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......... ....... ....... . . . . . . . . . . . . . . . . I,Hill.-mo r pupiicuito I out I in llllNNito il.i IhlH V Hull)' I'lVM*
B o x I - I l t d I ) n w n r i ' n ( i m v r , I I , ( J O S I S U S A . l o i I om o n d i r d c o » M O i «*»»»-1 * . h I u n
WlhMlv
I11 ediçAo 2 0 1 0 .. 3 . 0 0 0 exemplares
Co n s e l ho Edi tor ial
Adão Carlos do Nascimento 
Ageu Ci ri lo de Magalhães, Jr.
Cláudio Marra (Presidente) 
Fabiano Almeida de Oliveira 
Francisco Solano Portela Neto 
Heber Carlos de Campos Júnior 
Jôer Corrêa Batista 
Jailto Lima 
Mauro Fernando Meister 
Tarcízio José Freitas de Carvalho 
Valdeci da Silva Santos
Produção Editorial
Tradução 
Valdeci Santos
Revisão 
Silvana Brito 
W ilton Vidal de Lima 
Paulo Pompêo
Editoração
Lidia de Oliveira Dutra 
Capa
Lela Design
Wdl»h, Brian; Middlcton,J. Richard
A vis.m transformadora / Brian Walsh, J . Richard Middleton; traduzido por 
Vaklei-i Santos, _ S ã o Paulo: Cultura Cristã, 2010
192 I6x23cm
I radtição I lie transforming vision 
ISBN 9 7 8 - 8 5 - 7 6 2 2 - 3 0 6 - 1
I. Teologia Bíblica 2. Bíblia I. Título
C D D 230.041
€
6DITORR CULTURR CRISTR
Rua Miguel Teles Junior, 394 - Cambuci 
01540-040 - São Paulo - SP - Brasil 
Fone (11) 3207-7099 - Fax (11) 3209-1255 
www.editoraculturacrista.com.br - cep@cep.org.br
0800-0141963
Superintendente: Haveraldo Ferreira Vargas 
Editor: C láud io A ntônio Batista Marra
http://www.editoraculturacrista.com.br
mailto:cep@cep.org.br
Aos nossos alunos e 
Institu to para Estudos Cristãos
S u m á r i o
im 'M NT/lÇj()..................................................................................................................................9
/*«/1vício..........................................................................................................................................11
PAKTK 1: O que são cosmovisões?
( 'upítulo 1: Cosmovisão e cultura...................................................................................... 15
l 'upítulo 2: Analisando as cosmovisões...........................................................................29
PAU I I ' 2: A cosmovisão bíblica
l ‘upítulo 3: Com base na criação........................................................................................ 39
( 'upítulo 4: Reconhecendo a queda....................................................................................55
l 'upítulo 5: Transformado pela redenção..........................................................................65
l'A UTE 3: A cosmovisão moderna
( ’upítulo 6: O problema do dualismo................................................................................81
l'upítulo 7: O desenvolvimento do dualismo................................................................. 93
l 'upítulo 8: O progresso da cosmovisão secular........................................................... 101
( 'upítulo 9: Os deuses da nossa era .................................................................................113
PAUTE 4: A cosmovisão bíblica em ação
l 'upítulo 10: Uma resposta cristã cultural.....................................................................129
l 'upítulo 11: A cosmovisão e a academia...................................................................... 141
l ’upítulo 12: Rumo a uma estrutura filosófica cristã................................................. 151
N< >TAS.................................................................................................................................................. 161
1 J MA lilBLIO G R A FIA SEM A QUAL NÃO PO D EM O S V IV E R .................................................177
A i m u í s k n t a ç ã o
K m Ir livro foi motivado por um profundo desapontamento e por um desejo 
llltciiNO, ( )s autores, eles próprios cristãos, observam que um grande número de 
ftfllN contemporâneos norte-americanos se considera cristão. Ainda assim o Cris- 
IiiiliÍnih<> é ineficiente para moldar suas vidas públicas. O que modela com eficácia 
iiuNMH vida pública e nossa sociedade em geral é a subserviência com -que tratamos 
•i i kénciu, a tecnologia e o crescimento econômico. Na maior parte do tempo o 
I ‘i lhtiiinisnio fica de lado e, simplesmente, observa. Esse é o desapontamento dos 
tlUtorcN. ( ) desejo intenso deles c que haja mudança - porque o Cristianismo pode 
inrltcr uma inclusão social e cultural. Pois nisso eles veem a vida, o direcionamento 
ti CNpcrança que nossa sociedade tanto precisa.
Walsh e Middleton questionam por que o Cristianismo norte-americano 
pn mimeec tão separado da sociedade. A resposta deles é mais ou menos esta: Se 
íniNi ;ii mos em qualquer sociedade por sua formação básica, descobrimos que ela é 
ltinunda pela cosmovisão daqueles que a compõem. Isso é o que molda sua existência. 
A roMiiovisão de um povo é sua maneira de pensar a respeito da vida e do mundo, 
íHHniT.ula aos valores que estabelecem para si mesmo dentro do contexto daquela 
IflHlIcira de pensar. Os japoneses têm uma cosmovisão que molda sua vida em um 
nmjunto; os índios canadenses dene têm uma cosmovisão, a cultura da maioria, 
mi América do Norte, existe uma, e assim por diante.
ICxiste também uma cosmovisão cristã, que na verdade não está claramente 
Incorporada em alguma sociedade existente, mas está expressa nas Escrituras. Para 
rtdotur o Cristianismo com autenticidade é preciso ser uma pessoa de fé que aceita 
|U|urla cosmovisão bíblica. Walsh e Middleton dão uma declaração renovada do que 
»* t*HHa cosmovisão bíblica. Eles desejam, especialmente, enfatizar que um escrutínio 
preciso dessa cosmovisão deixa clara sua extensão. Essa é uma cosmovisão para 
inolilar a vida como um todo e não apenas alguns ângulos religiosos ou espirituais 
ou sagrados da vida.
Então, por que ela não funciona realmente assim? Por que a cosmovisão cristã 
fâermanece tão excluída da sociedade apesar de tantos nela se considerarem cris- 
Iflos? A resposta que Walsh e M iddleton desenvolvem é que os cristãos, em geral, 
(hlliam cm perceber o alcance radical da cosmovisão bíblica. Eles consideram que 
HGU impacto formativo não alcança além de um ângulo religioso da vida. “Vejam,
f\ v w u | 'hAnmri | lUHrt
cutá iu|ui, mus nflo exÍ8tr"; é corno eles pensam, Klcs ntto percebem o dcHcjo ardente 
(Ir I )cuh pela rxprcssiío cie fé no Kstado ou sociedade caracterizada pelo senso co­
mum polis. Consequentemente, outras cosmovisõcs c outras crenças concorrentes 
modelam sua vida pública. Resumindo, os cristãos são dualistas.
Kntfto este livro é um chamado veemente aos cristãos para ter um só coração 
r uma só mente e reconhecer que Jesus Cristo c Senhor na vida como um todo. 
Leia o como uma análise perturbadora sobre o que impede tal simplicidade de 
coração e mente. Leia-o, também, como uma receita provocativa para vencer os 
obstáculos e recuperar a atitude de servir apenas um Mestre.
Nicholas W olterstorff 
l \ilvin ( ’ollrge
P k k f á c i o
1'IhIc livro originou-se de uns 20 cursos sobre cosmovisão cristã que nós dois
■ imiihiinos cm vários campt universitários na região de Ontário Sul entre 1977 e 
IW t. N osso alvo era auxiliar os estudantes a desenvolver uma cosmovisão cristã 
liilr|ii ml;i, uma cosmovisão que fosse tanto fiel às Escrituras quanto motivadora de 
iiiiin obediência cristã em uma era secular. Este livro tem o mesmo objetivo.
A Marte 1 introduzirá as cosmovisões. O Capítulo 1 discute o que elas são 
V m ino nos afetam. No Capítulo 2 atentamos para formas de avaliá-las: O que 
lii/ iiiiiii cosmovisão específica ser boa? A partir dessa visão geral nos direciona- 
inon para a Parte 2, para uma exposição da cosmovisão cristã. Cada um dos três
i tiplliilos aqui desenvolve um elemento crucial da perspectiva cristã. A Parte 3, 
"A cosmovisão moderna”, apresenta a visão que atualmente guia a sociedade oci- 
ilt nliil. ( ) Capítulo 6 observa sua base dualista, e o Capítulo 7 explica de onde ela 
veio, ( )s Capítulos 8 e 9 analisam a idolatria e a situação profundamentedifícil 
ili nossa era presente.
As Partes 1 a 3 nos preparam para a resposta cristã da Parte 4. Nesses últimos 
»tipii (ilos enfatizamos a natureza comum de nossa resposta cultural. As conclusões, 
òn quais chegamos aqui, particularmente são sustentadas por cristãos eruditos, e 
iiNHÍm, a bibliografia com a qual concordamos é muito mais do que um anexo. E , 
ltu verdade, uma bibliografia sem a qual não podemos viver.
Nossa crença de que as cosmovisões são comuns é indicada pelo fato de que 
rMe livro foi escrito em coautoria. M as a natureza comunitária deste livro é tam­
bém evidenciada por todas as outras pessoas que contribuíram para este projeto. 
Infelizmente, podemos agradecer apenas a poucos neste espaço.
I lendrik Hart, James Olthuis e Al Wolters, professores no Instituto para 
KmIikIos Cristãos, Toronto, tiveram profunda influência sobre nossa maneira de 
pensar. Robert Vandervennen, diretor de serviços educacionais no Instituto para 
Khludos Cristãos, deu suporte e encorajou o projeto desde o início.
A assistência editorial de D on Sedgwick no esboço inicial do manuscrito 
foi inestimável. Susan Bower, Jack Kuhatschek, Jane Wells e Jim Sire leram o 
mtmuscrito inteiro e fizeram comentários úteis. O manuscrito foi digitado por 
Don Knudsen e Kathy Vanderkloet. Gord Carkner e Ruth Irwin deram assis- 
léiuia compilando a bibliografia. E o Instituto para Estudos Cristãos supriu com
gmeroiddade a asniíitêneia linanceira necessária. Somou profundamente devedores 
a todoí (*I(?h, por participarem deste projeto comunitário.
Mas existe um tipo especial de participação comunitária que queremos ilcs-- 
tacar. Wendy Bartley e Mareia Middleton não digitaram manuscritos ou deram 
conselhos editoriais. Elas simplesmente nos amaram. Agradecemos a Yahweh, 
HONRO Senhor, pelo amor e por sua constante fidelidade pactuai por nós.
finalmente, este livro nunca teria sido escrito sem nossos alunos. Suas perguntas, 
ideias e reações entusiásticas à cosmovisão cristã c suas implicações transformadoras 
de vida constituíram um estímulo fundamental em nossos escritos.
I A VI RAI J 1HANRPIJUMAP 'HA
Brian W;ilsh
Rii hard Middleton
Montreal, Natal tie 1983.
P a k t e 1
O Q U E S Ã O C O S M O V IS Õ E S ?
C a p í t u l o i
COSMOVISÃO E CULTURA
Anthony sentou-se e conversou conosco, na cafeteria bem iluminada, por um 
Intimo período. Apesar de entendermos seu problema, parecia impossível para nós 
fllt ant,i'i lo. Não conseguíamos atravessar o abismo perceptível existente entre nós. 
I' ui o I i|x> de abismo que separa dois tipos de vida, duas cosmovisões.
Anthony veio para o Canadá estudar comércio, com a intenção de voltar para 
milti chhii em Singapura e começar a trabalhar em seu ramo de atividades. Ao retornar 
(4(7 ilovcria se casar com uma garota com a qual já se relacionava havia alguns anos. 
Apesar de não estarem oficialmente comprometidos, dentro da estrutura cultural 
ilrlfM, supunha-se que eles se casariam.
M as algo aconteceu. Em seu segundo ano no Canadá, Anthony tornou-se 
i iimUIo por meio do grupo InterVarsity Christian Fellowship à t seu campus. Ele
i resecu como pessoa de maneira nunca antes esperada por ele mesmo. Como, fre­
quentemente, acontece em tais períodos de crescimento, velhos planos começam 
B mudar. Anthony concluiu que não amava mais sua amiga, e começou a esfriar o 
irliu ionamento em suas cartas. Por fim, fez-se necessário voltar para casa e romper
ii relacionamento de modo adequado.
Ao contar sua história, ficamos impressionados com a integridade moral do 
ijlle liiivia feito e da maneira como havia feito. Entretanto, agora que ele havia 
fel ornado, Anthony era um jovem deprimido e enfraquecido. Sua família o havia 
rejeitado por ter terminado o relacionamento com a moça. “Você é pior do que um 
Rulmal", seu pai lhe disse. “Até mesmo animais demonstram gratidão.”
Aos olhos de seus pais e aos olhos dos pais de sua namorada, Anthony havia 
n »metido um pecado imperdoável. Ele havia golpeado as esperanças e expectativas 
i Ir mia família sendo desleal com a mulher a quem ele havia sido prometido. Na cul- 
11ii ii natal de Anthony, a lealdade é um dos mais altos de todos os deveres morais.
Essa história ilustra de forma dolorosa o caráter infiltrador das cosmovisões. 
A família de Anthony viu o que ele havia feito de maneira completamente dife- 
letltc de como nós vimos. O que se destacou para nós foi a integridade de caráter
JO A VIMM I TUANMVt i|UIAln IRA
de Antlumy. Vimos um jovem que se recusou ;i esconder se atTil« dos milmtrcs de 
quilômetros que o separavam de uma situação desagradável. Vimos um jovem que 
cru uherto e sensível na maneira como se relacionava com sua antiga namorada. 
Sc seus pais notaram essas características admiráveis em Anthony, certamente não 
viram sua importância. Viram em primeiro lugar falta de lealdade e de gratidão.
Temos aqui duas maneiras de ver - na verdade, duas cosmovisões. Contudo,
0 que fez a situação mais dolorosa ainda é que as duas cosmovisões estavam em 
guerra dentro do próprio Anthony. Apesar de algumas pessoas alegarem o contrário, 
a conversão a Jesus Cristo não apaga de imediato anos de criação de acordo com 
outra visão religiosa. Anthony sabia que, como cristão, suas ações eram amorosas e 
honestas, mas em seu coração oriental as acusações de seus pais ainda faziam sentido.
' Talvez ele losse, realmente, o vilão que seu pai disse que era.
Knhu batalha de cosmovisões, essa tensão fundamentalmente espiritual in­
comodou e deprimiu Anthony por meses. Como amigos cristãos, o melhor que 
podÍHinoH fa/er cru afirmar o lado cristão daquela batalha. Tentamos elevar sua 
lUitnGrttiimi fUWcgurundo seu valor aos olhos de seu Senhor e de seus irmãos e irmãs
1 I Ihliloh,
Kmc’ livro é sobre cosmovisões. Cosmovisões são mais bem compreendidas 
qiiiiitdo um vemos materializadas, incorporadas em modos reais de vida. Elas não são 
hÍMciiiun de pensamentos, como teologias ou filosofias. Pelo contrário, cosmovisões 
Mfto dHtruturas perceptivas. São formas de se ver. Se quisermos entender o que as 
pewMOiin veem ou a maneira como veem, precisamos prestar atenção à maneira como 
elun uiuliun. Se colidem com certos objetos ou tropeçam neles, então podemos 
Niipoi que elas não os estão vendo. Reciprocamente, seus olhos podem não apenas 
ver, mas lixar se em outros objetos.
Dois exemplos ilustrarão a questão. Antes de tudo, veremos como as práticas 
de criação de filhos no Japão diferem das do Canadá e então analisaremos os pontos 
de vist a a respeito da terra mantida pela cultura norte-americana dominante e pela 
cultura norte-americana dos índios nativos, contrastando-os.
Sobre dar banho em bebês
Em 1959 a antropóloga M argaretM ead ajudou a produzir um filme intitulado: 
As quatro fam ílias} O filme retrata um dia na vida de quatro famílias de quatro 
culturas: índia, França, Japão e Canadá. As famílias são moradoras da zona rural 
e aproximadamente do mesmo nível e classe sociais. O contraste entre a família 
japonesa e a canadense é particularmente intrigante.
O conceito de família japonesa é mais amplo; os avôs paternos moram com a 
família do filho mais velho. O bebê fica a maior parte do tempo nas costas da avó
( \«MOVInA( H ( 11| ('URA 17
um 11 <i».i hiiida i omum n»i-< coinmildudnt oi ientain das grandes cidades nortc- 
.iiiit'ii» iinan. No filme, o conselho »Ihm avô* tcrn autoridade. A sabedoria da avó é 
*"l" I lulmriHr importance nu criliiçílo dos lilhos. Na verdade, Mead observa que 
ri niRp i‘ dominada por sua sogra. Quando chega a hora do banho do bebê, a mãe 
Mim î n o í\ avó, em uma enorme banheira; a avó segura o bebê junto ao seu corpo 
I lava ti I ,imoes flutuam na água para protegê-los do mal.
Nu cilNa existem santuários budistas e xintoístas, diante dos quais os adultos 
iipnpipiitani pequenas cerimônias religiosas, adorando os deuses e ancestrais. As 
1 1 1 ui iça« compartilham pequenos e delicados brinquedos cuidadosamente manufa- 
llli >tdON. Nem o irmão nem a irmã podem reivindicara posse particular de qualquer 
Inliiqucdo. No fim tio filme, perguntou-se a uma pessoa japonesa quais caracte- 
Hfttli um (’i am requeridas das crianças japonesas. Ela respondeu que eles deviam se 
IniiUU dóceis, gentis, obedientes, submissos e dependentes.
A » >ra, olhem para a família canadense. O que nos impressiona de imediato é
I |up un » I ianças, nessa família nuclear, são incentivadas a desenvolver autossuficiência, 
tiiiltu nu fiança e independência. Cada criança tem seus brinquedos e é ensinada a 
tf^pultur os direitos de propriedade dos outros. Quando uma criança (um menino) 
nu il de sua língua durante o jantar, ele é advertido a não ser um “bebê chorão”. Além
• liMii, h cerimônia religiosa de dar graças antes das refeições é desempenhada por 
uniu das crianças.
( ) mais interessante é o banho do bebê. O ritual é executado com grande 
hIU l îu ia. Parece até um evento médico ver o nariz e as orelhas do bebê serem 
rtrduumente investigadas com o uso de cotonetes. Em vez de estar em uma banheira 
ilplnveitando a proximidade de um parente, o bebê está sozinho. Observa-se que 
a míle luta com a criança pela posse da esponja, Mead comenta: “Novamente a 
Piilihr na independência, positividade e o desenvolvimento do poder da vontade”. 
Kijquunto o bebê japonês (como as crianças francesas e indianas) é alimentado com 
lellr materno e colocado para dormir com uma cantiga de ninar, o bebê canadense 
Im desmamado cedo. Na hora de dormir ele recebe sua mamadeira e é colocado no 
hriço. A luz é desligada e a porta fechada. Não tem cantiga de ninar.
E óbvio que nem toda família japonesa nem canadense vive, exatamente, 
rnuio as famílias desse filme. E verdade também que o filme é da época em que os 
pu pé is da família no Japão eram mais tradicionais e o livro Baby and Child Care de 
llcnjamin Spock era a bíblia para muitas famílias jovens do baby-boom/* na Am é-
iii u do Norte. M esmo assim os padrões de vida dessas duas famílias esclarecem a
II uti l reza das diferenças existentes entre as cosmovisões das duas culturas.
Quando olhamos para uma cultura, estamos olhando para as peças de um 
quebra-cabeça. Podemos ver o funcionamento de instituições diferentes, como a 
Iwnília, governo, escolas, instituições de culto (igrejas, templos, sinagogas e assim 
por diante) e empresas. Podemos ver os modos diversos de recreação, diferentes 
Pfiportes, hábitos de comida e de transporte. Cada cultura desenvolve uma vida
•artística c musical que singulur, Todas essas atividades culturais silo pt*v»H de um 
quebra-cabeça.
A questão e: Como montamos o quebra-cabeça? Como as peças se relacio­
nam? Qual é o padrão da cultura? Existe um código que desvenda o padrão? Sim.
O elemento central que interliga as partes do quebra-cabeça tornando-o um todo 
coerente é a cosmovisão que tem o papel principal na vida daquela cultura.
Assim, se quisermos entender realmente por que uma família japonesa é tão 
diferente de uma canadense (ou por que Anthony teve de sofrer tanto na ruptura 
de seu relacionamento) precisamos compreender as distintas cosmovisões que estão 
em vigor. Por que a avó é tão importante na cultura japonesa e em outras culturas 
orientais? Por que ela tem a honra de dar banho no bebê? Por que as crianças têm 
de compartilhar seus delicados e esteticamente ricos brinquedos? Por que as crian­
ças são criadas de maneira a ser dóceis, gentis, submissas e dependentes? Apesar 
de cada uma dessas perguntas ter muitas respostas, entenderemos o modo de vida 
japonês melhor se conhecermos mais a respeito de sua visão da vida.
O povo dominante
A cosmovisão japonesa tradicional foi formada por três tradições religiosas 
antigas: o Xintoísmo, o Confucionismo e o Budismo. Essas religiões não compe­
tem entre si no Japão. Pelo contrário, elas se unem para formar o ponto de vista a 
respeito da vida que é predominante naquela cultura. No livro didático intitulado 
Japan: A Way o fL ife , os autores Arnold DeGraaff, Jean Olthuis e Anne Tuininga 
apresentam este esclarecimento:
As três religiões formais do Japão enfatizam sentimentos de lealdade 
ao grupo e de dever aos superiores. Praticar isso como modo de vida requer 
autocontrole e abnegação. A pessoa tende a negar suas necessidades e 
desejos pessoais e render-se aos interesses do grupo. Essa pessoa adquire 
um senso de importância pessoal por ser um membro leal do grupo. Por­
tanto, ninguém pode agir sem o suporte ou aprovação do grupo.2
O egoísmo é visto como destruidor da harmonia original entre o homem e a 
natureza, o homem e outro homem, e entre o homem e ele próprio. A lealdade ao 
grupo é a única maneira de reaver essa harmonia porque tal lealdade não dá lugar 
ao egoísmo. E o que é o grupo?
O grupo é, em primeira instância, a família. “Trazer desonra sobre o nome 
da família é a pior coisa que uma pessoa pode fazer.”3 A pessoa que pratica tal ato 
demonstra deslealdade e ingratidão aos seus superiores na hierarquia familiar. A 
lealdade e a gratidão estendem-se também aos ancestrais. De acordo com DeGraaff,
I n A VISAI * TR A N IN IH M Al H 'HA
f i l i l m i i i U i i n i n g í i , ti l i un í l i i i <' " K i r m u d u p o i u n i u l i n h a c i f d e s c e n d ê n c i a i n i n 
lt h m| >1 ii i|ii( rt truvfSNn o s s«;i i i Ion. ( ) e n p u i t o d e c a d a a n c e s t r a l a i n d a vive e 6 p a r t e
il.i l l i ini l l i i 1 ( ) c u l t o a o s a n c c H t m i i i o u d e v o ç f t o f i l i a l <’• a p a r t e c e n t r a l p a r a o m o d o 
»I» • I' I I lilpOIlÔH,
N1.1*1 ii família suprema nslo 6 apenas a linha de descendência dc uma família 
|||nimlvti cm particular. I1'. a nação como um todo. Os japoneses têm uma crença 
liiidli IlllHtl dc cjue cies sa<> os descendentes diretos da deusa do sol Amaterasu-Omi- 
flflttli I til dcHcendência os destina a ser o povo supremo tio mundo. Portanto, o 
•il>" lluiil dc lealdade c a nação.
IÍmIuh cnnus facetas são integrantes da visão de vida japonesa. Apesar de não 
«Hi m abnuigentcs, elas nos esclarecem sobre o modo de vida japonês e oriental. A
I ii iftlt, li. i dou avós na família é firmemente estabelecida enquanto a devoção filial tra- 
i||i lniiiil c cNtimulada. 1'] as crianças não terão necessidade de proteger seus próprios 
!i| lni|iit’doN porque serão treinadas a ser humildes e submissas. Por razões religiosas 
»I» «i M i a m gentileza, obediência, docilidade e dependência- porque egoísmo é 
H lilM de toda desarmonia e porque a família nacional chegará à preeminência do 
miiuiln, Ihho só pode ocorrer se as pessoas forem leais.
I'/Nnc sentimento de lealdade religiosa estava na base das atividades japonesas 
Hd NftfUtlda ( Jucrra Mundial. Nenhuma outra nação naquela guerra podia esperar 
Hl jiii lr tIpo dc lealdade abnegada, comum entre as forças militares japonesas. Após a 
> lt li‘i 111| hu mi Ibante em 1945, a honra do Japão ficou em perigo por causa da eventual 
Mimpíjnridade econômica do Japão sobre o mundo ocidental. A industrialização 
Inin guci ra cra uma tentativa religiosa de reconquistar o orgulho nacional.
Entretanto, a forma que tal industrialização tomou tem sido diferente daquela 
i|i( capita li Ht n o ocidental. Graças ao seu modo religioso de ver a vida, o Japão pode 
mmliii com uma força-tarefa dedicada e leal. O espírito empreendedor industrial 
min f' uma batalha individualista entre a administração e a mão de obra, mas um 
i h|(H\'o nacional. Os trabalhadores relacionam-se com a corporação com a lealdade 
i rthU IcrÍBtica de sua vida. O emprego é para a vida toda, não uma conveniência a 
tti i vendida a um arrematador no mercado de empregos.
Kmsc senso fundamental de lealdade e gratidão também é responsável pela 
ili il experimentada por Anthony, pois as cosmovisões do Japão e de Singapura têm 
Ml/e» Nemelhantes. Romper um relacionamento não era meramente uma questão 
(»■KNiial na relação entre um homem e uma mulher; tinha profundas ramificações 
H l||Jlt.KUs.
Jrt que um capítulo posterior tratará da cosmovisãonorte-americana e da 
mi Iduntal em detalhes, podemos ser breves em nossa discussão sobre a família cana- 
t li iim’ aqui. O contraste com a família japonesa é evidente. Os valores incutidos nas
II liuiças canadenses - independência, individualidade e autoconfiança - são quase 
diretamente opostos aos valores japoneses de dependência, lealdade e obediência. 
< ) ílflM não ganha o prazer da amamentação nem uma cantiga de ninar antes de ir
A VIBAl' rRANNM tRMADOUA
para o berço. Está sozinho, segurando nua própria mamadeira; eípera mc dele que 
vá dormir como um adulto, assim que as luzes sito apagadas. E as crianças recebem 
mais liberdade, seja sendo respondonas ou ao disputar a posse de uma esponja.
Por que as crianças canadenses são criadas assim? A herança judaico-cristã, 
com sua ênfase 110 interesse de Deus por nós como pessoas distintas, é uma das 
razões. Os seres humanos têm valor e são importantes aos olhos de Deus. Mas 
existem outras razões também, pois o individualismo da cosmovisão ocidental é 
contrário às noções bíblicas de comunidade, serviço e corpo de Cristo. O Ocidente 
enfatiza o indivíduo porque vê as pessoas como autônomas. O Renascimento defen­
dia o homem que se faz pelo esforço próprio. O espírito pioneiro norte-americano 
promove a pessoa que vence por si mesma, que é agressiva e autoconfiante.
A vida contemporânea norte-americana requer que as pessoas tenham essas 
qualidades. A vida de negócios, por exemplo, não é vida de lealdade a uma com­
panhia, destinada a realçar a honra nacional. Os norte-americanos participam de 
corporações sem nenhuma obrigação nacional - elas são, na verdade, corporações 
multinacionais. O propósito do trabalho é criar segurança econômica e afluência 
material, em primeiro lugar para indivíduos e famílias nucleares. Se outra corpo­
ração oferecer mais dinheiro e melhores benefícios, o assalariado desconsidera a 
lealdade e a gratidão para aceitar o novo trabalho.
Uma sociedade assim precisa de indivíduos agressivos, não de membros leais 
de grupos. Sem a força da lealdade filial, os avôs, em tal sociedade individualista, 
normalmente, vivem separados de suas crianças. Quando não podem mais cuidar 
de si mesmos, os mais idosos são colocados em instituições para serem cuidados 
por profissionais. Em uma sociedade assim, os mais idosos tornam-se inúteis e são, 
consequentemente, descartados. Não sendo economicamente mais produtivos, eles 
são, presumivelmente, velhos demais para oferecer um conselho significativo às 
suas crianças no mundo moderno. Não é de se admirar que as crianças japonesas 
e canadenses tenham relacionamentos tão diferentes com seus avôs.
O contraste entre o modo tradicional de vida japonês e o canadense oferece 
evidência para duas cosmovisões distintas. Uma tem suas raízes nas crenças budista, 
xintoísta e confucionista a respeito do grupo, dos ancestrais, da deusa do sol, da 
lealdade e da gratidão, ao passo que a outra está fundamentada em uma mistura 
de crenças cristãs e humanistas a respeito do indivíduo, autonomia e progresso 
econômico. Essas perspectivas da vida conduzem seus respectivos adeptos a modos 
de vida radicalmente diferentes.
E essas diferenças de cosmovisões podem ser identificadas em acontecimentos 
tão corriqueiros como na maneira de dar banho em um bebê. Para os ocidentais 
pode parecer uma estranha superstição colocar limões na banheira para proteger a 
família do mal, mas podemos questionar se a aura da higiene científica e médica 
que cerca nossa maneira de dar banho em bebês não é também religiosa e talvez 
até supersticiosa.
Um pluralismo de cosmovisões
( )tj modos de vida das lamilias japonesas c canadenses ilustram a diferença na 
himiiioviuUo dc duas culturas gcogrrtlicn e politicamente distintas. Mas nem todos 
uh HiiMTiliroR de cada uma dessas sociedades aceitam a cosmovisão dominante e a 
Imiiui dc vida habitual de suas respectivas culturas. Cosmovisões minoritárias e 
t miiiuiiuIihIch alternativas sempre estão presentes cm qualquer sociedade. D e fato, 
>i ic.ieju crifltü antiga era exatamente como uma comunidade alternativa durante 
i I ia Uommia.
( guindo a sociedade manifesta uma pluralidade de cosmovisões, aparecem 
| •Mil tlrmas. Se não existe uma visão dominante, aquela sociedade se torna uma casa 
diviilidu coi itra si mesma e, inevitavelmente, experimentará uma desintegração 
mliiihil. Mas quando há uma posição majoritária, quando uma cosmovisão do- 
Hlllni u h outras, a cultura deve lidar com as minorias de algum jeito. Essa questão
# üijçnilieante no âmbito ético e político. Como a sociedade principal, com sua 
'li »lirm,Uo à forma de vida culturalmente dominante, relaciona-se com os grupos 
iiiinoi Hat io s inclusos nela própria?
( )n cristãos do primeiro século d.C. descobriram como a cultura dominante 
llililHtt com sua comunidade alternativa quando Nero ordenou sua perseguição. A 
i » «mi i m ivisil< > fascista de Hitler levou à tentativa da eliminação do povo judeu. Exem - 
|i|tiN de culturas dominantes esmagando seus grupos minoritários são abundantes, 
hoje, nos regimes totalitários de esquerda e de direita.
A .,. icstão do pluralismo tem sido um problema central também para nações 
i uloiihus, só que a situação é oposta. No caso do colonialismo a questão não é como 
d maioria lida com a minoria, mas como uma minoria colonial poderosa lida com 
il iimloi ia nativa a qual ela colonizou. O colonialismo cria a estranha situação em 
ijiii a nova cosmovisão do poder colonial é forçada sobre a população majoritária
■ la t olniiia. Vemos um exemplo extremo disso na política racista do apartheid [se- 
que ocorreu na África do Sul.
Entretanto, a África do Sul não é o único país no mundo que tem um pro- 
nativo. O Canadá e os Estados Unidos também o têm. Ambas as nações 
Mitu coloniais no sentido dc que são habitadas e governadas por pessoas de herança 
jiliiit ipulmente europeia (isto é, estrangeiros). M as havia pessoas aqui antes dos 
MHiopeus chegarem, e essas pessoas ainda estão aqui hoje. Os povos nativos da 
América do Norte tinham uma cosmovisão e um modo de vida antes da chegada 
ijiiR colonizadores brancos, e aquela cosmovisão contrasta com a forma de vida 
(Hiropeia de maneira tão veemente quanto o faz a cosmovisão japonesa. Desde os 
|u imdrdios da conquista europeia da América do Norte tem havido pluralismo de 
I iieniovisoes e, consequentemente, problemas de cosmovisão.
Como os poderes coloniais tentaram lidar com aquele pluralismo? Eles 
iMilnram absorver a população nativa na mistura cultural ocidental. Se os povos
( 'ONMOVHMO |i i l l l II III A 21
I í . A V In A O I H A I J '4 'i Hl Kl A l M tllA
n a t i v o s n i lo t|uist*SHrin »ei* a b s o r v i d o s p e l a c u l t u r a b r a n c a ( c an a l i t l l t lc H d o s
brancos faziam cjut* essa assimilnvfio fosse (piusc impossível), enfflo eles recebiam 
duas opções: morte em batalha ou o isolamento nas reservas onde o modo de 
vida deles não podia ter continuação. A segunda opção equivalia à destruição 
cultural (alguns diriam genocídio) tanto quanto a primeira, mas o processo era 
mais vagaroso.
Sir John A. Macdonald, primeiro-ministro do Canadá, deixou claro que a 
cultura europeia dominante não deixaria espaço político, cultural ou econômico para 
os povos nativos do continente: “Os índios e mestiços do noroeste serão mantidos 
sob mão forte até que o oeste seja conquistado e controlado pelos colonizadores 
brancos.”5 Os filmes hollywoodianos sobre a conquista do oeste nos mostram que
o programa de ação interno americano era o mesmo que o do Canadá.
A insistência na absorção era uma rejeição total ao pluralismo cultural. T h o ­
mas Berger, comissário de uma recente investigação do governo canadense sobre 
as propostas de se construir um oleoduto ao longo do vale Mackenzie no Território 
Noroeste do Canadá, fez esta observação: “Era para ser missão do homem branco 
não apenas subjugar a terra e cultivá-la, mas também domesticar o povo nativo 
confinando-ono âmbito da civilização.”6 E óbvio que existem várias suposições 
aqui: (1) nativos são selvagens que necessitam ser domesticados; (2) a cultura nativa 
não é uma civilização; (3) costumes nativos são inferiores aos dos colonizadores 
europeus e têm de ser rejeitados.
A suposta inferioridade da forma nativa de vida levou muitos missionários 
cristãos a trazer tanto o evangelho de Jesus Cristo quanto a civilização da Europa 
para os povos nativos. No Canadá, por exemplo, a igreja controlou a educação na­
tiva. Ela via a educação como o meio mais eficaz de livrar os índios de sua forma de 
vida tradicional e começar a incorporá-los à cultura branca dominante. Não é de se 
admirar que tantos nativos hoje (e povos em geral em todo o mundo que tiveram 
contato com missionários cristãos), simplesmente, equiparam o Cristianismo à 
cultura ocidental. E eles rejeitam ambos de maneira categórica.
A maior parte das crianças índias, nos Territórios Noroeste, vivia em interna­
tos onde recebiam sua educação. Em 1893 Mr. Hayter Reed, superintendente das 
questões indígenas, deixou claro o objetivo deles: “Nos internatos e nas escolas de 
aprendizagem industrial os alunos são retirados da liderança desta vida não civi­
lizada por um longo período e recebem atenção e cuidados constantes.”' Tirando 
;is crianças de seus pais, vestindo-as com as roupas comuns aos brancos do sul e 
extinguindo o uso das línguas nativas e observâncias religiosas nativas, os brancos 
esperavam que essas crianças rejeitassem sua cosmovisão tradicional e seu modo 
île vida e se convertessem à civilização branca.
Apesar de esse programa assimilativo ter conseguido criar crianças com baixa 
autoestima (elas foram ensinadas a envergonhar-se de sua herança cultural nativa), e 
apesar de produzir jovens que perderam sua agilidade tradicional para caçar, pescar
COílMOVHAO H i ilt lUUA 2 Í
• l'* «i .iriiiiulilliuM, cif nflo |muhi iu prNNQttN morenas integradas í\ cultura branca, 
t t pnvo nativo perdeu sim linguagem, icligiflo c* modo de vida, mas não conseguiu 
•idiiiiii ii coumovisílo branca.
PifHON entre duas cultura«, cIch tornaram-se um povo desiludido e enfraque- 
i idn, nflo muito diferente do jovem Anthony. Sem raízes e espiritualmente desam- 
purtuloH, muitos passaram a ser dependentes da Previdência Social. O estereótipo 
dn índio preguiçoso e bêbado tem suas origens nessa crise de cosmovisão. Por 
liMiihi, h única mercadoria que recebe subsídio governamental nos Territórios do 
NtmieNte do Canadá, deixando seu preço tão baixo como o do sul, são as bebidas 
itli tiúlii as.H Ao passo que comida e roupas são caras, álcool é relativamente barato. 
I ditfcil entender o raciocínio do governo canadense.
Observando a terra
Nos últimos 15 anos os povos nativos da América do Norte têm começado a 
tii/er algo a respeito de sua situação. Para a renovação ou mesmo a sobrevivência 
di' Miiíi cultura, é necessário um retorno à sua cosmovisão tradicional e seu modo de 
vldti. A espiritualidade nativa tem tido um ressurgimento marcante. Os indígenas 
fim dito que a única maneira de recuperar o controle sobre sua vida e libertá-los 
dii dependência da Previdência Social e das bebidas alcoólicas é o retomo aos seus 
\ iilores tradicionais.
Um conceito fundamental para esses valores é a percepção nativa sobre a 
iPl ia. Entretanto, sua opinião sobre a terra leva-os imediatamente a um conflito 
p&piritual, legal e político com a sociedade dominante do Canadá.Thom as Berger 
Identifica o problema com muita precisão. O conflito é entre aqueles que veem a 
Iri i u como uma fronteira (os europeus) e aqueles que a veem como sua terra natal 
(fiN denes e os inuítes). Berger escreve:
Consideramos o Norte como uma fronteira. Para nós é natural pen­
sar em desenvolvê-lo, em subdividir a terra extraindo dela recursos para 
alimentar a indústria canadense e aquecer nossos lares. Nossa inteira 
inclinação é pensar na expansão de nossa máquina industrial até o limite 
da fronteira de nosso país... Mas o povo nativo diz que o Norte é a terra 
natal deles. Eles moram lá há milhares de anos. Eles reivindicam que a 
terra pertence a eles e creem que têm o direito de dizer o futuro dela.9
Nossa sociedade colonial branca nunca permitiu que o povo nativo mantivesse 
« mi modo de vida livremente. Mas o problema torna-se crítico quando a forma de 
vida dos indígenas obstrui o caminho do nosso modo de viver. Isso ocorre de modo 
muis notório quando precisamos usar as terras indígenas para nossos propósitos
/.*] / \ V IHAI' I HANSI'1 UiMALH WA
industriais. Em questão pode estar uma barragem, um desumi umrnín ou u explorarão 
e transporte de óleo e gás natural.10
Apesar de tal conflito, de maneira inevitável, levar ao debate sobre a questão 
legal de reivindicações de terras nativas, o problema não e, originalmente, legal 
ou político. Em um nível mais básico o problema é de contraste de cosmovisões. 
Certa vez o economista E . F. Schumacher disse: “Observe como uma sociedade 
usa suas terras, e você pode chegar a conclusões bastante confiáveis a respeito do 
que será seu futuro.”11 Poderíamos também dizer que o futuro de uma sociedade 
é dependente de sua visão, e sua visão pode ser averiguada a partir da observação 
de como ela usa suas terras.
Por que os euros-canadenses veem o norte como uma fronteira enquanto os 
povos denes e inuítes o veem como terra natal? Não é bastante dizer que é fronteira 
para nós porque somos relativamente novos na América do Norte, enquanto os 
nativos a veem como terra natal por estarem aqui há muito mais tempo. Sem dúvida 
essas realidades históricas são relevantes, mas não é só isso.
A cultura ocidental, caracteristicamente, vê a humanidade em uma relação de 
disputa com a natureza. Schumacher diz: “O homem moderno não se sente parte da 
natureza, mas uma força externa destinada a dominá-la e conquistá-la.”12 A natureza 
é uma ameaça. E selvagem e irracional. Portanto, deve ser domesticada, subjugada 
e submetida ao controle racional dos seres humanos. Além do mais: “A natureza 
é a esfera de ação da autorrealização do homem.”13 Isto é, em nossa manipulação 
e exploração da natureza construímos nossa sociedade, que é nossa autoafirmação. 
Aqui a exploração é um elemento-chave. A natureza existe para ser explorada pelos 
homens; à parte disso, tem pouco valor.
Um comercial de televisão da empresa Óleo Imperial (Exxon) ilustra o 
caráter antagônico e explorador de nossa relação com a natureza. Homens estão 
trabalhando em uma perfuratriz petrolífera no M ar de Beaufort. O anunciante 
nos transmite a ideia de como as condições deste M ar Ártico são desfavoráveis 
aos seres humanos. Explorar os vastos campos petrolíferos sob o fundo do oceano 
é uma tarefa difícil e perigosa. As perfuratrizes contorcem-se visivelmente contra 
os ventos tempestuosos do Ártico. Barcaças de suprimentos, que parecem pedaços 
de cortiça balançando no mar revolto, gastam horas tediosas tentando aproximar- 
se da plataforma gelada. Tudo está envolto em gelo. Mas a tecnologia da empresa 
Oleo Imperial conquistará esse oceano e trará petróleo para o sul do Canadá para 
assegurar que não congelemos no escuro deste inverno.
A natureza é vista aqui como o adversário constante. Tiramos da natureza os 
recursos que consumimos para nos isolar da natureza, por meio do nosso trabalho 
e da tecnologia. O comercial transmite a confiança de que o ser humano pode con­
quistar e explorar a natureza. E óbvio que não é mencionado que um vazamento 
de petróleo seria impossível de se limpar sob essas condições e resultaria em danos 
ecológicos incalculáveis.
[ ( ViHMovisAt'i i wi muA 2*»I M ponto de viwlii ocidental iHi tvi iiiMOH podem ser possuídos e também explo- 
íiíiIm I leii podem tifto apenas mbi poNHiiídoí, mas também comprados c vendidos. 
r\ li iiii * * um artigo dc merendo assim como comida e vestuário. Isso pode não 
itiiii ím pressionar como sendo algo muito estranho, mas vale a pena observar que 
■I lili iii de vender terra é relativamentenova até mesmo na cultura ocidental. O 
i j|)iiin!o Kobei i I leill ■»roner mostrou que: “Até o século 14 ou 15 não havia terra, 
| h - I i i m o n O N no moderno sentido de propriedade vendável, produtora de renda.”14 
A li*",II*> de propriedade privada que pode ser comprada livremente, explorada, 
I' ’I livolvida, subdividida e vendida é fundamental para a economia contemporânea 
.I> m m tul<> dos países capitalistas. Isso não é apenas um conceito econômico. E 
lllii mnilo fundamental de ver a terra.
( povos nativos veem a terra de maneira muito diferente da nossa. Vamos 
tUliiliNtu primeiro a forma como eles nos entendem e ao nosso ponto de vista. O 
i In lií Snillil da tribo suwamish escreveu estas palavras ao presidente dos Estados 
í l|lld<)N em 1855:
Sabemos que o homem branco não compreende nossos caminhos.
Pura ele uma porção de terra é a mesma que a próxima, pois ele é um 
entranho que vem à noite e toma da terra o que ele precisa.
A (erra não é sua irmã, mas sua inimiga, e quando já a conquistou, muda- 
we... Seu apetite devorará a terra e deixará atrás apenas um deserto.1;>
( h | »ovos nativos em toda a América do Norte consideram-se inseparáveis 
iM twru, A terra é algo que Deus deu a eles; eles devem usá-la e devem ser seus 
tl»linlnÍHtradores. A terra é uma amiga. Não deve ser destruída, mas transferida para 
rtt iiK lillios e netos. A terra é segurança. Enquanto estiver lá eles não temem ficar 
himu nllmento c abrigo. Além disso, a terra é a fonte de identidade e de autorrespeito. 
I lii« iii ieditam que se a terra for destruída ou se eles se separarem dela, morrerão. 
I <4it i* a razão pela qual, muitos deles, veem a expansão industrial em direção a 
ftllHN propriedades como uma maneira de genocídio cultural.
Veja. nos como o povo dene descreve seu relacionamento com a terra:
Ser indígena significa ser capaz de compreender e viver com este mun- 
ilu de forma muito especial. Significa viver com a terra, com os animais, 
com os pássaros e peixes, como se fossem nossos irmãos e irmãs. Significa 
dizer que a terra é uma velha amiga e uma velha amiga que nosso pai 
conheceu, nosso avô conheceu e de fato seu povo sempre conheceu... Para
o povo indígena nossa terra é realmente nossa vida. Sem nossa terra não 
podemos - não poderíamos existir mais como povo. Se nossa terra for 
destruída, nós também o seremos. Se seu povo algum dia tomar nossa 
terra, estará tomando nossa vida. [Richard Nervsoo]
•26 A VllAt I l RANÍI1 )RM VI>< IRA
A cerra é nosso sangue. Nascemos e fomos t rindo* 110I11 Vivemos e
sobrevivemos dela. | joe Hctsidea]
Para nós é exatamente como uma mãe que criou seus filhos. K assim 
que nos sentimos com respeito a este país. E exatamente como uma 
mãe. Essa é a seriedade com que pensamos a respeito tia terra por aqui. 
[Isodore Kochon]16
Em razão da cosmovisão dene vincular uma relação íntima e religiosa para com 
a terra, a noção de vendê-la é estranha para eles. Você não vende sua mãe, vende? 
Além disso, a propriedade é pública, não individual e particular. Um filho poderia 
fazer uma reivindicação especial de possuir sua mãe e também sua irmã? Claro 
que não. Os povos dene e inuíte compartilham suas posses materiais e chegam a 
decisões com base em consenso comum, não pela maioria democrática.
Esses pontos de vista contrários a respeito da terra levam a abordagens 
contrastantes sobre seu desenvolvimento. Os povos nativos não são contra o 
desenvolvimento em si. Eles, simplesmente, têm uma abordagem diferente. Os 
próprios denes identificam as duas propostas opostas: uma eles chamam filosofia 
colonial de desenvolvimento, a outra filosofia comunitária. A abordagem colonial 
vê o norte como o celeiro de recursos para os centros industriais do sul. Os denes 
explicam as consequências: “O petróleo, o gás e os minerais mudam-se para o sul, 
para esses centros. Os lucros que eles geram também se mudam para o sul com 
eles. O norte torna-se uma região distante dependente do sul; perde seus recursos 
e ganha a Previdência Social em troca.”17 O desenvolvimento colonial, dizem os 
denes, teria um impacto terrível sobre a cultura do norte. Sugaria seus recursos até 
que se secassem, destruiria o meio ambiente e aniquilaria o modo local de vida.
Existe alguma alternativa? Os denes dizem que sim. Propõem uma abordagem 
comunitária de desenvolvimento pela qual pode ser concedida a eles a propriedade 
legal das terras, para as quais possuem a reivindicação aborígine. Eles teriam posse 
comum delas e as desenvolveriam com base no senso comum. “Somente a proprie­
dade comunitária da terra, terra que pertence ao nosso povo por milhares de anos, 
pode nos dar a habilidade de determinar e seguir nosso próprio caminho.”18
Os denes empenham-se em desenvolver a terra como administradores e não 
mestres; como gratos recipientes da bênção divina e não como gananciosos caça­
dores de lucros. Eles disseram que permitiriam até mesmo que um oleoduto fosse 
construído, com todo o risco que tal projeto traz para o modo de vida deles, se 
fossem convencidos de que o óleo iria ajudar os pobres do Terceiro Mundo. C on­
tudo, eles não aceitarão tal risco, se for apenas para alimentar a máquina industrial 
do Canadá ou dos Estados Unidos.19
Temos aqui dois modos de vida, duas visões da terra, duas abordagens para o 
desenvolvimento, uma cultura dentro de outra. Se essas duas cosmovisões podem 
coexistir dentro de uma sociedade será conhecido com o tempo.
I .'i wMoVlNAi H i'H I lU IW n
litnhoi ,i nejn íiVil íular de cumihivimOcm em termos abstratos, tentamos mostrar 
i|m* • hm míIo mais que sistemas redutívelm \\ denci içftõ tcórica. Cosmovisõcs têm poder 
MiIlUi ill e espiritualmente íormativo nn vida de indivíduos que dão banho em bebês 
i iiiitlam sobre a terra. I Ima descrição meramente teórica não pode transmitir seu 
k tiiiUPr direcionadot de vida. Mas, após ter dito tudo isso, queremos agora olhar 
Imi ;t ti explicação teórica das cosmovisócs, sem reduzi-las a meras abstrações.
C a p í t u l o 2
A n a l i s a n d o a s c o s m o v i s õ e s
( )n Ncres humanos são criaturas de visão. Isso não significa, simplesmente, 
>|iii icniiiH olhos. Animais têm olhos. Antes, significa que somos criaturas que 
» |h ui ti vida em termos de perspectivas, da visão que temos da vida. Os animais 
liilll |im isum de tal perspectiva, pois são guiados por instintos. Os homens fazem 
Mi ulli.lN dc vida e as realizam considerando a maneira como veem as coisas.
I '< msidcre a noção bíblica de modo de vida. As Escrituras nos dizem para andar 
l<» |m 1'jpírito e não pela carne (G 15.25). Paulo não quer dizer que deveríamos deixar 
IIhum ih corpos de lado, tentando ser, de algum modo, espíritos desencarnados. Não, 
ISlilU) CHtii dizendo que a orientação de nossa caminhada de vida, nossa direção, 
di vp N(?r de obediência a Deus e não desobediência.1 Devemos focalizar nossos 
iilljtlN c nossa visão em uma direção e não na outra. Isso vai diretamente ao âmago 
dii iliirHlao do que e uma cosmovisão.
i oêmovisão, cosmovisão: todos têm uma cosmovisão.
Uma cosmovisão nunca é meramente uma visão da vida. E sempre uma 
VUflO, (umbém, para a vida.2 D e fato, uma visão da vida ou cosmovisão, que não
i tiudtiza, necessariamente, uma pessoa ou um povo em uma forma distinta de vida 
nitii é cosmovisão. Nossa cosmovisão determina nossos valores. Ela nos auxilia a 
luii‘1 protar o mundo ao nosso redor. Ela separa o que é importante do que não é; 
li ime 6 mais valioso do que é menos.
I Ima cosmovisão, então, proporciona um modelo de mundo que direciona 
HPilH adeptos no mundo. Ela estipula como o mundo deve ser, e assim nos adverte 
■i rlupcito do modo como seus partidários devem se conduzir no mundo. D e certa 
niiiiwira, cada cosmovisão vem acompanhada de uma escatologia, uma visão do 
IllHiro que guia e direciona a vida. Os contrastes entre as visões diretrizes dos
•v» n Yiünv • i iinrwn »nivmi " nvi
japoneses, com respeito à honra nacional, a visito i oIoijIuIJnIu tio norte canadense,como uma fronteira e a filosofia comunitária dos dcncN de desenvolvimento í I un 
tram esse ponto de vista. Vemos neles três culturas, três cosmovisfles, três direçOffl 
de vida e três expectativas.
Contudo, é importante notar que as cosmovisões (assim como as cultural) 
nunca pertencem a apenas um indivíduo. Cosmovisões sempre são compartilhada«}1 
elas são comunitárias. Na verdade, a existência de uma comunidade verdadeira (* 
possível somente quando pessoas estão ligadas por uma forma comum de vida 
fundamentada em uma visão compartilhada de vida. Como vimos em nosso olhai' 
rápido sobre o Japão, o Canadá e os denes, quando uma sociedade inteira está 
dominada por uma cosmovisão em particular, surge um padrão cultural. Arnold 
D eG raaff observa que: “Atividades políticas, legais, econômicas, casamento, família 
e criação de filhos são práticas que expressam o modo de vida conduzido de modo 
confessional. Assim, cada cultura apresenta urn padrão coerente, significativo que 
encontra sua unidade na visão dominante de vida.”3
Todos os diferentes aspectos de uma cultura, seja sua vida artística, estrutural 
econômicas ou práticas de criação de filhos, surgem de sua cosmovisão e são dire­
cionados por ela (veja a Figura 1). Isso é o que faz esses aspectos diferentes de uma 
cultura permanecer unidos. Como educamos nossos filhos, que tipo de cuidado 
de saúde recebemos e como fazemos negócios, são partes de um todo exatamente 
porque são guiados pelo mesmo espírito. Se não são, então experimentamos um 
tipo de esquizofrenia espiritual, na qual uma parte da vida é liderada por um prin­
cípio e outra parte por um princípio diferente. Tal condição não pode continuar 
indefinidamente sem causar problemas.
Entretanto, a vida cultural não está apenas baseada na cosmovisão dominan­
te; ela também orienta a vida em termos daquela cosmovisão. Essa é a razão pela 
qual as setas no diagrama apontam em ambas as direções. Se determinada visão 
cultural da vida leva a certa maneira de criar filhos, certas práticas educacionais 
e econômicas, então aquelas práticas educarão as crianças para viver em termos 
daquela visão.
Mundos a parte
Cosmovisões são intensamente espirituais. Elas são um fenômeno religioso. 
Hendrik Hart observa que: “Quando você fala do princípio de um movimento, você 
fala de sua vida, de sua forma de relacionar-se com as coisas ao seu redor, daquilo 
que realmente o faz aquilo que ele é.”4 Falamos da tendência da época quando um 
princípio vital ou cosmovisão tem um papel preponderante em uma cultura durante 
um período significativo.
