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É causada pelo Trichomonas vaginalis, que é constitu- ído de uma célula polimorfa. É considerado um proto- zoário muito plástico, tendo capacidade de formar pseudópodes, utilizados para capturar alimentos e se fixar em partículas sólidas. Só possui forma trofozoi- tica, sendo variável a depender das condições físico- químicas (pH, temperatura, tensão de oxigênio, etc) do ambiente em que se encontra. Esta espécie possui quatro flagelos anteriores livres, desiguais em tamanho e se originam no complexo gra- nular basal anterior, também chamado de complexo ci- tossomal. Os flagelos estão inseridos no blefaroplasto, que coordena seus movimentos. O núcleo é elipsoide com dupla membrana nuclear e frequentemente apre- senta um nucléolo. Possui um reticulo endoplasmático ao redor da membrana e é desprovido de mitocôndrias, apresentando, porém, hidrogenossomos dispostos em fileiras. O T. vaginalis habita no trato urogenital do homem e da mulher, onde produz a infecção. Entretanto, só é sintomático na mulher. Sua reprodução se dá por divi- são binária longitudinal. Cresce bem em meios artifi- ciais complexos, em temperaturas entre 25 e 40°C e em faixa de pH bastante ampla, com seu ótimo entre pH 5,5 e 6, isto é, em meios nitidamente ácidos. Utili- zam como fonte energética a glicose, frutose, maltose, glicogênio ou amido. Alguns carboidratos como saca- rose e manose não são utilizados. Não há ciclo de Krebs completo, pois não há cito- cromo. O metabolismo sendo anaeróbio, compreende- se que o desenvolvimento do flagelado, tanto em cul- tura como em condições naturais, faz-se melhor em presença de um crescimento bacteriano. A ação favo- rável das bactérias consistiria em criar um ambiente redutor, pois demonstrou-se que a presença de oxigé- nio é nociva para Trichomonas vaginalis. A utilização de 02 por este protozoário leva à produção de H202. Muitas espécies de tricomonadídeos possuem uma ca- talase que desdobra H202 em oxigénio e água. Mas, como T. vaginalis não dispõe dessa enzima, fica into- xicado quando acumula. Para a propagação. T. vaginalis sobrevive, entretanto, 6 horas em uma gota de secreção vaginal em tempera- tura ambiente e na água, resiste 2 horas, a 40°C, e mais de 20 minutos a 46°C. A propagação mais frequente é feita pelo coito, visto que o parasito infecta facilmente o homem, alojando- se na uretra, nas vesículas seminais ou na próstata, mesmo que não se acompanhe de manifestações clíni- cas. Mães infectadas podem contaminar suas filhas du- rante a parturição. Além disso, sugere-se, também, a contaminação por fômites (banho, roupa íntima ou de cama, artigos de toalete etc. quando molhados ou in- completamente secos) ou pela água. A implantação do T. vaginalis estaria associada a mo- dificações do meio vaginal. Dentre as alterações que favoreceriam o desenvolvimento do flagelado, esta- riam: modificações da flora bacteriana vaginal; dimi- nuição da acidez local; diminuição do glicogênio, nas células do epitélio; acentuada descamação epitelial. Na base dessas modificações poderiam estar fatores hormonais, ou outros processos de natureza inflama- tória ou irritativa. O estabelecimento da doença na vagina se inicia com o aumento do pH, já que o pH normal da vagina é ácido (3,8-4,5) e o organismo cresce em pH maior que 5. A elevação do pH vaginal na tricomoníase é evi- dente, com uma redução concomitante de Lactobaci- llus acidophilus e um aumento na proporção de bacté- rias anaeróbias. Um contato inicial entre o T. vaginalis e leucócitos resulta em formação de pseudópodes, in- ternalização e degradação das células imunes nos va- cúolos fagocíticos do parasito. A aderência e a citoto- xicidade exercidas pelo parasito sobre as células do hospedeiro podem ser ditadas pelos fatores de virulên- cia, como adesinas, cisteína-proteinases, integrinas, cell-detaching factor (CDF) e glicosidases. Outra classe de moléculas implicada na adesão de Tri- chomonas vaginalis é representada pelas cisteína-pro- teinases, que são citotóxicas e hemoliticas e apresen- tam capacidade de degradar IgG, IgM e IgA presentes na vagina. A expressão dos genes que codificam as proteinases e as adesinas é modulada por fatores ex- ternos relacionados com hospedeiro, como os níveis de cálcio e ferro. Enquanto o número de organismos na vagina diminui durante a menstruação, os fatores de virulência mediados pelo ferro