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1 TECNOLOGIA E PRODUÇÃO DE SEMENTES AULA 1 Prof. Thiago Cardoso Silva 2 CONVERSA INICIAL Nesta etapa, daremos início a assuntos relacionados à tecnologia e produção de sementes visando ao estudo deste material para a produção vegetal. As temáticas abordadas nesta etapa serão relacionadas à morfologia e embriologia de sementes. Desta feita, iremos abordar temas sobre a introdução do estudo das sementes. Como objetivo desta etapa, visamos o estudo dos fundamentos da Tecnologia e Produção de Sementes e seus conceitos essenciais para a avaliação da qualidade e eficiência produtiva. A partir disso, destacaremos a abordagem da Morfologia e Embriologia de Sementes, com foco em suas aplicações na produção agrícola e florestal e no melhoramento genético. Por fim, serão introduzidas as temáticas que envolvem a diferenciação entre os processos de formação e desenvolvimento das sementes, bem como suas implicações práticas. Tais assuntos são de grande importância para o estudo da tecnologia e da ciência das sementes no contexto agrário e florestal. Os temas principais desta etapa serão: • Introdução ao estudo das sementes • Anatomia interna e morfologia externa das sementes • Formação e desenvolvimento das sementes • Germinação de sementes • Classificações e tipos de sementes Vamos iniciar o estudo, pois temos muitos assuntos importantes a tratar. TEMA 1 – INTRODUÇÃO AO ESTUDO DAS SEMENTES O estudo das sementes é uma área fundamental dentro da botânica, pois as sementes representam a fase de reprodução e dispersão das plantas. Para o melhor entendimento sobre o que são as sementes, é preciso destacar que estas são a unidade reprodutiva das plantas espermatófitas. As espermatófitas são o grupo de plantas que geram sementes para a desenvolverem etapas da reprodução sexuada. Esse grupo é constituído pelas Gimnospermas (Figura 1) e pelas Angiospermas, classificadas como monocotiledôneas ou eudicotiledôneas (Figura 2). 3 Figura 1 – Sementes de Gimnospermas Crédito: Kazakova Maryia/Shutterstock. Figura 2 – Diferenças entre monocotiledôneas e eudicotiledôneas, focando nas diferenças entre sementes e como formam diferentes morfologias de plantas Crédito: VectorMine/Shutterstock. As sementes são estruturas complexas, resultantes do processo de fecundação, e contêm o embrião, que dará origem a uma nova planta. A semente também carrega reservas nutritivas que serão usadas durante as fases iniciais do crescimento do embrião. Assim, entender a biologia das sementes nos mostra uma visão abrangente do ciclo de vida das plantas e oferece informações para a conservação e propagação de diversas espécies vegetais. Essas informações são fundamentais para definir os padrões de tecnologia e produção de sementes para propagação vegetal, seja uma cultura agrícola ou uma espécie florestal. 4 Na botânica, o estudo das sementes envolve diversas áreas de conhecimento, como a morfologia, a fisiologia e a ecologia. A morfologia das sementes explora suas características externas e internas, como o tegumento (casca), o embrião e os tecidos nutritivos. Já a fisiologia se dedica a entender os processos bioquímicos e moleculares que regulam a germinação, dormência e vigor das sementes. Por fim, a ecologia das sementes examina os mecanismos de dispersão e as interações entre as sementes e o meio ambiente, fatores que influenciam a sobrevivência e o estabelecimento das plantas. Esse campo de estudo é de grande importância para diversas áreas aplicadas, como a agricultura, a silvicultura e a conservação ambiental. No contexto agrícola, o entendimento sobre o desenvolvimento e a viabilidade das sementes é essencial para melhorar a produção de alimentos, aumentando a eficiência da germinação e a resistência das plantas a condições adversas. Na conservação, o estudo das sementes auxilia na preservação de espécies ameaçadas, permitindo a formação de bancos de sementes para a recuperação de ecossistemas degradados. A tecnologia de sementes envolve técnicas que garantem a qualidade e viabilidade das sementes, desde a colheita até o plantio. Inclui melhoramento genético, tratamento, armazenamento e testes de germinação, visando manter o vigor das sementes. Além disso, busca aprimorar a produção agrícola, desenvolvendo sementes mais resistentes a pragas, doenças e mudanças climáticas, promovendo, assim, maior produtividade e sustentabilidade nos sistemas agrícolas. A produção de sementes é um processo importante para a agricultura, garantindo sementes de alta qualidade. O processo inclui a seleção de plantas matrizes, manejo do cultivo, colheita