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CASO CLÍNICO R.B.S, 24 anos, G1 PN1 A0, primípara, IG no parto: 40 semanas e 3 dias, natural de Caravelas, sem comorbidades. Realizado pré-natal de baixo risco habitual, de forma adequada. Foi encaminhada à UMMI de Teixeira de Freitas, mediante vaga zero, com quadro de hemorragia uterina volumosa refratária ao uso de ocitocina e transamin, após parto parto vaginal no dia 14/03/24, às 10:12h. No 3º período do parto, dequitação completa da placenta, com sangramento imediato. Revisado canal de parto, identificado laceração grau 1, feito rafia. Exame físico pós-parto: REG, estável hemodinamicamente, sem uso de drogas vasoativas, apresentando hemorragia vaginal volumosa e persistente, hipocorada 1+/4+, afebril, acianótica. SINAIS VITAIS: FC: 110 bpm, FR: 18 irpm, PA: 100x60 mmHg, Sat O2: 96%, Glasgow 15. ABD: flácido, indolor à palpação. QUAL A HIPÓTESE DIAGNÓSTICA? (que o médico de Caravelas pensou ao solicitar vaga zero) R.B.S, 24 anos, G1 PN1 A0, primípara, IG 40 semanas e 3 dias, natural de Caravelas, sem comorbidades. Realizado pré-natal de baixo risco habitual, de forma adequada. Foi encaminhada à UMMI de Teixeira de Freitas, mediante vaga zero, com quadro de hemorragia uterina volumosa refratária ao uso de ocitocina e transamin, após parto parto vaginal no dia 14/03/24, às 10:12h. No 3º período do parto, dequitação completa da placenta, com sangramento imediato. Revisado canal de parto, identificado laceração grau 1, feito rafia. Exame físico pós-parto: REG, estável hemodinamicamente, sem uso de drogas vasoativas, apresentando hemorragia vaginal volumosa e persistente, hipocorada 1+/4+, afebril, acianótica. SINAIS VITAIS: FC: 110 bpm, FR: 18 irpm, PA: 100x60 mmHg, Sat O2: 96%, Glasgow 15. ABD: flácido, indolor à palpação. ROTURA UTERINA! HEMORRAGIA PÓS-PARTO UNIVERSIDADE FEDERAL DO SUL DA BAHIA INTERNATO DE GINECOLOGIA E OBSTETRÍCIA II Internos: Aleff Caio Menezes Alves e Beatriz Rihs Matos Tavares DEFINIÇÕES 01 HEMORRAGIA PÓS-PARTO (HPP) Perda sangue ≥ 2.000 mL nas primeiras 24 horas pós-parto ou Necessidade de transfusão ≥ 4 bolsas de concentrado de hemácias ou Queda da hemoglobina ≥ 4 g/dL ou Distúrbios de coagulação Qualquer perda sanguínea que acarrete instabilidade hemodinâmica ou Perda de sangue ≥ 500 mL após parto vaginal ou ≥ 1.000 mL após parto cesáreo + nas primeiras 24 horas pós-parto HEMORRAGIA PÓS-PARTO MACIÇA (HPPM) CLASSIFICAÇÕES 02 PRIMÁRIA → até 24 horas PRINCIPAIS CAUSAS: atonia uterina, retenção de restos placentários, lacerações, inversão uterina, acretismo placentário, distúrbios de coagulação SECUNDÁRIA → entre 24 horas e 6 a 12 semanas após o parto PRINCIPAIS CAUSAS: infecção puerperal (endometrite), retenção de restos placentários, doença trofoblástica gestacional, e distúrbios hereditários de coagulação QUAL A CLASSIFICAÇÃO DA HPP DO CASO? ETIOLOGIA e FATORES DE RISCO 03 PRINCIPAIS CAUSAS → 4Ts 01 TÔNUS Atonia uterina! 02 TRAUMA Laceração, hematoma, inversão e rotura uterina 03 TECIDO Retenção de tecido placentário, coágulos e acretismo placentário 04 TROMBINA Coagulopatias e uso de anticoagulantes FATORES DE RISCO GERAIS: Anteparto: HPP prévio, gestação gemelar, polidramnia, macrossomia, distúrbios de coagulação, DHEG Intraparto: trabalho de parto prolongado, laceração vaginal 3º e 4º gau, DPP, parada de progressão ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO 04 BAIXO → Manejo ativo no 3º período + observação de 2 horas FATORES DE RISCO: ausência de cicatriz uterina; gravidez única; ≤ 3 partos vaginais prévios; sem distúrbios