Prévia do material em texto
1 Gasometria arterial É um exame complementar utilizado na pneumologia e na terapia intensiva. É feito a partir da punção da artéria radial ou braquial ou femural (compressão por 10 a 15 min, faz para evitar hematoma). Consiste na medição dos gases sanguíneos no sangue arterial: pO2, pCO2, pH. O transporte de CO2 tem um efeito direto sobre o equilibro acidobásico do sangue. O pulmão excreta ácido volátil. Quanto melhor a ventilação alveolar, mais se consegue eliminar CO2. Este último, por sua vez, combina- se com a água, formando ácido carbônico. Há dissociação de íons hidrogênio e íons bicarbonato. • PaO2 em ar ambiente nível do mar: 109 – 0,45 x idade. o Idade 30 anos: PaO2 = 95 o Idade 70 anos: PaO2 = 77 A manutenção do equilíbrio é fundamental para a homeostasia. A maioria das reações químicas do organismo ocorre em faixas estreitas de pH. O pH se relaciona com a concentração de íons H+. • pH ↓ = ↑ concentração de H+ (acidose); • pH ↑ = ↓ concentração de H+ (alcalose). Os distúrbios acidobásicos são frequentemente encontrados nos pacientes críticos. Existem sistemas tampão para manter o pH constante, apesar da adição de ácidos ou bases ao meio interno. Sistemas que vão regular a concentração de H+ • Sistema tampão: sistema químico de tampão acidobásico dos líquidos corporais. Ao agir, conseguem reduzir a variação no pH de forma muito rápida (em segundos). Ele não vai eliminar os íons hidrogênio, vai apenas mantê-lo fixado. Ocorre logo no início da alteração do pH do plasma. • Centro respiratório: regula a remoção do CO2, assim como do ácido carbônico no plasma. Isso ocorre em minutos. • Rins: eliminam mais bicarbonato ou íons hidrogênio. Excretam diurese mais ácida ou alcalina, de modo a manter a concentração de íons hidrogênio. No entanto, os rins demoram mais para atuarem no equilíbrio do pH. Começa a agir em torno de alguns dias. O primeiro sistema que vai agir é o tampão, depois o respiratório e, por fim, o renal. Quando há um aumento da concentração de íons hidrogênio, há queda do pH, o que leva a uma acidemia. Quando reduz a concentração de H+, temos um meio alcalino. Variações muito grandes do pH levam à morte celular e são incompatíveis com a vida, por isso há a ação desses sistemas e, de início, o sistema tampão para que o pH não varie tanto. O pH plasmático é determinado principalmente pela relação dos íons bicarbonato e pelo CO2. A função do sistema tampão é evitar variações bruscas do pH. Os íons hidrogênio se ligam com o bicarbonato, formando ácido carbônico, que vira CO2 e água. Isso também ocorre de forma inversa. A enzima anidrase carbônica catalisa a reação. Quando se eleva o bicarbonato, este se junta com o hidrogênio, aumentando o CO2; o inverso também acontece. O bicarbonato é considerado a base do sistema, porque ele vai consumir íons hidrogênio. O CO2 é considerado o ácido do sistema, porque ele libera os íons hidrogênio, após se juntar com a água e formar o ácido carbônico. Como analisar uma gasometria arterial? 1. Saber se o gasômetro está calibrado: coloca na fórmula de Henderson-Hasselbach. • pH = 6,10 + log (HCO3/PaCO2 x 0,003060) Ex.: pH = 7,25; PaCO2 = 25 mmHg; HCO3 = 10,7 mEq/L pH = 6,10 + log (10,7/25 x 0,003060) = 7,254 2. Verificar se existe alteração do pH e qual o distúrbio acidobásico primário. • Valores normais na gasometria arterial 2 o pH: 7,35 – 7,45 o pCO2: 35-45 (componente respiratório, porque quem elimina são os pulmões) o pO2: 109 – 0,45 x idade o HCO-3: 22-26 (componente metabólico) o HCO-3: padrão ou standard – corresponde ao