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Pancreatites Aguda e Crônica Data: 31/05/2023 / Disciplina: Clínica Cirúrgica III / Professor: Thiago Diniz Transcrição por: Fernanda Martins Essa última aula é uma aula de abdome agudo inflamatório. Quando falamos em abdome agudo inflamatório tem vários, falamos de apendicite, diverticulite, colecistite. É um tema muito importante. Eu acho que essa aula não deveria ser dada por um cirurgião, eu acho essa aula extremamente clínica, deveria ser dada por um clínico. Infelizmente, quando chega um paciente com pancreatite aguda no PS encaminha para o cirurgião é igual hemorragia digestiva, essa semana teve um caso no HU de hemorragia digestiva e encaminharam para o cirurgião avaliar. Não tem o que a gente fazer. É endoscopia, estabilizar. Então, o que a gente vai fazer? Você tem que estudar. De onde é que está vindo esse sangramento? Eu não sei. Claro se está sangrando “vivo”, pode ser alguma coisa mais baixa e se está sangrando “melena”, pode ser alguma coisa mais alta. Mas é protocolo. Quando você tem ao ponto de operar um paciente com pancreatite aguda, acabou. Então assim, o cirurgião entra nos casos graves e a grande maioria dos casos a pancreatite é leve se resolve só por meio de suporte clínico sem precisar de nada do cirurgião. Aqui é a anatomia básica. Aqui está o pâncreas, ele é um órgão retroperitoneal, delicado, fica entre a coluna e as vísceras do abdome anterior. Para ver o pâncreas tem que abrir a retrocavidade que fica entre o estômago e o cólon. Ele não é peritoneal, ele fica na frente da coluna, por isso que a dor e em barra e irradia para a coluna, porque o plexo pancreático é mais posterior. Gástrica esquerda para cima, esplênica para esquerda e hepática comum para a direita: artérias do tronco celíaco. São importantes, porque na pancreatite necrohemorrágica esses vasos são corroídos, levando a hematoma na região dos flancos, do umbigo, porque disseca o retroperitôneo. O suco pancreático tem várias enzimas: amilase, lipase e outros que digerem todo tipo de alimento. O problema da pancreatite é quando esse suco pancreático ativado começa a “corroer” tudo. Então, tem a sua importância, não está aí à toa. Aqui é importante vocês lembrarem do desenho da via biliar que tem o ducto hepático esquerdo e direito forma o ducto hepático comum, que se une ao cístico e forma o colédoco e se junta ao ducto pancreático e forma a papila duduodenal. quando se obstrui pensar em processos benignos (cálculos) ou malignos (tumores). Tumores na região ampular (cabeça de pâncreas, tumor de papila e colangiocarcinoma) e na bifurcação é o tumor de klatskin. Importância na pancreatite: nessa região pode cair um cálculo da vesícula, que vai passar pela papila e pelo ducto do Wirsung (ducto pancreático) e inflama o pâncreas. A principal causa da pancreatite aguda é biliar. A fisiopatogenia/gênese da pancreatite o paciente tem uma ativação das enzimas pancreáticas que é para ser ativada só no tubo digestivo, mas na verdade elas são ativadas dentro do próprio pâncreas, então ele têm essa ativação enzimática intra pancreática que começa a “corroer”, consumir parede pancreática, ativa uma cascata de inflamação e começa a ter uma Síndrome da Resposta Inflamatória Sistêmica (SIRS), há quem diga que a pancreatite aguda em casos graves só perde para o grande queimado em termo de SIRS, gravem isso. Essa imagem é pra fica na cabeça de vocês. A principal causa é a biliar e a segunda é a alcoólica. Pedra na vesícula pode inflamar o ducto pancreático, as enzimas podem não escoar e ativar dentro do pâncreas e promover inflamação. Todo o mecanismo da pancreatite grave, de vômito, de dor é pelo processos inflamatório. O que mata o paciente é a SIRS (catecolaminas, IL-6, 2, 1, TNF-alfa). É inflamação, não é infecção. Não pode prescrever antibiótico. Então, normalmente é a obstrução do ducto ou uma agressão direta, principalmente alcoólica, que causa a ativação das enzimas intrapancreáticas. Como se fecha o diagnóstico de pancreatite? Paciente com dor em barra, vômito, desconforto abdominal procurou o PS. Lá você fez exame de imagem e