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TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO Programa de Pós-Graduação EAD UNIASSELVI-PÓS Autoras: Ana Paula Fischer Hort Juliana Alves Santiago CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090 Reitor: Prof. Hermínio Kloch Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Norberto Siegel Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD: Profa. Bárbara Pricila Franz Profa. Cláudia Regina Pinto Michelli Prof. Ivan Tesck Profa. Kelly Luana Molinari Corrêa Revisão de Conteúdo: Profa. Cláudia Regina Pinto Michelli Revisão Gramatical: Profa. Sandra Pottmeier Diagramação e Capa: Carlinho Odorizzi Copyright © Editora UNIASSELVI 2012 Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri – UNIASSELVI – Indaial 370 H821t Hort, Ana Paula Fischer Transtornos globais do desenvolvimento / Ana Paula Fischer Hort; Juliane Alves Santiago. Indaial : Uniasselvi, 2012. 159 p. : il ISBN 978-85-7830-639-7 1. Transtornos globais. 2. Desenvolvimento. I. Centro Universitário Leonardo da Vinci. Revisado: Janeiro / 2016 Juliana Alves Santiago Ana Paula Fischer Hort Possui graduação em Psicologia pela Universidade Regional de Blumenau (2008). Tem formação em Psicologia Existencialista pelo NUCA (Núcleo Castor - Estudos e Atividades em Existencialismo) - 750 horas (2008) e em autismo pelo Programa Son- Rise na Inspirados dos pelo Autismo, em regime de residência (2010 – 2012). Acompanha crianças e adultos com Autismo, Síndrome de Asperger e Transtorno Global de Desenvolvimento desde 2005 com supervisão e acompanhamento da Inspirados pelo Autismo. Realiza palestras, workshops sobre TGD e consultorias a profissionais, famílias e instituições no Brasil desde 2010. Palestrou no I Encontro Nacional de Autismo, em 2010 em São Paulo. Foi coautora do artigo “Encorajando a Criança a Desenvolver Habilidades Sociais no Programa Son-Rise” para a revista Autismo - 2ª edição, 2011. Possui graduação em Normal Superior pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci (2003). É pós-graduada em Psicopedagogia pelo Instituto Catarinense de Pós- Graduação (2005) e mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Regional de Blumenau (2008). Tem experiência na área de Educação nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental e no Ensino Superior, com ênfase em Educação Inclusiva, Problemas de Aprendizagem e Alfabetização. Publicou os artigos: “Escola regular e escola especial: reinterpretando papéis” e “Prática pedagógica inclusiva: possibilidades e desafios”. Sumário APRESENTAÇÃO ......................................................................7 CAPÍTULO 1 A História do Autismo e suas Diferentes Compreensões .......... 9 CAPÍTULO 2 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações...................................................... 23 CAPÍTULO 3 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento ................................................................ 53 CAPÍTULO 4 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento..................................................... 87 CAPÍTULO 5 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento......................... 131 APRESENTAÇÃO Caro(a) pós-graduando(a): Esta disciplina, intitulada Transtorno do Espectro Autista, a qual apresentamos neste caderno de estudos, tem fundamental importância, principalmente para quem trabalha nas áreas da educação, psicologia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e psicopedagogia. Isso porque é crescente o número de crianças que recebe o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA), aspecto que gera impacto e inúmeras dúvidas a pais e profissionais. Dessa forma, elaboramos este material, que está dividido em cinco capítulos, conforme elucidado a seguir: O primeiro capítulo objetiva desvelar a história da identificação do Transtorno do Espectro Autista e as principais explicações acerca da etiologia desse transtorno. Nesse capítulo, você vai estudar ainda sobre as diferentes perspectivas do Transtorno do Espectro Autista. Sabemos que para planejar ações de intervenção é necessário conhecer o conceito e as características dos possíveis diagnósticos que fazem parte do TEA. Dessa forma, o segundo capítulo nos fornece um amplo panorama a respeito disso e indícios que levam aos diagnósticos relacionados ao Transtorno do Espectro Autista. Para complementar nossos estudos, no terceiro capítulo, buscamos compreender aspectos fundamentais acerca do desenvolvimento social, cognitivo e sensório-motor da pessoa que apresenta o Transtorno do Espectro Autista. No capítulo quatro, apresentamos as diferentes possibilidades de intervenção para o desenvolvimento global das pessoas com TEA e procuramos distinguir e selecionar estratégias que melhor viabilizarão o seu desenvolvimento global, visando aos objetivos pré-estabelecidos. No quinto e último capítulo, lançamos o desafio de ir além. Além de compreender a evolução da Inclusão Escolar e as propostas que fundamentam sua prática pedagógica, propomos que a escola repense suas práticas e sua estrutura para promover a inclusão do aluno com Transtorno do Espectro Autista. Agora, convidamos você a descortinar as muitas facetas do Transtorno do Espectro Autista, por meio das informações contidas em cada página deste caderno que foram selecionadas com muito empenho. As autoras. 8 Transtornos Globais do Desenvolvimento CAPÍTULO 1 A História do Autismo e suas Diferentes Compreensões A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Conhecer a história da identificação do Transtorno do Espectro Autista e as principais explicações acerca da etiologia desse transtorno. 3 Analisar as diferentes perspectivas sobre o Transtorno do Espectro Autista. 10 Transtornos Globais do Desenvolvimento 11 A História do Autismo e suas Diferentes Compreensões Capítulo 1 Contextualização Estimado aluno, é com muito entusiasmo que apresentamos a você o primeiro capítulo deste caderno de estudos! Nele, você conhecerá o Transtorno do Espectro Autista (TEA). Cada vez mais, esse tema desperta o interesse de pais e profissionais que têm contato com o TEA. Dessa forma, nosso objetivo não é esgotar cada um dos temas aqui discutidos, mas informar, de maneira introdutória, sobre os mesmos. Para iniciarmos os estudos, vamos entender o fenótipo proposto para o TEA, que inclui manifestações em três domínios: do social, da comunicação e do comportamento. Além disso, convidamos você a explorar a história da identificação e das principais explicações acerca do Autismo Infantil e do Transtorno Asperger, já que o TEA engloba transtornos antes nomeados dessa maneira. Os Primeiros Estudos sobre o Autismo Você sabe como surgiu o reconhecimento e o interesse pelo Autismo? Como passaram a utilizar essa palavra para definir crianças que demonstram dificuldade em interagir com outras pessoas e em se comunicar? No início do século XX, os psiquiatras, que até então davam mais atenção às “anormalidades e demências” dos adultos, começaram a se interessar pelas particularidades das “demências precoces” encontradas nas crianças. Vários estudos realizados por médicos e pedagogos descreveram isoladamente crianças com sintomas característicos de autismo. Rosenberg (2011) cita os estudos de Willis (1677),Friedreich e Esquirol (1834), Griesinger (1845), Morel (1861), Emminghaus (1887), Moreau de Tours (1888) e Lutz (1925). Apesar da descrição de crianças que se isolavam, não se comunicavam e não apresentavam reciprocidade, foi apenas em 1911 que Bleuer utilizou pela primeira vez a palavra “autismo” para caracterizar crianças com esquizofrenia, que perdiam contato com a realidade e apresentavam grandes dificuldades de comunicação. (GADIA, TUCHMAN, ROTTA, 2004). A palavra “Autismo” deriva da palavra grega “autós”, que significa “de si mesmo”, ou seja, quer dizer: estado caracterizado pela tendência a alhear-se do mundo exterior e ensimesmar-se, estar voltado a si mesmo. 12 Transtornos Globais do Desenvolvimento No entanto, foi a partir dos estudos do Doutor Leo Kanner que a categoria ganhou maior relevância científica. Rosenberg (2011) nos conta que a história oficial do Autismo Infantil inicia com a publicação do artigo “Distúrbios Autísticos do Contato Afetivo”, na revista The Nervous Child, em 1943, em que usou a mesma expressão que Bleuer para descrever onze crianças que tinham em comum a incapacidade de se relacionarem de forma regulare com as pessoas desde o início da vida e por respostas incomuns ao ambiente, que incluíam: • Uma solidão extrema aos estímulos externos. • Uma falha em assumir uma postura antecipatória e de reciprocidade pelo cuidador. • Uma dificuldade em adquirir fala para manter uma conversação. • Aspectos não usuais das habilidades de comunicação da criança, como a inversão dos pronomes e ecolalias. • Excelente memória em bloco. • Obsessões, compulsões e comportamentos repetitivos e autoestimulatórios. • Resistência à mudança ou insistência na monotonia. Apesar do estabelecimento dos critérios para definição do Autismo Infantil, o Transtorno do Espectro Autista é um conceito, ainda nos dias de hoje, de contorno bastante impreciso, tanto nas suas características comportamentais quanto em relação às diferentes concepções de autismo em termos de enfoque teórico, tendo em vista que atualmente não há consenso sobre a etiologia do transtorno. Lampreia (2004) observa que, sem tal esclarecimento, a definição do TGD fica limitada às características comportamentais. No entanto, de acordo com os critérios para diagnóstico determinados pelo DSM V (APA, 2014), os quais nós apresentaremos no Capítulo 2, é possível encontrar diversos quadros clínicos diferentes a partir das combinações de alguns dos critérios para diagnóstico. Dessa forma, pode-se diagnosticar com Transtorno do Espectro Autista crianças que falam e outras que não falam; crianças com pouco ou nenhum tipo de contato social e outras com um tipo bizarro de relacionamento; crianças com deficiência intelectual e outras com um nível de desenvolvimento adequado para sua idade. Sem a etiologia estar de fato elucidada, desde Kanner, muitas são as explicações para tentar esclarecer o Transtorno do Espectro Autista. Kanner concluiu seu artigo dando sua perspectiva em relação à etiologia do transtorno: 13 A História do Autismo e suas Diferentes Compreensões Capítulo 1 Nós devemos, então, assumir que estas crianças vieram ao mundo com uma incapacidade inata para formar o costumeiro contato afetivo com pessoas, biologicamente fornecido, assim como outras crianças vêm ao mundo com déficits inatos físicos ou intelectuais. (KANNER, 1985 apud ROSENBERG, 2011, p. 23). Durante os anos 50 e 60 do século passado, defendeu-se a hipótese da “Mãe Geladeira”, que acreditava que o autismo era causado por pais não emocionalmente responsáveis com seus filhos. No início dos anos 60, “estudiosos começaram a apontar evidências sugerindo que o autismo era um transtorno cerebral presente desde a infância e encontrado em todos os países e grupos socioeconômicos e étnico-raciais investigados”. (KLIN, 2006). Até 1979, o autismo era considerado uma psicose infantil. A partir dos estudos de Michael Rutter, o autismo passou a ser definido como uma síndrome comportamental derivada de um quadro orgânico, caracterizado por um déficit cognitivo específico que afeta a linguagem e processos centrais de codificação, com implicações para o comportamento social. (GOLDBERG, 2005). Em 1978, Rutter propôs [...] uma definição do autismo com base em quatro critérios: 1) atraso e desvio sociais não só como função de retardo mental; 2) problemas de comunicação, novamente, não só em função de retardo mental associado; 3) comportamentos incomuns, tais como movimentos estereotipados e maneirismos; e 4) início antes dos 30 meses de idade. (KLIN, 2006, s.p). Klin (2006) aponta que os pesquisadores vêm buscando compreender o autismo para além dos comportamentos observáveis, por meio da busca de endofenótipos (fenótipos internos constituídos por medidas bioquímicas, neurofisiológicas, neuroanatômicas e neuropsicológicas) que são relacionados aos neurocircuitos e a suas funções. Alguns desses endofenótipos são os modelos da Teoria da Mente, o desempenho de coerência central, a função executiva, entre outros. No capítulo 3, nós explicaremos cada uma dessas habilidades. Em 2010, o neurocientista Alysson Muotri e sua equipe de pesquisadores constataram que o neurônio autista teria o seu núcleo e o número de “espinhas”, que são as ramificações que atuam nas sinapses, com tamanhos menores em comparação aos neurônios do grupo controle, confirmando que o autismo é um transtorno neurológico. Enfim, as primeiras definições do autismo e a origem desse termo se diferem em alguns aspectos das concepções atuais, uma vez que novos estudos permitiram muitos avanços no que se refere à compreensão do 14 Transtornos Globais do Desenvolvimento autismo infantil. No entanto, ainda há muita imprecisão em relação ao TEA, principalmente no que diz respeito à sua etiologia. Apesar das atuais evidências neurofisiológicas, as quais citamos anteriormente, atualmente não há consenso em relação ao déficit primário do autismo, e muitas são as teorias explicativas. A seguir, serão brevemente apresentadas algumas dessas teorias: Teorias Psicanalíticas, Teorias Cognitivistas e Neuropsicológicas e Teorias Afetivas. Essas são, no momento, as Teorias mais referenciadas no Estado da Arte. Atividade de Estudos: 1) Você conheceu a história do Autismo, que tal fazer uma síntese em forma de linha do tempo, indicando a evolução dos conceitos sobre autismo? ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ Algumas Teorias Explicativas: Teorias Psicanalíticas, Teorias Cognitivas e Neuropsicológicas e Teorias Afetivas Na seção anterior, você viu que existem várias teorias que buscam compreender a etiologia do autismo. Abaixo, apresentamos as três principais teorias: Psicanalíticas, Cognitivas e Neuropsicológicas e Afetivas. a) Teorias Psicanalíticas Barros (2011) cita Melanie Klein como a pioneira no reconhecimento e tratamento da psicose em crianças, propondo que a esquizofrenia infantil estaria ligada a falhas importantes e repetidas nas trocas afetivas entre a mãe e o bebê nos primeiros meses de vida. No entanto, segundo a autora, foram 15 A História do Autismo e suas Diferentes Compreensões Capítulo 1 Mahler (1952), Bick (1968), Tustin (1972) e Meltzer (1975) que desenvolveram a compreensão psicanalíticada psicopatogenia dos transtornos do espectro do autismo e seu tratamento. Para esses autores, o autismo seria um subgrupo das psicoses infantis e uma regressão ou fixação a uma fase inicial do desenvolvimento de não diferenciação perceptiva, cujos sintomas que mais se destacariam são as dificuldades em integrar as sensações vindas do mundo exterior e interior e em perceber a mãe como representante do mundo exterior (BARROS, 2011). Goldenberg (2005) explica que, para Mahler, “o autismo é uma reação traumática à experiência de separação materna que envolveria o predomínio de sensações desorganizadas, levando a um colapso depressivo”. O autismo seria, então, uma defesa ao “desmantelamento do ego”, que seria [...] o processo no qual a atenção da criança à função total do objeto estaria suspensa, sendo concentrada em partes do objeto que são mais atrativas para ela em dado momento. Esse desmantelo, no qual o processo de senso de integridade e continuidade é interrompido, leva predomínio de emoções primitivas e muitas vezes dolorosas. (GOLDENBERG, 2005). Barros (2011) esclarece que o autismo se instala depois de dois estágios: fusão patológica entre a mãe e o bebê, seguida de uma ruptura traumática de tal estado. Para se defender da separação materna, o bebê suspende sua vida mental que “leva ao desmantelamento passivo do ego em seus elementos perceptuais, ou seja, o objeto materno passa a ser destituído de unicidade e passa a ser vivido como uma multiplicidade de eventos sensuais separados” (BARROS, 2011, p. 30). O desmantelamento do ego leva a graves prejuízos na aquisição do conceito de espaço interno, tanto no Self quanto no objeto, prejudicando os processos de projeção, introjeção e simbolização. Segundo Barros (2011, p.30): Como consequência, o ego tende a permanecer num estado de fusão primitiva, adesiva, com seu objeto externo, e a experiência de separação, altamente traumática, é vivida pelo bebê como perda de partes de si mesmo, sugadas por um vazio terrorífico e acompanhada por um tipo particular de angústia denominada angústia de aniquilamento. A exacerbação da autossensualidade faz às vezes de uma manobra defensiva, preenchendo, por assim dizer, o vazio deixado pelo desaparecimento do objeto-parte-de-si-mesmo. Barros (2011), em sua explanação, ressalta que as Teorias Psicanalíticas se referem primordialmente à constituição e funcionamento do inconsciente. 16 Transtornos Globais do Desenvolvimento b) Teorias Cognitivas e Neuropsicológicas De acordo com Lampreia (2004), ao longo da década de 1970 e 1980, com o advento dos exames por imagem e dos estudos da anatomia cerebral, pesquisadores constataram fortes evidências em alterações neuroestruturais, funcionais e de conectividade neuronal, deixando, assim, de considerar o autismo como uma condição que envolve basicamente o retraimento social e emocional, passando a conceber como um transtorno de desenvolvimento que envolve déficits cognitivos severos, com origem em alguma forma de disfunção cerebral, como, por exemplo, de atenção, memória, sensibilidade a estímulos e linguagem. Rutter (1976), Frith (1997) e Baron-Cohen (2000) são alguns dos principais autores da perspectiva cognitivista. O primeiro considera o prejuízo da linguagem como um aspecto central do déficit cognitivo associado ao autismo, e os últimos defendem a visão cognitivista da Teoria da Mente, que é a habilidade de imaginar e compreender o estado mental dos outros. Eles argumentam que o mecanismo cognitivo inato responsável pela habilidade da Teoria da Mente estaria prejudicado e, por essa razão, as pessoas com autismo teriam seu comportamento social afetado. (BOSA, 2000) Lampreia (2004) explica que Rutter conclui que a dificuldade em se comunicar que as pessoas com autismo apresentam deve-se a uma falha básica em habilidades de linguagem e não à falta de motivação para falar ou algum retraimento social. Ele cita um estudo em que “vários autistas deixaram de apresentar retraimento social, mas permaneceram sem fala e tinham dificuldades em compreender instruções faladas, embora obedecessem a gestos e demonstrações”. (LAMPREIA, 2004). Ele, então, argumenta que o déficit na compreensão da linguagem em geral e o déficit da fala parecem ser anteriores ao problema social. O prejuízo social consistiria em dificuldades no uso da comunicação verbal e não-verbal, sendo, assim, um problema simbólico. Goldberg (2005) aponta Hermelin e O’connor (1970) como os primeiros autores a estudarem como as crianças com autismo processam a informação sensorial na resolução de testes de habilidades de memória e motoras. Seus testes científicos mostraram que essas crianças apresentam problemas na percepção de ordem e significado e tendência a armazenar a informação visual, utilizando um código visual, enquanto que as crianças com desenvolvimento típico usavam códigos verbais e/ou auditivos. Segundo Bosa (2000), muitos são os autores que buscam demonstrar cientificamente a relação do autismo com as dificuldades relacionadas à Coerência Central e à Função Executiva. Essas habilidades são explicadas no capítulo 3. Frith (1989) foi quem propôs que no autismo existiria uma falha na operação da coerência central, que consiste na habilidade de dar 17 A História do Autismo e suas Diferentes Compreensões Capítulo 1 prioridades à compreensão dos significados. Isso quer dizer que a pessoa com autismo apresentaria uma falha em processar informações que dão sentido ou significado ao contexto. Já Ozonoff, Pennington e Rogers (1991) teriam relacionado o autismo a déficits na função executiva, que consiste na habilidade para resolução de problemas de informação provenientes de diferentes fontes. Lampreia (2004) argumenta que a perspectiva cognitivista considera a capacidade da linguagem, da racionalidade, da intencionalidade, da consciência e dos processos psicológicos básicos como atenção, memória, percepção como uma função cognitiva inata, e que no autismo os déficits nesses processos cognitivos levariam à inabilidade social. Por isso, essa perspectiva adere a uma visão objetivista/racionalista de sujeito – uma visão naturalista. c) Teorias Afetivas Bosa (2000) explica que a teoria afetiva, inicialmente defendida por Kanner e, mais tarde, retomada e estendida por Hobson, sugere que o autismo se origina de uma inabilidade inata básica para interagir emocionalmente com os outros, o que levaria a uma falha em reconhecer estados emocionais (expressão facial, vocal e gestual), perceber e responder à linguagem corporal alheia, de acordo com o contexto social, de inferir emoções a partir dessa linguagem, e há um prejuízo na habilidade para abstrair e simbolizar. Esses déficits impediriam a criança de viver a experiência social intersubjetiva. Lampreia (2004) esclarece que esse processo foi denominado por Trevarthem, em 1979, como “Intersubjetividade Primária”, que seria a capacidade de estabelecer relações afetivas recíprocas, e assim, distinguir pessoas de “coisas” e compreender os estados mentais alheios. Os autores da Teoria Afetiva defendem que o ser humano é essencialmente interpessoal e que a vida humana depende da intersubjetividade, e a criança com autismo não teria a habilidade inata de se engajar pessoa- a-pessoa, as habilidades para a conexão emocional, comunicação não- verbal e responsividade emocional, gerando, por consequência, déficits no desenvolvimento da linguagem e da simbolização (GOLDBERG, 2005). Lampreia (2004) também cita os estudos de Dawson e Lewy (1989) que defendem que os bebês com autismo apresentam um baixo limiar de sensibilidade para estímulos novos e imprevisíveis, tais como os comportamentos humanos, e por consequência, as pessoas ao redor do 18 Transtornos Globaisdo Desenvolvimento bebê se tornariam super-estimuladoras e aversivas para o bebê, provocando resposta de evitação, afetando a formação inicial do apego a pessoas, a expressão das emoções e a coordenação interpessoal da expressão afetiva. Segundo Lampreia (2004), a teoria afetiva de Hobson, Trevarthem e Dawson adota uma perspectiva desenvolvimentista, a qual consiste: [...] em analisar o processo de desenvolvimento típico e procurar identificar as falhas ou desvios que ocorrem no desenvolvimento da criança autista. Elas procuram mostrar como o produto final – a interação social e a comunicação – derivam conjuntamente de um processo de construção a partir de um ponto de partida biológico. Em suas análises, são enfatizadas a sensibilidade/responsividade e expressividade emocionais iniciais e os processos intersubjetivos subsequentes que possibilitam o desenvolvimento da comunicação não-verbal e verbal. No caso do autismo, tendo em vista uma falha biológica inicial, todo o processo de desenvolvimento será desvirtuado. (LAMPREIA, 2004). Lampreia (2004) conclui que a perspectiva desenvolvimentista adere a uma visão construtivista/pragmática e social de sujeito, pois articula as inabilidades inatas da criança com autismo às experiências sociais prejudicadas, considerando, assim, como fator chave para a construção das capacidades específicas dos humanos. Desse modo, o foco estaria no processo de construção e desenvolvimento das habilidades sociais, como contato ocular, prestar atenção aos outros, observar a contingência das ações, imitação, e atenção compartilhada. Ao longo deste capítulo nós apresentamos três diferentes perspectivas sobre a possível etiologia do Transtorno do Espectro Autista. Gostaríamos de salientar que, atualmente, não há consenso na comunidade científica sobre qual dessas teorias está correta. Apenas se sabe que o Transtorno é neurológico. Enfim, teorias que culpabilizam os pais como responsáveis pelo atraso no desenvolvimento de seus filhos diagnosticados com Transtorno do Espectro Autista não se sustentam em recentes estudos científicos. Agora que você já conhece a história do Autismo Infantil, iremos apresentar brevemente a história do Transtorno de Asperger, que também faz parte do Transtorno do Espectro Autista. 19 A História do Autismo e suas Diferentes Compreensões Capítulo 1 Atividade de Estudos: 1) Vamos completar a tabela abaixo com as principais características das Teorias Explicativas expostas neste Capítulo? TEORIAS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS PSICANALÍSTAS COGNITIVAS E NEU- ROPSICOLÓGICAS AFETIVAS Os Primeiros Estudos sobre o Transtorno de Asperger O Transtorno de Asperger (TA) se caracteriza por prejuízos na interação social, bem como, interesses e comportamentos limitados. Ela se difere do autismo pelo fato de não haver um retardo significativo no desenvolvimento da linguagem falada ou na percepção da linguagem, no desenvolvimento cognitivo, nas habilidades de autocuidado e na curiosidade sobre o ambiente. (KLIN, 2006). Klin (2006) nos explica que tal transtorno foi referenciado pela primeira vez em 1944 pelo pediatra austríaco Hans Asperger, após descrever quatro crianças que tinham dificuldade em se integrar socialmente em grupos. Asperger após perceber que essas crianças, apesar de terem as habilidades intelectuais preservadas, apresentavam uma notável pobreza na comunicação não-verbal, empatia pobre, assim como uma tendência a intelectualizar as emoções, denominou a condição por ele descrita como “psicopatia autística”, indicando um transtorno estável de personalidade marcado pelo isolamento social ligada ao sexo masculino. Asperger desconhecia os estudos de Kanner publicado um ano antes. De acordo com Klin (2006), os estudos de Hans Asperger, publicados originalmente em alemão, tornaram-se amplamente conhecidos na comunidade científica apenas em 1981, quando Lona Wing publicou uma série de casos com semelhanças aos de Asperger, diferenciando-se em alguns aspectos. Wing incluiu um pequeno número de meninas e crianças com retardo mental 20 Transtornos Globais do Desenvolvimento leve, bem como de algumas crianças que tinham apresentado alguns atrasos de linguagem nos primeiros anos de vida. Desde então, vários estudos tentaram validar o Transtorno de Asperger como distinto do autismo por não ter retardo mental, no entanto, devido à falta de consenso para os critérios diagnósticos da condição, tal síndrome apenas foi reconhecida oficialmente na publicação da CID-10 e do DSM-IV, em 1995. Em 2014, foi lançado o DSM-V que incluiu no diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista os transtornos antes chamados de Autismo Infantil, Autismo de Kanner, Autismo de Alto Funcionamento, Autismo Atípico, Transtorno Global de Desenvolvimento sem outra Especificação, Transtorno Desintegrativo da Infância e Transtorno de Asperger. Tal mudança foi realizada pautada no argumento que, a partir dos critérios para diagnóstico anteriores, era fácil identificar quando uma pessoa apresentava déficits característicos do Transtorno Global de Desenvolvimento, mas, muitas vezes, difícil de diferenciar entre as subcategorias (APA, 2011). Dessa forma, com o lançamento da quinta edição do DSM e a mudança dos Transtornos Globais de Desenvolvimento para Transtorno do Espectro Autista, o diagnóstico continua a ser a tríade presente desde a tenra infância: déficit em comunicação recíproca verbal e não verbal, déficit em interação social recíproca e a presença de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades, buscando diferenciar pessoas com autismo de baixo, moderado ou alto funcionamento. Algumas Considerações Para concluirmos, lembramos alguns aspectos interessantes deste primeiro capítulo: • Doutor Leo Kanner foi responsável por impulsionar os estudos sobre o autismo. • A história oficial do Autismo Infantil inicia com a publicação do artigo “Distúrbios Autísticos do Contato Afetivo”. • A partir dos estudos de Michael Rutter, o autismo deixou de ser considerado psicose infantil e passou a ser uma síndrome comportamental derivada de um quadro orgânico, caracterizada por um déficit cognitivo específico que afeta a linguagem e processos centrais de codificação, com implicações no comportamento social. 21 A História do Autismo e suas Diferentes Compreensões Capítulo 1 • As teorias explicativas para o autismo elencadas neste caderno são: Psicanalíticas, Cognitivas e Neuropsicológicas e Afetivas. • As teorias psicanalíticas sugerem que o autismo seria um subgrupo das psicoses infantis e uma regressão ou fixação a uma fase inicial do desenvolvimento. • No que se refere às teorias Cognitivas e Neuropsicológicas, o autismo seria uma condição que envolve basicamente o retraimento social e emocional, passando a conceber como um transtorno de desenvolvimento que envolve déficits cognitivos severos com origem em alguma forma de disfunção cerebral. • Para as teorias afetivas, o autismo teria origem em uma inabilidade inata básica para interagir emocionalmente com os outros. • O Transtorno de Asperger foi referenciado pela primeira vez em 1944 pelo pediatra austríaco Hans Asperger. • O TA se difere do autismo pelo fato de não haver um retardo significativo no desenvolvimento da linguagem falada ou na percepção da linguagem, no desenvolvimento cognitivo, nas habilidades de autocuidado e na curiosidade sobre o ambiente. Referências APA. Autism Spectrum Disorder. American Psychiatric Association DSM 5 Development. 2011. Disponível em: <http://www.dsm5.org/ProposedRevisions/ Pages/proposedrevision.aspx?rid=94>. Acesso em: 06 set. 2012. APA. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais- DSM 5. 5 ed.Porto Alegre: Artmed, 2014. BARROS, I. G. Autismo e Psicanálise no Brasil: história e desenvolvimentos. In. SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. BOSA, C. Breve revisão de diferentes abordagens. Psicologia Reflexão e Crítica. Porto Alegre, v. 13, n. 1, 2000. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. 22 Transtornos Globais do Desenvolvimento GADIA, C. A.; TUCHMAN, R.; ROTTA, N. T. Autismo e Doenças Invasivas do Desenvolvimento. Jornal de Pediatria. Porto Alegre, v. 80, n. 2, supl. 0, 2004. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. GOLDENBERG, K. Autismo uma Perspectiva Histórico – Evolutiva. Disponível em: <http://www.sicoda.fw.uri.br/revistas/artigos/1_2_21.pdf> Acesso em: 11 ago. 2012. KLIN, A. Autismo e síndrome de Asperger: uma visão geral. Revista Brasileira de Psiquiatria. São Paulo, v. 28, supl. 1, 2006. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. LAMPREIA, C.. A perspectiva desenvolvimentista para a intervenção precoce no autismo. Estudos de Psicologia. Campinas, v. 24, n. 1, 2007. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. ROSENBERG, R. História do autismo no mundo. In. SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. CAPÍTULO 2 Transtorno do Espectro Autista: Conceitos e Classificações A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Identificar os possíveis indícios que levam ao diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA). 3 Diferenciar as características relacionadas ao Transtorno do Espectro Autista (TEA) a partir dos critérios de diagnóstico. 