A N A I IKANI IO AH i i iMM< JVHOB* ' I
ãlytih i I Hnlnçüo mútua entre cosmovisão e cultura.
hpnjtimin W horf, um aluno de teoria da linguagem, explica que a diferença 
t hIm grupos de diferentes línguas reflete as diferenças em suas cosmovisões. Ele 
"A estrutura da linguagem que uma pessoa utiliza comumente influencia 
ft liitiiii-ii ii pela qual ela compreende seu ambiente. A imagem do universo muda 
In lliiht língua para a outra.”5
ApcHtir cie não desejarmos alegar que cada língua reflete uma cosmovisão 
Ml lililVH e uniforme, no entanto nossa linguagem realmente afeta nossa maneira 
i|t vis| Por exemplo, não existe palavra para deserto em dene. Não é de se surpre- 
rHtU'1 imiIiío que a cosmovisão dene não tenha deserto, pelo contrário, veja toda
ii 11 hm como uma mãe e como amiga. Uma linguagem diferente significa uma 
diferente do mundo. M as o oposto, sem dúvida, também é verdadeiro. 
NhINíI linguagem é moldada por nossa cosmovisão. As duas confirmam-se reci- 
Mjiii tmirnte.
Jumes Sire falou das cosmovisões como universos dentro dos quais as pessoas 
VlM iu/' I )e fato, constantemente sentimos que estamos mundos à parte de outras 
pi'MHHN, 011 que alguém parece viver em um mundo diferente do nosso. E muitas 
HIeín IfiHO é exatamente o que acontece. A cosmovisão de outra pessoa é como um
mundo OU universo diferente, c seus elementos coiimI Í Iu I Ivoi, mio i nniii um roupa 
daquele mundo.
Essa é a razão pela qual, muitas vezes, é tão difícil puni pessoas cie visõc* ‘l<’ 
vida diferentes a comunicação e a compreensão mútuas. Elas realmente estão em 
mundos diferentes e não podem penetrar o universo do outro.Talvez isso explique o 
fracasso do homem branco na educação das crianças nativas. As crianças não sabem
o que o professor está falando porque estão em um universo discursivo diferente. I
A base de uma cosmovisão
Assim, a linguagem reflete a cosmovisão e a cosmovisão dá forma à lingua 
gem. Onde é que esse ciclo começa então? O que vem primeiro, determinando 
tanto a cosmovisão quanto sua formulação verbal? Gostaríamos de sugerir que 
as cosmovisões são fundadas em compromissos fundamentais de fé.
Fé é uma parte essencial da vida humana. Os homens são criaturas confet)-1 
sionais, crédulos e confiantes. Nosso objeto de fé determina a cosmovisão que I 
adotaremos/ Em outras palavras, nosso compromisso fundamental de fé determina 
os contornos de nossa cosmovisão. Ela molda nossa visão para um modo de vida, 
As pessoas que duvidam de sua cosmovisão são inquietas e sentem que não têm 
uma base para se apoiar. Elas estão sempre na iminência de uma crise psicológica, 
Mas essa crise emocional é fundamentalmente religiosa, pois nossa cosmovisão 
repousa em um compromisso de fé.
O que é um compromisso de fé? E a maneira como respondemos quatro 1 
perguntas básicas que afrontam a todos:8 (1) Ouem sou eu? Ou, qual é a natureza, ! 
a tarefa e o propósito dos seres humanos? (2) Onde estou? Ou, qual é a natureza 
do mundo e do universo onde vivo? (3) O que está errado? Ou, qual é o problema 
básico ou o obstáculo que me impede de atingir a satisfação? Em outras palavras, 1 
como eu entendo o mal? E , (4) qual é a solução? Ou, como é possível vencer esse I 
impedimento à minha realização? Em outras palavras, como encontro salvação?
Quando tivermos respondido essas perguntas, ou seja, quando nossa fé estiver j 
estabelecida, então começaremos a ver a realidade em alguns padrões perceptíveis. ; 
De nossa fé procede a cosmovisão sem a qual a vida humana, simplesmente, não 
pode continuar.
A vida de toda pessoa pressupõe respostas a essas perguntas elementares de fé, 
mas tais respostas raramente são consideradas de modo consciente. Apesar de elas 
poderem ser trazidas à consciência e feitas cognitivamente explícitas, essas perguntas j 
e respostas não são teóricas por natureza. Em outras palavras, fundamentamos todo
o nosso pensamento teórico nas respostas pré-teóricas que atribuímos às quatro ! 
perguntas fundamentais.9 (O Capítulo 11 explicará melhor essa ideia.) Seria um
ANA! IMANIM ' Aí' I OMMOVlfti 'I \ H
ml ui ii In uma cosmovisão ooiii itiM nÍMlrimi lilosófko ou teológico. Uma 
lUlnltit i nempie luudamcnial pura tal MÍHtema, mas nunca c esgotada nele.
I mim irinoH agora a coNinovinAo cIoh japoneses, norte-am ericanos c denes, 
liilu nmin crenças assumidas do modo i|ue eles vivem para responder as quatro 
inlitH liiiidamentais: Q uem sou eu? O nde estou? ( ) que está errado? Q ual é 
tu,*»",1 Ttsnha em mente que poucas pessoas de qualquer uma dessas culturas 
!M M i m m RU a cosmovisão dessa maneira, ou até m esm o teriam pensado a res-
♦ i* diumi, M as, podemos sugerir essas visões não imaginadas, que direcionam
4 Vidii, ilenta maneira:
JAPÃO: sou membro da família nacional do Japão, descendente direto 
dii dciina do sol. Vivo na Terra do Sol Nascente em harmonia e unidade 
i uiii o lluxo da natureza. A desarmonia ocorre quando trago desonra para 
liiliilui família ou meu país. M inha tarefa na vida é enaltecer o nòme de 
ililnliii família nacional, porque a verdadeira bênção somente ocorrerá 
lmando o Japão alcançar a superioridade sobre o mundo das nações.
AMERICA d o N o r t e : eu sou eu, um indivíduo, o mestre livre e inde- 
pMidcnlc do meu próprio destino. Estou em um mundo cheio de potencial 
iiiiliiiiil, e minha tarefa é utilizar esse potencial para o bem econôm ico.
ApCMiti de ser atrapalhado nessa tarefapela ignorância da natureza e falta 
d» lemimentas para controlá-la, contudo minha esperança está na boa 
vida do progresso em que a natureza concede sua abundância em prol do 
liriiclli io humano. Somente assim todos encontrarão felicidade em uma 
vida de afluência material, sem necessidades e sem dependência.
I ) I .N 1C: sou um dene, um pele-vermelha, moro aqui, sou um filho da 
IciiH, A terra é minha mãe; ela me dá vida. A terra é um presente que 
MUprilo, que uso com gratidão e com a qual vivo em harmonia. M as o 
limuem branco chegou, roubando minha terra, dispersando meu povo e 
KBparando-nos do Grande Espírito. Nossa salvação como povo está na 
rp|eiçi\o nos costumes do homem branco e no retorno às nossas antigas 
IVttdiçóes. Somente assim a terra será preservada e mantida para nossos 
filhos e netos.
liando uma cosmovisão
t '< uno julgamos uma cosmovisão? Quais critérios podemos usar? Se, por algum 
IliMl Ivi i, for necessário escolher uma cosmovisão, o que nos motivaria a escolher uma 
Mli tltMrtinento de outra? Nossa apresentação de três cosmovisões, inevitavelmente,
ÍPMttpÔN certa reprovação a elas. Apesar de tentar sermos justos, nossa discussão tfMM la íi>u mais os hábitos de vida dos denes e m enos os dos norte-am ericanos.
H A VIsAi t lUAMM' HtMAI'1 'KA
A raz&o desse favoritismo 6 que, apesar de nfto «ermoM ilench, ii comnovififto dele« 
parece mais próxima da nossa, cm alguns aspectos, do i|Uc n vlnfto de vida japoneil 
ou norte-americana.
Essa é a única base para a reprovação? Certamente níio. Mas seria desonewtn 
desconsiderar quanto tendemos a ser atraídos por cosmovisões que coincidem com 
a nossa ou que oferecem critérios que aprofundam nossa própria visão. Entretanto, 
existem outros critérios pelos quais uma cosmovisão deve ser julgada. Mas até mesnn > 
esses critérios são dependentes da cosmovisão. Isso é inevitável.
Realidade. O primeiro critério é, simplesmente, este: a cosmovisão em foco 
efetua o que uma cosmovisão deve realizar? Como visão de vida, elucida toda il 
vida? Ela pode tornar acessível a vida como um todo para aqueles que aderem » 
ela? Ela é verdadeiramente uma visão do mundo? Ou tende apenas a dar acesnn 
para alguns aspectos da vida, ignorando outros? Ela enfatiza de maneira exage­
rada ou idolatra uma coisa em detrimento de outra? Por exemplo, a visão de vidrt 
norte-americana, com sua preocupação com o desenvolvimento, enfatiza demais
o crescimento econômico em detrimento da responsabilidade ecológica? A ênfase ; 
japonesa no grupo e na lealdade resulta em uma desvalorização do indivíduo e dc . 
suas necessidades?
O fato é que a criação de Deus tem coerência. Tudo tem seu lugar legítimo,
E uma cosmovisão que dá prioridade absoluta para o lado econômico da vida ou 
para a participação do indivíduo em um grupo, inevitavelmente, fará injustiça à 
coerência da criação. Essa injustiça se tornará evidente em certos colapsos na vida 
de uma cultura. Por exemplo, uma crise ecológica ou problemas psicológicos podem 1 
indicar um problema fundamental na visão de vida de uma cultura. Eventualmente, 
sofreremos as consequências de uma cosmovisão idólatra.
Uma cosmovisão que não integra e esclarece a criação de Deus como ela , 
realmente é não pode levar a um modo de vida integral.10 Na verdade, a questão ] 
é se a nossa cosmovisão é consistente com a realidade ou não. Se não for, então a 
realidade entrará em disputa contra nossa interpretação errônea, impelindo-nos a 1 
mudar nossa perspectiva e nosso modo de vida.
Uma segunda pergunta a fazer é se nossa perspectiva nos sensibiliza ou nos ' 
torna insensíveis para os assuntos a respeito do amor e da justiça. Na verdade ela 
torna legítimas todas as formas de mal? Nós nos tornamos cegos para o egoísmo I 
e para a injustiça que nossa própria cultura propaga ou ainda podemos vê-los? Se 
tudo em nosso ambiente tende a legitimar nosso modo de vida, nunca o desafiando, 1 
então talvez precisemos de nova receita para nossos óculos de cosmovisão.11
Coerência interna. Uma cosmovisão deve não apenas desvendar a criação para 
nós, mas também ser coerente internamente. Uma cosmovisão não é um conjunto 
de crenças ajuntadas de modo arbitrário; ela deve ser uma visão coerente da vida. 
A questão não é tanto de coerência lógica, mas de unidade de comprometimento. 
Essa visão de vida permanece unida ou é uma casa dividida em si mesma?
ANA! IMA NI II I AH ' I >*Mt 'VI’11 H H
\ 111 (< m i,i dojttpflo, noH ii11iiiioft ;.S .mo«, exibe umn cosmovisão que carece dc 
H$hi iii lutei nu, A coHmovifl&o jiiponcMi culaii/a uma unidíidc com u natureza e a
■ 1 i"i ii l.uli iloH japoncsen sobre todos ou outros povos do mundo. A preocupação 
H jltjttin 1 oin <> orgulho do grupo e lealdade cru a força motriz por trás da indus- 
[| ili ■■•ti. tu ) min guerra do Japão. Mus u iudusti iuli/uçáo trouxe poluição, e a poluição
• » * * » ....... everônciu xintoístu pela natureza. Consequentemente, o Japão enfrenta
de cosmovisão em que um de seus elementos milita contra outro.12
I hiiiquera. A Bíblia sugere uma pergunta concisa pela qual podemos avaliar 
p â • fi.iiiiivÍHUo (I )t 30 .15-20): Essa visão traz vida ou morte, bênção ou maldi- 
' I m nutras palavras, ela desvenda a vida ou a encerra? Em qualquer aspecto, 
iiiiliu tiOHinovisão traga esclarecimento, devemos aprender dela e permitir que 
uoHna cosmovisão. Por exemplo, temos muito que aprender com os japoneses 
■pft* ^iftlldtto e com os denes a respeito da terra.
Implicitamente, sugerimos, aqui, uma distinção de uma boa cosmovisão: 
■ 'ffC i 111 lu re seu próprio estado e limitações. Ela está aberta para aprender de 
MMilii" vlhOes de vida. Isso pode ser uma proposta difícil. As pessoas apegam-se 
ft HiHii Cosmovisão porque acreditam que ela descreverá melhor a realidade do 
jjUt“ tjliuk|uer outra. M as uma cosmovisão não é infalível e, portanto, não deve 
mittiidcrada absoluta. Ousamos não permitir que nossa cosmovisão se tom e 
H 1 I lu deve ser informada, constantemente, pela realidade e, se somos cristãos, 
pHt III>ui compreensão cada vez maior da revelação, a Palavra de Deus.
I*i«< * 11< is t raz de volta à questão do pluralismo, que foi mencionado inicialmente 
wÇmpítulo um. Se uma cosmovisão chega a ser dominante em uma cultura, deve 
Pi^iti pspiiço para outras visões competirem dentro daquela sociedade. Se não for 
iltltil, temos razões para suspeitar de sua viabilidade como cosmovisão. Tal visão, 
fitMlilili 1» em caráter, torna-se assim uma ideologia.13 Devemos reconhecer que 
ĤS«ii visfío de vida sempre é limitada. Ela deve sempre ser aberta à correção e 
P tliiincnto , mesmo por outras cosmovisões.14
í/ifM cosmovisão cristã
I lilvez você esteja imaginando como uma cosmovisão cristã possa ser corrigida. 
Mtiuil i le contas, ela não está fundamentada em nossa fé em Jesus Cristo, que é
111 '«mlnlio, a Verdade e a Vida? Sim, está. M as se fizermos um estudo empírico 
I*mi 1I11 iremos que existem muitas cosmovisões cristãs.15 Infelizmente, como ve- 
I» mo» 110 Capítulo seis, os cristãos, com frequência, defendem uma cosmovisão 
pVprgentc de sua confissão de Cristo.
Aqui temos a questão da coerência interna de nossa cosmovisão. Ela é consis- 
Ih íIp com seu compromisso de fé? Se não, então falta integridade. Com frequência,
A VISA» 1 IKANMh tÚMAI>i >UA
é exatamente essa descoberta (|iie impele muito! criHtflnM ,i iim.u i me dr cosmovisito, 
Um dia descobrimos que nossa cosmovisão não é a dtlM Km l iturftH; vemos que el»i 
não é consistente com nossa confissão dc que Jesus 6 o Senhor. Kntílo precisamou 
ou negar nossa confissão e olhar em outra direção ou começar a rever nossa maneira 
básica de olhar para a vida e de vivê-la.
Para os cristãos, o critério máximo pelo qual julgamos nossa cosmovisão ó 
a Bíblia. Ela é a revelação de Deus a respeito da realidade. Paulo diz a Timóteo 
que as Escrituras têm um propósito; elas são para nos ensinar, reprovar e corrigir, 
e para nos treinar na retidão de maneira que possamos estar equipados para umitvida de boas obras (2Tm 3 .16-17). Se buscamos uma cosmovisão que nos leve \\ 
vida e não à morte, então devemos procurar as Escrituras para instrução. E , como 
nossa cosmovisão é informada, corrigida e moldada pelas Escrituras sob o direcio­
namento do Espírito, receberemos orientação para nosso modo de vida. Os trên 
próximos capítulos investigarão essa cosmovisão bíblica, o caminho para nosstl 
caminhada com Deus.
P a r t e 2
A C O S M O V IS Ã O B Í B L I C A
C a i ’ î t u l o 3
C o m b a s e n a c r i a ç ã o
"No |'i indpio, criou Deus os céus e a terra” (G n 1.1). A Bíblia tem início com 
BÜ ffiiljriiloHn proclamação. Assim, também, inicia a cosmovisão bíblica.
t itmo cristílos, constantemente, concordamos com a doutrina bíblica apenas 
si 1 1mu ti puni fora”. Pensamos que ela é importante talvez para refutar a teoria da 
' nlll|fltl, MUIN, por outro lado, não damos muito valor a ela. Em vez disso, focali- 
IhIiim l 'm to e a mensagem de salvação.
A | ii'Miii disse>, a cosmovisão das Escrituras não tem início com Cristo e a salvação, 
li,*. i ti i it\H ‘'«un I )eus e a criação. O primeiro artigo do Credo dos Apóstolos enfatiza
II jfpltflii ilt1 ( iênesis: “Creio em Deus Pai, Todo-Poderoso, Criador dos céus e da 
IWm I' nqui que o Cristianismo começa. A criação é o ponto de partida bíblico.1 
IlUlubiluvelmente, o foco das Escrituras é Jesus Cristo e a redenção que ele 
A mensagem bíblica é um convite para sair do pecado, indo em direção à 
HHIII Ulttvflo com Deus. Mas o que é pecado? E o que significam palavras como 
ItitfitiïfHt redenção e reconciliação? E impossível dar uma resposta a essas perguntas 
fî tirtn tivermos uma ideia implícita sobre a criação. Pois é a criação que é afetada 
|§|f) iir« mio c pela salvação.
1'iiiu liilar sobre pecado precisamos olhar como as criaturas de Deus o de- 
«n|iííilmu‘iim e como sua boa criação foi distorcida. O que é a salvação senão a 
ij'innriiliiçiio, em termos de trabalho, do amor de Deus por sua criação ao restau- 
14 lil tlil CNcravidão e dos efeitos do pecado? A criação então, apesar de certamente 
H f) icr ii mensagem central das Escrituras, é o alicerce fundamental. D e fato, sem 
Mtiiil compreensão da visão bíblica da criação nosso entendimento a respeito do 
«Ht siilii r ilii redenção, inevitavelmente, será distorcido. Em termos de cosmovisão, 
Mflii |hiilemos responder as perguntas: “O que está errado?” E , “qual é a solução?”, 
íj IMEMlOH que abordemos antes as questões com respeito a quem somos e onde
i -I<iituin. Responder as quatro perguntas sobre cosmovisão nos levará pelos temas 
bllilíi un cia criação, queda e redenção em Cristo. Esses temas constituem o fluxo 
PÍMro e o mecanismo da Bíblia.
40 A VIKAi I I UANHI'1 MMAIN 'KA
Contudo precisamos nos lembrar que cbnom nfto wflo nuTumenle ideias iii 
tcrcssantcvs paru serem discutidas. Uma cosmovisflo Hempre (' muferializadfii /\ 
cosmovisão das Escrituras, que vem com autoridade de I )cus, convoca seu pov» 
ao comprometimento e à ação. Assim como não podemos ser neutros a respeili 
da pessoa de Cristo e da salvação que ele oferece, também não podemos ignohti 
as implicações radicais do ensino bíblico acerca da criação.
Pela palavra, pela sabedoria.
M uito pode ser dito sobre a criação, mas comecemos observando duas imfl 
gens significativas que a Bíblia usa para retratar a divina criação do mundo.2 A 
primeira ocorre em Gênesis 1, 110 qual Deus cria pelo comando da palavra. A 
segunda imagem vem de Provérbios 8. Lá a sabedoria é o artesão por meio do 
qual Deus fez o mundo.
Essas duas imagens, criação pela palavra e criação pela sabedoria, têm in 
trigado os cristãos há muito tempo. Mas que ideia elas transmitem? E como cljjtN 
contribuem para nossa compreensão da cosmovisão bíblica?
Olhe primeiro para a imagem da criação pela palavra. Depois da declaraçjí 
inicial majestosa que proclama a criação de Deus do universo inteiro, a terra 
descrita como sem forma e vazia, como um oceano escuro. E “o Espírito de DeiU 
pairava por sobre as águas” (G n 1.2). A cena é de preparação. Algo grandioso eslil 
prestes a acontecer. Então “Disse Deus: Haja luz; e houve luz” (G n 1.3). EbiI 
imagem, sobre a ordem de Deus e a reação da criação, torna-se o paradigma, 01 
modelo, para o restante do capítulo. Oito vezes Deus traz novas criaturas à vida 
partir de sua criação amorfa, original, pelo comando de sua palavra.3
O impacto dessa imagem nos faz conscientes do poder e da soberania do Criado; 
Sua autoridade é tal que ele precisa apenas falar e a criação obedece. Pelo seu decrete 
soberano ele dá ordem e estrutura ao mundo. Como Isaías 55.10-11 diz: a palavnt 
de Deus não retorna para ele vazia. Ela sempre executa sua vontade. Nesse caso, 
palavra de Deus executa a criação.4 Daí o refrão em Gênesis 1: “E assim se fez”.5
M as outro refrão importante aparece em Gênesis 1: Deus está satisfeito com | 
ordem e a complexidade do mundo que ele fez. A variedade incrível da criação - dii 
e noite; céu, terra e mar; sol, lua e estrelas; peixes, aves, animais e seres humanol 
- tudo isso é declarado bom , na linguagem simples, mas ao mesmo tempo profundí 
de Gênesis 1. Por quê? O que deixa Deus satisfeito?
E bom, antes de tudo, que o mundo exista com toda a sua diversidade, coflj 
tantos tipos de criatura. Deus está satisfeito com as várias coisas diferentes que cia 
fez. Por quê? Porque é uma expressão de sua vontade. A criação constitui um padrãC 
de resposta obediente à sua voz de comando. Isso é o que Deus considera bom.
I V 1M HA.MI» MA I I I I Al, A( I 41
Hkirtin Mc foHHc para Bolidífii ai i in nonmiil inentCH quanto 1 )eus estava .satisfeito 
UHII mundo, C icnesis I aíil nui a <■ seriem ia da eriaçílo não menos que sele vezes. 
..Ill liiiiydo filial, no fechamento do capítulo (v. 31), declara enfaticamente que: 
ti I ». 'Uh tudo quanto fizera, e cíh que era muito bom .”6 
A ideia da criação pela palavra de I )eus, entretanto, não está limitada a G ê-
• I l )h Salmos, por exemplo, também falam desse modo. Eles estão cheios de
ii I >rus por sua criação. I Jm exemplo clássico é o Salmo 33.6-9 :
( h rn is por sua palavra se fizeram, 
i', pelo sopro de sua boca, 
i» exército deles.
I'',le ajunta em m ontão 
Uh jlguas do mar; 
c riu reservatório encerra 
iih grandes vagas.
I rm a ao SENHOR toda a terra, 
tem am -no todos os habitantes 
do mundo.
1'ois ele falou, e tudo se fez; 
d e ordenou, e tudo passou a existir.7
« Kl I ro exemplo é o Salmo 148 .5 -6 , que convida as criaturas de Deus a
ItftiVil In
I ,ouvem o nome do SENHOR, 
pois mandou ele, e foram criados.
K os estabeleceu para todo o sempre; 
lixou-lhes uma ordem 
que não passará.
I Duramente essas duas passagens ressoam Gênesis 1. Elas retratam Deus 
i Mino o t Viador soberano que dá as ordens; seu mundo e sua criação existem em 
li »(iimlii, A criação existe pela palavra de Deus.8
Mil« a criação também existe pela sabedoria de Deus. Observe Provérbios 8, 
Mn que a sabedoria, personificada na forma feminina, explica seu relacionamento 
HMD I •('UH e com a criação.
I ( ) S e n h o r me possuíano início de sua obra,antes de suas obras mais antigas.I )esde a eternidade fui estabelecida,
42 A VlsAo HlANWUIlMAlHiKA
desde <> princípio, 
untes do começo da terra.
Antes de haver abismos, eu nasci, 
e antes ainda de haver fontes 
carregadas de águas.
Antes que os montes 
fossem firmados, 
antes de haver outeiros, eu nasci.
Ainda ele não tinha feito a terra, 
nem as amplidões, 
nem sequer o princípio 
do pó do mundo. (8.22-26)
No princípio, antes da criação, Deus possuía sabedoria. Na verdade, Deu 
é sábio. M as ele também estabeleceu e fez nascer a sabedoria. O que isso siglil9 
fica? Significa que o sábio Criador elaborou um plano brilhante. Ele deu à luz n 
sabedoria; seu esquema incrível foi concebido. E ele designou esse plano sábl< 
como modelo para o mundo que criou. A sabedoria estava lá antes que o mundo 
fosse feito, e ainda assim ela estava também lá na criação e, na verdade,teve parte 
nela.
Quando ele preparava os céus, 
aí estava eu;
quando traçava o horizonte
sobre a face do abismo;
quando firmava as nuvens de cima;
quando estabelecia
as fontes do abismo;
quando fixava ao mar o seu limite,
para que as águas não traspassassem
os seus limites;
quando compunha
os fundamentos da terra;
então, eu estava com ele
e era seu arquiteto,
dia após dia, eu era as suas delícias,
folgando perante ele
em todo o tempo;
regozijando-me
no seu mundo habitável
e achando as minhas delícias
com os filhos dos homens. (Pv 8.27-31)
CO M ftANI NA i HIAi. An
■Attuim, ,i mibcdoria nflo <■ mrnimciitr o plimo de Deus puni a criaç&o no 
iiii«, t lii c o modo ddbio pelo 111uiI ele verdadeiramente projetou e ordenou o 
jjH A Imagem r do Critidor tnibídhundo como um artífice e estruturando a 
fln i mu habilidade, (irando as medida« para o oceano, estabelecendo limites, 
tiiidii ii horizonte, lixando os céus e as nuvens em seus lugares. Em tudo isso, 
liMilmiii r o "artesíío” de Deus.
A I ifltt tf cm da criação pela sabedoria é fundada em outras partes na Bíblia. 
PJttHiipln, em Jó 28 .25-27 o método de criação de Deus é descrito de forma 
Ht HHnii'Iliunto à de Provérbios 8.
lenindo regulou o peso do vento 
c lixou ;i medida das águas;
(|Uiindo determinou leis para a chuva 
c caminho para o relâmpago 
iltiN irovões,
piitfto, viu ele a sabedoria 
r ii manifestou; 
c’Nlaheleceu-a 
t* liiinbém a esquadrinhou.
I podemos nos voltar para Provérbios 3 .19-20 , que declara:
( ) S kni lOR com sabedoria 
fundou a terra,
com inteligência estabeleceu os céus.
Pelo seu conhecim ento 
os abismos se rom pem , 
c as nuvens destilam orvalho.
1’nni a mente hebraica antiga term os com o sabedoria, entendimento e 
inicii/o eram quase sinônimos. Eles se referem à mesma realidade básica, a 
Hltliu lr» sábia como Deus projetou e estruturou a criação.
A forma sábia e maravilhosa como Deus fez o mundo é motivo de muito re- 
Sua criação é boa. Em Provérbios 8 vemos a sabedoria dançando de alegria 
HHlitc de Deus, deleitando-se em suas obras. E o salmista exclama no que talvez 
IH*|H o mais belo salmo da Bíblia sobre a criação:
Que variedade, SENHOR, 
nas tuas obras!
' I odas com sabedoria as fizeste;
cheia está a terra das tuas riquezas. (SI 1 0 4 .2 4 )
.'\ VINAl > I HrtNNI I M<MAI M i|lA
Davi, relletindo cm sua própria condiç&o de ciiuimn, Mprcrtcmin nm regwlro 
pessoal dessa consciência quando diz ao Senhor:
Graças te dou, visto que por modo 
assombrosamente maravilhoso 
me formaste;
as tuas obras são admiráveis, 
e a minha alma o sabe muito bem; (SI 139.14)
Esses textos selecionados são apenas uma amostra da consciência que ou 
escritores bíblicos tinham da maravilha e excelência da criação, uma consciência 
que transborda em louvor ao Criador.
Digno de louvor
Tanto as passagens da criação pela sabedoria quanto da criação pela palavra 
ocorrem em um contexto de louvor e adoração a Deus. A criação nunca é discuti­
da de maneira abstrata e teórica nas Escrituras. Pelo contrário, o foco é em Deus 
como o Criador sábio e Todo-Poderoso. Seja por seu discernimento perspicaz no 
surpreendente projeto do mundo ou por sua autoridade imperiosa à qual a criação 
responde, Deus é digno de ser louvado.
Uma passagem que reúne essas duas ênfases e focaliza o Senhor como o único 
digno de culto pode ser encontrada em Jeremias 10.1-16. E uma crítica bíblica 
clássica contra os ídolos, que, em contraste com Yahweh, são impotentes e estúpidos. 
Esses falsos deuses não têm parte na criação.
O SENHOR fez a terra pelo seu poder; estabeleceu o mundo por sua 
sabedoria c com a sua inteligência estendeu os céus. Fazendo ele “soar a 
voz”, logo há tumulto de águas no céu, e sobem os vapores das extremi­
dades da terra; ele cria os relâmpagos para a chuva e dos seus depósitos 
faz sair o vento. (Jr 10.12-13).9
Essa passagem reúne criação pela sabedoria e pela palavra. E ambas são motivo 
para louvar o Criador.
Existe outra ligação entre as passagens de criação pela palavra e a criação pela 
sabedoria. Ambas são repletas de termos que se referem à maneira como Deus dá 
forma e medidas ao mundo por meio do ato da criação. Podemos comparar, por 
exemplo, duas das mais longas passagens que já mencionamos. Em Gênesis 1, a 
palavra do Criador ordena e estrutura a terra informe; em Provérbios 8 a sabedoria 
é o “artesão” de Deus pelo qual a criação recebe limites e medidas.
I mi' fctnii da O H t r u t u »iln i 1 lui.ilo r rui ontnulo em todas as passagens que 
HiMii inn.iiuoN c cm pralivamrnlr todas uh ouirufi referências bíblicas á criação. 
Iili iii liÁMÍctl, nus palavras dc Isaían 'IS. IH, é que 1 )c*us: “Kormou a terra, que a
# » a rtül'nl)dleceu; que níío a criou para ncr um caos, mas para ser habitada”. A 
Hllimi*• tujui é a ( ienesis 1.2, a figura da terra desolada, terra vazia. Mas esse não foi 
M HltUlO lina I da criação. I >onge de ser um solo improdutivo e caótico,10 o mundo 
tiMii lliído e um cosmos, um universo habitável, em ordem, estruturado pelos sábios 
lHliitili(loH do próprio Deus.
vário* dos termos utilizados nessas passagens sobre a criação conotam mais 
HM i | H i upcuas ordem ou estrutura. Eles inferem uma ordem estável, uma estrutura 
m f r i J i i a I *a lavra de Deus é fiel, fundando e estabelecendo o mundo, fixando-o 
fUtlli mente em seu lugar.11 Essa ênfase direciona para a natureza radicalmente 
ili pt lulente da criação. Em nós mesmos não possuímos qualquer estrutura ou 
M hlítulil. Nada mais somos do que carne e pó, hoje aqui, amanhã não mais. 
UiftitH 40.6 H nos compara com a erva e com as flores. “Seca-se a erva, e cai a 
tiliii lliif, mas a palavra de nosso Deus permanece eternamente” (v. 8). Criaturas 
Httti, poi delinição, totalmente dependentes. Existim os apenas porque a sábia 
Miilavra dc Deus sustém e preserva nosso ser. O salmista, em 119 .89-91 , afirma 
Is.....h iu ih Io diz:
1’ara sempre, ó SENHOR,
está firmada a tua palavra no céu.
A tua fidelidade estende-se 
de geração em geração; 
fundaste a terra, e ela permanece.
Conforme os teus juízos, 
assim tudo se mantém até hoje; 
porque ao teu dispor 
estão todas as coisas.
I i >M IIANI NA i Kl At, Al » 'h
Um pacto com a criação
t 'ontrário à ideia deísta da criação, Deus não falou no princípio, somente, 
iIh m iiu Io o mundo por conta própria.12 A criação não é um relógio no qual Deus 
tlf [i corda e deixou para funcionar sozinho. Até hoje ele ainda fala; sua voz ecoa por 
Imltl ii criação. Essa é a única razão pela qual o mundo ainda está aqui. A criação é 
IMíMiualmente constituída como uma resposta às leis de Deus. Não demos início 
d iitittsa própria existência. Em vez disso, existimos porque a Palavra de Deus - seu 
i leeretc >, seus mandamentos e suas leis - permanece para sempre. Podemos depender 
iln ( Viador porque ele é fiel à sua Palavra.
ICxplieando de outra maneira: 1 >t*ns é fiel ao mcii prn t<> Normalmente peii 
samos na aliança de I)eus como seu relacionamento com Ahrano <>u Israel, ou dti 
nova aliança por meio de Jesus. Mas a realidade subjacente por Ir.ls desses pados 
históricos é o relacionamento de Deus com a própria criaçflo. Isso é colocado ei# 
maneira explícita no livro de Jeremias, no qual Yafnueh, falando por meio do pro 
feta, faz um desafio:
Se puderdes invalidar a minha aliança com o dia e a minha aliança 
com a noite, de tal modo que não haja nem dia nem noite a seu tempo, 
poder-se-á também invalidar a minha aliança com Davi, meu servo, 
para que não tenha filho que reine no seu trono; como também com os 
levitas sacerdotes, meus ministros [...] Se a minha aliança com o dia e 
com a noite não permanecer, e eu não mantiver as leis fixas dos céus e 
da terra, também rejeitarei a descendência de Jacó e de Davi, meu servo 
(Jr 33.20-21, 25-26).
Em outras palavras, o relacionamento de Deus com o dia e a noite, os céliN 
e a terra é tão pactuai quanto seu relacionamento com seu povo. E esse pacto estit 
ligado de modo explícito com a ordem fixa da criação a qual Deus estabeleceur 
designou. A criação é uma resposta pactuai à Palavra de Deus. Assim como aToríl, 
ou Lei, foi dada a Israel no contexto de um relacionamento pactuai, assim também 
as leis e ordenanças de Deus para toda a criação são pactuais. Todo o universo estít 
intimamente relacionado e limitado a Yahweh, e ele se interessa por seu mundo 
amorosamente.13
Essa ligação pactuai entre Deus e a criação, esse modelo de relacionamento I 
soberano e amoroso de Deus com o mundo, corresponde ao tema bíblico do reino 1 
dc Deus. Deus é o grande Rei sobre a criação, e ele governa seus súditos por de- 1 
ereto soberano. Ele dá a sua lei, e a criação responde em obediência. Ele governa 1
o mundo por sua Palavra sábia.
O reinado de Yahweh é proclamado em toda a Bíblia e em muitos textos é 1 
diretamente ligado à criação. O Salmo 95 .3-5 , por exemplo, convida-nos a cantar ] 
de alegria:
Porque o SENHOR é o Deus supremo
e o grande Rei
acima de todos os deuses.
Nas suas mãos estão
as profundezas da terra,
e as alturas dos montes lhe pertencem.
Dele é o mar, pois ele o fez; 
obra de suas mãos, os continentes.
M
•ru r\ v in a í > i HANm i in M ftin i|t/\
t ’.nM MAHl' NA clUAt. Ao 47
A'.mm, I ) ouh c'* o Rei l i i.mIi n I eu govei no rmá vinculado à sua preservação 
9 lihii iii«> tio mundo. C\>mo <> Sulino % ,9 10 declara:
Adorai o S i:nl IOH 
nu beleza da sua santidade;
Iremei diante dele, todas as terras.
I)izei entre as nações:
K ein a o SlCNT IOR.
IClc lirmou o mundo 
para que não se abale.
I'ni que I )eus governa o mundo, a criação pode depender dele para sua con- 
MliUil̂ fto. 1’orque ele é fiel à sua aliança, porque suas ordens sábias e soberanas 
HwmWieeem lirmes, a terra está firmemente estabelecida.
Se lossem os ajuntar todas as linhas de pensamento bíblico e figuras que 
iMlUffl explorado, veríamos uma imagem unificada: começando com as imagens 
<!*) i iIhçíIo pela Palavra e a sabedoria de Deus, integramos essas ideias seminais 
i VÍKilo bíblica mais ampla do mundo como o bom reino de Deus, o domínio 
i|i mm witbio e soberano governo. Toda a criação (que nos inclui como criaturas 
liiii iituias) é pactualmente vinculada a Deus e é constituída em sua essência como 
lliiiit ifHposta às suas leis. O universo inteiro é dependente de Yahweh por seu ser, 
P i Ir c louvado e adorado por suas criaturas. Nas palavras conhecidas do Salmo
I I " ( )s céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras das 
aihin mHos”. Eles proclamam sua glória porque é uma expressão obediente de sua 
Vniililile. ( ) Salmo 148.8 mesmo menciona: “Ventos procelosos que lhe executam 
it piiluvra". E assim o salmista em 119.91 declara a Deus: “Ao teu dispor estão 
|niliiii uh coisas”.
Nesse modelo de realidade, intensamente religioso, nesse padrão de relacio- 
Uiillirnlo íntimo, de Deus com o mundo, encontramos a resposta bíblica para a 
Iti!l(junta s<>bre cosmovisão “Onde estou?” Nossa resposta proporciona a base na qual 
H (ítlllu io da cosmovisão bíblica total é construído. Todas as principais categorias e 
li iiiuh ilas Escrituras são entendidos em termos dessa base subjacente. A natureza
• I» i perado e a redenção, por exemplo, sempre são vistas no contexto da aliança e 
ilii rnlltado de Deus. E , como veremos mais adiante, essa base é particularmente 
Importante para a compreensão da nova aliança inaugurada por Jesus - a qual ele 
i nffmmente chamava de reino de Deus.
M as esse fundamento também é importante para entender quem somos como 
Hi o 'i humanos.
4H A VlsAn lUANSI t IKMAIIUUA
À imagem de Deus
O que significa scr humano? Quem somos nós como seres humanof? I' H 
sas perguntas têm perseguido os pensadores religiosos e fi.los6ii.cos dc todan 
civilizações, incluindo a nossa, e muitas respostas têm sido dadas. Apesar il'lM 
essas perguntas não são assuntos apenas para a elite filosófica. São perguntiM 
cosmovisão, básicas para todos, que dizem respeito à visão que temos da vii 
Todos nós adotamos, consciente ou inconscientemente, alguma ideia do i|Hí 
significa ser humano. E vivemos por essa ideia. Podemos não ser capa/en 
articular o que acreditamos que somos, mas exercemos nossas funções com uiiittj 
consciência implícita de uma identidade, uma visão de quem somos como hci 
humanos.
Quem a Bíblia diz que somos? Sua resposta inicial é que somos criatimiM 
Deus, vivendo em seu reino, dependentes de seu governo sábio e amoroso. J 
mesma maneira como os céus que declaram sua glória e os ventos que obedcctM 
ao seu comando, somos servos de Yahweh, o Rei-Criador. Isso está intrínseco rt 
nossa condição de criaturas.
Apesar disso somos diferentes dos céus e do vento, assim como das plaiili 
e dos animais, e sentimos essa diferença. Somos servos de Deus, mas a naturelj 
do nosso serviço é singular. Ela está resumida no termo bíblico imagem de Dílllk 
introduzido em Gênesis 1 .26-28.
Disse Deus: Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa 
semelhança; tenha ele domínio sobre os peixes do mar, sobre as aves dos 
céus, sobre os animais domésticos, sobre toda a terra e sobre todos os 
répteis que rastejam pela terra. Criou Deus, pois, o homem à sua ima­
gem, à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. E Deus os 
abençoou e lhes disse: Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e 
sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre 
todo animal que rasteja pela terra.
O significado desta fórmula - “imagem de Deus” - tem sido assunto de muito 
debate ao longo dos séculos.14 Normalmente, a imagem tem sido relacionada a algii 
ma característica ou conjunto de atributos, que se imagina serem compartilhados pofi 
Deus e pela humanidade, o que nos distingue dos animais. Alguns pensam ser nosHftl 
capacidade racional, outros, nossa natureza moral, nossa espiritualidade ou nosHfij 
personalidade. Essa abordagem ao significado da imagem como algo estrutural, ou 
estático, pode ser chamada de sentido amplo do termo. Uma abordagem dinâmica, 
relacional, na qual a imagem se refere ao nível de moralidade de uma pessoa ou 
ao grau de conformidade com o caráter perfeito de Deus, pode ser chamada d{9 
sentido reduzido da imagem. A primeira refere-se à nossa humanidade em si; 11
V 11M (M fll ' fttfM, W > T >
11 ugem como iiorm.Uivti, o padrfio ao qual elevemos nos conlormar.
klPUfciUii-. tem tentado letinii ennim dilHI enlases.
iiMiiulo,existe um sério problema aqui. Muitas interpretações da imagem têm 
illii! m iadas mais por lilonofiau uao ci istas do que pelas próprias Escrituras. 
iHn pn i imi ser assim. I )everíamos ser os primeiros a discordar, com um bibli- 
iMji.eiMU), com a ideia de que podemos nos aproximar da Bíblia tabula rasa, 
H» iiilo lõssemos influenciados por (juaisquer ideias e suposições extrabíblicas 
(nesse caso, ideias relacionadas ao que significa ser humano). Além do
i, tMi pinprias Escrituras são a fonte apropriada de nossa compreensão do que 
lilt .i ui i \\ imagem de Deus. E o ensino central delas é bem claro quando cada 
$m r lula no contexto.
N m m n h criação à imagem dc Deus é relacionada a duas noções bíblicas im- 
friiitN! nosso domínio ou governo sobre a terra, e a escolha religiosa de servir 
Mli m u nos ídolos.15 Essas duas noções, que, de algum modo, correspondem ao 
)ii iimplo e ao reduzido da imagem, são, na realidade, entrelaçadas, mas será 
tllftllityiii las ao analisarmos o que significa ser humano.
w&rn&ndo sobre a terra
As Ideias tia imagem de Deus e do nosso governo da terra se acham próximas 
Mi ilii outra na narrativa de Gênesis, fazendo sua conexão parecer natural. Mas 
?«ti iiito t*, de maneira alguma, sua única ligação. D o começo ao fim de Gênesis 
IpUK é retratado como o Senhor-Criador que governa seu mundo por decreto 
flthi i tino, Então, com a criação do ser humano, a ideia da imagem de Deus é in- 
ffKiltlftidil. (^iiase que ao mesmo tempo, Deus abençoa suas criaturas especiais e 
jlil a rim* domínio sobre a terra. Ele lhes dá uma autoridade real e um reino para 
iUl'|ufi,ii c governar.
Vemos em Gênesis1 uma analogia intencional entre a autoridade limitada 
mim ii terra, que os humanos possuem, e a soberania suprema de Yahweh. A 
|tl In lei ui é retratada como um reflexo ou semelhança da última. Somos criados, 
llt.h lio e I cmea, à imagem do soberano Senhor. Com o o Salmo 8 enfatiza, fomos 
i m i mi los com glória e honra, e feitos dominadores sobre a criação de Deus.
Mas sejamos mais precisos. Como exatamente refletimos a imagem de Deus? 
Hm (jllC consiste nosso governo? O que significa subjugar a terra? Encontramos 
tjtiiit renposta inicial a essas perguntas no próximo capítulo de Gênesis. Diferente
il.i prtiiorámica de Gênesis 1, que apresenta a humanidade como o clímax e a coroa
■ III »ilação de Deus, Gênesis 2 focaliza especificamente as criaturas humanas de 
I •* uh. Em vez de aparecer, simplesmente, no último ato, por assim dizer, somos a 
SlitttjSfto central; nossa natureza singular e tarefa são esclarecidas. De modo especial,
é dito a nós que I )eu8 plantou um jardim no Éden < mim ou Adfío nele: “Paru o 1 
cultivar e o guardar" ((Jn 2.15). Talvez a versão da Bübliu Ucvinia c Corrigida de 
Almeida seja a mais conhecida por alguns. A tarefa de Adflo no jardim do Kdeu 
é: “O lavrar e o guardar” (G n 2.1.5). Seja qual for a tradução, o argumento é <i 
mesmo. A tarefa humana original é dupla: desenvolver e f reservar o ambiente onde 
fomos criados.
Antes de tudo, devemos cultivar ou lavrar o jardim. Ou, nas palavras da lil 
blia na linguagem de hoje, devemos trabalhar o jardim. A primeira tradução noí 
ajuda a entender melhor a passagem por causa da ligação explícita entre as palavrftN 
cultivar e cultura. Cultura é o resultado de cultivo. Uma cultura bacteriana, por 
exemplo, é uma colônia de organismos criada e, intencionalmente, cuidada paru 
algum propósito. Cultura e cultivo referem-se em essência às nossas interaçõCH 
humanas com o mundo.
E claro que cultura abarca enorm e amplitude. Tudo em que colocam os nossa 
mão (ou m ente) se transform a - causamos algum tipo de desenvolvimento. Apesar 
do desenvolvimento e da transformação serem possíveis sem atividade humana (por 
exemplo, processos de crescim ento ou desastres naturais), a interação hum ana com 
nosso mundo ou o cultivo dele sempre constitui cultura.
Portanto, a cultura e a história são inseparáveis, quase por definição. A cultura 
refere-se ao que os seres humanos desenvolveram, assim, a cultura é essencialmente 
histórica. A construção da vida humana é desenvolvida; isso é intrínseco à nossa 
natureza como criatura humana. Além disso, essa verdade vale também com res- 
peito à criação não humana de Deus. Em razão de sempre acontecer algum tipo de 
desenvolvimento, pode-se dizer que o mundo tem sua própria história independente 
da cultura criadora humana. M as, somente a história humana, o desenvolvimento 
histórico da humanidade, é baseada em nossa constante interação e cultivo da 
realidade como nós a percebemos.
Essa interação com a realidade e nossa cultura transformadora humana <5 
intrinsecamente um fenômeno comunitário ou social. Seu caráter social é sugerido I 
pela menção, em Gênesis 1.27, do homem e da mulher como imagem de Deus. Ela 
é indicada, também, muito claramente pela ordem definida que Deus deu a eles. A 
tarefa deles era subjugar ou governar a terra. M as porque Adão e Eva eram apenas 
dois, Deus diz a eles para serem férteis e encher a terra. De que outra maneira 
poderia eles subjugá-la? Assim, o desenvolvimento cultural da criação primitiva e 
pouco desenvolvida não é concebido como tarefa para um indivíduo. A cultura é 1 
solidamente fundamentada na sociedade. Nossa humanidade, à imagem de Deus, 
é essencialmente uma co-humanidade. Somos seres socioculturais, chamados por 
Deus para trabalhar juntos no desenvolvimento e no cultivo da criação.
Além de jardins, também cultivamos relacionamentos, maneiras e formas de 
adoração. Subordinamos os animais e as forças da natureza. Formulamos e desen­
volvemos ideias e tradições, e construímos não apenas objetos tecnológicos, mas
l 'OM IIA«P NA l tUAC/AO '>|
Hf ui i0m iip;i tiptimcíiiloH e i nHlil ui«, õtn •,» u 1.1 r I odas essas atividades c* seus resultados 
f*1 1 1 iiIhmuím; luto <\ silo reiitidudc4’- humanamente desenvolvidas. A cultura não sc 
h li ii meramente its atividade# intelectuais e csl clicas (como em alta cultura ou pessoa 
mfht) A culuira cobre toda u amplitude da sociedade humana. Ela inclui não somente 
Hl , uuillcu c escolaridade, mas também coisas como nossa vida econômica e política, 
n li|i,iiiti, Igreja, educação, tecnologia, mídia, casamento, vida familiar, publicidade e 
ili11 inflo, 1 !m ser cultural é, de modo bem simples, um ser humano.16
Ahníiii, a ordem principal dc subjugar a terra (com frequência é chamada de 
HMiiiliilo da criação) é um mandato cultural. Em todas as nossas atividades cul- 
Hil.ih e uFazeres - isto é, em todas as ações humanas, artefatos, relacionamentos 
inmlfuiçrtes pelas quais interagimos com a criação e a desenvolvemos - os seres 
limihinos produzem evidências da ordem dada a eles por Deus a respeito da terra. 
A limitem de Deus, em sua referência central à ideia de subjugar a terra, designa 
Mm mmpm humanos como histórico-culturais.
I tilemos ver aqui uma ênfase principal da visão bíblica da vida: a totalidade. 
An fomeçar a responder a pergunta de cosmovisão: “Onde estou?”, vimos a bondade 
'lii i imçito diversificada de Deus afirmada pelos escritores bíblicos. E agora, em 
:̂ (IMNii discussão sobre “Quem sou?”, vemos que os seres humanos são reconhecidos 
mm iCicrituras como criaturas culturais, totalmente completas, chamadas por seu 
I liftdor para ir e desenvolver a terra. Essa abordagem holística é restauradora e 
Hwl^linidora da vida. A cosmovisão bíblica associa-se com a realidade. Ela afirma 
liiuma humanidade e corresponde ao que existe.
Analisando nossa interpretação
Ma s estamos interpretando as Escrituras corretamente? Poderia a nossa 
Viltfli) da natureza cultural da humanidade ser apenas uma interpretação moderna, 
BMittnha ao verdadeiro mandato de Gênesis? Talvez estejamos lendo uma noção 
imnlemporãnea de um texto antigo. Observemos, então, dois pontos-chave: a 
Cmtrutura literária do livro de Gênesis, e os exemplos de desenvolvimento cultural 
ipgjHlrados em Gênesis 2 .4-4 .26 .
Km primeiro lugar, um estranho refrão que ocorre periodicamente em Gênesis 
IIiin proporciona um indício explicativo: “São estas as gerações dos...”, a palavra 
"I ífiações” é uma tentativa de traduzir o termo hebraico toledoth. O refrão “São 
gNtllH as toledoth dos...” divide o livro em 11 pontos. Esse refrão marca a estrutura 
lllrrriria de Gênesis; cada ocorrência serve como um prefácio ou título para a seção 
P narrativa ou genealogia que se segue.17
Algumas vezes o refrão toledoth faz a introdução de uma seção contendo pouco 
uhiím do que uma lista genealógica.18 Nesses casos, toledoth significa, de modo literal,
r\ virvM i i kajnthh ihmam i h ia
gerações ou descendência, Porém cm quase a metade tlor« i i*l i o* o nl^ulfii ado é uuiilo 
mais amplo.1*' Um exemplo instrutivo c Gênesis 2,4, que dl/: "Kstu é u gênese dou 
céus c da terra quando foram criados”. Vindo logo apÓM a críaçílo dos céus c dn 
terra, esse título introduz sua gênese, no sentido do que foi gerado deles.
Apesar de ainda haver um elemento genealógico aqui, uma leitura da seçiln 
que se segue (2 .5-4 .26) irá sugerir que o significado é, na verdade, muito mui« 
aproximado da ideia de desenvolvimento histórico. Portanto, o refrão toledoth apoim 
nossa interpretação do mandato da criação. Na verdade, ele incorpora essa ênfalô 
no desenvolvimento e na história na própria estrutura do livro de Gênesis.
O segundo ponto-chave é que o toledoth dos céus e da terra registra umu 
série de exemplos do desenvolvimento cultural e inovação. A narrativa inicial du 
criação nos diz como o mandato para o homem e a mulher subjugarem a terra é 
emitido. A seção seguinte sobre a gênese ou desenvolvimento histórico mencionaexplicitamente como eles reagiram a esse mandato.
A cultura primitiva de Adão, em Gênesis 2, por exemplo, inclui não somentf 
jardinagem (agricultura) mas relações conjugais (Adão e Eva), os primórdios dtt 
linguagem (a nomeação dos animais) e até mesmo o primeiro poema (os dois 
versos de Adão em louvor a Eva). Um segundo grupo de exemplos, encontrado« 
em Gênesis 4 .20-22 , dá um apoio muito mais forte. Aqui encontramos registro« 
de três fabricantes que aparecem na história, os criadores de três tradições: Jabíll: 
“O pai dos que habitam em tendas e possuem gado”; Jubal: “O pai de todos 01 
que tocam harpa e flauta”; e Tubalcaim: “Artífice de todo instrumento cortante, 
de bronze e de ferro”. Nos primeiros capítulos de Gênesis, os seres humanos silo 
nitidamente reconhecidos como seres culturais, sendo que seu desenvolvimento 
cultural é observado com clareza.
A implicação é que a criação tem uma cscatologia embutida. A cosmovisão 
bíblica não é somente integral, mas também dinâmica. A criação segue em frente, 
A apresentação do pecado ao mundo não é equivalente ao início da mudança, como 
algumas cosmovisões sugerem. As mudanças teriam vindo de qualquer maneira, 
A criação foi destinada a ser desenvolvida. Ela se submeteu ao desenvolvimento 
mesmo antes da humanidade entrar em cena. O próprio Deus substituiu (pelo de­
senvolvimento) sua criação original para um mundo diversificado onde habitamos 
hoje. A imagem do Criador, somos chamados a continuar o exercício de nosso 
governo desenvolvendo a terra. Devemos cultivar o jardim da criação.
O que acontece quando um jardim é cultivado? A resposta está nos dois úl­
timos capítulos da Bíblia. Lá, nos novos céus e terra (a criação redimida dos efeitos 
mutiladores do pecado), encontramos um contraste com Gênesis 2. Em vez de um 
jardim como em Gênesis (obviamente refletindo uma situação primitiva), encon­
tramos em Apocalipse uma cidade completamente ornamentada.
Esse movimento escatológico do jardim para a cidade foi pretendido por Deus, 
E verdade que a queda ocorreu no intervalo; o pecado entrou em cena. No entanto, a
i ApoeiilipNC .! I c .12 tvtlitfit um iininili) purificado da qucdil e de seus efeitos. 
i ili ni ftvolviirUMiCo permanece cnuio pude <l<> mundo purificado.
I i mandato cultural ̂ parte do plano original dc Deus para o mundo. A 
t îtu iiAo o nega, pelo contrário, cumpre o. Ser formadores de cultura é in- 
Inhi o íl nalureza humana. ( )h seres humanos têm o mandato dado por Deus de 
Mivnlvn a criação.
turvando a terra
I' iilretimto, a Bíblia não dá base para o desenvolvimento desenfreado. A tarefa 
jilti ilitdil a Adão era desenvolver e cuidar ou preservar o jardim. A intenção do 
iiihliiln bíblico é bem distinta da visão ocidental moderna da conquista humana e
Sjilni iiçíit ) da natureza. (Essa última ideia é a raiz da visão colonial da terra comofron- M i|l 10 discutimos no Capítulo 1, e que abordaremos novamente no Capítulo 8.) Pudemos observar aqui que o motivo da conquista é uma visão completamente 
ih llltii, bem estranha ao princípio vital das Escrituras. Na Bíblia o mundo não hu- 
ui Iiilo é visto como algo exterior. Não nos colocamos na posição de adversários 
ti*' I ms criaturas de Deus. Em vez disso, nossa solidariedade para com a criação 
|l nmlii mada. As montanhas e as árvores também servem a Deus. Estamos em um 
1*1* 1» >111111 lento pactuai com o mundo, um relacionamento de administração.