laboratório e detectou uma amilase e lipase elevadas. Fechou o diagnóstico de pancreatite? Fechou. Porque eu preciso de 2 critérios para fechar a pancreatite. Eu tenho o critério clínico e laboratorial ou imagem. Raramente você vai ter uma pancreatite sem vômito, é muito raro. Se grave, pode ter hipotensão. Se o colédoco estiver obstruído, pode ter icterícia. OBS: PANCREATITE É DOR ABDOMINAL E VÔMITO . A DOR NEM SEMPRE IRRADIA PARA O DORSO, PODE FICAR SÓ NO EPIGASTRIO, PODE OU NÃO DÁ DISTENSÃO. E SE O PACIENTE DISSER QUE JÁ TEVE PEDRA NA VESÍCULA FACILITA MAIS AINDA. O que serve para dar diagnóstico de pancreatite? É a amilase e a lipase. A amilase é mais sensível e menos específica A lipase é menos sensível e mais específica A sensibilidade é a probabilidade do paciente estar doente quando o exame está positivo (verdadeiros positivos). A especificidade é a probabilidade do paciente não estar doente quando o exame dá negativo (verdadeiros negativos). Quando eu tenho um teste de boa acuracia? Quando eu tenho boa sensibilidade e boa especificidade. EX: É a ck-mb no infarto, ela se eleva por qualquer coisa, ou seja, é sensível, é como se fosse a amilase. Já a lipase é parecida com a troponina no infarto, que é mais específica. A lipase se eleva depois e fica mais tempo alta. Já a amilase se eleva antes, mas cai antes também. Nas primeiras 24-48h, na pancreatite a tomografia vai está normal, porque não detectou o processo inflamatório do pâncreas. Logo, o recomendado para se pedir a tomografia é após 48-72h. É tomografia de abdome com contraste. Após o diagnóstico de pancreatite você vai estadiar. Existem 2: a pancreatite aguda leve ou edematosa e a pancreatite aguda grave. A leve é maioria, 85%, é só não mexer muito com o paciente, não ser iatrogênico, fica observando, dá um suporte, um soro, um analgésico. Já em 10-15% é grave e não se sabe ao certo porquê eles têm uma cascata inflamatória bem mais exacerbada. Em pancreatite, existem vários scores. Na prática: dona Raimunda chega ao PS com quadro de dor abdominal epigástrica irradiado para o dorso, vômito e amilase e lipase elevadas, tem pancreatite? Sim. A dona raimunda está de boa, tá um pouco desidratada pelo vômito, FC 110, PA 12x8, não tá com dispneia. Clinicamente, a partir dos sinais vitais ela está grave? Não Agora um paciente com pancreatite aguda, acidótico, PA 6x4, dispneico FC 130, derrame pleural a cara dele com toxemia, leucocitose ferrada, pcr nas alturas, febre, com anasarca, esse paciente tá grave. Então, na prática veja os sinais vitais, rx e laboratório. Às vezes, o idoso está com pancreatite com confusão mental, oligúria, isso é um paciente grave. Olhem os critérios de APACHE, ele serve para tudo em Medicina, não é exclusivo de pancreatite. Então, paciente com confusão mental, oligúria, dispneia, acidose, leucocitose, alteração de PA e FC é claro que este paciente está grave, então o prof não gosta muito desses critérios. Sempre reavaliar o paciente com pancreatite a cada 48 horas com a repetição dos exames, porque esse paciente pode se tornar grave. Existem sinais clínicos graves que não são específicos da pancreatite. • Sinal de Cullen: Equimose em região periumbilical. Indicativo de hemorragia retroperitoneal. Pode ser encontrado em pancreatite necro-hemorrágica; • Sinal de Gray-Turner: Equimose em região de flancos. Esses pacientes normalmente estão em UTI, graves, chocados, com noradrenalina, com oligúria. Esses critérios de ranson são famosos. Não precisa decorar. Mas cai muito em prova OBS: A principal medida que muda o curso da pancreatite é a hidratação. Um hematócrito quesubiu quer dizer que o paciente está hemoconcentrando, como que eu estou dando líquido e o pacientes está hemoconcentrando? É um paciente grave, que está perdendo líquido para o terceiro espaço, está com sangramento, a medula está óssea está ruim. Nunca olhe esses critérios de maneira isolada. É mais recente e costuma cair em prova: • B de BUN de ureia, função renal alterada; • I: confusão mental, então um idoso que chega com alteração de consciência. É uma alteração de órgão alvo, ou seja, sepse grave (sepse + alteração