Prévia do material em texto
<p>CONHECIMENTOS PRÉVIOS</p><p>E APRESENTAÇÃO DO</p><p>MATERIAL DE PESQUISA</p><p>AULA</p><p>INICIAL</p><p>1</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>O que é</p><p>gramática?</p><p>Do grego “grammatiké”: a arte de escrever ou ler. Atualmente,</p><p>significa sistematização dos fatos da língua.</p><p>Seu enfoque pode ser variado, a depender do intuito do estudioso e</p><p>do enfoque dado por ele. Por exemplo:</p><p>○ A gramática histórica (ou diacrônica) estuda a história da língua,</p><p>debruçando-se sobre a origem e a evolução de determinado</p><p>sistema linguístico;</p><p>○ A gramática comparativa estuda as diferenças e semelhanças</p><p>entre as línguas, especialmente as derivadas do mesmo tronco;</p><p>○ A gramática descritiva (ou sincrônica) estuda o mecanismo pelo</p><p>qual uma língua se constrói em dado momento da história;</p><p>○ A gramática normativa é a própria gramática descritiva do</p><p>registro culto escrito, utilizada com intenção didática.</p><p>A base sobre a qual se constrói a gramática normativa é o uso culto</p><p>(daí falar-se em “norma culta”). Assim, estudiosos, pessoas conceituadas</p><p>e grandes escritores são os que norteiam a criação do padrão de uso da</p><p>língua. É em torno de suas obras que se constrói o ideal de bem falar e</p><p>escrever.</p><p>Nas palavras de Evanildo Bechara:</p><p>“Cabe à gramática normativa, que é uma das disciplinas com</p><p>finalidade pedagógica, elencar os fatos recomendados como modelares</p><p>da exemplaridade idiomática para serem utilizados em circunstâncias</p><p>especiais do convívio social. A gramática normativa recomenda como se</p><p>deve falar e escrever segundo o uso e a autoridade dos escritores corretos</p><p>e dos gramáticos e dicionaristas esclarecidos.”</p><p>2</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>A gramática normativa se divide formalmente em:</p><p>○ Fonética: estuda os fonemas ou sons que formam palavras, sua</p><p>correta pronúncia (ortoépia), correta grafia (ortografia) e correta</p><p>acentuação (prosódia);</p><p>○ Morfologia: estuda a estrutura, a formação, a classificação e a</p><p>flexão das palavras;</p><p>○ Sintaxe: estuda o emprego das classes gramaticais e suas funções,</p><p>bem como as relações de regência, concordância, colocação que</p><p>elas mantêm entre si na estruturação da oração e nas relações</p><p>entre orações.</p><p>Essa divisão é de caráter eminentemente didático e não corresponde</p><p>a distinções naturais da língua.</p><p>Por que</p><p>estudar gramática?</p><p>O estudo da gramática não costuma ser benquisto pela maioria das</p><p>pessoas. Parte disso se deve à não compreensão de sua finalidade: entendê-la</p><p>como uma soma de regrinhas arbitrárias é esvaziar-lhe completamente a</p><p>razão de ser.</p><p>Gramática é originalmente a “arte de inventar símbolos e combiná-los</p><p>para expressar pensamento” (Mirian Joseph). Ela prescreve como combinar</p><p>palavras de modo a formar corretamente as frases.</p><p>No Medievo, seu estudo era acompanhado do da retórica e da lógica,</p><p>cujos conceitos vale a pena apresentar:</p><p>○ Retórica: comunicação, por meio de símbolos, das ideias relativas</p><p>à realidade. Ela prescreve a melhor forma de combinar frases em</p><p>parágrafos e estes numa composição, que apresente unidade,</p><p>coerência e ênfase desejada, bem como clareza, vigor e beleza.</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>○ Lógica: arte de pensar; prescreve como combinar conceitos em</p><p>juízos e estes em silogismos e cadeias de raciocínio de modo a</p><p>obter a verdade.</p><p>Juntas, essas três artes – o Trivium – desenvolvem as faculdades</p><p>básicas do espírito e libertam a inteligência da ignorância, preparando o</p><p>indivíduo para o caminho da sabedoria.</p><p>Modernamente, o estudo do que se chama “gramática” envolve, em</p><p>grande parte, a retórica e mesmo a lógica. A análise dos fatos modelares</p><p>da língua inclui muito mais do que apenas a correta combinação de</p><p>símbolos para expressão do pensamento. Durante o estudo, fala-se sobre</p><p>as qualidades de um bom texto, o que envolve, por exemplo, coerência</p><p>e coesão, concisão, ênfase, figuras de linguagem etc. Esses tópicos, aliás,</p><p>são encontrados na maior parte das gramáticas normativas modernas, ou</p><p>seja, percebe-se que o estudo da chamada “gramática” passou e envolver</p><p>também o de vários elementos retóricos e mesmo lógicos.</p><p>Apesar disso, ressalta-se que o englobamento da retórica e da</p><p>lógica pela gramática não substitui o ensino individual de tais ramos do</p><p>conhecimento, cujo estudo aprofundado é de indiscutível valia.</p><p>De toda forma, independentemente da nomenclatura, não faria</p><p>sentido fatiar as artes do Trivium: um estudo que separe a técnica gramatical</p><p>de seu efetivo emprego é completamente vazio. É como ter em mãos uma</p><p>complexa e eficiente ferramenta, mas não saber como operá-la.</p><p>Como todo estudo normativo, a gramática exige memorização</p><p>de informações e regras, cujo objetivo é desenvolver uma comunicação</p><p>exemplar, dentro do que melhor existe no padrão culto da língua. Visa-se</p><p>ao ajuste da escrita àquilo que de melhor se produz na literatura culta.</p><p>Trata-se de ponte inegável com a boa literatura produzida em todas as</p><p>épocas, permitindo que o lapso de tempo entre as produções literárias não</p><p>nos afaste de nossos melhores autores e de nossa identidade cultural.</p><p>3</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Assim, essa arte passa longe de ser um amontoado de regrinhas</p><p>aleatórias; é um esteio da melhor comunicação, um padrão de excelência</p><p>quanto ao emprego da palavra.</p><p>“Quem escreve de maneira displicente confessa, com isso, antes</p><p>de tudo, que ele mesmo não atribui grande valor a seus pensamentos.</p><p>Pois apenas a partir da convicção da verdade e importância de nossos</p><p>pensamentos, surge o entusiasmo que é exigido para buscar sempre, com</p><p>incansável perseverança, a expressão mais clara, mais bela e mais vigorosa”,</p><p>escreveu Schopenhauer.</p><p>Dado que o pensamento humano se constrói por meio da linguagem</p><p>e que os homens se comunicam entre si também por meio dela, seu</p><p>polimento há de ser constante.</p><p>Cuidar da expressão é cuidar dos próprios pensamentos, garantindo</p><p>que eles sejam formulados e transmitidos da melhor forma possível.</p><p>Evidentemente, o aperfeiçoamento de tal faculdade enseja ascensão social,</p><p>mas tal efeito é secundário. Antes disso, disciplina a mente e traz polimento</p><p>ao espírito. Entregar-se ao estudo da gramática é, enfim, polir-se.</p><p>Quais são os</p><p>objetivos do Curso?</p><p>Desenvolver o estudo da gramática normativa da língua portuguesa,</p><p>compreendendo, por meio de análises textuais, seu verdadeiro fim.</p><p>4</p><p>5</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Quais benefícios podemos auferir</p><p>a partir da conclusão do Curso?</p><p>Melhora do raciocínio, disciplina e permeabilidade da mente para o</p><p>estudo, melhora do entendimento do que se lê e da capacidade de escrever,</p><p>desenvolvimento da articulação entre as ideias, possibilidade de ascensão</p><p>profissional.</p><p>Para que servem</p><p>os dicionários e como usá-los?</p><p>De acordo com o Dicionário Michaelis, o vocábulo “dicionário” quer</p><p>dizer “coleção, parcial ou completa, das unidades lexicais de uma língua</p><p>(palavras, locuções, afixos etc.), em geral dispostas em ordem alfabética,</p><p>com ou sem significação equivalente, assim como sinônimos, antônimos,</p><p>classe gramatical, etimologia etc., na mesma ou em outra língua”.</p><p>São livros que se dispõem a fazer, portanto, um inventário abrangente</p><p>dos termos da língua, seus significados e empregos.</p><p>É claro que, dado o dinamismo da língua e a velocidade com que</p><p>ela se expande e modifica, há limitações naturais que lhes são impingidas.</p><p>É justamente o que reconhece Aurélio Buarque no prefácio de seu Novo</p><p>Aurélio (3ª impressão):</p><p>“Pretendeu-se fazer um dicionário médio, ou inframédio, etimológico,</p><p>com razoável contingente vocabular (bem mais de cem mil verbetes e</p><p>subverbetes), atualizado (dentro dos seus limites), atento não só à língua</p><p>dos</p><p>já deve ter visto algum político usar construções como</p><p>“Agradecemos por sua confiança e nos comprometemos a fazer um</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>ótimo mandato”, não é mesmo? Se ele está falando em nome próprio,</p><p>qual a lógica de usar a 1ª pessoa do plural (“nós”)?</p><p>Trata-se do egrégio, do insigne, do ilustre plural majestático,</p><p>mais conhecido hoje como plural de modéstia. É no mínimo curioso o</p><p>mesmo fenômeno linguístico ter dois nomes que, numa rasa análise,</p><p>parecem referir-se a eventos opostos, afinal “majestático” remete a</p><p>nobreza e “modéstia”, a humildade.</p><p>Convém aqui primeiro definir o que de fato é “modéstia”: a</p><p>palavra vem do latim “modestus” e significa “falta de vaidade em relação</p><p>às próprias qualidades” (Caldas Aulete); “parcimônia ou moderação</p><p>diante das circunstâncias, dos deveres etc.; sobriedade” (Michaelis). Ou</p><p>seja, modéstia é irmã da singeleza, da humildade. No entanto, este é um</p><p>daqueles curiosos casos em que um vocábulo, de tanto ser usado em</p><p>sentido irônico, acaba passando para o falante o sentido exatamente</p><p>oposto ao seu: é muito comum que alguém ostensivo e desumilde seja</p><p>zombeteiramente tachado de “modesto”: “Sou o homem mais belo do</p><p>planeta”. ”Uau! Quanta modéstia!”. Às vezes, a ironia se instala no espírito</p><p>com mais força que a literalidade. Nuances da língua...</p><p>Voltando ao assunto: o hábito de usar “nós” no lugar de “eu”</p><p>surgiu nos altos escalões da Igreja, visando transmitir humildade e</p><p>solidariedade (daí o “de modéstia”), pois passava a imagem de se estar</p><p>“dividindo” com o povo a responsabilidade pelos bons feitos. O interlocutor,</p><p>assim, sentia-se parte das realizações sobre as quais se falava.</p><p>Com o tempo, a expressão começou a designar justamente o</p><p>contrário disso, transmitindo imagem de grandeza e majestade (daí o</p><p>“majestático”). Era como se imperadores e nobres tivessem o poder e a</p><p>glória de falar em nome de todo o povo. De certa forma, um efeito colateral</p><p>dessa construção era que o povo se sentia parte das nobres conquistas:</p><p>“Nós conquistamos os povos inimigos” certamente fazia com que um</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>prosaico cidadão se visse como um nobre cavaleiro da távola.</p><p>Modernamente, ensina-se que o plural de modéstia é capaz de</p><p>retirar a carga impositiva e personalista da fala. Há sentido, por exemplo,</p><p>em que o juiz condenador de um réu fale no plural, visto que ele representa</p><p>o próprio Estado naquele ato. Da mesma maneira, um palestrante pode</p><p>tornar o discurso mais próximo e envolvente, conferindo ar de troca de</p><p>experiências à ocasião.</p><p>No entanto, faz bem ter cautela, pois pode ser visto com maus</p><p>olhos, a depender de quem o emprega. Pouca coisa é tão desagradável</p><p>quanto a completa incompatibilidade entre a linguagem escolhida e a</p><p>realidade cognoscível por olhos atentos. Se o indivíduo for claramente</p><p>marqueteiro e dissimulado, o plural de modéstia pode aumentar ainda</p><p>mais o grau de incredulidade do interlocutor.</p><p>O fato é que a fronteira entre modéstia e majestade nem sempre</p><p>é clara.</p><p>(Texto publicado por Lara Brenner na página Língua e Tradição,</p><p>no Facebook)</p><p>Ainda para fazer referência a si mesmo ou a um grupo de pessoas,</p><p>tem sido cada vez mais comum o uso da expressão “a gente”). Trata-se, no</p><p>entanto, de expressão coloquial, que deve ser evitada em situações formais.</p><p>Quando usada, é fundamental que se faça a concordância na terceira pessoa</p><p>do singular. Construções como “A gente somos inútil” (música do Ultraje a</p><p>Rigor) devem ser evitadas. Diga-se: A gente é inútil.</p><p>De forma semelhante à que ocorre com o plural majestático (ou de</p><p>modéstia), usa-se, ainda, o chamado plural de cerimônia, que consiste em</p><p>empregar a 2ª pessoa do plural (vós) para indicar tratamento respeitoso e</p><p>cerimonioso a uma pessoa ou a mais de uma pessoa. É exatamente o que</p><p>ocorre na oração Pai Nosso:</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pai Nosso, que (vós) estais no Céu,</p><p>santificado seja o vosso Nome,</p><p>venha a nós o vosso Reino,</p><p>seja feita a vossa vontade</p><p>assim na terra como no Céu.</p><p>A Bíblia inteira é marcada pela presença do plural de cerimônia.</p><p>Note que não apenas o pronome reto “vós” é empregado, mas também o</p><p>possessivo “vosso” e suas variações.</p><p>Nos dias atuais, no entanto, quase não se usa o pronome “vós”, que</p><p>foi substituído por “vocês” em praticamente todas as situações.</p><p>Por fim, ainda no que diz respeito à modéstia, é fundamental ter</p><p>discernimento para falar de si mesmo na terceira pessoa. A estratégia é</p><p>bem-vinda quando se fazem requerimentos à pessoa a quem se dirige, caso</p><p>em que o discurso assume tom cortês. É exatamente o que faz Policarpo</p><p>Quaresma quando peticiona à Câmara dos Deputados. Embora ele mesmo</p><p>tenha escrito e enviado as palavras, autorreferencia-se em 3ª pessoa:</p><p>POLICARPO</p><p>“Policarpo Quaresma, cidadão brasileiro, funcionário público,</p><p>certo de que a língua portuguesa é emprestada ao Brasil; certo também</p><p>de que, por esse fato, o falar e o escrever em geral, sobretudo no campo</p><p>das letras, se veem na humilhante contingência de sofrer continuamente</p><p>censuras ásperas dos proprietários da língua; sabendo além, que dentro</p><p>do nosso país os autores e os escritores, com especialidade os gramáticos,</p><p>não se entendem no tocante à correção gramatical, vendo-se diariamente</p><p>surgir azedas polêmicas entre os mais profundos estudiosos do nosso</p><p>idioma – usando do direito que lhe confere a Constituição, vem pedir</p><p>que o Congresso Nacional decrete o tupi-guarani como língua oficial e</p><p>nacional do povo brasileiro.</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>O suplicante, deixando de parte os argumentos históricos que</p><p>militam em favor de sua ideia, pede vênia para lembrar que a língua é a</p><p>mais alta manifestação da inteligência de um povo, é a sua criação mais</p><p>viva e original; e, portanto, a emancipação política do país requer como</p><p>complemento e consequência a sua emancipação idiomática.</p><p>Demais, Senhores Congressistas, o tupi-guarani, língua</p><p>originalíssima, aglutinante, é a única capaz de traduzir as nossas belezas,</p><p>de pôr-nos em relação com a nossa natureza e adaptar-se perfeitamente</p><p>aos nossos órgãos vocais e cerebrais, por ser criação de povos que aqui</p><p>viveram e ainda vivem, portanto possuidores da organização fisiológica</p><p>e psicológica para que tendemos, evitando-se dessa forma as estéreis</p><p>controvérsias gramaticais, oriundas de uma difícil adaptação de uma</p><p>língua de outra região à nossa organização cerebral e ao nosso aparelho</p><p>vocal – controvérsias que tanto empecem o progresso da nossa cultura</p><p>literária, científica e filosófica.</p><p>Seguro de que a sabedoria dos legisladores saberá encontrar</p><p>meios para realizar semelhante medida, e cônscio de que a Câmara e o</p><p>Senado pesarão o seu alcance e utilidade</p><p>P. e E.2 deferimento.”</p><p>Semelhante comportamento, no entanto, pode soar pedante ou</p><p>causar profundo estranhamento ao ouvinte em outras circunstâncias.</p><p>Quando Pelé, falando de si mesmo, diz “Pelé foi um grande jogador”, a</p><p>sensação que se tem é, no mínimo, desagradável.</p><p>Eventualmente, essa prática confere ar de autoridade, como ocorre</p><p>quando o pai de Teresa, infeliz personagem de Amor de Perdição, diz à filha:</p><p>Vais hoje dar a mão de esposa a teu primo Baltasar, minha filha.</p><p>É preciso que te deixes cegamente levar pela mão de teu pai. Logo que</p><p>deres este passo difícil, conhecerás que a tua felicidade é daquelas que</p><p>precisam ser impostas pela violência. Mas repara, minha querida filha,</p><p>10</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>que a violência de um pai é sempre amor.</p><p>Algumas pontuações merecem destaque quanto ao emprego dos</p><p>pronomes pessoais:</p><p>1) A expressão “para mim” (e semelhantes) pode</p><p>aparecer</p><p>tranquilamente diante de verbo no infinitivo, contanto que não esteja</p><p>ocupando função de sujeito:</p><p>Não foi fácil para mim compreender toda a teoria.</p><p>No caso, o sujeito de “compreender” não é “mim”. A oração está</p><p>na ordem inversa. Colocando-a na ordem direta, percebe-se com mais</p><p>facilidade como a estrutura está absolutamente correta:</p><p>Compreender toda a teoria não foi fácil para mim.</p><p>Diferente, no entanto, é uma construção como “Separei várias tintas</p><p>para mim testar qual fica melhor”. Nesse caso, o sujeito de testar é “mim”, o</p><p>que a norma-padrão não abona. Corrigindo, teríamos: Separei várias tintas</p><p>para EU testar qual fica melhor. Agora, sim, colocou-se um pronome pessoal</p><p>do caso reto na função de sujeito, que lhe cabe por definição.</p><p>2) Se a preposição que antecede os pronomes oblíquos tônicos</p><p>é “com”, resultam as formas “comigo”, “contigo”, “consigo”, “conosco” e</p><p>“convosco” (oriundos das formas latinas mecum, tecum, secum, nobiscum,</p><p>vobiscum).</p><p>As formas “com vós” e “com nós” permanecem, quando</p><p>acompanhados de todos, mesmos, próprios, outros ou de algum numeral,</p><p>aposto ou alguma oração adjetiva, não se contraindo com a preposição.</p><p>Veja:</p><p>A paz esteja conosco.</p><p>A paz esteja com nós todos/com nós dois/com nós mesmos/com</p><p>nós, que somos irmãos.</p><p>3) Os pronomes si e consigo são essencialmente reflexivos, ou seja,</p><p>11</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>seu emprego é adequado quando se refere ao próprio sujeito da ação.</p><p>Admitem, inclusive, os pronomes de reforço “mesmos” e “próprios” (e as</p><p>variações deles):</p><p>As turmas conversaram entre si (mesmas). (Não “entre elas”)</p><p>Ele fez pouco caso de si (próprio). (Não dele mesmo)</p><p>Cada um consigo é triste. (Fernando Pessoa)</p><p>Não se diz, portanto, “Preciso falar consigo”, mas, sim, “Preciso falar</p><p>com você”, nem “Trouxe um vinho para si”, mas “Trouxe um vinho para</p><p>você”.</p><p>4) Numa sequência de pronomes pessoais do caso reto ou destes</p><p>com substantivos, não há precisamente uma regra quanto à ordem. Por</p><p>elegância, no entanto, coloca-se o outro à frente:</p><p>O estagiário e eu fomos responsáveis por este belo parecer.</p><p>Ele e eu fomos responsáveis por este belo parecer.</p><p>Se, no entanto, a situação for desagradável, elegante é fazer</p><p>justamente o contrário:</p><p>Eu e o estagiário assumimos a culpa por este erro.</p><p>Ele e eu assumimos a culpa por este erro.</p><p>5) Por ênfase, podem-se empregar dois pronomes oblíquos num</p><p>pleonasmo correto e bem-vindo:</p><p>Conhece-te a ti mesmo. (Sócrates)</p><p>A mim, quando vejo um morto, a morte parece-me uma partida.</p><p>O cadáver dá-me a impressão de um trajo que se deixou. Alguém se foi</p><p>embora e não precisou de levar aquele fato único que vestira!</p><p>(Fernando Pessoa)</p><p>Na seção de sintaxe, falar-se-á com mais profundidade sobre a</p><p>função sintática dos pronomes pessoais, especialmente sobre seu correto</p><p>emprego, e a correta colocação dos átonos.</p><p>12</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pronomes de tratamento</p><p>Denominam-se pronomes de tratamento certas palavras ou</p><p>expressões que valem por verdadeiros pronomes pessoais, pois fazem</p><p>alusão às pessoas do discurso, o que ocorre, em grande parte das vezes, de</p><p>maneira cerimoniosa.</p><p>Exemplos: você, senhor, senhorita, Vossa Excelência, Sua Santidade</p><p>etc. (Os dois últimos expressam cerimônia.)</p><p>Obs.: Existe caloroso debate quanto à classificação de tais palavras</p><p>como pronomes de tratamento ou formas de tratamento, distinção que</p><p>não se fará neste material.</p><p>Vejam-se alguns pronomes e os casos de seu emprego:</p><p>Vossa Senhoria: pessoas com grau de prestígio maior, como:</p><p>funcionários públicos graduados, coronel, major etc.</p><p>Vossa Excelência: pessoas com alta autoridade, militares e políticos,</p><p>como: juízes de direito, desembargadores, promotores de justiça,</p><p>vereadores, prefeitos, deputados, senadores, ministros, governadores de</p><p>Estado.</p><p>Vossa Santidade: papa.</p><p>Vossa Majestade: reis, rainhas, imperadores.</p><p>Vossa Alteza: duques, arquiduques, príncipes, princesas.</p><p>Vossa Magnificência: reitores de universidade.</p><p>Usa-se “Vossa” quando se fala diretamente com a pessoa e “Sua”</p><p>quando se fala sobre ela:</p><p>Vossa Excelência (você) precisa de algo?</p><p>Sabe se Sua Excelência (ele) deixou-me algum recado?</p><p>Duas peculiaridades interessantes dos pronomes de tratamento:</p><p>1) embora se refiram à 2ª pessoa do discurso, trabalham com</p><p>verbos e pronomes na terceira pessoa do discurso. Trata-se de verdadeiro</p><p>idiotismo, ou seja, um comportamento aceito pela gramática normativa,</p><p>13</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>mas que não encontra nenhuma análise satisfatória;</p><p>2) apesar de serem formas femininas, ensejam concordância com o</p><p>sexo da pessoa à qual se referem. Na prática:</p><p>Vossa Excelência, o juiz de Silvânia, apareceu no gabinete bem-</p><p>vestido.</p><p>Sua Santidade está calado.</p><p>Pronomes possessivos</p><p>Pronomes possessivos indicam o que cabe ou pertence às pessoas</p><p>do discurso: meu(s), minha(s), teu(s), tua(s), seu(s), sua(s), nosso(s), nossa(s),</p><p>vosso(s), vossa(s).</p><p>Eles concordam em gênero e número com a coisa possuída:</p><p>Nosso céu tem mais estrelas,</p><p>Nossas várzeas têm mais flores,</p><p>Nossos bosques têm mais vida,</p><p>Nossa vida mais amores.</p><p>(Obs.: Não “nossas vidas”)</p><p>(Gonçalves Dias, Canção do Exílio)</p><p>Muitas são as possibilidades de sentido que assumem os possessivos,</p><p>a depender sempre do contexto:</p><p>Passei por meus apertos de dinheiro. (indefinição)</p><p>Ele deve ter seus seis filhos. (aproximação)</p><p>Cantou uma de suas músicas sacras durante a missa. (hábito)</p><p>Minha senhora, como posso ajudá-la? (respeito)</p><p>Meu velho, aonde iremos hoje? (intimidade)</p><p>Eventualmente, pronomes oblíquos átonos assumem valor de</p><p>possessivos:</p><p>14</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>[...] a lagarta viscosa, a muriçoca doida, que esvoaçava havia muito</p><p>tempo em torno do corpo dele, assanhando-lhe os desejos, acordando-lhe</p><p>as fibras embambecidas pela saudade da terra, picando-lhe as artérias, para</p><p>lhe cuspir dentro do sangue uma centelha daquele amor [...] (O Cortiço)</p><p>Note, na passagem, como o pronome lhe indica posse: assanhando</p><p>seus desejos, acordando suas fibras, picando as suas artérias, cuspindo uma</p><p>centelha dentro de seu sangue.</p><p>É importante atentar sempre ao pronome “seu”, uma vez que, por se</p><p>referir à terceira pessoa do singular e do plural, pode causar ambiguidade.</p><p>Por exemplo:</p><p>O pai conversava com o filho sobre suas estratégias para o setor</p><p>de serviços.</p><p>Estratégias de quem? Do pai? Do filho? Dos dois? De uma terceira</p><p>pessoa? Para resolver o imbróglio, lança-se mão de alguns artifícios</p><p>linguísticos:</p><p>O pai conversava com o filho sobre as estratégias deles, pai e filho,</p><p>para o setor de serviços.</p><p>O pai conversava com o filho sobre as estratégias dele, pai, para o</p><p>setor de serviços.</p><p>O pai conversava com o filho sobre as estratégias dele, filho, para</p><p>o setor de serviços.</p><p>O pai conversava com o filho sobre as estratégias dele, fulano (ex.:</p><p>Alberto), para o setor de serviços.</p><p>Observação: Outras poderiam ser as soluções linguísticas para retirar</p><p>a ambiguidade.</p><p>O emprego de artigo definido é facultativo antes de pronomes</p><p>possessivos adjetivos (ou seja, que acompanham substantivos ou palavras</p><p>substantivadas):</p><p>15</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Fecho, cansado, as portas das minhas janelas. (Fernando</p><p>Pessoa usa artigo definido “as” antes do possessivo “minhas”)</p><p>Minha terra tem primores,</p><p>Que tais não encontro eu cá. (Gonçalves Dias já prefere não usar</p><p>o artigo antes do possessivo “minha”.)</p><p>No entanto, se o pronome for substantivo, o artigo é obrigatório:</p><p>(A) Minha terra tem primores que a sua não tem. (Não se diria</p><p>simplesmente “que sua não tem”.)</p><p>Pronomes demonstrativos</p><p>São aqueles que situam a posição espacial,</p><p>temporal ou textual de</p><p>uma coisa ou ser em relação às outras pessoas do discurso. São pronomes</p><p>demonstrativos:</p><p>Este, esse, aquele, isto, isso, aquilo, o (=aquele), a (=aquela), mesmo,</p><p>próprio, semelhante, tal (e as variações deles).</p><p>Falemos de cada um separadamente:</p><p>* Mesmo, próprio: conferem reforço de identidade:</p><p>Um banho morno, em que se demorou, não serviu para</p><p>acalmar-lhe os nervos, muito pelo contrário. Arrepiava-se ao perpassar</p><p>da esponja, ao sentir suas próprias mãos; a água tépida irritava-a como</p><p>se fosse um contato humano estranho.</p><p>(A carne, Júlio Ribeiro)</p><p>Merece atenção a concordância de tais pronomes:</p><p>Elas próprias fizeram o trabalho.</p><p>Os homens mesmos explicaram o caso.</p><p>A mesma pessoa que atendeu você me atendeu também. (Note</p><p>que, junto do artigo “a”, adquire valor de “exata”)</p><p>16</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Observação: Muito se tem empregado o pronome “mesmo”</p><p>indiscriminadamente, em construções como “As secretárias reuniram-se</p><p>na copa. As mesmas decidiram pedir aumento”. Para a maioria esmagadora</p><p>dos gramáticos, essa construção não é adequada à norma-padrão. Quando,</p><p>no entanto, for sinônimo de “a mesma coisa”, o pronome cabe bem: As</p><p>secretárias reuniram-se na copa, e, mais tarde, os zeladores fizeram o</p><p>mesmo (a mesma coisa).</p><p>* Tal, semelhante: são demonstrativos quando sinônimos de este,</p><p>isto, aquilo, aquele:</p><p>Lenita comia quase sempre só na vastíssima varanda; depois de</p><p>almoçar ou de jantar ia conversar com o coronel, e fazia esforços incríveis</p><p>para conseguir fazer-se ouvir da velha [esposa do coronel Barbosa] que,</p><p>resignada e risonha, aumentava com a mão trêmula a concha da orelha</p><p>para apanhar as palavras. Tal (=Esse, semelhante) entretenimento</p><p>cansava a moça, e ela recolhia-se logo aos seus cômodos para ler, para</p><p>procurar distrair-se. Tomava um livro, deixava; tomava outro, deixava; era</p><p>impossível a leitura.</p><p>(Júlio Ribeiro, A Carne)</p><p>As explicações foram confusas e sem nexo. O aluno jamais</p><p>entenderia semelhantes (=aqueles, tais) enigmas.</p><p>* o(s), a(s): são demonstrativos quando substituíveis por aquele,</p><p>aquilo, isso, isto. Funcionam sempre como pronomes substantivos:</p><p>O sacerdote da direita é recém-chegado; o (=aquele) da</p><p>esquerda, antigo de casa.</p><p>Toda a sala estava suja; a dona bem o percebeu (=percebeu isso).</p><p>Noto à margem do (=daquilo) que li o (=aquilo) que julguei que</p><p>senti.</p><p>17</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Releio e digo: “Fui eu?”</p><p>Deus sabe, porque o (=isto) escreveu.</p><p>(Fernando Pessoa)</p><p>Os pronomes demonstrativos este, esse e aquele (e todas as variações</p><p>deles), bem como isto, isso e aquilo analisam-se de três perspectivas:</p><p>espacial, temporal e textual.</p><p>ESPACIAL</p><p>* este(a/s), isto: indicam proximidade do falante. Podem ainda ser</p><p>usados em referências que o autor faz ao próprio texto:</p><p>Esta turma aqui ainda não começou o ano letivo.</p><p>Morrer... quando este mundo é um paraíso,</p><p>E a alma um cisne de douradas plumas:</p><p>Não!</p><p>(Castro Alves)</p><p>Há algum tempo, hesitei se devia abrir estas memórias pelo</p><p>princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento</p><p>ou a minha morte.</p><p>(Machado de Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas)</p><p>* Esse (a/s), isso: indicam distanciamento do falante e/ou proximidade</p><p>daquele com quem se fala:</p><p>Essas escolhas que você fez me parecem as melhores.</p><p>* Aquele (a/s), aquilo: indicam algo ou alguém distante do ouvinte e</p><p>do falante:</p><p>Algo me diz que aquele sofá não combinará com a sala.</p><p>18</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Comum na literatura. Distância no tempo e no espaço</p><p>Lenita abriu os olhos. Atraiu-lhe as vistas o brilho suave do metal</p><p>ferido pela luz.</p><p>Ergueu-se, acercou-se da mesa, fitou com atenção a estátua:</p><p>aqueles braços, aquelas pernas, aqueles músculos ressaltantes,</p><p>aqueles tendões retesados, aquela virilidade, aquela robustez,</p><p>impressionaram-na de modo estranho.</p><p>Dezenas de vezes tinha ela estudado e admirado esse primor</p><p>anatômico em todas as suas minudências cruas, em todos os nadas que</p><p>constituem a perfeição artística, e nunca experimentara o que então</p><p>experimentava.</p><p>(Júlio Ribeiro, A Carne).</p><p>TEMPORAL</p><p>* este(a/s): referem-se a tempo presente, passado recente ou futuro:</p><p>Esta é a hora de nós irmos embora.</p><p>Este ano está sendo de grandes testes psicológicos.</p><p>Esta festa de ontem foi épica.</p><p>* Esse (a/s): indicam passado recente ou futuro:</p><p>Essas últimas horas foram exaustivas.</p><p>Estes próximos dias serão de grande trabalho.</p><p>* Aquele (a/s): passado ou tempo distante, vago:</p><p>Aqueles tempos de Cristo foram de luz e crueldade.</p><p>Se lá no assento etéreo, onde subiste</p><p>Memória desta vida se consente,</p><p>Não te esqueças daquele amor ardente</p><p>Que já nos olhos meus tão puro viste.</p><p>(Camões)</p><p>19</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Observação:</p><p>Com alguma frequência, os pronomes demonstrativos não se</p><p>separam por linhas rigorosas de demarcação; há certa liberdade admitida</p><p>gramaticalmente em seu uso. É o que defendem gramáticos de ponta,</p><p>como Rocha Lima, Celso Cunha e Bechara. Sobre o assunto, pondera Celso</p><p>Cunha:</p><p>“Estas distinções que nos oferece o sistema ternário dos</p><p>demonstrativos em português não são, porém, rigorosamente obedecidas</p><p>na prática. Com frequência, na linguagem animada, nos transportamos</p><p>pelo pensamento a regiões ou épocas distantes, a fim de nos referirmos</p><p>a pessoas ou objetos que nos interessam particularmente como se</p><p>estivéssemos em sua presença. Linguisticamente, esta aproximação</p><p>mental traduz-se pelo emprego do pronome este (esta, isto) onde seria</p><p>de esperar esse ou aquele.”</p><p>Essa não distinção se nota em vários textos, inclusive de grandes</p><p>autores, como Drummond. Em Poema das Sete Faces, emprega “esse” no</p><p>lugar de “este” e “essa” no lugar de “esta” ou “aquela”:</p><p>Eu não devia te dizer</p><p>Mas essa lua</p><p>Mas esse conhaque</p><p>Botam a gente comovido como o diabo.</p><p>(Carlos Drummond, Poema das Sete Faces)</p><p>TEXTUAL</p><p>Também dentro do texto, os pronomes demonstrativos este, esse,</p><p>aquele e as variações de cada um podem ser de grande valia para fazer</p><p>referências endofóricas catafóricas ou anafóricas.</p><p>* Este(a/s), isto: Referem-se ao que ainda será dito (valor catafórico).</p><p>20</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Muitos gramáticos admitem, ainda, a possibilidade de que retomem o que</p><p>já se disse:</p><p>Jantei e fui a casa. Lá achei uma caixa de charutos. [...] Entendi,</p><p>abri-a e tirei este bilhete: Meu B...Desconfiam de nós [...] (Machado de</p><p>Assis, Memórias Póstumas de Brás Cubas)</p><p>O juiz tomou a pior decisão. Esta feria o direito de defesa do réu.</p><p>* Esse (a/s), isso: Referem-se sempre a algo já dito (valor anafórico):</p><p>Não cultiveis sistemas, extravagâncias e singularidades. Por</p><p>esse meio lucraríeis a néscia reputação de originais; mas nunca a de</p><p>sábios, doutos, ou conscienciosos.</p><p>Não militeis em partidos, dando à política o que deveis à</p><p>imparcialidade. Dessa maneira venderíeis as almas e famas ao demônio</p><p>da ambição, da intriga e da servidão às paixões mais detestáveis.</p><p>(Rui Barbosa, Oração aos Moços)</p><p>Caso haja dois elementos, “aquele” retoma o mais distante e “este”, o</p><p>mais próximo:</p><p>Bem poucas ilusões desde o começo podíamos nutrir.</p><p>Apesar de tal ser o destino imediato da nossa causa, não a podemos</p><p>desamparar. Quando praticamos uma boa ação, não sabemos se é para</p><p>hoje ou para quando. O caso é que os seus frutos podem ser tardios, mas</p><p>são certos. Uns plantam a semente da couve para o prato de amanhã;</p><p>outros, a semente do carvalho para o abrigo ao futuro. Aqueles cavam</p><p>para si mesmos. Estes lavram para o seu país, para a felicidade dos seus</p><p>descendentes, para o benefício do gênero humano. (Rui Barbosa, em</p><p>discurso no Senado)</p><p>A prudência</p><p>não impede a coragem nem esta (coragem) anula</p><p>aquela (prudência).</p><p>21</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Nada impede a retomada de apenas um dos dois elementos</p><p>anteriores:</p><p>E daí a pouco apareciam ajudantes gratuitos para os arranjos</p><p>do jantar, tanto do lado da das Dores, como do lado da Rita Baiana. O</p><p>Albino encarregou-se de varrer e arrumar a casa desta, entretanto que a</p><p>mulata ia para o fogão preparar seus quitutes do Norte. (Aluísio Azevedo,</p><p>O Cortiço)</p><p>Querendo-se retomar ambos, aplica-se a regra geral da anáfora:</p><p>A prudência não impede a coragem. Essas convivem dentro de</p><p>todo ser.</p><p>Os pronomes demonstrativos apresentam valores estilísticos aferíveis</p><p>dentro do contexto. Veja:</p><p>Se acaso me quiseres</p><p>Sou dessas mulheres que só dizem sim</p><p>Por uma coisa à-toa, uma noitada boa</p><p>Um cinema, um botequim</p><p>(Chico Buarque, Folhetim)</p><p>Isso não passa de uma besta quadrada!</p><p>Foi uma jornada daquelas...</p><p>Tem um decote pequeno,</p><p>Um ar modesto e tranquilo;</p><p>Mas vá-se lá descobrir</p><p>Coisa pior do que aquilo!</p><p>(Fernando Pessoa)</p><p>22</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pronomes indefinidos</p><p>Referem-se à terceira pessoa do discurso, indicando quantidade</p><p>incerta ou identidade indeterminada. Podem ser variáveis ou invariáveis.</p><p>Exemplos de variáveis: algum, nenhum, todo, outro, quanto, muito,</p><p>pouco, certo, vário, tanto, qualquer, bastante, um, algum.</p><p>Exemplos de invariáveis: alguém, ninguém, tudo, nada, outrem, cada,</p><p>algo, mais, menos.</p><p>Por esta porta entrarão todos os convidados.</p><p>Tudo isto que o Sol toca é o nosso reino. [...] O tempo de um rei</p><p>governar nasce e se põe como o Sol.</p><p>(O Rei Leão)</p><p>Entre os semeadores do Evangelho há uns que saem a semear,</p><p>há outros que semeiam sem sair. Os que saem a semear são os que vão</p><p>pregar à Índia, à China, ao Japão; os que semeiam sem sair são os que se</p><p>contentam com pregar na pátria. Todos terão sua razão, mas tudo tem</p><p>sua conta.</p><p>(Padre Antônio Vieira, Sermão aos Peixes)</p><p>Perceba como os pronomes sublinhados carregam ideia de</p><p>indefinição, quantidade indefinida, e referem-se à 3ª pessoa do discurso.</p><p>Podem ainda aparecer sob a forma de locuções pronominais, ou seja,</p><p>grupo de vocábulos com valor de pronome indefinido: seja qual for, cada</p><p>qual, quem quer que, cada um, cada qual etc.:</p><p>Cada qual com suas loucuras.</p><p>Só de cinco temos escrituras; mas a diferença com que</p><p>escreveram, como sabem os doutos, é admirável. As penas todas eram</p><p>tiradas das asas daquela pomba divina; mas o estilo tão diverso, tão</p><p>23</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>particular e tão próprio de cada um, que bem mostra que era seu. (Padre</p><p>Antônio Vieira, Sermão da Sexagésima)</p><p>Algumas observações sobre pronomes indefinidos são fundamentais:</p><p>Observações práticas</p><p>1) Não se confundem os pronomes “mais” e “menos” com os advérbios</p><p>“mais” e “menos”:</p><p>Espera-se mais graça que desgraça. (“Mais” é pronome, pois indefine</p><p>“graça”, um substantivo)</p><p>Espero que você goste mais daqui do que de lá. (“Mais” é advérbio,</p><p>pois modifica o verbo “gostar”)</p><p>2) “Bastante” e “nenhum”, como pronomes indefinidos, variam</p><p>normalmente:</p><p>Não encontrei nenhuns documentos na gaveta.</p><p>Tenho escrito bastantes crônicas. (=muitas crônicas)</p><p>Convidei bastantes parentes para a festa (=muitos parentes).</p><p>Obs.: É diferente de dizer Convidei parentes bastantes para a festa</p><p>(=parentes suficientes)</p><p>3) “Nem um” refere-se à unidade, “nenhum” é termo que generaliza</p><p>a negação:</p><p>Não tenho nenhum celular. = não tenho celular algum</p><p>Não tenho nem um celular, que dirá dois. Um = numeral</p><p>Não fiz nem uma coisa nem outra. Um = pronome indefinido</p><p>Não é incomum haver situações em que “nenhum” e “nem um”</p><p>caibam corretamente. Haverá apenas leve diferença de sentido. Observe:</p><p>Não venho nenhum amigo à festa dele. = Não veio amigo algum; há</p><p>aqui uma negativa generalizada.</p><p>Não veio nem um amigo à festa dele. = Não veio nem um único</p><p>24</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>amigo; há aqui ênfase de caráter quantitativo.</p><p>Ambas as construções são possíveis e corretas.</p><p>4) “Nenhum” pode ser reforçado normalmente por advérbios de</p><p>negação: Não fiz nenhum esforço para carregar o sofá. Nunca ninguém</p><p>me disse isso.</p><p>Aliás nada há de errado com a dupla negação em língua portuguesa.</p><p>Ela marca um reforço da ideia:</p><p>“Não sou nada. Nunca serei nada, não posso querer ser nada. À</p><p>parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.”</p><p>Falhei em tudo. Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo</p><p>fosse nada.</p><p>(Fernando Pessoa, como Álvaro de Campos, Tabacaria)</p><p>5) “Todo”, no singular, quando junto a artigo ou pronome</p><p>demonstrativo, significa “inteiro”; sem artigo, significa “qualquer”:</p><p>Nem todo estado aceita sua carteira de motorista. (= nem todos os</p><p>estados, ou seja, não é qualquer estado que aceita.)</p><p>Nem todo o estado aceita sua carteira de motorista. (= não é o estado</p><p>inteiro que aceita, apenas uma parte.)</p><p>6) O pronome indefinido “cada” sempre acompanha um substantivo</p><p>ou um numeral. Não são normativas, portanto, construções como</p><p>As pastas de dente custaram 10 reais cada.</p><p>Resolve-se a questão assim:</p><p>As pastas de dente custaram 10 reais cada uma ou</p><p>Cada pasta de dente custou 10 reais.</p><p>7) As palavras “fulano”, “beltrano” e “sicrano” são, segundo o Volp</p><p>e dicionários, substantivos, não pronomes indefinidos, embora tenham</p><p>dinâmica muito semelhante à destes. A propósito, veja-se texto sobre a</p><p>https://kdfrases.com/frase/124425</p><p>https://kdfrases.com/frase/124425</p><p>25</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>origem dessas palavras:</p><p>Fulano, beltrano e... sicrano?</p><p>Analisar a digital das palavras é entender a história que carregam.</p><p>Fulano, beltrano e sicrano – essas palavras esquisitas que usamos</p><p>para fofocar – têm origens distintas. São vistas como siamesas hoje, mas</p><p>não o são de fato, como nos conta um exame detalhado de DNA.</p><p>Fulano tem procedência certa: do árabe “fulân”, era pronome</p><p>demonstrativo sinônimo de “tal”, usado em construções como “fulano</p><p>vizinho” (tal vizinho) e “fulana refeição” (tal refeição), por exemplo. Os</p><p>espanhóis – influenciados pelos mouros – falavam assim no século 13, mas,</p><p>quando a expressão passou para o português, veio como substantivo.</p><p>Beltrano, por sua vez, vem do nome próprio Beltrão (oriundo do</p><p>francês Bertrand). Dizem os etimólogos que o nome era muito famoso</p><p>nas novelas de cavalaria e, de tão comum, acabou-se tornando, de fato,</p><p>um substantivo comum. De “Beltrão” para “beltrano” foi um pulo, por</p><p>clara influência da terminação de “fulano”.</p><p>Já “sicrano” tem um DNA bem apagado. Sua digital se perdeu no</p><p>desenrolar corrosivo do tempo. A origem é bastante controvertida: há</p><p>quem diga vir do árabe “sicrán”, que significa “bêbado”; há quem defenda</p><p>ser o desfiguramento de um nome próprio, como ocorreu com “beltrano”;</p><p>há quem avente provir do latim “securu”; por fim, há quem rogue ser uma</p><p>mistureba de “zutrano” e “citano”, palavras espanholas equivalentes a</p><p>“fulano” e “beltrano”.</p><p>O que se nota, por esse belo conto de fadas etimológico, é que</p><p>nenhum deles se registra como substantivo próprio, ao contrário do que</p><p>se costuma imaginar. Falando de maneira simples: fulano, beltrano e</p><p>sicrano não são nomes de pessoas específicas, mas substantivos comuns</p><p>referentes a indivíduos, como são as palavras “pessoa” e “humano”, por</p><p>exemplo. Pode-se concluir, por isso, que: 1) nenhuma delas se grafa com</p><p>26</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>letra maiúscula, como assevera claramente o Acordo Ortográfico; 2) não</p><p>há margem para adaptações criativas, como o uso de “ciclano” no lugar</p><p>de “sicrano”.</p><p>É claro que tudo isso é a norma-padrão sendo o que é: normativa.</p><p>Nada impede que a palavra “ciclano” evolua formalmente e deixe de</p><p>viver na clandestinidade, irmanando-se a “sicrano” de forma digna. Por</p><p>enquanto, dicionários definem tal vocábulo apenas como um grupo de</p><p>hidrocarbonetos saturados. Faz sentido estar saturado, o pobre “ciclano”.</p><p>Tantos anos vivendo à margem do reconhecimento não faz bem a</p><p>ninguém.</p><p>(Lara Brenner para a página Língua e Tradição, no Facebook)</p><p>Pronomes interrogativos</p><p>São aqueles empregados em interrogativas diretas (com ponto de</p><p>interrogação) ou indiretas (sem ponto de interrogação). São eles: que, qual</p><p>(quais), quem, quanto (a/s).</p><p>A entonação nas interrogativas diretas é ascendente; nas indiretas,</p><p>descendente. Estas trabalham com verbos como desejar, querer, saber,</p><p>perguntar, ignorar, verificar, responder etc.:</p><p>Quem é esse navegador? (Pergunta direta)</p><p>Não sei quem é esse navegador. (Pergunta indireta)</p><p>Por qual caminho devemos passar? (Pergunta direta)</p><p>Verificarei por qual caminho devemos passar. (Pergunta indireta)</p><p>Comendo alegremente perguntavam,</p><p>Pela Arábica língua, [...]</p><p>Quem eram, de que terra, [...]</p><p>Ou que partes do mar corrido tinham.</p><p>Os fortes Lusitanos lhe tornavam</p><p>27</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>As discretas respostas, que convinham:</p><p>“Os Portugueses somos do Ocidente,</p><p>Imos buscando as terras do Oriente.