24 Transtornos Globais do Desenvolvimento 25 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 Contextualização Caro aluno, agora que você já conhece um pouco da história da identificação do Autismo Infantil e do Transtorno de Asperger, que são os principais transtornos pertencentes ao Transtorno do Espectro Autista, convidamos você a conhecer os conceitos e as características que apontam para o diagnóstico do TEA. Os critérios para diagnósticos serão apresentados de maneira introdutória, pois, devido à complexidade do transtorno e à variedade de graus dos sintomas, é muito delicado realizar o diagnóstico e, por isso, o mesmo deve ser realizado por um profissional médico especializado em desenvolvimento infantil, que leve em consideração a história do desenvolvimento neurológico, cognitivo, da linguagem e a história da sociabilização do indivíduo, assim como, a história do contexto familiar e social. Transtorno do Espectro Autista: Conceitos e Classificações O conceito do TEA se refere a um espectro caracterizado por uma variabilidade de apresentações clínicas, que podem variar tanto em sintomas quanto em grau de severidade, no entanto, apresentam em comum o fato de se manifestarem na infância precoce, tipicamente antes dos três anos, e por afetarem o desenvolvimento global (cognitivo, social, emocional, motor e da linguagem) da criança, principalmente no que tange à interação social recíproca. Dessa forma, de acordo com DSM-5 (2014), que é o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais publicado pela Associação Americana de Psiquiatria (APA), o TEA é caracterizado por um desenvolvimento anormal da interação social, da linguagem, (comunicação verbal e não- verbal), e de comportamentos socialmente adequados, caracterizados por atraso no desenvolvimento da imaginação e da flexibilidade (inclui-se aqui repertório de interesses restritos e comportamentos motores repetitivos e de autoestimulação). 26 Transtornos Globais do Desenvolvimento Provavelmente, se você conhece uma pessoa com TEA, saberia listar alguns comportamentos repetitivos ou de autoestimulação. No entanto, quem nunca teve contato com uma pessoa com TEA talvez estivesse se perguntando: O que é isso? Para deixarmos claros esses termos, relembramos que crianças com TEA tendem a se interessar apenas por um tema, muitas vezes considerado bizarro. Esses temas podem ser trens, carros, dinossauros, museus, rodinhas de carros, panfletos, etc. Os comportamentos de autoestimulação seriam aqueles motores, repetitivos e sem função comportamental ou social, isso é, realizar o movimento pelo movimento, como, por exemplo, pular, correr, balançar o corpo e/ou as mãos, agitar ou torcer os dedos, fazer sons sem fins comunicativos, bater palmas, etc. Outro aspecto que vale a pena discutir é a afirmação anterior de que o TEA se manifesta antes dos três anos. Ouvimos pais relatarem que só perceberam que seu filho tinha um comportamento diferente depois que entrou na escola, com cerca de seis anos. Muitas vezes, isso não significa que a criança passou a ter TEA com essa idade. Nesse caso, pode ser que os sintomas eram muito leves e só ficaram evidentes quando, no ambiente escolar, a criança passou a interagir com grupos de crianças e isso solicitou habilidades de interação e de comunicação, às quais a criança não correspondeu de forma típica. Se os pais investigarem, irão perceber que as inabilidades sociais já estavam presentes antes dos três anos. Quando uma criança começa a manifestar sintomas semelhantes ao TEA, como o isolamento social ou a diminuição da comunicação, por exemplo, realmente depois dos três anos de idade, é necessário investigar melhor o contexto em que tais comportamentos se manifestaram e fazer uma investigação fisiológica para identificar os possíveis desencadeadores e, assim, definir a devida intervenção. Por isso, é importante reafirmarmos que as manifestações do TEA ocorrem antes dos três anos, ou seja, na infância precoce (Schwartzman, 2011). A seguir, explicaremos os possíveis critérios para o diagnóstico do TEA que engloba os transtornos antes chamados de Autismo Infantil, Transtorno de Asperger, Transtorno Desintegrativo da Infância e Transtornos Globais do Desenvolvimento Sem Outra Especificação. 27 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 Atividade de Estudos: 1) Se você conhece uma pessoa que tenha o diagnóstico de TEA, descreva-a. Exemplo: nome, idade, sexo, diagnóstico, características físicas, preferências, características de interação, etc. ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ ____________________________________________________ Transtorno do Espectro Autista O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é complexo, caracterizado por sintomas e graus que variam de pessoa para pessoa. É comum escutarmos que pessoas com autismo são aquelas que nunca olham nos olhos, ficam totalmente isoladas em seu próprio mundo, balançando seu corpo e que nunca conseguirão se desenvolver ou se adaptarem socialmente. Isso é um mito! Algumas pessoas com autismo até poderiam se enquadrar nessa sintomatologia grave, mas muitas outras pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista conseguem interagir, comunicar-se e olhar nos olhos, porém, isso ocorre de maneira atípica, tanto em quantidade quanto em qualidade se comparadas com pessoas com desenvolvimentotípico. Desenvolvimento típico e atípico são expressões utilizadas para diferenciar o desenvolvimento neurológico natural do ser humano (típico) do desenvolvimento neurológico diferenciado (atípico). 28 Transtornos Globais do Desenvolvimento Dessa forma, utilizamos o termo “espectro autista” que se refere a uma escala de sequência contínua de sintomas que vai do mais grave ao mais leve, o que nos levará a encontrar pessoas com autismo de baixo, moderado e alto funcionamento. De acordo com Klin (2006, Base Scielo), pessoas com autismo de baixo funcionamento podem: • Ser mudas por completo. • Emitir sons não especificados ou apresentar limitada comunicação verbal e não verbal. • Ser isoladas ou possuir mínimo intervalo de atenção compartilhada. • Focar sua atenção muito mais em objetos ou em seres inanimados. • Apresentar déficit cognitivo. Importante saber: Atenção compartilhada é a capacidade de coordenar a atenção a um objeto com um parceiro social, ou seja, prestar atenção à mesma atividade ou ao tópico que outra pessoa está prestando. Sem a habilidade de atenção compartilhada, o indivíduo não é capaz de sustentar uma conversa ou até se envolver em uma simples brincadeira de cócegas, por exemplo, durante muito tempo. Aprofundaremos esse tema no próximo capítulo. Já em pessoas com autismo de alto funcionamento, observa-se linguagem espontânea e as crianças podem aceitar a interação social passivamente. Até podem se interessar pela interação social, mas não a iniciam ou a mantém de forma típica, tendo dificuldade de regular a interação social após ter iniciado. (KLIN, 2006, Base Scielo). São pessoas que buscam a interação social, convidam os colegas para irem a sua casa, mas brincam por pouco tempo, ficam confusas na interação social. Adiante, explicaremos tais inabilidades sociais de maneira mais aprofundada. Para melhor exemplificar a variação dos sintomas dentro do Espectro Autista, citaremos duas situações, sendo que a primeira se refere ao “autismo de baixo funcionamento” ou “baixas habilidades” e a segunda, ao “autismo de alto funcionamento” ou “altas habilidades”. Carlinhos é um garoto de 5 anos. Fala bastante e é muito agitado. Não consegue ficar parado, pula o tempo todo, bate palmas, grita pela casa. Só consegue ficar focado se estiver em frente ao computador. É fanático por eletrônicos. Conhece todas as marcas, todos os modelos e, apesar de não ser alfabetizado, consegue encontrar os vídeos de seu interesse: vídeos de trens, da Xuxa e de eletrônicos. Assiste repetidas vezes sem cansar, durante horas. A mãe admira essa capacidade e gosta do tempo que ele passa engajado 29 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 nessa atividade, pois é a única maneira de ele ficar parado. Só assim ela consegue fazer outras coisas na casa. Esse também é o único momento em que o filho permite que os pais participem de uma atividade com ele. (SILVA, GAIATO E REVELES, 2012, p. 39 - 40). Jonas sempre foi um garoto exemplar, bom filho, muito estudioso, nunca desobedecia a seus pais, nem falava palavrões. Era aficcionado por videogames e se reunia com os amigos durante toda a infância para jogar. Não raras vezes era o campeão do dia, considerado “o fera” dos jogos. Suas habilidades faziam com que sempre tivesse coleguinhas em sua casa. Sua mãe sempre foi muito receptiva e fazia questão de tratar muito bem a todos. Ela gostava de ver sua casa repleta de crianças, pois assim também sabia com quem o filho andava. Na adolescência, os amigos, passaram a ter outros interesses e já não convidavam mais o amigo para ir ao shopping, ao cinema, ou às baladas para paquerar. Jonas começou a ficar chateado e se sentir excluído do grupo. Tentava se aproximar, mas ganhou o apelido de “nerd” e se sentia completamente deslocado. Certo dia ouviu um dos garotos comentando que não o chamaria para sair, pois ele falava muito alto, não tinha outro assunto exceto videogame e os envergonhava na frente das garotas. (SILVA, GAIATO E REVELES, 2012, p. 64-65). Os exemplos de Carlinhos e Jonas nos permitem compreender que pessoas com autismo apresentam déficits no desenvolvimento da interação social recíproca, da comunicação verbal e não-verbal e de comportamentos sociais adequados para a interação social recíproca. Após a atividade de estudo, aprofundaremos cada um desses critérios para o diagnóstico. Atividade de Estudos: 1) Diferencie: Autismo de baixo funcionamento de Autismo de alto funcionamento: Se tiver exemplos de seu cotidiano, sugerimos que os descreva, abaixo: _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ 30 Transtornos Globais do Desenvolvimento Klin (2006, Base Scielo) esclarece que o espectro autista atinge indivíduos de ambos os sexos e de todas as etnias, classes sociais e origens geográficas. Sua incidência é maior entre o sexo masculino, quatro vezes mais comum em meninos do que em meninas, mas os sintomas tendem a ser mais severos em meninas. Ainda não há consenso sobre o motivo de as mulheres terem uma menor incidência no espectro. Para Klin (2006, Base Scielo), um possível esclarecimento para tal fenômeno seria que os homens possuem [...] um limiar mais baixo para disfunção cerebral do que as mulheres, ou, ao contrário, de que um prejuízo cerebral mais grave poderia ser necessário para causar autismo em uma menina. De acordo com essa hipótese, quando uma pessoa com autismo for uma menina, ela teria maior probabilidade de apresentar prejuízo cognitivo grave. Várias outras hipóteses foram propostas, incluindo a possibilidade de que o autismo seja uma condição genética ligada ao cromossomo X (dessa forma, tornando os homens mais vulneráveis), mas atualmente os dados ainda são limitados para possibilitar quaisquer conclusões. Outra explicação seria de que o espectro do autismo estaria ligado ao hormônio testosterona. De fato, o pesquisador inglês Simon Baron-Cohen levanta a hipótese de que o cérebro autístico seria um cérebro predominantemente masculino, como resultado de uma exposição maior à testosterona, o hormônio masculino, durante a gestação. Estudos genéticos, apesar de muito importantes, ainda engatinham nas elucidações da causa do autismo e é provável que a tese do excesso de testosterona não explique todos os casos de autismo existentes no mundo. Mas tudo indica que isso pode ser um dos fatores nessa colcha de retalhos. (SILVA, GAIATO E REVELES, 2012, p. 55). O “cérebro masculino” se refere à teoria de Baron-Cohen para explicar as diferenças entre homens e mulheres. Para esse estudioso, o cérebro feminino seria mais social e relacionado a sentimentos e emoções, e o cérebro masculino seria mais lógico, concreto e inflexível. Paula, Ribeiro e Teixeira (2011) explicam, em um artigo sobre epidemiologia e Transtorno do Espectro Autista, que a primeira pesquisa sobre a prevalência de TEA e autismo foi realizada 1960, pelo inglês Victor 31 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 Lotner. Desde então, dezenas de estudos já foram concluídos nos Estados Unidos e em países da Europa. Estima-se que, atualmente, existam entre 70 e 90 casos para cada 10.000 habitantes, sendo que pesquisas anteriores a 2004 revelavam números de 10 a 16 casos para cada 10.000 habitantes. De acordo com o órgão americano Center for Disease Control, que é considerado atualmente referênciaem prevalências de TEA, quase 1% da população dos EUA faz parte do Espectro do Autismo. Em 2007, o Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo estimou que poderia ter no Brasil, país com uma população de cerca de 190 milhões de pessoas em 2007, cerca de 1 milhão de casos de autismo. Você deve estar se perguntando: Por que será que a prevalência do TEA aumentou tanto na última década? A seguir, sanaremos essa dúvida. Paula, Ribeiro e Teixeira (2011) esclarecem que o aumento da prevalência deve-se a diversos fatores: • Ampliação dos critérios diagnósticos. • Maior conscientização dos profissionais e da comunidade científica sobre as manifestações do autismo. • Melhor detecção dos casos sem manifestação de deficiência menta. • Melhoria dos serviços de atendimento especializado, gerando maior encorajamento dos pais a buscarem o diagnóstico. • Aumento de estudos epidemiológicos populacionais internacionais sobre autismo, em vez de apenas pesquisas baseadas em estudos de caso, contribuindo para a detecção de mais casos. O primeiro fator citado por Paula, Ribeiro e Teixeira (2011) é a ampliação dos critérios diagnósticos. Vamos conhecê-los? As avaliações diagnósticas mais aceitas são baseadas no CID-10 e no DSM 5, da Associação Americana de Psiquiatria (2014). Abaixo, seguem os critérios para diagnóstico o Transtorno do Espectro Autista encontrados no DSM 5: 32 Transtornos Globais do Desenvolvimento Atividade de Estudos: CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS 299.00 (F84.0) A. Déficits persistentes na comunicação social e na interação social em múltiplos contextos, conforme manifestado pelo que segue, atualmente ou por história prévia (os exemplos são apenas ilustrativos, e não exaustivos; ver o texto): 1. Déficits na reciprocidade socioemocional, variando, por exemplo, de abordagem social anormal e dificuldade para estabelecer uma conversa normal a compartilhamento reduzido de interesses, emoções ou afeto, a dificuldade para iniciar ou responder a interações sociais. 2. Déficits nos comportamentos comunicativos não verbais usados para interação social, variando, por exemplo, de comunicação verbal e não verbal pouco integrada à anormalidade no contato visual e linguagem corporal ou déficits na compreensão e uso gestos, a ausência total de expressões faciais e comunicação não verbal. 3. Déficits para desenvolver, manter e compreender relacionamentos, variando, por exemplo, de dificuldade em ajustar o comportamento para se adequar a contextos sociais diversos a dificuldade em compartilhar brincadeiras imaginativas ou em fazer amigos, a ausência de interesse por pares. Especificar a gravidade atual: A gravidade baseia-se em prejuízos na comunicação social e em padrões de comportamento restritos e repetitivos (ver Tabela 2). B. Padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades, conforme manifestado por pelo menos dois dos seguintes, atualmente ou por história prévia (os exemplos são apenas ilustrativos, e não exaustivos; ver o texto): 1. Movimentos motores, uso de objetos ou fala estereotipados ou repetitivos (p. ex., estereotipias motoras simples, alinhar brinquedos ou girar objetos, ecolalia, frases idiossincráticas). 33 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 2. Insistência nas mesmas coisas, adesão inflexível a rotinas ou padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal (p. ex., sofrimento extremo em relação a pequenas mudanças, dificuldades com transições, padrões rígidos de pensamento, rituais de saudação, necessidade de fazer o mesmo caminho ou ingerir os mesmos alimentos diariamente). 3. Interesses fixos e altamente restritos que são anormais em intensidade ou foco (p. ex., forte apego a ou preocupação com objetos incomuns, interesses excessivamente circunscritos ou perseverativos). 4. Hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais ou interesse incomum por aspectos sensoriais do ambiente (p. ex., indiferença aparente a dor/temperatura, reação contrária a sons ou texturas específicas, cheirar ou tocar objetos de forma excessiva, fascinação visual por luzes ou movimento). Especificar a gravidade atual: A gravidade baseia-se em prejuízos na comunicação social e em padrões restritos ou repetitivos de comportamento (ver Tabela 2). C. Os sintomas devem estar presentes precocemente no período do desenvolvimento (mas podem não se tornar plenamente manifestos até que as demandas sociais excedam as capacidades limitadas ou podem ser mascarados por estratégias aprendidas mais tarde na vida). D. Os sintomas causam prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo no presente. E. Essas perturbações não são mais bem explicadas por deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual) ou por atraso global do desenvolvimento. Deficiência intelectual ou transtorno do espectro autista costumam ser comórbidos; para fazer o diagnóstico da comorbidade de transtorno do espectro autista e deficiência intelectual, a comunicação social deve estar abaixo do esperado para o nível geral do desenvolvimento. Nota: Indivíduos com um diagnóstico do DSM-IV bem estabelecido de transtorno autista, transtorno de Asperger ou transtorno global 34 Transtornos Globais do Desenvolvimento do desenvolvimento sem outra especificação devem receber o diagnóstico de transtorno do espectro autista. Indivíduos com déficits acentuados na comunicação social, cujos sintomas, porém, não atendam, de outra forma, critérios de transtorno do espectro autista, devem ser avaliados em relação a transtorno da comunicação social (pragmática). Especificar se: Com ou sem comprometimento intelectual concomitante Com ou sem comprometimento da linguagem concomitante Associado a alguma condição médica ou genética conhecida ou a fator ambiental (Nota para codificação: Usar código adicional para identificar a condição médica ou genética associada.) Associado a outro transtorno do neurodesenvolvimento, mental ou comportamental (Nota para codificação: Usar código[s] adicional[is] para identificar o[s] transtorno[s] do neurodesenvolvimento, mental ou comportamental associado[s].) Com catatonia (consultar os critérios para definição de catatonia associados a outro transtorno mental, p. 119-120) (Nota para codificação: usar o código adicional 293.89 [F06.1] de catatonia associada a transtorno do espectro autista para indicar a presença de catatonia comórbida.) Fonte: APA (2014, p. 50-51). 35 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 Abaixo segue a tabela do DSM 5 que se refere aos níveis de gravidade dentro do Espectro Autista: Tabela 1 – Níveis de gravidade dentro do Espectro Autista Nível de gravidade Comunicação social Comportamentos restritos e repetitivos Nível 3 “Exigindo apoio muito substancial” Déficits graves nas habilidades de comu- nicação social verbal e não verbal causam prejuízos graves de funcionamento, grande limitação em dar início a interações sociais e resposta mínima a aberturas sociais que partem de outros. Por exemplo, uma pessoa com fala inteligível de poucas palavras que raramente inicia as interações e, quando o faz, tem abordagens incomuns apenas para satisfazer a necessidades e reage somente a abordagens sociais muito diretas. Inflexibilidade de comportamento, extrema dificuldade em lidar com a mudança ou outros comportamentos restritos/repetitivos interferem acentu- adamente no funcionamento em todas as esferas. Grande sofrimento/dificul-dade para mu- dar o foco ou as ações. Nível 2 “Exigindo apoio substancial” Déficits graves nas habilidades de comuni- cação social verbal e não verbal; prejuízos sociais aparentes mesmo na presença de apoio; limitação em dar início a interações sociais e resposta reduzida ou anormal a aberturas sociais que partem de outros. Por exemplo, uma pessoa que fala frases simples, cuja interação se limita a interes- ses especiais reduzidos e que apresenta comunicação não verbal acentuadamente estranha. Inflexibilidade do comportamento, dificuldade de lidar com a mudança ou outros comportamentos restritos/ repetitivos aparecem com frequência suficiente para serem óbvios ao obser- vador casual e interferem no funciona- mento em uma variedade de contextos. Sofrimento e/ou dificuldade de mudar o foco ou as ações. Nível 1 “Exigindo apoio” Na ausência de apoio, déficits na comuni- cação social causam prejuízos notáveis. Dificuldade para iniciar interações sociais e exemplos claros de respostas atípicas ou sem sucesso a aberturas sociais dos outros. Pode parecer apresentar interesse reduzido por interações sociais. Por exem- plo, uma pessoa que consegue falar frases completas e envolver-se na comunicação, embora apresente falhas na conversação com os outros e cujas tentativas de fazer amizades são estranhas e comumente mal sucedidas. Inflexibilidade de comportamento causa interferência significativa no funcio- namento em um ou mais contextos. Dificuldade em trocar de atividade. Problemas para organização e planeja- mento são obstáculos à independência. Fonte: APA (2014, p. 52). 36 Transtornos Globais do Desenvolvimento É importante conhecer os critérios para o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista para que você aprofunde seus conhecimentos acerca dos aspectos relacionados ao autismo, mas isso não significa que você, profissional da educação ou da saúde, poderá realizar diagnóstico ou escrever um laudo sobre isso. Esse conhecimento faz-se importante para a identificação precoce de possível atraso no desenvolvimento infantil e encaminhamento ao profissional especializado, como o neuropediatra, por exemplo, possibilitando, assim, a intervenção precoce. Lampreia (2007, Base Scielo) conceitua o autismo como inabilidade inata para “a responsividade emocional que permite o engajamento pessoa a pessoa, as habilidades para a conexão emocional e a comunicação não verbal.” Essa inabilidade, segundo Lampreia (2007, Base Scielo) “acarretaria um prejuízo no desenvolvimento da linguagem e, consequentemente, no cognitivo”. Isso significa que, pessoas com autismo não prestam tanta atenção aos estímulos sociais como as pessoas neurotípicas. O termo “neurotípico” se refere ao desenvolvimento neurológico considerado típico. Pessoa com TEA apresentam o desenvolvimento neurológico atípico, conforme explicado no Capítulo I. Em suma: Pessoas com TEA não são “anormais”, mas sim “diferentes”. Podemos citar, como exemplo de estímulo social, um adulto chamando uma criança com autismo pelo nome ou olhando para os olhos dela. Essas são habilidades sociais consideradas básicas e que crianças de desenvolvimento típico aprendem nos primeiros meses de vida. As crianças que têm um atraso na aprendizagem da habilidade de orientação social apresentam dificuldade no processamento de estímulos sociais e, apresentam então, atraso no desenvolvimento de habilidades, como atenção compartilhada e o compartilhar experiências emocionais com os outros. Esses são passos cruciais durante os primeiros anos do desenvolvimento da criança e formam a base para todo o aprendizado social e boa parte do aprendizado cognitivo. O desenvolvimento anormal da interação social é a viga mestre para a realização do diagnóstico em autismo e o sintoma mais fácil de causar falsas interpretações. Quando a interação social está prejudicada, a pessoa apresenta dificuldade em se relacionar com os outros, em compartilhar sentimentos, gostos e emoções; incapacidade na discriminação entre diferentes pessoas; resistência às mudanças ou insistência à monotonia; e falta de antecipação postural e de contato ocular. (KLIN, 2006, Base Scielo). 37 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 Para ilustrar a dificuldade de interação social presente em crianças com autismo, expomos o exemplo de Silva, Gaiato e Reveles (2012, p. 24): A mãe de Pedro, dona de uma loja de sapatos, gostava muito de levá-lo para o trabalho no período da tarde. Suas clientes conheciam bem o garoto e, a todo momento, levavam para ele doces e balas. D. Maria começou a perceber que seu filho ficava muito feliz com as visitas, pois sempre que elas chegavam, Pedro corria para recebê-las. A pergunta era sempre a mesma: “O que você trouxe para mim hoje, tia?”. Ele pegava as guloseimas e saía correndo. Gostava de brincar no estoque da loja, que ficava embaixo de uma escada, e sua maior diversão era empilhar caixas. Algumas mães, também lojistas da região, levavam seus filhos para a loja. Pedro olhava pela fresta da porta e, quanto mais crianças apareciam na frente da loja, mais parecia se esconder atrás das caixas. O contato que Pedro tinha com as clientes da loja era melhor do que com as próprias crianças, fato que sua mãe não conseguia entender. A brincadeira de empilhar parecia muito mais divertida, pois ele passava tardes inteiras entretido nessa arte. Depois da pilha feita, Pedro as desmontava e tornava a empilhar. Atividade de Estudos: 1) A partir do exemplo de Pedro, reescreva as partes que demonstram características do autismo e nomeie as características: ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ ________________________________________________ Dentro do Espectro vamos encontrar pessoas que não apresentam atraso significativo no desenvolvimento da linguagem falada ou na percepção da linguagem, no desenvolvimento cognitivo, nas habilidades de atividade de vida diária (utilizar o vaso sanitário, vestir-se sozinho, comer utilizando talheres, etc.) e na curiosidade sobre o ambiente. No entanto, podem apresentar interesses intensos e, muitas vezes considerados bizarros, que ocupam grande parte do foco da atenção, bem como a tendência a falar em monólogo, prejudicando a interação e comunicação social recíproca. 38 Transtornos Globais do Desenvolvimento Atwood (2010) explica que, diferente do autismo de baixo ou moderado funcionamento, indivíduos com o autismo de alto funcionamento buscam atividades solitárias, mas não são inibidos na presença dos demais, apesar de abordarem o outro de forma excêntrica, pelo fato de muitas vezes: Estabelecerem uma conversação em monólogo, ou seja, apenas ele fala e, quando outro fala, muitas vezes, a pessoa com o TA não presta atenção no que o outro diz, não dando continuidade ao diálogo, a não ser que o outro diga algo que seja de muito interesse para a pessoa com TA. • Apresentarem pouco ou muito contato ocular. • Falarem muito alto e rápido. • Exibirem padrões de entonação, velocidade e fluência da fala pouco relacionados com o contexto da conversa. • Exibirem linguagem prolixa, muitas vezes em tom pedante sobre um tópico favorito, muitas vezes incomum. • Apresentarem dificuldade em compreender os sentimentos e intenções alheias emitidas por comunicação não-verbal, como a expressão facial, gestos e tom da voz, porexemplo. • Atraso na maturidade e raciocínio social. • Demonstrarem apego às regras formais do comportamento e às rígidas convenções sociais. • Dificuldades em iniciar ou manter as amizades. • Necessidade de ajuda com algumas capacidades de autoajuda e de organização. • Desajeitamento no andar e na coordenação motora fina ou ampla. • Sensibilidade a específicos sons, aromas, texturas ou experiências táteis. A seguir, apresentamos o exemplo de Douglas, menino com Transtorno do Espectro Autista: Douglas tem 9 anos e é um garoto muito inteligente. Adora dinossauros e sabe tudo sobre eles. Sua família admira tanto sua profundidade de conhecimento, que não se cansa de ouvi-lo falar sobre TyrannosaurusRex, cotidianamente. Todos ali brincam do jeito dele, entendem o que ele fala, aceitam suas falas repetitivas e o enchem de carinho. Sua mãe até adivinha o que ele quer. Porém, na escola não é assim. Os colegas têm dificuldade em fazer o mesmo que a família do Douglas faz. São mais exigentes, não querem brincar apenas com dinossauros e isso prejudica a interação entre eles. (SILVA, GAIATO E REVELES, 2012, p. 28). 39 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 As descrições feitas na citação abaixo são exemplos de comportamentos de pessoas com TEA: O garoto que não conseguia jogar futebol, mas decorava todas as regras, conhecia os jogadores e até conversava sobre os times; o jovem que preferia ser fotógrafo das festinhas familiares, somente como desculpa para não interagir com os demais; e outros que adotaram hobbies únicos e extremamente solitários, como o videogame, computador ou pescaria. [...] Alguns mais habilidosos, na tentativa de estabelecer relacionamentos, chegam a oferecer seus serviços, mas acabam sendo usados pelas pessoas, sem conseguir aprofundar os laços de amizade. (SILVA, GAIATO E REVELES, 2012, p. 23). Segundo Silva, Gaiato e Reveles (2012, p. 20), “interpretar os sinais sociais e as intenções dos outros impede que as pessoas com autismo percebam corretamente algumas situações no ambiente em que vivem”. Explicam, ainda, que essa dificuldade prejudica a compreensão da intenção das perguntas e ações alheias e das intenções do interlocutor, como, por exemplo, se está entediado ou não com a conversa. Por isso, acabam não deixando as pessoas participarem da conversa, não percebendo as consequências dos seus atos em falar sempre sobre o mesmo tema. Essa habilidade é chamada de Teoria da Mente, que será explicada de forma mais profunda no Capítulo III. Por conta dessa dificuldade, muitas pessoas com TEA se isolam, evitando, assim, uma situação desconfortável. Dessa forma, pessoas com autismo de alto funcionamento, por não apresentarem dificuldades cognitivas e inabilidades sociais severas, podem ter amigos, namorar, ter uma profissão e serem independentes. Por isso, faz-se necessário aguçar e valorizar os talentos dessas pessoas e identificar suas dificuldades sociais, para que possam exercer todo o seu potencial com qualidade de vida. Além da dificuldade na interação social recíproca, pessoas que estão no espectro apresentam déficit na comunicação social. Segundo Lampreia (2004, Base Scielo), cerca de 50% das crianças com autismo não fazem uso da fala e aquelas que falam apresentam irregularidades que envolvem dificuldades na comunicação não verbal, como falta ou uso precário de gestos, mímica e do apontar; problemas simbólicos, pragmáticos e pré-linguísticos na fala; falhas na compreensão da mesma; e ausência de expressão facial ou expressão facial incompreensível para os outros. Essas dificuldades na comunicação acontecem em graus variados, podendo-se encontrar tanto uma criança com linguagem verbal, porém repetitiva e não comunicativa, quanto com dificuldades na comunicação por qualquer outra via. 40 Transtornos Globais do Desenvolvimento Klin (2006, Base Scielo) também observa que Os padrões usuais de aquisição da linguagem (brincar com os sons e balbuciar) podem estar ausentes ou ser raros. Bebês e crianças jovens com autismo podem guiar a mão dos pais para obterem um objeto desejado, sem fazer contato visual (como se ela estivesse obtendo o objeto pela mão e não pela pessoa). Além das alterações no desenvolvimento da comunicação verbal e não verbal, a pessoa com autismo aparenta não fazer uma avaliação da mudança de perspectivas dos interlocutores no diálogo, não percebendo a necessidade da mudança do pronome, levando à inversão pronominal. Isso quer dizer que essas crianças podem falar na terceira pessoa em vez de utilizar “eu”. Por exemplo, quando uma pessoa com autismo quer comunicar que está com fome, em vez de dizer “Eu quero comer”, falaria “Maria quer comer” ou “Você quer comer”. Isso ocorre porque essas pessoas “[...] ouviram desde bebês seus pais dizerem frases assim, quando se referiam a elas na hora da comida. Por serem recompensadas com o alimento, aprenderam que, para conseguir qualquer coisa, basta utilizar expressões parecidas”. (SILVA, GAIATO E REVELES, 2012, p. 35). Outras formas que deixam as pessoas com autismo confusas são o humor e o sarcasmo. [...] na medida em que a pessoa com autismo pode não conseguir apreciar a intenção de comunicação do falante, resultando em uma interpretação completamente literal da declaração. Em geral, a entonação de voz é apagada ou monótona e os demais aspectos comunicativos da voz (e.g., ênfase, altura, volume, e ritmo ou expressões) são idiossincráticos e pobremente modulados. (KLIN, 2006, Base Scielo). Isso significa que pessoas com autismo não conseguem compreender expressões do tipo: “Vá num pé e volte no outro” ou “Chover no molhado” e até mesmo piadas, pois compreendem as expressões literalmente. Assim como também falam sem alterar a expressão facial, timbre e ritmo e volume da voz. Falam “como se fossem um robozinho programado. [...] Elas têm dificuldade de colocar emoções no seu discurso”. (SILVA, GAIATO E REVELES, 2012, p. 35). Abaixo segue um exemplo: Carlos aprendeu a falar de maneira estereotipada. Logo pela manhã, todos os dias, repetia a mesma frase “bom dia, dormiu bem? Hoje esta um lindo dia!”, sempre de forma idêntica, independente se estivesse chuva ou sol. Quando não queria algo, dizia “Oh! Essa não!” com voz infantilizada, como nos desenhos, sem a devida ênfase à expressão. (SILVA, GAIATO E REVELES, 2012, p. 35). 