Prévia do material em texto
<p>AULA 1</p><p>LEITURA E PRODUÇÃO</p><p>DE TEXTO</p><p>Profª Zuleica Aparecida Cabral</p><p>2</p><p>CONVERSA INICIAL</p><p>A leitura e a produção de textos são alicerce para todas as nossas práticas</p><p>diárias. Basta observamos que, já ao acordar, fazemos a leitura do dia:</p><p>investigamos se vai chover ou fazer sol, lemos a mensagem no celular...; também</p><p>escrevemos algo, por mais simples que seja: um bom dia na mensagem do</p><p>WhatsApp, um bilhete na geladeira, entre outros.</p><p>Nesse sentido, este curso foi estruturado com base na concepção de que</p><p>o texto é o lugar da interação, e é nesse lugar que somos construídos como</p><p>sujeitos, por meio das nossas ações linguísticas que estabelecem sentidos dentro</p><p>de sua organização.</p><p>Vamos nos basear nos estudos de Koch e Elias (2007), professoras</p><p>pesquisadoras da Linguística Textual, ciência que toma o texto como objeto de</p><p>estudo.</p><p>Ao longo do curso vamos apresentar uma série de conhecimentos</p><p>referentes à língua, aos textos, às coisas do mundo e às situações de</p><p>comunicação, de forma a levar você a participar na construção de sentidos,</p><p>visando ser estrategista na interação pela linguagem para que, assim, construa</p><p>com seus alunos os conhecimentos e estratégias para produção e leitura de</p><p>textos.</p><p>Nesta primeira aula vamos discutir, em escopo amplo, leitura, texto e</p><p>sentido, com vistas a fundamentar as concepções de leitura e texto, as estratégias</p><p>de leitura, os fatores de compreensão da leitura, os contextos de uso e os</p><p>contextos de produção, até encerrarmos em texto e leitura como indissociáveis no</p><p>processo de alfabetização e letramento.</p><p>CONTEXTUALIZANDO</p><p>Você já parou para pensar sobre concepções de texto e leitura? Já pensou</p><p>em como é importante saber de que lugar teórico devemos partir para trabalhar</p><p>com texto? Nesta aula vamos nos ater às concepções de leitura e, por</p><p>conseguinte, às concepções de texto e língua, visando fortalecer os processos de</p><p>compreensão da leitura e produção de texto. Destacamos a importância dessa</p><p>discussão para que haja compreensão sobre o processo dialógico que norteia o</p><p>trabalho do professor em sala de aula; devemos compreender que, ao falarmos</p><p>de texto e leitura, estamos falando de “língua(gem)”. Falamos de encontros,</p><p>3</p><p>desencontros e confrontos de posições, porque somos todos seres constituídos</p><p>na e pela linguagem. Portanto, como destaca Geraldi (1993), focar na</p><p>“língua(gem)” com base no processo interlocutivo é pensar em um processo</p><p>educacional que exige olhar para o outro em suas singularidades, isto é, focalizar</p><p>a interação verbal como lugar de produção de “língua(gens)” e dos sujeitos.</p><p>Nesse processo interacional, a língua não está, de antemão, dada como</p><p>pronta e acabada, mas sim em ação de reconstrução por meio da linguagem.</p><p>Convém destacar que, ao longo da história da Educação, já tivemos muitas</p><p>concepções de língua e linguagem; isso não quer dizer que uma concepção</p><p>excluiu a outra, mas que foram sendo reformuladas de acordo com as</p><p>necessidades de ensino. Aqui, quero ressaltar que adoto o termo “língua(gem)”,</p><p>usado dessa forma, com os parênteses, para explicar que língua e linguagem são</p><p>termos interdependentes. A língua não é um sistema de regras e normas a serem</p><p>seguidas, ela é um processo discursivo que muda de acordo com a situação de</p><p>uso, portanto, usamos a língua em diversas linguagens e de modos variados em</p><p>cada uma delas, sem a determinação de uma língua (regra) única e certa. A língua</p><p>está para a linguagem assim como a linguagem está para a língua; desse modo,</p><p>“língua(gem)” é uma prática discursiva que está em processo em cada situação</p><p>efetiva de uso, da mais informal à mais formal, porém sempre dentro de um</p><p>contexto.</p><p>Cada sujeito se constitui como tal na interação com os outros, baseado em</p><p>seu conhecimento de mundo; é um ser social que vai se (re)construindo e se</p><p>completando em suas falas (textos, leituras). As interações acontecem dentro de</p><p>um contexto social e histórico, respeitando as singularidades e a formação social,</p><p>ou seja, crenças, tradição, instituição social, comportamentos, processos de</p><p>aprendizagem etc.</p><p>Trocando em miúdos, a criança é um sujeito social que interage em</p><p>diversas situações e traz consigo um conhecimento pautado no que ela vive. Suas</p><p>interações vão sendo construídas por meio da língua em práticas de linguagem e,</p><p>assim, ela vai se construindo como sujeito na linguagem e pela linguagem.</p><p>TEMA 1 – CONCEPÇÕES DE LEITURA</p><p>Tomamos como pressuposto básico que o texto é o lugar das interações</p><p>de sujeitos sociais, conforme preconiza Bakhtin (1997), e nele os sujeitos se</p><p>constituem e são constituídos dialogicamente. Kock e Elias (2007, p. 7) dizem que</p><p>4</p><p>[...] é por meio de ações linguísticas e sociocognitivas que se constroem</p><p>objetos-de-discurso e propostas de sentido e [os sujeitos] ao operarem</p><p>escolhas significativas entre as múltiplas formas de organização textual</p><p>e as diversas possibilidades de seleção lexical que a língua lhes põe à</p><p>disposição [constituem-se enquanto sujeitos por meio do texto, que é o</p><p>lugar da interação].</p><p>Isso quer dizer que em todo e qualquer texto há uma gama de situações</p><p>implícitas, de inúmeros modos que são observados pela mobilização do contexto</p><p>sociocognitivo em que se movem os atores sociais.