Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

DirEiTo PENAL
DirEiTo PENAL
2015
ISBN 978-85-02-63541-8
Direito penal : parte geral / obra coletiva de autoria 
da Editora Saraiva com a colaboração de Luiz Roberto Curia 
e Thaís de Camargo Rodrigues. – São Paulo : Saraiva, 
2015.
1. Direito penal 2. Direito penal - Brasil I. Curia, Luiz 
Roberto. II. Rodrigues, Thaís de Camargo. III. Título.
 CDU-343 (81)
Índice para catálogo sistemático:
1. Brasil: Direito penal 343 (81)
Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer 
meio ou forma sem a prévia autorização da Editora Saraiva.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei n. 
9.610/98 e punido pelo artigo 184 do Código Penal.
Data de fechamento da edição: 7-7-2015
Dúvidas? 
Acesse www.editorasaraiva.com.br/direito 
Rua Henrique Schaumann, 270, Cerqueira César – São Paulo – SP
CEP 05413-909
PABX: (11) 3613 3000
SAC: 0800 011 7875
De 2ª a 6ª, das 8:30 às 19:30
www.editorasaraiva.com.br/contato
Direção editorial Luiz Roberto Curia
Gerência editorial Thaís de Camargo Rodrigues
Coordenação geral Clarissa Boraschi Maria
Preparação de originais Maria Izabel Barreiros Bitencourt Bressan e 
Ana Cristina Garcia (coords.) 
Willians Calazans de Vasconcelos de Melo
Projeto gráfico Isabela Agrela Teles Veras
Arte e diagramação Isabela Agrela Teles Veras 
Claudirene de Moura Santos Silva
Revisão de provas Amélia Kassis Ward e 
Ana Beatriz Fraga Moreira (coords.) 
Rita de Cássia Sorrocha Pereira
Serviços editoriais Elaine Cristina da Silva 
Kelli Priscila Pinto 
Marília Cordeiro
5
 Sumário 
1. A CIÊNCIA PENAL
1.1. História do Direito Penal, 12
1.1.1. História do Direito Penal no Brasil, 13
1.2. Controle Social, Ciências Penais e Estado Democrático de Direito, 
16
1.3. O Direito Penal, 16
1.3.1. Conceito, características e funções, 16
1.3.2. Fontes, 16
1.3.2.1. Analogia em Direito Penal, 17
1.3.3. O Direito Penal e as demais Ciências Jurídicas, 18
2. PRINCÍPIOS NORTEADORES, GARANTIDORES 
E LIMITADORES DO DIREITO PENAL
2.1. Princípios constitucionais e infraconstitucionais, 22
3. TEORIA DA NORMA JURÍDICO-PENAL
3.1. Teoria da Norma. A Norma Jurídico-Penal, 28
3.2. Classificação, 28
3.3. Norma penal do mandato em branco – confronto com o Princípio 
da Legalidade, 29
3.4. Conflito aparente de normas, 29
3.4.1. Princípio da especialidade (lex specialis derogat generalis), 30
3.4.2. Princípio da subsidiariedade (lex primaria derogat legi subsi-
diariae), 31
3.4.3. Princípio da consunção ou da absorção (lex consumens dero-
gat legi consumptae), 31
3.4.4. Princípio da alternatividade, 32
4 . VALIDADE E EFICÁCIA DA LEI PENAL 
NO TEMPO E NO ESPAÇO
4.1.Conflito de leis penais no tempo, 34
4.2. Leis excepcionais e leis temporárias, 34
4.3. Tempo do crime, 35
4.3.1. A questão do crime continuado, 36
6
4.4. A lei penal no espaço, 36
4.4.1. Foro competente, 36
4.4.2. Territorialidade da lei penal (CP, art. 5º), 37
4.4.3. Extraterritorialidade da lei penal (CP, art. 7º), 37
4.4.3.1. Condições aplicáveis aos casos de extraterritorialidade 
condicionada, 39
4.4.3.2. Extraterritorialidade na Lei de Tortura, 39
4.4.3.3. Princípio do non bis in idem (CP, art. 8º), 39
5. TEORIA DO DELITO
5.1. O caráter fragmentário do Direito Penal, 42
5.2. Conceito de crime, 42
5.2.1. Conceito material e formal, 42
5.2.2. Conceito analítico, 42
5.3. Sistemas penais e os elementos constitutivos do crime, 44
5.4. O sistema clássico (ou sistema “Liszt/Beling/Radbruch”), 44
5.4.1. Críticas ao sistema clássico, 45
5.4.2. Resumo dos elementos do crime para os “clássicos”, 47
5.5. Sistema neoclássico (Frank/Mezger), 48
5.5.1. Resumo dos elementos do crime para os “neoclássicos”, 49
5.6. Sistema fi nalista (Hans Welzel), 49
5.6.1. Teoria finalista da ação, 51
5.6.2. Estrutura do crime no sistema finalista, 51
5.6.2.1. Fato típico, 51
5.6.2.2. Ilicitude, 52
5.6.2.3. Culpabilidade, 52
5.6.3. Teoria social da ação (Wessels e Jescheck), 52
5.7. Sistema funcionalista, 53
5.7.1. Introdução, 53
5.7.2. Imputação objetiva, 54
5.7.2.1. Conceito, 54
5.7.2.2. Origem, 54
5.7.2.3. Substituição da relação de causalidade material, 55
5.7.2.4. Insuficiência das teorias tradicionais, 56
5.7.2.5. Natureza jurídica, 57
5.7.3. Linhas mestras da imputação objetiva segundo Roxin, 58
Direito Penal
7
5.7.3.1. Criação de um risco relevante e proibido, 58
5.7.3.2. Realização do risco proibido e relevante no resultado, 59
5.7.3.3. Risco compreendido no alcance do tipo, 60
5.7.4. A imputação objetiva segundo Jakobs, 60
5.7.4.1. A imputação objetiva é vinculada a uma sociedade 
concretamente considerada, 60
5.7.4.2. O contato social gera riscos, 61
5.7.4.3. A imputação objetiva enfoca apenas comportamentos 
que violam determinado papel social, 61
5.7.4.4. Fundamentos da imputação objetiva, 61
5.7.5. Diferenças entre Roxin e Jakobs no contexto da teoria da im-
putação objetiva, 63
5.7.6. Regras extraídas da imputação objetiva (Damásio de Jesus), 63
5.7.6.1. Princípios auxiliares, 64
6. DO FATO TÍPICO E SEUS ELEMENTOS
6.1. Fato típico, 66
6.2. Conduta, 66
6.3. Resultado, 66
6.3.1. Classificação dos crimes quanto ao resultado naturalístico, 67
6.3.2. Classificação dos crimes quanto ao resultado jurídico, 67
6.4. Relação de causalidade, 68
6.4.1. Causas dependentes e independentes, 69
6.5. Tipo penal, tipicidade e adequação típica, 71
6.5.1. Conceito, 71
6.5.2. Adequação típica, 72
6.5.3. Tipicidade conglobante, 73
6.6. Dolo, 73
6.7. Culpa, 74
7. ILICITUDE
7.1. Conceito, teorias, 76
7.2. Causas de justificação. Descriminantes legais, supralegais e putativas, 76
7.3. Estado de necessidade, 77
7.3.1. Teorias, 77
7.3.2. Faculdade ou direito, 77
7.3.3. Requisitos, 77
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
8
7.3.4. Classifi cação, 79
7.4. Legítima defesa, 80
7.4.1. Requisitos, 80
7.4.2. Commodus discessus, 83
7.4.3. Excesso, 83
7.4.4. Classificação, 83
7.4.5. Ofendículos, 84
7.4.6. Diferenças entre legítima defesa e estado de necessidade, 84
7.5. Estrito cumprimento de dever legal, 85
7.6. Exercício regular de direito, 85
8. CULPABILIDADE
8.1. Conceito, natureza e fundamento jurídico, 88
8.2. Elementos da culpabilidade na concepção fi nalista, 88
8.2.1. Imputabilidade, 88
8.3. Causas de exclusão da culpabilidade, 89
8.4. A inexigibilidade de conduta diversa como causa supralegal de ex-
clusão da culpabilidade, 92
9. TEORIA DO ERRO
9.1. Conceito de erro. Distinção entre erro de tipo e erro de proibição: 
natureza jurídica e efeitos, 96
9.2. Erro de tipo essencial e acidental, 96
9.2.1. Erro de tipo essencial, 97
9.2.2. Erro de tipo incriminador (art. 20, caput) e permissivo (art. 
20, § 1º). Diferença, 97
9.3. Descriminantes putativas e as teorias extremada e limitada da cul-
pabilidade, 97
9.4. Erro provocado por terceiro, erro sobre o objeto, erro sobre pessoa, 
erro na execução (aberratio criminis), 98
9.5. Resultado diverso do pretendido (aberratio criminis), 100
9.6. Erro de proibição, 101
9.6.1. Coação moral irresistível putativa e obediência hierárquica 
putativa, 101
9.6.2. Erro sobre a inimputabilidade, 101
10. CONCURSO DE PESSOAS
10.1.Conceito e nomenclatura, 104
Direito Penal
9
10.2.Teorias e requisitos do concurso de pessoas, 104
10.3. Autoria, 105
10.4. Participação, 106
10.5. Concursos em crimes culposos, 106
10.6. Homogeneidade de elementos subjetivos, 107
10.7. Participação de menor importância e dolosamente distinta, 107
10.8. Autoria colateral e autoria incerta, 108
10
DirEiTo PENAL
12
 1.1 HiSTÓriA Do DirEiTo PENAL
Desde a Antiguidade até hoje verifi camos grandes mudanças nos 
institutos criminais. Se analisarmos a pena, por exemplo, podemos tra-
çar a seguinte evolução: perda da paz ou vingança indeterminada, vin-
gança limitada pela lei do talião, composição voluntária, composição 
legal e pena pública (BRUNO, 1956, p. 70 e 71). 
Conforme ensina Aníbal Bruno, nas sociedades antigas, onde 
ainda não havia umórgão que exercesse a autoridade coletiva, o res-
peito às normas era baseado no temor religioso ou até mesmo má-
gico. E a punição, que era a vingança, visava aplacar a ira dos deuses 
(BRUNO, p. 66).
A religião sempre esteve muito presente no Direito Penal. Algumas 
normas podem servir de exemplo: Leis de Manu, Índia, sécs. 12 ou 13 
a.C., e Pentateuco ou Torá, dos hebreus, 1250 a.C. Até hoje normas com 
cunho religioso são utilizadas pelo Direito Penal de inúmeros países, em 
especial os orientais.
Remontando às sociedades mais primitivas, a vingança privada era 
um ato de guerra entre tribos e não uma pena (BRUNO, p. 68). Entre os 
membros do grupo a pena era a expulsão, e essa pena equivalia à pena 
de morte, pois difi cilmente o indivíduo conseguiria sobreviver fora dos 
domínios de proteção e cooperação de seu clã. 
Procedendo dessa maneira poderia haver a completa dizimação de 
grupos inteiros. Surge, assim, a lei do talião, visando aplicar certa pro-
porcionalidade ao Direito Penal. Como exemplo, podemos citar o Códi-
go de Hamurabi, Babilônia, 2.083 a.C.
Da vingança o Direito Penal evoluiu para a composição. Por esse 
método o autor do delito “comprava” a sua liberdade. Em vez da vin-
gança de sangue era oferecido um valor sufi ciente para “cobrir” os danos 
sofridos pela vítima. 
3RGHPRV�DÀ�UPDU�TXH�R�'LUHLWR�3HQDO�VXUJH�FRP�R�KRPHP�H�R�DFRPSDQKD�
DWUDYpV�GRV� WHPSRV��1R� LQtFLR�HUD�DSHQDV�XPD� UHDOLGDGH� VRFLROyJLFD�� LQVWLQWLYD��
1mR�KDYLD�TXDOTXHU�UHJXODPHQWDomR�H�D�SXQLomR�SRU�XP�FULPH�HUD�EDVHDGD�QD�
YLQJDQoD�SULYDGD��$�UHDomR�GD�YtWLPD��GH�VXD�IDPtOLD�RX�DWp�GH�VXD�WULER�RX�FOm��
DWLQJLD�QmR�DSHQDV�R�RIHQVRU��PDV�WRGR�R�VHX�JUXSR��VHP�TXDOTXHU�SURSRUomR��
&RP�R�SDVVDU�GR�WHPSR�VXUJH�D�OHL�GR�WDOLmR��EDVHDGD�QR�´ROKR�SRU�ROKR��GHQWH�
SRU�GHQWHµ��EXVFDQGR�HTXLOtEULR�HQWUH�FULPH�H�FDVWLJR��$R�ORQJR�GRV�VpFXORV�D�HYR�
OXomR�IRL�OHQWD��$SHQDV�DSyV�R�VpFXOR�;9,,,��3HUtRGR�+XPDQLWiULR��p�TXH�R�'LUHLWR�
3HQDO�SDVVD�D�WRPDU�RV�FRQWRUQRV�GR�TXH�FRQKHFHPRV�KRMH�
CurioSiDADE
Detalhe do Monólito com 
o Código de Hamurabi 
(Museu do Louvre, França)
Vigiar e Punir�� 0L�
FKHO� )RXFDXOW�� 3X�
EOLFDGR� RULJLQDO�
PHQWH� HP� ������
QD� )UDQoD�� p� GH�
GLFDGR� j� DQiOLVH�
GD�YLJLOkQFLD�H�GD�
SXQLomR�� TXH� VH� HQFRQWUDP� HP�
YiULDV�HQWLGDGHV�HVWDWDLV��KRVSLWDLV��
SULV}HV� H� HVFRODV��� /HYD� j� GLVFXV�
VmR� VREUH�RV� VXSOtFLRV�� D� WRUWXUD�H�
DV�IRUPDV�PRGHUQDV�GH�SULVmR�
Dos delitos 
e das pe-
nas,� &HVDUH�
%HFFDULD�� $�
REUD� p� XP�
PDUFR� GR�
'LUHLWR� 3HQDO�� URPSHQGR� FRP� D�
DUELWUDULHGDGH� H� D� FUXHOGDGH� H�
DEULQGR�DV�SRUWDV�SDUD�R�SHUtRGR�
KXPDQLWiULR�
BiBLioTECA
o segredo dos seus 
olhos, direção de 
Juan José Campa-
nella, 2009. 2�À�OPH�
WUDWD�GH�XP�FULPH�
EiUEDUR�� OHYDQGR�
j� UHÁ�H[mR� VREUH�
SXQLomR�HVWDWDO��SURSRUFLRQDOLGD�
GH�H�YLQJDQoD�SULYDGD�
CiNEmATECA
Direito Penal
13
Porém, todos esses métodos são de ordem privada. Com a evolução 
social e uma maior organização estatal, aproximadamente a partir do 
séc. XII, o Estado afastou a vingança privada e assumiu o poder-dever de 
aplicar a vingança pública. Torna-se dever do Estado manter a ordem e 
fazer justiça.
As partes envolvidas perdem o direito de buscar por si próprias 
uma solução. A nova postura é submeter-se a um poder externo, que é o 
Estado. Este substitui a vítima durante o processo. 
Até o advento do período humanitário, essa justiça estatal era mar-
cada pela influência religiosa, pela arbitrariedade dos processos e pela 
crueldade das penas. 
Durante a Idade Média e a Moderna, o direito visava a proteção 
do príncipe e da religião. Suas práticas eram baseadas no arbítrio e na 
crueldade, criando uma “atmosfera de incerteza, insegurança e justi-
ficado terror” (BRUNO, p. 86). O direito era instrumento para que a 
nobreza e o clero permanecessem no poder político e econômico. 
A ausência de proporcionalidade ou respeito à dignidade humana 
era vista na desigualdade de punição entre nobres e plebeus, na inde-
terminação das penas e na definição dos crimes, na falta de publicidade 
no processo, na ausência de defesa e nos meios inquisitoriais (BRUNO, 
p. 86). 
Esses excessos criaram na consciência comum a exigência da ime-
diata reforma das leis penais, e assim inicia-se o período humanitário.
Personagem mais importante desse período é sem dúvida Cesare 
Beccaria, que publicou em 1764 a obra Dos delitos e das penas. Essa obra 
é um marco no Direito Penal, pois visava romper com o direito vigente, 
baseado em suplícios e no arbítrio dos reis. 
Vivendo sob a égide do Iluminismo – de cunho racionalista e jus-
naturalista – podemos afirmar que Beccaria sofreu a influência de filó-
sofos como Locke, D’Alembert, Diderot, Hume, Montesquieu, Rousseau 
e Voltaire.
Beccaria propunha um direito baseado no respeito à personalidade 
humana. Ele defendia a elaboração de leis claras e precisas, penas pro-
porcionais e o fim da pena de morte e da tortura.
As ideias de Beccaria foram aceitas e incluídas, mesmo que de modo 
ainda embrionário, na legislação de diversos países, como Rússia (1767), 
Toscana (1786), Áustria (1787), França (1791 e 1810) e na Declaração 
dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789) (FRAGOSO, 1959, p. 43 
e 44).
1.1.1 História do Direito Penal no Brasil
O Direito Penal brasileiro sempre recebeu influência do direito pe-
nal europeu, em especial dos italianos e alemães.
Sombras de 
Goya, dire-
ção de mi-
los Forman, 
2007. 2�ÀOPH�
UHWUDWD� R� GL�
UHLWR� SHQDO�
GR� SHUtRGR�
GDV� LQTXLVL�
o}HV�� FRP�
FRPSOHWR� GHVUHVSHLWR� DRV� SULQFt�
SLRV�SHQDLV��HVSHFLDOPHQWH�GD�GLJ�
QLGDGH�KXPDQD�H�GD�OHJDOLGDGH�
As Bruxas de 
Salem, direção 
de Nicholas 
Hytner, 1996. O 
ÀOPH�PRVWUD�D�
LQÁXrQFLD� GD�
UHOLJLmR� QR� 'L�
UHLWR�� TXDQGR�
DOJXPDV� MR�
YHQV�VmR�DFXVDGDV�GH�EUX[DULD��2�
ÀOPH� VH� SDVVD� HP� 6DOHP��0DVVD�
FKXVHWWV�������
CiNEmATECA
ordália�� SUiWLFD� FRPXP� GX�
UDQWH�D�,GDGH�0pGLD��p�XP�WLSR�GH�
SURYD�DUELWUiULD�H�FUXHO�XVDGD�SDUD�
GHWHUPLQDU� D� FXOSD� RX� D� LQRFrQ�
FLD�GR�DFXVDGR�� FXMR� UHVXOWDGR�p�
LQWHUSUHWDGR�FRPR�XP�MXt]R�GLYLQR��
([HPSOR��R�DFXVDGR�SUHFLVDYD�DQ�
GDU�VREUH�D�EUDVD�RX�SHJDU�XP�IHU�
UR�LQFDQGHVFHQWH��6H�QmR�VH�TXHL�
PDVVH��VHULD�FRQVLGHUDGR�LQRFHQWH��
CurioSiDADE
VoCABuLário
suplícios:�SXQLomR�FRUSRUDO�TXH�
SRGH� OHYDU� j� PRUWH� SRU� PHLR�
GH�JUDQGH�WRUWXUD��FDVWLJR�HOH�
YDGR�
sob a égide:� VRE� D� SURWHomR��
DPSDUR�RX�SDWURFtQLR�
14
O Livro V das Ordenações Filipinas, de 1603, foi a legislação 
penal utilizada no Brasil durante o período colonial. Essa legislação 
refletia o espírito dominante à época, que não distinguia o direito da 
moral e da religião. 
Outra característica das Ordenações é a extrema crueldade das pe-
nas, que também eram um refl exo da época, duramente combatida por 
Beccaria e outros iluministas.
Como se viu acima, a pena para sodomia, por exemplo, era extre-
mamente desumana. O texto original dizia: “Toda a pessoa, de qualquer 
qualidade que seja, que peccado de sodomia per qualquer maneira comet-
ter, seja queimado, e feito per fogo em pó, para que nunca de seu corpo e 
sepultura possa haver memória”.
No Brasil temos o exemplo de Tiradentes, que foi condenado à 
morte pelo crime de lesa-majestade, e, após ser enforcado, teve seu cor-
po esquartejado e seus membros fi ncados em postes e colocados à beira 
das estradas como “exemplo” para os demais súditos da coroa. Era a in-
timidação pelo terror. 
O Direito Penal desse período era visto como primeira ou única 
opção. As condutas hoje abarcadas por outras áreas do direito, como o 
administrativo ou civil, recebiam tratamento penal. Ex. Título LXXXI – 
Dos que dão música de noite (pena de prisão por 30 dias, multa e perda 
dos instrumentos musicais e armas).
Outra característica que merece ser comentada é a interferência da 
qualidade do autor na defi nição da pena. Ex. Título XXXIII – Dos ru-
fi ões e mulheres solteiras. A pena era de açoite, multa e degredo para 
a África. Porém, se o homem fosse escudeiro, a pena seria de multa e 
degredo para fora da vila. Resta assim evidenteo total desrespeito ao 
princípio da igualdade. 
Com a proclamação da independência em 1822 se fez necessária a 
revisão de toda a legislação vigente no país, que era de origem portugue-
sa. Em 1824 foi outorgada a primeira Constituição do Brasil, e em 1830 
foi promulgado o primeiro Código Criminal brasileiro.
A Constituição de 1824, elaborada sob o ideário liberal e humanis-
ta, trazia em seu art. 179 direitos e garantias individuais que infl uencia-
ram sobremaneira a elaboração do Código Criminal.
O Código de 1830 foi o primeiro código autônomo da América 
Latina, e de tão elogiado, serviu de modelo para outros códigos, tanto na 
América quanto na Europa. 
O projeto aprovado foi de Bernardo Pereira de Vasconcelos, for-
mado em Coimbra e atualizado com os ideais do Iluminismo e da Re-
volução Francesa.
Uma questão que deu margem a dissídio no Parlamento durante 
a aprovação do projeto foi a pena de morte (na forca). Os conservado-
res queriam mantê-la no Código, e os liberais, extirpá-la. Venceram os 
9HMDP� DOJXQV� H[HPSORV� GH�
FULPHV� SUHYLVWRV� QDV� 2UGHQDo}HV�
)LOLSLQDV��GD�IRUWH�LQÁ�XrQFLD�GD�UH�
OLJLmR�H�GD� LQWURPLVVmR�GR�(VWDGR�
QD�YLGD�SULYDGD��
ō�7tWXOR�,�²�'RV�KHUHJHV�H�DSyV�
WDWDV� �DV� SHQDV� ²� FRUSRUDLV� H� GH�
FRQÀ�VFR�²�HUDP�GHWHUPLQDGDV�SH�
ORV� MXt]HV� HFOHVLiVWLFRV� H� H[HFXWD�
GDV�SHOR�JRYHUQR�FLYLO���
ō� 7tWXOR� ,,,� ²� 'RV� IHLWLFHLURV�
�SHQD�GH�PRUWH��
ō� 7tWXOR� ;,,,� ²� 'RV� TXH� FRPH�
WHP�SHFDGR�GH� VRGRPLD� H� FRP�
DOLPiULDV� �SHQD� GH� PRUWH� QD� IR�
JXHLUD��FRQÀ�VFR�GH�EHQV��H�À�OKRV�H�
QHWRV�FRQVLGHUDGRV�LQIDPHV��
ō� 7tWXOR� ;;9� ²�'R�TXH�GRUPH�
FRP� PXOKHU� FDVDGD� �SHQD� GH�
PRUWH��
ō�7tWXOR�;&,9�²�'RV�PRXURV�H�MX�
GHXV�TXH�DQGDP�VHP�VLQDO��SHQD�
SHFXQLiULD��
CurioSiDADE
milk, direção 
de Gus Van 
Sant, 2008. É 
EDVHDGR� QD�
YLGD� GR� SROt�
WLFR� H� DWLYLVWD�
JD\� +DUYH\�
0LON��TXH� IRL�R�
SULPHLUR� KR�
PRVVH[XDO�GH�
FODUDGR�D�VHU�HOHLWR�SDUD�XP�FDUJR�
S~EOLFR�QD�&DOLIyUQLD��2�À�OPH�PRV�
WUD�D� OXWD�H�R�SUHFRQFHLWR� VRIULGR�
SHORV�KRPRVVH[XDLV�TXDWUR�VpFXORV�
DSyV�DV�2UGHQDo}HV�)LOLSLQDV�
CiNEmATECA
VoCABuLário
sodomia:�UHODFLRQDPHQWR�VH[XDO�
HQWUH�SHVVRDV�GR�PHVPR�VH[R�RX�
VH[RV�RSRVWRV��FRP�FySXOD�DQDO�
degredo:�SHQD�TXH�FRQVLVWH�QR�
DIDVWDPHQWR� FRPSXOVyULR� GD�
WHUUD�QDWDO�SRU� WHPSR�GHWHUPL�
QDGR�RX�LQGHWHUPLQDGR�
Direito Penal
15
primeiros, sob o argumento de que os escravos não temeriam nenhum 
outro castigo.
Não obstante os elogios recebidos, esse Código mantinha resíduos 
de uma sociedade escravocrata. A crítica da sociedade da época era que 
o caráter liberal do Código contribuía com o aumento da criminalidade, 
o que levou à posterior elaboração de leis de cunho retrógrado, princi-
palmente contra escravos (TOLEDO, 2002, p. 59). 
Com o fim da escravidão e o advento da República, novamente 
se fazia necessária a ruptura com o velho, e, assim, a elaboração de 
novos diplomas legais. Em 1890 foi promulgado o Código Penal, antes 
mesmo da primeira Constituição da República, promulgada apenas 
em 1891.
Ao contrário do Código Criminal do Império, o Código Penal de 
1890, foi elaborado às pressas, e apresentava, além de defeitos técnicos, 
um posicionamento atrasado em face da ciência de seu tempo. 
Não obstante as críticas, cabe ressaltar que esse código aboliu a 
pena de morte e instalou o regime penitenciário de caráter correcional.
Tendo em vista as sucessivas alterações processadas no texto do có-
digo, em 1932 foi adotada a Consolidação das Leis Penais de Vicente 
Piragibe, publicadas sob a denominação de Código Penal Brasileiro, pelo 
Decreto n. 22.213/1932. 
Entre o final do séc. XIX e início do séc. XX houve um grande desen-
volvimento da ciência penal. Muitos conceitos haviam sido discutidos e 
estabelecidos e novamente se mostrava necessário um novo Código. O 
Código Penal de 1940 foi originado no projeto de Alcântara Machado, 
revisado por uma Comissão de que participavam Nelson Hungria, Ro-
berto Lyra, Costa e Silva, entre outros. O Código foi inspirado no Código 
Rocco de 1930, porém sem adotar a pena de morte e de prisão perpétua, 
e no Código Suíço de 1937. 
Nasce no período entre guerras, em pleno Estado Novo, de índole 
ditatorial, onde Getúlio Vargas detém os Poderes Executivo e Legis-
lativo. Mas, conforme leciona Francisco de Assis Toledo (TOLEDO, 
p. 63), “o curioso é que, fruto de um Estado Ditatorial e influenciado 
pelo código fascista, manteve a tradição liberal iniciada com o Código 
do Império”. 
Em 1984, a Lei n. 7.209 substituiu toda a Parte Geral do Código Pe-
nal, alterando profundamente certos institutos como o erro, as penas e o 
concurso de agentes. Com o advento da Constituição Federal em 1988, 
houve outras alterações e adequações, como a Reforma no Título dos 
Crimes contra a Dignidade Sexual, visando obedecer aos novos preceitos 
constitucionais.
Jornada pela Liber-
dade (Amazing Gra-
ce), direção de mi-
chael Apted, 2006. 
)LOPH� VREUH� D� FDP�
SDQKD� FRQWUD� D� HV�
FUDYLGmR� OLGHUDGD� SRU�:LOOLDP�:LO�
EHUIRUFH��XP� IDPRVR�DEROLFLRQLVWD�
LQJOrV�� UHVSRQViYHO� SRU� OHYDU� DR�
3DUODPHQWR� %ULWkQLFR� D� OHJLVODomR�
DQWLHVFUDYDJLVWD�
12 Anos de Escravi-
dão, direção de Ste-
ve mcQueen, 2013. 
$GDSWD� D� DXWRELR�
JUDÀD�GH������GH�6R�
ORPRQ� 1RUWKXS�� XP�
QHJUR� OLYUH� QDVFLGR� QR� (VWDGR� GH�
1RYD� ,RUTXH� TXH� IRL� VHTXHVWUDGR�
HP�:DVKLQJWRQ�� '�&�� HP� ������ H�
YHQGLGR�FRPR�HVFUDYR�
Amistad, direção de 
Steven Spielberg, 
1997. $SyV� XPD� UH�
EHOLmR��XP�QDYLR�QH�
JUHLUR� p� WRPDGR� SRU�
VHXV� HVFUDYRV�� &DS�
WXUDGRV�� SDUDP� HP� WHUUDV� QRU�
WH�DPHULFDQDV�� RQGH� JHUDP� XPD�
HQRUPH� GLVFXVVmR� MXUtGLFD� VREUH�
SRVVH��DEROLomR�H�OLEHUGDGH��
A Vida de David 
Gale�� direção de 
Alan Parker, 2003. 
$GYRJDGR� H� DWLYLVWD�
FRQWUD� D� SHQD� GH�
PRUWH�� p�SUHVR�� DFX�
VDGR� GH� HVWXSUDU� H�
DVVDVVLQDU� XPD� FROHJD�� 1R� FRUUH�
GRU�GD�PRUWH��HOH�SHGH�TXH�XPD�
MRYHP� MRUQDOLVWD� IDoD� H� SXEOLTXH�
VXD�~OWLPD�HQWUHYLVWD�
CiNEmATECA
1R�%UDVLO�Ki�SUHYLVmR�GH�pena 
de morte� DSHQDV� HP� FDVR� GH�
JXHUUD�GHFODUDGD��FRQIRUPH�SUH�
YLVWR� QR� DUW�� ���� ;/9,,�� GD� &RQVWL�
WXLomR� )HGHUDO�� 6REUH�D� TXHVWmR��
FRQVXOWH�WDPEpP�R�&yGLJR�3HQDO�
0LOLWDU��GH������
CurioSiDADE
16
 1.2 CoNTroLE SoCiAL, CiÊNCiAS PENAiS E ESTADo DEmoCráTiCo DE DirEiTo
O controle social pode ser formal e informal. O informal é aquele 
aplicado pela família, escola, igreja, partido político, opinião pública, vi-
zinhos, clube. Nem sempre será sufi ciente para solucionar confl itos mais 
complexos ou graves. 
Das necessidades humanas decorrentes da vida em sociedade sur-
ge o Direito, que visa garantir condições indispensáveis à coexistência 
pacífi ca.
O fato que contraria a norma legal, ofendendo ou pondo em perigo 
um bem jurídico tutelado, é um ilícito jurídico e poderá ter consequên-
cias em vários ramos do Direito.
O Direito Penal constitui uma das espécies do sistema de controle 
social formal. Possui regras e princípios especiais, devendo ser utilizado 
apenas como ultima ratio, ou seja, para os casos de ofensas graves aos 
bens jurídicos fundamentais, os mais sensíveis à sociedade.
Os princípios penais decorrem da Constituição Federal de 1988 
que deu forma, na República Federativa do Brasil, a um tipo de estado 
designado como Estado Democrático de Direito.
A Constituição Federal estabelece como fundamento do Estado 
Democrático de Direito a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III). No 
art. 5º determina que são invioláveis os direitos à liberdade, à vida, à 
igualdade, à segurança e à propriedade. Dessa forma, a limitação a esses 
direitos ou garantias constitucionais somente se justifi ca quando a ofen-
sa ou a ameaça sejam proporcionais à intervenção do Direito Penal e a 
aplicação da pena ou medida de segurança.
 1.3 o DirEiTo PENAL
1.3.1 Conceito, Características e Funções
O Direito penal é o ramo do direito público que se encarrega de 
selecionar condutas atentatórias aos mais importantes bens jurídicos — 
justamente aqueles considerados essenciais para a vida em sociedade —, 
sancionando-ascom uma pena criminal ou medida de segurança. Tem 
por função primordial servir como modelo orientador de condutas ade-
quadas, promovendo o normal funcionamento da vida em sociedade.
1.3.2 Fontes
As fontes do direito subdividem-se em fontes materiais, substan-
ciais ou de produção e em fontes formais, de conhecimento ou de cog-
VoCABuLário
ultima ratio:� H[SUHVVmR� ODWLQD�
TXH�VLJQLÀ�FD�´~OWLPR�UHFXUVRµ�
pena criminal:� p� D� VDQomR� LP�
SRVWD�D�TXHP�FRPHWH�RV�FULPHV�
SUHYLVWRV�HP�QRVVR�RUGHQDPHQWR�
MXUtGLFR��6mR�HODV��SULYDWLYDV�GH�OL�
EHUGDGH��UHFOXVmR�H�GHWHQomR���
UHVWULWLYDV� GH� GLUHLWR� �H[��� SUHVWD�
omR�SHFXQLiULD��OLPLWDomR�GH�À�P�
GH�VHPDQD��SUHVWDomR�GH�VHUYL�
oRV�j�FRPXQLGDGH��H�PXOWD�
medida de segurança:�p�D�VDQ�
omR� LPSRVWD� DRV� LQLPSXWiYHLV�
�DUW�����GR�&3��
$V�PHGLGDV�GH� VHJXUDQoD� VmR�
de internação� HP� KRVSLWDO� GH�
FXVWyGLD� H� WUDWDPHQWR� SVLTXL�
iWULFR� RX� GH� sujeição a trata-
mento ambulatorial�
direito público:� 'LUHLWR� FRQFHU�
QHQWH� jV� UHODo}HV� MXUtGLFDV� GH�
QDWXUH]D�S~EOLFD�
8PD� ~QLFD� FRQGXWD� SRGH�
JHUDU�XP�LOtFLWR�FLYLO�H�XP�LOtFLWR�SH�
QDO�� $� OHVmR� FRUSRUDO�� SRU� H[HP�
SOR��p�SXQLGD�FULPLQDOPHQWH�FRP�
D�DSOLFDomR�GD�SHQD�GH�GHWHQ�
omR�RX�UHFOXVmR��GHSHQGHQGR�GD�
JUDYLGDGH��1D�HVIHUD�FLYLO��D�YtWLPD�
SRGH� VROLFLWDU� XPD� LQGHQL]DomR�
GRV� YDORUHV� SDJRV� FRP� R� WUDWD�
PHQWR�PpGLFR�DR�DXWRU�GD�OHVmR�
CurioSiDADE
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Direito Penal
17
nição. As fontes materiais indicam o órgão 
encarregado da produção do direito penal. 
Em nosso ordenamento jurídico, somente a 
União possui competência legislativa para 
criar normas penais (CF, art. 22, I). No-
te-se que o parágrafo único do dispositivo 
constitucional citado prevê que lei comple-
mentar poderá autorizar os Estados a legislar sobre questões específicas 
acerca de matérias penais.
As fontes formais, por sua vez, subdividem-se em imediatas e me-
diatas. Somente a lei pode servir como fonte primária e imediata do 
direito penal, porquanto não há crime sem lei anterior que o defina, nem 
pena sem prévia cominação legal (CF, art. 5º, XXXIX, e CP, art. 1º). Ad-
mitem-se, no entanto, fontes secundárias ou mediatas: são os costumes 
(“conjunto de normas de comportamento a que pessoas obedecem de 
maneira uniforme e constante pela convicção de sua obrigatoriedade” 
— Damásio de Jesus, Direito penal: parte geral, v. 1, p. 27) e os princípios 
gerais de direito (“premissas éticas que são extraídas, mediante indução, 
do material legislativo” — idem, p. 29).
Tais fontes formais sofrem importante limitação como decorrência 
do princípio da legalidade (CF, art. 5º, XXXIX, e CP, art. 1º). Não se ad-
mite que de seu emprego resulte o surgimento de crimes não previstos 
em lei ou, ainda, a agravação da punibilidade de delitos já existentes. Os 
princípios gerais do direito e os costumes, portanto, somente incidem na 
seara da licitude penal, ampliando-a. Os trotes acadêmicos, por exem-
plo, traduzem uma prática reconhecida e costumeira, de modo que pos-
síveis infrações, como injúria (ex.: referir-se ao calouro como “bicho”) 
ou constrangimento ilegal (ex.: obrigar o novato a fazer “pedágio”), são 
consideradas permitidas à luz do art. 23, III, do CP (exercício regular de 
um direito).
Os costumes, além disso, representam importante recurso inter-
pretativo, sobretudo no tocante aos elementos normativos presentes em 
alguns tipos penais (p. ex., a expressão “ato obsceno” no art. 233 do CP).
Anote-se também que os costumes não revogam lei penal (art. 2º, 
§ 1º, da LINDB).
