Prévia do material em texto
MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 1 APG 17: “FORA DE CONTROLE” OBJETIVO 1: REVISAR A MORFOFISIOLOGIA DAS MENINGES. As meninges são três membranas protetoras, compostas por tecido conjuntivo, que envolvem a medula espinal e o encéfalo. Elas são, da camada mais externa para a mais interna: DURA-MÁTER, ARACNOIDE-MÁTER e PIA-MÁTER. As meninges espinais envolvem a medula espinal e são contínuas com as meninges cranianas, que recobrem o encéfalo. As três meninges espinais revestem os nervos espinais até sua passagem pelos forames intervertebrais da coluna vertebral. A medula espinal também é protegida por um coxim de tecido adiposo e tecido conjuntivo localizado no espaço epidural (extradural), espaço entre a dura-máter e a parede do canal vertebral. DURA-MÁTER: A mais superficial das três meninges é uma espessa membrana formada por tecido conjuntivo denso irregular. A dura-máter forma um saco desde o forame magno, onde ela é contínua com a dura-máter do encéfalo, até a segunda vértebra sacral. Ela também é contínua com o epineuro, o revestimento externo dos nervos espinais e cranianos. ARACNOIDE-MÁTER: Esta membrana intermediária, delgada e avascular é formada por células e fibras finas e dispersas de material elástico e de colágeno. Ela é assim chamada devido à disposição de suas fibras em forma de uma teia de aranha. Ela está abaixo da dura- máter e é contínua com a aracnoide-máter do encéfalo no forame magno. Entre a dura-máter e a aracnoide-máter existe um delgado espaço subdural, contendo líquido intersticial. PIA-MÁTER: A meninge mais interna é uma fina camada de tecido conjuntivo transparente que adere à superfície da medula espinal e do encéfalo. A pia-máter é composta por finas células pavimentosas e cúbicas entrelaçadas com feixes de fibras de colágeno e algumas fibras elásticas delgadas. Na pia-máter estão muitos vasos sanguíneos que fornecem oxigênio e nutrientes para a medula espinal. Projeções membranosas triangulares da pia-máter suspendem a medula espinal no meio de sua bainha dural. Estas projeções, ligamentos denticulados, são áreas de espessamento da pia-máter. Elas se projetam lateralmente e se fundem com a aracnoide- máter e com a superfície interna da dura-máter, entre as raízes anterior e posterior dos nervos espinais em ambos os lados. Os ligamentos denticulados protegem a medula espinal contra deslocamentos súbitos decorrentes de traumatismo. Entre a aracnoide-máter e a pia-máter existe um espaço, o espaço subaracnóideo, que contém líquido cerebrospinal – líquido que, entre outras funções, absorve energia decorrente de um impacto. OBJETIVO 2: COMPREENDER A EPIDEMIOLOGIA, A ETIOLOGIA, OS FATORES DE RISCO, A FISIOPATOLOGIA, AS MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS, O DIAGNÓSTICO E O TRATAMENTO DAS INFECÇÕES DO SISTEMA NERVOSO CENTRAL. - Formas de transmissão e prevenção; - Principais agentes etiológicos: bactérias, vírus, fungos e parasitas; - Características do liquor em cada tipo de infecção; - Comparativo entre neurocisticercose, neurocriptococose e neurotoxoplasmose. INTRODUÇÃO As infecções do sistema nervoso central (SNC) abrangem desde doenças comuns a doenças graves e raras, de manifestações benignas a comprometimentos neurológicos graves, que, muitas vezes, determinam sequelas ou ocasionam o óbito do paciente, além de doenças agudas, subagudas e crônicas. As principais manifestações clínicas das infecções são caracterizadas por cefaleia, febre e alteração do estado mental. Vômitos e sinais localizatórios podem ocorrer. Assim, devido às graves complicações e até óbito em curto período, o diagnóstico diferencial deve ser estabelecido o mais brevemente possível, visto que é doença tratável na maioria das vezes. É imprescindível anamnese completa, antecedentes epidemiológicos e exames clínico e neurológico acurados para vislumbrar sinais que possam sugerir o diagnóstico provável. O exame do líquido cefalorraquidiano (LCR) é fundamental. MENINGITES AGUDAS Meningite é um processo inflamatório nas meninges, membranas que envolvem o neuroeixo, cérebro e medula espinal, em especial pia-máter e aracnoide, que delimitam o espaço subaracnóideo MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 2 (ESA). A apresentação desta enfermidade se dá de forma aguda, subaguda e crônica. Na maioria das vezes, neste processo, a infecção aguda da pia- máter e da aracnoide se estende por todo o espaço subaracnóideo, sendo denominado leptomeningite. Embora a grande causa de meningites agudas em unidades de emergência seja viral, as meningites bacterianas são mais graves, com altas taxas de morbimortalidade. Os fatores de risco associados à contração de meningite são traumatismo craniano com fratura de base de crânio, otite média, sinusite ou mastoidite, neurocirurgia, fístula dérmica, septicemia sistêmica ou imunossupressão. MENINGITES VIRAIS São aquelas causadas por vírus. É caracterizada por um quadro clínico com evolução autolimitada e benigna. Não há tratamento específico, geralmente requer apenas a terapia de suporte. As manifestações clínicas assemelham-se às viroses em geral. AGENTES ETIOLÓGICOS Os principais agentes são vírus do gênero Enterovirus. Neste grupo, estão incluídos os 3 tipos de poliovírus, 28 sorotipos do vírus echo, 23 sorotipos coxsackie A, 6 sorotipos coxsackie B e 5 outros enterovírus. Entretanto, outros vírus também podem causar meningite viral: Arbovirus, vírus da caxumba, arenavírus (coriomeningite linfocitária), HIV, vírus do sarampo, vírus da família Herpesviridae – vírus do herpes simples tipos 1 e 2 (HSV-1 e HSV-2), citomegalovírus (CMV), vírus de Epstein-Barr (EPB) e vírus da varicela zóster (VCZ). EPIDEMIOLOGIA No Brasil, entre os anos de 2007 e 2020, foram notificados 393.941 casos suspeitos de meningite. Destes, foram confirmados 265.644 casos de várias etiologias, sendo a meningite viral mais frequente (121.955 casos), seguida pela etiologia bacteriana (87.993 casos). Em São Paulo, em 2019, foram notificados 72% de casos de meningites virais contra 28% de meningites bacterianas. TRANSMISSÃO Nas meningites por enterovírus, a transmissão/contaminação se faz por via fecal-oral, podendo ocorrer também por via respiratória. A transmissão pode também ocorrer por via aérea, com período de transmissibilidade de 10 a 15 dias. PERÍODO DE INCUBAÇÃO E TRANSMISSIBILIDADE O período de incubação é de 7 a 14 dias, podendo variar de 2 a 35 dias, e o período de transmissibilidade pode perdurar por diversas semanas nas fezes. FISIOPATOLOGIA Estudos atuais indicam que a infecção enteroviral ativa o inflamassoma NLRP3, sendo o mesmo um importante complexo proteico para o processo inflamatório responsável pela maturação das citocinas pró-inflamatórias IL-1β e IL-18. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS As manifestações clínicas iniciais mais frequentes são febre, mal- estar geral, náuseas, mialgias e dor abdominal. Após 1 ou 2 dias dos sintomas iniciais, aparecem vômitos e sinais de irritação meníngea: rigidez de nuca e sinais de Kernig e Brudzinski. Outros sintomas podem ocorrer, como anorexia, diarreia, tosse, faringite e erupção cutânea. Em alguns raros casos, podem ocorrer rebaixamento do nível da consciência, espasmos musculares, insônia e mudança da personalidade. Tais sintomas devem alertar para a possibilidade de evolução para encefalite, caso em que o enterovírus cepa 71 tem grande importância. DIAGNÓSTICO O diagnóstico se faz por quadro clínico sugestivo, mas a confirmação se faz pela coleta de líquido cefalorraquidiano (LCR) por punção lombar para análise. O LCR habitualmente se mostra claro ou levemente opalescente, com 100 a 200 células/mm3, composto principalmente por linfócitos e monócitos, com presença de plasmócitos. Nas fases iniciais dosdos ventrículos e hérnias cerebrais. FORMA PSIQUIÁTRICA A apresentação psiquiátrica pura é rara, sendo mais frequentes distúrbios como demência, confusão, delírio, excitação, alucinação, depressão e déficit de memória. Há, inclusive, relato de caso do tipo esquizofrênico. Estas alterações aparecem devido a associação de fatores concomitantes (inflamações recidivantes, hipertensão intracraniana, vasculites e compressões por edemas). FORMA RAQUIANA Relativamente rara, quase sempre está associada a outras localizações. Os cistos podem estar localizados em diferentes sítios, desde a medula propriamente dita até espaço subaracnóideo raquiano, meninges, cauda equina e raízes. A manifestação clínica MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 14 é muito variável, sendo muitas vezes confundida com outras doenças neurológicas raquimedulares. As alterações podem ser sensitivas, motoras, esfinctéricas e comprometer um ou mais membros. DIAGNÓSTICO O diagnóstico se faz como parte da investigação de epilepsia, por meio de exame de imagem do SNC. Diante da suspeita, o exame de LCR pode ajudar na confirmação. Pode apresentar aumento do número de células, associado à presença de eosinófilos, hipoglicorraquia e hiperproteinorraquia, podendo causar confusão com outras doenças infecciosas crônicas, como tuberculose, criptococose, nocardiose e outras. As reações imunobiológicas no LCR geralmente confirmam o diagnóstico. A associação das reações de fixação de complemento, imunofluorescência e imunoenzimática podem apresentar sensibilidade e especificidade superior a 95%, dependendo da fase em que se encontra a doença. Em algumas situações, as reações imunobiológicas podem apresentar-se falsamente negativas, por exemplo: cisto único intraparenquimatoso, nódulo calcificado ou baixos níveis de anticorpos, consequente à ação imunológica do hospedeiro. TRATAMENTO Há a recomendação de que, antes de se iniciar o tratamento antiparasitário, todos os pacientes realizem exame oftalmológico com fundoscopia para avaliação de cisticercose intraocular. Em caso desse acometimento, deve haver o tratamento cirúrgico, pois o tratamento antiparasitário nesses casos pode ameaçar a visão. O tratamento deve ser realizado em pessoas sintomáticas, com cistos viáveis, localizados dentro do parênquima cerebral. A abordagem neurocirúrgica prévia ao tratamento antiparasitário é imperativa nos casos de hidrocefalia obstrutiva e formas racemosas ou tumorais com grande efeito de massa, pois o tratamento medicamentoso puro pode levar a aumento do efeito inflamatório e piora do quadro de hidrocefalia e hipertensão intracraniana, com risco de morte. ANTIPARASITÁRIOS A primeira droga com ação eficaz sobre o cisticerco foi o Praziquantel (PZQ), um derivado isoquinoleico que causa lesão das membranas celulares do parasita. A dose usual do PZQ é de 50 mg/kg/dia por 15 dias. Atualmente o albendazol, um derivado imidazol do grupo dos benzimidazólicos, vem sendo utilizado com vantagens sobre o PZQ. Seu mecanismo de ação é inibir a captação de glicose pelo parasita, além de alterar, em nível molecular a sua citoarquitetura por ligação aos microtúbulos (tubulin) intracelulares. É um anti-helmíntico de amplo espectro de ação tríplice: vermicida, ovicida e larvicida. Ele tem boa absorção por via intestinal, alcançando níveis plasmáticos em 3 a 4 horas da administração. Sua dose recomendada é de 15 mg/kg/dia por 10 dias. As vantagens deste medicamento sobre o anterior incluem maior taxa de eliminação de cistos do parênquima cerebral, baixo custo de tratamento e maior tolerância do paciente quanto aos efeitos colaterais. Tudo isto tornou o ALBENDAZOL a droga de escolha para o tratamento da neurocisticercose. É importante lembrar que se o albendazol for utilizado por mais de 14 dias, deve-se fazer controle com função hepática e leucometria. CORTICOSTEROIDES Sua administração tem como objetivo diminuir a reação inflamatória que ocorre quando há morte do parasita, momento em que grande quantidade de substâncias antigênicas é liberada. Estas substâncias causam, geralmente nos primeiros dias de