Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

• ■
T I-: .
?■ • i"! í'-!
< '
M- ^àMFèlditíàii de Mirairí
y ir
árciq Lúcio de Mirandá
,Vv
(íflsinari^ » ito.*; ni<ic4i>iianínd« mtít fum
ináciú!^ A CitaviMi' dr mniiH*-» CMmtrüU
,-■(' :
\ - '■
y-, .
ilmt»» i»» uut
iVlf -I
«ssua» <J«f'
(IUM.K4 iH^ia 110^ «tHO»rrr"> >Stftlia
/■
r=^:l:
■■■-
WS*«â, parti iíiso^
inlifnpsiHiaíViip
: ;f •^;
01 (r)it frioti'Nk fL
[:
ft ■ > - <4
/ I
4/?:t íí-í • ^í^<SXrtU.»l»í'í
Hl
L^t-
.. :
í:. r
V.. .•
ii. , : '
• •
f- -a-íf,. -
^1,
flS-ÔStlS-DM-M
> 'Wi
-: =-f ..í-t
^-íi o88585"6150A8 jmgu
i c#€5cer
m
mm
Copyright © J983 de
Clara Feldman de Miranda
Márcio Lücío de Miranda .
Capa:
L. A. Fontes
Ilustrações:
L. A. Fontes
Regina Coeli Rennó
Editoração: bits*
Dados lDternack>naiâ de Catalogação oa Publicação (CIP) (Câmara
Brasileira do Livrot SP, Brasil)
Miranda, Clara Feldman de
Construindo a relação de ajuda / Clara Feldman de Miranda, Márcio
Lúcio de Miranda. - 10. ed. - Belo Horizonte: Crescer, 1996.
Complementado por Guia do Treinador.
I. Relação de ajuda. I. Miranda, Márcio Lúcio de.
II. Título.
ISBN 85-85615-04-4
93-1890 CDD-158.2
índices para catálogo sistemático:
1. Relação de ajuda: Psicologia aplicada 158.2
^1^^ ed/tora
^ crescer
Rua Brasópolis 73 - Floresu - CEP: 30150-170
Fone: (031) 224,9321 Fax; (031) 224.2776
Belo Horizonte - Minas Gerais - Brasil
mCdrÇío^
com <^uem o/oo mináa ma/sprofunda relação
de afuda;
a um s6 iempOy
o afudador mais efeiivo^
o ajudado mais ierno.
5? G/araj
<jue me ajudou
aperder o medo deperder^
condiçãofundameniafpara ̂anÁar.
1® .9«mfií5trp rtft 7nifl
Agradecimentos
A Wolber de Alvarenga -
terapeuta, mestre, amigo.
A Bernard G. Berenson e Robert R. Carkhuff -
mestres.
Aos nossos alunos, clientes e treinandos -
ajudados que foram, tantas vezes, nossos melhores
ajudadores.
Neste livro, vamos falar de como podem ser
construídas as relações entre as pessoas, especial
mente aquelas relações em que uma pessoa tem a
intenção de ajudar a outra.
Mas, antes de mais nada, vamos construir uma
relação com você, leitor. Nossa intenção é ajudá-
lo, seja de que forma for. Podemos ser bem suce
didos nessa tarefa ou não.
Antes que você comece a ler as páginas se
guintes, gostaríamos de fazer uma observação a res
peito de tudo o que você vai encontrar neste livro.
Os aspectos que vamos abordar são fruto de
nossa experiência na vida pessoal, no consultório,
nas salas de aula, no trabalho com grupos. Dessa
experiência nasceu a crença de que esses aspectos
são importantes nas relações humanas, em geral, e
nas relações de ajuda, em particular Isso não signi
fica, no entanto, que as crenças devam ser tomadas
como regras. Aliás, uma de nossas crenças é de
que as regras nem sempre funcionam.
Nossa intenção é apenas compartilhar com
você algumas coisas em que acreditamos. Algumas
delas podem servir a você, outras não. É a esse pro
cesso de discriminação e seleção que nos submete
mos cada vez que lemos e escutamos outras pessoas
falando de suas crenças. Absorvemos das experiên
cias alheias e de nossa própria só aquilo que se mos
trou efetivo e, ao mesmo tempo, condizente com
nosso sistema de valores, estilo de vida, jeito de
ser. A partir disso, construímos nosso estilo de tra
balho.
1® SftmpRtrp rtp PDIft
Este é nosso convite a você - pergunte-se, a
cada linha:
"O que isso tem a ver comigo?" Absorva o
que encontrar de bom nestas páginas, jogue fora o
que não o for e construa seu próprio estilo.
Belo Horizonte, março de 1983.
/
PREFACIO 11
1. COMPREENDENDO A RELAÇÃO
DE AJUDA 19
De que são feitas as pessoas
significativas? 21
Como tudo começou 25
Quem precisa de ajuda? 36
Quem pode ajudar? 40
Alguns princípios da relação
interpessoal.. 45
2. SINTONIZANDO
(abrindo as portas da percepção) 49
Preparando o ambiente 52
Acolhendo 63
Atendendo 73
Observando 87
Escutando 101
3» RESPONDENDO
(abrindo as portas da comunicação). 121
Respondendo ao conteúdo 125
Respondendo ao sentimento 139
Respondendo ao sentimento e
conteúdo 163
Respondendo com imagens 175
Respondendo ao comportamento 185
Respondendo às perguntas 199
Respondendo com os próprios
sentimentos 213
1® ."ífimpRtrí» ?nift
4. PERSONALIZANDO
(abrindo as portas da compreensão). 223
Transformando a vítima em agente 227
As fases do personalizar 231
5. ORIENTANDO
(abrindo as portas da realização) 241
Orientar: habilidade opcional 243
Orientando formalmente 245
O significado da mudança 248
Existe fim para o processo de ajuda?.... 256
PREFÁCIO
MEMÓRIAS DE AMHERST
fíow long it s' been since yesíerday
And what abouí iomorrow?
And what about our dreams
And ali the memories we shared?
(De um disco do Bob,
todo dia tocado no "Mill")
Em 1982, pedi a Adélia Prado um prefacio
para meu primeiro livro. Ela botou a mão na cabeça,
jurou que não dava conta. Depois, despachada, fa
lou: "Deixa o livro nascer pelado, que nem a gente
mesmo, viver a\áda dele". E explicou: "Se for bom,
não precisa; se for ruim, nãó adianta". Sem prefácio,
"Casos de Minas" está na quinta edição.
Agora, revendo este belíssimo Construindo
a Relação de Ajuda, em vésperas da 9® edição, con
cordo com Adélia: prefácios costumam não ser ne
cessários. Mas Clara me pede um, falando de nossa
experiência em Amherst, nos mágicos domínios de
Carichuff, que nós chamávamos de Bob.
Ele estivera aqui, a convite do CEDEPE, que
já operava com o Modelo de Ajuda. Depois, o grupo
fez uma pesquisa para a Secretaria da Educação,
onde eu era Superintendente Educacional. Na apre
sentação do relatório, acabei coordenando a reu-
11
1» SftmAstrA rifi ?nifi
nião. E me identifiquei tanto com o trabalho e a
equipe que, ao final, Letícia me ofereceu uma bolsa
para o curso de Tecnologias Educacionais, nos Esta
dos Unidos, cerca de um mês depois.
Superei inúmeras dificuldades, inclusive uma
mudança de Secretário e, meio aos trambolhões,
cheguei a Anaherst três dias atrasado. Debaixo de
uma chuva fininha, num fim de tarde de julho (o
ano era 78), me vi diante da casa onde viveria uma
de minhas experiências mais transformadoras. En
volta em hera, e plantada no centro de extenso gra
mado verde, ela me pareceu sólida e aconchegante.
Enquanto admirava aquela construção bicentenária,
com dois andares e sótão, pensei em duas coisas:
no privilégio de estar ali, junto a um novo portal da
vida, e num antigo provérbio da minha terra que
diz; "em festa de nhambu, jacu não entra".
Era quase noite e todos esperavam pelo jantar.
Recebido calorosamente, entrei logo na confraria.
E o jacu foi aprendendo pios, tomando jeitos de
nhambu. Dividindo tarefas, compartilhando pão e
sonho, viramos companheiros, tomamo-nos irmãos.
No "Mill", a gente passava o dia, das 9 ás 5.
Com sua roda d'água, o lago transparente, o riacho
marulhando sem cessar, aquela paz bucólica de síl-
fides e duendes, o lugar era propício a impensáveis
viagens. E a casa de madeira, cheirando a alcatrão,
navegava como encantado barco em mágica jor
nada. Em cada porto, uma lição: atender, responder,
personalizar, orientar. Em cada escala, um nível:
físico, emocionai, intelectual, espiritual. E fomos
aprendendo a ver o mundo com os olhos do outro,
a nos enfiar na pele do outro, a sentir cheiros, cores,
sons e gostos desconhecidos; a saltar rumo ao im
ponderável.
Um dia, logo na primeira semana, coube-me
atender o Geraldinho. Inseguro nos conceitos e na
técnica, soltei a intuição, exacerbei a atenção, bebi
cada pequeno gesto, senti o mais leve tremor na voz,
adivinhei-lhe pensamento e coração. Quando, na ter
ceira tentativa, dei a esperada resposta intercambiá-
vel, o Márcio pulou na minha frente e perguntou;
- Onde foi que você aprendeu isso?
- Acabei de aprender - respondi, ainda
ofegante.
Para minha surpresa, ele pediu:
- Então me atende.
Era meu batismo de fogo, Ou de suor, porque
a camisa podia torcer, de tão molhada.
Márcio e Clara consolidavam seu bonito rela
cionamento numa casa na Amold Road, entre lebres,
esquilos e framboesas, enquanto iam germinando
fiitura missão. A maior parte do grupo ficava na
rua 14, em permanentealerta, partilha e comunhão.
Depois do dia no "Mill", e antes dos trabalhos da
noite, a gente relaxava conversando, contando
casos, cantando. Bob aparecia sempre, atento e ins-
tigante. Violão em punho, cantava "Blowing in the
wind". Ou "Five hundred miles". João na gaita, Lívia
ao violão, retribuíam com "Asa Branca" - nós, mor
rendo de saudade de um sertão atávico, Bob ouvin
do com encantamento.
12
1® .^pmesfrp rte ?niR
13
E Bob Dylan, na voz de CarkhuíF, perguntava
quantas estradas um homem deve percorrer antes
de ser chamado homem. Ou quantos mares precisa
visitar antes de dormir na areia. Ou quantos anos
algumas pessoas existem antes que possam ser
livres... E a todas as perguntas ~ estas e tantas outras
- ele respondia, desvelando segredo: "The answer,
my friend, is blowing in the wind". Ou, como disse
Paulinho da Viola, "as coisas estão no mundo, a
gente só tem que aprender". E ali, naquele exube
rante cenário da Nova Inglaterra, a muito mais de
quinhentas milhas de casa, despojados de papéis
ou expectativas, livres, soltos e abertos, a gente
prestava atenção, punha sentido, descobria terri
tórios virgens, expandia fronteiras, aprendia, ensi
nava, repartia. Vivia, cada um, seu gratuito e incom-
parável latifúndio de transformação e descoberta.
Depois do modelo de relacionamento de aju
da, vieram as tecnologias educacionais, cada um
dando sua aula prática. E Caroline, por absoluta
falta de molejo, nos confirmou que samba não se
aprende no colégio; Isis só andou de bicicleta depois
de descobrirmos a obviedade fundamental de manter
os pedais em movimento; Woiber ensinou-nos a
relaxar, ouvir a música do corpo, traduzí-la em poe
sia. E foi emocionante ver Sally, descalça à beira
do riacho, quase morrendo de alegria ao terminar o
primeiro poema de sua vida. Lívia, que conversava
com a natureza e tinha paixão e garra para ensinar,
percebeu a importância de aperfeiçoar os processos
pedagógicos. E o fez com tal competência que aca
bou, na volta, formulando um novo modelo de trei
namento. Ah, e Ailson, que espantava os nativos
com seu Inglês peculiar, que pedia desculpas ás
máquinas de trocar dinheiro, acabou descobrindo
um método de coletar preços que faria inveja nesses
tempos de pecliinchas reais.
Nas "rodas de casos", o que a Clara gostava
era o do fazendeiro que foi daqui para uma feira de
gado nos Estados Unidos e, lá, num aviãozinho
alugado, enfrentou um tempo horroroso. E quando
o piloto avisou que ia pousar no meio da maior
tempestade, ele deu de ombros e falou, num Inglês
absurdo: "If you want to land, land. But, if it give
cake, I take my body out". O Márcio pedia a história
do roceiro que, desgostoso da vida, bebeu veneno.
Chamado às pressas, o compadre encontrou o de
funto já esticado num catre, a viúva do lado, muda
de espanto e susto. O diálogo, seco e direto, foi
assim:
- Estricnina, comadre?
-Formicida tatu...
- Bão, também!
Ah, mas teve a missa, quer dizer, as missas.
Dos quatro padres do grupo, três moravam conos
co: Marcos, Castelo e Chabassus. O velho Cha-
bassus, sábio e discreto, celebrava cedinho, enquan
to dormíamos, acolitado pela Glorinha, Lívia ou
Letícia, sempre madrugadeiras. Num domingo em
que muitos tinham viajado, pedimos ao Castelo uma
missa. E foi tão tocante que, no domingo seguinte,
casa cheia, todos quisemos outra. E o Castelo, que
14 15
1° Rpmpstrft rift
discutira com Bob sobre a existência de Deus,
começou assim; "Hoje, teremos um encontro com
o Absoluto". E celebrou o que provavelmente tenha
sido a missa mais impressionante de nossas vidas.
Porque, de repente, a mesa em que nos reuníamos
para comer, trabalhar e conviver virava altar. Os
objetos do cotidiano compunham o cenário do culto
e nós nos irmanávamos no clima de transcendência
subitamente instalado em nossos corações. E, de
espirito aberto, fizemos as entregas mais sinceras.
Por tudo demos graças. Revimos amorosamente
nossos pontos fracos, avaliamos nossos talentos,
vivenciamos o amor e a esperança. Libertos no
perdão, pudemos comungar com a fi-aterna confian
ça dos primeiros cristãos. Jamais me esquecerei do
João, barba cerrada, ainda negra, olhos vermelhos
de tanto chorar, me abraçando e dizendo; "Eta missa
braba, hein, compadre?"
Em Amherst, viramos poetas, com obra regis
trada pela Leticia num caderno de capa preta. Um
postal comprado na cidade ensinava que "yesterday
is but a memory, tomorrow still a promise... but
today is ours, to hold and live". Geraldinho, habi
tualmente reservado, segredou-nos que "à noite
todos os gatos são pardos, mas todas as luzes são
claras, todos os gritos são roucos, mas todo sus
surro é canto. Todos os heróis são lerdos, mas toda
coragem luta, todo barulho é medo, mas todo
silêncio acolhe..." No bar do Galeão, na ida ainda,
João Timponi comparava sua poesia a um parto:
"E sofrida, espremida, suada. Mas meu amor é peito
16
farto, évida, corpo, poeira, estrada..." Noutra mesa
de bar, acima do equador, AÍIson escrevia: "Os olhos
cheios, a alma plena, os copos vazios... A cidade é
linda, o bar é nosso, a mesa é a vida".
Eu sempre me considerei um privilegiado com
a experiência de Amherst, registrada, aliás, em dois
sonhos inesquecíveis. O primeiro veio depois de
uma noite mal dormida, em que ficara estudando
até alta madrugada. À tarde, voltei do "Mill" com
muitas tarefas mas resolvi tomar um bom banho e
descansar. Despertado no melhor do sono, resisti à
tentação de me levantar. Dormi de novo, como se
cumprisse cuidadoso ritual com o corpo, coisa que
jamais fizera - pelo menos com tanta consciência.
Aí veio o sonho - sem história, sem enredo, um
sonho de pura sensação. Uma sensação prazerosa
como jamais pudera imaginar: eu flutuava, leve e
gostosamente, num maravilhoso e desconhecido
nirvana, E de um recanto oculto do meu cérebro
veio a única mensagem racionalmente compreensí
vel: "este sonho é um agradecimento do seu corpo
pelo cuidado que você teve com ele".
O segundo sonho foi na volta, em Washington.
Acordei de madrugada com a sensação de uma
corrente elétrica passando pela cabeça, onde fer
vilhavam, impressionantemente nítidas, as seqüên
cias de um imenso e raro filme. Ansioso para pre
servar cada imagem, cada personagem, fui re
gistrando, resumidamente, cena por cena num bloco
de lavanderia. O tempo todo Bob e os companheiros
de Amherst, Leonor adiante, iam sinalizando a
17
1® SftmPRtrft Hf» ?nifi
trajetória pela qual eu repassaria, simbolicamente,
a minha vida inteira. A vivência era tão forte que
eu mal conseguia registrar uns poucos itens de cada
vez. Anotando esquematicamente, gastei sete pági
nas e mais de duas horas. Quando, exausto, final
mente terminei, o sol nascia. Mais clara que a manhã
em Washington foi a certeza de que, com aquele
sonho, iniciava-se um novo ciclo na minha exis
tência. Ao ler, depois, minhas anotações, Leticia
garantiu: "Você teve foi um terremoto". Meu ana
lista afirmou tratar-se de um autêntico sonho de
cura, embora a alta ainda levasse algum tempo.
Hoje, dezesseis anos depois, fica a certeza
de termos vivido uma rica experiência humana,
impactante e transformadora - tanto pessoal quanto
profissionalmente. Passamos por intensos conflitos,
num momento de incomum riqueza emocional, que
propiciou o desabrochar de insuspeitadás possibili
dades em todos nós. Nas palavras de Leticia, "cada
um viu o melhor caminho, explorou, compreendeu
e foi em frente". O Wolber, por exemplo, andou
tanto que nem quer mais falai; de Amherst...
Belo Horizonte, setembro de 1994
1
COMPREENDENDO
A RELAÇÃO DE AJUDA
Olavo Romano
18
19
1® .SftmfiRtrft rift ?nift
que sdo Jeitos os pessoas
signijicativos?
Pare por um momento e empreenda uma
busca no seu arquivo pessoal - esse amontoado de
vivências, marcantes o suficiente para terem sido
registradas ao longo de sua vida. Se você se perguntar:
"Qual foi a pessoa mais significativa em minha
vida? Quem foi aquela pessoa que me ajudou em
momentos de crise ou com quem mantive uma
convivência tão construtiva a ponto de jamais ter-
me esquecido dela?
Um vizinho?
Um tio?Um professor?
Um médico?
Meu pai? Minha mãe?
Meu parceiro?
Aquele Jornaleiro da esquina que me viu crescer?
Ou... qualquer outra pessoa?"
É provável que sua resposta seja semelhante
às de muitas outras pessoas a quem foi feita essa
mesma pergunta: clientes; alunos de Psicologia,
21
1® .^pmpstrp rip ?niR
Odontologia, Medicina; enfermeiras; professores;
médicos e muitos outros, no decorrer de processos
de terapia, em cursos regulares na Universidade ou
encontros esporádicos para treinamentos ou pa
lestras.
Não importa quem foi essa pessoa signifi
cativa.
O que importa é saber o que a tomou tão
marcante em sua vida. E é esse quê o ponto comum
a todas as respostas: ela se tornou importante, não
pela aparência física, sexo, idade, atividade pro
fissional, conhecimentos teóricos ou grau de paren
tesco; sua importância reside, certamente, em deter
minadas características pessoais ou "traços de per
sonalidade" que deram direção ao relacionamento
que ela manteve com você.
Talvez você a descrevesse como uma pessoa
humana e calorosa; como uma pessoa acolhedora,
aceitativa, estimulante; ou, quem sabe, como
alguém que sabia escutar miííto bem, compreender
muito bem; alguém que era capaz de perceber sua
aflição e sintonizar com você sem que uma única
palavra fosse dita; e, até mesmo, como alguém cujos
conselhos sempre funcionavam.
Enfim, certamente você escolheu como a
pessoa significativa em sua vida alguém que possuía,
em alto grau, o que chamamos de habilidades
interpessoais - como o próprio termo indica, habili
dades entre pessoas, aquelas habilidades que nos
permitem um relacionamento integral e construtivo
com o outro.
E agora talvez seja a sua vez de ser essa
pessoa significativa para alguém - um vizinho, um
sobrinho, um aluno, um cliente, um filho, o parceiro
- ou a próxima pessoa aflita que você encontrar.
Qualquer pessoa que precise de você ou que busque
sua ajuda, de maneira explícita ou não, e para quem
você esteja disponível.
Se este é o seu caso, então você precisa de
certas habilidades para ajudar. É claro, muitas dessas
habilidades já fazem parte de você, integradas à sua
pessoa ao longo de sua vida e aprendidas, quem sabe,
com aquela pessoa significativa de quem você se
lembrou. Talvez até mesmo sem perceber, você tenha
passado a fazer com os outros o que fizeram com
você. Ao avaliar suas próprias habilidades interpes
soais, você pode se perceber como uma pessoa hu
mana, calorosa, acolhedora, aceitativa, estimulante.
Ainda assim, você pode ser muito mais do
que isso. Você pode não só desenvolver todas as
habilidades que já tem, como também adquirir novas
e incorporá-las à sua pessoa.
Esta é a proposta básica do livro - ajudar você
a:
- identificar habilidades interpessoais presentes em
seu relacionamento com as pessoas;
- desenvolver ou reforçar essas habilidades;
- adquirir novas habilidades interpessoais.
Acima de tudo, você pode tornar-se atento
para as relações de causa e efeito que estabelece
22
23
1® SfimpRlm rifi 901 fi
com o mundo a seu redor. Você pode, a cada
momento, perguntar-se:
- Que efeitos produzem em mim as pessoas com
quem convivo?
- Que efeitos produzo nas pessoas com quem
convivo?
Em outras palavras, você pode aprender a
detectar, em você mesmo e nos outros, aquelas
habilidades que "puxam para cima" ao invés de
"puxarem para baixo"; aquelas habilidades que,
construindo ao invés de destruir, nos ajudam a viver
melhor neste mundo em crise e a encontrar um
sentido maior para a própria vida.
Como turfo começou
A abordagem mais sistemática às habilidades
interpessoais foi desenvolvida por Robert R.
CarkhufF e Bernard G. Berenson através de seu
Modelo de Ajuda, fonte principal do nosso trabalho,
e cuja história passamos a resumir.
O QUE TORNA AS TERAPIAS REALMENTE
EFETIVAS?
Felizmente para a ciência, muitas vezes são
os próprios profissionais de uma determinada área
que resolvem questionar e investigar melhor seu
trabalho, sem medo das descobertas que possam
vir a fazer.
Assim foi com a Psicoterapia, que viu seu
campo de trabalho vasculhado e questionado nas
últimas décadas, a partir de pesquisas feitas pelos
próprios psicoterapeutas.
Um dos estudos mais importantes nessa área
foi realizado por Carl Rogers, de 1962 a 1967: clien
tes de tcrapeutas trabalhando com abordagens
24 25
1® .^pmp.çtrp rtp ?niR
teóricas diferentes tiveram seu funcionamento
avaliado de acordo com determinados critérios -
antes, durante e depois de se submeterem ao pro
cesso psicoterápico. Durante a pesquisa, foram gra
vadas horas e horas de sessões de cada cliente. Ao
final da pesquisa, segundo novas avaliações de seu
fimcionamento, esses clientes foram divididos em
dois grupos: aqueles que tinham "melhorado" e
aqueles que tinham "piorado" significativamente em
relação ao início do processo psicoterápico.
Este foi o primeiro achado importante:
Em muHos casos, a Psicoterapia tem efeitos
destrutivos sobre os clientes.
Restava saber quais eram os elementos co
muns a esse grupo e quais eram os elementos co
muns ao grupo de clientes cujos resultados foram
considerados positivos.
Surpreendentemente, esses elementos, deter
minados a partir das gravações das sessões psicote-
rápicas, não estavam ligados à abordagem teórica
ou às técnicas usadas pelos terapeutas. Assim é que,
no grupo dos que "melhoraram", havia clientes pro
venientes de terapias de abordagens diferentes, o
mesmo acontecendo no grupo dos que "pioraram"
Este era, então, um segundo achado:
O crescimento do cliente não é função da
abordagem teórica ou das técnicas usadas pelo
terapeuta.
E o que se encontrou de comum, então, já
que não era a linha teórica de trabalho do terapeuta
que fazia a diferença?
O que se encontrou foram tão somente algumas
características individuais dos terapeutas no seu rela
cionamento com o cliente, algo a que se poderia cha
mar de posturas ou atitudes terapêuticas, indepen
dentemente da dehorninaçâo teórica que o terapeuta
usava. Tínhamos, a partir disso, um terceiro achado:
O crescimento do cliente é função de
determinadas atitudes assumidas pelo terapeiHa
durante o processo psicoterápico,
BUSCANDO AS DIMENSÕES DO TERA
PEUTA
As posturas terapêuticas foram classificadas
em seis dimensões básicas - aquelas atitudes cons
trutivas assumidas pelo terapeuta na sua relação
com o cliente. As três primeiras dimensões foram
identificadas por Rogers (1967), enquanto as três
últimas foram identificadas por Carkhuff (1969):
1. Empfltia: capacidade de se colocar no lugar do
outro, de modo a sentir o que se sentiria caso se
estivesse em seu lugar.
2. Aceitação incondicional ou respeito: capa
cidade de acolher o outro integralmente, sem que
lhe sejam colocadas quaisquer condições e sem
julgá-lo pelo que sente, pensa, fala ou faz.
3. Coerência: capacidade de ser real, de se mostrar
ao outro de maneira autêntica e genuína, expres
sando, através de palavras e atos, seus verdadei
ros sentimentos.
26 27
1® .9pmftRtr« rip POIS
4. Confrontação: capacidade de perceber e comu
nicar ao outro certas discrepânclas ou incoe
rências em seu comportamento.
5. Imediaticidade; capacidade de trabalhar a pró
pria relação terapeuta-cliente, abordando os sen
timentos imediatos que o cliente experimenta
pelo terapeuta e vice-versa.
6. Concreticidade: capacidade de decodificar a
experiência do outro em elementos específicos,
objetivos e concretos.
Além de terem sido categorizadas as dimen
sões, determinou-se também a importância de dois
outros aspectos ligados a essas dimensões:
- o grau ou nível em que elas eram apresentadas
pelo terapeuta, demonstrando-se que quanto mais
alto era esse nível, maior o crescimento por parte
do cliente;
- o momento em que eram introduzidas na relação
terapêutica: as três primeiras (empatia, aceitação
e coerência) caracterizando uma fase inicial do
processo, e as outras três aparecendo em fases
mais avançadas.
Essas dimensões, dependendo do nível em
que eram apresentadas pelo terapeuta, foram
consideradas responsivas ou iniciativas. Responsi-
vas, quandoo terapeuta respondia ao cliente no
mesmo nível em que esse estava se colocando; ini
ciativas, quando o terapeuta se tomava mais dire
tivo, permitindo-se acrescentar sua própria percep
ção, indo além do conteúdo colocado por ele.
Enfim, é como se as dimensões responsivas
estabelecessem a base do relacionamento terapeuta-
cliente e se tomassem pré-requisito para fases mais
avançadas do processo, quando as dimensões
iniciativas desempenham um papel decisivo no
crescimento do cliente.
BUSCANDO OS EFEITOS NO CLIENTE
Da mesma forma que determinaram as dimen
sões presentes nos terapeutas efetivos, os pesqui
sadores tentaram descobrir o que se passava com
os clientes, à medida que se desenrolava seu rela
cionamento com esses terapeutas. Assim, tentaram
estabelecer as relações de causa e efeito a que já
nos referimos: se um terapeuta é empàtico, respei
toso, coerente, concreto, imediato e capaz de
confrontação, que efeitos provoca em seu cliente?
1. Mudança nos construtos pessoais: trans
formação das crenças e valores que orientam o
relacionamento do cliente consigo mesmo e com
o mundo à sua volta, no sentido de uma maior
flexibilidade desses valores, inicialmente rígi
dos.
2. Proximidade da experiência: habilidade do
cliente em desenvolver o autoconhecimento
através de um contato cada vez mais próximo
com sua própria experiência.
28 29
1® ."ípmpfttrf* ?nift
3. Entrega ao relacionamento; confiança do clien
te em relação ao terapeuta, de modo a se abrir
livremente com ele no decorrer do processo.
4. Mudança na expressão dos problemas: movi
mento do cliente quanto ao conteúdo de suas
verbalizações, no sentido de expressar, cada vez
mais, conteúdo interno (referente à sua própria
pessoa) e menos conteúdo externo.
Em resumo, seria exatamente o somatório
dessas mudanças por parte do cliente que o levaria
a um crescimento emocional, através da aquisição
de habilidades com as quais pudesse lidar melhor
com seus problemas. Enfim, transportando as novas
aprendizagens da sala de terapia para seu mundo, o
cliente poderia chegar a seu objetivo final: uma vida
mais plena e maís satisfatória.
TRANSFORMANDO .AS DIMENSÕES EM
COMPORTAMENTOS
Uma vez identificadas as dimensões do tera
peuta e seus efeitos sobre as pessoas, ocorreram
uma compreensão maior do processo terapêutico e
uma maior organização no estudo das psicoterapias.
Elementos até então desconhecidos ou apenas sus
peitados vieram à luz, transformando-se em padrões
confiáveis para a realização de novas pesquisas.
Mas isso não era ainda o bastante ~ um as
pecto fundamental no campo da Psicoterapia estava
ainda deficitário: o processo de aprendizagem des
sas dimensões pelas pessoas que pretendiam tomar-
se terapeutas efetivos. Elas já sabiam o que fazer -
mas não sabiam como fazer. A verdade é que as
dimensões não eram concretas o suficiente para
serem treinadas e exercitadas pelos candidatos a
terapeutas efetivos. Só havia um caminho para que
fosse implementado um verdadeiro programa de
treinamento - a transformação das dimensões em
comportamentos ou habilidades tão visíveis e men
suráveis que não houvesse dúvida sobre sua apren
dizagem por párte de quem quer que fosse.
E assim foi feito; desenvolvendo o Modelo
de Ajuda, Robert R. Carkhuff buscou incessan
temente uma operacionalização, cada vez maior,
das habilidades interpessoais. Não se tratava então
de sonegar informações e conhecimentos aos inte
ressados em ajudar, mas, ao contrário, de compar
tilhar as habilidades de ajuda com o maior número
possível de pessoas. Essas incluiam também os cha
mados leigos, uma vez que essas dimensões não
eram privilégio ou exclusividade dos profissionais
de ajuda. Não só eram encontradas em qualquer
segmento da população, como havia também
enorme necessidade de serem aprendidas pelas
pessoas significativas: pais, educadores, patrões,
profissionais de saúde, assistentes sociais, religiosos,
empresários, etc. São pessoas que normalmente
exercem influência marcante na vida dos outros -
além, naturalmente, dos próprios profissionais da
área da saúde mental - psiquiatras, psicólogos,
psicotetapeutas, orientadores, conselheiros. A todo
30 31
1® Remftstrfi rip ?niR
esse grupo de pessoas significativas chamou-se de
ajudadores, e ao grupo de pessoas que, de uma for
ma ou de outra, sofrem sua influência, de ajudados.