</p><p>(Camões, Os Lusíadas)</p><p>Pronomes relativos</p><p>São aqueles que se referem a termo antecedente explícito,</p><p>substituindo-o. Essa função pode ser desempenhada por que, o qual (e</p><p>suas flexões), quem, quanto, onde, cujo, como e quando. Veja:</p><p>Quadrilha</p><p>João amava Teresa que amava Raimundo</p><p>que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili,</p><p>que não amava ninguém.</p><p>João foi para os Estados Unidos, Teresa para o convento,</p><p>Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,</p><p>Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes</p><p>que não tinha entrado na história.</p><p>(Carlos Drummond)</p><p>- O qual, a qual, os quais, as quais: ajudam a evitar ambiguidades e</p><p>queísmos (repetição excessiva da palavra “que”).</p><p>O depoimento da testemunha, que revirou o processo, finalmente</p><p>ocorreu.</p><p>Quem revirou o processo? Agora observe:</p><p>O depoimento da testemunha, a qual revirou o processo, finalmente</p><p>ocorreu.</p><p>O depoimento da testemunha, o qual revirou o processo, finalmente</p><p>ocorreu.</p><p>28</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>- Que: é relativo quando permutável por o qual, a qual, os quais, as</p><p>quais. Refere-se a pessoa ou coisa.</p><p>O recurso, que foi claramente redigido às pressas, ficou ruim.</p><p>Obs.: Em prol do bom movimento rítmico, bons gramáticos</p><p>recomendam usar o pronome “o qual” em detrimento do “que” quando</p><p>precedido de locução prepositiva ou preposição de duas ou mais sílabas:</p><p>O verão durante o qual atuei naquele caso de homicídio deixou</p><p>suas marcas.</p><p>(E não “durante que”.)</p><p>Houve perdas apesar das quais nós vencemos.</p><p>(E não “apesar de que”.)</p><p>Eu sumi a procuração mediante a qual você me passou poderes.</p><p>(E não “mediante que”.)</p><p>- Quem: sempre precedido de preposição, refere-se a pessoas ou</p><p>seres personificados.</p><p>Seixas, apesar da revolução que se nele se havia operado nos</p><p>últimos seis meses, ainda não gastara de todo seus hábitos de homem</p><p>da sociedade para quem a vida é uma série de etiquetas e cerimônias,</p><p>regradas pelo uso.</p><p>(José de Alencar, Senhora)</p><p>Durante essas pausas, Aurélia observava o marido, e assistia</p><p>comovida à transformação que se fora operando aquele caráter, outrora</p><p>frágil, mundano e volúbil, a quem uma salutar influência restituía</p><p>gradualmente a sua natureza generosa.</p><p>(José de Alencar, Senhora)</p><p>- Onde, aonde, donde: utilizados quando o antecedente for lugar</p><p>(físico ou virtual). Dispensa a preposição “em”.</p><p>29</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Voltou a seu apartamento, onde havia esquecido as chaves.</p><p>O comandante olhou para o sítio donde Mariana se atirara, e</p><p>viu, enleado ao cordame, o avental, e à flor da água, um rolo de papéis,</p><p>que os marujos recolheram da lancha. (Camilo Castelo Branco, Amor de</p><p>Perdição)</p><p>Não, não sei isto, nem outra coisa, nem coisa nenhuma...</p><p>E, no fundo do meu espírito, onde sonho o que sonhei,</p><p>Nos campos últimos da alma, onde memoro sem causa</p><p>Fogem desmantelados, últimos restos</p><p>Da ilusão fina. (Fernando Pessoa)</p><p>O velhinho subiu ao sobrado, donde voltou logo munido de</p><p>um par de óculos verdes, que usara outrora por causa dum ameaço de</p><p>oftalmia. (José de Alencar, Senhora)</p><p>Obs.: A escola (n)onde estudo é boa. (O “nonde” caiu em desuso.</p><p>Usa-se apenas “onde” nesse caso)</p><p>Atenção!</p><p>Evite usar “onde” para referências que não sejam a lugares físicos ou</p><p>virtuais:</p><p>Não suporto pegadinhas de rua onde o humor se faz com base no</p><p>desespero de alguém.</p><p>Prefira “...em que/nas quais o humor se faz com base no desespero</p><p>de alguém”.</p><p>Foi justamente aquele o momento onde ele decidiu mudar.</p><p>Prefira “...em que ele decidiu mudar”.</p><p>A médica era habilidosa e atenciosa, onde conquistou o coração</p><p>dos pacientes.</p><p>Prefira “...razão pela qual conquistou o coração dos pacientes”.</p><p>30</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>- Cujo, cuja, cujos, cujas: indicam posse ou pertinência e concordam</p><p>com a palavra posterior.</p><p>A sentença, cujo teor claramente fere a norma penal, deve ser</p><p>reformada.</p><p>Já não eram trinta, mas trezentas pessoas que acompanhavam</p><p>o barbeiro, cuja alcunha familiar deve ser mencionada, porque ela deu</p><p>nome à revolta; chamavam-lhe o Canjica. (Machado de Assis, O Alienista)</p><p>Os pés [...] eram resguardados por um par de sapatos cujas</p><p>fivelas não passavam de um simples e modesto latão. (Machado de Assis,</p><p>O Alienista)</p><p>- Quanto(a)(s): como relativos, vêm antecedidos de tudo, todos, todas,</p><p>que podem ser ocultados.</p><p>Tudo quanto fiz foi em vão.</p><p>Explico tantas vezes quantas forem necessárias.</p><p>- Quando: como relativo, refere-se apenas a tempo e dispensa</p><p>preposição.</p><p>Os momentos quando o réu saiu da sala foram tensos.</p><p>- Como: na função de pronome relativo, tem como antecedente</p><p>nome denotador de modo (maneira, forma, jeito) e pode ser substituído</p><p>por “segundo o(a) qual”, “pelo(a) qual”.</p><p>Estou observando a maneira como você se porta.</p><p>A forma como se entreolharam deixou evidente que o Juiz e o</p><p>Promotor estavam de acordo.</p><p>O alienista disse-lhe confidencialmente que esse digno homem</p><p>não estava no perfeito equilíbrio das faculdades mentais, à vista do modo</p><p>como dissipava os cabedais. (Machado de Assis, O Alienista)</p><p>31</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>O bom emprego dos pronomes relativos está diretamente atrelado</p><p>ao domínio de regência. Analise alguns exemplos:</p><p>E corriam sem temor de serem vistos, porque os outros tinham</p><p>dobrado o outeiro, em cujo vale corria a estrada. (Camilo Castelo Branco,</p><p>Amor de Perdição)</p><p>Muitos entenderam que o alienista merecia uma especial</p><p>manifestação e deram-lhe um baile, ao qual se seguiram outros bailes e</p><p>jantares. (Machado de Assis, O Alienista)</p><p>Havia em cima da mesa uma caixa de jogo, donde Aurélia</p><p>tirou um baralho, com que se entreteve a fazer sortes. (José de Alencar,</p><p>Senhora)</p><p>EXERCÍCIOS E RESPOSTAS</p><p>CADERNO 1</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Exercícios</p><p>Substantivo, adjetivo, pronome, numeral e artigo.</p><p>Questão 1</p><p>Explique gramaticalmente o que possibilitou a resposta de Snoopy</p><p>na tira abaixo.</p><p>Questão 2</p><p>Os exercícios a seguir são relativos à primeira estrofe de “Oh retrato</p><p>da Morte, oh noite amiga”, de Bocage, poeta português, representante do</p><p>arcadismo lusitano.</p><p>Oh retrato da Morte, oh Noite amiga,</p><p>Por cuja escuridão suspiro há tanto!</p><p>Calada testemunha de meu pranto,</p><p>De meus desgostos secretária antiga</p><p>Pois manda Amor que a ti somente os diga</p><p>Dá-lhes</p><p>pio agasalho no teu manto;</p><p>Ouve-os, como costumas, ouve, enquanto</p><p>Dorme a cruel que a delirar me obriga.</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>E vós, ó cortesãos da escuridade,</p><p>Fantasmas vagos, mochos piadores,</p><p>Inimigos, como eu, da claridade!</p><p>Em bandos acudi aos meus clamores;</p><p>Quero a vossa medonha sociedade,</p><p>Quero fartar o meu coração de horrores.</p><p>a) Dê a classe gramatical de “Morte” e “Noite” e explique por que tais</p><p>vocábulos foram grafados com letras maiúsculas.</p><p>b) Explique o emprego do pronome relativo “cuja”, presente no</p><p>segundo verso.</p><p>c) Veja a definição de “amiga” no dicionário Michaelis:</p><p>Substantivo feminino: Mulher ligada por laços de amizade a pessoa,</p><p>animal ou coisa: Amiga dos filhos. Amiga dos animais e das artes.</p><p>No contexto do poema, a palavra “amiga” é, de fato, empregada</p><p>como substantivo? Justifique.</p><p>d) O que o poeta quer dizer com “de meus desgostos secretária</p><p>antiga”?</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Questão 3</p><p>Os exercícios desta questão são sobre a crônica a seguir, escrita por</p><p>Otto Lara Resende:</p><p>VISTA CANSADA</p><p>Acho que foi o Hemingway quem disse que olhava cada coisa à sua</p><p>volta como se a visse pela última vez. Pela última ou pela primeira vez? Pela</p><p>primeira vez foi outro escritor quem disse. Essa ideia de olhar pela última</p><p>vez tem algo de deprimente. Olhar de despedida, de quem não crê que a</p><p>vida continua, não admira que o Hemingway tenha acabado como acabou.</p><p>Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta.</p><p>Um poeta é só isto: um certo modo de ver. O diabo é que, de tanto ver, a</p><p>gente banaliza o olhar. Vê não-vendo. Experimente ver pela primeira vez o</p><p>que você vê todo dia, sem ver. Parece fácil, mas não é. O que nos cerca, o</p><p>que nos é familiar, já não desperta curiosidade. O campo visual da nossa</p><p>rotina é como um vazio.</p><p>Você sai todo dia, por exemplo, pela mesma porta. Se alguém lhe</p><p>perguntar o que é que você vê no seu caminho, você não sabe. De tanto ver,</p><p>você não vê. Sei de um profissional que passou 32 anos a fio pelo mesmo</p><p>hall do prédio do seu escritório. Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo</p><p>porteiro. Dava-lhe bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma</p><p>correspondência. Um dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer.</p><p>Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a mínima</p><p>ideia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve que morrer.</p><p>Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo o rito, pode ser</p><p>também que ninguém desse por sua ausência. O hábito suja os olhos e lhes</p><p>baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente, coisas, bichos. E vemos?</p><p>Não, não vemos.</p><p>Uma criança vê o que o adulto não vê. Tem olhos atentos e limpos</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>para o espetáculo do mundo. O poeta é capaz de ver pela primeira vez o que,</p><p>de fato, ninguém vê. Há pai que nunca viu o próprio filho. Marido que nunca</p><p>viu a própria mulher, isso existe às pampas. Nossos olhos se gastam no dia</p><p>a dia, opacos. É por aí que se instala no coração o monstro da indiferença.</p><p>a) Releia a passagem:</p><p>“Lá estava sempre, pontualíssimo, o mesmo porteiro. Dava-lhe</p><p>bom-dia e às vezes lhe passava um recado ou uma correspondência. Um</p><p>dia o porteiro cometeu a descortesia de falecer.”</p><p>Dê a classificação do adjetivo sublinhado quanto ao grau e explique</p><p>por que o autor optou pela utilização nessa flexão.</p><p>b) Releia:</p><p>“Como era ele? Sua cara? Sua voz? Como se vestia? Não fazia a</p><p>mínima ideia. Em 32 anos, nunca o viu. Para ser notado, o porteiro teve</p><p>que morrer. Se um dia no seu lugar estivesse uma girafa, cumprindo o</p><p>rito, pode ser também que ninguém desse por sua ausência. O hábito</p><p>suja os olhos e lhes baixa a voltagem. Mas há sempre o que ver. Gente,</p><p>coisas, bichos. E vemos? Não, não vemos.”</p><p>Explique, morfológica e semanticamente, de que maneira a escolha</p><p>da palavra sublinhada ajuda a construir o argumento do autor.</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>c) Releia:</p><p>“Se eu morrer, morre comigo um certo modo de ver, disse o poeta.</p><p>Um poeta é só isto: um certo modo de ver.”</p><p>Classifique morfologicamente a palavra sublinhada e justifique seu</p><p>uso.</p><p>Questão 4</p><p>Os exercícios a seguir são sobre o soneto A Carolina, de Machado de</p><p>Assis, que o escreveu após o falecimento de sua esposa, a qual deu o nome</p><p>ao poema.</p><p>A CAROLINA</p><p>Querida, ao pé do leito derradeiro</p><p>Em que descansas dessa longa vida,</p><p>Aqui venho e virei, pobre querida,</p><p>Trazer-te o coração do companheiro.</p><p>Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro</p><p>Que, a despeito de toda a humana lida,</p><p>Fez a nossa existência apetecida</p><p>E num recanto pôs um mundo inteiro.</p><p>Trago-te flores, — restos arrancados</p><p>Da terra que nos viu passar unidos</p><p>E ora mortos nos deixa e separados.</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Que eu, se tenho nos olhos malferidos</p><p>Pensamentos de vida formulados,</p><p>São pensamentos idos e vividos.</p><p>Publicado no livro Relíquias de Casa Velha (1906).</p><p>In: ASSIS, Machado de. Obra completa. Org. Afrânio Coutinho.</p><p>Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994. v.3, p.313. (Biblioteca luso-brasileira. Série</p><p>brasileira</p><p>a) Releia:</p><p>Querida, ao pé do leito derradeiro</p><p>Em que descansas dessa longa vida,</p><p>Aqui venho e virei, pobre querida,</p><p>Trazer-te o coração do companheiro.</p><p>O adjetivo “pobre” é usado em seu sentido literal? Justifique.</p><p>b) Justifique a construção “em que” (verso 2) e dê duas outras</p><p>possibilidades de construções cabíveis.</p><p>c) No primeiro verso da segunda estrofe, lê-se: Pulsa-lhe aquele</p><p>afeto verdadeiro. A quem se refere o pronome oblíquo átono “lhe” e qual é</p><p>sua função semântica?</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>d) Ainda quanto ao verso “Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro”,</p><p>classifique morfologicamente a palavra “aquele” e justifique a escolha do</p><p>autor por essa palavra.</p><p>e) Releia:</p><p>Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro</p><p>Que, a despeito de toda a humana lida,</p><p>Fez a nossa existência apetecida</p><p>Qual é a expressão retomada pelo pronome relativo “que”?</p><p>O que o autor quer dizer com “a despeito de toda a humana lida,</p><p>Fez a nossa existência apetecida”?</p><p>f) Se, no segmento “Trago-te flores”, o autor desejasse empregar um</p><p>pronome oblíquo tônico no lugar de um átono, como ficaria a construção?</p><p>Justifique.</p><p>g) Releia:</p><p>Trago-te flores, — restos arrancados</p><p>Da terra que nos viu passar unidos</p><p>E ora mortos nos deixa e separados.</p><p>A quem se referem os adjetivos “mortos” e “separados”?</p><p>10</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Questão 5</p><p>Leia o texto para responder às questões.</p><p>PRA MIM BRINCAR</p><p>Não há nada mais gostoso do que o mim sujeito de verbo no</p><p>infinitivo. Pra mim brincar. As cariocas que não sabem gramática falam</p><p>assim. Todos os brasileiros deviam de querer falar como as cariocas que não</p><p>sabem gramática.</p><p>– As palavras mais feias da língua portuguesa são quiçá, alhures</p><p>e miúde.</p><p>BANDEIRA, Manuel. Seleta em prosa e verso. Org: Emanuel de</p><p>Moraes. 4ª ed.</p><p>Rio de Janeiro, José Olympio, 1986. p. 19.</p><p>a) O poeta se refere a um desvio gramatical muito comum. Explique</p><p>gramaticalmente por que a construção “para mim brincar” não é correta.</p><p>b) Qual é o significado das palavras tidas pelo autor como as mais</p><p>feias da língua portuguesa?</p><p>11</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Questão 6</p><p>Leia a piada para responder às questões.</p><p>O diretor de uma empresa contrata um detetive particular para</p><p>investigar o sócio.</p><p>– Siga o Pereira durante uma semana para saber o que ele está</p><p>fazendo. Aquilo tem tipo de safado.</p><p>Uma semana depois o detetive retorna e conta:</p><p>– O Pereira sai</p><p>de sua empresa ao meio-dia, pega o seu carro, vai</p><p>à sua casa almoçar, namora a sua mulher, fuma um dos seus charutos e</p><p>regressa para o trabalho.</p><p>O diretor comenta, satisfeito:</p><p>– Ah, bom. Tudo bem, então.</p><p>O detetive pergunta:</p><p>– Posso tratá-lo por tu?</p><p>– Claro.</p><p>– Então, vou contar a história de novo. O Pereira sai ao meio-dia, pega</p><p>o teu carro, vai à tua casa almoçar, namora a tua mulher, fuma um dos teus</p><p>charutos e regressa para o trabalho.</p><p>a) Utilizando o conceito de pronomes, explique o que gera o humor</p><p>da história.</p><p>b) Por que o diretor da empresa usa o pronome demonstrativo</p><p>“aquilo” ao final de sua primeira fala?</p><p>12</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Questão 7</p><p>Leia a tira.</p><p>Perceba que, para fugir da pergunta de Eddie, Hagar se vale de</p><p>um artifício da língua portuguesa, ao interpretar de forma conveniente a</p><p>primeira fala de seu funcionário (“Posso fazer uma pergunta?”). Utilizando</p><p>seus conhecimentos sobre classes gramaticais, explique o que Eddie quis</p><p>dizer no primeiro balão e como Hagar interpretou essa pergunta.</p><p>13</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Respostas</p><p>Questão 1</p><p>Sally usa o artigo indefinido “um” para se referir a Snoopy, dando a</p><p>entender que se trata de um cachorro desconhecido dos moradores da casa,</p><p>visto que mostrar falta de familiaridade é justamente uma das funções dos</p><p>indefinidos. Já Snoopy, em sua resposta, se vale do artigo definido “o”, o qual</p><p>deixa evidente que ele é um cachorro conhecido da família e, mais do que</p><p>isso, é o único (ou pelo menos o mais importante) cão daquela residência.</p><p>Questão 2</p><p>a) Trata-se de substantivos. Foram grafados com maiúsculas porque,</p><p>embora sejam correntemente substantivos comuns, são tratados pelo autor</p><p>como próprios, pois ele os entende como representantes de verdadeiras</p><p>pessoas (figura de linguagem chamada personificação). Esse processo</p><p>de mudança na classificação morfológica da palavra se chama derivação</p><p>imprópria. No caso, deixam de ser substantivos comuns e passam a ser</p><p>próprios.</p><p>No poema, Bocage diz que a Noite é o retrato da Morte. Ele dialoga</p><p>com a Noite, dividindo com ela suas angústias, afloradas pelo fato de se</p><p>sentir perto da Morte.</p><p>b) Existe relação de pertencimento: a escuridão pertence à Noite,</p><p>logo é pertinente o emprego do pronome relativo “cuja”.</p><p>Nota-se que ele concorda com “escuridão”, pois tal pronome, embora</p><p>retome o nome anterior (Noite amiga), realmente deve concordar com o</p><p>nome posterior (escuridão).</p><p>No contexto, quem suspira, suspira POR alguma coisa, daí a</p><p>justificativa da preposição “por” em “por cuja escuridão suspiro há tanto.</p><p>Ou seja: o autor suspira PELA escuridão da Noite.</p><p>14</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>c) Não. No poema, ocorre processo de derivação imprópria (quando</p><p>há mudança de classificação morfológica de uma palavra, a depender</p><p>do contexto). A palavra “amiga” não é empregada para designar um ser,</p><p>mas, sim, para caracterizar o substantivo “Noite”. Funciona, portanto, como</p><p>verdadeiro adjetivo.</p><p>d) Um dos sentidos de “secretária”, já em desuso, é, conforme dicionário</p><p>Michaelis, “Mulher que guarda segredos de outrem”. No poema, a Noite</p><p>guarda os segredos do autor, sendo, portanto, sua verdadeira confidente.</p><p>Questão 3</p><p>a) O adjetivo está no grau superlativo (especificamente, superlativo</p><p>absoluto sintético). O autor escolhe essa flexão para ressaltar a pontualidade</p><p>do porteiro, evidenciando como ele estava sempre presente no edifício,</p><p>embora não fosse notado pelo profissional sobre o qual o autor fala.</p><p>b) O autor escolhe um substantivo cujo referente é um animal,</p><p>formando, assim, imagem completamente deslocada da realidade de um</p><p>escritório. Dessa forma, causa estranheza ao leitor, levando-o a compreender</p><p>a extremidade de seu argumento: o profissional era tão desatento, que não</p><p>veria o porteiro, ainda que ele absurdamente fosse uma girafa.</p><p>c) Trata-se de um pronome demonstrativo, escolhido pelo autor para</p><p>projetar uma ideia (movimento catafórico). No caso, o autor apresenta a</p><p>definição de poeta (“um certo modo de ver”) depois do pronome “isto”.</p><p>Questão 4</p><p>a) Não, o sentido literal seria “sem dinheiro”, o que nada tem a ver</p><p>com o poema. Trata-se de uso metafórico, dada a anteposição do adjetivo</p><p>ao substantivo “querida” e, é claro, dado o contexto. No poema, “pobre”</p><p>expressa o apreço e carinho do autor por sua amada, bem como indica seu</p><p>lamento pela partida dela.</p><p>15</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>b) Querida, ao pé do leito derradeiro</p><p>Em que descansas dessa longa vida,</p><p>A preposição “em” é cabível pelo fato de que, no contexto, quem</p><p>descansa, descansa EM algum lugar. O pronome relativo “que” retoma “leito</p><p>derradeiro”. Poder-se-ia substituir a expressão por “no qual” ou “onde”.</p><p>c) O pronome oblíquo átono “lhe” remete à terceira pessoa do</p><p>discurso. Durante todo o texto, o autor se refere à amada chamando-a pela</p><p>segunda pessoa (tu), de maneira que já se exclui a possibilidade de “lhe” ser</p><p>referente a ela.</p><p>No caso, “lhe” tem valor possessivo. Poderia ser substituído por:</p><p>aquele afeto verdadeiro pulsa no coração do companheiro (ou seja, em</p><p>seu coração). Como o autor acabara de fazer referência ao coração do</p><p>companheiro (ou seja, a seu próprio coração), infere-se que o afeto a que se</p><p>refere é aquele que ali (em seu coração) pulsa.</p><p>d) Trata-se de pronome demonstrativo escolhido para revelar certo</p><p>distanciamento temporal, uma vez que o afeto do qual fala é de longa data</p><p>conhecido por Carolina. É como se ele dissesse “aquele afeto que há anos tu</p><p>tanto conheces ainda aqui permanece”.</p><p>e) O pronome relativo “que” retoma “aquele afeto verdadeiro”. Assim,</p><p>ele diz que o afeto verdadeiro de seu próprio coração fez a existência deles</p><p>apetecida (ou seja, desejada, pretendida), apesar da lida (ou seja, do trabalho,</p><p>do esforço, do labor) humana. Em outras palavras: apesar da sofrida existência</p><p>humana, o afeto de seu próprio coração pela amada Carolina fez com que a</p><p>existência deles como casal fosse desejada, agradável, pretendida por ele.)</p><p>f) Trago flores a ti (ou para ti). Seria necessária a inserção de a ou para</p><p>porque os pronomes oblíquos tônicos (como ti) trabalham necessariamente</p><p>acompanhados por preposições.</p><p>16</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>g) Ambos os adjetivos se referem a “nós” (Carolina e o autor). Em</p><p>outras palavras, o autor diz que a terra os viu passar unidos, mas agora ela</p><p>os deixa mortos e separados. Ao usar tais adjetivos no plural, o autor deixa</p><p>claro que a separação deles pela morte também o matou.</p><p>Questão 5</p><p>a) O pronome “mim” é pessoal oblíquo tônico, categoria que não</p><p>funciona como sujeito. Os pronomes que desempenham papel de sujeito</p><p>são os pessoais do caso reto (eu, tu, ele/ela, nós, vós, eles/elas). No caso, a</p><p>estrutura deveria ser “para eu brincar”.</p><p>b) De acordo com o Dicionário Aulete:</p><p>Quiçá: talvez, provavelmente;</p><p>Alhures: em outro lugar;</p><p>Miúde: com frequência; repetidas vezes; a miúdo.</p><p>Questão 6</p><p>a) O humor é gerado pelo fato de o pronome possessivo “seu” poder</p><p>se referir tanto à pessoa sobre a qual se fala (Pereira) como à pessoa com</p><p>a qual se fala (o diretor da empresa). Isso acontece porque o detetive</p><p>começou a história tratando seu interlocutor pode “você”. Os pronomes de</p><p>tratamento (como é o caso de “você”) trabalham com verbos e pronomes da</p><p>terceira pessoa, embora se refiram à segunda pessoa do discurso. Trata-se</p><p>de um idiotismo da língua portuguesa, ou seja, um fenômeno não explicável</p><p>logicamente, porém já consolidado no idioma.</p><p>b) Para manifestar desprezo pelo indivíduo sobre o qual falava.</p><p>Questão 7</p><p>Eddie usou a palavra “uma” como artigo indefinido, querendo saber</p><p>se poderia fazer uma pergunta qualquer, ainda não especificada (uma</p><p>17</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>vez que ainda não feita). A resposta de Hagar no último quadrinho deixa</p><p>evidente que ele convenientemente tomou tal artigo indefinido “uma”</p><p>como um numeral, de maneira que Eddie só poderia fazer uma única</p><p>pergunta. Dessa forma, conseguiu se esquivar do segundo questionamento</p><p>de Eddie (“Quando vou receber algum pagamento?”), o qual era o que</p><p>verdadeiramente interessava no contexto, mas de que Hagar queria se</p><p>esquivar.</p><p>EXERCÍCIOS E RESPOSTAS</p><p>PRONOMES</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Exercícios</p><p>Seguem alguns exercícios. Posteriormente, no capítulo de regência,</p><p>voltar-se-á ao assunto.</p><p>Questão 01</p><p>Preencha as lacunas com o pronome correto.</p><p>a) Eu fiz o relatório semanal ____________________ você pediu.</p><p>b) Esta é a estratégia digital ____________________ eu preciso.</p><p>c) A cidade X, ____________________ ruas estão mal asfaltadas, recebeu</p><p>o Governador de São Paulo.</p><p>d) O restaurante X, ____________________ trabalham os melhores chefs</p><p>de cozinha do Brasil, está contratando garçons.</p><p>e) Encontrei hoje um antigo professor ____________________ esposa</p><p>tornou-se presidente da minha empresa.</p><p>f) No trabalho, eu me reporto diretamente ao supervisor de</p><p>marketing, ____________________ me referi durante a reunião de hoje.</p><p>g) O estado ____________________ venho se chama Goiás.</p><p>h) Quaisquer detalhes ____________________ você se lembrar serão</p><p>fundamentais nesta ação.</p><p>i) Os aspectos processuais ____________________ ele fez alusão são</p><p>relevantes.</p><p>j) O caso ____________________ estou preocupada ainda não apareceu</p><p>na televisão.</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>k) As companhias ____________________ eu ando são boas, não se</p><p>preocupe!</p><p>l) Estive solitária em toda a festa ____________________ você dormiu!</p><p>m) As histórias ____________________ eu costumo sorrir não são tão</p><p>engraçadas assim.</p><p>n) A partir do instante ____________________ cheguei, todos ficaram</p><p>em silêncio.</p><p>o) O apartamento ____________________ resido não pode ser</p><p>penhorado.</p><p>Questão 02</p><p>Complete as lacunas abaixo utilizando o pronome relativo CUJO.</p><p>Faça as devidas adequações.</p><p>a) Aquela é a vítima ___________________ ligações foram ilegalmente</p><p>interceptadas.</p><p>b) Este é o político ___________________ projeto foi aprovado.</p><p>c) Aquele é o professor ___________________ aula nem todos participam.</p><p>d) Esta é a comentarista política ___________________ capacidade</p><p>todos confiam.</p><p>e) Aquele é o jornalista ___________________ ideias não concordo.</p><p>f) São estes os participantes ___________________ ideias sempre</p><p>lutamos.</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>g) Morreu ontem o jurista ___________________ livros fiz alusão em</p><p>meu artigo.</p><p>h) Ele é um colaborador, ___________________ ajuda vamos, sem dúvida</p><p>alguma, precisar.</p><p>i) Este é um argumento ___________________ força tenho muita</p><p>confiança.</p><p>j) O homem ___________________ olhos passa a verdade jamais</p><p>conseguirá dela desviar.</p><p>Questão 03</p><p>Preencha com onde, aonde, donde:</p><p>a) Todos os quartos ____________________ nos hospedamos da última</p><p>vez estão ocupados.</p><p>b) Os restaurantes ____________________ vamos com mais frequência</p><p>são o Bartolomeu e o Meze.</p><p>c) Há labirintos ____________________ é difícil sairmos ilesos.</p><p>d) O prédio ____________________ você está se dirigindo não é o correto.</p><p>e) A cidade ____________________ vim se chama Guapó.</p><p>f) A cidade ____________________ estamos nos dirigindo é famosa por</p><p>sediar crimes bárbaros.</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Questão 04</p><p>Corrija:</p><p>a) O resultado que eu não tenho controle sobre ele sairá amanhã.</p><p>b) Todas as pessoas que se espera algo delas em algum momento</p><p>decepcionam.</p><p>c) Felizes são os filhos que os pais deles os deixam alçar os próprios</p><p>voos.</p><p>d) Este é o ato que eu falei dele ontem.</p><p>e) Procuro não me preocupar com questões que eu não detenho</p><p>entendimento sobre.</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Respostas</p><p>Questão 01</p><p>a) que / o qual</p><p>b) de que / da qual</p><p>c) cujas</p><p>d) onde / no qual / em que</p><p>e) cuja</p><p>f) ao qual / a quem / a que</p><p>g) donde / do qual / de que</p><p>h) dos quais / de que</p><p>i) aos quais / a que</p><p>j) com que / com o qual</p><p>k) com as quais / com que</p><p>l) em que / durante a qual</p><p>m) das quais / de que</p><p>n) quando / em que / no qual</p><p>o) onde / em que / no qual</p><p>Questão 02</p><p>a) cujas</p><p>b) cujo</p><p>c) de cuja</p><p>d) em cuja</p><p>e) com cujas</p><p>f) por cujas / contra cujas / a favor de cujas</p><p>g) a cujos</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>h) de cuja</p><p>i) em cuja</p><p>j) por cujos / diante de cujos / em frente a cujos</p><p>Questão 03</p><p>a) onde</p><p>b) aonde</p><p>c) donde / de onde</p><p>d) aonde</p><p>e) donde / de onde</p><p>f) aonde</p><p>Questão 04</p><p>a) O resultado sobre o qual não tenho controle sairá amanhã.</p><p>b) Todas as pessoas de quem/de que/das quais se espera algo em</p><p>algum momento decepcionam.</p><p>c) Felizes são os filhos cujos pais os deixam alçar os próprios voos.</p><p>d) Este é o ato sobre o qual eu falei ontem.</p><p>e) Procuro não me preocupar com questões sobre as quais eu não</p><p>detenho entendimento.</p><p>VERBO</p><p>AULA 6</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Verbo</p><p>A palavra “verbo” advém do latim “verbu(m)” e significava</p><p>originalmente “palavra”. Dela, advêm cognatos como “verborragia”,</p><p>“averbar”, “verboso”, “verbete”, “verve” etc.</p><p>Partindo-se desse sentido amplo é que se compreende o começo</p><p>do evangelho de São João:</p><p>No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo</p><p>era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas</p><p>por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida, e a vida</p><p>era a luz dos homens. (João, 1:1-5)</p><p>Deus, portanto, era o próprio Verbo, a palavra, a linguagem, a razão.</p><p>Em grego: o logos.</p><p>Apenas com o passar do tempo, seu conceito passou a ser mais</p><p>restrito. Verbo, linguisticamente, é a classe gramatical que designa ação</p><p>ou processo, estado, mudança de estado ou fenômeno da natureza. Ele</p><p>trabalha essencialmente dentro de uma perspectiva temporal e pode ser</p><p>conjugado. Veja:</p><p>Choveu ontem pela manhã. (fenômeno da natureza, passado)</p><p>A sua intelectualidade, tal como seu corpo, desabrochara</p><p>(processo, passado) inesperadamente, atingindo de súbito, em pleno</p><p>desenvolvimento, uma lucidez que a deliciava e surpreendia (ação,</p><p>passado). Não a comovera tanto a revolução física. Como que naquele</p><p>instante o mundo inteiro se despia à sua vista, de improviso esclarecida,</p><p>patenteando-lhe todos os segredos de suas paixões. [...] Sorriu. E no seu</p><p>sorriso já havia garras.</p><p>(Aluísio Azevedo, O Cortiço)</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Vou-me embora pra Pasárgada (ação, presente)</p><p>Lá sou amigo do rei (estado, presente)</p><p>Lá tenho a mulher que eu quero (presente; posse e volição)</p><p>Na cama que escolherei (ação, futuro)</p><p>(Manuel Bandeira, Vou-me embora para Pasárgada)</p><p>A definição tradicional, no entanto, deixa escapar outras funções</p><p>semânticas do verbo, como existência, conveniência, necessidade,</p><p>passividade etc. Veja:</p><p>Quero ganhar a aposta. (desejo/volição)</p><p>Preciso ganhar a aposta. (necessidade)</p><p>Ele sofreu um derrame. (passividade)</p><p>Convém que eles cheguem a tempo. (conveniência)</p><p>As casas espiam os homens</p><p>que correm atrás de mulheres.</p><p>A tarde talvez fosse azul,</p><p>não houvesse tantos desejos. (existência)</p><p>(Carlos Drummond, Poema de Sete Faces)</p><p>O verbo, quando no infinitivo, termina em -ar (dizemos que é de</p><p>primeira conjugação),</p><p>-er (dizemos que é de segunda conjugação) e -ir</p><p>(dizemos que é de terceira conjugação): cantar, beber e partir ilustram</p><p>esses finais. O infinitivo é a única forma verbal que não apresenta nenhuma</p><p>noção temporal.</p><p>Obs.: Há ainda verbos terminados em -or, todos derivados do verbo</p><p>“pôr”. “Pôr” é, por sua vez, de segunda conjugação, advindo do latim</p><p>“poner(e)”.</p><p>(O Globo)</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Verbo é uma classe gramatical que flexiona bastante, ou seja, varia</p><p>muito sua estrutura. Estudemos inicialmente as flexões de modo, tempo,</p><p>número e pessoa.</p><p>Flexão de modo</p><p>O modo é a maneira pela qual o verbo indica a atitude da pessoa</p><p>que fala quanto ao fato que enuncia.</p><p>São três os modos: indicativo, subjuntivo e imperativo.</p><p>O modo indicativo é a expressão categórica, definida, real do juízo,</p><p>seja este negativo, afirmativo ou interrogativo. Ele está ligado à constatação</p><p>da realidade de um fato. Exemplo:</p><p>Veja como “aponta” e “é” são verbos que indicam um fato</p><p>devidamente constatado.</p><p>Mesmo que se perguntasse algo como “O documento do Coaf</p><p>aponta transferências do dono da Precisa para o ex-diretor da Petros?”, o</p><p>indivíduo que pergunta estaria atrás de obter resposta quanto a um fato</p><p>categórico e definido.</p><p>O modo imperativo, por sua vez, expressa, como o próprio nome</p><p>diz, império (mando, comando). Pode, ainda, indicar exortação, pedido ou</p><p>súplica. Exemplo:</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Prêmio Faz Diferença: Conheça os indicados em 14 categorias e</p><p>vote aqui. (Jornal O Globo)</p><p>[...] Toma um fósforo. Acende teu cigarro!</p><p>O beijo, amigo, é a véspera do escarro,</p><p>A mão que afaga é a mesma que apedreja.</p><p>Se alguém causa inda pena a tua chaga,</p><p>Apedreja essa mão vil que te afaga,</p><p>Escarra nessa boca que te beija!</p><p>(Augusto dos Anjos, Versos Íntimos)</p><p>Semanticamente, pode ocorrer de o verbo não aparecer no modo</p><p>imperativo, mas, ainda assim, exprimir seu valor. São formas supletivas do</p><p>imperativo. Veja:</p><p>6º mandamento: Não matarás. (verbo no futuro do presente</p><p>indicando ordem)</p><p>Passar bem! (Verbo no infinitivo indicando desejo.)</p><p>Todo mundo caminhando! Caminhando! (Verbo no gerúndio</p><p>indicando ordem.)</p><p>Amar a Deus sobre todas as coisas. (Verbo no infinitivo exprimindo</p><p>uma prescrição de cunho religioso.)</p><p>O modo subjuntivo indica que o verbo não tem sentido caso não</p><p>venha subordinado a outro verbo, do qual será dependente para perfeita</p><p>compreensão. Ou seja, “subjuntivo” tem esse nome porque expressa o</p><p>modo de um verbo que se subjuga a outro.</p><p>Em termos de sentido, expressa possibilidade, dúvida,</p><p>indeterminação. Veja a diferença:</p><p>Sei que ele faz terapia. (“Faz” expressa uma constatação da realidade.</p><p>Trata-se de modo indicativo.)</p><p>https://oglobo.globo.com/premio-faz-diferenca/</p><p>https://oglobo.globo.com/premio-faz-diferenca/</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Espero que ele faça terapia. (“Faça” reforça um desejo de algo que</p><p>pode vir a se concretizar ou não. Daí ser o modo subjuntivo também</p><p>conhecido como modo da possibilidade.)</p><p>Em orações adjetivas e substantivas (as quais estudaremos com</p><p>profundidade mais à frente, mas que já podem ser intuídas desde já), o</p><p>subjuntivo muda o sentido das estruturas:</p><p>Entendo que a conduta é caso de expulsão. (Percepção certa, o fato</p><p>propende para a realização.)</p><p>Entendo que a conduta seja caso de expulsão. (Percepção duvidosa,</p><p>expressa suposição.)</p><p>Não conheço quem costura este tipo de roupa. (Fato certo: há pessoas</p><p>que costuram, mas eu não as conheço.)</p><p>Não conheço quem costure este tipo de roupa. (Fato duvidoso: talvez</p><p>nem existam pessoas que costurem o tipo de roupa em questão.)</p><p>Bendito seja o mesmo sol de outras terras que faz meus irmãos</p><p>todos homens. (Fernando Pessoa) (Fato certo: o sol de outras terras</p><p>indubitavelmente faz os irmãos todos homens.)</p><p>Art. 30 [...] § 1º Aquele que tiver direito à posse provisória, mas não</p><p>puder prestar a garantia exigida neste artigo, será excluído, mantendo-se</p><p>os bens que lhe deviam caber sob a administração do curador, ou de</p><p>outro herdeiro designado pelo juiz, e que preste essa garantia. (Código</p><p>Civil) (Fato possível: indica condição para que algo ocorra.)</p><p>Observação: “Andam por aí a construir ‘Você quer que eu faço’,</p><p>‘Você quer que eu vou?’ – o que jamais devemos tolerar, a menos que</p><p>desejemos conspurcar o nosso idioma de uma vez para sempre. É de rigor</p><p>em português o emprego do subjuntivo nas orações que se subordinam a</p><p>verbos que indicam desejo, vontade (verba voluntatis): ele aconselha que</p><p>eu vá (aconselhava que eu fosse), ele admite que eu vá (admitiu que eu</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>tivesse ido), ele concede que eu vá (teria concedido que eu tivesse ido),</p><p>consinto que padeçam (consenti que padecessem), convenho que ele seja</p><p>bom (convim que ele fosse bom), ele deixa que eu venda (deixava que eu</p><p>vendesse), ele deseja que eu fique (desejaria que eu ficasse) [...]”. (Napoleão</p><p>Mendes de Almeida)</p><p>Há ainda outros casos de emprego do modo subjuntivo, sobre</p><p>os quais se falará mais à frente, quando forem estudadas orações</p><p>subordinadas.</p><p>Flexão de tempo</p><p>É a flexão que visa a indicar o tempo, a época em que se realiza</p><p>o fato expresso pelo verbo em relação ao momento da fala. Ela reflete a</p><p>capacidade do ser humano de criar uma linha do discurso, situando o</p><p>verbo no tempo.</p><p>São três os tempos verbais naturais: passado, presente e futuro.</p><p>Quando se flexiona um verbo no tempo, é impossível não lhe notar também</p><p>o modo verbal. É por isso que sempre se diz, por exemplo, “presente do</p><p>subjuntivo”, “futuro do indicativo”, “pretérito imperfeito do subjuntivo” etc.,</p><p>ou seja, há sempre a percepção de um tempo atrelada à percepção de um</p><p>modo.</p><p>A tabela abaixo conjuga o verbo “estudar” na primeira pessoa do</p><p>singular (eu), em tempos e modos diferentes. Compare:</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Mais à frente, falaremos sobre a formação dos tempos verbais.</p><p>Flexão de número</p><p>É a variação que ocorrer para expressar singular ou plural. O verbo</p><p>está no singular quando se refere a uma só pessoa ou coisa e, no plural,</p><p>quando a mais de uma pessoa ou coisa.</p><p>Singular: estudo, estudas, estuda</p><p>Plural: estudamos, estudais, estudam</p><p>Flexão de pessoa</p><p>É a variação que ocorre em função das pessoas gramaticais do</p><p>sujeito:</p><p>Eu amo, tu amas, ele ama, nós amamos, vós amais, eles amam</p><p>Como se pode notar, as flexões de número e pessoa caminham</p><p>juntas. Ao dizer “amas”, sabe-se, pela letra -s, que o verbo está na 2ª pessoa</p><p>do singular.</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>As desinências número-pessoais e modo-temporais registram as</p><p>flexões do verbo, embora elas nem sempre estejam presentes. A título de</p><p>curiosidade, analise a estrutura de alguns verbos:</p><p>Era como se, na alma da cidade,</p><p>Profundamente lúbrica e revolta,</p><p>Mostrando as carnes, uma besta solta</p><p>Soltasse o berro da animalidade.</p><p>(Augusto dos Anjos, As cismas do destino)</p><p>Em soltasse, solt é radical, a é vogal temática (o verbo “soltar” é de 1ª</p><p>conjugação), sse é desinência modo-temporal (indica que o verbo está no</p><p>pretérito imperfeito [tempo] do subjuntivo [modo]).</p><p>Comeremos do mesmo pão?</p><p>Em comeremos, com é radical, e é vogal temática (o verbo “comer”</p><p>é de segunda conjugação), re é desinência modo-temporal (indica que</p><p>o verbo está no futuro do modo indicativo) e mos é desinência número-</p><p>pessoal (indica que o verbo se refere à primeira pessoa do plural).</p><p>As desinências nem sempre estão presentes. Veja:</p><p>Eu te amo porque te amo,</p><p>Não precisas ser amante,</p><p>e nem sempre sabes sê-lo.</p><p>(Carlos Drummond de Andrade, As sem-razões do amor)</p><p>Em “amo”, o am é o radical,</p><p>o o é desinência número-pessoal (indica</p><p>que se trata da primeira pessoa do singular: eu). Note que não aparecem a</p><p>vogal temática nem a desinência modo-temporal.</p><p>10</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Formas nominais</p><p>Chamam-se formas nominais o infinitivo, o gerúndio e o particípio.</p><p>São assim chamadas porque se comportam como nomes em certos</p><p>contextos, quando desempenham funções próprias do substantivo, do</p><p>adjetivo ou do advérbio.</p><p>O infinitivo (terminações -ar, - er, -ir, -or) expressa o conteúdo do</p><p>verbo em sua potência; muitas vezes, seu conteúdo aproxima-se do de um</p><p>substantivo. É nessa forma “crua”, de indeterminação e generalidade, que</p><p>os verbos aparecem nos dicionários.</p><p>Um barco parece ser um objecto cujo fim é navegar; mas o seu fim</p><p>não é navegar, senão chegar a um porto. Nós encontrámo-nos navegando,</p><p>sem a ideia do porto a que nos deveríamos acolher. Reproduzimos assim,</p><p>na espécie dolorosa, a fórmula aventureira dos argonautas: navegar é</p><p>preciso, viver não é preciso. (Fernando Pessoa)</p><p>O gerúndio (terminação -ndo) expressa o processo verbal em curso.</p><p>Ele exerce seu valor de verbo em locuções verbais e nas orações reduzidas.</p><p>Além disso, pode desempenhar tanto função de adjetivo como de advérbio.</p><p>Serviu-me água fervendo.</p><p>[...]</p><p>É uma grande pena que não se possa</p><p>estar ao mesmo tempo nos dois lugares!</p><p>[...]</p><p>Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo…</p><p>e vivo escolhendo o dia inteiro!</p><p>[...]</p><p>Mas não consegui entender ainda</p><p>qual é melhor: se é isto ou aquilo.</p><p>(Cecília Meireles)</p><p>11</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>– Fabiano, você é um homem, exclamou em voz alta. [...]</p><p>Olhou em torno, com receio de que, fora os meninos, alguém</p><p>tivesse percebido a frase imprudente. Corrigiu-a, murmurando:</p><p>– Você é um bicho, Fabiano.</p><p>(Vidas Secas, Graciliano Ramos)</p><p>O meu olhar é nítido como um girassol.</p><p>Tenho o costume de andar pelas estradas</p><p>Olhando para a direita e para a esquerda,</p><p>E de vez em quando olhando para trás...</p><p>E o que vejo a cada momento</p><p>É aquilo que nunca antes eu tinha visto,</p><p>E eu sei dar por isso muito bem...</p><p>(“O Guardador de Rebanhos”. In Poemas de Alberto Caeiro.</p><p>Fernando Pessoa)</p><p>Como se explica que o meu maior medo seja exatamente o de</p><p>ir vivendo o que for sendo? como é que se explica que eu não tolere ver,</p><p>só porque a vida não é o que eu pensava e sim outra – como se antes eu</p><p>tivesse sabido o que era! Por que é que ver é uma tal desorganização?</p><p>(Clarice Lispector, A Paixão Segundo G.H.)</p><p>Litania</p><p>Nunca nos realizamos.