Apesar de rejeitar toda noção panteísta de reverenciar a natureza, devemos
!li)lb|tn reconhecer o elemento crucial de cuidado amoroso e preservação no man- Hh) bíblico de subjugar aterra. Devemos lavrar e guardar o jardim. Nossa formação 
.li i iiltuin não deve ser realizada de maneira egoísta, mas com cuidado verdadeiro 
|h lit 11 iuçao. Para sermos fiéis à imagem de Deus, nosso desenvolvimento cultural 
fU l|i nt deve ser bom, sábio e amoroso - como o governo pactuai de Yahweh.
A h n íiii, ser humano significa duas coisas básicas. Primeiro, somos criaturas de
I liMII I1., como todas as criaturas, vivemos somente em resposta à palavra amorosa 
=!i I )riiN, Não somos autônomos. Isso é bem diferente da cosmovisão da cultura 
ui Iili utal, que considera a humanidade como uma lei (nomos) em si {autos). Mas, 
iinjUi' de fixar nosso próprio padrão, estamos de fato sujeitos à lei de Deus. So- 
HIIIN «eus servos, vivendo sob seu domínio. Isso é fundamental à nossa condição 
■,|i i tliilura. Em segundo lugar, os seres humanos são singulares. Somos criaturas 
l||«|i ii ico culturais. Deus nos colocou em posição de autoridade sobre a terra para
i iilllvá la e desenvolvê-la. Tanto a autoridade quanto o serviço são fundamentais 
|i>iiii nossa humanidade. Aqui está a resposta bíblica inicial para a pergunta de 
H"'!ii.0visao: “Quem somos?”
Essa resposta é bem ilustrada na parábola de Jesus sobre os talentos em Mateus 
J'í I I M). Na parábola, o mestre saiu em uma jornada e colocou seus escravos na
administração de Hiiaw linunçuN (os talentos), puni inv< mH lo* sabiamente dum 
sua ausência. Da mesma maneira Deus descansou de RCU trabalho da criuçA 
deu autoridade aos seres humanos para expandir suas posses, c]ue são a criui, 
que ele nos confiou.20 Mas a responsabilidade é importante, pois o mestre rotot 
e julga seus escravos pela forma como cies empregaram su;is posses. Do incil 
modo acontece conosco. Não podemos governar a terra como quisermos, poin n 
somos donos deste reino. Nossa autoridade é derivada de Deus, e assim ela fidú
o caráter da mordomia.
A analogia financeira na parábola é bem significativa. A raiz da palavra H 
nomia é a palavra grega oikonomos, palavra comum do Novo Testamento para ui 
dono da casa ou mordomo, alguém a quem se confia a supervisão e a administraçft 
das propriedades de seu mestre. Isso é diretamente oposto à visão moderna <1 
economia, que vê cada pessoa como um agente autônomo, que não está sujeito 
restrições em sua exploração do mundo.
Contudo, a ideia bíblica de mordomia compara autoridade ao ato de sei vi 
Isso atinge o âmago de nossa humanidade. Apesar de sermos, de fato, os senhoit» 
da terra, somos também servos de Deus. Somos chamados a exercer nosso govfri 
no em resposta obediente à soberania máxima de Yahweh. Subjugar a terra é um 
questão de responsabilidade pactuai.
C a p í t u l o 4
R k c o n h e c e n d o a q u e d a
N» IV'I r ao Senhor, nosso Criador, é nossa responsabilidade pactuai, e mesmo 
«IBM Ui |l(In Homos forçados a fazê-lo. E possível desobedecer e nos afastar do que 
■ M hi i liHinados para ser. E essa possibilidade tornou-se realidade na queda. A 
fotlliliVlHílo cristã responde a terceira pergunta básica: “O que está errado?”, em 
piíiiMn de desobediência humana a Deus.
I )m Nei es humanos são criaturas inerentemente religiosas. Não podemos viver 
iHn um d eus, mesmo que ele seja fabricado por nós. Precisamos de um centro,
■ I...... Hlipremo, um ponto de orientação para nossa vida. Temos, de fato, duas
illMHUtlvuN. ( )u servimos ao Senhor e obedecemos a sua vontade, ou praticamos 
lilnl.ll lia em desobediência. Essas são as antíteses espirituais, o ou/ou da vida a 
MIM 'I llfhlia se refere repetidamente. Em todos os nossos afazeres, em todas as 
fjftllhtll Hlividades humanas habituais e culturais, constantemente nos deparamos 
l i D li i dois caminhos pactuais.
A questão das antíteses espirituais pode ajudar-nos a compreender o que a 
(líMlii quer dizer por imagem de Deus. Apesar do princípio fundamental da ima- 
î tu iIt1 I )eus ser nossa natureza como seres culturais ordenados a governar a terra 
Ini lllttrtr dr Yahweh, a orientação bíblica que vai, além disso, para essa expressão é 
t >plli lliunente pós-queda. Isto é, o significado completo da imagem de Deus leva 
MM i Unwitleração a desobediência humana, em particular a idolatria.
1'omo pode ser isso? Qual é a relação entre nossa criação à imagem de Deus 
£ it rtieolha pactuai de servir a Deus ou os ídolos? A resposta está na exata natureza
il.i tíliiIni ria, uma práticaque não preocupa a maior parte dos cristãos de hoje, mas 
ijiiM i* mencionada frequentemente nas Escrituras. Considerando essa frequência, 
Bflltttincial analisar a idolatria para nosso entendimento do que significa ser criado
i l|Uiip(em de Deus.
"50 A VlKAl' PRANMW WMAftl >HA
ídolos: usurpando o lugar de Deus.
Iniciemos com a discussão de Paulo sobre pecado no primeiro capítulo 
Romanos. De acordo com Paulo, vivemos no mundo de I )cus c estamos cô n id o fl 
intuitivamente, que existe um poderoso Criador digno de nosso culto. Mas rrje 
tamos esse conhecimento. Desde eras remotas, os seres humanos têm rejeitai 1«• 
revelação que Deus faz de si próprio por meio da criação. Eles não o têm reconluvli 
ou cultuado como Deus. Em vez disso, eles:
e mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem 
de homem corruptível, bem como de aves, quadrúpedes e répteis... pois 
eles mudaram a verdade de Deus em mentira, adorando e servindo a 
criatura em lugar do Criador, o qual é bendito eternamente. Amém!
(R m 1 .2 3 ,2 5 )
Existem apenas duas categorias básicas: o Criador e o criado. Se não adoram n m 
a Deus, focalizaremos em algo na criação e a elevaremos à condição de divindadi?, 
Adoraremos a um falso deus. Nossa natureza intrinsecamente religiosa não um 
permite ?mo cultuar. Ou prometemos completa devoção a Yahweh, o único Deu»» 
verdadeiro, ou nos comprometemos com alguma coisa criada e fazemos dela tni 
deus. Temos de escolher um ou outro, pois não podemos viver sem um deus, e nllu 
podemos ter dois - pelo menos, não por muito tempo.
Jesus disse que é impossível servir a dois senhores. Um terá de dar lugar uo 
outro porque a adoração é uma prática exclusiva. Por esta razão Paulo falou tl 
respeito da idolatria como uma troca: é algo que fazemos em vez de servir a Deu«, 
Contudo, somente Yahweh é digno de adoração. Coisas criadas não são dignai», 
pois elas são apenas seus servos, dependentes de seu governo para sua existêm in 
A idolatria é, essencialmente, uma declaração de autonomia e independência ili1 
nosso Criador, nossa rejeição de seu reino legítimo.
As consequências podem ser terríveis. Se não adoramos o Rei da criação, Jc 
rejeitamos seu domínio, então desobedecemos suas leis. Essa é a razão pela quill 
os profetas trouxeram uma mensagem dupla de julgamento a Israel: o povo havlii 
renunciado a Yahweh em favor dos ídolos; e a terra está cheia de ilegalidade e in 
justiça. Os ídolos estão na raiz da desobediência.
Então, não é de se admirar que a idolatria seja denunciada no início ilo 
decálogo, ou que Paulo, em Romanos 1, tenha visto a idolatria como o prin 
cípio da desobediência humana. Se nossa sujeição não é a Deus, não temo 
razão para manter seus padrões. Assim, a idolatria é retratada, na Bíblia, não 
meramente como um pecado entre muitos, mas como a epítome do pecado. Kl< 
é o ato central de desobediência que interrompe o governo de Yahweh sobre 
vida humana.
Hl I I >NIli ' UNIX’' A guwiA 17
l\l i fino ii.it) puni poi .11 A m 1«>l.iiiia envolve idolos, Apesar da essência da 
k jh in I Mt i ,i iGjeiçitodo reinado de Deune u tentativa ele cultuar algo na criação, 
■IhIhiMo non tempos anlijiçoH ia muito além. As pessoas tentavam representar Deus 
Hll K i |in< o ,ul<mulor pensava sei: deus) p<>i meio de estátuas esculpidas ou fundidas. 
P| ){|ii|,M i i »onstruíam uma imagem visual da deidade a ser cultuada.
' Iiin observe que essa prática nào é registrada nos primeiros capítulos de G ê- 
H ii I i1,o pecado humano e a rebelião contra Deus são mencionados claramente, 
pi iiiin CKÍMe referência a ídolos físicos, literais. Essas referências só aparecem 
iMiipn iIom patriarcas.1 Não seria sábio tentar datar o início da idolatria a partir 
PHiln ili HHe indício, mas observe um segundo fato intrigante. Essa mesma seção 
t jMili luinil de ( lênesis, que não faz menção de ídolos, é a única parte do Antigo 
Hk*í»HM* nto a referi r-se aos seres humanos como a imagem de Deus. Uma obser- 
m ui picendeute. A não ser por quatro referências à humanidade à imagem de 
uni primeiros capítulos de Gênesis (1 .26-27; 5.1; 9.6), o Antigo Testamento
11 ttiii ii rijüpeito desse tópico. Por quê? Estariam essas primeiras referências à nossa 
lIltijílH, rniiiii imagem de Deus, relacionadas à ausência de antigas referências à 
llnhlfluí
l ntumente existe a sugestão a uma correlação pelo fato de a Bíblia usar o 
IhitíWW para se referir tanto aos seres humanos quanto aos ídolos. A mesma 
[iijl.ii i i Im l.i.m a é usada.2 Porém, mais importante do que a palavra em si é a ideia
lil<l....... Qiinl é o significado de um ídolo ser uma imagem, em particular a
de um deus?
títulos: usurpando nosso lugar.
Ni i mundo antigo um ídolo não era considerado um deus em si. Ele não era de
....... lligènuo identificado com a deidade que supostamente representava. Em vez
llM n.ii ídolo era visto como o meio local pelo qual a deidade se tornava presente 
jiimi um pessoas. Ele era a incorporação visível do deus, representando seu poder 
p ||iu|*'Nltulc. Como imagem, o ídolo era simbólico; ele mediava e manifestava a 
jfliilitl f1 o domínio do deus para os que estavam ao seu redor.’
l iMHii compreensão do que significa fazer imagem de um deus coincide com 
Hm̂mi interpretação anterior da imagem de Deus no homem. Assim como o ídolo 
m HMiNiderado ser a manifestação local, visível do deus, o meio pelo qual ele se 
If lIii. lV U P resente, também se pressupõe, em Gênesis, que os seres humanos repre- 
uh in 1 \thweh na terra. Seu Espírito e poder o acompanham, e ele exercita seu 
itíillilo sobre a terra por meio deles. A ligação fundamental entre a imagem de 
IMln r o mandato cultural é então confirmada. Os seres humanos são embaixadores 
» I )t nu, seus representantes para o restante da criação. Somos os administradores
m n VI'.,• V I 11V\N*M 1 MIMAI M IHA
(|iic‘ ele estabeleceu com o uutoridlide «obre a teirn | »ura muuiíentnr m u i prmMn,^
refletir sua glória em toda» a» nossas atividades cultuniÜ!.
M as observe que a imagem consiste cm nossa represem ação corpórea à& I )mi 
A pessoa como um todo, e não apenas uma parte espiritual e interior, ó. critldii 
imagem de Deus. Refletimos a glória de Deus e o representamos na terra pi 
meio de nossa presença física, completa. Na verdade, a visibilidade é essencial, pui 
precisamos fazer o Deus invisível visível por meio de nossa vida. Em todo o ml 
de ação de nossas atividades culturais devemos demonstrar o governo amoroso 
Yahweh.4
Por conseguinte, a idolatria é errada não por tentar fazer Deus visível (qntj 
exatamente a tarefa humana), mas porque realiza isso da maneira errada. Em V»?Í 
de aceitar e cumprir nossa responsabilidade, criada para representar o Senhor ui 
âmbito completo de nossas atividades culturais, projetamos essa responsabilidfjdí 
nos ídolos. Assim, negamos nosso chamado para viver de tal modo que o domítii 
amoroso de Deus possa ser visto, e começamos a cultivar a terra em desobediôtu ia 
Dessa maneira a idolatria é a alternativa ilegítima para a genuína tarefa hurmiilí 
de refletir a imagem de Deus. E equivalente a viver uma vida tão distorcida pe| 
falsa adoração que cesse de refletir os padrões de Deus.
A idolatria, então, tem duas características distintas, apesar de relacionâdflj 
Ela envolve não apenas falsa adoração, mas, por conseguinte, falsa criação d 
imagens. Ambas são condenadas nos Dez Mandamentos. Veja o que Deus diz eilf 
Êxodo 20 .3-5 :
1. Não terás outros deuses diante de mim.
2. Não farás para ti imagem de escultura, nem semelhança alguma do
que há em cima nos céus, nem embaixo na terra, nem nas águas 
debaixo da terra. Não as adorarás, nem lhes darás culto.5
Existe uma distinção importante entre esses dois mandamentos. O primeiru 
focaliza Yahweh como o único Deus verdadeiro; o segundo focaliza a humanidade 
como a única imagem verdadeira de Deus. Não é nossa prerrogativa inventar fll 
que quer que seja, de maneira arbitrária, para adorarmos, pois existe apenas um 
Deus. Semelhantemente, nãotemos a autoridade de designar o que deverá su 
a imagem de Deus. Deus estabeleceu isso quando nos criou. E ele disse a suiui 
criaturas humanas: Você reflete minha imagem! Não os ídolos. Os ídolos s9d 
apenas representações inadequadas de Yahweh. Essa tarefa é reservada para o h 
seres humanos.
Desse modo, a idolatria usurpa não apenas o lugar próprio de Deus, mas n 
nosso também. Ela contradiz o reinado legítimo de Deus como Senhor do universe 
e nosso chamado humano fundamental de representá-lo em obediência cultural 
diária - para refleti-lo em nossa vida.
11 M lid iniuimento ilc iiloliiiiui puiit iiommu criaçflo imagem de I)cus imlica, 
Hm, niiMMii natureza inliindecimicnlf religion, n estrutura ou/ou de nossa vida. 
Hilltn Mt’iVN humanos, com lirqum cia, deparamos com dois caminhos: um 
|Vti it verdadeira adoraçîlo a Ydlmu'h, e o outro que leva ao culto aos ídolos. Ou
Il..... t. ï ui Uigcm tie Deus em nosso amoroso governo da terra, ou deixamos de
fítll PNuti tarefa cm desobediência.
thn hoje
I ntiti* oh seres humanos devem escolher entre dois caminhos pactuais, as duas 
P$n j m iNMÍveis its leis de Deus para nossa vida. Não podemos deixar de responder. 
Hliiim npenas em relacionamento de aliança com o nosso Criador. Existimos 
íhiIi m i resposta ao seu governo soberano.
Am !IH Como não podemos ser neutros em relação a ele, ele não é neutro com 
HM" I I" ui. I )eus julga nossa reação a suas leis. A aliança, em outras palavras, 
"Mlll̂ OCH,
I ) livro de i )euteronômio é muito instrutivo nesse aspecto. Deuteronômio é 
ifltli H It'Kli) completo da Bíblia de uma cerimônia de renovação da aliança. Ele 
MM!» nIki o que aconteceu entre Yahweh e Israel nas planícies de M oabe, antes 
jíinn m irar na Terra Prometida.
I 11 Kmax do livro e o resumo clássico do pacto vêm em Deuteronômio 30.15-20. 
>*MI di' esses versículos ocorrerem no contexto de uma aliança histórica especí- 
j| Hiin- Yahweh e Israel, eles são embasados no pacto da criação e apresentam a
111 «ui.I PM I ui ura fundamental.6 A passagem começa com Moisés apresentando os ||i I iimíiilios pactuais diante do povo. D iz ele: “Vê que proponho, hoje, a vida e li In • ui, h morte e o mal” (v. 15). Ele descreve o primeiro caminho:
... que ames o SENHOR, teu Deus, andes nos seus caminhos, e guardes 
ui* urus mandamentos, e os seus estatutos, e os seus juízos, então, viverás 
tí Ir multiplicarás, e o SENHOR, teu Deus, te abençoará na terra à qual 
(IHHHiis para possuí-la (v. 16).
I' ui Ho ele se volta para o segundo caminho:
Porém, se o teu coração se desviar, e não quiseres dar ouvidos, e fores 
flficlu/ido, e te inclinares a outros deuses, e os servires, então, hoje, te 
tIceIaro que, certamente, perecerás; não permanecerás longo tempo na 
ferra à qual vais, passando o Jordão, para a possuíres (vs. 17,18).
I ovando seu discurso ao clímax, Moisés então diz:
KwiONHI'i PNI' 1 1 A p i III »A *>
A Vl!'A< i III \N«I< MIM M» 'i-
()s céus c íi terra i oi no, liojc, por tcstemunhiiH eontru ti, <|iic* te propun .1 
vida e a morte, a bênçflo e a maldiçíio; escolhe, poiw, u vida, para que v í v u h , j 
tu c a tua descendência, amando o Skni i o r , teu I )cus, dando ouvidos sua 
voze apegando-te 11 cie; pois disto depende a tua vida e a t ua longevidade; 
para que habites na terra que o Sk.NI IOR, sob juramento, prometeu dar a 
teus pais, Abraão, Isaque e Jacó (vs. 19, 20).
O que temos no livro de Deuteronômio, focalizando nessa passagem, r ti 
descrição de Yahweh, o grande Rei, o Senhor soberano, dando suas leis, 8UM n 
truções para a forma correta de vida, e chamando seu povo para compromilH 
obediência inabaláveis e totais. As duas opções pactuais de obediência am orolf 
desobediência idólatra são dispostas diante deles.
As consequências são claras. Deus reage à nossa reação. O caminho da obnlifl 
cia é o caminho da paz; resulta em vida e bênção da mão de Deus. M as o camml 
da desobediência é o caminho de morte e da maldição do julgamento.
As consequências são inevitáveis. Pois a desobediência vai contra a própi 
natureza da criação em si. O pecado é rebelião contra a estrutura e contra o E mIi 
turador da realidade. Tal rebelião é, inevitavelmente, autodestrutiva.
Por outro lado, satisfazer a natureza criada, estar em obediente harmoil 
com as leis de Deus, é a plenitude da vida. Por essa razão, encontramos no form 
estruturado de modo cuidadoso de Gênesis 1 uma afirmação repetitiva de 1 ) f 
de que a reação original da criação à sua Palavra era boa, até mesmo muito lut 
E a raça humana recebe, na criação, a bênção pactuai (G n 1.28).
Entretanto, em Gênesis 3 acontece exatamente o oposto. Lá, no relato da (]i 
da, encontramos que o resultado da desobediência humana é a declaração de tiiitt 
série de maldições (3.14-18). Ou, como Paulo explica em Romanos 6.23: “O salií 
do pecado é a morte”. Esse é o único resultado possível quando desobedecenioH 
palavra da vida.
Em outras partes a Bíblia chama essas duas direções básicas de vida de caml 
nhos de sabedoria e de insensatez. Do mesmo modo como o projeto maravilhoso 
Deus para a criação mostra sua sabedoria (evidente em suas leis sábias para todfl 
vida), assim também nossa resposta obediente a essas leis constitui nossa sabedo: 
Nas Escrituras rebelar-se contra os padrões da criação de Deus é considerado com 
a mais extrema insensatez.
Uma separação entre o sagrado e o secular?
Os caminhos da sabedoria/obediência e da insensatez/desobediência cruzar 
se em tudo 0 que fazemos. Somos chamados para servir ao Senhor e reconheQ
U h o n i i i i B N fto A ( J H lH A ('I 
iiiíiiln c m toda íi CHÍcni d r tu,tli» de momnh!. a t iv id ades culturais. Acjui níío exis-
IH ........... . lentos Híigrudo/HCoilni N onno culto a I)eus não é algo que fazemos
H|||h i|i nossa vida humana comum. A Bíblia não conhece tal dicotomia. Na
Nfln bíblica toda a vida, em todas as suas dimensões, é constituída como
klflM I )í!mlc nossas escolhas econômicas até nossa recreação, de nossa vida de 
l|ÍH ti hirmii como damos banho em nossos bebês, em toda atividade cultural e
I VlvcmoM somente em resposta ã lei cósmica da criação de Deus. Este universo 
fftliijili tumente de Deus. E somos chamados para ser responsáveis em nossa 
MÉit 'I hiiil íll»rangenteTorá.
!N I in ,i nc|v.iração sagrado/secular é difícil. Muitos contestam, argumentando que 
||f„ , t il! padrões para algumas das ações humanas, mas que para outras ele é, sim- 
piilHttc, Indiferente. Eles argumentam que, em alguns aspectos, a vida é realmente 
mus não pode ser identificada de maneira rigorosa com a religião. Afinal, 
tyimi t i Inlianismo não se aplica diretamente a tudo o que fazemos. Por exemplo, 
b ftittt nc ilplica a atividades tão “seculares” como a agricultura e as artes.
I hi de aplica? Veja o que a Bíblia diz em Isaías 28:
Porventura, lavra todo dia o lavrador, para semear?
( )u todo dia sulca a sua terra e a esterroa?
Porventura, quando já tem nivelado a superfície, não lhe espalha o 
Ml li lio, não semeia o cominho, não lança nela o trigo em leiras, ou cevada, 
lin devido lugar, ou a espelta, na margem? (24-25)
1 UI lio o fazendeiro sabe como arar os campos e semear as sementes? “O seu 
Ppll« iiBhim o instrui devidamente e o ensina” (v. 26). A passagem continua:
() endro não se trilha com instrumento de trilhar, nem sobre o comi­
nho se passa roda de carro; mas com vara se sacode o endro, e o cominho, 
ei ii ii pau. Acaso, é esmiuçado o cereal? Não; o lavrador nem sempre o 
Mlhí debulhando, nem sempre está fazendo passar por cima dele a roda 
dn Neu carro e os seus cavalos (vs. 27-28).
I lido isso sobre uma atividade mundana como os métodos de colheita de 
lllu huendeiro. Como ele sabe a forma correta de colher o grão? “Também isso 
Mi ii pi Ir do S e n h o r dos Exércitos; ele é maravilhoso em conselho e grande em 
■il» i-loíhi" (v. 29).
KlU outras palavras, o entendimento do agricultor a respeito da maneira correta 
tf* \ iilllvur uma fazenda - a prática da boa agricultura - é consideradona Bíblia 
vindo de Deus. O fazendeiro está conectado à sabedoria de Deus. Ele foi 
Mi ItFPCldo e segue as sábias leis de Deus, suas normas sobre a criação, nessa área 
HbtyiHuncnte secular da vida.
( ’oiisiilcic ou iro exemplo bíblico, ilesin ve/ relacionado miii u construção
tabernáculo (Êx 31). I )cu8 explica a Moisés que ele encolheu Mezulel como arlíl
mestre para administrar »> trabalho do tabernáculo. A questülo significativa ufltil ̂
a razão dada para a perícia de Bezalel. ( ) Senhor diz:
O enchi do Espírito de Deus, de habilidade, cic inteligência e de 
conhecimento, em todo artifício, para elaborar desenhos e trabalhar em 
ouro, em prata, em bronze, para lapidação de pedras de engaste, para 
entalho de madeira, para toda sorte de lavores (Ex 31.3-5).
Essa passagem pode abalar nossas ideias pré-concebidas a respeito do »1110 
significa servir a Deus; ela pode abalar nossa cosmovisão. Êxodo 31 pode cauMi 
uma mudança estrutural no modo como vemos a relevância do Cristianismo pattl 
a vida. Ele fala do propósito de Deus cm sermos cheios do Espírito de Deus.
O Espírito de Deus nos capacita a viver obedientemente, viver uma vida 
santa de acordo com seus padrões. Deus encheu Bezalel com seu Espírito de lal 
modo que ele fosse conduzido à obediência artística. Yahweh, o Criador e Scnl 1111 
do universo, aquele que nos criou como seres artísticos, queria um bom traballm 
feito em seu tabernáculo; assim, ele capacitou Bezalel a discernir e obedecer a seus 
critérios da perícia profissional e da arte.
tudo o que fazemos deve ser feito com o coração cheio de amor a Deus. Se noMa 
vida não for uma expressão de nosso amor por ele, ela expressará rebelião contia 
ele. Essa é, simplesmente, nossa natureza religiosa como portadores da imagem 
de Deus. Toda a nossa vida cultural está sujeita às normas de Yahweh, e somou 
chamados a responder a ele em obediência.
Reinos em conflito
Contudo, temos falhado em nosso chamado. Somos pessoas débeis que tôm 
servido a ídolos em vez de refletir a imagem de Deus. Vivemos em uma criaçfln 
caída e gemendo por redenção. O pecado não é, simplesmente, uma possibilidade 
criada; é um fato presente. Essa é nossa experiência humana comum. A queda 
aconteceu, e a maldição foi proclamada.
Mas como isso ocorreu? Como o pecado entrou na boa criação de Deus? 
Satanás tentou assumir o domínio da criação incitando seus habitantes, sujeitos a 
Yahweh, à traição de seu Governante de direito. Ele liderou uma rebelião contril 
o legítimo Rei da criação e estabeleceu seu próprio reino renegado, chamado em 
Colossenses 1.13 o império das trevas. Satanás intitulou-se um governante (fti 
Escrituras o chamam príncipe) apesar de ser, apenas, um pretendente ao trono, não 
tendo nenhum direito legal à autoridade.7 Seu reinado, estabelecido em oposição
Esses dois exemplos de Isaías e de Êxodo ilustram o ensino bíblico central
i I )ru*t i' puriwitrtrio, C 'orno Salunrtu uno tem um reinado legítimo (ou cria 
|j) jiiihi ele próprio governur, vive Nr punido do governo de I )eus. Seu domínio 
|k)Hlr em tentativas de distorcei a bou i 1 iuçíto de I )eus. Seu reino de destruição 
linilli i i oiiirn a sábia ordem de I )eun para a criação.
AmíIiu Siitanás levou a raça humana ao pacto da desobediência. Ele tentou o 
■ illillim iK ) a rejeitar o governo de Yahwch e emitir sua declaração de independên-
i d. M0U C Viador. As consequências são devastadoras. Quando a comunhão com 
[ i liii U ii da vida c quebrada, a morte é o resultado inevitável. A vida não é mais 
iii|iIHii, mus destruída. Colapsos pessoais, interpessoais e sociais são abundantes
ii vida é separada de sua fonte. Além do mais, a declaração de independência 
|{li nhl i a Ncr uma ilusão. Em vez de encontrar autonomia, descobrimos que ainda 
M(l* nervos sujeitos a um déspota que governa sobre um reino de escravos.
Mm em a queda afetou mais do que a humanidade; nosso pecado escravizou 
|) l iti Mm razão de Deus ter nos dado uma autoridade singular sobre a criação, 
liHit demibedicncia levou toda a criação a ficar sob maldição. Daí em diante a 
M cultural, a vida humana em todos os seus aspectos, passou a ser um conflito. 
Iffimai de refletir a imagem de Deus em nosso domínio da terra, vamos contra a 
iHmyu da vida; contradizemos a maneira como as coisas deviam ser. Na verdade, 
-iilitidi/emos nosso próprio ser; não nos preocupamos mais com a criação; de
i omeçamos a experimentar a terra como uma inimiga. Em vez de preservar e 
ÍH)Vt)lver a criação, nós a destruímos e exploramos. Governamos a terra em deso- 
illíjlU ia, Assim como o déspota usurpador, agimos como déspotas (Jo 8.41-44).
I *01110 consequência, toda a criação, diz Paulo em Romanos 8.19-23, geme e
I <n íi | leia hora em que será: “Redimida do cativeiro da corrupção, para a liberdade
I fejririil dos filhos de Deus”. Em outras palavras, a criação está esperando por 
tylkli libertação. Somente então ela será verdadeiramente restaurada. Porque ela 
} Nfii l nvizada pelo nosso governo pecaminoso (a maldição que era a consequência
1 nimua desobediência), apenas nossa redenção garantirá sua liberdade.
I >ois reinos estão em guerra. Uma batalha espiritual está acontecendo, um 
infUfodc reinos que permeia todo o conjunto de atividades humanas. D o mesmo 
mim omo as duas maneiras pactuais influenciam tudo o que fazemos, da mesma
111 ui oh dois reinos. Assim como toda a nossa vida cultural é criada e permanece 
ih o domínio de Deus e assim como somos chamados para servi-lo em tudo que 
#P!ftOH, lambém toda a nossa vida se encontra agora caída. Nada há na criação
o pecado não tenha tocado: “O mundo inteiro jaz 110 maligno” ( l jo 5.19). 
Apesar de Deus ainda nos chamar para executar nossa tarefa cultural obedien- 
Hii'liU‘, o usurpador nos propõe um pacto de fidelidade ao seu reino renegado, 
fluido assim nosso chamado legítimo. As palavras criteriosas de C. S. Lewis
iii direto ao ponto central, com respeito à nossa situação pós-queda: “Não existe 
iIm neutro no universo: cada centímetro quadrado, cada segundo tem seu direito 
tlUOrido por Deus e tem uma pretensão oposta de Satanás”.8
Uh oniiI'1 hndoa i.tui itA M
C a p í t u l o 5
T r a n s f o r m a d o p e l a r e d e n ç ã o
\ nihinovisiio bíblica afirma a bondade da criação e fala da tarefa humana 
tmiuiN grandiosos. Mas ela não romantiza a vida; ela é totalmente realista
ii iln ui tu ação difícil do homem. Na verdade, se a cosmovisão bíblica parasse 
il tllm ussao a respeito do que está errado, teríamos razão para um profundo
I iilicianio, a visão bíblica oferece esperança. Ela não somente trata do pro- 
H domai, mas nos diz como Deus respondeu a quarta pergunta da cosmovisão: 
ril • ii Nolução?”
J r
íórla redentora
A llíblia promete que as reivindicações ilegítimas de Satanás um dia cessarão;
o Imt será destruído. Gênesis 3, o próprio capítulo que narra a queda, anuncia 
f iiiinm indício do plano redentor de Deus. Em meio à sua declaração de julga- 
Hli do pecado, Deus diz a Satanás: “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre 
Hiil dnuvndência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o 
'i miiIuh " (G n 3.15).
Aqui, embutida nas maldições pactuais, vem uma promessa do fim dessas 
hIiIiçOck: por meio do descendente da mulher, Deus diz que Satanás será der- 
irttloi
I1' óbvio que o descendente da mulher é Jesus, o Messias prometido, aquele 
‘ts Vflío para destruir para sempre o reino das trevas e realizar a redenção de Deus 
hi o inundo caído. Mas o descendente também se refere aos descendentes de Adão 
I Vil que chegariam até Jesus. Apesar de Deus, no final das contas, trazer salvação 
J meio de Jesus, ele profetizou a respeito de Jesus durante um longo processo 
lÈÒflco que podemos chamar adequadamente de história redentora.1 Essa é a
A VlsAi i iKANHI i illMAIX 'KA
história que as líscrituras contam. Elas relatam o iliiiiim dou íiIon podcroftoH 
Deus na I listória - conduzindo ao seu maior ato, u encarnação de Cristo ■ pi 
meio da qual ele reverte a queda,golpeia o pecado e iiHHÍm restaura e redimfl julu 
criação caída.
Qualquer cosmovisão construída a partir da Bíblia, como resultado, de 
focalizar na encarnação de Cristo - sua vida, morte c ressurreição. M as precisanut 
também compreender algo da história da redenção, tudo o que precedeu e esttlbí 
leceu o contexto para sua vinda. Embora Jesus esteja no centro do plano redentd 
de Deus, o mesmo não o enviou de imediato à cena da queda - pré-embalado, po 
assim dizer. Em vez disso, o Deus da História preparou o mundo para a vinda d( 
Messias.
A história redentora, como a Bíblia a relata, prossegue principalmente por me 
de uma série de alianças históricas as quais Deus estabeleceu com a raça human 
Assim, a maneira como Deus se relaciona conosco na salvação é estruturada em MM 
relacionamento original e fundamental com a própria criação. A redenção, COM{ 
a criação, é em seu teor pactuai. Por essa razão, no clímax da história redentoii 
temos a nova aliança inaugurada por Jesus e selada por seu sangue.
M as, para compreender com mais clareza o significado daquele pacto niii 
ximo, olhemos, inicialmente, duas alianças do Antigo Testamento, aquelas <|iií 
Deus fez com Noé e com Abraão. Veremos como elas contrastam entre si e eoin 
a nova aliança.2
O -pacto com Noé. D e acordo com Gênesis, a desobediência inicial de Adfli 
levou a mais desobediência, e pior. Gênesis 6.5 diz que: “Era continuamente nuii 
todo desígnio do seu coração”. Nossa condição de caídos dificilmente podci'1 
ser descrita com. mais intensidade; o livro de Gênesis nos diz que Deus ficou lili 
enojado dessas criaturas desobedientes, que pararam de refletir sua imagem, (|iií 
ele se arrependeu de tê-las criado. E assim veio o julgamento - o dilúvio.
M as este ainda não era o julgamento final. Pois Deus havia prometido a ed 
perança por meio de descendente da mulher. E assim ele salvou Noé e sua famllln 
Aqui, encontramos a divisória entre os dois caminhos pactuais. Toda a terra estiU 
presa à desobediência e à rebelião contra Deus, e ainda assim: “Noé era hometi 
justo e íntegro entre os seus contemporâneos; Noé andava com Deus” (G n 6})) 
Vemos duas maneiras de vida com duas consequências. A desobediência traz mim 
maldição - nesse caso, o dilúvio. M as a obediência traz bênção.
Depois do dilúvio Deus estabeleceu seu pacto com Noé e todos os seus dofl 
cendentes e com toda criatura vivente. Ele prometeu que nunca mais traria uii 
julgamento desse tipo sobre a terra, não importando quão maldosas se tornassel 
as pessoas.
Embora esse fosse o primeiro pacto na Bíblia denominado pacto (ver G n 6.18) 
ele é nitidamente desenvolvido com base na relação de pacto fundamental de Dei 
com sua criação. Em Gênesis 9 .9-17, Deus diz, explicitamente, por seis vezes, quel
I U M I' li lUMAIH) II IA Hl I )l Mi, Al I (>7
fiin it ' mu Noé 6 oom:"*Cbdon ou r....... vjv» iiItn"ou rom <1 própria terra. lilementos
pi h ! iii il ch encontrado» em Cîcue»un l , nu no nossa criação à imagem de 1 )eus (9.6)
# HiiiiuUto de ser fecundos e enclier a lerni I, 7), são repetidos. Até mesmo o 
tliftii pactuai regular da criaçflo û mencionado em 8.22: “Enquanto durar a terra, 
|ii ilríHnin ile haver sementeira e ceifa, frio e calor, verão e inverno, dia e noite”.
Apesar disso, esse não e o pacto inicial de Deus com a criação. Nesse meio 
)pHt| >il aconteceu o pecado. Certas modificações consideram a situação pós-queda, 
« 1 1 " ii admoestação contra tirar a vida humana em 9.5-6 .
I INC é o pacto redentor de Deus. Aqui Deus trabalha, não criando o mundo 
p ) HUMeiltando sua existência, mas executando seu plano de salvação, seu plano de 
IímIiiiiIi mcii mundo caído. E ele inicia com a redução da população da terra para 
ijltni íiimília justa, apesar de o pacto continuar sendo de alcance universal.
( i /un to com Abraão. Uma nova e significativa fase na história da redenção é 
Hmh iiiIn por ( ïênesis 12. Até esse ponto a aliança de redenção de Deus, estabelecida 
ËHIH Nne, era estendida a toda a criação - entre Deus e toda a terra. D e Gênesis 
I i mIi* o lim do Antigo Testamento, o pacto original de Deus com a criação ainda 
mnllnuii (por isso o mundo ainda está aqui). Ainda assim Deus estabelece um pacto 
Njif»i liil com Abrão (chamado mais tarde de Abraão) e seus descendentes.
I )e todo o mundo, agora Deus se relaciona especialmente com uma família, 
H|> logo sc torna uma nação. Deus promete fazer dos descendentes de Abraão 
lllll III III le povo e dar-lhes a terra de Canaã como herança. E o propósito é que: 
"Nt mu benditas todas as famílias da terra” (G n 12.3). Deus, como Rei do pacto, dá 
Uni 1'ftlavra de lei a Abraão e sua exigência pactuai: “Anda na minha presença e sê 
jinl* Itn" (( In 17.1). Apesar disso, o que mais sobressai em todas as fases do pacto 
lililillllilico é sua palavra de promessa (G n 12.1-9 ; 13 .14-17; 15 .1-21; 17.1-21). 
A Plifkme é na fidelidade de Deus com a aliança e o que ele realizará por meio de 
Miiilíln e de seus descendentes.
Anniin como o pacto com Noé era com todas as pessoas e toda a criação, assim 
failliif*in, mais tarde, no novo pacto por meio de Jesus Cristo, seria, de uma vez 
i&Ftl nnnprc, aberto para todos. M as até essa ocasião, Yahweh estreita o foco de sua 
irdentora, e assim sua aliança redentora, a Abraão e seus descendentes. Esse 
|l h furo básico do pacto no restante do Antigo Testamento.3
IW que Deus limitou seu pacto dessa maneira? Qual era o propósito em 
Mi liili tudo, menos um povo e nação, pelo menos temporariamente?
Nus Escrituras, povos e terra são intimamente relacionados. “Quem somos” 
ij'iiihiilores da imagem formadora de cultura de Deus) é inseparável de “onde 
n IíIiiiúh” (na boa criação de Deus que deve ser guardada e cultivada). O plano 
tHlftlunl de Deus na criação era que um povo santo e obediente refletiria sua 
M artin e viveria em um relacionamento pactuai com ele em uma terra até então 
{plu t niTupção. M as veio então o pecado, afetando tanto a humanidade quanto
ii li ira. K então, o plano de Deus transformou-se em criar outro povo santo (o
corpo redimido do Cristo), que viveria diante dele nu n l.it ionuiiiento pactuai t m 
uma terra renovada. A segunda carta de Pedro 3.13 menciona: "Novos céus e novit A 
terra, nos quais habita justiça”.
M as para realizar isso o Messias teve de vir, aquele cuja missão seria a »l< 
destruir o pecado em sua raiz, libertando assim a criação de sua escravidão uo 
maligno. Para fazer isso Deus focalizou seu pacto temporariamente. Primeiro, fclfl j 
criou um povo santo temporário, Israel, vivendo em uma terra temporariamente 
purificada, Canaã. No meio deste povo, nessa terra, o Messias nasceu e cresctui. = 
Apesar de Deus trazer uma redenção parcial por meio de sua aliança com Abra fio 
e seus descendentes, o principal propósito era preparar um contexto no qual o I 
Messias pudesse vir. Aquele que inauguraria a nova aliança e assim efetuaria u 1 
redenção total e completa da criação.4
O nazareno manifesto
O termo nova aliança aparece pela primeira vez em Jerem ias 3 1 .3 1 -3 4 , cm 
que ele fala da era messiânica. Vemos mais tarde, especialmente em conexSo ] 
com Jesus, em IC oríntios 11.25 e Hebreus 8 .6 -1 3 e 9.15. M as as referências são 
poucas e distantes umas das outras. Apenas a passagem de C oríntios se refere I 
ao uso que Jesus faz do termo. M as outra expressão, praticamente equivalente 1 
à ideia da nova aliança, estava sempre em seus lábios, anunciando a suma e | 
essência de sua mensagem. Essa expressão é reino de Deus.
A ideia do reino messiânico é central nos evangelhos sinóticos e sabemoH i 
pelos registros bíblicos que Jesus iniciou seu ministério público anunciando a vinda J 
de seu reino.5 Depois de seu batismo no rio Jordão e tentação no deserto, Jesus* 1 
voltou à Galileia. Lá, em sua província natal, ele proclamou o evangelho de Deus I 
(M c 1.14). Qual era a natureza desse evangelho, essas boas-novas? “O tempo está I 
cumprido, e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede noevangelho” 9 
(M c 1.15). No ensino de Jesus, o evangelho do arrependimento e da fé era intei- | 
ramente conectado à vinda do reino de Deus.
O evangelho de Lucas, diferente de Marcos (e M t 4.17), não começa o registro j 
do ministério de Jesus com sua proclamação do reino. Por que ele omite isso se a I 
ideia é tão fundamental para a pregação de Jesus? A explicação mais plausível é I 
que Teófilo, a quem Lucas escrevia (1.3), era um grego e não perceberia o signi- I 
ficado completo dessa ideia hebraica. Ele não era suficientemente familiarizado 1 
com a cosmovisão bíblica para entender o que Jesus queria dizer com reino de I 
Deus. Assim, em vez de usar essa imagem no início, Lucas registra para nós um I 
incidente no qual Jesus explica a natureza do reino de Deus - sem, contudo, men- 
cionar a expressão.
OH A VlNAi1 rUANUlH HIMAI )i >UA
THANSI'C 'HM A I h > |»MA UI 1 >1 N(, Ai i 6 9
Aprendemos cm l/iu.r. I • pm , ili pois de leu batismo c tentaçfto, Jésus re- 
iHilioii îi sua cidade natal, Na/nnS c foi à sinagoga no sábado. C) rolo do profeta 
j«iiiii'i foi passado a de; de o ftbrlu no capítulo M . O que se segue bem que pode 
nt i i Iminuido de tnanifestaçflo do nazareno, pois esboça como Jesus via sua missão.
I I* leu para as pessoas:
O Espírito do Senhor está sobre mim, pelo que me ungiu para 
evangelizar os pobres; enviou-me para proclamar libertação aos cativos 
c restauração da vista aos cegos, para pôr em liberdade os oprimidos, e 
apregoar o ano aceitável do Senhor. (Lc 4.18-19)
K então ele devolveu o rolo, sentou-se (como era o costume dos rabinos 
i|iiiiudo iam ensinar) e proclamou: “Hoje, se cumpriu a Escritura que acabais de 
Hii l̂r” (Lc 4.21).
|esus havia citado uma profecia do Antigo Testamento da era messiânica.6 
1̂ Iiim li i|iiê ela se referia? A missão do Messias seria restrita a uma esfera pura­
mente f*\piritual, da maneira como esses versos são normalmente interpretados? 
t Mi a passagem tem um significado de fato literal, e diz algo concreto? Siga o que 
■ti iinlecc poucos capítulos mais tarde, em Lucas 7:
Jesus havia realizado obras miraculosas, e as notícias chegaram até João Ba- 
llftlil, <|uc estava na prisão. Assim, João envia dois de seus discípulos a Jesus com a 
jlPI'gunta: “Es tu aquele que estava para vir ou havemos de esperar outro?” (Lc 7.19). 
Inun responde com simplicidade: “Ide e anunciai a João o que vistes e ouvistes: os
veem, os coxos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos 
Mil < i ressuscitados, e aos pobres, anuncia-se-lhes o evangelho” (v. 22).
Lm outras palavras, Jesus diz que a evidência de sua função messiânica podia 
||l encontrada nas obras físicas que ele estava realizando. As palavras em itálico 
fio cumprimentos da profecia de Isaías a qual Jesus citara previamente em sua 
mun i ( estação. Lucas retrata o ministério de Jesus como o cumprimento de uma 
profecia messiânica. Em sua natureza ela continha dois aspectos: a proclamação 
Verbal das boas-novas do reino de Deus e a manifestação física do reino.
Reino e aliança
Mas por que devemos chamar isso o reino de Deus? O que as boas-novas 
tfm a ver com o reinado ou o governo de Deus? Apenas isto: o reinado de Deus 
r* pactuai por natureza. Vimos no Capítulo 4 que Deus vincula suas criaturas a si 
pela sua palavra soberana; ele governa por decreto. Então, a criação, como reino 
pailual de Deus, reage à sua palavra em obediência ou desobediência. O significado 
da queda é que a raça humana dedicou sua lealdade a outro rei, resultando em
desobediência pactuai i\s leis de I )eus, I)cssc modo, r\pn iiiienlmiiOH nao apentui • • 
pecado humano intencional e vários tipos de cativeiro enlie Immiuios, mas também 
doenças físicas c morte. A boa criação de Deus tem sido dintorcida de todas csmin 
maneiras pela queda.
Nesse contexto, Jesus veio como Messias e Salvador. lCssa restauração coiw 
siste, primeira e principalmente, no perdão dos pecados, mas ela também envolve 
a restauração total das vidas humanas (incluindo a cura das enfermidades) pulu 
obra de Cristo.7 Jesus, enquanto estava na Terra, ao se engajar nesse ministério 
demonstrou as boas-novas que ele proclamava - pois o governo redentor de Deilf 
sobre a criação havia começado. O reino de Deus havia chegado.
Apesar de o reino de Deus ser a designação central do governo redentor de 
Deus nos evangelhos sinóticos, a expressão não é comum nos outros escritos do 
Novo Testamento. Mesmo assim, o caráter restaurador e o alcance cósmico dii 
salvação são ideias constantes em toda a cosmovisão neotestamentária. VarisiH 
passagens de Atos, Apocalipse e das epístolas confirmam isso.
Já observamos a declaração de Paulo em Romanos 8.19-23 de que toda it 
criação está gemendo debaixo da maldição da futilidade, esperando o dia quando 
será libertada de sua escravidão seguida da redenção liberadora dos filhos de DeiiH, 
Encontramos a mesma noção de recriação de todo o universo em 2Pedro 3.10-13 
e Apocalipse 21.1. Ambos referem-se ao final do velho e o aparecimento do “novo 
céu e nova terra”. Atos 3.21 registra um pensamento semelhante, falando de uni 
tempo futuro quando, de acordo com sua promessa dada por meio dos profetas, 
Deus restaurará todas as coisas. E Colossenses 1.20 proclama de forma paralela que
0 plano de Deus é que: “Reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre 
a terra, quer nos céus”, pelo sangue expiatório de Cristo. Podemos comparar essa 
obra reconciliadora com o propósito eterno de Deus declarado em Efésios 1.10: 
“D e fazer convergir nele, na dispensação da plenitude dos tempos, todas as coisa«, 
tanto as do céu como as da terra”.
Todas essas passagens enfatizam dois temas. Em primeiro lugar, todas as coisas 
(nos céus e na terra) serão redimidas. A redenção é, verdadeiramente, cósmica em 
se tratando de alcance. Esse tema concorda, por completo, com a natureza holística 
de nossa vida pactuai discutida no último capítulo. Nenhuma área da criação está 
além do alcance de Deus ou de seu cuidado. Nenhum aspecto de nossa vida cultural 
está isento de seu plano redentor e justo governo.
O segundo aspecto é que essas passagens (com exceção de Efésios 1.10) veem 
a salvação como refazendo algo. Romanos 8, por exemplo, descreve a redenção 
como o comprar novamente da escravidão e, como resultado, libertar. Colossenses
1 fala de reconciliação, que significa trazer de volta à unidade e à harmonia aqueles 
que foram separados pela inimizade. Tanto 2Pedro como Apocalipse enfatizam 
claramente a recriação, a restauração do original, da bondade da época da criação, 
perdida pelo pecado.8
I U A N M i lH M A I» i PUI A UI l ' l N i . A i ■ 7 1
( ) plano de Deul il<* milvH»,i\o involve, iinhúii, todo o universo. O novo nas- 
lim pito nflo cHtíl limitado Noineuie ,i huintui idade. A passagem do evangelho dc 
jiifli), na qual encontramoK n Irase: “NuHcido de novo”, contém as únicas referên-
i Iiih duquclc evangelho ao reino de I ) cmis (3 .3-5). Deus ama o mundo e, portanto,
ii ntttova (dá a ele um novo nascimento) e diz a Nicodemus para ser parte dessa 
|f linvaçilo por meio de seu próprio novo nascimento.
0 usurpador detido
M as e a parte de Jesus nisso? Como na verdade ele efetua o reino de Deus? 
l/i ui lo o reino messiânico é baseado na obra do Messias? Para responder essas 
Ittjfgimtas nos voltamos para um acontecimento que relaciona a vinda do reino de
1 Ihiu com o triunfo da morte e ressurreição de Jesus. (Esse incidente é registrado 
iidn irôs sinóticos: M t 12.28-29, M c 3.27 e Lc 11.20-22.)
Nessa ocasião Jesus é acusado de expelir demônios pelo poder de Satanás. Em 
IfmpoHta ele menciona que, se esse fosse o caso, Satanás estaria trabalhando contra 
Al próprio. “Se, porém, eu expulso os demônios pelo dedo de Deus, certamente, é
i limulo o reino de Deus sobre vós” (Lc 11.20). E aí vem a analogia fundamental: 
"Ninguém pode entrar na casa do valente para roubar-lhe os bens, sem primeiro 
rtlfUirrá lo; e só então lhe saqueará a casa” (M c 3.27). Jesus está dizendoque sua 
Vilitla para a terra tinha um propósito específico. Era de atacar e sobrepujar Sata- 
liiln, o valente, e amarrá-lo. Isso é o que Cristo realizou por meio de sua morte e 
lÜÜHUiTcição. Tendo sobrepujado e amarrado o valente, ele estava agora em posição 
(lc reivindicar as possessões que o príncipe usurpador havia tomado de Deus.9
Entretanto, a vitória do reino de Deus exigiu a morte de Jesus Cristo como 
n ( 'ordeiro de Deus, que sofreu a maldição pactuai pelos nossos pecados. O julga- 
llinito pactuai completo de Deus, por todos os pecados do mundo, caiu sobre Jesus 
tjUHiido ele foi pendurado na cruz, abandonado por seu Pai. Por ter sofrido aquele 
tlbnndono, não somos mais amaldiçoados por nossa desobediência. Jesus tornou-
11 sacrifício final, último, pelo pecado, por sua morte e ressurreição triunfal foi 
Dferccida a nós a bênção pactuai gratuita da vida eterna e abundante em comunhão 
tom Deus. A obra é toda de Deus. Temos apenas que nos arrepender de nossos 
pecados e nos voltar para Cristo em fé.
Por meio da vitoriosa morte-ressurreição de Jesus ele inaugurou o reino de 
I )eus. Ele começou a restaurar a obediência dos súditos de Deus que outrora fo- 
rum rebeldes. O reino messiânico que Jesus trouxe é, assim, a revogação do mal, a 
renovação da boa criação de Deus.
Ainda assim, Jesus não tentou estabelecer o reino total e imediatamente en- 
(|Uimto estava na terra. Por exemplo, ele não decidiu curar todas as pessoas doentes
r~V v i p w i U W rN B H H tM A IM H IA
do mundo. ICssa não era sua tarefa. Ele veio por.i iniuijinnit o reino. Por meio il< 
suas palavras e obras ele anunciou a chegada desse reino; nhih milagre« apontavuni 
para o fato de (|uc Deus havia começado a desfazer as obrtiN de Satanás.
( ) reino de Deus, explicou Jesus, é como um pouco de lermento colocado 
na massa, que permeia toda cia (M t 13.33 e Lc 13.20-21). Entretanto, o ponto 
central dessa parábola não é que o reino crescerá gradualmente até encher toda* 
as coisas. Jesus não era pós-milenista.10 Ele não acreditava que o mundo ficaria 
cada vez melhor. Ele reconhecia que o crescimento do reino era um esforço e tuim 
batalha. M as a parábola nos anima. Assim como o fermento do pecado permeou 
radicalmente toda a criação, assim também o fermento do reino agora alcança 
todos os lugares onde a maldição éencontrada. E nos últimos dias o reino virá em suil 
plenitude pela intervenção cataclísmica do próprio Deus.
Ainda temos na criação tanto o fermento do reino quanto o do pecado.1 
Daí a importância da primeira e da segunda vindas de Cristo: o reino vem em 
duas etapas. Ao passo que sua primeira vinda significou a inauguração do reino 
de Deus, sua segunda anunciará a consumação. Em primeiro lugar está o dia I),
o primeiro advento de Cristo quando ele deu um golpe decisivo no pecado e em 
Satanás. Aqui a batalha já foi vencida; o reino de Satanás está condenado. Mas a 
guerra ainda não terminou. Os combates continuam e o domínio das trevas ainda 
luta. M esmo assim, a batalha, em princípio, está vencida. E no fim será o dia V, 
dia da vitória, quando Cristo retornar para eliminar o pecado, anular os efeitos da 
queda, trazendo assim nossa redenção completa.12 Paulo diz:
Então virá o fim, quando ele entregar o reino ao Deus e Pai, quando 
houver destruído todo principado, bem como toda potestade e poder. 
Porque convém que ele reine até que haja posto todos os inimigos debaixo 
dos pés. O último inimigo a ser destruído é a morte (IC o 15.24-26).