A partir da operacionalizaçao das dimensões
do terapeuta e dos efeitos por elas provocados nos
clientes, desenvolveu-se o Modelo de Ajuda. Esse
inclui os comportamentos do ajudado durante seu
processo de mudança, e as habilidades do ajudador
que possibilitam essa mudança - habilidades essas
observáveis, mensuráveis e, acima de tudo, trans
missíveis ou treináveis.
Guardando, em sua essência, uma estreita li
gação com as dimensões já citadas, esses foram os
quatro grupos principais de habilidades interpes
soais do ajudador formulados pelo Modelo (cada um
dos quatro grupos se subdivide em habilidades espe
cíficas que serão destrinchadas ao longo do livro):
1. Sintonizar: entrar em sintonia com o ajudado,
comunicando-lhe, de maneiras não-verbais, dis
ponibilidade e interesse.
2. Responder: comunicar, corporal e verbalmente,
compreensão pelo ajudado.
3. Personalizar: mostrar ao ajudado sua parcela de
responsabilidade no problema que está vivendo.
4. Orientar: avaliar, com o ajudado, as alternativas
de ação possíveis e facilitar a escolha de uma
delas,
A mesma classificação das dimensões em
responsivas e iniciativas foÍ mantida para as habi
lidades. Assim é que as duas primeiras - sintonizar
e responder - são consideradas habilidades respon
sivas, enquanto que as duas últimas - personalizar
e orientar - são consideradas iniciativas.
A medida que o ajudador sintoniza, responde,
personaliza e orienta, o ajudado começa também a
comportar-se de modo a promover sua própria mu
dança. Essas são as fases pelas quais ele passa du
rante o desenrolar do processo de ajuda:
1. Envolver-se: capacidade de se entregar ao pro
cesso de ajuda, iniciando a expressão corporal e
verbal de seus problemas.
2. Explorar: capacidade de avaliar a situação real
em que se encontra no momento do processo de
ajuda - seus problemas, déficits, insatisfações -
e de definir, com clareza, onde está.
3. Compreender: estabelecer ligações de causa e
efeito entre os várias elementos presentes em
sua vida - como se estivesse juntando as peças
de um quebra-cabeça - de modo a perceber sua
responsabilidade na situação que está vivendo e
a definir sua meta: onde quer chegar.
4. Agir: movimentar-se do ponto onde está para
onde qtter chegar, escolhendo, para isso, o
melhor caminho ou programa de ação - como
chegar lá.
As inter-relações entre as habilidades do aju
dador e os comportamentos do ajudado podem ser
representadas da seguinte maneira:
32 33
1° .^ftíTiftRtrp rlR ?nift
Ajudador: sintoniza responde ->• personaliza -> orienta
4 ^ 4
Ajudado: envolve-se -» explora -> compreende -► age
A cada habilidade do ajudador corresponde
um comportamento do ajudado. Tanto essas habi
lidades quanto os comportamentos obedecem a uma
certa seqüência, de tal modo que uns se tornam
pré-requisitos para os outros. Por exemplo: para o
ajudador, não é possível personalizar sem antes
sintonizar e responder, para o ajudado, não é
possível agir de maneira efetiva sem antes com
preender sua própria experiência.
Observando-se melhor as diversas fases do
processo de ajuda, fica mais fácil compreender, por
exemplo, por que os "conselhos" (orientar) nem
sempre funcionam. Isso ocorre porque esses foram
oferecidos sem a necessária base de compreensão
por parte das pessoas.
CONSELHO
Não colhe agora o botão
que,
somente amanhã,
promete desabrochar.
a rosa se abrirá num sorriso
a te oferecer
suas pétalas...
seu perfume...
Dócil e
integralmente.
Cláudia Myriam Botelho
Por outro lado, ao final de uma fase do pro
cesso, quando o ajudado age em alguma direção,
todo esse processo se recicla novamente: os resul
tados de sua nova ação se tomam os dados para o
começo de mais um ciclo, em que ele vaiexplorar
esses dados, compreendê-los e agir novamente - e
assim sucessivamente, até que ele se sinta em con
dições de andar por si mesmo. Em outras palavras,
o final do processo de ajuda ocorre quando o aju
dado se toma seu próprio ajudador - ele é capaz de
sintonizar consigo mesmo, se responder, persona
lizar sua experiência e se orientar. Enfim, ele já sabe
fazer aquilo que o ajudador fez com ele ao longo
de todo o processo de ajuda.
Dá seiva à roseira
que,
por si só,
34
1® .9ftmpstr« rip ?nift
35
Quem precisa de tyuíía?
Nem melhor, nem pior.
Apenas em falta de alguma coisa que, quando
encontrada, irá mudar sua vida para melhor.
O ajudado é, antes de mais nada, uma pessoa
a quem faltam algumas habilidades de vida. Isso o
leva a entrar em crises sucessivas de insatisfação
consigo mesmo, com os outros, com o mundo. Às
vezes, parece-lhe que a falta é exfeima - ele busca
sempre coisas e mudanças fora de sua pessoa. Muda
de emprego, de casa, de cidade, de parceiro.
Compra carro novo, roupa nova, um novo som. E,
ainda assim, a falta persiste. Dela nascem a ansie
dade e a coníusão. Ele se sente perdido. Gastou
toda sua força e energia na busca de coisas fora
dele. Talvez tenha alcançado tudo aquilo que se
prometeu um dia, na esperança de preencher o vaao
- dinheiro, status, sucesso, às vezes aplauso e admi
ração.
Mas o vazio começou muito tempo antes e
cresceu com ele e sua história. Na verdade, o vazio
começou com as pessoas significativas de sua vida,
a quem também faltaram habilidades para
estabelecer com ele uma relação saudável e constru
tiva, Entre essas habilidades, é provável que tenha
faltado uma crucial a seu desenvolvimento como
pessoa; amor incondicional, Se os adultos que o
cercaram não foram capazes de lhe expressar afeto
e transmitir mensagens de amor incondicional, ele
cresceu se percebendo como uma pessoa "nao-
gostável".
De acordo com essas mensagens, ele só seria
amado se preenchesse determinadas condições
impostas pelos adultos: "Se você fizer isso... Se você
fizer aquilo... Se você não fizer aquilo outro...".
Ele seria amado desde que fizesse deternünadas
coisas, e seu valor como pessoa não estava em sim
plesmente ser quem era, mas em fazer o que
esperavam que fizesse ~ em ações que deveria
executar para atender às expectativas dos outros.
Não tendo sido realmente amado, não aprendeu a
se amar.
Quando se tomou adulto, seu vazio era a falta
de alguma coisa tão indispensável quanto o ar que
respirava: o amor a si mesmo, a que chamamos
auto-estima.
Essa falta é a fonte de toda a insatisfação e
infelicidade que o acompanham pela vida afora, até
o dia em que ele decide pedir ajuda. Para isso, é
preciso que haja uma predisposição interna para ser
ajudado. Ou seja, só pode receber ajuda quem
admite que realmente precisa ser ajudado. Se é
esse o caso, é hora de pedir socorro. Em meio à
36 37
1° .9fimPí5trR rjp POlft
confusão e ansiedade, ele nem mesmo sabe o que
lhe falta. Ou onde está se refletindo essa falta: se
em sua área física, emocional e afetiva, pro
fissional, intelectual ou espiritual. Se alguma coisa
não vai bem com seu corpo, seu déficit éfísico. Ele
pode descobrir que não está bem suprido de sono,
de descanso; que sua alimentação não está saudável;
que sua resistência física está baixa, sua energia e
vigor para o trabalho estão pequenos; que seu peso
está abaixo ou acima do que deveria; ou que sua
própria saúde está abalada por sintomas físicos ou
por alguma doença que o impede de viver todo o
seu potencial.
Seu déficit pode ser também emocional e
afetivo: ele pode estar sempre ansioso, angustiado,
sem nem mesmo saber por quê; pode estar se
sentindo em desarmonia com o mundo que o cerca,
incapaz de se ajustar às situações do dia-a-dia. Seu
relacionamento consigo mesmo e com os outros
pode estar insatisfatório. Ele pode estar convivendo
mal com as pessoas da família, com os colegas de
trabalho; pode estar se sentindo sozinho, sem ami
gos; pode estar sem um{a) parceiro(a), sem que essa
condição lenha sido escolhida por ele. Ou pode estar
vivendo mal com o(a) parceiro(a), incapaz de
melhorar a relação ou de buscar outra, mais satis
fatória.
Outra área de problema pode ser a profis
sional - ele pode estar insatisfeito com seu trabalho:
com a própria profíssão que escolheu ou com o
lugar ou com a maneira como a está exercendo.
Pode estar ainda se sentindo mal remunerado, ou
pode até mesmo estar inativo profissionalmente.
Sua área intelectual pode ser também o foco
de seu problema: ele pode estar tendo dificuldades
de aprendizagem; de aquisição de conhecimentos e
informações importantes para viver uma vida
melhor
Para algumas pessoas, é a área espiritual que
pode estar deficitária. Num dado momento, podem
estar se sentindo vazias, sem encontrar um sentido
maior para a própria vida. Podem estar precisando
de adotar uma religião formal ou apenas acreditar
em alguns princípios que dêem mais significado à
sua vida.
Enfim, pode ser que todas as áreas estejam
deficitárias, tal a interdependência entre elas.
É hora de encontrar uma pessoa que faça com
o ajudado aquilo que nunca fizeram antes - alguém
que sintonize com ele e que responda à sua expe
riência, de modo a explorar onde está\ alguém que,
personalizando, o leve a compreender sua própria
contribuição a seus problemas e a identificar onde
quer chegar; e alguém que possa orientá-lo, ajudan-
do-o a encontrar a melhor maneira de chegar lá.
Quem pode ajudá-lo agora?
38 39
1® rift ?nift
Quem poíte ̂ 'utíar?
Antes de mais nada, é importante retomar
mos, neste ponto, aquela velha discussão do
hereditário versus aprendido. Tão velha quanto os
primórdios da Psicologia e uma de suas primeiras
indagações, ouviu-se, muitas vezes, a pergunta;
Afinal, o que importa mais - a carga genética
ou o ambiente? Certos traços individuais são deter
minados pelas combinações genéticaSí no momento
da concepção, ou pelas aprendizagens ocorridas no
meio ambiente desde o nascimento? Assim, como
qualquer outra atividade, ̂ habilidade de ̂udar seria
um "dom inato", uma vocação e uma tendência na
tural, ou poderia ser um comportamento passível
de aprendizagem e treinamento?
Não é nossa intenção solucionar essa contro
vérsia, que permanece até hoje sem uma conclusão
definitiva, apesar dos esforços de tantos pesqui
sadores nesse sentido.
O importante é avaliarmos as implicações de
uma ou de outra resposta e daí darmos direção a
nosso trabalho.
Digamos quejá nascemos sabendo ajudar, que
essa habilidade é realmente fruto de nossa carga he
reditária, E então? O que nos resta senão cruzarmos
os braços e esperarmos as pessoas irem nascendo,
com ou sem o "gen da ajuda"? Quando muito, nosso
papel seria apenas o de avaliarmos a presença ou au
sência desse gen numa certa altura da vida das pessoas,
encaminhando-as ou não para as profissões de ajuda.
Ou digamos, pelo contrário, que a habilidade
de ajuda pode ser aprendida^ seja de maneira sis
temática (nos diversos cursos destinados aos pro
fissionais de ajuda), seja de maneira informal,
durante a vida. Por maneira Informal entendemos
todos os encontros que a pessoa manteve com
pessoas significativas durante a sua vida. Seria uma
aprendizagem casual de habilidades através da
identificação e imitação de modelos - a mãe, o pai,
o professor ou qualquer outra pessoa ~ fazendo com
os outros o que fizeram com ela.
Se ajudar é realmente uma habilidade a ser
desenvolvida, podemos aumentar o controle sobre
sua aprendizagem, ao invés de deixarmos essa
aprendizagem por conta do acaso. Mesmo porque
isso não seria justo com aquelas pessoas que
gostariam de saber ajudar, mas, por azar, não ti
veram encontros significativos o bastante para
adquirirem as habilidades necessárias.
Assim, uma primeira resposta à questão sobre
quem pode ajudar seria essa:
Pode apidar aquele que aprendeu as habilida-
des de ajuda - seja de maneira formal ou informal.
40
41
1® .Sftmfistrp rtp ?niR
Mais especificamente, sabe ajudar o outro
aquele que sabe ajudar a si mesmo.
Como conseqüência dos encontros significativos, a pessoa passa a fazer consigo mesma
aquÜo que os outros fizeram com ela. O que a dife
rencia dos outros não é o fato de não ter problemas
em sua vida - mas sua habilidade em lidar com eles.
Quem sabe ajudar-se sabe, antes de mais nada,
sintonizar consigo mesmo; sabe responder à sua
própria experiência, identificando onde está e o que
lhe falta para chegar onde precisa. Sabe qual é a
sua parcela de responsabilidade nas crises em que
vive e sabe agir de maneira efetiva para sair delas.
Além disso, o ajudador tem como caracterís
tica básica uma boa dose de auío-esíima. Isso
significa que ele aprendeu a se amar acima de tudo
e independentemente das circunstâncias externas de
sua vida. E é esse o ensinamento básico que vai
transmitir ao ajudado durante o processo de ajuda:
amar-se. Isso só é possível quando o ajudador é
capaz de amar o outro. Como de amor não se fala,
mas se faz, o amor, no processo de ajuda, "se faz"
ou se operacionaliza através das habilidades inter
pessoais do ajudador. E um verdadeiro "ciclo do
amor" que poderia ser representado assim:
pessoa significativa ama o ajudador
ajudador se ama -> ajudador ama o ajudado
ajudado se ama ajudado ama outros (torna-se
ajudador) -> e assim por diante.
Com isso, chegamos a um último "ingre
diente" do ajudador: ele precisa ter disponibilidade_
interna para ajudar o outro e para amá-lo no
decorrer do processo de ajuda. Sem isso, nenhuma
habilidade interpessoal é efetiva, da mesma forma
que nenhum amor é suficiente para ajudar quando
não foram adquiridas as habilidades necessárias ao
processo.
Aqui é bom lembrar que nenhum ajudador
tem a obrigação de ajudar o tempo todo ou a todas
as pessoas. Como tudo mais em sua vida, a ajuda é
uma opção que ele faz a cada momento - se quer
ou não usar suas habilidades, com quem, quando,
onde. Assim, chegamos à equação final do processo
de ajuda:
AJUDA = disponibilidade + amor + habilidades
A partir deste ponto, vamos falar de habi
lidades de ajuda. E importante saber-se que essas
habilidades obedecem a uma certa seqüência ou
cronologia no desenrolar do processo de ajuda e,
conseqüentemente, na organização do livro.
Como já vimos no tópico Transformando as
Dimensões em Comportamentos, não podemos, por
exemplo, personalizar sem antes responder; orientar
sem antes sintonizar com o ajudado. É nesses
"saltos" que está, muitas vezes, a causa do fi*acasso
de uma relação de ajuda.
O importante aqui é não perdermos de vista
as habilidades mais básicas quando estivermos
42
43
1® .9«mp«Rtrp riA 9niR
abordando as mais complexas. Talvez possamos
compreender melhor a seqüência das habilidades
se as virmos como cumulativas - cada uma sendo
pré-requisito para a próxima. Ou se as compararmos
com uma escada em que cada habilidade é um
degrau, sendo que só pisamos no de cima depois
de pisarmos no de baixo - lembrando sempre que
precisamos passar por todos os degraus para
atingirmos nosso objetivo - no caso, ajudar alguém,
Aíguns princípios da relação Interpessoal
1. A pessoa c, em grande parte, resultado das relações
interpessoais que estabeleceu durante sua vida.
Ninguém sai ileso de um encontro com outra pessoa.
Há sempre uma relação de causa c efeito acontecendo
entre duas pessoas - uma causa efeitos sobre a outra e
we-versa,
Esses efeitos podem ser para melhor ou para pior, cons
trutivos ou destrutivos, para uma das partes ou para
ambas.
Esses efeitos sáo especialmente marcantes quando uma
das pessoas é considerada significativa - aquela que
tem maior influencia sobre a outra devido ao papel social
que desempenha.
Numa relação de ajuda, a responsabilidade maior pelos
resultados do encontro é do ajudador.
O resultado do encontro depende de suas habilidades
interpessoais.
Essas habilidades podem ser aprendidas.
Para serem aprendidas, essas habilidades devem ser
operacionalizadas em comportamentos observáveis e
mensuráveis.
10. No processo de ajuda, o ajudador sintoniza, responde,
personaliza e orienta o ajudado; como conseqüência,
este se envolve, explora onde está, compreende onde
quer chegar e age para chegar lá.
11. A falta do ajudado pode estar localizada em uma ou
mais de suas áreas de funcionamento: física, emocional
e afetiva, profissional, intelectual e espiritual.
12. Os ingredientes do ajudador são: disponibilidade inter
na, amor pelo ajudado e habilidades inteipessoais em
alto nivel.
13. Essas habilidades, apesar de caracterizarem a relação
de ajuda, são básicas a qualquer encontro entre duas pes
soas, mesmo que não lhe seja dada a conotação de ajuda
- são elas que determinam a qualidade desse encontro.
4.
5.
44 45
1® .«ípmfiRtm flp ?niR
Qi4ão bela, quão intensa e libertadora é a
experiência de se aprender a ajudar o outro. É
impossível descrever-se a necessidade imensa que
têm aspessoas de serem realmente ouvidas, levadas
a sério, compreendidas.
A Psicologia de nossos dias nos tem, cada
vez mais, chamado a atenção para esse aspecto.
Bem no cerne de toda psicoterapia permanece esse
tipo de relacionamento em que alguém pode falar
tudo a seu próprio respeito, como uma criança fala
tudo à sua mãe.
Ninguém pode se desenvolver livremente
nesse mundo, nem encontrar uma vidaplena, sem
sentir-se compreendido por uma pessoa, pelo
menos...
Aquele que se quiser perceber com clareza
deve se abrir a um confidente, escolhido livremente
e merecedor de tal confiança.
Ouça todas as conversas desse mundo, tanto
entre nações quanto entre casais. São, na maior
parte, diálogos entre surdos.
?■'
a-%-' ií
j
\
Paul Toumier, M.D.
46
1° Spmestrft flfi ?niR
2
SINTONIZANDO
(abrindo as portas da percepção)
49
1® riR ?niR
Neste primeiro gaipo de habilidades, vamos
ver como o ajudador inicia seu trabalho muito antes
de interagir verbalmente com o ajudado e até mesmo
antes de encontrá-lo.
Inúmeras mensagens são transmitidas o
tempo todo pelo corpo do ajudador e pela extensão
desse corpo, que é seu ambiente de trabalho.
O corpo não mente. Não importa se as
palavras estão sendo ditas ou como estão sendo
ditas, o corpo está lá e vai estar sempre, dizendo
suas próprias coisas, sem jamais mentir.
Posso tornar-me ciente de meu corpo e
aprender com ele um pouCo mais a meu próprio
respeito. Posso saber, através dele, o que ando
dizendo às pessoas. Posso também escolher o que
dizer a cada uma, a cada momento, com esse corpo.
Posso fazer dele o retrato do meu coração.
50
1® .«{emftsirp rJp ?niR
I
H
5®
A DECORAÇÃO
^Preparando o ambiente
o primeiro contato do ajudado com o aju-
dador se faz através do ambiente físico em que
este exerce sua atividade. Nesse caso, o ambiente
de trabalho é como se fosse a própria extensão do
seu atendimento. Ou seja, o ajudador começa a
atender a pessoa antes mesmo de entrar em contato
direto com ela - ele está presente em cada móvel,
em cada objeto, em cada detalhe que compõe seu
espaço.
O ambiente físico nunca é neutro ele emite,
o tempo todo, mensagens para o ajudado. Essas
mensagens tanto podem ser de cuidado e de interes
se como de extremo descuido e desinteresse. Essa
ausência de neutralidade não é exclusiva do ambien
te de ajuda. Costuma-se dizer, por exemplo, que "a
casa é o retrato do dono" - isso porque cada pessoa
imprime suas características a tudo o que faz, inclu
sive à maneira pela qual arranja o ambiente em que
vive.
Independente do estilo e do custo, a decora
ção do ambiente é extremamente reveladora em
relação à pessoa do ajudador.
A partir do instante em que o ajudado entra
em contato com o lugar em que vai ser atendido,
começa a experimentar sensações de bem-estar ou
de mal-estar, provocadas pelo ambiente. Ele pode
perceber esse ambiente como aconchegante e ca
loroso; ou como frio e impessoal. Essa percepção,
por sua vez, pode desencadear sentimentos de
esperança, alívio, acolhimento, aceitação; ou de
preocupação, rejeição e até medo.
As cores: A decoração inclui as cores usadas no am
biente - como são combinadas, se são suficientes
para dar vida ao lugar ou se são tão fortes que che
gam a desviar, por completo, o focode atenção do
ajudado.
A disposição dos móveis: esta é fijndamental para
a relação de ajuda. E importante que as cadeiras
estejam de frente uma para a outra e que sua distância
seja adequada ao tipo de encontro; a proximidade
entre elas aumenta à medida que aumenta o vínculo
entre ajudador e ajudado. Essa proximidade pressu
põe também a ausência de barreiras físicas entre os
dois, especialmente quando o vínculo já se tomou
grande o suficiente para dispensar, por exemplo, a
presença da escrivaninha ou qualquer coisa entre
52
53
1® .'ípmpRtro rip 7nifl
eles. Também na sala de aula, essa disposição é pré-
requisito para que se estabeleça uma relação de aju
da efetiva entre professor e aluno. O ideal é colocar
as cadeiras em círculo de modo a que todos se ve
jam, sem que um tenha de dar as costas ao outro,
como acontece quando as carteiras são eníileiradas.
Igualdade das cadeiras;outro aspecto importante
está ligado a uma razoável igualdade entre as cadei
ras usadas pelo ajudador e pelo ajudado. Essa igual
dade está ausente, por exemplo, num consultório
em que a cadeira do profissional é muito mais alta
do que a do ajudado ou numa sala de aula em que o
professor se assenta sempre atrás da mesa. Tanto
numa situação como na outra há uma mensagem,
muitas vezes não-intencional, de superioridade por
parte do ajudador. É como se ele estivesse dizendo,
do alto de sua cadeira, ou de trás de sua mesa: "Eu
sou melhor do que você".
Naturalmente, essa igualdade não pode ignorar que
os papéis ali desempenhados são diferentes - ao
ajudado é oferecido maior conforto, e sua cadeira
é um convite ao relaxamento e ao alívio de tensões.
Por outro lado, esse não pode ser o convite da ca
deira do ajudador, que está num momento de
extrema atenção, não de descanso ou desconíração.
Tudo isso deve ser levado em conta na escolha dos
móveis para um e para outro.
Limpeza e conservação: Também fazem parte da
decoração a limpeza e conservação do ambiente.
Uma sala de aula cheia de papéis e pontas de cigarro
no chão, ou um consultório com vidros quebrados
e estofados rasgados, emitem mensagens de extre
mo descuido por parte do ajudador. Talvez possa
ocorrer ao ajudado a seguinte indagação: "Posso
acreditar que essa pessoa vai saber cuidar de mim
melhor do que cuida do próprio ambiente em que
trabalha?"
Quadros e objetos:um último tópico referente à
decoração diz respeito aos quadros e objetos usados
para enfeitar o ambiente. São essenciais para dar
aconchego ao lugar e se tomam especialmente im
portantes quando dizem do tipo de ajuda prestada
no local. E o caso, por exemplo, de "posters" com
mulheres grávidas ou amamentando num consultó
rio obstétrico; ou dos brinquedos, num consultório
pediátrico. São detalhes que individualizam o
ajudado e o fazem lembrar da importância que tem
naquele lugar especifico.
ALGUNS CUIDADOS COM O AJUDADO
Além do cuidado direto, o ajudador pode ter
alguns cuidados indiretos para com o ajudado antes
que se inicie o contato entre os dois.
Esses cuidados podem incluir, por exemplo,
revistas na sala de espera; água ou café, se for pos
sível; um banheiro, em caso de necessidade; música
ambiente, também na sala de espera. Em outros
lugares mais amplos, como um hospital ou uma
54
55
dft ?nift
escola, esses cuidados podem incluir a sinalização
adequada das salas, para que o ajudado não se sinta
perdido,
Já durante o contato direto, uma caixa de
lenços de papel significa cuidado e, mais do que
isso, a permissão para o ajudado expressar livre
mente suas emoções.
Cuidar do ajudado inclui também eliminar do
ambiente qualquer fonte de desconforto físico. Seu
próprio papel de ajudado pressupõe a existência de
um desconforto que o levou a buscar ajuda. Esse
desconforto pode ser físico, emocional ou de qual
quer outra natureza. Não é necessário, nem mesmo
justo, que o ambiente de ajuda lhe propicie um des
conforto a mais. Pelo contrário, esse é o ambiente
que, em meio a todos os problemas, vai-se tomar
seu lugar de paz e tranqüilidade. Esses desconfortes
podem estar ligados à temperatura dó ambiente
(especialmente em ambientes, muito quentes ou
muito frios); a ruídos excessivos (barulhos da rua
ou vozerio de pessoas); á estimulação externa muito
intensa (um grande movimento de pessoas, por
exemplo) e até mesmo à claridade excessiva (nesse
caso, basta uma mera troca nas posições das ca
deiras para aliviar o ajudado).
Enfim, são pequenas atenções por parte do
ajudador, mas de grande significado para o ajudado.
A mensagem que ele recebe é algo como: "Estou
ligado em você e me importo com seu bem-estar
muito antes de nos encontrarmos".
A GARANTIA DE PRIVACIDADE
Nem sempre a decisão de buscar ajuda é fácil
ou tranqüila para o ajudado. Admitir sua própria
"fraqueza" e dizer a respeito dela para alguém é
mais difícil ainda.
As pessoas geralmente se sentem embaraça
das diante de seus problemas e por isso os escondem
dos outros. Têm medo de não serem compreendidas
e aceitas pelos outros. Quando, finalmente, decidem
entregar-se ao ajudador, é porque estão dispostas a
confiar nele. E o ajudador não pode trair sua confiança.
De início, o mínimo que pode oferecer-lhes é a total
garantia de privacidade - a certeza de que ninguém,
além dele próprio, vai compartilhar sua intimidade.
Essa garantia é dada, basicamente, através do
ambiente: isso quer dizer que a vedação acústica
entre a sala onde os dois se encontram e as outras
salas deve ser perfeita. Não se admite que qualquer
outra pessoa possa escutar o que está sendo dito
entre os dois. Isso quer dizer também que a "veda
ção visual" não pode faltar - não se admite que
qualquer outra pessoa possa ver o interior da sala
onde os dois se encontram, especialmente em con
sultórios onde se realizam exames físicos do
ajudado.
Além disso, privacidade significa que o ajuda
do vai relacionar-se sozinho com o ajudador e que
os acompanhantes ~ pai, mãe, filhos, marido, mulher
- apesar de muitas vezes insistentes, vão ficar espe
rando do lado de fora. A não ser que sua companhia
56 57
1® SftmpRtrí» dp Pnift
seja requisitada pelo próprio ajudado - ele é o foco
da relação de ajuda e quem dá a direção.
Isso se aplica também a quaisquer outras
pessoas que façam parte do ambiente de ajuda:
secretárias, serventes, outros profissionais, etc. A
partir do momento em que ajudado e ajudador se
encontram, não deve haver o menor risco de serem
interrompidos por qualquer outra pessoa - e de
verem sua privacidade quebrada.
Até esse ponto, temos nos referido aos pro
fissionais de ajuda - médicos, dentistas, fisiolera-
peutas, psicólogos, professores, orientadores educa-
cionms, assistentes sociais e outros - e a seus am
bientes de trabalho. Isso não quer dizer, no entanto,
que foram excluídos os outros ajudadores - pais,
colegas, amigos, parceiros, etc. - a que poderíamos
chamar de ajudadores informais. A diferença entre
uns e outros, quanto ao preparo do ambiente, está
apenas na existência de locais cuja finalidade básica
é a ajuda, para os primeiros;:é na improvisação de
outros locais, para os segundos. Mesmo improvisado,
o ambiente em que o ajudador informal e seu ajuda
do vão encontrar-se pode - e deve - manter algumas
condições às quais nos referimos: posições adequa
das tanto para um quanto para outro (a proximidade
compatível com o vínculo), a possibilidade de um
ver o outro sem barreiras, a eliminação de
desconfortes físicos e, acima de tudo, a privacidade.
Vale aqui lembrar John Powell: Se eu exponho
a você minha nudez como pessoa, não me faça
sentir vergonha.
PREPARANDO O AMBIENTE
O que é:
Arranjar o ambiente físico em que o ajudado vai
ser atendido, uma vez que esse ambiente é a
extensão de nossa pessoa.
Para que:
Se cuido do ambiente físico, cuido indiretamente
do ajudado, de modo a propiciar-lhe uma sensação
de bem-estar.
Como:
1. Estar atento à decoração.
2. Combinar as cores do ambiente.
3. Dispor os móveis de maneira adequada.
4. Manter o ambiente limpo e bem conservado.
5. Usar objetos decorativos relacionados com o
ajudado.
6. Oferecerpequenos cuidados ao ajudado.
7. Eliminar qualquer desconforto do ambiente.
8. Garantir privacidade ao ajudado.
58
1° SfimfiRtrí» flft PniR
59
REFUGIO
Quando iodos parecem conspirar
contra você,
quando o mundo parece desabar
a seu redor,
haverá ainda um lugar
aonde ir
Lá você pode sentir e chorar
e falar da dor e esvaziar o peito
cheio de mágoa.
Lá é trégua de guerra
é refúgio tranqüilo
é porto seguro.
Vem, e ancora aqui
seu coração.
C.RM.
60
1® Sf»mfiRtrp rip Pfllfl
l
'
'
'
í
y^poífientío
É nos primeiros momentos de cada encontro
que o ajudador vai acolher o ajudado e, através
dessa acolhida, construir a base da relação entre os
dois no restante do tempo que têm pela frente. Isso
vale para qualquer encontro e, em especial, para o
primeiro - quando um vai conhecer o outro.