de órgão; • S: SIRS, tem que saber os critérios, alterações dos sinais vitais, FC aumentada, hipo ou hipertermia, leucócitos para mais ou menos, alteração de frequência respiratória; • Age: idade maior que 60 anos; • P: Derrame pleural, o líquido está indo para o terceiro espaço dando derrame que gera dispneia. Isso aqui pode cair em prova mais que o ranson. Assinale a alternativa que apresenta um critério não relacionado ao bisap ou a pancreatite? Creatinina, por exemplo. Leucocitose está dentro da SIRS. Hemoglobina não está. TC alterada não está, a não ser que descreva o derrame pleural. Aqui é um derrame pleural. Essa parábola é bem clássica de derrame pleural- parábola de damoiseau. Esse paciente est dispneico, você coloca um dreno abaixo da clavícula nas costas para drenar. A amilase e a lipase não têm relação com gravidade! Tá passando o tempo elas caem mesmo. Amilase de 100000 o paciente pode estar bem. Amilase e lipase são diagnósticos e não prognósticos. O paciente grave da pancreatite é o mesmo paciente grave da medicina Exame de imagem, o grande exame de imagem é a tomografia com contraste EV. Pedir com 48 a 72h do quadro. Se edematosa é leve, necrotizante é grave. Esse é um corte axial. Normalmente, a frente do pâncreas está o estômago e atrás dele a aorta e a coluna. O pâncreas é esse filete. TC com contraste. O que você nessa seta branca no pâncreas? Tem líquido e tem pontos pretos dentro do líquido do pâncreas e isso é gás/ar, ou seja, é uma pancreatite que está tendo bactéria produtora de gás. Normalmente esses pacientes estão graves. É uma pancreatite que tem necrose, pois o pâncreas praticamente sumiu, porque necrosou e criou gás dentro da necrose devido a bactéria. Então líquido/coleção, necrose e gás são critérios tomográficos de pancreatite aguda. O pâncreas está desenhado no meio e vê que tem líquido ao redor dele. É uma pancreatite que tem edema, coleções fluidas e esse paciente pode não estar grave. Essa bola preta no rim é cisto renal, de paredes regulares, classificação de Bosniak. São critérios tomográficos de gravidade de pancreatite. Necrose de pâncreas, presença de gás, coleções ao redor do pâncreas. Não precisa decorar! Avalia líquidos e necrose ao redor do pâncreas. Independente da doença, se paciente estiver grave, não pode mandar para enfermaria e sim UTI, se não tiver UTI deve transferir. É aquele paciente hipotenso, sonolento, que não urina. Ainda apresenta algumas controversas. Cirurgiões antigos deixavam paciente 10 dias sem comer, porque acreditavam que se não comesse não estimularia o pâncreas, porém foi provado que isso mata mais. Se paciente estiver vomitando, não adianta dar comida. Mas você pode deixar no máximo 1, 2 ou 3 dias em jejum. O básico é analgesia, hidratação e antiemético, então toda pancreatite deve ter esses 3. O que mais modifica o quadro da pancreatite é a hidratação (já foi questão de prova de residência) e deve ser feita com soro fisiológico ou ringer lactato (nada de soro glicosado). Passou de 2 a 3 dias sem comer, deve já passar uma sonda para ele se alimentar, caso não consiga comer porque ele vai entrar em catabolismo e precisa de proteína. Além da hidratação, também tem que corrigir eletrólitos, porque vômitos provocam isso. Por que deixar o paciente em jejum piora muito, além do catabolismo? Porque quando passamos mais de 5 dias sem comer, as microvilosidades do intestino atrofiam e formam uma mucosa de barreira de proteção para que os germes do intestino não passem para dentro da cavidade peritoneal. Quando o paciente morre de pancreatite, o principal germe que está no pâncreas gerando aquele gás é a E. coli, que é principalmente germe de tubo digestivo. Então essa atrofia vai translocar bactérias. A causa geralmente é biliar, portanto, tem que resolver esse problema, que é pela cirurgia (colecistectomia). Todo paciente com pancreatite tem que resolver a causa base. Em que momento? Paciente grave não pode. Deixa melhorar, pode, inclusive, mandar pra casa e depois resolver isso. A melhor resposta é na mesma internação, aproveita essa internação e retira a vesícula. Se o paciente não estiver