</p><p>Saiba mais</p><p>Para ilustrar esse pressuposto, confira o movimento de nossos pequenos</p><p>atores sociais por meio da leitura: A leitura inspira as crianças (Max’s love letter)</p><p>Disponível em: . Acesso em:</p><p>25 nov. 2022.</p><p>A leitura exige muito mais que o simples conhecimento linguístico</p><p>compartilhado entre os interlocutores; ela precisa participar de forma ativa na</p><p>construção de sentidos.</p><p>Nessa direção, vejamos as concepções de leitura que são decorrentes da</p><p>concepção de sujeito, de língua, de texto e de sentido que se deve adotar para o</p><p>trabalho em sala de aula.</p><p>1.1 Foco no autor</p><p>Quando a produção de texto volta sua atenção apenas para o autor,</p><p>determinada concepção de língua, texto e sujeito é posta em foco. Koch e Elias</p><p>(2007, p. 9) afirmam que, nessa perspectiva, a concepção de “língua como</p><p>representação do pensamento e o sujeito como psicológico, individual, dono de</p><p>sua vontade e suas ações”.</p><p>Nesse norte, o sujeito é dono de seu dizer e representa seu conhecimento</p><p>na escrita, que deve ser apreendida pelo interlocutor tal como o autor idealizou.</p><p>Assim, o texto seria meramente um produto pronto e acabado, lógico, do</p><p>pensamento do autor. Não resta ao leitor nada mais que ler e entender as</p><p>intenções do autor em um papel completamente passivo. Por conseguinte, a</p><p>leitura nada mais seria que uma atividade de interpretação do que o autor quis</p><p>dizer, captando suas intenções.</p><p>Ao adotar essa concepção de leitura, não há possibilidade de interação da</p><p>criança com o texto; tudo está escrito e ela simplesmente precisa ler e entender</p><p>https://www.youtube.com/watch?v=hducz1b-z5E</p><p>5</p><p>as ideias do autor. Vale destacar que essa concepção de leitura não é mais</p><p>preconizada pelos documentos oficiais; no entanto, muitas vezes permanece</p><p>sendo executada, calando os sujeitos e doutrinando a criança a encontrar a</p><p>resposta correta.</p><p>1.2 Foco no texto</p><p>Koch e Elias (2007, p. 10) nos trazem, nesse foco, a “concepção de língua</p><p>como estrutura e de um sujeito assujeitado, caracterizado por uma espécie de não</p><p>consciência”: a língua entendida como um sistema, um código que passa a ser</p><p>mero instrumento de comunicação. Nesse caso, o sujeito é determinado por esse</p><p>sistema estrutural da língua. As regras, os usos e o conhecimento da língua são</p><p>determinados pela norma de uma língua única e correta, prescrita por uma</p><p>gramática ideal. Se o texto obedece a todas as regras da língua, ele está correto</p><p>e dotado de sentidos. Por sua vez, o texto permanece sendo produto que deve</p><p>ser decodificado pelo</p><p>leitor, como se a atividade de leitura fosse uma via de mão</p><p>única – um emissor escreve para um receptor –, não havendo retorno do receptor</p><p>para o emissor. A leitura, nesse foco, é linear – o leitor deve fazer o</p><p>reconhecimento das palavras e frases, ou seja, apenas reproduzir o que está dito.</p><p>Apropriar-se dessa concepção é limitar a criança à mera reprodução de um</p><p>texto que já está pronto e, caso ela não consiga reconhecer o que está dito no</p><p>texto, significa que ela não sabe ler.</p><p>1.3. Foco na interação autor-texto-leitor</p><p>Ao contrário das concepções anteriores, nesse foco trazemos os estudos</p><p>de Mikhail Bakhtin sobre a concepção interacional da língua (dialógica), em que</p><p>os sujeitos são vistos como atores sociais, sujeitos que são ativos e se constroem</p><p>social e dialogicamente por meio do texto, levando sempre em consideração o</p><p>lugar da interação e a constituição dos interlocutores (para quem escrevo, como</p><p>escrevo, qual o contexto etc.). Nessa perspectiva, o sentido do texto passa a ser</p><p>construído na interação entre o próprio texto e os sujeitos nele envolvidos. A leitura</p><p>é uma atividade de produção de sentidos, altamente interativa e complexa, que</p><p>mobiliza uma vasta gama de conhecimentos dos atores sociais (sujeitos ativos na</p><p>interação) por meio de informações que estão presentes na superfície do texto.</p><p>Vejamos a tirinha a seguir.</p><p>6</p><p>Figura 1 – Leitura da tirinha da Turma da Mônica</p><p>Fonte: Mauricio de Sousa Produções Ltda., 1999.</p><p>Podemos depreender da tirinha acima as informações que estão explícitas</p><p>e também as que ficam sugeridas na clara demonstração de que o anjo da guarda</p><p>de Cebolinha não negou ajuda, mas estava ao seu lado após a surra que levou</p><p>da Mônica. O texto aqui não é apenas um produto de decodificação, já que, por</p><p>meio das imagens, é possível tecer várias considerações sobre o texto, incitando</p><p>as crianças com perguntas e discussões, tais como: Por que será que a Mônica</p><p>estava tão brava? Seria algo tão ruim assim o que o Cebolinha aprontou para a</p><p>Mônica? Por que ele se ajoelhou implorando? Ele poderia ter corrido da Mônica?</p><p>Por que não correu? O que o segundo quadrinho indica? Por que o anjo da guarda</p><p>de Cebolinha apareceu somente depois da surra?</p><p>Quais seriam as possíveis respostas a essas perguntas? Vamos elencar</p><p>algumas. Para a primeira pergunta, poderíamos esperar como resposta o aluno</p><p>dizer que o Cebolinha roubou o coelho da Mônica; porém, se os alunos não</p><p>conhecerem o personagem, podem chegar a outras conclusões, as quais devem</p><p>ser consideradas para não desestimular as crianças. Além de roubar o Sansão (o</p><p>coelho da Mônica), o Cebolinha pode ter dado o brinquedo para outra criança, e</p><p>isso deixou Mônica ensandecida. Cebolinha se ajoelhou como forma de apelo e</p><p>arrependimento, certo? Se ele tivesse corrido, poderia levar uma surra ainda pior.