. Com a queda de preço da tecnologia dos últimos anos, é pos- sível encontrar ferramentas que poderiam auxiliar muito no gerenciamento – mas, novamente, elas não são usadas em sua total capacidade e terminam gerando benefícios muito inferiores a seu potencial, e a culpa é sempre do fornecedor. Mas fica a pergunta: será que é isso mesmo? Evoluir a maturidade de gestão hospitalar requer, antes de tudo, um planejamento sólido e estruturado de negócio. Porque, sim, hospital é um negócio e, como qualquer empresa, deve ser gerido para uma melhor per- 20 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L formance, aumento do resultado financeiro, redução de custos e desenvolvi- mento contínuo do produto final, que é o cuidado e a segurança do paciente. Formular um planejamento estratégico só não é mais difícil do que o se- guir. Papel aceita qualquer coisa, e muitas instituições fazem planejamento todo ano apenas para colocar na gaveta em março ou abril. O grande desafio é acompanhar de forma regular, corrigir o rumo, tomar decisões, aprender. Isso exige técnica e muita disciplina, mas é fundamental para alcançar os resultados planejados. É essencial, também, passar por algumas perguntas: você está satisfeito com seus resultados? A instituição está produzindo o máximo de resultados que poderia? É uma organização que aprende? Está melhorando a cada dia? A verdadeira riqueza não é medida pela quantidade de bens que acu- mulamos, mas pelo total de sonhos realizados. E como sonho que se sonha junto é o prelúdio da realidade, lhe convido a sonhar comigo. 21Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL 1. A conquista Uma boa parte dos hospitais brasileiros se informatizou a partir dos anos 2000 com o objetivo de modernizar seus serviços e sua gestão. Foram muitos investimentos em informatização de processos – o que é importante, mas insu- ficiente para resolver problemas administrativos e de gestão: 90% de todos os hospitais4 usam menos de 40% dos recursos informáticos que possuem. Enquanto o fornecedor está presente e dá apoio à equipe, a instituição de Saúde consegue utilizar cerca de 60% dos recursos do software. Essa proporção cai com o passar do tempo, geralmente, porque faltam clareza na estratégia, governança corporativa, gerenciamento de processos e treinamento da equipe focado no negócio, não apenas na ferramenta. A informatização é um bom primeiro passo, mas a somente com ferra- mentas estratégicas de gestão e administração, além da sistematização de pro- cessos, é possível construir maturidade de gestão, característica tão necessária para que organizações de Saúde, principalmenteas de pequeno e médio portes, saiam do vermelho e cresçam de forma sadia e sustentável. 4 Pesquisa da GesSaúde feita com cerca de 300 hospitais. 22 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L 2. O porquê Em uma definição rápida, maturidade de gestão hospitalar é sinônimo de administração estratégica e eficiente, voltada ao atingimento de metas e melhoria contínua de resultados enquanto presta um bom atendimento e ele- va a segurança do paciente. Esse movimento se dá de forma progressiva e complexa, a partir da integração entre os atores e elementos que direta ou indiretamente estão envolvidos na assistência, na busca pelo maior controle de processos e gastos e na redução de desperdícios. Como atingir Instituições nas quais os serviços são fragmentados e burocráticos cons- tantemente desperdiçam tempo de atendimento e podem oferecer assistência deficitária aos clientes, seja por longas esperas, seja pela falta de comunicação adequada entre os departamentos. Esse problema de gestão afeta a imagem do hospital e, geralmente, é responsável por acarretar gastos desnecessários, devido à falta de otimização de serviços e recursos. Instituições hospitalares que apostam em uma gestão estratégica, com áreas integradas e treinadas a usar de forma inteligente as soluções tecnológi- cas, reduzem esses problemas e detêm quatro elementos essenciais: qualidade de atendimento, segurança do paciente, eficiência dos processos e sólidos re- sultados financeiros. Benefícios Um plano estratégico bem estruturado pode dizer muito sobre o rumo que a instituição está tomando e até qual o potencial de seu crescimento. E o con- trário é verdadeiro: não possuir objetivos definidos gera complicações e falta de clareza quanto ao caminho a seguir. Com a evolução da gestão hospitalar, os resultados são redução de gastos, aumento da receita e maior qualidade assistencial. 23Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL 3. O que esperar Compreendida a importância e os resultados de uma boa gestão, é hora de iniciar a mudança. Para isso, é necessário o desenvolvimento de cinco impor- tantes pilares: estratégia empresarial, governança corporativa, tecnologias de gestão, gerenciamento de processos de negócios e gestão de pessoas. Evoluir a maturidade de gestão hospitalar demanda uma construção de dentro para fora. Esse processo requer uma integração entre áreas, algo que, tradicional- mente, não ocorre em muitas organizações por questões culturais, já que de- partamentos costumam ser geridos de forma isolada. A proposta, portanto, é visualizar a instituição como um todo, desenhando processos fim a fim e iden- tificando gargalos para, somente então, iniciar ou rever as ações estratégicas, de forma ampla e integrada. Ao formalizar os processos, a organização colhe benefícios tanto de de- sempenho quanto financeiros: maior eficiência operacional, redução do des- perdício, maior integração entre as áreas, menos glosas e redução no ciclo de faturamento, por exemplo. Os resultados são: z Processos alinhados: definir um plano estratégico que avalie se os pro- cessos estão adequados aos objetivos de eficácia, eficiência e qualidade e que permita identificar melhorias na operação é uma forma de en- contrar e sanar gargalos. A consequência é uma gestão mais forte e resultados conectados ao projeto empresarial; z Fluxo de caixa equilibrado: a otimização do caixa exige um controle maior sobre processos e serviços. Por exemplo, uma gestão madura tem maior capacidade de gerir estoques e leitos. Isso implica diretamente em uma movimentação financeira precisa, que evita gastos desnecessá- rios. Evoluir a maturidade pode implicar na redução do ciclo de fatura- mento, o que permite a aplicação de novas estratégias administrativas; z Gestores capacitados: investir em uma gestão madura envolve, neces- sariamente, a capacitação de pessoas (líderes e liderados), com vistas a obter equipe coesa e que detenha visão holística do funcionamento da organização. Os gestores precisam, portanto, aprofundar seus conhe- cimentos sobre diferentes áreas do hospital e daqueles específicos de gestão, como finanças, faturamento, suprimentos, gestão de projetos e 24 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L pessoas, etc. Trocar ideias com líderes de outras instituições ajuda no amadurecimento; z Mensuração de resultados: o acompanhamento sistêmico dos pro- cessos propicia a aferição de metas e planejamento de correções ne- cessárias. Para isso, é preciso que, no planejamento estratégico, sejam definidos indicadores de monitoramento dos resultados. O acompa- nhamento desses números, geralmente, é feito em reuniões mensais, com a participação dos líderes das áreas (colegiados); e z Mais qualidade assistencial: a inserção de melhores práticas de ges- tão não reflete somente em aspectos administrativos. A área clínica do hospital é beneficiada, o que reflete em maior qualidade assistencial – a partir da clareza de processos, redução de erros de comunicação e instituição de protocolos –, e consequente ampliação da segurança do paciente. 25Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL 4. Ideologia Missão, valores e visão são alicerces que resumem a razão de existir de uma organização, sua identidade operacional e ideológica, independentemente do setor no qual está inserida, e servem como premissa para toda a decisão de negócios. Esses conceitos, que não devem ser vistos como mera formalidade institucional, são definidos ou revisados durante o planejamento empresarial. z Missão: motivo pelo qual a instituição foi criada, seu propósito, sua espinha dorsal. A pergunta “qual a nossa missão?” deve ser feita antes mesmo de a instituição ser lançada ao mercado. As razões de existir do negócio podem ser diversas, mas devem ser dispostas de forma clara, objetiva e realista. Construir uma mensagem vaga como “atender ao pa- ciente com eficiência” ou “gerar lucros por meio do aumento no número de usuários atendidos” é pouco efetivo. A missão deve resumir: - o que se planeja entregar à sociedade; - o diferencial do serviço prestado; - mercado de atuação; - principais competências; - a maneira de se fazer negócio; e - o público atendido. Em uma organização com gestão madura, a missão é retomada frequen- temente para auxiliar nas decisões estratégicas. Por exemplo: se não houver confluência entre uma nova oportunidade e a razão de existir da instituição, o negócio não deve ser aproveitado, mesmo que aparente ser rentável. Veja alguns exemplos de missão definidas por organizações de Saúde: Hospital Albert Einstein: “Oferecer excelência de qualidade no âmbito da Saúde, da geração do conhecimento e da responsabilidade social, como forma de evidenciar a contribuição da comunidade judaica à sociedade brasileira”; Sociedade Beneficente de Senhoras – mantenedora do Hospital Sírio- -Libanês: “A Sociedade Beneficente de Senhoras Hospital Sírio-Libanês é uma instituição brasileira que desenvolve ações integradas de assistência social, de Saúde, de ensino e de pesquisa”; 26 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L Hospital São Luiz: “Prestar atendimento médico-hospitalar de alto pa- drão, promovendo a segurança dos pacientes, familiares, médicos e cola- boradores, através da qualidade assistencial de alta performance, infraes- trutura adequada e eficiência operacional”. z Valores: a missão também deve estar conectada aos valores da institui- ção, que resumem sua “personalidade”. Esses princípios servem como balizadores para a contratação e a formação dos colaboradores, com, por consequência, as práticas que serão usadas para alcançar os objeti- vos propostos. Eles apontam de que forma a instituição deve se com- portar com pacientes edemais interlocutores nas mais variadas situa- ções e como o negócio se assume perante a concorrência. Os princípios devem conter expressões que realmente façam sentido para o corpo empresarial e para a missão a qual a organização se propôs a seguir. Veja alguns exemplos: Hospital e Maternidade Brasil: Segurança: a atitude profissional, a pa- dronização dos processos e as ações de prevenção e de contenção permitem minimizar os riscos de nossas atividades; • Ética: a transparência no relacionamento com as partes interessadas gera confiança mútua, ganhos compartilhados e relações duradouras; • Responsabilidade: as ações de cidadania e o respeito ao meio am- biente contribuem para o desenvolvimento social da região e do país; • Vocação: talento em servir com humanização nossos clientes; • Inovação: a atualização constante, o aproveitamento de ideias criati- vas, o uso de tecnologias modernas e confiáveis visam à excelência no atendimento; • Resultado: o retorno do capital investido pelos acionistas resulta da satisfação das partes interessadas e garante a perpetuidade da empresa; Hospital Santa Helena: Excelência no atendimento; humanização; res- peito; valorização pela vida do próximo; Hospital Santa Catarina: Tradição, humanização, credibilidade, respeito e dignidade, empreendedorismo. z Visão: indica como a companhia quer ser reconhecida no futuro e está atrelada ao significado dos objetivos organizacionais. Estruturada uma missão e garantidos os valores de sustentação, a visão é consequência 27Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL final. Somente indicando aonde se quer chegar é possível maximizar resultados. • Exemplos: Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo: “Ser reconhe- cida pela excelência no atendimento, ensino, pesquisa e gestão em Saúde”; Hospital Samaritano: “Ser referência em medicina especializada, integra- da com responsabilidade social, gerando e disseminando conhecimento, investindo na gestão empresarial e no capital humano”; Hospital Santa Isabel: “Ser reconhecido entre as principais opções de hospitais em medicina supletiva”. Estruturados missão, visão e valores, o hospital consegue pensar nos pró- ximos passos da estratégia empresarial. 28 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L 5. Planejamento estratégico O planejamento estratégico é o pensamento sistêmico estruturado para que uma instituição defina e alcance os objetivos previamente traçados. Para o hospital, que também deve ser visto como um negócio, o planejamento se torna uma ferramenta primordial para o equilíbrio entre atendimento de qua- lidade e gestão efetiva de recursos. Afinal, saúde não tem preço, mas tem custo. Por definição, o planejamento é uma ferramenta de gestão. Portanto, deve ser aplicado de forma contínua, atendendo às mudanças do mercado e às ino- vações dos insumos. Assim, a organização é gerida com um olhar holístico e agregador, o que permite o diálogo entre áreas e o atingimento de metas. Pode-se compreender o planejamento estratégico como uma alavanca para o amadurecimento da gestão. A estratégia contempla todas as áreas envolvidas nos processos produtivos, do assistencial ao backoffice, de modo que o alvo é a segurança do paciente e todos os processos que abrangem essa capacidade, como humanização, qualidade assistencial, logística, etc. Na prática A elaboração da estratégia demanda tempo e dedicação, já que é preciso olhar para o passado, avaliar o presente e tentar antecipar o futuro. Definido o modelo de gestão, o próximo passo é elencar os principais objetivos da ins- tituição, que serão compartilhados com os gestores funcionais. A partir daí, os planos serão elaborados com os indicadores de resultados, que devem ser administrados setorialmente de forma contínua. Dessa forma, é possível traçar um roteiro que auxilia na elaboração do planejamento estratégico: • 1° passo: descrição do histórico da instituição; • 2º passo: identificação do modelo de negócio a ser seguido; • 3º passo: definição dos preceitos missão, visão e valores da organização; • 4º passo: análise de cenários e definição dos objetivos organizacionais e ações estratégicas; • 5º passo: elaboração dos planos de ação; • 6º passo: elaboração do orçamento empresarial; 29Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL • 7º passo: implementação dos planos; e • 8º passo: acompanhamento contínuo. Resultados A elaboração e o acompanhamento do plano estratégico trazem os se- guintes retornos: melhoria do desempenho geral, crescimento dos serviços, aumento da receita, redução dos custos, melhor qualidade do atendimento e segurança do paciente, eficiência no fluxo de internação, eficácia no sistema de comunicação, melhoria na organização e controle dos serviços, elevação do desempenho financeiro, redução das reinternações e infecções hospitalares, além da diminuição dos estoques e custos como um todo. 30 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L 6. Primeiros passos Atingir um alto nível de maturidade de gestão significa alcançar os resul- tados planejados com os recursos disponíveis. Quanto maior, mais contínua e sustentável for essa capacidade, superior será o potencial administrativo. No longo prazo, é contínua a elevação da segurança do paciente, da qualidade da assistência, da eficiência nos processos e dos ganhos financeiros. Um planejamento estratégico eficiente passa, invariavelmente, por uma revisão do plano empresarial, para que, antes de mais nada, fique claro se os objetivos traçados estão adequados à realidade da instituição. Essa etapa abar- ca metodologias de análise gerencial, tais como: z Matriz do Boston Consulting Group (Matriz BCG), que estuda port- fólio de produtos ou serviços; z Análise SWOT, que cruza aspectos internos da organização – Forças (S – Strengths) e Fraquezas (W – Weaknesses) – aos externos, de mer- cado – Oportunidades (O – Opportunities) e Ameaças (T – Threats); e z Análise das Cinco Forças de Porter, que entende o posicionamento e os diferenciais da instituição em relação aos pilares Clientes, Concorren- tes, Fornecedores, Novos Entrantes e Produtos Substitutos. Nessa etapa, será revisto o posicionamento estratégico e definida a estra- tégia empresarial, com ranqueamento de objetivos de médio e longo prazos, além de orçamento e investimentos. As grandes metas devem ser subdivididas em objetivos menores, os quais são distribuídos a departamentos responsáveis pelo seu atingimento. Por exemplo: se uma das intenções for reduzir glosas, existem atividades a serem desempenhadas pela equipe clínica (fornecimento assertivo de informações que justifiquem procedimentos), pela área de relacionamento com a operadora (transmissão correta e tempestiva de informações e documentos comprobató- rios), pela central de guias (que deverá buscar autorizações prévias para todos os procedimentos) e, em geral, por todas as áreas ligadas ao ciclo de fatura- mento. Nesse caso, cada departamento pode ter a meta de reduzir em deter- minada proporção o número de erros nos procedimentos. Para que as atividades não fiquem perdidas na rotina hospitalar, é neces- sário que os resultados sejam mensuráveis e comparados com indicadores de 31Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL qualidade e operacionalidade. Os relatórios de acompanhamento devem se- guir uma frequência mínima – mensal, por exemplo – em reuniões coletivas, com participação dos principais agentes envolvidos no colegiado. É preciso que haja planos de ação de curto, médio e longo prazo caso os objetivos não estejam sendo atingidos. Ferramentas de gestão O planejamento estratégico deve buscar utilizar ao máximo os recursos que a instituição possui. Isso significa fazer investimentos somente quando for estritamente necessário. Caso já hajainfraestrutura satisfatória de tecnologia da informação, sequer são necessárias aquisições. Para tanto, é preciso um plano de capacitação de funcionários e gestores, de forma a elevar o aproveitamento, otimizando a uti- lização de recursos, do parque instalado. 32 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L 7. Análise SWOT, Matriz BCG e Cinco Forças de Porter Atingir os principais objetivos de um planejamento estratégico implica em conhecer os fundamentos e a aplicabilidade das metodologias Análise SWOT, Matriz BCG e as Cinco Forças de Porter. O agrupamento dessas ferramentas dentro da gestão hospitalar ajuda na estruturação do modelo de negócio, le- vantamento do público-alvo e serviços que mais geram receita, além da iden- tificação de oportunidades e ameaças de mercado. O papel da Análise SWOT (iniciais de Forças – Strengths, Fraquezas – Weake- nesses, Oportunidades – Opportunities e Ameaças – Threats) é analisar a situação da organização de dois pontos de vista: interno, identificando as forças e fraquezas, e externo, elencando as oportunidades e ameaças às quais a instituição está sujeita. A técnica foi fundamentada por Kenneth Andrews e Roland Christensen, com o ob- jetivo de aprimorar o planejamento estratégico empresarial, que era bastante estimu- lado nas escolas tradicionais norte-americanas ao longo das décadas de 1960 e 1970. A contribuição da Análise SWOT é claramente perceptível, por exemplo, quando ocorrem crises financeiras de alcance nacional. Esse cenário é caracte- rizado pelas altas taxas de desemprego e consequente redução de beneficiários da Saúde Suplementar. Com a metodologia, o gestor identifica as adaptações necessárias do negócio, considerando o momento atual do mercado. Fonte: GesSaúde. 33Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL Também é possível auxiliar hospitais na análise de cenários no caso da ampliação da rede de atendimento por meio de fusões e aquisições. Foco no serviço A Matriz BCG (sigla para Boston Consulting Group, empresa para a qual Bruce Henderson desenvolveu o método nos anos 1970) pode oferecer resul- tados positivos se direcionada para analisar serviços específicos do hospital. Ela é baseada no ciclo de vida dos produtos ou serviços, em sua participação no mercado e no potencial de crescimento. Os produtos e serviços são dispostos em um gráfico no estilo X/Y, no qual: z X representa o faturamento gerado e o potencial de crescimento do mercado; e z Y representa o custo de produção e a participação do produto no mercado. Atenção a esse ponto: quanto maior, mais próxima do zero, que é um com- portamento decrescente em relação às matrizes convencionais. Fonte: GesSaúde. 100 Alta Al to Baixa Dúvida CãoVaca Leiteira Estrela O tamanho da “bola” é o faturamento do produto. Participação relativa de mercado Geração de caixa Cr es ci m en to d e m er ca do Us o de c ai xa Ba ix o 8, 00 % 1 0,56 0 34 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L Para calcular a participação relativa, é preciso dividir a participação de mercado do líder pela participação de mercado da empresa analisada: (1) Por exemplo: se o produto líder tem 10% e o segundo colocado tem 5%, a conta ficará: 10/5 = 2 Participação relativa: 2 (2) Por exemplo: você tem 5% e o líder 10%: 5/10 = 0.5 Ou seja, sua marca tem participação relativa de metade da líder (3) Se você divide a liderança com outra marca, sendo 10% para cada um, fica: 10/10 = 1 Ou seja, sua participação relativa é 1 Acima dele você é líder de mercado. Abaixo dele, não Após o preenchimento do gráfico, cada produto é classificado conforme o quadrante ao qual foi inserido, sendo: z Vaca Leiteira: quadrante de categoria madura, com maior participação relativa no faturamento índices mais baixos de custo/crescimento de mercado. Não requer quase nenhum investimento e marketing, e o pro- duto/serviço gera caixa para rodar os demais; z Estrela: apresenta altos crescimentos e gera caixa, mas requer altos in- vestimentos por ser um produto/mercado em ascensão. A ideia é que esses altos investimentos ajudem o produto/serviço a se firmar para que, quando o mercado esteja maduro, ele vire uma vaca leiteira; z Dúvida ou Criança Problema: tem caixa negativo, e é preciso decidir se ele será levado a uma condição de estrela ou se deve ser interrompi- do; e z Cachorro ou Abacaxi: produto com baixo índice de participação num mercado com baixo índice de crescimento. 35Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL Por exemplo: um hospital possui uma maternidade com alto investimento, mas retorno baixo, já que o número de nascimentos está em queda; e identifica que o setor de oncologia apresenta alta demanda e traz mais receita para a organização. Com apoio da BCG, fica mais fácil visualizar o cenário e tomar as decisões necessárias. Foco na concorrência Outra ferramenta de análise da competitividade empresarial é o modelo das Cinco Forças de Porter. Ele foi desenvolvido para analisar a concorrência entre empresas e seu funcionamento considera cinco fatores – as cinco forças competitivas – que devem ser detalhadamente avaliados para que, então, surja uma estratégia empresarial eficaz. Criado no fim dos anos 1970 pelo professor de Harvard Michael Porter, o modelo se difundiu rapidamente como recurso completo para se analisar um ambiente competitivo. Fonte: GesSaúde. Rivalidade entre Concorrentes Avalia a competitividade do mercado, levando em conta aspectos como: – Quantidade de concorrentes – Diferenciação dos produtos – Diversidade dos concorrentes – Market Share de cada concorrente – Poder financeiro/econômico dos concorrentes Novos Entrantes Avalia a dificuldade de novas empresas entrarem no mesmo Mercado, observando: – Necessidade de capital para iniciar o negócio – Custos de mudança – Acesso aos canais de distribuição – Know How, patentes – Custos e tempo para regulamentação Fornecedores Avalia o poder de negociação dos fornecedores, levando em conta aspectos como: – Quantidade de fornecedores – Custo para mudança de fornecedor Compradores Avalia o seu poder de negociação sobre os fornecedores, observando: – Volume de compras – Custos de mudança de fornecedor – Produtos substitutos – Quantidade de fornecedores Substitutos Analise a possibilidade de produtos substitutos através de: – Propensão do comprador – Relação preço/rendimento – Custos de mudança para o comprador 36 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L Essa ferramenta auxilia na identificação de ameaças de novos entrantes e produtos substitutos, poder de barganha dos fornecedores e dos compradores e rivalidade entre os concorrentes existentes. Para todos Acima de tudo, para obter os resultados esperados de cada uma das meto- dologias descritas, é necessário compreender que todas são complementares e se adequam a hospitais de qualquer formato, tamanho e complexidade. Por outro lado, aqueles que não contam com planejamento estratégico de médio e longo prazo tendem a trabalhar com estratégias intuitivas, que podem levar a erros de direção. 37Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL 8. Orçamento empresarial Não é incomum que os hospitais sejam eficientes na gestão do cuidado e sofram com baixa rentabilidade por causa do desperdício de insumos, capital humano e recursos tecnológicos. O orçamento empresarial funciona como a materialização do planejamen- to estratégico: o momento no qual o gestor dará formato às principais engre- nagens da organização de Saúde. Serve não apenas para garantir a melhor aplicação dos recursos financeiros, mas também para maximizar resultados. Auxilia, ainda, na garantia de recursos que promovam: a segurança dopa- ciente, a qualidade da assistência, a eficiência dos processos e o retorno de investimentos. O que é A origem histórica da ferramenta na disciplina de administração moderna ocorreu em meados da década de 1760, na Inglaterra. O orçamento era uma estratégia de controle e acompanhamento dos gastos governamentais. Não de- morou muito para que as empresas embaladas pela Revolução Industrial o aplicassem para ampliar os lucros. Nesse período, porém, as diretrizes de ges- tão eram definidas verticalmente (por áreas), um passo antes do caminho para a maturidade de gestão, que trabalha a organização de forma holística, na qual todas as áreas e setores são tratados de forma horizontal e contribuem para o crescimento da instituição. Principais resultados O orçamento é uma ferramenta que une controle e planejamento empre- sarial e, portanto, auxilia a garantir saúde financeira e continuidade da institui- ção. Entre os principais resultados, estão: z Clareza de responsabilidades: o orçamento implica que os gestores e a sua equipe formalizem suas responsabilidades e planejem metas para curto, médio e longo prazos; z Facilidade de acompanhamento: a ferramenta estabelece objetivos es- pecíficos – o que facilita o acompanhamento e torna clara a visualização 38 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L do cumprimento, ou não, das metas. Por exemplo: se o objetivo é cres- cer 20% em receita, mas o avanço foi de 15%, a diferença é pragmática e não cabe dupla interpretação. Isso resulta em conferências objetivas e planos de ações assertivos; e z Amplitude de gerenciamento: a ferramenta permite uma visão ma- cro do hospital, sem que se perca uma leitura individualizada, com a contribuição de cada área, para o resultado. Dessa forma, o executivo consegue coordenar as ações considerando as particularidades de cada departamento. Por exemplo: se há problemas no estoque, as ações cor- retivas serão feitas apenas no processo de armazenamento de insumos, sem que haja necessidade de modificar os protocolos da enfermagem. Como construir O orçamento é, geralmente, construído considerando um ano fechado. Para elaborá-lo, é preciso avaliar: z o conjunto de planos que a entidade planeja executar no ano de referên- cia, considerando o plano de negócios (objetivos internos e externos); e z o cenário do mercado (demanda, concorrência, etc.). O cruzamento dessas informações gera o forecast: melhor previsão ou es- timativa possível de toda a peça orçamentária, com base em receita, despesa, custo e resultado. A entidade deve equilibrar essas ofertas e projetar o número de procedimentos de acordo com a sua capacidade instalada e seu quadro de funcionários. As projeções para o ano do orçamento podem ser feitas sob duas perspec- tivas: z Com base no histórico do ano anterior: feito quando a entidade quer manter suas estruturas e formato de atendimento do período passado, melhorando, contudo, performance e calculando taxas de crescimento, considerando potencial de aumento de demanda; e z Com base zero (orçamento base zero – OBZ): utilizado quando a cada ano a instituição refaz do zero seu planejamento orçamentário redefinindo ou revisando toda a sua estrutura de custos, item a item, com base no planejamento definido. 39Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL Além disso, a gestão orçamentária deve abranger três fluxos: operacional (receitas e gastos), de investimentos (gastos efetuados a longo prazo) e o fi- nanceiro (empréstimos e financiamentos), sendo que cada um deve se ajustar às despesas de acordo com cumprimento das metas de receita. Participação coletiva Todos os níveis gerenciais devem participar da formatação do orçamento, de forma a garantir uma visão holística da organização. Em uma administra- ção madura, a responsabilidade pelos resultados é compartilhada entre o gestor e a sua equipe. Dimensionando o orçamento e ampliando a participação de sua forma- tação para diversos departamentos, aumenta-se a possibilidade de manter um quadro financeiro estável, com estoque equilibrado e maior integração interde- partamental. Por isso, pode ser um mecanismo de controle em nível gerencial, uma vez que auxilia os gestores a coordenar esforços de subordinados, sem, contudo, perder o foco multidimensional do negócio e a participação efetiva de todos os colaboradores. Acompanhamento Deve-se levar em conta que a peça orçamentária não pode ser rígida. Na área de Saúde, que lida com doenças que mudam e epidemias que surgem, é importante adequar o plano quando houver intercorrências. Exatamente por isso, é necessária a revisão constante, podendo ocorrer mensalmente, trimes- tralmente ou sempre que preciso. Assim como para todos os patamares da estrutura empresarial, é necessário adotar indicadores de qualidade e resultados para melhor compreensão e im- plementação do orçamento. Avaliar de forma regular e objetiva onde e em que estão sendo aplicados os recursos da instituição, comparar com o planejado e tomar as ações corretivas podem significar a diferença entre lucro e prejuízo no fim do ano. 40 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L 9. O BSC e o 5W2H Hospitais são organizações complexas, inseridas em um ambiente que se torna, progressivamente, mais competitivo, desafiador e impactado pelo avan- ço da tecnologia. Um planejamento empresarial bem estruturado demanda acompanhamento de resultados, processos e evolução do time. Houve uma mudança importante e recente no que é considerado como resultado para os hospitais, o que elevou o grau de exigência sobre o líder: no passado, as métricas usadas eram lucro ou superávit; hoje, a sustentabilidade exige também a consideração de aspectos sociais e ambientais. A velocidade, a intensidade e a imprevisibilidade das mudanças conduzem à necessidade de um contínuo monitoramento e adaptação da organização. Portanto, o ciclo de planejamento não deve ser o único reservado à conferência de resultados e promoção de adaptações. A avaliação é trabalho contínuo e de responsabilidade do gestor. Duas metodologias eficientes para aferir o desenvolvimento dos resultados são a Balanced Scorecard (BSC) e a 5W2H. Balanced Scorecard O BSC foi usado primeiramente como uma ferramenta de avaliação de desempenho organizacional. Seus criadores, Robert Kaplan e David Norton, desenvolveram a ferramenta no início dos anos 1990, ao notar que os sistemas de avaliação utilizados até então tomavam como base apenas indicadores finan- ceiros, o que não garantia uma visão rigorosa sobre a eficácia de um empreendi- mento. A evolução do BSC foi equilibrar esses indicadores com os operacionais, possibilitando um detalhamento melhor da atuação da organização. A ideia é envolver todo o corpo empresarial, colaborador a colaborador, em um mapa estratégico de crescimento, considerando objetivos e metas a serem alcançados de acordo com a realidade do negócio. É uma mudança de perspec- tiva gerencial, tirando o foco exclusivo no financeiro, envolvendo e integrando todos os setores da organização de Saúde na otimização. Para implantar, é necessário levar em consideração alguns pontos principais dessa metodologia. z Mapa estratégico: essa etapa consiste em ressaltar missões e objetivos da organização e elencar em um mapa ou uma planilha os objetivos 41Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL de cada área ou departamento. Em seguida, é necessário identificar e apontar as interseções de auxílio entre áreas diferentes; z Mudança de cultura: é importante que o gestor apresente a metodologia para toda a equipe e motive o time a utilizá-la. O sucesso do BSC como ferramenta de maximização de resultados está baseado na integração dos departamentos e na colaboração. Além de cumprir com as metas próprias, cada departamento tem de compreenderque a organização tem de crescer como um todo, e as suas metas contribuem para o trabalho de todos; e z Indicadores: o BSC se vale de indicadores estratégicos de desempe- nho. Uma vez mapeado todo o negócio de acordo com os objetivos e metas individuais das áreas, o gestor deve criar os indicadores de cres- cimento e resultados. A avaliação periódica desses indicadores dará a visão e a métrica necessária para ajustes rotineiros. A metodologia é dividida em quatro perspectivas: financeira, cliente, pro- cessos internos e aprendizagem e conhecimento: Fonte: GesSaúde As quatros perspectivas de valor: Planejamento Estratégico com BSC Estrutura do Balanced Scorecard: Estratégia (Visão, Missão e Valores) Financeira ProcessosClientes Aprendizagem e CrescimentoPara alcançarmos nossa visão, como deveríamos ser vistos pelos nossos clientes? Para alcançarmos nossa visão, como sustentaríamos nossa capacidade de mudar e melhorar? Para sermos bem sucedidos financeiramente, como deveríamos ser vistos pelos nossos sócios e investidores? Para satisfazermos nossos acionistas e clientes, em que processo de negócio deveríamos alcançar a excelência? 