Esses momentos poderiam ser comparados
ao aquecimento de um motor, que só funciona
quando bem aquecido a cada manhã. Da mesma
forma, o relacionamento de ajuda é aquecido a cada
encontro, de modo a render o máximo para ajudador
e ajudado. E como se o primeiro formasse uma
imagem do segundo nesses primeiros momentos,
checando o quanto de abertura e disponibilidade
pode esperar dele. E é a partir dessa imagem que o
ajudado vai decidir o quanto de entrega vai lhe
oferecer no restante do tempo. Sendo assim, há
algumas coisas que o ajudador pode fazer para
aumentar a chance de o ajudado se entregar.
63
1® SpmeRtrp rip ?nifi
APRENDER O NOME DO AJUDADO
E o nome a primeira coisa que Identifica a
pessoa para ela mesma e para cs outros. É uma das
primeiras palavras que a criança escuta e aprende
desde muito cedo, e que a destaca do resto do
mundo.
Aprender o nome do ajudado e chamá-lo
sempre por esse nome é também a primeira coisa
que o ajudador pode fazer para tornar a relação de
ajuda um encontro mais pessoal - destacando o
ajudado como uma pessoa única. E uma tarefa que
o ajudador deve executar antes mesmo de se
encontrar com ele, de modo a chamá-lo pelo nome
desde o início do primeiro contato. No caso de
ambulatórios e enfermarias em que os pacientes são
numerados, por exemplo, é muito importante que
os profissionais saibam seus nomes' antes de
começarem o atendimento.
Essa tarefa se toma um pòuco mais difícil quan
do a relação de ajuda não envolve apenas duas pes
soas. Na relação professor-aluno ou no atendimento
a grupos, o número de ajudados, às vezes, é grande.
Nesses casos, é exigido do ajudador um esforço maior
para aprender o nome de todos. Há, no entanto,
alguns procedimentos que facilitam a tarefa:
- pedir aos ajudados que se assentem sempre nos
mesmos lugares, pelo menos nos primeiros en
contros, de modo a associar os nomes às posições
ocupadas;
- fazer uma "chamada" sempre no início do en
contro, dizendo cada nome e parando por um
momento na pessoa para fixar sua fisionomia;
- perguntar e repetir o nome da pessoa cada vez
que ela se dirigir ao ajudador ou cada vez que
este se dirigir a ela;
- repetir o nome várias vezes durante cada inte
ração;
- nomear cada ajudado quando algum material for
entregue ao grupo - nomeando primeiro, en
tregando depois;
- associar a pessoa e seu nome a alguma carac
terística marcante - por exemplo, João é o que
usa óculos, Márcia usa aparelho nos dentes,
Antônio tem barba, Cláudia tem cabelo comprido;
- quando se esquecer, não ter vergonha de pergun
tar novamente o nome do ajudado;
- avisar, no início do contato, que vai perguntar e
repetir os nomes várias vezes até aprender, dizen
do também o quanto isso é importante para uma
boa relação.
Acima de tudo, quando o ajudador nomeia o
ajudado, emite uma mensagem do tipo "Você é uma
pessoa importante e única para mim no momento
em que nos encontramos".
CUMPRIMENTAR
São os cumprimentos que marcam o início
de cada encontro. É importante que seja o ajudador
64
65
1® r|p 9niR
a pessoa que vai "buscar" o ajudado onde ele estiver
- numa saía de espera, num corredor, etc. As vezes,
basta chegar até a porta de onde se pode ver o ajuda
do e acenar para ele, cumprimentando-o e convi-
dando-o a entrar.
Além do aspecto verbal, faz parte do cumpri
mento algum tipo de contato físico com o ajudado.
Esse contato vai depender da profundidade e da
natureza da relação - um aperto de mão, um "tapi-
nha" nas costas, um abraço, às vezes, urn beijo.
O aperto de mão, em especial, é uma forma
não só de transmitir segurança e apoio para a pessoa,
como também de captar os sentimentos que ela está
experimentando no momento. Talvez seja essa uma
forma de contato muito antiga na história da pessoa,
que a faz lembrar do aperto de mão do pai e da mãe
e da segurança que eles lhetransnátiam dessa manei
ra. Para o ajudador, o toque é uma daá primeiras
chances não só de perceber o outro, como também
de emitir a seguinte mensagém: "É bom ver você
neste momento; estou aqui para ajudá-lo."
INDIVIDUALIZAR
Individualizar o ajudado, apesar de ser uma
habilidade verbal, vai ser mencionada aqui porque
vem, no geral, junto do cumprimento.
Individualizar o ajudado significa perceber al
gumas de suas características presentes a determi
nado encontro. Isso é especialmente importante
quando houver alguma mudança sensível em sua
aparência em relação ao último encontro. Por
exemplo, "Você cortou o cabelo, está se vestindo
com muito cuidado, está gripado, machucou-se,
etc.". Assim, quando, além de perceber, o ajudador
comunica essa percepção, dá ao ajudado a sensação
de ser sempre lembrado e de ser, por isso, impor
tante para o ajudador
NUTRIR O AJUDADO FISICAMENTE
As vezes, uma pessoa em crise deixa até
mesmo de atender a suas necessidades básicas -
não raro, por exemplo, ela deixa de se alimentar.
Na medida do possível, o ajudador deve nutrir
fisicamente o ajudado no início do encontro. Até
mesmo para receber ajuda, é necessário ter um míni
mo de energia e as necessidades básicas atendidas.
No processo de aprendizagem, por exemplo, a ali
mentação é pré-requisito para que essa aprendiza
gem ocorra. E por isso que, nas escolas de nível
sócio-econômico mais baixo, as crianças são ali
mentadas antes de iniciarem qualquer atividade.
Oferecer um copo d'água ou uma xícara de
chá, leite, café; agasalhar; oferecer medicamento
ou fazer um curativo para aliviar a dor; oferecer
um lugar confortável para que o ajudado possa
relaxar-se e descansar são cuidados que fazem parte
do que chamamos de nutrir fisicamente. Além do
alivio que trazem ao ajudado, representam, simboli
camente, toda a nutrição emocional que o ajudador
está disposto a lhe oferecer.
66
1® .9ftmpRtr« rifi 901R
67
ACOLHENDO
O que é:
Receber o ajudado calorosamente ao se iniciar cada
encontro com ele.
Para que:
Se acolho o ajudado, eu lhe transmito receptividade
e interesse, de modo a sentir-se valorizado.
Como:
1. Dirigir-se ao ajudado usando seu norne.
2. Cumprimentá-lo.
3. Individualizá-lo.
4. Nutrí-lo fisicamente.
69
1® Rpmpstrp rtp 70^R
Tente, de alguma maneira,
fazer alguém feliz.
Aperte a mão, dê um abraço,
um passo em sua direção.
Aproxime-se, sem cerimônia.
Dê um pouco do calor
de seu coração.
Assente-se bem perto
e deixe-se ficar,
muito tempo, ou pouco tenípo.
Não conte o tempo de se dar.
Deixe o sorriso acontecer.
E não se espante
se a pessoa maisfeliz
for você.
Anônimo
i-Vvtf
-,vv
i ir?
Sí-^S
if.v-
V*'
íSHi-
ií;- ̂ r
70
1® Sftmftstrft flp 7niR
í
'
í
'
í
A^cnd^ndo
Em se tratando de mensagens, nada é mais
significativo do que o corpo. Já verificamos como
as mensagens são transmitidas nos pequenos deta
lhes - na maneira como o ambiente é arranjado,
nos cuidados que são oferecidos ao ajudado, na ma
neira como ele é cumprimentado, percebido, nu
trido. Nada, no entanto, tem a força da mensagem
corporal. Isso fica bem ilustrado no próprio título
do livro de Pierre WeÜ, O Corpo Fala.
Uma das razões dessa força pode estar sim
plesmente na enorme verdade que reside no corpo
de cada um. O corpo não só fala; o corpo nunca
mente. Podemos, às vezes, duvidar das palavras,
mas não do corpo. Sua mensagem é tão clara e ver
dadeira que não deixa margema dúvidas.
O corpo é nossa parte acima de qualquer
suspeita.
Isso talvez se explique através do controle:
assim como exercemos ura razoável controle sobre
as palavras - pensando sobre elas, escolhendo-as,
medindo como vamos pronunciá-las - o mesmo não
73
riR ?niR
acontece com o corpo. Por não termos um espelho
permanente à nossa frente, dizendo-nos, a cada
momento, como estamos corporalmente, assumi
mos posturas impensadas; não nos damos conta do
que estamos falando através do nosso corpo. Quan
do falta o controle, surge a verdade.
Atender significa, então, emprestar ao corpo
posturas tais que comuniquem ao ajudado disponi
bilidade, abertura, interesse - caso isso tudo esteja
presente no ajudador, é claro. Como vimos anterior
mente, nenhum processo de ajuda pode ser iniciado
sem que haja disponibilidade interna por parte do
ajudador.
Quando essa disponibilidade existe, é muito
provável que o ajudador transforme seu corpo num
reflexo de seu interior Ao fazer isso, ele "ajeita"
seu corpo de maneira intuitiva, escolhendo a postura
que melhor transmita sua mensagem ê;'~ao mesmo
tempo, lhe ofereça um mínimo de conforto para o
atendimento.
O grande problema, entretanto, é quando o
ajudador está disponível internamente mas, por
razões várias, não consegue comunicar sua disponi
bilidade ao ajudado. Este, por sua vez, se não conse
gue perceber o interesse por parte do ajudador,
fecha-se sem nem mesmo começar a se envolver
no processo de ajuda.
Essas "razões várias" podem incluir um certo
cansaço do ajudador ou uma necessidade de muito
conforto físico que o leva a assumir posturas incom
patíveis com seu desejo de ajudar
É necessário, então, estar atento para aquelas
posturas que realmente comunicam sua disposição
de ajudar Há alguns comportamentos que facilitam
essa comunicação.
APROXIMAR
Como já foi visto no tópico sobre disposição
das cadeiras, há uma "distância ótima" a ser estabele
cida a cada encontro e a cada momento num mesmo
encontro. Uma distância muito grande pode dificul
tar a expressão do ajudado por significar, para ele,
uma distância emocional e afetiva do ajudador Por
outro lado, uma distância muito pequena pode signifi
car uma invasão de sua intimidade, um desrespeito
a seu espaço, dificultando também sua expressão.
A proximidade adequada é estabelecida a
partir de um pedido, também corporal, do ajudada.
Através da observação, o ajudador percebe se a
distância que determinou a princípio está adequada
à necessidade do ajudado. Caso não esteja, faz ajus
tes na sua posição até que a proximidade seja a
ideal para aquele momento.
FICAR DE FRENTE
É importante que todo o corpo do ajudador
esteja de frente para o ajudado - literalmente da
cabeça aos pés.
Às vezes, voltamos apenas a cabeça para a pes
soa com quem estamos falando, esquecendo-nos
74
75
1® riíí ?nifl
do resto do corpo. Essa posição de lateraiidade pode
soar como pouca disponibilidade para o ajudado.
INCLINAR
Um dos elementos mais significativos na
postura do ajudador é a posição de seu tronco. Essa
posição pode variar desde o encostar-se para trás
na cadeira até uma grande inclinação, passando pela
posição ereta. A mensagem transmitida, em cada
uma delas, muda sensivelmente.
Quando alguém está "escarrapachado" ou
mesmo recostado na cadeira, a impressão que se
tem é de cansaço, sono, desânimo. A pessoa muito
ereta pode comunicar afastamento ou até mesmo
uma certa superioridade. Sem dúvida, é quando
inclina seu corpo para a frente que o ajudador co
munica total atenção pelo ajudado.
MANTER CONTATO VISUAL
São os olhos a fonte maior de comunicação.
Às vezes, podemos nos abstrair de qualquer outro
traço fisionômico - boca, nariz, sobrancelhas, quei
xo, testa-mas não dos olhos, que dão vida ao rosto.
No momento em que o ajudador olha nos
olhos do ajudado, não só comunica seu desejo de
contato, como também capta as mensagens que ele
lhe transmite. Além disso, aumenta a sua concen
tração, evitando a dispersão por outros estímulos
que não o ajudado.
76
Há algumas abordagens ao processo terapêutico
que acreditam que a melhor posição para o terapeuta
é aquela em que ele não é visto pelo cliente. A justifica
tiva seria o cliente não se deixar controlar pelas possí
veis reações do terapeuta e, ao mesmo tempo, ser o
único foco de sua própria atenção durante o processo.
Mas, desde que acreditamos que o processo
de mudança tem como base a própria relação entre
ajudador e ajudado, não seria coerente dispensar
mos. nessa relação, qualquer contato possível entre
os dois - em especial através dos olhos.
Como no caso da distância ótima, deve haver
também uma dosagem adequada de contato visual
durante cada encontro. Às vezes, o ajudado se sente
embaraçado diante do olhar do ajudador, receoso
de que este descubra, em seus olhos, coisas que
ainda não está pronto para dizer. Se for esse o caso,
em certos momentos, o ajudador comunica respeito
deixando de encará-lo.
MANTER nSIONOMIA RECEPTIVA
Muito ligada ao contato visual, a fisionomia
receptiva é aquela que transmite o interesse incondi
cional do ajudador não só através dos olhos, mas
de todos os traços fisionômicos,
Sobrancelhas levantadas, boca caída, testa
franzida são também sinais do que o ajudador pode
estar sentindo ou pensando.
Por outro lado, esse é o elemento físico que
mais foge ao controle: a expressão fisionômica é a
77
Sfimftstrp rlp ?nift
menos susceptível à mentira, ou seja, não podemos
controlar nossos traços fisionômicos de modo a
transmitir uma mensagem falsa. Não se trata aqui
de sugerir ao ajudador que "faça cara boa", mas
apenas que esteja atento à sua fisionomia e ciente
de que ela pode trai-lo caso esteja obrigando-se a
atender alguém sem a necessária disponibilidade.
Ou caso esteja experimentando sentimentos tão
fortes que eles se reflitam em sua fisionomia e o
impeçam de atender o outro. Nessa situação, para
preservar a coerência e imediaticidade, o ajudador
pode falar desses sentimentos ao ajudado (ver mais
adiante em respondendo com os próprios senti'
mentos).
CONCENTRAR-SE
No tópico referente ao contato visual, jámen-
cionamos que olhar nos olhos evita a dispersão.
Concentrar-se significa exatamente não fazer nada
que não seja prestar atenção ao ajudado.
Qualquer outra atividade, por pequena que
seja, divide a atenção do ajudador, que perde, por
instantes, algum sinal significativo do ajudado. Este,
por sua vez, pode perceber a distração do ajudador
como uma mensagem do tipo: "Não estou inteiro
para você, por isso outras coisas chamam minha aten
ção". Ainda que isso não seja verdade, é assim que o
ajudado se sente- pouco importante para o ajudador.
Isso inclui desde pequenas distrações - ra
biscar um papei, brincar com algum objeto, segurar
alguma coisa, estalar os dedos, olhar o relógio, fu
mar - até atividades que exigem maior atenção -
escrever, datilografar ou digitar, folhear um livro,
falar ao telefone, procurar alguma coisa.
Algumas dessas observações se aplicam dire
tamente à área da saúde, onde, durante a anamnese,
o profissional escreve ou datilografa o que o cliente
está dizendo; ou atende a telefonemas de outras
pessoas durante a consulta.
ASSENTIR COM A CABEÇA
Também bastante intuitivo, o movimento de
cabeça, quando conversamos com alguém, indica
que estamos realmente acompanhando tudo o que
está sendo dito, ou escutando o que está sendo rela
tado.
Na relação de ajuda, esse gesto dá a sensação
ao ajudado de que está sendo escutado com atenção
integral.
É um traço individual, ao mesmo tempo
natural em certas pessoas e desconfortável para ou
tras, para quem o movimento de cabeça seria força
do e desnecessário.
TOCAR
Já foi mencionado o contato físico no tópico
sobre o cumprimento inicial.
Mesmo no desenrolar de um encontro, há
momentos em que nenhuma palavra é boa o bastante
78 79
1° Rftmftstrft rtp Pfllft
para expressarmos ao outro que estamos a seu lado.
Especialmente em momentos de intensa tristeza e
angustia, tocar o ajudado emite a mensagem: "Posso
não ter a solução de seu problema, mas possocom
preendê-lo; estou com você."
MANTER A MESMA ALTURA DO AJUDADO
Durante o contato com o ajudado, qualquer
que seja sua duração, é importante que p ajudador
esteja no mesmo nível físico que ele. Em outras
palavras, se o ajudado está sentado, é importante
que o ajudador se assente também. Se ele permanece
de pé, pode dar ao ajudado a impressão de que está
com pressa. Isso é especialmente importante quando
o ajudado é um paciente e está acamado, em casa
ou no hospital. Puxar uma cadeira e colocá-la em
frente a cama facilita a expressão do paciente, que
percebe, nesse gesto, a disponibilidade do ajudador.
OUTROS ELEMENTOS
Como nenhuma postura é destituída de sig
nificado, vale lembrar aqui algumas posições que,
quando adotadas pelo ajudador, podem emitir
mensagens negativas-distância, rejeição, ausência
de disponibilidade, pressa, desinteresse: qualquer
posição em que o ajudador tenha sua musculatura
contraída; pernas cruzadas; braços cruzados; coto
velos apontados na direção do ajudado; pés em
posição de andar, etc.
Neste ponto, gostaríamos de fazer uma obser
vação a respeito desses elementos ligados à postura
fî sica do ajudador: nós os consideramos como ingre
dientes do atendimento, podendo ser usados todos
ao mesmo tempo ou apenas alguns deles de cada
vez. Isso vai depender do estilo individual de cada
ajudador Não estamos apresentando regras, apenas
algumas "dicas" para serem avaliadas pelo leitor.
O fato de você atender recostado na cadeira ou fu
mando não compromete necessariamente a quali
dade de seu atendimento. Existem muitas outras
características suas que vão tomar efetivo seu en
contro com o ajudado.
80 81
1® Spmftsfrp fjp
ATENDENDO
O que é:
Transmitir ao ajudado mensagens corporais de
interesse e disponibilidade.
Para que:
Se atendo o ajudado, transmito-lhe mensagens de
interesse, de modo a envolvê-lo no processo de
ajuda.
Como:
1. Aproximar.
2. Ficar de frente.
3. Inclinar o corpo para frente.
4. Manter contato visual.
5. Manter a fisionomia receptiva.
6. Concentrar.
7. Assentir com a cabeça.
8. Tocar.
9. Manter a mesma altura do ajudado.
83
1® .Sfimfi-strft flfl 9nift
'í-'-"í-" •'^' ?í^"
sS^ \ ..^SíVi^S^r-cíii^^.-í. yíi:. .».,~..v.''
Quando me sento junto de alguém, sei que
isso é alguma coisa, mesmo que eu nada tenha de
valioso a dizer. Não necessito da evidência
constante de que estou sendo efetivo é útil Posso
apenas me sentar e oferecer minha companhia. Já
vivi situações em que minha dor não podia ser
compreendida, mas em que me sentia confortá\>el
apenas estando com alguém realmente disponível
para mim, alguém que nada exigia, alguém que
não podia compreender meu coração dilacerado,
mas que era uma companhia - como um lugar
aonde ir quando se está fraco e só- uma presença
humana, a civilização depois do deserto. É muito
quando eu apenas me sentojunto de alguém. Mas
acredito que ajuda óÀZQx que pretendo sentar em
silêncio. Ajuda afazer do nada alguma coisa.
Eugene T. Gendlin
%
s
-W
S(\t
• 5ii'^ "•
á«
is.
ss;
.=: V
i
2^
X\ {.
%
W.i
■Ri
m.
•ív"; "^"Vk-L
V'^>- ' '
•"❖hX
ÍM
84
1® Rpmpsfrp rifi 501 fi
!
'
O&scrvanáo
Quando falamos de atender, o foco é o corpo
do ajudador e como ele pode usá-lo para transmitir
mensagens ao ajudado.
Agora, invertemos o foco: nossa preocupação
aqui é captar as mensagens do ajudado através de
seu corpo, que também fala como o do ajudador.
Este, abstraindo-se das palavras do ajudado, pode
se indagar:
- Que mensagens não-verbaÍs o ajudado está me
transmitindo?
- O que seu corpo está me dizendo e que, às vezes,
suas palavras não podem me dizer?
Aí reside o papel crucial da observação na
relação de ajuda.
Se quero entender a pessoa, devo primeiro
olhar seu corpo para depois ouvir suas palavras,
pois a verdade está, acima de tudo, no primeiro.
87
1® Rfimftstrp dfl
OBSERVAR: HABILIDADE PERDIDA
Como muitas outras habilidades de ajuda,
observar faz parte do nosso dia-a-dia, e nós a usa
mos, com freqüência, no contato com as pessoas.
No entanto, não tanto quanto poderíamos. Segundo
Powell, a tristeza básica da família humana é que
muito poucas são as pessoas que aproveitam todo
o seu potencial; a estimativa é de que elas usam,
em geral, apenas dez por cento do que poderiam.
Isso vale também para o que vêem - apenas dez
por cento da beleza do mundo à sua volta.
Assim, o objetivo ao abordarmos a observa
ção é recuperarmos nossa capacidade de ver, per
dida ao longo de nosso desenvolvimento. Dois fato
res parecem ter contribuído para essa perda:
1. A incoerência dos adultos quer em nossa
infância, se comportavam de uma maneira
diferente daquilo que nos diziam. Fazendo uma
coisa e falando outra, eles nos levaram a ficar
confusos e a acreditar que tínhamos "visto
errado":
- Mamãe, você está muito triste, seus olhos estão
molhados e vermelhos de tanto chorar.
- Bobagem, meu filho, isso é porque estou gripada
hoje...
De incoerência em incoerência, fomos atrofiando
nossos olhos e nossa habilidade natural de obser
var. Infelizmente, por serem autoridades para
nós, os adultos nos levaram a acreditar mais em
suas palavras do que naquilo que víamos e nos
fizeram descrentes de nossos olhos.
2. O sofrimento que, às vezes, resulta de nossa
observação. Quando vemos de verdade, pode
mos ver, além da incoerência, a indiferença, a
rejeição, o desamor. Assim, preferimos não ver
para não sofrer e escolhemos viver "tampando
o sol com a peneira".
Como diz o provérbio, "a verdade dói, mas
liberta'*.
Treinando a habilidade de observar, vamos recu
perar a credibilidade de nossos olhos, checando
pacientemente com nosso ajudado o que estamos
vendo.
OBSERVAR X INFERIR
Antes de começarmos a ver o outro, é funda
mental estabelecermos a diferença entre observar e
inferir.
Quando observamos, estamos apenas consta
tando a existência de algumas coisas visíveis na
pessoa observada: sua aparência (a maneira como
está vestida e penteada), seus gestos, movimentos,
sua expressão fisionômica, o ritmo de sua respiração
e de seus batimentos cardíacos, sua postura, a deli
mitação de seu território corporal.
A partir desses dados objetivos, coletados
através da observação, podemos fazer inferências
- hipóteses sobre o possível significado de cada um
desses dados.
88 89
1® .^pmpRtrp fift ?nift
A observação é objetiva, não deixa margem
a dúvidas: "Eu realmente v/ seus olhos cheios
d'água".
A ínferência é subjetiva, pode estar certa ou
errada em relação à verdade da pessoa observada:
"Será tristeza o que vi em seus olhos? Será ternura?
Ou simplesmente uma conjuntivite?" Só ela pode
dizer-me. Isto é, se souber o que é e se quiser
compartilhar isso comigo.
A partir dos elementos observados, o ajuda-
dor pode inferir o nível de energia de uma pessoa,
que tipo de sentimento ela está experimentando,
sua prontidão para determinada tarefa, seu rela
cionamento com o próprio ajudador e com outras
pessoas (caso esteja em grupo) e, acima de tudo, a
coerência entre o que fala seu corpo e o que dizem
suas palavras. Vamos detalhar mais cada uma das
inferências e relacioná-las aos dados observados.
Nível de energia: refere-se ao tônus muscular ou
disposição física da pessoa. A grosso modo, pode
mos classificá-lo como alto, médio ou baixo, a partir
de sua postura (especialmente os ombros), de seus
movimentos e de sua expressão fisionômica, espe
cialmente os olhos.
Sentimentos; estes também numa classificação mais
abrangente, podem ser agradáveis ou desagi adáveis
para a pessoa que os experimenta; pode ser bom
ou ruim senti-los. Essa inferência pode ser feita a
partir de todos os elementos observados, em espe
cial a expressão fisionômica, o ritmo cardiaco e
respiratório.
Prontidão; refere-se à disponibilidade da pessoa
para executar qualquer tarefa que tenha pela frente:
fazer um exercício, assistir à aula, submeter-se a
um exame, etc. Posso supor sua presença ou ausên
cia a partir da postura e da expressão fisionômica
da pessoa observada.
Relacionamento: a relação do ajudado com o aju
dador e com outras pessoas, se fizer partede um
grupo, pode ser negativa ou positiva. Ele pode estar
aberto ou fechado para esse relacionamento. Isso
pode ser inferido através de seu contato visual com
as pessoas (se ele o mantém ou não) e da delimitação
de seu território corporal. Este pode ser inferido se
traçarmos uma linha imaginária em volta do ajudado
e observarmos sua relação com as pessoas a seu
redor, incluindo o ajudador. Assim, não é por acaso
que ele fica sempre próximo de algumas pessoas e
distante de outras. Também não é coincidência,
numa sala de aula, que um aluno se assente sempre
na primeira fila e um outro, sempre na última.
Observando seu território corporal, podemos inferir
sua relação com o professor e com os colegas.
Toda vez que o ajudado se coloca numa pos
tura de atendimento diante do ajudador ou de outras
pessoas do grupo, podemos dizer que o seu relacio
namento é positivo; caso contrário, que ele está
fechado para a relação.
90
91
1® rift 701 fl
Ainda um bom exercício para se inferir a
relação de uma pessoa com as outras é a observação
de fotografias. Estudando a inclinação do tronco e
da cabeça, o afastamento, a distância, a posição das
mãos e dos pés, podemos supor muitas coisas a
respeito das pessoas fotografadas. Isso vale espe
cialmente para o estudo das relações num núcleo
familiar, através dos álbuns de família. Além de
todos os dados acima, podemos verificar a fre
qüência com que os membros da família se apro
ximam e se afastam de outros.
Coerência; o último item a ser inferido - a coerência
entre o corporal e o verbal - como já foi dito anterior
mente, é o mais revelador em relação ao ajudado.
Há momentos em que ele nos diz determinada coisa
e nos mostra outra, ás vezes inversa. Como o corpo
é mais genuíno do que o intelecto,^qüe dita as
palavras, é também mais digno de crédito. Muitas
vezes, o que me traz a verdadeira compreensão
sobre a pessoa é aquilo qué vejo e não aquilo que
escuto. Vamos falar, adiante, da decisão de dizermos
ou não ao ajudado a respeito do que vimos, especial
mente quando isso contradiz o que ele fala,
princípios da OBSERVAÇÃO EFETIVA
1. O ajudador deve ser discreto ao observar o
ajudado.
A discrição refere-se à naturalidade com que
o ajudador capta as mensagens do ajudado. En
cará-lo com curiosidade vai fazer com que ele
se sinta tolhido e se feche. Se ele se sentir "vigia
do", vai também mudar seu comportamento,
deixando de ser espontâneo na relação com o
ajudador.
2. O ajudador deve ser persistente e paciente na
sua observação.
Já que a capacidade de observar foi parcial
mente perdida ao longo de seu desenvolvimento,
é importante agora que o ajudador seja persis
tente e paciente na recuperação da habilidade
perdida. Isso significa um treino constante - não
só durante o tempo em que está trabalhando,
mas durante todo o tempo. Encontros, reuniões
ou qualquer atividade que envolva gente são boas
oportunidades para se observar as pessoas e suas
interações umas com as outras.
3. As inferências só se tornam verdades quando
confirmadas pelo ajudado.
Acima de tudo, o ajudador deve ser humilde
para admitir que não é dono da verdade de
ninguém e que só o ajudado sabe de si. Quando
o ajudador decide checar suas inferências com o
ajudado, este pode confirmá-las ou negá-las.
Quando o ajudado as confirma, ele já tem
consciência dos aspectos inferidos pelo ajudador
e se sente verdadeiramente compreendido por
ele; ou o ajudado não sabe e, concordando com
a inferência, está se tomando mais ciente de seus
92 93
.*ípmRRtrf» rlR ?nift
sentimentos, mais próximo de si mesmo e de sua
experiência.
Quando o ajudado nega suas inferências, é
porque:
- o ajudador se enganou; suas suposições a respei
to do ajudado não correspondem à verdade. O
significado do que ele viu é outro que não aquele
inferido (os olhos rasos d'água não são de triste
za, mas a simples reação a um cisco caído no
olho);
- o ajudado concorda interiiamente, mas não quer
admitir o que foi inferido pelo ajudador. Ele não
quer "dar o braço a torceri', ou talvez se enver
gonhe daquilo que o ajudador descobriu a seu
respeito. Mais tarde, quando sua entrega na
relação for maior, ele vai poder admitir o que
agora nega;
- o ajudador acertou na sua inferência, mas cedo
demais - o ajudado não .está pronto ainda para
admitir, nem para ele mesmo, que aquilo que o
ajudador inferiu seja verdade. Assim, negando
para si mesmo, nega, conseqüentemente, para o
ajudador. Ele precisa de mais tempo para tra
balhar suas vivências até ficar pronto para aceitar
o que realmente está se passando com ele.
Novamente aqui, diante de uma recusa do aju
dado em aceitar sua inferência, o ajudador deve con
tinuar sendo humilde e respeitoso, não discutindo
com ele nem tentando convencê-lo a aceitar sua
inferência. Mais tarde, o ajudador pode perceber
que se enganou, ou o ajudado pode aceitar a inferên
cia. Se esse é o caso, ambos sairão enriquecidos: o
ajudado, por ter descoberto mais a seu próprio
respeito e por estar entregando-se mais na relação;
o ajudador, por ter sabido respeitar e esperar pelo
momento certo.
O mais importante para o ajudador é não ficar
preso á inferência recusada, pois essa prisão pode
significar a perda de outras descobertas impor
tantes a respeito do ajudado e que estão por acon
tecer.
4. Há o momento exato para se comunicar ao
ajudado alguma observação a seu respeito.
Além das inferências, mesmo os dados mais
óbvios observados pelos ajudador podem não
ser aceitos pelo ajudado.
Aj udador: - Toda vez que você fala sobre isso,
fica ofegante.
Ajudado: - Impressão sua, isso não é nem um
pouco importante para mim.
