Prévia do material em texto
DIREITO PENAL: REVISÃO Princípios: 1- Princípio da legalidade: “Instrumento de proteção individual que proíbe o uso arbitrário da força por parte do Estado (detentor do monopólio da força/violência legítima)” • Nestes termos, o art. 1º do CP assevera, ipsis litteris: “Art. 1º - Não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia cominação legal.” “nellum crien, nulla poema sine lege” Esse princípio talvez seja o mais cobrado, mais famoso e mais importante dentre todos os que iremos estudar. Previsto tanto na Constituição quanto no Código Penal, tem como principal objetivo limitar o poder do Estado. A premissa é básica: para que o Estado defina crimes e comine penas, deve editar uma lei, a ser aprovada pelo Congresso. Esse princípio é importante pois existem outros atos normativos que podem ser editados pelo Governo. Por exemplo, um Presidente da República pode editar uma Medida Provisória, ato normativo que não é lei, mas que tem força de lei. Entretanto, seria absurdo que um Presidente, por conta própria, criasse um crime! E é graças ao princípio da legalidade que isso não ocorre, pois tal princípio veda, entre outros atos, a criação de crimes através de medidas provisórias. Lembre-se: apenas a lei em sentido estrito, aprovada pelo Congresso Nacional, pode ser utilizada para tal finalidade. E o que é lei em sentido estrito? Como consequência da restrição da criação de crimes a apenas estas espécies de lei, o princípio da legalidade também é chamado de princípio da legalidade estrita ou da reserva legal. CESPE/TJ-SE/TÉCNICO JUDICIÁRIO/2014) É legítima a criação de tipos penais por meio de decreto. Errado. Só lei em sentido estrito pode criar tipos penais. Não tem exceção! • Pode-se perceber o enfoque proibitivo do princípio da legalidade: A) Proibição de analogia da lei penal (in malam partem) A analogia, como método de pensamento comparativo de grupos de casos, significa aplicação da lei penal a fatos não previstos, mas semelhantes aos fatos previstos “espírito da lei” OBS.: é importante constatar que a analogia in bonam partem, favorável ao réu é permitida pelo princípio da legalidade. Por força do princípio da legalidade, é vedada a utilização de analogias que prejudiquem o réu (as chamadas analogias in malam partem). “Mas, professor, o que é uma analogia?” A analogia é forma de integração da lei. Quando a lei não prevê a solução para um caso, a analogia permite a aplicação de uma norma parecida. É a chamada análise por semelhança. Em alguns outros ramos do direito, é possível fazer a integração da lei. Quando falta uma norma para o caso, o juiz escolhe outra norma parecida e a utiliza para suprir a falta da norma específica. Essa analogia pode ser utilizada de duas formas: NÃO É PERMITIDO A ANALOGIA IN MALAM PARTEM – POIS A MESMA PREJUDICA O RÉU. O exemplo mais utilizado nessa situação é o do aborto. O CP autoriza ao médico a realização de manobras abortivas se não há outro meio de salvar a vida da gestante (o chamado aborto necessário). Entretanto, imagine o seguinte: uma gestante está à beira da morte em uma pequena cidade que não dispõe de médico. Por conta da urgência da situação, o aborto acaba sendo realizado por uma parteira. Entretanto, veja o que diz o Código Penal: Art. 128. Não se pune o aborto praticado por médico: Aborto necessário I – Se não há outro meio de salvar a vida da gestante; A lei não prevê autorização para que outros profissionais da saúde pratiquem o chamado aborto necessário. Apenas o médico tem essa prerrogativa. Mas veja que, nessa situação, seria praticada clara injustiça ao punir a parteira que realizou tal prática por não haver alternativa. Nesse caso, dizemos ser possível o uso da analogia in bonam partem em favor da parteira, possibilitando a aplicação da norma permissiva para inocentá-la da prática do aborto. Entretanto, verifique agora um outro artigo do CP: Omissão de notificação de doença Art. 269. Deixar o médico de denunciar à autoridade pública doença cuja notificação é compulsória. Imagine que uma nutricionista que trabalhe em um grande hospital fique sabendo de uma doença grave e de notificação obrigatória, mas deixe de comunicar às autoridades competentes. Seria possível fazer o mesmo que no caso da parteira, e utilizar da analogia para criminalizar sua conduta? É claro que não! Nesse caso, não será possível utilizar da analogia para punir a nutricionista, pois não é possível realizar analogias in malam partem no Direito Penal. Essa interpretação restrita, quando em prejuízo do acusado, é uma consequência do princípio da legalidade. Dito isso, temos que falar de mais duas funções do princípio da legalidade, quais sejam: • vedar a aplicação da lei penal incriminadora a fatos anteriores à sua vigência; • proibir a criação de tipos penais vagos e indeterminados. (CESPE/DETRAN-DF/ANALISTA – ADVOCACIA) O princípio da legalidade veda o uso da analogia in malam partem, e a criação de crimes e penas pelos costumes. Certo. Relembrando: só lei em sentido estrito pode criar crimes e penas. E como acabamos de estudar, no Direito Penal, por força do princípio da legalidade, é vedado o uso da analogia em prejuízo do acusado! B) Proibição de retroatividade da lei penal Expressa no art. 5º, XL da CF: “a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu” Também contemplada no art. 2º do CP: “Ninguém pode ser punido por fato que lei posterior deixa de considerar crime, cessando em virtude dela a execução e os efeitos penais da sentença condenatória.” É importante constatar “A lei posterior, que de qualquer modo favorecer o agente, aplica-se aos fatos anteriores, ainda que decididos por sentença condenatória transitada em julgado.” C) Proibição do costume como fonte da lei penal Costumes são hábitos sociais reiterados que podem ser "praeter legem", "secundum legem" e "contra legem". OBS.: o costume, in bonam partem, pode ser admitido, para excluir ou reduzir a pena ou para descriminalizar o fato, nas hipóteses indicadas pela sociologia jurídica de perda de eficácia da lei penal – e, com a perda de eficácia, a perda de validade da lei. Exemplo: o crime de casa de prostituição. Era tipificava como um crime, só que o costume das pessoas que frequentava a casa de prostituição fez com que deixasse de ser crime. D) Proibição de indeterminação da lei penal A proteção do cidadão contra o arbítrio exclui leis penais indefinidas ou obscuras, leis penais indefinidas ou obscuras favorecem por um lado interpretações judiciais particulares para cada juiz, além de impedir ou dificultar o conhecimento da proibição Debate filosófico sobre a problema da inevitabilidade de certo nível de indefinição, pois se trata de palavras, sendo essas objeto de interpretações diferente Princípio da humanidade O princípio da humanidade, deduzido da dignidade da pessoa humana como fundamento do Estado Democrático de Direito, exclui a previsão, aplicação e execução de certos tipos de pena, sendo tal fato regulado pelo art. 5º, XLVII, CF/88: a) de morte (salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX) b) perpétuas c) de trabalhos forçados d) de banimento e) cruéis, como castrações, mutilações, esterilizações, ou qualquer outra pena infamante ou degradante do ser humano A garantia da integridade física e moral do ser humano preso, implícita no princípio da dignidade da pessoa humana é ratificada por disposição do art. 40 da Leide Execução Penal “Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios.”