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Livro Didático Digital Direito de Família Diretor Executivo DAVID LIRA STEPHEN BARROS Gerente Editorial CRISTIANE SILVEIRA CESAR DE OLIVEIRA Projeto Gráfico TIAGO DA ROCHA Autoria RODRIGO GONÇALVES AUTORIA Rodrigo Gonçalves Rodrigo Gonçalves Sou formado em Direito desde 2012, com experiência técnico-profissional na área de Direito Civil, principalmente na área de Direito de Família. Passei por alguns escritórios privados, porém, atualmente possuo meu próprio escritório, litigando em favor dos que me procuram. Sou apaixonado pelo que faço e adoro transmitir minha experiência de vida àqueles que estão iniciando em suas profissões. Por isso, fui convidado pela Editora Telesapiens a integrar seu elenco de autores independentes. Estou muito feliz em poder ajudar você nesta fase de muito estudo e trabalho. Conte comigo! ICONOGRÁFICOS Olá. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de aprendizagem toda vez que: OBJETIVO: para o início do desenvolvimento de uma nova compe- tência; DEFINIÇÃO: houver necessidade de se apresentar um novo conceito; NOTA: quando forem necessários obser- vações ou comple- mentações para o seu conhecimento; IMPORTANTE: as observações escritas tiveram que ser priorizadas para você; EXPLICANDO MELHOR: algo precisa ser melhor explicado ou detalhado; VOCÊ SABIA? curiosidades e indagações lúdicas sobre o tema em estudo, se forem necessárias; SAIBA MAIS: textos, referências bibliográficas e links para aprofundamen- to do seu conheci- mento; REFLITA: se houver a neces- sidade de chamar a atenção sobre algo a ser refletido ou dis- cutido sobre; ACESSE: se for preciso aces- sar um ou mais sites para fazer download, assistir vídeos, ler textos, ouvir podcast; RESUMINDO: quando for preciso se fazer um resumo acumulativo das últi- mas abordagens; ATIVIDADES: quando alguma atividade de au- toaprendizagem for aplicada; TESTANDO: quando o desen- volvimento de uma competência for concluído e questões forem explicadas; SUMÁRIO Celebração Como Prova do Casamento ............................................ 10 As Provas do Casamento ..........................................................................20 A Eficácia do Casamento ..........................................................................30 Efeitos Sociais ................................................................................................................................... 30 Efeitos Pessoais ................................................................................................................................32 Efeitos Patrimoniais ........................................................................................................................37 Invalidade Jurídica do Casamento ......................................................39 Nubente que não Completou a Idade Mínima para Casar ............................... 41 Nubente em Idade Núbil sem Autorização para o Casamento .................... 41 O Casamento Poderá ser Anulável Também nos Casos em que o Nubente Esteja Incapaz de Consentir ou de Manifestar o seu ConSentimento .. 50 Quando Realizado pelo Mandatário, sem que ele ou o outro Contraente Soubesse da Revogação do Mandato, e não Sobrevindo Coabitação entre os Cônjuges ........................................................................................................................ 50 Incompetência da Autoridade Celebrante .................................................................. 51 7 UNIDADE 03 Direito de Família 8 INTRODUÇÃO Nesta unidade, iremos visitar alguns assuntos já vistos, porém, agora que você, aluno, está um pouco mais maduro no direito de família, usaremos esses conceitos vistos para trazer novos, que irão preparar você para o desfecho de nossa disciplina. O tema de nossa unidade continuará sendo casamento, porém, aqui, veremos assuntos que estão mais intrínsecos à vida do casal ou da família. São assuntos que nos preparam para observar o casamento depois de sua celebração. A partir daqui, o operador do direito ganha mais amplitude para sua atuação, e cada vez mais vamos nos distanciando da parte administrativa do casamento, e ingressando mais e mais nas relações jurídicas e sociais do matrimônio. Entendeu? Ao longo desta unidade letiva, você vai mergulhar neste universo! Direito de Família 9 OBJETIVOS Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 03. Nosso objetivo é auxiliar você no desenvolvimento das seguintes competências jurídicas até o término desta etapa de estudos: 1. Identificar a celebração do casamento compreendendo-a como prova do casamento. 2. Distinguir os tipos de prova do casamento. 3. Avaliar questões sobre a eficácia do casamento. 4. Discernir sobre questões acerca da invalidade jurídica do casamento. Com essas novas competências, você ficará pronto para chegar ao final de nossa disciplina. E então, preparado para uma viagem sem volta rumo ao conhecimento? Ao trabalho! Direito de Família 10 Celebração Como Prova do Casamento OBJETIVO: Ao término deste capítulo, você será capaz de entender qual o real objetivo da celebração do casamento, bem como a necessidade de seus formalismos. Isso será fundamental para o exercício de sua profissão. As pessoas que tentaram ingressar no mercado de trabalho sem a devida instrução aqui cedida tiveram problemas em compreender todo o conjunto legal acerca do matrimônio civil. E então, motivado para desenvolver esta competência? Vamos lá. Avante!. Como temos dito por algumas vezes, em nossa matéria encontramos muitos elos que se conectam de tal forma, que é quase impossível falar de uma matéria sem tratar de outras. Costumamos falar, quando somos chamados a dar palestras ou ministrar aulas, que o direito de família muitas vezes parece um trem, em que a máquina puxa os vagões a ele conectados. Portanto, assim é a matéria sobre o casamento, seus atos estão conectados de ponta a ponta. Historicamente, sabemos que a celebração do casamento é um dos pontos altos de nossos estudos. Talvez pelo fato deste momento estar incrustado em nossos ideários, posto ser neste instante que o casamento se materializa de fato, ou quiçá por entendermos que um dia devemos nos unir com alguém. Muito embora saibamos que tenham pessoas que se opunham ao casamento, ou a união entre duas pessoas em prol de uma constituição familiar, também sabemos que muitos buscam a constituição familiar a partir das uniões matrimoniais. Com a evolução do Estado, as celebrações das uniões, que eram feitas com informalidade, ou com apenas o crivo religioso, passaram a ganhar formalização para que viessem a ter sua eficácia estatal devida. Para preencher tal eficácia, a celebração passou a exigir um rito próprio, tornando-se complexa, porém, embasada nos costumes, na religião prevalecente e no Direito. Direito de Família 11 Nesse sentido, o famoso civilista Beviláqua (1959) preleciona: A ficção da captura, quando ela já não mais uma realidade, é, sem dúvida, o mais antigo cerimonial dos casamentos. Os chineses, os romanos, os gregos e vários outros povos usaram-na, como é geralmente sabido. Depois vão aparecendo outras ideias mais complexas, simbolismos religiosos de purificação, indicações de natureza e fins de casamento. Entre essas cerimônias, é notável, por sua generalização, o banquete em comum, ou um simples bolo que os esposos têm de comer conjuntamente. Não foram somente os romanos e os helenos que usaram dele na celebração do casamento; muitos outros povos procediam do mesmo modo, como sejam os macedônios entre os antigos, e os iroqueses, em tempos recentes. Na Índia, a noiva prepara uma bebida especial para o seu casamento. Na ocasião da solenidade nupcial, senta-se ao colo do noivo, empunha uma taça, em que derramou porção do licor preparado por ela, bebe a metade e entrega o restante ao noivo, que, avidamente, o sorvepor vício de vontade, nos termos do art. 1.550, III do CC/02, em casos de coação e erro essencial quanto à pessoa do cônjuge (arts. 1.556 e 1.557 do CC/02). Pretende o autor imputar conduta desonrosa alegando que a ré sempre manteve relações com outros homens, desde a época do namoro bem como após as núpcias e, após o casamento, estaria envolvendo-se com outra pessoa que inclusive frequentava a casa do autor e era seu amigo. Com a evolução da sociedade, caracterizações como honra e boa fama devem ser interpretadas cum grano salis evitando-se, assim, práticas discriminatórias e atentatórias à dignidade da pessoa humana, em evidente contrariedade ao ordenamento jurídico. Não há motivo para anulação de casamento, mas sim para eventual pedido de separação judicial, nos termos da legislação em vigor. Desprovimento do Recurso (TJRJ — Ap 2007.001.49973 — 9.ª Câm. Cív. — Des. Roberto de Abreu e Silva — Julgamento em 18-12- 2007). Direito de Família 47 Ao nosso ver, agiu corretamente o tribunal, pois vejamos: um dos elementos essenciais do erro sobre a pessoa é exatamente o desconhecimento dos fatos anteriores ao casamento, e que, em um dado momento, posterior à celebração, foram descobertos. Além disso, deve se comprovar a omissão dolosa de quem deu causa. Pela dicção da ementa em tela, podemos entender que o marido conhecia as condutas extraconjugais de sua consorte desde antes do casamento. Desse modo, ação cabível aqui seria a separação judicial. Em outro plano, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em extrema observância do que dissemos acima, assim proferiu: APELAÇÃO. ANULAÇÃO DE CASAMENTO. ERRO ESSENCIAL EM RELAÇÃO À PESSOA DO CÔNJUGE. OCORRÊNCIA. A existência de relacionamento sexual entre cônjuges é normal no casamento. É o esperado, o previsível. O sexo dentro do casamento faz parte dos usos e costumes tradicionais em nossa sociedade. Quem casa tem uma lícita, legítima e justa expectativa de que, após o casamento, manterá conjunção carnal com o cônjuge. Quando o outro cônjuge não tem e nunca teve intenção de manter conjunção carnal após o casamento, mas não informa e nem exterioriza essa intenção antes da celebração do matrimônio, ocorre uma desarrazoada frustração de uma legítima expectativa. O fato de que o cônjuge desconhecia completamente que, após o casamento, não obteria do outro cônjuge anuência para realização de conjunção carnal demonstra a ocorrência de erro essencial. E isso autoriza a anulação do casamento. DERAM PROVIMENTO. