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TRANSFERÊNCIA DE CALOR AULA 6 Prof. Marcos Baroncini Proença 2 CONVERSA INICIAL Tratamos até o momento das transferências de calor por condução, por convecção e por radiação. Também tratamos de uma aplicação envolvendo a análise da troca térmica por condução e convecção juntas. No entanto, há também uma aplicação envolvendo as três formas de transferência de calor, que é de suma importância para a Engenharia de Produção. É a determinação da carga térmica no ambiente de trabalho, a qual resulta na análise do conforto térmico, um dos fatores que mais influenciam a produtividade. Figura 1 – Carga térmica Fonte: Shutterstock Trataremos então nesta aula da determinação da carga térmica em ambientes de trabalho, bem como passaremos uma noção de conforto térmico. Figura 2 – Carga térmica em domicílios Fonte: Shutterstock 3 TEMA 1 – NOÇÕES SOBRE CONFORTO TÉRMICO O conforto térmico é um conceito subjetivo, determinado pelas condições de temperatura e umidade que proporcionam bem-estar aos seres humanos. Essa noção pode ser estendida, em ambientas de produção industrial, para os equipamentos e as instalações. Porém, o foco da noção de conforto térmico em termos de produção industrial é a resultante de temperatura e umidade que levarão às melhores condições de produtividade por parte dos funcionários. Figura 3 – Conforto térmico Fonte: <http://w3.ualg.pt/~econcei/Human%20Thermal%20Comfort.htm> Em termos básicos, o conforto térmico trata da sensação de calor ou frio que sentimos. Essa sensação se deve a alguns fatores do ambiente de trabalho, como umidade relativa do ambiente, temperatura e movimento do ar, e temperatura superficial da pessoa. A nossa temperatura superficial é função direta de como perdemos ou ganhamos calor por condução, convecção (evaporação) e radiação. Essa troca de calor é função de fatores fisiológicos como idade, atividade sendo exercida e saúde da pessoa. Interfere nesse processo de troca térmica a vestimenta que está sendo usada, atuando como um isolamento térmico. 4 Figura 4 – Troca de calor pelo corpo humano Fonte: Shutterstock.com Embora cada um de nós tenha suas próprias percepções de conforto térmico, valores médios foram estabelecidos estatisticamente, sempre tendo como meta atingir satisfação de no mínimo 80% dos funcionários do local de trabalho. Normas técnicas foram estabelecidas em função desses valores médios. As principais normas são da American Society of Heating, Refrigerating and Air-Conditioning Engineers Standard 55 (ASHRAE) e a Associação Brasileira de Normas Técnicas NBR6401 (ABNT). Figura 5 – Gráfico de conforto térmico Fonte: ASHRAE Standard 55 A ASHRAE 55 apresenta graficamente uma região de conforto térmico em função da temperatura e da umidade do ambiente de trabalho. A ABNT NBR6401 estabelece em quadros as temperaturas e umidades recomendadas para verão e inverno. 5 Tabela 1 – Condições internas de conforto térmico para verão Fonte: NBR 6401 Tabela 2 – Condições internas de conforto térmico para inverno Fonte: NBR 6401 O conceito de conforto térmico bem como as determinações das vazões de ventilação e sistemas de refrigeração necessários para manter as condições de conforto térmico serão vistos com maior profundidade na disciplina Sistemas Térmicos e de Geração de Energia. É importante salientar que muitas vezes a melhor determinação da combinação temperatura e umidade deve ser auferida na instalação, pois, embora a instalação esteja dentro das normas, pode ser uma causa para 6 afastamentos de funcionários e problemas de produtividade por estar gerando desconforto térmico. Temperaturas entre 21°C e 24°C, para uma umidade máxima de 65%, são os parâmetros mais comumente usados em empresas e indústrias para manter os funcionários termicamente confortáveis. TEMA 2 – CARGA TÉRMICA TOTAL Carga térmica total é a quantidade de calor total que deve ser retirada do ambiente de trabalho para que se atinja o conforto térmico. Outra forma de analisar é como a carga térmica total do ambiente de trabalho deve ser anulada parcial ou totalmente, visando que se atinjam as condições de conforto térmico. Figura 6 – Carga térmica em um escritório Fonte: Shutterstock Assim, para que seja selecionado o melhor sistema de ventilação ou de condicionamento