contribuem para a exacerbação dos sintomas nesse período. Das manifestações objetivas, a mais frequente é leu- corréia, que, em mulheres adultas, consiste na produ- ção de um corrimento abundante, geralmente esbran- quiçado e sem sangue, podendo ter origem na vulva, na vagina, no fúndus ou na cérvix uterina. Ainda que Trichomonas vaginalis seja a principal causa de leu- corréia, outros agentes podem estar envolvidos, tais como as leveduras do gênero Candida (monília), in- fecções gonocócicas e outras. O infiltrado inflamatório contém principalmente neu- trófilos e alguns eosinófilos. O corrimento varia muito, quanto ao aspecto e quantidade, sendo consti- tuído de soro, muco, células epiteliais descamadas, leucócitos e piócitos em abundância, bactérias diver- sas e considerável número de Trichomonas. Depen- dendo dos microrganismos associados, modificam-se a cor, a viscosidade, o cheiro e o aspecto (espumoso ou bolhoso, se há fermentação com muita produção de gás). Muitas vezes ele é irritante para a pele das regi- ões perigenitais. Nas formas agudas, a vulva, o períneo e as áreas cutâneas vizinhas, das nádegas, podem estar avermelhadas e edemaciadas. A mulher apresenta dor e dificuldade para as relações sexuais (dispareunia de intróito), desconforto nos ge- nitais externos, dor ao urinar (disúria) e freqüência miccional (poliúria). A vagina e a cérvice podem ser edematosas e eritematosas, com erosão e pontos he- morrágicos na parede cervical, conhecida como colpi- tis macularis ou cérvice com aspecto de morango. A tricomoníase no homem é comumente assintomática ou apresenta-se como uma uretrite com fluxo leitoso ou purulento e uma leve sensação de prurido na uretra. O diagnóstico da tricomoníase não pode ter como base somente a apresentação clínica, pois a infecção pode- ria ser confundida com outras doenças sexualmente transmissíveis (DSTs), visto que o clássico achado da cérvice com aspecto de morango é observado somente em 2% das pacientes e o corrimento espumoso so- mente em 20% das mulheres infectadas. A investiga- ção laboratorial é necessária e essencial para o diag- nóstico da tricomoníase, uma vez que leva ao trata- mento apropriado e facilita o controle da propagação da infecção. Nas mulheres, o material é usualmente coletado na vagina com swab de algodão não-absor- vente ou de poliéster, com o auxílio de um espéculo não-lubrificado. Enquanto nos homens, realiza-se o mesmo procedimento ou coleta-se uma amostra fresca do sêmen obtida pela masturbação em um recipiente estéril. O tratamento pode ser realizado com: metronidazol, omidazol, tinidazol ou nimorazol. A mesma dosa- gem é prescrita para homens e mulheres. Qualquer que seja a terapêutica adotada, as mulheres devem fazer uso concomitante de medicação local, com aplicação diária de um comprimido ou geléia contendo 500 mg da mesma droga. Problemas relacionados a gravidez – estudos de- monstram a associação entre a tricomoníase e a rup- tura prematura de membrana, parto prematuro, baixo peso de recém-nascido em grávidas com ruptura es- pontânea de membrana, baixo peso ao nascer associ- ado a parto prematuro, endometrite pós-parto, nati- morto e morte neonatal. A resposta inflamatória ge- rada pela infecção por T. vaginalis pode conduzir di- reta ou indiretamente a alterações na membrana fetal ou decídua. Problemas relacionados com a fertilidade – o risco de infertilidade é quase duas vezesmaior em mulheres com história de tricomoníase comparado com as que nunca tiveram tal infecção. O T. vaginalis está relaci- onado com doença inflamatória pélvica pois infecta o trato urinário superior, causando resposta inflamatória que destrói a estrutura tubária e danifica as células ci- liadas da mucosa tubária, inibindo a passagem de es- permatozóides ou óvulos através da tuba uterina. Transmissão do HIV – a infecção por T. vaginalis tipicamente faz surgir uma agressiva resposta imune celular local com inflamação do epitélio vaginal e exo- cérvice em mulheres e da uretra em homens. Essa res- posta inflamatória induz urna grande infiltração de leucócitos, incluindo células-alvo do HIV, como lin- fócitos TCD4+ e macrófagos, aos quais O HIV pode se ligar e ganhar acesso. Além disso, o T. vaginalis frequentemente causa pontos hemorrágicos na mu- cosa, permitindo o acesso direto do vírus para a cor- rente sanguínea. Desse modo, há um aumento na porta de entrada para o vírus em indivíduos HIV-negativos.