. outrossim, a LEP ainda garante um rol de direitos do preso no art. 41. OBS1.: Debate sobre a constitucionalidade do Regime Disciplinar Diferenciado, sistema em que o preso é recolhido em cela individual e tem direito a visitas semanais de duas pessoas. OBS2.: Art. 295. Serão recolhidos a quartéis ou a prisão especial, à disposição da autoridade competente, quando sujeitos a prisão antes de condenação definitiva: VII - os diplomados por qualquer das faculdades superiores da República; Princípio da responsabilidade penal pessoal O art. 5º, XLV estabelece, verbo ad verbum: “nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido” Sentença penal: diferença entre Sanção penal (reclusão, pena, MULTA) e sanção extrapenal (perder a carteira de habilitação). OBS: NA SANÇÃO PENAL DE MULTA, NÃO PODE SER PASSADA PARA TERCEIROS OUTRA DEFINIÇÃO! Princípio da Pessoalidade ou da Intranscendência da Pena CF/1988 Art. 5º XLV – Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano (prestação pecuniária) e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido. Previsto na própria Constituição Federal, este princípio existe para evitar que as sanções penais sejam executadas em face de terceiros. É fácil observar a incidência desse princípio em casos concretos. Quando verificamos a atuação policial, seja na rua ou mesmo na televisão, verificamos que a polícia busca sempre o autor do fato, e somente ele! Imagine o absurdo de uma equipe policial levar ao cárcere os filhos ou netos de um autor de um roubo, sendo que eles nada tiveram a ver com o fato? E é justamente esse tipo de exagero que é evitado pelo princípio da pessoalidade! É muito importante, no entanto, perceber um pequeno detalhe: se o autor de um fato for condenado ao perdimento de bens ou a reparar o dano e vier a falecer antes da execução da sentença, ela poderá ser executada contra os herdeiros, até o limite da herança recebida. “Mas como assim, professor?” Imagine que seu vizinho quebre todo o seu carro com uma barra de ferro propositalmente. Com isso, você poderá registrar ocorrência do fato, dando início à apuração do crime de DANO. Agora imagine que seu vizinho, nesse cenário, seja condenado a reparar os danos no seu veículo, que foram avaliados em R$ 10.000,00. Caso o autor venha a falecer antes da reparação do dano, o valor poderá ser Subtraído da herança deixada para os filhos!Agora, muita atenção, pois existe uma pegadinha sobre este assunto que os examinadores simplesmente adoram: a questão da MULTA. Ao final do curso, estudaremos as espécies de penas aplicáveis no Direito Penal. Uma dessas espécies é a multa. Entretanto, você não pode confundir a obrigação de reparar o dano com a pena de multa. A multa tem caráter punitivo, e, como tal, fica vinculada à pessoa do condenado! Em outras palavras: mesmo se tratando de dinheiro, a multa não pode ser deduzida da herança, pois isso feriria o princípio da pessoalidade. Lembre-se: as únicas responsabilidades que podem ser transferidas aos herdeiros são as de reparar o dano e a decretação de perdimento de bens. E, mesmo assim, estas últimas ficam limitadas ao valor da herança que foi deixada. Para ficar mais claro: No nosso exemplo, falamos que os danos causados no veículo foram estimados em R$ 10.000,00. Caso a herança deixada pelo vizinho quebrador de automóveis alheios fosse de R$ 8.000,00, este seria o valor máximo que poderia ser executado em face dos herdeiros. Mesmo que a vítima fique ainda com um prejuízo de R$ 2.000,00, não há o que fazer. A obrigação residual só pode ir até o valor da herança deixada pelo autor. Princípio da fundamentação O art. 93, IX da CF/88 estabelece que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade” O Princípio Constitucional da motivação das decisões judiciais está previsto na Constituição Federal, art. 93, IX, e disciplina o seguinte: “Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade [...]”. Em outras palavras, permite, em termos práticos, que as partes identifiquem precisamente os motivos que levaram o juiz a utilizar determinada forma de julgamento. Ainda hoje há decisões genéricas, que não seguem uma realidade de “processo constitucional”. O jurisdicionado depara-se, sim, com decisões em que os magistrados afirmam terem decidido com base em um suposto “senso de justiça”, portanto, sem esclarecer as razões que o nortearam. Dessa forma, visando coibir tal prática, o Novo Código de Processo Civil, Lei n. 13.105/15, em seu art. 11, disciplina que “Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade”. Ademais, conforme o art. 10, “O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”. O PRINCIPIO DA MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS COMO GARANTIA CONTITUCIONAL- ART. 93, INC. IX CF/88. O princípio da motivação das decisões judiciais surge com intuito de disciplinar o poder jurisdicional, impondo-lhe limites para que tal poder afaste da sua função toda e qualquer arbitrariedade em detrimento dos direitos inerentes ao cidadão. Sendo assim, caracteriza uma garantia constitucional, tendo em vista que dá ao cidadão a plena garantia que seus direitos serão assegurados por um Estado-juiz justo. A motivação das decisões judiciais se amolda aos direitos e garantias trazidas pelo Estado Democrático de Direito, pois conforme demonstrado acima, o Poder jurisdicional encontra limites e esses limites devem respeitar primordialmente os direitos do cidadão que estão sob sua tutela, desta maneira, prevalecerão os direitos enraizados na democracia. E) Presunção de inocência: mesmo com prisão preventiva, em flagrante ou provisória. O art. 5º, LVII da CF estabelece que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” Mesmo preso de forma temporária, preventiva ou até com execução provisória da pena após condenação em segunda instância, o réu não será considerado culpado A isto cabe dizer que paira sobre o cidadão uma presunção de inocência, ou melhor, de não culpabilidade, onde, em boa hermenêutica, vemos que não se fala em inocência, mas antes, de não culpabilidade. Asseverando esta interpretação temos CUNHA escrevendo que: Na verdade, o princípio insculpido na referida norma garantia é o da presunção de não culpa (ou de não culpabilidade). Uma situação é a de presumir alguém inocente; outra, sensivelmente distinta, é a de impedir a incidência dos efeitos da condenação até o transito em julgado da sentença, que é justamente o que a Constituição brasileira garante a todos. [6] No entanto, interessante discussão se apresenta quando trazemos à baila o instituto da prisão cautelar, quais sejam: Prisão em Flagrante Delito; Prisão Preventiva e Prisão Temporária. A prisão em flagrante ocorre quando o agente é pego ainda cometendo ou acabou de cometer oato delituoso. Esta medida repressiva é de natureza cautelar e puramente administrativa, ou seja, não necessita de ordem do juiz, permitindo assim cessar a agressão com o encarceramento do agente criminoso. Já a prisão preventiva se torna uma cautelar mais ampla, com projeção futurista. Enquanto a prisão em flagrante pretende cessar agressão atual, a preventiva tem o objetivo de reprimir qualquer tipo de violação futura. Nesta modalidade de prisão não basta somente haver a comprovação de materialidade e indícios de autoria, também tem que estar presente o fator de risco que justifique esta medida, sendo esta a última opção a ser considerada. Na prisão temporária, tem-se um prazo determinado, cabível no inquérito ou investigação equivalente, nas hipóteses descritas no art. 282 e 283 do CPP. Tomando por base estes tipos de prisões, vemos que há certo grau de inconstitucionalidade em todas elas. Contudo, a nossa Corte Maior já determinou por meio do HC 101537, onde o Relator Ministro Marco Aurélio, deu seu parecer afirmando ser uma exceção ao princípio as prisões acima descritas. Contudo, não está somente ligado às prisões a ofensa a este princípio, mas também, à exposição por meio das mídias existente sobre a pessoa do acusado, realizando um pré-julgamento social sobre este. Por fim, este princípio se encontra intimamente relacionado à pena, pois, como veremos mais adiante, pode ser este causa de aumento ou diminuição da pena base. ENTENDIMENTO DO SITE MIGALHAS (PRESUNÇÃO DE INOCENCIA – ART. 5, INCISO VLII CF- O princípio da presunção de inocência, como se sabe, está estabelecido no art. 5º, inciso LVII, de nossa Constituição Federal, e é resultado da externalização de norma de intenção protetiva do legislador, por prever que ninguém deverá ser considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Suas origens remetem à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, do séc. XVIII, que, em seu art. 9º, previa: "Tout homme étant présumé innocent jusqu’a ce qu’il ait été déclaré coupable; s’il est jugé indispensable de l’arrêter, toute rigueur Qui ne serait nécessaire pour s’assurer de as personne, doit être sévèrement reprimée par la loi" 1; e, posteriormente, à Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU, em 1948, que dizia: "Toda pessoa acusada de delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não se prova sua culpabilidade, de acordo com a lei e em processo público no qual se assegurem todas as garantias necessárias para sua defesa".2 Na doutrina brasileira, juristas como Aury Lopes Jr.3 e André Nicolitt4, defendem que a presunção da inocência trata-se de "princípio reitor do