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (TJRS, AC n. 70016807315, 8.ª Câm. Cív. rel. Rui Portanova, julgado em 23-11-2006). Direito de Família 48 Como se vê, tudo irá depender de cada caso. VOCÊ SABIA? Algumas situações, com o tempo, foram deixando de ser encaradas como erro sobre a pessoa. Uma delas era relacionada a das pessoas acometidas com esquizofrenia manifestada após o casamento, e que de alguma forma tornasse insuportável a vida conjugal. No caso dessa hipótese em específico, destacamos que, com o advento do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146, de 6 de julho de 2015), essa possibilidade atualmente inexiste. Da mesma forma, pereceu com o tempo a regra no CC de 1916 (art. 219, IV). Em seu texto, era permitido ao marido requerer a anulação do casamento pela descoberta do defloramento (perda da virgindade) da sua esposa antes do ato. Prosseguindo sobre as questões que geram a anulação do casamento devido a algum vício de vontade, dispõe o art. 1.558, CC/2002: Art. 1.558. É anulável o casamento em virtude de coação, quando o consentimento de um ou de ambos os cônjuges houver sido captado mediante fundado temor de mal considerável e iminente para a vida, a saúde e a honra, sua ou de seus familiares. (BRASIL, 2002) DEFINIÇÃO: A doutrina tem entendido coação como sendo a ação que é capaz de viciar o consentimento mediante violência psicológica, que opera de tal forma, que influencia a vítima a realizar um ato contra sua vontade. Direito de Família 49 Ela, a coação, pode ser manifestada de duas formas, a física ou a moral. Nas palavras de Gagliano, assim são explicadas: A coação física (vis absoluta) é aquela que age diretamente sobre o corpo da vítima. A doutrina entende que esse tipo de coação neutraliza completamente a manifestação de vontade, tornando o negócio jurídico inexistente. [...] A coação moral (vis compulsiva), por sua vez, é aquela que incute na vítima um temor constante e capaz de perturbar seu espírito, fazendo com que ela manifeste seu consentimento de maneira viciada. (GAGLIANO, 2019, p. 283) Para entender melhor, vamos usar dois exemplos: • Coação física — Beto, nos altos de seus 18 anos completos, engravida sua namorada, Mona, de 16 anos. O pai da moça, extremamente enfurecido, agride fisicamente o jovem rapaz diariamente até forçá-lo a casar-se. Essa situação perdura até o dia do casamento. Aqui, como se vê, Beto não se casou de livre e espontânea vontade, e sim por causa das várias agressões sofridas. • Coação moral —Beto, é filho de Bruno, que é gerente de vendas de uma loja de automóveis cujo dono é o Sr. Francisco. Beto inicia um relacionamento com Mona, filha do Sr. Francisco, com 16 anos. Beto engravida Mona. Ao saber disso, o Sr. Francisco ameaça Beto, dizendo que, além de demitir seu pai da loja, irá matá-lo caso este não case com sua filha. Ambos os casos estão enquadrados no CC sob a seguinte redação Art. 151. A coação, para viciar a declaração de vontade, há de ser tal, que incuta ao paciente fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família ou aos seus bens. (BRASIL, 2002) Direito de Família 50 O Casamento Poderá ser Anulável Também nos Casos em que o Nubente Esteja Incapaz de Consentir ou de Manifestar o seu ConSentimento Esta ocasião ocorre quando a pessoa está sob efeito de álcool ou entorpecentes a tal ponto que não pode transferir certeza a autoridade competente se é inteiramente a favor dos termos do casamento ou não. Quando Realizado pelo Mandatário, sem que ele ou o outro Contraente Soubesse da Revogação do Mandato, e não Sobrevindo Coabitação entre os Cônjuges Na unidade anterior, estudamos um tipo de modalidade de casamento celebrada através de procuração. Pois bem, nos termos do art. 1.550, V, do CC, existe a previsão de anulação do casamento por procuração, caso o mandato público tenha sido revogado sem o conhecimento do então procurador ou do outro cônjuge, não sobrevindo coabitação entre os consortes. Para entender esta situação, vamos fazer valer os conhecimentos adquiridos nas unidades passadas. Otávio irá casar-se com Bruna, todavia, este está no exterior e não conseguirá chegar a tempo do seu casamento civil. Para não perder o casamento já aprazado, ele passa uma procuração pública especial para seu amigo, João. Ocorre que Otávio conhece em sua viagem Judy, e desiste de casar-se, revogando a procuração sem que João e aquela que seria sua esposa soubessem. Chega então o dia, João e Bruna comparecem ao ato, casam-se perante a autoridade competente. Porém, como Otávio não tem mais anseio pelo casamento, ele não irá mais residir (coabitar) com Bruna. Nesses casos, Bruna ou Otávio poderão pedir a anulação do feito. Direito de Família 51 Incompetência da Autoridade Celebrante Incompetência da autoridade celebrante também é causa de anulação do casamento. Aqui não há muito o que se falar, uma vez que em momentos anteriores já tratamos de temas correlatos. Em um plano geral do direito, podemos afirmar que se um ato não foi presidido pela autoridade competente, este portanto, nunca existiu. Mas o aluno pode perguntar: e se o ato ocorreu por alguém delegado pela autoridade competente? Nesses casos, o ato mesmo assim manterá sua validade. Aqui, caro aluno, a previsão legal está para nos casos em que uma pessoa que se faça passar pelaautoridade competente, presida o ato, então aqui será cabível a anulação. Embora saibamos que nos dias de hoje isso seja quase impossível, o CC não descartou a hipótese. IMPORTANTE: Sobre os prazos para requerimento de anulação, no CC de 2002, os prazos prescricionais encontram-se prelecionados nos arts. 205 e 206, de maneira que todos os outros são decadenciais, ou seja, após exauridos os prazos, haverá a perda do direito potestativo. Nos casos em que a pessoa esteve incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco o consentimento, o prazo será de 180 dias contados a partir do casamento. Será de dois anos o prazo decadencial, se constatada incompetente a autoridade celebrante. O prazo será de três anos para os casos relativos a erro sobre a pessoa, e de quatro anos se caso houve coação. O art. 1.560, § 1º do mesmo Código, afirma que extingue-se, em 180 dias, o direito de anular o casamento dos menores de 16 anos, contado o prazo para o menor do dia em que perfez essa idade; e da data do casamento, para seus representantes legais ou ascendentes. Direito de Família 52 Na hipótese do casamento realizado pelo mandatário sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges, o prazo para anulação do casamento é de 180, a partir da data em que o mandante tiver conhecimento da celebração (art. 1.560, § 2º). A anulação do casamento dos menores de 16 anos poderá ser requerida pelo próprio cônjuge menor; ou por seus representantes legais; por seus ascendentes (art. 1.552). Vale a ressalva de que somente o cônjuge que incidiu em erro, ou sofreu coação, poderá demandar a anulação do casamento. Curioso é saber que nos casos de mandato revogado, sob a previsão do art. 1.557 do CC/2002, caso haja a coabitação, e havendo ciência do vício, o ato será entendido como válido (art. 1.559 do CC/2002). Sobre esse aspecto, Gagliano (2019) pontua: A coabitação, portanto, atua como fator validante do matrimônio anulável por erro essencial, salvo na hipótese de o erro decorrer da ignorância de moléstia perigosa e transmissível, de defeito físico irremediável que não caracterize deficiência ou de doença mental grave, anteriores ao casamento, já estudados neste capítulo. (GAGLIANO, 2019, p. 290) RESUMINDO: O CC coloca regras que podem gerar a anulação do casamento civil. Embora essas situações possam parecer atípicas, aqui ou acolá podem acontecer. Direito de Família 53 REFERÊNCIAS BARBOSA, C.L.C. Casamento. Rio de Janeiro: Forense, 2006. BEVILÁQUA, C. Direito de Família. Rio de Janeiro/São Paulo: Livraria Freitas Bastos S.A., 1959. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AR 3.022/SP. Relator. Min. Gilson Dipp, julgado em 28-6-2006, DJ 21-8-2006, p. 227, 3.ª Seção. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/. Acesso em 07 de junho de 2002. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Apelação: 994093013170 SP, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento: 11/03/2010, 4ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/03/2010. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/. Acesso em 07 de junho de 2002. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Apelação: 00025393620188160179 PR 0002539-36.2018.8.16.0179 Relator: Desembargador Ruy Muggiati, Data de Julgamento: 07/02/2019, 11ª Câmara Cível, Data de Publicação: 10/02/2019). Disponível em: https:// www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/. Acesso em 07 de junho de 2002. BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. AC n. 70015469091, 7.ª Câm. Cív. Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 13-9-2006). (Segredo de justiça) BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro.AC: 70079438321 RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Data de Julgamento: 20/03/2019, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 21/03/2019). Disponível em: https://www.jusbrasil. com.br/jurisprudencia/. Acesso em 07 de junho de 2002. DIAS, M.B. Manual de Direito das Famílias. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. Direito de Família 54 FERRARESI, E. Código das Famílias Comentado: de acordo com o Estatuto das Famílias (PLN n. 2.285/07). Belo Horizonte: Del Rey, 2009. GAGLIANO, P.S.; PAMPLONA FILHO, R. Novo curso de direito civil. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. GONÇALVES, C.R. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 2017. GONÇALVES, C.R. Direito civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2017. MADALENO, R. Curso de Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 2016. MONTEIRO, W.B. Curso de Direito Civil. V.II: Direito de Família. São Paulo: Saraiva, 1999. PEREIRA, C.M.S. Instituições de Direito Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001. RODRIGUES, S. Direito Civil. Direito de Família. V. 6. 