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HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 1 FONOAUDIOLOGIA FLUÊNCIA E DISFLUÊNCIA BASES NEUROBIOLÓGICAS DA FLUÊNCIA E CARACTERIZAÇÃO DA FLUÊNCIA DA FALA HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 2 A fala é a forma mais importante da comunicação humana e a mais eficiente forma de transmissão de informação (ESMAILI et al., 2016). É considerada um ato complexo, linguístico e motor que exige precisão e organização temporal adequada (PINTO, 2007). A comunicação oral é uma das características que definem o ser humano (CHANG et al., 2018). Frente a esta informação é possível refletir sobre o impacto dos distúrbio da fluência na vida do falante. Figura 1. Processo de fala de acordo com a proposta de TREMBLAY; DESCHAMPS; GRACCO (2016). Fonte: Elaborada pela autora. INTRODUÇÃO HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 3 Considerada como uma função neural complexa, a fala envolve componentes neurais processados por diferentes vias neurais. Estudiosos mencionam que a fluência precisa do simbólico e do sistema de sinais para que a mensagem idealizada chegue ao córtex motor (PERKINS; KENT; CURLEE, 1991). O sistema simbólico integra componentes cognitivos, linguísticos e segmentais da fala, ou seja, a forma e conteúdo da mensagem. Já o sistema de sinais tem por objetivo estruturar componentes prosódicos e paralinguísticos, que são responsáveis pela intensidade, altura, qualidade e duração das silabas e sua sequencialização nas palavras. A fala só é gerada sem rupturas quando esses sistemas neurais trabalham mutuamente, caso ocorra a alteração nesta integridade, o fluxo de fala se rompe temporariamente ocorrendo a disfluência (PERKINS; KENT; CURLEE, 1991). Em 1999 o termo fluência foi defino pela ASHA: “A fluência é um aspecto de produção da fala que se refere a continuidade, velocidade e/ou esforço com as quais as unidades fonológicas, lexicais, morfológicas e/ou sintáticas de linguagem são expressas.” Figura 2. Parâmetros da fluência de acordo com a definição da ASHA (1999). Fonte: Elaborada pela autora. HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 4 A fala fluente se apresenta de forma contínua, ou seja, sem interrupções, sem alteração de velocidade, com prosódia adequada e sem esforço, uma vez que o falante se atenta a ideia e não no ato da fala. A sincronicidade desses parâmetros propicia a transmissão da mensagem com naturalidade. Os indivíduos fluentes são avaliados como melhores comunicadores, visto que não apresentam interrupções que podem causar prejuízos na naturalidade e inteligibilidade da fala. O desenvolvimento da fluência ocorre concomitante ao desenvolvimento de linguagem, a habilidade de desenvolver a fala fluente é adquirida com a prática e está sujeita a erros. Segundo a literatura, a aquisição e manutenção da fluência acontecem frente a atividades neuronais que se sucedem em padrões temporais definidos e sincronizados. A prática é fundamental para que a pessoa adquira a fluência em sua fala, e, como o cérebro aprende por repetição, quanto mais se pratica essa habilidade, mais ela se aprimora e automatiza. Portanto, a fluência é um processo complexo e multifatorial, ou seja, fatores inerentes à própria pessoa e fatores externos interagem entre si de forma dinâmica (OLIVEIRA; BOHNEN, 2022). A fluência é variável de indivíduo para indivíduo e em um mesmo individuo (MACIEL; CELESTE; MARTINS-REIS, 2013). A variabilidade da fluência pode estar relacionada a eventos diários, emoções, domínio sobre o tema de conversação e de diferentes situações de fala do dia a dia. Dentre as situações de variabilidade da fluência o falante necessita de domínio sobre aspectos ambientais, linguísticos, pessoais e temporais. • Aspetos ambientais: estão relacionados às circunstancias sociais, fala do interlocutor, a pressão do tempo e as reações dos