processo penal e, em última análise, podemos verificar a qualidade de um sistema processual através do seu nível de observância (eficácia)", e que "embora recaiam sobre o imputado suspeitas de prática criminosa, no curso do processo deve ele ser tratado como inocente, não podendo ver-se diminuído social, moral nem fisicamente diante de outros cidadãos não sujeitos a um processo". Seja como for, o que se pretende esclarecer de maneira muito breve, é que a intenção da redação de referida norma foi, precisamente, justa e razoável, na medida em que pensada para impedir a prisão do indivíduo, sem a sólida certeza de sua condenação – o que, de certa forma, poderia levar o Estado a incorrer em tremenda injustiça, caso, após o término do processo, se concluísse pela inocência do acusado. Contudo, muito embora a Constituição tenha consagrado este princípio como um dos basilares do processo penal brasileiro, dizer que ninguém deverá ser considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória, não significa dizer que medidas acautelatórias, tais como as prisões cautelares (preventivas, temporárias ou em flagrante), não poderão ser tomadas, durante o processo penal, para o fim de este assegurar. Afinal, para toda regra há – pelo menos – uma exceção. Neste sentido, diz-se que o princípio da presunção de inocência, aqui, influi na medida em que, ainda que aplicada alguma modalidade de prisão cautelar, como regra, o acusado poderá responder em liberdade (devendo esta ser conquistada por fiança, para os crimes afiançáveis, ou por habeas corpus, para os crimes inafiançáveis – vide disposição do art. 5º, incisos XLII, XLII e XLIV, da CF/88). numerus clausus: Art. 85. O estabelecimento penal deverá ter lotação compatível com a sua estrutura e finalidade.(LEI DE EXECUÇÃO PENAL – LEP) LEI Nº 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984. Em 1989, Gilbert Bonnemaison, deputado do Partido Socialista francês, encaminhou ao Ministro da Justiça um relatório com diversas propostas para a modernização do serviço público penitenciário da França.[2] Entre as propostas, foi apresentada a ideia do numerus clausus (NÚMERO FECHADO) que consistia na obrigatoriedade de que o número de presos em um estabelecimento penal atendesse ao número exato (fechado) de vagas disponíveis, de modo que, uma vez ultrapassada a capacidade máxima do estabelecimento, deveriam ser escolhidos os presos com melhor prognóstico de adaptabilidade social, impondo-lhes a detenção domiciliar com vigilância eletrônica. A par das críticas quanto ao critério de escolha dos presos – prognóstico de adaptabilidade social – e quanto à medida proposta pelo relatório Bonnemaison – vigilância eletrônica –, fato é que estava lançada uma proposta concreta de contenção da presença de mais presos do que a capacidade de vagas no cárcere. Em junho de 2000, em depoimento prestado à Comissão de Inquérito da Assembleia Nacional Francesa acerca da situação das prisões francesas, Gilbert Bonnemaison voltou a afirmar sua crença no princípio, asseverando: direi-lhes antes de mais nada a minha crença, forte ontem, mais forte ainda hoje, que esvaziar as prisões de sua superlotação e criar os meios para proibir a sua reprodução pelo numerus clausus é a única maneira de resolver o problema das prisões”.[3] Ainda no ano de 2006, partindo da premissa de que ninguém deve entrar no cárcere se não há lugar disponível, iniciou-se novamente na França uma campanha, organizada por Bernard Bolze, um dos fundadores do Observatório Internacional de Prisões, com o nome “Trop c’est trop! Pour un numerus clausus en prison”, envolvendo mais de trinta organizações da sociedade civil.[7] Com fundamento no princípio “uma vaga por cada preso” e na necessidade de utilização de celas individuais, a campanha teve como um de seus motes principais a seguinte colocação: “os responsáveis políticos serão tentados a justificar a construção de novos estabelecimentos pela necessidade de oferecer mais vagas. Eles aumentarão o número de pessoas presas (isso é exatamente o que não queremos), mas eles não resolverão o problema da superpopulação, que só pode ser resolvido de uma maneira: não coloque uma pessoa onde não existe uma vaga”.[8] Atualmente, segmentos importantes da sociedade civil organizada, dos meios de comunicação e da classe política da França continuam a sustentar a adoção do numerus clausus.[9] Aportando a ideia para a realidade brasileira, podemos definir numerus clausus (ou número fechado) como o princípio ou sistema organizacional segundo o qual cada nova entrada de uma pessoa no âmbito do sistema carcerário deve necessariamente corresponder ao menos a uma saída, de forma que a proporção presos-vagas se mantenha sempre em estabilidade ou tendencialmente em redução.[10] Como premissa basilar, é importante ressaltar que o numerus clausus, antes de tudo, é um princípio que preconiza a redução de população carcerária, não a criação de novas vagas. Na atual conjunturapenitenciária, a adoção desse princípio ou sistema aparece como importante elemento de uma política reducionista, pautada pela intolerância absoluta à superlotação das prisões. Aparece ainda como instrumento de recondução da execução penal a um status de conformidade constitucional, sempre que caracterizada a imposição de encarceramento em condições contrárias ao senso de humanidade. De fato, não se pode admitir que o interesse do Estado em satisfazer sua pretensão punitiva ou executória justifique a ruptura de direitos fundamentais. E mais, é impensável que o Estado esconda sua ineficiência com o sacrifício dos direitos fundamentais. 2- Funções da pena: Direito penal: sistemas de normas que define o crime, comina penas e estabelece princípios da sua aplicação. Quando falamos em política criminal, observamos que, a mesma, não inclui políticas públicas de emprego, salário digno, escolarização, moradia etc., como programas oficiais capazes de alterar ou de reduzir as condições sociais adversas da população marginalizada o mercado de trabalho e dos direitos da cidadania, definíveis como determinações estruturais do crime e da criminalidade, por isso que deveria ser uma POLÍTICA PENAL POSITIVA, mas de fato, existe uma POLÍTICA PENAL NEGATIVA instituída pelo código penal e leis complementares. E qual a resposta para esses crimes? A definição de crimes, a aplicação de penas e a execução penal. Política penal: pressupõe o estudo das funções atribuídas à pena criminal, como instrumento principal do programa oficial de controle do crime e da criminalidade. O Direito Penal representa o sistema de normas que define crimes, comina penas e estabelece os princípios de sua aplicação. Funções da pena segundo o discurso oficial são: retribuição + prevenção (geral e especial) Contudo, a análise da pena criminal não pode se limitar ao estudo das funções atribuídas pelo discurso oficial, definidas como funções declaradas ou manifestas da pena criminal Pelo contrário, esse estudo deve rasgar o véu da aparência das funções declaradas da ideologia jurídica oficial, para identificar as funções reais ou latentes da pena criminal, que podem explicar sua existência, aplicação e execução nas sociedades de classes sociais antagônicas, fundadas na relação capital/trabalho assalariado, que define a separação força de trabalho/meios de produção das sociedades contemporâneas. A política penal realizada pelo Direito Penal é legitimada pelo teoria da pena, construída pelos discursos de retribuição do crime e de prevenção geral e especial da criminalidade – as funções atribuídas à pena criminal pela ideologia penal oficial. A compreensão da Política Criminal – rectius, política penal – pressupõe o estudo das funções atribuídas à pena criminal, como instrumento principal do programa oficial de controle do crime e da criminalidade. Pode-se perceber uma contradição entre o discurso penal e a realidade da pena, que seguem direções opostas. • Detalhando o discurso oficial da teoria jurídica da pena: A função da pena enunciada pela legislação pátria é a de reprovabilidade e de prevenção, nos termos do art. 59 do CP que assevera, ad litteram: Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime 1. A pena como retribuição de culpabilidade Conceito. A pena como retribuição do crime representa a imposição de um mal justo contra o mal injusto do crime, necessário para realizar justiça ou restabelecer o Direito, segundo a fórmula de SENECA: punitur, quia