42 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L z Financeira: envolve indicadores e parâmetros que fornecem informa- ções sobre como a estratégia empresarial está contribuindo para o re- torno financeiro; z Cliente: traz informações sobre o mercado, traçando o perfil básico dos consumidores e segmentos. Qualidade, atendimento e custo são dados importantes, pois apresentam ao gestor a forma como a organização atua diante dos pacientes e podem contribuir na captação e fidelização de novos clientes; z Processos internos: avaliam competência e desempenho dos processos implantados. Abordagens de mensuração tradicionais estão mais fo- cadas em dados históricos de desempenho, mantendo toda a estrutura de avaliação no passado que não se atualiza às mudanças de mercado, perfis de cliente, dinâmica de fornecedores e evolução de novas tec- nologias. O BSC, ao contrário, implica em abordagem proativa e de melhor visualização global; e z Aprendizado e conhecimento: dados que apontam o caminho para chegar aos objetivos planejados pelas perspectivas anteriores. É impor- tante capacitar e manter sempre ativo o aprendizado de colaboradores para melhorar o fluxo de informações, a aplicação de atitudes e a com- preensão holística do empreendimento. Com o BSC, a gestão terá um mapa estratégico que permeia, entre outros indicadores, volume de faturamento e participação no mercado (perspectiva financeira), valoração do cliente (perspectiva do cliente/mercado), ampliação da excelência operacional (perspectiva dos processos internos) e compreensão e otimização do investimento em capital humano, mensurado pela perspectiva do aprendizado e desenvolvimento. O 5W2H O 5W2H é outra importante ferramenta de gestão de projetos. Criada pela indústria automobilística japonesa, representa a resposta a sete perguntas: z O que será feito (What); z Por quê (Why); z Onde (Where); z Por quem (Who); 43Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL z Quando (When); z Como (How); e z A qual custo (How much). Essas respostas são dispostas em uma matriz, conforme o exemplo a seguir: O quê (What) Quem (Who) Quando (When) Onde (Where) Por que (Why) Como (How) Quanto (How much) Fonte: GesSaúde Essa análise leva a uma checklist de atividades específicas que devem ser desenvolvidas com o máximo de clareza e eficiência por todos os envolvidos em um projeto. Acompanhamento A utilização desses métodos auxilia os gestores do hospital a estabelecer metas quantitativas e verificáveis, prazos, responsáveis por cada processo, entre outros. Com isso, a execução e a avaliação passam a ser muito mais focadas e objetivas, contribuindo mais efetivamente para o alcance dos objetivos estra- tégicos. 44 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L 10. O papel dos indicadores Manter os processos em funcionamento e garantir o empenho de toda a equipe exige que o gestor tenha auxílio ferramental que indique a qualidade, a seguridade e a dinâmica de todo o funcionamento da organização de Saúde. Os dados coletados nas diversas áreas do hospital, quando correlacionados, transformam-se em indicadores – instrumentos úteis para a avaliação da assis- tência prestada, quantidade e tipo de recursos envolvidos, controle dos custos gerados na produção dos serviços e grau de resolutividade. São os key perfor- mance indicators (KPIs). A ferramenta facilita a leitura da situação real do hospital e, portanto, fun- ciona como medida indireta e parcial de uma quadro mais amplo e complexo. Quando calculados sequencialmente, os indicadores apontam a direção e a velocidade das mudanças e servem para comparar diferentes áreas ou grupo de pessoas em um mesmo momento. Uma vez contrapostos com os de outras instituições ou grupos, indicam o nível de eficiência em relação aos concorren- tes (benchmark). Construção Os indicadores podem ser de dois tipos: de gestão – relacionados ao bac- koffice – ou de operação – conectados ao departamento clínico. Antes de elen- cá-los, vale uma consulta à teoria da administração moderna, que elenca os principais subtipos que regem as métricas: z Indicadores estratégicos: indicam o caminho no qual a empresa está rumo ao atingimento dos objetivos estabelecidos no planejamento es- tratégico; z Indicadores de qualidade: remetem à percepção e à satisfação do cliente final em relação ao produto ou serviço ofertado; z Indicadores de capacidade: é a razão entre a produção por um período determinado de tempo, indicando a competitividade da organização; e z Indicadores de produtividade: representam os esforços e o tempo ne- cessários para gerar determinado produto ou serviço. 45Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL Alguns exemplos Há alguns indicadores típicos do setor hospitalar que podem ser consi- derados pela instituição que for criar seus próprios modelos. Dentre os de operação, podem-se destacar: z Taxa de ocupação: cálculo com a razão entre o número de pacientes- -dia e o número de leitos-dia do hospital dentro de um período de tempo específico – incluindo os extras e excluindo os bloqueados (seja por motivo de infecção, seja por necessidade de manutenção). O leito hospitalar é um recurso extremamente custoso e, portanto, um ponto no qual se pode obter forte ganho de eficiência operacional ao aumen- tar seu giro; z Tempo médio de permanência: representa o número de pacientes atendidos por período de amostragem versus desocupações por altas, transferências ou óbito. Reflete a rotatividade do leito operacional con- siderando o tipo de enfermidade, permitindo, dessa forma, que o gestor ajuste os procedimentos de atendimento e acompanhamento a cada tipo de problema de saúde, por meio de protocolos médicos; z Intervalo de substituição: revela o tempo de ociosidade de um leito entre a saída de um paciente e o ingresso de outro. Calcular o intervalo de substituição permite que o hospital avalie como vem sendo adminis- trado o uso de um leito hospitalar ou de uma sala de cirurgia; z Funcionários por leito: possibilita uma análise das áreas e subáreas de diagnóstico, terapia e acompanhamento de quadro clínico diante da disponibilidade de funcionários. É uma ferramenta importante para aferir o quadro assistencial, indicando a necessidade de contratações e possíveis realocações ou dispensas. Nesse ponto, a produtividade hos- pitalar pode ser considerada por áreas, por exemplo: enfermagem, la- boratório, centro cirúrgico, arquivo médico e radiologia. A avaliação da estrutura gerencial ocorre em paralelo à clínica, uma vez que, por mais que não seja claro na visão histórica do setor de Saúde, ambasestão absolutamente relacionadas e são interdependentes; z Rentabilidade: não apenas um, mas vários indicadores que podem ser calculados levando em consideração cada tipo de procedimento, pro- fissionais, convênios médicos ou departamento. É importante que o gestor, de posse dos dados obtidos por meio desses indicadores, tome as decisões mais alinhadas com os objetivos e a missão da instituição, sem perder o foco nos valores definidos. Uma forma de calcular a ren- 46 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L tabilidade geral e a eficiência administrativa do hospital é por meio do ROI (Return On Investment, ou Retorno Sobre Investimento), que representa a produtividade decorrente da utilização dos recursos, e do Ebitda (sigla em inglês para earnings before interest, taxes, depreciation and amortization, que traduzido literalmente para o português significa lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização); e z Faturamento: tem de ser analisado sob a ótica dos demais indicadores. Se o faturamento não condiz com o previsto na estratégia empresarial, é necessário que o gestor reavalie os demais indicadores e faça a revisão com todos os departamentos. Por isso, processo importante é a Reunião Mensal de Acompanhamento de Resultados (Remar), quando os níveis gerenciais avaliam os indicadores e as metas de cada setor da organiza- ção de Saúde. 47Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL 11. A Remar Se o planejamento empresarial está amarrado com indicadores de qualida- de e rentabilidade, manter a dinâmica dos resultados requer colaboração entre os departamentos. Dessa necessidade nasceu a Reunião Mensal de Acompa- nhamento de Resultados (Remar). A Remar vai além de uma simples conferência entre funcionários e direção hospitalar: z O que é: como o próprio nome diz, um encontro mensal de líderes, que reúne gestores de todas as áreas do hospital para apresentação de indicadores e alinhamento da equipe; z Propósito: acompanhar a evolução do planejamento estratégico e re- solver problemas prioritários, focando sempre a elaboração de medidas corretivas e a reavaliação da eficiência operacional; z Formato: para melhor aproveitamento de todo o quadro empresarial, não pode ser imposta verticalmente, devendo envolver responsáveis dos departamentos. A palavra-chave é granularidade: envolvimento de to- das as equipes para dividir as responsabilidades e aumentar a quantida- de de informações a serem repassadas para grupo gerencial. Coleta de informações Os indicadores discutidos na Remar deverão ter sido previamente defini- dos no planejamento estratégico. A coleta de informações para a apresentação na Remar costuma ocorrer em três níveis: z Operacional: volume de pacientes atendidos, detectação dos principais procedimentos executados pelo assistencial, tempo entre atendimento e alta do paciente, rotatividade de leitos, etc.; z Tático: disponibilidade de insumos e equipamentos para atendimento e cuidado de pacientes, agendamento de salas cirúrgicas e de procedi- mentos ambulatoriais, gestão de recursos humanos (RH), etc.; e z Estratégico: união e engajamento de equipes para contribuição mú- tua, como financeiro, contábil e jurídico trocando informações sobre o 48 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L impacto da judicialização na relação com as principais operadoras de Saúde parceiras e a análise de indicadores estratégicos. Em uma gestão madura, cada área/departamento tem seus objetivos e me- tas estabelecidos no plano estratégico. A junção de todos esses objetivos e me- tas compõem, portanto, os resultados gerais da instituição. O conjunto desses resultados funciona como uma fotografia de acertos e erros, que devem ser compreendidos para que seja possível promover os ajustes necessários, como levantamento de investimentos em insumos, quadro pessoal, etc. Eficiência A eficiência da Remar vai depender de quão alinhados e claros estão os objetivo e metas, como são avaliados os problemas percebidos e quais foram as soluções tomadas para solucioná-los e evitar que se repitam. Durante a reunião, devem ser apresentados e discutidos os indicadores de cada área, como, por exemplo: z Indicadores em geral, com destaque para a saúde financeira do hospital, medida pelo Ebitda (do inglês earning before interest, taxes, deprecia- tion and amortization – ou lucros antes de juros, tributos, depreciação e amortização); z Resultados de cada meta estabelecida; z Desvios em cada processo e departamento; z Profissionais que registraram melhores resultados; z Medidas já colocadas em prática; z Projetos estratégicos; z Carências diversas, seguindo dos insumos para o setor assistencial até o quadro de técnicos, profissionais e colaboradores de forma geral; e z Novas estruturações e mudanças de cenário mercadológico (surgimen- to de uma epidemia, por exemplo, que pode alterar a demanda pelos serviços). Gestão do tempo Para que a Remar seja produtiva, é necessária uma gestão acurada do tem- po. Discussões sobre problemas menores e com efeitos localizados, que não 49Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL afetem o bom andamento geral da organização ou da área, não devem ser trazidas à tona. Saber avaliar a relevância das situações permite que haja mais tempo para discussões mais abrangentes, como falhas processuais, motivadores de glosas e necessidades de reestruturação da equipe, por exemplo. É importante que toda a organização esteja alinhada com as metas, com cada nível hierárquico tendo acesso às informações que fazem sentido e con- tribuem para o seu resultado. Portanto, é papel dos gestores departamentais absorver as mensagens do encontro e transmitir à equipe aquelas que fizerem sentido para o bom andamento de sua área e colaboração com as demais. 50 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L 12. Estratégia colaborativa Um passo crucial para que a maturidade de gestão seja uma realidade entre os mais de seis mil hospitais de pequeno e médio portes no Brasil está na cul- tura do associativismo, para a troca de experiências. Associativismo não é sinônimo de abertura de informações privilegiadas ou sigilosas. É troca de experiências para que se alcance o círculo virtuoso de erros minimizados e acertos maximizados. Isso significa discutir referências de casos, sem, muitas vezes, citar detalhes – com todo o processo sendo condu- zido por alguém de fora, que filtre as informações necessárias e permita que um grupo, restrito e selecionado de pessoas, discuta sobre o assunto com a metodologia adequada. Ser capaz de trabalhar junto, por si só, já é um sinal de maturidade. Per- mitir que os interesses da instituição e das pessoas que dela se utilizam sobre- ponham os desejos individuais é crucial para o desenvolvimento da instituição, mas, acima de tudo, para a sobrevivência do negócio. Isso é ainda mais evidente em tempos de competitividade acirrada, com a chegada de players, nacionais e internacionais, na Saúde brasileira, que podem acabar, de um dia para o outro, com organizações retrógradas e ineficientes financeiramente por entregarem um resultado melhor e mais barato ao paciente. O trabalho em conjunto deve ser encarado como, de fato, ele é: uma manei- ra otimizada de aprender, se desenvolver e crescer juntos, uma vez que a Saúde é feita por muitos atores e negócios. Por esse aspecto é possível compreender que apenas um player não tem a capacidade de deter sozinho a solução de todo um segmento econômico. E nem consegue se abrir para novas e mais baratas soluções que – por que não – o salvem de uma falência, obsolescência, ou que, ao menos, ajudem a pensar em outras possibilidades. 51Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IAEM PRESARIAL 13. Benchmarking Apesar das inúmeras associações existentes no mercado de Saúde, há uma dificuldade histórica na construção de benchmarking entre os hospitais brasilei- ros. Fruto de um modelo de gestão ainda pouco maduro, essa visão individua- lista e parcial compromete a troca de experiências, a construção de melhores práticas e a colaboração para ganhos coletivos. O benchmarking vem como mé- todo de aproveitamento das vivências do mercado com o objetivo de melhorar processos internos, reciclar conceitos e aprimorar a gestão do negócio. O que é A tradução literal da palavra inglesa benchmarking é “ponto de referência”. O termo foi amplamente adotado no universo corporativo a partir da década de 1970, quando o time de engenharia da fabricante Xerox passou a adquirir produtos de suas concorrentes, desmontá-los e absorver ideias que resultariam em melhorias de seus produtos finais. O benchmarking pode ser utilizado em qualquer indústria e em todo o tipo de processo, seja ele de fabricação de produtos, seja ele de prestação de serviços ou relacionados a práticas de gestão. Tem como premissa “observar, aprender e melhorar”, para que a companhia não se limite a seu próprio universo e identi- fique, diante de outros players, concorrentes ou não, novas formas de trabalhar com o intuito de melhorar os resultados. Importante ressaltar que a prática não se resume à cópia de outras orga- nizações: trata-se de análises detalhadas e da escolha de parâmetros e expe- riências que realmente agreguem valor e melhorias para o negócio. No caso de hospitais, é relevante tanto pela perspectiva administrativa quanto assistencial. São quatro categorias de benchmarking5: z Interno: ocorre quando a entidade olha para seus próprios processos, seja em departamentos isolados, seja em unidades, no caso das insti- tuições que trabalham em rede. A ideia é identificar, dentro de casa, formatos mais produtivos e seguros de trabalho, para transformá-los em padrão para a marca; 5 Fontes: GesSaúde; Endeavor. Disponível em: <https://endeavor.org.br/benchmarking/>. https://endeavor.org.br/benchmarking/ 52 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L z Competitivo: a análise, neste caso, é em relação aos concorrentes, e o objetivo final é superar os processos e melhorar a competitividade. Ob- viamente, esse não é um trabalho fácil, porque significa obter um tipo de informação que nem sempre é acessível; z Funcional: a categoria abrange a comparação de processos entre di- ferentes organizações, mesmo que de outros segmentos de mercado; e z Colaborativo ou de cooperação: é a parceria explícita entre duas ou mais instituições para a construção de melhores práticas. Pode ser cria- do por uma entidade “modelo” ou por companhias que, apesar de tra- balharem no mesmo segmento, não atuam na mesma especialidade: um hospital de oncologia e outro especializado em ginecologia, por exemplo. Grupos de trabalho formados por diferentes hospitais e geri- dos por um consultor externo também são um ambiente seguro para o compartilhamento de metodologias e informações. Como aplicar Há um caminho básico que pode auxiliar na complexa missão de se estru- turar um processo de benchmarking: z Passo 1: compreensão dos procedimentos internos. Essa análise primá- ria leva em conta o status atual dos processos em todos os departamen- tos do hospital ou naqueles em que se planeja fazer a avaliação; z Passo 2: momento no qual se escolhe a instituição de excelência, que servirá como modelo; z Passo 3: forma como ocorrerá o benchmarking – se ele será interno, competitivo, funcional ou colaborativo; z Passo 4: identificação de melhores práticas a partir da análise de mercado; z Passo 5: comparação das práticas do hospital aos modelos e às melho- res práticas obtidos no benchmarking, para que os gaps estejam claros e possam ser criados planos de ação para atingir os níveis de referência; z Passo 6: plano de trabalho para acabar com os gaps identificados no passo anterior; e z Passo 7: avaliação contínua dos indicadores para melhoria de processos e novas tomadas de decisão. 53Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL A construção de uma estratégia de benchmarking traz algumas vantagens, sendo que a primeira delas é autoconhecimento sobre o momento da insti- tuição, considerando a profunda análise de processos que ocorre no primeiro passo do plano. Os resultados de uma estruturação bem-feita passam de redu- ção de custos à consequente elevação de rentabilidade e aplicação de protoco- los que elevem a segurança do paciente. Por outro lado, se for malconduzido, pode resultar em uma cópia de modelos de concorrentes, que não se aplicam à realidade do hospital. Assim como demais ferramentas de gestão, precisa ser liderado por um profissional experiente, que consiga extrair os melhores resul- tados a uma baixa taxa de risco. 54 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L 14. Mercado aquecido O movimento de fusões e aquisições na Saúde teve início por volta dos anos 2000, quando o fundo brasileiro Pátria iniciou um processo de conso- lidação de laboratórios clínicos que culminou com a abertura de capital do Grupo Dasa, em 2004. Esse movimento ganhou novo impulso em 2015, com a promulgação da Lei 13.097/2015, que permite a participação de empresas de capital estrangeiro em atividades de assistência à saúde e em atividades de apoio, incluindo hospitais, clínicas e laboratórios, entre outros. Desde então, houve intensa disputa por bons ativos no setor, particularmente no segmento de hospitais e planos de Saúde – processo que se aqueceu em 2017 com a che- gada de novos investidores antes não ligados ao setor. Esse aquecimento foi motivado pelos seguintes fatos: z O tamanho do setor de Saúde no Brasil, que representa cerca de 10% do PIB nacional; z Potencial crescimento do número de consumidores no setor, com o au- mento do rendimento familiar e melhor distribuição de renda, apesar dos “soluços” observados em 2015 e 2016, que provocaram a redução do número de beneficiários da iniciativa privada; z Necessidade de escala e eficiência para combater o aumento de custos; z O modelo verticalizado de planos de Saúde, com hospitais e clínicas próprias, visto como uma saída para ganhar escala e obter sinergias; z Crescimento no número das clínicas populares no médio prazo, com o aumento dos custos e encarecimento dos serviços em planos, clínicas e hospitais de médio e alto padrão; z Aumento do consumo de serviços, motivado pelo envelhecimento da população; e z Maior estabilidade da demanda por serviços de saúde, por se tratar de serviços básicos. Pequenos no foco 55Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL O mercado atual apresenta grande volume de investimento de capital e novas aquisições de negócios, aumentando ainda mais a concorrência. Para sobreviver nesse ambiente, é necessário apostar no aumento do nível de ma- turidade de gestão de forma acelerada, aproveitando o conhecimento compar- tilhado entre hospitais e recursos tecnológicos disponíveis. O novo foco dos investidores são as operações de médio e pequeno porte, já que boa parte das grandes operações no Brasil foram de alguma forma consolidadas em grandes grupos nos últimos dez anos. Para que todo esse processo gere melhorias na assistência ao paciente, uma gestão madura ganha papel de destaque. Uma administração bem desenvol- vida deve contar com uma visão que envolva todas as áreas internas, com o desenvolvimento e a integração de cinco elementos: estratégia empresarial, governança corporativa, tecnologias de gestão, gerenciamento de processos de negócios e gestão de pessoas. Fica na mira de investidores: z Gestão profissional, com foco nos controles e no desempenho da ope- ração; z Controles financeirose operacionais, feitos por meio de sistemas infor- matizados; e z Outras práticas de governança corporativa, alinhadas à estratégia em- presarial. Risco x oportunidade Esse cenário pode ser tanto um risco como uma oportunidade para hospi- tais e empresas de Saúde. A oportunidade vem do fato de que, quanto mais dinheiro é injetado em um setor que ainda tem espaço para crescer, melhores serão os resultados e mais benefícios receberão os clientes. Ao passo que organizações são com- pradas, total ou parcialmente, o resultado reflete em mais recursos, serviços oferecidos e ampliação do capital de pessoas envolvidas nesse mercado. Mas entidades que possuem baixa maturidade de gestão enfrentam duas situações de risco em potencial. A primeira delas é a organização ser comprada a um preço abaixo do seu potencial. Os bons resultados de um negócio estão diretamente ligados à capacidade de gerenciamento de receita e recursos, e uma administração menos desenvolvida é sinônimo de alto índice de glosas, desperdício de verba e equipamentos e dificuldade de antever tendências – e, claro, se preparar para elas. Quanto menor o nível de maturidade de gestão, menor tende a ser o valor pago em um potencial acordo de fusão e aquisição. 56 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L São as regras comuns de um processo de valuation, já que, quanto menor a capacidade de gestão, menos potencial de lucro a organização tem no futuro. Para o comprador, trata-se de uma grande oportunidade, pois ele antevê que, evoluindo a gestão, pode obter resultados muito melhores que os projetados no cenário atual. A segunda forma pela qual o risco se manifesta é o hospital que não tem uma maturidade mínima de gestão, simplesmente, morrer quando concorren- tes chegarem. E como esses competidores não vão partir de um núcleo de em- presários já conhecidos – considerando que eles estão aparecendo via grandes redes, empresas de outro setor e parcerias público-privadas –, pode não haver tempo para se planejar uma reação. 57Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL 15. Perfil do CEO A profissionalização da gestão em instituições de Saúde é um processo recente no Brasil. Historicamente, famílias, médicos e religiosos eram os ad- ministradores, em um cenário no qual o hospital era visto quase que exclusi- vamente como um ambiente de caridade e cuidado e pouco como uma em- presa, que precisa, portanto, gerar resultados. Contudo, com a evolução das tecnologias, demanda e complexidade das relações do setor, as exigências au- mentaram, e técnicas de gestão passaram a ser tão importantes para garantir tanto atendimento ao paciente quanto conhecimentos e habilidades da equipe clínica. A formação em medicina deixou de ser característica essencial para o CEO de Saúde. A régua de corte é o profissional ser capaz de conduzir a equipe e a instituição às metas e aos objetivos. Ele deve estar disposto, portanto: a buscar conhecimento acadêmico e for- mação em gestão, por meio de cursos de pós-graduação, MBA, entre outros; possuir conhecimento prático, para tirar ideias do papel; entender profunda- mente do negócio e do mercado, mantendo-se sempre informado sobre as mudanças e de olho em oportunidades; e desenvolver habilidades de liderança para motivar e engajar colaboradores, sejam eles assistenciais, sejam adminis- trativos. A forma como lida com a tecnologia e a transformação digital também é relevante: ele deve, portanto, entender quais são os processos que demandam ferramentas tecnológicas dentro do hospital antes de qualquer investimento. Isso evita a subutilização de tecnologia. Condução do planejamento estratégico No conjunto de atribuições e deveres do novo CEO de Saúde está o co- nhecimento sobre como realizar o planejamento estratégico, que exige executi- vos com uma visão clara sobre o modelo de negócios e o futuro da organização. Como ponto de partida, é preciso ter em mente os valores e a missão da insti- tuição, e atuar dentro desses conceitos previamente estabelecidos. O desafio, então, é manter a motivação da equipe para que as metas – conceito tão novo para esse perfil de empresa – sejam atingidas. Cabe ao líder desenvolver e supervisionar os demais gestores a partir das competências para 58 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L a elaboração de planos de ação de acordo com necessidades e desafios de cada departamento. A evolução das áreas deve ser acompanhada de perto, com ajuda de indi- cadores – que podem ser assistenciais, como de infecção hospitalar, ou admi- nistrativos, tal qual glosas – criados e pactuados com os gerentes e diretores durante o planejamento estratégico. A determinação de padrões de conduta e melhores práticas também amparam o desenvolvimento, do assistencial ao backoffice. É o CEO quem irá acompanhar a execução da estratégia de maneira con- sistente e constante, para identificar erros, corrigir rotas, encontrar oportuni- dades de melhorias e, por consequência, otimizar a gestão. Acima de tudo, ele tem de estar próximo da equipe para garantir que todos trabalhem de forma coesa com vistas aos objetivos da instituição, que vão além das metas departa- mentais. Tanto implantar quanto acompanhar o planejamento estratégico depen- dem da maturidade de gestão hospitalar. É a evolução dela que irá auxiliar os gestores para que o hospital chegue ao equilíbrio entre a qualidade do atendi- mento ao paciente e os recursos finitos – um dos maiores desafios de gestão da atualidade. 59Roberto Gordilho CAPÍTU LO 1: ESTRATÉG IA EM PRESARIAL Reflexão: Transformação digital e a revolução na Saúde A transformação digital na Saúde é uma realidade que vai, sim, bater à porta dos hospitais. Contudo, não se trata de um movimento que ocorrerá de um dia para o outro: há algumas fases e características que serão percor- ridas a partir de um desenvolvimento que, apesar de natural, não pode ser dado a passos lentos. O processo de informatização dos hospitais pode ser pensado em cin- co níveis: o primeiro deles é o básico, de processos, nos quais estão 90% dos hospitais. Aqui estou falando de organizações que adotam o Sistema Integrado de Gestão Empresarial (Enterprise Resource Planning – ERP), o Sistema de Informatização Hospitalar (Hospital Information System – HIS), o Gerenciamento de Relacionamento com Clientes (Customer Relationship Management – CRM) e outros softwares de gestão. Na segunda etapa, estão as entidades que possuem um Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP), mas que ainda mantêm arquivos em papel. Os hospitais do terceiro estágio são os que possuem PEP com certificado digital e já dispensam a impressão e a assinatura: tudo é eletrônico; o quarto nível são as instituições que, além do PEP, trabalham toda a assistência sem papel – anexando à ficha do cliente todos os documentos que forem neces- sários à composição das análises clínicas, como resultados de exames feitos em instituições externas. Por fim, chegamos ao quinto nível, o do hospital totalmente sem papel, no qual todos os processos – inclusive os não assistenciais, como RH, supri- mentos, faturamento, relação com a operadora, entre outros – ocorrem de forma digital. Esse cenário é absolutamente novo na Saúde brasileira, então poucas instituições tateiam formatos adequados para que ele seja colocado em prática – especialmente por mexer numa relação tão burocrática e com- plexa quanto a do centro de Saúde com o convênio médico. Mas mesmo todos esses níveis de informatização não são suficientes para estabelecer um primeiro passo para a transformação digital na Saúde. Até aqui, tudo o que é feito visa ao aumento de produtividade, à melhoria de processos. Até esse ponto, ninguém pensa em reescrever totalmente a organização e, muito menos, o sistema de Saúde como um todo. Essa tarefa é da transformaçãodigital. E acredite: muita coisa vai mudar. 60 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 1 : E ST RA TÉ G IA E M PR ES AR IA L Veja bem: como o hospital ganha dinheiro? Com procedimentos que ob- jetivam tratar e recuperar o bem-estar do paciente. Para ser tratada, a pes- soa precisa ter um problema de saúde. Sem enfermidade não há receita. A doença, portanto, é mola de toda a cadeia. E para que as operações sejam rentáveis, é preciso otimizar processos e aumentar a rentabilidade. A tecno- logia atua como um meio facilitador. Mas, em todas as indústrias, a transformação digital vem com um mote que, na verdade, é o motor da revolução dos modelos de negócios: o cliente como centro da estratégia. Isso vai reverberar na Saúde, claro. E não vai demorar muito. Toda a adaptação tecnológica dos hospitais, portanto, deverá visar ao bem-estar do indivíduo – ou seja, à não ocorrência de doenças. É nesse momento que serão construídas as instituições de Saúde. As empresas de doença vão desaparecer ou perder espaço, afinal, por mais que não deseje- mos, sempre vão existir casos agudos que precisarão de intervenção médica. O aparato tecnológico deverá focar análises preditivas e preventivas. Big Data, dispositivos vestíveis (wearable devices), Inteligência Artificial, Internet das Coisas (IoT, ou Internet of Things), computação cognitiva e coisas que ainda nem surgiram deverão estar integrados ao PEP, para que seja possível estar um passo à frente da doença. As organizações serão centros de previ- são e prevenção de enfermidades. E isso virá com a tão discutida mudança no modelo de remuneração dos hospitais, partindo do pagamento por ser- viço para o pagamento por performance. Uma coisa vai permitir e estimular o desenvolvimento da outra. Para estar pronto para esse cenário, que deve se tornar realidade daqui a poucos anos, é preciso começar agora. Quando a gente menos espera, aque- le futuro que era distante – pá! – chegou. Não se trata da mudança de uma ou outra entidade rumo ao ganho da eficiência. Trata-se de um movimento generalizado de todo um setor. Quem não se adequar vai desaparecer. CAPÍTULO 2: GOVERNANÇA CORPORATIVA C A P Í T U L O 2 GOVERNANÇA CORPORATIVA 65Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA Reflexão: A difícil tarefa de equilibrar resultados com assistência Uma afirmação que ouço muito entre os profissionais de Saúde quando o assunto é governança corporativa é que a gestão clínica é mais importante que a gestão empresarial. Afinal, a instituição de Saúde nasceu para cuidar do paciente. Essa é uma visão parcial e equivocada: um bom serviço depen- de de equilíbrio entre os dois aspectos. Uma área não existe sem a outra, e elas precisam trabalhar juntas para alcançar os resultados planejados e para o bem do próprio paciente. O setor ainda mantém o foco na figura do médico. Os líderes da maioria dos hospitais são os profissionais da área que, apesar de serem excelen- tes no que fazem, não necessariamente contam com conhecimentos e ex- periência de gestão. Por isso, focam todos os seus esforços na assistência, traçando objetivos e alinhando interesses unicamente nela, muitas vezes se esquecendo que o hospital é uma empresa. Mas experimente deixar a organização um único dia sem a equipe de suprimentos e farmácia, por exemplo. Como será possível administrar os medicamentos receitados sem contar com os profissionais responsáveis pela compra dos itens pelo melhor preço, a gestão do que entra e sai e a dis- pensação do medicamento indicado ao paciente correto? O risco de gastos desnecessários e intercorrências nesse processo seria muito maior. Imagine agora um hospital sem o setor de faturamento. Prestar aten- dimento ao paciente se torna quase impossível quando não há gestão de contas a faturar. A ocorrência de glosas aumenta desenfreadamente, e o hospital não consegue receber o pagamento das operadoras de Saúde. Essa é, portanto, a principal dicotomia do setor: tratar a saúde e gerar resultados que mantenham a qualidade do atendimento, além do equilíbrio dos recursos finitos. Importância x relevância Com essa análise fica claro que, na visão do gestor maduro, a importân- cia que se dá tanto à área assistencial quanto à empresarial de um hospital deve ser a mesma. Mas importância é diferente de relevância. A relevância da assistência nas organizações de Saúde é sempre maior, porém, para que ele atue de 66 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA forma plena, os demais departamentos que fornecem apoio devem estar bem orquestrados. Um paralelo que facilita o entendimento é com os programas de TV: quando assistimos a um noticiário, vemos os apresentadores na frente das câmeras totalmente preparados e tendemos a esquecer de toda a equipe que está atrás daquelas lentes. São eles que ajudam os apresentadores a brilhar na tela. O mesmo processo deve acontecer no hospital: para que o médico garanta a qualidade do serviço, precisa do apoio do backoffice e de todos os serviços de apoio. O gestor O responsável por garantir que assistencial e backoffice funcionem de forma plena e integrada é o gestor. É ele quem precisa evoluir a maturidade de gestão, para que o hospital seja visto como um todo, e não mais de forma departamental – não pode haver caixinhas quando o assunto é administrar uma organização de Saúde. Para percorrer esse caminho e evoluir, é preciso considerar os cinco pila- res da maturidade de gestão – governança corporativa, estratégia empresa- rial, tecnologias de gestão, gerenciamento de processos e gestão de pessoas – em todas as áreas. Não adianta, por exemplo, implantar gerenciamento de processos no atendimento se não há o mapeamento de todos os processos envolvidos no cuidado ao paciente. Não há organização que alcance metas e resultados de estratégia empresarial sem considerar seu backoffice. Não existem tecnologias de gestão que otimizem tempo e recursos sem levar em consideração todos os setores da instituição. Portanto, é preciso unir assistência e gestão para que a instituição possa sobreviver, crescer e cumprir a sua missão e vocação: levar o melhor, mais seguro e mais humano atendimento de saúde àqueles que necessitam. 67Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA 1. Redução de fraquezas Cada vez que uma instituição de Saúde identifica suas fraquezas e procura melhorá-las, investindo no fortalecimento da gestão, está ao mesmo tempo aumentando a força de seus serviços e da entrega do produto final, que é um melhor atendimento ao seu paciente. Os primeiros passos nesse caminho são identificar onde a instituição está em matéria de gestão e definir aonde se quer chegar, e, para isso, é importante a realização ou a atualização do planejamento estratégico e a elaboração de um plano empresarial. Uma vez definido o posicionamento estratégico, que permite identificar forças, fraquezas, oportunidades e ameaças, a organização poderá traçar metas, definir indicadores e elaborar o orçamento para acompanhar esses objetivos. Depois desse processo, é hora de identificar e solucionar problemas que geram ineficiência. Um planejamento só é válido se tiver acompanhamento, por isso é impor- tante haver reuniões mensais de resultados, para avaliar indicadores, realizar as avaliações e definir ações para realinhar a operação em direção aos objetivos definidos. Acompanhamento dos resultados é, acima de tudo, um ato de disciplina e autoanálise da gestão. Mais do que ter indicadores para tudo, é preciso ques- tionar se eles são necessários para o objetivo principal. Caso sejam, devem ser avaliados de forma sistemática e usados como ferramenta para a correção de rotas. Revisão de processos Apesar de as instituições de Saúde usarem sistemas informatizados de ges- tão para otimizar processos, não é raro eles terem sido elaborados em épocaspassadas e precisarem ser revisados e incorporados com as boas práticas atuais. Feito isso, haverá uma tendência maior em ganhar eficiência, reduzir desperdí- cios, melhorar a qualidade da assistência e a segurança dos pacientes, além de atingir um aumento no faturamento e/ou redução de perdas. 68 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA 2. Otimização gerencial A governança corporativa vem para modernizar recursos, trazer uma nova cultura de serviços e de prestação de contas, a partir da implantação de con- troles internos, de gestão de riscos, assim como do incentivo às boas práticas, envolvendo desde sócios até investidores e órgãos de regulação. Ela deve atri- buir à administração os princípios6 de: z Transparência: prática de disponibilizar às partes interessadas as infor- mações que sejam de seu interesse, e não apenas aquelas impostas por disposições de leis ou regulamentos. Não deve restringir-se ao desem- penho econômico-financeiro, contemplando também os demais fatores (inclusive intangíveis) que norteiam a ação gerencial e que condizem à preservação e à otimização do valor da organização; z Equidade: tratamento justo e isonômico de todos os sócios e demais partes interessadas (stakeholders), levando em consideração seus direi- tos, deveres, necessidades, interesses e expectativas; z Prestação de contas (accountability): relatórios de conduta claros, con- cisos, coesos, compreensíveis e tempestivos. Gestores devem assumir integralmente as consequências de seus atos e omissões e atuando com diligência e responsabilidade no âmbito dos seus papéis; z Responsabilidade corporativa: zelo pela viabilidade econômico-fi- nanceira das organizações, reduzindo as externalidades negativas de seus negócios e suas operações e aumentando as positivas, levando em consideração, no seu modelo de negócios, os diversos capitais (financei- ro, manufaturado, intelectual, humano, social, ambiental, reputacional, etc.) no curto, médio e longo prazos. Hospitais privados x filantrópicos Tradicionalmente, as instituições de Saúde consideram como distintas a gestão empresarial e a gestão assistencial, o que gera um dilema administrativo. 6 Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). 69Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA A governança corporativa entra, portanto, como apoio na resolução de ques- tões-chave para o gestor, que tem um modelo claro para tomar suas decisões. No caso dos hospitais privados, parte do pressuposto de que seus sócios e gestores têm como objetivo melhorar a eficiência operacional e, consequente- mente, otimizar a geração de lucro. Por sua natureza, esse perfil de instituição tende a ter mais facilidade na atração de investimentos em forma de capital financeiro. Dessa forma, um dos focos da governança corporativa dessas insti- tuições é a transparência e a prestação de contas. Sob o ponto de vista dos hospitais filantrópicos, a exigência para a presta- ção de contas parte da sociedade. Deixar de investir em governança corpora- tiva diante da crise é um dos maiores erros da gestão, uma vez que implica em perder a atenção no controle de riscos e custos. Isso também pode resultar em uma miopia na introdução de padrões de governança, o que pode comprome- ter os retornos positivos em curto, médio e longo prazo. 70 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA 3. Níveis de governança corporativa Um dos principais termômetros da maturidade de gestão é o nível de pro- fissionalismo do modelo de governança corporativa (GC). São cinco etapas de maturidade7: Nível 1 – Iniciado z Possui conselho de administração (CA); z As demonstrações financeiras são auditadas por auditor totalmente in- dependente da gestão: contratação, destituição, honorários, escopo e avaliação; e z Ninguém na companhia está envolvido em decisão sobre sua remune- ração. Nível 2 – Expandido z O conselho fiscal (CF) é permanente; z O conceito de segregação de funções permeia todos os processos da companhia; z A renovação contratual da auditoria independente está condicionada a uma avaliação formal e documentada; z Há uma área responsável por propor, monitorar e avaliar a adequação dos controles internos, políticas, normas e procedimentos da compa- nhia; z O CA monitora a implementação das recomendações referentes a de- monstrações financeiras, controles internos, políticas e procedimentos; z Os mandatos no CA e na diretoria executiva têm tempo determinado e recondução condicionada a alguma avaliação formal de desempenho; 7 NETO, João Souza. Maturidade em governança corporativa: diretrizes para um modelo preli- minar. Brasília: Universidade Católica de Brasília, abr. 2013. 71Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA z Os acordos com efeitos societários na companhia estão disponíveis a todos os sócios; e z Há política de alçadas decisórias. Nível 3 – Institucionalizado z Há profissional ou área dedicada ao tema GC; z Cargos de diretor-presidente e presidente do CA não são ocupados pela mesma pessoa; z CA e CF têm orçamentos próprios e autonomia para gerenciá-los; z Há canal direto de comunicação com o CA (ouvidoria e/ou canal de- núncias); z O CA e o CF têm agendas anuais de prioridades e calendário de reu- niões; z O CA é o principal componente do sistema de GC da companhia e seu principal protetor; z Há, como um dos comitês de assessoramento ao CA, o Comitê de Auditoria; z Há, como um dos comitês de assessoramento ao CA, o Comitê de RH e remuneração; z Há, como um dos comitês de assessoramento ao CA, o Comitê de GC; z Há política de prevenção e combate a atos ilícitos; z A remuneração paga à diretoria, ao CA e ao CF é divulgada em blocos distintos; z Há política de operações com partes relacionadas; z Há políticas de divulgação de informações e uso de informações privi- legiadas (insider information); z Há política sobre atos gratuitos; e z Há procedimento sistemático de convocação, realização de reunião e registro de deliberações em Assembleia Geral (AG), reuniões do CA, reuniões do CF e comitês. 72 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA Nível 4 – Aprimorado z Os acordos de acionista arquivados na companhia não restringem os direitos ou competências do CA, CF e/ou diretoria executiva; z O CA promove sessões executivas e apenas seus membros ficam pre- sentes no momento das deliberações; z O CA revê, periodicamente, seus comitês de assessoramento e as polí- ticas da companhia; z Cabe ao diretor-presidente a indicação dos diretores e a proposição de suas remunerações para aprovação do CA; z O sistema de controles internos e gestão de riscos são avaliados perio- dicamente por auditor externo independente; z A composição do CA e a seleção de seus membros são definidas me- diante processo estruturado e consideram as necessidades da compa- nhia; z O CA estabelece e monitora o plano de sucessão para o diretor-presi- dente da companhia; z As metas, avaliação e remuneração da diretoria executiva consideram objetivos de curto a longo prazo, incluindo aspectos socioambientais; z O relatório anual de administração é abrangente, tem padrão interna- cional e é auditado; z Todas as políticas da companhia são deliberadas pelo CA e estão dis- poníveis publicamente; z Há direito a voto para todas as ações; z Todos os sócios são estimulados a incluir assuntos e participar das AGs; e z O Código da Conduta é abrangente e contempla o relacionamento en- tre administradores, conselheiros, acionistas, empregados, fornecedores e demais partes interessadas (stakeholders). Nível 5 – Completo z Não existem dispositivos que restrinjam a substituição dos atuais ad- ministradores; 73Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: GO VERN AN ÇA CO RPO RATIVA z Trabalhos específicos atestam a qualidade das informações oriundas de controladas, coligadas ou quaisquer outras que sejam refletidas nas de- monstrações financeiras da organização; z A remuneração do CA considera o valor econômico gerado, os riscos assumidos e não se baseia em resultados de curto prazo; z A AG estabelece regras e limites sobre a participação de administrado- res da companhia em outros conselhos, diretorias e comitês; z Há relatos periódicos (trimestralmente, no mínimo) sobre a atuação e o desempenho da companhia, e não estão restritos a informações eco- nômico-financeiras; z Todos os comitês são coordenados por um conselheiro independente e a maioria de seus membros é composta por conselheiros; z Os acionistas não controladores indicam a maioria dos membros do CF; z As operações com partes relacionadas são aprovadas em AG por quó- rum qualificado; z Em alienação de controle, há direito de venda conjunta para todos os sócios em iguais condições; z Não há conselheiros internos no CA, sendo a maioria independente; e z Após cinco anos, eventual renovação contratual dos auditores indepen- dentes é matéria qualificada de AG. Os níveis e detalhes descritos não consideram o mercado de Saúde em específico, mas trazem diretrizes gerais de melhores práticas. Aqui, vale um adendo: os dados do Serviço de Atendimento a Clientes (SAC) ou ouvidoria são fontes relevantes de informações para que sejam propostas melhorias ba- seadas nas críticas e reclamações dos pacientes. Além disso, seguir o fluxo de processos recomendado por órgãos de acreditação hospitalar, como o da Or- ganização Nacional de Acreditação (ONA), contribui para atingir uma gestão mais eficaz. 74 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA 4. Efeitos colaterais Um dos principais indicativos de uma organização de Saúde com pouca ou nenhuma aderência à metodologia de governança corporativa é a desorga- nização interna. Uma vez que o conceito tem como característica determinar regras e parâmetros de gestão da entidade, abrir mão dele leva a uma adminis- tração instintiva e não profissionalizada. Outros sintomas ajudam a identificar a falta de compromisso com técnicas de governança corporativa: z Desalinhamento entre departamentos: isso se reflete em problemas de comunicação, retrabalho, baixa eficiência operacional e não atendimen- to a protocolos internos; z Lideranças sem autonomia: baixa autonomia das lideranças para toma- da de decisões operacionais e gerenciais; z Falta de profissionalização da gestão: determinações baseadas no feeling dos gestores ou do dono do hospital, mesmo que estejam em desacordo com a estratégia empresarial divulgada; z Ausência de prestação de contas: compartilhamento de informações sobre o negócio às partes interessadas ocorre sem frequência adequada, quando ocorre; z Falta de transparência: board e demais gestores desconhecem processos decisórios ou não têm acesso a decisões antes de elas serem tomadas; e z Desalinhamento entre sócios: problemas de relacionamento entre os sócios do hospital transparecem nos demais departamentos, causando desalinhamento nas dinâmicas de trabalho e excesso de competitivida- de negativa interna. A governança corporativa é crucial para evitar esses desgastes, principal- mente em organizações geridas por grupos familiares. Transparência, respon- sabilidade corporativa, equidade e prestação de contas são fundamentos que uniformizam o negócio e apresentam um padrão ético a ser seguido por todos, dos gestores aos funcionários. 75Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA A falta de uma estratégia de governança corporativa também dificulta o enfrentamento de crises financeiras e baixas de orçamento. Decisões concen- tradas apenas nas mãos do superintendente podem dificultar os processos, deixando-os lentos e, muitas vezes, ocasionando no não atingimento das me- lhores soluções. Importante frisar, ainda, que decisões monocráticas reduzem o engajamento da equipe. 76 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA 5. Conselho de administração O conselho de administração é um órgão com potencial de maximizar a governança corporativa nas organizações de Saúde, priorizando decisões cole- tivas em detrimento das individuais. Sua implantação tem como objetivo me- lhorar a qualidade das decisões estratégicas e contribuir para mitigar riscos. O papel do conselho é supervisionar as atividades gerenciais, sendo responsável pela estratégia da organização. É ele que dá as orientações gerais dos negócios, bem como seu parecer sobre o relatório de contas. Para montá-lo, é necessário reunir profissionais que, com suas diferentes expertises e vivências práticas, sejam capazes de visualizar a instituição como um todo, a fim de buscar os melhores resultados – seja no equilíbrio das fi- nanças, seja no atendimento direto ao paciente. Isso porque o conselho precisa estar apto a identificar e corrigir desvios de gestão em diversos níveis, como jurídicos, financeiros e de planejamento, por exemplo. Entenda algumas par- ticularidades: z Composição: não há uma regra sobre o número de participantes na composição do conselho de administração, mas, em geral, é composto por diretor, tesoureiro, seus respectivos vices e provedores. A composi- ção pode continuar com integrantes como diretores técnicos, clínicos, administrativos e também profissionais gabaritados de fora da institui- ção. No caso de hospitais filantrópicos, por exemplo, muitos empresá- rios de outros setores têm por hábito integrar o conselho de adminis- tração, já que auxiliam na captação de verba; z Frequência e papel: as decisões sobre como será formado o conselho e com que frequência serão as reuniões dependem de cada hospital. O que não pode variar é o fato de que os conselheiros têm responsabilida- de para com o negócio, e não para com quem os indicou, ou seja, sem influências pessoais ou profissionais. Por isso, é importante dar atenção primordial à formação específica do profissional que ocupará os cargos e preencher as lacunas necessárias de conhecimento que contribuirão para o bom andamento geral; z Remuneração: a remuneração dos integrantes do conselho – tanto em hospitais filantrópicos como privados – serve como catalisador da pro- 77Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA fissionalização do grupo. Sem a prática, é difícil conquistar o compro- metimento do grupo no longo prazo, e, sua relevância e sugestões de conduta perdem poder diante do gerenciamento formal da instituição; z Avaliações: é necessário mensurar as atividades do conselho por meio de avaliações periódicas de desempenho. Dessa forma, é possível saber como cada conselheiro contribui para os resultados do hospital e do próprio conselho; e z Poder de decisão: na Saúde, boa parte das decisões estratégicas refe- rentes ao hospital deve ser tomada pelo conselho de administração. Nesse aspecto, o conselho ajuda a promover a integralidade entre os membros para manter as metas e os objetivos da instituição. Com a evolução da maturidade de gestão hospitalar, o conselho ganha auto- nomia para a tomada de decisão, inclusive se essa decisão for pela troca do superintendente, por exemplo. Essa liberdade de atuação auxilia no desenvolvimento econômico sustentável do hospital, melhorando o seu desempenho e facilitando o acesso a recursos. 78 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA 6. Conselho Fiscal A metodologia de governança corporativa é dividida em cinco níveis, que indicam quão madura é a gestão da organização. No primeiro – conhecido como iniciado –, é imprescindível a presença de um conselho de administração; no segundo – o expandido –, faz-senecessária a instituição do conselho fiscal. O que é? O conselho fiscal8 tem como função fiscalizar o trabalho dos administra- dores e do próprio conselho de administração, além de emitir pareceres sobre demonstrações financeiras, alterações de capital e outras atividades gerenciais. O grupo deve se reunir com uma periodicidade definida em uma agenda anual e ter autonomia orçamentária. Ele é composto por profissionais multidiscipli- nares, que são remunerados a partir de uma política clara e, preferencialmente, não variável. Sócios controladores e não controladores devem indicar os nomes dos conselheiros, que serão selecionados, posteriormente, em uma eleição. Impacto na gestão Consiste em uma poderosa ferramenta para boas práticas de governança corporativa no hospital. É responsável pela fiscalização contábil e financeira, ajudando a planejar melhor os recursos disponíveis, otimizar os custos e até mesmo evitar fraudes que prejudiquem o desempenho da organização – como, por exemplo, o desvio de recursos da instituição por meio de contratos fraudu- lentos, que não tenham comprovação de serviços prestados. Competências z Fiscalizar e verificar o atendimento das obrigações legais e estatutárias por parte da administração da sociedade. Isso se dá por meio do acompanha- mento da estrutura de capital e o endividamento de curto e longo prazos, unindo informações que serão comparadas com concorrentes no mercado; 8 Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Guia de orientação para o conselho fiscal. Disponível em: <http://www.ibgc.org.br/userfiles/1.pdf>. http://www.ibgc.org.br/userfiles/1.pdf 79Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA z Acompanhar a execução dos orçamentos de operação e manutenção e de investimentos, inclusive com possibilidade de pedido judicial caso as informações não sejam liberadas; z Garantir que os resultados produzidos pelo hospital estejam de acordo com o estabelecido pelo estatuto social, evitando, por exemplo, con- tratações em condições de favorecimento. Nesse ponto, deve-se ficar atento também à gestão de pessoas, acompanhando, por exemplo, o número de reclamações trabalhistas; z Elaborar medidas para evitar autuações e penalidades; e z Decidir sobre investimentos e gerenciamento de riscos. Como o conselho fiscal está focado diretamente no controle dos atos in- ternos da companhia, deve avaliar ações da administração executiva e reprová- -las quando necessário. Para tanto, é crucial haver independência de seu traba- lho. Tanto o executivo quanto o board e o próprio conselho de administração devem estar abertos para essas interferências, que visam melhorar o trabalho da instituição como um todo e elevar seus resultados. Para opinar sobre os atos e as possíveis tomadas de decisões, o conselho fiscal tem de ter acesso às documentações e aos relatórios, com foco em iden- tificar potenciais riscos, avaliar decisões de negócios e de parcerias. Para os acionistas ou sócios, o conselho fiscal é a garantia de que a organização é gerida de forma clara e competente em relação aos seus números e procedimentos contábeis e fiscais. Para cumprir com o seu papel, tem de conhecer as propostas de orçamento e capital. O report é feito diretamente aos acionistas. Sua composição deve ser renovada periodicamente, conforme o código de conduta. O caráter independente do conselho fiscal agrega confiabilidade à admi- nistração e à marca do hospital, o que se reflete em melhores negociações com potenciais credores e adiciona pontos em processos de negociação ou renego- ciação de contratos e valores. 80 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA 7. Compliance O compliance é um importante conceito de governança corporativa para hospitais. Deve estar conectado à estratégia da instituição e ajuda a elevar a maturidade de gestão por estar em linha com os quatro pilares de governança corporativa – transparência, equidade, prestação de contas e responsabilidade social –, o que facilita o alcance de metas operacionais, financeiras e de aten- dimento ao paciente. O termo é originado do verbo to comply, que em inglês significa “agir de acordo com uma regra”. Foi criado no início do século 20 nos Estados Uni- dos, com a instituição do Food and Drug Administration (FDA), departamento de segurança alimentar e de medicamentos norte-americano, que tem como objetivo garantir que indústria e comércio atendam a controles mínimos de qualidade e segurança. O conceito ganhou espaço no mercado corporativo nas últimas décadas. Quando uma organização de Saúde tem compliance, significa que ela segue tanto leis e regulamentos externos quanto internos, sejam eles impostos, sejam voluntários: z Normas internas: aquelas apresentadas no manual de práticas éticas (código de conduta), missão e valores de uma organização e em ativi- dades cotidianas e operacionais definidas pela instituição; e z Normas externas: desde aspectos tributários e fiscais até o cumpri- mento das resoluções dos respectivos conselhos regionais e federal das profissões envolvidas – medicina, enfermagem, fisioterapia, entre outras. Como funciona Em instituições com gestão madura, em geral há funções que podem estar em um ou mais departamentos (dedicado ou não) responsáveis por garantir o compliance, com os seguintes objetivos e responsabilidades: z Analisar riscos operacionais e fraudes; z Desenvolver projetos de melhoria contínua; 81Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA z Gerenciar os controles internos (fiscalização das normas e procedimen- tos, em todas as esferas da organização); z Monitorar políticas de recursos humanos, tecnologia da informação, segurança da informação, antifraude, etc.; z Realizar auditorias periódicas; z Elaborar manuais de conduta e desenvolver planos de disseminação do compliance na cultura organizacional; z Fiscalizar conformidade contábil de acordo com as normas internacio- nais (International Financial Reporting Standards – IFRS); z Fiscalizar conformidade regulatória; e z Interpretar leis e adequá-las ao universo da instituição. Para criar uma área ou função de compliance, é preciso: z Passo 1: construir um código de conduta, que esteja alinhado a missão, visão e valores da instituição e à legislação vigente; z Passo 2: comunicar o time sobre as regras de forma consistente, gene- ralizada e abrangente; z Passo 3: garantir que os gestores da instituição respeitem o código de conduta e, portanto, liderem pelo exemplo; e z Passo 4: possuir normas, processos e procedimentos definidos e comu- nicados a toda a instituição. Papel do gestor O papel do gestor é imprescindível na aplicação do compliance como parte da governança corporativa e estratégia da organização de Saúde. Ele é o res- ponsável pela operacionalização e o bom cumprimento das expectativas de- mandadas pelos conselhos de administração, fiscal, de auditoria e assembleia de acionistas instalados nas organizações de Saúde. Instituições com gestão madura em geral optam por estabelecer comitês ou fóruns para reunir líderes executivos responsáveis pelos vários domínios dos riscos envolvidos em compliance, a fim de propor uma visão consistente e sistêmica sobre o tema. Nessas grandes instituições, o papel do chief compliance officer (CCO) vem ganhando destaque, com mais supervisão e autoridade. 82 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA Resultados O compliance traz confiabilidade e profissionalização à gestão dos hospi- tais, uma vez que gera boas práticas, orienta a organização quanto ao cumpri- mento das leis, resoluções e normas, que contribuem para o gerenciamento maduro. Dessa forma, melhora a percepção do público, de parceiros e credores da instituição. 83Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA 8.Gestão de riscos O gerenciamento de risco9 é uma ferramenta de gestão que visa antecipar potenciais perigos, conforme os diferentes cenários que a organização pode enfrentar. É uma importante etapa durante o planejamento estratégico e tem como principal objetivo fornecer suporte para a tomada de decisões diante de eventos indesejáveis. Dentro da governança corporativa, existem várias alternativas para a cons- trução de uma estrutura de gerenciamento de riscos. Cada organização deve adotar a estrutura que melhor se enquadre no perfil do negócio, mas uma saída comum é a criação de uma unidade responsável por essa função. A cultura de riscos de uma gestão define como ela identifica, aceita e ge- rencia os eventos e ações que podem influenciar o cotidiano do hospital. Por sua complexidade e importância, a gestão de riscos envolve conselho de admi- nistração, conselho fiscal e comitê de auditoria, em três linhas de defesa: z A primeira é realizada pelos gestores das unidades e responsáveis dire- tos pelos processos. Deve operar as funções de gerenciamento e respon- de em primeiro lugar pelos riscos; z A segunda é executada pelos gestores corporativos de práticas de con- trole e tem a finalidade de oferecer visão integrada dos riscos; e, z Por fim, a terceira linha de defesa é realizada pela auditoria interna e fornece avaliações por meio do acompanhamento dos controles internos. Para colocar a gestão de riscos em prática, é necessário envolver as áreas técnicas, que vão oferecer as informações necessárias para complementar a vi- são sobre potenciais intercorrências. Quatro passos ajudam no processo: z Identificação: essa é a etapa de levantar o conjunto de eventos externos e internos que podem impactar de alguma forma os objetivos estra- tégicos ou comprometer a operação. Ao observar o ambiente externo do hospital, os gestores devem se atentar aos possíveis cenários e às mudanças no setor. Em seguida, o olhar deve ser direcionado para o 9 Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC). Guia de orientação para gerenciamento de riscos corporativos. Disponível em: <http://www.ibgc.org.br/userfiles/3.pdf>. 84 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA interior do negócio, identificando pontos fracos, fortes e autonomia de resposta aos eventos. O número de ocorrências dependerá do porte e do tipo de serviço prestado pela organização. Esse processo deve ser revisto frequentemente, com periodicidade a ser definida pela gestão, para que seja possível a rápida adaptação às mudanças. O perfil dos riscos pode ser definido pelo corpo executivo e avaliado pelo conselho de administração; z Avaliação: nesse momento, é preciso saber quais tipos de efeitos os ris- cos podem causar na organização de Saúde, como, por exemplo, redu- ção na qualidade do atendimento, queda nos resultados, multas fiscais, etc. Saber a potencialidade de eventos futuros fornece embasamento para o tratamento que será executado; z Implementação: é realizada por meio da estruturação dos processos internos, com o intuito de reduzir, mitigar e absorver impactos, além de fomentar a cultura de gestão de riscos. Ou seja, os responsáveis pelo gerenciamento de riscos são os gestores de um determinado processo, que devem fazer acompanhamento contínuo; e z Monitoramento: após identificado o risco, é preciso acompanhar a evolução do evento, formatar medidas de desempenho, descrever o im- pacto em relatórios e quantificar possíveis perdas, a fim de criar padrões que serão seguidos caso o evento volte a ocorrer. O conselho de administração também tem o papel de fortalecer com o corpo executivo e a diretoria a importância da manutenção da gestão de riscos e a sua disseminação a todas as áreas da organização de Saúde. Papéis Cabe ao conselho de administração identificar os perigos e definir e atuali- zar o apetite de risco da organização, que significa o quanto de exposição uma instituição pode tolerar para atingir suas metas e seus objetivos. O conselho também deve monitorar periodicamente os potenciais eventos. O conselho fiscal, como órgão de governança, pode assumir a supervisão e o monitoramento da gestão de riscos, que inclui a supervisão dos comitês de auditoria, gestão de riscos, auditoria interna, áreas contábil, jurídica, de ética e conduta. O objetivo é usar as informações desses agentes para formar opinião sobre os atos da gestão. As informações pertinentes sobre os riscos são direcionadas para a direção ou presidência do hospital. Esse alto escalão se vale de todos os dados para as- 85Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA sumir a tomada de decisões, baseado no apetite de risco. Todos os detalhes da decisão, contudo, são antes discutidos com o conselho de administração, para nortear as ações e evitar possíveis erros de conduta e investimento. 86 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA 9. Hospitais familiares e filantrópicos Os hospitais brasileiros utilizam diferentes formas de administração, a de- pender do porte e das características. No entanto, há uma percepção clara entre todos: é preciso ter um modelo baseado em gestão estratégica, inovação, gestão participativa e de qualidade. Governança corporativa significa gestão, o que inclui planejamento, dire- ção, controle, relação entre sócios, conselhos, clientes, fiscalização, entre ou- tros. E gestão condiz com qualquer modelo de negócio hospitalar – inclusive os filantrópicos e familiares, os quais, historicamente, possuem uma gestão mais voltada ao assistencialismo e menos direcionada a melhores práticas de mercado. Assim como ocorre com os hospitais privados, portanto, essas entidades devem começar um processo de governança corporativa atendendo aos con- ceitos de transparência, equidade, prestação de contas (accountability) e res- ponsabilidade corporativa. Não há motivos para exceções ou adaptações nesses aspectos. Minimamente, devem ser criados os conselhos de administração e fiscal. Família e provedores podem integrar esses grupos, porém, sem ter maior peso de decisão que os demais – respeitando, aqui, o item equidade. Isso, aliás, é im- prescindível, já que os conselheiros precisam decidir com base na missão e visão da organização, estratégia, necessidades dos stakeholders e dentro da lei, e não baseados em interesses. Sendo assim, o conselho de administração está acima da superintendência sempre, e o conselho fiscal deve estar na linha de staff. Porém, mesmo com as etapas descritas, evoluir a maturidade de gestão hospitalar exige a compreensão e a aplicação de outras ferramentas impor- tantes, como a implantação de auditorias independentes, código de conduta, manual societário (estatuto, acordo e transparência), órgão de fiscalização e controle, entre outras. 87Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA 10. Case: Hospital São Vicente de Paulo Em sua origem etimológica, a palavra filantropia significa “amizade pela humanidade”. O conceito original, desenvolvido no início do século 20, parte do princípio de que a ação social nasce da decisão individual de um possuidor de bens ou recursos financeiros, que acredita que esses recursos doados a uma entidade ou a uma causa podem fazer a diferença na vida de uma ou mais pessoas. Dentro desse conceito nasceram os hospitais filantrópicos, que hoje so- mam em torno de 2.600 instituições no Brasil. São organizações privadas, mas que não têm fins lucrativos, e muitas vezes prestam seus serviços em parceria com o Sistema Único de Saúde (SUS). O modelo de instituição sobrevive por meio dessas parcerias e também de seus mantenedores, que colaboram com recursos para manter os hospitais funcionando. É o caso do Hospital São Vicente de Paulo (HSVP), no Rio de Janeiro, cuja história começou na década de 1930, quando as filhasda caridade de São Vicente de Paulo criaram uma instituição escola. Em 1980, a unidade deu lu- gar ao HSVP, que, em 1998, obteve a certificação ISO 9002:1994, e em 2008, o selo internacional de excelência e segurança na assistência ao paciente da Joint Commission International ( JCL), um dos mais importantes órgãos de acreditadação em Saúde do mundo. Liderança Os reconhecimentos são mantidos e renovados anualmente até hoje. A líder desse resultado é a Irmã Marinete Tibério, CEO desde 2009. Quando assumiu o cargo, a instituição enfrentava dificuldades de caixa, como tantos outros hospitais filantrópicos, com déficit de R$ 20 milhões vindo de 2008 e expectativa de perdas de R$ 22 milhões em 2009. Além de ser graduada em direito, Irmã Marinete já tinha experiência em gestão, pois era ecônoma provincial da Associação São Vicente de Paulo, cargo que ocupou por sete anos. Consciente dos desafios e das peculiaridades da nova função à frente da administração de um hospital de grande porte, ela decidiu se especializar, com- plementando a formação com dois MBAs: administração hospitalar e gestão em Saúde. 88 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA A gestora estruturou, ao longo dos últimos anos, todos os processos assis- tenciais. No período, foram adotados novos protocolos de assistência e realiza- dos investimentos na compra de equipamentos com tecnologia de ponta e na criação de serviços especializados. Todo esse trabalho resultou no reconheci- mento do HSVP como uma instituição de padrão internacional e referência na área de Saúde, com foco voltado para a melhoria na qualidade e na segurança do paciente. Para esse processo de reestruturação foi necessária consultoria externa e especializada. Dessa forma, a transformação do gerenciamento do hospital respeitou três importantes eixos: renovação da governança corporativa, rees- truturação financeira e redesenho da vocação médica. Apesar de o hospital não visar ao lucro, o gerenciamento leva em conta que o equilíbrio financeiro é determinante. Isso porque, com recursos escalonados e auditados, é possível para a organização filantrópica investir em projetos de crescimento, oferecer benefícios para colaboradores e equipes e outras aplica- ções. No caso da gestão da CEO, todo o superávit é reinvestido no hospital, isso feito com transparência e participação do corpo administrativo. A história da evolução administrativa do HSPV mostra que precisou ha- ver uma mudança de mentalidade em todos os setores para que as medidas implantadas alcançassem resultados. Gestões passadas mantinham uma visão voltada ao assistencial, ligada ao conceito de obra de caridade. Não existia a convicção que uma organização hospitalar filantrópica, familiar ou societária é, antes de tudo, uma empresa, com objetivos realistas que carecem de plane- jamento, indicadores, divisão de departamentos e todos os preceitos de uma governança corporativa atualizada e atenta para a evolução de implementos tecnológicos e a gestão de pessoal. “É preciso equilibrar a caridade sem es- quecer que hoje a instituição hospitalar é vista como um negócio. E não posso tratar de maneira diferente o hospital religioso e filantrópico se o mercado não o faz”, relata Irmã Marinete. 89Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA 11. Identificação de falhas É papel do gestor hospitalar garantir que a governança corporativa passe de teoria à prática. Implantar uma governança mais profissional, metodológica e madura na organização de Saúde é um processo que depende de acompanha- mento constante e efetivo do líder. Apesar de cada hospital ter sua particularidade e cada equipe responder de uma forma específica às determinações da diretoria, alguns sinais recorrentes dão indícios de que há falhas na implantação da governança. Níveis básicos Há níveis de maturidade no que se refere à adoção das metodologias de governança corporativa. A ausência de alguns recursos básicos pode indicar falhas nessa etapa inicial: z Conselho de administração: é inadmissível conceber um projeto de governança corporativa sem um conselho de administração. É papel desse grupo melhorar a qualidade das decisões estratégicas e contri- buir para mitigar riscos e possíveis erros gerenciais. Contudo, de nada adianta constituir o órgão apenas como fachada, sem permitir que seus integrantes tenham autonomia em relação à gestão executiva. É preciso ficar claro que o papel do conselho é, exatamente, promover evoluções no formato gerencial, o que ocorre quando há uma demanda, que pode ser identificada sob forma de maus resultados ou perda de oportunida- des de negócios. Esse grupo deve, portanto, ser independente; z Auditor independente: esse importante agente de governança tem como objetivo principal verificar se as demonstrações contábeis estão em conformidade com a realidade. Sem a figura de um auditor inde- pendente, não há a garantia externa que as demonstrações de resultados e os balanços refletem a realidade das operações; e z Interferência financeira: se a organização tem um conselho de ad- ministração e possui auditoria independente, mas permite que seus executivos decidam sobre suas próprias remunerações, ainda tem um longo caminho a percorrer para atingir o status de governança corpo- rativa madura. O sistema de remuneração e incentivos é uma das mais 90 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA potentes armas da governança corporativa porque tem como propósito elevar o desempenho da organização, criando e mantendo incentivos que motivem os dirigentes e colaboradores a maximizar a eficiência operacional, o retorno sobre ativos e o crescimento da produtividade no longo prazo. Níveis intermediários Resolvidas essas três questões, considera-se que a organização de Saúde atingiu o primeiro nível da governança corporativa. É hora, então, de promo- ver avanços. Aqui, outros pontos de evolução: z Conselho fiscal: é importante que esse grupo seja permanente, porque seus integrantes têm como missão fiscalizar as ações praticadas pelos administradores e opinar sobre as contas da organização (demonstra- ções financeiras, modificações de capital, incorporação, entre outras). Os membros devem se reunir para analisar amplamente os assuntos de sua competência e emitir pareceres e manifestação. Qualquer acionista pode solicitar a instalação do CF e também sugerir a eleição de mem- bros qualificados para compor seu quadro; z Monitoramento: nesse nível, também é esperado que o conselho de administração fiscalize a implementação das recomendações referen- tes a demonstrações financeiras, controles internos, políticas e proce- dimentos. Os mandatos do conselho e da diretoria executiva também devem ter tempo determinado e recondução condicionada a alguma avaliação formal de desempenho; e z Dedicação exclusiva: também é esperado que haja um profissional ou área exclusivamente dedicado ao tema governança corporativa. Outro comportamento que se deve evitar: ocupação dos cargos de diretor-pre- sidente e presidente do CA pela mesma pessoa. Nível avançado Para alcançar a excelência da governança corporativa e dar passos mais seguros em relação à maturidade da gestão, é preciso evoluir os preceitos. São sinais claros de falha nesse processo: z Dispositivos que restrinjam a substituição dos atuais administradores; 91Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA z Plano de remuneração do conselho de administração não respeitar di- retrizes, como valor econômico gerado, os riscos assumidos, e não se baseia em resultados; z Ausência de relatórios trimestrais sobre a atuação e o desempenho da companhia ou que são restritos apenas a informações econômico-fi- nanceiras; e z Falta de conselheiro independente na coordenação de cada um dos co- mitês. Portanto, elaborar o checkliste verificar se há sinais de falhas na implanta- ção de cada uma dessas ferramentas pode indicar o que é necessário mudar no processo de governança corporativa e, assim, evoluir o nível da maturidade da gestão hospitalar. 92 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA 12. Suporte ao cuidado A área assistencial representa o primeiro contato do paciente com o hos- pital. É possível encontrar executivos que levam tão a sério essa afirmação que focam todos os seus esforços nela, esquecendo-se que a qualidade da assistên- cia também depende do backoffice. Mas como esse é o ambiente que, de fato, o paciente enxerga, é o principal responsável por garantir a estabilidade da marca ou prejudicar todo o negócio. Para que o último caso não aconteça, toda a estrutura por trás da assistên- cia tem de estar alinhada e funcionando harmonicamente. Ou seja, é preciso complementaridade para garantir o objetivo final: a qualidade do cuidado ao paciente. Por isso, é importante que a organização se atente aos agentes de governança corporativa. O hospital deve ser visto por todos os colaboradores, sejam eles clínicos, sejam de backoffice, como um negócio, o que significa que há limites de re- cursos e indicadores financeiros e de performance a serem atingidos. Alinhar qualidade de atendimento às características econômicas e estruturais da orga- nização é papel do gestor. Papéis A gestão empresarial tem o papel de garantir que todos os insumos, re- cursos e equipamentos estejam disponíveis para a atuação da gestão clínica no local, quantidade e tempo corretos. O compliance entra nesse aspecto para garantir que a organização está de acordo com as exigências legais do setor de Saúde para o paciente. É preciso que o médico tenha condições adequadas de trabalho, sentindo-se com plena autonomia para atuar pela melhor assistência ao paciente. E isso só é conseguido por meio de todos os processos e as práticas administrativas que são adotados pela gerência empresarial. Por exemplo, a organização e agendamento de salas cirúrgicas têm de ser clara e atender às mais variadas demandas. Para isso, é necessária a união entre a gestão empresarial, que, baseada nas informações cedidas pela administração clínica, se encarrega da compra de equipamentos e insumos cirúrgicos, efetua a contratação de pessoal técnico e de apoio e organiza a escala de uso do am- biente. Se tudo está em ordem, basta aguardar a atuação da equipe. 93Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA A administração do estoque de insumos vai permitir que o hospital com- pre itens pelo melhor preço e que sejam liberados na hora certa. Novamente, o compliance ganha notoriedade, pois, em se tratando de materiais de alto valor agregado, é necessário que tudo esteja de acordo com o que exigem os órgãos de fiscalização. É nesse departamento que as datas de vencimento e validade de remédios, por exemplo, têm de ser rigorosamente acompanhadas. A soma de forças das duas gestões também pode contribuir para a pa- dronização de práticas assistenciais, conhecidas como protocolos clínicos. O objetivo é elevar a performance da equipe de cuidado, a partir da adoção de um código de conduta específico para cada cenário, e promover maior segurança do paciente. Nesse ponto, a tecnologia pode contribuir para o mapeamento das principais tarefas assistenciais, reunindo informações sobre o paciente e disponibilizando-as para o corpo médico, auxiliando na recepção e no encami- nhamento da pessoa. Para executar seu trabalho, a equipe médica não pode se preocupar com falta de insumos, limpeza de áreas de tráfego, disposição de leitos e baixo nú- mero de colaboradores. É a gestão empresarial que se encarrega para que tudo esteja em ordem, de modo que a equipe tenha total foco no paciente. Se todos os grupos de apoio ao setor assistencial estão comprometidos com a missão e os valores da organização de Saúde, é possível executar um trabalho eficiente e entregar ao médico e paciente um ambiente sustentável, dinâmico e totalmen- te voltado para a assistência de qualidade. 94 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA 13. Pagamento por performance De tempos em tempos, o setor de Saúde retoma discussões sobre uma dico- tomia que compromete seu desenvolvimento: de um lado, quanto mais deman- dado, maior será a receita dos hospitais; de outro, quanto menos o usuário buscar atendimento, mais as operadoras e o próprio Sistema Único de Saúde (SUS) economizam. Em meio a esse conflito de interesses, está o paciente, que espera do sistema – seja público, seja privado – um atendimento seguro e de qualidade. A mudança no modelo de remuneração hospitalar – de pagamento por serviço (fee-for-service) para pagamento por performance – é alternativa am- plamente debatida no Brasil como saída para resolução do impasse. Mas não se trata da única forma de combater essa situação. Contexto O fee-for-service foi criado nos Estados Unidos na década de 1930 e esta- belece que haja uma tabela, com valores pré-definidos, para a remuneração de cada procedimento, como exame, internação, cirurgia, consultas, etc. O mode- lo estimula a produtividade, em detrimento, muitas vezes, da qualidade. O for- mato também estimula a ineficiência do ponto de vista de backoffice, uma vez que as operadoras de Saúde e o próprio SUS exigem uma série de documentos que comprovem a necessidade de realização de procedimentos, o que eleva tanto a incidência de glosas quanto a não autorização da prestação de serviço. Segundo relatos históricos, o pagamento por performance foi instituído na década de 1990 na Austrália. Por fazer parte de um sistema de pagamento mais amplo, baseado em valor (value-based payment), prioriza a qualidade de atendimento na quantia paga pela operadora ou pelo SUS ao hospital. A ava- liação é feita por meio da soma de qualidade assistencial e do custo compatível; portanto, quanto maior a qualidade e menor o custo para a prestação do servi- ço, maior a percepção de valor e, portanto, a remuneração. Além do pagamento por performance, há outras alternativas sob o concei- to de pagamento baseado em valor em discussão ao redor do mundo: z Pagamento por capitação (capitation): provedores de serviços recebem um valor fixo por paciente, em uma área de abrangência e em determi- nado período de tempo; 95Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA z Pagamento por pacote de serviços (bundle): valores fixos por procedi- mento e pelo ciclo do cuidado, desde antes da internação até um período que pode variar de seis meses a um ano pós-alta; e z Pagamento por diagnóstico (Diagnosis Related Groups – DRG): tem como base a Classificação Internacional de Doenças (CID), e o paga- mento é feito de forma integral, considerando o diagnóstico. Maturidade da gestão A mudança do modelo de remuneração é debatida há alguns no Brasil, o que faz com que muitas instituições de Saúde desacreditem que, de fato, o impasse possa ser resolvido de forma tempestiva. Contudo, enquanto o setor não entra em consenso sobre o assunto, aderir às metodologias de governança corporativa representa um passo rumo à redução de glosas e à garantia de bom funcionamento da instituição, seja ela pública, seja privada. Graças às ferra- mentas da estrutura, é possível: z O aumento de controle sobre procedimentos realizados e documenta- ção coletada, que facilita a relação com a fonte pagadora (operadora de Saúde ou SUS); z A instituição de protocolos clínicos, que eleva a eficiência do atendi- mento e da segurança do paciente; z O acompanhamento constante dos conselhos fiscal e de administração, o que garante melhoria constante de processos; e z A maior clareza sobre as demandas, o que gera um relacionamento mais claro com fornecedores a respeito de quantidade de insumos que precisamser adquiridos. Como as glosas são decorrências da falta de capacidade de comprovar a necessidade dos procedimentos, a maturidade de gestão proporciona melhor preparação das organizações. A rotina de urgência vivenciada pelas instituições cobra dos colaboradores maior atenção no cumprimento das atividades como, por exemplo, no lançamento na conta de medicamentos e demais insumos utilizados no atendimento dos pacientes. Uma gestão madura e com visão holística sobre o funcionamento da organização usa das ferramentas de gover- nança para melhorar a comunicação entre equipes e facilitar os processos para os colaboradores. 96 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA 14. Estruturação de incentivos Instituído com a Constituição de 1988, o Sistema Único de Saúde (SUS) tem como prerrogativa a garantia de atendimento universal à toda a população, como um dever do Estado. Mesmo com auxílio do serviço suplementar – que acolhe cerca de 20% da população10 –, ofertar o serviço indistintamente a cerca de 208 milhões de pessoas11 é tarefa viabilizada, somente, com ajuda de enti- dades privadas, via programas de incentivo fiscal e financeiro. No artigo 197, a Constituição prega: “são de relevância pública as ações e os serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, so- bre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado”12. Já no artigo 199, expressa, claramente, a possibilidade de a iniciativa priva- da participar ativamente do SUS: “as instituições privadas poderão participar de forma complementar do Sistema Único de Saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de direito público ou convênio, tendo preferência as entida- des filantrópicas e as sem fins lucrativos”13. A participação complementar no SUS está limitada às situações em que as disponibilidades dos órgãos e das entidades públicas forem insuficientes para garantir cobertura assistencial à população sob sua área de abrangência14. “Em outras palavras, o gestor do SUS está autorizado a recorrer aos serviços ofertados pela iniciativa privada, sempre que os serviços próprios da sua rede pública de Saúde forem insuficientes para atender às necessidades da popula- ção”, pontua o estudo do Ministério da Saúde. “A União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, representados por suas instâncias gestoras do SUS, são responsáveis pela organização e execução das ações da atenção hospitalar 10 Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Dez. 2017. 11 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dez. 2017 12 Portal do Senado. Disponível em: <https://www.senado.gov.br/atividade/const/con1988/con1988_06.06.2017/art_197_.asp>. 13 Portal do Senado. Disponível em: <https://www.senado.gov.br/atividade/const/con1988/con1988_06.06.2017/art_199_.asp>. 14 Ministério da Saúde. Aplicação do novo marco regulatório das organizações da sociedade civil no âmbito do Sistema Único de Saúde. Disponível em: <http://portalarquivos.saude.gov.br/images/pdf/2017/janeiro/34/14.Estudo-sobre-a-aplicabili- dade-das-disposicoes-da-Lei-n-13019-DEZ2016.pdf>. p. 52. 97Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA nos seus respectivos territórios”, conforme a nova Política Nacional de Aten- ção Hospitalar (PNHOSP)15. A PNHOSP é um conjunto de diretrizes e normas para organizar o mo- delo de assistência hospitalar, de acordo com o contexto do SUS, de forma que a universalização da assistência saia da teoria. Graças à PNHOSP, as organi- zações hospitalares podem aderir à parceria com o SUS por meio de chama- mentos públicos e editais. Por causa da contrapartida de estados e municípios, é possível comple- mentar o serviço público, adicionando especialidades, nível de serviço e tecno- logias que não estariam disponíveis à população. Isso garante a efetividade de dois princípios fundamentais do SUS: z Universalidade: a garantia do acesso integral de Saúde para toda a po- pulação; e z Equidade: oferta de serviço de acordo com as necessidades do público local. Atualmente, existem incentivos fiscais e financeiros para organizações de Saúde privadas em parcerias com o SUS: z Incentivo à Qualificação da Gestão Hospitalar (IQGH), que passa a substituir o Incentivo de Adesão à Contratualização (IAC) e será regu- lamentado em portaria específica; z Incentivo de Custeio das Redes Temáticas de Atenção à Saúde, Rede Cegonha, Rede de Atenção às Urgências e Emergências, Rede de Atenção Psicossocial, Rede de Cuidado à Pessoa com Deficiência e a Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas; z Incentivo de Atenção Especializada aos Povos Indígenas (IAE-PI); e z Recursos do Programa de Reestruturação dos Hospitais Universitários Federais (REHUF). O gestor público contratante poderá definir valores adicionais à parte pré- -fixada, caso tenha capacidade de financiamento com fonte própria. 15 Ministério da Saúde. Portaria 3.390, de 30 de dezembro de 2013. Disponível em: <http:// www.saude.sp.gov.br/resources/humanizacao/biblioteca/leis/outras-relevantes/portaria_-_poli- tica_nacional_de_atencao_hospitalar_-_ministerio_da_saude.pdf>. 98 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA Legislação As legislações que regem os incentivos, atualmente, são portarias do Mi- nistério da Saúde16: z Portaria 3.390: institui a Política Nacional de Atenção Hospitalar (PNHOSP) no âmbito do SUS, estabelecendo as diretrizes para a organização do componente hospitalar da Rede de Atenção à Saúde (RAS); z Portaria 3.410: estabelece as diretrizes para a contratualização de hos- pitais no âmbito do SUS, em consonância com a PNHOSP; z Portaria 142: institui, no âmbito do SUS, o Incentivo de Qualificação da Gestão Hospitalar (IGH), de que trata a Portaria 3.410/GM/MS, de 30 de dezembro de 2013, que estabelece as diretrizes para a con- tratualização de hospitais no âmbito do SUS, em consonância com a PNHOSP; z Portaria 2.567: dispõe sobre a participação complementar da iniciativa privada na execução de ações e serviços de saúde e o credenciamento de prestadores de serviços de Saúde no SUS; e z Portaria 1.646: institui o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES). CNES O dimensionamento de oferta de serviços e demandas é verificado pelo governo graças às informações obtidas via Cadastro Nacional de Estabele- cimentos de Saúde (CNES)17, que “se constitui como documento público e sistema de informação oficial de cadastramento de informações de todos os estabelecimentos de Saúde no País, independentemente da natureza jurídica ou de integrarem o Sistema Único de Saúde (SUS)”. O CNES é um cadastro obrigatório diante do SUS para qualquer orga- nização de Saúde, pública ou privada. Reúne todos os prestadores mostrando uma leitura da rede assistencial. Por exemplo, capacidade instalada, instalações 16 ARRUDA, Fernando Teles – coordenador adjunto da Universidade Municipal de São Caetano do Sul. Dez. 2017. 17 Ministério da Saúde. Portaria 1.646, de 02 de outubro de 2015. Disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2015/prt1646_02_10_2015.html>. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2015/prt1646_02_10_2015.html 99Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA ociosas, mapeamento de equipamentos e recursos. Conforme a legislação, o CNES possui as seguintes finalidades: z Cadastrar e atualizar as informações sobre estabelecimentos de Saúde e suas dimensões, como recursos físicos, trabalhadores e serviços; e z Disponibilizar informações dos estabelecimentos de Saúde para outros sistemas de informação. Preparação Para se preparar para o cadastro no SUS, as organizações de Saúde devem associar suas forças principais às necessidades da região em queestá inserida. z Primeiro passo: saber a vocação da organização. Para extrair valor por meio dos incentivos é preciso levar em consideração a missão, a visão e os valores da instituição e entender, sob o ponto de vista do planeja- mento estratégico, para onde a instituição caminha. Com essas premis- sas em mente, é possível diagnosticar o perfil de oferta a ser feita em parceria com o Estado; z Segundo passo: entender o contexto. É preciso compreender o con- texto local e as principais demandas e necessidades do público que será atendido, casando-as com o que o hospital tem a ofertar; z Terceiro passo: desenhar a estrutura. A partir da análise realizada no passo anterior, é preciso organizar as áreas internas da instituição para trabalhar as oportunidades: • Direcionar o departamento jurídico para licitações públicas e com- preender leis locais que permitem a contratualização dos serviços privados; • Definir de que forma a instituição deve estar preparada para atender de forma complementar a população local; e • Destacar um departamento ou área do hospital para levantar infor- mações quanto a estruturas ociosas, períodos de menor movimento e utilização de serviços, equipamentos subutilizados ou que em deter- minados períodos atendem a pouca demanda, por exemplo; 100 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA z Quarto passo: atender à população. Com todo o processo estruturado, é hora de ir para a prática. Por exemplo, serviços de hemodiálise, exa- mes diagnósticos, assistência clínica, mutirões, entre outros. A complementaridade deve ser vista como oportunidade de ampliação as- sistencial que pode abrir uma linha que permita trabalhar responsabilidade social, marketing e todos processos do gerenciamento do negócio. 101Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA 15. Papel do gestor A adoção das metodologias de governança corporativa traz uma nova cul- tura de serviços e de prestação de contas para a instituição de Saúde, a partir da implantação de controles internos e de gestão de riscos, que devem envolver desde sócios até investidores e órgãos de regulação. Esse movimento amplia o papel do gestor, que vai além de mostrar resultados financeiros e passa a res- ponder por diversos outros indicadores, que vão de desempenho à satisfação do usuário. Por envolver um rol muito extenso de atividades, o primeiro passo antes de se adotar um processo de governança corporativa no ambiente hospitalar é o de “arrumar a casa”, pelo qual é possível ter uma fotografia ampliada da instituição e do desenvolvimento dos colaboradores. A adoção de melhores práticas abrange todas as áreas dentro da institui- ção, não somente a diretoria. Por isso, é essencial que o gestor esteja muito pró- ximo dos demais departamentos, de forma a repassar conhecimento e envolver a todos – respeitando hierarquias e atribuições – no projeto. Desde a hotelaria, que conta com serviços de limpeza e manutenção, até a equipe de médicos, que lida diretamente com os pacientes, os setores tanto internos quanto externos (fornecedores, trabalhadores terceirizados) devem ter conhecimento da im- portância de sua participação individual no plano completo. Dentro do programa de governança corporativa, existem funções específi- cas de responsabilidade de seus gestores, como, por exemplo: z Acompanhar os dados do Serviço de Atendimento a Clientes (SAC) ou ouvidoria da instituição para propor melhorias baseadas nas críticas e reclamações feitas por pacientes; z Gerenciar os serviços oferecidos por meio de feedbacks de funcionários e trabalhar na melhoria com ajuda de treinamentos e coachings; z Acompanhar o fluxo de processos recomendados por órgãos de acre- ditação hospitalar, como da Organização Nacional de Acreditação (ONA); e z Estabelecer manutenções preventivas em equipamentos e maquinários. 102 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA Investir em sua própria capacitação é importante para o gestor, visto que isso passa pelo conhecimento dos códigos que regem a governança corporativa nas auditorias de processos, como os do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), relevantes para manter a gestão das informações de for- ma clara e transparente. 103Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA 16. Compartilhamento de metas Para implantar governança corporativa no hospital é preciso, primeira- mente, criar uma cultura de profissionalização da gestão – processo que exi- ge disciplina, planejamento e leva tempo. Os gestores têm papel de destaque nesse processo, pois são os responsáveis por aculturar o hospital para que as boas práticas de governança convertam princípios básicos em recomendações objetivas. Assim, alinham-se os interesses com a finalidade de preservar e otimizar o valor econômico de longo prazo da organização, facilitando seu acesso a recur- sos e contribuindo para a qualidade do atendimento ao paciente. No processo de aculturação de uma organização de Saúde, alguns passos são importantes para que haja união e engajamento das equipes: z Organização: o primeiro passo para a aculturação do hospital é que funcionários saibam exatamente quem é a liderança direta – figura a quem vão se reportar, alinhar atividades, definir prioridades e reportar não conformidades; z Conhecimento de atuação: um dos princípios básicos da governança corporativa é possibilitar que todos conheçam o papel que desempe- nham para o cumprimento da atividade-fim do hospital, que é ofere- cer atendimento de qualidade ao paciente com os recursos disponíveis. Esse processo também faz parte da aculturação, já que propõe que se entenda o que o outro executa e a forma como eventuais erros podem impactar o ciclo completo da cadeia de prestação do serviço – nesse ponto, contar com gerenciamento de processos facilita a aculturação para que se alcancem boas práticas de governança corporativa; e z Transparência: entre os pilares da governança corporativa também es- tão a comunicação e a transparência, portanto, é preciso não apenas criar conselhos e comitês, mas também comunicar aquilo que é discu- tido e, principalmente, decidido em suas reuniões aos demais funcio- nários, e stakeholders quando necessário. Conhecer os resultados que a organização quer alcançar é essencial para que o profissional desempe- nhe sua função e se sinta parte do sucesso do time. 104 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 2 : G O VE RN AN ÇA C O RP O RA TI VA Reflexão: O impacto da transformação digital na governança corporativa Na década de 1950, a indústria automobilística estudava a necessida- de de colocar cintos de segurança nos automóveis. Em 2017, debatemos o transporte via aplicativos e o problema que os táxis estão passando. No futuro, os carros sequer precisarão de motoristas – os testes estão, inclusive, sendo realizados enquanto você lê este artigo. Tudo isso é fruto do avanço da tecnologia e da transformação digital. Mudanças como essas também ocorrem nos hospitais. Processos são informatizados, e sistemas passam a servir de apoio à prática médica e acu- mulam enorme quantidade de dados, que podem ser usados para tomar decisões que irão mudar para sempre a forma como as organizações fun- cionam e se posicionam no mercado. Em meio a esse turbilhão, está claro que a governança corporativa também precisará se adaptar – afinal, ela se consolidou como prática administrativa há 25 anos, a partir de 1992, com a publicação na Inglaterra do Relatório Cadbury, considerado o primeiro códi- go de boas práticas sobre o assunto. Essa metodologia de gestão é definida como o sistema pelo qual as or- ganizações são dirigidas e monitoradas, envolvendo relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalizaçãoe con- trole e demais partes interessadas. Por sua vez, a transformação digital, no meio corporativo, é considerada como a vasta e rápida mudança na maneira como as empresas pensam suas atividades, tais como processos, competên- cias e modelo de negócios. As inovações disruptivas proporcionadas pela transformação digital não significam que a governança deva ser deixada de lado, muito pelo contrário. É preciso, sim, utilizar a tecnologia tanto para aumentar a eficiência e pro- dutividade quanto para garantir melhores práticas de governança, gestão e inovação nas organizações. Serão cada vez mais necessárias novas regras, novos modelos de compliance, novas formas de praticar governança corpo- rativa. Pode até parecer estranho falar de regras em um ambiente que está quebrando muitas delas, mas é justamente com diretrizes que os hospitais alcançarão os resultados prometidos pela transformação digital. 