1.3.2.1 Analogia em Direito Penal
A analogia é uma forma de suprimento (preenchimento) de 
lacunas (brechas) legislativas. Consiste em “aplicar, a um caso não 
contemplado de modo direto ou específico por uma norma jurídi-
ca, uma norma prevista para uma hipótese distinta, mas semelhante 
ao caso não contemplado” (DINIZ, Lei de Introdução às Normas do 
Direito Brasileiro, p. 108). Para utilizá-la, portanto, é preciso que se 
verifiquem dois pressupostos: 1º) existência de uma lacuna na lei; 2º) 
encontro no ordenamento jurídico de uma solução legal semelhante, 
"não há crime sem 
lei anterior que o 
defina, nem pena 
sem prévia comi-
nação legal"
$SHQDV�D�8QLmR��SRU�PHLR�GR�
&RQJUHVVR�1DFLRQDO��p�DXWRUL]DGD�
D�OHJLVODU�VREUH�R�'LUHLWR�3HQDO��,VVR�
VLJQLÀFD� TXH� RV� JRYHUQDGRUHV� H�
SUHIHLWRV� QmR� SRGHP� FULDU� QRYRV�
FULPHV�RX�UHYRJDU�RV�H[LVWHQWHV�
ATENÇÃo
0XLWDV� YH]HV� Ki� H[FHVVRV�
QRV� WURWHV�� SRGHQGR� FRQÀJXUDU�
FULPH��9DL�DOpP�GR�TXH�VHULD�DG�
PLWLGR�SHOR�FRVWXPH��9HMD��´7URWH�
+XPLOKDQWH� �� $XVrQFLD� GH� FRQ�
FRUGkQFLD� GD� YtWLPD� �� &RQVWUDQ�
JLPHQWR�LOHJDO�FRQÀJXUDGRµ��$&5�
�����������������')�
CurioSiDADE
$�DQDORJLD�YLVD�GHL[DU�R�'LUHL�
WR�PDLV� MXVWR"�,PDJLQH�D�VHJXLQWH�
VLWXDomR��R�DUW�������,,��GR�&3�DGPL�
WH�R�DERUWR�SUDWLFDGR�SRU�PpGLFR�
HP�FDVR�GH�HVWXSUR��1R�FDVR�GR�
DERUWR� UHDOL]DGR� SRU� HQIHUPHLUR��
KDYHQGR� D� LPSRVVLELOLGDGH� GH�
DWHQGLPHQWR�PpGLFR��Ki�R�FULPH"
rEFLEXÃo
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Sublinhado
18
vale dizer, uma regra jurídica que tenha sido estipulada para regular 
caso análogo. Funda-se a analogia no princípio ubi eadem legis ratio, 
ibi eadem dispositio (onde há a mesma razão legal, aplica-se o mesmo 
dispositivo).
Em direito penal, contudo, somente se admite a analogia in bonam 
partem, ou seja, aquela utilizada em benefício do sujeito ativo da in-
fração penal. Exemplo: o Código Penal somente autoriza a reação em 
estado de necessidade, afastando o caráter criminoso da conduta, se o 
sujeito busca afastar um perigo “atual”, nada dispondo sobre a excluden-
te de ilicitude se o agente visava escapar de um perigo “iminente”; este, 
contudo, também se considera abrangido pela norma permissiva, por 
analogia in bonam partem.
Proíbe-se, de outra parte, a analogia in malam partem, isto é, em 
prejuízo do sujeito ativo da infração penal, justamente por importar 
a criação de delitos não previstos em lei ou no agravamento da puni-
ção de fatos já disciplinados legalmente, atentando contra o princípio 
da legalidade. Acompanhe os exemplos: o art. 63 do CP defi ne como 
reincidente aquele que comete crime depois de ter sido condenado 
com trânsito em julgado por outro crime, no Brasil ou no estrangeiro. 
O art. 7º da Lei das Contravenções Penais, por sua vez, estipula ser 
reincidente o agente que pratica uma contravenção penal depois de 
ter sido condenado defi nitivamente por outro crime, no Brasil ou no 
estrangeiro, ou por outra contravenção penal no Brasil. Na combina-
ção dos dispositivos nota-se uma lacuna: não é reincidente o autor de 
um crime praticado após ter sido ele irremediavelmente condenado 
por uma contravenção penal. Em suma, se o agente for condenado de 
modo defi nitivo por uma contravenção penal e, após, cometer outra 
contravenção, será reincidente, mas, se praticar um crime, será pri-
mário! Tal omissão do legislador gera uma situação injusta, que não 
pode ser corrigida pelo emprego da analogia, causando reincidência 
em ambas as situações, sob pena de agravar a punição de um fato sem 
expressa previsão legal.
Há duas espécies de analogia:
1ª) analogia “legis”: dá-se com a aplicação de uma norma existente 
a um caso semelhante;
2ª) analogia “juris”: ocorre quando se baseia num conjunto de nor-
mas, visando retirar elementos que possibilitem sua aplicabilidade ao 
caso concreto não previsto (p. ex. trata-se do encontro e aplicação de 
princípios gerais do direito).
1.3.3 o Direito Penal e as demais Ciências Jurídicas
O Direito Penal é apenas um dos objetos de estudo das Ciências 
Penais. Há a dogmática penal, a criminologia, a política criminal, psi-
quiatria e psicologia forense, dentre outras.
Dogmática penal é a “disciplina que se ocupa da interpretação, 
sistematização e desenvolvimento (...) dos dispositivos legais e das 
Última para-
da 174, dire-ção de Bruno 
Barreto, 2008. 
&RQWD� D� KLVWy�
ULD� GH� 6DQGUR��
PRUWR�SHOD�SR�
OtFLD� TXDQGR�
VHTXHVWURX� R�
IDPRVR�{QLEXV������QR�5LR�GH�-D�
QHLUR�� 0RVWUD� D� KLVWyULD� SRU� RXWUR�
kQJXOR��FRQWDQGR�D�YLGD�GH�6DQ�
GUR�GHVGH�R�QDVFLPHQWR�DWp�R�GLD�
GR�FULPH��(VVH�ROKDU�p�FRPXP�QD�
FULPLQRORJLD�
CiNEmATECA
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Sublinhado
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Mylena
Realce
Direito Penal
19
opiniões científicas no âmbito do direito penal” (Claus Roxin, Funcio-
nalismo e imputação objetiva no direito penal, p. 186-187). Este livro, 
portanto, representa um trabalho eminentemente relacionado à dog-
mática penal.
“A criminologia tradicional é uma ciência que procura uma expli-
cação causal do delito como obra de um autor determinado” (Enrique 
Bacigalupo, Direito penal: parte geral, Capítulo I, § 7º). Com os resul-
tados das investigações criminológicas, visa tal ciência auxiliar o direito 
penal a encontrar uma solução para as causas que levaram o delinquente 
ao delito.
A política criminal, por sua vez, corresponde à que deve ser imple-
mentada no combate à criminalidade. Discute-se se ela deve servir ex-
clusivamente ao legislador, como critério de orientação na construção 
de normas penais e suas consequências jurídicas (posição tradicional), 
ou se, além disso, deveria também orientar o aplicador do direito dian-
te da norma posta (posição moderna). Em outras palavras, poderiam 
os juristas valer-se de critérios de política criminal para interpretar o 
alcance e a aplicabilidade de normas penais? A moderna teoria fun-
cionalista (Claus Roxin e Günther Jakobs) entende que sim, susten-
tando deva o tecnicismo “ceder espaço à política criminal e à função 
pacificadora e reguladora do tipo” (Fernando Capez, Consentimento 
do ofendido e violência desportiva: reflexos à luz da teoria da imputação 
objetiva, p. 49).
O direito penal pertence ao direito público, pois seu objeto refere-se 
primordialmente às relações do Estado com particulares em razão de seu 
poder soberano, atuando na tutela do bem-estar coletivo.
É possível dividir o direito penal em objetivo e subjetivo. O primeiro 
consiste no próprio ordenamento jurídico-penal, isto é, no conjunto de 
normas jurídicas que perfazem o sistema penal. O segundo, também cha-
mado de jus puniendi estatal, corresponde ao direito de punir do Estado. 
Em sentido abstrato, traduz-se no direito de exigir de todos que se abste-
nham de praticar condutas delitivas, e, em sentido concreto, no interesse 
de aplicar a sanção cominada ao delito àquele que violou a norma penal.
Dependendo de quem se trate o sujeito passivo, é possível que o 
Direito Penal assuma uma outra velocidade, ou uma outra forma de atu-
ação. Trata-se de concepção criada por Günther Jakobs em que o direito 
penal do cidadão teria como escopo garantir a vigência da norma (o 
indivíduo que comete o crime desrespeita a norma, a qual, por meio 
da pena aplicada, mostra que permanece incólume), e o direito penal 
do inimigo (como o de indivíduos que reincidem constantemente na 
prática de delitos ou praticam fatos de extrema gravidade, como ações 
terroristas) tem como finalidade combater perigos. Neste, o infrator não 
é tratado como pessoa, mas como inimigo a ser eliminado e privado do 
convívio social.
Cuida-se de concepção polêmica, rejeitada pela maioria dos auto-
res, os quais sustentam que jamais se pode deixar de considerar um in-
divíduo como pessoa.
VoCABuLário
tecnicismo:�FRUUHQWH�GRXWULQiULD�
TXH�UHGX]�R�GLUHLWR�j�WpFQLFD�
Claus roxin��QDVFL�
GR� HP� �����������
HP� +DP��EXU�JR�� p�
XP�GRV�PDLV� LQÁX�
HQWHV�GRJ�PiWL�FRV�
GR� GLUHLWR� SHQDO�
DOHPmR�� WHQGR�
FRQ�TXLVWDGR� UHSXWDomR� QDFLR�
QDO� H� LQWHUQDFLRQDO� QHVVH� UDPR��
e�GHWHQWRU�GH�LQ~PHURV�GRXWRUD�
GRV� KRQRUiULRV� H� Mi� SURIHULX� SD�
OHVWUDV�QR�%UDVLO��
Günther Jakobs, 
QDVFLGR�HP�0|Q�
FKHQJODGEDFK��
HP� �����������
p FDWHGUiWLFR�
HPpULWR�GH�'LUHL�
WR�3HQDO�H�)LORVRÀD�GR�'LUHLWR�SHOD�
8QLYHUVLGDGH�GH�%RQQ��$OHPDQKD��
e� DXWRU� GR� SROrPLFR� OLYUR� Direito 
Penal do Inimigo��)HLQGVWUDIUHFKW��
AuTor
A vila, dire-
ção de m. Ni-
ght Shyamalan, 
2004. O medo 
FRPR� IRUPD� GH�
FRQWUROH� VRFLDO�
XWLOL]DGR� QR� ÀOPH�
SRGH�VHU�XWLOL]DGR�FRPR�DQDORJLD�
SDUD� LQWHUSUHWDU�R�PXQGR�SyV����
GH�VHWHPEUR��
CiNEmATECA
20
2
Princípios Norteadores, 
Garantidores e 
Limitadores do 
Direito Penal
22
 2.1 PriNCíPioS CoNSTiTuCioNAiS E iNFrACoNSTiTuCioNAiS
Os princípios constitucionais possuem a função de orientar, orga-
nizar e estruturar o ordenamento jurídico, especialmente quanto a apli-
cação do direito e interpretação da norma jurídica.
Neste sentido, aliás, já se disse que “os princípios constitucionais 
(tragende Konstitutionsprizipien) e as garantias individuais devem atuar 
como balizas para a correta interpretação e o justo emprego das normas 
penais, não se podendo cogitar de uma aplicação meramente robotiza-
da dos tipos incriminadores...” (Edilson M. Bonfi m e Fernando Capez, 
Direito penal: parte geral, p. 114).
Diversos são os princípios de Direito Penal que estão assegurados 
na Constituição. Vejamos:
a) Princípio da dignidade da pessoa humana. Trata-se do mais 
importante dos princípios penais e constitui um dos fundamentos da 
República Federativa do Brasil (CF, art. 1º, III). Proíbe a incriminação 
de comportamentos socialmente inofensivos, isto é, que não provoquem 
dano efetivo ou lesão ao corpo social (ex.: incriminar o ato de manifes-
tar publicamente admiração por pessoas queridas). Impede, ademais, 
que a aplicação das normas penais ocorra de maneira totalmente divor-
ciada da realidade.
b) Princípio da legalidade. Não há crime sem lei anterior que o 
defi na, nem pena sem prévia cominação legal (CF, art. 5º, XXXIX, e CP, 
art. 1º). 
c) Princípio da anterioridade da lei penal. A lei penal não retroagi-
rá, salvo para benefi ciar o réu (CF, art. 5º, XL, e CP, art. 2º). 
d) Princípio do ne bis in idem. Ninguém pode ser condenado pelo 
mesmo fato mais de uma vez; além disso, uma única e determinada cir-
cunstância fática não pode ser utilizada mais de uma vez, seja para agra-
var, seja para benefi ciar o agente. 
e) Princípio da insignifi cância ou da bagatela. Foi desenvolvido 
por Claus Roxin. Para o autor, a fi nalidade do Direito Penal consiste na 
proteção subsidiária de bens jurídicos. Logo, comportamentos que pro-
duzam lesões insignifi cantes aos objetos jurídicos tutelados pela norma 
penal devem ser considerados penalmente irrelevantes. A aplicação do 
princípio produz fatos penalmente atípicos.
Na atualidade, a aceitação deste princípio é praticamente unânime. 
A divergência consiste, no mais das vezes, em defi nir, no caso concreto, 
se a lesão ao bem jurídico foi diminuta (e, portanto, penalmente rele-
vante) ou insignifi cante (logo, atípica).
Ninguém dirá que a subtração de uma folha de papel ou de um 
dente de alho deve ser considerada como crime de furto. Outros pode-
rão afi rmar, ainda, que a subtração de um objeto avaliado em um quarto 
Princípios básicos de 
Direito Penal��)UDQFLVFR�
GH�$VVLV�7ROHGR��(GLWRUD�
6DUDLYD��2EUD� FOiVVLFD��
GLVFXWH�SULQFtSLRV�H�GH�
PDLV� WHPDV� UHOHYDQWHV�
GD�GRJPiWLFD�SHQDO�
os miseráveis, 9LFWRU�
+XJR�� 2� SHUVRQDJHP�
SULQFLSDO� -HDQ� 9DOMHDQ��
SUHWHQGHQGR� VDFLDU� D�
IRPH� GH� XPD� FULDQoD��
IXUWD�XP�SHGDoR�GH�SmR��
H�� SRU� HVVD� UD]mR�� SDVVD� PXLWRV� DQRV�
SUHVR�� $SyV� YiULDV� WHQWDWLYDV� GH� IXJD��
FRQVHJXH�D�OLEHUGDGH��SRUpP�SDVVD�D�
YLGD� WRGD� VHQGR� SHUVHJXLGR� SHOR� LQV�
SHWRU�GH�SROtFLD�-DYHUW��6HX�FULPH�p�XP�
H[HPSOR�GH�DSOLFDomR�GR�SULQFtSLR�GD�
LQVLJQLÀ�FkQFLD��H�D�OHLWXUD�GD�REUD�GHL[D�
FODUD�VXD�LPSRUWkQFLD�SUiWLFD��
BiBLioTECA
CurioSiDADE
o Julgamento de Nu-
remberg, direção de 
Stanley Kramer, 1961. O 
7ULEXQDO� GH�1XUHPEHUJ�
IRL� R� 7ULEXQDO� 0LOLWDU� ,Q�
WHUQDFLRQDO�FULDGR�FRP�
D� À�QDOLGDGH� GH� MXOJDU�
SULVLRQHLURV� GH� JXHUUD� QD]LVWDV�� 2� À�O�
PH� OHYD�j� UHÁ�H[mR� VREUH� D� YLRODomR�
GH�SULQFtSLRV�SHQDLV��HVSHFLDOPHQWH�R�
SULQFtSLR�GD�OHJDOLGDGH��
CiNEmATECA
(P�DJRVWR�GH�������R�67)�HQIUHQ�WRX�XP�FDVR�HPEOHPiWLFR�GH�DIURQWD�
DR� SULQFtSLR� GD� GLJQLGDGH� KXPDQD��
8P� SHGUHLUR� IRL� FRQGHQDGR� SRU� KR�
PLFtGLR� TXDOLÀ�FDGR� H� FRQWHVWRX� VXD�
VHQWHQoD�QR�6XSUHPR�DOHJDQGR�TXH�
SHUPDQHFHX�DOJHPDGR�GXUDQWH�WRGR�
R� MXOJDPHQWR� H� TXH� LVVR� OKH� FDXVRX�
FRQVWUDQJLPHQWR��DOpP�GH�WHU�LQÁ�XHQ�
FLDGR� QHJDWLYDPHQWH� RV� MXUDGRV�� 2�
67)�DFROKHX�RV�DUJXPHQWRV�H�HGLWRX�D�
6~PXOD�YLQFXODQWH�Q�����
Mylena
Realce
Direito Penal
23
do salário mínimo é insignificante, mas, certamente, num caso deste, 
haverá intenso debate no processo sobre a caracterização do princípio.
O Supremo Tribunal Federal vem adotando critérios que nos pa-
recem ajustados para a verificação, em cada caso, sobre a possibilidade 
de aplicar o princípio. São eles: (i) a mínima ofensividade da conduta 
do agente, (ii) a nenhuma periculosidade social da ação, (iii) o reduzido 
grau de reprovabilidade do comportamento e (iv) a inexpressividade da 
lesão jurídica provocada (HC 84.412/SP).
O STF, ainda, tem travado interessante discussão sobre a aplicação 
do princípio ao crime de porte de droga para consumo pessoal. As duas 
Turmas do STF têm divergido a respeito do assunto. Assim, enquanto 
a 1ª Turma tem negado a incidência do princípio ao crime de porte de 
droga para consumo próprio (v. HC 91.759, rel. Min. Menezes Direito, 
DJU, 30-11-2007, p. 547), a 2ª Turma o tem admitido (v. STF, HC 92.961, 
rel. Min. Eros Grau, DJU, 22-2-2008, p. 925 e HC 94.809, DJU, 30-5-
2008, rel. Min. Celso de Mello).
f) Princípio da alteridade ou da transcendentalidade. Proíbe a 
incriminação de atitude meramente subjetiva, que não ofenda bem ju-
rídico alheio. Também foi desenvolvido por Claus Roxin. A ação ou 
omissão puramente pecaminosa ou imoral não apresenta a necessária 
lesividade que legitima a intervenção do direito penal. Por conta desse 
princípio, não se pune a autolesão, salvo quando se projeta a prejudi-
car terceiros, como no art. 171, § 2º, V, do CP (autolesão para fraudar 
seguro); a tentativa de suicídio (nosso CP somente pune a participa-
ção no suicídio alheio — art. 122); o uso pretérito de droga (o porte 
é punido porque, enquanto o agente detém a droga, coloca em risco a 
incolumidade pública).
g) Princípio da ofensividade. Não há crime sem lesão efetiva ou 
ameaça concreta ao bem jurídico tutelado — nullum crimen sine inju-
ria. Daí resulta serem inconstitucionais os crimes de perigo abstrato 
(ou presumido), nos quais o tipo penal descreve determinada conduta 
sem exigir ameaça concreta ao bem jurídico tutelado. Note-se, entre-
tanto, que a jurisprudência dominante tende a admitir como válidos 
os delitos de perigo abstrato, por constituírem uma forma legítima de 
punição de infrações penais em sua fase embrionária (opinião com a 
qual concordamos).
h) Princípio da exclusiva proteção de bens jurídicos (ou princípio 
do fato). Deriva, como muitos, do princípio da dignidade da pessoa hu-
mana e do fato de o Brasil ser um Estado Democrático de Direito (i. e., 
todos se submetem ao império da lei, que deve possuir conteúdo e ade-
quação social). Dele decorre que o direito penal não pode tutelar valores 
meramente morais, religiosos, ideológicos ou éticos, mas somente atos 
atentatórios a bens jurídicos fundamentais e reconhecidos na Consti-
tuição Federal. “Caso isso não ocorra, o tipo deverá ser excluído do or-
denamento jurídico por incompatibilidade vertical com o Texto Cons-
titucional. Assim, toda norma penal em cujo teor não se vislumbrar um 
Q u e b r a n d o 
o tabu, dire-
ção de Fer-
nando Gros-
tein Andrade, 
2011. Com 
YiULDV� SHUVR�
Q D O L G D G H V ��
FRPR� )HU�QDQ�
GR� +HQULTXH�&DUGRVR�� R� ÀOPH� VDL�
DR� HQFRQWUR� GH� VROXo}HV�� SULQFt�
SLRV� H� FRQFOXV}HV�� PDQWHQGR� R�
IRFR�GDV�GLVFXVV}HV�HP� WRUQR�GD�
GHVFULPLQDOL]DomR�GDV�GURJDV�� %LOO�
&OLQWRQ��-LPP\�&DUWHU�H�H[�FKHIHV�
GH� (VWDGR�� FRPR� GD� &RO{PELD��
GR�0p[LFR�H�GD�6XtoD��PRVWUDP�R�
PRWLYR�GH�VXDV�RSLQL}HV��e�FDSWX�
UDGR�R�UHODWR�GH�SHVVRDV�FRPXQV��
TXH� WLYHUDP� VXDV� YLGDV� DWLQJLGDV�
SHOD�*XHUUD�jV�'URJDV��DWp�H[SH�
ULrQFLDV�GH�'UDX]LR�9DUHOOD��3DXOR�
&RHOKR�H�*DHO�*DUFLD�%HUQDO�
CiNEmATECA
$�3ROtWLFD�0XQGLDO�GH�'URJDV�� WUD�
GX]LGD� QR� PRGHOR� SURLELFLRQLV�
WD�EHOLFLVWD� TXH� VH� FRQYHQFLRQRX�
GHVLJQDU� FRPR� ´ZDU� RQ� GUXJVµ��
YHP�UHFHEHQGR�GXUDV�FUtWLFDV�GRV�
PDLV�YDULDGRV�VHWRUHV�H�DWRUHV��QD�
FLRQDLV� H� LQWHUQDFLRQDLV�� TXH� VH�
RFXSDP�GD�́ TXHVWmR�GDV�GURJDVµ��
KDYHQGR�XP�UHODWLYR�FRQVHQVR�QR�
VHQWLGR� GH� TXH� R� SURLELFLRQLVPR�
IUDFDVVRX��9RFr�FRQFRUGD"
6REUH�R�WHPD�
Drogas e redução de 
danos: direitos das 
pessoas que usam 
drogas�� 0DXULGHV� GH�
0HOR�5LEHLUR�
A política criminal de 
drogas no Brasil: es-
tudo criminológico e 
dogmático�� 6DOR� GH�
&DUYDOKR�
rEFLEXÃo
ipad lena
ipad lena
24
bem jurídico claramente defi nido e dotado de um mínimo de relevância 
social será considerada nula e materialmente inconstitucional. (...). Sem 
bem jurídico não existe infração penal” (Edilson M. Bonfi m e Fernando 
Capez, Direito penal: parte geral, p. 133).
i) Princípio da intervenção mínima. Somente se deve recorrer à 
intervenção do direito penal em situações extremas, como a última saída 
(ultima ratio). A princípio, portanto, deve-se deixar aos demais ramos 
do direito a disciplina das relações jurídicas. A subtração de um pacote 
de balas em um supermercado, já punida com a expulsão do cliente do 
estabelecimento e com a cobrança do valor do produto ou sua devo-
lução, já foi resolvida por outros ramos do direito, de modo que não 
necessitaria da interferência do direito penal.
j) Princípio da fragmentariedade. Trata-se, na verdade, de uma 
característica do direito penal, mencionada por alguns autores também 
sob a forma de princípio, estabelecendo que as normas penais somente 
se devem ocupar de punir uma pequena parcela, um pequeno fragmen-
to dos atos ilícitos, justamente aquelas condutas que violem de forma 
mais grave os bens jurídicos mais importantes.
k) Princípio da adequação social. O fato deixará de ser típico 
quando aceito socialmente. Acompanhe esse exemplo extraído da juris-
prudência: “Contravenção Penal — ‘jogo do bicho’ — Perda do mono-
pólio do Estado às empresas de comunicações na exploração de jogos e 
loterias aliada a ausência de reprovabilidade na consciência da absoluta 
maioria dos cidadãos — Punição afastada pela aplicação do princípio 
da adequação social — Inaplicabilidade do art. 58 do Dec.-Lei 6.259/44. 
Convence que a adequação social supera contravenção denunciada. Em 
vez de punir um fato por ser típico, devemos adequá-lo à realidade vi-
gente, aos costumes sociais, enfi m, à consciência coletiva. A lei deveria 
ser interpretada pro societate, e, ao que tudo indica, a coletividade não se 
interessa pela punição dos ‘bicheiros’. Ao contrário, já inseriu o jogo do 
bicho em seu dia a dia” (TARS, RT, 753/699).
Tal princípio não tem merecido acolhida da maioria da jurispru-
dência, uma vez que sua aceitação implicaria a conclusão de que os cos-
tumes teriam força para revogar lei penal, o que é inadmissível em face 
do art. 22, I, da CF, e art. 2º, § 1º, da LINDB. 
l) Princípio da humanidade. As normas penais devem sempre dis-
pensar tratamento humanizado aos sujeitos ativos de infrações penais, 
vedando-se a tortura, o tratamento desumano ou degradante (CF, art. 
5º, III), penas de morte, de caráter perpétuo, cruéis, de banimento ou de 
trabalhos forçados (CF, art. 5º, XLVII).
m) Princípio da proporcionalidade. “Quando a criação do tipo 
penal não se revelar proveitosa para a sociedade, estará ferido o prin-
cípio da proporcionalidade, devendo a descrição legal ser expurgada de 
nosso ordenamento jurídico por vício de inconstitucionalidade. Além 
disso, a pena, isto é, a resposta punitiva estatal ao crime, deve guardar 
proporção com o mal infl igido ao corpo social” (Edilson M. Bonfi m e 
Fernando Capez, Direito penal: parte geral, p. 130).
os miseráveis, 
direção de Tom 
Hooper, 2012. 
2�À�OPH�ID]�XPD�
DGDSWDomR�GD�
REUD� HVFULWD�
SHOR� IUDQFrV�
9LFWRU� +XJR��
SXEOLFDGD� HP������� 7UDWD�VH�
GD�KLVWyULD�GH�XP�KRPHP�GR�VpFXOR�
;,;��TXH�IRL�FRQGHQDGR�LQMXVWDPHQ�
WH�SRU�WHU�URXEDGR�XP�SHGDoR�GH�
SmR�� À�FDQGR� HP� FODXVXUD� SRU� ���
DQRV�� 3DVVDGR� R� WHPSR� GH� UHFOX�
VmR�� R� SHUVRQDJHP� -HDQ� 9DOMHDQ�
�+XJK� -DFNPDQ�� VDL� HP� OLEHUGDGH�
FRQGLFLRQDO�� WRUQDQGR�VH� XP� KR�
PHP� KRQUDGR� H� KRQHVWR�� SRUpP�
FRQWLQXD� VRIUHQGR� RV� UHÁ�H[RV� GDV�
LQMXVWLoDV� VRIULGDV�QR�SDVVDGR�� VHQ�
GR�SHUVHJXLGR�SHOR�LQVSHWRU�-DYHUW�
�5XVVHOO� &URZH��� TXH� QmR� DFUHGLWD�
HP� VXD� UHDELOLWDomR�� 1R� GHFRUUHU�
GD�WUDPD��YHPRV� ODFXQDV�GR�VLVWH�
PD�SHQDO�H�D�YLRODomR�GH�SULQFtSLRV�
FRPR� R� GD� LQWHUYHQomR� PtQLPD��
KXPDQLGDGH�� IUDJPHQWDULHGDGH��
SURSRUFLRQDOLGDGH�H�GD�EDJDWHOD��
Papillon, dire-
ção de Franklin 
J. Schaffner, 
1973. 7UDWD�VH�
GD� KLVWyULD� GH�
+HQUL� &KDUULqUH�
�3DSLOORQ��� TXH�
YLYHX� QRV� DQRV�
GH� ������ FRQ�
GHQDGR�D�SULVmR�SHUSpWXD��À�FDQ�
GR� UHFOXVR� QD� *XLDQD� )UDQFHVD��
,OKD� GR� 'LDER�� VRE� XP� VLVWHPD�
H[WUHPDPHQWH�ULJRURVR�H�FUXHO��2�
À�OPH�UHWUDWD�RV�DEXVRV�GR�VLVWHPD�
FDUFHUiULR�SRU�PHLR�GH�SHQDV�GH�
VXPDQDV�H�KXPLOKDQWHV��
CiNEmATECA
Mylena
Realce
Mylena
Realce
ipad lena
Direito Penal
25
n) Princípio da autorresponsabilidade ou das ações a próprio ris-
co. Aquele que, de modo livre e consciente, e sendo inteiramente res-
ponsável por seus atos, realiza comportamentos perigosos e produz re-
sultados lesivos a si mesmo arcará totalmente com seu comportamento, 
não se admitindo nenhum tipo de imputação a pessoas que o tenham 
eventualmente motivado a praticar tais condutas perigosas (ex.: o agente 
que incentiva desafeto a praticar “esportes radicais” não responde pelos 
acidentes sofridos pela vítima, que optou por fazê-lo livremente).
o) Princípio da confiança. Uma pessoa não pode ser punida quan-
do, agindo corretamente e na confiança de que o outro também assim 
se comportará, dá causa a um resultado não desejado (ex.: o médico 
que confia em sua equipe não pode ser responsabilizado pela utiliza-
ção de uma substância em dose equivocada, se para isso não concorreu; 
o motorista que conduz seu automóvel cuidadosamente confia que os 
pedestres se manterão na calçada e somente atravessarão a rua quando 
não houver movimento de veículos, motivo pelo qual não comete crime 
se atropela um transeunte que se precipita repentinamente para a via 
trafegável).
p) Princípio do estado de inocência ou presunção de não culpabi-
lidade. “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de 
sentença penal condenatória” (CF, art. 5º, LVII).
q) Princípio da culpabilidade. Como decorrência do princípio da 
dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) e da presunção de não 
culpabilidade (CF, art. 5º, LVII), exsurge esse princípio, segundo o qual: 
a) não se admite responsabilidade penal objetiva, ou seja, desprovida de 
dolo ou culpa (v. art. 19 do CP) ou carente de culpabilidade (v. arts. 21 a 
28 do CP); b) a pena há de ser dosada segundo o grau de reprovabilidade 
da conduta do agente.
Estação Ca-
randiru, dire-
ção de Héc-
tor Babenco, 
2003. Baseado 
QD� REUD� HVFUL�
WD� SHOR� Pp�
GLFR� 'UDX]LR�
9DUHOOD��R�ÀOPH�ID]�XPD�UDGLRJUD�
ÀD� GR� VLVWHPD� FDUFHUiULR� QR� %UD�
VLO�� WHQGR�FRPR�SDQR�GH�IXQGR�R�
PDVVDFUH�RFRUULGR�QD�GpFDGD�GH�
����TXH�FXOPLQRX�QD�PRUWH�GH�����
SUHVRV��
CiNEmATECA
O Supremo Tribunal Federal�p�R�yUJmR�GH�F~SXOD�GR�3RGHU�-XGL�
FLiULR��H�D�HOH�FRPSHWH�D�JXDUGD�GD�&RQVWLWXLomR�)HGHUDO��2�WULEXQDO�
p� FRPSRVWR�SRU� RQ]H�0LQLVWURV�� EUDVLOHLURV� QDWRV�� HVFROKLGRV�GHQWUH�
FLGDGmRV�FRP�PDLV�GH����H�PHQRV�GH����DQRV�GH�LGDGH��GH�QRWiYHO�
VDEHU�MXUtGLFR�H�UHSXWDomR�LOLEDGD��H�QRPHDGRV�SHOR�3UHVLGHQWH�GD�
5HS~EOLFD��DSyV�DSURYDomR�GD�HVFROKD�SHOD�PDLRULD�DEVROXWD�GR�
6HQDGR�)HGHUDO�
CurioSiDADE
ipad lena
26
3 Teoria da Norma Jurídico-Penal
28
 3.1 TEoriA DA NormA. A NormA JuríDiCo-PENAL
A norma jurídica se apresenta com diversas características, confor-
me a área do Direito que se está analisando. No direito penal, reveste-se 
das seguintes características:
a) imperatividade: impõe-se a todos independentemente de sua 
vontade ou concordância;
b) exclusividade: somente a ela cabe a tarefa de defi nir infrações 
penais;
c) generalidade: incide sobre todos, generalizadamente;
d) impessoalidade: projeta-se a fatos futuros, sem indicar a puni-
ção a pessoas determinadas.
É possível diferenciar lei penal de norma penal. A primeira designa 
o enunciado legislativo, ou seja, o fato descrito e a pena a ele cominada 
(ex.: no crime de homicídio na forma simples — art. 121, caput, do CP 
— a lei penal é: “Matar alguém. Pena — reclusão, de seis a vinte anos”). 
A segunda refere-se ao comando normativo implícito na lei, isto é, a 
norma de conduta imposta a todos (ex.: no caso do homicídio simples: 
“não matarás”).
 3.2 CLASSiFiCAÇÃo
Quanto à classifi cação das normas penais, é possível classifi cá-las 
como incriminadora e não incriminadora.
A primeira compreende todos os dispositivos penais que descrevem 
condutas e lhes cominam uma pena. Compõe-se do preceito ou preceito 
primário — descrição da conduta proibida — e da sanção ou preceito 
secundário — quantidade e qualidade da(s) pena(s) aplicável(eis). Seu 
comando normativo pode ser proibitivo ou mandamental. Nos crimes 
comissivos, a lei penal descreve e pune uma ação esperando que todos 
se abstenham de praticá-la; trata-se de uma norma proibitiva (ou seja, a 
ação prevista em lei é proibida, sob ameaça de pena). Nos crimes omis-
sivos, a lei penal descreve uma omissão (um não fazer), porque espera 
de todos, naquela determinada situação, um comportamento ativo; 
trata-se de uma norma mandamental (ex.: a lei penal manda agir, sob 
pena de, omitindo-se, receber uma pena).
A norma penal não incriminadora, por sua vez, subdivide-se em 
explicativa ou complementar, quando fornece parâmetros para a apli-
cação de outras normas (ex.: o conceito de funcionário público para 
fi ns penais do art. 327 do CP), e permissiva, quando aumenta o âmbito 
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
Direito Penal
29
de licitude da conduta (e, a contrario sensu, restringe o direito de punir 
do Estado).
 3.3 NormA PENAL Do mANDATo Em BrANCo – CoNFroNTo Com o 
PriNCíPio DA LEGALiDADE
Trata-se da lei cujo preceito primário é incompleto, embora o pre-
ceito secundário seja determinado. Tal lei tem de ser completada por 
outra, já existente ou futura, da mesma hierarquia ou de hierarquia in-
ferior.
Exemplo: os tipos penais da Lei n. 11.343/2006 são leis penais em 
branco, uma vez que punem condutas relacionadas com drogas ilícitas 
sem descrever quais seriam essas substâncias (tal informação se encon-
tra em ato administrativo da Agência Nacional de Vigilância Sanitária 
— ANVISA); o art. 237 do CP pune a conduta daquele que contrai ca-
samento tendo ciência da existência de impedimento que lhe cause nu-
lidade absoluta, sendo que tais nulidades não são definidas pelo CP, mas 
constam do Código Civil.
É possível classificar a norma penal em branco em sentido lato ou 
homogênea e em sentido estrito ou heterogênea.
Entende-se por lei penal em branco homogênea aquela cujo com-
plemento se encontra descrito numa fonte formal da mesma hierarquia 
da norma incriminadora, ou seja, quando o complemento também está 
previsto numa lei ordinária (ou outra espécie normativa equivalente). 
Exemplo: art. 237 do CP (“Contrair casamento, conhecendo a existência 
de impedimento que lhe cause a nulidade absoluta”), cujo complemento 
se encontra no Código Civil, o qual enumera as causas de nulidade do 
matrimônio nos arts. 1.521, 1.517, 1.523 e 1.550.
Em sentido estrito ou heterogênea é aquela cujo complemento está 
descrito em fonte formal distinta daquela do tipo penal incriminador. 
Exemplo: Lei n. 11.343/2006, art. 33 (tráfico ilícito de drogas), que não 
indica quais são as “drogas ilícitas”, delegando tal funçãoa normas admi-
nistrativas (portarias da ANVISA); com efeito, o art. 1º, parágrafo único, 
desta Lei dispõe que: “... consideram-se como drogas as substâncias ou os 
produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou 
relacionados em listas atualizadas periodicamente pelo Poder Executivo 
da União”.
 3.4 CoNFLiTo APArENTE DE NormAS
Um mesmo fato concreto não pode ser enquadrado em vários tipos 
penais, sob pena de afronta ao princípio do non bis in idem (ou ne bis in 
(P� ���������� D�$QYLVD� SXEOL�
FRX�D� 5HVROXomR� Q�� ���� H� UHWLURX�
R� FORUHWR� GH� HWLOD� �ODQoD�SHUIX�
PH�� GD� /LVWD� )�� �VXEVWkQFLDV� HQ�
WRUSHFHQWHV� RX� SVLFRWUySLFDV���
FRORFDQGR�R�QD�/LVWD�'���LQVXPRV�
TXtPLFRV� SUHFXUVRUHV�� TXH� QmR�
VmR� SURLELGRV�� PDV� DSHQDV� FRQ�
WURODGRV� SHOR� 0LQLVWpULR� GD� -XV�
WLoD��� $SyV� XPD� VHPDQD� KRXYH�
D� UHWLÀFDomR�� PDV�� GXUDQWH� HVVH�
SHUtRGR�� IRL� HOLPLQDGR� R� FDUiWHU�
FULPLQRVR�GR�FORUHWR�GH�HWLOD��(VVD�
IDOKD�GD�$19,6$�JHURX�D�H[WLQomR�
da punibilidade de acusado de 
comercializar lança-perfume nes-
se período pela 2ª Turma do STF 
�+&��������
CurioSiDADE
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
30
idem). Portanto, se aparentemente ocorrer a incidência de mais de um 
tipo penal a um mesmo fato, caberá ao intérprete, socorrendo-se dos 
princípios da especialidade, consunção, subsidiariedade ou alternativi-
dade, resolver o confl ito, apontando o correto enquadramento.