peccatum est. A sobrevivência histórica da pena retributiva – a mais antiga e mais popular função atribuída à pena criminal – parece inexplicável para o discurso oficial: a pena como expiação de culpabilidade lembra suplícios e fogueiras medievais, concebidos para purificar a alma do condenado; a pena como compensação de culpabilidade atualiza o impulso de vingança do ser humano, tão velho quanto o mundo. A literatura penal possui várias explicações para a sobrevivência da função retributiva da pena criminal. Primeiro, a psicologia popular, evidentemente regida pelo talião, poderia ser a base antropológica da pena retributiva: a retaliação expressa no olho por olho, dente por dente constitui mecanismo comum dos seres zoológicos e, por isso, atitude generalizada do homem, esse zoon politikon. Segundo, a tradição religiosa judaico-cristã ocidental apresenta uma imagem retributivo vingativa da justiça divina, que talvez constitua a influência cultural mais poderosa sobre a disposição psíquica retributiva da psicologia popular – portanto, de origem mais social do que biológica. Terceiro, a filosofia idealista ocidental é retributiva. IMPORTANTE!!!! • KANT (1724-1804): define a justiça retributiva como lei inviolável, um imperativo categórico pelo qual todo aquele que mata deve morrer, para que cada um receba o valor de seu fato e a culpa do sangue não recaia sobre o povo que não puniu seus culpados14; • HEGEL (1770-1831) define crime como negação do direito e pena como negação do crime – portanto, como reafirmação do direito – e considera a justiça retributiva a única digna do ser humano: criticou a teoria da coação psicológica de FEUERBACH (1775-1833) porque não tratava o homem como ser “dotado de honra e liberdade”, mas como um cão ameaçado com um bastão. Em síntese, Essa é a mais antiga e mais popular função atribuída à pena criminal, sendo caracterizada pela “a imposição de um mal justo contra o mal injusto do crime”. Justifica-se, essa função, por várias explicações (PSICOLOGIA POPULAR, TRADIÇÃO JUDAICO-CRISTÃ E FILOSOFIA IDEALISTA OCIDENTAL): A psicologia popular: retribuição do mal para quem o deu causa, esse pensamento “vingativo” *(VIGIAR E PUNIR – FOUCALT) é derivado da Lei de Talião, que preservava a máxima: “olho por olho, dente por dente”, característica comum ao homem.Também se justifica, a tradição religiosa judaico-cristã ocidental apresenta uma imagem retributivo vingativa da justiça divina. Tem uma relação judaica divina, quando se trata da vingança Por fim, a base retributiva tem escopo na filosofia idealista que muito influenciou a nossa formação. Para isso, é importante trazer à baila o entendimento de HEGEL, que define crime como “negação do direito e pena como negação do crime” – portanto, como reafirmação do direito. Expressando o caráter retributivo do crime, análise trazida por Juarez Cirino. .Quarto, o discurso retributivo baseia-se na lei penal. O legislador determina ao juiz aplicar a pena conforme necessário e suficiente para a reprovação do crime. Crítica ao pensamento retributivo: (crítica ao pensamento judaico cristã) Juarez Cirino, traz a abordagem de que compensar um mal (o crime) com outro mal (a pena) corresponde a uma crença, com escopo em um ato de fé (mas não é democrático, nem científico). Não podendo o poder punitivo ser exercido em nome da crença (Deus), mas sim do povo (já que o estado é democrático e não teológico). Ainda a luz dessa abordagem crítica, é importante reiterar que o Direito Penal tem por objetivo proteger bens jurídicos – e não realizar vinganças. . Por outro lado, não é científico porque a retribuição do crime pressupõe um dado indemonstrável: a liberdade de vontade do ser humano, pressuposta no juízo de culpabilidade – presente em fórmulas famosas como o poder de agir de outro modo de WELZEL18 –, não admite prova empírica. Assim, a pena como retribuiçãodo crime fundamenta-se num dado indemonstrável: o mito de liberdade pressuposto na culpabilidade do autor 2. A pena como prevenção especial (AQUELES QUE JÁ SE ENCONTRAM PRESOS) 1. Conceito. A função de prevenção especial da pena criminal, dominante nos séculos 19 e 20, é atribuição legal dos sujeitos da aplicação e da execução penal: primeiro, o programa de prevenção especial é definido pelo juiz no momento de aplicação da pena, através da sentença criminal individualizada conforme necessário e suficiente para prevenir o crime (art. 59, CP); segundo, o programa de prevenção especial definido a sentença criminal é realizado pelos técnicos da execução da pena criminal – os chamados ortopedistas da moral, na concepção de FOUCAULT20 –, com o objetivo de promover a harmônica integração social do condenado (art. 1º, LEP). A execução do programa de prevenção especial ocorre em dois processos simultâneos, pelos quais o Estado espera evitar crimes futuros do condenado: • Por um lado, a prevenção especial negativa: de neutralização do condenado, consistente na incapacitação para praticar novos crimes durante a execução da pena; negação do crime, a partir da negação não haverá mais crime fora da prisão. • Por outro lado, a prevenção especial positiva de correção (ou ressocialização) do condenado, realizada pelo trabalho de psicólogos, sociólogos, assistentes sociais e outros funcionários da ortopedia moral do estabelecimento penitenciário. Adestramento do corpo, docilização dos corpos - (Foucault). Crítica: o Estado não pode impor moldes a alguém, não pode ditar como alguém deva pensar. • A sociedade não é harmônica; Crítica à pena como prevenção especial: A prevenção especial negativa de neutralização do condenado parece indiscutível: a incapacitação seletiva de indivíduos considerados perigosos constitui efeito evidente da execução da pena porque impede a prática de crimes fora dos limites da prisão, assim, a neutralização do condenado seria uma das funções declaradas cumpridas pela pena crimina. A crítica jurídica da prevenção especial positiva fala da supressão de direitos não atingidos pela privação de liberdade, da necessidade de respeitar a autonomia do preso e de limitar os programas de ressocialização a casos individuais voluntários: afinal, o condenado não pode ser compelido ao tratamento penitenciário, o Estado não tem o direito de melhorar pessoas segundo critérios morais próprios e, enfim, prender pessoas fundado na necessidade de melhoria terapêutica é injustificável. O reconhecimento da ineficácia corretiva da prevenção especial positiva e dos efeitos nocivos da prevenção especial negativa atribuídos à pena privativa de liberdade são diluídos, segundo PILGRAM/ STEINERT, por frequentes declarações simplistas de que ainda não temos nada melhor do que a prisão. • corpos dóceis e disciplinados • Ortopedia social • Docilização dos corpos. ( O Estado não tem o direito de melhorar pessoas segundo critérios morais próprios) A pena como prevenção geral (PARA AS PESSOAS QUE NÃO SE ENCONTRAM ENCARCEIRADA) A função de prevenção geral atribuída à pena criminal igualmente tem por objetivo evitar crimes futuros mediante uma forma negativa antiga e uma forma positiva pós-moderna. Prevenção geral negativa aparece na forma tradicional de intimidação penal, expressa na célebre teoria da coação psicológica de FEUERBACH (1775-1833)27: o Estado espera que a ameaça da pena desestimule pessoas de praticarem crimes A crítica à prevenção geral negativa destaca a ineficácia da ameaça penal para inibir comportamentos criminosos. Aliás, afirma-se que não é a gravidade da pena – ou o rigor da execução penal –, mas a certeza (ou a probabilidade) da punição que pode desestimular o autor de praticar crimes. Além disso, a prevenção geral negativa possui dois defeitos graves: primeiro, a falta de critério limitador da pena transforma a ameaça penal em terrorismo estatal (Gilmar Mendes – criticando as prisões preventivas/temporárias). – como indica a lei de crimes hediondos, essa infeliz invenção do legislador brasileiro; segundo, a natureza exemplar da pena como prevenção geral negativa viola a dignidade humana porque acusados reais são punidos de forma exemplar para influenciar a conduta de acusados potenciais – em outras palavras, aumenta-se injustamente o sofrimento de acusados reais para desestimular o comportamento criminoso de acusados potenciais A prevenção geral positiva (SURGE NO FINAL DO SÉCULO 20) atribui ao Direito as funções (a) de estabilização do sistema social, (b) de orientação da ação