</p><p>O anjo do Cebolinha apareceu depois, talvez para mostrar a ele que,</p><p>indiferentemente ao que Cebolinha fez de errado, o anjo é a bondade e o perdão.</p><p>Evidentemente, são possíveis respostas que suscitam uma série de discussões</p><p>com as crianças, de modo a levá-las a refletir que a leitura é muito mais que</p><p>decodificação de imagens ou palavras.</p><p>7</p><p>Reiteramos, assim, a concepção interacional da língua, privilegiando os</p><p>atores sociais e seus conhecimentos, já que o sentido do texto não está lá, mas é</p><p>construído com os sujeitos por meio da leitura.</p><p>TEMA 2 – ESTRATÉGIAS E OBJETIVOS DE LEITURA</p><p>O que esperamos da criança enquanto leitora de um texto? É fundamental</p><p>que ela processe as informações nele contidas; esperamos que desenvolva a</p><p>capacidade crítica para contradizer e\ou avaliar informações; enfim, que</p><p>estabeleça sentido para aquilo que lê. Evidentemente, para produzir, as crianças</p><p>precisam ler muito, buscar subsídios em muitas fontes para então colocar no papel</p><p>os sentidos que compreenderam, seus conhecimentos interligados a essas</p><p>leituras para a construção do texto.</p><p>Para isso, precisamos deixar claro que temos objetivos quando lemos, por</p><p>mais que essa leitura seja por fruição (aquela leitura chamada “por prazer”).</p><p>Lemos para nos manter informados, lemos para fazer pesquisas, lemos para fazer</p><p>consultas, lemos o tempo todo, com mais ou menos atenção. A leitura está</p><p>presente em nossas práticas e não é apenas a decodificação de códigos verbais.</p><p>Temos também a leitura imagética (imagens em geral), a leitura de ações e</p><p>atitudes, leitura de silêncios – somos leitores constantes do mundo. Essas leituras</p><p>agregam conhecimentos que ajudam em leituras monitoradas, ou seja, as leituras</p><p>que são orientadas na escola, no processo de ensino/aprendizagem.</p><p>As leituras requerem estratégias, que são técnicas ou métodos para</p><p>ensinar a retirar as informações necessárias ao leitor; são procedimentos para</p><p>auxiliar no processo de compreensão. Dentre essas estratégias, destacamos</p><p>primeiramente o monitoramento da leitura. É importante tornar a leitura, de fato,</p><p>um processo interativo, levando a criança a saber quem é o autor do texto, em</p><p>que meio esse texto está veiculado – por exemplo: livros, jornais, revistas etc. –,</p><p>o gênero (tema que discutiremos mais adiante), o título, que orienta a construção</p><p>do sentido, quais informações podemos retirar desse ou daquele texto, os</p><p>personagens da história em questão, que sentimentos o texto desperta, o que se</p><p>espera da leitura. Por meio do trabalho monitorado, é possível conduzir a criança</p><p>para dentro da leitura, levando-a a participar ativamente da construção do sentido</p><p>do texto e a estabelecer várias outras relações por meio dele.</p><p>Outra estratégia de leitura refere-se à aprendizagem cooperativa: uma</p><p>leitura em conjunto, coletiva, para, em seguida, fazer uma roda de discussão sobre</p><p>8</p><p>o texto lido. É importante que nessa ocasião o professor capture os</p><p>conhecimentos de mundo dos alunos. Esse é um momento importante para “olhar</p><p>o outro”, pois é uma atividade que permite conhecer melhor cada um dos alunos</p><p>que participam de nossa sala de aula.</p><p>Empreender uma organização semântica ou gráfica do texto também é uma</p><p>estratégia interessante com crianças. É o momento em que o professor incita a</p><p>criança a criar um desenho sobre a história, ou reproduzir a história com as</p><p>próprias palavras, ou solicita a modificação de um personagem ou mesmo do</p><p>início ou fim da história. Com essa estratégia o professor confere ao aluno o direito</p><p>de mostrar os sentidos que construiu com a leitura e de produzir seu texto,</p><p>ressignificando-o para o seu lugar de interação, isto é, compreendendo que ele, o</p><p>aluno, é um sujeito ativo que se constrói como sujeito por meio da interação com</p><p>o texto, não sendo simplesmente reprodutor do que lê e/ou escreve.</p><p>Outra estratégia seria traçar a estrutura do enredo, ensinando a questionar</p><p>e a responder ao texto, interagindo com ele por meio de perguntas, como: Quem?</p><p>O quê? Quando? Onde? É possível traçar uma linha do tempo, caracterizando</p><p>personagens e acontecimentos.</p><p>A estratégia mais comum para produção de texto é a de responder</p><p>perguntas: o professor faz perguntas a respeito do texto e o leitor recebe o</p><p>feedback sobre sua resposta, levando todos os demais a refletirem também.</p><p>Todavia, é importante trabalhar essa estratégia com muito cuidado para que as</p><p>respostas nãos sejam automáticas, sem que haja de fato reflexão sobre o texto.</p><p>Como exemplo, vamos ler a história abaixo.</p><p>O leão e o ratinho</p><p>Um leão, cansado de tanto caçar, dormia espichado debaixo da sombra</p><p>boa de uma árvore. Vieram uns ratinhos passear em cima dele e ele</p><p>acordou. Todos conseguiram fugir, menos um, que o leão prendeu</p><p>debaixo da pata. Tanto o ratinho pediu e implorou que o leão desistiu de</p><p>esmagá-lo e deixou que fosse embora. Algum tempo depois o leão ficou</p><p>preso na rede de uns caçadores. Não conseguindo se soltar, fazia a</p><p>floresta inteira tremer com seus urros de raiva. Nisso apareceu o ratinho,</p><p>e com seus dentes afiados roeu</p><p>as cordas e soltou o leão. Moral: uma</p><p>boa ação ganha outra. (Fábulas Pequenas. O leão e o ratinho. Refletir</p><p>para refletir. Disponível em:</p><p>. Acesso em:</p><p>29 jun. 2018.