Muito embora não exista dispositivo legal tratando do tema ou 
consenso doutrinário acerca do assunto (salvo no tocante ao princípio 
da especialidade), admitem-se comumente os princípios acima mencio-
nados.
Importante acentuar que só haverá confl ito aparente de normas se 
houver um só fato ao qual aparentemente se apliquem várias normas 
penais incriminadoras (todas vigentes). Na hipótese de serem vários os 
fatos, ter-se-á concurso de crimes (arts. 69 a 71 do CP). Além disso, to-
dos os dispositivos penais aparentemente aplicáveis devem estar simul-
taneamente em vigor, caso contrário surgirá um confl ito de leis penais 
no tempo.
3.4.1. Princípio da especialidade (lex specialis 
derogat generalis)
Dá-se quando existir, entre as duas normas aparentemente inci-
dentes sobre o mesmo fato, uma relação de gênero e espécie. Será espe-
cial e, portanto, prevalecerá a norma que contiver todos os elementos 
de outra (a geral), além de mais alguns, de natureza subjetiva ou ob-
jetiva, considerados especializantes. “Toda a ação que realiza o tipo do 
delito especial realiza também necessariamente, e ao mesmo tempo, 
o tipo do geral, enquanto que o inverso não é verdadeiro” (Jescheck, 
Tratado de derecho penal, trad. Mir Puig e Muñoz Conde, Barcelona: 
Bosch, 1981, p. 1035, apud Cezar Roberto Bitencourt, Manual de direi-
to penal: parte geral, v. 1, p. 130). Assim, se a mãe mata o fi lho durante 
o parto, sob a infl uência do estado puerperal, incorre, aparentemente, 
nos arts. 121 (homicídio) e 123 (infanticídio). No primeiro, porque 
matou uma pessoa; no segundo, porque essa pessoa era seu fi lho e a 
morte se deu no momento do parto, infl uenciada pelo estado puerpe-
ral. O infanticídio contém todas as elementares do homicídio (“matar” 
+ “alguém”), além de outras especializantes (“o próprio fi lho” + “du-
rante o parto ou logo após” + “sob a infl uência do estado puerperal”), 
o que o torna especial em relação a esse. Percebe-se, então, que toda 
ação que realiza o tipo do infanticídio realiza o do homicídio, mas nem 
toda ação que se subsume ao homicídio tem enquadramento no tipo 
do infanticídio.
Note que esse confl ito se resolve abstratamente, isto é, basta a com-
paração entre as duas normas, em tese, para saber qual delas é a especial 
e, por via de consequência, a aplicável. Também é interessante notar que 
na relação de especialidade é indiferente se a norma especial é mais ou 
menos grave. Acrescente-se que a relação de especialidade se dá entre 
tipos fundamentais e secundários (ex.: roubo simples — art. 157, caput, 
e roubo agravado — art. 157, § 2º).
VoCABuLário
puerperal:�UHODFLRQDGR�DR�SDU�
WR��SHUtRGR�TXH�RFRUUH�VHJXLGR�
DR�SDUWR�
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
Direito Penal
31
3.4.2. Princípio da subsidiariedade (lex primaria 
derogat legi subsidiariae)
A relação de subsidiariedade pressupõe que haja entre as normas 
aparentemente aplicáveis uma relação de conteúdo a continente. Há 
uma norma mais ampla (norma primária), porque descreve um grau 
maior de violação ao bem jurídico, e uma norma menos ampla (norma 
subsidiária), pois descreve um grau inferior de violação a esse mesmo 
bem. Ensinava Hungria que “a diferença que existe entre especialidade 
e subsidiariedade é que, nesta, ao contrário do que ocorre naquela, os 
fatos previstos em uma e outra norma não estão em relação de espécie 
e gênero, e se a pena do tipo principal (sempre mais grave que a do tipo 
subsidiário) é excluída por qualquer causa, a pena do tipo subsidiário 
pode apresentar-se como ‘soldado de reserva’ e aplicar-se pelo residuum” 
(Comentários ao Código Penal, v. 1, t. 1, arts. 1º a 10, p. 147).
A norma aplicável será sempre a que previr o maior grau de viola-
ção (lei primária). Assim, por exemplo, o crime de estupro (art. 213 do 
CP) contém o de constrangimento ilegal (art. 146 do CP). Se alguém 
constrange mulher à conjunção carnal, haverá estupro.
Há duas espécies de subsidiariedade:
1ª) expressa: se a norma expressamente declarar que só terá aplica-
ção “se o fato não constituir crime mais grave” (a norma se autoprocla-
ma “soldado de reserva”) — ex.: art. 132 do CP;
2ª) tácita: verifica-se quando o crime definido por uma norma é 
elemento ou circunstância legal de outro crime — ex.: art. 304 do CTB 
(omissão de socorro em acidente de trânsito) em relação ao homicídio 
culposo na direção de veículo automotor, qualificado pela omissão de 
socorro (art. 302 c/c o art. 303, parágrafo único, do CTB).
3.4.3. Princípio da consunção ou da absorção 
(lex consumens derogat legi consumptae)
“Ocorre a relação consuntiva, ou de absorção, quando um fato de-
finido por uma norma incriminadora é meio necessário ou normal fase 
de preparação ou execução de outro crime, bem como quando constitui 
conduta anterior ou posterior do agente, cometida com a mesma finali-
dade prática atinente àquele crime (...). Os fatos não se apresentam em 
relação de espécie e gênero, mas de minus a plus, de conteúdo a conti-
nente, de parte a todo, de meio a fim, de fração a meio” (Damásio de 
Jesus, Direito penal: parte geral, v. 1, p. 114). Na síntese de Jiménez de 
Asúa, citado por Damásio (idem, ibidem), a consunção se dá:
“a) quando as disposições se relacionam de imperfeição a perfeição 
(atos preparatórios puníveis, tentativa — consumação);
b) de auxílio a conduta direta (partícipe — autor);
c) de minus a plus (crimes progressivos);
d) de meio a fim (crimes complexos); e
e) de parte a todo (consunção de fatos anteriores e posteriores) — 
antefato e post factum impuníveis”.
VoCABuLário
consuntiva:� DWR� � RX� HIHLWR� GH�
FRQVXPLU��DEVRUYHU�
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
ipad lena
32
Convém deter-se na letra e, em que ocorre a relação de parte a todo, 
ou a chamada “progressão criminosa”. Em sentido lato, a progressão cri-
minosa inclui:
a) Progressão criminosa em sentido estrito: o agente inicia o iter 
criminis com o objetivo de provocar determinada lesão a um bem jurí-
dico; após conseguir seu intento, muda de ideia e busca provocar um 
grau maior de violação ao mesmo bem jurídico. Exemplo: o sujeito pre-
tendia lesionar seu desafeto, mas, em meio aos socos e pontapés, decide 
tirar-lhe a vida e leva-o a óbito. Só responde pelo homicídio, fi cando as 
lesões corporais por ele consumidas.
b) Antefactum impunível: quando um fato anterior menos grave é 
praticado como meio necessário para a realização de outro (ex.: o porte 
de arma em relação ao homicídio cometido com tal instrumento; o cri-
me de falsidade exclusivamente utilizado com o fi m decometer estelio-
nato, nos termos da Súmula 17 do STJ).
c) Post factum impunível: quando o agente, após praticar o fato, 
provoca nova violação ao mesmo bem jurídico, pertencente ao mesmo 
sujeito passivo (ex.: furto e posterior danifi cação ou venda do objeto).
3.4.4. Princípio da alternatividade
Este princípio tem lugar nas infrações penais de ação múltipla ou 
conteúdo variado, que são aqueles tipos penais que possuem diversos 
núcleos (verbos), separados pela conjunção alternativa “ou”.
Quando alguém pratica mais de um verbo do mesmo tipo penal, 
num mesmo contexto fático, só responde por um crime (e não pelo 
mesmo crime mais de uma vez). Exemplos: a) aquele que expõe à venda 
e, em seguida, vende substância entorpecente pratica um só crime de 
tráfi co ilícito de entorpecentes (Lei n. 11.343/2006, art. 33); b) quem 
induz e instiga outrem a se suicidar, vindo a vítima a falecer, incorre 
uma só vez no delito de auxílio ao suicídio (art. 122 do CP). Anote-se, 
entretanto, que em tais casos o juiz deve considerar a incursão em mais 
de uma ação nuclear na dosagem da pena, de modo a exacerbar a sanção 
imposta ao agente.
VoCABuLário
iter criminis:� H[SUHVVmR� ODWLQD�
TXH�VLJQLILFD�´FDPLQKR�GR�FUL�
PHµ�
ipad lena
ipad lena
4 9DOLGDGH�H�(ÀFiFLD� da Lei Penal no Tempo e no Espaço
34
 4.1 CoNFLiTo DE LEiS PENAiS No TEmPo
Quando várias leis penais que tratam do mesmo assunto de modo 
distinto se sucedem no tempo, deve o intérprete defi nir qual delas será 
aplicada ao fato. A regra é que a lei que deve ser aplicada é a vigente 
ao tempo da prática do fato criminoso, de acordo com o princípio do 
tempus regit actum. Contudo, existem exceções e elas se dividem em re-
troatividade (aplicação da lei a fatos cometidos antes da sua vigência 
quando for mais benéfi ca) e ultra-atividade (a lei penal revogada pode 
ser aplicada após sua revogação, quando o ilícito praticado durante a sua 
vigência for sucedido por lei mais severa). 
Confi ra abaixo as hipóteses de confl ito da lei penal no tempo:
Hipótese prática Significado Solução
Novatio legis
incriminadora
Lei posterior incrimina conduta 
que era lícita (cria um novo crime)
Irretroatividade
Abolitio criminis Lei posterior descriminaliza con-
dutas, tornando-as atípicas
Retroatividade
Novatio legis in 
pejus
Lei posterior, mantendo a incri-
minação do fato, torna mais grave 
a situação do réu (ex.: aumenta a 
pena cominada ao crime)
Irretroatividade
Novatio legis in 
mellius
Lei posterior, sem suprimir a in-
criminação do fato, beneficia de 
algum modo o agente (ex.: diminui 
a pena cominada ao crime)
Retroatividade
Em suma, a lei penal mais benéfi ca retroage para atingir os fatos 
passados (retroatividade) e a lei revogada será aplicada aos fatos cometi-
dos durante a sua vigência mesmo quando não estiver mais em vigor e a 
conduta for regulamentada por lei mais severa (ultra-atividade).
 4.2 LEiS EXCEPCioNAiS E LEiS TEmPoráriAS
De acordo com o art. 3º do CP, “A lei excepcional ou temporária, 
embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstân-
cias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigên-
cia”. É considerada excepcional a lei elaborada para incidir sobre fatos 
havidos somente durante determinadas circunstâncias excepcionais, 
como situações de crise social, econômica, guerra, calamidades etc. E 
temporária aquela elaborada com o escopo de incidir sobre fatos ocorri-
dos apenas durante certo período de tempo.
A doutrina costuma afi rmar que as leis excepcionais e temporárias 
são leis ultrativas, ou seja, que produzem efeitos mesmo após o término 
de sua vigência. Na verdade, não se trata do fenômeno da ultratividade, 
$� V~PXOD� ���� GR� 67)� GL]�� ´D�
OHL�SHQDO�PDLV�JUDYH�DSOLFD�VH�DR�
FULPH� FRQWLQXDGR� RX� DR� FULPH�
SHUPDQHQWH��VH�D�VXD�YLJrQFLD�p�
DQWHULRU� j� FHVVDomR� GD� FRQWLQXL�
GDGH� RX� GD� SHUPDQrQFLDµ�� 2X�
VHMD��VH�FULPH�FRPHWLGR�QD�YLJrQ�
FLD�GD�OHL�PHQRV�JUDYH��PDV�FXMD�
H[HFXomR�VH�SURORQJXH�DWp�D�HQ�
WUDGD�HP�YLJRU�GD�OHL�PDLV�JUDYH��
SRGHUi� VHU� DSOLFDGD� HVWD� ~OWLPD��
1mR� Ki� QLVVR� QHQKXPD� YLRODomR�
DR� SULQFtSLR� EDVLODU� GD� DEVROXWD�
LUUHWURDWLYLGDGH�JUDYRVD��'H� IDWR��
D� OHL�PDLV� JUDYH�HVWi� VHQGR�DSOL�
FDGD�VLPSOHVPHQWH�SRUTXH�R�FUL�
PH�RFRUUHX�GXUDQWH�VXD�YLJrQFLD��
(PERUD�SDUWH�GD�GRXWULQD�GLVFRU�
GH� GD� V~PXOD�� HOD� DWXDOPHQWH� p�
SRVLomR�PDMRULWiULD��
ATENÇÃo
5HFHQWHPHQWH� IRL� VDQFLR�
QDGD�D� /HL� Q�� ��������GH���GH� MX�
QKR� GH� ������ FRQKHFLGD� FRPR�
/HL� *HUDO� GD� &RSD�� )RL� GHÀ�QLGD�
FRPR�WHPSRUiULD�SRUTXH�RV�WLSRV�
SHQDLV�SRU�HOD�FULDGRV�WLQKDP�XP�
SUD]R� FHUWR� GH� YLJrQFLD� �DWp� ���
�����������
CurioSiDADE
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
35
uma vez que, com o passar da situação excepcional ou do período de 
tempo estipulados na lei, ela continua em vigor, embora não mais seja 
aplicável. O art. 2º, VI, da Lei n. 1.521/51 (Lei dos Crimes contra a Eco-
nomia Popular e contra a Saúde Pública), que vigorou de fevereiro de 
1952 a dezembro de 1991, definia como crime a conduta do comerciante 
que vendia ou expunha à venda produto acima do preço definido em 
tabela oficial (“tabela de congelamento de preços”). Tal dispositivo, que 
vigorou por quase 40 anos, permaneceu, durante muito tempo, inaplicá-
vel, salvo em algumas épocas, como na década de 1980, durante o perí-
odo de “congelamento” de preços decorrente do “Plano Cruzado”. Nesse 
período, o tipo penal em questão tornou-se aplicável; assim, vários co-
merciantes flagrados vendendo produtos acima do preço oficial foram 
investigados e processados criminalmente; superado o período do tabe-
lamento oficial, os processos já instaurados continuaram em andamen-
to, uma vez que a norma não fora, então, revogada: a ação de vender ou 
expor à venda produtos acima do preço oficial continuou sendo crime 
até sua revogação pelo art. 6º, I, da Lei n. 8.137/90, o qual pune conduta 
semelhante, mas com pena maior. O fim do “congelamento” ocorrido 
na década de 1980 assinalou, portanto, apenas o término do período de 
aplicabilidade da lei, impedindo que fato posterior pudesse ser apenado 
com base no dispositivo.
Não se há de falar, portanto, em ultratividade, de modo que fica 
superada qualquer alegação de violação ao princípio da retroatividade 
benéfica da lei penal (CF, art. 5º, XL). Aliás, nesse sentido já se mani-
festaram consagrados penalistas (v., por todos, José Frederico Marques, 
Tratado de direito penal, v. 1, p. 268).
A regra constante do art. 3º do CP tem ainda uma razão prática 
evidente, declarada na Exposição de Motivos da Parte Geral do CP: “Esta 
ressalva visa impedir que, tratando-se de leis previamente limitadas no 
tempo, possam ser frustradas as suas sanções por expedientes astuciosos 
no sentido do retardamento dos processos penais”.
 4.3 TEmPo Do CrimE
Dentre as três teorias possíveis na matéria: teoria da atividade, teo-
ria do resultado e teoria da ubiquidade (ou mista), o CP adotou a pri-
meira, conforme podemos observar no artigo 4º do Código Penal. Assim 
sendo, considera-se praticado o crime ao tempo da ação ou omissão, 
ainda que outro seja o do resultado.
É fundamental compreender a importância do dispositivo, cuja uti-
lidade se dá para:
a) Delimitação da responsabilidade penal: com base na regra do 
art. 4º do CP torna-se possível delimitar o exato momento em que o 
agente passará a responder criminalmente por seus atos — isso se dará 
somente se a ação ou omissão houver sido praticada quando ele já tiver 
([LVWH� XP�PpWRGR�PQHP{QL�
FR�TXH�DMXGD�D�GHFRUDU�DV�WHRULDV�
GH� WHPSR�GR�FULPH�H�R� OXJDU�GR�
FULPH�� e� Vy� PHPRUL]DU� D� SDODYUD�
LuTA� �/XJDU� GR� FULPH�� WHRULD� GD�
8ELTXLGDGH� H� 7HPSR� GR� FULPH��
WHRULD�GD�$WLYLGDGH���
CurioSiDADE
2�DUW�� ��� GR�&3�QmR�VH�DSOL�
FD� DR� SUD]R� SUHVFULFLRQDO�� TXH��
SRU� IRUoD� GH� UHJUD� SUySULD� �&3��
DUW�� ����� ,��� FRPHoD�D� VHU�FRQWD�
GR�� HP� JHUDO�� GR� PRPHQWR� GD�
FRQVXPDomR� GR� FULPH� �H� QmR�
DR� WHPSR�GD�DomR�RX�RPLVVmR���
7DPEpP�QmR�VH�DSOLFD�DRV�FDVRV�
HP�TXH�p�SRVVtYHO�GLPLQXLU�D�SUHV�
FULomR�SHOD�PHWDGH� �DUW�� ����GR�
&3��H�SDUD�D�DSOLFDomR�GD�DWH�
QXDQWH� JHQpULFD� �DUW�� ��� GR� &3��
QR�FDVR�GH�R�DJHQWH�VHU�PDLRU�GH�
���DQRV��FRQVLGHUD�VH�D�LGDGH�QR�
PRPHQWR�GD�VHQWHQoD��
ATENÇÃo
36
completado 18 anos de idade (o que ocorre no primeiro minuto de seu 
18º aniversário).
b) Delimitação da lei penal aplicável: nos crimes materiais ou de 
resultado, a conduta pode ocorrer num momento, e o resultado, depois. 
Exemplo: o agente, pretendendo matar seu desafeto, arquiteta uma em-
boscada e, colhendo-o de surpresa, descarrega os projéteis do tambor do 
revólver, atingindo gravemente a vítima, a qual passa dois meses inter-
nada em hospital, vindo a falecer (consumando o crime de homicídio 
qualifi cado). Imagine que o ofendido tenha sido hospitalizado durante 
a entrada em vigor da Lei n. 8.930/94 (que transformou o crime de ho-
micídio qualifi cado em hediondo). Seria, então, de perguntar: o agente 
responderá pelo homicídio qualifi cado como crime hediondo ou não? 
Observe que no momento da ação (disparos) o delito não era hediondo, 
mas ao tempo do resultado (morte), sim. Qual a solução? Por força do 
art. 4º do CP, deve-se considerar o momento da conduta; logo, o agente 
não terá de sofrer os efeitos penais gravosos da Lei n. 8.072/90 com a 
alteração da Lei n. 8.930/94 (crimes hediondos).
4.3.1. A questão do crime continuado
O agente pratica dois fatos quando menor de 18 anos e um terceiro 
quando maior, todos em continuidade delitiva. Aos dois primeiros fatos 
aplicar-se-á o ECA, e ao último, o CP.
 4.4 A LEi PENAL No ESPAÇo
O CP defi niu no art. 6º o lugar do crime, adotando a teoria da ubi-
quidade ou mista, segundo a qual o crime se considera praticado tanto 
no lugar da conduta quanto naquele em que se produziu ou deveria pro-
duzir-se o resultado. A preocupação do legislador foi estabelecer quais 
crimes podem ser considerados como ocorridos no Brasil e, por via de 
consequência, a quais delitos se aplica a lei penal brasileira.
A regra em estudo só terá relevância nos chamados crimes a dis-
tância ou de espaço, que são aqueles cuja execução se inicia no território 
de um país e a consumação se dá ou deveria dar-se em outro. Imagine 
a hipótese de um agente iniciar a execução de um crime na Argentina, 
visando produzir o resultado no Brasil, ou o inverso. Em ambos os casos, 
os delitos serão considerados como ocorridos em território nacional, de 
modo que a lei penal brasileira a eles se aplicaria. Como dizia Hungria, 
basta que o crime tenha “tocado” o território nacional para que nossa lei 
seja aplicável.
4.4.1. Foro competente
Em se tratando de determinação de competência territorial (“foro 
competente”), deve-se observar a regra do art. 70 do CPP, que considera 
(P�VH�WUDWDQGR�GH�FULPH�SHU�
PDQHQWH��DTXHOH�FXMD�FRQVXPD�
omR�VH�SURORQJD�QR�WHPSR��FRPR�
RFRUUH�FRP�R�GHOLWR�GH�H[WRUVmR�
PHGLDQWH� VHTXHVWUR� ³� DUW�� ����
GR� &3��� GHYH�VH� ID]HU� XPD� RE�
VHUYDomR��PHVPR� WHQGR�D�DomR�
RX� RPLVVmR� VH� LQLFLDGR� DQWHV� GD�
PDLRULGDGH�SHQDO��VH�R�DJHQWH�D�
SURORQJRX� FRQVFLHQWHPHQWH� DR�
SHUtRGR� GH� VXD� LPSXWDELOLGDGH�
SHQDO��WHUi�DSOLFDomR�R�&3�
Juízo, Direção 
de maria Au-
gusta ramos, 
2007.� 'D� PHV�
PD�GLUHWRUD�GR�
GRFXPHQWiULR�
-XVWLoD�� -Xt]R�
UHWUDWD�R� MXOJD�
PHQWR�GH�DGR�
OHVFHQWHV�HP�FRQÁ�LWR�FRP�D�OHL�
CiNEmATECA
1R� %UDVLO� D� LPSXWDELOLGDGH�
SHQDO�VH�Gi�DRV����DQRV��4XDQGR�
R�LQGLYtGXR�HQWUH����H����DQRV�FR�
PHWHU� XPD� GDV� FRQGXWDV� GHVFUL�
WDV� QR�&yGLJR� 3HQDO�� DSOLFDP�VH�
DV� PHGLGDV� SUHYLVWDV� QR� Estatuto 
da Criança e do Adolescente��VmR�
DV�PHGLGDV� VRFLRHGXFDWLYDV�� DG�
YHUWrQFLD�� REULJDomR� GH� UHSDUDU�
R�GDQR�� SUHVWDomR�GH� VHUYLoRV� j�
FRPXQLGDGH�� OLEHUGDGH� DVVLVWLGD��
LQVHUomR�HP�UHJLPH�GH�VHPL�OLEHU�
GDGH�� LQWHUQDomR�HP�HVWDEHOHFL�
PHQWR�HGXFDFLRQDO��
ATENÇÃo
ComENTário
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
37
competente o foro do local em que o crime se consumou (ou, no caso de 
tentativa, o do local em que se deu o último ato executório).
4.4.2. Territorialidade da lei penal (CP, art. 5º)
Dá-se o fenômeno da territorialidade quando a lei penal se aplica 
ao fato cometido dentro do território nacional. Conforme dispõe o 
art. 5º do CP, a lei penal brasileira aplica-se em todo o território nacio-
nal, ressalvado o disposto em tratados, convenções ou regras de direito 
internacional. Trata-se do princípio da territorialidade temperada ou 
mitigada.
Por território, no sentido jurídico, deve-se compreender todo o es-
paço em que o Brasil exerce sua soberania, que abrange:
a) os limites compreendidos pelas fronteiras nacionais;
b) o mar territorial brasileiro (faixa que compreende o espaço de 12 
milhas contadas da faixa litorânea média — art. 1º da Lei n. 8.617/93);
c) todo o espaço aéreo subjacente ao nosso território físico e ao mar 
territorial nacional (princípio da absoluta soberania do país subjacente 
— Código Brasileiro de Aeronáutica, art. 11, e Lei n. 8.617/93, art. 2º);
d) as aeronaves e embarcações:
— brasileiras privadas, em qualquer lugar que se encontrem, salvo 
em mar territorial estrangeiro ou sobrevoando território estrangeiro;
— brasileiras públicas, onde quer que se encontrem;
— estrangeiras privadas, no mar territorial brasileiro.
Como se viu inicialmente, há crimes que, embora praticados den-
tro do território nacional, não se sujeitam à lei brasileira (em função de 
ressalvas previstas em tratados ou convenções internacionais): isso se dá 
nos casos de imunidade diplomática. Note-se que a embaixada de um 
país no Brasil não é considerada território estrangeiro, de modo que, se 
um crime ali for praticado, a ele será aplicável a nossa lei, a não ser que 
ocorra um caso de imunidade diplomática.
4.4.3. Extraterritorialidade da lei penal (CP, art. 7º)
Extraterritorialidade é o fenômeno pelo qual a lei penal brasileira 
se aplica a fatos ocorridos fora do território nacional. Subdivide-se em 
extraterritorialidade condicionada ou incondicionada. Nesta, a lei bra-
sileira aplicar-se-á ao crime praticado no exterior, independentemente 
do preenchimento de qualquer requisito ou condição (art. 7º, I e § 1º). 
Naquela, o fenômeno depende da conjugação de uma série de fatores 
(art. 7º, II e §§ 2º e 3º).
Fala-se em extraterritorialidade incondicionada nas seguintes hi-
póteses:
a) crime contra a vida ou a liberdade do Presidente da República;
b) crime contra o patrimônio ou contra a fé pública da União, do 
Distrito Federal, dos Estados, dos Municípios ou dos Territórios, ou suas 
8PD�GDV� TXHVW}HV�PDLV� FR�
PXQV� HP� SURYDV� H� FRQFXUVRV� p�
D�TXH�YHUVD�VREUH�D�TXHVWmR�GR�
WHPSR� H� OXJDU� GR� FULPH� H� D� WH�
RULD� DGRWDGD� D� UHVSHLWR�� (QWmR��
QmR� VH� HVTXHoD�� D�� 7(032� '2�
&5,0(��$7,9,'$'(��E��/8*$5�'2�
&5,0(�� 8%,48,'$'(�� F�� )252�
&203(7(17(��5(68/7$'2�
ATENÇÃo
VoCABuLário
mitigada:� GLPLQXtGD�� DPHQL]D�
GD��DWHQXDGD�
2�%UDVLO�p�VLJQDWiULR�GR�(VWDWX�
WR�GH�5RPD�GR�7ULEXQDO�3HQDO� ,Q�
WHUQDFLRQDO� �'HFUHWR�Q�� �������GH�
�������2�DUW�����GR�(VWDWXWR�GLVS}H��
´������ 2� 7ULEXQDO� VHUi� XPD� LQVWLWXL�
omR� SHUPDQHQWH�� FRP� MXULVGLomR�
VREUH� DV� SHVVRDV� UHVSRQViYHLV�
SHORV�FULPHV�GH�PDLRU�JUDYLGDGH�
FRP� DOFDQFH� LQWHUQDFLRQDO�� GH�
DFRUGR�FRP�R�SUHVHQWH�(VWDWXWR��
H� VHUi� complementar às jurisdi-
ções penais nacionaisµ��2V�FULPHV�
WXWHODGRV� SHOR� 73,� VmR�� JHQRFt�
GLR�� FULPHV� FRQWUD� D� KXPDQLGD�
GH�� FULPHV�GH�JXHUUD�H�FULPH�GH�
DJUHVVmR��DUW������
Sede do Tribunal Penal Internacional - TPI, Haia, Holanda
CurioSiDADE
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
38
autarquias, das empresas públicas, das sociedades de economia mista ou 
das fundações instituídas pelo Poder Público;
c) crime contra a administração pública brasileira por quem está a 
seuserviço;
d) crime de genocídio, se o agente for brasileiro ou domiciliado 
no Brasil.
A extraterritorialidade condicionada ocorre em relação às seguin-
tes infrações:
a) crimes previstos em tratado ou convenção internacional que o 
Brasil se obrigou a reprimir;
b) crimes praticados por estrangeiro contra brasileiro, fora do nos-
so território (se não foi pedida ou se foi negada a extradição e se houve 
requisição do Ministro da Justiça);
c) crimes praticados por brasileiro;
d) crimes praticados a bordo de navio ou aeronave brasileiros pri-
vados, quando praticados no exterior e ali não forem julgados.
A doutrina costuma apontar uma série de princípios que inspira-
ram o legislador a eleger os casos em que a lei de um país deve ser apli-
cada a fatos que se deram no estrangeiro:
a) Princípio da justiça penal universal ou cosmopolita: refere-se a 
hipóteses em que a gravidade do crime ou a importância do bem jurídi-
co violado justifi cam a punição do fato, independentemente do local em 
que praticado e da nacionalidade do agente. Foi adotado nas letras d da 
extraterritorialidade incondicionada e a, da condicionada.
b) Princípio real, da proteção ou da defesa: justifi ca a aplicação 
da lei penal brasileira sempre que no exterior se der a ofensa a um bem 
jurídico nacional de origem pública. Foi adotado nas letras a até c da 
extraterritorialidade incondicionada.
c) Princípio da personalidade ou nacionalidade ativa: como cada 
país tem interesse em punir seus nacionais, a lei pátria se aplica aos bra-
sileiros, em qualquer lugar que o crime tenha sido praticado. Foi adota-
do na letra b da extraterritorialidade condicionada.
d) Princípio da personalidade ou nacionalidade passiva: se a víti-
ma for brasileira, nosso país terá interesse em punir o autor do crime. Foi 
adotado na letra b da extraterritorialidade condicionada (v. CP, art. 7º).
Obs.: ao contrário do que sustentam alguns autores, esse princípio 
não se confunde com o princípio da proteção, que se refere a bens pú-
blicos, o que não ocorre aqui.
e) Princípio da representação ou da bandeira: a lei brasileira se 
aplica às embarcações ou aeronaves que carreguem nossa bandeira. Foi 
adotado na letra d da extraterritorialidade condicionada.
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
39
4.4.3.1 Condições aplicáveis aos casos de 
extraterritorialidade condicionada
São as seguintes:
a) entrada do agente no território nacional (condição de procedi-
bilidade);
b) ser o fato punível também no país em que cometido;
c) estar o crime entre aqueles a que a lei brasileira admite a extra-
dição;
d) não ter sido o agente absolvido ou não ter cumprido pena no 
estrangeiro;
e) não ter sido perdoado e não se tiver extinguido sua punibilidade, 
segundo a lei mais favorável (condições objetivas de punibilidade).
4.4.3.2 Extraterritorialidade na Lei de Tortura
A Lei n. 9.455, de 1997, que tipifica o delito de tortura (“constranger 
alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofri-
mento físico ou mental: a) com o fim de obter informação, declaração 
ou confissão da vítima ou de terceira pessoa; b) para provocar ação ou 
omissão de natureza criminosa; c) em razão de discriminação racial ou 
religiosa”), estabelece que seus dispositivos se aplicam “ainda quando o 
crime não tenha sido cometido em território nacional, sendo a vítima 
brasileira ou encontrando-se o agente em local sob jurisdição brasileira” 
(art. 2º). Cuida-se, portanto, de situação de extraterritorialidade prevista 
em lei especial.
4.4.3.3 Princípio do non bis in idem (CP, art. 8º)
Nas hipóteses de extraterritorialidade incondicionada é possível, 
em tese, que o agente responda por dois processos pelo mesmo fato, um 
no exterior, outro no Brasil, sobrevindo duas condenações. Se isso ocor-
rer, aplicar-se-á o art. 8º, que se funda no princípio do non bis in idem 
(o qual proíbe seja alguém condenado duas vezes pelo mesmo fato). 
Sendo assim, a pena cumprida no estrangeiro: a) atenua a pena imposta 
no Brasil pelo mesmo crime, quando diversas; ou b) nela é computada, 
quando idênticas (detração).
5HFHQWHPHQWH� Ki� FDVRV� Fp�
OHEUHV�GH�GLVFXVVmR�GH�H[WUDGLomR�
QR�%UDVLO�� (P������� IRL�DSOLFDGD�D�
SHQD� GH� PRUWH� D� GRLV� EUDVLOHLURV�
FRQGHQDGRV� SRU� WUiÀFR� GH� GUR�
JDV�QD�,QGRQpVLD��5RGULJR�*XODUWH��
GH� ���DQRV�� H�0DUFR�0RUHLUD�� ���
DQRV��2�SDtV�QHJRX�D�H[WUDGLomR��
2� %UDVLO� WDPEpP� QHJRX� D� H[WUD�
GLomR�GH�&HVDUH� �%DWWLVWL��TXH� IRL�
FRQGHQDGR�QD�,WiOLD�j�SULVmR�SHU�
SpWXD� SRU� KRPLFtGLR�� TXDQGR� LQ�
WHJUDYD�R�JUXSR�3UROHWDULDGRV�$U�
PDGRV�SHOR�&RPXQLVPR��(P�������
IXJLX� SDUD� R� %UDVLO�� )RL� SUHVR� HP�
������$� ,WiOLD�SHGLX�D�H[WUDGLomR��
H�R�67)�FRQFRUGRX��PDV�GHVWDFRX�
TXH� H[WUDGLomR� p� FRPSHWrQFLD�
GR� SUHVLGHQWH� GD� 5HS~EOLFD�� (P�
������R�HQWmR�SUHVLGHQWH�/XL]�,Qi�
FLR� /XOD� GD� 6LOYD� FRQVLGHURX� %DW�
WLVWL�DOYR�GH�SHUVHJXLomR�H�QHJRX�
D� H[WUDGLomR�� 2� 6XSUHPR� YROWRX�
D�GLVFXWLU�R�FDVR��PDV�FRQVLGHURX�
TXH�D�GHFLVmR�GR�SUHVLGHQWH�WLQKD�
TXH�VHU�UHVSHLWDGD���)RQWH��*��
CurioSiDADE
40
5 Teoria do Delito
42
 5.1 o CAráTEr FrAGmENTário Do DirEiTo PENAL
Uma das principais características do direito penal reside em sua 
fragmentariedade. Apesar da multiplicidade de atos ilícitos existentes, 
apenas uma pequena parcela interessa a esse ramo do direito; tal parcela 
compreende os atos que ofendem de modo mais grave os bens jurídi-
cos considerados essenciais para o convívio em sociedade. As infrações 
penais, portanto, correspondem a um pequeno fragmento extraído da 
vasta gama de atos ilícitos.
 5.2 CoNCEiTo DE CrimE
Nossa legislação não apresenta, atualmente, um conceito de crime, 
como ocorria nos Códigos anteriores (1830 e 1890). Há tempos o legis-
lador se deu conta de que a tarefa de defi nir esse importante instituto 
jurídico cabe à doutrina. Os penalistas, então, na tentativa de cumprir 
essa árdua missão, apresentam uma série de conceitos, ora enfatizando 
o aspecto puramente legislativo (conceitos formais), ora procurando in-
vestigar a essência do instituto (conceitos materiais), ora verifi cando os 
elementos constitutivos do crime (conceitos analíticos).
Tradicionalmente, os conceitos analíticos têm sido o foco central da 
preocupação dos juristas brasileiros.
5.2.1. Conceito material e formal
Do ponto de vista material, crime pode ser defi nido como toda 
ação ou omissão consciente, voluntária e dirigida a uma fi nalidade, que 
cria um risco juridicamente proibido e relevante a bens considerados 
essenciais para a paz e o convívio em sociedade.
Formalmente, crime é a conduta proibida por lei, com ameaça de 
pena criminal (prisão, pena alternativa ou multa).
5.2.2. Conceito analítico
Como se antecipou acima, boa parte de nossa doutrina tem subli-
nhado a importância do conceito analítico. Sob o pretexto de investigar 
quais os elementos constitutivos do crime, duas grandes teorias despon-
tam no Brasil, a primeira defendendo que crime é o fato típico, antijurí-
dico (ou ilícito) e culpável (teoria tripartida); a outra sustentando ser tal 
ilícito o fato típico e antijurídico (ou ilícito) (teoria bipartida).
Não se pode ignorar a existência de autores asseverando que crime 
é o fato típico, antijurídico, culpável e punível. Essa visão, contudo, tem 
pouco prestígio na doutrina, porquanto se assenta em uma premissa 
3DUD� HQWHQGHU� D� WHRULD� GR� GHOL�
WR�� p� LPSRUWDQWH� HVWXGDU� D� VXD�
HYROXomR� DR� ORQJR� GRV� DQRV�� 6H�
IRU�R�VHX�SULPHLUR�FRQWDWR�FRP�R�
DVVXQWR�� UHFRPHQGDPRV� D� OHLWX�
UD�GR�FDStWXOR� ��
GD�REUD�manual 
de Direito Penal: 
Parte Geral��*XV�
WDYR�-XQTXHLUD�H�
3DWULFLD�9DQ]ROLQL�
RX�� SDUD� XP� HV�
WXGR�PDLV�DSUR�
IXQGDGR��D�SDU�
WLU� GR� FDStWXOR�
��� GD� REUD� Tra-
tado de Direito 
Penal��YROXPH����
GH�&H]DU�5REHU�
WR�%LWHQFRXUW�
BiBLioTECA
ATENÇÃo
CrimE =�)$72�7Ì3,&2���$17,-85Ì',&2
(Teoria bipartida)
CrimE = )$72�7Ì3,&2���$17,-85Ì',&2���&8/3É9(/
(Teoria tripartida)
Mobile UserMobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
43
frágil: a punibilidade não pode ser considerada elemento do crime, já 
que lhe é algo exterior. Note que por punibilidade entende-se a possibi-
lidade jurídica de aplicação da sanção penal. É possível, diante disso, que 
um crime tenha ocorrido, mas, por fatores alheios à conduta delitiva, 
não se possa aplicar a correspondente sanção. Assim, se um crime foi 
cometido há muito tempo, provavelmente o seu responsável não mais 
possa ser punido porque o fato terá sido atingido pela prescrição (causa 
extintiva da punibilidade — art. 107, IV, do CP). O crime, entretanto, 
subsiste, apesar da extinção da punibilidade. Para melhor compreender, 
acompanhe este exemplo: A mata B em 1980, mas a autoria desse delito 
só vem a ser descoberta em 2005. O homicídio prescreve em 20 anos (CP, 
art. 109, I); logo, essa descoberta tardia impedirá a punição do culpado 
(A). A prescrição obsta a aplicação da pena, na medida em que extingue 
a punibilidade, mas não apaga o crime, que inegavelmente ocorreu (ou 
será possível afirmar que, com a prescrição, o homicídio deixou de exis-
tir, ressuscitando a vítima!).