Também aqui prevalece o mesmo respeito
mencionado no tópico anterior. As vezes, basta
que o ajudador arquive o que viu, esperando o
momento em que o ajudado vai estar pronto para
ver também.
94 95
1° dft
5. Algumas observações nunca serão comunicadas
ao ajudado.
Se relembrarmos aqui a finalidade da relação
de ajuda-levar o ajudado a crescer como pessoa
- esse deve ser o critério para decidirmos, muitas
vezes, que não vamos dizer a ele o que vimos.
Como tudo o que o ajudador faz durante o
processo de ajuda, esse tipo de comunicação
também pode ser para melhor ou para pior em
relação ao ajudado. Se for para mejhor, basta
esperar o momento adequado. Caso contrário,
o que foi visto é arquivado, servindo apenas
como um dado a mais para compreendê-lo.
OBSERVANDO
O que é:
Usar os olhos para captar as mensagens nâo-verbais
transmitidas pelo ajudado.
f. •
Para que:
Se observo o ajudado, posso receber mensagens
significativas sobre o que ele está vivendo, de modo
a conhecê-lo melhor.
Como:
1. Olhar.a aparência do ajudado.
2. Olhar o comportamento do ajudado.
3. Inferir;
- nívehie energia
- sentimento
- prontidão
- relacionamento
- coerência.
96 97
1® .^pmflRtrp <1p ?niR
Olhe para mim. Por favor, me veja.
Não minhas roupas ou unhas curtas
Ou minhaface descuidada.
Abra seu coração, de modo a ver o meu.
Não estou lhe pedindo para concordar com
Ou compreender tudo o que vê,
Pois nem mesmo eu faço isso.
Apenas olhe para o que está realmente aqui
E permita ser.
Peg Hoddinott
. •> v>
1;
M
■} '
V;
Sá
;?íN-h2s;í.:v ••
.1^ ,.K^'4Ç&
wMu
fí È̂• v
à
1
^ ♦ **C
<S<
N.
;X-
*?3
'S,.-
m\:m Vi*
5xv:^-, ■\.-\-X > • •
•■ - N^ -" ■v > .^'■ àti
%''v.
\\X
98
1® Sftmpstrft flp ?nift
í
'
'
í
%
^Escutando
Até aqui, referimo-nos, basicamente, à parte
não-verbal da interação entre ajudador e ajudado.
Ao preparar o ambiente, acolhê-lo e atendê-lo, o
ajudador está transmitindo mensagens não-ver-
bais. Ao observar, está captando mensagens não-
verbais.
Ao escutar, no entanto, começamos a lidar
com o aspecto verbal da interação, ainda que só da
parte do ajudado.
Enquanto observar é captar suas mensagens
não-verbms, escutar refere-se a captar as mensagens
verbais que ele transmite, retendo na memória os
pontos mais importantes de seu relato.
Quando associamos as mensagens verbais às
não-verbais, aumentamos a chance de compreender
realmente o que se passa com o ajudado. Ao escutarmos, comunicamos, mais uma vez, nosso desejo
de ajudá-lo.
1® .^pmpstrp dp
101
ESCUTAR: MAIS UMA HABILIDADE
PERDIDA
Se ficarmos atentos às pessoas que nos cer
cam, vamos perceber que muito poucas são aquelas
que têm a capacidade de escutar, verdadeiramente.
Muitas "fazem de conta" que escutam. É suficiente
um pequeno teste para verificarmos que absorveram
uma parcela ínfima do que foi dito ou, às vezes,
nem isso. Outras nem mesmo simulam: quando são
procuradas por alguém que precisa muito dizer das
suas coisas, começam imediatamente a falar de si
mesmas, ao invés de escútar.
Da mesma forma que tentamos compreender
a perda da capacidade de observar, podemos tentar
descobrir o que nos impediu de aprender a escutar.
Antes de mais nada, não tivemos modelos
efetivos de "escutadores". Provavelmente nossos
pais não nos escutaram, nem nossos professores,
nem nossos amigos. Perdemos, assim, a chance de
aprender por imitação. V
Além disso, escutar é um risco de se entrar
em intimidade com aquele que fala. Quando dou
ao outro a chance de falar de si mesmo, vou escutar
coisas que podem me amedrontar porque não sei
como responder ou lidar com elas. Por outro lado,
a pessoa que fala de si faz um convite para que eu
fale de mim. Ela se entrega a mim e espera que, em
retomo, eu me entregue a ela. E eu tenho muito
medo de me entregar. Não aprendi a dizer as minhas
coisas, receoso de me mostrar fraco e não ser aceito
por isso. Assim, está formada a cadeia: não escuto,
para que você não fale a seu respeito, para que eu
não fale a meu respeito. Ao invés disso, falo em
primeiro lugar para ter o controle da conversa, e
escolho temas tão superficiais que não corro o risco
de ter que entrar em intimidade e me expor ao outro.
Quanto a essa superficialidade, Powell classi
fica a comunicação entre as pessoas em cinco níveis
de profundidade, indo do mais superficial ao mais
íntimo ou profundo:
Nível 5: conversa clichê - é aquela que se faz atra
vés de frases prontas e chavões, em que as palavras
soam vazias porque na verdade, não representam o
que sentimos, ou o que queremos dizer realmente:
"Apareça lá em casa um dia desses..."
Nível 4: comentários sobre outras pessoas - é o
que chamamos, habitualmente, de "fofoca". Uma
pessoa se encontra com outra e fala a respeito de
uma terceira, nunca a respeito de si mesma: "Você
nem imagina com quem ele estava ontem..."
Nível 3: idéias e julgamentos - é o início da auto-
exposição, quando a pessoa começa a falar das
coisas que pensa, de suas idéias, de suas crenças:
"Na minha opinião, a Educação Sexual deveria ser
obrigatória nas escolas."
Nível 2: sentimentos e emoções - além de idéias e
pensamentos, há muito mais para a pessoa oferecer
102 103
1° Rftmftstrfi rtft ?nift
de si mesma e que a torna um ser único: seus
sentimentos e emoções. Ela tem medo de expressá-
los, pois pode não ser aceita por isso: "Fico muito
embaraçado quando meus filhos falam de sexo
comigo".
Nível 1: comunicação perfeita - são os momen
tos em que as duas pessoas que interagem con
seguem sentir uma empatia tão reciproca e ver
dadeira, que cada uma compartilha inteiramente sua
experiência e é capaz de sentir inteiramente a da
outra. Acima de tudo, cada uma expressa hones
tamente os sentimentos que experimenta em relação
à outra:
- "Tenho medo de te perder, por Isso sinto tanto
ciúme."
- "E assim que me sinto também: ameaçado cada
vez que você conhece uiua pessoa nova, com
medo de você ir embora;"
V.
Os níveis mais profundos de relacionamento
exigem que as pessoas envolvidas saibam escutar.
A melhor maneira de superíícializar um encontro é
não escutar, apenas falar de coisas sem importância
em relação à própria experiência.
Pode parecer contraditória, mas é verdadeira
a afirmação de que quanto mais necessito (e temo)
falar, menos escuto o outro, com medo de que
"chegue a minha vez".
QUANDO SÓ ESCUTAR É SUFICIENTE
Às vezes, nos surpreendemos quando, depois
de um encontro em que escutamos uma pessoa sem
dizermos nada, ela nos agradece, aliviada pela ajuda
que prestamos. Não conseguimos entender como,
mesmo "sem fazer nada", conseguimos ajudar.
Muitas vezes, a pessoa necessita apenas de
ser escutada para que possa ordenar e organizar
sua própria experiência. Quando encontra alguém
pela frente disposto simplesmente a parar e escutá-
la, começa a dizer coisas, antes de mais nada, para
ela mesma. À medida que vai falando, escuta sua
própria voz e vai colocando em ordem pensamentos
que, contidos, estavam confusos. Sem dizermos
nada, ela não só ordena sua experiência, como tam
bém se compreende melhor e chega a encontrar uma
saída para seus problemas.
Mesmo nos casos em que uma solução parece
distante ou até impossível, o mero falar traz um
alívio imediato. Fica para a pessoa a sensação de
que encontrou, no mínimo, alguém interessado em
seu problema. Se não descobriu a solução, encon
trou alento e esperança. A imagem que ilustra bem
a situação é aquela de um reservatório prestes a se
romper pelo acúmulo de água represada. Se permi
tirmos que essa água se escoe por uma pequena
brecha, haverá um "alívio" no reservatório, que não
mais se romperá. Esse processo também ocorre com
a pessoa sobrecarregada de emoções - quando ela
se expressa, encontra alívio; se o nível de tensão
104 105
1® .^pmpRtrft rip ?niR
sobe acima de seu limite, sem possibilidade de
dividir o peso com alguém, ela explode, desestru-
turando-se.
Quanto a "não fazermos nada" e a "apenas"
escutarmos, isso não passa de uma subestimação
de nossa capacidade. Estamos, isso sim, fazendo
muita coisa quando escutamos o outro com inte
resse e atenção. Estamos abrindo espaço para que
ocorra esse alivio a que nos referimos. Temos a
tendência a buscar técnicas complexas e
sofisticadas, quando as habilidades mais simples
são as mais efetivas - e estão ao nosso alcance.
TUDO O QUE ESCUTO É VERDADEIRO
E importante que o ajudador tenha em mente,
ao escutar, que qualquer coisa dita pelo ajudado
tem uma razão de ser. Não existe "mentira" no que
ele diz. Se algum fato relatado não corresponde à
realidade objetiva, não cabe ao ajudador desmentir
ou discordar do ajudado. Se ele diz que é o sol que
ilumina a noite, é porque precisa ver as coisas dessa
maneira. Só acreditando nele e continuando a seu
lado, sem tentar convencê-lo do contrário, é que
vamos poder compreendê-lo. E talvez ajudá-lo,
algum dia, a ver a noite como ela é - não iluminada
pelo sol, mas pela lua e pelas estrelas.
Vale aqui lembrar o ajudado rotulado como
"paciente psiquiátrico". Talvez sua principal carac
terística seja a distância entre o que vive e o que
chamamos de realidade objetiva. Se ele diz que está
vendo uma aranha a percorrer-lhe o corpo, não cabe
ao ajudador dizer-lhe que isso é mentira e que não
há nenhuma aranha em seu corpo, nesse momento.
Acreditando que ela está lá e tentando ver o seu
significado na vida do ajudado, talvez o ajudador
possa, mais tarde, levá-lo a libertar-se dela.
A base do processo de ajuda é tentar ver o
mundo com os olhos do ajudado, não importa como
ele o veja. O papel do ajudador não é mostrar ao
ajudado o que é certo ou errado, verdade ou menti
ra, mas apenas estar a seu lado e compreendê-lo.
O que ele diz ao ajudador é o que ele precisa
dizer-lhe, num dado momento; talvez seja o que
ele mesmo precisa de acreditar, para sobreviver, e
sua esperança é que o ajudador acredite também.
O que ele diz é, acima de tudo, a sua verdade. E é
nela que o ajudador vai acreditar se quiser ajudá-
lo.
A FALA É COMO UMA CANÇÃO: TEM
MÚSICA E LETRA
Quando escuto uma pessoa, posso dividir sua
fala em duas partes: o conteúdo verbal ou o con
junto das palavras, que corresponde à letra de uma
canção; e a "música" que acompanha esse conteúdo,
formada da entonação da voz, de sua altura, inten
sidade e timbre, do ritmo das palavras, das pausas
entre uma e outra e da respiração de quem fala.
A linguagem escrita poderia ser comparada
a uma canção sem música, só com letra. É a lingua-
106
1® rift ?niR 107
gem falada que ganha vidacom a melodia que cada
pessoa lhe empresta.
Uma mesma frase pode ser dita de várias
maneiras por pessoas diferentes; pode comunicar
alegria, tristeza, raiva ou qualquer outra coisa -
depende de como é dita.
Cada elemento dessa música tem um signifi
cado especial - se falo depressa, posso estar ansioso;
se faço pausas ou gaguejo, posso estar embaraçado;
se falo baixo, posso estar envergonhado e, se minha
respiração é ofegante, posso estar emocionado.
Se o ajudador quer captar o máximo da ex
periência de seu ajudado, deve estar atento a tudo
o que ele diz e à maneira como ele diz.
BUSCANDO TEMAS COMUNS
A medida que o ajudador escuta, vai sele
cionando, em meio à fala do ajudado, aqueles pontos
mais relevantes de sua experiência. Se avaliarmos
a expressão verbal de uma pessoa, vamos perceber
que alguns pontos são fiindamentais, enquanto
outros são secundários e aparecem apenas como
complementos dos primeiros.
Ao escutar, o ajudador separa os tópicos mais
importantes dos menos importantes, tentando iden
tificar o que é realmente relevante para o ajudado.
Dois critérios podem ajudá-lo nessa seleção:
- tudo o que é importante se repete, várias vezes,
na fala do ajudado - é o tema central que vai e
volta, ainda que sob formas diferentes até que
ele o tenha explorado inteiramente e possa passar
a outro tema;
- o que é importante é dito com grande intensidade
pelo ajudado - ele pode alterar o tom da voz,
encher os olhos d'água, fazer pausas; enfim, cada
vez que ele tocar num ponto relevante, haverá
uma mudança marcante na música que
acompanha suas palavras.
MENSAGEM EXPLÍCITA X MENSAGEM
IMPLÍCITA
Há ainda um outro aspecto fundamental a ser
lembrado quando se aborda o escutar: a fala de
uma pessoa é, quase sempre, expressa em dois
níveis.
Num primeiro nível captamos a mensagem
explícita. Esta consiste no conjunto de palavras
objetivas e audíveis para quem escuta; é o que a
pessoa parece estar querendo transmitir:
- "Engraçado, acho que ando mesmo sem sorte;
sempre que lhe telefono, a secretária me diz que
você está ocupado".
A mensagem explícita, no entanto, não vem
sozinha.
Seu propósito é esconder alguma outra men
sagem que a pessoa, por alguma razão, não pode
transmitir diretamente. Ela é apenas o veículo atra-
108
1® .^Rmpstrp dft ?nifl
109
vés do qual a pessoa vai tentar dizer o que realmente
está sentindo e querendo dizer - a mensagem
implícita, que é a verdadeira mensagem;
- "Acho que não sou importante para você, porque
nunca me atende quando telefono".
Escutar é, acima de tudo, a busca permanente
da verdadeira mensagem, que a pessoa esconde
através de palavras por não poder revelá-la aberta
mente.
COMPORTAMENTOS QUE FACILITAM O
ESCUTAR
Ficar calado
A relação falar-escutar é uma simples questão
de espaço. Se preencho esse espaço falando, não
existe a menor possibilidade de que outra pessoa o
faça. Quando duas ou mais pessoas se encontram,
a fala se torna fator de competição. Cada uma
disputa o maior espaço possível para que, falando,
possa receber atenção e, às vezes, testar o quanto
está sendo aceita e amada pelos outros.
Em se tratando de uma relação de ajuda, o
espaço maior pertence ao ajudado. É ele que precisa
de ajuda e a está buscando, e o mínimo que tem a
fazer é falar; quanto ao ajudador, o mínimo que
tem a fazer é calar-se, até o momento em que o
ajudado lhe ceda o espaço.
Não interromper
Quando o ajudado fala, segue uma linha de
raciocínio com princípio, meio e fim, como se "falas
se em parágrafos". Quando o ajudador corta essa
linha ao meio, dispersa o ajudado e o afasta do foco
de seu problema. Ele vai voltar sua atenção para as
palavras do ajudador no momento em que mais pre
cisa estar consigo mesmo. A interrupção é um corte
no contato que o ajudado estabeleceu consigo mes
mo, uma perda da própria pessoa.
Não interromper significa discriminar o mo
mento exato em que o ajudado, expressando-se ver
bal e corporalmente, não só cede o espaço para o
ajudador, como também lhe pede que fale. Ele agora
é quem quer escutar, até o momento em que indicar
que precisa de espaço novamente.
Enfim, o ajudado é que administra o espaço
na relação de ajuda - usando-o e cedendo-o de
acordo com suas necessidades.
Evitar distrações externas
Tanto no tópico sobre privacidade (prepa
rando o ambiente) quanto no tópico sobre concen
tração (atendendo), já nos referimos à importância
de se diminuir, tanto quanto possível, a estimulação
externa durante o encontro de ajuda.
O ajudador deve cuidar desses dois aspectos
para evitar que sua atenção se desvie do ajudado:
preparar o ambiente de modo a eliminar, ao máximo,
quaisquer estímulos visuais e auditivos; estar atento
à sua própria concentração, de modo a não se dis-
110 111
1® .SftmfiRtre rtft ?nift
trair com qualquer outra atividade, por menor que
seja.
As vezes, esses cuidados, apesar de simples,
são muito efetivos para a redução de estímulos.
Numa sala de aula, por exemplo, manter a porta
aberta é um convite à dispersão tanto para o profes
sor quanto para os alunos - é difícil impedir que a
atenção se volte para quem passa no corredor ou
para os ruídos que vêm de fora. Um simples fechar
de porta faz uma enorme diferença. Numa enfer
maria, há também uma maneira simples de se cortar
um pouco a estimulação proveniente do movimento
intenso de médicos, enfermeiras, alunos, serventes,
visitas e dos outros pacientes. Apesar de não ser o
lugar ideal para um encontro de ajuda, pode-se tanto
aumentar a privacidade do paciente como também
diminuir pelo menos parte da estimulação visual se
for usado o "biombo". Essa divisória móvel, que faz
parte das enfermarias, é usada, em geral, para a troca
de curativos e para os exames em que o paciente
precisa ficar sem roupa; às vezes, é também usada
para isolar um paciente terminal, que constitui estímu
lo doloroso e ameaçador para os outros. Esse mes
mo biombo, quando colocado entre a cama do ajuda
do e o resto da enfermaria, facilita bastante sua rela
ção com o ajudador. E como se ambos se abstraíssem
do que está acontecendo do outro lado do biombo.
Para o ajudador, cortar as distrações externas
aumenta muito sua capacidade de escutar e de
manter sua atenção voltada só para o ajudado por
períodos de tempo mais longos.
Evitar distrações internas
O ambiente externo não é a única fonte de
estimulação para o ajudador. Seu próprio ambiente
interno - seu corpo e seu coração - às vezes lhe
oferece estímulos tão Intensos, que esses o impedem
de escutar o outro. Quando isso acontece, seu mo
mento é de escutar, mas a si mesmo - a seu corpo,
que carece de atenção, ou a seu coração, que lhe
demanda cuidado.
As distrações internas podem ser de ordem
física ou emocionai. Quando são físicas, há alguma
coisa acontecendo com o corpo que exige uma pa
rada do ajudador na sua própria pessoa. Ele pode
estar precisando de satisfazer alguma necessidade
básica - sono, repouso, alimentação, eliminação. É
quase impossível escutar alguém quando estamos
com sono, cansados, com fome, com sede ou com
a bexiga cheia.
Além disso, qualquer desconforto ou incômo
do físico dividem, também, nossa atenção; roupas
ou sapatos apertados, dores, febre, qualquer tipo
de mal-estar. Até que as necessidades sejam satis
feitas e os incômodos sejam eliminados, o ajudador
não vai estar inteiro para o ajudado.
O mesmo ocorre com as distrações emocio
nais. Quando o ajudador está vivendo alguma difi
culdade que o angustia, precisa se escutar. Ouvindo
sua própria voz, não vai estar pronto para ouvir a
voz dos outros. As vezes, precisa até mesmo buscar
um ajudador que facilite a resolução de seus
problemas. Nesse momento, ele precisa falar, não
112
113
1° .Spmfisfrp rlfi ?nift
escutar; ele se transforma num ajudado e não pode
ser, ao mesmo tempo, ajudador. Se ele se forçar a
escutar alguém, sua própria voz vai competir com
a voz do outro ~ ambas precisam ser ouvidas e,
nessa competição, é a sua voz que vai ganhar. Es
cutar o outro, nessa hora, é uma tarefa impossível,
pois seu espaço interno já está ocupado com suaprópria fala. É preciso que o ajudador "se esvazie"
primeiro, se quiser oferecer seu espaço ao ajudado
novamente.
/ . /
E importante lembrarmos que o profissional
de ajuda não é um "super-homem" nem um "semi-
deus". E feito da mesma massa que as outras pes
soas: sofre, passa por momentos difíceis, entra em
crises. A única coisa que o diferencia dos outros é
o conjunto de habilidades que possui para lidar com
os próprios problemas, a facilidade com que aprende
através da própria dor e a efetividade com que sai
de suas crises: mais maduro, mais crescido, mais
inteiro.
Resumindo, só posso ajudar o outro depois
de ajudar a mim mesmo; quando estou em falta
comigo e tento ajudar alguém, seremos dois ajuda
dos e afundaremos, juntos, no mesmo barco.
Suspender julgamentos
Toda pessoa possui seu próprio sistema de
valores - aquele conjunto de crenças e princípios a
respeito de si mesma, dos outros, da vida e do mun
do que a cerca. Esse sistema é dividido em "certos"
e "errados" - aquilo que a pessoa se permite viver.
e que é a "coisa certa"; aquilo que ela não aceita
para si mesma (e, às vezes, para os outros), e que é
a "coisa errada". É esse sistema de valores que dá
direção à sua vida.
Numa relação de ajuda, entre outras coisas,
ocorre o encontro entre dois sistemas de valores
quase sempre diferentes - o do ajudador e o do
ajudado.
Se, ao escutar, o ajudador permite que o seu
sistema de valores aflore e venha à tona, vai começar
a julgar o que escuta de acordo com esses valores,
classificando o que o outro diz em certo e errado,
bom ou ruim.
Quando isso ocorre, o ajudador deixada escu
tá-lo para escutar sua própria voz, como acontece
com as distrações internas. Se, ao invés de ouvir o
relato do ajudado, começa a avaliar esse relato, está
ouvindo a si mesmo e perde, portanto, tudo o mais
que o ajudado tem a dizer.
Essa tendência ao julgamento está presente
na maior parte das pessoas e é uma das causas mais
comuns da dificuldade de escutar e de ajudar o ou
tro. A dificuldade fica ainda maior quando essejul-
gamento é explícito, ou seja, quando o ajudador o
transmite verbalmente para o ajudado. Esse vai
sentir-se incompreendido e pode querer procurar
alguém que seja mais capaz de compreendê-lo.
Julgar é exatamente a atitude inversa às pos
turas de aceitação incondicional e de empatia encon
tradas nos ajudadores efetivos. Não se trata aqui
de se abrir mão do próprio sistema de valores, mas
114
115
1® Rftmestrp Hp 9niR
apenas de esquecê-lo durante o encontro com o
ajudado. Fazendo isso, o ajudador abre as portas
de seu coração sem restrições, escutando as palavras
do ajudado sem qualquer centrara.
Trata-se aqui, também, de sermos suficien
temente humildes para sabermos, mais uma vez, que
não somos donos da verdade - o que é bom para
mim pode não o ser para o ajudado e vice-versa.
Ajudar não é impor meu sistema de valores à outra
pessoa, mas apena ajudá-la a construir o seu próprio
e viver em coerência e harmonia com ele.
ESCUTANDO
O que é:
Usar os ouvidos para captar as mensagens verbais
transmitidas pelo ajudado.
Para que:
Se escuto o ajudado, permito que ele diga tudo o
que considera importante, de modo a compreendê-
lo melhor.
Como:
1. Ficar calado.
2. Não interromper.
3. Evitar distrações externas.
4. Evitar distrações internas (físicas e emocionais).
5. Suspender julgamentos.
116 117
1® Sempstrp rie 701 ft
Âssim, o primeiro e mais simples sentimento
que quero compartilhar com você è minha
satisfação quando consigo realmente escutar
alguém. Creio que essa tem sido uma característica
antiga em mim. Ocorrem-me meus primeiros dias
de escola. Uma criança fazia uma pergunta à
professora, e esta dava uma respostaperfeita a uma
pergunta completamente diferente. Nessas
ocasiões, um sentimento de dor e angiistia sempre
me invadia, Minha reação era: - Mas você nem
mesmo o escutou! Eu sentia uma espécie de
desespero infantil diante dafalta de comunicação
que era (e ainda é) tão comum.
Carl R. Rogers
OXt.
tais.s-
Sv .-r
a)J
4 "«satf'
. n
U\\
118
1® Rftmftstrft rtft PDIR
Vimos, neste capítulo, as cinco habilidades
que fazem parte do sintonizar; preparar o ambiente,
acolher, atender, observar e escutar. E através delas
que o ajudador deixa que o mundo do ajudado
penetre o seu. Comunicando-lhe sua disponibilida
de, vendo-o claramente e ouvindo o que ele tem a
dizer, o ajudador vai poder formar um quadro mais
preciso do ajudado. É com esse quadro em mente
que ele vai poder começar a responder.
Relembrando aqui o titulo do livro - Cons
truindo a Relação de Ajuda - poderíamos comparar
as habilidades não-verbais aos alicerces de uma
construção. Além de indispensáveis, é de sua quali
dade que depende a firmeza do edifício. Isso é tam
bém verdade para as habilidades de sintonizar -
quanto mais desenvolvidas por parte do ajudador,
maior a chance de ele ser efetivo com o ajudado.
Se elas não estiverem presentes no processo de aju
da, pelo menos num nível mínimo, faltará a própria
base desse processo que irá, sem dúvida, fracassar.
RESPONDENDO
(abrindo as portas da comunicação)
120 121
1® SpmpstrR flft ?niR
Estamos iniciando, neste capítulo, a aborda
gem das habilidades verbais que o ajudador precisa
desenvolver em sua interação com o ajudado - as
habilidades de responder.
Apesar de extremamente importantes e in
dispensáveis ao processo de ajuda, as habilidades
de sintonizar, na maior parte dos casos, não são
suficientes para uma condução efetiva desse pro
cesso.
Mesmo reconhecendo o enorme significado
da interação corporal entre as pessoas, não podemos
nos esquecer de que a comunicação entre seres
humanos é feita basicamente através da palavra.
O ajudado, ao terminar cada uma de suas
colocações verbais, espera um retorno do ajudador,
também verbal. E certo que a necessidade básica
do ajudado é falar - mas vai chegar o momento em
que vai querer escutar. Ele pode querer uma prova
concreta de que foi compreendido. E essa prova é
verbal. Ele pode querer escutar algo além daquilo
que já sabe a seu respeito para se situar melhor, ou
decidir melhor. Esse algo mais só o ajudador pode
lhe transmitir, verbalmente.
Se prestarmos atenção às respostas que as
pessoas dão umas às outras no dia-a-dia, vamos
perceber que pouco têm a ver com o que foi dito.
Às vezes, a distância entre as verbalizações
das pessoas que conversam é tão grande, que
parecem estar falando línguas diferentes. Isso pode
ocorrer por várias razões:
- não aprendemos a escutar e é impossível respon
dermos corretamente quando não escutamos;
- não aprendemos a responder, da mesma forma
que não aprendemos as outras habilidades;
- precisamos tanto falar a nosso respeito, que não
podemos responder ao outro; quando este ter
mina uma colocação, iniciamos outra que nada
tem a ver com ele, e sim com a nossa própria
pessoa.
Constatando essa dificuldade, vamos ver,
neste capitulo, o que podemos fazer para desenvol
vermos as habilidades de responder e para faci
litarmos, com nossas respostas, o crescimento do
outro.
122 123
1® .«sftmfistrft rip. ?niR
'
í
'
1® SprriRRtrp Hp ?niR
Q^spontíeníío ao Coníeúíío
SEPARANDO Õ JOIO DO TRIGO
Uma das características que estão presentes
na maior parte dos ajudados é o relato confuso de
sua experiência. Essa confusão reflete uma certa
desordem interna e uma dificuldade para separar
os elementos relevantes dos que não o são. Na maio
ria das vezes, o ajudado está perdido em seu próprio
mundo. Uma das expectativas que ele tem do ajuda-
dor é que este o leve a encontrar um caminho. Para
que isso ocorra, uma das primeiras tarefas do ajuda-
dor é refazer a expressão verbal do ajudado de um
modo novo, resumindo e organizando o que ele lhe
disse.
Responder ao conteúdo, então, é buscar na
fala do ajudado o verdadeiro motivo que o levou a
se manifestar verbalmente ou até mesmo o motivo
que o levou a procurar ajuda.
Conteúdo, nesse sentido, se refere ao tema
central de sua fala - esse tema em torno do qual as
pessoas, contam suas histórias, às veze longas e
126
confusas. Refere-se,também, àquele conjunto de
temas comuns que mencionamos no tópico sobre
escutar. Como essa habilidade - escutar - é pré-
requisito para o responder, só escutando com aten
ção total vamos ser capazes de separar o joio do
trigo, ou seja, de identificar, em meio à fala do aju
dado, os elementos mais importantes. São esses
elementos que compõem a verdadeira mensagem
que ele quer nos transmitir.
A resposta de conteúdo não implica repetir,
mas refletir esse conteúdo, através de formatos do
tipo; "Você está me dizendo que..." ou "Em outras
palavras..." ou "Parece-me, então, que o mais im
portante é...".
EFEITOS DA RESPOSTA DE CONTEÚDO
Como na interação entre pessoas não existe
causa sem efeito, podemos identificar algumas
conseqüências, tanto por parte do ajudado, quanto
por parte do ajudador, quando este responde ao
conteúdo;
Por parte do ajudador;
Aqui a palavra-chave é compreensão - o
ajudador tem como tarefa básica compreender o
ajudado. Muitas vezes, é o ajudador a primeira pes
soa a fazer isso, em toda a vida do ajudado. Como
ele (ajudador) vai saber se realmente captou a men
sagem do outro? Como vai saber se realmente o
escutou? Quando responde ao conteúdo, ele obtém
do ajudado respostas a essas indagações. Este vai
confirmar ou negar a percepção do ajudador, corpo
ral e verbalmente. Quando o ajudado diz: "É isso
mesmo!" ou relaxa sua fisionomia (e aqui a habili
dade de observar continua presente), está confir
mando sua percepção. Quando ele diz: "Bem, não
é exatamente assim", ou franze a sobrancelha, está
negando a percepção do ajudador. É como se este
usasse a resposta de conteúdo como uma bússola
através da qual faz sucessivas correções de rumo
até que o caminho certo seja encontrado.
Por parte do ajudado;
Já dissemos que o ajudado geralmente está
confuso. Diante de uma resposta correta, ele dá o
primeiro passo na direção de seu crescimento: co
meça a explorar sua própria experiência, organi-
zando-a para descobrir onde está. Aqui também a
palavra-chave é compreensão - ele começa a se
compreender, encontrando uma certa ordem em
meio ao caos.