</p><p>Somos dois abismos – um poço fitando o céu. (Fernando Pessoa)</p><p>O particípio (terminação em -do, normalmente), por sua vez,</p><p>apresenta o resultado do processo verbal quando indica ação praticada</p><p>por alguém. Porém, funciona como adjetivo, quando caracterizador de</p><p>substantivo, e, por vezes, como o próprio substantivo.</p><p>12</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>O bem que não chegou a ser possuído,</p><p>Perdido causa tanto sentimento,</p><p>Que, faltando-lhe a causa do tormento,</p><p>Faz ser maior tormento o padecido.</p><p>Sentir o bem logrado, e já perdido,</p><p>Mágoa será do próprio entendimento;</p><p>Porém, o bem que perde um pensamento</p><p>Não deixa a outro bem restituído.</p><p>[...]</p><p>(Gregório de Matos, Obra Poética. Defende-se o bem que se</p><p>perdeu.)</p><p>Amar o perdido</p><p>deixa confundido</p><p>este coração.</p><p>(Memória, Carlos Drummond)</p><p>Sei ter o pasmo essencial</p><p>Que tem uma criança se, ao nascer,</p><p>Reparasse que nascera deveras...</p><p>Sinto-me nascido a cada momento</p><p>Para a eterna novidade do Mundo...</p><p>(“O Guardador de Rebanhos”. In Poemas de Alberto Caeiro.</p><p>Fernando Pessoa)</p><p>São onze horas da manhã no Brasil. É agora. Trata-se</p><p>exatamente de agora. Agora é o tempo inchado até os limites. Onze</p><p>horas não têm profundidade. Onze horas está cheio das onze horas até</p><p>13</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>as bordas do copo verde. O tempo freme como um balão parado. O ar</p><p>fertilizado e arfante. (Clarice Lispector, A Paixão Segundo G.H.)</p><p>Ave Maria, cheia de graça,</p><p>o Senhor é convosco,</p><p>bendita sois vós entre as mulheres</p><p>e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus.</p><p>(Ave Maria, oração cristã)</p><p>Só que não nos falávamos mais. Ela era mais digna do que eu</p><p>havia pensado: conseguido o dinheiro, nada mais quis me contar. E nem</p><p>eu pude mais fazer festas ao menino vestido de menina. Pois qualquer</p><p>agrado seria agora de meu direito: eu o havia pago de antemão.</p><p>(Clarice Lispector, As caridades odiosas)</p><p>E eu te farei as vontades</p><p>Direi meias verdades sempre à meia luz</p><p>E te farei, vaidoso, supor</p><p>Que és o maior e que me possuis</p><p>Mas na manhã seguinte</p><p>Não conta até vinte, te afasta de mim</p><p>Pois já não vales nada, és página virada</p><p>Descartada do meu folhetim</p><p>(Folhetim, Chico Buarque)</p><p>Achei que ele já tivesse comprado o jantar.</p><p>Feito o jantar, teremos apenas de arrumar a mesa. (= Quando o</p><p>jantar for feito)</p><p>O edifício foi construído pela empresa de meu avô.</p><p>14</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Inúmeras são as considerações pertinentes às formas nominais do</p><p>verbo, as quais este material não pretende esgotar. Eis um assunto que</p><p>merece incursão destemida nas folhas de gramáticas normativas.</p><p>De toda forma, seguem observações importantes e úteis a respeito</p><p>delas:</p><p>1) É necessário tomar cuidado com o gerundismo</p><p>O gerúndio, como visto, expressa, por via de regra, continuidade no</p><p>tempo. Comumente, no entanto, usa-se essa forma nominal, ao lado do</p><p>verbo “ir” e do verbo “estar”, em construções que exprimem atos pontuais,</p><p>incompatíveis com a noção continuativa de gerúndio. Por exemplo:</p><p>Pela manhã, eu vou estar ligando para o médico e marcando</p><p>minha consulta.</p><p>Você pode estar me passando seus dados, por favor?</p><p>Note-se que as ações de ligar, passar e marcar são pontuais, não se</p><p>desdobram no tempo, de maneira que sua melhor escrita seria:</p><p>Pela manhã, ligarei para o médico e marcarei minha consulta.</p><p>Você pode me passar seus dados, por favor?</p><p>A provável razão do gerundismo na língua portuguesa é a má</p><p>correspondência com o inglês. Uma frase como “I´ll be sending the</p><p>curriculum soon” costuma ser traduzida literalmente na forma: “Vou estar</p><p>mandando o currículo brevemente”, quando deveria ser “Vou mandar (ou</p><p>mandarei) o currículo brevemente”.</p><p>2) Mesmo que bem empregado, o excesso de gerúndio deixa o</p><p>texto pesado e arrastado. Por exemplo:</p><p>O homem desacelerou seu passo, caminhando lentamente,</p><p>percebendo o barulho que o cercava, fazendo a criança que estava a seu</p><p>lado assustar-se, chorando muito, claramente a fim de ser carregada no</p><p>15</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>colo pelo homem, esperando proteção.</p><p>Agora compare:</p><p>O homem desacelerou seu passo, caminhando lentamente ao</p><p>perceber o barulho que o cercava. Isso fez a criança que estava a seu lado</p><p>assustar-se e chorar muito. Claramente, ela esperava ser carregada no colo</p><p>pelo homem para se sentir protegida.</p><p>Note como a reestruturação das frases faz com que fiquem mais</p><p>leves e menos cansativas.</p><p>3) Não se confunde o infinitivo com o futuro do subjuntivo. O</p><p>futuro do subjuntivo é um tempo verbal; o infinitivo, uma forma nominal. É</p><p>bem verdade que com frequência coincidem formalmente, mas, como já</p><p>se disse, o emprego de um verbo irregular esclarece a dúvida. Analise:</p><p>Quando ele chegar, estarei pronta.</p><p>Seria “chegar” infinitivo ou flexão no futuro do subjuntivo? Para tirar</p><p>a prova, basta usar um verbo irregular no lugar:</p><p>Quando ele vier aqui/propuser o acordo/vir o filme/fizer o dever etc.</p><p>Nota-se, portanto, que os verbos irregulares usados claramente não</p><p>têm coincidência no infinitivo, de maneira que, pode-se concluir, trata-se de</p><p>verbos flexionados no futuro do subjuntivo,</p><p>escritores (muito especialmente os modernos, mas sem desprezo, que</p><p>seria pueril, dos clássicos), senão também à língua dos jornalistas e revistas,</p><p>do teatro, do rádio e televisão, ao falar do povo, aos linguajares diversos –</p><p>regionais, jocosos, depreciativos, profissionais, giriescos...”</p><p>6</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>O próprio dicionarista reconhece, portanto, tratar-se de um dicionário</p><p>“médio” ou “inframédio”, revelando a natural e esperada impossibilidade de</p><p>se registrarem todos os verbetes existentes na língua.</p><p>A fonte para a produção de um dicionário é abrangente, a fim de</p><p>captar as tendências da língua. Ainda no Prefácio, explica Aurélio:</p><p>“Entre os autores, dos mais desvairados gêneros, figuram com</p><p>certa frequência os cronistas, por se mostrarem, em maior ou menor</p><p>grau, bons espelhos da língua viva. São, aliás, vários deles, mestres da</p><p>prosa dos nossos dias. Nem foi esquecida outra classe de autores: a dos</p><p>letristas de sambas, marchas, canções. Eles – tal como, até certo ponto,</p><p>também os cronistas –, além de captarem a criação linguística popular,</p><p>não raro são, ainda por cima, criadores, inventores de palavras.</p><p>Injusto seria deixar de recorrer aos comentaristas políticos,</p><p>econômicos etc., aos repórteres, aos noticiaristas – desde os mais</p><p>qualificados colaboradores, de vária espécie, de jornais e revistas, até</p><p>aos mais modestos, aos focas anônimos, aos que fazem a cozinha da</p><p>profissão.”</p><p>O que são a</p><p>Academia Brasileira de Letras e o VOLP?</p><p>Academia Brasileira de Letras (ABL) é uma instituição cultural</p><p>privada, inaugurada em 20 de julho de 1897 e sediada no Rio de Janeiro,</p><p>cujo objetivo é o cultivo da língua e da literatura nacional.</p><p>Entre os primeiros integrantes, estavam Machado de Assis, Olavo</p><p>Bilac, Rui Barbosa e Joaquim Nabuco. O número de membros é sempre 40,</p><p>e a entrada de novos só ocorre com a morte de algum acadêmico.</p><p>Entre notáveis atividades da ABL, está a edição do VOLP – Vocabulário</p><p>Ortográfico da Língua Portuguesa –, espécie de dicionário que lista palavras</p><p>Pesquisa de “inexorável” no site do VOLP</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>reconhecidas oficialmente como pertencentes à língua portuguesa, bem</p><p>como lhes fornece a grafia oficial. Seu objetivo, no entanto, difere do dos</p><p>dicionários comuns, uma vez que ele não explica o significado dos termos</p><p>registrados, mas apresenta sua grafia indicada, seu gênero, sua categoria</p><p>morfológica, eventualmente sua pronúncia correta etc. É o VOLP que</p><p>oficialmente registra a ortografia das palavras da língua portuguesa do</p><p>Brasil.</p><p>Abaixo, vê-se exemplo de pesquisa no VOLP. Em “inexorável” ( =</p><p>rigoroso, inflexível), esclarece-se que a pronúncia-padrão é de /z/. Em “xerox”,</p><p>apresentam-se a dupla possibilidade de grafia e a correta pronúncia do x</p><p>final: /cs/.</p><p>Pesquisa de “xerox” no site do VOLP</p><p>10</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Observação importante:</p><p>Não raro, há divergências entre os próprios dicionários ou entre alguns</p><p>dicionários e o VOLP, o que não deve causar estranhamento ao usuário da</p><p>língua. Catalogar o léxico enquanto a língua ainda vive e se transforma não</p><p>poderia ser missão completamente uniforme. Cabe ao estudioso pesquisar</p><p>sempre, buscando o melhor e mais primoroso emprego das palavras.</p><p>7</p><p>11</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>O que é o</p><p>Novo Acordo Ortográfico da Língua</p><p>Portuguesa?</p><p>“A existência de duas ortografias oficiais da língua portuguesa, a</p><p>lusitana e a brasileira, tem sido considerada como largamente prejudicial</p><p>para a unidade intercontinental do português e para seu prestígio no</p><p>Mundo.” (Anexo II)</p><p>Esse é precisamente o argumento de abertura da Nota Explicativa do</p><p>Acordo Ortográfico. Desde 1931, quando foi aprovado o primeiro acordo entre</p><p>Brasil e Portugal, houve inúmeras tentativas de unificar as grafias, todas</p><p>malsucedidas pelo desrespeito às peculiaridades de cada país no emprego</p><p>da língua. A unificação ortográfica absoluta, embora ideal, passava longe</p><p>de se concretizar, uma vez que vias administrativas jamais conseguiram</p><p>transpor artificialmente as diferenças inegáveis entre os países.</p><p>Feita tal constatação, o último Acordo Ortográfico (Decreto de 29</p><p>de setembro de 2008) adaptou seu escopo, surgindo com o intuito não de</p><p>unificar tudo o que já existia, mas de acautelar a grafia futura, especialmente</p><p>porque, além de Brasil e Portugal, entraram no debate os países africanos</p><p>oficialmente falantes de português: Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau,</p><p>Moçambique e São Tomé e Príncipe. Justifica o documento do Acordo:</p><p>“Com a emergência de cinco novos países lusófonos, os fatores</p><p>de desagregação da unidade essencial da língua portuguesa far-se-ão</p><p>sentir com mais acuidade (...) Nesse sentido, importa, pois, consagrar</p><p>uma versão de unificação ortográfica que fixe e delimite as diferenças</p><p>atualmente existentes e previna contra a desagregação ortográfica da</p><p>língua portuguesa.”</p><p>Ressalta-se que, apesar de o decreto ser de 2008, o acordo em si é de</p><p>1990. O Timor-Leste tornou-se signatário em 2004.</p><p>8</p><p>12</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Estima-se terem sido unificados 98% do léxico, o que certamente já</p><p>representa um avanço.</p><p>Algumas divergências foram mantidas (de acentuação gráfica –</p><p>bebê e bebé, acadêmico e académico etc. são formas aceitas e registradas</p><p>oficialmente –; preservação de consoante muda – carácter e caráter, facto</p><p>e fato etc. são também formas registradas oficialmente), mas substancial</p><p>parte se unificou.</p><p>As principais alterações incidiram sobre a colocação do hífen, a</p><p>acentuação de alguns vocábulos, o emprego de maiúsculas e minúsculas e</p><p>o trema (o qual foi, em regra, abolido).</p><p>Fazem-se, com razão, algumas críticas à Reforma, como a</p><p>manutenção de hífen em “exceções consagradas pelo uso”, sem que haja</p><p>um critério objetivo para medir o que é “consagrado”. No entanto, trata-se de</p><p>um documento oficial, cujas alterações devem ser seguidas, especialmente</p><p>na produção de documentos oficiais e acadêmicos, dada a necessidade de</p><p>padronização.</p><p>Que</p><p>livros didáticos escolher?</p><p>O melhor livro de gramática normativa é aquele que, apresentando</p><p>a teoria correta, consegue ser mais bem entendido pelo leitor.</p><p>Algumas gramáticas (como as de Rocha Lima e Paschoal Cegalla)</p><p>expõem a matéria de forma extraordinariamente didática, sem preocupação</p><p>com divergências muitas vezes de cunho puramente acadêmico. Outros,</p><p>por sua vez, adentram nessas discussões e balizam o debate (Napoleão</p><p>Mendes, Evanildo Bechara, Amini Hauy e Celso Cunha – este último um</p><p>pouco menos).</p><p>13</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Há livros específicos para determinados fins:</p><p>○ A vírgula, de Celso Luft, por exemplo, fala apenas sobre o tema</p><p>do título;</p><p>○ Manual de Redação Jurídica, de José Maria da Costa, debruça-se</p><p>sobre as dificuldades linguísticas do profissional de Direito;</p><p>○ Dicionário de Questões Vernáculas, de Napoleão Mendes;</p><p>Dicionário de Dificuldades da Língua Portuguesa, de Cegalla; e</p><p>Não Tropece na Língua, de Maria Tereza Piacentini, tratam das</p><p>dificuldades cotidianas no uso da língua;</p><p>○ “A Gramática”, de Fernando Pestana, traz a teoria gramatical com</p><p>apresentação das divergências entre os autores. Embora voltada</p><p>para concurso, é útil a todos;</p><p>○ Dicionário de Regência Verbal e Dicionário de Regência Nominal,</p><p>de Celso Luft, debruçam-se exclusivamente sobre o estudo da</p><p>regência de nomes e verbos;</p><p>○ Comunicação em Prosa Moderna, de Othon Garcia, aborda</p><p>técnicas de boa escrita.</p><p>Enfim, cada livro traz sua colaboração para o polimento do</p><p>conhecimento.</p><p>Para um estudo inicial, sugerem-se</p><p>assim como o verbo “chegar”.</p><p>Agora veja:</p><p>Chegar atrasado não é algo que eu goste de fazer.</p><p>Substituindo por verbos irregulares, perceba como eles de fato estão</p><p>no infinitivo:</p><p>Vir ao teatro não é algo que eu goste de fazer/Propor um acordo não</p><p>é algo que eu goste de fazer/Ver um filme não é algo que eu goste de fazer.</p><p>4) O infinitivo pode ser pessoal ou impessoal. Será impessoal</p><p>quando estiver em seu máximo de generalização, não se referindo a um</p><p>sujeito especialmente. Será pessoal quando estiver ligado a um sujeito.</p><p>16</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Analise:</p><p>Não chores, meu filho;</p><p>Não chores, que a vida</p><p>É luta renhida:</p><p>Viver é lutar.</p><p>A vida é combate,</p><p>Que os fracos abate,</p><p>Que os fortes, os bravos</p><p>Só pode exaltar.</p><p>(Gonçalves Dias, Canção do Tamoio)</p><p>No excerto acima, por exemplo, “viver” e “lutar” são infinitivos</p><p>impessoais, uma vez que se referem ao ato em si, sem atribuí-lo a alguém</p><p>especial. Já “exaltar”, por sua vez, faz parte da locução verbal “pode exaltar”.</p><p>Em casos assim, apenas o verbo auxiliar (“pode”, no caso) se flexiona</p><p>quando necessário. O infinitivo permanece não flexionado. Exemplo: Os</p><p>presentes podem fazer o teste em dupla.</p><p>O fato de um milhão de pessoas participarem dos mesmos</p><p>vícios não os transforma em virtudes. (Gustavo Corção)</p><p>Na passagem de Corção, o infinitivo “participarem” refere-se a</p><p>“pessoas”. O infinitivo se flexiona normalmente se houver sujeito que assim</p><p>exija. Veja as desinências número-pessoais em destaque.</p><p>Comprei o chá para eu beber.</p><p>Comprei o chá para tu beberes.</p><p>Comprei o chá para ele beber.</p><p>Comprei o chá para nós bebermos.</p><p>Comprei o chá para vós beberdes.</p><p>Comprei o chá para eles beberem.</p><p>17</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>5) Muito comuns são as dúvidas envolvendo infinitivo flexionado</p><p>ou não. Por exemplo: Eles se esforçaram para entender a matéria ou para</p><p>entenderem a matéria?</p><p>A questão não é simples. As gramáticas comumente divergem entre</p><p>si ou dão dupla possibilidade de uso, a depender do contexto.</p><p>A propósito do assunto, Napoleão Mendes de Almeida, sempre crítico</p><p>severo dos problemas linguísticos injustificados, assevera:</p><p>Por que dizer “A tendência dos modernos estudiosos da língua é</p><p>reconhecer que não há regras fixas e definidas a propósito do assunto?”</p><p>Ora, sejamos mais sinceros e digamos: A conjugação do infinitivo é a</p><p>maior prova de putrefação do nosso idioma ou, para maior suavidade,</p><p>é consequência de confusão com o futuro do subjuntivo ou, ainda mais</p><p>delicadamente, é resultante necessária da falta de escolas. Se em</p><p>nenhum idioma provindo do latim o infinitivo é conjugado, como dizer</p><p>que precisamos conjugar o infinitivo no nosso?</p><p>Fazendo-se o cotejo de várias gramáticas normativas, é razoável</p><p>depreender o que se segue.</p><p>Flexiona-se o infinitivo:</p><p>1) Quando o sujeito estiver claramente expresso:</p><p>Estranho é nós não fazermos barulho quando nosso time vence.</p><p>Até tu fazeres trinta anos, moraremos aqui.</p><p>2) Quando o sujeito não está expresso, mas se quer dar a</p><p>conhecê-lo pela desinência.</p><p>É hora de começarmos os trabalhos.</p><p>Necessário se faz introduzires o assunto logo.</p><p>Caso se escrevesse “começar” e “introduzir”, não se saberia se essas</p><p>ações seriam referentes a alguém especificamente. Ao pessoalizar o</p><p>18</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>infinitivo por meio das desinências, sabemos a quem ele se refere.</p><p>3) Quando a frase tem verbos com sujeitos diferentes:</p><p>Falei sobre o desejo de almoçarmos fora.</p><p>Repare como o sujeito de “falar” é “eu”, mas o de “almoçarmos” é</p><p>“nós”.</p><p>Se o sujeito for o mesmo, a flexão do infinitivo é desnecessária,</p><p>embora seja possível. Abaixo, “nós” é sujeito tanto de “falamos” (nós falamos)</p><p>como de “almoçar” (nós almoçarmos):</p><p>Falamos sobre o desejo de almoçar/almoçarmos fora.</p><p>Não se flexiona o infinitivo:</p><p>1) Nas locuções verbais:</p><p>Vamos passar o dia aqui.</p><p>Os moços começaram a dançar.</p><p>2) Quando o sujeito do infinitivo é um pronome oblíquo átono ou</p><p>um substantivo e há verbos sensitivos (ver, ouvir, sentir e semelhantes) ou</p><p>causativos (mandar, deixar, fazer e semelhantes). São as famosas orações</p><p>infinitivo-latinas:</p><p>Não nos deixeis cair em tentação. (Pai Nosso, oração cristã)</p><p>Então disse Jesus: “Deixem vir a mim as crianças e não as</p><p>impeçam; pois o Reino dos céus pertence aos que são semelhantes a</p><p>elas”. (Matheus, 19:14)</p><p>Observação: Quando o substantivo sujeito do infinitivo é plural,</p><p>admite-se a flexão em prol da clareza (embora a contragosto do professor</p><p>Napoleão):</p><p>19</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Vi os navios que partiam desaparecer/desaparecerem no</p><p>horizonte.</p><p>Senti suas mãos roçar/roçarem as minhas.</p><p>Vi teus vestidos brilharem [brilhar]</p><p>sem qualquer clarão do dia. (Cecília Meireles)</p><p>Como se pode perceber, trata-se de questão melindrosa, que</p><p>comporta certa liberdade em prol da clareza textual. Casos nada raros</p><p>como “Os leitores têm possibilidade de consultar/consultarem o dicionário”</p><p>podem causar dúvida, e a melhor diretriz para saná-los deve ser a clareza.</p><p>Não sendo a flexão do infinitivo útil à clareza, melhor deixá-lo não flexionado</p><p>(Os leitores têm possibilidade de consultar o dicionário).</p><p>A respeito do assunto, assevera Celso Cunha, citando Said Ali: “Como</p><p>vemos, ‘a escolha da forma infinitiva depende de cogitarmos somente da</p><p>ação ou do intuito ou necessidade de pormos em evidência o agente da</p><p>ação’ (Said Ali). No primeiro caso, preferimos o infinitivo não flexionado;</p><p>no segundo, o flexionado. Trata-se, pois, de um emprego seletivo, mais do</p><p>terreno da estilística do que, propriamente, da gramática”.</p><p>Lúcida é a conclusão do mestre Napoleão Mendes, que resume</p><p>praticamente tudo o que se estudou:</p><p>Não flexionemos o infinitivo quando nenhuma necessidade virmos</p><p>de o conjugar: “Prepararam-se para MORRER”, “Precisávamos cavar o</p><p>chão para OBTER água”, “Cometemos tais atrocidades para AGRADAR</p><p>aos chefes”, “Obrigando-os por via de tormento a RESTITUIR” aquilo que</p><p>tinham ocupado”, “Convidam os homens a PERSEVERAR”, “Não temos</p><p>tempo nem papel para TRATAR do assunto”, “A linguagem é o meio de</p><p>que dispomos para, através das palavras, EXPRIMIR o nosso pensamento”.</p><p>20</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Locução verbal</p><p>Locução ou perífrase verbal é, nas palavras do professor Fernando</p><p>Pestana, “um grupo de verbos que geralmente tem uma só unidade de</p><p>sentido, como se fosse um só verbo. Ela é formada por verbo(s) auxiliar(es) +</p><p>verbo principal (o principal é sempre o último da locução, aparecendo nas</p><p>formas de infinitivo, gerúndio ou particípio)”. É o principal que carrega o</p><p>significado fundamental da locução. Veja:</p><p>Vou ir à sua casa hoje.</p><p>Sorria! Você está sendo filmado.</p><p>A dívida deve começar a ser paga antes que sejas preso.</p><p>O professor ficou rodeado de alunos.</p><p>Se o paciente não tivesse se atrasado, eu teria chegado a tempo.</p><p>Pedro disse que tinha tido um sonho estranho.</p><p>Continue a estudar. Continue estudando.</p><p>Acabei de deixar o copo sobre a mesa.</p><p>Há de haver quem resolva isto.</p><p>“Lamento não ter podido dar aos humildes tudo o que eu</p><p>desejava.” (Getúlio Vargas)</p><p>Observação: Como se pode perceber pelas frases “Acabei de deixar</p><p>[...]” e “Continue a estudar”, o verbo auxiliar às vezes se liga ao principal por</p><p>meio de uma preposição.</p><p>Inúmeras são as considerações pertinentes à formação da locução</p><p>verbal; nem sempre é fácil identificar se o que há é uma locução verbal</p><p>ou são verbos “autônomos” colocados lado a lado. É interessante notar</p><p>como o verbo auxiliar (ou os verbos auxiliares) pode ter funções diversas:</p><p>auxiliares de aspecto (acurativos), auxiliares de modo (modais) etc. A</p><p>respeito do assunto, leia o material</p><p>complementar, que traz as minuciosas</p><p>21</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>considerações do professor Fernando Pestana sobre o assunto.</p><p>Vozes verbais</p><p>A voz verbal é a forma em que o verbo (ou locução verbal) de ação se</p><p>mostra ao indicar se o sujeito pratica e/ou sofre a ação verbal. Para que se</p><p>fale em voz verbal, portanto, é preciso que 1) estejamos diante de um verbo</p><p>de ação; 2) o verbo em questão tenha sujeito.</p><p>Voz ativa</p><p>Ocorre quando a forma do verbo ou da locução verbal indica uma</p><p>ação praticada pelo sujeito. Fala-se, então, em sujeito agente:</p><p>Iracema recosta-se langue ao punho da rede; seus olhos negros e</p><p>fúlgidos, ternos olhos de sabiá, buscam o estrangeiro e lhe entram n’alma.</p><p>O cristão sorri; a virgem palpita; como o saí, fascinado pela serpente,</p><p>vai declinando o lascivo talhe, que se debruça enfim sobre o peito do</p><p>guerreiro. Já o estrangeiro a preme ao seio; e o lábio ávido busca o lábio</p><p>que o espera, para celebrar nesse ádito d’alma o himeneu do amor. (José</p><p>de Alencar, Iracema)</p><p>Fulano resolveu tomar uma atitude.</p><p>Tive de sair da sala correndo.</p><p>A comunidade já havia/tinha programado a festa, quando a chuva</p><p>caiu.</p><p>Observação: Embora haja divergência, para a maior parte dos</p><p>gramáticos, não há voz ativa quando o conteúdo semântico do verbo indica</p><p>passividade, como em: levou um soco, sofreu um acidente, recebeu uma</p><p>proposta etc. Evanildo Bechara, no entanto, diz que esse argumento faz</p><p>confundir voz passiva com verbo de sentido passivo (passividade).</p><p>22</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pondera a professora Amini Hauy: “Não têm flexão de voz, portanto,</p><p>os verbos impessoais e os de ligação; aqueles [impessoais] porque não têm</p><p>sujeito, e estes [de ligação], porque não indicam ação (indicam estado).</p><p>Também não indicam ação, por exemplo, sofrer, merecer, receber, ganhar”.</p><p>Assim, por exemplo, uma construção como a seguinte, presente na</p><p>primeira frase, não está na voz ativa:</p><p>– Estrangeiro, Iracema não pode ser tua serva. É ela quem</p><p>guarda o segredo da jurema e o mistério do sonho. Sua mão fabrica para</p><p>o Pajé a bebida de Tupã. (José de Alencar, Iracema)</p><p>Nas duas outras frases, “guarda” e “fabrica” estão na voz ativa, pois</p><p>expressam uma ação.</p><p>Voz passiva</p><p>Ocorre quando a forma do verbo ou da locução verbal indica que o</p><p>sujeito sofre a ação verbal. Fala-se, então, em sujeito paciente.</p><p>Ela pode se construir de duas maneiras:</p><p>1) Voz passiva analítica: ocorre com o verbo auxiliar de passiva (ser</p><p>- passiva de ação, estar -passiva de estado, ficar – passiva de mudança de</p><p>estado) + particípio. O agente da passiva pode estar presente ou não.</p><p>Eu estou profundamente tocada.</p><p>Eu estou profundamente tocada por esta música.</p><p>Eu sempre fico profundamente tocada por esta música.</p><p>Estava a Terra em montes, revestida</p><p>De verdes ervas e árvores floridas,</p><p>Dando pasto diverso e dando vida</p><p>Às alimárias nela produzidas.</p><p>A clara forma ali estava esculpida</p><p>23</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Das Águas, entre a terra desparzidas,</p><p>De pescados criando vários modos,</p><p>Com seu humor mantendo os corpos todos.</p><p>(Os Lusíadas, Luís de Camões, Canto Sexto)</p><p>Pensei que a casa havia sido invadida pelos ladrões.</p><p>Observações:</p><p>- Repare a diferença das duas estruturas abaixo.</p><p>A sala é apertada.</p><p>A mão da mãe é apertada com força pelo filho.</p><p>No primeiro caso, “apertada” é apenas um adjetivo que expressa</p><p>uma qualidade da sala. No segundo, “apertada” faz parte de uma locução</p><p>verbal (é apertada) que indica voz passiva, uma vez que a mão da mãe está</p><p>sofrendo a ação de ser apertada.</p><p>- Analise a passagem abaixo, percebendo como, embora</p><p>aparentemente semelhantes, as locuções verbais destacadas estão em</p><p>vozes diferentes.</p><p>Mais tarde um pouco, cerca de um ano depois, o padre viria sem</p><p>ser pelo órgão e, mais tarde ainda, eu poderia desmontar o instrumento</p><p>porque dois ou três anos de trabalhos árduos tinham encontrado razão de</p><p>ser em um só minuto, tinham sido superambundantemente resgatados</p><p>com um pedaço de pão.</p><p>(Gustavo Corção, A descoberta do outro)</p><p>2) Voz passiva sintética: verbo transitivo direto ou direto e indireto</p><p>na 3ª pessoa do singular ou do plural seguido do pronome “se” apassivador.</p><p>Intimaram-se as testemunhas.</p><p>24</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Iniciou-se o trabalho com devoção.</p><p>Estudaremos a voz passiva sintética com mais profundidade em</p><p>análise sintática, quando falarmos de tipos de sujeito e de concordância</p><p>verbal. Por ora, importa-nos mais reconhecer aquilo que efetivamente</p><p>caracteriza a voz passiva em geral.</p><p>Voz reflexiva</p><p>Ocorre quando o sujeito é, ao mesmo tempo, agente e paciente da</p><p>ação. Sua ocorrência se dá com o auxílio de um pronome reflexivo. Veja:</p><p>Nós nos prejudicamos quando fazemos algo assim.</p><p>Ela se maquiou com cuidado.</p><p>Tu te enxergas neste espelho?</p><p>Um bom jeito de analisar a presença da voz reflexiva é averiguar a</p><p>possibilidade de acrescer “a mim mesmo”, “a ti mesmo”, “a nós mesmos”, “a</p><p>si mesmos” etc.</p><p>Note que, nos casos acima, seria possível que a ação recaísse sobre</p><p>outra pessoa (é possível prejudicar outrem, por exemplo), mas recai sobre</p><p>o sujeito.</p><p>Note, ainda, que a conjugação do verbo na voz reflexiva é sempre</p><p>acompanhada de pronome também reflexivo.</p><p>No poema de Gonçalves Dias, tal comportamento do verbo “banhar”</p><p>fica claro.</p><p>O CANTO DO ÍNDIO</p><p>Quando o sol vai dentro d’água</p><p>Seus ardores sepultar,</p><p>Quando os pássaros nos bosques</p><p>Principiam a trinar;</p><p>Eu a vi, que se banhava...</p><p>25</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Era bela, ó Deuses, bela,</p><p>Como a fonte cristalina,</p><p>Como luz de meiga estrela.</p><p>[...]</p><p>(DIAS, Gonçalves. Primeiros cantos.)</p><p>Atenção!</p><p>Não basta que se possa empregar “a mim mesmo” e outras formas</p><p>semelhantes para que seja voz reflexiva. É preciso que o sujeito seja agente</p><p>e paciente da ação. Na passagem abaixo, por exemplo, isso não ocorre:</p><p>Perdi alguma coisa que me era essencial, e que já não me</p><p>é mais. Não me é necessária, assim como se eu tivesse perdido uma</p><p>terceira perna que até então me impossibilitava de andar, mas que fazia</p><p>de mim um tripé estável. (Clarice Lispector, A paixão segundo G.H.)</p><p>Nem mesmo se pode falar em “voz” na passagem acima, já que o</p><p>verbo “ser” não expressa uma ação.</p><p>A voz reflexiva pode ser recíproca, o que ocorre quando há dois ou</p><p>mais seres praticando a mesma ação verbal um ao outro.</p><p>Abraçaram-se longamente.</p><p>Feriram-se com armas brancas.</p><p>Note como, fora de contexto, as frases anteriores podem ser ambíguas,</p><p>daí se poder usar uma estrutura de reforço, como:</p><p>Feriram-se a si mesmos com armas brancas (ou simplesmente</p><p>Feriram a si mesmos).</p><p>Feriram-se uns aos outros com armas brancas (ou simplesmente</p><p>Feriram uns aos outros com armas brancas).</p><p>Abraçaram-se a si mesmos longamente. (ou simplesmente</p><p>26</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Abraçaram a si mesmos.)</p><p>Feriram um ao outro com armas brancas. (ou simplesmente</p><p>Feriram um ao outro.)</p><p>Verbos pronominais</p><p>Essencialmente pronominais são aqueles verbos que sempre</p><p>aparecem acompanhados de um pronome oblíquo átono em sua</p><p>conjugação, o qual constitui parte integrante do verbo e não expressa</p><p>necessariamente ação reflexiva. É como se o pronome fosse parte do radical</p><p>do verbo.</p><p>Alguns essencialmente pronominais: arrepender-se, atrever-se,</p><p>candidatar-se, dignar-se, engalfinhar-se, esforçar-se, persignar-se,</p><p>queixar-se, refugiar-se, suicidar-se, tornar-se, abster-se, apaixonar-se etc.</p><p>Não se diz, por exemplo, que alguém “tornou” professor, mas, sim,</p><p>que “se tornou” professor. Veja:</p><p>Queixei-me de dor quando ele pisou meu pé.</p><p>Apaixonaram-se pela matéria.</p><p>Nós nos esforçamos para obter bons resultados.</p><p>João amava Teresa que amava Raimundo</p><p>que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili</p><p>que não amava ninguém.</p><p>João foi pra os Estados Unidos, Teresa para o convento,</p><p>Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,</p><p>Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes</p><p>que não tinha entrado na história.</p><p>(Carlos Drummond de Andrade, Quadrilha)</p><p>Vários verbos, por sua vez, são acidentalmente pronominais, ou seja,</p><p>27</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>podem ser conjugados eventualmente com pronomes oblíquos átonos.</p><p>Exemplos: concentrar-se, enganar-se, sentar-se, vacinar-se, alegrar-se,</p><p>apoderar-se etc. Os exemplos abaixo são do dicionário Michaelis:</p><p>O povoado alegra o vale. A fé alegra e conforta. Alegrou-se com a</p><p>volta do filho.</p><p>Engana-se de propósito por não suportar a realidade. Não quer</p><p>enfrentar os fatos e só faz enganar.</p><p>O homem não podia sentar devido ao ferimento. A criança preferiu</p><p>sentar-se a ficar no colo da mãe. Enfim, a filha conseguiu sentar a mãe</p><p>já idosa.</p><p>Veja a diferença no emprego do verbo nos cartazes a seguir:</p><p>Formação do imperativo e uniformidade de tratamento</p><p>Uma das mais extensas e extenuantes partes do estudo verbal é</p><p>a formação dos tempos verbais. Por absoluta ausência de tempo hábil,</p><p>este material (este curso) não tratará do assunto, mas disponibilizaremos</p><p>material extra de autoria do professor Fernando Pestana para aqueles que</p><p>quiserem estudar mais a fundo.</p><p>De toda forma, não podemos nos furtar de dois pontos fundamentais:</p><p>a formação do imperativo e a uniformidade de tratamento das pessoas do</p><p>discurso.</p><p>É muito comum que o falante se pergunte cotidianamente se</p><p>28</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>o correto é “arraste para cima” ou “arrasta para cima”, “siga os sinais” ou</p><p>“segue os sinais”, “faça o exercício” ou “faz o exercício”, “não começa” ou</p><p>“não comece” etc. Essas dúvidas são todas relativas ao emprego do modo</p><p>imperativo.</p><p>Há dois tipos de imperativo: o afirmativo e o negativo. O primeiro</p><p>expressa uma ordem, sugestão, conselho de caráter positivo; e o segundo, a</p><p>mesma coisa, mas de caráter negativo.</p><p>Para construir os imperativos e o presente do subjuntivo, parte-se do</p><p>presente do indicativo, chamado de tempo primitivo.</p><p>Veja o presente do indicativo dos verbos “voltar” (1ª conjugação),</p><p>“correr” (2ª conjugação) e “partir” (3ª conjugação):</p><p>Presente do indicativo</p><p>Eu volto</p><p>Tu voltas</p><p>Ele volta</p><p>Nós voltamos</p><p>Vós voltais</p><p>Eles voltam</p><p>Presente do indicativo</p><p>Eu corro</p><p>Tu corres</p><p>Ele corre</p><p>Nós corremos</p><p>Vós correis</p><p>Eles correm</p><p>Presente do indicativo</p><p>Eu parto</p><p>Tu partes</p><p>Ele parte</p><p>Nós partimos</p><p>Vós partis</p><p>Eles partem</p><p>29</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Em sequência, constrói-se o presente do subjuntivo, o que ocorre da</p><p>seguinte maneira:</p><p>Nos verbos de 1ª conjugação, trabalha-se com o final -e:</p><p>Presente do</p><p>indicativo</p><p>Imperativo</p><p>afirmativo</p><p>Presente do</p><p>subjuntivo</p><p>Imperativo</p><p>negativo</p><p>Eu volto Que eu volte</p><p>Tu voltas Que tu voltes</p><p>Ele volta Que ele volte</p><p>Nós voltamos Que nós</p><p>voltemos</p><p>Vós voltais Que vós volteis</p><p>Eles voltam Que eles voltem</p><p>Nos verbos de 2ª conjugação, trabalha-se com final -a:</p><p>Presente do</p><p>indicativo</p><p>Imperativo</p><p>afirmativo</p><p>Presente do</p><p>subjuntivo</p><p>Imperativo</p><p>negativo</p><p>Eu corro Que eu corra</p><p>Tu corres Que tu corras</p><p>Ele corre Que ele corra</p><p>Nós corremos Que nós</p><p>corramos</p><p>Vós correis Que vós corrais</p><p>Eles correm Que eles corram</p><p>Nos verbos de 3ª conjugação, trabalha-se com final -a:</p><p>Presente do</p><p>indicativo</p><p>Imperativo</p><p>afirmativo</p><p>Presente do</p><p>subjuntivo</p><p>Imperativo</p><p>negativo</p><p>Eu parto Que eu parta</p><p>Tu partes Que tu partas</p><p>Ele parte Que ele parta</p><p>Nós partimos Que nós</p><p>partamos</p><p>Vós partis Que vós partais</p><p>Eles partem Que eles partam</p><p>30</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Para a construção do imperativo afirmativo, basta retirar-se o -s das</p><p>segundas pessoas (tu e vós) do presente do indicativo e copiar as demais</p><p>pessoas do presente do subjuntivo. Não há primeira pessoa no imperativo</p><p>pela simples impossibilidade de se dar uma ordem a si mesmo.</p><p>Para a construção do imperativo negativo de todas as conjugações,</p><p>basta copiar todo o presente do subjuntivo.</p><p>Nas terceiras pessoas dos imperativos, trocam-se o “ele” por “você”</p><p>e o “eles” por “vocês”. Como já se viu em outro momento, a conjugação</p><p>dos pronomes de tratamento (inclusive “você”) é idêntica à das terceiras</p><p>pessoas.</p><p>Por mera questão didática, escrevem-se os pronomes após o verbo</p><p>nos imperativos.</p><p>Presente do</p><p>indicativo</p><p>Imperativo</p><p>afirmativo</p><p>Presente do</p><p>subjuntivo</p><p>Imperativo</p><p>negativo</p><p>Eu volto --- Que eu volte ---</p><p>Tu voltas (-s) Volta tu Que tu voltes Não voltes tu</p><p>Ele volta Volte você Que ele volte Não volte você</p><p>Nós voltamos Voltemos nós Que nós voltemos Não voltemos nós</p><p>Vós voltais (-s) Voltai vós Que vós volteis Não volteis vós</p><p>Eles voltam Voltem vocês Que eles voltem Não voltem vocês</p><p>Presente do</p><p>indicativo</p><p>Imperativo</p><p>afirmativo</p><p>Presente do</p><p>subjuntivo</p><p>Imperativo</p><p>negativo</p><p>Eu corro --- Que eu corra ---</p><p>Tu corres (-s) Corre tu Que tu corras Não corras tu</p><p>Ele corre Corra você Que ele corra Não corra você</p><p>Nós corremos Corramos nós Que nós corramos Não corramos nós</p><p>Vós correis (-s) Correi vós Que vós corrais Não corrais vós</p><p>Eles correm Corram vocês Que eles corram Não corram vocês</p><p>31</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Presente do</p><p>indicativo</p><p>Imperativo</p><p>afirmativo</p><p>Presente do</p><p>subjuntivo</p><p>Imperativo</p><p>negativo</p><p>Eu parto --- Que eu parta ---</p><p>Tu partes (-s) Parte tu Que tu partas Não partas tu</p><p>Ele parte Parta você Que ele parta Não parta você</p><p>Nós partimos Partamos nós Que nós partamos Não partamos nós</p><p>Vós partis (-s) Parti vós Que vós partais Não partais vós</p><p>Eles partem Partam vocês Que eles partam Não partam vocês</p><p>Compreendendo-se essa formação, fica fácil perceber que uma frase</p><p>como “Corre! Você está atrasado!” mistura 2ª e 3ª pessoas: enquanto se está</p><p>chamando a pessoa por “você”, está-se usando o imperativo “corre”, que é</p><p>para “tu”. Procedendo-se à uniformização, tem-se:</p><p>Corra! Você está atrasado!</p><p>Corre! Tu estás atrasado!</p><p>Vejamos mais alguns exemplos com falta de uniformidade:</p><p>Você bebeu pouca água; bebe mais!</p><p>Não se precipita ou vai acabar se arrependendo!</p><p>Procedendo-se à uniformização:</p><p>Você bebeu pouca água; beba mais! Ou Tu bebeste pouca água;</p><p>bebe mais!</p><p>Não se precipite ou vai acabar se arrependendo! Ou Não te precipites</p><p>ou vais acabar te arrependendo!</p><p>32</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Venha para a Caixa você também! Ou Vem para a Caixa tu também!</p><p>Aproveitando-se a construção da tabela anterior, vale a pena ressaltar</p><p>que o emprego do subjuntivo também é frequentemente feito de forma</p><p>errada.</p><p>O subjuntivo aparece, por via de regra, em orações subordinadas</p><p>(estudaremos mais adiante, em sintaxe), e orações optativas. Veja:</p><p>Que Deus te guie!</p><p>Espero que não aconteça algo sério.</p><p>É fundamental que se tomem medidas urgentemente.</p><p>É comum que se diga erradamente “Quer que eu faço isto para</p><p>você?” em vez de “Quer que eu faça isto para você?”. Note que, no caso,</p><p>a oração “que eu faça isto para você” é subordinada à oração “Quer”. Veja</p><p>outros exemplos:</p><p>Você precisa que eu compro o almoço? (Corrigindo: que eu compre)</p><p>Necessitamos que ele corta a grama para nós. (Corrigindo: que ele</p><p>corte)</p><p>Classificação dos verbos</p><p>Quanto a suas características morfossintáticas, os verbos podem</p><p>ser classificados como regulares, irregulares, anômalos, defectivos e</p><p>abundantes.</p><p>a) Regulares são aqueles que seguem um paradigma, ou seja, um</p><p>modelo, de conjugação. Por exemplo: o pretérito imperfeito do subjuntivo</p><p>de verbos regulares</p><p>de 2ª conjugação segue sempre a mesma lógica: se eu</p><p>sofresse, se eu conhecesse, se eu comesse, se eu concedesse, mas... Se eu</p><p>fizesse (não “fazesse”). Ou seja, o verbo “fazer” não é regular nesse tempo</p><p>verbal, pois não segue o paradigma.</p><p>33</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>b) Irregulares são aqueles que não seguem um paradigma regular,</p><p>seja porque seu radical se altera, seja porque sua desinência se altera. É o</p><p>caso dos verbos dar, estar, fazer, pedir etc.</p><p>Veja:</p><p>Eu amo, eu canto, eu nado, mas... Eu estou (não “esto”).</p><p>Eu sofro, eu corro, eu bebo, mas... Eu faço (não “fazo”).</p><p>Mais à frente neste material – ainda neste módulo – trataremos de</p><p>alguns verbos irregulares especialmente espinhosos.</p><p>c) Anômalos são aqueles tão instáveis, que nem sequer possuem</p><p>radical. São apenas dois: ser e ir.</p><p>Analise o comportamento do verbo “ser”: Eu sou, tu és, ele é... Eu fui,</p><p>tu foste, ele foi... Eu serei, tu serás, ele será....Eu era, tu eras, ele era...</p><p>Analise o comportamento do verbo “ir”: Eu vou, tu vais, ele vai...Eu fui,</p><p>tu foste, ele foi...Eu irei, tu irás, ele irá...Eu ia, tu ias, ele ia.</p><p>Observação: Ia X iria</p><p>Ele iria caminhar, mas desistiu por causa da chuva. (Iria = futuro do</p><p>pretérito)</p><p>Antigamente, ele ia caminhar ao meio-dia, mas agora vai às 11h. (Ia =</p><p>pretérito imperfeito)</p><p>d) Defectivos são aqueles cuja conjugação não é completa. São</p><p>simplesmente inexistentes em alguma conjugação.</p><p>É o caso dos verbos demolir, feder, explodir, reaver etc. Não se diz,</p><p>por exemplo, eu “fedo”, eu “explodo”, eu “reavo”ou ele “reave”.</p><p>Mais à frente neste material – ainda neste módulo – trataremos de</p><p>alguns verbos defectivos especialmente espinhosos.</p><p>34</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Sobre o assunto, pondera Celso Cunha em sua Gramática:</p><p>“[...] Outras vezes o desuso de uma forma verbal é ocasionado</p><p>por sua pronúncia desagradável ou por prestar-se a confusão com uma</p><p>forma de outro verbo, de emprego mais frequente. A razões de ordem</p><p>eufônica atribui-se, por exemplo, a falta da 1ª pessoa do singular do</p><p>presente do indicativo e, consequentemente, de todas as pessoas do</p><p>presente do subjuntivo do verbo abolir; pela homofonia com formas do</p><p>verbo falar, justifica-se a inexistência das formas rizotônicas do verbo</p><p>falir. Mas, como a própria caracterização do que é agradável ao ouvido</p><p>é sempre difícil, pois está condicionada ao gosto pessoal, há frequentes</p><p>discordâncias entre os gramáticos em estabelecer os casos de lacuna</p><p>verbal aconselhados por motivos eufônicos. Não raro, não se vislumbra</p><p>mesmo razão maior do que o simples desuso de uma forma para que ela</p><p>continue sendo evitada pelos que falam ou escrevem.”</p><p>e) Abundantes são aqueles que apresentam mais de uma forma na</p><p>mesma flexão. Veja:</p><p>Nós hemos/havemos de tomar boas decisões.</p><p>O governo construi/constrói pontes frágeis e com materiais de baixa</p><p>qualidade.</p><p>Dize com quem andas/Diz com quem andas</p><p>Essa dupla possibilidade ocorre principalmente no particípio. É muito</p><p>comum haver dúvidas como “pagado ou pago?”, “imprimido ou impresso”</p><p>etc.?</p><p>No particípio, as formas regulares (terminadas em -ado e -ido) são</p><p>empregadas após os verbos auxiliares ter e haver:</p><p>Apesar de o cliente já ter pagado a fatura do cartão, o banco</p><p>notificou-o, fazendo nova cobrança.</p><p>35</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Nos Estados Unidos, ele havia pegado prisão perpétua quando a</p><p>nova lei foi sancionada.</p><p>Quando o chefe chegou, o subordinado já havia imprimido a folha.