do ambiente de produção, primeiro deve ser determinada essa carga térmica total a que os funcionários estão sujeitos. A carga térmica total pode ser determinada pela seguinte expressão: qT = qc + qI + qIL + qE + qP + qInf + qV (1) Em que: qT = carga térmica total, ou quantidade de calor total (BTU/h ou W) 7 Cabe aí salientar que: 1 W = 3,412 BTU/h qC = calor por condução e convecção(W) qI= calor por insolação (W) qIL = calor por iluminação (W) qP = calor por pessoas (W) qE = calor por equipamentos (W) qInf = calor por infiltração (W) qV = calor por ventilação (W) Trataremos separadamente de cada uma dessas cargas na sequência. TEMA 3 – CARGA TÉRMICA POR CONDUÇÃO E CONVECÇÃO A carga térmica por condução e convecção analisa a quantidade de calor imposta a um ambiente de trabalho levando em consideração o coeficiente global de troca térmica. Para ambientes internos de trabalho, normalmente esse coeficiente global é obtido pela sua expressão para paredes planas. Caso haja tubulação passando pelo ambiente na qual circule vapor ou um fluido frio, deve também ser incorporada a expressão do coeficiente global para tubulações. Vídeo Assista ao vídeo <https://www.youtube.com/watch?v=jw_AdGX2yOA> para visualizar a carga térmica em unidades industriais. Assim, conforme visto no Tema 2 da Aula 4, a expressão que usaremos para determinar a carga térmica será: TUAq C = UA(T∞4 - T∞1) (2) Para paredes planas, conforme visto no Tema 2 da Aula 4, o coeficiente global será determinado por: (3) Com relação ao coeficiente de transferência de calor por convecção (h), embora já tenhamos visto como determiná-lo na Aula 3, tanto para convecção natural quanto para convecção forçada, poderemos adotar aqui uma tabela de variação em função da velocidade de circulação do ar, que nos permite determinar mais facilmente esse coeficiente, com uma margem aceitável de 8 precisão. Para valores intermediários das velocidades tabeladas, usamos interpolação para a obtenção dos coeficientes relativos a elas. Para valores maiores que o valor máximo da tabela, usamos extrapolação. Velocidade do ar (km/h) h(BTU/h.ft2) h(W/m2) 0 1,46 – 1,63 0,428 – 0,478 12 4 1,172 24 6 1,758 Os coeficientes de transferência de calor por condução são obtidos das tabelas do Anexo 4 da Aula 2. Com relação à insolação, devemos acrescentar um valor (∆t) à diferença de temperatura entre o meio interno e o meio externo do ambiente de trabalho (∆T), em virtude do telhado e das paredes. Esse acréscimo ocorre devido à função da cor e da posição do telhado e das paredes, na maior parte do dia, com relação ao sol. A tabela a seguir fornece esses valores de acréscimo da temperatura. Tipo de superfícieValor de acréscimo de temperatura (°C) Cor escura Cor intermediária Cor clara Telhado 25 17 8 Parede E e O 17 11 5,5 Parede N 8 5,5 3 TEMA 4 – CARGA TÉRMICA DA INSOLAÇÃO E CARGA TÉRMICA POR ILUMINAÇÃO A carga térmica da insolação é a quantidade de calor por insolação que penetra em um ambiente, resultante de inter-relação de três fatores: Energia refletida (qR) Energia absorvida (qA) Energia passante (qP) Energia refletida é a parte da insolação que o vidro não permite que passe através dele, sendo, portanto, refletida. Energia absorvida é a parte da insolação que o vidro absorve e que, por consequência, não atinge o ambiente. A energia passante é aquela que efetivamente atinge o ambiente, levando ao seu aquecimento. 9 A expressão para o cálculo da carga térmica da insolação é: qI = K.A (4) Em que K é o coeficiente de transmissão de calor solar através de vidros (BTU/h ft2 ou W/m2), que depende da posição relativa da janela com relação ao sol na maior parte do dia, sendo determinado para os meses do ano, e A sendo a área total ocupada pelas janelas. Há uma tabela com valores de insolação no Anexo 1. Como mencionado por Proença (2015), “Se houver algum tipo de proteção contra a radiação nas janelas, devemos multiplicar os resultados obtidos pelos seguintes fatores da tabela abaixo”. Tabela 4 – Fatores de redução da insolação por janelas, em função do tipo de proteção Fonte: Creder, 2004. A carga térmica da iluminação nada mais é que somatória da potência dissipada pelo conjunto de luminárias que compõem a iluminação artificial do ambiente de trabalho. Figura 7 – Definição de luz Portanto, essa