HCO-3 do sangue após a correção da PaCO2 para 40. Só estará alterado se ocorrer déficit ou excesso real de bicarbonato no sangue. o BE (base excess)/Buffer Base Na gasometria, existem dois valores de bicarbonato. Há o bicarbonato normal e o padrão ou standard (ST). Isso acontece porque, por exemplo, se houver elevação da pCO2 no sangue, em segundos, o sistema tampão age elevando o bicarbonato. Isso significa que o organismo está produzindo bicarbonato a mais? Ainda não, porque só quem está agindo é o sistema tampão. O bicarbonato que já existe no sistema tenta neutralizar a ação do CO2. No valor do bicarbonato standard, o gasômetro corrige o valor da pCO2 como se ela estivesse normal e, se a elevação do bicarbonato estava proporcional apenas à elevação da pCO2, o valor dele vai ser normal. Com o passar dos dias, o rim começa a reter mais bicarbonato para neutralizar o pH mais ácido devido ao aumento da pCO2 no sangue. Aí sim que o bicarbonato standard se eleva. Uma alteração respiratória crônica altera os dois bicarbonatos. Se tiver alteração na pCO2, tem como saber se é aguda ou crônica. Olha o bicarbonato padrão ou standart. O bicarbonato não é a única base do sistema, existem outras também. Quando essas bases se somam, teremos um valor denominado buffer base. Quando há um excesso ou déficit de bases, chamamos de base excess (BE). Valor normal = -2 a +2 • BE+: alcalose metabólica • BE-: acidose metabólica. Em UTI, esse valor ajuda até no prognóstico do paciente. Quanto menor o seu valor, mais grave é o paciente. Só se altera em distúrbios crônicos. Distúrbios acidobásicos - classificação • Acidose metabólica: bicarbonato reduzido • Acidose respiratória: CO2 aumentado (retenção) • Alcalose metabólica: bicarbonato aumentado • Alcalose respiratória: CO2 reduzido Mecanismos compensatórios Todo distúrbio primário gera uma resposta secundária. Se o distúrbio primário for metabólico, a resposta secundária é respiratória, e vice versa. Esta resposta secundária tem como objetivo atenuar o efeito do distúrbio primário sobre o pH. Geralmente, a resposta secundária não normaliza o pH, mas evita variações muito grandes. Classificação dos distúrbios • Simples: anormalidade inicial e resposta compensatória esperada. • Mistos: grau de compensação não é adequado ou quando a resposta é maior que a esperada. Distúrbios respiratórios • Alcalose respiratória • Acidose respiratória • “Resposta compensatório metabólica”: não é um distúrbio, é uma resposta normal do organismo. Abaixo, a figura mostra a compensação da pCO2, nos distúrbios de natureza respiratória. • Causas de alcalose respiratória: hiperventilação aguda ou crônica. o Causas pulmonares: pneumonia, doença pulmonar intersticial, asma. o Causas não pulmonares: dor, psicogênicas, febre, hipoxemia, sepse. • Causas de acidose respiratória: a principal causa é a hipoventilação. Contudo, também são causas os estados hipercatabólicos e o aumento do espaço fisiológico. Distúrbios metabólicos • Alcalose metabólica • Acidose metabólica • “Resposta compensatória respiratória” 3 Na imagem abaixo, o comportamento do bicarbonato real (BR), nos distúrbios metabólicos. • Causas de alcalose metabólica o Excesso de bases: principalmente pela retenção renal de HCO3 o Perda de ácidos: vômitos, aspiração por sonda (perde muito ácido clorídrico). • Causas da acidose metabólica o Hipotensão arterial grave – choque: sepse leva a um aumento de ácido lático (pela falta de oxigênio, o organismo tenta usar energia anaeróbica). o Insuficiência renal o DM descompensado Princípio da eletroneutralidade