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TUTELA PENAL DA INFÂNCIA E JUVENTUDE E CRIMINALIDADE INFANTO-JUVENIL Prof. Rafael de Oliveira Costa “Se você traçar metas absurdamente altas e falhar, seu fracasso será muito melhor que o sucesso de todos.” – James Cameron 1 Apresentação do Professor • Professor Visitante na Universidade da Califórnia- Berkeley (EUA). • Professor Visitante na Wayne State University (EUA). • Professor na Escola Superior do Ministério Público. • Doutor em Direito pela UFMG. • Mestre em Direito pela UFMG. • Graduado em Direito pela Universidade de Wisconsin (EUA) / UFMG. • Promotor de Justiça no Estado de São Paulo. • Revisor de Periódicos, incluindo o Athens Journal of Law. 2 Apresentação da Disciplina 3 Apresentação da Disciplina 4 1) Introdução - Tutela penal da pessoa vulnerável 2) Direito Comparado 3) Tutela dos bens jurídicos coletivos 4) Direito Penal Coletivo em perspectiva comparada 5) ECA – Visão Geral dos Aspectos Criminais 6) ECA – Crimes em espécie Programa da Disciplina 5 Aspectos importantes: 1) Tirem as dúvidas. Errar nas aulas não é problema; não se pode é errar na prática e prejudicar o interesse das pessoas. 2) Iremos aprofundar! A aula não será básica, mas aprofundada. Busca pela excelência! 3) A legislação penal especial é complexa e sistemática! Há uma conexão entre as várias normas, o que não ocorre normalmente em outros ramos. Apresentação da Disciplina 6 4) O material de aula é fruto da fusão de inúmeros livros, artigos e estudos! 5) Alguns conceitos serão lançados e posteriormente explicados. 7) Dedicação e transpiração: segredo do sucesso! Ninguém que obteve sucesso teve baixo índice de dedicação na área jurídica! Apresentação da Disciplina 7 Tutela penal da pessoa vulnerável 1. Tutela penal da pessoa vulnerável – Abrangência: A) Criança; B) Adolescente; C) Idoso; D) Mulher em situação de violência doméstica; E) Pessoa com deficiência em situação de risco, entre outros. 2. No presente módulo, iremos estudar apenas a tutela penal de crianças e adolescentes, com foco em aspectos coletivos (Direito Penal Coletivo). 8 Direito Comparado 1. EUA - Violent Crime Control and Law Enforcement Act of 1994: dobra a pena mínima e a máxima em crimes que têm como vítimas crianças e adolescentes. 2. Direito Espanhol: O art. 189, item “1”, a, do Código Penal Espanhol, prevê: “1. É punido com pena de prisão de um a três anos: a) Qualquer pessoa que usa menores ou incapazes com a finalidade de espetáculo exibicionista ou pornográfico, tanto públicos, como privado, ou para fazer qualquer tipo de material pornográfico, ou para financiar qualquer uma dessas atividades.” 9 Projetos de Lei 1. Projeto de Lei do Senado nº 497/2018 (arquivado) - Pais ou responsáveis autores de violência contra crianças ou adolescentes poderão ter que frequentar programas de reeducação, recuperação e prevenção, caso o juiz responsável pela investigação assim o determine: "Art. 130, do ECA: Verificada a hipótese de maus-tratos, opressão ou abuso sexual infligidos pelos pais ou responsável, a autoridade judiciária poderá determinar, como medida cautelar, o afastamento do agressor da moradia comum, bem como o seu ingresso em programas de prevenção de violência contra crianças ou adolescentes e em programas de reeducação social.” 10 1. Inovação – Aspecto Penal: Lei n° 13.772/18 (“Registro Não Autorizado da Intimidade Sexual”) 1 - A Lei n° 13.772/18 acrescentou um novo crime ao Código Penal sob a rubrica “Registro não autorizado da intimidade sexual”. Vejamos: Art. 216-B – Produzir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, conteúdo com cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo e privado sem autorização dos participantes. Pena – detenção, de 06 (seis) meses a 01 (um) ano, e multa. Parágrafo único - Incorre na mesma pena quem realiza montagem em fotografia, vídeo, áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo. 11 1. Lei n° 13.772/18 2 - Tipo objetivo: produzir, fotografar, filmar ou registrar (tipo misto alternativo - ainda que o agente tenha praticado mais de uma conduta, responderá por delito único). 2.1 – O caput abrange a prática das condutas típicas envolvendo cenas de nudez, ato sexual ou libidinoso que sejam verdadeiras, ou seja, das quais a vítima tenha efetivamente participado e integrado sua produção. 2.1.1 - O parágrafo único estabelece, de outra forma, que incorre na mesma pena quem realiza montagem em fotografia, vídeo, áudio ou qualquer outro registro com o fim de incluir pessoa em cena de nudez ou ato sexual ou libidinoso de caráter íntimo. 12 1. Lei n° 13.772/18 3 - Elemento subjetivo do tipo: não exige elemento subjetivo específico. Não há previsão da modalidade culposa. 4 - Objeto jurídico: o tipo penal tutela a intimidade sexual da vítima, razão pela qual, inclusive, o legislador o inseriu em novo capítulo no Código Penal denominado “Da exposição da intimidade sexual”. 5 - Sujeitos do delito: o novo tipo penal tem natureza bicomum, ou seja, tanto o sujeito ativo como o passivo podem ser qualquer pessoa. 13 1. Lei n° 13.772/18 6 - Caráter íntimo e privado: o delito exige que a cena tenha sido praticada em caráter íntimo e privado para a sua consumação. Assim, se duas pessoas se beijarem em público e um terceiro realizar a filmagem, não há que se falar em violação ao tipo penal. 7 - Ausência de autorização dos participantes: na hipótese de o agente obter a autorização de todos os participantes, inexiste violação ao tipo penal. 7.1 – Contudo, pode incorrer o sujeito ativo no tipo previsto no artigo 240, do ECA, desde que envolvido pelo menos um adolescente – princípio da especialidade. Vamos abrir um parênteses para explicar esse tipo do ECA! 14 ECA – Crimes em espécie Filme pornográfico com criança ou adolescente - Art. 240. Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, envolvendo criança ou adolescente: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. § 1º Incorre nas mesmas penas quem agencia, facilita, recruta, coage, ou de qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas referidas no caput deste artigo, ou ainda quem com esses contracena. § 2º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o agente comete o crime: I – no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto de exercê-la; II – prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade; ou III – prevalecendo-se de relações de parentesco consanguíneo ou afim até o terceiro grau, ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de quem, a qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, ou com seu consentimento. 15 ECA – Crimes em espécie 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. Trata-se de crime comum. 2. Sujeito passivo: a criança ou o adolescente. 3. Pedofilia: consiste no transtorno da sexualidade manifestada pela atração fantasiosa e pelo desejo de prática sexual que um adulto nutre por uma criança ou por um adolescente. 4. Produzir, reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar, por qualquer meio - delito de livre execução. Não se exige que o agente tenha qualquer contato com a criança ou com o adolescente. 16 ECA – Crimes em espécie 5. Interpretação extensiva da cena de sexo explícito ou pornográfica - A criança ou adolescente não precisa estar nua, mas pode estar, por exemplo, com as vestes íntimas (Informativo n° 577 - DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E PENAL. TIPIFICAÇÃO DAS CONDUTAS DE FOTOGRAFAR CENA PORNOGRÁFICA E ARMAZENAR FOTOGRAFIAS DE CONTEÚDO PORNOGRÁFICO ENVOLVENDO CRIANÇA OU ADOLESCENTE. Fotografar cena e armazenar fotografia de criança ou adolescente em poses nitidamente sensuais, com enfoque em seus órgãos genitais, ainda que cobertos porobsta a entrada). 116 ECA – Crimes em espécie 4. Tipo penal misto alternativo: caso o agente pratique mais de uma conduta descrita no tipo penal (impedir ou embaraçar), responderá por um delito apenas. 5. Classificação: crime comum; material no verbo impedir e formal no verbo embaraçar; doloso; comissivo; instantâneo; admite tentativa. 6. E se o embaraçamento envolver atividade de investigação de organização criminosa (art. 2°, § 1º, da Lei n. 12.850/13 – “Nas mesmas penas incorre quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de infração penal que envolva organização criminosa.”)? A) Incide a Lei n° 12.850/13 (mais razoável – pena mais elevada). B) Incide o ECA (princípio da especialidade). 117 ECA – Crimes em espécie C) Incidem ambos os delitos, em razão dos bens jurídicos tutelados. 118 ECA – Crimes em espécie Sequestro de criança ou adolescente para fins de colocação em lar substituto - Art. 237. Subtrair criança ou adolescente ao poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou ordem judicial, com o fim de colocação em lar substituto: Pena – reclusão de dois a seis anos, e multa. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. Trata-se de crime comum. 2. Sujeito passivo: criança ou o adolescente. 3. Especial fim de agir: colocar a criança ou o adolescente subtraído em lar substituto, ou seja, a finalidade específica de criar, estruturar um novo lar com uma nova família para a criança ou o adolescente. 119 ECA – Crimes em espécie 4. Princípio da especialidade: o tipo penal ora comentado é especial em relação ao delito de subtração de incapazes contido no art. 249, do Código Penal (“Art. 249 – Subtrair menor de dezoito anos ou interdito ao poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou de ordem judicial: Pena – detenção, de dois meses a dois anos, se o fato não constitui elemento de outro crime. § 1º – O fato de ser o agente pai ou tutor do menor ou curador do interdito não o exime de pena, se destituído ou temporariamente privado do pátrio poder, tutela, curatela ou guarda. § 2º – No caso de restituição do menor ou do interdito, se este não sofreu maus- tratos ou privações, o juiz pode deixar de aplicar pena.”) - O elemento especializante consiste no especial fim de agir contido no delito do ECA que é colocar o menor em lar substituto. Caso haja a subtração do menor sem nenhuma outra finalidade, o delito configurado será o do Código Penal. 120 ECA – Crimes em espécie 5. Classificação: crime comum; formal; doloso; comissivo; de dano; instantâneo; admite tentativa. 121 ECA – Crimes em espécie Entrega de filho a terceiro mediante paga - Art. 238. Prometer ou efetivar a entrega de filho ou pupilo a terceiro, mediante paga ou recompensa: Pena – reclusão de um a quatro anos, e multa. Parágrafo único. Incide nas mesmas penas quem oferece ou efetiva a paga ou recompensa. 1. Sujeito ativo: os pais, o tutor ou o guardião. 2. Sujeito passivo: a criança ou o adolescente. 2.1. Inclui o nascituro? Sim (STJ, Resp 48.119). 3.Tráfico de crianças: o agente entrega o menor a outrem em troca de dinheiro. 122 ECA – Crimes em espécie 4. Princípio da especialidade: o tipo penal ora comentado constitui especialidade em relação ao delito de entrega de filho menor à pessoa inidônea, contido no art. 245, do Código Penal (“Art. 245 – Entregar filho menor de 18 (dezoito) anos a pessoa em cuja companhia saiba ou deva saber que o menor fica moral ou materialmente em perigo: Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos. § 1º – A pena é de 1 (um) a 4 (quatro) anos de reclusão, se o agente pratica delito para obter lucro, ou se o menor é enviado para o exterior.”) - No delito do Código Penal o agente entrega o filho a uma pessoa em caráter transitório. No delito do ECA, a venda do menor dá-se em caráter definitivo. 