</p><p>Após a leitura do texto em voz alta com a turma, é hora de começar a</p><p>questionar nossos pequenos leitores: Por que os personagens são um rato e um</p><p>leão? O objetivo é levá-los a pensar que nem sempre tamanho significa força, e</p><p>que nem sempre a força exige tamanho. É um excelente momento para tecer</p><p>http://www.refletirpararefletir.com.br/fabulas-pequenas</p><p>9</p><p>reflexões sobre diversidade, respeito, colaboração etc. Por que será que o leão</p><p>segurou o ratinho? Foi proposital? Ou ele prendeu o ratinho no momento em que</p><p>se mexeu e nem percebeu isso? Se os alunos disserem que foi proposital, solicite</p><p>que justifiquem essa escolha com uma passagem do texto. Ele soltou o ratinho</p><p>por bondade ou por que estava com a barriga cheia e cansado? Quando o leão</p><p>soltou o ratinho, será que foi motivado por pensar que sua ação poderia lhe trazer</p><p>benefícios no futuro?</p><p>Vale destacar que essas são sugestões de perguntas, e é claro que outras</p><p>podem ser tecidas. Você pode solicitar também que um aluno faça perguntas</p><p>sobre o texto a um colega da classe, pois esse trabalho permite que o aluno</p><p>perceba seu papel de ator social no processo interativo da leitura.</p><p>Também é possível trabalhar com perguntas geradoras. Nessa estratégia,</p><p>quem faz as perguntas é o próprio leitor, ou seja, o aluno. É relevante destacar</p><p>que, com essa estratégia, buscamos criar a autonomia do leitor, para que em</p><p>qualquer leitura aprenda a questionar o que está sendo lido. Desse modo, ele vai</p><p>criando um roteiro para a construção de sentido. Vale destacar que as crianças</p><p>são por natureza curiosas; assim, permitir que elas mesmas questionem o texto e</p><p>tragam para a discussão suas questões ajudará que produzam textos criativos,</p><p>sendo críticas sobre suas leituras e produções.</p><p>A prática do resumo também é um exercício enriquecedor, pois a criança</p><p>leitora tenta identificar as ideias principais que unem ou integram o texto,</p><p>compreendendo que é uma unidade coerente, dotada de sentidos interligados</p><p>pelas ideias que ali estão.</p><p>Para encerrar essas sugestões de táticas mais utilizadas em leitura e</p><p>produção de texto, destacamos o ensino com múltiplas estratégias, que é bastante</p><p>eficaz nas séries iniciais, pois utiliza procedimentos flexíveis e adequados para</p><p>cada série e/ou idade. Enfatizamos que essas estratégias precisam ser</p><p>trabalhadas em conjunto com o currículo e adaptadas de acordo com a prática de</p><p>ensino. No primeiro ano, quando a criança ainda está em processo de aquisição</p><p>da escrita de forma mais autônoma, é bastante indicado o trabalho com pequenos</p><p>desenhos, seguidos de explicação oral do que a criança leu. Conforme a criança</p><p>evolui e aumenta o domínio da escrita, sugere-se o trabalho com resumos, que é</p><p>uma interpretação escrita, para depois seguir para a produção do texto. Todo esse</p><p>trabalho precisa ter os objetivos bem definidos, a fim de que a compreensão</p><p>aconteça de fato.</p><p>10</p><p>TEMA 3 – FATORES DE COMPREENSÃO DA LEITURA</p><p>Compreender o que se lê é um processo bastante complexo. A</p><p>compreensão acerca do que se lê varia de acordo com as circunstâncias da leitura</p><p>e depende de inúmeros fatores. Convém destacar que nesse processo há o</p><p>envolvimento do leitor com a língua e, por se tratar de compreensão de leitura</p><p>com crianças, é preciso levar em conta como a criança compreende a língua, os</p><p>códigos. Com base nesse conhecimento prévio do aluno, é necessário saber o</p><p>que a criança conhece do tema em questão, qual o conhecimento de mundo dessa</p><p>criança a respeito do tema, em que lugar ele já ouviu falar sobre isso etc., visando</p><p>iniciar o processo de compreensão do texto.</p><p>Destacamos que na leitura há uma relação entre o autor/leitor, o</p><p>reconhecimento de elementos linguísticos, a bagagem cultural e a circunstância</p><p>em que o texto foi produzido. Muitas vezes, as crianças ainda encontram</p><p>dificuldades no reconhecimento de elementos linguísticos, isto é, palavras,</p><p>expressões, pontuação etc. Por isso é importante o professor ajudar o aluno a</p><p>voltar ao texto tendo como base suas dificuldades, retomando a leitura, pedindo</p><p>que releia, pois assim as crianças têm a oportunidade de voltar com calma e</p><p>refazer a leitura. O vídeo sugerido abaixo mostra como esse modelo de</p><p>compreensão pode ser aplicado.</p><p>Saiba mais</p><p>COMO MELHORAR a fluência de leitura de seus alunos. Fundação Lemann, 13</p><p>set. 2013. Disponível em: .</p><p>Acesso em: 25 nov. 2022.</p><p>3.1 Autor/leitor</p><p>No que se refere ao conhecimento linguístico, é necessário um “acordo</p><p>tácito” entre autor e leitor: quem escreve um texto deve levar em consideração o</p><p>público a que se destina, e o mesmo acontece com o leitor, pois a seleção do texto</p><p>lido precisa fazer parte do conhecimento prévio que se tem sobre o assunto.</p><p>Assim, o professor precisa selecionar um texto que esteja de acordo com a faixa</p><p>etária de sua turma; em seguida, é indicado fazer a leitura com a criança, parando</p><p>nos elementos da língua que, a princípio, o professor julgue que o aluno</p><p>desconheça. Após essa leitura, perguntar se há outras palavras cujo significado</p><p>11</p><p>as crianças não saibam e se, de acordo com o texto, conseguem saber a que se</p><p>referem.