tratamento, cefaleia, náuseas, vômitos, reação inflamatória meníngea e crises epilépticas. Nos casos de cisticercose racemosa de base de crânio ou em cisternas, como a cisterna silviana, quando os sintomas são recidivantes, a associação de corticosteroides e anti-histamínicos é uma opção de tratamento que ajuda no controle clínico da doença. Tal associação reduz os sintomas inflamatórios, permitindo que o corticosteroide seja utilizado em dose mais baixa e por menor tempo. Dentre os anti-histamínicos, o mais comumente utilizado é a DEXCLORFENIRAMINA, de 6 a 12 mg/dia, associada a DEXAMETASONA 6 a 8 mg/dia. PREVENÇÃO Medidas de saneamento básico, como serviços de esgoto e água potável, em conjunto com a educação das comunidades, são as formas mais eficientes de prevenir a doença. NEUROESQUISTOSSOMOSE INTRODUÇÃO Existem três espécies principais que acometem o SNC: Schistosoma japonicum, S. haematobium e S. mansoni. EPIDEMIOLOGIA A neuroesquistossomose é um problema de saúde pública. No Brasil, existem cerca de 10% de indivíduos com esquistossomose (cerca 17 milhões), de modo que há a possibilidade de existir, atualmente, algo em torno de 51.000 a 680.000 pessoas com neuroesquistossomose ou grande potencial para tal afecção. A espécie Schistosoma mansoni, única espécie presente no Brasil, foi, provavelmente, trazida da África com tráfico de escravos. As áreas de maior endemicidade estão situadas nos estados do Nordeste e em Minas Gerais, existindo focos em quase todos os estados, ocasionados pelo grande fluxo migratório existente. FORMAS DE TRANSMISSÃO A via de infestação do homem se faz pela penetração das cercárias (larva transmissora) através da pele quando o indivíduo entra em contato com águas infestadas. CICLO As cercárias se diferenciam em esquistossômulos (com a perda da sua cauda), ganham a corrente sanguínea por meio da migração pelo tecido subcutâneo, sendo levados passivamente ao sistema porta-hepático, desenvolvendo-se a sua forma adulta, que migra para o território da veia mesentérica inferior, iniciando a oviposição a partir do 37º dia. O comprometimento do sistema nervoso depende da presença direta dos ovos ou vermes adultos ou indireta pela deposição dos complexos imunes circundantes no parênquima cerebral, medular ou no espaço subaracnóideo. O comprometimento encefálico‚ mais raro na esquistossomose mansônica, é mais frequente na esquistossomose japônica. O S. mansoni alcança o cérebro quando há hipertensão portal, pois existe desvio do fluxo venoso intra-abdominal para o sistema MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 15 da cava superior. Na circulação pulmonar, por meio de shunts arteriovenosos pulmonares, o S. mansoni alcança a circulação sistêmica, sendo embolizado para diversos órgãos, incluindo o encéfalo. Nesses casos, o diagnóstico é feito tardiamente, não raro em achado de autópsias, quando o paciente está em fase terminal da doença. O comprometimento intracraniano também pode ser alcançado por meio da ampla comunicação do sistema venoso intra- abdominal com o plexo venoso vertebral e subaracnóideo. Por ser avalvular, o sangue abdominal pode alcançar os seios venosos intracranianos. Já o comprometimento mielomeningorradicular se faz na fase intestinal e/ou hepatointestinal da doença, quando os ovos e/ou vermes adultos alcançam os plexos venosos vertebrais via plexo de Batson. Esse plexo é totalmente desprovido de válvulas e comunica o sistema venoso intra-abdominal com o vertebral, de modo que qualquer aumento da pressão venosa intra- abdominal pode fluir o sangue livremente para o plexo venoso vertebral. A forma mielorradicular acomete oindivíduo jovem e produtivo, no qual, por motivo de prensa abdominal, há um refluxo de sangue abdominal para o sistema venoso vertebral, carreando os ovos e/ou vermes para os vasos ali localizados. No espaço subaracnóideo, começa um processo inflamatório do tipo imunoalérgico, no qual há pleiocitose à custa de células linfomonocitárias, com presença variável de eosinófilos e aumento das proteínas do líquido cefalorraquidiano (LCR). Quando há formação de granuloma, instala-se um quadro clínico sugestivo de bloqueio do espaço subaracnóideo, parcial ou absoluto, originando líquido de estase com grande teor proteico. Essa forma é a mais diagnosticada, pois recebe diagnóstico inicial de processo expansivo intrarraquidiano. O substrato anatomopatológico é fundamentado no encontro de granulomas verdadeiros, tendo, no centro, restos de ovos do S. mansoni em meninges e tecido parenquimatoso cerebral e/ou medular. Às vezes, há amolecimento medular resultante de infartos ocasionados pela vasculite. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O acometimento do SNC pode se manifestar principalmente como quadro encefálico, meníngeo, mielítico (cone e epicone medular, na maioria das vezes), pseudotumoral granulomatoso e mielomeningorradiculítico. O quadro clínico está mais relacionado ao comprometimento mielomeningorradicular, em que predominam: Paraparesia, na maioria das vezes de evolução progressiva e, às vezes, paraplegia. Paraparestesia e hipoestesia, principalmente em região selar (S1 a S5). Alteração esfinctérica vesical e retal, com incontinência e retenções. Impotência sexual. Muitas vezes, esse quadro é precedido por forte dor lombar baixa relacionada a esforços físicos executados no dia anterior. Na história, há frequente relato de infestação recente por contato com água contaminada (“lagoas de coceira”), geralmente entre 6 meses e 1 ano do início da doença neurológica. DIAGNÓSTICO O diagnóstico deve ser lembrado sempre que houver o quadro neurológico descrito e antecedente epidemiológico para esquistossomose. O diagnóstico de esquistossomose clínica deve ser confirmado por meio de exame protoparasitológico, reações sorológicas e, quando necessário, biópsia de valva retal. Assim, o diagnóstico de neuroesquistossomose é feito por esquistossomose e distúrbio neurológico mielomeningorradicular característico. Quando a neuroesquistossomose encefálica assumir outras formas de manifestação, o diagnóstico só será realizado por estudo anatomopatológico. O paciente pode apresentar, além da forma pseudotumoral granulomatosa, meningite linfomonocitária com presença ou não de eosinófilos; manifestações vasculares isquêmicas ou hemorrágicas, ocasionadas por fenômeno vasculítico; encefalite aguda e difusa, etc. No LCR, além das alterações imunoalérgicas, é possível realizar reações laboratoriais na tentativa de diagnosticar a neuroesquistossomose: ELISA, hemaglutinação indireta, reação de imunofluorescência indireta, reação periovular, etc. Todas as reações descritas visam à identificação de anticorpos anti- Schistosoma mansoni no LCR. A reação que melhor satisfaz o conceito de sensibilidade e especificidade para neuroesquistossomose é a reação de imunofluorescência indireta, utilizando-se como substrato antigênico o corte parafinado de verme adulto de S. mansoni, com conjugado fluoresceínico, o anti-IgM humano. Em áreas onde a prevalência da esquistossomose é alta, a concomitância dessa parasitose e outras doenças, incluindo inflamatórias e/ou infecciosas do SNC, é previsível. O vírus linfotrópico T humano (HTLV-I) é um retrovírus que pode causar uma doença concomitante à essa, por exemplo. A possibilidade da concomitância dessas doenças dificulta o diagnóstico diferencial, exigindo uma reação altamente específica para o diagnóstico da neuroesquistossomose. TRATAMENTO O sucesso do tratamento depende diretamente do diagnóstico precoce do acometimento neurológico. Quando o diagnóstico é retardado, podem ocorrer danos irreversíveis no SNC. O tratamento é realizado com a combinação de esquistossomicida e corticosteroides, associação com a melhor resposta terapêutica. O PRAZIQUANTEL é o esquistossomicida de escolha. Seu mecanismo de ação é alterar a homeostasia do cálcio nas células do helminto, causando contrações intensas, paralisia e morte. Sua dose padrão é de 40 a 60 mg/kg, em dose única, podendo ser dividida em 2 doses com 4 horas de intervalo. Há também literatura que indique o tratamento com a mesma dose diária por 3 dias. O OXAMINIQUINE (15 a 20 mg/kg por via oral (VO) em dose única) pode ser uma opção secundária para o tratamento. Seu mecanismo de ação atua apenas sobre o S. mansoni e apenas sobre sua fase adulta, não agindo sobre as outras fases do ciclo. Há evidência de eficácia e tolerância comparada ao praziquantel nas formas intestinal e hepatoesplênica. O ALBENDAZOL, um derivado do grupo dos benzimidazólicos, é um anti-helmíntico de amplo espectro de ação tríplice (vermicida, ovicida e larvicida) que tem boa absorção por via intestinal, alcançando níveis plasmáticos em 3 a 4 horas da administração. Atua interferindo no nível molecular, alterando a citoarquitetura por ligação aos microtúbulos (tubulin) MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 16 intracelulares. No entanto, sua utilização em esquistossomose permanece controversa. Trata-se de um anti-helmíntico recente, com poucos efeitos colaterais. Como na neurocisticercose, a dose recomendada está entre 10 e 15 mg/kg, dividida em três tomadas e associada a corticoesteroide. É importante ainda observar que, além do tratamento direto e específico, há a possibilidade de tratamento de complicações secundárias da doença, como impotência sexual e alterações esfinctéricas. PREVENÇÃO Evitar o contato com águas infectadas; acesso a água potável, saneamento básico e educação em saúde. MENINGITE TUBERCULOSA AGENTES ETIOLÓGICOS Agentes do complexo Mycobacterium são responsáveis por esta infecção, entre eles M. tuberculosis, M. bovis, M. africanum, M. canetti, M. microti, M. pinnipedi e M. caprae. Contudo, o principal agente é o M. tuberculosis conhecido como bacilo de Koch (BK). No Brasil, a tuberculose pulmonar é uma infecção muito prevalente. A meningite tuberculosa pode ocorrer em qualquer idade, sendo mais frequente na infância, habitual complicação da tuberculose miliar. EPIDEMIOLOGIA Dados da OMS de 2016 alertam que mais de 10 milhões de pessoas desenvolveram tuberculose em 2015, estimando que 580 mil com a forma multirresistente, com mortalidade próxima de 1 milhão e meio das pessoas infectadas. Estima-se que o comprometimento encefálico pela tuberculose seja de 5 a 10% de todos os focos extrapulmonares, resultando em 1 a 2% de todos os casos de tuberculose pulmonar. FISIOPATOLOGIA A infecção ocorre pela via respiratória, com o BK alcançando o alvéolo pulmonar. Ali, inicia-se o processo inflamatório, formando uma pneumonite localizada. Em seguida, há desenvolvimento de linfangite em direção ao hilo pulmonar, onde ocorre infarto ganglionar em hilo pulmonar, formando o complexo de Ghon ou complexo primário. Nessa fase, há disseminação do bacilo pela corrente sanguínea para todos os órgãos do corpo, principalmente àqueles onde há grande oferta de oxigênio. É nessa fase que alcança o SNC. Existem evidências que o BK atravessa a barreira hematoencefálica tanto da passagem direta do bacilo para barreira quanto da passagem pela barreira dentro de macrófagos infectados. Após essa fase, há formação de microgranulomas de Rich no parênquima encefálico e na meninge. Com a ruptura desses granulomas para o espaço subaracnóideo, inicia-se o processo inflamatório meníngeo. Essa inflamação forma uma substância gelatinosa, composta por neutrófilos, linfócitos e monócitos, que ocupa a basedo crânio e suas reentrâncias, prejudicando o livre fluxo do líquido cefalorraquidiano (LCR) e provocando hidrocefalia, lesões de nervos cranianos e vasculites. A disseminação hematogênica na forma miliar pode provocar aparecimento de múltiplos pequenos granulomas caseosos em todo neuroeixo. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Em adultos, o quadro clínico mais frequente é o de meningite acompanhada de febre variando de 37,5 a 38,5 °C, cefaleia e rigidez de nuca. Com o passar dos dias, somam-se déficits neurológicos focais e alterações do comportamento e da consciência. A evolução é indolente, com poucos sintomas no início da doença, havendo casos relatados de meses de evolução até chegar ao diagnóstico de comprometimento neurológico. Habitualmente, a doença se desenvolve em 1 a 3 semanas. Em crianças, a apresentação é mais dramática, com quadro agudo ou subagudo de febre, náuseas, vômitos, crises convulsivas, rebaixamento da consciência e coma. Em crianças com idade inferior a 12 meses e tuberculose, a punção lombar diagnóstica deve ser considerada, pois essa população é suscetível a apresentar forma disseminada da doença. DIAGNÓSTICO O principal método para o diagnóstico etiológico da meningite tuberculosa é a análise do LCR. A punção lombar, precedida de exame de imagem do SNC, evidencia elevada pressão de abertura, com saída de líquido opalescente e amarelado. As alterações liquóricas dependem do estágio da doença. Geralmente há processo inflamatório que não costuma exceder a 500 leucócitos/mm3, apesar de serem relatados casos com mais de 4.000 leucócitos/mm3. O exame citológico é composto, em geral, por linfócitos e monócitos, com presença de plasmócitos, embora possa haver predomínio de neutrófilos nas fases iniciais da doença. A taxa de proteína está geralmente elevada, e valores acima de 500 mg/dL podem estar associados a bloqueio do canal raquiano, situação na qual há desabamento de vértebra torácica ou lombar (mal de Pott). Os níveis de glicose no LCR estão diminuídos. A concentração de lactato no LCR, importante marcador de meningite bacteriana, também está elevada nestes casos. O diagnóstico laboratorial é confirmado pela identificação do bacilo álcool-ácido-resistente (BAAR) em amostras de LCR por exame bacterioscópico direto e cultura específica em meio de Löwenstein-Jensen. A detecção de antígenos bacterianos em amostras de LCR suspeitas de meningotuberculose, pelo método de reação em cadeia da polimerase (PCR), tem revelado alta especificidade, mas baixa sensibilidade. Assim, esse exame não serve para afastar a possibilidade de meningotuberculose com segurança. A cultura é o método padrão-ouro em amostras de LCR de pacientes com meningoencefalite. O Gene Xpert MTB/RIF é um ensaio totalmente automatizado baseado em RT-PCR para a detecção de M. tuberculosis e resistência à rifampicina em amostras clínicas. A adenosina deaminase (ADA) é uma importante enzima do sistema purina que deamina, irreversivelmente, a amina em inosina. Está presente na proliferação linfocitária, sendo um marcador da imunidade celular mediada. A análise por neuroimagem permite diagnosticar lesões parenquimatosas, hidrocefalia, realce meníngeo em espaços subaracnóideos e base do crânio. A RM de crânio, assim como na TC, mostra realce meníngeo, principalmente na base do crânio. TRATAMENTO De acordo com a orientação da Agência Nacional de Vigilância Epidemiológica, a meningoencefalite tuberculosa é de notificação obrigatória. MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 17 De acordo com a recomendação do Ministério da Saúde, associar corticosteroide: PREDNISONA, 1 a 4 mg/kg/dia por 4 semanas, com redução gradual nas 4 semanas subsequentes. Em casos mais graves, DEXAMETASONA INJETÁVEL, 0,3 a 0,4 mg/kg/dia por 8 semanas, com redução gradual nas 4 semanas subsequentes. PREVENÇÃO A principal forma de prevenir é a vacinação de rotina com a BCG, uma vez que o risco de adoecimento é maior no 1° ano de vida. ABSCESSOS, EMPIEMAS E TROMBOFLEBITE SÉPTICA INTRODUÇÃO Abscessos e empiemas são coleções purulentas que podem ocorrer no parênquima encefálico (abscesso cerebral e de tronco encefálico) ou medular. Empiemas podem ocorrer no espaço entre a dura-máter e aracnoide (empiema subdural) e no espaço extradural (empiema epidural). Estas coleções purulentas relacionam-se com veias e seios venosos cerebrais, sendo concomitante a presença de tromboflebites. EPIDEMIOLOGIA A incidência mundial de abscessos cerebrais é estimada em 0,3 a 1,3/100.000 pessoas por ano, mais frequente em homens em relação às mulheres, a uma taxa de 2:1 a 4:1. Esta enfermidade tem sua incidência e prevalência nas populações de baixa renda. Um empiema epidural raquidiano é encontrado em 0,2 a 2 de cada 10 mil pessoas admitidas em hospitais, sendo mais prevalente em homens acima dos 30 anos de idade, em usuários de drogas injetáveis, diabéticos e pacientes submetidos a procedimentos raquidianos invasivos. AGENTES ETIOLÓGICOS O Staphylococcus aureus é o principal agente etiológico. Pseudomonas spp. é causa de empiema epidural comumente isolada em usuários de drogas injetáveis. Empiemas epidurais intracranianos são muito raros, de origem polimicrobiana, sendo mais frequentes em pacientes jovens com idade inferior a 20 anos, altamente associados a sinusite frontal, otite média e neurocirurgia recente. O empiema subdural pode ser intracraniano ou, raramente, raquidiano. Geralmente, o empiema intracraniano é uma complicação de sinusite frontal ou etmoidal ou, menos frequentemente, de otite média e de procedimentos neurocirúrgicos, sendo mais frequente em pacientes jovens com idade inferior a 20 anos. A tromboflebite séptica é uma complicação de infecções na face, sinusites, otites, mastoidites, meningites e empiemas subdurais ou epidurais, com epidemiologia semelhante à encontrada nas doenças associadas. FISIOPATOLOGIA O abscesso cerebral é uma área de cerebrite com posterior necrose, que pode ocorrer por disseminação hematogênica, geralmente resultando em múltiplos abscessos, por contiguidade após meningite ou infecções de estruturas próximas, como nasofaringe ou seios paranasais (lobo frontal), ouvido médio e mastoide (lobo temporal ou cerebelo) ou dentes (qualquer lugar), ou por trauma craniano penetrante, fratura craniana aberta ou colocação intracraniana de um corpo estranho. O abscesso epidural raquidiano posterior pode ser causado por disseminação hematogênica, associada ou não a fatores que diminuem a resposta imune, como diabetes melito, neurocirurgia raquidiana, trauma raquidiano penetrante, infecções e abscessos musculocutâneos paravertebrais. O abscesso epidural raquidiano anterior surge a partir de infecção do disco intervertebral e/ou do corpo vertebral. O empiema subdural raquidiano também pode ser consequência de disseminação hematogênica ou por contiguidade a uma osteomielite. O abscesso epidural e o empiema subdural intracranianos são frequentemente causados por extensão retrógrada de infecções nos seios paranasais e no ouvido médio através de veias emissárias avalvuladas que se comunicam com a drenagem venosa dural. A tromboflebite séptica do seio sagital superior pode decorrer de meningite bacteriana, afetando as veias diploicas avalvuladas na convexidade cerebral. A tromboflebite séptica do seio transverso e/ou sigmoide pode ocorrer como complicação de otite média e/ou mastoidite. A sinusite esfenoidal ou etmoidal é a principal causa de tromboflebite séptica do seio cavernoso. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS As manifestações clínicas de um abscesso cerebral são subagudas e estão associadas à presença de hipertensão intracraniana e à localização da lesão. A cefaleia é o sintoma mais frequente, enquanto febre, convulsões e alterações no nível de consciênciasão menos frequentes. O papiledema é comum em casos de abscesso cerebral. As alterações neurológicas focais auxiliam na determinação do local da lesão, mas dependem do tamanho do abscesso. Os sinais e sintomas de um abscesso epidural ou empiema subdural raquidianos são semelhantes. É comum o abscesso epidural intracraniano manifestar-se por meio de cefaleia hemicraniana ipsilateral e febre persistente, sendo que outros sinais e sintomas surgem apenas após a disseminação da infecção para o espaço subdural. Como tamém, o empiema subdural intracraniano é caracterizado por déficits neurológicos focais, meningismo, convulsões e sinais de hipertensão intracraniana. A apresentação clínica da tromboflebite séptica intracraniana depende da fonte inicial de infecção e do seio venoso dural afetado, ou seja, no caso do seio sagital superior, podem ocorrer paraparesia crural, convulsões e sinais de hipertensão intracraniana com rápida redução do nível de consciência. Já no caso do seio cavernoso, podem ocorrer ptose, proptose, dor frontal e/ou retro-orbitária, diplopia por paralisia da musculatura ocular extrínseca e hipo ou hiperestesia dos ramos oftálmico e maxilar do nervo trigêmeo ipsilateralmente. Já no caso do seio transverso, há diplopia horizontal por paralisia do nervo abducente e dor facial; retro-orbitária ipsilateralmente. MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 18 DIAGNÓSTICO Pelo fato de o quadro clínico ser inespecífico para abscessos e empiemas do SNC, é imperativa a realização de exames de neuroimagem para a confirmação diagnóstica. A TC contrastada é o exame inicial de escolha por sua maior disponibilidade e rapidez de realização; porém, a imagem por RM com gadolínio é mais sensível para o diagnóstico. A confirmação do diagnóstico por meio de RM, venografia por RM, angiografia por TC ou angiografia cerebral é recomendada. A punção lombar não é indicada em quase todos os casos. INVESTIGAÇÃO COMPLEMENTAR Os achados laboratoriais encontrados em pacientes com abscessos e empiemas do SNC também são inespecíficos, encontrando-se leucocitose leve e elevação da velocidade de hemossedimentação (VHS) e da proteína C reativa em cerca de metade dos pacientes. A hemocultura pode revelar o organismo causador em alguns casos associados à endocardite e à osteomielite. A análise do líquido cefalorraquidiano (LCR) também mostra resultados inespecíficos, como pleiocitose linfocítica leve, aumento da proteinorraquia e glicorraquia normal. A coloração pelo Gram e a cultura do LCR raramente conseguem revelar o organismo causador, devendo ser solicitadas apenas nos casos em que a cultura do material obtido por um procedimento neurocirúrgico for negativa. A TC é o exame inicial de escolha, podendo mostrar: Lesões parenquimatosas hipodensas com realce periférico anelar ao contraste, nos casos de abscessos cerebrais. LEGENDA: Abscesso cerebral: imagens de TC (A) sem e (B) com contraste mostram aspecto anelar, com centro hipoatenuante, que apresenta realce bem definido de paredes finas.. Ao redor, observa-se a hipoatenuação do edema na substância branca. Lesões extra-axiais hipodensas bicôncavas com realce dural e que respeitam as fossas cranianas, nos abscessos epidurais intracranianos. Lesões intra-axiais hipodensas em formato crescente com realce marginal que emoldura o córtex subjacente sem respeitar as fossas cranianas, nos empiemas subdurais intracranianos. LEGENDA: Empiema: TC mostrando alargamento do espaço extradural da região frontal mediana. A. Deslocamento interno do seio sagital superior, com o realce meníngeo (seta). Na região occipital paramediana esquerda, há alargamento do espaço subdural (seta aberta), que se associa a edema cerebral adjacente (seta curva). B. TC com empiema subdural frontal paramediano esquerdo (seta branca cheia) com extenso edema perilesional (seta curva). Lesões vertebrais hipodensas com destruição óssea e realce subaracnóideo adjacente nos casos de osteomielite vertebral associada a abscesso epidural e/ou empiema subdural raquidianos. A RM é o exame mais sensível para o diagnóstico de abscessos e empiemas do SNC, principalmente nos estágios iniciais. Tipicamente, o abscesso cerebral é hipointenso em T1, com realce periférico anelar ao gadolínio, sendo hiperintenso com uma cápsula hipointensa cercada por edema hiperintenso em T2. O diagnóstico de tromboflebite séptica é sugerido quando a ausência de sinal típica dos seios venosos cerebrais não está presente nas imagens de RM em T1, sendo confirmada pela visualização de uma obstrução na venografia por RM, na angiografia por TC ou na fase