Se "faço comigo o que fazem comigo", é
através da compreensão do ajudador que ele começa
a se compreender: o ajudado faz consigo o que o
ajudador faz com ele.
Mesmo nos casos em que ele não está confu
so, a resposta de conteúdo vai lhe comunicar a
atenção do ajudador - é como se essa resposta refor
çasse verbalmente a comunicação corporal da pos
tura de atender. A mensagem é a mesma: "Estou
junto dç você". Como conseqüência, o ajudado se
126 127
1® rift 901 ft
sente mais confiante, seguro e disposto a continuar
falando de si mesmo, aprofundando, cada vez mais,
suas verbalizações.
Por outro lado, às vezes a resposta de conteú
do parece não provocar qualquer efeito sobre o
ajudado, seja verbal ou corporal. Ele está tão en
volvido nas próprias verbalizações, que precisa
ainda dizer mais a seu respeito. Nesse momento, é
impossível escutar a resposta do ajudador, por mais
acertada que seja. A sua própria ausência de reação
à resposta tem um significado - é como se ele
estivesse dizendo: "Fique calado, não acabei de lhe
dizer tudo o que preciso; espere até que eu esteja
pronto para escutar você".
O TAMANHO DA RESPOSTA
É muito importante que o ajudador esteja
atento ao tamanho de sua resposta: esta deve ser
sempre menor do que a colocação feita pelo ajudado.
Em primeiro lugar, a resposta de conteúdo é
um resumo da fala do ajudado. Como todo bom
resumo, deve ser sintética e formulada em poucas
palavras, sem detalhes ou divagações. Compete ao
ajudador identificar o "miolo" dessa fala e devolvê-
lo com o menor número possível de palavras, para
que o ajudado simplifique e perceba, com clareza,
o que está vivendo naquele momento. Aqui, por
exemplo, poderíamos formular uma resposta de
conteúdo ao que foi dito nos dois primeiros pará
grafos:
"Você está me dizendo que as pessoas falam
mais do que o necessário para expressar o essencial
e que o ajudador pode devolver ao ajudado apenas
o que é fundamental em sua fala". Com relação ao
tamanho, foram gastas 14 linhas para expressarmos
uma idéia nos dois primeiros parágrafos, enquanto
foram gastas apenas 4 para respondermos ao con
teúdo desses mesmos parágrafos.
Além disso, como já foi mencionado antes,
há um aspecto básico na relação de ajuda que não
pode ser esquecido - a distribuição do espaço (ou
tempo). Essa distribuição não pode ser eqüitativa
- a parcela maior é sempre do ajudado, que precisa
de muito mais espaço na relação. Uma resposta
grande não só dificulta a organização de sua expe
riência, como lhe rouba parte de um espaço que é
seu.
RESPOSTAS CERTAS X RESPOSTAS
ERRADAS
Quando buscamos o conteúdo da expressão
do ajudado, podemos ou não captar esse conteúdo
de fonna correta. Quando captamos o miolo de sua
fala, ele elabora sua próxima colocação verbal sem
ter de voltar atrás para tentar uma nova explicação.
Quando isso acontece, dizemos que nossa resposta
não desfocalizou o processo do ajudado, isto é, não
o afastou de sua experiência. Pelo contrário, essa
resposta o ajudou em seu raciocínio e o fez caminhar
para frente em seu próprio entendimento.
128 129
1® Spmí>fttrp fip ?niS
Por outro lado, quando não conseguimos cap
tar o conteúdo, o ajudado volta atrás, tentando ser
mais claro dessa vez, para o ajudador e para si
mesmo. O importante aqui é lembrarmos que,
mesmo diante de uma resposta "incorreta" (aquela
que não captou o miolo), o ajudado continua
recebendo uma mensagem de atenção e interesse
por parte do ajudador. E como se esse estivesse
dizendo: "Estou realmente interessado em com
preender o que você está me dizendo, ainda que, às
vezes, não o consiga da primeira vez". Essa é a
mensagem mais importante e, por isso, o fato de o
ajudador não acertar, em nada invalida sua interação
com o ajudado.
Nesse sentido, não há, realmente, respostas
"erradas". Todas são corretas, desde que expressem
um empenho verdadeiro do ajudador em com
preender o ajudado, não importa quantas tentativas
ele faça até encontrar o conteúdo de sua fala.
Novamente aqui podemos formular uma
resposta de conteúdo a todo esse tópico: "Você está
me dizendo que o mais importante é o empenho do
ajudador em compreender o ajudado, e não a cor
reção de suas respostas".
RJESPOSTA DE CONTEÚDO X DIMENSÕES
Entre as dimensões mencionadas no primeiro
capítulo, duas estão especialmente presentes quando
formulamos respostas de conteúdo:
Aceitação incondicional ou respeito - quando o
ajudador responde usando o ponto de referência
do ajudado e não o seu próprio, está lhe dizendo:
"Eu o aceito como você é, vivendo qualquer coisa
que for importante para você". Isso leva o ajudado
a sentir-se livre na relação, perdendo gradativa-
mente o medo de se expor; ele sabe que não será
reprovado ou criticado, diga o que disser. Acima
de tudo, ele passa a se aceitar, como o ajudador faz
com ele.
Concreticidade - ao sintetizar o conteúdo, o aju
dador torna-se concreto e específico em suas res
postas, refletindo o que é fundamental e abando
nando o que é secundário.
Como ilustração das respostas de conteúdo,
vamos apresentar as falas de três ajudados e as
respectivas respostas do ajudador:
Ana;
"Nem sei como começar, sabe, não falei disso a
ninguém, é difícil para mim contar o que houve. O
problema é que comecei a trabalhar numa firma
desde o ano passado, com um salário muito bom e
um serviço fácil de fazer, agradável até. O ambiente
também era bom, meus colegas eram pessoas legais.
O patrão sempre muito educado e atencioso, eu
não tinha queixas dele, até quando começou com
uns comportamentos melo estranhos nos últimos
meses. Me trazia uns presentes de vez em quando,
130
1" rift ?nift
131
dizia que era porque estava muito satisfeito com o
meu serviço; às vezes me pedia para fazer hora
extra, dispensava os outros e ficava sozinho comigo
no escritório até tarde e outras coisas assim. Até
que, na semana passada, numa dessas horas extras,
ele se assentou muito perto de mim. Estava meio
ofegante, de repente me agarrou,queria me beijar
de todo Jeito, dizendo que me queria, desde a pri
meira vez que me viu. Entrei em pânico, saí cor
rendo do escritório, não voltei lá até hoje porque
não sei o que vou fazer. Preciso muito do emprego,
não posso ficar sem ganhar, mas também não quero
me relacionar com ele, afinal tenho meu noivo, a
quem amo demais, estamos até pensando em nos
casar no ano que vem... Realmente, não sei o que
devo fazer..."
Resposta de conteúdo:
"Você está me dizendo que não sabe o que fazer:
por um lado, precisa manter seu emprego, por
outro, não quer se relacionar afetivamente com seu
patrão"
Lúcia;
"Às vezes, penso que vou ficar louca. Foram anos
e anos de espera, fazendo tratamentos, cirurgias ar
riscadas. Tomei quilos de remédios, gastamos o que
tínhamos e o que não tínhamos. Até o carro tivemos
que vender. A ansiedade foi enorme até sabermos,
pelo exame, que eu estava grávida. Nossa alegria
não tinha tamanho, só pensávamos no neném o dia
inteiro. Mas durou pouco. Abortei com três meses.
e agora o sonho acabou. Não sei como vou fazer
para continuar vivendo..."
Resposta de conteúdo;
"Você quer me dizer que perdeu o que tinha de
mais importante - seu filho - e que agora sua vida
não tem mais sentido".
Paulo:
"Você sabe, já não foi fácil para mim desfazer o
primeiro casamento. Todo aquele problema com os
meninos, aquela culpa com a primeira mulher; afinal
era eu que a estava deixando. Custei a refazer minha
vida. Fui me acostumando a ver os meninos só nos
fins de semana, aprendi a me virar sozinho, até que
apareceu a Rosa, minha segunda mulher. Enfrenta
mos uma barra juntos, foi um custo até que os me
ninos a aceitassem e eu pudesse refazer minha famí
lia. A chegada do filho nos uniu ainda mais, a nós
dois e aos meninos todos. Agora ela vem e me diz
que vai embora, que não me ama mais. Às vezes,
penso que isso é demais para mim, tenho medo de
não agüentar".
Resposta de conteúdo;
"Em outras palavras, você foi capaz de vencer a
crise do primeiro casamento desfeito, mas desfazer
um segundo e perder a mulher a quem ama parece
demais para você".
132 133
1® .*ÍpmpRtrí> íIp ?nift
RESPONDENDO AO CONTEÚDO
O que é:
Identificar os pontos mais importantes da fala do
ajudado e refleti-los para ele, de maneira resumida
e organizada.
Para que:
Se respondo ao conteúdo da fala do ajudado, orga
nizo sua mensagem, de modo a ele se compreender
melhor.
Como:
1. Identificar o tema básico.
2. Resumí-lo para o ajudado usando o formato:
"Você está me dizendo que..."
135
1® Sftmestrfl ?nifl
Seres humanos não são máquinas com fios
soltos ou válvulas queimadas, que um cirurgião
ideal pode tocar e consertar, ou ajustar, retirar ou
reconecíar. Somos organismos interativos, expe-
rienciais. Quando eu respondo ao que se passa com
alguma pessoa, então alguma coisa se passa dentro
dela. É claro, alguma coisa também já está acon
tecendo antes que eu responda. Ela está magoada,
ansiosa ou deprimida; ela perdeu seu próprio
sentido; pode não estar sentindo coisa alguma;
tudo pode estar soando insipido. Quando eu
respondo (ou digamos, quando eu consigo respon
der, pois às vezes tento e falho durante semanas e
meses), então algo mais está, de repente, aconte
cendo; ela sente, realmente, alguma coisa, há um
sentido surpreendente do próprio eu e ela pensa:
"Puxa, talvez eu não esteja perdida...
Eugene T, Gendlin
V
S.J''-
'-«Mm
K
5^
■//.
ÍSS
mm
136
1® Rftmesfre de PniR
í
'
ai?
ai?
2^
Q^sponcíenífo ao sentimento
I - Quando me relaciono comigo
Se nos indagarmos, num dado momento, qual
é o verdadeiro sentido da vida, poderíamos respon
der que são os sentimentos a essência da própria
vida. E o sentir que faz a diferença entre as pessoas
e as plantas, ou entre as pessoas e as pedras. O que
é a nossa vida senão o alternar constante entre a
tristeza e a alegria, a raiva e o medo, a frustração e
a esperança? E o que dizer do amor, sentido maior
da própria vida?
E quase impossível imaginarmos a vida como
um mero desenrolar de "eventos neutros" - ganhos,
perdas, encontros, desencontros, vitórias, derrotas
- sem que esses eventos sejam acompanhados de
algum tipo de sentimento. Se isso fosse possível,
seria vida, afinal?
A TEORIA DO ABC
Segundo Albert Ellis, psicólogo americano
que desenvolveu a PsicoterapiaRacional-Emotiva,
139
1® SftmARtrft Ha PDIft
o que importa não são os fatos, mas como nos
sentimos diante deles. Assim é que um mesmo fato
pode provocar sentimentos diferentes em pessoas
diferentes, dependendo das circunstâncias de vida
de cada uma. Ou um mesmo fato pode produzir
sentimentos diferentes numa mesma pessoa, em
diferentes momentos de sua vida. Talvez seja essa
uma das mudanças fundamentais que as pessoas
buscam alcançar através da relação de ajuda: sentir-
se de modo diferente diante de uma situação que
não vai mudar. Quando não é possível mudar as
coisas externas, e se essas coisas provocam sen
timentos de incômodo e desconforto, nada nos resta
senão lidar com os sentimentos, que são mutá
veis.
Ellis, através da abordagem Racional-Emoti-
va, procura explicar a fonte dos sentimentos através
do que chama de "princípio do ABC":
® -> ©
acontecimento conseqüência
(sentimento e/ou ação)
Diante de ̂ - um acontecimento qualquer -
a pessoa sofre conseqüências (C) em dois níveis:
sentimentos e ações. No dia-a-dia, as pessoas
explicam o que sentem e o que fazem usando A
como causa de C, da seguinte maneira: "Estou com
muita raiva (sentimento) e vou largar meu emprego
(ação) porque meu patrão me chamou a atenção
(acontecimento)". Portanto, A causa C.
Segundo Ellis, no entanto, se um mesmo
acontecimento leva a conseqüências tão diferentes
em pessoas diferentes, não pode ser A a causa de
C. Há, portanto, um elemento faltando nessa relação
A C.E esse elemento seria a verdadeira causa
\
dos sentimentos e ações das pessoas:
® -> ® -> ©
acontecimento "belief conseqüência
(crença)
B, do inglês "belief (crença), refere-se às
idéias, pensamentos ou crenças presentes nas pes
soas. E como se essas construíssem, ao longo de
sua vida, um arquivo onde acumulassem idéias a
respeito de tudo. Esse arquivo varia de pessoa para
pessoa e é formado basicamente através das expe
riências individuais de cada um; essas experiências
podem ser diretas (aquilo que a pessoa viveu na
própria pele) e indiretas (o que viu e ouviu de pes
soas importantes em sua vida). O casamento, por
exemplo, pode ser considerado um evento muito
bom e desejável para uma pessoa (que viu o casa
mento satisfatório dos pais) e muito indesejável para
outra (que sempre ouviu a mãe dizendo que o
casamento estragou sua vida).
Assim, seriam as idéias que as pessoas têm
das coisas, e não as próprias coisas, que as levariam
a experimentar sentimentos diversos. Esses seriam
determinados pela interpretação pessoal que cada
indivídup tem a respeito do mundo em que vive.
140 141
.^pmpRtrp Hp 901 fi
Ainda segundo Eilis, as idéias a respeito das
coisas podem ser de dois tipos: racionais e
irracionais. As primeiras seriam interpretações
lógicas a respeito dos eventos e poderiam levar a
sentimentos moderados de frustração, tristeza, etc.
As segundas seriam interpretações irracionais a
respeito dos eventos, levando a fortes conse
qüências emocionais, freqüentemente desa
gradáveis e desgastantes para quem as experi
menta.
Entre as idéias irracionais, algumas são
encontradas com maior freqüência entre as pessoas,
causando-lhes ansiedade, culpa, autocensura,
etc.:
1. Necessitamos ser amados por todas as pessoas.
2. Devemos ser bem-sucedidos em'tudo o que
fazemos.
3. E terrível que as coisas não sejam exatamente
como gostaríamos que fossem.
O objetivo da Terapia Racional-Emotiva é
identificar, questionar e eliminar essas e outras
idéias irracionais que impedem as pessoas de vi
verem uma vida satisfatória e feliz. Essa tarefa só é
possível na medida em que os sentimentos são
também identificados e expressos pela própria pes
soa ou com a ajuda de alguém capaz de percebê-
los.
COMO AS CRIANÇAS EXPERLMENTAM E
EXPRESSAM SENTIMENTOSComo o observar e o escutar, também o sentir
sofre modificações ao longo do processo de desen
volvimento das pessoas. A criança pequena é intei
ramente livre para sentir e expressar o que sente. A
fonte de seus sentimentos se localiza, basicamente,
nos órgãos de sentido: seus olhos, ouvidos, nariz,
boca e pele lhe dizem o que é bom e o que é ruim,
e daí nascem seus sentimentos, puros e livres de
quaisquer outras interferências. Livre também é sua
expressão: ela chora, ri, repete o que lhe dá prazer
e rejeita o que não lhe dá. Mais tarde, quando já faz
uso da palavra, diz abertamente o que sente, de uma
maneira tão direta e verdadeira, que chega a emba
raçar os adultos.
O que acontece às pessoas e que as leva a es
conder seus sentimentos de si mesmas e dos outros?
Muito cedo, as crianças começam a ser punidas
por expressarem seus sentimentos. A punição pode
ser explícita (repreensões, agressões físicas) ou im
plícita (o levantar das sobrancelhas, franzir de testa
e outras expressões de desagrado). É como se os adul
tos as educassem para seguir, não para sentir. Seguir
significa não fligir aos padrões sociais, ao que é con
siderado "adequado". Nesse contexto, a criança que
sente e se expressa pode ser considerada subversiva.
Além de ser punida e rejeitada, ela percebe
que os adultos à sua volta não expressam o que
sentem. Pelo contrário, muitos lhe comunicam que
U2 143
1° .SftmR-strR flR ?nifi
o sentimento é sinônimo de fraqueza. Homem não
chora. Sem modelo de pessoa verdadeira, punida e
rejeitada cada vez que é honesta quanto ao que
sente, a cnança vai encolhendo pouco a pouco, re
primindo suas emoções. No inicio, temerosa de não
ser aceita, depois até culpada por estar sentindo,
acaba tão impossibilitada de ser ela mesma quanto
os adultos que estão à sua volta.
Os efeitos dessa repressão não tardam a se
fazer presentes. Quando reprimo miphas emoções,
escondendo-as de mim mesmo e dos outros, isso
não me garante que essas emoções se acabem, des-
manchando-seno ar, simplesmente. Pelo contrário,
elas continuam em algum lugar dentro de mim,
mesmo que eu não saiba. Levam-me a uma insa
tisfação geral e difusa, para a qual não tenho uma
explicação. As vezes, quando todas as coisas exter
nas parecem perfeitas - um bom ethprego, o casa
mento ajustado, crianças saudáveis, uma bela casa
e o carro do ano - a insatisfação persiste, sem uma
explicação aparente. Em outros casos, é o corpo
que começa a mostrar os sinais - dores inexpli
cáveis, insônia, inapetência e até mesmo doenças
sem qualquer causa orgânica, que denominamos de
''psicossomáticas" - palavra composta segundo a
qual a psique (psíquico, emocional) se manifesta
através do soma (corpo). Algumas vezes, o resulta
do final é um "estouro" inesperado: o casamento
desfeito, o emprego abandonado, a mudança brusca
de vida e, às vezes, a perda do contato com a reali
dade, que traz para a pessoa a conseqüente rotula-
ção de "paciente psiquiátrico". São as emoções re
primidas durante toda uma vida e que, acumuladas,
explodem diante de um estímulo qualquer,
O AUTOCONHECIMENTO COMO CONDIÇÃO
PARA A MUDANÇA
Já dissemos anteriormente que o processo de
ajuda tem como finalidade a mudança do ajudado e
que a base desse processo está na exploração e com
preensão de suas vivências. Ao explorar e com
preender a si própria, a pessoa atinge o autoco-
nhecimento, que é, antes de mais nada, o reconhe
cimento dos próprios sentimentos. Quando me
observo e me escuto, posso me perguntar; "O que
estou sentindo neste momento? De onde vem meu
sentimento? O que quero? O que não quero? O que
é importante para mim?" Quando entro em contato
comigo, faço o que é melhor para mim. Quando
não me conheço, acabo fazendo aquilo que esperam
que eu faça e não o que quero fazer, de verdade.
Só posso mudar de maneira construtiva quan
do me conheço o suficiente para escolher a minha
própria direção.
REAPRENDENDO A EXPRESSAR SENTI
MENTOS
Segundo John Powell, há alguns aspectos que
devo levar em conta se quiser expressar minhas
próprias emoções ou sentimentos:
144 145
1' .*^pmftstrp rip ?niR
1. Meus sentimentos não se dividem em certos
e errados, eles simplesmente existem.
A maior parte das pessoas tende a julgar seus
próprios sentimentos, como se alguns fossem
bons e outros maus. Quando penso que meu
sentimento é mau ou errado, tenho vergonha ou
me culpo por experimentá-lo.
É importante saber que todo e qualquer
sentimento, se brota dentro de mim, é apenas
uma parte natural da própria condição humana.
Preciso dar-me permissão, portanto, para sentir,
para experienciar, reconhecer e aceitar qualquer
emoção que seja minha.
2. Meus sentimentos nem sempre determinam
minha ação.
E importante aqui fazermos uma distinção
entre sentir e agir. O fato de eu me permitir expe
rimentar meu sentimento em sua totalidade não
significa que eu deva agir de acordo com ele.
Esse é o medo que impede muitas pessoas de
sentir: elas temem que, se deixarem os sentimen
tos vir á tona, vão agir de acordo com eles, mes
mo que sejam destrutivos. Se estou com raiva
de você, isso não quer dizer que vou agredí-lo
fisicamente.
Minha ação é o resultado de uma escolha que
eu mesmo faço: posso ou não agir em determina
da direção. Reprimir as emoções ou agir sempre
de acordo com elas são, ambas, atitudes extre
mas, não-saudáveis e destrutivas para a pessoa.
3. É desejável que eu expresse meus sentimentos
a outra pessoa.
Faz parte de uma relação construtiva a possi
bilidade de eu dizer à outra pessoa o que estou
sentindo em relação a ela. Mais do que isso, é
da comunicação de meus sentimentos que depen
de o sucesso de nosso relacionamento.
Se reprimo minhas emoções, com medo de
ser rejeitado, punido ou mal compreendido, vou
estar apenas "varrendo a poeira para debaixo do
tapete". Isso significa que, depois de algum tem
po, corro o risco de tropeçar, cair e me machucar
por causa dos montes de poeira que eu mesmo
fiz.
Já nos referimos ao "estouro" das emoções
reprimidas. O caminho mais curto para estragar
um relacionamento é reprimir minhas emoções
até o dia em que elas estourem com tal violência
que destruam, irreversivelmente, a relação que
eu pretendia preservar.
4. Posso mudar minhas emoções.
Como Poweli, também Elíis afirma que os
sentimentos não são imutáveis. Se experimento
emoções que me desgastam e me trazem sofri
mento, posso fazer aflorar essas emoções para
que eu as conheça. Conhecendo-as e descobrin
do sua fonte, posso decidir trocá-las por outras
que não sejam tão destrutivas para mim.
Enfim, a base do relacionamento que esta
beleço comigo está em meus sentimentos: só
146
147
1® .9emftfttrA íIa
posso me conhecer e me relacionar comigo
quando sou capaz de escutá-los e identificá-los;
quando sou capaz de aceitá-los em sua totalida
de; e quando sou capaz de expressá-los livre
mente a mim mesmo e a outra pessoa.
// - Quando me relaciono com o outro
O sentimento existe, sempre.
Ao se relacionar com o ajuda4o, é importante
que o ajudador tenha sempre em mente que ninguém
vive sem sentimentos: atrás de cada palavra e de
cada silêncio está presente um sentimento ou uma
mistura de muitos. Ainda que a pessoa não expresse
esses sentimentos de maneira explícita, e ainda que
o ajudador não seja capaz de captar os sentimentos
escondidos, é importante lembrar que o ajudado
está sempre experimentando sensações, sentimentos
de incômodo ou desconforto. Assim, são os senti
mentos que levam a pessoa a buscar ajuda.
Por isso, é fundamental que cada sentimento
seja percebido e captado e que sua percepção seja
comunicada ao ajudado.
Na área de saúde, por exemplo, os profissio
nais tendem a investigar e cuidar apenas da parte
física do ajudado. O paciente procura o médico
queixando-se de algum sintoma físico. O médico,
por sua vez, limita-se a dar atenção a esse sintoma,
a algum órgão afetado ou à doença apresentada pelo
paciente. Não sendo treinado para cuidar do aspecto
emocional de seu ajudado, ele se esquece que, atrás
do sintoma, existe uma pessoa sentindo alguma
coisa a nivel emocional.O sintoma desperta um sen
timento, e é esse sentimento que leva o paciente a
buscar o médico. Um sintoma físico que não provo
que preocupação, medo ou ansiedade não é suficien
te para levar o paciente a pedir ajuda. Além disso,
sabemos que, muitas vezes, não existe nem mesmo
um sintoma físico que justifique a consulta. O
paciente está "apenas sentindo" e busca o profissio
nal na esperança de ser escutado e de resolver seu
problema. Em muitos casos, o sintoma é "inven
tado" ou serve apenas de pretexto para a marcação
da consulta. O paciente começa a se queixar desse
sintoma, mas, se encontrar um médico capaz de
escutá-lo e de perceber seus sentimentos, vai passar
rapidamente ao problema que o preocupa e que é a
verdadeira razão que o levou a buscar ajuda. Caso
contrário, vai embora insatisfeito, continuando a
procurar um profissional que, enfim, seja capaz de
compreendê-lo.
A EXPRESSÃO DOS SENTIMENTOS
Como já foi visto neste capítulo, poucas são
as pessoas que sabem expressar seus sentimentos
de maneira direta. Essas incluem, em seus relatos,
não só os fatos, mas os sentimentos que experimen
tam diante desses fatos, A maior parte das pessoas,
no entanto, se expressa de maneira indireta, através
de seus relatos verbais ou através de seu corpo.
Muitas vezes, o ajudado nem mesmo sabe o que
148
149
1® fl«
está sentindo. Ou sabe e não quer admitir para si
mesmo, pois o reconhecimento daquilo que sente
vai levá-lo a sofrer ou a considerar-se um fraco. E,
é claro, quando seus sentimentos não são admitidos
nem para sí mesmo, não podem ser admitidos ou
expressos ao ajudador.
PREPARANDO O AJUDADO PARA IDENTI
FICAR SEUS SENTIMENTOS
/
E importante que o ajudador seja capaz não
só de detectar esses sentimentos, mas também de
discriminar o momento exato de comunicá-los ao
ajudado. Este pode não estar pronto ainda para es
cutar suas próprias verdades. Quando isso ocorre,
são as respostas de conteúdo que vão lhe comunicar
compreensão, sem que ele se sinta ameaçado. Essas
respostas facilitam a construção de um relaciona
mento firme e consistente entre os dois de tal modo
que, mais tarde, o ajudador possa comunicar sua
percepção integral ao ajudado.
Além das respostas de conteúdo, há um outro
aspecto que deve ser levado em conta, à medida
que é construída a relação de ajuda: há vários níveis
de sentimentos, do mais superficial ao mais pro
fundo, e esses níveis podem ser apresentados pouco
a pouco ao ajudado, dependendo de sua prontidão
para aceitá-los. E como se houvesse "camadas de
sentimentos", uns por baixo dos outros. Por exem
plo, o ajudador pode aprofundar os níveis de senti
mento com um ajudado diante da possibilidade de
abandono por parte do parceiro, da seguinte ma
neira: "Você está se sentindo incomodado -> irri
tado -> enciumado -> ameaçado". E como se o
ajudador levasse o ajudado a contactar sua própria
experiência de maneira cuidadosa, preparando-o
para ver, cada vez mais, a seu próprio respeito.
COMO RESPONDER AOS SENTIMENTOS
Quando o ajudador percebe que o ajudado
está pronto para encontrar-se com seus sentimentos,
seja em que nível for, começa a responder a eles.
Em resumo, responder ao sentimento refere-se à
habilidade de captar o que o ajudado está sentindo
a cada momento e comunicar isso a ele. Novamente
aqui a palavra-chave é comunicação. De nada
adianta o ajudador compreender uma série de coisas
a respeito do ajudado: é preciso que este saiba que
o ajudador o compreende. Ainda que não existam
soluções mágicas a serem oferecidas, já vimos a
importância de o ajudado poder expressar-se livre
mente e entrar em contato consigo mesmo. Quando
o ajudador responde a seu sentimento, está facili
tando esse contato.
Para responder com o máximo de precisão
possível, há alguns passos que o ajudador pode se
guir a fim de desenvolver e exercitar essa habilida
de:
1. Identificar a categoria do sentimento,
2. Identificar a intensidade do sentimento.
150 151
1® rtfi 9018
3. Escolher a palavra-senümenío apropriada.
4. Responder ao ajudado usando o formato: "Você
está se sentindo..."
Já vimos anteriormente como as habilidades
interpessoais se tornam pré-requisitos umas para
as outras. Ao responder, o ajudador continua aten
dendo ao ajudado. Por outro lado, seus olhos (ob
servar) e seus ouvidos (escutar) são as duas fontes
básicas que lhe permitem captar q sentimento do
ajudado. Observando todas as suas mensagens nao-
verbais e escutando a música e a letra de seu relato
verbal, ele vai aumentar a chance de sintonizar com
o ajudado. A música aqui é fundamental: uma mes
ma frase pode refletir os mais diferentes sentimen
tos, até mesmo contrários, dependendo da entona
ção que a acompanha.
Quanto à categoria do sèntimento, sua
identificação pode ser útil quando o ajudador está
tendo dificuldade em perceber o que o ajudado está
realmente sentindo, ou quando está começando a
treinar esse tipo de habilidade. A categoria refere-
se a uma classificação geral dos sentimentos. Para
efeitos didáticos, foram determinadas cinco catego
rias: alegria, tristeza, raiva, medo, confusão. Quan
do o ajudador, ao observar e escutar o ajudado,
fica em dúvida quanto ao que ele está sentindo,
pode, pelo menos, tentar identificar a natureza de
seu sentimento: "Será raiva o que ele está sentindo?
Ou será medo? Ou ele parece triste?" A divisão em
categorias, no entanto, não significa que todos os
sentimentos sejam sempre enquadrados em alguma
delas. Há alguns que não se encaixam em nenhuma
ou, às vezes, se encaixam em mais de uma. "Ansio
so", por exemplo, pode ser um sentimento ligado a
medo, confusão ou raiva. Por outro lado, "culpado"
pode não estar enquadrado em nenhuma categoria.
Como já foi dito, a divisão é simplesmente didática.
Depois de escolher uma categoria mais pro
vável, o ajudador pode se perguntar com que inten
sidade o ajudado está experimentando o sentimento.
Este é muito forte, fraco ou moderado? A intensida
de com que ele se expressa, corporal e verbalmente,
vai lhe dizer a intensidade com que ele está sentindo.
Quando o ajudador identifica uma categoria
e uma intensidade mais prováveis, pode escolher a
palavra-sentimento ~ aquela palavra, em geral um
adjetivo, que mais se encaixa ao que a pessoa está
sentindo no momento. Se a categoria é tristeza, por
exemplo, e a intensidade é forte, uma boa palavra
para descrever o sentimento pode ser "arrasado".
Numa mesma categoria há várias palavras que ex
pressam intensidades diferentes do mesmo senti
mento. Quando a categoria é raiva, posso estar enfu
recido, aborrecido ou apenas irritado.
No geral, as pessoas têm um vocabulário de
palavras-sentimento pobre e limitado. Mesmo que
tenham aprendido muitas dessas palavras, têm pou
co hábito de usá-las no dia-a-dia, exatamente pela
dificuldade em reconhecer e expressar sentimentos.