e (c) de institucionalização de expectativas normativas. Tendo escopo na segurança da ordem jurídica. O delito seria uma má propagando para o sistema Busca uma harmonia/consenso social: “há a tipificação de um crime com a finalidade de que esse não seja cometido”. Ao violar esse sistema harmônico o agente deve ser punido para o sistema ser reequilibrado, voltando à harmonia. Nessa linha, aparecem duas variantes: a) ROXIN29 concebe a prevenção geral positiva no contexto de outras funções declaradas da pena criminal, legitimada pela proteção de bens jurídicos, de natureza subsidiária (existem outros meios mais efetivos) e fragmentária (proteção parcial dos bens jurídicos selecionados); b) JAKOBS concebe a prevenção geral positiva de modo absoluto, excluindo as funções declaradas de intimidação, de correção e de retribuição do discurso punitivo: a pena é afirmação da validade da norma penal violada – definida como bem jurídico-penal, categoria formal substitutiva da categoria real do bem jurídico –, aplicada com o objetivo de estabilizar as expectativas normativas e de restabelecer a confiança no Direito, frustradas pelo crime. A crítica à prevenção geral positiva destaca a desigualdade, violência, falta de acesso à direitos como a própria desarmonia desse sistema. A harmonia desse sistema é formal, descreve um mundo irreal. Em sociedades desiguais, quanto mais conflitos, menos consenso. Não existes harmonia em sociedades desiguais. Obs: aumentar a pena não diminui o delito As teorias unificadas: a pena como retribuição e prevenção No Brasil, o CP consagra as teorias unificadas ao determinar a aplicação da pena “conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime” (art. 59, CP): As teorias unificadas da pena criminal conjugam as teorias isoladas com o objetivo de superar as deficiências particulares de cada teoria, mediante fusão das funções declaradas de retribuição, de prevenção geral e de prevenção especial da pena criminal. Então, a pena representaria: (a) retribuição do injusto realizado, mediante compensação ou expiação da culpabilidade; (b) prevenção especial positiva mediante correção do autor pela ação pedagógica da execução penal, além de prevenção especial negativa como segurança social pela neutralização do autor; (c) prevenção geral negativa através da intimidação de criminosos potenciais pela ameaça penal e prevenção geral positiva como manutenção/reforço da confiança na ordem jurídica etc. No Brasil, o CP consagra as teorias unificadas ao determinar a aplicação da pena “conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime” (art. 59, CP): a reprovação exprime a ideia de retribuição da culpabilidade; a prevenção do crime abrange as modalidades de prevenção especial (correção e neutralização do autor) e de prevenção geral (intimidação e manutenção/reforço da confiança na ordem jurídica) atribuídas à pena criminal. A crítica à teoria unificada Os defeitos das teorias isoladas não desaparecemnas teorias unificadas da pena criminal, com a reunião das funções (a) de compensar ou expiar a culpabilidade, (b) de corrigir e neutralizar o criminoso, e (c) de intimidar autores potenciais e de manter/reforçar a confiança no Direito. Por outro lado, a admissão de diferentes funções da pena criminal, mediante cumulação de teorias contraditórias e reciprocamente excludentes, significa adotar uma pluralidade de discursos legitimantes capazes de racionalizar qualquer punição pela escolha da teoria mais adequada para o caso concreto O feixe de funções conflitantes das teorias unificadas não permite superar as debilidades específicas de cada função declarada da pena criminal (ao contrário, as teorias unificadas significam a soma dos defeitos das teorias particulares). Segundo, não existe nenhum fundamento filosófico ou científico capaz de unificar concepções penais fundadas em teorias contraditórias, com finalidades práticas reciprocamente excludentes. OBS: NÃO SEI SE CAI!!!!! B) A crítica materialista/dialética da pena Criminal 1. A pena como retribuição equivalente do crime O discurso crítico da teoria materialista/dialética pretende revelar a natureza real da pena criminal nas sociedades contemporâneas: a retribuição equivalente – contrariamente ao que pensa a crítica jurídica – não representa resquício metafísico de expiação do mal injusto do crime pelo mal justo da pena (como pretendem teóricos da prevenção), nem se reduz ao argumento antropológico de sobrevivência da vingança retaliatória no psiquismo humano, nem pode ser explicada por argumentos filosóficos do tipo imperativo categórico ou dignidade do ser humano, assim como não se confina aos argumentos legais da pena necessária e suficiente para reprovação do crime. A teoria criminológica materialista/dialética introduz uma explicação política da emergência histórica do conceito jurídico-econômico da retribuição equivalente, como fenômeno sócio estrutural específico das sociedades capitalistas: a função de retribuição equivalente da pena criminal corresponde aos fundamentos materiais e ideológicos das sociedades undadas na relação capital/trabalho assalariado porque existe como forma de equivalência jurídica fundada nas relações de produção das sociedades contemporâneas. A teoria materialista/dialética da história parte do princípio de que a produção e a circulação de mercadorias é o fundamento material da ordem social capitalista64. A síntese do materialismo histórico foi formulada por MARX no célebre Prefácio de 1859, que apresenta o método de estudo das formações sociais modernas. Segundo essa concepção, o Direito e o Estado não podem ser compreendidos por si mesmos, mas pelas relações da vida material da sociedade civil, cuja anatomia é representada pela economia política. Na produção da vida social, os homens entram em relações de produção determinadas e necessárias, cujo conjunto constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se elevam superestruturas jurídicas e políticas, e à qual correspondem determinadas formas de consciência social. O modo de produção da vida material condiciona os processos da vida social, política e intelectual, em geral: não é a consciência dos homens que determina o ser, mas o ser social que determina a consciência. 2. A prevenção especial como garantia das relações Sociais (teoria materialista) 1. A prevenção especial negativa de neutralização do condenado mediante privação de liberdade – a incapacitação seletiva de indivíduos considerados perigosos –, em princípio incontestável porque impede a prática de crimes fora dos limites da prisão, igualmente possui aspectos contraditórios, como demonstra a crítica criminológica: a) a privação de liberdade produz maior reincidência – portanto, maior criminalidade –, determinada pelos reais efeitos nocivos da prisão; b) a privação de liberdade exerce influência negativa na vida real do condenado, mediante desclassificação social objetiva, redução das chances de futuro comportamento legal e formação subjetiva da autoimagem de criminoso – portanto, habituado à punição; c) a execução da pena privativa de liberdade representa a máxima desintegração social do condenado, com a perda do lugar de trabalho, a dissolução dos laços familiares, afetivos e sociais, a formação pessoal de atitudes de dependência determinadas pela regulamentação da vida prisional, além do estigma social de ex-condenado; d) a subcultura da prisão produz deformações psíquicas e emocional no condenado, que excluem a reintegração social e realizam a chamada self fulfilling prophecy, como disposição aparentemente inevitável de carreiras criminosas; e) prognoses negativas fundadas em indicadores sociais desfavoráveis, como pobreza, desemprego, escolarização precária, moradia em favelas etc. desencadeiam estereótipos justificadores de criminalização para correção individual por penas privativas de liberdade, cuja execução significa experiência subcultural de prisionalização, deformação pessoal e ampliação de prognósticos negativos de futuras reinserções no sistema de controle; f ) finalmente, o grau de periculosidade criminal do condenado é proporcional à duração da pena privativa de liberdade: quanto maior a experiência do preso com a subcultura da prisão, maior a reincidência e a formação de carreiras criminosas, conforme demonstra o labeling approach. A crítica criminológica da função de prevenção especial positiva da pena criminal – baseada na noção de crime como