A carga positiva, pelo princípio da eletroneutralidade, tem que se equilibrar com a carga negativa. No nosso organismo, há muitos íons com carga positiva. O valor normal médio do sódio é de 140, ao contrário do valor do potássio, que é de 3,5 a 5,5, ou do magnésio, que é 2, por exemplo. Portanto, proporcionalmente, quem mais contribui com a carga positiva do organismo é o sódio, além de que este último é mais extracelular. O principal responsável pela carga elétrica positiva do plasma é o sódio. Da mesma forma, épreciso que haja 140 de uma carga negativa. As substâncias responsáveis pela carga elétrica negativa são os íons cloro, bicarbonato, a albumina, o sulfato e o fosfato. Esses dois últimos nós não temos como mensurar. A soma do cloro + bicarbonato + albumina + sulfato + fosfato tem que ser mais ou menos 140. O ânion gap (AG) é justamente os ânions que não se consegue mensurar (albumina + fosfato + sulfato; embora se possa mensurar a albumina). Cálculo do Ânion GAP: Na – (Cl + HCO3). O valor normal é de 6 a 12. Por que ele é importante? Quando o rim começa a tentar eliminar mais bicarbonato/hidrogênio, haverá a formação de outros ácidos. Por exemplo, se o rim começar a reter mais íons hidrogênio (carga positiva), ele vai ter que eliminar mais o sódio (carga positiva), que se junta com o bicarbonato. Toda vez que o paciente tiver, principalmente, uma acidose metabólica, a carga elétrica negativa estará menor, porque o bicarbonato estará em níveis menores. Então, é preciso contrabalancear essa carga elétrica. Se houver perda de carga elétrica negativa, de alguma outra forma, é preciso elevar a carga elétrica negativa. Dessa 4 forma, ou o organismo aumenta o cloro ou o ânion-gap. A acidose metabólica pode ser hiperclorêmica ou com o ânion-gap alargado. A albumina reflete muito o estado nutricional do paciente. Portanto, na vigência de hipoalbuminemia, o AG precisa ser corrigido, pois ele está subestimado. Se o estado nutricional do paciente estivesse normal, com albumina dentro dos valores esperado, provavelmente o ânion gap estaria elevado. Dessa forma, para cada 1g/dl que a albumina esteja abaixo de 4g, deve-se adicionar 2,5 ao AG mensurado. Ex.: Albumina 2 e AG calculado = 16. Neste caso, o AG deve ser corrigido para 21. O AG também dá fator de prognóstico, quanto maior, pior o prognóstico. • Acidose metabólica com AG alargado: aumento dos níveis de hidrogênio junto com um ânion. Ex.: acidose lática, cetoacidose diabética, intoxicações, uremia. • Acidose metabólica hiperclorêmica: redução dos níveis de bicarbonato (retenção de cloro para compensar a perda de cargas negativas). Ex.: distúrbios intestinais (diarreia). A figura abaixo mostra o comportamento de diferença de bases nos distúrbios metabólicos do equilíbrio ácido-base. Só muda se, a nível renal, o indivíduo estiver perdendo ou retendo bases. Respostas secundárias A resposta compensatória é sempre no mesmo sentido. Se um estiver baixo e o outro estiver alto, ou vice versa, já se conclui que há um distúrbio misto. A única resposta que o organismo não consegue compensar tanto é no caso da alcalose metabólica, porque o organismo não consegue elevar tanto a pCO2, devido aos quimiorreceptores. Uma pequena elevação, no entanto, consegue ser feita, embora não seja tão eficaz. A magnitude esperada da resposta secundária pode ser determinada através de fórmulas. Efeito benéfico da compreensão respiratória da compensação respiratória sobre o pH Avaliação da gasometria arterial 1. Determine se existe acidemia ou alcalemia. 