Podem estar sentindo ou vendo alguém sentir, mas
não conseguem expressar esse sentimento através
152 153
1® .^pmpRtrf» rtp ?nift
de uma palavra adequada. Esse vocabulário pode
ser desenvolvido. Basta que o ajudador se proponha
a escrever, num papel, todas as palavras-sentimento
de que se lembrar, em cada categoria e com intensi-
dades forte, fraca, moderada. Na categoria de con
fusão, por exemplo, vão aparecer palavras como
indecisa, incerta, perdida, confusa, "baratinada", di
vidida, desorientada, etc. Ao final de algum tempo,
o ajudador vai descobrir que seu vocabulário se
enriqueceu com palavras que estayam registradas
em sua memória e das quais não se lembrava de
inicio.
Um aspecto importante ao escolher a palavra-
sentimento, é verificar sua adequação ao ajudado
específico que o ajudador tem à sua frente. Deve-
se levar em conta sua idade, seu nível social, estilo
de vida, sua procedência. E o caso da gíria, que
pode captar, com exatidão, o sentimento de uma
pessoa mais jovem ("bodeado", por exemplo), mas
pode ser inintelegivel ou mesmo ofensiva a uma
pessoa que não a usa no seu dia-a-dia. Por outro
lado, uma palavra como "estupefacto" pode ser en
tendida por pessoas com um certo nível acadêmico,
mas nãoser compreendida por outras que não ti
veram a chance de estudar. Os regionalismos tam
bém devem ser levados em conta na interação verbal
com o ajudado. Dependendo da região de onde ele
procede, a terminologia para descrever determi
nados eventos é específica e diferente daquela usada
pelo ajudador. Como ilustração, podemos lembrar
o caso de um paciente proveniente da zona rural
internado num hospital de cidade grande. Foi ne
cessária uma boa dose de paciência por parte de
seus ajudadores, alunos do curso de Medicina, até
que pudessem compreender a que ele se referia
quando dizia estar acometido de "pé ligeiro". De
pois de várias tentativas de compreensão, consegui
ram descobrir que "pé ligeiro" se referia a desarranjo
intestinal ou diarréia.
Há ainda uma outra estratégia que facilita ao
ajudador a escolha da melhor palavra. Observando
e escutando o outro, ele pode se perguntar: "Se eu
fosse essa pessoa, vivendo o que ela está vivendo e
relatando a vivência da maneira como relata, como
me sentiria?". A resposta a essa pergunta pode levá-
lo a encontrar uma palavra de sentimento pelo
menos próxima do que o ajudado está experimen
tando (resposta empática).
Como último passo, o ajudador pode respon
der ao ajudado usando um formato que facilita sua
comunicação: "Você está se sentindo..." obriga o
ajudador a usar realmente uma palavra-sentimento,
que acompanha o pronome reflexivo se. No início
do treinamento, existe o risco de o ajudador acabar
dando uma resposta de conteúdo ("Você está
sentindo que.,.^') quando queria dar uma resposta
de sentimento.
E importante reafirmar aqui que esses passos
apenas facilitam o desenvolvimento da habilidade
numa fase de treinamento. Via de regra, captar e
responder ao sentimento do outro é uma habilidade
que brota naturalmente do ajudador depois de
154
155
1° .9emftstrft dft PniR
alguma prática, como brotam todas as outras
habilidades de ajuda.
RESPONDENDO A SENTIMENTOS POSITI
VOS
Algumas vezes, temos a tendência de cuidar
mais do ajudado quando ele vive momentos difíceis.
Preocupados com seu bem-estar e, às vezes, ansio
sos por vê-lo superar uma crise, dan^os atenção inte
gral a seus sentimentos desagradáveis, tentando
compreendê-lo e comunicando-lhe nossa percepção
da melhor maneira possível.
No entanto, é bom lembrar a extrema impor
tância que têm os momentos de alegria e esperança
em seu processo de crescimento. É nesses mo
mentos que ele está descobrindo soluções e alter
nativas de ação para mudar numa direção melhor
É quando está descobrindo seus pontos fortes. É
essencial que o ajudador responda a essa situação
com o mesmo cuidado com que responde à crise.
A isso chamamos de usar a força do ajudado para
"puxá-lo para cima", ao invés de apenas enfatizar
mos seus pontos fracos. É tão importante para o
ajudado poder compartilhar a dor e o desespero
quanto a alegria e a esperança. O ajudador efetivo
está a seu lado em ambos os momentos.
Retomando as falas dos ajudados da seção
anterior, vamos formular respostas de sentimento
a cada um deles:
Ana
Final da fala: "... Preciso muito do emprego, não
posso ficar sem ganhar, mas também não quero me
relacionar com ele, afinal tenho meu noivo, a quem
amo demais, estamos até pensando em nos casar
no ano que vem... Realmente, não sei o que devo
fazer..."
Resposta de sentimento:
"Você está se sentindo desorientada", ou
"Você está se sentindo ameaçada".
Lúcia
Final da fala: "Abortei com três meses, e agora o
sonho acabou. Não sei como vou fazer para conti
nuar vivendo..."
Resposta de sentimento:
"Você está se sentindo desesperada", ou
"Você está se sentindo arrasada".
Paulo
Final da fala: "Agora ela vem e me diz que vai
embora, que não me ama mais. Às vezes, penso
que isso é demais para mim, tenho medo de não
agüentar..."
Resposta de sentimento:
"Você está se sentindo angustiado", ou
"Você está se sentindo sufocado".
156 157
1® .^RmpRtrp fiR
RESPONDENDO AO SENTIMENTO
O que é:
Perceber o que o ajudado está sentindo a cada mo
mento e comunicar essa percepção a ele.
Para que:
Se respondo ao sentimento do ajudado, ele vai se
sentir compreendido de modo a entrar em contato
consigo mesmo.
Como;
1. Identificar a categoria do sentimento.
2. Identificar a intensidade do sentimento.
3. Escolher a palavra-sentimento.
4. Responder usando o formato:
"Você está se sentindo..."
159
1® Rftmftstrp rtft ?nift
Mem sentimentos são como minha impressão
digital, como a cor dos meus olhos e o tom de minha
voz: únicos e irrepetíveis. Para você me conhecer,
é preciso que conheça meus sentimentos.
Minhas emoções são a chave para a minha
pessoa. Quando lhe dou essa chave, você pode
entrar e compartilhar comigo o que tenho de mais
precioso para lhe oferecer: eu mesmo.
John Powell
.5' •
160
, • >■. : •
1 ° Sf>mpRtrp Hft ?ni ft
•~.r
•,VÍV
m
t.--
.riV
%
■í."-
>.L
vr-<
r
•:-v;
^é>s_
í
oy.
f^esponcíeníío ao sentimento e
conteúíío
SOMANDO HABILIDADES
Responder a sentimento e conteúdo é o soma
tório das duas habilidades anteriores. Quando o aju-
dador responde a sentimento e conteúdo, comunica
que compreende, ao mesmo tempo, como o ajudado
está se sentindo eporque ele está se sentindo assim.
Através dessa resposta, o ajudador capta a razão
para o sentimento do ajudado, que é exatamente o
conteúdo de sua fala.
Se a finalidade da resposta é comunicar a
compreensão total da experiência do ajudado, nem
a resposta de sentimento, nem a de conteúdo, isola
damente, são suficientes para se fazer essa comu
nicação. Assim como não existe conteúdo despro
vido de sentimento, não existe também sentimento
sem uma razão de ser A resposta de sentimento e
conteúdo é, portanto, a mais completa para o aju
dador expressar sua compreensão em relação ao
ajudado. E através dela que se faz a ligação entre
163
1® Rftmfistrft rtfi ?nift
seu mundo interno (seus sentimentos) e o mundo
externo em que vive (as pessoas, fatos e situações
que desencadeiam seus sentimentos).
Estabelecendo uma ligação entre o principio
do ABC e a resposta de sentimento e conteúdo,
vamos verificar que os sentimentos do ajudado
constituem C - a conseqüência a nível emocional -
e o conteúdo constitui A - o acontecimento que
desencadeia a conseqüência. Mais tarde, na habili
dade de personalizar, será incluido/o elemento B -
o sistema de crenças do ajudado.
RESPOSTAS INTERCAMBIÁVEIS, ADITIVAS
E SUBTRATIVAS
Uma outra denominação usada para esse tipo
de resposta é o que chamamos de respostainlerccan-
biável- aquela que é formulada no mesmo nível em
que o ajudado está se expressando, nem mais, nem
menos. Além da resposta intercambiável, o ajudador
pode oferecer respostas aditivas - aquelas em que
ele acrescenta alguma coisa além daquilo que foi
expresso pelo ajudado. Essas respostas serão abor
dadas a partir do personalizar, que é considerada
uma habilidade iniciativa, diferente das habilidades
vistas até agora, consideradas responsivas. Há tam
bém respostas subtraiivas- porém, nào ca
racterizam o ajudador efetivo. Como o próprio nome
indica, são respostas que subtraem alguma coisa à
experiência do ajudado, ou seja, que cortam sua fa
la e o impedem de continuar em sua auto-exploraçao.
Podemos ilustrar isso melhor no próximo tó
pico, usando uma classificação mais simples para
os várias tipos de resposta que as pessoas dão umas
às outras.
RESPOSTAS EMPÁTICAS, SIMPÁTICAS E
ANTIPÁTICAS
Examinando a relação entre algumas dimen
sões do ajudador e as respostas de sentimento e
conteúdo, podériamos classificar as interações do
dia-a-dia em três categorias. Essa classificação seria
feita de acordo com a presença ou ausência dessas
dimensões em cada interação. Se prestarmos aten
ção às respostas que as pessoas dão umas às outras,
vamos verificar que se enquadram em alguma das
categorias ou se aproximam delas. As mais comuns
seriam as respostas do tipo simpática e antipática,
e a menos comum, provavelmente, seria a empática.
Resposta simpática - a pessoa que responde
procura ser agradável a quem fala, mas desfocaliza
inteiramente aexperiência do outro; é como se ela
se sentisse embaraçada diante do relato da outra
pessoa, tentando, através de sua resposta simpática,
interromper esse relato ou superficializá-lo, e passar
para outro assunto. Seu efeito é cortar quem está
falando.
Resposta antipática - essa também leva a pessoa
a cortar o seu relato, mas é formulada de maneira
164 165
1® .^AmpRtrp Hp ?niR
desagradável. No geral, tem uma conotação de crí
tica à pessoa, tanto nas palavras quanto na ento
nação de voz e a deixa freqüentemente "com um
gosto ruim na boca", arrependida por ter começado
a falar.
Resposta empática - como já a definimos, é a única
que dá permissão à pessoa para se expressar e conti
nuar seu relato; comunica compreensão por parte
de quem escuta, que tenta colocar-^se no seu lugar,
entrando debaixo de sua pele para sentir o que ela
está sentindo.
Se retomarmos a fala de Paulo, o ajudado
que está prestes a desfazer seu segundo casamento,
poderíamos formular as respostas dos três tipos
diante de seu relato.
Resposta simpática;
"Não liga não, Paulo, as mulheres são todas iguais,
não vaie a pena você esquentar a cabeça com elas.
Logo você ajeita sua vida outra vez, mulher é o
que não falta. Olhá, vamos sentar ali e tomar uma
cerveja geladinha, que isso logo passa..."
Resposta antipática:
"Bem feito, isso é que dá fazer bobagem duas vezes
na vida. Já não chegou o primeiro casamento, não
serviu de lição, tem mais é que sofrer as conse
qüências agora. Vê lá se não vai cair num terceiro,
hein..."
Resposta empática:
"Imagino como você deve estar se sentindo, Paulo,
angustiado e sem saber o que fazer diante da possibi
lidade de desfazer seu segundo casamento".
BASE INTERCAMBIÁVEL
Ao conjunto de respostas intercambiáveis ou
empáticas que o ajudador oferece ao ajudado, cha
mamos de base intercambiável É essa base, no rela
cionamento entre os dois, que vai permitir ao
primeiro passar para habilidades iniciativas, quando
o segundo sinaliza que está pronto para isso.
E como se a base intercambiável fosse o In
gresso para o ajudador passar a níveis mais profun
dos no processo de ajuda, quando vai poder acres
centar sua própria percepção à compreensão que
comunica ao ajudado (respostas aditivas).
Não há um tempo pré-estabelecido para a
construção dessa base na relação de ajuda. Pode
levar de alguns minutos até meses ou anos. Tudo
vai depender da prontidão do ajudado e do tempo
total de que os dois dispõem para construir sua
relação. Numa consulta médica de cinqüenta
minutos, essa base pode ocupar dez ou quinze
minutos do tempo total. Num processo de terapia
mais prolongado, pode levar algumas semanas ou
meses. E num ponto de ônibus, apenas alguns
minutos.
166 167
1° rift 9nift
PASSOS PARA SE FORMULAR A RESPOSTA
DE SENTIMENTO E CONTEÚDO
1. Identificar o sentimento.
2. Identificar a razão para o sentimento.
3. Responder usando o formato;
, "Você está se sentindo,., porque..."
Também aqui os passos são sugeridos apenas
para efeito de treinamento. O formato, que ajuda a
identificação tanto do sentimeíito quanto do
conteúdo, pode ser trocado por qualquer outro que
inclua os dois elementos: "Diante de... você se sente;
quando... acontece, você se sente...; você se sente...
toda vez que...".
O TESTE FUNCIONAL DA RESPOSTA
Dizemos que o teste da resposta do ajudador
se faz através da reação do ajudado. Se a resposta
"funciona" para o ajudado, ele vai continuar re
latando suas vivências, em níveis cada vez mais pro
fundos. É como se cada resposta fosse um convite
à sua expressão, é como se cada resposta "desse
corda" ao ajudado, em analogia com brinquedos
que continuam a se movimentar cada vez que a
criança lhes dá corda.
Quando o ajudado recusa a resposta ou inter
rompe seu relato, é sinal de que o ajudador não o
compreendeu ou não conseguiu comunicar sua
compreensão através da resposta e deve continuar
tentando até acertar.
EXISTEM RESPOSTAS ERRADAS?
O "erro" na resposta de sentimento e conteú
do funciona como na resposta de conteúdo: não
existe, no sentido de que o ajudador sempre acerta
pelo simples fato de estar empenhado em com
preender e ajudar.
Se o sentimento captado e comunicado pelo
ajudador não corresponde ao que o ajudado está
sentindo, este mesmo se encarrega de corrigir ou
de relatar melhor o que está vivendo. Muitas vezes,
é nessa hora de "correção" que ele descobre seu
verdadeiro sentimento, até então desconhecido.
Além disso, só o empenho do ajudador em
acertar já o faz sentir-se amparado e valorizado
como pessoa.
Uma boa analogia para as tentativas do ajuda
dor é o alvo usado no treinamento de tiro.
As respostas podem guardar distâncias variá
veis do alvo, ou do verdadeiro sentimento e conteú
do do ajudado. A cada tentativa, o "tiro" pode ficar
mais próximo, até que uma determinada resposta
atinja realmente o centro do X: o alvo ou o miolo
de sua fala.
Por último, é importante lembrar aqui o cui
dado com que o ajudador deve formular suas res
postas Essas nunca devem ter a conotação de afir
mações taxativas sobre aquilo que o ajudado está
vivendo. Iniciar as respostas com: "Parece-me que;
quem sabe você está se sentindo; talvez isso faça
você se sentir; não sei se é isso mesmo, mas percebo
168 169
1® Rpmestrp rip ?nift
que você se sente, etc," transmite uma atitude fun
damental do ajudador - a consciência de que o único
dono de sua verdade é o próprio ajudado; que ele,
o ajudador, está tentando apenas facilitar a com
preensão do ajudado em relação a si mesmo. Se
este confirma sua resposta, significa que o ajudador
captou sua experiência; caso contrário, nada lhe
resta senão fazer novas tentativas até encontrar a
resposta acertada. Isso em nada prejudica a relação
entre os dois; pelo contrário, reflete,apenas a postura
de humildade do ajudador, que reconhece que a
verdade pertence a seu próprio dono - o ajudado.
RESPONDENDO AO SENTIMENTO E
CONTEÚDO
O que é:
Comunicar ao ajudado a compreensão de como ele
está se sentindo e por que está se sentindo dessa
maneira.
Para que:
Se respondo ao sentimento e conteúdo do ajudado,
ele vai sentir-se compreendido integralmente de
modo a estabelecer ligações entre seu mundo inter
no e externo.
Como:
1. Identificar o sentimento.
2. Identificar a razão para o sentimento.
3. Responder usando o formato:
"Você está se sentindo... porque...".
170
171
1® Sftmftstrft riA ?nift
A pessoa inteira é aquela que estabelece um
contato significativo e profundo com o mundo à
sua volta. Ela não só escuta a sl mesma, como
também às vozes de seu mundo. A extensão de sua
própria experiência é infinitamente multiplicada
pela empatia que sente em relação aos outros. Ela
sofre com os infelizes e se alegra com os bem-
aventurados. Ela nasce a cada primavera e sente
o impacto dos mistérios da vida:, o nascimento, o
crescimento, o amor, o sofrimento, a morte. Seu
coração bate com os enamorados, e ela conhece a
alegria que está com eles. Ela conhece também o
desespero, a solidão dos que sofrem sem alívio: Q
os sinos, quando tocam, ressoam de maneira
singular para ela.
John Powell
-'iv''-- >'0;
«t vr-M <•!*.-
.M- ■
'1,
í.
•S
>■-
«•
-Ser-
t/j.
iWxJíSSs'»
bS
a» -j-uy
>s;
fê -'s-*
A
•.W'5 t'.
í ̂' i^V • C '-V' ^
V :•?
•:;'.-vàV Í
■■
172
1® Sftmpstrfi Hp 7f)1R
í
'
f
4B
Q^sponcíencío com imagens
Muitas vezes, à medida que o ajudador escuta
uma pessoa, ocorre-lhe uma imagem que capta, de
maneira simbólica, sua experiência. Essa imagem
seria como uma representação daquilo que a pessoa
relata estar vivendo ou sentindo, criada pelo pensa
mento do ajudador.
Nem sempre, apenas refletir o conteúdo ou
encontrar uma palavra-sentimento é suficiente para
captar inteiramente a experiência do ajudado. A
imagem que brota espontaneamente no ajudador
enquanto escuta o outro tem, às vezes, um poder
muito maior de comunicar compreensão do que as
respostas de conteúdo e sentimento.
E por brotar com tanta espontaneidade que a
imagem reflete um alto grau de empatia por parte
do ajudador: é como se, de repente, ele captasse,
visual evisceralmente, todo o relato do ajudado,
com uma empatia total. Visceralmente, porque a
imagem nasce dentro de suas próprias vísceras, de
maneira inesperada e como resultado de uma sinto
nia perfeita com o ajudado.
175
1® Ha
Compreendendo com tanta clareza a vivência
do outro e comunicando a ele essa compreensão, o
ajudador facilita ao ajudado o entendimento do que
se passa com ele. Através da imagem, ambos visuali
zam com enorme nitidez aquilo que o ajudado está
vivendo e relatando. Às vezes, responder com ima
gem é a maneira mais efetiva de levá-lo a entrar em
contato profundo com a própria pessoa.
Relacionando esse tipo de resposta à dimensão
de concreticidade, poderíamos dizer/que a imagem
torna concreta uma experiência até então indefinida,
que o ajudado tem dificuldade de visualizar.
Por outro lado, nos momentos em que a ima
gem se refere a alguma ação que o ajudado pretende
iniciar, é como se ele, através da imagem, "ensaiasse"
essa ação. E quando ele conse^e yisualizar-se fa
zendo alguma coisa num futuro próximo, mas para
a qual não está pronto ainda. Nesse caso, a imagem
o ajuda a antecipar sua ação pelo menos na imagina
ção, dando-lhe informações sobre como vai se sentir
ao executá-la.
Também nos momentos em que o ajudado co
meça a relatar mudanças em sua vida, pequenas mas
ao mesmo tempo significativas, o ajudador pode
enfatizar seu processo usando uma resposta de
imagem (semelhante ao que vimos no tópico sobre
responder a sentimentos positivos). Por exemplo:
mente. Só pensava em morrer. Mas ontem, quando
me peguei rindo pela primeira vez em tanto tempo
e satisfeita ao lado de outro homem, comecei a pen
sar que talvez até possa refazer minha vida afetiva".
Resposta de imagem:
"Que bom, Beatriz, é como se, pela primeira vez
em muito tempo, você começasse a enxergar Lima
luz ao final do túnel!"
A resposta de Imagem pode ser formulada
para o ajudado isoladamente ou acompanhada de
respostas de sentimento, de conteúdo, ou de ambas.
Os respectivos formatos seriam estes:
1. Resposta de imagem:
"É como se...(imagem)"
2. Resposta de imagem e conteúdo:
"Quando...(conteúdo), é como se...(imagem)"
3. Resposta de imagem e sentimento:
"Você se sente...(sentimento) como se... (imagem)"
4. Resposta de imagem, sentimento e conteúdo:
"Diante de...(conteúdo), você se sente...
(sentimento) como se...(imagem)"
Vamos ilustrar usando falas de ajudados e
formulando uma resposta de imagem para cada uma
delas:
Beatriz:
"Nas primeiras vezes em que eu vim aqui, pensei
que jamais conseguiria esquecê-lo e ser feliz nova-
Pedro:
"Ando muito em dúvida quanto ao curso que devo
fazer. Às, vezes, penso que o melhor seria Medicina.
176 177
1° SftfnfiRtrft rlft 701 ft
Acho uma profissão bonita, e meu pai poderia aju
dar-me, por ser médico. Mas o curso é muito pesa
do, e a vida de médico não é fácil. Por outro lado,
gosto também de Odontologia, acho que poderia
ser um bom dentista. O curso é só de quatro anos,
e eu poderia ter uma vida mais tranqüila, depois de
formado. Não sei mesmo o que fazer, é uma escolha
difícil para mim."
Resposta de imagem:
"E como se você estivesse numa /encruzilhada,
Pedro. Tem diante de você duas estradas, e não
sabe qual delas vai leyá-lo ao melhor lugar".
João:
"Cada vez que meus colegas me criticam, fico
péssimo. Me dá um mal-estar muito grande, tenho
vontade de avançar neles. Tambéni não gosto de
brincadeiras. Tudo que as pessoas me dizem me
incomoda muito, ás vezes fico pensando o dia inteiro
naquilo que alguém me falou, não consigo nem
estudar".
Resposta de imagem, sentimento e conteúdo:
"Você se sente 'fisgado' diante do que as pessoas
lhe dizem, João, como se você fosse um peixe e as
palavras fossem um anzol, que o fisgam quando
você as escuta".
não sei o que fazer com a liberdade que eu tanto
queria".
Resposta de imagem e conteúdo:
"Quando você se vê solteira de novo, é como se
fosse um passarinho que, depois de muito tempo
de prisão, ve a porta da gaiola aberta, mas não sabe
para onde voar".
Roberto:
E uma situação que acontece sem o meu controle.
Eu vejo as pessoas fazendo coisas erradas, ou que
me desagradam, todos os dias. Não consigo falar
com elas sobre o que me incomoda. Um dia, de
repente, por causa de uma bobagem, eu estouro, e
aí vai tudo por água abaixo".
Resposta de imagem e sentimento:
"Você se sente oprimido como se fosse água fer
vendo na chaleira, com a tampa fechada. Quando a
ebulição é muito grande, faz a tampa saltar, e toda
a água entorna da chaleira".
Teresa:
"É engraçado, antes eu vivia pensando em como ia
me sentir livre ao me separar. Agora, consegui o
que queria, meu marido assinou o divórcio, mas
178
179
1° .^Rmestrfl rlft ?niR
RESPONDENDO COM IMAGENS
O que é:
Captar a experiência do ajudado através de uma
representação simbólica e transmiti-la a ele.
Para que:
Se respondo com imagens ao ajudado, comunico-
lhe um alto grau de compreensão, de modo a tornar
sua experiência mais concreta.
Como:
1. Encontrar uma representação concreta para o
relato do ajudado.
2. Transformá-la em palavras.
3. Responder usando o(s)formato(s);
"É como se..."
"Quando..., é como se..."
"Você se sente... como se...
"Diante de... você se sente... como se..."
181
1® .Semftstre dfi PniR
Livre,
como um balão que sobe ao céu,
sem dono.
Perdido,
como um barco em meio à tempestade,
sem leme.
Triste,
como um órfão em noite de Natal,
sozinho.
Esperançoso,
como um náufrago sem forças,
avistando a praia.
Imagem: numa só linha,
em poucas palavras,
a mágica de fazer entrar
o mundo inteiro.
C.FM,
182
íK
'.wí
-•«■•A:
«A-\
.:V:-
áè
fcS
>3íS=^ê
Ê:
5ví:.Í)C^
'WltMsPrv,'.--
mv?\
^j"»- -• >.•
jfov.
■iÇ*^-TV- •iV;» »
1®
'
/7é>
mís'
ái7
Wh
^/a
Q^sponcícncío ao comportamento
COMO O AJUDADO SE EXPRESSA
Antes de conceituarmos a habilidade de res
ponder ao comportamento, vamos examinar as ma
neiras pelas quais o ajudado se expressa quando
está diante do ajudador;
1.. O ajudado se expressa corporal e verbalmente.
2. O ajudado não se expressa verbalmente, apenas
corporalmente, através do que chamamos de
"silêncio parado" - quase não há movimenta em
seu corpo. Os únicos dados de que dispomos a
seu respeito são a sua aparência (modo como
está vestido, penteado e sua postura) e sua ex
pressão fisionômica.
3. O ajudado não se expressa verbalmente, apenas
corporalmente, através de um "silêncio movi
mentado": ele pode chorar, rir, torcer as mãos,
mexer pernas, braços e cabeça, respirar de ma-
185
1® rlp Pfllft
neira ofegante, suspirar, andar de um lado para
outro, às vezes até mesmo agredir o ajudador.
São inúmeros sinais, cada um com um significado
e uma mensagem diferentes.
Levando isso em conta, podemos determinar
o que é responder ao comportamento nesse con
texto.
O QUE É RESPONDER AO COMPORTA
MENTO
Já dissemos no tópico sobre a habilidade de
observar, que o ajudador precisa saber discriminar
quando deve arquivar e quando deve confrontar o
ajudado, oferecendo-lhe os dados de suas obser
vações e/ou inferências.
Responder ao comportamento é a habilidade
de oferecer ao ajudado esses dados e/ou inferências,
nos momentos em que isso for benéfico para ele.
Quando o ajudado está se expressando verbal
mente, o ajudador pode responder simultaneamente
à sua expressão verbal e corporal. Se existe coe
rência entre as duas, o ajudador responde ao que
está vendo e, com isso, apenas confirma o que está
escutando. Por exemplo, "Você está me dizendo
que as coisas melhoraram muito; e realmente posso
ver que seus olhos estão brilhando e sua fisionomia
está alegre".
Se os dados corporais não estão compatíveis
com'Os dados verbais, e o ajudador acredita que
isso vai ser efetivo para o ajudado e que seu rela
cionamento já lhe dá esse direito, ele pode con
frontá-lo com sua percepção: "Por um lado, você
me diz que está tudo muito bem, por outro, estou
vendo você triste e abatido hoje". Como já vimos
também no observar, cabe ao ajudado confirmar
ou negar essa inferência.
Na habilidade de acolher, no tópico sobre indi
vidualizar,falamos de alguns sinais do ajudado que
não têm, no momento, qualquer ligação com o que
ele está dizendo, mas que são dignos de nota e
devem ser mencionados, porque podem ter um sig
nificado importante. Por exemplo, "É a primeira
vez que o vejo com uma roupa vermelha; como
você só usava cores escuras, estou pensando que
talvez você tenha resolvido se enfeitar mais". Ou,
"Você cortou o cabelo; será que isso faz parte da
sua decisão de cuidar mais de você?"
Já dissemos da importância de "puxarmos
para cima" o ajudado. Quando o ajudador observa
pequenas mudanças e comunica isso a ele, está lhe
dizendo algo como "Você é importante para mim,
estou muito atento à sua pessoa e valorizo cada
mudança sua".
Até agora, falamos de responder ao compor
tamento quando há expressão verbal do ajudado.
Há muitos momentos, no entanto, em que ele não
se expressa dessa maneira; vamos, então, responder
a seu comportamento, respondendo a seu silêncio,
"parado" ou "movimentado". Aqui, vamos precisar,
mais do que nunca, de nossa habilidade de observar
186
187
1® dfi ?nifi
- diante de seu silêncio, é a única habilidade a nosso
alcance para captarmos suas mensagens.
POSSÍVEIS SIGNIFICADOS DO SILÊNCIO DO
AJUDADO
Quando o silêncio está ligado à sua relação
consigo mesmo (ele não tem a intenção de usar o
silêncio para transmitir qualquer mensagem ao
ajudador). ^
1. O ajudado não sabe o que dizer no primeiro con
tato: em se tratando de uma relação de ajuda
profissional, a pessoa que busca essa ajuda pela
primeira vez pode não saber o que se espera dela
nesse contato. Ela não sabe se deve falar em
primeiro lugar, se deve esperar que o ajudador
fale ou se deve apenas responder a perguntas.
Com medo de "errar", ela se cala, esperando que
o ajudador lhe diga o que fazer
2. O ajudado está inteiramente voltado para si mes
mo: é quando ele não está interessado em intera
gir com o ajudador ou com qualquer outra pes
soa. Está tão absorvido consigo mesmo, que se
comporta como se estivesse sozinlio. Usando
uma imagem, poderíamos dizer que ele está com
"inversão do globo ocular", ou seja, seus olhos
estão voltados para seu interior, de tal modo que
só enxerga a si mesmo e a ninguém mais.
3. O ajudado está deprimido: às vezes, no pico da
crise, o ajudado está com o nível de energia tão
baixo, que não tem força para coisa alguma, nem
mesmo para se expressar verbalmente.
4. O ajudado está confuso: quando sua experiência
está muito desordenada, ele pode perder-se no
meio dela, sem saber por onde começar.
5. O ajudado está organizando seu pensamento:
algumas pessoas não querem falar de sua própria
confusão. Preferem organizar suas idéias pri
meiro, para depois expressá-las de maneira mais
ordenada.
6. O ajudado está sentindo com muita intensidade:
quando experimenta sentimentos muito intensos,
o ajudado nem sempre encontra palavras para
traduzi-los. Prefere calar-se ou expressar-se de
outras maneiras (chorando, por exemplo).
7. O ajudado está com "ressaca de entrega": às ve
zes, ele coloca um limite para a própria entrega.
Quando já se entregou tanto quanto queria ou
mais do que pretendia, prefere calar-se. É como
se tivesse bebido muito e deixasse de beber,
durante o período de "ressaca". De acordo com
Powell "...Eu quero seguir a prescrição inteira,
mas em pequenas doses. Eu quero a história in
teira, mas só posso ler um capítulo de cada vez.