41 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 Algumas pessoas com autismo podem apresentar ecolalia imediata ou tardia, ou seja, repetem o que acabaram de ouvir ou frases antigas gravadas em sua memória. A respeito dos desvios do uso da imaginação e da flexibilidade, podemos caracterizá-los por rigidez e inflexibilidade do pensamento, linguagem e comportamento do sujeito. Tais desvios podem ser percebidos por uma forma de brincar desprovida de criatividade e pela exploração singular de objetos e brinquedos, como passar muitas horas seguidas explorando a textura de um brinquedo, ou, naqueles sujeitos de alto funcionamento, a fixação em determinados assuntos e rotinas. (Klin, 2006, Base Scielo). Vamos ler o exemplo de Rodrigo: Rodrigo fazia tudo de acordo com o relógio. Se a consulta estivesse marcada para às nove horas e o médico atrasasse, ele começava a chutar a porta do consultório. Todos os dias tirava os sapatos na hora do almoço, independente do lugar que se encontrava. Deitava-se pontualmente às 22 horas e, caso estivesse fora de casa nesse horário, começava a chorar ou gritar. Nunca perdia nenhum episódio de Chaves, por isso também precisava estar em casa na hora do programa, o que praticamente inviabilizava as viagens da família. (SILVA, GAIATO E REVELES, 2012, p. 43).Klin (2006, Base Scielo), em seu artigo, também explica que no autismo pode haver a presença de habilidades preservadas ou altamente desenvolvidas em certas áreas que contrastam com os déficits gerais de funcionamento da criança. Não é incomum, por exemplo, que as crianças com autismo tenham grande facilidade de decifrar letras e números, às vezes precocemente (hiperlexia), mesmo que a compreensão do que leem esteja muito prejudicada. Talvez 10% dos indivíduos com autismo exibam uma forma de habilidades “savant” – desempenho alto, às vezes prodigioso em uma habilidade específica na presença de retardo mental leve ou moderado. Esse fascinante fenômeno relaciona-se a um âmbito reduzido de capacidades – memorização de listas ou de informações triviais, cálculos de calendários, habilidades visuo-espaciais, tais como desenho ou habilidades musicais envolvendo tonalidade musical perfeita ou tocar uma peça musical após tê-la ouvido somente uma vez. É interessante que indivíduos autistas representam uma maioria desproporcional entre todas as pessoas “savant”. (KLIN, 2006, Base Scielo) Isso nos faz refletir que as pessoas com autismo não apresentam apenas dificuldades, mas também possuem talentos, qualidades como todos. Silva, Gaiato e Reveles (2012) explicam que a obsessão por determinados assuntos 42 Transtornos Globais do Desenvolvimento Klin (2006) conclui seu artigo argumentando que a avaliação da criança com autismo deve incluir pesquisa genética e deve excluir a Síndrome do Cromossomo X Frágil, e exame para excluir prejuízo auditivo, convulsões e esclerose tuberosa, Transtorno de Rett, testes para identificar déficits ou anormalidades motoras e sensoriais evidentes ou sutis. ou atividades, a atenção voltada a detalhes e o hiperfoco levam algumas dessas pessoas com autismo a serem excelentes em determinados quesitos. Isso porque o funcionamento cerebral autístico propicia um hiperfuncionamento em áreas específicas do cérebro, em detrimento a outras. O cérebro típico funciona como um conjunto de sistemas integrados, já no cérebro atípico a integração desses sistemas não é completa, levando algumas áreas do cérebro a funcionar sem a interferência de outras, gerando extraordinários talentos e habilidades. Nesse sentido, salientamos algo extremamente importante: o sujeito sempre deve ser considerado como um todo e o autismo é uma de suas características, pois, de acordo com Vygotski (1997, p. 104), “É importante conhecer não só o defeito que tem afetado a criança, mas que criança tem tal defeito”. Klin (2006, Base Scielo) chama a atenção para outra característica típica do autismo que é tanto a hiper quanto a hipossensibilidade aos estímulos sensoriais tácteis, visuais, auditivos, vestibulares, proprioceptivos, olfativos e degustativos. Não é raro você perceber pessoas com autismo que tapam os ouvidos ao ouvir um caminhão ou moto ou barulho de um aspirador de pó ou liquidificador, ou parecerem ausentes quando se deparam a ruídos fortes ou pessoas que a chamam. Em contrapartida essas pessoas podem ficar fascinadas por música ou pelo fraco tique-taque de um relógio de pulso. “Podemos notar que algumas pessoas com autismo ficam estressadas diante de luzes brilhantes, ainda que algumas pessoas sejam fascinadas pela estimulação luminosa.” (KLIN, 2006, Base Scielo). Muitas pessoas apresentam grande sensibilidade ao toque, reações fortes a tecidos específicos ou ao toque social/afetuoso, embora haja muitas pessoas que sejam insensíveis à dor. Você pode encontrar pessoas com autismo fascinadas “por objetos que giram, ou partes de brinquedos que podem girar, enquanto algumas têm prazer com sensações vestibulares, como rodopiar, realizando essa ação sem, aparentemente, ficarem tontas.” (KLIN, 2006, Base Scielo). Além dos distúrbios de processamento sensorial que explicaremos melhor no Capítulo III, Klin (2006, Base Scielo) aponta a presença dos distúrbios do sono e alimentares. Esse último pode “[...] envolver aversão a certos alimentos, devido à textura, cor ou odor, ou insistência em comer somente uma pequena seleção de alimentos e recusa de provar alimentos novos.”. Klin (2006) chama a atenção para o cuidado com crianças que colocam objetos na boca e que podem, devido à tinta, contaminá-las com chumbo. Klin (2006) conclui seu artigo argumentando que a avaliação da criança com autismo deve incluir pesquisa genética e deve excluir a Síndrome do Cromossomo X Frágil, e exame para excluir prejuízo auditivo, convulsões e 43 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 esclerose tuberosa, Transtorno de Rett, testes para identificar déficits ou anormalidades motoras e sensoriais evidentes ou sutis. O DSM 5 explica com detalhes as características referentes aos critérios de diagnóstico. Achamos interessante incluir esse texto no caderno para complementar seus estudos. CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO As características essenciais do transtorno do espectro autista são prejuízo persistente na comunicação social recíproca e na interação social (Critério A) e padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades (Critério B). Esses sintomas estão presentes desde o início da infância e limitam ou prejudicam o funcionamento diário (Critérios C e D). O estágio em que o prejuízo funcional fica evidente irá variar de acordo com características do indivíduo e seu ambiente. Características diagnósticas nucleares estão evidentes no período do desenvolvimento, mas intervenções, compensações e apoio atual podem mascarar as dificuldades, pelo menos em alguns contextos. Manifestações do transtorno também variam muito dependendo da gravidade da condição autista, do nível de desenvolvimento e da idade cronológica; daí o uso do termo espectro. O transtorno do espectro autista engloba transtornos antes chamados de autismo infantil precoce, autismo infantil, autismo de Kanner, autismo de alto funcionamento, autismo atípico, transtorno global do desenvolvimento sem outra especificação, transtorno desintegrativo da infância e transtorno de Asperger. Os prejuízos na comunicação e na interação social especificados no Critério A são pervasivos e sustentados. Os diagnósticos são mais válidos e confiáveis quando baseados em múltiplas fontes de informação, incluindo observações do clínico, história do cuidador e, quando possível, autorrelato. Déficits verbais e não verbais na comunicação social têm manifestações variadas, dependendo da idade, do nível intelectual e da capacidade linguística do indivíduo, bem como de outros fatores, como história de tratamento e apoio atual. Muitos indivíduos têm déficits de linguagem, as quais variam de ausência total da fala, passando por atrasos na linguagem, compreensão reduzida da fala, fala em eco até linguagem explicitamente literal ou afetada. Mesmo quando habilidades linguísticas formais (p. ex., vocabulário, gramática) 44 Transtornos Globais do Desenvolvimento estão intactas, o uso da linguagem para comunicação social recíproca está prejudicado no transtorno do espectro autista. Déficits na reciprocidade socioemocional (i.e., capacidade de envolvimento com outros e compartilhamento de ideias e sentimentos) estão claramente evidentes em crianças pequenas com o transtorno, que podem apresentar pequena ou nenhuma capacidade de iniciar interações sociais e de compartilhar emoções, além de imitação reduzida ou ausente do comportamento de outros. Havendo linguagem, costuma ser unilateral, sem reciprocidade social, usada mais para solicitar ou rotular do que para comentar, compartilhar sentimentos ou conversar. Nos adultos sem deficiência intelectual ou atrasos de linguagem, os déficits na reciprocidadesocioemocional podem aparecer mais em dificuldades de processamento e resposta a pistas sociais complexas (por exemplo, quando e como entrar em uma conversa, o que não dizer). Adultos que desenvolveram estratégias compensatórias para alguns desafios sociais ainda enfrentam dificuldades em situações novas ou sem apoio, sofrendo com o esforço e a ansiedade para, de forma consciente, calcular o que é socialmente intuitivo para a maioria dos indivíduos. Déficits em comportamentos de comunicação não verbal usados para interações sociais são expressos por uso reduzido, ausente ou atípico de contato visual (relativo a normas culturais), gestos, expressões faciais, orientação corporal ou entonação da fala. Um aspecto precoce do 54 Transtornos do Neurodesenvolvimento transtorno do espectro autista é a atenção compartilhada prejudicada, conforme manifestado por falta do gesto de apontar, mostrar ou trazer objetos para compartilhar o interesse com outros ou dificuldade para seguir o gesto de apontar ou o olhar indicador de outras pessoas. Os indivíduos podem aprender alguns poucos gestos funcionais, mas seu repertório é menor do que o de outros e costumam fracassar no uso de gestos expressivos com espontaneidade na comunicação. Entre adultos com linguagem fluente, a dificuldade para coordenar a comunicação não verbal com a fala pode passar a impressão de “linguagem corporal” estranha, rígida ou exagerada durante as interações. O prejuízo pode ser relativamente sutil em áreas individuais (por exemplo, alguém pode ter contato visual relativamente bom ao falar), mas perceptível na integração insatisfatória entre contato visual, gestos, postura corporal, prosódia e expressão facial para a comunicação social. 45 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 Déficits para desenvolver, manter e compreender as relações devem ser julgados em relação aos padrões relativos a idade, gênero e cultura. Pode haver interesse social ausente, reduzido ou atípico, manifestado por rejeição de outros, passividade ou abordagens inadequadas que pareçam agressivas ou disruptivas. Essas dificuldades são particularmente evidentes em crianças pequenas, em quem costuma existir uma falta de jogo social e imaginação compartilhados (por exemplo, brincar de fingir de forma flexível e adequada à idade) e, posteriormente, insistência em brincar seguindo regras muito fixas. Indivíduos mais velhos podem relutar para entender qual o comportamento considerado apropriado em uma situação e não em outra (por exemplo, comportamento casual durante uma entrevista de emprego) ou as diversas formas de uso da linguagem para a comunicação (por exemplo, ironia, mentirinhas). Pode existir aparente preferência por atividades solitárias ou por interações com pessoas muito mais jovens ou mais velhas. Com frequência, há desejo de estabelecer amizades sem uma ideia completa ou realista do que isso significa (por exemplo, amizades unilaterais ou baseadas unicamente em interesses especiais compartilhados). Também é importante considerar o relacionamento com irmãos, colegas de trabalho e cuidadores (em termos de reciprocidade). O transtorno do espectro autista também é definido por padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades (conforme especificado no Critério B) que mostram uma gama de manifestações de acordo com a idade e a capacidade, intervenções e apoios atuais. Comportamentos estereotipados ou repetitivos incluem estereotipias motoras simples (por exemplo, abanar as mãos, estalar os dedos), uso repetitivo de objetos (por exemplo, girar moedas, enfileirar objetos) e fala repetitiva (por exemplo, ecolalia, repetição atrasada ou imediata de palavras ouvidas, uso de “tu” ao referir-se a si mesmo, uso estereotipado de palavras, frases ou padrões de prosódia). Adesão excessiva a rotinas e padrões restritos de comportamento podem ser manifestados por resistência a mudanças (por exemplo, sofrimento relativo a mudanças aparentemente pequenas, como embalagem de um alimento favorito; insistência em aderir a regras; rigidez de pensamento) ou por padrões ritualizados de comportamento verbal ou não verbal (por exemplo, perguntas repetitivas, percorrer um perímetro). Interesses altamente limitados e fixos, no transtorno do espectro autista, tendem a ser anormais em intensidade ou foco (por exemplo, criança pequena muito apegada a uma panela; criança preocupada com aspiradores de pó; adulto que gasta horas 46 Transtornos Globais do Desenvolvimento escrevendo tabelas com horário). Alguns encantamentos e rotinas podem estar relacionados a uma aparente hiper ou hiporreatividade a estímulos sensoriais, manifestada por meio de respostas extremadas a sons e texturas específicos, cheirar ou tocar objetos de forma excessiva, encantamento por luzes ou objetos giratórios e, algumas vezes, aparente indiferença a dor, calor ou frio. Reações extremas ou rituais envolvendo gosto, cheiro, textura ou aparência da comida ou excesso de restrições alimentares são comuns, podendo constituir a forma de apresentação do transtorno do espectro autista. Muitos adultos com transtorno do espectro autista sem deficiência intelectual ou linguística aprendem a suprimir comportamentos repetitivos em público. Interesses especiais podem constituir fonte de prazer e motivação, propiciando vias de educação e emprego mais tarde na vida. Os critérios diagnósticos podem ser satisfeitos quando padrões limitados e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades estiverem claramente presentes na infância ou em algum momento do passado mesmo que os sintomas não estejam mais presentes. O Critério D exige que as características devam ocasionar prejuízo clinicamente significativo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo no presente. O Critério E especifica que os déficits de comunicação social, ainda que algumas vezes acompanhados por deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual), não estão Transtorno do Espectro Autista alinhados com o nível de desenvolvimento individual e que os prejuízos excedem as dificuldades esperadas com base no nível do desenvolvimento. Instrumentos padronizados de diagnóstico do comportamento, com boas propriedades psicométricas, incluindo entrevistas com cuidadores, questionários e medidas de observação clínica, estão disponíveis e podem aumentar a confiabilidade do diagnóstico ao longo do tempo e entre clínicos. Fonte: APA (2014, 53-55). 47 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 Sugerimos que você assista aos filmes listados a seguir. Elucidamos que todas as sinopses foram encontradas na Base Scielo: www.interfilmes.com: Rain Man Direção: Barry Levinson Gênero: Comédia dramática País/ano: EUA/1988 Duração: 133 minutos Sinopse: Um jovem yuppie (Tom Cruise) fica sabendo que seu pai faleceu. Eles nunca se deram bem e não se viam há vários anos, mas ele vai ao enterro e, quando vai cuidar do testamento, fica sabendo que herdou um Buick 1949 e as roseiras premiadas do seu pai, sendo que um “beneficiário” tinha herdado três milhões de dólares. Fica curioso em saber quem herdou aquela fortuna e descobre que foi seu irmão (Dustin Hoffman), cuja existência ele desconhecia. O irmão dele é autista, mas pode calcular problemas matemáticos complicados com grande velocidade e precisão. O yuppie sequestra seu irmão autista da instituição onde ele está internado, pois planeja levá-lo para Los Angeles e exigir metade do dinheiro, nem que para isso tenha que ir aos tribunais. É durante uma viagem cheia de pequenos imprevistos que os dois se compreenderão mutuamente e entenderão o significadode serem irmãos. Meu Filho Meu Mundo Direção: Glen Jordan Gênero: Drama País/ano: EUA/1979 Duração: 120 minutos Sinopse: Quando nasceu, Raun era um saudável e feliz bebê. Com o passar dos meses, seus pais começam a observar que há alguma coisa estranha com ele, sempre um ar ausente. Um dia vem a confirmação do que suspeitavam: Raun era autista. Decidem então penetrar no mundo da criança, acreditando que somente o milagre do amor poderá salvá-lo. Temple Grandin Direção: Mick Jackson Gênero: Biografia/Drama País/ano: EUA/2008 Duração: 103 minutos Sinopse: Cinebiografia da jovem autista Temple Grandin (Claire Danes) 48 Transtornos Globais do Desenvolvimento que tinha sua maneira particular de ver o mundo, distanciou-se dos humanos, mas chegou a conseguir, entre outras conquistas, defender seu doutorado. Com uma percepção de vida totalmente diferenciada, dedicou-se aos animais e revolucionou os métodos de manejo do gado com técnicas que surpreenderam experientes criadores e ajudaram a indústria da pecuária americana. Sugerimos que você leia o artigo “Temple Grandin e o autismo: uma análise do filme” escrito por Carlo Schmidt, em junho de 2012. Você poderá encontrar o artigo no link:http://www.scielo.br/scielo. php?pid=S1413-65382012000200002&script=sci_arttext Loucos de Amor Direção: Petter Naess Gênero: Comédia País/ano: EUA/2005 Duração: 94 minutos Sinopse: Comédia romântica inspirada na vida de duas pessoas com a Síndrome de Asperger, uma forma de autismo, cujas disfunções emocionais ameaçam sabotar seu recém-iniciado romance. Donald é um cara legal, porém um motorista de táxi sem sorte que ama os pássaros e tem uma habilidade fora do comum com os números. Como muitos portadores da síndrome, ele gosta de padrões e rotinas, mas quando a bela, mas complicada Isabelle se junta ao seu grupo de ajuda aos autistas, sua vida - e seu coração - ficam de cabeça para baixo. Adam Direção: Max Mayer Gênero: Comédia/Drama País/ano: EUA/2009 Duração: 99 minutos Sinopse: Adam (Hugh Dancy) é um jovem meigo e simpático, mas com dificuldade de se relacionar com as pessoas. Ele vive em um mundo solitário até que conhece sua mais nova vizinha a Beth (Rose Byrne), uma linda moça simpática e muito atenciosa. Ela tenta mostrar o mundo real para Adam, o relacionamento dos dois ilustra o que muitos dizem: os opostos se atraem. 49 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 Meu Nome é Kahn Direção: Karan Johar Gênero: Drama/Romance País/ano: Índia/2010 Duração: 165 minutos Sinopse: Rizwan Khan (Tanav Chheda), uma criança mulçumana que tem a síndrome de Asperger cresceu com a sua mãe (Zarina Wahab) na seção Borivali de Bobaim. Quando adulto (Shahrukn Khan), Rizwan muda-se para São Francisco onde vive com os seus irmãos. Ele apaixona-se por Mandira (Kajol) com quem mais tarde se casa. Após o 11 de Setembro, Rizwan então começa uma longa jornada através dos Estados Unidos para conseguir Mandira de volta. Na sua jornada, ele inspira otimismo e alegria no coração das pessoas que encontra pela disseminação de mensagem por onde quer que passe. Algumas Considerações Conhecer os possíveis indícios que levam ao diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista é de suma importância para que profissionais de várias áreas compreendam o desenvolvimento dessas pessoas e tracem uma meta de intervenção que seja efetiva para cada caso. Nesse sentido, este capítulo é importante para que você consiga diferenciar as características relacionadas aos TEAs. Abaixo elencamos itens relevantes deste Capítulo II: • O TEA é caracterizado por um desenvolvimento anormal da interação social recíproca, da linguagem e pelo atraso no desenvolvimento da imaginação e flexibilidade. • Os sintomas do TEA ocorrem na infância precoce. • O TEA se subdivide em diversos graus de gravidade. Há pessoas com severas dificuldades em interação social e linguagem, assim como pessoas com dificuldades sutis para desenvolver, manter e compreender relacionamentos, fazer amigos. • Pessoas com Autismo podem se desenvolver muito quando a intervenção é feita de forma adequada. Para finalizar, lembramos que após o diagnóstico realizado pelo profissional adequado, o laudo terá importância no encaminhamento da intervenção, mas o sujeito está além do laudo, ou seja, devemos olhar sempre e em primeiro lugar para o sujeito e depois para suas características. 50 Transtornos Globais do Desenvolvimento Referências APA. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM 5. 5 ed. Porto Alegre: Artes Médicas, 2014. ASSUMPÇÃO, F.; KUCZYNSKI, E. Diagnóstico diferencial psiquiátrico no Autismo Infantil. In. SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. ARAÚJO, C.A. Psicologia e os Transtornos do Espectro do Autismo. In. SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. ATWOOD, T. Tudo sobre Síndrome de Asperger. Lisboa: Verbo, 2010. ETCOR. Generalidades do Sistema Nervoso. Disponível em: <http://etcor3. blogspot.com.br/2012/03/sistema-nervoso.html>. Acesso em: 20 set. 2012. KLIN, A. Autismo e síndrome de Asperger: uma visão geral. Revista Brasileira de Psiquiatria. São Paulo, v. 28, supl. 1, 2006. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. LAMPREIA, C.. A perspectiva desenvolvimentista para a intervenção precoce no autismo. Estudos de Psicologia. Campinas, v. 24, n. 1, 2007. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. MERCADANTE, M. T.; GAAG, R. J.V.; SCHWARTZMAN, J. S. Transtornos invasivos do desenvolvimento não-autísticos: síndrome de Rett, transtorno desintegrativo da infância e transtornos invasivos do desenvolvimento sem outra especificação. Revista Brasileira de Psiquiatria. São Paulo: v. 28, suppl.1, 2006. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. PAULA, C. S.; RIBEIRO, S. H.B.; TEIXEIRA, M. C.T. V. Epidemiologia e Transtornos Globais do DesenvolvimentoIn. SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. PICSED. Top Images. Disponível em: < http://picsed.com/keyword/ nucleo+caudado>. Acesso em: 12 set. 2012. SCHWARTZMAN, S. Transtornos do Espectro do Autismo. In. SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. 51 Transtornos Globais do Desenvolvimento: Conceitos e Classificações Capítulo 2 SILVA, A.B.B.; GAIATO, M.B.; REVELES, L.T. Mundo Singular: entenda o autismo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012. VYGOTSKI, L. S. Obras escogidas V: fundamentos de defectología. Madrid: Visor Distribuiciones, 1997. 52 Transtornos Globais do Desenvolvimento CAPÍTULO 3 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Compreender aspectos fundamentais acerca do desenvolvimento social, cognitivo e sensório-motor da pessoa que apresenta o Transtorno Global de Desenvolvimento. 3 Avaliar aspectos fundamentais do desenvolvimento social, cognitivo e sensório- motor da pessoa diagnosticada com Transtorno Global de Desenvolvimento. 54 Transtornos Globais do Desenvolvimento 55 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 Geralmente entre 3 e 5 meses de idade, o bebê busca orientar sua atenção aos estímulos sociais, como o seu cuidador, por exemplo, que é quem lhe dará, entre outras coisas, o alimento. Contextualização Como vimos no Capítulo 2, o qual nos permitiu um aprofundamento acerca das característicasrelacionadas aos Transtornos Globais do Desenvolvimento, saber diferenciar os tipos de Transtornos pertencentes ao Espectro Autista é fundamental para que possamos direcionar nosso olhar e conduzir um trabalho efetivo com a pessoa com TGD. Neste capítulo, convidamos você a ir além do diagnóstico, ou seja, conhecer os aspectos do desenvolvimento social que na pessoa com TGD estão prejudicados e conseguir compreender como cada um deles interfere em seu desenvolvimento. Para tanto, apresentamos a você, na ordem mencionada, os aspectos das seguintes funções: Atenção Compartilhada, Imitação, Teoria da Mente, Função Executiva e Impulso da Coerência Central e Processamento Sensorial. O que significam essas funções? Como afetam a vida da pessoa com TGD? A seguir, essas e outras dúvidas serão levantadas e discutidas. Atenção Compartilhada Ao observar o desenvolvimento típico de uma criança desde o seu nascimento, você perceberá que desde cedo, geralmente entre 3 e 5 meses de idade, o bebê busca orientar sua atenção aos estímulos sociais, como o seu cuidador, por exemplo, que é quem lhe dará, entre outras coisas, o alimento. Tal orientação social se caracteriza, inicialmente, pelo direcionamento do seu corpinho e do seu rosto na direção do seu cuidador quando chama o bebê pelo nome ou se aproxima do bebê conversando de forma animada. Com o passar dos meses você observará que a partir da orientação social ocorre o desenvolvimento da atenção compartilhada, que é a habilidade necessária para o estabelecimento da interação social e das conexões sociais. Sem a habilidade da atenção compartilhada a criança não consegue com sucesso interagir de maneira típica e se sociabilizar. A interação social é caracterizada pela ação social recíproca compartilhada entre duas ou mais pessoas, de tal modo que a ação de uma pessoa influencia na ação e no comportamento das demais pessoas participantes da interação. Uma interação social implica em um ou mais ciclos de ações e reações, tal como demonstrada na figura abaixo. 56 Transtornos Globais do Desenvolvimento Figura 4 - Interação Social Fonte: Apostila workshop em Autismo - Nível 1 - Inspirados pelo Autismo – 2012. Diferente da interação social, a ação social implica na iniciativa social de uma pessoa sem receber em reciprocidade a resposta de outra pessoa ao estímulo oferecido. Figura 5 - Ação Social Fonte: Apostila workshop em Autismo - Nível 1 - Inspirados pelo Autismo – 2012. 57 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 Atividade de Estudos: 1) Observe as figuras e escreva quais figuras representam interação social e quais representam ações sociais. 58 Transtornos Globais do Desenvolvimento A habilidade de atenção compartilhada diz respeito à habilidade de dirigir a atenção ao outro com o objetivo de compartilhar interesses. Agora que você já sabe diferenciar a interação social da simples ação social, você vai aprender o que é a atenção compartilhada. De acordo com Araújo (2011, p. 181) “a atenção compartilhada é a capacidade para coordenar atenção a um parceiro social e a um objeto ou a um evento do interesse mútuo.” Ou seja, é a habilidade de prestar atenção a mesma atividade ou ao mesmo tópico que outra pessoa está prestando, dividindo a atenção ora para o objeto ou evento compartilhado, ora para o sujeito com quem se está interagindo. Araújo (2011) explica que esta habilidade deve estar adquirida entre 9 e 14 meses de idade e pode ser constatada pelos seguintes comportamentos: • Mostrar e compartilhar objetos com os outros; • Apontar para os objetos com o objetivo de compartilhar o interesse; • Seguir o olhar do outro, ou seja, olhar na mesma direção para onde o outro está olhando; • Alternar o olhar entre um objeto ou evento e a face do parceiro, com o objetivo de compartilhar a informação; • Observar a face do outro, não focando sua atenção apenas ao objeto ou evento partilhado; • Reconhecer a face humana e reagir de maneira congruente às emoções percebidas no outro; • Em reciprocidade, apresentar a imitação de gestos e expressão facial, como o sorriso, por exemplo; • Olhar para o outro quando terminar de executar uma tarefa. No desenvolvimento típico, observa-se todos os comportamentos citados acima. Como você pode perceber, a habilidade de atenção compartilhada diz respeito à habilidade de dirigir a atenção ao outro com o objetivo de compartilhar interesses. A atenção compartilhada se diferencia da simples orientação social que seria a habilidade de se dirigir ao outro para ter uma necessidade atendida, por exemplo. Para exemplificar a habilidade de orientação social, podemos citar uma criança de 5 anos que se aproxima de um adulto para pedir que lhe alcance o carrinho de brinquedo que ela não consegue pegar sozinha. Assim, que a criança consegue o carrinho (seu interesse), ela foca sua atenção ao objeto, sem continuar a interagir. Outro exemplo, seria esta mesma criança pedir uma informação e, assim que ela obtém a resposta que deseja, se afasta, não dando continuidade à conversa. Seguindo os exemplos 59 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 citados acima, a habilidade de atenção compartilhada poderia ser a criança compartilhar seu foco de atenção com o outro após ter seu objeto alcançado, conversando sobre o carrinho fazendo comentários, perguntas e respostas, ou brincando de carrinho com a outra pessoa. Em pessoas que apresentam TGD, desde muito cedo, por volta dos 18 meses, já se percebe o atraso no desenvolvimento da atenção compartilhada caracterizada por falhas no desenvolvimento do jogo intencional, do contato visual e da comunicação verbal e não-verbal (ARAÚJO, 2011). Jogo intencional seria a habilidade de brincar com objetos de maneira funcional, com a intenção de interagir. Muitas vezes a criança utiliza nos jogos intencionais a imitação como grande recurso para brincar e interagir. Bosa (2002) chama a atenção para a ideia equivocada de que pessoas com TGD nunca apresentam atenção compartilhada ou reciprocidade ao outro, não sendo comunicativas ou interativas, evitando persistentemente a interação social. Sabe-se que pessoas com TGD engajam-se e respondem a interações sociais, demonstram carinho e afeto, participam de brincadeiras, emitem vocalizações na direção do outro ou conversam com o outro, quando a fala está desenvolvida. No entanto, quando comparadas a pessoas com desenvolvimento típico, a duração e a qualidade da atenção compartilhada esperada para sua idade cronológica apresentam déficits. Para ilustrar possíveis déficits em atenção compartilhada presentes em crianças com TGD, expomos o seguinte exemplo fictício: João de 3 anos adora empilhar blocos. Sua mãe, percebendo seu interesse, busca interagir com João mostrando que podem fazer carrinho com blocos e com este carrinho levar os bichos para passear, fazendo onomatopeias, como: “brum-brum”, por exemplo. João aceita que sua mãe brinque ao seu lado e utilize os seus blocos, às vezes, observa por cerca de 1 minuto o que a mãe faz, e até sorri quando o seu bicho preferido, o macaco, passeia no carro. No entanto, logo seu foco de interesse volta a ser empilhar os blocos sem demonstrar qualquer comportamento de querer mostrar para sua mãe o que está fazendo com os blocos. 