123 ECA – Crimes em espécie 5. Tipo penal misto alternativo: caso o agente pratique mais de uma conduta descrita no tipo penal (prometer ou efetivar), responderá por um delito apenas, não havendo concurso de crimes. 6. Delito plurissubjetivo: a prática desse delito exige a presença de duas pessoas. 7. Classificação: crime próprio; formal na conduta prometer e material na conduta entregar; doloso; comissivo; de dano, instantâneo; admite tentativa. 124 ECA – Crimes em espécie Tráfico de crianças ao exterior- Art. 239. Promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro: Pena – reclusão de quatro a seis anos, e multa. Parágrafo único. Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude: Pena – reclusão, de 6 (seis) a 8 (oito) anos, além da pena correspondente à violência. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. Trata-se de crime comum. 2. Sujeito passivo: a criança ou o adolescente. 3. Há necessidade de saída do menor para o exterior? Não (TRF1, ACR 42.066 AP 2000.01.00.042066-4, j. 5-12-2006). 125 ECA – Crimes em espécie 4. Especial fim de agir: o fim de lucro é a finalidade específica do agente na hipótese de ele promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio da criança ou do adolescente ao exterior com a observância das formalidades legais. 5.Trata-se de tipo penal misto alternativo (promover ou auxiliar). 6. Revogação do § 2º do art. 245 do Código Penal (“§ 2º – Incorre, também, na pena do parágrafo anterior quem, embora excluído o perigo moral ou material, auxilia a efetivação de ato destinado ao envio de menor para o exterior, com o fito de obter lucro”.) – Logo, sempre incide o tipo previsto no ECA. 126 ECA – Crimes em espécie 7. Competência: a competência para o processo e o julgamento desse delito é da Justiça Federal, com fundamento no art. 109, V da CR/88. – STF: O Colegiado realçou que a decisão impugnada destacara que, no caso, estaria envolvido o cumprimento de tratados internacionais dos quais o Brasil seria signatário, a atrair a incidência do inciso V do art. 109 da CF. (...). (HC 121472/PE, rel. Min. Dias Toffoli, 19.8.2014.) 8. Requisição direta pelo membro do Ministério Público ou pelo Delegado de Polícia de dados e informações cadastrais da vítima ou de suspeitos - arts. 13-A e 13-B ao Código de Processo Penal: permitem o membro do Ministério Público ou o Delegado de Polícia possa requisitar, de quaisquer órgãos do poder público ou de empresas da iniciativa privada, os dados e as informações cadastrais da vítima ou de suspeitos 127 ECA – Crimes em espécie Venda de foto pornográfica envolvendo criança ou adolescente - Art. 241. Vender ou expor à venda fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. Trata-se de crime comum. 2. Sujeito passivo: a criança ou o adolescente. 3.Vender ou expor à venda: o legislador equiparou as duas condutas (tipo misto alternativo). 4. “Cena de sexo explícito ou pornográfica” – Norma penal em branco. 128 ECA – Crimes em espécie 5. Competência - em regra, a competência é da Justiça Estadual. Caso a conduta ultrapasse os limites do território nacional, especialmente quando praticada por meio da rede mundial de computadores, a competência será da Justiça Federal (art. 109, V da CR/88 – STF, RE 628624/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, 28 e 29.10.2015). 129 ECA – Crimes em espécie Divulgação de foto pornográfica pela Internet - Art. 241-A. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático, fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. § 1º Nas mesmas penas incorre quem: I – assegura os meios ou serviços para oarmazenamento das fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo; II – assegura, por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo. 130 ECA – Crimes em espécie § 2º As condutas tipificadas nos incisos I e II do § 1º deste artigo são puníveis quando o responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. Trata-se de crime comum. 2.Sujeito passivo: criança ou o adolescente. 3. Tipo objetivo: oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou divulgar por qualquer meio (tipo misto alternativo). 4. Competência: em regra, da Justiça Federal (art. 109, V da CR/88), em virtude da ampla possibilidade de atingir terceiros localizados fora do país. 131 ECA – Crimes em espécie 5.1 - Repercussão geral – STF: 1) Não há transnacionalidade se houver troca de e- mails ou conversas privadas entre pessoas no Brasil (competência de Justiça Estadual); 2) Há transnacionalidade em publicação de sites (Redator Min. Edson Fachin). Tese fixada: “Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente (arts. 241, 241-A e 241-B da Lei nº 8.069/1990) quando praticados por meio da rede mundial de computadores”. 132 ECA – Crimes em espécie 6. Especialidade em relação ao novo artigo 218-C, do CP (a pena prevista pelo ECA é superior à cominada pela nova redação conferida ao Código Penal - Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia: Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, se o fato não constitui crime mais grave.). 133 ECA – Crimes em espécie 6.1) “Revenge porn” ou “pornografia da vingança”: consiste na divulgação de fotos ou vídeos íntimos ou sensuais, com finalidade de “punir” o/a “ex” pelo fim do relacionamento. 6.2) Causa de aumento: “Art. 218-C, § 1º - A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços) se o crime é praticado por agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima ou com o fim de vingança ou humilhação.” 6.3) São duas as finalidades que admitem o aumento da pena: 1) o agente que mantém ou tenha mantido relação íntima de afeto com a vítima; 2) ou com o fim de vingança ou humilhação. 6.4 – Quando incidem as causas de aumento, o delito do Código Penal torna-se mais gravoso que o do ECA. Qual deles 134 ECA – Crimes em espécie 6.4 – Quando incidem as causas de aumento, o delito do Código Penal torna-se mais gravoso que o do ECA. Qual deles deve incidir? 1) O ECA (princípio da especialidade); 2) O art. 218-C, do CP. 7. Inciso I - Armazenamento do material contendo pedofilia: O agente não produz o material, apenas guarda, armazena de forma física ou virtual. 8. Inciso II. Asseguramento do acesso ao material contendo pedofilia por rede de computadores: o legislador incriminou a conduta do provedor de internet que mantém o material de pedofilia em seu site e garante o acesso a ele. 135 ECA – Crimes em espécie 9. Condição objetiva de punibilidade – “responsável legal pela prestação do serviço, oficialmente notificado, deixa de desabilitar o acesso ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo” – prazo: no julgamento do REsp 1.323.754, a Min. Nancy Andrighi do STJ entendeu que após a notificação, o prazo seria de 24 horas. 136 ECA – Crimes em espécie Guarda de material pornográfico envolvendo criança ou adolescente Art. 241-B. Adquirir, possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia, vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. § 1º A pena é diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois terços) se de pequena quantidade o material a que se refere o caput deste artigo. § 2º Não há crime se a posse ou o armazenamento tem a finalidade de comunicar às autoridades competentes a ocorrência das condutas descritas nos arts. 240, 241, 241-A e 241-C desta Lei, quando a comunicação for feita por: I – agente público no exercício de suas funções; 137 ECA – Crimes em espécie II – membro de entidade, legalmente constituída, que inclua, entre suas finalidades institucionais, o recebimento, o processamento e o encaminhamento de notícia dos crimes referidos neste parágrafo; III – representante legal e funcionários responsáveis de provedor de acesso ou serviço prestado por meio de rede de computadores, até o recebimento do material relativo à notícia feita à autoridade policial, ao Ministério Público ou ao Poder Judiciário. § 3º As pessoas referidas no § 2º deste artigo deverão manter sob sigilo o material ilícito referido. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. 2. Sujeito passivo: a criança ou o adolescente. 138 ECA – Crimes em espécie 3. Manutenção de material contendo pedofilia: pune-se a manutenção de material contendo pedofilia. Note-se que o material já foi produzido anteriormente (conduta incriminada no art. 240). 4. Competência: em regra, da Justiça Estadual. Quando praticado por meio da rede mundial de computadores, estando configurada a transnacionalidade, a competência será da Justiça Federal (art. 109, V da CR/88) – STF: Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente (ECA, artigos 241, 241-A e 241-B), quando praticados por meio da rede mundial de computadores. (RE 628624/MG, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, 28 e 29.10.2015). 139 ECA – Crimes em espécie 5. § 1º - Causa de diminuição de pena: o legislador não especificou o que seria pequena quantidade do material, ficando ao arbítrio do Juiz. 6. § 2º - Causa de exclusão da tipicidade: trata-se de causa de exclusão da tipicidade formal, que tem como intuito permitir o combate à figura delitiva. 7. Erro de tipo – Ex. o agente criminoso imagina que a fotografia pertença à pessoa maior de dezoito anos. Nesse caso, presente situação escusável do erro, é possível que se configurar situação de atipicidade. 140 ECA – Crimes em espécie Montagem de foto pornográfica de criança ou adolescente - Art. 241-C. Simular a participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual: Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende, expõe à venda, disponibiliza, distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou armazena o material produzido na forma do caput deste artigo. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. 2. Sujeito passivo: a criança ou o adolescente. 141 ECA – Crimes em espécie 3. Tipo objetivo: pune-se a conduta do agente que representa, como se fosse real, a participação de criança ou de adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica (ex. agente que possui uma fotografia contendo duas crianças em planos distintos da imagem e adultera-a para simular uma cena de sexo). 4. Classificação: crime comum; formal; doloso; comissivo; de perigo abstrato; instantâneo; admite tentativa. 142 ECA – Crimes em espécie Assédio à criança- Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso: Pena– reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: I – facilita ou induz o acesso à criança de material contendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso; II – pratica as condutas descritas no caput deste artigo com o fim de induzir criança a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. 143 ECA – Crimes em espécie 2. Sujeito passivo: apenas a criança (seria possível realizar interpretação extensiva para abranger também o adolescente? Majoritária: não – princípio da legalidade). 3. Tipo objetivo: aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação (tipo misto alternativo). 4. Especial fim de agir: intenção de praticar ato libidinoso com a criança. Ausente esse especial fim de agir, o delito não estará configurado. 144 ECA – Crimes em espécie Conceito de cena de sexo explícito e pornográfica envolvendo criança ou adolescente - Art. 241-E. Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão “cena de sexo explícito ou pornográfica” compreende qualquer situação que envolva criança ou adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais. 1. Norma penal explicativa (interpretação autêntica): tem a função de esclarecer o conceito de “cena de sexo explícito ou pornográfica”. 