Não me sinto forte o bastante, nem me amo o
188 189
1® .SftfTiPsfrp rtft ?nifl
bastante para me defrontar com tudo de uma só
vez".
Quando o silêncio está ligado à sua relação com
o ajudador (sendo usado para lhe enviar mensagens
específicas).
1. O ajudado está com medo do ajudador; quando
ainda não se estabeleceu um clima de inteira con
fiança na relação, ele pode ter medO; da reação
do ajudador diante de seu relato. Ou ele pode
ter medo de o ajudador, não manter sigilo abso
luto. Quando esse medo é maior do que o desejo
de falar, ele se cala.
2. O ajudado se sente envergonhado diante do aju
dador: uma de suas características é a inaceitação
quanto às coisas que está vivendo. Dessa ina
ceitação, surge a vergonha de sua própria expe
riência e de sua pessoa. Temeroso de que o aju
dador o julgue como ele mesmo está se julgando,
o ajudado fica ansioso e embaraçado e não
consegue relatar suas vivências.
3. O ajudado está com raiva do ajudador: num certo
momento da relação, ele pode se voltar contra o
ajudador por várias razões. Nesse caso, usa o
silêncio como punição. É a maneira de rejeitar o
ajudador e de dizer a ele que está magoado ou
irritado. O ajudador não correspondeu às suas
expectativas e agora é castigado por isso.
4. O ajudado está testando o ajudador; faz parte
do processo de ajuda, especialmente no Início,
uma fase em que ele testa o ajudador para decidir
se pode ou não se entregar. Um dos instrumentos
de teste pode ser o silêncio. A pergunta implícita
é do tipo: "Você é capaz de me aceitar incon
dicionalmente? Você vai querer me compreender
e se interessar por mim, mesmo que eu per
maneça em silêncio?"
Para o ajudador que observa o tempo todo,
não é difícil perceber quando o silêncio tem a ver
com o próprio ajudado e quando tem a ver com a
relação entre os dois. No primeiro caso, o ajudado
não tem intenção de manter qualquer contato, e
sua postura revela isso. No segundo, mesmo quando
olha para outro, lugar ou fica de costas, o ajudado
mantém contatos visuais rápidos e esporádicos para
conferir qual é o efeito que está causando no
ajudador. Se a finalidade é incomodá-lo, ele quer
checar o quanto está atingindo seu objetivo.
O AJUDADOR DIANTE DO SILÊNCIO DO
AJUDADO
Se retomarmos aqui o principio do ABC,
vamos verificar que o silêncio do ajudado tem signi
ficados diferentes para cada ajudador.
Para alguns, o silêncio pode soar como uma
mensagem do tipo: "Não estou gostando de você,
não quero compartilhar minhas coisas com você",
190 191
1® Rftmpstrft r|p
mesmo quando não é isso o que o ajudado está
querendo transmitir. E no caso de ele querer trans
mitir exatamente isso, usando o silêncio para punir
o ajudador, esse pode sentir-se rejeitado e culpado,
como se tivesse fracassado em suas funções. Sua
tendência é quebrar o silêncio o mais rápido possível
para baixar sua ansiedade. Com isso, está perdendo
a chance não apenas de respeitar o ajudado como
também de trabalhar a relação entre os dois.
Há várias maneiras através das qqais o aju
dador pode lidar com o silêncio do ajudado:
1. Ficando em silêncio também
Quando interpreta o silêncio de maneira racional,
o ajudador torna-se capaz de suportá-lo, transmi
tindo ao ajudado mensagens de respeito e aceita
ção. Isso vale especialmente para algumas das si
tuações já descritas anteriormente (quando o aju
dado está voltado para si mesmo, está organizan
do suas idéias, está sentindo com muita intensida
de, ou não quer entregar-se mais naquele momen
to). Em algumas situações, qualquer resposta ver
bal pode soar como uma cobrança para que o aju
dado fale. O melhor é esperar até que ele envie
qualquer mensagem, verbal ou corporal, no senti
do de retomar a interação verbal entre os dois.
Por outro lado, isso não quer dizer que o ajudador
não possa, também, responderão comportamento
do ajudado em cada uma dessas situações, desde
que o faça de maneira respeitosa, dando um tem
po para o silêncio do outro antes de responder.
2. Respondendo ao comportamento
Nas situações já descritas, se o ajudador decide
que o melhor é responder ao ajudado, ele pode
formular respostas do tipo: "Parece-me que você
está precisando de ficar sozinho com você mes
mo" ou "Você prefere colocar suas idéias em
ordem primeiro e falar depois" ou "Esse senti
mento é grande demais para ser expresso em
palavras" ou "Hoje você falou de coisas muito
pesadas e prefere não falar mais a esse respeito
por enquanto". Diante das respostas, o ajudado
decide continuar em silêncio, ou retomar sua
expressão verbal.
Quanto às outras situações, precisam ser
trabalhadas para facilitar o próprio crescimento do
ajudado e por isso, o ajudador deve respondera
cada uma delas:
- No primeiro contato: "Você talvez não saiba o
que fazer e gostaria que eu lhe dissesse. Pois
aqui quem dá a direção é você. Se quiser, pode
dizer-me porque motivo me procurou, ou pode
começar de onde achar melhor".
- Com o ajudado deprimido: "Parece-me que hoje
você está triste e abatido."
- Com o ajudado confuso: "Você me parece per
dido dentro da sua experiência. Talvez possa me
dizer como é isso, para tentarmos organizar as
coisas juntos".
192
1® SftmpRfrft riR 901R
193
Quando o ajudador percebe que o silêncio está
ligado à sua relação com o ajudado, deve usar a di
mensão de imediaticidade- o que está acontecendo
aqui e agora entre os dois - e aproveitar a oportuni
dade para trabalhar a relação. Desse trabalho depen
de toda a continuidade do processo de ajuda e o
próprio crescimento do ajudado. Também aqui, o
ajudador deve responder a cada uma das situações:
- O ajudado está com medo: "Você talvez esteja
receoso de me relatar o que está vivendo, é um
medo de eu não ser capaz de aceitá-lo, ou, quem.
sabe, um medo de eu hão guardar isso só para
mim?"
- O ajudado está envergonhado: "É difícil para
você falar dessas coisas, parece-me que você se
sente embaraçado; há um receio de eu me sentir
embaraçado também?"
- O ajudado está com raiva: "Parece-me que você
está aborrecido ou magoado comigo; será que
foi por alguma coisa que eu fiz, ou falei com
você?"
- O ajudado está testando: "Talvez você esteja se
perguntando se eu vou.aceitá-lo de qualquer
jeito, mesmo ficando em silêncio assim".
O importante aqui é como vão ser formuladas
essas respostas. Um tom interrogativo significa
compreensão e aceitação por parte do ajudador e,
ao mesmo tempo, o reconhecimento de que só o
ajudado sabe a verdade a seu respeito.
RESPONDENDO AO COMPORTAMENTO
O que é:
Comunicar ao ajudado que suas mensagens não-
verbais foram captadas.
Para que:
Se respondo ao comportamento do ajudado:
- ele pode aliviar sua tensão, de modo a facilitar
sua comunicação verbal;
- ele pode perceber alguma incoerência entre seu
comportamento verbal e corporal, de modo a se
conhecer melhor;
- podemos avaliar nosso relacionamento, de modo
a tomá-lo mais profundo.
Como:
1. Observar.
2. Identificar mensagens nao-verbals.
3. Comunicar essas mensagens ao ajudado, usando
o formato:
"Estou percebendo você...", ou
"Você está me parecendo..."
No caso de incoerência:
"Por um lado você me diz que..., por outro você
me parece..."
194 195
1® .SflmftstrA rift ?nifl
A realidade do outro não está naquilo que
ele revela a você, mas naquilo que ele não lhe pode
revelar.
Portanto, se você quiser compreendê-lo,
escute não o que ele diz, mas o que ele não diz.
Kalil Gibran
\
- ■
196
1® fipmpsfrp f|p 701R
í
I
^ip.
<«'
>3
<s»
Q^sponcíeníío às perguntas
A interação verbal entre as pessoas não se
faz apenas através de relatos e afirmativas. As per
guntas servem também de meio de comunicação
entre elas. As razões que as levam a fazer perguntas
são várias e é importante sabermos que ninguém
indaga nada à-toa.
POR QUE AS PESSOAS PERGUNTAM?
1. Porque precisam da resposta.
Em alguns casos (talvez a menor parte deles),
as pessoas precisam apenas de uma informação
objetiva. A resposta vai ajudá-las a tomar uma
decisão ou a iniciar alguma ação. Por exemplo:
- "Onde fica essa rua?"
- "A que horas passa o próximo ônibus?"
- "Quanto custa?"
São perguntas objetivas, sem qualquer outra
intenção que não a de obter exatamente a res
posta pedida, a não ser em situações especiais.
199
1® .^firriAstrft ri» POlft
2. Porque querem manter contato com o outro.
Muitas vezes, a resposta é o menos importan
te para quem indaga. A pessoa deseja apenas se
aproximar do outro, conhecê-lo, ganhar afeto e
compreensão. Nos contatos sociais, são formu
ladas algumas perguntas-padrão do tipo:
- "Como é o seu nome?"
- "O que você faz?"
- "Onde você mora?"
As respostas a essas perguntas nçm sempre
são muito importantes para quem pergunta.
Tenha o nome que tiver, more onde morar e seja
qual for a atividade profissional do outro, quem
pergunta está apenas fazendo um convite para
se relacionar. Algumas vezes a pessoa que indaga
já sabe até mesmo a resposta. Sua pergunta é
apenas um pretexto para se aproximar de quem
responde.
3. Porque querem expressar alguma coisa e não
conseguem.
Nesse caso, a pessoa quer o contato descrito
acima e algo mais além disso: comunicar alguma
coisa que não consegue expressar diretamente.
Por exemplo, um cliente pergunta ao dentista:
- "Doutor, será que esse tratamento vai ficar
muito caro?"
Comunicação implícita na pergunta:
- "Eu não tenho muito dinheiro e gostaria que
o senhor não cobrasse muito caro de mim."
4. Porque querem saber alguma outra coisa e não
conseguem perguntar diretamente.
Também aqui há uma camuflagem, em que a
pergunta formulada esconde a vontade da pessoa
de saber outra coisa. Por exemplo, a mulher per
guntando ao marido:
- "A que horas você saiu do serviço?"
Pergunta implícita:
- "Você veio direto para casa, ou fez alguma
outra coisa antes de vir?"
Às vezes, atrás de uma pergunta implícita,
existe outra ainda mais implícita:
- "Você está se encontrando com outra mulher?"
Não só existem uma ou mais perguntas im
plícitas, como também existe uma comunicação
escondida:
- "Tenho muito medo de você gostar de outra
pessoa e não me querer mais."
Como a pessoa tem medo ou vergonha de
perguntar o que realmente quer saber, ou de co
municar o que realmente está sentindo, ela usa a
pergunta para obter respostas às suas dúvidas e
inseguranças.
MENSAGENS APARENTES E SUBJACENTES
Já mencionamos no tópico sobre escutar, que
a expressão verbal é formulada em dois níveis. No
primeiro, temos uma mensagem explícita ou apa
rente, que está contida na superfície das palavTas
que estão sendo ditas. E a esse nível que geralmente
200
201
1° .^ftíTlíSRtrR fÍR PDIfl
escutamos e respondemos. No segundo, temos uma
mensagem implícita ou subjacente, que é a verda
deira mensagem - é o que a pessoa realmente está
querendo nos dizer. A essa, raramente estamos aten
tos e por isso, não costumamos responder a ela.
As pessoas usam a mensagem aparente por
que têm dificuldade de comunicar direta e aber
tamente o que realmente estão sentindo.
Tudo isso vale para as perguntas. Por baixo
de cada indagação, está escondida a verdadeira men
sagem ou pedido da pessoa que pergunta. As pala
vras objetivas usadas na formulação da pergunta
servem apenas de veículo através do qual a men
sagem real é transmitida à pessoa que escuta. A ela
cabe desvendar essa mensagem.
COMO RESPONDER ÀS PERGUNTAS
Nesse contexto, responder à pergunta é a
habilidade de;
- perceber a mensagem subjacente a essa pergunta;
- comunicar essa percepção ao outro;
- responder, se necessário, à parte objetiva da
questão (mensagem aparente).
A identificação da mensagem subjacente en
volve a percepção de sentimentos e conteúdos que
estão atrás da pergunta. Muitas vezes, quando o
ajudador capta essa mensagem e comunica sua
compreensão ao ajudado, este nem mesmo vai
querer resposta à pergunta objetiva que formulou.
Ele queria apenas compreensão, e não informação.
Se, no entanto, essa informação objetiva for impor
tante também, ele vai voltar a ela, perguntando
novamente. Nesse momento, já tendo respondido
a sentimento e/ou conteúdo, o ajudador fornece a
informação pedida.
Quando o ajudador responde apenas à mensa
gem aparente, perde, ao mesmo tempo, duas chan
ces: comunicar sua compreensão ao ajudado, dan
do-lhe espaço para se expressar diretamente; facili
tar sua exploração, levando-o a entrar em contato
com sentimentos que, ás vezes, nem ele mesmo
conhece. É como se o ajudador "tirasse a roupa"
da pergunta para encontrar, junto com o ajudado,
o "corpo" de sua mensagem.
Novamente aqui vamos lembrar a importância
de formular respostas em tom interrogativo. Dessa
maneira, nossa postura diante do ajudado continua
sendo de humildade, diante da verdade que é só
dele.
Vamos ilustrar essa habilidade, respondendo
às perguntas deElizabete e Carlos.
Elizabete:
"Você acha que a mulher, quando perde a virgin
dade, tem mais dificuldade em se casar?"
Resposta à mensagem aparente:
"Não, Elizabete, acredito que um homem pode amar
uma mulher e querer casar-se com ela mesmo se
ela não for virgem".
202
203
1® .Sftmftstrft rift ?niR
Essa resposta pode resultar no corte da comu
nicação do ajudado. Elizabete pode estar querendo
comunicar, através da pergunta, um fato difícil de
ser relatado - a perda de sua própria virgindade - e
seus sentimentos diante disso - preocupação e medo
de não se casar.
Se, por outro lado, o ajudador está atento à
mensagem subjacente, pode responder de modo a
levar o ajudado a trazer à tona seus verdadeiros
sentimentos:
Respostas à mensagem subjacente:
"Parece-me que a virgindade é um aspecto com o
qual você tem se preocupado", (resposta de conteúdo)
"E importante para você que a mulher se case, e a
ausência da virgindade pode ser um empecilho",
(resposta de conteúdo)
"Isso deixa você preocupada?" (resposta de senti
mento)
Outro aspecto importante é a cautela com que
o ajudador formula a reposta, Uma maneira muito
direta ou muito rápida de abordar o verdadeiro
problema pode assustar o ajudado e levá-lo a fechar-
se. Por exemplo: "Você perdeu a virgindade e está
com medo de não se casar", pode ser uma maneira
descuidada e desrespeitosa de confrontar o ajudado
com o problema que é real, mas que ele não quer
abrir para o ajudador nesse momento. Sua tarefa,
nesse caso, é apenas oferecer condições para que o
ajudado seja capaz de colocar o seu problema.
Carlos:
"Você acha que é normal uma pessoa ter ódio do
próprio pai?"
Resposta à mensagem aparente:
"Claro, Carlos, se uma pessoa odeia o pai é porque
tem razões para isso."
Respostas à mensagem subjacente:
"Parece-me que você acha estranho ver uma pessoa
com ódio do pai", (resposta de conteúdo)
"Você está preocupado com o tipo de sentimento
que as pessoas experimentam em relação a seus
pais?" (resposta de sentimento e conteúdo)
Uma vez aberta a comunicação, tanto com
Elizabete como com Carlos, e depois de explorado
o problema de cada um, o ajudador pode responder,
de maneira objetiva, às perguntas, caso isso ainda
seja importante para eles:
"Não, Elizabete, não creio que a ausência da virgin
dade impeça a mulher de se casar."
"Acho normal, Carlos, pois acredito que todos os
sentimentos que brotam das pessoas são naturais e
têm uma razão de ser".
EM QUE SITUAÇÕES O AJUDADOR
PERGUNTA?
U Quando não entendeu alguma coisa.
Se o ajudador não escutou bem, ou não com
preendeu alguma coisa expressa pelo ajudado,
204 205
1® .^pmfistre rip
deve perguntar sobre a parte que perdeu. Isso
não significa desatenção, mas justamente o con
trário: seu desejo de captar cada palavra do aju
dado, de modo a compreendê-lo da melhor forma
possível.
2. Quando o ajudado quer, mas não consegue
se expressar.
Muitas vezes o ajudado está repleto de coisas
para colocar, mas algo o impede -^vergonha,
medo de crítica, falta de costume de falar a seu
respeito, etc. (ver respondendo ao compor
tamento). Nesses momentos, uma pergunta
(tanto quanto uma resposta ao comportamento)
pode aliviar a tensão e facilitar a expressão do
ajudado.
3. Quando o ajudado tem dificuldade de
explorar seus sentimentos.
Às vezes, o ajudado não consegue detectar seus
próprios sentimentos. Nesse caso, as perguntas
podem facilitar a tarefa. Por exemplo, "Como é
esse incômodo?" ou "De onde vem sua
ansiedade?" são perguntas que podem levá-lo a
explorar melhor sua experiência.
4. Quando o ajudado se expressa de maneira
abstrata.
O ajudado, às vezes, se expressa através de di-
vagações e abstrações. Lembrando a dimensão
de concreticidade, o ajudador pode levá-lo a se
tomar mais específico em suas colocações atra
vés de perguntas. No geral, falta ao ajudado fazer
ligações entre sentimentos e conteúdos. Por
exemplo:
"Como a ausência dele faz você se sentir?" ou
"O que você experimenta quando pensa em
recomeçar a trabalhar?" ou "O que faz você ficar
tão preocupado?"
Deixamos apenas um pequeno espaço para
esse último tópico por acreditarmos que o ajudador
efetivo é capaz de captar as mensagens do ajudado
sem que, para isso, tenha de fazer perguntas, a não
ser nos casos descritos acima. Voltando às habili
dades básicas, quanto melhor o ajudador atende,
observa e escuta, menor é a necessidade de pergun
tar. Da mesma forma, são as respostas do ajudador,
e não suas perguntas, que comunicam uma
verdadeira compreensão ao ajudado.
206 207
1° SftmfiRfrp flft ?nift
RESPONDENDO AS PERGUNTAS
O que é:
Responder, ao mesmo tempo, à mensagem subja
cente e à mensagem aparente trasmitida pelo aju
dado.
Para que;
Se respondo às perguntas do ajudado, comunico-
lhe compreensão, de modo a facilitar-lhe a comuni
cação de conteúdo implícito.
Como:
1. Identificar sentimentos e/ou conteúdo
subjacentes à pergunta.
2. Responder a sentimento e/ou conteúdo.
3. Responder à questão objetiva, se necessário.
209
1" .SpmftRfrft Hp ?nifl
Seja paciente com as coisas não-resolvidas
em seu coração...
Tente amar as própria questões...
Não procure agora as respostas
que não podem ser dadas
pois você não seria capaz
de vivê-las.
E o mais importante,
é viver tudo.
Viva as questões agora.
Talvez você possa, então,
pouco a pouco,
sem mesmo perceber,
Conviver, algum dia distante,
com as respostas.
Rainer Maria Rilke
V&í
• «A• $ .
V \0
V •- • .x. v C'/-/ • -
NS.*ÍÍ!
^•. 'í.
•n\V^
:• \%S\
-^■■xliipiisiíaSv"
210
1® Remftfttrft rift ?fl1ft
í
'
'
w
m>ó
=52
<̂«?
-
í
mè
<^
Q^sponrfcncío com os próprios
sentimentos
SENDO GENUÍNO
Há uma tendência antiga de se ver o papel do
ajudador como alguém que ocupa uma posição de
superioridade na relação de ajuda. As vezes, é o
próprio ajudador que quer ser visto como o elemen
to superior da relação, e tanto suas mensagens
verbais quanto corporais são nesse sentido. Outras
vezes, é o ajudado que tende a se sentir inferior
como pessoa diante do ajudador.
A verdade é que não há ninguém melhor ou
pior como pessoa na relação de ajuda. O ajudador
não é melhor, da mesma forma que o ajudado não é
pior, O que existe é apenas uma diferença entre os
repertórios dos dois. Isso quer dizer que o ajudador
sabe fazer coisas que o ajudado não sabe, e são
essas coisas que este quer aprender - basicamente,
habilidades de vida. Por sua vez, o ajudado também
sabe fazer coisas que o ajudador provavelmente não
sabe. Esses repertórios estão ligados à atividade
213
1® .^ftmpRtrp Hp ?nifi
profissional de cada um. A diferença está, portanto,
nesses repertórios e não na qualidade como pessoa.
Existem várias formas de se quebrar essa ima
gem de superioridade. Uma delas está na genuini-
dade do ajudador. Entre outras coisas, ser genuíno
implica a habilidade de expressar os próprios senti
mentos ao ajudado. Quando o ajudador faz isso,
coloca sua parte de pessoa em contato com a pessoa
do ajudado. O relacionamento, então, não é entre
dois papéis, mas entre duas pessoas vigendo um
encontro verdadeiro.
SENDO COERENTE
Já dissemos antes que ninguém vive vazio de
sentimentos. O ajudador experimenta uma série de
sentimentos quando está diante do ajudado. Que
rendo ou não, esses sentimentos brotam e são ex
pressos, ainda que apenas corporalmente. Quando
são muito intensos e o ajudador os expressa verbal
mente, está apenas afirmando com palavras o que
já transmitiu com o corpo; está sendo também coe
rente com suas atitudes diante dele. Quando o ajuda
do capta essas mensagens corporais e o ajudador
nega o que está vivendo, é como se o estivesse con
vidando a negar também seus sentimentos e suas
vivências.
Algumas vezes, o ajudado pergunta ao ajuda
dor a respeito de sua vida pessoal. Voltando à habili
dade de responder às perguntas, o ajudador pode
começar respondendo á mensagem subjacente. ■
- "Disseram-me que você tem sete filhos, é ver
dade?"
- "Isso te deixa surpreso?"
Explorando com o ajudado como esse evento
o faz sentir, o ajudador pode depois responder
objetivamente à pergunta:- "E verdade, sim. Como sou casado pela segunda
vez, tenho quatro filhos do primeiro casamento,
uma filha do segundo e dois filhos do primeiro
casamento de minha mulher, que considero como
se fossem meus também. A soma de todos dá
sete".
O relato de experiências pessoais, quando têm
a ver com as do ajudado ou quando questionadas
por ele, desmistifica a pessoa do ajudador e o apro
xima do ajudado.
SENDO CUIDADOSO E EMPÁTICO
E importante que o ajudador saiba discriminar
quais sentimentos devem ser comunicados e quando
comunicá-los ao ajudado. Tão importante quanto
ser coerente é ser cuidadoso com ele.
Cuidado, aqui, se refere a duas situações: na
primeira, o ajudador é cuidadoso quando não ex
pressa os próprios sentimentos se isso for destrutivo
para o ajudado. Por exemplo, "morro de raiva de
você quando me conta como está agredindo seu
214
215
1® flp ?niR
marido" não vai facilitar em nada a abertura do
ajudado. É preciso verificar até que ponto o ajuda-
dor está misturando suas próprias coisas com as do
outro (implicitamente, "E essa a raiva que eu sinto
quando minha mulher me agride"). Quando ele sabe
separar o que é seu do que é do outro, vai controlar-
se quanto à comunicação de sentimentos que pos
sam destruir sua relação com o ajudado. Muito pro
vavelmente, vai deixar de sentir raiva quando des
cobrir a fonte de seus sentimentos. Até que ele a
descubra, o melhor é não expressá-los, especial
mente quando está confuso. Na segunda situação,
o ajudador é cuidadoso quando expressa senti
mentos que vão comunicar interesse pelo ajudado.
Em alguns momentos, o ajudador pode dizer como
se sente diante das vivências do ajudado. "Fico preo
cupado quando penso que você está vivendo uma
situação tão pesada e que precisa suportá-la por
mais algum tempo". "Estou triste por saber que o
que você mais temia aconteceu".
Ainda que o ajudador não possa oferecer so
luções mágicas, é reconfortante para o ajudado sa
ber que alguém está a seu lado, sentindo junto com
ele, com um grau profundo de empatia.
SENDO EFETIVO
Há uma pergunta básica que o ajudador deve
fazer a si mesmo antes de expressar seus sentimentos
ao ajudado.
- "Essa comunicação vai ser-lhe útil ou não?"
- "Estou sendo construtivo ou destrutivo?"
- "Estou sendo efetivo ou inefetivo?"
Só quando responde essas questões, é que o
ajudador pode se expressar tranqüilamente.
E importante também que ele saiba as razões
que o levam a expressar seus sentimentos ao aju
dado.
Há duas razões que nâo deveriam levá-lo a
esse tipo de comunicação: manipulação (querer
causar mudanças no ajudado) e desabafo (inverter
os papéis na relação e usar os ouvidos do ajudado
como se este fosse o ajudador).
Por outro lado, há uma boa razão pela qual o
ajudador deve expressar-se ao ajudado; quando sua
expressão é um convite para que o outro também se
expresse. A auto-expressão foi até mesmo transfor
mada numa técnica de abertura por um psiquiatra
americano. Segundo Goldbainner, é possível ter-se
acesso à parte mais profunda das pessoas em poucos
minutos, Basta, para isso, que o ajudador comece
falando de si ao ajudado, dizendo-lhe honesta e aber
tamente sobre seus próprios sentimentos. Também
segundo Poweil"... Se estou disposto a expor minha
parte mais profunda a outra pessoa, o resultado é
quase sempre automático e imediato: ela sente-se
autorizada a se revelar para mim. Tendo escutado
meu segredo e meus mais profundos sentimentos,
ela ganha coragem para comunicar os seus. É a isso,
em última análise, que chamamos de encontro."
216 217
1® Spmpsfrp rip 7nifl
Acima de tudo, há aqui uma questão básica:
nima relação de ajuda, o ajndador é antes de mais
nada um modelo para o ajudado. Isso se aplica
não só à expressão de sentimentos, mas a tudo o
mais: mil palavras de uma pessoa não valem um
só de seus atos.
Voltando à coerência, é importante sabermos
que, numa relação de ajuda ~ e aqui vale lembrarmos
a relação professor-aluno - a aprendizagem ocorre
muito mais através daquilo que o ajijidado vê do
que através do que ele escuta.
RESPONDENDO COM OS PROPRIOS
SENTIMENTOS
O que é;
Identificar meus próprios sentimentos diante do
ajudado e expressá-los a ele.
Para que:
Se expresso meus próprios sentimentos ao ajudado,
tomo-me mais próximo dele e convido-o a expressar
os seus.
Como:
1. Identificar meus sentimentos.
2. Expressá-los ao ajudado, usando o formato:
"Eu me sinto...quando...
porque...
diante de..."
218
1® SftmpRtrft flft ?niS
219
CONVITE
Pois fica decretado,
a partir de hoje,
que terapeuta é gente também.
Sofre e chora,
ama e sente,
e, àj vezes, precisa falar.
O olhar atenta,
o ouvido aberto
escutando a tristeza do outro
quando, às vezes, a tristeza maior
está dentro do seu peito.
Quanto a mim,
fico triste e fico alegre
e sinto raiva também.
Sou de carne e sou de osso
e quero que você saiba isso de mim.
E agora,
que já sabe que eu sou gente,
querfalar de você
para mim?
C.F.M.
220
1® SRrriRRtre Hr ?ni8
PERSONALIZANDO
(abrindo as portas da
compreensão)
223
1° Spmftstrft rift 901R
Vamos rever as fases do processo de ajuda e
localizar até onde caminhamos neste livro.
Ajudndor Sintoniza Responde Personaliza -> Oricntó
4- 4- ^ ■4 -4
Ajudado Envolvc-sc Explora Compreende Age
Fase respoiisíva Fase íaiciativa
Abordamos, até aqui, as chamadas habilidades
responsivas - sintonizar e responder - através das
quais o ajudador responde ao ajudado no mesmo
nivel em que este está se expressando, sem qualquer
acréscimo, Isso é verdade para a maior parte das
habilidades incluídas no sintonizar e responder. Não
é verdade, no entanto, para as três últimas, que já
se caracterizam por um toque de iniciativa por parte
do ajudador - responder ao comportamento,
responder às perguntas e responder com os próprios
sentimentos.
Antes de entrarmos na fase iniciativa pro
priamente dita, é bom que sejam enfatizados alguns
pontos importantes relativos ao desenvolvimento
do processo de ajuda:
1. As habilidades incluídas no sintonizar e res
ponder são as mais importantes na relação de
ajuda: são elas que vão estabelecer a base de
todo o processo.
2. Com freqüência, quando o ajudador sintoniza e
responde muito bem ao ajudado, não precisa de
usar suas habilidades de personalizar e orientar:
o próprio ajudado personaliza sua experiência e
começa a agir sem pedir orientação ao ajudador.
3. Isso se torna possível quando as respostas do
ajudador são tão efetivas que levam o ajudado a
níveis profundos de compreensão quanto à sua
responsabilidade na própria vida.
4. Quando o ajudado não chega a personalizar para
si mesmo, o ajudador pode fazê-lo, desde que
tenha adquirido esse direito através de suas habi
lidades de sintonizar e responder.
224 225
1° Rflmestrft rtp ?niR
í
í
^'̂ 4?
'%Sj
Í?É%*
22^
''^Sgaé
I 22^
-%
»>
'transformando a vítima em agente
Chegamos, finalmente, ao ponto culminante
do processo de ajuda, seja personalizando para o
ajudado, seja vendo-o personalizar para si mesmo.
Esse é também o ponto culminante do pro
cesso de amadurecimento da pessoa, vivendo ou
não uma relação de ajuda formal. Esse processo é
análogo ao desenvolvimento da criança, que ama
durece gradativamente. Seu choro diminui pouco a
pouco com seu crescimento, à medida que aumenta
seu repertório de habilidades diante da vida. Nos
primeiros meses, o recém-nascido chora de fome e
frio. Ele não sabe suprir suas próprias necessidades,
como não sabe pedir, de outra forma, aquilo de que
necessita. Seu choro é proporcional à falia de res
postas em seu repertório de vida. À medida que
cresce, a criança aprende primeiro a pedir, depois a
fazer por si mesma. Alimentar-se e agasalhar-se
deixam de ser problemas quando ela adquire o
repertório que lhe possibilita viver sem ajuda ex
terna; não precisa mais chorar para ganhar, ela mes
ma age para obter o que precisa.