60 Transtornos Globais do Desenvolvimento A habilidade de atenção compartilhada é fundamental para o desenvolvimento da criança, principalmente para o desenvolvimento da capacidade simbólica e da linguagem. Atividade de Estudos: 1) Como você imagina que a mesma criança citada acima, mas com desenvolvimento neurotípico,demonstraria sua habilidade de atenção compartilha ao brincar com a sua mãe? _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ A habilidade de atenção compartilhada é fundamental para o desenvolvimento da criança, principalmente para o desenvolvimento da capacidade simbólica e da linguagem. É através das trocas que a criança estabelece com o outro em atividades conjuntas que ela passará a desenvolver a interpretação compartilhada do mundo que a cerca. Durante atividades conjuntas, as crianças começam a notar que outras pessoas têm reações diferentes das dela frente às mesmas situações, o que equivale a dizer que elas descobrem que as pessoas conferem diferentes “significados” aos objetos/eventos que as circundam. Em outras palavras, a criança passa a perceber que ela pode atribuir mais do que uma representação a uma entidade e cada vez mais passa a trocar com o parceiro tais descobertas, utilizando- se de diferentes canais de comunicação (BOSA, 2002, Base Scielo). Cole & Cole (2004) explicam que uma das principais formas que a criança obtém estas trocas sociais é na brincadeira social. Ao brincar a criança aprende, se desenvolve e treina novas competências sociais, cognitivas e motoras. A seguir você conhecerá os tipos de brincadeiras que você encontrará no desenvolvimento típico de uma criança: 61 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 • Brincadeira paralela: Este tipo de brincadeira ocorre entre os bebês e crianças até 2 anos de idade que brincam um ao lado do outro ou de costas um para o outro, prestando pouca ou nenhuma atenção a quem está ao seu lado, ficando muito mais interessado no que ele mesmo faz. As crianças gostam de estar juntas e, às vezes, de observar o que os outros fazem. Nesta fase, as crianças tendem a participar de jogos físicos e sensoriais, caracterizados pela repetição de movimentos e exercícios em busca do puro prazer sensorial, ou seja, pela simples exploração do corpo, através dos sentidos. Por exemplo: correr, pular, saltar, estourar bolha de sabão, sacudir chocalhos, apertar brinquedos musicais. • Brincadeira associativa: Este é um tipo de brincadeira desestruturada, sem regras pré-definidas, em que duas crianças interagem e usam os mesmos brinquedos. Ocorre entre os 2 e 3 anos de idade. Nesta fase, a criança passa a interagir em brincadeiras físicas que envolvem objetos, como boliche, encaixar blocos, jogar bola, puxar carrinho pela cordinha, por exemplo. • Brincadeira cooperativa: Quando a criança chega aos 3 anos, a criança começa a brincar de modo cooperativo. Isso envolve participar de atividades com regras, alternar a vez, e participar de jogos competitivos, e jogos de “faz de conta”. Também se observa a presença do jogo simbólico. A criança começa a dar vida aos bonecos, muitas vezes representado em brincadeiras simbólicas o seu cotidiano. Nesta fase, a criança passa a ser capaz de fazer de conta que um bloco pode ser um cavalo, por exemplo. Crianças com TGD apresentam atraso no desenvolvimento do brincar. Alterações significativas no brincar já podem ser observadas no primeiro ano de vida e tendem a perdurar ao longo da vida. A primeira fase do desenvolvimento normal do brincar, que envolve comportamento manipulatório e explorativo com objetivos, está caracterizada na criança com autismo, por um grande número de aspectos não usuais. Essa criança tende a restringir a atividade exploratória a limitar a manipulação a poucos objetos, o que prejudica o desenvolvimento posterior do brincar (ARAÚJO, 2011, p. 182). Além da manipulação de limitados objetos e da maior frequência da brincadeira paralela, observa-se que crianças com TGD em atividades simbólicas podem apresentar menos atividade espontânea, repetindo roteiros pré-estabelecidos. Ou seja, elas repetem roteiros conhecidos de livros, de filmes ou de brincadeiras já realizadas em vez de criar seus próprios roteiros. Em suma, visando à avaliação da criança com TGD, faz-se necessário observar em quais atividades a criança apresenta atenção compartilhada 62 Transtornos Globais do Desenvolvimento Pessoas com TGD podem apresentar grandes prejuízos na habilidade de imitação imediata dos movimentos faciais e de gestos e na imitação tardia de ações sobre os objetos. E importante que se verifique em que contextos a criança apresenta ou não tais habilidades, na relação com que pessoas, e com que frequência, para tomar cuidado em não rotular crianças tímidas ou mais reservadas como “autista” ou “Asperger”. e que comportamentos (contato visual, expressão facial, gestos, e fala) ela apresenta na interação social para demonstrar tal habilidade, e quais comportamentos ela deveria apresentar de acordo com o desenvolvimento típico esperado para sua idade cronológica. No entanto, é importante que se verifique em que contextos a criança apresenta ou não tais habilidades, na relação com que pessoas, e com que frequência, para tomar cuidado em não rotular crianças tímidas ou mais reservadas como “autista” ou “Asperger”. Gostaríamos de lembrar que para uma pessoa ser diagnosticada com autismo ela precisa apresentar antes dos 3 anos de idade um conjunto de déficits no desenvolvimento da interação social, comunicação verbal e não-verbal e na flexibilidade e imaginação, e quem está habilitado para fazer diagnósticos é o profissional especializado neurologista ou psiquiatra especializado em TGD. Passamos então, para o próximo item, que abordará sobre a imitação, uma habilidade fundamental para o desenvolvimento social e cognitivo. A Imitação A partir do desenvolvimento da orientação social e da atenção compartilhada, outras habilidades sociais e cognitivas se desenvolvem nas crianças neurotípicas. Uma destas habilidades é a imitação. Esta é uma das principais habilidades que possibilitam o aprendizado social e cognitivo, e se manifesta desde muito cedo. Aos 12 meses, observa-se que as crianças neurotípicas copiam os comportamentos dos outros, como o gesto de dar tchau, de apontar e mandar beijo, por exemplo. Pessoas com TGD podem apresentar grandes prejuízos na habilidade de imitação imediata dos movimentos faciais e de gestos e na imitação tardia de ações sobre os objetos. A ausência do comportamento de imitação pode ser um importante indício para a presença do autismo infantil (ARAÚJO, 2011). De acordo com Araújo (2011), alterações no processo da imitação motora estariam interligadas às alterações na atividade dos neurônios-espelho. Estes neurônios, que desempenham uma função crucial para o comportamento humano, são ativados quando percebemos uma ação de outra pessoa. A simples percepção das ações realizadas por outra pessoa ativa as mesmas áreas cerebrais estimuladas em quem está executando a ação que é observada. Isto quer dizer, que nossa percepção inicia uma série de simulação ou duplicação interna dos atos dos outros. Estes neurônios, então, possibilitam que a imitação não dependa da memória. Isto possibilita que nós imitemos algo que nunca percebemos antes. 63 Aspectos Relacionados aosTranstornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 A função social da imitação é crucial para a criança neurotípica executar o que deseja. Se alguém faz um movimento corporal complexo que nunca realizamos antes, os nossos neurônios-espelho identificam no nosso sistema corporal os mecanismos proprioceptivos e musculares correspondentes e tendemos a imitar, inconscientemente, aquilo que observamos, ouvimos ou percebemos de alguma forma (LAMEIRA; GAWRYSZEWSKI; PEREIRA JR, 2006, BASE SCIELO). Segundo Araújo (2011) neurônios-espelhos são necessários para o processo da imitação, mas não são suficientes. O processo de imitação é bastante complexo e depende de uma série de habilidades sociais e cognitivas, os quais várias áreas cerebrais são responsáveis para sua execução. A imitação social pode estar relacionada a outras habilidades sociais como, por exemplo, a atenção compartilhada, a Teoria da Mente, a Função Executiva, Impulso da Coerência Central e o Processamento Sensorial que serão explicados ao longo deste capítulo. Além disso, Araújo (2011) cita a pesquisa de Nielsen e Carpenter (2008) que afirma que a imitação seletiva da criança neurotípica se baseia em uma série de fatores, tais como: a) as metas e as intenções do outro que serve de modelo; b) os indícios comunicativos do modelo; c) a contingência do comportamento do modelo para a criança; e d) a aparente racionalidade do comportamento do modelo. Assim concluem os autores, a capacidade da imitação das crianças é multifacetada e altamente flexível, sendo dependente de múltiplos contextos tendo múltiplos propósitos e sendo determinadas por uma série de varáveis pessoais, inter- relacionais e situacionais (ARAÚJO, 2011, p. 183). Em vista disso, o comportamento da imitação está interligado ao contexto social, a intenção de quem imita e quem é o modelo social. Desta forma, a função social da imitação é crucial para a criança neurotípica executar o que deseja. Isto não seria diferente para as pessoas com autismo. A elucidação para a falta de função para a imitação social é melhor explicada por déficits em outras habilidades sociais, como já citamos: atenção compartilhada, a Teoria da Mente, a Função Executiva, Impulso da Coerência Central e o Processamento Sensorial. Agora, então, você aprenderá sobre a Teoria da Mente. 64 Transtornos Globais do Desenvolvimento Esta habilidade possibilita que consigamos fazer uma “leitura” da expressão facial, dos comportamentos, das atitudes das pessoas, e da prosódia e aspectos pragmáticos do discurso e, assim, fazer uma hipótese do que possivelmente as pessoas pensam, desejam e sentem e, por consequência, prever o que o outro fará e até mesmo, compreender por que o outro fez o que fez. Atividade de Estudos: 1) Vamos recapitular esta seção? Sugiro que você escreva com suas palavras, mas baseado no que acabou de ler nesta seção sobre a Imitação, o que pode acontecer na vida de uma pessoa com TGD que tem a habilidade de imitar prejudicada. _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ Neurociência: A Teoria da Mente A Teoria da Mente (ToM) é o nome que se dá à habilidade social de inferir estados intencionais as outras pessoas e a si mesmo com a finalidade de compreender e predizer os comportamentos alheios, permitindo o processamento rápido das informações provenientes do ambiente social. Esta habilidade possibilita que consigamos fazer uma “leitura” da expressão facial, dos comportamentos, das atitudes das pessoas, e da prosódia e aspectos pragmáticos do discurso e, assim, fazer uma hipótese do que possivelmente as pessoas pensam, desejam e sentem e, por consequência, prever o que o outro fará e até mesmo, compreender por que o outro fez o que fez. Isto quer dizer, que estados intencionais seriam as crenças e intenções das pessoas. 65 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 Prosódia está relacionada às variações de tom, entonação, ritmo e intensidade da pronúncia das palavras. De acordo com a prosódia, nós conseguimos perceber quando uma pessoa está sendo sarcástica, literal, e até mesmo brava, triste ou piadista. Já os aspectos pragmáticos têm relação com contexto da conversação. De acordo com o lugar e com quem estivermos conversando, os nossos comentários, perguntas e respostas, e a modo e o tom de falar serão diferenciados. Nós não falamos com uma autoridade do mesmo modo que falamos com um amigo em uma conversa informal. Assim, intencionais são todos os estados mentais com conteúdo e, não apenas o estado particular de ter a intenção e agir. Correspondem a estados intencionais com conteúdo: acreditar em algo, esperar algo, desejar algo... e são diferentes de outros estados intencionais que nãos e relacionam a algo, tais como estar com dor, estar deprimido, estar em alerta...”(ARAÚJO, 2011, p. 185). Este conceito não se refere de fato a fazer uma “teoria”, mas sim, a apreender a intenção alheia de maneira automática, rápida e espontânea. Bosa (2000) explica que este processo de inferir estados mentais ocorre de maneira tão automática, quanto o processo de decodificação dos estímulos sensoriais. Quando observamos o que ocorre a nossa volta, nós, não fazemos uma “Teoria Visual do Mundo”, mas sim, de maneira automática, fazemos uma “versão” da situação e planejamos e executamos uma resposta adaptativa às circunstâncias. Sabe-se que há controvérsias em torno desta teoria. Alguns estudiosos, tais como Fodor (1983), Frith (1985), Leslie (1987) e Baron Cohen (1990), consideram a habilidade para fazer a Teoria da Mente uma capacidade inata ao ser humano e que seu déficit deve-se a questões neurológicas e cognitivas. Já outros estudiosos, como Bruner (1990), Johnson (1990), e Hobson (1991), pressupõem que esta habilidade é adquirida e desenvolvida através das experiências interpessoais mediadas pelo outro, ou seja, afirmam que a ToM está relacionada à habilidade de construir através da linguagem o argumento ao outro, e o sentido e o significado dos comportamentos, atitudes e intenções alheias através da interação social recíproca, e não necessariamente por uma disfunção ou um déficit (JOU; SPERB, 1999, BASE SCIELO). Deste modo, para os estudiosos inatistas, a ToM pode ser aprendida 66 Transtornos Globais do Desenvolvimento É importante reconhecer que a pessoa com Síndrome de Asperger tem capacidades de ToM, ou empatia, imaturas ou com déficits e não ausência de empatia. através de treino, dramatizações, histórias sociais e análise de imagens e filmes. Já para os estudiosos sociointeracionistas o atraso no desenvolvimento da ToM seria uma consequência do atraso do desenvolvimento da orientação social, da atenção compartilhada, e da linguagem, e por isso, aToM pode ser desenvolvida pela interação social recíproca através da mediação de outra pessoa na “leitura” adequada das situações que a criança vivencia no dia a dia. A seguir você vai saber como o atraso no desenvolvimento da ToM pode estar relacionada com alguns comportamentos das pessoas diagnosticadas com TGD. No desenvolvimento típico, crianças com 4 anos já conseguem atribuir estados mentais aos outros. No entanto, pessoas com TGD apresentam comprometimento na aquisição da Teoria da Mente, causando prejuízo no desenvolvimento de papéis sociais e na representação simbólica. Por isso, as pessoas com TGD tendem a insistir de maneira inflexível a rotinas, apresentando menos tolerância às mudanças, de modo a buscar mais controle e previsibilidade ao que ocorre ao seu redor. Esta inabilidade é melhor percebida em pessoas com Síndrome de Asperger ou Autismo de Alto Funcionamento. Ao longo do desenvolvimento, com a aquisição de maiores competências, os déficits sociais tendem a ser os mais pronunciados em situações não estruturadas da vida social, nas quais é exigida compreensão rápida e intuitiva do que está acontecendo, o que vai suceder em seguida e o que se deveria ou os outros deveriam, poderiam ou não deveriam fazer ou dizer (ARAÚJO, 2011, p. 185). Isto significa que, pessoas com autismo ou Síndrome de Asperger apresentam dificuldade em “se colocar no lugar do outro”, já que elas percebem muito mais o mundo físico do que o mundo social. Elas podem não reconhecer, nem compreender os indícios que indicam os pensamentos os sentimentos da outras pessoas num nível esperado para sua idade cronológica (ATWOOD, 2010). Atwood (2010) também esclarece que em pessoas neurotípicas há mais atividade cerebral do que em pessoas do Espectro do Autismo. As áreas cerebrais afetadas seriam o córtex pré-frontal, sulco temporal superior e pelos lobos temporais. É importante reconhecer que a pessoa com Síndrome de Asperger tem capacidades de ToM, ou empatia, imaturas ou com déficits e não ausência de empatia. Sugerir uma ausência seria um insulto terrível para pessoas com Síndrome de Asperger, com a implicação de que a pessoa não reconhece ou se preocupa com os sentimentos dos outros. A pessoa preocupa-se muito profundamente, mas não pode ser capaz de reconhecer os sinais mais sutis de estados emocionais ou de “ler” estados mentais complexos (ATWOOD, 2010, p. 147). 67 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 Portanto, nas pessoas do Espectro do Autismo, do ponto de vista da eficiência, a ToM é mais lenta quando comparadas às pessoas neurotípicas (BOSA, 2000). O tempo que leva a processar a informação social é semelhante ao tempo que leva alguém que está a aprender uma segunda língua a processar o discurso de alguém que é fluente nesta língua. E o falante nativo desta língua falar demasiado depressa, a outra pessoa só consegue perceber alguns fragmentos do que foi dito. Aprendi a justificar a minha interação com uma pessoa que tem Síndrome de Asperger para ficar a alcance da sua capacidade de processamento do raciocínio social (ATWOOD, 2010, p. 158). Desta forma, Atwood (2010), elucida que as pessoas do Espectro do Autismo apresentam mais dificuldades em interagir com grupos de pessoas, já que a informação social é mais complexa que na interação de um-para- um. A pessoa com dificuldade em ToM pode ter dificuldade em selecionar intuitivamente quais sinais são relevantes e quais são redundantes. Quanto mais presença de pistas sociais, maior a dificuldade para se fazer tal seleção. Isso pode levar a pessoa do Espectro a serem menos hábeis em perceber as gafes alheias e provavelmente a também cometerem mais fiascos no seu cotidiano. Uma criança neurotípica de 8 anos é capaz de evitar fazer comentários ou críticas com o intuito de não aborrecer ou envergonhar a outra pessoa. Ela consegue fazer isto, pois consegue prever a reação emocional das pessoas em determinados contextos. As pessoas do Espectro podem ser muito rápidas e sagazes em identificar e apontar os erros e equívocos alheios sem considerar que é inapropriado fazê-los. Atwood (2010, p. 156) nos dá um exemplo: Observei adolescentes com Síndrome de Asperger a criticarem o professor em frente de toda a turma. O erro do professor pode ser banal, como a pronúncia incorreta de uma palavra, mas, para o jovem com Síndrome de Asperger, corrigir o erro tem precedência sobre os sentimentos do professor. Um dos principais fatores que podem interferir na dificuldade em uma pessoa com TGD saber o que o outro pode pensar ou sentir, é o fato destas pessoas apresentarem menos contato visual do que o esperado, e mais tendência para a boca, para o corpo, e para objetos do que para os olhos, em comparação às pessoas com desenvolvimento típico. As pessoas neurotípicas denotam ter mais capacidade de “ler” as expressões faciais principalmente na região em volta dos olhos (ATWOOD, Atwwod, 2010). Para exemplificar tal dificuldade citamos: 68 Transtornos Globais do Desenvolvimento Pessoas com TGD tendem a olhar menos para os rostos, elas também têm dificuldade em reconhecer e compreender as expressões faciais. Chris era um adolescente com Síndrome de Asperger que tinha um interesse especial por astronomia. Antes de frequentar uma avaliação diagnóstica os pais tinham lhe pedido que não me falasse sobre seu interesse porque seu entusiasmo e sua tendência para aborrecer as pessoas o faziam perceber excêntrico. Porém, eu sabia de seu notável conhecimento de astronomia e comecei a falar com Chris sobre algumas fotografias recentes da superfície de Marte que tinham sido mostradas em programas noticiosos da televisão. Chris estava consciente de que quando eu mostrava querer continuar a conversa sobre astronomia, como ele também queria, os pais, que estavam presentes e observavam, não aprovavam o tema da conversa. Ficou confuso e recolheu- se, fechando os olhos, mas continuou a falar de astronomia. Expliquei, então, a Chris a dificuldade que eu tinha em continuar a falar com alguém que tinha os olhos fechados. Chris respondeu: “Por que é que eu haveria de querer olhar para si se sei onde está?” (ATWOOD, 2010, p. 148). Já que pessoas com TGD tendem a olhar menos para os rostos, elas também têm dificuldade em reconhecer e compreender as expressões faciais. É muito comum você notar pessoas do Espectro falarem sobre seu assunto preferido e não perceberem o quanto elas estão aborrecendo as pessoas com quem conversam. Estas dificuldades em inferir estados intencionais aos outros, também leva à dificuldade da pessoa compreender seus próprios sentimentos, desejos e crenças que estão na base das suas próprias atitudes decorrentes de uma determinada situação. Pessoas com dificuldades em ToM apresentam déficits na execução da auto avaliação. Por isso, não é incomum você perguntar para uma pessoa do Espectro por que agiu de determinada maneira ou como ela está se sentindo diante de tal situação e a resposta ser “não sei”. Outra resposta comum seria inferir ao mundo externo a razão para seus comportamentos em vez de inferir aos seus próprios pensamentos e sentimentos. Por exemplo: para uma pessoa do Espectro não é ela quem está com medo do cachorro, mas o cachorro que é assustador. Isto leva à dificuldade de perceber que há diferentes perceptivas frente às mesmas situações. Assim, a pessoa com autismo pode estar com medo do cachorro, mas nós não. Para ela, todos sentem medo daquele cachorro que é assustador (ARAÚJO, 2011). Déficits em ToM também levam a mais dificuldades com conceitos simbólicos e abstratos da linguagem (metáforas, ironias, figuras de linguagem) do que com descrições ou fatos concretos. Uma das consequências dissoé uma tendência a fazerem uma interpretação literal do que o outro diz. Por isso, muitas vezes a pessoa com autismo ou Síndrome de Asperger acaba sendo considerada irreverente ou mal-educada. Abaixo segue uma situação muito comum entre pessoas do Espectro: 69 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 Nós constantemente fazemos isso para evitar maiores consequências ou por ser uma solução rápida para um problema social. Quando uma mãe pergunta ao filho: “O que fizeste hoje na escola?”, as crianças comuns sabem o que a mãe já sabe e o que gostaria de saber, ou acharia interessante saber sobre o que aconteceu na escola. As crianças com déficit na ToM, pelo contrário, não sabem como responder àquela pergunta. Ela quer saber tudo, desde que a criança entrou na sala até ao momento que saiu? O que seria importante para ela? Até onde que já sabe? A criança com Síndrome de Asperger pode ter dificuldade em identificar os acontecimentos- chave a partir da perspectiva da mãe e, ou se recusa a responder a pergunta porque é demasiado difícil, ou fornece um comentário do dia anterior, com todos os detalhes. Um monólogo, então, torna-se muito entediante (ATWOOD, 2010, p. 151). Uma importante habilidade social para a sobrevivência na arena social é capacidade de se realizar as “mentiras inocentes” ou “socialmente aceitas”. Nós constantemente fazemos isso para evitar maiores consequências ou por ser uma solução rápida para um problema social. Nós “mentimos”, quando, por exemplo, alguém nos dá um presente que não gostamos, e nós cuidamos para não denunciar nosso pensamento em nossa face, e agradecemos ao presente dizendo o quanto adoramos, ou quando alguém liga em momento inapropriado e pedimos para dizer que não estamos, ou quando vamos a algum evento sem realmente ter querido ir. Pessoas com déficits em ToM tendem a serem extraordinariamente honestas, obediente às regras sociais. Atwood (2010, p. 151) exemplifica: A criança com Síndrome de Asperger pode reparar que uma mulher na fila do caixa do supermercado é obesa e comenta que, nos eu tom de voz e volume habituais, que a senhora é gorda e precisa fazer dieta. Na opinião da criança, ela deveria ficar grata pela observação e pelo conselho; a probabilidade de a mãe ficar embaraçada ou a mulher ofendida com um comentário tão grosseiro não faz parte do processo mental da criança. Outras crianças normalmente inibem uma reação idêntica com base nos pensamentos e sentimentos das outras pessoas. As crianças e os adultos com Síndrome de Asperger parecem ter maior fidelidade à honestidade e à verdade do que aos pensamentos e sentimentos dos outros. Visando a sua melhor compreensão, expomos outra situação muito comum entre pessoas com déficit em ToM: Enquanto o professor está distraído, uma criança pode praticar um ato de desobediência. Quando o professor reconhece que aconteceu qualquer coisa e não sabe quem foi, pode pedir que o culpado se confesse. As outras crianças, muitas vezes, sabem quem foi, mas geralmente não o dizem porque sua fidelidade é para o código social, [...]. No entanto, para as crianças com Síndrome de Asperger 70 Transtornos Globais do Desenvolvimento a fidelidade é para a verdade, não para com o grupo social. O professor fez uma pergunta e ela dá a resposta rapidamente, mas depois fica confusa com a irritação das outras crianças, especialmente se não praticarem o ato. No que lhe diz respeito, a criança deu a resposta lógica e correta à pergunta do professor (ATWOOD, 2010, p. 152). Atwood (2010) chama a atenção para o fato de pessoas do Espectro ao se depararem com alguma situação conflituosa ou confusa não buscarem ajuda ou mediação, tendendo a resolverem sozinhas, muitas vezes de forma agressiva, já que são menos maduras e hábeis na arte da persuasão e gestão de conflitos. Se as pessoas do Espectro apresentam dificuldades de compreender os estados mentais alheios, elas também vão ter dificuldades em saber como influenciar as pessoas. Desta forma, estas pessoas podem ir mais facilmente para o confronto, para a chantagem emocional e para a inflexibilidade frente ao seu próprio ponto de vista. Segue uma situação que ilustra o que acabamos de explicar. Observei uma criança com Síndrome de Asperger que estava sentada no chão da sala de aula com outras crianças da turma, ouvindo a professora a ler uma história. O rapaz ao lado começou a provocá-lo espetando-lhe os dedos nas costas quando a professora não estava a olhar. A criança com Síndrome de Asperger começou a ficar cada vez mais aborrecida e acabou por bater no rapaz a fim de o fazer parar. A professora estava a olhar para as crianças, nesta altura, mas, não sabendo dos acontecimentos anteriores advertiu à criança com Síndrome de Asperger por ser agressiva. Outras crianças teriam explicado que tinham sido provocadas e reconheceriam que, se a professora soubesse as circunstâncias, as consequências seriam menos severas e mais justas. Contudo, ela ficou calada. A professora continuou a história e, momentos depois, outra criança voltou para a aula, vinda do banheiro. Ao passar cuidadosamente junto da criança com Síndrome de Asperger, tocou-lhe acidentalmente. A criança com Síndrome de Asperger não teve consciência de que, nesta situação, a ação fira acidental, por isso bateu-lhe da mesma maneira que batera à criança que estivera a atormentá-la. Felizmente, neste caso, a professora percebeu a dificuldade da criança em distinguir atos acidentais e deliberados e conseguiu acalmar a situação com uma explicação (ATWOOD, 2010, p. 153, grifos nossos). Segundo Atwood (2010, p. 154-155, grifos nossos), por apresentarem atraso no desenvolvimento de habilidades referentes a ToM, pessoas com autismo e Síndrome de Asperger podem expor as seguintes características na resolução de conflitos: 71 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 • dificuldade em conceituar a perspectiva e as prioridades da outra pessoa • competências de persuasão limitadas • tendência para confrontar e ser rígido • relutância em mudar uma decisão e em admitir que cometeu um erro • aversão a ser interrompido • compulsão por levar algo até o fim • tendência para punir em vez de louvar • tendência a evitar reivindicações • falta de conhecimento de estratégias alternativas. Vocês podem imaginar como deve ser difícil, estressante e exaustivo para uma pessoa com déficit em Teoria da Mente interagir com pessoas que não conhecem, com pessoas imprevisíveis, ou com grupos. Atwood (2010) afirma que estas pessoas quando estão relaxadas, processam com mais facilidade os processos mentais. A seguir, você aprenderá sobre a habilidade Função Executiva e o Impulso da Coerência Central também muito fundamental para a vida em sociedade. Atividade de Estudos: 1) Escreva 5 características que pessoas com déficit em ToM pode apresentar: _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ 72 Transtornos Globais do Desenvolvimento Estas capacidades são fundamentais para a resolução de situações-problemas seja em situações novas ou conhecidas. __________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ Função Executiva e Impulso da Coerência Central Entende-se por Função Executiva o conjunto de condutas que envolvem planejamento e execução de estratégias adequadas para se atingir um determinado objetivo. Tal função estaria relacionada com a capacidade de “[...] antecipar, planificar, controlar impulsos, inibir respostas inadequadas, flexibilizar pensamento e ação.” (CUNHA; BELISÁRIO FILHO, 2010, p. 17). Para Cunha e Belisário Filho (2010) estas capacidades são fundamentais para a resolução de situações-problemas seja em situações novas ou conhecidas. Isso porque é a Função Executiva que permite nos adaptarmos às variações que ocorrem nas situações que estamos acostumados a enfrentar, levando em conta nossas intenções e as dos outros, assim como nossos objetivos em cada situação. É através da Função Executiva, associada à Teoria da Mente, que podemos planejar e executar diferentes e eficazes estratégias para diferentes contextos. Por exemplo: A estratégia para conseguir beber água em consultório médico, num banco, ou reunião é diferente das estratégias que utilizamos em nossa casa. De acordo com Junior e Melo (2011, Base Scielo) A função executiva é requerida sempre que se faz necessário formular planos de ação ou quando uma sequência de respostas apropriadas deve ser selecionada e esquematizada. Do ponto de vista da neuropsicologia a função executiva compreende os fenômenos de flexibilidade cognitiva e de tomada de decisões. Muitas das dificuldades das pessoas com TGD podem ser explicadas por déficits em Função Executivas. Por exemplo: dificuldades com atividades de vida diária (escovar os dentes, tomar banho, vestir-se sozinha (o)), dificuldades para brincar de maneira funcional, dificuldades no processo de imitação, e nos processos de aprendizagem. 