de coagulação; sem história de HPP MODERADO FATORES DE RISCO: história prévia de HPP; parto cesáreo prévio; cirurgia uterina prévia; gestação múltipla; pré-eclâmpsia; ≥ 4 partos vaginais; HAS gestacional leve; polidrâmnio; macrossomia fetal; corioamnionite; obesidade → Condutas anteriores + acesso venoso periférico + solicitar hemograma e tipo sanguíneo + Rh ALTO FATORES DE RISCO: ≥ 2 fatores de médio risco; placenta prévia; acretismo placentário; pré-eclâmpsia grave; plaquetopenia < 100.000; hematócrito < 30; sangramento ativo na admissão; DPP; coagulopatias; uso de coagulantes → Condutas anteriores + solicitar prova cruzada + avisar o banco de sangue CASO CLÍNICO COMO DAR SEGUIMENTO A ESTE CASO? Na UMMI, a paciente foi examinada clinicamente e coletado exames laboratoriais e de imagem. Ao exame físico: útero contraído, sangue abundante, intensa quantidade de coágulos. Exames laboratoriais (14/03/24): Hb 7,1; Ht 20,8; Leucócitos 22.750; Plaquetas 253.000; Segmentados 76; Linfócitos 9; Bastões 5; Ferritina 18,6; PCR 16,47. Testes rápidos para HIV, sífilis, hepatites B e C não reagentes. USG (14/03/2024): Exame compatível com o período puerperal precoce. DIAGNÓSTICO 05 ESTIMATIVA VISUAL CONTRAS: parâmetro subjetivo + subestima as perdas volumosas PESAGEM DE COMPRESSAS LEMBRANDO QUE… 1g de sangue = 1mL de sangue PERDA SANGUÍNEA ESTIMADA (mL) = peso das compressas sujas de sangue (g) - peso do mesmo nº de compressas secas (g) ÍNDICE DE CHOQUE (IC) ÍNDICE DE CHOQUE = __ frequência cardíaca (FC)___ pressão arterial sistólica (PAS) → quanto maior o índice, pior o prognóstico! IC ≥ 0,9 = perda sanguínea significativa IC ≥ 1,0 = abordagem rápida e agressiva + possibilidade de transfusão sanguínea IC ≥ 1,3 a 1,4 = transfusão sanguínea maciça IC entre 1,3 a 1,4 e 1,7 = choque moderado IC ≥ 1,7 = choque grave HORA DE OURO NA HEMORRAGIA PÓS-PARTO: controle do sangramento de forma precoce e agressiva + prevenir complicações E OS EXAMES? DEVO SOLICITAR? QUAIS? EXAMES LABORATORIAIS: hemograma, tipagem sanguínea e fator Rh, fibrinogênio, prova cruzada, coagulograma, lactato, gasometria arterial Fibrinogênio < 200 mg/dL: valor preditivo positivo de 100% para HPP grave ULTRASSONOGRAFIA → achados sugestivos de HPP: descontinuidade do miométrio hematomas adjacentes à cicatriz uterina prévia membrana amniótica distendida para fora do útero (dedo de luva) presença de líquido livre em cavidade peritoneal partes fetais fora da cavidade uterina extrusão completa fetal da cavidade e morte fetal TRATAMENTO 06 QUAL A 1ª CONDUTA A SER TOMADA? OCITOCINA! Parto vaginal: 10 UI, IM, imediatamente após nascimento Parto cesáreo: 3 UI, EV, de 3/3 minutos até 3x (dose ataque) + 15 UI diluído em SF 0,9% 500 mL, com velocidade de infusão a 100 mL/hora (dose manutenção) Além disso… Clampeamento oportuno do cordão umbilical ≥ 1 a 3 minutos, se possível Contato pele a pele mãe-bebê ≥ 2 horas, se possível Manobra de Brandt-Andrews: tração controlada do cordão umbilical Manobra de Jacobs: rodar a placenta para o seu desprendimento completo Revisão sistemática do canal de parto → para verificar se há lacerações Avaliação sistemática da placenta após dequitação → para conferir se a dequitação foi completa e se não sobrou restos placentários Vigilância + massagem uterina gentil de 15/15 minutos nas primeiras 2 horas pós-dequitação MEDIDAS GERAIS Manobra de Hamilton → massagem uterina bimanual Dois acessos venosos calibrosos SF 0,9% ou Ringer lactato 500 mL reavaliar a cada 500 mL e não ultrapassar 2.000 mL Ácido tranexâmico 1g + 100 mL de SF 0,9% em 10 minutos