</p><p>Todos já tinham aceitado o acordo, quando o empresário mudou de</p><p>ideia.</p><p>O trabalhador tem ganhado honestamente seu dinheiro nos últimos</p><p>anos.</p><p>Pensou-se que a vítima havia morrido durante o assalto.</p><p>Na voz passiva construída com os auxiliares ser, estar e ficar, bem</p><p>como nas locuções de tempo composto na voz passiva (ter/haver + sido +</p><p>particípio), usam-se as formas irregulares (não terminadas em -ado e -ido)</p><p>quando o verbo as possui. Além disso, pode haver variação de gênero e</p><p>número:</p><p>A conta foi paga pelo cliente.</p><p>O ladrão foi pego em flagrante.</p><p>O ladrão tinha sido pego em flagrante, mas fugiu.</p><p>A folha será impressa pelo subordinado.</p><p>O acordo foi aceito por todos.</p><p>Finalmente a folha ficou impressa.</p><p>O dinheiro foi ganho honestamente.</p><p>A testemunha será morta caso não haja proteção a ela.</p><p>Atenção!</p><p>Os verbos trazer, chegar, abrir, cobrir, comprar e escrever não são</p><p>abundantes!</p><p>Eu tinha chegado pela manhã.</p><p>(Jamais “chego”)</p><p>36</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>A casa foi devidamente comprada pela parte, mas descobriu-se que</p><p>se tratava de fraude.</p><p>(Jamais “compra”)</p><p>O pacote foi trazido na hora certa.</p><p>(Jamais “trago”)</p><p>A oferta da empresa A foi coberta pela da empresa B.</p><p>(Jamais “cobrida”)</p><p>A ata deve ser escrita à mão.</p><p>(Jamais “escrevida”)</p><p>Se eu soubesse que era você, teria aberto a porta.</p><p>(Jamais “abrido”)</p><p>É fundamental darmos a devida atenção a tais verbos, pois eles são</p><p>traiçoeiros. Aqui, não nos preocuparemos muito com o nome dos tempos</p><p>verbais nem com a apresentação de todas as flexões dos verbos, mas com</p><p>o emprego prático de alguns casos específicos. Passemos a alguns verbos</p><p>irregulares:</p><p>VERBO PÔR E SEUS DERIVADOS</p><p>A dinâmica do verbo pôr estende-se a todos os terminados em -or:</p><p>compor, dispor, sobrepor, antepor, depor, entrepor, expor, justapor, pospor,</p><p>repor, apor etc.</p><p>Presente do indicativo: eu ponho, tu pões, ele põe, nós pomos, vós</p><p>pondes, eles põem</p><p>Pretérito perfeito do indicativo: eu pus, tu puseste, ele pôs, nós</p><p>pusemos, vós pusestes, eles puseram</p><p>Pretérito imperfeito do indicativo: eu punha, tu punhas, ele punha,</p><p>nós púnhamos, vós púnheis, eles punham</p><p>37</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Futuro do pretérito do indicativo: eu poria, tu porias, ele poria, nós</p><p>poríamos, vós poríeis, eles poriam</p><p>Presente do subjuntivo: que eu ponha, que tu ponhas, que ele ponha,</p><p>que nós ponhamos, que vós ponhais, que eles ponham</p><p>Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu pusesse, se tu pusesses, se</p><p>ele pusesse, se nós puséssemos, se vós pusésseis, se eles pusessem</p><p>Futuro do subjuntivo: quando eu puser, quando tu puseres, quando</p><p>ele puser, quando nós pusermos, quando vós puserdes, quando eles</p><p>puserem</p><p>Imperativo afirmativo: põe tu, ponha você, ponhamos nós, ponde</p><p>vós, ponham vocês</p><p>Imperativo negativo: não ponhas tu, não ponha você, não ponhamos</p><p>nós, não ponhais vós, não ponham vocês</p><p>Exemplos:</p><p>É fundamental que nós aponhamos nossa assinatura ao final do</p><p>contrato.</p><p>Se o assistente de acusação se dispusesse a falar, poderíamos</p><p>esclarecer melhor a situação.</p><p>Quando nós repusermos o estoque, entraremos em contato.</p><p>Componhamos novas estratégias para melhorar nossa peça.</p><p>VERBO VIR E SEUS DERIVADOS</p><p>A dinâmica do verbo vir estende-se a todos os seus derivados: advir,</p><p>convir, desavir (=indispor) intervir, provir, sobrevir etc.</p><p>Presente do indicativo: eu venho, tu vens, ele vem, nós vimos, vós</p><p>vindes, eles vêm</p><p>Pretérito perfeito do indicativo: eu vim, tu vieste, ele veio, nós viemos,</p><p>vós viestes, eles vieram</p><p>38</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Presente do subjuntivo: que eu venha, que tu venhas, que ele venha,</p><p>que nós venhamos, que vós venhais, que eles venham</p><p>Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu viesse, se tu viesses, se ele</p><p>viesse, se nós viéssemos, se vós viésseis, se eles viessem</p><p>Futuro do subjuntivo: quando eu vier, quando tu vieres, quando ele</p><p>vier, quando nós viermos, quando vós vierdes, quando eles vierem</p><p>Imperativo afirmativo: vem tu, venha você, venhamos nós, vinde vós,</p><p>venham vocês</p><p>Imperativo negativo: não venhas tu, não venha você, não venhamos</p><p>nós, não venhais</p><p>vós, não venham vocês</p><p>Exemplos:</p><p>O oficial deve vir aqui logo pela manhã.</p><p>É fundamental que nós intervenhamos nesta discussão, pois ela</p><p>pode ser mortal.</p><p>A testemunha agiu da maneira que convinha; se conviesse outra</p><p>forma, assim ela faria.</p><p>Quando nós viermos até o local, daremos mais instruções.</p><p>Eu provenho de uma cidade pequena.</p><p>Você pode vir aqui, por favor?</p><p>Ele há de convir que estas ameaças não são necessárias.</p><p>A partilha dos bens desaveio os irmãos.</p><p>VERBO VER E SEUS DERIVADOS</p><p>A dinâmica do verbo ver estende-se a todos os seus derivados:</p><p>antever, prever, rever etc.</p><p>Presente do indicativo: eu vejo, tu vês, ele vê, nós vemos, vós vedes,</p><p>eles veem</p><p>39</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Presente do subjuntivo: que eu veja, que tu vejas, que ele veja, que</p><p>nós vejamos, que vós vejais, que eles vejam</p><p>Futuro do subjuntivo: quando eu vir, quando tu vires, quando ele vir,</p><p>quando nós virmos, quando vós virdes, quando eles virem</p><p>Imperativo afirmativo: vê tu, veja você, vejamos nós, vede vós, vejam</p><p>vocês</p><p>Imperativo negativo: não vejas tu, não veja você, não vejamos nós,</p><p>não vejais vós, não vejam vocês</p><p>Exemplos:</p><p>É muito importante antevermos as possíveis estratégias da parte</p><p>contrária.</p><p>Para que nós revejamos os argumentos antes de apresentá-los,</p><p>precisaremos de uma reunião.</p><p>Quando os jurados virem as provas, não terão dúvida.</p><p>Os desembargadores raramente reveem casos como este.</p><p>Se você vir o vídeo que eu vi, pensará como eu.</p><p>Observação 1:</p><p>O verbo prover (= fornecer, receber e deferir [recurso]) não é derivado</p><p>do verbo ver, embora eventualmente coincidam em algumas conjugações.</p><p>Veja:</p><p>Presente do indicativo: eu provejo, tu provês, ele provê, nós</p><p>provemos, vós provedes, eles proveem</p><p>Pretérito perfeito do indicativo: eu provi, tu proveste, ele proveu, nós</p><p>provemos, vós provestes, eles proveram</p><p>Pretérito imperfeito do indicativo: eu provia, tu provias, ele provia,</p><p>nós províamos, vós províeis, eles proviam</p><p>Presente do subjuntivo: que eu proveja, que tu provejas, que ele</p><p>proveja, que nós provejamos, que vós provejais, que eles provejam</p><p>40</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Futuro do subjuntivo: quando eu prover, quando tu proveres,</p><p>quando ele prover, quando nós provermos, quando vós proverdes, quando</p><p>eles proverem</p><p>Exemplos:</p><p>Esperamos que o magistrado proveja o recurso que interpusemos</p><p>ontem. De toda forma, se ele não prover, estudaremos a possibilidade de</p><p>interpor embargos.</p><p>Por anos, o autor proveu sua esposa de condições para que ela não</p><p>trabalhasse e tivesse boa qualidade de vida.</p><p>Quando ele se prover de recursos humanos suficientes como</p><p>assessor, poderemos cogitar sua promoção.</p><p>Observação 2:</p><p>Precaver(-se) também não é derivado do verbo ver. Trata-se de verbo</p><p>defectivo, o qual não se conjuga em determinadas flexões.</p><p>Presente do indicativo: nós (nos) precavemos, vós (vos) precaveis</p><p>Imperativo afirmativo: precavei(-vos) vós</p><p>Imperativo negativo: -</p><p>Presente do subjuntivo: -</p><p>Os demais tempos existem normalmente.</p><p>Exemplos:</p><p>Se eles não se precaverem, serão pegos de surpresa pelos</p><p>argumentos ministeriais.</p><p>Nós nos precavemos e instalamos câmeras em todo o escritório.</p><p>Observação: São erradas construções como “Ele que se precavenha”,</p><p>“Eu me precavejo sempre que possível” etc. Nesses casos, sugere-se usar</p><p>os verbos “prevenir” ou “acautelar”: Ele que se previna/acautele, “Eu me</p><p>previno/acautelo sempre que possível”.</p><p>41</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>VERBO TER E SEUS DERIVADOS</p><p>A dinâmica do verbo ter estende-se a todos os seus derivados:</p><p>abster-se, ater-se, deter, entreter, manter, obter, reter etc.</p><p>Presente do indicativo: eu tenho, tu tens, ele tem, nós temos, vós</p><p>tendes, eles têm</p><p>Pretérito perfeito do indicativo: eu tive, tu tiveste, ele teve, nós</p><p>tivemos, vós tivestes, eles tiveram</p><p>Pretérito imperfeito do indicativo: eu tinha, tu tinhas, ele tinha, nós</p><p>tínhamos, vós tínheis, eles tinham</p><p>Presente do subjuntivo: que eu tenha, que tu tenhas, que ele tenha,</p><p>que nós tenhamos, que vós tenhais, que eles tenham</p><p>Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu tivesse, se tu tivesses, se ele</p><p>tivesse, se nós tivéssemos, se vós tivésseis, se eles tivessem</p><p>Futuro do subjuntivo: quando eu tiver, quando tu tiveres, quando ele</p><p>tiver, quando nós tivermos, quando vós tiverdes, quando eles tiverem</p><p>Imperativo afirmativo: tem tu, tenha você, tenhamos nós, tende vós,</p><p>tenham vocês</p><p>Imperativo negativo: não tenhas tu, não tenha você, não tenhamos</p><p>nós, não tenhais vós, não tenham vocês</p><p>Exemplos:</p><p>O cliente tem bons advogados.</p><p>Os clientes têm bons advogados.</p><p>Eu me entretive por horas analisando os documentos.</p><p>Nós nos mantivemos ocupados durante toda a manhã.</p><p>Se o policial o detivesse sem mandado, seria investigado.</p><p>Quando o delegado obtiver mais provas, finalizará o inquérito.</p><p>Caso nós nos abstenhamos/abstivermos de votar, deixaremos nas</p><p>mãos de quem vota o nosso futuro político.</p><p>42</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>VERBOS TERMINADOS EM -EAR</p><p>Pentear, estrear, passear, presentear, custear, recear, frear etc.</p><p>Presente do indicativo: eu custeio, tu custeias, ele custeia, nós</p><p>custeamos, vós custeais, eles custeiam</p><p>Pretérito perfeito do indicativo: eu custeei, tu custeaste, ele custeou,</p><p>nós custeamos, vós custeastes, eles custearam</p><p>Presente do subjuntivo: que eu custeie, que tu custeies, que ele</p><p>custeie, que nós custeemos, que vós custeeis, que eles custeiem</p><p>Imperativo afirmativo: custeia tu, custeie você, custeemos nós,</p><p>custeai vós, custeiem vocês</p><p>Imperativo negativo: não custeies tu, não custeie você, não</p><p>custeemos nós, não custeeis vós, não custeiem vocês</p><p>Exemplos:</p><p>Infelizmente, nós não freamos o carro a tempo de evitar o acidente.</p><p>Eles receiam entrar no rol de investigados.</p><p>O advogado estreou com muita competência no tribunal do júri.</p><p>VERBOS TERMINADOS EM -IAR</p><p>Verbos como variar, avaliar, copiar, maquiar, adiar, arriar (=fazer</p><p>descer) são regulares. Veja o presente do indicativo:</p><p>Presente do indicativo: eu vario, tu varias, ele varia, nós variamos, vós</p><p>variais, eles variam</p><p>No entanto, há 5 verbos para os quais é preciso dar atenção especial,</p><p>pois se comportam de forma diferente: mediar, ansiar, remediar, incendiar,</p><p>odiar. Veja:</p><p>Presente do indicativo: Eu medeio, tu medeias, ele medeia, nós</p><p>mediamos, vós mediais, eles medeiam</p><p>43</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Presente do subjuntivo: Que eu medeie, que tu medeies, que ele</p><p>medeie, que nós mediemos, que vós medieis, que eles medeiem</p><p>Imperativo afirmativo: medeia tu, medeie você, mediemos nós,</p><p>mediai vós, medeiem vocês</p><p>Imperativo negativo: não medeies tu, não medeie você, não</p><p>mediemos nós, não medieis vós, não medeiem vocês</p><p>Exemplos:</p><p>É importante que ele não se remedeie, mas que procure um médico.</p><p>Caso eu intermedeie a reunião, ouvirei as duas partes sem tempo</p><p>cronometrado.</p><p>Anseio por nova postura do governo.</p><p>Quem é honesto sempre remedeia as injustiças.</p><p>Observação: O verbo mobiliar recebe acento agudo na sílaba “bi”</p><p>em algumas flexões:</p><p>Presente do indicativo: Eu mobílio, tu mobílias, ele mobília, nós</p><p>mobiliamos, vós mobiliais, eles mobíliam</p><p>Presente do subjuntivo: Que eu mobílie, que tu mobílies, que ele</p><p>mobílie, que nós mobiliemos, que vós mobilieis, que eles mobíliem</p><p>VERBO QUERER</p><p>Futuro do presente: eu quererei, tu quererás, ele quererá, nós</p><p>quereremos, vós querereis, eles quererão</p><p>Futuro do pretérito do indicativo: eu quereria, tu quererias, ele</p><p>quereria, nós quereríamos, vós quereríeis, eles quereriam</p><p>Presente do subjuntivo: que eu queira, que tu queiras, que ele</p><p>queira, que nós queiramos, que vós queirais, que eles queiram</p><p>Pretérito imperfeito do subjuntivo:</p><p>se eu quisesse, se tu quisesses,</p><p>se ele quisesse, se nós quiséssemos, se vós quisésseis, se eles quisessem</p><p>44</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Futuro do subjuntivo: quando eu quiser, quando tu quiseres,</p><p>quando ele quiser, quando nós quisermos, quando vós quiserdes, quando</p><p>eles quiserem</p><p>Imperativo afirmativo: quer(e) tu, queira você, queiramos nós, querei</p><p>vós, queiram vocês</p><p>Imperativo negativo: não queiras tu, não queira você, não queiramos</p><p>nós, não queirais vós, não queiram vocês</p><p>Exemplos:</p><p>Queiramos sempre polir nossas peças processuais.</p><p>Na semana que vem, ele provavelmente não quererá viajar, pois</p><p>estará cansado.</p><p>Quando nós quisermos adquirir um imóvel, entraremos em contato.</p><p>Talvez eles não queiram opor embargos.</p><p>Eu quereria viajar agora, se não fosse a pandemia.</p><p>Atenção!</p><p>O verbo requerer não é derivado do verbo querer. Veja:</p><p>Presente do indicativo: eu requeiro, tu requeres, ele requer, nós</p><p>requeremos, vós requereis, eles requerem</p><p>Pretérito perfeito do indicativo: eu requeri, tu requereste, ele</p><p>requereu, nós requeremos, vós requerestes, eles requereram</p><p>Exemplos:</p><p>Eu requeiro astreintes em algumas de minhas iniciais.</p><p>O advogado requereu novas provas.</p><p>45</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>VERBOS HAVER E REAVER</p><p>O verbo reaver é derivado do verbo haver, porém só se conjuga nas</p><p>formas em que o verbo mantiver a letra “v”, ou seja, reaver é um verbo</p><p>defectivo.</p><p>Presente do indicativo: eu hei, tu hás, ele há, nós hemos/havemos,</p><p>vós heis/haveis, eles hão</p><p>Pretérito perfeito do indicativo: eu houve, tu houveste, ele houve,</p><p>nós houvemos, vós houvestes, eles houveram</p><p>Presente do subjuntivo: que eu haja, que tu hajas, que ele haja, que</p><p>nós hajamos, que vós hajais, que eles hajam</p><p>Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu houvesse, se tu houvesses,</p><p>se ele houvesse, se nós houvéssemos, se vós houvésseis, se eles houvessem</p><p>Futuro do subjuntivo: quando eu houver, quando tu houveres,</p><p>quando ele houver, quando nós houvermos, quando vós houverdes, quando</p><p>eles houverem</p><p>Exemplos:</p><p>Com muita briga na justiça, os herdeiros reouveram a fortuna deixada</p><p>pelo pai.</p><p>Se nós reouvermos o direito ao voto na empresa, elegeremos fulano.</p><p>O patrão é uma pessoa difícil, por isso eu hei-me quase sempre com</p><p>os empregados.</p><p>Os empregados nunca se houveram bem com o patrão.</p><p>VERBO LIDAR</p><p>O verbo lidar não é derivado do verbo dar.</p><p>Presente do indicativo: eu lido, tu lidas, ele lida, nós lidamos, vós</p><p>lidais, eles lidam</p><p>46</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pretérito perfeito do indicativo: eu lidei, tu lidaste, ele lidou, nós</p><p>lidamos, vós lidastes, eles lidaram</p><p>Presente do subjuntivo: que eu lide, que tu lides, que ele lide, que</p><p>nós lidemos, que vós lideis, que eles lidem</p><p>Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu lidasse, se tu lidasses, se</p><p>ele lidasse, se nós lidássemos, se vós lidásseis, se eles lidassem</p><p>Futuro do subjuntivo: quando eu lidar, quando tu lidares, quando ele</p><p>lidar, quando nós lidarmos, quando vós lidardes, quando eles lidarem</p><p>Exemplos:</p><p>Se nós lidássemos melhor com a corte, talvez ela ouvisse nosso</p><p>argumento com mais boa vontade.</p><p>Quando eu lidar com casos como esse, posso fazer parceria com</p><p>você.</p><p>VERBO VIGER</p><p>É defectivo em algumas de suas primeiras pessoas.</p><p>Presente do indicativo: -, tu viges, ele vige, nós vigemos, vós vigeis,</p><p>eles vigem</p><p>Pretérito perfeito do indicativo: eu vigi, tu vigeste, ele vigeu, nós</p><p>vigemos, vós vigestes, eles vigeram</p><p>Pretérito imperfeito do indicativo: eu vigia, tu vigias, ele vigia, nós</p><p>vigíamos, vós vigíeis, eles vigiam</p><p>Futuro do presente do indicativo: eu vigerei, tu vigerás, ele vigerá,</p><p>nós vigeremos, vós vigereis, eles vigerão</p><p>Futuro do pretérito do indicativo: eu vigeria, tu vigerias, ele vigeria,</p><p>nós vigeríamos, vós vigeríeis, eles vigeriam</p><p>Presente do subjuntivo: -</p><p>47</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu vigesse, se tu vigesses, se</p><p>ele vigesse, se nós vigêssemos, se vós vigêsseis, se eles vigessem</p><p>Futuro do subjuntivo: quando eu viger, quando tu vigeres, quando</p><p>ele viger, quando nós vigermos, quando vós vigerdes, quando eles vigerem</p><p>Exemplos:</p><p>Se o prazo viger até março, será possível cumprir o combinado.</p><p>Por anos, vigeram medidas pouco eficientes para o controle a praga</p><p>nas lavouras.</p><p>O prazo já está vigendo?</p><p>VERBOS ADVERTIR, ADERIR, AFERIR, COMPETIR,</p><p>DIVERGIR, DIGERIR, DISCERNIR, EXPELIR, INTERFERIR, GERIR,</p><p>INGERIR, IMPELIR, PRETERIR E REPELIR</p><p>Presente do indicativo: eu divirjo, tu diverges, ele diverge, nós</p><p>divergimos, vós divergis, eles divergem</p><p>Presente do subjuntivo: que eu divirja, que tu divirjas, que ele divirja,</p><p>que nós divirjamos, que vós divirjais, que eles divirjam</p><p>Pretérito imperfeito do subjuntivo: se eu divergisse, se tu</p><p>divergisses, se ele divergisse, se nós divergíssemos, se vós divergísseis, se</p><p>eles divergissem</p><p>Imperativo afirmativo: diverge tu, divirja você, divirjamos nós, divergi</p><p>vós, divirjam vocês</p><p>Imperativo negativo: não divirjas tu, não divirja você, não divirjamos</p><p>nós, não divirjais vós, não divirjam vocês</p><p>Exemplos:</p><p>Nunca compito com meus próprios colegas de escritório por</p><p>clientes. Os honorários aqui são todos divididos.</p><p>48</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Esperemos que ele gira bem os negócios da família.</p><p>É preciso que nós afiramos nossa pressão agora.</p><p>Caso ele pretira nosso candidato, precisamos ter um plano B.</p><p>Quando o estagiário chegar, advirta-o de que ele deixou o</p><p>computador ligado ontem.</p><p>Por favor, não me compila a fazer coisas que não domino ainda.</p><p>VERBOS MEDIR, PEDIR, DESPEDIR, EXPEDIR, REEXPEDIR,</p><p>IMPEDIR</p><p>Presente do indicativo: eu expeço, tu expedes, ele expede, nós</p><p>expedimos, vós expedis, eles expedem</p><p>Presente do subjuntivo: que eu expeça, que tu expeças, que ele</p><p>expeça, que nós expeçamos, que vós expeçais, que eles expeçam</p><p>Imperativo afirmativo: expede tu, expeça você, expeçamos nós,</p><p>expedi vós, expeçam vocês</p><p>Imperativo negativo: não expeças tu, não expeça você, não</p><p>expeçamos nós, não expeçais vós, não expeçam vocês</p><p>Exemplos:</p><p>Meça melhor as palavras para fazer a sustentação oral. O tom foi</p><p>muito pesado.</p><p>Por favor, reexpeçam os ofícios aos cartórios.</p><p>Diariamente, impeço pessoas de serem executadas indevidamente.</p><p>VERBOS ARGUIR E REDARGUIR</p><p>Presente do indicativo: eu arguo, tu arguis, ele argui, nós arguimos,</p><p>vós arguis, eles arguem</p><p>Pretérito perfeito do indicativo: eu arguí, tu arguíste, ele arguiu, nós</p><p>arguímos, vós arguistes, eles arguíram</p><p>49</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Presente do subjuntivo: que eu argua, que tu arguas, que ele argua,</p><p>que nós arguamos, que vós arguais que eles arguam</p><p>Futuro do subjuntivo: quando eu arguir, quando tu arguíres, quando</p><p>ele arguir, quando nós arguirmos, quando vós arguirdes, quando eles</p><p>arguírem</p><p>Imperativo afirmativo: argui tu, argua você, arguamos nós, arguí vós,</p><p>arguam vocês</p><p>Exemplos:</p><p>Espero sinceramente que ele não redargua as acusações que</p><p>fizemos, pois há provas de tudo.</p><p>Para que nós arguamos com mais segurança, precisamos estudar o</p><p>assunto profundamente.</p><p>No momento em que eles arguírem inocência, mostrarei a filmagem</p><p>feita no prédio.</p><p>ADVÉRBIO</p><p>AULA 7</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Advérbio</p><p>Fundamentalmente, o advérbio é um modificador do verbo, daí seu</p><p>nome: ad (junto a) + verbum.</p><p>Exemplo: Hoje, começa a primavera.</p><p>Na frase acima, a palavra “hoje” indica a circunstância temporal</p><p>referente ao verbo “começar”.</p><p>Expressões e locuções adverbiais</p><p>A locução adverbial é aquela construção fixa, cristalizada</p><p>gramaticalmente,</p><p>que equivale a um advérbio. Já a expressão adverbial</p><p>é um conjunto de palavras que ocasionalmente exerce a referida função.</p><p>Observe:</p><p>Começou a gritar de repente. (locução adverbial de tempo)</p><p>Retornei do centro de Goiânia um pouco antes do almoço.</p><p>(expressões adverbiais de lugar e de tempo, respectivamente)</p><p>Analise:</p><p>Hoje em dia, as pessoas criam opiniões como animais de</p><p>estimação, sucedâneos do afeto humano. Quanto às minhas, trato-as a</p><p>pão e água, ginástica sueca e chibatadas, levando muitas delas à morte</p><p>por definhamento, a outras estrangulando no berço ou esmagando-as a</p><p>golpes de fatos que as desmentem: fico com as que sobrevivem.</p><p>(Olavo de Carvalho, O Jardim das Aflições)</p><p>De acordo com a NGB, os advérbios (bem como as locuções e</p><p>expressões adverbiais) classificam-se como:</p><p>○ de lugar: abaixo, acima, longe, perto, dentro (de longe, à direita,</p><p>por perto, entre a cruz e a espada)</p><p>○ de tempo: nunca, agora, entrementes, sempre, jamais, outrora,</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>antigamente, enfim (à tarde, de manhã, em breve, certa vez, de</p><p>vez em quando, de tempos em tempos)</p><p>○ de modo: devagar, mal, suavemente, outrossim (de propósito, do</p><p>mesmo modo, em vão, pouco a pouco, com amor)</p><p>○ de negação: não, sequer, nem ([nem] sequer, em nenhuma</p><p>hipótese, de forma nenhuma)</p><p>○ de afirmação: sim, certamente, efetivamente (sem dúvida, de</p><p>fato, com certeza)</p><p>○ de dúvida: talvez, quiçá, porventura, por acaso (por acaso, por</p><p>ventura)</p><p>○ de intensidade: muito, assaz, bastante, tão, quão, menos, meio,</p><p>todo, pouco, quase, sobremaneira (em excesso)</p><p>Observação: A lista é apenas exemplificativa, não taxativa.</p><p>Veja na prática:</p><p>Mas, já que o demônio nos dá doutrina, quero-lhe eu dar um</p><p>quinau. Vem cá, demônio, outra vez. Tu sábio? Tu astuto? Tu tentador?</p><p>Vai-te daí, que não sabes tentar. Se tu querias que Cristo se ajoelhasse</p><p>diante de ti, e souberas negociar, tu o renderas. Vais-lhe oferecer a Cristo</p><p>mundos? Oh! que ignorância! Se quando lhe davas um mundo, lhe tiraras</p><p>uma alma, logo o tinhas de joelhos a teus pés. Assim aconteceu.</p><p>Apenas a título de curiosidade literária, leia o restante do parágrafo:</p><p>Quando Judas estava na Ceia, já o diabo estava em Judas: Cum</p><p>jam diabolus misisset in cor ut traderet eum Judas. - Vendo Cristo que o</p><p>demônio lhe levava aquela alma, põe-se de joelhos aos pés de Judas, para</p><p>lhos lavar, e para o converter. Tá, Senhor meu, reparai no que fazeis: não</p><p>vedes que o demônio está assentado no coração de Judas? Não vedes</p><p>que em Judas está revestido o demônio, e vós mesmo o dissestes: Unus</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>ex vobis diabolus est? - Pois, será bem que Cristo esteja ajoelhado aos</p><p>pés do demônio? Cristo ajoelhado aos pés de Judas, assombro é, pasmo</p><p>é; mas Cristo ajoelhado, Cristo de joelhos diante do diabo? Sim. Quando</p><p>lhe oferecia o mundo, não o pôde conseguir; tanto que lhe quis levar uma</p><p>alma, logo o teve a seus pés. Para que acabemos de entender os homens</p><p>cegos, que vale mais a alma de cada um de nós que todo um mundo. As</p><p>coisas estimam-se e avaliam-se pelo que custam. Que lhe custou a Cristo</p><p>uma alma, e que lhe custou o mundo? O mundo custou-lhe uma palavra:</p><p>Ipse dixit, et facta sunt- uma alma custou-lhe a vida, e o sangue todo. Pois,</p><p>se o mundo custa uma só palavra de Deus, e a alma custa todo o sangue</p><p>de Deus, julgai se vale mais uma alma que todo o mundo. Assim o julga</p><p>Cristo, e assim o não pode deixar de confessar o mesmo demônio. E só</p><p>nós somos tão baixos estimadores de nossas almas, que lhas vendemos</p><p>pelo preço que vós sabeis.</p><p>(Padre Antônio Vieira, Sermão da primeira dominga da quaresma)</p><p>Apesar da restrita lista da NGB, sabe-se que os advérbios (assim como</p><p>as locuções e expressões adverbiais) podem ter muitas outras classificações</p><p>semânticas. Veja apenas alguns exemplos:</p><p>○ Causa:</p><p>O homem se assustou com todo o alvoroço.</p><p>De tanto caminhar, fizeram-se bolhas em meu pé.</p><p>○ Condição:</p><p>A testemunha só vai falar com permissão do advogado.</p><p>Ainda que eu falasse a língua dos homens</p><p>E falasse a língua dos anjos</p><p>Sem amor, eu nada seria.</p><p>(Legião Urbana, com base na Carta aos Coríntios)</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>○ Meio</p><p>Viajamos de barco.</p><p>Por meio dos investimentos, os cientistas puderam concluir a</p><p>pesquisa.</p><p>Observação: Note a diferença: Após os investimentos, os cientistas</p><p>puderam concluir a pesquisa. (tempo, não meio)</p><p>○ Concessão</p><p>Apesar da chuva, chegamos a tempo.</p><p>Passei no concurso, não obstante todas as dificuldades.</p><p>○ Finalidade</p><p>Viajaremos a trabalho.</p><p>Para nosso desenvolvimento, tivemos que abrir mão de muita coisa.</p><p>○ Exclusão</p><p>Só responderemos a uma pergunta.</p><p>Afora os percalços aéreos, viajar me fez bem.</p><p>○ Matéria</p><p>Ergui com tijolos amarelos os muros.</p><p>Fabricamos com fibra natural estes tecidos.</p><p>○ Companhia</p><p>Fui ao cinema com meus filhos.</p><p>O Secretário fez a reunião sem seus assessores.</p><p>A lista é longa e merece um estudo detalhado, caso se queira</p><p>mergulhar na complexidade dos advérbios. Para que se tenha ideia, o</p><p>professor Fernando Pestana divide-os em advérbios de: afirmação, negação,</p><p>modo, tempo, lugar, dúvida, intensidade (esses previstos pela NGB),</p><p>causa, concessão, conformidade, finalidade, condição, meio, instrumento,</p><p>assunto, companhia, preço, quantidade, referência, ordem, medida, peso,</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>matéria, proporção, reciprocidade, substituição, favor, exclusão, inclusão,</p><p>consequência/conclusão. E mesmo esse estudioso afirma haver outras</p><p>classificações, que dependem do contexto para que sejam feitas.</p><p>Note-se que a classificação semântica do advérbio depende do</p><p>contexto. Além disso, é bastante comum que a mesma palavra, dependendo</p><p>do contexto, mude de classe gramatical. Analise:</p><p>O coral canta mal. (advérbio de modo)</p><p>Após a cirurgia, Pedro mal consegue se levantar. (advérbio de “quase</p><p>negação”)</p><p>Mal chegou o coral, e todos se levantaram para aplaudir. (conjunção</p><p>temporal)</p><p>Estamos absolutamente perdidos nesta estrada. (advérbio de</p><p>intensidade)</p><p>Pensa em ter filhos? Absolutamente. Não imagino minha vida sem</p><p>filhos! (advérbio de afirmação)</p><p>Pensa em ter filhos? Absolutamente. Nem me imagino cuidando</p><p>de crianças. (advérbio de negação)</p><p>Estou só em casa, sem companhia nenhuma. (adjetivo, sinônimo de</p><p>“sozinho”)</p><p>Só responderei a uma pergunta. (advérbio de exclusão)</p><p>Falávamos sobre você, aí ele me contou que vocês dois já tiveram</p><p>um caso. (advérbio de tempo)</p><p>Eu jamais moraria aí. (advérbio de lugar)</p><p>Embora em essência seja um modificador do verbo, ele pode ainda</p><p>se ligar ao adjetivo ou a outro advérbio, exprimindo, na maioria das vezes,</p><p>intensidade (embora não apenas). Veja:</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Fiquei completamente imóvel. (intensidade)</p><p>A criança mostrou-se tão feliz! (intensidade)</p><p>Quão agradáveis foram aquelas férias! (intensidade)</p><p>Chegue mais tarde. (intensidade)</p><p>Comprei um tecido quimicamente tratado. (modo)</p><p>Não raramente, esqueço-me das coisas. (negação)</p><p>Evito maus hábitos moralmente viciantes. (modo)</p><p>“Meus diálogos são realmente pobres.</p><p>Só eu sei o trabalho que me dá empobrecê-los.” (afirmação ou</p><p>intensidade)</p><p>(Nelson Rodrigues)</p><p>O Anel de Vidro</p><p>Aquele pequenino anel que tu me deste,</p><p>— Ai de mim — era vidro e logo se quebrou</p><p>Assim também o eterno amor que prometeste,</p><p>— Eterno! era bem [=muito] pouco e cedo se acabou.</p><p>(Manuel Bandeira)</p><p>Ressalta-se que o advérbio é uma classe gramatical invariável. Assim,</p><p>diga:</p><p>Você é menos paciente do que parece. (não “menas”)</p><p>Minha esposa está todo preocupada com essa questão. (não “toda”)</p><p>Fiquei meio assustada com o crime que presenciei. (não “meia”)</p><p>Apenas</p><p>a título de aprofundamento, vale dizer não serem poucos</p><p>os autores que apresentam o advérbio como uma classe que extrapola a</p><p>mera relação com verbos, adjetivos e advérbios. Inúmeros são os exemplos</p><p>comprobatórios disso:</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pessoas assim são raras.</p><p>Eles chamaram muito poucas pessoas para a festa.</p><p>Quase dez partidos figuram nas eleições nacionais.</p><p>Muito embora a audiência tenha sido tranquila, o advogado se</p><p>exasperou.</p><p>Observações:</p><p>a) Havendo mais de um advérbio terminado em -mente, pode-se</p><p>deixar o sufixo apenas no último:</p><p>Riu alta, nervosa e compulsivamente.</p><p>Se vos querem comprar a casa, o canavial, o escravo, ou o cavalo,</p><p>não lhe pondes um preço muito levantado, e não o vendeis muito bem</p><p>vendido? Pois, se a vossa casa, e tudo o que nela tendes, o não quereis</p><p>dar, senão pelo que vale, a vossa alma, que vale mais que o mundo todo,</p><p>a vossa alma, que custou tanto como o sangue de Jesus Cristo, por que a</p><p>haveis de vender tão vil e tão baixamente?</p><p>(Padre Antônio Vieira, Sermão da primeira dominga da quaresma)</p><p>b) São advérbios de interrogação aqueles empregados em</p><p>interrogações diretas ou indiretas:</p><p>Onde estariam meus sapatos?</p><p>Não sei como faremos isso.</p><p>Quando nos veremos?</p><p>c) É muito comum que adjetivos funcionem como advérbios.</p><p>Eles falam baixo (em vez de “baixamente”);</p><p>Esta cerveja desce redondo (em vez de “redondamente”);</p><p>Lancei a bola errado (em vez de “erradamente”).</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pensando em construções assim, Rui Barbosa (ninguém menos que</p><p>Rui Barbosa!) defendeu “independente” no lugar de “independentemente”</p><p>quando da redação do Projeto do Código Civil. Em 1903, dirigiu-se aos</p><p>senadores da Comissão do Código Civil, fazendo inúmeras ponderações,</p><p>muitas de ordem gramatical. Em resposta ao gramático Ernesto Ribeiro,</p><p>que lhe aconselhou abolir “independente” como advérbio, disse Rui:</p><p>“[...] é muito da nossa língua evitar os largos advérbios em -mente,</p><p>substituindo-os pelos adjetivos adverbialmente empregados.”</p><p>Para exemplificar, citou trechos de “Obras”, de Filinto Elysio: ‘Fácil se</p><p>vê’; ‘Comeu fino, bebeu largo’. ‘Direito se encaminha’. ‘Brando o atalha’. ‘Sem</p><p>pranto um avarento raro acaba’. ‘Folgado dançariam nelas quatrocentas</p><p>pessoas’.</p><p>Citou, ainda, ‘Nova Floresta’, de Pe. Bernardes: ‘Procedia mais discreto,</p><p>portando-se impertinente, pouco nacional procede, quis portar-se fiel’.</p><p>Como se nota, portanto, além de não ser uma novidade linguística,</p><p>adjetivos que funcionam como advérbios deixam o texto mais enxuto.</p><p>Apesar disso, parece não haver, no registro culto escrito, muita adesão</p><p>dessa prática. Mesmo várias leis e códigos brasileiros, quando deixaram</p><p>passar um pobre “independente”, acabaram procedendo à correção em</p><p>suas atualizações posteriores.</p><p>d) É comum que, na linguagem coloquial, reforce-se o sentido dos</p><p>advérbios por meio de sua repetição ou da colocação de algum afixo.</p><p>Ainda com o fito de reforçar coloquialmente, é comum haver construções</p><p>inventivas:</p><p>Chego aí já, já.</p><p>Logo, logo, começaremos o trabalho.</p><p>Acordei cedaço. Acordei supercedo.</p><p>Fulano fala pelos cotovelos.</p><p>10</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Ah, eu era rapaz, eu era rapaz naquele tempo! E às vezes me</p><p>julgava importante porque no jornal que levava para casa, além de</p><p>reportagens ou notas que eu escrevera sem assinar, ia uma crônica ou</p><p>artigo com o meu nome. O jornal e o pão estariam bem cedinho na porta de</p><p>cada lar; e dentro do meu coração eu recebi a lição de humildade daquele</p><p>homem entre todos útil e entre todos alegre; “não é ninguém, é o padeiro!”</p><p>E assobiava pelas escadas. (Rubem Braga, O Padeiro)</p><p>e) Antes de particípio, empregam-se “mais bem” e “mais mal”, não</p><p>“melhor” ou “pior”, de acordo com a gramática normativa clássica:</p><p>Meu relato foi mais bem escrito que o seu. (não “melhor escrito”)</p><p>Por ser o mais mal regado, aquele jardim não floresceu. (não “pior</p><p>cuidado”)</p><p>f) Necessário tomar cuidado com a perda de acento ocorrente</p><p>quando se transforma um adjetivo acentuado num advérbio terminado em</p><p>-mente: economicamente, criticamente, nitidamente etc.</p><p>g) O Volp não registra o advérbio de ordem “segundamente”. O</p><p>dicionário Aulete o faz:</p><p>h) O chamado grau superlativo intensivo, o qual expressa os limites</p><p>das possibilidades, tem estrutura fixa. Assim:</p><p>11</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Chegamos o mais cedo possível para a festa.</p><p>Fomos o mais diligentes possível.</p><p>Vestiu a blusa o menos quente possível.</p><p>A ordem pode-se inverter: Fomos diligentes o mais possível.</p><p>Palavras denotativas</p><p>De acordo com a professora Amini Hauy, palavras e locuções</p><p>denotativas “são as palavras e expressões de situação que, paralelamente à</p><p>informação, acrescentam ao discurso a participação crítica ou emocional do</p><p>falante. Caracterizam-se por não terem, assim como a interjeição, nenhuma</p><p>função sintática, ao contrário das demais classes de palavras”.</p><p>De acordo com a NGB, as palavras denotativas classificam-se como</p><p>de: inclusão, exclusão, designação, realce, retificação, situação. Veja:</p><p>Traga dois pães, aliás, três! (retificação)</p><p>Só as criaturas que nunca escreveram (exclusão)</p><p>Cartas de amor</p><p>É que são (realce)</p><p>Ridículas.</p><p>(Fernando Pessoa como Álvaro de Campos)</p><p>Eis o mistério da fé.</p><p>Eis-me aqui perante todos vocês. (designação)</p><p>O dinheiro compra tudo. Até amor verdadeiro. (inclusão)</p><p>(Nelson Rodrigues)</p><p>Sobre o assunto, pontua Celso Cunha: “Como vemos, tais palavras</p><p>não devem ser incluídas entre os advérbios. Não modificam o verbo,</p><p>12</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>nem o adjetivo nem outro advérbio. São por vezes de classificação</p><p>extremamente difícil.”</p><p>Existe muita divergência entre os próprios gramáticos a respeito de</p><p>como encaixar as palavras denotativas.</p><p>Valor discursivo</p><p>É fundamental notarmos que os advérbios e palavras denotativas</p><p>frequentemente exprimem envolvimento afetivo do emissor com a</p><p>mensagem:</p><p>Lamentavelmente, teremos de nos mudar desta casa.</p><p>Grandes são os desertos e tudo é deserto,</p><p>Salvo erro, naturalmente.</p><p>Pobre da alma humana com oásis só no deserto ao lado!</p><p>(Fernando Pessoa como Álvaro de Campos)</p><p>Já me vejo na estação até aqui simples metáfora.</p><p>Sou uma pessoa perfeitamente apresentável.</p><p>Vê-se — dizem — que tenho vivido no estrangeiro.</p><p>Os meus modos são de homem educado, evidentemente.</p><p>Pego na mala, rejeitando o moço, como a um vício vil.</p><p>(Fernando Pessoa como Álvaro de Campos)</p><p>Madrugada</p><p>Do fundo de meu quarto, do fundo</p><p>de meu corpo</p><p>clandestino</p><p>ouço (não vejo) ouço</p><p>13</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>crescer no osso e no músculo da noite</p><p>a noite</p><p>a noite ocidental obscenamente acesa</p><p>sobre meu país dividido em classes</p><p>(Ferreira Gullar)</p><p>https://www.pensador.com/autor/ferreira_gullar/</p><p>PREPOSIÇÃO</p><p>AULA 8</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Preposição</p><p>Preposição (do latim prae = diante de + positionem = posição) é a</p><p>palavra invariável que conecta dois termos – um regente (subordinante) e</p><p>um regido (subordinado). Analise:</p><p>Chegou de Goiânia.</p><p>Caminhei contra a luz.</p><p>Parou ante o muro.</p><p>Para a compreensão do valor semântico da preposição, o contexto</p><p>é fundamental, ou seja, seu sentido intrínseco revela-se contextualmente.</p><p>Veja a diferença:</p><p>Lutar por Pedro, lutar contra Pedro, lutar com Pedro, Lutar para</p><p>Pedro, lutar sem Pedro.</p><p>Por Cristo, com Cristo, em Cristo,</p><p>a vós, Deus Pai todo-poderoso, na unidade do Espírito Santo,</p><p>toda a honra e toda a glória,</p><p>agora e para sempre.</p><p>(Doxologia final – Oração Eucarística)</p><p>Por = Através de Cristo, damos</p><p>glória ao Pai (Ele é o caminho);</p><p>Com = Ele quem dá glória ao pai, nós participamos da glória com Ele;</p><p>Em = “Dentro” dEle, em comunhão com Cristo.</p><p>Note-se que, na citação da Doxologia final, as preposições não estão</p><p>entre dois termos, mas iniciando as estruturas. Isso só acontece porque</p><p>os adjuntos adverbiais por elas introduzidos estão deslocados. Na ordem</p><p>direta, teríamos:</p><p>(Nós damos) Toda honra e toda a glória a vós, Deus Pai todo-</p><p>poderoso, por Cristo, com Cristo, em Cristo, na unidade do Espírito Santo,</p><p>agora e para sempre.</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Para que se compreenda melhor, observe um caso mais simples:</p><p>Até amanhã, eu terminarei a tarefa. (Ordem indireta)</p><p>Eu terminarei a tarefa até amanhã. (Ordem direta)</p><p>Na ordem direta dos termos, portanto, fica evidente a função</p><p>conectiva da preposição (no caso, conecta o adjunto adverbial “até amanhã”</p><p>ao restante da frase).</p><p>Observação importante: Não se preocupe, estudaremos os termos</p><p>da oração mais para frente no curso.</p><p>Em alguns casos, a preposição apresenta um sentido próprio</p><p>bastante fraco – ou até inexistente – e servirá apenas como elemento de</p><p>conexão.</p><p>Exemplo: Havereis de comprar, Luís de Camões, cara a cara etc.</p><p>Sobre o valor semântico das preposições, assevera Celso Cunha, em</p><p>pontuação interessantíssima:</p><p>“Comparando as frases:</p><p>Viajarei com Pedro</p><p>Concordo com você,</p><p>observamos que, em ambas, a preposição com tem como</p><p>antecedente uma forma verbal (viajei e concordo), ligada por ela a um</p><p>consequente, que, no primeiro caso, é um termo acessório (com Pedro =</p><p>adjunto adverbial) e, no segundo, um termo integrante (com você = objeto</p><p>indireto) da oração.</p><p>A preposição com exprime, fundamentalmente, a ideia de</p><p>‘associação’, ‘companhia’. E esta ideia básica, sentimo-la muito mais intensa</p><p>no primeiro exemplo (Viajei com Pedro) do que no segundo (Concordo</p><p>com você). Aqui, o uso da partícula com após o verbo concordar, por ser</p><p>construção já fixada no idioma, provoca um esvaecimento do conteúdo</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>significativo da ‘associação’, ‘companhia’, em favor da função relacional</p><p>pura.</p><p>Costuma-se nesses casos desprezar o sentido da preposição</p><p>e considerá-la um simples elo sintático, vazio de conteúdo nocional.</p><p>Cumpre, no entanto, salientar que as relações sintáticas que se fazem</p><p>por intermédio de preposição obrigatória selecionam determinadas</p><p>preposições exatamente por causa de seu significado básico. Assim, o</p><p>verbo concordar elege a preposição com em virtude das afinidades que</p><p>existem entre o sentido do próprio verbo e a ideia de ‘associação’ inerente a</p><p>com. O objeto indireto, que em geral é introduzido pelas preposições a ou</p><p>para, corresponde a um ‘movimento em direção a’, coincidente com a base</p><p>significativa daquelas preposições.</p><p>Completamente distinto é o caso do objeto direto preposicionado,</p><p>em que o emprego da preposição não obrigatória transmite à relação</p><p>um vigor novo, pois o reforço que advém do conteúdo significativo da</p><p>preposição é sempre um elemento intensificador da relação do verbo-</p><p>objeto:</p><p>Conhecer da natureza quando seja mister, para adorar com</p><p>discernimento a Deus. (R. Barbosa, EDS, 653).</p><p>Em resumo: a maior ou menor intensidade significativa da</p><p>preposição depende do tipo de relação sintática por ela estabelecida.”</p><p>Muitas vezes, são as preposições fundamentais. Leia este texto de</p><p>Manoel de Barros:</p><p>Quando a Vó me recebeu nas férias, ela me apresentou aos</p><p>amigos: Este é meu neto. Ele foi estudar no Rio e voltou de ateu. Ela disse</p><p>que eu voltei de ateu. Aquela preposição deslocada me fantasiava de</p><p>ateu. Como quem dissesse no Carnaval: aquele menino está fantasiado</p><p>de palhaço. Minha avó entendia de regências verbais. Ela falava de sério.</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Mas todo-mundo riu. Porque aquela preposição deslocada podia fazer</p><p>de uma informação um chiste. E fez. E mais: eu acho que buscar a beleza</p><p>nas palavras é uma solenidade de amor. E pode ser instrumento de rir.</p><p>De outra feita, no meio da pelada um menino gritou: Disilimina esse,</p><p>Cabeludinho. Eu não disiliminei ninguém. Mas aquele verbo novo trouxe</p><p>um perfume de poesia à nossa quadra. Aprendi nessas férias a brincar</p><p>de palavras mais do que trabalhar com elas. Comecei a não gostar de</p><p>palavra engavetada. Aquela que não pode mudar de lugar. Aprendi a</p><p>gostar mais das palavras pelo que elas entoam do que pelo que elas</p><p>informam. Por depois ouvi um vaqueiro a cantar com saudade: Ai morena,</p><p>não me escreve / que eu não sei a ler. Aquele a preposto ao verbo ler, ao</p><p>meu ouvir, ampliava a solidão do vaqueiro.