Resta, agora, considerar as duas teorias mais aceitas no Brasil. An-
tes, porém, cabe uma advertência. Costuma-se designar como “clássico” 
o autor que diz ser o crime fato típico, ilícito e culpável, e “finalista” 
aquele que afirma ser fato típico e ilícito. Embora tais designações sejam 
correntes, não são precisas. A aceitação da teoria finalista da ação (que 
revolucionou o direito penal da metade do século passado) não implica 
necessariamente a conclusão de que o crime é fato típico e antijurídico. 
Há, nesse sentido, diversos “finalistas” que defendem ser o crime fato 
típico, antijurídico e culpável; dentre eles, Hans Welzel, o precursor da 
teoria citada.
Por esse motivo, devem-se reservar as qualificações “clássicos” e 
“finalistas” para se referir aos adeptos, respectivamente, da teoria cau-
sal ou naturalista da ação (e psicológica da culpabilidade) e da teoria 
finalista da ação (e normativa pura da culpabilidade), que serão estu-
dadas abaixo.
No Brasil, seguindo o caminho inicialmente trilhado por René Ariel 
Dotti e Damásio de Jesus, há vários juristas, como Julio Fabbrini Mira-
bete, Luiz Flávio Gomes e Fernando Capez, que se filiam ao entendi-
mento segundo o qual crime é o fato típico e antijurídico.
Outros, porém, como Heleno Cláudio Fragoso, Cezar Roberto Bi-
tencourt e Francisco de Assis Toledo, estão entre os adeptos da tese se-
gundo a qual crime é fato típico, antijurídico e culpável.
O conceito tripartido, elaborado da seguinte forma: fato típico, an-
tijurídico e culpável, é o predominante na doutrina, apesar de haver vá-
rios adeptos da corrente bipartida no Brasil. Quase a totalidade absoluta 
dos manuais de Direito penal adota esse sistema. 
Importante notar que os efeitos da opção pelo conceito tripar-
tido ou bipartido são muito mais teóricos do que práticos; pois para 
ambas as correntes se não houver a culpabilidade não haverá a impo-
sição de pena.
2� DOHPmR 
Hans We l ze l 
����� �� � � � � p�
FRQ V L GH U DGR�
R� SDL� GD� Teo-
ria Finalista da 
Ação�� DGRWDGD 
SHOD� UHIRUPD� GD 
3DUWH�*HUDO�GR�&yGLJR�3HQDO�%UD�
VLOHLUR� GH� ������ (P� YLUWXGH� GH� D�
7HRULD� )LQDOLVWD� GD� $omR� WHU� VLGR�
UHFHSFLRQDGD� DPSODPHQWH� SRU�
RUGHQDPHQWRV�MXUtGLFRV�IRUD�GD�$OH�
PDQKD�� HVVH� SHQVDGRU� p� XP� GRV�
PDLV� IDPRVRV�HVWXGLRVRV�GR�'LUHLWR�
3HQDO�$OHPmR�
AuTor
rEFLEXÃo
9RFr� DGRWD� D� FRUUHQWH� TXH�
GHIHQGH� D� WHRULD� ELSDUWLGD� RX� D�
WHRULD�WULSDUWLGD"
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
possibilidade jurídica de aplicação da sanção penal.
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
44
 5.3 SiSTEmAS PENAiS E oS ELEmENToS CoNSTiTuTiVoS Do CrimE
A expressão “sistemas penais” é pouco utilizada pela doutrina bra-
sileira. Muitos preferem referir-se a “teorias penais”. Assim, por exemplo, 
diz-se com mais frequência “teoria clássica” do que “sistema clássico”. A 
terminologia “sistema”, entretanto, afi gura-se mais adequada. Na defi -
nição de Kant, sistema é a “unidade dos múltiplos conhecimentos sobre 
uma ideia” ou “uma totalidade de conhecimentos ordenada sob princí-
pios”. Sistema penal, portanto, indica um conjunto de teorias intrinse-
camente relacionadas, desenvolvidas durante determinado período da 
evolução da dogmática penal.
Atualmente, apontam-se os seguintes sistemas penais:
a) sistema clássico (ou sistema “Liszt/Beling/Radbruch”), que re-
monta ao início do século XX;
b) sistema neoclássico (conhecido também como normativista. 
Corresponde ao anterior, acrescido da teoria de Reinhard Frank), sur-
gido em 1907;
c) sistema fi nalista (ôntico-fenomenológico), difundido a partir 
da década de 1930;
d) sistema funcionalista (teleológico-racional), que se divide em: 
funcionalismo sistêmico (Jakobs) e teleológico (Roxin), dentro dos 
quais se desenvolveu a (moderna) teoria da imputação objetiva.
 5.4 o SiSTEmA CLáSSiCo (ou SiSTEmA “LiSZT/BELiNG/rADBruCH”)
No fi nal do século XIX, inicialmente com Franz von Liszt, depois 
com Beling e Radbruch, surgiu o sistema clássico. Graças às suas teorias, 
grandes avanços foram conquistados. Um dos mais marcantes foi afastar 
de vez a responsabilidade penal objetiva, já que esses penalistas erigiram o 
dolo e a culpa a elementos essenciais do crime, sem os quais ele não existe.
Essa doutrina teve grande infl uência do positivismo científi co, na 
medida em que buscava examinar o crime sob um enfoque puramente 
jurídico, desprovido de qualquer interferência de outras ciências, como 
a sociologia, a fi losofi a ou a psicologia.
No dizer de Roxin, “o conceito clássico de delito (...) estava infl uen-
ciado de modo decisivo pelo naturalismo do fi nal do séc. XIX, que de-
sejava submeter as ciências humanas ao ideal de exatidão das ciências 
naturais, alicerçando, em razão disso, o sistema jurídico-penal em dados 
da realidade mensuráveis e empiricamente comprováveis” (Funcionalis-
mo e imputação objetiva no direito penal, p. 201).
Franz ritter von 
Liszt� ������������ MX�
ULVWD� DOHPmR�� FULPL�
QRORJLVWD�H�UHIRUPD�
GRU� GR� GLUHLWR� LQWHU��
QDFLRQDO�� IRL� R�SUR�
SRQHQWH�GD�HVFROD�
MXUtGLFD�VRFLROyJLFD�H�KLVWyULFD��'H�
�����DWp�������IRL�SURIHVVRU�GH�'L�
UHLWR�3HQDO�H�,QWHUQDFLRQDO�GD�8QL�
YHUVLGDGH�GH�%HUOLP�
AuTor
VoCABuLário
erigir:�FRQVWUXLU��LQVWLWXLU�
Mobile User
Direito Penal
45
O sistema em questão resultou da conjugação de duas importantes 
teorias: 1ª) teoria causal ou naturalista da ação; 2ª) teoria psicológica 
da culpabilidade. A primeira vê a ação como a inervação muscular, pro-
duzida por energias de um impulso cerebral, que provoca modificações 
no mundo exterior (von Liszt). A segunda entende que a culpabilidade 
é o vínculo psicológico que une o autor ao fato praticado, por meio do 
dolo ou da culpa.
Os penalistas clássicos subdividiam o crime em dois aspectos:
1º) aspecto objetivo: fato típico e antijuridicidade;
2º) aspecto subjetivo: culpabilidade.
O fato típico, para os clássicos, era composto de: ação; tipicidade 
(ou seja, adequação perfeita entre o fato humano e o modelo legal abs-
trato — Beling); resultado (visto como modificação causal no mundo 
exterior provocada pela conduta); e nexo de causalidade (vínculo que 
une a conduta ao resultado).
A ilicitude ou antijuridicidade era consequência inerente à tipicidade 
(todo fato típico presume-se ilícito); aquela, contudo, não ocorria quan-
do o fato típico fosse cometido sob o amparo de alguma causa excludente 
de ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento 
do dever legal ou exercício regular de um direito). Além disso, entendia- 
-se que tais excludentes, por serem exclusivamente objetivas, dispensa-
vam, para sua constatação, a presença de elementossubjetivos, vale dizer, 
agia em legítima defesa mesmo aquele que desconhecesse totalmente a 
existência de uma agressão injusta contra si ou terceiro. Por exemplo: A 
mata B por vingança, justamente no momento em que este se encontrava 
prestes a matar C, fato desconhecido pelo homicida A; embora objetiva-
mente A tenha salvado a vida de C, não matou por ciência, mas por pura 
vingança; para os clássicos, A teria agido em legítima defesa de terceiro, 
porquanto é irrelevante para tais fins verificar sua intenção.
A culpabilidade era vista como o vínculo psicológico que une o 
autor ao fato, por meio do dolo ou da culpa. Tinha como pressuposto 
a imputabilidade, entendida à época como capacidade de ser culpável 
(ou seja, de reunir maturidade intelectual suficiente para agir dolosa ou 
culposamente). Era o liame subjetivo que justificava a punição do autor.
A limitação da culpabilidade à constatação de dolo ou culpa dei-
xava sem resposta inúmeras situações em que a pena não se justificava, 
apesar de o agente ter cometido o fato dolosa ou culposamente.
5.4.1. Críticas ao sistema clássico
Muitas das ideias elaboradas pelos clássicos ainda são defendidas 
nos dias de hoje, dentre elas a negação da responsabilidade penal obje-
tiva. Outras, no entanto, foram alvo de críticas e acabaram sendo aper-
feiçoadas. Vejamos:
&RPSRVLomR� GR� Fato Típico 
SDUD�RV�FOiVVLFRV�
!�DomR
!�WLSLFLGDGH
!�UHVXOWDGR
!�QH[R�FDXVDO
ATENÇÃo
DXWRU
GROR�RX 
FXOSD
&XOSDELOLGDGH
�YtQFXOR 
SVLFROyJLFR�
Culpabilidade
para os clássicos:
IDWR
ATENÇÃo
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
46
a) Os autores clássicos entendiam que a ação, em sentido amplo, 
subdividia-se em ação em sentido estrito (ex., um fazer) e omissão (não 
fazer). Ambas eram consideradas causais (teoria causal ou naturalista da 
ação), ou seja, tanto a ação propriamente dita (fazer) quanto a omissão 
(não fazer) geravam relações de causa e efeito. A omissão, contudo, não 
dá ensejo a relações de causalidade. Trata-se de um nada, e do nada, 
nada vem (ex nihilo, nihil). Não se pode dizer que o não agir é causa real 
e efetiva de algum evento. Quem não age, quando muito, deixa de inter-
ferir numa relação de causalidade preexistente, mas não cria uma por si 
só. A pessoa que assiste a um homicídio praticado por desconhecido e 
nada faz, seja por medo, seja por indiferença, não pode ser considerada 
responsável pela morte da vítima, a não ser que possua algum dever ju-
rídico de impedir esse resultado (como o policial). Essa pessoa não cria 
a relação de causalidade que leva ao óbito, embora possa nela intervir 
de algum modo (ex.: gritando por socorro, empurrando o atirador para 
que erre o alvo etc.). Ao policial, entretanto, será imputada a responsabi-
lidade criminal pela morte no momento de sua omissão. O que diferen-
cia a pessoa comum do policial nessa situação não é o comportamento, 
pois ambos podiam agir e se omitiram, mas o fato de o agente da lei, 
diferentemente das demais pessoas, ter o dever jurídico de agir e de evi-
tar o resultado. A omissão penalmente relevante, portanto, não é causal, 
mas normativa, é dizer, funda-se na existência de um dever jurídico (ou 
normativo) de agir visando afastar o resultado.
b) Os clássicos somente examinam a intenção (dolo) do agente no 
âmbito da culpabilidade, ignorando-a quando da verifi cação da ação. 
Ocorre que, ao separarem a intenção da conduta, estão separando, na 
teoria, algo indissociável na prática. Todas as pessoas, em função de seus 
conhecimentos prévios sobre as relações de causa e efeito, podem ante-
ver, dentro de certos limites, as consequências possíveis de seus atos, diri-
gindo-os a uma fi nalidade que pretendam atingir. Sabemos que ninguém 
age sem ter, por detrás, alguma intenção, por mais singela que seja. O 
fato de alguém estar lendo esse texto demonstra que toda ação humana 
é dirigida a uma fi nalidade. Quem pretende a aprovação num exame ou 
concurso público (fi nalidade) sabe que somente com estudo (conduta) 
se atinge a meta escolhida. Diante disso, dirige sua ação (estudando) para 
alcançar o objetivo a que se propôs (passar no exame). Sendo assim, não 
se concebe como a conduta humana penalmente relevante possa ser ana-
lisada sem a intenção que a moveu. Os clássicos incorriam nesse equívo-
co quando reservavam o exame do dolo para a culpabilidade.
c) Como consequência da crítica anterior, essa teoria encontra di-
fi culdades para explicar o crime tentado. Se uma pessoa é fl agrada pu-
lando o muro de uma residência, nela adentrando e pondo suas mãos 
sobre um objeto, como é possível enquadrar sua ação num tipo penal 
sem saber qual sua intenção? Se o fato é típico, independentemente do 
exame do dolo (da maneira como sustentam os clássicos), como saber 
qual o fato típico praticado? Violação de domicílio ou tentativa de furto? 
Será impossível determinar sem perquirir o propósito do agente. Será 
Direito Penal
47
que ele pretendia subtrair aquele objeto que tocou ou somente o admi-
rava para, em seguida, devolvê-lo? Essas considerações são fundamentais 
para sabermos qual o fato típico. Sem o exame da intenção, portanto, 
não há como descobrir que fato típico houve, e, por vezes, nem sequer 
é possível determinar se ocorreu ou não fato típico (como se verá na 
próxima crítica).
d) Os elementos subjetivos do injusto. A doutrina havia-se aper-
cebido do fato de que, em determinadas situações, era absolutamente 
indispensável examinar a intenção do sujeito (o elemento subjetivo do 
injusto) para descobrir se houve crime. Assim, quando um médico passa 
suas mãos nas partes pudendas de uma mulher, não temos como saber 
se ocorreu algum delito se não analisarmos sua intenção. Se o profissio-
nal estiver realizando um exame ginecológico de rotina, não há ilícito 
penal algum, mas se estiver aproveitando-se para dar vazão à sua lascí-
via, ocorre violação sexual mediante fraude (CP, art. 215, com a redação 
dada pela Lei n. 12.015, de 2009). O que separa as duas condutas, uma 
lícita e outra criminosa, é, tão só, a intenção do sujeito.
e) Para os clássicos, a culpa tem natureza psicológica, quando, na 
verdade, tem caráter normativo, já que seu exame demanda um juízo 
de valor, por meio da comparação a ser feita pelo juiz entre a conduta 
do agente e a de uma pessoa de mediana prudência e discernimento, na 
situação em que ele se encontrava.
f) Essa teoria não explica os casos de coação moral irresistível e 
obediência hierárquica (em nosso CP, v. art. 22). Se uma pessoa é obri-
gada a produzir um documento falso, sob a mira de uma arma de fogo 
municiada, não deve ser condenada pelo crime de falsificação de do-
cumento (não teria cabimento a lei preferir que alguém cedesse a sua 
vida a que fabricasse um documento falso). Dessa conclusão ninguém 
diverge. Ocorre que, aplicando as teorias sustentadas pelos clássicos, não 
há como fundamentar uma decisão absolutória.
5.4.2. resumo dos elementos do crime para os 
“clássicos”
SISTEMA CLÁSSICO
Aspecto objetivo do crime Aspecto subjetivo do 
crime
Fato típico (elementos 
que o compõem)
Ilicitude ou 
antijuridicidade
Culpabilidade (pressu-
posto: imputabilidade)
1) Conduta (ação)
2) Resultado
3) Nexo de causalidade
4) Tipicidade
Estará sempre presen-
te, salvo quando o fato 
típico for praticado 
sob o abrigo de alguma 
excludente de ilicitude 
(legítima defesa, estado 
de necessidade etc.)
Subdivide-se em duas 
espécies:
a) dolo, ou b) culpa
48
 5.5 SiSTEmA NEoCLáSSiCo (FrANK/mEZGEr)
Muitos dos equívocos acima destacados foram desde logo percebi-
dos pela doutrina alemã, que procurou reelaborar alguns conceitos com 
vistas a aperfeiçoar a teoria do crime. Nesse sentido, Reinhard Frank re-
formulou a noção de culpabilidade, visando melhor adequá-la aos pro-
blemas concretos, notadamente às situações de coação moral irresistível 
e obediência hierárquica. Esse autor vinculou a culpabilidade à ideia de 
reprovabilidade, defendendo que só sepode considerar culpável a con-
duta reprovável socialmente, ou seja, digna de censura. A pessoa que 
falsifi ca um documento sob ameaça de morte exercida com emprego de 
arma de fogo, embora cometa um crime e aja dolosamente (de modo 
consciente e voluntário), não tem escolha na situação concreta, pois, se 
não agir dessa forma, morrerá. Em função disso, não se pode exigir do 
agente comportamento distinto. Como poderíamos condenar alguém 
que agiu exatamente como qualquer um agiria em determinada situa-
ção? Não podemos exigir do réu um comportamento diferente (ou seja, 
que não cometa o crime), quando, na situação em que ele se encontrava, 
teríamos agido do mesmo modo. Nessas situações excepcionais, o réu 
deve ser absolvido, entendendo-se que sua conduta não foi censurável.
Estruturalmente, a teoria desenvolvida por Frank resultou na com-
preensão de que a culpabilidade deveria ser composta por um novo ele-
mento: a exigibilidade de conduta diversa (só age culpavelmente quem, 
na situação concreta, poderia ter-se comportado de outro modo).
Ao lado do novo elemento, havia outros dois conhecidos: dolo ou 
culpa e imputabilidade (antes vista como pressuposto da culpabilidade, 
passa agora a ser considerada seu elemento).
Em resumo, de acordo com a teoria de Frank, denominada “psi-
cológico-normativa da culpabilidade” ou “normativa da culpabilidade”, 
uma das bases do sistema neoclássico, a culpabilidade tem os seguintes 
elementos: a) imputabilidade; b) dolo ou culpa; c) exigibilidade de con-
duta diversa.
Note-se que o sistema neoclássico tem como pilares, além da nova 
teoria da culpabilidade citada, a teoria causal ou naturalista da ação 
(oriunda do sistema clássico, até então inalterada).
Com isso percebe-se que Frank solucionou apenas um dos proble-
mas encontrados no sistema clássico, justamente a necessidade de ex-
plicar lógica e juridicamente a absolvição nos casos de coação moral 
irresistível e obediência hierárquica; as demais críticas, no entanto, sub-
sistiam.
Procurou-se, ainda, resolver a questão do erro de proibição (o qual 
ocorre quando uma pessoa pratica um ato desconhecendo totalmente 
que a lei o proíbe; p. ex., alguém se apodera de um relógio perdido na 
rua acreditando ter o direito de se apropriar do bem, com base no dito 
reinhard Frank 
������������� SUR�
IHVVRU� DOHPmR�
GH� GLUHLWR� SHQDO�
H� GLUHLWR� LQWHUQD�
FLRQDO��IRL�XP�GRV�
SULQFLSDLV�UHVSRQ�
ViYHLV�SHOD� UHIRU�
PD�GR�&yGLJR�3HQDO��DOHPmR�
AuTor
Edmund mezger 
e o Direito Penal 
de seu tempo��GH�
)UDQFLVFR� 0XxR]�
&RQGH�� $� REUD�
WUDWD� GD� UHODomR�
GH� 0H]JHU� FRP�
D� TXHVWmR� SROtWL�
FR�FULPLQDO�QDFLRQDO�VRFLDOLVWD�
BiBLioTECA
(OHPHQWRV� GD� Culpabilidade 
QR�VLVWHPD�QHRFOiVVLFR�
��LPSXWDELOLGDGH
��GROR�RX�FXOSD
���H[LJLELOLGDGH� GH� FRQGXWD�
GLYHUVD
ATENÇÃo
Direito Penal
49
popular “achado não é roubado”, desconhecendo que a lei pune esse ato, 
que configura o crime de apropriação de coisa achada — art. 169, pará-
grafo único, II, do CP). No sistema anterior não havia solução satisfató-
ria para tal situação. Com o escopo de dar uma resposta a esse proble-
ma, alguns autores integrantes do sistema neoclássico “ressuscitaram” 
a teoria do dolus malus e, com uma roupagem atualizada para a época, 
criaram o chamado “dolo híbrido ou normativo”. Trata-se do dolo que 
exige a presença de três elementos: consciência, vontade e consciência da 
ilicitude do comportamento. Assim, aquele que age sem ter consciência 
da ilicitude de sua conduta não age dolosamente. No exemplo acima 
proposto, o agente seria absolvido por falta de dolo. Tal solução, todavia, 
não ficou isenta de questionamentos.
Ao afirmar que o dolo contém a consciência da ilicitude, corre-se 
o sério risco de tornar impunes criminosos habituais e demais delin-
quentes profissionais. Imagine uma pessoa criada numa grande favela, 
que não teve acesso à educação e viveu no meio da violência e da mar-
ginalidade como se isso fosse o normal. É possível que ela não veja mal 
algum na venda de certa quantidade de droga para se sustentar. Pode 
até considerar esse comportamento correto, segundo seus padrões in-
dividuais. Esse sujeito, então, nunca seria punido criminalmente pelo 
tráfico de drogas que cometesse, pois a falta de consciência individual 
da ilicitude conduziria, consoante a teoria acima exposta, à ausência de 
dolo em suas condutas.
5.5.1. resumo dos elementos do crime para os 
“neoclássicos”
SISTEMA NEOCLÁSSICO
Aspecto objetivo do crime Aspecto subjetivo do 
crime
Fato típico (elementos 
que o compõem)
Ilicitude ou 
antijuridicidade
Culpabilidade (elemen-
tos que a compõem)
1) Conduta
2) Resultado
3) Nexo causal
4) Tipicidade
Estará sempre presente, 
salvo quando o fato 
típico for praticado 
sob o abrigo de alguma 
excludente de ilicitude 
(legítima defesa, estado 
de necessidade etc.)
1) Imputabilidade
2) Dolo ou culpa
3) Exigibilidade de 
conduta diversa
 5.6 SiSTEmA FiNALiSTA (HANS WELZEL)
Em 1931, em sua obra Causalidade e Omissão, Welzel rompe defi-
nitivamente com os sistemas anteriores. Partindo de uma premissa ex-
50
traída de lições da psicologia, Welzel percebe que a fi nalidade constitui a 
espinha dorsal da conduta humana.
Como já se destacou acima, as pessoas, em função de seus conheci-
mentos prévios sobre as relações de causa e efeito, podem antever, dentro 
de certos limites, as consequências possíveis de seus atos, dirigindo-os a 
uma fi nalidade que pretendam atingir. Ninguém age sem ter, por detrás, 
alguma intenção, por mais singela que seja. Sendo assim, não se concebe 
como a conduta humana penalmente relevante possa ser analisada sem 
a intenção que a moveu (esse o fundamento da teoria fi nalista da ação). 
Os clássicos incorriam nesse equívoco quando reservavam o exame do 
dolo para a culpabilidade, e foi justamente isso que Welzel corrigiu.
O dolo, elemento indicativo da intenção perseguida pelo agente, 
não pode ser analisado somente no âmbito da culpabilidade, de modo 
destacado da ação ou omissão a que se vinculou. Se a fi nalidade é a 
alma da conduta humana, ele deve ser analisado em conjunto na teoria 
do crime.
Como consequência, o penalista mencionado passou a sustentar 
que o dolo e a culpa deveriam fazer parte do fato típico, e não da culpa-
bilidade. Assim, grafi camente:
SISTEMA FINALISTA
Fato típico (elementos 
que o compõem)
Ilicitude ou 
antijuridicidade
Culpabilidade (elemen-
tos que a compõem)
1) Conduta DOLOSA 
OU CULPOSA
2) Resultado
3) Nexo causal
4) Tipicidade
(...) 1) Imputabilidade
2) (...)
3) Exigibilidade de con-
duta diversa
Hans Welzel notou, também, que o dolo deve possuir apenas dois 
elementos: consciência e vontade (“dolo natural” ou “dolo neutro”). A 
consciência da ilicitude deve ser retirada do dolo e mantida na culpabi-
lidade, mas não como consciência atual (individual), e sim como cons-
ciência potencial da ilicitude, como se explicará mais adiante.
Dolo e culpa, como se observa, deslocaram-se para o fato típico, o 
que motivou o surgimento de um fato típico de crime doloso e outro de 
crime culposo.
Interessante notar que o próprio Welzel afi rmava não ter trazido 
nenhum elemento novo à estrutura do crime, apenas os teria distribuí-
do corretamente.
As ideias desse autor resultaram em duas novas teorias: teoria fi -
nalista da ação e teoria normativa pura da culpabilidade, os pilares do 
sistema fi nalista.
Antes de prosseguir, convém uma última e breve advertência: rotu-
lar alguém de “clássico” ou “fi nalista”, portanto, equivale a identifi cá-lo 
como seguidor da teoria causal da ação e psicológica da culpabilidade 
ou da teoria fi nalista da ação e normativa pura da culpabilidade.
$� WHRULD� À�QDOLVWD� GH� :HO]HU�
´UHWLUDµ�dolo e culpa�GD�FXOSDEL�
OLGDGH�H�D�WRUQD�FRPSRQHQWH�GR�
IDWR�WtSLFR�
ATENÇÃo
Direito Penal
51
�������7HRULD�ÀQDOLVWD�GD�DomR
Sustenta que a ação não é mero acontecer causal, mas sim um acon-
tecer final. A finalidade está sempre presente porque o homem, graças ao 
seu saber causal(conhecedor das leis da causa e efeito), pode direcionar 
sua ação para a produção de um resultado querido. Ação e finalidade 
são inseparáveis. A teoria causal, ao separar o dolo da ação, separa juri-
dicamente o que é inseparável no mundo real. Acompanhe o exemplo a 
seguir, confirmando que o dolo está na ação e não na culpabilidade. O 
art. 124 do CP tipifica o crime de autoaborto. Trata-se de delito punido 
apenas na forma dolosa. Logo, se uma gestante ingere, acidentalmente, 
um comprimido, desconhecendo seu efeito abortivo, não responderá 
pelo crime. Pergunta-se, então, por quê? E a resposta evidente é: porque 
o fato é atípico (a lei não pune o aborto culposo). Adotando-se o sistema 
clássico, entretanto, teríamos um fato típico e antijurídico, pois a falta de 
dolo, nesse sistema, não conduz à atipicidade do comportamento, mas 
leva à exclusão da culpabilidade. Na prática, significa que o Ministério 
Público, por esse sistema, mesmo após constatar com absoluta seguran-
ça que a mãe não agiu dolosamente, deveria denunciá-la pelo crime do 
art. 124 do CP, cabendo ao juiz (com base no art. 415 do CPP) ou ao 
Júri absolvê-la. Com o sistema finalista, entretanto, tal absurdo pode ser 
evitado. Quando o membro do MP conclui categoricamente que não 
houve dolo, tem diante de si um fato atípico, com base em que pode 
validamente postular o arquivamento do inquérito policial.
�������(VWUXWXUD�GR�FULPH�QR�VLVWHPD�ÀQDOLVWD
5.6.2.1. Fato típico
Graças à teoria finalista, foi possível diferenciar um fato típico de 
crime doloso e outro de crime culposo (afinal, o dolo e a culpa saíram 
da culpabilidade e se agregaram ao fato típico, ao lado da conduta, que 
pode ser dolosa ou culposa).
FATO TÍPICO
Crime doloso Crime culposo
Conduta dolosa Conduta voluntária
Resultado voluntário (nos crimes 
materiais)
Resultado involuntário
Nexo de causalidade (entre conduta 
e resultado, nos crimes materiais)
Nexo de causalidade (entre conduta 
e resultado)
Tipicidade Tipicidade
Quebra do dever de cuidado obje-
tivo (imprudência, negligência ou 
imperícia)
Previsibilidade objetiva do resultado
1R�%UDVLO�RV�~QLFRV�FULPHV� MXO�
JDGRV�SHOR�7ULEXQDO�GR�-~UL�VmR�RV�
GRORVRV�FRQWUD�D�YLGD��KRPLFtGLR��
LQIDQWLFtGLR��DERUWR�H�LQGX]LPHQWR��
LQVWLJDomR�RX�DX[tOLR�D�VXLFtGLR�
CurioSiDADE
52
5.6.2.2. Ilicitude
No âmbito da ilicitude, destaca-se a seguinte inovação: com a im-
portância conferida à fi nalidade da conduta, passou-se a sustentar que 
todas as causas excludentes de ilicitude possuem um elemento subjeti-
vo, ao lado dos requisitos objetivos exigidos por lei. Assim, na legítima 
defesa, além da existência de uma agressão injusta, atual ou iminente, a 
direito próprio ou alheio, que se refute moderadamente com os meios 
necessários (CP, art. 25), é preciso que a pessoa aja com a intenção de 
defender-se ou de defender terceiro.
5.6.2.3. Culpabilidade
Como se viu, a retirada do dolo e da culpa da culpabilidade pro-
moveu sua reestruturação, passando ela a conter os seguintes elementos: 
a) imputabilidade; b) exigibilidade de conduta diversa; e c) potencial 
consciência da ilicitude.
Segundo a teoria de Welzel, todos os elementos da culpabilidade 
têm natureza normativa, porquanto implicam um juízo de valor (daí o 
nome teoria normativa pura da culpabilidade).
O elemento potencial consciência da ilicitude não constitui, pro-
priamente, uma novidade. De fato, foi ele destacado do dolo, onde se 
encontrava até então. No sistema anterior, o dolo compunha-se de cons-
ciência e vontade (elementos psicológicos), e consciência da ilicitude 
(elemento normativo) (“dolo híbrido ou normativo”). A partir do fi -
nalismo, passou a conter somente os dois primeiros elementos (“dolo 
natural” ou “neutro”). A consciência da ilicitude, por sua vez, permane-
ceu na culpabilidade, porém não como consciência atual, mas potencial. 
Com outras palavras, a simples falta de compreensão acerca do caráter 
ilícito do fato não mais é sufi ciente para isentar o agente de respon-
sabilidade penal. Quando isso ocorrer, justifi car-se-á tão somente uma 
redução da pena. Só haverá isenção total da pena quando a pessoa, além 
de desconhecer a ilicitude de comportamento, nem sequer possuir con-
dições, em função da realidade em que viveu e foi criada, de alcançar tal 
compreensão. Da mesma forma: se o sujeito não sabia que agia ilicita-
mente, mas tinha condições de sabê-lo, merecerá uma pena menor; se, 
contudo, essa pessoa, por mais inteligente e atenta que fosse, nunca teria 
tido condições de perceber a ilicitude do comportamento, não respon-
derá criminalmente pelo ato. Nossa legislação adotou essa sistemática, 
como se constata no art. 21 do CP.
5.6.3. Teoria social da ação (Wessels e 
Jescheck)
A teoria social da ação pode ser enquadrada dentro do sistema 
fi nalista, uma vez que incorpora boa parte de seus postulados. Foi con-
cebida visando suplantar o conceito fi nalista e, por essa razão, agregou 
um elemento até então inexistente ao conceito de ação, qual seja, a 
&RQWH~GR� GD� Culpabilidade 
QR�)LQDOLVPR�
��LPSXWDELOLGDGH
���H[LJLELOLGDGH� GH� FRQGXWD�
GLYHUVD�
���SRWHQFLDO� FRQVFLrQFLD� GD�
LOLFLWXGH
ATENÇÃo
3DUD� DSURIXQGDU�
RV� FRQKHFLPHQ�
WRV�VREUH�R�FRP�
SOH[R� XQLYHUVR�
da Culpabilida-
de� VXJHULPRV��
Culpabilidade, 
GH�'DYL�GH�3DLYD�
&RVWD�7DQJHULQR��(GLWRUD�6DUDLYD��
BiBLioTECA
Direito Penal
53
relevância social. Desse modo, a ação passa a ser entendida como a 
conduta socialmente relevante, dominada ou dominável pela ação e 
dirigida a uma finalidade. Tal concepção não angariou muitos adep-
tos, dentre outros motivos, pelo fato de que a teoria social da ação faz 
com que condutas socialmente aceitas constituam irrelevantes penais, 
o que, em última análise, significa a revogação de uma lei penal por um 
costume social.
 5.7 SiSTEmA FuNCioNALiSTA
5.7.1. introdução
No direito penal moderno tem-se travado um debate ainda sem so-
lução definitiva: deve a dogmática penal ser entendida à luz da função 
(missão) do direito penal (funcionalismo) ou deveria ela ser estruturada 
a partir de dados empíricos (causalismo e finalismo)?
A última opção, além de ser aquela tradicionalmente aceita, tem a 
seu favor a segurança jurídica que advém de seus critérios bem definidos 
(ação, nexo causal, dolo e culpa). Contra ela se aduz a injustiça de algu-
mas de suas soluções (ex.: regressus ad infinitum), adotadas em nome da 
“harmonia do sistema”.
A primeira revoluciona o direito penal e propõe que mais impor-
tante que a “beleza estética” do sistema é a busca de soluções justas. 
É a mais aceita na Europa e tem ganhado corpo na América Latina. 
Pesa contra ela a crítica de que se apoia em critérios fluidos, por vezes 
não delimitados completamente (ex.: risco permitido). Essa concepção 
é denominada funcionalismo, isto é, a tese segundo a qual a dogmática 
deve ser interpretada à luz da função do direito penal. No seu contexto 
é que se deu o desenvolvimento da teoria da imputação objetiva: “A im-
putação objetiva, ao considerar a ação típica uma realização de um ris-
co permitido dentro do alcance do tipo, estrutura o ilícito à luz da fun-
ção do direito penal. Esta teoria utiliza-se de valorações constitutivas da 
ação típica (risco não permitido, alcance do tipo), abstraindo de suas 
variadas manifestações ônticas” (Claus Roxin, Sobre a fundamentação 
político-criminal do sistema penal, in Estudos de direito penal, trad. Luís 
Greco, p. 79-80).
Seus principais seguidores são Claus Roxin (funcionalismo racional-
-teleológico) e Günther Jakobs (funcionalismo sistêmico). Esses penalis-
tas divergem, entretanto, quanto à função do direito penal, o que reflete 
decisivamente em seu modo de pensar a dogmática penal (embora sejam 
ambos adeptos da teoria da imputação objetiva, com pequenas variações).
A grande distinção entre as teorias de Roxin e Jakobs funda-se no 
fato de que aquele propõe limitações expressas ao direito de punir esta-
tal, o que não se vê neste.
54
Comparem-se, abaixo, as palavras decada um dos citados autores:
Roxin: “Os limites da faculdade estatal de punir só podem resultar da 
fi nalidade que tem o direito penal no âmbito do ordenamento estatal. 
(...). Penso que o direito penal deve garantir os pressupostos de uma 
convivência pacífi ca, livre e igualitária entre os homens, na medida 
em que isso não seja possível através de outras medidas de controle 
sociopolíticas menos gravosas” (Claus Roxin, Que comportamentos 
pode o Estado proibir sob ameaça de pena? Sobre a legitimação das 
proibições penais, in Estudos de direito penal, trad. Luís Greco, p. 32). 
Complementa o autor: “... a fi nalidade do direito penal (...) é carac-
terizada como ‘proteção subsidiária de bens jurídicos’. São chamados 
bens jurídicos todos os dados que são pressupostos de um convívio 
pacífi co entre os homens, fundado na liberdade e na igualdade; e sub-
sidiariedade signifi ca a preferência de medidas sociopolíticas menos 
gravosas” (p. 35).
Jakobs: “... a garantia jurídico-penal da norma deve garantir a segu-
rança de expectativas”. Nesse sentido, “a pena deve reagir mediante 
um comportamento que não possa ser interpretado como compatível 
com um modelo de mundo esboçado pela norma” (Günther Jakobs, 
A proibição de regresso nos delitos de resultado, in Fundamentos do 
direito penal, trad. André Luís Callegari, p. 93). Em outras palavras, “a 
fi nalidade da pena é a manutenção estabilizada das expectativas so-
ciais dos cidadãos. Essas expectativas são o fundamento das normas, 
ou seja, dos modelos de conta orientadores do contato social. A pena, 
consequentemente, tem a função de contradizer e desautorizar a deso-
bediência da norma. O direito penal, portanto, protege a validade das 
normas e essa validade é o ‘bem jurídico do direito penal’” (Enrique 
Bacigalupo, Direito penal: parte geral, trad. André Estefam, p. 184).
5.7.2. imputação objetiva
5.7.2.1. Conceito
A imputação objetiva constitui uma teoria, fundada em sua con-
cepção moderna por Claus Roxin, por meio da qual se sustenta que um 
resultado só pode ser atribuído a quem realizou um comportamento ge-
rador de um risco relevante e proibido, que se produziu neste resultado.
Luís Greco a defi ne como “o conjunto de pressupostos que fazem 
de uma causação uma causação típica, a saber, a criação e realização 
de um risco não permitido em um resultado” (A teoria da imputação 
objetiva — uma introdução, in Claus Roxin, Funcionalismo e imputação 
objetiva no direito penal, p. 15).