145 ECA – Crimes em espécie Venda de arma, munição ou explosivo - Art. 242. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente arma, munição ou explosivo: Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. 2. Sujeito passivo: a criança ou o adolescente. 3. Conflito aparente com o art. 16 parágrafo único, V, do Estatuto do Desarmamento: 1) A conduta de vender, fornecer ou entregar arma de fogo, munição ou explosivo a criança ou adolescente configura o delito previsto no Estatuto do Desarmamento. 2) O ECA não fez menção à arma de fogo, razão pela qual continua aplicável quando se tratar de arma branca. 146 ECA – Crimes em espécie 4. Violação do art. 81, I do ECA: o tipo penal ora comentado constitui violação à norma contida no art. 81, I do próprio ECA (“Art. 81. É proibida a venda à criança ou ao adolescente de: I – armas, munições e explosivos”.). Trata-se simultaneamente de delito e de infração de natureza administrativa. 147 ECA – Crimes em espécie Venda de produtos que possam causar dependência física ou psíquica na criança ou adolescente - Art. 243. Vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar, ainda que gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou a adolescente, bebida alcoólica ou, sem justa causa, outros produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica: Pena – detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. Trata-se de crime comum. 2. Sujeito passivo: criança ou o adolescente. 3. Produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica, ainda que por utilização indevida: cigarro, remédios, cola de sapateiro, thinner, entre outros. 148 ECA – Crimes em espécie 7. Laudo de exame de corpo de delito: 1) Indispensável: “No entanto, conforme asseverado na sentença recorrida, a materialidade deste delito não restou comprovada, eis que o laudo de fl. 65, apesar de atestar a natureza da substância apreendida, qual seja, CLOROFÓRMIO, nada diz sobre a nocividade de referida substância à saúde, o que torna imperativa a absolvição do apelante” (TJRN, ACR 91992 RN 2010.009199-2, j. 11-1- 2011). 2) Dispensável: TJMG, Autos n° 1.0372.07.027010- 6/001(1), j. 2-2-2010, Data da Publicação: 16-4-2010). 149 ECA – Crimes em espécie 4. Princípio da especialidade – Drogas: o delito praticado será o do art. 33, da Lei de Drogas, com a incidência da causa de aumento contida no art. 40, VI, da Lei nº 11.343/2006. 5. Subsidiariedade expressa (“se o fato não constitui crime mais grave”): se por utilização indevida a criança morrer, o delito configurado será o homicídio. 6. Conceito de bebida alcoólica: “aquela que contiver 0.5 grau Gay-Lussac ou mais de concentração, incluindo-se aí bebidas destiladas, fermentadas e outras preparações, como a mistura de refrigerantes e destilados, além de preparações farmacêuticas que contenham teor alcoólico igual ou acima de 0.5 grau Gay-Lussac.” 150 ECA – Crimes em espécie Venda de fogos de estampido ou de artifício a criança ou adolescente - Art. 244. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer forma, a criança ou adolescente fogos de estampido ou de artifício, exceto aqueles que, pelo seu reduzido potencial, sejam incapazes de provocar qualquer dano físico em caso de utilização indevida: Pena – detenção de seis meses a dois anos, e multa. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. 2. Sujeito passivo: a criança ou o adolescente. 3. Classificação: crime comum; formal; doloso; comissivo; de perigo abstrato; instantâneo; admite tentativa. 151 ECA – Crimes em espécie 4. Exame de copo de delito: para a prova da materialidade, mister a apreensão e a realização de perícia (TACRIM-SP, APELAÇÃO Nº 953.333/3, Rel. Rene Ricupero, j. 8.8.1995). 152 ECA – Crimes em espécie Corrupção de menores - Art. 244-B. Corromper ou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la: Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. § 1º Incorre nas penas previstas no caput deste artigo quem pratica as condutas ali tipificadas utilizando-se de quaisquer meios eletrônicos, inclusive salas de bate-papo da internet. § 2º As penas previstas no caput deste artigo são aumentadas de um terço no caso de a infração cometida ou induzida estar incluída no rol do art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990. 1. Sujeito ativo: qualquer pessoa. 153 ECA – Crimes em espécie 2. Sujeito passivo: o menor de 18 anos. 3. Corromperou facilitar a corrupção de menor de 18 (dezoito) anos: o tipo protege o bem jurídico moralidade social do menor de 18 anos. 4. A prática de crime em concurso com dois adolescentes distintos implica em concurso formal de delitos de corrupção de menores? Sim, devendo ser o agente condenado por dois delitos previstos no artigo 244-B, do ECA, na forma do artigo 70, do CP (STJ. 6ª Turma. REsp 1.680.114-GO, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 10/10/2017). 5. Crime formal: Súmula nº 500, do STJ - “A configuração do crime do art. 244-B do ECA independe da prova da efetiva corrupção do menor, por se tratar de delito formal.” 154 ECA – Crimes em espécie 6. Concurso de crimes: caso o agente pratique o presente delito e também pratique a infração penal juntamente com o menor, responderá pelos dois delitos em concurso formal de crimes (majoritária) - (...) verificada a ocorrência de concurso formal entre o crime de roubo e de corrupção de menores, as penas referentes aos dois delitos serão aplicadas cumulativamente somente quando demonstrada a existência de desígnios autônomos por parte do agente. Caso contrário, é de ser aplicada a mais grave das penas cabíveis aumentada de 1/6 (um sexto) até 1/2 (metade), por expressa disposição legal (Art. 70, primeira parte, do Código Penal). HC 134640. Rel. Min. Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora convocada do TJ/PE), julgado em 06/08/2013. 155 ECA – Crimes em espécie 6. §1º - Conduta equiparada: consiste na corrupção de menores por meios eletrônicos, inclusive salas de bate-papo na internet. 7. § 2º - Causa de aumento de pena: crimes hediondos - caso a infração penal esteja prevista no rol do art. 1º, da Lei n° 8.072/90, a pena do delito ora comentado aumenta-se de um terço. 8. Não abrangência dos delitos equiparados a hediondos: Tendo em vista que § 2º fez menção expressaao rol do art. 1º da Lei n° 8.072/90, à luz do princípio da legalidade, o aumento de pena não abrange os delitos equiparados a hediondos (maj.). 156 Conclusão 1. Procurei trazer para os Senhores as principais discussões envolvendo aspectos criminais do ECA e do Estatuto do Idosos, bem como tendências nesses dois ramos do Direito. 2. Obrigado pela atenção! 3. Espero revê-los em breve! Slide 1 Slide 2 Slide 3: Apresentação da Disciplina Slide 4 Slide 5 Slide 6 Slide 7 Slide 8 Slide 9 Slide 10 Slide 11 Slide 12 Slide 13 Slide 14 Slide 15 Slide 16 Slide 17 Slide 18 Slide 19 Slide 20 Slide 21 Slide 22 Slide 23 Slide 24 Slide 25 Slide 26 Slide 27 Slide 28 Slide 29 Slide 30 Slide 31 Slide 32 Slide 33 Slide 34 Slide 35 Slide 36 Slide 37 Slide 38 Slide 39 Slide 40 Slide 41 Slide 42 Slide 43 Slide 44 Slide 45 Slide 46 Slide 47 Slide 48 Slide 49 Slide 50 Slide 51 Slide 52 Slide 53 Slide 54 Slide 55 Slide 56 Slide 57 Slide 58 Slide 59 Slide 60 Slide 61 Slide 62 Slide 63 Slide 64 Slide 65 Slide 66 Slide 67 Slide 68 Slide 69 Slide 70 Slide 71 Slide 72 Slide 73 Slide 74 Slide 75 Slide 76 Slide 77 Slide 78 Slide 79 Slide 80 Slide 81 Slide 82 Slide 83 Slide 84 Slide 85 Slide 86 Slide 87 Slide 88 Slide 89 Slide 90 Slide 91 Slide 92 Slide 93 Slide 94 Slide 95 Slide 96 Slide 97 Slide 98 Slide 99 Slide 100 Slide 101 Slide 102 Slide 103 Slide 104 Slide 105 Slide 106 Slide 107 Slide 108 Slide 109 Slide 110 Slide 111 Slide 112 Slide 113 Slide 114 Slide 115 Slide 116 Slide 117 Slide 118 Slide 119 Slide 120 Slide 121 Slide 122 Slide 123 Slide 124 Slide 125 Slide 126 Slide 127 Slide 128 Slide 129 Slide 130 Slide 131 Slide 132 Slide 133 Slide 134 Slide 135 Slide 136 Slide 137 Slide 138 Slide 139 Slide 140 Slide 141 Slide 142 Slide 143 Slide 144 Slide 145 Slide 146 Slide 147 Slide 148 Slide 149 Slide 150 Slide 151 Slide 152 Slide 153 Slide 154 Slide 155 Slide 156 Slide 157: Conclusãopeças de roupas, e incontroversa finalidade sexual e libidinosa, adequam-se, respectivamente, aos tipos do art. 240 e 241-B do ECA. (REsp 1.543.267-SC, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 3/12/2015, DJe 16/2/2016.) 17 ECA – Crimes em espécie 6. “Cena de sexo explícito ou pornográfica”: norma penal em branco. 7. Classificação - crime comum; formal; doloso; comissivo; de perigo abstrato; instantâneo; admite tentativa. 8. Prescrição: os crimes dos arts. 240,241, 241-A, 241-B, 241- C, 241-D, quando identificada a criança ou adolescente, também são crimes contra a dignidade sexual e, portanto, a prescrição inicia a partir da data em que a vítima completa 18 anos (art. 111, V, do CP). 9. Prova da idade da criança ou adolescente – se ficar evidente que se trata de pessoa menor de 18 anos, existe uma presunção de atingimento do bem, que, por sinal, é coletivo. 18 ECA – Crimes em espécie 10. Incidência do Direito Processual Penal Coletivo – atinge bem jurídico-penal coletivo em sentido amplo. 19 1. Lei n° 13.772/18 8 - É possível o concurso material com o crime previsto no artigo 218-C, do Código Penal (“Divulgação de cena de estupro ou de cena de estupro de vulnerável, de cena de sexo ou de pornografia” - Art. 218-C. Oferecer, trocar, disponibilizar, transmitir, vender ou expor à venda, distribuir, publicar ou divulgar, por qualquer meio - inclusive por meio de comunicação de massa ou sistema de informática ou telemática -, fotografia, vídeo ou outro registro audiovisual que contenha cena de estupro ou de estupro de vulnerável ou que faça apologia ou induza a sua prática, ou, sem o consentimento da vítima, cena de sexo, nudez ou pornografia:)? Diante da tutela de diferentes bens jurídicos, inexiste qualquer óbice ao reconhecimento do concurso material. 20 1. Lei n° 13.772/18 9 - É admissível a tentativa? É plenamente possível a modalidade tentada. 10 - Ação penal: Trata-se de crime de menor potencial ofensivo e que se submete à ação penal pública incondicionada, nos termos do art. 225, do Código Penal. 21 2. Lei n° 14.132/21 1) Introdução A Lei nº 14.132/2021 dispõe sobre: 1) o crime de perseguição, também chamado de stalking; e 2) a revogação do art. 65, da Lei das Contravenções Penais. 2) Novo crime de perseguição (art. 147-A, do Código Penal) O art. 147-A, do Código Penal, passou a dispor que: 22 2. Lei n° 14.132/21 Art. 147-A. Perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. Pena – reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Trata-se de figura conhecida como assédio por intrusão ou stalking. Até o advento da Lei n° 14.132/21, o nosso ordenamento jurídico reprimia condutas desse jaez através da contravenção penal prevista no art. 65, do Decreto-lei 3.688/41. A Lei nº 14.132/2021 revogou a contravenção de molestamento (art. 65, do DL n° 3.688/41), passando a prever conduta semelhante que pode ocasionar graves consequências psicológicas à vítima, razão pela qual incide, nas hipóteses em que cabível, o princípio da continuidade normativo-típica. 