28 Ed. São Paulo: Saraiva, 2004. SILVA, R.B.T. da. Novo Código Civil: tutela da dignidade da pessoa humana no casamento. Revista do Advogado, São Paulo, a. 22, n. 68, p. 120-126, dez. 2002. VENOSA, S.S. Direito Civil: Parte Geral. São Paulo: Atlas, 2001. Direito de Família Celebração Como Prova do Casamento As Provas do Casamento A Eficácia do Casamento Efeitos Sociais Efeitos Pessoais Efeitos Patrimoniais Invalidade Jurídica do Casamento Nubente que não Completou a Idade Mínima para Casar Nubente em Idade Núbil sem Autorização para o Casamento O Casamento Poderá ser Anulável Também nos Casos em que o Nubente Esteja Incapaz de Consentir ou de Manifestar o seu ConSentimento Quando Realizado pelo Mandatário, sem que ele ou o outro Contraente Soubesse da Revogação do Mandato, e não Sobrevindo Coabitação entre os Cônjuges Incompetência da Autoridade Celebranteaté a última gota. É simples, mas é expressivo. (BEVILÁQUA 1959, p. 45-6) IMPORTANTE: Portanto, na sociedade contemporânea, em termos de direito de família, o ritualismo acolchoa-se em uma enorme importância, dada a impreterível solenidade para a realização do matrimônio. Claro, meu caro aluno, se você chegou até aqui, já sabe que o termo solenidade, para o Direito Civil, não quer dizer que haja um evento festivo, e sim um ato contratual com protocolos legais rígidos. Neste arcabouço, o casamento é, no Direito Civil pátrio, o ato mais solene. Desde as sociedades mais primitivas, o casamento já era uma solenidade, um dia bastante esperado, em que os nubentes juram promessas de amor eterno, com a finalidade de constituir uma família, remetendo-lhe, portanto, forte zelo, em um arcabouço de solidariedade e respeito, perante amigos, conhecidos e familiares. Direito de Família 12 Além disso, o casamento é um ato contratual que requer estrita observância das leis estatais, sob pena, nulidade, a depender da situação. Já sabemos que casamento será celebrado no dia, hora e lugar previamente designados pela autoridade que houver de presidir o ato, mediante petição dos contraentes, que se mostrem habilitados com a certidão de habilitação, expedida pelo Cartório de Registro Civil responsável pela publicação dos proclamas (art. 1.533, CC/2002), devendo ser presidida de “portas abertas” (art. 1.534, CC/2002). Esse rigor pelas portas abertas encontra repouso em raízes constitucionais e, por isso, carece de nossa atenção, pois essa obrigatoriedade não está prevista de forma aleatória. Ela remonta a uma historicidade primitiva, pois a união de um casal era motivo de orgulho para uma comunidade, logo, não deveria ser maculado, e, caso assim o fosse, aquele que tivesse alguma causa impeditiva deveria mostrar somente no ato do casamento, pois ali teria testemunhas suficientes para demonstrar seu pleito impeditivo. Ao transferirmos poderes aos estados modernos, estes, por sua vez, tiveram que entregar transparência em seus atos. Tais atos são refletidos nos cinco princípios de uma administração pública, que inclusive estão em nossa constituição. São eles: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Tais princípios estão de alguma forma incrustados no direito de família, no entanto, para fins deste capítulo, nos deteremos apenas nos princípios da moralidade e da publicidade. Um casamento estatal precisa manter em todos os seus procedimentos lisura, boa-fé, sinceridade e ética, e, para tal, todos aqueles atuantes na celebração matrimonial, quais sejam, os nubentes, o oficial de registro e a autoridade competente devem estar em conformidade plena dentro de suas atribuições, caso contrário, todos os atos podem ser eivados de vícios, inclusive insanáveis. É por isso que, por exemplo, os nubentes não podem estar impedidos para o ato, conforme já estudamos. Direito de Família 13 Portanto, para atender melhor à necessidade de moralidade nos processos administrativos, surge então a obrigatoriedade por publicidade dos atos públicos. Desde o início até o fim das formalidades do casamento, existe uma necessidade inerente de que sejam atos públicos, daí a importância das celebrações serem de portas abertas, para que, caso alguém queira opor alguma causa impeditiva, por exemplo, o Estado tome conhecimento e interrompa aquele processo até que o eventual vício seja sanado. Agora acredito que o artigo art. 1.522 do CC tenha ficado claro, não é verdade? Pois relembre sua redação: Art. 1.522. Os impedimentos podem ser opostos, até o momento da celebração do casamento, por qualquer pessoa capaz. Parágrafo único. Se o juiz, ou o oficial de registro, tiver conhecimento da existência de algum impedimento, será obrigado a declará-lo. (BRASIL, 2002) Portanto, sempre quando tenho a oportunidade de esclarecer, preconizo que os nubentes podem vetar a entrada de pessoas na eventual festa de casamento, porém, nunca na celebração deste propriamente dita, podendo o ato ter sua devida nulidade, conforme prevê o CC, in verbis: Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando: [...] V — for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade. (BRASIL, 2002) Caso a oposição sobre alguma causa impeditiva tenha sido apenas como uma forma de interromper indevidamente a cerimônia, aquele que deu causa poderá ser responsabilizado civilmente pelo ato, ou, dependendo da circunstância, até criminalmente, se por exemplo, houver uma falsa acusação de bigamia (art. 235 do Código Penal Brasileiro), ao que deu causa indevida pela imputação poderá ser perpetrada uma imputação do crime de calúnia. Direito de Família 14 Algumas pessoas chegam até nós, muitas vezes por ignorância, querendo entender o porquê de tantas formalidades, eis portanto, que respondo expondo os argumentos acima. Essa formalidade do casamento visa coibir atos que atentem contra a moral pública e privada dos nubentes. A importância de tais formalidades é tamanha, que para complementar nossas falas, trago as palavras de COLANI (2006), que nos coloca preciosa dicção: Questiona-se o porquê de tal minúcia do legislador; contudo, queremos crer tratar-se de uma oportunidade de dimensionar o ato, valorando-o para o casal e pessoas presentes, além de consistir em uma fórmula de uniformizar o ato. (COLANI, 2006, p. 96) Algumas vezes somos perguntados sobre alguns vícios de consentimento que podem existir no transcorrer da cerimônia, e por acreditar que o momento pertinente para tratar sobre isso seja neste capítulo, precisamos tecer alguns comentários. Notemos que, em uma situação normal recebendo-se um ao outro como consortes, os nubentes contraem as obrigações legais perante o Estado e perante os ali presentes; desse modo, não é cabível de forma alguma vício de vontade. A declaração diante do juiz deve ser audível, não cabendo acenos de mão ou cabeça, por exemplo. Nesse diapasão, já sabemos os termos do CC: Art. 1.538. A celebração do casamento será imediatamente suspensa se algum dos contraentes: I — recusar a solene afirmação da sua vontade; II — declarar que esta não é livre e espontânea; III — manifestar-se arrependido. Parágrafo único. O nubente que, por algum dos fatos mencionados neste artigo, der causa à suspensão do ato, não será admitido a retratar-se no mesmo dia. (BRASIL, 2002) Direito de Família 15 VOCÊ SABIA? Todavia, não tratamos do caso de um dos nubentes não dizer nada. E se na hora de responder se quer ou não casar, um dos nubentes ficar em silêncio? Esta é uma questão jurídica interessante, porém, a doutrina e a jurisprudência têm declinado no sentido de que, uma vez que “o matrimônio exige declaração expressa de vontade, o silêncio não traduz aquiescência, impondo a suspensão do ato e, se for o caso, a sua ulterior repetição” (GAGLIANO, 2019, p. 209). Caso não haja nenhum vício ou alguma oposição de causas impeditivas, por exemplo, dispõe o art. 1.536 do CC/2002, lavrar-se-á o assento no livro de registro. No assento, assinado pelo presidente do ato, pelos cônjuges, pelas testemunhas pelo e Oficial do Registro, serão exarados: I — os prenomes, sobrenomes, datas de nascimento, profissão, domicílio e residência atual dos cônjuges; II — os prenomes, sobrenomes, datas de nascimento ou de morte, domicílio e residência atual dos pais; III — o prenome e sobrenome do cônjuge precedente e a data da dissolução do casamento anterior; IV — a data da publicação dos proclamas e da celebração do casamento; V — a relação dos documentos apresentados ao oficial do registro; VI — o prenome, sobrenome, profissão, domicílio e residência atual das testemunhas; VII — o regime do casamento, com a declaração da data e do cartório em cujas notas foi lavrada a escritura antenupcial, quando o regime não for o da comunhão parcial,ou o obrigatoriamente estabelecido. (BRASIL, 2002) Direito de Família 16 Interessante é vermos na nossa atividade jurídica que, mesmo que não tenhamos faltas graves, como os impedimentos já estudados, aqui ou acolá vemos situações inusitadas, como a do julgado a seguir. REGISTROS PÚBLICOS. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO MANDAMENTAL. RETIFICAÇÃO DE REGISTROS PÚBLICOS – PRETENSÃO DE SUPRESSÃO DE PATRONÍMICO FAMILIAR EM RAZÃO DE CASAMENTO – NEGATIVA DO OFICIAL DE REGISTRO CIVIL NO MOMENTO DA HABILITAÇÃO – INSURGÊNCIA EXCLUSIVAMENTE QUANTO A ASPECTO FORMAL – COMPETÊNCIA MATERIAL – JUÍZO DA VARA DE REGISTROS PÚBLICOS RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.