venosa da angiografia cerebral. TRATAMENTO O abscesso cerebral requer tratamento medicamentoso e cirúrgico, mas existem poucas indicações de tratamento antimicrobiano isolado (abscesso únicoaté os corpos dos neurônios (HSV-1 e 2 e VZV) ou, ainda, entrar no SNC escondidos em células do sistema imunológico periférico (EBV e HHV-6). Os HHV causam a lise das células infectadas durante sua replicação e são capazes de permanecer latentes nos gânglios nervosos (HSV-1 e 2 e VZV), nas células epiteliais (EBV), nos leucócitos, nas células endoteliais (CMV) e nos linfócitos (HHV- 6). Assim, os HHV podem causar mielite tanto na infecção primária quanto em uma reativação. Os enterovírus (EV) entram no organismo principalmente pela via oral. A maioria dos EV também apresenta algum neurotropismo, podendo infectar diversas células do SNC durante a viremia (vírus Coxsackie A e B) ou afetar os neurônios motores do corno anterior da medula (poliovírus e EV tipos 70 e 71). Todos os EV causam a lise das células infectadas durante sua replicação, com subsequente neuronofagia, mas não possuem a capacidade de latência apresentada pelos HHV. Assim, podem causar mielite somente na infecção primária. Os arbovírus entram no organismo principalmente por meio da picada de um inseto vetor. Após a infecção das células endoteliais dos capilares, durante a viremia inicial, alguns arbovírus causam subsequente infecção dos neurônios e transmissão célula à célula através de dendritos e axônios. Um subgrupo de arbovírus neurotrópicos também pode afetar o corno anterior da medula (vírus West Nile – WNV, dengue, vírus da encefalite japonesa – JEV). Causam lise celular com subsequente neuronofagia, ocorre vasculite difusa que pode adquirir aspecto hemorrágico. Os arbovírus também não apresentam latência. QUADRO CLÍNICO A apresentação clínica da mielite viral aguda pode ser dividida em síndrome do corno anterior da medula (PFA viral tipo poliomielite) ou síndrome de MTA, que pode ser parcial ou completa. A PFA viral pode ser precedida ou acompanhada por sintomas de meningite e/ou encefalite e, dentro de alguns dias, a paresia ou paralisia flácida de um ou mais membros fica evidente, principalmente nos membros inferiores, sem alterações evidentes de sensibilidade ou sintomas de disfunção esfinctérica. A MTA viral também pode ser precedida ou acompanhada de sintomas de meningite e/ou encefalite, além de sintomas de radiculite, em alguns casos (VZV, CMV, EBV). Poucos dias após o início do quadro, o paciente desenvolve déficit de sensibilidade ascendente, retenção urinária e fraqueza progressiva distal no nível sensitivo, podendo ser flácida ou espástica. DIAGNÓSTICO No Brasil, todo caso de PFA de início súbito em menores de 15 anos de idade, independentemente da hipótese diagnóstica de poliomielite, deve ser notificado. A coleta de fezes para a cultura e o isolamento viral deve ser realizada nos primeiros 14 dias a partir da instalação do déficit motor, mas pode ser feita nos primeiros 40 dias, para vírus vacinal, ou 60 dias, para vírus selvagem. O caso de poliomielite será confirmado se a cultura for positiva no paciente ou nos contactantes próximos. O diagnóstico de MTA pode ser feito com: Presença de disfunção motora, autonômica e/ou de sensibilidade atribuível à medula. Bilateral (não necessita ser simétrico). Nível medular definido; exclusão de fator compressivo (RM ou mielografia). Inflamação medular (líquido cefalorraquidiano (LCR) com pleiocitose ou alto índice de IgG ou realce com gadolínio); e progressão para o nadir entre 4 horas e 21 dias. Apesar de o exame PADRÃO-OURO para o diagnóstico ser a cultura viral do LCR, o isolamento dos vírus no SNC é muito difícil. Assim, a realização precoce dos testes de PCR/RT-PCR e a posterior detecção de anticorpos no LCR, associados aos testes sorológicos, auxiliam no diagnóstico etiológico da mielite viral aguda. Outros exames, como a eletromiografia (EMG) na PFA viral, podem mostrar decremento nos potenciais de ação compostos da unidade motora. TRATAMENTO O tratamento da mielite viral aguda deve ser direcionado para agentes antivirais específicos sempre que possível, sendo os mesmos utilizados para as encefalites virais. É recomendável administrar as medicações antivirais quando o resultado do PCR/RT-PCR no LCR é positivo ou, empiricamente, quando a suspeita diagnóstica é muito grande. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bertolucci, Paulo H., F. et al. Neurologia: diagnóstico e tratamento. Disponível em: Minha Biblioteca, (3rd edição). Editora Manole, 2021. Tortora, Gerard, J. e Bryan Derrickson. Princípios de Anatomia e Fisiologia. Disponível em: Minha Biblioteca, (14th edição). Grupo GEN, 2016. MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 20sintomas, pode haver predominância de NEUTRÓFILOS e, em menos de 24 horas, essa predominância passa a ser LINFOMONOCITÁRIA. As alterações bioquímicas são discretas a leves, sem alteração da glicose; o lactato está discretamente elevado, mas sempre inferior a 40 mg/dL. A análise microbiológica é negativa para flora bacteriana e o EXAME DE PCR tem alta sensibilidade e especificidade na identificação viral, sendo o EXAME PADRÃO- OURO para o diagnóstico etiológico. A evolução é benigna e autolimitada, sem deixar sequelas. TRATAMENTO O tratamento se fundamenta em suporte clínico e medicações sintomáticas, não necessitando internação nos casos com confirmação etiológica que não apresentem sinais de comprometimento encefalítico. MENINGITES BACTERIANAS A meningite bacteriana cursa com um quadro mais grave do que a meningite viral. AGENTES ETIOLÓGICOS Em adultos, as meningites bacterianas agudas comunitárias são frequentemente causadas pela Neisseria meningitidis seguida pelo Streptococcus pneumoniae, outras bactérias e, em quarto, o Haemophilus influenzae. No caso das meningites nosocomiais, ocorre aumento na incidência de infecções por enterococos e estafilos, diretamente relacionadas a procedimentos neurocirúrgicos e traumatismos cranioencefálicos. EPIDEMIOLOGIA Dados epidemiológicos do Ministério da Saúde confirmaram 15.364 casos de meningite em todo o Brasil no ano de 2018. Destes, 1.117 casos estavam associados à doença meningocócica e 1.016 foram causados pelo pneumococo, independentemente da faixa etária. TRANSMISSÃO Geralmente, as bactérias que causam meningite bacteriana se espalham de uma pessoa para outra por meio das vias respiratórias, por gotículas e secreções do nariz e da garganta. Já outras bactérias podem se espalhar por meio dos alimentos, como é o caso da Listeria monocytogenes e da Escherichia coli. MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 3 PERÍODO DE INCUBAÇÃO O período de incubação é de 2 a 10 dias, média de 3 a 4 dias. FISIOPATOLOGIA O pneumococo, o meningococo e o Haemophilus influenzae, o hemófilo, são bactérias encapsuladas que fazem parte da flora nasofaríngea de uma grande parte da população. Esses três patógenos conseguem escapar das defesas locais e colonizar as vias aéreas superiores ao produzir proteases que inativam a imunoglobulina A da mucosa por meio da clivagem do anticorpo. Além disso, o meningococo possui pelos ou fímbrias que permitem sua adesão às células epiteliais da mucosa nasofaríngea. Após a colonização das vias aéreas superiores, o meningococo atinge a corrente sanguínea por endocitose, enquanto o hemófilo consegue separar as junções intercelulares das células epiteliais para conseguir chegar ao espaço intravascular. O pneumococo pode causar uma infecção nas vias aéreas, por exemplo, uma pneumonia, antes de atingir a corrente sanguínea. Durante a bacteriemia, as bactérias encapsuladas conseguem escapar dos mecanismos de defesa do hospedeiro porque a sua cápsula polissacarídea inibe a fagocitose e a atividade bactericida do complemento. Esplenectomia é um dos fatores importantes no risco de infecções bacterianas agudas, principalmente meningites. Após uma bacteriemia, os principais patógenos causadores de meningite possuem uma predileção única pelas meninges, mas as razões desse tropismo ainda são desconhecidas. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Os efeitos clínicos precoces do processo inflamatório leptomeníngeo são febre, cefaleia intensa, rigidez de nuca e distúrbio da consciência, às vezes acompanhados de convulsões generalizadas. O encontro de pelo menos dois desses sinais e sintomas associados a uma história clínica ou antecedente epidemiológico sugestivo deve levantar a hipótese de meningite aguda. A TRÍADE cefaleia, rigidez de nuca e distúrbio da consciência pode ajudar no diagnóstico, mas nem sempre terá esses sintomas simultâneos. Os sinais de Kernig e Brudzinski são característicos de meningite, mas estão presentes em menos de 50% dos pacientes adultos. Pode se manifestar apenas com confusão mental em pacientes geriátricos. Algumas peculiaridades podem auxiliar no diagnóstico etiológico. A meningite meningocócica tem evolução muito rápida, ocorrem lesões petequiais ou purpúricas e frequentemente choque circulatório. A meningite pneumocócica pode ser precedida de infecção pulmonar, de ouvidos e de seios da face, presença de válvulas cardíacas, alcoólatras, pacientes esplenectomizados e pacientes idosos. A meningite por H. influenzae é comumente precedida por infecção respiratória alta e otites em pacientes não vacinados. Meningite após um procedimento neurocirúrgico deve levantar a possibilidade de infecção por Enterococcus spp., Klebsiella spp., Acinetobacter spp. e Staphylococcus aureus. As derivações ventrículo-peritoneais são propensas a infecções por estafilococos coagulase-negativos. A imunodepressão predispõe a infecções por enterobactérias e listéria. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de meningite aguda deve ser clínico, sendo confirmado por exames complementares que se baseiam na análise do LCR obtido por punção lombar. Em casos de doença meningocócica, há petéquias e sufusões hemorrágicas difusamente distribuídas no tegumento do paciente. A raspagem destas lesões, com preparo do raspado em lâminas de microscopia com imediata coloração pelo método de Gram, demonstra a presença do meningococo. Este método tem alta sensibilidade e especificidade para o diagnóstico etiológico. A análise mínima inicial do LCR deve incluir a realização da citologia global e diferencial, glicorraquia, dosagem de proteínas e lactato, exame bacterioscópico direto com coloração pelo método de Gram e cultura para bactérias. A análise concomitante do hemograma e da glicemia é imprescindível para uma correta interpretação. Se o exame bacterioscópico do LCR pelo método de Gram for negativo, há necessidade da realização de testes de aglutinação no látex para os patógenos mais frequentes, além da realização da reação em cadeia da polimerase (PCR) para bactérias e vírus. A dosagem de lactato nas amostras de LCR é um exame de baixa complexidade técnica, mas de grande valor no direcionamento diagnóstico, pois valores entre 30 e 40 mg/dL ou superior têm alta sensibilidade e especificidade para meningites bacterianas. Independentemente dos exames prévios, se o paciente foi submetido a uma neurocirurgia recentemente, a dosagem de lactato no LCR superior ou igual a 4 mmol/L (36 mg/dL) fortalece a decisão de iniciar antibioticoterapia empírica por 3 dias enquanto se aguarda a cultura do LCR. A suspensão da antibioticoterapia após cultura negativa é um procedimento seguro. CONDUTA INICIAL A punção lombar diagnóstica deve ser realizada imediatamente ante a suspeita de meningite aguda. Deverá ser precedida de tomografia computadorizada (TC) de crânio antes da punção lombar em pacientes com imunodepressão conhecida, doença prévia do sistema nervoso central (SNC), convulsão recente, papiledema, nível de consciência alterado (escala de coma de Glasgowinicial da meningite bacteriana aguda deve ser baseado na idade e na existência de fatores predisponentes a