no momento adequado e processamento das sementes para assegurar pureza e viabilidade. O controle de qualidade tem como objetivo garantir alta germinação e ausência de contaminantes, como pragas e doenças. Esse ciclo assegura sementes saudáveis e produtivas, fundamentais para o sucesso agrícola. A seguir, serão abordados diversos temas para fundamentarem o estudo da Tecnologia e Produção de Sementes. TEMA 2 – ANATOMIA INTERNA E MORFOLOGIA EXTERNA DAS SEMENTES O termo semente refere-se ao conjunto composto pelo esporófito jovem (embrião), o tecido de reserva (endosperma), que pode estar ausente, e o 5 envoltório protetor (tegumentos) (Cortez et al., 2016). Essas diferenças são observadas principalmente entre as diferentes espécies de Angiospermas, quando observadas as sementes de monocotiledôneas e eudicotiledôneas, porém estas também se diferenciam das sementes as Gimnospermas. A semente se forma a partir do desenvolvimento do óvulo após a fecundação da oosfera (reprodução sexuada) ou de maneira autônoma a partir do processo conhecido como apomixia (Cortez et al., 2016). Apomixia é um processo reprodutivo no qual há a formação da semente sem necessidade de fertilização sexual. As sementes das Angiospermas são formadas basicamente por três partes (Figura 3) (Rodrigues et al., 2015; Santiago, 2018): Figura 3 – Partes das sementes de Angiospermas Crédito: Nandalal /Adobe Stoc.k I – Tegumento: também conhecido como perisperma, cujas células se diferenciam em estruturas externas (chamadas de testa) e estruturas internas (chamadas de tégmen). É a camada externa que protege a semente, funcionando como uma camada de defesa contra condições e mudanças ambientais e na regulação da germinação. É originado pelas paredes externas do óvulo após fecundação e possuem células de esclerênquima e parênquima com paredes lignificadas e cutícula. Podem apresentar camadas de mucilagem para auxiliar na dispersão. As estruturas suplementares do tegumento podem ser (Figura 4): 6 a) Arilo: uma estrutura carnosa que se desenvolve a partir do funículo (estrutura reprodutiva nas flores) e pode envolver toda a semente, sendo tipicamente suculento. Um dos exemplos é a semente do maracujá. b) Ariloide: similar ao arilo, mas em vez de se originar do funículo, surge do tegumento ao redor da micrópila e pode cobrir toda a semente. Um dos exemplos é a semente da noz-moscada. c) Helobial: uma estrutura carnosa, mais firme que o arilo, localizada no hilo de algumas sementes, porém geralmente não cobre a semente por completo. Um dos exemplos é a semente da mamona. Figura 4 – Sementes contendo arilo, ariloide e carúncula Crédito: Thiago Cardoso Silva/Canva. II – Endosperma: corresponde ao tecido de reserva da semente e pode ser uma estrutura ausente em algumas espécies. A longevidade, o tipo e a quantidade de material armazenado variam amplamente, servindo para fornecer nutrientes como amido, glúten, proteínas e lipídios ao embrião; em algumas espécies, essa estrutura é muito rígida e, em certos casos, pode ser substituída pelos cotilédones, como ocorre nas exalbuminosas (aquelas que, apósa fertilização, não possuem endosperma ou o têm em quantidades muito reduzidas). Pode ser de três tipos: a) Nuclear: durante as divisões celulares o núcleo fica livre no citoplasma, posteriormente formando parede celular. Porém podem acontecer exceções, como no caso do coco (Cocos nucifera), cujo núcleo permanece livre e forma o endosperma líquido (água de coco) e posteriormente se solidifica (parte comestível). b) Celular: não apresenta núcleos livres e as divisões se dão a partir da formação de parede celular. 7 c) Helobial: é característico das monocotiledôneas, podendo ser considerado um tipo de endosperma com características intermediárias ao nuclear e ao celular. Forma duas câmaras: calazal (pequena e com menos divisões e núcleos livres no citoplasma) ou micropilar (grande, cujo núcleo migra até o saco embrionário). III – Embrião: Nas eudicotiledôneas, o embrião se desenvolve em estágios lineares, globulares, trapezoidais, cordiformes e torpedos. No estágio globular, distingue-se o embrião principal do suspensor, que empurra o embrião para o tecido de reserva e absorve nutrientes. O desenvolvimento é semelhante em monocotiledôneas e outras angiospermas até o estágio globular; depois, em monocotiledôneas, o embrião se torna cilíndrico com um cotilédone, enquanto nas outras angiospermas, formam-se dois cotilédones laterais e o embrião se torna cordiforme. O embrião geralmente inclui o eixo hipocótilo-radícula, cotilédones e o primórdio caulinar (Figura 5), com a primeira gema chamada plúmula