Satanás está totalmente derrotado. A vitória repercute em Apocalipse 11.15: 
“O sétimo anjo tocou a trombeta, e houve no céu grandes vozes, dizendo: O reino 
do mundo se tornou de nosso Senhor e do seu Cristo, e ele reinará pelos séculos 
dos séculos”.
A vitória de Deus no fim será tão completa que o reino é descrito como uma 
pedra, cortada sem o uso de mãos, que cresce até se tornar uma montanha e enche 
toda a terra (Dn 2 .34-35 , 44). O reino de Deus vindouro é tão radical em seu 
efeito purificador e transformador que nada (e nenhum tipo de coisa) escapa à sua 
influência. Nada na criação está, em princípio, fora do alcance da redenção.13
Onde nós ficamos no meio dessa redenção cósmica? Como nos encaixamos 
nos planos de Deus de salvação? Quem somos nós como humanos redimidos? E 
qual é a nossa tarefa redentora? Aqui nos voltamos para nossa resposta a um tema 
preeminente do Novo Testamento: a renovação da imagem de Deus.
I HANM'ORMADO 1*11 A HI III mi, Ai I 7 '
Rtnovaçâo da Imna&m
ObNorvamos anteriormente como o Antigo Testamento sc refere pouco à 
Hohrm criação imagem do I )cuh, o relacionamos esse fato à presença do pecado, 
nii particular da idolatria. O Novo 'I estamento, ao contrário, está cheio dessas 
u-lrifMicias. Contudo, a ênfase nao c, apenas, em nossa criação à imagem de Deus, 
mil* na restauração dessa imagem na igreja, o corpo de Cristo, que é vista como a 
llOVii c redimida humanidade.
() próprio fato de a igreja, em quem a imagem de Deus é restaurada, ser cha- 
limdil corpo de Cristo nos indica Cristo, o cabeça da igreja. O Novo Testamento 
irlrir se a ele como a imagem de Deus p ar excellence (C l 1.15; Hb 1.3; 2C o 4.4-6). 
Apennr dessas passagens poderem ser consideradas como referentes à posição sin­
gular ilc‘ Cristo como Deus, elas também se referem à sua perfeita humanidade.14 
l ’i Into é a imagem perfeita de Deus, o homem paradigmático que representou Deus 
totalmente e mediou a presença de Deus na extensão total de sua vida terrena e 
humana. Daí a declaração clássica em João 14.9: “Quem me vê a mim vê ao Pai”, 
|ii it ler, facilmente, fazer referência tanto à humanidade de Cristo como à sua deidade. 
Nu verdade, o evangelho de João está cheio de declarações relacionadas à perfeita 
obediência de Cristo e à unidade de propósito com o Pai, obediência e unidade que 
«oi nos chamados a imitar.
ICsse ensino é encontrado em outros textos das Escrituras. Por exemplo, Paulo 
Ví' Cristo como um segundo Adão. Ele cumpriu a tarefa de refletir a imagem de
I )pus, tarefa que a falha do primeiro Adão havia começado a desgastar. Romanos 
5,12“ 19 faz um contraste de Adão com Cristo. Enquanto Adão desobedeceu a
I )eus, trazendo o pecado ao mundo e passando-o para toda a humanidade, Cristo 
trouxe salvação por obediência perfeita, a qual agora ele dá a todos que creem nele. 
Km iCoríntios 15.49 isso é fortalecido; assim como os cristãos têm ostentado a 
Imagem de Adão, falhando em refletir a imagem de Deus em nossa vida, assim 
também exibiremos um dia a semelhança de Cristo, refletindo a imagem de nosso
l 'i iador mais uma vez.
As Escrituras nos prometem que naquele dia final, quando Cristo retornar 
pura consumar seu reino: “Seremos semelhantes a ele” ( l jo 3.2). Paulo diz que, de 
lato, Deus predestinou a igreja: “Para serem conformes à imagem de seu Filho, a 
lim tie que ele seja o primogênito entre muitos irmãos” (Rm 8.29; ver Hb 2 .10-11). 
M as essa restauração da imagem não se destina somente ao futuro. Ela é também a 
realidade presente de nossa santificação, nosso crescimento à maturidade de Cristo. 
Porque Cristo, o cabeça da igreja, é nosso padrão e medida (E f 4.13), nossa tarefa 
tie refletir o governo de Deus em nossa vida é equivalente ao nosso crescimento em 
Hcmelhança a Cristo (E f 4.13). Assim como Cristo representou Deus totalmente em 
Ioda a sua vida terrena, assim nós, como igreja e corpo de Cristo, devemos manifestar 
ile modo visível a vida e a presença de Cristo nosso Senhor, aqui e agora.
74 A VNAh III Mslim ( «KM.M II m A
O Espírito que renova
Cristo está presente em sua igreja pelo Espírito Snnto que habita em nóij 
Desse modo a igreja como corpo de Cristo é uma extensão da presença de Cristo 
na terra. E le vive em nós pelo seu Espírito, que nos conforma à sua imagem. C) 
Espírito Santo, portanto, é fundamental para o entendimento ncotestamentário 
de nossa tarefa de refletir a imagem de Deus.
A vinda do Espírito Santo, no Pentecostes, marcou um novo estágio signili 
cativo nahistória redentora. Sua vinda proclamou que a era da nova aliança estava 
aqui. Sob o antigo pacto, o Espírito de Deus era mencionado apenas ocasional 
mente, e somente em conexão com certos líderes específicos de Israel. Debaixo da 
nova aliança o Espírito é derramado sobre todos que creem (At 2 .17 -18 , 38). Sob
o antigo pacto, a habitação redentora de Deus estava localizada no tabernáculo e 
depois, no templo; no novo pacto ela é o povo de Deus - corpo de Cristo, assim 
como o corpo de cada cristão - que é chamado de templo do Espírito Santo. Somos 
a casa espiritual na qual Deus habita.15
O Espírito é dado também como penhor ou garantia de nossa herança c 
glória futuras (2Co 1.22; 5.5; E f 1.13; 4.30). Por causa da presença permanente c 
transformadora de Deus conosco, podemos ter certeza de que compartilharemos 
nesse reino futuro a redenção cósmica que ele efetuará.
Pelo Espírito temos um antegozo da bênção do reino futuro - nossa trans* 
formação à imagem de Deus. Assim como Bezalel foi cheio com o Espírito para 
discernir e obedecer as leis da criação de Deus (Capítulo 4), assim também o Espírito 
leva o corpo de Cristo, hoje, a uma santidade completa. Por essa razão Paulo orava 
constantemente pela igreja, para que o Espírito desse a eles sabedoria para discernir 
a vontade de Deus e para viver com obediência em tudo que fizessem (E f 1.17; 
Cl 1 .9-10). Não devemos limitar essas orações espirituais de Paulo a alguma área 
restrita da vida. Exatamente porque nossa espiritualidade consiste na renovação de 
nossa vida total diante de Deus, devemos viver com sabedoria, atendendo à voz do 
Espírito de Deus em todo o raio de ação de nossa vida cultural.16 Dessa maneira, 
começamos a nos conformar ao governo justo de Deus.
Sob o antigo pacto, quando o Espírito não fora universalmente derramado, 
Deus deu leis pactuais detalhadas a seu povo. Nas palavras de Paulo, eles preci­
savam de um “aio” ou “tutor” para levá-los a Cristo (ver G1 3.24). M as agora que 
Cristo inaugurou o novo pacto, tais leis detalhadas estão perceptivelmente ausentes. 
Deus não removeu os padrões para a nossa vida como um todo (análogo ao âmbito 
das leis do Antigo Testamento). Em vez disso, ele deu o Espírito Santo à igreja 
para nos colocar, de novo, em contato com os padrões divinos da criação. Agora 
podemos discernir sua vontade em todos os nossos empenhos. Assim como Deus 
proclama por meio de Jeremias, profetizando acerca da nova aliança: “Na mente, 
lhes imprimirei as minhas leis, também no coração lhas inscreverei; eu serei o seu 
Deus, e eles serão o meu povo” (31.33).
I uaNM i MMÀlît > Phi A RHMIiNt;AO I e)
Como esse novo piicin iM reliuiomido com u IWblia, a Palavra escrita de
I )eiin? As Escritura« paru iión hAo o livio que nos estabelece a direção a seguir. A
I'uilivra escrita de I )cus (' uuui Pulnvru viva; ela atinge nosso coração, nos corrige e
I it in firm a no caminho certo (21m 3. U> 17; I lb 4.12). M esmo assim as instruções 
puni o viver correto não cobrem todas as situações que encontramos na vida, por 
iiniÍM que usemos nossa imaginação. Km vez disso, a lei é escrita em nosso coração 
peltl habitação do Espírito Santo, e é confiada a nós a responsabilidade de inter­
pretin' e aplicar essa lei em nossa vida.
( í raças a Deus que não somos deixados para fazer nossas próprias decisões 
Individuais. Temos não apenas a divina palavra da criação e a escrita, mas também
o Espírito do Deus vivo que nos sensibiliza aos padrões de Deus e nos estimula 
íi obediência. Daí vem a descrição que Paulo faz da obra do Espírito sob a nova 
ujiunçii em contraste com a antiga. Ele chama a nova aliança de: “M inistério do 
ICupírito” que “traz justiça” (2Co 3.8-9).
( ) antigo pacto havia trazido em si mesmo apenas condenação. Paulo destaca 
que o reflexo transitório da glória shekinah no rosto de Moisés no M onte Sinai não 
Se compara com a glória do Senhor refletida pelos cristãos. Enquanto Israel ainda 
HNii t ) véu para a mensagem messiânica (e assim para a imagem), estamos sem o véu 
Iuiru o Espírito e por ele. Paulo diz: “Todos nós, com o rosto desvendado, contem- 
plimdo, como por espelho, a glória do Senhor somos transformados, de glória em 
glória, na sua própria imagem, como pelo Senhor, o Espírito” (2Co 3.18).
Essa transformação tem um significado bem literal. Nosso reflexo da imagem 
de 1 )eus é a transformação de todo o nosso estilo de vida. Em Efésios 4 .24 Paulo 
lembra que nos vestimos: “D o novo homem, criado segundo Deus, em justiça e 
reli dão procedentes da verdade”; em Colossenses 3.10 ele diz que esse novo homem 
He: “Refaz para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou”, 
lermos como justiça., retidão e conhecimento devem ser considerados com o sentido 
hebraico, em que eles se referem no geral à obediência pactuai holística.
Juntos: refletindo a imagem de Deus.
Nós não somente temos o auxílio do Espírito Santo para discernir e praticar 
u vontade de Deus, mas também temos uns aos outros. A igreja, como corpo de 
( Visto, tem muitos membros. O ensinamento central no Novo Testamento é que
o Cristianismo não é individualista. Paulo sempre descreve nossa individualidade 
cm termos de nossa contribuição singular para o corpo (lC o 12.7-31). E quando 
Cie nos diz para sermos renovados à imagem de Cristo, ele nunca fala isso apenas 
pura indivíduos, mas sempre para comunidades de crentes ( E f 4 .7 -1 6 ,2 2 -2 4 ; 5 .1-2 ;
I I 3 .5-17). Nossa tarefa de compreender as leis de Deus e refleti-lo por meio de 
nosso estilo de vida obediente é uma tarefa comunitária. Devemos lutar juntos para 
discernir como reagir como cristãos autênticos à cultura secular na qual vivemos
n Y lO rtU I K A N P P W K M A IIP H A
- essa cultura com seus efeitos profundamente arraigado« e com lVoc|UÔncia distorJ 
eidos sobre a vida humana.
Mas não é fácil estabelecer uma resposta crista autêntica à cultura. E muita 
fácil dar respostas superficiais, e elas geralmente são erradas. O povo dc Deus pie 
cisa lutar junto, ouvindo o que o Espírito diz às igrejas. Existem muitos assuntou 
urgentes: a guerra nuclear, o materialismo econômico, a explosão informática, um 
testemunho cristão acadêmico, uma contribuição cristã à cura política e soei.il, 
uma transformação cristã das artes e um enriquecimento da vida estética em geral 
Alguns assuntos parecem mais urgentes que outros, dependendo de nossos dom 
e interesses particulares. E em muitas áreas não temos uma longa tradição eriiit,i 
de reflexão ou ação à qual recorrer. Em algumas áreas os cristãos têm começado H 
responder apenas recentemente.
Quão difícil é então apresentar uma imagem integrada, completa dc uin.i 
resposta cristã à cultura! Essa é a razão pela qual este livro sobre a cosmovisão crist n 
é um esforço conjunto, e não apenas de coautoria. Nós dois temos aprendido tanto 
de cristãos dedicados lutando com sua fé, das Escrituras e do mundo ao nosso redoi 
que seria impossível mostrar um catálogo completo de nossos reconhecimentos,
Nossa questão é que sozinhos não podemos refletir a imagem de Deus, aindu 
que por nenhuma outra razão, além daquela que a imagem tem uma referência 
ao nosso domínio cultural sobre a criação. E , como já vimos, a tarefa humana de 
formação cultural é comunitária. O tema bíblico do corpo de Cristo também no| 
leva nessa direção. Como cristãos agindo em unidade, precisamos tratar dos afl" 
suntos de nossa cultura. Isso significa começar exatamente onde estamos, com au 
escolhas econômicas que fazemos cada dia, com nossos empregos e nossas família«, 
Precisamos desenvolver uma perspectiva cristã em nossos estudos, e lutar seriamente 
com a questão de como nossa fé cristã tem influenciado e irá influenciar nossa« 
escolhas de carreira e a maneira como executamos nosso trabalho. PrecisamoM 
considerar com seriedade a parte cultural do que significa ser renovado à imagem 
de Deus. Por meio do evangelho de Cristo fomos restabelecidos na posição de 
servos-senhores da criação. O mandato culturalfoi renovado: esse é o significado 
do ensino neotestamentário de que nós reinaremos com Cristo.17
Todavia, nossa tarefa comunitária como igreja não é desenvolvimento cultural, 
puro e simples. Vivemos em um mundo caído - não estamos na criação primitiva, 
Pela graça de Deus recebemos as boas-novas de seu reino; submetemos nosso 
coração ao Rei e experimentamos seu amor transformador em nossa vida. Mesmo 
assim, o clímax do reino ainda está por vir. O eschaton, os novos céus e a nova terra, 
ainda não chegou. Cristo redime todas as coisas, mas nós ainda não vemos todas 
as coisas redimidas. Vivemos entre os tempos; a nova era já começou, mas a antiga 
ainda está aqui. Não estamos nem no jardim nem na Nova Jerusalém.
Os cristãos nesses últimos dias são, portanto, chamados para empenharem-se 
na tarefa de refletir a imagem de Deus como ministros da reconciliação. Essa é nossa
I IIA N H P O IV M A R O PBI.A UM *I N<, A i » 7 7
i ‘i m 11 rrcicntoni: é vocíçlo do corpo d*‘ i i into trabalhar junto cm um mundo caído, 
jiiiti tirando trazer o petdflo, a ouru r .1 rcuovaçüo do domínio de Deus para cada 
»In >1 (hi vida. ( )s indivíduo» precliuin arrepender-se, e padrões culturais necessitam 
bi 1 redirecionados. A obediência a C Visto nao requer menos. Essa é a profundidade 
HHHpleta e radical do evangelho.
Assim, estamos diante de uma questão vital, prática: como refletimos a imagem 
ti» l rÍHto em nossa cultura? Para responder essa questão devemos antes de tudo 
Ptihindcr a diferença entre a estrutura da cultura em suas diferentes expressões e a 
Igfld^ucia espiritual que determina a qual reino ela serve.
tntrutura e direção
Imagine dezenas de fios elétricos entrelaçados, colocados juntos formando
111 ti único fio.18 Esses fios são como os vários aspectos da vida que experimentamos. 
ImitOH eles constituem uma estrutura inteira. E essa estrutura foi ordenada por Deus 
ihi criação. Ele estruturou, por meio de sua Palavra, não somente os átomos, as 
irvnrcs e as galáxias, mas a vida em sociedade e cultural. Toda a criação, existindo 
fui no uma resposta às leis de Deus, expressa sua ordem na criação.
Assim, os vários ramos de nossa vida funcionam, cada um ao lado do outro, 
tit*litro da estrutura que Deus estabeleceu. E são muitos: físico, emocional, biológi- 
10 , Intelectual, político, estético, econômico, ético e devocional. Esses aspectos, no 
Mfitanto, não esgotam, de maneira alguma, tudo o que contribui para a estrutura da 
vltlu a criação de Deus é complexa demais para isso - mas a vida parece envolver 
fwb menos essas dimensões.
Entretanto, diferente dos fios, que formam um único fio, os fios da vida não 
ulto partes distintas. Não podemos separá-los uns dos outros; não podemos fazer 
1111 ui escolha econômica, por exemplo, sem relação à ética, política ou ao intelecto. 
Vivemos todos em conjunto.
Assim como os fios não existem para seu próprio interesse, assim também os 
elementos da vida existem com um propósito. Eles são campos de atividades. A 
elel l icidade é transmitida através dos fios. Deus não criou o mundo para ser neutro, 
1111 no um quadro de natureza morta. No princípio a corrente passou através de sua 
ifAtrutura em resposta perfeita ao seu pacto da criação. A vida moveu-se de acordo 
00111 a vontade de Deus - e era bom, vemos em Gênesis. A raça humana (e toda a 
mação) serviu a Deus em obediência amorosa.
Então veio o pecado. Era uma corrente passando no sentido contrário. O pe- 
rado não mudou a estrutura de vida no mundo; a criação original de Deus continua 
firme, sustentada por ele. O que mudou foi o sentido da corrente.
A obra de Deus na salvação é redirecionar a corrente de nossa vida. A redenção 
i* it restauração de nossa obediência à vontade de Deus, em essência nossa recriação;
7H A VINAl' 1 IlANHl-t iIlMAlH )KA
;t corrente passa no sentido original novamente dc tíil modo qur podemos nu o 
que fomos criados para ser.
Apesar de a obediência e a desobediência poderem ser comparadas a corrônltft 
passando em sentidos contrários, a comparação só vai até ;ií, pois a vida é complcx.fi 
Tanto o bem quanto o mal estão presentes na criação de Deus. K os dois reinou, 
ou correntes, estão em guerra.
M as observe que o pecado não é intrínseco à criação. Ele nunca é um fio dii 
vida em si. A corrente de energia não flui em um sentido em alguns aspectos da vid>i 
e no sentido oposto em outros, pois bem e mal não são partes estruturais da criaçftO, 
Deus criou todas as coisas boas. O mal é o nó em cada fio, em cada aspecto da vidu, 
é o sentido da corrente que se distancia de Deus e vai para a desobediência.
Pensar em algumas partes da vida como boas por natureza, direcionadas a I DetlfJ 
e considerar outras como inferiores por natureza, é dividir a estrutura da vida cm 
categorias impossíveis. Tal modo de pensar é a base de um dualismo sagrado/secultí! 
que compreende o bem e o mal em aspectos separados da criação de Deus. Isolar 
alguns dos fios eleva-os a uma posição de privilégio - enquanto depreciam outroK
Essa não é a visão bíblica. As Escrituras sugerem certa democracia acerca di)N 
fios. Quaisquer que sejam as distinções - entre sagrado/secular ou santo/comum
- que possam ter existido debaixo do antigo pacto (com seu sacerdócio especial, 
templo e sacrifícios), tudo foi mudado com a vinda do reino de Cristo. PrecisamoN 
atentar à profecia de Zacarias da era messiânica:
Naquele dia, será gravado nas campainhas dos cavalos: Santo ao S e - 
NHOR; e as panelas da Casa do S E N H O R serão como as bacias diante do 
altar; sim, todas as panelas em Jerusalém e Judá serão santas ao S E N H O R 
dos Exércitos (Zc 14.20-21).
Todos os aspectos do mundo de Deus são criados bons, mas todos os aspectos 
são também caídos. Em Cristo todos poderão ser redimidos.
O que isso significa para o nosso viver prático e diário? Significa que nÓ8 
como cristãos devemos procurar entender os fenômenos culturais e trazê-los ao 
senhorio dc Cristo. D c cada parte da vida devemos fazer duas perguntas. Primeira:
o quê nesta parte da vida é bom em termos de criação? Segunda-, o que não & Dc 
que maneira isso foi orientado de forma imprópria?
Essas perguntas se aplicam a todas as áreas da cultura humana. Não podemos, 
simplesmente, desconsiderar um aspecto da cultura humana como se ele estivesse 
além da redenção, nem podemos aceitá-lo de maneira indiscriminada pelo seu valor 
aparente. Em vez disso, precisamos lutar com discernimento com nossos irmãos 
e irmãs em Cristo (assim como com não crentes que são sensíveis às normas da 
criação). Precisamos ouvir o Espírito de Deus quando ele nos dá a orientação dc 
sua palavra para todas as áreas de nossa vida.
P a r t e 3
COSMOVISÃO MODERNA
C a p ít u l o 6
O PROBLEMA DO DUALISMO
A cosmovisão da criação, queda e redenção é abrangente. Ela fala com cla- 
H'/n c riqueza quem somos; onde estamos; o que está errado e qual é a solução.
I uma visão que ilumina literalmente toda a vida e nos capacita a andar em 
iilhm Iicncia diante do Senhor. Realmente o senhorio de Cristo não se estabelece 
| m ii menos.
Mas existe um problema. Se uma cosmovisão está sempre fundamentada em 
um modo de vida (e está), por que encontramos uma disparidade tão grande entre
ii nossa maneira de viver e a cosmovisão bíblica? A visão de vida das Escrituras 
nunca foi manifestada por completo em nossa história cultural. Em algum lugar a 
PfUTgia dela tem entrado em curto-circuito.
A cosmovisão cristã é bíblica?
Podemos definir o problema da seguinte maneira: Jesus disse que o reino de
I )cus é chegado, e essa mensagem é o centro de nosso evangelho. M as como Jim 
Wall is observa: “Existe pouca evidência, na maneira como os cristãos vivem, para 
tlpoiar nossa alegação de que o reino dos céus está aqui. Em vez disso, a evidência 
KUgere que, na maioria das igrejas, o que chegou foi a cultura dos sistemas econô­
mico, político e militar dos Estados Unidos. A pergunta que deve ser feita é: Por 
i|iK' as igrejas não vivem pelo que confessam?”1Onde, pois, está o evangelho? Onde estão as boas-novas personificadas cultu- 
üilmente? Se o reino dos céus é chegado, por que os pobres não ouvem um pouco 
ilas boas-novas para variar (Lc 4 .18-19)? Por que os cativos não são colocados em 
Uberdade? Por que os cegos deste mundo ainda não têm olhos para ver? Quando 
UH oprimidos receberão sua dignidade de volta? Como membros do corpo de
l Visto, como responderemos por nossas falhas em exibir os atributos de cidadãos
/"V V IP A l) I HflNSn IBM M H >M?\
do reino? Por que ;i palavra cristão nílo evoca irnugcni d< pntNâiiN virando o mundo 
de cabeça para baixo?2
C) problema e evidente em todas as áreas de nossa vida. Isso tem levado cristflon 
mais fracos a uma crise de confiança, e alguns chegam até a negar e abandonai ii 
sua fé totalmente. Se a cosmovisão bíblica é singular, e se ela é radicalmente ililp- 
rente da cosmovisão dominante em nossa cultura secularizada, então por que ou 
cristãos se encaixam tão bem na nossa cultura?3 Por que a nossa vida de discipultlt li i 
e obediência não nos faz parecer excêntricos culturais?
Talvez esse problema também responda pela ineficiência de nosso evangelisnl<>, 
Será que temos vergonha da nossa fé porque pensamos que ela é irrelevante piuu 
os não crentes? Afinal de contas, nossa vida difere pouco da deles.
Observe como o apóstolo Pedro responde a esses problemas: “Estando sempre 
preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que lu\ 
em vós” (IPe 3.15). Pedro considera que as pessoas estão fazendo perguntas aoN 
cristãos. “Por que vocês vivem desse jeito? Por que vocês compartilham suas posseH 
uns com os outros? Por que vocês não se curvam para César?” Quando fizerem eSHilN 
perguntas, devemos estar prontos para dar um relato de nossa esperança. Nesío 
contexto o evangelismo será frutífero.
Talvez as pessoas não estejam fazendo esse tipo de pergunta por não notarem 
nada significativamente diferente em nós.4 Nosso estilo de vida não os torna inve ■ 
josos do evangelho (ver Rm 11.14). Infelizmente, quando não cristãos nos notam, 
em regra é por repulsa a certos aspectos de nosso estilo de vida.
Se nos lembrarmos do critério pelo qual as cosmovisões são julgadas (Capítulo 
2), torna-se evidente que nosso problema representa nada menos que uma crise tlt* 
cosmovisão. Uma cosmovisão deve esclarecer ou tornar acessível tudo na vida. Mas 
a cosmovisão cristã operante nas igrejas frequentemente parece ser irrelevante paru 
a maior parte da vida. Ela se preocupa apenas com a nossa vida espiritual. Nossa 
cosmovisão nos sensibiliza para a justiça e a opressão, como a cosmovisão bíblica 
requer? A ausência de muitos cristãos evangélicos das favelas da vizinhança, das 
marchas pela paz e ações políticas que se empenham pelo amor, justiça e miseri­
córdia sugere que nossa cosmovisão é inadequada.
Entretanto, ainda mais importante é a questão de se a cosmovisão é con­
sistente com seu compromisso de fé, se ela é fundamentada culturalmente em 
uma forma de vida integral e saudável. Nesse ponto, nossa crise de cosmovisão 
torna-se aguda. Nossa cosmovisão não apenas parece irrelevante para a maior 
parte da vida, mas sua própria irrelevância sugere que ela é uma traição tanto das 
Escrituras quanto de nossa confissão do senhorio de Jesus Cristo sobre todos os 
aspectos da vida.
Vhièío dividida
Orule foi que ;is coistiN começimtm u Iicsir erradas? Como nossa cosmovisão, 
ijpmrmuuhada em nosso modo do vida, ficou em desacordo com as Escrituras? A 
nfíOHta pode ser resumida em uma palavra: dualismo. Dualismo é uma cosmovisão 
dividida. Ela separa a realidade em duas categorias fundamentalmente distintas: 
miiitu e profana, sagrada e secular.
Porém, existe uma diferença enorme entre dualismo e dualidade. O discipulado 
t iii.i.k > nos força a reconhecer a dualidade na vida: ou servimos ao Senhor ou seguimos 
lih ld< il< >s. C) dualismo obscurece a dualidade válida entre obediência e desobediência 
|iiili|uc identifica a obediência, a redenção e o reino de Deus apenas com uma área 
dit vida. Ele vê o restante da vida como se não se relacionasse com a redenção (ou o 
mi^rudo), ou pior - sob o poder da desobediência, do pecado e do reino das trevas.
No lugar de uma compreensão do reino de Deus como domínio de Deus 
gobre toda a criação, o reino é identificado com o que tem sido chamado de nossa 
vidkl espiritual. A maior parte das pessoas considera que a vida espiritual é algo 
que se relaciona com a oração, a Bíblia, estudo, comunhão e evangelismo. Em qual 
ItlHtituição essas atividades ocorrem? Na igreja.
Assim o reino de Deus (ou o sagrado) vem a ser identificado principalmente
11 ii n a igreja, enquanto o restante da vida é visto como secular. Quando as pessoas 
começam a sentir as limitações de tal dualismo sagrado/secular, elas dizem que
ii evangelho deve ser tornado relevante para o restante da sociedade. M as o que 
MMiiprc querem dizer é que uma instituição, a igreja, deve se tornar relevante para 
iin outras instituições culturais (a família, a escola, o Estado e assim por diante), 
t ) dualismo permanece. Ainda temos duas instituições separadas, as quais devem, 
de alguma maneira, ser relacionadas. A vida ainda está fragmentada.
Essa cosmovisão é dualista porque tem sobreposto sobre a estrutura da criação 
il <|uestão direcional da obediência ou desobediência. O dualista entende a distinção 
brm-mal (que realmente é uma questão de obediência ou de desobediência) como 
lima distinção dentro da estrutura da criação.
Lembre-se, de novo, da imagem do cabo elétrico. Como o cabo, a vida é uma 
CHtrutura complexa formada de muitos fios, esferas de atividades. Em cada fio a 
c< >rrente pode ser positiva ou negativa. Assim também, a corrente de nossa atividade 
pode ser ou obediente em direção às leis da criação de Deus ou desobediente. O 
dualismo, entretanto, confunde estrutura e direção. Em vez de ver como a questão 
direcional permeia toda a vida, ele identifica a direção com partes particulares da 
estrutura. Alguns aspectos da cultura são vistos como irredimíveis (isto é, ineren­
temente desobedientes), enquanto outros estão abertos à redenção. Tal dualismo 
distorce nossa vida porque distorce a realidade.
O dualismo não é apenas um problema teórico para teólogos profissionais. 
Kle é o problema fundamental da cosmovisão que tem contaminado a história da
igreja e ainda nos contamina. I Ima pessoa com um« coiiiik>vImiu> dualista, simples 
mente, admite que « vida tem dois setores distintos. I oiiiq Umes ( )lthuis dia cm
Ou/ ofC on cem for the Church, “Essa é a sua maneira de ver «h coisas. Não impofttt
o que ele faz, o faz com base em sua visão ‘bissetorial’. Essa visão torna-se sou 
guia na criação”.5 O dualismo aparece em pelo menos três formas: como vemos
o trabalho, como vemos a cultura e como lemos a Bíblia.
Os cristãos e o trabalho
Talvez você tenha tido a experiência de ir para uma conferência missionária 
e voltar de lá com o terrível sentimento de culpa por ter um trabalho secular c 
não ir para o campo missionário. Por alguma razão nos sentimos como cristão» 
de segunda categoria. John Stott dá a entender que criamos uma hierarquia na 
comunidade cristã:
Com frequência, damos a impressão de que se um jovem cristão é 
realmente entusiástico por Cristo, ele sem dúvida se tornará um missio­
nário no exterior, que se ele não é tão apaixonado assim, ficará em seu 
país e se tornará um pastor e se não tiver a dedicação para ser um pastor, 
ele sem dúvida servirá como um médico ou professor, enquanto aqueles 
que se dedicam ao trabalho social ou à mídia ou (na pior das hipóteses) 
à política não estão distantes da apostasia.6
Desenvolvemos a ideia de “trabalhadores cristãos de tempo integral”. Fica­
mos bem embaraçados com a frase (essa é a razão pela qual colocamos aspas nessa 
frase), mas a crença persiste de que somente alguns de nós somos “trabalhadores 
cristãos de tempo integral”.
Essa noção continuará a subsistir enquanto nossa cosmovisão for dualista.Se o mundo realmente está dividido em dois reinos, um mais importante do que
o outro, um mais espiritual e mais agradável a Deus do que o outro, então sempre 
teremos uma hierarquia na comunidade cristã. Até mesmo quando rejeitamos essa 
noção de serviço de tempo integral e dizemos que todos os cristãos são servos do 
Senhor em tempo integral, um dualismo inconsciente ainda pode nos constranger. 
Frequentemente, transmitimos a ideia de que todos nós somos chamados para 
evangelizar, não importa em qual situação encontrarmos a nós mesmos. Nesse caso 
a submissão a Cristo pode ainda estar limitada a uma atividade espiritual, por assim 
dizer, que não está relacionada ao trabalho de uma ocupação secular.
O problema não é que a comunidade cristã esteja deficiente de médicos, 
fazendeiros, homens de negócios ou músicos; o problema é que existem pou­
quíssimos médicos, fazendeiros, homens de negócios e músicos cristãos. Muitos
H'| A VImAo IUANKHiHMAIK >RA
c ̂I‘lii UH UMA I >*' !>l IAl l#M< 1 Hfi
11* uõn hEIo cristflOH e algo inaiti, nílo iiun o» upainos de nossas tarefas diárias inte- 
gi a I mente como ci iat£lON. ( )u tpntamoh vive*i uma vida integrada sem abandonar 
iioNNo dualismo. Nesse caso, iión iion tornamos médicos ou fazendeiros no campo 
mtllliondrio, mas deixamos de desenvolver uma alternativa cristã na medicina e 
ii.i agricultura.
Ou nos tornamos um homem de negócios cristão - alguém que tem uma 
livraria evangélica ou ganha muito dinheiro em uma empresa secular e então dá 
1‘Hne dinheiro para vários ministérios cristãos. O debate de como alguém estabelece 
uni negócio “de forma crista’ dificilmente vai além das questões morais básicas
i Iti honestidade. Raramente o cristão faz perguntas fundamentais relacionadas 
\\ çconomia: Qual é o propósito do empreendimento? Qual o papel dos lucros? 
Minha empresa, em particular, será ecologicamente sensível e responsável em 
firmos sociais?
I )e maneira semelhante, um músico cristão pode sentir-se limitado a cantar
i unções religiosas ou espirituais, permanecendo fora do alcance de músicas que 
Iratam da vida em geral. Essa ideia de música cristã, no geral, não deixa espaço 
pura música instrumental, a não ser por acompanhar um cantor com uma mensa- 
^W/.Tais tentativas nobres, mas mal orientadas, de integração originam-se de uma 
Vindo dividida da vida. Esses cristãos bem intencionados apenas acrescentam fé à 
Hl ia vocação em vez de deixar que sua fé transforme sua vocação. Uma estrutura 
iltialista nunca proporcionará estímulo para tal transformação.
Experimentamos nossa vida de trabalho dualisticamente mesmo se ela não 
i‘Mt iver relacionada com nossa fé. D e fato, muitas pessoas em nossa cultura têm uma 
nítida linha divisória entre sua vida profissional e sua vida de lazer.Trabalho é algo 
i|iie temos de fazer, é um mal necessário. Porém, vale a pena fazê-lo porque nos dá 
ON recursos necessários para nos dedicar às outras atividades que mais apreciamos. 
Ktítia parte de nossa vida é chamada lazer. Em contraste com o trabalho, estamos 
livres em nosso tempo de lazer - livres para o divertimento, livres de quaisquer 
restrições de nossos patrões.
Os antigos e o trabalho
As raízes da dicotomia trabalho/lazer retrocedem aos gregos e romanos. Cícero 
disse que: “O trabalho pesado de um trabalhador contratado, que é pago somente 
por seu trabalho e não por alguma habilidade artística, é indigno para um homem 
livre, e sórdido em caráter”.8 A questão não era o trabalho pesado em si, mas se 
esse trabalho era escolhido de forma voluntária.
Comentando sobre a visão greco-romana do trabalho, o cientista político 
Paul Marshall diz: “O que foi contestado foi o trabalho e as relações baseadas na
A VImAO IKANMlHmMAln 'HA
dependência e na necessidade a ausência de autonomia" ' C/onNeqiientemenu , 
diferentes tipos de trabalho tiveram seus preços fixados de acordo com o nível df 
liberdade c de necessidade envolvido. Quanto mais liberdade c menos necessidade, 
melhor. Aristóteles, por exemplo, avaliou o trabalho dos pastores como tie alto preço 
porque envolvia um nível mais alto de lazer (tempo livre) tio que outros tipos de 
trabalho ligados ao campo.10
Esse dualismo, entre liberdade/necessidade no mundo antigo, implicava que a 
maior parte do trabalho no império fosse feita por escravos e servos. Por deíiniçilo, 
não era de se esperar que pessoas livres se empenhassem na sordidez do trabalho 
necessário.
Agostinho (354-430), o gigante dos pais da igreja, também sustentava UD» 
dualismo claro sobre o assunto das vocações. Ele não dizia que as ocupações seculare« 
eram totalmente inaceitáveis para os cristãos, mas sugeria que a agricultura, a vida 
militar, as leis, a navegação e os negócios eram nada mais do que rios de Babilônia, 
Eles passariam. Eram temporais, não eternos. Em consequência, ninguém podia 
exercer um chamado cristão em qualquer uma dessas ocupações.
O dualismo liberdade/necessidade, dos gregos, tornou-se, para Agostinho, a 1 
distinção entre a vida contemplativa (vita contemplativa) e a vida ativa (vita activa),
A última incluía toda a sorte de trabalho necessário, e a anterior era da esfera da 
reflexão, meditação e oração. Marshall observa:
Apesar de esses dois tipos de vida serem bons, a vida contemplativa 
era de ordem mais elevada. De vez em quando era necessário que alguém 
tivesse a vida ativa, mas, sempre que possível, ele deveria escolher o outro;
“para um a vida é amada, para o outro, suportável”.11
Podemos ver como essa dicotomia contemplação/ação corresponde dire- ] 
tamente ao dualismo lazer/trabalho. Bem mais tarde, Tomás de Aquino (aprox, I 
1225 a 1274) confirmou a distinção vita contemplativa/vita activa, identificando , 
a anterior com o eterno, e a última com as necessidades da vida atual. Ele argu- 1 
mentou que, apesar de ambas terem sua importância, a vida de contemplação t' 
um chamado que é mais elevado do que a vida de ação.12 Em consequência, a 
vocação monástica ou clerical era o único chamado cristão verdadeiro. “Na ver- 1 
dade os termos chamado ou vocação eram os únicos usados em referência a tais I 
atividades”, diz M arshall.13
Assim, a distinção entre “trabalho cristão de tempo integral” e “ocupação 
secular” é meramente a versão cristã moderna da dicotomia trabalho/lazer, neces- 1 
sidade/liberdade. Originado no pensamento grego e adaptado pelos pais da igreja, I
o dualismo permanece conosco. Apesar de não possuir apoio bíblico, ele permeia 
nossa consciência - e, portanto, nossa cosmovisão.
i i m mi uma no m ai IHMt > MV
cristãos e a cultm a
A cosmovisão dunlinlfl puniu/ um testemunho cultural cristão na melhor das 
liiprileNCS problemático, (* nu pior, impossível. No princípio deste capítulo pergun- 
!.iilio* por tjue os cristãos em nossa sociedade tendem a se adaptar tão bem. A 
JVMpONtti é o dualismo. Uma cosmovisão dualista divide a vida nos campos secular 
| Htigrndo, sendo que a maior parte da cultura humana acaba sendo identificada 
n iino do campo secular.
A., ueles que defendem tal cosmovisão, inevitavelmente, têm problemas para 
lipllinc>nar o sagrado ao secular; eles não podem manter uma presença cultural cristã 
Integral. A maior parte dos cristãos hoje identifica o sagrado apenas com sua vida 
prMMoal e individual, de tal modo que sua fé tem cada vez menos a ver com sua
i iill lira exterior. Os cristãos têm pouca influência em moldar a cultura porque suas 
lOHinovisões os impedem de tal influência. Se, por exemplo, cristãos se encontram 
f»H1 posições de liderança cultural, no geral sua fé cristã desempenha um papel 
«d undário em direcionar suas decisões.
Entretanto, não nos esqueçamos do que cultura significa. Não queremos 
tti/cr aquela esfera de altos assuntos que são relacionados apenas a líderes, artistas, 
pnlíl icos e escritores. Não: todos somos criaturas culturais. Como vimos, a questão 
ilit cultura relaciona-se com a maneira como damos banho em bebês, educamos 
ui iKsas crianças, gastamos nosso dinheiro, escolhemos nosso entretenimento,cons- 
lllUÍmos nossos casamentos, desempenhamos nosso trabalho, estruturamos nosso
i ui lo, votamos ou abordamos nossos estudos. A formação da cultura é nossa tarefa 
ordenada por Deus. Infelizmente, os cristãos têm sido seguidores da cultura em 
vey de formadores de cultura. Como podemos reverter esse quadro?
Aqui, na linguagem bíblica, a questão é como vivemos no mundo sem ser 
iln mundo (Jo 17.16-17)? Os israelitas tinham de lidar com as nações idólatras 
tiu seu redor; a igreja primitiva enfrentou a cultura greco-romana; e agora enfren- 
lamos uma sociedade profundamente secularizada. Esse é o problema do cosmo\ 
(* fundamental para nossa cosmovisão. De fato, podemos dizer que a forma como 
um cristão define o cosmo é uma indicação certa acerca do tipo de cosmovisão 
11u(' ele defende.
Dentro de uma estrutura dualista, os cristãos veem o mundo de uma destas 
lies maneiras: como a segunda melhor parte na comparação com a vida de fé, ou 
ninio um mal necessário, ou como algo a evitar. H. Richard Neibuhr no livro Christ 
Htid Culture identifica essas três posições respectivamente como: “Cristo acima da
i ui l ura”, “Cristo e cultura em paradoxo” e “Cristo contra a cultura”.14 Para ter uma 
noção a respeito das diferenças entre essas três posições, imagine como cada uma 
delas lidaria com a questão de se as crianças deveriam ler romances seculares na 
PHCola. A controvérsia sobre o livro Catcher in the Rye [Apanhador no Campo de 
( 'enteio], de J. D. Salinger, poderia ser um caso para o teste.15
Aqueles (]uc defendem íi perspectiva“Cristo anmtt >l.i niltuni" provavelmen 
te não se oporiam a permitir que seus íillios lessem ittl livro, Como uin produio 
cultural c resultado da imaginação humana, os romances (incluindo esse) são boiin 
para serem lidos. As crianças deveriam ser ensinadas que as atividades culturais mio 
boas, mas que a busca pela santidade é um alvo melhor e mais elevado.
A perspectiva “Cristo e cultura em paradoxo” é semelhante, mas existe uiim 
diferença significativa. A cultura não é boa; é um mal necessário. Deveríamos In 
os romances não tanto para nos divertir, mas para entender o mundo no qual vi ' 
mos. Essa posição força os cristãos a um paradoxo: eles vivem a vida de fé e a vid.i 
do mundo. Eles fazem uma avaliação negativa da cultura em si, todavia rejeitam 
qualquer atitude escapista.
A posição mais extremista é mantida pela perspectiva “Cristo contra a cultura", 
Catcher in theRye é mau e as crianças não devem lê-lo. Se uma escola exige a leituru 
dele pelas crianças, então os pais devem tirá-las daquele sistema educacional.
Em geral, essas três perspectivas têm predominado na história da igreja.16 Míin 
todas as três perspectivas deixam de oferecer um testemunho cultural exclusivamente 
cristão. A cultura sempre é vista como algo à parte do evangelho e da redenção. Uniu 
presença ou testemunha cultural cristã positiva nunca é possível porque o evangelho 
é renegado, apriori, a uma única área da vida, enquanto o restante da vida é ideii 
tificado como o mundo. O resultado é que ou os cristãos vivem em seus próprioi 
guetos bem fortificados, ou servem ao Senhor em uma das áreas da vida e seguem 
outros deuses nas outras. No último caso, eles tentam viver em um compromisso 
que o Senhor disse ser impossível; eles tentam servir a dois senhores (M t 6.24).
Porque o dualismo identifica o mundo com uma parte da vida não redimidti 
(distinta da parte sagrada, redimida da vida), o alcance abrangente da cosmovisão 
bíblica é negado. Macaulay e Barrs destacam no livro BeingHuman que: “O cosmo' 
no Novo Testamento é a esfera da vida na qual o senhorio de Deus é rejeitado, onde 
as coisas desta vida se tornam os fins em si ou são até adoradas”.17 Consequente­
mente, qualquer coisa pode ser mundana, assim como qualquer coisa, em princípio, 
pode ser redimida por Cristo. A questão, portanto, que o dualismo sempre evita é 
se nossa vida cultural e nossa formação de cultura são obedientes; elas seguem os 
ídolos ou o Senhor? “Não existe campo neutro”, dizem os autores.18
Nossa abordagem dualista à cultura nos contamina de outra forma, a ma­
neira como relacionamos evangelismo e ação social. M uitos evangélicos veem 
que o evangelho faz da ação social um imperativo cristão. Mas o temor de perder
o evangelho por focalizar exclusivamente nas preocupações sociais faz que elea 
tentem equilibrar os dois. Eles falam de cuidar dos dois, o corpo e a alma, ambos, 
a vida física e a vida espiritual.19 Mas, tão logo falamos de ambos/e nesses termos, 
reconhecemos um dualismo: estamos vendo duas realidades fundamentalmente 
distintas as quais devemos de alguma maneira colocar juntas de novo. Talvez 
esse não seja o dualismo severo do passado, mas continua sendo dualismo. E ele
MH A VhAi > l,'UANM|'u|<MAi:mUA
I I í P lio n i l MA n o | i l IAI INM( t
<liitVii(]uec*cü noRRíi (tçflo mocIiiI poiqm iiil envolvimento sempre é subserviente ao
i Immildo mais elevado <lo rvati^rhriiiio
As consequônciaR deNNíi tuífudc? ido bem desastrosas. I)e vez em quando os
i iInIiIos dizem que nosso alvo principal c mudar o indivíduo, não o sistema.20 O 
dunIlHino persiste: de algum modo nossa vida espiritual pode ser separada de nossa 
Vidfl cultural, e isso significa que podemos trabalhar no sistema aceito. Na pior das 
hipóteses, tal perspectiva nos permite viver em um compromisso idólatra.
I loward Snyder preocupa-se com as tendências dicotomísticas em muito 
fiftquilo que pensamos a respeito da relação entre ação social e evangelismo. Ele
• Ii/ que precisamos de uma “Visão mais abrangente e penetrante”.21 A visão a 
l|ttr ele busca é a visão do reino que parte da cosmovisão bíblica, uma visão que 
ilfirma a bondade de nossas tarefas como criaturas, quando redimidos por Cristo.
I )tjli*ndemos a autoridade e a inspiração da Bíblia. Por que então a visão abran­
gem e das Escrituras não tem sido evidente para nós quando a lemos?
Óculos que distorcem as Escrituras
Até mesmo nossa leitura da Bíblia é influenciada por nossa cosmovisão. A 
llíblia sempre parece dizer o que esperamos que ela nos diga, por alguma razão 
linssa teologia sempre é legitimada pela Bíblia.
( ) problema é que pessoas com teologias extremamente diferentes, mesmo 
Htíitas, fazem a mesma declaração de fidelidade bíblica. Esse problema pode ser 
ílm rito como o círculo hermenêutico; o texto e a perspectiva que trazemos para o 
mesmo sempre parecem legitimar um ao outro. Entretanto, as Escrituras são como 
tuna espada de dois gumes que pode separar esse círculo (ITb 4 .12-13). Elas são 
ulris para a correção e a repreensão; elas podem destruir nossa cosmovisão dualista 
p nos instruir na visão que Deus tem do mundo (2Tm 3.16).
Uma passagem escatológica é um bom teste porque uma cosmovisão sempre 
tem uma escatologia implícita (e, na maioria das vezes, explicada). Assim, se nossa 
1'nsmovisão não for bíblica, ela inevitavelmente distorcerá nossa compreensão do 
texto bíblico. O texto em foco é Mateus 24 .36-41 :
Mas a respeito daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos dos 
céus, nem o Filho, senão o Pai. Pois assim como foi nos dias de Noé, 
também será a vinda do Filho do Homem. Porquanto, assim como nos 
dias anteriores ao dilúvio comiam e bebiam, casavam e davam-se em 
casamento, até ao dia em que Noé entrou na arca, e não o perceberam,
L
 senão quando veio o dilúvio e os levou a todos, assim será também a vinda 
do Filho do Homem. Então, tlois estarão no campo, um será tomado, 
e deixado o outro; duas estarão trabalhando em um moinho, uma será 
tomada, e deixada a outra.
_____________________________________________________
A VT'Ai) IUAHKH 'IlMAI.H i|lA
Voeô dove, ugoju, t'HtfiI esperando a defeati tie mug (floriu (íNcutológiot fiii 
particular (amilenista, pós milcnist;i ou pré-milenliitft), ihiih iiohhu diseusafU) 4 
mais simples. A frase-elimax do discurso deJesus vein no final. Quando o Filhn 
do Homem retornar, dois homens estarão no campo; um será levado e um mci >) 
deixado. Duas mulheresestarão trabalhando no moinho; uma será tomada, uiim 
deixada. A pergunta é: “Quem é tomado e quem é deixado?”
Talvez você já esteja sussurrando a canção de Larry Norman “I wish we’d till 
been ready” [Que bom se estivéssemos todos prontos]. Muitos livros têm sido ex» 
critos e filmes produzidos com base nesse texto. Quem é tomado e quem é deixad< ií* 
A maior parte dos cristãos provavelmente responderia: “O cristão é tomado c n 
não cristão é deixado, é claro”. M as olhe o texto outra vez. Por que acreditaria mo« 
que o cristão é tomado? O texto justifica tal interpretação?
Olhando para as Escrituras de uma nova maneira
Vejamos com cuidado o que Jesus está dizendo aqui. O Filho do Homem viní 
em um dia assim como os dias de Noé. As pessoas não acreditaram em Noé quando 
ele construía a arca. Eles, simplesmente, continuaram a viver sua vida se divertindo, 
e eles nada percebiam até que o dilúvio veio e os levou a todos. Quem foi levado? Ah 
pessoas que ignoraram Noé! Assim também, quando o Filho do Homem vier, al 
guns serão levados. Quem? O mesmo tipo de pessoa dos dias de Noé - aqueles quê 
ignorarem o evangelho da salvação e persistirem na desobediência.
Em outras palavras, uma olhada mais cuidadosa ao texto revela que não são 
os cristãos que são tomados, mas os não cristãos. Em vez de tratar do assunto do 
arrebatamento dos santos, Jesus aqui fala do julgamento dos não crentes. A pas­
sagem que faz paralelo, em Lucas 17.26-37, é mais explícita ainda. Os discípulos 
perguntam onde as pessoas são tomadas e Jesus responde: “Onde estiver o corpo, 
aí se ajuntarão também os abutres” (Lc 17.37). A mensagem de julgamento para 
aqueles que são tomados é inequívoca.
Se o texto está dizendo verdadeiramente que os não cristãos são tomados, por 
que então temos lido as palavras de Jesus de maneira errada tão consistentemente? 
Por que então queremos de modo tão desesperador acreditar que o retorno de 
Cristo resulta na retirada dos crentes para fora da criação?
Em vez de visualizar que a visão bíblica do futuro é uma restauração da criação 
e de nossa vida como criaturas diante do Senhor; parece que admitimos a escato- 
logia dualista que nos retira da criação e nos coloca no céu.22 Nosso dualismo nos 
leva a uma mentalidade de sair do mundo. Ela fechou nossos olhos para a visão 
bíblica do céu vindo até nós.23 Assim, constantemente entendemos de forma errada 
passagens tais como Mateus 24 .37-41 .
l 1 I'ROIMJMA IK) nUALIKMI i VI
Nossa cOMYlOvitiflo aid ,i, i onio vi moh, todilM as coisas, até mesmo como lemos 
D H(blin. Uma cosmovilftn I|iie mio poNHlli a abrangência da cosrnovisão bíblica 
tleeeilo nos causará uma intrrprotiiçflo errfinea das lEscrituras. Ela nunca terá o 
till mice completo de sua mensagem redentora.
Romanos 12.2 fala diretamente de nossa situação. “Não vos conformeis com 
flxle léculo, mas transform ai-vos pela renovação da vossa mente.” Esse verso sugere 
ijiie podemos ser (na verdade devemos ser) transformados, e que isso acontecerá 
Mnu a renovação de nossa mente. Como fazemos isso? Permitindo que as Escri- 
liirus moldem nossa cosrnovisão. M as acabamos de ver que, por sua vez, nossa 
fOHiiiovisão molda nossa interpretação das Escrituras. Como nos livramos desse
i livulo hermenêutico?
Normalmente não nos livramos. As vezes isso leva a uma crise de cosrnovisão.
I )cvemos, pelo menos, estar abertos a uma renovação e crescimento. Precisamos 
permitir que o Espírito corrija ou até mesmo destrua uma cosrnovisão não bíblica. 
Aii Escrituras são mais afiadas do que uma espada de dois gumes e podem quebrar 
nossos preconceitos. O Espírito Santo, trabalhando por meio da Palavra de Deus, 
pode nos levar a nova visão e a nova obediência.
C a p í t u l o 7
O DESENVOLVIMENTO DO DUALISMO
Sc for verdade que a cristandade tem sido contaminada com o dualismo, 
eflfflo o primeiro passo para a restauração da cosmovisão bíblica terá de envolver 
um diagnóstico melhor das origens da doença. No Capítulo 6, esboçamos breve­
mente de onde esse modo de ver a vida veio, mas agora devemos olhá-lo com mais 
t Ujdado. Gostaríamos de ver, além disso, como essa cosmovisão dualista veio a ser
ii visão secular da vida que guia a cultura ocidental moderna.
O Novo Testamento contém os escritos cristãos mais antigos que temos. 
Neles lemos a respeito da preocupação principal da primeira geração de cristãos 
o conflito deles com o Judaísmo. Porque o Cristianismo começou como urii 
movimento judeu, o surgimento desse conflito era certo. Por essa razão, assuntos 
t omo circuncisão, leis cerimoniais judaicas e a relação dos gentios com a igreja 
Ocupam muitas páginas do Novo Testamento.
Entretanto o conflito com o Judaísmo não era tão importante para a segunda, 
terceira e quarta gerações. A cultura dentro da qual o evangelho tomou forma era 
Itmlo judaica quanto helenística, mas foi o ambiente helenístico que exigiu maior 
M tenção. E foi o helenismo que exerceu um efeito mutilador sobre a vida da igreja.
Platão: alma versus corpo.
Os dois vultos mais importantes na tradição filosófica grega são Platão (aprox. 