infecção por patógenos específicos. Para adultos sem fatores de risco, é recomendado o uso de uma cefalosporina de 3ª geração, enquanto, para pacientes idosos, a associação com ampicilina é necessária para a cobertura da listéria. Para pacientes com fratura de base de crânio, o uso de uma cefalosporina de 3ª geração é suficiente. Para pacientes que sofreram traumas penetrantes ou foram submetidos a neurocirurgia recentemente ou são portadores de derivação ventrículo-peritoneal, é necessário cobrir patógenos Gram- positivos e bacilos Gram-negativos com vancomicina associada a uma cefalosporina com cobertura para Pseudomonas aeruginosa ou a um carbapenêmico (preferencialmente meropeném pelo seu menor potencial epileptogênico e maior espectro). Quando os exames realizados permitem o diagnóstico etiológico, o esquema terapêutico deve ser ajustado, segundo orientação do Ministério da Saúde. O tempo de duração da terapia antimicrobiana deve ser baseado na resposta clínica do paciente. Apesar da falta de dados científicos, a administração IV deve ser mantida durante toda a duração do tratamento para garantir que concentrações adequadas dos antimicrobianos sejam atingidas no LCR. PREVENÇÃO A aplicação da vacina conjugada contra o hemófilo tipo B conseguiu reduzir o número de casos de meningite por este patógeno entre 50 e 95%, sendo maior em países industrializados. É recomendada para crianças a partir de 2 meses numa série de três doses com reforço entre 12 e 15 meses. A aplicação da vacina polissacarídea contra o pneumococo 23- valente é indicada apenas para alguns grupos de risco específicos, mas não demonstrou benefício em menores de 2 anos. Por isso, a vacina conjugada contra o pneumococo heptavalente foi desenvolvida, com aplicação na infância. Apesar de existir uma vacina conjugada contra o meningococo tetravalente usada rotineiramente nos Estados Unidos, apenas a vacina conjugada contra o sorotipo C do meningococo foi introduzida no calendário vacinal no Brasil, pela alta prevalência da doença causada por este sorotipo em nosso país. A quimioprofilaxia está indicada para os contatos íntimos de casos de doença meningocócica e menores de 5 anos não imunizados nos casos de meningite por hemófilos. ENCEFALITE VIRAL INTRODUÇÃO Encefalite é a presença de um processo inflamatório no parênquima encefálico, associado à evidência clínica de disfunção encefálica. Embora esse processo decorra de diversos agentes infecciosos, entre bactérias, fungos e protozoários, é mais frequentemente causado por infecção viral. Em virtude da estrutura do sistema nervoso central (SNC), às vezes ocorre meningite associada, sendo denominada meningoencefalite. EPIDEMIOLOGIA A incidência de encefalite viral é variável e dependente de localização geográfica, população estudada, programas de vacinação populacional e controle de vetores, no caso de arboviroses. Em regiões tropicais, estima-se incidência geral de 6,3/100.000, chegando a 0,7 a 13,8/100.000 no Ocidente. Notadamente, é mais frequente em crianças que adultos. AGENTES ETIOLÓGICOS Os principais vírus causadores de encefalites em imunocompetentes pertencem à família Herpesviridae – herpes simples tipo 1 (Herpes simplex virus type 1 – HSV-1), herpes simples tipo 2 (H. simplex type 2 – HSV-2), Human herpes virus 6 e 7, arboviroses –, famílias Togaviridae, Flaviviridae e Bunyaviridae, e enterovírus – família Picornaviridae. O HSV-1 é o mais comumente envolvido. As encefalites em imunodeprimidos frequentemente são causadas pelo vírus varicela zóster (Varicela zoster virus – VZV) e pelo citomegalovírus (CMV). FORMAS DE TRANSMISSÃO A exposição ao vírus pode ocorrer através da respiração (partículas da pessoa infetada), água/alimentos contaminados, picadas de mosquitos e pelo contato direto da pele. PERÍODO DE INCUBAÇÃO O período de incubação da infecção varia de 4 a 6 dias. MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 5 FISIOPATOLOGIA Os mecanismos patogênicos das encefalites dependem da etiologia: infecciosa, pós-infecciosa ou mediada por anticorpos (imune e paraneoplásico). Dessa forma, a patogenia pode ser dividida em dois modos: 1 – direto e 2 – indireto. Dentro do mecanismo direto, existem 3 possíveis vias, a hematogênica, quando há infecção do endotélio dos pequenos vasos, de modo que os leucócitos infectados chegam ao sistema nervoso central através dos plexos coroides (Herpes e Arbovírus); difusão, quando ocorre infecção através da difusão centrípeta a partir de nervos periféricos (Raiva); olfativa, muito relacionada com as infecções por herpes, poliomielite e arbovírus. Quanto ao mecanismo indireto, a patologia ocorre através de mecanismos imunológicos, por um mecanismo predominantemente mediado por células T ativadas que reconhecem antígenos da mielina e causam a lesão. HERPES VÍRUS A infecção aguda do HSV-1 causa gengivoestomatite. Após essa fase inicial, o vírus aloja-se no gânglio trigeminal e demais ramificações de nervos cranianos relacionados com a cavidade oral e nasofaringe, onde assume a forma latente. Na maioria das vezes, recrudescimento da infecção causa lesões cutâneas papulovesiculares e pruriginosas em ramos trigeminais. Contudo, a ocorrência concomitante da infecção cutânea e do SNC é relativamente rara. Após uma reativação, o HSV-1 pode atingir o SNC por duas vias: (a) terminações nervosas do nervo olfatório, responsáveis pela intensa necrose hemorrágica do lobo temporal inferomedial e lobo frontal médio-orbital (lesões típicas); e (b) terminações nervosas trigeminais que inervam as meninges, justificando lesões em topografias não habituais. VARICELA VÍRUS O comprometimento encefálico por este vírus pode ocorrer na infecção inicial ou na sua recrudescência. É comum em crianças não vacinadas. Após o início da doença, em período variável de 1 semana a 10 dias, é comum a criança apresentar síndrome cerebelar aguda, de evolução usualmente autolimitada e benigna. Como afeta estruturas da fossa posterior craniana, pode haver expansão para outras estruturas do tronco cerebral, piorando o prognóstico. Em adultos, o comprometimento encefálico ocorre por recrudescência viral, muitas vezes acompanhando quadro de erupção herpética tegumentar, conhecida como herpes zóster cutâneo. ARBOVIROSES A infecção aguda por arbovírus ocorre após 5 a 15 dias da picada do mosquito transmissor. A invasão do SNC pode acontecer durante a fase inicial de viremia, com infecção das células endoteliais dos capilares e subsequente infecção dos neurônios. A infecção viral espalha-se de um neurônio para outro através dos dendritos e axônios, acometendo predominantemente a substância cinzenta e os gânglios da base. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A encefalite viral deve ser suspeitada na presença de uma doença febril acompanhada de dor de cabeça, alteração do nível de consciência e sinais e sintomas de disfunção cerebral. As anormalidades da função encefálica podem ser divididas em 3 categorias: 1. DISFUNÇÃO COGNITIVA: distúrbios agudos de memória. 2. MUDANÇAS DE COMPORTAMENTO: desorientação, alucinações, psicose, mudanças de personalidade, agitação. 3. ALTERAÇÕES NEUROLÓGICAS FOCAIS: anomia, afasia, hemiparesia, hemianopsia, crises epilépticas. Após a suspeita diagnóstica, a abordagem deve incluir história meticulosa e exames clínico geral e neurológico cuidadosos. Alguns achados clínicos podem sugerir uma etiologia. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de encefalite aguda deve ser clínico, sendo confirmado por exames complementares que se baseiam na análise do LCR obtido por meio de uma punção lombar, associados ao exame de neuroimagem. Os exames gerais, como hemograma, velocidadede hemossedimentação (VHS), proteína C reativa, radiografia de tórax e hemoculturas, devem fazer parte da investigação inicial para diferenciar uma infecção viral de uma infecção de outra natureza. A linfocitose com VHS e proteína C reativa normais é achado frequente nas infecções virais. A Federação Europeia das Sociedades de Neurologia (EFNS) recomenda que a investigação mínima inclua análise química e citológica básica do LCR, pesquisa de vírus específicos no LCR pela técnica de PCR, detecção de anticorpos específicos de vírus no LCR e no sangue e exame de neuroimagem, preferencialmente RM. A solicitação de outros exames, como eletroencefalografia (EEG) e biópsia cerebral, deve ser indicada somente se os exames anteriores não forem conclusivos. Na encefalite por HSV-1, a sensibilidade do PCR é de 96% e a especificidade, de 99%, quando o LCR é estudado entre os dias 2 e 10 do início dos sinais e sintomas. Valores semelhantes são encontrados para outros vírus nessa mesma janela temporal. Na impossibilidade de PCR, os anticorpos específicos, principalmente da classe IgM, devem ser avaliados qualitativa e quantitativamente no LCR e no sangue do paciente. Se a relação entre os títulos séricos e liquóricos for menor ou igual a 20, existe produção intratecal do anticorpo, o que é altamente sugestivo de encefalite viral. A RM de crânio é mais sensível que a tomografia computadorizada (TC) para a avaliação de encefalite viral. Os achados típicos da infecção pelo HSV-1 são edema ou hemorragia no lobo temporal e giro do cíngulo, que podem ser vistos precocemente na RM e tardiamente na TC. No caso da encefalite por VZV, pode ocorrer encefalomielite, ventriculite e arterite de pequenos e grandes vasos, com infartos isquêmicos e hemorrágicos associados. A EEG é um indicador precoce e sensível do envolvimento cerebral e geralmente mostra anormalidades de base antes que as evidências iniciais de alteração parenquimatosa apareçam nos exames de neuroimagem. MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 6 Esse fato pode ajudar a diferenciar uma simples meningite asséptica de uma encefalite. Cerca de 80% dos pacientes com encefalite por HSV-1 apresentam descargas epileptiformes periódicas lateralizadas na área temporal sobre um ritmo de base lentificado. CONDUTA INICIAL A EFNS também recomenda a realização de exame de neuroimagem antes da punção lombar nos pacientes com imunodepressão, doença prévia do SNC, convulsão recente, papiledema, nível de consciência alterado (escala de coma de Glasgow(sorotipo A) e Cryptococcus neoformans var. neoformans (sorotipo D), que provocam manifestações clínicas diversas. As variantes grubii e neoformans estão amplamente difundidas na natureza. Cryptococcus gattii (sorotipos B e C) foi reconhecida como uma espécie distinta por diferenças morfológicas, nichos ambientais e características genômicas específicas. EPIDEMIOLOGIA Estima-se que 220.000 casos de meningite criptocócica ocorram entre pessoas com HIV/Aids em todo o mundo a cada ano, resultando em quase 181.000 mortes. A maioria dos casos de meningite criptocócica ocorre na África Subsaariana, onde é uma das principais causas de morte em pacientes com HIV/Aids, podendo matar mais pessoas a cada ano que tuberculose. O Cryptococcus neoformans sorotipo A é o responsável por 95% das infecções do SNC, restando 4 a 5% para os sorotipos B, C e D. O Cryptococcus gattii parece ser mais agressivo, invadindo precocemente o SNC. Sua distribuição ocorre em regiões de clima tropical e subtropical. FORMAS DE TRANSMISSÃO A infecção pelo Cryptococcus spp ocorre por meio da inalação, podendo-se observar infecção das vias aéreas precedendo as manifestações do SNC. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Clinicamente, o paciente apresenta cefaleia, muitas vezes acompanhada de sinais de hipertensão intracraniana e papiledema. Pode se manifestar como meningite ou lesão focal, determinando crise convulsiva, déficit focal e efeito de massa quando existe criptococoma. Alguns pacientes podem evoluir com lesões císticas e hidrocefalia. DIAGNÓSTICO O diagnóstico é feito pelo líquido cefalorraquidiano (LCR), que revela aumento da pressão de abertura (superior a 25 cmH2O), pleiocitose variável, aumento de proteínas, lactato e discreta alteração da glicorraquia. O processo inflamatório se faz à custa de linfócitos e monócitos, podendo ocorrer plasmócitos. O criptococo é facilmente demonstrável ao exame direto pelo método da tinta da China, pesquisa de antígeno criptocócico solúvel (aglutinação do látex para Cryptococcus spp; CrAg) e/ou pela cultura. Em pacientes imunocompetentes, as modificações citológicas e químicas do LCR são semelhantes às observadas em doentes com meningite tuberculosa, porém, o achado do fungo ou a pesquisa positiva para antígeno capsular em amostras de soro ou LCR faz o diagnóstico diferencial. Nos pacientes com Aids, o quadro clínico e laboratorial pode ser diferente. Pacientes HIV positivos e com CD4+ ≤ 100 células/mcL podem ter poucos sintomas neurológicos e LCR com análise quimiocitológica pouco alterada ou mesmo normal, com encontro frequente de grande quantidade de criptococos por mm3, o que demonstra a necessidade da pesquisa rotineira do fungo em todas as amostras de LCR dos pacientes imunodeficientes. Exames de imagens devem ser realizados previamente à punção, principalmente em pacientes com imunodepressão adquirida ou congênita, com o objetivo de afastar lesões que ocupem espaço, colocando em risco a punção lombar. A tomografia computadorizada (TC) de crânio é o exame de imagem mais rotineiramente utilizado, em geral não mostrando alterações significantes. A ressonância magnética (RM) de crânio pode mostrar lesões sugestivas de neurocriptococose: granulomas criptocócicos ou múltiplas lesões em núcleos da base bilateral, sem captação de contraste. Tais lesões são resultantes da invasão dos espaços de Virchow-Robin pelos fungos. LEGENDA: RM de crânio mostrando forma multicística nos núcleos da base. Nas infecções crônicas do SNC, sempre se deve pensar em criptococose. O diagnóstico micológico é baseado fundamentalmente na morfologia característica desse fungo. Em líquidos orgânicos e em tecidos, apresenta-se envolto por uma ampla cápsula gelatinosa e refringente, a qual permite distingui- lo facilmente de outras leveduras. Reproduz-se por brotamento, o que, juntamente com a cápsula, constitui o elemento básico do diagnóstico. A cultura em meio de Sabouraud revela seu desenvolvimento fácil à temperatura ambiente ou a 37 °C. TRATAMENTO O tratamento deve ser iniciado tão logo seja confirmada a doença. O tratamento da neurocriptococose se faz em três etapas: indução, consolidação e manutenção. INDUÇÃO A primeira linha de tratamento é com ANFOTERICINA B, convencional ou formulação lipossomal, por 2 semanas, tanto em pacientes com ou sem HIV positivo, por via intravenosa (IV). O CDC recomenda associação com 5-FLUCITOSINA na dose de 37,5 a 50 mg/kg a cada 6 horas, com dose total diária de 100 a 200 mg/dia (deve ser calculada dose para insuficiência renal). Após a fase de indução, exame de LCR deve ser realizado para avaliar pressão do sistema liquórico (realizada diariamente por 10 dias consecutivos, desde o início do tratamento, se houver hipertensão liquórica, até sua normalização) e para resultado da cultura, que deve ser negativa neste momento. Em caso de crescimento do fungo à cultura, a fase de indução deve ser estendida. CONSOLIDAÇÃO É realizada com FLUCONAZOL 800 mg/dia por 8 semanas. MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 8 MANUTENÇÃO É realizada com FLUCONAZOL 200 mg/dia durante 1 ano. Pacientes com HIV positivo, em plena adesão à terapia antirretroviral (TARV), com CD4+ ≥ 200 células/mcL e assintomáticos podem ter a terapia de manutenção suspensa. Na impossibilidade da utilização de anfotericina B, o fluconazol pode ser utilizado, com ou sem 5-fluocitosina, na dosagem de 800 mg/dia até completar a fase de consolidação, totalizando 10 semanas. A 5-fluocitosina não deve ser utilizada como monoterapia, pois induz resistência rapidamente. Itraconazol é opção viável para tratamento em substituição aos antifúngicos citados, mas constitui apenas opção na falta de tais medicamentos. Para o tratamento não medicamentoso, é fundamental assegurar que a pressão intracraniana se normalize até o final do período de indução. TRATAMENTO COM MANITOL E ACETAZOLAMIDA É CONTRAINDICADO, dada a sua ineficácia. HYSTOPLASMA CAPSULATUM Este fungo é encontrado no solo principalmente onde há pássaros e morcegos, pois há proliferação do fungo nas excretas destes animais. A exposição ocorre em trabalhadores agrícolas, pessoas com contato frequente com galinheiros e granjas, exploradores de cavernas, podadores de árvores, demolidores de prédios antigos e contato ocasional em locais isolados e ocupados por pássaros. EPIDEMIOLOGIA A alta incidência de sorologia positiva nos habitantes de áreas endêmicas sugere que a infecção primária pulmonar seja assintomática. Pode ocorrer em imunocomprometidos e imunocompetentes. Frequentemente, a infecção restringe-se ao pulmão, sendo que a disseminação ocorre em até 80% dos imunocomprometidos e, destes, cerca de 20% terão envolvimento do SNC. Cerca de 50% dos pacientes com doença disseminada fazem uso de droga imunossupressora e têm linfoma, leucemia, distúrbios esplênicos ou Aids. A recidiva no SNC é muito frequente, devendo ser avaliado o tratamento contínuo com antifúngico nestes casos. Em pacientes com meningite e imunossupressão, a mortalidade ocorre entre 20 e 40% dos casos. FORMAS DE TRANSMISSÃO A infecção inicial ocorre pela via respiratória, por meio de inalação de esporos. A invasão do SNC ocorre por via hematogênica na disseminação da doença. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A apresentação clínica de comprometimento do SNC acontece de formas variadas. Cefaleia, febre e rigidez de nuca acontecem em aproximadamente 50% dos pacientes, manifestando-se como meningite subaguda ou crônica. Cerebrite focal ou formação de granulomas são formas frequentes de apresentação. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO O estudo do LCR em pacientes com histoplasmose evidencia pleiocitose moderada (20 a 500 células/mm3), com predomínio de células linfocitárias e monocitoides, com glicorraquia de normala baixa. A cultura pode ser positiva, sendo que o crescimento do fungo pode levar semanas. A pesquisa de antígenos fúngicos tem relevância discutível, pois é uma doença endêmica e frequentemente assintomática, contudo, as reações positivas em amostra de LCR de pacientes com meningite crônica têm importância na definição da invasão do SNC. A pesquisa do fungo por biologia molecular (PCR) ainda não tem evidência adequada para definir o envolvimento neurológico, por ter baixa sensibilidade. A hemocultura pode ser útil, mas reações sorológicas na pesquisa de antígenos fúngicos são importantes tanto para monitorar a eficácia do tratamento quanto para o acompanhamento ambulatorial do paciente. Os principais testes são: imunodifusão, reação de fixação de complemento e ELISA. Em áreas endêmicas, são esperados títulos inferiores a 1:8. Títulos superiores a 1:32 são compatíveis com infecção aguda. A TC com contraste e a RM do crânio podem mostrar realce meníngeo ou lesões focais com efeito de massa e realce periférico – micetomas. Aproximadamente 50% dos casos são curados com o tratamento. ANFOTERICINA B na dose total de 30 a 35 mg/kg, realizada por infusão IV de 0,7 a 1 mg/kg/dia, é necessária para o alcance da remissão. Em virtude da alta dose necessária, a ANFOTERICINA LIPOSSOMAL na dose de 3 a 5 mg/kg/dia, por 3 a 4 meses, é recomendada para diminuição dos efeitos adversos. O tratamento de manutenção é realizado com ITRACONAZOL na dose de 400 mg/dia durante 1 ano, quando os títulos sorológicos devem ser acompanhados para observar sua redução. No caso de elevação dos títulos ou piora clínica, deve-se suspeitar de recidiva da infecção. Após o tratamento, os pacientes devem ser seguidos AMBULATORIALMENTE por 5 anos, pois a recorrência é alta. Quando houver granulomas intraparenquimatosos, a terapêutica fungicida deve sempre preceder a cirúrgica, sendo esta reservada apenas aos casos de falência medicamentosa ou grandes massas granulomatosas. Nos casos de recidiva e em pacientes com Aids, a terapia deve ser prolongada com ITRACONAZOL. PARACOCCIDIOIDES BRASILIENSIS A blastomicose sul-americana, causada pelo Paracoccidioides brasiliensis (paracoccidioidomicosec – PCM) é uma doença granulomatosa crônica, causada por um fungo dimórfico, endêmica nas regiões subtropicais, como Américas Central e do Sul. Os trabalhadores e moradores rurais são a população de risco, mas viajantes para essas áreas também podem adquirir a infecção, que pode permanecer latente por muitos anos. É muito mais comum em homens, sendo a relação homem-mulher de 15:1. FORMAS DE TRANSMISSÃO A contaminação ocorre por meio da inalação, não havendo transmissão inter-humana. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Após a infecção inicial, podem surgir sintomas respiratórios leves ou mínimas lesões mucosas, sendo, na maioria das vezes, assintomáticas. Após um período de latência indeterminado, com MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 9 ou sem imunossupressão, o processo sofre reativação, levando às manifestações da doença. Pele, linfonodos, pulmões, suprarrenal e SNC são os mais acometidos. A invasão do SNC é mais comum do que se imagina e deve sempre ser considerada no diagnóstico diferencial das infecções granulomatosas do SNC. A forma granulomatosa predomina e as manifestações são crises convulsivas, hemiparesia, sinais cerebelares, cefaleia, entre outros. Meningite e sinais meníngeos podem acompanhar o quadro. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO O diagnóstico definitivo é difícil. O LCR pode apresentar elevação da pressão de abertura nos casos pseudotumorais, com aumento de proteínas à custa de gamaglobulina, glicose normal e celularidade normal ou com discreta pleiocitose linfomonocitária. O fungo é difícil de ser isolado. A reação imunológica ELISA para o anticorpo anti-gp-43, principal antígeno do P. braziliensis, apresenta 89% de sensibilidade e 100% de especificidade no LCR. A detecção do antígeno gp-43 também pode ser realizada. Os métodos de imagem (TC e RM) mostram lesões granulomatosas com área hipodensa, circundada por realce anelar e área de edema, sendo múltiplas (65%) ou isoladas (35%). Pode ser necessária a biópsia da lesão para o diagnóstico diferencial para lesões granulomatosas ou tumorais. A combinação SULFAMETOXAZOL-TRIMETOPRIM (SMT), na dose de 800 mg/160 mg, respectivamente, 3 vezes/dia é um eficaz tratamento para PCM cerebral. Sua duração depende da resposta clínica e do controle tomográfico seriado com TC. Esse tratamento é de baixa toxicidade e baixo custo. Opção viável de tratamento é a utilização de CLOTRIMOXAZOL (CMX), disponível por via oral (VO), intramuscular (IM) e IV, com dose de 960 a 1.440 mg a cada 12 horas. A dosagem deve ser calculada em casos de insuficiência renal. A eficácia e a efetividade do tratamento com CMX é de 98% e 94% respectivamente, abaixando para 90% e 78% no tratamento por VO de manutenção. Isso devido a intolerância gástrica que os pacientes apresentam. A ANFOTERICINA B só é usada em casos de resistência ou intolerância às drogas anteriores. Outra opção de tratamento é a associação de SMT, na dosagem de 410 mg/90 mg, com COTRIMAZINA 500 mg, tomados a cada 12 horas. O CMX É CONTRAINDICADO NA GESTAÇÃO. O tratamento cirúrgico deve ser considerado em casos de hidrocefalia, hipertensão intracraniana e granulomas que exercem compressão de estruturas e não respondem ao tratamento clínico. CANDIDA SP. A Candida faz parte da flora microbiana normal. A disseminação acontece nos casos de imunossupressão, antibioticoterapia prolongada, uso de corticosteroides, tratamento quimioterápico, prematuridade, cirurgias abdominais, queimaduras e nutrição parenteral. A neutropenia é um fator de risco para candidíase invasiva. Nos casos de disseminação, pode haver envolvimento do SNC em 18 a 90% dos casos. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A disseminação é hematogênica, levando a meningite, microabscessos cerebrais, vasculite e trombose, com predomínio no território da artéria cerebral média. Pode haver formação de aneurismas micóticos e endoftalmite. A invasão do SNC também pode ser direta, por meio de manipulação cirúrgica, derivações ventriculares externas e traumatismo cranioencefálico. Nesses casos, é mais frequente a formação de abscessos cerebrais únicos. A manifestação clínica baseia-se na forma de apresentação, preponderando cefaleia, confusão mental, sonolência e coma. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO Algumas vezes, o diagnóstico é feito na autópsia, porém, quando há suspeita clínica, o exame de LCR revela processo inflamatório, além da presença de leveduras. A cultura em meio de Sabouraud (Agar glicose 2%), que facilmente recupera o agente, serve para identificar a espécie e avaliar a sensibilidade aos fungicidas. O tratamento de escolha é com ANFOTERICINA B IV, na dose de 0,7 a 1 mg/kg/dia, por 4 semanas, sugerindo-se manter por 2 semanas após culturas negativas. Por causa da alta toxicidade da anfotericina, especialmente nestes casos de disseminação sistêmica da doença, habitualmente em pacientes gravemente enfermos e em unidades de terapia intensiva, FLUCONAZOL é opção viável, pois apresenta boa penetração pela barreira hematoencefálica e hematoliquórica, tendo menores índices de toxicidade. Observar que o fluconazol é pouco eficaz em candidemia não albicans. Em casos de C. glabrata ou C. tropicalis, é adequado usar VORICONAZOL 200 mg por VO ou IV a cada 12 horas, com 400 mg de dose de ataque. Em crianças com função renal normal, dose de ataque 200 mg a cada 12 horas e 100 mg a cada 12 horas de manutenção. COCCIDIOIDES IMMITIS Trata-se de um fungo dimórfico altamente infeccioso que habita solos secos e ácidos. É muito prevalente nas Américas do Sul e Central, no México e no Sudoeste dos Estados Unidos. FORMAS DE TRANSMISSÃOA infecção inicia-se pela inalação do artroconídio, que pode iniciar a infecção pulmonar primária, a qual dissemina para fora da árvore respiratória em menos de 0,2% dos casos. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Entretanto, quando isso ocorre, 1/3 evolui para meningite, frequentemente associada à meningite na base do crânio, hidrocefalia obstrutiva e infarto cerebral. Entre os fungos que infectam o SNC, é o único que se manifesta na forma de meningite crônica com presença de eosinófilos (70% dos casos), podendo ser maior que 10% da celularidade. Apesar de a imunidade celular ser importante para o controle da doença, apenas 2% dos casos apresentam doença de base conhecida. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO O diagnóstico é realizado por meio de reação de fixação de complemento, sendo muito raros testes falso-positivos. Em pacientes com Aids, os títulos podem ser tão elevados quanto 1:1.024 nas amostras de LCR. O tratamento de escolha é com MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 10 ANFOTERICINA B, até que a reação de fixação de complemento no LCR se torne negativa. ASPERGILOSE Aspergillus fumigatus, A. terreus, A. flavus, A. niger e A. nidulans são fungos capazes de causar doenças no ser humano. FORMAS DE TRANSMISSÃO E MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A inalação de esporos do A. fumigatus causa asma alérgica, aspergiloma, aspergilose broncopulmonar alérgica e alveolite extrínseca. Esse fungo é também um patógeno oportunista capaz de causar aspergilose invasiva em indivíduos imunossuprimidos, dos quais 10 a 20% terão comprometimento neurológico, com morte em 80%. O acometimento do SNC pode ocorrer por via hematogênica ou a partir de infecção dos seios da face e otite. No SNC, pode ocorrer meningite, abscessos únicos ou múltiplos, aneurismas micóticos, mielite e invasão das artérias carótidas ou vertebrais. Clinicamente, os pacientes apresentam febre persistente, alteração do estado mental, déficits neurológicos e, menos frequentemente, sinais meníngeos. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO É difícil diagnosticá-la, apresentando taxas de mortalidade entre 10 e 100%. Pacientes mais suscetíveis à doença invasiva são aqueles com leucopenia, linfoma, leucemia e receptores de transplante de órgãos. As culturas sanguíneas raramente são positivas. Anticorpos específicos para A. fumigatus têm sido detectados na corrente sanguínea de pacientes com infecção por Aspergillus não invasiva, por meio de métodos de imunofluorescência, hemaglutinação passiva, RIA e por ELISA. A dosagem de galactomanana em amostras de soro ou LCR, por estarem com grande quantidade na parede celular do fungo (não exclusivo), em associação às características clínicas, pode ajudar no diagnóstico, pois tem alta sensibilidade em pacientes neutropênicos, com leucemias ou receptores de transplante de órgãos sólidos. A pesquisa do antígeno 1,3-B-Glucan também tem sido utilizada no diagnóstico, mas seus resultados ainda necessitam de validação. Na investigação de rotina, a observação do fungo em tecidos infectados obtidos por biópsia ou cultura de líquidos orgânicos é fundamental para confirmação diagnóstica. Ensaios laboratoriais utilizando biologia molecular (PCR) ainda estão em estudo. O quadro deve ser tratado agressivamente, assim como a doença de base e o estado de neutropenia. ANFOTERICINA B DEOXICOLATO na dose 1 a 3 mg/kg/dia IV deve ser iniciado precocemente, com controle dos efeitos tóxicos deste agente. O VORICONAZOL pode levar a melhora ou estabilização clínica em comparação com a anfotericina B convencional. A dose de ataque preconizada é de 6 mg/kg/dia IV, por 12 horas no 1º dia, seguido de 4 mg/kg/dia IV, por 12 horas por tempo prolongado. Manutenção oral é feita com 400 mg/dia. Os abscessos cerebrais ou epidurais precisam ser drenados cirurgicamente. ZIGOMICOSE A zigomicose, ou mucormicose, é causada pelos fungos Mucor spp., Rhizopus spp., Cunninghamella bertholletiae e Absidia spp. Trata-se de infecção esporádica de distribuição mundial, que acomete principalmente pacientes com diabetes e acidose. Outros pacientes de risco são usuários de corticosteroide, transplantados renais, pacientes com neoplasias e usuários de quelantes de ferro para hemocromatose. FORMAS DE TRANSMISSÃO E MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A mucormicose leva a manifestações respiratórias e cutâneas. A invasão rino-órbito-cerebral pode ocorrer após inoculação do agente em cavidades nasais e seios paranasais. Estabelece-se processo inflamatório progressivo, invadindo tecidos adjacentes, órbita e cavidade craniana, invadindo vasos sanguíneos, levando a trombose de seio cavernoso, arterite carotídea com obstrução e consequente isquemia cerebral. O processo inflamatório é necrotizante, envolvendo tecidos adjacentes, provocando hemorragias. O sistema nervoso também pode ser acessado por via hematogênica, na forma disseminada da doença, que tem alta mortalidade se não tratada a tempo. Clinicamente, o paciente apresenta rinorreia escura, cegueira, gangrena ocular, etc. TRATAMENTO O tratamento inclui a CORREÇÃO DO FATOR PREDISPONENTE, como a glicemia, e o uso de ANFOTERICINA B na dose de 1 a 1,5 mg/kg/dia, por 8 a 10 semanas, sendo que, após o controle inicial, é possível reduzir a dose para 0,8 mg/kg/dia. O desbridamento cirúrgico da área comprometida pode ser necessário. PREVENÇÃO Para preveni-las, deve-se tomar algumas medidas simples como não compartilhar toalhas de banho ou materiais de manicure, não utilizar roupas molhadas, assim como evitar o uso de roupas íntimas que retenham umidade, enxugar bem todas as partes do corpo após o banho e evitar andar descalço. NEUROSSÍFILIS INTRODUÇÃO Neurossífilis é a designação do envolvimento do sistema nervoso central (SNC), decorrente de infecção sistêmica não tratada pelo Treponema pallidum. EPIDEMIOLOGIA Em 2010, tornou-se obrigatória no Brasil a notificação de sífilis adquirida e congênita e, de acordo com boletim epidemiológico do Ministério da Saúde em 2017, foram notificados 342.531 casos de sífilis em 6 anos de observação (2010 a 2016), dos quais 59,2% ocorreram na região sudeste. Apenas em 2016, foram notificados 87.593 casos de sífilis adquirida, 37.436 casos de sífilis em gestantes e 20.474 casos de sífilis congênita. O aumento do número de casos foi dramático entre 2015 e 2016, quase triplicando o número de notificações. Tal fenômeno tem múltiplas causas, entre elas: diminuição da proteção nas relações sexuais, desabastecimento mundial de penicilina e rejeição dos profissionais de saúde em administrar penicilina benzatina nas unidades básicas de saúde. Dentre as capitais, as maiores taxas foram em Florianópolis/SC 244,5/100.000 e Vitória/ES com 190/100.000. FORMAS DE TRANSMISSÃO MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 11 Grande parte dos indivíduos portadores de sífilis adquiriram a doença por meio da inoculação direta do T. pallidum em superfície cutânea ou mucosa, não se podendo ignorar as doenças adquiridas por via endovenosa (EV) e por transmissão vertical. FISIOPATOLOGIA Depois da inoculação epitelial, o organismo se multiplica, com disseminação hematogênica e para os tecidos linfáticos locais, desencadeando uma resposta inflamatória no local da lesão primária. A disseminação da espiroqueta para o SNC ocorre durante estes primeiros eventos, mas a espiroquetemia continua durante todo o curso da sífilis inicial não tratada, com aumento da prevalência de alterações liquóricas observadas. Durante os estágios iniciais da doença, as mudanças patológicas estão limitadas a inflamação meníngea e perivascular, envolvendo vasos de todos os calibres. O dano vascular contribui para a origem de todos os estágios da neurossífilis, mas esse dano também pode ser causado por imunocomplexos e por lesão neuronal direta pelo T. pallidum. A vasculite sifilíticaprogressiva resulta em sinais e sintomas clínicos decorrentes de inflamação local, vasoespasmo, hipóxia tecidual por dano vascular irreversível e fibrose e cicatrização após dano hipóxico. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O envolvimento do SNC em pacientes com sífilis pode ser dividido em 6 categorias: ASSINTOMÁTICO: ocorre durante toda a história natural da sífilis não tratada. Já na fase de cancro, há invasão do SNC pelo T. pallidum. Cerca de 30% destes pacientes apresentam discreta pleiocitose, com poucas alterações bioquímicas. Há um clareamento natural deste líquor na maioria dos pacientes. No entanto, um terço estão em risco para o desenvolvimento de doença clinicamente aparente. MENINGITE SIFILÍTICA: ocorre em cerca de 0,3 a 2,4% dos casos de envolvimento do SNC, com pico de incidência entre 1 e 2 anos após a infecção primária. Os sintomas mais comuns são cefaleia intensa, náuseas e vômitos, que ocorrem em 91% dos casos e podem ser sinais de hidrocefalia aguda. Se o processo inflamatório predominar na região do vértex, surgem crises epilépticas, déficits neurológicos focais transitórios (hemiplegia ou afasia) e delirium. Se a inflamação predominar na região basilar, surgem alterações nos nervos cranianos, sendo mais comum nos nervos faciais e vestibulococleares, mas os nervos ópticos e oculomotores também podem ser afetados. SÍFILIS MENINGOVASCULAR: ocorre em cerca de 10 a 12% dos casos, com pico de incidência entre 5 e 7 anos após a infecção. A maioria dos pacientes apresenta sinais e sintomas prodrômicos episódicos por semanas ou meses, como cefaleia, vertigem, apatia, desatenção, irritabilidade, amnésia, insônia ou crises epilépticas. A vasculite sifilítica causa insuficiência arterial progressiva, podendo ocorrer ataques isquêmicos transitórios antes dos déficits neurológicos focais ficarem permanentes. NEUROSSÍFILIS PARENQUIMATOSA ENCEFÁLICA (PARALISIA GERAL OU DEMÊNCIA PARALÍTICA): ocorre em cerca de 5% dos casos, com pico de incidência entre 10 e 20 anos da infecção. Os déficits neurológicos são resultantes de lesão neuronal direta irreversível. O quadro clínico inicial é sutil e lentamente progressivo, começando com dificuldades de concentração, irritabilidade e mínimas alterações nas funções integrativas superiores. Posteriormente, o paciente apresenta transtornos psiquiátricos (psicose, mania), demência e perda do controle motor fino (tremores de intenção e disartria). Após 3 a 4 anos, no estágio final da doença, o paciente pode sofrer crises epilépticas e perder ainda mais o controle motor e esfinctérico, ficando paralisado e incontinente pouco antes de sua morte. NEUROSSÍFILIS PARENQUIMATOSA MEDULAR (TABES DORSALIS): ocorre em até 10% dos casos, com pico de incidência entre 15 e 30 anos da infecção. Os déficits neurológicos são resultantes da desmielinização da parte dorsal da medula espinal. O paciente começa sentindo dores em choque na distribuição de uma ou mais raízes nervosas, podendo ocorrer períodos de remissão na qual essas dores não acontecem, sendo esta uma característica bem sugestiva de tabes dorsalis. Além disso, os pacientes com tabes apresentam ataques episódicos de dor abdominal, parestesias, atrofia óptica e/ou acometimento dos nervos oculomotores associados. Tanto as pupilas de Argyll- Robertson (que reagem apenas à acomodação) quanto o sinal de Lhermitte (sensação de eletricidade descendo o dorso após a flexão da cabeça) são comuns em pacientes com tabes. Com a progressão da doença, as sensibilidades profundas e o controle esfinctérico são afetados, podendo originar o sinal de Romberg (queda ao fechar os olhos), a marcha talonante (calcanhares recebem todo o peso do corpo com a base alargada) e as articulações de Charcot (destruição articular por traumas repetidos). NEUROSSÍFILIS GOMOSA: ocorria em até 15% dos casos na era pré-antibiótica; hoje, é relativamente rara, incidindo entre 1 e 46 anos após infecção. Os sinais e sintomas clínicos são decorrentes do efeito de massa das lesões gomosas, que são lesões granulomatosas compostas de infiltrado inflamatório crônico pial e treponemas, podendo afetar qualquer lugar do SNC. DIAGNÓSTICO Pacientes com suspeita de neurossífilis devem ser submetidos à investigação sorológica para sífilis, com realização de exames treponêmicos e não treponêmicos: VDRL, FTA-Abs e ELISA. A negatividade destas reações no soro afasta a possibilidade da doença no SNC. Esta avaliação inicial deve ser seguida para pacientes HIV negativos e positivos. Após esta etapa, caminhos diferenciados devem ser seguidos na investigação diagnóstica. Pacientes com reações sorológicas positivas podem ser classificados em 3 categorias: com sinais e sintomas sugestivos de neurossífilis, assintomáticos e pacientes com alteração visual ou auditiva. O primeiro grupo deve ser submetido à punção lombar para análise do líquido cefalorraquidiano (LCR), onde deve ser realizada a reação de VDRL. Se reação positiva, deve ser encaminhado para tratamento específico. Em caso de reação negativa, devem ser observadas contagem celular e concentração de proteínas. Se a contagem de células for superior a 5/mm3, tratamento específico; se a concentração de proteínas for superior a 45 mg/dL e a reação de FTA-Abs for reagente, tratamento específico. MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 12 Pacientes HIV positivos com sinais e sintomas sugestivos de neurossífilis seguem a mesma rotina já descrita, exceto quando a reação de VDRL for negativa. Nestes casos, é importante avaliar a contagem global de células no LCR. Se estiver acima de 20 células/mm3, deve-se seguir tratamento específico. De 6 a 20 células/mm3, devem ser observados os seguintes parâmetros: CD4 5 a 10/mL. Segundo a diretriz europeia para o manuseio da sífilis de 2008, o TPHA Index Vienna 2000 > 70 e o título de TPHA no LCR > 320 são os indicadores mais confiáveis de neurossífilis. INVESTIGAÇÃO COMPLEMENTAR O LCR deve ser analisado em todos os pacientes com sorologia positiva para sífilis e suspeita de neurossífilis, sífilis ocular ou otite sifilítica e coinfecção com HIV, especialmente com contagem de CD4e lesões medulares na RM são raras. A angiorressonância ou a angiografia podem demonstrar oclusão vascular nos casos de vasculite sifilítica. TRATAMENTO O tratamento de escolha para a neurossífilis é a PENICILINA G CRISTALINA, de 18 a 24 milhões U/dia pelo CDC7 ou 0,15 milhões U/kg/dia pelo consenso europeu, via EV, em infusão contínua ou 3 a 4 milhões U a cada 4 horas, por 10 a 14 dias. A CEFTRIAXONA 2 g EV ou IM por 10 a 14 dias pode ser usada como esquema alternativo. No caso de alergia à penicilina, a dessensibilização do paciente deve ser oferecida primeiro, mas na impossibilidade de utilização da penicilina, a DOXICICLINA deve ser oferecida na dose de 200 mg a cada 12 horas por 28 dias, com maior risco de falha terapêutica. Um novo exame do LCR deve ser realizado após 6 a 12 meses do tratamento. PPREVENÇÃO Adotar o uso de preservativos durante as relações sexuais, evitando o contato direto com a lesão; além do compartilhamento de instrumentos perfurocortantes. NEUROCISTICERCOSE INTRODUÇÃO A neurocisticercose é uma infecção do sistema nervoso central (SNC) causada pelo Cysticercus cellulosae, forma larvária da Taenia solium, verme que pertence ao filo Platelmintos, classe Cestoidea, ordem Cyclophyllidea, família Taeniidae, gênero Taenia e espécie solium. O homem é seu único hospedeiro definitivo e reservatório natural, sendo responsável pela manutenção do ciclo biológico, o que possibilita a erradicação da doença no Brasil. EPIDEMIOLOGIA A incidência da teníase, assim como da neurocisticercose, está diretamente associada às condições socioeconômicas e políticas de saúde pública. No Brasil, não existem dados fidedignos a respeito da incidência da teníase, restando apenas uma noção da prevalência em grandes centros neurológicos que apontam para 0,2 a 7,5% dos pacientes atendidos. Também pouco se sabe a respeito da cisticercose suína, já que existem muitos abatedouros clandestinos no país, sem fiscalização sanitária, dificultando a análise da vigilância sanitária, necessária para o controle da cisticercose humana. FORMAS DE TRANSMISSÃO A teníase é a doença causada pela ingesta do cisticerco (forma larvar) em carne de suínos crua ou malcozida que evolui à fase adulta no intestino delgado causando sintomas gastrintestinais. CICLO Quando eles são ingeridos pelos suínos, seus hospedeiros intermediários, ocorre o desenvolvimento do óvulo ao embrião hexacanto no intestino e, com seus 6 ganchos, perfura a mucosa intestinal, atingindo, via circulação sanguínea, os músculos do porco, onde se desenvolve até sua fase larvária, o Cysticercus cellulosae, que possui o escólex em uma vesícula. O homem, ao ingerir a carne suína infectada, digere a vesícula, liberando o escólex que se fixa na parede do intestino delgado e evolui à sua forma adulta, liberando as proglotes maduras junto com as fezes. A cisticercose é a doença causada pela ingesta de ovos (forma embrionária) da tênia por meio de uma das seguintes formas de infecção: HETEROINFECÇÃO (INFESTAÇÃO EXTERNA): ingestão de alimentos ou água contendo ovos viáveis. HOMOINFECÇÃO (AUTOINFESTAÇÃO): EXTERNA: indivíduos com Taenia solium que se contaminam com as próprias fezes, por meio de hábitos de higiene precários. INTERNA: indivíduos com Taenia solium que apresentam regurgitação enterogástrica ou vômitos (teórico). MONICK LEBRÃO MEDICINA- TURMA XIV (FASAVIC) 13 Os ovos viáveis ingeridos liberam, no sistema gastrintestinal humano, o embrião que atravessa a mucosa gástrica e se distribui pela corrente sanguínea alcançando diversos tecidos, como músculo, coração, olhos e cérebro, onde irá se desenvolver em cisticerco (larva). Ao atingir o cérebro, causam a neurocisticercose, forma mais grave da doença. No parênquima encefálico, a forma larvária pode sobreviver por meses a anos e, após um período variável, entra em degeneração seguindo 4 fases evolutivas: VESICULAR OU CÍSTICA: visualização do escólex à RM e raramente à TC de crânio. Ao exame anatomopatológico, o cisto possui cápsula delicada contendo líquido transparente em seu interior, podendo o escólex ser visualizado como um espessamento desta cápsula. COLOIDAL: cápsula envolvendo vesícula com conteúdo gelatinoso. À RM de crânio, observa-se apenas cisto sem a presença de escólex e, geralmente, sem reação inflamatória. Ao exame anatomopatológico, a cápsula encontra-se mais espessada e o conteúdo mais gelatinoso. A ausência do escólex é notada. NODULAR: cisto coloidal, com ausência de escólex, apresentando grande reação inflamatória ao redor, evidenciada por captação de contraste de forma anelar aos exames de imagem do crânio. Ao exame anatomopatológico, já se observa deposição de cálcio no componente gelatinoso, e o cisto tem o tamanho reduzido com aspecto granular grosseiro. NODULAR CALCIFICADA: nódulo calcificado reduzido mais bem evidenciado pela TC de crânio. Ao exame anatomopatológico, há calcificação completa do cisto, reduzindo seu tamanho a 1/3 ou 1/4 do tamanho original. LEGENDA: Cisticercose: forma calcificada. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS A cisticercose é a mais importante doença parasitária do SNC. 50 a 70% dos pacientes com neurocisticercose apresentam crises convulsivas. É o líder das causas de epilepsia tardia em regiões onde é endêmica. As manifestações clínicas da neurocisticercose são determinadas pelas localizações dos cistos, que podem se alojar no encéfalo, medula, ventrículos, espaço subaracnóideo e meninges. Pode ser sintomática ou assintomática, com presença de forma cística, racemosa, mista ou calcificada, sendo única ou múltipla e de evolução clínica aguda, subaguda ou crônica. As formas sintomáticas são muitas e as mais descritas são: epiléptica, hipertensiva, psiquiátrica, meningoencefálica, cefalálgica, hemiplégica, edematosa, cerebelar, troncular, hidrocefálica, endócrina, medular, extrapiramidal, apoplética, meningítica recidivante e mista. FORMAS CLÍNICAS MAIS FREQUENTES FORMA MENINGÍTICA As alterações clínicas são muitas vezes indistinguíveis das meningites virais ou bacterianas, com a tríade clássica composta por cefaleia, rigidez de nuca e vômitos. Em alguns casos, o LCR pode apresentar citologia composta por neutrófilos, monócitos e linfócitos, com presença não obrigatória de eosinófilos. A concomitância de formas encefálicas e hidrocefálicas é comum. FORMA HIDROCEFÁLICA A presença de cistos livres dentro dos ventrículos determina reação inflamatória do tipo imunoalérgica que determina aderências, paquimeningites, alterações da barreira hematoencefálica tornando o LCR viscoso, o que dificulta sua livre movimentação. Consequentemente, a obstrução dos forames interventriculares determina hidrocefalias em diferentes níveis. A presença de cistos livres nos ventrículos pode causar obstruções mecânicas intermitentes dos forames interventriculares, determinando hidrocefalias agudas, associadas a determinadas posições da cabeça, conhecidas como síndrome de Bruns, classicamente apresentada como quadro súbito e transitório de cefaleia, vômitos e vertigem. LEGENDA: Cisticerco em 4º ventrículo. FORMA EPILÉPTICA Aproximadamente 50 a 80% dos casos de neurocisticercose desenvolvem epilepsia em alguma fase da doença. As crises podem ser generalizadas ou parciais, e a forma de manifestação depende da localização dos cistos. A forma de início focal motor é certamente a mais frequente. FORMA EDEMATOSA A hipertensão intracraniana é a expressão clínica desta forma. Quase sempre há maciça infecção, com múltiplas lesões dispostas difusamente no encéfalo. É comum encontrar lesões em diversas etapas de evolução (imagem), demonstrando a alta endemicidade no local de origem destes pacientes. A reação inflamatória é intensa, com edema encefálico difuso, provocando diminuição