e o epicótilo como sua parte caulinar. A junção do embrião + endosperma pode ser chamado de amêndoa. Outras estruturas relevantes para destacar nessas sementes são: a) Radícula: primórdio das raízes, que se desenvolverão após a germinação; b) Hipocótilo: estrutura de transição responsável pela projeção dos cotilédones para fora da semente após a germinação; c) Hilo: cicatriz de abscisão da semente, sendo o local onde o funículo se separou do óvulo, marcando o ponto onde a semente se destacou do fruto; d) Micropila: abertura na superfície de uma semente, situada geralmente na região oposta à cicatriz de abscisão (onde a semente se separa do fruto). Em muitas espécies, essa estrutura também permite a entrada de água, importante para o processo de germinação. 8 Figura 5 – Esquema de uma semente eudicotiledônea, destacando a existência do hipocótilo, da radícula, do epicótilo e dos primórdios foliares Crédito: designua/adobe stock. Algumas espécies de monocotiledôneas, como o trigo (Figura 6), podem apresentar sementes com três diferentes estruturas, específicas dos cereais (Taiz et al., 2017; Silva, 2019): I. Escutelo: uma modificação do cotilédone, que atua como órgão de absorção de água e fica localizado entre o embrião e o endosperma; II. Coleóptilo: uma extensão do escutelo com função de proteção das primeiras folhas desenvolvidas após a germinação; III. Coleorriza: uma extensão do hipocótilo responsável pela formação de uma bainha de proteção da radícula. Figura 6 – Semente de trigo destacando a existência do escutelo, do coleóptilo e da coleorriza Fonte: Silva, 2019. 9 TEMA 3 – FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DAS SEMENTES As sementes começam a se formarem imediatamente após a fecundação do óvulo na flor (Figura 7). É preciso lembrar que esta faz parte de uma das etapas da reprodução sexuada das plantas. Para que isso ocorra, o pólen precisa percorrer toda a extensão do estilete para chegar até o ovário. Figura 7 – Morfologia da flor após fecundação Crédito: 54 Design/adobe stock. A fecundação do óvulo faz com que ele comece a evoluir, resultando em diversas modificações. O desenvolvimento do óvulo finaliza na formação de uma semente madura. Esta semente, como visto anteriormente, só é considerada madura quando passa a apresentar tegumento, reserva e embrião, com algumas espécies apresentando endosperma. Para entender esse processo complexo, é preciso considerar características dos órgãos florais da planta, que incluem a microsporogênese (formação do pólen), a macrosporogênese (formação do saco embrionário), a polinização, a fertilização e a embriogênese, que leva à formação da semente (Vieira e Carvalho, 2023). Ainda segundo os autores, as características principais são as seguintes: 10 I – Estruturas florais: A flor é um ramo modificado com folhas adaptadas para reprodução. Uma flor completa possui verticilos florais dispostos concentricamente em um receptáculo, incluindo sépalas (cálice), pétalas (corola), estames (androceu) e carpelos (gineceu) (Figura 8). Os estames, o órgão masculino, possuem filete, conectivo e antera com sacos polínicos que contêm pólen. O carpelo, o órgão feminino, inclui o estilete e o ovário, que se transforma em fruto. Os óvulos se formam na placenta dentro do ovário. Figura 8 – Morfologia da flor Crédito: Designua/Shutterstock. II – Microsporogênese: A antera produz micrósporos diploides (2n) que passam por meiose e formam micrósporos haploides (n). Esses micrósporos germinam e formam os grãos de pólen (gametófitos masculinos), compostos por uma célula vegetativa, que forma o tubo polínico, e uma célula germinativa, que origina dois núcleos gaméticos (n). O grão de pólen é protegido por exina e intina. A antera se rompe, liberando pólen para polinização. III – Macrosporogênese: Uma célula-mãe (2n) no óvulo sofre meiose, formando quatro células haploides (n); três degeneram e uma se torna um megásporo funcional. Esse megásporo sofre três mitoses, formando oito núcleos. Três migram para a micrópila (oosfera e sinérgidas), três para o 11 polo oposto (antípodas) e dois permanecem no centro. O gametófito feminino, com sete células, é o saco embrionário que abrigará o embrião. IV – Polinização: Corresponde ao processo de transferência do grão de pólen da antera para o estigma, onde germina formando um tubo polínico. O núcleo germinativo do pólen se divide em dois núcleos gaméticos; um fecunda a oosfera, formando o zigoto (2n), e o outro une-se aos dois núcleos centrais, criando uma célula triploide (3n). Esse processo, chamado de dupla fertilização, resulta na formação do embrião e do endosperma. V – Embriogênese: O processo de desenvolvimento da semente, começando com a fertilização do óvulo e culminando na formação de uma nova planta em miniatura. Ela inclui três fases: a) Divisão celular: envolve os processos de rápida divisão celular, diferenciação, expansão, síntese proteica, produção de RNAm e endoduplicação do DNA. b) Expansão celular: durante essa fase, ocorre a continuação da endoduplicação do DNA, acúmulo de reservas, e síntese de amido, proteínas e lipídios. Além disso, há expansão e diferenciação celular significativa no desenvolvimento. c) Dessecamento: precisa ser lenta e controlada para proteger as membranas, ocorrendo a perda de polissomos e a máxima síntese de proteínas de reservas e amido. VI – Maturação: Após a fertilização, o ovário da flor passa por transformações físicas, químicas, biológicas e morfológicas, resultando em uma semente madura capaz de gerar uma nova planta. A semente atinge seu peso seco máximo, vigor e capacidade de germinação na maturidade fisiológica, com mudanças notáveis na umidade, tamanho, peso seco, poder de germinação e vigor. A maturação começa quando o embrião atinge seu tamanho máximo e finaliza com a semente se tornando independente da planta-mãe. Durante a criptobiose, um estado de repouso fisiológico em sementes ortodoxas após a maturação, podem ocorrer dois tipos de latência: a) Dormência: causada por fatores intrínsecos à semente, como inibidores, impermeabilidade tegumentar e imaturidade, que impedem a germinação. 12 b) Quiescência: ocorre devido à ausência de fatores extrínsecos, como oxigênio,água, temperatura e luz, necessários para a germinação. A formação das estruturas morfológicas das sementes ocorre da seguinte maneira (Chagas, 2023): I – Formação do embrião: o embrião se forma a partir do zigoto diploide (2n), que resulta da fusão do núcleo espermático (n) com a oosfera (n) dentro do saco embrionário do óvulo (Figura 9). Esse zigoto se divide em duas células com polaridades distintas. A célula do polo inferior, por meio de divisões sucessivas, desenvolve o suspensor, uma estrutura temporária que anexa o embrião à micrópila, facilitando a transferência de nutrientes. O suspensor é uma estrutura de vida curta, fundamental apenas nas fases iniciais de desenvolvimento. A célula do polo superior, também por meio de divisões sucessivas, dá origem ao embrião propriamente dito, que eventualmente se desenvolverá na nova planta. Esse processo de divisão e especialização celular é responsável pelo desenvolvimento adequado do embrião, garantindo a formação de todas as partes necessárias para o crescimento da planta. Figura 9 – Diagrama de fertilização do óvulo Crédito: Aldona/Adobe Stock. II – Formação da reserva: depois que um núcleo espermático (n) se funde com dois núcleos polares (n), começa o processo de multiplicação celular. Esse processo dá origem a um tecido de reserva triploide (3n) conhecido como albume. A formação do albume é fundamental para o desenvolvimento da semente, pois fornece nutrientes essenciais durante o crescimento do embrião. O albume, sendo triploide, contém um conjunto adicional de cromossomos, o que o diferencia de outros tecidos da planta. 13 III – Formação do tegumento: o tegumento da semente origina-se dos envoltórios que cobriam o óvulo. Sua principal função é proteger o embrião contra danos mecânicos e evitar a perda excessiva de água. Esse processo contribui para a viabilidade da semente, pois como visto o tegumento atua como uma barreira física que preserva a integridade do embrião e controla a umidade interna. Dessa forma, o tegumento garante que a semente possa sobreviver em condições adversas até encontrar um ambiente adequado para germinar e crescer. Para isso, a primina (parede externa do óvulo) forma a testa e a secundina (parede interna do óvulo) forma o tégmen. TEMA 4 – GERMINAÇÃO DE SEMENTES Após a dispersão em um ambiente úmido, as sementes absorvem água, e o embrião recomeça seu desenvolvimento, formando uma plântula. O processo de germinação inicia-se com a embebição, que aumenta o volume da semente e rompe o tegumento, permitindo o crescimento do embrião. A raiz primária cresce no solo por geotropismo positivo, formando o sistema radicular, enquanto o caule e as folhas se desenvolvem no sentido oposto por geotropismo negativo (Chagas, 2023). Conhecer os fatores que influenciam a germinação, a dormência das sementes e os tipos de germinação é fundamental para garantir o sucesso na agricultura, reflorestamento e na preservação de espécies vegetais. A germinação é o processo inicial de desenvolvimento da planta a partir de uma