5.7.2.2. Origem
Há uma “genealogia ofi cial” da imputação objetiva, construída por 
seu criador (Claus Roxin), que assim se segue:
AuTor
6REUH� D� LPSX�
WDomR� REMHWLYD�
UHFRPHQGDPRV��
Tratado de Direito 
Penal�� YRO�� ��� GH�
&H]DU�5REHUWR�%L�
WHQFRXUW�� (GLWRUD�
6DUDLYD��
um Panorama da 
Teoria da imputa-
ção objetiva��GH�
/XtV�*UHFR�
BiBLioTECA
Claus roxin��QDVFL�
GR� HP� �����������
HP� +DP��EXU�JR�� p�
XP�GRV�PDLV� LQÁ�X�
HQWHV�GRJ�PiWL�FRV�
GR� GLUHLWR� SHQDO�
DOHPmR�� WHQGR�
FRQ�TXLVWDGR� UHSXWDomR� QDFLR�
QDO� H� LQWHUQDFLRQDO� QHVVH� UDPR��
e�GHWHQWRU�GH�LQ~PHURV�GRXWRUD�
GRV� KRQRUiULRV� H� Mi� SURIHULX� SD�
OHVWUDV�QR�%UDVLO��
Günther Jakobs, 
QDVFLGR�HP�0|Q�
FKHQJODGEDFK��
HP� �����������
p FDWHGUiWLFR�
HPpULWR�GH�'LUHL�
WR�3HQDO�H�)LORVRÀ�D�GR�'LUHLWR�SHOD�
8QLYHUVLGDGH�GH�%RQQ��$OHPDQKD��
e� DXWRU� GR� SROrPLFR� OLYUR� Direito 
Penal do Inimigo��)HLQGVWUDIUHFKW��
Direito Penal
55
— Karl Larenz, em 1927, define o conceito de imputação para o 
direito em sua tese de doutorado, intitulada A teoria da imputação de 
Hegel e o conceito de imputação objetiva. O problema básico que se 
procura resolver é o seguinte: quais são os critérios adequados para se 
distinguir entre as consequências de nossos atos que nos podem ser atri-
buídas como obra nossa e quais são mera obra do acaso?
— Richard Honig, em 1930, transporta para o direito penal a con-
cepção de Larenz, por meio de seu ensaio intitulado Causalidade e im-
putação objetiva. Partindo da antiga polêmica entre a teoria da equiva-
lência dos antecedentes e a teoria da causalidade adequada (v. Cap. V, 
item 4, abaixo), no sentido de estabelecer o critério mais acertado para 
se atribuir a uma pessoa um resultado, Honig conclui que não se pode 
admitir seja a comprovação de uma relação de causalidade material o 
aspecto mais importante da teoria do crime. Deve-se, ao revés, verificar 
quais são as exigências jurídicas para que se estabeleça um liame entre 
ação e resultado.
— Claus Roxin, em 1970, elabora o ensaio Reflexões sobre a pro-
blemática da imputação no Direito Penal, publicado em obra que co-
memorava os 70 anos de Honig, em que resgata o ponto de partida 
deste autor (rejeição da importância da causalidade material) e elabora 
as bases da “moderna” teoria da imputação objetiva (fundada no prin-
cípio do risco).
Importante acrescentar que Günther Jakobs também se inclui entre 
os adeptos da imputação objetiva, embora discorde de Roxin quando 
este sustenta que se deve abandonar o nexo de causalidade fundado na 
teoria da equivalência dos antecedentes. Para Jakobs, a imputação de um 
resultado a uma conduta dá-se em duas etapas: 1ª) verifica-se se houve 
nexo causal; 2ª) analisa-se a existência de imputação objetiva entre a 
conduta e o resultado, de modo que esta teoria atua como um freio (e 
não como substituta) da relação de causalidade material.
5.7.2.3. Substituição da relação de causalidade 
material
Claus Roxin procura elaborar uma teoria geral da imputação obje-
tiva, aplicável aos crimes materiais. Para o autor, a imputação objetiva 
deve substituir a relação de causalidade, abandonando-se o “dogma da 
causalidade”. No Brasil, Damásio de Jesus segue a mesma orientação.
Para Günther Jakobs, contudo, não há como abrir mão de um míni-
mo de causalidade material na aferição da responsabilidade penal. A im-
putação objetiva serviria, então, para restringir o alcance do nexo causal 
fundado na teoria da equivalência. É a opinião, entre outros, de Enrique 
Bacigalupo e Juarez Tavares.
Vê-se, portanto, que, enquanto Roxin propõe a substituição da re-
lação de causalidade material pela imputação objetiva, Jakobs assevera 
que não se deve abrir mão da relação de causalidade física, servindo a 
imputação objetiva como uma espécie de freio.
56
Parece-nos que, em face de nosso ordenamento jurídico, notada-
mente por conta do art. 13, caput, do CP, deve-se preferir a concepção 
de Jakobs.
“A sequência da comprovação da imputação objetiva exige que, de 
início, se estabeleça uma relação de causalidade entre o resultado tí-
pico (por exemplo, interrupção do estado de gravidez, no crime de 
aborto) e uma determinada ação. Em seguida, deve-se verifi car: 1º) 
se essa ação no momento de sua execução constituía um perigo ju-
ridicamente proibido (se era socialmente inadequada); e 2º) se esse 
perigo é o que se realizou no resultado típico produzido” (v. Enrique 
Bacigalupo, Direito penal: parte geral, trad. André Estefam, p. 248).
Em suma: deve-se determinar, primeiramente, a relação de causa-
lidade, nos termos (inafastáveis) do art. 13, caput, do CP. Em seguida, 
deve-se verifi car a relação de imputação objetiva.
Importante ressaltar que a adoção da teoria não depende de refor-
ma legislativa, porquanto a relação de imputação objetiva caracteriza 
elemento normativo implícito de todo tipo penal, podendo, assim, ser 
extraída do princípio constitucional da legalidade (art. 5º, XXXIX).
���������,QVXÀFLrQFLD�GDV�WHRULDV�WUDGLFLRQDLV
A relação de imputação objetiva dá-se quando for possível atribuir 
a alguém a criação de um risco juridicamente proibido e relevante e a 
produção de um resultado jurídico, como consequência daquele.
A preocupação central da teoria é identifi car os critérios jurídicos 
para que alguém possa ser considerado o responsável por determina-
do resultado jurídico, não do ponto de vista meramente causal (relação 
causa-efeito), mas sob um aspecto valorativo, vale dizer, quando é justo 
considerar alguém como o verdadeiro responsável por determinadale-
são ou ameaça de lesão a algum bem jurídico.
A teoria da imputação objetiva (na concepção que adotamos) bus-
ca restringir o alcance no nexo de causalidade, fundado na teoria da 
equivalência dos antecedentes, cuja extensão conduz a situações injustas 
e, às vezes, absurdas: afi rmar a existência de nexo de causalidade entre a 
ação do vendedor de uma arma de fogo (ou até do fabricante!) e a morte 
provocada com o tiro do revólver confi gura demasiado exagero.
Tradicionalmente, apesar da existência da relação de causalidade, 
diz a doutrina que nem o vendedor nem o fabricante respondem pela 
morte, pela falta de imputação subjetiva (ex.: falta de dolo). A solução 
proposta é justa, mas não resolve todas as situações. E se o vendedor 
agisse com dolo? Imagine que A, pretendendo matar B, conhecido polí-
tico, dirija-se à loja de C para comprar um revólver (apresentando toda 
a documentação necessária). O vendedor C, coincidentemente, toma 
conhecimento da intenção de A, porque o ouve conversando ao tele-
fone. Ao vender a arma de fogo, o comerciante C deseja e espera que o 
crime se consume, já que considera o político B um corrupto. Pois bem, 
Direito Penal
57
apura-se que B fora morto por A, o qual se utilizou do instrumento bé-
lico vendido por C. Nesse exemplo há, indubitavelmente, nexo objetivo 
entre a venda e o homicídio; afinal, sem o negócio jurídico a morte não 
ocorreria da maneira como se deu, de sorte que a ação do comerciante 
C é causa do resultado. Há, também, vínculo subjetivo, de modo que 
o vendedor deveria ser responsabilizado pelo homicídio doloso! Nada 
mais absurdo, sobretudo diante de tantos fatores, alheios à conduta do 
vendedor, que interferiram no desfecho letal. Este não possuía domínio 
algum sobre o desenrolar causal dos fatos; além disso, o controle sobre o 
uso do revólver por seu adquirente extrapola, em muito, o papel social 
que se espera do vendedor. Ao concluir pela responsabilidade do vende-
dor estaríamos punindo sua ideia!
Qual a diferença, do ponto de vista prático, entre a atitude do ven-
dedor que realiza o negócio sabendo ou esperando o resultado e a da-
quele que faz exatamente a mesma coisa, sem ter o menor conhecimen-
to do destino do bem? Apenas o pensamento diferencia uma situação 
da outra. Quando um comerciante vende arma de fogo a um policial, 
mesmo sabendo que o adquirente é um agente da lei e esperando que 
faça bom uso do revólver, se efetivamente várias vidas forem salvas em 
serviço graças ao instrumento bélico, nenhum mérito ou crédito terá o 
vendedor. Se a ele não se atribuem os louros, também não deve arcar 
com os ônus.
Aplicando-se a esse problema a teoria da imputação objetiva, che-
ga-se a um resultado justo e convincente. Com ela, exige-se que a condu-
ta do vendedor do automóvel tenha criado um risco juridicamente proi-
bido e relevante ao bem jurídico lesado (no caso, a vida do político B). O 
comportamento do vendedor, no entanto, não gera nenhum perigo (ou 
risco) proibido à vida de terceiros. Não faz parte de seu papel social zelar 
pelo bom ou mau uso do veículo por seu adquirente. Por esse motivo, 
embora haja nexo causal e dolo, ele não responde pela morte, pela falta 
de imputação objetiva. Acrescente-se que uma conduta inicial lícita não 
conduz seu autor à responsabilidade por ações posteriores ilícitas prati-
cadas por terceiro (princípio da proibição do regresso).
5.7.2.5. Natureza jurídica
A relação de imputação objetiva constitui elemento do fato típi-
co (elemento normativo implícito), cuja função é servir como critério 
limitador à relação de causalidade material. Serve para barrar aquelas 
situações injustas, em que a aplicação rigorosa da teoria da equivalência 
dos antecedentes conduz a soluções absurdas.
O sistema funcionalista, dentro do qual se insere a teoria da impu-
tação objetiva, opõe-se ao finalismo quanto ao seu método. Ontologicis-
ta (ou empírico) neste e normatizante naquele.
Esquematicamente, o fato típico, nessa nova concepção, conteria os 
seguintes elementos: a) conduta (dolosa ou culposa); b) resultado (nos 
$�WHRULD�GD�LPSXWDomR�REMH�
WLYD�FDGD�YH]�PDLV�p�D�FLWDGD�HP�
QRVVRV�WULEXQDLV�
´­� OX]� GD� WHRULD� GD� LPSX�
WDomR� REMHWLYD�� DVVHQWRX� TXH� R�
PRGR� GH� DJLU� GD� Up� QmR� FULDUD�
VLWXDomR� GH� ULVFR� QmR� SHUPLWLGR��
DSWD� D� YLVOXPEUDU�� VH� FRPSURYD�
GR� SHOR�parquet�� R� UHOHYR� SHQDO�
GR� FRPSRUWDPHQWR�� TXHU� VRE� R�
kQJXOR� GD� DXWRULD�� TXHU� VRE� R�
GD� SDUWLFLSDomRµ�� $3� ����0*��
UHO��0LQ�� -RDTXLP�%DUERVD�� ���� ���
H������������ �$3������� ,QIRUPDWLYR�
67)����������
CurioSiDADE
58
crimes materiais ou de resultado); c) nexo de causalidade (nos crimes 
materiais ou de resultado); d) tipicidade; e) imputação objetiva (ele-
mento normativo implícito), o qual se desdobra no exame da criação de 
um risco proibido e na realização do risco no resultado.
A ilicitude e a culpabilidade não são afetadas dentro do novo sis-
tema. É certo, porém, que muitos problemas penais que antes eram so-
lucionados sob o prisma da licitude passam a ser tratados, com a apli-
cação da teoria da imputação objetiva, como fatos atípicos (é o caso da 
violência desportiva, das intervenções cirúrgicas e do consentimento do 
ofendido).
5.7.3. Linhas mestras da imputação objetiva 
segundo roxin
Roxin afi rma que a imputação objetiva possui as seguintes linhas 
mestras (que correspondem a três níveis de imputação): criação de um 
risco relevante e proibido + realização do risco no resultado + resultado 
dentro do alcance do tipo.
5.7.3.1. Criação de um risco relevante e proibido
Para que exista imputação objetiva o agente tem de produzir (ou au-
mentar) um risco relevante e proibido, caso contrário (i. e., riscos irrele-
vantes, permitidos ou diminuídos), ter-se-á um fato penalmente atípico.
a) Riscos irrelevantes
Os riscos gerais da vida são irrelevantes penalmente. Quem se apro-
veita de tais riscos não pode ser considerado como responsável pelo re-
sultado. Este não será obra sua, mas desses riscos gerais da vida (ex.: 
aquele que instiga alguém a praticar um esporte radical ou a fazer uma 
viagem de carro numa estrada perigosa não pode ser responsabilizado 
pela morte da pessoa, ainda que tenha desejado esse resultado).
b) Riscos permitidos
A criação de riscos permitidos afasta a imputação objetiva do re-
sultado (e, como consequência, a responsabilidade penal). Assim, por 
exemplo, os riscos autorizados em face de sua utilidade social, como o 
decorrente do tráfego de automóveis (de acordo com as regras de trânsi-
to), a correta utilização da lex artis (no caso da Medicina, da Engenharia 
etc.), a prática de esportes, entre outros.
Também se entendem por risco permitido as situações às quais se 
aplica o princípio da confi ança:
I) confi ança de que a conduta de terceiros realizada na sequência 
será conforme o direito. Exemplo: o motorista que conduz pela via pre-
ferencial confi a que o outro irá aguardar sua passagem; se isso não acon-
tece, não se pode imputar àquele que trafegava na via principal respon-
sabilidade alguma pelo acidente, ainda que fosse possível a ele evitá-lo, 
por exemplo, dando a passagem ao outro motorista;
II) confi ança de que aquele que realizou uma conduta preceden-
te cumpriu corretamente seu papel. Exemplo: o médico que utiliza um 
Direito Penal
59
material cirúrgico confia que seus assistentes o esterilizaram correta-
mente; caso isso não tenha ocorrido, o médico não poderá responder 
pela infecção contraída, cabendo tal responsabilidade exclusivamente 
aos seus assistentes.
c) Diminuição do risco
Quando alguém realiza um comportamento que diminui um risco 
proibido e relevante gerado por terceiro, não age de modo contrário ao 
direito e, por óbvio, não será responsabilizado criminalmente por sua 
conduta. Exemplo: a pessoa que consegue convencer um ladrão a sub-
trair mil reais em vez de cinco mil não responde por furto, embora tenha 
influenciado no ato do furtador.
5.7.3.2. Realização do risco proibido e relevante 
no resultadoQuando houver a criação de um risco relevante e proibido, será pre-
ciso verificar se ele efetivamente se produziu no resultado, a fim de que 
este possa ser imputável objetivamente ao autor.
a) Causas imprevisíveis (cursos causais extraordinários) Não se 
pode imputar a alguém um resultado quando o agente não tinha con-
trole sobre o desenrolar causal dos acontecimentos. O responsável pelo 
atropelamento de um pedestre não responde pela morte deste se ela se 
deu por conta de um incêndio no hospital. Esta hipótese é expressamen-
te solucionada em nosso CP, no art. 13, § 1º.
b) Riscos que não tiveram nenhuma influência no resultado (que 
teriam ocorrido de qualquer maneira)
Quando se verifica que o resultado teria ocorrido de qualquer 
modo, ainda que o agente empregasse a diligência recomendada, não 
se pode imputar a este objetivamente o resultado produzido. Exemplo: 
o fabricante de um pincel com pelo de cabra deixa de fornecer equipa-
mentos adequados de proteção individual a seus funcionários que vêm a 
contrair uma infecção letal; comprova-se, posteriormente, que se tratava 
de um bacilo até então desconhecido, cujo contágio seria inevitável, ain-
da que todos os equipamentos e normas técnicas de segurança fossem 
observados.
c) Resultados não compreendidos no fim de proteção da norma
É preciso verificar qual a finalidade da norma de cuidado, vale dizer, 
o que ela visava proteger. Para que haja imputação objetiva, será preciso 
que o agente tenha produzido um resultado compreendido dentro do 
fim de proteção da norma. Exemplo: há uma norma que exige dos ciclis-
tas, durante à noite, que se utilizem de um farol. Essa norma tem como 
finalidade evitar acidentes pessoais. Se dois ciclistas andam com farol 
apagado, e o que vai à frente é abalroado por um caminhão, não se pode 
imputar esse resultado ao outro ciclista, ainda que se demonstrasse que 
o fato de ele ter utilizado o farol evitaria a morte do ciclista que seguia 
à frente. A norma de proteção visa evitar acidentes pessoais, e não de 
terceiros.
60
5.7.3.3. Risco compreendido no alcance do 
tipo
Há casos em que, mesmo tendo-se verifi cado a realização de um 
risco proibido no resultado, constata-se que, no caso concreto, “o al-
cance do tipo, o fi m de proteção da norma inscrita no tipo (ou seja, da 
proibição de matar, ferir, danifi car etc.) não compreende resultados da 
espécie do ocorrido, isto é, quando o tipo não for determinado a im-
pedir acontecimentos de tal ordem. Esta problemática é relevante em 
especial nos delitos culposos” (Claus Roxin, Funcionalismo e imputação 
objetiva no direito penal, trad. Luís Greco, p. 352). Em termos de crimes 
dolosos, há três hipóteses em que se aplica o critério ora exposto: a) 
autocolocação dolosa em perigo; b) heterocolocação consentida em pe-
rigo; c) âmbito de responsabilidade de terceiros.
a) Autocolocação dolosa em perigo
A vítima que se coloca dolosamente numa situação de perigo ex-
clui, com essa atitude, a responsabilidade de terceiros pelas lesões que 
vier a sofrer. Exemplo: a pessoa que pratica contato sexual desprotegida 
com um portador do vírus HIV, ciente dessa circunstância, afasta a res-
ponsabilidade do parceiro decorrente do contágio venéreo.
b) Heterocolocação consentida em perigo
A mesma solução se aplica quando a vítima consente em que ou-
trem a coloque numa situação de perigo, como no caso de quem pede 
carona a um motorista visivelmente embriagado, vindo a ferir-se num 
acidente automobilístico.
c) Responsabilidade de terceiros
A responsabilidade de terceiros no resultado afasta a imputação ob-
jetiva de quem deu início ao processo causal. É o caso do erro médico. 
Para Roxin, quando o erro substitui o perigo gerado, só o médico res-
ponde pelo resultado (ex.: a morte do paciente por choque anafi lático 
afasta a responsabilidade pelo óbito de quem havia lesionado o falecido). 
Quando, por outro lado, o erro não impede a realização do resultado, é 
preciso distinguir se o médico agiu com culpa leve (hipótese em que 
haverá responsabilidade do médico e da pessoa que havia provocado as 
lesões no falecido) ou culpa grave (só o médico responde).
5.7.4. A imputação objetiva segundo Jakobs
Günther Jakobs estrutura a teoria da imputação objetiva a partir 
das seguintes premissas:
5.7.4.1. A imputação objetiva é vinculada a uma 
sociedade concretamente considerada
Jakobs afi rma que a imputação, enquanto forma, isto é, a tarefa de 
determinar quando alguém deve responder por seus atos, sempre acom-
panhou a humanidade, como já se via no exemplo bíblico de Adão e Eva, 
Direito Penal
61
em que aquele procurou justificar-se perante Deus, dizendo que a maçã 
que havia comido lhe fora dada pela mulher que Ele havia criado (ou 
seja, num misto de relato e defesa, tentava eximir-se de responsabilidade 
alegando que o fizera confiando na mulher que o próprio Criador lhe 
enviara).
O conteúdo da imputação, vale dizer, os critérios para atribuir a al-
guém a responsabilidade por seus atos, depende de uma sociedade con-
cretamente considerada.
5.7.4.2. O contato social gera riscos
Todo contato social gera algum risco, sendo este inerente à vida 
em sociedade. Isso se vê num simples aperto de mão (que pode trans-
mitir germes), no ato de servir uma comida (que pode estar estraga-
da), em atitudes como deixar que os filhos pequenos brinquem com 
os amigos, servir bebidas alcoólicas, fabricar carros, produzir bens de 
consumo etc.
A eliminação desses riscos é absolutamente impossível, sob pena de 
engessar a sociedade. O que se deve esperar das pessoas, nesse sentido, 
não é a total eliminação de riscos (algo inatingível), mas que cumpram 
corretamente seu papel social. Assim, não se pode impedir que um bar-
man sirva bebidas alcoólicas a seus fregueses, mas pode-se exigir dele 
que não o faça a menores de 18 anos. É impossível impedir a fabricação 
de carros, mas pode-se exigir de seus fabricantes que observem as nor-
mas técnicas e os construam dentro dos padrões de segurança. Não há 
como evitar que restaurantes sirvam comida, mas é possível estabelecer 
a obrigatoriedade de observarem condições mínimas de higiene.
5.7.4.3. A imputação objetiva enfoca 
apenas comportamentos que violam 
determinado papel social
Não se pode exigir de um mecânico que, mesmo sabendo que o 
dono do automóvel costuma andar em alta velocidade, deixe de con-
sertá-lo. Seu papel social consiste em arrumar os defeitos dos veículos, 
mantendo-os dentro de suas especificações regulares, nada mais que 
isso. Não se pode atribuir a esse mecânico, que se limitou a exercer seu 
papel social, a responsabilidade pela morte do proprietário do veículo 
num acidente de trânsito.
Um barman que serve bebida alcoólica a um motorista não pode ser 
responsabilizado pelo acidente automobilístico posteriormente causado, 
já que se limitou a cumprir seu papel social.
5.7.4.4. Fundamentos da imputação objetiva
A imputação objetiva assenta-se nas premissas acima resumidas e 
não se fará presente, segundo Jakobs, nas hipóteses abaixo:
62
1ª) Criação de um risco permitido
Aquele que realiza um risco permitido não pode responder juridi-
camente pelo resultado produzido.
O risco permitido dá-se nas seguintes situações:
 a) normas jurídicas que autorizam comportamentos perigosos (ex.: 
regras de trânsito, práticas desportivas autorizadas, normas técni-
cas de atividades industriais);
 b) fatos socialmente adequados (ex.: um passeio de automóvel 
com amigos, o ato de levar um adolescente a um passeio numa 
montanha);
 c) lex artis: a observação das regras técnicas de determinada ativi-
dade, como a Medicina ou a Engenharia;
 d) autorizações contidas em normas extrapenais. Jakobs desenvolve, 
ainda, conceitos de compensação do risco e de variabilidade do risco.
A compensação de um risco pode ser levada em conta quando a 
lei não estabelece determinado padrão (porque, se o faz, é justamente 
por não admitir nenhum tipo de compensação). Assim, se um motorista 
conduz seu automóvel sob efeitode álcool acima do limite permitido, 
não pode compensar essa atitude por sua experiência ao volante.
A variabilidade do risco signifi ca que o mesmo comportamento 
produtor de risco pode variar conforme o papel social do agente. Uma 
mãe que trata a ferida do fi lho com um pano não esterilizado não come-
te delito, ainda que isso resulte num agravamento da lesão. Um médico, 
contudo, não pode agir da mesma maneira, sob pena de responder pe-
nalmente por sua conduta.
2ª) Princípio da confi ança
Na vida em sociedade, as pessoas não podem ser obrigadas a des-
confi ar das demais, supondo constantemente que os outros não cumpri-
rão seu papel. Daí a exclusão da responsabilidade penal quando alguém 
agiu na confi ança de que o outro o cumpriu (ou cumpriria).
O princípio da confi ança (que para Roxin faz parte do conceito de 
risco permitido) também se projeta de duas formas, como visto acima.
3ª) Proibição do regresso
Por este princípio, uma conduta lícita não gera responsabilidade 
por atos ilícitos praticados posteriormente por terceiros. O motorista 
de táxi que conduz um passageiro até o seu destino não pode ser res-
ponsabilizado pelas atitudes deste (ex.: matar alguém), ainda que tenha 
conhecimento delas no trajeto.
4ª) Capacidade da vítima
O consentimento do ofendido a agressões a bens jurídicos a ele per-
tencentes deve excluir a responsabilidade penal, quando a vítima tinha 
capacidade para entender e anuir com a lesão. Assim, por exemplo, aque-
le que realiza um contato sexual voluntário com uma pessoa portadora 
do vírus HIV, ciente dessa circunstância, e, conscientemente, não toma 
Direito Penal
63
nenhuma precaução para evitar o contágio deve ser o único responsável 
pela transmissão da doença, eximindo de responsabilidade o parceiro.
5.7.5. Diferenças entre roxin e Jakobs no 
contexto da teoria da imputação objetiva
Diversas diferenças poderiam ser apontadas entre as teorias da im-
putação objetiva sustentadas por Claus Roxin e Gunther Jakobs; duas 
delas, entretanto, merecem destaque:
a) A missão da causalidade material
Roxin constrói uma teoria geral da imputação objetiva para os cri-
mes materiais, de modo a substituir a relação de causalidade, abando-
nando-se o que ele denomina “dogma da causalidade”.
Jakobs, por sua vez, sustenta que não há como abandonar um míni-
mo de causalidade na aferição da responsabilidade penal, de modo que 
a imputação objetiva serviria para restringir o alcance do nexo causal.
b) Os níveis de imputação objetiva
A “principal peculiaridade do sistema de Roxin em face da doutrina 
dominante” é a “existência de um terceiro nível de imputação, a saber, 
o alcance do tipo” (Luís Greco, A teoria da imputação objetiva — uma 
introdução, in Claus Roxin, Funcionalismo e imputação objetiva no di-
reito penal, p. 116).
A maioria dos autores define a imputação objetiva em dois níveis: 
a criação de um risco proibido e relevante e sua realização no resultado.
Jakobs, de sua parte, estrutura o risco juridicamente relevante e 
proibido em quatro subníveis: risco permitido, princípio da confiança, 
proibição do regresso e capacidade da vítima.
5.7.6. regras extraídas da imputação objetiva 
(Damásio de Jesus)
Não há imputação objetiva (e o fato será atípico) quando: a) o su-
jeito não criou o risco com sua conduta; b) o risco, embora criado pela 
conduta, era permitido ou irrelevante (princípio da insignificância); c) 
o risco criado não produziu resultado jurídico (o que conduz à atipici-
dade ou à responsabilização pelo crime na forma tentada); d) não há 
relação direta entre a conduta, o risco criado e o resultado ocorrido (ex.: 
atropelamento culposo e morte por infecção hospitalar. Pela doutrina 
tradicional, o agente responde pelo resultado, considerado como dentro 
do desdobramento causal esperado de sua conduta. Pela teoria da im-
putação objetiva, a morte não será imputada ao motorista, pela falta de 
relação direta entre sua conduta e o evento fatal).
Haverá, porém, imputação objetiva se o sujeito aumentou o risco 
ao bem jurídico ou extrapolou o risco juridicamente permitido (ex.: 
entende-se tradicionalmente não configurar crime a conduta daquele 
que polui águas já corrompidas; com a teoria, há crime, pois o sujeito 
aumentou o risco ao bem jurídico).
imputação obje-
tiva,�GH�'DPiVLR�
GH� -HVXV�� (GLWRUD�
6DUDLYD�
BiBLioTECA
64
5.7.6.1. Princípios auxiliares
A teoria da imputação objetiva enseja a admissão de uma série de 
princípios:
a) Princípio da confi ança: uma pessoa não pode ser punida quan-
do, agindo corretamente e na confi ança de que o outro também assim 
se comportará (i. e., cumprirá o seu papel), dá causa a um resultado 
não desejado (ex.: o médico que confi a em sua equipe não pode ser res-
ponsabilizado pela utilização de uma substância em dose equivocada, 
se para isso não concorreu; o motorista que conduz seu automóvel cui-
dadosamente confi a que os pedestres se manterão na calçada e somente 
atravessarão a rua quando não houver movimento de veículos, motivo 
pelo qual não comete crime se atropela um transeunte que se precipita 
repentinamente para a via trafegável).
b) Princípio da insignifi cância: quando a conduta do agente pro-
duzir lesões insignifi cantes aos bens jurídicos, o fato será penalmente 
atípico (ex.: furto de uma caixa de fósforos).
c) Princípio da proibição do regresso: uma conduta inicialmente 
lícita não pode conduzir à responsabilização do agente por resultados 
ilícitos posteriores cometidos por terceiros (ex.: venda de um veículo 
automotor posteriormente utilizado em atropelamento).
d) Princípio da autorresponsabilidade ou das “ações a próprio 
risco”: aquele que, de modo livre e consciente, e sendo inteiramente res-
ponsável por seus atos, realiza comportamentos perigosos e produz re-
sultados lesivos a si mesmo arcará totalmente com as consequências de 
seus atos, não se admitindo qualquer tipo de imputação a pessoas que o 
tenham eventualmente motivado a praticar tais condutas perigosas (ex.: 
agente que incentiva desafeto a praticar “esportes radicais”).
6 Do Fato Típico e seus Elementos
66
 6.1 FATo TíPiCo
Fato típico é o fato humano que se adequa perfeitamente ao tipo 
penal. O fato típico consubstancia o primeiro dos elementos estruturais 
do delito e sua composição varia em função da espécie de crime.
Nos dolosos são: a) conduta dolosa; b) resultado (nos crimes ma-
teriais); c) nexo causal (nos crimes materiais); d) tipicidade; e) relação 
de imputação objetiva (elemento normativo implícito do fato típico).
Nos culposos, por outro lado: a) conduta voluntária; b) resultado 
involuntário; c) nexo causal; d) tipicidade; e) relação de imputação ob-
jetiva (elemento normativo implícito do fato típico); f) quebra do dever 
de cuidado objetivo; g) previsibilidade objetiva.
 6.2 CoNDuTA
A conduta deve ser entendida como a ação ou omissão huma-
na, consciente e voluntária dirigida a uma fi nalidade. Seus elementos 
são: exteriorização, consciência e voluntariedade. Faltando um desses 
elementos, não há falar em conduta. As formas de conduta, como vi-
mos acima, são duas: ação e omissão. Ação é a conduta positiva que 
se manifesta por um movimento do corpo humano (“matar”, “cons-
tranger”, “subtrair”, etc.). Omissão é a conduta negativa que consiste 
na abstenção de um movimento. É o deixar de fazer algo penalmente 
relevante. Há duas espécies de crimes omissivos: crimes omissivos pró-
prios e crimes omissivos impróprios (comissivos por omissão). Os cri-
mes omissivos próprios são crimes de mera conduta, o tipo penal nem 
sequer faz uma referência à ocorrência de um resultado no mundo 
exterior, ou seja, basta o sujeito se omitir para estar confi gurado o tipo 
(ex.: arts. 135, 244 e 269 do CP). Nos crimes omissivos impróprios 
(omissivos por omissão), o tipo penal descreve uma conduta positiva, 
ou seja, uma ação. O sujeito responde pelo crime porque estava juridi-
camente obrigado a impedir a ocorrência do resultado. Atenção: para 
que alguém responda por um crimecomissivo por omissão é necessá-
rio que, nos termos do art. 13, § 2º, do CP, tenha o dever jurídico de 
evitar o resultado. 
 6.3 rESuLTADo
Há duas teorias que se debatem na conceituação do resultado para 
fi ns penais:
1ª) teoria naturalística: resultado é a modifi cação no mundo exte-
rior provocada pela ação ou omissão;
$SURIXQGH�VHXV�FRQKHFLPHQ�
WRV� FRP� D� OHLWXUD� GR� DUWLJR� ´2�
TXH� p� D� WLSLFLGDGH� SHQDO� KRMHµ��
GH� 3DXOR� 4XHLUR]�� GLVSRQtYHO� HP��
KWWS���HPSRULRGRGLUHLWR�FRP�EU��
R�TXH�H�WLSLFLGDGH�SHQDO�KRMH�
SAiBA mAiS
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
67
2ª) teoria jurídica: resultado é a lesão ou ameaça de lesão ao bem 
jurídico tutelado pela norma penal.
Há crime sem resultado? De acordo com a teoria naturalística, isso 
ocorre nos crimes de mera conduta. Para a teoria jurídica, não há crime 
sem resultado jurídico, de modo que, se a conduta não provocou uma 
afetação (lesão ou ameaça de lesão) a algum bem jurídico penalmente 
tutelado, não houve crime.
��������&ODVVLÀFDomR�GRV�FULPHV�TXDQWR�DR�
resultado naturalístico
a) Materiais ou de resultado: o tipo penal descreve a conduta e um 
resultado material, exigindo-o para fins de consumação. Exemplos: ho-
micídio (CP, art. 121), furto (CP, art. 155), roubo (CP, art. 157), estelio-
nato (CP, art. 171).
b) Formais: o tipo penal descreve a conduta e o resultado material, 
porém não o exige para fins de consumação. Exemplos: extorsão (CP, 
art. 158), extorsão mediante sequestro (CP, art. 159), sequestro qualifi-
cado pelo fim libidinoso (CP, art. 148, § 1º, V).
c) De mera conduta: o tipo penal não faz nenhuma alusão a re-
sultado naturalístico, limitando-se a descrever a conduta punível inde-
pendentemente de qualquer modificação no mundo exterior. Exemplos: 
omissão de socorro (CP, art. 135), violação de domicílio (CP, art. 150).
Alguns autores afirmam que o tipo penal nos crimes formais é in-
congruente, porquanto descreve conduta e resultado, mas se contenta 
com aquela para que ocorra a consumação, vale dizer, exige menos do 
que aquilo que está escrito na norma penal.
�������&ODVVLÀFDomR�GRV�FULPHV�TXDQWR�DR�
resultado jurídico
a) De dano ou de lesão: quando a consumação exige efetiva lesão 
ao bem tutelado. Exemplos: homicídio (CP, art. 121), lesão corporal (CP, 
art. 129), furto (CP, art. 155).
b) De perigo: caso a consumação se dê apenas com a exposição do 
bem jurídico a uma situação de risco. Exemplos: perigo de contágio ve-
néreo (CP, art. 130), perigo à vida ou saúde de outrem (CP, art. 132).
Estes se subdividem em crimes de perigo concreto (o risco deve 
ser demonstrado) e de perigo abstrato (a prática da ação ou omissão 
gera uma presunção absoluta de que o bem jurídico sofreu um risco). 
Há polêmica na doutrina acerca da constitucionalidade dos crimes de 
perigo abstrato. Para Luiz Flávio Gomes, tais delitos seriam inconstitu-
cionais por violação ao princípio da ofensividade (nullum crimen sine 
injuria) (Princípio da ofensividade no direito penal). Fernando Capez, por 
outro lado, entende subsistir a “possibilidade de tipificação de crimes de 
perigo abstrato em nosso ordenamento legal, como legítima estratégia 
Nova Lei Seca – 
comentários à 
Lei n. 12.760, de 
20-12-2012�� GH 
/XL]� )OiYLR� *R�
PHV� H� /HRQDUGR�
6FKPLWW� GH� %HP��
(GLWRUD�6DUDLYD��
Tóxicos: /HL� GH�
'URJDV� DQRWD�
GD� H� LQWHUSUHWD�
GD�� GH� 5HQDWR�
0DUFmR�� (GLWRUD�
6DUDLYD�
BiBLioTECA
68
de defesa do bem jurídico contra agressões em seu estado embrionário, 
reprimindo-se a conduta antes que ela venha a produzir um perigo con-
creto ou dano efetivo”. Afi rma o autor que se trata de “cautela reveladora 
de zelo do Estado em proteger adequadamente certos interesses” (Con-
sentimento do ofendido e violência desportiva: refl exos à luz da teoria da 
imputação objetiva, p. 87). Na jurisprudência predomina amplamente o 
entendimento no sentido da constitucionalidade de tais delitos (v. STJ, 
HC 23.969/RJ, rel. Min. Hamilton Carvalhido, j. 9-9-2003, Informativo 
STJ, n. 183).
 6.4 rELAÇÃo DE CAuSALiDADE
Dispõe o art. 13, caput, parte inicial, do CP: “O resultado, de que de-
pende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa”. 
O resultado a que alude o dispositivo é o naturalístico ou material, isto é, 
a modifi cação no mundo exterior provocada pela conduta.
A grande maioria dos tipos penais não se limita a descrever uma 
ação ou omissão, exigindo também, para fi ns de consumação, que ocor-
ra um resultado material. Nesses casos, o art. 13 condiciona a existência 
do crime à constatação de um liame causal entre a conduta e o resultado 
por ela supostamente produzido.
Nexo de causalidade consiste justamente nesse vínculo ou liame 
que une a conduta ao resultado nos crimes materiais.