23 2. Lei n° 14.132/21 a) Conduta O verbo nuclear é perseguir, no sentido de importunar a vítima. O novo tipo penal pune a conduta do agente que persegue alguém praticando uma de três condutas: a) ameaçando a integridade física ou psicológica do ofendido; b) restringindo a sua capacidade de locomoção; ou c) invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. Note-se que o tipo penal ainda dispõe que a conduta não pode ser episódica, mas deve ocorrer de forma reiterada, ou seja, exige habitualidade no comportamento criminoso. Em se tratando de crime habitual, não admite a figura tentada. 24 2. Lei n° 14.132/21 É preciso que o delito seja praticado valendo-se de um meio específico? Não, podendo o agente se valer de qualquer meio, tais como recados em faixas afixadas nas proximidades da residência da vítima, permanência na saída da escola ou do trabalho, internet, WhatsApp, telefone, correspondência, drones, presencialmente etc. Importa ressaltar, nesse ponto, que a perseguição pelos meios digitais está prevista no tipo penal, caracterizando a figura do cyberstalking (ex. o agente que envia centenas de mensagens diárias para a ofendida). b) Bem jurídico tutelado A liberdade individual. 25 2. Lei n° 14.132/21 c) Sujeito ativo Qualquer pessoa (crime comum). d) Sujeito passivo Qualquer pessoa, seja homem ou mulher. e) Elemento subjetivo Só admite a forma dolosa, não exigindo elemento subjetivo especial. 26 2. Lei n° 14.132/21 f) Concurso de delitos No caso de o agente ameaçar a vítima, o delito de ameaça resta absorvido pelo tipo do art. 147-A, do CP. Contudo, o delito de stalking não absorve a violência. Assim, caso o ato de perseguição resulte em lesão corporal, óbice algum existirá à responsabilização do agente pelo delito correspondente, tendo em vista que as “penas deste artigo são aplicáveis sem prejuízo das correspondentes à violência” (art. 147-A, § 2°, do CP). Nesse caso, deverá incidir, a nosso ver, o concurso formal. 27 2. Lei n° 14.132/21 g) Causa de aumento de pena A pena é aumentada de metade se: 1) O ofendido for criança, adolescente ou idoso; 2) A vítima for mulher e o delito for praticado por razões da condição de sexo feminino, ou seja, o crime deve envolver violência doméstica ou familiar ou menosprezo ou discriminação à condição de mulher; 3) O delito for perpetrado mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas; 4) O crime for praticado com o emprego de arma (branca ou de fogo). Entendemos que o crime de porte de arma de fogo não resta absorvido pelo delito de stalking, tendo em vista que tutelam bens jurídicos distintos. 28 2. Lei n° 14.132/21 h) “Paparazzi” Em regra, os paparazzi não incorrem na prática do tipo penal. Contudo, quando reiteradamente invadir ou perturbar a esfera de liberdade ou privacidade, é possível que incorra na prática da conduta típica. i) Ação penal Somente se procede mediante representação, tratando-se, portanto, de crime que se submete a ação penal pública condicionada. Nos casos em que incidir a Lei Maria da Penha, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público (art. 16). 29 2. Lei n° 14.132/21 j) Pena Reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa. Assim, é possível a aplicação, na forma básica, da transação penal e suspensão condicional do processo. Nesses casos, inviável o acordo de não persecução penal, em virtude da possibilidade de aplicação da transação penal (art. 28-A, § 2º, inc. I, do CPP). Na modalidade majorada (§ 1º), é possível o ANPP se o crime não for praticado no âmbito de violência doméstica ou familiar, ou contra a mulher por razões da condição de sexo feminino. 30 2. Lei n° 14.132/21 k) Habitualidade iniciada antes da entrada em vigor do tipo penal O agente que iniciou a prática da conduta criminosa antes da entrada em vigor do novo tipo e continua a praticá-lo com o advento do novo diploma incorre na prática do crime previsto no art. 147-A, do CP. 3) Revogação da contravenção prevista no art. 65, da LCP Ao revogar a contravenção penal, o legislador promoveu abolitio criminis de inúmeras condutas que não estão abrangidas pelo novo tipo penal do art. 147-A, do CP, em especial porque não exigia ameaça nem restrição à capacidade de locomoção ou à privacidade. 31 3. Lei n° 14.344/22 a) Introdução A Lei nº 14.344/22, denominada “Lei Henry Borel”, cria mecanismos para a prevenção e o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente. b) Sistema constitucional de prevenção e enfrentamento da violência domésticae familiar contra a criança e o adolescente: 1) Art. 226, § 8°, da Constituição, que estabelece que o Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. 32 3. Lei n° 14.344/22 2) Art. 227, § 4º, da Constituição, dispõe que a lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente. c) Conceito de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente Configura violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente qualquer ação ou omissão que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual, psicológico ou dano patrimonial (art. 2º): I - no âmbito do domicílio ou da residência da criança e do adolescente, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; 33 3. Lei n° 14.344/22 II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que compõem a família natural, ampliada ou substituta, por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III - em qualquer relação doméstica e familiar na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a vítima, independentemente de coabitação. (O dispositivo segue a mesma linha da Súmula 600, do STJ , que dispensa a coabitação no âmbito da Lei Maria da Penha.) Obs. É possível que a Lei Henry Borel incida nas hipóteses de berçário e creche? Não, tendo em vista que a hipótese não está prevista no rol do art. 2º, da Lei n° 14.344/22. 34 3. Lei n° 14.344/22 Atenção! Embora a Lei Henry Borel não defina as várias formas de violência contra criança e adolescente, altera a Lei nº 13.431/17, que passa a disciplinar a matéria em seu artigo 4º, acrescentando, ainda, uma inovação: a previsão da violência patrimonial. Vejamos: Art. 4º Para os efeitos desta Lei, sem prejuízo da tipificação das condutas criminosas, são formas de violência: I - violência física, entendida como a ação infligida à criança ou ao adolescente que ofenda sua integridade ou saúde corporal ou que lhe cause sofrimento físico; II - violência psicológica: 35 3. Lei n° 14.344/22 a) qualquer conduta de discriminação, depreciação ou desrespeito em relação à criança ou ao adolescente mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, agressão verbal e xingamento, ridicularização, indiferença, exploração ou intimidação sistemática ( bullying ) que possa comprometer seu desenvolvimento psíquico ou emocional; b) o ato de alienação parental, assim entendido como a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente, promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou por quem os tenha sob sua autoridade, guarda ou vigilância, que leve ao repúdio de genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculo com este; 36 3. Lei n° 14.344/22 c) qualquer conduta que exponha a criança ou o adolescente, direta ou indiretamente, a crime violento contra membro de sua família ou de sua rede de apoio, independentemente do ambiente em que cometido, particularmente quando isto a torna testemunha; III - violência sexual, entendida como qualquer conduta que constranja a criança ou o adolescente a praticar ou presenciar conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso, inclusive exposição do corpo em foto ou vídeo por meio eletrônico ou não, que compreenda: a) abuso sexual, entendido como toda ação que se utiliza da criança ou do adolescente para fins sexuais, seja conjunção carnal ou outro ato libidinoso, realizado de modo presencial ou por meio eletrônico, para estimulação sexual do agente ou de terceiro; 37 3. Lei n° 14.344/22 b) exploração sexual comercial, entendida como o uso da criança ou do adolescente em atividade sexual em troca de remuneração ou qualquer outra forma de compensação, de forma independente ou sob patrocínio, apoio ou incentivo de terceiro, seja de modo presencial ou por meio eletrônico; c) tráfico de pessoas, entendido como o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento da criança ou do adolescente, dentro do território nacional ou para o estrangeiro, com o fim de exploração sexual, mediante ameaça, uso de força ou outra forma de coação, rapto, fraude, engano, abuso de autoridade, aproveitamento de situação de vulnerabilidade ou entrega ou aceitação de pagamento, entre os casos previstos na legislação; 38 3. Lei n° 14.344/22 IV - violência institucional, entendida como a praticada por instituição pública ou conveniada, inclusive quando gerar revitimização. V - violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluídos os destinados a satisfazer suas necessidades, desde que a medida não se enquadre como educacional. 39 3. Lei n° 14.344/22 d) Assistência à criança e ao adolescente em situação de violência doméstica e familiar - deve ser prestada em quatro perspectivas distintas: 1) assistência à saúde; 2) assistência à segurança pública (art. 12), em especial no que tange à Polícia Civil; 3) assistência social; 4) políticas públicas de proteção. e) Articulação e efetividade no combate a violência doméstica e familiar contra criança e adolescente: o Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente, juntamente com os sistemas de justiça, de saúde, de segurança pública e de assistência social, os Conselhos Tutelares e a comunidade escolar, poderão, na esfera de sua competência, adotar ações 40 3. Lei n° 14.344/22 articuladas e efetivas direcionadas à identificação da agressão, à agilidade no atendimento da criança e do adolescente vítima de violência doméstica e familiar e à responsabilização do agressor (art. 8º). f) Atendimento pela Autoridade Policial: na hipótese de ocorrência de ação ou omissão que implique a ameaça ou a prática de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente, a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência adotará, de imediato, as providências legais cabíveis, inclusive no que tange às medidas protetivas (art. 11). Obs. Quais as medidas devem ser adotadas pela Autoridade Policial? Nos termos do art. 6º, do CPP, a Autoridade Policial deverá:41 3. Lei n° 14.344/22 I - dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais; II - apreender os objetos que tiverem relação com o fato, após liberados pelos peritos criminais; III - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e suas circunstâncias; IV - ouvir o ofendido (Nesse caso, o depoimento da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência doméstica e familiar será colhido nos termos da Lei nº 13.431/17 (escuta especializada), observadas as disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 12, da Lei nº 14.344/22). Ademais, a autoridade policial poderá requisitar e o Conselho Tutelar requerer ao Ministério Público a propositura de ação cautelar de antecipação de produção de prova nas causas que envolvam violência contra a criança e o adolescente, 42 3. Lei n° 14.344/22 observadas as disposições da Lei nº 13.431/17 (art. 21, § 1°, da Lei nº 14.344/22). V - ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no Capítulo III do Título Vll, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por duas testemunhas que Ihe tenham ouvido a leitura; VI - proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a acareações; VII - determinar, se for caso, que se proceda a exame