(ART. 67, § 5º, LEI Nº 6.015/73). (TJPR - 11ª C. Cível - 0002539-36.2018.8.16.0179 - Curitiba - Rel.: Desembargador Ruy Muggiati - J. 07.02.2019) (TJ-PR - APL: 00025393620188160179 PR 0002539- 36.2018.8.16.0179 (Acórdão), Relator: Desembargador Ruy Muggiati, Data de Julgamento: 07/02/2019, 11ª Câmara Cível, Data de Publicação: 10/02/2019) No julgado em tela, a nubente gostaria de ter o patronímico (sobrenome) de seu futuro marido, porém, por motivos alheios, o oficial de registro negou esse direito na ocasião da habilitação. O casal adentrou com o processo buscando a alteração do registro civil, na Vara de Família daquela comarca, mas o juiz não reconheceu o mérito e se averbou incompetente, posto em verdade o juízo competente ser o Juízo da Vara de Registros Públicos, motivo pelo qual o recurso de apelação não foi provido. O que queremos dizer é que acidentes no procedimento do casamento, embora sejam desconhecidos pelo grande público, você, aluno, futuro operador do direito, irá, inevitavelmente, se deparar com algum. Algumas questões sobre o tema também surgem, e acredito que tenhamos que precisam ser esclarecidas. A primeira é que, embora seja hoje mero tradicionalismo, o nubente do sexo masculino poderá ter para si o nome de sua consorte sem nenhum problema, pois ressalta-se: Direito de Família 17 Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família. § 1. º Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro. (BRASIL, 2002) Inclusive, a ordem pode ser alterada, podendo o homem ter o sobrenome da esposa ao final sem problema algum. GANGLIANO (2009), a propósito, pontua que: Em uma sociedade que se propõe a ser mais justa e igualitária, não há mais espaço para discriminações odiosas, calcadas em um machismo jurássico e anacrônico, violador do princípio maior da dignidade da pessoa humana. (GANGLIANO, 2009, p. 210) Por fim, devemos lembrar que o casamento religioso deve se adequar às normas do casamento civil, conforme art. 74 da Lei de Registros Públicos, que admite a habilitação posterior ao casamento religioso em caráter excepcional, vejamos: Art. 74. O casamento religioso, celebrado sem a prévia habilitação, perante o oficial de registro público, poderá ser registrado desde que apresentados pelos nubentes, com o requerimento de registro, a prova do ato religioso e os documentos exigidos pelo Código Civil, suprindo eles eventual falta de requisitos nos termos da celebração. [Renumerado do art. 75, pela Lei n. 6.216, de 1975.] Parágrafo único. Processada a habilitação com a publicação dos editais e certificada a inexistência de impedimentos, o oficial fará o registro do casamento religioso, de acordo com a prova do ato e os dados constantes do processo, observado o disposto no artigo 70. (BRASIL, 1973) Vale destacar ainda que nem a lei e nem a jurisprudência relaxam sobre essa regra, pois leia atentamente este recente julgado, em seguida faremos as devidas considerações. REGISTRO CIVIL. SUPRIMENTO JUDICIAL. REGISTRO CIVIL DE NASCIMENTO NÃO LOCALIZADO. CABIMENTO. CASAMENTO CIVIL. CASAMENTO RELIGIOSO REALIZADO EM 1895. IMPOSSIBILIDADE DO SUPRIMENTO JUDICIAL. PEDIDOS QUE OBJETIVAM A OBTENÇÃO DE CIDADANIA Direito de Família 18 ITALIANA. 1. Diante da existência da certidão de casamento realizado no Registro Civil, cabível o deferimento do suprimento judicial do registro civil de nascimento do avô do recorrente. 2. Segundo o disposto no art. 226, § 2º, da Constituição Federal e no art. 1.515 do Código Civil, é atribuído ao casamento religioso o efeito civil, desde que atendidas as exigências da lei para validade do casamento civil. 3. Considerando que o casamento civil no Brasil foi instituído através do Decreto nº 181, de 1890, vedando qualquer outra forma de casamento, não há como reconhecer a possibilidade de suprimento do registro civil de casamento dos bisavós do recorrente, que foi realizado na forma religiosa em 1895. Recurso provido em parte. (Apelação Cível Nº 70079438321, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 20/03/2019). (TJ-RS - AC: 70079438321 RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Data de Julgamento: 20/03/2019, Sétima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 21/03/2019) A matéria de que trata o presente julgado é complexa e, além do direito de família, teremos que buscar conceitos de Direito Constitucional, Direito Internacional Privado e de outras leis que já estudamos em outras oportunidades. Primeiro, devemos entender que no Direito Civil italiano, a nacionalidade é conferida por consanguinidade, já que, na linha de transmissão de sangue, a mulher italiana somente transmite a cidadania aos filhos nascidos após 1º de janeiro de 1948. Ou seja, se uma mulher italiana der à luz a um bebê em solo brasileiro, este, por sua vez, terá nacionalidade italiana. Isso é o suficiente de Direito Internacional Privado de que precisaremos. O apelante, que chamaremos de AJD, é filho da italiana CMC, porém, esta não o registrou civilmente como seu filho. O documento que atesta que ela tem raízes no Brasil é o do casamento religioso, ocorrido em 29 de maio de 1895. O único documento que comprovaria a filiação de AJD é o registro do casamento civil, realizado em 28 de abril 1923, quando AJD casou-se no civil com BDF. Direito de Família 19 Nesta ação, AJD buscou fazer seu registro de nascimento tardio através de suprimento judicial. Como as provas colaboraram para que sua filiação seja reconhecida, a justiça entendeu que não haveria problema nenhum, concedendo a oportunidade de registro. Até aqui tudo bem, porém, essa ação tinha um pedido extra. Que nos coloca maior complexidade. Essa ação foi movida pelo intuito de VRD, filha de AJD, conseguir a nacionalidade italiana, uma vez que é descendente direta de italiana, e em Roma judicialmente haver esta possibilidade. Porém, a autoridade italiana requeria que a união conferida por CMC e seu companheiro deveria ter a chancela do estado brasileiro, ou seja, que o casamento religioso fosse reconhecido pelo estado brasileiro como legítimo. Então só haveria cabimento no pedido de VRD se houvesse um suprimento do processo de habilitação do casamento da mãe de AJD para que este, através de sentença judicial, tenha sua validade. Nesse ponto em específico, o julgado em comento não deferiu o pedido posto desde o Decreto nº 181, de 24 de janeiro de 1890, que prevê que o casamento religioso deveria ter chancela estatal, por meio de processo de habilitação, e como o casamento religioso em questão ocorreu em 1895, não se sabe ao certo se atendeu às exigências da lei tal como disposto no CC, não há como deferir o suprimento judicial para reconhecer o casamento religioso perante o registro civil. Resta, portanto, o pedido prejudicado. RESUMINDO: A celebração do casamento é um ato antigo, mas ao transferirmos poderes ao estado moderno democrático de direito, o casamento passou a ter demasiadas formalidades, com o fim de coibir atos públicos irregulares, principalmente movidospor condutas tidas como imorais. Direito de Família 20 As Provas do Casamento OBJETIVO: Ao término deste capítulo, você será capaz de entender que provas identificam um casamento. Isso será fundamental para o exercício de sua profissão. As pessoas que tentaram ingressar no mercado de trabalho sem a devida instrução aqui cedida, distinguir o casamento civil de outras uniões, bem como sendo operador do direito, de auxiliar seus constituintes ou jurisdicionados no melhor deslinde de seus litígios. E então, motivado para desenvolver esta competência? Vamos lá. Avante! Neste capítulo, trataremos sobre os meios de provas existentes em nosso ordenamento jurídico com efeito de prova do casamento. Aqui é onde o operador do direito ganha suas principais ferramentas de trabalho, com a finalidade de um melhor deslinde das lides, considerando-se a ocorrência de inúmeras situações processuais com que você, aluno, na sua atividade profissional, poderá se deparar. A primeira coisa, e mais óbvia de todas, é que a certidão de casamento é meio prioritário de prova, isso é constatado na dicção do CC. Vejamos: Art. 1.543. O casamento celebrado no Brasil prova-se pela certidão do registro. Parágrafo único. Justificada a falta ou perda do registro civil, é admissível qualquer outra espécie de prova. (BRASIL, 2002) Perceba pelo enredo do próprio artigo que a prioridade da certidão se sobrepõe a outra prova, que só será admitida com sua justificativa plausível para a sua ausência. Isso coloca a certidão de casamento em uma posição soberana sobre as outras provas. Isso, inclusive, demonstrando que, entre os meios de prova, a certidão é a prova formal diante de todas as outras. Direito de Família 21 NOTA: Quando o CC coloca os termos “justificada a falta ou perda”, em verdade, afigura-se a inteligível ausência do documento, em casos como, após fortes chuvas, é verificado que o houve a destruição do livro de registro, impedindo a extração de segunda via de certidão, por exemplo. Desse modo, não se entende, contudo, justificativas determinadas situações banais como perda ou esquecimento do documento, ou até mesmo hipóteses como subtração por terceiros, uma vez que sempre será possível a obtenção de uma segunda via. Maria Helena Diniz, considerada uma das maiores civilistas de nossa era, assim preleciona sobre os nossos dizeres: Se faltar, em virtude do fato de o oficial não ter lavrado o termo por desleixo ou má-fé, ou se se perder, pela destruição do próprio livro ou cartório, em razão de incêndio, guerra, revolução etc., admitem-se meios subsidiários de prova (passaporte — RT, 222:90; testemunhas do ato; certidão de proclamas; documentos públicos que mencionem o estado civil etc.), mediante justificação, requerida ao juiz competente. (DINIZ, 2005, p. 120) De toda sorte, é preciso ingressar com procedimento judicial cabível, para nova obtenção de nova prova do casamento. Dessa sentença, assim dispõe o nosso CC: Art. 1.546. Quando a prova da celebração legal do casamento resultar de processo judicial, o registro da sentença no livro do Registro Civil produzirá, tanto no que toca aos cônjuges como no que respeita aos filhos, todos os efeitos civis desde a data do casamento. (BRASIL, 2002) Ou seja, o efeito será ex tunc (retroativo). Ainda, sua eficácia terá força sobre os descendentes. Direito de Família 22 A força probatória da certidão de casamento é tamanha, que ela é prova sobre qualquer lide processual, como deixa claro o julgado a seguir: Processual e previdenciário. Ação rescisória. Aposentadoria por idade. Rurícola. Certidão de casamento. Início razoável de prova material. Caracterização. Documento novo. Preexistente ao acórdão rescindendo. CPC, art. 485, VII. Solução pro misero. Adoção. Exigência. Período de carência. Desnecessidade. I — Nos termos da assentada jurisprudência da Corte, considerando as condições desiguais vivenciadas pelo trabalhador rural, e adotando a solução pro misero, a prova, ainda que preexistente à propositura da ação originária deve ser considerada para efeito do art. 485, VII do Código de Processo Civil. Na hipótese dos autos, o documento novo acostado aos autos, consistente em Certidão de Casamento, constitui início razoável de prova suficiente da atividade rurícola da Autora. II — Consoante jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, para fins de aposentadoria por idade, não é exigível do trabalhador rurícola, a comprovação de período de carência. Precedentes. III — Ação rescisória procedente (AR 3.022/SP, rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 28-6-2006, DJ 21-8-2006, p. 227, 3.