Várias teorias se preocupam em defi nir o critério para constatar o 
nexo causal:
a) teoria da equivalência dos antecedentes ou da conditio sine qua 
non: sustenta que todo fator que de forma direta ou indireta exerceu 
alguma infl uência no resultado deve ser considerado como sua causa;
b) teoria da causalidade adequada: apenas se reputa causa do 
resultado a circunstância mais adequada a produzi-lo, segundo um 
juízo de probabilidade (ou “prognose póstuma-objetiva”: verifi ca-se 
se um homem dotado de conhecimentos medianos poderia antever o 
resultado como provável ou possível na situação em que o agente se 
encontrava);
c) teoria da imputação objetiva do resultado: defende que a cau-
salidade natural, fundada na teoria da equivalência dos antecedentes, 
leva a exageros que devem ser limitados pela verifi cação da existência 
de relação de imputação objetiva entre a conduta e o resultado. Além da 
causalidade material, portanto, é preciso que a atitude do agente tenha 
produzido um risco juridicamente relevante e proibido ao bem jurídico.
Nosso CP adotou expressamente a teoria da equivalência dos ante-
cedentes (art. 13, caput, parte fi nal), ao estabelecer: “Considera-se causa 
a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido”. Tudo 
o que contribuir para o resultado, portanto, deve ser considerado sua 
VoCABuLário
conditio sine qua non:� p� XPD�
H[SUHVVmR� ODWLQD� TXH� VLJQLÀ�FD�
´VHP�D�TXDO�QmRµ�
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
69
causa, seja uma conduta humana, seja um fator natural. A doutrina, 
em face de tal definição, construiu um procedimento para determinar 
qual fator é ou não causa de um resultado: trata-se do processo ou juízo 
de eliminação hipotética, pelo qual basta excluir mentalmente algum 
antecedente do resultado para saber se ele é ou não sua causa (Julius 
Glasser foi seu precursor, conforme assinalou, entre outros, Tobias Bar-
reto, em seus Comentários ao Código Criminal do Império, in Estudos 
de direito). Se após a exclusão mental do antecedente se concluir que 
o resultado teria ocorrido da maneira como ocorreu, será sinal de que 
o antecedente excluído não foi causa do resultado. Se, por outro lado, 
se perceber que sem o fator examinado o resultado não teria ocorrido 
daquela maneira, significará que o antecedente foi causa do resultado. 
Exemplo: A, pretendendo matar B, dirige-se à residência da vítima à 
noite e, vendo seu corpo deitado sobre a cama, efetua disparos de arma 
de fogo. Constata-se, posteriormente, que B havia falecido duas horas 
antes dos tiros, em virtude de um ataque cardíaco. Os disparos que 
A efetuou, nesse caso, não foram causa da morte de B. Basta excluir 
mentalmente a conduta do atirador para concluir que o resultado teria 
ocorrido exatamente como ocorreu.
O problema do regressus ad infinitum. Uma das críticas mais vee-
mentes contra a teoria da conditio sine qua non diz respeito à questão 
do regresso ao infinito. De fato, por essa teoria pode-se concluir que 
o mais remoto antecedente deverá ser considerado causa do resultado. 
No conhecido exemplo do homicídio com emprego de arma de fogo, a 
condutadaquele que vendeu a arma ao homicida e até a do fabricante do 
instrumento bélico serão consideradas causa do resultado. Em casos tais, 
porém, apesar da existência do nexo físico entre a conduta do fabricante 
e do vendedor e o resultado morte, eles não responderão criminalmente 
pelo homicídio. A doutrina, de há muito, sustenta a não responsabili-
zação penal do fabricante da arma ou do vendedor com base na teoria 
da ausência do dolo. Vale dizer, apesar do nexo objetivo entre conduta e 
resultado, não há liame subjetivo, psicológico. Pondere-se, contudo, que 
a teoria da ausência do dolo não é suficiente para responder satisfatoria-
mente a todos os casos (a teoria mais adequada para fazê-lo é a teoria da 
imputação objetiva).
6.4.1. Causas dependentes e independentes
Determinados fatores podem interpor-se no nexo de causalidade 
entre a conduta e o resultado, de modo a influenciar no liame causal. 
Tais fatores são chamados de “concausas” ou simplesmente “causas”, 
como prefere atualmente a maioria dos autores.
Dividem-se em causas dependentes e independentes. Aquelas são 
as que se originam na conduta do agente e se inserem dentro da sua 
linha de desdobramento causal natural, esperado. Trata-se daquilo que 
normalmente acontece (quod plerumque accidit), constituindo, assim, 
VoCABuLário
DG� LQÀQLWXP:� p� XPD�H[SUHVVmR�
HP�ODWLP�TXH�VLJQLÀFD�´DWp�R�LQ�
ÀQLWRµ��´VHP�OLPLWH�RX�VHP�ÀPµ��
SDUD� LQGLFDU� XP� SURFHVVR� RX�
RSHUDomR�TXH�FRQWLQXD�LQGHÀ�
QLGDPHQWH�
70
decorrências corriqueiras da conduta (ex.: a morte por choque hemor-
rágico subsequente a um ferimento perfuroinciso profundo confi gura 
evento esperado; para a jurisprudência, a morte em virtude de infecção 
hospitalar é considerada decorrência esperada de uma internação). As 
independentes, de sua parte, são as que, originando-se ou não da condu-
ta, produzem por si sós o resultado e confi guram algo que normalmente 
não acontece. São eventos inusitados, inesperados (ex.: uma pequena 
ferida incisa, normalmente, não é capaz de levar à morte, mas isso pode 
ocorrer se a vítima for hemofílica).
Em se tratando de causas dependentes, o agente responderá por 
todos os seus desdobramentos.
Quanto às causas independentes, é preciso distinguir entre as cau-
sas absoluta e as relativamente independentes da conduta do agente.
1) Causas absolutamente independentes: são as que produzem por 
si sós o resultado e não têm qualquer origem ou relação com a conduta 
praticada pelo sujeito. Como nesse caso o resultado ocorreria de qual-
quer maneira, com ou sem o comportamento realizado, fi ca totalmente 
afastado o nexo de causalidade, motivo por que o agente não responderá 
pelo resultado. 
Subdividem-se em preexistentes (se anteriores à conduta do agen-
te), concomitantes (quando ocorrem ao mesmo tempo) ou superve-
nientes (se posteriores).
Exemplos:
a) efetuar disparos de arma de fogo, com intenção homicida, em 
pessoa que falecera minutos antes (causa preexistente);
b) atirar em pessoa que, no exato momento do tiro, sofre ataque 
cardíaco fulminante que não guarda relação alguma com o disparo 
(causa concomitante); 
c) ministrar veneno na comida da vítima, que, antes que a peçonha 
faça efeito, vem a ser atropelada (causa superveniente; nesse caso, o agen-
te só responde pelos atos praticados, ou seja, por tentativa de homicídio).
Lembre-se de que em todas as causas absolutamente independentes 
fi cará afastada a relação de causalidade entre a conduta do sujeito e o 
resultado produzido, razão pela qual o sujeito apenas responderá pelos 
atos praticados, não sendo possível imputar-lhe o resultado fi nal (nos 
exemplos acima: a morte da vítima).
2) Causas relativamente independentes: são as que, somadas à con-
duta do agente, produzem o resultado. De regra, não se exclui o nexo de 
causalidade, de forma que o resultado poderá ser atribuído ao agente, 
que por ele responderá.
Também se subdividem em preexistentes, concomitantes ou super-
venientes.
Exemplos de causas relativamente independentes: a) Efetuar feri-
mento leve, com instrumento cortante, num hemofílico, que sangra até 
a morte (a hemofi lia é a causa preexistente que, somada à conduta do 
agente, produziu a morte). Note que nesse exemplo se pressupõe que o 
D��as causas absolutamente 
independentes� VHPSUH� URPSHP�
R� QH[R� FDXVDO�� GH�PRGR� TXH� R�
DJHQWH� QXQFD� UHVSRQGHUi� SHOR�
UHVXOWDGR�� VRPHQWH� SHORV� DWRV�
SUDWLFDGRV��E��as causas relativa-
mente independentes� QmR� URP�
SHP� R� QH[R� FDXVDO�� PRWLYR� SRU�
TXH�R�DJHQWH��VH�D�FRQKHFLD�RX�
VH��HPERUD�QmR�D�FRQKHFHQGR��
SRGLD� SUHYr�OD�� UHVSRQGH� SHOR�
UHVXOWDGR��VDOYR�QD�FDXVD�VXSHU�
YHQLHQWH��
ATENÇÃo
Direito Penal
71
sujeito tenha efetuado um golpe leve no ofendido, que não produziria a 
morte de uma pessoa saudável.
b) Efetuar disparo contra a vítima que, ao ser atingida pelo projétil, 
sofre ataque cardíaco, vindo a morrer, apurando-se que a soma desses 
fatores produziu a morte (considere, nesse caso, que o disparo, isolada-
mente, não teria o condão de matá-la, o mesmo ocorrendo com relação 
ao ataque do coração — causa concomitante).
c) Após um atropelamento, a vítima é socorrida com algumas lesões 
ao hospital; no caminho, a ambulância explode, ocorrendo a morte (a 
explosão da ambulância é a causa superveniente que, aliada ao atropela-
mento, deu causa à morte do ofendido).
Nestes três últimos exemplos, há nexo causal entre a conduta e o 
resultado. O agente, contudo, só responderá pelo resultado se a causa 
preexistente ou concomitante for conhecida (o que conduz à responsa-
bilização a título de dolo) ou, ao menos, previsível (indicativo de culpa). 
Nas concausas relativamente independentes supervenientes não há, por 
força de lei, nexo causal (CP, art. 13, § 1º). Trata-se de uma exceção le-
gal à teoria da equivalência dos antecedentes. Isso se aplica ao exemplo 
da explosão da ambulância. Seria, efetivamente, um exagero imputar ao 
sujeito culpado pelo atropelamento a morte da vítima, que ocorreu em 
razão da explosão.
 6.5 TiPo PENAL, TiPiCiDADE E ADEQuAÇÃo TíPiCA
6.5.1. Conceito
Tipicidade é a relação de subsunção entre um fato concreto e um 
tipo penal previsto abstratamente na lei. Trata-se de uma relação de en-
caixe, de enquadramento. É o adjetivo que pode ou não ser dado a um 
fato, conforme ele se enquadre ou não na lei penal.
O conceito de tipicidade, como se concebe modernamente, pas-
sou a ser estruturado a partir das lições de Beling (1906), cujo maior 
mérito foi distingui-la da antijuridicidade e da culpabilidade. Seus 
ensinamentos, entretanto, foram aperfeiçoados até que se chegasse à 
concepção vigente.
Jiménez de Asúa sistematizou essa evolução, dividindo-a em três 
fases:
1ª) Fase da independência (Beling — 1906): a tipicidade possuía 
função meramente descritiva, completamente separada da ilicitude e da 
culpabilidade (entre elas não haveria nenhuma relação). Trata-se de ele-
mento valorativamente neutro. Sua concepção não admitia o reconheci-
mento de elementos normativos ou subjetivos do tipo.
subsunção:�p�D�DomR�RX�HIHLWR�
GH� VXEVXPLU�� LVWR� p�� LQFOXLU� �DO�
JXPD� FRLVD�� HP� DOJR� PDLRU��
&RPR�GHÀQLomR�MXUtGLFD��FRQÀ�
JXUD�VH�D�VXEVXQomR�TXDQGR�R�
FDVR� FRQFUHWR� VH� HQTXDGUD� j�
QRUPD�OHJDO�HP�DEVWUDWR�
VoCABuLário
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Inclusão 
72
2ª) Fase do caráter indiciário da ilicitude ou da ratio cognoscendi 
(Mayer — 1915): a tipicidade deixa de ter função meramente descriti-
va, representando um indício da antijuridicidade. Embora se mantenha, 
admite-se ser uma indício da outra. Pela teoria de Mayer, praticando-se 
um fato típico, ele se presume ilícito. Essa presunção, contudo, é relativa, 
pois admite prova em contrário. Além disso, a tipicidade não é valorati-
vamente neutra ou descritiva, de modo que se torna admissível o reco-
nhecimento de elementos normativos e subjetivos do tipo penal.
3ª) Fase da ratio essendi da ilicitude (Mezger — 1931): Mezger atri-
bui ao tipo função constitutivada ilicitude, de tal forma que, se o fato 
for lícito, será atípico. A ilicitude faz parte da tipicidade. O tipo penal do 
homicídio não seria matar alguém, mas matar alguém fora das hipóteses 
de legítima defesa, estado de necessidade etc.
Concepção dominante: a de Mayer.
6.5.2. Adequação típica
É o mesmo que tipicidade, ou seja, a relação de subsunção entre o 
fato e a norma penal. Há quem pense de modo diverso, afi rmando que 
tipicidade seria a mera correspondência formal entre o fato e a norma, 
enquanto a adequação típica, a correspondência que levaria em conta 
não apenas uma relação formal de justaposição, mas a consideração de 
outros requisitos, como o dolo ou a culpa.
Há duas modalidades de adequação típica:
1ª) Adequação típica por subordinação imediata ou direta: dá-se 
quando a adequação entre o fato e a norma penal incriminadora é ime-
diata, direta; não é preciso que se recorra a nenhuma norma de extensão 
do tipo. Exemplo: alguém efetua dolosamente vários disparos contra a 
vítima — esse fato se amolda diretamente ao tipo penal incriminador 
do art. 121 do CP.
2ª) Adequação típica por subordinação mediata ou indireta: o en-
quadramento fato/norma não ocorre diretamente, exigindo-se o recurso 
a uma norma de extensão para haver subsunção total entre fato concreto 
e lei penal. Exemplo: se alguém, com intenção homicida, efetua vários 
disparos de arma de fogo contra outrem e foge, sendo a vítima socorrida 
e salva a tempo, esse fato não se amolda ao tipo penal do art. 121 (não 
houve morte). Também não se enquadra no art. 129 (lesões corporais) 
porque o sujeito agiu com animus necandi (o art. 129 pressupõe animus 
laedendi). Seria o fato atípico? Não. Para que ocorra o perfeito enqua-
dramento da conduta com a norma, contudo, será preciso recorrer a 
uma norma de extensão; no caso, o art. 14, II, que descreve a tentativa. 
O mesmo se verifi ca quando alguém empresta arma de fogo a um ho-
micida, que a utiliza posteriormente para cometer o crime. Sua conduta 
não encontra correspondência direta com o art. 121 do CP. Novamente 
é preciso, então, socorrer-se de uma norma de extensão; nesse caso, o art. 
FRQGXWD
�DomR�RX�
RPLVVmR�
FATo TíPiCo
1H[R�
FDXVDO
7LSLFL�
dade
5HVXO�
WDGR
ATENÇÃo
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
73
29, caput, que pune a participação1. 
6.5.3. Tipicidade conglobante
Trata-se de um dos aspectos da tipicidade penal, que se subdividiria 
em tipicidade legal (adequação do fato com a norma penal, segundo 
uma análise estritamente formal) e tipicidade conglobante. Por meio 
desta, deve-se verificar se o fato, que aparentemente viola uma norma 
penal proibitiva, não é permitido ou mesmo incentivado por outra nor-
ma jurídica (como no caso das intervenções médico-cirúrgicas, violên-
cia desportiva, estrito cumprimento de um dever legal etc.). Não teria 
sentido, dentro dessa perspectiva, afirmar que a conduta do médico que 
realiza uma cirurgia no paciente viola a norma penal do art. 129 do CP 
(não ofenderás a integridade corporal alheia) e, ao mesmo tempo, aten-
de ao preceito constitucional segundo o qual a saúde é um direito de 
todos (não é lógico dizer que ele viola uma norma e obedece a outra, ao 
mesmo tempo).
Por meio da tipicidade conglobante (análise conglobada do fato 
com todas as normas jurídicas, inclusive extrapenais), situações consi-
deradas tradicionalmente como típicas, mas enquadráveis nas excluden-
tes de ilicitude (exercício regular de um direito ou estrito cumprimento 
de um dever legal), passariam a ser tratadas como atípicas, pela falta de 
tipicidade conglobante. Com a adoção da teoria da imputação objetiva, 
tais resultados (atipicidade de fatos então considerados típicos, porém 
lícitos) são atingidos sem necessidade dessa construção, que se torna su-
pérflua. 
 6.6 DoLo
Dolo é a vontade de concretizar as características objetivas do tipo 
(Damásio de Jesus). Trata-se de elemento subjetivo implícito da conduta. 
O dolo possui elementos, quais sejam:
a) Cognitivo ou intelectual, que é a representação, a consciência da 
conduta, do resultado e do nexo causal entre eles;
b) Volitivo, que é a vontade de realizar a conduta e produzir o re-
sultado. 
1. Na tentativa (art. 14, II), há extensão temporal da figura típica; na participação, 
extensão espacial e pessoal. Há outros exemplos de norma de extensão, como o art. 
9º do CPM: nos crimes militares impróprios, o processo de adequação típica dá-se 
por subordinação indireta porque, além da subsunção fato/tipo penal, requer-se a 
presença de uma das hipóteses previstas nesse dispositivo, dentre as quais ser o fato 
praticado em situação de serviço. Assim, por exemplo, para que um estupro seja 
considerado crime militar, além da prática das elementares previstas no art. 232 do 
CPM, deverá ser cometido em situação de serviço.
74
 6.7 CuLPA
O crime culposo está previsto no artigo 18, II, do Código Penal 
Brasileiro com a seguinte redação: 
Art. 18 — Diz-se o crime: 
(...) 
II — culposo, quando o agente deu causa ao resultado por impru-
dência, negligência ou imperícia. 
Para determinar quando surge a imprudência, negligência ou im-
perícia, é necessária a noção de dever de cuidado objetivo. Este corres-
ponde ao dever, que a todos se impõe, de praticar os atos da vida com as 
cautelas necessárias, para que do seu atuar não decorram danos a bens 
alheios. 
A imprudência é uma conduta positiva, que se dá com a quebra 
de regras de conduta ensinadas pela experiência. Exemplo: dirigir em 
excesso de velocidade e atropelar um pedestre. A negligência ocorre 
quando o sujeito se porta sem a devida cautela; é uma conduta negativa, 
uma omissão quando o caso impunha uma ação preventiva. Exemplo: 
mãe que deixa um veneno perigoso à mesa, permitindo que seu fi lho 
pequeno o ingira e morra. Imperícia é a falta de aptidão para o exercício 
de arte ou profi ssão. A imperícia pressupõe sempre a qualifi cação ou ha-
bilitação legal para o ofício. Exemplo: um médico, durante uma cirurgia, 
secciona uma artéria e causa hemorragia seguida de morte. 
moDALiDADES 
DE CrimE 
CuLPoSo
LPSUXGrQFLD
QHJOLJrQFLD
LPSHUtFLD
ATENÇÃo
7 Ilicitude
76
 7.1 coNcEIto, tEoRIas
Trata-se da contrariedade do fato com o ordenamento jurídico (en-
foque puramente formal ou “ilicitude formal”), por meio da exposição 
a perigo de dano ou da lesão a um bem jurídico tutelado (enfoque ma-
terial ou “ilicitude material”).
A antijuridicidade da conduta deve ser apreciada objetivamente, 
vale dizer, sem se questionar se o sujeito tinha consciência de que agia 
de forma ilícita. Por essa razão, pode perfeitamente ser considerada ilí-
cita eventual conduta de um inimputável, ainda que ele não tenha ca-
pacidade de avaliar a antijuridicidade de seu comportamento. Ele pode 
cometer, portanto, um fato típico e antijurídico (mas não receberá pena 
por ausência de culpabilidade).
A doutrina classifi ca a ilicitude em genérica e específi ca. Aquela 
corresponde à contradição do fato com a norma abstrata, por meio da 
afetação a algum bem jurídico. Esta consiste na ilicitude presente em 
determinados tipos penais, os quais empregam termos como “sem justa 
causa”, “indevidamente”, “sem autorização ou em desacordo com deter-
minação legal ou regulamentar”. Na verdade, dessas, só a primeira real-
mente trata-se de ilicitude. A chamada antijuridicidade específi ca nada 
mais é do que uma designação equivocada para determinados elemen-
tos normativos de alguns tipos penais.
 7.2 causas dE JustIFIcaÇÃo. dEscRImINaNtEs LEgaIs, 
supRaLEgaIs E putatIvas
Nossa legislação dispõe sobre quatro excludentes: estado de neces-
sidade, legítima defesa, exercício regular de um direito e estrito cum-
primento de um dever legal. Sendo o fato praticado nessas circunstân-
cias, não haverá crime (CP, art. 23).
Apesar de o leque legal ser abrangente, a doutrina admite a exis-
tência de causas supralegais (ex.: não previstas em lei) de exclusão da 
ilicitude, fundadas no emprego daanalogia in bonam partem, suprindo 
eventuais situações não compreendidas no texto legal. É o que ocor-
re com o consentimento do ofendido nos tipos penais em que o bem 
jurídico é disponível (ex.: crime de dano — art. 163 do CP) e o sujeito 
passivo, agente capaz. Importante advertir que, em certos casos, o tipo 
penal prevê o dissenso da vítima como elementar; se isso ocorrer, seu 
consentimento fi gurará como causa excludente de tipicidade (ex.: viola-
ção de domicílio — art. 150 do CP).
NÃo HÁ cRImE quando o fato é 
praticado em:
��HVWDGR�GH�QHFHVVLGDGH�
��OHJtWLPD�GHIHVD�
��H[HUFtFLR�UHJXODU�GH�XP�GLUHLWR�
���HVWULWR�FXPSULPHQWR�GH�XP�GH�
YHU�OHJDO�
atENÇÃo
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Excludentes de ilicitude 
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
77
 7.3 Estado dE NEcEssIdadE
Diz o CP no art. 24: “Considera-se em estado de necessidade quem 
pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua von-
tade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo 
sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se”.
A situação de necessidade pressupõe, antes de tudo, a existência de 
um perigo (atual) que ponha em conflito dois ou mais interesses legíti-
mos, que, pelas circunstâncias, não podem ser todos salvos (na legítima 
defesa, como se verá adiante, só existe um interesse legítimo). Um deles, 
pelo menos, terá de perecer em favor dos demais. O exemplo caracterís-
tico é o da “tábua de salvação”: após um naufrágio, duas pessoas se veem 
obrigadas a dividir uma mesma tábua, que somente suporta o peso de 
uma delas. Nesse contexto, o direito autoriza um deles a matar o outro, 
se isso for preciso para salvar sua própria vida.
7.3.1 teorias
a) Diferenciadora: afirma que, se o bem salvo for mais importante 
que o sacrificado (ex.: salvar a vida e danificar patrimônio alheio), ex-
clui-se a ilicitude (“estado de necessidade justificante”), ao passo que, 
se os bens em conflito forem equivalentes (ex.: salvar a própria vida em 
detrimento da vida alheia), afasta-se a culpabilidade (“estado de neces-
sidade exculpante”).
b) Unitária: em quaisquer das hipóteses acima analisadas há exclu-
são da ilicitude. Foi a teoria adotada no CP/46.
7.3.2 Faculdade ou direito
A doutrina tradicional via no estado de necessidade uma faculdade 
do agente, e não um direito. Argumentava-se: no estado de necessidade 
há um conflito entre dois ou mais bens ou interesses legítimos, sendo to-
dos protegidos pelo direito. Diante do perigo, o titular de um bem, para 
salvá-lo, ofende bem de terceiro, o qual não tem obrigação de permitir o 
perecimento de seu bem, pois também dispõe de um interesse legítimo. 
Se a todo direito corresponde uma obrigação, e se o terceiro não está 
obrigado a deixar seu bem ser lesionado, ninguém tem direito de agir em 
estado de necessidade, mas mera faculdade legal. Para a doutrina mo-
derna, o sujeito tem direito de agir em estado de necessidade. O sujeito 
passivo dessa relação jurídica não é, como se pensava, o terceiro titular 
do bem perecido, mas sim o Estado, que tem a obrigação de reconhecer 
a licitude da conduta do agente
7.3.3 Requisitos
Há requisitos vinculados à situação de necessidade, que justificam 
a excludente, e outros ligados à reação do agente. Entre os primeiros 
crime e casti-
go, de Fiodor 
0��'RVWRLHYVNL��
8P�GRV�PDLR�
UHV� URPDQFHV�
GH� WRGRV� RV�
WHPSRV�� QDU�
UD� D� KLVWyULD�
GR� HVWXGDQWH�
5DVN{OQLNRY��TXH��YHQGR�VH�QD�PL�
VpULD��DVVDVVLQD�XPD�YHOKD�XVXUiULD�
H�QmR�FRQVHJXH�OLYUDU�VH�GR�SHVR�
GR�UHPRUVR��3DUD�UHÁHWLU��5DVN{OQL�
NRY�DJLX�DFREHUWDGR�SHOR�estado 
de necessidade?
o caso dos 
explorado-
res de ca-
vernas, de 
/RQ� /�� )XOOHU��
$� REUD� RUL�
JLQDO� HVWD�
GXQ LGHQVH�
p� GH� ������
'HSRLV� GH�
XP� DFLGHQWH�� FLQFR� FLHQWLVWDV�
DFDEDP�SUHVRV�HP�XPD�FDYHUQD��
6mR� LQIRUPDGRV�SHODV�HTXLSHV�GH�
UHVJDWH� TXH� D� GHPRUD� SRGH� OH�
Yi�ORV�D�PRUUHU�GH� IRPH��8P�GRV�
H[SORUDGRUHV�FRQYHQFH�RV�RXWURV�
GH�TXH� XP�GHYH� VHU�PRUWR�SDUD�
VHUYLU� GH� FRPLGD� DRV� GHPDLV� H�
SURS}H�XP�VRUWHLR�SDUD�HVFROKHU�R�
VDFULÀFDGR��'HSRLV�GR�UHVJDWH��RV�
TXDWUR�VREUHYLYHQWHV�YmR�D�MXOJD�
PHQWR�SRU�KRPLFtGLR��3DUD�UHÁHWLU: 
Ki�H[FOXVmR�GH�LOLFLWXGH�EDVHDGD�
no estado de necessidade?
BIBLIotEca
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
78
temos: a) existência de um perigo atual; b) perigo que ameace direi-
to próprio ou alheio; c) conhecimento da situação justifi cante; d) não 
provocação voluntária da situação de perigo. Com relação à reação do 
agente, temos: a) inexigibilidade do sacrifício do bem ameaçado (pro-
porcionalidade dos bens em confronto); b) inevitabilidade do perigo; c) 
inexistência do dever legal de enfrentar o perigo.
a) Perigo atual
Perigo é a probabilidade de dano. Embora a lei só se refi ra ao perigo 
atual, deve-se admitir o estado de necessidade quando iminente o peri-
go (analogia in bonam partem). Não se admite a excludente, entretanto, 
quando passado o perigo ou quando este ainda está por vir.
b) Ameaça a direito próprio ou alheio
Age em estado de necessidade não somente quem salva direito pró-
prio (ex.: a “tábua de salvação”) mas também quem defende direito de 
terceiro (ex.: médico que quebra sigilo profi ssional revelando que um 
paciente é portador do vírus HIV para salvar terceira pessoa que seria 
contaminada). A excludente, ademais, aplica-se quaisquer que sejam os 
direitos em jogo. Se o interesse for tutelado pelo ordenamento jurídico, 
poderá ser protegido diante de uma situação de necessidade.
c) Conhecimento da situação justifi cante
É fundamental que o sujeito tenha plena consciência da existência 
do perigo e atue com o fi m de salvar direito próprio ou alheio. Por essa 
razão, o médico que realiza aborto por dinheiro não age em estado de 
necessidade, mesmo se constatando, após, a existência de risco atual à 
vida da gestante.
d) Perigo não provocado voluntariamente pelo sujeito
O provocador do perigo não pode benefi ciar-se da excludente, a não 
ser que o tenha gerado involuntariamente. Em outras palavras, aque-
le que por sua vontade produz o perigo não poderá agir em estado de 
necessidade. Provocar voluntariamente signifi ca provocar dolosamen-
te. Dessa forma, se o agente provocou culposamente o perigo, poderá 
ser benefi ciado pela excludente. Há quem entenda de maneira diversa, 
equiparando a provocação voluntária tanto à dolosa como à culposa. 
Argumenta-se que o provocador do risco teria sempre o dever jurídico 
de impedir o resultado (i. e., salvar o bem alheio em detrimento do seu), 
independentemente de dolo ou culpa, com base no art. 13, § 2º, c, do CP. 
Esse dispositivo, contudo, não se aplica ao estado de necessidade, pelo 
princípio da especialidade; isso porque o art. 24, § 1º, do CP estipula que 
só não pode alegar estado de necessidade quem tem o dever legal de en-
frentar o perigo (situação retratada no art. 13, § 2º, a, do CP). Portanto, 
das pessoas arroladas no art. 13, § 2º, somente aquela da alínea a não 
pode agir amparada pela excludente; já as demais (letras b e c) podem.
e) Inexigibilidade do sacrifício do bem ameaçado (princípio da 
ponderação de bens)
6REUH� R� HVWDGR� GH� QHFHVVLGDGH��
HP�VtQWHVH��WHPRV�
Requisitos:
D��3HULJR�DWXDO�
E���$PHDoD� D� GLUHLWR� SUySULR�
RX�DOKHLR�
F���&RQKHFLPHQWR� GD� VLWXD�
omR�MXVWLÀ�FDQWH�
G���3HULJR�QmR�SURYRFDGR�YR�
OXQWDULDPHQWH�SHOR�VXMHLWR�
H���,QH[LJLELOLGDGH�GR�VDFULItFLR�
GR� EHP�DPHDoDGR� �SULQ�
FtSLR� GD� SRQGHUDomR� GH�
EHQV��
I���,QHYLWDELOLGDGH�GR�SHULJR�
J���,QH[LVWrQFLD�GH�GHYHU�OHJDO�
GH� DUURVWDU� R� SHULJR� �DUW��
����������
&ODVVLÀ�FDomR�
���(VWDGR�GH�QHFHVVLGDGH�GH�
IHQVLYR�
���(VWDGR� GH� QHFHVVLGDGH�
DJUHVVLYR�
���(VWDGR�GH�QHFHVVLGDGH�MXV�
WLÀ�FDQWH�
���(VWDGR�GH�QHFHVVLGDGH�H[�
FXOSDQWH�
���(VWDGR�GH�QHFHVVLGDGH�SUy�
SULR�
���(VWDGR�GH� QHFHVVLGDGH�GH�
WHUFHLUR�
���(VWDGR�GH� QHFHVVLGDGH�
UHDO�
���(VWDGR�GH�QHFHVVLGDGH�SX�
WDWLYR�
atENÇÃo
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
79
Na situação concreta deve-se fazer uma análise comparativa entre o 
bem salvo e o bem sacrificado (ponderação de bens). Haverá estado de 
necessidade quando aquele for de maior importância que este, ou, ain-
da, quando se equivalerem (ex.: ofender o patrimônio de terceiro para 
salvar a vida ou matar para salvar a própria vida). É evidente que essa 
comparação não pode ser feita de acordo com um critério milimétri-
co. Caso o bem salvo seja de menor importância que o sacrificado, não 
haverá estado de necessidade (ex.: para evitar que um navio afunde, o 
capitão ordena que a tripulação se jogue em alto-mar). Nesse caso, to-
davia, deve-se aplicar o § 2º do art. 24 (causa obrigatória de diminuição 
de pena, de 1 a 2/3).
f) Inevitabilidade do perigo
Se o conflito estabelecido entre os bens puder ser solucionado de 
modo diverso, como por um pedido de socorro a terceira pessoa ou pela 
fuga do local do perigo, o fato não se considerará justificado, pois a con-
duta lesiva deve ser o único meio de salvar o bem do perigo.
g) Inexistência de dever legal de afastar o perigo (art. 24, § 1º)
Quem tem dever legal de enfrentar o perigo não pode invocar es-
tado de necessidade. Isso ocorre com algumas funções ou profissões: 
bombeiro, policial etc. Assim, o bombeiro não pode eximir-se de salvar 
uma pessoa num prédio em chamas sob o pretexto de correr risco de 
se queimar. Evidentemente que não se exige heroísmo (ex.: bombeiro 
ingressar em uma casa totalmente em chamas para salvar algum bem 
valioso, sendo improvável, na situação, que ele sobreviva, apesar de todo 
o seu treinamento).
������&ODVVLÀFDomR
a) Estado de necessidade defensivo: a conduta do sujeito que age 
em necessidade se volta contra a coisa de que provém o perigo — se o 
perigo foi causado por alguém, contra este é que se dirige a conduta, le-
sionando um bem de sua titularidade (ex.: um náufrago disputa a tábua 
de salvação com outro, que é o responsável pelo afundamento do navio).
b) Estado de necessidade agressivo: a conduta do sujeito que age 
em necessidade se volta contra outra coisa, diversa daquela que originou 
o perigo, ou contra terceiro inocente (ex.: um náufrago disputa a tábua 
de salvação com outro, sendo que ambos não tiveram nenhuma respon-
sabilidade no tocante ao afundamento do navio).
A distinção acima não tem relevância para o direito penal (ambos 
excluem a ilicitude), mas repercute na órbita cível. O sujeito que age em 
estado de necessidade agressivo deverá reparar o dano causado ao ter-
ceiro inocente pela sua conduta, tendo direito de regresso contra o cau-
sador do perigo. O reconhecimento do estado de necessidade defensivo, 
por outro lado, afasta até mesmo a obrigação de reparar o dano causado 
pelo crime (a sentença penal que o reconhecer impedirá eventual ação 
civil ex delicto).
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
80
c) Estado de necessidade justifi cante: afasta a ilicitude da conduta.
d) Estado de necessidade exculpante: exclui a culpabilidade do 
agente (não foi adotado pelo CP).
e) Estado de necessidade próprio: salva-se bem próprio.
f) Estado de necessidade de terceiro: salva-se bem alheio.
g) Estado de necessidade real: é aquele defi nido no art. 24 do CP.
h) Estado de necessidade putativo: trata-se do estado de necessida-
de imaginário (afasta o dolo — art. 20, § 1º, do CP, ou a culpabilidade 
— art. 21 do CP, conforme o caso).
 7.4 LEgítIma dEFEsa
Diz o CP, no art. 25: “Entende-se em legítima defesa quem, usando 
moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou 
iminente, a direito seu ou de outrem”.
Trata-se de um dos mais bem desenvolvidos e elaborados institutos 
do direito penal. Sua construção teórica surgiu vinculada ao instinto de 
sobrevivência (“matar para não morrer”) e, por via de consequência, 
atrelada ao crime de homicídio. Atualmente, permite-se seu reconheci-
mento como meio de tutelar qualquer direito, não somente a vida ou a 
integridade física.
7.4.1 Requisitos
São os seguintes: a) existência de uma agressão; b) atualidade ou 
iminência da agressão; c) injustiça dessa agressão; d) agressão contra 
direito próprio ou alheio; e) conhecimento da situação justifi cante (ani-
mus defendendi); f) uso dos meios necessários para repeli-la; g) uso mo-
derado desses meios. Vejamos abaixo:
a) Agressão
É sinônimo de ataque, ou seja, a conduta humana que lesa ou expõe 
a perigo bens jurídicos tutelados. A mera provocação não dá ensejo à 
defesa legítima. Ao reagir a uma provocação por parte da vítima, o agen-
te responderá pelo crime, podendo ser reconhecida em seu favor uma 
atenuante genérica (CP, art. 65, III, b) ou um privilégio, como no crime 
de homicídio (CP, art. 121, § 1º).
A agressão deve ser humana. Contra agressão de animal cabe esta-
do de necessidade (a não ser que alguém provoque deliberadamente o 
animal, de modo que ele sirva como instrumento do ataque de um ser 
humano).
b) Atualidade ou iminência
Atual é a agressão presente, que está em progressão, que está acon-
tecendo. Iminente, quando está prestes a se concretizar. “A legítima de-
fesa não se funda no temor de ser agredido nem no revide de quem já o 
foi” (Noronha). Reação contra agressão passada é vingança; em vez de 
tempo de ma-
WDU�� GLUHomR�
de Joel schu-
macher, 1996. 
(P� &DQWRQ��
QR� 0LVVLVVLSL��
GRLV� EUDQFRV�
HVSDQFDP� H�
HVWXSUDP� XPD�
PHQLQD� QHJUD� GH� GH]� DQRV�� (OHV�
VmR� SUHVRV�� PDV�� TXDQGR� HVWmR�
VHQGR�OHYDGRV�DR�WULEXQDO�SDUD�WHU�
R�YDORU�GD�VXD�À�DQoD�GHFUHWDGD��
R�SDL�GD�JDURWD� �6DPXHO�/�� -DFN�
VRQ�� GHFLGH� ID]HU� MXVWLoD� FRP� DV�
SUySULDV�PmRV�H�PDWD�RV�GRLV� QD�
IUHQWH� GH� GLYHUVDV� WHVWHPXQKDV��
DOpP� GH� DFLGHQWDOPHQWH� IHULU� VH�
ULDPHQWH�XP�SROLFLDO��3DUD�UHÁ�HWLU: 
VHULD�R�FDVR�GH legítima defesa da 
honra?
cINEmatEca
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
81
lícita, é, como regra, mais severamente punida (motivo fútil ou torpe). 
Se a agressão for futura, o agente também comete crime.
c) Injustiça da agressão
Injusta é a agressão ilícita (não precisa ser criminosa). São exemplos 
de agressões justas: cumprimento de mandados de prisão ou efetivação 
de prisão em flagrante (v. arts. 284 e 292 do CPP), defesa da posse, vio-
lência desportiva e penhora judicial. Nesses casos, quem reagir não esta-
rá em legítima defesa.
É possível legítima defesa de legítima defesa? Simultaneamente, 
não. Se uma das pessoas se encontra em legítima defesa, sua conduta 
contra a outra será justa (lícita), e, por consequência, o agressor nunca 
poderá agir sobre o amparo da excludente. É possível, no entanto, que 
uma pessoa aja inicialmente em legítima defesa e, após, intensifique des-
necessariamente sua conduta, permitindo que o agressor, agora, defen-
da-se contra esse excesso (legítima defesa sucessiva). Devem-se lembrar, 
também, as seguintes situações possíveis: legítima defesa real contra legí-
tima defesa putativa ou, ainda, duas pessoas agindo, uma contra a outra, 
em legítima defesa putativa.