73 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 O lobo frontal é responsável pela formação de metas e objetivos, e no planejamento de estratégias de ações necessárias para atingir tais objetivos, selecionando as habilidades cognitivas e motoras requeridas para a execução, e coordenando as mesmas para aplicá- las na ordem correta, e o lobo pré-frontal é responsável pela avaliação do sucesso ou fracasso das ações executadas. Sabe-se que o centro executivo do cérebro são os lobos frontais direito e esquerdo, e ao córtex pré-frontal: área que ocupa 1/3 do cérebro humano e é responsável pela execução de atividades a partir de informações recebidas pelas regiões posteriores do córtex. Bosa (2001) explica que o lobo frontal é responsável pela informação sensorial enquanto que a pré-frontal organiza as informações emotivas e da atenção, oriundas do sistema límbico, do cerebelo, e dos sistemas sensoriais. Junior e Melo (2011) esclarecem que o lobo frontal é responsável pela formação de metas e objetivos, e no planejamento de estratégias de ações necessárias para atingir tais objetivos, selecionando as habilidades cognitivas e motoras requeridas para a execução, e coordenando as mesmas para aplicá-las na ordem correta, e o lobo pré-frontal é responsável pela avaliação do sucesso ou fracasso das ações executadas. Nota-se que o déficit em Função Executiva que as pessoas com TGD normalmente apresentam são semelhantes aos comportamentos dos indivíduos que sofrem lesão nos lobos frontais e pré-frontais. Pessoas que sofreram lesões nas regiões pré-frontais tenderam a apresentar alterações de personalidade, tais como aumento da irritabilidade ou, ao contrário, apatia; perda do juízo crítico envolvendo valores sociais, além de problemas na área da atenção, memória de trabalho e prospectiva (BOSA, 2001, Base Scielo). Portanto, Bosa (2001) elucida que muitas características do TGD, tais como a inflexibilidade, comportamentos obsessivos e compulsivos, foco no detalhe em detrimento de um todo, e dificuldades no relacionamento interpessoal, podem ser explicadas por comprometimento no funcionamento do lobo frontal. A dificuldade em “[...] juntar as partes de informações para formar um ‘todo’ provido de significado (coesão central) é uma das características mais marcantes no autismo” (BOSA, 2001, Base Scielo ). O mundo que nos cerca é cheio de detalhes, no entanto nós tendemos a selecionar a informação relevante e coerente umas com as outras de tal modo que apreendemos a essência da situação. Essa capacidade é denominada Impulso da Coerência Central”. Então, se nós vermos balões, crianças, bolo, brigadeiro, cama elástica, palhaços e ouvirmos músicas infantis, seguramente concluiremos que se trata de uma festa de aniversário. Já pessoas com TGD podem não fazer a conexão dos balões com os demais estímulos e não compreenderem onde estão, com que objetivo, e o que se espera que elas façam naquele contexto. A dificuldade em fazer a coesão central podem gerar dificuldades com linguagem, percepção das expressões faciais e focos em partes de objetos. Quando ouvimos uma frase ou uma história, nós buscamos captar o seu 74 Transtornos Globais do Desenvolvimento sentido global. Muitas palavras ambíguas são melhores compreendidas se analisarmos o todo da frase ou da história. Pessoas com TGD tendem a focar sua atenção às palavras isoladamente do contexto. Elas ficam tão presas às partes que perdem o todo. O mesmo pode ocorrer ao manusear os objetos e observarem as pessoas. As crianças com TGD podem, por exemplo, focar sua atenção à rodinha, depois à porta, e não percebe que aquilo que ela está vendo é um carrinho. Ou ao observarem uma pessoa, podem focar separadamente sua atenção primeiro no brinco, depois nos botões da camisa, e em seguida no cabelo, em vez de olhar o todo e já reconhecerem quem é aquela pessoa. Por isso, pessoas com TGD podem se concentrar em detalhes, que nós muitas vezes nem percebemos. (WILLIAMS; WRIGHT, 2008). Tendo em vista as dificuldades com Atenção Compartilhada, Teoria da Mente, Função Executiva e Impulso da Coerência Central, muitas características do TGD podem ser compreendidas. Para concluir este capítulo, explicaremos o Processamento Sensorial das pessoas com TGD que em sua maioria ocorre de maneira diferenciada. Atividade de Estudos: 1) Veja a figura a seguir: Após estudar sobre Função Executiva e Impulso da Coerência Central, tente descrever como a pessoa com prejuízo nessas habilidades analisaria a imagem acima: _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ 75 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ O Processamento Sensorial Para se apropriar dos conteúdos deste caderno de estudos, você utiliza alguns de seus sentidos, sobretudo a visão e a audição. Da mesma forma, para internalizarmos as informações sobre o mundo que nos cerca utilizamos nossas experiências sensoriais. Por meio dos nossos sete sentidos, conseguimos saber se a água do banho está quente ou fria, se a comida está temperada ou insossa, sabemos o cheiro do perfume ou odor de um lixo, sentimos o aconchego de um abraço ou o sufoco de uma multidão, apreciamos uma música alta ou baixa. Sabemos também que as preferências por determinados estímulos sensoriais são singulares: alguns gostam de banho bem quente outros não, comida bem apimentada, perfumes mais suaves, abraço bem forte, música bem alta. Isto ocorre de acordo como a informação sensorial que chega ao nosso cérebro, já que temos diferentes limiares ou níveis de tolerância à informação sensorial. O que é interpretado como agradável para alguns, para outros pode ser desagradável ou excessivo (GOLDSTEIN, 2011). Neste momento você deve estar se perguntando, será que redigiram o texto de maneira errada? Não são cinco sentidos? Não nos enganamos. São sete sentidos, sim. No quadro abaixo você os conhecerá. 76 Transtornos Globais do Desenvolvimento Quadro 1 - Os sete sentidos Sistema Sensorial Localização Função Visual Olhos Fornece informações sobre cor, forma e luminosidade. Ajuda a reconhecer as pessoas e objetos. Auditivo Ouvido Fornece informações sobre sons no ambiente. Gustativo Receptores na língua Fornece informações sobre os diferentes sabores: salgado, doce, picante, amargo e azedo. Olfativo Receptores nasais Fornece informações sobre os diferentes tipos de cheiro: forte, fraco, intenso, suave. Tato Receptores na pele Fornece informações sobre a textura, a pressão e a temperatu- ra de ambientes e objetos. Proprioceptivo Músculos, tendões e articulações Fornece informações sobre a nossa noção corporal. É impor- tante para a sensação da posi- ção do corpo e do movimento. Vestibular Ouvido interno Fornece informações sobre tô- nus, movimento do corpo através do espaço e modulação do nível de alerta. Fonte: (GOLDSTEIN, A., 2011, p. 15). Para obtermos informações sobre algum objeto ou sobre o ambiente, nós utilizamos mais de um sentido, de tal modo que as informações captadas pelos sentidos se inter-relacionam. Quanto maior a associação entre as informações sensoriais, mais apropriadas serão as respostas. Desta forma, o processamento sensorial é a função neurofisiológica responsável por registrar, organizar e interpretar informações sensoriais captadas pelos sistemas sensoriais. No processo de aprendizagem que inclui estabelecer relações funcionais, apropriar-se do ambiente e aprender são 77 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 Os estímulos sensoriais precisam ser assimilados e descartados adequadamente. Para compreender o processamento sensorial, faz- se necessário compreender a condução das informações sensoriais desde a sua recepção. processos que dependem da percepção, organização, da interpretação e integração de informações sensoriais interoceptiva (internas) e exteroceptiva (externas) (MOMMO; SILVESTRE, 2011). Para compreender o processamento sensorial, faz-se necessário compreender a condução das informações sensoriais desde a sua recepção. Nossos canais de recepção captam sensações tácteis, proprioceptivas, vestibulares, auditivas, visuais gustativas e olfativas, as transformam em impulsos e os conduzem até o córtex sensorial. No córtex sensorial, essas sensações, agora impulsos, são integradas para serem interpretadas e conduzidas ao córtex motor. O córtex motor recebe a interpretação, também impulso, e promove uma resposta que resulta em comportamentos. A amígdala, centro das emoções e formação da memória de eventos carregados de emoção, também recebe a informação sensorial e atribui valor afetivo e essas sensações. Para organizar o comportamento, então, ocorre um planejamento da ação, seja ela motora ou cognitiva, nos lobos frontais e pré-frontais, como explicamos no segmento anterior. Figura 6 - O Processamento Sensorial Fonte: (GOLDSTEIN, A. 2011, p. 16). Tal como a Função Executiva, o processamento sensorial é a base para comportamentos como comer, vestir-se, lavar-se, desenhar, ler, escrever, andar de bicicleta. Os estímulos sensoriais precisam ser assimilados e descartados adequadamente. E isto vai depender da codificação da modalidade, localização, intensidade, grau e duração. 78 Transtornos Globais do Desenvolvimento A modulação sensorial está relacionada à intensidade, frequência e duração dos estímulos sensoriais. Um estímulo pode ser mais agradável para uns e não para outros porque o caminho que as sensações fazem até o cérebro pode ser diferente em sua intensidade. Ou chega lentamente e com pouca intensidade ou chega de forma rápida e intensa. O ideal é que a informação não chegue com tanta intensidade ao ponto que cause um choque, e nem com tanta pouca intensidade que custe a ser percebida (GOLDSTEIN, 2011). O transtorno da modulação afeta principalmente o nível de alerta pessoal, causando flutuação constante do estado de alerta e da disposição para sensibilização de novas sensações. A modulação sensorial dos estímulos táteis, vestibulares, auditivos e visuais pode variar conforme os estímulos, podendo ser hipossensíveis ou hipersensíveis (MOMMO; SILVESTRE, 2011). Mommo e Silvestre (2011) e Goldstein (2011) citam alguns comportamentos das pessoas com TGD podem estar relacionados ao processamento sensorial diferenciado: São eles: • Busca constante por movimento; • Balanceio do corpo, tronco ou cabeça; • Reação brusca ou esquiva ao contato físico; • Movimentos das mãos, dedos e objetos em frente aos olhos, ação de cheirar objetos, pessoas próximas; • Morder-se, puxar cabelo, bater-se; • Prazer com ruídos estranhos ou produção de ruídos; • Preferência por certos gostos e aromas específicos; • Dificuldade em sustentar a atenção ou distração na presença de ruído ambiente; • Déficits práxicos (planejamento motor); • Alterações no sono-vigília; • Medo ou insegurança com relação a movimentos que envolvam mudanças de posição ou postura; • Inabilidade em regrar comportamentos em situações de risco; 79 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 • Emissão de sons intermitentes; • Aversão a sons esporádicos; • Ausência de reações a dor; • Brincadeiras repetitivas e não funcionais a objetos de apego. Crianças rígidas, inflexíveis, com comportamentos repetitivos e estereotipados podem ter relação ao modo de expressar seu desconforto sensorial ou em autorregular e controlar as entradas sensoriais, podendo ser hipersensíveis ou hipossensíveis a alguns estímulos (MOMMO; SILVESTRE, 2011). Pessoas hipersensíveis são aquelas que emitem respostas mais intensas e diferenciadas quando comparadas a outras crianças no mesmo contexto. Isso pode ser caracterizado por desconforto, irritação, choro e pelo afastamento e esquiva de informações desagradáveis. A seguir, de acordo com Mommo e Silvestre (2011) e Goldstein (2011), seguem alguns exemplos relacionados à hipersensibilidade: • Dificuldades com alimentos, alimentação seletiva com base na textura ou consistência; • Incômodo com atividades de higiene pessoal (banho, vestir-se, pentear o cabelo, cortar unha e cabelo); • Incômodo com etiquetas e alguns tecidos, costuras; • Incômodo com o toque alheio; • Evita andar descalço; • Choraquando toma banho; • Sensibilidade a ruídos como de liquidificador, aspirador de pó e máquina de cortar grama; • Dificuldade em permanecer em filas; • Tendência a evitar objetos que giram, assim como balanços e escorregadores; • Tendência a evitar tocar em argila, areia e guache. 80 Transtornos Globais do Desenvolvimento Mommo e Silvestre (2011) explica que a hipersensibilidade também pode estar relacionada à insegurança gravitacional, que é a hiper-resposta a estímulos vestibulares e proprioceptivos. Pessoas com esta hipersensibilidade parecem ter medo de movimentos, de pular, de correr, de saltar, e de escalar. Atos simples como tirar os pés do chão no vaso sanitário ou se debruçar sobre a pia do banheiro podem gerar muita ansiedade ou pânico. Já pessoas hipossensíveis podem apresentar comportamentos de passividade, alienação, isolamento e lentidão, parecendo estarem desorientadas e confusas frente a mudanças ambientais ou na presença de novas informações sensoriais. Estas pessoas também apresentam alto limiar para dor, ou seja, precisam de maior estímulo para sentirem dor, estando, então mais vulneráveis a situações de risco (MOMMO; SILVESTRE, 2011). Desta forma, segundo Mommo e Silvestre (2011) e Goldstein (2011) pessoas hipossensíveis emitem menor resposta e de forma mais lenta a alguns estímulos sensoriais. A seguir, daremos alguns exemplos que podem caracterizar pessoas hipossensíveis: • Não percebe o toque alheio; • Usa roupas torcidas; • Adora andar descalço na areia ou grama; • Morde-se; • Bate-se em objetos; • Parece ter prazer em cair; • Adora parquinho e atividades de grande intensidade; • Parece não ter saciedade; • Adora alimentos crocantes, de texturas variadas, e apimentadas; • Adora música alta; • Cheira objetos; • Toca excessivamente as pessoas; • Adora tomar banho de chuveiro; • Não se incomoda em estar sujo. 81 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 Devido ao processamento sensorial diferenciado, pessoas com Autismo de Auto Funcionamento ou Síndrome de Asperger, muitas vezes relatam sentirem uma sobrecarga sensorial. Outro fator importante no Processamento Sensorial é a Busca Sensorial que compreende a necessidade da criança de obter estímulos mais intensos, com maior duração e maior frequência para poder responder a eles. Estas crianças desejam e procuram mais as informações sensoriais, na tentativa de organizar seu comportamento que, todavia, se torna mais desorganizado à medida que a criança obtém mais estímulos com maior duração, frequência e intensidade. Nestas crianças encontramos maior nível da atividade motora, maior agitação e comportamento de excitação, impulsividade e desorganização motora e espacial. Por exemplo: crianças que são muito agitadas correm ou pulam demais, e quanto mais correm e pulam, mais agitadas ficam. Estas crianças quando precisam ficar sentadas, para controlar a ansiedade, a agitação motora e a impulsividade, podem tamborilar os dedos, cantarolar, emitir sons, manipular os olhos e a boca, os cabelos, ou mudar de posição constantemente (MOMMO; SILVESTRE, 2011). Outra alteração no processamento sensorial seria o Transtorno de Discriminação sensorial, caracterizado pela dificuldade em a pessoa selecionar, filtrar e organizar a informação relevante para o planejamento, coordenação e execução das nossas ações para atingirmos nossos objetivos. Assim, as pessoas com TGD podem ter dificuldades com discriminação visual, auditiva, vestibular, táctil, e olfativa. Estas dificuldades geram ansiedade, confusão, e dificuldades para a execução de tarefas, imitação, habilidades de coesão central, e Teoria da Mente, e da manutenção da atenção compartilhada (MOMMO; SILVESTRE, 2011). Devido ao processamento sensorial diferenciado, pessoas com Autismo de Auto Funcionamento ou Síndrome de Asperger, muitas vezes relatam sentirem uma sobrecarga sensorial. Atwwod (2010) chama a atenção para o fato de a pessoa que possui sensibilidades sensoriais tornar-se hipervigilantes, tensas, inseguras ou distraídas. A criança evita ativamente situações específicas, como os corredores da escola, os recreios, centros comerciais, supermercados, barulhentos, conhecidos por causarem experiências sensoriais intensas. A assustadora perturbação de tornar-se tão grave que pode ser desenvolvida uma perturbação ansiosa, como fobia de cães, pois eles podem ladrar de repente, ou agarofobia (medo de lugares públicos), dado que a casa é uma experiência sensorial relativamente segura e controlada. Algumas situações sociais como assistir a uma festa de aniversário, podem ser evitadas, não só pela incerteza no que se refere às convenções sociais, mas também devido aos níveis de barulho de crianças exuberantes e ao risco dos balões estourarem (ATWOOD, 2010, p. 351). 82 Transtornos Globais do Desenvolvimento Em suma, vale a reflexão de que comportamento de isolamento, esquiva, ansiedade, fobias, e comportamentos obsessivos e de repetição podem ser uma busca por controle, organização sensorial, conforto, calma e tranquilidade. Por isso, quando estamos frente aos comportamentos de inflexibilidade, de repetição e muitas vezes de isolamento das pessoas diagnosticadas com TGD, é interessante que tenhamos a atitude de um detetive em busca de compreender tais comportamentos. Perguntas como: “Por que a pessoa faz tais comportamentos frente a determinadas situações? Qual a necessidade sensorial que há por traz deste comportamento?”, são imprescindíveis quando estamos diante de uma pessoa com TGD, assim como a busca pelas respostas fará toda a diferença no programa de intervenção desta pessoa. Atividade de Estudos: 1) O quadro abaixo foi retirado desta seção, que aborda sobre o sistema sensorial. Sugiro que você complete-o, para revisarmos o conteúdo. Veja que, nesta atividade inserimos mais uma coluna. Escreva, nesta última coluna, um comportamento que uma criança com TGD poderia apresentar quando possui falhas em seu sistema sensorial: Sistema Sensorial Localização Função Comportamento apresentado quando há prejuízo nesta função Visual Auditivo Gustativo Olfativo Tato Proprioceptivo Vestibular 83 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 Algumas Considerações Neste capítulo, abordamos sobre alguns aspectos ligados ao desenvolvimento social, cognitivo e sensório-motor da pessoa que apresenta o Transtorno Global do Desenvolvimento. São eles: Atenção Compartilhada, Imitação, Teoria da Mente, Função Executiva e Impulso da Coerência Central e Processamento Sensorial. Compreendemos igualmente que: • A habilidade de atenção compartilhada é fundamental para o desenvolvimento da capacidade simbólica e da linguagem; • As trocas que a criança estabelece com o outro em atividades conjuntas propiciará o desenvolvimento da habilidade de interpretação compartilhada do mundo que a cerca; • Pessoas com TGD podem apresentar prejuízos significativos na habilidade de imitação dos movimentos faciais, de gestos e na imitação de ações sobre os objetos; • A Teoria da Mente nos possibilita realizar a compreensão da expressão facial, dos comportamentos, das atitudes das pessoas, da prosódia e dos aspectos pragmáticos do discurso; • A dificuldade em fazer a coesão central podem gerar dificuldades com linguagem, percepção das expressões faciais e focos em partes de objetos; • Possuímos sete sentidos que nos auxiliam a internalizar o mundo: Visual, Olfativo, Gustativo, Tato, Auditivo, Vestibular e Proprioceptivo; • Devido ao prejuízo no processamento sensorial, pessoas com Autismo de Auto Funcionamento ou Síndromede Asperger, muitas vezes, relatam sentirem uma sobrecarga sensorial; • Comportamentos de isolamento, esquiva, ansiedade, fobias e comportamentos obsessivos e de repetição podem ser uma forma da pessoa com TGD obter controle, organização sensorial, conforto, calma e tranquilidade. 84 Transtornos Globais do Desenvolvimento Referências ARAÚJO, C. A. Psicologia e os Transtornos do Espectro do Autismo. In: SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. ATWOOD, T. Tudo sobre Síndrome de Asperger. Lisboa: Verbo, 2010. BOSA, C. Breve revisão de diferentes abordagens. Psicologia Reflexão e Crítica. Porto Alegre, v. 13, n. 1, 2000. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. _____. As Relações entre Autismo, Cognição Social e Função Executiva. Psicologia Reflexão e Crítica. Porto Alegre, v. 14, n. 2, 2001. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. _____. Atenção Compartilhada e Identificação Precoce do Autismo. Psicologia Reflexão e Crítica. Porto Alegre, v. 15, n. 1, 2002. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. COLE, M.; COLE, S. R. O desenvolvimento da criança e do adolescente. 4. ed. Porto Alegre: Artmed, 2004. CUNHA, P.; BELISÁRIO FILHO, J. A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar: transtornos globais do desenvolvimento. Brasília: Ministério da Educação, 2010. GOLDSTEIN, A. O Autismo sob o Olhar da Terapia Ocupacional – um guia de orientação para pais. 3. ed. São Paulo: Casa do Novo Autor, 2011. JOU, G. I.; SPERB, T. M. Teoria da Mente: diferentes abordagens. Psicologia: Reflexão e Crítica. Porto Alegre, v. 12, n. 2, 1999. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. JUNIOR, C. A. M.; MELO, L. B. R. Integração de Três Conceitos: Função Executiva, Memória de Trabalho e Aprendizado. Psicologia: Teoria e Pesquisa. Brasília, v. 27, n. 3, 2011. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. LAMEIRA, A. P.; GAWRYSZEWSKI, L. G.; PEREIRA JR, A. Neurônios Espelhos. Psicologia USP. São Paulo, v. 17, n. 4, 2006. Disponível em: <www. scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. 85 Aspectos Relacionados aos Transtornos Globais do Desenvolvimento Capítulo 3 MOMMO, A.; SILVESTRE, C. Integração Sensorial nos Transtornos do Espectro do Autismo. In SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. TONELLI, H. Autismo, Teoria da Mente e o Papel da Cegueira Mental na Compreensão de Transtornos Psiquiátricos. Psicologia Reflexão e Crítica. Porto Alegre, v. 24, n. 1, 2011. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. WILLIAMS, C.; WRIGHT, B. Convivendo com Autismo e Síndrome de Asperger: estratégias práticas para pais e profissionais. São Paulo: MBooks do Brasil, 2008. 86 Transtornos Globais do Desenvolvimento CAPÍTULO 4 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Conhecer as diferentes possibilidades de intervenção para o desenvolvimento global das pessoas diagnosticadas com Transtorno Global do Desenvolvimento. 3 Distinguir as diferentes possibilidades de intervenção para as pessoas diagnosticadas com Transtorno Global do Desenvolvimento e selecionar as estratégias que melhor viabilizarão o desenvolvimento global destas pessoas, visando objetivos pré-estabelecidos. 88 Transtornos Globais do Desenvolvimento 89 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 O método ABA ou Análise Aplicada do Comportamento baseia-se no Behaviorismo Radical posposto por Skinner em 1930 e pelo Dr. Ivar Lovaas em 1987. Contextualização Para chegar até aqui, você passou por três capítulos que o auxiliaram basicamente a compreender o Transtorno Global do Desenvolvimento. Todo o estudo feito até agora foi necessário para que, neste capítulo, você consiga compreender e analisar as diferentes abordagens de intervenção para pessoas com TGD. Gostaríamos de salientar que existem vários caminhos de intervenção que não são únicos e exclusivos para promover o desenvolvimento da pessoa com TGD. É preciso compreender quem é esse sujeito, qual a sua história, qual o seu contexto familiar e social, quais os seus gostos, interesses, talentos e dificuldades, e em que contextos (onde, quando e como) apresentam suas dificuldades para se pensar na melhor forma de intervir. Sem contextualização e sem saber sobre a história individual de cada sujeito não há método suficiente que dê conta. É preciso compreender por que cada criança apresenta determinados comportamentos ou dificuldades para se pensar na melhor estratégia de intervenção. Elencamos as principais abordagens da atualidade e as apresentamos de maneira neutra, ou seja, sem dar prioridade a uma delas. Desejamos que você consiga, por meio deste estudo, escolher aquela que você considerar mais apropriada, ou até mesmo, unir elementos interessantes de cada abordagem e utilizá-los em sua intervenção. Primeiramente, você vai conhecer o método da Análise Aplicada do Comportamento (ABA), passando para os métodos TEACCH e PECS e em seguida passamos para as Abordagens Relacionais e a Terapia de Integração Sensorial. Lembramos que, o trabalho de intervenção pode, ou melhor, deve ser planejado por uma equipe multidisciplinar, onde cada profissional, como por exemplo, psicólogo, pedagogo, fonoaudiólogo, terapeuta ocupacional, psicopedagogo, contribuirá de alguma forma para o desenvolvimento do sujeito com TGD. O Método Aba (Análise Aplicada do Comportamento) O método ABA ou Análise Aplicada do Comportamento baseia-se no Behaviorismo Radical posposto por Skinner em 1930 e pelo Dr. Ivar Lovaas 90 Transtornos Globais do Desenvolvimento em 1987. Com o objetivo de se fazer uma análise do comportamento, Skinner definiu o que é comportamento, quais as variáveis que influenciam neste comportamento e como podemos modificá-lo a fim de se conseguir comportamentos desejados e extinguir os indesejados. O Behaviorismo é a ciência que observa, analisa e explica a associação entre o ambiente, o comportamento humano e a aprendizagem. Lovaas foi quem estudou a Análise Aplicada do Comportamento e desenvolveu um Programa de Intervenção Comportamental Intensiva para o desenvolvimento de pessoas com autismo. Os profissionais responsáveis pela aplicação deste Programa são em sua maioria psicólogos com especialização em Terapia Comportamental ou Mestrado em Psicologia Experimental. No entanto, com a orientação e acompanhamento destes profissionais especializados a aplicação em si pode ser realizada por qualquer pessoa, inclusive a família da pessoa com TGD (FAGGIANI, 2012). A intervenção do Método ABA começa com a avaliação da criança com autismo, a fim de se identificar comportamentos a serem extintos, tais como, os que estão em excesso em seu repertório ou prejudicam a interação da criança com o ambiente social ou dificultam a aprendizagem de novos comportamentos, os comportamentos a serem maximizados (contato visual, atenção compartilhada, comportamentos verbais, não-verbais, de autocuidado, pré-acadêmicos, acadêmicos, e brincar), e os que devem ser adquiridos de acordo com a idade cronológica e desenvolvimento (BAGAIOLO; GUILHARDI; ROMANO, 2011). Faggiani (2012) esclarece que para o ABA é importante que comportamentos como as estereotipias, birras, rituais e interesses restritos sejam extintos por considerarem que impedem a realização de comportamentos considerados adequados e, assim, prejudicam a aprendizagem. Para tanto,deve-se registrar a ocorrência de tais comportamentos: quais (que comportamentos repetitivos), quando (dia e hora) e em que situações (o que estava acontecendo no ambiente). Estereotipias são comportamentos repetitivos de auto- estimulação que podem ocorrer ao manipular objetos ou com o próprio corpo. Rituais são comportamentos repetitivos localizados a uma situação, como por exemplo, a criança insistir em passear sempre pelo mesmo caminho. E interesses restritos são caracterizados por apego demasiado a algum interesse ou a não aceitação de novas tarefas ou brincadeiras. 91 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 O currículo da pessoa com TGD, que são individuais levam em conta as peculiaridades daquele individuo e é desenvolvido pelo analista do comportamento, é composto por vários programas. Bagaiolo, Guilhardini e Romano (2011) explicam que a partir da avaliação dos comportamentos da pessoa com TGD é possível delinear o currículo comportamental, ou seja, o que e como ensinar, levando em conta que a execução de um comportamento complexo, como por exemplo, desenhar, envolve uma série de outros comportamentos simples, como olhar, imitar, seguir instruções, pegar o giz e desenhar. Isto é denominado de fragmentação da tarefa. Abaixo segue um exemplo de fragmentação da tarefa: Figura 7 - Exemplo de Fragmentação da Tarefa Fonte: Lear (2004, p. 7). O currículo da pessoa com TGD, que são individuais levam em conta as peculiaridades daquele individuo e é desenvolvido pelo analista do comportamento, é composto por vários programas. Tais programas devem descrever o procedimento de ensino e ser registrado o desempenho da pessoa (BAGAIOLO; GUILHARDI; ROMANO, 2011). Figura 8 - Exemplo de Programas de um Currículo ABA Fonte: Lear (2004, p. 10). 92 Transtornos Globais do Desenvolvimento Lear (2004) ressalta a importância de que o currículo abrange várias áreas do desenvolvimento da criança de maneira equilibrada, tal como exposto na “Pizza Curricular” abaixo: Figura 9 - Pizza curricular Fonte: Lear (2004, p. 4). Segundo Lear (2004) cada programa do currículo possui o conteúdo programático organizado, tal como exemplificado abaixo: Autocuidado • Usa independentemente xícara, colher e garfo. • Veste e tira a roupa independentemente. • Habilidades de toalete. • Habilidades de higiene – pentear cabelos, escovar os dentes, lavar o rosto e as mãos, tomar banho. Motora (Fina e Ampla) • Desenhar, colorir. • Copiar, escrever. 93 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 • Cortar, amarrar. • Usar o teclado, usar o mouse. • Correr, andar, pular, balançar. • Usar equipamentos (bolas, raquetes etc.). Social • Responde a saudações. • Responde perguntas sociais (ex. “Como vai você?”, “Qual é o seu nome?”). • Imita colegas. • Responde às propostas dos amigos. • Inicia brincadeiras com colegas. • Interage verbalmente com colegas (comenta, pergunta, oferece ajuda). Linguagem/Comunicação • Receptiva – identifica objetos, partes do corpo e figuras; segue instruções de 1, 2 e 3 passos... • Expressiva – faz pedidos, nomeia figuras, objetos, pessoas e verbos; pede itens desejados; diz “sim” e “não”; repete frases; permuta informações; responde a perguntas do tipo “por quê”. • Abstrata – conversa sobre coisas ausentes, responde questões do tipo “por quê?”, antecipa consequências, explica ações, relata estórias, inventa estórias. Brincar • Brincar sozinho de modo apropriado com brinquedos. • Brincar em paralelo – brincar ao lado de outras crianças, sem interação. • Brincar com foco compartilhado – brincar com os mesmos itens, tal como as outras crianças, sem interação. 94 Transtornos Globais do Desenvolvimento • Brincar com ação compartilhada – brincar que demanda alguma colaboração com outras crianças (ex.: construir torre, empurrar balança). • Brincar de faz-de-conta – capaz de assumir uma outra identidade. • Brincar com colegas de faz-de-conta e de representar papéis. Acadêmica (e Pré-acadêmica) • Habilidades de imitação. • Identificação de números e letras. • Leitura – palavra inteira e fônica. • Soletração. • Habilidades de matemática e números. • Habilidades de uso do computador. • Habilidades escolares – participa de um grupo, espera a vez, recita em uníssono. Fonte: (LEAR, 2004, p. 4-5, cap. 7) para: Fonte: Lear, (2004, p. 4-5, cap. 7). De acordo com Bagaiolo, Guilhardini e Romano (2011) existem alguns passos importantes na execução dos programas em ABA: 1) Reforçamento contínuo: Com o objetivo de aumentar a frequência da execução e algum comportamento desejado, utiliza-se como consequência algum objeto ou evento reforçador imediatamente após a pessoa realizar tal comportamento (reforço positivo). Por exemplo - Se quisermos que a criança olhe em nossos olhos com mais frequência, podemos oferecer o acesso ao seu programa preferido logo após ela olhar em nossos olhos. Existem três tipos de reforçadores: os Primários, os Condicionados e os Generalizados. O primeiro são aqueles que garantem a sobrevivência: comida, bebida. O segundo são aqueles que ganham a propriedade de serem reforçadores quando são pareados com os reforços primários. Seria, por exemplo, a mamadeira, que se pareia com o leite. Já os Reforços Generalizados são estímulos que foram pareados com muitos reforços secundários, como o afeto e atenção social, por exemplo. Na intervenção com pessoas com TGD, os reforços são um grande desafio, levando em conta o restrito repertório de interesses. 95 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 Reforço negativo é a retirada de alguma condição aversiva quando a criança realiza algum comportamento desejado. Por exemplo: o aluno faz o exercício para não tirar nota baixa, ou para se livrar de alguma tarefa. 2) Pareamento de estímulos: Este procedimento tem como objetivo aumentar o repertório de reforçadores do indivíduo, e consiste em parear estímulos novos aos estímulos já conhecidos e apreciados pela pessoa com TGD. Assim, ao oferecermos o acesso à televisão quando a criança olhar em nossos olhos, podemos também oferecer um brinquedo ou elogio. 3) Modelagem: Consiste no ato de reforçar as pequenas respostas que se aproximam da resposta desejada. Por exemplo: o comportamento desejado é que a criança jogue a bola. Você pode reforçar comportamentos como olhar para a bola, se aproximar da bola, tocar na bola, segurar a bola. 4) Tentativa discreta: Neste procedimento busca-se retirar o pedido ou instrução para a realização do comportamento. Primeiro você dá a instrução, depois da resposta da criança você oferece o reforço positivo, espera a tentativa de realizar a instrução para novamente recompensar. 5) Hierarquia de dicas de resposta: Visa garantir que a aprendizagem ocorra com o mínimo possível de erros para que ocorra o reforçamento. O aplicador apresenta a tarefa e ajuda a criança a realizá-la a partir de dicas que podem ser a manipulação física, gestual, verbal ou com a utilização de fotos, imagens, símbolos, ou objetos. As dicas iniciais são intrusivas e aos poucos passam a ser menos intrusivas. 6) Esquema de Reforçamento Intermitente: À medida que a pessoa adquire o comportamento em seu repertório, e precisa ser mantido, o aplicador o aumenta a quantidade de emissão do comportamento antes de dar a consequência. Isto fará com a que a pessoa generalize e mantenha tal comportamento em outros contextos sociais. Para tanto, o analista do comportamento podeoportunizar a realização de tal comportamento em vários contextos e situações do cotidiano para recompensá-los. O ideal é que estes comportamentos ocorram em situações naturais e que sejam recompensados naturalmente. Por exemplo - O comportamento pode ser bater palma e a criança pode ser incentivada a bater palma numa festa de aniversário na hora de cantar “Parabéns”. 