428-348 a.C .) e Aristóteles (384-322 a.C.). Apesar de Aristóteles ter grande im­
portância nos últimos anos da igreja medieval, Platão era mais influente no primeiro 
t1 segundo séculos da Era Cristã. E até 100 a.C. (500 anos depois de Platão), o 
pensamento platônico passava por um reavivamento.1
A diferença fundamental entre Platão e Aristóteles é identificada por Raphael 
cm sua pintura do século 16 The SchoolofAthens. Comentando sobre o quadro Escape
v«|' n v h a i > i KA iN w rv h v m a i »* m ia
//w/w Reason, 1'Vancis Schacffer observa tjtie: “A ris iu ir liru i»1 pMlmdetulo suas miinN 
para baixo enquanto Platão está apontando paia cuiui" ' Arldtôtfles enfatizou 
estudo da realidade experimentada de maneira empírica. I 'ontudo, Platão: “Pcfdti 
a esperança de encontrar algo real em um mundo de instabilidade e passageiro, 
concluiu que a realidade não era feita de coisas mutáveis. A realidade era compoili 
de ideias ou ideais imutáveis que Platão denominou de formas V Essas conclutQíJ 
de Platão mais tarde exerceram profunda influência no desenvolvimento do pen 
samento cristão antigo.4
O dualismo é fundamental para todo pensamento platônico, a distinção quo 
acabamos de observar entre os ideais imutáveis {formas) e o mundo do instável 0 
mutável (matéria).5 O céu é a verdadeira e máxima realidade, e a terra é a realidil 
de derivada - às vezes vista como uma ilusão, mas sempre vista como de menol 
valor. Na pior das hipóteses, o platonismo via o mundo visível como a pátria i/o 
mal, enquanto o mundo de ideias era visto como o alvo da vida e da moralidade 
humanas.6 Seguindo a lógica platônica, devemos negar nossa vida como criatura << 
nos empenhar pela vida celestial de permanência, estabilidade e felicidade.7
Em seu livro Phaedo, Platão fala sobre a relação do corpo com a alma. I)oiw 
mundos existem dentro da pessoa humana, diz ele. “A alma é semelhante ao divino,
o imortal, o inteligível, o uniforme, o indissolúvel, o imutável; enquanto o corpo 
é semelhante ao humano, o mortal, incompreensível, multiforme, dissolúvel, o 
mutável’.8 O corpo é a prisão da alma; ele corrompe a alma e inibe a habilidade d» 
alma de conhecer o divino. Portanto, a alma anseia por ser liberta de seu cativeiro 
no corpo.9
Esse dualismo extremo foi o clima intelectual dentro do qual a fé da igreja 
primitiva teve de ser proclamada e formulada. Como a igreja se relacionaria a easn 
cosmovisão helenística? As reações variavam. Elas iam da rejeição completa (Ter- 
tuliano, aprox. 160/70-215/20) à acomodação consciente (Justino Mártir, aprox. 
100-165). O padrão predominante, contudo, era a aceitação cuidadosa.
No terceiro e quarto séculos a atitude que dominava o pensamento de líderes 
cristãos como Clemente (aprox. 155-220), Orígenes de Alexandria (aprox. 185- 
254) e Basílio de Cesareia (aprox. 329-379) já era o de que a filosofia grega era 
preparatória para a teologiacristã. A leitura da filosofia grega era considerada de 
grande valor para o cristão, não como um fim em si, mas como um treinamento 
para uma tarefa mais elevada de exegese bíblica.
Os pais da igreja primitiva certamente rejeitaram elementos da tradição 
filosófica grega, quando necessário, para afirmar verdades bíblicas tais como a en­
carnação e a criação espontânea do mundo.10 Todavia, eles tenderam a adaptar-se s\ 
cosmovisão grega, e começaram a ler as Escrituras usando os óculos da cosmovisão 
dualista. Vimos as consequências dessa acomodação no capítulo seis.
Uma alegoria comum era usada para justificar essa adaptação: como os ju ­
deus fugindo do Egito, a cristandade deve arrebatar os vasos de prata e de ouro
F l Î Hl ‘il'NVi H V IM IN ln n n MUAIIUMO 95du inimigo c empregri Ion |mii»> npii pmpiio iiho," A filosofia grega era o ouro c it piala. ( ) problema, é óbvio, <u deiemiimu quais eram as joias dignas de uso e i|HiUH, na realidade, eram hombftH l'eMgio preparadas para destruir a cosmovisão 
! i i lmI a de dentro para fora.
I lin dos problemas que os cristãos primitivos encontraram com Platão era 
ijUP ele era muito racionalista. Os ideais celestiais ou formas eram compreendidos 
jii'lo pensamento racional ou lógico. Isso não deixava espaço para revelação. O 
neoplatonismo do filósofo grego Plotino (205-70 d.C .) solucionou esse problema; 
Pin I Motino, tanto certa tendência mística de Platão quanto seu dualismo chegaram 
il Htiii mais alta expressão. Muitos cristãos sentiam que Plotino deixava espaço para 
!i revelação exatamente em sua ênfase na transcendência mística de nossa condição 
(Ir criaturas (incluindo nossa razão) a uma união com o Ser Supremo. O dualismo 
tln espiritual versus o material estava agora estabelecido na tradição intelectual 
ocidental.12
Agostinho: eterno versus temporal.
O dualismo recebeu sua legitimação teológica máxima com Agostinho (354-
I 10), que era altamente influenciado por Plotino.13 O famoso estudioso de Plotino 
À, I I. Armstrong comenta: “A tradição neoplatônica ocidental influenciou grande­
mente Agostinho, que leu Enneads em uma tradução latina de Marius Victorinus, e, 
principalmente, por meio dele o pensamento de Plotino exerceu influência grande 
r frutífera sobre a teologia e a filosofia católicas ocidentais”.14 A pergunta é se essa 
illj/iiênciafrutífera produz frutos bons ou ruins.
Já vimos (no Capítulo 6) como a visão de trabalho e a vocação de Agostinho 
haviam herdado o dualismo grego. Sua visão de alma e de corpo era, de modo 
lenielhante, neoplatônica. Apesar de ele não depreciar o corpo como Plotino 
(i|ue, em alguns pontos, era mais negativo ainda do que Platão), Agostinho falha 
em ver a pessoa humana como um todo. Em vez disso ele fala da alma racional 
habitando o corpo.1S Consequentemente, é a questão da alma que merece nossa 
maior atenção.
O dualismo de Agostinho leva-o, de maneira natural, a uma visão um tanto 
negativa da sexualidade. Na verdade, a maioria dos dualistas cristãos tem dificul­
dade em afirmar a bondade da sexualidade humana. Agostinho defende a ideia 
de que Adão e Eva poderiam ter tido relações sexuais no paraíso sem pecar, mas 
ftcha difícil imaginar a bondade de tal atividade sexual depois da queda. Todos os 
atos sexuais, mesmo dentro do casamento, diz Agostinho, são vergonhosos porque 
estão inevitavelmente enraizados na lascívia. Essa é a razão pela qual tais atos são 
feitos em secreto e no escuro.16 A visão de Agostinho da sexualidade, decerto, era
influente. Apesar de seus ewei itos niio serem a Im ê e\i lieiiva pui a .1 regi 11 medieval 
do celibato para 0 clero, suas concepções eram, com hequem iu, unadas para exoi 1 m 
os celibatários a continuar naquele estado. Se a sexualidade ê denegrida, entiío p u i 
que aqueles que têm uma vocação religiosa devem desejá-la?
Como platonista, Agostinho cria em uma divisão entre o campo do e te rn o 
(ou espiritual) e o campo do temporal (ou material). A alma encontra seu lai n u 
eterno, e o corpo no temporal. O conhecimento é uma questão, fundamentalmente, 
da alma. Portanto, a percepção sensorial pode ser real, mas não dá conhecimento 
nem tem qualquer valor básico. Essa é a razão pela qual Agostinho disse: “Dewjit 
conhecer Deus e a alma. - Nada mais? - Absolutamente nada”.17 Na verdade, 
para Agostinho, qualquer conhecimento que não era de relevância direta para Meu 
conhecimento teológico não tinha interesse. A fé não só tinha prioridade sobre a 
razão, mas a única tarefa válida da razão era nos preparar para a fé e então uun 
ajudar a entender nossa fé.
Em muitas maneiras Agostinho é o pai da Idade Média. A cosmovisão agOH* 
tiniana permeia toda a cultura medieval. Ela é, acima de tudo, eclesiasticista: A 
igreja domina toda a sociedade. Que a igreja institucionalizada deve ter importância 
aumentada é inevitável quando o campo da graça está limitado à vida espiritual di' 
alguém e a igreja é vista como sua curadora.
Se o evangelho não é visto como um poder reformador e redentor em tudo 
da vida, então a igreja como curadora daquele poder estenderá sua influência, 
geralmente à custa do restante da vida. Ela se encarregará sozinha da educaçflo, 
por exemplo, seja em monastérios ou em escolas da catedral. E os conflitos igreja- 
Estado acontecerão, pois a igreja, constantemente, afirmará sua superioridade sobre 
o Estado secular.
Esse último conflito aponta para a hierarquia implícita em todo dualismo. C) 
dualista vê toda ordem social em termos de instituições e classes mais altas e mail 
baixas.18 Por causa da desconfiança platônica na variação e no desenvolvimento 
(o céu, afinal de contas, é estável, imutável e invariável), essa hierarquia social t' 
também estática. Na providência de Deus, as pessoas são colocadas em suas esta­
ções da vida , e qualquer tentativa de se mudar para outra vocação é estritamente 
proibida.
Na verdade, tal cultura estática desaprovará quaisquer inovações econômi­
cas ou tecnológicas que possam perturbar o status quo da ordem social.19 Uma 
cultura com uma orientação vertical para o céu terá, de fato, pouco estímulo para
o desenvolvimento econômico, tecnológico ou científico. Uma preocupação pla­
tônica com as formas ou ideais impedirá qualquer interesse verdadeiro no mundo 
material. A orientação vertical da vida, necessariamente, desvaloriza a orientação 
horizontal.
U 11| M WVi HVIMI N U ) IH J IH IAI HMf I 07
lomás de Aquino: na1ui &ta 0 graça.
Enquanto esse pluloiiíhiiio ny,onliimuio estabelecia o padrão para o pensa­
mento e a cultura medicvuiii, 110 lun da Idade M édia outro movimento filosófico 
|B levantou, o qual tentava dar mais ônfase ao lado natural e horizontal da vida, 
embora ainda dentro dc uma estrutura dualista. O Cristianismo ocidental, por 
llielo das cruzadas, veio a um contato renovado com a filosofia de Aristóteles.
I )c Jato, durante os séculos 12 e 13, seus textos, adquiridos principalmente por 
incio de contatos com os muçulmanos, foram traduzidos em grande quantidade. 
() apelo de Aristóteles, depois de séculos de platonismo, era seu empirismo. Seus 
PMcritos sobre lógica, física, medicina e biologia empolgavam as pessoas que ha­
viam sido limitadas ao campo do eterno por tanto tempo. Aristóteles substituiu 
Plutão como “o filósofo” em muitos escritos cristãos.
Nesse reavivamento do aristotelismo encontramos Tomás de Aquino no século 
13. Enquanto Agostinho enfatizava a falibilidade da humanidade e da natureza, 
lomás de Aquino realçava sua bondade por causa da criação. Apesar de pensar que 
ti razão humana era ainda inferior à revelação divina, no entanto ele afirmava que 
>1 1 uzão era um guia verdadeiro, ainda que insuficiente para obter a verdade acerca 
de nossa experiência natural. Com essa afirmação sobre a razão, Aquino também 
UNseverou a validade da vida natural e social:
Todas essas atividades [naturais] eram, na verdade, subordinadas 
por ele à vocação sobrenatural do homem, e foram elevadas a um poder 
superior pelo alvo da ação sobrenaturaldo cristão, mas elas tinham sua 
própria realidade e valor, elas não eram meras sombras ou vaidades.20
Tomás de Aquino afirmava a natureza, mas o fazia dentro de uma estrutura 
dualista. Uma vez que o dualismo havia entrado na igreja por meio de Platão e de 
IMotino, seria necessário mais do que uma nova ênfase empírica para exorcizá-lo. 
() ponto de vista de Tomás de Aquino, com respeito à relação entre o evangelho e 
a vida, era que a graça funcionava como um donum superadditum (um complemen- 
lo) para a natureza. De acordo com Tomás de Aquino, a raça humana foi criada 
como uma alma racional em união com um corpo, mas era também dotada de um 
dom sobrenatural de graça. Esse dom, dado na criação, capacitava-o a conhecer e 
amar a Deus.
A queda no pecado significou principalmente a perda (ou privação) desse 
dom. Os humanos não estão mais em uma relação correta com Deus. M as ape­
nas esse dom sobrenatural foi perdido. A racionalidade humana em relação à 
realidade natural e a lei natural foram deixadas intactas, apesar de enfraquecidas. 
A redenção em Jesus Cristo, portanto, é a recuperação do donum superadditum. 
O dom original mais elevado é restaurado pela graça, por meio da igreja. Em
A V IM A O IH A I J h lM IU H lM >|i \
consequência, Aquino poillti admitir Aristóteles conin um jjçuiu verdadeim 
confiável no campo da natureza e podia afirmar a lgrc)n c n Palavra de I )ci 
como adições e complementos sobrenaturais de nossa vida como criatura, I I» 
era aristotélico (no campo natural) e cristão (no campo da graça).
Para Tomás tlc Aqui no, a natureza é o: “Independente ‘ponto de pttfllfltl 
para a graça’, a subestrutura de uma superestrutura crista”.21 O problema C(»l 
Tomás de Aquino é que ele retem uma divisão interna na criação: “Por distingui!
o natural e o sobrenatural e por restringir a abrangência da queda e da redeiiçflí 
ao sobrenatural”.22 Em termos da cosmovisão bíblica, ele falha na compreeiihili 
do radicalismo da queda e da redenção. O pecado, como o fermento, pernieli 
toda a criação. A redenção, contudo, restaura todas as coisas. De acordo com 
cosmovisão bíblica, a graça não complementa a natureza; cia a restaura.
O dualismo de Tomás de Aquino e Agostinho é diferente, mas ambos Nfln 
dualismos. Aristotélico ou platônico, ambos são gregos na origem, não bíblicoNi 
Essa história do dualismo desde a Idade Média é nosso legado. E os problemas dn 
dualismo são nossos problemas. Eles criam uma calamidade que ainda nos aflige. () 
dualismo distorce nossa leitura das Escrituras e dificulta nossa vida de obediência, 
Mas o efeito mais devastador do dualismo é que ele necessita de uma sujeição dupla. 
Ele nos força a servir a dois senhores. Com o crescimento da cosmovisão secuhn, 
em reação ao compromisso greco-cristão medieval, nossos problemas tornam no 
ainda mais críticos.
Do dualismo para o secularismo
O que ocorreu na síntese medieval do pensamento grego e bíblico foi urna 
confusão do que chamamos de estrutura e direção. A estrutura da boa criação de 
Deus foi encoberta pelas duas principais direções possíveis dentro daquela criação: 
obediência e desobediência. Em vez de afirmar que o bem e o mal são possíveis em 
todas as áreas de nossa resposta a Deus, o dualismo natureza/graça, em essência, 
colocou a primeira direção (bondade, obediência, reino de Deus) no campo da graça 
e colocou a segunda direção (mal, desobediência, o mundo) no campo da natureza, 
Assim o bem e o mal foram fixados estruturalmente em dois campos separados. O 
campo da graça corresponde à vida de fé, moralidade pessoal e questões eclesiásticas, 
tais como o culto e os sacramentos. A natureza abarcou tudo o mais.
Por meio disso a graça foi posicionada sobre a natureza. O campo espiritual 
das questões eclesiásticas foi considerado como superior ao mundo natural e 
assim foi mais valorizado. Essa elevação de uma dimensão da vida das criaturas 
em detrimento da outra foi, com efeito, uma forma de idolatria. Com o resulta­
do, encontramos, por exemplo, o dualismo extremamente ascético de Tomás
i » ni •>! n v í >i viM i n u n u u n ia i inm< ) v v
Ki uipi.» <’in seu livro Imitution oj ( 'hn\t | Imii.içito de l Visto |, que divinizava a vida 
iltlt rior c aconselhava a fugtt «la i‘i Iuçfto. 1 Ou testemunhamos o dualismo mais 
d* «contraído, hierárquico de Tomas tlr A(|uino, com sua ênfase na neutralidade 
mu mi reduzida bondade da natureza e a superioridade religiosa da graça. Nessas 
| noutras manifestações da cosmovisao medieval vemos o aspecto eclesiológico 
ilii vida removido de seu verdadeiro contexto no todo da vida e tornado absoluto 
ili forma idólatra. Paradoxalmente, isso levou a consequências desastrosas para 
•i Igreja.
A consequência principal foi que tornou o evangelho irrelevante para a vida
i oiiio um todo. Em tal visão dualista da vida, o Cristianismo nada tem de essen-
i lu I a dizer à nossa vida natural. Se o evangelho repudia a criação (como na versão 
illtíética do dualismo) ou, simplesmente, acrescenta algo extra ao hojnem natural 
(mino na visão moderada deTomás de Aquino), então a fé cristã afeta a criação e 
il vida criada apenas de modo tangencial. O poder radical, transformador de vidas 
ilii evangelho, é impedido.
Ainda pior, o caminho fica aberto para uma sujeição dupla. Se o evangelho 
iiíio comunica nenhuma palavra normativa para a cultura, então daremos ouvidos 
il outras palavras, pois somos seres, inevitavelmente, culturais. Por deixar grande 
MUI’te da vida sem ser influenciada pelas afirmações de Cristo, o dualismo medieval 
levou os cristãos a encontrar outras autoridades fundamentais para o lado natural 
de sua vida. Isso se tornou evidente no papel que Aristóteles e outros escritores 
ijdssicos vieram a desempenhar no pensamento do fim do período medieval e início 
do humanístico. Esse tipo de visão dupla leva a uma forma de adoração dupla. Até 
Iloje, os cristãos ainda não estão livres, em suas cosmovisões ou em seu estilo de 
vida, dos efeitos debilitantes desse dualismo não bíblico.
Todavia, as consequências desse dualismo se estenderam além da igreja. O 
dualismo da igreja abriu a porta para o triunfo do secularismo como direcionador 
du cultura ocidental. Em termos bem objetivos, se não fosse pelo dualismo medieval 
dn n atureza/graça, o secularismo moderno poderia nunca ter surgido.
O biólogo-filósofo francês Jacques Monod concorda com esse julgamento 
histórico em seu comentário sobre a revolução científica:
Se esse evento sem precedentes na história da cultura aconteceu no 
Ocidente cristão em vez de em alguma outra civilização, talvez tenha 
sido, em parte, graças à distinção fundamental esboçada pela igreja entre 
os domínios do sagrado e do profano.24
Enquanto os teólogos medievais outorgaram um grau limitado de autonomia 
no campo de nossa vida natural, os humanistas do Renascimento expandiram tanto
ii autonomia da natureza que não havia mais necessidade para o campo da graça. Se
I )eus e o Cristianismo já eram basicamente irrelevantes para a maior parte da vida,
1 0 0 A V IS A I I 11< A t I l i i N M A I N I H A
por que nílo fazer a irrelcvAncia deles complcta? Nun pntuvi .in dr l'*i aiu• is Schnefi' i
a natureza começou a “devorar” a graça.^
Isso não quer dizer que a eosmovisão ocidental sr tornou ateia subitameilfÉ 
Até hoje a proporção de ateus estritos não é muito alta. C) secularismo não signilici 1 
necessariamente uma falta de crença em Deus. Ele c mais intimamente relacionai In, 
como Bernard Zylstra aponta, à negação da revelação de Deus.26 Embora a cxm 
tência de Deus não seja, em rigor, questionada na eosmovisão secular, Deus rnuli 
tem de essencial a nos dizer acerca de como é o mundo ou como devemos vivei 
O secularismo questiona sim a autoridade e a relevância de Deus para o .íi/i#* 
culum. Essa palavra latina da qual a palavra secularismo é derivada significa literal 
mente século, isto é, o mundo criado visto em especial como temporal ou histórico, 
E foi exatamente do campo da História, ocampo temporal das ocupações diária«, 
que Deus foi excluído cada vez mais. Ao passo que o saeculum se tornava mail r* 
mais absoluto Deus começou tomar parte cada vez menos notória como porçflti 
integrante da eosmovisão moderna. E a posição do homem cresceu proporcional 
mente. Voltamo-nos agora para essa nova visão da humanidade que é o coraçtto 
da eosmovisão moderna.
C a p í t u l o 8
( ) P R O G R E S S O D A C O S M O V IS Ã O S E C U L A R
Quando a cosmovisão secular apareceu primeiro? Para responder a essa 
ptTgunta precisamos primeiro fazer outra: quando começou a história da Europa 
ti it ulema? Infelizmente uma resposta exata não é possível; datar períodos históricos 
provoca a subjetividade e uma simplificação exagerada. M as é satisfatório dizer que 
Piilie 1470 (a origem do Renascimento italiano) e 1700 (o início do Iluminismo) 
li mundo moderno nasceu. No século 15, a Europa ainda podia ser caracterizada 
mino genuinamente medieval, mas, por volta do século 18, a modernidade já se 
havia estabelecido.
O que havia mudado? Se fôssemos comparar o mundo ocidental moderno à 
Km opa medieval (ou mesmo às culturas não ocidentais), a característica distintiva 
ilu ( )cidente moderno seria seu secularismo. O processo da modernidade tem sido
ii processo da crescente secularização da vida. Mas qual o significado de dizer que
ii mundo moderno é, em essência, secular? Para a maioria das pessoas significa 
i|uc as pessoas modernas perderam o interesse na religião. Deixamos de ser uma 
Modedade bidimensional (secular mais sagrado) e passamos a ter apenas uma di­
mensão. Perdemos o sagrado.
Todavia, isso, definitivamente, não é o que queremos dizer com secularismo. 
Tal interpretação faz sentido apenas dentro de uma estrutura dualista na qual o 
«Ugrado e o secular estão separados. Mas não queremos dizer também que o secula- 
1'ÍHino seja um sistema de crenças filosóficas ou intelectuais (como encontramos, por 
exemplo, no The Humanist Manifesto)', ele não é humanismo secular. Em vez disso, 
unamos a palavra secularismo para transmitir a ideia de uma cosmovisão - aquela 
visão pré-teórica e comprometida que tem moldado as instituições dominantes do 
mundo ocidental moderno desde o Renascimento. A cosmovisão do secularismo 
PH l á inevitavelmente encarnada na secularização da cultura.1
Apesar de os intelectuais não terem criado a cosmovisão secular, contudo eles 
Ifcquentemente têm sido vozes eloquentes para o progresso da visão. Focalizaremos 
ftgora essas pessoas.
Homo autonomous
A essência da nova cosmovisão é capturada no fumoso livro Qmtion on th# 
Dignity o f Man, de Pico dclla Mirandola. Pico, escrcvciulo cm L487, ainda noI' 
grande influência da estrutura neoplatônica cristianizada da Idade Média, fez h< >ai 
a trombeta anunciando a visão moderna e secular da humanidade. Na nova venuui 
de Pico sobre a história da criação, Deus faz o homem indeterminado, sem muit 
natureza específica. Então Deus se dirige à sua outra criação:
Nós não demos a você, ó Adão, uma aparência própria para si mes­
mo, nem algum dom propriamente seu, de maneira que, qualquer lugar, 
qualquer forma, quaisquer dons que você possa, com premeditação, se­
lecionar, esses mesmos, você possa ter e possuir por meio de seu próprio 
julgamento e decisão.
Lá se foi a ordem medieval fixa da sociedade. Em seu lugar ficou a humanidade 
moderna com ilimitadas possibilidades. Podemos ter o que escolhemos; podemou 
ser o que desejarmos ser. Deus diz a Adão mais adiante:
A natureza de todas as outras criaturas é definida e restrita às leis que 
estabelecemos; você, ao contrário, sem impedimentos de tais restrições, 
por seu próprio livre-arbítrio, a cuja tutela te designamos, pode traçar, 
por si mesmo, as características de sua própria natureza.
A raça humana - diferente da natureza - fica assim nem limitada pela lei de 
Deus, nem responsável a ela. Em vez de ser uma criatura dependente, respondendo 
àTorá de Deus em todas as atividades de criatura, a humanidade é definida em 
termos de liberdade da lei. Aqui chegamos ao âmago do secularismo moderno: o 
postulado da autonomia humana. Na cosmovisão moderna, o homem torna-se umu 
lei (nomos) para si mesmo {autos).
Podemos dizer que o Deus de Pico, realmente, isenta Adão da criação, da 
finitude. Deus diz a Adão que ele não tem uma natureza específica, limitada:
Para que você possa, como o formador livre e orgulhoso de seu próprio 
ser, dar forma a si mesmo como preferir. Estará em seu poder descer às 
formas de vida mais baixas, animalescas; você será capaz, por meio de 
sua própria decisão, de erguer-se novamente às ordens superiores cuja 
vida é divina.2
Assim, os humanos podem se tornar deuses se eles desejarem, pois não estão 
restritos pelas mesmas regras das criaturas como o restante da criação. Nessas parte«
I 1 pin ii ip.I ssi I DA msMoVhAo M|u HI AH 10'
I ><ii .Ildus da () ration podcmin» mi ninm IV n, upemu' de utilizar os conceitos da tra- 
mística neoplatònica, i’uluvn, no entunto,essencialmente cm termos modernos. 
MJco anunciava a morte d» cotumovisflo medieviil. No limiar da modernidade, ele 
profetizou a respeito de uma nova humanidade vindoura, uma humanidade com 
pMNibilidades infinitas que ficariam no lugar de Deus, cujo destino estava em suas 
próprias mãos - homo autonomous.''
Com o começo do seeularismo nós, então, temos o campo transcendente da 
jftuçu reduzido em termos seculares ao campo humano da liberdade. A dicotomia 
itálica tornou-se então aquela entre o homem autônomo - o sujeito racional - e a 
Initurcza determinada, moderada pela lei - o objeto que existe essencialmente para a 
manipulação e controle humanos. Mas até esse tempo o próprio significado da palavra 
Htíturcza havia mudado. Ela não tinha mais o significado medieval dos aspectos não 
Pipi rituais da vida, incluindo a cultura humana comum. Em vez disso, começava 
tl ter a conotação moderna do mundo não humano, o campo da exterioridade, dos 
nhjetos, dos recursos a ser explorados. A natureza tornou-se o mundo láfora , distinto 
dii raça humana e, às vezes, oposto a ela. Herman Dooyeweerd sugere que:
Orgulhosamente consciente de sua autonomia e liberdade o homem 
moderno via a “natureza” como uma vasta arena para as explorações de sua 
personalidade livre, como um campo de possibilidades infinitas no qual 
a soberania da personalidade humana deve ser revelada por um domínio 
completo dos fenômenos da natureza.4
A revolução científica
O domínio sobre a natureza tomou forma, inicialmente, no campo da ciência. 
A ciência, no sentido clássico da procura por um entendimento sistemático e abs- 
Irato das estruturas universais do mundo, não começou com os tempos modernos. 
( )s antigos gregos já desenvolviam ciências tais como a Lógica, a M atemática e a 
Astronomia. Apesar disso, a visão deles de ciência, baseada no dualismo de uma 
ordem racional, transcendente, estável e um campo caótico e inferior de controle, 
era muito mais contemplativa do que a ciência moderna. Resumindo, a ciência grega 
nao estava, particularmente, interessada no mundo empírico. Seu foco estava na 
estrutura abstrata e racional da realidade e das leis e formas estáveis e permanentes 
divinamente implantadas no universo, às quais poderíamos ser inseridos por meio 
de nossa parte divina - nossa razão. Uma vez que a mente humana e a estrutura 
do cosmos eram racionais, a ciência (apesar de basicamente teórica e especulativa) 
era possível e justificada.
Com a chegada da Idade Média e a crescente espiritualização do dualismo 
grego, a iniciativa científica empírica tornou-se mais inibida. Certamente houve
» « T irv i* r | H M lini i ' 1* 1*101 '» »Wtt
uma consciência i n e d i c v n l d o que hoje chammmn. m i l u n v i i , i o o l u d o i s s o n í t o l e v o 
à ciência moderna, mas à observaçíío da natureza pura um propósito mtnx elêvfo 
Mesmo quando vista de maneira positiva, a natureza nfto eru considerada imporCilfitü 
em si, mas apenas indicadora de I )euse do reino da grui;;». ICla consistia de matUl1 
ilustrativo para sermões, moralização e edificação ou para a construção de umtl teu 
logia natural - evidência de Deus baseada na ordem e na harmonia do mundo,
Um empirismo crescente. Todavia, durante os séculos 12 e 13, essa atitude ;il< 
górica tornou-se de alguma maneira transformada. Por exemplo, Alberto Mauu 
o professor de Tomás de Aquino, viajou extensivamente a pé pela Europa, invoNl 
gando e observando seus arredores. Ele começou a ver a criação como mais do qtit1 
simbólica ou ilustrativa. Ele estava interessado nas causas naturais das coisas. Apetmi 
das imperfeições da natureza, Alberto constatou que seu estudo era importa nh' 
tanto em si mesmo como por suas aplicações práticas. Embora Tomás de Aqiüiltí 
não tenha insistido nesse interesse prático e empírico muito minuciosamente, nu 
entanto ele enfatizou com força a beleza e a bondade do mundo e combateu ti 
crença extrema no sobrenatural e o desprezo por esta vida.5
M as essas ênfases perderam o valor em comparação com a importância do 
mundo empírico nos séculos 15 e 16. Essa foi a era da exploração e da descoberln,
o novo mundo das Américas havia se aberto. Os horizontes humanos estavam sendo 
expandidos e a ciência moderna irrompia. Na verdade, a ciência liderava o papt I 
cultural no princípio do desenvolvimento do Ocidente. A nova visão da conquislu 
humana e da exploração da natureza para nossos próprios fins logo incorporou
o poder da descoberta científica e da invenção, e contribuiu grandemente para u 
revolução científica do século 17.
Para ter uma noção do papel da ciência moderna no desenvolvimento dn 
eosmovisão secular, preste bastante atenção às palavras do inventor do método 
científico, Francis Bacon. Escrevendo em seu Novum Organum no princípio do 
século 17, Bacon explicou que: “Na queda, o homem caiu, ao mesmo tempo, de seu 
estado de inocência e de seu domínio sobre a criação. Contudo, ambas as perdttl 
podem ser corrigidas em parte, mesmo nesta vida; a primeira pela religião e a IV*, 
a última pelas artes e ciências”.6
Bacon era cristão e acreditava na queda. Ainda assim a natureza não bíblica 
do dualismo medieval é evidente em sua separação dos aspectos espirituale naturul 
da queda e em sua proposta de uma forma dupla de salvação. Em outras palavras,
o dualismo de Bacon requeria que ele fornecesse duas respostas para cada per* 
gunta da eosmovisão “O que está errado?” e “Qual é a solução?”. Ao passo que u 
restauração de nossa inocência moral estava nas mãos de Deus, a restauração dc 
nosso domínio sobre a natureza estava, na opinião de Bacon, em nossas próprias 
mãos competentes.
Aqui temos uma ilustração de como o esquema natureza/graça preparou o 
caminho para o secularismo moderno. Em virtude de Deus ter sido removido de um
( » I IU li III I v i l ) MA I IIS M I iVIHA i > UI I I I I AH
piipel relevante cm nossa viiIn i ul im. i l , r cm pm ilcular científica, algum outro tipo dc 
urilvuçflo precisou redimit no i x o d o m í n i o nobre a criação. A s s i m , Bacon proclamou 
riu seu lugar um modo dc sulvaçfllo essencialmente humanístico, e a s s i m secular.
K verdade que Bacon estava preocupado com a restauração de nosso domínio 
ni'4»queda sobre a criação. Ati'* esse ponto ele ainda retinha elementos, explicita- 
me u le , bíblicos em sua eosmovisão. Porém, como o historiador de filosofia John 
PiiHiunore tem destacado: “A ideia da ‘restauração’ pode ser tranquilamente renun-
i tilda de tal forma a ser substituída por uma ambição que os cientistas de mentes 
imiis seculares pudessem compartilhar com alegria”.7 O propósito declarado, e a 
ilinbição da sociedade científica utópica de Bacon em New Atlantis, era: “O co­
nhecimento das causas, e os movimentos secretos das coisas; e o alargamento dos 
limmmtes do império humano, para a efetuação de todas as coisas possíveis”.s Esse 
Império humano, o “Império do homem sobre as coisas depende em sua totalidade 
diiK artes e ciências”, declarava Bacon.9
Ainda assim, exatamente porque Bacon ainda tinha resquícios cristãos em sua
i nsniovisão, o significado, considerado redentor de maneira idólatra, dado à ciência 
torna-se evidente. Passmore comenta:
O que o pecado havia danificado a ciência pôde consertar em grande 
parte: o homem pôde tornar-se não apenas o titular, mas o verdadeiro 
senhor da natureza. Esse não era, dc forma alguma, o ensino cristão 
ortodoxo; isso equivalia a dizer que o homem, diferente de Deus, poderia 
levar o mundo ao estado ideal que Isaías havia profetizado.10
O milênio estava perto, um milênio dependente do esforço humano. O que 
lemos aqui é, de maneira clara, uma variação do humanismo, mas uma variação 
particularmente moderna. Isto é, o cientificismo: a absolutização da ciência, a elevação 
d;i bravura científica humana a um nível de significância salvadora ou redentora. 
Nós confiamos na ciência. Essa é a aplicação clara do postulado da autonomia 
humana na conquista da natureza pela iniciativa científica.11
Racionalismo matemático. Essas não eram atitudes exclusivas de Bacon. René
I )escartes, por exemplo, o pai da filosofia moderna, concordava com as ideias 
essenciais de Bacon. Escrevendo em 1637 em seu Discourse on Method, Descartes 
discordou da filosofia especulativa dos filósofos da Idade Média. No lugar dela ele 
propôs “Uma filosofia prática que, ao nos ensinar a conhecer a força e a ação do fogo, 
do ar, dos corpos celestes, do céu e de todas as outras substâncias que nos cercam, 
nos habilitaria a nos tornar ‘os mestres e donos da natureza ”.12 Esse domínio é 
considerado por Descartes como a tarefa humana automanifesta, sendo que sua 
própria filosofia proporcionava suporte sólido para essa visão.
O que era essa filosofia? E como ela deu suporte ao domínio humano sobre a 
natureza? Ao responder essa pergunta chegamos a uma importante diferença entre
f % v i ;v v » i n n r v im ' h ivi^ i n in n
Bacon e 1 )escarte8. Apcmu de mnboflos filósofos ureitinviu« iiurm nu Hublimídndi 
de nosso domínio e conquista da natureza, Bacon teve urnu ênfase esmagadom, j 
empírica c realista, enquanto 1 )cscartes sustentou uma posição abstrata, íiloiólit rt 1 
e racionalista. Na verdade, a distinção entre empirismo e raeionalisino, apesm di 
normalmente ser enfatizada com exagero, ilustra seus diferentes pontos de vintu
Para Descartes, a matemática (em particular a geometria com seus axioimw »< 
deduções) era o paradigma do conhecimento, absolutamente certo, infalível, l\»i 
tanto, a partir de seu próprio axioma básico cogito ergo sum (“Penso, logo existo”) rlp 
tentou construir um edifício de conhecimento filosófico usando rigorosos pasiow 
lógicos. Começando pelo mundo interior do pensamento puro, ele tentou ligiu o 
abismo com o campo exterior dos objetos. Seu sucesso nesse empenho tem sitiu 
muito debatido desde então.
Entretanto, o que geralmente é reconhecido como uma importante coil 
tribuição é a divisão, agora famosa, que Descartes fez do mundo em res cogi/on\ 
{coisapensante, ou mente) e res extensa (coisa ampliada, ou matéria). Por meio dcHHO I 
dualismo rigoroso ele enfatizou, até mais do que Bacon o fez, o abismo radiewl 
entre o homem e a natureza. Ao passo que o homem era um agente racional livro 
e consciente, toda a natureza era nada mais que uma máquina formidável, o campo 
da matéria morta, atuando por meio das leis firmes da causa e efeito que o homem 
podia entender e explorar com vistas ao benefício humano. Essa é uma das origenl I 
da física clássica, e do universo bola de bilhar newtoniano. Além do mais, eswtt 
redução cartesiana da natureza (isto é, tudo, exceto a mente humana) à res extensa
- um sistema de relacionamentos físico-espaciais e determinados pela lei (paru 
Descartes até os animais eram meras máquinas) - deu suporte à impunidade com 
a qual a humanidade autônoma podia manipular e explorar o mundo natural pani 
seu próprio benefício.
Descartes via o universo físico não em termos da rica diversidade e variedade*na natureza, mas em termos das relações ou leis quantitativas abstratas pelas quail *
o mundo-máquina funcionava. Embora tais ideias não pareçam tão extraordinárias ' 
para nós hoje, a nova “filosofia mecânica da matéria, movimento e matemática” dc 
Descartes não tinha nada de óbvio para as pessoas de sua época.13 Era um con- ] 
ceito radicalmente novo, altamente abstrato do universo, e era muito distinto, potf 
exemplo, da visão de senso comnm de Bacon.
Bacon concordava com Descartes sobre o fim principal da ciência, mas consi- ] 
derava a filosofia mecânica cartesiana repugnante. Qualquer ciência que divergisse do 
campo claramente observável e empírico era suspeita. A mente, importante como é, I 
deve ser corrigida pelos sentidos, o tribunal de apelação final. A observação direta I 
da natureza (e não o cálculo matemático) era, no ponto de vista de Bacon, a única I 
via válida para a verdadeira ciência.
Foi por essa razão que Bacon rejeitou a visão copérnica do universo heliocêntri­
co, que ganhava em popularidade. Essa visão era, na opinião de Bacon, apenas uma
I > I'ld H i l t l v i i 1 HA ( I W M i 1 V IH Â I' s t'i I 'I A lt 1 0 7
Ifni in especulativa, muito dbtnnn' (1»>*• Info* (W on observáveis. Ela tentava registrar 
Oh movimentos dos planrtiih tiNitmlo leniiMO« ijue Macon considerava um sistema 
iflfltemiltico nflo verificável. In I teoriu nflo podia ser parte genuína da ciência.
Uma utopia humanistica
A ideia central na filosofia de Bacon era a experiência. Na verdade, a palavra 
riu si veio a ter conotações quase mágicas entre os simpatizantes da filosofia de 
Uni on do fim do século 17. Os experimentos indutivos eram considerados como o 
meio real para a compreensão dos segredos da natureza e para obter conhecimento
i lcntífico genuíno. Este era o novo método de Bacon. Ele visionava todo um exército 
fit* artesãos, mecânicos e técnicos (não instruídos e, portanto, não corrompidos pela 
filosofia especulativa) que empregaria esse método para o controle da natureza e o 
benefício da raça humana. O convite ressonante de Bacon para essa democracia de
i íciitistas experimentais (um tipo de sacerdócio científico dos crentes) foi uma de suas 
contribuições para o grande avanço da ciência no século 17.
I)e acordo com o historiador Richard Foster Jones, a grande ênfase dada à 
experimentação na Inglaterra do século 17, juntamente com o ponto de vista de 
que a ciência deve ser subordinada para fins utilitários e até mesmo utópicos, é 
Hl ribuída de forma direta à influência de Bacon.14 A Sociedade Real, que foi fundada 
oficialmente por carta de patente em 1662 para estimular o avanço da ciência, traçou 
mias raízes até Bacon intencionalmente, tomando-o como seu mentor. Ele é até 
venerado em grande parte da literatura daquele período. Por exemplo, o prefácio 
de Abraham Cowley para o livro History o f the Royal Society (1667), de Thomas 
Sprat: “Atribui a reforma na ciência a Bacon, comparando-o a Moisés, que apontou 
a terra prometida, apesar de não poder entrar nela”.15
As conotações religiosas dessa analogia são bem apropriadas, pois um zelo 
religioso definido estava sendo desenvolvido pela nova ciência. Entre os membros 
da Sociedade Real, observa Jones: “O experimento e a observação como o método 
apropriado para a descoberta das verdades naturais representavam uma fé, e duvidar 
disso era heresia”. E todo novo sucesso da sociedade: “Elevava-os [seus membros] 
ao mais alto nível de entusiasmo e enchia-os com visões confiantes do futuro”.16 Aos 
olhos da Sociedade Real (e sua influência crescia rapidamente), a ciência dispensava 
a palavra certa do conhecimento, uma onisciência que levaria a humanidade à terra 
prometida, a utopia humanistica que estava quase instalada.
O método experimental de Bacon era uma condição necessária, apesar de não 
suficiente, para o desenvolvimento do cientificismo. Essa nova idolatria também 
exigia a concepção de mundo de Descartes que era fundamentada na matemática 
e na mecânica. Bacon havia rejeitado a filosofia mecânica cartesiana; ela havia sido
considerada no início um» hipótese opcional pelu Sm iedad( Ural, tnna teoria ;i mi i 
testada pelo experimento, Mesmo assim foi exatamente a abordagem cartesiana qmM 
“Foi estabelecendo a ciência, de forma vagarosa, sobre a mais firme base que Intviii 
possuído”.17 A ênfase matemát ica quantitativa de Descartes provou ser frutífera an | 
extremo para a formulação tias leis científicas, e assim para a predição de fenômenow ] 
Na verdade, sua concepção reducionista de um mundo-máquina cientificamente- 
manipulado pode ser considerada como a escritura da Revolução Industrial}*
O empirismo experimental e o racionalismo mecânico in tandem constituíram
o impulso para a revolução científica.19 Juntos eles proporcionaram um fundamento 
firme para a fé que se desenvolvia recentemente em um paraíso secular alcançável 
pelo domínio humano científico e técnico sobre o mundo natural. Contudo, en|H 
perspectiva, de maneira alguma, era incontestada, tanto hoje quanto no século 17l 1 
“A abordagem cartesiana de Bacon com respeito à natureza dominou o Ocidente, j 
à primeira vista somente como uma aspiração, no fim como uma realização”.í0 .
Ciência, a modernidade e a cosmovisão cristã.
Estamos exagerando em nossa representação dos elementos negativos dil 
revolução científica? A força motriz inicial por trás da origem da modernidade 
era na realidade tão anticristã? Não existia, em vez disso, uma motivação crktA 
significativa por trás do aparecimento da ciência moderna?
Certos cristãos hoje enfatizam que a ciência moderna começou e floresceu 
naquela época específica porque estava com solidez cercada pela crença em um 
Deus racional que havia criado um universo racional o qual podíamos comprcen 
der pelo exercício da razão.21 M as foi isso mesmo o que aconteceu? Em primeiro 
lugar, esse é um conhecimento de Deus e do mundo essencialmente cristão? Ettl 
segundo lugar, sendo cristão ou não, era esta, de fato, a força motivadora oculta no 
aparecimento da ciência moderna?
A resposta a cada uma dessas perguntas é sim e não. Primeiro, a visão do 
universo racional é cristã apenas no sentido de que é uma forma (um tanto inútil) 
de declarar o ensino bíblico de que Deus criou o mundo com uma estrutura ou 
ordem legal que exibe sua sabedoria. Essas leis são, em sua origem, destinadas a 
ser obedecidas, mas podem também ser cientificamente estudadas. Além disso, u 
ideia de um cosmo estruturado com regularidades constantes nunca foi exclusiva < 
à cosmovisão judaico-cristã. Ela é encontrada também nas cosmovisões de outra» 1 
culturas antigas do Oriente Próximo, no Egito, na Mesopotâmia e na Babilônia.
Além disso, a ideia de que essa estrutura cósmica seja essencialmente racional I 
é uma compreensão de característica grega e não cristã. Como anteriormente men - I 
cionado, os filósofos gregos acreditavam que um raciocínio divino (um logos, ou as 1
1
Iw n r\ v i r w > I i iA iN n n >UMAI H JNA
s i |'|II i o n i z o |)A i OXMOVIHAO Nm UI AH IUV
lilciiiH dc uma mente cliviiiii) ■ i ,i implmiudo nu própria cBtrutura das coisas, e que
iiN humanos, por mui rn/ilo (o if<‘n\ Interno), podiam compreender conceitualmen- 
lf rssa estrutura. ” Kmbont ínnc im ionalismo tenha gerado muita contemplação 
üloHÓÍica, não levou à ciência empíricu por ser estabelecido dentro do contexto de 
tiniu perspectiva dualista que nSU) considera o mundo físico importante o bastante 
pura estudo e observação detalhados. Esse dualismo, com suas implicações racio- 
Hulistas e até certo ponto atenuadas, foi transmitido para a tradição cristã medieval 
r ii influenciou de modo decisivo. Aqui, também, ele produziu muita especulação 
filosófica e teológica, mas não ciência empírica.
Parece, então, que precisamos de outra hipótese para considerar a origem da 
rléncia empírica moderna além da ideia de um universo ordenado que pode ser 
PMtudado por meio da razão. O que está faltando? Considere a impressionante 
iinugem sugeridapelo historiador R . Hooykaas:
Para os materiais que constroem a ciência (lógica, matemática, o 
princípio de uma interpretação racional do mundo) precisamos olhar 
para os gregos; mas as vitaminas indispensáveis para um crescimento 
saudável vêm do conceito bíblico da criação.23
O que faltava nas cosmovisões medieval e grega, e o que era novo nos séculos 
16 e 1.7, era uma apreciação positiva deste mundo e da tarefa humana nele.
O problema é que havia duas versões dessa asserção crescente do saeculum. 
Km grande parte graças à ênfase da reforma nas Escrituras, a visão bíblica da boa 
mação de Deus e do mandato cultural para desenvolver essa criação foi recu­
perada.24 Por outro lado, o Renascimento propôs uma versão secularizada dessa 
declaração. A boa criação de Deus foi reduzida a uma máquina, um objeto que 
uK seres humanos podiam manipular; e a tarefa dada por Deus de desenvolver a 
criação, como administradores, foi transformada na visão humanística de nossa 
conquista científica autônoma do mundo-máquina. Porque uma nova avaliação 
positiva do mundo é encontrada tanto na Reforma quanto no Renascimento, é 
difícil determinar se o Cristianismo é originalmente responsável pelo desenvolvi­
mento da ciência moderna.
A cosmovisão secular é, de fato, fundamentada na realidade de uma criação boa 
c no mandato cultural. Assim as respostas que as cosmovisões, bíblica e secular, dão 
pura “Quem somos nós?” são surpreendentemente semelhantes. Mas também existe 
uma diferença profunda. As Escrituras proclamam que somos criaturas especiais 
de Deus, feitas à sua imagem, criadas como administradores para desenvolver sua 
criação em obediência humilde à sua vontade soberana. O secularismo, por outro 
lado, repudia qualquer submissão ao que parece ser uma autoridade externa.
Mesmo assim, a cosmovisão moderna aceita claramente e acentua com vigor a 
mitoridade legítima da humanidade de fazer uso do mundo criado e transformá-lo.
I i v o V l!W > I H A N *H 1HMA!« ’ MA
Nisso ela tí semelhante eowmovififlo bíblica ebem diferente de OOPUiiovínAch de muiitim 
culturas mais antigas e tradicionais. As pessoas moderiuiN nfio projetam eonseieiili 
mente seu exercício de refletir a imagem tle Deus para ídolos externos estabelecido! 
como deuses. Na verdade, elas veem sua secularidade e suposta ausência de religlfl® 
como uma de suas realizações mais significativas comparadas a eras anteriores.
Mordomos ou deuses?
Contudo, apesar de seus triunfos culturais e falta de ídolos clássicos, o O tí 
dente moderno não reconhece o homem como imagem de Deus. Isso admitii n 
nossa natureza dependente, inerentemente derivada e o caráter padronizado dit 
iniciativa cultural. Em consequência, a ideia da administração é, visivelmente 
ausente da cosmovisão moderna. M as se o povo moderno não se vê como imagCfli 
de Deus nem ergue pedaços de madeira e pedra externos como supostas imageiiN, 
que opções temos?
Chegamos agora ao que é, absolutamente, único com relação à cosmovisílo 
secular moderna. Pela primeira vez, desde o Renascimento, temos no Ocidente 
uma civilização inteira que, de maneira gradual, vem a crer e a afirmar que a própria 
raça humana é Deus - não precisamos de Deus nem das imagens. A essência do 
humanismo moderno é que a humanidade se deifica. Isto é, consideravelmente, 
mais radical do que a visão grega na qual o homem era divino em virtude de sua 
razão, por meio da qual ele participava de um logos eterno, ou mente divina. Mesmo 
a visão grega defendia um reino mais elevado ao qual era nosso dever nos ajustar. 
Entretanto, na cosmovisão secular encontramos a surpreendente crença de que o 
homem realmente é a medida de todas as coisas, e que a tarefa de desenvolvimento 
cultural é, portanto, autodirecionada, padronizada por nossa própria racionalidade 
autônoma.
De uma perspectiva cristã, esse desenvolvimento histórico é estranho, até 
mesmo paradoxal. O paradoxo é a similaridade, apesar da profunda diferença, 
entre as cosmovisões da Bíblia e de nosso tempo moderno. Mas, exatamente, por 
causa da visão secular do domínio humano sobre a natureza ser tão semelhante à 
visão bíblica genuína da administração da criação que a Era Moderna tem des­
frutado de um avanço cultural tão incrível. A cosmovisão secular é dependente de 
um importante discernimento bíblico. Ainda assim, esse discernimento tem sido 
distorcido terrivelmente.
Postular nossa autoridade absoluta sobre o saeculum, sugerir que podemos, 
por nossos próprios esforços, em virtude de nossa razão autônoma, controlar e 
manipular a natureza externa para produzir uma história, progredindo do caos para 
um estado máximo de perfeição e harmonia - isso nada é além de uma religião
hlmi, Com ii ruça humiiDii romo ilnih, » < miCurrM como a matéria inflexível pré
i h Intente, que dcvemoi nulijiljp.tii paru produzir nossa criação, existe até mesmo 
uma história redentora snulari/adu c uma cscatologia de progresso em direção a 
um estado final de bem aventurança. A eosmovisão moderna é uma religião que 
tornou muita coisa emprestada de sua herança cristã, mas ainda é em si mesma 
iiiâ/iitnr. o próprio homem tornou-se o ídolo.
Km termos bíblicos, plantamos as sementes de nossa destruição ao quebrar o 
parlo tia criação. Como vimos no Capítulo 4, a idolatria sempre envolve a desobe­
diência das leis do Rei legítimo, e o resultado inevitável é a maldição do julgamento. 
A cultura ocidental, agora, é apanhada em sua idolatria. Se buscarmos nossa regra 
ilíi criação, dada por Deus, como se fôssemos proprietários e não administradores, 
r k c nos ocuparmos do desenvolvimento cultural sem obedecer os padrões sábios 
r amorosos de Deus, o resultado será um desastre - um mundo de guerra, ódio, 
lascívia, ganância, competição, imperialismo e destruição ambiental. Certamen- 
li\ descobrimos nesses dias aflitos que, professando ser sábios, temos sido tolos.
I )esconsiderando a Palavra do Criador, a profundidade de nossa insensatez está 
ncirIo exposta. Esse é o estranho paradoxo da inspiração cristã, também perversão 
humanista, da Era Moderna.
t i i f « IKI *.*U i CIA u WM» «VlsAt » M l I 'i \u 111
C a p í t u l o 9
O s DEUSES DA NOSSA ERA
A cosmovisão ocidental dominante rejeitou a autoridade de Deus ou deuses 
v ulirmou a autonomia autonormativa da raça humana. Mesmo assim, apesar de 
mui essência humanística e secular, a cultura ocidental tem, de fato, servido a outros 
deuses, muitos deles - bens, coisas criadas que temos idolatricamente tornado 
nl»solutas e procurado com religiosidade na esperança de realização máxima.
Entre esses muitos ídolos, três em particular têm emergido de modo dra- 
IttiUico como principais na história recente. Isso não deveria nos surpreender. 
Kmbora a civilização ocidental seja, incontestavelmente, politeísta, ela nunca 
poderia ter conseguido sua coesão e dominância cultural sem algum absoluto, ou 
absolutos unificadores. Simplesmente, não faz sentido falar da cosmovisão mo- 
dcrna, ou da civilização ocidental, sem alguns valores preeminentes com os quais 
deveríamos estar comprometidos com força e de forma comunal, sem a maioria 
dns deidades, nas quais podemos colocar nossa confiança e em torno das quais 
orientamos nossa vida. Enquanto podemos experimentar hoje a desintegração 
dessa mesma cosmovisão e civilização, ainda há uma ortodoxia dominante que 
tem decisivamente moldado nossa história, e a qual vive no meio das ruínas de 
liossa era.
No que vem a seguir, não é nosso objetivo proporcionar uma análise exaustiva 
do desenvolvimento de nossa religião secular. Para os nossos propósitos um breve 
resumo será suficiente. Assim como nossa discussão anterior da revolução científica 
c da origem da cosmovisão moderna não pretendia ser uma história abrangente, 
HKsim o que se segue é apenas uma visão geral. Nossa intenção é apenas destacar 
os compromissos religiosos da humanidade moderna nos últimos 400 anos. O b- 
Hcrvaremos aqueles falsos deuses que têm tido o impacto mais decisivo e formativoNobre o modelo e a direção da cultura ocidental.
No apogeu do panteão secular está uma trindade profana, um deus em três 
pessoas, um ídolo em três absolutos. Os três absolutos são o cientificismo, o tec­
nicismo e o economismo.
Cientificismo: pernas de ferro.
Como ;i estátua de Nabucodonosor em Daniel 2, esse ídolo é de: “KxtraofdinA 
rio esplendor” (Dn 2.31). Representando os reinos que dominariam a terra, as vitrítin 
partes da estátua de Nabucodonosor eram feitas de materiais diferentes: “A cabe», i 
era de fino ouro, o peito e os braços, de prata, o ventre e os quadris, de bronze; un 
pernas, de ferro, os pés, em parte, de ferro, em parte, de barro” (vs. 32-33).
O ídolo de nossa era também é feito de várias partes. Suas pernas, sua base de 
suporte, são de ferro - o ferro forte e invencível da compreensão científica humana, ii 
habilidade de entender a natureza de maneira conceituai (e assim controlá-la). C) cicn 
tificismo é, então, o primeiro absoluto em nossa religião moderna. Ele é o primeiro deu« 
falso em quem o homem secular tem depositado sua confiança historicamente.