de corpo de delito e a quaisquer outras perícias; VIII - ordenar a identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes; 43 3. Lei n° 14.344/22 IX - averiguara vida pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime e durante ele, e quaisquer outros elementos que contribuírem para a apreciação do seu temperamento e caráter. X - colher informações sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos filhos, indicado pela pessoa presa. - Além disso, o art. 13, da Lei nº 14.344/22, dispõe que no atendimento à criança e ao adolescente em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências: I - encaminhar a vítima ao Sistema Único de Saúde e ao Instituto Médico-Legal imediatamente;44 3. Lei n° 14.344/22 II - encaminhar a vítima, os familiares e as testemunhas, caso sejam crianças ou adolescentes, ao Conselho Tutelar para os encaminhamentos necessários, inclusive para a adoção das medidas protetivas adequadas; III - garantir proteção policial, quando necessário, comunicados de imediato o Ministério Público e o Poder Judiciário; IV - fornecer transporte para a vítima e, quando necessário, para seu responsável ou acompanhante, para serviço de acolhimento existente ou local seguro, quando houver risco à vida. g) Medidas a serem adotadas pelo juiz em favor de criança e adolescente (art. 15): I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência. É necessária prévia oitiva do 45 3. Lei n° 14.344/22 MP para a concessão de medida protetiva? Não, pois o art. 16, § 1°, da Lei nº 14.344/22, dispõe que as medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, o qual deverá ser prontamente comunicado. - Contudo, poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou do Conselho Tutelar, ou a pedido da vítima (criança ou adolescente) ou de quem esteja atuando em seu favor, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da vítima, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público (art. 16, § 3°, da Lei nº 14.344/22). Nesse caso, parece ser indispensável a prévia oitiva do Ministério Público. 46 3. Lei n° 14.344/22 II - determinar o encaminhamento do responsável pela criança ou pelo adolescente ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso; III - comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis; IV - determinar a apreensão imediata de arma de fogo sob a posse do agressor (pressupõe posse legítima da arma de fogo). h) Medidas protetivas de urgência que obrigam o agressor: constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente, o juiz poderá determinar ao agressor, de imediato, em conjunto ou separadamente, a aplicação das seguintes medidas protetivas de urgência (rol exemplificativo - art. 20): 47 3. Lei n° 14.344/22 I - a suspensão da posse ou a restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003; II - o afastamento do lar, do domicílio ou do local de convivência com a vítima; III - a proibição de aproximação da vítima, de seus familiares, das testemunhas e de noticiantes ou denunciantes, com a fixação do limite mínimo de distância entre estes e o agressor; IV - a vedação de contato com a vítima, com seus familiares, com testemunhas e com noticiantes ou denunciantes, por qualquer meio de comunicação; V - a proibição de frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da criança ou do adolescente, respeitadas as disposições da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);48 3. Lei n° 14.344/22 VI - a restrição ou a suspensão de visitas à criança ou ao adolescente; VII - a prestação de alimentos provisionais ou provisórios; VIII - o comparecimento a programas de recuperação e reeducação; IX - o acompanhamento psicossocial, por meio de atendimento individual e/ou em grupo de apoio. i) Medidas Protetivas de Urgência à Vítima: poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas (rol exemplificativo), determinar em favor da vítima a adoção das seguintes medidas (art. 21): I - a proibição do contato, por qualquer meio, entre a criança ou o adolescente vítima ou testemunha de violência e o agressor; 49 3. Lei n° 14.344/22 II - o afastamento do agressor da residência ou do local de convivência ou de coabitação; III - a prisão preventiva do agressor, quando houver suficientes indícios de ameaça à criança ou ao adolescente vítima ou testemunha de violência; IV - a inclusão da vítima e de sua família natural, ampliada ou substituta nos atendimentos a que têm direito nos órgãos de assistência social; V - a inclusão da criança ou do adolescente, de familiar ou de noticiante ou denunciante em programa de proteção a vítimas ou a testemunhas; VI - no caso da impossibilidade de afastamento do lar do agressor ou de prisão, a remessa do caso para o juízo competente, a fim de avaliar a necessidade de acolhimento familiar, institucional ou colação em família substituta;50 3. Lei n° 14.344/22 VII - a realização da matrícula da criança ou do adolescente em instituição de educação mais próxima de seu domicílio ou do local de trabalho de seu responsável legal, ou sua transferência para instituição congênere, independentemente da existência de vaga. Obs. As medidas protetivas caducam no prazo de 30 dias se não for ajuizada ação na esfera cível? Não, perdurando enquanto demonstrada a sua necessidade, seguindo o entendimento do STJ no âmbito da Lei Maria da Penha. 51 3. Lei n° 14.344/22 j) Afastamento do agressor do lar e ordem preferencial de atuação: verificada a ocorrência de ação ou omissão que implique a ameaça ou a prática de violência doméstica e familiar, com a existência de risco atual ou iminente à vida ou à integridade física da criança e do adolescente, ou de seus familiares, o agressor será imediatamente afastado do lar, do domicílio ou do local de convivência com a vítima. Obs. Quais autoridades devem promover o afastamento do agressor do lar? A ordem de atuação preferencial vem prevista no art. 14 da Lei Henry Borel: I - pela autoridade judicial; II - pelo delegado de polícia, quando o Município não for sede de comarca; III - pelo policial, quando o Município não for sede de comarca e 52 3. Lei n° 14.344/22 não houver delegado disponível no momento da denúncia. Atenção! Conselho Tutelar poderá promover o afastamento? Não, uma vez que § 1º do art. 14 da Lei nº 14.344 dispõe que o Conselho Tutelar poderá representar às autoridades para requerer o afastamento do agressor do lar, do domicílio ou do local de convivência com a vítima. k) Medidas protetivas fixadas pelo juízo da execução: nos casos de: a) violência doméstica e familiar contra a criança, o adolescente e a mulher; b) de tratamento cruel ou degradante; e c) ou de uso de formas violentas de educação, correção ou disciplina contra a criança e o adolescente, o juízo da execução poderá impor ao agressor a medida protetiva de comparecimento obrigatório a programas de recuperação e reeducação. 53 3. Lei n° 14.344/22 Atenção! Não se trata de pena, uma vez que o juízo da execução não pode impor pena não prevista em sentença transitada em julgada. A determinação de comparecimento a programas de recuperação e reeducação tem natureza de medida protetiva. l) Novo crime de desobediência para aquele que descumpre medidas protetivas: “Art. 25 Descumprir decisão judicial que defere medida protetiva de urgência prevista nesta Lei: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos.” Obs. O delito não incide em relação ao descumprimento de outras determinações judiciais no âmbito da Lei Henry Borel, masapenas no caso de violação a medidas protetivas de urgência.54 3. Lei n° 14.344/22 Atenção! A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu a medida (art. 25, § 1°). - E se a medida de afastamento do lar for deferida pela polícia? Não há que se falar de subsunção ao tipo em apreço, em atenção ao princípio da legalidade, mas ao delito de desobediência previsto no art. 330, do Código Penal. m) Do dever de comunicação daquele que presencie violência doméstica e familiar contra criança e adolescente: qualquer pessoa que tenha conhecimento ou presencie ação ou omissão, praticada em local público ou privado, que constitua violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente tem o dever de comunicar o fato imediatamente. 55 3. Lei n° 14.344/22 Obs. Quais autoridades devem ser comunicadas? De forma alternativa, a lei estabelece que o dever de comunicação é cumprido quando o agente cientifica: a) o serviço de recebimento e monitoramento de denúncias; b) o Disque 100 da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos; c) o Conselho Tutelar; ou d) a autoridade policial. Obs. 2. O dever de comunicação é imposto por lei, de modo que, não realizada a comunicação, o agente incorre na prática do crime previsto no art. 26, da Lei nº 14.344/22: “Art. 26. Deixar de comunicar à autoridade pública a prática de violência, de 56 3. Lei n° 14.344/22 tratamento cruel ou degradante ou de formas violentas de educação, correção ou disciplina contra criança ou adolescente ou o abandono de incapaz: Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos.” n) Medidas de proteção e compensação para pessoas que noticiarem ou denunciarem a prática de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente: o poder público garantirá meios e estabelecerá medidas e ações para a proteção e a compensação da pessoa que noticiar informações ou denunciar a prática de violência, de tratamento cruel ou degradante ou de formas violentas de educação, correção ou disciplina contra a criança e o adolescente (art. 24). 57 3. Lei n° 14.344/22 Obs. O noticiante ou denunciante não se confunde com a figura do whistleblower previsto na Lei nº 13.608/18, visto que este último não tem o dever de noticiar ou denunciar. Atenção! A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão estabelecer programas de proteção e compensação das vítimas, das testemunhas e dos noticiantes ou denunciantes das condutas (art. 24, § 1°). (A Lei nº 14.344/22 não regulamentou a compensação, de modo que o tema será objeto de sedimentação ulterior pelos Tribunais). Não bastasse, o noticiante ou denunciante poderá condicionar a revelação de informações de que tenha conhecimento à execução das medidas de proteção necessárias para assegurar sua integridade física e psicológica, e caberá à autoridade competente requerer e deferir a adoção das medidas necessárias (art. 24, § 3°). 