conseguindo comer, faz por sonda nasoenteral. Se tolerar dieta via oral, dá preferência para ela. Nutrição parenteral total (NPT) é aquele líquido branco, com dieta toda digerida, que coloca direto na veia. Então tem várias formas. A melhor dieta é oral ou enteral. Tem vários trabalhos mostrando que o jejum prolongado piora a sobrevida em pancreatite. A dieta deve começar dentro das primeiras 72h. Outra polêmica em pancreatite. Normalmente não começa antibiótico de cara. Espera um pouco, vê como está o paciente. Se aquele pâncreas tem muita necrose, paciente está piorando clinicamente, pode iniciar. Mas o ideal é fazer punção da necrose, fazer cultura para ver que tipo de germe tem nele, embora saiba que a maioria são gram-negativos e anaeróbios. Por isso o grande ATB da pancreatite é o Imipenem, que é um carbapenêmico. Então, se eu colocar um caso de pancreatite leve na prova: NADA DE ANTIBIÓTICO! Agora se eu colocar aquele caso que está afundando, tem necrose e está crítico: PODE COMEÇAR ATB! Então ATB só pode estar em 15% dos casos, porque esses são os graves. Não há benefício de ATB profilático. A cirurgia fica em último plano. Antigamente, operar paciente com pancreatite era 100% de mortalidade, hoje melhorou. INDICAÇÃO: Quando tem muita necrose, não está resolvendo com ATB. A cirurgia exacerba mais ainda a resposta inflamatória. Aqui são fotos de cirurgia de pancreatite bem graves. Tem a imagem de “bico de vela”, que é típico de pancreatite. Pâncreas destruído. Necessário colocar essa bolsa, porque não consegue fechar a barriga. A cada 48h deve levar para centro cirúrgico para trocar. Não tem como fechar essa barriga porque está tudo edemaciado, se tentar fechar vai dar síndrome compartimental. Cirurgia da pancreatite é necrosectomia, retirar a necrose. Existe uma complicação da pancreatite que eu quero que vocês saibam: Pseudocisto, normalmente após 6 semanas. Está na prova: Paciente tinha pancreatite aguda, foi pra casa e volta daqui a 2 meses sentindo um cheio, come e enche rápido (plenitude). Faz a Tc e mostra um cisto enorme na região do pâncreas. É pseudocisto, porque espera-se que um cisto tenha uma parede bem formada de epitélio, tem tecido epitelial, e esse é debris da pancreatite que foram se acumulando (necrose), então é uma falsa parede, é só volume de necrose que foi se juntando e formando aquela parede falsa, não tem epitélio. Essa imagem é clássica. Ele come e se sente cheio porque o pseudocisto está comprimindo o estômago. Estômago todo rechaçado/rebatido lá em cima no primeiro slide. O 2° é de uma criança com abdome traumático (bateu no guidom da bicicleta), com pseudocisto enorme. A pancreatite traumática é a causa mais comum de pancreatite em criança. Tratamento: Apenas quem é sintomático. Não é punção externa, é drenar ele para uma alça de intestino, mas geralmente faz para o estômago. Abre o estômago e faz uma comunicação do cisto com o estômago e deixa lá e vai ficar saindo secreção do cisto para o estômago e sai nas fezes. Gastrocistostomia ou jejunocistostomia. Pode fazer até com Stent.Esse paciente está sofrendo, teve pancreatite, tirou a vesícula, mas bebe muito. Principal causa de pancreatite crônica é álcool (não é biliar). Afeta tanto pâncreas endócrino (paciente fica diabético e tem que tomar insulina) e exócrino. Não digere gordura então tem esteatorreia (não tem lipase para digerir), tem que tomar a enzima em comprimido. E o pâncreas fica doendo. Tríade da pancreatite crônica: dor + esteatorreia + Diabetes mellitus. No exame de imagem, vê pâncreas destruído/calcificado. Em cima é pancreatite aguda. Embaixo é pancreatite crônica, em que o pâncreas está cheio de calcificações, ducto pancreático dilatado. São 3 coisas que tem que tratar. Tratamento da esteatorreia: enzima pancreática. DM: Insulina. Dor: normalmente usa Stent, se não resolver faz a cirurgia de Puestow. Abre o ducto pancreático, tira as calcificações do ducto e faz uma anastomose do intestino com o ducto, e o pouco de suco pancreático vai cair na alça intestinal e não vai ter dor (porque a dor é o espasmo do pâncreas tentando eliminar o suco pancreático). FIM!