problema individual e na concepção de pena como tratamento curativo – demonstra o fracasso histórico do projeto técnico-corretivo da prisão, caracterizado pelo reconhecimento continuado do fracasso e pela reproposição reiterada do mesmo projeto fracassado – segundo o célebre isomorfismo reformista de FOUCAULT83. A crise do projeto de reconstrução do condenado como força de trabalho útil, sintetizada no famoso “nothing works” de MARTINSON84, está na origem da atual transformação da prisão em instrumento de pura deterrence, reduzido à prevenção especial negativa de segurança e de incapacitação do preso. As distorções do projeto técnico-corretivo de prevenção especial positiva abrangem os momentos de aplicação e de execução da pena criminal. A crise da aplicação da pena reside na contradição entre o discurso do processo legal devido e a realidade do exercício seletivo do poder de punir: a) por um lado, o discurso do processo legal devido, regido pela dogmática como critério de racionalidade, vê o crime como realidade ontológica pré-constituída, que o sistema de justiça criminal identifica e processa85; b) por outro lado, a realidade do exercício seletivo do poder de punir, encoberta pelo discurso do processo legal devido, permite (a) compreender o crime como realidade social construída pelo sistema de controle social, (b) definir criminalização como um bem social negativo distribuído desigualmente pela posição social do autor, e (c) identificar o sistema de justiça criminal como instituição ativa na transformação do cidadão em criminoso86. O crime como realidade social construída, a criminalização como bem social negativo e o sistema de justiça criminal como instituição ativa na distribuição social da criminalização podem ser explicados pela lógica menos ou mais inconsciente das chamadas metarregras – ou basic rules, segundo CICOUREL87 –, mecanismos psíquicos de natureza emocional atuantes no cérebro do operador do Direito, constituídos de estereótipos, preconceitos, idiossincrasias e outras deformações ideológicas do intérprete88 – definidos por SACK como o momento decisivo do processode criminalização89 –, capazes de esclarecer a concentração da repressão penal em setores sociais marginalizados ou subalternos, ou na área das drogas, ou do patrimônio, por exemplo – e não nos crimes contra a economia, a ordem tributária, a ecologia etc., próprios das elites de poeconômico e político da sociedade90. 3. Enfim, a crise da execução da pena, como realização do projeto técnico-corretivo da prisão, é irreversível. E a explicação da crise é simples: a prisão introduz o condenado em duplo processo de transformação pessoal, de desculturação pelo desaprendizado dos valores e normas de convivência social, e de aculturação pelo aprendizado de valores e normas de sobrevivência na prisão91, a violência e a corrupção – ou seja, a prisão só ensina a viver na prisão. Em poucas palavras, a prisão prisionaliza o preso que, depois de aprender a viver na prisão, retorna para as mesmas condições sociais adversas que determinaram a criminalização anterior. Em síntese, o processo simultâneo de desculturação e de aculturação descrito por BARATTA designa aqueles mecanismos de adaptação pessoal à subcultura da prisão desencadeados pela rotulação oficial do cidadão como criminoso, que transformam a autoimagem e deformam a personalidade do condenado, recondicionada como produto de nova (re)construção social, orientada pelos valores e normas de sobrevivência na prisão, como indica o labeling approach92. Cumprida a pena, o retorno do condenado prisionalizado para as mesmas condições sociais adversas determinantes da criminalização anterior encontra um novo componente: a atitude dos outros. A expectativa da comunidade de assuma o papel de criminoso praticando novos crimes fecha as supostas possibilidades de reinserção social e completa o modelo sequencial de formação de carreiras criminosas, realizando a chamada self fulfilling prophecy, em que o condenado assume as características do rótulo, concretizando a previsão de autorrealização e confirmando a teoria da construção da personalidade no processo de interação social. 4. Como visto, o fracasso histórico da prisão refere-se à função declarada de correção (de ressocialização, de reeducação etc. – em suma, do que é definido como ideologia do condenado, atribuída à pena criminal pela ideologia do sistema punitivo, porque a função real de controle seletivo da criminalidade, fundado em indicadores sociais negativos, e de garantia de relações sociais desiguais, fundadas na relação capital/trabalho assalariado, constitui incontestável êxito histórico, como assinala FOUCAULT. 3. A prevenção geral como afirmação da ideologia Dominante 1. A prevenção geral negativa da ameaça penal pode ter efeito desestimulante (intimidação) em crimes de reflexão (crimes econômicos, ecológicos, tributários etc.), característicos do Direito Penal simbólico, mas não teria efeito em crimes impulsivos (violência pessoal ou sexual, por exemplo), próprios da criminalidade comum estampada nos meios decomunicação de massa. Logo, a inibição de impulsos antissociais pela ameaça penal somente seria relevante no Direito Penal simbólico – um direito destituído de eficácia instrumental e instituído para legitimação retórica do poder punitivo do Estado, mediante criação/difusão de imagens ilusórias de eficiência repressiva na psicologia do povo –, mas é absolutamente irrelevante no Direito Penal instrumental, cujo objeto é delimitado pela criminalidade comum, área de incidência exclusiva da repressão penal seletiva. 2. A prevenção geral positiva substitui a proteção de direitos individuais pela proteção de complexos funcionais – finanças, tributos, ecologia, energia etc., – ou seja, substitui a proteção de bens jurídicos individuais pela proteção de funções sistêmicas98. A concepção do Direito como subsistema normativo de estabilização do sistema social mostra a natureza conservadora da teoria, como discurso de reprodução/ conservação da realidade social, construído com base no sistema de direito positivo. Como sempre, a resposta penal é uma reação sintomatológica ao nível da manifestação do conflito (o fato criminoso) – e não ao nível da produção do conflito (determinações estruturais da desigualdade social) –, justificada pelos supostos efeitos de integração social e de aumento da confiança institucional; desse modo, encobre os reais efeitos negativos de desagregação social dos presos, introduzidos em carreiras criminosas por um sistema penal desigual e seletivo. Em poucas palavras: enquanto o discurso da prevenção/integração legitima a repressão seletiva das camadas subalternas e a imunidade das elites de poder econômico e político, o discurso crítico revela a ligação da repressão seletiva dos marginalizados sociais com a reprodução das relações sociais desiguais, precisamente mediante o processo de gestão diferencial do sistema penal. CONCLUSÃO Em resumo: a) a pena criminal cumpre a função de retribuição equivalente do crime nas sociedades modernas, precisamente mediante a neutralização de condenados reais durante a execução da pena – eventualmente, com a função complementar de intimidação de autores potenciais; b) as outras funções (i) de correção individual (prevenção especial positiva, destruída pela experiência histórica e arquivada pelo labeling approach), e (ii) de afirmação da validade da norma (prevenção geral positiva, em contradição com a correlação sistema penal/mercado de trabalho) constituem retórica encobridora das funções reais da pena criminal, de garantia da desigualdade social e da opressão de classe da relação capital/trabalho assalariado das sociedades contemporâneas. 