Oxigênio em máscara facial O2 a 100%, fluxo de 8 - 15 L/min Estimativa da perda sanguínea + calcular o índice de choque Avaliação rápida de possível etiologia Acionar banco de sangue Avaliação de antibioticoprofilaxia Elevação de membros inferiores → para melhora do retorno venoso Aquecimento da puérpera Sondagem vesical de demora Monitoramento contínuo da paciente COMPLICAÇÕES: Tríade letal (hipotermia + acidose + coagulopatia); histerectomia, infecção, falência de órgãos-alvo, edema pulmonar, coagulopatia, morte; síndrome de Sheehan (hipopituitarismopós-parto) HEMOTRANSFUSÃO TIPOS: Concentrado de hemácias (CH) 250-300 mL/unidade indicação: melhorar oxigenação tecidual em quadros hemorrágicos mudança laboratorial: eleva hemoglobina 1 a 1,5 g/dL e hematócrito em 3% Plasma fresco congelado (PFC) 180-200 mL/unidade indicação: sangramentos + RNI > 1,5, reposição de fatores de coagulação e transfusões maciças Concentrado de Plaquetas 50 mL/unidade randômica indicação: sangramentos + plaquetas < 50.000 ou < 100.000 se sangramento ativo mudança laboratorial: 1 unidade de plaqueta randômica = aumenta 5.000 a 10.000/mm³ METAS TERAPÊUTICAS: Hemoglobina > 8 g/dL Fibrinogênio > 200 mg/dL Plaquetas > 50.000/mm³ ou > 100.000/mm³ (se sangramento ativo) RNI ≤ 1,5 ATONIA UTERINA 07 CONCEITO: sangramento pós-parto + útero não contraído e acima da cicatriz umbilical FATORES DE RISCO: distensão uterina; multiparidade; corioamnionite; placentação anormal; trabalho de parto prolongado, taquitócito ou induzido CONDUTA Manobra de Hamilton (massagem uterina bimanual) Ácido tranexâmico 250 mg/5mL, 1g, EV lento em 10 minutos, de 6/6 horas Ocitocina 5UI/1mL, 5UI (1 amp) EV lento, em 3 minutos + 20 a 40 UI (4 a 8 amp) em SF 0,9% 500 mL, infusão de 250 mL\h Metilergometrina 0,2mg/mL, 0,2 mg (1 amp), IM contraindicação: quadros hipertensivos / gestantes hipertensas Misoprostol 200 mcg, 800 mcg (4 comp), via retal ou oral Traje antichoque não pneumático Balão de tamponamento intrauterino (se falha de uterotônicos) E/OU LAPAROTOMIA técnicas: sutura compressiva de B-Lynch → ligadura das artérias uterinas ou das artérias ilíacas internas → histerectomia INDICAÇÃO: falha da terapia farmacológica na atonia uterina Administrar Ceftriaxona + Ocitocina em dose de manutenção TEMPO DE USO: até 24 horas ou se a hemorragia for controlada e a gestante estabilizada TRAJE ANTICHOQUE NÃO PNEUMÁTICO INDICAÇÃO: sangramento com instabilidade hemodinâmica ou iminência de choque TEMPO DE USO: entre 6 e 8 horas PARÂMETROS PARA RETIRADA: Perda sanguínea < 50 mL/hora FC < 100 bpm PAS > 100 mmHg Hemoglobina (Hb) > 7 g/dL Hematócrito (Ht) > 20% BALÃO DE TAMPONAMENTO INTRAUTERINO LACERAÇÕES 08 RETENÇÃO PLACENTÁRIA 09 CONCEITO: quando a saída da placenta demora mais que 30 minutos FATORES DE RISCO: história de cesárea anterior história de placenta prévia curetagem prévia QUANDO SUSPEITAR: quando a placenta não sai íntegra após a dequitação ou quando a placenta não se desprende do útero no tempo esperado e precisa de extração manual CONDUTA: extração manual + curagem uterina CURAGEM UTERINA CONCEITO: retirada manual de conteúdo intra-uterino, com a introdução dos dedos indicador e médio envolvidos em gaze ou compressa por meio do colo uterino, procurando remover restos placentários, material ovular ou coágulos ROTURA UTERINA 10 CONCEITO: rotura completa de todas as camadas do útero, tanto o endométrio, quanto miométrio e serosa DEISCÊNCIA UTERINA: rotura incompleta ou rotura subclínica, normalmente envolvendo miométrio + endométrio e preservando a serosa uterina é assintomática