ª Seção). EXPLICANDO MELHOR: Na ocasião deste julgado, a requerente tinha como meio de prova a certidão de casamento, em que constava sua profissão, qual seja, de trabalhador rural. Devido a essa prova inequívoca, o tribunal concedeu a pensão por idade. Ainda sobre a prova do casamento, é importante destacar que o art. 1.544 do CC dispõe que o casamento de brasileiro, celebrado no estrangeiro, perante as respectivas autoridades ou os cônsules brasileiros, deverá ser registrado em no máximo 180 (cento e oitenta) dias, a contar da volta de um ou de ambos os cônjuges ao Brasil, no cartório do respectivo domicílio, ou, se caso na edilidade não possua, no 1º Cartório de Ofício da Capital do Estado em que passarem a residir. Direito de Família 23 Dessa forma, a doutrina tem entendido que trata-se de um prazo decadencial, e, havendo inobservância, pode ser gerada a perda do direito de extensão da eficácia, em território nacional, portanto, o matrimônio celebrado fora do país pode perder sua validade. Sobre esta matéria, Ferraresi (2009) assim afirma: O legislador não deixou à mercê dos nubentes a escolha do tempo apropriado para registrar o ato matrimonial no Brasil. Ao contrário, impôs-lhes o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contado da volta de um ou de ambos os cônjuges ao país. A palavra ‘volta’ deve ser entendida de maneira ampla, englobando a palavra ‘ingresso’, segundo entende Paulo Lôbo (2008, p. 97), não se limitando, portanto, apenas ao ‘retorno’ do cônjuge (brasileiro ou estrangeiro), mas, também, à ‘primeira entrada’ em território brasileiro. Inobservado o prazo, o casamento não produzirá efeitos no Brasil, ainda que no exterior mantenha sua eficácia. A propósito, Paulo Lôbo afirma que o prazo de 180 (cento e oitenta) dias é decadencial, ‘significando dizer que, se for ultrapassado, o casamento fora do Brasil não produzirá efeitos neste país. Em outras palavras, não serão considerados casados segundo as leis brasileiras’ (LÔBO, 2008, p. 97). De outro lado, Luiz Edson Fachin e Carlos Eduardo Pianovski Ruzyk indagam: ‘Qual seria, porém, a consequência do descumprimento deste prazo?’. Imediatamente respondem: ‘Embora a regra silencie, podem-se reputar os 180 dias como o período dentro no qual é possível oferecer eficácia, em território nacional, ao casamento realizado no exterior pelas autoridades consulares. A perda do prazo ensejará a necessidade de habilitação em território nacional para que seja possível realizar o registro no prazo de eficácia do certificado de habilitação (FACHIN; RUZYK, 2003, p. 141). Portanto, o descumprimento do prazo de cento e oitenta dias não implica inexistência ou invalidade do casamento celebrado no exterior, mas apenas condiciona a eficácia a uma nova habilitação (e não a uma nova celebração do casamento em território nacional). (FERRARESI, 2009, p. 82-83) Observadas essas questões, o CC assevera que, na ausência de prova documental suficiente (leia-se certidão de casamento), será admitida o que chamamos de prova indireta do casamento, necessitando, assim, que os consortes comprovem a posse do estado de casadas. Direito de Família 24 DEFINIÇÃO: A posse do estado de casadas é uma situação fática em que o casal mantém “a nítidaaparência da existência e validade da relação matrimonial, atuando ambos os “possuidores” desse estado com animus de consortes” (GAGLIANO, 2019, p. 207).. Imaginemos as seguintes hipóteses: 1. Um casal, cujos consortes estão casados há mais de 25 anos, no incurso de constantes mudanças de residência, perderam muitos documentos, inclusive a certidão de casamento. Dessa união, constituíram patrimônio e advieram descendentes. Note que, mesmo sem a certidão de casamento, os cônjuges mantiveram a posse do estado de casados. 2. Dois companheiros, juntos por mais de 30 anos, também tiveram filhos e constituíram algum patrimônio. Nesse caso, os companheiros também detêm a posse do estado de casados. Ou seja, para que se tenha posse do estado de casadas, as pessoas devem agir como tais, conforme os deveres prelecionados no CC, independentemente se houve formalização matrimonial ou não. Apresentando com maestria, Gagliano (2019) explica a posse do estado de casado: Como decorrência da cláusula geral de boa-fé e por imperativo de segurança jurídica, admite-se prova do casamento de pessoas que, tendo convivido na posse do estado de casadas e constituído prole, não possam mais manifestar vontade, por morte ou outra circunstância impeditiva. (GAGLIANO 2019, p. 217) Nesse sentido, as provas que atestam a posse do estado de casados podem ser cartas ou correspondências, como bilhetes, e-mails ou mensagens enviadas por aplicativos. Não podemos esquecer que também são consideradas as provas informais visuais, como fotos, vídeos etc. Direito de Família 25 No entanto, em nossa atividade advocatícia encontramos uma diversidade de outras provas que a doutrina de forma geral esquece de citar. Um bom operador do direito deve estar atento aos muitos documentos que circundam o casal, dentre eles a certidão de nascimento de eventuais filhos, caso o casal os tenha, pois nesse documento consta o nome dos pais, e, se assim lá se acosta, existem fortes indícios de comprovação de que estes mantiveram/mantêm estado de casados. Portanto, um bom operador do direito deve estar atento aos documentos que circundam a relação matrimonial. Inclusive, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em alguns julgados, já se pronunciou nesse sentido, in verbis: Apelação cível. Investigação de paternidade e maternidade. Inteligência do art. 1.614 do Código Civil (antigo art. 362 do CC/16). Decadência reconhecida. Na investigatória de paternidade e/ou maternidade em que o autor não possui pais registrais não há falar em prescrição ou decadência. Todavia, nos casos de prévia existência de uma relação jurídica de parentalidade certificada pelo registro de nascimento, incide o prazo decadencial de quatro anos. Esta restrição de direito se impõe em face do princípio de igualdade de direitos dos filhos, posto no § 6.º do art. 227 da CF, sejam eles havidos ou não da relação de casamento, pois, se entendermos que o filho extramatrimonial pode, a qualquer tempo, vindicar estado distinto daquele que resulta de seu assento de nascimento igualmente teremos que assegurar esta possibilidade aos filhos havidos na vigência do casamento o que — se pode antever — dá oportunidade à total insegurança no seio familiar. Na atualidade, se confrontadas a verdade que emana das informações registrais com a verdade biológica/consanguínea e a verdade social e afetiva, onde houve coincidência entre a verdade registral e a posse de estado de filho fica mantida a relação de parentesco já constituída, em detrimento da identidade genética. De ofício, reconheceram a decadência, extinguindo o processo com julgamento de mérito, por maioria. (Segredo de justiça) (TJRS, AC n. 70015469091, 7.ª Câm. Cív. rel. Luiz Felipe Brasil Santos, julgado em 13-9-2006). Direito de Família 26 A doutrina tradicional normalmente aponta três elementos que caracterizam a posse do estado de casado, são eles nomen, tractatus e fama. De forma bem sintética, o famoso civilista Washington de Barros Monteiro nos explica: O primeiro, consiste em trazer a mulher o nome do marido; o segundo, em se tratarem ambos como casados; e o terceiro, no reconhecimento geral, por parte da sociedade, da condição de cônjuges. (MONTEIRO, 1999, p. 78) Evidentemente que o primeiro requisito foi relativizado ante as novas constituições familiares, porém, seu ideário continua sendo adequado para todos os casos de constituição familiar, pois vejamos: Se José casou-se com João, e ostenta socialmente o sobrenome deste, obviamente José enquadra-se no elemento nomen. Ademais, o elemento nomen está cravado no CC, como na previsão a seguir: Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família. § 1.º Qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro. (BRASIL, 2002) O aluno pode perguntar “e se as provas se restarem insuficientes para atestarem a condição de estado de casado?” E responderei sem pestanejar, que restará a você, futuro operador do direito, complementar suas provas com testemunhas idôneas. Claro que isso irá depender de cada caso, porém, o CC preleciona que a dúvida entre as provas favoráveis e contrárias julgar-se-á pelo casamento, se os cônjuges, cujo casamento se impugna, viverem ou tiverem vivido na posse do estado de casados (art. 1.547 do CC/2002). Muitas pessoas chegam a nos perguntar se é juridicamente aceitável desdobrar a previsão da posse do estado de casados àqueles que se encontram em união estável. Direito de Família 27 Para Gagliano (2019), isso não é possível: O fato de a Constituição não estabelecer hierarquia ou prevalência entre as inesgotáveis formas de família não significa que identifiquemos institutos equiparáveis, mas não iguais. Casamento não é igual a união estável, até porque, se assim o fosse, a própria Constituição Federal não regularia a sua conversão em matrimônio. Em outras palavras, a equiparação de direitos, segundo uma hermenêutica apurada, não significa que apliquemos indistintamente regras do casamento à união estável e vice-versa. Com isso, temos firme a ideia de que a previsão da posse do estado de casado não pode ser aplicada ao companheirismo por analogia ou interpretação ampliativa. (GAGLIANO, 2019, p. 2019) Em que pese as palavras do famoso doutrinador a quem temos muito apreço, ousamos discordar, pois, muito embora os companheiros em uma união estável não gozem do elemento nomen, os outros elementos, quais sejam, tractatus e fama estão firmemente presentes. Vejamos, o art. 1.723 do CC: este disciplina que é reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. Percebe-se nitidamente os elementos tractatus e fama nesta redação. Ademais, praticamente as mesmas provas informais que possam comprovar um casamento formal podem ser usadas para comprovar uma união estável. Claro que o fundamento para uma união estável e um casamento se dispersam em muitos momentos, o que verificaremos em momento oportuno, mas carece que neste momento façamos importantes ressalvas. Comungam conosco o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP), quando, enfrentando o julgamento da Apelação Cível de nº 994.09.301317-o, em 11 de março de 2010, afirmou à relatoria que, para que haja posse no estado