58 3. Lei n° 14.344/22 o) Não incidência da Lei nº 9.099/95 nos crimes praticados contra a criança e o adolescente: “art. 226, § 1º, do ECA - Aos crimes cometidos contra a criança e o adolescente, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.” Obs. O dispositivo incide em relação a todos os crimes cometidos contra vítima criança ou adolescente? Existem três correntes sobre o tema: a) A Lei nº 9.099/95 não incide em relação a qualquer crime perpetrado em face de criança ou adolescente; b) A Lei nº 9.099/95 não incide em relação a qualquer crime perpetrado em face de criança ou adolescente quando cometido no âmbito doméstico e familiar, em exegese sistemática com o art. 2º, da Lei 14.344/22;59 3. Lei n° 14.344/22 c) A Lei nº 9.099/95 não incide exclusivamente em relação aos crimes previstos no ECA (Rogério Sanches). p) Termo inicial da prescrição da pretensão punitiva em delitos perpetrados com violência contra criança e o adolescente: Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr: V - nos crimes contra a dignidade sexual ou que envolvam violência contra a criança e o adolescente, previstos neste Código ou em legislação especial, da data em que a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.” - Sintetizando: a prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final (prescrição da pretensão punitiva), tem como termo inicial a data em que vítima completar 18 anos - salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal – nos seguintes casos: 60 3. Lei n° 14.344/22 a) Em se tratando de crime contra a dignidade sexual; b) Em qualquer delito que envolva violência contra a criança e o adolescente, nos termos do art. 4º, da Lei nº 13.431/17. Atenção! Trata-se de norma penal mais gravosa e, portanto, irretroativa. q) Nova qualificadora do homicídio contra menor de 14 anos: “Art. 121. Matar alguém: Pena - reclusão, de seis a vinte anos. § 2° Se o homicídio é cometido: IX - contra menor de 14 (quatorze) anos;” 61 3. Lei n° 14.344/22 - Assim, o homicídio perpetrado contra menor de 14 anos deixou de ser apenas majorado e passou a ser qualificado. - Atenção! De modo a evitar o bis in idem, não é possível a incidência simultânea do art. 121, § 2°, inciso IX, e do art. 121, § 4°, do Código Penal, que prevê a causa de aumento para o homicídio perpetrado contra menor de 14 anos. r) Novas majorantes no crime de homicídio perpetrado contra menor de 14 anos: Art. 121, § 2º-B. A pena do homicídio contra menor de 14 (quatorze) anos é aumentada de: I - 1/3 (um terço) até a metade se a vítima é pessoa com deficiência ou com doença que implique o aumento de sua vulnerabilidade; 62 3. Lei n° 14.344/22 II - 2/3 (dois terços) se o autor é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela. - Assim, é possível a majoração da pena no homicídio perpetrado contra menor de 14 anos: I - se a vítima é pessoa com deficiência ou com doença que implique o aumento de sua vulnerabilidade (ex. a vítima é portadora de câncer); II - se o autor é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela. 63 3. Lei n° 14.344/22 s) Nova majorante nos crimes contra a honra perpetrados contra criança ou adolescente: Art. 141. As penas cominadas neste Capítulo aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido: IV - contra criança, adolescente, pessoa maior de 60 (sessenta) anos ou pessoa com deficiência, exceto na hipótese prevista no § 3º do art. 140 deste Código. t) Vigência A Lei nº 14.344/22 entrou em vigor 45 dias após a data de sua publicação (25/05/22). 64 1. Direito Penal Coletivo 1.1 – Sociedade de risco (Weltrisikogesellschaft - Ulrich Beck) – Características: A) Resulta do desenvolvimento tecnológico; B) É imperceptível aos sentidos; e C) Afeta a sociedade em seu conjunto, sem distinção de classes. 1.2 – Efeitos no ordenamento jurídico: A) Introdução de novos delitos, especialmente em hipóteses derivadas do progresso técnico e científico, como a informática, a tecnologia genética e a biotecnologia. Obs. Crítica - a expansão inadequada e ineficaz da tutela penal que abrange bens jurídicos de modo vago e impreciso enseja a denominada desmaterialização, espiritualização, 1. Direito Penal na Sociedade de Risco dinamização ou liquefação do bem jurídico, em virtude de estarem sendo criados sem qualquer substrato material, distanciados da lesão perceptível dos interesses dos indivíduos. STF – a criação de perigo abstrato não representa, por si só, comportamento inconstitucional por parte do legislador penal. A tipificação de condutas que geram perigo abstrato, muitasvezes, acaba sendo a melhor alternativa ou a medida mais eficaz para a proteção de bens jurídicos-penais supraindividuais ou de caráter coletivo, como, por exemplo, o meio ambiente, a saúde etc. Portanto, pode o legislador, dentro de suas amplas margens de avaliação e de decisão, definir quais as medidas mais adequadas e necessárias para a efetiva proteção de determinado bem jurídico, o que lhe permite escolher espécies de tipificação próprias de um direito penal preventivo.” (HC 102.087) 1. Direito Penal na Sociedade de Risco B) Ampliação da força persecutória e a melhoria da persecução criminal – “Nova formas de criminalidade”. C) Necessidade de uma nova compreensão da função judicial na tutela transindividual, devendo o Estado priorizar a máxima efetividade dos direitos fundamentais coletivos, a fim de evitar a propagação dos danos em massa. D) Crise do Direito Penal e, consequentemente, do Processo Penal, em virtude da ausência de adequação entre as medidas existentes e a tutela eficiente dos bens jurídicos. Obs. Sugestão de bibliografia sobre o tema: livro com o Gregório. 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo A) Evolução do conceito de bem jurídico: 1. Feuerbach (Lehrbuch des gemeinen in Deutschland gültigen peinlichen Rechts) - o objeto de proteção penal deve ser o direito subjetivo, razão pela qual o delito deve ser visto como a lesão a um direito subjetivo de outrem. 2. Bimbaum (1834) - sustentou que o crime não lesiona direitos subjetivos, mas bens (Gutsverletzung). Em outras palavras, o objeto do ilícito corresponde a um bem, a um conteúdo material (“materialização”), não, ao direito em si. 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo 3. Positivismo jurídico - passou a identificar o bem jurídico como aquilo que o legislador contemplasse como tal, ou seja, a lei é a expressão do bem jurídico. 4. Franz von Liszt - define bem jurídico como “o interesse juridicamente protegido”, ou seja, como um conteúdo material, decorrente do fato de que vital para a comunidade ou o indivíduo, em virtude de sua danosidade social. 5. Neokantismo - o conceito de bem jurídico como um valor abstrato, um valor cultural, que fundamenta a antijuridicidade (ratio essendi da norma penal). 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo 6. Escola de Kiel - durante o nacional socialismo alemão, esqueceu-se do conceito de bem jurídico, fazendo com que o delito fosse concebido como a violação do dever de fidelidade do indivíduo para com o Estado. 7. Hans Welzel - o bem jurídico deve ser entendido como algo vital para a comunidade e para o indivíduo, merecendo ser protegido juridicamente por sua significação social, ou seja, atentando para os valores ético-sociais. 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo 8. Teorias sociológicas de índole funcionalista: buscaram conferir ao Direito a função de garantir os sistemas sociais. Os bens jurídicos são interesses individuais ou coletivos das pessoas, ou seja, constituem-se no contexto da compreensão social e normativa do controle social formalizado. 9. Teorias constitucionais: convergiram no sentido de buscarem explicar o conteúdo material dos bens jurídicos, identificando na Constituição o meio ideal para tanto. 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo 10. Claus Roxin: “o direito penal é muito mais a forma, através da qual as finalidades político-criminais podem ser transferidas para o modo de vigência jurídica”. Entre as mais importantes finalidades político-criminais, encontra-se a proteção de bens jurídicos, a qual deve ocorrer com base nos princípios da intervenção mínima, da subsidiariedade e da fragmentariedade. 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo B) O Direito Penal Coletivo em perspectiva comparada - Direito Penal Norte-Americano: estrutura significativamente diferente da experiência brasileira. A.1) Elemento subjetivo - segue uma ordem decrescente de responsabilidade: 1) purposeful (quando o acusado atua com “dolo direto”); 2) knowing (quando o acusado atua com “dolo eventual”); 3) imprudência (recklesness); e 4) negligência (negligence). A.2) Em sendo omisso o Model Penal Code, presume- se ser necessária a prova de que o agente agiu com imprudência (recklessness), nada impedindo a sua responsabilização pelas intenções mais graves (purposeful ou knowing). 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo A.3) Existe conceito similar ao de bem jurídico penal? Não. O Common Law oscila na sua estruturação, adotando conceitos amplos como “interesse público ou individual” e “dano” (harm) e “mal” (evil). A.4) Como solucionar os impasses? A jurisprudência tem se voltado para o Direito Constitucional nas hipóteses em que são levantadas questões fundadas no escopo da tutela do Direito Penal. A título de exemplo, a Suprema Corte dos EUA foi chamada a decidir se relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo caracterizavam crime e, como razão de decidir, conferiu especial atenção ao direito constitucional à privacidade. 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo A.5) Tutela penal coletiva – Especialmente em crimes contra a saúde pública e o meio ambiente. A.5.1) Meio ambiente: desde a metade do século XX, a poluição tem sido reconhecida como uma séria ameaça à saúde e ao bem-estar das pessoas. O enforcement de normas administrativas e criminais nessa seara é realizado não apenas pelas agências reguladoras, mas por todo o Sistema de Justiça Criminal, sendo vários dos delitos fruto da negligência dos sujeitos ativos em atenderem padrões regulamentares ou em adotarem medidas exigidas pela legislação. 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo A.5.2) Características: as infrações penais que tutelam “direitos coletivos” são tidas como mala prohibida e exigem um nível menor em termos de elemento subjetivo (intent) para a responsabilização do agente (strict liability). Exemplos: 1) Caso State Budd Company: o Tribunal sustentou que o Direito não exige a prova do elemento subjetivo e que “o crime de destruição da vida selvagem se consuma independentemente do dolo ou culpa na conduta do agente que pratica a poluição.” 2) Reynolds v. McNichols: um Tribunal Federal autorizou a detenção e o tratamento compulsório de uma mulher detida pela prática de prostituição e sobre a qual pairava a suspeita de possuir doença venérea. 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo A.5.3) Crimes de colarinho branco: tipos penais consagram as violações antitruste, o “insider trading”, o suborno, as fraudes em valores mobiliários, as fraudes realizadas por meio de cartão de crédito e a lavagem de dinheiro. A.5.4) Elemento subjetivo em relação aos crimes de colarinho branco: o sistema norte-americano exige a prova de que o agente agiu “knowingly and willfully”, ou seja, é necessário demonstrar que na prática do delito o agente atou com elemento subjetivo “mais intenso”. 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo C) A crise da dogmática penal clássica: a) A dogmática foi construída à luz de um Direito Penal amparado em uma visão do Estado Liberal de Direito que não tinha no seu horizonte a tutela dos direitos ou interesses fundamentais massificados, especialmente os de titularidade difusa. b) O Código Penal de 1941, apesar de elaborado sob a égide do Governo Vargas, congressa uma estrutura normativa com traços de uma orientação política e ideológica nacionalista. c) A estrutura normativa penal atual codificada é incapaz de tutelar adequadamente os novos direitos, principalmente osrelacionados com a solidariedade coletiva, a biotecnologia e os referentes às tecnologias da informação. 