96 Transtornos Globais do Desenvolvimento Isso se refere a investigar a função dos eventos ambientais (antecedente e consequência) no comportamento avaliado. Além do ensino de novos comportamentos, Lear (2004) explica que o Método ABA busca modificar alguns comportamentos através da Avaliação Funcional dos Comportamentos que é o processo de coletar informações sobre os antecedentes e as consequências que estão relacionadas funcionalmente à ocorrência de problemas de comportamento. Isso se refere a investigar a função dos eventos ambientais (antecedente e consequência) no comportamento avaliado. Para fazer tal análise, buscam-se fazer as seguintes verificações: • Quando o comportamento-problema usualmente ocorre? • Onde o comportamento-problema usualmente ocorre? • Quem esteve presente quando o comportamento-problema ocorreu? • Que atividades ou eventos aconteceram imediatamente antes da ocorrência do comportamento? • O que as outras pessoas disseram e fizeram imediatamente antes do comportamento-problema ocorrer? • A criança emitiu quaisquer outros comportamentos antes do comportamento-problema? • Quando, onde, com quem e sob que circunstâncias é menos provável do comportamento-problema ocorrer? • O que aconteceu depois que o comportamento-problema ocorreu? • O que outras pessoas fizeram quando o comportamento- problema ocorreu? • Que mudanças ocorreram depois da ocorrência do comportamento-problema? • O que a criança recebeu depois da ocorrência do comportamento- problema? • O que a criança evitou ou do que ela escapou depois do comportamento-problema? Fonte: Lear, (2004, p. 6, Cap. 4). 97 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 A partir desta análise é possível compreender porque a criança se utiliza de tal comportamento e criar um plano estratégico para modificação comportamental através da retirada da situação gatilho do comportamento ou retirada da consequência ou modificação da consequência (reforço positivo, reforço negativo e punição). Punição é o termo utilizado para a retirada de algum reforço positivo ou apresentação de algum estímulo aversivo após a execução do comportamento indesejado, visando à diminuição da frequência de tal comportamento. Para melhor fazer a análise e compreensão da função do comportamento, pode-se fazer o registro do antecedente, comportamento e consequência em uma tabela, tal como exemplificada abaixo: Figura 10- Registro de Avaliação Funcional Fonte: Lear (2004, p. 6). De acordo com Lear (2004) alguns comportamentos, principalmente os auto-estimulatórios, precisam ser redirecionados para um comportamento social aceito e funcional. Isso é possível através da interrupção do comportamento indesejado, redirecionamento para o comportamento adequado pareado com reforço mais forte do que a criança encontra no comportamento auto- estimulatório em si. Lear (2004, p. 9, Cap. 4) exemplifica: 98 Transtornos Globais do Desenvolvimento se a criança tem um comportamento auto-estimulatório de bater palmas, você poderia interrompê-lo e redirecioná-lo para uma atividade de música, como bater num tambor, ou tocar pratos, caso o ruído das palmas seja o que mantém o comportamento. Se for a estimulação sensorial que estiver mantendo o comportamento, o comportamento poderia ser redirecionado para uma atividade com massinha ou argila. Lear (2004) explica que outra forma de impedir os comportamentos auto- estimulatórios é impedir a criança de ter tempo de executá-lo, ou seja, você pode manter a criança bastante ocupada. Para conhecer mais sobre o método ABA, sugerimos que você leia o manual “Ajude-nos a aprender: Manual de Treinamento em ABA- Parte 1” encontrada na Base Scielo: http://www.autismo. psicologiaeciencia.com.br/wp-content/uploads/2012/07/Autismo- ajude-nos-a-aprender.pdf Agora que você conheceu de maneira geral o método ABA, apresentamos a você o Método Teacch, que também é baseado Na Teoria Behaviorista e é muito utilizado em escolas. Atividades de Estudos: 1) Nesta seção, conhecemos a “Pizza Curricular” proposta por Lear (2004). Abaixo listamos algumas ações que estão relacionadas às habilidades mencionadas por Lear (2004). Desafiamos você a descobrir qual habilidade está relacionada a cada ação: Pular corda: ________________________________________ Brincar de casinha: __________________________________ Soletrar uma palavra: ________________________________ Contar uma história: _________________________________ Tomar café utilizando uma xícara: ______________________ Perguntar o nome de alguém: __________________________ 99 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 2) Com base no que você aprendeu nesta seção, exemplifique os termos abaixo: Reforçamento contínuo: ______________________________ Pareamento de estímulos: ____________________________ Modelagem: _______________________________________ Tentativa discreta: ___________________________________ Hierarquia de dicas de respostas: _______________________ Esquema de reforçamento intermitente: _________________ O Método Teacch O Método TEACCH foi criado por Eric Shopler em 1966 na divisão de Psiquiatria da Escola de Medicina da Universidade da Carolina do Norte (EUA). Baseado na Teoria Behaviorista e a Psicolinguística, este método se caracteriza pela valorização das descrições das condutas esperadas pela criança, a utilização de programas passo a passo e o uso de reforçadores (recompensas) para os comportamentos socialmente aceitos, e a utilização de recursos visuais (KWEE; SAMPAIO; ATHERINO, 2009). A Teoria Behaviorista se baseia em Skinner (1930) que postula que a aprendizagem acontece por meio de treino e aquisição de novos comportamentos desejados através de reforços (recompensas) e punição. A Psicolinguística é o estudo dos processos cognitivos da linguagem compreensiva, receptiva e funcional (com que intenção o sujeito se comunica, o que ele quer dizer, e relacionado a que contexto). Sugere-se que a aplicação deste método seja feita em um espaço de atendimento, cuja organização dos móveis e objetos favoreça a compreensão da pessoa com TGD do que se espera que se realize naquele lugar. Leon e Osório (2011) explicam que para que a pessoa com TGD entenda, por 100 Transtornos Globais do Desenvolvimento Para as atividades livres, o ambiente pode ser organizado com brinquedos, mesa de jogos e computador. exemplo, que desejamos que ela se sente na cadeira para escutar uma história, podemos colocar uma cadeira diante de um livro sobre uma mesa. Se quisermos que a pessoa com TGD compreenda que desejamos que ela fique em pé e dance uma música, podemos colocar um tapete na frente de um aparelho de som. Desta forma, Leon e Osório (2011) esclarecem que no TEACCH recomenda-se que se tenha um lugar para atividades dirigidas e um outro lugar para atividades livres. No trabalho dirigido, pode-se ter um local para atividades novas e outro local para atividades já conhecidas, em que a pessoa com TGD consegue fazer com autonomia. Para as atividades livres, o ambiente pode ser organizado com brinquedos, mesa de jogos e computador. Os locais de atividades devem ser diferenciados visualmentepara servirem de pistas à pessoa com TGD que as situações são diferentes e, por isso, os comportamentos esperados e as regras a serem seguidas também são. Figura 11- Espaço de trabalho individual Fonte: CEDAP Brasil (2012). 101 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 Figura12 - A organização da sala no Método TEACCH Fonte: CEDAP Brasil (2012). Figura 13 - Área de lazer Fonte: CEDAP Brasil (2012). Além da organização do ambiente, a programação da rotina é algo fundamental no Método TEACCH. Tal programação se diferencia de acordo com a idade cronológica e o desenvolvimento da pessoa com TGD. Segundo Leon e Osório (2011) se a criança for pequena, de até 30 meses, por exemplo, cujo período de atenção compartilhada é curto e a necessidade de se movimentar é maior, planejam-se atividades individuais de 20 minutos. À medida que a criança cresce, o tempo aumenta para 30 minutos até chegar a 45 minutos. Além disso, Leon e Osório (2011) explicam que quanto maior for a capacidade da criança em se integrar e se adaptar à rotina, mais atividades variadas devem ser inseridas. A programação da rotina deve ser apresentada previamente à criança para que ela tenha previsibilidade do que vai ser feito 102 Transtornos Globais do Desenvolvimento através de um calendário ou exposição da sequência de objetos a serem utilizados. Este calendário pode ser organizado de tal forma que as atividades sejam expostas de cima para baixo e da esquerda para a direita. Além disso, podem ser utilizados como dicas visuais das atividades a serem realizadas: • Objetos reais; • Partes de objetos reais; • Miniaturas; • Fotografias; • Imagens desenhadas; • Pictogramas; • Palavras escritas. Pictogramas são símbolos ou desenhos que representam um objeto ou atividade. Segue um exemplo: Figura 14 – Pictograma Fonte: Disponível em: <http://www.taringa.net/posts/offtopic/4573442/ El-diseno-de-un-pictograma.html>. Acesso em: 10 dez. 2012. 103 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 Assim, quando a pessoa acaba de realizar a tarefa, ela poderá saber qual a próxima atividade a ser executada. Abaixo, seguem alguns exemplos de como a programação da rotina podem ser apresentadas: Figura 15 - Calendário semanal de atividades Fonte: Disponível em: <http://educacaoinclusivasapucaiadosul.blogspot.com. br/2009/11/pecs-calendario-semanal.html>. Acesso em: 10 dez. 2012. Figura 16 - Calendário diário de atividades Fonte: Disponível em: <http://pecsemportugues.blogspot. com.br/>. Acesso em: 10 dez. 2012. 104 Transtornos Globais do Desenvolvimento Leon e Osório (2011) apontam que após a organização dos locais de execução das atividades e da programação da rotina, faz-se necessário organizar os sistemas de trabalho, ou seja, as estratégias para estimular a pessoa com TGD a realizar as etapas de início, meio e fim das atividades com autonomia, entendimento e intenção. Figura 17- Sequência de objetos concretos Fonte: Disponível em: <http://segundosprofes.blogspot.com. br/2012_08_01_archive.html>. Acesso em: 10 nov. 2012. Leon e Osório (2011) apontam que após a organização dos locais de execução das atividades e da programação da rotina, faz-se necessário organizar os sistemas de trabalho, ou seja, as estratégias para estimular a pessoa com TGD a realizar as etapas de início, meio e fim das atividades com autonomia, entendimento e intenção. De acordo com Leon e Osório (2011, p. 268), os sistemas de trabalho podem ser realizados de duas formas: 1. Esquerda/Direita com cesto do acabou: As atividades a serem realizadas são dispostas de forma organizada no lado esquerdo da mesa ou em uma prateleira ao lado esquerdo do sujeito. Essas tarefas devem ser realizadas uma a uma e, à medida que vão ficando prontas, devem ser colocadas no lado direito da mesa ou no cesto do “acabou”, localizado também do lado direito. Esse sistema segue a convenção ocidental da leitura e da escrita, que também se desenvolvem da esquerda para a direita. 2. Emparelhamento de cores / símbolos / palavras: As tarefas são dispostas em estantes separadas em recipientes diferenciados (p. ex., caixas ou cestos). Cada um é identificado por um símbolo (números, letras, formas geométricas, etc.) que tem um par correspondente na mesa de trabalho do sujeito, apresentado por meio de uma dupla de rótulos idênticos colocados na frente do recipiente. Por exemplo: cartão 1 na mesa de trabalho correspondente na estante ao cesto 1, que contém um trabalho de encaixe. 105 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 Para você compreender melhor o que foi citado acima, seguem fotos que exemplificam os dois sistemas de trabalho: Figura 18 - Esquerda/Direita com cesto do acabou Disponível em: <http://segundosprofes.blogspot.com. br/2012_08_01_archive.html>. Acesso em: 10 nov. 2012. Figura 19 - Emparelhamento de cores Fonte: Disponível em: <http://portuguese.alibaba.com/product-gs/l450-64- pc-pairing-screw-set-460508556.html>. Acesso em: 10 nov. 2012. Figura 20- Emparelhamento de cores Fonte: Disponível em: <http://portuguese.alibaba.com/product-gs/l450-64- pc-pairing-screw-set-460508556.html>. Acesso em: 10 nov. 2012. 106 Transtornos Globais do Desenvolvimento Figura 21 - Emparelhamento de palavras Fonte: As autoras. Figura 22 - Emparelhamento de figuras geométricas Fonte: As autoras. Você deve ter percebido nas figuras acima que a informação visual das atividades fornecerem informações simples e concretas, assim como são visualmente atrativas em relação a suas cores, formas e harmonia. Leon e Osório (2011) explicam que no método TEACCH a maneira como a informação visual é apresentada é fundamental, pois objetiva-se que as 107 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 fotos e as imagens utilizadas auxiliem na compreensão e na expressão dos enunciados, instruções e realização do cotidiano. Desta forma, o passo a passo da preparação de um sanduíche, por exemplo, pode ser enfatizada a partir de recipientes com os materiais ou rótulos dos produtos a serem utilizados, tal como demonstrada na foto abaixo. Figura 23 - Preparação de cachorro-quente Fonte: CEDAP Brasil (2012). No método TEACCH, do mesmo modo que a quantidade e a duração das atividades aumentam à medida que a pessoa com TGD cresce e se desenvolve, os tipos de atividades também se tornam mais complexos. O planejamento terapêutico leva em conta, então, a avaliação de diferentes repertórios de habilidades da criança, tais como imitação, percepção, coordenação motora, desenvolvimento cognitivo e de linguagem e de seus interesses. Dentre os instrumentos de avaliação existentes para pessoas com TGD, no Brasil a mais utilizada para avaliar crianças até 12 anos é o PEP-R (Profile Psychoeducational Revised). É um teste longo composto 171 itens que através de escalas específicas com tarefas a serem executadas e comportamentos a serem observados, avalia a coordenação motora ampla, coordenação motora fina, coordenação visomotora, percepção, imitação, desempenho cognitivo e cognição verbal, relacionamento e afeto, brincar, interesses por materiais, respostas sensoriais e linguagem (LEON; OSÓRIO; 2011). 108 Transtornos Globais do Desenvolvimento Além do PEP-R, existem outros instrumentos de avaliação utilizados pelo método TEACCH. São eles: CARS (Childhood Autism Rating Scale) e AAPEP (Adolescent and Adult Psychoeducational Profile).Este último é utilizado para planejamento terapêutico de pessoas com mais de 12 anos de idade. Leon e Osório (2011) esclarecem que além das atividades individuais também são realizados trabalhos coletivos em que o grupo realiza em conjunto a mesma atividade. Cada integrante do grupo contribui com suas habilidades já adquiridas. Neste capítulo nós explicamos a metodologia TEACCH aplicada na intervenção especializada. A aplicação do TEACCH no ensino regular será explicada no Capítulo 5. Em suma, o método TEACCH visa à autonomia do sujeito e a sua adaptação ao meio social através do desenvolvimento cognitivo, da linguagem e de comportamentos socialmente aceitos. Isso significa que, neste método, a aprendizagem ocorre por meio de atividades concretas e visuais, através da repetição, memorização e condicionamento operante de comportamentos. O condicionamento operante foi desenvolvido por Skinner que estabeleceu que todo comportamento é influenciado pelo estímulo antecedente a ele e pelo resultado consequente, ou seja, a consequência após a execução do comportamento. O comportamento aumenta de frequência diante de reforço positivo (recompensa), e o reforço negativo (retirada de estímulo aversivo), e o comportamento diminui diante da presença da consequência negativa (punição). 109 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 Atividade de Estudos: 1) Faça uma síntese de como funciona o método TEACCH, com base no que estudou nesta seção: _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ ______________________________________________ ______________________________________________ ______________________________________________ ______________________________________________ O Método PECS PECS (The Picture Exchange Communication System) ou Sistema de Comunicação por Troca de Figuras foi desenvolvido nos Estados Unidos em 1985, pelo psicólogo Andrew Bondy e pela fonoaudióloga Lori Frost, com o objetivo de pessoas com TGD que não se comunicam, ou se comunicam com pouca eficiência, ou não tenham como se comunicar por meios convencionais iniciarem sua comunicação e adquirirem rapidamente habilidades comunicativas. Através da troca de figura com o item desejado com o parceiro, a pessoa com TGD percebe que se comunicar é mais eficaz e rápido em conseguir o que deseja do que utilizar comportamentos inadequados como choro ou agressividade (MACEDO; ORSATI, 2011). 110 Transtornos Globais do Desenvolvimento Muitas pessoas como, por exemplo, pais ou profissionais, se perguntam se a utilização dos PECS poderia levar a criança COM TGD a ter preguiça de falar ou até mesmo privar a aprendizagem da comunicação verbal. Deixamos esta dúvida para ser respondida ao final desta seção, após conhecermos mais sobre o Método PECS. De acordo com Macedo e Orsati (2011), o Programa PECS busca ensinar a discriminação dos símbolos utilizados para representar os objetos e ações desejadas, a utilização com função comunicativa, e como agrupar os cartões de modo a formar sentenças simples. Isto é feito em seis etapas: 1. Início da comunicação: Ensina-se a criança que assim que ela entregar o cartão que representa o objeto que ela deseja, ela receberá tal objeto. Por exemplo: Se a criança deseja receber a bala, ela deve pegar o cartão que tem a figura da bala entregar ao adulto e esperar que seu pedido seja atendido imediatamente. Nesta fase, apresenta-se para a criança apenas uma opção de figura. 2. Comunicação a maior distância: Nesta fase, a figura não está prontamente disponível. A criança deve saber procurar a figura e se mover até a pessoa que pode lhe ajudar a entregar o objeto que deseja. A criança continua a ter acesso apenas a uma figura. 3. Discriminação: Nesta fase, aumenta-se o número de opções de cartões, assim como não se atende prontamente ao pedido, para ajudar a criança a lidar com a espera. A criança passa a ter uma pasta com cartões, que primeiramente possuirá dois cartões e, gradativamente é aumentado até cinco cartões. Ao final desta fase, a criança deverá conseguir ir até a sua pasta, escolher um cartão entre outros, aproximar-se de seu parceiro de comunicação e entregar-lhe o cartão que representa seu pedido. Abaixo segue uma foto que ilustra a pasta com cartões: 111 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 Figura 24 - Pasta com PECS Fonte: Disponível em: <http://autismo-actividadesesugestoes.blogspot.com. br/2010/03/pecs-picture-exchange-communication.html>. Acesso em: 10 nov. 2012. 1. Formação de sentenças: Nesta fase, a criança passará a utilizar a sentença “eu quero...”. Esta sentença estará impressa em um cartão que já estará exposto em uma mesa. A criança completará a sentença colocando a figura que deseja. Em seguida, o parceiro de comunicação deverá ler a sentença, e pedir para que a pessoa com TGD acompanhe a leitura com os seus olhos. Ao final desta fase, a quantidade de cartões presentes na pasta passa para 20, de tal modo que a criança estará capaz de se comunicar em diferentes contextos. Abaixo, segue um exemplo de cartões utilizados para formar sentenças: 112 Transtornos Globais do Desenvolvimento Figura 25 - PECS: Formação de sentenças Fonte: Disponível em: <http://autismo-actividadesesugestoes.blogspot.com. br/2010/03/pecs-picture-exchange-communication.html>. Acesso em: 10 nov. 2012. 1. Comunicação por sentenças: O parceiro pergunta “O que você quer?” à pessoa com TGD que aponta para a frase “eu quero...” e em seguida para a figura que completa a sentença. 2. Comunicação por sentenças complexas: Ao final da sexta fase, a criança deverá estar capaz de responder a perguntas mais complexas, tais como “O que você está vendo” ou “O que você está ouvindo?”, e a se comunicar espontaneamente. Macedo e Orsati (2011) explicam que o aprendizado da utilização dos cartões ocorre através do condicionamento operante utilizando estratégias de dicas e reforçamento (recompensas). Além disso, Macedo e Orsati (2011) chamam a atenção para a necessidade de a criança já saber fazer a discriminação visual, ou seja, reconhecer figuras e parear (combinar) a figura com os objetos reais antes de se comunicar por troca de cartões. Para crianças muito pequenas ou com dificuldades de abstração, recomenda-se utilizar o material em si para fazer pedidos. Por exemplo: a criança pode utilizar a boneca para pedir uma brincadeira ou a embalagem de um chocolate para pedir o doce. O manuseio dos cartões podem ser feitos através de pranchas, cadernos ou cartazes, ou ainda através da tecnologia “touchscreen” (telas sensíveis ao toque), como o iPad, por exemplo. 113 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 Após um ano, mais da metade das 66 crianças das 85 que aprenderam a se comunicar porPECS utilizavam a linguagem falada e os outros 30% das 66 crianças utilizavam a combinação PECS e linguagem falada. Atividade de Estudos: 1) Você se recorda da questão levantada no início desta seção? Será que incentivar a comunicação pelo uso de PECS levará o sujeito com TGD a não desenvolver a comunicação por meio da fala? Então, antes de continuarmos, após todo o conhecimento adquirido, qual sua opinião sobre isso? _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ Agora que você já escreveu sua resposta, compare com o que dizem os estudos a respeito desta questão. Macedo e Orsati (2011) citam a pesquisa de Bondy e Frostque, que em 1994 descreveram resultados positivos em 85 crianças menores de cinco anos de idade diagnosticadas com autismo e que não eram capazes de se comunicar pela fala. Após um ano, mais da metade das 66 crianças das 85 que aprenderam a se comunicar por PECS utilizavam a linguagem falada e os outros 30% das 66 crianças utilizavam a combinação PECS e linguagem falada. Dessa forma, podemos concluir que a utilização do método PECS pode ser um bom recurso para pessoas com TGD que apresentam grandes dificuldades de comunicação verbal e não-verbal. Além disso, ressaltamos que quanto mais pessoas do convívio com a criança (profissionais, professores, cuidadores e familiares) utilizarem a comunicação facilitada por cartões, mais rápida e eficaz será a comunicação da criança em diversos ambientes. 114 Transtornos Globais do Desenvolvimento Abordagens Relacionais: Uma Pespectiva Desenvolvimentista As abordagens relacionais são aquelas em que buscam o desenvolvimento e o aprendizado da pessoa com TGD através da interação social recíproca, ou seja, a partir da construção da relação e do vínculo afetivo entre o mediador e a criança, baseando sua prática na perspectiva desenvolvimentista, o qual busca compreender as peculiaridades e desvios do desenvolvimento da pessoa com autismo a partir do desenvolvimento típico. Muitas são as abordagens relacionais. Citaremos algumas: DIR/Floortime, RDI - Intervenção para o Desenvolvimento de Relacionamentos, Método Hanen, e Programa Son-Rise. Nesta seção, não aprofundamos todas as abordagens relacionais mencionadas, mas apresentamos de maneira introdutória o que elas possuem em comum. De acordo com Lampreia (2007) estas abordagens partem da premissa que faltaria ao bebê com autismo a responsividade emocional que permite o engajamento pessoa a pessoa, as habilidades para a conexão emocional e a comunicação não-verbal, como por exemplo, o contato visual e o apontar. “[...] para o enfoque desenvolvimentista no autismo, uma falha biológica impediria o bebê de relacionar-se social e afetivamente, o que acarretaria um prejuízo no desenvolvimento da linguagem e, consequentemente, no cognitivo.” (LAMPREIA, 2007, Base Scielo). Desta forma, Lampreia (2007) elucida que os programas de intervenção relacionais procuram estabelecer através da interação social o caminho de desenvolvimento que não foi possível à pessoa com autismo percorrer tal como a pessoa neurotípica: observa-se a sequência de desenvolvimento típico e proporciona-se à pessoa com autismo uma estimulação próxima de seu nível atual. Ou seja, o objetivo principal é o desenvolvimento de habilidades comunicativas e sociais de maneira que a pessoa com autismo saiba como iniciar e continuar as interações e comunicar suas intenções através de meios não simbólicos, como gestos e vocalizações, e simbólicos, como cartões com figuras. 115 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 O planejamento da intervenção é feito de maneira personalizada após uma minuciosa avaliação do desenvolvimento social, cognitivo, sensorial e habilidades autocuidado da pessoa com TGD. O termo “neurotípico” se refere ao desenvolvimento neurológico considerado típico. Pessoa com TGD apresentam o desenvolvimento neurológico atípico, conforme explicado no Capítulo 1. Em suma: Pessoas com TGD não são “anormais”, mas sim “diferentes”. Então, para exemplificar, imagine uma pessoa com autismo que inicia sua interação social levando a outra pessoa pela mão até o objeto desejado (um carrinho, por exemplo) sem fazer contato visual ou emitir qualquer som, porém após conseguir o carrinho, ela volta ao isolamento. Para este tipo de situação as metas iniciais seriam: • Olhar nos olhos para iniciar a interação social; • Apontar para o objeto desejado; • Apontar e olhar para a outra pessoa com o objetivo de indicar que precisa de ajuda; • Emitir vocalizações e pedaços de palavra para pedir o objeto que deseja. Por exemplo: a criança pode falar “ca” para pedir o carro; • Apresentar imitação, tanto de como utilizar o objeto de maneira funcional, quanto de como se comunicar de maneira eficaz e adequada; • Apresentar atenção compartilhada e interação (criança – brinquedo – mediador) utilizando o objeto de maneira funcional. O planejamento da intervenção é feito de maneira personalizada após uma minuciosa avaliação do desenvolvimento social, cognitivo, sensorial e habilidades autocuidado da pessoa com TGD. Tais metas podem ser trabalhadas em atividades interativas lúdicas estruturadas baseadas nos interesses e motivações da pessoa com TGD. Desta forma, as abordagens relacionais acreditam que a pessoa com TGD, motivada e interessada a interagir, supera seus desafios, se desenvolve, e aprende novos comportamentos através da mediação do terapeuta, brincando e se divertindo. 116 Transtornos Globais do Desenvolvimento Vamos citar outro exemplo mais específico: João, de 5 anos, adora bichos, música e carrinhos. Podemos criar uma atividade interativa de tal modo que toda vez que João olha em nossos olhos, nós levamos algum bicho de brinquedo para passear no carro, cantando alguma música predileta dele. João pode também tentar cantar, empurrar o carrinho ou escolher qual será o próximo bicho a passear. Se quisermos ajudá-lo a fazer algum pareamento de figuras iguais, podemos pedir para ele parear os bichos e, toda vez que ele formar o par, o respectivo bicho será levado a passear. Se quisermos que ele passe a se interessar por uma nova atividade, como quebra-cabeça, podemos pedir para João encaixar uma peça de quebra-cabeça de animais. Toda vez que ele encaixar uma peça, você leva o respectivo bicho para passear no carro. Com o tempo o quebra-cabeça em si se tornaria motivador para João. Atividade de Estudos: 1) Agora é sua vez! Desafiamos você a criar uma atividade lúdica para uma criança com autismo que tem dificuldade em realizar contato visual, utilizando os princípios das abordagens relacionais e os seguintes elementos motivadores (bolhas de sabão e palhaço). _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ __________________________________________________________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ 117 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 As sessões de intervenção são individuais e realizadas em uma sala convidativa para brincar, na qual estariam presentes brinquedos e jogos novos e conhecidos pela criança, baseados nas motivações dela. Na Figura (X), podemos visualizar um exemplo de uma sala de intervenção: Figura 26 - Sala de atendimento da Abordagem Relacional Fonte: Disponível em: <www.inspiradospeloautismo. com.br>. Acesso em: 01 nov. 2012. O grande diferencial das abordagens relacionais para as abordagens comportamentais é que a primeira visa à interação social e o relacionamento, de tal forma que os comportamentos aprendidos têm função no contexto social interativo. Isto quer dizer que nas abordagens relacionais, as habilidades sociais e cognitivas são desenvolvidas em situações naturais do cotidiano e em atividades interativas lúdicas, tal como ocorrem no aprendizado das pessoas neurotípicas. Desta forma, podemos, por exemplo, ensinar a criança a “apontar” quando ela quiser algo que está fora de seu alcance, como água, comida ou brinquedos. Podemos oferecer pouca água ou objetos de cada vez, para oportunizar mais momentos de aprendizado. Em vez de dar todo o quebra-cabeça, podemos dar uma peça por vez. Já em atividades lúdicas, a “recompensa”, ou seja, a consequência positiva da participação da criança na atividade que faria com que a criança quisesse participar mais da atividade, seria a ação do terapeuta na brincadeira ou interação. Por exemplo: se quisermos que a criança aprenda a jogar a bola para o terapeuta, este busca ser bastante divertido e interessante ao devolver a bola, de tal modo que a criança queira jogar a bola de novo e, assim, continuar a interagir com o terapeuta por motivação intrínseca, desejo próprio, ou seja, sem ser forçada para isso. Um jeito divertido de jogar a bola pode ser imitando os bichos, caso a criança goste de bichos, ou cantando música, ou ainda fazendo efeitos sonoros. Assim, as reações do terapeuta frente às participações da criança na atividade são baseadas nos interesses e motivações de cada criança. 118 Transtornos Globais do Desenvolvimento É fundamental a utilização de padrões de interação social com a pessoa com autismo tal como ocorrem naturalmente nos contextos sociais com pessoas neurotípicas. Lampreia (2007) explica que é fundamental a utilização de padrões de interação social com a pessoa com autismo tal como ocorrem naturalmente nos contextos sociais com pessoas neurotípicas. Para tanto, criamos oportunidades naturais para a interação social e, a partir da necessidade da criança, ensinamos passo a passo como ela pode interagir e se comunicar de maneira adequada. Exemplos de situações naturais podem ser na hora do banho, das refeições, no momento de escolher a roupa que vai vestir, ao passear etc. São oportunidades para incentivar a criança a fazer escolhas, solucionar situações a fim de se atingir o objetivo desejado, e para desenvolver a conversação e compreensão do contexto interativo. Segundo Lampreia (2007), a intenção e motivação da criança são fundamentais, e por isso, nestas abordagens a criança também apresenta o papel de iniciador da interação social. Isto é, o mediador segue o foco de interesse da pessoa com TGD, reconhece e interpreta suas comunicações e intenções espontâneas, e responde a estas comunicações. Lampreia (2007, BASE SCIELO) explica que a abordagem relacional [...] considera habilidades de desenvolvimento tais como atenção e foco, engajamento e relacionamento social, gesto não verbal, afeto, resolução de problemas, comunicação simbólica, pensamento abstrato e lógico. Essas habilidades são chamadas de processos emocionais funcionais por terem em sua base as interações emocionais iniciais. O tratamento visa ajudar a criança a estabelecer a sequência de desenvolvimento que foi prejudicada e ajudá-la a tornar- se mais intencional e afetivamente conectada. Além das atividades de estruturas baseadas nos interesses e motivações da pessoa com TGD, e respostas às comunicações espontâneas da criança, modelando e solicitando a comunicação adequada (o próximo passo no desenvolvimento), as estratégias clínicas também devem ocorrer em rotinas naturais em casa e na escola, assim como, em ambientes comunitários. Para tanto, a família e professores são cruciais, e por isso, devem ser apoiados e treinados. 119 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 O desenvolvimento da linguagem e da comunicação com função social recíproca é um ponto muito importante nas abordagens relacionais. Sugerimos que você leia o livro “Mais do que Palavras” da autora Fern Sussman Figura 27 - Terapeuta incentivando a imitação de gestos de uma coreografia Fonte: Disponível em: <http://proautinclusao.blogspot. com.br/>. Acesso em: 12 nov. 2012. O desenvolvimento da linguagem e da comunicação com função social recíproca é um ponto muito importante nas abordagens relacionais. Buscamos tal desenvolvimento, a partir da utilização e estratégias mediadoras e valorização de todas as formas verbais e não-verbais de comunicação receptiva e expressiva em situações naturais e espontâneas e em atividades lúdicas, como por exemplo, atividades exploratórias e simbólicas, jogos, desenhos, leitura de figuras e de textos (PERISSINOTO, 2011). Figura 28 - Terapeuta incentivando a linguagem através da exploração do livro Fonte: Disponível em: <http://proautinclusao.blogspot. com.br/>. Acesso em: 12 nov. 2012. 