de casados, deve haver consistente de relacionamento público, notório, duradouro, que configure um Direito de Família 28 núcleo familiar. Ainda, deve haver vida em comum, more uxório, não necessariamente sob o mesmo teto, mas com sinais claros e induvidosos de que aquele relacionamento é uma família, cercada de afeto e de uso comum do patrimônio. Na ocasião, a mesma corte ainda proferiu: Na lição deSimão Isaac Benjó, a união estável se aproxima de fato do casamento, de modo que «a companheira deve ter o trato, o nome e a fama de esposa» (União Estável e seus Efeitos Econômicos em face da Constituição Federal, in Revista Brasileira de Direito Comparado, 1.991, v. II, os. 59 e seguintes) (TJ-SP - APL: 994093013170 SP, Relator: Francisco Loureiro, Data de Julgamento: 11/03/2010, 4ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/03/2010) Esse entendimento é constante em outros tribunais. Frisamos aqui também o do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJ-ES), quando, enfrentando a Apelação Cível de número AC 24050115492 ES 024050115492, suscitou o já mencionado art. 1723 do CC/2002, referendando que nele constam requisitos indispensáveis à comprovação da união estável quais sejam, intenção de constituir família e convivência pública contínua e duradoura, porém, devido à inexistência de provas no sentido da posse do estado de casado, o tribunal conheceu o recurso conhecido, mas negando-lhe provimento. Isso nos leva a crer que exista condão sim, se elencadas as devidas provas, de reconhecer a posse do estado de casado com a finalidade de comprovar a união estável, porém, ressalvamos que, caso reste-se essa comprovada, jamais em juízo será considerada como casamento civil, pois, embora os institutos no plano fático sejam semelhantes, juridicamente são diferentes. Veremos mais detalhadamente mais adiante, porém, podemos desde já antecipar alguns dizeres. É comum residir a dúvida entre as pessoas que não entendem a diferença entre união estável e casamento, até por causa do art. 226, § 3º da Constituição Federal, que reconhece a união estável como família, mas Direito de Família 29 não é porque o texto magno assim o reconhece, que exista uma segurança patrimonial plena. E é aqui que reside uma das maiores diferenças. O casamento, por ter uma chancela estatal, tem sua eficácia plena, erga omnes, enquanto a união estável precisa a qualquer momento passar por algum crivo administrativo ou judicial. Um casal que contraiu matrimônio no regime de comunhão parcial de bens, uma vez que não houve nenhuma irregularidade, quando entenderem que devem se separar, basta computarem os bens pretéritos ao casamento, os que advieram depois do casamento, e, assim, judicialmente cindi-los. Já um casal em união estável, o patrimônio, a rigor, encontra-se todo misturado, pois não houve um marco formal, como é o caso do casamento, então o casal, caso queira se separar, terá que reconhecer a união estável, para somente então dissolvê-la e tentar dividir de forma satisfatória os bens. É claro que por economia processual, o reconhecimento à dissolução e à partilha de bens pode ser feito em uma única ação, mas em nossa carreira, observamos que é muito mais custoso as dissoluções de uniões estáveis do que divórcios, exatamente por uma certa precariedade de documentos. Ou seja, embora os dois tipos de uniões gozem da mesma posse do estado de casados, os casamentos possuem uma segurança jurídica muito mais robusta. RESUMINDO: As provas do casamento são elementos que atestam a veracidade do matrimônio. A maior prova é a certidão de casamento, porém, na falta justificada desta, outras provas informais podem ser obtidas a fim de que se produza a mesma finalidade probante da certidão. Direito de Família 30 A Eficácia do Casamento OBJETIVO: Ao término deste capítulo, você será capaz de entender uma gama de questões relevantes que determinam a eficácia jurídica do casamento. Isso será fundamental para o exercício de sua profissão. As pessoas que tentaram ingressar no mercado de trabalho sem a devida instrução aqui cedida tiveram muitos problemas na produção de peças processuais, assim como na atividade jurídica no direito de família. E então, motivado para desenvolver esta competência? Vamos lá. Avante! Neste capítulo, você terá a oportunidade de fazer reflexões sobre temas relativos ao casamento que o tornam de fato eficaz. Embora exista um corpo legal que dita normas extremamente vastas que disciplinam sua eficácia, como você já deve ter observado, alguns poucos detalhes fazem a diferença ao operador do direito para determinar se uma união matrimonial é eficaz ou não. Esses detalhes são o que chamamos de consequências do casamento. Essas consequências projetam nos cônjuges efeitos de diversas naturezas e que irão refletir em efeitos sociais, pessoais e patrimoniais. Vejamos agora cada um deles. Efeitos Sociais Uma vez que um dos principais efeitos do matrimônio é a constituição de uma família, conforme redação do texto constitucional do art. 226, §§ 1º e 2º, a família, portanto, sai da esfera privada e ganha status público. Alguns autores entendem que essa tutela estatal, ou seja, esse cuidado por parte do estado, foi um forte avanço para as pessoas humanas envolvidas. Direito de Família 31 Por isso que em alguns textos da doutrina especializada iremos ler que a CF confere proteção à comunhão de vida, é por isso que o art. 1.513 proíbe a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família. E, por sua vez, quando tratamos desse dispositivo, vimos que ele realça o livre planejamento familiar, também afigurado no art. 226, § 7º. Nessa comunhão de vida, seus coparticipantes lidam com alguns efeitos sociais, dentre eles: a. A emancipação do cônjuge incapaz (art. 5º parágrafo único, II). Para entender melhor nosso dizeres, o aluno deve recordar das lições adquiridas sobre esse assunto na parte geral do CC e dos apontamentos que fizemos quando tratamos nesta disciplina. Ao dizer que a idade núbil é aos 16 anos, e que o menor autorizado pelos pais poderá casar-se, o CC disciplina a emancipação civil deste. O que queremos dizer é que o menor em idade núbil, se casando, ele automaticamente está emancipado para efeitos civis. E mais, essa emancipação é um ato de solidez tamanha, que mesmo com a dissolução do casamento, seja pela viuvez, separação ou pelo divórcio, o jovem continuará emancipado. Ou seja, uma vez emancipado, o jovem não retornará ao estado de incapacidade que anteriormente tinha. b. O estabelecimento do vínculo de parentesco por afinidade entre os parentes dos cônjuges, em alguns casos, é permanente, como estudamos nos casos de impedimentos matrimoniais. Lembre-se, sogra é para sempre! c. O estado de casado, como vimos, faz interferência direta de como a sociedade vê o casal. É a proteção jurídica mínima em relação a terceiros, pois, dessa forma, resguarda-se muitos direitos pertencentes aos entes familiares. Basta lembrar, por exemplo, que o bem de família é protegido perante o estado, já uma pessoa que se atende apenas como solteira, pode ter seus bens penhorados. d. Em decorrência da presunção de casados, também haverá a presunção de paternidade dos filhos na constância do casamento. Chamamos aqui de relação jurídica filiatória, pois a mera presença de um menor junto a um casal já pressupõe-se a filiação deste. Direito de Família 32 Efeitos Pessoais a. Noções gerais Com o desenvolvimento dos pressupostos da dignidade humana, podemos considerar qualquer atividade discriminatória abominável. Sabiamente, nosso CC traz: Art. 1.565. Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família. (BRASIL, 2002) Com isso, entendemos que deva existir um dever de cuidados para com o outro, de qualquer ordem, seja física, mental, psicológica, moral ou qualquer outra admitida em direito, não permitindo-se mais diferenciação entre mulher e homem, companheiro que trabalha e o que se preserva no lar, por exemplo. b. Possibilidade acréscimo do sobrenome do cônjuge Como sabemos, o nome é um direito da personalidade, é através dele que atingimos o direito à identificação, um direito essencial, portanto.Nosso CC inovou em relação ao Código passado, prelecionando que qualquer dos nubentes, querendo, poderá acrescer ao seu o sobrenome do outro (Art. 1.565, §1º). Dessa monta, é importante destacarmos que é facultativa a mudança, e não obrigatória, como muitos pensam, e mais, o homem pode ter para si o sobrenome da mulher. Devemos recordar que essa alteração do nome se dá no ato de habilitação ao casamento. NOTA: Todavia, tem-se entendido que, caso os nubentes não optarem no momento da habilitação, após o casamento, poderão pleitear judicialmente a alteração (leia-se retificação) de seu nome, para isso, que se faça em uma vara de registros públicos. Direito de Família 33 Antecipando assuntos que serão vistos na nossa próxima unidade, uma vez alterado o nome em razão do casamento, caso sobrevenha alguma dissolução, a rigor, haverá a manutenção do nome adquirido pelo casamento, porém, caso o consorte queria retornar ao nome de solteiro, ele terá que fazer o pedido na ação de dissolução matrimonial cabível. c. Fixação de domicílio conjugal Eis aqui um dos grandes marcos que diferenciam o casamento de outras uniões, qual seja, o dever de coabitação. Enquanto na união estável não existe essa obrigatoriedade, no casamento é uma regra, para tal, é necessário que se atenda ao que o CC ensina: Art. 1.569. O domicílio do casal será escolhido por ambos os cônjuges, mas um e outro podem ausentar-se do domicílio conjugal para atender a encargos públicos, ao exercício de sua profissão ou a interesses particulares relevantes. (BRASIL, 2002) Ou seja, não existe uma necessidade plena de que os cônjuges residam no mesmo local, mas que mantenham de domicílio. Lembre-se das lições da parte geral, caro aluno. Domicílio representa a sede jurídica da pessoa, onde irá se presumir que ela esteja presente para efeitos de direito. Já a residência é um local onde se estabelece uma situação de fato. Embora na prática esses termos se confundam bastante, veja o exemplo: A família de João mora em Juazeiro do Norte, no estado do Ceará, mas mantém uma residência em Fortaleza, capital desse mesmo estado. João mantém seu domicílio em Juazeiro do Norte, pois é lá onde trabalha, guarda sua família, tem suas relações de amizade; já na