carga térmica é calculada pela expressão: qIL = ∑ P (5) Em que: P = potência dissipada pela luminária (W) Tipo de proteção Fator Toldos ou persianas externos 0,15-0,20 Persianas internas ou películas refletoras 0,5-0,66 Cortinas internas brancas 0,25-0,61 10 A NBR 6401 apresenta a potência dissipada por metro quadrado de área coberta pelas luminárias, em função da quantidade de lux (relação entre o fluxo luminoso que incide na direção perpendicular a uma superfície e sua área) que proporciona. Para obter o valor da potência dissipada, deverá conhecer a necessidade de iluminação do local e o tipo de luminárias que será usado. O Anexo 2 apresenta essa tabela. TEMA 5 – CARGA TÉRMICA POR EQUIPAMENTOS E POR PESSOAS A carga térmica por equipamentos é obtida pela somatória do calor dissipado por computadores, motores e ventiladores: qE = qCOMP + qMOT +qVENT (6) No caso dos computadores, o calor dissipado é a somatória do calor dissipado em cada computador: (7) Tomando como base um PC de configuração padrão, podemos dizer que ele consome uma potência aproximada de 460W. Considerando que 15% dessa potência é dissipada na forma de calor, podemos então estimar que cada computador dissipa na forma de calor aproximadamente 69W. 11 Figura 8 – Placa motor elétrico Para motores, o calor dissipado é obtido pela expressão: .2,490 P η P =qMOT (7) Sendo q o calor dissipado em BTU/h; P a potência do motor em HP e η o rendimento do motor. Tanto a potência quanto o rendimento do motor são obtidos das placas presentes nas carcaças deles. No caso de a potência do motor ser usada em CV, o calor dissipado será em W e a expressão será: .733 P η P =qMOT (8) A carga térmica dissipada por ventiladores é obtida pelas expressões: .2,490 η P =qVENT (9) .733 η P =qVENT (10) 12 Usamos aqui as mesmas observações que foram feitas para os motores. Figura 9 – Placa de um ventilador Quando não constar na placa o rendimento quer seja do motor quer seja do ventilador, a tabela a seguir pode ser usada com um bom grau de precisão. Tabela 5 – Rendimento em função da potência do motor Potência (HP) Rendimento Aproximado (%) Até ¼ 60 ½ a 1 70 1,5 a 5 80 7,5 a 20 85 Maior que 20 88 Fonte: Creder, 2004. A carga térmica por pessoas é obtida pela soma das cargas térmicas devidas a cada indivíduo, em função principalmente da atividade exercida. A NBR 6401 apresenta a carga térmica liberada por pessoas em kcal/h. Para transformar kcal/h para W usar a relação: 1 kcal/h = 1,163W O Anexo 3 apresenta essa tabela. 13 TEMA 6 – CARGA TÉRMICA POR INFILTRAÇÃO E POR VENTILAÇÃO A carga térmica por infiltração de ar e por ventilação de ar são determinadas usando a mesma metodologia. Cabe, então, definir a diferença entre a infiltração e a ventilação e como obter os dados para calcular a carga térmica devida a cada uma delas. Infiltração de ar se refere à vazão de ar que entra no ambiente de trabalho por frestas em janelas e portas ou por portas abertas. Ventilação, por sua vez, refere-se à entrada de ar forçada necessária às pessoas dentro de um ambiente e que é medida em metros cúbicos por pessoa, por exemplo. Tabelas com valores usados para vazão de infiltração e ventilação estão presentes na NBR6401. O Anexo 4 apresenta essas tabelas. A carga térmica devido tanto à infiltração quanto à ventilação é dada pela somatória da carga fornecida pelo calor sensível com a carga fornecida pelo calor latente. A expressão para determinação do calor específico é: qS = Q.0,29.(Te-Ti) Em que Q é a vazão de ar em m3/h que por infiltração é fornecida para janelas e portas, sendo para ventilação fornecida pela quantidade de ar em m3 necessária em função do tipo de ambiente e das pessoas; Te é a temperatura do ambiente externo e Ti é a temperatura de conforto térmico para o ambiente de trabalho. A expressão para determinação do calor latente é: qL = 583.C Sendo C a capacidade calorífica (J/molK) dada por: C = (UE2-UE1). ρ. Q Em que UE2 é a umidade específica do ar interno em kg/kg; UE1 é a umidade do ar de entrada em kg/kg, e ρ é a massa específica do ar em kg/m3. A vazão Q é obtida pelas tabelas fornecidas no Anexo 4. Os valores de massa específica ρ são fornecidos por tabelas do Anexo 4 da Aula 2. Os valores de umidade específica são obtidos por cartas psicométricas. O Anexo 5 apresenta cartas psicométricas e como levantar dados delas. 