Age em legítima defesa quem se defende de agressão de inimputá-
veis (menores, doentes mentais etc.)? Para a doutrina prevalente a res-
posta é afirmativa, uma vez que a injustiça da agressão deve ser aferida 
objetivamente, ou seja, sem cogitar se o agressor detinha capacidade de 
entender o caráter ilícito de sua agressão. Essa interpretação, no entanto, 
pode redundar em situações absurdas, porquanto na legítima defesa não 
se exige que a agressão seja inevitável. O que dizer, então, da hipótese 
em que uma criança de 5 anos se mune de um bastão para agredir um 
adulto, que, nas circunstâncias, poderia simplesmente desviar do golpe? 
O adulto, se quiser, poderá reagir ainda na iminência de ser atingido, 
ferindo a criança (legítima defesa contra agressão iminente). Para evitar 
tal conclusão, deve-se entender quecontra agressões de inimputáveis só 
é cabível estado de necessidade, em que se exige que o perigo seja ine-
vitável. Aplicando tal solução ao exemplo acima, o adulto que ferisse a 
criança responderia pelas lesões nela provocadas, pois poderia evitar o 
golpe, dele desviando. Como argumento de reforço, cabe recordar que 
contra ataques de animais aplicam-se os princípios do estado de neces-
sidade (mais restritos) e não os da legítima defesa (a não ser que o se-
movente seja açulado por alguém). Isso significa afirmar que diante da 
investida de um cão bravio, de regra, só poderemos reagir se não houver 
outro meio de escapar (inevitabilidade do perigo). Não se pode admitir 
que a repulsa contra o golpe evitável de uma criança seja lícita e a reação 
contra o ataque evitável de um animal seja crime. O direito estaria dan-
do mais proteção ao ser irracional que ao infante (nesse sentido: Enrique 
Bacigalupo, Direito penal: parte geral, Capítulo VII, § 710).
d) O direito defendido
Qualquer direito pode ser defendido pela excludente: vida, liber-
dade, honra, integridade física, patrimônio etc. Age em legítima defesa 
6REUH� D� legítima defesa, em 
VtQWHVH��WHPRV�
1. Requisitos:
D��$JUHVVmR�
E��$WXDOLGDGH�RX�LPLQrQFLD�
F��,QMXVWLoD�GD�DJUHVVmR�
G��2�GLUHLWR�GHIHQGLGR�
H���(OHPHQWR� VXEMHWLYR� ³� FR�
QKHFLPHQWR� GD� VLWXDomR�
MXVWLÀFDQWH�
I��0HLRV�QHFHVViULRV�
J��0RGHUDomR�
���&ODVVLÀFDomR�
���/HJtWLPD�GHIHVD�UHFtSURFD�
���/HJtWLPD�GHIHVD�VXFHVVLYD�
���/HJtWLPD�GHIHVD�UHDO�
���/HJtWLPD�GHIHVD�SXWDWLYD�
���/HJtWLPD�GHIHVD�SUySULD�
���/HJtWLPD�GHIHVD�GH�WHUFHLUR�
���/HJtWLPD�GHIHVD�VXEMHWLYD�
����/HJtWLPD�GHIHVD�FRP�aber-
ratio ictus�
atENÇÃo
Mobile User
Mobile User
82
aquele que defende direito próprio (legítima defesa própria) ou alheio 
(legítima defesa de terceiro).
e) Elemento subjetivo — conhecimento da situação justifi cante
Constitui requisito fundamental para a existência da excludente. O 
agente deve ter total conhecimento da existência da situação justifi cante 
para que seja por ela benefi ciado. “A legítima defesa deve ser objetiva-
mente necessária e subjetivamente orientada pela vontade de defender-
-se” (Cezar Roberto Bitencourt, Manual de direito penal, v. 1, p. 264). 
Imagine a seguinte situação e questione se houve ou não legítima defesa: 
A pretende vingar-se de seu inimigo B e passa a andar armado. Certo 
dia, avista-o. Ocorre que somente enxerga sua cabeça, pois B se encon-
tra atrás de um muro alto. A não sabe o que está acontecendo do outro 
lado do muro. Como tencionava matar seu desafeto, saca sua arma e 
efetua um disparo letal na cabeça de B. Posteriormente, apura-se que, 
do outro lado do muro, B também estava com uma arma em punho, 
prestes a matar injustamente C. Constata-se, ainda, que o tiro disparado 
por A salvou a vida de C. Enfi m, A deve ou não ser condenado? Agiu em 
legítima defesa de terceiro? Não, uma vez que só age em legítima defesa 
(e isso vale para as demais excludentes de antijuridicidade) quem tem 
conhecimento da situação justifi cante e atua com a fi nalidade/intenção 
de defender-se ou defender terceiro.
Presentes os requisitos vistos até então, tem-se uma situação de le-
gítima defesa, de modo que a repulsa contra a agressão será lícita. No 
entanto, a reação deve pautar-se pelo necessário e sufi ciente para salvar 
o direito ameaçado ou lesionado. Excedendo-se, extrapola o agente os 
limites da defesa, acarretando excesso, pelo qual o sujeito responderá, 
se no tocante a ele atuar dolosa ou culposamente (CP, art. 23, parágrafo 
único).
f) Meios necessários
É o meio menos lesivo que se encontra à disposição do agente, po-
rém hábil a repelir a agressão. Havendo mais de um meio capaz de evi-
tar o ataque ao alcance do sujeito, deve ele optar pelo menos agressivo. 
Evidentemente essa ponderação, fácil de ser feita com espírito calmo e 
refl etido, pode fi car comprometida no caso concreto, quando o ânimo 
daquele que se defende encontra-se totalmente envolvido com a situa-
ção. Por isso que se diz, de forma uníssona, que a necessidade dos meios 
(bem como a moderação, que se verá em seguida) não pode ser aferida 
segundo um critério milimétrico, mas sim tendo em vista o calor dos 
acontecimentos. Assim, exemplifi cativamente, a diferença de porte físico 
legitima, conforme o caso, agressão com arma.
g) Moderação
Não basta a utilização do meio necessário, é preciso que esse meio 
seja utilizado moderadamente. Trata-se da proporcionalidade da reação, 
a qual deve dar-se na medida do necessário e sufi ciente para repelir o 
ataque. Como já lembrado, a moderação no uso dos meios necessários 
deverá ser avaliada levando-se em conta o caso concreto.
Direito Penal
83
7.4.2. Commodus discessus
Consiste na fuga do local, evitando a agressão que ensejaria a le-
gítima defesa. O CP não exige que a agressão causadora da legítima 
defesa seja inevitável, de modo que o agente não está obrigado a pro-
curar uma cômoda fuga do local, em vez de repelir a agressão injusta. 
Em outras palavras, ainda que tenha o sujeito condições de retirar-se 
ileso do local, evitando a agressão, agirá em legítima defesa se optar 
por ali permanecer e reprimir a agressão injusta, atual ou iminente, a 
direito seu ou de outrem, desde que o faça moderadamente e use dos 
meios necessários.
7.4.3. Excesso
Trata-se da desnecessária intensificação de uma conduta inicial-
mente legítima. Predomina na doutrina o entendimento de que o ex-
cesso decorre tanto do emprego do meio desnecessário como da falta 
de moderação (nesse sentido, entre outros, Julio F. Mirabete, Manual de 
direito penal: parte geral, v. 1, p. 183; Fernando Capez, Curso de direito 
penal: parte geral, v. 1, p. 237).
Há duas formas de excesso:
a) intencional ou voluntário, quando o agente tem plena consciên-
cia de que a agressão cessou e, mesmo assim, prossegue reagindo visando 
lesar o bem do agressor; nesse caso, o agente responderá pelo resultado 
excessivo a título de dolo (é o chamado “excesso doloso”);
b) não intencional ou involuntário, o qual se dá quando o sujeito, 
por erro na apreciação da situação fática, supõe que a agressão ainda 
persiste e, por conta disso, continua reagindo sem perceber o excesso 
que comete. Se o erro no qual incorreu for evitável (i. e., uma pessoa de 
mediana prudência e discernimento não cometeria o mesmo equívoco 
no caso concreto), o agente responderá pelo resultado a título de culpa, 
se a lei previr a forma culposa (“excesso culposo”). Caso, contudo, o erro 
seja inevitável (qualquer um o cometeria na mesma situação), o sujeito 
não responderá pelo resultado excessivo, afastando-se o dolo e a culpa 
(“excesso exculpante” ou “legítima defesa subjetiva”).
�������&ODVVLÀFDomR
a) Legítima defesa recíproca: é a legítima defesa contra legítima de-
fesa (inadmissível, salvo se uma delas ou todas forem putativas);
b) legítima defesa sucessiva: é a reação contra o excesso;
c) legítima defesa real: é a que exclui a ilicitude;
d) legítima defesa putativa: é a imaginária, trata-se de modalidade 
de erro (CP, arts. 20, § 1º, ou 21);
e) legítima defesa própria: quando o agente salva direito próprio;
f) legítima defesa de terceiro: quando o sujeito defende direito 
alheio;
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
84
g) legítima defesa subjetiva: dá-se quando há excesso exculpante 
(decorrente de erro inevitável);
h) legítima defesa com aberratio ictus: o sujeito, ao repelir a agressão 
injusta, por erro na execução, atinge bem de pessoa diversa da que o agredia. 
Exemplo: A, para salvar sua vida, saca uma arma de fogo e atira em direção 
ao seu algoz, B; no entanto, erra o alvo e acerta C, que apenas passava pelo 
local. A agiu sob o abrigo da excludente e deverá ser absolvido criminalmen-
te; na esfera cível, contudo, deverá responder pelos danos decorrentes de sua 
conduta contra C, tendo direito de regresso contra B, seu agressor.
7.4.5. ofendículos
Compreendem todos os instrumentosempregados regularmente, de 
maneira predisposta (previamente instalada), na defesa de algum bem ju-
rídico, geralmente posse ou propriedade. Há autores que distinguem os 
ofendículos da defesa mecânica predisposta. Os primeiros seriam apara-
tos visíveis (cacos de vidro nos muros, pontas de lança etc.); os segundos, 
ocultos (cercas eletrifi cadas, armadilhas etc.). De qualquer modo, a juris-
prudência recomenda que o aparato seja sempre visível e inacessível a ter-
ceiros inocentes (em se tratando de defesa mecânica predisposta, é preciso 
a existência de alguma advertência visível, p. ex., “cuidado, cão bravo” ou 
“atenção, cerca eletrifi cada”, além da inacessibilidade a terceiros inocen-
tes). Presentes esses requisitos, o titular do bem protegido não responderá 
criminalmente pelos resultados lesivos dele decorrentes. Quando atingir 
o agressor, terá agido em legítima defesa (preordenada); se atingir terceiro 
inocente, será absolvido com base na legítima defesa putativa.
Embora haja dissenso doutrinário a respeito da natureza jurídica 
dos ofendículos (legítima defesa ou exercício regular de um direito), 
prevalece o entendimento de que sua preparação confi gura exercício re-
gular de um direito, e sua efetiva utilização diante de um caso concreto, 
legítima defesa preordenada. Pela teoria da imputação objetiva, no en-
tanto, a instalação dos ofendículos constitui fato atípico, pois se trata de 
exposição de bens jurídicos a riscos permitidos.
��������'LIHUHQoDV�HQWUH�OHJtWLPD�GHIHVD�H�HVWDGR�
de necessidade
a) A legítima defesa pressupõe agressão, e o estado de necessidade, 
perigo;
b) nela, só há uma pessoa com razão; no estado de necessidade, 
todos têm razão, pois seus interesses ou bens são legítimos;
c) há legítima defesa ainda quando evitável a agressão, mas só há 
estado de necessidade se o perigo for inevitável;
d) não ocorre legítima defesa contra ataque de animal (salvo quan-
do ele foi instrumento de uma agressão humana), mas existe estado de 
necessidade nessas situações.
Diferenças entre legítima defesa e estado de necessidade
Legítima defesa Estado de necessidade
Pressupõe agressão. Pressupõe perigo.
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
85
O direito só ampara o comportamento 
de um dos envolvidos (aquele que se 
defende).
Todos são amparados pelo direito, 
pois seus interesses ou bens são 
legítimos.
A agressão pode ser evitável. O perigo deve ser inevitável.
Não ocorre legítima defesa contra ata-
que de animal (salvo quando ele foi 
instrumento de uma agressão humana).
Existe estado de necessidade contra 
ataque de animal.
 7.5 EstRIto cumpRImENto dE dEvER LEgaL
Por vezes, a própria lei obriga um agente público a realizar condutas, 
dando-lhe poder até de praticar fatos típicos para executar o ato legal.
Para que o cumprimento do dever legal exclua a ilicitude da condu-
ta é preciso que obedeça aos seguintes requisitos:
a) existência de um dever legal, leia-se: de uma obrigação imposta 
por norma jurídica de caráter genérico, não necessariamente lei no sen-
tido formal; o dever poderá advir, inclusive, de um ato administrativo 
(de conteúdo genérico). Se específico o conteúdo do ato, poder-se-á falar 
em obediência hierárquica;
b) atitude pautada pelos estritos limites do dever;
c) conduta, como regra, de agente público e, excepcionalmente, de 
particular. Como exemplo de dever legal incumbido a particular costu-
ma-se lembrar do dever dos pais quanto à guarda, vigilância e educação 
dos filhos.
Exemplos de atos lesivos a bens jurídicos penalmente tutelados que 
são permitidos em lei e se enquadram na excludente em estudo:
a) CPP, art. 292: violência para executar mandado de prisão;
b) CPP, art. 293: execução de mandado de busca e apreensão e ar-
rombamento;
c) oficial de justiça que executa ordem de despejo;
d) soldado que fuzila o condenado por crime militar em tempo de 
guerra, cuja sanção é a pena de morte;
e) agente policial infiltrado com autorização judicial que se vê obri-
gado a cometer delitos no seio da organização criminosa (art. 2º, V, da 
Lei n. 9.034/95).
Como em todas as excludentes, também é possível que ocorra ex-
cesso (doloso, culposo ou exculpante).
 7.6 ExERcícIo REguLaR dE dIREIto
Todo aquele que exerce um direito assegurado por lei não prati-
ca ato ilícito. Quando o ordenamento jurídico, por meio de qualquer 
de seus ramos, autoriza determinada conduta, sua licitude reflete-se na 
(VWDomR� &D-
randiru, de 
'UDX]LR� 9D�
UHOOD�� $� REUD�
GLVFRUUH� VREUH�
VXD� H[SHULrQ�
cia como mé�
GLFR�YROXQWiULR�
QD� &DVD� GH�
'HWHQomR� GH�
6mR� 3DXOR�� FRQKHFLGD� FRPR� &D�
UDQGLUX��(OD�WUD]�R�UHODWR�GRV�SUHVRV�
VREUH�R�PDVVDFUH�TXH�RFRUUHX�HP�
������ 3DUD� UHÁHWLU�� RV� SROLFLDLV� DJL�
UDP�DFREHUWDGRV�SHOR�estrito cum-
primento do dever legal? 
BIBLIotEca
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
86
seara penal, confi gurando excludente de ilicitude: exercício regular de 
um direito (CP, art. 23, III). A esfera de licitude penal, obviamente, só 
alcança os atos exercidos dentro do estritamente permitido. O agente 
que inicialmente exerce um direito, mas o faz de modo irregular, trans-
bordando os limites do permitido, comete abuso de direito e responde 
pelo excesso, doloso ou culposo (não se podendo excluir a possibilidade 
do excesso exculpante).
Interessante assinalar que a excludente pode fundar-se não só em 
normas jurídicas mas também nos costumes, como ocorre no caso dos 
conhecidos trotes acadêmicos. É certo, por óbvio, que os trotes, se exces-
sivos, constituirão crime.
Os exemplos mais comuns de incidência da excludente em apreço 
são:
a) intervenção médico-cirúrgica (a intervenção cirúrgica não prati-
cada por profi ssional habilitado apenas será autorizada em casos de es-
tado de necessidade); note que o médico deverá colher o consentimento 
do paciente, ou de seu representante, se menor, somente se podendo 
cogitar de cirurgia independentemente de autorização do paciente nos 
casos de estado de necessidade;
b) violência desportiva, desde que o esporte seja regulamentado 
ofi cialmente e a lesão ocorra de acordo com as respectivas regras;
c) desforço imediato na defesa da posse;
d) fl agrante facultativo (CPP, art. 301), que constitui a faculdade 
conferida por lei a qualquer do povo de prender quem esteja em situa-
ção de fl agrante delito.
Imputação objetiva
Cabe enfatizar que, segundo a teoria da imputação objetiva, o exer-
cício regular de um direito deixa de existir como excludente de ilicitude, 
sendo suas hipóteses tratadas no âmbito do fato típico, como afastado-
ras da relação de imputação objetiva, tendo em vista que o risco criado 
pelo agente nesses casos seria um risco permitido.
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
8 Culpabilidade
88
 8.1 CoNCeiTo, NaTuReZa e FuNdaMeNTo JuRÍdiCo
Trata-se do pressuposto necessário para a aplicação de uma pena ao 
agente que cometeu um crime (fato típico e antijurídico). Dá-se quando 
o sujeito for imputável, detiver possibilidade de compreensão da ilici-
tude de sua conduta e se puder dele exigir comportamento diferente na 
situação em que se encontrava. Embora haja autores que sustentem ser 
a culpabilidade requisito do crime, não é essa a conclusão que decorre 
do exame de nossa legislação, a qual afi rma, nas hipóteses de falta de 
culpabilidade, ser o agente isento de pena (v. CP, arts. 21, 22, 26 e 28), 
em vez de declarar não haver crime, como faz no caso das excludentes 
de ilicitude (v. CP, art. 23).
No sistema clássico, a culpabilidade era vista como mero vínculo 
psicológico entre autor e fato, por meio do dolo e da culpa, que eram 
suas espécies (teoria psicológica da culpabilidade). No sistema neoclás-
sico, agregou-se a ela a noção de reprovabilidade, resultando no entendi-
mento de que a culpabilidade somente ocorreria se o agente fosse impu-
tável, agisse dolosa ou culposamente e se se pudesse dele exigir compor-
tamentodiferente (teoria psicológico-normativa ou normativa da cul-
pabilidade). Já se tratava de um grande avanço, mas o aperfeiçoamento 
defi nitivo só veio com o sistema fi nalista, pelo qual ela se compunha de 
imputabilidade, possibilidade de compreensão da ilicitude da conduta e 
de exigir do agente comportamento distinto (teoria normativa pura da 
culpabilidade).
A teoria normativa pura, hoje prevalente, subdivide-se em: teoria 
limitada e teoria extremada da culpabilidade, as quais são absolutamen-
te coincidentes em todos os seus postulados, salvo no tocante à natureza 
das descriminantes putativas.
 8.2 eleMeNTos da Culpabilidade Na CoNCepÇão FiNalisTa
Para que alguém possa considerar-se culpável é preciso que tenha 
imputabilidade, possibilidade de consciência da ilicitude da conduta e 
que dele possa exigir-se comportamento diverso.
8.2.1 imputabilidade
É a capacidade mental de compreender o caráter ilícito do fato (vale 
dizer, de que o comportamento é reprovado pela ordem jurídica) e de 
determinar-se de acordo com esse entendimento (ou seja, de conter-
se), conforme se extrai do art. 26, caput, interpretado a contrario sensu. 
Em outras palavras, consiste no conjunto de condições de maturidade e 
2V� GRLV� À�OPHV� DEDL[R�PRVWUDP� DV�
PD]HODV�GR�VLVWHPD�FDUFHUiULR�EUD�
VLOHLUR� GHVWLQDGR�
DRV� FRQVLGHUDGRV�
LQLPSXWiYHLV�� WUD�
oDQGR� XP� SDUD�
OHOR�FRP�R�PXQGR�
GDV�GURJDV�
bicho de sete Ca-
beças, direção 
de laís bodanzky, 
2005.
Meu nome não é 
Johnny, direção 
de Mauro lima, 
2008. 
o estranho no Ni-
nho, direção de 
Miloš Forman, 
1975. 2� ORQJD� ID]�
XPD� UHOHLWXUD� GD�
REUD� GH� .HQ� .H�
VH\�� FRP� R� HQIR�
TXH� QD� UHDO� VLWX�
DomR�GDV�SHVVRDV�TXH�YLYHP�HP�
XP� VDQDWyULR�� 1DUUD� D� KLVWyULD� GH�
XP�KRPHP�TXH�FRPHWH�XP�FULPH��
PDV�GHYLGR�D�VHX�FRPSRUWDPHQ�
WR�� SDVVD� R� SHUtRGR� GH� UHFOXVmR�
HP�XP�VDQDWyULR��1R�GHFRUUHU�GR�
À�OPH��p�DERUGDGD�D�UtJLGD�URWLQD�D�
TXH�RV�SDFLHQWHV�VmR�VXEPHWLGRV��
FRP� LQWHQVR�XVR�GH�PHGLFDPHQ�
WRV�H�KXPLOKDo}HV��R�TXH� UHIRUoD�
D�QHFHVVLGDGH�GH�UHSHQVDUPRV�D�
IRUPD�FRUUHWD�GH�WUDWDPHQWR�SDUD�
SHVVRDV�QHVVD�VLWXDomR�
CiNeMaTeCa
biblioTeCa
inimputabilidade 
e processo penal��
GH�$QWRQLR�&DUORV�
GD� 3RQWH�� (GLWRUD�
6DUDLYD��2EUD�PXO�
WLGLVFLSOLQDU�� GLVFX�
WH� DV� LPSOLFDo}HV�
QD� LQLPSXWDELOLGD�
GH�GXUDQWH�R�SURFHVVR�SHQDO�
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
89
sanidade mental, a ponto de permitir ao sujeito a capacidade de compre-
ensão e de autodeterminação.
Diferença em relação à responsabilidade penal: esta equivale à obri-
gação de sujeitar-se às consequências do crime. O doente mental que 
praticar o fato típico e ilícito nas condições do art. 26, caput, do CP será 
considerado inimputável, mas ainda assim deverá sujeitar-se a uma me-
dida de segurança, como consequência de seu ato. Nesse caso, inexiste 
imputabilidade, mas há responsabilidade penal.
 8.3 Causas de exClusão da Culpabilidade
No nosso ordenamento jurídico haverá exclusão da imputabilida-
de penal nas seguintes hipóteses: a) doença mental ou desenvolvimento 
mental incompleto ou retardado (CP, art. 26); b) embriaguez completa 
e involuntária — decorrente de caso fortuito ou força maior (CP, art. 28, 
§ 1º); c) dependência a substância entorpecente (Lei n. 11.343/2006, art. 
45, caput); d) intoxicação involuntária por substância entorpecente (Lei 
n. 11.343/2006, art. 45, caput); e) menoridade (CP, art. 27, e CF, art. 228).
As quatro primeiras fundam-se no chamado sistema (ou critério) 
biopsicológico. A última, no biológico.
Sistema biopsicológico: além da causa (“bio”), é necessário o efeito 
(“psico”). Explica-se: além de o sujeito ser doente mental, estar com-
pleta e involuntariamente embriagado etc. (que é a causa ou origem do 
problema), é preciso que, ao tempo da conduta (ação ou omissão), não 
tenha capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar- 
-se de acordo com esse entendimento (como consequência do problema).
Sistema biológico ou etiológico: a última causa de exclusão da im-
putabilidade — a menoridade — é puramente biológica. Isso porque é 
de todo indiferente pesquisar o efeito, bastando identificar-se a causa; 
ou seja, basta que o sujeito seja menor de 18 anos para que se considere 
inimputável, sendo totalmente irrelevante investigar se o sujeito sabia o 
que fazia (tinha noção de certo e errado) e podia controlar-se (capacida-
de de autodeterminação).
Sistema psicológico: por meio desse sistema, que não foi adotado 
entre nós, bastaria o efeito para caracterizar a inimputabilidade; o por-
quê seria irrelevante.
Todas as causas de exclusão da imputabilidade devem fazer-se pre-
sentes no exato momento da conduta. O requisito temporal é funda-
mental. Em tese, portanto, é possível que alguém seja são no momento 
da conduta e, depois, tenha suprimida, em virtude de doença mental, a 
capacidade de entender e querer. Responderá normalmente pelo crime.
O exame do requisito temporal dá ensejo a outro questionamento. 
Qual a solução quando alguém propositadamente se coloca numa situ-
biblioTeCa
3DUD�DSURIXQGDU�R� WHPD�GD�PH�
QRULGDGH��LQGLFDPRV�DV�REUDV
Curso de direi-
to da Criança 
e do adoles-
cente: aspectos 
teóricos e prá-
ticos,� FRRUGH�
QDGR� SRU� .iWLD�
5HJLQD� )HUUHLUD�
/RER� $QGUDGH�
0DFLHO��(GLWRUD�6DUDLYD�
estatuto da Crian-
ça e do ado-
lescente: lei n. 
8.069/1990 co-
mentada artigo 
por artigo�� GH�
/XFLDQR� $OYHV�
5RVVDWR�� 3DXOR�
(GXDUGR� /pSRUH� H� 5RJpULR� 6DQ�
FKHV�&XQKD��(GLWRUD�6DUDLYD�
direito penal de 
adolescentes: 
elementos para 
uma teoria ga-
rantista��GH�.DU\�
QD� %DWLVWD� 6SR�
VDWR�
VoCabulÁRio
inimputabilidade�p�D�DXVrQFLD�
GH�FDUDFWHUtVWLFDV�SHVVRDLV�QH�
FHVViULDV� SDUD� TXH� SRVVD� VHU�
DWULEXtGD�D�DOJXpP�D�UHVSRQVD�
ELOLGDGH�SRU�XP�LOtFLWR�SHQDO�
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
90
ação de inimputabilidade para cometer o crime, considerando que, no 
momento da conduta, terá afastada a capacidade de autodeterminar-se? 
É o caso do sujeito que voluntariamente se deixa hipnotizar para o fi m 
de cometer o crime, ou se embriaga com esse mesmo propósito. Aplica-
se a teoria da actio libera in causa (ação livre na causa), pela qual o agente 
responde pelo resultado produzido, uma vez que, ao se autocolocar no 
estado de inimputabilidade, tinha plena consciência do que fazia. Im-
portante advertir que o sujeito só responderá pelo crime se na causa 
(ação livre) estiver presente o dolo ou a culpa ligados ao resultado. Em 
outras palavras, o resultado posterior que se pretende imputar ao agente 
deve ter sido, ao menos, previsível quando da ação livre (hipnose ou 
embriaguez, p. ex.).
Como ensina Damásio de Jesus: “A moderna doutrina penal não 
aceita a aplicação da teoria da actio libera in causa à embriaguez comple-
ta, voluntária ou culposa e não preordenada, em que o sujeito não pos-
sui previsão, no momento em que se embriaga, da prática do crime. Se o 
sujeito se embriaga prevendo a possibilidade de praticar o crime e acei-
tando a produção do resultado, responde pelo delito a título de dolo. Se 
ele se embriaga prevendo a possibilidade do resultado e esperando que 
ele não se produza, ou não o prevendo, mas devendo prevê-lo, responde 
pelo delito a título de culpa. Nos dois últimos casos, é aceita a aplicação 
da teoria da actio libera in causa. Diferente é o primeiro caso, em que o 
sujeito não desejou, não previu, nem havia elementos de previsão da 
ocorrência do resultado” (Direito penal: parte geral, v. 1, p. 513).
a) Doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou re-
tardado (CP, art. 26)
A doença mental, ou desenvolvimento mental incompleto ou re-
tardado, se aliada à falta de capacidade de compreender o caráter ilícito 
do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento, produz a 
inimputabilidade.
Trêssão os requisitos: biológico (a causa, ou seja, a doença mental 
etc.); psicológico (o efeito, ex., a supressão das capacidades de entendi-
mento ou autodeterminação); temporal (ocorrência dos requisitos an-
teriores no exato momento da conduta).
O sujeito que, nessa hipótese, praticar um crime será absolvido. 
Trata-se de absolvição imprópria, pois a ele se aplicará uma medida de 
segurança.
Se, por outro lado, presente a causa, o agente não tiver suprimida 
mas simplesmente diminuída a capacidade de entender o caráter ilícito 
do fato ou de autodeterminar-se, aplica-se o parágrafo único do art. 26 
(“semi-imputável”). A ele poderá ser imposta a pena pelo crime pratica-
do, diminuída de 1 a 2/3, ou uma medida de segurança (art. 98), confor-
me se afi gure mais adequado ao juiz, em função da necessidade ou não 
de especial tratamento curativo.
O silvícola inadaptado ao convívio com a civilização, assim como o 
surdo-mudo alijado da cultura, pode enquadrar-se no art. 26, caput ou 
parágrafo único, de acordo com o caso concreto.
VoCabulÁRio
silvícola�p�TXH�RX�TXHP�QDVFH�
RX�YLYH�QD�VHOYD��VHOYDJHP�
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
91
Obs.: a expressão “semi-imputável”, apesar de corrente, não é ade-
quada; isso porque se o agente possui, ainda que reduzidamente, a capa-
cidade de entendimento ou de autocontrole, é imputável, embora com 
culpabilidade diminuída (daí o fato de a lei determinar que ele receba 
pena reduzida e, excepcionalmente, no caso de necessidade de tratamen-
to, uma medida de segurança).
b) Embriaguez completa e involuntária (decorrente de caso fortuito 
ou força maior) (CP, art. 28)
Somente a embriaguez (intoxicação aguda e transitória causada 
pelo álcool) completa e involuntária exclui a culpabilidade. Há três es-
tágios de embriaguez: 1º) excitação; 2º) depressão; 3º) sono (letargia). 
Considera-se completa a embriaguez nas duas últimas fases, pois ela re-
tira por completo a capacidade de discernimento do agente.
O sujeito pode embriagar-se voluntariamente (quando tem a inten-
ção de fazê-lo) ou de forma culposa (excesso imprudente no consumo de 
bebida alcoólica). Nessas hipóteses não incide o dispositivo em exame, 
que pressupõe embriaguez involuntária, ou seja, oriunda de caso fortui-
to (quando se ingere substância cujo efeito inebriante era desconhecido) 
ou força maior (quando se é fisicamente forçado a consumir álcool ou 
substância de efeitos análogos). Aos casos de embriaguez voluntária, do-
losa ou culposa, aplica-se a teoria da actio libera in causa.
Juridicamente, a embriaguez completa e involuntária enseja absol-
vição própria, por exclusão da culpabilidade. Se o comprometimento 
da capacidade de compreensão ou autodeterminação for apenas parcial, 
incidirá uma causa de diminuição de pena, de 1 a 2/3 (CP, art. 28, § 2º).
A embriaguez pode, ainda, ter os seguintes efeitos: a) imposição de 
medida de segurança, no caso de embriaguez patológica (o alcoolismo é 
equiparado a doença mental, sendo tratado na forma do art. 26 do CP); 
b) imposição de agravante genérica (CP, art. 61, II, l), quando houver 
embriaguez preordenada (o agente se embriaga propositadamente para 
cometer o crime).
c) Dependência ou intoxicação involuntária por substância entor-
pecente
O art. 45, caput, da Lei de Tóxicos (Lei n. 11.343/2006) dispõe: “É 
isento de pena o agente que, em razão da dependência, ou sob o efeito, 
proveniente de caso fortuito ou força maior, de droga, era, ao tempo da 
ação ou da omissão, qualquer que tenha sido a infração penal praticada, 
inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determi-
nar-se de acordo com esse entendimento”. Nesse caso, “quando absolver 
o agente, reconhecendo, por força pericial, que este apresentava, à época 
do fato previsto neste artigo, as condições referidas no caput deste arti-
go, poderá determinar o juiz, na sentença, o seu encaminhamento para 
tratamento médico adequado” (parágrafo único).
d) Menoridade (CP, art. 27, e CF, art. 228)
Os menores de 18 anos são penalmente inimputáveis, aplicando- 
-se-lhes a legislação pertinente: Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do 
Adolescente — ECA).
biblioTeCa
penas e Medi-
das de segu-
rança no direito 
penal brasileiro��
GH�6DOR�GH�&DU�
YDOKR�� (GLWRUD�
6DUDLYD�� 2� OLYUR�
DERUGD� RV� SUR�
EOHPDV� QXFOHDUHV� GD� MXVWLÀFDomR�
H�GD�DSOLFDomR�GDV�SHQDV�H�GDV�
PHGLGDV�GH�VHJXUDQoD��
Mobile User
Mobile User
92
O adolescente (pessoa com mais de 12 e menos de 18 anos comple-
tos) que pratica um fato defi nido como crime ou contravenção penal 
incorre, nos termos do ECA, em ato infracional, sujeito às chamadas 
medidas socioeducativas (internação, semiliberdade etc.).
“O limite de idade deve ser fi xado de acordo com a regra do art. 10, 
1ª parte: ‘O dia do começo inclui-se no cômputo do prazo’. Se o fato 
é cometido no dia em que o sujeito comemora 18 anos, responde por 
crime, pois não se indaga a que hora completa a maioridade penal. A 
partir do primeiro instante do dia do aniversário surge a maioridade” 
(Damásio de Jesus, Direito penal: parte geral, v. 1, p. 506).
 8.4 a iNexiGibilidade de CoNduTa diVeRsa CoMo Causa supRaleGal 
de exClusão da Culpabilidade
Estamos agora diante do último elemento da culpabilidade. Para 
dizer que alguém praticou uma conduta reprovável, é preciso que se 
possa exigir dessa pessoa, na situação em que ela se encontrava, uma 
conduta diversa. Muitas vezes, as pessoas se veem em situações nas quais 
não têm escolha: ou agem de tal forma, ou um mal muito maior lhes 
acontecerá. Veja o seguinte caso: para obter declaração falsa e assinatura 
em um contrato, um sujeito aponta arma de fogo contra a cabeça da 
vítima, exigindo que redija e assine o documento. Evidente que a vítima 
pode recusar-se a assiná-lo, no entanto, se o fi zer, morrerá. Nesse caso, 
não se pode exigir do ofendido que assinou o documento falso compor-
tamento diferente.
Nosso CP prevê duas causas em que não é exigível conduta diversa: 
coação moral irresistível e obediência hierárquica (art. 22).
a) Coação moral irresistível
De início é importante lembrar que a culpabilidade só estará exclu-
ída quando se tratar de coação moral. Havendo coação física, afasta-se a 
ação ou omissão, gerando um fato atípico.
Requisito da coação moral (ameaça): deve ser irresistível. E a “irre-
sistibilidade da coação deve ser medida pela gravidade do mal ameaça-
do (...) Somente o mal efetivamente grave e iminente tem o condão de 
caracterizar a coação irresistível prevista pelo art. 22 do CP. A iminência 
aqui não se refere à imediatidade tradicional, puramente cronológica, 
mas signifi ca iminente à recusa, isto é, se o coagido recusar-se, o coator 
tem condições de cumprir a ameaça em seguida, seja por si mesmo, seja 
por interposta pessoa” (Cezar R. Bitencourt, Manual de direito penal: 
parte geral, v. 1, p. 310).
Quando alguém pratica o fato sob coação moral irresistível, só é 
punível o autor da coação. O coagido estará isento de pena. Apesar de 
haver duas pessoas envolvidas na consecução do fato — o coator e o 
Mobile User
Mobile User
Mobile User
Direito Penal
93
coagido — não se há de falar em concurso de pessoas. O coagido é mero 
instrumento nas mãos do coator. Por isso fala-se em autoria mediata. 
Aliás, cumpre observar que o coator terá contra si uma circunstância 
agravante (CP, art. 62, II).
Coação resistível: se resistível a coação, ambos respondem pelo fato 
— coator e coagido; este com uma atenuante (art. 65, III, c, 1ª figura) e 
aquele com a agravante acima mencionada.
b) Obediência hierárquica
Requisitos: a) relação de direito público (hierarquia); b) ordem do 
superior; c) ordem ilegal, mas cuja ilegalidade não seja manifestamente 
evidente. O superior hierárquico que profere a ordem ilegal responde 
pelo crime com uma circunstância agravante (CP, art. 62, III); seu subor-
dinado será isentode pena (trata-se de outro caso de autoria mediata).
Discute-se a possibilidade de admitir a existência de causas suprale-
gais (não previstas em lei) de inexigibilidade de conduta diversa.
Primeiro deve-se lembrar que estamos no campo das normas pe-
nais permissivas, para as quais é perfeitamente admissível o emprego 
da analogia (in bonam partem). Além disso, a não exigibilidade corres-
ponde a um princípio geral de exclusão de culpabilidade. Não há óbice, 
portanto, à aplicação de causas supralegais de exclusão da culpabilidade.
A emoção e a paixão não excluem o crime (CP, art. 28). Seria um 
absurdo se isso ocorresse, já que, por mais amoral que seja o criminoso, 
ele sempre estará sentindo alguma emoção (tensão, apreensão, nervosis-
mo, alegria, prazer, irritação, ansiedade etc.).