</p><p>(Manoel de Barros, Memórias inventadas: a infância)</p><p>As preposições podem conectar palavras entre si, palavras a orações,</p><p>ou orações entre si:</p><p>Irei a Roma (“a” conecta o verbo “Irei” à palavra “Roma”.)</p><p>Pão de queijo (“de” conecta as palavras “pão” e “queijo”.)</p><p>Estudei para finalmente aprender (“para” conecta as orações</p><p>“estudei” e “aprender”.)</p><p>Classificação</p><p>As preposições podem ser essenciais ou acidentais.</p><p>As essenciais são as preposições propriamente ditas:</p><p>a, ante, após, até, com, contra, de, desde, em, entre, para, perante,</p><p>por, sem, sob, sobre, trás</p><p>Exemplos de uso:</p><p>Eles hão de fazer uma reunião sobre o assunto.</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Perante o cenário inesperado, a gestora traçou boas estratégias de</p><p>gestão.</p><p>Em tempos de pandemia, não se pode agir sem comedimento.</p><p>Sob a terra ou sobre ela, a plantação dá mostras de saúde.</p><p>As acidentais pertencem a outras classes gramaticais, mas</p><p>eventualmente têm valor de preposição. Algumas delas:</p><p>Conforme, como, exceto, mesmo, durante, senão.</p><p>Exemplos de uso:</p><p>Tenho-o como pai.</p><p>Nada senti senão medo.</p><p>Durante o dia, dormiram profundamente.</p><p>Locuções prepositivas</p><p>Locuções prepositivas são um conjunto de palavras, de valor</p><p>prepositivo, que se finaliza com preposição essencial (de, com, a).</p><p>Alguns exemplos: a fim de, de encontro a, ao encontro de, além de,</p><p>devido a, por trás de, sob pena de, embaixo de, em cima de, além de, aquém</p><p>de, quanto a, de acordo com, em conformidade com.</p><p>Exemplos de uso:</p><p>Jamais agirei em conformidade com uma mentira.</p><p>Os alunos foram de encontro às orientações.</p><p>Os alunos foram ao encontro das orientações.</p><p>O resultado foi aquém do esperado.</p><p>Leia o parágrafo abaixo, procurando identificar as preposições e sua</p><p>função semântica:</p><p>Lá se tinha ficado o Josias, na sua cova à beira da estrada com</p><p>uma cruz de dois paus amarrados, feita pelo pai.</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Ficou em paz. Não tinha mais que chorar de fome, estrada afora.</p><p>Não tinha mais alguns anos de miséria à frente da vida, para cair depois</p><p>no mesmo buraco, à sombra da mesma cruz.</p><p>Cordulina, no entanto, queria-o vivo. Embora sofrendo, mas em</p><p>pé, andando junto dela, chorando de fome, brigando com os outros.</p><p>(Rachel de Queiroz, O Quinze)</p><p>Resposta:</p><p>Lá se tinha ficado o Josias, na sua cova (em – lugar) à beira da</p><p>estrada (à beira de – lugar), com (com – proximidade/companhia) uma cruz</p><p>de dois paus amarrados (de – matéria), feita pelo pai (por – agente).</p><p>Ficou em paz (em – estado). Não tinha mais que chorar (que</p><p>– ligação entre “ter” + infinitivo, caráter relacional) de fome (de – causa),</p><p>estrada afora. Não tinha mais alguns anos de miséria (de – característica)</p><p>à frente da vida (à frente de – tempo), para cair (para – consequência</p><p>[ilógica]) depois no mesmo buraco (em – lugar), à sombra da mesma cruz</p><p>(à sombra de – lugar).</p><p>Cordulina, no entanto, queria-o vivo. Embora sofrendo, mas em</p><p>pé (em – modo), andando junto dela (junto de – companhia), chorando</p><p>de fome (de – causa), brigando</p><p>com os outros (com – introdução do</p><p>complemento do verbo “brigar”, caráter relacional).</p><p>(Rachel de Queiroz, O Quinze)</p><p>Observações</p><p>1) Por seu caráter subordinante, a preposição essencial leva os</p><p>pronomes pessoais para sua forma oblíqua tônica (lembrando: as formas</p><p>retas não podem funcionar como elementos subordinados):</p><p>Isso depende de mim. (Não de “eu”)</p><p>A notícia chegou até mim. (Não “até eu”)</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Tenho uma novidade para ti. (Não “para tu”)</p><p>Entre mim e ti, não há competição. (Não entre “eu e tu”)</p><p>No entanto, caso haja um verbo do qual o pronome seja sujeito,</p><p>deve-se usar o pronome reto:</p><p>Repetiram a notícia até eu entender seu sentido.</p><p>2) A forma “pra” é própria da linguagem coloquial. Formalmente,</p><p>usa-se “para”.</p><p>3) Algumas preposições podem-se combinar ou contrair com outras</p><p>palavras:</p><p>Fique neste cômodo. (em + este = neste)</p><p>Daqui sairão os futuros presidentes. (de + aqui = daqui)</p><p>Irei aonde você for. (a + onde = aonde)</p><p>Resisti aos encantos dela. (a + os = aos)</p><p>Refiro-me àquele tópico. (a + aquele = àquele)</p><p>Vá à padaria, por favor. (a + a = à)</p><p>Vim dum belo mosteiro. (de + um = dum)</p><p>Lembrando o que já se viu anteriormente: Não se contrai a preposição</p><p>“de” com artigo nenhum quando há verbo no infinitivo. Logo: Antes de ele</p><p>sair, quer falar com você. (Não “dele sair”)</p><p>4) Comumente, a preposição não é exigida por um termo, mas pode</p><p>aparecer por razões estilísticas. Bechara, por exemplo, cita “cumprir com o</p><p>dever” como uma construção em que a preposição “acentua a ideia de zelo</p><p>ou boa vontade para executar algo”.</p><p>Outro exemplo: “arrancar da espada”, quando o de enfatiza a “ideia</p><p>de uso do objeto”.</p><p>Mais exemplos: Procurei por você em todo lugar; Comeremos do</p><p>pão e beberemos do vinho.</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>5) Quando a preposição for exigida mais de uma vez, pode-se</p><p>omiti-la, contanto que não se prejudique o contexto. Veja:</p><p>Falei com o vizinho e (com) a vizinha. (A omissão não interfere no</p><p>sentido pretendido.)</p><p>Dedicatória aos poetas e (aos) pintores da cidade. (A omissão interfere</p><p>diretamente no sentido.)</p><p>6) Os verbos chegar, ir, voltar, levar não trabalham com a preposição</p><p>em, mas com as preposições a ou para: Vou para o prédio, Voltamos à</p><p>escola, Levei-a para a estação, Chegastes ao topo.</p><p>CONJUNÇÃO</p><p>AULA 9</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Conjunção</p><p>Conjunção (do latim conjunctus, “unido, ligado”) é a classe gramatical</p><p>que relaciona duas orações ou dois termos semelhantes da mesma oração.</p><p>Com raras exceções, a conjunção carrega em si um sentido próprio. Veja:</p><p>Para acabar as coisas, é preciso começar a fazê-las. Parece</p><p>óbvio, mas falta-te tantas vezes esta simples decisão. E...como satanás se</p><p>alegra com a tua ineficácia.</p><p>(Josemaria Escrivá)</p><p>Note como as palavras marcadas (mas e e) articulam respectivamente</p><p>relação de adversidade e de adição.</p><p>Estudar ou trabalhar: eis a questão.</p><p>Perceba como a palavra ou estabelece uma escolha entre os</p><p>infinitivos estudar e trabalhar.</p><p>Classificação</p><p>Podem ser coordenativas ou subordinativas.</p><p>As coordenativas, de acordo com Amini Hauy, conectam duas</p><p>palavras da mesma classe ou valor gramatical e mesma função sintática</p><p>[ou ainda duas orações]: substantivo, substantivo (ou equivalentes, isto é:</p><p>pronome substantivo/substantivo ou locução substantiva etc.); com igual</p><p>ocorrência: adjetivo/adjetivo; pronome/pronome; preposição/preposição;</p><p>advérbio/advérbio; verbo/verbo etc. Em geral, são as conjunções aditivas,</p><p>adversativas ou alternativas que, além de ligarem orações (verbo/verbo),</p><p>relacionam quaisquer termos de mesma classe ou valor gramatical e</p><p>função sintática.</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Exemplos:</p><p>Qualquer um e nós (locução pronominal – pronome)</p><p>Corpo e alma (substantivo – substantivo)</p><p>Ou eles chegarão a tempo, ou não entrarão. (oração coordenada</p><p>sindética – oração coordenada sindética)</p><p>Já as conjunções (ou locuções conjuntivas) subordinativas</p><p>introduzem orações subordinadas, ou seja, orações que sintaticamente</p><p>dependem de uma principal.</p><p>Exemplos:</p><p>Já que a escola está fechada, faremos a aula em casa. (oração</p><p>subordinada adverbial causal – oração principal)</p><p>Apenas espero que ele me ligue de volta. (oração principal – oração</p><p>subordinada substantiva objetiva direta)</p><p>No primeiro caso, “já que” é locução subordinativa adverbial causal</p><p>e, no segundo, “que” é conjunção subordinativa integrante.</p><p>Quanto às semelhanças e diferenças entre conjunções e preposições,</p><p>convém pontuar o seguinte, a título de esclarecimento: ambas podem ligar</p><p>palavras ou orações. Agora atenção:</p><p>○ As preposições (e locuções prepositivas) estabelecem relação de</p><p>subordinação sempre; quando introduzem orações, estas são</p><p>sempre reduzidas.</p><p>○ Já as conjunções, quando conectam palavras, são sempre</p><p>coordenativas. Quando conectam orações, podem ser</p><p>coordenativas ou subordinativas. Sendo subordinativas, jamais</p><p>serão reduzidas (caso forem, tratar-se-á de preposição, não de</p><p>conjunção).</p><p>Essas diferenças serão pontuadas quando se falar em sintaxe.</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Alguns exemplos de conjunções na prática:</p><p>“Todo amor é eterno e (coordinativa aditiva), se (subordinativa</p><p>adverbial condicional) acaba, não era amor.” (Nelson Rodrigues)</p><p>“Invejo a burrice, porque (subordinativa adverbial causal) é</p><p>eterna.” (Nelson Rodrigues)</p><p>“O cristão amou a filha do sertão, como (subordinativa adverbial</p><p>comparativa) nos primeiros dias, quando (subordinativa adverbial</p><p>temporal) parece que (subordinativa integrante) o tempo nunca poderá</p><p>estancar o coração. Mas (coordenativa adversativa) breves sóis bastaram</p><p>para murchar aquelas flores de uma alma exilada da pátria.</p><p>O imbu, filho da serra, se (subordinativa adverbial condicional)</p><p>nasce na várzea porque (subordinativa adverbial causal) o vento ou</p><p>(coordenativa alternativa) as aves trouxeram a semente, vinga, achando</p><p>boa terra e fresca sombra; talvez um dia cope a verde folhagem e enflore.</p><p>Mas (coordenativa adversativa) basta um sopro do mar, para tudo</p><p>murchar. As folhas lastram o chão; as flores, leva-as a brisa.” (José de</p><p>Alencar, Iracema)</p><p>Observações:</p><p>1) É frequente que uma conjunção (ou locução conjuntiva) tenha</p><p>mais de um sentido, o qual somente se esclarecerá no contexto. Veja alguns</p><p>exemplos:</p><p>Desde que cheguei, não falaram de outro assunto, senão o pedido</p><p>de demissão do chefe. (conjunção adverbial temporal)</p><p>Dede que nos alimentemos bem, ganharemos massa magra.</p><p>(conjunção adverbial condicional)</p><p>Se bebermos mais, passaremos mal. (conjunção adverbial</p><p>condicional)</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Não sei se esta é uma boa ideia. (conjunção integrante)</p><p>A equipe deve agir como ordenou o superior. (adverbial conformativa)</p><p>Como Pedro se atrasou, passei outra pessoa à sua frente. (adverbial</p><p>causal)</p><p>2) A conjunção e é particularmente polissêmica. Não raro, nem</p><p>sequer chega a ser uma conjunção.</p><p>E você por acaso acredita nele? (palavra denotativa de assunto)</p><p>Estudou como nunca e obteve seu primeiro dez. (valor conclusivo =</p><p>portanto)</p><p>Tomei todas as precauções, e peguei a doença. (valor adversativo =</p><p>mas)</p><p>Preciso chamar meu filho e dar uma explicação séria sobre este</p><p>assunto. (finalidade = para)</p><p>Abaixo, nota-se a riqueza da referida palavra:</p><p>Nas conversas gerais, a morte é tratada como se fosse, por</p><p>exemplo, um triângulo esférico e (oposição de ideias) não como uma</p><p>intensa realidade que ronda pela sala em torno de nossos corpos. É coisa</p><p>que acontece com parentes afastados e (conecta oraçõa) que elimina</p><p>periodicamente personagens</p><p>Gramática Normativa da Língua</p><p>Portuguesa, de Rocha Lima; Novíssima Gramática da Língua Portuguesa,</p><p>de Domingos Paschoal Cegalla; “A Gramática”, de Fernando Pestana, e</p><p>“Nova Gramática do Português Contemporâneo”, de Celso Cunha.</p><p>Não é necessário que o aluno adquira todos eles; basta escolher</p><p>aquele com cuja linguagem mais se identifique.</p><p>9</p><p>14</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>O que é a</p><p>Nomenclatura Gramatical Brasileira?</p><p>Até a metade do século XX, era caótica a teoria gramatical da</p><p>língua portuguesa. Tamanhas eram as subdivisões nas classificações dos</p><p>fatos linguísticos, que gramáticos se perdiam e se desencontravam, cada</p><p>um desenvolvendo suas próprias teorias, sem muita preocupação com a</p><p>unidade e a coesão gramatical.</p><p>Ciente de tal realidade, em 1957, o então Ministro da Educação e</p><p>Cultura, Clóvis Salgado, convocou professores do Colégio Pedro II para</p><p>elaboração do Anteprojeto de Simplificação da Nomenclatura Gramatical</p><p>Brasileira, cujo objetivo era padronizar a nomenclatura técnica empregada</p><p>nos estudos de gramática normativa.</p><p>Argumentou sensatamente o Ministro à época: “Um dos empecilhos</p><p>maiores, se não o maior, à eficiência do emprego da língua portuguesa reside</p><p>na complexidade e falta de padronização da nomenclatura gramatical em</p><p>uso nas escolas e na literatura didática”.</p><p>A portaria de nº 36 de 1959 recomentou expressamente que a</p><p>Nomenclatura Gramatical Brasileira fosse adotada no ensino programático</p><p>da língua portuguesa nos estabelecimentos de ensino.</p><p>Embora tenha sido importante passo rumo à unificação da</p><p>nomenclatura técnica, fato é que a multiplicidade de conceituação e análise</p><p>não cessou. A mera adoção da terminologia prescrita no documento não</p><p>impediu a proliferação de obras com análises distintas e frequentemente</p><p>inconciliáveis.</p><p>O objetivo deste Curso, no entanto, não é explicitar as divergências,</p><p>tampouco confundir o aluno com os pontos de maior impasse teórico, mas,</p><p>sim, apresentar as classificações pacíficas e as que, não sendo pacíficas,</p><p>sejam majoritárias e razoáveis.</p><p>MORFOLOGIA E</p><p>SUBSTANTIVO</p><p>AULA 1AULA 1</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>MORFOLOGIA</p><p>(do grego “morphê” = forma + “logia” = estudo)</p><p>A morfologia é a parte da Gramática que estuda as palavras quanto a</p><p>sua estrutura e formação, a suas flexões e a sua classificação.</p><p>Quando se analisa a palavra “inútil” e diz-se, por exemplo, que 1) ela</p><p>tem um prefixo (-in); 2) se trata de um adjetivo; e 3) pode ir para o plural</p><p>(“inúteis”), essas considerações são todas de ordem morfológica, pois estão</p><p>se debruçando sobre a construção da palavra.</p><p>Quanto à ideia e forma que carregam, as palavras se dividem em dez</p><p>classes gramaticais. Classes são, portanto, grupos de palavras classificadas</p><p>de acordo com a ideia e a estrutura que encerram. São elas: substantivo,</p><p>adjetivo, artigo, pronome, numeral, verbo, advérbio, conjunção, preposição</p><p>e interjeição.</p><p>As mais importantes, entre essas classes, são o substantivo e o verbo,</p><p>porque são elas a base da frase, como se verá.</p><p>Passemos à análise de cada uma.</p><p>Substantivo</p><p>Como o próprio nome diz, “substantivo” é a classe gramatical</p><p>responsável pela nomeação do que tem substância, ou seja, do que tem</p><p>existência, seja real (parede, raiz), seja imaginária (fada, sereia, anjo), seja</p><p>concreta (lápis, árvore, pão), seja abstrata (verdade, carisma, sofisticação),</p><p>seja animada (gato, macieira, homem), seja inanimada (pedra, ar).</p><p>Em torno do substantivo, gravitam quatro classes: artigo, adjetivo,</p><p>numeral e pronome, sobre as quais se falará posteriormente.</p><p>O substantivo flexiona varia em gênero, número e grau. Exemplo:</p><p>leitão/leitoa (variação em gênero), leitões (variação em número) e leitãozinho,</p><p>megaleitão (variação em grau).</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Ressalta-se que qualquer palavra pode tornar-se substantivo, o que</p><p>geralmente ocorre com a anteposição de um determinante: artigo, adjetivo,</p><p>pronome ou numeral.</p><p>“Entre o psicanalista e o doente, o mais perigoso é o psicanalista.”</p><p>(Nelson Rodrigues)</p><p>Note como “psicanalista” e “doente” nomeiam as pessoas em si, não</p><p>apenas expressam uma característica delas. Essa percepção é reforçada</p><p>pela presença do artigo definido “o”.</p><p>Agora compare:</p><p>A paciente doente tratou-se com o médico psicanalista.</p><p>Aqui, “doente” passa a ser característica de “paciente” e “psicanalista”</p><p>passa a ser característica de “médico”. Os substantivos, portanto, na última</p><p>frase, são “paciente” e “médico”.</p><p>Compare:</p><p>“O jovem tem todos os defeitos do adulto e mais um: — o da</p><p>imaturidade.” (Nelson Rodrigues)</p><p>O aluno jovem fez uma pergunta perspicaz.</p><p>No primeiro caso, “jovem” é substantivo, ao passo que, no segundo,</p><p>adjetivo.</p><p>Por fim, analise:</p><p>Eu que me aguente comigo e com os comigos de mim. (Fernando</p><p>Pessoa)</p><p>Cidadezinha qualquer</p><p>“Casas entre bananeiras</p><p>mulheres entre laranjeiras</p><p>pomar amor cantar.</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Um homem vai devagar.</p><p>Um cachorro vai devagar.</p><p>Um burro vai devagar.</p><p>Devagar... as janelas olham.</p><p>Eta vida besta, meu Deus.”</p><p>Carlos Drummond de Andrade, Alguma Poesia.</p><p>Note como a primeira estrofe explora basicamente os substantivos</p><p>para a formação da imagem e das sensações na cabeça do leitor.</p><p>Observação: Podem-se nominalizar verbos, o que é de grande valia</p><p>para a estilística do texto.</p><p>Analise:</p><p>Mudar o material das embalagens foi uma forma de a empresa</p><p>solucionar um problema, para fabricar seus produtos de maneira a atender</p><p>ao que o mercado exigiu. Quando a novidade chegou, houve grande</p><p>entusiasmo do público.</p><p>A mudança no material das embalagens foi uma solução</p><p>encontrada pela empresa, para que a fabricação de seus produtos</p><p>atendesse às exigências do mercado. Com a chegada da novidade, houve</p><p>grande entusiasmo do público.</p><p>Mais exemplos de nominalizações de verbos: tolerar, tolerância;</p><p>pescar – pescaria; ler – leitura; participar – participação; ceder – cessão;</p><p>surgir – surgimento; acessar – acesso etc.</p><p>Classificação dos substantivos</p><p>Quanto à significação, podem ser: próprios ou comuns, abstratos ou</p><p>concretos, coletivos.</p><p>Quanto à estrutura e formação, podem ser: simples ou compostos,</p><p>primitivos ou derivados.</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Próprios ou comuns</p><p>Comuns são aqueles que designam todos os seres de uma mesma</p><p>espécie, por compartilharem a mesma essência: bar, criança, livro, vida, rua,</p><p>quadrado, deus</p><p>Coletivos, ou seja, palavras que, mesmo no singular, representam um</p><p>grupo de seres da mesma espécie: cáfila (camelos), esquadrilha (aviões),</p><p>povo (pessoas) etc.</p><p>Próprios são aqueles que designam um ser específico de uma</p><p>espécie, ou seja, ressaltam a individualidade: Rua do Lazer, Ulisses, Goiânia,</p><p>Neosaldina, Deus.</p><p>Obs.: A parte da lexicografia que trata o estudo dos nomes próprios</p><p>é a onomástica.</p><p>Ressalta-se que um substantivo próprio pode virar comum e vice-</p><p>versa, num processo denominado “derivação imprópria”:</p><p>Quero comprar um panamá antes de viajar. (=chapéu)</p><p>Não seja um dom casmurro, tire a carranca! (=mal-humorado)</p><p>Os Oliveiras se acham poderosos na cidade.</p><p>Analise:</p><p>“O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia,</p><p>Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia</p><p>Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia,</p><p>O Tejo tem grandes navios</p><p>E navega nele ainda,</p><p>Para aqueles que veem em tudo o que lá não está,</p><p>A memória das naus.</p><p>O Tejo desce de Espanha</p><p>E o Tejo entra no mar em Portugal.</p><p>Toda a gente sabe isso.</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia</p><p>E para onde ele</p><p>de destaque na política e na literatura</p><p>(conecta palavras); e por isso, quando nos cai perto e cobre de lividez o</p><p>rosto da esposa, nosso primeiro sentimento é de absoluto espanto, como</p><p>se, apesar de todas as enormes cifras demográficas, aquele fenômeno</p><p>fosse ímpar no mundo. Cada morte é terrivelmente inesperada.</p><p>(Gustavo Corção, A descoberta do outro)</p><p>Segundo o professor Fernando Pestana: “A conjunção e, além desses</p><p>valores, pode indicar sequenciação temporal, isso ocorre quando o papel</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>dela é apenas ligar dois eventos sucessivos: Depois da ferrenha discussão,</p><p>Maria fechou o rosto e João foi para o quarto em seguida”.</p><p>Ainda sobre a referida conjunção, ressalta-se que pode ela aparecer</p><p>após ponto, a fim de lhe ressaltar o sentido, como faz Clarice:</p><p>Será preciso coragem para fazer o que vou fazer: dizer. E me</p><p>arriscar à enorme surpresa que sentirei com a pobreza da coisa dita.</p><p>Mal a direi, e terei que acrescentar: não é isso, não é isso! Mas é preciso</p><p>também não ter medo do ridículo, eu sempre preferi o menos ao mais por</p><p>medo também do ridículo: é que há também o dilaceramento do pudor.</p><p>(Clarice Lispector, A paixão segundo G.H.)</p><p>3) É bastante comum que a relação de sentido entre as orações seja</p><p>capturada pelo usuário da língua sem que haja uma conjunção. No entanto,</p><p>colocando-a, a relação se esclarece. Veja:</p><p>Vestiu-se inadequadamente e proferiu muitos palavrões: foi</p><p>despedido sumariamente do emprego.</p><p>Embora não haja uma conjunção explícita, a segunda oração expressa</p><p>claramente uma conclusão, de maneira que poderia ser introduzida por</p><p>“por isso”, “portanto”, “logo” etc.</p><p>INTERJEIÇÃO</p><p>AULA 10</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Interjeição</p><p>A palavra “interjeição” provém do latim “interjectio” – “ato de lançar</p><p>ou colocar entre”, de INTER, “no meio, entre”, mais JACERE, “jogar, atirar,</p><p>lançar”.</p><p>É a expressão da linguagem afetiva com que se exprimem estados</p><p>de emoção, sensações e estados de espírito. Seu caráter é quase sempre</p><p>exclamativo, embora possa aparecer interrogativamente (acompanhada de</p><p>interrogação) ou reflexivamente (acompanhada de reticências). É comum</p><p>vê-la isolada também por simples vírgula(s).</p><p>As verdadeiras interjeições não apresentam caráter vocabular, ou</p><p>seja, não são lexicalizadas. É o caso de hum, ei, eita, eba, opa, ué, ufa, tchau,</p><p>olá, hein, bis, tchau.</p><p>Fora as interjeições tradicionais, a verdade é que qualquer palavra –</p><p>ou mesmo frase – proferida com tom exclamativo, em caráter emocional,</p><p>pode se tornar uma interjeição:</p><p>Cuidado! (Advertência)</p><p>Obrigado! (Agradecimento)</p><p>Nossa! (Espanto)</p><p>Quê? (Incredulidade)</p><p>Viva! (Comemoração)</p><p>Bravo! (Aprovação)</p><p>Tomara! (Desejo)</p><p>Perdão! (Desculpa)</p><p>Xô! (Afugentamento)</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Locução interjetiva</p><p>São expressões de valor interjetivo:</p><p>Ai de mim!</p><p>Sangue de Jesus tem poder!</p><p>Ora bolas!</p><p>Ô de casa...</p><p>Que raios?</p><p>Que horror!</p><p>Sem dúvida!</p><p>Por seu caráter afetivo e expressivo, as interjeições aparecem</p><p>constantemente em poemas, músicas, orações, prosas e textos literários</p><p>em geral, conferindo a eles expressividade. Alguns exemplos:</p><p>Com açúcar, com afeto</p><p>Fiz seu doce predileto</p><p>Pra você parar em casa</p><p>Qual o quê!</p><p>Com seu terno mais bonito</p><p>Você sai, não acredito</p><p>Quando diz que não se atrasa</p><p>(Chico Buarque, Com açúcar, com afeto)</p><p>Quem me dera ouvir de alguém a voz humana</p><p>Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;</p><p>Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!</p><p>Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.</p><p>Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez</p><p>foi vil?</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Ó príncipes, meus irmãos,</p><p>Arre, estou farto de semideuses!</p><p>Onde é que há gente no mundo?</p><p>(Fernando Pessoa, Poema em linha reta)</p><p>Salve, Rainha,</p><p>mãe de misericórdia,</p><p>vida, doçura, esperança nossa, salve!</p><p>A Vós bradamos,</p><p>os degredados filhos de Eva.</p><p>A Vós suspiramos, gemendo e chorando,</p><p>neste vale de lágrimas.</p><p>Eia, pois, advogada nossa,</p><p>esses Vossos olhos misericordiosos</p><p>a nós volvei.</p><p>E, depois deste desterro,</p><p>nos mostrai Jesus, bendito fruto</p><p>do Vosso ventre.</p><p>Ó clemente, ó piedosa,</p><p>ó doce Virgem Maria.</p><p>Rogai por nós, Santa Mãe de Deus,</p><p>para que sejamos dignos das promessas de Cristo.</p><p>(Salve Rainha, oração católica)</p><p>Observações</p><p>1) Após interjeição seguida de exclamação (ou interrogação, ou</p><p>reticências), usa-se letra minúscula:</p><p>Ah! que bom você ter vindo!</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>2) Ó e Oh são interjeições com funções diferentes.</p><p>Oh expressa admiração, alegria, tristeza: Oh! esta é uma excelente</p><p>notícia!</p><p>Ó expressa apelo e aparece em vocativos: Ó Deus, que dor!</p><p>3) Sobre a grafia de algumas interjeições, ressalta Evanildo Bechara:</p><p>“certos sons vocálicos na escrita se representam de maneira convencional</p><p>ah!, oh!, hui!, hum!; o h no final pode marcar uma aspiração, alheia ao</p><p>sistema do português.</p><p>4) Alguns autores classificam as onomatopeias como fossem</p><p>interjeições. Tal classificação, no entanto, não parece a melhor, uma vez</p><p>que a natureza delas é diferente: enquanto a onomatopeia é uma figura de</p><p>linguagem que visa reproduzir sons de coisas e ações, a interjeição visa a</p><p>exprimir graficamente emoções e sentimentos humanos.</p><p>Sobre o assunto, pondera o Dicionário Houaiss:</p><p>«[existem interjeições] que apresentam sons articulados, com</p><p>fonemas que fazem parte do sistema da língua (ai, eba, ei, epa, oba,</p><p>opa, ui, xi etc.) e cujo caráter vocabular é mais definido, tendo uso</p><p>bastante generalizado e convencionado, embora algumas guardem</p><p>espontaneidade e expressividade bastante marcadas, como ai e ui (gritos</p><p>de dor, excitação); este tipo de interj. incorpora-se, de certo modo, ao</p><p>repertório comunicativo da língua, passando a fazer parte do vocabulário</p><p>desta.»</p><p>[...]</p><p>«[há interjeições] que praticamente não apresentam caráter</p><p>vocabular, já por serem constituídas de sons inarticulados, ou que não</p><p>fazem parte dos fonemas da língua, já por serem formadas por sequências</p><p>de fonemas que não ocorrem em outras palavras; tais interjeições são, de</p><p>certo modo, o limite da língua, pois, embora sejam emissões acústicas</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>realizadas com o aparelho fonador e tenham função expressiva e</p><p>comunicativa, estão fora do sistema fonológico, assemelhando-se mais,</p><p>a este respeito, a elementos não linguísticos ou supralinguísticos como</p><p>os gestos, a entonação etc. (algumas dessas interjeições chegam a ter</p><p>uso relativamente convencional; além disso, podem ou não receber</p><p>representação gráfica mais ou menos padronizada): ó (vocativo); oh</p><p>(espanto etc.); x/ch (som do ch, para pedir silêncio); hm ou hm-hm ou</p><p>ham-ham ou hum-hum (representação do ruído que se faz ao pigarrear</p><p>para chamar a atenção sobre si, quando não se é notado, ou para sugerir</p><p>ironicamente que algo que foi dito não é verdadeiro); ha (desprezo, riso</p><p>etc.); hã (interrogação, surpresa).</p><p>Deve-se notar que as onomatopeias, embora sejam um recurso</p><p>expressivo associado à linguagem, diferenciam-se deste tipo de interj., pois</p><p>não traduzem um estado emocional; pode-se legitimamente considerar</p><p>a representação gráfica ou a imitação das interjeições deste tipo como</p><p>onomatopaicas (pois imitam sons, e não palavras, e podem estar inseridas</p><p>em um encadeamento frasal: morreu sem dizer ah/sem fazer um ah</p><p>sequer), mas sua realização espontânea na fala, ainda que onomatopaica</p><p>ou imitativa, é tipicamente interjetiva [...]; dentre as interjeições deste tipo,</p><p>[...] [incluem-se] aquelas que, além de ter uso relativamente convencional,</p><p>recebem representação</p><p>gráfica padronizada e são compatíveis com as</p><p>regularidades da língua (p. ex., psiu [onomatopeia do som /ps/, us. para</p><p>chamar alguém ou pedir silêncio]; já, p. ex., pf [expressão de desprezo]</p><p>ou ts ou tsc [ruído que se faz com a língua no céu da boca, para exprimir</p><p>contrariedade ou reprovação] não se registraram) [...].»’</p><p>Fonte: Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, https://ciberduvidas.</p><p>iscte-iul.pt/consultorio/perguntas/a-interjeicao-ai/23514 [consultado em</p><p>18-01-2022]</p><p>OS PORQUÊS</p><p>AULA 11</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Os porquês</p><p>1) “Porque” (conjunção explicativa ou causal)</p><p>Possui o mesmo valor semântico de pois, uma vez que, tendo em</p><p>vista que. É utilizado para explicar ou mostrar a causa de alguma coisa.</p><p>Exemplo: Ele não foi buscá-la porque (uma vez que) não teve tempo.</p><p>Observação: Pode acontecer de vir no começo da frase: Porque</p><p>(uma vez que) não teve tempo de se trocar, foi com a roupa suja mesmo.</p><p>2) “Porquê” (substantivo) – É utilizado como sinônimo de razão,</p><p>motivo e geralmente vem antecedido por algum determinante (como</p><p>artigo, pronome ou numeral).</p><p>Exemplos:</p><p>Não há um porquê (motivo) para a ausência de minha mãe aqui.</p><p>Seus porquês (suas razões) não convenceram.</p><p>3) “Por que” pode ser empregado nas seguintes situações:</p><p>a) Por (preposição) + que (pronome interrogativo) valor adverbial</p><p>interrogativa</p><p>É utilizado geralmente no início de perguntas e equivale a por qual</p><p>razão, por qual motivo.</p><p>Exemplo: Por que (por qual motivo/razão) você não veio me buscar?</p><p>Às vezes, aparece no meio da pergunta direta.</p><p>Exemplo: Ele não disse por que (por qual motivo/razão) não veio me</p><p>buscar?</p><p>A pergunta pode, ainda, ser feita de forma indireta (sem ponto de</p><p>interrogação).</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Exemplo: Juliana deseja saber por que (por qual motivo/razão) eu</p><p>dormi tão cedo.</p><p>Caso haja um termo intercalado após “por que”, ele não deve ser</p><p>acentuado.</p><p>Não entendi por que, após tanto esforço, pretendem mudar o escopo</p><p>do projeto.</p><p>b) Por (preposição) + que (pronome relativo) – É utilizado como</p><p>sinônimo de pelo(a)(s) qual(is).</p><p>Exemplos:</p><p>A situação por que (pela qual) passamos foi difícil.</p><p>“Só eu sei as esquinas por que (pelas quais) passei.”</p><p>c) Por (preposição exigida por um termo) + que (conjunção</p><p>integrante)</p><p>Ansiamos por que o palestrante esclarecesse seu ponto de vista.</p><p>d) Por (preposição) + que (pronome indefinido), equivalendo a “por</p><p>qual”:</p><p>Estou curioso para saber por que motivo nossas malas não chegaram.</p><p>Perguntaram-me por que razão decidi lecionar.</p><p>Mas por que cargas d’água ainda estamos aqui? (“por que diabos”,</p><p>“por que raios”)</p><p>Pode acontecer de a palavra “motivo” ou “razão” estar subentendida:</p><p>O empresário recusou-se a ter uma rede social, daí por que seu</p><p>produto caiu em esquecimento.</p><p>(Ou seja: daí a razão pela qual o produto caiu em esquecimento)</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>4) “Por quê” (preposição + pronome interrogativo tônico)</p><p>Assim como “por que”, também é sinônimo de “por qual razão”.</p><p>No entanto, é utilizado geralmente ao final de frase (interrogativa direta</p><p>ou indireta), antes de marca final de pontuação (ponto final, interrogação,</p><p>exclamação) ou de reticências.</p><p>Exemplos:</p><p>Não vou lhe contar por quê.</p><p>Ele fez isso por quê?</p><p>Sei que ela está em silêncio há horas, mas não aconselho que você</p><p>lhe pergunte novamente por quê!</p><p>Ele me deu uma má resposta e eu não entendi por quê...</p><p>Mesmo que constitua uma frase isolada, caso haja referência clara</p><p>no contexto, também se grafa “por quê”.</p><p>Você deixou todas as roupas espalhadas pela casa. Por quê?</p><p>Precisamos nos unir e fazer um abaixo-assinado. Por quê? Porque, se</p><p>agirmos juntos, nossas chances são maiores.</p><p>Embora seja raro, pode ocorrer de o “quê” tônico ocorrer no meio da</p><p>frase.</p><p>Não sei por quê, mas tenho a impressão de que a ideia não dará certo.</p><p>A duquesa apareceu aos prantos no jornal. Como todos indagaram</p><p>por quê, ela não teve outra saída senão explicar-se.</p><p>Sei quando há acento nas palavras. Explicar por quê é que são elas.</p><p>(=...explicar por que há acento nas palavras...)</p><p>Sabemos que ele se mudou de país, mas revelar por quê ele não vai.</p><p>(=revelar por que ele mudou de país)</p><p>São sempre certeiras as observações colhidas pelo professor José</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Maria da Costa. Algumas delas:</p><p>Arnaldo Niskier - ao que parece com razão, já que não é</p><p>apenas no fim da frase que o que adquire tonicidade - é um pouco mais</p><p>abrangente, para não apenas possibilitar essa grafia com acento no fim</p><p>da frase, mas também em casos intermediários, em que há pausa, mas</p><p>no meio da frase, antes, por exemplo, de uma vírgula, ou mesmo de um</p><p>ponto e vírgula: “Por quê (separado e com acento) é usado em perguntas</p><p>quando vem seguido imediatamente por uma pausa”. Ex.: “O advogado</p><p>não sabe por quê, nem como, nem quando a causa foi perdida”.</p><p>Atento a essa circunstância, observa Celso Pedro Luft que, muito</p><p>embora o Acordo Ortográfico se retira ao que acentua apenas no fim da</p><p>frase, o certo é que, exatamente pela igual circunstância de que ele se</p><p>torna tônico, “a rigor, pelo mesmo motivo, se devia acentuar o que em</p><p>qualquer pausa (vírgula, ponto-e-vírgula)”.</p><p>Anote-se, por fim, que essas quatro distinções (porquê, porque,</p><p>por que, por quê) acham-se regularmente abonadas pelas regras de</p><p>ortografia e acentuação de nosso idioma, bem como pelo Vocabulário</p><p>Ortográfico da Língua Portuguesa, da Academia Brasileira de Letras,</p><p>órgão oficialmente incumbido de definir quais as palavras integrantes</p><p>de nosso léxico, além de sua correta grafia e acentuação.</p><p>Além disso, também a 1ª observação da 14ª regra da alínea</p><p>43 de acentuação gráfica das instruções do Formulário Ortográfico,</p><p>unanimemente aprovadas pela Academia Brasileira de Letras em sessão</p><p>de 12 de agosto de 1943, ao referir-se ao emprego do “acento circunflexo</p><p>para distinguir de certos homógrafos inacentuados as palavras que têm</p><p>e ou o fechados”, ordena que se acentue “porquê (quando é substantivo</p><p>ou vem no fim da frase)”, para distinguir de “porque (conjunção)”.</p><p>Em termos históricos, vale aditar, com Silveira Bueno, que “o fato</p><p>de empregarmos, diferentemente grafados, porque e por que, é muito</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>recente”, com o que se buscou “indicar as funções diversas da palavra até</p><p>então sempre escrita num vocábulo só - porque”.</p><p>José Maria da Costa, em https://www.migalhas.com.br/coluna/</p><p>gramatigalhas/15581/porque</p><p>Os porquês na prática</p><p>Eu canto porque o instante existe</p><p>e a minha vida está completa.</p><p>Não sou alegre nem sou triste:</p><p>sou poeta.</p><p>(Cecília Meireles)</p><p>“Gosto de dizer. Direi melhor: gosto de palavrar. As palavras são</p><p>para mim corpos tocáveis, sereias visíveis, sensualidades incorporadas.</p><p>Talvez porque a sensualidade real não tem para mim interesse de</p><p>nenhuma espécie – nem sequer mental ou de sonho –, transmudou-</p><p>se-me o desejo para aquilo que em mim cria ritmos verbais, ou os escuta</p><p>de outros. Estremeço se dizem bem.”</p><p>(Livro do Desassossego, Fernando Pessoa)</p><p>Exercícios em aula</p><p>_______________________ fiz dieta, consegui emagrecer 20 kg.</p><p>Ainda não compreendemos o _______________________ de ela ter</p><p>desistido do curso.</p><p>Soube das desilusões amorosas _______________________ você passou</p><p>ao longo da vida.</p><p>Não consigo baixar o aplicativo, não sei _______________________ !</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Seu irmão já explicou _______________________ deixou de falar comigo?</p><p>Nos embargos, o advogado pediu ao juiz que fundamentasse</p><p>melhor os _______________________ motivadores da decisão.</p><p>Durante</p><p>a viagem, _______________________ caminhei com pressa,</p><p>acabei torcendo o tornozelo.</p><p>Não vou ao baile e já expliquei _______________________.</p><p>As pessoas entenderam sua explicação _______________________ ela</p><p>foi clara e objetiva.</p><p>Todas as causas _______________________ briguei eram nobres.</p><p>A prova foi cancelada? _______________________?</p><p>Você saiu sem se explicar. Sugiro que volte e diga a ela</p><p>_______________________ .</p><p>Os cantores irão de avião simplesmente _______________________ está</p><p>chovendo?</p><p>Alguém já comentou _______________________ o céu está cheio de</p><p>fumaça?</p><p>Faremos o serviço _______________________ só assim será possível</p><p>ganhar o dinheiro de que precisamos.</p><p>SENÃO OU SE NÃO?</p><p>AULA 12</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>SENÃO OU SE NÃO?</p><p>“Senão” pode ter vários significados. Veja:</p><p>a) Do contrário</p><p>Sugiro que não me ligue mais, senão (=do contrário) bloquearei seu</p><p>número.</p><p>b) A não ser</p><p>Nunca uso vestido brilhoso, senão (=a não ser) em situações muito</p><p>formais.</p><p>c) Mas também</p><p>A audiência transcorreu de forma não apenas tranquila, senão (=mas</p><p>também) agradável.</p><p>d) Mas sim (ou simplesmente “mas”)</p><p>Não pretendo fazer prova para a Procuradoria da República, senão</p><p>(=mas sim) para a Procuradoria do Estado.</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>O objetivo da bronca não foi assustar a criança, senão (=mas) educá-la.</p><p>“Se não”, por sua vez, significa “caso não”. “Se” é uma conjunção</p><p>condicional (introduz uma condição para que algo ocorra).</p><p>Se não (=caso não) estivesse tão sem tempo, convidá-lo-ia para</p><p>tomarmos um café.</p><p>A confusão acontece porque, não raramente, ambas as formas</p><p>cabem, dada sua semelhança de sentido.</p><p>Veja:</p><p>Sugiro que ele venha até aqui imediatamente, senão (=do contrário)</p><p>o juiz determinará condução coercitiva.</p><p>Sugiro que ele venha até aqui imediatamente; se não (=caso não), o</p><p>juiz determinará condução coercitiva.</p><p>No último caso, a vírgula após “se não” marca tanto a supressão do</p><p>verbo como a circunstância de condição: se não <vier>, o juiz determinará</p><p>condução coercitiva.</p><p>ÍNDICE DE INDETERMINAÇÃO</p><p>X PRONOME APASSIVADOR</p><p>AULA 13</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Como já se disse, a palavra “se” pode desempenhar inúmeras</p><p>funções dentro da língua portuguesa (veja o arquivo anexo, retirado do</p><p>livro A Gramática para Concursos Públicos, de Fernando Pestana).</p><p>Para completar nosso estudo de sujeitos, vejamos o “se” como</p><p>pronome apassivador e índice de indeterminação.</p><p>Pronome apassivador</p><p>O pronome apassivador “se” acompanha sempre VTD ou VTDI na</p><p>terceira pessoa do singular ou do plural (ser singular ou plural depende de</p><p>qual é o sujeito). Forma-se, assim, voz passiva sintética, a qual quase sempre</p><p>pode se desdobrar em passiva analítica.</p><p>Observe:</p><p>A cozinheira comprou os ingredientes da receita. (Voz ativa)</p><p>Os ingredientes da receita foram comprados pela cozinheira. (Voz</p><p>passiva analítica)</p><p>Os ingredientes da receita foram comprados. (Voz passiva analítica</p><p>sem o agente da passiva)</p><p>Compraram-se os ingredientes da receita. (Voz passiva sintética)</p><p>Note que, na voz passiva, “os ingredientes da receita” é termo que</p><p>exerce função de SUJEITO. Essa é precisamente a razão pela qual o verbo</p><p>“comprar” aparece flexionado (compraram-se).</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Ambas as construções na voz passiva só são possíveis porque</p><p>estamos na presença de um verbo transitivo direto (comprar). Assim, o que</p><p>era objeto direto na voz ativa (“os ingredientes da receita”) vira sujeito na voz</p><p>passiva – tanto na analítica como na sintética.</p><p>Em outras palavras, o pronome apassivador só existe quando o verbo</p><p>é transitivo direto ou transitivo direto e indireto na voz ativa, pois só assim</p><p>haverá um objeto direto capaz de virar sujeito na voz passiva.</p><p>Mais exemplos:</p><p>Vendem-se casas. – Casas são vendidas.</p><p>Compram-se apartamentos. – Apartamentos são comprados.</p><p>Fazem-se unhas neste local. – Unhas são feitas neste local.</p><p>Soube que se concederam todos os pedidos que você fez. – Soube</p><p>que todos os pedidos que você fez foram concedidos.</p><p>Eles disseram que aqui se filmariam as cenas de terror. – Eles</p><p>disseram que aqui as cenas de terror foram filmadas as cenas de terror.</p><p>Arquivem-se os autos. = Sejam os autos arquivados.</p><p>Construir-se-ão viadutos na cidade de Goiânia. – Viadutos serão</p><p>construídos na cidade de Goiânia.</p><p>Ouviram-se inúmeros tiros quando do assalto. – Inúmeros tiros</p><p>foram ouvidos quando do assalto.</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Devem-se resolver rapidamente as pendências cartorárias. – As</p><p>pendências cartorárias devem ser resolvidas rapidamente.</p><p>Veja que, nesses casos todos, não se sabe quem é o praticante da</p><p>ação, uma vez que com raras exceções (que geralmente remontam à</p><p>literatura clássica), a voz passiva sintética é incompatível com a presença do</p><p>agente da passiva.</p><p>Agora note a diferença:</p><p>Trata-se de casos sérios. = De casos sérios são tratados???</p><p>É raro o dia em que não se assiste a desentendimentos neste</p><p>podcast. = É raro o dia em que desentendimentos não são assistidos...????</p><p>Precisa-se de assessores com experiência. = De assessores com</p><p>experiência são precisados????</p><p>Procedeu-se às devidas investigações após os crimes do ano</p><p>passado. = As devidas investigações foram procedidas??????</p><p>Nos casos acima, não é possível a transposição para a voz passiva</p><p>analítica por um motivo muito simples: as construções não estão na voz</p><p>passiva. O pronome “se”, no caso, é índice de indeterminação do sujeito.</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Índice de indeterminação do sujeito</p><p>O índice de indeterminação (ou pronome de indeterminação)</p><p>acompanha VL, VI ou VTI e sempre aparece na 3ª pessoa do singular, sem</p><p>sujeito explícito. Nesses casos, não é possível passar a oração para a voz</p><p>passiva analítica, permanecendo ela na voz ativa.</p><p>Na minha terra, é-se mais calmo. (Alguém é mais calmo, só não se</p><p>sabe quem.)</p><p>Precisa-se de garçonetes. (Alguém precisa, só não se sabe quem.)