4. Por isso, a função de retribuição equivalente do crime – fundada no valor de troca medido pelo tempo (a) de trabalho social necessário na economia, e (b) de liberdade pessoal suprimida no Direito – legitima a pena segundo a lógica do capital, produtora de um Direito Penal desigual, como programa de criminalização seletiva de marginalizados sociais do mercado de trabalho, orientado por indicadores sociais negativos (pobreza, desemprego etc.) que ativam estereótipos, preconceitos, idiossincrasias pessoais e todo o sistema ideológico dos agentes de controle social, excluindo ou reduzindo a função de critério de racionalidade atribuída à dogmática penal. Origem da pena privativa de liberdade: Prisão: aparelho disciplinar exaustivo da sociedade capitalista, constituído para o exercício do poder de punir, mediante privação de liberdade, em que o tempo exprime a relação: crime/punição. O tempo é o critério geral e abstrato do valor da mercadoria na economia, assim como a medida de retribuição equivalente do crime do Direito. OBS: A PRISÃO FUNCIONA COMO APARELHO JURÍDICO ECONÔMICO QUE COBRA A DÍVIDA DO CRIME EM TEMPO DE LIBERDADE SUPRIMIDA, E COMO APARELHO TÉCNICO DISCIPLINAR, PROGRAMADO PARA REALIZAR A TRANSFORMAÇÃO INDIVIDUAL DO CONDENADO. • Disciplina: método de transformação individual da prisão, definida como política de coerção exercida para dissociar a energia do corpo da vontade pessoal do condenado, com o objetivo de construir indivíduos DÓCEIS E ÚTEIS, que obedecem e produzem. • Recursos do poder disciplinar: vigilância hierárquica, sanção normalizadora e exame. • Obs: a disciplina nasce da administração capitalista do trabalho na fábrica, onde os trabalhadores são submetidos à autoridade dos capitalista (faz referência ao modelo auburniano de penitenciária) Esse entendimento se estende da fábrica para a sociedade (controle social da sociedade civil), com o intuito de formar um novo tipo de homem: a força do trabalho dócil e útil (faz referência a foucault) a disposição do capital no mercadode trabalho. • Obs: a prisão nasce de uma exigência do mercado de trabalho (capitalismo). vigilância hierárquica: técnica de ver produzem efeitos de poder, executada por dispositivos que obrigam pelo olhar; sanção normalizadora: ordem artificial de punições e recompensas disciplinares em que a identidade do modelo, produz sujeitos homogêneos; exame: controle normalizante e ritualizado fundado na vigilância e na sanção, é uma tecnologia de dominação que constitui o indivíduo como objeto de saber e efeitos de relações de poder. O dispositivo disciplinar é o PANÓPTO (PANÓTICO) de Bentham (onde o poder vigilantes se posiciona no meio e os condenados ao redor) era considerado o modelo ideal de prisão. O mesmo era utilizado para controlar coletividades humanas em instituições de custódias, instrução e trabalho. E pq a vigilância representava um elemento tão importante na prisão? Porque a consciência da vigilância gera a desnecessidade objetiva da vigilância, ou seja, vigiar gerava um medo, logo, era desnecessidade o ato de “vigiar”. • Conclusão do conceito de prisão: a disciplina como método e o panótico como dispositivo de poder disciplinar caracterizam a PRISÃO principal instituição auxiliar da fábrica no interior da sociedade política. • IMPORTANTE: segundo o princípio de RUSCHE/KIRCHEIMER que todo sistema de produção tende a descobrir punições que correspondem às suas relações produtivas. O mesmo, descobre a relação mercado de trabalho/prisão na gênese histórica da sociedade capitalista. • IMPORTANTE: Foucault em sua obra VIGIAR E PUNIR mostra a disciplina como mecanismo de poder na produção de sujeitos dóceis e úteis na economia e no controle social. • OBS: depois te todos as contribuições teóricas de todos esses doutrinadores do direito penal, que tentam explicar o conceito de prisão e sua relação dos demais elementos, pode-se concluir a mesma como: uma instituição central de controle social de controle social forma, da sociedade capitalista. Relação cárcere/fábrica (matriz histórica da sociedade capitalista que explica o aparecimento do aparelho carcerário nas primeiras sociedades industriais (Holanda, Inglaterra, Estado Unidos) A prisão, aparelho de privação de liberdade do sistema de controle social, e a fábrica, aparelho de produção econômica da estrutura social, são as instituições básicas das sociedades capitalistas contemporâneas, em relação de dependência recíproca: as relações de produção materiais, fundadas na separação trabalhador/meios de produção, e a disciplina do trabalho na fábrica, organizada com objetivo de lucro, dependem diretamente da prisão, principal instituição de controle social. Em suma: capital (estrutura social) e prisão (controle social) – organização dos fatores de produção – submissão do meio de produção disciplinar. O método punitivo da prisão objetiva transformar o sujeito real (condenado) em sujeito ideal ( trabalhador), adaptado à disciplina do trabalho na fábrica (principal instituição da estrutura social) Punição anterior ao cárcere: suplício, forma de punição que recai sobre os corpos dos punidos, o ato de prisão era meramente processual. Demonstra o poder quem aplica a pena. É importante ressaltar que o suplício não é a mera vingança, pois há rituais a serem obedecidos. Tomar cuidado para não ter noção teleológica, analisando os fatos do passado com a perspectiva presente. Sob o prisma do modelo punitivo inquisitorial é importante ter em mente que, ao ser acusado, o réu perdia a condição de inocência, devendo prová-la. Nesse modelo, em que a pessoa que acusa é a mesma que julga, a confissão era a rainha de todas a provas (sendo essa confissão buscada pelo acusador). A origem da penitenciária IMPORTANTE: para entendermos a origem da penitenciária, devemos nos englobar na relação CAPITAL/TRABALHO ASSALARIADO Durante a queda do regime feudal, houve um processo de urbanização na Europa (séculos XIV ao XVI). Esse êxodo rural, devido a expropriação dos meios de produção dos camponeses, fez aumentar drasticamente a mendicância (massa de desocupados – mendigos, vagabundos, ladrões e outros delinquentes dos centros urbanos) na zona urbana, isso causado pela insuficiente absorção de mão de obra pela manufatura e a inadaptação à disciplina do trabalho assalariado Com isso, houve a transformação do Castelo de Bridewell (Londres) em casa de trabalho forçado (workhouses – uma invenção do século XVI para resolver problemas de exclusão social do capitalismo) de camponeses expropriados, com a finalidade de disciplina para o trabalho assalariado na manufatura, é emblemática da política de controle das massas marginalizadas do mercado de trabalho, sem função na reprodução do capital obrigadas a aceitar empregos por salários miseráveis Rasphuis: casa de trabalho forçado fundada em Amsterdam no século XVII, seria o modelo de aparelho carcerário para a disciplina da força de trabalho ociosa da Europa continental. Esse nome Rasphuis, advém da ação de raspar a madeira para produzir tintura – esse modelo institui o trabalho obrigatório como método pedagógico para construir o homo oeconomicus, com duas exigências: exclusão de penas breves, pela aprendizagem insuficiente; b) exclusão de penas perpétuas, pelo desinteresse de aprender – inaugurando as teorias da prevenção especial, cujo objetivo de correção determina a duração das penas criminais • As instituições carcerárias Caracterizavam-se por duas características: economia de custos e trabalho carcerário 1- Estrutura arquitetônica: panóptico (panótico) o dispositivo ideal disciplinar, constituído de torre central e anel periférico com distribuição de corpos conforme exigências de separação e visibilidade que diminuem a força política e aumentam a força útil dos condenados. 2- A prisão baseia-se no princípio da inegibilidade: isso, para desestimular a prática de novos crimes, onde: o nível de vida na prisão deve estar a baixo do nível de vida da classe trabalhadora mais inferior da população livre. IMPORTANTÍSSIMO: O cárcere funcionará como uma “instituição auxiliar da fábrica. A disciplina como política de coerção do aparelho carcerário para produzir sujeitos dóceis e úteis, na formulação de FOUCAULT, descobre suas determinações materiais na relação capital/trabalho assalariado, porque existe como adestramento da força de trabalho para reproduzir o capital e, portanto, como fenômeno de economia política, na definição de MELOSSI/PAVARINI. Modelo filadelfiano de penitenciária (EUA SÉC.XVIII – PRISÃO WALNUT STREET- 1790) O modelo filadelfiano de instituição penitenciária, foi a alternativa para o trabalho carcerário no período da produção manufatureira: Utilização do panótico de Bentham, como arquitetura disciplinar da instituição penal, combinado com o confinamento em celas individuais para oração e trabalho, como a nova pedagogia da correção. A funcionalidade do panótico transcendeu o sistema prisional e também passou a ser usado em outras instituições de controle como: escolas, hospitais e fábricas. CONFINAMENTO DE DIA E DE NOITE EM CELAS INDIVIDUAIS, TRABALHANDO COM MANUFATURAS! PRINCIPAIS SISTEMAS DE TRABALHO: a) o state-use, com