residência de Fortaleza, ele e sua família costumam passar os dias de verão, ou as férias. Logo, João e sua família possuem duas residências, mas um único domicílio. Entendeu? d. Os direitos e deveres recíprocos do casamento Tratamos deste tema quando falamos da finalidade do casamento. São deveres que importam a ambos os cônjuges, quais sejam: fidelidade recíproca; vida em comum no domicílio conjugal; mútua assistência; sustento, guarda e educação dos filhos; respeito e consideração mútuos. (Art. 1.566 do CC/2002). Direito de Família 34 NOTA: Interessante aqui fazer menção honrosa a um tema que aparentemente parece estar vencido, porém, ainda é constante nos lares. Dentre os deveres elencados no art. 1566, um deles merece especial análise, o que também se pretende verificar de forma mais precisa: o débito conjugal, previsto no inciso II, como dever de coabitação. Muitos autores conceituam de forma superficial esse dever, apenas no sentido de comunhão de vida, de evitar o abandono do outro cônjuge, sem motivo justificado, contra a vontade do consorte. Segue esse entendimento Carlos Roberto Gonçalves (2017, p. 189), ao afirmar que “a vida em comum, no domicílio conjugal, ou dever de coabitação, obriga os cônjuges a viver sob o mesmo teto e a ter uma comunhão de vidas”. Entretanto, algo importante não pode ser omitido no dever de coabitação: o débito conjugal. A coabitação do lar conjugal é pressuposto matrimonial que obriga os cônjuges a compartilharem suas vidas, aí incluída também a vida sexual, o que se entende por débito conjugal, que é entendido como o direito-dever dos cônjuges de cederem reciprocamente os seus corpos à mútua satisfação sexual, mas presente no CC de 1916, fruto de uma sociedade patriarcalista, foi mantido ainda no CC atual. Sendo assim, um dever matrimonial elencado no CC, o débito conjugal poderia legitimar a exigência do cumprimento por parte do outro cônjuge, o que poderia gerar, inclusive, situações de violência sexual, totalmente incompatíveis com nossa realidade social, bem como a legislação criminal. Rolf Madaleno (2016) expressa que A unidade conjugal atende desse modo a uma das finalidades do casamento, consubstanciada na convivência, como modelagem inerente à entidade familiar. A coabitação dos cônjuges também envolve seu relacionamento sexual, como dever implícito do vínculo nupcial. (MADALENO, 2016, p. 180) Direito de Família 35 DEFINIÇÃO: O débito conjugal seria, portanto, o direito-dever dos cônjuges de realizarem entre si o ato sexual. A omissão da expressão “débito conjugal” por parte da doutrina civilista deve-se ao fato de que alguns autores o consideram como ínsito ao dever de coabitação. Alguns casais, atualmente, por adotarem um estilo de vida incompatível com a coabitação, por vezes em virtude do trabalho, ou até mesmo por opção, prescindem desse dever conjugal e convivem de forma pacífica e duradoura, estabelecendo comunhão plena de vida mesmo em lares separados, especialmente com a inserção plena da mulher no mercado laboral. Como relembram Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2015), Em verdade, o termo coabitação não abrange – e não pode abranger – uma obrigação jurídica aos cônjuges de manter relacionamentos sexuais porque implicaria em violação à dignidade deles, bem assim como em uma interdição sobre a sua própria vida privada, valores tutelados constitucionalmente. O sentido jurídico da expressão vida em comum no domicílio conjugal é outro, mais restrito, não invadindo a esfera da privacidade da pessoa humana. Esta, sim, a interpretação que emerge de uma análise detida à luz dos valores garantistas afirmados constitucionalmente. (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p. 248) Desse modo, deve-se lembrar que o débito conjugal, hoje, não pode mais ser exigido como antes, até mesmo porque isso implicaria em violação a outros direitos, ainda mais considerando a situação de igualdade dos cônjuges após a relação conjugal. O aluno pode questionar, e se houver descumprimento dos deveres conjugais? Direito de Família 36 O descumprimento dos deveres conjugais gera consequências jurídicas, sendo a primeira delas a possibilidade de rompimento da sociedade conjugal, por inviabilidade de continuação da vida comum, previsto no CC Brasileiro, em seu art. 1.572, caput, e art. 1.573. Entretanto, atualmente, para a ruptura da sociedade conjugal e o pedido de divórcio, diante de inúmeras mudanças na legislação, notadamente após a Emenda nº 66/2010, já não mais se exige que haja a comprovação de violação dos deveres conjugais, e sequer comprovação em decorrência de lapso temporal. Justifica-se tal fato, como relembra Rolf Madaleno (2016), ao mencionar que Cada vez interessava menos ao Direito ocupar-se em longos embates jurídicos da pesquisa da culpa pela derrocada nupcial. A visão moderna do casamento, que prioriza a dignidade da pessoa, não podia mais permitir vazios conflitos internos de ponderação da dignidade conjugal, sugerindo que a pesquisa da culpa gerasse a responsabilidade social e jurídica pelo fim do amor. Importa, na atualidade, para um processo de divórcio ou de dissolução de uma união estável, tão somente o desejo de facilitar ao casal a finalização formal de seu relacionamento, sempre que pelo menos um deles, quando não o for pela iniciativa de ambos, aportar em juízo para denunciar o fim da sua comunhão plena de vida e da ausência definitiva de interesses comuns e esse foi o principal propósito da emenda Constitucional n.66, de 13 de julho de 2010. (MADALENO, 2016, p. 175) De fato, percebe-se que o momento do divórcio já é bastantedelicado para as famílias: uma fase de adaptação, de estruturação, de frustrações, muitas vezes com mágoas e ressentimentos. Tudo isso reflete-se no desejo de expressar discussões inócuas acerca da atribuição de culpa ao término do relacionamento, e quem lida na área de direito de família compreende essa realidade e percebe que essa discussão não tem qualquer contribuição prática para a decretação do término da sociedade conjugal. Direito de Família 37 Nesse contexto, importante falar sobre outra consequência jurídica quando há violação dos deveres conjugais: a possibilidade de indenizar. A transgressão aos deveres conjugais, com expressa previsão legal, gera ao cônjuge inocente a possibilidade de reparação. Assim manifesta-se Regina Beatriz Tavares da Silva (2002), quando diz que A lei, ao estabelecer deveres aos cônjuges, obriga-os à prática de certos atos e à abstenção de outros. Uma vez violados esses deveres, com a ocorrência de danos, surge o direito do ofendido à reparação, em razão do preenchimento dos pressupostos da responsabilidade civil subjetiva – ação ilícita, dano e nexo causal – assim como ocorre diante da prática de ato ilícito em outras relações jurídicas, com fundamento na regra geral da responsabilidade civil. (SILVA, 2002, p. 120) Alguns tribunais brasileiros já vêm decidindo favoravelmente nesse sentido, em casos de infidelidade conjugal, e da falta de respeito e consideração mútuos. Além da reparação civil, há ainda outros aspectos que podem influenciar no direito de família. O descumprimento do dever de guarda, sustento e educação dos filhos, por exemplo, enseja inúmeras ações de alimentos, abandono afetivo, guarda compartilhada, que são objeto de leis específicas no ordenamento civil brasileiro, e que podem ser consideradas decorrência da violação do dever conjugal. Efeitos Patrimoniais É da natureza do matrimônio a aquisição bens em comum. Embora em nosso ideário quiséssemos conquistar um patrimônio vultoso, sabemos que a vida muitas vezes não permite tal ascensão. E isso é normal. Portanto, a aquisição de patrimônio não está diretamente ligada a bens de alto valor, mas sim de bens de diversificada natureza. VOCÊ SABIA? Nesse sentido, em nossa carreira advocatícia, em situações de dissolução matrimoniais, já chegamos a partilhar apenas eletrodomésticos, proventos referentes a aluguéis, animais, como bovinos, equinos e tantas outras coisas inusitadas. Direito de Família 38 Mas o cerne de nossos comentários neste tópico não estão para o que se pode partilhar, pois guardaremos isso para momento mais oportuno, quando tratarmos da dissolução matrimonial. Tecemos esses comentários somente para destacar que é típico das uniões a aquisição de patrimônio, e isso gera reflexos. RESUMINDO: Embora o casamento seja rodeado de normas que regem seu ato, algumas questões de ordem social, pessoal e patrimonial determinam a sua eficácia. Direito de Família 39 Invalidade Jurídica do Casamento OBJETIVO: Ao término deste capítulo, você será capaz de entender uma gama de questões relevantes que determinam a invalidade jurídica de um casamento, ou seja, as causas que anulam o matrimônio. Isso será fundamental para o exercício de sua profissão. As pessoas que tentaram ingressar no mercado de trabalho sem a devida instrução aqui cedida tiveram muitos problemas na atuação como operadores do direito, no âmbito do direito familiar. E então, motivado para desenvolver esta competência? Vamos lá. Avante!. Nas unidades anteriores, pudemos acompanhar as causas impeditivas do casamento que geram a nulidade deste. Agora, estudaremos as questões da validade do casamento que o tornam anulável. Tais questões encontram raízes legais no CC de 1916, quando lemos em seu art. 209 a seguinte redação: “É anulável o casamento contraído com infração de qualquer dos ns. IX a XII do art. 183”. Nesse intento, éramos remetidos a ler os seguintes termos: Art. 183. Não podem casar (arts. 207 e 209): (...) IX — as pessoas por qualquer motivo coactas e as incapazes de consentir; [Redação dada pelo Decreto do Poder Legislativo n. 3.725, de 15-1-1919.] X — o raptor com a raptada, enquanto esta não se ache fora do seu poder e em lugar seguro; XI — os sujeitos ao pátrio poder, tutela ou curatela, enquanto não obtiverem, ou lhes não for suprido o consentimento do pai, tutor, ou curador (art. 212); [Redação dada pelo Decreto do Poder Legislativo n. 3.725, de 15-1-1919.] Direito de Família 40 XII — as mulheres menores de 16 (dezesseis) anos e os homens menores de 18 (dezoito). (BRASIL, 2002) Como podemos observar, alguns desses incisos caíram em desuso ante as inovações do novo CC. Para nós, a mais inusitada situação está no inciso X, que diz que o casamento poderá ser anulável quando “o raptor com a raptada, enquanto esta não se ache fora do seu poder e em lugar seguro”. Geralmente, este dispositivo se aplicava na seguinte situação: uma mulher casada era seduzida por um outro homem, que não o seu marido. E assim, sedutor e seduzida, extremamente apaixonados, resolvem fugir, pois, como o casamento em 1916 era algo extremamente indissolúvel, só restava esta última e única alternativa. Aqui a mulher era entendida com alguém que seria incapaz de entender seus desejos e seus anseios, portanto, era compreendida como raptada, e seu amante, o raptor. Nesse sentido, o raptor e a raptada eram impedidos de casarem- se, mas, se caso conseguissem, o casamento poderia ser anulável. Hoje, o CC, nos novos ares de sensatez contemporâneos, dispõe, em seu art. 1.550, que poderá ser anulável o casamento: I — de quem não completou a idade mínima para casar; II — do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal; III — por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558; IV — do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento; V — realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges; VI — por incompetência da autoridade celebrante. § 1.