14 NA PRÁTICA 1. Determinar a carga térmica por insolação em um ambiente de trabalho, no período de janeiro a março, sabendo que possui 50 m2 de área de janelas. Determinar com e sem película de insulfilm, sabendo que o ambiente ao longo do dia varia de NE para N para NO, com relação ao Sol. Resolução: Sabemos que a expressão é qI = K.A K é determinado pela média aritmética dos valores encontrados no Anexo 1: W/m2 Assim: Como A = 50 m2 Teremos: qI = K.A qI = 312,5.50 = 15625 W = 15,625 kW Cálculo com insulfilm: Considerando insulfilm como superfície refletora, temos o fator entre 0,50 e 0,66 para multiplicar com o resultado: qI = 15625.0,58 = 9062,5 = 9,062kW Obs.: Repare como o insulfilm reduziu o calor por irradiação. 15 2. Sabendo que um escritório possui iluminação artificial com lâmpadas fluorescentes com 20 mesas, tendo em cada mesa 1 computador e um funcionário e tendo 4 ventiladores de teto de ½ HP, determinar a carga térmica devida à iluminação, ao equipamento e às pessoas. Resolução: Sabemos que a carga térmica pela iluminação é dada por: qIL= ∑ P Do Anexo 2: Da tabela, vemos que cada mesa necessitará de 1000 lux, com potência dissipada de 40W/m2. Considerando 1,5 m2 por mesa e sabendo que temos 20 mesas, teremos então: qIL = ∑ P = 40 + 40 + 40 + 40... + 40 = 20.40 = 800W O calor dissipado pelos computadores é dado por: = 69 + 69 +...+ 69 = 20.69 = 1380W O calor dissipado pelas pessoas é fornecido no Anexo 3: qP = 20.113 = 2260 kcal/h = 2260.1,163 = 2628,4W A carga térmica dissipada pelos ventiladores é dada por: .733 η P =qVENT W=qVENT 6,523.733 7,0 5,0 Como são 4 ventiladores: qVENT = 4 . 523,6 = 2094,4W O calor total será então: qT = 800 + 1380 + 2628,4 + 2094,4 = 6902,8 W = 6,903kW 3. Determinar a quantidade de calor devida à infiltração e à ventilação para um ambiente de trabalho em um galpão com 50 funcionários e uma porta de 180 16 x 180 aberta constantemente e com um sistema de ventilação industrial. Nesse galpão, deseja-se manter uma temperatura de 24°C para uma umidade de 50% e no ambiente externo tem-se uma temperatura média de 30°C e uma umidade média de 30%. Resolução: Primeiro temos as expressões de calor sensível e calor latente para infiltração e para ventilação. qS = Q.0,29.(Te-Ti) qL = 583.C Em que: C = (UE2-UE1). ρ. Q Do Anexo 4, teremos os valores de vazão de infiltração e de ventilação: Assim, a vazão de infiltração será de 1350m3/h e a de ventilação será Qv = 50.13 = 650 m3/h Do Anexo 5, teremos UE1 e UE2 que serão usados para infiltração e ventilação. Da carta psicométrica UE2 = 0,011kg/kg de ar e UE1 = 0,008kg/kg de ar. ρ será obtido do Anexo 4 da Aula 2, para a temperatura média (T = 27 + 273 = 300K) : ρ = 1,1614 kg/m3 Substituindo nas expressões, teremos: Ventilação: qS = 650.0,29.(30-24) = 1131 W 17 C = (0,011-0,008). 1,1614. 650 = 2,265 J/molK qL = 583.2,265 = 1320,5 W qTV = 1131+1320,5 = 2451,5W Infiltração: qS = 1350.0,29.(30-24) = 2349 W C = (0,011-0,008). 1,1614. 1350 = 4,704 J/molK qL = 583.4,704 = 2742,4 W qTI = 2349+2742,4 = 5091,4W Assim, o calor total por ventilação e infiltração será: qT = qTV + qTI = 8352,9W = 8,35 kW SÍNTESE Após esta aula, você adquiriu conhecimentos gerais sobre transferência de calor envolvendo simultaneamente condução, convecção e radiação. Também viu aplicações de expressões matemáticas para determinar a carga térmica, bem como noção de conforto térmico. Expanda seus conhecimentos lendo os anexos das rotas de aprendizagem, assim como pesquisando sobre o assunto em outras leituras. REFERÊNCIAS BIRD, R. B.; STEWART, W. E.; LIGHTFOOT, E. N. Fenômenos de transporte. 2. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2004. CREDER, H. Instalações de ar-condicionado. Rio de Janeiro: LTC, 2004. INCROPERA, F. P. et al. Fundamentos da transferência de calor e massa. 6. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2008. MORAN, M. J.; SHAPIRO, H. N. Princípios da termodinâmica para engenharia. 6. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2009. PROENÇA, M. B. Cálculo de carga térmica. Disponível em: <http://documents.tips/documents/calculo-de-carga-termica- 55cac04cabb36.html>. Acesso em: 22 dez. 2016. SISSON, L. E.; PITTS, D. R. Fenômenos de transporte. Rio de Janeiro: Guanabara Dois, 1996.