</p><p>Feito o trabalho inicial de mobilizar o conjunto de conhecimentos</p><p>linguísticos dos alunos, conforme explicitado acima, é momento de a criança</p><p>iniciar a construção de sentido. Também é possível discutir o gênero do texto</p><p>estudado (estudaremos esse tema mais adiante).</p><p>Além desses fatores, há outros que precisam ser considerados muito antes</p><p>da leitura em conjunto, como, por exemplo, o tamanho das letras, bem como sua</p><p>clareza; também a cor, a textura do papel, o comprimento das linhas, a</p><p>constituição dos parágrafos – se muito longos e/ou curtos demais. Muito embora</p><p>sejam aspectos materiais do texto, eles interferem na compreensão da criança.</p><p>Apesar de, como professores, estarmos focados em como ensiná-las a</p><p>compreender o que leem, as crianças estão atentas a esses aspectos materiais,</p><p>que podem chamar à atenção no momento da leitura.</p><p>Ainda é necessário despertar a consciência fonológica, destacar que</p><p>diferentes letras produzem sons diferentes, desenvolver o princípio alfabético da</p><p>grafia e do som que há na palavra. Pronunciar as palavras e escrevê-las ajuda a</p><p>criança a decodificá-las e entender que elas dão fluência e ritmo ao texto; deve-</p><p>se trabalhar com rimas, trava línguas, repetição de vogais e consoantes em início</p><p>de palavras. Esse é um trabalho que pode ser feito com poesias e canções,</p><p>levando as crianças a perceberem que essa repetição de consoantes e vogais</p><p>representa uma ideia no texto. Por exemplo, no texto abaixo, a repetição do</p><p>fonema /P/ representa o som que o pato faz; a repetição do fonema /A/ com o /P/</p><p>traz a representação do som do pato. Esses e outros recursos podem ser</p><p>cantados e recitados, levando as crianças a perceberem que os jogos de letras e</p><p>sons são recursos para construção de sentido.</p><p>O Pato</p><p>Quén! Quen! Quén! Quen!</p><p>Quén! Quen! Quén! Quen!</p><p>Quén! Quen! Quén! Quen!</p><p>Quén! Quen! Quén! Quen!</p><p>Lá vem o Pato</p><p>Pata aqui, pata acolá</p><p>Lá vem o Pato</p><p>Para ver o que é que há</p><p>Lá vem o Pato</p><p>Pata aqui, pata acolá</p><p>Lá vem o Pato</p><p>Para ver o que é que há</p><p>O Pato pateta</p><p>Pintou o caneco</p><p>Surrou a galinha</p><p>Bateu no marreco</p><p>Pulou do poleiro</p><p>No pé do cavalo</p><p>Levou um coice</p><p>Criou um galo</p><p>Comeu um pedaço</p><p>De jenipapo</p><p>Ficou engasgado</p><p>Com dor no papo</p><p>Caiu no poço</p><p>Quebrou a tigela</p><p>12</p><p>Tantas fez o moço</p><p>Que foi pra panela</p><p>Quá! Quá! Quá! Quá Quá!</p><p>Quá! Quá! Quá! Quá Quá!</p><p>Quá! Quá! Quá! Quá Quá!</p><p>Lá vem o Pato</p><p>Pata aqui, pata acolá</p><p>Lá vem o Pato</p><p>Para ver o que é que há</p><p>Lá vem o Pato</p><p>Pata aqui, pata acolá</p><p>Lá vem o Pato</p><p>Para ver o que</p><p>é que há</p><p>O Pato pateta</p><p>Pintou o caneco</p><p>Surrou a galinha</p><p>Bateu no marreco</p><p>Pulou do poleiro</p><p>No pé do cavalo</p><p>Levou um coice</p><p>Criou um galo</p><p>Comeu um pedaço</p><p>De jenipapo</p><p>Ficou engasgado</p><p>Com dor no papo</p><p>Caiu no poço</p><p>Quebrou a tigela</p><p>Tantas fez o moço</p><p>Que foi pra panela</p><p>Caiu no poço</p><p>Quebrou a tigela</p><p>Tantas fez o moço</p><p>Que foi pra panela. (Moraes,</p><p>2004, p. 12)</p><p>Além dos recursos elencados acima, destinados a promover a interação</p><p>autor-leitor no texto, a pontuação também é elemento importante para a</p><p>compreensão do que se lê, constituindo marcas com função dentro do texto. A</p><p>pontuação pode ajudar a marcar o ritmo, a assonância e, por isso, sua ausência</p><p>pode comprometer a própria construção de sentidos; a ausência proposital de</p><p>pontuação pode marcar um recurso de interação do autor com o leitor, levando-o</p><p>a construir outros significados para o texto. No texto acima, há apenas a marcação</p><p>do ponto de exclamação na primeira estrofe e, no restante do texto, não há marca</p><p>alguma de pontuação.</p><p>Portanto, como enfatiza Santos (1990), não basta que o leitor somente</p><p>decodifique, mas é preciso que contextualize e atribua significado à leitura.</p><p>Destacamos que é de suma importância levar a criança a gostar do ato de ler, de</p><p>escrever; a ludicidade e o olhar atento do professor devem fazer parte da sua</p><p>prática em sala de aula. É possível ter estímulo por meio de vídeos, músicas e</p><p>desenhos, constituindo sempre um apoio para o ensino-aprendizagem. Um</p><p>exemplo disso é a música “Linhas e letrinhas” do grupo Palavra Cantada, que</p><p>pode ser encontrada no Youtube (confira na seção “Saiba Mais”, logo a seguir).</p><p>São recursos que podem servir como referência para a compreensão do texto.</p><p>Além disso, pode-se contar com outros estímulos, como, por exemplo: trabalhar</p><p>com cantigas de roda, pesquisando onde e por que foram criadas, criar poesias</p><p>com imagens, produzir cartas enigmáticas, criar mapas do tesouro para a</p><p>brincadeira no intervalo, escrever as regras de uma brincadeira que as crianças</p><p>gostam, dentre outros.</p><p>13</p><p>Saiba mais</p><p>PALAVRA Cantada | Linhas e Letrinhas. Palavra Cantada Oficial, 4 set. 2013.</p><p>Disponível em: . Acesso em:</p><p>29 jun. 2018.</p><p>BRINCAR de ler. Ernesto, 22 abr. 2014. Disponível em:</p><p>. Acesso em: 29 jun. 2018.</p><p>BÊ-Á-BÁ – Toquinho. Baldonari, 21 fev. 2010. Disponível em:</p><p>. Acesso em: 25 nov. 2022.