semente, e sua eficiência depende de diversos fatores como a umidade, temperatura, luz e oxigenação. Quando esses elementos são adequadamente controlados, o estabelecimento das mudas se torna mais eficiente, o que impacta diretamente na produtividade e no sucesso de culturas agrícolas e em projetos de conservação ambiental. Além dos fatores externos, a dormência da semente é outro aspecto a ser compreendido. A dormência é um mecanismo que impede a germinação em condições desfavoráveis, mesmo quando todos os fatores externos parecem adequados. Isso ocorre para garantir que a semente só comece a germinar quando as chances de sobrevivência da planta forem altas. Ademais, conhecer os tipos de germinação também é importante para o manejo das plantas durante suas fases iniciais de desenvolvimento. Esse 14 conhecimento permite que os agricultores e pesquisadores entendam melhor as necessidades das plantas nas fases iniciais de seu crescimento, otimizando o manejo do solo, a irrigação e a proteção contra praga. A seguir serão detalhados todos esses aspectos. 4.1 Fatores que influenciam na germinação A germinação das sementes é influenciada por fatores essenciais como temperatura, umidade, oxigênio e luz, que juntos determinam o sucesso no início do desenvolvimento da planta. Além disso, deve-se considerar também as características de cada tipo de semente, que são influenciadas pela genética. Essa junção de fatores afeta a velocidade, a uniformidade e a porcentagem de germinação das sementes. Segundo Oliveira et al. (2021), os fatores que interferem na germinação são: I – Fatores internos: características próprias da semente, que determinam sua capacidade de germinar mesmo quando as condições externas são favoráveis: a) Longevidade: é o tempo que a semente pode permanecer viável em condições ideais de armazenamento, influenciada por suas características genéticas e pelo ambiente. Para bancos de germoplasmas, entender a longevidade de cada espécie é importante para determinar o período de viabilidade das sementes. Pode-se classificar as sementes como de longevidade: i. Longa: quando dura mais de 15 anos. São exemplos: algodão, feijão, milho, tomate e trigo. ii. Média: dura entre 3 e 15 anos. São exemplos: arroz, azevém e soja. iii. Curta: dura menos de 3 anos. São exemplos: cacau, café e manga. b) Vitalidade e viabilidade: a vitalidade é essencial para a germinação da semente, enquanto a viabilidade refere-se à capacidade da semente de estar viva e pronta para germinar em condições favoráveis. A viabilidade é influenciada pelo vigor da planta-mãe, pelas condições climáticas durante a maturação e armazenamento, e por danos mecânicos na colheita e pós-colheita. Esses fatores impactam o tempo de vida e a capacidade de germinação da semente. 15 c) Dormência: sementes dormentes têm vitalidade, mas não viabilidade, pois possuem mecanismos de bloqueio que impedem a germinação, mesmo em condições ambientais ideais. Esse tema ainda será abordado no item 4.2. d) Sanidade: afeta a germinação, pois patógenos externos como fungos, bactérias e vírus, transportados pelas sementes, causam danos diretos ou indiretos à germinação. e) Integridade morfológica e estrutural: durante a formação e maturação das sementes, problemas na planta-mãe podem resultar em má formação do embrião. Isso leva a sementes com tecidos internos defeituosos, resultando em plântulas anormais. II – Fatores externos: são variáveis ambientais que influenciam o processo de germinação das sementes. Podem ser: a) Temperatura: afeta a taxa de reações bioquímicas dentro da semente. Cada espécie possui uma faixa de temperatura ideal para a germinação. Temperaturas muito baixas ou muito altas podem retardar ou impedir o processo. b) Umidade: a água é essencial para a germinação, pois ativa as enzimas que iniciam o crescimento da planta. A semente precisa absorver uma quantidade adequada de água para iniciar o processo, formando satisfatoriamente o processo de embebição. Sem umidade suficiente, a semente permanece dormente. c) Luminosidade: algumas sementes requerem luz para germinar, enquanto outras germinam melhor no escuro. A luz influencia a ativação de certos hormônios e processos dentro da semente, dependendo da espécie. d) Oxigênio: a respiração celular, que fornece energia para o crescimento inicial da semente, requer oxigênio. Sementes plantadas em solo muito compactado ou encharcado podem sofrer falta de oxigênio, prejudicando a germinação. e) Qualidade do solo: nutrientes disponíveis no solo, seu pH, e a textura influenciam a germinação. Um solo bem drenado e rico em nutrientes pode favorecer o desenvolvimento inicial da plântula. 