</p><p>Não acredito que se more bem nestas regiões tão ruidosas.</p><p>(Alguém não mora bem. Só não se sabe quem.)</p><p>Sua vez. Nas frases abaixo, identifique se o pronome “se” é índice de</p><p>indeterminação ou pronome apassivador.</p><p>Entrega-se o material no mesmo dia da compra.</p><p>Imagino que, nesta pequena cidade, sonhe-se com água encanada</p><p>e esgoto.</p><p>Soube que, neste prédio, alugam-se escritórios.</p><p>Na família de meu marido, briga-se por qualquer coisa.</p><p>Fica-se mais confortável nesta poltrona do que naquela.</p><p>EXERCÍCIOS E RESPOSTAS</p><p>PRONOME APASSIVADOR E</p><p>ÍNDICE DE INDETERMINAÇÃO</p><p>AULA 13</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Exercícios</p><p>Identifique a função do pronome “se” e corrija o enunciado,</p><p>se necessário.</p><p>a) Nunca se viu tamanha censura nas redes sociais.</p><p>b) Nunca se viram tamanhas ações de censura nas redes sociais.</p><p>c) Nesta empresa, capacita-se novos funcionários com frequência.</p><p>d) Infelizmente, não se podem contar com jurados num tribunal.</p><p>e) Idealizam-se vidas sem problema quando não se conhecem</p><p>os outros.</p><p>f) Aceitam-se cheques.</p><p>g) Trata-se de duas ações de alimentos.</p><p>h) Precisa-se de novos funcionários.</p><p>i) Gosta-se de sapatos confortáveis.</p><p>j) Os funcionários me disseram que, na fábrica, espera-se novos</p><p>uniformes.</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>k) Duvida-se de políticos profissionais.</p><p>l) Não se pode confiar em pessoas polidas demais.</p><p>m) Em Goiânia, vive-se bem.</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U</p><p>E S A</p><p>Gabarito:</p><p>a) Nunca se viu tamanha censura nas redes sociais. (PA. Frase correta)</p><p>b) Nunca se viram tamanhas ações de censura nas redes sociais. (PA.</p><p>Frase correta)</p><p>c) Nesta empresa, capacita-se novos funcionários com frequência.</p><p>(PA. Frase incorreta. Deveria ser “capacitam-se”. Passando-se para a voz</p><p>passiva analítica, teríamos, “Novos funcionários são capacitados”.)</p><p>d) Infelizmente, não se podem contar com jurados num tribunal.</p><p>(IIS. Frase incorreta. Deveria ser “pode contar”, pois “com jurados” é apenas</p><p>objeto indireto, não sujeito.)</p><p>e) Idealizam-se vidas sem problema quando não se conhecem os</p><p>outros. (PA em ambos os casos. Frase correta)</p><p>f) Aceitam-se cheques. (PA. Frase correta)</p><p>g) Trata-se de casos diferentes. (IIS. Frase correta)</p><p>h) Precisa-se de novos funcionários. (IIS. Frase correta)</p><p>i) Gosta-se de sapatos confortáveis. (IIS. Frase correta)</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>j) Os funcionários me disseram que, na fábrica, espera-se novos</p><p>uniformes. (PA. Frase incorreta. Deveria ser “esperam-se”. Passando-se para</p><p>a voz passiva analítica, teríamos, “Novos uniformes são esperados”.)</p><p>k) Duvida-se de políticos profissionais. (IIS. Frase correta)</p><p>l) Não se pode confiar em pessoas polidas demais. (IIS. Frase correta)</p><p>m) Em Goiânia, vive-se bem. (IIS. Frase correta)</p><p>SINTAXE</p><p>AULA 13</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>SINTAXE</p><p>“Sintaxe” advém do grego “syntaxis”, passada para o latim, e significa</p><p>literalmente “ato de colocar em ordem, de arranjar”, formada por SYN-,</p><p>“junto”, mais TASSEIN, “ordenar, arrumar”.</p><p>A sintaxe estuda o emprego das classes de palavras e as relações</p><p>de regência, concordância e colocação que elas mantêm entre si, na</p><p>estruturação das orações, e as relações que se estabelecem dentro do</p><p>período. (Amini Boainain Hauy)</p><p>Falar em estudo do “emprego das classes de palavras” significa tratar</p><p>de sua ordem, do arranjo que elas estabelecem entre si e da função que</p><p>desempenham dentro da oração.</p><p>Fazer uma análise sintática é, portanto, entender a dinâmica, as</p><p>possibilidades e os mecanismos de construção da oração, percebendo as</p><p>implicações semânticas daí decorrentes.</p><p>Observação: “Morfossintaxe” é o estudo simultâneo da morfologia e</p><p>da sintaxe, ou seja, das classes gramaticais e suas funções sintáticas.</p><p>Para que se proceda ao estudo da análise sintática, deve-se</p><p>estabelecer o conceito de frase, oração e período.</p><p>• Frase é todo enunciado com sentido completo. Inicia-se com</p><p>letra maiúscula e finaliza-se com ponto (qualquer que seja ele).</p><p>Nas palavras de Maria Helena Moura Neves:</p><p>Unidade significativa da interação verbal produzida com um</p><p>propósito comunicativo definido: declarar, interrogar, ordenar, exclamar.</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pode ser declarativa, interrogativa, exclamativa, imperativa, optativa.</p><p>Abaixo, há apenas uma frase em cada enunciado:</p><p>A vida é muito mais variada, anárquica e imprevisível do que</p><p>sonham os ideólogos. (Paulo Francis)</p><p>Já chegamos?</p><p>Fora!</p><p>• Oração é a estrutura sintática formada com a presença de um</p><p>verbo ou locução verbal.</p><p>Leia:</p><p>Veja, Lorena, aqui na mesa este anjinho vale tanto quanto o peso</p><p>de papel sem papel ou aquele cinzeiro sem cinza, quer dizer, não</p><p>tem sentido nenhum. Quando olhamos para as coisas, quando</p><p>tocamos nelas, é que começam a viver como nós, muito mais</p><p>importantes do que nós, porque continuam. (Lygia Fagundes Telles,</p><p>Os objetos – Antes do baile verde)</p><p>Na passagem citada, há tantas orações quantas são os verbos</p><p>marcados, ou seja, há 7 orações. No entanto, como só há 2 marcações</p><p>de ponto, há duas frases apenas.</p><p>Observação: “Quer dizer” e “é” (na expressão “é que”) não ensejam</p><p>orações. No primeiro caso, trata-se de locução denotativa usada para</p><p>introduzir um esclarecimento sobre algo. No segundo, “é que” é mera</p><p>locução expletiva de realce.</p><p>• Período é uma frase constituída de uma ou mais orações.</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Leia:</p><p>O certo é que todas essas coisas, carinhos, atenções, obséquios,</p><p>fizeram em mim uma transformação, que o natural sentimento da</p><p>mocidade ajudou e completou. Imaginam, creio eu?</p><p>- Não.</p><p>- O alferes eliminou o homem. Durante alguns dias, as duas</p><p>naturezas equilibraram-se; mas não tardou que a primitiva cedesse à</p><p>outra; ficou-me uma parte mínima de humanidade. Aconteceu então</p><p>que a alma exterior, que era dantes o sol, o ar, o campo, os olhos das</p><p>moças, mudou de natureza e passou a ser a cortesia e os rapapés da</p><p>casa, tudo o que me falava do posto, nada do que me falava do homem.</p><p>A única parte do cidadão que ficou comigo foi aquela que entendia com</p><p>o exercício da patente; a outra dispersou-se no ar e no passado. (Machado</p><p>de Assis, O Espelho)</p><p>No último parágrafo do trecho, há 15 orações (“passou a ser” é locução</p><p>verbal e enseja apenas uma oração) e 4 frases.</p><p>A primeira frase (“O alferes eliminou o homem”) contém apenas uma</p><p>oração. Chama-se, portanto, período simples. Todo período simples é uma</p><p>oração absoluta.</p><p>Já a segunda frase do trecho (Durante alguns dias[...]humanidade)</p><p>tem três orações. Quando há mais de uma oração no período, ele se chama</p><p>período composto.</p><p>{</p><p>{</p><p>{ {{</p><p>{{</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Termos da oração</p><p>Dado o conceito de oração, passemos a seu estudo aprofundado.</p><p>Chamam-se termos os elementos gramaticais que compõem as</p><p>orações. São eles:</p><p>1) Sujeito</p><p>2) Predicado</p><p>Sintaticamente, o verbo pode ser:</p><p>a) de ligação, quando haverá um predicativo do sujeito.</p><p>b) intransitivo</p><p>c) transitivo direto, quando haverá um objeto direto</p><p>d) transitivo indireto, quando haverá um objeto indireto</p><p>e) transitivo direto e indireto, quando haverá objetos direto e indireto.</p><p>3) Complemento</p><p>4) Adjunto</p><p>simples</p><p>composto</p><p>indeterminado</p><p>oração sem sujeitos</p><p>verbal</p><p>nominal</p><p>verbo-nominal</p><p>verbal</p><p>nominal</p><p>objeto direto</p><p>objeto indireto</p><p>adnominal</p><p>adverbial</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>5) Aposto</p><p>6) Vocativo</p><p>7) Agente da passiva</p><p>Analisemos separadamente os termos:</p><p>1) Sujeito</p><p>O Sujeito é a pessoa do verbo, o ser sobre o qual se faz uma declaração;</p><p>é em sua função que se flexiona o verbo da oração.</p><p>O sujeito é expresso por um ou mais núcleos substantivos (ou</p><p>substantivados), ou equivalentes de substantivo, como, por exemplo,</p><p>pronomes pessoais, pronomes substantivos, numerais [substantivos],</p><p>orações substantivas, subordinadas ou reduzidas. (Amini Hauy)</p><p>Veja:</p><p>O alferes eliminou o homem. (Machado de Assis, O Espelho)</p><p>As grandes convivências estão a um milímetro do tédio. (Nelson</p><p>Rodrigues)</p><p>Engenhosos são os malabarismos da consciência.</p><p>[...] o sol trazia dissolvido na sua luz algum veneno misterioso</p><p>que [pronome relativo retomando “algum veneno misterioso”] vencia os</p><p>cuidados mais pacientes, ressequia a frescura das irrigações, esterilizava</p><p>o poder nutritivo do caroço com tanto custo obtido. (Rachel de Queiroz, O</p><p>Quinze)</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Classificações do sujeito</p><p>• Simples: tem apenas um núcleo.</p><p>Você acha Maria Inês bonita, mamãe? (Lygia Fagundes Telles, O</p><p>Menino)</p><p>Amar é dar razão a quem não tem. (Nelson Rodrigues)</p><p>Depois os dois deram-se os braços como há muito tempo não se</p><p>usava dar. (Chico Buarque, Valsinha)</p><p>Foi concedida, após inúmeros pedidos por parte do Autor, a</p><p>guarda da filha.</p><p>A maior desgraça da democracia é trazer à tona a força numérica</p><p>dos idiotas, que são a maioria da humanidade. (Nelson Rodrigues)</p><p>• Composto: tem mais</p><p>de um núcleo.</p><p>Foram vendidas a casa e a cobertura no mesmo contrato.</p><p>A experiência de mil gerações, a guerra, a propaganda espírita,</p><p>as epidemias não conseguem nos reconciliar com a morte porque, dentro</p><p>de nós, muito em nosso íntimo, esperamos que ela seja vencida. A morte</p><p>é inimiga e imprópria. Há um modo divertido de falar na morte, entre</p><p>anedotas e piscadelas de olho, estando todos convictos que aquele</p><p>fenômeno tem qualquer coisa de subversivo e obsceno: adivinhamos nele</p><p>a suprema pornografia. (Gustavo Corção, A descoberta do outro)</p><p>Pode ocorrer de o sujeito – seja simples, seja composto – vir</p><p>subentendido, mas facilmente identificado pelo contexto ou pela</p><p>desinência, caso em que se diz ser o sujeito elíptico ou oculto.</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Observação: “Elipse” vem do grego elleipsis, passado para o latim, e</p><p>significa “supressão”. Analise:</p><p>[Nós] Chegamos tarde.</p><p>Vem, por favor não evites [tu]</p><p>Meu amor, meus convites,</p><p>Minha dor, meus apelos</p><p>[Eu] Vou te envolver nos cabelos</p><p>Vem perder-te [tu] em meus braços</p><p>Pelo amor de Deus!</p><p>(Chico Buarque, Sem fantasia)</p><p>Essa supressão pode ser de grande valia estilística, como se nota em</p><p>Construção, de Chico Buarque:</p><p>Amou daquela vez como se fosse a última</p><p>Beijou sua mulher como se fosse a última</p><p>E cada filho seu como se fosse o único</p><p>E atravessou a rua com seu passo tímido</p><p>Subiu a construção como se fosse máquina</p><p>Ergueu no patamar quatro paredes sólidas</p><p>Tijolo com tijolo num desenho mágico</p><p>Seus olhos embotados de cimento e lágrima</p><p>Sentou pra descansar como se fosse sábado</p><p>Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe</p><p>Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago</p><p>Dançou e gargalhou como se ouvisse música</p><p>E tropeçou no céu como se fosse um bêbado</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>E flutuou no ar como se fosse um pássaro</p><p>E se acabou no chão feito um pacote flácido</p><p>Agonizou no meio do passeio público</p><p>Morreu na contramão atrapalhando o tráfego</p><p>Observações: Comumente, o sujeito é simples, mas se liga pela</p><p>conjunção “e”, formando uma expressão de uma só ideia. Não se flexiona o</p><p>verbo, nesse caso:</p><p>“Lei e Ordem” é um seriado norte-americano.</p><p>“Casseta e Planeta” me fazia rir.</p><p>Pode ocorrer, por razões de ênfase, de o sujeito ser pleonástico:</p><p>Todos esses que aí estão</p><p>Atravancando meu caminho,</p><p>Eles passarão...</p><p>Eu passarinho!</p><p>(Mário Quintana)</p><p>• Indeterminado: ocorre quando não se quer ou não se pode</p><p>explicitar o sujeito. Ocorre de duas maneiras:</p><p>a) Quando há verbo na terceira pessoa do plural, sem referência a</p><p>um termo explícito presente no texto.</p><p>Falaram mal de você lá fora.</p><p>Se, depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biografia,</p><p>Não há nada mais simples.</p><p>Tem só duas datas — a da minha nascença e a da minha morte.</p><p>10</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Entre uma e outra coisa todos os dias são meus.</p><p>(Fernando Pessoa como Alberto Caeiro)</p><p>Observação: Se o texto der clara referência, não se tratará de</p><p>sujeito indeterminado.</p><p>Exemplo: Todos os palestrantes chegaram no horário. Esperaram</p><p>apenas 5 minutos e logo começaram a palestra.</p><p>Nesse caso, os verbos sublinhados têm sujeito elíptico (todos os</p><p>palestrantes).</p><p>b) Verbo (de ligação, intransitivo, transitivo direto seguido de</p><p>preposição ou transitivo indireto) na terceira pessoa do singular + índice</p><p>de indeterminação do sujeito:</p><p>Pelo Tejo, vai-se para o Mundo. (Fernando Pessoa)</p><p>Lá em casa, sempre se falou muito alto.</p><p>Observações:</p><p>1) Quando se usa um pronome indefinido como sujeito, não</p><p>se pode dizer que há sujeito indeterminado. Embora a ideia seja de</p><p>indeterminação, o sujeito está escrito. Não se pode esquecer de que a</p><p>análise sintática se fundamenta na sintaxe. Exemplo:</p><p>Ninguém me perguntou nada.</p><p>Tudo era apenas uma brincadeira e foi crescendo, crescendo,</p><p>me absorvendo... (Peninha)</p><p>2) É muito comum, na linguagem coloquial, trabalhar-se com a</p><p>11</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>ideia de indefinição do sujeito:</p><p>A morte é sempre um enigma. Você, quando se depara com a morte,</p><p>provavelmente nem sabe que se trata dela. Aí você embarca sem saber</p><p>quem está levando você nem para onde você vai.</p><p>A gente é muito engraçado, né? Adora ser paparicado, mas tem a</p><p>maior dificuldade para servir.</p><p>Note como, nos exemplos acima, “você” e “a gente” referem-se a um</p><p>sujeito psicologicamente indeterminado. Sintaticamente, no entanto, são</p><p>sujeitos simples determinados.</p><p>Oração sem sujeito</p><p>Algumas construções específicas se apresentam sem sujeito, o que</p><p>ocorre na presença dos chamados verbos impessoais. Não havendo sujeito,</p><p>não há razão para se flexionar o verbo para o plural. Seguem os principais</p><p>casos de oração sem sujeito:</p><p>a) “Haver” no sentido de existir, ocorrer e acontecer:</p><p>Houve muitos boatos sobre o sumiço da garota.</p><p>Haverá dias de paz nesta casa?</p><p>Havia cochichos por todo lado.</p><p>Observação 1: Nas locuções verbais, essa impessoalidade é transferida</p><p>ao verbo auxiliar:</p><p>Pode haver manifestações contra o aborto na Paulista hoje.</p><p>Deve haver festas organizadas pela Prefeitura nos próximos dias.</p><p>Creio que, depois do derradeiro sono, há de haver trevas e luzes.</p><p>12</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Observação 2: Os verbos “existir”, “ocorrer” e “acontecer” são pessoais</p><p>e se flexionam normalmente, inclusive quando compõem locuções verbais:</p><p>Aconteceram fenômenos naturais não explicados aqui nesta terra.</p><p>Devem ocorrer festas organizadas pela Prefeitura nos próximos dias.</p><p>Creio que, depois do derradeiro sono, hão de existir trevas e luzes.</p><p>Observação 3: O emprego do verbo “ter” no sentido de “haver” é</p><p>informal. Nesse caso, mantém-se a impessoalidade: Terá dias de paz nesta</p><p>casa? Tinha cochichos por todo lado.</p><p>b) “Fazer” indicando tempo ou aspectos naturais. Nesse caso, assim</p><p>como no anterior, a impessoalidade se transmite à locução verbal, quando</p><p>houver:</p><p>Faz seis anos que não nos vemos.</p><p>Nesta cidade fez verões intensos nas últimas décadas.</p><p>Vai fazer verões intensos nos próximos anos.</p><p>c) Verbos que indicam fenômenos da natureza.</p><p>Choveu, ventou, relampejou e nevou ontem perto da costa.</p><p>Amanheceu um pouco mais tarde hoje.</p><p>Observação: Caso esses verbos sejam empregados em sentido</p><p>figurado, terão sujeito normalmente. Exemplos: Choveram elogios ao</p><p>cantor. Meu sorriso amanheceu feliz por saber que meu marido chegaria</p><p>logo. Nos casos anteriores, “elogios” e “meu sorriso” são sujeitos. Não se trata</p><p>de orações sem sujeito, portanto.</p><p>13</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Atenção especial merece o verbo “ser”. Mesmo sendo impessoal quando</p><p>indica hora, data, e distância, ele se flexiona:</p><p>São seis da manhã.</p><p>Daqui até lá são seis quilômetros.</p><p>Amanhã já são trinta de março.</p><p>2) Predicado</p><p>É a declaração que se faz sobre o sujeito (quando há sujeito). Sempre</p><p>apresenta um verbo (ou locução verbal). Veja:</p><p>“Sou o vosso verdadeiro pai.” (Machado de Assis, A Igreja do Diabo)</p><p>“A misantropia pode tomar aspecto de caridade.” (Machado de Assis,</p><p>A Igreja do Diabo)</p><p>“Todas as formas de respeito foram condenadas por ele.” (Machado de</p><p>Assis, A Igreja do Diabo)</p><p>Esperavam os professores que o salário aumentasse.</p><p>Para que se possa classificar o predicado, é preciso compreender melhor</p><p>os termos que o compõem. Passemos a eles.</p><p>3) Verbo de ligação e predicativo do sujeito</p><p>Verbo de ligação é aquele que serve para relacionar o sujeito com seu</p><p>predicativo. São tidos como “vazios” pela gramática tradicional. Os principais</p><p>são: ser, estar, permanecer, ficar, continuar, tornar-se, transformar-se, parecer.</p><p>Predicativo do sujeito, por sua vez, é um termo que expressa qualidade,</p><p>estado</p><p>ou condição do sujeito. Trata-se, portanto, de um atributo. Seu núcleo</p><p>14</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>pode ser um adjetivo, um substantivo, um numeral, um pronome ou uma</p><p>palavra substantivada. Análise:</p><p>A padaria é meu lugar favorito.</p><p>Você parece faminta.</p><p>Fátima ficou arrepiada com a notícia.</p><p>Sua aula foi dez.</p><p>“É”, “parece”, “ficou” e “foi” são verbos de ligação. “Meu lugar favorito”,</p><p>“faminta”, “arrepiada com a notícia” e “dez” são predicativos do sujeito.</p><p>Como o verbo de ligação é apenas relacional, diz-se que o predicado,</p><p>nesses casos, não é verbal, mas, sim, nominal, pois o termo mais importante</p><p>é o predicativo. O verbo, como se disse, é vazio.</p><p>“É meu lugar favorito”, “parece faminta”, “ficou arrepiada com</p><p>a notícia” e “foi dez” são, portanto, predicados nominais, e o núcleo do</p><p>predicado, nesses quatro casos, é o predicativo do sujeito.</p><p>Ressalta-se que o predicativo do sujeito pode aparecer sem que haja</p><p>um verbo de ligação. Não é raro que figurem ao lado de verbos de ação:</p><p>Ele e eu assistimos ao filme esperançosos. (“Assistir” é verbo de ação;</p><p>“esperançosos” é predicativo do sujeito “ele e eu”.)</p><p>“Sozinho, no cais deserto, a esta manhã de Verão,</p><p>Olho pro lado da barra, olho pro Indefinido” (Fernando Pessoa)</p><p>(“Olho” é verbo de ação; “sozinho” é predicativo do sujeito elíptico</p><p>“eu”.)</p><p>15</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>A mãe dos adolescentes caminhou ansiosa pela praia. (“Caminhar” é</p><p>verbo de ação; “ansiosa” é predicativo do sujeito “A mãe dos adolescentes”.)</p><p>4) Verbo intransitivo</p><p>Verbo intransitivo é aquele que, dentro do contexto, não exige um</p><p>complemento. Análise:</p><p>José Rodolfo morreu ontem pela manhã.</p><p>Os bailarinos dançaram mesmo sem música.</p><p>Cheirou a comida feita por ele.</p><p>Perceba como os verbos até podem ser acompanhados por adjuntos</p><p>adverbiais (que expressam circunstância), mas não pedem complemento.</p><p>Tradicionalmente, considera-se que os verbos indicadores de</p><p>deslocamento ou moradia são intransitivos, pois são acompanhados de</p><p>adjunto adverbial de lugar. Essa costuma ser uma dúvida muito comum,</p><p>pois o adjunto adverbial de lugar pode facilmente se confundir com um</p><p>complemento verbal. Veja:</p><p>“Moro num país tropical.”</p><p>Voltamos ao lugar de origem.</p><p>Note que, acima, a pergunta que se faz é “onde?” (ou “aonde?”), não “o</p><p>quê?”, de maneira que os termos “num país tropical” e “ao lugar de origem”</p><p>expressam circunstância de lugar, não se tratando, portanto, de objeto.</p><p>Nos exemplos anteriores, não há verbo de ligação nem predicativo, e o</p><p>núcleo do predicado são verbos que expressam ação (morar e voltar). Assim,</p><p>em ambos os casos, temos predicados verbais.</p><p>16</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>5) Verbo transitivo direto e objeto direto</p><p>Verbo transitivo direto é aquele que, dentro do contexto, exige um</p><p>complemento sem preposição obrigatória. A esse complemento dá-se o nome</p><p>de objeto direto.</p><p>Finalmente, recuperei minha saúde. (Recuperei – VTD; minha saúde –</p><p>OD)</p><p>Chocolate nós só comemos aos finais de semana. (Comemos – VTD;</p><p>chocolate – OD)</p><p>Note que poderíamos substituir o objeto por um pronome, o qual</p><p>continuaria exercendo função de objeto. Veja: Finalmente, recuperei minha</p><p>saúde – Finalmente, recuperei-a. (Recuperei – VTD, a – OD)</p><p>Nos exemplos anteriores, não há predicativo nem verbos de ligação. Os</p><p>verbos empregados são de ação (recuperar e comer), de maneira que falamos</p><p>em predicado verbal.</p><p>6) Verbo transitivo indireto e objeto indireto</p><p>É aquele que exige um complemento com preposição obrigatória. A</p><p>esse complemento dá-se o nome de objeto indireto.</p><p>Concordo com meus pais a respeito da viagem. (Concordo – VTI; com</p><p>meus pais – OI)</p><p>Ele acreditou em minhas palavras. (Acreditou – VTI; em minhas palavras</p><p>– OI)</p><p>É raro, mas pode acontecer de um verbo ter dois objetos indiretos.</p><p>Exemplo: Contribua com suas aulas para nosso projeto de caridade. A esses</p><p>verbos, dá-se o nome de birrelativos.</p><p>17</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Nos exemplos anteriores, não há verbo de ligação nem predicativo.</p><p>Os verbos presentes são de ação (concordar e acreditar), de maneira que o</p><p>predicado é, portanto, verbal.</p><p>7) Verbo transitivo direto e indireto</p><p>Verbo transitivo direto e indireto – também chamado de bitransitivo – é</p><p>aquele que exige tanto complemento com preposição (objeto indireto) como</p><p>complemento sem preposição (objeto direto).</p><p>Assinei o jornal para você. (Assinei – VTDI; o jornal – OD, para você – OI)</p><p>Comunicamos o falecimento do diretor ao time. (Comunicamos – VTDI;</p><p>o falecimento do diretor – OD; ao time – OI)</p><p>Meus pais compraram um carro para meu irmão. (Compraram – VTDI;</p><p>um carro – VTD; para meu irmão – VTI)</p><p>Nos exemplos anteriores, não há verbo de ligação nem predicativo. Os</p><p>verbos apresentados não são vazios de sentido (assinar, comunicar, comprar).</p><p>Os predicados são, portanto, verbais.</p><p>Observações sobre objetos:</p><p>a) Pronomes podem funcionar como objetos tranquilamente:</p><p>Por que ele me expulsou da reunião? (me – OD)</p><p>Levei-os ao show no ano passado. (os – OD)</p><p>Fiz-lhe uma sobremesa deliciosa. (lhe - OI)</p><p>Eu te tenho como amigo. (te – OD, como amigo – PO)</p><p>b) O objeto direto eventualmente pode aparecer preposicionado. Nesse</p><p>18</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>caso, não é o verbo que pede a preposição, mas ela aparece por algum motivo</p><p>relacionado a clareza ou a ênfase. Vejamos alguns casos:</p><p>Não convidei a ele. (a ele – OD preposicionado)</p><p>Convidei o palestrante a quem admiro. (a quem – OD preposicionado)</p><p>Amar a Deus sobre todas as coisas. (a Deus – OD preposicionado)</p><p>Façamos com que nossos filhos sejam fortes. (com que nossos filhos</p><p>sejam fortes – OD preposicionado)</p><p>Comemos do mesmo pão e bebemos do mesmo vinho. (do mesmo pão</p><p>e do mesmo vinho – ODs preposicionados)</p><p>c) Chama-se objeto direto pleonástico o pronome oblíquo átono que</p><p>retoma um objeto direto já apresentado no começo da oração:</p><p>Essas aulas, fi-las durante o fim de semana.</p><p>“Essas dificuldades, nós as temos. Mas não falei do encantamento de</p><p>lidar com uma língua que não foi aprofundada. O que recebi de herança não me</p><p>chega. Se eu fosse muda e também não pudesse escrever, e me perguntassem</p><p>a que língua eu queria pertencer, eu diria: inglês, que é preciso e belo.” (Clarice</p><p>Lispector)</p><p>Tudo o que ele construiu, quem o lembra?</p><p>A mim me parece inadequado esse comportamento.</p><p>d) Chama-se objeto direto interno aquele que aparece com uma palavra</p><p>cognada ou pertencente ao mesmo campo semântico do verbo.</p><p>Ele chorou um choro de gratidão.</p><p>“E sorria um sorriso pontual” (Chico Buarque)</p><p>Cochilei um sono dos justos hoje.</p><p>19</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>8) Predicativo do objeto</p><p>Aparece nas construções em que um dos núcleos é um verbo transitivo</p><p>(direto ou indireto). O predicativo do objeto refere-se ao complemento desse</p><p>verbo e não faz parte desse complemento. Muitas vezes (nem sempre), trata-se</p><p>de uma condição imposta ao objeto pelo sujeito.</p><p>Um bom jeito de se verificar a presença do predicativo do objeto é</p><p>substituir o objeto por um pronome. Se o predicativo não “entrar” no pronome</p><p>e ficar de fora, trata-se efetivamente de um predicativo do objeto. Veja:</p><p>O sacerdote julgou o momento inadequado. (O sacerdote julgou-o</p><p>inadequado. Julgou - VTD; o momento – OD; inadequado – PO. Note que</p><p>“inadequado” é uma percepção do sujeito a respeito do objeto.)</p><p>Preciso dos meus irmãos sãos e salvos. (Preciso deles sãos e salvos. Preciso</p><p>– VTI; dos meus irmãos – OI; sãos e salvos – PO. Note que “sãos e salvos” é uma</p><p>necessidade do sujeito quanto ao objeto.)</p><p>“Génio? Neste momento</p><p>Cem mil cérebros se concebem em sonho</p><p>génios” (Fernando Pessoa)</p><p>(Concebem – VTD; se – OD; génios – PO)</p><p>O bom líder faz forte sua equipe. (O bom líder a faz forte. Faz – VTD; sua</p><p>equipe – OD; forte – PO. Note que “forte” é uma mudança imposta pelo sujeito</p><p>ao objeto.)</p><p>Os concurseiros consideraram a prova razoavelmente difícil. (Os</p><p>consurseiros consideraram-na razoavelmente difícil. (consideraram - VTD; a</p><p>prova – OD; razoavelmente difícil – PO. Note que “razoavelmente difícil” é uma</p><p>percepção do sujeito sobre o objeto.)</p><p>20</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Nos casos anteriores, há tanto verbos de ação (julgar, precisar,</p><p>conceber, fazer e considerar) como predicativos do objeto (inadequado, sãos</p><p>e salvos, génios, forte, razoavelmente difícil). Nesse caso, dizemos tratar-se de</p><p>predicado verbo-nominal. Aliás, vale anotar: sempre que há um predicativo do</p><p>objeto, o predicado é verbo-nominal.</p><p>9) Complemento nominal</p><p>Trata-se de um termo que complementa o sentido de um substantivo,</p><p>adjetivo ou advérbio transitivo (ou seja, que pede complemento). O</p><p>complemento nominal vem sempre preposicionado e compõe outro termo</p><p>sintático.</p><p>Temos medo de seu retorno. (de seu retorno – CN de “medo”)</p><p>A luta contra nossos vícios exige esforço diário. (contra nossos vícios –</p><p>CN de “luta”)</p><p>Farei as malas, independentemente de sua opinião. (de sua opinião –</p><p>CN de “independentemente”)</p><p>Esse comportamento não é favorável à sua imagem. (à sua imagem –</p><p>CN de “favorável”)</p><p>Estou certo de nossa vitória. (de nossa vitória – CN de “certo”)</p><p>Pronomes oblíquos podem funcionar como complementos nominais.</p><p>Veja:</p><p>A campanha foi útil a mim. A campanha foi-me útil. (“a mim” e “me”</p><p>complementam o sentido do adjetivo “útil”).</p><p>10) Agente da passiva</p><p>21</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Relembre o que é voz passiva: são aquelas construções em que o verbo</p><p>de ação indica que o sujeito sofre a ação verbal. Nesses casos, o sujeito se</p><p>chama paciente e o praticante da ação, quando aparece, se chama agente da</p><p>passiva. Veja:</p><p>A escultura foi revestida de um veludo verde.</p><p>Note como a estrutura está na voz passiva analítica: o sujeito “as</p><p>escultura” sofre a ação verbal. Nesse caso, “foi revestida” é locução verbal e</p><p>“de um veludo verde” é agente da passiva justamente porque pratica a ação</p><p>dentro da voz passiva.</p><p>Passando para a voz ativa, teríamos:</p><p>Um veludo verde revestiu a escultura.</p><p>Veja como, passando da passiva para a ativa, o agente da passiva vira</p><p>sujeito e o sujeito vira objeto direto.</p><p>Mais exemplos:</p><p>Estão proibidas pela diretoria as transações com bitcoins.</p><p>Estive rodeado por/de fãs por toda a noite.</p><p>“Ao mesmo tempo que imaginário, era um mundo de se comer com os</p><p>dentes, um mundo de volumosas dálias e tulipas. Os troncos eram percorridos</p><p>por parasitas folhudas, o abraço era macio, colado.” (Clarice Lispector)</p><p>Observação: Pode ocorrer de o agente da passiva não aparecer. Nesse</p><p>caso, o praticante da ação é oculto. Note a diferença:</p><p>A cidade foi arruinada. (Na ativa: Arruinaram a cidade – sujeito</p><p>indeterminado)</p><p>22</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>A cidade foi arruinada pelos bárbaros. (Na ativa – Os bárbaros arruinaram</p><p>a cidade – sujeito simples)</p><p>11) Adjunto adnominal</p><p>Trata-se de um termo que caracteriza um núcleo nominal, restringindo-o</p><p>ou determinando-o. O adjunto adnominal sempre faz parte da mesma função</p><p>do núcleo ao qual ele se refere. Analise:</p><p>Os meus dois irmãos mais novos moram na mesma cidade.</p><p>Na frase anterior, o sujeito é “Os meus dois irmãos mais novos”. O núcleo</p><p>é “irmãos”; os demais termos são adjuntos adnominais. “Na mesma cidade” é</p><p>adjunto adverbial, cujo núcleo é “cidade”; o pronome “mesma” e o artigo “a”</p><p>(presente em “na”) são adjuntos adnominais.</p><p>Chamamos as trinta primeiras sorteadas do dia.</p><p>Na frase anterior, “chamamos” é verbo transitivo direto; “as trinta</p><p>primeiras sorteadas do dia” é objeto direto, cujo núcleo é “sorteadas”. Os demais</p><p>elementos do objeto são adjuntos adnominais.</p><p>“tenho em mim todos os sonhos do mundo.” (Fernando Pessoa)</p><p>Na frase anterior, o verbo “ter” é transitivo direto; “todos os sonhos do</p><p>mundo” é objeto direto. O núcleo do objeto direto é “sonhos”. As demais palavras</p><p>do objeto direto (sublinhadas na frase) são adjuntos adnominais do núcleo</p><p>“sonho”.</p><p>“Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.” (Fernando</p><p>Pessoa)</p><p>23</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Na frase anterior, “todos os meus conhecidos” é sujeito da locução “têm</p><p>sido”. O núcleo do sujeito é “conhecidos”. As demais palavras do sujeito são</p><p>adjuntos adnominais. “Campeões em tudo” é predicativo do sujeito. O núcleo</p><p>do predicativo é “campeões”; “em tudo” é complemento nominal (“em tudo”</p><p>complementa “campeões”, pois quem é campeão é campeão em algo).</p><p>Observação importante: É fundamental ressaltar como muitas vezes o</p><p>contexto é importante para a percepção da diferença entre adjunto adnominal</p><p>e predicativo. Por exemplo:</p><p>Encontrei as vítimas mortas.</p><p>Se o sujeito já sabia que as vítimas estavam mortas, “mortas” é um</p><p>adjunto adnominal (encontrei-as). Se ele não sabia, “mortas” é um predicativo</p><p>do objeto (encontrei-as mortas).</p><p>Note, portanto, que o adjunto adnominal denota o máximo de aderência</p><p>do nome ao adjetivo, ao passo que o predicativo dissocia fortemente a qualidade</p><p>para colocá-la em relevo.</p><p>Outra observação importante: Diferenciar adjunto adnominal de</p><p>complemento nominal não é difícil. Quando eles parecem se confundir, basta</p><p>observar o seguinte: o complemento nominal tem caráter paciente, ao passo</p><p>que o adjunto adnominal tem caráter agente. Veja:</p><p>Todos repudiaram a atitude da secretária. (da secretária = adjunto</p><p>adnominal. Ela pratica a atitude.)</p><p>Todos repudiaram a morte da secretária. (da secretária = complemento</p><p>nominal. Ela sofreu a morte.)</p><p>Note que, não raramente, a frase é ambígua, deixando impossível</p><p>perceber se se trata de complemento ou adjunto:</p><p>24</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>A escolha dos alunos foi certeira. (Os alunos escolheram algo ou foram</p><p>escolhidos? No primeiro caso, adjunto adnominal; no segundo, complemento</p><p>nominal.)</p><p>12) Adjunto adnominal</p><p>Termo da oração formado por uma ou mais palavras, responsável por</p><p>exercer a mesma função de um advérbio.</p><p>Sem sentimento nenhum, olhei a cena. (ADV de modo)</p><p>Venho de uma terra distante. (ADV de lugar)</p><p>O evento ocorreu no último dia 2. (ADV de tempo)</p><p>Irei de carro. (ADV de meio)</p><p>Fizemos a reunião, embora com atraso. (ADV de concessão)</p><p>Realizaste o plano conforme a lei? (ADV de conformidade)</p><p>Falemos acerca deste problema. (ADV de assunto)</p><p>A mulher padeceu de frio. (ADV de causa)</p><p>13) Aposto</p><p>Trata-se de um termo substantivo (ou equivalente) que esclarece,</p><p>especifica ou caracteriza um núcleo também substantivo ao qual se refere</p><p>(chamado fundamental). O aposto e o fundamental designam sempre o mesmo</p><p>ser, ideia, objeto ou fato e, por isso, equivalem-se. Assim, um pode substituir o</p><p>outro.</p><p>“A vida, essa coisa enorme, é que prende tudo e tudo une.” (Fernando</p><p>Pessoa) – aposto explicativo</p><p>Ele é Pedro, meu amigo de infância. – aposto explicativo</p><p>25</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Começou o mês de maio. – aposto restritivo</p><p>Meu cachorro Bono fugiu de casa. – aposto restritivo ou especificativo</p><p>“Nós nunca nos realizamos.</p><p>Somos dois abismos – um poço fitando o céu.” (Fernando Pessoa) –</p><p>aposto oracional</p><p>Serão todos bem-vindos: alunos, professores, diretores e monitores. –</p><p>aposto enumerativo</p><p>Foram feitas grandes descobertas – por exemplo: a energia elétrica e</p><p>o aquecimento solar. – aposto enumerativo</p><p>Pasta de dente, escova de dente, algodão, absorvente, tudo</p><p>serviu para</p><p>ajudarmos as famílias carentes. – aposto recapitulativo ou resumitivo</p><p>Para uma alma se converter por meio de um sermão, há-de haver três</p><p>concursos: há-de concorrer o pregador com a doutrina, persuadindo; há-de</p><p>concorrer o ouvinte com o entendimento, percebendo; há-de concorrer Deus</p><p>com a graça, alumiando. (Pe. Antônio Vieira) – aposto enumerativo</p><p>Foi decretado feriado, o que nos deixou indignados. – aposto oracional</p><p>“Eu, filho do carbono e do amoníaco,</p><p>Monstro de escuridão e rutilância,</p><p>Sofro, desde a epigênese da infância,</p><p>A influência má dos signos do zodíaco.” – aposto explicativo (Augusto</p><p>dos Anjos)</p><p>14) Vocativo</p><p>Do latim vocativus (vocare = chamar) é o chamamemtno, a invocação,</p><p>a interpelação do ser com quem se fala (2ª pessoa do discurso).</p><p>Esse termo pode-se deslocar pela oração e é quase sempre marcado</p><p>por vírgula (eventualmente por exclamação, interrogação ou reticências).</p><p>26</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>“Ó mar salgado, quanto de teu sal são lágrimas de Portugal?” (Fernando</p><p>Pessoa)</p><p>Deus, tende piedade de nós.</p><p>É verdade, Carla, tudo aquilo que disseram?</p><p>Ora, meu povo, quando vamos todos nos ver?</p><p>Bom dia, senhora, tudo bem?</p><p>Oi, alunos. Vamos começar?</p><p>Por fim, vale dizer que, tradicionalmente, os termos da oração se classificam</p><p>assim:</p><p>Essenciais: sujeito e predicado</p><p>Integrantes: objetos direto e indireto, complemento nominal e agente da</p><p>passiva</p><p>Acessórios: adjunto adverbial, adjunto adnominal, aposto</p><p>O vocativo não entra na classificação anterior.</p><p>Apenas a título de curiosidade: o predicativo do sujeito, quando está num</p><p>predicado nominal, é um termo essencial. Quando faz parte de um predicado</p><p>verbo-nominal, é um termo acessório. O predicativo do objeto, por sua vez, é tido</p><p>como um termo integrante. Grande parte dos autores, no entanto, nem sequer</p><p>faz essas menções.</p><p>27</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>ESTUDO DAS ORAÇÕES</p><p>AULA 14</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Estudo das orações</p><p>Nas últimas aulas, estudamos os termos da oração, ou seja, analisamos</p><p>internamente que elementos sintáticos podem compô-la. Lembrando que,</p><p>quando a oração está sozinha dentro do período, chamamo-la de absoluta;</p><p>o período que só contém uma oração, chamamo-lo de período simples.</p><p>A partir de agora, analisaremos a relação entre as orações: entre si,</p><p>elas podem ser coordenadas ou subordinadas.</p><p>Coordenação e Subordinação</p><p>Termos sintáticos coordenados são aqueles que se colocam lado a</p><p>lado, desempenhando a mesma função.</p><p>Veja: (A melhor maneira de viajar é sentir)</p><p>“Ocupa de toda a tua força e de todo o teu poder quente</p><p>Meu coração a ti aberto!”</p><p>(Fernando Pessoa)</p><p>“[...]sou um globo</p><p>De chamas explosivas buscando Deus e queimando</p><p>A crosta dos meus sentidos, o muro da minha lógica,</p><p>A minha inteligência limitadora e gelada.”</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Note como, no primeiro exemplo, os adjuntos adverbiais</p><p>encontram-se lado a lado, desempenhando ambos a mesma função</p><p>(adjunto adverbial de modo).</p><p>No segundo exemplo, há várias coordenações: entre as orações</p><p>reduzidas de gerúndio (buscando Deus e queimando...), entre os</p><p>complementos de “queimando” (a crosta dos meus sentidos, o muro da</p><p>minha lógica, a minha inteligência limitadora e gelada) e entre os dois</p><p>adjuntos adnominais de “inteligência” (limitadora e gelada).</p><p>O mesmo raciocínio se aplica às orações. São coordenadas entre si as</p><p>orações que, estando no mesmo período, são sintaticamente independentes</p><p>entre si. Em outras palavras: uma oração fica simplesmente ao lado da outra,</p><p>sem que nenhuma exerça função sintática sobre a outra.</p><p>Veja:</p><p>“E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite</p><p>esfriou, e agora José?”</p><p>(Carlos Drummond de Andrade)</p><p>As orações “A festa acabou”, “a luz apagou”, “o povo sumiu” e “a noite</p><p>esfriou” são colocadas lado a lado (ao que se dá o nome de justaposição),</p><p>sem que uma exerça função sintática sobre a outra. Como não apresentam</p><p>conectivo entre si, dizemos que são assindéticas (síndeto = conjunção, logo</p><p>“assindéticas” significa “sem conjunção”).</p><p>“E agora, José” não é uma oração, pois não apresenta verbo.</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Mais um exemplo:</p><p>“Eu canto porque o instante existe</p><p>e a minha vida está completa.</p><p>Não sou alegre nem sou triste:</p><p>sou poeta.”</p><p>(Cecília Meireles)</p><p>As duas últimas orações são coordenadas entre si. No entanto, perceba</p><p>como se trata de uma independência apenas sintática. Semanticamente,</p><p>a oração “sou poeta” claramente serve para explicar, esclarecer a oração</p><p>anterior. Ela não explica um termo da oração anterior, mas a oração inteira.</p><p>Assim, embora sintaticamente sejam coordenadas, há certo grau de</p><p>dependência semântica.</p><p>Agora note a diferença:</p><p>Espero que meus pais venham.</p><p>No período anterior, a oração “que meus pais venham” funciona</p><p>como objeto direto do verbo “esperar”. Se ela exerce uma função sintática,</p><p>dizemos tratar-se de uma oração subordinada. A oração “espero”, por sua</p><p>vez, é chamada de principal.</p><p>São subordinadas as orações que não possuem autonomia</p><p>gramatical, isto é, aquelas que estabelecem uma relação de dependência</p><p>com a oração principal.</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Outro exemplo:</p><p>“Só é lutador quem sabe lutar consigo mesmo.”</p><p>(Carlos Drummond de Andrade)</p><p>Na frase anterior, a oração “quem sabe lutar consigo mesmo” é</p><p>sujeito do predicado “é lutador” (“só” é palavra denotativa de inclusão). Na</p><p>ordem direta, teríamos:</p><p>Só quem sabe lutar consigo mesmo é lutador.</p><p>Novamente: se a oração sublinhada exerce função sintática, logo</p><p>dizemos tratar-se de oração subordinada. “Só é lutador” é oração principal.</p><p>Orações Coordenadas</p><p>As coordenadas podem ser assindéticas (quando aparecem sem</p><p>conjunção, caso em que são chamadas de justapostas) ou sindéticas</p><p>(quando ligadas por conjunção).</p><p>As sindéticas são classificadas como: aditivas, adversativas,</p><p>alternativas, conclusivas e explicativas. Vejamos cada uma delas:</p><p>Aditivas: expressam adição, soma, e são iniciadas por conjunção</p><p>aditiva (e, nem, mas [precedido de não só]);</p><p>Adversativas: expressam oposição, adversidade, e são iniciadas</p><p>por conjunção adversativa (mas, porém, contudo, entretanto, no entanto,</p><p>todavia);</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Alternativas: expressam alternância ou exclusão, e são iniciadas por</p><p>conjunção alternativa (ou, ou...ou, ora...ora, quer...quer, seja...seja).</p><p>Conclusivas: expressam conclusão e são iniciadas por conjunção</p><p>conclusiva (logo, portanto, por isso, pois [após o verbo], por conseguinte).</p><p>Explicativas: expressam explicação, justificativa, e são iniciadas por</p><p>conjunção explicativa (porque, pois, porquanto, que).</p><p>Vejamos alguns exemplos:</p><p>“Quero vivê-lo em cada vão momento</p><p>E em louvor hei de espalhar meu canto</p><p>E rir meu riso e derramar meu pranto</p><p>Ao seu pesar ou seu contentamento.”</p><p>As orações sublinhadas são coordenadas sindéticas adversativas. A</p><p>primeira oração é coordenada assindética.</p><p>Observação: Havendo sujeitos diferentes, vários são os autores que</p><p>defendem o emprego da vírgula antes da conjunção “e”, veja:</p><p>“Os adjetivos passam, e os substantivos ficam.” (Machado de Assis,</p><p>Balas de Estalo)</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>“Afinal, a melhor maneira de viajar é sentir.</p><p>Sentir tudo de todas as maneiras.</p><p>Sentir tudo excessivamente</p><p>Porque todas as coisas são, em verdade excessivas</p><p>E toda a realidade é um excesso, uma violência,</p><p>Uma alucinação extraordinariamente nítida [...]”