e geralmente diagnosticada no intraoperatório de uma cesariana CLÍNICA: Bradicardia fetal < 110 bpm Sinal de Bandl-Frommel distensão do segmento uterino + palpação do ligamento redondo retesado Sinal de Reasens parada súbita das contrações + subida da apresentação fetal após rotura Sinais de choque hemorrágico QUANDO SUSPEITAR: bradicardia fetal, instabilidade hemodinâmica, dor abdominal repentina, diminuição da atividade uterina, apresentação fetal não mais detectável ao toque vaginal, hemorragia vaginal CONDUTA: estabilização hemodinâmica da paciente + cesárea de emergência para nascimento do concepto e correção da lesão QUANDO INTERROMPER A GESTAÇÃO Se rotura anterior ocorreu no termo, durante o trabalho de parto e no segmento uterino inferior: entre 36 e 37 semanas Se rotura anterior ocorreu < 37 semanas, antes do início do trabalho de parto, ou tenha sido originada no fundo uterino em vez do segmento inferior: a partir de 34 semanas COMPLICAÇÕES: lacerações de bexiga, infecção secundária do sítio cirúrgico, histerectomia, morbidade neonatal relacionada à hipóxia intrauterina, morte fetal CASO CLÍNICO CONDUTA NA ADMISSÃO: Manobra de relaxamento uterino. Realizado retirada de membranas do colo uterino e canal vaginal. Prescrito Ringer Lactato 500 mL, EV + SF 0,9% 500 mL, EV + Ergotrate 0,2 mg/mL, 01 amp, IM. Solicitado novos exames laboratoriais. PRESCRIÇÃO HOSPITALAR NA ADMISSÃO DA PACIENTE: Dieta oral livre SF 0,9% 500 mL de 6/6h + 01 amp ocitocina em cada soro Transamin 2 amp, EV, agora + 500 mL SF 0,9% Dipirona 500 mg, 01 amp EV de 6/6 horas Ondansetrona 4 mg/2mL, 01 amp EV de 8/8 horas Sinais vitais de 6/6 horas Cuidados gerais EXAMES LABORATORIAIS (15/03/24): Hb 4,7; Ht 13,3; Leucócitos 18.750; Plaquetas: 196.000; Segmentados 75; Linfócitos 17; Bastões 2; PCR: 15,49 TAP 13,2-73%; TTPA 25,7; RNI = 1,21 CONDUTA: Paciente encaminhada a sala de parto, sendo revisado canal de parto, encontrado laceração em ambas as laterais, com vaso ativo, pulsante e sangrante. Realizado rafia, sob anestesia local. Revisado sutura. Posteriormente, encaminhada ao alojamento conjunto. Feito 2 bolsas de CH, devido queda hemantimétrica. PRESCRIÇÃO HOSPITALAR POSTERIOR: Dieta oral livre SF 0,9% 500 mL de 6/6h Ergotrate 1 amp, IM, agora Cefalotina 1g, EV, de 6/6h Transamin 4 amp, EV + 500 mL SF 0,9% Dipirona 500 mg, 01 amp EV de 6/6 horas Ondansetrona 4 mg/2mL, 01 amp EV de 8/8 horas Sinais vitais de 6/6 horas Cuidados gerais APÓS HEMOTRANSFUSÃO (16/03/24): PA 130x90 mmHg, FC 87 bpm, SAT O2 98% AA, FR 18 irpm. Manteve-se afebril. Hipocorada 2+/4+. ABD: RHA+, flácido, indolor à palpação profunda, com útero involuído e globo de Pinard 5 dedos abaixo da cicatriz umbilical. EXAMES LABORATORIAIS (16/03/24): Hb 7,3; Ht 20,5; Leucócitos 14.780; Plaquetas: 208.000; RNI = 1. CONDUTA: Alta hospitalar; Prescrevo Noripurum 100 mg/5 mL, 01 amp, 02 amp/semana, EV; Prescrição pós-parto vaginal; Atestado médico de 120 dias; Orientações gerais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Álvaro Luiz Lage; FRANCISCO, Adriana Amorim; OSANAN, Gabriel Costa; VIEIRA, Laíses Braga. Hemorragia pós-parto: prevenção, diagnóstico e manejo não cirúrgico. FEBRASGO, V. 48, n. 11, p. 671 - 679, 2020. OPAS; BRASIL. Organização Pan-Americana da Saúde; Ministério da Saúde. Recomendações assistenciais para prevenção, diagnóstico e tratamento da hemorragia obstétrica. 2018. FEBRASGO. Fundação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. Tratado de Obstetrícia. 1. ed. Rio de Janeiro [RJ]: Elsevier, 2019. image2.png image3.png image4.png image1.png