ouvintes. • Aspectos linguísticos: associados à produção de fala, bem como, a posição da sentença, tipo e extensão da palavra. • Aspectos pessoais: o quão desenvolvida é a habilidade de fala do indivíduo, se diz respeito as habilidades motora e linguística, maturidade emocional e desenvolvimento cognitivo. • Aspetos temporais: presença de rupturas na fala e variações de humor. Ainda sobre a fluência, um importante parâmetro a ser considerado é a velocidade de fala. A velocidade de fala é considerada como um dos parâmetros que HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 5 permite avaliar o processamento motor envolvido na produção da fala (COSTA; MARTINS-REIS; CELESTE, 2016). A velocidade de fala pode ser influenciada pelas disfluências típicas da gagueira. Portanto, a velocidade de fala foi descrita como inversamente proporcional à gravidade da gagueira (ANDRADE, 2004, 2011). Para finalizar este conteúdo faremos uma breve definição quanto aos distúrbios da fluência: gagueira e taquifemia. Ambos apresentam alterações nos parâmetros da fluência, como a presença de rupturas inapropriadas na fala e alteração em velocidade de fala (taxa de elocução). A Gagueira é considerada o principal distúrbio da fluência (WHITFIELD et al., 2018), ela pode ter início na infância paralela ao desenvolvimento de linguagem e persistir até a idade adulta, é caracterizada pela manifestação de rupturas involuntárias na fala (ARCURI et al., 2009) que podem prejudicar a suavidade (SASISEKARAN, 2013) e a taxa de elocução (LIU et al., 2014). Segundo a literatura, existe uma relação entre a velocidade de fala e a gagueira. Uma vez que indivíduos que gaguejam podem apresentam uma fala mais lenta devido ao tempo maior para planejamento linguístico e fonológico dos atos motores da fala, o que ocasiona uma produção articulatória tardia (CONTURE, 1991; PETERS; HULSTIJN; STARWEATHER, 1989; POSTMA; KOLK, 1993). E vale ressaltar que a presença de disfluências no fluxo de fala leva a uma lentificação na velocidade de fala, principalmente em indivíduos com gagueira (ERDEMIR et al., 2018). Além da presença de disfluências na fala, indivíduos com gagueira também podem apresentar elementos qualitativos como: aumento da tensão física; contorções faciais; movimentos de braços, cabeça ou mandíbula; tensão cervical e da cintura escapular; tremor nos lábios; uso do ar residual durante a fala e anormalidades vocais. Os concomitantes físicos são fatores qualitativos relevantes e considerados na classificação da gravidade do distúrbio (RILEY, 1994). A taquifemia é caracterizada pela velocidade de fala percebida como rápida e/ou irregular, acompanhada de no mínimo um dos seguintes sintomas: aumento na ocorrência das disfluências, sendo que a maioria não é típica da gagueira; coarticulação entre os sons; pausas em posições atípicas (ST. LOUIS; SCHULTE, 2011). Outros achados sobre a taquifemia pontuam que o distúrbio pode estar associada a distúrbios motores, de linguagem, do processamento auditivo central, ao transtorno do espectro autista, transtorno do déficit de atenção com hiperatividade, HARMONIA EDITORA LTDA, CNPJ 07.634.888/0001-63. Avenida Dom Orlando Chaves. Nº. 2655 – Cristo Rei, Várzea Grande/MT. 6 Síndrome de Tourette, bem como distúrbios neurológicos e casos de má-formação congênita (BÓNA, 2012; ST. LOUIS et al., 2010). AMERICAN SPEECH AND HEARING ASSOCIATION. Special interest division 4: Fluency and fluency disorders. Terminology pertaining to fluency andfluency disorders: Guidelines. ASHA, v. 41, p. 29-36, 1999. ANDRADE, C.R.F. Fluência. In: ANDRADE, C. R. F.; BÉFI-LOPES, D. M.; FERNANDES, F.D.M.; WERTZNER, H.F. (org.). ABFW: teste de linguagem infantil nas áreas de fonologia, vocabulário, fluência e pragmática. Carapicuíba: Pró-Fono, p. 61-75, 2011. ANDRADE, C.R.F. Fluência. In: ANDRADE, C.R.F. et al. 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