105Roberto Gordilho CAPÍTU LO 2: G O VERN AN ÇA CO RPO RATIVA Cultura Uma boa governança corporativa traz mais agilidade, transparência e autonomia, portanto, está diretamente ligada à digitalização. Hospitais que querem fazer parte da era da transformação digital precisam engajar suas equipes para essa nova cultura, e nada melhor que contar com a metodolo- gia para que todos comprem a “ideia” de ser digital. Isso porque a governan- ça corporativa garante que os primeiros passos desse processo não enfren- tarão problemas como falta de entendimento e clareza dos papéis que cada um desempenha. A Endeavor, organização global voltada ao empreendedorismo, afirma que crescer com governança corporativa, entre outras coisas, significa apri- morar os processos de administração. Isso se aplica a tomadas de decisão estratégicas, como iniciar ou encerrar um projeto, e a definição de níveis e papéis de controle na organização. Mais uma vez, o conceito se destaca em meio à transformação digital, já que o processo de digitalização da operação tende a facilitar o acompanhamento das práticas de gestão da instituição. Mas é preciso enfatizar que, para que a transformação digital, de fato, permeie o cotidiano das organizações de Saúde, será preciso avançar tam- bém nos pilares de estratégia empresarial, tecnologias de gestão, gerencia- mento de processos e gestão de pessoas, além da governança corporativa, de forma a evoluir a maturidade de gestão. CAPÍTULO 3: GERENCIAMENTO DE PROCESSOS C A P Í T U L O 3 GERENCIAMENTO DE PROCESSOS 109Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S Reflexão: A relação entre maturidade de gerenciamento de processos e de gestão hospitalar Toda atividade realizada no hospital é resultado de um processo. São eles que determinam se os resultados alcançados serão repetíveis – o que significa que poderão ser executados novamente, independentemente da equipe – ou artesanais – frutos dos chamados profissionais-heróis, que se desdobram para garantir uma qualidade mínima aos serviços. Ter bons pro- cessos é um dos primeiros desafios a ser vencido para evoluir a maturidade de gestão. A partir daí é que vamos desenvolver pessoas, trabalhar a tecnolo- gia e criar estratégias que permitam que a instituição cresça e se desenvolva. Mas não há como alcançar a maturidade no gerenciamento de proces- sos se ele for aplicado de forma departamental, dividido em caixinhas, feito somente no backoffice ou na assistência – como costumava ser até bem pouco tempo atrás. Não adianta o esforço de um profissional mais dedicado à gestão em seu departamento se esse empenho não tiver continuidade. Afinal, os processos não se esgotam em si, são complementares. O conceito também não pode ser implantado de forma verticalizada, hie- rarquizada. É preciso que ocorra horizontalmente, com todas as áreas envol- vidas e colaboradores participando ativamente do desenho, gerenciamento e das revisões de cada processo. Essa é a maneira mais fácil de engajar a equipe para que ela entenda o impacto dos erros para a prestação do servi- ço como um todo – e, claro, para a satisfação do paciente/cliente. O gerenciamento de processos precisa permitir que se tracem dois ca- minhos: o do dinheiro e o do paciente/cliente. Quando o paciente está no hospital, esses dois caminhos andam de mãos dadas. O desafio está no mo- mento da alta. Essa é a hora em que se deve fechar a conta para encaminhar à operadora de Saúde, que irá efetuar o pagamento. Para que os serviços realizados sejam efetivamente pagos, tudo o que foi utilizado pelo paciente/ cliente – de insumos a procedimentos – precisa ser registrado. Isso evita a ocorrência de perdas por não lançamentos ou de glosas, uma das maiores preocupações dos hospitais, pois a existência delas significa que foram gas- tos recursos sem que haja retorno financeiro – o que pode comprometer o frágil equilíbrio entre prestar um serviço de qualidade ao paciente com verbas que, obviamente, não são infinitas. 110 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S Revisão de processos Para garantir que os dois caminhos se cruzem durante toda a estadia do paciente e também após a alta, é preciso mapear os processos e fazer o gerenciamento de forma madura. Essa maturidade se traduz também na necessidade de revisão dos desenhos, identificando possíveis gargalos e empreendendo esforços para resolvê-los. É melhor um processo ruim que nenhum processo, e é melhor um bom processo que um processo ruim, porque, a partir da falha, é possível evoluir até alcançar a maturidade. Isso significa que cada funcionário deve saber exatamente o que deve ser feito, de que forma deve ser feito e como deve ser registrado. Ao alcançar esse nível de maturidade do conceito, a organização tem processos mapeados de forma integral e integrada e profissionais treinados, o que reflete em atendimento seguro e de qualidade para o paciente e, na outra ponta, contas que registram tudo o que ocorreu com ele enquanto esteve na organização, o que facilita o faturamento e, consequentemente, o pagamento por parte das operadoras. Implantar e amadurecer o gerenciamento de processos não é algo para o futuro, mas sim para ontem. Os gestores precisam enfrentar agora esse complexo trabalho. Os que se atrasarem correm o risco de ficar para trás diante de um mercado cada vez mais concorrido e de um paciente a cada dia mais empoderado. 111Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S 1. Business Process Management (BPM) Encadear as tarefas e responsabilidades de cada departamento do hospital, para que as atividades fluam sem intercorrências, é desafio endereçado pela metodologia de gerenciamento de processos de negócios (Business Process Ma- nagement, ou BPM). Diferentemente do que se acredita, o BPM é um conceito da administra- ção, não um software. Contudo, dada a complexidade do ambiente hospitalar – que precisa integrar processos de departamentos com tarefas bem distintas, porém interligadas, como assistenciais e de backoffice –, é comum a busca por sistemas que automatizem processos e impeçam que determinados procedi- mentos evoluam caso a etapa anterior não tenha sido cumprida. A implantação do BPM pode ser executada em etapas: 1 – Projeto: essa etapa trata da elaboração do plano e definição do escopo dos protocolos e procedimentos operacionais padrão incluídos no BPM. Aqui se definem metas e desenha-se o início, o meio e o fim de cada atividade. Nes- se momento, também são elencados os principais problemas que devem ser tratados no andamento dos trabalhos, tais como: • Riscos à segurança do paciente; • Incidência de glosas; • Desperdícios com insumos de enfermagem; • Falhas de estoque; • Atrasos de agendamento; e • Demora no atendimento ao paciente. 2 – Mapeamento: aqui cada processo será descrito em detalhe. Por exem- plo, antes da cirurgia, o paciente é submetido a uma bateria de exames, e é preciso reservarsalas e quartos para antes, durante e depois do procedimento. Aqui é desenhado o papel de cada colaborador no processo, informação ex- traída a partir de: • Entrevistas individuais ou com responsáveis por áreas; • Reuniões departamentais; e 112 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S • Formulários eletrônicos. 3 – Simulação: com base nos processos mapeados e fluxos operacionais definidos, parte-se para a simulação do desempenho de cada área em um am- biente de teste (informatizado ou não). Nessa leitura são identificadas falhas de comunicação, repetição/perda de ineficiência ou falta de atendimento às regras. 4 – Aplicação: em seguida, é hora da apresentação dos processos e das atividades de rotina, a partir do fluxo de trabalho otimizado, denominado pro- cedimento operacional padrão. 5 – Acompanhamento: uma vez em funcionamento, os processos devem ser acompanhados e monitorados com frequência por meio de indicadores, para identificação de oportunidades de melhorias. Resultados esperados O gerenciamento efetivo é um dos indicativos de maturidade de gestão de processos. Com essa metodologia, o gestor tem em mãos uma poderosa ferramenta para auxiliar o acompanhado do negócio e estruturar estratégias de melhoria de desempenho. Os resultados são: z Redução de custos: ao conhecer e melhorar processos, gastos com equipamentos e contratação desnecessárias serão reduzidos. O conceito ajuda o gestor a perceber que, antes de investir em uma rede de compu- tadores para a recepção do hospital, é preciso melhorar o serviço ofere- cido; ou, previamente à ampliação do departamento financeiro, deve-se pensar em criar uma cultura para a redução das glosas, por exemplo; z Aumento do resultado: com um time mais coeso e que perde menos tempo realizando procedimentos, a produtividade aumenta e as per- das diminuem – o que, consequentemente, eleva a receita e/ou reduz o custo; z Maior qualidade: com a redução de erros e maior agilidade, há mais qualidade no atendimento. Por exemplo: assim que o paciente é re- cepcionado no hospital, seus dados estão disponíveis aos médicos, en- fermeiros, farmácia, entre outros departamentos. O prontuário do pa- ciente é de fácil acesso – podendo estar informatizado –, o que auxilia no diagnóstico e no tratamento. Esse conjunto de fatores reduz filas, agiliza o atendimento e eleva a segurança nos procedimentos; e 113Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S z Facilidade na gestão: a partir do desenho de cada processo e apontadas as intersecções com demais áreas dos hospitais, a capacitação de cola- boradores é facilitada e o gerenciamento de suas atividades também. Por fornecer praticidade ao acompanhamento do desempenho de todo o hospital, o gerenciamento de processos se tornou ferramenta para conhecer o próprio negócio e garantir que os resultados obtidos estejam sempre alinhados com missão e valores da organização. 114 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S 2. Impacto na gestão O gerenciamento de processos de negócio (BPM) é uma abordagem disci- plinada com impacto direto nos resultados, porque permite que a organização alinhe o encadeamento de atividades à sua estratégia. O envolvimento dos colaboradores, que devem ter papéis claros, é essen- cial. Uma vez adotados de forma isonômica na instituição e aliados ao plane- jamento estratégico, processos bem definidos e gerenciados representam um poderoso elemento de competitividade e lucratividade. Focar a metodologia implica em: z Menores taxas de complicações hospitalares; z Maior rentabilidade em cima do capital investido; z Menor tempo de resposta no pedido de medicamentos e na marcação de consultas; z Maior eficiência no controle de estoque; z Aumento da capacidade de produção; z Maior eficiência operacional; z Redução de glosas; z Melhoria na qualidade de atendimento; e z Mais segurança para colaboradores e pacientes. O gerenciamento de processos estabelece métodos e padrões para definir e acompanhar a forma de trabalho de toda a equipe e certificar que todos estão desempenhando um bom trabalho. O objetivo é que os pacientes e co- laboradores fiquem satisfeitos com os serviços prestados em um ambiente que inspire crescimento constante. 115Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S 3. Como implantar Mapeamento, implantação e monitoramento dos processos são etapas complexas, porém essenciais nas organizações que tenham como meta evoluir sua maturidade de gestão. Além da complexidade particular de cada atividade administrativa, de apoio ou assistencial, o gestor deve levar em consideração as interfaces entre os departamentos. Ou seja, o projeto de operação deve ser de uma sequência de processos bem elaborada para produzir os efeitos positivos e evitar gargalos em toda a cadeia. De forma geral, o primeiro passo é convocar os líderes das áreas de gestão e assistencial, pois são eles que irão receber o treinamento específico e mul- tiplicá-lo aos demais colaboradores. Na sequência, deve-se realizar reuniões interdepartamentais e multidisciplinares entre os envolvidos em cada um dos processos, de forma a garantir a adesão, plena execução e mapeio de interfaces. Assim, os funcionários saberão exatamente a sua responsabilidade individual e como não conformidades podem afetar o processo como um todo, levando a impactos administrativos e financeiros e podendo afetar, ainda, a qualidade e segurança na assistência ao paciente. Com todo o potencial organizacional, o gerenciamento de processos deve ser implantado em todas as áreas, a partir da seguinte premissa: toda institui- ção é formada por processos primários ou de negócios, de apoio e gerenciais. z Processos primários: todos aqueles que representam a essência de va- lor do serviço da instituição. Nos hospitais, em geral, relacionam o ca- minho do paciente, desde o primeiro contato (marcação de consulta, procedimentos) até a alta. Exemplos: • internação; • ambulatório; • pronto-atendimento, etc.; z Processos de suporte operacional: são os que suportam os processos primários. Em geral, possuem grande integração ou impacto com os processos primários. Exemplos: • suprimentos; 116 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S • faturamento; • manutenção; • controladoria (financeiro e contabilidade), etc.; z Processos gerenciais: destinados à administração da instituição, para acompanhamento, medições e monitorações dos processos primários, de forma a garantir a eficiência, eficácia e efetividade das atividades. Exemplos: • avaliações de resultados; • monitoração de processos; • avaliações de pessoas, etc. Não existe um modelo único de definição de processos, o importante é realizar a definição considerando todo o ciclo de atendimento e colocar sem- pre o paciente como centro e foco principal do processo. Acompanhamento Para que o modelo funcione, é preciso monitorar os processos e capacitar os colaboradores que executam ou lidam diretamente com cada um deles. Essa ação permite identificar tanto falhas quanto oportunidades de melhoria. Uma vez que a rotina estará esquematizada e descrita, basta que os funcionários, treinados, a executem, evitando, assim, necessidades de constantes orientações e pausas na execução das atividades. Todo o trabalho alcança melhores resultados quando há uma rotina esta- belecida, e todo processo deve ter uma padronização que garanta essa rotina18 e possibilite monitoramento e ciclos de melhoria. Os trabalhos de mapeamen- to e redesenho criam uma nova padronização, que depois de implementada deve permanecer até que um novo ciclo de estudo seja iniciado e realizado. É importante, após a implementação, insistir na evoluçãoe buscar melhorias de forma constante e consistente. Para tanto, as lideranças devem estar atentas à rotina; documentar e medir os eventos indesejados para, em cada novo ciclo de revisão, saná-los; e, ainda que não existam eventos indesejados, buscar novas formas de aumentar a eficiência e a eficácia do trabalho. 18 Metodologia Gestão por Processos (Gepro), desenvolvida pela Universidade de Campinas (Unicamp) e implantada no Hospital das Clínicas. 117Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S 4. Faturamento: área ou processo? Pagar contas, ampliar investimentos, aumentar infraestrutura, apoiar novas parcerias e manter o funcionamento orgânico do hospital demandam capital. O faturamento da organização é a principal fonte dos recursos. Otimizar a receita depende do entendimento sobre as duas visões do faturamento: a de- partamental e a processual. z Visão departamental: refere-se à área da organização que cuida do pro- cessamento das contas e envio para o Sistema Único de Saúde (SUS) ou operadoras de Saúde. Em geral, é passiva e espera que as duplicatas cheguem para iniciar os trabalhos de auditoria, processamento e remes- sa. Enxergar o faturamento como uma área reduz muito as possibilida- des de melhorias de processo; e z Visão processual: o faturamento, encarado não apenas como um de- partamento, mas como um processo, extrapola as responsabilidades para todas as áreas do negócio, envolve múltiplos líderes e colabora- dores e leva em consideração tudo o que entra e sai da organização. Tem início na marcação de consultas e termina na contabilidade, após o processamento de todo o ciclo, inclusive recursos de glosas e repasse médico. Permeia todas as áreas do hospital. Benefícios da visão processual A criação de uma estrutura digital com integração de todo o processo hos- pitalar possibilita um melhor entendimento e acompanhamento das etapas do faturamento e responsabiliza a todos, cada um contribuindo de uma forma diferente, para que o ciclo seja sustentável. Por exemplo: muitas vezes as contas ficam paradas por problemas no preenchimento das guias ainda na recepção; falta de laudos nos prontuários; ausência de justificativas médicas para determinados procedimentos; esque- cimento de lançar procedimentos ou itens consumidos na conta do paciente. Todas essas situações fazem parte do fluxo do dinheiro e podem comprometer os resultados, mas não são gerados ou podem ser resolvidos pela área de fatu- ramento. 118 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S Adotar a visão de faturamento como processo torna possível acompanhar cada fase do atendimento com foco, além da melhoria e segurança do pacien- te, na geração de informações. Esses dados proporcionarão à instituição gerar a conta e realizar o envio e a cobrança ao SUS ou convênio com muito mais eficiência, o que refletirá diretamente na redução do ciclo da receita e no fluxo de caixa do hospital. 119Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S 5. Eficiência Hospital eficiente é aquele que consegue entregar a máxima qualidade com a quantidade exata de recursos necessários. Alcançar esse equilíbrio também é um desafio do gerenciamento de processos. O gerenciamento de processos pode alterar a forma como são desempe- nhadas todas as atividades de um hospital: z Administrativo: os processos de compra definidos conforme a deman- da. O gestor dessa área deve levar em conta a manutenção de estoques mínimos, acompanhar contratos com fornecedores e parceiros, além de fazer a gestão do orçamento; z Assistencial: podem ser implantados protocolos clínicos, gestão de qualidade e da segurança do paciente, todos de forma estruturada para que cada colaborador compreenda seu papel e de que forma o executar para alcançar as metas; e z Comercial e financeiro: esses departamentos devem estar constante- mente alinhados. A gestão dos contratos com as seguradoras e operado- ras de Saúde deverá considerar as informações dos custos da assistência para que cada acordo tenha viabilidade e garanta resultados ao hospital. O gestor que se propõe a implantar o gerenciamento de processos precisa ter em mente que haverá falhas no meio do caminho – e esses equívocos per- mitem uma análise mais aprofundada e a busca de melhorias de cada processo. 120 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S 6. Identificação de falhas Manter gargalos na criação ou condução de uma cultura orientada a pro- cessos e resultados pode afetar áreas fundamentais da instituição e significar falhas com graves consequências para a gestão e potencialmente para o pacien- te. Para evitar esse cenário, o gestor deve identificar potenciais gargalos. Alguns sinais indicam problemas de gestão de processos nas áreas mais estratégicas de uma instituição de Saúde: financeira, médico-assistencial e operacional. z Financeiro: alta taxa de glosas podem ser sinais de que algo está er- rado. A glosa é detectada no fim do processo, após o pagamento pela operadora, mas pode ser gerada em toda a cadeia de processo e pode significar um contrato mal negociado, a realização de um procedimento não coberto pelo contrato, um preço divergente do contratado, falta de uma solicitação médica, etc.; z Médico-assistencial: não capacitar a equipe médica e assistencial após a informatização da instituição impede a otimização dos atendimentos, exames e procedimentos em geral. O mau dimensionamento da en- fermagem e a falta de controle no estoque de medicamentos também comprometem o acesso rápido a insumos – fator importante para a segurança do paciente. Como resultado, são verificados altos índices de infecções, mortalidade, reinternações, abstenção e rotatividade de profissionais; e z Operacional: outra falha comum na operação é a falta ou erro de co- municação entre o gestor e seus colaboradores, o que resulta em lenti- dão e intercorrências. É necessário criar canais de comunicação efetivos e assertivos, para que problemas sejam identificados com mais rapidez e que as soluções sejam aplicadas e comunicadas de maneira mais ágil. Tão importante quanto identificar falhas é estabelecer planos de ação e um sistema de monitoramento que se retroalimente, tanto para solucionar os problemas quanto para evitar que eles se repitam. 121Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S 7. Segurança do paciente O gerenciamento de processos é ferramenta poderosa para auxiliar na se- gurança dos pacientes, pois, graças à metodologia, é possível traçar uma linha de atendimento – que vai desde o momento em que o paciente marca a con- sulta até uma cirurgia ou internação e sua alta final. O controle demanda o acompanhamento do fluxo de informações e permite a visualização de cada etapa da assistência. A gestão de processos ocorre em três níveis: primário, de apoio e gerencial. Os processos primários são aqueles que impactam diretamente o serviço pres- tado, ou seja, o atendimento ao paciente, e devem ser projetados para propor- cionar, além de um atendimento rápido, mais segurança – o que é possibilitado com a introdução de barreiras de segurança. Há algumas situações que impac- tam a segurança do paciente e que devem ser consideradas no estabelecimento dessas barreiras de segurança no gerenciamento de processos: z Identificação do paciente; z Prevenção de úlcera por pressão; z Segurança na prescrição, no uso e na administração de medicamentos; z Cirurgia segura; z Prática de higiene das mãos em serviços de saúde; z Prevenção de quedas; e z Comunicação efetiva. Inserir protocolos de segurança, melhores práticas de atendimento e cui- dados específicos para cada perfil de paciente na estruturação dos processos reduz as intercorrências. Já na área administrativa, é importante estabelecerum monitoramento de indicadores de resultados e desempenho. A razão de ser de uma instituição de Saúde é assistência ao paciente e tratamento deste, que deve ser o centro de todos os processos, receber um atendimento humanizado de qualidade e, principalmente, seguro. 122 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S 8. Redução de erros Para que o gerenciamento de processos ajude a reduzir erros, os colabora- dores devem estar envolvidos com a metodologia, tanto durante o mapeamen- to quanto na execução, o monitoramento e a revisão das atividades. Acima de tudo, requer-se o reconhecimento de que evitar intercorrências é compromisso coletivo. z Backoffice: o trabalho não começa, somente, no âmbito assistencial. Ter gerenciamento de processos no backoffice e entender as rotinas de su- primentos, contas a pagar e receber, contabilidade, entre outros, ajuda a compreender a dinâmica total da operação. Com isso, identificam-se gastos excessivos e/ou desperdícios, além do índice de glosas, que re- presentam um claro sinal de problemas com processos. A gestão de estoque também pode ser otimizada: a compra de remédios e demais insumos sem o devido controle gera prejuízos, tais como a perda dos itens por vencimento da data de validade. Perdas na área administrativa cascateiam em menos recursos e eficiência para o âmbito assistencial; z Tecnologia: a informatização não pode ser vista como única forma de resolver as questões, já que é necessário ter maturidade de gestão para que se tire proveito de todo o potencial da tecnologia. De qualquer forma, essas ferramentas oferecem melhoria na qualidade do trabalho, tempo de execução e integração de equipes. Mas é preciso estar atento à forma como ela é utilizada: é comum que, ao redesenhar os processos, muitos gestores façam alterações em normas, diretrizes, metas e res- ponsabilidades sem que haja uma comunicação integral dessa política. A automação desses processos é deixada de lado, o que acaba por ex- cluir uma importante ferramenta de auxílio para evitar erros; z Assistencial: o foco principal de qualquer hospital é prestar assistência ao paciente. Nesse ponto, portanto, que se deve obter os maiores ga- nhos com a implantação do gerenciamento, seja no aumento da qua- lidade do atendimento, seja no aumento da segurança do paciente. Ao estudar o fluxo de pessoas é possível, por exemplo, reduzir tempos de espera, otimizar a utilização de equipamentos, reduzir tempo de lim- peza, fatores que vão impactar diretamente a duração de atendimento, 123Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S aumentando a percepção de qualidade deste. Outro aspecto importante é a criação de barreiras de segurança, que vão desde a correta identifica- ção do paciente até itens como a checagem de medicamentos antes da aplicação, a implantação de procedimentos de cirurgia segura, a inser- ção de protocolos, a padronização da documentação de prontuário, etc. O Núcleo de Segurança do Paciente (NSP) é muito útil para atender a esses desafios: segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), é uma instância criada para promover e apoiar a implemen- tação de ações voltadas à segurança do paciente em diferentes áreas de atenção, organização e gestão de serviços de Saúde. 124 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S 9. O papel da consultoria Mapear os processos do hospital, a depender do porte da instituição, pode ser trabalho longo, que requer investimento e apresenta variados desafios. Há duas opções para realizar o trabalho: contratar uma consultoria especializada ou formar um time interno. Em ambos os casos, é essencial que toda a equipe, do backoffice ao assistencial, esteja envolvida para que os resultados almejados sejam alcançados. A consultoria externa, em geral, é formada por um grupo de profissionais especializados que atuam por demanda, estipulando um valor a ser cobrado. Primeiramente, fazem o diagnóstico situacional, traçam uma meta e aplicam uma metodologia para atingir determinado objetivo. Por serem especialistas, possuem experiência no método e focam em entregar os resultados acordados. Os contratos, em geral, possuem escopo e prazo bem definidos. Já o grupo interno é formado por profissionais com conhecimento espe- cífico, escolhidos dentro da organização de Saúde. Esse time também fará o diagnóstico situacional, alocará os recursos e traçará metas para atingir os objetivos. A escolha por um ou outro modelo depende de diversos fatores, entre eles o nível de qualificação da equipe interna para desenvolver o trabalho, a verba disponível para investimento e, ainda, o nível da maturidade de gestão da or- ganização. No caso da opção por uma consultoria, é preciso ir além do mero mapeamento e implantação dos processos: é importante que o serviço inclua a qualificação do time interno, com o objetivo de garantir a continuidade e a evolução da iniciativa. 125Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S 10. Revisão de processos A efetivação e evolução do gerenciamento de processos depende de audi- toria interna, que pode estar sob responsabilidade de um departamento espe- cífico (qualidade ou processos) ou ser realizado de forma descentralizada. In- dependentemente do formato, é atividade crucial para identificação de falhas, oportunidades de melhoria e auxílio na revisão dos procedimentos. Essa auditoria pode ser motivada tanto pela identificação de não confor- midades quanto pela oportunidade de descobrir melhorias. É preciso deixar claro aos colaboradores que o papel da auditoria não é punitivo, mas, sim, de conferência para garantia do desenvolvimento e ganho de desempenho. No primeiro caso, os auditores realizam visitas (tanto marcadas quanto surpresas) aos diversos departamentos do hospital, de forma a comparar a des- crição à forma como o processo é realizado. Caso seja identificado o descum- primento das regras, é preciso relatar ao superior imediato da área, que deve avaliar e determinar se faltou treinamento das pessoas envolvidas ou se há uma oportunidade de melhoria e necessidade de revisão e descrição da atividade. Mesmo que não sejam identificados problemas, as buscas por melhorias devem ser constantes – o que não significa, necessariamente, que sejam fáceis de serem identificadas. Por isso, a metodologia de ciclo PDCA (do inglês: plan – do – check – act, ou seja, planejar, fazer, verificar e agir), que tem como base a repetição, atua como importante aliada. O planejamento, a padronização e a documentação são práticas relevantes dessa metodologia, assim como medições precisas. z Planejar (Plan) – hora de analisar os problemas que precisam ser resol- vidos dentro da organização. O passo a passo deve ser a identificação dos problemas, a definição de objetivos, a escolha dos métodos e se questionar cinco vezes (5 Why) por que o problema ocorreu, de forma a tornar a resposta cada vez mais completa. O final é um plano para ser executado; z Fazer (Do) – o momento da execução do plano, mas, para tanto, é pre- ciso garantir os recursos necessários para a execução, entre eles o trei- namento da equipe. Isso feito, é hora de executar, mudar ou aperfeiçoar o que for necessário e registrar os resultados obtidos; 126 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S z Verificar (Check) – uma das etapas mais importantes do ciclo, permite acompanhar se o processo é realizado da maneira correta, verificar po- tencialidades e não conformidades, questionar os motivos pelos quais elas ocorrem e, com as respostas, reavaliar o plano; e z Agir (Act) – assertividade em prática. Se os processos funcionam da forma planejada, garanta que continuem assim. Se há gargalos, revise--os, mude-os, treine-os e implante-os, repetindo todo o ciclo. A revisão de processos hospitalares é crucial porque o hospital é um or- ganismo vivo – e uma solução de um ano atrás não necessariamente atende às demandas momentâneas. 127Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S 11. Participação da TI Do momento em que o paciente dá entrada no hospital até a sua alta, são inúmeros os processos que garantem assertividade no atendimento e na segu- rança no tratamento. Tudo começa na recepção, quando é feito o registro da chegada e disponibilizado o prontuário do paciente, que irá acompanhá-lo nas demais etapas que envolvem o atendimento – exames, consultas, internações, cirurgias ou quaisquer outros procedimentos. Garantir o fluxo sem que haja intercorrência, considerando que são múlti- plos atendimentos em uma corporação que funciona no esquema 24/7, não é tarefa fácil. Por isso, é cada vez mais comum que o gerenciamento de processos de negócios (BPM) ocorra com o apoio de ferramentas de TI, usadas para au- tomatizar atividades e garantir que nenhuma etapa ocorra sem que a anterior tenha sido completada. Exemplo disso se dá no funcionamento de um pronto-socorro. Sistemas informatizados permitem automatizar filas e implantar o protocolo de clas- sificação de risco para identificar necessidade de atendimentos prioritários. Dessa forma, a triagem deve identificar qual a classificação de risco do pacien- te, registrá-la no sistema e, assim, prosseguir com o atendimento. Ainda na área assistencial, as ferramentas de TI também permitem implantar alertas de segurança para alergias e interações medicamentosas. Os sistemas de TI também servem de apoio para os processos de backof- fice ao permitir, por exemplo, que os serviços sejam liberados somente com a aprovação dos procedimentos pela operadora de Saúde (em casos não emer- genciais), o que ajuda a evitar glosas. Esses exemplos mostram que, com o auxílio de software, a visão sobre o funcionamento de toda a organização é ampliada. Dentro de um hospital, as rotinas envolvem atenção de várias equipes ao mesmo tempo. Basta apenas um desvio em uma das tarefas nesses processos que o prejuízo será grande para o hospital. Por isso, ter sistemas que contam com ferramentas como Big Data, analytics e Business Intelligence (BI) ajuda a organizar a operação e hierarqui- zar dados, o que facilita o fluxo de cada atividade e ainda gera relatórios de feedback, ajudando a reduzir as margens de erro e ainda servindo de apoio à tomada de decisões de negócios. 128 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S 12. Engajamento do time O gerenciamento de processos hospitalares depende diretamente do enga- jamento dos colaboradores – afinal, são eles que irão executar as tarefas elen- cadas. Das rotinas administrativas até o cuidado com o paciente, é importante que cada indivíduo tenha pleno conhecimento sobre o impacto das suas ações sobre os demais processos e como pequenos erros podem comprometer tanto a saúde do paciente quanto a financeira, do próprio hospital. Não é possível esperar, contudo, que as pessoas desenvolvam essa visão holística de forma natural e proativa. O primeiro passo para engajar o time, portanto, é treiná-lo. O atendimento ao paciente começa no momento em que ele pisa no hospital: todo o caminho percorrido, do tempo do registro inicial à alta, é crucial para a sua recuperação, e os envolvidos nessa cadeia têm partici- pação ativa em seu bem-estar. A ciência de que a demora na liberação de uma ficha pode definir se um paciente vai sobreviver a um tratamento, por exemplo, traz uma responsabilidade e exige um comprometimento maior de um recep- cionista que, até então, acreditava que apenas o trabalho do médico e da equipe assistencial era fundamental. Esse reconhecimento ajuda, inclusive, a elevar a autoestima dos colaboradores, por entenderem a relevância de sua atividade. Um segundo ponto a se considerar é que as metodologias não podem ser adotadas de uma forma vertical ou serem impostas pelas lideranças. É essen- cial ouvir os colaboradores e entender a rotina deles para que, a partir de um cenário factual, identificar quais processos melhor se encaixam na dinâmica do hospital e como poderão ser otimizados. Também é necessário que todos participem ativamente do mapeamento e da revisão dos processos, para que se encontrem gargalos e oportunidades de melhorias e seja possível servir como base para os gestores corrigirem rumos e até mesmo efetuarem o total remodelamento do negócio. O monitoramento constante das atividades, portanto, é a chave para a melhoria contínua do ge- renciamento de processos. 129Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S 13. Avaliação de desempenho O mapeamento e o gerenciamento de processos hospitalares têm impacto direto na avaliação de desempenho dos profissionais. Isso porque a metodo- logia determina exatamente quem executa cada tarefa e de que forma ela deve ser realizada para entregar atendimento de qualidade para o paciente. Quanto mais maduro o gerenciamento de processos, mais ele permite avaliar o desem- penho de cada profissional, pois é possível enxergar onde há intercorrências e avaliar se o problema está na atividade ou no colaborador. Isso se dá por meio do acompanhamento e monitoramento constante dos indicadores dos processos mapeados. Essa avaliação deve considerar os seguin- tes aspectos: z Metas: as metas a serem atingidas por cada funcionário devem ser ela- boradas e apresentadas individualmente, levando em consideração os processos por ele executados. É importante o papel das lideranças para que haja engajamento de todos na busca de excelência e qualidade na realização de cada tarefa; z Comportamento: é preciso considerar comprometimento, postura, relacionamento interdisciplinar, pontualidade e engajamento de cada funcionário na execução dos processos de sua responsabilidade. É im- portante que o gestor forneça feedback constante para a melhoria contí- nua e não espere o momento da avaliação anual para tal; e z Pontos fracos e fortes: identificadas as fraquezas e características de excelência do colaborador, a avaliação de desempenho segue para a eta- pa de elaboração de um plano para melhorias no desenvolvimento do professional e execução das atividades. A avaliação de desempenho, quando executada em conjunto com o ge- renciamento de processos, eleva a maturidade de gestão hospitalar. Isso se dá porque de ambos os conceitos e métodos podem ser extraídas informações importantes para a reformulação estratégica e a tomada de decisões. Um dos principais pontos de atenção que os gestores devem focar são as potencialidades de cada colaborador, relacionando sempre com o desenvol- vimento do hospital. Uma das fontes de resultado pode vir do paciente, por 130 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S meio de pesquisas de pós-atendimento, oferecendo ao usuário a possibilidade de apontar erros e oportunidades de melhorias tanto de processos quanto de pessoas. 131Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S 14. Atribuições do gestor Além da capacitação, motivar colaboradores também depende do papel do gestor e do nível de maturidade de gestão da organização. É o líder quem ga- rante que todos os funcionários conheçam as etapas envolvidas nos processos. Os gestores precisam desenvolver de três princípios de ações essenciais: z Liderança, devido ao contato direto com as pessoas; z Técnica, que lhes garante o conhecimento específico inerente à função; e z Método, que pode ser traduzido como o caminho para se alcançar re- sultados. Por mais que seja absolutamente necessário o engajamento do time na elaboração, no gerenciamento e na revisão dos processos,o gestor deve estar à frente de todo o planejamento. É o líder que dá a visão geral e conecta as pontas entre os diferentes departamentos, além de estar amplamente ciente de falhas. Não basta estabelecer os protocolos em um processo ou software e dei- xar que as coisas se encaixem sozinhas: a mudança de cultura organizacional, necessária para o sucesso do gerenciamento de processos, deve partir do líder, que precisa se certificar que toda a sua equipe está desempenhando o trabalho de forma otimizada, eficiente, eficaz e segura. Para isso, o gestor pode criar um departamento/área ou função responsável por gerenciamento e auditorias internas, que deve ter a liberdade de propor alterações nas rotinas do hospital – até mesmo se elas sugerirem mudanças no trabalho do gestor. Essas atividades estão diretamente ligadas à qualidade do serviço prestado e têm como objetivo garantir a integração de todas as rotinas de trabalho da instituição. Todos os gestores devem desenvolver as habilidades necessárias para ge- renciar os processos de forma a alcançar as metas definidas pela instituição. O caminho é a busca constante por conhecimento e aperfeiçoamento. Para tanto, é preciso desenvolver habilidades técnicas, humanas e conceituais e evoluir a maturidade de gestão diariamente – e ao lado de uma equipe forte e compro- metida com o desenvolvimento da instituição. 132 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 3 : G ER EN CI AM EN TO D E PR O CE SS O S Reflexão: A era do paciente no gerenciamento de processos Imagine-se na seguinte situação: um familiar está doente e precisa ser internado. O médico que o atende é um profissional renomado, de extrema confiança, e você está satisfeito com o tratamento indicado. Mas, por uma fa- lha na dispensação de medicamentos, ele toma um remédio errado e piora. O gerenciamento de processos é uma forma de minimizar esse risco. O conceito tem como princípio básico organizar a rotina do hospital. Ao ma- pear todas as atividades realizadas pelas equipes – tanto as envolvidas dire- tamente com a assistência quanto as administrativas –, é possível identificar rotinas que podem ser melhoradas, além de criar procedimentos e barreiras de segurança para reduzir erros. Esse olhar ampliado sobre a organização garante que todos irão atuar de forma a proporcionar a máxima qualidade e segurança no atendimento ao paciente com a quantidade exata de recursos necessários. Na era da transformação digital, movida por velocidade, disrupção e inovação, não podemos mais dissociar o gerenciamento de processos das tecnologias, afinal, as ferramentas são fundamentais para a execução das atividades. No mercado atual, porém, ainda existem instituições que acre- ditam que a equipe de processos não precisa entender das ferramentas de gestão e vice-versa. Pior que isso só equipes de processo que não entendem sequer do negócio e acreditam que apenas ferramentas de BPM ou outra notação qualquer irá resolver o problema. O fato é que tecnologia e processos devem andar de mãos dadas quan- do o paciente é colocado como o centro da visão, da missão e dos valores da instituição. A tendência une conceitos como liderança, cultura, estratégia e gestão, que, com a tecnologia, precisam ser desenvolvidos dentro das orga- nizações que desejam permanecer e, mais que isso, crescer em um mercado de Saúde que se torna mais complexo a cada dia. Para entender, volte à situação supracitada. Com um circuito fechado de medicamentos e checagem beira-leito realizados por sistemas informa- tizados e integrados, as chances de erros diminuem. Não precisamos mais de heróis, profissionais exemplares que se sacrificam para garantir o melhor atendimento. O que necessitamos são processos bem desenhados e execu- tados, amparados pelas tecnologias de gestão. 133Roberto Gordilho CAPÍTU LO 3: G EREN CIAM EN TO D E PRO CESSO S Mudanças Os processos devem ser mapeados nos sistemas informatizados para que se garanta mais controle sobre a maneira como eles são realizados, quem os realiza e o impacto para o paciente. Todos os envolvidos são res- ponsáveis pela correta execução das atividades e preenchimento dos dados – que, trabalhados por ferramentas de Business Intelligence (BI), se tornam importantes fontes de insights de negócios. Para garantir que isso ocorra, a capacitação é requisito básico, mas não devemos nos limitar a ela. Envolver toda a equipe na implantação, no geren- ciamento e nas tecnologias é uma das formas de criar engajamento e acul- turamento. Transformação digital não é um conceito que pode ser imposto. Para que se alcancem os resultados esperados com o investimento em ino- vações, os colaboradores devem participar ativamente das mudanças. São eles que vão dizer de que forma as tecnologias podem auxiliar os processos, com risco de que, se não for realizado dessa forma, não haverá plena adesão – e, então, será dinheiro escoando pelo ralo. Alguns profissionais podem até ser resistentes, mas, quando a transfor- mação digital é um objetivo que parte da alta gestão e está associado à es- tratégia, deve-se transmiti-la de forma a promover o total engajamento. Isso só será possível se o gerenciamento de processos for uma ferramenta ver- tical na essência, que inclui todos os níveis da organização, e horizontal na implementação, afinal, o processo não conhece organograma, ele perpassa diversas áreas para garantir a melhor prestação do serviço ao paciente. Entenda que não é possível fazer gerenciamento de processos apenas em um departamento, ou somente na assistência, por exemplo. Afinal, o atendimento ao paciente não respeita hierarquias, muito menos departa- mentos. Numa orquestra, é preciso que cada músico execute com perfeição as suas notas para garantir a harmonia perfeita da música. O mesmo tem de ocorrer no hospital: cuidar da saúde do paciente depende de que cada um realize o processo ou a atividade sob sua responsabilidade com a máxima qualidade e segurança ao paciente – e, claro, com o apoio cada vez maior da tecnologia. CAPÍTULO 4: GESTÃO DE PESSOASCAPÍTULO 3: GERENCIAMENTO DE PROCESSOS C A P Í T U L O 4 GESTÃO DE PESSOAS 137Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS Reflexão: Maturidade digital Na Inglaterra do fim do século 18, o acendedor de lampiões era essencial para a sociedade em plena Revolução Industrial. Ele era responsável por, diariamente, ao cair da tarde, acionar todos os candeeiros das ruas, permi- tindo assim que o turno das fábricas fosse ampliado. Pouco mais de cem anos depois, com a chegada da iluminação elétrica, o profissional perdeu sua função. O avanço tecnológico causou comoção na classe: revoltados, alguns chegaram a cortar os fios que ligavam as lâmpadas aos postes, como represália. Outros enxergaram as oportunidades e se transformaram em eletricistas. Outros cem anos se passaram e a humanidade está em plena trans- formação digital, movimento também batizado de a Quarta Revolução In- dustrial. Nos hospitais, o conceito, que ganha cada vez mais força, é impul- sionado por inovações como inteligência artificial, Internet das Coisas (IoT, de Internet of Things), impressoras 3D e computação cognitiva, apenas para citar exemplos. Serão necessários em torno de cinco anos para que todas essas tecnolo- gias, que já existem e estão disponíveis no mercado, estejam inseridas no co- tidiano da maioria das organizações de Saúde. Com isso, é necessário avaliar também o papel da gestão de pessoas, pois cada funcionário verá a forma como desempenha suas atividades mudar radicalmente, acompanhando a revolução no cuidado. Do ponto de vista do departamento de recursos humanos, a chave da transformação digital é a capacitação. É preciso treinar o colaborador na incorporação e quanto ao uso das ferramentas tecnológicas para que ele desempenhe os processos digitalizados e perceba a importância dos da- dos que estão sendo gerados para o negócio e para o cuidadodo paciente. Mas essa não é a única necessidade. Cerca de 20% do aprendizado está na capacitação oferecida pela organização, cujo interesse principal é que o pro- fissional use os sistemas e conheça os processos da instituição. Os outros 80% dependem da mudança de mentalidade – que deve partir de cada um. A tecnologia precisa ser vista pelo profissional como uma forma não ape- nas de otimizar e agilizar seu trabalho, mas de mudar a maneira como hoje se prestam cuidados em Saúde. Com o acelerado envelhecimento da popu- lação e o consequente aumento da demanda pelos serviços, os hospitais 138 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS precisam começar desde já a trilhar o caminho que os levará a se tornarem, de fato, organizações de Saúde, apoiados pela prática das medicinas preven- tiva e preditiva. Esse paciente do futuro é empoderado, e seus desejos são viver mais e melhor. É isso que o hospital precisará entregar. Humanização Esse novo profissional sabe que o conhecimento acumulado ao longo da carreira é importante, mas também reconhece a necessidade de enxergar a tecnologia como um apoio para o trato humanizado do paciente. Ele sabe que o olho no olho e o toque são insubstituíveis, mas reconhece o valor que uma base de conhecimentos digitalizada oferece durante o diagnóstico. Aproveitando o exemplo, essa é uma forma de mostrar que a tecnologia apoia tanto os profissionais que têm mais tempo de formação quanto os recém-formados. Afinal, o maior legado de um médico com 40 anos de pro- fissão é a experiência. Com conhecimento armazenado em sistemas apoia- dos por tecnologias como a computação cognitiva e a inteligência artificial, ele tem a oportunidade de se tornar ainda mais especializado e oferecer um tratamento diferenciado a seu paciente. A tecnologia também proporciona mais segurança para médicos que co- meçaram sua atuação recentemente, por meio de uma base de dados sólida que pode ser consultada pela internet e servir de apoio ao diagnóstico. Ela também pode ampliar o acesso à Saúde, com o desenvolvimento da teleme- dicina, fazendo com que os serviços cheguem às localidades mais afastadas dos grandes centros urbanos. As possibilidades são inúmeras e já estão acontecendo. Quem conseguir alterar seu mapa mental durante a passagem dessa onda terá mais chances de não ser engolido por ela. Com uma gestão madura, é possível garantir que a capacitação da equipe da organização de Saúde vá além do mero uso das ferramentas tecnológicas e estimule a mudança de cultura, sem deixar de lado o relacionamento humano. 139Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS 1. Papel do RH A gestão de pessoas é o processo de associação entre as habilidades e os métodos dos colaboradores da empresa com as políticas, técnicas e práticas definidas por seus administradores e stakeholders, com o objetivo de melhor gerir os comportamentos internos e potencializar o capital humano. Uma or- ganização de Saúde que procura melhorar os processos de negócios deve se preocupar, portanto, com o estímulo à capacitação de pessoas alinhada à visão e à missão do hospital. Para isso, é preciso que os colaboradores tenham co- nhecimento para executar e pôr em prática as ações definidas pelos gestores. Metodologias de gestão de pessoas, quando bem conduzidas, resultam em melhoria de desempenho e resultados que elevam a organização ao rol de ins- tituições de referência. O conceito de departamento – ou seja, silos isolados dentro das empresas – perde o sentido com a evolução da maturidade de gestão, em qualquer setor da economia que a companhia esteja inserida. Sistemas puramente hierárqui- cos ou verticais estão evoluindo para sistemas matriciais. A “vertical” desses sistemas está pautada no organograma, vital pelo seu caráter orientador. A “horizontal” é representada pelos processos de negócios que “navegam” ponta a ponta ao longo da organização, sempre cruzando as verticais – diretorias e gerências. A união de ambas compõe a estrutura matricial. Dentro dessa abordagem, a área de gestão de pessoas ganha mais espaço na formação dos times de trabalho, que devem contar com a definição de papéis e competências de pessoas cujas habilidades de liderança e gestão, proatividade e mente conectada com as últimas tendências do segmento sejam acentuadas. Com essa base, a gestão de pessoas impulsiona uma visão sistêmica, ajudando a organização a atingir um patamar maduro administrativo com um time en- gajado nesse propósito. Essa gestão tem a função de humanizar as empresas por meio da parti- cipação, da capacitação, do envolvimento, do comprometimento e do desen- volvimento dos seus colaboradores, trazendo uma maior integração entre os envolvidos nos processos rotineiros, o que concede eficiência e eficácia rumo à maturidade da gestão. 140 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS Turnover x engajamento O RH também deve focar a redução da rotatividade do time, indicador chamado de turnover. Quanto menor o turnover, mais estável é a equipe. Como buscar novos profissionais no mercado é um processo custoso e demorado, as políticas de recursos humanos devem ser usadas como alavanca para reduzir os conflitos, integrando e engajando os times. Vale salientar que o turnover tende a aumentar com a chegada dos millen- nials ao mercado de trabalho, que tem como consequência o choque de cultura e expectativas absolutamente diferenciadas entre os representantes da geração X e anteriores. Portanto, diante de um mercado cada vez mais competitivo e de rápidas mudanças tecnológicas, cabe aos gestores de hospitais o trabalho de tornar a organização mais focada no capital humano. 141Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS 2. Impacto nos resultados A gestão de pessoas tem impacto direto nos resultados das instituições, uma vez que o sucesso só é alcançado por meio do trabalho em equipe. Com funcionários qualificados e engajados, do assistencial ao backoffice, o hospital pode atingir a excelência no atendimento ao paciente e conquistar o equilíbrio financeiro necessário para manter e desenvolver a operação. O papel do gestor é decisivo na implantação e execução da gestão de pes- soas, porque ele precisa aliar conhecimento técnico à visão estratégica, de for- ma a enxergar o hospital como um todo e incentivar as equipes a buscar os resultados planejados. As estratégias de gestão de pessoas em hospitais precisam ser aplicadas nas seguintes etapas: z Seleção dos funcionários, que devem ter seus valores alinhados aos da instituição e capacidade técnica necessária para exercer a função; z Acompanhamento da rotina, sempre em busca de melhorias e desen- volvimento do trabalho sob uma ótica integrada; e z Avaliação periódica, com geração e execução dos planos de desenvolvi- mento individual, de forma integrada e com visão estratégica. A excelência no atendimento envolve todos os profissionais. Apesar de essa necessidade ser mais evidente com a equipe médico-assistencial, as demais áreas devem ser contempladas. z Recepção: recepcionistas não podem ficar de lado, porque se tratam, muitas vezes, do primeiro contato que a pessoa terá ao procurar o aten- dimento, em um momento no qual ela, normalmente, está fragilizada. O acolhimento fará a diferença na forma como ela enxerga a organi- zação; z Hotelaria: em hospitais de ponta, a área ganhou grande destaque por- que faz parte da experiência do paciente. As pessoas não querem se sen- tir em um hospital que transmita frieza. Por isso, grandes organizações criaram cargos como o concierge, que cuida de todas as necessidades do paciente enquanto ele permanece internado. Esses profissionais tam- 142 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS bém devem ser capacitados constantemente para que estejamalinhados com os processos e as metas de trabalho; z Farmácia: apesar de os profissionais da farmácia não lidarem direta- mente com o paciente, são essenciais, já que insumos são parte crucial da assistência; e z Atendimento clínico: no caso de médicos, enfermeiros e equipes mul- tidisciplinares, os cuidados são ainda maiores no que diz respeito à ges- tão de pessoas. Além dos conhecimentos técnicos para desempenhar suas funções, esses profissionais precisam desenvolver habilidades de relacionamento para lidar diretamente com o paciente e seus familiares. Alcançar resultados depende da integração de todos os times que com- põem um hospital, do assistencial ao backoffice. Nesse processo, evoluir a ma- turidade da gestão hospitalar é fator decisivo porque proporciona a capacidade de enxergar o todo – e, mais que isso, fazê-lo funcionar. 143Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS 3. Apoio da TI Em busca de melhoria de processos, aumento de produtividade e otimi- zação gerencial, hospitais de todos os portes apostam em ferramentas de ges- tão, principalmente, o sistema de informação hospitalar (Hospital Information System – HIS) e o sistema de gestão empresarial (Enterprise Resource Planning – ERP). Contudo, além da informatização, há um pilar crucial para o bom re- sultado de qualquer projeto do tipo: o treinamento dos colaboradores, a partir de uma estratégia de gestão de pessoas que esteja alinhada ao plano de negó- cios da organização. Segundo a pesquisa TIC Saúde, uma das mais importantes para a tecno- logia da informação em Saúde no Brasil, somente 25% dos hospitais que, em 2015, possuíam conexão com a internet tinham uma área ou um setor respon- sável pela gestão de tecnologia da informação (TI). A falta de integração da área com profissionais de Saúde – apenas 6% das equipes de TI possuíam um profissional especializado na área – também dificultava o bom resultado dos projetos. Como consequência, segundo 89% dos médicos e 93% dos enfermeiros, a falta de treinamento dificultou a implantação e o uso das ferramentas. A pes- quisa também revelou que 85% dos médicos e 75% dos enfermeiros não par- ticiparam de nenhum curso, treinamento ou capacitação na área de tecnologia de informação e comunicação em Saúde nos 12 meses anteriores à pesquisa. Capital humano O desenvolvimento do capital humano, portanto, é crucial para que os projetos de melhoria de gestão tenham efeito e elevem a instituição ao patamar de maturidade de gestão hospitalar. Para isso, é importante uma estratégia de gestão de pessoas que abarque as seguintes iniciativas: z Treinamentos: palestras, cursos e workshops são importantes para que a instituição apresente a tecnologia – seja de gestão, seja voltada ao ambiente clínico –, aprofunde a temática e demonstre quais os resul- tados esperados, como redução de glosas, melhoria do desempenho da recepção, mais eficiência da gestão de leitos, aumento da segurança do paciente e melhoria da qualidade do atendimento, apenas para citar 144 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS alguns exemplos. Obviamente, é preciso identificar qual o público que operará o sistema em questão para organizar esse ciclo de treinamentos; z Acompanhamento: o treinamento é o primeiro passo do processo. Passada essa etapa, os líderes diretos dos profissionais envolvidos de- vem reportar a evolução e o aproveitamento dos conhecimentos obti- dos à área de gestão de pessoas. Essa proximidade ajuda a identificar habilidades e dificuldades dos colaboradores, de forma que seja possível aplicar treinamentos específicos que foquem a melhoria contínua; e z Metas e objetivos: a gestão de pessoas, contudo, não passa somente pelo treinamento e desenvolvimento contínuo do profissional. É preci- so compartilhar com a equipe como os esforços individuais somam nas metas e nos objetivos traçados pela instituição. Como qualquer projeto de informatização deve estar atrelado a um objetivo de negócio, é es- sencial comunicar ao time, seja ele do backoffice, seja do corpo clínico, o atingimento dos resultados ou a definição de estratégias para correção de rota – quando houver. Quanto mais o colaborador se sentir parte do contexto global da empresa, mais engajado estará. 145Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS 4. Seleção de profissionais Hospitais são organizações que requerem equipes multidisciplinares, com alto nível de profissionalização. São administradores, médicos, enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem, farmacêuticos, biólogos, nutricionis- tas, técnicos em nutrição, biomédicos, técnicos de radiologia, fisioterapeutas, psicólogos, técnicos de laboratório, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, educadores físicos, odontólogos, dentistas, engenheiros clínicos e assistentes sociais, entre outros, que precisam atuar de forma integrada para alcançar os mesmos objetivos: proporcionar a melhor e mais segura assistência ao pacien- te e maximizar o resultado da instituição – afinal, o hospital também é uma empresa. Selecionar o corpo de profissionais é tarefa complexa não somente pela diversidade de funções e consequentes conhecimentos técnicos, mas, também, pela necessidade de contar com um time que possua habilidades comporta- mentais específicas, especialmente quando se fala em funções gerenciais. O departamento de recursos humanos, portanto, deve ter uma visão clara sobre o que é exigido para cada atividade: a contratação de pessoas para áreas opera- cionais é mais simplificada que a de médicos e gestores, que têm de lidar com uma série de particularidades, entre elas o relacionamento entre o paciente, o hospital e seus familiares. Testes que simulam a multidisciplinaridade das funções ajudam a identi- ficar a maneira como o profissional atua em trabalhos em equipe e como se relaciona com colaboradores das demais hierarquias, por exemplo. Hospitais com elevada maturidade de gestão veem como diferencial a es- pecialização do profissional, especialmente quando se trata de cargos de di- retoria ou acima. Nesse caso, é fundamental certificados de MBA ou curso de gestão em Saúde, já que a graduação em medicina geralmente é focada no aspecto assistencial. Tipo de contratação Hospitais ainda utilizam o regime de contratação CLT em 80% da enfer- magem e do backoffice. Para a equipe médica, um sistema muito utilizado é a parceria entre pessoas jurídicas, pois o profissional costuma atuar conforme a demanda, especialmente no caso de cirurgias. 146 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS Com esses cuidados da gestão de pessoas no momento da contratação, aliados a um plano de capacitação e desenvolvimento continuado do profis- sional, os hospitais garantem a formação de equipes fortes, interessadas na melhoria contínua e que compreendem que isso agrega satisfação ao trabalho e resulta em um melhor cuidado ao paciente. 147Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS 5. Conhecimentos e competências Construir o quadro de colaboradores de uma organização de Saúde não é tarefa fácil. De um lado, há uma demanda por profissionais de backoffice altamente especializados; do outro, a busca por equipe clínica de excelência. Cada um, em seu espectro de atuação, deve contribuir para que o objetivo do hospital – o cuidado ao paciente – seja atingido sem intercorrências. Fica a cargo da gerência de recursos humanos a complexa tarefa de não somente selecionar, como também reter os profissionais que cumpram os re- quisitos necessários. Essa tarefa é facilitada quando se tem em mente as ne- cessidades específicas de conhecimentos e competências do time do hospital. Essas duas palavras podem, até mesmo, serem usadas como sinônimos, mas representam coisas diferentes. Conhecimento é tudo aquilo que pode ser apreendido intelectualmente, o que está ligado àprofissão e atividade. Compe- tências estão ligadas a um conjunto de habilidades desenvolvidas pelo sujeito à medida que ele amadurece. Conhecimentos Os conhecimentos podem ser caracterizados de três formas: z Técnico: trata-se do saber prático, relacionado a como executar a tarefa dentro da área na qual o colaborador será alocado. Por exemplo: o en- fermeiro precisa saber como aplicar injeção, trocar sonda, etc.; ao passo que a recepcionista deve ser capaz de se comunicar com o paciente de maneira eficiente, em um momento que costuma ser de alta fragilidade; z Processo: o colaborador deve ter conhecimento sobre como a atividade que ele executa contribui para o processo como um todo, incluindo as tarefas precedentes e posteriores. Isso permite uma visão global da instituição; e z Gerencial: como o próprio nome diz, relacionado ao entendimento do gestor sobre as rotinas administrativas, de forma que ele possa conduzir os processos, motivar as equipes e apresentar os resultados. 148 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS Competências Além dos conhecimentos, as competências também são importantes para selecionar o perfil de profissional para cada área do hospital. Elas podem ser medidas por sete tipos: z Liderança: é importante que o colaborador conheça e tenha noção de ascendência sobre outros profissionais, estando ele ou não em cargo de gestão; z Espírito de equipe: não existe trabalho individual em uma organização de Saúde, seja dentro da gestão clínica, seja empresarial. Cada atividade está atrelada e é dependente de outra. Todos, portanto, precisam ter o entendimento que fazem parte de um time, que deve atuar de forma integrada; z Foco em resultados: a execução dos processos tem de estar focada na geração de resultados que cada contribuição individual tem para o todo; z Resiliência: mesmo que os resultados esperados não sejam atingidos, é necessário que o profissional saiba superar os problemas, sem se abalar, para dar continuidade ao trabalho e à busca pela excelência; z Senso de urgência: manter a qualidade do trabalho levando em consi- deração o tempo de demanda do paciente; z Visão sistêmica: é importante que o funcionário compreenda em que parte ele está inserido dentro de todo o sistema que rege a organização de Saúde. Ele deve compreender quais são os processos que são realiza- dos anteriores aos dele e também posteriores; e z Orientação para custos: os resultados devem ser entregues dentro dos custos condizentes à realidade da organização. O foco nessa caracte- rística é oferecer à instituição resultados que maximizem a produção sem, contudo, danificar a estrutura de gastos. Melhor atendimento ao paciente e maior rentabilidade para a organização; Para que uma instituição de Saúde funcione de forma orgânica, é preciso contar com profissionais competentes e engajados. O gestor deve manter o direcionamento dos processos sempre alinhado com a motivação das equipes e aferindo o perfil de cada colaborador dentro das tarefas. 149Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS 6. Avaliação de desempenho A avaliação de desempenho é uma análise sistemática de como o funcio- nário executa suas atividades, das metas e dos resultados a serem alcançados e de seu potencial de desenvolvimento na empresa. No caso dos hospitais, essa ferramenta de gestão de pessoas tem capacidade de proporcionar tanto retorno financeiro quanto melhorar a assistência ao paciente. O primeiro passo para implantá-la é definir as metas que devem ser atin- gidas por cada funcionário, que devem estar alinhadas aos objetivos gerais do negócio e do departamento do qual fazem parte. A avaliação de desempenho é dividida em três etapas: observação do com- portamento do colaborador, identificação de pontos fortes e fracos e análise da evolução. z Comportamento: devem ser analisados pontos como comprometi- mento, comunicação, pontualidade, relacionamento com a equipe e os progressos e limitações. O feedback deve ser dado após essa avaliação inicial; z Pontos fortes e fracos: o gestor aprofunda a avaliação em busca dos pontos fortes e fracos e, a partir daí, traça um plano estratégico com resoluções de gaps e aproveitamento de habilidades para curto, médio e longo prazos. Nessa fase, é importante que o funcionário seja incenti- vado e motivado a alcançar seus objetivos; e z Evolução: por fim, é necessária a análise da evolução do colaborador, que precisa ser feita de forma constante, a fim de corrigir possíveis erros no processo. Parte da estratégia A avaliação deve ser realizada pelo gestor direto da área, com o departa- mento de recursos humanos e com a participação dos altos executivos respon- sáveis pela organização de Saúde. O gestor pode adotar um cronograma de aplicação da avaliação de desempenho, para que seja feita a cada seis meses ou um ano, por exemplo, a fim de avaliar como o funcionário se desenvolveu no período e quais são as eventuais mudanças necessárias para alinhar o rumo. 150 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS Com a ferramenta, a gestão descobre as potencialidades de cada colabora- dor, ou seja, quais são os talentos que ele possui e que podem ser úteis para o desenvolvimento da empresa. Ela também permite identificar os pontos fracos dos funcionários e capacitá-los com o intuito de sanar os problemas. Acima de tudo, é uma ferramenta que atende à necessidade de capacitação contínua dos profissionais. 151Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS 7. Treinamento e desenvolvimento A transformação digital exige ritmo de evolução cada vez mais veloz. E, como organizações são compostas por pessoas, o desenvolvimento do capital humano é crucial para que a companhia atinja os níveis definidos na estraté- gia empresarial. Estruturar programas de treinamento e desenvolvimento, de forma a garantir que as equipes estejam aptas a cumprir os desafios propostos no planejamento estratégico, é tarefa conjunta dos gestores e do departamento de recursos humanos, devendo ser revisitada de forma constante e consistente. Treinamento “é uma ação planejada para aumentar o grau de conhecimen- to de quem se treina ou fazer com que este adquira novas habilidades ou atue segundo novos comportamentos”19. Para estruturar programas que alcancem essa finalidade, é preciso levar em consideração que 20% do aprendizado do funcionário é proporcionado pela empresa, mas os outros 80% devem partir do próprio colaborador. A capacitação técnica é responsabilidade dele e deve ser avaliada já no momento da seleção, pois o que será conduzido pela organiza- ção é o treinamento para execução dos processos e visão da instituição sobre o negócio20. Algumas metodologias podem ajudar as organizações nas estratégias de treinamento e desenvolvimento de pessoas: z Cursos: para elaborar o treinamento das equipes, é preciso levar em consideração quais capacidades e competências deverão ser desenvolvi- das na execução daquele processo e quais são as metas que se quer atin- gir com ele. Os cursos podem ser presenciais – no modelo tradicional ou in company – e a distância. O formato mais adequado dependerá do que será ensinado; z Coaching e mentoring: são duas formas de acompanhamento indivi- dual. No primeiro caso, o objetivo é ajudar a pessoa a atingir objetivos específicos dentro de um determinado período de tempo. Nesse pro- cesso, identificam-se os gaps entre a capacidade atual do colaborador e 19 Sebrae. Treinamento adequado de funcionários. Disponível em: <http://www.bibliotecas. sebrae.com.br/chronus/ARQUIVOS_CHRONUS/bds/bds.nsf/8AB0AB2AE70E24FF8325758C- 00646CDE/$File/NT000400EA.pdf>. 