</p><p>(Fernando</p><p>Pessoa)</p><p>A primeira oração sublinhada é coordenada sindética explicativa. A</p><p>segunda é coordenada sindética aditiva.</p><p>“Tende piedade, Senhor, de todas as mulheres</p><p>Que ninguém mais merece tanto amor e amizade</p><p>Que ninguém mais deseja tanto poesia e sinceridade</p><p>Que ninguém mais precisa tanto de alegria e serenidade.”</p><p>(Vinicius de Moraes)</p><p>As orações sublinhadas são coordenadas sindéticas explicativas.</p><p>A primeira da estrofe é coordenada assindética.</p><p>Ora nos movíamos com lentidão, ora caminhávamos com presteza.</p><p>As duas orações são coordenadas sindéticas alternativas.</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Os ônibus estavam lotados, por isso me atrasei tanto.</p><p>A oração sublinhada é coordenada sindética conclusiva. A primeira</p><p>é coordenada assindética.</p><p>Foi preciso não só fazer esforço, mas também desenvolver uma</p><p>técnica para carregar o piano.</p><p>A primeira oração é coordenada assindética. A segunda é</p><p>coordenada sindética aditiva.</p><p>Paralelismos semântico e sintático</p><p>“A ideias similares deve corresponder forma verbal similar. Isso é</p><p>o que se costuma chamar paralelismo ou simetria de construção. Trata-se</p><p>de uma diretriz, mas diretriz extremamente eficaz, que muitas vezes</p><p>saneia a frase, evitando construções incorretas, algumas, inadequadas,</p><p>outras.” (Othon Garcia)</p><p>Um bom texto, de maneira geral, é marcado por estruturas paralelas,</p><p>ou seja, construções regulares, correspondentes, tanto do ponto de vista</p><p>sintático como do semântico. Analise:</p><p>“A troca de algumas peças do armário, ou na forma como você</p><p>organiza suas roupas, pode fazer com que a possibilidade de combinações</p><p>aumente bastante.”</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Estão-se comparando dois elementos de natureza diferente (peças</p><p>e forma), rompendo o que se chama de paralelismo semântico; ademais,</p><p>a comparação é, por si mesma, estranha, pois se inicia com preposições</p><p>diferentes (de e em). A essa ruptura da estrutura textual, dá-se o nome de</p><p>quebra do paralelismo sintático.</p><p>Reescrita:</p><p>“A troca de algumas peças do armário ou a mudança na</p><p>organização das roupas pode fazer com que sua possibilidade de</p><p>combinações aumente bastante.”</p><p>Note como, agora, comparam-se dois substantivos abstratos (troca</p><p>e mudança).</p><p>Outra possibilidade:</p><p>“Trocar algumas peças do armário ou mudar a organização das</p><p>roupas pode fazer com que sua possibilidade de combinações aumente</p><p>bastante.”</p><p>Aqui, coordenam-se dois verbos no infinitivo: trocar e mudar.</p><p>Analise:</p><p>“O aumento do dólar resulta das incertezas relativas à estabilidade</p><p>política do país, como também das recentes declarações do Presidente.”</p><p>10</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>No caso anterior, nota-se haver ruptura da coesão estrutural: usa-se</p><p>“como também” sem antes empregar a outra parte da locução conjuntiva</p><p>(não só...como também). Novamente, quebra do paralelismo sintático.</p><p>Corrigindo:</p><p>“O aumento do dólar resulta não só das incertezas relativas à</p><p>estabilidade política do país, como também das recentes declarações do</p><p>Presidente.”</p><p>Vejamos mais alguns exemplos com quebra de paralelismo tanto</p><p>semântico como sintático:</p><p>Como o curso de oratória vai me ajudar?</p><p>Você vai descobrir como e por onde começar da forma correta.</p><p>Os segredos para demonstrar suas ideias com clareza, objetividade;</p><p>Como ser mais convincente, ter maior capacidade persuasiva;</p><p>Habilidades que melhoram a sua postura profissional e te tornam</p><p>uma autoridade respeitada.</p><p>Como apresentar mais segurança ao ser questionado por</p><p>clientes/colegas.</p><p>Como ser mais produtivo, imprimindo velocidade na explicação</p><p>de suas ideias.</p><p>Reescrita, uniformizando-se especialmente o início dos tópicos:</p><p>11</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Como o curso de oratória vai me ajudar?</p><p>Você descobrirá:</p><p>Como e por onde começar da forma correta;</p><p>Quais são os segredos para demonstrar suas ideias com clareza</p><p>e objetividade;</p><p>Como ser mais convincente e ter maior capacidade persuasiva;</p><p>Quais habilidades desenvolver para que sua postura profissional</p><p>transmita autoridade;</p><p>Como apresentar mais segurança ao ser questionado por</p><p>clientes/colegas;</p><p>Como explicar melhor suas ideias.</p><p>“As atividades favoritas de meus filhos são equitação, natação e</p><p>fazer escalada.”</p><p>Reescrevendo:</p><p>“As atividades favoritas de meus filhos são equitação, natação e</p><p>escalada.”</p><p>“Existe uma enorme diferença entre candidatos e vagas</p><p>disponíveis no mercado.”</p><p>12</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Reescrevendo:</p><p>“Existe uma enorme diferença entre a quantidade de candidatos e</p><p>a de vagas disponíveis no mercado.”</p><p>“É plenamente possível exercitar-se todos os dias, seja na academia,</p><p>ou em parques.”</p><p>Reescrevendo: É plenamente possível exercitar-se todos os dias, seja</p><p>na academia, seja em parques.</p><p>“De um lado, a economia mostra melhoras. Além disso, ainda não</p><p>reconquistou investidores alemães.”</p><p>Reescrevendo: “De um lado, a economia mostra melhoras; de outro,</p><p>ainda não reconquistou investidores alemães.”</p><p>“A seleção brasileira enfrentará a Alemanha na semifinal.”</p><p>Reescrevendo:</p><p>“A seleção brasileira enfrentará a alemã na semifinal.”</p><p>Ou ainda:</p><p>“O Brasil enfrentará a Alemanha na semifinal.”</p><p>Observação: Quando dois ou mais elementos estão coordenados e o</p><p>primeiro está introduzido por preposição, pode ocorrer o seguinte:</p><p>Temos direito a suco e refrigerante.</p><p>Temos direito a suco e a refrigerante.</p><p>Temos direito ao suco e ao refrigerante.</p><p>Temos direito ao suco e refrigerante.</p><p>13</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Por fim, convém dizer que a quebra de paralelismo pode ser um</p><p>recurso de estilo muito bem-vindo, quando ocorre intencionalmente e de</p><p>forma bem construída:</p><p>“Ou a mulher é fria ou morde. Sem dentada não há amor possível.”</p><p>(Nelson Rodrigues)</p><p>“Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis.”</p><p>(Machado de Assis, em Memórias Póstumas de Brás Cubas)</p><p>14</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Como já se disse anteriormente, a coordenação trabalha com</p><p>estruturas de função ou valor sintático equivalente, a subordinação</p><p>estabelece relação de dependência entre tais funções.</p><p>As subordinadas podem exercer função de substantivo, adjetivo ou</p><p>advérbio, daí serem classificadas como subordinadas substantivas, adjetivas</p><p>ou adverbiais.</p><p>Orações subordinadas substantivas</p><p>Veja:</p><p>Espero nosso encontro.</p><p>Espero que eu encontre você.</p><p>Note como tanto “nosso encontro” como “que eu encontre você”</p><p>complementam o sentido do verbo “esperar”. “Nosso encontro” é um objeto</p><p>direto cujo núcleo é o substantivo “encontro”. Na segunda frase, esse termo</p><p>nominal foi substituído por uma oração, a qual chamamos de subordinada</p><p>substantiva (pois exerce função sintática própria de substantivo, como se</p><p>pôde perceber).</p><p>Assim, as orações subordinadas substantivas são aquelas que exercem</p><p>função sintática própria de substantivo em relação à oração principal.</p><p>Podem ser: subjetivas, objetivas diretas, objetivas indiretas,</p><p>completivas nominais, apositivas e predicativas do sujeito.</p><p>15</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Essa classificação segue o previsto pela Nomenclatura Gramatical</p><p>Brasileira (NGB), mas pode-se ainda dizer da existência das predicativas do</p><p>objeto, adjuntivas adnominais e agentivas, que não mencionaremos neste</p><p>material.</p><p>As orações subordinadas substantivas são geralmente introduzidas</p><p>por conjunções subordinativas integrantes (que e se), mas podem, ainda,</p><p>ser introduzidas por pronomes de interrogação (que, qual, quem, quanto),</p><p>pronomes indefinidos (quem, quanto), advérbios</p><p>de interrogação (onde,</p><p>quando, como, por que) e advérbio de intensidade (quão).</p><p>Ressalta-se que não é preciso decorar esses conectivos que</p><p>introduzem as orações, mas entender sua função dentro delas.</p><p>Falemos sobre cada uma das classificações.</p><p>Subjetivas</p><p>Exercem função de sujeito.</p><p>Parece que os convidados se atrasarão.</p><p>Note que “que os convidados se atrasarão” é aquilo que parece;</p><p>trata-se do sujeito de “parecer”. Poder-se-ia dizer “isto parece”. O verbo</p><p>“parecer” é intransitivo. “Que” é conjunção subordinativa integrante.</p><p>Não foi dito se é preciso trocarmos de roupa agora.</p><p>16</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>“Se é preciso trocarmos de roupa agora” é o que não foi dito.</p><p>Poder-se-ia dizer “Isto não foi dito”. A construção está na voz passiva. Não</p><p>se conhece o agente da passiva, ou seja, não se sabe quem disse. “Se” é</p><p>conjunção subordinativa integrante.</p><p>“Depois, quando jovem, em Belo Horizonte, eu sentia muito a</p><p>dificuldade de aproximação com as moças. Era proibido olhar para as</p><p>mulheres.” (Última entrevista de Carlos Drummond, Folha de São Paulo)</p><p>A oração sublinhada encontra-se reduzida de infinitivo (oração</p><p>subordinada substantiva subjetiva reduzida de infinitivo). Em seu modo</p><p>desenvolvido, teríamos: Era proibido que se olhasse para as mulheres. Nesse</p><p>caso, “que” seria uma conjunção subordinativa integrante. Poder-se-ia dizer</p><p>“Era proibido isto”.</p><p>Note que, em todos os exemplos anteriores, o pronome “isto”</p><p>desempenha função de sujeito.</p><p>Objetivas diretas</p><p>Exercem função de objeto direto.</p><p>“O senhor teve uma infância feliz?” Drummond – “Não sei se pode</p><p>chamar de feliz a infância, porque há sempre aqueles traumas da falta de</p><p>entendimento com os adultos, o mistério da vida que a gente não decifra.</p><p>Eu acho que uma criança pode ser tão feliz ou tão infeliz quanto um adulto</p><p>[pode ser]”. (Última entrevista de Carlos Drummond, Folha de São Paulo)</p><p>17</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>As orações sublinhadas são objetivas diretas. A primeira completa o</p><p>sentido de “sei” e a segunda completa o sentido de “acho”. Poder-se-ia dizer</p><p>“Não sei isto” e “Eu acho isto” (sendo “isto” objeto direto). “Que” e “se” são</p><p>conjunções subordinativas integrantes. “Quanto um adulto” é uma oração</p><p>subordinada adverbial comparativa (estudaremos mais à frente).</p><p>Não vejo como o artista pode influenciar na sociedade brasileira.</p><p>(Última entrevista de Carlos Drummond, Folha de São Paulo)</p><p>A oração sublinhada é objetiva direta. “Não vejo” é a oração principal.</p><p>No caso, a objetiva direta é introduzida pelo advérbio de interrogação “como”.</p><p>Objetivas indiretas</p><p>Exercem função de objeto indireto.</p><p>Anseio por que consigamos melhores resultados.</p><p>Lembre-me de que preciso corrigir sua prova.</p><p>Nos exemplos anteriores, as orações sublinhadas completam o</p><p>sentido dos verbos “ansiar” e “lembrar-se” e são introduzidas por preposição.</p><p>Completivas nominais</p><p>Exercem função de complemento nominal.</p><p>18</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Refiro-me à esperança de que o evento não seja cancelado.</p><p>O verbo “referir-se” pede objeto indireto (à esperança de que o evento</p><p>não seja cancelado). Dentro desse objeto, o substantivo “esperança” pede</p><p>um complemento: quem tem esperança, tem esperança de algo. A oração</p><p>“de que o evento não seja cancelado” completa o sentido de “esperança”.</p><p>Trata-se, portanto, de uma oração subordinada substantiva completiva</p><p>nominal.</p><p>Veja que, assim como os complementos nominais, as orações</p><p>completivas nominais sempre integram outra função sintática. No caso, ela</p><p>se encontra dentro do objeto indireto do verbo “referir-se”.</p><p>“E a sua adolescência, como foi?” Drummond – “Tumultuada.</p><p>Depois da expulsão do colégio jesuíta, fui morar em pensão, em Belo</p><p>Horizonte. Tive a sorte de encontrar os melhores amigos da minha vida.”</p><p>(Última entrevista de Carlos Drummond, Folha de São Paulo)</p><p>Note o seguinte: o verbo “ter” pede o objeto direto “a sorte de</p><p>encontrar os melhores amigos da minha vida”. Dentro desse objeto, há o</p><p>substantivo “sorte”, o qual, por sua vez, pede um complemento nominal.</p><p>Quem tem sorte, nesse contexto, tem sorte de algo. A oração “de encontrar</p><p>os melhores amigos da minha vida” completa o sentido de “sorte”. Trata-se</p><p>de uma oração subordinada substantiva completiva nominal reduzida de</p><p>infinitivo, a qual se encontra dentro do objeto direto do verbo “ter”.</p><p>19</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Predicativas do sujeito</p><p>Exercem função de predicativo do sujeito.</p><p>A grande dúvida é se podemos mesmo sair.</p><p>Note como a estrutura já é sua conhecida: sujeito “A grande dúvida”</p><p>+ verbo de ligação (é) + predicativo do sujeito “se podemos mesmo sair”.</p><p>“Tornar-te-ás só quem tu sempre foste.</p><p>O que te os deuses dão, dão no começo. [...]</p><p>Contenta-te com seres quem não podes</p><p>Deixar de ser.” (Fernando Pessoa)</p><p>Nas duas orações predicativas sublinhadas, o sujeito é elíptico “tu”.</p><p>No primeiro caso, o verbo de ligação é “tornar-se”; no segundo, é “ser”. Ainda</p><p>no segundo caso, perceba como a oração predicativa encontra-se dentro do</p><p>objeto indireto “com seres quem não podes deixar de ser”, o qual completa</p><p>o sentido de “contenta-te”.</p><p>Apositivas</p><p>Exercem função de aposto.</p><p>Esta é minha maior motivação: que nossos f ilhos cresçam bons</p><p>e justos.</p><p>20</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>A oração sublinhada visa a esclarecer o substantivo “motivação”</p><p>e tem com ele equivalência semântica, sendo, portanto, um aposto de</p><p>“motivação”. A primeira oração é a principal.</p><p>A grande preocupação dela – que pudesse viajar logo – infelizmente</p><p>se mostrou válida.</p><p>A oração sublinhada visa a esclarecer o substantivo “preocupação”</p><p>e tem com ele equivalência semântica. A oração principal é “A grande</p><p>preocupação dela infelizmente se mostrou válida”.</p><p>Observação: Como bem pontua o professor Celso Cunha, a gramática</p><p>de nosso idioma permite perfeitamente a omissão da conjunção integrante</p><p>“que” depois de certos verbos que exprimem ordem, desejo ou súplica. Essa</p><p>supressão é bastante elegante, inclusive.</p><p>É conveniente seja feito novo acordo.</p><p>Requer sejam tomadas novas medidas.</p><p>Penso seria terrível se você desistisse.</p><p>Subordinadas substantivas justapostas</p><p>Como já se disse, embora as orações subordinadas substantivas</p><p>desenvolvidas sejam geralmente introduzidas por conjunção integrante,</p><p>podem também não ser. Nesse caso, são chamadas de orações</p><p>subordinadas substantivas justapostas. Elas podem iniciar com pronomes</p><p>21</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>de interrogação (que, qual, quem, quanto), pronomes indefinidos (quem,</p><p>quanto), advérbios de interrogação (onde, quando, como, por que) e</p><p>advérbio de intensidade (quão). Podem, ainda, iniciar sem nenhum tipo</p><p>de conectivo. Veja alguns exemplos:</p><p>Toda unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade</p><p>não precisa pensar. (Nelson Rodrigues) (Oração subordinada substantiva</p><p>subjetiva justaposta)</p><p>Que seu coração palpite por mim um minuto por dia é quanto</p><p>basta a um amor que não busca nem as venturas do gozo, nem as galas</p><p>da publicidade. (Machado de Assis, Confissões de uma moça viúva) (Oração</p><p>subordinada substantiva predicativa justaposta)</p><p>Nunca conheci quem tivesse levado porrada.</p><p>Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo. (Fernando</p><p>Pessoa) (Oração subordinada substantiva objetiva direta justaposta)</p><p>Muitos não sabem propriamente distinguir a originalidade da</p><p>excentricidade: uma caracteriza o génio, outra manifesta o louco.</p><p>(Fernando Pessoa) (Duas orações coordenadas que, juntas, compõem uma</p><p>estrutura subordinada substantiva apositiva justaposta)</p><p>Você já sabe onde vai morar?</p><p>vai</p><p>E donde ele vem.</p><p>E por isso, porque pertence a menos gente,</p><p>É mais livre e maior o rio da minha aldeia.</p><p>Pelo Tejo vai-se para o Mundo.</p><p>Para além do Tejo há a América</p><p>E a fortuna daqueles que a encontram.</p><p>Ninguém nunca pensou no que há para além</p><p>Do rio da minha aldeia.</p><p>O rio da minha aldeia não faz pensar em nada</p><p>Quem está ao pé dele está só ao pé dele.”</p><p>“O Guardador de Rebanhos”.</p><p>In Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa</p><p>Refletindo a respeito do poema, poderia alguém dizer “Há tantos</p><p>tejos há no mundo, e todos eles são menos valiosos que o rio de minha</p><p>aldeia...”. Nesse caso, estaria transformando um substantivo próprio em</p><p>comum.</p><p>Abstratos ou concretos</p><p>Concretos são aqueles que têm subsistência própria, ou seja, que</p><p>existem por si sós, seja no mundo material, seja no mundo imaginário: livro,</p><p>povo, cidade, fada, Deus, Diabo, alma, fantasma.</p><p>Abstratos são aqueles que dependem de outros seres para existir;</p><p>nomeiam qualidades, ações, estados, sentimentos resultados de ações,</p><p>propriedades, concepções: ironia, fama, beijo, luto, interpretação, fé.</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>“Aqueles homens gotejantes de suor, bêbados de calor,</p><p>desvairados de insolação a quebrarem, a espicaçarem, a torturarem a pedra,</p><p>pareciam um punhado de demônios revoltados na sua impotência contra o</p><p>impassível gigante que os contemplava com desprezo [...]”</p><p>(Aluísio Azevedo, O Cortiço, de 1890)</p><p>Substantivos concretos: homens, suor, pedra, demônios, gigante</p><p>Substantivos abstratos: calor, insolação, desprezo</p><p>Analise:</p><p>“Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo,</p><p>encontrei num trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço</p><p>de vista e de chapéu. Cumprimentou-me, sentou-se ao pé de mim, falou da</p><p>lua e dos ministros, e acabou recitando-me versos.”</p><p>(Machado de Assis, Dom Casmurro)</p><p>O efeito de sentido é obtido pela quebra de paralelismo entre</p><p>substantivos abstrato e concerto (no primeiro caso) e entre substantivos</p><p>concretos de natureza muito distinta (no segundo caso).</p><p>Simples ou compostos</p><p>Simples são os que apresentam apenas um radical: flor, boi, água.</p><p>Compostos são os que apresentam mais de um radical: flor-de-lis,</p><p>aguardente, peixe-boi, bom-dia.</p><p>Primitivos ou derivados</p><p>Primitivos são os que se apresentam, em regra, sem prefixo ou sufixo.</p><p>É deles que se derivam outros substantivos: agulha, pedra, chapéu.</p><p>Derivados são os que apresentam, em regra, prefixo e/ou sufixo:</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>infelicidade (deriva-se de feliz), agulheiro (deriva-se de agulha), chapelaria</p><p>(deriva-se de chapéu).</p><p>Analise parte de um texto escrito pelo autor contemporâneo Eduardo</p><p>Affonso e perceba a construção de substantivos compostos e derivados:</p><p>“[...]</p><p>Sabe quando você vai na caixa de bombom e só sobrou o crocante?</p><p>Quando chega no lugar onde deixou o carro, e o carro não está lá? Quando</p><p>vai tomar o resto do refrigerante ou da água com gás, e já não tem mais gás</p><p>nenhum?</p><p>Isso tinha que ter um nome. “Vacúnia”, talvez. Ou “orfância”, quem</p><p>sabe.</p><p>E como não dar nome ao momento devastador em que você vai</p><p>dar o segundo beijo e o(a) curitibano(a) vira a cara, e te deixa no ar? Sim,</p><p>não bastasse o frio, em Curitiba são avaros de beijos. É um só, e com muito</p><p>favor. Você fica com a boca em bico a um palmo da face da criatura, sem</p><p>chão, sem rumo, sem jeito, sem razão de viver, sem ter onde se enfiar. Um</p><p>“precipismo” — dos brabos.</p><p>“Repugnasco”. O misto de nojo, inapetência e vergonha alheia</p><p>que te invade quando alguém repete, com ares de pretensa dignidade e</p><p>indignação social, seus mantras ideológicos.</p><p>“Remordência”. A impotência diante da impossibilidade de recuar</p><p>dois minutos no tempo quando uma pessoa por quem você não estava</p><p>minimamente interessado te dá um pé na bunda, sem dó nem piedade — e</p><p>você só esperava uma oportunidade para terminar a coisa decentemente.</p><p>“Deserfúgio”. O momento em que o orgasmo estava vindo, estava</p><p>vindo, estava ali para acontecer, e resolve mudar de ideia, pegar um retorno,</p><p>passar outra hora.</p><p>[...]</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Porque tudo tinha que ter nome. Um nome torna o sentimento</p><p>mais gerenciável. Lhe dá um formato anatomicamente compatível,</p><p>facilitando o encaixe e a aceitação.</p><p>Imagine se a inveja não tivesse sido batizada, e você ficasse se</p><p>remoendo sem saber o que era aquele ácido a te corroer por dentro. Ou se o</p><p>ciúme não tivesse um nome próprio, e a gente o confundisse com a inveja,</p><p>o despeito, a paranoia — ou mesmo com a vacúnia e o precipismo. [...]”</p><p>(Eduardo Affonso, TORSCHLUSSPANIK)</p><p>Flexões do substantivo</p><p>“Flexão”, gramaticalmente falando, significa variação de forma. Na</p><p>língua portuguesa, os substantivos podem flexionar em razão de gênero,</p><p>número e grau.</p><p>Flexão de gênero</p><p>Os substantivos podem ser masculinos ou femininos. Ressalta-se que</p><p>essa distinção se refere apenas e tão somente a um aspecto gramatical, não</p><p>biológico. Não se confunde gênero da palavra com sexo (tampouco com</p><p>gênero) de seres humanos. Vale a pena fazer uma pequena retomada histórica.</p><p>Na língua latina, havia três gêneros gramaticais: masculino, feminino</p><p>e neutro. Por evolução natural do idioma e analogia entre terminações,</p><p>o neutro latino foi incorporado às palavras de gênero masculino (as</p><p>terminações mais frequentes eram -us [masculino], -a [feminino] e -um</p><p>[neutro]. O chamado gênero complexo, que agrupa substantivos de gêneros</p><p>diferentes, era indicado em latim pelo neutro). Ainda há um resquício de</p><p>palavras neutras em português, como aquilo, tudo, algo, isso, isto, mas são</p><p>raríssimas.</p><p>Modernamente, quando alguém diz, por exemplo “Para ser</p><p>10</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>procurador do estado, o cidadão deve prestar concurso”, sabe-se</p><p>intuitivamente que a afirmativa se refere a qualquer pessoa, seja do gênero</p><p>masculino, seja do feminino, porque tanto a palavra “cidadão” como</p><p>“procurador” estão sendo usadas em sua acepção neutra.</p><p>No entanto, se alguém construir a mesma frase com as palavras</p><p>“procuradora” e “cidadã”, a ideia limita-se à esfera das pessoas de gênero</p><p>feminino. Ou seja, em português, a marca que em regra distingue o gênero</p><p>é a feminina.</p><p>Ainda assim, inúmeras palavras não seguem um padrão específico</p><p>de gênero: o/a motorista (palavra terminada em -a, mas que pode referir-se</p><p>a qualquer ser humano); a pessoa (palavra feminina, mas que pode referir-se</p><p>a qualquer ser humano); o bosque (palavra masculina terminada em -e); a</p><p>ponte (palavra feminina terminada em -e); o/a gerente (palavra terminada</p><p>em -e, mas que pode referir-se a qualquer ser humano) etc.</p><p>Passemos à classificação de gênero das palavras:</p><p>Substantivos biformes: mudam de forma para indicar os gêneros:</p><p>o ateu/a ateia; o poeta/a poetisa; o monge/a monja; o czar/a czarina; o</p><p>embaixador/a embaixatriz; o cavaleiro/a amazona; o cavalheiro/a dama; o</p><p>boi/a vaca; o zangão/a abelha.</p><p>Note que, nos últimos casos, ocorre heteronímia, ou seja, o feminino</p><p>se expressa com radical diferente daquele do masculino.</p><p>Substantivos uniformes: apresentam apenas uma forma para indicar</p><p>os gêneros. Podem ser:</p><p>○ Comuns de dois: distinguem-se pela presença de um</p><p>determinante: o/a dentista; dois/duas jovens; outro/outra colega;</p><p>um/uma agente.</p><p>○ Sobrecomuns: não se alteram na forma nem no determinante: o</p><p>algoz; uma vítima; criatura estranha; pessoa bela.</p><p>○ Epicenos: designam, em apenas uma forma, animais e plantas:</p><p>11</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>a barata, a cobra, rouxinol, o pinheiro, o musgo. Para designação</p><p>de gênero, usam-se os adjetivos “macho” e “fêmea”: cobra macho,</p><p>cobra fêmea.</p><p>Algumas dificuldades: o presidente/ a presidenta;</p><p>(Oração subordinada substantiva</p><p>objetiva direta justaposta)</p><p>Estou convencido, neste caso, de como devemos proceder. (Oração</p><p>22</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>subordinada substantiva completiva nominal justaposta)</p><p>Só é verdadeiramente senhor do mundo quem está acima de suas</p><p>glórias fofas e das suas ambições estéreis. (Machado de Assis) (Oração</p><p>subordinada substantiva subjetiva justaposta)</p><p>Orações subordinadas adjetivas</p><p>Analise:</p><p>Preciso de uma roupa colorida.</p><p>Preciso de uma roupa que tenha cor.</p><p>Note como, no segundo caso, substituímos o adjetivo “colorida” pela</p><p>oração “que tenha cor”.</p><p>É justamente esta a função das orações subordinadas adjetivas:</p><p>exercer função sintática própria de adjetivo em relação à oração principal.</p><p>As adjetivas têm duas características fundamentais: iniciam-se,</p><p>quando desenvolvidas, com pronomes relativos (que, quem, o qual, cujo,</p><p>quanto, onde, como, quando) e sempre exercem função sintática de adjunto</p><p>adnominal. Assim como os adjuntos adnominais, essas orações sempre se</p><p>posicionam dentro de outras funções sintáticas.</p><p>Quanto à classificação, podem ser explicativas ou restritivas. Essa</p><p>distinção é evidenciada visivelmente pela pontuação, como se verá a seguir.</p><p>23</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Explicativas</p><p>Explicam o termo antecedente (que pode ser nome ou pronome) e</p><p>são marcadas por vírgula(s), travessão(ões) ou parênteses.</p><p>Os meus filhos, que estudam para concurso, saíram-se bem na</p><p>última prova.</p><p>Pedro tem uma forte síndrome do pânico (contra a qual luta há anos).</p><p>Drummond – A minha obra literária foi determinada pela</p><p>circunstância de eu ser mineiro. Mineiro do interior de Minas, uma região</p><p>de mineração, onde a dificuldade de comunicação era maior do que em</p><p>outras zonas do Estado. (Entrevista de Drummond à Folha de São Paulo)</p><p>Tio Juca – a quem serei eternamente grata pela ajuda – faleceu na</p><p>tarde de quinta passada.</p><p>O homem, que, nesta terra miserável, mora entre feras, sente a</p><p>inevitável necessidade de também ser fera. (Augusto dos Anjos)</p><p>Arre, estou farto de semideuses!</p><p>Onde é que há gente no mundo?</p><p>Então sou só eu que é vil e erróneo nesta terra?</p><p>Poderão as mulheres não os terem amado,</p><p>Podem ter sido traídos — mas ridículos nunca!</p><p>E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,</p><p>24</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?</p><p>Eu, que tenho sido vil, literalmente vil,</p><p>Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.(Fernando Pessoa)</p><p>Restritivas</p><p>A vida é cheia de obrigações que a gente cumpre, por mais vontade</p><p>que tenha de infringir deslavadamente. (Machado de Assis, Dom Casmurro)</p><p>Art. 85. São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da</p><p>República que atentem contra a Constituição Federal.</p><p>(Constituição da República)</p><p>Quem me dera ouvir de alguém a voz humana</p><p>Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;</p><p>Que contasse não uma violência, mas uma cobardia!</p><p>Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam. (Fernando Pessoa)</p><p>Há escritores (ai de nós!) cujo maior título é uma pontualidade</p><p>ou uma atitude: estar escrevendo. Vivem num particípio presente que</p><p>não participa de um presente. Estão na literatura como os generais</p><p>na ativa. Reformados, vai-se-lhes o prestígio; mortos, fica um registro</p><p>nos almanaques e outro na sepultura. Há no mundo dois mundos, um</p><p>de pedra e outro de neblina: geologia e meteorologia. Na literatura há</p><p>25</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>também montanhas e brisas. Os livros que encontramos são, na maior</p><p>parte, como as correntes de ar; e sua leitura tem a brevidade e o enfado</p><p>de uma gripe. Leu-se; sofreu-se; acabou-se. (Gustavo Corção, Reflexões</p><p>inúteis sobre escritores inúteis)</p><p>Assim como as substantivas, as adjetivas também podem ser</p><p>justapostas, o que vai ocorrer quando elas não forem iniciadas por</p><p>pronomes relativos, mas, sim, por pronomes interrogativos (que, quem,</p><p>qual, quanto) ou advérbios interrogativos (onde, como, quando, por que).</p><p>Ainda temos os tapetes de quando morávamos em nosso</p><p>primeiro apartamento.</p><p>As conquistas de quem se esforçou verdadeiramente são bem</p><p>mais saborosas.</p><p>Observações:</p><p>1) Note que há diferença quando se diz, por exemplo:</p><p>Meu filho que estuda piano é adolescente.</p><p>Meu filho, que estuda piano, é adolescente.</p><p>No segundo caso, por se tratar de adjetiva explicativa, a pessoa tem</p><p>apenas um filho ou o contexto deixa evidente que se está falando daquele</p><p>26</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>filho especificamente. No primeiro caso, por se tratar de adjetiva restritiva,</p><p>ela tem mais de um filho, mas ressalta que apenas o que estuda piano</p><p>é adolescente.</p><p>2) Como já se disse em outro momento deste material, é fundamental</p><p>observar a regência nas orações adjetivas. Exemplos:</p><p>Finalmente nos livramos das roupas de cujos modelos não gostamos.</p><p>As marcas brasileiras contra cujos valores eu me posiciono não</p><p>entram na minha casa.</p><p>As pessoas de quem/das quais/de que falei acabam de chegar.</p><p>O que é a esperança, para o senhor? Drummond – Um fio muito</p><p>fino, ao qual eu me agarro para não morrer desesperado.</p><p>Sugere-se revisar o capítulo sobre pronomes relativos.</p><p>27</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Orações subordinadas adverbiais</p><p>As orações subordinadas adverbiais funcionam como verdadeiros</p><p>adjuntos adverbiais em relação à oração principal. Isso significa que, assim</p><p>como os adjuntos adverbiais, elas exprimem circunstâncias diversas. Elas</p><p>são introduzidas por conjunções ou locuções subordinativas adverbiais.</p><p>Observe:</p><p>Ismália</p><p>Quando Ismália enlouqueceu,</p><p>Pôs-se na torre a sonhar...</p><p>Viu uma lua no céu,</p><p>Viu outra lua no mar.</p><p>No sonho em que se perdeu,</p><p>Banhou-se toda em luar...</p><p>Queria subir ao céu,</p><p>Queria descer ao mar...</p><p>E, no desvario seu,</p><p>Na torre pôs-se a cantar...</p><p>Estava perto do céu,</p><p>Estava longe do mar...</p><p>E como um anjo pendeu</p><p>As asas para voar...</p><p>28</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Queria a lua do céu,</p><p>Queria a lua do mar...</p><p>As asas que Deus lhe deu</p><p>Ruflaram de par em par...</p><p>Sua alma subiu ao céu,</p><p>Seu corpo desceu ao mar...</p><p>(Aphonsus de Guimarães, Ismália )</p><p>Os trechos sublinhados exprimem circunstância: na primeira oração</p><p>(Quando Ismália enlouqueceu), temos uma circunstância temporal, ou seja,</p><p>ela pôs-se a sonhar exatamente no instante em que enlouqueceu. Nesse</p><p>caso, a conjunção que introduz a oração é “quando” (conjunção temporal) e</p><p>a oração em si se chama subordinada adverbial temporal.</p><p>A segunda oração sublinhada trabalha com um verbo elíptico:</p><p>E, como um anjo [pende], [Ismália] pendeu as asas para voar. O fato de</p><p>esse verbo estar elíptico não invalida o fato de se tratar de uma oração. No</p><p>presente caso, ela indica comparação (entre a forma como um anjo pende</p><p>e a forma como Ismália pende), daí dizermos que como um anjo [pende] é</p><p>uma oração subordinada adverbial comparativa.</p><p>Vale dizer que esta matéria é fundamental para o bom</p><p>desenvolvimento da coesão textual. Conhecer os conectivos aqui</p><p>apresentados sem dúvida faz com que o usuário do idioma articule muito</p><p>melhor seus pensamentos por meio de palavras.</p><p>29</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>De acordo com a Nomenclatura Gramatical Brasileira, há 9 tipos</p><p>de orações adverbiais: causais, consecutivas, condicionais, concessivas,</p><p>conformativas, comparativas, finais, proporcionais, temporais.</p><p>1) Causais</p><p>Exprimem causa, razão do pensamento expresso na oração principal.</p><p>Conjunções e locuções conjuntivas causais: que (= porque), porque,</p><p>como (=porque),</p><p>visto que, já que</p><p>Como a professora se atrasou, os alunos decidiram ir embora.</p><p>Tudo terminaria bem, visto que estávamos prontos.</p><p>Eu me dispus a ajudá-lo, mas, já que você chegou, ajude-o você!</p><p>2) Consecutivas</p><p>Exprimem consequência, efeito, resultado da oração principal.</p><p>Conjunções e locuções conjuntivas consecutivas: que (quando</p><p>ligado a uma expressão de natureza intensiva presente na oração</p><p>principal, como tão, tanto, tal, tamanho), de maneira que, de modo que,</p><p>de sorte que, de tal modo que, de tal maneira que</p><p>Entendi seu ponto de vista, de maneira que retificarei o meu próprio.</p><p>Ficou em casa, de sorte que pôde ver a passeata de sua janela.</p><p>30</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>E ali dançaram tanta dança</p><p>Que a vizinhança toda despertou</p><p>E foi tanta felicidade</p><p>Que toda cidade se iluminou</p><p>E foram tantos beijos loucos</p><p>Tantos gritos roucos como não se ouvia mais</p><p>Que o mundo compreendeu</p><p>E o dia amanheceu em paz</p><p>(Chico Buarque, Valsinha)</p><p>Eventualmente, o termo intensivo (tão, tamanho etc.) fica elíptico.</p><p>Exemplo: Bebia, que era uma lástima. Ou seja: Bebia [tanto], que era uma</p><p>lástima. Outro exemplo: É triste, que faz chorar. Ou seja: É [tão] triste, que</p><p>faz chorar.</p><p>3) Condicionais</p><p>Exprimem principalmente condição para que se realize ou deixe</p><p>de se realizar o que se declara na principal. Podem, ainda, exprimir ideia</p><p>de hipótese, eventualidade.</p><p>Conjunções e locuções conjuntivas condicionais: se, caso (jamais</p><p>“se caso”), contanto que, sem que, a menos que</p><p>Caso nós nos atrasemos, pode ligar para a polícia.</p><p>31</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Estrutura-se bem o trabalho, contanto que haja planejamento.</p><p>Não permita Deus que eu morra,</p><p>Sem que eu volte para lá;</p><p>Sem que desfrute os primores</p><p>Que não encontro por cá;</p><p>Sem qu’inda aviste as palmeiras,</p><p>Onde canta o Sabiá.</p><p>(Gonçalves Dias, Canção do Exílio)</p><p>No caso do poema acima, as orações condicionais têm, em seu</p><p>interior, orações subordinadas adjetivas (que não encontro por cá, onde</p><p>canta o Sabiá). Esse tipo de ocorrência é bastante comum, uma vez que,</p><p>como já estudado, as orações adjetivas são sempre parte de alguma função</p><p>sintática, pois funcionam como adjuntos adnominais.</p><p>A gente sentava num banco, cinco ou seis sujeitos se espremiam,</p><p>para ver quem caía do banco primeiro. Era bom, era gostoso. Naquele</p><p>tempo não tinha gelo, eletricidade, cinema, automóvel. Mas a gente vivia</p><p>muito bem e não sentia falta de nada. Hoje, se a televisão for suspensa, a</p><p>criança morre de desgosto. (Carlos Drummond de Andrade, em entrevista</p><p>para a Folha de São Paulo)</p><p>32</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>4) Concessivas</p><p>Exprimem concessão, ou seja, um fato que se concede, se admite,</p><p>opondo-se à oração principal. Nesse caso, o conteúdo da oração concessiva</p><p>exprime um obstáculo insuficiente para modificar ou impedir o conteúdo</p><p>da principal.</p><p>Conjunções e locuções conjuntivas concessivas: embora, mesmo</p><p>que, apesar de que, conquanto, posto que</p><p>Observação: É bastante comum que se empregue a locução</p><p>conjuntiva “posto que” com valor causal. Tal não é a lição, no entanto, dos</p><p>autores clássicos.</p><p>Sairemos ao meio-dia, mesmo que as malas não estejam prontas.</p><p>A moça, conquanto fosse solitária, amava a própria vida.</p><p>Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não</p><p>tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o címbalo que retine.</p><p>E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os</p><p>mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda fé, de maneira tal</p><p>que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria.</p><p>E ainda que distribuísse todos os meus bens para sustento dos</p><p>pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não</p><p>tivesse amor, nada disso me aproveitaria.</p><p>(São Paulo, Carta aos Coríntios)</p><p>33</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>5) Conformativas</p><p>Exprimem acordo ou conformidade do conteúdo presente na</p><p>subordinada em relação ao conteúdo presente na principal.</p><p>Conjunções e locuções conjuntivas conformativas: conforme, como,</p><p>segundo, consoante</p><p>Procedemos conforme nos foi pedido.</p><p>Consoantediz o professor Olavo de Carvalho, “Eis a que se resume</p><p>a famosa rebeldia do adolescente: amor ao mais forte que o despreza,</p><p>desprezo pelo mais fraco que o ama”.</p><p>6) Comparativas</p><p>São as orações que exprimem um ser com que se compara o ser da</p><p>oração principal.</p><p>Conjunções e locuções conjuntivas comparativas: como, tal qual,</p><p>qual, tal como</p><p>O lugar fedia tal qual você descreveu.</p><p>O garoto agiu como se estivesse numa festa.</p><p>A noite fecundava o ovo dos vícios</p><p>Animais. Do carvão da treva imensa</p><p>34</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Caía um ar danado de doença</p><p>Sobre a cara geral dos edifícios!</p><p>Tal uma horda feroz de cães famintos,</p><p>Atravessando uma estação deserta,</p><p>Uivava dentro do eu, com a boca aberta,</p><p>A matilha espantada dos instintos!</p><p>(Augusto dos Anjos, As cismas do destino)</p><p>Tende piedade da mulher no instante do parto</p><p>Onde ela é como a água explodindo em convulsão</p><p>Onde ela é como a terra vomitando cólera</p><p>Onde ela é como a lua parindo desilusão.</p><p>(Vinicius de Moraes, O desespero da piedade)</p><p>Note que, no último caso, o verbo está subentendido: Onde ela é</p><p>como [é] a água explodindo em convulsão. É bastante comum que o verbo</p><p>esteja elíptico nas comparativas. Exemplo: Ninguém treinou tanto quanto</p><p>Ricardo [treinou].</p><p>Essa elipse, inclusive, pode trazer alguns desentendimentos. Veja a</p><p>piada abaixo, que se constrói a partir de tal recurso:</p><p>35</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>O ser humano come mais banana do que macacos. Quer ver?</p><p>Quantos macacos você comeu na última semana?</p><p>Note que poderíamos interpretar da seguinte forma: “O ser humano</p><p>come mais banana do que [ele come] macacos” ou então “O ser humano</p><p>come mais banana do que macacos [comem bananas]”.</p><p>A confusão ocorre justamente pela elipse dos termos na</p><p>oração comparativa.</p><p>As comparações podem ainda ser quantitativas. Nesse caso, as</p><p>principais locuções conjuntivas são tanto/tão...como/quanto, mais...que/do</p><p>que, menos...que/do que.</p><p>Um homem pode saber mais do que muitos [sabem], mas nunca</p><p>mais do que todos [sabem].</p><p>Dormir nesta cama é tão desconfortável quanto dormir no chão.</p><p>7) Finais</p><p>Exprimem finalidade, objetivo da oração principal.</p><p>Conjunções e locuções conjuntivas finais: para que, a fim de que,</p><p>porque (=para que), que (=para que)</p><p>Fiz sinal que se calasse. [=para que se calasse]</p><p>36</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Faça tudo o que puder porque tais encrencas sejam evitadas. [para</p><p>que tais encrencas...]</p><p>A fim de que sejamos amigos, precisaremos acertar algumas arestas.</p><p>E a Constituinte? Drummond – Eu gostaria muito que ela fosse</p><p>realmente uma Constituinte. Mas vejo pouca probabilidade de se formar</p><p>um grupo realmente poderoso e consciente, que seja de bons patriotas,</p><p>para que possa fazer uma boa Constituição.</p><p>8) Proporcionais</p><p>Expressam proporção. O fato trazido pela oração subordinada</p><p>exprime fato que aumenta ou diminui na mesma proporção do fato</p><p>declarado na principal.</p><p>Locuções conjuntivas proporcionais: à medida que, à proporção</p><p>que, tanto mais...quanto mais, tanto mais...quanto menos, tanto menos...</p><p>quanto mais.</p><p>Ela se sentia melhor, à medida que cantava. (Observação: Jamais “na</p><p>medida que” ou “na medida em que”)</p><p>Quanto mais eu sinta, quanto mais eu sinta como várias pessoas,</p><p>Quanto mais personalidades eu tiver,</p><p>Quanto mais intensamente, estridentemente as tiver,</p><p>Quanto mais simultaneamente sentir com todas elas,</p><p>37</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A</p><p>P O R T U G U E S A</p><p>Quanto mais unificadamente diverso, dispersadamente atento,</p><p>Estiver, sentir, viver, for,</p><p>Mais possuirei a existência total do universo,</p><p>Mais completo serei pelo espaço inteiro fora,</p><p>Mais análogo serei a Deus, seja ele quem for,</p><p>Porque, seja ele quem for, com certeza que é Tudo,</p><p>E fora d’EIe há só EIe, e Tudo para Ele é pouco.</p><p>(Fernando Pessoa)</p><p>Ressalta-se que, no exemplo anterior, as orações subordinadas</p><p>proporcionais são as segundas (introduzidas por “mais”), pois são elas que</p><p>expressam os fatos proporcionalmente vinculados aos presente nas outras</p><p>orações (principais).</p><p>9) Temporais</p><p>Expressam tempo de realização do fato expresso na principal.</p><p>Conjunções e locuções conjuntivas: quando, antes que, logo que,</p><p>mal (=quando), assim que, eis que, até que</p><p>Quando os gatos saem, os ratos fazem a festa.</p><p>Iniciei meus trabalhos mal ele saiu de casa.</p><p>38</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Estaremos juntos até que a morte nos separe.</p><p>Vai-se a primeira pomba despertada…</p><p>Vai-se outra mais… mais outra… enfim dezenas</p><p>De pombas vão-se dos pombais, apenas</p><p>Raia sanguínea e fresca a madrugada.</p><p>E à tarde, quando a rígida nortada</p><p>Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,</p><p>Ruflando as asas, sacudindo as penas,</p><p>Voltam todas em bando e em revoada.</p><p>(Raimundo Correia, As Pombas)</p><p>Observações finais:</p><p>1) As orações adverbiais, assim como as substantivas e adjetivas,</p><p>podem ser justapostas:</p><p>Não conseguiram respirar, tão assustados estavam. (oração</p><p>subordinada adverbial causal justaposta)</p><p>Foi difícil diferenciá-los, tamanha era a semelhança entre ambos.