</p><p>TEMA 4 – TEXTO E CONTEXTO: CONTEXTO DE PRODUÇÃO E CONTEXTO DE</p><p>USO</p><p>Depois que um texto é escrito, ele passa a ter existência independente do</p><p>autor. Koch e Elias (2007) destacam que entre a produção do texto escrito e sua</p><p>leitura pode passar muito tempo. Por isso, o contexto, tanto da produção quanto</p><p>das circunstâncias em que o texto foi escrito, pode ser completamente diferente</p><p>do contexto de uso, ou seja, das circunstâncias da leitura. Esse é um fator a ser</p><p>levado em consideração, porque interfere na produção de sentido. Destacamos</p><p>essa mudança na produção de sentido justamente porque as crianças têm muito</p><p>acesso ao universo da web, do mundo on-line, com televisão a cabo e celulares</p><p>etc. Como disse Cortella (2000), a criança, quando vai para a escola, tem mais de</p><p>5 mil horas de televisão em sua bagagem, e isso deve ser levado em consideração</p><p>pelo professor, haja vista que essas crianças têm muitas informações que fazem</p><p>parte do seu conhecimento de mundo. Esses conhecimentos e informações</p><p>podem e devem ser retomados no momento de leitura, de compreensão e de</p><p>produção dos próprios textos.</p><p>Vejamos as ilustrações abaixo que nos remetem a diferentes</p><p>interpretações.</p><p>Figura 2 – O uso da Fita VHS e da Fita K7</p><p>Fonte: Rose Carson/Shutterstock; OlegDoroshin/Shutterstock.</p><p>14</p><p>Ao observar as imagens acima, para muitos de nós não há estranhamento.</p><p>Porém, como as crianças entenderiam que, um dia, as memórias eram</p><p>preservadas nessas fitas VHS? Ou que esse porta-caneta foi criado com base em</p><p>uma fita K-7, que foi substituída pelo CD, pelo pen-drive e, mais atualmente, pelo</p><p>cartão de memória? Isso quer dizer que, se não houver conhecimento do que está</p><p>sendo tratado, ou do objetivo ao fazer referência a um texto, ou de expressões</p><p>que fazem parte de outro contexto histórico, as relações de sentido podem gerar</p><p>outras compreensões que nem sempre são aquelas que estão expostas no texto.</p><p>Comprovamos, assim, que o contexto de produção e o contexto de uso são</p><p>diferentes, podendo remeter a outras construções de sentido.</p><p>Uma atividade interessante para desenvolver com as crianças seria o</p><p>professor guardar a primeira produção de texto que a turma fizer durante o ano.</p><p>No último bimestre de aulas, o professor devolve os textos para os alunos e</p><p>conduz uma discussão que os faça refletir sobre como produziram aquele texto, o</p><p>que queriam dizer naquele momento; por fim, pode pedir para que reescrevam o</p><p>texto e comparem as duas versões. É uma atividade que os levará a perceber o</p><p>texto como processo e a variação dos sentidos de acordo com as circunstâncias.</p><p>4.1 Elementos do contexto</p><p>Sempre que se escreve, mobiliza-se elementos sobre o contexto, muitas</p><p>vezes até inconscientemente; porém, esses elementos vão influenciar a</p><p>sequência do texto. São eles: a imagem que o autor passa de si, os possíveis</p><p>destinatários do texto, o local no qual o texto pode circular, seu objetivo e o</p><p>momento da publicação. Vejamos cada um detalhadamente:</p><p>1. Sempre que se produz um texto, principalmente os primeiros textos na</p><p>escola, tentamos passar uma imagem sobre nós mesmos naquele</p><p>momento como alunos. Assim, sempre que a criança for levada a pensar</p><p>sobre a leitura e, por conseguinte, a produzir um texto, haverá uma</p><p>representação dela mesma no texto. O primeiro passo para a produção é</p><p>partir de si próprio; o parâmetro é sempre subjetivo, com base em como o</p><p>sujeito se vê e como se representa na sociedade.</p><p>2. O segundo passo é mostrar que todo texto deve ser escrito para alguém;</p><p>desse modo, o aluno precisa ter em mente para quem escreve, e como fará</p><p>isso.</p><p>15</p><p>3. O local do texto é o lugar representado na escrita: como o autor</p><p>contextualiza para quem escreve, em que lugar o interlocutor desse texto</p><p>se encontra.</p><p>4. O contexto histórico será exposto também; portanto, por meio do texto de</p><p>cada criança é possível perceber o mundo em que ela vive.</p><p>5. Por último, mesmo que inconscientemente, a criança tenta convencer, por</p><p>meio do seu texto, que ela é capaz de justificar o porquê de escrever desse</p><p>ou daquele modo; sempre que se escreve, a escrita tem uma finalidade,</p><p>seja ela de convencer, de informar, de argumentar etc.</p><p>Ao observar os elementos do contexto, é perceptível que haverá mudanças</p><p>no momento de uso, isso porque cada texto tem um objetivo específico, um</p><p>público diferente, diferentes locais de circulação etc. Portanto, os textos não</p><p>podem ser vistos como estanques e com um único caminho para a compreensão.</p><p>Muito embora os elementos do contexto não sofram tanta alteração, o contexto</p><p>histórico e social passa por transformações constantemente. Por isso,</p><p>apresentaremos nas aulas seguintes alguns caminhos que podem ser explorados</p><p>na leitura e produção; no entanto, não há uma receita pronta que sempre</p><p>funcionará, e sim estratégias para encaminhar os alunos a desenvolver a</p><p>criticidade, a criatividade e a autonomia. Há várias possibilidades de leitura de um</p><p>texto.</p><p>TEMA 5 – TEXTO E LEITURA</p><p>Leitura e texto são atividades inerentes a todo o processo de</p><p>ensino\aprendizagem.