20 Canal GesSaúde. Treinamento e desenvolvimento. Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=0p2vw6V7m3E>. http://www.bibliotecas.sebrae.com.br/chronus/ARQUIVOS_CHRONUS/bds/bds.nsf/8AB0AB2AE70E24FF8325758C00646CDE/$File/NT000400EA.pdfhttp://www.bibliotecas.sebrae.com.br/chronus/ARQUIVOS_CHRONUS/bds/bds.nsf/8AB0AB2AE70E24FF8325758C00646CDE/$File/NT000400EA.pdf http://www.bibliotecas.sebrae.com.br/chronus/ARQUIVOS_CHRONUS/bds/bds.nsf/8AB0AB2AE70E24FF8325758C00646CDE/$File/NT000400EA.pdf https://www.youtube.com/watch?v=0p2vw6V7m3E 152 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS o que ele deve desenvolver para chegar ao nível necessário. O trabalho é acompanhado por um profissional especializado, chamado de coach, e pode ser aplicado tanto para desafios pessoais quanto profissionais. Já o mentoring ocorre estritamente no âmbito corporativo e funciona na base do aconselhamento, feito por um profissional mais experiente naquela área que o colaborador quer se desenvolver. Diferentemente do coaching, não há prazos pré-estabelecidos para o atingimento de metas: a ideia é que haja um constante desenvolvimento vindo da relação de ensino-aprendizado entre os profissionais; z Feedbacks: momentos estruturados de feedbacks ajudam o colaborador a saber em que está acertando e o que precisa melhorar. Isso ocorre formalmente nas avaliações de desempenho, mas podem também ser feitos em outros momentos, conforme a necessidade identificada pelo gestor; e z Team building: metodologia experimental que nasceu na década de 1940 e consiste em alinhar conceitos ensinados em programas de inte- gração ou desenvolvimento com emoções. Integrar e aproximar pessoas que participam do mesmo processo, mesmo que sejam de diferentes de- partamentos, cria uma sensação de pertencimento a um objetivo maior e pode ajudar a fixar aquilo que foi aprendido. É importante ainda que a organização estimule o desenvolvimento externo do profissional, estruturando planos de carreira que levem em consideração cursos e outras formas de aprendizado e evolução desenvolvidas fora do am- biente de trabalho. Fluxo e etapas O treinamento e desenvolvimento de colaboradores deve ocorrer de forma prática: dinâmicas de grupo e técnicas de integração são feitas com base na realidade do hospital. É importante que as práticas sejam criadas consideran- do missão, visão e valores da instituição, para que haja uma integração entre posicionamento institucional e trato com clientes, parceiros e fornecedores. Independentemente do formato escolhido, o fluxo de treinamento deve ser constante. Ele deve ocorrer nas seguintes etapas: z Integração: é o treinamento executado assim que que o colaborador é contratado, dá as bases sobre o funcionamento da organização; 153Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS z Manutenção: atualização das informações, para a manutenção do de- senvolvimento do profissional considerando seus desafios específicos e dos de sua área. Ocorre a cada três ou seis meses; e z Atualização: treinamento anual para aprimoramento sobre novas téc- nicas e procedimentos, como tecnologia implantada no hospital ou no- vos processos de atendimento. Demanda do colaborador Além dos treinamentos ofertados pela instituição, é importante considerar que os próprios colaboradores podem buscar, no mercado, cursos, treinamen- tos, palestras, workshops, etc., com o objetivo de se desenvolver. Caso a organização queira investir dessa forma no funcionário, é preciso que haja um budget reservado para essas ações, cujo valor é definido no orça- mento empresarial. A concessão da verba deve respeitar as políticas pré-defi- nidas, que englobam: tipo de curso (formato, duração); nível hierárquico, que pode apelar ao benefício; tempo mínimo de casa que a pessoa deve permanecer na organização após a finalização do curso; etc. 154 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS 8. Estímulo e motivação Motivação é o exercício diário de envolver o colaborador nos objetivos da organização. Esse trabalho deve ser feito pelo gestor direto – que está próximo da pessoa – em conjunto com o departamento de recursos humanos – res- ponsável por alinhar a visão individual sobre o funcionário às necessidades e demandas da corporação. O primeiro fator que auxilia a motivar qualquer profissional é sua autoi- dentificação com missão, visão e valores da organização. De nada adianta que a instituição tenha bons rendimentos financeiros se os seus colaboradores trans- parecem, no trato com o paciente, fornecedores e parceiros, o descontenta- mento com o trabalho. Os estímulos mais frequentes são: z Apoio e desenvolvimento: ocorre quando o colaborador tem certeza de que a instituição está comprometida em auxiliá-lo no seu desenvol- vimento pessoal e profissional, o que pode vir em formas de treinamen- to, avaliações de desempenho feedbacks, informações, etc.; z Recompensa financeira: participação nos lucros e resultados (PLR), bônus, promoções, pagamentos variáveis; e z Recompensa no tratamento: reconhecimento frequente e estímulo ao atingimento de objetivos. Porém, não é possível manter todos os integrantes de uma equipe motiva- dos a todo o tempo. O diálogo aberto entre profissional e gestor é fundamental para identificar a desmotivação. Bons líderes são muito mais presentes nas questões pessoais e comportamentais que na cobrança de aspectos técnicos e de entrega de resulta- do financeiro. Quanto mais próximo do colaborador o gestor estiver, melhores serão os resultados proporcionados. 155Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS 9. Trabalho em equipe Um dos maiores problemas no desenvolvimento de equipes dentro de um hospital é o afastamento provocado pela cultura departamental. Criam-se in- ternamente pequenos feudos – as áreas –, e a interação entre elas ocorre de forma restrita. É necessário, portanto, corrigir essa visão míope para estimular a integração – papel conduzido pelas lideranças, em parceria com o departa- mento de recursos humanos. A união deve começar entre os gestores de cada área: o exemplo de cima para baixo (top down) estimula os demais colaboradores a fazer o mesmo, de forma instintiva; e o estabelecimento de processos horizontais, que permeiem os departamentos envolvidos, oficializa essa cultura. Fica a cargo do RH organizar workshops, reuniões de confraternização e cursos de treinamento em conjunto com diversas áreas, para integração entre gestores e equipe a cada seis meses ou um ano. Além disso, as reuniões perió- dicas de projetos ou acompanhamento devem agregar todas as pessoas envol- vidas, independentemente de departamentos. Comunicação interna A integração entre áreas diferentes pode ser maximizada com uma co- municação corporativa eficiente. Para isso, jornais e revistas internos, sites e páginas de redes sociais que agreguem todos os profissionais ajudam a ali- nhar o discurso. Essa estratégia deve estar alinhada ao RH, que vai repassar os conceitos que a instituição quer transmitir e filtrar quais tipos de informação podem ser compartilhadas com todos da organização. 156 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS 10. Papel do CEO A gestão de pessoas ainda é encarada por muitas organizações como res- ponsabilidade exclusiva do departamento de recursos humanos. Mas uma das maiores responsabilidades de um líder é formar e motivar suas equipes; por isso, o CEO do hospital deve ter papel ativo na escolha e gestão de seus cola- boradores e dar o exemplo sobre a importância das pessoas para a instituição. Isso não significa que RH perde espaço – na verdade, muda-se a cultura de que o departamento é custo, e ele passa a ser visto como um ativo estratégico alinhado à visão, à missão e aos valores do hospital. O CEO que não enca- ra seu capital humano como ativo da organização acaba por influenciar essa atitude entre os demais gestores e, em vez de formar líderes, corre o risco de desestimular sua equipe e, consequentemente, ver seus talentos sumirem. Para quesejam formados bons líderes, é preciso que universidades e cursos de pós-graduação coloquem a gestão de pessoas ao lado dos demais pilares essenciais da maturidade de gestão: governança corporativa, estratégia em- presarial, tecnologias de gestão e gerenciamento de processos. Se não há uma boa gestão de pessoas, alcançar níveis de profissionalismo em cada uma dessas vertentes se torna praticamente impossível. São as pessoas que irão contribuir para os objetivos primordiais da organização de Saúde: qualidade e segurança no atendimento ao paciente e melhoria dos resultados. Tecnologia x pessoas Em tempos de transformação digital, o CEO corre o risco de cometer o erro de achar que a tecnologia irá resolver tudo. Investir em equipamentos sem um trabalho de capacitação e engajamento das equipes pode incorrer em prejuízos e mais ineficiência – o oposto do objetivo desejado. Por isso, é preciso que a comunicação entre CEO e funcionários seja enca- rada como parte do cotidiano. O líder do hospital não pode ser inacessível. O CEO deve saber ouvir e ponderar as opiniões dos colaboradores para melhor gerir o capital humano e todos os demais departamentos do hospital. Uma boa gestão de pessoas, que valoriza seus talentos e incentiva o desen- volvimento tanto dentro quanto fora da organização, deve considerar alguns aspectos: 157Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS z Reconhecimento sobre a importância do papel de cada indivíduo na efetividade organizacional; z Estabelecimento de parcerias nas equipes; z Atração e retenção de talentos, com competências alinhadas ao objetivo da organização; e z Treinamento e desenvolvimento de competências e profissionais, a fim de criar vínculo duradouro entre as duas partes. O verdadeiro líder, com o apoio do RH, incentiva, conduz, inspira e forma outros líderes. E assim o hospital evolui. 158 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS 11. Desenvolvimento de lideranças Hospitais são organizações complexas e multifacetadas, que agregam pro- fissionais dos mais diversos níveis e especialidades de formação, que atuam de forma multidisciplinar para prestar atendimento ao paciente com qualidade e segurança. Recai sobre o líder a responsabilidade de preparar a equipe para que seja possível levar a organização a alcançar os objetivos traçados no plane- jamento de negócio. Esse trabalho do líder pode ser facilitado a partir de algumas técnicas: z Levar segurança para a equipe: é preciso estudar e compreender o fun- cionamento do hospital, suas necessidades e complexidades e estar em contato com profissionais do mercado, sem jamais parar de se atualizar. Informação traz segurança para a equipe, que sabe que tem um gestor que conhece o trabalho a ser desempenhado e que, por isso mesmo, pode seguir sua liderança; z Executar tarefas: não basta querer que as metas sejam alcançadas. Fa- zer acontecer é a diferença entre inércia e sucesso. É a mesma dis- paridade entre criatividade e inovação. A primeira é ter uma ideia. A segunda, colocá-la em prática; z Comunicar expectativas: a comunicação é importante para a evolução da maturidade do líder e do hospital. Metas e objetivos devem estar claros para toda a equipe, que também deve saber como proceder para alcançar os resultados esperados pelos gestores; z Desafiar a equipe: é importante estimular as lideranças a pensar por si mesmas e a propor soluções para os desafios do dia a dia. O gestor deve compreender que bons líderes trocam ideias, aceitam sugestões e confiam em seus colaboradores; z Responsabilidade com os colaboradores: líderes de sucesso devem se concentrar nos resultados do grupo sem, no entanto, serem controla- dores. É preciso estar aberto ao diálogo e às críticas, mas deixar clara a responsabilidade pelos resultados obtidos, sejam positivos, sejam ne- gativos; 159Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS z Liderar pelo exemplo: líderes que são vistos como exemplos pelos seus colaboradores são mais eficientes. É preciso praticar aquilo que se pre- ga. Exemplo: um líder que exige dos colaboradores o uso do avental e o crachá de identificação deve usar, diariamente, o avental e o crachá de identificação; z Recompensar por desempenhos: não se trata necessariamente de re- compensas financeiras. Líderes que não elogiam a equipe pelo bom de- sempenho, não demonstram confiança e não conseguem estimular fun- cionários não alcançam resultados de forma continuada e consistente; z Oferecer feedback: o feedback não deve ser deixado somente para o momento da avaliação de desempenho. Deve ser executado cotidiana- mente, como parte das orientações necessárias para o desempenho de cada atividade; z Incentivar talentos: é preciso que o gestor conheça os talentos de sua equipe e saiba como utilizá-los para lidar com situações específicas e, assim, otimizar os processos; z Solicitar conselhos: é preciso incentivar os colaboradores a participar dos processos de decisão. Muitas vezes boas ideias para solucionar de- safios vêm de onde menos se espera; z Resolver problemas: a habilidade de solucionar problemas e enfrentar situações desagradáveis de frente é essencial para o bom líder, que sabe que precisará lidar cotidianamente com os desafios da gestão hospitalar; z Estimular a positividade: profissionais precisam de uma cultura de trabalho positiva. A atmosfera agradável entre as equipes e suas lide- ranças aumenta a força de vontade; z Ser claro no repasse de informações: para ser um bom líder, é preciso saber que o professor não é somente aquele que ensina, mas aquele que orienta no caminho do aprendizado; z Investir em relacionamento: o sucesso do líder depende do sucesso de sua equipe. Manter o bom relacionamento, sem impor dominância, mas atuando de forma a estimular o trabalho em equipe, é o que carac- teriza uma boa liderança; e z Conhecer a própria influência: os verdadeiros líderes gostam de li- derar não por causa do poder, mas sim porque sabem que podem in- fluenciar pessoas e, assim, fazê-las amadurecerem e evoluírem como profissionais e como pessoas. 160 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS Evoluir as lideranças do hospital é possível desde que haja entendimento de que esse processo se dá ao mesmo tempo e é parte fundamental da evolução da maturidade de gestão da organização. Contar com estratégias, governança, tecnologias e gerenciamento de processos facilita a gestão de pessoas, pois há regras e métodos a serem seguidos para que se alcancem os resultados esperados. 161Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS 12. Mudança com o digital A digitalização da Saúde permite suporte mais assertivo às decisões clíni- cas, o que promove melhor qualidade da atenção e mais segurança ao paciente – consequentemente, pode tornar o atendimento mais eficiente e humanizado. Com o avanço da transformação digital, o hospital deixará de ser uma orga- nização que ganha apenas com a doença e passará a ser remunerado também por promoção da qualidade de vida – status que demanda mudança na cultura organizacional e, claro, na gestão de pessoas. Com a implantação de novas tecnologias no hospital, os profissionais pre- cisam registrar as informações com um nível mínimo de detalhes – estabele- cido pelo próprio sistema –, parâmetro que garante confiabilidade e facilita o acesso. Esse banco de dados será fonte de informação para o gerenciamento de toda a organização; portanto, a gestão de pessoas deve ser executada de ma- neira que todos os colaboradores compreendam a dimensão de suas atividades, individualmente, no processo de digitalização do sistema de Saúde. Por isso, é preciso destacar a relevância de associar ferramentas de suporte à tomada de decisão clínica – como sistema de apoio ao diagnóstico e trata- mento baseados em evidências científicas– aos prontuários eletrônicos. Nessa associação, também é possível citar a utilização de machine learning e inteligên- cia artificial, que permite, por meio da “leitura” das informações dos pacientes, com a interpretação de artigos, publicações e cases, proporcionar recomenda- ções de protocolos e esquemas de tratamento. A adoção de Internet das Coisas (Internet of Things – IoT) e dispositivos vestíveis (wearable devices) também transforma o modelo de atenção, pois consiste no envio instantâneo de dados individualizados de saúde, o que ajudará a monitorar a evolução do tratamento e a necessidade de mantê-lo ou alterá-lo. Nesse contexto, a medicina preventiva se torna essencial para a sustentabi- lidade do sistema e deve estar cada vez mais incorporada à atenção. Assim, o hospital pode deixar de ser apenas a porta de entrada para o sistema de Saúde por meio do tratamento de doenças e passar a ser um elemento importante no processo de prevenção. Como parte de um todo, deve fazer parte de um siste- ma tecnológico que integre os dados do usuário ao longo dos demais agentes e que seja disponível para os gestores, profissionais de Saúde e, principalmente, para o próprio paciente, que deverá se engajar em seu cuidado e entender que é o próprio responsável pela sua qualidade de vida. 162 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS Já a medicina preditiva, por sua vez, permitirá atendimento cada vez mais individualizado e personalizado. Cruzar dados estruturados – de sistemas in- formatizados – e desestruturados – o chamado Big Data –, com apoio de fer- ramentas como Business Intelligence, inteligência artificial e analytics, permitirá, por exemplo, verificar a probabilidade de uma mulher ter câncer de mama, considerando histórico familiar, grupos de risco que ela integra, mapeamento genético, hábitos de alimentação, estilo de vida, entre outros fatores. Isso dará ao departamento de recursos humanos a responsabilidade de selecionar profissionais alinhados a esse perfil de prevenção e utilização de tecnologias, e capacitar os colaboradores que já integram o corpo clínico na criação da visão de ampliar a interação com o paciente para mais que o trata- mento e a cura, para a prevenção e educação em saúde. O papel do médico terá uma mudança significativa. Atualmente, no modelo de organização para tratar doenças, esse profissional passa praticamente 100% do tempo focado em recu- perar o paciente, não necessariamente em promover o bem-estar e a qualidade de vida de pessoas já saudáveis. 163Roberto Gordilho CAPÍTU LO 4: G ESTÃO D E PESSO AS Reflexão: Novo papel A transformação digital promete revolucionar o funcionamento dos hos- pitais. Mas essa mudança não vai sair da teoria se a direção do hospital não conseguir engajar a equipe – da assistência ao backoffice. Somente com a integração dessas duas áreas, ainda tão apartadas, é possível usufruir dessa tendência e evoluir a maturidade de gestão hospitalar que permitirá a mu- dança do perfil das organizações. As tecnologias de inteligência artificial exigem um profissional diferen- ciado, com a mente aberta para entender que não será substituído pelas máquinas, mas terá, sim, seu trabalho alterado. A transformação digital exige capacitação das equipes – caso contrário, não será possível tirar o melhor proveito das funcionalidades dos sistemas e de novas tecnologias. Há alguns anos, falava-se em médicos que se apresentavam resistentes para preen- cher o histórico dos pacientes e realizar prescrições via computador, por exemplo. Hoje não tem mais espaço para o “não querer”: profissional que não se adaptar vai perder relevância. Que contraditório: o medo de perder espaço para tecnologias será o motivador dessa perda de espaço. Esse movimento não ocorrerá somente na assistência, mas também no backoffice. Na área administrativa, por exemplo, o hospital exigia um fun- cionário para emitir uma nota fiscal, outro para conferir, outro para fazer o lançamento contábil. Agora todos esses procedimentos podem ser feitos por uma única pessoa, com o apoio de sistemas informatizados que tornam esse trabalho muito mais preciso e ágil. A possibilidade de ocorrer um erro humano nessas operações se torna muito menor. Em compensação, tarefas surgem – são necessários especialistas em análise de dados e gerenciamento de informações, que saibam utilizar as modernas ferramentas de Business Intelligence (BI), analytics, Big Data e ou- tras que estão por vir. São esses funcionários, focados muito mais no traba- lho intelectual que braçal, que vão ajudar a revolucionar a Saúde, possibili- tando insights de negócios que ajudarão a evoluir o modelo de operação e a melhorar a assistência ao paciente. Equipes engajadas por líderes em instituições com gestão madura sabem que a transformação digital proporcionará os resultados almejados pela or- ganização e irá garantir a qualidade do atendimento ao paciente – mas irá além disso. As mudanças proporcionadas pela tecnologia da informação (TI) 164 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 4 : G ES TÃ O D E PE SS O AS nos hospitais tornam o atendimento mais seguro, o diagnóstico ocorre com apoio de protocolos clínicos e baseado em evidências. É possível também colocar em ação a preditividade, que permitirá a mu- dança total do perfil dessas organizações. O hospital deixará de ganhar di- nheiro apenas com doença e passará a ganhar também com a saúde e a prevenção, ao evitar que as doenças se manifestem. Assim como o perfil do gestor está mudando nos hospitais, o perfil dos demais profissionais também precisa mudar. O melhor médico, que antes era promovido a superintendente por seu conhecimento técnico do setor, dá lugar ao gestor de Saúde – médico de formação ou não – que conduzirá à evolução da gestão por meio, entre outros elementos, da transformação digital. Da mesma forma, o líder de TI não pode mais ser exclusivamente operacional, mas precisa alcançar um patamar estratégico essencial para que a mudança de processos aconteça. CAPÍTULO 5: TECNOLOGIAS DE GESTÃO C A P Í T U L O 5 TECNOLOGIAS DE GESTÃO 169Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO Reflexão: TI, estratégia e maturidade de gestão hospitalar Da década de 1980 – quando a EXE Sistemas, empresa que fundei, lan- çou a primeira solução integrada de gestão empresarial (ERP) da Bahia – até hoje, aumentaram o peso e a importância que o departamento de tecnolo- gia da informação (TI) tem para as empresas, especialmente as organizações de Saúde. E muito ainda está por vir. As mudanças recentes, impulsionadas pela digitalização dos processos, pedem uma TI técnica, mas também com muito mais visão estratégica. Isso porque quando pensamos em todos os elementos que levam à maturidade de gestão hospitalar, como governança, estratégia, processos e pessoas, a tecnologia precisa ser aquela que dá liga aos demais. Sabe quando usamos o telefone para fazer uma ligação? Ele simples- mente funciona, sem que pensemos como isso acontece. Deve ser assim com o operacional da tecnologia da informação: deve simplesmente funcio- nar, para que, assim, a TI possa assumir seu verdadeiro papel. A mudança se dá com o avanço das inovações tecnológicas, tais como Big Data, wearable devices e inteligência cognitiva, todas trabalhando em prol da saúde do paciente. É por meio dessas e de outras novidades que o hos- pital poderá colher uma infinidade de dados sobre cada indivíduo atendido. Esses dados possibilitarão que se identifiquem padrões que permitam uma mudança processual e gerencial que transformará a forma de trabalhar. Será possível praticar a preditividade, que é a capacidade de identificar potencial de desenvolvimento de doenças, considerando o histórico pessoal, familiar e estilo de vida da pessoa. Isso é uma revolução para a medicina. A TI será a condutora desse processo, por meio datransformação digital, que permitirá identificar gargalos, pontos de melhoria, trabalhar questões de efi- ciência de uma forma não só ligada à operação, mas no sentido de qualidade global e segurança da informação, com o conceito do eletrônico fim a fim em que o paciente está no centro. É fundamental que a TI seja proativa nas atividades, comunicando-se constantemente com as demais áreas em busca de soluções e melhorias nos processos de trabalho. Ela também deve manter seu planejamento, me- tas e acompanhamento dos resultados alinhados à estratégia do hospital, otimizando os custos e adequando processos e sistemas à visão global da instituição. 170 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O 1. Além da TI A cada dia é mais notória a importância da gestão da informação nas ins- tituições de Saúde, que lidam com uma infinidade de dados administrativos e médicos dos milhares de pacientes. Mais do que ter acesso a esses dados, transformá-los em indicadores permite análises que tornam a gestão mais efi- ciente e resultam na melhoria da saúde financeira da instituição e segurança do paciente. Adquirir um sistema de gestão parecia ser a solução para os problemas administrativos. Mas, com o passar dos anos, os gestores perceberam que isso não é suficiente para resolver todos os problemas do hospital. Uma visão com- pleta e integrada depende de metodologia que envolva estratégia, processos, gestão de pessoas e governança. Sem uma base gerencial bem estabelecida, a tecnologia não é utilizada em sua plena capacidade e, dificilmente, valerá o investimento. Qualquer corporação que deseja mergulhar no mundo da tecnologia deve planejar todo o processo antes de informatizar a gestão e operação, além de manter um acompanhamento após a implantação. Dessa forma, a primeira ação passa, invariavelmente, por uma análise sobre o nível de maturidade tec- nológica da instituição, para que, ao se estabelecer aonde se quer chegar, seja possível traçar um plano de ação, com etapas claras e consistentes. A informatização visa melhorar os processos administrativos e reduzir a dependência do papel, além de centralizar e disponibilizar as informações de qualquer lugar a qualquer hora de forma automatizada. O objetivo final é sem- pre oferecer melhor atendimento, maior produtividade e redução de custos à instituição e aos pacientes. Para que a informatização faça sentido, é preciso que ela atenda a uma ne- cessidade. Um processo de sistematização do hospital demanda cinco etapas, tanto do aspecto de backoffice quanto do clínico: z Banco de dados sólido: um bom projeto de informatização é baseado em um banco de dados sólido, no qual estão concentradas todas as informações que dizem respeito à instituição: desde controle de gastos e dados sobre a eficiência de cada departamento até o registro clínico total dos pacientes, que passa a ficar disponível em um único lugar, com as fichas de cadastro pessoal e do agendamento de consultas e exames; 171Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO z Business Intelligence: os softwares de gestão, em sua maioria, contam com a tecnologia de Business Intelligence (BI) integrada, que gera pai- néis de indicadores que auxiliam o gestor na hora de comparar núme- ros, como total de consultas realizadas e de atendimentos, entre outros. Isso permite tomadas de decisão mais baseadas em dados e menos em impressões, com visão clara sobre o ritmo do hospital e os pontos críti- cos que precisam ser reavaliados e melhorados; z Gestão eletrônica de documentos: com um plano de gestão eletrônica de documentos (GED), o hospital consegue otimizar o atendimento por permitir acessos de dados on-line ao agendamento e aprovação de consultas e cirurgias diante os convênios; z PACS: o Sistema de Comunicação e Arquivamento de Imagens (Pic- ture Archiving and Communication System – PACS) tem como função primordial armazenar imagens de exames, partindo da realização até o monitoramento e diagnóstico. Isso facilita a comunicação entre os setores envolvidos no processo, dentro e fora do hospital; e z Prontuário Eletrônico do Paciente: integrado aos sistemas informa- tizados de gestão vem o Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP), que agrega todas as informações clínicas dos atendimentos e histórico de diagnósticos e tratamentos. Como atingir a excelência Para a informatização ser, de fato, eficaz, a instituição de Saúde deve contar com uma formulação estratégica que permita o aproveitamento dos benefícios do sistema de gestão e crie mecanismos que ajudem a explorar por completo as facilidades trazidas pela informatização. Em linhas gerais, a maturidade em gestão hospitalar não é estar informatizado apenas, é ter na equipe pessoas qualificadas e capacitadas para utilizar a tecnologia com bons e sólidos proces- sos na execução, sempre ao lado de um sistema de governança que permita o acompanhamento da organização e das ações planejadas. 172 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O 2. TI básica Equipar um hospital com tecnologia de informação exige tomada de de- cisão por parte do gestor e empenho integral da equipe. O departamento de TI deve atender às necessidades da organização, sempre visando à melhoria do atendimento ao paciente e à obtenção de resultados. A tecnologia colabora muito para esses objetivos, porém, é preciso garantir a estrutura necessária para que os processos ocorram de forma integrada e ágil, sem perda de eficiência. Com aparato tecnológico, é possível compreender, hierarquizar e atender às necessidades do usuário, desde o registro na recepção até a alta. Outro be- nefício é mais segurança ao paciente, informações mais focadas e direcionadas e compartilhamento de informações importantes que compõem a formulação do diagnóstico. Estruturar a TI requer compreender como as funcionalidades de cada fer- ramenta podem agregar ao atendimento. Conheça as principais: z Enterprise Resource Planning (ERP): o primeiro passo é ter computa- dores com ERP instalados. Essa ferramenta é essencial para o controle sobre processos como recebimento, pagamento e gestão de estoque, por exemplo; z Prontuário Eletrônico do Paciente: é preciso instalar o PEP para di- gitalizar os dados do paciente e integrá-los com demais áreas assisten- ciais e operacionais do hospital, como os sistemas de farmácia e labo- ratório para fazer controle de dispensação de medicamento, checagem beira-leito, ciclo de medicamentos; z Data center/Cloud computing: para armazenar todos os dados gerados, é necessário um data center com servidores, ou, então, optar por um serviço que faça o armazenamento em nuvem, o que pode, em alguns casos, reduzir custos e ampliar segurança ao evitar perda por incêndio, problemas de quebra ou erros de armazenamento; z Sistema de Comunicação e Arquivamento de Imagens (Picture Ar- chiving and Communication System – PACS): fundamental para inte- grar sistemas de imagem de exames e deve ser gerenciado de modo que tanto paciente quanto profissionais da assistência possam ter acesso; e 173Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO z Sistema de Informações de Radiologia (Radiology Information Sys- tem – RIS): software que automatiza o fluxo de uma clínica de medicina diagnóstica, permitindo aos profissionais de radiologia acessar templates de laudos de diferentes especialidades e otimizar suas atividades. Alinhar e capacitar todos os colaboradores é essencial para que as tecnolo- gias sejam utilizadas de forma precisa e que garantam atendimento de qualida- de, com celeridade, e, principalmente, contribuam para uma maior segurança ao paciente. 174 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O 3. TI subutilizada Há diversas instituiçõesde Saúde que contam com sistemas e equipamen- tos modernos, mas não sabem exatamente como aproveitá-los para melhorar o atendimento ao paciente, reduzir custos, fazer o faturamento crescer e se destacar em meio ao competitivo mercado da Saúde. Estimativas dão conta de que 90%21 dos hospitais usam somente de 30% a 40% da potência das tecno- logias de gestão que possuem. Os motivos são diversos: falta de conhecimento, de processos, de capaci- tação, de estratégia e de disciplina. A situação é ainda mais grave em hospitais de pequeno e médio portes ou que estão mais afastados dos grandes centros urbanos. Com a queda de preço da tecnologia nos últimos anos, é possível en- contrar ferramentas que poderiam auxiliar o gerenciamento dessas organiza- ções, independentemente do tamanho e da capacidade, mas, sem planejamen- to, revisão de processos e uma estratégia clara, elas acabam por não cumprir esse papel. Antes de pensar em investir em hardware e software, é preciso planejamen- to sólido e estruturado de negócio para entender de que forma essas ferramen- tas poderão ajudar no dia a dia do hospital. Esse processo é dificultado porque muitas organizações de Saúde ainda funcionam de forma departamental, sem gestores com visão integrada de negócio. Assim, as áreas que mais fazem uso das tecnologias de gestão são ainda as que lidam com tarefas administrativas, como materiais e logística, faturamento e controladoria, que originalmente foram a porta de entrada da informatização no setor hospitalar. As tecnologias que costumam ser mais subutilizadas nos hospitais são: z Agendamento online: a ferramenta facilita o acesso do beneficiário à instituição, já que permite a marcação de consultas, exames e procedi- mentos 24 horas por dia, sete dias por semana. Apesar disso, muitas organizações continuam optando pelo call center, que é mais caro, por conta do custo com equipe, e menos assertivo, por não facilitar a confir- mação de presença por ferramentas acessíveis como o SMS. O grande número de faltas tem como consequência horários ociosos, que pode- riam ser utilizados para ampliar a receita da instituição; e 21 Dados levantados pela GesSaúde em cerca de 300 hospitais brasileiros. 175Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO z Sistema de Informação de Radiologia (Radiology Information Sys- tem, ou RIS) e Sistema de Comunicação e Arquivamento de Ima- gens (Picture Archiving and Communication System, ou PACS): es- sas soluções, integradas, facilitam o trabalho do médico radiologista, aumentando a produtividade e reduzindo custos. A subutilização da tecnologia prejudica também os diagnósticos, que podem ser otimiza- dos por meio de ferramentas inseridas nos sistemas, como o 3D, por exemplo, que permite a visualização tridimensional de estruturas como veias e órgãos. A mudança da cultura analógica para a digital precisa partir das lideranças, e, para tanto, é necessário que elas evoluam o nível de maturidade de gestão antes de pensar em informatizar seus sistemas. Mas não basta traçar a estraté- gia: é preciso também acompanhá-la de forma regular, corrigir o rumo, tomar decisões, aprender. Tudo isso exige técnica e muita disciplina, mas é funda- mental para alcançar os resultados planejados. 176 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O 4. Maximização de investimentos Ao implementar soluções de gestão hospitalar, como o Enterprise Resource Planning (ERP), Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP) e checagem à beira do leito, muitas organizações se esquecem que essa não é uma atividade me- ramente tecnológica, mas, sim, uma mudança no estilo da gestão e operação, com novos processos, diferentes atribuições entre equipes e acompanhamento de indicadores. Ter um retorno de investimento positivo, com aproveitamento total das ferramentas, exige uma minuciosa avaliação de processos e atividades, além de capacitação constante dos profissionais – tanto do corpo clínico quanto da administração. Essa visão é essencial para evitar a subutilização dos sistemas. Para isso, é necessário seguir quatro ações cruciais: z Mudança de mentalidade (cultura): o primeiro passo é conscientizar toda a equipe da importância da adoção de tecnologia para o dia a dia de trabalho. Se isso não fizer parte da cultura e do mindset de todos os profissionais, o projeto não vai para frente como deveria; z Mapeamento interno (processos): é essencial realizar uma análise de todos os processos de trabalho para buscar oportunidades de automa- tização e aumento da eficiência. Em geral, muitas atividades realizadas de forma manual podem ser automatizadas pelas ferramentas já exis- tentes e outras que já são informatizadas podem ser melhoradas. Para isso, é recomendado conversar com todas as áreas que vão usufruir das tecnologias, com o intuito de identificar que funcionalidades precisam e que módulos estão sendo subutilizados para a adequação no momen- to da implantação; z Equipe de especialistas (pessoas): ter pessoas qualificadas e capacita- das para utilizar a tecnologia com bons e sólidos processos na execução da estratégia definida, aliadas a um sistema de governança capaz de permitir o acompanhamento da organização e das ações planejadas, é de suma importância. Após a finalização do projeto de implantação do sistema, é normal que haja uma desmobilização de toda a equipe do projeto, e, com isso, os esforços de melhoria em muitos casos deixam de ser feitos, comprometendo o avanço da utilização das ferramentas. 177Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO É importante manter um esforço constante de reavaliação, revisão dos processos, correção do que não ficou tão bom e aprendizado com os sucessos; e z Treinamento para todos: o planejamento estratégico deve levar a utili- zação dos recursos disponíveis até o limite, antes que se avaliem novas aquisições e investimento. Por isso que o processo deve vir acompanha- do de um plano de capacitação continuado de funcionários e gestores. 178 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O 5. TI madura e HIMSS A certificação da Healthcare Information and Management Systems Society (HIMSS – Sistemas de Gestão) Analytics, organização que lidera os esforços globais para otimizar a Saúde e a assistência médica por meio da tecnologia da informação (TI), é cobiçada por hospitais que buscam digitalizar seus pro- cessos. Ela funciona de maneira similar a qualquer acreditação hospitalar, com a diferença de avaliar se os processos assistenciais estão, de fato, apoiados e auto- matizados por sistemas e tecnologias digitais. Os requisitos da HIMSS servem como um guia para os gestores que pretendem transformar a organização em um hospital digital. O modelo de adoção de prontuário eletrônico (Eletronic Medical Record Adoption Model, ou Emram) da HIMSS é dividido em oito estágios, a saber: Estágio 0 – sistemas LIS (laboratório), RIS (radiologia) e PHIS (farmá- cia) não estão instalados ou não são integrados; Estágio 1 – sistemas para laboratório, radiologia e farmácia instalados e integrados; Estágio 2 – repositório de dados clínicos (CDR) instalado, com vocabulá- rio médico controlado (CMV) e apoio à decisão clínica, além de intercâmbio de informações clínico-assistenciais; Estágio 3 – documentação de enfermagem disponível no prontuário ele- trônico, apoio à decisão clínica com checagem de erros e Sistema de Arqui- vamento e Comunicação de Imagens (Picture Archiving and Communication System – PACS) disponível fora da radiologia; Estágio 4 – Sistema de prescrição eletrônica instalado e sistema de apoio à decisão clínica baseado em protocolos clínicos; Estágio 5 – PACS com as principais modalidades de diagnósticos e elimi- nação do uso de filme radiológico (filmless); Estágio 6 – circuito fechado de medicamentos com checagem beira-leito,documentação médica integrada aos sistemas de apoio à decisão clínica; e 179Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO Estágio 7 – PEP completo e em uso em todos os setores do hospital, com integração para o compartilhamento de informações clínicas e uso de BI e analytics para melhoria da assistência. Os estágios 6 e 7 são os mais complexos e requerem um nível de maturida- de de gestão hospitalar mais elevada. Para conseguir a certificação nos estágios mais elevados, é preciso uma análise profunda do papel da tecnologia em cada processo hospitalar. O projeto, porém, não pode ser visto como uma ação do departamento de TI, mas depende de atuação estratégica da equipe para sair do papel. É preciso rever os processos e até mesmo incorporar outros para alcançar os objetivos propostos e ser certificado. A TI tem papel importante na condução das ações, mas precisa estar alinhada com os objetivos de negócio da instituição. Interoperabilidade É importante frisar que a HIMSS preconiza a interoperabilidade inter- na em primeiro lugar. Isso significa que, para ser acreditado no Estágio 6, é necessário que diferentes sistemas estejam integrados: o de prescrição tem de estar ligado ao da farmácia; o do prontuário eletrônico ao do diagnóstico por imagem; e assim por diante. Já para o Estágio 7 é exigida a interoperabilidade externa, ou o comparti- lhamento de dados com instituições parceiras, principalmente a operadora de Saúde. Para tanto, é preciso ainda mais maturidade de gestão, um desafio ainda enfrentado pela maioria das organizações, pois o compartilhamento de infor- mações, mesmo que referentes ao paciente, ainda não é uma prática comum. Garantir os requisitos solicitados pela HIMSS, portanto, não mostra ao mercado apenas um hospital digital, mas também um hospital que evoluiu sua maturidade de gestão de forma a enxergar a tecnologia como um meio para alcançar resultados, sendo os principais a segurança e a qualidade do atendi- mento ao paciente. 180 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O 6. Transformação digital e TI A transformação digital é uma megatendência motivadora de uma revolu- ção na forma como os negócios entregam valor aos clientes, com reflexo direto em seu desempenho, posicionamento e alcance. Para os hospitais, trata-se de uma mudança estrutural e de estratégia que dá à tecnologia papel mais ativo no cuidado ao paciente e na gestão. Mas, sozinha, a tecnologia não é capaz de levar as organizações a evoluírem a maturidade de gestão: o fator-chave é uma mudança de cultura. É necessário, antes de escolher as ferramentas, saber exatamente quais são as necessidades da organização e dos pacientes e de que forma a tecnologia po- derá resolvê-las. Isso leva tempo e consome recursos, mas não são só as grandes organizações que podem implantar programas de transformação digital, até porque isso não se resume a quem tem mais dinheiro. A transformação digital envolve quatro vertentes: processos (melhoria da eficiência), pessoas (capacitação continuada), tecnologia (inovação) e va- lor (vantagem competitiva e melhoria da experiência do cliente – neste caso, paciente). Ela não somente automatiza processos, mas os modifica e cria mo- delos de negócio, melhorando a experiência dos pacientes pela exploração in- tensa da tecnologia, possibilitando novas maneiras de interação entre eles, a equipe assistencial e a organização. Para organizações de Saúde, a revolução digital auxilia no ganho de efi- ciência operacional, no sentido de processos e fluxos de trabalho melhor dese- nhados e transparentes e indicadores mais confiáveis para acompanhamento e tomada de decisão por parte dos gestores – ponto positivo, portanto, para a evolução da maturidade. Além do ganho de eficiência, a transformação digital ainda melhora o relacionamento com o paciente porque permite conhecer suas expectativas e otimizar a comunicação, além de trazer mais segurança e transparência no atendimento. Cultura digital A capacitação dos funcionários é parte fundamental da mudança de cul- tura que a transformação digital exige. Sem ela, as tecnologias de gestão se tornam subutilizadas dentro do hospital, porque não há entendimento das 181Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO equipes em relação aos benefícios das ferramentas informatizadas e adesão plena ao novo modelo. Porém, não se trata somente de ensinar a usar o software. A transformação digital é um conceito complexo, que precisa partir do topo e se espalhar por to- das as decisões estratégicas e os processos do hospital. É preciso ir além e mos- trar ao funcionário o que o preenchimento correto dos dados representa para a execução dos processos. Isso só é possível quando há maturidade de gestão, que torna líderes mais conscientes do funcionamento do todo, capazes de motivar e engajar equipes para alcançar os resultados almejados pela organização. 182 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O 7. Atualização do parque Os hospitais deram início ao processo de digitalização de seus dados na década de 1980. Hardware e software começaram a ser adquiridos principal- mente para informatizar processos de backoffice, em especial os de faturamento. Atualmente, com a transformação digital e o desenvolvimento de ferramentas como Business Intelligence (BI), analytics, Big Data, Internet das Coisas (In- ternet of Things – IoT), entre outras, é preciso evoluir a tecnologia de gestão existente e, portanto, atualizar o parque tecnológico da organização. Mas não adianta adquirir um software de última geração, dotado de inte- ligência artificial, se gestores e equipe não souberem exatamente de que forma ele auxiliará e trará mais qualidade no atendimento ao paciente – e, conse- quentemente, o que fazer com os dados que esse sistema vai gerar e armazenar. Na era da transformação digital, as tecnologias de gestão devem ser con- sideradas como um meio, aliadas a outros pilares que levam à maturidade de gestão: governança corporativa, estratégia empresarial, gerenciamento de pro- cessos e gestão de pessoas. É preciso ter em mente que, sozinhas, as tecnologias não entregam os resultados almejados. Porém, sem elas, não é possível fazer parte do futuro. Nesse cenário, o departamento de tecnologia da informação (TI) precisa assumir um papel muito mais estratégico. Todo o processo de renovação do parque tecnológico deve ser feito com o apoio da TI, alinhada ao planejamento estratégico do hospital, a fim de entregar, com as novas tecnologias, aquilo que a organização planeja – tanto do ponto de vista da qualidade e segurança no atendimento ao paciente quanto de resultados financeiros. Integração Outro ponto que deve ser levado em consideração ao conduzir a migração tecnológica é a integração dos sistemas. Ela não era comum no passado, quan- do cada departamento usava um tipo de software, e eles não conversavam entre si. Com a transformação digital, a interoperabilidade se torna fator essencial não apenas para obter acreditações – que são diferenciais de mercado –, mas também para a prática do dia a dia. Ela permite, por exemplo, que o sistema da farmácia receba de forma automática a prescrição de um medicamento, 183Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO faça a dispensação e checagem beira-leito para garantir que o insumo certo foi entregue ao paciente certo. Para a gestão, a integração entre os sistemas traz assertividade no plane- jamento dos rumos do hospital. Isso porque ela permite gerar dados estrutu- rados que podem ser utilizados para a avaliação e tomada de decisões estra- tégicas – como, por exemplo, e se for o caso, deixar de oferecer o serviço de maternidade e investir mais no de oncologia, que tem demanda maior e pode trazer mais resultados financeiros. Com o papelmais estratégico da TI e um parque tecnológico atualizado, é possível evoluir a maturidade de gestão e, assim, garantir a continuidade da organização em um mercado com pacientes cada vez mais exigentes sobre o cuidado com sua saúde e qualidade de vida – incluindo o uso da tecnologia para tal. 184 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O 8. Novas tecnologias A transformação digital pede modernização das tecnologias de gestão dos hospitais. É necessário investir em ferramentas que sirvam de apoio à execução dos processos e entrega dos resultados. Mas, antes de adquiri-las, deve-se pla- nejar e entender de que forma cada inovação poderá ajudar na entrega de um atendimento de qualidade ao paciente. Algumas tecnologias são essenciais para alcançar a maturidade de gestão hospitalar: z Enterprise Resource Planning (ou sistema de gestão hospitalar): em geral, hospitais informatizados já contam com a ferramenta, porém, muitas vezes não há integração entre ela e os demais softwares, tais como o Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP), Sistema de Arquivamen- to e Comunicação de Imagens (Picture Archiving and Communication System – PACS) e Sistema de Informações de Radiologia (Radiology Information System – RIS), por exemplo. Com a interoperabilidade in- terna, é possível armazenar todos os dados e processos da organização – incluindo assistência e backoffice – em plataforma única. Isso não só facilita o acesso como também a análise dessas informações; z Business Intelligence (BI): ferramenta capaz de coletar, organizar, anali- sar, compartilhar e monitorar informações que oferecem suporte à ges- tão de negócios. Conceitualmente, trata-se do conjunto de teorias, me- todologias, processos, estruturas e tecnologias que transformam uma grande quantidade de dados brutos em informação útil para a tomada de decisões estratégicas. Na prática, ajuda, por exemplo, na identifi- cação de possíveis gargalos nos processos, que, solucionados, podem otimizar os resultados. z Analytics: trazem mais recursos de preditividade, possibilitando traçar cenários futuros por meio da análise dos dados com raciocínio sistemá- tico. Dessa forma, amplia-se a possibilidade de seu uso para conduzir a um processo de tomada de decisão ainda mais eficiente. A indicação é o uso de BI e analytics em complementaridade; z Big Data: a quarta tecnologia de gestão essencial para o hospital que quer entrar de vez na era da transformação digital. Ele representa o ar- 185Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO mazenamento de grande volume de dados, gerados pelas mais diversas fontes, estruturados ou não, e que, ao serem analisados, são revertidos em informações estratégicas para os negócios, com alta tempestividade; z Computação cognitiva e inteligência artificial: representam a pró- xima revolução da Saúde. Sistemas podem aferir diversas informações ao mesmo tempo e oferecer resultados que podem contribuir para o diagnóstico, por exemplo. Pode auxiliar em tarefas clínicas, como o diagnóstico e a detecção de focos de doenças; z Wearable devices e Internet das Coisas (IoT): dispositivos vestíveis, ou wearable devices, são tecnologias acopladas ao corpo que trabalham com medições vitais, tais como como batimentos cardíacos, tempera- tura e pressão arterial. Trabalham em conjunto com a IoT: possuem biossensores que podem ser agregados a um smartphone, relógio ou chip implantado sob a pele ou ingerido como pílula. Com esses dispositivos é possível também rastrear alterações hormonais ou no sangue, contri- buindo para o tratamento preventivo; e z Impressão tridimensional (3D): esse tipo de tecnologia vai permitir a produção de itens personalizados, adaptados às necessidades fisiológi- cas de pacientes, reduzindo desperdícios na compra e no uso dos equi- pamentos. A impressão 3D pode modificar as redes de abastecimento de produtos, pois requer menos capital e se reduz a uma escala mínima de necessidade. Essas tecnologias de gestão estão em constante evolução, e, em anos, po- dem aparecer outras necessidades e soluções, a depender do perfil de cada instituição. O que não haverá mais é um hospital sem o apoio de ferramentas digitais em seus processos, pois este não será capaz de enfrentar o competitivo e exigente mercado de Saúde dos próximos anos. 186 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O 9. Computação cognitiva A inteligência artificial permite o desenvolvimento da computação cogni- tiva, que, grosso modo, significa que o sistema consegue fazer associações como um cérebro humano e aprender com erros, dentro do contexto do machine lear- ning (aprendizado de máquina). A tendência é considerada a próxima revolu- ção da Saúde, porque adiciona maior capacidade e velocidade de processamen- to, fornecendo apoio tanto ao diagnóstico e tratamento quanto às operações de atendimento do hospital. As aplicações são inúmeras. Na assistência, permite o desenvolvimento da medicina preditiva: cruza informações individualizadas dos pacientes – cole- tadas via dispositivos vestíveis (wearable devices) ou a partir de outras fontes – com histórico familiar, tendências de seu grupo de risco, entre outras informa- ções, para verificar a probabilidade de desenvolvimento de doenças no longo prazo e sugerir medidas preventivas. Também aumenta o potencial e precisão dos diagnósticos, permite simular processos infecciosos e integra protocolos clínicos, apoiando o médico em suas decisões. Outra aplicação são os chatbots: “robôs” de atendimento ao usuário, que automatizam o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC). Funcionam como uma equipe de suporte 24/7, tirando dúvidas operacionais dos clientes acessando informações em tempo real sobre o relacionamento da pessoa com a instituição. Importante frisar que os chatbots não abrangem assuntos relacio- nados a tratamento, mas a dúvidas operacionais com a marca. Fica a cargo do departamento de TI apoiar a adoção da computação cog- nitiva. As ferramentas de TI são aliadas fundamentais na busca pela integração das informações. Porém, ainda é preciso que as soluções disponíveis passem por evoluções como melhorar a precisão das tecnologias (processamento de linguagem natural e de dados e tecnologias cognitivas), incrementar a precisão dos diagnósticos dos pacientes e ter custos de acesso reduzido para viabilizar uma adoção em larga escala pelas instituições. 187Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO 10. Wearable devices Os dispositivos vestíveis (wearable devices) são roupas e acessórios que fun- cionam com base no conceito de Internet das Coisas (IoT), sob o qual sen- sores conectados à internet garantem inteligência a objetos, antes, puramente analógicos. Na Saúde, têm como principal função a coleta de dados vitais do paciente, como batimento cardíaco, níveis de glicemia, entre outros, o que per- mite, entre outras coisas, o gerenciamento a distância de pacientes crônicos. Smartwatches, ou relógios inteligentes, são um exemplo de wearable device de uso pessoal, atualmente sem qualquer ligação com o sistema de Saúde. Os aparelhos medem o número de passos, batimento cardíaco e outras informa- ções pessoais, analisadas por um aplicativo móvel. Quando se fala em integra- ção da tecnologia com o trabalho dos hospitais, ainda há um longo caminho a ser percorrido para a efetivação da tendência no Brasil, mas experiências do exterior mostram diversas oportunidades de aplicação: dispositivos que im- pulsionam a audição, pílulas inteligentes que monitoram a resposta corporal à medicação, palmilhas que medem peso e temperatura do paciente, lentes de contato que coletam níveis de glicose no sangue, pulseiras que verificam fre- quência cardíaca e queima de calorias, entre outras. O acesso a informações tão individualizadas aindaincorre em questões éti- cas, que envolvem o sigilo médico e de segurança da informação. Um projeto de wearable devices deve trazer, portanto: planejamento de segurança da informa- ção; treinamento dos colaboradores envolvidos; utilização de múltiplas cama- das de proteção; garantia de que informações da rede não serão acessadas por pessoas não autorizadas; políticas de coleta e armazenamento dos dados; etc. No futuro, o avanço tecnológico ajudará na prevenção de possíveis doenças e, em larga escala, na criação de indicadores sanitários. 188 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O 11. Impressão 3D Obter visão realista de órgãos, reduzir custos de produtos e criar próteses extremamente adaptadas à necessidade do paciente são algumas das vantagens que a impressão tridimensional proporciona ao hospital e ao cuidado com a Saúde como um todo. Essa é uma tendência que já está mudando a dinâmica, os processos e as estruturas dos materiais e equipamentos médicos. O princípio básico da tecnologia é a construção de qualquer formato adi- cionando material camada a camada, prática denominada técnica de proces- samento aditivo. Esses conjuntos criam o objeto sólido tridimensional, que permite algumas aplicações revolucionárias, como, por exemplo: z Próteses: produção de itens personalizados, adaptados às necessidades fisiológicas do indivíduo, reduzindo desperdícios na compra e no uso dos equipamentos. Trata-se de um investimento não apenas em acele- rar a execução de tarefas, mas também na segurança da pessoa; e z Réplicas: produção de réplicas exatas de órgãos antes da cirurgia, a partir dos exames de imagem arquivados no Sistema de Comunicação e Arquivamento de Imagens (Picture Archiving and Communication Sys- tem – PACS). Isso permite que o médico prepare o procedimento antes de operar o paciente, incorrendo em menos riscos e mais assertividade na operação. A impressão 3D tende a modificar as redes tradicionais de abastecimen- to de produtos, pois requer menos capital. Atualmente, é possível encontrar no mercado moldes, pele sintética para vítimas de queimaduras, órgãos e im- plantes (ortopédicos e dentários) feitos em impressoras 3D. Obviamente, sua adoção demanda investimentos por parte do hospital: treinamento de equipe e uso de hardware e software adequado, no caso da elaboração de réplicas. No que se refere à compra de próteses, demanda uma adaptação na relação com fornecedores. 189Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO 12. Big Data O avanço de ferramentas tecnológicas voltadas à saúde e ao cuidado com a vida gera um número cada vez maior de dados, estruturados ou não. Essas in- formações, quando trabalhadas com inteligência e elevado nível de maturidade de gestão, têm grande potencial para gerar insights de negócios e melhorar tanto o atendimento ao paciente quanto o resultado da instituição. O Big Data é o amontoado de dados gerados a partir de fontes estrutura- das ou não de informação. Ele é classificados com base em 3 Vs: z Volume: há muito mais dados não estruturados do que estruturados; z Velocidade: os dados são gerados de forma extremamente rápida e pre- cisam ser processados também com agilidade; e z Variedade: a variedade das fontes de dados é quase infinita, especial- mente quando consideramos o uso de IoT (Internet das Coisas). As fontes de alimentação do Big Data podem ser: z Equipamentos médicos: ultrassom, tomografia computadorizada, res- sonância magnética; e z IoT: dispositivos que podem ser acoplados a equipamentos, leitos de hospital, instalações físicas em geral, salas de cirurgia, wearables/gadgets (como relógios inteligentes e dispositivos similares) e até mesmo em anotações médicas realizadas em formulários não informatizados, além de todos os sistemas de gestão e operação em uso na instituição. O processamento de dados por ferramentas de analytics, somado à análise de Business Intelligence que ocorre a partir das informações estruturadas ou não, pode melhorar muito o processo de tomada de decisões. Um dos objetivos do conceito é identificar padrões e, por meio deles, criar modelos matemáticos/estatísticos para prever cenários e comportamentos fu- turos. Essa função pode contribuir para melhorar o atendimento e acompa- nhamento do estado de saúde do paciente. Com as informações reunidas pelo Big Data e os modelos produzidos, a equipe médica ganha um grande aliado na formulação de diagnósticos, por exemplo. 190 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O Dessa forma, o Big Data permite abrir novas dimensões de análise que são impossíveis ao fazer uso somente da tecnologia tradicional, especialmente considerando que cerca de 80% dos dados de uma organização não são estru- turados. Engajamento Extrair valor dos dados não depende somente de tecnologia: é crucial que os colaboradores envolvidos no processo sejam treinados para contribuírem com a nova funcionalidade. É preciso engajá-los no preenchimento dos dados digitalizados e treiná-los sobre como utilizar as novas funcionalidades. Há também uma mudança na forma de cuidar do paciente: unindo a aná- lise desse amontoado de informação à inteligência artificial e computação cognitiva, é possível prever o aparecimento de doenças e agir sob os preceitos da medicina preditiva, que tratam para evitar as enfermidades antes da ma- nifestação. Mais uma mudança de cultura, portanto, do que uma melhoria tecnológica. 191Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO 13. Novo perfil do CIO Com os avanços e transformações que a tecnologia vem proporcionando ao setor da Saúde, fica cada vez mais evidente o papel do departamento de tecnologia da informação (TI) na evolução do hospital. Nesse contexto, é atri- buição do CIO (chief information officer), ou qualquer que seja a denominação do líder de TI na instituição, posicionar o departamento de forma mais ativa e estratégica na gestão. Dentre as novas atribuições demandas nesse ambiente de transformação digital estão: z Profissionalização: é impossível ter uma TI madura se a gestão do hospital não for profissionalizada. Aqui, portanto, mora a importância da adoção de metodologias para criação e acompanhamento da estraté- gia empresarial, gerenciamento de processos, gestão de pessoas e ado- ção de políticas de governança corporativa; z Mudança de visão: historicamente, a TI foi vista como departamento meramente operacional do hospital. Contudo, com a transformação di- gital e o apoio cada vez maior da tecnologia nos processos de negócio, é preciso colocar a área como agente ativo e consultivo da estratégia. Para tanto, o líder do departamento deve ter um viés mais estratégico e menos funcional; z Tradução de conceitos: uma vez que o líder de TI é considerado como um consultor dentro do hospital, ele precisa traduzir a tecnologia para a linguagem de negócio. Em outras palavras, ensinar como extrair valor e reduzir custos com a adoção de soluções; z Parceria: o CIO deve possuir a capacidade de trabalhar com o diretor clínico e todas as demais áreas do hospital, para orientar sobre a melhor maneira de implementar a tecnologia em uma organização de Saúde. É a ponte entre as áreas de TI e assistencial;conhecimento do negócio: o CIO deve estar sempre focado a encontrar respostas para melhorar a experiência e segurança do paciente na relação com o hospital. Por isso, precisam entender do negócio de Saúde, não só de TI; e 192 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O z Análise de dados: tecnologias como Business Intelligence (BI) e Big Data, que permitem trabalhar a grande quantidade de dados gerados pelos sistemas informatizados, viabilizam a extração de insights de ne- gócios. Para isso, contudo, é importanteque o CIO e a sua equipe es- tejam preparados para analisar dados dentro do contexto do negócio. Ainda é possível perceber organizações que consideram como inovação apenas a implantação do Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP) ou um sistema de gestão, por exemplo. Por isso, antes de pensar em transformar o departamento de TI, o líder do hospital precisa entender que os tempos, e as demandas, mudaram. Trata-se de uma transformação cultural. 193Roberto Gordilho CAPÍTU LO 5: TECN O LO G IAS D E G ESTÃO Reflexão: Para surfar na onda da transformação digital Eu tinha 20 e poucos anos quando notei que a informatização era uma onda avassaladora sobre o mercado corporativo. Fundei minha primeira em- presa e, com mais alguns sócios, programava softwares durante as noites e, de manhã e à tarde, fazia reuniões com potenciais clientes. Todas essas conversas eram baseadas na seguinte premissa: “a questão não é se você vai se informatizar, mas quando“. Minha companhia foi a primeira da Bahia a ofertar soluções integradas de gestão empresarial (ERP) no fim da década de 1980. Estava claro para mim, e eu fazia questão de deixar isso claro também para os clientes, que não havia jeito de voltar atrás. Quem não se adaptasse, em primeiro lugar, perderia a chance de crescer. Contudo, à medida que o cenário fosse se consolidando, a ideia era se informatizar para não morrer – e muitos morreram. Uma onda parecida com essa passa agora sobre nossas cabeças e afo- gará muitos desavisados – aqueles que ficam olhando somente para os pró- prios pés. Estou falando da transformação digital. O cenário não é o mesmo de há 30 anos, quando a informatização trazia fortemente o conceito de automação de processos para ganho de eficiência. Por mais que muito fornecedor fique com os pelos da nuca eriçados, na iminência de vender mais soluções de TI, não é disso que se trata. A trans- formação digital traz consigo uma revolução na forma de pensar o negócio. E, na Saúde, está intimamente ligada à evolução da maturidade de gestão. Apenas comprar mais software não vai resolver. Isso é discurso de ven- dedor. Obviamente que o item tecnologia é muito importante nesse proces- so, mas os pilares pessoas e processos fecham a composição do tripé, que deve ser gerido por líderes que estejam dispostos a extrair da digitalização do hospital processos mais seguros e um negócio que tenha o paciente no centro. Ele, o paciente, é o rei – e não mais apenas os diferenciais de gestão ou de equipamentos do hospital. E a transformação digital só é efetiva com a gestão madura. Esses dois movimentos ocorrem, então, de mãos dadas, porque ambos pressupõem revisão de processos, governança corporativa, gestão de pessoas, tecnologia e a estratégia empresarial como um todo. 194 Maturidade de Gestão Hospitalar e Transformação Digital CA PÍ TU LO 5 : T EC N O LO G IA S D E G ES TÃ O Uma coisa é automatizar processos de baixa inteligência. Outra é usar a tecnologia para colher dados e identificar padrões que permitam uma mu- dança processual e gerencial que realmente transforme a forma de ope- rar e se relacionar com o cliente (paciente). A transformação digital permite identificar gargalos, pontos de melhoria, trabalhar questões de eficiência de uma forma não só ligada à operação, mas no sentido de qualidade global e segurança da informação, com o conceito do eletrônico fim a fim, em que o paciente está no centro. Um exemplo é o hospital que trabalha com processo de triagem e con- dução do paciente totalmente informatizado: a pessoa recebe uma senha assim que chega à recepção e tem todas as atividades e o histórico integra- dos ao seu Prontuário Eletrônico do Paciente (PEP). Isso tudo agrega muito valor e facilita o trabalho de todos. Mas ainda é automação de processos. A transformação digital não melhora esse cenário, ela revoluciona. Pen- se nos bancos: economizaram bilhões terceirizando o trabalho da boca do caixa para o seu cliente. Nós efetuamos o pagamento de contas para eles sem cobrar nada por isso, apenas pela facilidade e conveniência da internet banking. O mesmo ocorre com o varejo. Quanto ele não perdeu, ou ganhou, desde que o e-commerce surgiu? Agora, imagine um paciente chegando a um hospital previamente identi- ficado pelo seu smartphone, com procedimentos já autorizados pela opera- dora do plano de Saúde, já tendo feito um primeiro contato, a distância, com seu médico, e com todas as informações pessoais disponíveis? E falo todas, afinal, com tantas pulseiras e gadgets que captam movimentos, temperatura, batimentos cardíacos e muito mais, monitorar nossa saúde vai fazer parte do dia a dia das instituições, e isso é muito mais que tratar doenças. Quanto uma mudança como essa não vai economizar em tempo de espera, equipe e proporcionar qualidade de vida para as pessoas? Qual o impacto sobre a se- gurança do paciente? Parece cena de filme de ficção científica? Vai por mim: esse cenário é tão futurista hoje quanto era um ERP era na década de 1980. Eu vejo, em um futuro próximo, as instituições efetivamente se transfor- marem em organizações de Saúde, em que a prevenção e educação serão tão ou mais importantes que a cura e o tratamento. Essa é a verdadeira transformação digital. E eu te pergunto: vai pegar essa onda ou vai se afogar?