Por emoção entende-se a forte e transitória perturbação da afetivi-
dade ou a viva excitação do sentimento. A emoção corresponde a um es-
tado momentâneo, e a paixão, a um estado duradouro. A emoção pode, 
eventualmente, influenciar na quantidade da pena (v. arts. 65, III, c, 121, 
§ 1º, e 129, § 4.º)
(P�UHODomR�j�REHGLrQFLD�KLH�
UiUTXLFD��D� VLWXDomR�GRV�PLOLWDUHV�
p�GLIHUHQWH�GRV� IXQFLRQiULRV�FLYLV��
2� &yGLJR� 3HQDO� 0LOLWDU� SUHYr� R�
FULPH�GH�LQVXERUGLQDomR��DUW�������
&30���TXH�LQYLDELOL]D�GLVFXWLU�D�OH�
JDOLGDGH�GH�XPD�RUGHP�SHOR�GH�
YHU�GH�REHGLrQFLD��1HVVHV�FDVRV��
VH�KRXYHVVH�FULPH�� Vy�R�DXWRU�GD�
RUGHP� UHVSRQGHULD�� R� VXEDOWHUQR�
QmR�
e�LPSRUWDQWH�QRWDU�TXH�R�&y�
GLJR�3HQDO�0LOLWDU� IDOD�HP�RUGHP�
PDQLIHVWDPHQWH� FULPLQRVD� �DUW��
����������&30���$�RUGHP�PDQLIHV�
WDPHQWH�FULPLQRVD�p�GLIHUHQWH�GD�
RUGHP�PDQLIHVWDPHQWH� LOHJDO� GR�
&yGLJR� 3HQDO�� SRLV� D� LOHJDOLGDGH�
PDQLIHVWD� p� UHODWLYD� D� IRUPDOLGD�
GHV� TXH� QmR� IRUDP� FXPSULGDV� H�
IDOWD�GH�OHJLWLPLGDGGH�GR�VXSHULRU�
SDUD� GDU� D� RUGHP�� -i� D� RUGHP�
PDQLIHVWDPHQWH� FULPLQRVD� WHP�
SRU�REMHWR�D�SUiWLFD�GH�DWR�PDQL�
IHVWDPHQWH�FULPLQRVR�
obseRVaÇão
94
9 Teoria do Erro
96
Para aprofundar o conhecimento 
sobre o tema, su-
gerimos a leitura 
da obra clássica: 
Erro de Tipo & Erro 
de proibição, de 
Cezar Roberto Bi-
tencourt, Editora 
Saraiva.
 9.1 
concEiTo DE Erro. DisTinÇÃo EnTrE 
Erro DE Tipo E Erro DE proibiÇÃo: 
naTurEZa JurÍDica E EFEiTos
Erro, em direito penal, corresponde a uma falsa percepção da rea-
lidade, que tanto pode incidir sobre situação fática prevista como ele-
mentar ou circunstância do crime (erro de tipo) como sobre a ilicitude 
da conduta (erro de proibição). Conforme lição clássica de Hans Welzel, 
a pessoa que subtrai coisa de outra, acreditando ser sua, encontra-se em 
erro de tipo (não sabe que subtrai coisa alheia); contudo, se acredita ter 
o direito de subtrair coisa alheia, como o caso do credor em relação ao 
devedor inadimplente, há erro de proibição; ou, ainda, na lição de Da-
másio de Jesus, quando alguém tem cocaína em casa, na crença de que 
constitui outra substância, inócua (ex.: talco), comete erro de tipo (art. 
20); mas se souber da natureza da substância, a qual mantém por supor 
equivocadamente que o depósito não é proibido, incide no erro de proi-
bição (art. 21).
O erro de tipo dá-se quando o equívoco recai sobre situação fática 
prevista como elemento constitutivo do tipo legal de crime (art. 20 do CP). 
Nele, o agente realiza concretamente todos os elementos de um tipo 
penal incriminador, sem, contudo, o perceber. Ele até sabe que uma atitu-
de como a que pratica confi gura, em tese, ilícito penal, porém não percebe 
o que está fazendo, pois algum dado da realidade (que constitui elemento 
do tipo) refoge à sua percepção. Exemplo: um aluno, ao fi nal da aula, inad-
vertidamente, coloca em sua pasta um livro de um colega, pensando ser o 
seu. Esse aluno tem plena noção de que a subtração de coisa alheia móvel 
é crime; acredita equivocadamente, todavia, que o bem lhe pertence.
Além da estudada acima, há outras modalidades de delito putativo 
ou crime imaginário, que são:
a) Delito putativo por erro de proibição: o sujeito realiza um fato 
que, na sua mente, é proibido pela lei criminal, quando, na verdade, sua 
ação não caracteriza ilícito penal algum. Exemplo: incesto.
b) Delito putativo por obra do agente provocador: dá-se quando o 
agente pratica uma conduta delituosa induzido por terceiro, o qual assegura 
a impossibilidade fática de o crime se consumar. Exemplo: policial à paisa-
na fi nge-se embriagado para chamar a atenção de um ladrão, que decide 
roubá-lo; ao fazê-lo, contudo, é preso em fl agrante (v. Súmula 145 do STF).
 9.2 Erro DE Tipo EssEncial E aciDEnTal
O erro de tipo pode ser: a) essencial, que se subdivide em erro de 
tipo incriminador e permissivo; b) acidental, compreendendo o erro so-
bre o objeto material, o erro na execução e o erro sobre o nexo causal.
Espécies de erro de tipo
�� Essencial: subdivide-se em erro 
de tipo incriminador e permissivo.
a) Erro de tipo incriminador (art. 
20, caput): Exemplos: contrair 
casamento com pessoa casa-
da, desconhecendo comple-
tamente o matrimônio anterior 
válido (o agente não será con-
siderado bígamo — art. 235 do 
CP); subtrair coisa alheia, supon-
do-a própria (não ocorre o cri-
me de furto — art. 155 do CP).
b) Erro de tipo permissivo (art. 20, 
§ 1º): Exemplo: numa comarca 
do interior, uma pessoa é con-
denada e promete ao juiz que, 
quando cumprir a pena, irá 
matá-lo. Passado certo tempo, 
o escrivão alerta o magistrado 
de que aquele réu está prestes 
a ser solto. No dia seguinte, o juiz 
caminha por uma rua escura e 
se encontra com seu algoz, que 
leva a mão aos bolsos de ma-
neira repentina. O juiz, supondo 
que está prestes a ser alvejado, 
saca de uma arma, matando-
-o; apura-se, em seguida, que o 
morto tinha nos bol sos apenas 
um bilhete de desculpas (legíti-
ma defesa putativa).
���Acidental: compreende o erro 
sobre o objeto material, o erro 
na execução e o erro sobre o 
nexo causal.
aTEnÇÃo
biblioTEca
Direito Penal
97
9.2.1 Erro de tipo essencial
É o que retira do agente a capacidade de perceber que pratica deter-
minado crime. Pode ser inevitável ou evitável. Em função dele, o sujeito crê 
não cometer ilícito algum (como no exemplo da pessoa que guarda cocaína 
em casa acreditando tratar-se de açúcar) ou, ao menos, que comete outro 
crime, diverso do que efetivamente pratica (p. ex., alguém ofende a digni-
dade de uma pessoa desconhecendo que se trata de funcionário público 
no exercício de sua função; apenas se dá conta, nesse caso, de uma situação 
ensejadora de crime de injúria — art. 140 do CP, por ele respondendo, e 
não por desacato — art. 331 do CP).
O erro de tipo essencial, seja ele evitável ou não, sempre exclui o 
dolo. Quando inevitável dolo, afasta a culpa. Tal erro ocorre quando o 
equívoco (ex., a falsa percepção da realidade) no qual o agente incor-
reu seria cometido por qualquer pessoa de mediana prudência e dis-
cernimento, na situação em que ele se encontrava. Exemplo: o caçador 
atira contra um arbusto ferindo uma pessoa que se fazia passar por 
animal bravio. O erro essencial pode, ainda, ser evitável, caso pudesse 
ter sido evitado por alguém de mediana prudência e discernimento. 
Embora afaste o dolo, enseja a punição por crime culposo, se previsto 
em lei. Exemplo: o caçador atira contra uma pessoa há poucos metros 
de distância porque, estando sem os seus óculos, a confundiu com um 
animal1.
9.2.2. Erro de tipo incriminador (art. 20, caput) e 
permissivo (art. 20, § 1º). Diferença
O erro de tipo essencial subdivide-se, ainda, em erro de tipo incri-
minador e erro de tipo permissivo:
a) erro de tipo incriminador: a falsa percepção da realidade incide 
sobre situação fática prevista como elementar ou circunstância de tipo 
penal incriminador (daí o nome);
b) erro de tipo permissivo: o erro recai sobre os pressupostos fáticos 
de uma causa de justificação (ex., excludente de ilicitude, que se encon-
tra em tipos penais permissivos).
 9.3
 DEscriminanTEs puTaTivas E as 
TEorias ExTrEmaDa E limiTaDa Da 
culpabiliDaDE
Como se viu acima,apesar da rubrica imprecisa do art. 20, § 1º, há 
1. Note que em se tratando de crime no qual só é prevista a forma dolosa, torna-se 
irrelevante apurar se o erro foi vencível ou invencível, uma vez que, com a exclusão 
do dolo, o fato sempre será atípico.
aTEnÇÃo
Erro de tipo incriminador: 
recai sobre a elementar ou 
circunstâncias do tipo de injusto
Escusável 
ou Inevitável: 
exclui a 
tipicidade 
dolosa ou 
culposa.
Vencível, 
Inescusável 
ou Evitável: exclui 
a tipicidade 
dolosa. Permite a 
punição por 
culpa se houver 
previsão legal.
98
duas espécies de descriminantes putativas: por erro de tipo e por erro 
de proibição:
a) por erro de tipo: dá-se quando o equívoco incide sobre os pres-
supostos de fato da excludente;
b) por erro de proibição: verifi ca-se quando a falsa percepção da 
realidade incide sobre os limites legais (normativos) da causa de justifi -
cação. O agente sabe exatamente o que está fazendo, percebe toda a si-
tuação; desconhece, no entanto, que a lei proíbe sua conduta. Pensa que 
age de forma correta, quando, na verdade, sua conduta é errada, proibi-
da, censurada pelo ordenamento penal. É o chamado erro de proibição 
indireto, que será estudado dentro da culpabilidade. Exemplo: “Um ofi -
cial de justiça realiza uma penhora. O executado, por erro, supõe que a 
diligência é injusta e reage em imaginária legítima defesa. O erro deriva 
não da má apreciação das circunstâncias do fato, mas de incorreta con-
sideração da qualidade da agressão. Esta existe, mas é justa. O executado 
a supõe injusta. Aplica-se o art. 21: se o erro é invencível, há exclusão da 
culpabilidade, se vencível, não há exclusão da culpabilidade e sim dimi-
nuição de pena” (Damásio de Jesus, Novas questões criminais, p. 136).
A natureza jurídica das descriminantes putativas varia de acordo 
com a teoria da culpabilidade adotada (extremada ou limitada, que são 
variações da teoria normativa pura da culpabilidade). São teorias que 
coincidem em praticamente todos os pontos, exceto em um: justamente 
sobre a natureza das descriminantes putativas.
Para a teoria extremada, todas as descriminantes putativas, seja as 
que incidam sobre os pressupostos fáticos de uma causa de justifi cação, 
seja as que recaiam sobre os limites autorizadores de uma excludente de 
ilicitude, são tratadas como erro de proibição (só haveria, portanto, des-
criminantes putativas por erro de proibição). Já para a teoria limitada da 
culpabilidade, quando o erro do agente recai sobre os pressupostos fáticos, 
há erro de tipo (erro de tipo permissivo), ao passo que, se incidir sobre os 
limites autorizadores, há erro de proibição (erro de proibição indireto).
Nosso CP adotou a teoria limitada da culpabilidade (v. item 17 da 
Exposição de Motivos da Parte Geral do CP).
Em resumo: a) teoria extremada da culpabilidade — as descrimi-
nantes putativas sempre têm natureza de erro de proibição; b) teoria 
limitada da culpabilidade — se o equívoco reside na má apreciação de 
circunstância fática, há erro de tipo; se incidir nos requisitos normativos 
da causa de justifi cação, erro de proibição.
 9.4 
 Erro provocaDo por TErcEiro, 
Erro sobrE o obJETo, Erro sobrE 
pEssoa, Erro na ExEcuÇÃo 
(ABERRATIO CRIMINIS)
Dá-se quando a falsa percepção da realidade incide sobre dados ir-
Descriminantes putativas
��(VSpFLHV
a) por erro de tipo: dá-se quan-
do o equívoco incide sobre os 
pressupostos de fato da exclu-
dente.
b) por erro de proibição:� YHULÀ�FD�
-se quando a falsa percepção 
da realidade incide sobre os 
limites legais (normativos) da 
FDXVD�GH�MXVWLÀ�FDomR��([HPSOR��
um executado reage à penho-
UD�IHLWD�SRU�XP�RÀ�FLDO�GH�MXVWLoD��
por entendê-la, equivocada-
mente, injusta.
��1DWXUH]D�MXUtGLFD
1) Para a teoria extremada da 
culpabilidade, ambas consti-
tuem erro de proibição.
2) Para a teoria limitada da culpa-
bilidade, a descriminante puta-
WLYD�SRU� HUUR�GH� WLSR�FRQÀ�JXUD�
erro de tipo, e a outra, erro de 
proibição.
Teoria adotada pelo CP: limi-
tada da culpabilidade (item 
17 da Exposição de Motivos da 
Parte Geral do CP).
aTEnÇÃo
Direito Penal
99
relevantes da figura típica. Encontra-se previsto nos arts. 20, § 3º, 73 e 74 
do CP.
Subdivide-se em: a) erro sobre o objeto material, que pode ser erro 
sobre a pessoa ou erro sobre a coisa; b) erro na execução, que pode ser 
aberratio ictus ou aberratio criminis; e c) erro sobre o nexo de causalidade.
Nesses casos, o agente, apesar do equívoco, percebe que pratica o 
crime; justamente por esse motivo, o erro não o beneficia.
Erro sobre o objeto material
O objeto material do crime é a pessoa ou coisa sobre a qual recai a 
conduta. Há, portanto, erro sobre a pessoa (error in persona) e erro sobre 
o objeto (error in objecto).
a) Erro sobre a pessoa
Pressuposto: o agente atinge pessoa diversa da que pretendia ofen-
der (vítima efetiva), pois a confunde com outra (vítima visada). Exem-
plo: o sujeito mata um sósia do inimigo, pensando tratar-se de seu algoz.
Efeito: não beneficia o agente, devendo ele responder como se tives-
se atingido a vítima visada (CP, art. 20, § 3º). Assim, se pretendia matar 
seu pai, mas atingiu desconhecido (porque o confundiu com seu geni-
tor), responde pelo crime de homicídio (simples ou qualificado, confor-
me o caso), com a agravante genérica do art. 61, II, e, do CP.
b) Erro sobre o objeto
Pressuposto: a conduta do sujeito recai sobre coisa diversa da ima-
ginada. Exemplo: alguém subtrai sacas de arroz acreditando tratar-se 
de milho.
Efeito: não beneficia o agente, respondendo ele pelo crime praticado.
c) Erro na execução do crime
Há duas modalidades de erro na execução: aberratio ictus e aberra-
tio criminis.
1ª) Aberratio ictus (erro na execução ou desvio no golpe) — art. 73 
do CP. Característica: o sujeito erra nos meios de execução (“erro-inabi-
lidade”), de tal forma que atinge pessoa diversa da pretendida.
Espécies:
a) com unidade simples ou resultado único: em face do erro na exe-
cução, o agente acaba por atingir apenas pessoa diversa da pretendida (a 
pessoa que queria atingir é chamada de vítima virtual e a pessoa atingida 
é chamada de vítima efetiva); 
— consequência: a solução é a mesma do art. 20, § 3º, ou seja, o 
agente responde pelo crime como se tivesse atingido a vítima pretendida 
(vítima virtual);
b) com unidade complexa ou resultado duplo: o agente, além de 
atingir a vítima efetiva, atinge a vítima virtual;
— consequência: aplica-se a regra do concurso formal. Apura-se 
a capitulação jurídica de cada crime, segundo o elemento subjetivo do 
agente, e faz-se a exasperação das penas.
Para falar em aberratio ictus 
com resultado duplo, pressupõe-
-se que a pessoa diversa da pre-
tendida tenha sido atingida por 
erro (culpa), pois, se houver dolo, 
ainda que eventual, não se estará 
GLDQWH�GD�ÀJXUD�GR�DUW�����
curiosiDaDE
Erro de tipo acidental: dá-se 
quando a falsa percepção da 
realidade incide sobre dados irre-
OHYDQWHV�GD� ÀJXUD� WtSLFD�� (QFRQ-
tra-se previsto nos arts. 20, § 3º, 73 
e 74 do CP.
��6XEGLYLGH�VH�HP��
a) Erro sobre o objeto material, 
que pode ser erro sobre a pes-
soa (art. 20, § 3º, do CP) ou so-
bre a coisa.
b) Erro na execução, que pode 
ser aberratio ictus ou aberratio 
criminis (arts. 73 e 74 do CP).
c) Erro sobre o nexo de causalida-
de.
�� (IHLWR� nesses casos, o agente, 
apesar do equívoco, percebe 
que pratica o crime; justamente 
por esse motivo, o erro não o be-
QHÀFLD�
aTEnÇÃo
As modalidades de erro so-
bre a execução e sobre o nexo 
causal são chamadas pela doutri-
na de delitos aberrantes.
curiosiDaDE
100
Diferença entre o erro sobre a pessoa e a aberratio ictus (erro na 
execução): “O erro sobre a pessoa surge no momento da formação 
da vontade e nisso se distingue da aberratio ictus, que surge no mo-
mento da execução da vontade” (Paulo José da Costa Júnior, Comen-
tários ao Código Penal, p. 380-382, apud Luiz Flávio Gomes, Erro de 
tipo e erro de proibição, p. 126). Além disso, no erro sobre a pessoa, 
a vítimavisada nem sequer chega a ser ameaçada com a conduta do 
agente.
2ª) Aberratio criminis (resultado diverso do pretendido) — art. 74 
do CP
Pressuposto: o erro do agente também está nos meios executórios. 
No entanto, em vez de atingir pessoa diversa da pretendida, acaba por 
atingir bem jurídico diverso do pretendido (daí o nomen iuris: resultado 
diverso do pretendido).
Exemplo: o agente atira uma pedra contra uma vidraça e acerta 
uma pessoa (só responde por lesão corporal culposa, fi cando absorvida 
a tentativa de dano).
Espécies:
a) com unidade simples ou resultado único: só atinge o bem jurídi-
co diverso do pretendido; para falar em aberratio criminis pressupõe-se 
que o bem jurídico diverso tenha sido atingido por erro (leia-se: culpa), 
pois, se houve dolo, ainda que eventual, deve o agente responder pelo 
crime na forma dolosa, não se aplicando o art. 74;
— consequência: só responde pelo resultado produzido e, mesmo 
assim, se previsto como crime culposo;
b) com unidade complexa ou resultado duplo: atinge o bem jurí-
dico que almejava e outro, diverso do pretendido, por erro na execução;
— consequência: concurso formal.
 9.5 rEsulTaDo DivErso Do prETEnDiDo (ABERRATIO CRIMINIS)
Dá-se quando o agente pretende atingir determinado resulta-
do, mediante dada relação de causalidade, porém obtém seu intento 
mediante um procedimento causal diverso do esperado, mas por ele 
desencadeado e igualmente eficaz. Exemplo: João, pretendendo ma-
tar seu inimigo, joga-o de uma ponte, na esperança de que, caindo 
no rio, morra por asfixia decorrente de afogamento; a vítima, no 
entanto, falece em virtude de traumatismo cranioencefálico, pois, 
logo após ser lançada da ponte, sua cabeça colide com um dos ali-
cerces da estrutura.
Se o resultado diverso do pre-
tendido não for previsto em lei 
como crime culposo ou for me-
nos grave que a conduta em si, 
não se aplica a regra do art. 74. 
Exemplo: o agente atira na vítima 
e não a acerta, atingindo apenas 
uma vidraça. Aplicando-se a re-
gra do art. 74, deveria responder 
somente pelo resultado, se previs-
ta a forma culposa. Ocorre que 
não há crime de dano culposo no 
CP, de modo que isso implicaria a 
não responsabilização do agen-
te. Nesse caso, a ele deve ser im-
putada uma tentativa branca de 
homicídio. Se assim não fosse, um 
fato atípico (dano culposo) ab-
sorveria um fato típico (tentativa 
de homicídio).
aTEnÇÃo
Direito Penal
101
 9.6 Erro DE proibiÇÃo
�������&RDomR�PRUDO�LUUHVLVWtYHO�SXWDWLYD�H�
obediência hierárquica putativa
Um funcionário público recebe uma carta ameaçadora dizendo- 
-lhe que não realize ato de ofício; amedrontado, omite-se; depois, per-
cebe que a carta era endereçada a outro funcionário com atribuição 
semelhante à sua. Responde o agente por prevaricação? A resposta é 
negativa, devendo aplicar-se os princípios relativos ao erro de proibição 
(CP, art. 21).
O agente, supondo existente uma ordem, não manifestamente ile-
gal, de superior hierárquico, pratica uma conduta. Na verdade, contu-
do, a ordem não foi dada. Responde pelo crime cometido? Não pode 
ser aplicado o art. 22 porque não havia ordem. É o caso de aplicar o art. 
21: erro de proibição. O agente supôs que sua conduta era lícita porque 
agiu na crença de que havia uma ordem de autoridade superior, a qual 
lhe pareceu legal (e cuja ilegalidade, à vista do homem médio, não era 
manifesta).
9.6.2 Erro sobre a inimputabilidade
Considere uma pessoa humilde, que não teve seu nascimento regis-
trado em cartório, acreditando ter 17 anos, quando, na verdade, possui 
18 (circunstância apurada mediante perícia). Também aqui devem ser 
aplicados os princípios relativos ao erro de proibição.
vocabulÁrio
DWR� GH� RItFLR� é aquele que a 
Administração Pública faz inde-
pendentemente de pedido do 
interessado. Não há necessida-
de de provocação. 
102
10 Concurso de Pessoas
104
Não confundir bigamia (con-
trair alguém, sendo casado, novo 
casamento) com adultério. O cri-
me de adultério (art. 240 do CP) foi 
UHYRJDGR�HP�������À�FDQGR�D�VXD�
disciplina apenas no âmbito civil.
CURIOSIDaDE
Ressalte-se que, no crime de 
rixa, em que pese o fato de os 
contendores serem sujeitos ativos e 
passivos a um só tempo, não há vio-
lação ao princípio da alteridade, 
pois o delito pressupõe agressões 
recíprocas dos rixosos, e, portanto, 
ocorrem lesões a bens alheios.
aTENçãO
 10.1 CONCEITO E NOMENCLaTURa
Uma infração penal, na grande maioria das vezes, é obra de uma 
só pessoa. Casos há, entretanto, em que várias pessoas reúnem esforços, 
materiais ou intelectuais, com o fi m de cooperar para o mesmo delito.
Como regra, os crimes podem ser praticados por uma só pessoa 
ou por várias, em coautoria ou participação (v. item 10.4, abaixo). Tais 
delitos denominam-se unissubjetivos, monossubjetivos ou de concurso 
eventual.
Outros, contudo, apenas podem ser cometidos por várias pessoas 
reunidas; são casos em que a pluralidade de sujeitos ativos aparece como 
condição para a existência do ilícito penal. Esses crimes chamam-se plu-
rissubjetivos ou de concurso necessário. Neles, não se fala em coautoria 
ou participação, pois todos os concorrentes são considerados autores do 
crime. A doutrina subdivide-os em: a) crimes plurissubjetivos de con-
dutas paralelas (ex.: CP, art. 288 — associação criminosa); b) de condu-
tas convergentes (ex.: CP, art. 235 — bigamia); e c) de condutas contra-
postas (ex.: CP, art. 137 — rixa ).
De qualquer modo, quando mais de uma pessoa concorre para a 
mesma infração penal, fala-se em codelinquência, concurso de agentes 
ou concurso de pessoas.
 10.2 TEORIaS E REQUISITOS DO CONCURSO DE PESSOaS
Há três teorias a respeito do tema: 1ª) monista, monística ou unitá-
ria; 2ª) dualista ou dualística; e 3ª) pluralista ou pluralística.
A primeira, adotada como regra em nossa legislação (CP, art. 29, 
caput), determina que todo aquele que concorre para o crime responde 
pelas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade. Assim, 
exemplifi cativamente, respondem pelo crime de latrocínio (CP, art. 157, 
§ 3º, última fi gura) tanto o agente que empunha a arma e efetua o dis-
paro quanto o que, ciente de tudo, limita-se a dar-lhe cobertura (v. TJSP, 
RT, 776/576).
Já para a teoria dualista, os coautores incorrem em determinado 
crime, e os partícipes, em outro.
Não foi adotada em nossa legislação, embora se possa afi rmar que 
o art. 29, § 1º, que trata da participação de menor importância, pos-
sui solução assemelhada à proposta pela presente teoria (o autor será 
enquadrado diretamente no tipo penal incriminador, p. ex., art. 121, e 
aquele que contribuiu de modo reduzido, no 121 c/c o art. 29, § 1º, im-
pondo-se-lhe pena menor).
Na visão da última delas, ou seja, da pluralista, para cada agente, 
A teoria unitária (CP, art. 29, 
caput) guarda profunda relação 
com a teoria da equivalência dos 
antecedentes (CP, art. 13, caput), 
segundo a qual se considera cau-
sa do resultado todo e qualquer 
fator que para ele tenha contri-
buído, ainda que minimamente. 
De modo semelhante, a infração 
considera-se produto da conduta 
de cada um, independentemen-
te do ato praticado, desde que 
ele tenha tido alguma relevância 
causal para o resultado.
Comentários à Lei 
de Organização 
Criminosa: Lei n. 
12.850/ 2013, de 
Cezar Roberto Bi-
tencourt e Paulo 
César Busato, Edi-
tora Saraiva. De maneira didáti-
ca a obra traz comentários à Lei, 
abordando os pontos de maior 
relevância, contribuindo para es-
clarecer as alterações normativas 
sobre o tema. 
CURIOSIDaDE
BIBLIOTECa
Direito Penal
105
um delito diferente. Há exemplos excepcionais dessa teoria em nosso CP, 
como na corrupção (o corruptor comete corrupção ativa — art. 333 —, 
e o funcionário corrompido, corrupção passiva — art. 317), no aborto 
(a gestante incorre no tipo do art. 124, e o médico que pratica o aborto, 
nos arts. 125 ou 126). Pode-se citar, ainda, o art. 29, § 2º, que cuida da 
participação dolosamente distinta.
Quanto aos requisitos,são os seguintes:
a) pluralidade de agentes;
b) relevância causal da conduta de cada um dos participantes (as-
sim, aquele que, querendo contribuir com o homicídio alheio, empresta 
instrumento letal, que não vem a ser utilizado na execução do fato e 
não influi psicologicamente na conduta do agente, não responde pelo 
delito); e
c) vínculo subjetivo (logo, se uma pessoa, p. ex., em virtude de sua 
falta de atenção, deixa aberta a porta da casa de um amigo, facilitando a 
ação do furtador, não responde pelo crime).
Importante lembrar que a lei não requer acordo prévio (pactum 
sceleris) entre os agentes, sendo suficiente a consciência por parte das 
pessoas que de algum modo contribuem com o fato.
Como consequência da presença dos requisitos acima, todos os 
agentes responderão pelo mesmo crime, na medida de sua culpabilidade 
(i. e., haverá identidade de infração penal), nos termos do art. 29, caput.
 10.3 aUTORIa
Há uma série de concepções diferentes acerca da autoria:
a) Conceito amplo ou extensivo de autor: todo aquele que concorre 
para o crime é seu autor, mostrando-se suficiente a relevância causal e o 
vínculo psicológico. Como resultado, essa teoria não distingue o autor 
do partícipe.
b) Conceito restritivo ou restrito de autor: autor é aquele que rea-
liza a conduta descrita no tipo penal, ou seja, executa a ação consubs-
tanciada no verbo núcleo do tipo. O partícipe, por sua vez, apenas coo-
pera com o delito, induzindo, instigando ou auxiliando materialmente 
seu autor.
c) Teoria do domínio do fato: autor é todo aquele que tem o domí-
nio do fato, isto é, seu controle final. Essa teoria permite a punição do 
autor mediato, vale dizer, da pessoa que, sem executar a conduta típica, 
controla ou manipula terceiro para que cometa o crime, utilizando-o 
como instrumento de sua vontade. Exemplos: 1) quando alguém se vale 
de um inimputável para a prática do crime; 2) quando provoca uma 
pessoa a agir em erro de tipo (art. 20, § 2º); 3) quando comete uma coa-
ção moral irresistível ou, sendo autoridade superior, expede ordem não 
manifestamente ilegal a um subordinado (CP, art. 22).
Teoria do domí-
nio do fato, de 
Pablo Rodrigo Al-
ÁHQ��(GLWRUD�6DUDL-
va. A obra apre-
senta uma expo-
sição aprofunda-
da da teoria do 
domínio do fato. 
O autor, de forma instigante, abor-
da as principais vertentes da teoria, 
seus critérios e sua aptidão para 
dar respostas à complexa deman-
da penal contemporânea.
BIBLIOTECa
Cidade de Deus, 
direção de Fer-
nando Meirelles, 
2002��2�ÀOPH� WUDWD�
da história do con-
junto habitacional 
Cidade de Deus, 
criado pelo governo do Rio de Ja-
neiro na década de 1960 e que 
se tornou um dos maiores polos 
GR�FRQWUROH�GR�WUiÀFR�QD�UHJLmR��
É um exemplo de crime que exige 
concurso de agentes. 
Os suspeitos, di-
reção de Bryan 
Singer, 1995. Após 
um crime que dei-
xa vários mortos, a 
polícia prende cin-
co suspeitos de te-
rem cometido o crime. A história 
mostra como os cinco criminosos 
foram unidos para um mesmo tra-
balho e como um lendário mestre 
do crime está por trás de tudo. O 
ÀOPH�SRGH�OHYDU�j�UHÁH[mR�VREUH�
concurso de agentes e teoria do 
domínio do fato.
CINEMaTECa
106
Dessas, o CP adotou a teoria restritiva: autor, portanto, será aquele 
que praticar a ação nuclear; coautores, os que cooperarem na execução 
do delito; partícipes, por fi m, todas as pessoas que prestarem auxílio 
moral (induzimento ou instigação) ou material. A doutrina, porém, sus-
tenta deva ser aceita no Brasil a teoria do domínio do fato como solução 
aos casos de autoria mediata.
 10.4 PaRTICIPaçãO
Todo aquele que, mesmo não praticando a conduta descrita no tipo 
penal, coopera com o crime responde pelas penas a este cominadas, sen-
do considerado seu partícipe.
Na participação, o procedimento de adequação típica não se dá di-
retamente, ou seja, o ato do partícipe não se enquadra no tipo incrimi-
nador. O art. 121 do CP, isoladamente considerado, pune quem mata al-
guém, mas não aquele que, por exemplo, lhe empresta a arma do crime. 
Essa ação, entretanto, também é penalmente relevante por força do art. 
29 do CP (norma de extensão pessoal da fi gura típica).
Discute-se a natureza jurídica da participação. A conduta nela 
substanciada, inequivocamente, é acessória em relação à do autor, de tal 
forma que o partícipe só será punido se o autor também o for (v. art. 31 
do CP). O nível dessa acessoriedade, entretanto, é controverso:
a) teoria da acessoriedade mínima: a conduta do autor precisa ser, 
pelo menos, típica, a fi m de que se puna o partícipe (crítica: se alguém 
induzir uma pessoa à prática de um homicídio em legítima defesa, co-
meterá crime);
b) teoria da acessoriedade limitada: exige que a conduta do autor 
seja típica e ilícita (é a melhor teoria);
c) teoria da acessoriedade extrema: a conduta do autor deve ser tí-
pica, ilícita e culpável (crítica: quando se induz menor a matar, ninguém 
responde pelo crime — o menor, por ser inimputável; o partícipe, por-
que auxiliou numa conduta sem culpabilidade);
d) teoria da hiperacessoriedade: sustenta que o fato deve ser típico, 
ilícito e culpável, acrescentando que o partícipe responderá pelas agra-
vantes e atenuantes pessoais do autor.
 10.5 CONCURSOS EM CRIMES CULPOSOS
Segundo orientação majoritária, em matéria de crimes culposos, 
admite-se somente a coautoria, mas nunca participação, inclusive por-
que os tipos penais desses delitos são abertos (que abarcam toda e qual-
quer forma de contribuição ao resultado, tornando desnecessária a utili-
zação do art. 29 do CP). Assim, se dois trabalhadores, numa construção, 
Veja exemplo de participa-
ção no crime de latrocínio: Recur-
so em Habeas Corpus n. 58.328, 
STJ, Relator Ministro Leopoldo de 
Arruda Raposo (Desembargador 
convocado do TJPE). “2 (dois) cor-
UpXV��TXH�À�QGDUDP�DSHQDGRV�SRU�
latrocínio, tudo com o auxílio de 
um terceiro réu, condenado como 
incurso nas sanções do art. 348 do 
CP, (...) agindo como motorista do 
bando”. Trecho da Ementa.
aTENçãO
Laranja Mecâ-
nica, dirigido 
por Stanley Ku-
brick, 1978. O 
À�OPH� WUDWD� GD�
história de Alex, 
líder de uma 
gangue de de-
linquentes que matam, roubam 
e estupram até serem presos. O 
À�OPH�p�XP�H[HPSOR� ULFR�GH�FRQ�
FXUVR�GH�SHVVRDV�FRP�D�À�QDOLGDGH�
de cometer crimes, além da análi-
se de questões morais sobre os im-
pulsos destrutivos do ser humano. 
CINEMaTECa
Direito Penal
107
lançam uma tábua e matam um transeunte, respondem por homicídio 
culposo, em coautoria.
 10.6 HOMOgENEIDaDE DE ELEMENTOS SUBjETIvOS
Só há participação dolosa em crime doloso (homogeneidade de 
elemento subjetivo). Não é possível, como consequência, participação 
dolosa em crime culposo ou participação culposa em crime doloso. 
Exemplos: a) um médico, por descuido, entrega à enfermeira uma in-
jeção que contém substância letal. Ela, por sua vez, percebendo essa 
circunstância, dela se aproveita para matar o paciente (dolosamente). 
Seria o médico partícipe do homicídio doloso praticado pela enfer-
meira? Não, em face da diversidade de elemento subjetivo. O médico, 
nesse caso, deve responder pelo resultado a título de culpa, ou seja, 
por homicídio culposo, e a enfermeira, por homicídio doloso (há dois 
crimes, um para cada um dos agentes, e não um só crime em con-
curso); b) alguém entrega uma arma verdadeira e carregada a outra 
pessoa, fazendo-a acreditar que se trata de arma de brinquedo. Em 
seguida, passa a incentivá-la a apertar o gatilho contra um terceiro. 
A pessoa, inadvertidamente, pressiona o gatilho, supondo tratar-se de 
arma finta, e acaba por matar a vítima, praticando um homicídio cul-
poso. Aquele que lhe entregou a arma é partícipe desse crime? Não. É 
autor de um crime doloso (autoria mediata).
 10.7 PaRTICIPaçãO DE MENOR IMPORTâN CIa E DOLOSaMENTE 
DISTINTa
a) CP, art. 29, § 1º: ao agente que tiver participação de menor impor-
tância, a pena pode ser diminuída de 1/6 a 1/3. Advirta-se que o disposi-
tivo só se aplica aos partícipes, não aos coautores. Exemplo: oagente que, 
ciente da intenção homicida de alguém, limita-se a indicar-lhe o local 
para a aquisição de uma arma, pratica conduta que, embora tenha algu-
ma relevância causal, pode ser considerada como participação de me-
nor importância.
b) CP, art. 29, § 2º: se o agente quis participar de crime menos gra-
ve, ser-lhe-á aplicada a pena deste, que será aumentada da metade se o 
resultado mais grave era previsível. Exemplo: duas pessoas combinam 
praticar um furto e uma delas, sem o conhecimento da outra, leva con-
sigo uma arma de fogo, que vem a ser utilizada, matando o ofendido. O 
atirador comete latrocínio, e o comparsa, furto qualificado pelo concur-
so de duas pessoas.
vOCaBULÁRIO
transeunte:� VLJQLÀFD� SDVVDQWH��
pessoa que passa pela rua. 
golpe Duplo, di-
reção de glenn 
Ficarra e john 
Requa, 2015. O 
ÀOPH� PRVWUD� R�
personagem do 
ator Will Smith, 
que é um tra-
SDV�VHLUR� SURÀVVLRQDO�� WUHLQDQGR�
uma novata a cometer crimes 
patrimoniais. Em várias cenas ela 
aparece colocando em prática 
o que lhe foi ensinado, enquanto 
ele tem pequenas participações 
no ato. É um bom exemplo de 
concurso de pessoas e participa-
ção de menor importância.
CINEMaTECa
108
 10.8 aUTORIa COLaTERaL E aUTORIa INCERTa
Dá-se a autoria colateral quando duas pessoas concorrem para um 
mesmo resultado, sem que haja entre elas vínculo subjetivo. Exemplo: 
dois atiradores efetuam disparos contra uma mesma pessoa sem que um 
saiba da conduta do outro.
A autoria incerta, de sua parte, ocorre quando, diante de uma hipó-
tese de autoria colateral, é impossível determinar quem foi o responsá-
vel pelo resultado. Se no exemplo acima não houver condições de aferir 
qual o disparo causador da morte, ambos os atiradores devem respon-
der por tentativa de homicídio
	Direito Penal_01_74
	Direito Penal_75_86
	Direito Penal_87_94
	Direito Penal_95_102
	Direito Penal_103_108

Mais conteúdos dessa disciplina