A crença profundamente religiosa de que a razão humana, em especial nu 
forma de um método científico, pode proporcionar o conhecimento completo do 
mundo da natureza e da humanidade é fundamental para a cosmovisão moderiui 
A ciência torna-se a fonte de revelação. No lugar do sacerdote do período medievul, 
o cientista vestido oficialmente de branco prescreve o conhecimento para a salvaçilo, 
O pecado original não é mais a desobediência a Deus; é a ignorância, a irracional'! 
dade ou a informação errada. A falta de conhecimento é a raiz de todo mal. Ve mo* 
então, com Os Guinness, que um pilar fundamental do humanismo moderno "l\ 
a crença na ciência como o guia para o progresso humano e o mantenedor de uniii 
alternativa para a religião e a moral”.1
Diferente do racionalismo grego mais antigo, que elevou a razão contemplativn 
e teórica a um nível de autoridade máxima, o racionalismo moderno é comprometido 
com certa razão orientada pela práxis. Foi Francis Bacon, afinal, que forjou a frasfll 
“Conhecimento é poder”. Jeremy Rifkin comenta que, para Bacon: “A primeira v 
última palavra de uma experiência humana expressa de forma simples é: para ser­
mos humanos, precisamos estar no controle. A ação é o alvo, não a contemplaçíto, 
Qualquer ação que leve a um controle maior sobre a natureza é benéfica”.2 E desde 
o início da Era Moderna até hoje, o propósito consciente da ciência tem sido a ma 
nipulação utilitarista do mundo-máquina para fins humanos. Por meio da aplicaç&o 
contínua da ciência, o credo moderno admite que progredimos, regularmente, em 
direção a uma utopia terrena, uma era milenar de nossa própria fabricação.
Tecnicismo: o bronze do poder.
Isso nos leva ao segundo deus falso no qual o Ocidente tem colocado sua con­
fiança, a segunda camada do ídolo de nossa era. Como a estátua de Nabucodonosor, 
o ventre e os quadris desse ídolo são de bronze - o bronze eficiente e produtivo da
I 1h IH USI-S DA NUSSA URA I I I
twhnéy o domínio ínrnmtivo r iri m iMglro tlsi natureza. Esse tecnicismo se apoia nas 
realizações il<> cicntifkiinio. Ele iTudu/ u descoberta científica em poder humano.
Embora as inuvnçAcH leenolrtglettH fossem evidentes em toda a história antiga 
r medieval, normalmente cltis falhavam no que se referia a encontrar um modo de 
Mi'r usadas em larga escala. Su;i aplicação era bloqueada pelos obstáculos duplos: 
itinii cosmovisão dualista e uma ordem social estática. Entretanto, na Era Moderna 
barreiras como essas, para progresso inovador, não permanecem. Na verdade iden­
tificamos nações como modernas somente se a ciência e a tecnologia tiverem um 
pupel de liderança em seu desenvolvimento contínuo. Desde o século 17, as pessoas 
wiavam uma poderosa tecnologia baseada na ciência. Motivadas pela ideologia da 
n mquista e a crescente aspiração por um paraíso secular, elas trabalhavam para de- 
lenvolver a vida sobre a terra por meio do controle científico do meio ambiente.
Até o fim do século 18, como destaca Bob Goudzwaard, essa aspiração 
Inicial baseada na possibilidade de progresso havia se tornado uma fé absoluta na 
inevitabilidade do progresso. Os dois componentes dominantes dessa fé eram: “seu 
poder de ação revolucionário” e “sua ênfase na inovação tecnológica como fonte de 
progresso”. Essa ênfase foi tão grande que a tecnologia se tornou, nas palavras 
d«* Goudzwaard, “Um guia salvador, um mediador entre o homem e Deus. Era o 
tllvorecer de um novo mundo”.3
O novo mundo era, e é, o mundo da máquina. Temos mecanizado a vida 
moderna e tornado-a técnica. Rifkin nos lembra que:
Ordenamos nossa vida por uma máquina - o relógio. Comunicamos 
por meio de uma máquina - o telefone. Aprendemos por meio de máqui­
nas - a calculadora, o computador, a televisão. Viajamos usando máquinas
- o automóvel, o avião. Até vemos com a ajuda de uma máquina - a luz 
elétrica. A máquina é o nosso meio de vida e nossa cosmovisão.4
Anteriormente, observamos a grande importância da imagem do mundo 
mecanizado para o surgimento da ciência e da tecnologia. Mas por que a máqui­
na é tão importante? Inicialmente, uma máquina é algo que podemos entender. 
Podemos desmontá-la e montá-la de novo. Nós a criamos cientificamente e a 
analisamos quantitativamente em termos de energia absorvida e rendimento. M as, 
o mais importante, a máquina aumenta nossa habilidade de controlar a natureza. 
A máquina nos faz mais poderosos porque nos torna mais eficientes. E somos fas­
cinados pela exatidão. Em nossa era mecanizada: “Precisão, velocidade e exatidão 
são os valores principais”.5
A fascinação estupenda e a significância salvadora da tecnologia na Eera 
Moderna são maravilhosamente apreendidas por Henry Adams em seu livro The 
Dynamo an d the Virgin. Descrevendo sua experiência com a gigantesca maquinaria 
na Grande Exposição de 1900, Adams escreve contando que ele experimentou:
n y ic v m • i u r t n n r i Min
O d í n a m o t l c a p r o x i m a d a m e n t e 1 2 i n c i t o u l o n i o u i n n f o r ç u m o d e l o ,
(In mesma maneira como os cristãos antigon (tentlimti h 1 1 u/, O próprio 
planeta, com sua rotação vagarosa c fora de moda, com regularidade anual, 
pareceu menos impressionante que esta enorme roda girando com frieza 
em velocidade vertiginosa e escassamente murmurando - antes tio fim 
alguém começou a orar a ela/’
O motivo que havia guiado a cultura ocidental por séculos havia sido subuli 
tuído por um novo modelo. A fé que havia se curvado para a virgem com a criai n,| 
agora prestava reverência à máquina. O sentimento de idolatria é opressor.
Ameaçada pela crítica recente e pelo ceticismo referente à tecnologia, Gould 
Inc., uma corporação com sede em Chicago, produziu uma série de panfletÒ* 
apologéticos para justificar sua fé. O primeiro livrete da série, Tecnology: Abatkfath 
Endure orAdvance? , declara sua fé logo na primeira página. Um título em negrito 
proclama: “Cremos na promessa da tecnologia”. Sem dúvida, admite o autor, o 
avanço rápido da tecnologia causou alguns problemas. Como deveríamos solucionui 
esses problemas? “Abandonar, tolerar ou ir em frente com nova ingenuidade? Todil 
a história mostra que somente a terceira opção é sustentável.” “A solução para on 
problemas apresentados por um avanço tecnológico”, diz outro título em negrito, 
“é, e sempre f o i , outro passo à frente”.
Tais afirmações abundam nesse sermão sobre religião técnica. M as o argUj 
mento decisivo é o parágrafo final. Em um clímax altamente emocional, um tipo 
de apelo secular, o escritor pergunta:
Podemos estar convictos de que a ciência e a tecnologia encontrarão as 
respostas? Podemos estar convictos de que existem soluções para nossos 
problemas? Não, mas podemos ter certeza de que nada, além da ciência 
e da tecnologia, pode encontrá-las, se elas existirem.
E então, em uma resolução religiosa final, separada em negrito no fim du 
página, lemos: “D aforma mais objetiva possível: a ciência e a tecnologia devem 
responder nossos problemas. Se elas não o fizerem nada mais o fará”.7
Enquanto o cientificismo sustenta a promessa da onisciência, o tecnicismo 
nos oferece a onipotência. A humanidade moderna tem acreditado no avanço ili­
mitado (e assim não normatizado) da ciência e da tecnologia, desconsiderando aw 
consequências: social, ambiental ou psicológica. Viemos a crer que se ela pode ser 
conhecida, ela deve ser con hecida; e se ela pode ser feita, ela deve ser feita. A ciência 
e a tecnologia têm se tomado os guias autônomos, foram elevados de seus lugares 
na criação de Deus e transformados em absolutos; promovidos a ídolos. A ciência, 
que atribui a palavra infalível do conhecimento, é o combustível inesgotável de nosso 
progresso inevitável, enquanto a tecnologia é seu motor eficiente e poderoso.
Aonde cHSt' m oioi inoimiiiinm» i ,iii noif levando? Qual 6 o alvo final dc nosso
I'rogresBO? A resposta ;i cmii.im peijJuntHn tbi dada na Revolução Industrial (da mc- 
Irtile do século 1H à metade do mjculo 19), coin sua transformação revolucionária 
ilii Hociedade moderna por meio da urbanização rápida c do desenvolvimento da 
economia das fábricas. O alvo final do progresso era o crescimento econômico e
ii prosperidade material.
Tecnicismo: a prata do lucro.
A terceira camada da estátua de Nabucodonosor (o peito e os braços de pra- 
liO representa a segunda metade do tecnicismo - o lucro para o qual a tecnologia 
moderna tem se voltado.8
A organização de uma sociedade inteira ao redor do motivo lucro é surpre­
endentemente recente. A própria ideia de ganho material, explica o economista 
Uobert Heilbroner, era blasfema para a cosmovisão da Idade Média, mas: “A noção 
mais ampla de que um esforço geral para o ganho pudesse, na verdade, unir uma 
comunidade teria sido considerada pouco menos que loucura”. Ainda assim isso é 
exatamente o que ocorreu.
A sociedade capitalista é fundamentalmente “Ativada pela corrida atrás do 
dinheiro”. Desde que o sistema de mercado começou a existir e as ideias abstratas 
de terra comercializadas, trabalho e capital foram invertidos, a sociedade ocidental,
i pie antes havia sido estática e tradicional, “Tornou-se fortalecida por uma máquina 
de combustão interna. Transações, transações, transações e ganho, ganho, ganho 
proporcionaram nova e surpreendente força motriz poderosa”.9
Assim como o advento da ciência moderna, o capitalismo requeria a afirmação 
ilii vida secular para crescer e florescer. Além disso, no contexto de uma cosmovisão 
Cada vez mais científica e mecanizada, era quase inevitável que o alvo principal da vida 
losse algo que pudesse ser mecanicamente produzido e matematicamente quantificado 
ou seja, o crescimento econômico. Também a ênfase do secularismo na expressão 
luimana autônoma da própria personalidade por meio do controle e da exploração 
díi natureza libertou o povo de quaisquer limites sobre seu apetite aquisitivo.
O capitalismo ocidental tem suas raízes religiosas na descoberta das leis naturais, 
lanto Jean-Jacques Rousseau quanto Adam Smith acreditaram que a primeira e 
mais importante lei que governa a existência humana é aquela da autopreservação 
e interesse próprio. Smith argumentava que enquanto as pessoas obedecessem à 
lei do interesse próprio e tentassem melhorar seus próprios interesses econômicos 
racionalmente, a sociedade se distinguiria e a prosperidade econômica para todos 
seria abundante. D e alguma maneira a atividade de interesse próprio dos indivíduos 
autônomos, preocupados com seu próprio ganho e não com o interesse público, seria
Q * 15BUIBH I IA NltHNA I KA I 17
IIH A VW A O fHANMI'HUM.MU)H \
liderada por mão invistvtl\)\\\\\ promover um lim tpi<* hoi in benélico pura ;i sociecliidi 
inteira. A vida econômica no mercado tem suas própria»» leia, debateu Smith, <* 1
for deixada desimpedida pelos regulamentos religiosos ou governamentais ela ugiiil 
dc maneira automática para o melhor interesse da sociedade como um todo.
A aceitação do interesse próprio e da autonomia tia economia teve implicsu,^! I 
morais e religiosas profundas. A sociedade ocidental “Escolheu fundamentar Nfi | 
em um tema apenas raramente reconhecido como válido na história das sociediidcn | 
humanas e, decerto, nunca antes elevado ao nível da justificação da ação e com 
portamento na vida diária, ou seja, o lucro”.10 O que o povo medieval via eoniii 
o pecado da avareza, do egoísmo e da ganância havia, agora, tornado se a bnnc 
religiosa do sistema econômico.
E óbvio que a mão invisível provou ser não apenas invisível, mas também impo- ] 
tente. O trabalho infantil, as condições insalubres de trabalho e de vida, o surgimento 
da pobreza urbana e a poluição ambiental com a inflação galopante e o desemprejj,! i, 
tudo deu a entender que a prosperidade econômica dos capitalistas, os quais servitilil 
aos seus próprios interesses, não levaria necessariamente a uma melhoria da sociedtulo. 
Nesse contexto testemunhamos a ascensão do marxismo. Ao passo que Marx aceituvn 
o ideal do progresso científico-tecnológico como a rota inevitável à prosperidade 
econômica desejada, ele insistia que o proletariado (os proprietários da mão de olnn 
ao contrário dos proprietários do capital) lideraria uma revolução por meio da qual 0 : 
poder seria transferido a eles. Isso, por sua vez, levaria ao Estado comunista, no quitl 
a igualdade reinaria. Temos visto a impotência dos sonhos marxistas.
Uma reação menos extremista ao fracasso da mão invisível veio de John Maynui i I 
Keyncs. A economia intervencionista de Keynes abandonou a abordagem laiswt* \ 
faire* de Smith enquanto mantinha (como Marx) o alvo principal da prosperidade 
econômica. Ele defendia, durante a Grande Depressão, que o governo deveria intervir 
na economia para estimular o crescimento e o emprego para todos. Ele apoiava litl 
intervenção até mesmo se resultasse em prejuízos governamentais. Desde a década 
de 1930 muitos países ocidentais têm seguido essa abordagem, apesar de nos aiion 
1980 ter surgido uma reação conservadora a ela em países como a Grã-Bretanha e 
Estados Unidos. Mas embora as estratégias possam divergir, o mesmo motivo (lu 
crescimento econômico direciona todos esses sistemas econômicos - seja o laissez-fatm I
o intervencionista ou o marxista. Na verdade, questionar a validade e a utilidade do 
crescimento econômico em si no mundo moderno é equivalente a uma blasfêmia.
O economismo: a cabeça de ouro.
A última amarra de nosso ídolo três em um é a cabeça de ouro da 
ouro cintilante e sedutor da habilidade humana de produzir riqueza e
OS OH N *. lv\ Nom#A I KA 11*>
mi lueroa. “C riatóvflo C oloinbo im i ,i lama dc ter dito que “O ouro é uma coisa 
maravilhosa! Aquele quo o powmii e .cuhoi de tudo o que desejar. Com ouro a 
|H'MOii pode ate* enviar ulimiH ao céu",11 A cabeça dourada do ídolo moderno tem, 
iui verdade, induzido o compromisso principal do homem moderno. O economista 
)®hn Kenneth Galbrailh observou corretamente que “Um padrão de vida ascen- 
tlnile tem o aspecto de uma fc em nossa cultura”.12 Ron Sider é mais enfático: “O 
pHdrilo de vida cada vez mais opulento é o deus da América do Norte do século 
M) c o publicitário é seu profeta”.15
Cremos na promessa do deus de ouro, e isso tem nos levado a uma devoção 
nu vil porque sua promessa é a mais excelente de todas. Ao passo que o cientiíicismo 
oferecia onisciência e o tecnicismo proporcionava a onipotência, o deus do econo- 
tttistno (a absolutização da boa habilidade humana de fazer escolhas econômicas) 
oferece a todos que ouvem a promessa empolgante de prosperidade material gloriosa 
lltlda menos que uma salvação secular. “Consuma e veja que este deus é bom .”
Esses três deuses juntos - e suas promessas trinas - têm dominado a Era 
Moderna. Segundo Goudzwaard: “Em nossa civilização ocidental, temos... dado 
Mossa confiança aos poderes do crescimento econômico, ciência e técnica para nos 
liderar em todos os nossoscaminhos”.14
Os três deuses da trindade profana não têm a mesma preeminência hoje. O 
ívonomismo é o ídolo chefe. Os produtos ainda nos são vendidos por terem sido
i imtificamente testados. Por vários anos os representantes comerciais da Nestlé no 
terceiro Mundo visitaram mães incultas, vestidos em seus jalecos brancos oficiais 
ilii ciência médica, convencendo-as a usar leite em pó em vez de amamentar.
Mas o cientiíicismo não é mais o deus dominante do Ocidente. No que diz 
respeito ao assunto, nem o tecnicismo é. Quando o assunto é pesquisa científica
i>11 inovação tecnológica, o ponto final hoje é: Paga bem? E lucrativo? Os deuses 
mais antigos ainda estão lá, sem dúvida, e proporcionam a base para nossa idolatria 
econômica; mas eles são muito subservientes à cabeça econômica do ídolo. H oje, a 
maximização do lucro e o crescimento econômico reinam supremos. “Nosso sistema 
econômico parece ser totalmente secular”, observa W alter W ink, “mas sustenta as 
marcas de uma religião sacerdotal”.15 E sacerdotal porque media nossa salvação 
terrena, a boa vida de prosperidade material crescente e bem-estar. Essa é a versão 
moderna definitiva da utopia para a qual estamos progredindo, a terra prometida 
de riqueza e segurança econômica.
O crepúsculo de uma época
Vivemos nos últimos dias sob a economia da trindade profana. A terra pro­
metida está às portas, e estamos na etapa final da história redentora secular. Assim
1 2 0 A VlsAi I I KANM i 'HMAIK )l( A
como Deus Psii enviou o Fillio para efetivar iioihu Hnlvâ Ho, e o Espírito Suum 
agora habita em nós para aplicar essa salvaçílo i\ noma vida aqui c agora, da meMinal 
maneira acontece com a história redentora do sccuiarismo, A absolutizaç&o dft <I 
cncia no Renascimento originou uma tecnologia extraordinária que traz salvaçUn, 
e a bênção e a presença dessas deidades humanísticas são hoje mediadas a nÓH pi'lil 
sociedade econômica consumista na qual vivemos; movemos-nos e temos noNM|J 
existência. O grande deus, cientificismo, em sua onisciência concebeu um plunu 
divino e enviou o filho da autoridade técnica para subjugar a natureza cm unM(jfl 
benefício. A razão divina encarnou-se na forma da conquista científico-tecnológlcft 
do mundo natural.
Quando os discípulos da nova religião se reuniram na Revolução Indust rial, ri 
espírito do capitalismo foi derramado. E agora, nesses últimos dias, somos chtMn« 
com o espírito e fortalecidos para fazer poderosos atos de produção e consumii, 
esperando e apressando o dia quando a invisível mão fará que as bênçãos da e i ii 
econômica escoem a todas as nações. E naquele dia, todos, grandes e pequeiUíH 
terão prosperidade. Desde o início nunca houve um dia assim; a riqueza cobrirtl ri 
terra; o choro e o trabalho árduo não mais existirão.
Nas palavras do compositor canadense Bruce Cockburn, nossos profeta* 
modernos nos ofereceram: “Algo por nada, novas lâmpadas por velhas,/E as ni.in 
serão de platina, não, de ouro”. Mas na continuação de Cockburn: “Bem , passe ínno 
em frente./Sua f é f o i colocada no lugar errado e o vendedor de doces se foi”.16
Como a visão está abalada. A era da expansão econômica ilimitada está cbe* 
gando a um final abrupto. Estamos indo contra os limites da própria criação. Am 
maldições pactuais de Deus chovem sobre nossa cabeça por causa de nossa desobedi 
ência idólatra. Os deuses seculares não têm nos salvado. Quando os deuses da cultlii a 
fracassam, o tempo é propício para uma séria reconsideração da cosmovisão.
Esmagar um ídolo
Para uma cosmovisão liderar a vida de pessoas ela deve dar a elas um senso tlc 
identidade e lugar, oferecer uma estrutura para a formação da cultura e para colo 
car a vida em um contexto de esperança. Se ela falhar nessas tarefas, seus adeptoN 
podem se sentir à beira de uma crise de cosmovisão.
M as as cosmovisões não são abaladas com facilidade. Sua natureza religioHil 
as torna resistentes a quaisquer formas de oposição. Por exemplo, os cristãos ficam 
envergonhados, com toda a razão, quando os muçulmanos os lembram das cruzada*, 
mas se a fé deles é sólida esse constrangimento não faz com que renunciem a Cristo 
Entretanto, se houvesse a manifestação de prova conclusiva para estabelecer que Cristo 
não ressuscitou dos mortos, então os cristãos, com integridade, teriam de reconhecei
I K IIIUM m Ni I HA ! . ’ I
n u ii o a p ó s to lo I ’a t i lo (|U c mui It <■( i M n ' il* n r ( 'u i V íio ( K 'o I S. I \ 17) , N o s s o I )c iih 
li riu la lh a c lo c o n o s c o , < n o s s a in M iu w h ú io nr r ia b a n ia im e n t e d e s a c r e d ita d a .
( ) que seria iiccchhAiÍ o paru ai ruiuat a coumovisílo secular dominante? ( ) (|ue 
liiiiu o ídolo de trôs amarras do olentilieismo, do tecnicismo e tio economismo 
lombar? Com sua cabeça de ouro, alguém poderia supor que uma depressão oco 
iiomica abalaria severamente essa trindade profana. Mas nem mesmo a depressflo 
dos anos de 1930 teve esse eleito.
A Grande Depressão foi vista como apenas um revés que requereu pouco 
iimín que alguns ajustes pequenos. E verdade que a “mão invisível” não eslava 
Itnii umando tão bem como necessário, mas isso podia ser remediado pela mão 
HiaiM visível da intervenção governamental no sistema econômico. Nos Estado« 
11nidos a fé secular estava firme. Com um pouquinho da economia New Dtuil** e 
uma guerra para estimular a produção, a tecnologia e a pesquisa científica, todo o 
liítem a estava de volta aos trilhos do progresso, a fartura e a harmonia social. I )uas 
guerras mundiais, Hiroshima e a Grande Depressão podem ter feito alguns tios 
Intelectuais questionarem o progresso, mas a disposição cultural dominante ainda 
Ittvoreceu uma cosmovisão economista.
Em 1930, no meio da Grande Depressão, John Maynard Keyncs escreveu 
uiii artigo intitulado “Economic Possibilities fo r our Grandchildren” [Possibilidades 
tiçonômicas para nossos netos] no qual ele disse: “A avareza e a agiotagem... devem 
nu nossos deuses por um pouco mais de tempo. Pois apenas elas podem nos levar 
UUra ver a luz no fim do túnel da necessidade econômica”.17 E o que é essa luz no 
fim tio túnel? Para Keynes, nada mais que um retorno: “A alguns dos mais certos 
r Neguros princípios de religião e virtude tradicional”.18
Em outras palavras, Keynes tinha esperança de uma sociedade não econo­
mista, mas sentia que o caminho para tal sociedade passava pela servidão ao ídolo 
do economismo. Se pudéssemos somente saciar esse deus um pouco mais, ele 
certamente nos libertaria de nossa idolatria.
Mas Keynes esqueceu-se de fazer duas perguntas. Primeira, esse deus algum 
ilr.t estará saciado, ou ele sempre requererá novos sacrifícios? Em segundo lugar, po 
ilemos de fato nos livrar de servir ao ídolo, mesmo que ele não nos seja mais útil?
A avaliação bíblica de ídolos nos convida a ter mais cuidado do que Keynes 
Hilmite (veja o Capítulo 4). Os ídolos nunca estão satisfeitos. Sempre requerem 
mais sacrifícios. Uma vez que colocamos nossa confiança neles, passamos a ser seus 
nervos. Renunciamos nosso domínio sobre a terra como refletores da imagem de 
I )eus, e somos, nós próprios, dominados por nossa imagem esculpida. Nossa vida 
r t ransformada na imagem do deus que servimos.
Se existisse uma nova sociedade, como Keynes esperava, não seria porque
o ídolo teria sido saciado, mas porque ele havia sido destruído. E tal destruição 
potle ser iminente. Seríamos pegos em uma situação sem possibilidade para a. 
vitória. Nosso pacto pagão é condenado porque nenhum dos lados pode manter
os compromissos d;i aliun^u. A sociedade inoderiut iiflo pode cominuar u st* optil I 
aos sacrifícios que os deuses requerem, nem podem <>h deuses livni la com munI
promessas de boa vida.
O frio do outono
A evidência sugere que estamos em uma cultura em declínio, uma cultiini 
que está perdendo a fé em sua cosmovisão fundamental. Como Langdon (Jilkn 
disse: “Um frio de outono paira no ar; sua semelhança ao frio em outros período* I 
de declínio cultural éinegável”.19 E óbvio que é impossível dizer com certeza quo 
estamos em uma cultura decadente. Mas podemos dizer, com Gilkey, que “Niil j 
sentimos” como se estivéssemos chegando ao fim de uma era histórica.20
O fr io de outono parece criar uma ansiedade pessoal intensa em nossa culturu, ( 1 
analista social Jeremy Rifkin diz: “As verdades científicas e tecnológicas que supomo* f 
que trazem um mundo artificial de segurança crescente e conforto estão agora dando 
origem a um nível intenso de ansiedade que está muito perto de chegar à histCl iti 
social em massa”.21 Ele associa essa angústia ao colapso das cosmovisões:
Quando uma cosmovisão em particular começa a entrar em colapso, 
quando ela não mais pode responder adequadamente às questões básicas 
para a satisfação de seus adeptos, a fé é arruinada, a incerteza e a confusão 
se estabelecem e o indivíduo e as massas são lançados à deriva - expostos, 
desprotegidos c, acima de tudo, amedrontados.22
Quando as pessoas estão às portas de uma crise de cosmovisão assim, ('hm 
perdem a esperança.Talvez isso explique por que somente 15% dos novos pais iioh 
anos 1980 acreditam que seus filhos terão uma vida melhor do que eles, comparado 
aos 85% de jovens pais na década de 1950.23
A ansiedade cultural é bem fundada. Nossos deuses falharam conosco. KIcn 
prometeram conhecimento científico completo, mas entregaram uma mera quati 
tificação de vida, a perda de qualquer compromisso significante ou envolvimenln 
pessoal na academia, e o eclipse de todas as experiências, crenças ou valores que nftu 
sejam cientificamente verificáveis. Em vez de nos fazer oniscientes, o cientificismo 
nos fechou para todo tipo de conhecimento não científico. Como M artin Bubei 
destacou em seu livro I and Thou, uma cultura científica relaciona-se com coisas 
(o it) e consequentemente perde a relação com pessoas (o thou).24
Respeitamos a ciência porque ela prometeu fazer nossa vida melhor. “Entre ■■ 
tanto a História tem nos despertado asperamente desse sonho iluminista”.2s Nu 
Idade M édia a teologia era a rainha das ciências. Quando as pessoas começaram 
a questionar e desconfiar do sacerdote, ficou evidente que a cosmovisão medieval
ML A VINAO 1‘KANÜI'ORMAnOllA
( )n BI i'M'. RA N( (DIA i l'A 123
i nIekva nu seus últimos dim" 11<>)«, ,i di u ifiiçn crescente dos doutores c cientistas 
.UfM’ir que a cosmovinflo modeitu estú ‘ begtmdo ao fim.
Bacon viu o c o n h e c i m e n t o científico como um poder para manipular o mundo 
objetivando o bem do h o m e m . ( ) deus do tecnicismo prometeu que tal controle 
t lentííico nos muniria de mais liberdade e mais bens consumíveis. Contudo, esse 
ileus tem proporcionado algo bem diferente. Em vez de proporcionar onipotência, 
i4c tem tornado a nós impotentes diante do colapso ecológico completo causado 
pclii poluição industrial, redução dos recursos necessários para a vida, e a ameaça 
ile destruição nuclear. As pessoas têm razões suficientes para estar ansiosas quando 
nflo podem sentir a si mesmas seguras sobre a comida que comem, sobre a água 
Ijlie bebem e o ar que respiram - tudo porque perigosas químicas produzidas pela 
tecnologia têm proliferado. Na verdade, é exatamente o sucesso do ideal de domínio 
tecnológico que agora ameaça nossa própria vida.
Não nos surpreendemos quando psicólogos nos dizem que muitos de seus 
clientes sofrem de alienação autoimposta. Com frequência, as pessoas trabalham 
pin empregos que adormecem sua mente e nos quais elas são peças substituíveis de 
uma máquina de produção. Em razão da automação cada vez maior são ameaçadas 
de perder seus empregos. Vivem em subúrbios eficientemente construídos onde 
Cflda casa parece ser a mesma e onde muitas pessoas gastam suas horas de folga 
«e relacionando com mais máquinas ainda (TV s, barcos a motor, estéreos, carros, 
Videogames e assim por diante). Um problema psicológico como a autoalienação 
normalmente é parte do sacrifício que o tecnicismo requer. Mas as pessoas começam
ii questionar se o sacrifício vale a pena, se o pagamento é compensador.
Não é. O economismo também tem sido incapaz de cumprir suas promessas. 
() deus tem falhado conosco em pelo menos três áreas: o crescimento econômico 
nflo nos tem trazido felicidade; o crescimento econômico tem se provado perigoso 
pura nossa vida; e o crescimento econômico em si agora está alcançando seu limite. 
Vejamos cada uma dessas áreas.
Utopia não
As pessoas desenvolvem culturas e comportam-se em termos de seus “horizon­
tes de felicidade” e o horizonte moderno de felicidade é utilitário. Se maximizarmos 
utilidades (lucros, bens consumíveis, tempo livre, etc.) e minimizarmos o que não é 
Útil (dor, esforço, trabalho), então o resultado deve ser a felicidade.26 M as o plano 
não tem funcionado. Na verdade, o economista Robert Heilbroner diz que o mal- 
estar cultural atual “Reflete a inabilidade de uma civilização direcionada para o 
envolvimento material - salários mais altos, dietas melhores, milagres na medicina, 
triunfos da física e da química aplicadas - para satisfazer o espírito humano”.2' A
A V IM í ' 11< \NNh MIMAI H IUA
prosperidade matcriul urto tra/ a reali/aiçflo e a leluidadr humana». A llflblia imi 1 
proclamado essa mensagem há séculos. Nossa cultura ciiirt apenas começiualu a 1 
aprender, dolorosamente, sua verdade.
O segundo fracasso do economismo está intimamente relacionado ao priiu» ini
O crescimento econômico falha em nos fazer felizes exatamente por trazer lama 
dor à nossa vida. Não é significativo que em culturas afluentes e industriali/iu)a* 
os problemas médicos como câncer e obesidade sejam abundantes? Não wlo a*> 
culturas econômicas liberais que fazem da sexualidade um bem consumível? N(t$| 
são essas as mesmas culturas eficientes que ameaçam os idosos e os inválidos o mm 
membros iníeriores porque não são mais produtivos?
Essa falha do economismo aparece no Terceiro Mundo, onde grande purtjf 
da pobreza é relacionada direta ou indiretamente à nossa fartura. Eles têm al^um 
direito de apontar o dedo acusando. A teoria trickle dow n” pode parecer atraenm, 
mas a abundância escoa-se devagar, e o abismo entre ricos e pobres (seja inlci 
nacionalmente, domesticamente ou até mesmo em nossas próprias igrejas) num it 
muda de modo evidente.
O crescimento não tem produzido a harmonia social que prometeu. K in 
teressante observar que a única província do Canadá que, com veemência, prQfl ] 
cura por meio de anúncio por trabalhadores sociais é Alberta, a província onde Q » 
crescimento econômico tem sido o mais alto do país (em grande parte graç&l A | 
descoberta de petróleo).
O economismo não fracassou apenas, ele nos amaldiçoou. M as a falha iliait» 
mutiladora de todas é a terceira, que atinge na veia jugular.
A maioria de nós sabe, pelo menos intelectualmente, que a cultura ociden 
tal está encontrando a finitude da criação. Temos chegado à conclusão de que •» 
crescimento econômico tem limites ecológicos, sociais e psicológicos definido«, 
M as estamos apenas começando a ver as ramificações desses limites para noHna 
cosmovisão. Em termos simples, a época do crescimento econômico parece eslai 
chegando ao fim, e com ela um fim para as expectativas de economia crescenU' 
(individual, nacional e globalmente). De fato, podemos estar vendo agora o fim 
(ou pelo menos a transformação radical) do próprio capitalismo.
Robert Heilbroner observa que “A expansão sempre foi considerada inHr- 
parável do capitalismo... Pelo contrário, um capitalismo fixo que não se exparul»1 
sempre foi considerado ou como um prelúdio para seu colapso ou como uma traiçílo 
ao seu propósito histórico”.28 Portanto, uma contração econômica do tipo que o 
mundo ocidental experimenta atualmente não é apenas uma questão econômioi, 
ela atinge o cerne de nossa cultura econômica. Não é de se admirar que tenham« >« 
uma angústia cultural tão difundida hoje.
Em termos de todas as questões econômicas que confrontam nossa socieda - 
de (inflação e desemprego simultâneos,redução da produção, déficit do governd 
dificuldades na administração do trabalho, e assim por diante), o assunto mala
l ) | niiU«l'H HA NOKIARUA 1 2 * 1
importante tem sido i rí*r d< cnrr^iii I )e lato, poderíamos dizer que a crisc de 
energia é urna espécie de ponlo d«1 ei iMtallfcaçflo c‘in nossa cultura. A questão ener- 
ujétlea expõe nossa vulnerabilidade cultura! e exibe as inadequações da cosmovisão 
m ideiual/' Nossa preocupado com a eficiência tem nos levado a desenvolver sis- 
Itmas de produção e estilos de vida intensos em termos de energia. (As máquinas, 
iilituil de contas, podem fornecer maior rendimento e entrada de capital por unidade 
dr energia do que jamais foi possível com o trabalho humano.)
Nosso tipo de economia fez sentido quando a energia barata era abundante.
I )osde a década de 1970 temos sido acordados com violência de nosso sonho. Em 
Mina criação finita, a energia é escassa e deve ser usada com responsabilidade. A 
rueassez de energia, portanto, tem atingido o âmago de nossa cultura. Uma me- 
Ifo ra comum agora soa como verdade: nosso espírito cultural está, na verdade, 
“ficando sem combustível”. A crise é tão severa que muitos líderes americanos 
Ileram a entender, durante a revolução iraniana, que uma guerra pelo controle dos 
unnpos petrolíferos iranianos era uma possibilidade iminente. Quando pessoas 
fiHtSo preparadas para morrer por petróleo, começamos a ver quão fundamental 
luis suprimentos de energia são para a nossa vida.
A nova realidade que enfrentamos é a realidade de limites. Como Rifkin 
tlisse: “Nosso sistema de valores expansionista não se encaixa mais à realidade de 
um inundo físico no qual os limites absolutos para crescimento demandam uma 
Hcomodação revolucionária em nossa cosmovisão”.30 Não é mais possível ver a 
multidão de problemas que nos afrontam (de escassez de energia, contração e in­
flação econômicas ao holocausto nuclear, relações de poluição e deterioração com
0 Terceiro Mundo) como meros colapsos em uma máquina que demanda cuidados 
intervencionistas. Nossa crise é de cosmovisão.31 Observe o que o analista social de
1 larvard, Daniel Bell, diz: “O verdadeiro problema da modernidade é o problema 
d;i crença. Usando um termo fora de moda, é uma crise espiritual, já que os novos 
nncoradouros se provaram ilusórios e os antigos submergiram”. Na próxima página 
de seu livro, The Cultural Contradictions o f Capitalism, Bell continua perguntando: 
"() que segura uma pessoa na realidade, se o sistema secular de significados dela 
comprova ser uma ilusão? Arriscarei uma resposta fora de moda - a volta de alguma 
forma de religião na sociedade ocidental”.32
Uma crise espiritual requer uma solução espiritual. O fim de uma cosmovisão 
requer a adoção ou desenvolvimento de uma nova. Tanto Bell quanto Rifkin su­
gerem a possibilidade de nova reforma.33 A pergunta que os cristãos devem fazer 
('■: quais devem ser os componentes de uma visão cultural renovada? A cosmovisão 
bíblica iluminaria nosso mal-estar cultural? Poderia ela ser a força para a cura de 
nossa cultura hoje? Diagnosticamos a doença e temos visto que o prognóstico, na 
verdade, é grave. Pode Jesus Cristo, por meio de seu corpo, trazer cura?
P arte 4
A COSMOVISÃO BÍBLICA EM AÇÃO
C a p í t u l o 1 0
U m a r e s p o s t a c r i s t ã c u l t u r a l
A ruína de nossa situação cultural atual pede uma resposta qúe cure. Se os
i lislíios não responderem, isso significará uma inconsistência com a cosmovisão 
bíblica e constituiria desobediência ao nosso próprio Senhor. Nos capítulos sobre 
it cosmovisão bíblica vimos que a criação é de Deus; ele nunca desistirá dela. Jesus
l Visto é quem restaura o pacto entre Deus e suas criaturas. Não há autonomia na 
Criação; tudo está pactualmente interligado ao Criador.
Entretanto, precisamos nos lembrar que todas as alianças têm estipulações. Se 
fhis são obedecidas, as bênçãos fluem; se são desobedecidas, as maldições acompa­
nham. Em termos de seu relacionamento pactuai com Deus, o mundo ocidental 
ftgora experimenta as maldições pactuais decorrentes da desobediência. Estamos 
cm um período de julgamento, apesar de não ser o julgamento final. Ainda estamos 
futre os tcmpos\ ainda há tempo para o arrependimento. Na verdade, tal julgamento 
exige arrependimento, pois não temos outra opção viável. A própria criação nos 
forçará a mudar nossos caminhos porque ela não sustentará mais nossos padrões 
culturais presentes.1
Fugir do mundo não é uma opção para o cristão. Como vimos nos Capítulos 
() c 7, tal atitude dualista é antibíblica, deprecia o evangelho e não pode realmente 
funcionar como uma cosmovisão viável. Vivemos nesta cultura - não existe esca­
patória. O chamado de Jesus para proclamarmos seu reino significa que sua cura 
deve ser oferecida à nossa cultura moribunda.
Talvez o maior problema com uma testemunha cristã cultural seja que os 
evangélicos com frequência estão na frente daqueles que tentam preservar o 
Uatus quo e a maneira capitalista de vida. Tais cristãos podem ser contra certos 
elementos na cultura moderna (aborto, educação liberalizada, e assim por diante), 
mas ainda querem conservar muitas de suas características principais, tais como o 
crescimento econômico, a superioridade tecnológica, o militarismo e a economia 
livre. Tal posição é claramente esquizofrênica. Ela tenta apoiar tanto o evangelho 
ilc Cristo quanto as formas culturais que existem em serviço aos ídolos. Esse é um
I iO A VIHA( > ritANKH MIMAI H H< \
I>(*«.<»sem safcla liÍHlrtrica <• teologicamente; csmíih Ioiuiuh viilluruiu nflo podem T 
sustentadas. lemos necessidade de uma visito radicalmente diferente uma c|U9 
seja fundamentada na cosmovisão bíblica.
Uma visão abrangente
Essa visão cultural cristã deve ser abrangente. Não adianta muita coisa de 
senvolver uma resposta cristã ao aborto se não tratarmos da corrida armamentisln, 
Tal abordagem limitada resulta em uma visão cristã contraditória da sociedade 
moral, uma que é contra o aborto e a fav or dos gastos militares crescentes. Morte 
é morte; esses dois assuntos devem estar relacionados.2 Semelhantemente, uiiiit 
resposta aos valores seculares na educação pública e aos problemas de pornografia 
e da pena de morte, sem desenvolver de maneira séria uma filosofia educaciomd 
cristã, bem como o tratamento da mercantilização da vida sexual e o assunto dit 
reforma penal, é inútil e rasa.3
Nossa abordagem deve ser abrangente porque todos os assuntos são correia 
cionados. Os problemas ambientais são relacionados ao crescimento industrial; o 
desemprego é estruturalmente ligado à automação e à produção intensa de energia; 
os processos de produção são, por sua vez, associados à escassez de energia (que em 
si leva às tensões internacionais) e aos problemas psicológicos nos trabalhadores. K 
a lista continua. A falta de alimentos não pode ser separada da distribuição desigual 
dos recursos do mundo ou dos negócios agrícolas, que são relacionados à poluição 
e ao fim da fazenda familiar. Uma noção utilitária de eficiência está conectada à 
maneira como tratamos os idosos e os inválidos, e à forma como processamos as 
pessoas por meio de nossas instituições sociais (bancos, escolas, hospitais). A cor­
relação das questões diante de nós é inconfundível.
Entretanto, não oferecemos aqui a resposta cultural cristã, mas, em vez disso, 
uma resposta cristã cultural. A resposta cristã cultural é a reação de toda a igreja, e 
oferecemos aqui nossas contribuições para esse desenvolvimento.
Levamos a sério a advertência de Bob Goudzwaard a respeito das “Cópias 
heliográficas” cristãs para a sociedade. Sociedades são dinâmicas; cópias heliográficas 
são estáticas. Uma testemunha cristã cultural é de longo prazo; cópias heliográficas 
são de curto prazo. Culturas são orgânicas; cópias heliográficas são mecânicas. Não, 
nós não precisamos de cópias heliográficas. O que precisamos é de direção; o que 
Goudzwaard chama de indicadores do reino. Precisamos de alguma visão paranos 
direcionar ao longo do caminho cultural e da presente escuridão.4
Como Neemias, temos conhecido o julgamento e continuamos a conhecê-lo. 
Mas a história ainda não acabou, então devemos tentar reconstruir nossa cultura 
novamente. Assim como Neemias começou a reconstruir Jerusalém, nós somos
l «MA UUNPtWA « IMS IA i Ul IURAI I ' I
I Inmuiclos u lii/er um» nova leuutlvii dr n»m rouNtrutores de cultura cm obediência 
pActual a Yahioeh,
( ) (|uc tal obediência requer tie nón? ICJa demandará que obedeçamos quatro 
condições. Devemos abandonar nossos ídolos, reconhecer o caráter multidimen­
sional da vida, responder em obediência as normas de Deus para suas criaturas, e 
começar a viver em comunidade uns com os outros de modo renovado.
Renunciando aos nossos ídolos
A primeira condição agora talvez seja óbvia, mas merece ser repetida. Se 
nossa crise é espiritual, então devemos começar a questionar se nossa fé tem estado 
equivocada. Qualquer deus que não possa cumprir suas promessas não é digno de 
nossa adoração. Goudzwaard diz que nós “Devemos questionar a reivindicação 
de que o progresso econômico, tecnológico e científico justifique a si próprio”.3
I )evemos ser livres para avaliar e até mesmo rejeitar o progresso.
Renunciar aos nossos ídolos, porém, não é fácil. O poder deles pode estar 
diminuindo, mas eles não estão dispostos a perder seu poder sobre nossa vida. 
1’odemos afirmar intelectualmente que a felicidade não é quantificável ou uti­
litária, mas ainda acumulamos riquezas e consumimos bens de tal modo que 
desmente nosso conhecimento intelectual e mostra onde nosso coração está. 
Mas a menos que rejeitemos por completo esses deuses, a renovação cultural não 
será possível.
Abordar questões ecológicas de um ponto de vista econômico, de interesse 
próprio, é autodestrutivo. Se conservarmos energia e limparmos o meio ambiente 
iipenas porque isso parece ser economicamente necessário, então nossos motivos 
ainda estão fundamentados no culto ao economismo. Tal culto não nos ajudará a 
sair dessa crise. Na verdade, foi essa adoração que deu início ao problema. Também 
ingênua é a confissão de fé que citamos no Capítulo 9: “Ciência e tecnologia devem 
responder nossos problemas. Se não o fizerem, nada mais o fará”.6 A espiritualidade 
do cientificismo e do tecnicismo está na base do problema e dificilmente seria o 
caminho para a salvação. Não, o que necessitamos é de uma rejeição desses ideais 
culturais falsos.
Devemos iniciar a discussão de um ponto completamente diferente. Em vez 
de perguntar como podem estimular a economia, os cristãos deveriam fazer uma 
pergunta mais fundamental. Por que devemos persistir de qualquer maneira com 
um ideal desgastado de crescimento econômico? E se questionarmos o crescimento 
econômico, então, provavelmente, questionaremos o poder nuclear também - não 
por ser nocivo em si, mas por funcionar como uma base para expansão econômica 
contínua, indiferente aos riscos ambientais e médicos envolvidos.
Sc rejeitarmos o tecnicismo, teremos dc adotai uniu novn forma dc tec nolujM
(porque ;i técnica, cm si, n&o 6 má) que priorize pessoas e nfto produtos. Ou wc rti 
cientificisino for visto como um falso deus, então teremos de reavaliar como prnpnffl 
cionaremos cuidados médicos em nossos hospitais e como nos dedicaremos á pcstluUl 
em nossas universidades. Esses exemplos não são abrangentes, é claro, num iium 
mostram quais passos podemos dar se escolhermos rejeitar ;i trindade profanu,
Reconhecendo o aspecto multidimensional
O problema da idolatria é que ela eleva certos aspectos devida em detrimcuiu 
de outros. Consequentemente, a segunda condição para a renovação cultural é (|iî 
essas outras dimensões de vida recuperem seus papéis adequados.
A criação de Deus é multidimensional. Todas as variedades de criaturii* g 
aspectos da vida funcionam em interdependência coerente. A ciência da ecoloyjtf 
entende a interdependência biológica dentro da criação, mas o que é verdade no nfv#l 
biológico é verdade para toda a vida humana (e, portanto, cultural). Francis SchaclltM’, 
em seu livro sobre ecologia, disse: “Assim Deus trata suas criaturas com integridmli, 
cada coisa em sua própria ordem, cada coisa da maneira que ele a fez”.7 Se fosse puni 
tomarmos uma postura semelhante, haveria sérias implicações para nossa vida,
A cosmovisão moderna é reducionista; isto é, ela reduz toda a vida à sua (li 
mensão econômica, técnica ou científica. O que significa reconhecer o verdadeiro 
aspecto multidimensional da vida?
Considere, por exemplo, vestuário e cosméticos. Certa vez, uma revista d| 
Toronto publicou um artigo sobre escolas de beleza em que meninas adolescente 
aprendem a fazer maquiagem, coordenar suas roupas pela cor e ter uma boa <7/>/,/* 
rência. Esse alvo não é errado em si mesmo. A vida tem uma dimensão estética qilfl 
requer nossa consideração não apenas na galeria de artes, mas também em noNKfl 
aparência pessoal. O problema surge quando um professor descreve o embelezamento 
de suas alunas como uma forma de ajudá-las a vender-se, tanto no mercado de tm 
balho quanto na interminável caça a um homem (ou homens). Essa abordagem t»u 
vestuário e à maquiagem é não apenas sexista, mas também reduz a vida a te min» 
econômicos. Jovens mulheres são produtos que precisam de embalagens atrativttf 
para que sejam bem vendidas. Uma visão cultural cristã não exclui a moda ou o» 
cosméticos, mas sim uma redução econômica de nossa vida estética.
Ou considere o trabalho assalariado. O trabalho humano é entendido cm 
termos reducionistas como o exercício eficiente de poder para produzir a máxitiM 
vantagem econômica. Tal visão submete o trabalho à análise científica para detci 
minar o modo mais eficiente de realizar uma tarefa. E dito, então, ao trabalhador 
para fazer aquela tarefa, destituído de qualquer liberdade ou responsabilidade,*
I U ,'\ VI!.A< 1 ÍMANNIH MMAIU 114 A
t Im a HI s ro M A I H h iA r i u IUUAI I < '
Homunindo, o trabalho e Miibinelido A aimline cirn/í/ica, que determina a efiei6ncia 
(tinha em (ermos dc |>rodut,rti> <’< tmômtm
Mas o trabalho é, na verdade, uma realidade multidimensional. Os seres 
luimanos são criaturas emocionais, lltticas e sociais, e sua humanidade é reduzida 
uuando não recebem liberdade ou responsabilidade em suas tarefas. Nosso traba­
lho nao é uma parte separada de nossa vida; ele é integrante de quem somos. E 
wc nosso trabalho não pode ser uma expressão de nossa individualidade completa, 
|0 I remos emocionalmente. Descobrimos que estamos na dicotomia trabalho/lazer 
cilada no Capítulo 6.
( ) trabalho também tem uma dimensão ética intimamente relacionada às cren­
ças tio trabalhador. Se nós, como cristãos, acreditarmos que a idolatria econômica 
MC rebela contra o Deus da criação e é um pecado contra as pessoas oprimidas do 
mundo, então teremos de considerar um problema óbvio: muitos de nós traba­
lhamos em instituições e sistemas que são erigidos em honra a esse ídolo. Nossa 
visao cultural cristã terá de lidar com essa contradição entre quem adoramos no 
domingo e a quem servimos durante o restante da semana. Talvez os membros da 
associação cristã, por exemplo, devessem instigar suas associações para se preocu­
parem não somente com salários mais altos, mas também com melhores controles 
de poluição, relacionamentos trabalho-gerência e responsabilidade social. Adotar 
tal postura seria mais consistente com a mordomia cristã dos recursos da terra, e 
com o amor e com a comunidade nas relações humanas. Mas o trabalhador cristão 
nao deve ser ingênuo a respeito do custo da responsabilidade ecológica; ela deve 
demandar salários menores.
Reconhecer o aspecto multidimensional da vida requer que atribuamos a 
todos os aspectos da vida seus lugares apropriados. A tomada de decisões, seja pelo 
governo ou por indivíduos, não deve ser afetada exclusivamente pelo crescimento 
econômico. No Capítulo 1, revimos a discussão canadense sobre a exploração e 
o transporte de petróleo e gásnatural no Ártico. O governo usa o que pode ser 
chamado de abordagem de mão-dupla para o assunto. A primeira e mais impor­
tante mão é econômica: qual é a eficiência econômica de determinado projeto? O 
projeto produzirá o benefício econômico máximo, usando o melhor conhecimento 
científico e a tecnologia atualmente disponível a nós? Se o projeto passar nesse 
teste, os responsáveis pelas decisões prosseguirão para a segunda pista. Aqui eles 
procuram minimizar os custos sociais e ambientais do projeto.
Tal abordagem de mão-dupla para a tomada de decisões do governo (seja 
relacionada à energia, educação, diretrizes sociais ou saúde) deixa de honrar a in­
tegridade das dimensões não econômicas da vida. Uma visão cultural cristã, pelo 
contrário, insiste que as questões sociais, ambientais e pessoais são tão importantes 
(juanto as considerações econômicas e tecnológicas. Assim, uma abordagem de mão- 
dupla sempre é insatisfatória - não apenas porque facilmente sacrifica interesses 
pessoais, comunidades e ecossistemas, mas porque fracassa em reagir a normas
I V| A Vlí».\l I f liAI l’t| I IHM SI H I|| ‘
tais como o amor, u c .1 mordomia, Ehsc fhu unho mm leva a nossa tm 
c o n d i ç ã o para uma reforma cultural.
virnl
Respondendo as normas de Deus
As culturas expressam os mais altos valores da cosmovisão dominante, I’m| 
exemplo, pessoas que valorizam, os processos naturais mais do que a análise científji ri 
e o controle tecnológico tendem a favorecer o parto normal; aqueles que VflOtit ri 
gestação e o nascimento como um problema médico geralmente requerem os m u i 
sos tecnológicos e a perícia científica dos hospitais e obstetras. Nossa abordagem 
cultural para com o ato biológico de dar à luz, portanto, está relacionada à iionn# 
cosmovisão; diferentes cosmovisões ditam diferentes valores ou normas. Elas ver 111 
a normalidade de maneiras diferentes. Os norte-americanos tendem a considcnn ii 
hospitalização de mulheres para dar à luz como normal. Mas muitas outras peSHOHD 
a consideram de certa maneira anormal.
O progresso do movimento de parto em casa na América do Norte entffl <: m 
conflito com as normas preponderantes da cosmovisão ocidental. M as o que acou 
tece nessa crítica do parto ocorre em toda a cultura. As “normas” da modernidutlr 
estão sob ataque. Por quê? Porque nossa cultura carece de algumas das noomii 
mais essenciais para a vida cultural continuar. Se uma sociedade passa por colsip#« 
econômico, é imperativo que seu povo sacrifique algumas de suas aspirações CCU" 
nômicas. M as quando nossos líderes políticos insistem em restrição econômitu, 
sempre há um tumulto da população. Evidentemente, nossos líderes apelam piiiii 
uma norma que não existe mais no coração de nosso povo.
Daniel Bell diz: “A sociedade ocidental necessita de civitas, a disposiçilii 
espontânea de fazer sacrifícios para algum bem público, e uma filosofia polítlÇri 
que justifique as regras normativas de prioridades e distribuições na sociedade V
O homem autônomo não aceita as leis (nomos) ou normas que transtornam nuu 
liberdade aquisitiva e de autoafirmação. À parte da (tão famosa) norma do interensp 
próprio, o individualismo capitalista não pode ter normas.10
Agora 0 problema atinge um estágio crítico, pois estamos chegando perigomt 
mente próximos ao ponto em que a própria terra imporá certas normas sobre nÓ8. K 
ilegal, em termos da criação, colocar resíduos químicos em um ecossistema quamlu 
eles não podem ser absorvidos. Se persistirmos em quebrar tal lei, o ecossistenui, 
eventualmente, entrará em colapso por completo e perderemos os recursos essenciais 
à vida. Como vimos no Capítulo 3, a criação está sujeita a leis. Somos livres paM 
quebrar essas leis; entretanto, quando o fazemos os efeitos são trágicos.
Uma resposta obediente às boas normas de Deus para a criação é então esse 11 
ciai para um testemunho cultural cristão. Aqui 0 evangelho de Cristo pode cunu
A
i Im a n u m tsiA ( h ih tA < i >i i n i u i i ^
hoihu cultura. Muitas pesMOft!« vrem oii problernaN, mas nílo podem proporcionar 
quaisquer normas porque lhes i.ilía urna hnwc hílilica." Kl as podem saber que o 
utilitarismo está falido, mas niia rosmovisilo nito oferece alternativa. A oportunidade 
rultural para o evangelho é maior quando as pessoas não têm lugar para onde ir.