2. Determine se o distúrbio primário é respiratório ou metabólico. 3. Se o distúrbio primário for respiratório, determine se é agudo ou crônico. 4. Se o distúrbio primário for metabólico, determine se a resposta respiratória é adequada. 5. Determine se o ânion gap está normal ou alargado. 6. Se houver uma acidose metabólica com ânion gap alargado, investigue a presença de outro distúrbio metabólico associado. CASOS CLÍNICOS Caso 1: pH = 7,30; pCO2, HCO3 = 29 Acidose respiratória; hipoventilação; sem distúrbio metabólico associado. 5 Caso 2: pH 7,32; pCO2 = 14; HCO3 = 5; Na = 123; Cl = 99; albumina = 2; HCO3 st = 6 Acidose metabólica. É melhor calcular com o bicarbonato standard. Sem distúrbio respiratório associado. Só pode dizer que o distúrbio está compensado se o pH estiver normal. Como saber a causa da acidose metabólica? Calcula o ânion gap. Lembrar de ajustar, pois a albumina está baixa. O resultado deu 23, ou seja, alargado. Resposta: Acidose metabólica com AG aumentado. Pode ocorrer em sepse com acidose lática. Acidose metabólica com AG elevado Não existe déficit real de bicarbonato, mas sim a adição de um ácido orgânico ao plasma. Quanto maior a quantidade de ácidos orgânicos acumulados, maior será o ânion gap. O bicarbonato plasmático se combina com esse ácido orgânico em uma reação de química reversível. Cada unidade de ácido orgânico acumulado resulta no consumo de aproximadamente uma unidade de bicarbonato. Caso 3: pH 7,48; pCO2 = 25; HCO3 = 18.; pO2 = 70 mmHg; SpO2 = 90%. Alcalose respiratória, sem distúrbio metabólico associado. Caso 4: pH 7,48; pCO2 = 45; HCO3 = 31 Alcalose metabólica, com resposta respiratória adequada. Caso 5: pH 7,05; pCO2 = 55; HCO3 = 15 Distúrbio misto. Acidose respiratória e acidose metabólica. Acidose mista, por isso a variação é tão grande no pH. Caso 6: pH 7,42; pCO2 = 19; HCO3 = 12 Apesar do pH normal, há uma alcalose respiratória junto com uma acidose metabólica. Se o pH está 7,42, está mais próximo de ser uma alcalose do que acidose, então provavelmente o distúrbio primário foi a alcalose respiratória, mas tem que ver o quadro clínico. Caso 7: pH 7,38; pCO2 = 60; HCO3 = 30 Apesar do pH normal, há uma acidose respiratória junto com uma alcalose metabólica. O pH está mais perto do ácido, provavelmente o distúrbio primário é uma acidose respiratória. Caso 8: pH 7,30; pCO2 = 35; HCO3 = 12 Acidose mista (respiratória + metabólica). Caso 9: pH 7,30; pCO2 = 50; HCO3 = 28; HCO3 st = 26; BE = 1. Acidose respiratória aguda. Caso 10: pH 7,35; pCO2 = 60; HCO3 = 32; HCO3 = 32; BE = 4. O pH está normal; acidose respiratória crônica compensada. Gasometria típica de paciente com DPOC retentor de CO2. Distúrbios de troca gasosa pO2 = 109 – 0,45 x idade • Idade 30 anos: PaO2 = 95 • Idade 70 anos: PaO2 = 77 Quando o paciente tem problema respiratório, a pressão de oxigênio está mais baixa. Quando há uma insuficiência respiratória aguda, a pressão, em ar ambiente, fica abaixo de 65-30. Isso significa que o paciente está hipoxêmico, necessitando de oxigenioterapia. A primeira coisa que faz no paciente que chega no hospital é dar oxigênio. Nesse caso, não pode olhar apenas para o valor da pressão de oxigênio na gasometria, tem que ver a relação entre ela e a quantidade de oxigênio que ele está recebendo. Relação PaO2/ FiO2 (índice de oxigenação) Se em uso de O2: usar PaO2/FiO2 (<300). • Normal > 400; • 200 – 300: 10 a 15% shunt • < 200: + de 20% shunt. Esse índice também é chamado de troca gasosa. Quando o paciente está em ar ambiente (primeiro caso), não precisa calcular o índice, basta olhar o valor da PaO2.