120 Transtornos Globais do Desenvolvimento Lampreia (2007, Base Scielo) explica que os déficits em comunicação e linguagem são abordados através da terapia da linguagem sociopragmática que enfatiza o uso funcional das habilidades pré-verbais e verbais de comunicação nas interações naturais e semiestruturadas. Inclui estratégias para o uso de sistemas de comunicação não-verbais como imagens simbólicas. Perissinoto (2011) esclarece que no primeiro momento a intervenção busca desenvolver habilidades para sustentar as competências sociais e precursoras da linguagem verbal, tais como: • Atenção compartilhada em diversas atividades e contextos; • Habilidades de expressão facial, contato visual e gestos para prestar atenção aos que outros estão prestando e compartilhar suas experiências na interação social; • Habilidades não-verbais, verbais e pragmáticas para fazer pedidos de acordo com o desenvolvimento típico; • Capacidade de se envolver em diversas brincadeiras, de tal modo que consiga seguir as regras, alternar a vez, contribuir com ideias espontâneas, fazer a imitação apropriada de ações isoladas e ou combinadas com o contexto; • Percepção de diferentes pontos de vista em jogos sociais (Habilidade em Teoria da Mente). Após o desenvolvimento destas habilidades, segundo Perissinoto (2011), as habilidades sociais e comunicativas a serem desenvolvidas seriam: • Habilidade para detectar e distinguir palavras ambíguas; • Compreensão dos significados múltiplos e flexíveis das palavras; • Competências para avaliar as diferentes formas de se expressar nas mais variadas situações sociais e ouvintes; • Compreensão das mais variadas gírias e figuras de linguagem, como ironia, metáfora, metonímia, que não podem ser compreendidas se interpretadas literalmente. Lampreia(2007) esclarece que para pessoas com TGD com altas 121 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 Tentamos compreender os comportamentos e necessidades da criança de maneira funcional, de tal modo que os terapeutas fazem uma análise e investigação de como e quais estratégias de intervenção podem ser mais eficazes. habilidades, mas dificuldades sociais principalmente em flexibilidade e Teoria da Mente, uma estratégia de intervenção é oportunizar a interação com pares mais experientes. Podem-se fazer atividades interativas com grupos de 3 a 5 integrantes, sendo que alguns apresentam dificuldades sociais e outros são bem desenvolvidos, de tal modo que os mais experientes podem ser modelos sociais e mediadores para os menos desenvolvidos. A compreensão de atos comunicativos envolve a compreensão de diferentes funções comunicativas como pedir, protestar, declarar, comentar e demonstrar afeto. Envolve também a atenção a diferentes meios comunicativos, como a expressão facial, o olhar, a manipulação do corpo e da face, gestos, entonação, ecolalia. No início, um adulto serve de intérprete para ajudar o par experiente a compreender o que o principiante quer significar. Depois essa responsabilidade é transferida para o próprio par experiente. Ao interpretar as deixas verbais e não-verbais dos principiantes como atos significativos e intencionais, os pares experientes aprendem a responder e a favorecer essas iniciações de jogo (LAMPREIA, 2007, BASE SCIELO). Nas abordagens relacionais buscamos, então, ser responsivos às comunicações, intenções e interesses da pessoa com TGD, de tal modo que os terapeutas se tornam mediadores para o desenvolvimento a partir da interação social recíproca. Além disso, tentamos compreender os comportamentos e necessidades da criança de maneira funcional, de tal modo que os terapeutas fazem uma análise e investigação de como e quais estratégias de intervenção podem ser mais eficazes. Nesta investigação e busca pela intervenção mais eficaz, o conhecimento em Processamento Sensorial e Integração Sensorial faz-se bastante necessário. É o que você vai conhecer a seguir. A Terapia de Integração Sensorial Importante! A Terapia de Integração Sensorial apenas pode ser realizada pelo profissional Terapeuta Ocupacional habilitado para exercer tal prática, pois a aplicação de atividades sensoriais sem conhecimento do método e a utilização indiscriminada dos equipamentos, atividades e recursos podem gerar disfunções e atrapalhar o desenvolvimento sensorial da criança. 122 Transtornos Globais do Desenvolvimento A terapia ocorre em uma sala de Integração Sensorial que contém recursos e equipamentos que promovem sensações vestibulares, proprioceptivas e informações auditivas, visuais, olfativas, gustativas e táteis. O objetivo desta seção é apresentar a Terapia de Integração Sensorial para que você conheça esta importante intervenção utilizada para pessoas com TGD diagnosticadas com Transtorno de Processamento Sensorial (TPS). Para isso, escrevemos esta seção com base no artigo “Integração Sensorial nos Transtornos do Espectro do Autismo” escrito pela terapeuta ocupacional Aline Mommo e pela psicóloga Cláudia Silvestre. A Terapia de Integração Sensorial (TIS) consiste na realização de atividades lúdicas, jogos e brincadeiras que oferecem a estimulação sensorial organizada a fim de se promover o apropriado processamento sensorial e, consequentemente, o correto planejamento da resolução de situações- problema, organização do comportamento, e a emissão de respostas adequadas para a execução das tarefas com sucesso, gerando, assim, a aprendizagem da criança (MOMMO; SILVESTRE, 2011). A terapia ocorre em uma sala de Integração Sensorial que contém recursos e equipamentos que promovem sensações vestibulares, proprioceptivas e informações auditivas, visuais, olfativas, gustativas e táteis. Neste ambiente, a criança, com a mediação do terapeuta, poderá executar diferentes desafios, e explorar aparelhos suspensos e objetos de diferentes texturas, consistências e formas diferenciadas (MOMMO; SILVESTRE, 2011). A seguir, citamos alguns exemplos dos aparelhos utilizados na sala de terapia de Integração Sensorial: o cavalo, a plataforma, o escorregador, o balanço, o rolo, a rede, o skate, a cama elástica, piscina de bolinhas, tábuas de equilíbrio. Figura 29 - Sala de Terapia de Integração Sensorial Fonte: Disponível em: <http://topediatrica.blogspot.com.br/2010/05/ terapia-de-integracao-sensorial.html>. Acesso em: 10 nov. 2012. 123 Abordagens de Intevenção para Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 4 Figura 30 - Sala de Terapia de Integração Sensorial Fonte: Disponível em: <http://topediatrica.blogspot.com.br/2010/05/ terapia-de-integracao-sensorial.html>. Acesso em: 10 nov. 2012. Figura 31- Plataforma de Equilíbrio Fonte: Disponível em: <http://www.pratick.com.br/ginastica-funcional_ prancha-de-equilibrio-90x60.html>. Acesso em: 10 nov. 2012. 124 Transtornos Globais do Desenvolvimento Figura 32 - Rede Fonte: Disponível em: <http://standart.com.br/produtos_itens. php?cat=6&prod=42>. Acesso em: 10 nov. 2012. Figura 33 - Aparelhos para Terapia de Integração Sensorial Fonte: Disponível em: <http://queridoap.blogspot.com. br/2010_10_01_archive.html>. Acesso em: 10 nov. 2012. Segundo Mommo e Silvestre (2011), o terapeuta deve observar os comportamentos da pessoa com TGD a fim de identificar pistas sobre as suas necessidades sensoriais e desvios no processamento sensorial, tais como explicamos no Capítulo 3. Comportamentos de desorganização, desequilíbrio do nível de atividade e descontrole do estado de alerta podem auxiliar na identificação de informações sensoriais que não estão corretamente integradas. Comportamentos de regulação de nível de atividade e manutenção do estado de alerta também podem ser excelentes guias para o processo terapêutico com a participação efetiva da criança (MOMMO; SILVESTRE, 2011, p. 307). 125 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 Diminuição de respostas aversivas às informações táteis presentes nas tarefas cotidianas para facilitação do desempenho em atividades de autocuidado. Tal motivação se evidencia através de ações motoras, da fala e da intenção comunicativa. Mommo e Silvestre (2011) explicam que a aproximação espontânea da criança de algumas atividades ou estímulos sensoriais podem justificar algumas de suas necessidades sensoriais. Por isso, faz-se fundamental na terapia seguir a motivação intrínseca da criança por determinadas brincadeiras ou objetos que deseja explorar e experimentar. Tal motivação se evidencia através de ações motoras, da fala e da intenção comunicativa. “O terapeuta deve ser a escuta e a observação, mas não a fala ou execução. O respeito à motivação intrínseca da criança, à liberdade de exploração, à motivação pelo compromisso e à diminuição do direcionamento verbal ou motor garante a fidelidade [...]” ao princípio de que a terapia de integração sensorial deve envolver a participação efetiva da criança (MOMMO; SILVESTRE, 2011, p. 307). Além de manter o equilíbrio entre a necessidade e a motivação intrínseca da criança, Mommo e Silvestre (2011), ressaltam a importância de controlar as entradas dos estímulos sensoriais (tipos, quantidade e intensidade) para não sobrecarregar a criança. Para tanto, o terapeuta deve atribuir significado às experiências sensoriais da criança e organizar o ritmo, a duração e a sequência de movimentos, ações ou tarefas realizadaspela criança, assim como oferecer um programa de nutrição sensorial, a fim de a criança receber ao longo do dia, vasto repertório de estímulos sensoriais agradáveis e incentivadoras que reduzam comportamentos de agitação, irritabilidade e evitamento. A preocupação inicial deve incluir a adequação do registro sensorial e o equilíbrio do estado de alerta. Posteriormente trabalha-se a habilidade para sustentar o nível de alerta e a organização do tempo, ritmo das atividades. Em um nível mais complexo, segue-se com o conhecimento, a ideação, e a antecipação de ações, e com a organização e o planejamento motor (MOMMO; SILVESTRE, 2011, p. 38). Desta forma, os objetivos da Terapia de Integração Sensorial para a pessoa com TGD são: • diminuição de respostas aversivas às informações táteis presentes nas tarefas cotidianas para facilitação do desempenho em atividades de autocuidado; • diminuição da hiperresponsividade sensorial e facilitação da sustentação do nível de alerta para eficiência em diversos contextos de desempenho ocupacional; • otimização do domínio em jogos com significado e propósito; • diminuição da hiporresponsividade com incremento do repertório de respostas para facilitar a atenção e destreza na realização de atividades cotidianas; 126 Transtornos Globais do Desenvolvimento • melhora da tolerância ao contato físico e da participação em atividades de grupo, com diminuição da hiperresponsividade sensorial; • melhora da capacidade de imitação e de antecipação de eventos diários, facilitando a organização da rotina diária; • otimização do planejamento motor e da resolução de problemas para aprimorar o desempenho ocupacional (MOMMO; SILVESTRE, 2011, p. 308). Podemos concluir que, os objetivos, o planejamento e a aplicação do processo terapêutico devem ser personalizados para cada caso a partir de uma minuciosa avaliação sensorial e das necessidades da pessoa com TGD. Atividade de Estudos: 1) A Figura X mostra a imagem do cérebro humano, destacando a parte responsável pelo processamento sensorial, o Lobo Parietal. Escreva, com base nos estudos realizados nesta seção, como a TIS pode auxiliar a pessoa com TGD a melhorar o desempenho desta região. Figura 34 - Lobo Parietal Fonte: Tafner e Fischer (2004). _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ 127 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ Algumas Considerações Neste capítulo, estudamos as abordagens de Intervenção mais utilizadas atualmente por profissionais que atuam com pessoas com TGD. ABA, TEACCH, PECS, abordagens relacionais e a TIS sempre geram calorosas discussões quando são pauta em Congressos sobre Transtornos Globais do Desenvolvimento. Certamente, você vai ouvir falar dessas abordagens novamente, podendo ouvir críticas negativas e positivas. Nesse sentido, o mais importante é você conseguir compreender e analisar cada uma delas para poder argumentar sempre que participar dessas discussões. Para revisarmos os principais pontos apresentados no Capítulo 4, escolhemos os tópicos a seguir: • O método ABA ou Análise Aplicada do Comportamento baseia-se no Behaviorismo Radical posposto por Skinner em 1930 e pelo Dr. Ivar Lovaas em 1987; • O método ABA abrange várias áreas do conhecimento, como o autocuidado, o desenvolvimento motor, social, da linguagem, do brincar e habilidades acadêmicas; • Os passos para a implantação dos Programas em ABA são: Reforçamento Contínuo, Pareamento de Estímulos, Modelagem, Tentativa Discreta, Hierarquia de Dicas de Resposta, Esquema de Reforçamento Itermitente; 128 Transtornos Globais do Desenvolvimento • O Método TEACCH foi criado por Eric Shopler em 1966 na divisão de Psiquiatria da Escola de Medicina da Universidade da Carolina do Norte (EUA); • A programação da rotina é algo fundamental no Método TEACCH; • O planejamento do método TEACCH, leva em conta a avaliação da criança, nos aspectos de imitação, percepção, coordenação motora, desenvolvimento cognitivo e de linguagem e de seus interesses; • O PECS ou Sistema de Comunicação por Troca de Figuras foi desenvolvido nos Estados Unidos, em 1985 pelo psicólogo Andrew Bondy e pela fonoaudióloga Lori Frost; • O objetivo do PECS é de desenvolver habilidades comunicativas em pessoas com TGD que não se comunicam ou se comunicam com pouca eficiência; • As abordagens relacionais são aquelas em que buscam o desenvolvimento e o aprendizado da pessoa com TGD a partir da construção da relação e do vínculo afetivo entre o mediador e a criança; • O planejamento da intervenção nas abordagens relacionais é feito de maneira personalizada após uma minuciosa avaliação do desenvolvimento social, cognitivo, sensorial e habilidades de autocuidado da pessoa com TGD; • O grande diferencial das abordagens relacionais para as abordagens comportamentais é que as abordagens relacionais visam à interação social e o relacionamento, de tal forma que os comportamentos aprendidos têm função no contexto social interativo; • A Terapia de Integração Sensorial (TIS) consiste na realização de atividades lúdicas, jogos e brincadeiras que oferecem a estimulação sensorial organizada a fim de se promover o apropriado processamento sensorial. Com o objetivo de finalizarmos os estudos do Transtorno Global do Desenvolvimento, passamos para o Capítulo 5, onde abordamos sobre a Inclusão Escolar da pessoa com TGD e, sugerimos estratégias para o trabalho pedagógico na escola. 129 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 Referências BAGAIOLO, L.; GUILHARDI, C.; ROMANO, C. Análise Aplicada do Comportamento. In: SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. FAGIANNI, R. Tutorial ABA. São Paulo, 2012. Disponível em: <http://www. autismo.psicologiaeciencia.com.br/tutorialaba/>. Acesso em: 07 jul. 2012. KWEE, C. S.; SAMPAIO, T. M. M.; ATHERINO, C. C. T. Autismo: uma avaliação transdisciplinar baseada no programa TEACCH. Revista CEFAC. São Paulo, v. 11, supl. 2, 2009. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. LAMPREIA, C. A perspectiva desenvolvimentista para a intervenção precoce no autismo. Estudos em Psicologia. Campinas, v. 24, n. 1, 2007. Disponível em: <www.scielo.org>. Acesso em: 07 jul. 2012. LEAR, K. Ajude-nos a Aprender: Manual de Treinamento em ABA Parte 1. 2. ed. Toronto: Ontario, 2004. Disponível em: <http://www.autismo. psicologiaeciencia.com.br/biblioteca-aba/> Acesso em: 07 jul. 2012. LEON, V. C.; OSÓRIO, L. O Método TEACCH. In: SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. MACEDO, E. C.; ORSATI, F. Comunicação Alternativa. In: SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. MOMMO, A.; SILVESTRE, C. Integração Sensorial nos Transtornosdo Espectro do Autismo. In: SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. PERISSINOTO, J. Condutas Terapêuticas em Linguagem e Comunicação. Psicologia e os Transtornos do Espectro do Autismo. In: SCHWARTZMAN, S.; ARAÚJO, C. Transtornos do Espectro do Autismo. São Paulo: Memnon, 2011. TAFNER, M. A.; FISCHER, J. O Cérebro e o Corpo no Aprendizado. Indaial: ASSELVI, 2004. 130 Transtornos Globais do Desenvolvimento CAPÍTULO 5 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes objetivos de aprendizagem: 3 Compreender a trajetória e a evolução da Inclusão Escolar e as propostas que fundamentam sua prática pedagógica. 3 Repensar a prática pedagógica e a estrutura escolar para promover a inclusão do aluno com Transtorno Global do Desenvolvimento. 132 Transtornos Globais do Desenvolvimento 133 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 Contextualização Nunca discutimos tanto sobre inclusão escolar como na última década. Essa discussão teve origem a partir do momento em que a Constituição Federal de 1988, em seu Art. 206, inciso I, determinou como um dos princípios para o ensino “a igualdade de condições de acesso e permanência na escola” (BRASIL, 2012, site). O termo “igualdade” refere-se a todos; portanto, a partir dessa lei, todos passaram a ter o direito de frequentar a escola regular. Isto é, o grupo de pessoas que antes só podia frequentar escolas especializadas, a partir da Constituição Federal de 1988 e da LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educação de n. 9.394/96 passou a ter o direito de efetivar matrícula na escola comum. Essa mudança trouxe um desafio às escolas comuns, ou seja, fez com que as escolas tivessem que se reestruturar para poder atender crianças que, muitas vezes, aprendem e se comportam de maneira diferente, por conta de seu transtorno, síndrome ou deficiência, e que, por isso, necessitam de adaptações específicas tanto na estrutura física, quanto pedagógica para que consigam desenvolver seu aprendizado. As pessoas com Transtornos Globais do Desenvolvimento também se incluem nesse novo grupo que passou a ter direito à educação formal nas escolas comuns, porém a forma peculiar como interpretam as informações do ambiente nos remete a reestruturar as práticas escolares e a criar novas estratégias de intervenção pedagógica. Dessa forma, neste último capítulo, apresentamos a você um breve histórico da evolução da Educação Inclusiva, uma reflexão do que significa Inclusão Escolar e, para finalizar, estratégias que poderão tornar a inclusão das pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento mais efetivas no aspecto social e cognitivo. Da Exclusão a Inclusão: Um Breve Histórico Antes de falarmos sobre Inclusão Escolar, é importante saber que este modelo de educação passou por uma longa trajetória produzida historicamente. A pergunta-chave desta seção é: Quais os caminhos percorridos pela educação até chegar no modelo atual, que chamamos de Educação Inclusiva? Destacamos que a mesma é resultado de mudanças históricas que foram constituídas socialmente. Para entender a gênese histórica desse modelo, é essencial que você faça uma análise das acepções e práticas que a elas servem de base. 134 Transtornos Globais do Desenvolvimento O modelo de exclusão, mundialmente falando, se comparado com os demais – da segregação, integração e inclusão –, foi o que predominou por mais tempo no que diz respeito à história social das pessoas com deficiência, transtornos ou síndromes. Ressaltamos que, por se tratar de mudanças de paradigmas, essas fases não ocorreram ao mesmo tempo para todos os grupos sociais, já que cada população tem seu próprio momento cultural e histórico. Embora os fenômenos históricos aconteçam de forma não-linear, ou seja, não ocorram de maneira contínua, a história da Educação Especial pode ser dividida, segundo Sassaki (1997) em quarto fases, sendo exclusão, segregação ou separação, integração e inclusão. Ressaltamos que, por se tratar de mudanças de paradigmas, essas fases não ocorreram ao mesmo tempo para todos os grupos sociais, já que cada população tem seu próprio momento cultural e histórico. Em relação a isso, Sassaki (1997, p. 16) nos explica que A sociedade, em todas as culturas, atravessou diversas fases no que se refere às práticas sociais. Ela começou praticando a exclusão social de pessoas que – por causa das condições atípicas – não lhe pareciam pertencer à maioria da população. Em seguida, desenvolveu o atendimento segregado dentro de instituições, passou para a prática da integração social e recentemente adotou a filosofia da inclusão social para modificar os sistemas sociais gerais (grifos no original). Entretanto, não podemos pensar nas fases mencionadas por Sassaki (1997) desvinculadas de seus momentos históricos, pois as mesmas foram norteadas por políticas públicas que enfatizavam as visões de mundo concebidas em tais momentos. Além disso, as quatro fases se referem às práticas sociais, portanto a educação, que é uma dessas práticas, está diretamente atrelada a essas mudanças. Dessa forma, quando falamos em exclusão, segregação, integração e exclusão neste capítulo, estamos nos referindo ao acesso à educação em escolas regulares. O modelo de exclusão, mundialmente falando, se comparado com os demais – da segregação, integração e inclusão –, foi o que predominou por mais tempo no que diz respeito à história social das pessoas com deficiência, transtornos ou síndromes. Nessa fase, era natural pensar em abandono e, até, na morte dos “débeis”, pois dessa forma, o sujeito deficiente não contaminaria o resto da sociedade. Essa maneira de pensar modificou-se à medida que o Cristianismo se difundiu, gerando o pressuposto de que o deficiente é um indivíduo dotado de alma e que, portanto, necessita ser socorrido. Esse reconhecimento da deficiência aos poucos transformou a fase de exclusão em fase de segregação ou separação, quando ocorreu a institucionalização da deficiência. 135 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 Institucionalização da deficiência significa, nesse caso, oferecer ensino às pessoas com deficiência em locais especializados, fora das escolas regulares. A fase de segregação ficou caracterizada pela retirada das pessoas com deficiência de suas comunidades de origem e pela manutenção das mesmas em instituições residenciais segregadas ou escolas especiais, situadas longe da localidade de suas famílias. Em outras palavras, as pessoas com deficiência tiveram acesso à educação, mas de forma segregada. Foi nessa época, mais especificamente no século XIX, que a Escola Especial passou a exercer um papel importante para as pessoas com deficiência, pois, segundo Beyer (2005, p. 14), essas escolas “integraram, pela primeira vez, as crianças com deficiência no sistema escolar”. Diferentemente do que imaginamos, a Escola Especial não foi criada para segregar as pessoas com deficiência, e sim, para dar a oportunidade de ensino que o sistema regular negava a essas pessoas. Sobre a Escola Especial, Glat (1998, p. 11) explica, que Tradicionalmente o atendimento aos portadores de deficiências era realizado de natureza custodial e assistencialista. Baseado em um modelo médico, a deficiência era vista como uma doença crônica e o deficiente como um ser inválido e incapaz, que pouco poderia contribuir para a sociedade, devendo ficar ao cuidado das famílias ouinternado em instituições ‘protegidas’, segregado do resto da população. Em relação ao exposto por Glat (1998), Beyer (2005, p. 15), adverte que “as escolas especiais foram importantes historicamente, mas uma solução transitória não tem ou não deve ter caráter permanente”. Dessa forma, é importante termos consciência da importância histórica da Educação Especial, como um meio de acesso à educação pelas pessoas com deficiência, porém precisamos estar cientes de que foi uma solução passageira. 136 Transtornos Globais do Desenvolvimento Nos anos subsequentes à publicação do Relatório Warnock (1978), tornou-se claro que seriam necessárias alterações substanciais no pensamento que se refere às três dimensões citadas, ou seja, situacionais, sociais e funcionais. Na citação de Beyer (2005) aparece o termo “integraram”. Cabe lembrar que a integração mencionada por Beyer (2005) é diferente da fase de integração em escolas regulares, pois apesar de as pessoas com deficiência estarem integradas em um sistema de ensino, esse sistema funcionava separado do convívio social. O processo de desinstitucionalização teve início com as mudanças socioeducacionais que ocorreram nos anos de 1970, dando um novo rumo à educação de pessoas com deficiência. Desinstitucionalização é o processo que marcou a transferência gradual das pessoas com deficiência das instituições especiais para as escolas regulares. A Comissão de Warnock, que aconteceu em Londres em 1978, deu o seu apoio ao princípio da integração para alunos com necessidades educacionais especiais, distinguindo três formas principais de integração, que descreveu como: situacionais, em que unidades ou turmas especiais se encontram ligadas com escolas do ensino regular; sociais, nas quais os alunos da unidade convivem com as outras crianças e, se possível, partilham atividades organizadas fora da sala de aula; e funcionais, nas quais aqueles que têm necessidades educacionais especiais assistem às aulas da escolaridade regular em regime de tempo inteiro ou de tempo parcial (WARNOCK, 1978). Nos anos subsequentes à publicação do Relatório Warnock (1978), tornou- se claro que seriam necessárias alterações substanciais no pensamento que se refere às três dimensões citadas, ou seja, situacionais, sociais e funcionais. A insatisfação com uma interpretação estreita da integração enquanto problema da minoria, na qual o sucesso significava adequar uma criança a um sistema que não fora concebido tendo em conta as suas necessidades, conferiu um impulso significativo a uma mudança na utilização da terminologia, passando a ser utilizado o termo inclusão em vez de integração. Diferente da proposta da integração que visava modificar os alunos até que pudessem se encaixar no perfil das escolas regulares, a inclusão visa que a escola se molde para atender as necessidades de cada aluno. Além disso, o termo inclusão implica o reconhecimento de que todos estão abrangidos, ou seja, o princípio da prática educativa inclusiva se aplica a todos os alunos. 137 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 Vamos entender melhor as quatro fases mencionadas até aqui? • Na fase de exclusão, as pessoas com deficiência estavam excluídas de todos os tipos de educação. • Na fase de segregação ou separação, foram criadas as primeiras instituições de ensino para pessoas com deficiência, mas que ficavam separadas do convívio social. • Na fase de integração, as pessoas com deficiência tinham acesso a mesma escola que as pessoas ditas normais, mas frequentavam classes separadas. • Na fase de inclusão, todas as pessoas têm direito ao acesso a escola regular. Será que podemos considerar que a segregação e a integração são formas de exclusão? Sim. A segregação pode ser considerada uma forma de exclusão, pois apesar de os alunos com deficiência estarem em uma instituição de ensino, esta era separada das escolas comuns, ou seja, estavam excluídos do ensino regular. Da mesma forma, podemos considerar que a integração é uma forma de exclusão, já que os alunos, mesmo incluídos na escola regular, ficam excluídos dos grupos de alunos ditos normais. Com isso, podemos compreender que o modelo de inclusão requer mais da escola do que o modelo de integração, pois prevê um ensino que abranja a todos em uma mesma classe dentro de uma mesma escola. Apesar da divisão dos períodos históricos discutidos até aqui, salientamos que atualmente vivemos um pouco de cada período na rotina escolar, ou seja, não é porque estamos no período da inclusão que todas as escolas praticam esse modelo de educação, porém o que todas buscam é chegar o mais próximo dentro de cada contexto. 138 Transtornos Globais do Desenvolvimento Achamos pertinente esclarecer bem esse termo, para que nós e você tenhamos o mesmo conceito e possamos delinear um diálogo claro. Atividade de Estudos: 1) Na tabela abaixo, inserimos as 4 fases discutidas nesta seção: Exclusão, Segregação, Integração e Inclusão. Insira na tabela as principais características de cada fase: FASES ASPECTOS Exclusão Segregação Integração Inclusão Para compreender mais sobre a Evolução da Educação Especial no Brasil, indicamos a leitura do Documento Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva que foi elaborado em 05 de junho de 2007 e prorrogado pela Portaria número 948, de 09 de outubro de 2007 no link: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/politica.pdf Inclusão Escolar: O Que Isto Significa? Optamos por inserir esta seção, pois consideramos que muitos falam de inclusão escolar e emitem opinião sobre essa prática sem conhecer as bases que a fundamentam. Será que nós, autoras deste caderno e você estamos falando da mesma inclusão? O que você entende por inclusão escolar? Achamos pertinente esclarecer bem esse termo, para que nós e você tenhamos o mesmo conceito e possamos delinear um diálogo claro. Para tanto, solicitamos que você analise a Figura 35. 139 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 Figura 35 - Cesta de Frutas Fonte: Disponível em: <http://www.pecadefruta.com/store>. Acesso em: 10 nov. 2012. Atividade de Estudos: 1) Após observar atentamente a Figura 35, lançamos o seguinte questionamento: Se o cesto fosse a escola regular e as crianças fossem as frutas, quais considerações podemos fazer sobre a imagem? _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ 140 Transtornos Globais do Desenvolvimento Imaginamos que você anotou suas considerações, conforme solicitado. Agora, nós também faremos as nossas, para que você possa tirar suas conclusões. Se fizermos uma analogia entre a imagem e as escolas regulares, podemos chegar a inúmeras considerações, como por exemplo: As frutas da imagem têm sabor, textura e odor diferenciados, porém todas têm seu valor nutritivo. Isso significa que, mesmo que uma fruta não seja igual a outra, todas têm algode bom para oferecer, porém depende de nós conseguir extrair o que cada uma tem de melhor. Da mesma forma que as frutas, cada aluno tem sua importância e sua forma singular de aprender e exteriorizar esse aprendizado. Não podemos considerar um aluno melhor do que o outro, nem esperar que sejam iguais em seu ritmo de aprendizagem. Assim, como não podemos esperar que a maçã possua as mesmas propriedades nutritivas de um morango, também não podemos esperar que todos os alunos aprendam e se desenvolvam da mesma maneira. Sabemos que cada fruta precisa de condições ambientais e cuidados especiais para chegar ao resultado esperado. Se compararmos com a realidade dos alunos, podemos afirmar que alunos com TGD conseguem se desenvolver na escola comum, porém temos que adequar o ambiente e a prática pedagógica para que façam isso com sucesso. Na próxima seção abordaremos esse assunto de forma mais aprofundada. Continuado com os fundamentos da inclusão, apresentamos o que alguns estudiosos pontuam sobre o tema. Mittler (2003), por exemplo, considera que as salas de aula inclusivas podem possibilitar benefícios aos alunos que se situem em contextos de aprendizagem funcional e significativa. Isso quer dizer que, para Mittler (2003), a inclusão escolar traz benefícios para a aprendizagem de alunos com e sem deficiência. Quais seriam esses benefícios? Vamos elencar alguns deles? Benefícios para alunos com deficiência: • Entendem que são diferentes, mas não inferiores; 141 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 • Ficam melhor preparados para a vida adulta em sociedade diversificada; • Adquirem experiência direta com as diferentes capacidades humanas. • Benefícios para alunos sem deficiência: • Têm acesso a uma gama mais ampla de papéis sociais; • Desenvolvem cooperação e paciência; • Assimilam que os espaços sociais não são homogêneos. Atividade de Estudos: 1) E você? Saberia apontar mais benefícios? _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ _________________________________________________ A exemplo de Mittler (2003), Stainback e Stainback (1999, p. 21) chamam a atenção quando afirmam que “[...] o ensino inclusivo é a prática da inclusão de todos – independente de seu talento, deficiência, origem socioeconômica ou origem cultural – em escolas e salas de aula provedoras, onde todas as necessidades dos alunos são satisfeitas”. Os autores definem que a palavra ‘todos’ na inclusão escolar se refere a todas as pessoas, sem exceção. 