A trágica ironia da situação atual é que as pessoas se agarram desesperada­
mente à sua liberdade hedonista, agindo como lhes apraz, mas o resultado final bem 
poderia ser a imposição de limites por um Estado autoritário. Se o povo não pode 
exercitar autocontrole interno, então o fantasma do controle externo é grande. A 
iinálise que Robert Heilbroner faz desse cenário lhe causa grande dor:
A tendência em direção ao forte exercício do poder político - um 
movimento, cujo momento inicial se dá pela necessidade de exercitar uma 
administração muito mais ampla e profunda da produção e do consumo 
- é conquistar suporte adicional a partir da insegurança psicológica que 
será estimulada em um período de desconforto e incerteza.12
( ) problema com um Estado autoritário, contudo, é que, por definição, ele não 
(' normativo. No totalitarismo o Estado é a norma, e não está sujeito a qualquer 
norma externa a si mesmo. Heilbroner tem boas razões para temer o desenvolvi­
mento de tais Estados autoritários no mundo ocidental.
Não questionamos que, de fato, haverá necessidade de impor limites. Entretan­
to, uma perspectiva cristã pede moderação interna e externa. A restauração cultural 
i'1 impossível sem uma resposta renovada à lei de Deus. Assim como a criação é 
niultidimensional, assim também é a lei de Deus. Em vez de ser uma imposição 
\\ liberdade humana, suas leis proporcionam o contexto para nossa liberdade e 
resposta dinâmica.13
Goudzwaard pede a “Percepção simultânea das normas”.14 Não apenas as 
liormas tecnológicas, científicas e econômicas devem ser obedecidas, mas também 
llk normas do amor, da justiça, da misericórdia e da bondade. Somente tentando 
perceber todas as normas de Deus de modo concomitante é que seremos capazes 
de reconstruir nossa cultura em obediência pactuai a Yahweh. Em vez de estipular 
u alvo de alta produção e consumo em uma utopia secular autofabricada, procura­
remos viver vidas normativas, integrais.
Uma percepção simultânea das normas parece impossível. O alto crescimento 
econômico, necessariamente, não entra em conflito com a justiça social? Sim, entra, 
mas talvez nosso entendimento da norma para a vida econômica precise ser revisto. 
As leis de Deus são coerentes. Quando são adequadamente compreendidas, as 
normas da economia e da justiça funcionam em harmonia. Não existe a intenção 
de que elas sejam praticadas uma contra a outra.
Vejamos com mais atenção a norma para a vida econômica. No grego clás- 
HÍco duas palavras descrevem a atividade econômica, oikonomia e chrêmatistikê.
i m /A VIHAUTHAWH WMAPPHA
ChrëtnaHstikŒ é: "A procura do iuitoenriquccimento, pai a poiiGNHftcK monrttlrwtit \ 
cada vez maiores, sc* for necessário, cm detrimento de oulro»".1’1 Isso caractfli'1/rt 
nossa cultura. Ela necessariamente entra cm conflito com as normas de justiça, nitloi, 
comunidade e bondade. Oikonomia (a raiz de nossa palavra economia) > contudo; 
“Designava o comportamento do mordomo cuja tarefa era administrar a proprie 
dade rural confiada a cie dc tal forma que ela continuasse a produzir frutos c assim 
proporcionasse um meio de vida para todos que viviam e trabalhavam nela".1,1
Aqui, economia é mordomia. Essa é, exatamente, a maneira como a Bíblia 
entende a atividade econômica. Seu propósito é duplo: ela deve cultivar, com 
responsabilidade, o que pertence ao M estre (uma reafirmação do mandato cul 
tural original), e deve fazê-lo para o serviço daqueles que vivem na propriedade í 
(toda a raça humana, no sentido de que toda a criação é propriedade de nosso 
M estre). Não existe espaço para o individualismo, ganância, interesse próprio, 
exploração ou a idolatria dos lucros.17 A doutrinada mordomia insiste que a 
atividade econômica está sujeita a normas que vão além das quotas e mercado» j 
dos lucros. Dessa maneira, uma avaliação sensível da mordomia nos leva a qucu* 
tionar o papel da propriedade privada em nossa cultura (o mordomo gerencia H 
propriedade, mas não é proprietário dela), a exploração destrutiva e a redilÇflo 
injustificada do meio ambiente (enfim, tais práticas não são frutíferas, e o M ettre 
espera os resultados), a razão para as corporações multinacionais (cuja estrutura 
corporativa exata é servir a elas mesmas, portanto, em oposição à mordomia) v 
a distribuição desigual da riqueza. Como Rifkin diz: “A nova doutrina da mor­
domia vira o mundo moderno de cabeça para baixo”.18 Se a vida econômica for 
guiada pela mordomia, então não necessita haver conflito com outras norman, 
inclusive a justiça social.
M as nossa visão da justiça social também precisa ser revista. Na abordagem 
dupla de diretrizes seguidas por líderes políticos, a justiça social não é apenas 
uma norma secundária. Ela também padece de uma interpretação econômica. 
Fazer justiça é entendido como proporcionar compensação monetária pela injustiça. C ) 
governo toma a terra dos povos nativos e sente que a justiça foi feita quando um 
acordo monetário generoso é concretizado. Na verdade, parece que a questão main 
importante que é discutida em nosso atual sistema legal não é “O que é justiça?”, 1 
mas “Que acordo é razoável?” A justiça é distorcida quando é compreendida, 
originalmente, nesses termos econômicos, em especial se nossa compreensão da 
própria vida econômica está distorcida.
Com frequência, a Bíblia usa as palavras justiça e retidão permutando-as. 
Assim, ser justo nunca pode ser reduzido à mera compensação econômica. Nem i 
é justiça uma questão de seguir os procedimentos legais corretos os quais foram j 
estabelecidos por um consenso com a sociedade. Tanto o consenso da sociedade 
quanto os procedimentos legais são injustos se violarem a exigência de Deus 
por retidão.
I )e víamos ouvit Icrrmni'.
Mas, sc dcvcrftN enwndiftidPN on vonnoh caminhos e as vossas obras, 
sc deveras praticardes a justiça, cada um com o seu próximo; se não 
oprimirdes o estrangeiro, c o óríHo, c a viuva, nem derramardes sangue 
inocente neste lugar, nem andardes após outros deuses para vosso próprio 
mal, cu vos farei habitar neste lugar, na terra que dei a vossos pais, desde 
os tempos antigos c para sempre. (Jr 7.5-7)
Jeremias cita o estrangeiro, a viúva e o órfão como seus exemplos porque eles Nilo 
us pessoas mais fracas na sociedade do Israel antigo. Eles não têm meios de sustento, 
nem lugar, nem herança. E Jeremias diz ao povo que o lugar deles, a herança da term 
deles, depende de como eles cuidam daqueles que não têm lugar. Fazer justiça, nesse 
caso, é ser um mordomo que assegura que as bênçãos da criação são compartilhadas 
por todos. Esse é o lado econômico da justiça. Se as estruturas econômicas e políticas 
impossibilitarem tal justiça econômica em qualquer medida, elas são injustas.
Mas o apelo de Jeremias é mais do que apenas um convite à justiça econômica. 
A justiça tem a ver com direitos. Se for nosso direito de criatura (e o direito de futuras 
gerações) ter a expectativa de ar e águas limpas, então a poluição ambiental é injust a. 
Kssa é a razão pela qual os regulamentos legais referentes ao meio ambiente silo 
justos. De modo semelhante, os pais têm direito a participar de maneira significai iva 
e controlar a educação de seus filhos. Portanto, uma burocracia educacional centra 
lizada, sobre a qual os pais não têm controle, também é injusta. E um trabalhador 
tem o direito de compartilhar de um trabalho significativo. Qualquer situação de 
trabalho que tire a responsabilidade do trabalhador transgride esse direito.
Uma realização simultânea das normas de Deus para nossa vida cultural 
multidimensional exigiria várias mudanças em nossa sociedade. Talvez alguns de 
nós sejamos céticos. “Isso não funcionará”, você pode dizer. “Sua análise de nossa 
cultura em declínio me deixou tão deprimido que não posso nem imaginar a re­
núncia aos nossos ídolos, viver de maneira multidimensional, e tentar perceber as 
normas de Deus ao reconstruir nossa cultura. E impossível!”
Se essa é sua resposta, então você já anteviu a quarta condição da integridade 
cultural - isto é, a comunidade.
Renovando a comunidade
A ansiedade cultural, facilmente, dá espaço para um sentimento de impotên­
cia. Convencido de que as forças idólatras de destruição estão vivendo uma vida 
independente, ficamos imobilizados, assistindo nosso mundo despedaçar-se. Parece 
que nada podemos fazer.
I I m a U I ' . I ' t I'11 \ I H I M A I H I I I 'U M 1 17
Mas o que eu, um solitário clínico geral cristão, posso fazer?”
A resposta? Nada. Por si mesmo você nada pode fazer no reino de Uhin, 
Assim como nossa renovação à imagem de Deus é comunitária, assim tumlu-m 
nossa tarefa de efetuar uma visão cultural cristã. John Francis Kavanaugh dÍHNP 
que um cristão:
Diante do tolhimento de nossa cultura e do isolamento do indivíduo, 
deve-se voltar para a comunidade de compartilhamento de experiências 
de vida que favorece a fé comprometida e capacita o indivíduo a criticar 
e desafiar a programação da cultura. O meio mais eficiente pelo qual, 
ambos, os alvos são alcançados é em uma vida cristã de compartilhamento 
comunitário.19
Precisamos da comunidade não apenas porque os problemas são tão grandtílf 
mas porque somos o corpo de Cristo. Experimentamos nossa individualidade 
principalmente, cm termos de nossa contribuição singular ao corpo.
Vejamos como a igreja pode lançar o fundamento para desenvolver e CXM i 
cutar uma visão cultural cristã. Em algumas províncias no Canadá, por exemplo, 
um médico dar assistência a um parto em casa seria ilegal. Desse modo, como ii 
comunidade cristã pode auxiliar o médico em seu meio? Primeiro, a comunidade 
é o lugar natural para o médico ser desafiado a desenvolver uma abordagem crinU 
da medicina. Em segundo lugar, a comunidade eclesiástica pode dar apoio a rir 
em seu testemunho médico cristão conforme ele vai se formando. Esse apoio podo 
incluir até mesmo auxílio financeiro, legal e espiritual em casos em que o doutor, 
por razões cristãs, transgredir o que o estabelecimento médico determinou como 
limites legais para a prática da medicina.
E quanto ao executivo iniciante? A comunidade deve ajudar os executivos v 
trabalhadores em geral da área de negócios a perceber que eles não podem, sim 
plesmente, atuar na corporação como se não houvesse problemas para os cristftON 
naquele ambiente. Não é que os cristãos devem, em absoluto, abandonar suas po 
sições nas empresas. Talvez existam formas significativas de começar a transformai 
a própria situação. Se, entretanto, um cristão decidir deixar a empresa, talvez ele 
ou ela pudesse desenvolver uma nova empresa de negócios dentro da comunidadCj 
uma que opere com o princípio da mordomia.
A comunidade é o meio de Deus para fortalecer o povo. Nossa obediêncu 
pública às normas de Deus em todas as áreas da vida é uma luz para o mundo, ̂
comunidade cristã, com sua visão bíblica de justiça, deveria trabalhar por justiça m
I Im a M'Mi'iwiA i iu m A i m 11 'uai I
vida política. A igreja devrt ia w i iiiii Iu^hi onde ou idosos e inválidos contribuíssem 
dr maneira significativa. ('on io uma romuiudado multidimensional, cia deveria 
HCr um lugar onde as artes lÔHsrm ehlimuladas e a vida estética florescesse. (Nestes 
tempos econômicos difíceis, a igreja deve assistir ate financeiramente seus escritores, 
músicos e artistas para que realizem suas tareias no reino de Deus.)
Resumindo, a comunidade crista deveria promover um estilo de vida eco­
nômico responsável tjuc rompesse de forma radical com o consumismo narcisista 
que nos cerca. Os cristãos precisam desenvolver meios de criar e educar seus filhos 
de modo que eles não sejam coagidos a servir os ídolos de nossa era. Isso pode 
significar o estabelecimentode escolas alternativas.
Quando pessoas casadas se sentem pressionadas a desistir de sua união, con­
forme os conflitos surgem, a comunidade cristã deve proporcionar um ambiente de 
apoio e cura, talvez até oferecendo assistência profissional. De maneira semelhante, 
ainda necessitamos descobrir o que significa para mulheres e homens ser um cm 
( Visto. Quais são os papéis adequados dos sexos? O que a liberação de homens e 
mulheres significa em nossa comunidade? Essas perguntas atingem muitos de nós 
rom profundidade, e elas não podem (não devem) ser respondidas individualmente. 
Kl as são perguntas comunitárias.
O que faz da comunidade cristã é sua adoração. Uma comunidade radical 
destrói a cultura dominante porque cultua, serve e ora a um Deus diferente. Sua 
adoração determina o padrão para toda a sua vida. Em vez de se conformar ao 
mundo, é uma comunidade sendo transformada pela renovação de sua mente 
comunitária - sua cosmovisão. Em consequência, sua adoração não é relegada 
apenas a atividades litúrgicas, mas oferece toda a sua vida a Deus como uma oferta 
sacrificial (esse é o ponto de vista de Romanos 12.1-2). Nisso está a essência de 
um testemunho cultural cristão em uma sociedade em declínio.
C a p í t u l o 11
A COSMOVISÃO E A ACADEMIA
A cosmovisão ocidental seguiu seu curso. Atualmente, estamos em um período 
dc declínio cultural. O Capítulo 10 argumentava que, da perspectiva de uma cos­
movisão cristã, a verdadeira renovação cultural é possível somente se abandonarmos 
nossos ídolos, reconhecermos o aspecto multidimensional da vida, respondermos 
com obediência as normas de Deus para nossa vida e nos empenharmos, de modo 
comunal, na renovação cultural. Uma visão cultural cristã deve ser abrangente 
tanto por causa de a crise ser muito ampla quanto porque a cosmovisão cristã (por 
definição) trata de todos os aspectos da vida. Agora dirigimos nossa atenção para 
ver como nossa visão influencia o conhecimento e o estudo.
Estudos universitários em uma cultura decadente
Alguns podem argumentar que, diante de tragédias humanas tais como a 
fome, a opressão política e a ameaça de holocausto nuclear, seja inescrupuloso para 
os cristãos se dedicarem na frivolidade do conhecimento. Por que se empenhar em 
estudos quando toda a cultura está em tal crise?
D e fato, por quê? Porque a universidade está no coração de nossa cultura.
I \>rtanto, é um lugar estratégico para um testemunho cristão saudável. Além disso, 
a menos que os cristãos façam sérias reflexões acadêmicas, seu testemunho cristão 
carecerá de profundidade e de discernimento. Tal carência está evidente em muitas 
tentativas de testemunho cultural cristão, hoje.
Se os shoppings suburbanos são templos do economismo, e se as armas 
nucleares construídas são um sacrifício ao tecnicismo, então a universidade fun­
ciona como o seminário teológico para os sumos sacerdotes do cientificismo. Na
A VI''Ai > lltANWI * IHVIAhi >11A
verdade, quando peneiramos a tlrea do conhecimento, eouio diz o IíIóhoIo eriltfto
I lendrik I lart, entramos na “Esfera de influência de um« d(M religiões da clvili 
zação ocidental mais dogmáticas e influentes”.1 Se nossa aniHise do cientilicisiint 
como um dos pilares da fé da cultura ocidental for honesta, então não poderilON 
evitar a compreensão da universidade em termos religiosos. Ideias desenvolvida» 
na academia são praticadas na sociedade.
Economia. Considere dois exemplos preeminentes, primeiro a economia o 
então a psicologia. Quando uma nação moderna está em um estado de rceesNflo 
econômica, ela se volta para os especialistas da economia para uma solução. (I )p 
certo modo isso é análogo à questão dos assim chamados povos primitivos procil 
rarem um pajé para descobrir por que os deuses não lhes deram uma boa colhei tu 
naquele ano.) Se os peritos da economia (treinados no sistema universitário oci 
dental) adotarem um modelo neoclássico de economia, eles defenderão que se deve 
deixar o mercado atuar independentemente (seja em termos da Wealth o f Nations, 
de Adam Smith, ou do Capitalism an d Freedom, de M ilton Friedman). Sua respONt a 
terá implicações econômicas, sociais e ecológicas.2 Essa abordagem laissez-ftirt 
não apenas resulta em um índice alto de desemprego e danos ao meio ambiente 
(regras ambientais são vistas como intervenções), mas também se coloca lado a lado 
com um enfraquecimento dos serviços sociais. Afinal de contas, se a economia foi 
deixada para funcionar por si só, dizem os economistas neoclássicos, os benefício« 
materiais serão repassados para o pobre. Além do mais, de acordo com essa teoria, 
a assistência governamental ao pobre é economicamente contraprodutiva porque 
tira deles o incentivo para trabalhar.
Se, entretanto, os especialistas em economia consultados em tempos de 
recessão forem intervencionistas, surgirá uma situação um pouco diferente. () 
intervencionismo, fundado por J. M . Keynes (ver pág.118), e seguido mais reccu 
temente pelo economista “liberar J. K. Galbraith, também vê o mercado como um 
mecanismo, mas argumenta que a máquina necessita de manutenção governamen 
tal. Nesse cenário, as despesas e o débito nacional tornam-se cada vez maiorCH, 
enquanto o papel do governo na vida de uma cultura se aproxima cada vez rnaid 
de um totalitarismo benevolente. O intervencionismo produz, no fim, um estad» i 
de previdência.*
Aqui temos duas teorias econômicas que são desenvolvidas, debatidas e ensi­
nadas no conforto das salas da universidade, das poltronas dos professores e clubes 
do corpo docente de nossa sociedade. Mas as implicações dessas teorias afetam 
a vida de absolutamente todas as pessoas quando se tornam normativas em dada 
cultura. Decerto as testemunhas cristãs das normas de Deus para a economia fazcfn 
parte dessa área da sociedade que é criadora de teorias.
Psicologia. Considere agora o bem conhecido (e muito debatido) modelo behit 
viorista na psicologia.3 O behaviorismo entende os seres humanos, exclusivamente, 
por meio do modelo de estímulo ->resposta comportamental->reafirmação. B. I\
Skinner diz que “O homem 1 ihh<i iihUiuiuh no sentido dc que ele 6 um sistema 
complexo comportando se <l< nutneii .1 IcgaJ".1 Sc o estímulo c a reafirmação forem 
consistentes, a resposta eomporfitmental humana também o será. Em sua manifes­
tação skinneriana, entfto, a psicologia torna-se a tecnologia do comportamento - uma 
tecnologia que pode ser utilizada para manipular as pessoas a se comportarem 
de formas sociais aceitáveis. Tal tecnicismo comportamental é o resultado lógico 
da visão renascentista de Francis Bacon sobre o conhecimento científico como 
controle e poder.
A cultura norte-americana não está nem perto de Walden II, mas já podemos ver 
iis implicações culturais de tal modelo behaviorista. Os hospitais de doenças mentais 
aprovados pelo governo, por exemplo, usam técnicas behavioristas com regularidade 
110 cuidado dos deficientes mentais. Além disso, a teoria educacional ensinada para a 
maioria dos professores de nossas crianças é instruída principalmente pelo behavio- 
rismo. O comportamento e a educação de nossas crianças, portanto, são controlados 
tecnicamente até o ponto em que seus professores sigam esse modelo de psicologia.
As agências de propaganda estão muito conscientes da maneira como o estí­
mulo correto (auditivo ou visual) e a reafirmação podem produzir o comportamento 
desejado em um consumidor. Administradores associados aprendem como usar 
instrumentos behavioristas para ajudá-los em sua administração dos relacionamen­
tos e estado de espírito dos funcionários. Certos incentivos (estímulo) e declarações 
(reafirmação) mantêm o corpo de funcionários produtivo (o comportamento dese­
jado). Assim, mesmo com esse relance superficial, podemos ver como uma teoria 
científica particular começa a moldar a vida da cultura, quando isso significa ter 
preeminência na academia.
Exemplos que ilustram o modo como o conhecimento acadêmico influencia
11 cultura são abundantes. Anteriormente nosreferimos à profissão médica. Um 
modelo que vê 0 corpo humano apenas como um complexo de funções bioquí­
micas produzirá o tipo de cuidado de saúde centrado nos medicamentos, o que 
caracteriza a sociedade ocidental . Métodos que exageram na ênfase à quantificação 
e estatística na sociologia acadêmica no fim determinam que tipo de diretrizes 
sociais nosso governo irá adotar; e contribuem para a impessoalidade e frieza em 
nossas profissões auxiliares. Se a técnica é absolutizada como um fim em si, não 
se sujeitando a outras normas, então a automação, a computação e a utilização da 
ciência nuclear serão nossos símbolos inquestionáveis de progresso.
Um testemunho acadêmico cristão
Porque a universidade está no centro nervoso da cultura ocidental, os cristãos 
serão agentes, completamente, efetivos do reino de Deus, que traz a cura em nossa
A i i WMOVImAi ' I At Al <1M I \ M '
cultura decadente* apenas nc eles lam hém derem tCNteinunho v contribuírem nela 
Mas essa não é a única razão pnra um testemunho acadêmico i rintão. Sc a univci 
sidade realmente for o lugar onde recebemos treinamento mais elevado em como 
servir os deuses de nossa era, c se a educação de fato transforma e molda noi|| 
visão da vida, de tal modo que sirvamos como guias em uma cultura liderada pelou 
ídolos, então um testemunho acadêmico cristão é imperativo para nosso cvangelís/no 
e para nossa responsabilidade pastoral.
A questão evangelística deveria ser óbvia. Para ser efetivo, o evangelho eleve 
confrontar de maneira clara a direção religiosa de nossa época. Mas não podemos con 
siderar a tarefa evangelística se a necessidade pastoral não for satisfeita primeiro. Isto 
é: “Os cristãos que são estudantes” precisam ser liderados em seus discipulados para 
se tornarem “estudantes cristãos”.3 Exploremos mais sobre o significado disso.
O dualismo que criticamos de maneira tão categórica nos Capítulos 6 e 7 
está vivo e bem na vida da maioria dos estudantes que são cristãos nas universi­
dades da América do Norte. Tão logo a fé de uma pessoa é relegada a um reino 
espiritual da vida (que pode incluir comunhão no campus, estudos bíblicos e até 
evangelismo), o restante da vida (a escrita de trabalhos finais, exames e relatórios de 
aulas de laboratório) está, em princípio, livre para servir os ídolos. Por exemplo, o 
cristão escreverá um trabalho final em essência do mesmo jeito que seu colega não 
cristão. De fato, ambos os estudantes tendem a ter uma abordagem basicamente 
utilitária da educação universitária. Ambos querem o diploma acadêmico porque 
é uma passagem para uma profissão em particular; e ambos querem uma profissão 
que lhes permita adquirir o estilo de vida e cosmovisão da cultura dominante. Mas 
sabemos que essa cultura, com seu estilo de vida e cosmovisão, está falida. Conse­
quentemente, por aceitar com ingenuidade a cosmovisão dominante na universidade 
(uma instituição formativa e reflexiva da cultura), o estudante cristão está sendo 
infiel a Jesus Cristo. Essa é a razão pela qual o problema é pastoral.
No nível mais básico, portanto, os cristãos devem desenvolver uma perspectiva 
integrante em seus estudos. Jesus é Senhor de todos. Seu senhorio é integral para 
tudo o que o estudante pensa e faz. Na cosmovisão bíblica a tarefa cultural cristíl 
(que inclui o academicismo) é afirmada por meio da criação e redimida em Jesus 
Cristo. O chamado acadêmico cristão é, então, levar “Cativo todo pensamento i\ 
obediência de Cristo” (2Co 10.5).
Os anos que um estudante passa na faculdade ou universidade são extrema­
mente importantes e formativos para desenvolver uma cosmovisão. Eles propor- , 
cionam aos jovens cristãos oportunidades de refletir sobre o significado de Jesus 
Cristo para os seus discípulos. Desenvolverem-se como estudantes cristãos (isto é, 
estudantes que pensam de form a cristã) na faculdade, estabelecerá o cenário para 
se tornar um form ador de cultura cristã para o restante da vida.
i *T"T r\ v ir v u * j K n n w r n w v iA i k »h a
A i (WMtlVIhAn | a \i A l>1 MIA H 'i
0 cientificismo rejeitado
Como alguém começu u hc dtixrfivolvcr nmii) um estudante cristílo? Como 
adquirimos uma perspectiva criHtCl cm nossos estudos? Da mesma maneira como
ii primeira condição para a renovuçflo cultural e que renunciemos aos falsos deuses 
que falharam conosco, assim também no academicismo o primeiro passo deve ser 
profético: devemos abandonar os falsos deuses do cientificismo.
C. Stcphen Evans descreveu o cientificismo como: “A crença de que toda ver 
dade é verdade científica e de que as ciências são nossa melhor opção de conhecei 
como as coisas realmente são'? A ciência assim deixa de ser um “empreendimento 
muito humano” e de certa maneira “subsiste” de modo autônomo, independente 
ilos seres humanos/
O cientificismo é fundado na crença de que o pensamento racional é autô­
nomo. A razão é considerada uma lei para si mesmo e, portanto, não se sujeita ;t 
outra lei. Porque a ciência autônoma é ciência tornada absoluta (é cientificismo), 
as considerações científicas sempre têm prioridade. Isso milita contra a realização 
simultânea das normas.
Nessa autonomia está implícita a rejeição de qualquer papel de crença religiosa 
no academicismo. A ciência é vista como religiosamente neutra. De fato, se alguém 
introduz ou sugere compromisso religioso em uma discussão acadêmica, em regra, é 
considerado fora de ordem.Tal compromisso é considerado irracional. Ainda assim
1 Iart observou a contradição implícita nessa rejeição de compromisso. O cienti­
ficismo declara que ser acadêmico é ser comprometido com a racionalidade. Mas 
esse comprometimento, paradoxalmente, não é reconhecido como compromisso. 
A crença na razão é isenta de ser uma crença. O cientificismo é, assim, cego para 
sua própria natureza religiosa.8
O antigo filósofo holandês Herman Dooyeweerd expôs o “Dogma da autono­
mia do pensamento teórico” como um mito já nos meados de 1930.9 Esse dogma 
tem sido atacado, mais reccntcmcnte, por outros estudiosos cristãos como James 
W. Sire, Nicholas W olterstorff e Arthur Holmes.10 Ele também foi muito criticail< > 
dentro da filosofia contemporânea da ciência, em especial nos trabalhos deThomas 
Kuhn, N. R. Hanson, M ichael Polanyi e Gerard Radnitzky.11
Se o academicismo de fato é uma atividade que funciona autonomamente, sem 
relação com crenças religiosas elementares, então, fica evidente que não é possível 
falar de uma perspectiva cristã no academicismo. Também, não haveria qualquer 
fundamento para nossas tentativas de destruir o cientificismo como um falso deus. 
Mas o fato é que a ciência não é autônoma. A própria proliferação de escolas de 
pensamento conflitantes em várias disciplinas, que acham impossível a comunicação 
entre si, sugere que existe algo mais essencial acontecendo nesses debates do que 
meras interpretações incompatíveis dos fatos. Enquanto Ian Barbour menciona 
que não existem fatos não interpretados, Hanson destaca que todos os dados já
s;ú> “thiory ladtn"*.v K Dooyewcerd argumenta que ou dehíiiest entre as eseoli 
conflitantes raramente «fio produtivos porejue nílo penetram nos pontos de ptu ti*Ir 
um do outro.Tal eompreensíío é impossível exatamente porque aqueles pontOl de 
partida “São mascarados pelo dogma que diz respeito à autonomia do pensameu 
to teórico”.13 Em outras palavras, enquanto fingirmos que a ciência é purainrim 
objetiva e não contém pontos de partida religiosos, o diálogo científico verdademi 
é impossível. O dogma do cientificismo deve dar lugar a uma compreensão nnun 
completa da natureza religiosa de todo academicismo.
Da cosmovisão para a academia
Jam es Sire argumentou corretamente que, para pensar, “Precisamos dr 
um ponto de partida, um lugar para nos fundamentar, um ponto de impacto”,^8 
W olterstorff diz que “ao analisar uma teoria uma pessoa sempre traz todo o com 
plexo de suas crenças”. As crenças mais importantes W olterstorff chama crençíl« 
de controle.15
Thomas Kuhn deu nova conotação à questão dascrenças de controle por meio 
de seu debate sobrt paradigmas. Para Kuhn, cada comunidade científica (ou escolit 
de pensamento) faz seu trabalho científico por meio de um paradigma comum, () 
paradigma funciona como a estrutura conceituai dos cientistas - suas generalizn 
ções em comum, valores e crenças. Ele proporciona o critério pelo qual as teorÍHN 
são julgadas, a evidência é considerada admissível, a natureza da demonstração $ 
determinada, e os elementos de uma verdadeira conclusão são constituídos. Um 
paradigma sugere quais perguntas devem ser feitas e, portanto, que programas dr 
pesquisa, provavelmente, serão proveitosos.
Por exemplo, um psicólogo humanista pode achar que a pesquisa entre arqué­
tipos míticos (à maneira de Jung) é promissora, enquanto um behaviorista veria t;il 
pesquisa como caprichosa, nem de perto tão sólida quanto os dados que podem sei 
quantificados. De modo semelhante, um médico influenciado pelo movimento de 
saúde holística pode considerar abertamente o potencial terapêutico da acupuntura, 
shiatsu e homeopatia; mas o médico tradicional (deveríamos dizer ortodoxo?), in 
fluenciado pelo modelo químico, considera tais métodos não científicos, e aquele« 
que os praticam charlatões. Kuhn comentaria que seus “Padrões ou definições de 
ciência não são os mesmos”. Kuhn diz que a profundidade da diferença entre seiw 
paradigmas é tão grande “No sentido de que sou incapaz de esclarecer melhor, OH 
proponentes de paradigmas concorrentes praticam seus ofícios em mundos dife­
rentes”. Além do mais, “A transferência de fidelidade de paradigma para paradigma 
é uma experiência de conversão que não pode ser forçada”. De fato, tal conversão, 
diz Kuhn, requer: “fé”.16
A COHMÜVISÀO I A A« Al H Ml A 1 4 7
Vemos, entflo, que o iu mit mu imno n.n> <'• uma atividade religiosamente neutra 
praticada pelos seres huMunon raeiontiis, Kla <\ em sua essência, religiosa - para 
todos, não apenas cristãos. Arthur I loi mes diz: “A honestidade intelectual consiste 
não em forçar uma neutralidade impossível, mas em admitir que a neutralidade não 
(' possível. Ela consiste em confessar e escrutinar um ponto de vista e as diferenças 
que ele faz, e explicar como outros pontos de vista teriam de discordar”.17 Na ver- 
dade, o fato de que muitos acadêmicos (se não a maioria) são ignorantes a respeito 
de seus pontos de vista é uma das principais causas da superficialidade acadêmica. 
Com essa superficialidade (“Eu apenas vejo os fatos”) vem a falta de habilidade 
para serem autocríticos (“As coisas são deste jeito”), porque tais estudiosos nunca 
consideram seus pontos de partida de modo explícito.
O relacionamento entre a fé religiosa principal de uma pessoa, formulada em 
uma cosmovisão e no trabalho teórico detalhado de conhecimento, pode ser descrito 
como se segue. Toda análise teórica, seja nas ciências naturais, humanas ou sociais, 
ocorre dentro do contexto de uma estrutura ou paradigma filosófico.
Isso funciona assim: a filosofia, como todas as disciplinas acadêmicas, é, por 
natureza, teórica; mas em contraste com as disciplinas específicas, a filosofia é in­
teressada na totalidade da realidade e não somente em aspectos específicos. Como 
tal ela funciona da mesma maneira que os paradigmas de Kuhn. Ela proporciona 
uma visão completa da realidade dentro da qual ocorre uma análise das partes 
partes como cada uma das ciências natural, humana e social. Dessa maneira, a 
estrutura filosófica circunda os limites de uma disciplina, selecionando o que ela 
irá ver. Se o acadêmico for consciente, ele molda a disciplina de forma explícita; 
se for ignorante, de maneira implícita. O paradigma descreve a relação de cada 
disciplina com as outras em termos de seu entendimento básico de como a realidade 
e estruturada e correlacionada.
Suponhamos que Dr. X tenha o funcionalismo como sua teoria sociológica 
básica. Desse ponto de vista teórico, ele compreende a sociedade mecanicamente. 
Ele vê quão diferente as instituições sociais funcionam para manter a sociedade. 
Assim, para o Dr. X : “O indivíduo é grandemente constituído pelos papéis sociais 
que ele desempenha se não o for por completo” Para o Dr. X , o casamento é, em 
primeiro lugar, uma instituição social, e não um relacionamento ético. Para ele a 
igreja institucional é um meio de manter o status quo\ ela nunca seria uma força 
transformadora da cultura. Esses são os fatos que o Dr. X considera e que demons- 
t raria como acadêmico.
Todo conhecimento é cercado por uma postura filosófica. Dooyeweerd diz que 
toda disciplina acadêmica “Pressupõe uma visão teórica da realidade, incluindo uma 
ideia da relação e interligação mútua que existe entre seus vários aspectos. E essa ideia, 
por sua vez, está intrinsecamente dominada por um motivo religioso principal”.19
Dooyeweerd trouxe-nos de volta ao nosso ponto inicial. Nosso paradigma 
filosófico molda o que vemos e conhecemos, mas, por sua vez, é moldado por
nossas respostas basicamente religiosa« para as quatro pcrguutu da cosmovÍMn 
(Capítulo 2).
Com frequência, a Bíblia nos fala de conhecimento e sabedoria em termou 
de obediência, relacionamento c intimidade.20 Na verdade, conhecerá muitas vezcn 
usado de uma maneira que parece sinônima a viver. Tal conhecimento c qualita 
tivamente diferente do conhecimento teórico. Teorizar é afastar-se de algo paiw 
objetivá-lo e analisá-lo. Mas o conhecimento nesse sentido bíblico é pré-teórieo, 
E a base a partir da qual interpretamos nossas teorias. Sem um conhecimento pré- 
teórico da vida em sua totalidade, não podemos nem começar a fazer perguntttH 
teóricas a respeito de qualquer coisa que seja tirada do todo.21
Agora propomos que as disciplinas acadêmicas específicas são distintas da 
filosofia porque aquelas são interessadas em aspectos particulares da realidade 
enquanto essa é mais abrangente em alcance. Ainda assim, compartilham de sua 
natureza teórica. Cosmovisões, em contraste, não são teóricas por natureza; sfln 
respostas pré-teóricas a perguntas elementares. Cosmovisões não devem ser con 
fundidas com sistemas filosóficos, apesar de ambos serem visões da totalidade da 
realidade. Em vez disso, cosmovisões são fundamentais para tais sistemas. KIhm 
refletem o que os escritos bíblicos geralmente chamam de conhecimento.
Assim como todo academicismo pressupõe um paradigma filosófico, todoi 
os paradigmas filosóficos pressupõem uma cosmovisão religiosa de um tipo ou dfl 
outro. Poderíamos fazer um diagrama do avanço da cosmovisão para o acadcmi 
cismo (veja a Figura 2).
Cosmovisão -------- > paradigma filosófico -------- > disciplina acadêmica
(visão pré-teórica (visão teórica (visão teórica
da totalidade da totalidade dos aspectos particulares
da realidade) da realidade) da realidade)
Figura 2. Da cosmovisão ao academicismo.
Uma cosmovisão, ou visão de toda a vida, é praticada na vida acadêmica em 
primeiro lugar quando o acadêmico formula uma estrutura de filosofia teórica. 
Holmes diz que: “Pensar ‘de maneira cristã’ é pensar ‘da maneira da cosmovisão”’.'23 
Apenas dessa maneira a fé cristã de uma pessoa funciona interiormente para o aca­
demicismo, em vez de ser dualisticamente adicionada sobre o academicismo.23
O relacionamento entre cosmovisão, filosofia e academicismo implica duas 
coisas. Primeira, se todo academicismo é religioso, então o cristão não é único. 
Já que o academicismo é, por fundamento, baseado no compromisso religioso 
(mesmo se esse compromisso seja para provar a si mesmo), então a questão não 
é necessariamente integrar fé e academicismo. Fé e academicismo estão sempre 
integrados. A única questão genuína é: Q u alfê? Muitos cristãos, ignorantes da
HM A VIIAO HIàN&IOIVMAIm »11A
A ' OHMOVllMti ' I A Al A!U MIA l-|'>
ti ii tu reza implicitamente fclífj,it»tHt »lo a< iidcmleiHino, cncontnun-se produzindo 
um academicismo de uiuit peiHpn tlvu tle l( antitótica sua fé cristã. Produzir 
ucademicismo dc forma criHtHi rutilo, d permit ir, de maneira consciente, que nossa 
fédirija nossos estudos. Isso no» leva a uma segunda implicação.
Se o academicismo c*, de fato, estruturado em termos da cosmovisão - com 
modelo de disciplina acadômico-íilosófico, como antes defendido, então a renovaçtlo 
cristã nos estudos universitários exigirá alguma compreensão filosófica cristã. Sem 
tal compreensão um testemunho acadêmico cristão será fragmentado e superficial,
l Ima pessoa não se torna um estuda?ite cristão simplesmente por aplicar textos bíbli 
cos ou teologia cristã à sua disciplina. W olterstorff comenta que a Bíblia “Não noi 
proporciona um corpo de propostas, sem dúvida, conhecidas por se referir àquilo 
que podemos determinar como teorias aceitáveis e não aceitáveis”.24 Em vez disso, 
o caminho das certezas da visão bíblica da vida, para os detalhes de análise cient ífica 
específica, é mediado por um paradigma filosófico. Portanto, precisamos desenvolver 
tal estrutura teórica que seja sensível à cosmovisão bíblica e fundamentada nela. O 
último capítulo sugerirá os contornos essenciais para tal estrutura.
C a p í t u l o 1 2
R u m o a u m a e s t r u t u r a f i l o s ó f i c a c r i s t ã
A renovação cultural é impossível até que tenhamos abandonado nossos ídolos 
culturais. Somente então podemos iniciar de maneira significativa a reconstrução 
de nossa cultura. De modo semelhante, nossa crítica ao ídolo do cientificismo 
foi um exercício de ajuste básico para desenvolver uma alternativa inspirada no 
Cristianismo para o academicismo. Essa alternativa também segue as mesmas 
condições daquelas listadas para a renovação cultural: reconhecer o aspecto mul­
tidimensional da vida, obedecer as normas de Deus para a sociedade e trabalhar 
em direção a um sentimento renovado de comunidade. Lidaremos com a analogia 
tias perguntas sobre normas no academicismo antes de nos dirigirmos ao tema do 
aspecto multidimensional.
A ordem de Deus para a criação
A tentativa cristã de filosofar começa com a perspectiva de que tudo, incluindo 
os seres humanos e suas teorias, está sujeito e existe apenas em resposta à lei da criação 
tie Deus (ou palavra). Tudo na vida responde às normas de Deus e é dependente 
delas. Assim, toda a criação é “subjetiva” no sentido que está sujeita à lei de Deus.1
Essa subjetividade tem implicações imediatas para uma perspectiva acadêmica 
cristã. A criação tem um caráter de referência. Isso quer dizer que a criação se refere 
à sua origem, aponta para ela e é reveladora dela. Tradicionalmente, a teologia tem 
chamado essa doutrina de revelação geral. A doutrina dá aos cristãos um estímulo 
especial para estudar a criação. E claro que uma pessoa nunca poderá substituir 
a revelação da palavra nas Escrituras pela revelação da criação. M as os cientistas 
cristãos não devem sentir que seu academicismo é de segunda categoria em relação 
aos acadêmicos bíblicos. Isso, por si só, reforçaria o ponto de vista dualístico, que 
inibe o desenvolvimento de um testemunho acadêmico cristão.
152 A VIMAi ’ lHANHIt 'H MM It 1|(A
Sc ;i palavra de I )t'UM ordena a criação, entflo o empreendimento científico 
c melhor visto como uma tentativa falível dc formular, como nua palavra de luto 
ordena, tipos específicos de vida como criação. Entretanto, deve-se observar <|ur ri 
ciência tem acesso à palavra da criação de 1 )eus somente de maneira indireta pol 
meio da observação da criação. Assim, para entender como Deus ordena a vidn 
biótica, nos empenharemos em uma análise detalhada dos padrões dc regularidade 
em organismos vivos verdadeiros. Ou, se quisermos saber a respeito da palavra dt* 
Deus para a vida política, devemos não apenas estudar as Escrituras para vei o 
que elas dizem sobre questões de justiça e de governo, mas nos empenharmoí cm 
uma análise sistemática e histórica detalhada das teorias políticas e dos governou 
existentes.
Ciladas na ciência legítima
M as isso leva a três problemas: (1) o que estudamos está decaído, (2) a ordem 
observável na criação, com frequência, é confundida com a lógica, e (3) nós mcsmi >s, í 
que observamos, somos parte da criação. Vejamos cada um desses problemas.
Obviamente nenhum governo representa com perfeição o mandato compleUi , 
de Deus para a vida política. Somente um nacionalismo idólatra faria tal declaraçRo 
de si mesmo. A criação é decaída, e sua resposta é distorcida e mal orientada. A 
palavra de Deus pode ser constante e certa, mas a criatura sempre parece entendei 
mal. Acadêmicos cristãos devem, portanto, ser criteriosamente cuidadosos em 
seu academicismo para discernir o efeito universal da Queda na criação ao tenlm 
desenvolver formulações teóricas da lei da criação.
Contudo, o segundo problema é até mais complexo e controverso. Quando 
nós, da herança intelectual ocidental, pensamos em algo que seja ordenado ou til 
rumado, de imediato pensamos em termos de lógica. Um universo ordenado deve 
ser um universo lógico ou racional. Mas tal identificação da ordem da criação com 
a ordem lógica é, de fato, o resultado de uma falsa sujeição à autonomia da razilo, 
Essa identificação é fundamentada na compreensão verídica de que a análise lógí 
ca (ou teórica) tem a tarefa legítima de formular como Deus ordena a criação. (> 
problema é que a ordem de Deus para a criação não é redutível à lógica. A própria 
lógica está sujeita à lei ou ordem de Deus para a atividade lógica, assim como ,i 
vida estética, a política ou a interação social são respostas subjetivas à lei de Deus 
para aqueles aspectos da vida. Elevar a lógica ao nível de norma para toda a criaçflt * 
é, implicitamente, declarar sua autonomia, negar que todas as coisas (incluindo o 
pensamento lógico) estão sujeitas à lei de Deus. A palavra de Deus, que está chcírt 
de majestade e de poder e criou e continua a sustentar o universo, não pode estiu 
limitada ao que os seres humanos consideram racional ou lógico.
11' 'M> ' \ I 'MA I H l lU n U R A I A i l l lü l \
Kinbora a dJutiuçüo rutiv ,u ndi im hu i iitçilo c ;i lógica seja tilo controversa, um 
problema ainda maioi precma nei llitütdo, I )m problema incessante no pensamento 
c cultura ocidentaÍH tem lido a íenuflo entre liberdade de determinismo. Quando o 
autodenominado homem autônomo tenta explicar, científica e mecanicamente, o 
todo da realidade como uma cadeia impecável de causa e efeito, ele não deixa lugar 
para a liberdade humana. 1 )ooyeweerd, descrevendo esse processo, disse: “O desejo,
o pensamento e as ações dos homens requerem as mesmas explicações mecânicas 
i|iic os movimentos das máquinas. Pois se o homem faz parte da natureza, então 
ele não pode ser livre e autônomo”? Aqui encontramos a profunda ironia de todas 
as sujeições aos falsos deuses. Prometendo liberdade, os ídolos sempre escravizam 
seus adoradores. O povo secular do Ocidente cria que havia encontrado o caminho 
para a verdadeira liberdade e iluminação por meio de sua disposição para a ação e 
racionalidade autônoma, com as quais ele controlaria todo o ambiente. M as essa 
mesma racionalidade no fim tem ameaçado a liberdade humana, porque tem sub­
metido a humanidade, efetivamente, à sua própria análise mecânica da natureza.
Como a liberdade humana pode ser protegida? O século 19 tentou preservar 
;i liberdade humana dividindo as disciplinas acadêmicas em duas categorias. Os 
ucadêmicos queriam parar a invasão do determinismo que viam nas ciências naturais 
com receio de que se tornasse uma norma para todas as disciplinas da academia. Em 
consequência, eles separaram as ciências humanas das ciências naturais, e essa divisão 
veio a caracterizar o currículo das universidades ocidentais. Enquanto as ciências 
naturais tentam explicar a realidade natural em termos de relações estritamente 
legais de causa e efeito, as ciências humanas tentam entender a realidade humana 
em termos de livres escolhas humanas na história.3
"Leis"experimentais, Universo livre.
E compreensível que esse debate suscite uma pergunta para um paradigma cris­
tão que daria ênfase às leis de Deus. Uma filosofia cristãresulta em um entendimento 
determinista ou legalista da realidade? D e maneira nenhuma. E por duas razões.
Em primeiro lugar, nossas chamadas leis científicas são construções teóricas 
que tentam esclarecer a legitimidade da criação. Elas são mais bem compreendidas 
como aproximações teóricas temporárias da forma que Deus ordena a criação, e 
assim devem ser mantidas como tentativas. Por exemplo, enquanto a realidade 
referente à lei, previsível e confiável, que todos experimentamos como gravidade, 
é constante, a “lei” de Newton sobre gravidade veio e se foi.
Em segundo lugar, devemos fazer uma distinção entre a ordem de Deus para 
a criação da criação efetiva e concreta. M esmo que as leis de Deus sejam universais, 
a própria criação está repleta de singularidade e individualidade.
A V ISA O IH \N hH t|lM M H i|IA
I odas uh rcHpoitiiM ,\ Iri de I ) h i h híU> h is tó r ic a s , Ehhc r o t’i itói io (exiigei ,h 
do lado das c iê n c ia s h u m a n a i densa discussão. Embora a lei de I V u s o r d e n e a vi 
da criação, deixa espaço para respostas divergentes, especialmente na vida luiman 
A lei de Deus para nossa vida cnllural c um chamado ao qual respondemos <’ n 
uma força determinista. Portanto, o processo humano de desenvolvimento d 
cultura é uma tentativa falível de trazer as leis de Deus a uma realidade c o n crr l i 
para nossa vida cultural. Por exemplo, Deus ordenou um princípio univertífll dt 
justiça como a lei para a atividade política, mas esse princípio é reduzido a fó n n ti 
e culturalmente decretado em uma estrutura legal vigente. Tais estruturas legitiu 
são tentativas melhores ou piores para efetuar a lei de Deus para a vida polílu a 
em sua criação.
D e fato, toda a vida cultural consiste de casos falíveis da lei de Deus. ( ) t rabalho 
artístico, a vida familiar, os sistemas escolares e os negócios são, todos, respoltUM 
ao chamado de Deus para a matização criativa, a autenticidade, a educaçílO e a 
mordomia, respectivamente. Essas são as normas que devem caracterizar a est rut ui a 
dada em particular. M as nenhum exemplo de estrutura pode ser considerado coiun 
o verdadeiro modelo, como a fórmula correta. Nenhum modelo historicamente 
variável em particular, digamos, do Estado (por exemplo, o modelo moderno, dr 
mocrático liberal), ou da família (por exemplo, o modelo nuclear do século 20), ou 
até mesmo uma forma particular de expressão musical (por exemplo, a tonalidade 
pré-século 20), deve ser absolutizado. Nunca se deve inferir que nenhum oiltfo 
modelo ou forma seria obediente à Palavra de Deus pelos aspectos da vida natural. 
Em diferentes situações históricas e culturais, diferentes respostas podem ser main 
adequadas e mais obedientes.
Reconhecer que as respostas ã lei da criação são sempre, historicamente, 
condicionadas é uma consequência natural da distinção (feita no Capítulo 5) entre 
estrutura e direção. Embora exista uma estrutura da criação (obediência, convo 
cação e direção da Palavra de Deus), existem duas direções possíveis em resposta (fl 
obediência e a desobediência).
A fissão nuclear, por exemplo, é uma possibilidade que Deus estruturou ml 
criação, mas o técnico cristão (e o cidadão) deve perguntar: Que direção espiritual 
é evidente em nossa tecnologia da cultura nuclear? Em razão dessa tecnologia 
funcionar como uma resposta desobediente às normas de Deus em nossa cultura 
presente, poderíamos pedir uma moratória por isso. Não desejamos encorajar um 
retorno romântico à natureza, que vê tal tecnologia como inerentemente má. Mas a 
tecnologia nuclear parece servir tanto à ideologia do militarismo quanto aos falso« 
deuses do cientificismo, do tecnicismo e do economismo.
Ml 'M m \ I M A I M IM Ml NtA I I I I MÓI K A ( H IM V I '>'»
Reducionismo em contrast* 
com o aspecto multidimensional
O fato de que a cosmovinflo bíblica sempre focaliza a idolatria como a raiz 
da má orientação da criação favorece o surgimento do terceiro elemento de uma 
perspectiva acadêmica cristã. Não devemos apenas rejeitar o cientificismo e nos 
ftgarrar à ordem dc Deus para a criação, mas também devemos considerar o aspecto 
mult idimensional da vida.
No academicismo o aspecto multidimensional é obscurecido pelo reducionis­
mo. Muito mais do que uma simples concepção teórica errônea, o reducionismo, 
cm última instância, equivale a culto idólatra. Quando não se permite que algo na 
criação permaneça em sua integridade como criatura, mas em vez disso é reduzido,
o insistentemente, ou explicado em termos de alguma outra coisa, então existe uma 
forma de idolatria oculta nas proximidades.
Donald M acKay chama o reducionismo de “nada além” porque sempre 
defende, de maneira míope, que algo é “apenas” um de seus elementos constituti­
vos.'1 Por exemplo, a consciência humana é nada mais que uma série de complexas 
interações físico-químicas no cérebro. Ou, os valores éticos nada mais são do que 
predisposições emocionais para a maior utilidade material ou os meios para isso. 
Ou a família é reduzida a uma unidade econômica e a sociedade a um mecanismo 
ile evolução humana.
Considere como até mesmo a religião tem sido reduzida a um elemento ou 
outro no decorrer dos anos. Freud, com suas teorias de projeção neurótica, reduziu 
a religião à vida emocional. M arx (lembre-se de sua ideia do ópio das massas) redu­
ziu-a a um elemento de vida econômica. O liberalismo clássico via a religião como 
um modo de vida social. Para a teologia neo-Kantiana de Ritschl, a religião era um 
sistema de valores. O racionalismo de Locke (e grande parte do proposicionalis?no 
evangélico contemporâneo) reduziu a fé a um sistema lógico. Cada uma dessas 
teorias tem alguma validade, pois a criação é verdadeiramente multidimensional. A 
vida religiosa humana inclui dimensões psicológicas, social, ética e lógica.3 Porém, 
erramos se a reduzimos a qualquer uma dessas dimensões.
Uma questão filosófica proposta por cristãos em qualquer campo de estudo é 
esta: com base em quê julgamos que uma posição é reducionista? A única maneira 
pela qual podemos discernir o reducionismo de verdade é se tivermos alguma noção 
dos irredutíveis. E a noção de irredutíveis depende do relato teórico dos aspectos 
multidimensionais da vida.
A teoria dos “Aspectos modais da realidade” de Herman Dooyeweerd é um 
desses relatórios. Dooyeweerd explica o aspecto multidimensional não em termos de 
diferentes tipos de criatura, mas em termos de como as criaturas operam, as maneiras 
como elas funcionam. Normalmente é nesse nível que o reducionismo ocorre.6
Por exemplo, apesai de poucas pessoas serem propeimuN ;i coiiíundii um cérrbm 
com uma rocha; muitos acadêmicos e eruditos distintos argumentam que o íuiici(um 
mento do cérebro nada mais é do que um processo de interações físico-químicai. Inmii 
não reduz uma coisa a outra; reduz os muitos modos como uma coisa da cnaçflo tiil 
particular (o cérebro) funciona ;i uma das suas funções constitutivas (interações I ihh <» 
químicas). Para nos proteger dc tal rcducionismo, precisamos cie uma formulaçio cIhh 
maneiras, modos, aspectos ou dimensões irredutíveis das funções da criatura.
Em bora não tentemos tal formulação completa aqui, observe como n açik) dr 
ler este livro ilustra os aspectos multidimensionais. A coisa mais óbvia íi rcipello 
de um livro é que ele é escrito: ele manifesta uma dimensão lingual. Mas sermflei j 
também são escritos, e este livro não é, originalmente, um sermão. E outro tipo 
de escrito; ele é (em especial neste capítulo) um escrito teórico ou analítico. An» 
bas as modalidades (dimensões), a teórica e a analítica, desempenham um piipt l 
importante e inter-relacionado na escrita e na leitura deste livro. D e fato, o livm 
será julgado, parcialmente, quanto a se foi claro do ponto de vista linguístico i5 
consistente em sua teoria.
M esmo assim a referência a um sermão ainda é relevante porque este liv.ru 
pressupõe certo ponto de partida confessional que inclui um compromisso com ii 
revelaçãobíblica e sua relevância para toda a vida. Nós, como autores, tentamou j 
ilustrar como essa revelação fala a todos os aspectos da vida, incluindo o acadonil 
cismo. Se nós, na verdade, não possuíssemos tais convicções, haveria algo antiélicn 
a respeito de nosso texto. Essa então é outra dimensão - a ética.
Outros aspectos poderiam ser observados também. Considere que as dimensões, tffd 
nômica e legal, estão estreitamente relacionadas. Os autores e o editor redigiram um 
contrato legal que incluía acordos referentes aos aspectos financeiros da produçfln 
e venda de um livro. Existe também um importante aspecto form ativo ; tentamOI : 
proporcionar um serviço educacional aos leitores, já que eles desenvolvem uriltt 
visão cultural cristã e uma estrutura filosófica. D aí nosso subtítulo: “Moldando 
uma cosmovisão cristã”. Nossa linguagem também tem uma dimensão estética i>\ 
medida que demonstra certo estilo de escrita. E o fato de que o livro é escrito poi 
dois autores e com participação de outras pessoas demonstra uma dimensão sociot 
do livro, assim como o faz sua intenção de interagir com os leitores e estimular suti 
interação comunitária para crescimento mútuo.