16 4.2 Tipos de dormência e formas de superá-las Comovisto anteriormente, a dormência é um obstáculo para a reprodução das plantas, sendo um processo fisiológico que resulta de estratégias evolutivas adotadas por diversas espécies para assegurar a propagação sexuada, regulando a germinação até que o ambiente ofereça condições adequadas (Hoppe et al., 2004). Em termos simples, a dormência impede que as sementes germinem em situações desfavoráveis. Diferentes espécies desenvolvem variadas formas de dormência, que podem ser classificadas da seguinte maneira (Pegorin et al., 2022): I. Momento ou Fase de ocorrência: a) Dormência primária: manifesta-se antes da dispersão, integrando o processo de desenvolvimento da semente; b) Dormência secundária: ocorre após a maturação da semente, iniciando quando as condições ambientais se tornam inadequadas, mesmo após a absorção de água (embebição). II. Mecanismos de dormência: a) Dormência exógena: relacionada a impedimentos físicos, químicos ou mecânicos provenientes dos envoltórios da semente; b) Dormência endógena: associada à imaturidade ou inibição metabólica do embrião, influenciada por fatores fisiológicos, morfológicos ou morfofisiológicos. A seguir, serão descritos alguns dos principais tipos de dormência que ocorrem em sementes, fundamentais para o entendimento dos mecanismos que regulam a germinação dessas sementes (Pinã-Rodrigues; Martins, 2012): I. Dormência tegumentar: resistência encontrada no revestimento de frutos e sementes, sendo a forma mais comum de dormência em espécies florestais. Ela se refere às barreiras presentes nas camadas externas de sementes e frutos, que impedem a entrada de gases e líquidos necessários à germinação. Essas barreiras podem ser físicas (tornando a semente impermeável) ou mecânicas (aumentando a dureza contra o rompimento); II. Dormência fisiológica: ocorre quando há ausência de quantidades suficientes de compostos essenciais para a germinação ou a presença de 17 substâncias que retardam ou inibem o processo. Essa forma de dormência está relacionada aos processos fisiológicos da planta; III. Dormência morfológica: resulta da imaturidade do embrião, que, quando subdesenvolvido, necessita de condições especiais para completar seu desenvolvimento e permitir a germinação; IV. Dormência combinada: surge quando dois ou mais tipos de dormência estão presentes em uma mesma espécie; V. Germinação lenta ou retardada: ocorre devido a diversos fatores, embora alguns autores não considerem o atraso na germinação como dormência. No entanto, se o processo demora de um mês a um ano para ocorrer, pode-se caracterizá-lo como um tipo específico de dormência, devido à irregularidade no processo natural. As sementes frequentemente podem apresentar dormência, mas existem técnicas conhecidas como superação de dormência para aumentar a eficiência da germinação. Em condições naturais, por razões ecológicas e fisiológicas, as sementes passam por um período adequado para superar essa dormência e continuar o ciclo de desenvolvimento e perpetuação da espécie. Alguns desses processos naturais de superação de dormência incluem diversas formas observadas na natureza (Pinã-Rodrigues; Martins, 2012): I. Queimadas naturais: provocam alterações diretas nas barreiras físicas e mecânicas das sementes, facilitando o desenvolvimento do embrião; II. Passagem pelo trato digestivo de animais: os ácidos digestivos afetam as barreiras físicas e mecânicas das sementes, e as fezes fornecem nutrientes e umidade, favorecendo a germinação; III. Umidade ambiental: a água das chuvas realiza uma “lavagem” nas sementes, eliminando substâncias que inibem a germinação; IV. Exposição ao frio intenso: baixas temperaturas estimulam a produção de compostos que favorecem o desenvolvimento do embrião, que germinará com a chegada das chuvas. Dessa forma, podemos perceber que existem diversos mecanismos naturais que permitem a superação da dormência em sementes. No entanto, também é possível utilizar técnicas artificiais que imitam esses processos naturais, facilitando a germinação das sementes em condições controladas. Esses métodos são amplamente utilizados na agricultura e reflorestamento, com o objetivo de melhorar a eficiência do desenvolvimento das plantas. Entre os 18 principais métodos de superação de dormência aplicados em sementes estão (Pinã-Rodrigues; Martins, 2012; Pegorin et al., 2022): I. Escarificação química: envolve a imersão das sementes em substâncias que desgastam o tegumento sem danificá-las. Ácidos como sulfúrico, clorídrico e peróxido de hidrogênio são comumente