</p><p>O professor precisa e deve investir em atividades que exijam a leitura, a</p><p>compreensão e a redação de texto, selecionando textos de gêneros e tipos</p><p>variados, levando o aluno a se posicionar, elevando pouco a pouco o nível de</p><p>dificuldade. Isso porque os processos de leitura e de escrita são atividades que</p><p>exigem intensa participação</p><p>dos atores sociais (sujeitos ativos na interação com</p><p>o texto), pois, se o autor apresenta lacunas no texto, exige que o leitor</p><p>pressuponha conhecimentos partilhados para completar tais lacunas. Além disso,</p><p>há todo o modelo cognitivo baseado em conhecimentos que estão armazenados,</p><p>e que podem ou não se confirmar ao longo do texto, demandando um trabalho de</p><p>construção de conhecimentos, sentido, saberes.</p><p>16</p><p>Como afirmam Koch e Elias (2007, p. 35), “A leitura é uma atividade de</p><p>construção de sentido que pressupõe a interação autor-texto-leitor, logo é preciso</p><p>considerar além de pistas e sinalizações que o texto oferece, considerar os</p><p>conhecimentos do leitor”.</p><p>5.1 Leitura</p><p>Ao longo desta aula, buscamos mostrar que a leitura é uma atividade que</p><p>necessita da intensa participação do leitor, já que, se o autor deixar lacunas no</p><p>texto, é necessário que o leitor complete esses vazios por meio de uma série de</p><p>contribuições.</p><p>O processo de leitura implica conhecimentos armazenados na memória do</p><p>leitor e, como leitores, estabelecemos com o autor uma série de conhecimentos</p><p>implícitos que vão sendo inferidos ao longo do texto. Nesse sentido, afirmarmos</p><p>que a leitura é um processo dialógico, o qual exige que leitor e autor interajam de</p><p>maneira dinâmica e que estejam de algum modo interligados, ou seja, que haja</p><p>conhecimento compartilhado.</p><p>O contato com a leitura aumenta a percepção de contato com o mundo: ao</p><p>ler, o sujeito estabelece maior relação com o mundo, uma vez que vai construindo</p><p>sentido para os textos que o cercam, potencializando a criatividade, o</p><p>posicionamento crítico, a construção cultural. Como diz Freire (1997, p. 11), “A</p><p>leitura do mundo precede a leitura da palavra”. O ato de leitura significa atribuir</p><p>sentido ao texto, relacionando-o com os contextos e experiências do leitor.</p><p>O professor tem papel fundamental nesse processo, mostrando à criança</p><p>o universo novo que a cerca, ampliando a percepção dela em relação ao mundo.</p><p>Ele tem o papel de interligar a leitura com os interesses da criança e com as suas</p><p>necessidades, porque a leitura é muito mais que decifrar os sinais gráficos, que</p><p>decodificar as palavras, visto ter papel fundamental em formar um sujeito crítico,</p><p>político, social, cultural, histórico, que interage e constrói sentidos por meio da</p><p>linguagem.</p><p>Antes mesmo da alfabetização, a criança já realiza a leitura a seu modo –</p><p>é o que Soares (2011, p. 32) chama de “práticas de letramento”: o bebê já percebe</p><p>que o mundo é lido porque observa o mundo que o cerca. Ele ainda observa os</p><p>gestos dos pais e os representa a seu modo, com gestos, movimentos, sons.</p><p>Sendo assim, o processo de aprendizado da leitura inicia-se com a percepção de</p><p>17</p><p>que não é somente por meio de sinais gráficos que se lê, mas de gestos,</p><p>movimentos, expressões etc.</p><p>Quando o professor oferece a leitura às crianças, ele contribui para a</p><p>construção de um mundo mais justo, com as mesmas oportunidades de acesso</p><p>ao conhecimento. Deve-se oferecer a leitura do mundo, levando a criança a</p><p>observar tudo ao seu redor o tempo todo: passear nos entornos da escola; mostrar</p><p>os desenhos nos muros e solicitar que cada criança construa sentidos para os</p><p>desenhos; observar os pedestres que transitam pelas ruas e como leem os sinais</p><p>de trânsito; auxiliar um idoso a atravessar rua; verificar como é o comportamento</p><p>dos ciclistas, dentre outras situações, são momentos em que as crianças mesmas</p><p>destacam quais foram suas “leituras” do entorno da escola. Nessa ação de</p><p>oferecer a leitura, propõe-se à criança condições para ser um ser da linguagem,</p><p>que pode transformar o mundo por meio do pensamento, da criatividade e da</p><p>imaginação.</p><p>5.2 Texto</p><p>Etimologicamente, texto vem do latim textos, e significa tecido,</p><p>enlaçamento, encadeamento. Portanto, o texto é um tecido, uma trama na qual se</p><p>tecem ensinamentos, informações, ideias, com ou sem palavras. A composição</p><p>do texto é permeada pelos vários discursos que constituem o sujeito. Assim, ao</p><p>escrever, o autor tece um diálogo com seu interlocutor, deixando marcas do</p><p>contexto em que se encontra, constituindo uma relação entre o autor e o leitor.</p><p>Nessa tessitura, o contexto de produção não coincide com o contexto de</p><p>recepção, já que leitor e autor não se encontram presentes no momento da</p><p>interação. Por isso, o produtor do texto precisa planejá-lo e executá-lo de maneira</p><p>cuidadosa, por meio da linguagem, com todos os recursos linguísticos. Nesse</p><p>sentido, podemos dizer que o texto é um conjunto de enunciados dotados de</p><p>significados, com o objetivo de levar o leitor a se coconstruir por meio do texto.</p><p>Convém destacar que, nos estudos da linguagem, várias são as asserções</p><p>sobre o que é texto, a começar por Saussure, em sua Teoria Estruturalista, até</p><p>autores que trabalham com Análise do Discurso. Muitas outras áreas do</p><p>conhecimento se apropriam da palavra texto, como a Filosofia, a Sociologia, a</p><p>História, a Antropologia, a Teologia etc. Por isso, de acordo com a perspectiva</p><p>teórica de quem escreve, o texto passa a ter diversos outros sentidos, que</p><p>dependem do olhar do pesquisador.