Um aspecto emocional também surge. Leitores podem estar entusiasmado#, 
intrigados ou irritados com o que escrevemos. E , é claro, emoções são relacionada« 
a uma dimensão físico-química\ se um leitor está irritado, certos compostos químicoí 
interagirão nele de determinadas maneiras. De fato, se já for tarde da noite e u 
nível de energia do leitor estiver baixo, então ele pode ter dificuldade em mantci 
um alto nível de concentração.
Assim, até mesmo o simples fato de ler um livro demonstra uma diversidade i Ir 
aspectos ou dimensões. E claro, nossa lista não é necessariamente abrangente, mim
Ih H " \ UMA I NI Kl M I )UA At lUNTA I '»7
(IA Hcntido ao que urna aiuílru- multidim..... ínmil deve ser. ( ) que é importante* é <nic
tais aspectos são irredutíveis I l m nlvi I ou dimtmnflo de funcionamento nunca pode 
substituir ou ser reduzido a outro nem lazer injustiça ao aspecto multidimensional 
(In criação. A irritaçfto ou o entUHÍUHmo do leitor tem um lado físico-químico, iuiin
ii dimensão psicológica ou emocional não é redutível à sua base físico-química. 
I)e modo semelhante, o livro tem uma dimensão econômica legítima, mas seu 
propósito não deve ser reduzido a uma aventura comercial. Em qualquer dos casos
ii integridade do livro, do leitor e dos autores é sacrificada.
O reducionismo é uma tentação fascinante no academicismo exatamente 
porque os diversos modos de funcionamento da criatura são tão coerente«, in 
ler-relacionados e interdependentes. Todos os aspectos irredutíveis podem ser 
encontrados funcionando de uma maneira ou de outra em todos os entes criado*. 
Para alguém que procura um princípio fundamental de explicação para as vastas 
áreas de realidade, a descoberta de que uma modalidade ou dimensão em parti 
ailar está exposta em todos os entes e eventos seria muito atrativa. Essa pessoa 
deve usar tal evidência atrativa para concluir que esse aspecto modal funcionará 
como um princípio explicativo fundamental. A tentação é mais forte para aqueles 
(|ue rejeitam o Criador e precisam encontrar tal princípio explicativo imanente na 
criação. Estudiosos cristãos, pelo contrário, encontram um princípio fundamental 
na palavra criadora e sustentadora de Deus.
A tentação do reducionismo é inerente na natureza do próprio conhecimento 
científico. O sociólogo Alan Storkey comenta: “Está na natureza de uma ciência 
que ela se abstraia da complexidade completa da realidade e analise de maneira 
particular”. Assim o botânico, o físico, o filósofo, o químico e o economista, todos 
estudam a mesma árvore, mas cada um, respectivamente, em termos de suas di 
mensões biológicas, físicas, ontológicas, químicas e econômicas. M as é imperativo 
observar, diz Storkey, que “Nenhuma análise pode afirmar ser a definitiva, pois o 
processo de abstração da realidade significa que o conhecimento científico é uma 
forma parcial e limitada de compreensão”/ Contudo, já que o mundo acadêmico 
tem tornado a ciência absoluta como cientificismo, e tem elevado o pensamento 
abstrato a um modelo para todo o conhecimento verdadeiro, não é de se admirar 
que vários reducionismos concorrentes sejam desmedidos.
Em certo sentido, o reducionismo ocorre quando a lei para um aspecto da vida 
criada é considerada lei para o outro. Os químicos cristãos, portanto, analisarão 
a estrutura legal de Deus para o funcionamento químico na criação. Sua análise 
também considerará como as funções químicas se relacionam com os aspectos 
bióticos e psicológicos, e resistirá à ideia de reduzir tais aspectos à química. De 
maneira semelhante, os teóricos políticos investigarão o funcionamento do Estado 
em termos do chamado de Deus para a justiça, e eles não reduzirão o Estado nem a 
uma mera organização de poder nem a um escravo do setor econômico. E embora 
os músicos ou compositores possam investigar com autenticidade os aspectos físicos
acústicos, mateimUicoti e píieológicoN da música, mio vilo prrdri de vista o IaIo dt 
que a música é, basicamente, unm expressão estética da criatividade humanu.
No Capítulo 10, nossos, hipotéticos, executivo júnior e médico perguntaram 
como poderiam sozinhos, ser agentes da renovação cultural.Talvez nossos químu u«, 
teóricos políticos c músicos hipotéticos pudessem estar perguntando agora: “Como 
posso eu, sozinho, opor-me à idolatria da academia, começar a discernir a lei dt1 
Deus para minha disciplina, ver como meu campo precisa ser guardado contra o 
reducionismo e também colocar meu próprio trabalho científico no contexto dnn 
aspectos multidimensionais da realidade?” Repetindo, uma pessoa sozinha nlWl 
pode fazer nada. Um testemunho acadêmico cristão deve ser comunitário. AshÍiii, 
consideremos agora alguns modos práticos pelos quais os cristãos podem ajudar um 
ao outro a desenvolver uma perspectiva cristã e um testemunho na academia.14
Academicismo cristão comunitário
Cristo nos convida a submeter todas as coisas em nossa vida, incluindo noOON 
estudos, ao seu senhorio. E devemos submeter não apenas individualmente, nut* 
também comunitariamente. Os estudantes cristãos devem afastar-se do individufl 
lismo competitivo de uma educação orientada para o emprego e começar a batalliui 
em conjunto para estudar de forma que reflita sujeição fundamental a Cristo.
Se uma perspectiva cristã na academia é antirreducionista e tenta honrar o 
complexo aspecto multidimensional da criação de Deus, então os estudos acadô 
micos cristãos devem ser conscientemente interdisciplinares. O conhecimento 
verdadeiro requer a integração dos critérios particulares de disciplinas limitadas (MU 
um quadro completo e integral. Entretanto, tal conhecimento holístico raramente 
é encontrado na universidade secular, especializada e desintegrada. Além do mui«, 
em razão do conhecimento integrado requerer a existência de atributos comuiiN 
de cosmovisão, que falta na universidade, os cristãos, no geral, terão de vencer esHU 
fragmentação do conhecimento em contextos diferentes da sala de aula.
Em várias disciplinas, os cristãos precisam ajudar um ao outro a percebei 
a coerência e o inter-relacionamento da criação. Uma maneira de fazer isso, por 
exemplo, seria promover grupos de estudo e discussão no campus. Esses grupou 
poderiam ser formados, talvez, ao redor de várias disciplinas. Nesse contexto, ele| 
poderiam trabalhar juntos para desenvolver uma perspectiva cristã naquele campo 
e relacionar seu trabalho a outras disciplinas. Poderiam escrever um trabalho cm 
conjunto, ou trabalhos individuais, sobre o tópico de integração para um curti) 
adequado. Isso seria especialmente relevante em cursos que lidam com a filosoliu 
de uma disciplina (por exemplo, crítica literária, filosofia da ciência, filosofia du 
educação e filosofia política).
I' i 11. \ p i ia i *I Kl 111 HA 1 II.OHÒPU A i KM \ I V)
Km cursos que «do uberiiiincnlrIíIonoIíioh, os cristãos, juntos, deveriam 
esforçar-se para averiguai u prinpei tlvu filosófica e ;i cosmovisão que são funda 
mentais para o modo pelo qual o professor (e livro texto) apresenta o material. 
'Iodos nós sabemos que a forniu main eletiva de aprender não é por meio de ouvir 
passivamente, mas por meio de perguntas e diálogo. Não deveríamos temer ter 
nossa cosmovisão, com clareza, exposta e aberta ao desafio. Contudo, devemos 
ser cuidadosos para que nossos comentários e perguntas não façam desviar, sem 
necessidade, um professor ou colega.
Estudantes cristãos devem também procurar professores cristãos que tenham 
tentado fazer seu academicismo de maneira cristã.9 Eles poderiam patrocinar de 
bates e diálogos públicos entre cristãos e não cristãos, membros do corpo docente 
ou acadêmicos convidados. Perspectivas contrastantes, em várias disciplinas, sobre 
tópicos variados, poderiam assim ser investigadas. Apesar de tais eventos terem um 
efeito evangelístico, também são maneiras para o cristão aprender dos não cristãos.
I )e fato, com frequência, os não cristãos têm tornado a criação acessível por meio 
de critérios teóricos enquanto os cristãos se seguram a ideias ultrapassadas (como 
u igreja se relacionou com Galileu, por exemplo) ou têm sido desinteressados a 
respeito de tais critérios científicos por causa de sua cosmovisão dualista.
Nos últimos anos, temos testemunhado um renascimento encorajador na 
abordagem da comunidade cristã ao academicismo. Como resultado, os estudantes 
iTistãos têm disponíveis a eles muitos livros sobre Cristianismo e academicismo; eles 
precisam 1er isso se procuram uma perspectiva cristã em seus estudos. Compilamos 
para o apêndice deste livro uma lista de alguns desses recursos. O estudo comunitário 
île tais livros, necessariamente, aumentará a carga do estudante, mas os estudantes 
cristãos terão de fazer tais sacrifícios. Talvez os estudantes devessem considerar até 
mesmo um ano a mais de estudo para que exista tempo suficiente para conseguir 
uma verdadeira educação, em vez de mero treinamento especializado.
Estar em comunhão uns com os outros significa ser dependentes e sujeitos 
uns aos outros. Como resultado, devemos procurar o conselho de irmãos e irmãs 
ao tentar servir o Senhor em nossos estudos; precisamos estar abertos às perguntas, 
preocupações e perspectivas uns dos outros.
O academicismo, em sua base, é uma resposta particular ao mandado cultural 
de cultivar e manter o jardim da criação. Como aquela tarefa requeria o trabalho 
em conjunto do homem e da mulher, assim também a tarefa de tornar a criação 
acessível e expô-la teoricamente é uma tarefa comunitária. Em uma situação de 
queda, aquela tarefa tem caráter redentor. Por meio de praticar um academicismo 
fundamentado em uma estrutura filosófica com inspiração bíblica, damos testemu­
nho do Criador e de seu Filho Jesu s Cristo - a Palavra encarnada. Tal academicismo 
traz esperança para uma presença acadêmica cristã renovada, a qual, por sua vez, 
espalha a paz por toda a nossa cultura.
N o t a s
C a p ít u l o 1 : C o s m o v is ã o e c u l t u r a
* No Brasil, Associação Bíblica Universitária (ABU). NT
1 The Four Families, National Film Board, 1959 (escrito e produzido por Ian McNeil).
** Termo que se tornou popular, nos Estados Unidos, após a Segunda Guerra Mundial por cau­
sa do grande aumento da natalidade ocorrido especialmente entre 1946 e 1.964. NT.
2 DeCraaff, Arnold H. D. Olthuis, Jean; Tuininga, Anne. Japan: a Way o f Life. Toronto: Joy 
in Learning Curriculum Development and Training Centre, 1980, pág. 145.
3 Ibid., pág. 64.
4 Ibid., pág. 62.
5 Citado em Watkins, Mel. Ed. Dene Nation: The Colony Within. Toronto: Univ. of Toronto 
Press, 1977, pág. 10.
6 Northern Frontier, Northern Homeland: The Report o f the Mackenzie Valley Pipeline Inquiry, 
v. 1. Ottawa: Ministry of Supply and Services, Canadá, 1977, pág. 85; daqui para frente re­
ferido como NF/NH.
7 Citado em NF/NH, pág. 90.
8 Watkins. Dene Nation, pág. 15.
9 NF/NH, pág. 1.
10 Veja M cCulhim, Hugh; McCuIlum, Karmel. This Land Is Not For Sale. Toronto: Anglican 
Book Centre, 1975, pág. 16.
11 Schumacher, E. F. Small Is Beautiful: A Study o f Economics As I f People Mattered. Lon­
dres: Abacus Books, 1974, pág. 84.
12 Ibid., págs. 10-11.
13 Goudzwaard, Bob. Capitalism and Progress: A Diagnosis o f Western Society. Trad. Josina 
VanNuis Zylstra. Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1979, pág. 24.
14 Heilbroner, Robert. The Worldly Philosophers, 4 ed. Nova York: Simon c Schuster, 1972, pág. 25.
15 Citado em McCuIlum; McCuIlum. This Land Is Not For Sale, pág. 24.
16 Todas essas citações são de NF/NH, págs. 94-95. (“Dene” é pronunciada De-nay.)
17 Citado em McCuIlum e McCuIlum. This Land Is Not For Sale, pág. 10.
18 Ibid., pág. 11.
19 Watkins. Dene Nation, pág. 8.
C a p ít u l o 2 : A n a l is a n d o a s c o s m o v is õ e s
1 Para uma discussão útil do uso que Paulo faz das palavras carne e espírito veja Ridderbos, 
Herman. Paul: An Outline o f His Theology, trad. J. R. DeWitt. Grand Rapids, Mich.: 
Eerdmans, 1975, cap. 19.
r\ VIHAV I IH/MNBI ' M IM A IH 'H A
2 Somos devedores no l)i hmu •* oIiIimIn poi gmnde pnrlo do miiterliil Hc^uinlc C'olhgi 
inlbrmnçOes sobiv siiiim pi'ivep^Aos n rcNpcllo dc visAes tit* vldti. prlnclpnlnienti’ pm m 
tic seminários c manuswiloH nflo publicados cscrilos no Instituto purii listudos CrlMlflon 
7‘oronto, Canadá.
3 DeGra si IT Arnold II. “Towards n Now Anthropological Model”, In J. Kraay c A, Ihl I 
Hearing and Doing. Ibronto: Wedge, 1979, pág. 101.
4 H art, Hendrik. The Challenge oj Our /fgc\Toronto: Wedge, 1974, pág. 5.
5 W horf, Benjamin L. Language, Thought and Reality, org. J. B. Carroll. Cambridge, Mii#»( 
MIT, s.d., pág. vi.
6 Sire, Janies W. The Universe Next Door: A Basic World View Catalog. Downers ( ll'O V tf, III 
Inter Varsity Press, 1976, pág. 16.
7 Sobre a fé, Veja DeGraaf. “A New Anthropological Model”, pág. 99; Storkoy, Alilii 4 
Christian Social Perspective. Leicester, Inglaterra: InterVarsity Press, 1976, págs. 15 I /,
8 Compare os tipos de pergunta apresentados por Storkey, ibid., pág. 16, e por Sire, (hitivm»* 
Next Door, pág. 18.
9 Veja Sire, James W. Sire. “From the Bottom Up: World View Analyssi as a Basis for Inli'inii 
tion”, em Faith and Discipline. Sterling, Kans.: Sterling College, 1980, págs. 18, 20, Aillmi 
Holmes também disse que: “A gênese dc uma cosmovisão está no nível pré-filosófieo", ( o*f 
tours o f a World View. Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1983, pág. 31.
10 Veja Drummer, Vincent. Theology> and Philosophical Inquiry: An Introduction. I'iliuli'lllii 
Westminster Press, 1982, pág. 140.
11 Veja Ragan, Claude. “Perceptual Process and Christian Commitment”, Reformed Joui'htil 
31. N. 5, maio de 1981, págs. 15-17.
12 Veja D eG raaf et al Japan: A Way o f Life, págs. 211-213.
13 Veja Bob Goudzwaard. idols o f Our Time. Trad. Mark Vandervennen. Downers Grove, III t 
InterVarsity Press, 1984.
14 Compare com Sire. Universe Next Door, pág. 209.
15 Por exemplo, veja, Niebuhr, H. Richard. Christ and Culture, Nova York: Harper & KnW, 
1983.
C a p ít u l o 3 : C o m b a s e n a c r ia ç ã o
1 Observe o comentário de Francis Schaeffer de que “O Cristianismo, como sistema, nflo ml- 
meça com Cristo como o Salvador, mas com o Deus infinito-pessoal que criou o mundo mi 
princípio e que fez o homem ser importante no decorrer da História”. Genesis in Space itittl 
Time: The Flow o f Biblical History (Downers Grove, 111.: InterVarsity Press, 1972), pág. 97,
2 Glacken, Clarence J., em seu magnífico estudo sobre as visões do homem e do muiulii, 
afirma a importância da criação para a cosmovisão bíblica. Ele declara que o Cristianismo í 
distintamente “Uma religião e uma filosofia da criação”, preocupada com o Criador, a criuçõi 
e seus relacionamentos (pág. 181). Observe, em particular, a seção, no capítulo 4, intitullliln 
“God, Man and Nature in Judeo-Christian Theology”, Traces on the Rhodian Shore:Natuw 
and Culture in Western Thought from Ancient Times to the End o f The Eighteenth Centui'v 
(Berkeley: Univ. of Calif. Press, 1976).
3 Veja Gênesis 1.3, 6, 9, 11, 14, 20, 24, 26. Observe o comentário de James Houston cm 
Believe in the Creator. Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1980, págs. 51, 272, 275, porque
N otas I M
creatlon /><v* vwhiim (crlaçBo peln pnlnvrti) <S, nu verdade, mais básico do que creatio es 
iilhilo (crliivflo ii partir do mula). Wnlicr Kaiser, .Ir., em To w anis an GUI Testament Theology. 
Cirund Rupids, Mioh.: Zondervan. I978, píig, 74, deshiea que isso também é uma exposição 
sistemática mais antiga.
■I A referência em Isaias 5 5 .10 - 11 é com relayflo à palavra profética de Deus, que é tão cheia de
autoridade que garante seu cumprimento. Em C ienesis I ela é a palavra criativa de Deus. Nos 
dois casos a palavra de Deus tem as mesmas características: ela realiza sua vontade.
5 Veja ( Jênesis 1.7, 9 ,11, 15, 24. A facilidade com a qual Deus estrutura a criação em Gênesis
está em contraste direto com outros relatos da criação do antigo Oriente Próximo, do qual
o Emrna Elish babilônico-sumérico talvez seja o mais famoso. No Enuma Elish, por exem­
plo, a criação é realizada por meio de uma tremenda batalha. A narração é cheia de deuses 
guerreiros e monstros, e a partir do clímax da batalha entre Marduk (o deus do sol nascen­
te) e Tiamat (as águas primitivas) o mundo é criado. Gênesis, portanto, retrata Deus como 
soberano absoluto; ele precisa apenas falar e sua criação obedece. Veja Sproul, Barbara C. 
PrimaI Myths: Creatingthe World. São Francisco: Harper & Row, 1979, para uma antologia 
abrangente dos relatos da criação, não apenas do Oriente Próximo, mas de todas as civiliza­
ções e culturas principais. Veja as páginas 9 l- l 13 a respeito da Enuma Elish. Ricoeur, Paul. 
The Symbolism ofEvil, trad. E. Buchanan. Boston: Beacon Press, 1969, parte 2, Caps. 1 e 3, 
também compara a cosmovisão babilónica à hebraica.
(> Veja Gênesis 1.4, 10, 12, 18, 21, 25, 31. Esta afirmação inequívoca da bondade intrínseca da 
realidade criada não tem paralelos em todos os relatos sobre as origens que temos investiga­
do até agora. Todas as outras narrativas da criação, quer sejam mitologias tribais ou nacionais 
ou as declarações de modernos pensadores, filosoficamente orientados com respeito às ori­
gens, inevitavelmente começam com a existência do mal de alguma forma - a menos que elas 
tenham sido influenciadas pela Bíblia. Parece então que, por causa da experiência humana da 
queda, nossa tentativa de construir uma cosmovisão independente da revelação bíblica levará 
ao postulado de um princípio defeituoso, uma ambiguidade inicial de bem e de mal.
7 Embora as citações bíblicas em todo este livro sejam tiradas da versão Almeida Revista e 
Atualizada (ARA), em uns poucos trechos trouxemos uma tradução bem literal. Tais altera­
ções são citadas nas notas. Uma adaptação que começa aqui e ocorre em outras citações tam­
bém é a substituição da palavra “Senhor” por “ Yahweh”, o nome pessoal e pactuai de Deus no 
Antigo Testamento (veja Êx 3.13-15 e 6.2-4). Já que estamos tentando retomar a cosmovisão 
bíblica, é bastante adequado que usemos o termo mais literal “ Yahweh” nesses contextos.
8 Esse ensinamento é encontrado também no Novo Testamento (NT) em Hebreus 11.3 e 2 Pe­
dro 3.5 e 7, e é a ideia básica de João 1.1-3, em que João se refere a Cristo como o Verbo pelo 
qual Deus fez o universo. É também a essência de Hebreus 1.1-3, que declara que o mundo 
foi criado por meio de Cristo e que ele o sustenta por sua Palavra. Entretanto, o ensino do NT 
sobre esse assunto nos leva mais adiante, e esse novo entendimento não pode ser, simples­
mente, pressuposto nas referências do AT. Os contextos literários aqui são essenciais.
9 Nessa passagem substituímos o termo “ribombar o trovão” da ARA pelo mais literal “soar a 
voz”, da versão Almeida Revista e Corrigida (ARC), pois o primeiro, embora não incorreto, 
tende a omitir a conexão com a ideia de criação pela palavra.
10 Observe que os adjetivos “sem forma” e “vazia”, utilizados para a terra, dão a ideia de uma 
massa que ainda não foi formada, e não de uma massa deformada.
A VIHAO TRANNPQflilA!" 'HA
11 Uma pcNqulm su|n*illohil revolcw. aproximadamente, 40 ivlm'nrlaH blbllcitN A term ou (I 
mundo aenilo “fliiulndo" on "cNtibolocldo". Urn qunrlo doitai erioontrudo no NT. Vc)«, pm 
exeniplo, Mateus 13,35; Luüun 11,50; Joflo 17.24; Hfóslos 1.4; Hebreu,s 9.26.
12 O deísmo era uma lllosolia de transiçflo entre o teísmo cristflo e o ateísmo, que desuhrotlmii 
no século IS. O deísmo postulava um Deus, mas um Deus que não estava partlculirmtflll# 
envolvido no universo- um Criador ausente que colocou o mundo em movimento, mas imiMii 
saiu de cena. Para uma boa introdução à cosmovisão deísta, veja Sire, Universe Next I 
págs. 44-56.
13 Outras passagens que falam do relacionamento de Deus com a criação como pactuai Mfln 
Jeremias 31.35-37; Ezequiel 34.23-31 e Oseias 2.18. Veja também a descrição entusiasmadii 
do cuidado de Deus pelo seu mundo no Salmo 65.9-13.
14 Para um relato excelente dos debates históricos, veja Berkouwer, G. C. Man: The Intake i)f 
God, trad. D. Jellema. Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1962, esp. Cap. 2. Em nossa discilRflflH 
do significado da imagem que se segue, omitimos por um lado a interpretação mórmon da iai, M 
humana como imagem de um deus literal, físico, de carne e osso (um ser humano divini/ailol 
e, por outro lado, a suposta distinção entre imagem e semelhança em Gênesis 1.26. Os ONtiulOS 
bíblicos têm mostrado amplamente que tal distinção é ilusória; os termos são sinônimos,
15 Aqui estão alguns estudos úteis sobre a imagem de Deus que contribuíram para nossa IiiUm 
pretação: Macaulay, Ranald; B arrs, Jerram. Being Human: The Nature o f Spiritual /i'v/M 
rience. Downers Grove, 111.: InterVarsity Press, 1978; Berkouwer, Man:The Image 
Kline, Meredith G. Images o f the Spirit. Grand Rapids, Mich.: Baker Book House, 19811 
Schrotenboer, P. Man in G od’s World: The Biblical Idea o f Office. Toronto: Wedge, I {>tj 
Veja também Fernhout, H. “Man: The Image and Glory of God” (mimeografado, Torouln, 
A. A. C. S.) e McKay, K. L. “Criação”, no The New Bible Dictionary, org. Douglas, J. I), t'l 
al. Londres: InterVarsity Press, 1962.
16 Para uma análise semelhante de cultura veja Niebuhr, Christ and Culture, Cap, I; f 
Kavanaugh, J. F. Following Christ in a Consumer Society'. The Spirituality o f Culliihtl 
Resistance. Maryknoll, N. I.: Orbis, 1981, págs. 55-62.
17 Veja Kidner, Derek. Genesis: An Introduction and Commentary. Downers Grove, III.: Itilri 
Varsity Press, 1967, págs. 23-24, para um debate sobre a importância da estrutura toledotll 
de Gênesis.
18 Como em Gênesis 5.1; 10.1; 25.12; 36.1,9.
19 Veja Gênesis 2.4; 6.9; 11.10, 27; 25.19; 37.2.
20 Uma analogia semelhante é encontrada em várias parábolas que Jesus contou para iluNthu
o reino de Deus. Deus é mostrado como o senhor que contrata servos ou um proprietário ilp 
terras arrendando seus campos para fazendeiros. (Veja como exemplo Mt 20.1-16; 24 .42-51, 
Lc 19.11-27; 20.9-18.) O mandato de Gênesis parece ter desempenhado um papel nillIUf 
importante no pensamento de Jesus.
C a p ít u l o 4 : R e c o n h e c e n d o a q u e d a
1 As duas primeiras referências são encontradas nas narrativas a respeito de Jacó, Gêncvt!» 
31.19 (“ídolos do lar”) e Gênesis 35. 2,4 (“deuses estranhos ou estrangeiros”).
2 Apesar de várias palavras hebraicas serem traduzidas como imagem no Antigo Testament 
os seres humanos são apresentados como os selem de Deus em Gênesis 1.26-27; 5.1; e ft,
N c>t a §
Emu peilnvra ó usmln tam bém em ivIit^hoIm no* íd o los em N úm eros 3 3 .5 2 ; 2 R c ls 11. 1K; 2 
C rô n icas 2 3 .1 7 ; E zequ lel 7 ,2 0 ; l(>, 17; c Am rts 5 ,2 6 . K a is e r , W alter. Towards an Old Testa­
ment Theology, pág. 7 6 , trnduz selem co m o : "P.stAtua ou có p ia en talh ad a on lavrada” .
3 Veja Berkouwer. Man: The Imageo f Clod, págs. 6 7 -1 1X, também o artigo “ Image” de M ar­
tin. Ralph I*, em The New International Dictionary o f New Testament Theology, v. 2, org. 
Colin Brown (Grand Rapids, Mich.: Zondervan, 1976), esp. pág. 287.
4 À luz do debate acima, discordamos da interpretação recente e influente de Francis Schaeffer 
sobre a imagem de Deus no homem. Ele considera que o termo signifique, simplesmente, 
nossa humanidade - ou, para ser mais preciso, nossa personalidade, nossa natureza singular 
como pessoa humana. Veja The God Who Is There. Downers Grove, 111.: InterVarsity Press, 
1968, pág. 87; Genesis in Space and Time, pág. 47; e também M orris, Thomas V. Francis 
Schaeffer’s Apologetics: A Critique,. Chicago: Moody Press, 1976, pág. 26.
Apesar de Schaeffer estar completamente certo em relacionar nossa humanidade com a ima­
gem de Deus (visto que são seres humanos quem estão na imagem), essa posição precisa 
de duas restrições importantes. Inicialmente, a imagem de Deus não é nóssa humanidade 
no sentido de nossa condição de pessoa, limitadamente entendida, pois também inclui nos­
sa própria existência corpórea. Em segundo lugar, a imagem refere-se não simplesmente à 
nossa natureza humana, mas (como Macaulay e Barrs indicam em Being Human, Cap. I) à 
qualidade normativa de ser humano, às nossas tentativas de viver de acordo com os padrões 
de Deus em tudo que fizermos. Além disso, devemos ver essa qualidade de ser humano como 
nossa realização do mandato cultural (um ponto não enfatizado por Macaulay e Barrs). Por­
tanto, nossa humanidade e a imagem de Deus são ligadas, mas não podem ser identificadas 
de forma irrestrita. Como destacado por Kline, Meredith. Images o f the Spirit, pág. 33, esses 
termos não são “simples equivalentes”.
5 O autor faz referência ao uso da palavra imagem em lugar de ídolo, que não vem ao caso na 
edição em português porque a versão bíblica utilizada (ARA) já utiliza a palavra imagem.
6 Para uma análise bíblico-teológica esclarecedora do pacto no AT, veja Kline, Meredith G. 
The Structure o f Biblical Authority, ed. rev. Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1975.
7 Veja Mateus 12.24; Marcos 3.22; Lucas 11.15; João 12.31; 14.30; 16.11; veja também Efé- 
sios 2.2.
8 Lewis, C. S. “Peace Proposals for Brother Every and Mr. Bethell”, Christian Reflections, org. 
Hooper, Walter. Glasgow: Collins, Fount Paperbacks, 1981, pág. 52.
( .a p ít u l o 5 : T r a n s f o r m a d o p e l a r e d e n ç ã o
1 História redentiva é um termo teológico técnico baseado no alemão heilsgeschichte que 
significa literalmente história santa. Algumas vezes é traduzido como história da salvação.
O conceito de heilsgeschichte é associado a teólogos como von Rad, Gerhard. Old Testa­
ment Theology, 2 vols. Nova York: Harper & Row, 1962-1966; Wright, G. Ernest. God Who 
Acts: Biblical Theology as Recital. Londres: S.P.C.K., 1952; e Cullmann, Oscar. Christ and 
Time: The Primitive Christian Conception o f Time and History, trad. Floyd U. Filson, ed. rev. 
Filadélfia: Westminster Press, 1964. Veja Travis, Steven H. Christian Hope and the Future. 
Downers Grove, 111.: InterVarsity Press, 1980, págs. 83-89.
2 Para uma exposição breve e excelente da história pactuai do Antigo Testamento, que é sus­
cetível à unidade das Escrituras e à cosmovisão bíblica, veja Sinnema, Don. Reclaiming the
Ul(> A VIM i i 111 v I' I ' «I*M M " 'I1
/ (iiiil I Sniilr o/ tlic* Uiiok uf,JoshiKi, o d iç ilt) d o p ro lcN lO i' r dt* gcupoit dt* CNludo.
( ’u r r lc i i lu in l ta v e lo p in c n t ( r n ir e , l V77 , págs, 4 s n . 1‘nrn um ira tam e n to ih o Ih po p u lm <U i u i Ih
ii M lb lli i p o r u m « penüpcotlv« p a c tu a i, v e ja DcCirauf, S . (I. Promlw and Dellvcrancti'I vu l» 
S t. C a th c r in e H , O n U ir io : P n ld e iu 1’rcss. 1977-1982.
3 C o m p a re tam b ém o s in a l p a c tu a i m a is e x c lu s iv o e lim ita d o da c irc u n e is f lo na a l ia n ç a lihCBft
m ic a co m o a rco - ír is u n iv e rs a l, d s in a l tia a l ia n ç a n o é lic a .
4 V e ja Sinncma. Reclaiming the Land, p a ra u m a a n á lis e da co n q u is ta de C a n a ã á lu/, tli»«in#
d ebate .
5 Para um estudo completo e excelente do reino de Deus na pregação de Jesus, veja RiddcrlHiNi 
Herman. The Corning o fth e Kingdom. Filadélfia: Presbyterian and Reformed, 1962. Qulwt 
trabalho acadêmico, apesar de mais acessível, é o Capítulo 2 de Ladd, G. E. The Pattvm tif 
New Testament Truth. Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1968, sobre o padrão sinólico, I mM 
faz um trabalho brilhante ao relacionar o tema do reino de Deus a outros temas centPlil« lin 
restante do Novo Testamento.
6 As imagens de fundo são tiradas de Êxodo (o novo Moisés que lideraria o povo para a llliífli 
dade) e os ensinamentos de Levítico 25 referentes ao ano do jubileu quando o povo rcoup# 
raria sua herança da criação.
7 Veja Ridderbos. Corning o f the Kingdom, págs. 211-232. Um artigo que também é lilll |3 
“The Biblical Message of Reconciliation” em Studies in Scripture and Its Authority, ( iiiintl 
Rapids, Mich.: Eerdmans, 1972.
8 Sugerimos que o fogo do julgamento em 2Pedro cap. 3 seja entendido como um fo g o pwt 
ficador que revela a verdade e a bondade da criação. ANova Versão Internacional (N VI) ilw 
no verso 10 que “A terra e tudo que nela há será desnudada”.
9 1 João 3.8 declara que “ Para isto se manifestou o Filho de Deus: para destruir as obrilH ilii 
diabo”.
10 Para uma apresentação (incluindo uma réplica) sobre o pós-milenismo, veja Clouso, Kn 
bert G., org. The Meaning ofthe MUlennium: Four Views. Downers Grove, 111.: IntcrVarnllv 
Press, 1977, págs. 117-152.
11 ICoríntios 5.6-8; Mateus 13.5-12 (veja também Mc 8.15 e Lc 12.1); e Gálatas 5.9 refcrcni»lf 
ao pecado como fermento.
12 A ilustração dia D/dia V é tomada emprestada de Cullmann. Christ and Time, pág. 84. Vr|ii 
Ladd, Pattern ofNew Testament Truth, pág. 50.
13 Isso não sugere uma doutrina de salvação universal, pois a Bíblia é clara a respeito dojillgii 
mento. Entretanto, estamos analisando outro ponto; ou seja, como é colocado por SchaojlVlS 
Francis. Art and the Bible: Two Essays. Downers Grove, 111.: InterVarsity Press, 1973, prtj| 
7, que “Em Cristo o homem é redimido por completo”. A salvação não se aplica aponti» n 
uma parte da vida, mas para a vida inteira. Nem a arte, nem a sexualidade e nem a polltli h 
são irredimíveis. Deus purificará sua criação de todo pecado. Portanto, uma arte profana illín 
terá parte no reino, nem a prostituição, nem qualquer forma de sexualidade ilícita, nem u* 
sistemas políticos corruptos. O problema é que nós não sabemos quanto a criação terá de ntfl1 
transformada para ser purificada. Até mesmo Paulo confessou grande nível de ignorAimiM 
com respeito à outra criação (ICo 2.9). Uma indicação interessante, contudo, é encontrmlii 
em Apocalipse 21, no qual João menciona que no novo céu e na nova terra haverá naçflt’« 0 
reis, e a “glória e a honra” das nações serão trazidas para a Nova Jerusalém (21.1, 24, 26),
N otas 167
14 O bserv o que outros títu los paru ( T I nIh tttrnhdm refletem essa am biguidad e. P or ex em p lo , 
“ F ilh o ile D eu s" pode se re ferir hum anidade de ( 'risto (c o m o nós som os tam bém filhos e
IiIIeis de D eu s) ou í» sua filiaçflo Im par (o lillio “ u n igén ito” ). A lém d isso , “ filho do h o m em ” , 
uma ex p ressão ju d a ica com um para um ser hum ano (v e ja SI 8 .4 e E z 2 . l , 3 , 6 , e tc .) , tam bém 
faz re ferên cia à ligura divina do M essias “co m o um filh o de h o m em ” na v isão ap o ca líp tica 
de D aniel 7 .1 3 -1 4 .
15 Veja ICoríntios 3.16-17; 6.19; 2Coríntios 6.16; Elésios 2.19-22; 1 Pedro 2.4-5; compare 
Apocalipse 21.2-3, 9-14.
I(> Observe o título importante do ótimo livro de Macaulay, Ranald e Barrs, Jerram Being
Human: The Nature o f Spiritual Experience. Esse título reflete firmemente a cosmovisão 
bíblica.
17 Veja 2Timóteo 2.12; Apocalipse 5.10; 20.4, 6. Compare as passagens que falamsobre o jul­
gamento que faremos do mundo, como Lucas 22.30; ICoríntios 6.2 e Apocalipse 20.4.
18 Para essa ilustração estamos em débito com nosso colega Al Wolters, anteriormente do Ins­
titute for Christian Studies.
( a p í t u l o 6 : O p r o b l e m a d o d u a l i s m o
1 Wallis, Jim. “Rebuilding the Church”, Sojourners 9, n. 1. Janeiro, 1980, pág. 10.
2 Compare com Atos 17.6. Talvez o problema seja ainda mais grave quando usamos a palavra 
evangélico. Por que o poder radical do evangelho falta em nossa vida, como evangélicos, 
com tanta frequência? Falando especificamente do evangelicalismo americano, Guinness, 
Os. “The American Church Faces the 80 ’s: A Moment Not to Be Missed”, Radix 13, n. 6, 
maio/junho de 1982, pág. 10, observou que a espiritualidade da comunidade evangélica 
americana é “Particularmente atrativa, mas socialmente irrelevante”. “Assim ele não causa 
impacto histórico-cultural cm termos do reino de Deus alcançando a sociedade.”
3 Zylstra, Bernard, diz que “A religião cristã, tendo perdido o largo alcance de uma vida 
centrada em Deus, limitando a salvação da alma à centralidade humana, tem se tornado para 
muitos a justificação moral para o nacionalismo, o modo americano de vida, e tudo o que 
ele defende no mundo hoje”. “Thy Word Our L ife”, em Will All the King’s Men... Toronto: 
Wedge, 1972, pág. 201.
4 Compare o comentário de Snyder, Howard: “Um evangelismo que focalize exclusivamente 
as almas ou um procedimento sobrenatural que não faz diferença real aqui c agora é infiel 
ao evangelho”. The Community o f the King. Downers Grove, 111.: InterVarsitv Press, 1977, 
pág. 102.
5 “Must the Church Become Secular?” em Out o f Concern fo r the Church. Toronto: Wed­
ge, 1970, pág. 117. Outhuis diz também: “A característica mais desanimadora desse estado 
doloroso é o fato de que o Corpo de Cristo - com poucas exceções - não reconhece essas 
correntes quando elas tinem e chocalham. Ela não vê que é seu próprio modo de pensar que, 
no final das contas, compromete o evangelho” (pág. 122).
6 Stott, John R. W. Christian Mission in the Modern World. Downers Grove, III.: InterVarsity 
Press, 1975, pág. 31.
7 Compare Walsh, Brian. “How to Think Your Way through College”, HIS, novembro, 1983.
8 Citado por Vanderkloet, E. “Why Work Anyway?” em Labour o f Love: Essays on Work. 
Toronto: Wedge, 1980, pág. 2 1.
L) Marshall, I*miI, "Vocation, Work mid Join", cm Labour of haw, prty, -I
10 Ibid., pág. 5,
11 Ibid., pág. 7.
12 Veja Aquinas.Tliomas. Summa Theologiae 2. 2. 179. I -2; 2. 2. IHI. I -4; 2.2. 18 2 .1 -2.
13 Marshall. “Vocation, Work and Jobs", pág. X.
14 Niebuhr. Christ and Culture, Caps. 2, 4, 5.
15 E óbvio que nossas descrições aqui têm certo cunho de caricatura para comunicar o liiiuln 
namento dessas perspectivas diferentes.
16 Niebuhr também se refere a duas outras opções, que são: “O Cristo da cultura" c " ( Ylhlu 
transforma a cultura”. O primeiro, simplesmente, identifica o Cristianismo, indiscrimlmulil 
mente, com o melhor da cultura humana. Esse liberalismo clássico não tem qualquer Inw 
bíblica e não será analisado neste livro. A segunda opção, que Niebuhr identifica com tu 
pontos de vista de Agostinho e F. D. Maurice é, exatamente, a perspectiva deste livro, ( i 
problema, entretanto, é que Agostinho não pode ser sempre interpretado como defensor dg 
perspectiva de “Cristo transforma a cultura” e F. D. Maurice também não. Sugerimol, IIU 
Capítulo 5, que a perspectiva bíblica é a transformista. Também descobrimos que a tradlçflti 
de Calvino traz essa perspectiva para a nossa própria de uma maneira que é mais senslvül ** 
fiel à cosmovisão bíblica.
17 Macaulay e Barrs. Being Human, pág. 54. Veja também Riddcrbos, Herman. Paid: An Oiilll 
ne o f His Theology?, trad. J. R. DeWitt, Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1975, págs. 91-93.
18 Ibid., pág. 76.
19 Compare Webster, Douglas. Christian Living in a Pagan Culture. Wheaton: Tyndalc Hon»*, 
1980, págs. 18, 95, 101, 126, 136. Para uma análise crítica desse “dualismo brando”, vejtt ii 
revisão de Webster em Radix 13, n2 3, novembro/dezembro de 1981, págs. 28-29, dc UrlWl 
Walsh.
20 Veja, por exemplo, Webster, Christian Living, pág. 29.
21 Snyder. Community o f the King, pág. 22. Compare Stott, Christian Mission, págs. 23-24, ;.i
22 M acaulay e B arrs diz: “Não será uma experiência não humana ou sobre-humana que dt?N» 
frutaremos no futuro com nossos corpos ressurretos. É, simplesmente, uma experiência hU< 
mana finalmente liberta das algemas do pecado”. Being Human, pág. 25. O dualismo semprf 
faz com que nos sintamos desconfortáveis com nossa humanidade, não nos faz sentir à vou 
tade na criação de Deus.
23 Veja Apocalipse 21 em que a Nova Jerusalém desce à terra, em vez de Cristo subir ao céu, A 
escatologia bíblica é uma escatologia da criação. Na verdade, não existe nem uma referênelft 
bíblica a cristãos vivendo eternamente no céu.
C a p ít u l o 7 : O d e s e n v o l v im e n t o d o d u a l is m o
1 Veja Gonzalez, J. L . A History o f Christian Thought. Nashville: Abingdon Press, 1970,1 ,47| 
Rogers, Jack; e McKim, Donald. The Authority and Interpretation o f the Bible: An Históri­
ca/ Approach. Nova York: Harper & Row, 1979, pág. 7; e Knowles, David. The Evolution <)/ 
Medieval Thought. Nova York: Random House, 1962, pág. 17.
2 Schaeffer, Francis. Escape from Reason. Downers Grove, 111.: InterVarsity Press, 1%N, 
pág. 17.
3 Rogers e McKim. Authority and Interpretation, pág. 5.
NOTAN IOW
4 Gon/.iilox, History o f I 'hrlstian Thought, pAg, 4N.
5 Para uuui análise útil do dcnonvolvlmento do dnnlismo lorma/niatéria na filosofia grega, veja
Dooyeweerd, Herman Roots o f Western Culture: Pagan, Secular, and Christian Options,
trad. J. Kraay. Toronto: Wedge, I‘>70, págs. 15-22, 111-113.
6 Gonzalez, History o f Christian Thought, pág. 49. Compare M acaulay e Barrs, Being Hu­
man, págs. 38-42.
7 Knowles, David diz que Platão é o pai de todos aqueles “Que encontram a verdadeira vida 
do espírito humano em um esforço ascendente cm direção ao divino”. Evolution o f Medieval 
Thought, pág. 11.
8 Phaedo, trad. Church, P. J. Nova York: Bobbs Merrill, 1951, pág. 30 (80).
9 Ibid., págs. 33 (82 e 83), 30 (80) e 12 (66).
10 Compare Gonzalez , History o f Christian Thought, pág. 120.
11 Veja Runner, H. Evan. The Christian and the World. Toronto: Association for the Advance­
ment of Christian Scholarship, pág. 7.
12 Veja também Knowles, Evolution o f Medieval Thought, pág. 23; M acaulay e B arrs, Being 
Human, pág. 43.
13 Knowles. Evolution o f Medieval Thought, pág. 38.
14 Armstrong. A. H. An Introduction to Ancient Philosophy. Londres: Methuen, 1965, pág. 
178. Knowles vai tão longe a ponto de dizer que se as Escrituras não deram direção cla­
ra quanto a qualquer assunto, que Agostinho “Aceitou do Timaeus e Meno de Platão e da 
Enneads de Plotinus a explicação que eles deram sobre os problemas intelectuais que atraí­
ram sua atenção”. Evolution o f Medieval Thought, pág. 36.
15 Agostinho. City o f God (trad. M. Dods), págs. 22.24. Compare Dooyeweerd, Roots o f 
Western Culture, pág. 115. Knowles diz que para Agostinho “Da mesma forma, para Platão, a 
alma é uma entidade espiritual completa ‘usando’ um corpo”. Evolution o f Medieval Thought, 
pág. 40.
16 Agostinho, City ofGod, págs. 14.16-26.
17 Citado por M aurer, A. A. Medieval Philosophy. Nova York: Random House, 1962, pág. 8.
18 Veja Dooyeweerd, Roots o f Western Culture, pág. 122.
19 Veja Goudzwaard, Bob. Capitalism and Progress, págs. 2, 6; e Heilbroner, WorldlyPhilo- 
sophers, págs. 6-27.
20 Veja Knowles, Evolution o f Medieval Thought, pág. 257.
21 Dooyeweerd. Roots o f Western Culture, pág. 117. Compare In the Twilight o f Western Thought 
de Dooyeweerd, Filadélfia, Pa.: Presbyterian and Reformed, 1960, págs. 191-193.
22 Ibid.
23 The Imitation o f Christ é um livro cristão de devocionais do fim da Idade Média que fo­
caliza um dualismo fundamental: o interior (a alma, na qual Deus e Cristo habitam) eo 
exterior (o mundo natural). Muito mais extremista do que Agostinho ou Tomás de Aquino,
o autor aconselha o leitor a “Desistir deste mundo desprezível” e aprender a “negligenciar 
tudo o que é exterior” com o objetivo de encontrar Deus (pág. 83). Ele vê Cristo como al­
guém que nos ensina a “Rejeitar as coisas da terra, e repugnar o que é temporal” (pág. 176). 
Por quê? “Quando você torna seus olhos para as coisas criadas, perde a visão do Criador” 
(pág. 175). Em vez disso, devemos procurar o caminho da vida interior e assim conseguir 
a purificação da influência corrupta da natureza externa. O principal impedimento para a
vida espiritual ó, portanto. poimtti "Qualquer colia do valor quo mu» ncJu aquele bom oin 
no, imensurável. Qualquer unlun que nflo seja Dou» é nnclu. e deve sor ooiislderadii uadu' 
(p ág . 1 6 0 ).
O número das páginas que demos sfto de Kenipis, Thomas a. The Imitation o f Christ, trail 
Betty I. Knoll. Londres: Collins, 1963. A sobreeapa dessa edição declara: "Depois da Hlhlln, 
este talvez seja o livro mais lido no mundo. Desde que foi escrito, no início tio século l\ 
milhares dc edições e traduções têm surgido”. Não é dc se admirar que encontremos a predo­
minância do dualismo na igreja moderna.
24 Monod, Jacques. Chance and Necessity: Na Essay on the Natural Philosophy o f Modern 
Biology, trad. Austrian, Wainhouse. Nova York: Random House, 1972, pág. 174.
25 Schaeffer, Escape from Reason, pág. 13. A argumentação de Schaeffer sobre a nuliitr/n 
medieval/método da graça (como também sua discussão posterior sobre a liberdade humii 
nística/tensão natural) está baseada na análise dc Herman Dooyeweerd. Veja Caps. 5 e 7 d»> 
Dooyeweerd. Roots o f Western Culture, um livro que, originalmente, apareceu em holaiulH 
como uma série de artigos de jornal, entre 1945 e 1948.
26 Zylstra, Bernard. “Modernity and the American Empire”, Internationa! Reformed Bulletin, 
nss 68/29, First-Second Quarter, 1971, págs. 5-6.
C a p í t u l o 8 : O p r o g r e s s o d a c o s m o v i s ã o s e c u l a r
1 Para uma argumentação mais útil sobre a secularização e a escravidão cultural da igrtM 
resultante disso, veja Guinness, Os. The Gravedigger File: Papers on the Subversion of tin1 
Modern Church. Downers Grove, 111.: InterVarsity Press, 1983.
2 M irandola, Giovanni Pico della. Oration on the Dignity o f Man, trad. Robert Caponijil'l, 
Chicago: Henry Regnery Co., 1965, págs. 7-8.
3 Apesar de muitos pensadores modernos adquirirem sua inspiração do livro Oration, de IMni, 
não está claro até que ponto o próprio Pico era motivado de modo consistente pelo espírito dn 
modernidade. O restante de Oration, por exemplo, tem uma orientação, caracteristicameiilo, 
medieval e mística. O propósito da liberdade humana é aspirar a Deus e assim obter descailHn 
e paz celestial. Veja Dresden, S. Humanism in the Renaissance, trad. Margaret King. NoVfl 
York: McGraw Hill, 1968, págs. 13-14. No entanto, Pico realmente proclamou um humanlK» 
mo variado que tem lido influência formativa na cosmovisão ocidental.
4 Dooyeweerd. Roots o f Western Culture, pág. 150; grifo de Dooyeweerd.
5 Uma boa fonte histórica é Glacken, Clarence J. Traces on the Rhodian Shore: Nature and 
Culture in Western Thought from Ancient Times to the End o f the Eighteenth Century. Berko« 
ley: Univ. of Calif. Press, 1976. Veja esp. o Cap. 5.
6 Bacon, Francis. Novum Orgcmum 2.52, em The New Organon and Related Writings, Ot'ĵ 
Anderson, Fulton H. Nova York: The Liberal Arts Press, 1960, pág. 267.
7 Passmore, John. Man’s Responsibility fo r Nature: Ecological Problems and Western Tradi­
tions. Londres: Gerald Duckworth, 1974, pág. 19. Para uma boa análise do domínio autôno­
mo do homem ocidental sobre a natureza, veja Cap. 1, “ Man as Despot”.
8 Bacon, Francis. “New Atlantis” em Ideal Commonwealths, org. Morely, Henry. Nova York! 
Colonial Press, 1901; ed. rev., pág. 129.
9 Bacon. Novum Organum 1.129, em New Organon and Related Writings, págs. 118-119.
10 Passmore. Man s Responsibility fo r Nature, pág. 19; grifo de Passmore.
11 h im portante nílo cxngernr o cübo do elenl'lflelm no secu lar de Bacon. M a n u e l, Frank E. c 
M i n i m i I'Vit/ic P., por exem p lo , cm moii Utopian Thought in the Western World. Cambridge: 
Belknap Press of I larvard I )niv, Press, 1979, destacam que sc alguém tira a utopia científica de 
Bacon dc sua estrutura moral e religiosa, prejudica seu trabalho (págs. 259-260). Portanto, eles 
admitem que é “Dilicil superestimar o papel central da ciência” e seu New Atlantis; eles des­
crevem sua utopia como uma sociedade de sacerdotes-cientistas e sua cosmovisão como ambi­
valente no aspecto da ciência-religião (págs. 254, 260). Observe também a seguinte passagem 
de um antigo trabalho dc Bacon, pouco conhecido ( The Masculine Birth o f Time), no qual ele 
se dirige a um discípulo imaginário: “Meu queridíssimo rapaz, minha intenção é unir você às 
próprias coisas em um matrimônio casto, santo e legal; e desta associação você garantirá uma 
prole além de todas as esperanças e orações dos casamentos comuns, a saber, uma abençoada 
raça de heróis e super-homens que sobrepujarão a impotência e a pobreza imensuráveis da 
raça humana, que causam mais destruição do que todos os monstros, gigantes ou déspotas, e te 
farão pacífico, feliz, próspero e seguro” (citado em Utopian Thought, pág. 260).
12 Descartes, René. Discourse on Method, Cap. 6, em Essential Works o f Descartes, trad. 
Lowell Bair, Nova York: Bantam, 1961, pág. 37.
13 Jones, Richard Foster. Ancients and Moderns: A Study o f the Rise o f the Scientific Movement 
in Seventeenth Century England. Nova York: Dover Publications, 1982, pág. ix. Os dois pró­
ximos parágrafos são devedores a esse estudo histórico, esp. p. ix-xi, 45-55, 233.
14 Ibid., págs. 50-51, 60, 124, 155, 185 ,2 3 3 -2 3 4 ,2 6 6 .
15 Ibid., pág. 234. Cowley continuou comparando Isaac Newton a Josué, que guiou o povo à 
Terra Prometida.
16 Ibid., págs. 185, 235; grifo nosso.
17 Ibid., pág. ix.
18 Passmore. Man s Responsibility fo r Nature, pág. 21.
19 Newton é um bom exemplo de alguém que combinou um forte compromisso tanto à expe­
rimentação quanto à explicação matemática. E é seu nome que normalmente é associado à 
“figura mecânica do mundo”. Contudo, temos focalizado o mecanismo de Descartes e não o 
de Newton por causa da prioridade histórica e influência filosófica de Descartes. Para uma 
análise de Newton, veja Bronowski, J. The Common Sense o f Science. Cambridge: Harvard 
Univ. Press, 1978, Caps. 2 e 3.
20 Passmore. Man s Responsibility’fo r Nature, pág. 22. Como, provavelmente, está claro a esta al­
tura, não temos tentado dar nem mesmo um resumo da história da revolução científica. Isso está 
muito longe do alcance deste livro. Ternos, simplesmente, destacado certos elementos da cosmo­
visão de Descartes e Bacon que têm contribuído significativamente para o surgimento da ciência 
moderna como também para o desenvolvimento do cientifcismo na cosmovisão moderna.
21 Veja, por exemplo, Schaeffer. Escape from Reason, págs. 30-32.
22 Veja Cap. 12 deste livro sobre a importante distinção entre estrutura e racionalidade (ou 
ordem e ordem lógica).
23 Hooykaas, R. Religion and the Rise o f Modern Science. Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 
1972, pág. 85.
24 Veja Cap. 2, “The Development of a Voluntarist Theology of Creation”, em Eugene M. Klaa- 
ren, Religious Origins o f Modern Science: B elief in Creation in Seventeenth-Century Thought. 
Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1977.
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1 G u in n e s s , ()s. Vhtf Dust o/Ut/citlt D ow ners (Jro v e , III,: InlerV nrslty P ress, 1 9 7 3 , p á f, I*»
2 K i Ik in , Je re m y (co m Ted I tow ard ), The /unerring ()rcier: Clod in the Age o f Scarcity, Nhvh 
Y ork: Ci. 1’. P u tn am ’s S o n s, 1 9 79 , pág. 27 .
3 G o u d z w a a r d , Bob. Capitalism and ProRresa, trad. .1. Van Nnis Zylstra. ( irand Rapids, MU li 
Eerdmans, 1979, págs. 57-59;

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