</p><p>(oração subordinada adverbial causal justaposta)</p><p>39</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Fizessem esforço real, teriam conseguido entender o mapa. (oração</p><p>subordinada adverbial condicional justaposta)</p><p>2) A NGB não registra formalmente as orações adverbiais locativas,</p><p>modais e de companhia, as quais, no entanto, são bastante comuns. Veja:</p><p>Não pode haver bom resultado onde tudo é brincadeira. (oração</p><p>subordinada adverbial locativa)</p><p>O psicopata agiu mansamente, sem que ninguém notasse seu plano.</p><p>(oração subordinada adverbial modal)</p><p>Onde me espetam, fico. (Machado de Assis, Um apólogo) (oração</p><p>subordinada adverbial locativa)</p><p>Irei ao cinema com quem quiser me acompanhar. (oração</p><p>subordinada adverbial de companhia)</p><p>Vale dizer, de toda forma, que outros tipos de circunstâncias</p><p>podem aparecer sob a forma de orações, as quais eventualmente não são</p><p>classificadas formalmente pela NGB. O contexto deve ser sempre levado</p><p>em conta.</p><p>Artboard 1</p><p>Artboard 2</p><p>Artboard 3</p><p>Artboard 4</p><p>Artboard 5</p><p>Artboard 6</p><p>Artboard 7</p><p>Artboard 8</p><p>Artboard 9</p><p>Artboard 10</p><p>o general/a</p><p>generala; o coronel/a coronela; o sargento/a sargenta; o mestre/a mestra; o</p><p>soldado, a soldada (mas: o/a agente, o/a vidente, o/a gerente, o/a regente);</p><p>a libido; a musse; o champanha; o dó; o matiz; o gengibre; o/a diabetes;</p><p>o/a usucapião; o/a travesti; o/a personagem.</p><p>Atenção à mudança de sentido: a caixa/o caixa; cabeça/o cabeça; a</p><p>grama/o grama; a rádio/o rádio etc.</p><p>Flexão de número</p><p>Os substantivos podem, em regra, apresentar-se no singular (quando</p><p>se referirem a um ente ou a um grupo de entes) ou no plural (quando houver</p><p>mais um ente ou grupo de entes). A esse acidente gramatical dá-se o nome</p><p>de flexão de número.</p><p>A marca do plural é a letra s: vidas, cadernos, dores, bandos etc.</p><p>Poucos são os substantivos que fogem a isso: o lápis azul/ os lápis</p><p>azuis; o ônibus grande/os ônibus grandes; o tórax aberto/ os tórax abertos.</p><p>São inúmeras as regras de pluralização dos substantivos. Algumas</p><p>notáveis:</p><p>Degraus, troféus, chapéus, avós, caracteres, ureteres, hambúrgueres,</p><p>gravidezes, arrozes, gizes, ases, adeuses, anciãos/anciões/anciães, escrivães,</p><p>corrimão/corrimões ou corrimãos.</p><p>Observações:</p><p>○ Pluralizam-se siglas apenas com o acréscimo de -s: CDs, IPTUs,</p><p>IPVAs, DNAs, ONGs etc.</p><p>○ O plural das letras do alfabeto se dá com o ascréscimo de -s a seu</p><p>12</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>nome ou duplicação da letra que se quer pluralizar: os ás/os aa, os</p><p>bês/ os bb, os cês/os cc, os erres/os rr.</p><p>○ O substantivo presente na locução adjetiva vai para o plural</p><p>quando der ideia de mais de um elemento: tabuleiro de jogos,</p><p>par de sapatos, fábrica de meias. Mas: taças de vidro, sócios da</p><p>empresa, impostos de renda.</p><p>○ Alguns substantivos só se usam no plural (pluralia tantum):</p><p>as algemas, as costas, os parabéns, as felicitações, os óculos, as</p><p>condolências, os pêsames.</p><p>○ Plurais de substantivos abstratos – como “saudades”, “ciúmes”,</p><p>“felicidades” – tendem a expressar a permanência, a intensidade</p><p>dessas emoções. Tais palavras podem ser usadas no plural ou</p><p>no singular, ainda que não seja essa a regra com substantivos</p><p>abstratos (“caridade”, “fortaleza”, “prudência” etc.).</p><p>○ É muito comum que o singular tome o lugar do plural, num</p><p>processo metonímico:</p><p>A vida das pessoas é dura.</p><p>Versos íntimos</p><p>“Vês! Ninguém assistiu ao formidável</p><p>Enterro de tua última quimera.</p><p>Somente a Ingratidão - esta pantera -</p><p>Foi tua companheira inseparável!</p><p>Acostuma-te à lama que te espera!</p><p>O Homem, que, nesta terra miserável,</p><p>Mora, entre feras, sente inevitável</p><p>Necessidade de também ser fera.</p><p>[...]”</p><p>(Augusto dos Anjos)</p><p>13</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Plural de compostos</p><p>Nos compostos, a regra geral é que substantivos, adjetivos e numerais</p><p>variem: cachorros-quentes (subst. + adj.), primeiros-ministros (num. + subst.),</p><p>ares-condicionados (subst. + adj.), curtas-metragens (adj. + subst.).</p><p>As demais classes, em regra, não variam: abaixo-assinados (adv. +</p><p>adj.), guarda-roupas (verbo + subst.), ave-marias (interj. + subst.), alto-falantes</p><p>(adv. + adj).</p><p>Alguns casos que merecem atenção:</p><p>○ Compostos não separados por hífen seguem as regras dos simples:</p><p>girassóis, pontapés, mandachuvas etc.</p><p>○ Nos compostos com hífen, se o segundo substantivo delimitar o</p><p>primeiro, indicando semelhança, tipo ou finalidade, só o primeiro</p><p>elemento varia ou ambos: pombos-correio(s), bombas-relógios(s),</p><p>bananas-maçã(s), públicos-alvo(s).</p><p>○ Se houver preposição entre substantivos, só o primeiro varia: pés</p><p>de moleque, pores do sol, calcanhares de aquiles.</p><p>Flexão de grau</p><p>Podem os substantivos apresentar-se em tamanho aumentado ou</p><p>diminuído, o que se reconhece como flexão de grau.</p><p>Essas variações podem ocorrer na forma analítica (com o auxílio</p><p>de um adjetivo): festa grande, filme gigante, computador imenso, pessoa</p><p>minúscula, cadeira miúda, jardim pequeno.</p><p>Podem, ainda, ocorrer na forma sintética, geralmente com o</p><p>auxílio de sufixos: barcaça, corpanzil, dramalhão, cabeçorra, papelzinho,</p><p>gorducho, engenhoca, chuvisco, barbicha, poemeto.</p><p>14</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Observação:</p><p>Substantivos terminados em -s e -z fazem diminutivo com -inho,</p><p>mantendo-se o -s ou o -z da palavra de origem:</p><p>lápis + inho(s) – lapisinho</p><p>pires + inho – piresinho</p><p>país + inho – paisinho</p><p>rapaz + inho – rapazinho</p><p>Mas, se a palavra de origem não tiver -s ou -z, o diminutivo será com -z:</p><p>pai + zinho – paizinho</p><p>flor + zinha – florzinha</p><p>Estilisticamente, pode a flexão de grau ser de grande valia:</p><p>Tende infinita piedade dos vendedores de passarinhos</p><p>Que em suas alminhas claras deixam a lágrima e a</p><p>incompreensão</p><p>E tende piedade também, menor embora, dos vendedores de</p><p>balcão</p><p>Que amam as freguesas e saem de noite, quem sabe onde</p><p>vão...</p><p>(O desespero da piedade, Vinicius de Moraes)</p><p>Note como “balcão” é um falso aumentativo. Muitas são as palavras</p><p>assim: galinha, vizinho, portão, pastilha, caixão. Algumas já foram tidas</p><p>como flexionadas no aumentativo, mas perderam essa noção.</p><p>ADJETIVO</p><p>AULA 2</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Adjetivo</p><p>Adjetivo é, em essência, um modificador do substantivo (ou de um</p><p>equivalente a substantivo). Serve para indicar-lhe qualidade, propriedade,</p><p>condição ou estado.</p><p>Na passagem abaixo, trecho de um soneto dedicado ao corpo</p><p>feminino, Cruz e Souza se vale abundantemente do poder semântico dos</p><p>adjetivos:</p><p>Ó Mãos ebúrneas, Mãos de claros veios,</p><p>esquisitas tulipas delicadas,</p><p>lânguidas Mãos sutis e abandonadas,</p><p>finas e brancas, no esplendor dos seios.</p><p>Mãos etéricas, diáfanas, de enleios,</p><p>de eflúvios e de graças perfumadas,</p><p>relíquias imortais de eras sagradas</p><p>de antigos templos de relíquias cheios.</p><p>Mais adiante, estudar-se-ão as orações adjetivas, mas desde já se</p><p>ressalta que elas têm valor adjetivo (daí seu nome). Por exemplo, no texto</p><p>de Cruz e Souza, “relíquias imortais” equivale a “relíquias que não morrem”,</p><p>ou seja, a oração adjetiva “que não morrem” equivale semanticamente ao</p><p>adjetivo “imortais”.</p><p>A relação entre substantivo e adjetivo é bastante estreita. Um pode</p><p>facilmente virar o outro, a depender do contexto e da intencionalidade</p><p>discursiva. Veja:</p><p>Mais vale ter um cachorro amigo que um amigo cachorro. (ditado</p><p>popular)</p><p>Os alunos do 9º ano são mais crianças (=infantis) do que parecem</p><p>ser.</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Foi explorando exatamente isso que Machado de Assis iniciou</p><p>Memórias Póstumas de Brás Cubas assim:</p><p>“Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo</p><p>princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento</p><p>ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja começar pelo nascimento,</p><p>duas considerações me levaram a adotar diferente método: a primeira é</p><p>que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor,</p><p>para quem a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria</p><p>assim mais galante e mais novo.”</p><p>Note como, em “autor defunto”, o substantivo “autor” é caracterizado</p><p>por ser “defunto” –– ou seja, tem-se um autor cuja característica é ser</p><p>“defunto” (morto) –, ao passo que, em “defunto autor”, tem-se, ao contrário,</p><p>um “defunto” cuja característica é ser “autor”. Isso acontece porque a</p><p>qualidade do ser é concebida com grande independência, a ponto de não</p><p>raramente denominar o próprio ser.</p><p>Com tal descrição, Machado de Assis deixa claro que não se trata de</p><p>um autor que já morreu (morto), mas de um defunto que virou autor, daí o</p><p>ineditismo da obra.</p><p>Frequentemente, retira-se o próprio substantivo e o adjetivo é vira</p><p>substantivo no contexto: o velho, aquele maldoso, três espertos etc.</p><p>Classificação dos adjetivos</p><p>Primitivo ou derivado</p><p>Primitivo</p><p>é aquele sem prefixo nem sufixo: capô cinza, sorriso torto,</p><p>roupa formal.</p><p>Derivado é o que apresenta prefixo e/ou sufixo: tom acinzentado,</p><p>caminho tortuoso, contrato formalizado.</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Simples ou composto</p><p>Simples é o que só apresenta um radical: homem mudo, nação</p><p>portuguesa, caso cirúrgico.</p><p>Composto é o que apresenta mais de um radical: cidadão surdo-</p><p>mudo, império luso-brasileiro, procedimento médico-cirúrgico.</p><p>Os adjetivos podem indicar nacionalidade (pátria, lugar, procedência),</p><p>casos em que são chamados pátrios (ou gentílicos): homem brasileiro,</p><p>acordo luso-americano, cidadão senegalês, mercado asiático, milho</p><p>goiano.</p><p>Para a formação de pátrios compostos, preferem-se primeiro as</p><p>formas curtas e contraídas ou mais antigas. Havendo igualdade silábica,</p><p>prefere-se a ordem alfabética.</p><p>Exemplos: empresas franco-teuto-brasileiras, acordo nipo-hispano-</p><p>dinamarquês, culturas afro-brasilo-espanholas, documento fino-ítalo-</p><p>australiano.</p><p>Algumas formas contratas:</p><p>Austro – Áustria</p><p>Dano – Dinamarca</p><p>Sino – China</p><p>Anglo – Inglaterra</p><p>Ásio – Ásia</p><p>Brasilo – Brasil</p><p>Fino – Finlândia</p><p>Euro – Europa</p><p>Franco – França</p><p>Teuto ou germano – Alemanha</p><p>Greco – Grécia</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Hispano – Espanha</p><p>Ítalo – Itália</p><p>Luso – Portugal</p><p>Nipo – Japão</p><p>A escolha dos adjetivos expressa frequentemente carga subjetiva e</p><p>avaliativa de quem os usa. É fundamental sopesar de maneira parcimoniosa</p><p>o contexto de uso. Analise a diferença de abordagem do mesmo veículo de</p><p>comunicação.</p><p>Locução adjetiva</p><p>Trata-se de um grupo de vocábulos composto de preposição ou</p><p>locução prepositiva mais núcleo substantivo (ou substantivado), com valor</p><p>adjetivo. Quase sempre – mas não sempre – pode ser substituído por um</p><p>adjetivo correspondente:</p><p>“Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver</p><p>dedico como saudosa lembrança estas Memórias Póstumas.”</p><p>“Obra de finado. Escrevi-a com a pena da galhofa e a tinta da</p><p>melancolia, e não é difícil antever o que poderá sair desse conúbio.”</p><p>(Memórias Póstumas de Brás Cubas)</p><p>Note as locuções modificadoras dos substantivos acima (“carnes”,</p><p>“obra”, “pena” e “tinta”).</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Observação: O adjetivo “difícil”, por sua vez, modifica toda a</p><p>construção “antever o que poderá sair desse conúbio”.</p><p>Os adjetivos e locuções adjetivas podem modificar outras classes de</p><p>caráter nominal que não o substantivo:</p><p>Aqueles da sala 1 foram embora.</p><p>Eles são de casa.</p><p>Os três eram competentes.</p><p>Por fim, analise:</p><p>“Os slogans, as figuras, os jingles e os logotipos da propaganda</p><p>povoam a imaginação do homem de hoje exatamente como outrora os</p><p>anjos e demônios, heróis e duendes do imaginário tradicional. Eles formam</p><p>o vocabulário básico com o qual o habitante das grandes cidades expressa</p><p>seus desejos, aspirações e temores.”</p><p>(O jardim das aflições, Olavo de Carvalho)</p><p>Curioso perceber a dinâmica na passagem anterior: “do homem de</p><p>hoje” é locução adjetiva de “imaginação”, ao passo que “de hoje” é locução</p><p>adjetiva de “homem”; “do imaginário tradicional” é locução adjetiva que,</p><p>embora expressa uma única vez, refere-se claramente aos substantivos</p><p>“anjos”, “demônios”, “heróis” e “duendes”.</p><p>Variações</p><p>Podem os adjetivos variar em gênero, número e grau.</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Gênero</p><p>Uniforme: homem/mulher capaz, inteligente, cruel, simples.</p><p>Biforme: homem vazio/ mulher vazia, homem judeu/mulher judia,</p><p>homem mau/mulher má.</p><p>Curiosidade: “Trabalhadora” é substantivo (a trabalhadora da fábrica</p><p>chegou); “trabalhadeira” é adjetivo (a mulher trabalhadeira chegou).</p><p>Nos adjetivos compostos, apenas o último elemento varia em gênero</p><p>(ou em gênero e número, como veremos a seguir):</p><p>Lentes côncavo-convexas, atividade lúdico-instrutiva, calça</p><p>amarelo-escura.</p><p>Exceção: surdo-mudo – a criança surda-muda.</p><p>Número</p><p>O adjetivo varia normalmente, em regra com o acréscimo de s, para</p><p>concordar com a palavra à qual se refere:</p><p>Vinho encorpado/vinhos encorpados, cenário pitoresco/cenários</p><p>pitorescos.</p><p>Atenção: Ele ficou só (sozinho)/ Eles ficaram sós (sozinhos).</p><p>Mas: Ele ficou a sós. Eles ficaram a sós. (“A sós” é expressão adverbial</p><p>invariável)</p><p>Quando se usa um substantivo como adjetivo, ele fica invariável (não</p><p>vai para o plural), o que é muito como quando há referência a cores, ocasião</p><p>em que se pressupõe a expressão “cor de”: tintas creme, tons pastel, blusas</p><p>gelo, livros laranja (mas “alaranjados”), luvas pérola (mas “peroladas”),</p><p>cobertores cinza.</p><p>O mesmo raciocínio se estende aos adjetivos compostos, quando</p><p>o último elemento é um substantivo referente ao adjetivo anterior:</p><p>blusas branco-gelo, tintas vermelho-sangue, camisas verde-abacate,</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>gravatas amarelo-palha.</p><p>A flexão em número dos adjetivos compostos é complexa e encontra</p><p>discordâncias mesmo entre estudiosos. Em regra, dá-se com a variação</p><p>apenas do último elemento, o qual concorda com o termo substantivo ao</p><p>qual o adjetivo inteiro se refere: pássaros azul-claros, olhos castanho-escuros,</p><p>bandeiras verde-amarelas.</p><p>Grau</p><p>Variação de grau é a intensificação do valor do adjetivo, seja por um</p><p>advérbio, seja por um afixo. Tal variação gradual pode ocorrer tanto em uma</p><p>estrutura comparativa como em uma superlativa. Na passagem abaixo,</p><p>Machado de Assis se vale do superlativo com sufixo ao descrever José Dias:</p><p>CAPÍTULO IV / UM DEVER AMARÍSSIMO!</p><p>José Dias amava os superlativos. Era um modo de dar feição</p><p>monumental às ideias; não as havendo, servia a prolongar as frases. [...]</p><p>Levantou-se com o passo vagaroso do costume, não aquele</p><p>vagar arrastado dos preguiçosos, mas um vagar calculado e deduzido, um</p><p>silogismo completo, a premissa antes da consequência, a consequência</p><p>antes da conclusão. Um dever amaríssimo!</p><p>(Machado de Assis, Dom Casmurro)</p><p>Alguns superlativos absolutos podem trazer dúvida. Exemplos:</p><p>Sério, frio, necessário, precário (adjetivos terminados em -io):</p><p>seriíssimo, friíssimo, necessariíssimo, precariíssimo. (Celso Cunha ressalta a</p><p>admissão desses adjetivos com um só i.)</p><p>Notável, amável, móvel (-vel vira -bil): notabilíssimo, amabilíssimo,</p><p>mobilíssimo.</p><p>Feroz, feliz, voraz (desaparece o -z): ferocíssimo, felicíssimo, velocíssimo.</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Bom, vão, pagão (terminados em -m e -ão): boníssimo, vaníssimo,</p><p>paganíssimo.</p><p>mísero, célebre, áspero, livre (terminados em -ro e -re): misérrimo,</p><p>celebérrimo, aspérrimo, libérrimo.</p><p>Algumas formas latinas antigas convivem com as formas modernas</p><p>(estas sempre terminadas em -íssimo). Exemplos:</p><p>Ágil – agílimo ou agilíssimo</p><p>Amargo – amaríssimo ou amarguíssimo</p><p>Baixo – Ínfimo ou baixíssimo</p><p>Doce – dulcíssimo ou docíssimo</p><p>Humilde – humílimo ou humildíssimo</p><p>Magro – macérrimo ou magríssimo (“magérrimo” é forma coloquial,</p><p>de acordo com a maior parte dos estudiosos)</p><p>Nobre – nobilíssimo ou nobríssimo</p><p>Pobre – paupérrimo ou pobríssimo</p><p>Recente – nupérrimo ou recentíssimo</p><p>Abaixo, nota-se grau comparativo de adjetivo e de verbo nas partes</p><p>destacadas. A passagem é interessante para distinguir tais fenômenos:</p><p>“Eu adoro todas as coisas</p><p>E o meu coração é um albergue aberto toda a noite.</p><p>Tenho pela vida um interesse ávido</p><p>Que busca compreendê-la sentindo-a muito.</p><p>Amo tudo, animo tudo, empresto humanidade a tudo,</p><p>Aos homens e às pedras, às almas e às máquinas.</p><p>Para aumentar com isso a minha personalidade.</p><p>10</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pertenço a tudo para pertencer cada vez mais a mim próprio</p><p>E</p><p>a minha ambição era trazer o universo ao colo</p><p>Como uma criança a quem a ama beija.</p><p>Eu amo todas as coisas, umas mais do que as outras —</p><p>Não nenhuma mais do que outra, mas sempre mais as que</p><p>estou vendo</p><p>Do que as que vi ou verei.</p><p>Nada para mim é tão belo como o movimento e as sensações.</p><p>A vida é uma grande feira e tudo são barracas e saltimbancos.</p><p>Penso nisto, enterneço-me mas não sossego nunca.”</p><p>(Livro de Versos, Fernando Pessoa como Álvaro de Campos)</p><p>Note como, no verso “Nada para mim é tão belo como o movimento</p><p>e as sensações”, trabalha-se com o grau comparativo do adjetivo “belo”, ou</p><p>seja, compara-se a incidência de tal característica (“belo”) sobre os termos</p><p>“nada” e “o movimento e as sensações”.</p><p>Ressalta-se, por fim, que os adjetivos bom, mau, grande e pequeno</p><p>têm formas especiais de comparativo de superioridade:</p><p>Bom – melhor</p><p>Mau – pior</p><p>Grande – maior</p><p>Pequeno – menor</p><p>Assim, no Brasil, não se diz “Este conto é mais pequeno (do) que</p><p>aquele”, mas sim “Este conto é menor (do) que aquele”. No entanto, caso se</p><p>estejam contrapondo qualidades, é possível fazer tais construções:</p><p>O cartorário era mais bom (do) que propriamente inteligente.</p><p>O sofá mostrou-se mais grande (do) que confortável.</p><p>ARTIGO</p><p>AULA 3</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Artigo</p><p>O artigo faz referência a toda uma classe ou espécie, seja de maneira</p><p>definida, determinada, precisa; seja de maneira indefinida, vaga, imprecisa.</p><p>No primeiro caso, usam-se os artigos o, a, os, as. No segundo, os</p><p>artigos um, uma, uns, umas.</p><p>O artigo antecede o substantivo e, na maioria das vezes, transforma</p><p>a palavra que o sucede em substantivo (quando, evidentemente, já não o</p><p>for), num processo de derivação imprópria. No poema de Cora Coralina, a</p><p>interjeição “ai” transforma-se em substantivo:</p><p>Meu pai</p><p>Nada lhe dei nas mãos.</p><p>Nem um beijo,</p><p>Uma oração, um triste ai.</p><p>Eu era tão pequena!...</p><p>E fiquei sempre pequenina na grande</p><p>falta que faz meu pai.</p><p>(Cora Coralina)</p><p>ESTILÍSTICA</p><p>Estilisticamente, pode o artigo ser de grande valia. O definido tem</p><p>como função primordial indicar indivíduos conhecidos ou já mencionados,</p><p>ao passo que o indefinido propõe indivíduos desconhecidos, não</p><p>mencionados.</p><p>No sermão da Sexagésima, Padre Antônio Viera se vale claramente</p><p>de tal recurso:</p><p>Mas dir-me-eis: Padre, os pregadores de hoje não pregam o</p><p>Evangelho? Não pregam as Sagradas Escrituras? Pois como não pregam</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>a palavra de Deus? Esse é o mal. Pregam palavras de Deus, mas não</p><p>pregam a palavra de Deus. [...] As palavras de Deus, pregadas no sentido</p><p>em que Deus as disse, são palavras de Deus; mas pregadas no sentido</p><p>que nós queremos, não são palavras de Deus, antes podem ser palavras</p><p>do Demónio.</p><p>(Padre Antônio Vieira, Sermão da Sexagésima)</p><p>“A palavra de Deus” é insubstituível, não obstante possam os</p><p>pregadores distorcer seu sentido, e quem exprime linguisticamente essa</p><p>verdade incontornável é o artigo definido “a”.</p><p>Além de individualizar o ser, pode ainda o artigo definido indicar</p><p>proximidade, razão pela qual não é indicado diante de personalidades</p><p>célebres, especialmente quando forem históricas:</p><p>Ninguém resistia aos encantos de Cleópatra. (Não “da” Cleópatra)</p><p>Napoleão Mendes de Almeida contribuiu inestimavelmente para a</p><p>gramática de nossa língua. (Não “o” Napoleão Mendes de Almeida)</p><p>Mas:</p><p>A Mariana e o Pedro chegaram atrasados de novo? (Os artigos</p><p>ressaltam familiaridade – seu emprego é facultativo e depende da região.)</p><p>O necessário Napoleão Mendes Mendes de Almeida apareceu na hora</p><p>certa para fazer os questionamentos certos. (Ao se inserir um especificador</p><p>[“necessário”], o artigo passa a ser obrigatório.)</p><p>Enquanto a função primordial do definido é a individualização, a do</p><p>indefinido é a generalização ou a indeterminação.</p><p>Um bom rato precisa saber se proteger dos gatos. (Nota-se a</p><p>generalização de “bom rato”.)</p><p>Um homem abordou-me na rua hoje para vender lotes. (Nota-se a</p><p>falta de familiaridade.)</p><p>No último exemplo, caso se fosse falar novamente sobre a pessoa</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>que fez a abordagem, usar-se-ia “o homem” (não mais “um homem”), uma</p><p>vez que já seria alguém conhecido do receptor, pois já foi introduzido no</p><p>discurso do emissor.</p><p>Além dos já mencionados, alguns usos dos artigos definido e</p><p>indefinido merecem registro. Comecemos pelo definido:</p><p>– Deve ser utilizado antes de pronome possessivo substantivo (que</p><p>substitui o substantivo), mas é facultativo diante de pronome possessivo</p><p>adjetivo (que acompanha o substantivo):</p><p>Ele disse palavras de consolo a (ou aos) meus pais, mas não aos seus.</p><p>Ele disse palavras de consolo a (ou às) minhas irmãs, mas não às suas.</p><p>– Indica a totalidade de uma espécie:</p><p>O pior cego é o surdo. Tirem o som de uma paisagem e não haverá</p><p>mais paisagem.”</p><p>(Nelson Rodrigues, “Flor de obsessão: as 100 melhores frases de</p><p>Nelson Rodrigues”)</p><p>– Não é usado quando se pretende sentido genérico de substantivo:</p><p>Não costumo ir a eventos de gala.</p><p>Não costumo ir a festas de gala.</p><p>– Pode aparecer em posições diferentes quando há estruturas</p><p>superlativas:</p><p>Hei de percorrer os caminhos mais retos na vida.</p><p>Hei de percorrer caminhos os mais retos na vida. (Cuidado: Não se diz</p><p>“os caminhos os mais retos”.)</p><p>– Diante de topônimos (nomes de lugar, como continentes, rios,</p><p>mares, desertos, países, regiões etc.), pode ou não aparecer, a depender do</p><p>que se consagrou:</p><p>Na Espanha, a sesta é cultural.</p><p>Moro em Goiás. (Não no Goiás)</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Ó mar salgado, quanto do teu sal</p><p>São lágrimas de Portugal! (Não do Portugal)</p><p>Por te cruzarmos, quantas mães choraram,</p><p>Quantos filhos em vão rezaram!</p><p>(...)</p><p>Para aprofundar o estudo, veja o que diz o site do Senado:</p><p>Nomes de cidades: em geral, não se usa artigo com nomes de</p><p>cidades e ilhas: Brasília, Buenos Aires, São Paulo, Florianópolis, Ilha Grande.</p><p>Nomes derivados de substantivos comuns mantêm o artigo: o Rio de</p><p>Janeiro, o Porto, o Cairo. Com Recife, o artigo é facultativo. A Secom adota</p><p>o Recife, no Recife.</p><p>Está em dúvida?</p><p>Dica: pesquise no dicionário o adjetivo gentílico (mato-grossense</p><p>ou recifense, por exemplo). O verbete dirá “... procedente de” (sem artigo)</p><p>ou “procedente do” e “da”; relativo “a” (sem artigo) ou relativo “à” e “ao”. O</p><p>Dicionário Aurélio, por exemplo, define “do Recife”.</p><p>Também mantêm o artigo algumas ilhas, como: a Sicília, a Sardenha,</p><p>a Madeira, a Groenlândia, a Córsega.</p><p>Nomes de estados brasileiros: o nome de alguns estados brasileiros</p><p>não aceita artigo. Antes de Alagoas e Minas Gerais, o artigo é facultativo. A</p><p>Secom adota sem artigo.</p><p>Use sem artigo: Alagoas, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul,</p><p>Minas Gerais, Pernambuco, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, São Paulo</p><p>e Sergipe.</p><p>Não use: O senador elogia balança comercial do Mato Grosso.</p><p>Use: O governador de Mato Grosso vem ao Senado.</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Os demais estados exigem o artigo: o Acre, o Amapá, o Amazonas,</p><p>a Bahia, o Ceará, o Espírito Santo, o Maranhão, o Pará, a Paraíba, o Paraná,</p><p>o Piauí, o Rio de Janeiro, o Rio Grande do Norte, o Rio Grande do Sul, o</p><p>Tocantins. Também use artigo com o nome do Distrito Federal.</p><p>Nomes de países, regiões e continentes: geralmente são</p><p>acompanhados de artigo definido: o Afeganistão, a África do Sul, a Albânia,</p><p>a Alemanha, a Arábia Saudita, a Argélia, as Bahamas, o Brasil, o Butão, o</p><p>Canadá, o Chade, o Chipre, o Djibuti, os Emirados Árabes Unidos, os Estados</p><p>Unidos, a Guatemala, a Guiana, a Guiné, a Guiné-Bissau, a Guiné Equatorial,</p><p>o Iêmen, o Kiribati, o Kuwait, o Laos, o Lesoto, o Malaui, o Mali, o Níger, o</p><p>Senegal, a Suazilândia, a Região Sul, a Região Serrana, os Andes, a Antártida,</p><p>a Oceania.</p><p>Alguns países, porém, não aceitam o artigo.</p><p>Use com as preposições de e em: Andorra, Angola, Antígua e Barbuda,</p><p>Bangladesh, Barbados, Belize, Benin, Botsuana, Brunei, Burkina Fasso,</p><p>Burundi, Cabo Verde, Camarões, Cingapura, Comores (Ilhas Comores),</p><p>Cuba, Dominica, El Salvador, Eritreia, Fiji, Gâmbia, Gana, Granada, Honduras,</p><p>Israel, Liechtenstein, Luxemburgo, Macau, Madagascar, Malta, Marrocos,</p><p>Maurício, Mianmar, Moçambique, Mônaco, Montenegro, Nauru, Omã, Palau,</p><p>Papua-Nova Guiné, Portugal, Ruanda, Samoa, San Marino, Santa Lúcia, São</p><p>Cristóvão e Névis, São Tomé e Príncipe, São Vicente e Granadinas, Seicheles,</p><p>Serra Leoa, Sri Lanka, Taiwan, Timor Leste, Tonga, Trinidad e Tobago, Tuvalu,</p><p>Uganda, Zâmbia, Zimbábue.</p><p>CRE aprova indicações para embaixadas no Azerbaijão e no Cabo Verde</p><p>CRE aprova indicações para embaixadas no Azerbaijão e em Cabo Verde</p><p>Indicações para embaixadas na Hungria e Dominica são aprovadas</p><p>pela CRE.</p><p>Indicações para embaixadas na Hungria e na Dominica são aprovadas</p><p>pela CRE.</p><p>7</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Comissão examina indicações para embaixadas brasileiras em</p><p>Botsuana e Eslováquia.</p><p>Comissão examina indicações para embaixadas brasileiras em</p><p>Botsuana e na Eslováquia.</p><p>Nomes de acidentes geográficos: em geral, pedem artigo nomes de</p><p>rios, lagos, oceanos, mares, montanhas, serras, desertos, vulcões: o Rio São</p><p>Francisco, o São Francisco, o Atlântico, o Mediterrâneo, o Mar Vermelho,</p><p>o Titicaca, a Serra do Cipó, o Himalaia, os Andes, o Saara, o Puyehue, o</p><p>Villarrica. Use o mesmo critério para constelações: o Cruzeiro do Sul, o</p><p>Triângulo Austral.</p><p>– Usa-se diante de dias da semana e de horas, nas expressões</p><p>adverbiais de tempo:</p><p>Aos sábados, hei de descansar.</p><p>Ao meio-dia, a cidade parou.</p><p>Às sete horas, começa a reunião.</p><p>Ressalta-se, no entanto, que é comum a supressão de artigo e</p><p>preposição nesse tipo de caso: Sábado, hei de descansar.</p><p>– É usado depois de “ambos”, quando há elemento posterior:</p><p>Ambos os meus alunos são candidatos à presidência.</p><p>– Usa-se após o pronome “todo” para indicar inteireza; sem o artigo,</p><p>“todo” significará “qualquer”:</p><p>Toda a sala estava cheirando mal. (=A sala inteira)</p><p>Toda sala desta casa é decorada com fotografias. (=Quaisquer salas</p><p>que se observem nesta casa)</p><p>“Toda mulher bonita é um pouco a namorada lésbica de si</p><p>mesma.” (Nelson Rodrigues)</p><p>“Toda unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade</p><p>8</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>não precisa pensar.” (Nelson Rodrigues)</p><p>Abordemos alguns usos de artigo indefinido:</p><p>– Pode indicar depreciação:</p><p>Ah! Esse cara tem me consumido</p><p>A mim e a tudo que eu quis</p><p>Com seus olhinhos infantis</p><p>Como os olhos de um bandido</p><p>Ele está na minha vida porque quer</p><p>Eu estou pra o que der e vier</p><p>Ele chega ao anoitecer</p><p>Quando vem a madrugada ele some</p><p>Ele é quem quer</p><p>Ele é o homem</p><p>Eu sou apenas uma mulher</p><p>(Caetano Veloso, Esse cara)</p><p>Nos dois últimos versos, note a força semântica da contraposição do</p><p>artigo definido com o artigo indefinido. O indefinido marca depreciação.</p><p>– Pode indicar ênfase (positiva ou negativa):</p><p>Ele tem um jeito para tratar de assuntos delicados!</p><p>– Pode indicar aproximação:</p><p>Chegaremos umas oito e meia.</p><p>Por fim, convém fazer três pontuações sobre esta classe gramatical:</p><p>1) Não se faz contração com preposição quando há sujeito de infinitivo:</p><p>Está na hora de o rapaz ir.</p><p>No caso de o assunto ser abordado, desconversarei.</p><p>A probabilidade de a candidata ser eleita é pequena.</p><p>2) Caso o artigo faça parte do título de alguma obra, pode-se evitar a</p><p>9</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>contração com a preposição antecedente ou usar apóstrofo (caso previsto</p><p>pelo Novo Acordo):</p><p>Li tais versos n’Os Lusíadas.</p><p>Li tais versos em Os Lusíadas.</p><p>2) É fundamental atentar ao papel expressivo do artigo, pois sua</p><p>presença ou ausência eventualmente pode comprometer o que se pretende</p><p>com o texto. Veja:</p><p>Foi premiado o cinema argentino e japonês.</p><p>Da maneira como se escreveu, dá-se a impressão de estar falando</p><p>a respeito de um único cinema, o qual ao mesmo tempo é argentino e</p><p>japonês. Para evitar possíveis mal-entendidos, há formas de reescrita, como:</p><p>Foi premiado o cinema nipo-argentino. (Com o emprego do adjetivo</p><p>composto, fica evidente que há, entre Japão e Argentina, colaboração para a</p><p>produção de filmes, ou seja, o cinema em questão tem duas nacionalidades.)</p><p>Foram premiados o cinema argentino e o japonês (Note a repetição</p><p>do artigo. No segundo caso, a presença de “o” subentende a palavra “cinema”,</p><p>ou seja, o [cinema] japonês.)</p><p>Foram premiados os cinemas argentino e japonês.</p><p>3) Ao contrário do que se costuma pensar, é plenamente possível</p><p>haver contração de artigo indefinido com preposição:</p><p>Saí dum quarto cheio de gente.</p><p>Numa das vezes em que ele me ligou, eu não estava em casa.</p><p>Mas de repente fiquei fria: tinha entendido. A mulher continuava</p><p>a falar. Então tirei da bolsa os dois mil cruzeiros e com horror de mim</p><p>passei-os à mulher. Esta não hesitou um segundo, pegou-os, meteu-os</p><p>num bolso invisível entre o que me pareceram inúmeras saias, quase</p><p>derrubando na sua rapidez o menino-menina.</p><p>(Clarice Lispector, As caridades odiosas)</p><p>NUMERAL</p><p>AULA 4</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Numeral</p><p>Numeral é a classe gramatical responsável por indicar quantidade,</p><p>expressa de forma absoluta (cardinal), fracionária (fracionário), multiplicativa</p><p>(multiplicativo) ou ordenadora (ordinal).</p><p>Cardinais: zero, um, dois, três, quatro, cinco...</p><p>Ordinais: primeiro, segundo, terceiro, quarto, quinto...</p><p>Multiplicativos: dobro/duplo/dúplice, triplo/tríplice, quádruplo,</p><p>quíntuplo...</p><p>Fracionários: meio/metade, terço, quarto, quinto...</p><p>Assim como o adjetivo, é uma classe intimamente ligada ao</p><p>substantivo, podendo acompanhá-lo ou substituí-lo.</p><p>Sete anos de pastor Jacob servia</p><p>Labão, pai de Raquel, serrana bela;</p><p>mas não servia ao pai, servia a ela,</p><p>e a ela só por prêmio pretendia.</p><p>(Camões)</p><p>Trata-se, no caso, de numeral cardinal adjetivo, uma vez que</p><p>acompanha o substantivo “anos”. Se se dissesse, por exemplo:</p><p>“Dos sete, três foram de grande sofrimento”,</p><p>os numerais “sete” e “três” carregariam em si mesmos a ideia do</p><p>substantivo “anos”. Seriam, portanto, numerais substantivos.</p><p>Por derivação imprópria, porém, pode ocorrer de virarem verdadeiros</p><p>substantivos. Isso acontece quando não indicarem quantidade exata no</p><p>contexto, mas sim a denominação dos próprios números:</p><p>O número dez me dá sorte.</p><p>O três é um numeral atrelado ao divino.</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>O aluno inadvertidamente transformou um zero num dez no</p><p>campo da nota.</p><p>Convém ressaltar que, para não confundir o numeral “um” com o</p><p>artigo indefinido “um”, basta atentar ao inegável caráter quantitativo</p><p>presente quando se fala em numeral:</p><p>Comprei não uma, mas duas bolsas. (numeral)</p><p>Quantos filhos tenho? Apenas um. (numeral)</p><p>Existe apenas e tão somente um Deus. (numeral)</p><p>Ele era apenas um autor mediano. (artigo indefinido)</p><p>Encontrei um ex-aluno hoje. (artigo indefinido)</p><p>Assim como os substantivos coletivos, há também numerais coletivos,</p><p>responsáveis por indicar quantia exata de seres ou coisas: quarentena, biênio,</p><p>semestre, século, dúzia, quarteto etc. Muitos são os autores que classificam</p><p>tais palavras como substantivos coletivos, não numerais.</p><p>A respeito de seu emprego prático, algumas observações úteis sobre</p><p>numerais precisam ser feitas:</p><p>1) Milhão, milhar, trilhão etc. são considerados numerais ou</p><p>substantivos e, portanto, determinam a concordância dos determinantes:</p><p>Os três milhões</p><p>de pessoas votaram a favor da reforma.</p><p>Há hoje uns três bilhões e meio de mulheres no mundo.</p><p>Ainda faltam alguns milhares de páginas para ele terminar o livro.</p><p>2) “Meio”, quando numeral (indicando “metade”), concorda com o</p><p>substantivo ao qual se refere:</p><p>Quero apenas meia laranja. (metade da laranja)</p><p>Já é meio-dia e meia. (meia hora)</p><p>No entanto, quando advérbio – indicando intensidade – não varia:</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Fiquei meio ressabiada com esta história. (um pouco ressabiada,</p><p>não “metade” ressabiada)</p><p>3) Frequentemente, o valor semântico dos numerais vai muito além</p><p>da simples quantificação. Ao dizer que determinado bem é de “quinta</p><p>categoria”, pretende-se diminuir-lhe o valor; se, no entanto, é de “primeira</p><p>categoria”, amplia-se seu valor. Embora numerais não sejam variáveis,</p><p>podem sê-lo, quando funcionam como verdadeiros adjetivos. Exemplo:</p><p>“primeiríssima” categoria (variação de grau, no caso).</p><p>Na passagem abaixo, Cristo valeu-se de hipérbole (figura de</p><p>linguagem que indica o exagero) por meio dos numerais:</p><p>Então Pedro, aproximando-se dele, disse: Senhor, até quantas</p><p>vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei? Até sete?</p><p>Jesus lhe disse:</p><p>Não te digo até sete; mas até setenta vezes sete.</p><p>(Mateus 18:21–35)</p><p>4) A grafia de numerais cardinais por extenso é feita da seguinte</p><p>forma:</p><p>2.456.256 = dois milhões, quatrocentos e cinquenta e seis mil,</p><p>duzentos e cinquenta e seis</p><p>2.456.200 = dois milhões, quatrocentos e cinquenta e seis mil e</p><p>duzentos</p><p>Sendo o número muito extenso, modernamente usa-se a vírgula:</p><p>Foi recebido 1,4 milhão de reais.</p><p>5) Emprega-se numeral ordinal para o primeiro dia do mês: 1º</p><p>(primeiro) de abril é o Dia da Mentira.</p><p>6) Para designar datas, admite-se mais de uma forma: o evento</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>ocorrerá em dois de abril/aos dois de abril/no dia dois de abril/aos dois dias</p><p>do mês de abril.</p><p>7) Para designar horas, grafa-se da seguinte forma: 19h40min6s</p><p>(dezenove horas, quarenta minutos e seis segundos).</p><p>8) A leitura de porcentagens pode ser feita de duas formas:</p><p>83,47%: oitenta e três inteiros e quarenta e sete centésimos por cento</p><p>Ou</p><p>oitenta e três vírgula quarenta e sete por cento.</p><p>9) Não se emprega ponto para indicação de data: 1999, 2021, 1789 etc.</p><p>Nos demais casos, emprega-se: Pagaram-me os R$1.400 que me deviam.</p><p>10) As formas “catorze” e “quatorze” são devidamente registradas e</p><p>aceitas.</p><p>11) Não se usa “um” antes de mil: Isto custou mil reais (não “um” mil</p><p>reais).</p><p>12) Atente à concordância do numeral “zero”. Por ser a ausência de</p><p>elementos, não há razão para que o substantivo vá para o plural: Ontem fez</p><p>zero grau; aquilo está à distância de zero metro dele; o objeto custou zero</p><p>real.</p><p>6</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>PRONOME</p><p>AULA 5</p><p>2</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Pronome</p><p>Pronome é a classe gramatical responsável por denotar os seres</p><p>ou substituí-los dentro e fora do discurso. Trata-se de palavras dotadas de</p><p>caráter dêitico, uma vez que mostram os seres em vez de conceituá-los.</p><p>Dessa forma, os pronomes têm significação dependente do contexto.</p><p>Obs.: “Discurso” é a “comunicação oral ou escrita que pressupõe um</p><p>locutor e um interlocutor”. (Michaelis)</p><p>No poema abaixo, por exemplo, Mário Quintana se vale de inúmeros</p><p>pronomes, os quais somente denotam um referente claro quando colocados</p><p>no contexto: “eu” e “meu” referem-se ao autor (Mário), “todos”, “esses”, “que”</p><p>e “eles” referem-se aos indivíduos que estão atravancando o caminho dele.</p><p>Poeminho do Contra</p><p>Todos esses que aí estão</p><p>Atravancando meu caminho,</p><p>Eles passarão...</p><p>Eu passarinho!</p><p>(Mário Quintana)</p><p>Assim como outras classes já estudadas, também os pronomes</p><p>podem ser substantivos (quando substituem os substantivos ou palavras</p><p>com valor substantivo) ou adjetivos (quando acompanham os substantivos</p><p>ou palavras com valor substantivo).</p><p>No poema acima, por exemplo, “meu” é pronome que acompanha</p><p>o substantivo “caminho”, portanto se trata de pronome adjetivo; já “eu”</p><p>substitui a própria pessoa do autor, logo se trata de pronome substantivo.</p><p>3</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Classificação dos pronomes</p><p>Os pronomes podem ser pessoais, possessivos, demonstrativos,</p><p>relativos, indefinidos e interrogativos.</p><p>Pronomes pessoais</p><p>São aqueles que designam as pessoas do discurso (emissor, receptor</p><p>e referente/assunto). Podem ser do caso reto ou do caso oblíquo.</p><p>São do caso reto aqueles que, por via de regra, funcionam como</p><p>sujeito do verbo, embora também possam funcionar como predicativo do</p><p>sujeito, aposto, vocativo e objeto direto, como se verá mais profundamente</p><p>na parte destinada à sintaxe.</p><p>São do caso oblíquo, por sua vez, os que funcionam majoritariamente</p><p>como complemento verbal ou nominal, embora possam desempenhar</p><p>inúmeras outras funções. Veja:</p><p>Nós (sujeito) somos pecadores.</p><p>Santa Maria, mãe de Deus, rogai por nós (complemento), pecadores,</p><p>agora e na hora da nossa morte.</p><p>No primeiro caso, “nós” é sujeito do verbo “ser”. Trata-se, portanto,</p><p>de pronome pessoal do caso reto. No segundo caso, quem roga, roga</p><p>por alguém, “por nós” é expressão que complementa o sentido do verbo,</p><p>tratando-se, pois, de pronome pessoal do caso oblíquo.</p><p>Veja o quadro:</p><p>4</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Os pronomes oblíquos átonos não são regidos por preposição, ao</p><p>passo que os tônicos o são. No exemplo anterior, “nós” é oblíquo tônico</p><p>regido pela preposição “por” (rogai por nós). Observe:</p><p>Não me convidaram pra esta festa pobre. (Cazuza)</p><p>Não convidaram a mim pra esta festa pobre.</p><p>Nos dois casos, os pronomes “me” e “mim” complementam o sentido</p><p>do verbo “convidar”. Note como, para que se use o pronome tônico “mim”, é</p><p>necessário haver uma preposição (no caso, preposição a). O pronome átono</p><p>dispensa esse emprego.</p><p>Convém ressaltar que os pronomes pessoais do caso reto (eu, tu, ele,</p><p>nós, vós, eles) não podem vir preposicionados, de maneira que construções</p><p>como “Entre eu e tu nunca houve amizade” estão erradas do ponto de vista</p><p>normativo. A construção deveria ser “Entre mim e ti nunca houve amizade”.</p><p>Se, no entanto, os pronomes estiverem funcionando como sujeito, aí,</p><p>sim, podem aparecer em sua forma reta: “Entre eu sair e tu saíres, prefiro</p><p>que eu o faça”. Veja como Fernando Pessoa sempre se vale do oblíquo</p><p>tônico mim após preposição:</p><p>5</p><p>E - B O O K B P G R A M Á T I C A N O R M A T I V A D A L Í N G U A P O R T U G U E S A</p><p>Longe de mim em mim existo.</p><p>Entre mim e o que sou há escuridão.</p><p>Mas não há nada, salvo tudo sem mim.</p><p>(Fernando Pessoa)</p><p>Exatamente pelo mesmo motivo, a gramática normativa</p><p>majoritariamente não tolera construções como “A hora dela ir embora</p><p>chegou” ou “Pelo fato dele ter muitos inimigos, decidiu se mudar”. Para</p><p>figurar como sujeito de infinitivo, os pronomes não devem aparecer</p><p>contraídos com preposições. Logo, prefere-se:</p><p>A hora de ela ir embora chegou.</p><p>Pelo fato de ele ter muito inimigos, decidiu se mudar.</p><p>Pensei em ele levar as compras, não eu.</p><p>Plural de modéstia</p><p>É muito comum substituir-se o emprego do pronome “eu” pelo “nós”,</p><p>com o fim de imprimir tom menos pessoal e mais modesto ao discurso.</p><p>Como bem pontua Celso Cunha em sua Gramática,</p><p>“Não devemos nos esquecer de que as palavras que designam</p><p>sentimentos exagerados da própria personalidade começam sempre</p><p>por ego, que era a forma latina do pronome eu: egoísmo, egocêntrico,</p><p>ególatra, egotismo.”</p><p>O texto abaixo explica a origem dessa prática e conta como ela se</p><p>incorporou a nossa cultura.</p><p>O PLURAL DE MODÉSTIA OU PLURAL MAJESTÁTICO</p><p>Você</p>