usados. As concentrações e temperaturas variam conforme a espécie; II. Escarificação mecânica: consiste em raspar ou desgastar o tegumento para torná-lo permeável à água e oxigênio. Lixas são frequentemente utilizadas, e a quantidade de material raspado depende da espécie; III. Imersão em água quente ou choque térmico: submete as sementes a variações de temperatura, alternando entre água quente e temperatura ambiente. Os tempos de imersão variam por espécie; IV. Imersão em água fria: facilita a absorção de água, uniformizando a germinação, especialmente em sementes de germinação lenta. O tempo de imersão costuma ser de 24 horas, dependendo da espécie; V. Imersão em água corrente: esse processo remove compostos que inibem a germinação. As sementes ficam entre 12 e 48 horas submersas em fluxo constante de água; VI. Estratificação a frio: aplicada em sementes com embrião imaturo, mantidas a baixas temperaturas (numa faixa entre 5°C e 10°C) por um período específico. Elas são colocadas em areia para estimular a produção de hormônios de crescimento; VII. VII – Alternância de temperatura: as sementes são colocadas em substrato úmido e submetidas a diferentes temperaturas para promover a germinação; VIII. VIII – Quebra de dormência combinada: utiliza dois ou mais métodos simultaneamente, especialmente em sementes com dormência tanto tegumentar quanto embrionária. 4.3. Tipos de germinação A germinação é o processo pelo qual uma semente dá origem a uma nova planta. Existem dois principais tipos de germinação: epígea e hipógea (Chagas et al., 2023). Na germinação epígea, o crescimento do hipocótilo (a parte do caule abaixo dos cotilédones) faz com que os cotilédones sejam empurrados 19 para fora do solo, como é o caso do feijão (Figura 10). Esse tipo de germinação expõe os cotilédones à luz, permitindo que auxiliem na fotossíntese inicial. Figura 10 – Germinação epígea, exemplo do feijão Crédito: KANCHIT/Shutterstock. Já na germinação hipógea, os cotilédones permanecem abaixo da superfície do solo, enquanto o epicótilo (a parte do caule acima dos cotilédones) cresce e emerge, como acontece com o milho (Figura 11). Nesse caso, os cotilédones servem principalmente como reserva de nutrientes até que as folhas verdadeiras da planta se formem e comecem a realizar a fotossíntese. Figura 11 – Germinação hipógea, exemplo do milho Crédito: AZ 54design/Shutterstock. 20 Esses tipos de germinação afetam a forma como a planta se desenvolve nas primeiras fases de sua vida, influenciando fatores como a capacidade de absorção de luz, proteção contra predadores e resistência a condições adversas. Outro esquema separando características de monocotiledôneas e eudicotiledôneas estão apresentadas na Figura 12. Influenciam também na classificação e tipos de sementes. Figura 12 – Germinações hipógeas e epígeas Crédito: VectorMine/Shutterstock. 21 TEMA 5 – CLASSIFICAÇÕES E TIPOS DE SEMENTES A classificação e os diferentes tipos de sementes são baseados em suas características estruturais e funcionais, refletindo adaptações evolutivas que influenciam seu desenvolvimento e papel na reprodução das plantas. Nesse contexto, pode-se classificar as sementes em diferentes tipos em função dessasdiferentes características. As sementes podem ser classificadas de acordo com o número de tegumentos que apresentam. Dessa forma, podem ser (Chagas, 2023): I. Bitegumentadas: são as sementes que apresentam testa e tégmen. Esse tipo é comum dentre as Angiospermas. II. Unitegumentadas: são as sementes que apresentam um tegumento único, sem divisão entre testa e tégmen. Esse tipo de sementes ocorre nas Gimnospermas. III. Ategumentadas: são as sementes que não apresentam tegumento. A parte da amêndoa é protegida apenas pelo pericarpo. Esse tipo de sementes é comum em monocotiledôneas, principalmente gramíneas. Em relação à estrutura das sementes completamente formadas, podemos classificá-las em dois tipos (Canhoto, 2017): I. Albuminosas ou endospérmicas: contêm endosperma quando maduras, como é o caso das sementes de alfarrobeira e rícino, comumente gramíneas, cujos endospermas podem ser fonte de compostos de interesse. II. Exalbuminosas ou não endospérmicas: o endosperma é absorvido durante o desenvolvimento, acumulando as reservas nos cotilédones. Um dos exemplos é o feijão. Em algumas sementes, como as do cafeeiro, o tecido de reserva é o perisperma, derivado do nucelo. Essa classificação anterior é baseada na formação do endosperma. As reservas nutritivas armazenadas nas sementes, tanto no endosperma quanto nos cotilédones, são utilizadas durante a germinação e o desenvolvimento da plântula até