</p><p>18</p><p>Neste nosso estudo, partimos da concepção da Linguística Textual (Koch;</p><p>Elias, 1990, 2007, 2011), em uma perspectiva sócio-histórica atual, que mescla e</p><p>conversa diretamente com a Análise do Discurso. Assim, o objetivo do texto, por</p><p>esse viés, é o de levar o leitor a coconstruir sentidos, porque os discursos que</p><p>compõem um texto se mesclam aos discursos dos inúmeros leitores desse texto.</p><p>Desse modo, num texto, o significado de uma parte não é autônomo, mas</p><p>depende de outras que se correlacionam. Devemos considerar ainda que o</p><p>significado global de um texto não é resultado de mera soma de suas partes – isto</p><p>é, das palavras, orações, períodos, parágrafos –, mas de uma combinação</p><p>geradora de sentidos (discursos que constituem o autor).</p><p>Assim, quando falamos de texto, falamos de leitura, e vice-versa, porque</p><p>ambos são conceitos indissociáveis. Quem escreve, escreve para ser lido, já que</p><p>o texto é uma exposição de sentidos que exige a leitura para seu reconhecimento.</p><p>Cada texto escrito estabelece diferentes leitores e diferentes sentidos, e essa</p><p>ampla constituição de textos possibilita ao professor uma infinidade de gêneros</p><p>para trabalhar, visando formar leitores críticos desde a alfabetização.</p><p>Vale ainda ressaltar que o texto não é passivo; por conseguinte, nem a</p><p>leitura o é – há uma interação entre autor-texto-leitor altamente complexa.</p><p>Textos dependem de coesão, coerência, sentido, discursos, ideologias,</p><p>conhecimentos individuais e conhecimentos universais. Cada texto é produzido</p><p>por um sujeito num dado tempo e espaço, dependendo da “língua(gem)”, das</p><p>escolhas de tipologias e dos gêneros, fenômenos que começamos a discutir nesta</p><p>aula e continuaremos ao longo deste curso.</p><p>FINALIZANDO</p><p>Nesta primeira aula, iniciamos nosso estudo sobre leitura e produção de</p><p>textos, assunto bastante complexo, mas de suma importância para as práticas de</p><p>qualquer ator social.</p><p>Para situar nosso local teórico, partimos das concepções de leitura, texto e</p><p>língua, de modo a esclarecer que cada uma delas teve sua importância ao longo</p><p>dos anos, sofrendo alterações de acordo com as evoluções sócio-históricas,</p><p>visando contemplar as necessidades da educação e o trabalho em sala de aula,</p><p>tendo em vista que ler e escrever fazem parte do dia a dia de todos os sujeitos na</p><p>sociedade.</p><p>19</p><p>Na sequência, apresentamos estratégias e objetivos de leitura,</p><p>comprovando que ler é muito mais que decodificar signos linguísticos. Essas</p><p>estratégias ajudam a elencar os fatores para a compreensão de leitura, e os</p><p>objetivos começam a desvelar os segredos do texto, além de suas correlações</p><p>com os conhecimentos e saberes de mundo.</p><p>Também nos atemos a mostrar que leitura e produção, muito embora sejam</p><p>faces da mesma moeda, exigem a contextualização</p><p>de múltiplos saberes,</p><p>conhecimentos partilhados, históricos, enciclopédicos etc., saberes que se</p><p>constroem à medida que interagimos e dialogamos com inúmeros textos em</p><p>diversas situações de uso.</p><p>Por fim, esclarecemos que o texto é um conceito complexo, porém</p><p>necessário para nossas práticas diárias.</p><p>LEITURA COMPLEMENTAR</p><p>Texto de abordagem teórica</p><p>Para estudar mais a fundo a escrita, compreendendo melhor as concepções de</p><p>leitura e texto, bem como os conhecimentos elencados para a ativação da escrita,</p><p>sugerimos a leitura do capítulo “Escrita e interação”, disponível na obra de Koch</p><p>e Elias (2007).</p><p>KOCH, I. V.; ELIAS, V. M. Ler e compreender: os sentidos de um texto. 2. ed.</p><p>São Paulo: Contexto, 2007, p. 31-44.</p><p>Texto de abordagem prática</p><p>Sempre que discutimos e pensamos na prática de produção de texto, a dúvida</p><p>que fica é: Como avaliar o texto do aluno? Afinal, há uma série de itens que</p><p>precisam ser avaliados separadamente, além de fatores externos à produção em</p><p>si. Para elucidar um pouco essa questão, sugerimos a leitura do texto de Eliane</p><p>Ruiz (1998).</p><p>RUIZ, E. M. S. D. Como se corrige redação na escola. Tese (Doutorado em</p><p>Linguística) – Universidade de Campinas, Campinas, Institutos de Estudos da</p><p>Linguagem, 1998. Disponível em: . Acesso em: 25 nov. 2022.</p><p>20</p><p>Saiba mais</p><p>GERALDI, J. W. Portos de passagem. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1993.</p><p>21</p><p>REFERÊNCIAS</p><p>BAKHTIN, M. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992.</p><p>CORTELLA, M. S. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e</p><p>políticos. São Paulo: Cortez, 2000.</p><p>FREIRE, P. A importância do ato de ler. 34. ed. São Paulo: Cortez, 1997.</p><p>GERALDI, J. W. Portos de passagem. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1993.</p><p>KOCH, I. V.; ELIAS, V. M. Ler e compreender: os sentidos de um texto. 2. ed.</p><p>São Paulo: Contexto, 2007.</p><p>_____. Ler e escrever: estratégias de produção textual. 2. ed. São Paulo:</p><p>Contexto, 2010.</p><p>MORAES, V. A arca de Noé. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.</p><p>SANTOS, M. R. As avaliações das redações escolares: alguns pressupostos</p><p>ideológicos. Belo Horizonte, Editora da UFMG, 1987.</p><p>SOARES, M. Alfabetização e letramento. 6. ed., 1. reimp. São Paulo: Contexto,</p><p>2011.</p>