1. Da Tutela Penal dos Direitos Coletivos em sentido amplo: O Direito Penal Coletivo d) Necessidade de reformulação das penas: as penas geralmente previstas para os crimes de dimensão coletiva não são proporcionais à gravidade e aos resultados causados pelos delitos, com destaque para as penas de multa (ex. a pena abstratamente prevista para o crime de sonegação fiscal, que atinge difusamente toda coletividade, equipara-se à prevista para o crime de furto qualificado perpetrado contra uma única vítima). Estatuto da Criança e do Adolescente 1. Art. 227, § 4º, da Constituição - A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente. 2. Natureza: mandado de criminalização (que encontra reflexo nas normas previstas no Código Penal e no ECA). 3. Princípio da especialidade: Art. 225. Este Capítulo dispõe sobre crimes praticados contra a criança e o adolescente, por ação ou omissão, sem prejuízo do disposto na legislação penal. 80 Estatuto da Criança e do Adolescente 3.1 - O elemento especializante nesse caso é a vítima do delito (ex. art. 3º, alínea a, da Lei de Abuso de Autoridade que dispõe “constitui abuso de autoridade qualquer atentado à liberdade de locomoção”, cede em relação ao art. 230, do ECA, que dispõe “Privar a criança ou o adolescente de sua liberdade, procedendo à sua apreensão sem estar em flagrante de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da autoridade judiciária competente: Pena – detenção de seis meses a dois anos”.). 4. Aplicação subsidiária do Código Penal e do Código de Processo Penal: Art. 226. Aplicam-se aos crimes definidos nesta Lei as normas da Parte Geral do Código Penal e, quanto ao processo, as pertinentes ao Código de Processo Penal. 81 Estatuto da Criança e do Adolescente 3. Ação penal pública incondicionada: Art. 227. Os crimes definidos nesta Lei são de ação pública incondicionada. 3.1. Competência: normalmente, compete à justiça estadual julgar os crimes previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente. Somente cabe à justiça federal julgar os crimes do ECA quando incidirem as hipóteses previstas no art. 109, da Constituição (“Compete à Justiça Federal processar e julgar réus acusados de crimes contra menores praticados no interior de campus de Universidade Federal, uma vez que agindo eles na condição de vigias do local, atingiram com sua ação delituosa interesses da autarquia federal” - TRF4 – APELAÇÃO CRIMINAL: ACR 11.209 SC 1998.04.01.011209-4, j. 8-6-1999, Publicação: DJ 18-8-1999, p. 552). 82 Estatuto da Criança e do Adolescente 4.1 – A Lei n° nº 13.431/2017 normatizou o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência. 4.2 - Trata-se de norma de aplicação compulsória aos menores de 18 (dezoito) anos e de aplicação facultativa às vítimas e testemunhas de violência entre 18 (dezoito) e 21 (vinte e um) anos (art. 2o, parágrafo único, do ECA). 4.3 – Inovação no âmbito criminal: tipifica expressamente a violação ao sigilo processual do depoimento (Art. 24. Violar sigilo processual, permitindo que depoimento de criança ou adolescente seja assistido por pessoa estranha ao processo, sem autorização judicial e sem o consentimento do depoente ou de seu representante legal. Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa. ). 83 4.3.1 - Atente-se para o fato de que, em existindo autorização judicial e, simultaneamente, consentimento do depoente ou de seu representante legal, o depoimento poderá ser assistido por pessoa estranha ao processo. 4.3.2 - Sujeito ativo: aquele que tem o controle sobre os presentes ao depoimento especial em razão do cargo que ocupa (ex. juiz). 4.3.3 - Sujeitos passivos: o Estado e o infante prejudicado com a divulgação indevida. 4.3.4 – Consumação: com a simples presença à oitiva, tratando-se de crime formal e que admite a tentativa.84 Estatuto da Criança e do Adolescente 4.3.5 – Na divulgação de depoimento especial prestado na delegacia de polícia incide o tipo penal? Não, pois o legislador deixou de criminalizar o sigilo na fase do inquérito policial. 4.4 – Principal inovação trazida pela Lei n° nº 13.431/2017 : “depoimento especial”, com ampla incidência não apenas nos feitos afetos ao Estatuto da Infância e Juventude, mas em qualquer caso em exista criança ou adolescente vítima ou testemunha de violência. 4.4.1 – Conceito de depoimento especial: procedimento de oitiva de criança ou adolescente vítima ou testemunha de violência perante autoridade policial ou judiciária. 85 Estatuto da Criança e do Adolescente 4.4.2 – Objetivo do depoimento especial: evitar a revitimização da criança ou adolescente. 4.4.3 – Finalidade: resguardar a criança ou adolescente de qualquer contato, ainda que visual, com o suposto acusado da violência ou com qualquer outra pessoa que represente ameaça, coação ou constrangimento (art. 9°, da Lei nº 13.431/2017). 4.4.4 – Local de realização do ato: apropriado e acolhedor, com infraestrutura e espaço físico que garantam a privacidade da criança ou do adolescente vítima ou testemunha de violência. 86 Estatuto da Criança e do Adolescente 4.4.5 - Momento em deve ser realizado o depoimento especial: em sede de “produção antecipada de prova judicial, garantida a ampla defesa do investigado, especialmente quando a criança ou o adolescente tiver menos de 7 (sete) anos ou em casos de violência sexual, objetivando minorar os traumas eventualmente causados ao infante. 4.4.5 - Qual o procedimento deve ser seguido na colheita do depoimento especial? A matéria vem regulamentada pelo art. 12, da Lei nº 13.431/2017: I - os profissionais especializados esclarecerão a criança ou o adolescente sobre a tomada do depoimento especial, informando-lhe os seus direitos e os procedimentos a serem adotados e planejando sua participação, sendo vedada a leitura da denúncia ou de outras peças processuais (evitar a indução nas respostas);87 Estatuto da Criança e do Adolescente II - É assegurada à criança ou ao adolescente a livre narrativa sobre a situação de violência, podendo o profissional especializado intervir quando necessário, utilizando técnicas que permitam a elucidação dos fatos; III - No curso do processo judicial, o depoimento especial será transmitido em tempo real para a sala de audiência, preservado o sigilo; IV - O juiz, após consultar o Ministério Público, o defensor e os assistentes técnicos, avaliará a pertinência de perguntas complementares, organizadas em bloco; 88 Estatuto da Criança e do Adolescente V - O profissional especializado poderá adaptar as perguntas à linguagem de melhor compreensão da criança ou do adolescente; VI - O depoimento especial será gravado em áudio e vídeo. 89 Estatuto da Criança e do Adolescente ECA – Crimes em espécie 1. Sistematização dos tipos penais: 1) Arts. 228 e 229: tratam de delitos ligados a hospitais, centros de saúde, etc.; 2) Arts. 230 a 235: tratam de delitos vinculados aos procedimentos relacionados a atos infracionais; 3) Art. 236: trata de criminalização visando facilitar as funções da autoridade judiciária, do membro do Conselho Tutelar e ainda do membro do Ministério Público; 4) Arts. 238 e 239: tratam de infrações vinculadas a colocação irregular em família substituta; 5) Arts. 240 a 244-E: tratam de outros assuntos. 90 ECA – Crimes em espécie Omissão no prontuário de nascimento - Art. 228. Deixar o encarregado de serviço ou o dirigente de estabelecimento de atenção à saúde de gestante de manter registro das atividades desenvolvidas, na forma e prazo referidos no art. 10 desta Lei, bem como de fornecer à parturiente ou a seu responsável, por ocasião da alta médica, declaração de nascimento, onde constem as intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato: Pena – detenção de seis meses a dois anos.Parágrafo único. Se o crime é culposo: Pena – detenção de dois a seis meses, ou multa. 1 Sujeito ativo - O encarregado de serviço ou o dirigente de estabelecimento de atenção à saúde de gestante que tenha o dever de cumprir as obrigações constantes do art. 10 do ECA. 2. Sujeito passivo. A criança. 91 ECA – Crimes em espécie 3. Crime omissivo - o encarregado de serviço ou o dirigente de estabelecimento deixa de cumprir as obrigações previstas no art. 10 desta lei, violando, assim, o seu dever de agir. 4. Descumprimento do art. 10, do ECA - “os hospitais e demais estabelecimentos de atenção à saúde de gestantes, públicos e particulares, são obrigados a: I – manter registro das atividades desenvolvidas, através de prontuários individuais, pelo prazo de dezoito anos; IV – fornecer declaração de nascimento onde constem necessariamente as intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato;” 92 ECA – Crimes em espécie 4.1 Conceito de “nascido vivo” (OMS): é a expulsão ou extração completa do corpo da mãe, independentemente da duração da gravidez, de um produto de concepção que, depois da separação, respire ou apresente qualquer outro sinal de vida, tal como batimentos do coração, pulsações do cordão umbilical ou movimentos efetivos dos músculos de contração voluntária, estando ou não cortado o cordão umbilical e estando ou não desprendido da placenta. 5. Consumação - O delito consuma-se com a mera omissão do agente. 6. Classificação - Crime próprio; formal; doloso; omissivo próprio; de perigo abstrato; instantâneo; não admite tentativa; de menor potencial ofensivo. 93 ECA – Crimes em espécie 7. A declaração do art. 10, IV, é obrigatória mesmo quando não houver interesse da genitora? Não (ex. não há crime quando a genitora abandonar o menor: “Direito à saúde – Obrigação dos hospitais de fornecer declarações sobre intercorrências do parto e desenvolvimento do neonato (art. 10, IV, ECA) – Conceituação. Crime previsto no ECA – art. 228, parágrafo único, da Lei nº 8.069/90 – Não fornecimento à genitora de declaração de nascimento de sua filha – Não demonstrada a ocorrência do crime imputado, quer na forma dolosa, quer na culposa.(...) Ora, partindo-se de tal interpretação, verifica-se que, no caso, não havia nenhuma razão de ordem prática para que a mãe recebesse tal documento, na medida em que abandonou o recém-nascido no hospital, sem se preocupar em saber se era do sexo masculino ou feminino, para que fosse colocado em família substituta. (TJ/SP - Apelação 812.615/0; 9ª Câmara; Comarca de Garça.) 94 ECA – Crimes em espécie Omissão na identificação do neonato - Art. 229. Deixar o médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de atenção à saúde de gestante de identificar corretamente o neonato e a parturiente, por ocasião do parto, bem como deixar de proceder aos exames referidos no art. 10 desta Lei: Pena – detenção de seis meses a dois anos. Parágrafo único. Se o crime é culposo: Pena – detenção de dois a seis meses, ou multa. 1. Sujeito ativo - O médico, o enfermeiro ou o dirigente de estabelecimento de atenção à saúde de gestante que tenha o dever de identificar corretamente o neonato e a parturiente. 2. Sujeito passivo - A criança e a parturiente. 95 ECA – Crimes em espécie 3. Troca de bebês e ausência de exames obrigatórios - O legislador quis evitar a “troca de bebês”, razão da incriminação da conduta de deixar de identificar corretamente o neonato e a parturiente. Além disso, criminalizou a não realização dos exames contidos no art. 10, III, do ECA, que consiste na realização de “exames visando ao diagnóstico e terapêutica de anormalidades no metabolismo do recém-nascido, bem como prestar orientação aos pais” (“teste do pezinho”). 4. Consumação. O delito consuma-se com a mera omissão do agente (crime omissivo próprio). 5. Classificação. Crime próprio; formal; doloso; omissivo próprio; de perigo abstrato; instantâneo; não admite tentativa por ser omissivo próprio. 96 ECA – Crimes em espécie Privação ilícita da liberdade de adolescente - Art. 230. Privar a criança ou o adolescente de sua liberdade, procedendo à sua apreensão sem estar em flagrante de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da autoridade judiciária competente: Pena – detenção de seis meses a dois anos. Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que procede à apreensão sem observância das formalidades legais. 1. Sujeito ativo. Qualquer pessoa. 2. Sujeito passivo. A criança ou o adolescente (criança nunca pode ser apreendida!). 3. Privar a liberdade por meio da apreensão: o menor fica detido, mas sem ser colocado na prisão. 4. Competência - Juízo da Infância e Juventude. 97 ECA – Crimes em espécie 5. Princípio da Especialidade - em relação ao art. art. 3º, alínea a, da Lei de Abuso de Autoridade (4.898/65), que dispõe “constitui abuso de autoridade qualquer atentado à liberdade de locomoção”. 6. Análise de caso: A, B e C, todos com dezesseis anos de idade completos, andavam de bicicleta em terreno baldio ao lado de um imóvel residencial onde era celebrado casamento religioso. Os gritos e comemorações dos adolescentes após cada salto e acrobacia incomodaram alguns convidados, entre eles, o tio da noiva, Roque, agente de polícia civil, que se dirigiu ao local onde estavam os adolescentes e os apreendeu, utilizando-se de algemas, conduzindo-os pela praça principal da cidade até a delegacia. Nela, Roque encontrou Júlio, agente de polícia, conhecido colega de trabalho, e, aproveitando-se da ausência temporária do delegado, solicitou 98 ECA – Crimes em espécie ao colega que mantivesse informalmente, na delegacia, os adolescentes até o término da celebração do casamento, liberando-os em seguida. Roque manteve os adolescentes, sem algemas, por duas horas nas dependências da delegacia, liberando-os em seguida, sem instauração ou lavratura de qualquer procedimento; tampouco foi feita qualquer comunicação dos fatos. Qual a adequada solução jurídica do caso? Roque e Júlio deverão responder pela infração penal de privação da liberdade de adolescente, mediante apreensão, sem as formalidades legais, sem flagrante de ato infracional nem ordem escrita da autoridade judiciária competente. 99 ECA – Crimes em espécie 7. Diferença em relação ao art. 148, §1º, IV, do Código Penal: colocação no cárcere (“Art. 148 – Privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado: § 1º – A pena é de reclusão, de dois a cinco anos: IV – se o crime é praticado contra menor de 18 (dezoito) anos”). 8. Consumação. O delito consuma-se com a efetiva privação da liberdade do menor (crime material). 9. Classificação. Crime comum; material; doloso; comissivo; de dano; permanente; admite tentativa. 100 ECA – Crimes em espécie 10. Erro de tipo: “seguranças deterem crianças suspeitas de usarem maconha, levando-as para local destinado a apuração dos fatos, tudo em obediência a ordens internas da administração da Universidade” (TRF4 – APELAÇÃO CRIMINAL: ACR 11.209 SC 1998.04.01.011209-4, j. 8-6-1999, Publicação: DJ 18-8-1999, p. 552). 11. Conduta equiparada do parágrafo único - Pode ser que a privação da liberdade da criança ou do adolescente decorra de estado de flagrância ou que haja ordem escrita da autoridade judiciária competente, mas ocorra o descumprimento das formalidades contidas nos art. 106, parágrafo único, 107, 108 e 109 do ECA: 1) “Art. 106. Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em flagrante de ato infracional ou por ordem 101 ECA – Crimes em espécie escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente. Parágrafo único. O adolescente tem direito à identificação dos responsáveis pela sua apreensão, devendo ser informado acerca de seus direitos. 2) Art. 107. A apreensão de qualquer adolescente e o local onde se encontra recolhido serão incontinenti comunicados à autoridade judiciária competente e à família do apreendido ou à pessoa por eleindicada. Parágrafo único. Examinar-se-á, desde logo e sob pena de responsabilidade, a possibilidade de liberação imediata. 3) Art. 108. A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias. Parágrafo único. A decisão deverá ser fundamentada e basear- se em indícios suficientes de autoria e materialidade, demonstrada a necessidade imperiosa da medida. 102 ECA – Crimes em espécie 4) Art. 109. O adolescente civilmente identificado não será submetido a identificação compulsória pelos órgãos policiais, de proteção e judiciais, salvo para efeito de confrontação, havendo dúvida fundada. 103 ECA – Crimes em espécie Omissão da apreensão de criança ou adolescente - Art. 231. Deixar a autoridade policial responsável pela apreensão de criança ou adolescente de fazer imediata comunicação à autoridade judiciária competente e à família do apreendido ou à pessoa por ele indicada: Pena – detenção de seis meses a dois anos. 1. Sujeito ativo - A autoridade policial responsável pela apreensão da criança ou do adolescente. 2. Sujeito passivo - A criança ou o adolescente. 3. Dupla comunicação - a comunicação deve ser feita à autoridade judiciária competente e à família do apreendido ou à pessoa por ele indicada. 104 ECA – Crimes em espécie 4. Comunicação imediata - dever de realizar a comunicação no exato momento em que a criança ou o adolescente é apresentado à autoridade policial. 5. Autoridadejudiciária competente: é o Juízo da Infância e Juventude. Caso a comunicação seja feita dolosamente à autoridade judiciária incompetente, haverá a prática desse delito. 6. Princípio da Especialidade - este tipo penal constitui especialidade em relação ao art. 4º, alínea c, da Lei de Abuso de Autoridade (Lei 4.898/65), que dispõe “constitui também abuso de autoridade: c) deixar de comunicar, imediatamente, ao juiz competente a prisão ou detenção de qualquer pessoa.” 105 ECA – Crimes em espécie 7. O delito consuma-se com a mera omissão do agente. Trata- se de crime omissivo próprio. 8. Classificação. Crime próprio; formal; doloso; omissivo próprio; de perigo abstrato; instantâneo; não admite tentativa por ser omissivo próprio. 106 ECA – Crimes em espécie Submissão de criança ou adolescente a vexame ou constrangimento - Art. 232. Submeter criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou vigilância a vexame ou a constrangimento: Pena – detenção de seis meses a dois anos. 1.Sujeito ativo. A pessoa que tenha a autoridade, a guarda ou a vigilância sobre a criança ou o adolescente. “O crime de submissão de criança ou adolescente que esteja sob a guarda, autoridade ou vigilância a vexame ou a constrangimento somente pode ser praticado pelo juiz, delegado de polícia, promotor de justiça e membro do Conselho Tutelar.” A assertiva está errada. 107 ECA – Crimes em espécie 2.Sujeito passivo. A criança ou o adolescente. 3.Submeter a vexame ou constrangimento: o professor ou o diretor da escola que, na frente de todos os demais colegas de classe, determina que determinada criança retire-se da sala de aula porque o seu responsável não efetuou o pagamento da mensalidade. 4.Princípio da Especialidade em relação ao art. 4º, alínea b, da Lei de Abuso de Autoridade (4.898/65), que dispõe “constitui também abuso de autoridade: b) submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a constrangimento não autorizado em lei.” 5.Classificação. Crime próprio; material; doloso; comissivo; de dano; instantâneo; admite tentativa. 108 ECA – Crimes em espécie 6. Inclui o dirigente de estabelecimento de ensino privado? Sim (Paulo Afonso). 7. Inclui a condução de adolescentes em camburão? Sim. 109 ECA – Crimes em espécie Omissão de liberação de apreensão ilegal - Art. 234. Deixar a autoridade competente, sem justa causa, de ordenar a imediata liberação de criança ou adolescente, tão logo tenha conhecimento da ilegalidade da apreensão: Pena – detenção de seis meses a dois anos. 1.Sujeito ativo - O Juiz da Infância e da Juventude e a autoridade policial. 2. Sujeito passivo - A criança ou o adolescente. 3. Sem justa causa - É a ausência de motivo previsto em lei. A autoridade policial ou judiciária deve verificar a legalidade e a formalidade da apreensão da criança ou do adolescente. Caso detecte alguma ilegalidade, deverá determinar a sua imediata liberação. 110 ECA – Crimes em espécie 4. Crime omissivo - Trata-se de crime omissivo, uma vez que autoridade policial ou Judiciária viola o seu dever de agir ao não determinar a imediata liberação do menor. 5. “Imediata liberação” - no exato momento em que a ilegalidade da apreensão é detectada, sem nenhuma delonga. 6. Classificação - Crime próprio; material; doloso; omissivo próprio; de dano; instantâneo; não admite tentativa por ser omissivo próprio. 7. O ECA prevê a modalidade culposa do crime de omissão na liberação de criança ou adolescente ilegalmente apreendido? Não, até porque trata-se de crime omissivo puro. 111 ECA – Crimes em espécie 8. Erro sobre a ilicitude do fato: pode incidir quando a autoridade pensa que se trata de apreensão legal (ex. juiz mantém a custódia do menor com base em informações fornecidas pelo Delegado de Polícia. Nesse caso, responde a autoridade policial pelo delito). 112 ECA – Crimes em espécie Descumprimento do prazo da custódia de adolescente infrator - Art. 235. Descumprir, injustificadamente, prazo fixado nesta Lei em benefício de adolescente privado de liberdade: Pena – detenção de seis meses a dois anos. 1. Sujeito ativo - A pessoa encarregada do cumprimento do prazo. Trata-se de crime próprio. 2. Sujeito passivo - O adolescente privado de sua liberdade. 3.“Prazo fixado nesta lei” (norma penal em branco): 1) “Art. 108: A internação, antes da sentença, pode ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias”; 2) Art. 121, §2º: “Art. 121. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em 113 ECA – Crimes em espécie desenvolvimento. § 2º A medida não comporta prazo determinado, devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada seis meses”; 3) Art. 175: “Em caso de não liberação, a autoridade policial encaminhará, desde logo, o adolescente ao representante do Ministério Público, juntamente com cópia do auto de apreensão ou boletim de ocorrência. § 1º Sendo impossível a apresentação imediata, a autoridade policial encaminhará o adolescente à entidade de atendimento, que fará a apresentação ao representante do Ministério Público no prazo de vinte e quatro horas.” 114 ECA – Crimes em espécie 4. “Injustificadamente” – excludente de tipicidade (ex. adolescente infrator internado provisoriamente em repartição separada na Cadeia Pública da Comarca de Ilha Solteira, distante 600 km da unidade de internação, sendo impossível o cumprimento do prazo de cinco dias). 5.Crime omissivo - Trata-se de crime omissivo, uma vez que o agente omite-se ao descumprir um prazo a que estava obrigado e observar, violando, com isso, o seu dever de agir. 6. Classificação - Crime próprio; formal; doloso; omissivo próprio; de perigo abstrato; instantâneo; não admite tentativa por ser omissivo próprio. 115 ECA – Crimes em espécie Embaraçamento de atuação de juiz, membro do Ministério Público ou de membro de Conselho Tutelar - Art. 236. Impedir ou embaraçar a ação de autoridade judiciária, membro do Conselho Tutelar ou representante do Ministério Público no exercício de função prevista nesta Lei: Pena – detenção de seis meses a dois anos. 1. Sujeito ativo. Qualquer pessoa. Trata-se de crime comum. 2. Sujeito passivo. O Estado. 3. Impedir ou embaraçar: trata-se da conduta do agente que quer obstaculizar a ação da autoridade judiciária, membro do Conselho Tutelar ou representante do Ministério Público (ex. unidade de internação que