227
1® Sftmftstrft flft 7niR
o mesmo ocorre no processo de ajuda. Há
um choro e um lamento do ajudado por não saber
fazer, para si mesmo, alguma coisa necessária a uma
vida satisfatória. Como orecém-nascido, ele depende
do outro para suprir suas necessidades. A partir do
momento em que o ajudador o leva a identificar o
que está faltando, ele troca o choro pela esperança -
esperança de quem descobre que as soluções estão
dentro de si mesmo e, por isso, podem ser alcançadas.
Assim, também, quando choro é pprque não
estou sabendo fazer alguma coisa por mim - não
estou personalizando minha experiência, ou seja,
não estou conseguindo identificar o meu papel den
tro do meu próprio problema.
Personalizar, então, é identificar e assumir rrú-
nha parcela de responsabilidade diante da situação
que estou vivendo. E tomar minha vida nas minhas
próprias mãos, percebendo minha contribuição para
os eventos que ocorrem à minha volta.
E, acima de tudo, abandonar o papel da vítima
que passivamente se submete a condições de vida
insatisfatórias e se transformar no agente da própria
mudança.
ASSUMINDO A RESPONSABILIDADE POR
MINHAS EMOÇÕES
Segundo Poweli, ninguém pode causar ou
ser responsável por minhas emoções. A tendência
para responsabilizar o outro pelo que sinto está cla
ramente expressa nalinguagem do dia-a-dia; "Você
me fez ficar com raiva, você me deixou enciumado,
você me fez sofrer, etc." ̂ erdade é que ninguém
ppde.fazer.naáa comigo. O outro,apenas estimula
as^emoções que estão dentro de mim, esperando
para virem ̂ tona. A„di_ferença entre causar e esli-
rnular emoções é crucial para o meu processo de
auto.conheclmentQ e para o meu relacioname.ntp
com o outro. Se acredito que o outro é que causa
minhas emoções, eu o acuso por isso, considerando-
0 culpado pelo meu sofrimento e me afasto dele.
Ou posso ficar a séu lado tomando nossa convivên
cia insuportável. Se, por outro lado, admito que o
outro apenas estimula emoções que já estão latentes
em mim, eu as reconheço e aproveito a oportuni
dade para me tornar responsável por mim mesmo e
me conhecer um pouco mais, perguntando-me;
De onde vem o meu medo?
Por que essa raiva tão grande?
Em que ponto vulnerável o outro me tocou?
Quando acredito nisso, posso lidar com mi
nhas emoções de maneira saudável, não preciso fu
gir de mim mesmo, Julgando e condenando os ou
tros. Posso ficar, cada vez mais, em contato comigo
mesmo.
O importante é saber que cada emoção me
diz alguma coisa a meu respeito. Preciso aprender
a não responsabilizar outras pessoas por minhas rea
ções, acusando-as, ao invés de aprender alguma coi
sa sobre mim. As reações emocionais de várias pes
soas são diferentes por causa de alguma coisa que
está dentro de cada uma delas. O máximo que posso
228
229
1® .9pmpstrp dp 9nifi
fazer é estimular essas emoções. Da mesma maneira,
se quero saber alguma coisa a meu respeito, preciso
escutar cuidadosamente minhas emoções, sem fazer
das acusações ao outro um refugio de mim mesmo.
LANÇANDO AS BASES
Já mencionamos antes a importância das
habilidades básicas - sintonizar e responder. São
elas que formam a base do personalizar np processo
de ajuda, especialmente através das respostas inter-
cambiáveis - aquelas que estão no mesmo nível em
que o ajudado se expressá.
Ele nos indica sua prontidão para iniciar essa
fase quando se toma capaz de manter seu próprio
comportamento de auto-exploração. Podemos per
sonalizar sua experiência quando ele mesmo se dá
respostas intercambiáveis,,ou seja, quando faz por
si o que fazíamos por ele.
No início do processo, o ajudado fala, o tem
po todo, a respeito de outras pessoas. Elas são, geral
mente, "culpadas" ou responsáveis por seus proble
mas. Já sabemos que isso não é verdade. Essa postu
ra de vítima reflete apenas a falta de autoconheci-
mento e a falta de habilidades para conduzir sua
vida. Além do mais, dificilmente poderíamos mudar
o comportamento de uma ou mais pessoas que estão
fora da relação de ajuda. Nosso trabalho se faz dire
tamente com o ajudado. À medida que caminhamos
com ele em seu crescimento, podemos levá-lo a as
sumir a responsabilidade pela própria vida.
A§ fases do pcrsonafisar
PERSONALIZANDO O CONTEÚDO (OU
TROCANDO PRONOMES)
Ao personalizar o contèúdo, nossa tarefa é
dar respostas aditivas que intermlizam, cada vez
mais, os temas da fala do ajudado. Esses temas,
que a princípio são externos, tornam-se internos à
medida que acrescentamos alguma coisa além do
nível em que o ajudado se expressa. É quando, de
pois de juntarmos as várias peças de sua experiência,
somos capazes de lhe oferecer nossa percepção des
sa experiência como um todo; e de lhe oferecer,
também, nossa percepção de qual é a sua parcela
de contribuição ao seu problema.
As perguntas básicas aqui são:
Qual é o efeito da situação sobre o ajudado?
Como suas vivências o afetam?
Se, na fase das respostas intercambiáveis, o
formato era do tipo "Você se sente... porque...",
agora há uma pequena modificação, de grande signi
ficado: "Você se sente,., porque você..." A mudança
do pronome é o primeiro sinal de que o conteúdo
230 231
1® .^pmpRtrp rip ?nift
está sendo internalizado. Quando o ajudada perso
naliza para ele mesmo, abandona os pronomes na
terceira pessoa ("Eu me sinto... porque você..." ou
"Eu me sinto... porque ele, ela, eles...") e passa a
usá-lo na primeira pessoa; "Eu me sinto... porque
eu..:\
E por essa modificação que passam também
as respostas do ajudador quando é ele que perso
naliza para o ajudado. De "Você se sente... porque
ele, ela, eles, etc....", o formato passa para "Você
se sente... porque você.,.'".
PERSONALIZANDO A FALTA
O passo seguinte é levar o ajudado a identi
ficar a própria falta. Aqui, "falta" não tem a conota
ção de erro, mas de déficit ou ausência. Esse passo
se refere à descoberta daquilo que o ajudado não
sabe, ou não consegue fazer, e que o leva a seu
problema.
Aqui, as perguntas básicas são:
Como o ajudado está contribuindo para seu
problema?
O que lhe falta e que o leva a viver o seu
problema?
É e^e o momento exato em que o ajudado
assume inteira responsabilidade pela,própria_vida.
E o momento em que o "o mundo deixa de ser mau"
para ser apenas o lugar em que ele mesmo se torrva
responsável pox sua experiência.
O formato aqui é do tipo:
"Você se sente... porque você não sabe
consegue
é capaz de..."
PERSONALIZANDO O OBJETIVO
A última fase do personalizar envolve a meta
do aiudado, que é^ ng geral, inversa à faJla.
A pergunta aqui é a seguinte;
O que o ajudado pode fazer para resolver o
seu problema?
Se lhe falta alguma coisa, é preciso identificar
um objetivo que, quando alcançado, o levará a
preencher a lacuna.
O formato inclui o sentimento, a falta e o
objetivo: "Você se sente... porque você não sabe...
e você gostaria de... (objetivo).
Q.objetivo é p último elemento do.processo,
cjja identificação vai possibilitar ao ajudado ela^-
rar seu programa de ação, ou determinar a direção
^__sua mudança. É a meta que lhe diz "onde ele
quer chegar." O como vai ser abordado no próximo
capítulo.
Vamos ilustrar essa fase com o exemplo de
um ajudado.
Marta (fala inicial):
"Bem que me avisaram sobre a ilusão da Univer
sidade. A gente entra pensando que é uma coisa,
quando chega lá vê que é outra. O sistema em que
vivemos é terrível, e a Universidade é seu reflexo.
232 233
1® RpmpRtrí» flp ?nifi
Não tem nem um professor que preste. São todos
incompetentes, não sabem dar a matéria e depois
exigem o que não deram. Desse jeito, acho que vou
acabar saindo do curso sem saber nada".
Resposta intercambiável de sentimento e con
teúdo;
"Você fica revoltada, Marta, porque a Universidade
não é aquilo que você esperava".
Resposta personalizada de conteúdo:
"Você está se sentindo frustrada porquç você não
está tendo o aproveitamento que gostaria com o
curso".
Resposta personalizada de falta;
"Você fica insatisfeita, Marta, porque você não está
sabendo como aprender as coisas que precisa em
condições de ensino tão desfavoráveis".
Resposta personalizada de objetivo;
"Você está preocupada, Marta, porque não está sa
bendo como aprender em circunstâncias tão desfa
voráveis e você gostaria de saber elaborar um pro
grama de estudo para você mesma."
Naturalmente, essesexemplos são esquemá-
ticos e simplificados em relação à vida real; apenas
ilustram os níveis de personalização e os vários tipos
de respostas.
Numa interação real, as respostas personali
zadas nem sempre ocorrem próximas umas das ou
tras. Na maior parte das vezes, o ajudador volta às
intercambiáveis entre as respostas personalizadas
que formula. Isso permite ao ajudado assimilar gra
dualmente a sua responsabilidade diante da situação
que está vivendo, Apesar de saudável e indispensá
vel a uma vida satisfatória, a personalização é um
processo doloroso que deve ser conduzido com ex
tremo cuidado pelo ajudador. Não há dúvida de que
é mais confortável, apesar de inefetiva, a posição
de tomar os outros responsáveis pelo próprio sofri
mento. Deixar de acusá-los e assumir a responsabi
lidade pela própria vida é um processo gradual e
lento, por causa da dor que provoca. A verdade a
respeito de nós mesmos é certamente a que mais
nos fere; por isso, deve ser "tomada em pequenas
doses".
Tudo isso deve ser levado em conta pelo aju
dador, especialmente nos momentos em que o
ajudado nega suas respostas personalizadas. Sua
recusa em aceitá-las é sinal de que ele não está
pronto ainda para ver sua verdade; é sinal de que o
ajudador se enganou, pensando que já era hora de
ajudá-lo a ver sua parcela. Isso em nada prejudica
o processo, desde que o ajudador volte a níveis in
tercambiáveis de resposta. Isso significa apenas que
esse processo precisa caminhar num ritmo mais
lento, que é o ritmo do ajudado. Mais tarde, o aju
dador faz novas tentativas, até que o ajudado esteja
pronto para personalizar sua experiência.
Um último ponto que gostaríamos de men
cionar é como os sentimentos do ajudado se modi
ficam à medida que se desenrola o processo de per
sonalização. Marta, por exemplo, sente-se revoltada
a princípio, depois frustrada e por fim insatisfeita
234 235
1® .^pmeRtrft rlft ?niR
consigo mesma. No imcio, os sentimentos são diri
gidos para fora, em especial para as pessoas que
convivem com o ajudado. Este costuma experimen
tar raiva, revolta, mágoa e ressentimento, porque
responsabiliza as outras pessoas por sua vida, e elas
raramente atendem a suas expectativas. Mais tarde,
ele se volta para dentro de si mesmo e se sente preo
cupado, ameaçado, insatisfeito. E um movimento
de fora para dentro - caracteriza a metamorfose da
vítima, que se transforma em agente ç muda a
direção da própria vida.
PERSONALIZANDO
O que é:
Mostrar ao ajudado sua parcela de responsabilidade
diante da situação,que está vivendo.
Para que:
Se personalizo para o ajudado, facilito sua com
preensão do papel que desempenha no próprio pro
blema de modo a poder resolvê-lo.
Como;
1. Lançar uma base intercambiável.
2. Internalizar o conteúdo, usando o formato:
"Você se sente... porque você...'*
3. Identificar a falta, usando o formato:
"Você se sente... porque você não sabe..."
4. Identificar a meta, usando o formato:
"Você se sente... porque você não sabe... e você
gostaria de..."
236
1® Sí>m#>Rtrp Hfi
237
Sou eu que faço você sofrer?
Ou é você que sofre por minha causa?
Ou, ainda, é você que sofre por sua própria
causa?
Chegar a essa pergunta (leva anos'e anos) é
essencial na relação de amor, A resposta deman
dará muito tempo, sofrimento e, em cada caso, será
diferente, Mas, se encontrada, melhorará qualquer
relação. Ou constatará o seu término.
Proponho, como exercício, uma atitude de
troca. Onde se lê sofrer, leia-se feliçar (eu feliço,
tu feliças, ele feliça, nós feliçamos, vós feliçais,
elesfeliçam). Por que felicidade não tem verbo?
A pergunta, então, ficaria: Sou eu que faço
você feliz, ou é você que feliça por minha causa?
Curiosa e masoquista a vida. O verbo sofrer
é complicado. Feliçar é simples. Por que a gente
prefere conjugar o sofrer?
Artur da Távola
^ f "A ^ y
(rm ■
i:
/ í
A-
%
238
1® 901 ft
ORIENTANDO
(abrindo as portas da realização)
241
1® SpmpRtrft rip ?nift
í
2%^
í
/
29^
5223
'^j?
«8?
%
«e
Oi^íettta»': fiabifidatíe opcionat
Assim como todo processo de ajuda efetivo
tem como resultado uma ou várias mudanças por
parte do ajudado, nem sempre essas mudanças ocor
rem mediante a orientação do ajudador. Isso quer
dizer que, tendo explorado sua situação insatisfa
tória e compreendido as várias peças dessa situação,
o ajudado, muita vezes, elabora sozinho seu progra
ma de ação. Seu processo de exploração e com
preensão só foi possível porque as habilidades de
sintonizar e responder do ajudador foram efetivas
no decorrer da relação de ajuda. As dimensões de
aceitação, empatia, respeito e genuinidade encon
tradas na relação propiciaram um ambiente rico em
calor humano e o levaram a descobertas inéditas a
seu próprio respeito. A partir desse processo de
autoconhecimento, ele foi capaz, algumas vezes,
de personalizar sua própria experiência. Agora,
também na fase de ação, sua mudança pode brotar
espontaneamente de dentro dele, sem que, para isso,
seja necessária a orientação do ajudador. Cada passo
de seu programa de ação flui naturalmente numa
seqüência harmoniosa, como resultado das etapas
243
1 ® Remestrp rip 901R
básicas do processo de ajuda: o sintonizar e o res
ponder, por parte do ajudador, o levou, como con
seqüência, à exploração e compreensão.
Em outros momentos e em algumas áreas
específicas de ajuda, a habilidade de orientar é indis
pensável para que a ação seja desencadeada. Isso é
especialmente verdade nas situações em que o aju
dado não tem o domínio da área em que a ajuda
está ocorrendo; o aluno e o paciente são ajudados
que ilustram bem essa situação. O professor pode
ser a melhor pessoa para ajudar o aluno a elaborar
um programa de estudo; ou ajevantar todas as alter
nativas de lugares em que ele pode fazer estágios
ligados à sua área acadêmica. Por outro lado, só o
médico pode apresentar as várias soluções para a
cura do paciente. Ou só o dentista pode sugerir o
melhor material a ser usado na restauração oral de
seu cliente. Mesmo nesses casos, a decisão última
é do ajudado: o ajudador o orienta, e ele escolhe
seguir ou não sua orientação.
Nào siga
por onde o caminho o levar.
Ande, melhor, onde
não há caminho
e deixe, por onde passar,
uma trilha.
^ovmoSimcnic
QUEM DÁ A DIREÇÃO?
O ajudado, sempre.
O papel do ajudador ao orientar é apenas faci
litar a decisão do ajudado ou elaborar, com ele, um
ou vários planos de ação, nunca decidir por ele.
Mesmo quando o ajudado não tem conheci
mentos técnicos de uma determinada área, e o aju
dador lhe aponta a melhor direção (submeter-se a
uma cirurgia, por exemplo), cabe ao primeiro decidir
se vai ou não seguir a orientação do segundo.
Cada pessoa é a maior autoridade em sua
própria vida.
O ajudado tem o direito de decidir o que é
melhor para ele, mesmo que sua decisão não seja a
melhor de acordo com a visão do ajudador. Este
pode, quando muito, expressar seus sentimentos
diante da direção que o ajudado vai tomar:
"Fico preocupado quando vejo você adiar
muito essa cirurgia".
"Sinto-me pesaroso por você ter decidido não
participar do grupo".
244 245
1° .Semftstrp dft ?niR
É muito importante também que o ajudador
expresse sentimentos positivos diante da decisão
tomada pelo ajudado;
"Fico alegre por você ter resolvido ficar com
esse emprego'*.
"Sinto-me aliviado por você ter decidido ex
pressar tudo isso a ele".
Em algumas situações, o ajudador pode tam
bém avaliar, com o ajudado, quais serão as conse
qüências por seguir uma ou outra direção/
"Se você resolver que é melhor não fazer o re
pouso, sua gravidez corre o risco de ser interrompida".
"Se você fizer estágio nessa empresa, aumenta
a chance de ser contratado depois de formado".
De resto, com ou sem conseqüências, é o aju
dado que dá direção à sua vida.
QUANDO A ORIENTAÇÃO É FORMAL
Algumas vezes, no momento em que o aju
dado decide agir numa determinada direção, há
algumas informações por parte do ajudador que lhe
facilitam a ação.
Orientar, então, seria fornecer ao ajudado os
dados necessárias â obtenção do objetivo que ele
mesmo escolheu.Esse objetivo já foi identificado quando o aju
dado personalizou sua experiência, percebendo sua
falta e determinando a meta a ser alcançada.
Às vezes, o ajudado percebe o objetivo como
estando muito distante dele, ou como sendo muito
grande para ser alcançado de uma só vez. Se o
ajudador orientá-lo de modo a decompor esse ob
jetivo em pequenos passos, vai aumentar sua chance
de sucesso. Às vezes, basta que o ajudador o leve a
encontrar o primeiro passo. Ao executá-lo, todos
os outros brotam em seguida.
Algumas informações também facilitam esse
processo de ação: quem, onde, como, quando,
quanto, etc. De posse delas, o ajudado se sente mais
pronto para começar a agir.
E importante que o ajudador, nessa fase, não
se esqueça das outras habilidades. Lembrando que
o modelo de ajuda é cumulativo e que cada habili
dade é pré-requisito para a seguinte, o ajudador
deverá continuar atendendo, observando e es
cutando as possíveis reações do ajudado, respon
dendo intercambiaveímente e personalizando no
vamente se necessário.
Por fim, quando o ajudado executa sua ação
e volta com os resultados, todo o processo é re
ciclado: a análise desses resultados consiste em nova
exploração e compreensão, originando novas ações
mediante a reciclagem das habilidades de ajuda
(sintonizar, responder, etc.).
Outro ponto a ser lembrado é a importância
de o ajudador compartilhar com o ajudado a alegria
diante do sucesso de sua ação; ou, caso contrário,
de aceitar o seu fracasso e tentar determinar, junto
com ele, onde e por que fi-acassou. O fundamental
é estar sempre junto do ajudado, em quaisquer
circunstâncias.
246 247
1 ® .Sí^rnpRtrft ris 901 ft
o sígnijlcatío da mudança
Ninguém procura eyuda se não estiver preten
dendo algum tipo de mudança em sua vida. Nenhum
processo de ajuda terá sido efetivo se sairmos como
entramos: do mesmo tamanho, sem que tenha ha
vido crescimento - seja físico, emocional, profis
sional, intelectual, espiritual.
O fim último da relação de ajuda é a
mudança do ajudado.
Já vimos como a exploração o leva a saber on
de está e como a compreensão o leva a escolher aon
de quer chegar. Quando ele identifica esses dois pon
tos, é hora de traçar o caminho que vai levá-lo de um
ao outro. É hora de agir. Agir, aqui, significa encon
trar uma direção na vida, mudar para melhor, crescer.
Quando a mudança não ocorre, alguma coisa
falhou nas fases anteriores do processo: pode não
ter havido compreensão suficiente, ou exploração
suficiente. Ninguém pode decidir como chegar a
algum lugar se não sabe onde fica esse lugar, ou se
nem sabe qual é o ponto de partida. Nesse caso, a
solução é voltar ao ponto em que o processo falhou:
é como dar a ré num carro que vai pegar "embalada"
para subir o morro. Voltar atrás significa, às vezes,
ganhar mais força para agir depois com mais se
gurança.
MUDANÇA INTERNA X MUDANÇA
EXTERNA
Uma das habilidades de vida mais caracte
rísticas da pessoa em crescimento é sua capacidade
de diferenciar aquilo que está sob seu controle da
quilo que não está.
Nós, seres humanos falíveis, temos a pre
tensão, às vezes, de controlar O mundo e as pessoas
que nos cercam. E tão insuportável a idéia de nossa
própria impotência, que preferimos "dar murro em
ponta de faca" ao invés de aceitarmos nossas limi
tações - e acabamos por descobrir que nada mudou;
e que, além disso, nossas mãos sangram e doem de
tanto esmurrar, inutilmente, as facas da vida.
É fundamental, antes de iniciarmos qualquer
mudança, que possamos determinar qual é o nível
dessa mudança ~ interno ou externo.
Quando a situação externa é passível de mu
dança, começo a agir diretamente sobre ela, dando-
lhe a direção que melhor me atende. Ao final de um
processo de ajuda, posso descobrir que não trabalho
no melhor lugar; que não faço o curso que realmente
queria; que não vivo com a melhor pessoa; ou que
não me permito desfhitar de tudo a que tenho di
reito. Quando trabalhei o bastante nos meus senti
mentos e nos significados de minhas vivências, pos-
248 249
1° flp ?nift
so decidir largar atividades, coisas e pessoas, trocá-
las por outras ou adquirir novas. No momento em
que fizer isso, vou estar livre para viver uma vida
mais plena, mais satisfatória.
Por outro lado, há situações externas imutá
veis. Delas fazem parte, por exemplo, os sentimen
tos, pensamentos, palavras, decisões e atos de ou
tras pessoas, sobre as quais não tenho controle. Não
posso nem consigo impor minha vontade sobre o
outro como se fosse seu dono. As pessoas são livres
e não vieram ao mundo para atender minhas expec
tativas. Se o fazem, não é porque me atendem, mas
porque atendem a elas próprias e, coincidentemente,
queremos as mesmas coisas. Felizmente, o que é
bom para mim, às vezes é bom também para o outro.
Isso é muito bem ilustrado no pequeno poema de
Fritz Perls, o criador da Terapia da Gestalt;
Eu faço minhas coisas, você faz as suas
Não estou neste mundo para viver de acordo com
suas expectativas
E você não está neste mundo para viver de acordo
com as minhas
Você é você, e eu sou eu
E se por acaso nos encontrarmos, será lindo
Se não, nada há afazer.
Além de pessoas, há situações também irre
versíveis e eventos irrevogáveis: a morte de alguém,
a perda de um braço num acidente, uma cirurgia
mutiladora, uma doença incurável, qualquer tipo
de limitação física, o próprio envelhecimento. En
tão, nada nos resta senão aceitar, conviver com e
admitir, humildemente, nossa impotência. Posso
tentar tornar-me menos vulnerável aos eventos
externos. Quando, num processo de ajuda, admito
minha impossibilidade de mudar o imutável e decido
aceitar a realidade que me cerca, posso reciclar esse
processo, iniciando uma nova etapa de crescimento
na qual a ação se passa dentro, e não fora de mim.
Fato
Não é Justo!
Não é bom,
Não é certo,
Não é limpo!
Não é coerente,
Não é maduro,
Não é sincero,
É desumano!
Não é decente,
Não é viável,
Não tem razão,
Não há quem entenda,
Não há quem aceite,
Não há quem aprove,
Ninguém gosta!!
Não engulo!
Mas é fato.
E contra osfatos não há argumentos.
Cláudia Myriam Botelho
250
1® f1« 9nift
251
Um último ponto a respeito de mudança e
ação: quando vivemos uma situação incômoda, nos
sa tendência é agir o mais rápido possível para "nos
vermos livres" da situação. Quando isso ocorre, aca
bamos tomando decisões apressadas e impetuosas,
sem a necessária base de exploração e compreensão.
As conseqüências dessas ações não tardam: são re
sultados desastrosos que poderíamos ter evitado
se soubéssemos lidar melhor com os momentos de
crise. É quando não Jazer nada também é fazer
alguma coisa. Não agir, em direção alguma, tam
bém é uma decisão. "Não fazer nada" externamente
significa fazer muitas coisas internamente, de modo
a nos compreendermos melhor e podermos, mais
tarde, agir na melhor direção.
ORIENTANDO
O que é;
Oferecer ao ajudado as informações necessárias à
obtenção de sua meta e avaliar com ele as alter
nativas para alcançá-la.
Para que:
Se oriento o ajudado, aumento a chance de ele al
cançar sua meta, de modo a promover as mudanças
desejadas por ele.
Como:
1. Decompor o objetivo em passos,
2. Identificar o primeiro passo.
3. Informar o que, quem, onde, como, quando,
quanto, etc...
4. Reciclar.
252 253
1" .Spmpslrp rip 901 fi
Oração da Serenidade
Deus me dê a serenidade para aceitar as
coisas que não posso mudar,
a coragem de mudar as coisas que posso
mudar,
e a sabedoria para conhecer a diferença.
Oração dos Alcoólatras Anônimos
254
7. •.
1® SftmpRtrA dp 901 ft
<<•--
.-V,
•VS
K':
ÍV*'l
m
^ »v
v>
X.
^S:- >»
-?1
SS-;
VóV
Existe jlm para o processo ãe
ajuda?
Sim e não.
S/m, para a relação dé ajuda formal, em que
ajudador e ajudado se encontraram regularmente
durante um certo tempo com a finalidade de cami
nharem juntos no processo de autoconhecimento
do ajudado.
Nessa relação, o momento de parar chega
quando o ajudado se transforma em ajudador - é
quando ele é capaz de fazer, consigo e com os ou
tros, o que a ajudador fez por ele todo esse tempo.
Eleja sabeacolher-se, atender-se, observar-se, escu
tar-se e assim por diante. Ele é capaz de identificar
seus próprios sentimentos e as razões pelas quais
os experimenta. Ele já sabe qual é sua parcela de
responsabilidade em cada situação e age para mudar,
sempre, para melhor.
A^ao, para a relação de ajuda que a pessoa
estabelece informalmente consigo mesma e com os
outros, a partir do modelo oferecido pelo ajudador.
Num processo efetivo, as habilidades de ajuda são
assimiladas de tal forma pelo ajudado, que se tomam
um estilo de vida. Ele não as esquecerá jamais e
passará o resto de sua vida sendo seu próprio ajuda
dor e o ajudador daqueles que o rodeiam.
Ele será a pessoa essencialmente humana que
Powell define como aquela capaz de manter o equi
líbrio entre sua "interioridade" e a sua "exterio-
ridade"; interioridade na medida em que vive em
níveis profundos de auto-aceitação; exterioridade,
na medida em que sintoniza com o outro em alto
grau de empatia.
Ele será a pessoa plena que sabe, ao mesmo
tempo, escutar os caminhos do coração e decidir, a
cada momento, se deve ou não segui-los. Ele será
a pessoa madura que se permite sentir tudo o que é
seu e, ao mesmo tempo, discriminar quais senti
mentos devem ser transformados em ação e quais
devem ser apenas guardados do lado esquerdo do
peito.
Acima de tudo, ele será a pessoa inteira, capaz
de reformular, a cada dia, sua própria direção. Sua
bússola são seus sentimentos, e seus caminhos são
os do coração. Afinal, há uma coisa que ele pode
fazer, eternamente, sem limitações: crescer, sempre
crescer.
256 267
1° .^pmpRtrp Hfi 90^R
o momento de se iniciar uma vida autêntica
e se afastar da traição e da alienação está sempre
presente. Não importa o quãopresa esteja a pessoa
ao mundo alheio, às racionalizações, análises e
inielectualizaçôes; não importa quão imersa esteja
em padrões, valores e metas do sistema ~ ela pode
decidir, no momento seguinte, alterar todo o curso
de sua vida. Ela ainda pode se transformar naquela
que realmente é, criando novos significados e
valores e realizando potenciais mais condizentes
com o seu verdadeiro eu. Ninguémpode lhe impedir
de fazer isso. E, em nenhuma circunstância pode-
se prever o que a pessoa fará. Independentemente
de seu passado, em qualquer situação ela pode
reativar as verdadeiras direções do eu. Esta é uma
verdade para qualquer pessoa: a qualquer mo
mento, ela pode escolher tomar-se ela mesma, que
é o único caminho para uma existência autêntica.
Clark Moustakas
258
1® Sftmftfttrp Hr ̂ niR
é
••
...o,;-.?.
v"
?1
/r
'.w-
-'i :
«5' ^
-
;.Ú
&
5
1.-.'
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CARKHUFF, R. R. Helping andHuman Relations.
Holt, Rinehart and Winston, New York, 1969.
CARKHUFF. R. R. & ANTHONY. W. A. TheArt
ofHealíh Core. HRD Press, Amherst, 1976.
& . The Skills of Helping. HRD Press,
Amherst. 1979,
CARKHUFF, R. R.; PIERCE, R. M.; CANNON,
J. R. The Ari of Helping IV. HRD Press,
Amherst, 1980.
ELLIS, A. Reason andEmption in Psychoíerapy.
Lyle Stuart, New York, 1962.
GENDLIN. E. T apud MOUSTAKAS, C. E.
Descobrindo o Eu e o Outro. Editora Crescer,
Belo Horizonte, 1994.
GIBRAN, K. apud MOUSTAKAS, C. E.
HODDINOTT, R apud MOUSTAKAS, C. E.
MOUSTAKAS, C. E. Descobrindo o Eu e o Outro,
Editora Crescer, Belo Horizonte, 1994.
PERLS, F. S. GestaluTerapiaExplicada. Summus
Ed., São Paulo, 1976.
POWELL, J. Por Que Tenho Medo de lhe Dizer
Quem Soul Editora Crescer, Belo Horizonte,
1985.
. O Segredo do Amor Eterno. Editora Crescer,
Belo Horizonte, 1987.
RTLKE R. M. apud POWELL, J, O Segredo do Amor
Eterno. Editora Crescer, Belo Horizonte, 1987.
ROGERS, C. R. et alli. The lherapeuticRelationship
and its Impact: a Study of Psychotherapy with
Schizophrenícs. The University of Wisconsin
Press, Madison, 1967.
apud Moustakas, C. E.
TÁVOLA, A. Alguém quejá nãofui. Salamandra,
Rio de Janeiro, 1978.
TOURNIER. P. apud POWELL, J. Por Que Tenho
Medo de lhe Dizer Quem Sou? Editora Crescer,
Belo Horizonte, 1987.
260 261
1° .^pmpstrp! flp ?nifi

Mais conteúdos dessa disciplina