que ela possa realizar a fotossíntese. Quanto à natureza da formação das substâncias de reserva das sementes, estas podem ser classificadas como (Figura 13) (Figueirêdo, 1978): 22 I. I – Amiláceas: sementes como as de milho, trigo e arroz, cuja principal substância de reserva é o amido. II. II – Aleuro-amiláceas: contêm tanto amido quanto proteínas como substâncias de reserva, como ocorre no feijão e na ervilha. III. III – Oleaginosas: sementes ricas em substâncias de reserva à base de óleos, como a mamona e o amendoim. IV. IV – Albuminoso-oleaginosas: além de óleos, possuem reservas proteicas, como na soja. V. V – Córneas: sementes com reservas celulósicas, como no caso do caqui. Figura 13 – Tipos de sementes quanto à natureza de formação das substâncias de reserva Fonte: Silva, 2024. Por fim, uma classificação baseada na tecnologia de sementes para uso prático está no potencial de armazenamento dessas ao longo do tempo. Para que seja preservada, é necessário muitas vezes realizar a secagem da semente, como poderá ser observado nas próximas etapas. Dessa forma, algumas espécies podem não resistir por muito tempo. Para isso, há uma classificação baseada na capacidade de dessecação na maturação (Carvalho et al., 2001; Silva, 2019): I. Sementes ortodoxas: são aquelas que suportam a redução do teor de umidade para níveis iguais ou inferiores a 5,0% e podem ser armazenadas a -18°C por 6 meses sem perda da capacidade de germinação. II. Sementes intermediárias: são capazes de suportar a redução da umidade apenas até níveis entre 7,0% e 10% sem perda de germinação, mas seu armazenamento a -18°C por 6 meses pode resultar em perda 23 parcial ou total da capacidade germinativa, independentemente do grau de umidade. III. Sementes recalcitrantes: perdem drasticamente ou totalmente a capacidade de germinação quando a umidade é reduzida para níveis iguais ou superiores a 15%. FINALIZANDO Chegamos ao final desta etapa, na qual foi possível discutir brevemente os conceitos iniciais sobre Tecnologia e Produção de Sementes. Além disso, destacamos a importância da Morfologia e Embriologia de Sementes para a compreensão dos processos de desenvolvimento e qualidade das sementes. Assim, foi possível observar que esses conhecimentos são fundamentais para otimizar a produção agrícola e florestal e aprimorar o controle das práticas de cultivo. 24 REFERÊNCIAS CANHOTO, J. Semente. Revista de Ciência Elementar, v. 5, n. 1, p. 1-4, 2017. CARVALHO, J. E. U. et al. Classificação de sementes de espécies frutíferas nativas da Amazônia de acordo com o comportamento no armazenamento. Comunicado técnico, 60. Belém: Embrapa, 2001. CHAGAS, P. C. Semente. In: THOMAZ, L. D. et al. (Org.) Morfologia Vegetal. Vitória: EDUFES, 2023. p. 103-112. CORTEZ, P. A. et al. Manual prático de morfologia e anatomia vegetal. Ilhéus: Editus, 2016. FIGUEIRÊDO, F. J. C. Botânica da semente. Belém: Embrapa, 1978. p. 1-17. HOPPE, J. M. et al. Produção de sementes e mudas florestais. Caderno Didático nº 1, 2. ed. Santa Maria: UFSM, 2004. OLIVEIRA, C. R. et al. Produção e Tecnologia de Sementes. Porto Alegre: Grupo A, 2021. PEGORIN, P. et al. Histórico e classificação da dormência: a grande polêmica. In: FERREIRA, G. et al. (Org.) Dormência de sementes: provocações e reflexões. Botucatu: Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Instituto de Biociências de Botucatu, 2022. p. 10-35. PIÑA-RODRIGUES, F. C. M.; MARTINS, R. B. Dormência: conceito, tipos e formas de superação. In: MORI, E. S. et al. Sementes florestais: guia para germinação de 100 espécies nativas. São Paulo: Instituto Refloresta, 2012. p. 19-26. RODRIGUES, A. C. et al. Anatomia vegetal. Florianópolis: Biologia/EaD/UFSC, 2015. SANTIAGO, S. A. Morfologia e sistemática vegetal. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2018. SILVA, G. R. Produção, tecnologia e armazenamento de sementes. Londrina: Editora e Distribuidora Educacional S.A., 2019. TAIZ, L. et al. Fisiologia e desenvolvimento vegetal. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2017. 518p. 25 VIEIRA, E. L.; CARVALHO, Z. S. Fisiologia de sementes: Parte I - formação e germinação de sementes. Boletim Científico Agronômico do CCAAB/UFRB, v. 1, e2259, 2023. CONVERSA INICIAL TEMA 1 – INTRODUÇÃO AO ESTUDO DAS SEMENTES TEMA 2 – anatomia interna e morfologia externa das sementes TEMA 3 – FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DAS SEMENTES TEMA 4 – germinação de sementes 4.1 Fatores que influenciam na germinação 4.2 tipos de dormência e formas de superá-las 4.3. tipos de germinação TEMA 5 – CLASSIFICAÇÕES E TIPOS DE SEMENTES FINALIZANDO REFERÊNCIAS