º Equipara-se à revogação a invalidade do mandato judicialmente decretada. § 2.º A pessoa com deficiência mental ou intelectual em idade núbia poderá contrair matrimônio, expressando sua vontade diretamente ou por meio de seu responsável ou curador”. (BRASIL, 2002) Tais incisos serão frutos de nossos estudos agora. Direito de Família 41 Nubente que não Completou a Idade Mínima para Casar Tratamos deste tópico quando falamos de capacidade para casar. A lembrar, o analisamos quando tratamos do art. 1.517 do CC, que fala da capacidade núbil, com a ressalva já vista no art. 1.520, que ocorre aos 16 anos completos, tanto para o homem quanto para a mulher, sendo então uma inovação, pois o CC de 1916 estabelecia a idade mínima para a mulher aos 16, e para o homem aos 18 anos. Conforme vimos no dispositivo acima, acreditamos que essa diferença etária no antigo Código considerava o amadurecimento masculino ser mais lento que o feminino. Nubente em Idade Núbil sem Autorização para o Casamento Também nas oportunidades de unidades passadas, tratamos que, caso o menor quisesse casar, teria que ter anuência expressa de seu pai, através de autorização, conforme teor do art. 1.518 do CC de 2002. Caso viesse a se casar, este ato poderia ser anulado. Como já tratamos disso, entendemos ser mais interessante abordarmos com maior profundidade nos outros incisos. a. Vícios de vontade NOTA: Os vícios de vontade geralmente são estudados na parte geral do CC, porém, por ter um viés contratual, o casamento é entendido como negócio jurídico, e a vontade dos nubentes deve estar inteiramente livre e eivada de boa-fé. Aqui, teremos a oportunidade de aplicar os estudos da parte geral no direito de família. Direito de Família 42 O primeiro vício que deveremos tratar temrelação com a omissão legal que gera outros vícios de consentimento. Sempre alertamos que os nubentes têm um dever entre si de prestarem informações verdadeiras entre a vida íntima de cada um, não cabendo determinadas omissões que futuramente possam comprometer o relacionamento familiar. Automaticamente, isso irá nos remeter ao art. 1.550, III, e aos arts. 1.556 e 1.558, todos do CC/2002, pois, pela leitura destes, é possível postular que será anulável o casamento quando houver erro essencial sobre a pessoa de um dos cônjuges ou coação. IMPORTANTE: Destacamos que, para que haja a concretização desse erro, o operador do direito deve detectar se houve uma séria omissão, no sentido de ser injustificada. Em outras palavras, precisamos ver se houve dolo para dar causa a essa invalidade. Nesse rumo do conceito de dolo aplicado ao direito de família, Venosa (2001) assim assevera: O dolo, como causa de anulação, colocaria sob instabilidade desnecessária o casamento, permitindo que defeitos sobrepujáveis na vida doméstica fossem trazidos à baila em um processo. (VENOSA, 2001 p. 128) Nesse sentido, para que se reste comprovado dolo, é imperioso que um dos nubentes atue com o inequívoco propósito de enganar o outro. Feitas essas observações sobre o dolo no que tange ao direito de família, devemos tratar sobre o erro essencial da pessoa de um dos cônjuges. O erro, nas palavras de Caio Mário Da Silva Pereira (2001), ocorre Quando o agente, por desconhecimento ou falso conhecimento das circunstâncias, age de um modo que não seria a sua vontade, se conhecesse a verdadeira situação, diz-se que procede com erro. (PEREIRA, 2001, p. 326) Direito de Família 43 Muito embora saibamos que a lei civil não estabelece distinções, o erro é, para Gagliano (2019, p. 271), “a falsa percepção da realidade, ao passo que a ignorância é um estado de espírito negativo, o total desconhecimento do declarante a respeito das circunstâncias do negócio”. Geralmente, a doutrina de direito privado considera erro passível de anulabilidade do negócio jurídico quando ele for: • Essencial (substancial). • Escusável (perdoável). Para entender melhor a diferença deles, precisamos nos redirecionar para um artigo do CC relativo à parte geral, in verbis: Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio. (BRASIL, 2002) DEFINIÇÃO: Assim, para que o erro seja considerado substancial, é necessária uma incisão sobre a essência do ato que se pratica, pois o erro substancial invalida o ato jurídico. Ele ocorre de formas não muito comuns para os dias atuais, mas aqui poderemos citar um exemplo plausível, baseado nas lições do CC, em seu art. 138. Digamos que A é noiva de B. B tem um irmão gêmeo idêntico, C. C, ardente de paixões por A, captura seu irmão, aprisiona-o no dia do casamento, e, assim, celebra matrimônio com A. Veja, o ato tornou-se inválido, pois embora tivesse tudo ocorrido em conformidade, o anseio de A era casar com B e não com C. Direito de Família 44 Um erro escusável no negócio jurídico é aquele que poderíamos esperar de homem médio que atue com grau normal de diligência. Imaginemos que A e B, empolgados com o casamento, não observam que na certidão de casamento que assinavam constava o regime de separação total de bens, quando estes haviam optado no processo de habilitação pelo regime de comunhão parcial de bens. Nitidamente houve uma falha do cartório de registro. Veja, embora consistisse um erro, este não invalida inteiramente o negócio jurídico. Visto isso, passemos a identificar os tipos de erro sobre a pessoa. Neste mesmo arcabouço jurídico, o CC elenca outras possibilidades de erro essencial sobre a pessoa: Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge: I — o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado; II — a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal; III — a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável que não caracterize deficiência ou de moléstia grave e transmissível, pelo contágio ou herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência. (BRASIL, 2002) Quanto ao que se concerne ao erro essencial sobre identidade ou à qualidade essencial da pessoa, por incrível que pareça, em nossa carreira, observamos que isso é mais comum do que parece. Esse tipo de erro está cravado no CC no seguinte artigo: Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por parte de um dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro. (BRASIL, 2002) Imagine que A está noiva de B, este, por sua vez, é bem é considerado pela sociedade como um grande e bem-sucedido executivo, que cresceu com o seu próprio suor. Ao casarem-se, A descobre que B vivia endividado e com grande quantidade de execuções fiscais, além disso, respondia por Direito de Família 45 diversos crimes de estelionato. A, por ser uma pessoa honesta e por ter escolhido B por ter a mesma fama, pode pedir a anulação do casamento, pois B fingiu ser uma pessoa que não era. O segundo inciso faz menção a situações, como a seguinte: A é filha única de um casal bem-sucedido. Quando adolescente, seus pais morreram vítimas de um homicídio cujas investigações não se restaram frutíferas, sendo assim, nunca descobriu-se quem matou seus pais. Os empreendimentos de seus pais seguiram firmemente graças ao empenho de B, por quem A se apaixonou logo em seguida. B e A casaram-se. Só que ao ver algumas trocas de e-mails, A descobre que o mandante do homicídio de seus pais foi exatamente B. A, desnorteada com a descoberta, promove ação civil cabível para anular seu casamento. Para exemplificar o terceiro inciso, aceite, aluno, esta alegoria: A é noiva de B, e por serem religiosos, resolvem manter-se castos até o matrimônio. Resolvem casar na modalidade religiosa com efeito civil. Após a linda festa, ao saírem para lua de mel, A descobre que B tem uma disfunção erétil crônica e que, além disso, ele era estéril. B sabia desses problemas desde que conheceu A, omitindo essas informações todo o tempo. Aqui, portanto, houve um erro sobre a pessoa, e A poderia pedir a anulação do casamento. IMPORTANTE: É importante sempre destacarmos que aqui tratamos de um direito potestativo, ou seja, aquele que sofreu o dano poderá exercê-lo ou não. Sabemos que muitas vezes, mesmo sendo enganadas, as pessoas perdoam e conseguem conviver com seu cônjuge ou companheiro. Outras vezes, por questões de honra, a vida torna-se insuportável, fazendo com que a única forma de curar a ferida seja a dissolução conjugal. Direito de Família 46 Sobre essas questões, a ilustríssima civilista Maria Helena Diniz traz outros motes que podem ensejar erros sobre a pessoa: “má vida ou prostituição da mulher anterior ao ato nupcial; vício de tóxicos; vida desregrada do cônjuge, chegando mesmo a manter relações sexuais com a própria mãe, etc.” (DINIZ, 2005, p. 268). Carece ainda de nossa atenção afirmar que os tribunais muitas vezes tendem a flexibilizar os conceitos de honra. Para entender melhor isso, conclamamos as palavras de Washington De Barros Monteiro, que define honra da seguinte forma: Honra é a dignidade da pessoa que vive honestamente, que pauta seu proceder pelos ditames da moral; é o conjunto dos atributos, morais e cívicos, que torna a pessoa apreciada pelos concidadãos. (MONTEIRO, 1999, p. 95-6) Por outro lado, encontramos neste julgado os seguintes dizeres: ANULAÇÃO DE CASAMENTO. ERRO ESSENCIAL. HONRA E BOA FAMA. NÃO CARACTERIZAÇÃO. É anulável o casamento