emprego da força de trabalho na produção de manufaturas na prisão, consumidas pela própria administração penitenciária e estatal, com produtividade reduzida em relação ao mercado livre, mas sem oposição de sindicatos ou moralistas – b) o public work, em que a força de trabalho é empregada em obras públicas, na construção de estradas, ferrovias, prisões etc., com eventual oposição de sindicatos pela concorrência no mercado de trabalho livre; c) o public account, em que o sistemacarcerário se converte em empresa pública: o Estado compra a matéria-prima, organiza os processos produtivos e vende os produtos a preçoscompetitivos no mercado, com todas as vantagens do trabalho carcerário – mas os reduzidos custos de produção, determinados por salários inferiores e pela ausência de tributos desestimulam a concorrência externa e geram a oposição de entidades sociais, sindicatos e partidos políticos Mas o modelo de Filadélfia entra em decadência na era da industrialização, pois a sociedade industrial exige uma política de controle baseada no trabalho produtivo do encarcerado, pois o trabalho isolado em celas individuais impede o trabalho coletivo necessário para industrializar a prisão. • Panóptipo: Ficava uma pessoa no meio para vigiar os presos e esses presos trabalhavam com manufaturas; • Posteriormente surgiu um modelo fordista de produção, trabalho a mão, organização da produção; • Faliu e surgiu o modelo auburniano; O modelo auburniano de penitenciária (NEW YORK – 1819) O modelo de Auburn, baseado no isolamento celular durante a noite e no trabalho comum durante o dia, sob o sistema do silêncio (Silent system) para garantir a disciplina do trabalho em comum, introduz a exploração capitalista da força de trabalho encarcerada e organiza o trabalho na prisão igual ao trabalho na fábrica. Organização do trabalho no modelo urburniano de penitenciária 3- Durante o dia: trabalho coletivo em máquinas nas prisões, com a lei de silencia para garantir a ordem do trabalho comum; 4- Durante a noite: confinamento celular 5- Menos correção pessoal e mais trabalho produtivo. Principais sistemas de exploração de trabalho a) contract – considerado o sistema mais adequado – submete a força de trabalho carcerária a duas autoridades: o capitalista organiza a produção, disciplina os processos de trabalho e vende a mercadoria no mercado livre a preços altamente competitivos; o Estado concede a exploração da força de trabalho carcerária e administra a instituição penitenciária, garantindo a segurança e disciplina internas, em troca de lucro sem risco econômico; b) o leasing submete a instituição penitenciária à autoridade exclusiva do capitalista, que dirige a prisão, organiza a produção e garante a disciplina da força de trabalho durante tempo determinado, mediante pagamento de um preço fixo ao Estado, livre de quaisquer custos: os problemas são a redução do preso à condição de escravo, os brutais castigos corporais por questões de disciplina ou de ritmo de trabalho e – last but not least – o criminoso encarcerado representa o não proprietário encarcerado, mostrando o cárcere como instituição coercitiva para transformar o criminoso não proprietário no proletário (cidadão de última classe) não perigoso, aquele sujeito de necessidades reais adaptado à disciplina do trabalho assalariado. Não obstante, a privatização de prisões inspirada no modelo de Auburn igualmente entra em crise: dificuldades de renovação tecnológica dos processos industriais na prisão, oposição crescente de sindicatos e organizações operárias contra a concorrência do trabalho carcerário, exploração predatória da força de trabalho cativo para ampliar a taxa de mais-valia, castigos desumanos por motivos disciplinares ou econômicos etc. impediram a transformação da penitenciária em empresa produtiva. • Como diz PAVARINI, a penitenciária não é uma célula produtiva, mas uma fábrica de homens instituída para transformar condenados em proletários, uma máquina de mutação antropológica de sujeitos reais, agressivos e violentos, em sujeitos ideais, disciplinados e mecânicos. Em outras palavras, o criminoso encarcerado representa o não proprietário encarcerado, mostrando o cárcere como instituição coercitiva para transformar o criminoso não proprietário no proletário não perigoso, aquele sujeito de necessidades reais adaptado à disciplina do trabalho assalariado. VI. Indústria do encarceramento: atualidade e perspectivas A reconstrução histórica do sistema penitenciário e seus modelos de exploração da força de trabalho carcerária mostra algumas coisas importantes: a) o fracasso da penitenciária como célula produtiva no modelo da fábrica: a prisão pode propor-se, segundo a ideologia oficial,como mecanismo de produção de sujeitos ideais, mas não é um aparelho de produção de mercadorias; b) a relação existente entre os modelos de trabalho na prisão e o nível de desenvolvimento dos processos de produção econômica do mercado livre: a manufatura produziu o confinamento solitário do modelo de Filadélfia, representado pelo public account; a indústria engendrou o trabalho em comum do modelo de Auburn, representado pelo contract e pelo leasing. A questão da exploração do trabalho carcerário por empresas privadas parece clara: nenhuma empresa privada é constituída com fins humanitários, mas com objetivos de lucro. A prisão, instituição de controle social, não pode se transformar em empresa, instituição econômica da estrutura social. Mas o desastre histórico da exploração privada do trabalho carcerário não extinguiu projetos empresariais de valorização acelerada do capital, aproveitando a chance de extrair gordas taxas de mais-valia da força de trabalho concentrada nas prisões, repetindo o mesmo discurso utilitário para encobrir o objetivo real de lucro puro e simples. Em suma, o desmonte do estado social produziu o estado penal com sua criminalização da pobreza e o indefectível sistema de full-scale management das prisões, nos EUA e na Inglaterra. E o mais inquietante: a relação cárcere/fábrica de MELOSSI/PAVARINI evoluiu para a simbiose fábrica/cárcere, em que a fábrica é construída sob a forma de cárcere, ou inversamente, o cárcere assume a forma da fábrica, configurando o ideal de exploração capitalista do trabalho humano, que realiza o trágico vaticínio de PAVARINI: os detidos devem ser trabalhadores; os trabalhadores devem ser detidos. VII. A privatização de presídios no Brasil 1. A Lei 7.210/84 (Lei de Execução Penal) define o trabalho do condenado como dever social e condição de dignidade humana (art. 28 e §§, LEP), realizado sob gerência de fundação ou empresa pública e com o objetivo de formação profissional do condenado (art. 34, LEP) – o que parece excluir a privatização do trabalho carcerário, porque se a gerência do trabalho carcerário é exclusividade de fundação ou empresa pública e está condicionado ao objetivo de formação profissional do condenado, então nem empresários privados podem gerenciar o trabalho carcerário, nem a força de trabalho encarcerada pode ser objeto de exploração lucrativa por empresas privadas. Esse regime prevaleceu até dezembro de 2003, quando a Lei 10.792/03 acrescentou o atual § 2º do art. 34 da Lei de Execução Penal, que admite convênios do poder público com a iniciativa privada para implantação de oficinas de trabalho em instituições penais, permitindo a privatização de presídios no Brasil. Atualmente existem 12 penitenciárias privatizadas no Brasil, assim distribuídas: 6 penitenciárias no Paraná, 3 no Ceará, 2 no Amazonas e 1 na Bahia. Logo, sistemas de trabalho carcerário que submetam a força de trabalho encarcerada ao poder disciplinar de qualquer outra autoridade diferente do Estado – por exemplo, empresas privadas de segurança prisional – são ilegais. Além disso, a própria privatização do trabalho carcerário por convênio com empresas privadas parece infringir o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1º, CR), por uma razão elementar: a força de trabalho encarcerada não tem o direito de rescindir o contrato de trabalho, ou seja, não possui a única liberdade realdo trabalhador na relação de emprego e, por isso, a compulsória subordinação de seres humanos encarcerados a empresários privados não representa, apenas, simples dominação do homem pelo homem, mas a própria institucionalização do trabalho escravo na prisão, como a história da ascensão, queda e ressurreição da privatização de presídios demonstra.