142 Transtornos Globais do Desenvolvimento “A inclusão implica uma mudança de perspectiva educacional, pois não atinge apenas alunos com deficiência e os que apresentam dificuldades em aprender, mas todos os demais, para que obtenham sucesso na corrente educativa geral”. Mantoan (2003, p. 24) igualmente defende a permanência de todos os alunos nas escolas e sugere uma reelaboração das filosofias educacionais quando afirma que “a inclusão implica uma mudança de perspectiva educacional, pois não atinge apenas alunos com deficiência e os que apresentam dificuldades em aprender, mas todos os demais, para que obtenham sucesso na corrente educativa geral”. Na mesma linha de pensamento dos autores mencionados, os pressupostos de Vygotski, considerado por Beyer (2006) um dos primeiros estudiosos cujas ideias abordaram conceitos centrais do projeto de inclusão escolar e a importância de a criança com deficiência frequentar ambientes sociais, inclusive a escola, já apresentava o conceito de que, para um bom desenvolvimento infantil e humano em geral, a sócio-gênese é condição fundamental. Sócio-gênese para Vygotski é a ideia de que, as interações sociais são fundamentais para a criança desenvolver estruturas humanas, como o pensamento e a linguagem. Neste sentido, Vygotski (1997, p. 214-215) afirmava que [...] as funções psicológicas superiores (o pensamento em conceitos, a linguagem racional, a memória lógica, a atenção voluntária, etc.) se formam durante o período histórico do desenvolvimento da humanidade e devem sua origem, não à evolução biológica, [...] mas a seu desenvolvimento histórico como ser social. Beyer (2006) cita que Vygotski (1997), ao invés de centrar a atenção na noção de defeito ou lesão, colocava o esforço em compreender de que modo o ambiente social e cultural poderia mediar as relações entre as pessoas com deficiência e o meio. De acordo com Beyer (2006, site). Vygotski sempre combateu uma proposta de formação de grupos com igualdade nos perfis, isto é, grupos com tendência a se homogeneizarem a partir particularmente dos critérios de condição intelectual e de desempenho acadêmico. Vygotski (1997), além de ressaltar a importância das relações sociais entre pessoas com deficiência e pessoas sem deficiência, também considerava fundamental que houvesse a promoção de acesso e permanência 143 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 dessas crianças com deficiência no âmbito social, pois, se não houvesse essas oportunidades de participação, seus destinos seriam a segregação e o isolamento, o que desfavoreceria seu desenvolvimento. Beyer (2006) foi um pesquisador da inclusão escolar. Em um de seus trabalhos intitulado “Por que Lev Vygotski quando se propõe uma educação inclusiva?”, o autor fez um estudo sobre a Defectologia, teoria escrita por Vygotski (1997). Se você tiver interesse por esses estudos, sugerimos que leia esses dois materiais, o artigo de Beyer (2006) no link http://coralx.ufsm.br/ revce/ceesp/2005/02/r7.htm Além da preocupação e da concepção dos estudiosos mencionados – Mittler, Stainback e Stainback, Mantoan, Beyer e Vygotski – sobre a educação inclusiva, outro aspecto que cabe ressaltar, se refere a quais iniciativas a escola deve tomar para que possa tornar a inclusão uma realidade de seu cotidiano. Mendes (2001, p. 17) explica que, Ao mesmo tempo em que o ideal da inclusão se populariza e se torna pauta de discussão obrigatória para todos os interessados nos direitos dos alunos com necessidades educacionais especiais, surgem as controvérsias, menos sobre seus princípios e mais sobre as formas de efetivá-la. Sob a perspectiva de Mendes (2001), podemos compreender que quanto mais a inclusão se torna parte da realidade escolar, mais discussões surgem em torno dessa nova filosofia, que giram em torno, principalmente da questão prática, ou seja, da forma de realizá-la. Afinal, o que é inclusão? A inclusão é um processo que requer muito mais do que transferir crianças da escola especial para a escola regular. Salientamos que a palavra processo é originária do latim processus e significa, segundo o dicionário (HOUAISS, 2001, p. 2303), “uma ação continuada e prolongada de uma atividade; andamento; desenvolvimento”. Portanto, quando são incluídas crianças em escolasregulares que ainda seguem um modelo baseado na integração, ou 144 Transtornos Globais do Desenvolvimento Propiciar a inclusão é participar de um processo de mudança, fazendo parte da reorganização da escola, onde estar incluído significa ter o direito de aprender junto, independente das condições físicas, linguísticas, intelectuais, sociais e emocionais. seja, em que todas as crianças devem seguir o mesmo método pedagógico, avançar no mesmo ritmo e serem avaliadas da mesma maneira, é preciso ter a clareza de que não ocorrerá uma mudança instantaneamente. Nesse sentido, propiciar a inclusão é participar de um processo de mudança, fazendo parte da reorganização da escola, onde estar incluído significa ter o direito de aprender junto, independente das condições físicas, linguísticas, intelectuais, sociais e emocionais. A inclusão a qual fazemos referência neste caderno de estudo, de maneira diferente do que já ficou estigmatizado, não abarca só as pessoas com deficiência ou necessidades especiais, conforme mostra a Declaração de Salamanca (1994): [...] escolas deveriam acomodar todas as crianças, independentemente de suas condições físicas, intelectuais, sociais, emocionais, lingüísticas e outras. [...] incluir crianças deficientes e superdotadas, crianças de rua e que trabalham, crianças de origem remota ou de população nômade, crianças pertencentes a minorias lingüísticas, étnicas ou culturais, e crianças de outros grupos desavantajados ou marginalizados. A Declaração de Salamanca (1994) elucida que a inclusão engloba, também, os sujeitos que, de alguma forma e por algum motivo, estão sendo deixados de fora das instituições regulares de ensino. Werneck (2006), em entrevista concedida ao Portal Educacional, que esclarece o motivo pelo qual a deficiência é destacada quando se fala em inclusão escolar: [...] tenho uma preocupação muito grande quando falo da escola. É uma instituição que todos nós, inclusive eu, ajudamos a construir e que tem de mudar, não porque não é boa para a criança com deficiência, mas porque não está boa para ninguém. Mas, no dia em que ela for boa para uma criança com deficiência, ela vai ser boa para todo mundo, certo? Esse é o fim da linha [...]. Se você quiser ler na íntegra a entrevista acesse www.educacional.com.br/entrevistas/entrevista0073.asp Ainda na mesma entrevista, Werneck (2006) explica sua opinião sobre a inclusão e defende a ideia da escola inclusiva afirmando que “[...] se eu ponho uma criança com deficiência na escola, eu acelero o processo de mudança. 145 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 [...] A escola inclusiva nada mais é do que uma escola de qualidade para todos. Mas um ‘todos’ que seja tudo. Um ‘tudo’ sem exceções”. Werneck (2006) e os demais mencionados nessa seção, bem como a Declaração de Salamanca (1994) apontam aspectos variados que ratificam princípios da escola inclusiva e a fundamentam: importância das amizades e da convivência nas relações sociais entre pessoas com e sem deficiência, iniciativas da escola para torná-la inclusiva, inclusão como processo e articulação da inclusão por pais e professores. Conforme vimos nesta seção inclusão é um processo de: • Mudança; • Reorganização da escola; • Valorização das diferenças; • Convivência; • Respeito à condição humana. Para conseguirmos criar estratégias eficazes para a inclusão de alunos com TGD, precisamos primeiro passar por todos os conceitos discutidos até aqui. Agora, vamos para a próxima seção, onde fazemos sugestões, focando o desenvolvimento pedagógico e social dos alunos com TGD. Inclusão Escolar da Pessoa com TGD: Sugestões para o Trabalho Pedagógico Antes de iniciarmos esta seção, apresentamos a você o texto “Dez coisas que todo aluno com autismo gostaria que a professora soubesse” retirado do site, que alerta professores sobre suas atitudes na escola a partir da perspectiva de um aluno com autismo. Lembramos que o texto se refere a crianças com autismo de maneira geral, porém sabemos que cada uma delas possui suas características e que se diferenciam entre si. 146 Transtornos Globais do Desenvolvimento DEZ COISAS QUE TODO ALUNO COM AUTISMO GOSTARIA QUE A PROFESSORA SOUBESSE 1.Comportamento é comunicação. Todo comportamento acontece por uma razão. Ele conta para você, mesmo quando as minhas palavras não podem fazê-lo, como eu percebo o que está acontecendo ao meu redor. Comportamento negativo interfere no meu processo de aprendizagem. Entretanto, simplesmente interromper esses comportamentos não é suficiente; ensine-me a trocá-los por alternativas adequadas de modo que a aprendizagem real possa fluir. Comece por acreditar nisto: eu verdadeiramente quero aprender a interagir de forma apropriada. Nenhuma criança quer receber uma bronca por comportamento negativo. Esse comportamento geralmente quer dizer que eu estou atrapalhado com sistemas sensoriais desorganizados, não posso comunicar meus desejos ou necessidades ou não entendo o que se espera de mim. Olhe além do meu comportamento para encontrar a fonte da minha resistência. Anote o que aconteceu antes do comportamento: as pessoas envolvidas, hora do dia, ambiente. Um padrão emerge depois de um período de tempo. 2. Nunca presuma nada. Sem apoio de fatos uma suposição é apenas uma suposição. Posso não saber ou não entender as regras. Posso ter ouvido as instruções, mas não ter entendido. Talvez eu soubesse ontem, mas não consigo me lembrar hoje. Pergunte a si mesmo: Você tem certeza que eu realmente sei como fazer o que você está me pedindo? Se de repente eu preciso correr para o banheiro cada vez que preciso fazer uma folha de matemática, 147 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 talvez eu não saiba como fazer ou tema que meu esforço não seja o suficiente. Fique comigo durante repetições suficientes da tarefa até que eu me sinta competente. Eu posso precisar de mais prática para dominar as tarefas que outras crianças. Você tem certeza que eu realmente conheço as regras? Eu entendo a razão para a regra (segurança, economia, saúde)? Estou quebrando a regra por que há uma causa? Talvez eu tenha pegado um pedaço do meu lanche antes da hora porque eu estava preocupado em terminar meu projeto de ciências, não tomei o café da manhã e agora estou morto de fome. 3. Procure primeiro por problemas sensoriais. Muitos de meus comportamentos de resistência vêm de desconforto sensorial. Um exemplo é luz fluorescente, que foi demonstrado muitas vezes ser um problema para crianças como eu. O som que ela produz é muito perturbador para minha audição supersensível e o piscar da luz pode distorcer minha percepção visual, fazendo com os objetos pareçam estar se movimentando. Uma luz incandescente ou as novas luzes econômicas na minha carteira vai reduzir o piscar ou talvez eu precise sentar mais perto de você; não entendo o que você está dizendo porque há muitos sons “entre nós” – o cortador de grama lá fora, a Maria conversando com a Lurdes, cadeiras arrastadas, o som do apontador. Peça à terapeuta ocupacional da escola para dar algumas ideias sensoriais que sejam boas para todas as crianças, não só para mim. 4. Dê um intervalo para auto regulação antes que eu precise dele. Um canto quieto com carpete, algumas almofadas livros e fones de ouvido me dão um lugar para me afastar quando preciso me reorganizar sem ser distante demais que eu não possa voltar para o fluxo de atividades da classe de forma tranquila. 5. Diga o que você quer que eu faça de forma positiva ao invés de imperativa. “Vocêdeixou uma bagunça na pia!” é apenas a afirmação de um fato para mim. “Não sou capaz de concluir que o que você realmente quer dizer é: por favor, lave a sua caneca de tinta e ponha as toalhas de papel no lixo”. Não me faça adivinhar ou ter de descobrir o que eu devo fazer. 148 Transtornos Globais do Desenvolvimento 6. Tenha uma expectativa razoável. Uma reunião de todas as crianças no ginásio de esportes e alguém falando sobre a venda de balas é desconfortável e sem significado para mim. Talvez fosse melhor eu ir ajudar a secretária a grampear o jornalzinho. 7. Ajude-me a fazer a transição entre atividades. Leva um pouco mais de tempo para eu fazer o planejamento motor de ir de uma atividade para outra. Dê-me um aviso de que faltam cinco minutos, depois dois, antes de mudar de atividade – e inclua alguns minutos extras no final para compensar. Um relógio, com o mostrador simples ou um “timer” na minha carteira pode me dar uma dica visual sobre o tempo para a próxima mudança e me ajudar a lidar com o tempo mais independentemente. 8. Não torne pior uma situação ruim. Sei que embora você seja um adulto maduro, às vezes, você pode tomar decisões ruins no calor do momento. Eu realmente não tenho a intenção de ter uma crise, mostrar raiva ou atrapalhar a classe de qualquer outra forma. Você pode me ajudar a encerrar mais rapidamente não respondendo com um comportamento inflamatório. Conscientize-se de que estes comportamentos prolongam ao invés de resolver a crise: • Aumentar o volume ou tom de voz. Eu escuto os gritos, mas não as palavras. • Imitar ou caçoar de mim. Sarcasmo, insultos ou apelidos não me deixam sem graça e não mudam meu comportamento. • Fazer acusações sem provas. • Adotar uma medida diferente da dos outros. • Comparar com um irmão ou outro aluno. • Lembrar episódios prévios ou não relacionados. • Colocar-me em uma categoria (“crianças como você são todas iguais)”. 149 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 9. Critique gentilmente seja honesta – você gosta de aceitar crítica construtiva? • A maturidade e auto confiança de ser capaz de fazer isso pode estar muito distante das minhas habilidades atuais. Você não deveria me corrigir nunca? Lógico que sim. Mas faça-o gentilmente, de modo que eu realmente consiga ouvir você. • Por favor! Nunca, nunca imponha correções ou disciplina quando estou bravo, frustrado, super-estimulado, ansioso, “ausente” ou de qualquer outra forma que me incapacite a interagir com você. • Lembre-se que vou reagir mais à qualidade de sua voz do que às palavras. Vou ouvir a gritaria e o aborrecimento, mas não vou entender as palavras e consequentemente não conseguirei descobrir o que fiz de errado. Fale em tom baixo e abaixe- se para falar comigo, de modo que esteja falando comigo no mesmo nível. • Ajude-me a entender o comportamento inadequado de forma que me apóie, me ajude a resolver o problema ao invés de punir ou me dar uma bronca. Ajude-me a descobrir os sentimentos que despertaram o comportamento. Posso dizer que estava bravo mas talvez estivesse com medo, frustrado, triste ou com ciúmes. Tente descobrir mais que a minha primeira resposta. • Ajuda quando você está modelando comportamento adequado para responder à crítica. 10. Ofereça escolhas reais - e apenas escolhas reais. Não me ofereça uma escolha ou pergunte “você quer...?” a menos que esteja disposto a aceitar não como resposta. “Não” pode ser minha resposta honesta para “Você quer ler em voz alta agora? ou você quer usar a tinta junto com o Pedro?” É difícil confiar em alguém quando as escolhas não são realmente escolhas. Você aceita com naturalidade o número enorme de escolhas que faz diariamente. Constantemente escolhe uma opção sobre outras sabendo que ter escolhas e ser capaz de escolher lhe dão controle sobre sua vida e futuro. Para mim, escolhas são muito mais limitadas, e é por isso que pode ser difícil ter confiança em mim mesmo. Dar-me escolhas frequentes me ajuda a me envolver mais ativamente na minha vida diária. 150 Transtornos Globais do Desenvolvimento • Sempre que possível, ofereça uma escolha dentro do que tenho de fazer. Ao invés de dizer: “escreva seu nome e data no alto da página” diga: você gostaria de escrever primeiro o nome ou a data? ou “qual você gostaria de escrever primeiro: letras ou números?”. A seguir diga: “você vê como o Paulo está escrevendo o nome no papel?” • Dar escolhas me ajuda a aprender comportamento adequado, mas também preciso entender que há horas em que você não pode escolher. Quando isso acontecer, não ficarei tão frustrado se eu entender o por quê: – ”não posso deixar você escolher nesta situação porque é perigoso. Você pode se machucar. – não posso dar essa escolha porque atrapalharia o Sérgio (teria um efeito negativo sobre outra criança). – eu lhe dou muitas escolhas, mas desta vez tem de ser a escolha do adulto. A última palavra: ACREDITE. Henry Ford disse: “quer você acredite que pode ou que não pode, geralmente você está certo”. Acredite que você pode fazer uma diferença para mim. É preciso acomodação e adaptação, mas autismo é um distúrbio não pré fixado. Não há limites superiores inerentes para aquisições. Posso sentir muito mais que posso comunicar e a coisa que mais posso perceber é se você acredita ou não que “eu posso”. Espere mais e você receberá mais. Incentive- me a ser tudo que posso ser, de modo que possa seguir o caminho muito depois de já ter saído de sua classe. Fonte: Disponível em: <www.inclusaobrasil.blogspot.com.br>. Acesso em: 10 nov. 2012. Traduzido de Ellen Notbohm por Heloiza Goodrich. De uma forma geral o texto “Dez coisas que todo aluno com autismo gostaria que a professora soubesse” (INCLUSÃO BRASIL, 2012, site), resume o que já estudamos nos capítulos anteriores, porém faz uma adaptação ao ambiente escolar. Conforme, discutimos, crianças com TGD têm direito ao ingresso e ao acesso a escola comum. Você pode estar se perguntando: Ingresso e Acesso? Esses termos não dizem respeito a mesma coisa? Por que as autoras utilizam dois termos para especificar a mesma coisa? Enfim, 151 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 Quando falamos em acesso, estamos indo um pouco mais além, ou seja, estamos nos referindo ao acesso em relação às barreiras físicas e pedagógicas. a princípio parece redundância afirmar que pessoas com TGD têm direito a ingressar e a acessar a escola regular, porém se pararmos para analisar, os termos se referem a coisas diferentes. Quando falamos em direito ao ingresso, estamos nos referindo ao direito que o sujeito tem em ser matriculado na escola comum. Agora, quando falamos em acesso, estamos indo um pouco mais além, ou seja, estamos nos referindo ao acesso em relação às barreiras físicas e pedagógicas. Isso que dizer que o sujeito com TGD tem direito a ser matriculado na escola comum, ter acesso ao ambiente físico e também ter acesso ao desenvolvimento cognitivo promovido pela aprendizagem de conteúdos. Veja um exemplo de uma situação: Os pais procuram a escola, efetuam a matrícula da criança, porém as adaptações físicas e pedagógicas deixam a desejar. Dessa forma, a criança não está recebendo seu direito por completo, pois está ingressando na escola comum, mas não está tendo acesso a ela. Agora, com base no que dissemos a respeito da Figura 35, exposta na seção anterior, onde afirmamos que alunos com TGD conseguem se desenvolver na escola comum, porém temos que adequar o ambiente e a prática pedagógica para que façam isso com sucesso, apresentamose discutimos a seguir, estratégias para remover as barreiras físicas e pedagógicas que limitam o acesso do aluno com TGD ao desenvolvimento na escola comum. As sugestões são baseadas no artigo “Incorporando as Estratégias do Ensino Responsivo na Escola”. Barreiras Físicas • Ter um espaço menos e com menos estímulos sensoriais – na própria sala de aula; – em outra sala. O espaço menor, também denomidado 1:1, se caracteriza por um local ou “ninho” onde a criança poderá ficar quando estiver se sentindo desconfortável com o excesso de estímulos sensoriais. Nesse espaço a criança poderá se reorganizar, a medida em que diminui os estímulos sensoriais e, assim, num segundo momento, conseguirá retornar a concentração no que for solicitado. Esse espaço pode ser inserido no fundo da sala de aula ou em outra sala. • Número de alunos em sala reduzido 152 Transtornos Globais do Desenvolvimento É importante que a escola leve em consideração que na sala onde houver aluno com TGD o número total de alunos seja reduzido, para diminuir a carga de estímulos sensoriais. Sabemos que nem sempre isso é possível, porém se a escola tiver condições de se organizar para diminuir o número de alunos na sala da criança com TGD seria positivo para a criança. • Diminuir o nível de distração/sobrecarga sensorial – estímulos visuais; – estímulos sonoros; – outros estímulos. Sabemos que uma sala de aula geralmente é cheia de informações visuais penduradas por toda a parte. Sugerimos, que na sala de aula do aluno com TGD essas informações visuais (cartazes, alfabeto, números etc) sejam expostos do lado de fora da sala, ou no fundo da sala, fora do campo de visão do aluno com TGD. A respeito dos estímulos sonoros, recomendamos que a sala de aula esteja localizada longe da quadra de esportes ou da rua, por exemplo, pois são locais onde há bastante barulho. • Intervalos/ autorregulação – permitir que a criança se movimente. A criança com TGD, conforme já mencionado, possui um tempo de concentração menor em relação as outras crianças e, algumas delas, precisam se movimentar mais para lidar com os estímulos sensoriais, por isso, recomendamos que os professores façam mais intervalos entre as atividades e permitam que a criança se autorregule. • Cadeira/ mesa apropriada – tamanho da mesa/cadeira de acordo com o tamanho da criança; – respeitar o tônus da criança; – oferecer almofadas. 153 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 Barreiras Pedagógicas • Antecipação/rotina de atividades – evitar modificar a rotina com frequência; – antecipar as atividades planejadas. Crianças com TGD têm dificuldade em lidar com mudanças, por isso, a rotina escolar deve ser previsível. Essa previsibilidade pode ser feita de diversas maneiras, mas a mais indicada é a utilização de recursos visuais que indicam a rotina das atividades. Quando for inevitável a mudança, procure avisar os pais com antecedência para que possam fazer as devidas antecipações. Utilize explicações objetivas das atividades que serão realizadas e do que será feito depois. • Buscar o máximo de informações a respeito da criança – habilidades; – dificuldades; – motivações. Assim, que a criança estiver matriculada na escola, recomendamos que uma entrevista com os responsáveis seja feita para buscar informações a respeito da rotina da criança. Nessa entrevista, são colhidos dados referente às habilidades que a criança já tem, habilidades que precisam ser aprimoradas e as motivações da criança, ou seja, aquilo que ela aprecia, que a deixa interessada e envolvida em uma atividade. A lista de motivações deve ser levada em consideração na hora do planejamento de atividades pedagógicas. Elas devem conter elementos motivacionais para que a criança se interesse em realiza-las. Além disso, é importante conversar com os professores que trabalharam com essa criança noutros anos escolares. É sempre importante ouvir outras pessoas falarem desse sujeito, pois sempre haverá informações importantes e diferentes. • Propiciar o acolhimento – desenvolver a interação, flexibilidade e confiança. Sabemos que a criança com TGD tem dificuldade, sobretudo, em iniciar e manter interação social, por isso na escola, os professores devem desenvolver momentos que desenvolvam a interação. Nessa interação, sugerimos que o 154 Transtornos Globais do Desenvolvimento professor seja muito flexível, para estabelecer uma relação de confiança com a criança com TGD e para mostrá-la que ser flexível é bom. Num segundo momento, podemos solicitar a flexibilidade da criança, que ao estar confiante no professor tenderá a corresponder da forma esperada. • Celebrações – encorajamento; – tentativas; – conquistas. As celebrações a encorajarão a criança com TGD a seguir em frente e a não desistir de tentar. Celebrar é mostrar a criança que as tentativas dela também são importantes, tanto quanto as conquistas. • Estado de disponibilidade da criança – respeitar o isolamento. Quando a criança se isola, ela também está “dizendo” algo para nós. Ela nos diz que algo não estava bom, ou que algo estava muito intenso e que naquele momento ela não era capaz de lidar com aqueles estímulos. O isolamento pode nos indicar que a criança quer ficar sozinha, ou então, que a criança precisa de um tempo para processar as informações, então além de respeitar este momento, devemos tentar descobrir o motivo pelo qual ela se isolou, como se fôssemos um detetive, investigando os comportamentos da criança e suas causas. O isolamento não é um momento que devemos considerar ruim, porém com as investigações realizadas e as intervenções adequadas podemos diminuir a quantidade de ocorrência desses momentos, transformando-os em momentos de interação. • Alternar atividades de baixa e intensa estimulação sensorial Sempre que possível, inserir no planejamento uma variação entre as atividades. Por exemplo, se a primeira aula é Educação Física, considerada uma aula de intensa estimulação sensorial, procure oferecer na segunda aula uma atividade menos intensa, para que a criança não fique super estimulada. Da mesma forma, se a primeira aula for uma aula tranquila, procure inserir elementos de mais estimulação na segunda aula, para que a rotina não se torne monótona. Isso ajudará a criança com TGD e as crianças de desenvolvimento neurotípico também se beneficiarão com as oscilações de estímulos. 155 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 • Criar quadro de limites – a criança compreende mais do que expressa; – seja claro, calmo e dê alternativas; A pergunta que mais ouvimos é: “Como impor limites às crianças com TGD? Geralmente, quando impomos limites ela se agride ou agride outras pessoas.” Sabemos que limites são importantes e que a escola está cheia de regras e limites. Os limites devem ser inseridos na rotina da criança com TGD, porém de forma clara, objetiva e que faça sentido para a criança. Então, antes de impor os limites precisamos nos fazer algumas pergunta:. • O limite que queremos impor é realmente necessário? • O limite que queremos impor beneficiará a criança? • O limite que queremos impor é viável para a criança entender neste momento? Se todas as respostas acima, ou a maioria for “sim”, significa que podemos prosseguir com os limites. O segundo passo é saber como impor determinado limite. Temos que estar cientes que se a explicação for clara e objetiva, mesmo que a criança não fale, é provável que ela entenda. Portanto, na hora de impor um limite devemos ser claros de nossos objetivos, falar de forma tranquila e segura e ofereceruma alternativa para a criança, conforme o exemplo abaixo: Situação: A criança quer brincar com a água da torneira. Perguntas: O limite é importante, senão estaremos desperdiçando água potável. O limite beneficiará a criança, pois ficar brincando com água da torneira é uma forma de se isolar e se ela compreender que isso não pode, ela deixará de fazer isso em outros locais (casa, locais banheiros públics, etc). Geralmente, a criança consegue compreender que deixar a torneira aberta para brincar com água é algo que não deve ser feito. Alternativa: Oferecer algo que a criança goste muito de fazer (uma motivação) para que a mesma aceite trocar a atividade com água por uma outra atividade igualmente divertida. 156 Transtornos Globais do Desenvolvimento Explicação: Sabemos que você adora brincar com água, mas a água serve para lavar as mãos e quando você terminar nós fecharemos a torneira e vamos brincar com bolha de sabão. Esse exemplo ilustra uma das inúmeras situações que podem ocorrer no espaço escolar. Por isso, dependerá das ações e necessidades de cada criança para que a elaboração do quadro de limites seja efetivada. • Explicações de formas variadas – explicar o que está acontecendo e porquê; – utilizar sentenças simples e curtas; – utilizar materiais concretos e símbolos visuais; – utilizar várias formas de explicar os conteúdos; – utilizar atividades que estimulem as várias vias de entrada de conhecimento (sentidos). Quando tiver que oferecer explicações a criança com TGD, sejam elas referente ao conteúdo ou rotina, é importante que façamos isso de uma forma acessível para a criança. Primeiramente, sempre ofereça explicações sobre o que espera que a criança faça, lembre-se de que a criança com TGD tem dificuldade em prever intenções. Além de dizer, o que vai acontecer, explique porque aquilo vai ocorrer. Sempre que possível ofereça explicações com auxílio de imagens. Quando a explicação for referente a um conteúdo, utilize várias formas de explicar, sobretudo concreta, estimulando os sentidos, utilizando as diversas vias de entrada de conhecimento. • Você e as crianças podem ser o modelo social – se você deseja que a criança faça algo, inicie por você. Ser modelo social da criança com TGD significa agir da forma que você gostaria que ela agisse. Por exemplo, se você quer que ela seja mais flexível e tenha capacidade de ceder, comece por você, seja flexível primeiro. Ela vai internalizar, por meio de suas atitudes o que esperamos que ela faça num segundo momento. Lembre-se que não adianta querer que ela pare de gritar se pedimos isso gritando com ela. • Computador / Tablet – uma ferramenta de aprendizagem e de autonomia 157 Estratégias para a Inclusão Escolar de Pessoas com Transtorno Global do Desenvolvimento Capítulo 5 O uso de computador ou tablet na escola, quando é feito de maneira programada, pode auxiliar muito no desempenho do aluno com TGD. Essas ferramentas são ótimos instrumentos de motivação, servindo para o desenvolvimento de atividades pedagógicas e propiciando autonomia do aluno que tem dificuldade em traçar no papel, sejam letras ou desenhos. Algumas Considerações Caro (a) Pós-graduando (a)! Chegamos ao final deste caderno de estudos! No Capítulo 5 você estudou sobre as estratégias para a Inclusão Escolar do sujeito com Transtorno Global do Desenvolvimento. Compreendemos de forma geral a evolução da Educação Especial e seu histórico, bem como os fundamentos da Inclusão Escolar. Nesse contexto, passamos a discutir como a escola pode oferecer ao aluno com TGD além das vagas, o acesso ao aprendizado, eliminando barreiras físicas e pedagógicas. A divisão dos capítulos foi exposta a fim de proporcionar a você um conhecimento abrangente a respeito do TGD. Por isso, apresentamos as diferentes perspectivas em torno dos Transtornos Globais de Desenvolvimento, os indícios que levam aos diagnósticos relacionados ao TGD, os aspectos fundamentais acerca do desenvolvimento social, cognitivo e sensório-motor da pessoa com TGD, bem como, as diferentes possibilidades de intervenção para o desenvolvimento global das pessoas com TGD. Esperamos que você tenha compreendido com este estudo que, apesar de todas as limitações que podem prejudicar as habilidades de interação, comunicação e imaginação, a pessoa com TGD pode se desenvolver tanto dentro como fora do espaço escolar e que muito pode ser feito pelo seu desenvolvimento. Referências BRASIL. Educação Especial, legislação. Disponível em: <www.mec.gov.br> Acesso em: 15 set. 2012. Constituição de 1998. BEYER, Hugo Otto. Inclusão e avaliação na escola: de alunos com necessidades educacionais especiais. Porto Alegre: Mediação, 2005. _____. Educação Inclusiva ou Integração Escolar? Implicações pedagógicas dos conceitos como rupturas paradigmáticas. In: Ensaios Pedagógicos. Brasília: MEC – SEESP, 2006. p. 27- 280. 158 Transtornos Globais do Desenvolvimento _____. Por que Lev Vygotski quando se propõe uma educação inclusiva? Educação Especial. Disponível em: <www.ufsm.br/ce/revista>. Acesso em: 10 ago. 2006. 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